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REPUBLICA «ST PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃ.O 3ST.° 59
EM II DE MAIO DE 1921
Presidência do Ex.mo Sr. Abílio Correia da Silva Marcai
Baltasar de Almeida Teixeira
Secretários os Ex,mos Srs.
Sumário. — Abre-se a sessão com a presença de 33 Srs. Deputados. E lida a acta. Expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Plínio Silva (para interrogar a Mesa) faz considerações sobre a forma de funcionamento das comissões para dar parecer sobre as propostas do Sr. Ministro do Comércio, respondendo-lhe o Sr. Presidente.
O Sr. Ministro do Coméreio (António Fonseca) pede que seja mandada rectificar a sua proposta destinada a favorecer a criação de novos empreendimentos industriais ou agrícolas, por ter sido publicada errada, e responde a algumas considerações do Sr. Plínio Silva, que volta novamente a ocupar-se do assunto.
O Sr. Manuel José da Silva (Porto) trata de vários assuntos relativos aos bairros Sidónio Pais e Social do Porto, do horário de trabalho e do Instituto de Seguros Sociais, respondendo-lhe os Srs. Ministros do Comércio e do Trabalho (José Domingues dos Santos).
É aprovada a acta.
O Sr. Maldonado de Freitas requere entre imediatamente em discussão a proposta de lei do ST. Ministro do Trabalho, n.° 766-D.
É aprovado.
Continua em disrjussão o parecer n." 727* usando da palavra o Sr. Lúcio de Azevedo. É aprovado na generalidade. É aprovada a emenda da comissão de finanças ao artigo^ 1.° Ê aprovado o artigo 1.° salva a emenda. Ê aprovado o artigo 2.° O Sr. Costa Júnior requere a dispensa da última redacção. Aprovado.
Repete-se a votação empatada na sessão anterior sobre a urgência e dispensa do Regimento requerida pelo Sr. Eduardo de Sousa, para o seu projecto de lei anulando a lei 1:158, tendo usado da palavra (sobre o modo de votar) os Srs. Vasco Borges e Eduardo de Sousa, É njeitada a urgência e dispensa do Regimento. O Sr. Vasco Borges requere apenas urgência para o mesmo projecto, que é aprovado depois de terem usado
Âliaro Pereira Guedes
lavra (sobre o modo de votar) os Srs. Jorge Nunes, Carlos Olavo e Vasco Borges. O Sr. Ferreira da Rocha requere dispensa do Regimento para o projecto do Sr. Eduardo de Sousa, declarando o Sr. Presidente que não pode aceitar o requerimento, contra o que protesta o Sr. Ferreira da Rocha, dando-Uie esplicações o Sr, Presidente e mantendo a sua decisão.
Tendo o Sr. Presidente declarado que vai entrar em discussão a proposta de lei n." 766-D, o Sr. Orlando Marcai reclama contra o facto de não ser posto em discussão o parecer n.° 734, usando também da palavra sobre o mesmo assunto o Sr. Cunha Leal, que, depois das explicaçõespres' tadas pelo Sr. Presidente, requere que seentreime-diatamente na ordem do dia. Aprovado.
O Sr. Maldonado de Freitas requere que a proposta de lei n.° 766-D entre em discussão na primeira parte de antes da ordem dn dia de amanhã.
O Sr. Ministro da Guerra (Álvaro de Castro) requere para entrarem em discussão antes da ordem do dia de amanho, os pareceres n." 681 e 685. Aprovado.
O Sr. Júlio Cruz requere para entrar em discussão, antes da ordem do dia de amanhã, opare~ cer n." 080. Aprovado.
Ordem do dia.— Entra em discussão o parecer n.° 13a, usando da palavra os Srs. Orlando Marcai, Carlos Olavo e Matos Cid.
O Sr. Costa Júnior comunica que foi nomeado presidente da comissão de inquérito ao Ministério da Agricultura.
O Sr. Vasco Borges (em negócio urgente) trata da apreensão de alguns jornais do norte, respondendo-lhe o Sr. Presidente do Ministério (Ber-nardino Machado).
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Diário da Câmara dos Deputados
Abertura da sessão às 10 horas e 10 minutos.
Presentes 65 Sr s. Deputados.
, Responderam à chamada os Sr s.:
Abílio Correia da Silva Marcai.
Afonso de Macedo.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Albino Pinto da Fonseca.
Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Álvaro Pereira Guedes.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Albino de Carvalho Moura1 o.
António Augusto Tavares Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Ferreira da Fon-seca.
António José Pereira.
António LObo de Aboim Inglôs.
António Luís de Gouveia Prestes Salgueiro.
António Maria da Silva.
António Marques das Neves Mantas.
António Pais Rovisco. . António Pires de Carvalho.
António dos Santos Graça,
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Cruz.
Eduardo Alfredo de Sousa,
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rego Chaves.
Francisco José Pereira.
Francisco de Sousa Dias.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Jaime de Andrade Vilares.
Jofto Luís Ricardo.
Jo&o Salema.
Joaquim Aires Lopes de Carvalho.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António da Costa Jánior.
José Domingues dos Santos.
JQSÓ Garcia da Costa.
José Mendes Nunes Loureiro.
José de Oliveira Ferreira Dinis.
Júlio Augusto da Cruz.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Manuel Alogre.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel José da Silva.
Nano Simões.
Orlando Alborto Marcai.
Podro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de SanfAna e Silva.
Raul Lolo Portela.
Rodrigo Pimenta Massapina.
Tomás do Sousa Rosa.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimfio.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriijues Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Entraram durante a sessão:
Acácio António Camacho Lopes Cardoso.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Álvaro Xavier de Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Domingos Leite Pereira.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Jacinto de Freitas.
João Gonçalves.
JoSo JQS.Ó da Conceição Camoesas.
Jofto de Orneias da Silva.
Jo&o Pereira Bastos.
Joaquim Brandão.
José do Vale de Matos Cid.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Josó da Silva.
Não compareceram à sessão 09 Srs.:
Afonso Augusto da Costa. Afonso de Melo Pinto Velos o. Alberto Carneiro Alves da Cruz. Albino Vieira da Rocha, Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa. Antao Fernandos de Carvalho. António Albino Marques de Azevedo. António Baitos Pereira. António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
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de 11 de Maio de 1921
António Dias.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
António Joaquim Granjo.
António Joaquim Machado do Lago Corqueira.
António Maria Peroira Júnior,
António de Paiva Gomes.
-Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Dias da Silva.
Augusto Joaquim Alvos dói Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Rebolo Arruda.
Dar-tolomeu dos Mártires Sousa Seve-pino.
Oonstãncio Arnaldo de Carvalho.
Diqgo Paohoco de Amorim.
Domingos Vítor Cordeiro Rosado. • Estêvão da Cunha Pimentel.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Cotrim da Silva Garços.
Francisco da Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco José Fernandes Costa.
Francisco José Martins Morgado.
Francisco José de Meneses Fernandes Gosta.
Francisco Manuel Oouceiro da Costa.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Henrique Ferreira de Oliveira Brás.
Ef enrique Vieira de Vasconcelos.
Hermana José de Medeiros.
Inocência Joaq\iim Camacho Rodrigues.
Jaime da Qunha Qoelho.
Jaime Daniel Leote do Roga.
Jaime Júlio de Sousa.
Jo.ão Cardoso Moniz Bacelar.
João. Estêvão Águas.
Jo&o José. Luís Damas.
Jpão Maria Santiago Gouveia , Lobo Prezado.
Joã.o. Ribeir-o. Gomes.
João Teixeira ã& Queiroz Vaz Guedes.
João, Xavier- Camarate Campos.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Barbosa.
José Gomes de Sousa Varela.
José Gregório de Almeida.
José Maria de Campos Melo.
José Maria (lê Vilhena Barbosa Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Monteiro. José Rodrigues Braga. Júlio César de Andrade Freiro. Júlio Gomes dos Santos Júnior. Júlio do Patrocínio Martins. Ladislau Estêvão da Silya Batalha. Leonardo José Coimbra. Liberato Dam53o Ribeiro Pinto. Lino Pinto Gonçalves Marinha. Luís de Orneias Nóbrega Quintal. Manuel de Brito Camacho. Manuel José Fernandes Costa. Marcos Cirilo Lopes L Maximiano Maria do- Azevedo Farta. -Mem Tinoco Vcrdial. Miguel Augusto Alvas Ferreira. Pedro Géis Pita. Raál António Tamagnini de Miranda Barbosa. Vasco Guedes io Vasconcelos. Vorgílio da Conceição Costa Xavier da Silva. . Ás 15 horas principou a fazer-se a chamada. O Sr. Presidente: — Estão presentes 30 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. .Eram 15 horas e 20 minutos. Foi lida a acta e deu-se conta do Expediente Ofícios Do Senado, devolvendo com alterações a proposta de lei que interpreta o artigo 7> da lei n.° 1:144. Para a comissão de legislação civil e comercial.' E)o mesmo, enviando uma proposta, de lei que promove ao posto imediato designados oficiais do exército. Para a comissão de guerra. • Do mesmo, enviando uma proposta de, lei que regula a forma de provimento dos, lugares de auditores , adjuntos das coió- = nias. . .-. Para a comissão de colónias.
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Diário da Câmara dos Deputados
7:482, publicados no Diário do Govêvno em 23 e 26 de Abril e 4 de Maio corrente.
Para a comissão de finanças.
Antes da ordem do dia
O Sr. Plínio Silva: — Está convocada para as 4 horas nma reunião da comissão de comércio e indústria para dar parecer sobre uma proposta do Sr. Ministro do Comércio.
Eu entendia que se devia ter convocado uma reunião conjunta de todas as co-.missões que têm de dar parecer sobre o assunto, especialmente a comissão de finanças.
Este princípio já foi adoptado quando se tratou dos transportes marítimos tendo a Câmara reconhecido a necessidade de uma reunião conjunta. Evidentemente, que este modo de pensar não envolve censura a V. Ex.a OQ à Mesa, o que não seria justo nem harmónico com as palavras que eu tive a honra de produzir quando a Câmara escolheu V. Ex.a para esse lugar.
O que eu desejava ó que V. Ex.a só pronunciasse.
O Sr. Presidente:—Uma parte das considerações que V. Ex.a produziu tem oportunidade no seio das comissões.
Na outra parte há um manifesto equívoco da parte de V. Ex.* A Câmara não resolveu que determinadas comissões reunissem em conjunto para estudar permanentemente o assunto dos transportes marítimos, mas que se reunisse uma grande comissão composta de todas as outras.
Não tenho duvida em convocar as outras comissões, mas tenho de consultar a Câmara para consentir a sua reunião durante a sessão e por emquanto ainda não há número.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Sr. Presi-denle: foi agora, por um Sr. Deputado, chamada a minha atenção, para um erro que vem na proposta de lei, a que justamente acaba de referir-se o Sr. Plínio Silva.
A base 11.a diz «dias» quando deveria dizer «anos».
Ora calcule-se, como seria absoluta-
mente extravagante, restringir-se a cinco dias o prazo para se pedirem concessões estabelecidas por uma lei.
A extravagância não resulta da minha proposta; ó o que tenho empenho em fazer salientar perante V. Ex.a e todas as pessoas que me escutam.
Para essas concessões se fazerem apenas num prazo de cinco dias, era preciso que já estivessem no bolso. O prazo que está na proposta de lei é de cinco anos, como se pode ver no original em poder do Sr. Plínio Silva.
Pedia a V. Ex.a o favor de mandar rectificar que na base 11.a da proposta de lei apresentada em 14 de Dezembro de 1920 pelo Ministro das Finanças, Sr. Cunha Leal e publicada no Diário do Governo da II série, onde diz: «a contar dentro de cinco dias», se deve ler: «dentro, de cinco anos».
E o que está na proposta de lei. Há, portanto, um erro de imprensa.
Aproveito o ensejo de estar no uso da palavra para pedir a V. Ex.a que mantenha o despacho da Mesa que fez considerar e mandar para a comissão de comércio e indústria e conjuntarnente para a comissão de agricultura o estudo dessa proposta de lei.
Essa proposta de lei tem efectivamente duas partes características: uma que se refere propriamente às indústrias ou anexos agrícolas que se pretende proteger, outra ao modo de as proteger, o que é de natureza exclusivamente financeira.
As comissões de comércio e indústria não deve interessar, nem interessa de facto, mais do que saber quais são as indústrias que se pretende proteger e à comissão de agricultura quais são as indústrias agrícolas que se pretende impulsionar.
O modo financeiro de fazer esta protecção é que é exclusivamente Ca atribuição da comissão de finanças, para a qual não podem servir os conhecimentos especiais das comissões de agricultura e comércio e indústria.
Evidentemente, os conhecimentos especiais de cada um dos membros destas comissões não servem para o estudo dos membros da comissão de finanças.
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Sessão de 11 de Maio de 1921
Parece-me, portanto, que o despacho do Sr. Secretário mandando essa proposta de lei à reunião conjunta das duas comissões, foi bem dado.
Recordo-me muito bem de que tendo 'tido ensejo de promover o andamento rápido desta proposta, fui encontrar-me com o presidente da comissão de comércio, Sr. João Luís Ricardo e com o ex-presi-donte da comissão de indústria, Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo que me respondeu, por parte da comissão de indústria, que suscitaria a convocação conjunta, para apreciar a proposta de lei.
Não se compreende que umas bases que apenas dizem respeito à agricultura, precisem ser submetidas à reunião conjunta das quatro comissões e não apenas à deliberação das duas comissões.
Devemos também considerar a urgência do uma proposta de lei que está aproximadamente há quatro meses no seio das comissões, não digo já no sentido de aprovar, mas até de a rejeitar, mas que se possa tirar daí o sentido, para que cada um possa ocupar-se naquilo que julgar mais útil.
Parece-me, pois, que V. Ex.a deverá manter a deliberação que a Mesa tomou, para que as duas comissões reunam con-juntamente, apesar de esse alvitre não ter sido da minha iniciativa.
Ao Sr. Plínio Silva direi que efectivamente não vale a pena estar a prender-se com pequenos detalhes de formulário quando S. Ex.a nas reuniões, terá ensejo de expor os seus pontos de vista.
Tenho dito.
O Sr. Plínio Silva: — Sr. Presidente: como sempre, ~ o ilustre Ministro do Comércio, com a inteligência que b caracteriza, procurou fazer vingar o seu ponto de vista, mas eu também, com a pertinácia, que, aliás, S. Ex.a já me reconheceu, vou procurar fazer vingar o meu.
Não posso estar de acordo com S. Ex.a, porque se estabelece um princípio novo, qual é o de, quando uma proposta deve ser encarada em conjunto, no caso de que se trata, por exemplo, a comissão de comércio só tem de dar parecer sobre certas bases.
A ser assim, eu tenho de penitenciar--me perante a Câmara de já, por várias vezes, ter invadido as atribuições de vá-
rias comissões, e ainda ontem, quando mandei para a Mesa o projecto do Sr. Vitorino Guimarães. Além deste, com outros projectos tenho feito a mesma cousa, como, por exemplo, o da pensão à junta do rio Mondego, que, após o estudo comparativo a que procedi, propus que fosse elevada de 2 a 5 contos.
Nestes termos, temos doutrina nova a fixar para as comissões.
Afirmo o meu modo de ver e discordo em absoluto da doutrina do Sr. Ministro do Comércio,
Entendo que havia a máxima vantagem em convocar todas as comissões que têm mais ou menos de emitir o seu parecer sobre esta proposta de lei.
Estou convencido de que retinindo todas as comissões conj untamente, muito mais rapidamente se chegaria ao fim desejado.
Ninguém se oporia a que se fizesse a reunião conjunta de todas as comissões que têm de intervir com o seu parecer, o qual seria dado com urgência.
De lastimar é até que a proposta de lei, há tempo apresentada, sobre estradas, não tivesse o parecer da comissão de finanças, tratando-se de ujn problema de largo alcance.
O parecer da comissão de finanças não prejudicaria a urgência da discussão da proposta.
O Sr. Manuel José da Silva (Porto): — Chamo a atenção do Sr. Ministro do Comércio para um assunto que me parece, se relaciona com a sua pasta.
Repetidas vezes do Porto me têm chamado a atenção para o seguinte: no lugar da Arrábida existe um bairro com muitas casas, podendo, talvez, comportar cem famílias.
Esse bairro foi mandado construir em 1918, com dinheiro do Estado, pelo Governo de Sidónio Pais. Essas casas haviam sido mandadas construir a pretexto de se acudir às necessidades ocasionadas pelo tifo exantemático. Têm paredes e telhados. Não têm mais nada. Dentro dessas casas existem muitos materiais que estão a inutilizar-se com o tempo, porque essas casas não têm portas. Os portais são apenas tábuas, sem serem aplainadas.
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Diário da Câmara dói Deputados
casas para os pobres, corno todos sabem.
Parocia-me que a melhor solução para aproveitar essas casas, seria quo o Estado as entregasse à Câmara Municipal do Porto, dotando a câmara com os meios pecuniários necessários para se acabar esse bairro.
Desejaria, portanto, que o Sr. Ministro do Comércio promovesse a entrega dôstc bairro à Câmara do Porto, o que seria de muita utilidade para o povo.
Visto estar a tratar de casas, desejo abordar o assunto — bairros sociais — visto estar presente o Sr. Ministro do Trabalho, não em relação às ocorrências que se deram, "mas no que diz respeito a um ponto mais importante.
._ Nunca concordei com que a construção de casas para habitação de clar-ses pobres fosse uma atribuição do Estado.
Não concordo que o Estado seja quem mande construir casas para operários; isso é uma missão que compete às câmaras municipais e o Estado o que deve fazer ó entregar às câmaras municipais os bairros sociais o dotá-las com os recursos precisos para elas poderem acabar essas construções e levar a efeito esses bairros.
Eu não sei se o Sr. Ministro do Trabalho ou o Governo concordam, com esta minha opinião.
Não posso aprovar que estas construções sejam feitas pela administração do Estado, porque o Estado não tem condições para isso; basta ver as constantes mudanças de Governos e portanto as constantes mudanças de orientação e planos.
Também tenho a dizer ao Sr. Ministro do Trabalho que no dia 27 de Abril mandei para a Mesa um pedido de documentos relativos aos bairros sociais. Peço ao Sr. Ministro do Trabalho que faça com que me seja .da.do despacho a esse requerimento e a nota me seja fornecida.
Também, tenho a dizer que, tendo ido ao Porto, vi que no Lordelo estão apenas feitos três barracões e que não há mais do que terraplenagens que só elas por si ficam mais caras do que a construção das casas.
O terreno aí é muito acidentado, foi um erro escolher esse terreno.
A melhor 'solução seria vender este terreno e adquirir o terreno ao lado norte
do bairro da Arrábida que se estende até o Campo Alegre terreno plar.o e bom.
Também desejo ouvir a opinião do Sr. Ministro do Trabalho sobre se a lei das oito horas de trabalho está om^ execução em.todo o País.
Tenho dúvidas porque UTL jornal do Porto afirmou que desde que o Regulamento foi adoptado provisoriamente a título de experiência mas como o prazo marcado já passou diz-se que a lei deixou de vigorar.
Na província não se faz caso da lei. Eu não me quero manifestar neste ou naquele sentido, mas o que eu queria era que o regime fosse igual para todos e para todo o País.
Também desejava abordar um ponto que há muito tempo tenho nos meus apontamentos relativamente ao ar:igo 29.° alínea a) do Regulamento dos Seguros Sociais.
Creio que não seria necessário que o Governo, de que era Ministro do Trabalho o Sr. Lima Duque, nomeasse uma comip-são de treze membros para fazer o Regulamento com 500$ cada um. Eu bem sei que o Estado tem o do^er de pagar aos seus funcionários, mas não duas vezes.
Não falo no assunto porque pense que o Estado fique arruinado cora esta questão, mas para afirmar que o aspecto moral do que se faz na República deixa imenso a desejar.
O Sr. João Luís Ricardo (interrompendo)'.— V. Ex.a tem razão em principio, mas como se trata de um assunto de técnica medica era necessária assa comissão.
Trata-se de assuntos médicos, de tribunais, dum sem número de cousas para as quais não têm competência burocrática os funcionários que lá estão.
O Orador: —Devo dizer a V. -Ex.a que não ó absolutamente assim. O indivíduo que não ó médico, mas que se especialize em determinada cousa medicinal, relaciona-se com os médicos; e assim como os engenheiros, advogados, stc.
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<_ que='que' a='a' foram='foram' dos='dos' j='j' cargos='cargos' quando='quando' exercer='exercer' p='p' nomeados='nomeados' iam='iam' para='para' então='então' competência='competência' esses='esses' tinham='tinham' funcionários='funcionários' matéria='matéria'>
O ponto de vista do Sr. João Kicárdo pafece^me imoral e injusto.
O Sr. João Luís Ricardo : —É justo e é moral porque o Estado tem pessoal mas não tem direito de exigir trabalho a criaturas que não sejam da especialidade.
O Orador:—;
O Sr. João Luís Ricardo:—V. Ex.a demonstra isso com factos, e..-.
O Orador:—Demonstro, sim senhor.
Tenho estado nas secretarias dos Seguros Sociais, e não tenho visto fazer nada, porque potíco mais de nada lá têm que fazer*
O Sr. João Liiis Ricardo : — É uma afirmação gratuita. -,
O Orador: — Três empregados que não pertencem ao Estado fazem mais serviço do que fazem os empregados dos Seguras Sociais, sendo mais de duzentos.
Peço perdão, Sr.-Presidente, se alguns Srs. Deputados supõem que pretendo melindrá-los.
Não vejo pessoas; vejo só factos, e a eles me refiro, e peço ao Sr. Ministro do Trabalho^ que, pelo menos, se não pode evitar factos passados, evite outros semelhantes no futuro. Tenho dito.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António da Fonseca): — Quanto à ques-tãò primeira, tratada por S. Ex.a, direi que é importante.
Há uma proposta de lei transferindo a propriedade daqueles terrenos para a Câmara Municipal do Porto. V. Ex.a poderá interessar-se junto das Mesas, se assinl o entender.
O Sr. Ministro do Trabalho (Domingues dos-Santos):—Creio que o primeiro assunto" qtíè foi tratado ,por S. Ex.a diz respeito à questão dos Bairros Sociais.
Devo dizer que foram criados por uni decreto com força de lei da minha autoria, e em vigor.
Não posso satisfazer o desejo de V. Èx.a ainda mesmo quando fosse ponto assente, sem que uma resolução da Câmara houvesse deliberado o contrário.
O assunto dos Bairros Sociais, quer na parte administrativa quer no seu funcionamento, está actualmente entregue a Uma comissão parlamentar de inquéritos qtlé há-de dar o seu parecer, não só sobre irregularidades, mas sobre outros asSUn-tos.
A comissão não se pronuncia ainda, e náo tomarei quaisquer iniciativas sem que essa proponha quaJquer cousa a esta Câmara.
Nessa altura devo então dizer o meti ponto de vista, quanto a esse assunto.
Penso como S. Èx.a que o seu funcionamento, tal como está, não pode cOíífí-nuar; penso que alguma cousa é necessário modificar; simplesmente o que digo é que a oportunidade de fazer essa modificação ainda não chegou, visto que a Comissão de Inquérito não apresentou ainda" o seu relatório.
Referiu-se S. Ex.a também ao facto de ó Bairro Social do Porto estar a ser cons-truído num local qite não é o melhor para esse fim. Devo dizer a S. Ex.a que discordo dessa opinião. Eu já examinei esse local com vários técnicos, e ficámos coní a certeza de que ele, pela sua extensão é situação perfo do mar, é o m'e'íhor que se podia ter encontrado para o fim á que se destinou. E, até £>or esse motivo, o Bairro Social do Porto, é de. todos, aquele que menos despesa tem feifo. Direi à S. Ex.a que estou convencido de que, se todas as obras do Estado fôssem como aquela, ninguém teria nada a dizer contra elas.
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e por isso o Sr. João Luís Kicardo se viu na necessidade de nomear uma comissão para esse fim.
Aparte do Sr. João Luís Ricardo que se não ouviu,
O Orador: — Eu devo dizer mais ao Sr. Manuel José da Silva que ato hoje nEo fiz nomeação de nenhuma comissão, e que procurarei realizar os serviços que forem necessários ao meu Ministério dentro da maior economia, sem nomear comissões remuneradas.
Sr. Presidente: há um outro assunto que S. Ex.a tratou, e é o que se refere ao horário de trabalho, ou seja à questão das oito horas de trabalho. Esta questão está hoje tomando uma orientação um pouco diferente daquela que teve quando foi publicado o seu respectivo regulamento. É certo que este determina que o seu prazo de validade é de seis meses, e daí deriva que os tribunais têm julgado que, sendo já passados êases seis meses, não há motivo para que se continue a aplicar a lei. Em face desta, circunstância, eu, neste momento, encontro-me impossibilitado de tomar qualquer iniciativa, porque compreende S. Ex.a que ao Poder Executivo não compete 'impor ao Poder Judicial a interpretação das leis. De resto, quando foi publicado o regulamento de que se trata, foi trazida pelo Sr. Aboim Inglês uma proposta para a sua revogação, proposta que foi entregue à comis-ião de trabalho desta Câmara, e por isso, sem ela se pronunciar, eu não posso tomar qualquer medida sobre o assunto.
Era esta, Sr. Presidente, a única medida que poderia tomar se, porventura, a ^comissão não tivesse tomado a peito a resolução da assunto.
Creio, Sr. Presidente, ter respondido a •todas as preguntas que me foram feitas pelo ilustre Deputado o Sr. Manuel José da Silva; porém, se alguns pontos tratados por S. Ex.a ficaram, porventura, sem resposta, eu aqui estarei pronto para responder a S. Ex.a
Tenho dito.
O Sr. Presidente:—Está em discussão a acta.
Não havendo quem peça a palavra, considera-se aprovada.
Foi aprovada.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra para um requerimento o Sr. Maldonado de Freitas.
O Sr. Maldonado de Freitas: — Sr. Presidente: pedi a palavra para pedir a V. Ex.a o obséquio de consultar a Câmara sobre se permite que entre desde já em discussão a proposta de lei n.° 766-D, da iniciativa do Sr. Ministro do Traba? lho.
Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.
O Sr. Presidente: — Continua em discussão o parecer n.° 727 e tem a palavra o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo.
O Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo:—Sr. Presidente: ouvi com a máxma atenção as considerações apresentadas pelos Srs. Deputados que já tomaram parte na discussão do parecer n.° 727.
Falaram já sobre ele os Srs. António Granjo e Manuel José da Silvt,, devendo eu dizer que estou absolutamente de acordo com as considerações apresentadas pelo Sr. António Granjo.
Eu devo dizer, Sr. Presidente, que reconheço que um dos grandes males da República tem sido exactamente a não aprovação, por parte do Parlamento, do Orçamento Geral do Estado, só bem que na situação em que nos encontramos seja quási que um impossível fazer-se um orçamento acertado.
Uma das verbas, Sr. Presidente, que mais chamou a atenção do Sr. António Granjo foi a que diz respeito à Casa da Moeda; porém, eu devo dizer a S. Ex.a que desconhece o assunto, pois, se assim não fosse, de certo que S. Ex.a não teria sido tani injusto nas suas apreciações como o foi.
Eu devo dizer à Câmara que a Casa da Moeda teve de fazer um contrato para um grande fornecimento, na importância total de 57:385 francos suíços.
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Seja como for, o certo ó que o Estado português tem de satisfazer a dívida que contraiu por intermédio desse estabelecimento. E, tanto esse pagamento se impõe, que já o Sr. Inocêncio Camacho, quando Ministro das Finanças, apresentou nesse sentido a proposta n.° 620.
A maior parte das verbas que constituem esto parecer não representam aumento de despesa, mas simplesmente um encontro necessário de determinadas verbas, e referem-se, na sua generalidade, a publicações feitas pela Imprensa Nacional, publicações cuja importância será descontada como receita geral do Estado, visto que o pagamento dos materiais adquiridos sai da totalidade dos lucros que para o mesmo Estado reverterão.
Portanto, em nome da comissão de finanças e como relator do parecer em discussão, devo dizer que nenhuma das razões apontadas pelos ilustres oradores que me antecederam pode colher. O que tomos é de fazer votos para que o Orçamento Geral do Estado seja rapidamente discutido porque só assim podemos evitar a apresentação de semeihan-tes pareceres.
O Sr. Presidente: — Está encerrada a discussão. Vai votar-se.
É aprovado na generalidade e na especialidade, sem discussão, bem como a emenda do Sr. Ministro das Finanças ao arti-go 1.°
O Sr. Costa Júnior: — Eequeiro que seja dispensada a leitura da última redacção.
É aprovado.
Procede-se à contraprova da votação que na sessão anterior incidira sobre o projecto do Sr. Eduardo de Sousa.
O Sr. Vasco Borges:—Pedi a palavra para declarar que voto a urgência pedida pelo Sr. Eduardo de Sousa para o seu projecto, mas simplesmente a urgência, porquanto reputo inconveniente a dispensa do Eegimento, uma vez que entendo que um tal assunto deve ser submetido à. apreciação das comissões respectivas para estas ,o estudarem detalhadamente e poderem dar à Câmara os esclarecimentos de que ela carece. *
Eu requeria que só dividisse o requerimento do Sr. Eduardo de Sousa. ..
Vozes:—Não pode ser!
O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara.
Trata-se duma contraprova que tem de repetir-se, visto ter sido empatada na sessão última; mas, se a Câmara negar a urgência e a dispensa do Eegimento, V. Ex.a não fica privado de, em seguida, requerer a urgência.
O Orador : — Era o que eu ia dizer, isto é, que me reservava, visto já não poder requerer a divisão do requerimento em duas partes, para, em.seguida à contraprova, requerer simplesmente a urgência.
O Sr. Eduardo de Sousa: — E preciso esclarecer o estado da questão.
O Sr. Presidente :—V. Ex.a não pode já discutir a questão.
O Sr. Eduardo de Sousa: — É sobre o modo de votar que eu falo.
Eu não teria dúvida em limitar-me a pedir a urgência para o projecto que apresentei se, porventura, julgasse isso simplesmente preciso. Mas eu pedi também a;dispensa do Eegimento e digo porquê. É porque acho absolutamente dispensável mandar este projecto novamente à comissão de guerra, desde que a comissão de guerra declare que não carece estudar novamente o assunto.
Estou certo de que qualquer dos membros dessa comissão declarará à Câmara que' ela está de acordo com o meu modo de ver.
O Sr. Presidente: — Isso Mo é falar sobre o modo de votar. , Os Srs. Deputados que rejeitam o requerimento do Sr. Eduardo de Sousa queiram levantar-s e.
Pausa.
O Sr. Presidente:— Estão sentados 32 Srs. Deputados; estão de pé 33 Srs. Deputados.
Está rejeitado.
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urgência para a discussão do projecto apresentado pelo Sr. Eduardo de Sousa.
Vozes : —Não pode ser !
O Sr. Presidente:—Peço a atenção da Câmara.
Não me parece que haja infracção regimental peio pedido do Sr. Vasco Borges. A Câmara acabou de decidir sobre a urgência e dispensa do Kegimento con-juntameute, mas não está impedida de conceder só a urgência. Entendo, pois, que não posso deixar de pôr à votação da Câmara o requerimento do Sr. Vasco Borges.
O Sr. Jorge Nunes (para explicações):— Não compreendo, à face do Regimento, como ó que, tendo a Câmara rejeitado a urgência ainda há pouco, e tam-bóni a dispensa do Regimento, V. Ex.a possa pôr à Câmara um requerimento que pede a urgência que já foi rejeitada. (Apoiados).
O requerimento do Sr. Vasco Borges não pode ser aceito pela Mesa.
O requerimento do Sr. Vasco Borges não pode ser aceito sequer pela Mesa porque houve um votação contrária ao assunto.
Apartes.
O Sr. Carlos Olavo: — Sr. Presidente : peço a atenção da Câmara e em especial a atenção do Sr. Jorge Nunes.
Há um equívoco em que labora a Câmara e é indispensável que ele seja desr feito.
O Sr. Jorge Nunes confunde urgência e dispensa do Regimento com a urgência simplesmente.
Para sor como S. Ex.3 deseja era necessário que as palavras urgência e dispensa do Regimento tivessem uma significação exclusiva.
O que estabelece o Regimento é que a urgência e dispensa do Regimento é diferente da urgência simplesmente.
É assim que sempre se tem considerado, e não pode ser outra cousa.
Apartes.
O Sr. Eduardo de Sousa: —Em vista das manifestações da Câmara, desisto tanto da urgência Q dispensa do Regimento
para o meu projecto, como também da simples urgência. Apartes.
O Sr. Jorge Nunes (_para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: a hermenêutica especial do Sr. Carlos Olavo n;io me convence.
sipartes.
O Orador: — Nós consicera:nos duas cousas distintas, já pelo seu significado, já pelas resoluções que a Câmara tem de tomar sobro urgência e dispensa do Regimento.
Houve um pedido de urgência e dispensa do Regimento e a Câmara pronunciou-se favorável ao roquerimei.to.
Houve unia contraprova e a votação ficou empatada, e hoje novamente foi votada.
Sobro essa votação tem do recair qual quer votação que se faça sobre o requerimento do Sr. Vasco Borges, e isso não podo ser porque contra essa resolução há uni artigo do Regimento.
Esta é que é a doutrina.
Apartes.
O Orador: — Se porventura o Sr. Eduardo de Sousa quiser que o seu projecto tenha, discussão na Câmara, tem de seguir outros termos diferentes daqueles que tem proposto, porque o Regimento no artigo 127.° não consente ou:ra cousa.
Apartes.
O Sr. Presidente: — O requerimento do Sr. Eduardo de Sousa importava a imediata discussão do projecto, v-isto que tendia a discussão da urgência o dispensa do Regimento; o requerimento do Sr. Vasco Borges é simplesmente para sor concedida a urgência e para isso entendo que este último deve ser posto à vota-
O Sr. Jorge Nunes: — Sr. Presidente: eu entendo que, para ser cumprido o Regimento e a exemplo do que se tem sempre feito, o requerimento devia ser desdobrado em duas partes, uma relativa à urgência e a outra à dispensa do Regimento.
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factos distintos. O facto de a Câmara votar a urgência e dispença do Regimento tem umas consequências; o facto da Câmara apenas votar a urgência tem umas consequências diversas. Não há, portanto, incompatibilidades entre as duas resoluções desta casa do Parlamento.
Nestas condições, entendo que V. Ex.a devo pôr o meu requerimento à votação.
Foi aprovado o requerimemto do Sr. Vasco Borges.
O Sr.. Ferreira da Rocha (para um requerimento}-.—Sr. Presidente: requeiro que seja concedida a dispensa do Regi-mento para a discussão do projecto do Sr. Eduardo de Sousa.
Vozes: — Não pode sor! Não pode ser!
.0 Sr. Carlos Olavo: — Invoco o § 3.° do artigo 51.° do Regimento.
O Sr., Presidente:— Não posso pôr à votação o requerimento do Sr. Ferreira da Rocha, porque isso seria iludir a primeira resolução da Câmara.
O Sr. Ferreira da Rocha: — A Câmara rejeitou a urgência e dispensa do Regimento conjuntamente, mas pode aprovar a dispensa do Regimento uma vez que já aprovou a urgência. (Apoiados].
O procedimento de V. Ex.a foi ilógico.
O Sr. Presidente : — Salvo o devido respeito por V. Ex.a, eu mantenho o meu ponto de vista.
Eu não podia admitir o requerimento de V. Ex.a, pois isso seria uma mistificação.
O Sr. Ferreira da Rocha:—V. Ex.a disse que o artigo 127.° não era aplicável à matéria.
O Sr. Presidente:—A Câmara por uma votação pôde conceder mais do que tenha concedido. (Muitos apartes}.
O Sr. Ferreira da Rocha:—V. Ex.a não aceitando o meu requerimento, também não podia aceitar- o requerimento do Sr. Vasco Borges. (Muitos apartes}.
Sussurro.
Leu-se na Mesa um projecto.
O Sr. Orlando Marcai: —V. Ex.a certamente está lembrado do requerimento do meu ilustre colega Sr. Cunha Leal, para entrar em discussão o projecto de lei n.° 734; com surpresa minha vejo que esto projecto foi substituído por outro e portanto reclamo perante V. Ex.a e a Câmara, para que entre em discussão o projecto de lei n.° 734.
O Sr. Presidente: —Logo que se-entre na ordem do dia, tenciono submetê-lo à apreciação cia Câmara, mas não podia deixar de cumprir uma deliberação da Câmara.
O Sr. Cunha Leal:—Há aqui uma confusão; eu já pedi a palavra dez vezes o ainda não consegui falar»
O que se quere não pode ser, porque toda a gente julgou que era sem prejuízo do tempo destinado à ordem do dia.
O Sr. Presidente:— Y. Ex.a fará certamente a justiça de acreditar que eu não ouvi pedir a palavra senão uma vez.
A votação que a Câmara fez foi no sentido de que o "projecto do Sr. Maldo-nado de Freitas entrasse na ordem "do dia.
O Sr. Cunha Leal:—Requeiro que se 'entre imediatamente na ordem do dia. Foi aprovado.
O Sr. Maldúnado de Freitas:—Devo dizer a V. Ex.a que o projecto não é meu nem do Sr. Ministro do Trabalho.
Requeiro que o projecto entre* amanhã em discussão antes da ordem do dia.
Foi aprovado.
O Sr. Ministro da Guerra (Álvaro de Castro): — Requeiro a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se consente que, antes da ordem do dia da sessão de amanhã, entrem em discussão os pareceres n.os 681 e 685.
Foi aprovado.
O Sr. Júlio Cruz:—Requeiro a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se consente que entre amanhã em discussão o parecer n.° 385.
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ORDEM DO DIA
Foi lido na Mesa e entrou em discussão o parecer n.° 734.
Parecer n.° 734
/Senhores Deputados.— A vossa comissão de legislação criminal estudou com todo o cuidado o presente projecto de lei da autoria do Sr. Orlando Marcai e chegou à conclusão, por maioria dos seus membros presentes, que à sua discussão nesta sessão legislativa terminantemente se opõe o artigo 25.° da nossa lei constitucional.
De facto, na sessão da, Câmara dos Deputados, de 8 de Abril corrente, foi apresentada o definitivamente rejeitada uma emenda concebida nos seguintes termos :
«São também amnistiados os crimes que, embora classificados de crimes comuns, tenham sido cometidos por motivo do origem, natureza ou carácter político».
O presente projecto de lei é a reprodução iniludível da mesma doutrina e do mesmo pensamento, não podendo, portanto, ser discutido sem ofensa da disposição constitucional já citada.
Assim o entendeu ainda há pouco a Câmara dos Deputados quando teve de se pronunciar sobre um projecto de lei que era a reprodução de uma emenda que, introduzida pelo Senado no projecto de reforma dos serviços farmacêuticos, foi rejeitada por esta Câmara com a confirmação do voto do Congresso.
E é louvando-se neste salutar procedimento que exprime o zelo bemjus'ificado dos legisladores da República no rigoroso cumprimento das disposições da sua lei fundamental que a vossa comissão de legislação criminal ousa lembrar aos Srs. Deputados que o presente projecto de lei não pode ser sujeito a qualquer espécie de discussão.
E por esta razão também esta comissão não entra na apreciação dos inconvenientes técnicos que ele contém e dos perigos que para a justiça podiam resultar da sua aprovação.
Sala das sessões da comissão de legislação criminal, 22 de Abril do 1921.— Vasco Borges—Álvaro Guedes—Orlando Marcai (vencido, por não concordar nem com a inconstitucionalidade do pro-
jecto, nem com a afirmação de «inconvenientes técnicos); e «dos perigos que para a justiça poderiam resultar», a quo o parecer alude e com o que absolutamente discordo)— Custódio de Paiva (vencido)— Carlos Olavo, relator.
O Sr. Orlando Marcai: — Sr. Presidente : antes de iniciar propriamente as respostas aos ataques e reparos c ae têm sido feitos ao meu projecto em discussão, desejo preguntar àqueles que representam o Poder neste país, quais são as garantias de defesa dos homens que têm o desassombro e a honestidade de rigorosamente cumprir as suas obrigações.
Quereria ver presente o Sr. Presidente do Ministério, que é também Ministro do Interior, para lhe exigir a resposta cabal de se já não há liberdade de opinião nesta pobre terra onde os cabotinos e os covardes se multiplicam, e se o*, indivíduos que, como eu, têm a rara virtude do, com coragem, apresentar os seus pontos de vista, como lhes ó pcrmitico pela letra expressa da lei e pelo concurso dos povos civilizados, podem continuar a sofrer vaias ignaras nas ruas por onde transitam e enxovalhes nas sujas colunas duma mprensa de linguagem despejada que ainda se consente para vergonha da mentalidade portuguesa. (Apoiados).
Se neste infeliz e desgraçado canto europeu chegámos ao descalabro, como nos sertões africanos, entre selvagens, de ter de só conquistar o respeito das pessoas e a independência das opiniões por meios violentos, então peremptoriamente declaro que asarei desse recurso, core. repugnância, é certo, porque sou homem de ordem, mas não me remeterão com facilidade ao silêncio dos vencidos, nem com ameaças, nem por meio de agressões.
(Apoiados).
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mais afrontosas provas da ignomínia e depravação morais. [Apoiados]. .
Não importa, porém, à minha sercni-dado o intrepidez. Emquanto tiver voz e uns restos, do energia, liei-do lutar pelo moti projecto de lei, só para republicanos concebido, F cm outro interesso que não seja satisfazer os ditames- do meu espírito 'o tranqftilizar a minha consciência revoltada por tanta miséria e duplicidade.
Posto isto, dispouho-me a responder com desenvolvimento a alguns Srs. Deputados que produziram considerações jurídicas, lio sentido de pretenderem concluir que o diploma que-tive a hoiira.de apresentar à Câmara ó inconstitucional.
ÊSSGS argumentos deduzidos, de tal maneira se reflectiram e pesaram no espírito dos membros da comissilo parlamentar de legislação criminal que esta, em sua maioria, perfilhou, som reservas, aíoutamonte, essa interpretação, que desde já classifico de errónea o por conseqiiôn-cia inoportuna.
. Se nãb vejamos: aduz^se que na sessão do 8 de Abril, quando só discutia na especialidade o projecto tendente a dar ampla amnistia aos criminosos monárquicos, foi apresentada unia proposta do aditamento idêntica, que foi rejeitada o por conseguinte o meu dito trabalho não pôde sequer sor admitido, porque a• isso se opOo a letra clara e expressa da Constituição.
Podom os contraditores do diploma da minha autoria e os três membros da aludida comissão de legislação criminal buscar novo caminho, porque esse recurso não lhos servirá para o estrangulamento do meu projecto. Eu gosto das situações = abertas, francas, escancaradas, o muito me pesa ver que, podendo esses elementos emitir parecer dicisivo, no sentido do meu trabalho não ser de aprovar por . qualquer outro motivo razoável ou inteligente, prqcurem a porta falsa da incons-titucionalidade, pondo assim em grave risco e. em dostoante cheque a sua competência, visto que todos ôles possuem um curso jurídico.
Sim, porque tenho a antecipada e absoluta certeza de que os luminares do direito que aqui têm assento, jurisconsultos de evidência, se quiserem intervir neste delicado assunto, para honra e prestígio das tradições parlamentares, hão-de repu-
diar por completo esse absurdo modo de ver.
Jamais me embrenhei, dentro e fora deste .ambiente, em questões onde os meus conhecimentos -não merecessem pelo menos a devida atenção por parte dos antagonistas. Faço-o sempre por um natural pudor mental, afastando-me sistematicamente das matérias que não- são da minha especialidade ou que não conheça com garantias.
Ora, prosseguindo, direi que cotejando a proposta de aditamento apresentada na sessão de 8 de Abril, que vou ler, com o corpo do artigo essencial do meu projecto, desde logo se observa, que são fundamentalmente diferentes. (Apoiados).
Todavia eu ainda quero, por hipótese-admitir que os dois trabalhos sejam per feitumenle iguais. Nem. assim teriam razão os paladinos dessa tam decantada in-constitucionalidade, presumida tábua de salvação, para se evitar a discussão dum diploma que simultaneamente inçará de perigos os que a aprovam e os que a rejeitam.
Eu, repito, é que nenhum receio tenho do que possa suceder, pois respeito em demasia as opiniões alheias para exigir que considerem igualmente ao minhas, levando a minha solidariedade a todos os que, embora no campo oposto, possam ser vexados por via da intransigência cios seus princípios.
A Constituição Política da Eepública Portuguesa diz, no seu artigo 35.°, o seguinte: «Os projectos definitivamente ré-, jeitados não poderão ser renovados na mesma sessão legislativa».
Será necessário, senhores, ir rememorando nesta discussão alguns princípios aliás rudimentares de direito publico, fazendo a leitura da disposições regulamen-, tares para se tirarem-conclusões em ordem a provar-se que a razão está do meu lado. Só assim sei discutir e argumentar.
Cabe por consequência preguntar: 4 as propostas de emendas, alterações o aditamentos que em qualquer altura dos debates se apresentam serão porventura os projectos a que aludo o citado e já lido artigo 35.° da Constituição ?
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isto é, ou sejam apresentados por membros do Poder Legislativo os primeiros ou pelos do Executivo as segundas, não podem ser sujeitos à discussão sem passarem pelss devidos trâmites regulares —o estudo das respectivas comissões com relatórios ou pareceres— a não ser que previamente disso tenham sido dispensados por meios que a própria Câmara pode facultar; ao passo que as emendas, alterações, aditamentos e substituições, devem ser discutidos e votados no momento om que qualquer diploma, a que digam respeito, esteja em análise e decisão legislativas.
Vê-se, portanto, desde logo, que não são uma e a mesma cousa "e tanto assim é que, para não irmos mais longe, o Re-gimento as distingue, quando se pronuncia, no artigo 51.°, da maneira seguinte: «Os Deputados têm direito de apresentar propostas, (que não são certamente de lei, porque essas só podem dimanar dos Ministros, como se observa no artigo 76.° deste mesmo Regimento), moções de ordem e projectos de lei, etc.»
E certo que o § 3.° do artigo que acabei de ler determina que «não pode ser mandada para a Mesa proposta alguma relativa ao assunto já discutido e votado» —notem V. Ex.as a lealdade com que argumento, não deixando de reserva nada que possa servir à interpretação dos meus contraditores—^mas isso significa por acaso que a matéria contida no mencionado parágrafo seja aplicável ao assunto em análise?
Não, ele diz somente respeito às propostas de eliminação, emendas, aditamentos e substituições relativas à discussão de qualquer medida legislativa, como iniludivelmente se conclui do confronto dos artigo 51.° e §§ 1.°, 2.° e 3.°, artigos 53.°, 107.° e 108.° do já referido Regimento.
Provando-se pois, como já fiz, que o projecto de lei ó cousa inteiramente distinta da proposta de emenda ou de aditamento, .como a que na sessão de 8 de Abril foi apresentada, vamos ver, mesmo dado de barato que a matéria contida no meu trabalho fosse igual à da proposta rejeitada, se, apesar disso, poderia ser-lhe vedada a discussão por inconstitucional. .
Relembremos uma vez mais o artigo
35.° da nossa Constituição e vejamos se, à face dessa doutrina, pode haver dúvidas ou se deve continuar a subsistir a teoria da comissão de legislação criminal. Só são inconstitucionais os projectos definitivamente rejeitados que se pretendam renovar na mesma sessão legislativa. E, partindo-se da hipótese 'de que o meu actualmente em discussão ó semelhante à proposta de emenda ou aditamento da sessão de 8 de Abril, é lícho inquirir: <ífoi p='p' inteiramente='inteiramente' ela='ela' rejeitada='rejeitada'>
Não, não foi, como plenamente vamos demonstrar.
O sistema parlamentar ou o Poder Legislativo entre nós, por via do seu regime constitucional, é exercido por duas Câmaras, a dos Deputados e a do Senado, que mantêm completa independência, deliberando em separado e só nos termos excepcionais trabalhando em -conjunto, ou seja em sessões do Congresso, quando entre elas haja discordância na, confecção das suas leis.
Ora, nesta conformidade só se pode considerar um projecto definitivamente rejeitado, respeitando a letra expressa do referido artigo 35.°, quando tenha sido aprovado nas duas Câmaras consecutiva-mente. (Muitos apoiados).
Sim, porque, pelo facto de um determinado diploma não ter alcançado aprovação em qualquer das assembleas do Poder Legislativo, isso não quere dizer que não possa ser presente naquela Câmara em que ainda não foi debatido.
Vozes:—Muito bem. Muito bem.
O Orador: — Mesmo o meu projecto de lei pode ser rejeitado aqui, mas nem por isso se pode considerar que o é definitivamente (Apoiados), porquanto qualquer membro do Senado ali o pode apresentar para sua discussão (Apoiados), e se lá tiver a mesma sorte daquela que porventura aqui sofreu, então, e só então, é que seria inconstitucional, quando renovado em qualquer das Câmaras, aã mesma sessão legislativa. (Muitos apoiados).
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comissão de legislação criminal, quer dos discursos que a ela deram origem.
Agora, Sr. Presidente, passo a cumprir uma obrigação contraída para com o meu ilustre colega, o distinto Deputado Sr. Matos Cid, que com elevação e brilhantismo apreciou juridicamente o meu projecto de lei, começando por agradecer-lhe vivamente as suas altas e significativas manifestações de boudade dirigidas às minhas modestas qualidades (Não apoiados) de legislador e jurisconsulto.
Na admirável dissertação de direito que apresentou a todos nós, emitiu dúvidas acerca da perfeita ou regalar aplicabilidade da doutrina do meu projecto, com a declaração de que aguardaria as minhas explicações, o que vou fazer, procurando responder, tanto quanto possível, às pre-guntas habilmente formuladas.
Desejou S. Ex.a saber, em primeiro lugar, em que altura do processo podia ou devia conhecer-se a sua indevida classificação, apresentando-se a demonstrar larga competência na análise que fez às complexas variantes porque os autos passam durante a sua organização.
O Sr. Matos Cid, que é um advogado com treno largo no foro, onde tem alcançado triunfos, conhece inteiramente, não só o formalismo processual, mas também a mecânica dos tribunais.
Não é por o pôr em dúvida, o que seria ocioso, mas para mais claramente deduzir a minha exposição e facilitar a minha tarefa, que vou descrever, o mais sucintamente que possa, as diversas formas de processo e as suas fases variadas para me desonerar do contraído dever.
pronunciar para, à sombra da letra do meu projecto, porem em liberdade todos os que a eles estivessem sujeitos? E acrescentou: após a pronúncia? Comecemos pelo mais importante, por conseguinte de cima para baixo, isto é, pelo processo ordinário, ou de querela. É boa, em qualquer altura, antes do julgamento, pois desde que este se tivesse realizado, havia o recurso à revisão, cujo direito é consignado no artigo 3.°, n.° 24.° da Constituição, para que o Supremo Tribunal de Justiça tomasse conhecimento de que a origem do feito crime tinha sido de natureza política e assim o tinham de libertar. Sim, porque, nos julgamentos destes processos, a origem política não chega a constituir dirimente para o alcance da absolvição, porque o júri sobre ela se não pode legitimamente manifestar. Portanto a parte devia, ou antes do julgamento, em qualquer altura do processo, e esta seria o forma mais própria, ou depois de julgado, por meio de revisão, requerer a admissão da prova. Mas diz o Sr. Matos Cid: a intervenção do interessado só podia ser admitida antes da pronúncia, afirmação com a qual não posso estar de acordo, que mo releve a sua comprovada autoridade. No caso do meu projecto ser aprovado, constituiria lei posterior, que revogaria a que a contrariasse. E compreende-se que se procedesse em conformidade com a minha opinião, pois os processos haviam seguido os trâmites vulgares, tinha-se formado a culpa sobre o feito crime, som atender à origem, e por consequência era razoável e ora justo que, desce que o arguido não usara da instrução contraditória por para ela não ter fundamento, ou da injusta pronúncia, pelo mesmo motivo, se lhe facultasse a intervenção em qualquer altura do processo, ainda após o libelo, visto ter aparecido um estatuto jurídico a que recorrer para se poder libertar. (Apoiados). Então iria demonstrar que a origem do delito era política, e assim conseguiria o seu objectivo.
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herdade como medida equitativa e generosa.
Sensação. Apartes.
O Orador: — E o que tenho visto na imprensa portuense. Ali, em todo o norte, conheço-os bem e posso distinguir os de delito político dos criminosos comuns. Mas, repito, têm sido a todos escancaradas as portas das prisões. A matéria contida no artigo 1.° da lei de amnistia, tendente a estabelecer excepção para os que tivessem atentado . contra os indivíduos e as fazendas, foi um platonismo ridículo (Apoiados), sabendo se que neste País o neste regime de transigências só não há benevolência para os que se batem pela República. (Muitos apoiados).
Eu sei qual a razão que levou o esclarecido espírito do Sr. Matos Cid a propugnar o princípio de que a doutrina por mim expendida não devia -ser admissível e, portanto, aplicável depois da pronúncia,em todos os processos que atenha.
É a mesma controvérsia dos jurisperi-tos acerca da instrução contraditória. Como se sabe, a Constituição, no n.° 20-° do seu artigo 3.°, veio permitir a todos os argiiidos, antes e depois da formação da culpa, todas as garantias de defesa. E esta doutrina, que parece fain clara e indiscutível, tem sido motivo para rijas polémicas e largas discussões, não havendo ainda hoje uniformidade nos julgados dos tribunais.
Tratadistas de direito há que dão como em pleno vigor e, portanto, de exclusiva aplicação a matéria contida nos artigQS 7.° do decreto de 14-de Outubro de 1910 e no artigo 14.° do decreto do 18 de Novembro do mesmo ano, que só admitem a instrução contraditória até a formação da culpa e depois de os acusados serem sujeitos a interrogatórios; outros, porém, dizem que essas disposições, inequivocamente contrárias à letra latitudinária da Constituição, estão ipso facto revogadas desde que esta foi promulgada, pois que, pela última parte do seu artigo 80.°, só continuam em vigor, em quanto não forem revistos pelo Poder Legislativo, as leis e decretos com força de lei que não forem contrários aos princípios consagrados na dita Constituição.
Portanto, apesar de a opinião declinada em primeiro lugar constituir a cor-
rente geralmente seguida por mestres de direito, escritores das revistas de jurisprudência e até pelos próprios arestos dos tribunais de primeira instância e superiores e pelo Sr. Matos Cid, como o demonstrou, hão-de permitir-me que opte e propugne a segunda, que se me afigura a mais consentânea com os fundamentos basilares da hermenêutica e da interpretação rígida e inteligente.
A instrução contraditória, j.\ o assegurei e sustentei em minuta perante os tribunais, íoi instituída para evitar a continuação da prática dos vexames dirigidos a pessoas de bem, e que inocentes e ma-lòvolamente eram compelidos a sentar-se nos bancos dos réus, pois que só em julgamento podiam provar a iní.nidado das acusações que lhe assacavam.
Sondo assim, e dada a imperfeição e a pouca clareza dos decretos aludidos de 1910, que nem cm instrução contraditória falavam, foi que a Constituição a instituiu com todas as garantias para os acusados, antes e depois da formação da culpa o, por consequência, a qualquer altura.
Deste modo, a meu ver, se deve entender. Que mo relevem os mestres proficientes, os julgadores experimentados, os articulistas peritos, os psicólogos intérpretes e o meu ilustre colega, Sou cioso das minhas opiniões, pois que as medito, avalio longamente e as robusteço com estudos duradouros e profundos, sem que me jacte jamais do ser um erudito.
Mas delimitei, como me cumpria, as duas correntes jurídicas com aquela isenção e imparcialidade que me caracterizam, devendo também declarar, com franqueza, que foram legítimas e lícitas a suspensão e as preguntas do Sr. Matos Cid, bem como a dúvida manifestada por outro meu ilustre colega, o ST. Carlos Olavo, relator do parecer da comissão do legislação criminal.
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Mas não é necessário chamar em auxílio os defensores da doutrina contrária, e sabe-se que neste sentido se têm pronunciado muitos tribunais, entre ôles o Supremo Tribunal do Justiça em vários acórdãos, jurisconsultos eminentes o revistas consagradas .no meio jurídico.
xv.s preguntas ansiadas dos Srs. Matos Cid e Carlos Olavo respondo, pois, cônscio de que não faço inovação impraticável ou desconforrne com a prática judicial:— os tribunais são chamados a intervir, para os casos sujeitos, ao meu projecto em qualquer momento em que as partes interessadas, por si ou por intermédio de procuradores, assim o requeiram e forneçam elementos de prova para corroborar o alegado.
É o que sucede também com o processo de polícia correccional (e com esta parte da exposição satisfaço à última pre-gunta do Sr. Matos Cid), que não'tem senão a íase preparatória, que não carece de pronúncia, pois que, organizado o corpo do delito indirecto e antes deste o Directo, se há lugar para tal, o agente do Ministério Público promove, por dever de ofício, que'se designo dia do julgamento se hpuver ofensas & lei, que deve declinar.
& Quando é que, neste caso essencial, a parte pode socorrer-se da instrução contraditória? pergunta-se-me. « A toda a altura do processo até o julgamento. Logo que o arguido sabe que está sob a sanção da lei e dependente da acção da justiça, e há-de sabê-lo, pelo menos uns dias antes do julgamento, pela intimação oficial, requero ao juiz que, desejando instruir contraditoriamente o processo, o ouça por termo nele as suas de-claraçõ.os sejam reduzidas a auto, as suas testemunhas ouvidas, e que por fim p magistrado sp. manifeste no septido de declarar se há motivo a prosseguir-se ou a arquivar-se o procedimento criminal.
O Sr. Pais Roviscq:
sim inosmo!
j claro, ó as-
0 Orador: — E esta minha opinião, que eu mantive em vários casos da minha actividade profissional, em que intervim como acjvpgado e que tive o prazer de ver decjdidos nos tribunais, tem sido largamente debatida, cora os mesmos pontos
de vista, por escritores eméritos, nos jornais que se dedicam à crítica jurídica e, em especial, a vi proficientemente deduzida na tam acatada Revista de Legislação e Jurisjwudêhcia, de Coimbra.
Não há, pois, dificuldade de espécie alguma na aplicação da matéria contida no meu projecto de lei em discussão. A persistir nesse receio é, sem desdouro para as intenções dos que iutcrvieram no debate e sem pretensão de ferir susceptibilidades, pôr em dúvida a competência e a lisura do Poder Judicial, ao qual quero prestar a minha homenagem de respeito e veneração, e que, não sendo ainda independente sob o ponto de vista financeiro (Apoiados], por culpa da Câmara, como de há muito venho reclamando, é. no cmtanto, intransigente na defesa da honra, da moral e do direito (Apoiados} para bem de todos nós, que, diga-se uma vez mais, o votamos ao esquecimento injustificado.
A outra parte, a que se fez referência demorada c oposição inexplicável, diz respeito à inconstitucionalidade do projecto.
O Sr. Matos Cid:—V. Ex.a dá-me licença? Eu tratei apenas fio. aspecto jurí-dico-criminal da questão.
O Orador:—Não me podia referir a V. Ex.a, pois é cm demasia arguto para ter de socorrer-se duma idea tam insubsistente.
Dirijo-me aos membros da comissão de legislação criminal que não se satisfazendo com a inconstitucionalidade arguida acrescentani que se o projecto for aprovado, trar4 inconvenientes técnicos, além dos perigos que para a justiça possam resultar !
Se no que respeita à primeira arguição ela representa um recurso infeliz, em relação às outras sintetizam afirmações tam anodinas e vagas, tam à sôbre-posse amontoadas, que nem merece a pena dissecar.
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Não o disseram, e tanto melhor, porque não tenho de ocupar-me dôles, nem prender por mais tempo as atenções de todos com estes pesadíssimos enfados (não apoiados).
Só os tribunais o poderiam dizer com vantagem e como à sua salvaguarda se deixa a classificação dos feitos, eles saberão nobremente assumir a responsabilidade das suas decisões, como ó costume, porque em demasia prezam a sua fidalga condição de rigorosos e honestos detentores da puríssima justiça lusitana. (Apoiados).
Sr. Presidente: a ordem dos trabalhos acerca desta matéria foi marcada pela própria comissão de legislação, porquanto o resultado do seu parecer é protelar a discussão do projecto, para se tratar exclusivamente da inconstitucionalidade que ó o ponto essencial neste momento.
Estou em dizer que, depois da minha exposição, esse recurso será relegado ao raso coval onde são sepultados os que não dão na sua passagem o mais leve sintonia de vida.
A pretensão íoi descoberta e como não sou dos que desanimam com facilidade, aguardo pacientemente que o episódio termino, para então se discutir num à vontade sem limites o fundo d» projecto que pela morosidade que tem levado a discutir já representa a sombra enorme que, apesar de distante, nos cobre de trevas a consciência alvoraçada.
Vozes:—Muito bem, muito bem. O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente:—As comissões dos negócios estrangeiros, agricultura e finanças, pedem autorização para reunir durante a sessão do dia 13.
Os Srs. Deputados que autorizam, queiram levantar-se.
Foi autorizado.
O Sr. Carlos Olavo : — Sr. Presidente: quis a maioria da comissão de legislação criminal dar-me a honra de me incumbir do encargo de exprimir no parecer que mandei para a Mesa o seu pensamento e opinião acerca do projecto de lei do Sr. Orlando Marcai.
Sr. Presidente : a comissão por maioria dos seus membros, entendeu que esse pro-
jecto de lei ia de encontro à disposição, a meu ver muito clara e terminante, do artigo 35.° da Constituição, e que, portanto, não se pudia discutir senão sob o ponto de vista dessa inconstitucionalidade.
Não vou por conseguinte, responder agora às considerações com que o Sr. Orlando Marcai pretendeu mais uma vez justificar o seu projecto de lei, relativamente ao seu alcance e às suas disposições.
Vou procurar simplesmente explicar à Câmara as razões por que a maioria da comissão entendeu que o projecto de lei era inconstitucional.
Sr. Presidente: é preciso não esquecer o artigo 35.° da. Constituição, que há dias foi aqui largamente discutido, tendo eu o prazer do ver a meu lado, para determinar uma justa e rigorosa interpretação, alguns dos meus colegas do Partido Popular.
Poderia entender-se que a disposição do artigo 35.°, poderia assim ser interpretada, porém não o foi, ficando de pé a verdadeira interpretação que se lhe deve dar.
O artigo 35.° da Constituição como é evidente, refere-se somente a projectos de lei apresentados nesta ou n& outra casa do Parlamento e não a emendas.
Desta forma, Sr. Presidente, não se pode de maneira nenhuma interpretar doutra íorma o artigo 35.° da Constituição que a meu ver é bem claro.
Desde que o Sr. Orlando Marcai queria que a sua emenda vingasse, tinha uma maneira fácil de iludir a disposição do artigo 35.° da Constituição, e era ter transformado a sua emenda num projecto de lei.
Assim a Câmara não se poderia opor a que esse projecto fosse recebido, discutido e porventura votado.
Doutra forma não, por isso que o arii-go 35.° da Constituição é, repito, bem claro a tal respeito.
Assim a Câmara cônscia das suas res-ponsabilidades e dos seiis deveres, entendeu e muito bem, que a doutrina apresentada pelo Sr. Orlando Marcai, não podia vingar.
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tuição, está no espírito de toda a Câmara.
Assim o entendeu o Partido Liberal, sobre a emenda introduzida no projecto relativo aos serviços farmacêuticos, tendo feito com que ele fosse retirado da dis-' cussão tal qual estava redigido.
O Sr. Cunha Leal:—Eu devo dizer francamente à Câmara que relativamente a questões jurídicas pouco percebo, porém, parece-me que o caso do ilustre Deputado Sr. Orlando Marcai é comple-tamente diferente do que estamos tratando.
O Orador:—Está V. Ex.a completa-mente enganado.
Nesta altura trocam-se apartes entre o orador e os Srs. Vasco Borges, Orlando Marcai e Cunha Leal, que não foi possível reproduzir.
O Orador: — Sr. Presidente: este artigo 35.° da Constituição, precisa ser explicado à Câmara, no ponto de vista das suas origens.
Quando se tratou da discussão da Constituição, eu que escrupulizei om dar pare-, cer o mais justo possível ao projecto do Sr. Orlando Marcai, fui procurar no Diário da Assemblea Nacional Constituinte a discussão que teria sofrido o artigo 30.° da Constituição.
Efectivamente sobre esse artigo que correspondia no projecto primitivo a-> n.° 24.°, verifiquei que nenhuma discussão tinha posto ossa hipótese, o simplesmente alguns Deputados tinham proposto a sua eliminação por entenderem que esta disposição do artigo 3õ.°, tinha carácter simplesmente regimental.
Abrindo o Eegimento da Câmara...
O Sr. Orlando Marcai:—É o ponto em discussão. Uma cousa que a comissão diz é que o projecto é anti-constitucional, não anti-regimental.
Era, portanto, à sombra do artigo 35.° da Constituição, não à sombra do Eegimento.
O Orador: — Não temos forma de seguir um argumento com este processo de interrupções constantes. É muito difícil argumentar porque não chegamos ao fim do nosso pensamento.
O Sr. Orlando Marcai:—li ao costumo interromper os oradores, como V. Ex.a sabe. Todavia, desde o momento em que V. Ex.a permitiu que todos os Srs. Deputados o interrompessem, fiz apenas a observação que me pareceu, porque ó, na realidade, lógica; mas com permissão de V. Ex.a
O Orador: — De modo algum me perturbou a interrupção de V. Ex.a, mas, para a discussão ter normalidade, preciso concluir o meu pensamento.
A comissão indica a inconstitucionali-dade do projecto. Verificou que as disposições da Constituição não podem dar razão a S. Ex.a, porque o artigo 35.° devia desaparecer do diploma fundamental da República e ser transformado.
Segundo o Regimento, o projecto do Sr. Orlando Marcai nem sequer podia ser recebido na Mesa pelo Sr. Presidente, nem podia ser enviado à comissão de legislação criminal, nem sobre ele podia incidir a mais pequena espécie de discussão.
Sr. Presidente: há uma outra parte deste parecer que foi impugnada pelo Sr. Orlando Marcai, em que S. Ex.a pretende, não que fosse modificada, porque lhe faltava a indispensável força, dado o confronto com a emenda rejeitada em 8 de Abril nesta Câmara ao tratar-se do projecto de amnistia.
Comparando, o projecto apresentado em 8 de Abril com o trazido agora à Câmara pelo Sr. Orlando Marcai, não me parece, Sr. Presidente, que possa existir no espírito dos Srs. Deputados a menor dúvida acerca da semelhança de pensamentos duma e outra proposta.
Por esto projecto, um crime classificado de delito comum, mas que é de origem política, é, nem mais nem menos, um crime indevidamente classificado, e não me parece que possa haver qualquer divergência sobre isto no espírito de qualquer pessoa que roflita de boa fé.
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ciar todos aqueles indivíduos, seja qual for a sua cor política, que se encontrem envolvidos indevidamente em processos por delito comum, .quando os seus delitos têm origem do natureza e carácter político.
jíi indispensável desfazer este equívoco para que não se diga que aqueles que impugnam o projecto o fazem por parti-pris político.
A razão por que eu sou contrário à aprovação deste projecto é simplesmente porque eu entendo que ele prejudica a justiça. Mais nada!
Se há, efectivamente, republicanos que não foram abrangidos na amnistia ultimamente concedida, cujos delitos tiveram realmente origem em factos de natureza política, apresente-se então um projecto no qual se faça indicação dos nomes a quem esse projecto deve atender, especificando também a natureza dos crimes.
Isto é que se deve fazer.
Não terei dúvida em dar o meu voto para a amnistia a esses republicanos, cujos delitos tenham origem nitidamente política.
O Sr. Cunha Leal: — Citando-se nomes deixa de ser amnistia. Será um indulto.
O Orador:—Não há nada na Constituição que se oponha a que o Parlamento amnistie especificadamente A, B ou C.
O Sr. Cunha Leal: — 4Que diferença há então entre amnistia e indulto?
O Orador: — A amnistia faz desaparecer por completo o delito.
O indulto é um perdão.
Sr. Presidente: aludindo exclusivamente à matéria constitucional do parecer da comissão a que tenho a honra de pertencer,, julgo ter respondido aos argumentos e considerações apresentados a esta Câmara em defesa do projecto de lei do Sr. Orlando Marcai.
Nada, absolutamente mais nada, por emquanto tenho a acrescentar.
Só se a Câmara, por uni estranho absurdo, entendesse qne este projecto era constitucional e que sobre as suas disposições devia recair urna discussão, é que, oní nome da comissão, teria também de
apreciar o que considero os verdadeiros inconvenientes técnicos e perigos que, para a justiça, poderiam resuliar da aprovação de tal projecto de lei.
• O Sr. Matos Cid: — Sr. Presidente: por uma coincidência de que sou o primeiro a felicitar-me, entrou hoje em discussão, nesta casa do Parlamento, o parecer da comissão de legislação criminal apresentado sobre o projecto de lei do Sr. Orlando Marcai. E digo por uma feliz coincidência porque, tencionando ausentar-me por dois dias de Lisboa e, pcrtanto, dos trabalhos desta Câmara, eu rsão poderia apresentar ao Sr. Orlando Marcai os meus agradecimentos, pelas palavras lisonjeiras com que S. Ex.a se referiu às modestas considerações que eu proferi numa das sessões passadas e, sobretudo, a dotes de espírito e requisitos que não possuo (Não apoiados), e que devo apenas ao favor e à benevolência do ilustre Deputado.
Sr. Presidente; creio que não é o projecto que está era discussão, mas simplesmente o parecer e, por isso, não querendo meter a fouce em seara alheia, eu não entrarei na apreciação dos motivos de natureza constitucional, tam brilhantemente expendidos pelo meu ilustre amigo Sr. Carlos Olavo, e apenas pá e limitarei a discutir o assunto debaixo do aspecto meramente jurídico.
Outros mais competentes de que eu e com responsabilidades que eu não tenho apreciaram o caso sob o ponto de vista político, visto que todas as amnistias têm esse carácter.
Sr. Presidente: efectivamente o ilustre Deputado Sr. Orlando Marcai procurou responder às objecções de técnica jurídica que eu tive a honra de formular, mas a verdade é que S. Ex,a, com o brilhantismo que costuma pôr em todos os seus trabalhos oratórios, de que é exímio cultor, com toda a sua inteligência, que lhe consagrou o nome nos tribunais) do norte, S. Ex.a apesar de tudo não respondeu às minhas preguntas, subsistindo absolutamente de pé todos os meus reparos.
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Keferiu-se S. Ex.a largamente aos diplomas que existem no nosso país e o que é para lastimar ó que esses diplomas não tenham sido até hoje convenientemente explicados pelo Poder Legislativo, para não darmos aos tribunais ocasião a interpretações diversas, que neste pais, como em todos os outros, só servem para prejudicar os mais caros interesses morais e materiais dos cidadãos. (Apoiados).
Os diplomas de Outubro e Novembro de 1910 não impõem a nenhum arguido da prática dum crime a obrigação de, em dado momento, vir ao tribunal respectivo pedir que se lhe promova uma acção contraditória. O que existe é a faculdade de o arguido poder íazer esse pedido.
Nestas circunstâncias, eu pregunto como é que S. Ex.a, estando ausente o arguido e não podendo aplicar-se-lhe ~a lei que regula o processo do crime dos au-, sentes, arranja as cousas para que o Poder Judicial possa aplicar rigorosa e convenientemente o seu projecto.
S. Ex.a não pode certamente fazer uma tal afirmação porque ela repugna ao seu espírito e à sua consciência de homem de bem e de verdadeiro republicano.
Eu não sei distinguir, nem posso distinguir, entre a justiça a conceder a um republicano ou a um monárquico,
Tal distinção não a aceita o meu espírito, não a aceita o espírito de ninguém*
A justiça é uma só, as circunstâncias é que são diferentes.
E digo isto, para evitar especulações vergonhosas como algumas que se tom feito lá fora, e que só servem, não para lançar um labéu sobre determinados homens públicos, mas simplesmente para envenenar a opinião pública.
Desde que fica assente — e S. Ex.a não demonstrou o contrário — que osta é a única doutrina sustentável, eu continuo a afirmar que a doutrina do projecto em discussão, uma vez aprovada, irá lançar uma arma perigosa nas mãos do julgador.
A amnistia é um esquecimento; é um traço lançado, não sobre o criminoso, mas sobre o crime, e sendo assim, eu pregunto o que virá a suceder, por .exemplo, no processo ordinário ou de querela quando o arguido não possa ou não queira sujeitar-se à instrução contraditória.
,xE o que virá a suceder ainda, se ele,
sujeitando-se a essa instrução procurar demonstrar em plena audiência e com toda a liberdade, o carácter, a origem e a natureza política do acto que praticou?
Isso seria um trabalho longo e que está no uso desta Câmara, pois está demonstrado que assembleas políticas não são próprias para fazer códigos, mas sim leis.
V. Ex.a não aproveitaria nada com a aprovação do seu projecto; apenas ele ia servir de instrumento de confusão, de discussão nos tribunais.
Isso0 não servirá para mais nada senão para o desprestígio da República"e da Pátria.
O Sr. Costa Júnior:—Participo a V.' Ex.a que está constituída a comissão de agricultura.
Pedia também a V. Ex.a, para solicitar do Sr. Ministro da Agricultura, para que nos fossem dadas todas as facilidades no Ministério da Agricultura.
O Sr. Vasco Borges (para um negócio urgente}:—Sr. Presidente: foram ontem à noite apreendidos cinco jornais que se publicam em Lisboa.
Não li desses jornais, senão o Diário de Lisboa, mas não encontrei nele nada que pudesse justificar essa apreensão, não sei que motivos levaram a autoridade a ter tal procedimento.
O Diário de Lisboa é um jornal autenticamente republicano (Apoiados], é um jornal correcto na sua forma de dizer, é o que se chama um jornal afamado.
Mais ainda: o homem que está à frente desse jornal é um republicano autêntico: é o Sr. Joaquim Manso, a respeito do qual o Sr. Presidente do Ministério é testemunha idónea, pois o Sr. Manso foi go-vtrnador de Vila Rial, no Ministério do Sr. Bernardino Machado.
Desejo saber em que se firmam as autoridades para fazer essas apreensões.
Faço as seguintes preguntas ao Sr. Presidente do Ministério-.
l.a ,J Foi o Sr. Presidente do Ministério quem ordenou a apreensão de todos esses jornais?
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Diário da Câmara dos Deputado*
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Bernardino Machado): — Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Vasco Borges acaba de dizer que lhe causou estranheza a apreensão de um jornal de ontem.
Eu digo mesmo mais : ignorava-a—e creio que, dizendo que a ignorava, tenho respondido apodas as preguntas de S. Ex.a
O Sr. Vasco Borges:— O Orador:—Tenho-o lido várias6vezes, mas ontem não o li, visto que foi apreon-dido... Interrupção do Sr. Vasco Borges. O Orador:—Perdão, a pregunta de S. Ex.a tinha razão de ser. Ignorava a apreensfio, porque se dela me tivesse sido dado conhecimento, eu. teria lido esse jornal. Com respeito aos outros jornais, devo dizer que só por acaso os leio. Não é que me não importem, porque eu preferiria que não fossem injuriosos para os poderes públicos e estimava mesmo que os nossos adversários discutissem connosco, com a cortesia com que todos aos procuramos discutir com eles, mas em geral não os leio, senão uma ou outra vez, para efectivamente ver qual é a fúria que lhes causa a vida da República e quási que exulto com os seus ataques. São sempre a prova da nossa vida e de que os nossos adversários se sentem absolutamente incapazes de nos combater no terreno da livre e nobre discussão. O Sr. Vasco Borges:—Eu reservo-me para continuar as minhas considerações, que simplesmente interrompi para o Sr. Presidente do Ministério poder responder imediatamente às minhas preguntas. O Orador:—Eu terminarei já o que tinha a dizer, mas, se V. Ex.a prefere... O Sr. Vasco Borges :— Eu prefiro sem- • pré ouvir S. Ex.a O Orador:— E um acto de modéstia ciue ainda dá mais relevo aos méritos de S. Ex.a (Risos). Ainda há pouco eu disse nesta Câmara que não me alvoroçaram nada os extre- mistas que erguem bandeiras vermelhas e gritam vivas à anarquia, porque nós também, quando na oposição, erguíamos a bandeira verde-rubra e gritávamos vivas à República que nesse tempo era para a monarquia a verdadeira anarquia no pior sentido que se usa dar à palavra — contanto que não haja violências. Também nada mo alvoroçam as tropas monárquicas e, por mim, deixaria dizer-se e escrever-se tudo, tornando-se esses ataques como um sintoma patológico do estado de alma dos nossos adversários. Só é lamentável porque se trata de portugueses. Nada mais. Sobre a matéria, propriamente, a minha pena é que não tenhamos uma lei de imprensa como é necessário que exista, assegurando todas as liberdades, mas impondo todas as responsabilidades. (Apoiados). Se essa lei existisse, não se teriam dado casos estranhos que todos nós conhecemos. Lembra-se V. Ex.a, Sr. Presidente, e lembra-se a Câmara da campanha de injúrias que se fez contra nós durante a guerra. Ficaram, no emtanto, inteiramente impunes todas elas. Agora, há jornais que não tem por fim senão a acção que não é crítica, mas dissolvente da sociedade portuguesja. Era necessário que esses jornais assumissem todas as responsabilidades pelo que escrevem, mas sobretudo, acima mesmo dessa necessidade, o que julgo indispensável é que haja uma imprensa republicana. O que me dói, como republicano é que se possa dizer contra nós que não estamos à altura da nossa missão. Aqui tem V, Ex.a o que eu penso, na certeza de que até agora não tinha recebido reclamação alguma da polícia. Receboa agora. Tenha S. Ex.a a certeza de que vou tomar as providências e de que me associo inteiramente ao seu pesar, porque o director do jornal a que S. Ex.a se .referiu, foi meu colaborador como secretário particular em 1914.
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tério que é preciso olhar com muito interesse para o que se passa com as autoridades a que está entregue o serviço de , vigilância da imprensa.
E preciso não esquecer que ainda temos uma lei do imprensa que é necessário fazer cumprir e respeitar, o que infelizmente eu não tenho visto, porque ao passo que uma vez na imprensa se insultam impunemente os homens públicos mais categorizados deste país e que se chega a ponto de ofender o nosso brio de portugueses, como sucedeu quando foi da chegada dos nossos gloriosos mortos ao arsenal, que um jornal, A Batalha, classificou essa cerimónia de batuque, a autoridade não interveio e ao Diário de Lisboa, porque publicou uma entrevista em que o Sr. Trindade Coelho exprimia o seu modo de pensar acerca do projecto de amnistia do Sr. Orlando Marcai, a polícia procedeu pelo modo que relatei a V. Ex.a
Nestas condições, a polícia está ao serviço duma facção.
Sabe V. Ex.a e a Câmara que todos os dias se efectuam prisões que não se mantêm, que só a truculência da polícia explica. E o caso do Sr. Moreira de Almeida, que só serve para enfraquecer a República, para desprestigiar as autoridades da República, e fazer o jogo dos monárquicos.
.Sr. Presidente: factos graves me têm sido apontados todos os dias, e consta-me até que há indivíduos que se intitulam agentes da autoridade, andando munidos de bilhetes que gratuitamente são fornecidos na polícia de Lisboa.
São esses homens que não merecem a confiança de ninguém, e que nas ruas espancam pessoas indefesas, e até republicanos, por engano e confusão.
Portanto, Sr. Presidente, eu sinto-me cheio de autoridade para chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério, a fim de que S. Ex.a tome imediatas providências no sentido de tais factos não continuarem desprestigiando a República, e para que es La se liberte de quem não quere ou não sabe servi-la com competência, e que apenas lhe presta um mau serviço.
Tenho dito.
O Sr. Presidente do Ministério e Mi-jiistrp do Interior (Bernardino Macha-
do) : — Eu disse ao Sr. Vasco Borges que não conhecia o facto da apreensão, e que não tinha recebido reclamação alguma sobre esse assunto. Desde que S. Ex.a fez a sua reclamação, eu tomarei todas as providências.
O Sr. Vasco Borges : —Muita gente não reclama porque não acredita na eficácia das suas reclamações.
O Orador: —Desculpe-me V. Ex.a, mas ninguém tem o direito de não acreditar na acção do Governo. Todos têm o direito de acreditar que aqueles qua se sentam nestas cadeiras zelam efectivamente pela dignidade da República. (Apoiados}.
Como disse, não tinha conhecimento do facto, mas vou examiná-lo e tomar as necessárias providências, e tenham V. Ex.as a certeza de que procederei como costumo proceder.
Tam pouco tinha conhecimento dos actos de violência a que S. Ex.a se referiu, e sou contrário a eles, praticados seja contra quem for.
É facto que são já do tempo deste Governo as prisões com a incomunicabilida-de. Eu sou inteiramente adverso a isso, e não podendo intervir na acção da polícia, sustando-as, pedi, no emtanto, um relatório sobre o caso, a fim de o examinar.
Realmente isto não pode ser, nem há-de continuar.
Mas, embora não possa intervir directamente na acção policial, eu fiz por esses presos, embora nossos adversários, tudo o que foi possível para que eles não tivessem de que se queixar do Governo.
São estas as explicações que, como chefe do Governo e como republicano, entendo dever dar a S. Ex.a
Tenho dito. •
O Sr. Vasco Borges : — Sr. Presidente: V. Ex.a faz-me a fineza, diz-me a que horas, é encerrada a cessão.
O Sr. Presidente: — Falta meia hora.
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ao adiantado da hora, e por várias discussões que tom sido aqui travadas, pre-guntava se V. Ex.a poderia interromper os trabalho» e continuar a discussão amanhã.
O Sr. Presidente: — Fica V. Ex.a com a palavra para amanhã.
ABtes de se encerrar a sessão
O Sr. João Camoesas : — Chamo a atenção de V. Ex.a para o modo como está procedendo a autoridade de Vila do Conde acerca dos republicanos do concelho.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Bernardino Machado) :—Já ontem mandei inquirir desse caso, e virei aqui trazer ao ilustre Deputado o resultado das averiguações a que mandei proceder por intermédio do governador civil.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
Antes da ordem:
Parecer n.° 713, de hoje;
Parecer n.° 766-D, que abre um crédito especial de 81.472$50, a fim de ser aplicado a despesas constantes do 2.° orçamento suplementai- ao ordinário de 1920-Í921, no Hospital D. Leonor, das Caldas da Rainha.
Parecer n.° 681, que abre um crédito especial de 350.000»? a favor do Ministério da Guerra, para fazer face às despesas com a aviação militar;
Parecer n.° 685, que autoriza a Ministério da Guerra a contrair um empréstimo de 1:000.000$ para completar a instalação do Parque do Material Aeronáutico em Alverca do Ribatejo;
Parecer n.° 580, que concede pensões annais a várias viúvas;
Parecer n.° 762, que concede urna pensão de 2.400$ à viúva e filhos do tenente da guarda republicana, José Martins.
Ordem do dia:
Parecer n.° 734, de hoje, e pareceres n.08 719, 720, 635-H, 752, 661 e 656, de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram Í8 horas e ôõ minutos.
Documentos enviados para a Ilesa dnrante a sessão
Proposta
Da comissão do Orçamento, para que seja nomeada uma comissão parlamentar para estudar e reorganizar- os quadros dos diferentes Ministérios-e serviços autónomos.
ImprimCt-se com a máxima urgência.
Proposta de lei
Do Sr. Ministro das Finanças, alterando a proposta de lei, já apresentada, sobre emolumentos e salários judiciais,
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Projectos de lei
Do Sr. Lúcio de Azevedo, criando em Lagos uma corporação denominada «Junta Autónoma do Porto Comercial de Lagos».
Para o «Diário do Governo».
Do mesmo,~'. criando em Vila Real de Santo António uma Junta Autónoma do Porto Comercial de Vila Real de Santo António.
Para o a Diário do Governo».
Do Sr. Alberto Jordão, contando ao bacharel Tomás Tiago Mexia Leitão, como serviço na magistratura, o sexeni o em que desempenhou o cargo de Juiz Municipal.
Para o «Diário do Governo».
Do Sr. Eduardo de {Sousa, anulando, por inconstitucional, a lei n.° 1:158 inserta Diário do Governo de 1921.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de guerra.
Pareceres
Da comftsão do Orçamento, sobre a proposta orçamental relativa ao Ministério do Trabalho.
Imprima-se com a máxima urgência.
Da mesma, sobre a proposta orçamental relativa aos serviços autónomos do Instituto de|Seguros Sociais Obrigatórios e de Providência Social.
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N.° 727, que reforça algumas verbas da proposta orçamental para o ano económico de 1919-1920.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Dispensada a leitura da última redacção.
Da comissão de marinha, sobre o n.° 763-A, que autoriza o Governo a delegar designadas faculdades numa corporação que se designará «Junta Autónoma da Ria e Barra de Aveiro.
Para a comissão de comércio e indústria.
Da comissão de finanças, sobre o n.° 693-D, que suspende os concursos para aspirantes do quadro do Ministério da Agricultura, emquanto não forem nomeados definitivamente os aspirantes provisórios em exercício.
Imprima-se
Requerimentos
Sequeiro que, pelo Ministério das Finanças me seja fornecida, com a maior urgência, uma nota das famílias que habitam nos conventos da Encarnação e de Santos-o-Novo, indicando-se o nome e idades das pessoas que constituem cada uma dessas famílias, número de compartimentos por elas ocupados, despachos que autorizaram essa residência, disposição da lei em que os mesmos despachos se baseiam, se foi pago o chamado piso, quanto e em que data e ainda nota das despesas feitas com obras nessas residências desde a proclamação da República.— Baltasar Teixeira.
Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério do Comércio e Comunicações, me seja foneci-da, com a maior urgência, uma nota das despesas feitas com quaisquer obras rea-
lizadas desde a proclamação da República nas residências particulares graciosamente concedidas a várias famílias nos conventos da Encarnação e de Santos-o--Novo, indicando-se a natureza dessas obras, despachos que as autorizaram e verbas despendidas em cada residência.— Baltasar Teixeira. Expeça-se.
Requeiro que por todos os Ministérios me sejam fornecidas as seguinte notas:
Quantos funcionários têm sido nomeados nos termos do § 2.° do artigo 2.° da lei 971;
Ordenados que percebem com as subvenções, categorias, idade, etc.;
Quais os nomeados interinamente e também os que foram difinitivamente, uns e outros 'com a desinação da data da nomeação.
Mais requeiro nota dos funcionários adidos e dos contratados por cada Ministério.
Como preciso destes informes para intervir na discussão dos orçamentos espero que mós enviem com urgência.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 11 de Maio de 1921.— Maldo-nado de Freitas.
Expeça-se.
Declaração de voto
Declaro que teria assinado o projecto de lei destinado a promover por distinção o coronel Jaime de Figueiredo, se tivesse tido a honra de os seus ilustres autores o submeterem à minha apreciação.
Câmara dos Deputados, 11 de Maio de 1921.— Vasco Borges.
Para a acta.
Comissões
Questão dos trigos — Carvalho Mourão. Orçamento — Dias Pereira. Para a Secretaria.