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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 75
(NOCTURNA E DIURNA)
EM 2 E 7 DE MAIO DE 1923
Presidência do Ex.mo Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso
Secretários os Ex.mos Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. — Respondem à chamada 47 Srs. Deputados. É lida a acta.
O Sr. Agatão Lança (para explicações) verbera uma local publicada no «Diário de Lisboa» referente ao subsidio de embarque aos oficiais da armada e a um incidente havido com o Sr. Francisco Cruz.
Respondem o Sr. Presidente e é Sr. Francisco Crus.
Ordem da noite. — Continua a discussão do parecer n.º 411-B — Orçamento do Ministério do Comércio.
Aprova-se o capitulo 1.º do parecer com uma emenda da comissão, tendo usado da palavra para interrogar a Mesa o Sr. Cunha Leal.
Com o Sr. Presidente troça explicações o Sr. António Fonseca sôbre a discussão conjunta do Orçamento com uma proposta de lei referente a estradas mandada para a Mesa pelo respectivo Ministro, requerendo o mesmo Sr. Deputado que a proposta se discuta com urgência e dispensa do Regimento, que o Sr. Presidente ata que já foram votadas.
Usa da palavra o Sr. Carvalho da Silva.
Responde o Sr. Presidente.
Seguem-se os Srs. Cunha Leal e Paulo Cancela de Abreu.
Dá informações o Sr. Presidente.
O Sr. Cunha Leal invoca o n.º 4.º do artigo 26.º da Constituïção, respondendo o Sr. Presidente que não vê motivo para a invocação.
Responde, impugnando, o Sr. António Fonseca.
Segue-se o Sr. Paulo Cancela de Abreu, que lê a acta respectiva, notando o Sr. Presidente que de facto dela não consta que se tivessem votado a urgência e dispensa do Regimento para a proposta de lei referida.
Usa da palavra o Sr. José Domingues dos Sanrtos.
O Sr. Carvalho da Silva entende que nos termos regimentais não pode ser admitida a proposta do Sr. António Fonseca.
Seguem-se os Srs. Cunha Leal e António Fonseca.
O Sr. Domingues dos Santos pede para a proposta de lei em questão a urgência e a dispensa do Regimento, seguindo para a comissão de finanças.
Trocam-se explicações sôbre se a proposta de lei é ou não de caracter orçamental.
É pôsto à votação o requerimento do Sr. Domingues doa Santos, usando da palavra para. explicações o Sr. Afonso de Melo.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu requere que a proposta seja publicada no «Diário do Govêrno", requerimento que é regeitado.
O Sr. Carlos Pereira diz que bate nas carteiras, como em determinada sessão fez a minoria monárquica.
Usa da palavra para explicações o Sr. Paulo Cancela de Abreu.
Entra em discussão o capitulo 2.º aprovado um requerimento do Sr. Tôrres Garcia para que a sessão seja prorrogada até se votar o referido orçamento.
O Sr. Tavares Ferreira manda para a Mesa duas propostas, verificando-se, quando da admissão não haver número, prosseguindo a discussão.
O Sr. Tavares Ferreira manda para a Mesa uma proposta sôbre o capitulo 3.º
Passa-se ao capitulo 4.º, usando da palavra o Sr. António Fonseca.
Põe-se em discussão o capítulo 5.º, sôbre o que manda para a Mesa uma proposta do Sr. Tavares Ferreira.
O Sr. Ministro do Comércio (Vaz Guedes) apresenta uma proposta de lei referente aos.operários inutilizados nas obras do Estado, requerendo a urgência, que se não põe à votação por não haver número.
O Sr. Lúcio de Azevedo mostra a necessidade de concentrarem os serviços de construção e re-

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Diário da Câmara dos Deputados
construção de edifícios públicos, e manda para a Mesa, referentes ao capitulo 6.º, propostas relativas a obras no edifício da Casa da Moeda, declarando o Sr. Presidente que, elas nos termos da lei não podem ser aceitas.
O Sr. Plínio Silva pregunta se há número para se fazerem votações.
O Sr. Presidente responde negativamente, o que se confirma pondo à votação alterações ao capitulo 2.º
O Sr. Cunha Leal declara que pelo facto de a Câmara estar procedendo ilegalmente, não obstante as suas reclamações, renuncia ao seu lugar de Deputado.
O Sr. Moura Pinto pede ao Sr. Presidente que com a sua autoridade proceda para que, a bem da República, se liquidar o incidente.
O Sr. Agatão Lança propôs que a sessão seja suspensa até se conseguir a harmonização necessária, para o regular prosseguimento dos trabalhos parlamentares.
Por parte da minoria monárquica usa da palavra o Sr. Carvalho da Silva.
O Sr. Tôrres Garcia entende que só há uma resolução a tomar: declarar vago o circulo pôr onde foi eleito o Sr. Cunha Leal.
Segue-se o Sr. Plínio Silva.
O Sr. Agatão Lança invoca o artigo 20.º do Regimento.
Concordam com o alvitre do Sr. Domingues dos Santos, para que o Sr. Presidente intervenha na resolução do conflito os Srs. António Fonseca e Ginestal Machado, manifestando-se no mesmo sentido, por parte do Govêrno, o Sr. Presidente do Ministério (António Maria da Silva).
O Sr. Presidente aceita a missão que lhe foi incumbida, e interrompe a sessão às 2 horas para continuar no dia 7.
Reabre a sessão às 15 horas e 5 minutos do dia 7.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu, invocando o Regimento, pregunta se há número.
Responde o Sr. Presidente.
Procede-se a uma contraprova sôbre a admissão duma proposta do Sr. Tavares Ferreira.
Não havendo número, procede-se à chamada e, verificando-se não haver número, nem sequer para discutir, é a sessão encerrada, marcando-se a imediata para o dia seguinte a hora regimental.
Abertura da sessão às 22 horas e 17 minutos.
Presentes à chamada 47 Srs. Deputados.
São os seguintes Srs.:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Mela Pinto Veloso.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto da Rocha Saraiva.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António de Abranches Ferrão.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Francisco Cruz.
Jaime Júlio de Sousa.
João Estêvão Águas.
João José Luís Damas.
João Salema.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
José Carvalho dos Santos.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Paulo Cancela de Abreu.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Ventura Malheiro Reimão.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto de Moura Pinto.
Alfredo Pinto dê Azevedo e Sousa.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.

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Sessão de 2 e 7 de Maio de 1923
António Ginestal Machado.
António Libo Neto.
António Maria da Silva.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal,
João José da Conceição Camoesas.
João Ornelas da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim Serafim de Barres.
José António de Magalhães.
Luís dá Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo da Costa Menano.
Sebastião de Herédia.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Lelo Portela.
Alberto Xavier.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
António de Paiva Gomes.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho de Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.

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Diário da Câmara dos Deputados
Tomé José de Sarros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vergílio da Conceição Costa.
O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à chamada.
Procedeu-se à chamada.
O Sr. Presidente: — Responderam à chamada 47 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 22 horas e 15 minutos.
Leu-se a acta.
O Sr. Agatão Lança (para explicações): — Sr. Presidente: um jornal da noite, o Diário de Lisboa, jornal que tem por costume achincalhar o Parlamento, diz no seu número de hoje:
«A discussão prossegue: e a certa altura, é pôsto à consideração da Câmara um projecto que implica a concessão de determinado subsídio de embarque aos. oficiais da Armada.
O Sr. Agatão Lança intervém e consegue que o projecto seja aprovado com prejuízo dos demais assuntos pendentes, o que provoca protestos violentos e clamorosos da parte da minoria".
Como V. Ex.ª sabe, nada disto sucedeu. Foi exactamente o contrário que aconteceu;
A minha intervenção foi somente para que o projecto não fôsse discutido. O meu requerimento foi rejeitado em prova e contraprova.
A minha intervenção não deu motivo a protestos violentos nem da minoria nem da maioria.
Mais adiante, o mesmo jornal diz:
«Começa, assim, a fase barulhenta da sessão, não deixando mais a maioria e a minoria de se increpar de maneira tumultuosa".
Toda a Câmara sabe que êste relato é absolutamente falso e calunioso. Apoiados. O mesmo jornal referindo-se à sessão de ontem diz em título:
«Um conflito entre os Deputados Francisco Cruz e Agatão Lança".
Não me consta que tivesse havido um conflito entre mim e o Sr. Francisco Cruz.
Êsse jornal, referindo-se 'mais abaixo ao que se passou, diz:
«A certa altura, entre os Srs. Francisco Cruz e Agatão Lança trocam-se duros àpartes. O primeiro avança para o segundo,, de punhos cerrados, e increpa-o. Alguns colegas e o Chefe do Govêrno impedem o corps-à-corps".
Eu não estou aqui, evidentemente, para fazer a análise da maneira parcial, capciosa e infame como o jornalista escreveu esta notícia.
Eu quero aproveitar a oportunidade para tornar clara uma informação que vagamente, chegou aos meus ouvidos.
Constou-me que na sessão, de ontem, durante os àpartes trocados entro mim e o Sr. Francisco Cruz, e que tam infamemente foram relatados por êsse jornal, tinham sido pronunciadas frases ofensivas para mim, frases que eu não ouvi.
Com toda a serenidade própria de um homem, com a firmeza que me impõe o meu brio militar e com toda aquela fleugma que eu sei ter nos momentos mais difíceis da minha vida, e que têm atestado o meu nome, eu peço por intermédio de V. Ex.ª, Sr. Presidente, ao Sr. Francisco Cruz o favor de- dizer se pronunciou essas frases vagamente pronunciadas e com carácter ofensivo para a minha pessoa.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Francisco Cruz: — Peço a palavra para explicações.
O Sr. Presidente: — Eu não tenho forma de evitar que os jornais publiquem relatos menos verdadeiros sôbre, o que se passa na Câmara.
Nós constatamos o facto; lamentamos, mas temos de passar adiante.
Pela minha parte não vejo forma de evitar que se falte, à verdade.
Sôbre a parte que se refere ao Sr. Francisco Cruz, S. Ex.ª acaba de pedir a palavra para explicações.

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Eu devo dizer, contudo, que não ouvi nenhuma frase da parte de S. Ex.ª que eu pudesse reputar como ofensiva; aliás teria intervindo, como era do meu dever.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Francisco Cruz (para explicações): — Sr. Presidente: eu tenho a consciência de que em toda a minha vida nunca fui provocador.
Tenho a consciência de ter estado sempre ao lado de todas as causas justas e nobres, quando assim se me afiguram. Todos os que me conhecem, são disso testemunho.
Porém, seja em que campo fôr, jamais deixei de reagir quando sou ofendido ou o suponho ser, mas a minha reacção cessa quando reconheça não haver motivos para isso.
Em tais circunstâncias, costumo declará-lo sempre muito nobremente.
De resto, nunca me servi de qualquer processo para reclame e também me não sinto disposto a servir para o fazer aos outros.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
ORDEM DA NOITE
Parecer n.º 411-b — Orçamento do Ministério do Comércio
O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à votação do capítulo 1.º, bem como à emenda da comissão.
O Sr. Cunha Leal (para interrogar a Mesa): — Apenas para o facto de constatar que a nossa atitude é sempre coerente com as nossas declarações, eu peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que me diga quantos Srs. Deputados estão presentes.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 63 Srs. Deputados.
O Orador: — Desde que a votação se faz com o número suficiente, o meu Partido acompanha essa votação.
O orador não reviu.
Posta à votação a emenda da comissão, foi aprovada.
Pôsto à votação o capitulo 1.º, foi aprovado salvo a emenda.
O Sr. António Fonseca (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: eu desejava que V. Ex.ª me informasse se tenciona pôr em discussão juntamente com o Orçamento a proposta enviada para a Mesa na última sessão pelo Sr. Ministro do Comércio.
O Sr. Presidente: — Essa proposta há-de entrar em discussão no momento oportuno.
O Orador: — Essa proposta tem de entrar em discussão, para se dar realização ao problema das estradas.
Para evitar todas as dúvidas, eu peço a V. Ex.ª que me conceda a palavra para um requerimento.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A proposta que está na Mesa é para ser discutida com o capítulo 4.º
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Nós não podemos discutir propostas dentro do Orçamento, Sr. Presidente.
O orador não reviu.
O Sr. António Fonseca (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: V. Ex.ª não ignora que a proposta mandada para a Mesa é de natureza orçamental. De modo que me parece que não vale a pena estarmos aqui hoje a votar uma cousa, para amanhã a alterarmos com a votação duma proposta. Requeiro, pois, que a proposta em questão seja discutida com urgência e dispensa do Regimento.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Julgo que a urgência e dispensa do Regimento já estão votadas.
Vozes: — Não pode ser! Não pode ser! Sussurro e àpartes de vários Srs. Deputados.
O Sr. Carvalho da Silva (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: sabe V. Ex.ª, e a Câmara sabe, que há dois Regimentos nesta Câmara: um destinado a

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regular a discussão do Orçamento e outro para qualquer outro assunto.
Há uma proposta sôbre estradas, na qual são criados impostos, e por mim não estou disposto a permitir que vão servir-se do Regimento para uma discussão dê tal natureza, que se não pode fazer.
Eu pregunto, pois, a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se é ou não verdadeiro que só para a discussão do Orçamento é que foram votadas as propostas do Sr. António Fonseca.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Devo dizer a V. Ex.ª que não posso responder à sua pregunta, pois que não estava presente à sessão em que foram votadas as propostas a que V. Ex.ª se refere. O que posso dizer é que o Sr. Ministro pediu para que fossem Votadas a urgência e a dispensa, a fim de poderem ser discutidas com o Orçamento.
Apoiados da maioria.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: mesmo o facto de se votar a urgência e a dispensa do Regimento não pode querer dizer que a discussão de tal proposta seja feita juntamente com o Orçamento.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Repito a V. Ex.ª que o Sr. Ministro das Finanças pediu para que fosse discutida a proposta conjuntamente com o Orçamento. É uma resolução posterior...
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Essa proposta não é uma proposta orçamental.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Qual é o Regimento que V. Ex.ª, Sr. Presidente, aplica a essa proposta?
V. Ex.ª não marcou a discussão dessa proposta para ordem da noite.
O orador não reviu.
O Sr. Cunha Leal (para explicações): — Sr. Presidente: dizem alguns membros da Câmara dos Deputados que conseguiram instituir um regime especial para a discussão do Orçamento. Afirmam isso, em contrário duma declaração mandada para a Mesa pela minoria nacionalista.
Depois de várias discussões, continuando o Partido Nacionalista a manter a mesma doutrina (Apoiados) por intermédio dos seus Deputados, acôrdou a maioria em quê a doutrina das propostas do Sr. António Fonseca era exclusivamente extensiva à discussão do Orçamento.
Pregunto, portanto, se é lícito, na discussão do Orçamento, introduzir quaisquer propostas ou projectos de lei que possam não ter nada com a matéria que se está discutindo; e se V. Ex.ª, Sr. Presidente, entende que o regime que se estabeleceu para a discussão do Orçamento vigora para qualquer dessas propostas. Assim, eu verifico que no orçamento do Ministério do Comércio se criaram receitas, mas não está em discussão o orçamento das receitas, e apresentasse uma proposta que nada tem com o orçamento do Ministério do Comércio.
Apoiados.
Esqueceu-se a Mesa, mesmo que tivesse havido uma discussão e votação a respeito da urgência è dispensa do Regimento desta proposta, esqueceu-se a Mesa, digo, de a fazer inserir na ordem da noite.
Essa proposta não diz respeito só ao orçamento do Ministério do Comércio, mas à criação de receitas de que fala o artigo 3.º
Criam-se, portanto, receitas. E como é que essas receitas podem estar incluídas no orçamento do Ministério do Comércio?
Êste lado da Câmara não tem culpa de que o Sr. Presidente se tivesse esquecido e incluir essa proposta na ordem da noite, e, nestas condições, nós continuamos a manter a doutrina de que a proposta se não pode discutir;
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para explicações): — Sr. Presidente: eu desejo preguntar a V. Ex.ª se está ou não disposto a aplicar apenas à discussão do Orçamento b Regimento especial para a sua discussão.
Pelo facto de sé dispensar o Regimento para a discussão do Orçamento, não quere dizer que essa dispensa se aplique à discussão de qualquer proposta.

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E depois, não podendo cada orador falar mais do que meia hora, como é que se pode discutir uma proposta desta natureza?
Desta forma, e em quanto se discutir o Orçamento, pode o Sr. Ministro das Finanças, por exemplo, pedir que se discutam, com urgência e dispensa do Regimento, o contrato dos tabacos, o imposto do sêlo e a contribuïção industrial! O Sr. Ministro da Guerra, pelo mesmo processo, e a propósito da discussão do capítulo 2.º do orçamento do seu Ministério, pôde requerer que se discuta a reorganização do exército. E V. Ex.ª, Sr. Presidente, admite isso?
Apoiados.
O Sr. António Fonseca com certeza que deseja que a Câmara aprecie a sua proposta.
E assim, V. Ex.ª, Sr. Presidente, entende que qualquer de nós pode apreciar a sua proposta somente durante a referida meia hora?!
Apoiados.
Além disto, como é que o Sr. Ministro do Comércio vem perfilhar essa proposta, quando há dias disse que tinha uma outra muito interessante, que resolvia o. problema da construção e reparação das estradas, proposta que lhe tinha sido presente pela Companhia Shell?!
Então porque é que se vão criar novos impostos?
O Sr. António Fonseca, ilustre leader da maioria, arranjou mais uma maneira hábil de conseguir fazer vingar a doutrina da sua proposta.
Mas não será sem o nosso protesto, que há-de ser veemente, que se praticará tal abuso.
Apoiados.
E se esta sessão fôr perdida, como já se diz que será, a culpa não é nossa, mas sim de quem pretende aplicar o regime especial para a discussão do Orçamento, à discussão de qualquer outra proposta.
Apoiados.
O discurso será publicado na íntegra revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Eu devo Declarar ao Sr. Cancela de Abreu e a toda a Câmara que encontrei admitida à discussão
a proposta do Sr. António Fonseca e como tal submeti-a à discussão.
A proposta das estradas tem a aprovação do Sr. Ministro das Finanças, mas não tem o parecer fundamentado da comissão de finanças, e portanto é necessário que a comissão de finanças dê meu parecer para que ela possa entrar em discussão, conjuntamente com o Orçamento.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Cunha Leal: — Invoco o n.º 4.º do artigo 26.º da Constituïção, e peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Eu não vejo qual seja a conexão que tenha esta proposta com o n.º 4.º do artigo 26.º da Constituïção.
No emtanto tem S. Ex.ª a palavra.
O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente: o n.º 4.º do artigo 26.º da Constituïção diz claramente que compete privativamente ao Congresso da República autorizar o Poder Executivo a realizar empréstimos e outras operações de crédito que não sejam de dívida flutuante, etc.
Ora na proposta do Sr. António Fonseca estabelecem-se alterações quanto a empréstimos autorizados anteriormente pelo Parlamento.
Todos sabem que, de dia para, dia, se modificam as taxas de desconto dos bancos e as suas possibilidades e condições.
Nestes termos, nós não sabemos se o Sr. António Fonseca quere aplicar as condições anteriores à sua proposta, e portanto se ela está dentro das condições anteriores, ou se quere alterar as condições do empréstimo da lei anterior, e assim nós precisamos que fique bem definida a opinião do Sr. António Fonseca, para que amanhã não haja dúvidas quanto às intenções do Parlamento.
E V. Ex.ª, Sr. Presidente, vê que estão claramente expressas as condições gerais em que deve ser feito êsse empréstimo na proposta do Sr. António Fonseca?
Pausa.
O Sr. Presidente: — Não sei.
Não posso estar a apreciar as propostas.

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Pede-se autorização para contrair um empréstimo.
O Orador: — Não se pode pedir à Câmara um empréstimo de tal natureza; ninguém pode pedir, tal autorização, porque isso é inconstitucional.
E nós, que já estamos habituados a interpretações dúbias, precisamos esclarecer bem êste caso.
O orador não reviu, nem o Sr. Presidente fez a revisão das suas declarações.
O Sr. António Fonseca (para explicações): — Começo por dar uma explicação.
Devo dizer a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que eu não me queixei ainda há pouco de que V. Ex.ª me tivesse preterido no uso da palavra.
O Sr. Presidente: — Pareceu-me.
O Orador: — Pois pareceu a V. Ex.ª
Estou convencido de que, se na ocasião oportuna V. Ex.ª me tivesse dado a palavra, já êste assunto se teria esclarecido.
Está-se tratando de alterar uma lei já existente.
Se o Sr. Cunha Leal tivesse lido a lei n.º 1:238, de Novembro de 1920...
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): — V. Ex.ª quere dizer que eu não li essa lei?!
Isso é o mesmo que fazer de mim tolo.
O Orador: — Ora essa...
Sussurro e àpartes de vários Srs. Deputados que se não entenderam.
O Sr. Presidente (agitando a campainha): — Peço ordem!
Está no uso da palavra o Sr. António Fonseca.
Pausa.
Àpartes e sussuro.
O Sr. Presidente: — Não há maneira de assim se poderem dirigir os trabalhos.
Vozes da maioria: — É cumprir o Regimento!
Regimento!
Regimento!
O Orador: — Sr. Presidente: eu dou todas as licenças para me interromperem, e muito especialmente ao Sr. Cunha Leal, não só pelas relações de amizade que desde há muito mantenho com S. Ex.ª, mas também porque julgo S. Ex.ª incapaz de se me dirigir de uma forma menos correcta.
Portanto, desde que o Sr. Cunha Leal me deseje interromper, eu dou-lhe êsse direito, somente o condiciono, reconhecendo-o a todos, a uma única condição: é a de me pedirem para interromper.
Nunca nesta Câmara ainda ninguém se queixou que eu tivesse o propósito de colocá-lo em má situação.
O Sr. Cunha Leal quere talvez que eu me irrite, mas eu sou um extenuado, e não posso irritar-me; os meus órgãos não mo permitem.
Desejo mostrar à Câmara que há um equívoco lamentável nesta questão.
Com o facto de eu ter dito que o Sr. Cunha Leal não tinha lido a lei, apenas quis significar que S. Ex.ª não a tinha interpretado bem.
Eu pretendo modificar o que se encontra estabelecido no § único do último artigo da lei n.º 1:238... Eu o que pedi foi a alteração da parte dum artigo e só dele. Ficam, portanto, de pé todos os outros artigos e parágrafos.
Mas se isto não bastasse, ter-se-ia em conta a lei n.º 1:238; para mostrar que o regime dos empréstimos está inutilizado.
Ora a proposta do Sr. Ministro das Finanças significa que se não farão empréstimos, e basta ler essa proposta para se ver que, não sendo a 7 por cento, os empréstimos são impossíveis.
Trata-se de uma lei caracteristicamente orçamental, e, se o Parlamento a não votar, às verbas que ficam são as da lei n.º 1:238.
Se tal suceder, fica-se na situação em que se estava.
Mas o que estamos nós fazendo aqui?
Estamos a legislar para o Orçamento; estamos a inscrever verbas no Orçamento, embora tudo o que diz respeito a estradas devesse ficar num só diploma.
Eu entendo, Sr. Presidente, que se deve acabar com toda esta discussão, pois a verdade é que em minha opinião o assunto se pode discutir separadamente, aplicando-se a um ponto as disposições re-

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gimentais que vigoram para a aprovação dos orçamentos, e ao outro as disposições gerais do Regimento.
Creio que desta forma fàcilmente se poderia resolver o assunto, visto que os Srs. Deputados assim, poderão discuti-lo o tempo que quiserem e com a largueza que êle requere.
Creio, pois, que assim se poderia dar uma solução ao assunto a contento de todos, pois a verdade é que não vejo razão para que se ponha de parte e não se procure dar uma solução ao que, a meu ver, hoje é dos mais graves e importantes.,
É êste, pois, Sr. Presidente, o alvitre que apresento; isto é, repito, aplicar-se a uma parte as disposições regimentais em vigor e aplicar-se também à outra parte as disposições regimentais igualmente em vigor para a discussão e aprovação dos orçamentos.
Assim, poder-se há dar uma solução ao assunto, e desta forma, creio eu, poderemos estar todos de acôrdo.
Não mo parece que as alterações introduzidas ao Regimento possam inibir que se discutam outros assuntos, tanto mais da natureza dêste, que a meu ver é da máxima importância e necessidade.
Espero, pois, Sr. Presidente, que a Câmara esteja de acôrdo com o alvitre que apresentei, única forma de resolver o assunto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — V. Ex.ª, Sr. Presidente, poder-me há dizer em que sessão foi aprovada a urgência e a dispensa do Regimento para a proposta em questão?
O Sr. Presidente: — Não posso responder desde já a V. Ex.ª íl, pois, para o fazer, necessito de consultar as actas.
O Orador: — Eu por mim tenho a impressão de que isso resolverá a questão, nos termos em que foi resolvido e consta da acta n.º 70, de 26 de Abril.
Dela não vejo que fôsse aprovado o requerimento de urgência e dispensa do Regimento.
Parece-me que o esclarecimento dêste caso resolverá a questão de vez.
O Sr. Presidente: — O Sr. Cancela de Abreu acaba de ler a acta duma sessão a que eu não presidi.
Da acta, ou porque ela não esteja bem feita, ou porque efectivamente não tivesse sido votada a urgência e dispensa do Regimento, não consta que essas urgência e dispensa tivessem sido votadas.
Estamos, pois, em face dum facto contra o qual não podem quaisquer outras explicações.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. António Fonseca: — Era exactamente essa informação que eu desejava.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Ninguém requereu a urgência e dispensa do Regimento...
Vozes: — Não pode sor!
O Sr. Vitorino Godinho: — Então é o Sr. Cancela de Abreu que dirige os trabalhos desta Câmara?
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Como se vê, de alguma cousa serviu a minha intervenção.
O Sr. José Domingues dos Santos. — Sr. Presidente: não assisti à sessão do dia 26 a que só referiu o Sr. Cancela de Abreu.
Não sei por isso se foi aprovado ou não o requerimento de urgência e dispensa do Regimento, nem sei também se conjuntamente com êsse requerimento foi aprovado um outro para que entrasse em discussão, com a proposta do Sr. António Fonseca, o orçamento do Ministério do Comércio.
O que não podemos é continuar neste regime do explicações, em que estamos há perto de uma hora.
Muitos apoiados.
Isto revela apenas o propósito de não discutir o Orçamento.
Muitos apoiados.
Levantou se a questão da constitucionalidade ou inconstitucionalidade da proposta do Sr. António Fonseca, à sombra do n.º 4.º do artigo 26.º
O que quero isto dizer?

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O Sr. António Fonseca mandou uma proposta para a Mesa de autorização ao Poder Executivo.
A Câmara votou ou não votou que ela estava dentro do artigo 26.º?
É claro que votou; logo esta é a doutrina que temos de seguir.
Em nome da maioria eu quero lavrar o meu protesto pela forma por que se pretende protelar a discussão daquilo que sé resolveu discutir, e por esta forma termino as minhas considerações.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr Carvalho da Silva (para invocar o Regimento): — Pela doutrina do artigo 79.º do Regimento, não pode ser admitida a proposta do Sr. António Fonseca.
O Sr. Cunha Leal: — Nunca tive interêsse em criar dificuldades, nunca levantei questões, senão quando a minha consciência me indica que as devo levantar e que sejam defensáveis.
Eu não estou a tirar conclusões das minhas palavras, mas dó que disse o Sr. António Fonseca.
Se o artigo 9.º é suprimido, toda a matéria dêsse artigo, incluindo os seus parágrafos, é suprimida.
Assim é a minha interpretação, que julgo lógica.
O Sr. António Fonseca: — Há tantas dúvidas a êsse respeito, que até o Supremo Tribunal Administrativo tem feito acórdãos para esclarecimento.
O Sr. Moura Pinto: — Calcule V. Ex.ª que até são precisos acórdãos!
O Orador: — Disse muito bem o Sr. Moura Pinto; até são precisos os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo!
Isto é, a interpretação é tam difícil, que é necessário fazer-se uma consulta a um tribunal!
Pode evidentemente haver um êrro de interpretação, mas não pode passar pela cabeça de ninguém o pensamento de que, levantando aqui a questão, obedeci aã intuito de fazer chicana política, o que estaria muito abaixo daquilo que qualquer Deputado deve à sua própria inteligência.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Fonseca: — Sr. Presidente: não se demonstrou que a proposta fôsse inconstitucional.
Posso ter feito uma proposta defeituosa, mas ao Parlamento é que compete aperfeiçoar e corrigir as propostas que não estão em condições de ser aprovadas, introduzindo-lhe, para isso, as emendas e modificações necessárias.
O orador não reviu.
O Sr. Cunha Leal: — Na minha opinião a proposta do Sr. António Fonseca é inconstitucional, e eu pregunto a S. Ex.ª: devemos obediência a uma proposta inconstitucional, mesmo que ela tenha sido aprovada pela Câmara?
Evidentemente que não, e é por isso que a minoria nacionalista não reconhece dever obediência à proposta do Sr. António Fonseca.
O Sr. José Domingues dos Santos: — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se concede a urgência e dispensa do Regimento a essa proposta, fazendo-a seguir imediatamente para a comissão de finanças.
O orador não reviu.
O Sr. António Fonseca (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: eu entendo que devemos considerar se a proposta é ou não orçamental, porque, se o não é, pode escusar de ir à comissão de finanças.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para interrogar a Mesa): — Peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o favor de me informar se, quando essa proposta vier com o parecer da comissão, S. Ex.ª lhe aplica o Regimento, na parte, relativa aos orçamentos.
O Sr. Presidente: — Desde que a proposta seja considerada orçamental, evidentemente que aplico o Regimento, na parte relativa ao Orçamento.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para invocar o Regimento): — Sr. Presidente:

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como é que V. Ex.ª pode aplicar esta disposição, nos termos de uma alteração feita no ano passado ao Regimento?
Isto não pode ser, Sr. Presidente, e eu desde já declaro a V. Ex.ª que nos havemos de opor a que isso se faça.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho de Silva: — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª o obséquio de me informar se se pode admitir na Mesa uma proposta que cria impostos, quando se discute o orçamento de despesa do Ministério do Comércio. O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Deixe V. Ex.ª vir o parecer da comissão de finanças, devidamente fundamentado, e enteio poderei responder.
S. Ex.ª não reviu.
O Orador: — Mas V. Ex.ª não pode admitir na Mesa uma proposta que vai de encontro ao Regimento.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Mas eu só poderei responder a V. Ex.ª quando vier o parecer da comissão de finanças.
S. Ex.ª não reviu.
Trocam-se àpartes.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se o requerimento do Sr. José Domingues dos Santos.
O Sr. Afonso de Melo: — Peço a palavra para invocar o Regimento.
O Sr. Presidente: — Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Afonso de Melo: — Sr. Presidente: nos termos do n.º 2.º das alterações ao Regimento, votadas por esta Câmara, uma das normas a seguir é a de as propostas baixarem imediatamente à comissão.
Não sei, pois, a que propósito vem a dispensa requerida pelo Sr. José Domingues dos Santos.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se o requerimento do Sr. Domingues dos Santos.
É aprovado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a V. Ex.ª que a proposta seja publicada no Diário do Govêrno próximo para ser conhecida pela Câmara.
O orador não reviu.
O Sr. António Fonseca: — V. Ex.ª diz-me se a circunstância de ser votado o requerimento do Sr. Cancela de Abreu me inibe de fazer amanhã um requerimento para a discussão imediata?
O Sr. Presidente: — Não, senhor.
O Orador: — Então pode dizer-se uma publicação inútil.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Não é inútil; é para conhecimento da proposta.
Nem ao menos a querem deixar publicar!
O orador não reviu.
É rejeitado o requerimento do Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Não querem conhecer uma proposta, mas querem votá-la.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, esta confirmou a rejeição.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Peço a palavra para explicações.
Uma voz: — É demais. Não pode ser. A brincadeira é demais.
O Sr. Presidente: — Peço a atenção dos Srs. Deputados.
Vou dar a palavra ao Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Carlos Pereira: — A minoria monárquica, em determinada sessão, procedeu batendo nas cadeiras; eu faço o mesmo.
O orador não reviu.
Vozes: — Ordem, ordem.

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O Sr. Presidente: — Eu peço a atenção da Câmara.
Eu não posso negar a palavra para explicações ao Sr. Cancela de Abreu.
Posso, contudo, dizer ao Sr. Cancela de Abreu que se tem estado num regime excepcional de explicações há muito tempo, e que dando-lhe a palavra para explicações é só para explicações que lhe dou, restritamente.
Não sendo assim, retiro-lhe a palavra.
Apoiados.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Quero explicar a V. Ex.ª sem prejudicar o seguimento dos trabalhos da Câmara, que não tendo nós maneira de ver a proposta, para a estudarmos devidamente, eu pedi que ela fôsse publicada no Diário do Govêrno.
Os Srs. Deputados da maioria não querem que a proposta seja conhecida da Câmara.
Mais nada; é não é perante a desordem que cedo.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Está em discussão o capítulo 2.º do orçamento do Ministério do Comércio.
O Sr. Tôrres Garcia: — Requeiro a V. Ex.ª seja consultada a Câmara sôbre se consente a prorrogação da sessão até se votar o orçamento do Ministério do Comércio.
O Sr. Velhinho Correia: — E sem interrupção. Aprovado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova o invoco o § 2.º do artigo 116.º
Feita a chamada, aprovaram 44 Srs. Deputados e rejeitaram U, sendo, portanto, confirmada a votação.
O Sr. Tavares Ferreira: — Mando para a Mesa duas propostas.
Leu-se o capítulo 2.º e as emendas do Sr. Tavares Ferreira.
Foram aprovadas e são as seguintes:
Capítulo 2.º, artigo 16.º:
Proponho que a rubrica do artigo 8.º, capítulo 2.º (p. 27) seja substituída por: a Arquitectos e engenheiros auxiliares em tirocínio". — O relator, Tavares Ferreira.
Capítulo 3.º, artigo 17.º: Proponho que na rubrica «Pessoal do quadro» do artigo 17.º do capítulo 3.º (p. 29) se eliminem as verbas destinadas a um médico na importância de 780$, visto estar vago êsse lugar. — O relator, Tavares Ferreira.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Procede-se à contraprova e contagem. De pé 4 Srs. Deputados. Sentados 48.
O Sr. Presidente: — Não há número. A votação repete-se quando houver número.
Vai entrar em discussão o capítulo 3.º
O Sr. Tavares Ferreira: — Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para mandar para a Mesa uma proposta de eliminação.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Tavares Ferreira.
Fica em discussão juntamente com a matéria.
O Sr. Presidente: — Como mais nenhum Sr. Deputado pede a palavra, considero encerrada a discussão, ficando a votação para. quando houver número.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está em discussão o capítulo 4.º
O Sr. António Fonseca: — Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para dizer que me não parece lógico que se esteja aqui a discutir uma cousa, quando há uma proposta tendente a alterá-la.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Está em discussão o capitulo 5.º
O Sr. Tavares Ferreira: — Pedi a palavra, Sr. Presidente, para mandar para a Mesa uma proposta de emenda.

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O ano passado não vinha incluída na parte respectiva uma verba para conclusão de obras.
Assim, há que abater à verba geral destinada aos edifícios públicos, que passará a ser de 2:300 contos.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Tavares Ferreira.
Lida na Mesa a proposta, fica em discussão juntamente com o capitulo.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Vaz Guedes): — Sr. Presidente: pedi a palavra porque desejava aproveitar a ocasião para mandar para a Mesa uma proposta de lei assinada por mim o pelo Sr. Ministro das Finanças, pela qual são passados para a Assistência os operários inutilizados nas obras dó Estado. Sequeiro para a minha proposta urgência.
O Sr. Presidente: — A votação da urgência fica para quando houver número.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Lúcio de Azevedo.
O Sr. Lúcio de Azevedo: — Sr. Presidente: pedi a palavra para relatar um lacto, qual é o do ainda nesta altura nós vermos que as obras dos edifícios públicos se encontram disseminadas por diversos Ministérios, o que é verdadeiramente deplorável, porquanto um tempo houve, e isso foi no extinto regime, em que tal critério se não adoptava, trazendo o processo um melhor rendimento.
A direcção do trabalho o de construção nós vemos sucederem-se novas direcções do construção do edifícios, encontrando-se assim dispersas e disseminadas,, o que representa um grande prejuízo para o Estado.
Sabem V. Ex.ª, Sr. Presidente o a Câmara que, quando tais serviços estavam adstritos ao antigo Ministério das Obras Públicas, havia uma direcção geral de obras públicas e minas, que tinha a superintendência do todas as obras de construção e reconstrução.
Disseminou-se essa direcção por novos Ministérios, e assim vemos no Ministério do Trabalho um conjunto de obras autónomas, como, por exemplo, o Manicómio Bombarda, cujos resultados de administração são bem conhecidos e bem tristes.
Para desejar seria, pois, que voltássemos à primeira forma, visto que é no Ministério do Comércio que existe o grupo de engenheiros especialistas, que poderiam muitíssimo bem tomar a direcção técnica e administrativa de tudo quanto seja edifícios em construção e reconstrução.
Isto é um desejo que eu manifesto, e estou convencido de que, se voltássemos à primeira forma, a administração pública muito teria a lucrar.
Aproveito o ensejo para chamar a atenção da Câmara para uma proposta que vou mandar para a Mesa, e a respeito da qual já pedi a colaboração dos Srs. Ministros das Finanças e do Comércio, lembrando que, entre os edifícios públicos que funcionam em condições deploráveis, figura a Casa da Moeda e Valores Selados.
A acumulação de serviço naquele estabelecimento é.de tal natureza, que não pode permitir o prolongamento do actual estado de cousas.
Nestas condições, eu desejaria que a Câmara votasse a proposta que vou submeter à sua consideração, sôbre o capítulo 5.º, destinada à ampliação e instalação do edifício; peco-lhe que, pelo menos, vote a verba de 200.000$.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Devo declarar ao Sr. Lúcio de Azevedo que a proposta que S. Ex.ª acaba de enviar para a Mesa não pode ser aceita, em virtude da lei-travão.
Quanto à outra proposta apresentada, também não pode ser aceita, por não ser permitida a transferência de verbas.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Plínio Silva: — Sr. Presidente: eu peço muito particularmente a atenção de V. Ex.ª para o que vou dizer, e devo desde já declarar que, na invocação do Regimento e preguntas que vou fazer a

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V. Ex.ª, eu não tenho outro fim se não o de lhe facilitar p desempenho da sua espinhosa missão.
Na alteração do Regimento, ultimamente feita, creio que ficou assente que a. Mesa, logo que verifique a existência do número suficiente de Deputados para as votações, proceda à votação da matéria já discutida.
Compreende, portanto, V. Ex.ª que é legítima a pregunta que eu, em qualquer altura, possa fazer sôbre qual o número de Deputados que se encontram na sala, e se V. Ex.ª me responder, que o número é o do quorum, ou seja de 55 Srs. Deputados, eu posso requerer à Mesa que se faça a votação.
Nestas condições, eu pregunto a V. Ex.ª quantos Srs. Deputados estão na sala, e, caso haja número legal para se tomarem deliberações, se V. Ex.ª submete à votação os capítulos já discutidos.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A maneira mais prática que eu tenho de responder às preguntas do Sr. Plínio Silva é proceder imediatamente às votações.
Vai proceder-se à contraprova das alterações ao artigo 2.º
Procedeu-se à contraprova.
O Sr. Presidente: — Não há número para se fazerem votações.
O Sr. Cunha Leal (para explicações): — Sr. Presidente: é velha usança de quem se respeita a si próprio e respeita os outros, e sentindo ser demais nalguma casa, sair dela.
Apoiados.
Bem ou mal por amor da República, pelo sincero desejo de extremar os campos e opiniões, e não para acoitar cadeiras de Ministro, que talvez ambicionem algumas das pessoas que têm determinados desejos — mas é um facto que nada interessa a quem, durante a sua vida pública, só tem querido afirmar princípios e convicções; para êsse fim eu marco a minha situação.
É certo que eu, tomando a iniciativa, afirmei e mandei para a Mesa uma declaração, dizendo que, à face da minha consciência, da qual ninguém, nesta hora, tem o direito de duvidar, eu considerava que, de facto, eram irritas e nulas as decisões tomadas pela Câmara, por serem contra as disposições regimentais.
Afirmei, citando os artigos do Regimento, e em virtude de a maioria se ter sobreposto, não com razões, mas com a fôrça numérica, àquilo que estava dentro do Regimento, que considerava irritas e nulas, as deliberações tomadas.
As atitudes que se seguiram foram conseqüência desta atitude.
Nos seus termos foram, porventura, feridos os meus sentimentos mais íntimos e profundos. Mas eu não sei mudar das minhas atitudes.
Eu entendo que, a partir da hora em que eu firmei uma atitude, só tinha uma outra, que era a de impedir que o Parlamento funcionasse tumultuàriamente, porque nós, os nacionalistas, desejávamos discutir uma proposta que supúnhamos ruïnosa para os interêsses da Nação.
Procedendo assim, nós não éramos menos amantes da nossa terra e desta República que servimos, pelo amor da qual tivemos conflitos do família e sofremos amarguras, sem, todavia, a termos explorado no anu amor com o amor pela monarquia.
Nestas condições, ou entendo que o meu procedimento derivava de responsabilidades tomadas por mim e mo obrigava a tomar outra atitude, e que nestes termos eu só tinha uma cousa a fazer, em holocausto à República, pelo amor que lhe tenho, porque não tenho recordações da monarquia. Assim se querem praticar uma violência, eu, que sou aqui de mais, que sou parasita dentro do Parlamento, renuncio ao meu lugar de Deputado.
Mas o meu acto de renúncia não é como aqueles que nós estamos acostumados a ver: postos de parte desde que sejam acompanhados de vários pedidos para que se desista dêles.
Não, o meu não é dêsses, porque reconheço que sou aqui de mais.
Bom republicano não sou, porque não tive a aprovação do congresso do Partido Republicano Português. Sou enxovalhado em jornais republicanos, e eu, que tenho filhos, mulher, e pai e embora êste seja paralítico, tive que guardar êsses jornais na minha algibeira para que êles os não lessem e se não envergonhassem de um

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homem que nunca foi senão republicano, e que tem conseguido sempre o que outros não têm alcançado — ser honrado.
Acredite V. Ex.ª que, se alguma vez pronunciei palavras irreflectidas, foram conseqüência de azedumes largamente amalgamados dentro da minha alma.
Deixo atrás de mim companheiros que estimo e prezo.
Não podendo ser outra cousa na política senão republicano, declaro que não quero continuar a ser militante de uma política em que é preciso, a toda a hora, cada um puxar pelos seus pergaminhos.
O orador não reviu.
O Sr. Moura Pinto: — Tenho estado há longo tempo afastado da atitude combativa que tomei nos primeiros anos em que estive nesta Câmara.
Sinto que qualquer cousa de grave vai surgir desta sessão, e rogo por isso a V. Ex.ª e à maioria, em nome dos compromissos quê temos perante a Nação, perante o estrangeiro, perante todo o mundo e até perante nós próprios, que não dêmos passos irremediáveis, daqueles de que resultam complicações sucessivas até chegar ao perigo máximo, que é o ódio máximo.
Tenho talvez uma autoridade especial para dizer isto, porque ninguém me pode acusar de insistir em atitudes combativas quando reconheço que são perigosas.
Sr. Presidente: faço aqui acto de penitência de todas e quaisquer palavras que eu porventura tenha proferido e que fossem susceptíveis de avolumar ou provocar ódio, garantindo a V. Ex.ª, sob minha palavra de honra, que, ao falar no Parlamento, sempre tive o intuito de bem servir a causa da Pátria e da República.
Mas reconheço que, sendo sincero e pretendendo ser justo, eu porventura contribuí também para a catástrofe, donde não vem nem remédio nem vantagem para a República.
Peço à maioria que pense, que medite, que reflita nas circunstâncias graves que surgem dêste incidente que se vem arrastando há oito dias.
Quem nos diz que a maioria, que julga vencer, não fica vencida e que porventura não ficamos vencidos todos nós?
Apelo para V. Ex.ª, Sr. Presidente, em nome da Pátria e da República.
Apelo para todos os republicanos e principalmente para V. Ex.ª, a fim de com a sua autoridade procurar sanar êste lamentável incidente e remediar ou evitar casos mais graves que ainda possam surgir.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Diga que casos graves são êsses.
O Orador: — Um dêsses casos graves é haver aqui certos Deputados.
Agitação.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Tacares de Carvalho não fez a revisão do seu «àparte".
O Sr. Presidente: — Peço atenção e prudência.
O momento que passa é demasiado grave.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Agatão Lança: — Não pertenço a nenhum partido da República, mas espero de todos os republicanos o favor e a justiça de me não alcunharem de talassa.
Desde que entrei nesta casa do Parlamento, nunca sofri, como agora, o pêso de um desgosto tam grande e que tam profundamente fizesse afectar e vibrar os meus sentimentos de republicano.
Nunca senti, como hoje, o pêso de amargos dias que porventura se vão passar e que fará sofrer ainda mais esta república, à qual dediquei o melhor da minha alma!
Sr. Presidente: eu verifico, com imensa mágoa, uma incompatibilidade entre os partidos da República, e por isso eu apelo para a consciência de todos os parlamentares que me ouvem, a fim de que meditem no que de grave pode surgir, não só para o prestígio do Parlamento, mas para a segurança, tranqüilidade e vida do regime, o qual, creio, todos os republicanos pretendem bem servir.
Sr. Presidente: não sei como poderá terminar êste conflito, que parece irredutível e que dura há oito dias.
Eu sei que esta Câmara tomou há pouco a resolução de não interromper a ses-

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são sem ser votado o orçamento do Ministério do Comércio.
Mas depois dessa resolução alguma cousa de imprevisto surgiu, e eu pregunto: se amanhã todos os Deputados nacionalistas, Deputados de um partido da República, abandonarem esta Câmara, os outros parlamentares pertencentes ao Partido Católico e os parlamentares independentes quererão continuar a nela trabalhar?
Eu entendo que, por cima da resolução que há pouco a Câmara tomou, será fácil passar, desde que nós por um momento, pondo de parte a votação realizada, dêmos um passo para a união e concórdia entre os dois partidos da República.
Eu tenho a convicção de que, se não tomarmos essa resolução, amanhã todos nós nos arrependeremos.
Nestas condições, eu ouso propor ao espírito esclarecido de V. Ex.ª, Sr. Presidente, e da Câmara, que esta sessão seja imediatamente suspensa, para que se possam fazer as démarches necessárias para se chegar a um acôrdo honroso entre os dois partidos, e para que a República continue a ser sorvida por cies; e para que nós não nos vejamos privados da companhia de homens que são patriotas e que procuram, a seu modo, servir a Pátria e a República com a mesma dedicação com que todos nós, republicanos, a procuramos servir.
Embora possa ter errado algumas vezes, e todos nós temos errado, o Sr. Cunha Leal, distinto oficial do exército, parlamentar de destaque, tem prestado à República os mais altos serviços em momentos bem graves, como foi êsse depois de 19 de Outubro, e seria uma infâmia que nós esquecêssemos êsses serviços neste momento.
Termino, formulando a seguinte proposta:
Que esta sessão seja encerrada a fim de se achar uma forma de conciliação entre os partidos da República desavindos, e que a Mesa seja encarregada dessa missão.
Procedendo assim, eu julgo ter prestado um serviço à República e à minha Pátria, e é essa a única consolação que eu tenho, sem receio de que alguém me procure acoimar de que quis servir os interêsses de A, B ou C.
O Sr. José Domingues dos Santos (para explicações): — E na verdade melindrosa a situação da maioria parlamentar.
A maioria parlamentar tem o seu fim, que é fazer aprovar os orçamentos dentro do prazo marcada pela lei.
Apoiados da esquerda.
Dentro dêsse critério, sem violências e sem enxovalhes, ela tem procurado seguir o seu caminho.
Não sei a que propósito veio nesta hora a discussão sôbre mais ou menos republicanismo.
Apoiados da esquerda.
Dêste lado da Câmara ninguém sancionou quaisquer palavras que porventura significassem o propósito de ter em menos conta o republicanismo da minoria nacionalista.
Apoiados da esquerda.
Eu por acaso tenho uma especial autoridade para assim falar, porque no congresso do meu Partido tive ocasião de afirmar que para aqueles republicanos filiados em outros partidos, e que, seguindo embora uma trajectória diversa tinham o mesmo fim, a posição do Partido Republicano Português devia ser esta: olhos leais e mãos leais para êles estendidas.
Quem assim fala, quem assim procede, não pode ser acusado de querer levantar questões irritantes nem tam pouco de passar atestados de menos republicanismo aos outros.
Era já tempo do acabarmos com esta scie de nos julgarmos mais ou menos republicanos do que os outros. Por mim não me julgo mais republicano ou menos republicano, do que os homens que se assentam naquelas bancadas.
Era bom que isto se afastasse da discussão.
O que nesta hora se discute é se se deve seguir ou não o que propôs o Sr. António Fonseca, e que foi sancionado pela maioria.
Pelo facto de nós termos uma opinião diversa da minoria, segue-se daí que queiramos fazer um agravo a quem assim não pensa?
Então porque não há-de ser o inverso?
Em todos os Parlamentos são as maiorias que decidem, e no nosso assim tem sucedido sempre.
Dêste lado da Câmara não há o propó-

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sito de tornar insolúvel as questões irritantes que surgem, mas a maioria também, não pode abdicar dos seus pontos de vista, simplesmente porque alguém se levanta a dizer que não concorda com a nossa orientação.
Apoiados da esquerda.
É possível entrar num entendimento, num bom, num honesto e digno entendimento entre a minoria nacionalista e a maioria democrática?
Não será dêste lado da Câmara que V. Ex.ª, Sr. Presidente, terá a menor oposição.
Apoiados da maioria.
É possível quebrar as arestas desta questão, que já se vem arrastando há dez dias, sem que tanto á minoria como a maioria fiquem deminuídas?
Tem V. Ex.ª, Sr. Presidente, dêste lado todo o apoio para isso.
E útil, é necessário e conveniente para o prestígio da República que os Partidos se entendam, mas dentro do caminho que cada um deve seguir.
O Sr. Moura Pinto em frases bem comovidas apelou para V. Ex.ª, para que pusesse termo a êste conflito.
Êste lado da Câmara dá o seu voto para que V. Ex.ª inicie as suas démarches, e pode V. Ex.ª ter a certeza de que não encontrará da nossa parte qualquer cousa que possa impedir, com honra para os dois lados, de encontrar uma solução.
O Sr. Agatão Lança propôs que se suspendesse a sessão até se resolver o conflito.
V. Ex.ª procederá como julgar conveniente.
Em nossa opinião, porém, entendemos que. isso não é necessário, e que podemos continuar a discutir, emquanto V. Ex.ª faz as suas démarches. Se porém V. Ex.ª julgar que é necessário para o bom êxito dessas démarches que a sessão se suspenda ou se encerre, a maioria não se oporá.
Quem assim procede mostra bem que não tem outro desejo que não seja êste: que os Partidos mutuamente se respeitem, porque não podemos ser respeitados lá fora, quando aqui dentro nos degladiar-nos.
E eu nunca compreendi que uma democracia possa viver, quando o seu mais. alto Corpo, o Corpo Legislativo, não merece consideração e respeito.
Tem-se achincalhado demasiadamente o Parlamento (Apoiados), e o que se passou hoje nesta sala não é de molde a prestigiá-lo.
Apoiados.
São para V. Ex.ª, Sr. Presidente, os nossos votos de que possa levar a bom termo a solução dum conflito que estalou contra nossa vontade, e que nós não queremos prolongar por mais tempo.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: falo em nome duma minoria de oposição ao regime, mas isso não faz com que da minha bôca saiam quaisquer palavras que, ao de leve sequer, possam irritar o conflito travado entre a maioria desta Câmara e a minoria nacionalista.
Não acompanharei, como V. Ex.ª compreende, as considerações dos ilustres oradores que me antecederam no uso da palavra, no campo em que S. Ex.ªs as puseram, e não acompanharei porque eu apenas ouvi falar em República, e eu, que represento uma minoria hostil ao regime, não me vou ocupar da vida da República.
Mas entendo eu, e entende êste lado da Câmara, que uma cousa há que todos nós, Deputados de qualquer das suas parcialidades, monárquicos ou republicanos, temos o dever de não esquecer, nem sequer por um instante: é o prestígio do Parlamento, é o prestígio da representação nacional.
Apoiados.
Entendo que sôbre todos os assuntos a discutir nesta Câmara há o aspecto nacional, o aspecto que a todos os portugueses deve interessar.
Não há dúvida que é lamentável o conflito ocorrido entre a maioria e a minoria nacionalista, com a qual somos solidários no incidente que o originou, e faço votos por que V. Ex.ª, Sr. Presidente, consiga estabelecer a boa harmonia que deve existir entre todos os lados da Câmara, para que toda a gente — e não só os partidos republicanos, como foi frisado pelos oradores que me antecederam — possa colaborar no bem do País.
O bem do País não é pertença de republicanos nem de monárquicos; o bem do País interessa por igual a todos os portugueses, qualquer que seja o seu credo político.

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Acima de tudo estão os interêsses da Pátria, que o mesmo é dizer os interêsses nacionais.
E porque assim pensamos, em V. Ex.ª, Sr. Presidente, entendemos que muito bem delegada está a representação desta Câmara, para que faça cessar quaisquer mal entendidos que porventura, tenha havido.
Levanta-se agora novo incidente, provocado pelo gesto do Sr. Cunha Leal, renunciando ao seu lugar de Deputado.
Nós, dêste lado da Câmara, fazemos os mais sinceros votos por que S. Ex.ª possa voltar — e volta — aos trabalhos parlamentares (Apoiados), e delegamos em,V. Ex.ª, Sr. Presidente, os nossos esfôrços no sentido de que S. Ex.ª ponha de parte o seu gesto, esperando também que V. Ex.ª nos dê a honra de transmitir ao Sr. Cunha Leal a expressão do nosso desejo, muito sincero, em vermos S. Ex.ª a colaborar nos trabalhos parlamentares.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Tôrres Garcia: — Sr. Presidente: não sei se êste incidente, que já dura há dias, surgiu naturalmente, ou se foi o pretexto para. se chegar até o ponto agudo em que hoje estamos. Eu tenho-me limitado a analisar o fenómeno, a observa-lo, sem me comover perante processos que não estão dentro da minha educação republicana.
Eu não possuo merecimento algum, mas tenho o de ser republicano com princípios que não são os desta República, pois não compreendo antagonismos pessoais e questiúnculas que não deixam ter confiança nos destinos da República e no bem da Nação.
Sr. Presidente: talvez que êste defeito do meu republicanismo provenha da minha educação pela leitura que em tenra idade fiz da História da Revolução francesa, e de ter dessa, leitura tirado ensinamentos, embora contraditado pelo sentimentalismo de muitos historiadores que consideravam figuras apagadas e cruentas os homens defensores do povo sofredor, que mais trabalharam na revolução, como o grande Marat, que decretou na Convenção que se salvasse a Pátria e a República, através de tudo.
Pois, quando diziam a Marat que era preciso harmonia e conciliação, êle respondia que nessa harmonia e nessa conciliação estava a morte da República.
Transportada a harmonia e a conciliação para a República Portuguesa, daí proveio o pântano em que vivemos.
É necessário agravar mais êste conflito, levá-lo até a sua culminância para aproveitar êsse instante supremo para se liquidarem de vez nesta terra.todos os equívocos em que temos vivido.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — É uma solução.
O Orador: — Quem não souber vencer dará o lugar a quem saiba e possa vencer.
Fora disto só há a perda da Pátria! O que tenho eu visto em toda a vida da República?
Tenho visto que a seguir ao aparecimento de qualquer atrito por mais leve que seja, com govêrno revolucionário ou não revolucionário, com govêrno que tenha fôrça ou que a não tenha, vem logo a transigência, a abdicação.
Até já houve um movimento revolucionário, que não obstante ter saído triunfante — refiro-me ao movimento militar de 14 de Maio — nada conseguiu fazer do que se propunha levar a efeito.
A obra do Govêrno que se lhe seguiu foi inteiramente perdida. Tem sido sempre assim.
Apoiados.
Em Portugal a política é feita por anões, por gente que anda de cócoras. Eu gostava que a política da nossa República fôsse feita por homens de espinha direita, de dorso levantado, e que se orientassem sempre pela grande razão que é a «razão de Estado", a suprema lei. E é o que eu não vejo l Está fora dêsses princípios a discussão aqui travada.
Perdem-se dias e dias em torneios meramente pessoais, sem haver a menor atenção pelos supremos interêsses do Estado.
Mas já disse o bastante para demonstrar que não concordo com a forma. Como se pretende resolver uma questão que a Câmara não levantou, embora a pessoa de que se trata seja digna de toda a nossa consideração e respeito.

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Repito, Sr. Presidente, tenho o máximo pesar pela atitude assumida pelo Sr. Cunha Leal, mas julgo que o que há a fazer é o Poder Executivo marcar nova eleição pelo círculo por onde S. Ex.ª foi eleito, elegendo-se assim um outro represente, de não menos valor.
Interrupção do Sr. António Correia que se não ouviu.
O Orador: — Peço a V. Ex.ª o obséquio de prevenir o Sr. António Correia.que não quero que me interrompa.
Esta é a minha opinião, e para terminar devo dizer mais uma vez que lastimo profundamente a saí da do Sr. Cunha Leal, pois a verdade é que, fazendo as considerações que apresentei, não tive o intuito de censurar fôsse quem fôsse, pois o meu ánico desejo é que a República se prestigie,,para o que necessário se torna organizarmos as contas e aprovarmos os orçamentos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Lino Neto: — Sr. Presidente: o único fito da minoria católica o procurar levantar o País tanto quanto possível, e neste sentido e dentro desta orientação, eu devo dizer a V. Ex.ªs que a minoria católica acompanha gostosamente a proposta do ilustre Deputado Sr. Agatão Lança, por isso que ela se impõe a todos os respeitos;
Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Cunha Leal tem talento, sendo por isso um elemento de muito boa colaboração nesta casa do Parlamento.
Se é certo que as maiorias têm os seus direitos, podendo dispor dos seus votos como queiram, não menos certo também que as minorias têm os seus direitos, e, assim, eu devo dizer que, tendo começado a discussão do Orçamento pela meia noite, a prorrogação da sessão até se votar o orçamento do Ministério do Comércio, um dos mais importantes, representou, de facto, uma violência, motivo por que a minoria católica votou contra essa prorrogação.
Por isso a, minoria católica aplaude a proposta do Sr. Agatão Lança para que a sessão se interrompa, a fim de poderem iniciar-se os necessários entendimentos entre a minoria e a oposição nacionalista.
Quanto às manifestações do nosso feitio de meridionais, elas são próprias da nossa raça e temos do contar com elas. Divergimos pelo pensamento, mas pelo sentimento estamos todos unidos.
Votando a proposta do Sr. Agatão Lança, concorremos todos para a boa marcha das cousas políticas da nossa terra.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Plínio Silva: — Sr. Presidente: emquanto que, em geral, todos os políticos desejam atingir vertiginosamente as mais altas culminâncias, eu sou um político que pensa apenas em manter-se equilibradamente dentro da acanhada posição que me é marcada pelos meus merecimentos.
Isso me dá o direito de expor a minha opinião, sem que de tal resulte uma quebra de disciplina partidária, ou menos consideração pelo meu ilustre correligionário que há pouco falou em nome da maioria, o Sr. José Domingues dos Santos.
Eu julgo, Sr. Presidente, necessário reviver um pouco os pormenores, que rodeiam o incidente parlamentar que acaba dê se produzir e, sobretudo, chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério para a segurança e estabilidade do seu Govêrno e para a necessidade de pôr em execução as medidas que S. Ex.ª teve preparadas há quatrocentos e tantos dias.
Pretendeu o Govêrno que os orçamentos fossem aprovados a tempo e horas, e pretendeu, também, que êles fossem apreciados com a máxima latitude. Era legítima e era justa essa pretensão.
Para- que essa apreciação pudesse ser feita em tais termos, perfilhou a maioria uma proposta apresentada na sessão transacta por um Deputado da oposição o Sr. Alberto Xavier.
Em volta da atitude da maioria, aliás absolutamente lógica, levantou-se uma tremenda questão.
A maioria transigiu e o seu leader, o Sr. Almeida Ribeiro, chegou mesmo a

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dar o dito por não dito, para evitar novas dificuldades à boa marcha da República.
Fizeram-se reüniões, e a maioria foi transigindo absolutamente nos pontos de vista que ia apresentando a minoria.
Toda a gente sabe que inclusivamente chegou a reünir o Grupo Parlamentar Democrático, e que as figuras de maior prestígio dentro dele conseguiram que não se levantassem atritos. Pois, quando as transigências da maioria tinham sido todas as possíveis, notou-se então êste facto: a minoria nacionalista abandonou a sala. Vejam, portanto, V. Ex.ªs se o momento não é para os homens do Govêrno e de energia!
Se não tivesse havido, realmente, estas transigências, não se tinha chegado a esta situação: a de haver um conflito grave, difícil de solucionar.
Todavia o tempo foi correndo, e, quando julgávamos chegar a 15 de Março com es orçamentos aprovados em ambas as Câmaras, verificámos que, apesar de todos os acôrdos, dos orçamento s ainda não havia nada.
Apareceu, então, a proposta do Sr. António Fonseca, destinada a servir os interêsses da Pátria e da República, e por efeito dela surgiu um grave conflito. Reconheceu-se que a proposta do Sr. António Fonseca tinha um carácter' geral; porém, a maioria, transigindo, não se importou que se entendesse que ela se destinava apenas à discussão dos orçamentos.
Vêem, portanto, V. Ex.ªs a vontade que temos de trabalhar, transigindo até onde podemos transigir!
Apoiados.
De resto, nós não somos intransigentes, e tanto assim, que ainda há pouco no Congresso do Partido Democrático uma das primeiras propostas que apareceram foi a de saüdação ao Partido Nacionalista, acabado de constituir, e que foram aprovada, salvo um o a outro voto discordante. Pregunto, pois: onde está o nosso agravo às oposições? Não o vejo!
Apoiados da maioria.
Seja-me, portanto, permitido fazer um apelo a todos. A disciplina deve partir de cima. Dêmos nós um exemplo de disciplina, e todas as outras camadas da sociedade se tornarão disciplinadas. Mas, não procedendo assim, damos o direito às outras classes para se insubordinarem. Estou perfeitamente ao lado do Sr. Tôrres Garcia.
Diga o Govêrno o que pretende, e verá que nos tem a seu lado, e bem assim o País.
Se a maioria, porventura, aqui tem faltado a apoiá-lo, e êle lamenta essa falta, é talvez porque a maioria vê com desgosto as hesitações do Govêrno. Mas, quando, como há pouco, ò Sr. Presidente do Ministério nos indicou claramente o seu ponto de vista, verificou. que aqui nos tem todos a apoiá-lo.
S. Ex.ª tem a seu lado não apenas a maioria parlamentar, mas o próprio País.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Agatão Lança (para invocar o Regimento): — Poderia fazer considerações como já fizeram outros Srs. Deputados, mas limito-me a invocar o artigo 20.º do Regimento.
O Sr. António Fonseca: — O Sr. Domingues dos Santos fez há pouco, em nome da maioria, aquela declaração que eu classifico da mais nobre e ponderada atitude, mas seja-me lícito destacar delas duas ideas: a primeira o desejo do seu partido de não contribuir com nenhum acto para agravar a situação ou criar novas situações, que sejam ainda mais graves, e a segunda a manifestação dum voto de confiança a V. Ex.ª, para que desde já êste assunto se resolvesse com honra para o Parlamento.
Não vejo que nestes termos alguém se deminua no exercício legítimo dos seus direitos.
V. Ex.ª, com todo o seu passado de homem de bem, está nas condições necessárias para merecer o voto de confiança que deriva das palavras do Sr. Domingues dos Santos.
Estou convencido que todos os partidos dariam um exemplo de abnegação se aclamassem V. Ex.ª na qualidade de juiz da oportunidade das démarches a fazer.
Associo-me, sinceramente, às palavras

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do Sr. Domingues dos Santos para que V. Ex.ª consiga demover o Sr. Cunha Leal da sua resolução e que em breve S. Ex.ª possa nesta Câmara continuar os seus trabalhos pela Pátria e pela República.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ginestal Machado: — Sr. Presidente: entrei na sala quando bem se pode dizer que se estava já no rescaldo do incêndio, mas, como de todos os rescaldos podem sair labaredas, é obrigação de nós todos, indistintamente, sobretudo daqueles que têm o amor à República mais no coração do que nos lábios, fazer o possível para que não venham novos conflitos perturbar mais ainda a vida da nação.
Ouvi, Sr. Presidente, com agrado e com reconhecimento, as palavras de conciliação e de justiça do Sr. António Fonseca, que em nenhuma bôca poderiam ter mais autoridade.
Ouvi palavras justas, serenas, tendentes a estabelecer aquela harmonia indispensável è, marcha de qualquer colectividade, da parte do ilustre leader da maioria, Sr. José Domingues dos Santos, a quem agradeço muito a sua atitude, bem como aos Srs. Lino Neto e Carvalho da Silva.
O Sr. Agatão Lança, quando eu entrei nesta sala, estava a propor, como fórmula de conciliação, que entregássemos nas honradas mãos de V. Ex.ª a resolução dêste conflito.
Estou inteiramente de acôrdo com esta proposta.
Em melhores mãos não poderia ser depositada, para prestígio da República, a solução do conflito.
É certo que V. Ex.ª, quando, não ocupa o seu lugar de Presidente da Câmara, se senta neste lado.
Temos muita honra nisso. Mas acima de tudo V. Ex.ª é um velho republicano, e, quando está em jôgo alguma cousa que pode afectar. Intimamente a vida da República, V. Ex.ª não é partidário de ninguém, mas ùnicamente da República.
Muitos apoiados.
Foi, portanto, a pessoa que melhor poderia ser escolhida para sanar êste lamentável conflito.
E que conflito foi êste?
E acaso nm conflito que brigue com a honra de alguém?
O Sr. António Fonseca tinha uma opinião, e dêste lado da Câmara outro era o ponto de vista.
Os mesmos sentimentos, o mesmo patriotismo, a mesma dedicação republicana nos animava a todos por igual.
Temos apenas, repito-o, uma divergência de opinião, e isso não pode servir para criar irredutibilidades.
Sr. Presidente: foi aqui acusado o Partido Nacionalista por dois Srs. Deputados.
Eu lembro à Câmara aquela colaboração desinteressada que já mais de uma vez êste Partido tem dispensado ao Govêrno.
E se é certo que nesse momento o grupo de homens a quem S. Ex.ª se dirige não tinha a mesma bandeira, não tinha o mesmo nome genérico, o que é verdade é que êles não perderam as suas qualidades nem deixaram de prestar a sua colaboração nos interêsses do País, o que aliás o Sr. Presidente do Ministério, com o aplauso, de toda a Câmara, não pôde deixar de reconhecer.
É isto, Sr. Presidente, que eu tenho a responder àqueles que talvez por um excesso de mocidade se lembraram de acusar o Partido Nacionalista, quási que que pondo em dúvida a sua educação, o seu patriotismo e até, porventura, a inteligência dos homens que o dirigem.
Termino estas considerações, fazendo votos sinceros para que V. Ex.ª, Sr. Presidente, possa encontrar uma solução que convenha honradamente a todos, e principalmente à República.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: no desentendimento que tem havido entre os dois lados da Câmara, o Partido a que tenho a honra de pertencer e o outro, pelo qual tenho muita consideração, não deve o Govêrno intervir.
Todavia, devo dizer que num momento em que é preciso o esfôrço de todos, mal

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iria à República que se não procurasse resolvê-lo com honra para todos.
Não pretende, repito, o Govêrno imiscuir-se nesta questão, que é puramente parlamentar, e apenas deseja declarar que às pessoas que se sentam nesta bancada, à quási totalidade composta de parlamentares, acompanham inteiramente os votos desta Câmara, no sentido de que êste desentendimento seja, resolvido, sem que qualquer das partes seja deminuída.
Ao Sr. Presidente pertence, portanto, depois das afirmações feitas por todos os lados da Câmara, resolver o conflito, nos termos' consentâneos com a dignidade do Parlamento e sem desprestígio para ninguém.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — As palavras que de todos os lados da Câmara me foram dirigidas produziram no meu espírito uma impressão muito especial, pelo reconhecimento na imparcialidade e correcção que inalteràvelmente tenho procurado pôr no desempenho do honroso cargo de que a Câmara me incumbiu,
A situação que se desenha em face do incidente parlamentar há pouco suscitado parece ser, realmente, extremamente grave e melindrosa.
A muitos se afiguraria difícil o cumprimento da missão de que sou investido; ela têm, efectivamente, as suas dificuldades, principalmente de ordem material, mas eu, habituado à disciplina militar, sei distinguir perfeitamente a minha situação de Presidente dá que ocupo-a dentro do Partido a que pertenço.
Espero que a missão de que me incumbem tenha sido confiada sem restrições.
Apoiados.
Nestes termos, eu entendo que a sessão deve ser interrompida, marcando a sua continuação para a próxima segunda-feira.
Vozes: — Muito bem.
O Sr. Presidente: — A sessão continua na próxima segunda-feira.
Está interrompida a sessão.
S. Ex.ª não reviu.
Eram 2 horas.
O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.
Às 15 horas e 5 minutos do dia 7 o Sr. Presidente reabre a sessão.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para invocar o Regimento): — V. Ex.ª diz-me se há número?
Estão na sala 36 Srs. Deputados?
O Sr. Presidente: — A sessão abre com qualquer número, mas como se tem de proceder a uma votação, em contraprova duma proposta do Sr. Tavares Ferreira, sôbre alterações ao Regimento, só então é que poderei verificar se há número.
Procedeu-se à contraprova.
Sentados 30 Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: — Não há número. Vai proceder-se à chamada.
Procedesse à chamada a que responderam 29 Srs. Deputados.
Responderam os Srs.:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
António Albino Marques de Azevedo.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Mendonça.
António Resende.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira:
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Manuel Homem Cristo.
João Estêvão Águas.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Mariano Martins.

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Sessão de 2 e 7 de Maio de 1923
Sebastião de Herédia.
Vitorino Henriques Godinho.
O Sr. Presidente: — Não há número, nem para se discutir.
A próxima sessão é amanhã 8, às 14 horas.
Está encerrada a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Os REDACTORES:
Sérgio de Castro.
Herculano Nunes.

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