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REPÚBLICA

PORTUGUESA

CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO lsT.°

EM 21 DE ABRIL DE 1921

Presidência do Ei.mo Sr. Abílio Correia da Silva Marcai

Secretários os Ex.moí Srs,

Baltasar de Almeida Teixeira António Marques das Neves

Sumário. — Abertura da sessão. Usa da palavra para interrogar a Mesa, o Sr. Orlando Marcai. Responde-lhe o Sr. Presidente. Leitura da acta e da correspondência.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Eduardo de Sousa manda para a Mesa um projecto de lei.

Usa da palavra, na discussão do parecer n.° 713, o Sr. Costa Júnior que fica com a palavra reservada.

O Sr. Orlando Marcai requere a urgência ea dispensa do Regimento que manda para a Mesa.

Aprovado êst° requerimento, usam da palavra os Srs. Jorge Nunes, Orlando Marcai, Lopes Cardoso (Ministro da Justiça} e Leio Portela.

Voltam a usar da palavra os Srs. Ministro da Justiça e Jorge Nunes, seguindo-se-lhe os Srs. Raul Tamagnini, que manda para a Mesa uma proposta de emenda que é admitida.

O Sr. Fernando Brederode (Ministro da Marinha) apresenta algumas propostas de lei.

Usam ainda da palavra sobre o projecto em discussão, os Srs. Cunha Leal e José de Almeida.

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis) manda para a Mesa um parecer.

Seguem-se no uso da palavra os 'Srs. Orlando Marcai, Matos Cid e Carlos Olavo que requere que o projecto baixe às respectivas comissões.

Usa da palavra, sobre, o modo de votar, o Sr. Orlando Marcai, propondo um aditamento ao requerimento do Sr. Carlos Olavo.

É aprovado o requerimento do Sr. Carlos Olavo e aprovado o aditamento.

E aprovada a acta.

São nomeados alguns Srs. Deputados para substituírem nas comissões os seus colegas no seu impedimento.

É autorizada a comissão de marinha a reunir durante a próxima sessão.

O Sr. Ministro das Finanças requere que entre na ordem do dia da sessão seguinte a sua proposta de lei sobre a Agência Financial.

Tem segunda leitura uma proposta do St. An tón>o Mantas. É admitida.

É nomeada uma comissão para representar a Câmara nas festas do centenário de Fernão de Magalhães..

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis) apresenta um projecto de lei, pedindo para ele a urgência e dispensa do heyimcnto, que lhe são concedidas.

Entrando em discussão ê aprovado, tendo o Sr. Ministro da Instrução declarado estar de acordo com o projecto, que é em seguida aprovado na especialidade, tendo sido eliminado o artigo 3." por proposta do autor do projecto.

Õ Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão às 15 horas. Presentes 93 Srs. Deputados.

Responderam à chamada os Srs.:

Abílio Correia da Silva Marcai.

Acácio António Camacho Lopes Cardoso.

Afonso de Macedo.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Alberto Álvaro Dias Pereira.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Eruesto de Sá Cardoso.

Álvaro Xavier de Castro.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

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Diário da Câmara dos Deputados

António Albino de Carvalho Mourao.

António Albino Marques de Azevedo.

António Augusto Tavares Ferreira.

António da Costa Godinho do Amaral.

António Francisco Pereira.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Joaquim Granjo.

António José Pereira.

António Maria da Silva.

António Pais Rovisco.

António de Paiva Gomes.

António Pires de Carvalho.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Augusto Dias da Silva.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Bartolomeu dos Mártires Sousa Seve-rino.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Custódio Maldonado Freitas.

Custódio Martins de Paiva.

Domingos Cruz.

Eduardo Alfredo de Sousa.

Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.

Francisco Alberto da Costa Cabral.

Francisco da Cruz.

Francisco da Cunha Rego Chaves.

Francisco José Fernandes Costa.

Francisco José Pereira.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Francisco de Sousa Dias.

Helder Armando dos Santos Ribeiro.

Hermano José de Medeiros.

Jacinto de Freitas.

Jaime de Andrade Vilares.

Jaime da Cunha Coelho.

Jofto Cardoso Moniz Bacelar.

João Gonçalves.

João José da Conceição Camoesas.

Jo&o Luís Ricardo.

João Maria Santiago Gouveia Lobo Prezado.

JoSo de Orneias da Silva;

JoSo Pereira Bastos.

João Xavier Camarate Campos.

Joaquim Aires Lopes do Carvalho.

Joaquim Brandão.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José António da Costa Júnior.

José Barbosa.

José Domingues dos Santos.

José Gomes de Sousa Varela.

José Gregório de Almeida.

José Maria de Campos Melo.

José Mendes Nunes Loureiro.

José de Oliveira Ferreira Dinis.

José Rodrigues Braga.

José do Vale de Matos Cid.

Jálio Augusto da Cruz.

Júlio Gomes dos Santos Júnior.

Júlio do Patrocínio Martins.

Ladislau Estêvão da Silva Batalha.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.

Manuel Alegre.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel José da Silva.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mariano Martins.

Nuno Simões.

Orlando Alberto Marcai.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Raul António Tamagnini de Miranda Barbosa.

Raul Leio Portela.

Rodrigo Pimenta Massapina.

Vasco Borges.

Ventura Malheiro Reimao.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Xavier da Silva.

Não compareceram à sessão os Srs.:

Afonso Augusto da Costa.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Ferreira Vidal.

Albino Vieira da Rocha,

Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa..

Álvaro Pereira Guedes.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Antão.Fernandes de Carvalho.

António Bastos Pereira.

António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.

António Carlos Ribeiro da Silva.

António da Costa Ferreira.

António Dias.

António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.

António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.

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Sessão de í l de Abril de 192 í

António Maria Pereira Júnior.

António Marques das Neves Mantas.

António dos Santos Graça.

Augusto Joaquim Alves dos Santos.

Augusto Pereira Nobre.

Augusto Rebelo Arruda.

Constâncio Arnaldo de Carvalho.

Diogo Pacheco de Amorim.

Domingos Leite Pereira.

Domingos Vítor Cordeiro Eosado.

Estêvão da Cunha Pimentel.

Francisco Coelho do Amaral Keis.

Francisco Cotrim da Silva Garcês.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Francisco José Martins Morgado.

Francisco Josó de Meneses Fernandes Costa.

Francisco Manuel Couceiro da Costa.

Henrique Ferreira de Oliveira Brás.

Henrique Vieira de Vasconcelos.

Inocêncio Joaquim Camacho Rodrigues.

Jaime Daniel Leote do Rego.

Jaime Júlio de Sousa.

João Estêvão Aguas.

João José Luís Damas.

João Ribeiro Gomes.

João Salema.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

José Garcia da Costa.

Josó Maria de Vilhena Barbosa Magalhães.

Josó Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Monteiro.

Júlio César do Andrade Freire.

Leonardo Josó Coimbra.

Liberato Damião Ribeiro Pinto.

Lino Pinto Gonçalves Marinha.

Luís de Orneias Nóbrega Quintal.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Josó Fernandes Costa.

Manuel José da Silva.

Maximiano Maria de Azevedo Faria.

Mem Tinoco Verdial.

Miguel Augusto Alves Ferreira.

Pedro Gois Pita.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Tomás de Sousa Rosa.

Vasco Guedes de Vasconcelos.

Vérgílio da Conceição Costa

Vitorino Henriques Godinho.

Pelas 15 horas com a presença de 30 Srs. Deputados declarou o Sr.. Presidente aberta a sessão.

O Sr. Orlando Marcai: — Peço a V. Ex.a que me informe se já se encontram sobre a Mesa as modificações à lei das indemnizações, proposta apresentada pelo Sr. Raul Tamagnini em 18 de Março de 1920.

O Sr. Presidente : —É melhor V. Ex.a vir à Mesa explicar o assunto.

O Orador: — Desejaria também que V. Ex.a me informasse se já se encontra sobre a Mesa a resposta ao pedido que fiz há três~ meses, para, pelo Ministério da Instrução, me serem enviados documentos sobre a forma como tem sido aplicada a comenda de S. Tiago da Espada, pois ó um assunto muito importante que eu aqui desejo tratar.

Mais uma vez protesto contra a burocracia, que não atende os pedidos feitos pelos Deputados da nação.

O orador não reviu.

Leu-se a acta e o seguinte

Expediente

Ofícios

Do Ministério das Finanças, pedindo para ser inscrita na proposta de alterações as verbas orçamentais de 1919-1920, a verba de 15 contos para ajuda do pagamento de um automóvel, comprado por 27 contos, para serviço daquele Ministério.

Para a comissão do orçamento.

Do governo civil de Castelo Branco, enviando uma representação da Câmara Municipal de Penamacor, pedindo para ser convertida em lei uma proposta apresentada pelo Sr. Pacheco de Amorim.

Para a Secretaria.

Da Associação dos Empregados no Comércio, convidando os Srs. Deputados a comparecerem a uma sessão comemorativa do seu 49.° aniversário.

Para a Secretaria.

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Diário da Câmara dos Deputados

hão-de constituir a comissão organizadora do congresso das colónias.

Comunique-se que é constituída pelos Sr s. Deputados abaixo indicados.

Mariano Martins.

Manuel Ferreira da Rocha.

Domingos Cruz.

Carta

Do Sr. António Mantas, participando estar doente.

Para a comissão de infracções e faltas.

Antes da ordem do dia

O Sr. Eduardo de Sousa:—Sr. Presidente : pedi a palavra para mandar para a Mesa um projecto de protecção à indústria nacional, isto ó, para uma empresa cinematográfica que já tem apresentado •filma importantíssimos como os Fidalgos da Casa Mourisca, e se propõe a apresentar assuntos da História Portuguesa.

No estrangeiro são as empresas como esta, protegidas e até subsidiadas pelo Estado.

Por isso, mando para a Mesa o meu •projecto de lei.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Continua em discussão o projecto n.° 713.

O Sr. Costa Júnior :—Prosseguindo nas considerações iniciadas em sessão anterior, o orador afirma que em 1859 não tinha a sciência farmacêutica atingido o progresso que actualmente tem.

Não se faziam as esterilizações, nem as análises das substâncias alimentícias ou medicamentos, visto a química estar ainda muito pouco desenvolvida.

A farmácia foi pouco a pouco organizando se, até que se fez a reforma do ensino farmacêutico em 1859.

Os chamados farmacêuticos de l.a classe não tinham curso superior.

Eram-lhes simplesmente exigidos os exames de instrução primária, o singular de francês e português e sete anos de prática numa farmácia, devidamente registada na respectiva Escola Médica, por onde os farmacêuticos faziam os exames.

Logo que concluíam a prática na farmácia, faziam o exame perante a Escola Médica, sondo-lhes passado o certificado de farmacêuticos.

Para os farmacêuticos havia ainda um curso superior.

Esses tinham o curso do licea e a cadeira de matéria médica e a de farmácia que se cursava durante dois anos na respectiva escola de medicina.

Depois de fazerem estes exames ficavam habilitados a exercer a profissão de farmacêutico.

Actualmente todo& os farmacêuticos do exército que são majores, tem este curso que exigia sete anos de prática, com o exame perante a Escola Médica.

Nenhum tem o curso superior de l.a classe.

Actualmente exigem-se aos farmacêuticos as seguintes habilitações : o curso complementar dos liceus e a cadeira da Faculdade do Sciências e outras cadeiras que se dividem por quatro anos,,

A aprovação no último exame depois de ter frequentado essa cadeira dá a esses farmacêuticos a faculdade de poderem exercer a farmácia em todo o país.

É este curso chamado Superior de Farmácia, sendo o único que existe no pais."

Portanto, exigem-se hoje habilitações especiais, que esses farmacêuticos não têm.

O orador pede licença para ler à Câmara as bases dum concurso para se ver que é uni concurso scientífico, em que se exige para os oficiais farmacêuticos verdadeira competência, porque, no estado actual da sciência, os oficiais farmacêuticos são obrigados a desempenhar, quer em campanha, quer em tempo de paz, serviços que até então estavam entregues a médicos, mas que em virtude dá sua especialidade, ficaram a cargo deles.

Entre esses serviços inclui-se, por exemplo, o de fazer análises dos terrenos onde devem acampar as tropatí, o que é muitíssimo importante para o estado sanitário delas, e o de fazer o exame bacteriológico das águas, o que ó :.gualmente muito importante, porque cada homem que se perde na guerra, por este motivo, é uma unidade que se não pode dispensar.

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. Sestão de 21 de Abril de 1921

estrangeiro, seria -o primeiro, se estivesse presente, a considerar este projecto como atentatório do bom nome e das normas adoptadas dentro da Kepública.

O orador lê em seguida à Câmara o programa de concurso mandado abrir pelo Sr. Pereira Bastos.

Estabelecia-se o princípio de que só se podia entrar por concurso para o quadro de farmacêuticos militares.

Interrupção do 87. Eduardo de Sousa.

O Orador:—Esses farmacêuticos já existiam no quadro. Eram simplesmente três. Interrupção do Sr. Eduardo de Sousa.

O Orador:—No quadro que foi feito em 1913 os farmacêuticos que tinham entrado para o quadro até essa data eram competentes para desempenhar o serviço que então lhes exigiam. Mas em 1913 exigiram-se maiores habilitações e mais responsabilidades no desempenho do seu cargo.

O Sr. Eduardo de Sousa: —

O Orador: — Esses farmacêuticos estão desempenhando serviço de ordom administrativa e de ordem técnica.

Tendo lido à Câmara alguns artigos do programa, vê-se— afirma o orador— que os farmacêuticos que querem ingressar no quadro respectivo do exército têm de prestar, em concurso, uma prova escrita que versa sobre os variados pontos.

Evidentemente que só poderá satisfazer a esta prova quem tenha conhecimentos profundos de química.

E absolutamente necessário que os farmacêuticos do exército saibam fazer o estudo das águas, pois, modernamente, como ainda agora quando se travou a Grande Guerra, são eles que nos campos de operações e de concentração fazem a análise das águas, serviço que antes da moderna organização dos serviços do exército era desempenhado pelos medir cos.

Foi por isso que, ao organizarem-se os serviços da Farmácia Central do Exército, se criou uma secção, que ó a l.a, que é dedicada exclusivamente a análises.

É fácil compreender a figura que fará quem, no desempenho das suas funções de farmacêutico do exército, não tenha os conhecimentos que é obrigado a ter.

Sujeita-se a ficar numa situação deprimente ante qualquer subordinado que tenha de dirigir. Jíi por isto que se passam casos como um que ele, orador, vai narrar à Câmara:

Certo funcionário, cujo nome não vem para o caso, achando-se a dirigir determinados serviços, foi abordado por um seu subordinado que havia feito uma análise, e que lhe disse:

— ^V. Ex.a, Sr. Director, pode interpretar esta análise porque eu não sei?

A resposta que esse director deu foi a seguinte:

i—Interprete-a o senhor como quiser.

Isto prova o inconveniente de, muitas vezes, quem dirige certos serviços não se encontrar revestido da competência que necessita ter para o desempenho das suas funções.

Trocccn sj apartes.

Interrupção do Sr. Francisco José Pereira que não foi ouvida.

O Orador:—Discordo da opinião de V. Ex.a Quem não conhece a marcha duma análise não a pode fazer.

Estabelecem-se diálogos.

O Sr. Presidente : —Peço a atenção da Câmara. Não posso consentir que a discussão prossiga em diálogos.

O Orador: — Seguindo na sua ordem de considerações, o orador lê alguns períodos do regulamento.

^0 Sr. Presidente:—Peço a V. Ex.a _que se cinja à discussão do projecto e não faça a discussão do regulamento a que se está referindo.

O Orador: — l$ão discute o regulamento. Tem, porém, do referir-se a ele, visto que, pelas suas disposições, ó que os farmacêuticos podem dar ingresso no quadro do exército.

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Diário da Câmara dos Deputados

ticos que, submetidos a um concurso, prestarem as provas exigidas na mesma lei.

Ainda ultimamente se legislou nesse sentido ao redigir-se o artigo 21.°

Ora esta lei ainda não foi aprovada há mês e meio, e já hoje se pretende modificá-la numa das suas disposições mais importantes. £ Pode a Câmara permitir um tal atropelo? O que ele, orador, sabe é que o projecto em questão não deve passar por todas as razões já apontadas e ainda porque, em seu entender, ele atenta contra as disposições da lei-travão, uma vez que, aumentando as despesas, não cria as receitas'respectivas. E, tanto assim é, que bastante estranheza lhe causou até o facto de ele ser aceit^ pela Mesa.

Não vai nisto qualquer censura à fornia como a Presidência tem dirigido os trabalhos parlamentares, mas apenas o desejo de que ela, estudando convenientemente o assunto e reflectindo sobre os fundamentos que o orador apresenta, possa, se ainda é tempo, fazer com que o projecto seja retirado da discussão, ou, pelo menos, submetido à sanção do Sr. Ministro das. Finanças como a referida lei--travão expressamente determina.

O orador prossegue na sua apreciação ao projecto, sob o ponto de vista scientí-fico e analisa o respectivo relatório.

Depois que se procedeu à remodelação dos serviços farmacêuticos os oficiais, que eram cinco, passaram a ser oito.

O orador lê uma nota do movime'nto dos doentes internados nos hospitais militares de Lisboa, nessa época, pela qual se vê que o movimento dos doentes, durante o ano de 1915, foi de 8:081. Por isto se verifica que os serviços farmacêuticos, estando o seu pessoal reduzido a seis farmacêuticos, e isto servirá de resposta ao Sr. Eduardo de Sousa, forçosamente tinham de se empregar apenas na confecção simples dos medicamentos, não podendo dedicar-se à confecção de drogas de origem, pois que não havia tempo para mais nada. Entretanto, existia o Depósito de Material Sanitário, dirigido por um oficial dos mais hábeis, o qual, por sua vez, era coadjuvado por dois farmacêuticos que honram a classe a que pertencem, e nesse Depósito já se iam fazendo certas substâncias de importância.

Mas foi exactamente em virtude de várias reclamações, não só da classe civil, como da classe militar, que o Sr. Persira Bastos, na Organização do Exército de 1911, aumentou o quadro dos farmacêuticos, e mais tarde o Sr. Norton de Matos criou a Farmácia Central do Exército. E aqui compete-lhe dizer que a iniciativa da criação dessa farmácia partiu da sua pessoa, em virtude dum projecto de lei que ele, orador, apresentou à Câmara e que mereceu a aceitação de todos os lados da Câmara, mas que não conseguiu ver aprovado em virtude de certas circunstâncias. O Sr. Norton de Matos, porém, valendo-se das autorizações que tinha para legislar para a guerra, decretou a criação dessa farmácia. S. Ex.a pôs à frente dela um oficial do quadro permanente, mas veio a mobilização e, tendo de partir para a guerra os oficiais do quadro permanente, tiveram de ser chamados os farmacêuticos civis para servirem como oficiais milicianos. Foram chamadcs doze...

O Sr. Rodrigues Braga;—V. Ex.a dá--me licença?

Uma das razões principais porque foram reorganizados os serviços farmacêuticos do exército, foi exactamente em vir-tudo das reclamações dos médicos militares, a cuja classe me honro de pertencer. Havia disparates enormes no regulamento de saúde, e um deles, que acontecia várias vezes na província, era o que determinava que, quando não houvesse farmacêutico para confeccionar os remédios, o médico mais novo da divisão é que seria obrigado a fazê-lo, o que ora irrisório.

Quanto ao facto de haver nossa época muitos doentes hospitalizados, V. Ex.a não se deve impressionar com isso, pois que> ganhando os farmacêutico» militares $10 por cada doente que existia nesaas condições, nós, os médicos, de qualquer forma demorávamos os doentes nos hospitais para, de qualquer maneira, protegermos os farmacêuticos que t.nham uns vencimentos muito modestos.

O Orador: — Devo dizer francamente que tinha conhecimento dos dados apresentados pelo Sr. Rodrigues Braga, não se tendo referido a eles por um lapso.

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Sessão de 21 de Abril de 1921

sendo dirigidos por um médico, que aliás é muito distinto, o Sr. Dr. Miranda, o qual tem a seu cargo os serviços médicos o bem assim os serviços farmacêuticos.

Foi em virtude disto que apareceram reclamações, as quais são de todo o ponto justificadas, por isso que os doentes têm de se conservar muito mais tempo nos hospitais, o que representa uma maior despesa para o Estado.

O Sr. Presidente: — Previno V. Ex.a de que são horas de se passar à primeira parte da ordem do dia.

O Orador: — Nesse caso, o orador pede a S. Ex.a o obséquio do lhe reservar a palavra p ara. a sessão de amanhã.

O discurso será publicado na integra quando forem devolvidas, revistas pelo orador, as notas taquigráficas.

O Sr. Presidente: —"Vai ler-se na Mesa um projecto do Sr. Orlando Marcai, e para o qual foi pedida a urgência e a dispensa do Regimento.

Leu-se na Mesa. É o seguinte :

Projecto de lei

Artigo 1.° São abrangidos pelas disposições da lei n.° 1:144, de 9 de Abril de 1921, todos os que envolvidos indevidamente em processos de delitos comuns se conheça que os actos praticados que deram origem à sua organização são de carácter político.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões, 14 de Abril de 1921.— Orlando Marcai.

O Sr. • Presidente : — Os Srs. Deputados que aprovam a urgência e dispensa do Regimento para a projecto que acaba de ser lido na Mesa, queiram levantar-se.

Está aprovada.

O Sr. Presidente:—Está em discussão.

O Sr. Jorge Nunes: — Sr. Presidente: pela simples leitura que fiz do projecto enviado para a Mesa pelo Sr. Orlando Marcai, confesso que não sei qual seja o seu ponto de justiça.

Parece me, porém, que nós respeitando a Constituição da República, não pode-

mos de forma alguma legislar em sentido contrário ao que foi resolvido.

Assim, Sr. Presidente, eu achava conveniente que -se suspendesse a sua discussão até chegar o Sr. Ministro da Justiça, a fim de nós podermos ouvir a opinião de S. Ex.a sobre o assunto.

Sr. Presidente: eu declaro muito francamente à Câmara que não posso de maneira alguma estar de acordo com a doutrina do projecto.

Desde que esta doutrina foi rejeitada, e muito bem, eu pregunto se porventura nós nos podemos pronunciar em todo ou em parte sobre a doutrina contida nesse artigo já rejeitado.

Sr. Presidente: é este um assunto importante e tanto mais importante quanto é certo que a doutrina nele contida é contrária ao sentimento da Câmara.

Isto. Sr. Presidente, a meu ver representa um atentado contra a Constituição, não podendo eu neste momento dizer a V. Ex.a quais os pontos a que este projecto visa.

Se ele por um lado pode ter um ponto justo, por outro lado tem uma doutrina que de maneira alguma pode merecer a nossa aprovação.

É indispensável que o Sr. Orlando Marcai nos explique em que consiste o seu projecto de lei.

E preciso que quem no Poder Executivo tem de olhar pelo cumprimento das leis nos diga a nós se convém à moral do Estado e'da sociedade, e ao respeito à lei fundamental, semelhante projecto de lei.

O discurso será publicado na integra quando forem devolvidas, revistas pelo orador, as notas taquigráficas.

O Sr. Orlando Marcai: — Sr. Presidente : desde logo pressenti, dada a apresentação do meu projecto de lei, para o qual pedi urgência e dispensa do Regimento, que o Sr. Jorge Nunes havia de ser a sentinela vigilante e a guarda avançada da oposição rude que vai sofrer.

Já que assim é, cumpram-se os fados que ainda hoje imperam nos destinos da humanidade, e deixem-me declarar, na máxima expressão de sinceridade, que gosto e prezo as atitudes definidas.

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Diário da Câmara dos Deputados

da liberdade e do direito, reconheci sempre aos outros o que para mim próprio reclamo, discutindo as suas propostas com lealdade e elevação, apreciando os seus argumentos à face da inteligência, ainda que não decline o direito que me assiste, e que é próprio dos homens de honra, de num à vontade franco falar com rasgada afoiteza a linguagem serena e firme da verdade.

O meu projecto de lei teve o condão de arrancar do mutismo, a que há tempos se obstinou o Sr. Jorge Nunes, e confesso que me deu um cálido prazer essa sua manifesta prova de atenção para um trabalho de tam apoucada valia, proporcionando-nos igualmente o agrado de o vermos de novo nas pugnas parlamentares em que é emérito, sendo caso para regozijo.

Mas, por entre as suas frases embala-doras, uma palavra se destacou dcstoante, de molde a ferir-nos o tímpano, tam pouco acostumados estamos a ouvi-las da sua boca.

S. Ex.a falou eni indignação, certamente, para fulminar o meu modesto projecto, quando ó certo que durante a discussão do da amnistia aos criminosos monárquicos, que pretenderam apunhalar a Kepú-blica por um ignóbil acto de traição, tan tas expressões amáveis, de cálida e carinhosa defesa lhe ouvi, referentes ao diploma que respeitava somente a inimigos confessos e irredutíveis dum ideal que diz preconizar!

A bondade excelsa de então, a fidalguia da magnanimidade então espargida prodigamente, foi substituída por uma crueza de ataque, neste momento, acerca dum projecto que visa somente a fazer justiça a republicanos sacrificados por suas ideas, de modo que me avantajo em dizer que o Sr. Jorge Nunes não leu atentamente o meu po.bre trabalho, nem atendeu às minhas explicações.

Vou então eu fazer a sua leitura, para que se não deturpem intenções puras:

«Artigo 1.° São abrangidos pelas disposições da lei n.° 1:144, de 9 de Abril de 1921, todos os que, envolvidos indevidamente em processos de delito comum, se reconheça que os actos praticados que deram origem à sua organização são de carácter político».

Nada mais simples, mais c..aro, mai» intuitivo.

Criaturas que nos tempos agitados do dezerubrismo, e outros congéneres por que temos passado, infelizmente, foram determinados à prática de actos que indevidamente se classificaram de crimes comuns, quando se reconheça que a sua origem advém dos antagonismos políticos existentes e que os geraram, são abrangidos pela letra do meu diploma (.apoiados).

O Sr. Jorge Nunes protestou, com toda a sua energia, contra a doutrina nele expressa, esquecendo-se de que não é tam afrontosa como a que defendau para os criminosos monárquicos que os tribunais têm posto em liberdade, apesar de se reconhecer que praticaram os assassinatos mais hediondos, os roubos mais audaciosos, os assaltos mais descaroá.veis e ousados, as investidas mais ferinas, contra a liberdade de opinião, as agressões mais violentas e revoltantes, por Instinto de malvadez ou mercenàriamente, e, por consequência, sem se poderem considerar como políticos. (Apoiados}.

De maneira que o meu desfjo é, como democrata e como homem de leis, que' este projecto em discussão vise a fazer terminar, duma vez para sempre, a desigualdade existente entre os £.ctos criminosos praticados contra a Pátria e contra o regime, que tam generosamente foram perdoados, e aqueles estruturalmente políticos que ainda hoje se encontram ein confusão perniciosa para os que se sacrificaram intemeratamente pela República. (Apoiados],

Sendo assim, como é, não repugnou ao meu espírito equitativo e justo, bem como estou certo de que encontrará acolhimento em todos os que nesta Câmara têm assento e que saibam apreciar es actos valorosos daqueles que, desprezando a própria vida, se bateram pelo ideal que propugnamos, para que ele se destine a libertar os que mereceram a nossa simpatia e solidariedade.

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À indignação do meu contraditor oponho a minha decidida tenacidade para demonstrar a S. Ex.a e à Câmara que não é lícito desprezarem-se ingratamente os que souberam comportar-se briosamente, com riscos espantosos, através um período de tirania e de vileza, quan-de tantas blandícias se prodigalizaram aos que não desarmam em derrubar a instituição política que, com tanta dificuldade, implantámos. (Apoiados}.

Todavia, para terminar, concordo plenamente coin o Sr. Jorgef Nunes, na parte em que deseja que o Sr. Ministro da Justiça, como representante do Poder Executivo, seja ouvido acerca do assunto om discussão. Igualmente me empenho de apreciar a opinião do Governo, contando desde já em que se exprima com clareza o acerto.

E por agora, Sr. Presidente, tenho dito.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Lopes Cardoso): — Sr. Presidente; o projecto da autoria do Sr. Orlando Marcai é um projecto referente à amnistia de crimes políticos, que foi discutida e. votada nesta Câmara.

Nessa ocasião o digno Presidente do Ministério fez declarações que julgou dever fazer, e eu não tenho autoridade para, em nome do G-ovêrno, alterar as considerações produzidas por S. Ex.a

S. Ex.a disse, e muito bem, e assim foi aprovado pelo Congresso, que o Governo entendia que,' a questão da amnistia era uma questão do Congresso da República. Aceitaria completamente as deliberações do Congresso.

Pelo respeito à lei, entendo não "dever fazer-se ressurgir a questão.

A Câmara sabe muito bem que a amnistia é uma lei votada, e, assim, não pode ser modificada por outra lei.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Leio Portela:—Está em discussão um projecto de lei que, a meu ver, nem sequer devia ter sido admitido por esta Câmara. (Não apoiados).

Um projecto de igual teor foi apresentado em emenda ao projecto então discutido sobre a amnistia, e no qual eram abrangidos os crimes da mesma natureza.

Ponho esta questão prévia: o projecto encerra matéria que já foi aprovada nesta Câmara, nesta sessão legislativa, e, nestas condições, entendo que não pode ser discutida novamente.

Temos de respeitar os termos da Constituição da República, artigo 3õ.°

Não só diga que eu não tenho sustentado esta doutrina.

A minha atitude tem sido sempre a mesma.

O projecto é inconstitucional.

O que o artigo 35.° da Constituição quere dizer é que, quando a matéria que se discute em projecto de lei, seja definitivamente rejeitada, essa mesma matéria não pode ser posta de novo à votação, seja sob que forma for.

Sr. Presidente : ouvindo as considerações do Sr. Ministro da Justiça, parece--me que elas não têm inteiro cabimento no projecto que ora se discute.

As declarações íeitas pelo Sr. Presidente do Ministério referiam-se ao projecto da amnistia; mas aqui trata-se de discutir os crimes classificados de delito comum.

Não se trata do amnistiar crimes políticos, e por isso não compreendo as razões, nem os motivos nem os argumentos aduzidos pelo autor do projecto do lei, quando diz: «Todos os envolvidos indevidamente em processos de delito comum».

Não chego a compreender nem a atingir o que S. Ex.a qnere dizer com esta palavra.

Crimes de delito comum são todos • aqueles que estão sob a alçada do Código Penal.

Não me consta que exista na nossa legislação qualquer disposição legal que estabeleça diferença entre crimes políticos e crimes comuns, e tanto é assim que quando se quer votar um projecto de lei de amnistia a crimes políticos, esses projectos têm sempre o cuidado de determinar quais são esses crimes.

Se amanhã este projecto de lei fosse aprovado,

O juiz tem de julgar à face do Código Penal.

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gê consideram de delitos comuns. <_:E que='que' de='de' ser='ser' razões='razões' referidos='referidos' os='os' comuns='comuns' crimes='crimes' classificar='classificar' p='p' podem='podem' para='para' levadas='levadas' delitos='delitos' até='até' _='_' ele='ele'>

óQual era a classificação em que o juiz se podia estribar para julgar indivíduos que por tais crimes tinham de ser julgados?

Por mais esforços que faça à minha inteligência e recorra à minha já larga prática do foro, não posso compreender a situação em que ficam esses magistrados, no caso de ser aprovado ôste projecto de lei.

Não chego a compreender como amanhã um juiz pode, em sua consciência, determinar quais os requisitos para classificar quais os crimes políticos e os delitos comuns.

Assim, Sr: Presidente, aprovar este projecto, será lançar o caos. a confusão e o arbítrio ; porque amanhã todos se achariam no direito de dizer perante os juizes que o crime que tinham comotido tinha uma natureza política, e podiam fazer essa afirmação, visto q-ue não há nada na nossa legislação que determine quais são os requisitos que deferenciam os crimes políticos dos delitos comuns.

Terminando, como havia começado, devo declarar que este projecto nem sequer pode ser discutido pela sua inconstitucio-:aalidade, visto que igual matéria foi rejeitada nesta Câmara, quando se discutiu o projecto da amnistia.

Tenho dito.

O discurso será publicado na íntegra, revistas pelo orador quando o orador restituir, revistas, as notas taquigráficas.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Lopes Cardoso):—Sr. Presidente: não tenho motivos para alterar as declarações que fiz, porque as considerações apresentadas pelo Sr. Leio Portela, não podem colher.

Disse S. Ex.a que no outro dia o Sr. Presidente do Ministério tinha feito declarações que agora repeti, porque se referiam a crimes políticos e hoje do que se trata é de crimes que não são políticos.

Isso não é inteiramente exacto.

A amnistia não foi dada só a crimes de natureza política, mas a crimes de imprensa, de carácter religioso e até comuns.

Nessa ocasião, o Sr. Presidente do Ministério não teve uma palavra a acrescentar ao projecto nem às emendas apresentadas, porque entendeu que sendo o projecto da iniciativa da Câmara, a própria Câmara, depois das declarações que S. Ex.a fez de que ele não seria prejudicial à República, a votaria conforme entendesse, visto que S. Ex.a havia dito que tinha os elementos .necessários para defender a República.

V. Ex.as sabem que a Junta Revolucionária do 14 de Maio, entendeu que determinados indivíduos deviam ser amnistiados, pois tinham prestado altos serviços a República e eram vítimas do despotismo.

O Sr. Sá Cardoso:—V. Ex.a diz muito bem; a Junta Revolucionária, assim o interpretou.

Uma voz:—E V. Ex.a fez parte dessa Junta. (Apoiados).

O Orador:—Ainda bem quo V. Ex.a aplaude as minhas palavras, e aplaude com tanto calor.

Eu confio nos tribunais do meu país, pois eles sabem bem interpretar as leis que vão desta casa.

O projecto do Sr. Orlando Marcai não tenho dúvida de que ó um projecto dum republicano.

S. Ex.a como parlamentar tem o direito de o apresentar.

Faço-lhe a mais completa justiça.

Não direi se deve ou não ser aprovado.

Não devo dizer mais nem menos do que disse o Sr. Presidente do Ministério.

Nem mais uma palavra direi, não por menos consideração pela Câmara ou pelo Sr. Leio Portela, mas por solidariedade para com o Sr. Presidente do Ministério.

O discurso será publicado na integra^ revisto pelo orador, quando o orador haja devolvido, revistas, as notas taquigráficas.

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máximo desprazer, porque eu não pre-guntei ao Governo, nem- precisava pre-guntar, se julgava oportuno ou não o alargar-se a amnistia.

Não lhe pedi a opinião, nem preciso dela.

0 que eu pregunto, é se o Sr. Ministro da Justiça encontra possibilidade em aplicar este projecto, sem contrariar as disposições da lei da amnistia.

Desejo uma resposta clara e terminante.

E necessário que o Sr. Ministro da Justiça se pronuncie sobre se acha moral a aprovação deste projecto de lei.

1 Isto é que é para mim fundamental!

Se João Brandão fosse vivo, neste momento estaria já a gozar às delícias deste projecto de lei.

i Não é novo na história, porque isso tem sucedido em. toda a pirte, que criminosos comuns se mascarem de políticos, para exercer as suas represálias!

Sussurro.

O Sr. Presidente: —Peço ordem!

O Orador: — jEu falo bem alto para que me ouçam, e não me incomodam nada as conversas que em voz alta os diversos grupos da Câmara entretenham!

Eu não tenho dúvidas sobre o destino deste projecto.

Tenho quási a certeza de que a Câmara, chamada a pronunciar-se, rejeitá-lo há e será rejeitado não pela política de qualquer de nós, mas pela moral de nós todos.

Quem deve esclarecer se os presos foram ou não indevidamente processados são os tribunais. •

A reprovação ó justa e será feita, pois nãa se podem estabelecer quais sejam os crimes comuns neste caso.

Por muito tumultuosa que a nossa legislação, até hoje dela alguma cousa se pode concluir tendo-a compulsado.

Tumultuosa ó certo que é; mas não desonesta, como se pode ver dos documentos legislativos que daqui saem.

Má foi a intervenção do Sr. Ministro da Justiça, e melhor seria que influísse para que não fosse aprovado um projecto desta ordem. °

S. Ex.a com a sua intervenção foi infeliz e inoportuno.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Lopes Cardoso) (interrompendo): — E necessário dar às palavras a -significação que elas têm.

Eu como Ministro da Justiça não digo* mais unia palavra além do que foi dito pelo Sr. Presidente do Ministério. E não. procedo assim por menos consideração para com V. Ex.a

Eu hei-do votar o projecto em discussão conforme entender e conforme as bases quo se me ofereçam para orientar a minha opinião.

O Orador: — O que é certo é que o Sr. Presidente do Ministério de uma forma anódina, entendeu que assim se devia pronunciar sobre a amnistia e o Sr. Ministro da Justiça quis referir-se às palavras do Sr. Presidente do Ministério quando afinal S. Ex.a não deu opinião alguma.

O Sr. Ministro da Justiça foi inoportuno na sua frase.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Lopes Cardoso) (interrompendo}: — Não fui infeliz e inoportuno na minha intervenção.

O projecto da amnistia íoi discutido nesta Câmara e nele foram incluídos os crimes políticos, de imprensa, crimes religiosos e até de carácter comum.

O Orador : — O Sr. Ministro da Justiça deve dar a sua opinião sobre a amnistia sobre este projecto. S. Ex.a é um membro do Poder Legislativo e é também magistrado; e certamente não seria de bom grado que a magistratura não respeitasse uma lei votada por esta Câmara. Mas S. Ex.a não respondeu à minha pre-gunta.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Lopes Cardoso): — O Poder Executivo tem o maior desejo de fazer cumprir a lei de amnistia há pouco votada por este Parlamento, tal como ela foi votada. Se, porém, for aprovado o projecto do Sr. Orlando Marcai e transformado em lei, o Governo fá-lo há igualmente cumprir, visto que os tribunais têm forma de o poder executar, como, de resto, tem sempre que as leis sejam claras.

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Justiça ato que S. Ex.a me responda claramente.

Eu não preguntei ao Governo se ele entendia ou não que a magistratura tinha os elementos necessários para cumprir a lei.

Não façamos confusões ; eu não preguntei nada disso, porque sei que uma vez este projecto transformado em lei será facilmente executado. O que eu preguntei foi se à consciência do Sr. Ministro da Justiça, como homem de leis e como Ministro, não repugna aceitar unia doutrina já rejeitada por esta Câmara quando da discussão e votação do projecto de amnistia.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Lopes Cardoso): — V. Ex.a tem, realmente, o direito do fazer essa pregunta, mas à Câmara e não a mim como Ministro, tanto mais que eu nem sequer conheço a disposição que a Câmara rejeitou e a que V. Ex.a se referiu.

O Orador: —O Sr. Ministro da Justiça que assistiu à votação da lei de amnistia, sabe, tam bem como eu, que essa disposição foi rejeitada. Desde que assim é, eu não compreendo as suas explicações vagas e imprecisas.

Eu sei, é certo, que S. Ex.a em sua consciência, me está a dar razão c a reconhecer que efectivamente a doutrina do projecto do Sr. Orlando Marcai é a mesma que se continha no artigo novo do Sr. Gomes dos Santos; mas a verdade é que S. Ex.a mostrando ignorá-la procura furtar-se a uma resposta concreta.

Eu sei, que se votarmos este projecto, o mundo continuará a girar da mesma maneira e que a divisa cambial nada sofrerá; mas sei, também, que a moral republicana sairá profundamente ferida.

E esta a minha maneira de ver e de pensar; e assim, Sr. Presidente, eu desafio todos os homens de Direito que têm assento nesta casa do Parlamento, a que contestem esta minha opinião, se puderem.

Este projecto, Sr. Presidente, conforme -já tive ocasião de dizer à Câmara, tem qualquer significado, se bem que ele não consigne nomes.

Desta forma, Sr. Presidente, não será de admirar que amanhã não haja criminosos no nosso país, por isso que eles à

sombra deste projecto, poderão invocar unia razão qualquer para serem absolvidos pelos crimes que praticaram.

Eu, Sr. Presidente, devo declarar em abono da verdade que votei a amnistia; mas não para os delitos de natureza política contra pessoas ou propriedades.

Assim, Sr. Presidente, todos os artigos que se referiam mais ou meiios a este ponto de vista não mereceram a minha aprovação, por isso quo entendo que o que hoje poderá representar um crime, amanhã poderá representar uir. acto heróico, por isso que um vencedor é "sempre um herói.

Eu, Sr. Presidente, votei aqui a amnistia plenamente convencido de que prestava assim um serviço à República; pois não a votei para que os monárquicos mo agradecessem.

Votei-a por isso que entendi que havia uma razão forte para isso, e, mais ainda, porque entendi que assim defenderia os altos interesses da República.

Para mim foi-me indiferente que ele aproveitasse a uma dúzia ou duas dúzias de pessoas.

Para mim o que importava ó que ela representasse um alto serviço prestado à República e à Nação.

Nestas condições, Sr. Presidente, eu votando a amnistia, como a votei, cumpri evidentemente o meu dever.

Ir amnistiar crimes comuns ...

O Sr. Orlando Marcai:—Mas isso não está lá!

O Orador: — Não está; porérc estão os interessados tam seguros da injustiça da sua pronúncia, que em vez de recorrerem para os tribunais, as únicas instâncias que podem e devem ser ouvidas, recorrem para o Parlamento.

Sr. Presidente : em aparte o Sr. Orlando Marcai foi me dizendo que eu tinha votado a amnistia para os monárquicos somente.

Pois, fique S. Ex.a sabendo que a votei para monárquicos e para republicanos! Invoco o testemunho do Sr. Dias da Silva para que ele diga quem redigiu o artigo que foi mandado para a Mesa por S. Ex.a abrangendo com a amnistia os criminosos por delitos sociais.

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tão na rua a mim o devem. Não digo isto para que mo agradeçam, mas se faço esta declaração, que desejava ocultar, é para demonstrar que não redigi nenhum artigo de amnistia que não fosse este.

Fique, pois, bem assente que eu não recebo lições de ninguém sob o ponto de vista dás minhas convicções, porque as tenho honrado sempre e em todos os campos, na medida das minhas posses e sem a todo o momento reclamar quaisquer acções que tenha exercido para alcançar votos, manifestações, aplausos ou criar ca-pelinhas.

Eepresento na República uru papel bem modesto, e como sei e como posso; mas tenho a coragem das minhas convicções, não pertenço ao número daqueles que, vexados, defendem uma doutrina em conversa, e quando se trata de em público fazer afirmações, porque isso pode importar à sua cadeira de Deputados, têm ideas opostas às referidas nessas conversas.

Mas não divaguemos, isto veio apenas a propósito do despropósito dum aparte.

Eu não quero, convença-se V. Ex.a, saber a opinião do Governo a respeito da oportunidade de alargar o projecto da amnistia.

Está presente o Sr. Presidente do Ministério e eu se quisesse neste momento podia dirigir-me a S. Ex.a, colocando-o entre dois ferros, a exigir-lhe uma resposta categórica; mas S. Ex.a, que já está um pouco em sobressalto; fitando-me, pode estar absolutamente tranquilo que ainda desta vez não terá de dar satisfações, porque não sou eu quem lhas peço.

Apenas me dirigi ao Sr. Ministro da Justiça, no propósito louvável e honesto dfe me esclarecer.

Se eu, porventura, pedisse aos Srs. Deputados que me esclarecessem sobre a latitude dp projecto em discussão, possivelmente iria encontrar opiniões contra e a favor.

Mas eu, dirigindo-me ao Sr. Ministro da Justiça, queria apenas louvar-me no critério de S. Ex.a

S. Ex.a que como parlamentar tem uma opinião, vê-se em papos de aranha para conciliar a sua opinião pessoal com a atitude ministerial que resolveu adoptar.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Lopes Cardoso (interrompendo):—Eu

tenho apenas uma opinião. O que não chegou foi o momento preciso para como parlamentar a definir.

O Orador: — Sr. Presidente : água mole em pedra dura, tanto dá até que fura. O Sr. Ministro da Justiça que começou por declarar à Câmara que, guardaria a sua opinião sobre o projecto, porque tal era o seu papel de Ministro, quando respondeu ao Sr. Leio Portela já avançou alguma cousa, já foi quási que justificando a sua discordância, com qualquer artigo na lei da amnistia, abrangendo os delitos de natureza comum. • .

Mas, agora, Sr. Presidente, numa frase muita curta, S. Ex.a denunciou quási a resolução que ia tomar.

É que, se ele como Ministro da Justiça quere guardar grande silêncio sobre o projecto, como Deputado da Nação condena-o.

A sua frase denunciou o seu pensamento. Eu vejo, Sr. Presidente que ali naquelas cadeiras, por mais que se precure fugir a uma resposta, até calado, sem nada dizer, se responde. É o caso do Sr. Ministro da Justiça.

Sr. Presidente: eu não estou aqui afazer obstrucionismo; estou apenas procurando esclarecer-me e esclarecer a Câmara.

Depois desta última interrupção que eu muito gostosamente consenti ao Sr. Ministro da Justiça, já não tenho dúvida absolutamente nenhuma de que, ele é contrário à doutrina deste projecto. Ele como membro do Poder Executivo, escravo da lei, porá em execução esse artigo, se ele se transformasse em lei, mas como parlamentar não o votará, porque lhe repugna a sua consciência de republicano.

Ele repugna à sua consciência de republicano. E desde que assim é, neste momento tenho já o parecer, não das comissões respectivas, que não foi solicitado, mas do Sr. Ministro, portador da vara da justiça que neste momento me deu razão acerca da minha opinião a respeito do projecto.

O discurso será publicado na integra, quando o orador haja restituído tas notas taquigrâficas.

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tia. Todavia de algum modo mandando para a Mesa uma declaração de voto, tive ocasião de exprimir a minha maneira de pensar sobre o assunto.

Não é demais repeti-lo agora aqui, visto cjue em poucas palavras se traduz.

É que eu não votaria a amnistia por achá-la inoportuna, emquanto não estivessem julgados todos os processos instaurados nos termos da lei n.° 968, e pagas todas as indemnizações.

Só quem não estava no norte nossa ocasião é que poderia julgar oportuno esse acto de clemência.

E não se venha invocar falsamente sentimentos de piedade e clemência para conseguir tal fim.

Piedade e clemência todos nós albergamos nos nossos corações, mas é necessário aguardar com serenidade o momento de as exteriorizar.

Houve criaturas que mandaram assaltar casas, que praticaram violências e barbaridades indescritíveis, violentando lares, assassinando a frio.

Amnistiá-los sem restrições acho demasiada transigência. E digo amnistiá-los porque embora pela lei n.° 1:144, fiquem presos os autores de crimes comuns, os principais virão agora passar ao pó das suas vítimas rindo-se escarninhamente. O principal criminoso não ó o que executa, é o que ordena.

Todavia o Sr. Orlando Marcai, pretende, e muito justamente após o facto consumado da amnistia, ampliar esse acto de clemência, abrangendo republicanos que praticaram crimes, que indevidamente foram classificados de comuns, mas que incontestavelmente são crimes de natureza política.

Disse aqui o ilustre Deputado que me antecedeu no uso da palavra, Sr. Leio Portela, que seria difícil destinguir entre crimes políticos e comuns.

Não me parece que assim seja, porque pelo conhecimento que têm os magistrados da classificação dos delitos, é para eles bem fácil essa apreciação.

Isso me dá garantia suficiente para os classificar; mas se assim não fosse lá estava aindo a opinião pública, que não hesita em apontar os que como tais devem ser classificados definitivamente.

O que se não pode confundir são os crimes de natureza política, de que quere

tratar o Sr. Orlando Marcai, com as praticadas no norte do país no período decorrido de 19 de Janeiro a 13 de Fevereiro de 1919, embora essa classificação errada os dê como políticos.

Há incontestavelmente uma diferença fundamental entre o crime praticado por exemplo, por um homem que, levado pelo impulso da sua paixão política, dá um tiro ou uma paulada num adversário ou noutro que julga prejudicial à sociedade, e os crimes praticados pela traulitânia no norte.

Ali cometeram-se actos de verdadeira e caracterizada inquisição.

São perfeitamente conhecidos porque se revestem do maior barbarismo, impróprio duma sociedade culta. (Apoiados}.

Há necessidade de fazer essa distinção de crimes, mas essa distinção é, como se vê, bem fácil.

Receia o Sr. Jorge Nunes, segundo depreendi das suas palavras e eu o receio também que, pelo projecto do Sr. Orlando Marcai, os trauliteiros venham para a rua.

Eu irei, portanto, ao encontro dos desejos de S. Ex.a, apresentando uma modificação, um parágrafo a aditar ao artigo 1.°, acautelando esse caso, de forma a que os criminosos que praticaram tais delitos à sombra da bandeira monárquica não sejam incluídos na amnistia, por princípio nenhum.

E assim eu mostro a minha coerência, pois quando apresentei nesta Câmara o projecto inicial da lei das indemnizações eu tive em vista castigar os crimes cometidos durante a monarquia restaurada para que outras aventuras dess;a ordem se não repitam, no intuito de obstarmos a que a sociedade portuguesa continue a andar sempre conturbada pelos mesmos indivíduos que nos não deixam trabalhar e progredir.

Desta maneira, creio que o parágrafo que vou ter a honra de enviar para a Mesa remediará esse mal, fazeado com que não fiquem abrangidos nas disposições da lei que se discute, criminosos dessa espécie.

Foi admitida a proposta de aditamento.

É a seguinte:

Proposta de aditamento

Artigo 1.°:

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posições desta lei os crimes praticados no norte do País desde 19 de Janeiro de 1919 até 13 de Fevereiro do mesmo ano, na zona onde flutuou a bandeira monárquica,

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 21 de Abril de 1921.—Os Deputados, Raul Tamagnini—Luís Tavares de Carvalho.

O Sr. Ministro da Marinha (Fernando Brederode):—Sr. Presidente: tenho a honra de mandar para a Mesa as seguintes propostas :

Fixando o quadro do pessoal da secretaria da Comissão Permanente Liquidatária de ResponsabiJidades;

Passando para Repartição de Faróis do Ministério da Marinha, a construção dos edifícios destinados a faróis, reparações dos mesmos e aquisições de aparelhos ópticos e sinais sonoros dos distritos do Funchal, Ponta Delgada e Angra do Heroísmo;

Abonando uma pensão mensal e vita-licici. de 100$ ao antigo cabo de mar da Nazaré, Joaquim Bernardo de Sousa Lobo;

Determinando que a Direção dos Serviços Marítimos que pelo decreto n.° 7:201 ficou sob as ordens dal.aDirecção Geral de Marinha, r>asse a fazer parte da 3.a Direcção Geral;

Elevando a 100$ mensais a pensão concedida ao arrais Gabriel Anca;

Dando aos actuais serventuários da 4-a Direção Geral de Marinha a denominação de contínuos.

foram para o ^Diário do Governo».

O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente : o projecto apresentado pelo Deputado e meu querido correligionário Sr. Orlando Marcai, não é senão da sua exclusiva responsabilidade.

YJ uma questão aberta para o meu partido. Eu mesmo não tenho ainda opinião formada a este respeito e não sei por eni-quanto como votarei. Espero os esclarecimentos dos Srs. jurisconsultos que têm assento nesta Câmara e que certamente irão —assim o espero— elucidar o meu espírito.

Não posso, porém, deixar de estranhar certos factos ocorridos durante esta sessão.

Quando se trata de defender monárquicos tudo são facilidades; quando queremos ser clementes para com os republicanos, tudo são dificuldades.

Ouvimos o Sr. Leio Portela invocar a inconstitucionalidade da discussão que estamos a fazer. Ouvimos dizer o Sr. Leio Portelo, muito indignado, que havendo no fundo deste projecto um princípio análogo a um determinado artigo do projecto da amnistia que foi rejeitado por esta Câmara, não pode o documento que estamos debatendo ser discutido.

Pois muito bem.

O Sr. Leio Portela classificou a interpretação da Constituição em contrário desta como uma cousa pouco séria. Nós Scibemos que S. Ex.a pertence ao Partido Liberal, e este partido, pela voz do Sr. António Granjo e pela voz do Sr. Ferreira da Rocha sustentou unia argumentação absolutamente antagónica a favor do Sr. Júlio Maria de Sousa.

Temos, portanto,, classiíicada pelo Sr. Leio Portela de pouco séria a argumentação produzida pelo seu partido.

Eu não estou a discutir com jurisconsultos.

Estou, sim, a dizer nesta Câmara que os partidos políticos tomam atitudes diferentes, conforme as pessoas. Estou a dizer que o mesmo partido que tornou a defesa do projecto referente ao major Sr. Júlio Maria de Sonsa, iez a seguinte cousa quando se reconheceu a inconstitu-cioualidade daquele mesmo projecto: transformou o Sr. Júlio Maria de Sousa, único major que está nas condições do projecto apresentado, em todos os majores farmacêuticos do exército.

Isto é para frisar que nem sempre os argumentos de ordem constitucional, são invocados fora das conveniências pessoais e que os partidos adoptam perante esses argumentos, atitudes opostas. Isto é para frisar que os partidos têm a mesma indignação e os mesmos ímpetos irados, quer quando discutem uma determinada teoria e a aprovam, quer quando reprovam a mesma teoria.

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deixaram falar e obrigaram-me & sair da sala.

Pois agora estando em discussão o projecto de que nos estamos ocupando, já o Sr. Ministro da Marinha falou, e a Câmara não opôs reparo algum, antes o ouviu com aplauso de todos.

Fica, pois, bern frisado que as atitudes e indignações aqui toniadfs, nem sempre traduzem sinceridade, e quo os partidos têm uma maleabilidade política que os leva muitas vezes a fazer uma .questão moral em casos em quo ela de facto não existe.

Sr. Presidente: perante os termos eni que foi concedida a amnistia, eu concluo o seguinte: que os republicanos que go-A'eruam a República, não conseguiram demonstrar que durante a revolução em Monsanto, se haja cometido um único dano, sequer, a pessoas e a propriedades.

Fica sabido que a República não teve o cuidado do verificar nenhum dano, • quando é certo que houve mortes, pois alguns republicanos foram mortos., e danos em propriedades.

Houve ainda mais: foram roubados dos cofres públicos do Porto, cerca do 2:000 contos. Não há, porém, nenhum processo instaurado por tal crime.

E eu recordo à Câmara todas as violências que os monárquicos fizeram cair sobre a cabeça de republicanos quando estes estavam em Santarém e ali ninguém tocou em um centavo.

Assim, pois, poder-se há concluir que o amor pelas instituições é platónico, e que aqueles dos republicanos que têm tani bom coração para defenderem os inimigos do regime, estão a arranjar uma carta de recomendação para quando vier a monarquia.

Ao passo que do nosso lado há o cuidado de não encontrar da parte do inimigo nenhum dano a pessoas ou a propriedades, vemos do outro lado todo o furor em encontrar esses danos causados por republicanos.

A propósito eu cito um caso que constitui uma verdadeira desonra para a República:

Quando da revolta de Santarém, o alferes Sr. Ribeiro dos Santos foi incumbido pelos comandantes das forças revo-

lucionárias, os Sr s. Álvaro de Castro e Jaime de Figueiredo, de procader a um reconhecimento no Vale de Santarém. Esse oficial, no cumprimento das ordens que lhe tinham sido dadas, marchou a de-sompenhar-se da sua missão e, em certa altura, foi atacado pelas forças adversárias, travando-se entre os dois destacamentos vivo tiroteio, de que resultou a morte dum oficial da facção contrária. Pois bem; passado o momento revolucionário, o alferes Sr. Ribeiro ,do» Santos é acusado, do crime do morto do referido oficial e obrigado a responder rios tribunais por tal motivo. <_0ra santarém='santarém' que='que' foi='foi' luta='luta' _-recebido='_-recebido' cuja='cuja' execução='execução' uma='uma' consequências='consequências' dos='dos' quo='quo' do='do' essa='essa' daqueles='daqueles' imputar='imputar' dada='dada' naturais='naturais' ordem='ordem' oficial='oficial' t.presontou='t.presontou' tal='tal' como='como' só='só' a='a' suas='suas' desde='desde' e='e' dado='dado' determinada='determinada' lhe='lhe' em='em' salvaguardando='salvaguardando' responsabilidade='responsabilidade' ribeiro='ribeiro' haver='haver' sr.='sr.' o='o' p='p' as='as' pode='pode' u='u' tinham='tinham' dessas='dessas' militar='militar' resultou='resultou' santos='santos'>

Depois, a perseguição aos republicanos, dentro da própria República, é taru evidente que foi possível levar o processo do crime que lhe imputavam a um tribunal civil, sob o pretexto de que o Sr. Ribeiro dos Santos não era oficial. ,;Pois então não foi como oficial que o Sr. Ribeiro dos Santos esteve em Santarém?

i Como este facto é bem significativo, e como c, alma republicana vê com tristeza o procedimento da Repútlica para com os seus defensores mais queridos!

Sem outras reflexões, possa este caso servir de exemplo o fazer levantar um pouco de remorso à consciência de todos nós. (Apoiados].

A República não se honra, meus Senhores, tratando por tal forma os seus servidores mais desinteressados e protegendo aqueles que mais encarnij.adamente a atacam. A sustentar uma tal doutrina é preferível entregarmos a República. \Apoiados).

De resto, a amnistia, tal como foi aprovada pelo Parlamento, é uma verdadeira burla porque, se amanhã eu quiser impedir que determinado indivíduo seja amnistiado, basta mover-lhe um processo como autor ou responsável por determinado crime durante as lutas revolucioná-

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Orlando Marcai vai longe de mais? Digam qual é a melhor forma de fazer justiça. -

Eu não quero que a lei se transforme em gazua e que vá abrir as portas a todas as prisões, mas também não quero que, como está, vá galardoar os monárquicos e prejudicar os republicanos.

Os jurisconsultos que descubram a fórmula.

O discurso será publicado na integra quando o orador haja devolvido as notas taquigráficas.

O Sr. José de Almeida: — Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Orlando Marcai veio a esta Câmara apresentar um projecto abrangendo na lei votada da amnistia todos os crimes de delito co-, mum, mas que puderem ser considerados como de natureza política.

Devo dizer a V. Ex.a e à Câmara que careço duma explicação da parte do autor do projecto.

A minha forma de ver é que a questão política e social, ó toda a mesma cousa. (Apoiados).

Sr. Presidente: eu pregunto a V. Ex.a se os indivíduos que fizeram o movimento monárquico não causaram dano. f Apoiados).

JL preciso que nos coloquemos sempre a dentro da nossa época e dentro do momento em que vivemos.

j Para que há-de haver repulsa para com os indivíduos que cometeram crimes de ordem social, se esses indivíduos talvez tivessem a impressão de que exerciam um grande direito!

Atentados contra pessoas e propriedade comete-os todos, os dias a sociedade.

Eu desejava que o autor do projecto me prestasse um esclarecimento: desejava que me dissesse se este diploma atinge também os delitos de natureza social que não foram abrangidos pela ultima amnistia. Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Orlando

:—.Sem dúvida.

O Sr. Manuel José da Silva (em nome da comissão do Orçamento]: —Foi submetida à comissão do Orçamento uma proposta de lei tendente a reforçar umas verbas do Orçamento de 1919-1920.

Dessa proposta algumas das rubricas são de aceitar, mas outras não; por isso a comissão entendeu fazer um parecer que agora envio para a Mesa.

0 Sr. Orlando Marcai:—Sr. Presidente : eu não pretendo demorar o debate, que já vai longo, mas também não posso ficar silencioso perante as arremetidas cruentas que o meu projecto de- lei tem sofrido.

Primeiramente foi o Sr. Jorge Nunes, que, como um clarim desperto, chamou ao ataque, seguindo-se-lhe o Sr. Leio Portela, que, navegando nas mesmas águas do antecedente, com impiedade combateu o diploma em discussão com palavras vazias, duma infelicidade flagrante, demonstrativas duma'inteira fa-Iheza de argumentação jurídica e duma sistemática e obstrucionista oposição que o não orgulhará certamente.

Ninguém com mais entusiasmo do que eu pretendeu opor-se à aprovação da amnistia aos monárquicos; mas, digo-o com desvanecimento, fi-lo com serenidade e com elevação, aduzindo argumentos que íoram apreciados pelos próprios contendores e, depois de ter definido e marcado atitude honrada, quási uma declaração de voto, mais para que se não dissesse que estava tudo coacto ou comprometido, deixei deliberar livremente numa compreensão nítida de deveres cívicos.

Discuti, é certo, largamente, amontoando razões, fazendo da lógica tábua rasa onde firmei premissas e tirei conclusões. Mas permiti que a maioria resolvesse tem conformidade com o seu modo de ver, reprovei o projecto sem que esboçasse o mais leve intento de perturbar a regular ordem dos trabalhos.

1 Pois não vejo idêntico procedimento para o meu projecto em discussão, que concitou contra ele, o malfadado, todas as iras dos propugnadores do perdão aos criminosos monárquicos, abandonando os republicanos à dura e miserável situação em que só a ambição e os erros dos do alto os colocou! (Apoiados],

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feonam de decididos defensores do regime não voltariam a ocupar os lugares em quê se alcandoram, e tardiamente ou j amais veriam a luz da liberdade. (Apoiados).

Não sei, porque estava longe, em que condições se achavam os Srs. Deputados que atacam o meu projecto, mas muitas amarguras não deviam ter sofrido, pois, pela posição tomaria neste debate, muitas amizades devem contar no campo oposto para uma oposição tam rija e tam porfiada.

Sr. Presidente: é lícito neste momento, como sempre, relembrar que à sombra dessa afrontosa lei de amnistia, ultima-mente votada, foram postos em liberdade todos aqueles monárquicos que cometeram crimes contra as pessoas o contra a propriedade, j Assim, ao comissário de polícia que exerceu a sua autoridade, pelo tempo do dezembrismo e da traulitânia, no Funchal, e que cometeu, entre outras, a suprema ignomínia de violentar mulheres indefesas, foram-lhe abortas as portas da prisão!

Pregunto a V. Ex.a e à Câmara, com o direito que me dá a minha consciência rebelada, se estes crimes se podom comparar àqueles a cujo castigo es ao sujeitos os republicanos, que, aliás, os praticaram em defesa dos seus ideais e, por consequência, iniludlvelmente políticos.

Sr. Presidente: o meu projecto de lei está redigido, e tenho essa certeza, em conformidade com as pragmáticas estatuídas nas leis do meu País. Kedigi-o sob o impulso da rebeldia que não pude dominar, à luz da minha inteligência e dos oieus conhecimentos jurídicos. De resto, não se trata dum projecto de lei semelhante, como erroneamente se disse já, a uma emenda que, durante a discussão da lei da amnistia, foi obviada para a Mesa. Só por confus^n, visto que os não reputo capazes duma deslealdade, é que os Srs. Leio Portela e JWge Nunes podiam abalançar-se a uma afirmação dessa natureza. Nessa ocasião eu, que não colaborei na lei da amnistia senão para a combater e rejeitar com decidida energia, eu, que não me inscrevi na especialidade da sua discussão, observei, contudo, que a emenda que nessa altura foi apresentada não estava em idênticas condições às que agora me levaram a apresentar o presente projecto de lei.

Mas a todos os Deputados que fizeram a defesa da lei da amnistia aos monár^ quicos, e que agora discordam em benefi^ ciar os republicanos presos ou sem situação definida, chamo o seu cuidado para o facto do meu projecto de lei semente poder aplicar-se aos actos indevidamente classificados de delitos comuns, dando-se, portanto, a regalia aos tribunais de os rever de novo e à face dos seus elementos se pronunciarem.

Contudo, todos manifestam espanto quando se alude à péssima classificação dos processos. Ora talvez se desconheça que no período dezembrista a iraioria das comarcas íoram abandonadas dos seus magistrados; os quais foram substituídos por homens que ao terrorismo deram a mais devotada colaboração; e foram estes agentes da legalidade que organizaram alguns autos, de opinião Antecipada, para a vingança mesquinha. Ê, pois, necessário que nesta altura, já que há a tendência para a normalidade e tam be= névolos têm sido para os antagonistas, se regularize a angustiosa situação dos que, reconhecidamente adeptos das instituições, por elas sofreram as perseguições dos janízeros, que nem defesa lhes permitiam, pois só justiça e imparcialidade se reclama.

E por isso confio em que o meu já tam discutido projecto de lei, que nasceu da minha consciência de revoltado, porque só para republicanos o elaborei, há-de encontrar nos espíritos livres, aqui presentes, o carinho, o entusiasmo e a nobreza de princípios desembaciados que me impulsionaram a sujeitá-lo ii discussão e aos mais duros embates. (Apoiados).

Tenho dito.

O Sr. Matos Cid: — Sr. Presidente: não contava entrar no debato e não será debaixo do ponto de vista político que eu terei de examinar o projecto c.e loi que o meu, ilustre colega, Sr. Orlando Marcai mandou para a Mesa e que com tanto entusiasmo acaba de defender.

Mas eu tenho o meu nome ligado à aprovação dalgumas leis do mou País que na prática têm encontrado dificuldades de aplicação muitíssimo acentuadas e não quero avolumar as minhas culpas.

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este projecto for convertido em lei e que tenha de ser apreciado pelos tribunais.

Nenhum intuito político tonho neste assunto. Sou um modesto advogado, já tenho bastantes anos da minha carreira e conheço as dificuldades que há na interpretação das leis, sendo necessário que, elas sejam suficientemente claras na sua redacção para evitar dúvida sobre o seu pensamento.

Li mais duma vez este projecto, e sem que explicações me sejam dadas sobre a sua técnica, e como está elaborado, não o posso votar, porque entendo que, como está, representa uma inutilidade a aumentar à nossa legislação.

Sr. Presidente: não é, porventura, unia prelecção sobre processo criminal que eu neste momento terei de fazer para justificar o meu voto.

Não faria a ofensa à Câmara de julgar que ela não sabe a maneira como corroni os processos nos seus julgamentos, conforme a sua natureza e origem.

É na origem e fundamento do processo que o réu faz a prova, se antes disso não tem recorrido; e é no começo do processo que o caso se define.

Com o projecto da amnistia dá-se este caso verdadeiramente extraordinário: de na audiência, e depois do julgamento, ter o réu de justificar todos os elementos de carácter político do acto praticado.

Eu como advogado não abdico dessa circunstância quando aqui legislo, .e não quero ligar o meu nome e responsabilidade a uni documento que possa dar lugar a interpretações diversas da parte de um poder do Estado que, pelo que representa, a todos o respeito devo impor.

Temos o processo correccional. Neste processo como V. Ex.a muito bem sabe o crime é classificado no despacho do juiz, e se até aí, o arguido não recorreu a instrução contraditória, fica sob a sanção da lei penal. Mas, os intuitos, o carácter, a natureza não tiveram cabimento até essa altura do processo.

Temos agora o processo ordinário.

Nestes processos, como V. ±Cx.as muito bem sabem só depois de feita a pronúncia e se o réu não recorrer a instrução contraditória, será perante o júri que se irá apreciar a amnistia.

Mas há uma outra cousa em que S.

Ex.a não pensou, e para o qual chamo a sua atenção.

Há com certeza, a estas horas, nas prisões deste país, indivíduos condenados por crimes comuns, e de entre eles. alguns que na audiência do julgamento, pela palavra dos advogados, apresentaram como atenuantes a natureza política, o carácter político do acto que praticaram.

Imagine V. Ex.a que o juiz no uso do seu direito, tinha formulado perante e júri competente, o seguinte quesito:

£ Se efectivamente o crime tinha origem política, e que o júri no seu livre direito tinha respondido que não?

^Como é que V. Ex.a com este diploma sabe quem se vai utilizar dele?

São estas as preguntas que desejava fazer, que não representam nenhuma desconsideração, porque não são preguntas de algibeira, desejando apenas ser suficientemente esclarecido.

Mas, deixe-me V. Ex.a dizer que, reconhecendo-se, em qualquer processo que o caso que se discute tem origem ou natureza política, parece-me que na lei da amnistia há qualquer disposição que pode ser aplicada.

Bem sei que V. Ex.a me poderá responder com o artigo 1.°

Mas eu responderei com o artigo 6.°

Aguardarei as explicações de V. Ex.a que me habilitem a votar com a consciência que sempre pus nos casos que já aqui tratei nesta Câmara, há alguns anos, e onde ainda vim encontrar pessoas de quem sempre recebi as maiores provas de estima e consideração.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra quando o orador haja devolvido as notas taquigráficas.

O Sr. Carlos Olavo: — Sou absolutamente contrário a este processo tumultuado de discutir suplementos à lei da amnistia.

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da amnistia, deturpando os seus fundamentos.

Sr. Presidente: tenho neste momento como todos os Srs. Deputados conhecimento completo do projecto mandado para a Mesa pelo Sr. Orlando Marcai, e devo dizer que a minha impressão é de que este projecto é não só inexequível como inconstitucional. (Apoiados}.

Diz o seguinte:

Leu.

Começa aqui a minha primeira dificuldade: distinguir os indivíduos indevidamente envolvidos em processos crimes comuns.

^Quem é que determina que esses indivíduos foram indevidamente envolvidos em,processos comuns?

É o Poder Judicial?

Nestas circunstâncias falta determinar na lei qual o momento em que o Poder Judicial pode determinar os indivíduos que foram indevidamente envolvidos em crimes comuns.

Mas não ó esta a idea do ilustre Deputado, Sr. Orlando Marcai.

Então se o Poder Legislativo é que determina quando ó que os indivíduos foram indevidamente envolvidos em processo de delitos comuns, Vcii o Poder Legislativo praticar um acto anti-constitucional, visto que pode imiscuir-se nos actos do Poder Judicial. (Apoiados}.

O Poder Legislativo vai dizer ao Poder Judicial que julgou mal ou pronunciou mal, ou que em todo o caso instruiu mal os processos orn que esses indivíduos estão envolvidos ou pronunciados.

Sr. Presidente: mas continuando a ler o projecto.

Ele diz:

Leu.

Quem o conhece?

£É o Poder Judicial ou o Poder Legislativo ?

Tenho o direito de formular estas pre-g untas.

O projecto não diz claramente.

Tenho o direito de preguntar se é o Poder Legislativo.

Se assim é, invade as atribuições do Poder Judicial, exclusivamente pertencentes ao Poder Judicial.

A conclusão é, portanto, lógica.

O projecto é absolutamente inexequível.

Mas suponhamos que ó exequível. É contrário, porém, à Constituição, em primeiro lugar porque ofende o artigo 31.° da Constituição.

O caso já aqui foi tratado por outro Sr. Deputado, e também pelo Sr. Cunha Leal que teve o cuidado de dizer que alguns Deputados Liberais tinham, levantado a questão anti-constitucional do projecto em contradição com a atitude adoptada com o projecto que integra LO exército um^ major miliciano farmacêutico.

É certo. Mas eu é que tenho autoridade para invocar a inconstitucionalidade deste projecto porque da mesma maneira procedi, com o mesmo fervor na defesa do cumprimento das disposições constitucionais, quando se tratou daquela que dizia respeito ao major Sr. Júlio Maria de Sousa.

E por istoj Sr. Presidente, que eu nesta Câmara tenho sido uma sentinela vigilante relativamente ao disposto no artigo 35.° da Constituição da República.

O Sr. António Granjo:—Eu devo dizer a V. Ex.a que os Deputados Liberais procederam nesse ponto com toda a sinceridade.

O Sr. Cunha Leal: — Eu devo declarar a V. Ex.a que ignorava esse facto, porém estou pronto a manter os princípios de sempre.

O Orador:—Assim, Sr. Presidente, eu devo dizer que com a mesma energia com que combati nesta Câmara o projecto referente ao Sr. Júlio Maria de Sousa, combato este agora apresentado pelo Sr. Orlando Marcai, por isso que a emenda que então foi apresentada é perfeitamente igual àquilo que constitui o projecto de lei que está em discussão.

Eu, Sr. Presidente, faço inteira justiça à boa fé de V. Ex.as^ mas o que é um facto é que a doutrina em discussão ó a mesma da apresentada pela discussão do projecto da amnistia.

Eu, Sr. Presidente, vou ler à, Câmara a emenda que então foi apresentada para ela assim ficar mais bem esclarecida.

Essa emenda diz:

Leu.

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' Claramente que sim e é por isso que, eu levantei aqui a questão constitucional.

Assim, Sr. Presidente, eu entendo que este projecto não se pode discutir nesta Câmara por isso que ele vai de encontro à doutrina bem clara e nítida do artigo a que me referi.

Mesmo que este projecto, Sr. Presidente, tivesse por fim visar crimes políticos, delitos comuns praticados por republicanos, eu não deixaria de levantar aqui a minha voz.

Interrupção do Sr. Orlando Marcai que não se ouviu.

O Orador: —Esta é a minha maneira de ver. Os republicanos não merecem menos consideração, mas exactamente por serem republicanos é que mais graves e mais condenáveis se tornam os crimes comuns por eles praticados. Ser republicano implica uma elevação de consciência e um rigor na noção dos seus deveres cívicos e morais inteiramente incompatível com a prática de qualquer crime.

Sr. Presidente : eu preciso esclarecer o Sr. Cunha Leal acerca do caso do alferes Ribeiro dos Santos.

Eu conheço muito bem esse caso, e todos estamos de acordo em prestar justiça à dignidade & honradez do alferes Sr. Eibeiro dos Santos, como todos os revolucionários de Santarém merecem a nossa simpatia pelo acto de coragem que praticaram o pelo fervor que puseram na defesa dos princípios republicanos.

Depois do acto praticado pelo alferes Sr. Ribeiro dos Santos, os jornais adversos ao regime começaram a dizer que o alferes Ribeiro tinha praticado um acto de cobardia; enteio o alferes Ribeiro re-quere ao Ministério da Guerra um inquó rito. Era então Ministro da Guerra o Sr. Freitas Ribeiro.

Mandou-se proceder ao inquérito que ilibou o alferes Ribeiro; mas como os jornais continuassem a insultá-lo o alferes Ribeiro requoreu um conselho de guerra.

O Sr. Cunha Leal:—E nunca se conseguiu que se publicasse o resultado.

O Orador: — Seja como for, o facto é que S. Ex.a ficou ilibado.

O Sr. Cunha Leal:—O facto é que o Sr. Alferes Ribeiro requerei! a vários Ministros da Guerra e nunca conseguiu a publicação da sindicância.

O Sr. Helder ribeiro: — Conheço o assunto e posso dizer a V. Ex.a que em treze meses que estive no Ministério da Guerra não recebi requerimento algum pedindo a publicação dessa sindicância.

O Sr. Cunha Leal (interrompendo):— Tendo sido passada guia para o regimento de cavalaria n.° 4 ao alferes Sr. Ribeiro dos Santos, o comandante deste regimento não o quis aceitar como seu oficial.

Cito este caso para constatação de que a justiça é só inflexível nos seus escrúpulos, quando se trata de republicanos, porque com os monárquicos dá-se o que nós todos vemos.

O Orador:— Perfeitamente. . Que o Sr. Alferes Ribeiro dos Santos seja julgado em conselho de guerra ou em tribunal civil, tenho a certeza de que justiça lhe será feita e que sairá ilibado de culpabilidade.

O Sr. Cunha Leal:—Perdão !

O Orador:-Cada classe tem o seu ponto de honra.

A honra dum militar não é a honra dnm paisano.

V. Ex.a sabe muito bem que para nós, os militares, há certas cousas que constituem motivo de melindre e que podem não o ser para a classe civil.

O Sr. Cunha Leal:—Em relação a um tribunal militar está bem, isso pode realmente constituir uma razão; mas em ré lação a um tribunal civil, não.

A verdade ó que com o nosso incompreensível procedimento atiramos com os republicanos para a cadeia, ao mesmo tempo que pomos à solta os monárquicos, nossos irredutíveis adversários. (Anoía-

T \

dos).

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uma existência absolutamente contrária aos princípios republicanos.

Além disso, e para terminar este incidente, devo dizer ainda que o Sr. Kibeiro dos Santos tem o direito de ingressar novamente no exército, em face da resolução ultimamente tomada pelo Sr. Ministro da Guerra.

Em conclusão: eu, em meu nome e em nome dos meus amigos do Partido Reconstituinte, não posso dar o meu voto ao projecto em discussão, tal como ele se encontra redigido, e, por isi!0; proponho para ele baixar à comissão de legislação criminal para que esta lhe possa dar uma forma exequível o não atentatória dos princípios de justiça.

O Sr. Cunha Leal: —Para V. Ex.a ver como eu tinha razão, acabam de me dizer qne como consequência do processo movido contra o alferes Sr. Kibeiro dos Santos, novo processo será instaurado contra o Sr. Ministro da Guerra.

Porque S. Ex.a juntou ao processo do Sr. Kibeiro dos Santos um documento em que, na sua qualidade de comandante das forças revolucionárias de Santarém, certifica que o referido alferes se encontrava ao serviço activo.

O Sr. Sá Cardoso:—Trata-se dum acto praticado durante uma revolução que vingou.

De resto ou estou convencido de que o processo do alferes Ribeiro dos Santos íá estaria arquivado, "se não tivesse sido pedido por ele próprio.

É posto à votação o requerimento do Sr. Carlos Olavo.

O Sr. Orlando Marcai:—Proponho, em aditamento ao requerimento do Sr. Carlos Olavo, que a comissão de legislação criminal dó o seu parecer no prazo de vinte e quatro horas.

O Sr. Presidente : — Neste caso, tanto faz ser vinte e quatro horas como de quarenta e oito horas, porque o parecer só poderá ser discutido na sessão de segunda feira-,

Posto à votação, foi aprovado o requerimento do Sr. Carlos Olavo.

Posto à votação o requerimento do Sr. Orlando Marcai, foi aprovado.

O Sr. Jorge Nunes : — Roqueiro a contraprova.

Foi novamente aprovado, depois de se proceder 4 contraprova.

O Sr. Presidente :—Vai votar-se a acta. Foi aprovada.

Foi concedido um dia de licença ao Sr. Alberto Jordão Marques da Costa.

O Sr. Presidente:—Â comissão de finanças requere para reunir amanhã durante a sessão e nesse sentido vou consultar a Câmara.

Foi autorizado.

O Sr. Presidente:—Nomeio o Sr. J. Varela para substituir o Sr. Lino Marinha, na comissão de marinha; e o Sr. Ma-riano Martins para substitui? o Sr. Velhinho Correia na comissão de comércio e indústria.

O Sr. Ministro das Finanças (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: |re-queiro que seja consultada a Câmara sobre se permite que sejam incluídas na ordem do dia de amanhã as propostas relativas ao aumento de receitas dos tabacos e sobre a Agência Financial do Rio de Janeiro.

Consultada a Câmara, foi aprovado.

Foi lida e admitida uma' proposta do Sr. António Mantas relativa c: sessões nocturnas.

Foi remetida à comissão competente.

O Sr. Presidente:—A comissão que há-de representar a Câmara no centenário de Fernão de Magalhães é composta dos seguintes Srs. Deputados:

Vasco Borges.

F. Costa.

E. Carvalho.

Alberto Jordão.

Malheiro Reimão.

Vergílio Costa.

Ladislau Batalha.

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de

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negócio urgente, porque realmente o assunto que desejo tratar é de urgência.

Por diploma publicado no Diário do Governo foi um instituto, nesse diploma mencionado, encarregado de fazer a comemoração do centenário de Fernão de Magalhães.

Foi respectivamente fixada a verba de 3:000$ para essa comemoração, mas com tal verba autorizada não há possibilidade de se poder cumprir o programa elaborado e assim vou mandar para a Mesa um projecto para alterar o montante dessa verba para 5.000$.

O projecto que vou mandar para a Mesa tem o voto conforme do Sr. Ministro das Finanças e estou certo de que o Sr. Ministro da Instrução não lhe negará também o seu voto.

Para este projecto requeiro a urgência e dispensa do Eegimento.

Tenho dito.

O Sr. Presidente:—Vai ser lido o projecto que o Sr. Manuel José da Silva acaba de mandar para a Mesa, e para o qual requereu urgência e dispensa do Regimento, e nesse sentido vou consultar a Câmara.

Lido o projecto foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento entrando em discussão na generalidade.

É o seguinte:

Na proposta orçamental do Ministério da Instrução Pública para o ano económico de 1921-1922 foi incluída a verba extraordinária de 3:000$ para ocorrer às despesas com a obra comemorativa do centenário de Fernão de Magalhães.

Reconhece-se, porém, agora a urgente necessidade de realizar imediatamente di-veras despesas que com aquela comemoração se relacionam e ainda a insuficiência de créditos propostos.

Nas circunstâncias expostas, tenho a honra de apresentar a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.° É autorizado o Governo a abrir, sem dependência das disposições do artigo 4.° da lei de 29 de Abril de 1913, um crédito especial da quantia de 5.000$ a fim de ocorrer ao pagamento das despesas com a comemoração do centenário de Fernão de Magalhães.

Art. 2.° A importância do referido crédito deverá ser inscrita no capítulo 23.° artigo 87.° da tabela da despesa extraordinária do Ministério da Instrução Públi-ca para o ano económico de 1920-1921, sob a rubrica «Comemoração do centenário de Fernão de Magalhães».

Art. 3.° Por virtude das disposições da presente lei é eliminada da proposta orçamental do Ministério da Instrução Publica para o ano económico de 1921-1922 a verba de 3.000$, inscrita no capítulo 13.° artigo 77.° da referida proposta com aplicação à mesma comemoração.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 21 de Abril de 1921.—Manuel José da Silva, (Oliveira de Azeméis).

O Sr. Ministro da Instrução (Júlio Martins) : — Pedi a palavra para declarar a V. Ex.a que concordo com a proposta.

Foi lido na Mesa o projecto de lei e aprovado na generalidade.

O Sr. Presidente: — Vai votar-se na especialidade.

Foram lidos e aprovados os artigos 1." e 2.° sem discussão.

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis):—Mando para a Mega uma pronosta.

É a seguinte:

Proponho a eliminação do artigo 3.° — Manuel José da Silva.

l

O Sr. Presidente: — O Sr. Mauuel José da Silva pediu a dispensa da leitura da última redacção. ,

Vou consultar a Câmara.

Foi dispensada.

Antes de se encerrar a sessão

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O Sr. Sampaio Maia :—Participo a V. Ex.a que tendo retinido a comissão de legislação civil e criminal nomeou para seu presidente, no impedimento do Sr. Barbosa de Magalhães, o Sr. Mesquita Carvalho, e no impedimento do secretário Sr. Pedro Pita, a mim participante.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã à hora regimental com a seguinte ordem do dia.

Antes da ordem do dia:

A de hoje.

Ordem do dia:

A de hoje.

Parecer n.° 711 que autoriza o Governo a negociar um acordo com a Companhia dos Tabacos de Portugal.

Parecer n.° 728 que encarrega a Caixa Geral de Depósitos de dirigir os serviços da Agência Financial do Rio de Janeiro.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas.

Projectos de lei

Do Sr. Maldonado Freitas considerando alferes milicianos da arma de infantaria, dos serviços para que estão apurados ou daqueles onde serviram, todos os equiparados a oficial contratados ou que não serviram no Corpo Expedicionário Português.

Para o «Diário do Governos.

Dos Srs. Maldonado Freitas e Alberto Jordão declarando as câmaras municipais obrigadas a distribuir semestralmente parte das receitas que cobrarem pelo imposto ad valorem pelos institutos e corporações de assistência e beneficiência dos concelhos.

Para o «Diário do Governo».

Do Sr. Raul Tamagnini, cedendo, à Câmara Municipal de Torres Novas o edifício do extinto colégio de Jesus Maria José.

Para o «Diário do Governo».

Documentos enviados para a Mesa durante

Requerimentos

Requeiro pelo Ministério das Colónias: La Guinée Portuguaise. Populações indígenas de Angola. — António Gr anjo. Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério do Comércio, me sejam fornecidos exemplares de todos os regulamentos das escolas industriais, comerciais, de artes e ofícios, preparatórios, etc., dependentes deste Ministério.

21 de Abril de 1921. — José Maria de Campos Melo.

Expeça-se.

Renovação de iniciat-iva

Declaro renovar a iniciativa do projecto de lei n.° 402-B, que promove a tenente o segundo sargento, Armando do Carmo.

Lisboa e Sala das Sessões da Câmara os Deputados, 21 de Abril de 1921.— Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Junte-se ao processo.

Para a comissão de guerra.

Do Sr. Eduardo de Sousa, isentando de pagamento de todas as contribuições, durante dez anos, os terrenos e prédios onde se encontrem instalações da Empresa Técnica Publicitária Film Gráfica Calde-villa.

Para o «.Diário do Governo».

Do Sr. Orlando Marcai, mandando abranger nas disposições da lei n.° 1:144, de 9 de Abril de 1921, todos os indivíduos, que envolvidos em processos de delito comum, se reconheça que os actos praticados são de carácter político.

Aprovada a urgência e disjiensa do Regimento.

Para a comissão de legislação criminal para responder em 48 horas.

Pareceres

Da comissão de finanças sobre o n.° 706-A que encarrega a Caixa Geral de Depósitos a executar os serviços da Agência Financial do Rio de Janeiro.

Imprima-se com urgência.

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do edifício para a Legação Portuguesa em Tóquio.

Para a comissão de finanças.

Da comissão de administração pública sobre os n.03 666-G e 706-H que cedeu à Câmara Municipal de Torres Vedras o castelo da localidade e terrenos anexos.

Para a comissão de guerra.

Da comissão de administração pública sobre o n.° 581-A que cede o passal e oasa anexa da freguesia de Barcelos à respectiva junta da freguesia.

Para a comissão de finanças.

Da mesma comissão sobre o n.° 698-F que cede à actual Junta Geral do Distri-

to de Santarém o edifício mandado cons-trair pela junta que foi extinta pelo rle-creto de 6 de Agosto de 1892. Para a comissão de finanças.

Da comissão do orçamento sobre o n.° 706-C, que reforça algumas verbas inscritas na proposta orçamental para 1919-1920.

Para a comissão de finanças.

Da comissão de guerra sobre o n.° 696-B que abre um crédito extraordinário a favor do Ministério da Guerra para despesas com os tribunais militares especiais.

Para a comissão de finanças.

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