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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 39
EM 28 DE FEVEREIRO DE 1923
Presidência do Ex. mo Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso
Secretários os Ex. mos Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira José Marques Loureiro
Sumário. — Abertura da sessão. Leitura da acta. Correspondência.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Carlos de Vasconcelos faz algumas considerações sôbre a necessidade da regulamentação do jôgo.
O Sr. Júlio de Abreu manda para a Mesa um projecto de lei.
O Sr. Carvalho da Silva usa da palavra para interrogar a Mesa.
Responde-lhe a Sr. Presidente.
É aprovada a acta. • E concedida uma licença e justificada uma falta.
A Câmara admite à discussão algumas proposições de lei.
O Sr. Alves de Sousa requere a discussão do parecer n.º 384.
Usa da palavra sôbre o modo de votar o Sr. João Bacelar, e em seguida é aprovado o requerimento.
Entrando em discussão o parecer. n.º 384, é dispensada a sua leitura, a requerimento do Sr. Tôrres Garcia.
Usa da palavra, para explicações, o Sr. António Maia.
É aprovado sem discussão na generalidade e na especialidade o parecer n.º 384, e dispensada a leitura da última redacção do projecto, a requerimento Sr. Tôrres Garcia.
O Sr. Carvalho da Silvo pede esclarecimentos ao Govêrno sôbre o rendimento do imposto sôbre transacção.
Responde-lhe o Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães).
O Sr. Sampaio Maia ocupa-se dos factos anormais ocorridos no concelho de Oliveira de Azeméis, onde o administrador do concelho se recusa a dar posse à vereação eleita.
Responde-lhe o Sr. Ministro das Finanças.
A requerimento do Sr. Plínio da Silva entra em discussão o parecer n.º 400, sendo dispensada a sua leitura a requerimento do Sr. Joaquim Brandão.
Usam da palavra o Sr. Carvalho da Silva e Ministro das Finanças, sendo aprovada em seguida a generalidade do projecto.
É aprovado, sem discussão, na especialidade, e dispensada a leitura da última redacção, a requerimento do Sr. Plínio Silva.
O Sr. Joaquim de Oliveira chama a atenção do Govêrno para a imoralidade que representa o procedimento do actual administrador do concelho de Vila Verde com relação ao uso que está fazendo dum edifício escolar.
Responde-lhe o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Pedro Pita reclama contra o facto da interferência do governador civil de Angra nos actos da Junta Geral do mesmo distrito.
Responde o Sr. Ministro das Finanças.
Ordem do dia. — Continuam a discutir-se os orçamentos na generalidade, usando da palavra os Srs. Lino Neto e Carvalho da Silva.
É autorizada a comissão do Orçamento para reünir amanhã durante a sessão, a requerimento do Sr. Tavares Ferreira.
Usa em seguida da palavra, sôbre a ordem do dia, o Sr. Jaime de Sousa que envia para a Mesa uma moção, ficando com a palavra reservada.
Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Sousa da Câmara pede a comparência do Sr. Ministro da Agricultura na próxima sessão para tratar de assuntos dependentes da sua pasta.
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 15 horas e 20 minutos.
Presentes à chamada 44 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 42 Srs. Deputados.

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Diário da Câmara dos Deputados
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Dias.
António de Sousa Maia.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Custódio Maldonado de Freitas.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damão. João Salema.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio de Campos Martins.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Sousa da Câmara.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Ferreira Vidai.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António Mendonça.
António de Paiva Gomes.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur de Morais de Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Hermano José de Medeiros.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Serafim de Barros.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho,
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Góis Pita.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amadeu Leite de Vasconcelos.

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Sessão de 28 de Fevereiro de 1923
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
António Vicente Ferreira.
Artur Brandão.
Augusto Pereira Nobre.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
Jaime Duarte da Silva.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Aguas.
João José da Conceição Camoesas.
João de Ornelas da Silva.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Às 15 horas principia a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 44 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Lê-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Do Ministério das Finanças, acompanhando 185 exemplares do desenvolvimento do orçamento do Instituto de Seguros Sociais Obrigatórios e de Previdência Geral.
Para a Secretaria.
Do Ministério do Instrução, acompanhando a cópia duma nota que lhe foi enviada pelo reitor do Liceu de Manuel de Arriaga, na Horta.
Para a comissão do Orçamento.
Do mesmo, com uma cópia da proposta do chefe de Repartição das Construções Escolares para que seja considerado benemérito da Pátria o falecido António Maria dos Santos.
Para a comissão de instrução pública.
Do Ministério da Agricultura, enviando uma cópia pedida no ofício n.º 102 para o Sr. Manuel de Sousa da Câmara.
Para a Secretaria.
Do vice-presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Moura, pedindo a aprovação do projecto de lei dos

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Diário da Câmara dos Deputados
Srs. Pedro de Castro, Gomes de Vilhena e Amadeu de Vasconcelos.
Para a comissão de administração pública.
Telegramas
Da Câmara Municipal de Portel, pedindo a liberdade do ensino religioso nas escolas.
Para a Secretaria.
Do governador civil de Bragança, declarando ter sido mal informado o jornal O Século nas referências à Junta Geral do Distrito.
Para a Secretaria.
Dos professores da Escola Normal Primária de Pôrto, pedindo para serem eliminados todos os impostos que recaem nos funcionários civis e militares.
Para a Secretaria.
Representações
Dos serventes contratados da Direcção Geral das Contribuïções e Impostos, pedindo para serem considerados na efectividade e no quadro.
Para a comissão de reorganização dos serviços públicos.
Dos funcionários da Direcção Geral de Saúde, pedindo várias equiparações no seu quadro.
Para a comissão de reorganização dos serviços públicos.
— Dos inspectores-chefes do pessoal de trens dos caminhos de ferro do Minho
e Douro, pedindo para não ser reduzido o seu quadro.
Para a comissão de reorganização dos serviços públicos.
Requerimentos
Do tenente reformado Diogo Fortunato de Azinhais pedindo para se lhe aplicar as disposições do artigo 1.º da lei n.º 1:358.
Para a comissão de colónias.
Do major reformado João Inácio Palermo de Oliveira fazendo igual pedido. Para a comissão de colónias.
Antes da ordem do dia
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Sr. Presidente: numa das primeiras sessões da semana passada, tive a honra de enviar para a Mesa um projecto, renovando a iniciativa do projecto do Sr. Jorge Nunes e outros Srs. Deputados, sôbre a regulamentação do jôgo, apresentado nesta Câmara em Fevereiro de 1919.
Êsse projecto está actualmente na comissão de legislação civil e comercial. Todavia, ainda não foi distribuído e receio muito que mais uma vez se confirmem as acusações que nesta Câmara têm sido feitas ao trabalho das comissões.
Sr. Presidente: trata-se dum assunto de grande magnitude, não só por concordar em absoluto com a regulamentação de jôgo — por considerar que ao Govêrno adviriam grandes lucros quer para a beneficência quer para a construção de estradas — mas ainda porque factos anormais que ùltimamente se deram me levaram ao convencimento de que, se não se regulamentar o jôgo, o estado de crise moral a que o Sr. Afonso Costa se referiu, será um facto.
Sr. Presidente: um dos jornais mais lidos de Lisboa, referindo-se há dias à questão do jôgo, afirmava que o Sr. governador civil havia mandado encerraras casas do jôgo, por influência dum trunfo político, que não pertence ao Partido Nacionalista, cujo filho perdera 10 contos, sendo reabertas depois de aquelas casas darem 70 contos.
£ Quanto de vergonhoso, de imoral e de anti-republicano êste acto encerra?
Não desejo por mais tempo referir-me a êste facto porque — estou certo — êle não se repetirá.
Mas, Sr. Presidente, eu bem sei que contra a regulamentação do jôgo se levantam os moralistas, aqueles que consideram o vício como uma mancha deprimente para a humanidade. Não há dúvida de que o jôgo bem como álcool, são vícios terríveis; mas, entre os que apreciam o vinho, há os que não se embriagam, e entre os que jogam, há os que não perdem fortunas.
Não se pretenda, pois, transformar êsses vícios, que podem ser como que uma orquídea que se coloca ao peito, numa chaga cancerosa.
Devo dizer à Câmara que as afirmações que venho de fazer, as faço em meu nome pessoal. Todavia, desejo informá-la de que existe um grupo de Deputados,

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Sessão de 28 de Fevereiro de 1923
que se empenham em que se estabeleça uma acção eficaz, tendente ou à regulamentação do jôgo ou à sua proïbição absoluta.
Muitos já são êsses Deputados; e se no prazo de 30 dias as comissões respectivas não apresentarem os seus pareceres sôbre o projecto, diariamente nesta Câmara, cada um dos Deputados que compõem êsse grupo, levantará a questão do jôgo e levará o Govêrno a cumprir a lei.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio de Abreu: — Sr. Presidente: para poder tratar do assunto para que pedi a palavra, necessitava da presença do Sr. Ministro do Comércio que não se encontra nesta sala.
Todavia, aproveito a ocasião para mandar para a Mesa um projecto de lei, referente ao major Sr. Ferreira do Amaral.
Sr. Presidente: quando aqui se discutiu o projecto sôbre a concessão de licenças ilimitadas, fui eu um dos Deputados que mais o combateram, afirmando no emtanto, que oficiais havia para quem eu admitia excepções, visto terem pedido as suas licenças antes de 1921, ou seja anteriormente a essa avalanche de oficiais que aqui fabricámos.
Um dêsses oficiais é o major Sr. Ferreira do Amaral, que tinha passado à situação de licença ilimitada para ir para a África, e que agora se vê impossibilitado de reingressar no exército, apesar de ser um oficial distinto e brioso, que heròicamente se portou em França, e tam heròicamente, que é condecorado com as cruzes de guerra de França e Inglaterra, Tôrre e Espada e medalha da campanha da Flandres.
Igualmente, por distinção foi promovido a major, e tam boas provas deu de si, que várias vezes foi elogiado pela Inglaterra, que lhe concedeu a ordem de serviços distintos, que é superior à Cruz de Guerra. 0
E possível que alguns oficiais sejam prejudicados pelo ingresso do Sr. Ferreira do Amaral; mas eu não tenho dúvida, em virtude dos relevantes serviços por êle prestados à Pátria, em propor que êle ingresse no quadro dos supranumerários.
Mais considerações tinha a fazer; mas reservo-as para quando estiver presente o Sr. Ministro do Comércio.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — V. Ex.ª Sr. Presidente, informa-me se hoje vem à Câmara, algum membro do Govêrno?
O Sr. Presidente: — Não tenho comunicação alguma.
O Orador: — Se V. Ex.ª me permite, reservo as minhas considerações, para quando estiver presente algum dos Srs. Ministros.
Foi aprovada a acta.
Justificação de faltas
Do Sr. João Ornelas da Silva.
Justificado.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Pedido de licença
Do Sr. José Vilhena, 10 dias.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas. Admissões
São admitidas as seguintes preposições de lei:
Proposta de lei
Do Sr. Ministro das Finanças, concedendo melhoria de pensão de reforma ou aposentação aos funcionários civis reformados por meio de títulos de renda vitalícia e aos aposentados com pensão paga por verbas orçamentais.
Para a comissão de finanças.
Projectos de lei
Do Sr. Carlos Olavo, restituindo aos Delegados do Procurador da República os direitos que possuíam por fôrça do artigo 110.º do Regulamento do Ministério Publico de 24 de Outubro de 1901.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Dos Srs. Almeida Ribeiro e Nunes Loureiro, facultando a inscrição de sócios do

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Diário da Câmara dos Deputados
Montepio Oficial aos funcionários do Estado com mais do 40 anos de idade e vencimento igual ou superior a 300$ anuais.
Para a comissão de administração pública.
O Sr. Alves dos Santos (para um requerimento). — Requeiro a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se digne consultar a Câmara sôbre se permite que entre imediatamente em discussão o parecer n.º 384, relativo ao projecto de lei n.º 381-B.
O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara.
Devo ponderar a V. Ex.ªs que esta Câmara deliberou que, quando antes da ordem do dia não houvesse oradores inscritos, se discutissem quatro projectos que estão aqui indicados.
Parece-me, pois, que o requerimento do Sr. Alves dos Santos, prejudica essa deliberação.
O Sr. Alves dos Santos: — V. Ex.ª dá-me licença?
Eu fiz o requerimento nestas condições, porque se trata dum assunto importante; e tam importante êle é, que se, no dia 31 de Março próximo, a câmara de Coimbra não tiver êste dinheiro para pagar o material eléctrico, perderá todas as prestações que já pagou.
Apoiados.
O Sr. João Bacelar: — Sr. Presidente: desejo declarar que estou inteiramente de acôrdo com as considerações que acabou de fazer o Sr. Alves dos Santos.
Como, porém, o projecto que está indicado para ser discutido — segundo a deliberação da Câmara — é o que se refere à concessão de 400 contos para a compra do edifício da escola da Figueira da Foz, e, como para êle ser discutido, é necessária a presença do Sr. Ministro do Comércio, e S. Ex.ª não está, parece-me não haver inconveniente em ser votado e aprovado o requerimento do Sr. Alves dos Santos.
Apoiados.
Boi aprovado o requerimento do Sr. Alves dos Santos.
O Sr. Tôrres Garcia (para um requerimento): — Requeiro a V. Ex.ª se digne consultar a Câmara, sôbre se dispensa a leitura do parecer. Foi aprovado.
O Sr. António Maia. (para explicações). — Sr. Presidente: em breves palavras quero agradecer a V. Ex.ª e a toda a Câmara a atenção que comigo tiveram, insistindo para retirar o meu pedido de demissão de oficial do exército. Agradeço tanto mais penhorado, quanto é certo que eu não esperava essa manifestação, e não a merecia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Está em discussão o parecer n.º 384.
Foi aprovado sem discussão na generalidade e especialidade.
O Sr. Tôrres Garcia (para um requerimento). — Requeiro a V. Ex.ª se digne consultar a Câmara sôbre se dispensa a leitura da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Carvalho da Silva: — Há dias tive a honra de preguntar ao Sr. Ministro das Finanças se podia saber qualquer cousa de concreto acêrca do rendimento do imposto sôbre transacções.
O Sr. Ministro, amável, como sempre, prometeu que numa das próximas sessões traria à Câmara qualquer cousa acêrca dêsse rendimento.
Como se passaram já alguns dias, é possível que o Sr. Ministro se tenha esquecido do meu pedido. De novo insisto com o Sr. Ministro, pedindo-lhe o favor de me informar sôbre o que lhe pedi. Se' agora S. Ex.ª o não pode fazer, peço-lhe que numa das próximas sessões me diga alguma cousa de concreto, tanto mais que, estando em discussão o Orçamento, muito útil o conveniente seria conhecer êsses dados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Tenho a responder ao ilustre Deputado que não tenho ainda os elementos pedidos sôbre êsse imposto.
Estou à espera de receber o rendimento relativo aos meses de Janeiro e Feve-

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reiro, e logo que possua êsses elementos trazê-los hei ao Parlamento para se apreciarem.
O orador não reviu.
O Sr. Sampaio Maia: — Chamo a atenção do Sr. Ministro das Finanças, a fim de transmitir ao Sr. Ministro do Interior a reclamação que vou formular.
Na eleição da Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis passaram-se factos verdadeiramente irregulares. Os legítimos vereadores, legalmente eleitos, foram impedidos de tomar posse pelo administrador do concelho, com o fundamento de que estava pendente um recurso relativo à eleição nessa assemblea.
Há mais de oito dias que o Supremo Tribunal Administrativo se decidiu pela validade da eleição daquela Câmara, tal como foi feita e conforme o apuramento que se fez.
Quero saber por que ainda hoje, decorridos dez a quinze dias depois da publicação do acórdão, a câmara legítima ainda não pôde tomar posse. Quero saber quais as providências que o Govêrno tomou para punir a forma abusiva como o administrador do concelho procedeu, intrometendo-se na posse dos representantes legítimos dessa vereação.
Peço, pois, ao Sr. Ministro das Finanças o favor de transmitir ao Sr. Ministro do Interior o que acabo de dizer, a fim de S. Ex.ª dar as suas instruções para que quanto antes a câmara municipal eleita entre na posse da vereação.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Pedi a palavra para dizer ao Sr. Sampaio Maia que transmitirei ao meu colega do Interior a reclamação feita acêrca da Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis, a fim de S. Ex.ª providenciar, no caso de a autoridade administrativa estar exorbitando no desempenho das suas funções.
O orador não reviu.
O Sr. Plínio Silva: — Requeiro a V. Ex.ª que consulte a Câmara, para entrar imediatamente em discussão o parecer n.º 400, já dado para discussão na ordem do dia.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Plínio Silva.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o parecer n.º 400. É o seguinte:
Parecer n.º 400
Senhores Deputados. — O projecto de lei n.º 376-C, da autoria do Sr. Vergílio Costa, visa a esclarecer a situação em que perante a lei n.º 1:355, de 15 de Setembro de 1922, ficaram uma parte dos ferroviários do Estado, que, por não terem sido incluídos no decreto n.º 7:016, de 12 de Outubro de 1920, como empregados técnicos, foram privados das melhorias e concedidas aos funcionários a que se encontravam anteriormente equiparados.
Em três grupos distintos se dividia o pessoal nos Caminhos de Ferro do Estado até 1920: técnicos, administrativos e jornaleiros.
Do primeiro dos referidos grupos faziam parte ùnicamente os engenheiros, engenheiros auxiliares e desenhadores. Com a publicação do citado decreto n.º 7:016, a classificação de técnicos tornou-se extensiva a outras categorias de empregados, como maquinistas, mestres, aprendizes de desenhadores, etc.
A lei n.º 1:355, excluindo dos benefícios da sua aplicação os assalariados do Estado, pelo que se refere aos Caminhos de Ferro do Estado, pôde aplicar-se aos empregados técnicos e administrativos mas não abrangeu os jornaleiros. Daí a publicação do decreto n.º 8:398, de 26 de Setembro de 1922, que concedeu a êsses empregados várias melhorias complementares de vencimento, deixando-os, porém, em situação de manifesta inferioridade em relação a muitos outros empregados a que estavam equiparados em vencimento.
A vossa comissão de caminhos de ferro, tendo ponderado detidamente a situação dos serviços autónomos, é de parecer que não podem continuar a ter aplicação a êsses serviços as disposições gerais das leis que visem a regular a situação do funcionalismo publico, entendendo que os quadros, vencimentos e melhorias de qualquer espécie do pessoal dos serviços autónomos deve ser objecto de diplomas especiais elaborados pelo Govêrno de acôrdo com as respectivas administrações e organizados, quanto possível, dentro das disponibilidades das suas receitas.

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Diário da Câmara dos Deputados
Convindo, porém, esclarecer desde já a situação dos ferroviários do Estado a que se refere o presente projecto de lei, é a vossa comissão de caminhos de ferro de parecer que melhor se adaptará ao fim que tem em vista substituí-lo pelo seguinte projecto de lei que temos a honra de submeter à vossa apreciação:
Artigo. 1.º Não são aplicáveis aos encarregados de oficinas, mestres de vapores e rebocadores, artífices, revisores de material, capatazes gerais, fogueiros e operários das diferentes classes dos Caminhos de Ferro do Estado, as disposições do artigo 13.º da lei n.º 1:355, de 15 de Setembro de 1922, beneficiando estes agentes das melhorias complementares de vencimento concedidas nos termos da referida lei, desde 1 de Janeiro de 1923.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 29 de Janeiro de 1923. — Alberto de Moura Pinto — Francisco Cruz — Plínio Silva — João E. Aguas — Vergílio Costa — Luís da Costa Amorim — Vitorino Godinho, relator.
Senhores Deputados. — A vossa comissão de finanças, tendo apreciado o projecto de lei da autoria do Deputado Sr. Vergílio Costa e a redacção proposta pela comissão de caminhos de ferro, julga de toda a justiça a aprovação duma medida tendente a reparar a iniquidade criada pela lei n.º 1:355, atingindo o pessoal ferroviário a que se refere o dito projecto e o parecer da referida comissão.
Discorda, simplesmente, da redacção do projecto inicial e da redacção do projecto proposto pela comissão de caminhos de ferro, parecendo-lhe que o fim a atingir será melhor realizado com a redacção que adiante se propõe. Trata-se, em poucas palavras, do seguinte:
Em 1920 fez-se a equiparação de vencimentos do pessoal ferroviário do Estado, integrando êste em 18 grupos, a cada um dos quais se fixou um tipo igual de vencimentos. A maior parte dos grupos compreendia pessoal técnico, administrativo e jornaleiro.
As funções e serviços que se equivaliam eram remunerados de forma igual.
Com a prática, a boa orientação do legislador foi reconhecida e êste regime dos grupos, extinguindo anomalias e absurdos anteriormente existentes, acabou por ser bem aceito por todo o pessoal ferroviário do Estado.
A lei n.º 1:355, de 15 de Setembro de 1922, abrangeu nas suas disposições gerais o pessoal técnico e administrativo dos Caminhos de Ferro do Estado como funcionários do Estado.
Tomou essa lei como base para êsses funcionários o para a respectiva melhoria os vencimentos que lhe tinham sido fixados pelo decreto n.º 7:016, de 12 de Outubro de 1920, conforme os grupos em que êsse pessoal estava integrado.
Mas, pelo artigo 13.º da referida lei para o pessoal assalariado e, portanto, para os jornaleiros dos Caminhos de Ferro do Estado foi buscar-se, para base da melhoria de vencimentos, os vencimentos e salários fixados anteriormente às subvenções e ajudas de custo de vida, isto é, fixados anteriormente ao decreto que tinha feito a equiparação do pessoal ferroviário, a que atrás nos referimos. Êste pessoal, portanto, foi consideràvelmente prejudicado.
O decreto n.º 8:399, de 20 de Setembro de 1922, pretendeu corrigir esta injustiça, mas, como se limitou a estabelecer para o pessoal jornaleiro e para cada grupo a mesma melhoria, nada conseguiu, visto os empregados a que se refere o presente projecto, dada a sua qualidade de jornaleiros, terem sido excluídos no que respeita aos seus vencimentos, fixos e certos, dos grupos onde estavam incluídos. O que havia a fazer, pois, era, salvo o devido respeito, pôr em vigor a disposição que temos a honra de submeter à vossa apreciação:
Projecto de lei
Artigo 1.º Os encarregados de oficinas, mestres de vapores e rebocadores, artífices, revisores de material, capatazes gerais, fogueiros e operários das diferentes classes dos Caminhos de Ferro do Estado, continuam, a partir de 1 de Janeiro de 1923, com os vencimentos que lhe foram atribuídos pelo decreto n.º 7:016, de 12 de Outubro de 1920, competindo-lhes iguais melhorias às que são abonadas ao pessoal técnico e administrativo dos gru-

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pos era que os empregados a que se refere êste artigo estão incluídos.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 8 de Fevereiro de 1923. Carlos Pereira — A. de Portugal Durão — Aníbal Lúcio de Azevedo — Alfredo de Sousa — Lourenço Correia Gomes — Tomé José de Barros Queiroz (com declarações) — Joaquim Ribeiro (com declarações) — Alberto Xavier (com restrições) — F. G. Velhinho Correia, relator.
Projecto de lei n.º 376-C
Senhores Deputados. — Considerando que, por virtude do disposto no artigo 13.º da lei n.º 1:355, de 15 de Setembro de 1922, o pessoal jornaleiro dos Caminhos de Ferro do Estado ficou privado da concessão de melhorias de vencimentos;
Considerando que posteriormente o decreto n.º 8:399 que procurou remediar esta desigualdade estabelece para êste pessoal uma situação de inferioridade em relação a outros funcionários que tenham iguais vencimentos;
Considerando que alguns empregados ferroviários do Estado pelo carácter especial das suas funções não têm em outros serviços públicos categorias correspondentes com que se equiparem;
Tendo em atenção o que o decreto n.º 7:016, de 12 de Outubro de 1920, estabelece acêrca da classificação do pessoal sob o ponto de vista da natureza das suas funções:
Tenho a honra de submeter à aprovação da Câmara o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º São considerados como incluídos no artigo 30.º do decreto n.º 7:016, de 12 de Outubro de 1920, ùnicamente para os efeitos da aplicação das disposições relativas a melhorias de vencimentos ao pessoal jornaleiro dos Caminhos de Ferro do Estado, os encarregados de oficinas, mestres de vapores e rebocadores, artífices, revisores de material, capatazes gorais, fogueiros e operários de qualquer classe.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 22 de Novembro de 1922. — O Deputado, Vergílio Costa,
O Sr. Joaquim Brandão: — Peço que seja consultada a Câmara sobre se dispensa a leitura do parecer.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: — Está em discussão na generalidade o parecer n.º 400.
O Sr. Carvalho da Silva: — Desejo ouvir a opinião dos Srs. Ministros das Finanças e do Comércio sôbre êste projecto de lei.
Parece-me que um projecto desta natureza não deve ser discutido sem a presença do Sr. Ministro do Comércio.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — O parecer n.º 400 é da iniciativa do Parlamento.
O assunto parece-me que é de aceitar.
O projecto vem resolver dificuldades que se levantavam na administração dos caminhos de ferro do Estado.
O aumento de despesa provocado não é exagerado.
O projecto tende a acabar com injustiças que se dão actualmente.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — O Sr. Ministro das Finanças justifica o projecto dizendo que êle é necessário para reparar injustiças que se dão.
Mas lembro que muitas outras injustiças existem também em relação a outras classes, que é urgente e indispensável reparar.
O projecto foi aprovado na generalidade.
Em seguida aprovou-se na especialidade, sem discussão.
O Sr. Plínio Silva: — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção. Foi aprovado.
O Sr. Joaquim de Oliveira: — Não estando presente o Sr. Ministro a que eu me desejava referir, peço ao Sr. Ministro das Finanças o favor de tomar nota do que vou dizer, porque é um assunto de alta importância para a República.
Refiro-me a um edifício escolar existente em Freiria, concelho de Vila Verde, distrito de Braga, edifício que foi legado por João Baptista de Macedo e que abu-

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sivamente se encontra há nove anos, na posse do actual presidente da câmara municipal, que está desempenhando as funções de administrador.
Eu entendo que êste homem não pode realmente merecer a confiança do Sr. Ministro do Interior, assim como entendo que é altamente imoral que aquele edifício esteja transformado em depósito de vinhos e dormitório dos empregados de quem não devem estar exercendo as funções administrativas.
E espantoso que cousas destas se dêem dentro das instituïções vigentes.
Eu desejaria também chamar a atenção do Sr. Ministro da Instrução, a fim de que S. Ex.ª me dissesse quais as providências que S. Ex.ª toma para que êsse edifício seja aplicado num edifício escolar, visto haver tanta falta dêles.
Êsse edifício valia 70 a 100 contos.
Eu peço ao Sr. Ministro das Finanças a fineza de transmitir estas minhas considerações ao Sr. Ministro do Interior o ao Sr. Ministro da Instrução.
Já que estou no uso da palavra, também queria chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças, visto não estar presente o Sr. Ministro da Guerra, para um facto muito irregular.
Quando foi das eleições de Juntas de Freguesia de Parada de Gatim, foi para lá um grupo de bandidos, comandado por um sargento de infantaria 11, de nome Andrade, que foi para lá sem licença do respectivo comandante.
Pois êste grupo de bandidos foi com bombas para a porta da igreja, não deixando votar os eleitores do Partido Reconstituinte, prendendo-os e, espancando-os.
Chamo a atenção do Govêrno para êste facto irregular.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Pedi a palavra para declarar que tomei nota das reclamações que acaba de formular o Sr. Joaquim de Oliveira, e que as transmitirei aos meus colegas do Interior, da Instrução e da Guerra, como me foi pedido.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita: — Não estando presente o Sr. Ministro do Interior, a, quem desejava dirigir-me, peço ao Sr. Ministro das Finanças o favor de transmitir a S. Ex.ª. as considerações que vou fazer.
Por um telegrama enviado de Bragança, sou informado de que a junta geral do distrito, tendo reuni do em 2 de Janeiro, elegeu uma comissão executiva. Creio que mais tarde, reunidos alguns procuradores, se procedeu h eleição da nova comissão executiva. Como quer que seja, o certo é que o administrador, por ordem do governador civil, oficiou à comissão executiva, eleita em 2 de Janeiro, para que entregasse todos os papéis e documentos em sua posse à nova comissão executiva.
No dia 23 pretendeu a comissão eleita em 2 de Janeiro reünir em sessão, mas encontrou seladas as portas da casa onde devia reünir, por ordem do governador civil.
Não interessa saber se de facto houve eleição irregular duma comissão administrativa. Esse facto não tem de ser discutido aqui.
O que interessa é saber se o Govêrno está ou não na disposição de obstar a que os governadores civis se intrometam na vida das corporações administrativas. Trata-se evidentemente dum abuso de autoridade, e é por isso preciso saber a lei em que vivemos. (Apoiados). O Govêrno tem obrigação não pó de punir semelhantes abusos de autoridade, mas ainda de evitar que êles se repitam.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador vão reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Transmitirei ao Sr. Ministro do Interior as considerações feitas pelo ilustre Deputado Sr. Pedro Pita. Creio que S. Ex.ª se deve apresentar brevemente à Câmara, o então terá o ilustre parlamentar ocasião de ser convenientemente esclarecido.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão na generalidade dos orçamentos
O Sr. Lino Neto: — Começa o orador por afirmar que é de justiça reconhecer que o Sr. Ministro das Finanças, apresentando o Orçamento, cumpriu o seu de-

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ver, nos termos da Constituïção. Compete agora à Câmara cumprir o seu.
A verdade é que o Orçamento Geral do Estado, dada a sua ligação com todos os assuntos de administração pública, presta-se a discussão do carácter geral, com dispêndio de tempo, e em casos de urgência pública outras previdências há a adoptar de carácter administrativo.
Melhor seria empregar o tempo nelas.
Por isso em todos os Parlamentos, sobretudo nos povos latinos, há uma tendência para limitar a liberdade da discussão nos orçamentos.
O nosso Parlamento também não tem fugido a essa tendência, e é de justiça que assim seja.
Assim, por virtude desta limitação, já o ano passado um dos grupos desta Câmara o a minoria monárquica abandonaram a Câmara quando ia discutir o Orçamento.
Êle, orador, acha bom que assim não ^suceda êste ano, porque realmente têm êsses grupos responsabilidades, e têm a dizer cousas graves ao país certamente. Êle, orador, está disposto» a ouvi-los com toda a atenção que lhes é devida.
Mas é preciso explicar a atitude da minoria católica. Entende ela que o Orçamento Geral do Estado é documento fundamental da administração pública do país. E um meio de ordem administrativa, porque deixa ver melhor a subordinação e solidariedade entre os vários serviços públicos. E mesmo um meio de progresso legislativo para reformas a empreender. Mas há mais: é também a forma da nação ver como se administra o país.
E, pois, o, documento fundamental, o, se a sua discussão não podo ter a amplitude que por vezes se afigura que podia ter, por falta do método e ordem, serve entretanto para esclarecer.
A discussão do 'Orçamento, da forma como se pretendo fazê-la, não significa mais do que a falta de ordem e de método, não querendo isto dizer, no emtanto, que haja uma certa margem para se discutir o Orçamento Geral do Estado na generalidade. Êle próprio vai fazer as suas considerações de carácter geral, reservando-se para fazer algumas especiais quando se tratar da discussão sôbre outros créditos.
Entende o orador que ao Orçamento
Geral do Estado, tal como se encontra, faltam dados importantíssimos.
Assim, a seu ver, o Orçamento Geral do Estado devia ter um plano geral sôbre a capacidade da vida económica e financeira do país.
Encontram-se, de facto, no Orçamento Geral do Estado mapas das despesas e mapas das receitas; porém, o que ali se não encontra, e o que, a seu ver, faz bastante falta, é um outro mapa com os elementos que são indispensáveis para se apreciar a capacidade da vida económica e financeira do país; pois a verdade é que o país tem riquezas, tem valores, como sejam florestas, caminhos de ferro, etc.
Não se encontra aqui, de facto, um inventário geral dêsses bens, o que seria importantíssimo para se poder apreciar devidamente as condições do crédito público em Portugal, não só pelo que diz respeito a capacidade tributária do Estado, como ainda à capacidade tributária das câmaras municipais e dos corpos administrativos.
Não se encontra, na realidade, no Orçamento qualquer dado a êste respeito, faltando todos os meios de apreciação da riqueza pública.
Assim, por exemplo, no antigo regime e no Ministério do Reino, existia uma nota de todos os bens pertencentes a todas as câmaras municipais do país.
Hoje não há nada que lembre qualquer cousa que seja parecido com isso. É, portanto, uma falta importante para se apreciar a unidade económica 'do Orçamento.
Mas outras faltas ainda existem! Portugal é um país colonial; está fazendo esforços para manter a sua colonização e desenvolvê-la; mas, para se saber se ela é proveitosa e está em proporção com os recursos do País, ora necessário e conveniente que nós tivéssemos uma nota das despesas e receitas dos orçamentos coloniais. Porém, com pena e mágoa devo dizê-lo: as nossas colónias, na sua maior parto, estão ainda regulando-se pelos orçamentos de há três ou quatro anos.
Àparte, que não foi ouvido, do Sr. Júlio de Abreu.
O Orador: — Diz-lhe um ilustre Deputado que os orçamentos das colónias estão já no Ministério das Colónias para se-

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rem aprovados. Mas não é disso que o orador se queixa; o que lamenta é que no Orçamento Geral do Estado não apareçam elementos que dêem uma idea, sequer, das receitas e despesas de todas as colónias, para cuja civilização e soberania nós temos de concorrer, pelo menos, com 50 por cento. E uma falta grave que se nota no Orçamento Geral do Estado. Ele, orador, bem sabe que essa falta já vem do passado, o que se deve à rotina; mas, ocupando-se pela primeira vez da generalidade dos orçamentos, notou logo essa falta.
Entretanto, ainda outras faltas se verificam. Por exemplo, o Orçamento Geral do Estado tem também falhado à política social que tem visado. Em 1909, Lloyd George iniciou na Inglaterra o chamado Orçamento Social, isto por meio de reformas e medidas a favor das classes operárias. Essa iniciativa caiu em graça em todos os meios sociais e foi aceita e abraçada por todos os países cultos. Portugal seguiu na mesma orientação. Não será a minoria católica quem negue a sua aprovação a semelhante orientação; pelo contrário, dá-lha por completo. Mas o que é verdade é que a política social, iniciada pelo Orçamento Geral do Estado, não tem condições de efectividade; encontra mesmo dentro da nossa própria administração elementos que inutilizam todas as tentativas feitas no sentido de melhorar a situação das classes desprotegidas. Assim, pode referir-se aos exclusivos do Estado. Nós não temos pròpriamente uma política dos exclusivos; estão sem sistematização unitária. Há exclusivos que não rendem cousa alguma para o Estado, devendo render; há outros que rendem, mas que, devendo manter e desenvolver a tradicional organização do trabalho, estão em decadência e alguns quási em ruína. Quási todos êles, em vez de servirem para proteger e desenvolver capitais em mãos de proprietários activos e inteligentes, têm servido para proteger capitais em mãos de proprietários pouco inteligentes e pouco activos.
Eis um dos factos que fazem com que falhe a política social do Orçamento Geral do Estado!
Mas mais do que isso: um dos meios de simplificar a administração pública e deixar ver melhor as várias contas e verbas das despesas e receitas é a chamada criação dos servidos autónomos, mas a verdade é que nós não temos um tipo oficial de administração autónoma. Ainda há pouco tempo, quando se discutiu a exploração dos Transportes Marítimos, êle, orador, teve ocasião de fazer notar à Câmara que a própria comissão que deu o parecer para uma solução relativamente a êsse complexo problema, confundia administração directa com administração autónoma Não se -sabe, na administração portuguesa, onde começa a administração autónoma e onde acaba a administração directa. Ora era conveniente explicar-se isso para se poder aliviar o Orçamento de contas complexas.
Todavia, não são só os factos citados que têm servido para inutilizar a política social do Orçamento: é também a nossa organização administrativa. No parecer do orçamento do Ministério do Interior diz o respectivo relator que ainda estamos à espera de reformas que se impõem para que entrem na ordem os serviços dêsse Ministério.
Sabe-se, portanto, por parte duma das comissões da maioria, que as reformas administrativas estão fazendo falta, mas elas mais sensìvelmente se tornam necessárias quando nos lembrarmos de que as autoridades administrativas, longo de fazerem administração pública, estão corrompendo essa administração em tudo o que ela tem de útil e progressivo. Já teve ocasião de se referir ao que estão fazendo por êsse País fôra os vários regedores substitutos para evitar que os eleitores se recenseiem. Os regedores, os administradores de concelho e os governadores civis servem, sobretudo, para evitar que as leis tenham aplicação justa e de harmonia com as necessidades do País. Porque se não faz uma reforma de maneira a acabar-se com este escalracho, que é culpa da má administração pública do nosso País?
Já se vê, pois, que o Orçamento Geral do Estado falha também na política social que tom visado. Mas mais: carece de condições de segurança para as suas previsões. O Sr. Ministro das Finanças diz que as -previsões de Governos saídos da actual maioria têm dado sempre certas, e invoca essa circunstância para dizer que espera que desta vez também as previ-

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sões de Govêrno saiam certas. Todavia, estamos num regime de moeda desvalorizada, e quais são as medidas que traz o Sr. Ministro das Finanças nesse sentido? Êle mesmo as indica no seu relatório, mas êle próprio se encarrega de dizer que são arriscadas.
O Govêrno e a maioria não apresentam medidas que garantam a estabilidade financeira.
£ Quem nos diz a nós que o Governo não está por terra em pouco tempo?
Tudo indica que o Govêrno ou a maioria da Câmara traga propostas no sentido de criar serviços e determinadas medidas como se está fazendo no Ministério da Justiça, relativamente à política religiosa do país.
Diz o Sr. Ministro das Finanças que em questões financeiras nos temos de guiar pelas indicações trazidas pela conferência de Bruxelas e de Génova.
Desde que em matéria financeira e económica há medidas universais, porque é que a maioria não traz propostas nesse sentido?
Há em toda a gente o intuito de explorar o Estado numa ganância que excedo todas as formas lícitas, morais e jurídicas.
Quem se entende nesta Babilónia?
O velho Centro Católico Português tem procurado estabelecer a ordem e a moral pondo os interêsses morais acima dos interêsses materiais, e é agora que os católicos são alcunhados de adesivos.
Adesivos são aqueles — e aqui o declara solenemente — adesivos são todos os filiados nos diversos grupos que tam depressa gritam: viva a monarquia, como viva a República, e que se metem em companhias e emprêsas explorando o Estado, sugando-o por uma forma parasitária.
A organização que representa e em nome da qual fala, acusada de ter ligações inconfessáveis de interêsses, quando procede afinal pelo interêsse da ordem moral e da pátria, no sentido mais elevado.
Declara que é criminoso o que estão fazendo acêrca da exploração industrial de toda a ordem, não deixando que o país viva no progresso.
Já é tempo de acabar com êsse festim de Baltasar,
O orador conclui, dizendo que é necessário dar ao carácter e à disciplina o lugar que lhes compete na administração pública da sociedade portuguesa.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: antes de continuar as considerações que fui obrigado a terminar, por me ter V. Ex.ª, em harmonia com alterações regimentais para a discussão do Orçamento, retirado a palavra, quero deixar bem acentuado que as considerações ontem formuladas e os números apresentados pelo ilustre Deputado Sr. Barros Queiroz foram apenas a confirmação do que foi dito dêste lado da Câmara, quando, dentro da meia hora então concedida a cada Deputado, tivemos a honra de começar a nossa apreciação da generalidade do falso orçamento de que nos estamos ocupando.
Demonstrei eu que, sendo superior a 2:400 por cento a diferença cambial e estando ela computada, na proposta do Orçamento, em 1:500 por cento, tinha a verba das despesas de ser aumentada de 85:900 contos, só nos capítulos respeitantes à dívida pública e a pagamentos a fazer, em ouro, pelos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, tendo já na conta das receitas, aplicada por diferença de câmbios, a mesma correcção às verbas correspondentes a emolumentos consulares e direitos de importação em vários géneros e mercadorias, que são cobrados em escudos, ao câmbio do dia.
O ilustre Deputado Sr. Barros Queiroz, confirmando as minhas afirmações, foi ainda mais longe, pois, por não ter calculado a diferença cambial em números redondos e por já o câmbio se ter agravado um pouco, avaliou em 110:000 contos o aumento indispensável a fazer, por êste motivo, nas despesas previstas.
Pelos prejuízos do Estado com o pão político, demonstrei eu ser preciso acrescentar à conta das despesas mais 80:000 contos, partindo do princípio de que a importação seja de 180:000 toneladas.
O Sr. Barros Queiroz, porque calcula que a referida importação atinja 200:000

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toneladas e também pelo maior agravamento cambial, calculou em 110:000 contos, a verba a acrescentar à incluída no Orçamento.
Em face das declarações feitas nesta Câmara pelo Sr. Ministro das Finanças, calculei eu ser necessário juntar 33:000 contos aos 290:000 previstos na proposta orçamental para pagamento de subvenções ao funcionalismo, mesmo sem contar, como declarei, com o deficit de todos os serviços autónomos, excepto o da Administração do Pôrto de Lisboa.
O Sr. Barros Queiroz afirmou que não deve andar longe de 30:000 contos só o deficit dos Caminhos de Ferro do Estado.
Dissera eu, apesar de não ter ainda em meu poder os dados oficiais que pedi, que o imposto sôbre transacções produziria, incluído o adicional de 75 por cento para subvenções, uma receita de 84:000 contos, o que, sendo de 210:000 contos a receita prevista, aumentaria o deficit calculado em mais 120:000 contos.
O Sr. Barros Queiroz, avaliando em 30 por cento a fuga do imposto e talvez calculando um pouco alto o custo médio da vida, prevê que a verba desta receita atinja 131:000 contos, o que, segundo S. Ex.ª, aumentará o deficit em 79:000 contos.
Afirmei ainda que havia a deduzir na» receitas os 2:973 contos, que se não receberão, de juros das 72:718 obrigações cio 1.º grau da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, incluídos no Orçamento, sabendo-se perfeitamente que não seriam cobrados.
Resumindo: dissera eu que o deficit verdadeiro, atendendo aos créditos com «que será indispensável reforçar muitas verbas de material e ao que, como o Sr. Ministro reconhece no seu relatório, terão aumentado os encargos da dívida flutuante, já bastante superior a 500:000 coutos, devendo aproximar-se muito dos 700:000 contos, logo que a Câmara, para remediar as injustiças das leis n.ºs 1:355 o 1:350, voto as alterações que ás mesmas leis lhe vão ser propostas.
Basta somar as verbas ontem aqui apontadas pelo Sr. Barros Queiroz para Ver que S. Ex.ª calcula o deficit em mais de 500:000 contos.
Não fez pois S. Ex.ª mais do que confirmar o que deste lado da Câmara afirmámos.
E o Sr. Barros Queiroz um republicano de sempre; e tam apaixonado republicano, que, por amor à República, só procura sustentar e prolongar uma situação política, cuja obra consiste e tem consistido, como êle próprio disso, em levar o país à beira do abismo; tam republicano, que, reconhecendo que o país pode acordar uma manhã sem ter meio de satisfazer as dívidas cujo pagamento os credores exijam, tem o cuidado de fazer constantes declarações de que não quere atacar os republicanos que se sentam nas cadeiras do Poder, não só sem apresentarem uma única medida capaz de salvar o país, mas, pelo contrário, só agravando mais e mais a situação com constantes aumentos de despesa; tam republicano, que, confessando que o caminho por que o país vai sendo levado constituo o mais' gravo perigo para a ordem pública, continua a empregar todos os meios para que possam manter-se aqueles que para êsse caminho o levam; tam republicano, que, revoltando-se contra o papel de comparsas desempenhado no Parlamento pelos que, por todos os meios, não impedem esta terrível marcha para a catástrofe, ainda ontem aqui reivindicou, para si e para o seu partido, a glória de não ter nunca criado ao Govêrno a menor dificuldade, procurando, pelo contrário, facilitar-lhe a sua acção; tam republicano, que, reconhecendo tudo isto, não hesita, do ninado pela paixão política, em unir-se constantemente, como o seu partido, àqueles cuja obra condena, para todos juntos combaterem os que, a custa dos maiores sacrifícios, são o único travão nesta marcha vertiginosa para o abismo; tam republicano, que, com uma sinceridade que e honra e um desalento que não pode ocultar, confessa que se sento vexado ao ver que nós, dêste lado da Câmara, atacamos, com verdade e razão, os republicanos.
Ninguém pode, pois, atribuir ao facciosismo anti-republicano do Sr. Barros Queiroz as conclusões a que S. Ex.ª chegou nos números que citou. E, no emtanto, êle não fez mais do que confirmar o que nós aqui dissemos já, acêrca da generalidade dêste falso Orçamento, em que só se procura ocultar ao país a pavorosa

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situação financeira a que o levou a República.
Não podia haver melhor resposta àqueles que, aqui dentro e lá fôra, costumam atribuir a especulação política o que dizemos, apenas movidos pela vontade de cumprir o nosso dever, e nunca com o intuito de vexar nem o Sr. Barros Queiroz nem qualquer outro republicano.
Nem um instante, Sr. Presidente, deixarmos de mostrar à Câmara e ao País a situação pavorosamente alarmante em que êle se encontra, e os meios indispensáveis para a sua salvação.
Veja o Parlamento o caminho que a República vai seguindo, sem' que dêle possa afastar-se.
Definiu-o o Sr. Barros Queiroz por estas palavras:
«Uma aventura financeira que nos abandalha ante os olhos do mundo».
Não podo evidentemente o país viver com uma situação desta ordem, e eu não conheço, Sr. Presidente, crime maior do que ocultá-la, para continuar na mesma loucura, em voz de a pôr bem a claro para, sem perda de tempo, a atacar de frente.
É o próprio Sr. Ministro das Finanças quem, no seu relatório, nos diz que «caminhamos rápida e vertiginosamente para uma falência, se resoluta e ponderadamente não procurarmos valorizar a nossa moeda.
Mas como havemos de caminhar para a valorização da moeda, se não enfrentarmos resolutamente as causas da sua depreciação?
Essa depreciação, que tam fortemente pesa nos orçamentos do Estado o dos particulares, não é uma causa. E um efeito.
Um efeito das loucas despesas improdutivas do Estado, despesas com que o país não pode, e que o levam, inevitàvelmente, à maior das catástrofes, se, sem demora, não forem inexoravelmente reduzidas.
E dessas despesas que resultam as sucessivas e constantes emissões de notas, êsses loucos agravamentos de impostos que asfixiam o país, a justificada desconfiança que faz com que o produto do trabalho dos portugueses seja convertido em ouro, que emigra.
São as conseqüências dessas criminosas despesas que encarecem a vida por forma incomportável, tornando indispensáveis as subvenções, que, por sua vez, originam novas emissões de notas, mais impostos e maior desconfiança.
Como resultado vem um novo acréscimo de custo de vida, novas subvenções, novas notas e novos impostos, e não se sai dêste círculo vicioso, que, perdendo o país, nos perde a todos.
Não sei, Sr. Presidente, a quem se pretende enganar, considerando a depreciação da moeda, que é apenas um efeito, como a causa dos males que trazem o país à beira do abismo!
A eliminação das desposas improdutivas do Estado é hoje a base do problema nacional.
Sem isso, não podemos viver.
É indispensável que o país saiba toda a verdade, e nós, dêste lado da Câmara não nos cansaremos de lha repetir, para que êle acorde o imponha a sua salvação.
Acabe-se com as mistificações!
Não venha dizer-se que só a depreciação da moeda traz o país em risco de perder-se.
Se fôsse possível levar prontamente o câmbio ao par, o desiquilíbrio orçamental seria, da mesma forma apavorante, porque só loucos podem supor que as receitas não desceriam na razão inversa da subida do câmbio.
O desiquilíbrio incomportável subsistiria, qualquer que fôsse a divisa cambial, porque o país não pode com as loucas despesas improdutivas ordinárias do Estado, agravando-se a situação, de ano para ano, com a acumulação dos encargos da nova dívida, sucessivamente criada para ocorrer aos deficits sempre crescentes.
Ou se encara de frente esta questão ou o país se perde!
E porque não se fez isso já? -Porque a República não pode resolver o problema nacional.
Vozes: — Não apoiado.
O Orador: — Com factos e números vou demonstrar a minha afirmação.
Foi a República que, com Governos partidários e de concentração de todos os

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seus partidos, criou essas escandalosas despesas que não deixam viver o país.
E porque o fez?
Por uma necessidade da sua defesa; porque não podia, como hoje não pode, viver sem gastar assim, para trazer satisfeitos os que a defendem, aqueles em cujas mãos entregou as bases da sua existência.
Não quere isto dizer, Sr. Presidente, que não haja na República homens bem intencionados, com muito desejo de que as despesas se reduzam ao indispensável, mas êsses homens esbarram sempre na defesa da República, e nada fazem, nem nada podem fazer, vendo-se até, por porem acima de tudo a sua qualidade de republicanos, na necessidade de defenderem e sustentarem a continuação de um estado de cousas que nenhuma dúvida têm de que só pode acabar num terrível desastre nacional,
Para lançar poeira nos olhos do país, procurando fazer crer que se entraria num caminho de moralização que tornasse menos hostil a atmosfera criada em volta da reforma do sistema tributário, foi pelo Govêrno, trazido a esta Câmara, na passada sessão legislativa, um pedido de autorização para serem remodelados os quadros do funcionalismo público.
Só nós, monárquicos, defendemos abertamente a necessidade de uma forte redução de despesas, e nos insurgimos contra a comédia representada durante a discussão dessa proposta de lei.
Todos os partidos republicanos, pela voz dos seus mais categorizados parlamentares, tiveram o cuidado de defensor a opinião de que, por nenhuma forma se deixassem de respeitar as nomeações feitas.
E uma comissão formada de Deputados e Senadores de todos os partidos republicanos, que nesse momento foi eleita, ainda não deu sinal de si, como se desconhecesse a pavorosa situação financeira do país.
O próprio Sr. Barros Queiroz, que ontem aqui ouvimos descrever, com as mais tétricas côres, a crise pavorosa que atravessamos, e que num relatório dos seus, confessou haver um enxame de funcionários que não cabe nas repartições e não tem competência para nada — o próprio Sr. Barros Queiroz — Sr. Presidente, para não prejudicar a defesa e a vida da República, não se cansa de afirmar que não ataca os que nem sequer pensam em reduzir ao indispensável, as despesas do Estado.
Mas como tudo isto não fosso mais do que suficiente para demonstrar que a república não pode resolver o problema nacional, só o agravando, os factos e números que vou citar, não podem deixar dúvidas nem aos mais apaixonados republicanos.
Foi principalmente depois da guerra que a situação se agravou mais espavorantemente, pois pior flagelo do que todas as guerras tem sido a administração da República, com a nomeação de muitos milhares de funcionários desnecessários e a repetição dos mais revoltantes escândalos. Para o ano económico de 1919-1920, quando já não podiam atribuir-se à guerra as espantosas despesas criadas, foi apresentado à Câmara dos Deputados um orçamento, em cujo relatório o Ministro das Finanças, seu autor, já alarmado com a situação, afirmava ser necessário e indispensável reduzir as despesas e aumentar as receitas, acabando é claro, por escrever esta frase sacramental, que se encontra em todos os documentos emanados de Ministros da República:
«Chegou a hora de pedir ao país um grande sacrifício tributário».
Não chegou êsse orçamento a ser votado, mas diz-nos o actual Sr. Ministro das Finanças, no sou relatório, que as despesas normais dêsse ano em relação às do anterior, aumentaram 168:855 contos.
Foi assim que se procedeu à chamada redução de despesas!
Para isso não tinha chegado a hora!
Mas, para o aumento de impostos sim. Para isso é sempre a hora na República, e, assim, as receitas dêsse ano foram já de mais 77:783 contos do que as do ano anterior.
Apesar disso o deficit foi de 98:541 contos!
Como conseqüência constata-se que: A divida pública aumentou nesse ano 183:927 contos, em valor efectivo, pois, sendo de 861:398 contos, no fim de 1918-1919, era de 1. 045:325 contos no fim de 1919-1920!

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A circulação fiduciária aumentou contos 156:059, tendo subido de 290:557 para 446:616 contos!
A divisa cambial desceu de 20 5/8 para
11 7/8.
Mas, se as despesas, em vez de reduzidas como o Ministro das Finanças reconhecia indispensável, aumentaram 168:855 contos, vejamos o que sucedeu no ano seguinte; como a República satisfez essa necessidade nacional por todos reconhecida.
Também para 1920-1921 foi presente ao Parlamento uma proposta orçamental que não se discutiu nem aprovou.
No relatório que a precedia, o Ministro das Finanças de então, já muito mais alarmado do que o do ano anterior, considerava da mais inadiável urgência a redução das despesas e um maior aumento dos impostos, concluindo, já se vê, ou não fôsse êle um Ministro da República, por dizer:
«Chegou a hora de pedir sacrifícios ao país».
Mas, longe de se reduzirem, as despesas aumentaram, Sr. Presidente, mais 190:570 contos, nesse ano, em relação ao anterior, tendo passado de 310:290 para 500:860 contos!
É o actual Sr. Ministro das Finanças quem no-lo diz no sou relatório.
O que se cumpriu, porque também dessa vez, como sempre na República, para isso tinha chegado a hora, foi a promessa dum novo aumento de impostos.
As receitas subiram mais 59:828 contos, tendo passado de 211:749 para 271:577 contos!
Apesar disso o deficit foi de 229:288 contos!
Como conseqüências:
A dívida pública, em valor efectivo, aumentou mais 382:962 contos, tendo subido de 1. 045:325 contos, no ano anterior, para 1. 428:287 contos, nesse ano!
A circulação fiduciária aumentou mais 203:229 contos, passando de 446:616 para 649:845 contos!
A divisa cambial desceu de 11 7/8 para 7 3/16!
Vejamos, Sr. Presidente, se, ao menos, esta angustiosíssima situação fez com que, no ano económico do 1921-1922, a República procurasse satisfazer à mais imperiosa e basilar das necessidades nacionais: a da redução das despesas.
Foram dois os orçamentos propostos, para êsse ano, ao Parlamento, que, afinal, se contentou em aprovar duodécimos.
Tanto o Sr. Cunha Leal, autor do Orçamento, como o Sr. Barros Queiroz, autor da proposta que o modificava, afirmavam serem indispensáveis e inadiáveis a redução de despesas e o aumento dos impostos, acabando ambos por dizer, nos seus respectivos relatórios, com uma harmonia que bem justifica pertencerem hoje ambos ao mesmo partido:
«Chegou a hora de pedir ao país um grande esfôrço fiscal, fazendo com que êle pague o que pode e deve pagar».
E o que vemos nós, Sr. Presidente?
Vemos no relatório do actual Sr. Ministro das Finanças, que, pelas contas até agora apuradas, o que quere dizer que ainda incompletas as despesas aumentaram nesse ano mais 51:411 contos, estando já averiguado que subiram de 500:800 para 532:271 contos!
E seria desnecessário dizer que, pelos aumentos de impostos, as receitas aumentaram mais 41:573 contos, tendo subido de 271:577 para 313:150 contos!
Apesar disso, o deficit até agora apurado foi de 219:121 contos!
Como conseqüência:
A dívida pública, em valor efectivo, aumentou mais 711:147 contos, tendo subido de 1. 428:287 contos, que era no ano anterior, para 2. 140:134 contos!
A circulação fiduciária aumentou mais 165:172 contos, tendo subido de 649:815 para 815:017 contos!
A divisa cambial desceu de 7 3/16 para 3 23/32!
Agravada, assim, a situação, em limites que transformaram a vida de quási todos os portugueses, num terrível sofrimento, terá a República, finalmente, enfrentado o problema da redução das despesas públicas para o ano económico corrente de 1922-1923!
Todos nós sabemos o que acêrca do Orçamento dêste ano se tem passado e está passando.
Apresentado a esta Câmara, há um ano, o Ministro das Finanças que aqui o trouxe, Sr. Portugal Durão, como os seus antecessores, afirmou a necessidade duma

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forte redação de despesas, frizando até, no seu relatório, a espantosa percentagem das despesas com pessoal, a par das irrisórias verbas a despender com material.
E para não faltar às praxes e aos costumes republicanos, acabava o Sr. Portugal Durão, por dizer:
«Chegou a hora de pedir ao país os maiores sacrifícios, um grande esfôrço fiscal».
Que fez esta Câmara?
Que fizeram todos os partidos da República, aqui representados?
Reduziram acaso as desposas públicas?
Cuidaram disso sequer?
Não.
Está por certo na memória de todos o que se passou.
Quando seria indispensável que, preterindo todos os outros assuntos, o Parlamento se entregasse, de alma e coração ao estudo e discussão do Orçamento, exigindo que dêle fôssem expurgados todos os escandalosos gastos inúteis. assistimos, pelo contrário, ao triste e inacreditável espectáculo de vermos com a mais completa oposição da minoria monárquica, e só dela, esta Câmara considerar como inútil a discussão das contas do Estado, votando-se, por propostas dos actuais Srs. Deputados nacionalistas, umas alterações ao Regimento da Câmara, proibindo a discussão na generalidade e restringindo o tempo em que cada Deputado pudesse usar da palavra sôbre a especialidade.
Quer dizer, Sr. Presidente, a Câmara considera mais útil a discussão de qualquer projectículo que crie uma assemblea eleitoral, do que o estudo e a discussão da mais importante e basilar das questões nacionais: a de redução das despesas, que tornam impossível a vida do país, e de que resulta o incomportável custo de vida dos portugueses.
|E inacreditável, mas infelizmente é assim!
Já tive ocasião de dizer a V. Ex.ª e à Câmara o que se passou com o projecto duma suposta remodelação dos quadros do funcionalismo.
Não se sabe ainda, é claro, a quanto subirá o deficit da actual gerência, mas não falta já quem afirme com justificadíssimos fundamentos que será superior a 300:000 contos, apesar do extraordinário aumento dos impostos já em vigor, se bem que muito maior será êsse aumento no próximo ano económico, em que a reforma tributária entrará em plena execução.
É impossível saber-se até que cifra sepantosa subiu já a dívida pública» durante a actual gerência, mas o que se sabe é que em redução de despesas, só nós monárquicos falamos, não deixando de insistir por ela, dia a dia, hora a hora.
Como se, porém, todos estes factos e números, verdadeiramente aterradores, não bastassem para demonstrar, por forma irrefutável, que a República não pode resolver o problema nacional, vejamos, Sr. Presidente, o que nos revela esta mistificação que estamos discutindo e os meios enunciados pelo Sr. Ministro das Finanças no seu relatório.
Apresenta nos o Sr. Ministro das Finanças um orçamento, em que, sem incluir os serviços autónomos, as despesas confessadas são de 813:000 contos, tendo eu já demonstrado à Câmara que elas são muito superiores a 1. 000:000 de 'contos, devendo agravar-se em muito com as alterações que em breve serão votadas às leis, n.ºs 1:355 e 1:356, referentes às subvenções ao funcionalismo público.
O deficit verdadeiro, apesar do extraordinário agravamento dos impostos, é de cêrca de 700:000 contos.
E ante esta alarmante situação que o Sr. Barros Queiroz aqui apresentou, também cheia dos mais graves perigos, que propõe o Govêrno?
Que fazem o Govêrno e o Parlamento republicanos?
Trouxe-nos acaso o Sr. Ministro das Finanças algumas propostas no sentido de serem reduzidas as despesas?
Não!
Pelo contrário!
O Sr. Ministro não se cansa de frisar no seu relatório a dificuldade, para não dizer a impossibilidade, de deminuir as despesas ordinárias do Estado.
1 Que é então o que se propõe para resolver esta situação que traz o país à beira do abismo?
É o que se traduz nestes períodos do relatório da proposta, que passo a ler: Para fazer face a estas despesas, estu-

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daram-se as receitas que deviam lògicamente contrapor-se-lhe, dividindo-se em receitas normais, que equilibrem as despesas permanentes normais e satisfaçam ainda aos encargos dos empréstimos contraídos que não tenham renda fixa especialmente consignada: em receitas temporárias expressas nos adicionais a criar sôbre os impostos ordinários, proporcionalmente ao agravamento da depreciação da moeda nacional, que equilibrem as despesas transitórias destinadas ao pagamento das subvenções, e em recursos directos ou indirectos, representados por utilização de créditos no estrangeiro e operações de empréstimos internos, destinados a equilibrar as despesas resultantes das diferenças cambiais, que lògicamente tendem a amortizar.
Vejamos, Sr. Presidente, o que tudo isto quer dizer, e comecemos pela parte referente a empréstimos internos.
Procura-se, ou antes, diz-se procurar a maneira de resolver uma situação com que o país não pode por serem escandalosamente excessivas as despesas.
E então que vai fazer-se?
Contrair ou tentar contrair um empréstimo interno, que se diz ser em ouro, mas é em puros escudos, e destinado a quê?!
A cobrir, no ano económico 1923-1924, menos da quarta parte do deficit dessa gerência.
Não pode êsse empréstimo, ainda mesmo quando subscrito, melhorar nada a situação cambial.
Abstraindo por agora das condições vergonhosas e ruinosíssimas dêsse empréstimo, em que é que afinal êle vem exclusivamente a traduzir-se?!
Num aumento de despesa, correspondente ao pagamento dos seus encargos.
Quere dizer: para remediar uma situação incompatível, pelas loucas despesas a fazer, em vez de reduzir ferozmente essas despesas, vão-se criar outras novas, a agravar ainda mais a situação.
Para onde quer a República levar êste desgraçado país?
Como os perdulários, que ao verem-se perdidos, se lançam desenfreadamente nas mãos da agiotagem, a República em nada hesita para procurar algum balão de oxigénio que lhe dê mais uns momentos de vida.
Assim entrou já no caminho dos últimos expedientes, esquecendo por completo que existe, que é indispensável salvar-se.
Passemos agora, Sr. Presidente, a ver o que representam os tais adicionais a criar, proporcionalmente à depreciação da moeda, para ocorrer ao novo acréscimo das subvenções.
São a contribuïção predial rústica, a contribuïção industrial e a de registo e o imposto sôbre transacções, os impostos sôbre que recaem os adicionais destinados a ocorrer ao pagamento das subvenções.
São estas as contribuïções que ainda mais, e não se sabe em quanto, se quere agravar.
Vou mostrar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e à Câmara, a monstruosidade que já hoje se exige à lavoura, ao comércio e à indústria, para que possa avaliar-se a inclassificável ligeireza de ânimo com que se pensa em aumentar-lhes mais Os impostos.
Comecemos pela lavoura.
Deve ser de 30:800 contos averba principal que o Estado lhe vai exigir, na contribuïção predial rústica, e sôbre essa verba incidem já hoje, depois da votação, há dias feita nesta Câmara, das percentagens para os municípios, 141 por cento, ou sejam 43:428 contos, que somados aos 30:800 contos da verba principal, perfazem um total de 74:228 contos.
A isto há a acrescentar o imposto pessoal de rendimento, que para a lavoura, o anuário estatístico das contribuïções directas me habilita a afirmar, ser superior a 4:044 contos.
São, portanto, só por estas duas contribuïções, 78:272 contos que a lavoura tem de pagar.
Vou dizer a V. Ex.ª e à Câmara quanto a mesma lavoura pagava, incluídos já todos os adicionais, em 1910, no tempo dessa ominosa monarquia, tão caluniada naqueles comícios dos saüdosos tempos da propaganda, em que os republicanos se não cansavam de afirmar que o povo não devia nem podia pagar mais impostos...
Sabem, V. Ex.ª Sr. Presidente, e a Câmara, quanto a lavoura pagava então ao todo?
Pagava 4:940. 421$16!!
Foi o que o país lucrou com a República!

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A lavoura, como se vê, paga já hoje mais de 19 vezes o que pagava no tempo da monarquia.
Mas não basta vermos o que ela já hoje paga na totalidade.
A diversidade de factores por que se multiplicaram as diversas categorias de rendimento colectável e a progressividade do imposto pessoal de rendimento obrigam-nos a ver, especialmente, os contribuintes colocados nos graus mais altos do escalão da progressão.
Assim, os proprietários rurais que, em 1910, tinham, em média, rendimentos colectáveis de 47. 700$, e pagavam de contribuïção, em média, também 7. 800$ cada um, pagam já hoje, também em média, 290. 482^50, ou sejam 41 vezes o que pagavam no abominável tempo da monarquia!
E ainda apareço o anuário de novos agravamentos tributários!
Quere-se fazer isto, Sr. Presidente, para ocorrer às incomportáveis condições de vida do funcionalismo.
E não se lembram, ou não querem lembrar-se, os que defendem essa monstruosidade, de que os impostos sôbre a lavoura recaem sôbre os géneros de primeira necessidade, acarretando qualquer novo aumento tributário um novo agravamento do custo de vida, que deixará os funcionários e aqueles que o não são em condições ainda mais angustiosas do que as que já hoje não podem suportar.
Passemos agora à contribuïção industrial.
São J?0 mil coutos que ao comércio e indústria se cobram em verba principal, por esta contribuïção, havendo que juntar-lhe 98 por cento de adicionais, o que perfaz um total de 117. 800$.
Há a juntar a isto o imposto pessoal de rendimento, mas como não sei, nem tenho meio de calcular quanto êle seja para o comércio e indústria, limito me a dizer a V. Ex.ª e à Câmara que são 117:800 contos que o comércio e a indústria já hoje pagam.
Confrontemos esta monstruosidade com o que, incluídos todos os adicionais, a contribuïção industrial rendia em 1910, no tempo daquela malfadada monarquia.
Sabem V. Ex.ª, Sr. Presidente, e a Câmara, quanto pagavam então o comércio e a indústria por esta contribuïção?
Pagavam 3. 722:168$281
Que grandes foram os benefícios que trouxe a República!
E ainda se pensa em aumentar a contribuïção industrial!
Mas se estas inacreditáveis monstruosidades se passam no que se refere à contribuïção predial rústica e à contribuïção industrial, muito pior é ainda, como vou provar, o que se passa com a contribuïção de registo.
Não se contenta o Sr. Ministro em querer lançar sôbre ela novos adicionais, como acima li, no relatório de S. Ex.ª
Êsse mesmo relatório diz ainda o que vou ler:
«Chegou, porém, para todos, o momento dos sacrifícios, a fim de que os males se não convertam numa situação irremediável.
Para que não só ao empréstimo se recorra, agravando demasiadamente os encargos do Tesouro, apresentará o Govêrno propostas de lei, remodelando as contribuïções do sêlo, de registo e da taxa militar, de molde a deminuir, em larga escala, o deficit o.
De facto, não tardou que o Sr. Ministro das Finanças, não contento com o novo adicional que anuncia o ainda não apresentou, trouxesse a esta Câmara uma espantosa proposta de agravamento da contribuïção de registo.
Não quero acreditar que se tivesse reparado para o que aqui se trazia, nem para o que, pela aprovação da lei n.º 1:368, já hoje é lei do País, em matéria de contribuïção de registo.
O Sr. Presidente: — Previno V. Ex.ª de que é esta a segunda vez que usa da palavra, por concessão da Câmara, e já esgotou, pela segunda vez também, a meia hora concedida pelo Regimento para esta discussão.
O Orador: — Desejo apenas que me seja concedido o mesmo tempo em que ontem usou da palavra o Sr. Barros Queiroz. S. Ex.ª falou durante 1 hora e 20 minutos.
Vozes: — Fale! Fale!
O Sr. Presidente: — Nesse caso pode V. Ex.ª continuar, mas peço-lhe para não alongar as suas considerações.

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O Orador: — Não excederei o tempo gasto pelo Sr. Barros Queiroz no seu discurso.
Dizia eu, Sr. Presidente, que a contribuïção de registo, tal como ficou pela lei n.º 1:368, não pode continuar.
Está já impossível.
Quanto mais pensarem em aumentá-la!
Incide essa contribuïção sôbre vinte vezes o rendimento colectável, de que é, portanto, uma função.
Imaginemos o caso duma herança de pai para filho, e vejamos o que pagava nm filho e o que se quere que êle hoje passe a pagar.
Não pagava imposto algum no tempo da monarquia.
Estabeleceu o Govêrno Provisório a taxa proporcional de 2 por cento.
Em 15 de Fevereiro de 1913, o estadista máximo do mundo, Sr. Dr. Afonso Costa, resolveu multiplicar, por factores arbitrários, os rendimentos colectáveis da propriedade imobiliária nos diversos concelhos do País, chegando essa multiplicação, nalguns concelhos, a fazer-se por um factor pròximamente de 7.
Em Julho de 1918, a ditadura dezembrista estabeleceu a progressividade dessa taxa, que se elevou até 4, o que quere dizer que, para os mesmos concelhos, tornou a contribuïção, para êsses casos, catorze vezes maior do que era em 1911.
Pela lei n.º 1:368, e por uma circular emanada da Direcção Geral dos Impostos, em 26 de Dezembro último, foram multiplicados por 7 os rendimentos já multiplicados, o que equivale a dizer que a contribuïção de registo, em tais casos, passou a ser 98 vezes o que era em 1911!
O Sr. Ministro das Finanças trouxe à Câmara uma proposta, relativa a essa contribuïção, em que eleva a taxa até 8 nas heranças de pais para filhos.
Mas, como pela lei n.º 1:368 há o adicional de 25 por cento sôbre a contribuïção de registo, o mesmo é que dizer que, pela proposta a que me refiro, a taxa sobe até 10, ou seja 2 vezes e meia o que já era.
Assim, o imposto sôbre uma herança de pai para filho, sempre nos casos a que me refiro, passaria a ser 245 vezes o que era em 1911!
Chega, Sr. Presidente, a não se acreditar que haja um Govêrno, um Parlamento e um regime em que semelhante monstruosidade seja possível propor-se!
Mas é assim mesmo!
E é ainda isto que o Sr. Ministro das Finanças diz no sou relatório do Orçamento que tenciona aumentar com um novo adicional!
Não posso deixar de pedir a atenção da Câmara para esta inacreditável confiscação.
Se se tratasse dum imposto sôbre rendimentos, em nenhum outro país se acreditaria que houvesse quem tivesse o arrojo de o propor.
Mas, Sr. Presidente, trata-se dum imposto sôbre o capital, o que ainda é pior!
Então digam francamente que querem confiscar a fortuna dos particulares!
Isto é plena Rússia bolchevista!
Procurar êste remédio num momento em que a desconfiança é um dos nossos maiores males, só pode admitir-se que o pense e que o faça quem queira, duma vez, acabar com o País!
Mostrei, Sr. Presidente, o que, em matéria de empréstimos e do impostos, se propõe para resolver a pavorosa situação financeira a que a República nos levou.
Nenhuma dúvida pode existir, para quem olhe ponderada e imparcialmente para os factos, dos desgraçados resultados das medidas propostas.
Mas não pára aqui, Sr. Presidente, a série de factores a levarem o País à ruína.
A situação chegou a tal ponto que já nada chega para compensar as despesas loucas do Estado.
j E assim que, além de tudo isto, o Govêrno ainda propõe um novo alargamento da circulação fiduciária!
E o mais curioso é que êsse alargamento é feito na própria proposta do empréstimo, que se diz destinado a evitar novas emissões de notas.
Referindo-se a recursos ao empréstimo e ao imposto, diz o Sr. Ministro das Finanças no seu relatório do Orçamento:
«Fôra dêstes recursos que a boa administração preconiza, restam sòmente dois meios, porém, já desacreditados: o aumento da circulação fiduciária e o acréscimo da dívida flutuante.

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Para que a êstes se não recorresse propôs o Govêrno a emissão dum empréstimo, que pode e deve ser considerado como a primeira duma série de operações de crédito a efectuar».
Só se procura ocultar a verdade, lançando mão de todos os meios: impostos, empréstimo, emissões de notas e dívida flutuante, e nada chega, Sr. Presidente.
Pois é ante uma situação desta ordem que a República, não pensando sequer em reduzir as despesas, só cuida em tornar ainda mais grave a crise nos anos futuros, em que elas serão as de agora, acrescidas com os encargos do empréstimo que se pretende realizar.
Depois disto pregunto, Sr. Presidente, se ainda haverá alguém que possa supor que á República pode resolver o problema nacional.
Chegou, Sr. Presidente, a hora de concluir as minhas considerações. Muito mais tinha a dizer, mas reservo-o para a discussão da especialidade dos orçamentos dos diferentes Ministérios.
Creio, no emtanto, ter dito mais do que o bastante para se avaliar a situação do País e encará-la de frente.
A obra da República é o que V. Ex.ª e a Câmara acabam de ver.
O Sr. Tavares Ferreira: — Peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se consente que a comissão do Orçamento reúna amanhã à hora da sessão.
Foi autorizado.
O Sr. Jaime de Sousa: — Obedecendo aos preceitos regimentais, envio para a Mesa a minha moção de ordem.
Sr. Presidente: se bem que tivesse prestado toda a atenção aos discursos que foram proferidos do lado da oposição, não ouvi cousa alguma que porventura possa deminuir o valor do trabalho do Sr. Ministro das Finanças, nem as propostas do Govêrno com a apresentação da proposta orçamental.
Eu também considero o Orçamento Geral do Estado o mais importante de todos os instrumentos de lei; mas também entendo que sem o necessário equilíbrio, e, portanto, com a extinção dê qualquer deficit que possa haver, não há Parlamento nenhum que se dignifique aprovando-o. *'
Seguindo uma boa norma de administração, o Govêrno trouxe ao Parlamento a sua proposta orçamental, que apresenta, creio bem, com toda a verdade o estado exacto das desposas e das receitas, apresentando também simultaneamente as propostas de lei que, em seu critério, têm por fim fazer o equilíbrio do Orçamento.
Temos, pois, de louvar o Govêrno por êsse seu procedimento, que certamente calará no ânimo de todos que desejam o restabelecimento duma situação normal.
Sr. Presidente: a fantasia oriental de todos aqueles que aqui no Parlamento, e lá fôra, avolumam cifras, leva-os a afirmar que o deficit do Estado atinge uma quantia que de facto não corresponde à verdade. E que não é outro, demonstra-se na proposta orçamental apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças, que prova, com algarismos incontestáveis, que o verdadeiro deficit é duma quantia que pode ser desfeito no próprio ano económico de 1923-1924.
Pena é que a política partidária não deixe muitas vezes que todos constatem a verdade das situações. O próprio Sr. Barros Queiroz, a quem presto toda a minha consideração, porque é pessoa de elevada competência e que apresenta as questões depois de estudá-las convenientemente, não deixou de produzir determinadas afirmações políticas que, ligadas com a doutrina do Orçamento do Estado, podem produzir aqui e lá fôra o efeito que delas propositadamente se pretende tirar.
Sr. Presidente: é minha impressão de há longa data que é indispensável para a boa e clara discussão do Orçamento do Estado haver o respectivo parecer da comissão do Orçamento. E má, no meu entender, a prática que se segue neste momento, de apenas se dar o relatório que precede a proposta orçamental, como elemento de estudo, aos Srs. Deputados. É pouco para base de discussão na generalidade. Julgo de muito maior conveniência um parecer da comissão do Orçamento elaborado por um relator geral, com a colaboração dos seus colegas na mesma comissão, e, portanto, um estudo bem mais completo.
Na generalidade do Orçamento, êste parecer, sendo examinado por todos os

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membros da comissão, que poderiam colher os necessários elementos e dados estatísticos que pudessem concorrer para um completo escudo, seria qualquer cousa de muito menos discutível, e, com toda a sinceridade, os Deputados podiam apreciar como resultado dum trabalho imparcial, sem a chancela do Govêrno. Êsse trabalho não pertencia já nem ao Govêrno, nem ao Ministro das Finanças, e daí resultava que os ataques possíveis não seriam feitos ao Poder Executivo, mas a um parecer que, na essência, era elaborado pela própria Câmara que o discutia, afastando-se assim toda a espécie de especulação política que à volta da proposta ministerial habitualmente se faz, arbitrando-se-lhe toda a sorte de malefícios, de inconveniências e até mesmo de propósitos de não dizer a verdade. Todos êsses ataques caiam automàticamente se houvesse um parecer geral sôbre o Orçamento,
O Sr. Presidente: — E a hora de se passar à segunda parte da ordem do dia.
V. Ex.ª conclui as suas considerações ou deseja ficar com a palavra reservada para a próxima sessão?
O Orador: — Peço a V. Ex.ª que me reserve a palavra para na próxima sessão concluir as minhas considerações, designadamente para responder a algumas afirmações do Sr. Carvalho da Silva sôbre o assunto, que S. Ex.ª mostrou não conhecer, mas sôbre as quais é preciso que a Câmara fique claramente elucidada.
É lida a seguinte
Nota de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro das Colónias sôbre o modus vivendi que o primeiro Ministro da União Sul Africana anunciou ao Parlamento do Cabo ter sido fechado entre o Govêrno da União e o Govêrno Português. — Álvaro de Castro.
Expeça-se.
O Sr. Presidente: Vai passar-se à segunda parte da ordem do dia, prosseguindo a discussão do parecer n.º 302.
Continua no uso da palavra o Sr. Ferreira de Mira.
O Sr. Ferreira de Mira: — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª a fineza de me dizer quanto tempo tenho para falar.
O Sr. Presidente: — Não temos hoje luz eléctrica, de modo que a sessão durará emquanto houver claridade suficiente.
O Orador: — Eu obedecerei às indicações de V. Ex.ª; mas, realmente, podemos ter luz por, um quarto de hora e é-me inteiramente impossível resumir as minhas considerações.
Não ganho eu em fazê-las, nem ganha a Câmara em estar a ouvi-las em retalhos de um quarto de hora.
Se, por conseqüência, V. Ex.ª entende que é' um trabalho inútil eu falar e a Câmara ouvir-me, êste quarto de hora, V. Ex.ª reserva-me a palavra para amanhã. Se V. Ex.ª o não entende, principio as minhas considerações, devendo repeti-las amanhã.
O Sr. Presidente: — Fica então V. Ex.ª com a palavra reservada para amanhã.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Sousa da Câmara: — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª a fineza de comunicar ao Sr. Ministro da Agricultura que desejava interrogá-lo amanhã visto que há três dias que peço a palavra para quando S. Ex.ª estiver presente, e S. Ex.ª não vem.
E, de resto, meu intuito fazer-lhe algumas preguntas sôbre um assunto que já tive até a franqueza de lhe dizer de que consta.
Trata-se da notícia do adiamento da proposta que alterava temporàriamente o regime cerealífero e de um plano que hoje apareceu anunciado nos jornais e que creio vai ser amanhã publicado no Diário do Govêrno.
Peço, portanto, a V. Ex.ª o obséquio de procurar conseguir que o Sr. Ministro compareça à sessão de amanhã.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã ás 14 horas com a seguinte ordem dos trabalhos:
Antes da ordem do dia: A que estava marcada, menos o parecer n.º 400.

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Ordem do dia:
1.ª parte: a que estava marcada.
2.ª parte: a que estava marcada, mais o parecer n.º 409, relativo a mercadorias de procedência alemã.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Requerimento
Requeiro que, pelo Ministério da Agricultura, me sejam fornecidas as notas seguintes:
Data em que se deu o incêndio na fábrica de moagem 1.º de Maio, matriculada, de Lisboa;
Data do requerimento em que pedem autorização para reconstruir-se e respectivo despacho ministerial;
Cópia do texto original dos artigos 43.º a 47.º do Regulamento da lei n.º 1294 que em provas de imprensa foi trazido à comissão de agricultura pelo Ministro Ernesto Navarro e por aquele foi rubricado. — João Luís Ricardo.
Expeça-se.
Projecto de lei
Dos Srs. Lúcio de Campos Martins, Jaime Cansado, Carlos de Vasconcelos, Bartolomeu Severino, Júlio de Abreu o Pires Monteiro sôbre contagem da antiguidade ao major João Maria Ferreira do Amaral.
Para o «. Diário do Govêrnos).
Parecer n.º 884
Que autoriza a Câmara Municipal de Coimbra a contrair um empréstimo até 800 contos para conclusão das instalações hidráulicas e eléctricas.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Dispensada a leitura da última redacção.
Parecer n.º 400
Que considera incluídos no artigo 30.º do decreto n.º 7:016, para melhoria de vencimento, o pessoal jornaleiro dos Caminhos de Ferro do Estado e outros ferroviários.
Aprovado.
Dispensada a leitura da última redacção.
O REDACTOR — João Saraiva.

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