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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADO
SESSÃO N.º 40
EM 1 DE MARÇO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
José Marques Loureiro
Sumário. — Abre a sessão com a presença de 41 Srs. Deputados.
É lida a acta, que adiante se aprova com número regimental
Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Júlio de Abreu reclama contra o facto do encerramento dalgumas estações ferroviárias e de incidentes ocorridos com a Junta Geral do Distrito de Bragança.
Responde o Sr. Ministro do Comércio (Vaz Guedes).
O Sr. Joaquim Ribeiro faz considerações sôbre o regime cerealífero, protestando contra o chamado «pão político».
Responde o Sr. Ministro da Agricultura (Fontoura da Costa).
O Sr. Bartolomeu Severino protesta contra factos ocorridos com respeito a expropriações no concelho de S. Pedro do Sul.
Responde o Sr. Ministro do Trabalho (Rocha Saraiva).
Usa da palavra o Sr. Bartolomeu Severino, para explicações, voltando a responder-lhe o Sr. Ministro do Trabalho, e seguindo-se-lhe o Sr. Ministro da Justiça (Abranches Ferrão).
Ordem do dia. — O Sr. Almeida Ribeiro alvitra que na primeira parte da ordem do dia de 5 do corrente se marque para discussão o parecer sôbre o empréstimo e se marquem sessões nocturnas para se discutir o Orçamento, prestando esclarecimentos a êste respeito o Sr. Presidente.
Usam da palavra para interrogar a Mesa os Srs. Carvalho da Silva e Jaime de Sousa.
Dá explicações o Sr. Presidente.
O Sr. Jaime de Sousa requere no sentido alvitrado pelo Sr. Almeida Ribeiro, requerimento que é aprovado, depois de usarem da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Paulo Cancela de Abreu e Carvalho da Silva.
É autorizada a reünir durante a sessão do dia seguinte a comissão do Orçamento.
Continua a discutir-se a generalidade dos orçamentos do Estado.
O Sr. Jaime de Sousa, que ficara com a palavra reservada, termina o seu discurso.
Faz-se uma substituição na comissão do Orçamento.
É admitida uma moção de ordem apresentada pelo Sr. Jaime de Sousa.
Em vista da informação de não haver iluminação, o Sr. Almeida Ribeiro requere que a partir do dia 5 se marquem duas partes na ordem do dia: primeira, empréstimo; segunda Orçamento.
Usam da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Pedro Pita, Carvalho da Silva, Tôrres Garcia, Almeida Ribeiro e Morais Carvalho.
O requerimento é aprovado.
Continuando a discussão do Orçamento, usa da palavra o Sr. Afonso de Melo, que não conclui o seu discurso.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte, às 14 horas.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Projectos de lei. — Propostas de lei. — Pareceres. — Nota de interpelação. — Requerimento.
Abertura da sessão às 15 horas e 16 minutos.
Presentes à chamada 41 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 49 Srs. Deputados.
Presentes à chamada:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Amaro Garcia Loureiro.

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Diário da Câmara dos Deputados
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António de Mendonça.
António de Paiva Gomes.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Manuel Homem Cristo.
João Salema.
João Vitorino Mealha.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
José Carvalho dos Santos.
José Mendes Nunes Lourenço.
José Pedro Ferreira.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio de Campos Martins.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Sousa da Câmara.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Lino Neto.
António de Sousa Maia.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Aguas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Brandão.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Marques Loureiro.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mário de Magalhães Infante.
Paulo da Costa Menano.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vergílio Saque.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Lelo Portela.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto do Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
António Albino Marques de Azevedo.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.

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Sessão de 1 de Março de 1923
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João José da Conceição Camoesas.
João de Ornelas da Silva.
João de Sousa Uva.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartino Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião do Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Pelas 15 horas e 15 minutos, com a presença de 41 Srs. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta.
Dá-se conta do seguinte
Expediente
Pedido de licença
Do Sr. Homem Cristo, um dia.
Concedido.
Para a comissão de infracções e faltas.
Ofícios
Do Ministério dos Negócios Estrangeiros, satisfazendo, em parte, ao pedido feito em ofício n.º 60, requerimento do Sr. Jaime de Sousa.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Setúbal, pedindo a urgente reparação de estradas.
Para a comissão de administração pública.
Da Associação dos Comerciantes do Pôrto, pedindo benefícios para a cidade, especialmente um melhor policiamento.
Para a Secretaria.
Requerimentos
Do primeiro sargento Júlio Alcino Cordeiro, pedindo para ser solucionado o seu requerimento de 5 de Maio de 1922.
Para a comissão de guerra.
Do primeiro sargento Jacinto Peixoto, pedindo para ser revisto o seu processo.
Para a comissão de guerra.
Do professor Tiago dos Santos Fonseca, pedindo para se lho abonarem determinados vencimentos, a que se julga com direito.
Para a comissão de instrução primária.

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Diário da Câmara dos Deputados
Antes da ordem do dia
O Sr. Júlio de Abreu: — Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para o facto que se dá na linha de Focinho a Miranda, onde foram fechadas duas estações para se fazer economias, transformando-as apenas em passagens, onde não se pode fazer despachos e o passageiro tem de pagar mais 20 por cento. Isto não é justo e poderia haver da mesma maneira economia transformando essas estações em apeadeiros, em que faz serviço em geral o guarda da linha, mas onde se vendem bilhetes e se fazem despachos.
Peço ao Sr. Ministro do Comércio o favor de se interessar junto do caminho de ferro do Minho e Douro para transformar as estações em apeadeiros.
Não está presente o Sr. Ministro do Interior e eu peço ao Sr. Ministro do Comércio que transmita a S. Ex.ª as minhas considerações.
O Sr. Pedro Pita tratou aqui da eleição da Junta Geral do distrito de Bragança. 1 Há tempo que já me tinham feito iguais reclamações, mas entendi que não era aqui que se devia trazer essa questão de campanário; mas uma vez que ela aqui se debateu, eu vou expor os factos como se passaram.
Fizeram-se as eleições no distrito de Bragança e em doze concelhos. Nos diferentes concelhos foram eleitos dezasseis procuradores, sendo oito de uma facção política e sete de outra facção, sendo um dêles independente, mas que votou com uma das facções. Em 2 de Janeiro devia reunir a Junta presidida pelo mais votado, como manda a lei, mas oito procuradores quiseram que fôsse eleito o mais velho, e assim foram reunir para um centro reconstituinte. O resto da Junta não pôde fazer nada por entender que estava em minoria.
O presidente e o tesoureiro da pseudo comissão executiva levaram os documentos, sendo então pedido o auxílio do administrador do concelho, que teve de mandar selar as portas do arquivo à noite, por não ter sido feita a entrega durante o dia.
Foi assim que se deu a intervenção do administrador, que apenas cumpriu o seu dever...
Direi ainda mais: para se pagar aos pobres asilados foi, preciso pagar do bolso particular.
Peço a V. Ex.ª para transmitir ao Sr. Presidente do Ministério o que digo, pedindo providências para êste estado de cousas.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Vaz Guedes): — Devo dizer a V. Ex.ª que farei todo o possível para serem satisfeitos os desejos dos interessados.
Com respeito ao mais, eu transmitirei as considerações de V. Ex.ª ao Sr. Ministro do Interior.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio de Abreu: — Pedi o palavra para agradecer ao Sr. Ministro, ficando aguardando as providências anunciadas.
O orador não reviu.
O Sr. Joaquim Ribeiro: — Sr. Presidente: desejava fazer umas considerações à Câmara na presença do Sr. Ministro da Agricultura.
Quando foi da minha interpelação, eu referi-me ao pão político e o Sr. Ministro foi o primeiro a concordar comigo.
S. Ex.ª apresenta uma proposta; essa proposta baixa à comissão de agricultura que a aprecia e modifica...
O Sr. João Luís Ricardo: — Perdão, essa proposta não foi modificada pela comissão, mas sim por emendas apresentadas pelo Sr. Ministro.
O Orador: — A verdade é que tal proposta, cujas disposições estavam, aliás, em completo desacordo com as declarações feitas pelo Sr. Ministro, não logrou a sanção da comissão, no seio da qual ela dorme ainda.
O tempo passa, a questão arrasta-se e o chamado pão político continua a manter-se em prejuízo do Estado e dos interêsses da restante população do País, nas cidades privilegiadas. de Lisboa e Pôrto.
Não compreendo, ninguém compreende o benefício de uns em detrimento de outros.
Muitos apoiados.

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Invoca-se o problema da ordem pública.
Acho pueril e até deprimente uma tal invocação.
Um Govêrno cônscio da sua fôrça e da sua missão não pode servir-se dela.
Apoiados.
Termino, Sr. Presidente, estranhando mais uma vez a incompreensível atitude do Sr. Ministro da Agricultura, sustentando hoje um princípio, amanhã outro.
Fala-se em que se manterá o rateio por fábricas que se encontram fechadas.
O que há de verdade em tudo isto?
Aguardo a resposta de S. Ex.ª e, por agora, tenho dito.
O Sr. Ministro da Agricultura (Fontoura da Costa): — Sr. Presidente: devo dizer que se não tenho insistido na rápida discussão da proposta que apresentei, é porque se modificaram inteiramente as condições que me forçaram a elaborá-la.
Os trigos que, neste momento, estão sendo fornecidos só serão pagos daqui a três meses.
Como V. Ex.ªs sabem, a proposta de empréstimo está pendente nesta Câmara.
Da sua aprovação resultará, estou certo, uma sensível melhoria de câmbio. Se no emtanto essa melhoria se não verificar, eu insistirei, então, na minha proposta.
Tenho dito.
O Sr. Bartolomeu Severino: — Sr. Presidente: eu vou acusar o Sr. Ministro do Trabalho dum acto de caracterizada parcialidade em manifesto e condenável prejuízo duma das mais ricas regiões do País. Vou procurar demonstrar esta minha afirmação apresentando à Câmara alguns factos.
Em 14 de Outubro de 1922, o Ministro do Trabalho, antecessor do Sr. Rocha Saraiva, publicou uma portaria dando à Câmara do S. Pedro do Sul o direito de expropriar uma determinada área de terreno para nele se construírem hotéis, balneários, casas de saúde, emfim, tudo quanto requere a exploração desta afamada estância. Em virtude dessa portaria, vários actos se realizaram, que foram até à nomeação de peritos. Contra ela não se levantaram quaisquer protestos, mas, mais tarde, quando os interêsses particulares iniciaram o seu movimento de oposição, os protestos surgiram ameaçadores. E então sucedeu êste caso estranho e inqualificável: o Supremo Tribunal Administrativo, que é um organismo com funções meramente consultivas, para o qual foram enviados êsses protestos, contra a letra expressa da lei, resolveu receber êsse recurso. Êsse recurso transitou para o Ministério do Trabalho, e o Sr. Ministro do Trabalho não hesitou em o acolher, quando devia devolvê-lo, dando assim uma lição a êsse tribunal, visto que já tinha decorrido o prazo do recurso.
Vou ler a portaria.
Pregunto: alguém levantou protestos contra esta portaria?
Suspendeu-se então a portaria, e fez-se isto sem se ter verificado a razão das reclamações apresentadas, quando em Conselho dê Ministros o titular da respectiva pasta afirmara que antes de tomar qualquer resolução trataria de averiguar dessa razão.
O Sr. Ministro do Trabalho curou dos interêsses de alguns, poucos, particulares, não curando dos interêsses colectivos.
Não estou tratando dos interêsses duma região; estou tratando dos interêsses nacionais. Efectivamente os melhoramentos, em projecto, de S. Pedro do Sul, são essenciais para a região; são necessários ao País, porque chamariam a êste grande número de turistas da América e da Espanha.
Trata-se de servir interêsses pessoais e políticos.
É pena que essas pessoas aqui não estejam para defenderem, os seus interêsses.
O Sr. Ministro apenas foi iludido nu sua boa fé.
Seria bom! ouvir-lhes aquelas infâmias que têm mandado publicar, para dizerem aqui o que aí se tem dito, porque queria desmenti-los, provando-lhes que tais argumentos são indignos de homens que vestem uma toga.
Cometeu S. Ex.ª um acto que não reputo desonesto, porque suponho que S. Ex.ª procedeu assim tendo sido abominàvelmente enganado por aqueles que falaram em nome de seus pais que morreram.
Disse que era um atentado que se fazia à República, e hei-de prová-lo no momento oportuno, visto que se não trata

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Diário da Câmara dos Deputados
de interêsses gerais mas de particulares.
Termino as minhas considerações por agora, apresentando com a proposta, em que apenas faço uma afirmação de princípios e de conducta.
O facto praticado por S. Ex.ª representa com efeito a inutilização cabal e formal do tudo que se queira fazer, a não ser que venha outro Ministro, ou S. Ex.ª reconsidere fazendo justiça.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Trabalho (Rocha Saraiva): — Sr. Presidente: ouvi com a maior atenção as considerações do Sr. Bartolomeu Severino, considerações que, no dizer mesmo de S. Ex.ª foram uma acusação ao Ministro do Trabalho.
S. Ex.ª fez essa acusação com um calor extraordinário.
De resto, é isso explicável porque S. Ex.ª é. de facto, representante da região a que interessa essa questão, e trata-se na verdade dum melhoramento que todos reconhecem de alto interêsse para a região de S. Pedro do Sul; o ate para o País,, pelo empreendimento que é digno de todo o louvor.
Devo dizer ao Sr. Deputado e à Câmara que o que se fez nesta questão se fez seguindo inteira e completam ente fora de preocupação de carácter pessoal, quer com concessionários, quer com proprietários das terras que se destinam às termas de S. Pedro do Sul.
Tudo se fez abstraindo inteira e completamente de cor política de concessionários ou proprietários.
Apoiados.
Não se quis saber duns ou doutros; apenas se tomaram em consideração os interêsses da região.
O facto é que foi requerida para expropriação, para as instalações dessa empresa, uma área de 135 hectares de terreno.
Disseram-me: «Nesses hectares estão as nossas fortunas, estão as nossas terras, as nossas casas. Sr. Ministro, acuda-nos»..
E claro que se, porventura, a autorização para a expropriação tivesse sido feita em harmonia com a lei, tínhamos de nos resignar a ver os prédios expropriados. Mas não foi assim feito.
Ofendeu-se a lei, e portanto, pedia-se que fôsse anulada a portaria que tal autorização concedia, por se ferirem interêsses muito legítimos, por serem de direito.
Vi logo que estava em face dum caso que realmente era grave, em que colidiam os interêsses duma grande empresa que se propunha realizar um facto de incontestável interêsse público, e os interêsses dos proprietários; interêsses respeitáveis, tanto dos proprietários cómoda empresa que se propõe realizar um melhoramento de interêsse público (Apoiados), visto que estamos num regime em que a propriedade é a base social, (Apoiados), e que é em volta da propriedade que gira todo o maquinismo de riqueza pública.
Apoiados.
De maneira que eu, do mais a mais conhecendo facto semelhante, procurei acompanhar, com todo o cuidado a questão.
Ora os proprietários diziam, com a letra da lei na. mão, que não era autorizada a expropriação nos termos da lei.
A expropriação, diziam, era unicamente para aquelas instalações destinadas a anexos em estabelecimentos desta natureza.
Todos os prédios urbanos, pequenas quintas e casas de arrendamento podiam ser expropriados por esta autorização, para que a empresa construísse o seu estabelecimento termal, com campo anexo de jogos desportivos.
O Sr. Bartolomeu Severino: — V. Ex.ª está a referir-se a um documento que não é oficial.
A portaria não diz nada disso.
O Orador: — Não diz isso, nem outras cousas que deveria dizer, porque a portaria nem sequer enuncia a área dos terrenos a expropriar, nem os nomes dos proprietários das terras que são expropriadas; mas o que a mesma portaria dizia é que aprovava a planta; e a planta que acompanhava o memorial justificativo declarava que eram 135 hectares de terreno e a quem êsses terrenos pertenciam.
Pedia-se-me, na representação que me foi dirigida, que eu ouvisse, por isso que se tratava de uma questão de direito, uma estação consultiva, e foi isso o que eu fiz,

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consultando a Procuradoria Geral da República, que emitiu um parecer, pronunciando-se sôbre o assunto e declarando que a portaria era ilegal.
Êsse parecer terminava pelas seguintes palavras:
«Entende esta Procuradoria Geral da República que V. Ex.ª deve anular a portaria ou pedir a interposição de um recurso ao Supremo Tribunal Administrativo».
Mas eu, que sei muito bem que todos os grandes melhoramentos provocam sempre protestos dos que têm interêsses particulares contrários a êsses melhoramentos — todos sabem, quantos protestos levantou a construção dos caminhos de ferro — hesitei, fiquei em dúvida e resolvi não revogar desde logo, pelo menos, a portaria.
Era necessário arranjar elementos de informação, que não tinha no meu gabinete, a dentro de quatro paredes, e não os podia obter em dois ou três dias.
Assim como a Procuradoria Geral da República me dizia que eu podia interpor um recurso ao Supremo Tribunal Administrativo, foi o que eu fiz, suspendendo a portaria.
Contra esta suspensão é que se revoltou o Sr. Bartolomeu Severino, sempre dominado por êsse desejo, aliás muito louvável, de defender os interêsses da sua região.
Pois eu havia de consentir, antes do Supremo Tribunal Administrativo só pronunciar sôbre a legalidade da portaria, que fossem demolidas as casas que embargavam a construção do estabelecimento termal de S. Pedro do Sul?
E se depois realmente se verificasse que a portaria era ilegal?!
O Sr. Bartolomeu Severino: — Isso é um argumento sentimental.
O Orador: — Não se trata de sentimentalismos.
Fiz o que devia fazer.
A suspensão da execução da portaria, emquanto o Supremo Tribunal não se pronunciasse, era tudo quanto havia demais justo, e não creio que a perda de dois ou três meses — o tempo necessário para a decisão do Tribunal — cause mais prejuízos à empresa do que a demolição das casas particulares causaria, se realmente fôsse considerada ilegal a portaria.
Entretanto chegou ao meu gabinete um recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, da parte dos próprios proprietários.
Eu, que já tinha estudado a questão, não. quis ainda resolver sem estar bem ao facto de tudo, e pedi informações e reflectia bem.
Eu não permito que ninguém ponha em dúvida e que não me faça inteira justiça às minhas intenções.
Depois disse que tinha resolvido não interpor por emquanto o recurso.
É êste o ponto em que a questão se encontra.
Dias depois, apareceu-me um caso análogo nas termas de Caldelas, e eu disse: não vá, suceder o mesmo que com as termas de S. Pedro do Sul, e entendi que só se tinha que aplicar a lei de 1912, que era o que êles pediam; mas pensava também se o meu despacho devia vir em portaria ou decreto.
Fui ver a área, e verifiquei que era mais pequena do que a de S. Pedro do Sol.
A questão de ser em decreto ou portaria, era uma cousa mínima, mas fi-lo por decreto.
Muitas vezes a gente erra sem querer, e até empregando todos os esfôrços para evitar o êrro.
Eu estava em casa.
Era um domingo, e li que vinha publicada no Diário do Govêrno uma portaria autorizando a expropriação de terrenos.
Uma portaria, quando eu tinha assinado um decreto.
Vendo- a lei, e falando com os funcionários, disseram-me que sempre assim se tinha feito, conforme os termos da lei de 6 de Junho de 1912, lei que era para Lisboa, Pôrto ou para grandes cidades ou vilas. Afinal estava empregando-se o mesmo processo para todas as terras.
Veja-se o artigo 4.º
Fui ver no Diário das Câmaras, o que se passara na discussão dêste artigo, e encontrei um discurso bastante elucidativo, proferido pelo Sr. Afonso Costa, em que S. Ex.ª dizia que achava perigoso que um tal princípio fôsse aplicado em geral, para todo o País.

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Estava bem que um tal processo sumário se aplicasse para Lisboa, Pôrto e algumas o atras cidades e vilas importantes, mas nunca para outras terras, em que há deficiência de educarão cívica e faltam todos os meios de publicidade.
Para êstes pontos do País, deverá vigorar a legislação antiga.
Depois de ter leito esta descoberta, eu nada mais tinha a fazer de pronto, senão mandar suspender o decreto, que tinha declarado de utilidade pública as expropriações em Caldelas.
Vi que tinha errado, e emendei o êrro.
No decreto que mandei publicar, anulando o que autorizara as expropriações das terras em volta das termas de Caldelas — decreto que se não foi publicado ontem, deverá sê-lo hoje — ordenava que se procedesse a todas as diligências a que se refere a lei, e tornava dependente do resultado dessas diligências a validade do primitivo decreto.
O Sr. Bartolomeu Severino acusou-me de eu haver ordenado que fôsse suspensa a, execução da portaria que autorizava as expropriações das terras que cercam as termas de S. Pedro do Sul, sem ter ido ao contrário do que S. Ex.ª à diz ter sido prometido por mim, ao local verificar o. estado da questão.
Ora eu não faltei a nenhum compromisso. Quando faço promessas, cumpro-as.
O que eu prometi foi não resolver a questão emquanto não possuísse todos os elementos que. reputasse necessários para ver quem, de facto, teria razão.
Iria, inclusivamente, ao local ouvir os interessados, pois que assim talvez conseguisse alcançar uma solução conciliatória, como é do meu desejo encontrá-la.
Mas isto era para a decisão do assunto; ora a verdade é que eu ainda nada fiz que decida a questão. Ela está ainda longe de ser resolvida. Apenas suspendi a portaria, contra a qual surgiram protestos, com o fundamento de que a sua execução poderia dar lugar a danos irreparáveis ou de difícil reparação.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem!
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Bartolomeu Severino: — Peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Só poderei conceder agora a palavra a V. Ex.ª se a Câmara mo autorizar.
Depois de prévia consulta à Câmara, foi dada a palavra ao Sr. Bartolomeu Severino.
O Sr. Bartolomeu Severino: — Sr. Presidente: o Sr. Ministro do Trabalho não conseguiu convencer-me com os seus argumentos, não obstante terem sido expostos com todo o brilho.
Só posso felicitá-lo pela descoberta que fez, segundo anunciou à Câmara, de que o artigo 4.º da lei de expropriações não é aplicável a todo o País, ao contrário do que se tem entendido até agora.
Todavia, lastimo que S. Ex.ª, só após quatro meses da publicação da portaria sôbre S. Pedro do Sul, houvesse feito Um grande descoberta.
Bem sei que S. Ex.ª pode dizer-me que então não era Ministro do Trabalho; mas S. Ex.ª já está no Govêrno há dois meses e só há oito dias fez essa descoberta.,
Sr. Presidente: o ponto de vista que S. Ex.ª defende prejudica os interêsses de uma região, e não só os dela como os do País, que tanto carece do desenvolvimento do turismo.
O Sr. Ministro do Trabalho, para impressionar a Câmara, socorreu-se de argumentos sentimentais, que só podem ter o valor de significarem a inteligência de quem os apresentou, mas jamais poderão servir de razão a quaisquer procedimentos, visto que não correspondem à realidade dos factos.
Assim, S. Ex.ª apresentou a Câmara de S. Pedro do Sul e a empresa concessionária como que dispostas a arrasarem todas as casas da povoação, para se edificarem novas casas cercadas de pequenas quintas para regalo dos turistas.
Seria de facto uma cousa monstruosa, como monstruoso é que alguém queira pôr intuitos tam inqualificáveis nas pretensões daquelas entidades. Nem a Câmara de S. Pedro do Sul nem a empresa concessionária têm semelhantes propósitos, e, portanto, a argumentação de S. Ex.ª fica invalidada.

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Não temos que atender a documentos particulares, como aquele a que S. Ex.ª se referiu — requerimento feito pelo engenheiro -; os documentos que valem são os documentos oficiais, e um dêsses é a portaria, e S. Ex.ª não encontra nela qualquer referência a quintas. Faz-se referência, sim, a balneários e a um grande parque.
Ora ninguém é capaz de demonstrar que um grande parque não seja hoje necessário existir anexo, em qualquer parte do mundo, aos estabelecimentos termais.
A lei determina que junto dos hotéis e estabelecimentos balneários haja grandes parques.
V. Ex.ª fez grande espanto, teve grande surpresa quando viu um prado frutífero.
Não vejo razão para isso.
Em toda a parte do mundo, na Alemanha, por exemplo, êsses parques existem para aprazimento dos turistas.
Mas S. Ex.ª achou extraordinária a área de 135 hectares.
Não acho, realmente; mas contra êsse argumento direi que a área está hoje reduzida a quási metade pela seguinte razão: é que a própria portaria a determina, fixando a delimitação.
Quere dizer, pela delimitação estar área fica de 80 hectares.
Pergunto eu se esta área é extraordinária para a exploração de umas termas, ou se devem ter apenas um simples «quintal» para os seus frequentadores.
É claro que S. Ex.ª não pode ter o critério estreito de querer apenas um hotelito com meia dúzia de quartos, um balneário pequenino. S. Ex.ª, que é um homem moderno, não pode, embora eu respeite muito os proprietários, cujas reclamações são muito interessantes, opor-se a êste melhoramento.
Mas grande número de pessoas já fez contratos com a empresa.
Apenas um senhor ou dois, que têm influência, tomaram determinada atitude.
Duas pessoas apenas; e em homenagem a duas pessoas apenas, S. Ex.ª vai embaraçar um empreendimento de utilidade para o País!
S. Ex.ª o faz com um pensamento; desejaria até o benefício e auxilio do empreendimento das termas de S. Pedro do Sul, que reputa úteis à colectividade; mas S. Ex.ª ensilvou-se de mais, embaraçou-se no ponto de vista jurídico, que estaria muito bem no Supremo Tribunal de Justiça, como Ministro da Justiça, mas se não harmonizará, para o caso, com o interêsse geral.
Tam extraordinário é êste caso que até se enviou um agente do Ministério Público para embaraçar tudo que represente o avanço dessa terra.
O seu primeiro cuidado foi nomear peritos, isto é, embaraçar.
O entusiasmo pelo interêsse da minha terra tem sido envenenado com calúnias da pior espécie, emquanto que eu defendo apenas interêsses gerais.
O Sr. Ministro do Trabalho (Rocha Saraiva): — Tenho todo o empenho em que a questão se resolva.
Eu não posso dar-lhe uma solução como V. Ex.ª deseja sem a intervenção do Tribunal.
A questão está afecta ao Tribunal; se não estivesse afecta ao Tribunal, já teria adoptado um processo igual ao de Caldelas.
O orador não reviu.
É aprovada a acta.
Foi lida uma nota de interpelação, que vai adiante publicada.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: pedi a palavra em virtude duma afirmação feita pelo Sr. Bartolomeu Severino, que desejo que fique esclarecida.
S. Ex.ª afirma que precisamente se tinha mandado um delegado para S. Pedro do Sul, que estivesse à mercê das partes interessadas.
Desejava saber se S. Ex.ª tinha intenção de dizer que foi nomeado por se desejar que êle fôsse favorável a êste ou àquele.
Fiz a nomeação dum homem de bem, indispensável, para se não deixar levar por influências.
Desde que se trata dum autêntico homem de bem, não há intervenção do Govêrno; êle dirá da sua justiça.
O Sr. Bartolomeu Severino: — V. Ex.ª ficará informado pela representação.

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O Orador: — Aguardo que o Conselho Judiciário Apresente as conclusões a que tenha chegado.
O orador não reviu.
ORDEM DO DIA
O Sr. Almeida Ribeiro: — Está distribuído o parecer da. comissão de finanças sobre a proposta do empréstimo.
Êsse parecer versa matéria muito importante, de que é urgente que a Câmara tome conhecimento ràpidamente. É certo que temos já em ordem do dia o Orçamento e uma proposta referente à revisão dum contrato entre o Estado e uma companhia, e tendo V. Ex.ª pelo Regimento a faculdade de marcar sessões nocturnas para a discussão do Orçamento, por isso pedia a V. Ex.ª que marcasse para ordem do dia da sessão de segunda-feira o parecer relativo ao empréstimo apresentado pelo Sr. Ministro das Finanças e para a discussão do Orçamento, se V. Ex.ª entendesse dever marcar sessões nocturnas, desde que isso seja possível, as marcaria. De outra maneira, designava para a segunda parte da ordem do dia a discussão do Orçamento e a proposta sôbre o empréstimo.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Segundo as alterações do Regimento, aprovadas no ano passado, o Orçamento tem de estar discutido até o dia 15 de Março. Ora o número de sessões que podemos ter já não chega para aprovar o Orçamento nesse prazo de tempo.
Nestas circunstâncias, tencionava propor à Câmara sessões nocturnas a partir de segunda-feira. Mas sucede que o motor da luz eléctrica está funcionando pessimamente. Hoje mesmo não temos luz, e por isso será difícil continuar a sessão até a hora regimental. Nestas condições, lembro à Câmara que talvez fôsse mais vantajoso não tomar por emquanto qualquer resoluto sôbre a proposta do Sr. Almeida Ribeiro, esperando para depois, com mais conhecimento de causa, resolvermos.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — As alterações do Regimento em relação ao Orçamento Geral do Estado dizem que os relatores do Orçamento deverão apresentar os seus pareceres no prazo máximo de quinze dias e, findo êste prazo, não tendo sido apresentados os pareceres, o presidente da comissão do Orçamento escolherá outros relatores.
Desejo que V. Ex.ª me informe se o presidente da comissão do Orçamento, em lace de não terem sido apresentados os pareceres, conforme o n.º. 5.º das alterações ao Regimento, já escolheu outros relatores, para, não continuar a discussão do Orçamento sem pareceres das respectivas comissões.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Só a comissão do Orçamento pode informar.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Almeida Ribeiro requereu a V. Ex.ª para consultar a Câmara sôbre se autorizava que de segunda-feira em diante fossem marcadas sessões nocturnas para se discutir regularmente o Orçamento Geral do Estado, sendo as sessões diurnas destinadas a discutir-se na primeira parte a proposta, de lei sôbre o empréstimo e na segunda parte o que V. Ex.ª entendesse e o contrato com a Companhia dos Tabacos. Entendo que o requerimento do Sr. Almeida Ribeiro é muito preciso, e deve por isso ser pôsto à votação.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Parece-me que o Sr. Almeida Ribeiro não requereu; apenas alvitrou à Mesa para assim proceder.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Não requeri que V. Ex.ª consultasse a Câmara. Quis apenas elucidar a Câmara sôbre a responsabilidade de o Orçamento não estar discutido e votado até 15 do corrente.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: — Nesse caso requeiro a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se autoriza que de segunda-feira em diante a divisão dos trabalhos seja conforme alvitrou o Sr. Almeida Ribeiro.
O orador não reviu.

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O Sr. Presidente: — Já foram entregues alguns pareceres sôbre o Orçamento. Se não forem entregues a tempo os outros, o Sr. Presidente nomeará os relatores.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Segundo as alterações ao Regimento, se no tempo oportuno não forem entregues os pareceres sôbre o Orçamento, o presidente da comissão do Orçamento nomeará outros relatores. E é preciso que isto seja cumprido, do contrário ficamos sem pareceres.
O orador não, reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: — Eu requeria que, na, segunda-feira, se discutisse na primeira parte da ordem do dia o parecer n.º 424, e na segunda parte, o que V. Ex.ª entendesse.
É pôsto à votação o requerimento do Sr. Jaime de Sousa.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (sôbre a modo de votar): — A maioria tem o hábito de querer uma lei para si o uma lei para os outros! Ainda há poucos dias eu fiz um requerimento para que se alterasse a ordem do dia. A maioria então protestou dizendo que a matéria do meu requerimento só podia ser considerada como proposta. Porque não se considera, pois, igualmente proposta o documento apresentado pelo Sr. Jaime de Sousa?
O orador não. reviu.
Q Sr. Presidente: — Trata-se dum caso inteiramente diverso e, por isso, eu não posso deixar de considerar o documento enviado para a Mesa pelo Sr. Jaime de Sousa como um requerimento.
O Sr. Carvalho da Silva: — Pretende o Sr. Jaime de Sousa levar a Câmara à apreciação simultânea de dois assuntos, qual dêles o mais importante. Esquecemo-nos infelizmente depressa dos funestos resultados das discussões e votações apressadas da última sessão legislativa.
Creio que é tempo de emendarmos os nossos processos de trabalho, para não continuarmos a dar ao País a impressão que legislamos sem saber como, nem por quê. Nestas condições não posso deixar de protestar contra a pretensão, do Sr. Jaime de Sousa.
O orador não reviu.
É aprovado o requerimento do Sr. Jaime de Sousa.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Procede-se à contagem.
O Sr. Presidente: — Estão de pé 27 Srs. Deputadas e sentados 45; está portanto, aprovado.
O Sr. Tavares Ferreira (por parte da comissão do Orçamento): — Sr. Presidente: Peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se permite que a Comissão do Orçamento retina amanhã durante a sessão.
Consultada a Câmara resolveu afirmativamente.
Continua a discutir-se á generalidade do Orçamento Geral do Estado.
O Sr. Presidente: — Sôbre a ordem fio dia ficou com a palavra reservada para a sessão do boje o Sr. Deputado Jaime de Sousa; devo porém informar S. Ex.ª de que a sessão deve terminar pouco depois das 18 horas, pelo facto de não haver luz.
O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: continuando a ordem de considerações que ontem tinha encetado, no sentido de justificar a moção que tive a honra de, mandar para a Mesa, devo dizer que não julgo o meu país tam próximo do abismo como querem os ilustres Deputados a oposição, que falaram antes de mim. O que nos conduziria directamente do abismo seria a conservação dum deficit orçamental permanente, e se nós num esfôrço, que tem de ser unânime, que tem de unir no mesmo intuito todos os republicanos, mais ainda, todos aqueles que amam verdadeiramente a sua Pátria, não actuássemos no sentido de extinguir desde já, com a maior urgência, êsse deficit.
Sr. Presidente, sabe V. Ex.ª e sabe a Câmara que neste ponto já não há nada à estudar; temos que entrar na política das realizações, doa a quem doer, empregando todos aqueles meios e medidas por mais violentos que possam parecer, no sen-

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tido de que êsse equilíbrio orçamental se produza, e não há campanha inflacionista possível, não há obstáculo que possa impedir a maioria democrática de, em auxílio do Govêrno que se encontra nas cadeiras do Poder, empregar o máximo do seu esfôrço no sentido de que o equilíbrio orçamental seja um facto no ano de 1923-1924.
Sr. Presidente, conhece V. Ex.ª e conhece a Câmara todas as consequências desastrosas que advêm para qualquer país da existência dum deficit, mesmo pequeno que êle seja. A existência do deficit está ligado imediatamente o recurso a meios extraordinários de pagar aquilo que se devo e aquilo que só não recebe, e êsses meios, quaisquer que êles sejam, examinando qualquer dos meios empregados para solver um deficit, todos êles são contrários à boa norma de administração pública e ao desenvolvimento dum país.
Há só dois meios de equilibrar um orçamento de contas públicas: é o recurso ao imposto e o recurso ao empréstimo.
Não apoiados.
Só há êstes dois meios legais; fora disto, só temos o recurso ao pior dos empréstimos, ao pior dos impostos que é o aumento da circulação fiduciária, a impressão de papel moeda.
É claro, Sr. Presidente, que eu não estou a dar à Câmara nenhuma novidade, porque a Câmara está tam convencida como eu de todos os inconvenientes que resultam para um país deficitário do recurso à circulação fiduciária; mas, se neste ponto estamos todos de acordo, outro há em que a nossa divergência se acentua: é nos meios que se torna necessário empregar, e que sejam mais conducentes ao equilíbrio das contas públicas do que essa forma de arruinar alegremente o País.
Não querem os ilustres Deputados da oposição ouvir falar em impostos, não querem ouvir falar em empréstimos, entendendo S. Ex.ªs, assim como aqueles elementos que lá fora pregam em todos os tons a campanha inflacionista, que deve começar-se pela compressão das despesas.
Sr. Presidente: eu sou daqueles que estão há muito tempo convencidos de que a primeira cousa a fazer é á compressão das despesas, mas inexoravelmente, como digo na minha moção, doa a quem doer.
Na própria proposta orçamental que está em discussão vem bem claramente, e não podia deixar de vir, a afirmação do Sr. Ministro das Finanças de que a compressão das despesas públicas se impõe.
Assim o diz o relatório do ilustre Ministro.
Sr. Presidente: devo chamar a atenção de V. Ex.ª e da Câmara para êste ponto concreto, porque se alguém tem realmente concorrido para pôr em prática esta forma de ajudar ao equilíbrio orçamental, que consiste em comprimir as despesas, é o actual Govêrno, que com os membros da maioria parlamentar da Câmara dos Deputados está procedendo a uma deminuïção gradual, persistente, dos quadros do funcionalismo público.
Não há hoje Ministério algum que não tenha vagas nos seus quadros do funcionalismo, e nalguns, como por exemplo no Ministério das Finanças, essas vagas são em tal número que chegam a algumas centenas, estando mesmo a prejudicar largamente o exercício dos serviços de máxima importância para o País, que passam pelas direcções gerais onde essas vagas existem.
Sr. Presidente: antes de ser votado nesta casa do Parlamento e ser pôsto em prática o novo sistema tributário, havia dificuldade de, no fim de cada ano, poderem abrir-se os cofres por falta de funcionalismo habilitado e mesmo pela falta de número suficiente de funcionários; ora sucede que actualmente com novos impostos, com sistema de impostos que é necessário estudar e pôr em prática pela primeira vez, sucede que êsse pessoal especializado que dantes não chegava está agora desfalcado, sendo necessário mais 400 empregados.
E a isto que se chama a compressão contraproducente, que neste caso atinge o elemento mais importante que pode haver para o equilíbrio das contas públicas, que é a cobrança o mais exacta possível dos réditos do Tesouro e das contribuições do Estado.
Isto, Sr. Presidente, vem em abono da afirmação que fiz de que tanto o Govêrno como a maioria parlamentar estão empenhados em que a maior compressão possível, compatível com as necessidades se faça duma maneira persistente e se continue inexoravelmente.

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É facto que a proposta orçamental traz um deficit que o ilustre Ministro computa em 139:000 contos, mas é certo também como diz o ilustre Ministro que qualquer melhoria cambial que nos pudesse colocar na possibilidade da divisa 5 acabaria automaticamente com êsse deficit. Juntando a acção às palavras traz o Govêrno as medidas necessárias para atingir êsse desideratum de não só reduzir a circulação fiduciária como acabar com os seus aumentos. É necessário, porém, dar ao Govêrno os meios necessários para atingir a primeira dessas étapes, que é o equilíbrio orçamental, e assim é que há pouco acabei de fazer um requerimento a V. Ex.ª, que a Câmara aprovou, com grande desgosto dos ilustres Deputados de oposição, para que mais intensivamente se discutam as propostas apresentadas pelo Govêrno, entre as quais avulta a do empréstimo interno que é o primeiro que no País se vai fazer depois da guerra, empréstimo que se não fez ainda devido principalmente às constantes perturbações de ordem pública que neste país, antes do actual Govêrno, foram norma de dois em dois meses.
Vamos, finalmente, fazer o primeiro empréstimo interno.
Durante a guerra não houve país que tivesse entrado nesse conflito que não fôsse obrigado a fazer aumento de circulação fiduciária, que não fôsse levado pela fôrça das circunstâncias a fazer empréstimos internos, alguns dêles avultadíssimos.
Sr. Presidente: como não quero alargar-me demasiadamente nas minhas considerações, porque não tenho tempo, peço a V. Ex.ª que, quando chegar a hora em que devo terminar, me previna para pôr ponto nas minhas considerações.
Sr. Presidente: devo ainda afirmar a V. Ex.ª e à Câmara que os países mais equilibrados em contas públicas, os países que verdadeiramente constituem modelos de administração pública, tiveram não só durante o período desastroso da guerra como também posteriormente de recorrer a largas inflações fiduciárias, empregando largamente o recurso dos empréstimos.
Eu não chamarei mais a atenção da Câmara para as finanças do Estado francês, porque êste assunto é bem do conhecimento desta assemblea; devo, em todo o
caso, dizer a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que não foi só a França que aumentou a sua inflação fiduciária.
A própria Inglaterra, onde as contas públicas são de tal maneira geridas modelarmente que para nós deve constituir um exemplo, não pôde escapar a essa necessidade e teve também de recorrer à inflação fiduciária, ao aumento dos impostos e ao empréstimo. De todos êstes processos usou e abusou largamente.
O que aconteceu, porém, é que o aumento dos impostos e o empréstimo tiveram por fim em Inglaterra, e conseguiram-no, fazer desaparecer o deficit no seu orçamento.
O aumento dos impostos atingiu nesse país o número formidável de 6 xelins por libra e apesar disto recorreu-se largamente ao empréstimo interno.
A inflação fiduciária em Inglaterra chegou a atingir 238 milhões de libras.
Sr. Presidente: emquanto nós recorrermos à circulação fiduciária, não recorrendo simultaneamente ao empréstimo, continuamos a aumentar a inflação fiduciária, desvalorizando cada vez mais a nossa moeda, o que traz inevitavelmente consigo a carestia da vida e a crise absoluta de tudo.
Não teríamos chegado às condições em que nos encontramos se os Governos tivessem tido a previdência de recorrer desde o princípio aos impostos e ao empréstimo.
Mas como isso não se fez até agora, urge que se faça desde já.
E por isso que eu me sinto à vontade defendendo a proposta ministerial, que tem por fim iniciar a política verdadeira das contas dum país que se presa, começando por extingir o deficit orçamental.
É isso que pretende a maioria parlamentar democrática.
Eu sei que êste facto não convém nem agrada àqueles que entendem que uma larga circulação fiduciária e uma grande baixa na nossa divisa cambial podem melhor servir aos seus interêsses inconfessáveis.
Sr. Presidente: eu entendo que a inflação exagerada atinge proporções de crime e que mal andaria qualquer Govêrno que não contrariasse por todos os meios os manejos que conduzem não só à conservação da actual inflação fiduciá-

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ria, mas ainda ao seu possível agravamento.
O perigo está na campanha formidável que se faz para aumentar a inflação fiduciária; dessa inflação provêm todos os nossos males a começar por aquele mal que o povo mais ràpidamente compreende, que é a carestia da vida.
E por isso que não deixarei de repetir neste momento, que o maior, o único inimigo do País é o inflacionista e que o combate a êsse inimigo deve ser o nosso lema e o objectivo de todos os nossos esfôrços. Entendo que o combate à inflação é a primeira êtape para o equilíbrio das contas públicas, para o desfazer do deficit orçamental, e é por isso que eu doa inteiramente o meu voto á proposta ministerial.
O Sr. Presidente: creio ter justificado suficientemente na estreiteza do tempo que me foi concedido a moção que tive a honra de mandar para a Mesa.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
Moção
A Câmara dos Deputados da República Portuguesa, confiando em que o Govêrno, cumprindo as afirmações feitas na proposta orçamental, procurará extingnir o deficit, promovendo o desenvolvimento da riqueza pública, a criação das receitas indispensáveis e a compressão inexorável das despesas e assegurando-lhe para êsse efeito a mais dedicada colaboração, passa à ordem do dia.
Sala das sessões, em 28 de Fevereiro de 1923. — Jaime de Sousa.
O Sr. Presidente: — Devo comunicar à Câmara que acabo de ser informado de que, por falta de luz durante uns dias não poderei dar execução à proposta que hoje foi aprovada, a fim de se efectuarem sessões nocturnas.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: em vista da informação que V. Ex.ª deu, na próxima semana ainda não teremos luz, não podendo, portanto, efectuar-se: sessões nocturnas.
Neste caso, peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se entende ou não que na ordem do dia se trate, na primeira parte, do empréstimo, e na segunda parte, da discussão do Orçamento.
O Sr. Presidente: — Vou consultar a Câmara sôbre se entende que a partir de segunda-feira a ordem do dia seja dividida em duas partes, discutindo-se na primeira parte a proposta relativa ao empréstimo e na segunda parte- o Orçamento.
O Sr. Pedro Pita (sobre o modo de votar): — Eu entendo que a ordem do dia não pode ser alterada,, pois tem que se discutir e votar no prazo devido o Orçamento Geral do Estado.
As sessões nocturnas destinavam-se exclusivamente à discussão do Orçamento. Uma vez que estejamos na impossibilidade, por falta de luz, de ter as sessões nocturnas, o natural é que essa discussão se faça nas sessões diurnas, não devendo ser relegada para a segunda parte da ordem o que equivalerá dizer-se que não será discutido.
Não me parece que o requerimento agora apresentado pelo Sr. Almeida Ribeiro deva ser submetido à votação.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — Começo por lembrar à Câmara o que diz o n.º 7.º das alterações ao Regimento.
Ora á Câmara não pode alterar a sua disposição por um simples requerimento.
A doutrina que o Sr. Almeida Ribeiro pretende introduzir paras a discussão é uma alteração ao que está preceituado naquele n.º 7.º das alterações ao Regimento que já li.
Ora essa alteração só pode ser feita por meio duma proposta e, portanto, como proposta deve ser aceito na Mesa o requerimento de S. Ex.ª
Acrescentarei ainda que não se compreende que a maioria, ainda há pouco tam azafamada em que o Orçamento se discutisse ràpidamente, venha agora com uma pretensão como a que consta do documento enviado para a Mesa pelo Sr. Almeida Ribeiro.

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Não pode ser. Só se justificam estas alterações da parte de quem não costuma estudar em casa os assuntos, por forma a ter uma orientação definida. Contra êste facto eu protesto, esperando que V. Ex.ª não considerará como um requerimento a proposta do Sr. Almeida Ribeiro, pois que o Regimento não pode ser alterada por um simples requerimento, mas sim por uma proposta, sôbre a qual há-de incidir uma votação.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Tôrres Garcia: — Sr. Presidente: quando da primeira vez se verificou a falta de luz, a Câmara resolveu que os seus trabalhos principiassem às 14 horas. Verifica-se novamente êsse facto e, por consequência, automaticamente se deve adoptar a mesma medida. Em meu entender, deve, pois V. Ex.ª sem necessidade de consultar a Câmara, marcar o início dos trabalhos para as 14 horas, e então já teremos tempo suficiente para se discutir o Orçamento e a proposta do empréstimo, assuntos êstes que é absolutamente necessário discutir para sairmos do regime de palavriado em que andamos metidos e de que eu confesso já estar farto. (Muitos apoiados). Não há que tomar resoluções novas.
Em face do mesmo mal, aplica-se o mesmo remédio.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador neto reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: no meu requerimento não se trata de nenhum incidente da discussão em curso, não podendo êle, portanto, ser considerado como uma proposta. Êle respeita apenas à ordem do dia da sessão da próxima segunda-feira, não visando, também a alterar o Regimento. O Regimento indica que se discuta o Orçamento; eu não peço que êle seja excluído da ordem do dia. Trata-se, portanto, — repito — dum requerimento e não duma proposta.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Morais de Carvalho: — Sr. Presidente: parece-me indiscutível que o que o ilustre Deputado, Sr. Almeida Ribeiro, apresentou é uma proposta e não um requerimento, visto que visa a alterar o que se acha adoptado e que consta das modificações do Regimento, aprovadas em Maio de 1922. Ainda quando se tratasse dum requerimento, que não se trata, eu não compreenderia o que com êle se pretende. A ordem do dia — disse S. Ex.ª — deverá ser dividida em duas partes, na primeira das quais se discutirá a proposta do empréstimo, sendo a segunda reservada ao estudo do Orçamento.
Eu pregunto, porém, se são êstes os fins exclusivos da ordem do dia das sessões além de segunda-feira, bem como em que espaço da sessão se discute o projecto dos tabacos, cuja discussão a Câmara já iniciou. Antes da sessão de segunda-feira só ternos a de amanhã e parece-me indubitável que um assunto transcendente como o dos tabacos se não poderá concluir em apenas mais uma sessão. Qual é pois, a ordem dos trabalhos? Parece-me haver uma desorientação completa.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — O documento enviado para a Mesa pelo Sr. Almeida Ribeiro não é uma proposta, mas sim um requerimento, per isso que não estabelece um regime novo para o funcionamento da Câmara, dada a circunstância de que já estávamos no regime de ser a ordem do dia dividida em duas partes. Até agora tem estado marcado para a primeira parte da ordem do dia o Orçamento Geral do Estado e para a segunda o projecto relativo aos tabacos, e o Sr. Almeida Ribeiro pede apenas que, conservando-se a ordem do dia, que ela se divida em duas partes: que na primeira se discuta a proposta do empréstimo e na segunda o Orçamento Geral do Estado.
O Sr. Morais de Carvalho: — Mas, se fôr votado o requerimento do Sr. Almeida Ribeiro, que eu continuo ainda a considerar como uma proposta, os outros assuntos que estão na ordem do dia ficam prejudicados?
O orador não reviu,
O Sr. Presidente: — Evidentemente.
S. Ex.ª não reviu.

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O Sr. Carvalho da Silva: — E, Sr. Presidente, sendo aprovado o requerimento, o Orçamente Geral do Estado estará votado até 15 de Março?
O Sr. Presidente: — Não sei. Não o sei eu, nem o sabe V. Ex.ª
S. Ex.ª não reviu.
Procede-se à votação do requerimento do Sr. Almeida Ribeiro, que é aprovado.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
O Sr. Presidente: — Emquanto os Srs. Deputados que estão fora da sala não chegam para se proceder à contraprova, devo observar que o Sr. Tôrres Garcia estava na razão quando disse que, dada a falta de luz, automaticamente devem as sessões voltar de novo a principiar às 14 horas. Por consequência, às 14 horas precisas de amanhã eu mandarei fazer a chamada, rogando a V. Ex.ª a fineza de não deixarem de estar presentes a essa hora.
S. Ex.ª não reviu.
Procede-se à contraprova da votação do requerimento do Sr. Almeida Ribeiro.
O Sr. Presidente: — Estão de pé 22 Srs. Deputados e sentados 36.
Está aprovado o requerimento.
Prossegue a discussão do Orçamento Geral do Estado.
O Sr. Afonso de Melo: — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª a fineza de me dizer por quanto tempo poderei usar da palavra na sessão de hoje.
O Sr. Presidente: — Creio que talvez uns vinte minutos.
O Orador: — Muito obrigado a V. Ex.ª Sr. Presidente: o Orçamento Geral ao Estado requeria, creio eu. para que acerca dele se aventassem as ideas que os diversos grupos políticos entendem dever defender sôbre os vários pontos de vista de administração, que a sua discussão fôsse acompanhada não só pelo Sr. Ministro das Finanças, mas também pelos demais membros do gabinete, visto que, se é certo que na sua elaboração tem a principal responsabilidade o Sr. Ministro das Finanças, não é menos certo que não se compreende a máquina administrativa, sem que todos, trabalhando em perfeito conjunto, se habilitem a realizar pelas respectivas pastas aqueles pontos de vista que podem. resultar da discussão que estamos aqui a fazer.
Ter um modo de ver diverso será supor, com desprestígio, não digo já dos Deputados que. usam da palavra, mas da própria instituição parlamentar, que esta é uma discussão ociosa e que quem aqui vem pronunciar considerações sôbre o Orçamento Geral do Estado nada. trará à tela da discussão que valha a pena ser aproveitado pelos Ministros que ocupam as várias pastas do Ministério!
Ontem, ao ouvir o Sr. Jaime de Sousa referir-se ao discurso pronunciado pelo meu amigo e ilustre correligionário Sr. Barros Queiroz, surpreendeu-me a frase em que S. Ex.ª capitulou do fantasias as afirmações e os números apresentados por êsse distinto financeiro e economista.
Se assim capitulou o Sr. Jaime de Sousa uma das mais balas orações que têm sido pronunciadas nesta casa do Parlamento, como hei-de eu capitular, não digo já o discurso de S. Ex.ª, mas o Orçamento Geral do Estado que foi submetido à nossa apreciação?
Não o classificarei de fantasia, mas posso denominá-lo «A mentira do Estado», à semelhança de um livro que anda agora. muito nas estantes dos livreiros...
Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Finanças, ao encimar o Orçamento Geral do Estado com o extenso relatório, que o precede, faz várias considerações que eu com o maior interêsse e com o maior prazer.
Com o maior interêsse pelo que diz da cuidada atenção que um Ministro da República põe nos assuntos da sua pasta; com o maior prazer, por verificar que S. Ex.ª está em certos pontos em perfeita concordância comigo.
Mas que contradição entre as palavras e as obras!
Que diferença entre a fachada, que é o prólogo do Sr. Ministro, e o interior, que são os números orçamentais!
Não é preciso ler o Orçamento Geral do Estado, dêste ano, detalhadamente, para ver a maneira como foi elaborado, os intuitos a que obedeceu e a colaboração que lhe foi dada.

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Afirma o Govêrno o seu desejo de que o Orçamento se equilibre a breve prazo, fazendo uma obra de severa e rigorosa economia, realizando, até os últimos limites, uma obra de compressão de despesas e evitando por todos os modos uma obra de inflação da circulação fiduciária, e, frase textual do relatório: «praticando o Govêrno os princípios que viu sustentados e aprovados na Conferência Internacional de Bruxelas».
Mas, Sr. Presidente, se eu estou perfeitamente de acordo com o Sr. Ministro das Finanças no enunciado dêstes bons propósitos, que são também os meus, que não podem deixar de ser os de todos os republicanos que desejam a República prestigiada e os de todos os patriotas que querem ver estabilizada a vida da Nação, dolorosamente verifico que — a dentro, quer do Orçamento Geral do Estado, quer das próprias conclusões a que no final do relatório o Sr. Ministro dás Finanças chega (apontando a sua maneira de proceder no intuito de fazer o saneamento das nossas finanças) — a realidade dos factos não corresponde à nobreza das intenções manifestada na primeira parte do seu trabalho.
O Orçamento Geral do Estado, a meu ver, mesmo sob o ponto de vista estritamente técnico da sua elaboração, da sua factura orçamentológica, enferma de um gravíssimo defeito.
Eu cuido, e comigo toda a gente que se ocupa dêstes assuntos, que um Orçamento será tanto mais perfeito, quanto mais claro e mais rigoroso nos cálculos aproximativos que hão-de representar, para o ano económico a que diz respeito, o montante das receitas e das despesas.
Pois bem, Sr. Presidente, eu não compreendo que neste Orçamento — e não o compreendia já em outros anteriores — a distribuïção das despesas — seja feita por uma forma que, sem um extenuante trabalho de que só seriam capazes pessoas especializadas na matéria, se torna absolutamente impossível verificar qual a importância real dessas despesas.
O Sr. Ministro das Finanças adoptou a classificação das despesas em ordinárias e extraordinárias, o que é defensável, mas fê-lo de. uma maneira singularmente nebulosa, pois estabelece para as despesas ordinárias várias designações, com pretenção a metódicas, mas na verdade confusas, figurando-as como «ordinárias normais, ordinárias permanentes, ordinárias transitórias», e até a pp. xv do relatório nos fala em «desposas ordinárias transitórias complementares das verbas permanentes normais» e logo a seguir em «despesas transitórias derivadas da situação cambial».
Pregunto a V. Ex.ª e à Câmara se a esta «detalhada classificação» não cabe antes o nome de «rematada confusão!
Emfim, uma confusão de termos que determina também fatalmente um natural embaraço em quem tem de apreciar os números da expressão, aliás pouco rigorosa, que êles nos podem dar da vida administrativa do País.
Outro e mais grave defeito a notar é que, estando nós a viver num regime de subvenções, que só por si inutiliza todas as verbas orçadas debaixo do ponto de vista do cômputo normal dos encargos do Estado, não temos maneira de verificar, em relação a cada serviço, quanto êle custa ao Estado!
O Sr. Ministro das Finanças, apresentando no Orçamento as despesas a que chamou normais permanentes figurando-as ao câmbio de 24, que é tudo quanto há de mais arbitrário, faz o cômputo do agravamento das despesas orçamentais, por motivo da depreciação cambial na base de 1:500 por cento, que é também arbitrária, não sendo vaga quanto ao número, porque a designação do 1:500 por cento é uma expressão bem definida, mas sendo absolutamente incerta e precária, quanto à realidade da sua efectivação, e até sem base de cálculo, quanto requereu sua probabilidade!
E como se esta fantasia, para me servir da expressão do Sr. Jaime de Sousa, não fôsse já bastante poeira lançada aos olhos do contribuinte, engloba-se numa só verba toda a despesa extraordinária resultante das subvenções.
Não faz sentido que peguemos no orçamento de qualquer Ministério e vejamos a soma das despesas ordinárias, calculadas com a libra esterlina a...10$, detalhada por pequenas parcelas, mencionando-se ainda funcionários a 1 e a 2 contos, para no capítulo das despesas extraordinárias encontrarmos numa só verba, sem qualquer distinção dos funcionários,

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Diário da Câmara aos Deputados
ao menos, dos serviços a que são adstritos, muitos milhares de contos, cuja aplicação não teremos maneira de verificar, porque não poderemos referi-los a cada serviço ou a cada cargo. Posso lá saber por êste processo, sem um estudo que requereria mesmo o recurso aos especialistas da matéria, que. me obrigaria a andar de repartição em repartição de contabilidade de todos os Ministérios, em quanto importam as despesas reais de, por exemplo, um determinado serviço do exército ou da administração da justiça? Evidentemente um orçamento elaborado com êstes vícios não é um orçamento perfeito debaixo do ponto de vista da técnica orçamental.
Sr. Presidente: tenho de consultar alguns apontamentos, mas a falta de luz mo permite.
O Sr. Presidente: — Fica V. Ex.ª com a palavra reservada.
A próxima sessão é amanhã, às 14 horas, com a mesma ordem de trabalhos.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 25 minutos.
Constituïção de comissão
De inquérito aos Bairros Sociais:
Presidente — O Sr. Albino Pinto da Fonseca.
Secretário — O Sr. Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Para a Secretaria.
Do Sr. Mariano Martins, durante a sua. doença, na comissão do Orçamento, pelo Sr. Correia Gomes.
Para a Secretaria.
Do Sr. António Fonseca, na, comissão do comércio, e na comissão dos negócios estrangeiros, respectivamente, pelos Srs. Carlos de Vasconcelos e João Pereira Bastos.
Para a Secretaria.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Projectos de lei
Dos Srs. Garcia Loureiro e Sousa da Câmara, sôbre contagem de tempo de serviço a professores de ensino primário geral de estabelecimentos de ensino dependentes do Ministério da Justiça. Para o «Diário do Governo».
Dós Srs. Moura Pinto, António Dias e Paulo Menano, regulando as promoções de sub-inspectores ou oficiais de finanças, por antiguidade.
Para o «Diário do Governo».
Proposta de lei
Dos Srs. Ministros da Justiça e das Finanças, contando 25 por cento a mais de tempo de serviço aos juizes e delegados do Procurador da República, efectivos, das comarcas das ilhas adjacentes.
Aprovada a urgência.
Para as commissões de legislação civil e comercial e de legislação criminal, conjuntamente.
Nota de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro do Comércio sôbre a legalidade das nomeações feitas para preenchimento dos lugares de professores da Escola Comercial e Industrial de Bernardino Machado, da Figueira da Foz.
Em 1 de Março de 1923. — O Deputado, João Bacelar.
Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério do Comércio, Direcção Geral do Ensino Comercial e Industrial, me seja facultado o exame aos processos de concurso e nomeação dos professores das Escolas Comercial e Industrial de Bernardino Machado, da Figueira da Foz.
Em 1 de Março de 1923. — O Deputado, João Bacelar.
Expeça-se.
Pareceres
Da comissão de administração pública, sôbre o n.º 363-D, que modifica a redacção da alínea 6) do § 2.º dó artigo 75.º do decreto n.º 5:847, sôbre limite de idade dos funcionários do Ministério do Comércio.
Para a comissão de finanças.

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Sessão de 1 de Março de 1923
Da comissão de legislação civil e comercial, sôbre o n.º 3.º -I, que autoriza a Câmara Municipal de Vila Nova de Paiva a vender terrenos baldios.
Para a comissão de finanças.
Da comissão de obras públicas e minas, sôbre o n.º 405.º -A, que reforça com 600. 000$ a dotação do Ministério do Comércio para «Trabalhos fluviais».
Para a comissão do Orçamento.
O REDACTOR — Sérgio de Castro.

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