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REPÚBLICA
PORTUGUESA
SIE!Sí3_Ã-O lsT.° 96
EM l! DE JUNHO DE 1920
Prosidôacla do Ex,mo Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso
Secretários os Êx,mos Srs,
Baltasar de Almeida Teixeira António Marques das Neves Mantas
Sumário.—Respondem à chamada 31 Srs. Deputados. Procede-se à leitura da acta, que é aprovada quando se verifica a presença de 63 Srs. Deputados. Lê-se o expediente, que tem o devido destino.
O Sr. Brito Camacho usa da palavra para interrogar a Mesa a propósito dum ofício do Senado em que se considera inconstitucional uma deliberação da Câmara. O Sr. Presidente dá explicações, consultando a Câmara nobre se a matéria contida no oficio do Senado deve entrar imediatamente em discussão. A Câmara resolve afirmativamente. Usam da palavra os Srs. António Maria da Silva, que manda para a Mesa uma proposta, Ferreira da Rocha, António Granja, Ministro das Finanças (Pina Lopes). Mariano Martins, que apresenta uma proposta, e Pedro Pita, que envia uma proposta para a Mesa, a qual depois retira com consentimento da Câmara. São aprovadas as propostas dos Srs. António Mana da Silva e Mariano Martins.
O Sr. João Pinheiro, para explicações, ocupa--se das referências que lhe são feitas nos relatórios da Comissão Parlamentar de Inquérito ao extinto Ministério dos Abastecimentos, terminando por mandar para a Mesa a declaração de-renúncia do lugar de Deputado. Responde o Sr. António Granjo em nome da Comissão.
Os Srs. Júlio Martins, Pais Sovisco e Cunha Liai ocupam-se também dos trabalhos daquela Comissão de Inquérito. As considerações do Sr. Cunha Liai responde, em nome da Comissão, o Sr. Tavares Ferreira.
O Sr. Presidente consulta a Câmara sobre se considera urgente um assunto apresentado pelo Sr. Álvaro Guedes: escândalos na administração pública. É rejeitado por 42 votos contra 21.
O Sr. Nóbrega Quintal também deseja tratar, em negócio urgente, da elevação a 3.600$ da pensão anual concedida à viúva, do capitão-tenente Carvalho Araújo. Sobre o modo de votar usam da palavra os Srs. Brito Camacho, João Camoe-sas, Eduardo de Sousa, Abiiio Marcai, Jaime de Sousa e Dias da, Silva.
O Sr. Presidente declara que o Sr. Ministro das Finanças deu a sua anuência ao projecto de lei mandado para a Mesa naquele sentido pelo Sr. Nóbrega Guintal. A Câmara concede para a sua discussão iirgència e dispensa do Regimento. Usam da palavra os Srs. Dias da Silvei} que manda para a Mesa uma propo-la de emenda, Vi-riato da- Fonseca, Pedro Pita, João Camoesas, Nóbrega Quintal. Ministro das Finanças, Plínio Silva, Júlio Martins, António Granjo, Eduardo de Sousa, Jaime de Sousa, Domingos Cruz e Álvaro de Castro. Seguidamente é o projecto aprovado na generalidade e na especialidade. A proposta de emenda do Sr. Dias da Silva não é submetida à votação por acarretar aumento de despesa e o Sr. Ministro das Finanças nã& lhe dar a sua anuência.
Em nome da Comissão de inquérito ao extinta Ministério d°s Abastecimentos, o Sr. António Granjo fornece à Câmara novas explicações.
Ordem do dia. — O Sr. Malãonado de Freitas requere para entrar em discussão na próxima se-gunda-feira o parecer n.° 395.
O Sr. Pais Rovisco preyunta quando se discute o parecer n.J 427. O Sr. Presidente responde que esse parecer traz aumento de despesa.
O Sr. António Granjo manda para a Mesa o processo relativo a algumas das averiguações da Comissão de Inquérito ao extinto Ministério dos Abastecimentos.
Entra em discussão o orçamento do Ministério do Comércio, usando da palavra os Srs, Jaime de Sousa, Manuel José da Silva f Oliveira de Azeméis), Ministro do Comércio (Lúcio de Azevedo) e Cunha Liai, sendo aprovados' alguns artigos com emendas apresentadas pelo Sr. Ministro do Comércio.
Antes de se encerrar a sessão. — Usam da palavra os Srs. Álvaro Guedes e Pedro Pita, respondendo o Sr. Ministro do Comércio.
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Diário da Câmara dos Deputados
Abertura da sessão às 14 horas. Presentes à chamada 63 Srs. Deputados.
São os seguintes:
Abílio Correia da Silva Marcai.
Afonso de Maeedo.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedq e Sousa.
Álvaro Pereira Guedes.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Albino de Carvalho Mourâo.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Granjo.
António José Pereira.
António Lobo de Aboim Inglês.
António Maria da Silva.
António Pais Rovisco.
António Pires de Carvalho.
António dos Santos Graça.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Cruz,
Eduardo Alfredo de Sousa.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco José Pereira.
Francisco de Pina Esteves Lopes.
Henrique Ferreira de Oliveira Brás.
Jacinto de Freitas.
Jaime da Cunha Coelho.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Henriques Pinheiro.
João José da Conceição Camoesas.
João de Orneias da Silva.
Joaquim Brandão.
Josó António da Costa Júnior.
José Gregório de Almeida.
José Maria de Campos Melo.
José Mendes Nunes Loureiro»
José Monteiro.
Jqs,é de Oliveira Ferreira. Pipis.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho,.
Luís Augusto Pitito de Mesquita Carvalho.
Luís de Orneias Nóbrega Quintal.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel Josó da Silva.
Manuel José da Silva.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mom Tinoco Verdial.
Pedro Gois Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
P-líuio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Raul Leio Portela.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Acácio António Camacho Lopes Cardoso. , Alberto Ferreira Vida}. Álvaro Xavier de Castro. Américo Olavo Correia de Azevedo. Aníbal Lúcio de Azevedo. António Augusto Tavares Ferreira. António Bastos Pereira. António Marques das Neves Mantas.
A ..í.___A 11____J.- r\_______V. „ T
Artur .ixiueriu vyctiuauiiu JLJ
Augusto Dias da Silva. Hartolomeú dos Mártires Sousa Seve-rino.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado de Freitas.
Francisco Coelho (Jo Amarai Reis.
Francisco da Cunha Rego Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Liai.
Francisco de Sousa Dias,
Jaime Júlio de Sousa.
João Gonçalves.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
José Domingues do.s Santos.
Júlio Augusto da Cruz.
Júlio do Patrocínio Martins.
Tomás de Sousa Rosa.
Vasco Borges.
Srs. Deputados que não compareceram :
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Sessão de li de Junho de 1920
Albino Vieira da Bocha.
Alexandre Barbedo Pinto de Almoidq.
Antão F;-mandes de Carvalho.
António Albino Marques de Azevedo.
António Aresta Branco.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
António Carlos Ribeiro da Silva.
António da Costa Ferreira.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António Maria Pereira Júnior.
António de Paiva Gomes.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Rebelo Arruda.
Constâncio Arnaldo de Carvalho.
Diogo Pacheco de Amorim.
Domingos Leite Pereira.
Domingos Vítor Cordeiro Rosado.
Estêvão da Cunha Pimentel.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Cotrim da Silva Garcês.
Francisco da Cruz.
Francisco José Martins Morgado.
Francisco José de Meneses Fernandes Costa.
Francisco Luís Tavares.
Francisco Manuel Couceiro da Costa.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Henrique Vieira de Vasconcelos.
Hermano José de Medeiros.
Jaime de Andrade Vilares.
Jaime Daniel Leote do Rego.
João Estêvão Aguas.
João Maria Santiago Gouveia Lobo Prezado.
João Pereira Bastos.
João Ribeiro Gomes.
João Salema.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Xavier Camarate Campos.
Joaquim Aires Lopes de Carvalho.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Garcia da Costa. •
José Q-omes Carvalho de Sousa Vá-
José Maria de Vilhona Barbosa Maga-
José Mendes Eiboire Norton de Matos» José Rodrigues Braga,
Júlio César de Andrade Freire.
Leonardo José Coimbra.
Liborato Damião Ribeiro Pinto.
Lino Pinto Gonçalves Marinha.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel José Fernandes Costa.
Maximiano Maria de Azevedo Faria.
Miguel Augusto Alves Ferreira.
Nuno Simões.
Orlando Alberto Marcai.
Raul António Tamagnini de Miranda Barbosa.
Rodrigo Pimenta Massapina.
Vítor José de Deus de Macedo Pinto.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Xavier da Silva.
Pelas 14- horas, com a presença de 31 'Srs. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta, que foi aprovada por 63 Sr s. Deputados.
Leu-se o seguinte
Expediente
Última redacção
Do projecto de lei n.° 471, que concede à Câmara Municipal de Ponta Delgada isenção de direitos de importação dos materiais para abastecimento de águas e iluminação eléctrica.
Dispensada a leitura da ultima redac' cão. •
Remeta-se ao Senado.
Projectos de lei
Do Sr. Alberto Jordão, sobre vencimentos dos funcionários civis que serviram ou. venham a servir em campanha.
Para a comissão de guerra.
Do Sr. João Camoesas, estabelecendo uma percentagem adicional sobre as importâncias arrecadadas pelo Estado, para melhoria de vencimentos dos oficiais de justiça dos tribunais criminais,
Para a comissão de legislação civil e comercial.
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Diário da Câmara doe Deputados
dústria para fabricação de limas, concedida a Manuel A. de Faria Vilaça, do Porto.
Pará a comissão de comércio' e indústria.
O Sr. Presidente:—Peço a atenção da 4 Câmara' para este documento, pois certamente que a Câmara quererá tomar qualquer resolução, independentemente dele baixar à comissão respectiva:
Ex.mo Sr. Presidente da Câmara dos Deputados. — Em referência ao oficio de V. Ex. n.9 82, de 4 do corrente, tenho a honra de comunicar a V. Ex.a que o Senado resolveu por unanimidade não aceitar a segunda parte da moção aprovada na Camará dos Deputados, por a julgar inconstitucional.
v Saúde e Fraternidade.—Palácio dp Congresso da Kepúbliea, em 9 de Junho de 1920. — António Xavier Correia Barreto,
O Sr. Brito Camacho: — Eu desejava saber se a opinião de V. Ex.a é forçar a Câmara a tomar já uma deliberação. Desejava que V. Ex.;t completasse o seu pensamento. Desejava que V. Ex.a fosse mais explícito.
O Sr. Presidente: — Não foi de forma alguma intento meu influenciar a Câmara para resolver já sobre a questão do Senado, embora essa resolução tenha de ser breve.
O Sr. Brito Camacho:—Realmente é uma questão urgente. •
Eu estava a ver que possivelmente o Senado não aceitaria a moção. Eu e o meu partido estamos à vontade, não temos de fazer grande esforço para mostrar a inconstitucionalidade da moção.
No meu entender deve-se tratar imediatamente deste assunto.
A Câmara aprovou que entrasse imediatamente em discussão.
• O Sr. António Maria da Silva: — Sr. Presidente: V. Ex.a notificou à Câmara que o Senado não tinha concordado connosco relativamente a cooperar na comissão para apreciar as propostas de finanças, alegando que isso não era constitucional. ;
Eu não conheço artigo algum no nosso código basilar pelo qual esse princípio seja proibido.
O facto ó qne esta proposta interessa ao país e é preciso resolvê-la o mais depressa possível.
,; As duas Câmaras não podem trabalhar senão-em Congresso? A Constituição.não diz que as comissões não possam também trabalhar conjuntamente.
O Senado não entende assim; não vale a pena insistir.
Não vaie a pena insistir não por menos consideração para com o Senado, mas já que o Senado assim o entende e declarou que conhecia as propostas e qne as estava .estudando dá-nos a esperança de que o seu estudo será proveitoso para o país e que quando as propostas lá chegarem já conhecerá bem a questão para a poder resolver rapidamente.
O que eu vejo, Sr. Presidente, e com mágoa, é que o Senado não quere trabalhar connosco, no sentido de se fazer um trabalho proveitoso para bem da-Pátria e da República.
Não podemos ficar assim, e nesta or-dein de idéas vou mandar para a Mesa. uma proposta.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: —Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. António Maria da Silva.
Foi lida e admitida.
E a seguinte:
Proposta
Proponho que se mantenha a moção anteriormente aprovada na parte que diz respeito a Deputados.
Sala das Sessões, 11 de Junho de 1920.— António Maria da Silva.
O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente : o Sr. António Maria da Silva referiu-se nas suas considerações' a uma moção que foi aqui apresentada.
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Sessão de 11 de Junho de 1920
Essa moção, Sr. Presidente, era de parecer que se nomeasse uma comissão de Deputados que podia trabalhar conjuntamente com uma outra comissão de Senadores, o que é completamente diferente.
Segundo a minha moção, ela seria apenas constituída por Deputados. Foi isto que eu propus e que não chegou a ser discutido.
Individualmente mantenho a minha opinião. Estou absolutamente convencido de que será melhor nomear uma comissão especial do que fazer baixar a proposta à comissão de finanças, já porque esta não seria a forma mais prática de resolver a questão, já porque nesta comissão se não encontram representados todos os agrupamentos políticos desta Câmara, faltando-lhe por isso elementos cujos conhecimentos seriam extraordinariamente úteis no exame e apreciação dessa proposta.
O orador não'reviu.
O Sr. António Granjo: — Sr. Presidente : a admitir a possibilidade de funcionarem conjuntamente duas comissões eleitas pelas duas Câmaras, temos igualmente de admitir a possibilidade de funcionarem conjunta e normalmente as duas Câmaras.
Ora como as duas Câmaras são constituídas, não apenas pelos seus membros, funcionando em sessões conjuntas, mas ainda pelos seus membros que funcionam em comissões, duas comissões funcionando conjuntamente infringem a Constituição. Desta forma, o Senado andou bem, rejeitando a moção por inconstitucional.
Em todo o caso, se é indispensável uma comissão especial para mais fácil e rapidamente dar parecer sobre as propostas de finanças, nada tenho a opor, embora tenha necessidade de fazer algunsscomen-tários.
A proposta do Sr. António Maria da Silva diz que a moção fica de pé pelo que diz respeito a Deputados.
Ponhamos de parte a redacção vaga desta proposta e coloquemo-la inteiramente de boa fé. Toda a Câmara compreendei! que o que se pretende é eleger uma comissão composta de onze membros, o O
O Sr. António Maria da Silva: — Eu
contei com a inteligência dos membros desta casa do Parlamento.
O Orador: — O que é preciso é contar com a inteligência do país para quem estamos legislando.
Pela moção que foi apresentada, dá-se a presidência da comissão ao Sr. Ministro das Finanças e é com este facto que eu não posso concordar. Quer seja uma comissão especial, quer seja uma comissão regimental, as comissões é que elegem o seu presidente.
O Sr. Ministro das Finanças é Deputado, mas eu não sei se, regimentalrapnte, S. Ex.a pode ser eleito para qualquer comissão parlamentar.
O Sr. Mesquita Carvalho: — Eegimental-mente não pode.
' O Orador: — Nessas condições, não acho vantagem nenhuma em que essa comissão seja presidida por S. Ex.a
O Sr. António Maria da Silva: — Como a comissão ora composta de Deputados e Senadores, deu-se a presidência ao Sr. Ministro das Finanças, mas, agora que ela é composta apenas de Deputados, deve ser efectivamente ela que tem de escolher o seu presidente.
O Orador:—Nesse caso/o melhor seria mandar para a Mesa um aditamento a essa proposta, explicando que a comissão será composta de onze membros, que terão a faculdade de escolher o seu presidente.
Mas há ainda um comentário que eu desejo fazer e esse diz respeito ao Governo.
Na ocasião em que nesta casa do Parlamento se discutia o assunto, o Governo, pela boca do Sr. Ministro das Finanças, declarou que só aceitaria a moção do Sr. Domingnes dos Santos...
O Sr. Velhinho Correia: — Não foi bom isso.
O Orador:—Isto quere dizor, cm linguagem .parlamentar, que o Governo faz questão da aprovação dessa moção.. .
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o que S. Éx.a disse foi que preferia a moção do Sr. José Domingues dos Santos.
O Orador : — Com toda a sua perentória afirmativa, o Sr. Velhinho Correia ó que está 'eni erro.
Em todo o caso, por um gesto negativo do Sr. Ministro das Finanças, parece que me enganei na interpretação que dei às suas declarações.
Para prestígio, porém, do Poder Executivo e-do próprio Parlamento, bom é que se meçam as palavras e bom é que o Governo se não coloque numa situação qne dê lugar a equívocos.
Eu, Sr. Presidente, não quero colocar o Governo numa situação melindrosa, e com o que disse quis apenas mostrar a razão que tivemos.
O que eu desejava, Sr. Presidente, é que a comissão trabalhe 'e quê apresente os seus trabalhos o mais rapidamente possível, de forma a que possam ser igualmente apreciados com toda a brevidade para bem da Pátria e da Kepública.
Tenho dito.
,U orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Pina Lopes) : — Sr. Presidente : eu pedi a palavra unicamente para esclarecer um ponto do discurso feito pelo Sr. António Granjo.
Sr. Presidente: as minhas palavras foram bem claras, não podendo ter duas interpretações diferentes.
Sr. Presidente: eu não fiz uma questão fechada; antes pelo contrário, em face das moções que foram apresentadas, fiz uma questão aberta, dizendo apenas que me parecia mais aceitável a moção apresentada pelo Sr. Domingues dos Santos.
Não fiz uma questão fechada, repito, nem a podia fazer, e para mim mesmo, a segunda parte dessa proposta era indiferente.
Terei muito prazer em poder assistir aos trabalhos dessa comissão, para a poder esclarecer sobre quaiscfuer pontos em que ela tenha dúvidas; mas não fiz, nem podia fazer, uma questão fechada da aprovação da moção.
O Parlamento resolverá conforme julgar mais conveniente, esperando somente que essa comissão trabalhe com vontade.
Tenho dito.
O orador não- reviu.
JDiáriv âa 'Càitidra aos Í)vputadôí
O Sr. Mariáno Martins : — Sr. Presidente: pedi a palavra para íazer apenas unias simples considerações, em vista do que acaba de dizer o Sr. António Granjo.
Eu, Sr. Presidente, devo declarar muito francamente que não houve censura alguma à marcha governativa do Ministér io.
Compreende-se que a comissão não soja a mesma que a comissão de finanças, porque nessa não estão representados todos os grupos políticos desta Câmara, e há necessidade que todos os grupos, nessa comissão a eleger, estejam representados, e que para isso ela seja composta de quinze membros.
Nesse sentido mando para a Mesa uma proposta.
O orador não reviu.
Foi lida na Mesa.
foi admitida.
E a seguinte:
Proposta
Proponho que seja de quinze o numero de Deputados que há-de compor a comissão encarregada de estudar as propostas de finanças. — O Deputado, Mariáno Mar-
O Sr. Pedro Pita:— Sr. Presidente: quando foi rejeitada a proposta do Sr. Domingues dos Santos, eu fui um dos que a rejeitaram, porque entendi que a Câmara dos Deputados não podia fixar o número de Senadores que deviam entrar nessa comissão, nem mesmo resolver que eles nela entrassem, visto não poder esta Câmara intervir nas resoluções da outra.
Hoje pretende o Sr. António Maria da Silva manter dessa moção a parte que diz respeito aos Srs. Deputados, ou seja a eleição de uma comissão especial, e o' Sr. Mariáno Martins apresentou unia proposta para que essa comissão seja composta de quinze membros.
Eu já tive ocasião de mostrar que em certo momento a Câmara deseja que a comissão de finanças seja ouvida uma e duas vezes sobre determinado assunto e outras deixa de a ouvir, saltando por cima dela.
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de 11 de Junho de 1920
Nessas condições, mando para a Mesa a seguinte
Proposta
Proponho que seja enviada á comissão de finanças desta Câmara, para sobre ela dar parecer, a proposta de lei respeitante aos lucros de guerra. — O Deputado, Pedro Pita.
Foi admitida.
O Sr. António Maria da Silva:—Sr. Presidente: como toda a Câmara sabe, na eleição das comissões não foi dada representação a dois grupos parlamentares: o grupo socialista e o grupo popular parlamentar.
Tinha-se tomado como compromisso o modificar sem demora o Regimento desta Câmara, e como isso não se fez até agora, não foi a proposta sobre lucros de guerra submetida à comissão de finanças, por não ser conveniente sujeitá-la ao estudo dessa comissão, não estando nela representados dois grupos políticos desta Câm..ra.
Há ainda outra razão, e é que tendo de ser ouvida a comissão de finanças, visto que o Governo contava com essa proposta para acabar o déficit, também teriam de ser ouvidas as comissões de comércio e de agricultura.
Se esta Câmara entendeu que era urgente o estudo da proposta e não se podia separar sem prover de remédio o déficit, que é assombroso, não sei o motivo por que não haviam de ter representação esses dois grupos.
De resto, sou membro da comissão de finanças e não podia partir de mim qualquer proposta contra essa comissão.
Não me parece que sejam de considerar as razões apresentadas pelo Sr. Pedro Pita e estou de acordo corn a proposta do Sr. Mariano Martins, não devendo porém deixar-se ao acaso de uma eleição a escolha dessa comissão, pare } cendo-me que a nomeação desses quinze membros deve obedecer ao princípio de dar representação aos vários agrupamentos parlamentares.
O orador nõ,n reviu.
O Sr. Fsdro Pita: — Sr. Presidente: cm vista das afirmações do Sr. António Maria da Silva, declarando que está de acordo em quo todos os agrupamentos políti-
cos tenham representação nessa comissão, requeiro para retirar a minha proposta. Foi autorizado.
O Sr. Presidente: — Vão ler-se para serem votadas as propostas apresentadas pelos Srs. António Maria da Silva e Mariano Martins.
Foram lidas e aprovadas.
Antes da ordem do dia
O Sr. João Pinheiro: — Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer algumas considerações sobre o relatório apresentado a esta Câmara, acerca do inquérito ao Ministério dos Abastecimentos.
Quem lesse esse relatório que é do dia 4 do mês de Maio, notaria que são incompatíveis e inconcebíveis os seus termos.
Sr. Presidente: é produndamente doloroso para rnim ter de afirmar aqui nesta Câmara quê é absolutamente falso esse primeiro relatório.
O Sr. Júlio Martins: — Ouça a comissão, ouça.
O Orador:—Como V. Ex.a sabe, Sr. Presidente, no primeiro relatório eu era acusado, segundo informação do chefe da contabilidade, do ter autorizado verbalmente a abertura dum crédito.
Mas eu não fui acusado por ninguém. Diz o relatório que o director geral disse que tinha a impressão de que usei duma forma verbal, dando uma ordeni para abertura dum crédito.
S. Ex.a declarara ainda que não sabe se interpretara mal a ordem dada.
Não há aqui acusação contra mini, nem contra ninguém.
Há a considerar ainda as circunstâncias em que a ordem foi dada, e se produziu dano para o Estado.
Há mais, muito mais, e ainda chamo para este caso a atenção de V. Ex.a
No relatório entregue em 4 de Maio, a comissão afirma categoricamente que existe uma acusação oficial contra mim, ein que se diz que um decreto por mim publicado era da autoria da moagem.
É absolutamente falso.
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cação duma carta no Diário de Notícias, em que se diz que a comissão de inquérito não dizia a verdade.
Pregunto a V. Ex.a e à Câmara: j fez ou não fez o chefe da repartição a acusação terminante de que o decreto publicado por niim era de autoria da moagem! Se fez não há aqui nada de duvidoso; é tudo quanto há de mais claro. Se realmente houve qualquer afirmação nestas condições do chefe do Ministério, da qual se pudesse tirar uma conclusão, peremptória, ^ qual é o direito de fazer insinuações vagas? (Apoiados}.
jjQual o direito de tirar conclusões tam terminantemente que vêm ferir a honra doutrem? (Apoiados}.
Sr. Presidente: nesse mesmo relatório há divergência fundamental, que ó absolutamente impossível conciliar.
Encontro-me com as mãos livres neste momento, porque já não podem acusar--me de, com quaisquer palavras, ter inte-.rêsse em ocultar algumas faltas, ou de que pretenda que a comissão me seja ou não favorável.
Repito, a absolvição não me honra nada : começou por falsidade, acabou por falsidades.
Sr. Presidente: fui Ministro dos Abastecimentos,, o este mês, o mais largo da minha vida, não quero dizer o que ele foi, simplesmente direi isto à comissão : é que entrei no Ministério com a greve dos caminhos de ferro do Sul e Sueste, e que era absolutamente necessário para a defesa da República que essa greve se resolvesse e eu resolvia-a, e resolvi-a, estou convencido que pela primeira vez, sem que fossem aumentados os vencimentos.
A situação em que fui para esse Ministério sabem-no V. Ex.as
Estava a revolução do norte na sua maior pujança, e V. Ex.as compreendem a minha situação, visto que o meu nome havia pertencido a um partido alcunhado de traição.
Não faltou nada ao exército do norte, embora tivesse lutado com dificuldades consideráveis. Mas ninguém pode dizer que houvesse faltas para o exército republicano, naquela hora que se lutava com dificuldades de transportes.
É preciso ter uma grande coragem e exercer um grande esforço para se poder conseguir isto. (Apoiados).
Diário da Câmara dos Deputados
Também nessa ocasião havia resistência da parte do cada merceeiro em fornecer géneros. Havia o que, se permitem a frase já consagrada, se chama ainda as bichas. Acabaram nessa ocasião.
E isto foi conseguido no espaço de um mês, com muito esforço e boa vontade.
Não tendo meio para abastecer o norte, estava preparado o vapor Lima, mas o estado do mar não permitia a saída desse vapor.
Foi ao norte.
Isto representa enormes dificuldades. Isto não viu a comissão de inquérito, e ou não a censuro por isso, porque não" foi para ver as cousas boas que ela foi nomeada, mas para ver as cousas má?.
Andarei de cara levantada.
Devo declarar que estou cansado, e que não posso continuar a representar na vida política do meu país o papel, até certo ponto de destaque, que tenho representado até aqui.
Sairei do Parlamento para não voltar cá mais. Não sairei do meu partido, porque não tenho razão absolutamente alguma para assim proceder.
Nestes termos, agradecendo todas as defereneias do Y. Ex.;i e da Câmara, -eu tenho a honra de enviar a declaração da minha resignação de voto, que leio.
Leu-se na Mesa.
É a. seguinte:
Declaração
Declaro, em harmonia com as minhas considerações verbais, .que resigno o meu mandato de Deputado, e envio para a Mesa o passe dos Caminhos de Ferro do Estado que possuía naquela qualidade.
Sala das Sessões da Câmara dos De-pulados, 11 de Junho de 1920.— João Henriques Pinheiro.
Para a Secretaria.
O Sr. António Granjo: — Sr. Presidente: a Câmara está impressionada com os termos da declaração do Sr. João Pinheiro.
S. Ex.a referiu-se aos seus serviços, prestados muito especialmente quando da revolução monárquica no norte.
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Sessão de li de Junho de 1920
De facto S. Ex.a foi um bom republicano e um bom cidadão, que empregou, todos os esforços para que os abastecimentos não faltassem às tropas que estavam combatendo no norte. A S. Ex.a tenho de apresentar os meus agradecimentos e as minhas homenagens.
Começou. S. Ex.a por se referir aos dois relatórios da comissão de inquérito, notando entre eles profundas divergências.
Devo dizer primeiramente à Câmara a forma como estão organizadas as sub--comissões.
A comissão parlamentar de inquérito ao Ministério dos Abastecimentos dividiu--se em sub-cornissões. Evidentemente, nós confiamos uns nos outros e portanto não sabíamos o que se passava nas diversas comissões.
Diversos apartes.
O Sr. João Pinheiro disse que era falsa a informação da comissão de inquérito no sentido de que o crédito aberto por S. Ex.a fosse dado verbalmente.
Afirmou S. Ex.° que também era falso o que se refere a Jaime Espanha.
Como já 'disse a V. Ex.a, cada sub--comissão estava encarregada do seu trabalho o nós evidentemente tínhamos confiança nos Deputados que as compunham.
Eu poço licença à Câmara para trazer aqui os documentos para a Câmara verificar se existem ou não lá esses documentos.
O que a comissão parlamentar não podia fazer era encobrir qualquer suspeita.
Era mais perigoso para a República isso do que pôr bem a descoberto tudo que houvesse, embora não passasse de indícios.
Assim, Sr. Presidente, a comissão é de parecer que desde que apareçam quaisquer acusações contra parlamentares e homens públicos o seu dever é investigar e ver se essas acusações são de carácter criminal para os enviar para juízo.
E esta, Sr. Presidente, a minha opinião e é esta a orientação que a comissão tem seguido até hoje, mandando fazer as necessárias investigações, a fim de saber se há ou não razão para. proceder, isto no interOsse da República.
Sr. Presidente: um outro ponto há ainda que desejava desfazer perante a Câmara e perante o país, qual é o de alguém jul-
gar que a comissão de inquérito está funcionando como tribunal.
Sr. Presidente: a comissão de inquérito ao extinto Ministério dos Abastecimentos funciona em virtude duma lei que foi votada pelo Parlamento, somente com funções de investigação criminal.
O Sr. Júlio Martins: — O que eu digo a V. Ex.ft é que se não devia ter vindo para aqui fazer insinuações falsas como aquelas que se fizeram.
O Orador:—Assim eu torno a dizer que a comissão parlamentar a que me tenho referido não é um tribunal de honra, e tem procedido e há-de continuar a proceder em virtude duma lei votada pelo Parlamento.
A comissão de inquérito, Sr. Presidente, que ó composta de parlamentares eleitos pelo Parlamento, entende e muito bem que quando efectivamente se apresenta qualquer acusação sobre qualquer homem, público tem o direito e o dever de investigar.
E por isso que essa comissão tem obrigação de trazer a esta Câmara todo e qualquer elemento de elucidação, sem o considerar sob o ponto do vista político, a fim de que a Câmara tomo a sua resolução, e até hoje não houve resolução nem coacção que desviasse a comissão do seu fim.
Creio bem que o relatório dessa comissão ainda este mCs será presente ao Parlamento e desejaria que a sua apreciação se fizesse serenamente, sem objurga-tórias, sem outro espírito que não fosse o da verdade e da justiça, e outro interesse, que não fosse o prestígio do Parlamento.
Peço desculpa à Câmara do tempo que lhe tomei com estas minhas explicações.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio Martins : — Sr. Presidente: há mais de um mês que os Deputados do Grupo Republicano Popular abandonaram o Parlamento, solidarizando-se com o seu colega e camarada nesta Câmara, o Sr. Cunha Liai.
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Diário da Câmara dos Deputados
Porque o fizemos?
Fizemo-lo para o prestígio da República se erguer e o prestígio do Parlamento se levantar.
Houve uin dia em que, perante a comissão de inquérito nomeada por esta Câmara, a propósito duma pregunta que se lhe fazia, a respeito do que ela teria feito sobre uma deliberação da Câmara, sobre o assunto do arroz, arroz que ainda não está no país e cujo dinheiro não está nos cofres do Estado, o Sr. presidente dessa comissão afirmou que nos escândalos do Ministério dos Abastecimentos, Deputados desta Câmara se encontravam envolvidos.
Era vaga a afirmação e caía sobre a cabeça de todos que aqui se encontravam, e o Grupo Popular Republicano insistiu perante a comissão para se explicar, porque no entender nosso, de ontem como de hoje, um Parlamento não terá autoridade o prestígio para estar a discutir os interesses do país e ouvir os Governos, quando sobre ele cai o peso duma acusação infamante, e essa acusação que era vaga e sem prova, lançada aqui, iria abalar lá fora, nos meios caluniosos, o Parlamento no seu prestígio, e a República na sua elevação.
Conhece V. Ex.a, Sr. Presidente, o primeiro relatório que foi trazido a esta Câmara. Esse relatório era a continuação das cousas vagas que o Sr. presidente da comissão de inquérito tinha afirmado nesta Câmara. E foi, então, que nós entendemos — o não eram só Deputados do Grupo Popular, mas de todos os partidos desta Câmara, que se encontravam visados pelas declarações do Sr. Vaz Guedes—, entendemos que a Câmara se devia constituir imediatamente em sessão permanente, para que não continuassem a cair sobre a cabeça dos Deputados várias acusações, ou para que só eles fossem, porventura, criminosos nós lhe levantássemos as imunidades parlamentares, à fim de serem entregues aos tribunais.
; E não Ô pelo facto dalguns membros dum partido prevaricarem que esse partido morre! j Não é também pelo facto dalguns homens públicos prevaricarem, que um regime morre! [Morrem sim, os partidos, quando dão solidariedade a criminosos ! ; Morrem, sim, o$ re.rrim.es qnando querem encobrir os criminosos quo os emporcalham e vexam! (Apoiados),
Mas saímos nós e as minhas declarações em nome do meu grupo foram públicas.
Queríamos, já que a Câmara não admitia o constituir-sn em tribunal ou em sessão permanente, queríamos que a comissão de inquérito desse a sua opinião concreta, fora de suspeições, fora de cousas vagas, para saberem os respectivos partidos quem tinham dentro do seu seio.
Contudo como vivemos num regime do publicidade e do democracia, nós, Grupo Parlamentar Popular, fomos perante o povo de Lisboa e perante o povo do norte do país, expor a nossa situação, e continuaremos a íazer essa propaganda.
Fomos!
E eu constatei que havia no país ínl eiró o renascimento da fé republicana.
Eu constatei que por toda a parte por onde andámos em contacto com o povo, ele escutava as nossas palavras, dando--nos o seu aptauso, porque nós lhe dizíamos, como sempre diremos, que não damos a nossa solidariedade a criminosos. (Apoiados).
Sr. Presidente: trabalhou a comissão de inquérito.
Ela, a quem estava afecta uma questão de honra dos seus próprios colegas, trabalhou extenuantemente — é de supor — e passou-se um mês e dias, até que finalmente entendeu trazer a esta Câmara o relatório completo.
Esse relatório está na Mesa.
Coiihece-o o País.
A comissão mandou Deputados e Senadores do vários partidos da República, para os tribunais.
E com a comissão !
Mas o que eu digo ao meu país é que essa comissão, a quem se tinha entregue a guarda e honra do Parlamento da República, a quem se tinha entregue a guarda e honra das próprias instituições, vem ao Parlamento com vagas suspeições, é obrigada a fazer um relatório, é obrigada a fazer segundo relatório, e só muito depois, que os acontecimentos se passam, apenas manda para os tribunais—escute-o o Pais! — Deputados e Senadores sem províis concretas da sua culpabilidade, sem indícios seguros da sua culpabilidade !. ..
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comissão esteve estudando durante mais de uin mós, vão para os tribunaÍH, o pela parte que diz respeito ao parlamentares populares, que aliás tiveram a susceptibilidade de se despedirem, por cartas que me dirigiram, do grupo a que pertencem, emquanto os tribunais não se decidirem, sobre a sua situação, — eu estou absolutamente convencido de que os tribunais, com toda a sua imparcialidade, hão-de fazer-lhes justiça.
Não só esses parlamentares hoje meus correligionários estão debaixo da acção da justiça; fale ela e depois falaremos nós; mas o que eu não posso deixar passar, e pena tenho que o relatório completo da comissão não esteja já à apreciação da Câmara, porque aquilo que ouvimos hoje ao Sr. António Gr anjo e ao Sr. João Pinheiro excede tudo quanto se possa imaginar; — o que eu não posso deixar passar são as declarações de S. Ex.as, que nos fizeram pasmar de como as questões de honra são tratadas pela comissão de inquérito.
Ouviu V. Ex.a, Sr. Presidente, o Sr. João Pinheiro acusar de falso o primeiro relatório da comissão.
E espantoso e assim vamos chegar certamente a um ponto que ou nos há-de glorificar ou mandar-nos para o fundo.
Estão os Deputados e Senadores debaixo da acção da justiça por indícios possíveis.
Mas possível é tudo!
[Possível é. Sr. Presidente, um tremor de terra neste momento!
E possível é até que' tenhamos de nomear uma comissão de inquérito para apurar dos actos da actual comissão.
j Ah, Sr. Presidente, se eu quisesse seguir o processo da comissão de inquérito, ou quisesse as possibilidades dessa mesma comissão, o que iria por aí fora!. ,.
Mandei hoje um requerimento para a Mesa, e ele há-de ser atendido para continuarmos esta discussão.
Há-de vir tudo à supuração do País, para quo um cautério forte queimo toda a gangrena que, porventura, possa haver dentro das instituições, o para quo os seus homens se possam erguer cheios de prestígio, mas tamb'C:m som estarem sujeitos a que qualquer meliante os emporcalho o ouxovalhe a qualquer esquina. (Apoiados),
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Sr. Presidente: concordo com o Sr. António Granjo.
A comissão de inquérito não tem funções de tribunal de honra, mas ela não pode ser também um tribunal de calúnias e de suspeições.
A admitir o princípio do Sr. António Granjo, se qualquer meliante se lembrar de levantar uma calúnia contra qualquer homem público, a comissão tem de apurar, o sou fundamento cm a sua falsidade.
É corto, mas esse apuramento tem de fazer-se dentro da comissão, não se trazendo a calúnia para público emquanto não se apurar toda a verdade.
Mas essa comissão todos os dias manda notas oficiosas para a imprensa, sem querer saber do próprio Parlamento, de quem é delegada, notas oficiosas em que se bordam várias considerações, afirmando-se num dia uma cousa, para se desmentir no outro.
Isto não é função da comissão, ó do tribunal.
Representa o desprestígio da honorabilidade dentro da o ai se havia colocado.
As contas com comissão parlamentar de inquérito hão de fazer-se (Apoiados)^
Ela continuará amarrada às suas res-ponsabilidades até o'fim da sua obra. Pe-ço-lhe que continue trabalhando.
Quanto à questão do arroz, para a qual a comissão recebeu um mandato imperativo da Câmara, nem sequer apresentou ainda um relatório.
Pois traga-o, e o mais rapidamente, para que se resolvam os seus trabalhos, e vermos se têm razão aqueles que dizem que a comissão tem procedido bem ou os que, como eu, não tom confiança absolutamente nenhuma nessa comissão. (Apoiados).
O orador não reviu.
O Sr. Pais Rovisco:—Sr. Presidente: já demonstrei aqui que a comissão parlamentar de inquérito se mantinha duma fornia atrabiliária e fora da lei; o há poucos dias ao Sr. António Granjo eu disso que, quando quisesse, estava pronto a demonstrar-lho o quo aqtii já havia afirmado.
Procede de forma atrabiliária, e sempre fora da lei.
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O Século de ontem dá uma notícia pela qual se vê que para os tribunais não foram um certo número de moageiros pelo facto do Estado ter depositado nos seus depósitos certa quantidade de farinha que a moagem não quis receber ao preço marcado, e a comissão mandou pôr em liberdade outros moageiros nas mesmas condições, alegando que os primeiros tinham dado .ao Estado a quantia por que ele tinha marcado o preço da farinha, e os outros não.
Bastava isto para ver o que a comissão foz, porque os moageiros cometeram um crime de abuso, que a lei condena, e entregaram o que deviam ao Estado; deixam de ser criminosos ! °
Não; são criminosos como os outros. Só o tribunal, a Boa-Hora, podo pôr em liberdade certos indivíduos, a comissão não. (Apoiados).
Vozes : — Muito bem.
O Orador: —Esses casos desejarei eu tratar quando a comissão trouxer o relatório definitivo. •
Depois do meu partido ter abandonado
esta Câmara, tive conhecimento, r/cla ini-* "j.
prensa, dum Deputado pertencente à comissão parlamentar de .inquérito ter dito, na nossa ausência portanto, que um Deputado que já não pertence à comissão, durante o tempo eni que lá esteve, não fez mais que perseguir o director geral.
Ora o Sr. Dr. João Pinheiro afirma serem falsos o primeiro e o segundo relatórios.
Durante o tempo em que lá estive organizou-se um processo, o único que foi pára a Boa-Hora.
Os juizes não puderam considerá-lo nulo por estar/eito legalmente e nele se encontrar provas oficiais.
Tudo quanto se relaciona com esse processo está devidamente assinado, não só pelo presidente da comissão, mas ainda pelo Deputado que me procurou visar.
Vêm-se por esta forma as falsidades desse Deputado e de quanto ó capaz quem pouco pode. Se eu fiz perseguições foi com o seu apoio e com a sua assinatura, e delas não estou arrependido, devo dizê--lo, porque a justiça as sancionou.
E preciso descer-se muito quando, para ferir outrem, se não hesita em difamar, em
abocanhar a honra e a dignidade alheias. (Apoiados).
Não será talvez esta a ocasião nem o
'lugar mais propícios para liquidar este
incidente, e se o faço é apenas para que
uma acusação caluniosa não fique pôr
mais tempo de pó.
Refiro-me ao Deputado da minoria socialista o Sr. António Francisco Pereira.
O orador não reviu.
O Sr. Cunha Liai:—As palavras que o Sr. João Pinheiro acaba de pronunciar, palavras "dum homem honrado, comove-' ram-iho profundamente e fizeram-mo atingir talvez a razão do procedimento da comissão parlamentar de inquérito ao Ministério dos Abastecimentos.
Embora não seja esto o momento de julgar completamente os trabalhos dessa comissão, não posso, todavia, deixar de fazer sentir algumas anomalias do seu procedimento c salientar alguns favoritis-mos que muito podem e hão de contribuir para o final e severo julgamento da sua atitude.
Por isso eu vou apontar à Câmara algumas dessas anomalias, alguns desses actos de favoritismo, o que vou fazer à face das notas oficiosas que têm vindo publicadas na imprensa.
Por elas os ilustres membros desta casa do Parlamento verão o suficiente para levantar todas as suspeitas e chegar ao convencimento de que em muitos dos actos dessa comissão houve apenas o propósito de prejudicar determinadas instituições e do lazer uma verdadeira caça ao homem. (Apoiados).
O caso inicial, base e origem de toda esta ignóbil manobra, foi o da expulsão, que outro nome não tem, do Sr. Pais Ro-visco da referida comissão.
S. Ex.a foi colocado em condições tais que, honradamente, tinha de sair, abandonando os trabalhos da comissão.
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Uma vez o Sr. Pais Rovisco fora da comissão, começou então a fazer-se a caça ao homem com todo o seu sinistro cortejo de perseguições, e a comissão, que-durante três ou quatro meses não dou acordo de si, aparece uni dia nesta Câmara e começa a fazer acusações vagas, indicando aos amigos que encontrava pelos corredores nomes de supostos incriminados.
Mas deixemos este caso e vamos ao assunto.
Afirmei há pouco que a comissão se tem farto de cometer ilegalidades. Vamos à primeira, que representa —não há forma de o contestar— ou um roubo à moagem ou um desfalque para o Estado. Ou a moagem dava os juros que .não tinha satisfeito ou a moagem não devia 5 réis e o Estado não tinha o direito de fazer quaisquer exigências.
£ Então o que fez a comissão de inquérito ?
Chegou a um acordo com a moagem sobre a forma de serem pagos esses juros.
Mas daqui não há que fugir: ou a comissão roubou a moagem ou roubou o Estado. (Apoiados).
Mas há mais.
Como director dum jornal chegou-me às mãos uma das numerosas notas da comissão, assinada pelo Sr. Tavares Ferreira.
Eu pregunto que diferença existe entre depósito e armazenagem?
Eu desejo saber porque para umas fábricas se diz ali que a farinha ficou depositada e para outras que a farinha ficou armazenada.
Mas reparem que esta diferença não é mais do que um favoritismo, porque cada tratamento é caracterizado por seu procedimento especial.
Se amanhã um gatuno me roubar a carteira o for proso, sendo-me restituído o roubo, o facto de eu relia ver o que mo pertencia não destrói a acção criminosa do gatuno nem o inibe de prestar contas nos tribunais.
Repare a Oâniciva nus altas capacidades jurídicas que se anicham na comissão de inquérito e que qupreui fazer ver ao país, publicando notas oficiosas, que representam a mentalidade desta casa do Parlamento.
Preciso fazer aqui a declaração do quo, por casualidade, fui companheiro de es-
cola do Sr. capitão Abreu Reis. Não me move contra este indivíduo nenhuma espécie de má vontade, mas nós aqui não nos encontramos diante de homens, mas de factos.
Trata-se dum homem que sendo gerente duma fábrica e sendo-lhe confiado um depósito abusou deste, restituindo uma parte do mesmo depósito depois de coagido a isso.
Há, ainda1, outras farinhas depositadas na Nova Companhia Nacional de Moagem, que da mesma forma abusou da confiança do estado, creditando Gsto apenas duma corta quantidade e por conta dum futuro rateio. Dizem-mo as informações particulares que tenho sobre o assunto quo esta farinha foi vendida a menos do $30.
O abuso do confiança subsiste da mesma forma.
O Sr. Tavares Ferreira:—V. Ex.a está muito mal informado. Daqui a pouco usarei da palavra o V. Ex.a há-de couven-cer-so do seu 6rro de informação.
O Orador: — Por mais que V. Ex.a diga não consegue destruir os factos que ocorreram. A verdade é que houve um abuso de confiança.
Mas há no procedimento da comissão de inquérito uma cousa que muito me surpreende. £ Qual a razão da pressa que S. Ex.as têm de, logo ao anunciar-se que os Deputados populares vão entrar na Câmara, publicarem uma nota oficiosa dizendo que há grossos escândalos?
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toza de que a cada peça de processo qtte levantem nós levantaremos também a nossa peça de processo ! Perguntaremos se esses escândalos são relativos à comissão de ravitaillement. (Apoiados}. Pré-gúataremos que diferença de tratamento há para os membros desta Câmara e para os da comissão de ravitaillement. (Apoiados). .
Houve, Sr. Presidente, um chefe dessa comissão que afirmou, nas suas declarações à comissão,de inquérito, que sabia que grandes escândalos se tinham cometido nela. A comissão mandou lá um seu membro, mas ele trouxe os papéis muito escondidos, e a comissão, que não quere constituir-se em tribunal de honra,- diz-.-nos apenas: não há nada, somente algumas cartas de empenho de diversos políticos recomendando vários negócios!
O empenho, que para o Sr. Vaz Guedes constitui um crime para levar aos tribunais, mais tarde não tem importância, não vale nada.
Que critério é este?
Mas há mais.
Têm sido Presidentes do Ministério homens que nem túin banca aberta de advocacia. Pois eles t.Am p.hama.do a si, nesses cargos, todos os seus amigos c parentes, toda a sua clientela, para-os favorecerem.
Pregunto eu: £ Não será isto mais grave, no entender da comissão, que aquilo de que se acusou nesta Câmara o Sr. António Fonseca? (Apoiados}.
Há companhias e empresas com relações com o Estado que têm como seus membros Deputados e Senadores. Embora a Constituição o permita, não será isto mais grave que o que fez levar o Sr. N tino Simões aos tribunais? (Apoiados).
O Sr. Presidente:—Peço a V. Ex.a que, em conformidade com o Regimento e com uma deliberação tomada pela Câmara na ausência de V. Ex.a, tendo pedido a palavra para explicações, torne as suas considerações o mais rápidas e curtas que puder.
O Orador:—Sr._ Presidente: aceitando as indicações de V. Ex.a, como me cumpre, poucas palavras proferirei.
Não vimos aqui para derrubar a coinis-são de inquérito. Deixemo-la trabalhar,
porque ela há-de vir aqui, ao Parlamento, definir esto caso concreto, pois precisamos saber se, praticando determinados actos, estamos ou não no uso dum direito que nos assiste.
Parece-me que dei algumas peças importantes para o processo da referida comissão.
Veremos então se a comissão teve igual procedimento para com todos os partidos e para com todos os homens. Veremos então se cm determinadas secretarias, segundo é voz corrente, existem vários processos esquecidos há muito tempo.
Agradeço à Câmara a atenção com que me escutou e permitam-me V.Ex.;iS que. eu agradeça ao meu ilustre chefe, Sr. Júlio Martins, amigo meu como irmão, e a todos/DS Srs. Deputados do Partido Popular, o seu gesto de, numa hora para mim bastante dolorosa, acompanharem o meu procedimento. Fiquem eles certos de que não saíram atrás dum homem desonesto e que este homem há-dc sempre saber defender a sua honra, e quo, sem um gesto de desânimo, antes terá um gesto de desafio. (Apoiados}.
Por último convido V. Ex.a, Sr. Pré-
. * A ^ T-tTWl, «*•»»
SI\.4.CL1 « ' ST O gências junto do Sr. João Pinheiro para que S. Ex.a volte a esta Câmara, onde a sua presença só poderá honrar-nos. (Apoiados}. O orador foi muito cumprimentado. O orador não reviu. O Sr. Tavares Ferreira: — Sr. Presidente: tanto o Sr. Pais Rovisco como o Sr. Cunha Liai fizeram referências à última nota oficiosa da Comissão de Inquérito com respeito aos moageiros que foram mandados para juízo por motivo dum abuso de confiança praticado com umas farinhas de quo eram depositários. Estou persuadido de que, depois das explicações que vou dar, o Sr. Cunha Liai, como toda a Câmara, hão-de convencer-se de que não houve favoritismos para ninguém, mas simplesmente o cumprimento da lei. •
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abusiva e criminosa como a farinha tinha sido consumida.
A Comissão de Inquérito, nessa altura, oficiou às diferentes empresas de moagem, preg untando -lhes como tinham consumido a farinha e quanto tinham dado ao Estado.
A fábrica Esperança não respondeu e a fábrica de moagem Aliança disse que a tinha creditado ao Estado a $28,52, entrando essa importância no saldo de 31 de Dezembro último, apurado pela Comissão de Inquérito, e por isso dava o assuato per liquidado.
A fábrica A Napolitana era tambôm acusada de praticar o mesmo abuso. Depois de detido o gerente, o Sr. Mário Reis, conseguiu provar, com documentos, que, em fins de Dezembro, a Direcção Geral do Comércio Agrícola lhe oficiara, em vista de ter consumido aquela farinha, e lha debitara pelo preço da de l.a, ou seja a ,$43.02.
Em vista disso, a fábrica apressou-se a entrar com ôsse dinheiro nos cofres do Estado.
Sr. Presidente : o artigo 453.° do Código Peual, em que estavam, incursos esses moageiros, exige : o depósito, o desvio dos objectos depositados (e estas duas condições deram-se), o prejuízo do proprietário, que, neste caso, é o Estado, e a recusa, por parte do depositário, em entregar o objecto ou o valor equivalente, quando a isso convidado. Ora, ^desde que este moageiro entregou voluntariamente o valor que a Direcção Geral do Comércio Agrícola lhe indicou, deixou do-prejudicar o Estado, entendendo a Comissão que, tendo essa Direcção, como legítima representante do Estado, liqui-dcido desta forma o assunto, não -havia motivo para procedimento criminal.
Sr. Presidente: eu era o investigador dôsse abuso de confiança, e, não sendo jurista, ^tive dúvidas, a meu ver bem justificadas. Consultei os membros da comissão, que são advogados, para mo elucidarem sobre este assunto. Foram estes de opinião de que, não tendo havido prejuízo para o Estado, o abuso desaparecia por já não existirem algumas das suas características.
Na fábrica da Nova Companhia Nacional de Moagem havia tambôui armazenada grande quantidade do farinha, orn
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que não tocou senão quando mais tarde lhe autorizaram o consumo por meio dum rateio que então lhe coube e pelo preço que lhe indicaram.
Grande parte dessa farinha foi vendida pelo Estado ao particular a 38 á/2> c°mo sucedeu com outras que estavam em outros depósitos.
Mais tarde, em 20 de Janeiro, a moagem comunicou ao Ministro da Agricultura que havia grande falta de farinha, sendo-lhe então rateados 2.163:000 quilogramas da farinha que estava em Santos, e ao preço do 23 e tal. Com autorização da Direcção Geral do Comércio Agrícola, em vez de gastar toda esta farinha do entreposto de Santos, consumiu, por conta desse rateio, a do vapor Dondo, que estava armazenada na sua fábrica do Beato. Não cometeu, portanto, abuso, visto que fez tudo isso com autorização da Direcção Geral da Agricultura.
A Comissão está investigando as res-pODsabilidados que, porventura, caibam-à Direcção Geral do Comércio Agrícola com a cedência dessa farinha, visto ter havido grande prejuízo para o Estado.
O Sr. Cunha Liai (interrompendo): — Existindo abuso, tem de ser pago.
Tem de se seguir o critério que se segue nos tribunais.
O Orador:—Eu não sou jurista, mas seguiu-se a opinião-dos que são advogados.
Quero também aludir à questão dos juros que a moagem foi obrigada a pagar, e a que aqui foram feitas referências.
Sr. Presidente: a Comissão de Inquérito, para o pagamento desses juros, seguiu o seguinte critério:
Depois de ter apurado que havia um grande débito da moagem ao Estado, resolveu exigir os juros pela demora dessas importâncias. Seguiu para esse efeito esta orientação:
Aquelas quantias que se provou estarem depositadas nos Bancos, e não foram pagas ao Estado por o Estado não ter j passado as guias de entrada na tesonra-i ria, pagariam o juro que venciam nossos | Bancos.
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gócios, onde lhe rendiam elevados juros, pagariam o juro de lei.
Com relação, Sr. Presidente, aos processos que se têm mandado para os tribunais, devo informar também o Sr. Cunha Liai que até esta data nem um só dos indivíduos neles abrangidos foi despronunciado.
O Sr. Cunha Liai: —O Sr. Jorge Nunes foi despronunciado.
O Orador:- -Não foi despronunciado, agravou da injusta pronúncia, o que é diverso, segundo me informaram.
Mas pode ter sido uru ou outro indivíduo despronunciado, contudo não o foram todos. . Tenho dito.
O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara. Já deu a hora de se passar à ordem do dia, mas, como tenho na Mesa dois pedidos para negócios urgentes, vou consultar a Câmara acerca deles. . O Sr. Álvaro Guedes deseja tratar, om negócio urgente, dos graves escândalos na administração pública, a que se refere a imprensa de hoje. Os Srs. Deputados que autorizam, queiram levantar-se.
Foi rejeitado.
O Sr. Júlio Martins: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procedeu-se à contraprova.
O Sr. Presidente: — Estão de pé 42 Srs. Deputados e sentados 21, Está rejeitado.
O segundo negócio urgente que tenho aqui na Mo s a é o seguinte:
O Sr. Nóbrega Quintal deseja tratar, em negócio urgente, da elevação da pon-são, para 3.600$, da viúva do antigo Deputado, capitão tenente Carvalho Araújo.
O Sr. Brito Camacho (sobre o i».odo de votar): — Sr. Presidente: parece-mo que se trata da apresentação dum projecto de lei, para a discussão do qual haverá de se pedir a urgência e dispensando Regimento.
O Sr. Presidente: —Tem V. Ex.3 rã-
0 Sr. Júlio Martins : — Mas o Sr. Deputado, tratando do assunto, pode terminar as suas considerações mandando para a j Mesa o seu projecto e pedindo para ele, ! então, a urgência e dispensa do Regi-j mento.
j
: O Sr. Presidente:—Eu não expus, há
| pouco, bera o assunto. O Sr. Nóbrega
í Quintal pediu a urgência e dispensa do
' Regimento para entrar em discussão um
projecto do lei aumontando a pensão à
viúva do capitão-teneuto Carvalho Araújo.
O Sr. João Camoesas (sobre o -modo de votar}-. — Para dizer a V. Ex.a, Sr. Presidente, que voto a urgência o dispensa do Regimento, tanto mais que eu tinha já tratado do mesmo assunto junto do Governo, e o Sr. Ministro das Finanças
i prontificou-se a apresentar uma proposta de lei nesse sentido à consideração da
i Câmara'.
! O Sr.' Eduardo de Sousa (sobre o modo * de votar): — Sr. Presidente: não tenho | dúvida em votar a urgência e a dispensa j do Regimento para o projecto de lei do i Sr. Nóbrega Qnintal, visto que eu trazia na minha pasta urn projecto idêntico.
O Sr. Abílio Marcai (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: para dizer que dou o meu voto ao projecto do Sr. Nó-j brega Quintal. Simplesmente eu entendo que ele não pode, sequer, sor admitido na Mesa sem ser ouvido o Sr. Ministro das Finanças, por causa da lei-travão.
O Sr. Jaime de Sousa (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente : em poucas palavras direi que voto com toda a satisfação o projecto do Sr. Nóbrega Quintal, e estou convencido de qne a Câmara se honrará muitíssimo votando a verba nele proposta, pois que a verba votada pelo Parlamento dezembrista à viúva do meu colega Carvalho Araújo ó extremamente irrisória.
l Voto o projecto, Sr. Presidente, con-j vencido de que toda a corporação da armada se solidariza com ele neste assunto. O orador não reviu.
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projecto de lei enviado para a Mesa pelo Sr. Nóbrega Quintal, vou consultar a Câmara sobre se concede a urgência e dispensa do Eegimento para esse projecto.
S. Ex,.a não reviu.
Concedida a urgência e a dispensa do Regimento.
O Sr. Presidente: —Vai ler-se o projecto. T.eú-se. E o seguinte:
Projecto de lei
Artigo 1.° É elevada para 3.600$ anuais a pensão concedida à viúva do capitão--tenente Carvalho Araújo, glorioso comandante do Augusto de Castilho.
§ 1.° Esta pensão será vitalícia, isenta de quaisquer imposições legais e paga a partir de l do corrente.
§ 2.° Pelo falecimento da, viúva e havendo filhos menores reverterá para estes a mesma pensão durante a sua menoridade ou emquanto frequentarem qualquer curso com aproveitamento.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala dos Sessões, em 11 de Junho de 1920.—O Deputado, Nóbrega Quintal.
O Sr. Dias da Silva: — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer a V. Ex.a e à Câmara que voto em absoluto o projecto em discussão;-desejava, contudo, que o benefício resultante desse projecto se estendesse às famílias das restantes vítimas desse desastre.
Entendo. P estou convencido de que toda a Câmara entende da mesma maneira, que iguais direitos têm as famílias das praças da armada que morreram, ao lado de Carvalho Araújo.
Nesse sentido, mando para a Mesa uma proposta concebida nos seguintes termos:
Proposta
Artigo 2.° As outras vítimas do mesmo naugrágio serão aumentadas proporcionalmente as pensões que hoje auferem.— O Deputado, Augusto Dias da Silva.
O Sr. Presidente: — Em conformidade com H proposta do Sr. Cunha Liai, tenho a dizer à Câmara que a Mesa procurará o Sr. João Pinheiro, a fim dç o dissuadir
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do seu propósito de abandonar os trabalhos da Câmara.
O Sr. Viriato da Fonseca:—Sr. Presidente : pedi a palavra para declarar que dou o meu incondicional apoio ao projecto de lei em discussão.
E uma homenagem que, creio, está no • ânimo de todos, que todos devemos prestar à memória desse grande vulto, desse homem que tanto honrou o nome português, batendo-se por uma forma tam bizarra e heróica.
Os próprios inimigos vieram mostrar perante o mundo inteiro a sua acção.
Eu, admirador das qualidades de Carvalho Araújo, quando era vivo, mais e mais sinto essa admiração crescer e aumentar ao lembrar-me do grande feito que praticou, que foi um feito heróico e altruísta, morrendo no seu posto.
E muito raro encontrar-se entre os heróis quem pratique um acto de tanto valor e tamanha grandeza.
Portuga], honrado por essa figura eminente, tem obrigação restrita neste momento de prestar-lhe mais uma vez homenagem, aprovando-se por unanimidade este projecto de lei.
A família de Carvalho Araújo ó numerosa e eu sei quanto custa hoje a sustentar uma família numerosa.
Prestemos essa homenagem, levantando-nos todos, aprovando o projecto cm discussão, porque ôle representa a manifestação mais grandiosa que a Câmara pode prestar à 'memória de Carvalho Araújo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita: — Sr. Presidente: resolvi também pedir a palavra sobre o projecto em discussão, porque entendo que a Câmara, prestando uma homenagem desta natureza, aproveita muito do seu tempo o não o desperdiça.
A dívida de gratidão que o país dalgum modo pretende pagar àqueles que eram caros ao comandante Carvalho Araújo, ó tam grande, que tudo quanto o país fizesse, não conseguiria salientar o quo representa esse grande gesto.
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que Carvalho Araújo praticou, mas uma dívida muito maior, que foi a do sacrifício da vida desse ilustre comandante para salvar a vida de muitos madeirenses. f^ Não tive a honra de apresentar esse projecto à consideração da Câmara por um escrúpulo talvez mal entendido.
Eu não sabia as circunstâncias eni que se encontrava a família de Carvalho Araújo e hoje li nos jornais que a pensão votada pelo Estado a esses infelizes, que perderam ao mesmo tempo o pai e recursos, e?'a tam insignificante, que o Governo ou alguém tinha pensado em aumentar essa pensão.
Entendi, Sr. Presidente, que não devia aproveitar uma intenção alheia, mas.resolvi imediatamente associar me com o maior entusiasmo a esse projecto, dar-lhe o meu voto e ao mesmo tempo as minhas palavras de gratidão e de homenagem à sua memória.
Sr. Presidente: recordo ainda,x com grande comoção, esses momentos terríveis que nós, ilhéus, passámos sempre sob a ameaça do submarino boche, dum'bombar-deamento cobarde feito sobre terras que não podiam defender-se, essas horas trágicas quo uma população civji iovo oo atravessar, essas horas de, amargura passadas a bordo dum paquete, sem condições nenhumas de defesa, e tendo apenas como únic:> recurso para a sua salvação, não os meios que lhe tinham facultado, que eram poucos —um pequeno caça-ini-nas com pequenos canhões— mas apenas a coragem, o valor do indivíduo que comandava essa pequena embarcação e daqueles que ele con\andava também.
Embarcou Carvalho Araújo em condições muito excepcionais, pois não tinha obrigação de o fazer e enibarcqu justamente porque Carvalho Araújo lutava nesse momento como bom republicano que era para que em Portugal voltasse a existir o regime republicano. A fé desse homem nos destinos futuros, a certeza que Csse homem tinha de que a República viria novamente a ser em Portugal um regime como era de esperar do regime republicano, mostrou-a bem, quando de passagem na.Madeira, sem poder ir a terra, sem poder comunicar com a, terra, pôde no emtanto chamar alguém que sabia bom republicano para- contar-lhe o que se passava dentro do seu espírito, a esperança
que tinha de que em breve a República estaria reimplantada neste país.
Sr. Presidente: trata-se, portanto, dum republicano a valer, trata-se dum português às direitas, trata-se dum homem que soube morrer no seu posto gritando aos marinheiros quando já as munições escasseavam: «avancem ainda, não sejam cobardes», como se cobardia fosse não continuar por as munições escassearem.
E que na sua alma de português havia o desejo de se bater sempre mesmo quando os meios de defesa lhe faltassem.
Ao juntar ao voto da Câmara as minhas palavras e as minhas homenagens, eu que até aqui falei como madeirense tenho agora de salientar a V. Ex.a e à Câmara que o partido a que tenho a nonra de pertencer se associa também à homenagem que se presta a essa grande figura de herói.
Tenho dito.
O orador não revi,u.
O Sr. João Camoesas: — Sr. Presidente: em meu nome, e creio não exorbitar dizendo que em nome dos parlamentares do Partido Eepublicano Português; voto U.G mGjLuor gFciúo G projecto úõ i6i apresentado pelo Sr. Nóbrega Quintal. Há dois ou^ três dias tinha vindo para a Câmara com o mesmo intuito, unicamente não o fiz porque me parece que ele teria maior significação perante o país se este acto de justiça que estamos praticando tivesse sido da iniciativa do Governo.
Não significa isto nenhuma espécie de censura ao Sr. Nóbrega Quintal, tanto mais que S. Ex.a ignorava estas démar-ches.
S. Ex.a tem um critério diferente do meu. e nem por isso o sou acto deixa de ser louvável, e todos nós estamos dispostos a sancioná-lo com o nosso' voto. Unicamente dovo esta explicação, sobretudo a -uma pessoa de família do comandante Carvalho Araújo, e que obteve da minha boca o compromisso espontâneo de tratar desta questão aqui.
Não tenho neste momento a pretensão de fazer política, mas parece-me que ele teria mais significação se fosse o Governo da República que tivesse tomado a sua iniciativa.
Obtive da boca dos Srs. Ministros das Finanças, do Comércio e do Trabalho
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a promessa de que este assunto seria tratado mini dos próximos Conselhos de Ministros, após o qual traria a proposta^à Câmara.
Sr. Presidente: porque se trata dum acto de justiça, porque se trata de saldar uma dívida que interessa à nacionalidade inteira, ninguém a si pode arrogar o direito de ter sido o orientador dum acto de justiça, do cumprimento dum dever, que está no coração de nós todos.
Sr. Presidente: eu tive a honra de ter sido amigo de Carvalho Araújo e recordo--me de quando, na véspera do seu embarque, o encontrei no Rossio.
Eu que já sabia que ele na véspera tinha regressado do França onde tinha ido escoltar uni comboio de soldados, eu que já sabia que o governo de miseráveis que então nos governava não respeitava toda a sorte de direitos e deveres, e que lhe intimara o cumprimento dum dever que lhe não competia-, disse a Carvalho Araújo: « j O Governo da Eepública, considera-te perigoso!» «É verdade, dizia-me ele, mas eu gosto mais de andar no mar, sobretudo quando em terra existem miseráveis como aqueles que nos governam. E, embora saiba que vou para o mar, como para um suicídio, eu sinto-me melhor no meio das ondas, cumprindo o meu dever, sobretudo quando ele é de honra para Portugal».
E quando passados dias'se deu o incidente do augusto Castilho, que é a mais bela página da história da marinha portuguesa, e alguns afirmavam que elo não tinha falecido, eu. pelo conhecimento que tinha da sua coragem e da sua valentia, não acreditei, porque sabia que onde ficasse o casco dôsse navio, havia igualmente de ficar a figura heróica, simpática, moça e galharda do comandante Carvalho Araújo. Foi sem dúvida aquele incidente a página mais bela da nossa história, durante a grande guerra.
Foi o próprio imediato do submarino que o atacou, que o confessa no relatório, vindo de Berlim, dizendo que ele se havia batido com um brio e valentia sem igual.
Sr. Prcsidenre: são os próprios inimigos os primeiros a diz6 Io, e a afirmar que elo íbi encontrado morto no seu posto de comando. E nós outros, que não somos republicanos por estreito facciosis-
mo, mas sim porque o nosso republicanismo é a tradução de tudo quanto há de viril nesta raça, quo queremos a República porque estamos convencidos de que j ela é o regime mais adequado a íazer o ressurgimento da mesma raça, e capaz de orientar as suas aspirações, devemos seguir o exemplo de Carvalho Araújo.
O comandante Carvalho Araújo bem merece o tributo de admiração que o Congresso da República Ibe está prestando; bem o mereço porque não foi só um herói, foi um profeta.
A sua atitude de sacrifício, cumprindo o seu dever ato a última, incita-nos a que cumpramos também o nosso dever até a última; cumpramo-lo apesar de tudo, porque se o conseguirmos Portugal será livre e a Pátria será honrada.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Vozes: — Muito bom, muito bem. O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Nóbrega Quintal: — Sr. Presidente : entendo também, como o meu ilustre colega Sr. Pedro Pita, que esta sessão, embora toda ela seja absorvida pela discussão do projecto qv:^ tive a honra de enviar para a Mesa, não % nunca pode ser uma sessão perdida, visto ser uma sessão em que se presta homenagem a Carvalho Araújo, que é, não só um herói nacional, mas um herói da humanidade, que é não só um herói deste século, mas de todos os séculos.
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buída à viúva de Carvalho Araújo. Concordo com o aditamento do S. Ex.a, como não podia";,deixar de concordar; lembrava-me apenas que S. Ex.a podia incluir na sua propôsfa também os guarda-rna-rinhas e aspirantes falecidos. Não podia deixar de concordar com essa homenagem a prestar a esses heróis obscuros que ajudaram a escrever a página mais bela da marinha nos últimos tempos. Outro motivo que me levou a pedir a palavra foram as considerações que realmente me chocaram, porque não as considero propositadas, do Sr. Deputado e, aliás, meu querido amigo, Sr. João Camoesas.
O Sr. Ministro das Finanças tinha já declarado que dava o seu voto ao meu projecto, mas o Sr. João Camoesas, talvez supondo que não bastava a declaração do Sr. Ministro das Finanças, ou que o Governo não se teria pronunciado claramente, revelou à Câmara que já há dias procurara dois membros do Governo para lhes fazer sentir a necessidade de apresentarem ao Parlamento uma proposta de lei, a fim de ser aumentada a pensão à viúva de Carvalho Araújo, c que o Governo se prontificara a fazê-lo.
S. Ex.a, que não é ainda Ministro, que não faz parte deste Governo, segundo me parece, quis completar assim as palavras do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. João Gamoesas:—Tinha-me comprometido com uma pessoa de família de Carvalho Araújo a tratar desse assunto; tinha de dizer algumas palavras para que essa pessoa não julgasse que dele me tinha desinteressado.
O Orador: — Completando as palavras do Sr. Ministro das Finanças, S. Ex.a comunicou à Câmara que o Governo tinha tenção de apresentar uma proposta de lei nesse sentido, o quo, aliás, só ó muito para louvar; simplesmente, o Sr. João Camoesas entendia quo essa proposta do lei daria a esta homenagem, uma significação que ela não podia ter, sendo por via do meu projecto.
Ora estas palavras extranhas do Sr. João Camoesas, que não sei a que intenção deva atribuir, chocaram-me profundamente, porquanto, não só tenho jurídica e moralmente o direito de apresentar todas os projectos de lei que entender,
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mas ainda porque, desde que enviei para a Mesa esse projecto de lei, deixou de ser meu para ser do Congresso da República, para ser de todos os republicanos, para ser de todo o país.
Disse S. Ex.a que há dois ou três dias tinha a bailar-lhe no cérebro esta homenagem a prestar a Carvalho Araújo.
Acredito, porque sei a admiração que S. Ex.a tinha por Carvalho Araújo, sei bem que a sua memória lhe é sagrada; simplesmente, eu não posso ser culpado de S. Ex.a se ter demorado e eu ter-me antecipado.
Acho que S. Ex.;l trazendo paia aqui esta discussão, veio dalguma forma diminuir uma homenagem em quo não devia haver uma nota discordante, veio dimi nuir unia homenagem que devia conservar-se toda ela num grande pé de elevação.
Disse S. Ex.a que a proposta de lei trazida pelo Governo teria uma significação maior, que não tinha o meu projecto de lei.
Q Sr. João Camoesas: — O que eu disse foi que entendia que teria mais alta significação nma proposta de lei apresentada pelo Governo, do que um projecto de lei apresentado por mim.
Vozes:—Não apoiado.
O Orador:—Desejaria, pois, que esta homenagem prestada a Carvalho Araújo, fosse feita com elevação, do princípio ao fim; vou terminar as minhas considerações, repetindo a V.' Ex.a e à Câmara, que esse projecto não é meu, é de todos nós, é da alma republicana, é da Nação.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Pina Lopes):— Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que dou o meu voto ao projecto que está em discussão, porque o acho muito justo.
O capitão-tenente Carvalho Araújo, uma alta individualidade que ao seu País prestou os niais relevantes serviços, morreu numa ocasião iruito difícil, morreu no seu posto, procurando dignificar o seu País.
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tanto declarar que não me julgo obrigado a proceder de igual fornia para com todas as pessoas que não estejam nas condições de Carvalho Araújo.
. Acho desnecessário salientar os serviços prestados por esse grande marinheiro, por esse grande patriota, por esse grande portugnês, porque eles estão na memória de todos.
Nestas cordições, em nome do Governo dou-lho o meu voto muito gostosamente, declarando, repito, que fazendo-o, não me julgo obrigado a proceder do igual modo para aqueles que não procederam de igual fornia. «
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Plínio Silva: — Sr. Presidente : brilhantemente o meu ilustre colega e querido amigo Sr. João Camoesas, falando em nome do Grupo Parlamentar a que me honro do pertencer, manifestou de uma forma clara qual o meu pensamento sobro as homenagens que se devem, prestar a Carvalho Araújo. E, Sr. Presidente, devo, patenteando duma maneira categórica a sinceridade da minha homenagem, lembrar neste momento o que disse quando nesta Câmara entrou em discussão o Tratado da Paz. Eu tive então o cuidado de começar por prestar as minhas homenagens, não só aos militares que em terra se bateram, como à marinha, destacando em Carvalho Araújo todos aqueles que com ele se tinham sacrificado.
Mas, Sr. Presidente, se o meu coração o o meu sentimento nesta ocasião vibram por Carvalho Araújo, visto a imprensa portuguesa de novo lhe fazer justa referência, em presença de um relatório do inimigo que salienta a heroicidade do acto por ele praticado, mi não devo entretanto esquecer outros bravos que praticaram feitos de não menos valor ao de Carvalho AraiVjo.
E, porque desejo ser sempre coerente nas minhes palavras e nos meus actos, procederei amanhã de igual modo, para coni aqueles incus camaradas, cujas famílias 0,11 porventura venha a saber vivem, em precárias circunstâncias, quer tenham ou não a sorte do serem os inimigos a fazer-lhes a referência que merecem.
Sr. Presidente : o meu espírito de justiça e a minha cabeça obrigam-me neste
momento a não esquecer todos aqueles que, como Carvalho Araújo, praticaram actos de bravura e valentia.
E, assim, eu acompanho o Sr. Dias da Silva que demonstrou ser um verdadeiro democrata, apresentando uma emenda pela qual aos marinheiros que combateram debaixo das ordens de Carvalho Araújo são igualmente dispensadas aquelas homenagens. Todos nós, oficiais do exército, sabemos que o nosso valor não se evidenciará se não formos auxiliados pelos nossos subordiuados, c assim a ôles pertence um grande quinhão dos nossos triunfos e das nossas glórias.
Sr. Presidente: acompanho com entusiasmo todos os lados da Câmara para que este projecto seja aprovado bem como o aditamento apresentado pelo Sr. Dias da Silva, devendo porém declarar da fornia mais categórica e terminante, que desde este momento de igual modo procederei para com todos os indivíduos que igualmente merecerem estas homenagens e se encontrem em situação precária, ficando toda a Câmara na obrigação de votar todos os projectos semelhantes.
Tenho dito."-
O Sr. Júlio Martins: — Sr. Presidente: associo-mo gostosamente ao projecto enviado para a Mesa pelo meu amigo e camarada Nóbrega Quintal, e faço-o porque estou couvoncido de que a sua aprovação representa um alto dever patriótico.
Já de todos os lados da Câmara se acentuou que ó absolutamente indispensável que fique esclarecido que nesta manifestação que a Câmara faz. votando esta proposta, não há qualquer significado político, seja de que natureza for.
A consagração feita a Carvalho Araújo ó, como muito bem disse o Sr. Nóbrega Quintal, uma consagração portuguesa, uma consagração nacional.
Sr. Presidente : discordo das considerações do Sr. João Camoesas, quando S. Ex.a afirmou que este facto tinha um significado niais alto, perante o País, só tivesse sido do Governo a sua iniciativa.
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Nestas condições, dou inteiramente o meu voto ao projecto do Sr. Nóbrega Quintal, e ao aditamento do Sr. Dias da Silva.
Sr. Presidente: actos como aquele que realizou Carvalho Araújo são actos que ilustram. Fui amigo de Carvalho Araújo, e tinha por ele muito respeito, não só pelas suas qualidades de valentia como pelas suas virtudes cívicas.
Assim, Sr. Presidente, eu entendo que é de toda a justiça, de um alto valor e de um guande patriotismo a consagração que o Parlamento faz a essa alta individualidade, pois pode dizer-se que Carvalho Araújo morreu to.ndo dedicado todo o seu valor à causa da Kepública.
Assim, Sr. Presidente c Srs. Deputados, eu entendo que a consagração que o Parlamento faz a Carvalho Araújo j á não é devida à proposta apresentada por um Deputado, membro de um partido político ou de um .grupo político; mas ao Parlamento da fiepública.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Granjo: — Sr. Presidente: Cavalho Araújo era de Trás-os-Montes o assim, Sr. Presidente, como transmontano que sou, não posso deixar de proferir algumas palavras, dando o meu voto ao projecto que se discute.
Diz-se, Sr. Presidente", que outros morreram em igualdade de circunstâncias, diz-se que outros têm direito à mesma pensão.
Sr. Presidente: o que eu vojo e que é pecha nossa nas discussões sobre estos assuntos regatear sempre o que a final estamos dispostos a fazer. (Apoiados).
Sejamos, Sr. Presidente,. pelo menos, nas palavras que proferimos e nas resoluções que tomamos, justos, atendendo à grandeza desses homens, ao que eles foram e aos sacrifícios que fizeram.
É facto, Sr. Presidente, que eu tive ocasião de ver morrer na Flandres muitos oficiais e praças do nosso exército que igualmente eram portugueses como Carvalho de Araújo; porém, temos de atender aos serviços por eles prestados e aos actos de heroísmo por eles praticados.
E a Câmara prestando esta homenagem não faz mais que executar a vontade do povo português. (Apoiados).
Por estas razões voto a proposta relativa à pensão a conceder à família de Carvalho de Araújo.
Vozes : — Muito bem. O orador não reviu.
O Sr. Eduardo de Sousa:—Sr. Presidente : já tive a honra .de declarar que votaria a urgência e disponsa do Eogi-mento para a proposta duma pensão à família do Carvalho Araújo apresentada pelo Sr. Nóbrega Quintal, e de tanto melhor grado assim voto quanto é certo ter eu aqui também redigida uma proposta com a mesma intenção.
Carvalho Araújo, Sr. Presidente, inscreveu na história da nossa intervenção na guerra uma página imorrodoura, e a qual, de per si só, bastaria para assinalar a brilhante .acção da nossa marinha durante Ôsse prolongado e sangrento conflito.
E o heróico feito de Carvalho Araújo nessa emergência em que ele gloriosamente'perdeu a vida bem poderia figurar sem desdouro a par dessas lendárias ca-tás^rofes que constituem as impressivas págmas uíi nOssa, história. trágiCO-iuãiíti-ma, tam intimamente ligada ao heróico período das nossas navegações e conquistas.
1 Todavia, Sr= Presidente, devo dizer que, votando se a proposta em discussão, a qual sobretudo visa a valer de momento à angustiosa situação económica em que ficou a família do heróico e malogrado oficial de marinha, não se me afigura que destarto fique por completo paga a dívida de gratidão contraída com a Pátria para com Carvalho Araújo. Cumpre que o nome dele fique dignamente perpetuado na memória da nossa marinha de guerra, não só como honra da classe dos nossos oficiais da armada, mas ainda como motivo de orgulho e glória para todos os nossos marinheiros.
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aflitivas condições de vida em que se encontra a família do heróico marinheiro. Assim, pois, concluo, Sr. Presidente, rciteirando em meu nome pessoal e no dos Deputados independentes, um voto de concordância e aprovação do projecto que se discute.
O Sr. Jaime de Sousa: — Pormita-me V. Ex.a que acrescente mais algumas palavras àquelas que proferi sobre o projecto.
Falo em meu nome e como oficial de marinha.
Tive a honra insigne de comandar Carvalho Araújo em operações de guerra. Foi um dos meus oficiais, e nunca vi he roicidade assim.
Era um valente. Era a valentia consciente, a coragem fria, uurna corrida para a morte voluntária, conhecendo absolutamente aquilo que se faz. Por vezes ele infringia, ^porventura, aqueles preceitos elementares que tinham sido assentados nos processos de fazer a guerra. Muitas vezes tive ocasião de observar-lhe que se não expusesse tanto. Cometia as maiores temeridades. Estivemos a destruir minas alemãs na nossa costa, e todos os dias Carvalho Araújo afirmava urna valentia, uma forma heróica de proceder, que eu nunca vi nas operações de guerra. Estou crente que não pode ser excedido.
Podia citar dezenas e dezenas de momentos heróicos dôsse homem, -mas não o furei em face 'da unanimidade da manifestação da Câmara nesta última justa homenagem.
H4, ainda um facto, todavia, que eu do-verei salientar, e esse ó o de que Carvalho Araújo foi mandado comandar um navio de recursos absolutamente insuficientes parada missão militar que lhe incumbiram. E certo que o material naval com que a nossa marinha de guerra se tem batido atravós a história tem sido sempre manifestamente insuficiente, mas, neste caso, Carvalho Araújo partiu cora um navio armado com poças que — sabia-o ôle, sabiam-no os directores gerais da armada, subia-o o próprio Ministro — seriam inteiramente ineficazes para combater um inimigo dispondo de poças de 15 centímetros, o, 110 emtanto. Carvalho Araújo, sabendo que corria para a morto, sabendo que o seu acío represou-
tava um verdadeiro suicídio, não teve um momento de hesitação, sendo testemunha do seu heroísmo o relatório do próprio comandante do submarino, que declarou que nunca presenccou um feito tam valoroso nas acções navais em que que tinha tomado parte. Defrontando um grande submarino inimigo, fortemente armado, Carvalho Araújo atirou-se, com o o seu navio, contra ôle com um heroísmo que jamais-poderá ser excedido e que ra-ríssimas vezes tora sido igualado. E por isso que o leito de Carvalho Araújo é qualquer cousa de muito grande, representando uma das páginas mais brilhantes de toda ^a história da nossa marinha de guerra. E preciso que Portugal o não esqueça, porque nós, .os marinheiros portugueses jamais o esqueceremos. Tenho dito.
O Sr. Domingos Cruz:—-Sr. Presidente : do coração me associo à homenagem que esta sendo prestada à memória de Carvalho Araújo.
Todas as palavras proferidas, todas as homenagens prestadas a esse grande oficial são bem, como já se disse, uma consagração própria de portugueses, e já 'que o Sr. Augusto Dias da Silva quis tomar a iniciativa de propor que seja tornada extensiva a pensão aos marinheiros que também pereceram no Augusto de Castilho, que escreveu uma das páginas fulgurantes da nossa história marítima, dou a minha aprovação à sua proposta, aproveitando o ensejo para pedir a atenção do Sr. Ministro das Finanças, visto que o Sr. Ministro da Marinha não está presente, para que seja reparada a injustiça que representa o não ter sido ainda colocada no quartel de marinheiros a lapide onde para sempre fiquem inscritos os nomes dos marinheiros que morreram em combate durante a última guerra.
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marinheiros ein campanha, tanto mais que na Escola Naval essa comemoração se fez com respeito aos oficiais que dali saíram.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro : — Sr. Presidente : pedi a palavra para me associar à votação do projecto que foi apresentado, pois conheci Carvalho Araújo não só como oficia] de marinha valoroso e que morreu como um herói, mas ainda como administrador que foi durante um ano do distrito de Inhambane, onde manifestou as suas altas qualidades de inteligência e de patriotismo, tendo deixado esse lugar logo quo em Lisboa se implantou o dezembrismo. Ê esta mais uma nota a acrescentar à biografia de Carvalho Araújo, desse velho republicano e amigo que jamais poderemos esquecer e a quem é de todo o ponto justo prestarmos todas as homenagens, ainda aquelas que importem para a situação de sua família um melhor bem estar.
O orador não reviu.
Vozes: — Muito bem.
hf. rfmrminrin n nrtfrfnn^tn inn riflflPrníl-
-_. W£,, ^,v~w~ ~— J* • VJ*,~~»~ y .....
dade.
É lido e aprovado o artigo 1.°
O Sr. Presidente: — O Sr. Augusto Dias da Silva mandou para a Mesa uma proposta que traz aumento de despesa. Nestas cir-cunstâncias, mandei consultar o Sr. Ministro das Finanças, que a ela se mostrou contrário, motivo por quo a não posso pôr h discussão.
O Sr. Brito Camacho :—É o projecto?
O Sr. Presidente : — Com o projecto tinha o Sr. Ministro das Finanças concordado. Agora trata-se de unia nova proposta.
O Sr. Brito Camacho: — E uma nova proposta e uma novíssima teoria. Foi lido e aprovado o artigo 2.°
O Sr. Nóbrega Quintal: — Kequeiro a dispensa da leitura da última redacção. Foi aprovado.
O Sr. António Granjo (por parte da comissão parlamentar de inquérito do Minis-
tério dos Abastecimentos) : — Sr. Presidente : limitar-me hei à parte do relatório que diz respeito ao ilustre Deputado Sr. João Pinheiro e a fazer a prova de que as afirmações contidas nesses,relatórios são absolutamente verdadeiras.
Está provado que, como a comissão afirmou, existe uma informação oficial da Contabilidade do Ministério dos Abastecimentos sobre a abertura do um credito ilegal de 560 contos a favor da firma Eosa, Cabral & C.a, por simples despacho verbal.
O Sr. Cunha Liai:— O Orador:—A comissão de inquérito, que sabe que esse crédito é superior a 10 contos e, portanto, devia ser autorizado em Conselho de Ministros, que sabo que nenhum Ministro pode abrir créditos verbalmente. O Sr. Júlio Martins:—V. Ex.a dá-me licença? Sobre essa questão ouvi simplesmente as afirmações do Sr. João Pinheiro e as de V. Ex." O Orador: — A minha é uma documentação. O Sr. Júlio Martins:—Isso é simplesmente para esclarecer de momento, porque, evidentemente, a comissão há-de apresentar um relatório completo. Disse o Sr. João Pinheiro, e. de resto, isso é verdade, que no relatório quo está na Mesa se menciona que o director geral do Ministério dos Abastecimentos tinha feito uma afirmação a seu respeito, afirmação que o Sr. João Pinheiro assegura não ter sido produzida. O Orador: — Passo a provar que o foi. O Sr. Júlio Martins : —V. Ex.a o que faz é simplesmente enterrar o seu correligionário, Sr. João Pinheiro. O Orador:—;Não posso admitir isso! j Eu ri^o quero saber se se trata de correligionário ou não! (Apoiados).
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O Sr. Júlio Martins;—Isto ó preciso ser esclarecido.
O Orador: — Assíin, estamos a perder tempo. Eu vou provar.
O director geral afirmou, como se demonstra nos documentos que aqui tenho, que foi aberto verbalmente aquole crédito.
Quanto à outra acusação, o Sr. Jaime Espanha declarou que o decreto parecia ter sido feito pela moagem.
Tonho também aqui a prova deste facto. Os depoimentos de João Baptista de Bar-ros e de Carlos Ribeiro Ferreira só vieram avolumar as suspeitas da comissão.
Vêem, portanto, V. Ex/lS que o que vem no relatório ó apenas incompleto e apenas vem incompleto porque, tendo a comissão necessidade de fazer uma narração sucinta dos factos, evidente é que não só poderia referir nem a todas as testemunhas, nem ao complexo desses factos.
Assim, eu quero aqui preguntar à Câmara, se, por parte da comissão de inquérito ao Ministério dos Abastecimentos, se falseou algnm documento ou se se acusou gratuitamente alguém ; porque, se a comissão visse da parte da Câmara qualquer tergiversão em referência à sua honorabilidade, eu vinha autorizado aime-diataraente dopor o seu mandato. (Não apoiados).
Jaime Espanha, que nesta informação, prestada quando ainda não existia a comissão do inquérito, íazia uma insinuação que, conjugada com um outro documento, deu à comissão o convencimento de qne precisava de averiguar num outro documento que depois juntou ao processo, quando a. comissão lhe pediu que explicasse as suas palavras duvidosas —são os próprios termos—, explicava todos os períodos da sua informação. Em resumo: Jaime Espanha retirara todas as insinuações e, portanto, ficara 25 apenas a afirmação por parto do moageiro Carlos Ribeiro Ferreira, e do João Baptista de Barro?, da qual resultara que o Sr. João Pinheiro, quando Ministro, ouviu, efectivamente, alguns membros da moagem, e, a pedido da mesma moagem, introduziu no decreto um artigo que lhe pareceu justo. A comissão entendeu, porém, que não podia, negar ao Ministro o diíeito do ouvir as classes interessadas, entendendo mesmo que era sua obrigação ouvi-las. O Sr. Cunha Liai:—,;Mas senão havia crime, para que se referiu a comissão a isso? Trava-se discussão entre o orador e os Srs. Cunha Liai e Júlio Martins. O Orador: — De facto, o que ficara quanto ao Sr. João Pinheiro era apenas isto : S. Ex.a ouviu a moagem e, a julgarmos verdadeira a afirmação duma pessoa que realmente merece crédito, porque era interessada, introduzira no decreto um certo artigo, a podido da moagem, e por lho parecer justo. Progunto à Câmara se a comissão podia interpretar estes factos como criminosos. Eu fiz a lei do inquilinato, ouvi todas as classes interessadas e, por sugestão delas, introduzi vários artigos. O Sr. Cunha Liai:—Dosde que não constituía crime um Ministro ouvir as clas- j sés interessadas, a comissão não tinha o direito de trazer o assunto para aqui. i O Orador: — A acusação primitiva era de que tinha sido a moagem quem tinha foito o decreto. O que eu posso garantir a V. Ex.a, como membro qne sou da comissão de inquérito ao extinto Ministério dos Abastecimentos, ó que os documentos que tive a honra de ler à Câmara não são falsos, i parecendo haver do facto um derreto que
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vesse pode a Câmara estar certa que os culpados já estariam na cadeia, fossem eles quem fossem, por isso que a comissão tem procedido como deve, investigando, como é do sou dever.
A comissão, repito, não tem procedido levianamente, nòm como tribunal de honra, como injustamente se tom dito, mas sim tem procedido em harmonia com as declarações que têm sido feitas, sem espécie alguma de política, e fazendo as necessárias investigações acerca dos parlamentares sobre que tem recebido indícios de criminalidade.
Interrupção cio Sr. Cunha, Liai, que se não ouviu.
O Orador: —Sr. Presidente : a comissão de inquérito até hoje tem sido acusada de leviana e de exagerada nas investigações que tem feito, o que não é verdade.
Se o Sr. João Pinheiro não foi enviado para juízo, foi porque a comissão de inquérito não lhe encontrou base alguma para o indicar como criminoso, por isso que ela está no firme propósito de enviar para juízo toda e qualquer pessoa sobre quem possam recair indícios de criminalidade.
Esta é a orientação que a comisão tem seguido até hoje, e esta será a orientação que seguirá daqui para o futuro, por isso que a sua acção, repito, não é de tribunal de honra, mas sim de investigação.
Eu, Sr. Presidente, devo declarar que não tinha conhecimento dos documentos a que me tenho referido, por isso que tenho de dar aos meus colegas da comissão a mesma autoridade e a mesma confiança que eles me dão a mim.
Creio que a Câmara se julga satisfeita sob o ponto de vista de a comissão não ter procedido levianamente falando do Sr. João* Pinheiro nestes dois relatórios, sob o ponto de vista do ficar demonstrado que não existe nenhuma oposição entre Csses mesmos relatórios, pois não se pode julgar sobre datas, nem sobre uma ou outra palavra, para se malsinar a comissão.
Era isto o que eu queria dizer à Câmara.
O Sr, João Pinheiro por duas vezes fez a afirmação de que não o honrava a decisão da comissão de inquérito.
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Eu já disse também que a comissão não funciona como tribunal de honra, mas sim como tribunal de investigação, e levar ou pretender levar para esse campo qualquer assunto que com ela se prenda, o mesmo seria que levar para ele qualquer juiz que proferisse uma sentença contra ou a favor dalguêni.
Estamos investidos da autoridade de juizes, operamos como juizes.
Nada mais.
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis):—Pena ó que não tenham também as sancções necessárias a que os juizes estão sujeitos.
O Orador:—Porquê?
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): —Por terem vindo fazer à Câmara declarações que lhes eram absolutamente vedadas.
O Orador: — Concordo em que foi esse o maior erro da comissão, o já declarei que se eu- estivesse presente, o Sr. Vaz Guedes, embora a tal incitado, nenhumas declarações teria prestado.
Sussurro.
O Orador: — Preferiria demitir-me a prestar quaisquer declarações (Apoiados), fossem quais fossem as equívocas suspeitas que se levantassem sobre o meu procedimento, porque acima de mini próprio está a minha consciência e a honestidade dos meus propósitos. (Apoiados).
Foi esse" o erro da comissão, mas já que assim sucedeu é preciso que a Câmara tenha efectivamente a máxima confiança na honorabilidade da comissão, ou então jamais nela poderemos continuar.
De resto nós que não estamos lá por prazer, que estamos cansados, que estamos cada vez mais aborrecidos, que apercebemos em redor de nós o ranger dos dentes daqueles que se julgam injustamente atacados, sentimos que, visto que demos a nossa cota de sacrifício para o saneamento da República, já é razoável, já é justo que a Câmara considere que será bom ir pensando na nossa substituição (Não apoiados).
Tenho dito.
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O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia.
Os Srs. Deputados que tem documentos a mandar para a Mesa fazem lavor de os enviar.
O Sr. Maldonado de Freitas (para um requerimento}:-—Peço a V. Ex.a que consulto a Câmara sobre se permite quo antes da ordem do dia da próxima sessão seja discutido o parecer n.° 390 sobre o projecto de lei que autoriza o Governo a ceder o Convento dos Franciscanos de Leiria à Câmara Municipal daquele distrito, para um hospital destinado a crianças pobres.
Foi aprovado.
O Sr. Pais Rovisco:—Sr. Presidente: ao entrar nesta sala íui Luíormado de que a Câmara resolvera há dias que V. Ex.a marcasse para antes da ordem do dia o parecer n.° 427.
Como ]ião vejo 6sse parecer marcado para antes da ordem do dia de hoje e vejo requerer que se marquem pareceres para serem discutidos na próxima sessão, autos da ordem do dia,, desejo que V. E>:.a me informe se de facto a Câmara deliberou que esse parecer entrasse em discussão, e quando se discutirá.
O Sr. Presidente: — Como o parecer n.° 427 traz aumento de despesa não posso marcá-lo para discussão, sem que ele tenha a aquiescência do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. António Granjo :—Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que o processo que hoje aqui foi discutido tem de ser enviado ao tribunal, porque representa mais uma acusação contra o director geral Pereira -Coelho.
Como a Câmara, porém, pode entender que esse processo deve conservar-se na Mesa durante algum tempo, a fim de ser examinado pelos Srs. Deputados, peço a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se assim o entende, on qno devo ser remetido imediatamente para o tribunal.
O Sr. Júlio Martins"—Bastavam-me 24 horas para ler os documentos.
Consultada a Cântara, resolveu que o
v nci Mesa*
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do orçamento do Ministério do Comércio
O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidtn-te: continuando na discussão do capítulo 4.° do orçamento do Ministério do Comércio desejo muito especialmente chamar a atenção do Governo para o artigo 29.° desse capítulo.
Tinha-se orçamentado para continuação das obras do porto artificial de Ponta Delgada unia verba de 100 contos, mas, na Direcção Geral de Obras Públicas e Minas, como era necessário entrar no caminho de compressão de despesas, essa verba foi reduzida para 80 contos.
Ora, Sr. Presidente, esta verba dá para manter, para conservar o que está feito, mas não chega para a continuação das obras que é necessário executar.
Depois de tudo quanto tenho dito sobre este assunto, não vou alargar-me em considerações detalhadas para provar que essa verba é insuficiente.
O que desejo simplesmente é pedir a V. Ex.a e à Câmara que ponderem bem este assunto, pedindo ao mesmo, tempo ao Sr. Ministro do Comércio para repor a verba como ela foi orçamentada, pois que a verba inscrita não chega nem mesmo para manter o estado actual do porto. A redução desta verba representa uma verdadeira monstruosidade económica.
Como V. Ex.a sabe, os portos marítimos representam uni elemento importante para o desenvolvimento económico das regiões que servem.
Foi mau ter substituído a palavra «Fomento» por «Comércio» na reorganização deste Ministério. Daí vem uma tal ou qual desorientação supondo-se que no Ministério do Comércio há qualquer cousa que não seja fomento. Este Ministério é essencialmente um Ministério de fomento.
Todas- as suas verbas são produtivas; aumentam a riqueza, na sua maioria.
Nestes termos, não querendo alongar -mo em considerações, proponho, apelando para o Sr. Ministro do Comércio quo, a verba primitiva se mantenha, visto a lei--travão não permitir que eu o proponha.
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faça a respectiva proposta de acordo cem o Sr. Ministro das Finanças.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): — Seria talvez conveniente antes de iniciar as minhas considerações ouvir da boca do Sr. Ministro das Finanças o que S. Ex.a pensa acerca da proposta que o Sr. Jaime de Sousa fez apelando para S. Ex.a
O Sr. Ministro das Finanças (Pina Lopes):— Pronunciar-me hei depois da proposta ser'apresentada.
O Orador: —Foi V. Ex.a, Sr. Presi" dente, quem como Presidente flo Ministério teve ocasião de classificar o orçamento de 1919 e 1920, e conseqúentemente este orçamento, de fancaria.
Realmente assim é. e se formos estudar em detalhe cada uma das verbas que constituem determinados capítulos desse orçamento, e os que dizem respeito aos serviços dependentes do Ministério do Comércio, somos levados a concluir que o
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me de Sonsa disse, é mais importante que outros portos também importantes, vivendo uma vida cheia de vicissitudes como o de Horta que tem no orçamento uma verba muitíssimo reduzida.
Se me fosse permitido acompanhar o pedido do Sr. Jaime de Sousa, pediria que a verba destinada ao porto de Ponta Delgada em vez de 60 contos fosse transformada em 80 contos por qualquer processo orçamental adoptado pelo Sr. Ministro das Finanças.
Também se fosse possível proporia uma transformação na verba destinada ao pôr-to da Horta para 80 contos.
Todos conhecem infelizmente o que tem sido em Portugal a chamada política de portos e a nenhuma importância que a ela tem ligado os diferentes Governos que têm passado por essas cadeiras . . .
O Sr. .Ministro do Comércio e Comunicações (Lúcio de Azevedo): — A verba destinada aos serviços de dragagem ó que está inscrita no artigo 28.°
O Orador: —Eu sei; mas o facto é que para aquisição de novo material e repa-
ração do que já existe, essa verba é duma exiguidade manifesta, dada a necessidade de se olhar a sério para este importante problema.
No porto da liorta, por exemplo, existe uma draga que, apesar do Estado ter gasto com ela algumas dezenas de contos, não corresponde de forma alguma ao fim a que se destina, e a situação desse porto é cada vez mais melindrosa.
Eu já tive ocasião de apresentar nesta Câmara urn projecto tendente a autorizar o Governo a contrair um empréstimo de 100 contos em -favor desse porto. Pena foi que ôsse projecto dum largo alcance e que não implicava, alôni disso, qualquer aumento de despesa, não tivesse merecido até hoje a aprovação desta Câmara. Faço alusão a este facto para pôr deante dos olhos do Sr. Ministro do Comércio a necessidade de encarar a sério a situação desse porto, visto que ele não foi feito apenas para servir de armazém de areias.
Pelos estudos a que se tem procedido tem-se verificado que é de 130:000 toneladas a quantidade de areia acumulada nesse porto.
A draga Aurora que lá tem estado em serviço, apesar de ser considerada pelas estações oficiais como uma das melhores, não corresponde às exigências desse pôr-to, o que já foi reconhecido pelo próprio Sr. Ministro do Comércio.
Folgarei muito em que o Sr. Ministro do Comércio inscreva no orçamento as verbas necessárias para o pagamento de pessoal e trabalhos que são necessários, para diferentes serviços e dragagens, mas que sejam verbas avultadas que permitam esses serviços.
S. Ex.a podia, com a sua autoridade de Ministro do Comércio, acompanhado do Sr. Ministro das Finanças, conseguir que a Câmara votasse o aumento da verba de 80 contos paru o porto da Horta, e posso dizer ao Parlamento que praticaria um acto digno de louvor. (Apoiados).
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio (Lúcio de Azevedo): — Sr. Presidente: poucas palavras vou dizer para responder aos Srs. Jaime de Sousa e Manuel José da Silva.
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80 contos para o porto de Ponta Delgada, pois todos sabem que os salários e os materiais têm subido muitíssimo, e que, portanto, essa verba nada significa.
Existindo uma disponibilidade no artigo 309.°, eu já tinha pedido que uma parte dela fosso destinada a aumentar a verba de 80 contos, a que se vem fazendo referência, o, estando o Sr. Ministro das Finanças de acordo, eu vou mandar para a Mesa ,uma proposta nesse sentido.
A Câmara sabe que há muitos melhoramentos e trabalhos a realizar, e, desde o momento que o Sr. Ministro das Finanças necessita que o Orçamento não seja aumentado em um só centavo, essa verba em disponibilidade terá de ser bem aproveitada.
O porto de Ponta Delgada, pela sua situação especial, é um porto que necessitava que se lhe fizessem obras indispensáveis.
Na altura em que foi pedida autorização para ali se estabelecer um depósito de óleos, eu vi que os seus principais cais estão por construir e é certo que todos reconhecem a necessidade de valorizar esse porto, não sendo, porém, com a verba de 80 contos que se poderão fazer grandes trabalhos. Essa verba é alguma cousa, mas não é tudo.
O encarecimento dos jornais o dos materiais colocam-nos numa situação difícil e, emquanto não houver medidas' de finanças que dêem mais alguns recursos,-esses melhoramentos, como se desejam, serão impossíveis de se fazer.
As nossas obras em estradas, rios e caminhos de ferro serão impossíveis, por completo, emquanto não houver dotações suficientes.
Eeconheço, em todo o caso, que S. Ex.a tem razão quando fala do porto da Horta, como nós temos também razão quando tratamos dos nossos portos da metrópole, que, como S. Ex.a sabe, estão abandonados, e sinto que, pela insuficiência de verbas, não se possam melhorar as condições dos nossos portos e facilitar as ligações dos nossos rios.
Devo dizer a S. Ex.a que já estão muito adiantados os trabalhos para a ligação do rio Sado, e espero que, muito em breve, ele possa ser navegável numa
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extensão de 15 quilómetros para montante de Alcácer do Sal.
Sr. Presidente: no que diz respeito ao porto da Horta, devo dizer que a draga Aurora se conservou naquele porto durante sete anos, sem sequer ter dragado um quilograma de areia, e, como este estado de cousas não podia continuar, tanto mais que a sua reparação representa uma dezena de contos, eu deliberei, em virtude da falta de material de dragagens, adquirir um lanchão-draga, com uma bomba de sucção, para substituir a draga Aurora.
Abriu-se o respectivo concurso, mas ficou deserto porque não houve unia única casa que quisesse concorrer em virtude das constantes oscilações e altas de preços.
Nestas condições, não foi possível adquirir o lanchão-draga, motivo porque a verba consignada no orçamento anterior, para aquisição de material de dragagens, ficou intacta.
Sr. Presidente: vou, pois, enviar para a Mesa uma proposta que dá satisfação às considerações dos Srs. Manuel José da Silva e Jaime de Sousa, com referência ao porto de Ponta Delgada.
Tenho dito.
São lidas na Mesa e admitidas as propostas de emenda apresentadas pelo Sr. Ministro do Comércio.
São as seguintes:
Propostas
Proponho que a verba a aumentar aos 300 contos inscritos no artigo 28.° do capítulo 4.° do orçamento em discussão, seja de mais 160 contos em vez dos 100 da proposta de alterações apresentada em 12 de Abril de 1920. — Lúcio de Azevedo— F. Pina Lopes.
Proponho que no orçamento do Ministério do Comércio, capítulo 4.°, artigo 29.°, se mantenha a verba primitivamente orçada de 80.000?$' para o porto de Ponta Delgada devendo a redução proposta de 20.000$ sor compensada pela verba que se anula de 52.723058 no artigo 309.° do capítulo 19.°
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Artigo 33.° — Levadas da Ilha dá Madeira :
Para pagamento aos cantoneiros
e distribuidores de águas : . 14.600$
Para inaterial e mão de obra a empregar na reparação das levadas existentes.....15.000$
Importância correspondente à receita provável das levadas, a aplicar na construção de novas levadas e na amortização do empréstimo feito pela Junta Geral do Distrito.....7.000$
36.600$ Importância proposta.....22.000$
Lúcio de Azevedo. F. Pina Lopes.
São aprovados os artigos 28.° e 29.,°j salvo as emendas, que igualmente foram aprovadas.
São aprovados, sem emendas, os artigos 30.°, 3L° e 32,°
Foi aprovado o artigo 33.°. salvo a emenda, que igualmente foi aprovada, bem como o artigo 34.°
O Sr. Presidente: — Proponho para fazer parte da comissão que há-de apreciar as propostas de finanças os seguintes Srs. Deputados:
António Maria da Silva.
António de Paiva Gomes.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Jaime de Sousa.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
Màrianb Martins.
Leio Portela.
Ferreira da Rocha.
Aboim Inglês.
Álvaro de Castro.
Rego Chaves.
João Gonçalves.
Ladislau Batalha.
Pacheco de Amorinii
O Sr. Presidente: — Só há apenas 20 minutos pára se entrar na segunda parte da ordem do dia e, se a Câmara concorda, continuar-se há, durante este espaço de tempo, a discutir o orçamento do Ministério do Comércio.
A Câmara concorda.
l)iáHo dá Câmara âoi Deputados
O Sr. Presidente:—Vai ler-se o capitulo 5.° com as emendas. Leu-se.
O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Cunha Liai.
O Sr. Cunha Liai: — Sr. Presidente: não venho, a propósito dó orçamento do Ministério do Comércio, iazer um ataque ò. obra do Governo.
Foi sempre, da parte do Grupo Parlamentar Popular, norma sua não fazer política partidária senão nas cousas em que ela seja absolutamente necessária, mas, em todo o caso, devo dizer que me parece que esto orçamento está a ser discutido talvez duma forma atrabiliária.
Se tivesse estado presente quando nesta Câmara se discutiu a proposta dos lucros de guerra, eu teria procurado demonstrar, como, aliás, ainda terei ocasião de o fazer, que não me parece razoável a aplicação desse tributo à redução da circulação fiduciária, mas sim deveria aplicar-se ao desenvolvimento do fomento do País.
Esta toso, que me parece interessante de versar, seria suficiente para alterar toda a idea que fazemos da estrutura do orçamento do Ministério do Comércio.
Nós estamos a discutir sob o aspecto dum país que não tem receitas, dum país falido.
• O Sr. Júlio Martins:--A fazer-se uma discussão assim, seria preferível votar se.m discutir.
O Orador: — Exactamente.
Se amanhã aqui se discutir a proposta dos lucros de guerra e a minha tese vin-, gar no Parlamento ...
O Sr. Ferreira da Rocha (interrompendo):- V. Ex.a dá-me licença?
Todos os lados da Câmara mais ou menos se manifestaram na idea de que não devia ser reduzida a circulação'fiduciária nos termos da proposta do Sr. Ministro.
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O Orador:—Muito bem.
No espírito da Câmara existe, pela maneira coifto os oradores se têm manifestado a respeito dos lucros de guerra, aidea de que esses lucros não devem ser aplicados integralmente na diminuição da circulação fiduciária.
Nós não sabemos quais os recursos com que o Estado pode contar.
Os lucros que se pretendem são muito variáveis e nós estamos dando ao país a impressão de que queremos discutir o Orçamento, quando não sabemos até que ponto devem ir as nossas despesas.
Estabelecida esta doutrina, eu digo que estou na presença dum facto consumado.
Evidentemente que não vou pedir ao Sr. Ministro do Comércio que me traga aqui a justificação, verba por verba, das despesas do capítulo de «Edifícios públicos».
Nós estamos num círculo vicioso. Devíamos discutir primeiro as propostas de finanças e agora vamos discutir o Orçamento, e esta discussão é apenas uma espécie de beneplácito dado pelo Poder Legislativo ao Executivo.
Compreendo a situação e espero que o país também a compreenda.
A verba de 3:720 contos reduzida em 600 contos, por iniciativa do Sr. Ministro, e de 10 contos, por'parte da comissão, e, portanto, de 3.110 contos para edifícios públicos, é de todas as verbas do orçamento do Ministério do Comércio a maior.
Continua a ser aquela que mais avulta nesse Ministério, sendo uma despesa quási improdutiva, pois nós sabemos que os edifícios públicos caminham como as obras de Santa Engrácia.
Em edifícios públicos comete-se o tremendo erro de se gastar mais dinheiro do que na repartição de estradas e pontes, que estão Uma verdadeira lástima.
A característica desta verba do capítulo 5.° é a sua grande desproporção em relação a outras verbas que deveriam talvez avultar no orçamento das despesas do Ministério do Comércio.
10 porque, por virtude das circunstâncias actuais, tem de ser assim, pois eu calculo quo isto depende em parte das condições de ordem política que nos inibem do despedirmos, dum momento para o outro, todos os Deputados.. „ perdão,
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ia a chamar-lhes Deputados pela sua improdutividade — todos os operários empregados nas obras; que também se não possa fazer num dia para o outro a selecção do pessoal, e, portanto, parece-me que o Parlamento não tem dados absolutamente nenhuns para saber ao certo se as verbas aqui descritas no Orçamento são ou não necessárias, a não ser 'por aquelas informações que o Sr. Ministro do Comércio se queira dignar dar à Câmara.
Sr. Presidente: por todas estas razões eu declaro que a discussão não me interessa sobremaneira; que é preciso que o pais compreenda as condições em que estamos aqni discutindo, e que, feita estas ligeiras considerações, eu me abstenho de entrar, verba por verba, na apreciação dos artigos, porque creio que só o Sr. Ministro do Comércio tem dados para saber se as verbas aqui descritas são as necessárias, deixando, por isso, a S. Ex.a a glória da sua responsabilidade.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): — Sr. Presidente: concordando absolutamente com as declarações que acaba de fazer o meu querido amigo, Sr. Cunha Liai, quanto à maneira como estamos fazendo a discussão deste orçamento, e porventura quanto à maneira como iremos discutindo os outros, eu, e a propósito do capítulo que está em discussão, devo dizer que estou convencido que o Sr. Ministro do Comércio, atento não só à falta de recursos do nosso Tesouro, mas devido ainda ao saneamento que S. Ex.% em notas oficiosas quási dia a dia tem trazido a público, como propondo-se fazô-lo, será o primeiro a mandar para a Mesa a proposta no sentido de aumentar a redução apresentada pelo Sr. António Fonseca, quando Ministro das Finanças, para um maior quantitativo.
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'S. Ex.a o Sr. Ministro do Comércio, e eu aproveito a ocasião para salientar o facto, iniciou, realmente, uma política dó saneamento a dentro das obras do Estado, e eu folgo em constatar que S. Ex.a tem tido como colaborador dedicadíssimo um engenheiro ilustre que muito honra as fileiras do' Grupo Popular: o Sr. Ovídio Malheiro, o qual, estou convencido, o Sr. Ministro do Comércio não deixará de ter em apreço, pelos muitos serviços que esse funcionário tem prestado ao Estado.
E assim, que o Grupo Republicano Popular, pelos seus homens aqui dentro, pelos seus elementos de colaboração lá fora, contribui para o saneamento da nossa administração pública, que deixa muito a desejar.
E não sou eu que o digo, para tirar efeitos oratórios, é das próprias bancadas do Poder que vêm dia a dia afirmações,concretas no sentido de que essa adminisnistração tem sido ruinosa, muitas vezes crapulosa.
O Sr. Ministro do Comércio, com a responsabilidade da situação que ocupa, atirou para público as mais graves afirmações, que talvez fosse conveniente rodear dumas certas cautelas, mas não será o Grupo Popular que impedirá S. Ex.a de falar em termos alevantados a linguagem da verdade. (Apoiados).
Sr. Presidente: eu vejo no orçamento do Ministério do Comércio uma rubrica «Instituições hospitalares».
Realmente, no que se tem pensado menos ó em hospitalização.
Passando há dias em Coimbra, visitei o hospital. ..
O Sr. Alfredo Cruz: — O hospital de Coimbra ó um hospital modelar. ,.
O Orador:—Nem ou digo o contrário, mas estou convencido de que se tem gasto nos hospitais, com obras, muito mais que era necessário gastar.
O Sr. Presidente :—Faltam cinco minutos para se entrar na parte destinada a antes de encerrar a sessão.
O Orador:—Então fico com a palavra reservada.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Álvaro Guedes:—Tendo pedido a palavra para tratar em negócio urgente
dum assunto que reputo importante, e a Carneira tendo-me negado essa autorização, não ó agora apenas em cinco minutos que posso desenvolver o assunto que desejava tratar.
No Diário de Notícias de hoje fazem--se considerações graves, embora justas, sobre a maneira fácil com que os Ministros da República fazem acusações e levantam suspeitas, apontam vagamente, sem as concretizar, irregularidades cometidas nos serviços públicos.
Já em tempos tive ocasião de convidar um Ministro a dirigir-se ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior depondo perante ele as acusações que lançou sobre as câmaras municipais e autoridades administrativas, solicitando dele e não da Câmara as respectivas sanções.
A maior parte dos Ministros fazem acusações que não provam, ou não procedem, e isto só serve para o desprestígio do poder e especialmente do Parlamento, se ficar impassível perante estes factos.
Nada tenho com a crítica que se faz ao Poder Executivo, mas tenho com a que se refere ao Parlamento, e que é injusta, pois não tem faltado aqui quem, como eu, íuuha protestado contra várias atitudes irreflectidas que só servem para desprestigiar e nada mais.
E certo que nesta Câmara vários Ministros e parlamentares têm feito referências e acusações vagas a determinadas classes -da sociedade portuguesa e sobre determinados indivíduos, e ainda há momentos um ilustre Deputado, a propósito dos relatórios da comissão de inquérito ao Ministério dos Abastecimentos, afirmou que ela era apenas uni tribunal de calúnias.
Francamente a Câmara devia imediatamente ter protestado contra tal afirmação, porque estou convencido de que a comissão de inquérito não é de modo algum uma comissão de calúnias.
É de estranhar todavia que o Parlamento se não sensibilize mais com certas afirmações, como com aquela que em aparte a um discurso do Sr. Álvaro do Castro aqui produziu o Sr. António Maria da Silva, que ó um parlamentar muito ilustre e uma alta figura da República, dizendo que o País tem estado a saque.
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estranho que assim se lancem suspeitas e acusações sem se provarem, ou sem se darem elementos às autoridades para enviarem os prevaricadores para os tribunais.
Contra isto protesto, porque entendo que os homens públicos devem usar de uma .maior circunspecção para evitarem que se carregue ainda mais esta pesada atmosfera de suspeições em que vive actualmente a política portuguesa.
Era isto o que eu tenho a dizer.-
E por agora nada mais.
O Sr. Ministro do Comércio (Aníbal Lúcio de Azevedo):— Sr. Presidente: p,edi a palavra para responder ao Sr. Álvaro Guedes, devendo em primeiro lugar observar a S. Ex.a que desde a primeira hora em que assumi a responsabilidade do Poder, desde o primeiro momento em que entrei para o Governo da presidência do ilustre homem público, que foi o Sr. Coronel António Maria Baptista, tomei o compromisso formal de vir para aqui fazer -uma política nacional, independente de partidos, absolntamente honesta, sem tibiezas nem enfraquecimentos, dizendo toda a verdade, porque exactamente pela razão de se faltar à verdade é que chegámos à angustiosa situação em que nos encontramos.
De resto, estou habituado desde criança a tomar a responsabilidade das minhas palavras e dos meus actos.
Não sei a que artigo o Sr. Álvaro Guedes se referiu, porque ainda hoje não tive tempo para ler jornais e por isso não sei em que se baseia.
O Sr. Álvaro Guedes :— O que critiquei foi que dentro do Parlamento muitos homens, Ministros e parlamentares, façam acusações vagas.
O Orador:— É o que eu quero saber. Falar a verdade, Sr. Presidente, não ó desprestigioso para a República, nem para o País. Eu, Sr. Presidente, já disse e repito que estou habituado desde pequeno a assumir por inteiro e completo a responsabilidade dos meus actos e das minhas palavras, e assim devo repetir o que já dis- 33 se no Senado: que infelizmente na nossa administração, dentro da República, nem sempre se tem seguido o caminho que seria para desejar, podendo-se dizer que o País tem estado verdadeiramente a saque. O Sr. Álvaro Guedes:—O que eu desejava é que V. Ex.a e o Governo tivessem a coragem de meter na cadeia todos esses que tem posto o País a saque. O Orador:—Eu, Sr. Presidente, não costumo empregar palavras para me tornar popular. Já disse a V. Ex.a que o País tem estado a saque e isto posso prová-lo e demonstrá-lo com documentos. Dentro da República tem havido funcionários pouco honestos; porém, eu algumas medidas já tenho tomado a bem da República e do País, isto pelo que diz respeito aos serviços que correm pela minha pasta, como sejam os serviços das obras públicas. Alguns funcionários já se acham presos e outros sê-lo hão se para tal existir razão. Posso garantir a V. Ex.a que, quando for oportuno, provarei à Câmara com documentos a verdade das minhas palavras, pois não venho para,aqui fazer insinuações. Assumo por completo a responsabilidade do que digo, conhecendo bem os deveres que me impõem a responsabilidade do lugar que ocupo. Repito, quando for oportuno mostrarei a V. Ex.a e à Câmara com documentos e números como o País tem estado a saque. Tenho dito. O orador não reviu. O Sr. Pedro Pita : — Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para a situação em que se encontra a Ilha da Madeira em virtude dos últimos temporais que caíram sobre aquela ilha e que produziram estragos de um valor muito importante, estragos muito maiores do que aquolos que caíram sobre os Açores.
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tia de 100 contos para de alguma maneira se reparar esses estragos. Os parlamentares pela Madeira procuraram o Sr. Ministro do Comércio de então, que era o Sr. Jorge Nunes, para lhe preguntar se havia necessidade de apresentarem um projecto de lei nas mesmas condições.
S. Ex.a asseyerou-me nessa ocasião que faria o que fosse necessário e de facto telegrafou para a Madeira preguntando aquilo que o Estado tinha necessidade imediata de fazer. Como de lá respondessem que era simplesmente necessária a quantia de três contos para a reparação, nenhum de nós, em virtude de1 ser tam diminuta essa importância, pensou em apresentar qualquer projecto do lei, e o Sr.. Jorge Nunes, então Ministro do Comércio, disse que seria satisfeita a legítima pretençao da Madeira.
Mas, Sr. Presidente, sucede o seguinte: a Madeira é cortada por ribeiras de espaços a espaços relativamente pequenos e sendo, como é, muito montanhosa, aproveitam-se terrenos para cultura até muito próximo do mar.
Ora essas ribeiras tomando grandes quantidades de água, o que acontece por ocasião daa chuvas, vão distrair as propriedades marginais.
Com os últimos temporais as ribeiras ficaram atulhadas com penedos e o resultado ó que a uma pequena chuvada as ribeiras já agora cheias de entulho transbordam com facilidade e produzem estragos mais importantes ainda que os que foram produzidos por esses grandes temporais.
De forma que era necessário, era conveniente, mandar desobstruir os leitos das ribeiras para que as águas possam correr livremente.
Sei que o orçamento do Ministério do Comércio neste ano não permite fazer-se essas obras, mas aproveitando a ocasião de se es.tar a discutir o orçamento dêsâe Ministério, desejava chamar a atenção de S. Ex.a o Sr. Ministro para este facto, a ver se era possível de qualquer maneira reforçar a verba de reparações com uma quantia que se pudesse destinar a esse fim para acudir à situação da Madeira. Estou convencido que com 'uma importância pequena, dez ou quinze contos, se remediariam as cousas de forma a evitar prejuízos futuros e produzirem-se desgra-
ças como agora se deram era que perigaram muitas vidas.
Chamo a atenção, de S. Ex.a para este facto pedindo-lhe a sua boa vontade para que se acuda à Madeira nesta situação.
Tenho dito.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Lúcio de Azevedo) : — Pedi a palavra para dizer ao Sr. Deputado Pedro Pita que a padeira me merece a maior simpatia.
Se é certo que no orçamento, não poderá inscrever-se uma verba destinada ao fim apontado por S. Ex.a, em todo o caso das verbas gerais alguma cousa se ppde-derá distrair para suavizar a situação da Madeira que é uma das terras que deve merecer as simpatias de todos o.s bons portugueses.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é na segimda-feira, 14, às 13 horas. A ordem do dia é a segiiinte :
Antes da ordem do dia:
A de hoje.
Parecer n.° 395, que autoriza o Governo a ceder definitivamente à Junta Geral do diâimo do Leiria o convento da Portela de Cima para a instalação de um asilo.
Ordem do dia: l.a parte.— A de hoje. 2.a parte.—A de hoje. Está encerrada a sessão. Eram 20 horas. '
Documentos enviados para a Mesa 'durante a sessão
Projecto de lei .
Do Sr. José de oliveira Ferreira Di-nis, autorizando os governos das colónias a criar e manter em Lisboa uma instituição scientífica e de propaganda, denominada Instituto Colonial.
Para o Diário do Governo.
Parecer
Da comissão de administração pública sobre o n." 468-H, que concede à Câmara Municipal» da Horta isenção de direitos pela importação de material para a canalização de águas.
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Requerimentos
Requeiro que pela Presidência da Câmara dos Srs. Deputados nie seja enviada cópia de todos os documentos que pertenciam aos serviços da comissão de Ra-vitaillement, e que actualmente estão em poder da comissão de inquérito ao extinto Ministério dos Abastecimentos.
Sala das Sessões, 11 de Junho de 1920.— O Deputado, Cunha Liai.
. Para a Secretaria. Expeça-se à comissão.
Requeiro que pela Presidência da Câmara dos Deputados me seja enviada, com a máxima urgência, cópia de toda a correspondência trocada entre a Companhia Industrial de Portugal e Colónias e a comissão de inquérito parlamentar ao extinto Ministério dos Abastecimentos, referente à liquidação e pagamento de juros de quantias devidas por aquela Companhia ao Estado.
Sala das Sessões, 11 de Junho de 1920.— O Deputado, Júlio Martins.
Para a Secretaria.
Expeça-se para a comissão.