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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 69
EM 26 DE ABRIL DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Afonso de Melo Pinto Veloso
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. — Abre a sessão com a presença de 43 Srs. Deputados.
É lida a acta, que adiante é aprovada com número regimental.
Dá-se conta do expediente.
É admitido um projecto de lei, já publicado no «Diário do Govêrno».
Antes da ordem do dia. — O Sr. António Maio, pregunta se o Sr. Ministro da Guerra já se deu por habilitado para responder à sua interpelação. O Sr. Presidente responde não haver informação na Mesa.
O Sr. Ministro da Marinha (Azevedo Coutinho) apresenta uma proposta de lei, estabelecendo um prémio para a aviação. Pede urgência è dispensa do Regimento, que são concedidas. É aprovado, tendo usado da palavra o Sr. Paulo Cancela de Abreu, sendo dispensada a última redação.
O Sr. Ministro da Justiça (Abranches Ferrão) manda para a Mesa uma proposta de lei de abertura de crédito extraordinário, pedindo urgência e dispensa do Regimento, que são concedidas. É aprovado, sendo dispensada a última redacção.
Em negócio urgente, o Sr. Vasco Borges trata do assalto ao Grémio Literário como casa de jôgo, terminando por enviar para a Mesa um projecto de lei, para que requere urgência. Responde o Sr. Presidente do Ministério (António Maria da Silva), usando em seguida da palavra, para explicações, os Srs. Carlos Borges e Carlos de Vasconcelos.
É rejeitado que o Sr. Leote do Rêgo, em negócio urgente, trate da questão Sul-Africana e de outros assuntos de carácter internacional.
Entra em discussão o parecer n.º 426, criando lugares de segundos comandantes da guarda republicana e regulando a forma de promoção dos primeiros cabos da mesma guarda. Usa da palavra o Sr. Pedro Pita, a quem responde o Sr. Presidente do Ministério, que termina enviando propostas de artigos novos.
É concedida a urgência para o projecto de lei do Sr. Vasco Borges.
Ordem do dia. — O Sr. Pedro Pita requere que continue em discussão o parecer n.º 426, com prejuízo da ordem do(dia. O requerimento é rejeitado, havendo contraprova
O Sr. Pedro Pita requere a prorrogação da sessão até se votar a proposta de alteração do Regimento.
O requerimento é aprovado.
O Sr. José Domingues dos Santos requere que a sessão também seja prorrogada, em seguida, para o parecer referente à guarda republicana, requerimento que em seguida retira, sendo perfilhado pelo Sr. Pedro Pita.
Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, António Fonseca, Pedro Pita e Paulo Cancela de Abreu.
Procedendo-se à votação do requerimento do Sr. Pedro Pita, verifica-se não haver número, e procede-se à chamada.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para as 21 horas.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Substituïções em comissões — Projecto de lei. — Pareceres.
Abertura da sessão às 10 horas e 25 minutos.
Presentes 43 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 37 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.

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Diário da Câmara dos Deputados
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Ferreira Vidal.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Abranches Ferrão.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Sousa Maia.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João de Sousa Uva.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Joaquim Gomos de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Pedro Ferreira.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano Martins.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Vasco Borges.
Viriato Gomes da Fonseca.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Alberto Moura Pinto.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Lino Neto.
Armando Pereira de Castro Lança.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferrreira de Matos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Francisco Cruz.
Hermano José de Medeiros.
João Estêvão Águas.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Serafim de Barros.
José António de Magalhães.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Não compareceram os Srs.:
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Correia.
António Dias.
António de Paiva Gomes.
António Resende.

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Sessão de 26 de Abril de 1923
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Joaquim Alvos dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado Freitas.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rogo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João Vitorino Mealha.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófito Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Às 15 horas principiou-se a fazer a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 43 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Leu-se a acta, que adiante foi aprovada com número regimental.
Dá-se conta do seguinte
Expediente
Pedidos de licença
Do Sr. António Correia, 2 dias.
Do Sr. Henrique Monteiro, 2 dias.
Do Sr. Júlio de Abreu, 15 dias.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Ofícios
Do 4.º juízo de investigação criminal de Lisboa, pedindo autorização para o Sr. Vasco' Borges depor como testemunha.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Da viúva do ex-Deputado Sr. José de Azevedo Castelo Branco, agradecendo o voto de sentimento pelo seu falecimento.
Para a Secretaria.
Telegramas
Da comissão vigilante, do Funchal, pedindo providências contra o prosseguimento do jôgo em 8 casas.
Para a Secretaria.
Do professorado primário do Carregai do Sal, Azambuja, Beja e Aveiro, pedindo para não ser excluído da actual melhoria de vencimentos.
Para a Secretaria.

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Diário da Câmara dos Deputados
Das Juntas de Freguesia de Mira, Agra, Freixiando, Parceiros, Barosa, Fermente-los, Abade Neiva, Campo, Visconde de S. Sebastião, Fernando Correia, José Gomes, Francisco de Almeida Teixeira, João Lopes Gomes, de Leiria, Centro Católico e Arcipreste de Barcelos, Fiéis de Alpedriz (Batalha), povo de Aljubarrota, pedindo liberdade de ensino religioso.
Para a Secretaria.
Dos Srs. Francisco Maria Félix, Ernesto Sena, Honorato Monteiro e J. Magno, de Santarém, pedindo liberdade de ensino religioso.
Para a Secretaria.
Do professorado primário de Santarém, pedindo prazo para não ser excluído da melhoria de vencimentos.
Para a Secretaria.
Carta
Do Sr. Vitorino Godinho, pedindo para ser substituído na comissão de finanças. Para a Secretaria.
Admissão
É admitido um projecto de lei do Sr. Carlos Eugénio de Vasconcelos, reorganizando a classe dos artífices do exército e remodelando as respectivas oficinas.
Para a comissão de guerra.
Antes da ordem do dia
O Sr. António Maia (para interrogar a Mesa): — Peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o favor de me informar se o Sr. Ministro da Guerra já se deu por habilitado a responder à minha interpelação.
O Sr. Presidente: — Não há na Mesa comunicação alguma nesse sentido.
O Sr. António Maia: — Muito obrigado a V. Ex.ª
O Sr. Ministro da Marinha (Vítor Hugo de Azevedo Coutinho): — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de lei, para a qual peço urgência e dispensa do Regimento.
Trata-se de distribuir pela aviação marítima o prémio de 20. 000$ que, nos termos do decreto n.º 5:787-MMM, é destinado ao aviador português ou brasileiro que primeiro consiga fazer a travessia aérea de Lisboa ao Rio de Janeiro.
Como se suscitaram dúvidas na aplicação do decreto, apareceu uma proposta dos aviadores Gago Coutinho e Sacadura Cabral para que aquela verba fôsse distribuída pelo pessoal da aviação marítima.
Os considerandos da proposta que apresento são suficientemente elucidativos, e se durante a discussão fôr necessário prestar quaisquer esclarecimentos, usarei da palavra.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Proposta de lei
Senhores Deputados. — O decreto n.º 5:787-MMM, de 10 de Maio de 1919, determina no seu artigo 1.º que seja conferido um prémio de 20. 000$ ao primeiro aviador militar português ou brasileiro que efectuar a travessia aérea entre Lisboa e o Rio de Janeiro em 168 horas;
Atendendo a que se pode interpretar o mesmo artigo no sentido de considerar essas 168 horas como duração de toda a viagem entre os pontos extremos o que leva a negar aos aviadores que a realizaram o direito de lhes ser conferido o referido prémio;
Considerando, porém, que as consequências de tal travessia foram as mais lisonjeiras para o País e que o pessoal da aviação marítima muito concorreu para os resultados obtidos sendo de justiça que se recompense quem tam esforçadamente contribuiu para que o glorioso feito fôsse levado a cabo:
Considerando finalmente a proposta que pelos mesmos aviadores foi apresentada ao Ministro da Marinha:
Tenho a honra de submeter à vossa esclarecida apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.º O prémio de 20. 000$ estabelecido pelo artigo 1.º do decreto n.º 5:787-MMM, de 10 de Maio de 1919, será entregue à Direcção da Aeronáutica Naval, que o distribuirá pelo pessoal da aviação marítima, nos termos da proposta apresentada pelo almirante Gago Coutinho e capitão de fragata Sacadura Cabral.

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Sessão de 26 de Abril de 1923
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
Ministério da Marinha, 12 de Abril de 1923. — O Ministro da Marinha, Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Ministro da Marinha, bem como a proposta apresentada na generalidade.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: pedi a palavra, não para fazer reparos ao requerimento do Sr. Ministro da Marinha, visto que se trata dum assunto que é digno da atenção da Câmara.
Desde que se verifica que o objecto da recompensa é pràticamente impossível de conseguir, evidentemente que a lei em vigor nenhuma utilidade tinha, tendo, portanto, de ser modificada.
Porém, como os dois heróicos aviadores vieram pedir ao Sr. Ministro da Marinha para que essa verba seja aplicada à aviação marítima, parece-me que devemos corresponder a êsse rasgo de generosidade, votando a proposta, a que êste lado da Câmara de todo o seu aplauso.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovada na especialidade a proposta sem discussão.
O Sr. António Maia (para um requerimento): — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de lei, abrindo no Ministério das Finanças, a favor do Ministério da Justiça, um crédito de 1:280. 000$, para acudir à situação aflitiva em que se encontram vários estabelecimentos penais.
Esta verba destina-se a pagar despesas já feitas e a evitar que parem vários serviços que não podem nem devem parar, obviando-se assim a uma situação que não se pode prolongar por muitos dias.
Requeiro, pois, para a proposta, a urgência e dispensa do Regimento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento para a proposta apresentada pelo Sr. Ministro da Justiça.
É a seguinte:
Senhores Deputados. — De há muito que a Administração e Inspecção Geral das Prisões vem trazendo até mim um sem número de reclamações sôbre as dificuldades com' que lutam os estabelecimentos prisionais e de protecção a menores para se sustentarem em face da exiguidade das verbas que lhes estão distribuídas, as quais, na sua maioria, se encontram já esgotadas, ou a caminho disso, achando-se os referidos estabelecimentos na emergência de terem de viver de crédito, ou falharem por completo a sua missão.
Um dia é a Manutenção Militar que suspende abruptamente o fornecimento de pão à Cadeia Nacional de Lisboa, porque êste estabelecimento penal lhe não satisfez em dia as suas requisições e tem já, dê meses atrasados, deficits avultadíssimos cuja liquidação se vai retardando e agravando, mais e mais. por maneira a não se descortinar possibilidade de pôr em dia as respectivas contas.
Outro, a própria Inspecção das Prisões que, nos seus relatórios e informações de toda a hora, me denuncia dificuldades e falhas de administração em uns e outros daqueles estabelecimentos, motivados pela provada impossibilidade de se poderem tomar medidas económicas de alcance dentro das reduzidas e apertadas dotações dos seus variados serviços; e, ainda outros, os próprios credores de um ou outro dêsses mesmos estabelecimentos, que, enfadados com as delongas da liquidação das suas contas recorrem ao próprio Ministro para êste ordenar imperativamente às direcções que ponham termo a semelhante estado de cousas, reembolsando-os daquilo que lhes é devido.
E, porque uma tal situação bem merecesse da parte do Ministro da Justiça cuidada atenção e estudo, por maneira a poder tomar-se uma providência de carácter geral que sanasse tam incomportáveis males, ordenei que à situação financeira de cada um dêsses estabelecimentos fôsse feito um inquérito sumário a fim de se conhecer com exactidão a respectiva posição económica, havendo-se chegado afinal ao apuramento concreto de que de deficits prováveis dêsses mesmos estabelecimen-

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Diário da Câmara dos Deputados
tos até o fim do actual ano económico se traduzirão, quanto menos, pelas cifras seguintes:
[Ver valores da tabela na imagem]
Escola Correccional de Reforma de Lisboa
Escola Penal de Reforma do Pôrto
Colónia Agrícola, Correccional de Vila Fernando
Cadeia Civil do Pôrto
Colónia Penal Agrícola de António Macieira
Cadeia Nacional de Lisboa
Idem
Prisão — oficina de Coimbra Cadeia Civil de
Lisboa
Idem
Escola de reforma para o sexo feminino
Escola Industrial de Reforma de S. Fiel
Escola Agrícola de Izeda
Refúgio da Tutoria de Lisboa
Refúgio da Tutoria do Pôrto
Despesas concernentes aos presos internados nas cadeias comarcas, do continente
Idem nas cadeias das ilhas adjacentes
Ou sejam 1:050. 000$.
É esta a situação pelo que respeita às dotações dos estabelecimentos prisionais, correccionais e de protecção a menores.
Não é, porém, menos angustiosa a situação em que se encontra o Ministério da Justiça para poder satisfazer encargos já realizados e a realizar com transporte de degredados que, nos termos legais, têm de seguir o seu destino, e ainda pelo que se refere à remoção de presos no continente, visto que as verbas inscritas no orçamento são absoluta e manifestamente insuficientes para tais encargos como consequência do constante aumento de tarifas, tanto nos transportes marítimos como ferroviários,
Destas circunstâncias resulta a inadiável necessidade de reforçar as respectivas verbas orçamentais pela seguinte forma:
[Ver valores da tabela na imagem]
Capítulo 6.º artigo 20.º — Cadeias concelhias e transportes de degredados e vadios
Transportes de presos em caminhos de ferro do Estado
Idem em caminhos de ferro não pertencentes ao Estado
Nestas circunstâncias tenho a honra de apresentar à Câmara a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.º É aberto no Ministério das Finanças, a favor do Ministério da Justiça e dos Cultos um crédito especial de 1:280. 0000 dos quais 20. 0000 são destinados à remoção de presos nos caminhos de ferro do Estado, e 10. 0000 para idêntico encargo em caminhos de forro não pertencentes ao Estado, rubricas estas todas pertencentes ao capítulo 6.º, artigo 20.º, do Orçamento do Ministério da Justiça para o actual ano económico; e a de 1:050. 0000 a adicionar à dotação inscrita no capítulo 2.º de despesas extraordinárias do mesmo orçamento com aplicação a suprir os deficits das despesas de material e diversos de todos os estabelecimentos prisionais, correccionais e de protecção a menores.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
O Ministro da Justiça e dos Cultos, António de Abrenches Ferrão — O Ministro das Finanças, Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
O Sr. Carlos Pereira: — Requeiro a dispensa da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Vasco Borges: — Sr. Presidente: em primeiro lugar agradeço à Câmara a amabilidade que teve em consentir que em negócio urgente tratasse mais uma vez da questão do jôgo, assim como agradeço ao Sr. António Mendonça a sua amabilidade.
Sr. Presidente: eu disse que iria ocupar-me de um caso conhecido, o desencerramento do Grémio Literário.
Pode parecer à primeira vista que o caso não tem importância.

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Trata-se de um caso suscitado a propósito da questão da repressão do jôgo, procurando-se enfraquecer a autoridade que fez encerrar as casas de jôgo e inutilizar o homem público que tratou dêsse caso, procurando acabar com a crápula, o vício e o crime que campeavam em liberdade na cidade de Lisboa.
Sr. Presidente: muito ràpidamente vou expor os factos.
O Grémio Literário é, como toda a gente sabe, uma associação que existe em Lisboa, frequentada pela melhor gente, pelas pessoas mais categorizadas no nosso meio.
A polícia entrava ali todas as noites e por mais de uma vez, e nunca verificou que ali se jogasse.
Mas sucedeu que numa dessas noites, há dois dias, a polícia entrou na cozinha e encontrou dois moços, dois espanhóis, dois galegos, que para ali tinham vindo do Clube dos Patos, os quais estavam jogando.
Sendo comunicado o caso para o Govêrno Civil, os homens foram presos e condenados, pois responderam ontem.
Êstes dois galegos estavam no Grémio há pouco tempo, desde que foi encerrado o Clube dos Patos.
Como constasse que se estava jogando no Grémio Literário, logo uma comissão de batoteiros procurou o Sr. Governador Civil dizendo que, se estavam encerradas as casas de jôgo, também tinha de ser encerrado o Grémio Literário.
Toda a gente sabe que eu tenho a honra de ser sócio dessa agremiação, e que a frequento assiduamente; e assim, fechada essa agremiação por lá se jogar, dir-se-ia que eu não tinha autoridade para pedir a repressão, pretendendo-se desta forma anular a acção da autoridade (Apoiados] que eu poderia ter em protestar contra o jôgo (Apoiados), pois não ora justo nem legítimo encerrar umas e não outras casas por influência minha.
Sr. Presidente: devo dizer, a V. Ex.ª que no Grémio Literário não se joga o jôgo de azar (Apoiados), o que pode ser confirmado pelos Srs. Vergílio Costa e Carvalho da Silva.
Por minha honra posso afirmar que no Grémio Literário não se ioga o jôgo de azar.
Apoiados.
E permitido qualquer sócio jogar jôgo lícito, e só isso.
E verdade que em tempos jogou-se lá jôgo de azar, más isso só era permitido aos sócios; mas hoje, com a presente direcção, não é permitido, e sendo a maioria dos sócios contrários a êsse jôgo, êle não existe ali.
Sr. Presidente: não me amordaçam!
Eu já tive ameaças de morte, e nem por isso deixei de fazer a minha vida habitual; mas se amanhã eu fôr objecto de qualquer atentado, é aos donos das casas de batota, que têm assassinos a sôldo, que se devem pedir responsabilidades.
Apoiados.
Não quero neste momento falar sôbre a sentença que tiveram os dois galegos.
Êles afirmaram quê jogavam o solo, e a polícia afirmava que jogavam a pedida.
Não quero discutir êste ponto, porque não conheço a nomenclatura dos jogos> mas fôsse qual fôsse o jôgo, o que não se podia era encerrar essa casa, visto que a direcção não podia ser responsável por aquilo que tinham praticado dois galegos seus serventuários.
Vou terminar as minhas considerações, convencido de que elas não são ociosas.
Eu cheguei à conclusão de que é necessário que ninguém se deixe intimidar com as coacções, com os trucs e ameaças dos batoteiros, que só têm o objectivo de entravar a acção das autoridades e da justiça.
Vou enviar para a Mesa um projecto de lei, que estou certo cairá no ânimo de toda a Câmara, porque se trata de uma obra que se tem de fazer, para evitar essa série de crimes a que todos os dias assistimos, e que têm por causa o jôgo.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: o Sr. Vasco Borges chamou a minha atenção para o facto de a polícia ter encerrado o Grémio Literário, frisando que a direcção dessa instituição nada tem com os actos praticados poios seus serventuários, e sem o seu conhecimento.

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Diário da Câmara dos Deputados
Por todos os motivos, e ainda por terem os empresários das casas de jôgo procurado o chefe do distrito, para pedirem a reabertura das casas de jôgo, eu estou convencido de que hoje não se joga.
Aproveitaram êsses senhores o ensejo para justificarem o seu pedido porque no Grémio Literário se jogava e continuava aberto.
Eu devo dizer que não tenho a mais pequena dúvida em acreditar que nessa sociedade £e não joga.
O Sr. Vasco Borges não tem de se justificar; a sua situação de parlamentar, muito distinta que é, o põe ao abrigo de qualquer suspeita.
Mas o facto de determinados serviçais terem quebrado o respeito que deviam à instituição que os mantinha, jogando numa dependência reservada nos termos previstos pela lei, não implica a mais ligeira responsabilidade dos indivíduos que fazem arte da mesma instituição. De resto o caso do Grémio Literário não pode ter qualquer espécie de confronto com outros que são do nosso conhecimento, e onde existem os chamarizes aos incautos.
Apoiados.
As casas onde se jogava ilicitamente continuarão encerradas, estando eu no firme propósito de mandar encerrar ainda todas aquelas onde se provar, que o jôgo ilícito se exerce.
E esta a resposta que eu tenho a dar ao ilustre Deputado Sr. Vasco Borges, que, honrando-me com a sua velha amizade, quis ter a gentileza de me mostrar alguns dos artigos que fazem parte do projecto que há pouco apresentou à Câmara.
Efectivamente muitas das suas disposições preenchem uma lacuna do Código Penal, daquele mesmo Código Penal que o Sr. Francisco Cruz parece conhecer melhor do que eu.
Risos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Vasco Borges: — Pedi a palavra para agradecer ao Sr. Presidente do Ministério a resposta que me deu e bem assim as palavras que me dirigiu, que eu atribuo à estima. que S. Ex.ª tem por mim, e à qual espero saber retribuir. Sr. Presidente: para o caso de ser concedida a urgência que requeri para o meu projecto, eu peço a V. Ex.ª para solicitar da respectiva comissão igual urgência.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Como tratei nesta casa do Parlamento da questão do jôgo, julgo do meu dever dizer algumas palavras sôbre as considerações que acaba de fazer o ilustre Deputado Sr. Vasco Borges, a propósito do projecto que mandou para a Mesa.
O grupo que nesta Câmara tinha por lema ou «regulamentação ou repressão», aceita nas suas linhas gerais o projecto do ilustre parlamentar, e está disposto a empregar toda a sua boa vontade no sentido de que êle seja aprovado o mais ràpidamente possível, convencido como está de que no Código Penal não existem as sanções necessárias para a eficaz repressão do jôgo de azar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — O Sr. Leote do Rêgo deseja ocupar-se em negócio urgente da questão do Convénio com a União, Sul-Africana.
Os Srs. Deputados que reconhecem a urgência, queiram levantar-se.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está rejeitado.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, é novamente rejeitado.
Entra em discussão o parecer n.º 426.
Parecer n.º 426
Senhores Deputados. — A apreciação da vossa comissão de administração pública foi submetida a proposta de lei n.º 410-E da iniciativa do Sr. Ministro do Interior, pela qual se procura criar uns lugares de segundos comandantes nalguns batalhões da Guarda Nacional Republicana, bem. como modificar a forma como actualmente se faz a promoção a primeiros cabos.
Nada tem esta comissão a opor à referida proposta de lei, mas entende que, tratando-se de um assunto de ordem técnica de serviços do exército, embora respeitante à Guarda Nacional Republicana,

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deve ser ouvida a comissão de guerra, que é sem dúvida a mais autorizada para dar parecer sôbre tam especial assunto. Sala das sessões da comissão do administração pública, 22 de Fevereiro do 1923. — Ribeiro de Carvalho — Custódio de Paiva — Alberto Vidal — Baptista da Silva — Alfredo de Sousa, relator.
Senhores Deputados. — A Guarda Nacional Republicana reorganizada por decreto n.º 8:064, de 13 de Março de 1922 é constituída por dois batalhões urbanos de infantaria, seis batalhões mixtos de infantaria e cavalaria, o no regimento de cavalaria, com um efectivo por cada uma destas unidades, que vai de 700 a 1:300 homens.
Os dois batalhões de infantaria urbanos e o regimento de cavalaria formam a polícia militar de Lisboa.
Os batalhões n.ºs 3, 4, 5, 6, 7 e 8 formam a polícia militar rural e, em algumas cidades da província, também urbana.
Êstes seis últimos batalhões divididos em 24 companhias o 78 secções guarnecem, presentemente, 463 postos e sub-postos, distribuídos por áreas extensíssimas. O comando dos batalhões da Guarda Nacional Republicana é um cargo difícil e pesado.
Além dos assuntos respeitantes à administração, justiça, instrução e disciplina, comuns a todos os comandos, os dos batalhões da Guarda Nacional Republicana tem, frequentemente, para resolver casos melindrosos e difíceis, demandando muito critério o perda de tempo.
Nos batalhões rurais, além de todas aquelas funções, os comandantes são obrigados a fazer visitas periódicas do fiscalização aos postos guarnecidos pelos subordinados do seu comando.
O decreto n.º 8:064, de 13 de Março de 1923, reconhecendo em parte aquela dificuldade criou os lugares de segundos comandantes no regimento de cavalaria da Guarda Nacional Republicana e no batalhão n.º 4, mas não o fez para os restantes batalhões, não se compreendendo bom porquê.
Os lugares do segundos comandantes existem em todos os regimentos do exército, cujos efectivos normais são muito monos numerosos do que os da Guarda Nacional Republicana, existem na Guarda Fiscal e até nos regimentos de reserva cujo serviço é de mero expediente.
Os segundos comandantes correspondem aos tenentes-coronéis que antes da reorganização da exército de 1911, havia em todos os regimentos; correspondem, aos sub-directores doa estabelecimentos militares, etc., etc.
Entende, por isso, a vossa comissão de guerra que a criação dos referidos lugares correspondo a uma necessidade tanto mais instante quanto mais numerosos são os efectivos e mais pesado o difícil o comando.
Desta medida não resultará aumento de despesa no Orçamento Geral do Estado porquê os lugares de segundos comandantes serão desempenhados por majores do exército cujo quadro se encontra notavelmente excedido.
A segunda parte da proposta que visa a modificar, em harmonia com o critério seguido no exército, o actual sistema de concurso e promoção a primeiro cabo, merece igualmente a vossa aprovação.
A Guarda Nacional Republicana ó, som contestação possível, uma fracção do exército adstrita, normalmente, a funções especiais de policiamento, mas integrando-se nele em caso de guerra, ou outros em que a força pública haja de operar em conjunto.
As praças da Guarda Nacional Republicana saem dos quadros do exército, na maioria dos casos, e a êles regressam quando, por qualquer motivo saem da Guarda Nacional Republicana.
Foi o próprio comando geral desta corporação que, reconhecendo o inconveniente da diversidade dos critérios, surgiu a vantagem da unificação.
A vossa comissão de guerra é, por isso, de parecer que a proposta de lei n.º 410-E merece ser aprovada integralmente.
Sala das Sessões, 5 de Março de 1923. — João Pereira Bastos — Pina de Morais — António de Sousa Maia — Viriato Quines da Fonseca — João E. Águas — António de Mendonça, relator.
Senhores Deputados. — A vossa comissão de finanças tomou conhecimento da proposta de lei n.º 410-E, da autoria dos Srs. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, que lhe foi presente acom-

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panhada já do parecer favorável da vossa comissão de administração pública e de um largo parecer justificativo da vossa comissão de guerra, que claramente manifesta e demonstra a necessidade da aprovação da proposta.
À vossa comissão de finanças, compete analisá-la sob o ponto de vista da despesa a que ela poderá dar lugar.
Os artigos 1.º e 2.º não trazem aumento de despesa, porque não contém matéria de novas admissões de funcionários, pois tende a colocar nos comandos oficiais do exército que já fazem parte dos respectivos quadros do Ministério da Guerra, *> que apenas perceberão mais as respectivas gratificações de comando, cuja verba é insignificante em relação ao serviço que vão prestar a bem da ordem e segurança pública.
O artigo 3.º contém matéria de aumento do despesa, comportável com as verbas orçamentais, mas que se torna indispensável, por não ser possível aos serviços da guarda deixar de preencher as vacaturas existentes.
Nestes termos a vossa comissão de finanças dá o seu parecer favorável à proposta.
Sala das sessões da comissão de finanças, 21 de Março de 1923. — F. G. Velhinho Correia — Viriato Gomes da Fonseca — Aníbal Lúcio de Azevedo — Joaquim António de Melo Castro Ribeiro — Carlos Pereira — Júlio de Abreu — Mariano Martins — Lourenço Correia Gomes, relator.
Proposta de lei n.º 410-E
Senhores Deputados. — Tem demonstrado a experiência a indispensabilidade dos lugares de segundos comandantes dos batalhões da Guarda Nacional Republicana, e principalmente nos batalhões rurais.
Mas a experiência também tem demonstrado que é necessário modificar a promoção a primeiros cabos, a qual, segundo o determinado no § 1.º do artigo 28.º do decreto n.º 8:064, de 13 de Março de. 1922 que reorganizou-os serviços daquela guarda, é feita por concurso, organizando-se listas dos aprovados, pelas quais, segundo as respectivas classificações, irão sendo sucessivamente feitas as promoções.
Não é no exército adoptado êste critério, por a prática o haver considerado menos conveniente.
Portanto, para melhor selecção parece preferível, que aquela promoção se faça entre as aprovados por proposta do respectivo comandante de companhia ou esquadrão, que são os que de mais perto conhecem as qualidades militares e as condições de competência dos seus graduados nos variados serviços que lhe são cometidos, e muito especialmente no serviço rural em que os primeiros cabos são chamados a comandar postos.
Pelo exposto tenho a honra do enviar para a Mesa a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.º São criados os lugares do segundos comandantes dos batalhões 1, 2, 3, 5, 6, 7 e 8 da Guarda Nacional Republicana.
Art. 2.º Os lugares a que se refere o artigo 1.º serão desempenhados por majores de cavalaria ou de infantaria.
Art. 3.º Os concursos para primeiros cabos realizar-se hão no regimento de cavalaria, batalhões 1, 2 e 4, e nas companhias rurais, organizando-se listas dos aprovados que preencherão as vacaturas ocorrentes nas unidades a que os candidatos pertencerem, por escolha e proposta dos respectivos comandantes de esquadrão ou companhia.
Art. 4.º Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões, 7 de Fevereiro de 1923. — O Presidente do Ministério e Ministro do Interior, António Maria da Silva — O Ministro das Finanças, Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
O Sr. Pedro Pita: — Quando ontem o Sr. António Mendonça pediu a discussão dêste parecer, eu, que o não tinha presente, entendi que se tratava duma proposta em que se estabeleciam, disposições tendentes a aumentar os vencimentos da Guarda Republicana.
Entendo que de facto se impõem, êsses aumentos, mas daí até criar novos lugares de comandantes vai uma grande distância.
Apoiados.
E eu verifico que, neste momento, se pretende simplesmente criar uns poucos de lugares de majores sete pelo menos.
Diz a comissão de finanças no seu pa-

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Sessão de 28 de Abril de 1923
recer que da criação dêsses lugares não resulta um sensível aumento de despesa. É o argumento do costume, e porque eu estou habituado aos resultados de tal argumento, tenho razões para ficar alarmado com esta nova pretensão.
O que a Câmara votou que se discutisse e votasse com urgência não foi a criação de lugares de segundos comandantes e a passagem do majores do Ministério da Guerra para o Ministério do Interior. O que se votou foi que se discutisse e aprovasse, com urgência, a revisão dos vencimentos dos oficiais e praças em serviço na Guarda Republicana. Foi só isto, e mais nada!
E eu, que desejava dar o meu voto a uma proposta que melhorasse a situação dos oficiais e praças da Guarda Republicana, vejo que fui ludibriado, e dei o meu voto à discussão urgente de uma proposta que cria novos lugares.
Sr. Presidente: é possível que durante a discussão o Sr. Ministro do Interior envie para a Mesa qualquer proposta no sentido de melhorar os vencimentos dos oficiais e praças da Guarda Republicana, mas é conveniente que se não confundam as duas propostas, que não se procure, a pretexto dalguma cousa que é justa, a pretexto de dar satisfação a uma reclamação justíssima, como é a de aumento de vencimentos, fazer-nos engolir uma disposição em que se criam mais lugares, em que se fazem mais majores.
Já há dias, quando se discutia a melhoria de situação para a Guarda Fiscal, se pretendeu, a troco da nossa boa vontade manifestada nessa questão e do nosso desejo de ver melhorada uma situação que, de facto, carecia que lhe acudissem, fazer engolir a êste lado da Câmara uma outra proposta que nos repugnava, e que nós estávamos a combater. Hoje voltamos à mesma.
A pretexto de se votar a melhoria de situação dos oficiais e praças da guarda Republicana, que se sabe que votamos e que temos mesmo empenho em ver votada, procuram fazer-nos engolir esta criação de novos lugares, e, porventura, a criação de novos majores.
Não colhe, repito, o argumento, tantas vezes empregado, de que não resultarão quaisquer promoções, visto que há, actualmente, majores a mais.
Embora assim fôsse, a verdade é que, criados mais êstes lugares no quadro da Guarda Republicana, resultará a existência de outros tantos oficiais dessa patente, e, portanto, o quadro dêsses oficiais fica aumentado em sete.
Daqui resulta que na melhor de todas as hipóteses, embora agora não se dessem essas promoções, elas virão a dar-se daqui a algum tempo, mas estando eu mesmo mesmo convencido de que se virão a dar desde já.
Têm-se discutido propostas de lei idênticas.
Ainda recentemente se votou uma proposta de lei a respeito da qual se afirmava que. por virtude das suas disposições não resultariam quaisquer promoções.
Pois, Sr. Presidente, resultou uma verdadeira avalanche de promoções!
Disse-se depois que não havia nisso nenhum inconveniente, porque os promovidos não receberiam conforme os galões, mas receberiam conforme a altura em que estivessem nos respectivos quadros. Mas, finalmente, receberam conforme os galões!
E esta a lição dos factos.
Sr. Presidente, se há majores do infantaria em grande número, a mais do que o fixado nos quadros, não os há na arma de cavalaria em grande número além do quadro.
Consta-me que há apenas dois ou três. Êstes lugares de segundo comandante são para oficiais de infantaria ou de cavalaria.
Se se forem buscar majores de cavalaria, ficarão faltando quatro no quadro o haverá logo quatro promoções.
Como quere que seja, aquilo que nós ontem votamos foi a urgência para a discussão de um parecer que trata da melhoria que é necessário dar-se aos oficiais o praças da guarda republicana.
Não votámos de facto, porque não lhe reconhecíamos urgência, nem vantagem, nem utilidade, a discussão de um projecto que tem por fim apenas fazer sete majores.
Sr. Presidente: não quero terminar as minhas considerações sem fazer referência a um facto que me constou ter-se dado ontem.
Ou por que não, estivéssemos na sala ou

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porque não tivéssemos ouvido, só soubemos por algumas pessoas que estavam nas galerias, e que do caso nos informaram, que um ilustre deputado da esquerda da Câmara, ao falar, teria dito que sabia muito bem que ao referir-se à guarda republicana, no sentido de se procurar melhorar a sua situação, causaria calafrios aos Srs. Deputados do outro lado da Câmara; que seria como que lançar sôbre êles um bloco de gelo.
O outro lado da Câmara é uma cousa muito vaga.
No outro lado da Câmara estamos nós, os Nacionalistas.
A êste lado da Câmara não causa nem poderia causar calafrios a defesa de quaisquer medidas que tenham fundo de justiça, tanto a respeito da guarda republicana, como a respeito de qualquer outra corporação.
Não podem causar calafrios, nem podem representar um bioco de gelo, quaisquer propostas de lei que tendam a melhorar situações que sejam de facto incomportáveis, perante a enorme carestia da vida, e êste lado da Câmara reconhece ser incomportável a actual situação dos oficiais e praças da guarda republicana.
Mas tratando-se da guarda nacional republicana, que tantos serviços tem prestado à República e ao País, que êste lado da Câmara reconhece, como não podia deixar de reconhecer, o projecto, longe de ser um bloco de gelo, longe de ser um calafrio, pelo contrário nos causou uma grande satisfação, por ver que esta Câmara pretende olhar a sério para a situação em que realmente vive uma corporação, que* muito merece a consideração da Câmara e do País.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador., quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Pedro Pitu proferiu uma frase que com toda a certeza não pode ter a interpretação que vulgarmente se dá, e que nem sequer é parlamentar.
S. Ex.ª declarou que a propósito de se pedir a discussão de um projecto, que tem por fim atender à situação da guarda nacional republicana, como se atendeu à situação da guarda fiscal, se pretende fazer engolir uma outra proposta.
Eu devo dizer a V. Ex.ª e à Câmara que não está nos meus propósitos, nem no meu carácter, usar de semelhantes processos.
Eu tenho, Sr. Presidente, a maior consideração pelo ilustre Deputado; conheço muito bem o seu carácter, e assim devo dizer que estou de acôrdo com o que S. Ex.ª disse, isto é, que êstes dois assuntos deviam ser separados.
Ora como assim S. Ex.ª confirmou o meu modo de pensar, eu devo dizer a V. Ex.ª e à Câmara, que achando absolutamente justificadas as aspirações da guarda nacional republicana, que são idênticas à da. guarda fiscal, que, quando se passar- à discussão do projecto na especialidade, mandarei para a Mesa uns artigos novos, respeitantes à melhoria da guarda, ou para melhor dizer, visto que o ilustre Deputado Sr. Pedro Pita e os seus correligionários nesta Câmara entendem, que se deve atender desde já a essa situação, eu vou mandar para a Mesa também desde já êsses artigos novos, a fim de que os ilustres parlamentares possam aprovar uns e reprovar outros.
Assim poderá o ilustre Deputado Sr. Pedro Pita ficar bem com a sua consciência, aprovando sem demora aquilo que acha justo, bem como todos os parlamentares que assim pensam, e que já manifestaram a sua opinião sôbre o assunto.
Vou pois mandar para a Mesa êsses artigos novos, de forma a que sejam atendidas as justas reclamações da guarda nacional republicana, assim como foram atendidas aã reclamações da guarda fiscal.
Mandarei um outro artigo a fim de que a Câmara o considere, isto além dos outros a que já me referi e que são a repetição dos que foram apresentados para a guarda fiscal, o qual diz respeito aos batalhões n.ºs 3, 5, 6, 7 e 8.
Êste artigo é absolutamente aceitável è justo, não me parecendo que possa merecer o voto contrário do Parlamento, nem que dê motivos para reparos.
Eu mando desde já para a Mesa êsses artigos, de forma a que a Câmara os possa apreciar desde já, e votá-los depois com conhecimento de causa.

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Sessão de 26 de Abril de 1923
Sr. Presidente: a proposta n.º 410-E refere-se também a um outro caso, qual seja o de regular a maneira como se há-de realizar o concurso para primeiros cabos.
E para se ver a razão do que afirmo, que não se trata de política no sentido pejorativo do termo, mas se trata realmente duma necessidade, j basta atentar nos nomes das pessoas que constituem a comissão de guerra e assinaram o parecer, em conformidade,com a proposta. Êsses Srs. Deputados pertencem a vários lados da Câmara e têm tanta competência que basta citar os seus nomes para ser imediatamente reconhecida.
Não pode o Sr. Pedro Pita acoimar-me de que tenha qualquer outro desígnio na apresentação da proposta de lei n.º 410-E. É simplesmente uma questão de serviço útil, que me foi pedido por várias entidades, e é compreensível até a presença dos segundos comandantes naqueles batalhões que têm larga acção rural. São circunstâncias de técnica, e eu, que me revolto contra todos os aumentos de despesa que não sejam justificáveis, penso assim. É necessário ou não é necessário?
Se é necessário, temos de dar remédio ao mal, sujeitando-nos às consequências que dele derivam.
Ora os segundos batalhões têm grande acção rural, e porque um guarda republicano não se parece com qualquer outro soldado do exército.
Os soldados da guarda exercem funções de acção administrativa, evitando às vezes vários conflitos, e por isso é necessário que percorram vários postos para verificar de visu se a aplicabilidade das leis é um facto, elucidando convenientemente as entidades que têm de aplicar essas leis.
Disse em tempo a alguém, e tive a honra de ser apoiado nessa hora pelo ilustre parlamentar o Sr. Pires Monteiro, cuja competência é manifesta em assuntos militares, que um indivíduo podia ser um militar brioso, cheio de consideração, um elemento prestante no exército, e podia, no em tanto, por circunstâncias alheias à sua vontade, não servir para exercer as suas funções de oficial da guarda republicana num serviço rural; disse a alguém, ia dizendo, que apresentaria ao Congresso esta proposta, quando estivesse absolutamente convencido da necessidade de o fazer.
Os factos vieram comprovar a razão de existirem segundos comandantes, e por isso aproveito a proposta de lei nesse sentido, apesar de já ter tido autorização do Congresso para o fazer.
Mas eu entendo que só quando mandam as necessidades é que se deve realizar.
Temos majores com 20 e 30 anos no exército, e a maior parte dêles exerce funções em postos inferiores.
A culpa é do Parlamento, que, modificando essa lei, fez pior, nesse sentido, do que eu.
Eis as razões que determinam a apresentação dos antigos 1.º, 2.º e 3.º, e aproveitando o ensejo que se me oferece, visto que houve dúvidas da respectiva entidade sôbre o direito de se apresentar essa emenda por parte dum Sr. Deputado, só o podendo fazer o Sr. Ministro das Finanças, aproveito o ensejo para o fazer. E não fiz engolir a ninguém cousa alguma, nem pratiquei qualquer habilidade.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia.
Foi aprovada a acta.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: — Consulto a Câmara sôbre a urgência para um projecto de lei apresentado pelo Sr. Vasco Borges.
Foi aprovada a urgência, e o projecto vai adiante por extracto.
O Sr. Pedro Pita: — Peço a V. Ex.ª que consulte, a Câmara sôbre se permite que continue a discussão do que estava pendente, com prejuízo da ordem do dia.
O Sr. António Fonseca: — Pregunto a V. Ex.ª se na ordem do dia estão as alterações ao Regimento.
O Sr. Presidente: — A primeira proposta a entrar em discussão é a de alteração ao Regimento, apresentada por V. Ex.ª
O Sr. Presidente: — Consulto a Câmara sôbre o requerimento do Sr. Pedro Pita.
Foi rejeitado.

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Diário da Câmara dos Deputados
O Sr. Pedro Pita: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º do Regimento.
Procedeu-se à contraprova, que deu o mesmo resultado.
O Sr. Pedro Pita: — Roqueiro que seja prorrogada a sessão até se votar o projecto que está em discussão e as propostas do Sr. António Fonseca.
O Sr. José Domingues dos Santos: — Sr. Presidente: pedi a palavra para um aditamento ao requerimento do Sr. Pedro Pita, para que sejam também votadas as propostas relativas à Guarda Republicana.
O. Sr. Presidente: — A Câmara já rejeitou que continuasse a discussão dessas propostas, que não estão dadas para a ordem do dia.
Vou pôr à votação n requerimento do Sr. Pedro Pita.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: — Vou pôr à votação o aditamento do Sr. José Domingues dos Santos.
Àpartes.
O Sr. José Domingues dos Santos: — Desisto do meu requerimento.
O Sr. Pedro Pita: — Faço meu o requerimento do Sr. José Domingues dos Santos, e se isso não me é permitido, formulo um novo requerimento no mesmo sentido.
Àpartes.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — Dêste lado da Câmara votamos o requerimento do Sr. Pedro Pita.
A maioria sabe que não tem número e quere incluir na votação a proposta relativa à guarda republicana.
Àpartes.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Isso é uma especulação.
Cruzam-se àpartes.
O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara.
Havendo duas questões a tratar, uma a proposta relativa à guarda republicana e outra às propostas do Sr. António Fonseca, o que me parece lógico é votar em harmonia com o requerimento do Sr. Pedro Pita.
Cruzam-se os àpartes.
O Sr. Carvalho da Silva: — Nós votamos, portanto, o requerimento do Sr. Pedro Pita, mas não damos o nosso voto ao requerimento do Sr. José Domingues dos Santos, porque votá-lo o mesmo é que dizer que se não vota a questão da guarda republicana.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Fonseca: — Sr. Presidente: a propósito do requerimento do Sr. Pedro Pita, o Sr. Carvalho da Silva fez a afirmação de que se pretendera fazer agora uma especulação com a questão Já guarda nacional republicana.
Os sucessos parlamentares dos dois últimos dias têm demonstrado cabalmente que o que se tem pretendido fazer tem sido efectivamente uma especulação, primeiro com a guarda fiscal, depois com a guarda republicana e ultimamente até com a marinha, mas essa especulação tem partido exclusivamente dos monárquicos.
E curioso que uma proposta que mandei para a Mesa, e que não é mais do que a reedição do que se fez em 1912, tenha tido uma tam sistemática oposição.
Eu vejo nisto tudo, infelizmente, uma verdadeira trica parlamentar, porque outra cousa não está na provocação da falta de número.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Uma autêntica trica é a proposta de V. Ex.ª
O Orador: — Quando falo em tricas parlamentares, lamentando-as, não me refiro a V. Ex.ª, cujos hábitos parlamentares são uma verdadeira trica de todos conhecida,
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — V. Ex.ª pode demonstrar isso?
O Orador: — Não preciso de demonstrações. Tenho o testemunho de toda a Câmara.
Ainda ontem, quando eu interrompi o

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Sr. Pedro Pita, dizendo que êle não podia finalizar as suas considerações pela maneira como o fazia, e que devia acrescentar a invocação do § 2.º do artigo 116. 9, V. Ex.ª foi espontâneo num imediato gesto de concordância com a minha doutrina.
A obra de V. Ex.ª, nesta casa do Parlamento, tem sido apenas uma obra destrutiva, de inutilização de trabalho.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (interrompendo): — V. Ex.ª chamou trica ao facto de invocar o Regimento para que êle se cumpra.
Não será maior trica modificá-lo para que se não cumpra?!
O Orador: — Declaro que tenho hoje uma situação de absoluta independência em relação a todos os partidos da República.
Apoiados.
E se neste momento a maioria se encontra em concordância comigo, eu n ao a consultei ao fazer apresentar a minha proposta.
Amanha poderá estar de acôrdo comigo o Partido Nacionalista.
Isto dá-me o direito de protestar contra êste sistema de se não fazer outra cousa que não seja o encerramento das sessões, servindo-se de todos os processos para lançar o desprestígio, que não afecta o Parlamento só, mas a República.
O Sr. Francisco Cruz: — Acuse os que não vêm cá.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Venham à sessão.
Interrupções do Sr. Vitorino Godinho e Francisco Cruz que se não perceberam.
O Orador: — É curioso. É de considerar esto facto!
Os Deputados que não vêm é porque não podem; e são precisamente os que censuram êstes Deputados de falta, os mesmos que estão nos Passos Perdidos para não fazerem número.
Eu sei quais são os direitos da maioria e da minoria, e nunca me sujeitei quando era democrático, nem reconstituinte, e não me sujeitaria amanhã, se pertencesse a outro partido, a que me coarctassem o meu direito.
O que não posso compreender, sobretudo, é que se use dum direito em tais condições, que não afecta êste ou aquele partido, mas a Republica e a instituição parlamentar.
Protesto indignadamente e veementemente contra êste facto.
O orador não reviu, nem os àpartes foram revistos pelos oradores que os fizeram.
O Sr. Pedro Pita: — Pedi a palavra sôbre o modo de votar no momento em que o Sr. António Fonseca me disse que eu procedia como correligionário dos monárquicos. Lembrarei a S. Ex.ª a sua recente filiação no Partido Republicano.
Ainda então éramos correligionários reconstituintes.
Sr. Presidente: não tem qualquer outra resposta essa afirmação, e basta-lhe esta.
De resto, é já matéria muito sacudida, é já matéria estafada, que parece impossível ter sido tocada pelo Sr. António Fonseca, que não costuma tocar árias estafadas, essa ária de que os outros devem transigir com as nossas pretensões para prestígio da República.
E eu devo dizer que, de facto, se estabeleceu nesta casa, posta em termos nítidos por um dos leaders dêste lado, o Sr. Cunha Leal, uma absoluta divergência de pontos de vista entre nós e a maioria, no que respeita a essa proposta que o Sr. António Fonseca teve a infelicidade de mandar para a Mesa, e posta em termos tais, que a ninguém era legítimo ficar em dúvida de que se a maioria queria impor-nos um procedimento que nós reputamos de incomportável com a nossa moralidade parlamentar, tinha de servir-se dos seus votos próprios. Dessa hora em diante não ficou dúvidas a ninguém de que essa proposta podia apenas ser votada com os votos da maioria. Se ela tem o remédio na sua mão, que nos faça sentir o pêso da sua maioria!
Se tem votos só por si para votar a proposta, que a vote, mas não conte connosco, porque não colaboramos nessa votação, nem damos votos para fazer número para que essa proposta seja aprovada!
Essa declaração foi já feita, ninguém tem que estranhar o nosso procedimento

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Diário da Câmara dos Deputados
Mas que há de extraordinário neste procedimento?
Que há que invocar os altos destinos da Pátria e da República, para nos imporem um pensar que não é o nosso?
Qual a razão, se da nossa atitude resulta um desprestígio para o Parlamento, porque devemos ser nós a ceder e não a maioria, quando ela tem maneira de nos vencer sem nós cedermos?!
Não tem a maioria 54 Deputados?
Não tem número suficiente para fazer votar a proposta? Pois que a vote!
Apoiados das direitas.
Impõe-nos, o regime que resulta da aprovação da proposta do Sr. António Fonseca, e nós temos de suporta Io, porque somos minoria, mas o que não estamos é dispostos a votá-la, nem a contribuir com número para que êsse regime seja votado. Que há de extraordinário nisto? Que há de censurável, pregunto eu eu que não tenho procuração de Sr. Cancela de Abreu para o defender, na atitude de S. Ex.ª, quando pretende fiscalizar o cumprimento do Regimento?!
O Sr. António Fonseca: — Quando lhe convém!...
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Quando?
O Sr. António Fonseca. — Ainda há dois dias, num final de sessão, se votou uma proposta sem número, e eu observei isso a V. Ex.ª!
Trocam-se mais àpartes entre os mesmos Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: — Chamo a atenção da Câmara.
Eu não posso consentir que se estabeleçam diálogos!
Pausa.
O Orador: — Sr. Presidente: é disposição constitucional que a Câmara não pode funcionar sem a presença dum têrço, pelo menos, dos membros que a compõem.
Ora desde que um Deputado, observando um preceito constitucional, não consinta que a Câmara funcione sem número, não só cumpre um direito, mas um dever.
Apoiados das direitas.
Mas eu já esperava que o ilustre Deputado António Fonseca não deixaria de responder ao bote que eu ontem não pude deixar de atirar-lhe.
Disse aqui que esperava a resposta, e ela não tardou; mas o que nunca supus é que partisse da parte de S. Ex.ª a afirmação de que os seus velhos correligionários do Partido Reconstituinte, êsses, pelo menos, eram correligionários dos monárquicos.
O Sr. António Fonseca: — Os meus correligionários de então não marcam nada no Partido, Nacionalista!
Apoiados da esquerda.
O Orador: — Sr. Presidente: a independência do Sr. António Fonseca ressente-se muito, e isso só o honra, do namoro que lhe tem sido feito.
O Sr. António Fonseca: — Se me tem sido feito namoro, tem sido dêsse lado.
O Orador: — Por maior valor que tenha S. Ex.ª, êle não é insensível a êsse namoro. Mas como os antigos correligionários de S. Ex.ª não marcam nada dentro do Partido Nacionalista, como S. Ex.ª acaba de dizer, contudo eu não quero deixar de dizer que, se alguém lhe tem feito namoro, não tenho sido eu. Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigrafias que lhe foram enviadas.
Os àpartes não foram revistos pelos oradores que os fizeram.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: muito nos honra o ilustre Deputado Sr. António Fonseca chamando «trica» ao procedimento da minoria monárquica, pelo facto de pugnar nesta Câmara pelo cumprimento do Regimento.
Quando se deu o incidente da moção relativa ao movimento de Monsanto, e por motivo dele, nós estivemos ausentes da Câmara durante 5 ou 6 dias cabazadas de projectos foram aprovadas sem número legal para votar.
Assim o relatou a imprensa, sem que tivesse havido desmentido.
Se estivéssemos presentes, tal não consentiríamos.

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Acho estranho que o Sr. António Fonseca trouxesse à tela da discussão uma conversa particular que teve comigo!
O Sr. António Fonseca: — Eu é que tive uma conversa com V. Ex.ª
O Orador: — Conversa que V. Ex.ª impròpriamente trouxe para aqui.
O Sr. António Fonseca: — Não é exacto.
O Orador: — E inteiramente exacto.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: o Sr. António Fonseca, pessoa cujos merecimentos eu muito aprecio...
Uma voz: — Duas vezes falar sôbre o modo de votar? Não pode ser.
O Orador: — S. Ex.ª, Deputado dos mais graduados da Câmara, veio acusar a minoria monárquica de exercer aquilo a que chamou tricas, na sua acção parlamentar, e de abandonarmos a sala paru evitarmos votações.
Devo dizer o seguinte: quando um Deputado julga que é ruinosa para o País qualquer medida, o seu primeiro dever é proceder, por todas as maneiras e dentro do Regimento, para que se evite que essa medida se voto.
Apoiados.
Quando um Deputado vê que com a sua presença o quorum fica completo para se votar ou discutir qualquer medida que seja prejudicial, deve evitar essa votação.
Apoiados.
Não tenho de me arrepender de assim proceder.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Nós não temos que dar colaboração à República.
O Orador: — Não posso deixar de notar que tudo isto define o regime de arbitrariedade em que nós vivemos.
Nunca nós julgámos uma habilidade exigir que se cumpra a lei; havemos de exigir sempre que ela se cumpra.
Quanto ao facto de se inutilizarem sessões, devo dizer que quem as inutiliza é quem não vem à Câmara; a maioria é que inutiliza as sessões não comparecendo como é seu dever.
O Sr. Manuel Fragoso: — Onde estão os restantes Deputados monárquicos?
O Orador: — Os Deputados monárquicos não têm de dar nem devem dar o seu voto a favor de qualquer medida quando a reputem inconveniente para os interêsses do País.
O Sr. Vitorino Godinho: — V. Ex.ªs não têm o mesmo diploma que os outros Srs. Deputados?
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Nós não temos de dar número ao Govêrno nem à República.
O Orador: — Quando qualquer Deputado é contra uma determinada medida, o seu primeiro dever é procurar por todas as formas contribuir para que essa medida não seja aprovada.
Trocam-se àpartes.
O Orador: — Tenho muito orgulho no procedimento que a minoria monárquica tem seguido e que há-de continuar a seguir.
Tenho dito.
O orador não reviu, nem os àpartes foram revistos pelos oradores que os fizeram.
O Sr. António Fonseca: — Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para dar umas explicações.
Quando há pouco me referi ao Partido Nacionalista, e empreguei em conjunção com os monárquicos a palavra correligionários, não quis significar que nem os meus antigos correligionários nem os Srs. Deputados que faziam parte do Partido Liberal fossem monárquicos, nem podia considerar assim pessoas de cujo republicanismo ninguém pode duvidar, e de que têm dado sobejas provas, como, por exemplo, o Sr. Álvaro de Castro e outros meus antigos correligionários do Partido Reconstituinte, assim como não se pode pôr em dúvida o republicanismo de tantíssimas pessoas que faziam parte do Partido Liberal.

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Quando empreguei a palavra correligionários foi no sentido restrito, para significar a ligação que havia entre os Deputados monárquicos e nacionalistas, e em relação apenas ao problema que se discute.
Não se trata de duvidar da fé republicana do Partido Nacionalista ou de qualquer dos seus membros; trata-se de dizer apenas que nesta questão sé encontram como correligionários monárquicos e nacionalistas.
A oposição é a mesma; os processos são os mesmos.
Quanto à questão a que se referiu o Sr. Cancela de Abreu, de eu ter trazido para público uma conversa privada, repito em absoluto, essa afirmação. Nunca fui nem sou homem capaz de fazer uma Cousa dessas.
Se eu tivesse de trazer para aqui uma conversa particular que tivesse tido com S. Ex.ª, tê-lo ia feito mas em ocasião mais oportuna, e se assim o julgasse mais necessário, tomando dêsse facto absoluta responsabilidade.
O que en disso foi que há dias fiz certa observação ao Sr. Cancela de Abreu, sem contudo me referir a qualquer cousa que S. Ex.ª me tivesse dito.
Sr. Presidente: o que está provado depois de tudo isto é que todos os requerimentos que a minoria monárquica tem apresentado, quer referentes à guarda fiscal, como à guarda republicana e à marinha, são apenas tendentes a evitar a votação destas propostas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se o requerimento do Sr. Pedro Pita para que a sessão seja prorrogada.
Pôsto à votação o requerimento, foi aprovado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º da artigo 116.º
Fez-se a contraprova.
O Sr. Presidente: — Estão sentados 46 Srs. Deputados e de pé 2.
Não há numero. Vai proceder-se à chamada.
Fez-se a chamada, a que responderam os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Ferreira Vidal.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António de Abranches Ferrão.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Júlio de Sousa.
João Estêvão Águas.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Sarafim de Barros.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Lourenço Correia Gomes.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira,
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Sebastião Herédia.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.

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Sessão de 26 de Abril de 1923
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
O Sr. Presidente: — Hoje há nocturna às 21 horas.
Está encerrada a sessão.
Ordem da noite:
Orçamentos.
Eram 17 horas e 55 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Substituïções
Comissão de finanças:
Substituir o Sr. Vitorino Godinho pelo Sr. Crispiniano da Fonseca.
Para a Secretaria.
Comissão do Orçamento:
O grupo parlamentar democrático indica o Sr. Lourenço Correia Gomes para na comissão do Orçamento substituir o Sr. Albino Pinto da Fonseca emquanto êste estiver impedido. — Almeida Ribeiro.
Para a Secretaria.
Projecto de lei
Dos Srs. Crispiniano da Fonseca e Vasco Borges, substituindo o artigo 265.º do Código Penal (jogo).
Aprovada a urgência.
Para a comissão de legislação criminal.
Para o «Diário do Govêrno».
Pareceres
Da comissão de finanças, sôbre o número 423-D, que autoriza o Govêrno a modificar as disposições relativas a exportação de mercadorias e a constituição da Janta do Fomento Agrícola.
Imprima-se.
Da mesma, sôbre o n.º 464-F, que abre um crédito especial a favor do Ministério do Interior para designados pagamentos na Imprensa Nacional.
Imprima-se.
Da mesma, sôbre o n.º 103-F, que autoriza o Govêrno a pagar anualmente 0:000 francos para custeio do Instituto Internacional do Comércio, em Bruxelas.
Imprima-se.
Da comissão de marinha, sôbre o número 453-D, que regula as pensões de reforma do pessoal dos Arsenais de Marinha e Exército e Fábrica Nacional de Cordoaria.
Para a comissão de guerra.
Da comissão dos correios e telégrafos, sôbre o n.º 65-B, que aprovou o contrato com a Western União Cº, relativa à amarração dum cabo submarino na ilha do Faial.
Para quando fôr dado para ordem do dia.
Notas de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro das Colónias sôbre factos graves praticados pelo curador interino dos serviçais de S. Tomé, que envolvem desprestígio para o bom nome da Nação, e representam desrespeito gravíssimo da Constituïção da República, e bem assim sôbre o último regulamento da mão de obra indígena em S. Tomé. — Carlos de Vasconcelos.
Expeça-se.
Desejo interpelar os Srs. Ministros das Colónias e do Comércio sôbre o não cumprimento do decreto de 8 de Dezembro de 1921, que manda entregar ao Ministério das Colónias os 50 por cento de taxa telegráfica e bem assim sôbre a divida do Ministério do Comércio à província de Cabo Verde. — Carlos Vasconcelos.
Expeça-se.
O REDACTOR — Sérgio de Castro.

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