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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 59
EM 11 DE ABRIL DE 1923
Presidente o Exmo. Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Manuel de Sousa Dias Júnior
Sumário. — Abre a sessão com a presença de 40 Srs. Deputados.
Lê-se a acta que adiante é aprovada.
Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Sousa Dias agradece o voto de sentimento pela morte de sua mãe.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu trata da emissão de selos comemorativos da travessia aérea do Atlântico, requerendo documentos.
Contínua a discussão, que fica pendente, do parecer n.º 380 — adicional às contribuições directas do Estado em benefício dos corpos administrativos.
Usam da palavra os Srs. Alfredo de Sousa, Alberto Cruz, Almeida Ribeiro, João Bacelar, António Fonseca e Francisco Cruz.
O Sr. João Luís Ricardo agradece o voto de sentimento pela morte de seu pai.
Ordem do dia. — O Sr. Jaime de Sousa manda para a Mesa um parecer da comissão de Finanças.
Foram considerados urgentes os assuntos anunciados respectivamente pelos Srs. Carlos Pereira e Sampaio Maia: situação dos Transportes Marítimos do Estado e tabela dos emolumentos judiciários.
O Sr. Carlos Pereira realiza o seu negócio urgente, respondendo o Sr. Presidente do Ministério António Maria da Silva.
Continua em discussão o orçamento do Ministério do Interior.
Procede-se a uma contraprova que vinha da sessão anterior sôbre o capitulo n.º 1
É aprovada.
Entra em discussão o capitulo 2.º, que é aprovado.
Entra em discussão o capitulo 3.º
Usa da palavra o Sr. Ferreira de Mira.
O Sr. Sampaio Maia realiza o seu negócio urgente. Apresenta numa proposta em que se empata, a votação, o pedido de dispensa do Regimento.
O Sr. Crispiniano da Fonseca apresenta um requerimento a que a Mesa não dá seguimento.
Usam da palavra para explicações os Srs. Nunes Loureiro, Pedro Pita, Sampaio Maia, Afonso de Melo e Paulo Cancela de Abreu.
Usa da palavra o Sr. Ministro da Justiça (Abranches Ferrão).
Volta a ser discutido o orçamento do Ministério do Interior, capítulo 3.º Usam da palavra os Srs. Afonso de Melo, Paulo Cancela de Abreu, António Correia e Presidente do Ministério.
Entra em discussão o capítulo 4.º
Usa da palavra o Sr. José Pedro Ferreira, que apresenta uma proposta, verificando-se não haver número quando em contraprova se propõe à votação.
Marcam-se sessões diurna e nocturna para o dia seguinte.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. -Projecto de lei — Pareceres — Declaração de voto — Nota de interpelação — Requerimentos.
Abertura da sessão às 15 horas e 15 minutos.
Presentes à chamada, 40 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão os Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
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Diário da Câmara dos Deputados
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António de Mendonça.
António Resende.
António Vicente Ferreira.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Francisco da Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Manuel Homem Cristo.
João José da Conceição Camoesas.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Serafim de Barros.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Domingos dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Alegre.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Tomé José de Barros Queiroz.
Ventura Malheiro Reimão.
Vitorino Henriques Godinho.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Maria da Silva.
António de Sousa Maia.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Artur Morais de Carvalho
Artur Virgínio do Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pereira Nobre.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Cortês dos Santos.
José do Oliveira da Costa Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Góis Pita.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Vergílio Saque.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Não compareceram os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Lino Neto.
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Sessão de 11 de Abril de 1923
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pires do Vale.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Germano José de Amorim.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
Jaime Duarte Silva.
João Baptista da Silva.
João de Ornelas da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Às 15 horas principiou a fazer-se à chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 40 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Substituïção
Comissão de marinha:
Substituir o Sr. Portugal Durão pelo Sr. Carlos Pereira.
Para a Secretaria.
Justificação de faltas
Do Sr. João de Ornelas.
Concedido.
Cumpra-se.
Correspondência
Do Sr. Marques Loureiro, agradecendo o voto do sentimento pelo falecimento de sua esposa.
Para a Secretaria.
Do Sr. Álvaro de Castro, pedindo para seguir um seu requerimento ao Sr. Ministro das Colónias.
Para a Secretaria.
Ofícios
Do Ministério da Guerra, acompanhando um requerimento e nota de assentos do tenente miliciano de artilharia n.º 4, António de Sonsa Pinto Cardoso Machado, pedindo revogação da ordem que o mandou licenciar.
Para a comissão de guerra.
Do mesmo, satisfazendo ao requerido pelo Sr. Pires Monteiro em ofício n.º 87, de Janeiro.
Para a Secretaria.
Do mesmo, pedindo autorização para o Sr. António Maia comparecer perante o
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Diário da Câmara dos Deputados
oficial de polícia judiciária militar para completar um seu depoimento.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracção e faltas.
Do agente de polícia judiciária da armada, pedindo a comparência do Sr. Cunha Leal no Quartel de Marinheiros, no dia 14 do corrente pelas 13 horas.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Do comando da 1.ª divisão do exército, pedindo autorização para ser ouvido num auto de corpo de delito o Sr. José Cortês dos Santos.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracção e faltas.
Requerimentos
De Avelino Hilário Ribeiro, sargento ajudante de infantaria n.º 33, pedindo para ser intercalado, por motivos que alega, no seu devido lugar na escala de acesso.
Para a comissão de guerra.
De Helena Pinto Mousinho da Silveira Valadares, pedindo na qualidade de viúva dum empregado da alfândega, o lugar de seladora.
Para a comissão de petições.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: — Estão presentes 51 Srs. Deputados.
O Sr. Sousa Dias: — Sr. Presidente: pedi a palavra para agradecer a V. Ex.ª e à Câmara o voto de sentimento manifestado pela morte de meu pai. Agradeço esta prova de estima, e afirmo que a guardarei no íntimo da minha alma.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: fui eu quem principalmente tratou nesta Câmara, do caso já classificado de escandaloso na própria imprensa republicana, relativo à emissão dos selos comemorativos da travessia aérea do Atlântico — e lembro-me até de que, desejando tratar êste assunto em negócio urgente, os Srs. Deputados da maioria, com a «amabilidade» e «deferência» que, por vezes, lhes são peculiares, rejeitaram o meu pedido de urgência!
Todavia, isso não impediu que eu tratasse do caso, no curto período de antes de se encerrar a sessão.
No dia seguinte, a Presidência sem sequer ter consultado a Câmara, deu a palavra ao Sr. Vasco Borges, que a pediu também para, em negócio urgente, se ocupar do mesmo caso.
Vê-se que uns são filhos e outros enteados!
São estas as normas dêste decantado regime de igualdade em que vivemos!
Sr. Presidente: tam escandaloso é o caso que os dois ilustres aviadores Sacadura Cabral e Gago Coutinho se viram na necessidade de intervir e mandaram o seu protesto ao Sr. Ministro do Comércio, reclamando contra o facto de se estar especulando com os seus nomes, e exigindo que o produto da venda dos selos fôsse destinado a despesas da aviação marítima.
Isto fez com que os concessionários se comprometessem a entregar ao Estado 3:000 contos destinados àquele fim.
Ora eu pregunto — quanto é que o contrato irá render, para poder permitir que os concessionários dispensem mais aquela avultada soma!
Sei que está anunciada uma interpelação sôbre êste assunto, pelo Sr. Cunha Leal; mas como fui eu quem primeiramente aqui o tratou, julgo-me no direito de o abordar de novo, antes de enviar para a Mesa um novo requerimento, instando pela remessa de documentos, relativos à famosa negociata.
E peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, a fineza de instar junto do Sr. Ministro do Comércio, para que êstes documentos me sejam enviados com urgência, a fim de que, quando se realizar a interpelação do Sr. Cunha Leal, eu esteja habilitado a intervir em debate generalizado.
É também indispensável saber-se qual a quantidade de selos que foram postos à venda ao público.
Houve inúmeras reclamações contra a sua falta.
Nem ao menos se cumpriu, nesta parte, o contrato!
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Sessão 11 de Abril de 1923
É ainda interessante averiguar qual foi o destino que tiveram as matrizes dos selos.
Parece-me que elas deviam ter dado imediatamente entrada na Casa da Moeda, a fim de se evitar qualquer falcatrua mais.
É necessário, emfim, que êste caso se esclareça inteiramente.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 55 Srs. Deputados.
Vai continuar a discussão do parecer n.º 380 — adicional às contribuições directas do Estado em favor dos corpos administrativos.
O Sr. Alfredo de Sousa: — Sr. Presidente: o artigo novo em discussão não é, em meu entender, de aceitar, porquanto não é moral que se crie um imposto especial, simplesmente para com êle beneficiar em cada município membros dos respectivos partidos.
Com certeza a elevação do dispêndio de 10 a 75 chega para todas as despesas necessárias do município e chega para elevar o vencimento de um funcionário municipal de 3$ a 6$.
Por esta razão não posso concordar com a doutrina do § 2.º, e também quanto à essência do artigo e § 1.º parece-me não ser admissível a sua redacção.
Portanto, para substituir a redacção do artigo e § 1.º e eliminar o § 2.º, mando para a Mesa uma proposta de substituição.
O orador não reviu.
Proposta
Artigo novo:
Artigo.º Aos médicos dos partidos municipais que não acumulem as funções de subdelegado de saúde, ou outras quaisquer, remuneradas pelo Estado, ou não exerçam a sua profissão nos meios citadinos, pagarão as câmaras municipais vencimentos iguais aos que superiormente forem estabelecidos aos que são subdelegados de saúde, deminuídos da gratificação anteriormente fixada pelas mesmas câmaras pelo desempenho dêsse cargo.
§ 1.º Os funcionários municipais atingidos pelas disposições dêste artigo, terão residência na sua área para cumprimento cabal das suas obrigações.
§ 2.º Para fazer face às disposições dêste artigo, e subsidiar o fundo de assistência e beneficência concelhia, e o combate e profilaxia das epidemias e doenças contagiosas — e exclusivamente para êsse fim — as percentagens adicionais às contribuições directas do Estado a que se refere o artigo 1.º dêste projecto de lei, serão aumentadas de mais 3 a 5 por cento sem sujeição ao referendum das juntas de paróquia.
Em 15 de Março de 1923. — Alberto Cruz.
Retirada.
Proposta
Proponho que a proposta de artigo novo apresentada pelo Sr. Alberto Cruz seja substituída por esta outra:
Artigo novo. Aos módicos municipais, que residam na área dos seus partidos, que não acumulem as funções de subdelegados de saúde ou outras quaisquer remuneradas pelo Estado, ou não exerçam a sua profissão nos meios citadinos, pagarão as câmaras municipais vencimentos iguais aos que, pelo Ministério do Trabalho, forem estabelecidos para os subdelegados de saúdo, deminuídos da gratificação anteriormente fixada pelas mesmas câmaras aos subdelegados de saúde pelo desempenho da função especial a êstes pertencente. — Alfredo de Sousa.
Admitida.
O Sr. Alberto Cruz: — É para dizer que concordo com a doutrina da proposta apresentada pelo Sr. Alfredo de Sousa.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Quando ontem me pronunciei a respeito do projecto de lei em discussão, alguns Srs. Deputados, levados certamente pelo calor da defesa da sua classe, disseram que eu não conhecia a vida do módico municipal, e que as minhas observações eram relativas a um tempo antigo, e que portanto estavam fora da actualidade das cousas.
Sou efectivamente um pouco velho, mas para comprovar as afirmações que fiz, de que os partidos médicos municipais estão instituídos em condições que variam de concelho para concelho e dentro do próprio concelho, vou dizer o que acontece com os partidos médicos municipais da
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Diário da Câmara dos Deputados
actualidade, quais são as condições em que esses1 partidos médicos municipais estão instituídos, segundo as circunstâncias dos respectivos provimentos.
Exemplificarei:
Em 1921, no concelho de Elvas, foi pôsto em concurso o partido médico de Vila Boim, com, além do vencimento, a ajuda de custo de 1. 100$ e pulso livre.
Em 1921, no concelho de Beja, foi pôsto a concurso um lugar de médico municipal com 920$, com a subvenção de 960$ anuais e pulso sujeito à tabela.
No concelho de Almada, em Abril de 1922, foram postos a concurso partidos médicos em Caparica e Cacilhas, ambos com 2. 190$, com pulso livre, mas com a obrigação de prestar assistência e vacinação gratuita aos pobres.
Em 1922, em outro concelho, foi pôsto a concurso um partido médico, em determinada freguesia, com o ordenado e mais a subvenção de 1. 200$, com pulso sujeito a tabela.
No concelho de Passos de Ferreira, em 1922; foram postos a concurso dois partidos médicos, cada um abrangendo sete freguesias, com os vencimentos de 250$ e a ajuda de custo, com a obrigação de dar consultas uma vez por semana em cada freguesia e pulso livre.
No concelho de Castelo de Vide, foram postos, a concurso dois partidos médicos, além do vencimento com 199$ de ajudas de custo e pulso sujeito a tabela; compreendendo esta a retribuição de 2$ por cada quilómetro de percurso, obrigando-se os médicos a prestar serviço de assistência no concelho.
Podia citar ainda outros casos de partidos médicos que estão actualmente funcionando, como foram instituídos, dos quais resulta uma variedade de condições que coloca os respectivos serventuários em condições diversas com outros.
Mas não se disse aqui, e eu quero dizê-lo.
Vote a Câmara como entender, mas vote perfeita e completamente esclarecida.
A lei n.º 1:245, de 15 de Setembro, que se ocupou dos médicos municipais, previu expressamente a sua melhoria de situação, e dispôs que aos médicos municipais são aplicáveis as percentagens e tabela n.º 4, sôbre vencimentos fixados anteriormente, e subvenções e ajudas de custo de vida.
Essas percentagens vão de 20 até 70 por cento do vencimento.
Isto foi no ano passado.
Como se querem já esfarrapar estas disposições legais, que pertencem a um conjunto de disposições que tanto têm dado que fazer e pensar?!
Não me parece pois, repito, que haja justificação alguma para a proposta apresentada.
Diz-se que os médicos municipais têm prestado grandes serviços à República.
Eu sei isso muito bem, Sr. Presidente, e tanto assim, que o ano passado, quando aqui se discutiu o caso da greve da Faculdade de Medicina, tive ocasião de dizer, e com grande satisfação, que se tratava realmente de uma classe que tem prestado relevantíssimos serviços em favor da República; porém, contra o que eu protesto, e não posso deixar de protestar, é que êsse facto possa dalguma maneira servir de justificação para explorações.
O que nós temos a considerar, é que há muitos serviços sanitários, e não só médicos; há por exemplo partidos farmacêuticos, partidos de parteiras e partidos veterinários, e assim o que é lógico é que se faça um estudo como deve ser do assunto, de forma a que se atenda a todos os serviços equitativamente.
Eram estas as considerações que eu tinha a fazer sôbre o assunto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. João Luís Ricardo: — Sr. Presidente: pedi a palavra para agradeceria V. Ex.ª e à Câmara o voto de sentimento que a Câmara votou à memória de meu pai, e muito principalmente as palavras de estima, de deferência e consideração que aqui foram proferidas pelos colegas que usaram- da palavra, as quais calaram profundamente no meu espírito, como filho afectuoso, que sempre fui, acompanhando assim o voto da Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Alberto Cruz: — Sr. Presidente: ouvi, com a máxima atenção, as considerações apresentadas pelo ilustre Deputa-
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do Sr. Almeida Ribeiro; porém, devo dizer que não estou do acôrdo com S. Ex.ª naquilo que directamente interessa à vida económica dos médicos municipais, pois a verdade é que todos conhecem as condições em que se encontram os facultativos municipais.
A sua situação é verdadeiramente angustiosa e aflitiva, sendo rude o seu trabalho o sempre mal pago, visto que as câmaras municipais, cada uma com o seu especial modo de proceder, não aplicam os devidos coeficientes que as leis n.ºs 1:355 e 1:356 determinam, o em harmonia com as disposições das leis, isto é, o coeficiente 9 sôbre os seus vencimentos, mas sim os coeficientes 5 ou 6, ou nenhum, se assim o determinarem a fobia das corporações administrativas aos serviços dos médicos municipais, ou à conveniência política da distribuïção partidária e facciosa das suas receitas.
A miséria bato à porta dum grande número do médicos municipais, e eu poderia ler à Câmara variadíssimos documentos que justificam a veracidade das minhas afirmações.
Por acaso tenho a carta dum médico municipal, na qual descrevo a sua situação, económica aflitiva.
É esta, na verdade, a situação em que muitos se encontram, o por isso chamo a atenção da Câmara para as justas disposições contidas no artigo novo apresentado pelo ilustre Deputado Sr. Alfredo de Sousa ao parecer n.º 380, e mais direi que se alguns médicos partidistas há que não cumprem rigorosamente os seus deveres, como o disse o Sr. Almeida Ribeiro, muitos há que o fazem porque não podem fazer o contrário; cumpriria às câmaras municipais chamá-los ao cumprimento dos seus deveres o modificar a organização dos serviços médico-municipais, do modo que o seu aproveitamento seja eficaz e a sua conveniência absolutamente útil o humanitária.
A Câmara, pois, a meu ver, votando o artigo apresentado pelo ilustre Deputado Sr. Alfredo de Sousa, pratica ùnicamente um acto de justiça e atendo à reparação dum estado do cousas que profundamente atinge uma classe trabalhadora e digna, do grandes responsabilidades na vida económica e social do País, e especificadamente encarregada de minorar o sofrimento, a dôr e a desgraça onde não chega o confôrto, a abastança, o conchêgo que a saúde aprecia e a doença exige para o combate dos males que tam asperamente dizimam a humanidade desgraçada.
A Câmara, Sr. Presidente, votando o artigo novo do Sr. Alfredo de Sousa, pratica uma acção humanitária, patriótica e justa.
Tenho dito.
O Sr. João Bacelar: — Sr. Presidente: a proposta do ilustre Deputado Sr. Alfredo de Sousa, e que vai substituir a que foi apresentada pelo Sr. Alberto Cruz, é absolutamente idêntica, representando um princípio com o qual eu não posso concordar, isto é, o que se refere aos médicos que se encontram em determinadas circunstâncias.
Não posso concordar com a proposta do Sr. Alfredo de Sousa, nem com a do Sr. Alberto Cruz, pois lhes encontro vários inconvenientes.
Em primeiro lugar, o Poder Legislativo constitucional não pode obrigar as câmaras a pagarem mais aos seus facultativos.
O Sr. Alberto Cruz: — Mas V. Ex.ªs votaram a lei de instrução primária, que trouxe um aumento de 32 por cento.
O Orador: — Uma exorbitância não justifica nada; não é argumento. Entre outras razões, há a considerar o contrato bilateral feito entre a câmara e o facultativo, e se o facultativo aceitou êsse ordenado é porque achou bem.
Um outro argumento é o pulso livre.
O Sr. Alberto Cruz: — O número de partidos médicos com pulso livre representa menos duma terça parte dos partidos.
O Orador: — Isso também não é argumento. Nós não podemos obrigar as câmaras municipais a aumentar os vencimentos dos seus funcionários, pois isso autorizaria a virem as câmaras pedir novos impostos.
As câmaras têm a sua autonomia financeira, e nós não podemos saltar por cima de tal disposição.
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O Sr. Alberto Cruz: — Têm-se modificado e revogado muitos contratos.
O Orador: — Eu votei sempre contra isso, pois nós devemos ser os primeiros a respeitar as disposições constitucionais, e, portanto, não posso votar a proposta.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Alberto Cruz não fez a revisão dos seus «àpartes».
O Sr. António Fonseca: — Eu podia dispensar me de usar da palavra depois do discurso do Sr. João Bacelar, que resumiu todas as considerações; mas tenho aqui os textos legais, e a êles me vou referir.
Por essas disposições nega-se ao Poder Legislativo a competência para alterar qualquer vencimento a funcionários administrativos, o que é de exclusiva competência das câmaras, e só se pode modificar quando a lei fôr alterada.
Temos mais os preceitos dos códigos de 1876 e de 1896.
Para evitar isto é que se pôs esta disposição, que tem, ainda, uma outra significação, qual é a de permitir às câmaras municipais estabelecerem os vencimentos aos seus funcionários ou ao seu pessoal contratado. E se assim é, nós praticaremos um acto manifestamente inconstitucional indo-nos imiscuir em assuntos que são da exclusiva responsabilidade e competência das câmaras municipais.
Propositadamente eu li o artigo onde se diz que compete, também, às câmaras proceder à extinção dos lugares de facultativo.
Digo-o com toda a sinceridade: se eu fizesse parte da câmara municipal dum concelho onde as despesas fossem superiores às receitas, em face duma disposição que a obrigasse a aumentar os vencimentos aos seus facultativos, eu seria o primeiro a lembrar o único caminho que havia a seguir, qual era o de suprimir todos êsses lugares.
A situação das câmaras municipais é, presentemente, de tal maneira grave que não se compadece com imposições dispendiosas, como aquela que se pretende fazer passar neste momento.
Depois nem todos os médicos municipais se encontram na necessidade de receber mais um novo subsídio.
Genérica como é, a disposição que se discuto, só serviria para ir agravar, ainda mais a situação de muitas câmaras municipais, já hoje esmagadas sob o pêso do orçamento das suas despesas.
De resto sendo os municípios constituídos por...
O Sr. Alberto Cruz: — Por analfabetos.
O Orador: — Eu não posso acreditar que o Partido a que V. Ex.ª pertence tenha procedido às eleições camarárias, com cuja vitória tanto se vangloriou, simplesmente para colocar à frente dos municípios creaturas analfabetas.
Risos.
Mas dizia eu que sendo os municípios formados por pessoas que conhecem de perto as necessidades e situação dos seus facultativos, a êles se devia deixar a iniciativa e competência, que, aliás, a lei consigna, de proceder ao melhoramento dessa situação sempre que ela se impusesse.
Nestas condições eu entendo que a Câmara dos Deputados não deve aprovar qualquer disposição que modifique a actual constituição dos partidos médicos. Estou convencido que as câmaras municípios, onde certamente chegarão os ecos do nosso debate, tendo conhecimento da atmosfera favorável ao aumento de vencimentos aos seus facultativos, se apressarão a atender as suas reclamações.
Tudo quanto seja ir além disto é manifestamente ir de encontro ao que diz a Constituïção, como se depreende da leitura dos textos que acabo de ler à Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente: muito breves considerações tenho a fazer depois das que foram produzidas pelo ilustre Deputado Sr. António Fonseca, que, como sempre, falou juridicamente.
A questão é bem simples: a quem presta serviço é que se deve pagar, e desde que os médicos municipais prestem ser-
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viços às câmaras, estas é que tem a obrigação de lhes pagar.
Eu vou contar à Câmara o que ainda há pouco só passou comigo.
Um médico municipal, meu amigo, abeirando-se de mim, com cara de caso — como costuma dizer-se — e pediu-me para lhe fazer um favor.
Eu respondi-lhe que para isso não era necessário que êle se apresentasse com aquela cara, e preguntei-lhe de que favor êle carecia.
Respondeu-me que desejava que eu lhe arranjasse um emprego, e êsse emprêgo era o dê distribuidor rural, que, dizia êle, era muito mais rendoso do que o de médico municipal!...
Infelizmente isto é verdade. Um simples distribuidor rural ganha mais do que um médico municipal.
Em iguais circunstancias se encontram, os subdelegados de saúde, cujos honorários são verdadeiramente miseráveis.
Apelo para o Parlamento e para o Govêrno, para que justiça seja feita tanto aos subdelegados de saúde como aos médicos municipais, que não podem viver apenas das receitas que passam nem da sciência que adquiriram.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Deu á nora de se passar à ordem do dia.
Foi lido o expediente, que já fica registado nos termos das respectivas rubricas.
O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: mando para a Mesa o parecer da comissão de marinha relativo ao parecer n.º 365, vindo do Senado.
O Sr. Presidente: — Encontram-se na Mesa dois pedidos de assuntos urgentes:
Um do Sr. Sampaio Maia, relativo ao decreto n.º 8:436, para ser tratado na presença do Sr. Ministro da Justiça; o outro, do Sr. Carlos Pereira, referente aos navios dos Transportes Marítimos do Estado.
Os Srs. Deputados que consideram estes dois assuntos urgentes têm a bondade de levantar-se.
Assim foram considerados.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra para o negócio urgente o Sr. Carlos Pereira.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: vou ser breve, muito breve mesmo, porque me faltam elementos pata tratar desenvolvidamente o meu «negócio urgente».
Requeri ontem que me fôsse enviada cópia das propostas das unidades da frota mercante do Estado que se queriam vender e requeri que me fôsse comunicado se o navio Estremadura dos Transportes Marítimos do Estado ainda ao Estado pertencia ou não.
E a causa de eu me atrever a preguntar se um navio do Estado era ou não do Estado é muito simples: é que já se anuncia nos jornais que é navio Estremadura pertence a uma emprêsa particular.
Não quero entrar na apreciarão das condições de troca de utilização dêsse navio, como de outros.
O mal está feito e não foi êste Govêrno que o praticou.
Não se compreende que á comissão liquidatária dos Transportes Marítimos do Estado possa reaver qualquer proposta que não tenha á forma expressa de aceitar todas as condições do concurso, e não só essas condições, mas todas as condições das leis.
Não tenho elementos, mas espero recebê-los, para ver se as propostas apresentadas aceitam todas as condições, ou se fica dependente de qualquer deliberação de qualquer entidade resolver sôbre o assunto.
A lei à que já me referi estabelece subsídios para certas carreiras, e uma proposta pedindo subsídios não poderia só por isso ser aceita.
Poderá o Estado dar subsídios pecuniários para as carreiras pára a África; mas dar o Estado subsídios livremente é que não pode ser, nem há-de ser, custe o que custar.
Se porventura houver, e hão sei se há, proposta nessas condições, essa proposta não pode ser aceita.
Se porventura as propostas feitas não puderem ser aceitas, por não cumprirem todas as condições do concurso e da lei, e se o concurso ficar deserto; estamos na altura de remediar o mal.
Interrupção do Sr. Artur Brandão.
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O Orador: — O Parlamento não pode abandonar êste assunto, deixando-o correr à vontade de quem quer que seja.
Diz-se vagamente que os concorrentes pretendem só estabelecer certas carreiras para a África, e que o Estado faça as outras.
Há uma condição para os concursos que diz que outros navios não podem fazer concorrência a certas carreiras.
Àparte do Sr. Francisco Cruz que não foi ouvido.
O Orador: — Sr. Presidente: o que eu espero é que a comissão liquidatária dos Transportes Marítimos do Estado não faça a transferência da frota do Estado para qualquer entidade que não tenha aceitado todas as condições do concurso e da lei, e espero que o Govêrno fará todos os esfôrços para que assim, só cumpra, porque assim se cumpre o lei.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: o Sr. Carlos Pereira fez um certo número de preguntas, e como não está presente o Sr. Ministro do Comércio, a resposta que posso dar é precária.
O assunto da transferência da frota marítima do Estado para a posse de particulares é da iniciativa de Govêrno meu, e não me arrependo de ter mencionado o assunto numa declaração ministerial, para evitar que êsse cancro continuasse a atacar os cofres públicos de um modo que todos conhecem.
Produziram-se os factos conhecidos, e o Parlamento não fez outra cousa senão ajudar os esfôrços do Govêrno para acabar com êsse estado de cousas, para usar de melhor linguagem.
Abriu-se o concurso, e só resta ao Govêrno saber se as propostas estilo nas condições da lei.
Qualquer alteração da ordem que S. Ex.ª referiu será para considerar em ocasião oportuna por quem de direito, e por entidade jurídica se fôr necessário.
O caso da adjudicação total representem uma preferência, e em nada anula qualquer disposição legal concernente ao assunto.
A lei tem de cumprir-se.
As propostas não foram consideradas ainda porque o Sr. Ministro do Comércio está ausente.
Na devida oportunidade o assunto será tratado, dando-se contas ao Parlamento.
Quanto às considerações do Sr. Carlos Pereira, devo declarar que por virtude da declaração de guerra, feita pela Alemanha a Portugal, houve necessidade de se aproveitar o vapor Malange para transporte de tropas, para o que se fez como que um contrato entre o Estado e a Empresa Nacional de Navegação.
O assunto não corre pela minha pasta e portanto eu informarei o meu colega do Comércio, que dará as informações solicitadas pelo Sr. Carlos Pereira.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai continuar a discussão do orçamento do Ministério do Interior.
Vai proceder-se à contraprova que foi requerida para a votação do capítulo 1.º
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está em discussão o capítulo 2.º
Pausa.
O Sr. Presidente: — Ninguém pede a palavra; vai votar-se.
Procede-se à votação.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
O Sr. Presidente: — Vai proceder se á contraprova e contagem.
Procede-se à contraprova e à contagem.
O Sr. Presidente: — Estão de pé 25 Srs. Deputados e 42 sentados. Está aprovado.
Está em discussão o capítulo 3.º
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O Sr. Ferreira de Mira: — Peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ferreira do Mira.
O Sr. Ferreira de Mira: — Sr. Presidente: quando na sessão legislativa passada foi discutido o orçamento do Ministério da Instrução, tive a honra de mandar para a Mesa várias emendas, e grande parte delas, justamente as mais importantes, foram rejeitadas, não porque não estivesse o que elas indicavam no pensamento da maioria da Câmara, mas porque entendeu essa maioria que estando a funcionar uma comissão parlamentar para estudar a remodelação dos serviços públicos, só se deveria considerar momento próprio para se fazer aquilo que eu propunha a ocasião em que viessem aqui os resultados do trabalho de o tal comissão.
Agora dão-nos para discussão orçamentos que não trazem, embora tenha decorrido quási um ano, o resultado dês-se estudo, e que são ùnicamente moldados em trabalhos anteriores das respectivas repartições.
A comissão respectiva não cumpriu a tempo o seu mandato, e quando se propôs que fôsse prorrogado o prazo dos seus estudos tive de dizer nesta Câmara que não podia votar essa prorrogação, convencido, como ainda o estou, de que a comissão não atingiria o fim para que fôra criada, e tanta mais razão tive para dizer isso, quanto é certo que eu fora um dos membros desta Câmara que defenderam a constituição da comissão.
A comissão ainda não reüniu, e nós continuamos a discutir os orçamentos em condições que não me parece permitirem quaisquer resultados profícuos.
Dos primeiros estudos dessa comissão tinha resultado a tentativa duma proposta para ser considerado pela Câmara o reconhecimento de dever ser deminuído o número de Ministérios. Não estava o Ministério do Interior no número dos que deveriam ser suprimidos, mas como uma remodelação de serviços com fins económicos se não podia cifrar ùnicamente na deminuïção do número de Ministérios, de esperar era que também viesse a redução do número de direcções gerais dos diversos Ministérios.
É, portanto, agora na discussão do capítulo 3.º do orçamento do Ministério do Interior a ocasião de se preguntar ao Sr. Ministro do Interior se realmente S. Ex.ª entende que no Ministério do Interior são necessárias as duas direcções gerais que existem, ou se deverão ser reduzidas a uma só direcção geral.
Sr. Presidente: não se trata de extinguir serviços de administração pública e civil, nem de segurança pública; trata-se de reunir aqueles dêsses serviços que se julguem indispensáveis numa só direcção geral.
Grande parte dos serviços da administração pública e civil deviam estar, se realmente nós seguíssemos os princípios republicanos do tempo da propaganda, entregues a vários organismos locais. Tantas vezes se falou de administradores de concelho, de regedores, e até de governadores civis, como funcionários principalmente destinadas a fazer eleições, quando os serviços de administração que lhes competiam poderiam estar entregues a funcionários electivos, como electivas são as câmaras municipais!
Nestas condições, e tendo já rejeitado o anterior capítulo em discussão, lamento que o Sr. Ministro do Interior e o Sr. relator não trouxessem à Câmara um trabalho de remodelação dos serviços do Ministério do Interior, por forma a que, ficando uma só direcção geral e deminuindo-se tanto quanto possível as despesas, se entrasse no caminho de economias, tam preconizado e tam pouco seguido.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Em conformidade com á resolução da Câmara, tomada há pouco, eu vou dar a palavra ao Sr. Sampaio Maia para tratar do seu assunto urgente, visto já estar presente o Sr. Ministro da Justiça.
Tem a palavra o Sr. Sampaio Maia.
O Sr. Sampaio Maia: — Sr. Presidente: começo por agradecer à Câmara a ama-
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bilidade que quis ter para comigo, considerando urgente o assunto de que vou tratar; de resto, revestindo êle um aspecto moral, bem andou a Câmara em reconhecer imediatamente a urgência.
Demais, o objecto do negócio urgente apresentado à Câmara é para mim dum alto melindre.
Toda a Câmara sabe que eu sou advogado e todos reconhecem como essa profissão se encontra intimamente ligada à magistratura judicial e à magistratura do Ministério Público, mas, entre o desagradar a qualquer dessas magistraturas ou a esquecer os interêsses da Nação, eu prefiro o primeiro caso, visto que acima de tudo seu Deputado.
Sr. Presidente: foi publicada à lei n.º 1:355 aprovada pelo Congresso da República, que no artigo 44.º dá ao Govêrno a seguinte autorização:
«Fica autorizado o Govêrno a modificar a tabela dos emolumentos e salários judiciais, a dos conservadores do registo predial e a dos administradores de falências, quando os respectivas funcionários não estejam abrangidos pelas disposições desta lei».
Vemos, pois, que o Govêrno foi autorizado a modificar a tabela de emolumentos e salários judiciais, mas só para aqueles funcionários que pela mesma lei n.º 1:355 não houvessem sido beneficiados com aumento de vencimentos. Pois bem! Nessa mesma lei, artigo 2.º, declara-se:
«São completados por uma percentagem de melhoria os vencimentos actuais de categoria e exercício dos funcionários civis de qualquer natureza e os sôldos ou prés, incluindo as gratificações de patente e de serviço de efectividade, dos militares do exército e da armada a os vencimentos da magistratura judicial e do Ministério Público e seus equiparados».
Em virtude desta lei a autorização dada ao Govêrno para publicar e tabela de emolumentos e salários judiciais ficava assim restrita aos funcionários que não tivessem tido aumento de vencimento.
Quais são êles?
Deve sabê-lo o Sr. Ministro da Justiça; pois para isso basta saber ler.
Esta lei, ao ser publicada no Diário do Govêrno de 15 de Setembro de 1922, foi alterada, ou pelo menos publicada com incorrecções, vendo-se o Govêrno na necessidade de publicá-la novamente, o que fez em 30 de Setembro do mesmo ano. Mas a autorização concedida no artigo 44.º foi mantida ipsis verbis quer numa quer noutra publicação.
Diz aí, no artigo 44.º da lei n.º 1:355, novamente publicada no Diário do Govêrno, de 30 de Setembro de 1922 e que eu não me cansarei de repetir à Câmara:
«Fica autorizado o Govêrno a modificar a tabela dos emolumentos e salários judiciais, a dos conservadores do registo predial e a dos administradores de falências, quando os respectivos funcionários, não estejam abrangidos pelas disposições desta lei».
Também no artigo 2.º desta mesma lei ùltimamente publicada se reproduz aquela mesma disposição que aumenta os vencimentos aos magistrados judiciais e do Ministério Público com uma melhoria.
Quere dizer, pela lei publicada em 30 de Setembro de 1922 o Govêrno recebeu uma autorização do Poder Legislativo para modificar a tabela dos emolumentos e salários judiciais, em relação àqueles funcionários que por aquela lei melhoria alguma tinham tido.
Mas o que fez o Govêrno?
Exorbitando da faculdade ou da autorização que o Poder Legislativo lhe deu, êle próprio concedeu uma melhoria ou melhor um aumento de emolumentos aos próprios magistrados judiciais e do Ministério Público e seus equiparados sem para isso estar legalmente autorizado.
Quem compulsou a tabela publicada em Outubro de 1922 e sancionada pelo decreto n.º 8:436, lá vai encontrar emolumentos extraordinariamente elevados em relação à tabela anterior referidos aos magistrados judiciais e do Ministério Público para todas as categorias, desde a primeira instância, até o Supremo Tribunal de Justiça. E para se ver quam elevados foram os emolumentos que êsse decreto estabeleceu basta dizer à Câmara que não há muito tempo no Tribunal do Comércio desta cidade numa causa, ou melhor num incidente, preparatório duma
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acção, num simples arrolamento que levou seis dias, as custas contadas sobem à fabulosa quantia de 87. 000$, cabendo ao juiz a importância de mais de 20. 000$!
Trocam-se àpartes.
O Orador: — Também pendente do Tribunal do Comércio desta cidade está uma outra causa em que só para o preparo da sentença, pela tabela que o Govêrno sancionou pelo decreto n.º 8:436, são precisos mais de 90. 000$!
Isto, Sr. Presidente, é, para demonstrar a V. Ex.ª e à Câmara como a tabela anterior foi modificada.
O Govêrno pretendeu ainda justificar êste abuso de Poder com uma outra autorização que lhe foi dada aqui no Parlamento pela lei de 22 de Setembro de 1922. Efectivamente a Câmara votou a seguinte autorização:
«São conferidas ao Poder Executivo as faculdades necessárias para, no interregno parlamentar, promulgar medidas de carácter económico ou financeiro que forem inadiáveis».
O Sr. Ministro da Justiça e o Govêrno de então, para justificarem a sua atitude, num considerando do decreto n.º 8:436, vieram dizer que foi ao abrigo do artigo 1.º da lei n.º 1:371, de 22 de Setembro de 1922, que modificaram a tabela dos emolumentos judiciais em relação aos magistrados e seus equiparados.
Não estava presente quando aqui foi votada a lei de 22 de Setembro, mas na Câmara certamente estão presentes muitos que assistiram à votação dessa autorização e presente está o Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, Sr. António Maria da Silva, que sabe o compromisso que tomou para com a Câmara ao ser votada essa autorização.
Nunca ela poderia abranger ou envolver quaisquer autorização que permitisse alterar o artigo 44.º da lei n.º 1:355.
De resto a própria letra da lei n.º 1:371, ao falar nos poderes que foram atribuídas ao Poder Executivo em medidas de carácter económico e financeiro, absolutamente repudia a interpretação que o Govêrno lhe quis dar.
Mas há mais. Esta autorização, como V. Ex.ªs sabem, tem a data de 22 de Setembro de 1922, e a última publicação da lei n.º 1:335 tem a data de 30 de Setembro do mesmo ano; quer dizer, a última publicação da lei n.º 1:335 tem no Diário do Govêrno data posterior à lei n.º 1:371, e toda a gente sabe que uma lei posterior revoga a anterior; mais ainda: segundo aquela lei a autorização era restrita, só se podendo aplicar àqueles funcionários que não tinham tido melhoria de vencimento pela referida lei n.º 1:355.
E o Sr. Ministro da Justiça, que é também um dos mais distintos professores da Faculdade de Direito, nos princípios gerais de direito civil, cadeira que rege com toda a proficiência, tem certamente ensinado que as leis especiais nunca podem ser revogadas por uma lei de carácter geral, a não ser que essa lei geral faça a revogação expressa das disposições especiais.
O decreto n.º 8:436 representa, pois, um autêntico abuso do poder.
Além de que o abuso do poder não só no aumento dos emolumentos que o Govêrno levou a efeito sem estar devidamente autorizado, está ainda em que o Govêrno, tendo recebido apenas uma autorização para modificar a tabela, dos emolumentos e salários, resolveu a seu talante incluir também no próprio decreto disposições de carácter processual, alterando e revogando disposições do próprio Código do Processo Civil e até disposições de carácter substantivo!
Isto é muito grave porque em causas pendentes nos tribunais de Lisboa já alguns magistrados se aproveitaram destas disposições de carácter processual para revogar despachos anteriores, com trânsito em julgado!
Não creio, nem pretendo insinuar que as modificações feitas de carácter processual através do decreto n.º 8:436 possam envolver quaisquer interêsses.
Não vou tam longe. Parte do princípio que o Ministro que subscreveu aquece decreto foi um Ministro inteiramente honesto, a quem eu presto pessoalmente e publicamente as minhas homenagens como um dos mais doutos e esclarecidos jurisconsultos do meu País.
Refiro-me, Sr. Presidente, ao Sr. Catanho de Meneses.
Mas se pela minha cabeça não passa a
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idea de que o Ministro, à sombra duma autorização para modificar a tabela dos emolumentos, modificou disposições de carácter processual, para servir interêsses de pessoas de alguma das partes já era juízo, pela cabeça de muita gente pode passar essa idea.
Não basta que um Ministro da República seja honesto, é preciso sempre que o pareça.
Sr. Presidente: como V. Ex.ª vê, e isto é que é importante, às partes têm sido extorquidos emolumentos, dinheiros que são recebidos por magistrados, indevidamente, ilegalmente.
O Sr. Alberto Cruz: — Admira-me que havendo magistrados na Câmara não protestem contra as palavras de V. Ex.ª
O Sr. Cancela de Abreu: — V. Ex.ª dá-me licença?
Eu não sou magistrado, mas julgo que V. Ex.ª devia antes dizer que os magistrados não têm recebido indevidamente; a lei é que lhes atribui vencimentos indevidamente.
O Orador: — Era exactamente o que eu ia dizer, em resposta ao Sr. Alberto Cruz.
Chamo, pois, a atenção do Sr. Ministro da Justiça para as considerações que acabo de fazer e estou certo que S. Ex.ª não pode deixar de fazer uma nova publicação do decreto n.º 8:436, mas agora devidamente rectificada, dentro da autorização do artigo 44.º da lei n.º 1:355.
Para evitar porém desde já os inconvenientes que apontei, mando para a Mesa a seguinte proposta, para a qual peço urgência e dispensa do Regimento:
Proponho a imediata suspensão do decreto n.º 8:436, publicado no Diário do Govêrno de 21 de Outubro de 1922, e o restabelecimento da legislação anterior sôbre emolumentos e salários judiciais até a nova publicação da tabela modificada nos precisos termos do artigo 44.º da lei n.º 1:355, de 15 de Setembro de 1922. — Angelo Sampaio Maia.
É lida a proposta na Mesa.
Consultada a Câmara sôbre a urgência e dispensa do Regimento, rejeita o requerimento.
O Sr. Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Procede-se à contraprova, verificando terem aprovado o requerimento 31 Srs. Deputados e rejeitado igual número.
O Sr. Presidente: — Está empatada a votação; tem de se repetir na próxima sessão.
O Sr. Crispiniano da Fonseca (para um requerimento): — Sr. Presidente: requeiro que V. Ex.ª consulte a Câmara sôbre se consente que a proposta do Sr. Sampaio Maia entre amanhã em discussão antes da ordem do dia, depois do parecer n.º 380 e nas mesmas condições dêste.
O Sr. Presidente: — A Mesa tem dúvidas sôbre a viabilidade dêsse requerimento. Julga-o contra o Regimento. Visto que não está ainda, aprovada a dispensa do Regimento, e assim a proposta não pode figurar na ordem do dia sem que esteja impressa e distribuída pela Câmara.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Nunes Loureiro (para explicações): — Sr. Presidente: salvo o devido respeito, parece-me que V. Ex.ª não pode ter dúvidas sôbre o requerimento, porque só a Câmara o votar implicitamente aprova a urgência e dispensa do Regimento. Mas a diferença que existe entre êste requerimento e o do Sr. Sampaio e Maia é que um diz respeito à sessão do hoje e o outro apenas à sessão de amanhã.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita (para explicações). — Sr. Presidente: parece-me, realmente, que não é pelo motivo que V. Ex.ª apresentou que não pode ser votado o requerimento do Sr. Crispiniano da Fonseca, mas porque determinando o Regimento que havendo empate duma votação ela se repetirá na sessão seguinte, seria iludir essa disposição fazer uma votação que implica com o assunto dessa mesma votação.
Apoiados.
O que me parece que há a fazer é suspender a discussão sôbre a matéria.
Por outro lado, não é aceitável que se
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esteja constantemente a preencher o espaço destinado ao antes da ordem do dia com discussões de projectos, prejudicando os interêsses da oposição, a não ser que o Govêrno receie quaisquer ataques.
Não apoiados da maioria.
Se não é assim, deve ser o Govêrno o primeiro a indicar aos seus correligionários que não votem nessas condições.
Apoiados da minoria.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro (para explicações): — Sr. Presidente: a minha opinião pessoal a respeito do requerimento que foi apresentado pelo Sr. Crispiniano da Fonseca é que êle efectivamente implica uma alteração do statu quo parlamentar em relação à proposta anterior que foi objecto duma votação que ficou empatada.
Por isso, parece-me que o requerimento não pode ter seguimento. A proposta que foi objecto de empate é que tem de seguir os trâmites legais.
O que eu quero, Sr. Presidente, é acentuar que o modo como se pretende votar essa proposta é absolutamente perigoso, isto para não apresentar outra qualificativa melhor.
Reputo absolutamente perigoso que uma lei de processo civil, ou qualquer outra, que está sendo aplicada nos tribunais, seja assim, por uma proposta com urgência e dispensa do Regimento, suspensa, podendo-se assim ir prejudicar alguns dos interêsses em jôgo.
Acho isto absolutamente perigoso, repito, não havendo nas minhas palavras a mais leve sombra de insinuações, que não é do meu carácter.
Presto as minhas homenagens ao apresentante dessa proposta, podendo-lhe garantir que da minha parte não há, repito, a mais leve sombra de insinuações, seja por quem fôr.
O meu desejo, apenas, foi mostrar os perigos que a aprovação desta proposta pode trazer ao País, pois a verdade é que nós dessa forma podemos ir até certo ponto anular inteiramente as funções judiciais não tendo assim mais justiça em Portugal, nem a podendo ter.
Temos que ponderar devidamente êste ponto de vista, e eu digo isto com tanta mais razão quanto é certo que estou aqui falando ùnicamente como Deputado, e não como juiz.
O Sr. Pedro Pita: — Eu devo dizer a V. Ex.ª que não me pronunciei, nem fiz referência alguma a propósito da proposta, pois a verdade é que votarei contra ela.
O que disse é que se não poderia fazer a votação do requerimento feito pelo Sr. Crispiniano da Fonseca, e nada mais.
O Orador: — Estou inteiramente de acôrdo com V. Ex.ª a êsse respeito; porém, o que eu quis foi mostrar os perigos que pode haver aprovando-se essa proposta; no emtanto a Câmara resolverá como melhor entendei.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Sampaio Maia (para explicações). — Sr. Presidente: o Sr. Almeida Ribeiro que é um dos mais distintos magistrados do meu País sabe perfeitamente a muita consideração que tenho sempre por S. Ex.ª e muito respeito que sempre me merecem as suas opiniões em assuntos jurídicos, mas, Sr. Presidente, o que não posso dar como boas são as considerações que S. Ex.ª acaba de fazer.
Se se tratasse de direitos adquiridos à sombra duma disposição legal, perfeitamente de acôrdo, a Câmara teria de pensar maduramente na suspensão dessa lei à sombra da qual se tivessem criado direitos; mas demonstrando eu, como demonstrei, que a tabela contém disposições de carácter processual e a sua publicação representa simplesmente um autêntico abuso do Poder, os direitos que ela criou não são direitos, são pretensos direitos, visto que foram criados à sombra duma pretensa lei, e assim é justo que os não respeitemos.
Sr. Presidente: não estou aqui simplesmente a pôr ora evidência a inconstitucionalidade do decreto n.º 8:436,testou ainda a indicar a necessidade de suspensão imediata dêsse decreto, que reputo ilegal, porque relativamente aos efeitos que já produziu, aos pretensos direitos que já estabeleceu lá estão os tribunais para lhes dar a respectiva sanção.
Não venho pedir a suspensão do decreto desde que apareceu ao Diário do Govêrno;
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venho pedir simplesmente a sua suspensão desde êste momento, porque é reputo absolutamente inconstitucional, não podendo à sua sombra adquirir-se quaisquer direitos.
Era isto, Sr. Presidente, o que eu queria dizer em relação às considerações do Sr. Almeida Ribeiro, a quem aliás muito considero.
Tenho dito.
O Sr. Afonso de Melo (para explicações): — Sr. Presidente: a propósito dêste assunto vou dar à Câmara as explicações que nos termos do Regimento posso dar.
Fui há pouco dos que rejeitaram a proposta do meu ilustre colega e correligionário Sr. Sampaio Maia.
Devo dizer a V. Ex.ª que cada vez me conformo mais com a resolução que tomei, porquanto, embora a mim me não caiba defender sequer o procedimento do Ministro que subscreveu o decreto a que S. Ex.ª se referiu e que foi o Sr. Catanho de Meneses, devo dizer a V. Ex.ª que, pondo-me inteiramente ao lado do Sr. Almeida Ribeiro nas considerações que aduziu no àparte que fez ao Sr. Sampaio Maia, entendo que a constitucionalidade de qualquer artigo de lei, sobretudo quanto se refere a causas pendentes dos tribunais, essa inconstitucionalidade só pode ser julgada por êsses mesmos tribunais.
Independentemente dêste detalhe devo ainda dizer que não reputo realmente êste decreto inconstitucional nem reputo ilegais ás disposições a que S. Ex.ª Se referiu.
A lei que fez alteração nos vencimentos, dos funcionários públicos, quando se referiu a empregados judiciais disse que aqueles que não quisessem optar por qualquer outro vencimento ficariam a receber emolumentos pela nova tabela.
Eu creio que, realmente, foram muito poucos os que usaram dessa faculdade, mas bastava que fôsse um só.
Estabelece-se discussão entre o orador e o Sr. Sampaio Maia.
O Orador: — O que se pode discutir é se o juiz usou ou não do direito de opção. Isso, porém, são casos individuais que qualquer advogado pode tratar nos tribunais, mas que não podem vir aqui tratar-se numa discussão de ordem geral.
Apoiados.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: poucas palavras. Apenas as suficientes para expor a V. Ex.ª a atitude da minoria monárquica neste incidente.
A minoria monárquica entendeu que devia votar a urgência e dispensa do Regimento pedida pelo ilustre Deputado Sr. Sampaio Maia, porque, desde que se fazem acusações graves a membros da magistratura portuguesa, era indispensável, para honra da própria magistratura, que é assunto fôsse urgentemente esclarecido. Pareceu-mos que assim contribuíamos com o nosso voto para o bom nome e prestígio da magistratura portuguesas.
Não quere isto dizer que aprovemos ou que deixemos de aprovar a proposta do Sr. Sampaio Maia.
Desejamos ouvir o Govêrno, desejamos ouvir as explicações do Sr. Ministro da Justiça para depois nos pronunciarmos sôbre o assunto.
Tem razão o Sr. Sampaio Maia? Não a tem? A discussão é que nos habilitará a formular o nosso juízo.
Se votámos a urgência e dispensa do Regimento pedidas, foi apenas para que não ficasse de pé uma acusação grave a um dos poderes do Estado que é digno de todo o respeito e das homenagens mais calorosas.
Foi pena que o ilustre Deputado Sr. Almeida Ribeiro não manifestasse o mesmo ponto de vista que manifestou agora quando da discussão da lei das autorizações, que deu origem a esta carrapata.
A carrapata arranjada pelo Sr. Catanho de Meneses deu estas consequências e há-de dar ainda outras piores. Além disso S. Ex.ª fez ditadura. Aqui o afirmei já, sem que alguém refutasse as minhas afirmações.
Com que direito o Sr. Catanho de Meneses alterou o próprio Código do Processo Civil, estando apenas autorizado a remodelar a tabela de emolumentos e salários judiciais?
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Como foi que, por exemplo, em matéria de citação para execução de custas pôde alterar completamente a lei existente?
Não há, porém, o direito de se dizer que os magistrados se locupletam com os dinheiros dos litigantes.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: — Continua em discussão o orçamento do Ministério do Interior.
O Sr. Afonso de Melo: — Sr. Presidente: está em discussão o capítulo 3.º do orçamento do Ministério do Interior.
O meu ilustre correligionário, Sr. Ferreira de Mira, com a autoridade especial que lhe dá o facto de ser hoje um dos leaders do meu partido, já enunciou aqui em breves palavras a necessidade que tem o Govêrno de não deixar correr ao desamparo em que tem andado a questão da reforma dos serviços públicos.
Eu permito-me insistir nesta nota, que é hoje fundamental para o bom seguimento da administração dos negócios do Estado.
Eu não sou, Sr. Presidente, daqueles que costumam pedir a palavra apenas para tomar tempo ou para dizer cousas já ditas e repisadas nesta Câmara.
Se agora me refiro às afirmações feitas pelo meu ilustre amigo, Sr. Ferreira de Mira, é porque elas realmente têm o alcance que eu me incumbirei de pôr em relevo ao tratar da discussão dêste capítulo, porque elas dalguma maneira significaram que o Partido Republicano Nacionalista tem, acêrca dêstes negócios de administração pública, ideas de remodelação de serviços que muito desejaria que se convertesse em leis dêste país, para que à sombra delas não só se valorizassem pelo Orçamento Geral do Estado as economias que são indispensáveis, mas para que se introduzisse outro espírito de justiça, outra moralidade nos serviços de administração e nos serviços de polícia.
Sr. Presidente: pelo que diz respeito ao capítulo 3.º, que está em discussão, eu não vou evidentemente desfiar estas pequenas e numerosas verbas referentes a cada um dos actos que dizem respeito ao contencioso fiscal e aos govêrnos civis do país.
Sussurro na sala.
O Orador: — Como ou vejo que aos Deputados da nação interessa muito mais continuar a debater em conversas particulares a questão de se saber se de um determinado processo judicial se cobrou ou não o devido emolumento, como estou reconhecendo que isso é muito mais importante do que saber a forma como está elaborado o orçamento do Ministério do Interior, dou por terminadas as minhas considerações.
Noutra oportunidade, em que a Câmara esteja menos nervosa, direi o que tenho a dizer sôbre a reforma da organização dos serviços administrativos e de segurança do Ministério do Interior.
O Sr. Sampaio Maia (para explicações): — Sr. Presidente: pedi a palavra para explicações pelo seguinte motivo:
Apresentei à Câmara um negócio urgente e requeri a presença do Sr. Ministro da Justiça para dêsse negócio urgente me ocupar.
Suponho que é um assunto de relativa importância, um assunto de alta moralidade e não qualquer futilidade.
Nestas circunstâncias, estranho que o Sr. Ministro da Justiça, estando presente, não tivesse uma única palavra para opor às minhas considerações.
Apoiados.
Feita esta explicação, nada mais tenho a dizer.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: ouvi com a maior atenção as palavras que acaba de pronunciar o ilustre Deputado Sr. Sampaio e Maia.
Era e é ainda minha intenção responder a S. Ex.ª
Simplesmente, tendo-se procedido a uma votação que ficou empatada, eu aguardava e aguardo o seu desempate para então responder como me cumpre às considerações do ilustre parlamentar...
O Sr. Sampaio e Maia: — V. Ex.ª refere-se à minha proposta, mas a verdade é que eu tratei também do assunto em «negócio urgente», e V. Ex.ª a êle se não referiu.
O Orador: — Como a proposta se relaciona íntimamente com o assunto do «ne-
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gócio urgente», não vejo que o meu silêncio possa representar menos consideração pelo Sr. Sampaio Maia.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — O Grupo Parlamentar Democrático indica para substituir o Sr. Portugal Durão na comissão de marinha o Sr. Carlos Pereira.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Concordando em absoluto com as considerações feitas pelos ilustres Deputados que me precederam no uso da palavra, os Srs. Ferreira de Mira e Afonso de Melo, relativamente à necessidade de se remodelarem os serviços públicos, nomeadamente à necessidade de reduzirem os respectivos quadros, eu limitar-me hei a formular uma pregunta ao Sr. Ministro do Interior.
Nas várias declarações ministeriais que S. Ex.ª leni feito na sua qualidade de Chefe do Govêrno, o Sr. Presidente do Ministério tem anunciado com insistência a publicação dum novo Código Administrativo, dando assim cumprimento a uma taxativa disposição constitucional, que tem sido sistematicamente desprezada pelos Govêrnos da República.
Quando é pois que S. Ex.ª se resolve a apresentar o novo Código Administrativo?
Refere-se também o capítulo em discussão à Imprensa Nacional.
A Imprensa Nacional não satisfaz à missão que lhe compete.
Haja em vista, por exemplo, o que sucede quanto às publicações oficiais do Parlamento.
A Câmara não ignora que, apesar de estarmos a mais de cinco meses do novo período legislativo, até hoje ainda não foi iniciada a publicação dos Diários das Sessões, relativos a êste período!
A publicação que aliás não é feita por ordem, ainda vai na altura das sessões de Julho do ano passado!
E evidentemente que a culpa só se pode atribuir à Imprensa Nacional.
De resto, não se compreende que uma publicação desta natureza e desta importância, especialmente depois de suprimida a publicação do Sumário, esteja tam atrasada.
Não há maneira de qualquer parlamentar poder saber o que se passou em determinada sessão a que não assistiu ou sequer recordar o que disse em certa ocasião.
A Imprensa Nacional aplica muito do seu pessoal à indústria lucrativa, com preterição completa das publicações oficiais.
Chamo a atenção do Sr. Presidente do Ministério para êste assunto.
Tenho dito.
O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: não obstante não poder mandar nesta altura qualquer proposta para a Mesa que traga aumento de despesa, não deixarei, contudo, de lastimar que estando em discussão o capítulo 3.º do orçamento do Ministério do Interior, eu veja que os funcionários dos govêrnos civis continuam na mesma situação em que têm estado há longos anos.
A minha intervenção neste assunto, mais não representa do que um protesto contra a demora que há na votação do projecto de lei, que aprovados já nesta casa do Parlamento dormem o sono dos justos na outra Câmara.
Efectivamente, por um espírito de coerência é que eu fui obrigado a intervir na discussão do Orçamento, porque fui o Deputado que pediu, há longos meses, que entrasse em discussão uns pareceres que estavam há muito na Mesa e que beneficiavam os funcionários dos govêrnos civis, os únicos que não têm tido aumentos de vencimentos, tendo a Câmara reconhecido a justiça dêsses pareceres aprovando-os. Mas foram encravados, no Senado, embora ali chegassem a entrar em discussão a pedido do Sr. Presidente do Ministério.
Tudo assim só passou, e agora verifico que no orçamento do Ministério do Interior os funcionários dos govêrnos civis ficam na mesma situação.
Eu estou inibido de mandar para a Mesa qualquer proposta de aumento de despesa, porque o Sr. Presidente do Ministério não a aceita.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Perdão. Não é o Presidente do Ministério, porque êle não é ditador. É a lei-travão.
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O Orador: — É a lei-travão que se opõe, mas eu desejaria ter visto que da parte das criaturas que elaboraram o Orçamento não tinha havido omissão do aumento que foi votado nesta Câmara e que, não sei porquê, o Senado deixou de votar.
Apresento, pois, o meu protesto contra o esquecimento a que foi votado um projecto de lei aprovado nesta Câmara, e que, desde 1919, tinha pareceres favoráveis.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: pedi a palavra ùnicamente para responder às considerações feitas por alguns ilustres Deputados a propósito do capítulo 3.º, e até, sem ofensa para o Sr. Cancela de Abreu, a despropósito do capítulo 3.º
Todavia, como todos merecem igual consideração, vou responder a S. Ex.ªs
Não se pode, evidentemente, apresentar durante a discussão do Orçamento qualquer proposta que traga aumento de despesa, porque as disposições da lei-travão são bom expressas a êsse respeito.
Não é, pois, por má vontade da minha parte, mas os Srs. Deputados têm na devida oportunidade maneira de conseguir êsses aumentos, fazendo passar os projectos que estão pendentes das duas casas do Congresso.
Relativamente ao Sr. Ferreira de Mira, devo dizer, que tenho feito tudo quanto é possível, dentro da legislação vigente.
Assim, todas as vagas que se têm dado nos govêrnos civis tenho-as feito preencher pelos empregados adidos, embora, para muitos deles, a deslocação de localidade represente grande prejuízo.
Já se suprimiram vários lugares no Ministério do Interior e mais se poderão suprimir, desde que se completem os trabalhos da comissão encarregada de reorganizar os serviços públicos.
Infelizmente, creio que as reuniões não têm sido muitas, porque, segundo parece, vários Srs. parlamentares a elas têm faltado. E, aproveitando o ensejo, quero lembrar a conveniência de S. Ex.ª, quando não possam comparecer, se façam substituir por pessoas do mesmo Partido, não se dando assim à opinião pública a impressão de que nada se produz.
Sr. Presidente: a lei n.º 971 é um travão em relação a muitos lugares públicos, mas não é suficiente para outros, do que resulta estabelecer-se uma desigualdade de proceder, que, a eternizar-se a reorganização dos serviços, em muito lesará os interêsses do Estado.
Falou o ilustre Deputado Sr. Cancela de Abreu do projecto referente, ao Código Administrativo.
Há uma comissão de pessoas competentes, pessoas que já têm dado provas da sua competência, para elaborar uma proposta para obviar, às dificuldades que há na legislação vigente, dificuldades até em matéria eleitoral.
Sr. Presidente: estou convencido que em breve será presente a esta Câmara um trabalho nesse sentido; mas, se não fôr, convidarei duas ou três pessoas idóneas para que a apresentação dum documento tam importante não se faça demorar.
Eram estas as considerações que eu tinha a fazer em resposta aos ilustres Deputados.
Foi aprovado o capitulo 3.º
O Sr. Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Aprovaram 49 e rejeitaram 8 Srs. Deputados.
Foi aprovado.
Entrou em discussão o capítulo 4.º
O Sr. Pedro Ferreira: — Bastantes dias se passaram depois que o Sr. Barros Queiroz, nosso ilustre correligionário, pronunciou nesta Câmara um notável discurso sôbre o Orçamento do Estado, e ainda eu tenho nos meus ouvidos as ásperas censuras dirigidas por S. Ex.ª aos Ministros que não quiseram ou não tiveram a coragem de fazer nos respectivos Orçamentos os cortes impostos pela moralidade e pela desgraçada situação financeira era que o País se encontra.
O Sr. Ministro das Finanças diz no início do seu relatório, no relatório que an-
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tecede o Orçamento Geral do Estado, que a época é de excepcional gravidade.
Mas como procede o Govêrno em presença dessa gravidade?
Que economias fez para a debelar?
Não faz aquelas que mais se impõem, e por isso nem o Sr. Vitorino Guimarães, nem os Srs. Deputados da maioria que têm tomado parte na discussão do Orçamento conseguiram destruir nenhum dos argumentos do ilustre financeiro, que pelo seu saber, pelo seu grande carácter, pelo seu talento e pelo seu acendrado patriotismo é uma das mais legítimas glórias do Partido Nacionalista, e um dos «republicanos que mais se têm esforçado para que a República em Portugal seja aquele sistema político ideal sonhado por S. Ex.ª no tempo das suas veementes campanhas contra a monarquia.
O Sr. Ministro das Finanças queixa-se no relatório a que aludi já do pessimismo dos portugueses, dêsse pessimismo que parece classificar de doentio e de antipatriótico.
A culpa de tal pessimismo cabe ùnicamente aos homens que administram pela forma condenável que está bem evidente neste capítulo.
Sim, Sr. Presidente, no capítulo em discussão, está claramente evidenciado o desregramento administrativo do actual Govêrno.
Na ocasião em que o Sr. Vitorino Guimarães diz:
«Ao Parlamento, ao Govêrno, a todos, senil distinção de hierarquias nem de classe — o consenso geral impõe uma única e principal preocupação — reduzir as despesas e aumentar as receitas até à extinção do deficit que nos asfixia», o Sr. Ministro do Interior arbitra para a segurança pública a bagatela de 26:209. 292$, dos quais 20:299. 871$64 são absorvidos pela Guarda Nacional Republicana.
Há cêrca de um ano, o País inteiro reclamou a redução da Guarda Nacional Republicana e o Sr. Ministro do Interior, que a princípio pareceu disposto a satisfazer essa exigência da opinião pública, que se impunha tanto pelo lado económico, como por outras razões, em certa altura mudou do orientação e a redução da Guarda Nacional Republicana não teve a largueza reclamada.
Depois essa redução nem sequer podia ser apelidada de violenta e não o podia ser, porque eu sei que há muitos soldados da Guarda Nacional Republicana que desejam voltar para os seus lides rurais, onde, sem dúvida, seriam mais prestantes à sociedade e onde receberiam melhor remuneração.
Para que a Câmara avalie, nesta ocasião de excepcional gravidade, o critério que presidiu à redução da Guarda Nacional Republicana, basta dizer-se que a banda de música do Comando Geral se compõe de cento e dez figuras, custando ao Estado 444 contos por ano.
Ora, eu devo dizer à Câmara que a banda da Guarda Nacional Republicana, que se compõe, como disse, de cento e dez figuras, é tam grande que não é ouvida pelo público, pois que não há em Lisboa coreto onde ela caiba.
Apenas toca aos sábados na parada do Quartel do Carmo, onde é ouvida por um número muito limitado de pessoas, visto que os comerciantes ou industriais, os empregados ou operários não estão disponíveis ao sábado para a ir ouvir.
A melhor banda da Europa, que é a da Guarda Nacional Republicana de Paris, compõe-se de setenta e duas figuras e as orquestras sinfónicas, tanto estrangeiras como nacionais, não têm mais do que êste número de executantes.
Êste caso que venho de apontar é verdadeiramente escandaloso.
Êle não representa só um luxo incompatível com a nossa situação financeira, mas uma prodigalidade que toca as raias da loucura.
Ao mesmo tempo que isto sucede, as bandas regimentais compõem-se de vinte e oito figuras e, em regra, nunca estão completas.
O povo de Lisboa não ouve a música da Guarda, porque os músicos são muitos, e tanto êle como o da província não ouvem as bandas do exército, porque estas têm músicos de menos.
Pelas razões que acabo de expor, vou mandar para a Mesa uma proposta reduzindo o número de músicos da banda da Guarda de cento e dez para setenta e dois.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Pe-
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dro Ferreira, a fim de ser consultada a Câmara sôbre a sua admissão.
Foi admitida.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se a admissão da proposta.
Foi admitida.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: — Estão sentados 45 Srs. Deputados, e levantados 4.
Não há número e, nos termos do Regimento, vai proceder-se à chamada, mas antes tenho que prevenir os Srs. Deputados que amanha há sessão nocturna.
Procede-se à chamada.
Responderam os Srs.:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amaro Garcia Loureiro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António Mendonça.
António Resende.
Artur Brandão.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
Francisco Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
aime Júlio de Sousa.
João José Luís Damas.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Serafim de Barros.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José Pedro Ferreira.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
O Sr. Presidente: — A ordem dos trabalhos da sessão de amanhã é a seguinte:
Antes da ordem do dia:
A de hoje e parecer n.º 225 que fixa o ordenado das praças da guarda fiscal.
A ordem da noite são os orçamentos dos Ministérios do Interior, Comércio e Guerra.
A sessão nocturna é às 21 horas e meia.
Está levantada a sessão.
Eram 19 horas e 5 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Projecto de lei
Do Sr. Américo Olavo, criando no Funchal um juízo criminal para instrução e julgamento de crimes, transgressões e contravenções praticadas na comarca.
Para o «Diário do Govêrno».
Pareceres
Da comissão de marinha, sôbre o n.º 294-C, que determina que o quantitativo da pensão de invalidez, não entre em li-
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nha de conta no cálculo dos salários dos mutilados e estropiados da guerra ou do trabalho, no regresso ao exercício profissional.
Para a comissão de finanças.
Da comissão de finanças, sôbre o n.º 393-A, que aumenta os subsídios de embarque e auxílio para rancho referidos nas tabelas n.ºs 4 e 10 do decreto n.º 5:571, de 10 de Maio de 1919.
Imprima-se.
Declaração devoto
Declaro que se tivesse comparecido ontem nesta Câmara e assistido ao debate suscitado em negócio urgente por um Sr. Deputado sôbre uns decretos do Poder Executivo, sôbre os chamados lucros excessivos, teria procurado intervir no debate para protestar contra esse abuso do Poder, visto que o decreto de 21 de Março é um diploma manifestamente inconstitucional porquanto só o Poder Legislativo tinha competência para estatuir sôbre a matéria.
Não me associarei, nem pelo meu silêncio, a semelhante abdicação das prorrogativas do Parlamento.
Por isso, desejo que êste meu protesto fique consignado na acta.
Sala das sessões, 11 de Abril de 1923. O Deputado, Alberto Xavier.
Para a acta.
Nota de interpelação
Declaro que desejo interpelar o Sr. Ministro da Marinha acêrca do contrato realizado, por S. Ex.ª em 6 de Junho de 1916 mediante o qual o Estado recebeu para seu serviço temporário da Emprêsa Nacional de Navegação o vapor Malange, entregando esta nas mesmas condições o vapor Estremadura. — Aníbal Lúcio de Azevedo.
Expeça-se.
Requerimentos
Requeiro que, se comunique ao Ministério das Finanças, de harmonia com a minha comunicação anterior, que devido à intensidade dos trabalhos parlamentares aos quais desejo continuar a prestar acídua colaboração, não poderei comparecer nesse Ministério para o exercício dos cargos de secretário geral e director geral da Fazenda Pública. — Alberto Xavier.
Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério do Comércio, me seja autorizado examinar todos os documentos concernentes à forma de utilização do crédito de 3 milhões de libras aberto em meados de 1922 em Londres pela repartição do prémio britânico Export Credit Department. — Alberto Xavier.
Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério do Comércio e Comunicações (administração geral dos correios e telégrafos), me seja fornecida com a maior urgência cópia do telegrama, em 17 de Fevereiro de 1928, pela comissão central de execução de lei da separação, ao presidente da comissão dos bens das igrejas de Alijó, com indicação do dia em que foi recebido pelo Ministério.
Sala das sessões, 11 de Abril de 1923 — O Deputado, Pedro Pita.
Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me seja fornecida cópia de todos os documentos, mesmo confidenciais, referentes à demissão do ex-capitão de infantaria de reserva Júlio Afonso Vieira da Cruz. — Tavares de Carvalho.
Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, me seja autorizado examinar todos os documentos relativos ao acôrdo Bemelmans a que Portugal aderiu pelo seu Govêrno em Outubro de 1922; toda a correspondência trocada entre êsse Ministério o os delegados portugueses, junto da comissão de reparações e ainda todos os contratos ou propostas de contratos sôbre a execução dêsse acôrdo no tocante aos interêsses portugueses. — Alberto Xavier.
Expeça-se.
Requeiro novamente que, pelo Ministério do Comércio, me sejam enviados, com toda a urgência, os seguintes documentos:
1.º Cópia do contrato relativo à emissão de 2. 849:300 selos comemorativos da travessia aérea do Atlântico;
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2.º Cópia das alterações que, porventura, tenham sido introduzidas no mesmo contrato;
3.º Indicação do número de selos que deram entrada na Casa da Moeda;
4.º Indicação do número de selos que foram postos à venda pela Direcção Geral dos Correios;
5.º Indicação do número e valor dos selos que foram vendidos pela referida Direcção Geral;
6.º Cópia de toda a correspondência relativa ao assunto. — Paulo Cancela de Abreu.
Expeça-se.
Desejando tratar, em negócio urgente, do acôrdo provisório, assinado pelo Ministro da Inglaterra e o Alto Comissário de Moçambique, para a manutenção da primeira parte da convenção entre a província de Moçambique e a União Sul Africana, requeiro:
1.º A remessa pelo Ministério das Colónias, com a maior urgência, da cópia do referido acôrdo;
2.º A autorização para examinar no Ministério das Colónias: a) toda a correspondência ordinária e confidencial e mais documentos referentes ao citado acôrdo; b) toda a correspondência trocada entre o Ministro, Alto Comissário e encarregado do Govêrno desde 15 de Março passado.
Independentemente da remessa da cópia do acôrdo desejo também ser autorizado a examinar no Ministério das Colónias o documento original do mencionado acôrdo provisório. — Álvaro de Castro.
Espeça-se.
O REDACTOR — Sérgio de Castro.