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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 33
EM 19 DE FEVEREIRO DE 1923
Presidência do Ex. mo Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso
Secretários os Ex. mos Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. — Abre a sessão com a presença de 43 Srs. Deputados.
É lida a acta.
São aprovadas as duas últimas actas.
Dá-se conta do expediente.
São admitidas proposições de lei, já publicadas no «Diário do Govêrno».
Antes da ordem do dia. — O Sr. Artur Brandão refere factos, que considera ilegais, que se estão dando no concelho de Celorico de Basto, e trata do encarecimento do azeite e da adjudicação do hotel monumental do Buçaco.
Responde o Sr. Ministro do Comércio (Vaz Guedes).
O Sr. Carlos Pereira troca explicações com o Sr. Presidente sobre os termos em que se encerrou a penúltima sessão.
O Sr. Juvenal de Araújo verbera o facto de se ter dado o nome de Sara de Matos a uma rua de Lisboa, usando da palavra sôbre o mesmo assunto, respondendo ao orador precedente, o Sr. Sá Pereira.
O Sr. Cancela de Abreu trata dos actos de heroicidade praticados no socorro aos náufragos do vapor «Rohn».
O Sr. Tavares de Carvalho trata de providências sôbre o encerramento das casas de jôgo.
Responde o Sr. Ministro do Comércio.
O Sr. Ribeiro de Carvalho trata de factos dados em Castanheira de Pera.
Responde o Sr. Ministro da Instrução (João Camoesas).
O Sr. Morais de Carvalho manifesta-se também contra o nome de «Sara de Matos» dado a uma rua de Lisboa e faz considerações acêrca do recenseamento eleitoral da mesma cidade.
O Sr. Francisco Cruz insta por documentos que requereu.
O Sr. Velhinho Correia manda para a Mesa um parecer da comissão de finanças.
O Sr. Jaime de Sousa manda para a Mesa um parecer da comissão dos negócios estrangeiros.
O Sr. Carlos Pereira volta a tratar dos termos em que se encerrou a penúltima sessão.
Responde o Sr. Presidente, voltando a usar da palavra o Sr. Carlos Pereira.
O Sr. Carvalho da Silva trata de factos referentes ao recenseamento eleitoral.
Responde o Sr. Ministro do Comércio.
O Sr. António Correia reclama contra o facto de se não terem pago alguns subsídios a famílias dos mortos da Grande-Guerra.
Responde o Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães).
São aprovados requerimentos referentes à discussão de pareceres na sessão seguinte.
São autorizadas a reünir durante a sessão as comissões de agricultura e finanças.
O Sr. Presidente propõe, e é aprovado, um voto de sentimento pela morte do parlamentar João Pessanha.
Usam da palavra, associando-se, os Srs. Luís de Amorim, Álvaro de Castro, Carvalho da Silva, Lino Neto, Joaquim Ribeiro e Ministro das Finanças.
Dá-se conta de últimas redacções.
Aprova-se que as sessões durem até que haja luz.
O Sr. Álvaro de Castro comunicou a constituïção do Partido Republicano Nacionalista.
Usam da palavra os Srs. Paiva Gomes, Carvalho da Silva, Lino Neto e Ministro das Finanças.
Ordem do dia. — Levanta-se discussão sôbre a forma de discutir o Orçamento: só na especialidade ou na generalidade e na especialidade.
Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Pedro Pita, Alberto Xavier e Almeida Ribeiro.
É pôsto à votação um requerimento do Sr. Carvalho da Silva.
O Sr. Almeida Ribeiro entende que se trata de uma proposta e não de um requerimento.
Considerado o requerimento como proposta, é admitida
Sendo requerida a urgência, é aprovada, entrando em discussão.
Prosseguindo o debate, falam os Srs. Pedro Pita, Tôrres Garcia, Plínio Silva, e Carvalho da Silva, que fica com a palavra reservada.
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Diário da Câmara dos Deputados
O Sr. João Luís Ricardo manda para a Mesa um parecer da comissão de agricultura sôbre a questão cerealífera.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte, à hora regimental.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Projecto de lei — Renovação de iniciativa — Pareceres — Requerimentos — Nota de interpelação.
Abertura da sessão às 14 horas e 25 minutos.
Presentes 43 Srs. Deputados.
São os seguintes:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo da Silva Castro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António de Sousa Maia.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Custódio Maldonado de Freitas.
Francisco Cruz.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
João de Ornelas da Silva.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Carvalho dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Mariano da Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Vitorino Henriques Godinho.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António Mendonça.
António de Paiva Gomes.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
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Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vasco Borges.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António Resende. António Vicente Ferreira.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Aguas.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João de Sousa Uva.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.
As 14 horas principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 43 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 14 horas e 25 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Pedidos de licença
Do Sr. Valentim Guerra, 12 dias.
Do Sr. Rêgo Chaves, 30 dias.
Do Sr. António Resende, 10 dias.
Do Sr. Marques de Azevedo, 10 dias.
Do Sr. António Pais, 20 dias.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Representações Da Câmara Municipal do Pôrto, contra a rejeição do artigo 2.º do projecto de lei
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Diário da Câmara dos Deputados
referente à elevação das percentagens adicionais às contribuïções directas do Estado.
Para a comissão de administração pública.
Da administração do concelho de Alcanena, pedindo para ser melhorada a situação do pessoal das administrações dos concelhos.
Para a comissão de finanças.
Dos professores do Instituto Industrial de Lisboa, pedindo que, nas providências a adoptar para melhorar a situação do funcionalismo, o professorado não seja equiparado a êle.
Para a comissão de finanças.
Ofícios
Do juiz encarregado do inquérito aos serviços do Comissariado do Rio de Janeiro, pedindo autorização para o Sr. Malheiro Reimão poder depor.
Concedido.
Do juiz das Caldas da Rainha, pedindo autorização para o Sr. Maldonado de Freitas ser jurado.
Concedido.
Do Ministério da Guerra, pedindo a comparência do Sr. António Maia, como testemunha, na comissão liquidatária do Corpo Expedicionário Português.
Concedido.
Das Câmaras Municipais de Lisboa, Loulé, Boticas, Ponte de Sor, Odemira, Cuba, Serpa, Pôrto de Mós, Alvaiázere, contra o referendum das juntas de freguesia na fixação da percentagem sôbre as contribuïções do Estado.
Para a comissão de administração pública.
Da Junta Geral do Distrito de Faro, contra a lei que estabelece excepção para o lançamento de percentagens às Juntas Gerais do Pôrto e Leiria.
Para a comissão de administração pública.
Da Associação Comercial e Industrial de Olhão, sôbre o regime fiscal imposto às indústrias da pesca.
Para a Secretaria.
Do Ministério das Finanças, respondendo ao ofício n.º 131, que comunicou um pedido do Sr. Angelo Sampaio Maia.
Para a Secretaria.
Do mesmo, respondendo ao ofício n.º 488, que transmitiu um pedido feito pelo Sr. Paulo Cancela de Abreu.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Justiça, acompanhando um processo para indemnizações pedidas por João Maria do Carmo Oliveira e António Formiga.
Para a comissão do Orçamento.
Do mesmo, respondendo aos ofícios n.ºs 134 e 137, que transmitiram os pedidos, respectivamente, dos Srs. Sampaio Maia e Baltasar Teixeira.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Agricultura, satisfazendo ao pedido feito em ofício n.º 101 da parte do Sr. Manuel de Sousa da Câmara.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Viana do Castelo, enviando uma representação sôbre ampliação de verba para expostos.
Para a comissão de Orçamento.
Do Ministério dos Negócios Estrangeiros, informando não terem lá dado entrada os ofícios n.ºs 568 e 19.
Responda-se.
Do Ministério da Guerra, pedindo para o Sr. António Maia ser ouvido nos termos de artigo 74.º do Regulamento Disciplinar do Exército.
Pregunte-se, quando, onde e por que razão deseja que seja ouvido êste Sr. Deputado.
Telegramas
Das Juntas Gerais dos Distritos de Castelo Branco, Évora e Aveiro, protestando contra o projecto de lei, em discussão, sôbre lançamento de percentagens.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Amarante, dizendo não poder prescindir dos impostos indirectos em discussão.
Para a Secretaria.
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Da Associação Comercial do Pôrto, pedindo a discussão do projecto aumentando o valor das avenças para pagamento do imposto das transacções.
Para a Secretaria.
Da Associação dos Empregados Menores do Estado, pedindo a votação da melhoria de vencimentos.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Oliveira dos Frades, pedindo para ser elevadas a 30 por cento as percentagens.
Para a Secretaria.
Das Câmaras Municipais de Caldas da Rainha, Portalegre, Viseu, S. Pedro do Sul, Pombal, Soure e Anadia, protestando contra a aprovação do artigo 1.º que submete ao referendum das Juntas de Freguesia a fixação das percentagens sôbre contribuïções.
Para a Secretaria.
Da Junta de Freguesia do Ervedal, apoiando reclamações dos católicos sôbre a liberdade do ensino nas escolas.
Para a Secretaria.
Admissões
São admitidos os seguintes projectos de lei, já publicados no «Diário do Govêrno»:
Do Sr. Joaquim Ribeiro, modificando, sob determinadas bases, a lei cerealífera. Para a comissão de agricultura.
Dos Srs. Jaime de Sousa, Vergílio Saque, Ornelas as Silva, Pedro Pita e Hermano de Medeiros, interpretando a lei n.º 1:368, de 21 de Setembro de 1922.
Para a comissão de administração pública.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 56 Srs. Deputados.
Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia:
Antes da ordem do dia
O Sr. Artur Brandão: — Sr. Presidente: pedi a palavra para me dirigir ao Sr. Ministro do Interior.
Como, porém, S. Ex.ª não está presente, peço a qualquer dos Srs. Ministros a fineza de lhe transmitir as considerações que vou fazer, as quais tem por fim chamar a sua atenção para actos irregulares que se estão praticando no concelho de Celorico de Basto.
Assim, Sr. Presidente, devo informar que por todas as formas, naquele concelho se impede que aqueles que não são partidários do Govêrno se recenseiem, chegando o escândalo ao extremo de se negarem certidões informando quem são os regedores do concelho.
Por êste motivo, peço ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior a fineza de dar as suas ordens no sentido de me ser fornecida, até ao fim do corrente mês, uma nota dos regedores dêsse concelho, para que os eleitores se possam habilitar com os respectivos certificados de residência.
Igualmente desejo referir-me ao facto de se encontrar, há longos meses, anichada na gaveta do juiz de direito da respectiva comarca, sem o devido despacho, uma porção de processos respeitantes a crimes por atentados eleitorais.
Eu desejo saber se o Sr. Ministro da Justiça, que eu considero um homem de bem, está ou não disposto a meter êsse funcionário na ordem, pois de forma alguma se pode justificar que êsses processos estejam meses e meses metidos numa gaveta, sem despacho.
Aproveito a ocasião de estar com a palavra para me referir a umas notícias que há dias vi publicadas nos jornais, e que dizem respeito ao encarecimento de vários géneros, entre os quais se destaca o azeite.
Ora, eu quero chamar a atenção da Câmara para êste facto, que reputo deveras extraordinário, porquanto, ainda não há muito tempo, foram concedidos permis de exportação para 1:200 pipas de azeite.
Como se compreende, pois, que agora se vá tabelar êste género?
Chamo, pois, a atenção do Sr. Ministro do Comércio para que tome providências urgentes, uma das quais poderá ser talvez evitar que sejam executados alguns dos permis que porventura ainda se encontram na gaveta dos especuladores.
Sr. Presidente: aproveitando a presença do Sr. Ministro do Comércio, devo di-
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zer também que, apesar de haver pedido há muito tempo a cópia de um contrato, que os jornais disseram haver sido feito, e pelo qual foi entregue a uma emprêsa particular, sem concurso, o grande Hotel do Buçaco, ainda até hoje tal cópia me não foi fornecida.
Não sei as razões que há na demora, mas peço ao Sr. Ministro do Comércio a fineza de providenciar, para que ela me seja remetida o mais ràpidamente possível, porquanto desejo tratar dêsse assunto nesta Câmara.
Tenho dito.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (João Teixeira Queiroz Vaz Guedes): — Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as considerações feitas pelo Sr. Artur Brandão, e em primeiro lugar devo esclarecer S Ex.ª que o Sr. Ministro do Interior ficou hoje retido em casa por proscrição módica.
Todavia comunicarei a S. Ex.ª, bem como ao Sr. Ministro da Justiça, a argumentação que produziu o Sr. Artur Brandão.
Interrupção do Sr. Cancela de Abreu, que não se ouviu.
O Orador: — Relativamente às licenças de exportação, devo informar V. Ex.ª que, depois que tomei conta da pasta do Comércio, nenhum permis de exportação foi concedido.
Parece-me, no emtanto, que qualquer medida deve ser tomada, mas, como a lei não me dá competência para isso, brevemente trarei ao Parlamento uma proposta, assinada também pelos Sr. Ministros das Finanças e Agricultura, restringindo ou fazendo cessar qualquer exportação, quando seja inconveniente para os interêsses do País.
Com relação à cópia do contrato, muito me obsequiava V. Ex.ª, fornecendo-me uma nota, com a data do pedido, para que eu possa verificar, pela repartição competente, dos motivos da demora.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: vou fazer uma pregunta a V. Ex.ª, esperando que V. Ex.ª me permita depois fazer algumas considerações.
Desejava que V. Ex.ª me informasse se a penúltima sessão foi encerrada por falta de número, e se se fez a chamada.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Fez-se a chamada e marcaram-se faltas.
Eu reservarei a palavra para no momento oportuno V. Ex.ª fazer as suas considerações.
Esta declaração será publicada, revista por S. Ex.ª, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Carlos Pereira: — Em àparte permita-me V. Ex.ª que lhe diga que não ouviu o meu pedido.
Lamento que V. Ex.ª se sirva da disposição regimental para evitar que eu fale.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Eu não posso permitir a V. Ex.ª que use da palavra, não por mim, mas porque iria escalar a palavra a outros Srs. Deputados, o que certamente os levaria a protestar.
Esta declaração será publicada, revista por S. Ex.ª, quando, nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Juvenal de Araújo: — Sr. Presidente: pedi a palavra para tratar dum facto que acaba de passar-se nesta cidade de Lisboa e que gravemente ofendeu a nossa consciência de católicos e de portugueses, como por igual agravou a consciência de todos os homens justos desta terra.
Refiro-me, Sr. Presidente, ao facto de a Câmara Municipal de Lisboa ter mandado colocar à esquina da antiga rua das Trinas de Mocambo uma lápide com os seguintes dizeres:
«Rua Sara de Matos — Assassinada no convento das Trinas em 19 de Julho de 1894».
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Quem, como nós, tem acompanhado a vida de Portugal nos últimos anos, e sabe a quanto ficou reduzida essa nefanda campanha que se produziu em torno da morte dessa pobre criança que se chamou Sara de Matos, pode bem aquilatar e compreender quanto de falsidade e também de agravo para os sentimentos católicos dos portugueses se encerra nos dizeres da lápide a que acabo de referir-me.
Contra êste facto, lavro aqui, em nome da população católica do País, o meu mais enérgico protesto.
Apoiados.
Onde foi a Câmara Municipal de Lisboa buscar a base da sua afirmativa de que Sara de Matos fôra assassinada no convento das Trinas?
Em nome do que princípio lança uma afirmação destas, como um pendão de guerra à Igreja e às suas instituïções de ensino, na lápide onde indica a nova denominação duma rua?
Baseia-se, porventura, nas conclusões da Sciência?
Mas como assim, se a Sciência incidiu com toda a luz das suas mais profundas investigações sôbre essa lenda do assassínio de Sara de Matos, desfazendo-a como a um monte de espuma?!
É no veridictum dos tribunais em que se fundamenta a Câmara?
Mas como assim, se se instaurou um processo em que se estabeleceram todos os meios de prova e as suas conclusões foram de reabilitação a mais perfeita, a mais concludente das inocentes vítimas dessa campanha?
Não compreendo, Sr. Presidente, como, sendo tam concludente e tam irrefragável a verdade histórica neste sentido, a Câmara Municipal de Lisboa passo por sôbre todas as noções de decôro e se transforme em instrumento do mais baixo sectarismo contra a Igreja.
Por vezes, ao pensar nestes factos em que se manifesta uma tam grande ausência do sentimento das realidades, chego a pasmar da irreflexão com que são praticados. Pois justamente no momento em que tanto carecemos de fazer exaltar o sentimento patriótico do povo português, pregunto: o que estaria indicado à Câmara Municipal de Lisboa, já que pretendia substituir o nome da antiga rua, se para obra de maior vulto lhe não chegava a iniciativa e o valor, senão fazer a substituição pelo registo dum feito, duma data ou dum nome que, inscritos numa lápide, lembrassem de futuro às gerações que por ali passassem um exemplo de patriotismo ou de beleza, de bravura ou de bondade, salutar para as gerações e honroso para a Pátria?! Apoiados.
A isto a municipalidade de Lisboa preferiu, muito simplesmente, repetir uma falsidade e um agravo à consciência dos católicos.
Bem sei, Sr. Presidente, que os corpos administrativos são autónomos nas suas deliberações, mas também sei que há decisões que brigam tanto com a ordem, o decôro e a moral pública que o Govêrno tem muitos meios, pessoal e oficialmente, de coïbir a prática de semelhantes abusos.
São estas as considerações que dirijo ao Govêrno desta tribuna que os católicos portugueses têm para fazer ouvir os seus anseios e os seus protestos.
Tenho dito.
Vozes: — Apoiado. Muito bem.
O Sr. Sá Pereira: — O Sr. Juvenal de Araújo lavrou o seu mais solene protesto contra o facto de a Câmara Municipal de Lisboa ter dado à rua das Trinas do Mocambo o nome de rua de Sara de Matos.
Eu não quero deixar passar as considerações de S. Ex.ª sem lavrar também o meu mais veemente protesto por S. Ex.ª ter vindo apontar ao Parlamento factos que não podem ser aqui tratados, pois as Câmaras são autónomas nas suas deliberações.
Mas, porventura, se se tivesse de discutir êsse assunto, eu aplaudiria entusiàsticamente essa deliberação como protesto, e para que toda a gente saiba e não esqueça o crime praticado pelos jesuítas, que depois de desflorarem uma criança a envenenaram para encobrirem o seu crime.
Eram estas explicações que eu queria dar à Câmara.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
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O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — O meu ilustre amigo Sr. Morais Carvalho já pediu a palavra para tratar do mesmo assunto a que se referiu o ilustre Deputado Sr. Juvenal de Araújo; mas vem a propósito eu referir-me também ao facto.
A Câmara Municipal gravou na esquina de uma rua uma mentira, uma verdadeira infâmia, e lamento o repugnante acto e contra êle protesto indignadamente.
E veja-se o contraste:
Tendo havido há dias um naufrágio, em que alguns indivíduos praticaram actos de verdadeira heroicidade, a Câmara Municipal ainda se não lembrou de os galardoar.
Êstes actos é que merecem galardão. Devia ser com a prepetuação dêles que a Câmara Municipal se devia preocupar. Apoiados.
E como é que o Govêrno Português não tratou de recompensar êsses heróis!
Peço a qualquer dos Srs. Ministros presentes o favor de transmitir ao seu colega da Marinha o desejo que êste lado da Câmara tem, sem preocupações de carácter político, de ver galardoados os indivíduos que fizeram parte da tripulação do barco que fez o salvamento a que me venho de referir, e nomeadamente aquele que salvou a nado a vida de dois náufragos, e que pertencia já a uma família de heróis.
Apoiados.
Desejava ainda tratar de outros assuntos, mas, como dizem respeito a Ministros que não estão presentes, reservo-me para me ocupar dêles mais tarde.
Tenho dito.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: desejava chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, para uma notícia que. chegou até mim; mas, como S. Ex.ª não está presente, peço a qualquer dos Srs. Ministros presentes o obséquio de lhe transmitir a pregunta que vou fazer ou, porventura, me responder se se julga habilitado a isso.
Constou-me que o Govêrno vai mandar encerrar as casas de jôgo; desejava saber se, efectivamente, êste facto é verdadeiro.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio a Comunicações (Queiroz Vaz Guedes): — Sr. Presidente: devo responder ao Sr. Tavares de Carvalho que, acêrca de qualquer providência nova a acrescentar àquelas que já existem na lei, para a repressão do jôgo ilícito, e que seja desejo do Govêrno aplicar imediatamente, nada me consta.
Entretanto, transmitirei ao Sr. Presidente do Ministério a pregunta que acaba de ser feita pelo ilustre Deputado Sr. Tavares de Carvalho.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ribeiro de Carvalho: — Sr. Presidente: eu desejava chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério para vários assuntos, mas, como me consta que S. Ex.ª se encontra retido em casa por doença, peço a atenção do titular da pasta da Instrução para o que vou dizer, a fim de S. Ex.ª transmitir ao seu colega do Interior.
No concelho de Castanheira de Pera, funcionam duas Câmaras Municipais, uma legal, outra ilegalmente. O Sr. Ministro do Interior ordenou que fôsse expulsa dos Paços do Concelho a Câmara que funcionava legalmente e ainda que fôsse preso o secretário da Câmara, que se tinha limitado a cumprir a lei. Ora isto não pode ser!
Mas factos iguais se estão passando em diferentes concelhos do País, num absoluto desrespeito da lei.
Apoiados.
Onde se não pode vencer pela violência no acto da eleição, está-se procedendo agora ao escorraçamento das Câmaras Municipais eleitas, usando-se para isso da guarda republicana.
Eu pregunto se a guarda republicana serve para manter a ordem ou para fins políticos.
No concelho de Castanheira de Pera estão-se dando estes factos, que eu não quero classificar, mas que são duma ilegalidade que sòmente serve para envergonhar o regime.
Eu desejava saber por que razão se encontra preso o secretário da Câmara, visto que se limitou a cumprir o que era o seu exclusivo dever.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Ministro de Instrução Pública
(João Camoesas): — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que transmitirei ao Sr. Presidente do Ministério as considerações que acaba de fazer o Sr. Ribeiro de Carvalho.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: havia de pedir a palavra logo que V. Ex.ª declarou aberta a inscrição para o período de antes da ordem do dia, para tratar também, em nome dêste lado da Câmara, do caso que tanto alarmou a consciência do País e sobretudo da população de Lisboa, qual é o de a Câmara Municipal desta cidade ter dado à antiga rua das Trinas do Mocambo o nome de Sara de Matos.
Antecipou-se-me a êste respeito o Deputado católico Sr. Juvenal do Araújo, e ainda bem que assim sucedeu, porque S. Ex.ª, com uma veemência e um eloqüência, sobretudo, que eu não saberia igualar, lavrou o seu protesto contra o facto inaudito que não honra a vereação falecida que o praticou.
Sr. Presidente: é cousa já muito para censurar esta mania que tem a Câmara Municipal de Lisboa de estar constantemente a alterar os nomes das ruas da cidade, causando com isso inúmeros inconvenientes, perturbações e prejuízos, entre os quais os respeitantes ao registo e descrição dos prédios nas respectivas matrizes, mas, quando a alteração de um nome se faz, não pode perpetuar um nome ou um gesto glorioso, a fim de ser lembrado às gerações presentes e futuras mas para perpetuar um acto infamante (tanto mais quando, como êste, não corresponde à verdade, porque a Câmara Municipal não pode saltar por cima duma decisão que transitou em julgado do Poder Judicial); não sei como classificar tal procedimento.
Apoiados.
O caso Sara de Matos, pretexto do uma vil exploração anti-clerical, foi levado perante os tribunais, tendo a irmã Colecta, a vítima dos ódios dos inimigos da religião, saído inteiramente ilibada em todas as decisões proferidas até ao Supremo Tribunal de Justiça.
Como vem agora a Câmara Municipal de Lisboa pretender, arvorando-se em última instância, ilegal e rancorosamente, anular a decisão última e definitiva de um poder do Estado, autónomo!?
Sr. Presidente: já que estou no uso da palavra, vou chamar a atenção do Govêrno para factos ocorridos na cidade de Lisboa o que se referem ao recenseamento eleitoral. Desejaria tratar dêste assunto na presença do Sr. Presidente do Ministério e, portanto, aguardaria para mais logo ou para amanhã poder ocupar-me dêle, se não tivesse ouvido dizer ao Sr. Deputado que me precedeu no uso da palavra que S. Ex.ª se encontra doente, o que muito sinto.
Assim, na incerteza de S. Ex.ª poder aqui comparecer qualquer dia breve, eu peço a atenção de qualquer dos membros presentes do Govêrno para o facto de, nas freguesias de Lisboa, designadamente naquelas em que os monárquicos têm maior influência, os regedores, para torpedear os futuros actos eleitorais, recusarem-se a passar os atestados de residência, indispensáveis para instruírem os requerimentos dos cidadãos que como eleitores desejam ser inscritos nos cadernos eleitorais.
Para evitar a sanção que a lei estabelece a tal respeito, alguns regedores, sem se atreverem a declarar que se recusam a passar os atestados, socorrem-se, todavia, de um sofisma, que não pode ser tolerado, dizendo que não conseguiram reünir as informações suficientes para poderem afirmar que determinado indivíduo reside há mais de seis meses em tal ou tal rua. E não se diga que há fantasia nesta minha acusação, por isso que eu sei, por exemplo, dum amigo meu que vive há muitos anos num prédio seu na rua Castilho e a quem foi negado o atestado de que ali residia há mais de seis meses com o fundamento de que não tinha sido possível colher informações seguras a tal respeito!
E trata-se, Sr. Presidente, de uma pessoa que mora mesmo em face da sede da administração do respectivo registo!
Factos dêstes só podem ter por fim evitar que determinados cidadãos, que se sabe ou se supõe serem monárquicos, usem, a seu tempo, do seu direito de voto.
Chamo para estes factos a atenção do
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Govêrno, pedindo a qualquer dos seus membros presentes o favor de os transmitir ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, na certeza de que, a não serem atendidas as minhas reclamações, não largarei o assunto de mão.
Tenho dito.
O Sr. Francisco Cruz: — Pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para o facto de não ter ainda recebido, como requeri, a cópia de alguns permis que foram concedidos por êsse Ministério.
Trata-se dum caso grave que envolve, em certos pormenores, um sensível prejuízo para a economia do País.
Posso afirmar, sem receio de desmentido, que em torno da concessão de tais permis se têm produzido os mais extraordinários escândalos, em manifesto prejuízo dos interêsses do Estado, escândalos que impõem a rápida e enérgica intervenção do Sr. Ministro do Comércio.
A questão económica deve neste momento, mais do que qualquer outra, preocupar as nossas atenções.
E preciso, em primeiro lugar, saber se o produto que se pretende exportar faz ou não falta no País.
Se faz, deve impedir-se inexoràvelmente a sua exportação; se ao contrário, a sua abundância excede a capacidade consumidora nacional, permita-se a sua exportação, lançando, todavia, sôbre êle um imposto ouro, que dalguma forma compense o prejuízo que de tal facto possa resultar para os cofres do Estado e para a economia pública.
O caso restrito de que desejo ocupar-me, logo que me cheguem os documentos a que já me referi, diz respeito aos permis para exportação de travessas de caminho de ferro.
Efectivamente não se compreende que se permita a exportação dessas travessas quando elas tanta falta fazem aos nossos caminhos do ferro.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Vaz Guedes): — Ouvi com toda a atenção as considerações que acaba de fazer o Sr. Francisco Cruz, em resposta às quais devo dizer que a orientação económica do Govêrno sôbre o assunto marcado por S. Ex.ª condiz muito com os seus pontos de vista.
Quanto ao facto de S. Ex.ª não ter recebido ainda cópia dos permis que desejava consultar, parece-me que S. Ex.ª andaria bem em fazer novo requerimento...
O Sr. Francisco Cruz: — Outro? Já é terceiro. Não será demais?
O Orador: — Nesse caso, eu vou providenciar imediatamente no sentido de que a S. Ex.ª sejam remetidos os documentos em questão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Velhinho Correia: — Mando para a Mesa o parecer da comissão de finanças ao projecto do Sr. Vergílio Costa, tendente a restabelecer a equiparação entre o pessoal ferroviário do Estado.
O Sr. Jaime de Sousa: — Em nome da comissão de negócios estrangeiros, mando para a Mesa um parecer.
Vai adiante por extracto.
O Sr. Carlos Pereira: — Ao ter pedido a palavra para interrogar a Mesa, fiz uma pregunta, qual foi sabor se a penúltima sessão se tinha realmente encerrado por falta de número, tendo havido a conseqüente chamada, e marcadas as faltas respectivas aos parlamentares que não responderam a essa chamada. V. Ex.ª respondeu-me que sim, ou se não foi bem isto, disse que se haviam cumprido os termos regimentais, o que importa dizer o mesmo.
Pois, Sr. Presidente, é contra tal facto que lavro o meu protesto, porquanto desde que esta casa deixou de ter iluminação, depois de longa discussão sôbre a hora de abertura e encerramento dos trabalhos parlamentares, foi aprovada uma proposta no sentido de a Câmara fechar inflèxivelmente às 17 horas.
Quando saí desta sala, passava já muito das 17 horas e 30 minutos.
Até então não tinha sido requerida prorrogação da sessão.
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Desde que há uma proposta que fixa o encerramento desta Câmara, não posso admitir que, pensando-se numa prorrogação tácita, os Srs. parlamentares, que cumpriram inflèxivelmente com a deliberação desta Câmara, possam ficar sujeitos a sofrer uma falta que não deram.
É contra tal facto que lavro o meu protesto, e apresento também à comissão respectiva o meu protesto por escrito, porque as deliberações desta Câmara são para serem cumpridas por todos.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe forem enviadas.
O Sr. Presidente: — Salvo o devido respeito pela opinião do Sr. Carlos Pereira, parece-me — e já mandei buscar a acta para o verificar — que a resolução que a Câmara tomou, não foi precisamente o que o Sr. Deputado acabou de expôr, mas que as sessões continuariam até não haver luz.
Não posso bem dizer o que a Câmara resolveu, mas o que é certo é que as últimas sessões têm sido encerradas às 17 horas e 50 minutos, e até depois dessa hora com o assentimento de todos e até de V. Ex.ª que a essas sessões tem assistido, sem que tivesse havido um protesto.
Mandei fazer a chamada para a contraprova. Não havia número.
Quando se estava procedendo à chamada, entrou na sala o Sr. Paiva Cromes, que disse que uma comissão estava retinida com autorização da Câmara e não tinha sido avisado da chamada, a que se estava procedendo.
Eu tinha mandado avisar as comissões.
Desde que alguém, pertencente a uma comissão, estava dentro da boa justiça, mandei proceder à contraprova.
Fez-se nova contraprova e, verificando-se não haver número, procedeu-se à chamada e, nos termos do artigo 120.º do Regimento, encerrou-se a sessão.
Já disse a V. Ex.ª que mandei buscar a acta, para ver o que realmente se resolveu.
O Sr. Carlos Pereira: — Tenho certa vaidade em possuir uma memória razoável, e por isso tenho a certeza de que a resolução da Câmara foi no sentido que disse.
Se algumas sessões têm sido encerradas mais tarde, não pode V. Ex.ª concluir que o meu silêncio signifique que aprovo êsse proceder.
O silêncio não me parece que seja manifestação de vontade.
Mais nada.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir nestas condições as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Carvalho da Silva: — Peço a atenção do Sr. Ministro do Comércio. Não é que o assunto de que vou ocupar-me se relacione com a pasta do Comércio, mas S. Ex.ª tem sido sempre tam gentil com êste lado da Câmara, que peço o favor de transmitir ao Sr. Presidente do Ministério as considerações que vou fazer.
Tencionava esperar que S. Ex.ª viesse hoje à Câmara para tratar do assunto, mas, não podendo o Sr. Presidente do Ministério comparecer pelo motivo que todos lamentam, peço ao Sr. Ministro do Comércio para transmitir a S. Ex.ª as considerações que vou fazer.
Já o ilustre Deputado Sr. Morais Carvalho se referiu há pouco ao que se estava passando em Lisboa com respeito ao recenseamento eleitoral.
Vários regedores recusam-se a passar os atestados de residência aos cidadãos que solicitam êsse documento, para serem inscritos no recenseamento eleitoral, e êste caso está sucedendo em vários pontos do País.
Em Lisboa, segundo citou o meu querido amigo, essas autoridades para fugirem à responsabilidade da lei, declaram não ter meio de averiguar se os cidadãos residem ou não residem há mais de seis meses no local citado, apesar de êles residirem há anos nas respectivas freguesias. E êste sistema de iludir a lei que é adoptado por muitos regedores da capital, parece ter sido combinado entre êles. Outros ainda declaram que, não estando em exercício, são os substitutos que devem passar os atestados, e, procurados êstes, respondem que não podem por agora resolver sôbre o assunto, porque não sa-
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bem se estão em exercício ou não. Outros declaram que só depois do dia 20 tomam posse dêsses lugares.
Manifestamente estas alegações têm por fim tornar impossível o recenseamento dos cidadãos dentro do prazo determinado na lei.
Contra estes factos lavro o meu mais indignado protesto, pedindo ao Sr. Ministro do Comércio que faça sciente o Sr. Presidente do Ministério, para que S. Ex.ª obrigue os seus subordinados a cumprirem a lei, cessando um abuso desta ordem.
Não faz sentido que se exija que os cidadãos paguem as contribuïções mais pesadas, não lhes permitindo a sua intervenção no acto eleitoral por meio das dificuldades opostas à sua inscrição no recenseamento.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Queiroz Vaz Guedes): — Sr. Presidente: pedi a palavra, para dizer que comunicarei ao Sr. Presidente do Ministério as considerações feitas pelo ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva.
O orador não reviu.
O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: pedi a palavra para expor ao Sr. Ministro das Finanças um facto que certamente S. Ex.ª ignora.
Tenho recebido imensas relações de viúvas de militares mortos na Grande Guerra, que há muitíssimo tempo não recebem as suas pensões de sangue.
Algumas dessas senhoras, viúvas de oficiais, levam uma vida de absoluta miséria e se, porventura, não lutam já com a fome, é porque têm pessoas de família que tanto quanto podem procuram evitar-lhes essa situação. Creio que êste facto não deixará de merecer a atenção do Sr. Ministro das Finanças que vai, de certo, tomar as devidas providências.
Tenho também em meu poder algumas reclamações de soldados da guarda fiscal, que se queixam de lhes não serem pagas, há meses já, as suas pensões de reforma.
Havendo, como se diz, grande número de funcionários a mais, eu não compreendo que o serviço do pagamento dessas pensões possa andar atrasado.
Espero que S. Ex.ª o Sr. Ministro das Finanças tome em consideração o que acabo de expôr, para que termine de vez um tal estado de cousas.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Ouvi com toda a atenção as considerações feitas pelo Sr. António Correia, e cumpre-me declarar que as suas reclamações são apresentadas em termos tam vagos que eu não posso tomar o compromisso de as atender sem mais delongas.
Para poder providenciar eficazmente necessário se torna que eu saiba quais são, de facto, as pensionistas que estão em atraso no recebimento das suas pensões.
Muitas vezes são da culpa das repartições distritais essas demoras no pagamento das pensões, estando na direcção geral em bom andamento os respectivos serviços.
É indispensável, pois, concretizar essas reclamações, para se verificar devidamente de onde parte a causa do atraso dos pagamentos.
Se S. Ex.ª quere referir-se a pensões que ainda não estão concedidas, eu devo lembrar que quási sempre as demoras que se dão provêm da circunstância de os interessados levarem muito tempo a apresentar os documentos indispensáveis.
Quanto à referência que S. Ex.ª fez ao excesso de pessoal, cumpre-me declarar que no Ministério das Finanças há pessoal a menos, havendo em todas as direcções gerais muitas vagas a preencher, o que motiva os atrasos que se notam em alguns serviços. Noutros Ministérios existe pessoal a mais, mas a verdade é que dêsse pessoal a mais não nos poderemos socorrer para determinados serviços do meu Ministério, porque sendo estes, como sucede na Direcção Geral da Contabilidade Pública, de carácter especial, exigem conhecimentos técnicos que aquele pessoal não possui.
A repartição que trata das pensões tem o seu serviço em dia e, portanto, os atra-
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sos no pagamento das pensões hão-de ter outra causa que não a de haver quaisquer demoras nessa repartição.
Seria bom que o Sr. António Correia me fornecesse uma nota das pessoas que reclamam, porque assim eu teria meio rápido de poder providenciar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Correia (para explicações): — Sr. Presidente: estranho a resposta que acaba de me dar o Sr. Ministro das Finanças.
Os Deputados não têm de apresentar factos concretos sôbre as reclamações que fazem nesta Casa.
Os Srs. Ministros têm à sua disposição as respectivas repartições para poderem averiguar do que se passe e providenciarem.
Numa repartição do Ministério das Finanças fui já informado de que os pagamentos estão em atraso.
Por isso levantei aqui a minha voz a favor da situação das viúvas.
O Sr. Ministro das Finanças não tinha mais que dizer senão que iria tomar as devidas providências.
O Sr. Ministro das Finanças só tinha que responder que tomaria na devida conta as minhas considerações e nunca pedir que apresentasse questões condicionais, pois, neste caso, significa uma desconfiança para as reclamações que eu aqui apresentei.
Nunca ouvi no Parlamento resposta mais descabida a um assunto dos mais importantes e simpáticos que eu aqui tenho tratado.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente pôs à votação as actas das sessões de 1 e 9 do corrente que foram aprovadas.
Os Srs. Lino Neto e Tôrres Garcia pedem para que antes da ordem do dia, sem prejuízo dos oradores inscritos, sejam, incluídos, respectivamente, os pareceres n.ºs 378 e 350.
O Sr. João Luís Ricardo: — Peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se
consente que durante a sessão reúna a comissão de agricultura. Foi concedido.
O Sr. Velhinho Correia: — Peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se ela permite que a comissão de finanças reúna durante a sessão.
Foi autorizado.
O Sr. Presidente: — Como a Câmara sabe, durante as férias faleceu o nosso colega, Sr. João Pedro de Almeida Pessanha, homem dotado de uma grande probidade de carácter, um funcionário exemplaríssimo e distinto cultor das letras.
Como Deputado toda a Câmara teve ocasião de apreciar na sua convivência essa colaboração que prestou em todos os assuntos.
Lamenta com certeza a Câmara a perda que sofreu e como não estivesse retinida, não foi possível nomear a Deputação que deveria acompanhar o féretro, mas a Mesa assumiu a responsabilidade de representar a Câmara no funeral.
Apoiados.
Parece-me, porém, que isto não basta, e que a Câmara aceitará uma proposta para que na acta se lance um voto de sentimento e que dêste facto se dê conhecimento à família enlutada.
A Câmara resolverá como entender.
O Sr. Luís da Costa Amorim: — Pedi a palavra para me associar ao voto de sentimento proposto por V. Ex.ª, em nome da maioria desta Câmara e como antigo amigo que fui de João Pessanha, pois nessa qualidade tive ocasião de apreciar o seu belo carácter e a sua alta inteligência.
Comquanto descendesse de uma família da mais antiga nobreza, João Pessanha foi sempre um devotado republicano e um espírito rasgadamente liberal.
Não possuindo fortuna, foi o verdadeiro tipo de homem feito á sua custa. Êle ascendeu aos mais altos lugares do seu quadro, sempre por concurso, sempre pelo seu próprio esfôrço.
As qualidades que, ràpidamente acabo de enumerar, são mais do que suficientes para que êste lado da Câmara se associe
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com a mais profunda mágoa ao voto proposto por V. Ex.ª e pranteia sinceramente a sua morte.
Tenho dito.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: comovidamente associo me ao voto de sentimento proposto por V. Ex.ª pela morte do nosso colega João Pessanha.
Era nosso adversário político, mas êste facto, porém, não obsta que tenhamos pela sua memória o mais profundo respeito, prestando-lhe a nossa comovida homenagem.
O orador não reviu.
O Sr. Lino Neto: — Em nome da minoria católica, associo-me comovidamente ao voto proposto por V. Ex.ª
João Pessanha não foi só um funcionário distinto, mas um colega correcto e competente.
Por estes motivos apresento à família enlutada as minhas condolências.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Joaquim Ribeiro: — Sr. Presidente: como independente, eu associo-me ao voto de sentimento proposto por V. Ex.ª
Fui amigo pessoal do falecido, e tive ocasião de apreciar as suas nobres qualidades.
Por isso, lamentando a sua morte, associo-me em meu nome pessoal e dos meus colegas dêste lado da Câmara ao voto proposto por V. Ex.ª
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Associo-me ao voto proposto por V. Ex.ª, com tanto mais pesar porque conheci João Pessanha desde os bancos das escolas, e melhor do que ninguém sei quam diamantino era o seu carácter.
Foi pena que o seu espírito retraído fôsse tam mal compreendido, e não tivesse feito destacar o seu grande valor.
Apesar de pertencer a uma família de tradições aristocráticas, foi sempre toda a vida um republicano.
Em meu nome pessoal e no do Govêrno, lamento a sua perda, e associo-me ao voto proposto por V. Ex.ª
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Em vista da manifestação da Câmara, considero a minha proposta aprovada por unanimidade.
Últimas redacções
Do projecto n.º 281, que fixa os vencimentos dos professores de música e canto coral das Faculdades de Letras.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
Do projecto n.º 328, que conta ao primeiro sargento reformado Jaime Garcia de Lemos, quando voltar ao serviço, a antiguidade do actual pôsto desde 18 de Dezembro de 1914.
Aprovada.
Remeta-se ao Senado.
Do projecto n.º 342, que isenta do pagamento de contribuïção de registo os legados deixados à Associação de Instrução Popular da Figueira da Foz pelo cidadão Fortunato Augusto da Silva.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
O Sr. Presidente: — A propósito da dúvida suscitada pelo Sr. Carlos Pereira, a respeito da hora em que deve ser encerrada a sessão, tenho a dizer que mandei procurar a acta dessa sessão, e não encontrei aí estipulada a hora de encerramento das sessões.
Tenho realmente idea de que houve uma proposta nesse sentido, mas tenho também idea de que nessa proposta se estabelecia que houvesse só uma chamada, e se encerrasse a sessão quando já não se visse na sala.
Nestas condições, desejo saber se a Câmara quere que realmente se encerre a sessão às 17 horas (Não apoiados), ou se deseja que a sessão continue emquanto houver luz.
Apoiados.
O Sr. Manuel Fragoso: — Concordo em que a sessão se encerre quando de facto já não se veja nada, para se poder trabalhar.
Entendo porém conveniente que V. Ex.ª mencione uma determinada hora, para que os Deputados possam saber até quan-
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do podem ficar dentro desta sala, para evitar reclamações semelhantes à do Sr. Carlos Pereira.
Deixo-me V. Ex.ª fazer notar que estava presente na sessão e respondi às duas chamadas.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A sessão poderá ir até às 5 horas e meia, se êste dia estiver claro; senão, encerrar-se há mais cedo.
Foi aprovado que as sessões funcionem até haver luz nas salas.
O Sr. Álvaro de Castro: — Sr. Presidente: no intervalo das sessões deu-se um facto político da maior magnitude para a República.
Tenho a honra de comunicar à Câmara que se constituiu um novo Partido, e, em nome dêsse novo Partido, dirijo a todos os lados da Câmara as suas saüdações.
O Partido que se constituiu, que se denomina Partido Republicano Nacionalista, vem trazer à República Portuguesa a sinceridade dos seus sentimentos, hasteando bem alto os princípios republicanos, e sendo, primeiro que tudo, um Partido que deseja actuar intensamente, dentro da Constituïção e dentro da ordem.
Apoiados.
Animados dos princípios liberais e progressivos que se manifestaram sempre em toda a sua vida política portuguesa, não quero caminhar tam ràpidamente que o seu progresso pareça um retrocesso, mas procurar sempre avançar de harmonia com os princípios liberais progressivos, integrando-se, quanto possível, dentro do espírito da nação, para o que buscará as suas ideas no mais íntimo da consciência popular, traduzindo os seus anseios e dando forma aos seus desejos, inteiramente de acôrdo com os princípios que têm norteado a actividade política que domina todas as organizações progressivas, e que vem trazer a harmonia política, não à agitação perene dos seus interêsses, mas à vitalidade efectiva de princípios, para a regeneração da Pátria Portuguesa.
Republicano, profundamente republicano por princípios, que muitos dos seus homens, o seu maior número, tem agitado em toda a sua vida, será penhor seguro e absoluto de que a República conta mais uma fôrça activa, inteligente e dominadora, para dirigir os seus destinos, pela forma elevada de alcançar o Govêrno, na certeza de que governará, não no sentido partidário, que se não percebe à luz da política, mas fôra dêle, porque continua a sua política dentro dos princípios que foram fixados pela Constituïção de 1911.
Ficará dentro dos princípios que o programa exige, aquilo que na sua larga, propaganda expôs, desejando levar a convicção a todos os espíritos, conseguindo que as ideas expendidas na Constituïção não sejam apenas ideas da República, mas da Nação Portuguesa.
Apoiados.
Animado dos princípios de tolerância política, reclamada por todos os partidos, mas nem sempre praticada, reconhecendo que todos os republicanos têm obrigação de congraçar-se para produzirem a obra de progresso social, fazendo no emtanto a, política individual relativamente ao Partido, porque deseja bem marcar a sua fisionomia politica (Apoiados), duma maneira bem clara, afirmada pelos seus princípios e por um conjunto de ideas de modo que o Partido signifique unidade e coesão. Nêle podem integrar-se todos que esperam com ansiedade que na República Portuguesa se abra um Partido capaz de integrar as ideas que ainda hoje não encontraram realização nos partidos existentes, ideas e princípios de tolerância e progresso, o que já afirmou em manifesto dirigido ao País.
O nome adoptado pelo novo Partido define uma política de realização da obra profícua para a República.
Define o espírito da liberdade por que pugnará.
Apoiados.
Animado, pois, Sr. Presidente, dos mais altos sentimentos republicanos, e em nome do Partido Republicano Nacionalista, a que tenho a honra de pertencer, eu comunico à Câmara a sua constituïção, certo de que êle encontrará da parte de todos os republicanos palavras de carinho e de afecto, que são dignas de todos aqueles que procuram engrandecer a República e a Pátria, muito principalmente na situação desgraçada em que nos encontramos.
Vozes: — Muito bem!
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O Orador: — O novo Partido não tem a preocupação de assumir as cadeiras do Poder, nem o prazer de se sentar nessas cadeiras.
Apoiados.
O novo Partido, repito, não tem o prazer de se sentar naquelas cadeiras, porém, na ocasião em que fôr chamado para o fazer, tratará de realizar a obra que é reclamada pelo Povo Português.
A nossa atitude, relativamente ao actual Govêrno, será serena, não deixando, no emtanto, de se preocupar, por todas as formas, com a realização da obra moralizadora, que tam necessária é para a Pátria e para a República.
Apoiados.
Sr. Presidente: ditas estas palavras, terminarei por renovar as minhas saüdações a V. Ex.ª, como Presidente da Câmara, e a todos os partidos aqui representados, dizendo novamente a todos os republicanos existentes dentro desta Câmara, e fôra dela, que podem contar com o nosso maior esfôrço no sentido de se glorificar a República.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem!
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, devolver as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Em vista das declarações que acabam de ser feitas pelo ilustro Deputado Sr. Álvaro de Castro, atendendo a que alguns Deputados já têm pedido a palavra sôbre o assunto, eu vou consultar a Câmara sôbre se permite que files falem.
S. Ex.ª não reviu.
A Câmara resolveu afirmativamente.
O Sr. Paiva Gomes: — É com prazer, Sr. Presidente, que nós vemos que para o novo agrupamento entraram antigos republicanos, elementos que à República têm dado o melhor do seu esfôrço.
Esta satisfação é sincera, por isso que todos nós vemos que a formação dêsse novo agrupamento é útil para a vida da República, dando-nos a agradável impressão de que chegou o termo das lutas partidárias entre republicanos, das lutas que se têm aqui travado, pode dizer-se, quási à mão armada.
Vejo felizmente, Sr. Presidente, que, depois de várias tentativas, se chegou a uma fórmula, que sem dúvida será útil para a República, útil para o País e útil também para o próprio Partido Republicano Português, a que tenho a honra de pertencer.
Ouvi com toda a atenção as considerações feitas pelo ilustre Deputado Sr. Álvaro de Castro, e com toda a sinceridade dirijo as minhas saüdações ao novo Partido, fazendo votos ardentes para que os propósitos de S. Ex.ª sejam inteiramente executados.
Li o manifesto que êsse partido dirigiu ao País, no qual, devo dizer em abono da verdade, se encontram exarados princípios que são os mais salutares e os mais úteis para a vida da República.
Oxalá que êles correspondam à realidade, e que o País compreenda os seus intuitos.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Álvaro de Castro acaba de comunicar à Câmara a constituïção do novo Partido Republicano, tendo começado por saüdar todos os lados da Câmara, sem distinção de côres políticas.
Também nós, Sr. Presidente, dêste lado da Câmara não podemos de maneira nenhuma deixar de saüdar o Sr. Álvaro de Castro e bem assim o novo Partido, em nome do qual S. Ex.ª falou.
Sr. Presidente: deve dizer, em abono da verdade, que até hoje êste lado da Câmara se tem dado muito bem com todos os membros do Partido Reconstituinte e do Partido Liberal, e assim não será agora, pelo simples facto de mudarem de nome, que nós havemos de nos dar mal.
Os membros do novo Partido, em nome do qual o Sr. Álvaro de Castro falou, serão para nós sempre os mesmos que constituíram os antigos Partidos Reconstituinte e Liberal, com quem sempre nos demos muito bem, e bem assim os antigos
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membros dos Partidos Unionista e Evolucionista com quem também sempre nos pernos muito bem; e, sendo assim, não há razão para que essa situação se modifique, pelo simples facto de terem mudado de nome.
Não podemos, pois, deixar de apresentar as nossas saüdações, se bem que sejamos adversários políticos.
Pelo contrário. Pelas declarações que o Sr. Álvaro de Castro acaba de fazer à Câmara, vê-se que não são alteradas as condições, em que até agora o Parlamento tem vivido.
Poderia ao menos S. Ex.ª ter declarado, em nome do Partido que mudou de designação, que intensificaria a sua acção de oposição ao Govêrno, mas nem isso sucedeu, tendo até S. Ex.ª dito que o novo agrupamento aguardará com serenidade o momento em que possa ser útil a sua acção no Govêrno.
Desde que o novo agrupamento ainda não reconhece útil a sua acção no Govêrno e continua serenamente a esperar a hora em que o Poder lhe seja entregue, mantém-se absolutamente a mesma situação política e nós, apenas por uma questão de delicadeza, cumprimentamos os nossos antigos colegas que continuam a ser os mesmos, apenas com o nome mudado tendo deixado de pertencer ao Partido Republicano Liberal e Partido Republicano Reconstituinte para constituírem o Partido Republicano Nacionalista.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Lino Neto: — Sr. Presidente: por parte do Partido Católico eu saúdo o novo Partido Nacionalista.
Ouvi atentamente o seu ilustre leader, Sr. Álvaro de Castro; considerei devidamente o programa dêste Partido, li o extraio dos jornais sôbre os discursos pronunciados ontem na sede dêsse Partido pelos Srs. Ginestal Machado, Cunha Leal e outros Srs. Deputados, e fiquei bem elucidado dos propósitos do Partido Nacionalista.
Na marcha para o levantamento do País, em que todos estamos empenhados, é absolutamente necessário acabar com todos os motivos de paixões irritantes que nada interessam ao bem da Pátria.
Uma dessas questões é a chamada questão religiosa, que tem vindo sempre agitando o País desde o tempo do Marquês de Pombal, dividindo a família portuguesa.
O novo Partido Nacionalista vem dizer ao País que quere respeitada a tradição religiosa nacional.
Bem haja êsse Partido por esta declaração, porque dêste modo afasta um dos motivos mais importantes do conflito entre todos os portugueses.
Por parte da maioria e de outros agrupamentos da Câmara foi acolhido com simpatia o programa do novo Partido.
Não temos senão de congratularmo-nos por tal facto.
A Igreja e a tradição religiosa devem ser consideradas como um dos elementos do nosso património nacional.
Eu não posso, portanto, deixar de saüdar com especial carinho o novo Partido pela forma como pôs a questão religiosa, fazendo votos para que os seus destinos sejam prósperos, sobretudo no sentido de que as suas prosperidades incidam, como devem incidir, com as prosperidades de Portugal, que é a nossa Pátria.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir, nestes termos, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Sr. Presidente: em nome do Govêrno eu apresento ao novo Partido Nacionalista as minhas saüdações.
O Sr. Álvaro de Castro, pelo seu passado republicano e pelos seus altos serviços ao País, serve de garantia para afirmar que efectivamente da organização do novo Partido algum bem resulta para o regime.
Não posso deixar de me referir às palavras do Sr. Álvaro de Castro, quando S. Ex.ª disse qual a atitude do novo Partido para com o Govêrno.
Exactamente o que o Govêrno deseja é uma fiscalização severa, para o cumprimento da lei e para que a moralidade triunfe.
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É com a maior sinceridade que o Govêrno envia ao novo Partido as suas saüdações, convencido que do novo Partido hão-de vir benefícios para a Pátria e para a República.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro: — Pedi novamente a palavra para agradecer a todos
os lados da Câmara o bom acolhimento que ao novo Partido foi feito.
Tenho dito.
O orador não reviu.
ORDEM DO DIA
Entra em discussão o orçamento do Ministério do Interior.
Parecer n.º 411-(a)
Senhores Deputados. — Uma vez mais o Congresso da República tem de discutir o orçamento do Ministério do Interior sôbre a base duma legislação administrativa fragmentada e desconexa, e, umas vezes confusa, outras contraditória.
Não obstante tentativas várias, e embora em labor quási permanente, a verdade é que o Parlamento não pôde ainda cumprir o preceito constitucional que lhe impõe o dever de promulgar um Código Administrativo.
E um problema que cada vez mais intensa e inadiàvelmente se impõe à atenção do legislador e dos homens de govêrno, mas também cada vez mais difícil e mais complexo, e em maiores embaraços de solução.
Emquanto a promulgação dêsse Código continua a ser para nós uma aspiração e a título provisório vamos vivendo com uma dispersa legislação administrativa,» também a título provisório a vossa comissão do Orçamento aceita a proposta orçamental a respeito dos três primeiros capítulos, que se referem á administração política e civil do Estado, tal como ela foi trazida a esta Câmara, com excepção do artigo 9.º do capítulo 3.º, a que se vai fazer umas breves considerações em justificação das alterações que vai propor-vos.
Com estas considerações abria esta comissão do Orçamento o sou parecer sôbre esta mesma proposta orçamental do Ministério do Interior.
Um ano volvido, elas podem aqui ser reproduzidas, infelizmente, com a mesma verdade e a mesma razão e, porventura, com mais legítimos e mais justificados reparos, por nenhum esfôrço o Parlamento ter feito e nenhuma iniciativa ter esboçado como tentativa para a resolução dêste problema.
Apenas umas comissões mais para o iludirem e entreterem e novas leis votadas como remendos e a confundirem o nosso tam fragmentado corpo de direito administrativo.
E, assim, em equilíbrios, vão passando os anos, e a necessidade duma codificação a revelar-se cada vez mais imperiosa e mais inadiàvelmente.
A proposta orçamental da despesa do Ministério do Interior para o ano de 1923-1924 é, sem alterações nem inovações, e apenas actualizado, o orçamento que o Parlamento votou em Junho último para o ano económico que vai decorrendo.
Por isso o seu exame é fácil como simples será sem dúvida a sua discussão.
Sôbre as dotações das diferentes verbas do orçamento de 1922-1923 há nesta proposta orçamental um aumento de 848. 213$66; mas outras verbas foram deminuídas ou eliminadas, na importância total de 490. 058$61, reduzindo assim o aumento a 358. 155$05.
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Referimo-nos à despesa ordinária. Aquela importância de 490. 058$61 provém da eliminação da verba de 484. 698$61, que no orçamento em vigor se inscreveu para pagamento de despesas especificadas de gerências findas e da de 5. 360$ para vencimentos de empregados em disponibilidade, alguns dos quais faleceram e a outros foi dada colocação em outros quadros.
Êste aumento de 848. 213$66 pode bem considerar-se insignificante e provém da carestia de todos os artigos de expediente e elevação de todas as despesas de material e outras, tais como transportes, rendas de casa, tarifas de caminhos de ferro, etc.
A vossa comissão de Orçamento verificou que êsse aumento vem feito nas seguintes verbas orçamentais e pelas seguintes importâncias:
Material e despesas diversas da Repartição de Contabilidade...1. 200$
Material e despesas diversas do Gabinete do Ministro e Secretaria Geral...4. 000$
Material e despesas diversas da Direcção Geral de Administração Política e Civil...500$
Material e despesas diversas do Supremo Tribunal Administrativo...1. 500$
Material e despesas diversas dos govêrnos civis...29. 290$
Material e despesas diversas da Imprensa Nacional de Lisboa...387. 500$
Visitas dos governadores civis aos concelhos dos distritos...6. 500$
Investigações e inquéritos...1. 800$
Pessoal telégrafo-postal, pelo serviço extraordinário do prolongamento do horário a requisição das autoridades administrativas...5. 000$
Conservação e reparação dos edifícios e mobília dos governos civis...2. 280$
Transportes dos governadores civis...6. 000$
Material e despesas diversas da Direcção Geral da Segurança...1. 500$
Material e despesas diversas da polícia de Lisboa...60. 372$
Material e desposas diversas da polícia do Pôrto...21. 000$
Das polícias dos demais distritos...1. 506$
Armamento e equipamento das polícias, compra e conserto...8. 000$
Transporte dos serviços policiais...5. 000$
Despesas de Polícia de Segurança do Estado...11. 120$
Há ainda a considerar o aumento de 142. 426$86, que provém da circunstância de ser bissexto o ano de 1924, de que resulta para êste Ministério um encargo de tal importância pelo pagamento ao pessoal aposentado da Secretaria Geral, as férias da Imprensa Nacional de Lisboa e vencimentos da Polícia e da Guarda Nacional Republicana.
Finalmente a perfazer a referida importância de 848. 213$66 há ainda que considerar a de 151. 718$80, representada pelas verbas de 20. 000$, pela inscrição da dotação para despesas com expedição de telegramas pelo Gabinete do Ministro e Secretaria Geral; de 38. 900$ resultante da elevação dos vencimentos dos auditores administrativos (artigo 1.º da lei n.º 1:252, de 10 de Abril de 1922), elevação que não está incluída no orçamento de 1922-1923; de 2. 000$ para ocorrer às reformas do pessoal inabilitado da Imprensa Nacional de Lisboa; de 12. 000$ pela inscrição da despesa com transportes em carros eléctricos dos agentes da polícia cívica de Lisboa em serviço de investigação; de 2. 000$ para poderem ser atendidas as constantes passagens à situação da reserva e de reformados dos oficiais do exército; de 20. 000$ para iluminação dos quartéis da guarda nacional republicana; de 50. 000$ para gasolina e reparação dos automóveis da mesma guarda e de 6. 818$80 para subsídio a estabelecimentos militares.
Todas estas alterações as examinou a vossa comissão, com o devido cuidado, vindo a reconhecer que êsses aumentos são fundamentados e feitos sem exagero, e assim, bem merecem a vossa aprovação.
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De resto e como acima já dissemos, êste aumento é de valor insignificante, quer o consideremos em relação à desvalorização da moeda, quer, e sobretudo, se o considerarmos em relação aos outros Ministérios, como se vê do seguinte mapa:
[Ver diário original]
Como dêste mapa se vê, o Ministério do Interior é o 8.º em ordem decrescente de aumento de despesas.
E nêle estão compreendidos os serviços de Segurança Pública que, a todos os respeitos, são serviços sempre despendiosos e que se impõem a uma conveniente remuneração.
A despesa extraordinária vem na proposta com um aumento de 18:174. 190$32, Vem êste aumento principalmente, e na sua quási totalidade (17. 916:724$32) de melhoria de vencimentos que engloba as anteriores ajudas de custo e subvenções diferenciais.
É a aplicação da lei n.º 1:355 e dos diplomas que se lhe seguiram, a que a comissão do Orçamento nada tem que opor nem corrigir.
Vem neste capítulo de despesa extraordinária uma verba nova, mas a que esta comissão dá também a sua aprovação. É a verba de 200. 000$ para a Imprensa Nacional, para compra de maquinismos de composição (Linotypes e Monotypes) e de impressão e reparação dos maquinismos de fundição.
A necessidade que tem a Imprensa Nacional de renovação dos seus maquinismos e material de composição já esta comissão a reconheceu no seu parecer sôbre a proposta orçamental para o corrente ano.
Já então e após uma demorada visita aquele estabelecimento, nós aqui denunciámos a grave crise que o assoberbava, proveniente da falta de matérias primas e por imperfeição de seus maquinismos.
Atendendo às difíceis circunstâncias do Tesouro Público propôs esta comissão que um dos males se conjurasse então, e à outra necessidade se ocorresse no Orçamento dêste ano.
Aumentaram-se nesse Orçamento as verbas para aquisição de materiais; reservou-se para o dêste ano a dotação para aquisição de máquinas.
E, pois, um caso já considerado pela comissão do Orçamento e uma situação por ela reconhecida como crítica e absolutamente necessitada de providências.
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E aí vos ponderámos que os serviços da Imprensa Nacional, sendo de natureza mui especial, importam também a adopção dum critério especial a aplicar ao seu orçamento.
Uma redução de verba pode ser motivo duma lamentável desorganização de serviços; o aumento duma dotação pode conduzir a uma apreciável realização de receitas.
Também nêsse mesmo parecer esta comissão ponderou que a organização da Imprensa Nacional carecia duma profunda remodelação.
Nos mesmos termos se manifesta hoje lamentando que ainda não tivesse sido submetida à discussão a proposta de lei que a esta Câmara foi apresentada em 15 de Agosto do 1917 pelos Ministros das Finanças e do Interior, de então, Srs. Afonso Costa e Almeida Ribeiro e cuja iniciativa por êste último foi renovada em sessão de 8 de Junho de 1922.
Senhores Deputados: a actual proposta orçamental de despesa para o Ministério do Interior, para o ano de 1923-1921, é o Orçamento do corrente ano tal como vós o aprovastes.
As alterações que contém resultam simples e estritamente da aplicação de diplomas legais a que também destes a vossa aprovação.
Nenhumas alterações tem, por isso, esta comissão a introduzir-lhe e a propor-vos.
E, assim, é seu parecer que ela, em todas as suas partes, merece a vossa aprovação.
Sala das sessões da comissão do Orçamento, 8 de Fevereiro de 1923. — A. de Portugal Durão — Mariano Martins — Tavares Ferreira — Paiva Gomes — Adolfo Coutinho — T. J. Barros Queiroz (com restrições) — Prazeres da Costa — Henrique Pires Monteiro (com declarações) — João Luís Ricardo — Abílio Marçal, relator.
O Sr. Presidente: — Lembro à Câmara que está resolvido que não haja discussão da generalidade sôbre os orçamentos, e que o uso da palavra foi restringido pelas alterações feitas ao Regimento.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (para explicações): — Eu tenho a impressão de que essa resolução era apenas para o caso excepcionado do ano passado e não para sempre, como parece V. Ex.ª interpretar.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Não vejo nada nas alterações do Regimento que restrinja só ao ano passado o que foi resolvido.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Pedro Pita: — Eu tenho também a impressão que V. Ex.ª está equivocado, porque as alterações foram apenas por uma necessidade de ocasião.
Não sendo assim, melhor será não discutir, porque a discussão no conjunto é necessária; de contrário, não é de forma alguma uma discussão séria.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Alberto Xavier: — Sr. Presidente: fui eu o autor da proposta de alteração do Regimento, numa ocasião em que o Orçamento se encontrava muito atrasado em relação ao período em que tinha de ser discutido, e com o intuito de evitar longas discussões.
Havia ainda outra razão: a de há mais de quatro anos não haver Orçamento aprovado, procurando-se evitar a continuação do regime do duodécimos.
A intenção foi meramente de ordem política e moral.
Ninguém melhor do que o próprio autor da proposta pode completar o espírito dessa proposta.
A disposição que V. Ex.ª acabou de ler foi para o ano passado, e não para o ano vigente.
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É indispensável que se faça uma discussão sôbre o Orçamento Geral do Estado e não sôbre o orçamento do Ministério do Interior ou de qualquer outro Ministério.
Nós precisamos fazer uma discussão sôbre o Orçamento para saber se as suas disposições são legais, se as suas normas são aquelas que mais convêm para as contas, lógica e coordenação de todos os elementos da situação financeira do Estado.
Afigura-se me indispensável uma discussão sôbre o Orçamento Geral.
Nós precisamos estabelecer uma doutrina, e desde Fevereiro até Julho pode fazer-se uma obra para se assentar nas bases do que seja um orçamento depois da guerra ou um orçamento da paz.
Eu sou contrário a que, a propósito da discussão do Orçamento, se faça uma discussão inoportuna e bisantina, e eu próprio falarei com sobriedade; mas daí a não se fazer discussão na generalidade sôbre todo o Orçamento Geral do Estado, vai uma grande diferença.
Deve fazer-se uma discussão na generalidade com parecer ou sem parecer. E de toda a utilidade fazer-se a discussão na generalidade.
É indispensável que haja essa discussão. Ela é necessária para definir critérios.
Essa discussão deverá recair sôbre o orçamento em bloco, para estabelecer princípios que deverão ser seguidos de futuro.
Julgo que V. Ex.ª, Sr. Presidente, poderá tomar a iniciativa de se estabelecer uma transacção para haver uma única discussão na generalidade sôbre o Orçamento Geral do Estado, e não uma discussão para cada Ministério.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Eu não faço mais do que cingir-me às alterações que foram aprovadas, para serem introduzidas no Regimento.
Todavia, em presença das considerações de S. Ex.ª, eu não terei dúvida de na devida oportunidade ponderar à Câmara a conveniência de se atender à situação.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (para explicações): — As considerações feitas pelo Sr. Alberto Xavier vêm corroborar a razão que eu tenho no que já expus à Câmara sôbre o assunto.
Não podemos compreender que alguém possa querer coarctar a esta Câmara o direito do discutir a generalidade do Orçamento.
Sr. Presidente: reputo inconstitucional a discussão do orçamento nesta ocasião, nos termos do n.º 3.º do artigo 26.º da Constituïção.
De que servirá ir hoje o Parlamento discutir orçamentos, se está pendente da aprovação da Câmara um novo projecto para subvenções ao funcionalismo, projecto que vai alterar decerto as despesas do Estado por todos os Ministérios?!
Como é, pois, que vamos discutir uni orçamento, quando há uma comissão encarregada de estudar a remodelação do funcionalismo público, o que irá, decerto, alterar fundamentalmente as despesas a fazer por cada Ministério?
Estarmos agora a discutir, e fixar despesas, que amanhã iremos alterar fundamentalmente, anulando por completo o trabalho que tivermos na discussão do Orçamento, parece-me que, além de ser um trabalho perdido, é ir contra o n.º 3.º do artigo 26.º da Constituïção.
Não vamos fixar a despesa anual do Estado, vamos fixar uma despesa que amanhã será alterada fundamentalmente.
Nestas condições, peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o favor de submeter à votação da Câmara um requerimento para que o Orçamento do Estado só seja discutido depois da Câmara ter apreciado a questão cerealífera, a questão das subvenções e a remodelação dos quadros do funcionalismo público.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer que, segundo o meu sentir, as resoluções tomadas por esta Câmara em sessão de 12 de Maio de 1922 são absolutamente de exe-
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cução permanente. Assim foram entendidas nessa ocasião; foram propostas com êsse carácter e votadas com êsse sentido. Nem podia deixar de entender-se assim, visto que juntamente com as propostas contidas nestas deliberações foram apresentadas outras que, aliás, foram convertidas em lei exactamente por isso, por se julgarem essas resoluções de carácter permanente.
Do próprio texto dessas resoluções se infere que não tinham de maneira nenhuma o carácter de medidas transitórias, e assim é que nelas se transcreve mais do que uma disposição da chamada lei-travão, por efeito da qual a disposição constitucional que manda apresentar os orçamentos até 15 de Janeiro de cada ano foi declarado abranger não só os trabalhos gerais e receitas e despesas, mas também as tabelas especiais de cada Ministério. Se não tivesse havido o intuito de considerar esta resolução de carácter permanente, não se teria inscrito aqui êste texto tirado, como digo, da lei-travão, tirado dum projecto de lei que não tinha sido ainda estudado no Senado, mas que foi votado pouco depois, projecto apresentado na Câmara dos Deputados para dar fôrça, para impôr até mesmo ao Poder Executivo esta deliberação, na parte que diz respeito à apresentação do Orçamento até 15 do Janeiro.
Além disso, as razões que justificaram no ano passado a proposta e votação desta deliberação, subsistem inteiramente; são resoluções de carácter permanente.
Não apoiados.
Foi assim que se consignou esta disposição.
De resto, Sr. Presidente, é uma afirmação que por vezes se tem repetido nesta Câmara, de que uma discussão do Orçamento na generalidade é absolutamente injustificável. Pode servir de pretexto para discursos muito interessantes, muito úteis como doutrina, muito úteis para conferência numa academia, mas não indispensáveis para trabalhos parlamentares.
Os orçamentos aproveitaram-se sempre em Portugal e no estrangeiro para longos discursos, mas, Sr. Presidente, o nosso regime, o regime em que vamos vivendo, não precisa disso. Nem para conhecer a situação êsses largos discursos servem, porque cada parlamentar tem repetidos ensejos, fora da discussão do Orçamento, para apreciar a situação em todos os seus vários aspectos.
Pelo Regimento, a discussão na generalidade considera especialmente o aspecto da oportunidade da proposta de lei; mas, Sr. Presidente, a oportunidade do Orçamento é sempre indiscutível.
A organização do próprio Orçamento, a discriminação das suas verbas, é feita segundo disposições legais; o arranjo interno dos capítulos do Orçamento...
Interrupção do Sr. Morais Carvalho, que não se ouviu.
O Orador: — A discussão do Orçamento, o arranjo dos seus capítulos está prescrito nessa proposta de lei.
Na generalidade, tal como o Regimento considera essa discussão, é uma questão de oportunidade.
Não tem agora cabimento algum. Não tem utilidade para a marcha dos trabalhos parlamentares.
Não vejo, como quis fazer ver o Sr. Carvalho da Silva, que a Constituïção seja violada por se seguir êste processo.
O Sr. Carvalho da Silva: — É que o Orçamento vai ser alterado totalmente pela remodelação dos serviços públicos e...
O Orador: — Parece que votando o Orçamento mais cousa alguma se poderá votar...
O Sr. Carvalho da Silva: — A remodelação dos quadros do funcionalismo público vai alterar profundamente o Orçamento Geral do Estado.
O Orador: — Mas há deliberações de carácter permanente.
Assim não se poderia discutir nem propor medidas de carácter permanente.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Carvalho da Silva não fez a revisão dos seus «àpartes».
Foi lido o requerimento do Sr. Carvalho da Silva.
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O Sr. Almeida Ribeiro: — Pedia a V. Ex.ª me dissesse se é requerimento o documento que acaba de ser lido ou uma proposta.
O Sr. Presidente: — É um requerimento.
Apoiados.
O Orador: — A simples palavra «requeiro», que aí está, não basta para que seja classificado de requerimento. É uma proposta, e assim têm sido sempre considerados os adiamentos de discussão.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Devo dizer que tenho assistido aqui a alguns Srs. Deputados terem requerido que seja retirado da discussão certo projecto.
Todos os dias se faz isto.
O Sr. Nunes Loureiro: — Foi até levantada a questão pelo Sr. António Fonseca.
Sempre que é apresentado um requerimento assim, é considerado uma proposta.
O Orador: — Ainda o ano passado foi apresentado um requerimento para ser remirado da discussão um projecto sôbre expropriações.
O orador não reviu, nem o Sr. Nunes Loureiro fez a revisão do seu «àparte»,
O Sr. Presidente: — Em face das considerações feitas, considero o requerimento como uma proposta e vou pô-la à admissão.
Foi admitido e segue os trâmites usuais.
O Sr. Presidente: — Já mandei buscar o processo, mas ainda não foi encontrado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Não posso concordar em que haja a discussão do Orçamento na generalidade sem ser precedida da distribuïção dos pareceres sôbre todos os orçamentos.
Por isso, não concordo com as considerações do Sr. Almeida Ribeiro.
Temos de reconhecer que o projecto do Sr. Alberto Xavier foi apenas uma medida de ocasião, e não destinada ao orçamento dêste ano e dos imediatos.
A análise e discussão das contas do Estado constitui uma das principais funções do Parlamento. E, por isso, eu proponho que a discussão e votação do Orçamento sejam feitas nos termos do Regimento aprovado na sessão de 4 de Julho de 1911, com prejuízo das alterações introduzidas em Maio de 1922.
Êste incidente deu o resultado de a opinião pública nos dar razão; e vários Srs. Deputados provaram que a tínhamos, visto que, no ano passado, discutindo certos capítulos do orçamento, fizeram considerações de ordem geral que nada tinham com a matéria em discussão.
Nestas condições, Sr. Presidente, mando para a Mesa a minha proposta, que diz:
Proposta
Proponho que a discussão e votação do Orçamento Geral do Estado sejam feitas nos termos do Regimento aprovado em sessão de 14 de Julho de 1911, com prejuízo das alterações introduzidas em Maio de 1922.
Lisboa, 19 de Fevereiro de 1922. — Paulo Cancela de Abreu.
Requeiro urgência e dispensa do Regimento para a minha proposta.
Tenho dito.
Foi admitida a proposta.
Foram concedidas a urgência e dispensa do Regimento.
C Sr. Presidente: — Vai ler-se para entrar em discussão a proposta enviada para a Mesa pelo Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Pedro Pita (para uma questão prévia): — Sr. Presidente: tive a mesma idea que o Sr. Cancela de Abreu, mas eu seguia por outro caminho. Procurando dispensar a votação da urgência e dispensa do Regimento, apresentava o meu ponto de vista como questão prévia, assinada por cinco Srs. Deputados. Assim não tenho mais do que declarar a V. Ex.ª e à Câmara o meu acôrdo com a proposta do Sr. Cancela de Abreu.
Na verdade, quando no ano pasmado, a tantos de Maio, pretendemos fazer a discussão do Orçamento que devia estar aprovado em 30 de Junho; quando sobretudo tínhamos em vista acabar com essa lenda do que em regime republicano não era
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possível ter mais orçamentos, compreendia-se que nós fizéssemos o sacrifício das nossas opiniões, fizéssemos todos os sacrifícios para se conseguir a aprovação do Orçamento em mês e meio, mas, Sr. Presidente, desde que daqui até 30 de Junho medeia o espaço de tempo suficiente para que essa discussão se faça em termos, para que se discuta, como não pode deixar do ser, a maneira de organização do Orçamento, para que se aprecie, como não pode deixar de ser, se na organização do Orçamento se obedeceu em primeiro lugar ao critério legal e depois ao critério melhor, o querer obrigar-nos a discutir o votar o Orçamento nos termos dessa proposta, como no ano passado se fez, atendendo-se ùnicamente ao pouco tempo que havia para fazer essa discussão e à sua absoluta necessidade, é exigir de nós uma abdicação, que não será de conseguir dentro desta Câmara.
Sr. Presidente: temos tanta vontade de que o Orçamento seja aprovado em devido tempo como a tem o partido que está representado no Govêrno, procurando prestigiar a República tanto como êsse partido, mas, Sr. Presidente, não podemos cooperar numa cousa que reputamos imprópria de nós mesmos.
Não podemos estar a simular que fazemos uma discussão quando antecipadamente temos a certeza de que não é possível fazer uma discussão séria. Nestes termos, um só caminho nos fica aberto, e é de abandonarmos completamente essa discussão, deixando-a fazer como a quiserem fazer aqueles que entendem que é possível, num regime como o nosso, vir ao Parlamento buscar apenas uma chancela, sem consciência nem conhecimento do que se trata.
Sr. Presidente: discutir o Orçamento por capítulos, sem que prèviamente tenha havido uma discussão em conjunto, para apreciar se foram ou não observados os preceitos legais, limitada a nossa acção apenas em cada capítulo a apontar uma ou outra verba julgada demasiada, é a mesma cousa do que dispensarem essa discussão.
No ano passado dava-se a circunstância especialíssima de que há muitos anos não tínhamos Orçamento, estando a mês o meio do prazo em que devia ser aprovado êsse documento legal.
Ora êste ano não se dá a mesma circunstância.
A Câmara sabe que no ano passado muitos parlamentares fizeram a declaração terminante de que não intervinham na discussão do Orçamento, simplesmente porque estavam dispostos a votá-lo sem o discutirem.
Eu fui um dos que fizeram essa declaração.
Não intervim na discussão do Orçamento, porque o que eu desejava era que o Orçamento fôsse aprovado.
E quem, como eu, entendia que era absolutamente necessário para o prestígio da República que êsse Orçamento fôsse aprovado, certamente que não tomou essa resolução como norma a seguir para sempre, para com todos os orçamentos.
Em resumo, Sr. Presidente, não pretendemos que o Orçamento só se discuta nos termos regimentais.
É necessário esclarecer convenientemente êste ponto de vista, a meu ver de muita importância.
Não desejamos, repito, que o Orçamento se discuta sòmente nos termos regimentais, pois desde que se possa estabelecer uma discussão na generalidade com uma certa amplitude, já podemos aceitar umas certas restrições na discussão na especialidade.
É bom que fique bem esclarecido êste ponto de vista, para que ninguém possa dizer que nós somos de opinião que os orçamentos só se devem discutir nos termos regimentais, ou então que não serão discutidos.
Não é assim: o nosso desejo é que relativamente aos orçamentos possa haver na generalidade uma discussão ampla, admitindo na discussão na especialidade umas certas e determinadas restrições.
É isto o que nós desejamos.
Tenho dito,
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos devolver as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Para que a Câmara fique devidamente esclarecida, eu vou ler-lho uns pontos da proposta enviada para a Mesa pelo ilustre Deputado Sr. Alberto Xavier na sessão passada.
Desta forma creio que a Câmara ficou
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devidamente esclarecida sôbre a proposta do Sr. Alberto Xavier.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Tôrres Garcia: — Sr. Presidente: pedi a palavra para expôr à Câmara a minha maneira de ver sôbre o assunto.
Veja-se, Sr. Presidente, o artigo 7.º das disposições que aqui foram votadas.
Isto, Sr. Presidente, foi o que foi votado em Maio, e como nesse artigo se fixa a data de 15 de Fevereiro para início da discussão do Orçamento e a de 15 de Fevereiro para a sua conclusão, datas estas posteriores àquela, evidente é o carácter permanente das alterações introduzidas, no ano passado, ao Regimento desta Câmara.
A meu ver, Sr. Presidente, os motivos imperiosos que então houve para se proceder dessa forma, existem ainda presentemente, ao menos para que o Orçamento Geral do Estado possa ser discutido e aprovado antes de 30 de Junho pelo Senado.
Segundo o que está estabelecido, cada Deputado pode usar da palavra durante trinta minutos sôbre cada capítulo, e que creio que será o suficiente, pois dá mais de 100 horas para cada Deputado.
Nós, Sr. Presidente, não devemos praticar actos inúteis e, a meu ver, a discussão do Orçamento tal qual está determinada é uma inutilidade. Não passa o Orçamento do Estado de uma tabela de despesas, que resultam do cumprimento das leis, e o Parlamento não dispõe de meios que lhe permita reduzi-las, porque já lá vai o tempo em que existia uma medida segundo a qual a extinção de uma verba impunha a extinção do serviço respectivo ou do lugar do funcionário que o desempenhava.
Hoje, se praticamos a infantilidade de reduzir quaisquer verbas, vamos apenas provocar a votação de créditos especiais para fazer face às despesas do serviço que não podemos modificar.
Para mim, chegam de sobra as 100 horas que me dá o Regimento tal como ficou depois da votação de Maio do ano passado, embora discorde profundamente de que à volta do Orçamento se não possa fazer no Parlamento uma discussão que conduzisse ao fundo da questão, que é a redução das despesas, o que nos está vedado pela legislação em vigor, de modo que, por mais peregrinas que sejam as doutrinas trazidas à Câmara, por mais que alguém se ocupe em esfolhar todas as livrarias da especialidade, no fim só se terá praticado um acto inútil. E, Sr. Presidente, como não estou disposto a praticar actos inúteis, declaro que me sinto muito à vontade dentro do que foi votado o ano passado e que, pelo império da sua redacção, se afirma como de soberana existência ainda êste ano.
Apoiados.
Tenho dito.
O Sr. Plínio Silva: — Sr. Presidente: lamento que a Mesa tivesse provocado êste incidente, porque foi, de facto, devido a uma observação da Mesa que chegamos à esterilidade completa de uma sessão da Câmara.
As alterações ao Regimento — e disso não pode haver a menor dúvida — foram votadas com carácter permanente, e o ilustre Deputado Sr. Tôrres Garcia acaba de chamar a atenção da Câmara para o n.º 7 dessas alterações, sôbre o qual não pode haver qualquer confusão.
O Sr. Almeida Ribeiro já tinha frisado a circunstância de no n.º 7 estar fixado que a discussão do Orçamento se deve iniciar em 15 de Fevereiro e, como as alterações ao Regimento foram votadas em Maio, é evidente que tal disposição se destinava a vigorar nos anos seguintes.
Procurou, porém, o Sr. Pedro Pita justificar que a urgência na discussão do Orçamento o ano passado fôra motivada pelo facto de se dispôr apenas de mês e meio. É curioso observar que a Câmara nas alterações ao Regimento se não limitou a fixar o dia em que se devia iniciar a discussão do Orçamento, pois que como o Sr. Tôrres Garcia acentuou fixou também o dia em que essa discussão deve estar terminada.
Vê-se pois, por êsse n.º 7 das alterações, que a Câmara o ano passado, ao encarar o problema da discussão do Orçamento, e vendo a necessidade de fazer um trabalho útil e prático, o resolveu duma maneira permanente. A Câmara dos Deputados entendeu que devia fixar êste prazo, porque devendo ser pela Constituïção; no dia 30 de Março, encerrados os trabalhos parlamentares, e assim estar
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votado o Orçamento, devia, entretanto, haver um certo prazo para a discussão de outros assuntos urgentes e importantes.
Vê, portanto, V. Ex.ª que de facto a Câmara fixou doutrina a êste respeito com carácter permanente.
Mas seja-me lícito também manifestar a minha extranheza por ver pessoas pensarem numa certa data de determinada maneira e noutra ocasião doutra maneira.
Esta proposta de alterações ao Regimento foi apresentada pelo Sr. Alberto Xavier no intuito de se chegar a resultados práticos na discussão dos orçamentos; ora não compreendo como S. Ex.ª hoje pensa de outra maneira, a não ser por não pertencer já ao mesmo partido!
Sr. Presidente: disse o Sr. Pedro Pita que no ano passado, ao aprovar-se esta proposta, havia apenas mês e meio para a discussão dos orçamentos. Ora creio que êste ano não temos muito mais tempo, porque ainda há muitos assuntos importantes a tratar.
Além disso, se nós analisarmos o que sucedeu o ano passado, temos de reconhecer que a nenhum Deputado foi cortado o direito de se manifestar abertamente sôbre os orçamentos.
Parece-me, por isso, salvo o devido respeito pela Mesa, que em primeiro lugar não havia necessidade do a Mesa fazer surgir esta discussão estéril, em segundo lugar que não tem razão os argumentos expostos, para alterar na discussão dos orçamentos, o que se fez o ano passado, porque a prática tem demonstrado que isso dá resultado úteis.
Julgo, pois, que a Mesa nada mais tem a fazer senão mandar iniciar a discussão do orçamento do Ministério do Interior, conforme o regime adoptado o ano passado.
Apoiados.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestas condições, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: em primeiro lugar devo dizer ao Sr. Plínio Silva que está em equívoco quando atribuo à Mesa as responsabilidades dêste debate, porquanto fui eu quem levantou as primeiras dúvidas sôbre a proposta apresentada na sessão transacta pelo Sr. Alberto Xavier.
Feita esta declaração, devo dizer a S. Ex.ª e à Câmara, que cada vez mais nos sentimos satisfeitos pela opinião manifestada por êste lado da Câmara o ano passado.
Afirmou o ilustre Deputado Sr. Pedro Pita que a rápida discussão que se fez o ano passado do Orçamento Geral do Estado tem a sua justificação na necessidade de acabar com a lenda de que a República não discutia os seus Orçamentos.
Quere-me parecer, porém, que a razão invocada por S. Ex.ª nada justifica, por quanto a discussão do Orçamento feita nas condições em que o foi, não representando absolutamente nada, não correspondeu às aspirações nacionais.
O Sr. Tôrres Garcia veio a esta Câmara sustentar o princípio de que a discussão do Orçamento na generalidade é uma discussão absolutamente inútil, mas o que é curioso é que foi S. Ex.ª quem nos veio dar razão ao afirmar que na especialidade o Parlamento não podia propor a eliminação desta ou daquela verba, uma vez que o Poder Executivo as tinha fixado.
Justamente o que queremos nós?
Queremos uma discussão ampla, para que durante a discussão na generalidade se possa demonstrar a necessidade de alterar determinadas leis, que acobertam despesas que o País não pode já comportar.
Além disso, eu não posso compreender que haja uma democracia que repute uma inutilidade as reclamações feitas pelo País.
Mas, Sr. Presidente, ao mesmo tempo que vemos esta afirmação feita por todos os ministros das Finanças, observamos que no Parlamento a maioria luta para que não possa discutir-se, em nome, porventura, da defesa da República.
E então, de duas, uma: ou a República é capaz de fazer essa redução de despesas ou tem de aceitar uma discussão ampla para que sejam tomadas medidas no sentido de ver se se pode salvar o País.
Sr. Presidente: nós, que somos representantes da Nação, não consentiremos, sem o nosso mais veemente protesto, que o parlamento continue por êste caminho,
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Diário da Câmara dos Deputados
e que o País deixe de saber qual a situação em que se encontra.
Havemos de demonstrar quanto os orçamentos estão afastados da verdade, e quanto de absurdo é estarmos a discutir as despesas actuais do Estado, com a certeza absoluta de que no dia seguinte, o Parlamento, vai votar propostas que, por completo, os alteram.
O Sr. Presidente: — V. Ex.ª deseja concluir as suas considerações ou ficar com a palavra reservada?
O Sr. Carvalho da Silva: — Se V. Ex.ª me permite, fico com a palavra reservada.
O orador não reviu.
O Sr. João Luís Ricardo (em nome da comissão de agricultura): — Pedi a palavra para mandar para a Mesa o parecer da comissão de agricultura, relativo à proposta sôbre o problema cerealífero.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã, às 14 horas, com a seguinte ordem dos trabalhos:
Antes da ordem do dia:
(Sem prejuízo dos oradores que se inscreveram).
Parecer n.º 350, que autoriza o Govêrno a contrair na Caixa Geral de Depósitos um empréstimo até 500:000$ destinado à construção do edifício para a Escola Industrial de Bernardino Machado, da Figueira da Foz.
Ordem do dia:
Proposta para que a discussão do Orçamento seja feita com prejuízo das alterações introduzidas no Regimento, em Maio de 1922, e a de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Projecto de lei
Do Sr. João E. Aguas, Suprimindo o artigo 4.º da lei n.º 1:340, de 25 de Agosto de 1922, sôbre promoções de oficiais.
Para o «Diário do Govêrnos».
Renovação de iniciativa Renovo a iniciativa do projecto de lei n.º 23-F, de 1919, com o parecer n.º 138, projecto publicado no Diário do Govêrno, de 26 de Julho do mesmo ano, assinado pelo ilustre Deputado Sr. Jorge de Vasconcelos Nunes e mais trinta e dois Srs. Deputados.
Sala das Sessões, 19 de Fevereiro de 1923. — Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Junte-se ao processo e envie-se à comissão de legislação civil e comercial.
Pareceres
Da comissão dos negócios estrangeiros, sôbre o n.º 375-F, que aprova, para ratificação, a Convenção de Emigração e Trabalho entre Portugal e os Estados Unidos do Brasil.
Imprima-se.
Da comissão de finanças, sôbre o n.º 376-C, que considera incluídos no artigo 30.º do decreto n.º 7:016, para melhoria de vencimentos, o pessoal jornaleiro dos Caminhos de Ferro do Estado e outras empresas ferroviárias.
Imprima-se.
Requerimentos
Requeiro que o Sr. Presidente consulte a Câmara sôbre se resolve que a discussão do Orçamento Geral do Estado para 1923-1924 só se faça depois de votados os projectos de lei referentes as subvenções ao funcionalismo público e regime cerealífero, o ainda depois do votada a proposta de remodelação dos quadros do mesmo funcionalismo. — Carvalho da Silva.
Considerado como proposta.
Admitida.
Para a comissão do Orçamento.
Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me seja enviada, com a máxima urgência, cópia autêntica de todo o processo da sindicância pedida pelo presidente do Tribunal Mixto Militar Territorial e de Marinha ordenada pelo Ex. mo General da 1.ª Divisão, em virtude duma carta publicada no jornal A Época, de 16 de Dezembro findo e transcrita no jornal O Dia da mesma data.
A urgência que se pede é explicável, pelo facto de se anunciar que no próximo
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Sessão de 19 de Fevereiro de 1923
dia 23 será dada a sentença, sendo mester que a referida certidão tudo esclareça para bem da justiça.
Sala das Sessões, 19 de Fevereiro de 1923. — O Deputado, Francisco Cruz.
Expeça-se.
Nota de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro do Comércio sôbre a crise dos serviços dos Caminhos de Ferro do Estado e sôbre as medidas com que o Govêrno conta debelar essa crise.
Outrossim desejo interpelar o mesmo Sr. Ministro, especialmente, sôbre a organização e funcionamento dêsses serviços nas linhas do Sul e Sueste.
Sala das Sessões, 19 de Fevereiro de 1923. — O Deputado, Alberto Xavier.
Expeça-se.
O REDACTOR — Sérgio de Castro.