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REPÚBLICA,

PORTUGUESA

CÂMARA DOS

EM 16 DE ABRIL DE 1920

• Presidência do Ex.mo Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso

Baltasar de Almeida Teixeira

Secretários os Ex,mos Srs,

António Marques das Neves Mantas

Sumário. — Abre-se a sessão com a presença de 33 Srt. Deputados.

É lida a acta da sessão anterior. Posta em dis- r cussão, o Sr. António Fonseca usa da palavra solicitando esclarecimentos. Responde-lhe o Sr. Presidente.

Verificando-se a presença de 67 Srs. Deputados, é a acta aprovada.

Dá-se conta do expediente.

São admitidas à discussão algumas proposições de lei.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Presidente explica as condições em que são- nomeados pela Mesa os~ Srs. Deputados que vão substituir nas comissões os seus colegas impossibilitados de continuar a colaborar nos trabalhos das mesmas.

Usa da palavra sobre este assunto o Sr. Velhinho Correia.

Volta a usar da palavra o Sr. Presidente.

Utam da palavra para explicações os Srs. António Fonseca e Velhinho Correia.

O Sr. Presidente anuncia que vai consultar a Câmara sobre a matéria em discussão. , Usam da palavra sobre o modo de votar os Sra. Álvaro de Castro, Velhinho Correia, António Fonseca, Brito Camacho, Presidente, António Maria da Silva e Pedro Pita.

O Sr. Presidente submete à votação o assunto em discussão, e a Câmara pronuncia-se no sentido dos alvitres propostos pelos Srs, Brito Camacho e Álvaro de Castro.

O Sr. Ministro da Guerra (Estêvão Aguas) manda para a Mesa uma proposta de lei.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Xavier da Silva) requere que entre imediatamente em discussão o' parecer n.° 892.

tio dia. — (Continuação da discussão da proposta de lei do Sr. Ministro da Justiça sobre a forma de julgamento dos fabricantes e portadores de bombas explosivas).

O Sr. Ladislau Batalha, que ficara com a pá lavra reservada, na sessão anterior, conclui as

Q Sr. Vasco de Vasconcelos usa da palavra sobre a ordem e manda para a Mesa a sua moção.

Lida na Mesa, é admitida.

O Sr. Cunha Liai requere que entre imediatamente em ordem do dia, com prejuízo de qualquer outra discussão a interpelação do Sr.r Costa Júnior ao Sr. Ministro da Agricultura. É rejeitado.

Proccde-se à contraprova, requerida pelo Sr. Cunha Liai, e que dá o mesmo resultado.

Usa em seguida da palavra, sobre a ordem, o Sr. Mesquita de Carvalho, que manda para a Mesa a sua moção.

O Sr. Presidente interrompe o orador para lhe observar que tendo a Câmara resolvido que a interpelação do Sr. Costa Júnior se realizasse na 2.* parte da ordem do dia, e tendo dado a hora de se passar a essa 2." parte, pode o orador ficar com a palavra reservada.

O Sr. Mesquita Carvalho desiste de continuar nas suas considerações.

líi admitida a moção do Sr. Mesquita Carvalho.

Segunda parte da ordem do dia. — O Sr.' Ministro da Agricultura (João Luís Bicarão) que ficara com a palavra reservada na sessão anterior conclui a sua resposta às considerações do Sr. Deputado interpelante. •

Segue-se no uso da palavra o Sr Cunha Liai. Tendo dado a hora de se encerrar a sessão, o orador fica com a palavra reservada.

Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Aseméis) cha-iha a atenção do Sr. Ministro da Agricultura para o facto de não lhe terem sido ainda fornecidos pelo seu Ministério alguns documentos por ele requeridos.

Mesponde-Lhe o Sr. Ministro da Agricultura (João Luís Ricardo).

O Sr. Presidente do Ministério promete atender às reclamares feitas pelo Sr. Manuel José da Silva.

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Abertura da sessão às 14 horas e 50 minutos.

Presentes à .segunda chamada 67 Srs. Deputados.

São os seguintes:

Acácio António Camacho Lopes Cardoso.

Afonso do Macedo.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Ernesto do Sá Cardoso.

Álvaro Pereira Guedes.

Álvaro Xavier de Castro.

António Albino de Carvalho Mourão.

António Albino Marques de Azevedo.

António da Costa Ferreira.

António da Costa Godinho do Amaral.

António Dias.

António Francisco Pereira.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Joaquim Granjo.

António Marques 'das'Neves-Mantas.

António de Paiva Gomes.

António Pires de Carvalho.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Augusto Pereira Nobre.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira. *

Cõnstâncio Arnaldo de Carvalho.

Custódio Martins de Paiva.

Diogo Pacheco de Amorim. . Domingos Cruz.

Domingos Frias de Sampaio e Melo..

Eduardo Alfredo de Sousa.

Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Francisco José Pereira.

Francisco de Pina Esto vês Lopes.

lloldwr Armando dob Santos Ribeiro.

Jaime da Cunha Coelho.

João Estêvão Aguas.

João José da Conceição Oamoesa».

João Luís Ricardo.

.To H o

João Xavier Camarate Campos.

Joaquim Brandão.

José António da Costa Júnior."

José Garcia da Costa.

José Maria de Campos Melo.

José Mendes Nunes Loureiro.

Josó Monteiro.

José de Oliveira Ferreira Diniz.

Júlio Augusto da Cruz.

Diário da Câmara dos Deputados

Júlio César de Andrade Freire.

Ladislau Estêvão da Silva Batalha.

Luís .António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís Augusto Pinto de Mesquita Car-vaDio.

Manuel do Brito Camacho.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso,

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel' Josó da Silva.

Manuel José da Silva.

Mariano Martins.

Orlando Alberto Marcai.

Pedro Gois Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio do SanfAna e Silva.

Raul Leio Portela.

Tomás de Sousa Rosa.

Vasco Guedes do Vasconcelos.

Ventura Malheiro Roimão.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Máximo 0*0 Carvalho Guimarães.

i

Srs. Deputados que entraram durante a sessão.

Afonso jle Melo Pinto Voloso.

Aníbal Lúcio do Azevedo.

António Augusto Tavares Ferreira.

António José Pereira.

António Maria da Silva.

Augusto Dias da Silva.

Bartolomeu dos Mártires Sousa Seve-rino.

Custódio Maldonado de Freitas'.

Domingos Leite Pereira.

Francisco Pinto da Cunha Liai.

Henrique Vieira do Vasconcelos.

Hermano José de Medeiros.

Jaime Júlio de Sousa.

João Cardoso Moniz Bacelai*. -

João Gonçalves.

João Pereira Bastos.

João Teixeira do Queiroz Vaz Guedes.

José MH n íi <í3 p='p' m.='m.' hirhnsl='hirhnsl' fle='fle' villiftn.il='villiftn.il'>

Júlio do Patrocínio Martins. . Lino Pinto Gonçalves Marinha. Lúcio Alberto Pinheiro doa -Santos, Luís do Orneias Nóbroga Quintal. Rodrigo Pimenta Massapina. Vasco Borges.

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Stsaão de 16 de Abril de 1920

Srs. Deputados que não comparece' ram à sessão:

Abílio Correia da Silva Marcai.

Adolfo Mário Salgueiro Cunha.

Afonso Augusto da Costa.

Alberto Álvaro Dias Pereira.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Ferreira Vidal.

Alberto Jordcão Marques da Costa.

Albino Vieira da Rocha.

Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.

Alfredo Pinto do Azevedo e Sousa.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Amílcar da Silva Ramada Curto.

Angelo do Sá Couto da Cunha-Sampaio Maia.

Antão Fernandes de Carvalho.

António Aresta Branco.

António Bastos Pereira.

António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.

António Carlos Ribeiro da Silva.

António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.

Aníóuio Joaquim Machado do Lago Cerqnára.

António LObo do Aboiin Inglês.

António Maria Pereira Júnior.

António Pais Rovísco.

António dos Santos Graça.

Augusto Joaquim Alves dos Santos.

Augusto Rebelo Arruda. /

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Domingos Vítor Cordeiro Rosado.

Estêvão da Cunha Pimentel.

Francisco Alberto da Costa Cabral.

Francisco Coelho do Amaral Reis. •

Francisco Cotriin da Silva 'Garcês.

Francisco da Cruz.

Francisco da Cunha Rego Chaves.

Francisco José Martins Morgado.

Francisco Josó de Meneses Fernandes Costa.

Francisco Luís Tavares.

Francisco Manuel Concoiro da Costa,

Francisco do Sousa Dias»

Henrique Ferreira de Oliveira Brás.

Jacinto do Freitas.

Jaime do Andrade Vilaros.

Jaime Daniel Lectfe do I?êgo.

Joíto Honrlquos

JoTto Josó Lnís

João Lopes Soaros.

Jof!.;i Alaria Santiago Couvcúi Lo

João Ribeiro Gomes. . João Salema.

Joaquim Aires Lopes do Carvalho.

Joaquim José do Oliveira.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Domingos dou oumo^.

Josó Gomo» Carvaíno ao Sousa Varela -

José Gregório de Almeida.

Josó Mendes .Kibeiro JNorton ae Matos.

José Rodrigues Braga.

Leonardo José Coimbra.

Liborato Damião Ribeiro Pinto.

Manuel Alegre.

Manuel Josó Fernandes Costa.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Maximiano Maria de Azevedo Faria.

Mem Tinoco Verdial.

Miguel Augusto Alves Ferreira.

Nuno Simões.

Raul António Tamagnini de Miranda Barbosa.

Vítor Josó do Deus do Macedo Pinto.

Vitorino Henriques Goclinho.

As 14 horas e 20 minutos principiou a fazer-se a chamada. Pausa.

O Sr. Presidente : — Estão presentes 33 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.

Eram 14 horas e 50 minutos.

Foi lida a acta,

O Sr. António da Fonseca (para interrogar a Mesa); — Desejava que V. Ex.a me dissesse o que pensa a Presidência acerca da situação eni que se encontram os Srs. Deputados que foram substituídos nas comissões pelo facto do desempenharem lugares que transitoriamente são incompatíveis com ossíis comissões. Assim, por exemplo, comigo só dá o caso do fazer parte dalgumas comissões nas quais fui substituído durante o tempo quo fui Ministro das F-inanças.

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Diário da Gamara dos Deputados

O Sr. Presidente: — Sou absolutamente da opinião .de V. Ex.a

O Orador: — Quere dizer: as pessoas que me substituíram regressam aos seus-lugares e eu tomo o meu nas comissões de que faço parte.

O Sr. Velhinho Correia: —Peço a palavra para interrogar a Mesa.

O Sr. Presidente: — Está em discussão a acta e por isso não posso dar a palavra a V. Ex.a sem que ela seja aprovada.

O Sr. Velhinho Correia: — Nesse caso não só considera como fechada a discussão há pouco levantada pelo Sr. António Fonseca.

O Sr. Presidente:

segunda chamada. Pausa.

-Vai proceder-se à

O Sr. Presidente:—Estão presentes 67 Srs. Deputados.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Foi aprovada a acta e deu-se conta do seguinte

Expediente ,-.

Pedidos de licença

Do Sr. António Pais Bovisco, 15 dias.

Do Sr. José Garcia da Costa, 10 dias.

Para a Secretaria.-

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Justificação de faltas

Do Sr. Abílio Marcai até 30 de Março. Para a comissão de infracções e faltas. ' , . Ofícios

Do Ministério do Trabalho, enviando os documentos requeridos pelo Sr. Campos Melo, em 24 de Fevereiro último.

Para a Secretaria..

Do Presidente do Conselho Superior de Disciplina do Exército, pedindo autorização para comparecer naquele'Conselho, no dia 27 do corrente, pelas 13 horas*, o Sr. Álvaro de Castro, para depor

no processo instaurado ao tenente-coro-nel José Maria da Rosa Júnior.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Do Presidente da Junta Geral do distrito de Leiria, pedindo a aprovação do projecto que concede àquela- Junta o edifício que foi convento à Portela de Leiria.

Para a Secretaria.

Do Presidente da Junta Geral do distrito de Faro, acompanhando três representações, pedinclo que sejam tomad.is na devida consideração.

Para a Secretaria.

Admissões

Foram admitidas à discussão as seguintes : .

Propostas de lei

i

j Do Sr. Ministro das Finanças, criando. ' um Conselho Superior, de Fiscalização | dos Serviços Públicos; alterando a contribuição industrial; criando um imposto sobre fi.s rmftvaçfifls da. Bolsa: criando uma cédula pessoal obrigatória e alterando algumas disposições da contribuição de juros.

Para a Secretaria.

Admitido.

Para a comissão de finanças.

Do mesmo Sr. Ministro, mandando proceder, no ano de 1920, ao recenceamento geral dos gados existentes na metrópole.

Pára a Secretaria.

Admitida.

Para a comissão de agricultura. •

Dos Srs. Ministros das Finanças e Agricultura, autorizando a expropriação, por utilidade pública, de terrenos incultos para estabelecer o Casal Agrícola do Soldado. - Para a Secretaria.

Admitido.

Para a comissão de agricultura.

Do Sr. Ministro da Agricultura, estabelecendo o princípio da exploração em comum dos baldios.

Para a Secretaria.

Admitida.

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Sessão de 16 de Abril de Í920

Do mesmo Sr. Ministro, autorizando o Ministério da Agricultura a despender até "1:000 contos para aquisição de propriedades rurais.

Para a Secretaria.

Admitida.

Para a comissão de Agricultura.

Do mesmo Sr. Ministro, autorizando o Governo a vender ou trocar a herdade da Mitra e adquirir outra propriedade rústica para campo de demonstração da Estação Agrícola da 7.a Região.

Para a Secretaria.

Admitida.

Para a comissão de agricultura.

Dos Sr s. Ministros das Finanças e Agricultura, transferindo verbas do capítulo 2.°, artigos 8.° e 10.° para o capí-> tulo 7.°, artigo 38.°, do Orçamento do Ministério da Agricultura, para reforço da verba destinada a designadas despesas, nos postos zootécnicos.

Para a Secretaria,

Admitida.

Para a comissão da agricultura.

Representações

Da Junta Geral do Distrito de Faro, pedindo autorização para lançar designa-dos impostos a fim de realizar melhoramentos cm toda a província.

Para a Secretária.

Para a comissão de administração pú-.blica. .

Da comissão executiva da Junta Geral de Faro, pedindo a proibição da importação, nesta província, de amêndoas do norte.

Para a Secretaria.

Para a comissão de comércio e indústria.

Da- mesma comissão, pedindo a .proibição do expor a alfarroba ao ar livre, depois de Setembro.

Paru a /Secretaria.

Para a comissão de comércio e indústria.

De ux-cubos do extinto regimento do caçadores n.° 9, pedindo a aprovação do projecto n.° 217, do 1917, apresentado pelo Sr. Angelo Vaz.

Para a Secretaria,

JL\ira í--, contusão de guerra,

De habitantes da povoação de Burgau, concelho de Vila do Bispo, pedindo que aquela povoação seja anexada à freguesia de Nossa Senhora da Luz, concelho de Lagos, deixando de pertencer a Budens, de Vila do Bispo.N

Para a Secretaria.

Para a comissão de administração pública.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: — Com referência ao assunto há pouco tratado pelo Sr. António Fonseca eu devo dizer qno os Depu-tado.s que transitoriamente não podem desempenhar os seus lugares nas comissões, tem sido praxe estabelecida, substituí-los por indicação da Mesa; ruas essa substituição é provisória o não definitiva.

O Sr. Velhinho Correia (para invocar o Regimento}:—Pedi a palavra para fazer uns ligeiros reparos à interpretação que V. Ex.a acaba de dar.

V. Ex.a,funda-se apenas na tradição; e eu fundamento as minhas observações na doutrina do Regimento no seu artigo 84.° que diz o seguinte:

«As comissões são eleitas pela Assem -blea ou nomeadas pela Mesa, por delegação da mesma Assemblea».

Isto quere dizer que tanta força tem a eleição como a nomeação feita pela Mesa com delegação da Câmarai Qucre dizer : havendo uma vaga em qualquer comissão a Mesa indica o Deputado que a vai preencher.-

O Sr. Presidente (interrompendo): — Não é para preenchimento, é para substituição !

O Orador:—Eu tenho muito gosto em que o Sr. António da Fonseca regresse à comissão de finanças aonde o estou substituindo deficientemente; o o meu único fim é deixar bem nítido que pela intrepe-tração do V. Ex.a a matéria do artigo 84.° fica sem efeito.

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tenho dado é a de substituição temporária. Todavia, seria bom aproveitar a oportunidade para se estabelecer doutrina.

O Sr. António da Fonseca:—A razão porque levantei ôste pequeno incidente é porque o Sr. M ariano Martins procurou consultar-mo sobre um projecto que tem pendente da comissão de finanças, e, como eu não sabia qual a minha situação dentro dessa comissão o de outras, desejei que ela ficasse-; bem definida.

Fazer parte' duma comissão é apenas um dever ou oorigaçao que os Deputados têm e também um direito. Eu tenho o direito de fazer parte das comissões para que fui eleito; e só posso perder esse lugar quando renuncie ao de Deputado.

Ora seria muito estranho que, pela circunstância de ter sido Ministro, um Deputado perdesse qualquer dos seus mandatos. Seria esta uma-excepção que não se pode admitir.

' Os artigos citados não tom nada com a questão. Por exemplo o artigo 171.° do Regimento não diz que um Deputado depois de deixar a sua pasta de Ministro não possa ir rocnpfirar as suas funções nas comissões para'que foi eleito.

Relativamente ao caso sujeito, dâ-se o mesmo que se observa em outras circunstâncias, como sejam aquelas em que se encontram os indivíduos que são chamados às funções de Ministre e que, ocupando- quaisquer lugares, têm .de os abandonar durante o tempo em que fazem parte do Poder Executivo, não ficando, porôm, inibidos de voltarem ao exercício desses lugares,- logo que abandonem o Governo.

A boa doutrina aí 'única doutrina aceitável ó a que nos diz que um indivíduo emquanto for Ministro não pode, fazer parte das comissões, mas conserva o di-rei^o de voltar ao seu lugar nessas comissões logo .que cesse o motivo da sua substituição.

Por isso mesmo, a substituição faz-se com o caráter de provisória. Se se tratasse duma substituição definitiva, deveria ser feita a competente eleição por esta Assernblca.

Tenho todo o direito a voltar ao meu lugar nas comissões para que fui eleito, e não estou disposto a abdicar dele.

O orador não reviu.

Diário da Câmara dos -Deputndos

O Sr. Velhinho Correia:—Sr. Presidente: eni presença das considerações, que acabam de ser expostas pelo orador antecedente, sou forçado a dizer mais alguma cousa sobre o assunto que se versa, com o fim de esclarecer o meu ponto de vista. • O artigo 84.° do Regimento, diz:.

«As comissões são eleitas pela Assern-blea ou nomeadas pela Mesa, por delegação da mesma Assemblea».

Saliento mais uma vez que a doutrina expressa neste artigo não distingue de maneira alguma entre eleitos e nomeados pelo Sr. Presidente.

Temos mais o artigo-171.° que diz:

«Os Deputados oue forem Ministros não poderão ser membros 'de nenhuma comissão; mas deverão comparecer perante as que solicitarem a sua presença, para esclarecimentos o informes».

Encontramos, pois, ne"ste artigo, clara-" monte expresso o princípio de _que quem for Ministro não podo ser membro das comissões.

Com a doutrina dôste artigo não se harmoniza, de maneira alguma o critério que' se pretende estabelecer, de (jue o indivíduo que deixou de fazer parte duma comissão polo motivo de ter sido chamado a Ministro a ela deve voltar, quando deixe de pertencer ao Governo.

Em reforço do.meu modo de ver neste assunto, posso ir buscar o caso que se passou com V. Ex.8 mesmo. Quando V. Ex.a foi chamado às cadeiras ministeriais deixou o seu lugar de Presidente desta Câmara, que então estava exercendo e para o qual tinha sido eleito por esta mesma Câmara. Mais tarde abandonou as cadeiras do Poder e não voltou para o-seu lugar. Só depois quando vagou o lugar de Presidente é que V. Ex.a para ele voltou, rnas não por 'força da primeira eleição, rnas sim por-virtude do resultado obtido numa nova eleição.

Uma voz: — Não houve substituição provisória. A substituição de S. Ex.a fora feita por unia eleição e, portanto, definitivamente.

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para Ministro deixa de pertencer às comissões de que então faça parte, para a elas voltar logo que saia do Ministério.

Diz-se só : «deixa de ser...».

Perde, portanto, o lugar. Dâ-se nma vaga. A presidência nomeia outro Deputado para a preencher e esse Deputado assim, nomeado fica exercendo o lugar vago com os mesmos direitos que tinha o ; eleito a quem foi substituir, visto quo o ' artigo 84." nãe distingue entre os eleitos ou nomeados. •

Sustento, pois, a minha doutrina apoiada nos artigos 84.° e 171.° do Regimento, o até num caso absolutamente análogo como seja o quo referi em relação ao que se .passou com V. Ex.a

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente:—Dois Srs. Dpputa-dos acabam, de defender, ambos com. muito brilho, doutrina oposta.

Prova isto que o Regimento não está claro e assim necessário se torna fixar uma interpretação.

Vou, portanto, fazer a devida consulta à Câmara,

Nestas condições compete-me subordinar ao critério da Câmara a seguinte questão : se se considera ' definitiva ou temporária a substituição nas comissões dos Srs. Deputados que foram Ministros..

Cf-

O Sr. Álvaro de Castro: — Sr. Presidente : eu creio que a questão devia ser posta no sentido do se entender que os membros das comissões não podom ser substituídos duma maneira permanente senão por novas eleições, porque me pá- ' roce indiscutível que o facto do se ter sido Ministro não faz perder o mandato de membro da comissão senão temporariamente.

Quero-me parecer, salvo melhor opi- l niâo, quo Y. Ex.a teria só de pôr à iuter- j preta cã o da Câmara a questão soguinte: i se a substituição nas comissões deve ser por eleição ou por nomeação- de V. Ex.a :

O Sr. Ve'hiaho Correia (sabre o vioão da voiuf): — Sr. Prosiucnte: eu entendo, ' salvo o devido n; s peito quo devo a V,

líkí.,p, f..;v o artigo 84o° não HÍ* J...TSÍÍI n

Não tem mais valor o Deputado quo ó" eleito do que o Deputado nomeado, ji, esta a maneira como se me afigura que devo ser interpretado o artigo 84.°

Relativamente ao artigo 171.°, não podem surgir dúvidas a ninguGm com respeito à forma da sua interpretação; pois o Deputado quo foi Ministro deixou de pertencer às comissões.

O Sr. António da Fonseca,: — Sr. Presidente : parece-me que a questão quo estamos a debater visa apenas a saber se a aceitação do cargo do Ministro implica a perda do mandato conferido pela Assom-blea ou pela Mesa numa comissão.

Esta é que é a questão sobre a qual a Câmara tem de pronunciar-se.

E no caso de assim ser, de pelo facto do Deputado ser Ministro perder o seu lugar na comissão, resta saber se ossa perda é temporária ou definitiva, se dura só emquauto o indivíduo é Ministro ou se é para sempre.

O Sr. Presidente : —LFoi já votada nesta Câmara unia moção habilitando a presidência a substituir temporariamente os Deputados que, por qualquer impedimento, inclusive o do fazerem parte do Govôrno, deixassem de pertencer às comissões.

O Sr. António daFonseca: —

Estava na alçada de V. Ex.a substituir-me temporariamente, mas, difira tiva-mente, não estava autorizado a fazô-lo.

O Sr. Brito Camacho : — Sr. Presidente: agradecendo a V. Ex.a ter-mo dado a palavra em último lugar, tendo sido o primeiro a pedi-la, vou fazer alguma s considerações sobro o incidente.

Trata-se realmente da interpretação do artigo 84.° do Regimento e do artigo 171.°, e trata-se, alem disso, duma deliberação da Câmara a quo ainda há pouco se rofc-riu o Sr. António Fonseca.

Parecc-nto quo, como disso o Sr. Velhinho Correia, o artigo 84.° mio ó sus-copíível de duas interpretnçíVs.

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Diário da Câmara dos Deputados

gação da Câmara, e quando são eleitas por delegação da Câmara são tam permanentes corno as primeiras.

Ora se a Mesa pode nomear, com ca-.râcter de permanência, uma comissão, por muito mais força de razão pode nomear um Deputado para uma vaga que se dê em qualquer das comissões.

Isto quanto ao artigo 84.°

De facto, houve uma deliberação da Câmara permitindo ao Sr. Presidente nomear para as vagas que se dessem nas comissões-f isto é, para as vagas que temporariamente se dessem, nas comissões. Pelo menos, foi assim que eu votei e interpretei o voto da Câmara. Davam-se vagas que não tinham carácter diímitivo e a Mesa nomeava temporariamente para essas vagas. Pareceu-me ser esto o pensamento da' Câmara.

Mas o artigo 171.°, pela sua letra, paroce-me que também não deixa dúvidas : os Deputados que forem Ministros não poderão ser membros de nenhuma comissão.

Não sei o que o legis-lador deste regulamento quis escrever.

Se tivesse escrito: não deverão funcio-. nhr como membros de nenhuma comissão, estava bem, e a interpretação do Sr. An-^tónio Fonseca era exacta. Ficava assente que nenhum Deputado chamado a sobraçar uma pasta de Ministro perdia o lugar nas comissões. Mas como o artigo está redigido, não.

4Por conseguinte não se deu .impedimento provisório se a nomeação feita pela Mesa é definitiva.

Parece-me .ser a interpretação que resulta, não direi do espírito, mas da letra do artigo 171.°

A questão .nitidamente posta pelo Sr. António Fonseca ó menos lata do que nítida. Eu reputo-a, mesmo, bastante restrita.

Nas comissões pode haver membros qiiii a, olíis pertençam provisoriamente devido a vagas resultantes de ter algum dos seus membros ido desempenhar qualquer outra função ou não desempenhar função nenhuma, como seja em caso de doença.

O caso de ser Ministro nã"o rne parece motivo para se abrir excepção, tanto mais que o ser Ministro é um «acidente de trabalho» a que todos estamos sujeitos.

Sé pôde haver, é permitido ao Ministro ou ao que for ao estrangeiro ou estiver afastado dos trabalhos da comissão por motivo de doença, ser substituído.

Paroce-me que o que a Câmara tinha a fazer, em primeiro lugar, era assentar no princípio de-que ó ela sempre que elege para as comissões, cousa .que se deixou de fazer para evitar a faina de estar sempre a eleger. Assentar que o provimento das comissões ó provisório por se não ter dado vaga difinitiva para a comissão.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente:—Peço a atenção da Câmara.

O Sr. Brito Camacho lembrava que se assentasse, duma maneira definitiva, se podem ou não ser substituídos provisoriamente os Srs. Deputados que tenham sido • afastados das comissões por qualquer impedimento provisório.

Submeto à aprovação da Câmara esta pregunta: ° se pode ser substituído provisoriamente o Deputado que faz parte duma comissão c què< temporariamente dela tenha sido afastado.

O Sr. António Maria da Silva: — Parece-me que efectivamente a pessoa que foi exercer o cargo -do Ministro pode continuar depois nas comissões. O fucto, porem, ó que no Begimento o caso é bem expresso: declara que os Ministros não podem continuar nas comissões.

llà uma maneira de resolver o caso: ó substituir o número regimental, que o não permite por outra disposição, em que se estatuísse que o Ministro pudesse voltar à comissão a que pertencia. Mas ó preciso um artigo para estabelecer que o Deputado seja substituído durante o seu afastamento.

A doutrina não está bem^expressá e, portanto, a Câmara tem de pronunciar-se j a respeito dela.

Mas é expresso este artigo c a Câmara, com a rncsma competência com que inscrever este artigo, introduzirá um outro artigo.

Tem-se estabelecido o processo que V. Ex.a usou desde 1911.

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Sessão de 16 de Abril de 1920

mo disse o Sr. Camacho, tom de ser Ministros.

A Câmara sempre interpretou assim, e, essa mesma disposição foi aplicada, nestes precisos termos, a todos os Srs. Depu- j lados que foram Ministros. i

Não há dúvida, a não ser que haja de , estabelecer-so doutrina nova.

O contrário disto é proceder arbitrariamente, desde que, até certo ponto, foi es- j tabelecida doutrina para a interpretação j do Regimento. |

O orador não reviu. í

O Sr. Pedro Pita: — Sr. Presidente: pedi a palavra em vista das diferentes interpretações que, pela Câmara, têm sido dadas ao artigo 171.° do Regimento.

Ora, Sr. Presidente, o artigo 171.° do Regimento diz muito claramente o seguinte :

«Os Deputados que forem Ministros não poderão ser membros de nenhuma comissão, mas deverão comparecer perante as que solicitarem a sua presença para esclarecimentos e informes».

Isto quere dizer, Sr. Presidente, que o Deputado que for nomeado para Ministro não pode ser eleito para nenhuma comissão.

Quere dizer: durante o tempo que exercer o lugar de Ministro deixará de pertencer à comissão ou comissões para que foi eleito.

Quando qualquer Deputado, que faça parte de qualquer comissão, for nomeado para desempenhar o lugar de Ministro, deixará de pertencer a essas comissões durante o tempo que ocupar o lugar de Ministro.

Isto, a meu ver, é-muito claro, e tam claro quanto é certo que este caso se deu já com um Sr. Deputado quo foi Ministro, segundo acabam de me informar. E é isto perfeitamente o que determina o nosso Regimento. !

Quanto ao artigo 81.°, diz ele o se- ;' guinte: - j

i

«Paru a análise dos negócios, olabora- ' SÍLO dos pareceres o, projectos do lei, a Assemblea tora, em cada sessão legislaíi- ' v; „ c:vi?i;sô>s pprimr->-'tCs '.' comilões

Em cada sessão legislativa, diz o artigo que acabo de ler; de maneira que os indivíduos que são eleitos para essas comissões o devem ser durante a sessão legislativa.

Desta forma, Sr. Presidente, não me parece que devam existir dúvidas, por isso que o artigo 171.° não diz o contrário das afirmações que foram aqui feitas pelo ilustre Deputado o Sr. António Fonseca.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: —Os Srs. Deputados que concordam em que os Deputados que fazem parte de comissões, e delas se afastarem temporariamente, podem ser substituídos provisoriamente, tendo esta votação um carácter geral em vista das declarações apresentadas pelo ilustre Deputado o Sr. Brito Camacho, isto é. envolvendo também o lugar de Ministro, tenham a bondade de se levantar.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: — Podem, portanto, ser substituídos provisoriamente em qualquer lugar os Srs. Deputados que se afastem por qualquer motivo. Falta agora saber quem procede a essa substituição. O Sr. Álvaro de Castro propôs que a substituição seja feita por eleição, mas há uma deliberação da Câmara que determina que seja a Mesa quem faça essa substituição, e parece que esta última doutrina foi defendida por alguns Srs. Deputados.

O Sr. Álvaro de Castro (para explicações}:— Sr. Presidente: eu não propus nada do que V. Ex.a acaba de dizer. Está, pois, V. Ex.a equivocado. Lembrei que a substituição dum Deputado nas comissões, quando do caso dele ser nomeado para Ministro (e só nesse), podia ser feita por eleição da Câmara, mas parecia-me ato conveniente que essa substituição continuasse a ser feita como ato aqui, pela Mesa.

O Sr. Prssâdentes—Em todo o caso ou desejava quo a Câmara confirmasse ou não a pTíixo já estabelecida.

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nas comissões seja feita pela Mesa, queiram ter a bondade de se levantar. íoi aprovado.

, O Sr. Ministro da Guerra (Estêvão Aguas): — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de lei tendente à aplicação da lei n.° 886 aos auditores militares que exerçam as suas funções nos tribunais ultramarinos.

É muito justo este princípio, tanto mais que eles estão equiparados aos juizes de investigação criminal, que têm essa regalia na aplicação da lei n.° 886.

De resto, a verba, necessária já está incluída no orçamento respectivo.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (XaArier da Silva): — Sr. Presidente : a Eepartição de Contabilidade do meu Ministério informa-me de que a verba para «instalação e viagens» dos funcionários dela dependentes está esgotada. Resulta desta circunstância que muitos dos funcionários quo têm de partir para o exercício das suas funções não o podem fazer porque não há verba.

É evidente o prejuízo que deste facto deriva para os serviços respectivos. De maneira que eu requeiro a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se permite que entre em discussão o parecer n.° 392.

O Sr. Presidente:—É a hora de se passar à ordem do dia.

Os Srs. Deputados que têm documentos a enviar para a Mesa podem fazê-lo.

Documentos enviados para a Mesa

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministério da Instrução Pública (Repartição de Sanidade Escolar), me soja fornecido o seguinte, com a maior urgência:

a) Elementos sobre a criação da Repartição de Sanidade Escolar (lei que deu lugar à mesma); .

b} Elementos sobre a criação da Escola de Educação Física e indicação, da lei que a rege;

c) Leis especiais que se referem aos médicos escolares e às suas nomeações;

d) Nota de todas as leis, decretos e portarias referentes à educação física em Portugal (por ordem e com a indicação cro-

nológica dos Diários do Governo em que foram publicados), desde que se começou a tratar de educação -física em Portugal, incluindo a legislação sobre as Escolas Primárias, Escolas Primárias Superiores, Liceus e Escolas Especiais.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 15 de Abril de 1920. — O Deputado, Costa Júnior.

Para a Secretaria.

Expeça-se.

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ORDEM DO DIA

Primeiora pavte

Continuação da discussão da proposta do Sr. Ministro da Justiça

O Sr. Ladislau Batalha: — Sr. Presidente: a gravidade da proposta de lei apresentada por S. Ex.a o Sr. Ministro da Justiça demanda muita ponderação pelos terríveis alcances, pelas terríveis conclusões a que pode levar se porventura for aprovada.

E-n lá íirmi nfivTYj.Pi n ri n n (J r» tii/6 Ocasião j »^ - j .-^~ ^ w~

de falar sobre esta proposta, que sou ir-redutívelmente contrário ao emprego violento de bombas para fins destruidores. Portanto, não podem de forma alguma ser suspeitas as minhas considerações.

Mas também tive ocasião de ponderar que estes crimes que se estão praticando, levemente, diga-se a verdade, de arremesso de bombas, são crimes de ordem social;

E posso agora dizê:lo com maior autoridade, porque em apoio das minhas palavras veio o ilustre Deputado Sr. António Granjo declarar; com toda a sua autoridade e saber, que neste momento efectivamente estamos em presença duma luta entre a burguesia constituída e as sociedades humanas revoltadas.

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posso deixar de ponderar alguns factos e de chamar para eles a atenção do Sr. Ministro da Justiça- A lei que se pretende fazer pela aprovação da proposta que se discute é semelhante à de 13 de Fevereiro.

Da mesma maneira como aquela, poderá ela ser aproveitada para violências e abusos.

Quero crer que o Governo, presidido pelo Sr. coronel Baptista, saberá fazer uso ponderado desta lei; mas a verdade é que n?ío posso ter a certeza do que farão com ela os Governos que se revezarem no poder.

Já temos os tristes exemplos do que se passou com a lei'de 13 de Fevereiro.

Feita contra os anarquistas, foi depois empregada contra. socialistas, contra republicanos, contra jornalistas e até contra outros adversários por motivo de vinganças pessoais.

Devemos também lembrar-nos de que tal lei marcou o início duma série de perturbações na sociedade portuguesa. Foi feita, como disse, para ser empregada contra os anarquistas, então considerados inimigos da sociedade. Posteriormente os estudos sociológicos demonstraram que era um erro considerá-los como tais, visto que aspiravam ao bem e não ao' mal, embora usassem então de processos inconvenientes.

Daqui nasceu a luta e lançou-se a sociedade em constantes convulsões.

Não nos esqueçamos que foi por virtude dnm,a lei do excepção que se deu o fu-silamento do Ferrer, e se tornou notável a sua morte.

Isto originou -uma grande luta social em Espanha, o que já hoje se estende a todo o mundo.

Não pode haver dúvida.de que os atentados bombistas que se têm dado em Portugal são de carácter social.

O Sr. Brito Camacho : — Mas são crimes !

: — São. Por isso nos revoltamos unanimemente contra ôles.

O -Sr. Ministro da Justiça, justamente alarmado pelos factos que se deram, veio apresentar à Câmara a proposta duma lei de excepção.

Ocorre-me preguntar a S. Ex.a se neste Iiú almina acontecimento íain

grande, tam funesto, que determine esta lei.

Há fábricas arrasadas ?

Há palácios destruídos?

Há muitos mortos e feridos? .<íHá p='p' com='com' de='de' parecido='parecido' os='os' caso='caso' ou='ou' sevilha='sevilha' barcelona='barcelona' algum='algum' berlim='berlim' heidelberg='heidelberg'>

£ Passa-se entre nós alguma cousa parecida com o que está sucedendo na Irlanda?

Ení Portugal não é mais do que o sentimentalismo o que apaixona a sociedade neste momento. Não foram as tr

Deu-se em tempo o incêndio da Rua da Madalena, e como houve vítimas todos se apaixonaram desusadamente. No emtanto já tinha havido antes e continua a haver muitos incôndios, mas ninguém mais se revoltou até hoje contra os incendiários !

Agora foi também a emotividade portuguesa que se expandiu.

Não me parece que haja neeessidade da lei impugnada. Ê uma lei de excepção!

Nós, que aqui no Parlamento somos o suprassumo da intelectualidade nacional,, pelo convencionalismo adoptado, devemos estudar e'apreciar devidamente a lei.

Não podemos, porém, retrogradar aos processos antiquados.

Antigamente receitava-se pára dores de cabeça, quando as dores de cabeça não são uma enfermidade, mas apenas um sintoma doutras doenças. o

O Sr. Brito Camacho: — V. Ex.a nunca teve enxaqueca...

O Orador:—A dor de cabeça não é lima enfermidade, mas sim um sintonia.

Antigamente vinha um médico, chamado para dores de cabeça, o logo aplicava água sedativa, sinapismos, cânfora, sais amoníacos, etc. O resultado era sempre nulo, porque quantas vezes a enxaqueca provinha duma perturbação no estômago, ou mesmo, por exemplo, dum espinho metido TIO calcanhar. Arrancado o espinho curada a enxaqueca!

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réstia, uso e abuso dos poderes da burguesia, vexame dos privilégios odiosos, promulgação desnecessária de leis excep-tivas, etc.

. O terrível sintoma das bombas, pois, só pode atenuar-se, e até vir a extinguir--se, atenuando os males que o determinam, extinguindo as enfermidades sociais que lhe'dão causa e origem.

Explicou o Sr. Granjo que esta lei só serve para deportar,

A lei assim o diz.

E para onde? Para o território colonial da República. Outra fatalidade!

Já aqui tenho dito-^-e não me cansarei de o repptir, em quanto tiver assento no Parlamento — não podemos continuar a mandar para as colónias a escória da nossa sociedade.

As colónias não são vasadouro das es-corrôhcias da sociedade ou de tudo quanto os tribunais apuram de mau.

Este procedimento do Governo tem vários inconvenientes.

Hoje os Estados empregam todos os esforços para acabar com o sistema de mandar os degredados para os domínios coloniais. As deportações para as colónias estão sendo postas de parte. Eesta apenas Caiena e pouco mais.

Portanto, não podemos continuar a dar o triste espectáculo do deportar os nos-'sos criminosos para África.

Quando se nota nas nossas províncias da metrópole falta de braços, quando o urbanismo está despovoando os nossos campos, quando a lavoura luta com enorme dificuldade para cultivar os campos, por quási absoluta carência do mão de obra, de onde deriva o encarecimento do salário agrícola, causa concomitante da carestia alimentar, devíamos nós pegar na escória da sociedade, nessa escorrên-cia dos tribunais e da vadiagem, e obrigá-la a trabalhar nos campos, "arrotean-, do, por exemplo, os latifúndios do Alentejo.

Eram braços aproveitados utilmente, em favor do nosso país, acabando-se com a carência de trabalhadores rurais.

Já tenho delineado um projecto de lei criando t) trabalho obrigatório em Portu gal, e apresentá-lo hei oportunamente, com rigorosas cláusulas contra os ociosos, que, embora cheios de vigor, pre.ten-dem viver como parasitas.

Diário da Câmara dos Deputados

A-escassez de produção é, em parte, devida, àqueles que, sem meios próprios, continuam vivendo à sombra das manigâncias indecorosas. Quem tem fôrçaa que trabalhe dalgum modo, coiro puder e como souber. Não se deve mais consentir que se viva sem trabalhar, explorando à produção alheia e agravando a economia social.

<íE quisesse='quisesse' que='que' estado='estado' sabe-se='sabe-se' do='do' indisciplina='indisciplina' marinhagem='marinhagem' lei='lei' se='se' saíssem='saíssem' para='para' obedeceria='obedeceria' crime='crime' não='não' ocasião='ocasião' a='a' praticar='praticar' país='país' colónias='colónias' em='em' deportados='deportados' quando='quando' o='o' p='p' as='as' na='na' esses='esses' perversa='perversa' da='da' manifestaria='manifestaria'>

Interntpcão que não foi 'percebida,

O Orador:—Não vejo necessidade de se votarem leis de excepção contra a prática dos delitos de que se trata.

Se os tribunais trabalhassem mais rá-, pidamonto e a polícia fosse mais diligente na organização dos serviços de investigação, de maneira a evitar a repetição de semelhantes atentados, certamente a sociedade portuguesa não só encontraria, como hoje, em face dum estado de verdadeiro sobressalto.

E agora, uma vez que sou daqueles que reconhecem a inutilidade da proposta ministerial e a combatem, resta-me e cumpre-mo" indicar a forma realmente prática de impedir a intensificação desses atentados.

(j Averiguado, como está, que esses tresloucados actos são "apenas filhos do mal estar da sociedade, o que há a fazer? Melhorar esse estado social. ^E será isso possível dentro da organização burguesa da sociedade? Creio que sim. A questão é que se adoptem processos ,novos, absolutamente diferentes daqueles que se têm seguido até agora. Evidentemente que não ó lançando famílias inteiras na miséria, neganuo-lhes trabalho, que nós conseguimos esse objectivo.

AlSm disso é ^reciso olhíir a sério ^

^.AAWJO.4. V.lLUkJW, W £/J. WVAUV WJ.^Li.VX «.« kj W A *. \J , VJ

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zos violenta e impulsiva, das modernas aspirações sociais brotem as resoluções mais sinistras e destruidoras?

Mas há mais. Não basta fazer leis; é indispensável torná-las exequíveis, de forma a não ficarem só no Diário do Governo.

É preciso que as leis se executem e não fiquem apenas no papel.

Estamos na seguinte situação: o Poder Legislativo delibera, o Governo manda executar e os executores não cumprem, na maioria dos casos, de que resulta uma anarquia oficial, como a que existe neste momento.

Sabemos que. o Sr. Ministro da Agricultura tem dedicado mesmo fervor ao problema da carestia da vida, fazendo tudo quanto humanamente se pode para a atenuar.

Não há dúvida alguma.

Porém a verdade ó que as ordens de S. Ex.a nem sequer se cumprem. . Há dias tive ocasião de ponderar ao Sr. Ministro do Trabalho o seguinte :

Decretou o Governo uma ajuda de custo a todos os funcionários do Estado.

Pois esta loi não é cumprida, porque os encarregados de a cumprirem, não ohedecem em geral.

Todos quantos trabalham tem direito à ajuda de custo, para fazer face à carestia da vida.

Não discuto se a lei é má ou boa, se o Governo fez bem ou mal em conceder esses 40$ mensais, como ajuda de custo de vida.

Pois bem, triste é dize-lo, os emprega-• dos dos asilos, a não ser os directores, nlo tem recebido essa ajuda de custo.

Tem sido excluídos.

Os empregados menores não conseguiram ainda obter essa ajuda de custo.

O Sr. Domingos Cruz (interrompendo):— Devo esclarecer que todos os funcionários dos quadros têm recebido ajuda de custo.

O Orador:—Faço a justiça de acreditar no que acaba de dizer o Sr. Domingos Cruz o

O Governo deseja fazer cumprir as leis, mas o facto ó que ,olas se não cumprem.

Z^IIL procurado om minhr, Ciisa por eiu-wo^adoK do Azilo do Mendicidiulo íjiie mo

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disseram que não haviam recebido a ajuda de custo, apesar da informação do director.

Os empregados do azilo de Maria Pia, procuraram me em minha casa, dizendo não terem ainda recebido a ajuda de custo.

Várias outras comissões de empregados públicos também me têm dito que não recebem a ajuda de custo.

Aqui tenho presente um despacho ministerial mandando pagar o aumento aos empregados menores do Asilo da Mendicidade, quer tenham ou não comedo-rias.

j E até hoje o despacho ainda não foi cumprido!

É esta falta de moralidade que se nota nas camadas superiores, que determina positivamente o não acatamento das leis por parte do quem tem de as cumprir,-por isso que traz, como não podia deixar de o ser, motivos de irritação e de insu> bordinacão.

É obviando a estes inconvenientes que se atenuam os pruridos de revindita popular, que felizmente em Portugal ainda são uma insignificância, comparados com o que vai por outros países.

Houve aqui quem dissesse que não votava a lei como estava, porque preferia a pena de morte.

A este respeito farei apenas uma simples observação. •

Efectivamente chega a causar desgosto que o Parlamento ^enha levantar, em pleno século xx, o abjecto princípio da pena de morte, quando os restantes estados da Europa onde essa pena existe, procuram por todas as formas, fazer o menor uso dela possível e tem o desejo de a extinguir.

A própria Inglaterra não aboliu ainda tam bárbara lei, não por falta de desejo de o fazer, mas por falta de possibilidade.

Antes de encerrar as minhas considerações, desejo chamar a especial atenção do Sr. António Granjo.

S. Ex«s, por incidente, a uni aparte do meu ilustro colega Sr. Augusto Dias da Silva, declarou que o qaríido político quo B. Ex,a aqui representava, não se confundia eon> o Partido Socialista o íez esta dcelnrs

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Nenhum partido dentro da sociedade burguesa pode confundir-se com o Partido Socialista, por várias razões e uma delas é que o Partido Socialista é internacional ao passo que os outros partidos são apenas nacionais.

Mas S. Ex.a> referiu-se a este lado da Câmara com uma certa ironia que eu...

O Sr. Antóuio Granjo (interrompendo):— £~V. Ex.a dá-me licença?.

Tenho o maior respeito pelas pessoas que representam aqui o Partido Socialista, não só por serem meus colegas nesta Câmara mas também por pertencerem a um partido que eu muito respeito, e.cujo programa eu multo considero.

Eu só poderia ter empregado nas minhas palavras qualquer ironia sé estivesse convencido da falta de sinceridade dos propósitos do Partido Socialista.

Como porém a minha convicção é absolutamente contrária a essa, evidentemente que eu não poderia de forma alguma ter--me referido em termos desprimorosos ao partido a que V. Ex.a pertence.

Devo esta explicação a V. Ex.a para que no sou espírito se desvaneça qual-puer dúvida que se lhe afigurasse relativamente às minhas palavras que V. Ex.a citou.

O Orador: — Como disse nenhum partido burguês se pode confundir com o Partido Socialista. O Partido Socialista ó uma organização internacional, não pode comparar-se com os partidos políticos que que se estão fraccionando," formando-se aos grupos em volta de homens e não de ideas ou princípios. Em Portugal os programas são habitualmente posteriores aos agrupamentos. No Partido Socialista, o mais antigo, porque conta quarenta e cinco anos de existência, o programa antecedeu-.

O Partido Socialista pode ser fraco em Portugal, mas não o é nas suas secções da Inglaterra, na Alemanha, na Bélgica, na Eússia e em muitos outros países em que dele fazem parte e com ele colaboram.

Para terminar e para que fique bem consignada na acta e nos arquivos desta casa de Parlamento, mais uma vez declaro que o Partido Socialista protesta contra todo5' os atentados bombistas que se estão praticando sem destino conhecido, mas reconhece- que esses atentados são i

• Diário da Câtâara dos Deputados

filhos de um estado social que-é necessário melhorar. Por outro lado o Partido Socialista entendo que ainda se não deram atentados como os de Barcelona, Berlim e Irlanda, que determinem a lei excepcional que cria um tribunal especial composto de três polícias! Tenho âito.

O Sr. Vasco de Vasconcelos : — De harmonia com as prescrições regimentais envio para a Mesa a seguinte

Moção

A Câmara, reconhecendo que na punição rigorosa dos crimes contra a sociedade não "podem ser esquecidos os princípios fundamentais do direito penal, continua nos seus trabalhos.

Lisboa, Sala das -Sessões, 16 de Abril de 1920.— O Deputado, Vasco de Vasconcelos.

Sendo hoje a primeira vez que tenho a-honra do me dirigir a S. Ex.íl o Sr.. Ministro da Justiça, deva declarar qne o faço com muita satisfação porquanto S. Ex.a ocupa a cadeira de Ministro por direito do conquista. S. Ex." antes de entrar no Parlamento já tinha feito o seu nome como advogado distinto que ó; e fazendo parte do Senado, pelos seus discursos e pareceres, tem firmado bem o seu lugar.

Se me é grato fazer estas considerações, eu sinto uma certa mágoa por S. Ex.a ser b autor desta proposta • de lei que está abaixo dos seus merecimentos, os quais eu sou o .primeiro a reconhecer.

Eu compreendo que neste momento • S. Ex.a perdesse um pouco de serenidade que um Ministro deve ter, pois apresentou unia proposta de lei que em vez de ser uma obra serena é uma obra febril e de ocasião.

Como sou um homem de leis sinto-me um pouco afrontado com a redacção deste projecto de lei. Não julgue V. Exsa que isto representa da minha parte indulgência para essa classe de criminosos. Eu sou* daqueles que entendem que a sociedade deve defender-so e que V. Ex.a não íez mais do que o seu dever!

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Entendo quo V. Ex.% como Ministro da Justiça, por forma nenhuma podia apresentar uma proposta desta natureza.

Compreendo que V. Ex.a no julgamento desta espécie de crimes quisesse livrar-so das contingências do jíuii que rialmente em Portugal está organizado defeituosamente. Compreendia queV.Ex.a adoptasse a forma dos tribunais colectivos ; agora V. Ex.a lançar mão dum tribunal que até em determinadas circunstâncias pode ser constituído por indivíduos que não tenham conhecimento das leis, porque V. Ex.a melhor do que eu sabe que para esses funcionários da polícia não é fundamental serem formados era direito, acho extraordinário, repito, que S. Ex.? sendo um jurisconsulto distinto fosse entregar a esse tribunal, que chamarei miliciano, questões duma importância tani gravo como são aquelas que se podem encontar nos crimes a que esta proposta diz respeito. Só S. Ex.a queria livrar-se das contingências do júri, da sua má orientação, da sua má escolha, outros caminhos havia que nãc este de cair npm tribunal policial; mas, eu sei que considerações a esto respeito foram feitas ontem nesta casa, apesar de não ter tido a honra de assistir a essa sessão, e porque não quero contribuir para o desprestígio do Parlamento pelo facto de dizerem que emprego longas palavras e longas dissertações quando se trata de discutir projectos, serei breve • nas minhas considerações.

Mas continuando na análise desta proposta, devo dizer que encontrei dentro dela cousas muito interessantes, senão muito pitorescas.

Esta classificação quo S. Ex.a arranjou de bombas de dinamite destinadas a produzir alarme social vem a dar o seguinte resultado: amanhã é o julgamento dum homem acusado de lançar bombas, mas esse homem afirma, arranjando mesmo testemunhas .que confirmem as suas declarações de que essas bombas "não eram destinadas u produzir alarmo social e o tribunal tem de absolvê-lo.

De resto, S. Ex.a querendo colher nus rodes desta proposta todos os indivíduos incriminados, fala nas bombas do dinamite, mas não fala do explosivos.

S« Ex.a como-juriscofisulío distinto que ò, sa^o muito boro que mnsmo o omprôgo

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da dinamite para usos industriais ou agrícolas está dependente duma certa licença; portanto desde-que alguém a ompre-, gasse sem essa licença devia ser incluído nessa lei.

Mas não param aqui as novidades e o pitoresco da proposta.

No regime do direito penal vai até ao pitoresco de arranjar até uma nova definição de agentes do crime.

O nosso Código Penal, marca três categorias qne são autores cúmplices e en-cubridores. Pois S. Ex.a arranja uma outra definição agentes de excitação.

Ora, Sr. Ministro da Justiça, estes agentes, conforme o seu grau de intervenção no delito, são fatalmente autores ou cúmplices.

Daqui não há que fugir.

De resto se V. Ex.a tomando à letra o> Código Penal que aplica nesta proposta. se refere àqueles que incitam a algum crime então inclui na sua proposta toda a qualidade de incitamentos e por consequência não há ninguém neste país que não esteja dentro desta proposta.

S. Ex.a manda aplicar a esta fofma de julgamento os artigos 463.° e 483.°. do> Código Penal.

Ora o artigo 483.° não se refere a nenhum crime, refere-se genericamente àqueles que provocaram, o crime.

Isto não pode ser.

V. Ex.a e todo o Ministério são inegavelmente excelentes pessoas. Quero crer que o segundo, terceiro e quarto Ministério, apôs este, sejam constituídos por excelentes pessoas; mas, S. Ex.a pode garantir-me que amanhã, porventura, não esteja à frente dos destinos da República uma situação anormal e que esta proposta não seja uma arma perigosíssima na sua mão?

Nessa situação anormal que eu indico há por exemplo um jornalista que escreve um artigo que traduz, numa pendência do honra, a sua opinião, isto é, quo uns indivíduos devem ou não bater-se, o como um duelo ó um crime previsto no Código Penal, o Ministro da Justiça tem uma arma na mão para desterrar o jornalista quo faz essas afirmações.

Mas, Sr. Ministro da Justiça, chame também a atenção de V. Ex.a para outros pontos.

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proposta aos crimes de. fogo posto e à tal incitação ao crime do artigo 483,° . Evidentemente, S. Ex.a teve em mira apresentar uma proposta que não só encerrasse um correctivo violento contra os perturbadores da ordem agravando-lhe as penas, como ainda teve em vista um outro ponto, que ó a intimidação.

S. Ex.a arranja situações tam extraordinárias, que a pena a aplicar a determinados crimes, fica inferior àquela que o Código Penal marca e portanto prejudicados ficam os intuitos de S. Ex.as

Pelo Código Penal, no crime de fogo posto se algum indivíduo for condenado como autor ou cúmplice, tem uma pena muito mais grave quo a que S. Ex.a marca nesta proposta.

Se portanto^há casos em que essas penas ficam diminuídas, pregunto quais as razões dessa substituição?

Mas ainda não param aqui as novidades que eu vim encontrar dentro desta proposta.

S- Ex.a deu uma redacção um pouco-chinho duvidosa ao artigo 4.°

Que\-r. Ex.a no artigo 4.°, dissesse que os processos seriam julgados na-forma do artigo I.3 desta lei compreendia-se; mas que V. Ex.a dissesse que seriam julgados conforme toda a lei leva-me à conclusão de que S. Ex.a quer aplicar esta lei final com efeito retroactivo.

Mas, se V. Ex.a aplica a lei com efeito retroactivo, terá de seguir o Código Penal que no § 2.° do artigo 6.° diz que:

«... no caso de haver duas penas terá que aplicar-se a mais benévola».

Neste caso tem V. Ex.a a stia proposta prejudicada.

Aqui tem V. Ex.a a traços largos o que há de extraordinário nesta proposta que. certamente será viável com as emendas que lhe seja introduzida pelo seu autor e pelos Srs. Deputados, porque sem ela é um aborto jurídico.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integrctj revisto pelo orador, quando- restituir, revistas, as notas taquigráUcas que lhe foram enviadas.

O Sr. Cunha Liai: — Equeiro. que, com prejuízo de todos os assuntos entre já em discussão a interpelação do Sr. Costa Júnior.

Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Presidente: — O assunto do requerimento de V. Ex.a colide com a matéria já votada pela Câmara, quê dispensou o Eegimento para a discussão deste projecto.

O Sr. Cunha Liai; —Eu entendo que a Câmara pode revogar o que fez numa sessão anterior.

O Sr. Presidente: — Está à votação o requerimento do Sr. Cunha Liai.

Foi rejeitado em prova e contraprova requerida pelo Sr. Cunha Liai.

O Sr. Mesquita Carvalho (sobre a-ordem) : — Tendo pedido a palavra sobre a ordem, mando para a Mesa a seguinte

Moção

A Câmara, prestando, à proposta em discussão, o cuidado e o interesse que merece, continua na ordem do dia.

Sala das Sessões, 16 do Abril de 1920.— Luis de Mesquita Carvalho.

Desligado como estou, hoje, de qualquer partido, ou agrupamento, tenho de expor o meu modo de ver e sentir individualmente.

A proposta em discussão tenho a submeter à minha consciência do cidadão, de republicano e de homem de leis e sob qualquer desses aspectos causaram-me a mais dolorosa impressão. E nas considerações que vou produzir. Sr. Presidente, e antes de iniciá-las, eu .preciso de fazer uma declaração categórica e terminante, para que as minhas palavras se não prestem a quaisquer equívocos ou quaisquer especulações.

Não tenho, nem por sombras, o intuito político de fazer qualquer ataque ou censura violenta ao actual Governo; a sua obra até hoje, tem sido, como todas as obras, certamente, imperfeita e incompleta, mas tem o valor para mim, de mostrar, da sua parte, boas intenções e os melhores desejos de acertar. Para mim a sua acção tem sido enérgica e sem dúvida benéfica, e em meu entender deve continuar a exercer o seu lugar; para tranquilidade de nós todos, e para que alguma cousa se modifique favoravelmente neste estado dá sociedade actual.

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com o Sr. Ministro da Justiça que subscreveu ° esta proposta, e que a trouxe as Parlamento em nome do Governo, poio que tenho por S. Ex.a a maior consideração e estima; e porque assim é, eu estou inteiramente à vontade, para dizer aquilo que não posso deixar de dizer, como uma imperiosa necessidade que se impõe à minha consciência,.repito, de cidadão, de republicano e de homem de leis. É profundamente doloroso e lamentável, que a sociedade portuguesa, e sobretudo o bas fond indisciplinado e p reverso da cidade de Lisboa, chegasse a um estado, que se não justifica, pelo menos dês culpa a apresentação duma proposta desta natureza. Mas, é muito mais deplorável e muito mais contristante que uma proposta desta natur-eza, na sua parte perceptível e ato na sua estrutura técnica, houvesse de ser trazida ao Parlamento, por um Governo da República, e que haja de ser discutida, aprecia" e votada por um Parlamento da República.

E que, Sr. Presidente, eu sinto ainda resoar-mo na alma e nos ouvidos o frémito tde protestos e de revolta que se propagou por todo o país e que nos agitou todos nós, republicanos, quando da promulgação da lei de 13 de Fevereiro de 1896, a que o povo classificou de lei celerada e contra a qual, decerto, alguns de nós que aqui estão dentro, e eu pertenço a esse número fizemos, dura crítica com as mais infiama-das palavras e escrevemos as mais inflamadas págimas.

Essa lei que a República ainda mal nascente, ainda não de todo posta no seu lugar, porque o decreto tem a data de 1.0 de Outubro de 1910, abalou e rasgou como uma afronta- o uma injúria aos princípios fundamentais do Direito e da Justiça e os sentimentos da Democracia e da Liberdade.

Mal poderíamos nós pensar, então, que alguns anos volvidos havia do ser apresentada ua República por um Governo dpla o para ser apreciada por um Parlamento doía, uma proposta de lei que ó incomparavelmente pior do que era a lei de 13 do Fevereiro.

Todavia, Sr. Presidente, o Governo apresentando • à Câmara, discutindo-a o, porventura, votando-a depois do conveuien temeiiú) melhorada, cumpre talvez um do-Ioroí'iV,K,iiuo dever. E só yob Gs^o

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que nos poderia fazer sangrar a alma e o coração, mas que se impõe como uma irredutível necessidade, nós poderemos todos votá-la, não como ela está, porque isso, seria o impossível, mas remendada, mas composta, e consertada, tanto quanto é possível consertar um aleijão desta natureza, para que ela não seja uni ultraje e uma vergonha para a República.

Carece de uma severa, de uma rigorosa perseguição — e eu emprego o termo intencionalmente — os autores, os instigadores, todos1 aqueles que por qualquer forma, directa ou indirectamente, têm tido intervenção nos crimes inqualificáveis que por emprego de explosivos se tem praticado na cidadeode Lisboa e quo porventura e desgraçadamente não se poderão considerar definitivamente terminados.

Em todas as medidas que o Governo, ou que a Câmara, julgue necessário promulgar, para os reprimir ou para os prevenir, terá o meu voto desde que os diplomas sejam tais que a minha consciência se não revolte em votá-los. Mais além disso, não posso ir. E é precisamente por isso que eu terei de dizer ao Sr. Ministro da Justiça que somente posso votar na generalidade a proposta que trouxe a este Parlamento, porque, antecipadamente, sei quo o seu espírito de justiça e de rectidão, está disposto a aceitar todas as -emendas e modificações que torne viável, que torne aceitável este diploma.

E ainda e somente nesse intuito que eu alguma cousa de breve direi- s'Ôbre a estrutura propriamente 'da lei.

Salientaram-s o já aqui, e por vozes mais autorizadas do que a minha, os inconvenientes e defeitos desta lei por tender a duplicar os julgamentos e penalidades aos autores dos crimes respectivos e por infringir uma disposição constitucional que garante aos réus de determinados crimes, o para 'aplicação de determinadas 'penas, o júri.

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Diário da Câmara dos Deputadits

ÍLÓS devemos respeitar, e que todos nós, parlamentares, nos cumpre sempre defender porque a própria Constituição nos impõe esse dever.

É que V. Ex.a, Sr. Ministro da Justiça, dá à sua proposta efeito retroactivo : dá-lho plenamente e infringindo em todos os seus três pontos a garantia fixada no n.° 21.° do artigo 3.'° da Constituição.

Primeiro, porque cria um tribunal especial para sentenciar;

Segundo, porque decreta uma lei para punir;

Terceiro, porque manda processar nos termos que esta lei estabelece; e. . .

O Sr. Presidente: — A Câmara deliberou que hoje fosse tratada em segunda' parte da ordem do dia a interpelação do Sr. Costa Júnior ao Sr. Ministro da Agricultura.

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O Orador: — Sr. Presidente: desisto do resto -das minhas considerações? Assim não ssi falar; a Câmara pouco perde com isso o eu só tenho. a ganhar. (Arcto apoia--«W).

O Sr, Presidente : — Vai ler- se a moção mandada para a Mesa pelo Sr. Mesquita Carvalho.

Leu-se, 'foi admitida e fícou em discu&-são. -

O Sr. Presidente : — Como não está presente o Sr. Costa Júnior, dou a palavra ao Sr. Ministro da Agricultura.

Tem a palavra V. Ex.a c

p» -a f t e

O Sr. João Luís Eicardo (Ministro da Agricultura): — Já tentei explicar,' Sr. Presidente, quando ontem usoi da palavra. os motivos qoe me levaram a estabelecer o regime dês dois tipos de pão, pela convicção que tinha, e ainda tenho, de que mais convém os dois tipos do que um único tipo de pão, o isto pelas seguintes razões :

Primeiro, porque as- fraudes que não tem sido possível evitar com os dois tipos de pão, muito menos o serão ,coni um único tipo de pão;

Segundo, porque a qualidade nunca poderá ser superior à que hojo está estabelecida;

Terceiro, porqno nunca se poderá vender o' pão por preço inferior a £24.

Porém, como não pretendo ira por a minha opinião li opinião pública, e coma o Congresso também se tem manifestado a favor do um único tipo de pão e a própria moagem pretenda também um único-tipo de pão, e bom 'assim os padeiros, eu devo declarar qne acho excelente, por isso que, desta forma, o Ministro da Agricultura deixa de ter as dificuldades que tem na fiscalização e acabam também assim- as reclamações, porquanto. estando a moagem de acordo com os padeiros o com o público,, nós poderemos caminhar no melhor dos ' mundos. Assim o pão-nunca deixará de ser fornecido largamente e como tal acabarem as reclamações."

Estou convencido de que não levará muito tempo a fazer a fiscalização e d© que acabarão as fraudes que se tOm dado até hoje, apesar do todas as medidas que o Governo tom tomado para aã evitar; rnas ó preciso saber-se quais são os receios -e os motivos que eu tenho para tal.

Eu devo dizer a V. Ex.as quo as dificuldades maiores, cue tenho encontrado para £i manutenção dos dois tipos do pão são as- seguintes, que passo a fornecer à Câmara segundo os elementos oficiais dados pela polícia*

O Sr. Cunha Liai: —

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O Sr. Cunha Liai : —

O Orador : — Eu estou convencido de que as minhas ordens foram cumpridas. Mas eu verifiquei, como disse, que no dia em que se barafustou mais contra a falta de pão foi no dia em que houve maior fabrico, bem como no dia em que toda a gento dizia que não havia falta, não condizia essa informarão com a da polícia.

^ medida, porém, que se aproximava a reunião do Congresso, as cousas dificultaram-se porque se esperava que o Parlamento tivesse a luminosa idea de deitar o Governo abaixo. E isto é tam verdade que, de há três dias para trás, as queixas contra a falta de pão não eram muitas ; mas desde que reuniu o Congresso e se fez uin cerco a Lisboa para evitar a saída de pão para os concelhos limítrofes,. a moagem começou a reclamar, os padeiros reclamaram e o povo reclamou contra a falta de pão.

O Sr. Presidente do Ministério informa-mo que. num cerco que se fez na Cascalheira, foram presos vários indivíduos, não por agitadores, mas por assam-barcadoros, visto que nas suas casas foram encontrados sacos com 50 pães cada, pão quê deveria sair para os concelhos limítrofes, pois que se está lá fabricando pão de tipo único a $28, e o nosso de 2.a, mais barato, é melhor.

]Iá outro facto ainda que contribui para a falta que se nota de pão: é o caso do padeiro — e isso é difícil evitar — vender o pão para as tabernas e, assim, havendo falta de pão nas padarias, elo existe nas tabernas, que o vendem mais caro. A moagem não pode trabalhar honestamente com a taxa que tem.

VOBSS : — .Essa afirmação ó gravo ! -

O Orado

E gravo, mns ó verda-

deira, o ou já o provo.

O Sr. Costa, Júnior disso que a moa-gom não reclamava cem a taxa, de mo:i-gcni de .-,1 centavo:;.

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! taxa, rne declarou que não podia traba-j-lhar e que, desse modo. entregava as fábricas ao Governo. Depois, segundo me informei, verifiquei que, efectivamente1, a moagem não podo trabalhar com a taxa de 2,1.

Em 1915 a moagem estabelecida por diagrama da lei, dava 10,2; em 18CO estava a trabalhar com 0,0. Tom, portanto,, vindo a moagem a aumentar a taxa.

A lei é a lei, nada a modifica. Quem faz a fraudo para evitar prejuízos é claro-que continua a fazer as fraudes. A moagem, mas toda a moagem, diz abertamente que não pode trabalhar com menos de 4,0. Os salários, os óleos, o carvão, tudo aumentou, "de forma que ela não pode viver por outra forma. A moagem tem recursos em várias fraudes.- Tem a extracção da farinha extra, tem a diferença do preço do peso específico e tem as indústrias anexas que lhe dão lucros, come a fabricação de bolachas, etc.

Não defendo os interesses da moagem, e acho conveniente até que o Parlamento considere este problema cm toda a sua magnitude, e quo daqui saía uma comissão de inquérito -que só faça acompanhar de criaturas técnicas e competentes, quo estudem largamente este problema, a ver qual seria o melhor remédio a dar ã todos os males quo nós conhecemos e, -porventura, àqueles que não conhecemos, a fim de se evitarem, e para que o Ministro tenha a devida autoridade moral para proceder energicamente.

O Sr. Júlio KZaitins:—-,»Então V. Ex.a não tem autoridade moral?

O Orador:—Tenho-a, sim, senhor, mão é porque tive a hombridade ds aqui vir dizer as circunstancias eni que Cste problema se encontra, o qup algumas das fraudes foram fartas, talvez, com consentimento dos próprios Ministros, mas for-çadamente.

Há .uma outra fraude de que se fala como unua cousa extraordinária, o que se refiro à quantidade de sCmea quo vem muiida nas farinhas; ora a-lui é de 1895, e os químicos dizem quo, cm viríudo da constanto variedade dos diagrama, não é possível numtor ÍMSÍI porconíagíTii.

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da falta de trigo necessário para moer normalmente; por isso têm-se servido doutras farinhas, cuja mistura dê o tipo do p^o marcado pela lei. E nós vemos que muitos dos processos que se encontram nos tribunais não têm tido o devido andamento, e já o Sr. Costa Júnior citou aqui o exemplo duma fábrica que foi processada por uma fraude, e cujo processo não teve seguimento. As fraudes continuam...

O Sr-. Júlio Martins: — O que eu acho extraordinário é que V. Ex.a diga que a moagem, não pode trabalhar honestamente dentro do diagrama marcado pela lei.

O Orador: — É por isso que eu tenho a hombridade de dizer que «os Ministros se tom visto muitas vezes em circunstâncias precárias».

O Sr. Queiroz Vaz Guedes : — Tendo a comissão de inquérito ao Ministério dos Abastecimentos verificado, pelo exame da escrita, que realmente se estava exigindo para a sêmea um preço superior ao estabelecido pela lei, resolveu mandar proceder a restituição ao Estado de tudo o que, peia respectiva escrita, representar lucros ilegítimos.

O Orador:—Ainda bem quê a comissão assim procedeu, porque dessa forma se poderá apurar quais foram os lucros ilegais da moagem, não só relativamente às sômeas, mas ainda às farinhas, fazendo restituir ao Estado aquilo que legitimamente lhe pertence e que lhe foi sone-' gado.

No discurso que ontem proferiu sobre esta questão o Sr. Gosta Júnior, apontou S. Ex.a os diagramas que, em seu entender, deviam sor seguidos no fabrico do tipo único de pão. Fraudes, irregularida-dos, descaminhos? Sem dúvida. Ainda ontem, uma fábrica, emquanto se negava a fornecer farinha às padarias independentes, sob o pretexto de que não podiam sair farinhas sem guias, fazia, remover para as fábficas da moagem dois camiões carregados do farinha de l.a Deseobriu--se o jogo o a fábrica foi entregue ao Poder Judicial.

Concluo as minhas considerações por dizer a V. Ex.as que aceito, se a Câmara o quiser, o estabelecimento dum único ti-

Diário du C à ai ar a dos Deputados^

• , /

po do pão, mas não me vencem, nem me

convencem. Aceito porque, como Ministro, tenho de acatar as indicações do Parlamento.'

O discurso será publicado na integra quando o orador haja devolvido as Anotas taquigráfícas.

O-Sr. Cunha Liai: — Principiarei, Sr-Presidente, por estranhar duas cousas: em primeiro lugar, este sistema que usa a presidência de marcar para umas curtas duas horas e meia de sessão, dois assuntos, de modo que nunca são tratados convenientemente e arrastamo-nos .aqui indefinidamente, sem que se chegue a uma conclusão definitiva sobre qualquer deles. Em segundo lugar, estranho bastante que a Câmara dos Deputados funcione com o reduzido número de membros que vejo neste momento. Bem contados, não chegariam a um quarteirão, sem ofensa para os representantes da Nação.

O Sr. Ministro da Agricultura (João Luís Ricardo):—É que o assunto não tem importância.

O Si*. Ministro da Agricultura (João Luís Eicardo) : — Para toda a gente.

O Orador: — Peço a V. Ex.a, Sr. Presidente, que convide os Srs. Deputados a deixarem-me falar.

E deveras para estranhar que o assunto não mereça a atenção da Câmara e que sahendo-se que só ia tratar do uma questão importantíssima para a vida da Nação, a respeito da qual se tern levantado suspeições sobro certos indivíduos e instituições, dizendo-se, embora erradamente, que o Estado perde mais de quarenta mil contos por ano, para que uma determinada percentagem — pelo menos quinze ou vinte mil contos — catre nos coiros de certas companhias, o interesse da Câmara não tenha sido bastante para aqui trazer, ao menos, a maioria, legal necessária para o seu funcionamento.

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nificar que têem razão os que lá fora dizem que na Câmara dos Deputados não há a òompetência necessária para tratar daquilo que realmente interessa á vida da Nação. Era intenção do Grupo Parlamentar Popular levantar esta questão no Parlamento. Creio mesmo que o meu amigo Júlio Martins tinha já anunciado essa intenção ao Sr. Ministro da Agricultura.

O assunto é duma grande importância, o assunto não ó conhecido pelo público. Houve um grande jornal do nosso País, O > Século, que procurou esclarecer a questão durante longos dias; o Sr. Costa Júnior levantou-a aqui;'o Sr. Ministro da Agricultura respondeu c nenhum deles a conhece. E uma afirmação que faço.

O Estado tem deter a sua polícia como a tem e Grupo Parlamentar Popular. Vimos trazer afirmações concretas do modo como a moagem tem roubado o povo e continua roubando; vimos dizer o seguinte : que embora se cumpram os diagramas, embora se exijam as sêmeas a moagem rouba. As leis tem da ser feitas em . atenção a todos estes factos e do desconhecimento deles resulta que os roubos continuam.'

Proponho-me, por isso, tratar esta questão sob dois aspectos. Não venho simplesmente armar o escândalo, venho trata Ia sob o ponto de vista doutrinário e dizer que1 ,a questão comporta tais o tais aspectos. E preciso encará-la debaixo do ponto de vista geral e debaixo do ponto de vista dos interesses do consumidor. E preciso acautelar o consumidor das fraudes que continuarão a praticar-se à sombra da lei que o Sr. Ministro da Agricultura promulgou. Venho aqui dizer que, além desse aspecto geral, existe um -aspecto particular, que c o dos roubos, que "hão de continuar a ser praticados senão se lhe puser um dique.'Abordarei em primeiro lugar, Q, lado doutrinário. Irei demonstrar com números como é que a moagem rouba e ^como para uma dada quantidade do trigo fornecido pelo Estado ela arranja a falsificar os diagramas. Devo fazer uma afirmação concreta. Ninguém dtJiáiUcisicara o seu jogo sem quo disso resulte qualquer interesse para o Pais. O meu interesse ó o seguinte, vou polo claramente; o Estado tom sido roubado Q ou comproineto-rne perante a Cá-HKiru uo seguinte: nomeie-se uma co-

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missão de sindicância, metam-no lá a mim, ponham-me um contabilista às minhas ordens, o, seja qual for a maneira habilidosa como esteja feita a escrita da moagem, eu separarei o que são lucros pormitidos pela lei dos lucros não permitidos pela lei. . .

Mas, para que eu o faça, é preciso que o Sr. Ministro da Agricultura, antes de eu atacar este ponto, me responda con-cretamente a esta pregunta. Prova-se que a moagem roubou, prova-se com a escrita, que arrecadou o lucro permitido pela lei e excedeu-o em tanto: mas, o que é que o Sr. Ministro faz a esses homens? Não vou lançar sobre mim o odioso de trazer estas afirmações e comprová-las cbm factos sem que, antecipadamente, se diga qual a sanção que o Sr. Ministro cu-tende dever aplicar a esses homens. Não me diga que os prenderá; é-me indiferente vê-los presos ou em liberdade. O dinheiro paga-se com o dinheiro.

A Moagem caiu numa esparrela. Isso é com ela.

Ninguém a obrigou a aceitar leis como aquela qua o Sr. Ministro da Agricultura promulgou, dentro das quais ela não podia viver sem roubar.

Eu, Sr. Presidente, vou apontar qual foi a importância' quo a Moagem roubou, porque a lei classifica como roubo os lucros que não são permitidos por lei. Mas, antes de o fazer, desejo perguntar ao Sr. Ministro da Agricultura se está disposto, a bem ou a mal, a fazer reentrar essas quantias nos cofres do Estado.

'O Sr. Ministro da Agricultura (João Luís Ricardo): — Eu posso já responder a V. Ex.a Dentro dos limites que a lei me estabelece eu garanto áV. Ex.a que a cumprirei fielmente. V. Ex.a deu a resposta a si próprio, qual foi a do lembrar a conveniência de se nomear uma comissão de sindicância a essas fábricas, o eu creio que V. Ex.a não se quere arvorar só om juiz, a fim de se apurar quais os lucros ilícitos.

E se eu não tiver na lei meios para fazer reentrar esse dinheiro» eu tmroi ao Parlamento, ou a própria comissão proporá as medidas a adoptar»

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contabilista e apurar-se há quais foram os lucros ilícitos nestes últimos anos.

Agora pregunto ainda:

Isso é que me interessa.

O Sr. Ministro da Agricultura (João Luís Eicardo): — £ V. Ex.a dá-me licença ? Eu digo a V. Ex.a que neste momento não posso afirmar se há ou não na lei os meios necessários, mas se imo os houver â comissão parlamentar de inquérito proporá a publicação da legislação necessária.

O Orador:---O caso não ó tam simples •como parece. O Sr. Ministro da Agricultura sabe que eu não ..poderei terminar hoje as minhas considerações, e que naturalmente só poderei fazer na próxima se-gunda-feira.

Vamos entrar de frente num caso de ordem sentimental, e eu vou pôr a questão em pratos limpos. Disse-se à Moagem:

«Os senhores para moerem um quilograma de trigo tom dois centavos apenas, porque não consentimos o aumento do preço do pão, mas podem trabalhar à vontade, pois que já de antemão st) sabe que aquele trabalho não pode ser, feito por aquela importância».

Sim, porque ninguém está a trabalhar para os outros,, e a Moagem caiu nn esparrela, como há pouco classifiquei, pois que o Estado disse isso, mas não escreveu nada.

A Moagem estúpida, desta vez, deixou-. -se ir nesta esparrela. Se só aplicasse a lei a Moagem era obrigada a restituir não só os ^lucros ganhos como o próprio capital. E por isso que eu, que sei -quais são as^ respon.sabilida.des que a cada um do nós competem, quando fazemos determinadas afirmações, sou capaz de descobrir a principal origesm da fraudo praticada pola/Mougom.

A Moagem quere a sua nacionalização, como únic'a salvarão.

Levanto, pois, uma-questão prévia para que o Sr, Miuií,ti*o medito bem na resposta a dar-me.

'Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Ministro da Agricultura (João Luís Eicardo) : — Não posso dar outra resposta.

O Orador: — Tenho .meios de o forçar a dá-la. Se eu não pudesse explicar os roubos da Moagem não perguntaria isto

Há-de ir de vagarinho, mas há-de dar outra resposta.

O Sr. Presidente: — Estando próxima a hora de se encerrar a sessão, e tendo ainda de dar a palavra aos Srs. Deputados que se inscreveram para antes de se oncerrar a sessão, eu pregunto seV.Ex.a quore ficar com a palavra reservada.

O Orador: — Ficarei com a palavra reservada. ' .

O- discurso será publicado na íntegra, quando o orador haja devolvido as notas taquigráfícas.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira do Azeméis): — Desejo chamar a atenção do Sr. Ministro da Agricultura para o facto de ter pedido uns documentos pelo seu Ministério, e dizendo respeito aos contratos para fornecimento de trigo ao Estado.

Está a tratar-se nesta casa da magna questão do pão.

Só pode ser esclarecida completamente em face dos referidos documentos.

Precido dôsses documentos com urgência.

Mais sabe S. Ex.a o que foi em Portugal a vida dos celeiros municipais.

Sabe também 'por documentos chegados ao seu conhecimento, de débitos avulta-díssimos ao Estado por parte desses celeiros.

Sabe que há quantias avultadíssimas a pagir pelo facto dos celeiros terem sido extintos.

Ksínu convencido de que a comissão de inquérito ao Ministério" dos Abastecimentos, alguma cousa terá apurado a esse respeito'.

Mas urge tomar providencias no sentido do serem pagos os débitos dos celeiros municipais o tomar a responsabilidade a quom compete.

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para o que se passa em Freixo de Espada à Cinta.

Reclamações tem sido feitas protestando contra a maneira porque tem sido feitas as operações de recenseamento naquele concelho, de indivíduos que não satisfazendo às disposições da lei, ainda não a tinham cumprido.

S, Ex.a com a autorização que têm nas leis, poderá conseguir que cessem os excessos cometidos pelas autoridades e duma vez para sempre para honra da República.

«j

O Sr. Ministro da Agricultura (João 'Luís Ricardo):—Sr. Presidente: pedia palavra para responder ?,o ilustre Sr. Manuel Josó da Silva.

Eu devo dizer a V. Ex.a que não tinha conhecimento do requerimento que V. Ex.* fez, no emtanto vou tratar do procurar saber o que V. Ex.a deseja e darei ordem imediata no sentido de serem satisfeitos os seus desejos.

O que eu posso dizer desde já a V. Ex.a, é que lhe poderei fornecer em parte, os elementos que V. Ex.? pediu, por isso quQ também já tratei de saber o que V. Ex.a quero, isto é: até a uma certa data, por isso que de JuJho a Outubro nada se poder saber, visto a escrita do Ministério dos Abastecimentos, ter desaparecido, isto é,.não se saber dela.

Quanto ao que V. Ex.a disse relativamente aos celeiros municipais, devia declarar-lhe .que oficialmente nada posso dizer, no 'emtanto o que posso afirmar a V. Ex.a é que já ordenei a todos os secretários de Finanças, para que procedam rapidamente à sindicância que por minha ordem mandei fazer.

Foram estas, Sr. Presidente, as medidas que tomei, em vista da comisscão de inquérito não me dar elementos,

Tojiho dito.

O orador não reviu.

G Sr. Queirós ¥aa Ghieáes °—Eu devo dizer h Cíimaca que a comissão de inquérito alguma cousa já foz.

Os (-.('loiros por Am são muitos, o por isso acho que o Sr. Ministro da Agricultura prtdodou piuito bom mandando fazer uma sindicância imedu\U=

O Sr. Presidente do Ministério (António Maria Baptista):—Sr. Presidente: ouvi com a máxima atenção as considerações feitas polo ilustre Sr. Manuel Josó da Silva, e posso garantir-lhe que nenhum conhecimento tenho dos factos que apontou à Câmara.

Vou informar- me> se eles se passaram como V. Ex.a disse, e eu tomarei as providências que julgar necessárias para bem da Pátria e da República.

O Sr. 'Presidente :—A próxima sessão será na • segunda feira, 19 do corrente, sendo a ordem do dia a mesma que estava dada para hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 15 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Propostas de lei

Dos Srs. Ministros da Guerra e Marinha, alterando a redacção do § único do artigo 54.° do Código de "Justiça Militar.

Para a Secretaria. • Para o «Diário do Governo».

Do Sr. Ministro da Agricultura, desdobrando a 6.a Circunscrição Florestal, o criando uma nova circunscrição para os serviços florestais do Funchal, que se denominará: 8.a Circunscrição Florestal.

Para a Secretaria.

Para o «.Diário do Governo»..

Pareceres

Da comissão de finanças, sobro o n.° 180-F, abrindo um credito de 1GÕ.232$15, a favor do Ministério das Finanças, para reforçar diferentes verbas do Orçamento de 1918-1919.

Para a Secretaria.

Para a com/ssão do Orçamento.

Da comissão de marinha, sobre ospro-jectos-n.os 272-1) o 27G-F, que estabelecem as disposições do decreto de 30 do Setembro de 1911, que modificou o plano do uniformes n n. ar w/ida, n,i. pnrto rofe= rcnto a distintivos.

Para a, Hpc.rp.tnrici.

Para a comissão de finanças.

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