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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 91
EM 24 DE MAIO DE 1923
Presidente o Exmo. Sr. Tomás de Sousa Rosa
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Luís António da Silva Tavares de Carvalho
Sumário. — Aberta a sessão com a presença de 41 Srs. Deputados, lê-se a acta e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Almeida Ribeiro apresenta uma proposta para nova prorrogação da sessão legislativa e requere urgência e dispensa do Regimento.
O Sr. Prazeres da Costa pede providências contra perseguições à imprensa exercidas na índia Portuguesa.
Responde-lhe o Sr. Presidente do Ministério (António Maria da Silva).
O Sr. Tôrres Garcia reclama contra a permissão para que se exporte a batata.
O Sr. Carlon Pereira trata de interêsses do município de Peniche.
Responde-lhe o Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães).
O requerimento do Sr. Almeida Ribeiro é aprovado, bem como a proposta, depois, de usar da palavra o Sr. Morais Carvalho.
O Sr. Morais Carvalho reclama contra a propaganda tendente ao incitamento a crimes como o que foi cometido no cemitério dos Prazeres.
O Sr. Presidente do Ministério ocupa-se do mesmo assunto, prometendo providências.
O Sr. Cancela de Abreu ocupa-se da reforma dos serviços do notariado.
Responde lhe o Sr. Ministro da Justiça (Abranches Ferrão).
O Sr. Marques de Azevedo reclama auxílio para o hospital de S. Marcos, de Braga.
É aprovada a acta.
São concedidas licenças.
O Sr. Presidente transmite agradecimentos do Sr. Embaixador de Portugal no Brasil por motivo do voto de saudação que lhe dirigia a Câmara, e comunica também a noticia da morte do antigo parlamentar Sr. Conde de Castelo de Paiva, propondo um voto de sentimento.
Associam-se a esta proposta os Srs. Cancela de Abreu, Lino Neto, Vasco Borges e Ministro do Comércio (Vaz Guedes).
Ordem do dia. — Prossegue a discussão do orçamento do Ministério da Instrução Pública.
É rejeitada, em contraprova, uma emenda ao capítulo 2.º artigo 4.º
É aprovado o capitulo 2.º, com uma emenda ao artigo 6.º
Entra em discussão o capitulo 3.º, usando da palavra os Srs. Cancela de Abreu e Carlos Pereira.
Esgotada a inscrição, é submetida à votação a moção do Sr. António Fonseca.
Sôbre o modo de votar usa da palavra o Sr. Almeida Ribeiro, que requere que se vote por números e alínias. É aprovado.
São aprovadas as alíneas a) e b), assim como os n.ºs 1.º e 2.º
São aprovadas emendas aos artigos 12.º e 22.º do capitulo 3.º
E submetido à discussão o projecto de lei constante do parecer n.º 411 (g).
Aprovado na generalidade, e em contraprova.
Discutido na especialidade, usam da palavra os Srs. Cancela de Abreu e António Fonseca.
É aprovado o artigo 1.º com uma emenda.
É aprovado o artigo 2 º
Sôbre o artigo 3.º, que é aprovado, bem como o 4.º, usa da palavra o Sr. Morais Carvalho.
A Câmara aprova as alterações propostas no parecer pela comissão.
Aprovado o capitulo 3.º, salvas as emendas.
Discute-se o capítulo 4.º
O Sr. António Fonseca apresenta e defende uma proposta, que é admitida.
Sôbre o artigo e a proposta usam da palavra os Srs. Morais Carvalho, Jaime de Sousa, Cancela de Abreu, Tavares Ferreira e Ministro da Instrução (João Camoesas) que fica com a palavra reservada.
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem.

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Abertura da sessão, às 10 horas e 23 minutos.
Presentes à chamada, 41 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 26 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Américo da Silva Castro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António de Mendonça.
António de Paiva Gomes.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar do Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Dinis de Carvalho.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Águas.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Vitorino Henriques Godinho.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto da Rocha Saraiva.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
Joaquim Serafim de Barros.
José António de Magalhães.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio Saque.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães,
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Correia.
António Dias.
António Ginestal Machado.

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António Pais da Silva Marques.
António Resende.
António do Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pires do Vale.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Comem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José do Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mário de Magalhães Infante.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Às 15 horas e 10 minutos principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 41 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 25 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Apoiando as reclamações dos católicos:
Das câmaras municipais de Condeixa e Catanhede.
Da Junta de freguesia de Adães, Barcelos, e regedor.
Da Junta de freguesia de Orgéns,Viseu.
Das Juntas de freguesia de Arves, Capelos, Castelões, Junqueira, Codal, Vila Nova, Vila Chã do concelho de Cambra.
Da Junta de freguesia de Tábua.
Da Junta de freguesia de Nine, Famalicão.
Do pároco, regedor e Junta de freguesia de Santo Adrião de Visela, Felgueiras.
Do regedor, freguesia do Espinho, Mangualde.

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Do pároco, regedor, Junta de freguesia de Monção.
Do pároco, regedor, Junta de freguesia de Aver-o-mar, Confraria das Neves, Sacramento. Associações do Coração de Jesus e Almas.
Das Associações do Coração de Jesus e Adoração Reparadora de Boaldela, Viseu.
Da Irmandade de Sant'Ana, Orgéns, Viseu.
Para a Secretaria.
Ofícios
Do pároco e presidente da Junta de freguesia do Arneiro das Milhariças, concelho de Santarém, apoiando as reclamações dos católicos.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Marinha, enviando uma lista de antiguidades dos oficiais da armada, para o Sr. Tomás Rosa e em satisfação do ofício n.º 419.
Para a Secretaria.
Dos sargentos da guarnição da Horta pedindo a aprovação do parecer n.º 442.
Para a Secretaria.
Do Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal da Horta, pedindo a aprovação duma proposta, apresentada no Senado, para que a Companhia «Western Union» pague àquela câmara designada importância, pelos telegramas expedidos pelo cabo que se projecta amarrar naquela ilha.
Para a comissão dos correios e telégrafos.
Do Sr. Deputado Hermano de Medeiros, associando-se à repulsa da Câmara pelo cobarde atentado contra o Sr. Carvalho da Silva.
Para a Secretaria.
Representações
Da Companhia Geral de Cal e Cimentos, pedindo auxílio igual ao concedido à Empresa dos Cimentes de Leiria.
Para a comissão de comércio e indústria.
De vários cidadãos, inquilinos de prédios pertencentes à Câmara Municipal do Pôrto, junto do Mercado do Bulhão, protestando contra a modificação dos contratos de arrendamento que aquela pretende fazer.
Para a comissão de administração pública.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de «antes da ordem do dia».
Tem a palavra, para um negócio urgente, o Sr. Almeida Ribeiro.
O Sr. Almeida Ribeiro (para um negócio urgente): — Sr. Presidente: em fins de Março foi prorrogada até fins de Maio a sessão legislativa corrente. Porém, estamos quási no fim,do mês, e ainda há diplomas a elaborar que importam essencialmente à vida do Estado, e que exigem a continuação da sessão legislativa por bastante tempo, sendo por êsse motivo necessário prorrogá-la.
Como à Câmara dos Deputados compete a iniciativa da prorrogação, mando para a Mesa a respectiva proposta, para a qual peço a urgência e dispensa do Regimento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Como ainda não há numero necessário para votação, a proposta de V. Ex.ª fica sôbre a Mesa, para ser oportunamente discutida.
O Sr. Prazeres da Costa: — Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Govêrno para os gravíssimos factos que se estão passando na Índia, e que traduzem uma verdadeira anarquia.
Consta dum telegrama de Nova Goa que a tipografia do jornal O Pigmeu foi invadida pela fôrça armada, e, depois de arrombadas as portas, foram as mesmas seladas, tendo sido empastelado todo o tipo.
Foi também, acrescenta o telegrama, violado o domicílio do administrador do referido jornal e guardada a redacção pela fôrça armada.
Ignoro o motivo das constantes perseguições de que está sendo vítima a imprensa da Índia.
Não ignora V. Ex.ª, Sr. Presidente, que há pouco tempo ainda foi agredido

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por quatro oficiais o director do jornal A Terra, sendo um dos agressores o próprio ajudante do governador, e, volvidos poucos meses, um outro jornal, O Heraldo, era perseguido pelo simples facto de ter chamado a atenção dos governantes para uma escandalosa arrematação dos matos de Pragana, e que êsse jornal julgava lesiva dos interêsses do Estado.
O telegrama em questão diz que o Pigmeu está sendo perseguido por ter criticado a protecção que o governador dispensa aos concessionários Magnier e Jagabai. Eu não quero entrar na apreciação dêsse assunto, porque êle está afecto à comissão parlamentar de inquérito, cujo relatório aguardo.
Em todo o caso, se o referido jornal exorbitou nas suas considerações, é ao tribunal que compete julgar, e não à fôrça pública, cuja missão é manter a ordem, e não provocar desordens.
Chego a convicção de que na Índia não vigora a Constituïção da República, que garante a inviolabilidade do domicílio e a liberdade do pensamento.
Protestando solenemente contra semelhantes arbitrariedades, que representam um atentado à Constituïção e um agravo, a toda a imprensa, peço enérgicas e urgentes providências no sentido de serem severamente castigados os que determinaram o assalto ao referido jornal.
Tenho dito.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — O ilustre Deputado Sr. Prazeres da Costa chamou a atenção do Govêrno para a forma atrabiliária como está sendo tratada a imprensa. A imprensa tem responsabilidades a cumprir perante as leis, mas o que não é admissível é que seja assaltada, entrando nesse assalto a própria fôrça armada e o próprio agente do Govêrno; isto não é próprio, nem é natural num país civilizado.
Eu transmitirei ao Sr. Ministro das Colónias as considerações do ilustre Deputado.
O orador não reviu.
O Sr. Tôrres Garcia: — Como não está presente o Sr. Ministro da Agricultura, peço a atenção do Sr. Presidente do Ministério, a fim de S. Ex.ª transmitir as minhas considerações ao Sr. Ministro da Agricultura.
Consta pela imprensa, e ainda não foi desmentido, que pelo Ministério da Agricultura foi permitida a exportação da batata. Eu não sei qual o motivo por que o Govêrno permitiu semelhante cousa.
Quando a própria natureza se encarregou de fazer com que no mercado houvesse bata-ta mais barata, quando, por um fenómeno natural, se tinha dado a lei da oferta e da procura, não deixando haver lucros desmedidos, as fôrças vivas vieram ao Parlamento com uma representação, para a qual chamo a atenção da Câmara; pregunto o que significa a atitude dos representantes.
Quando havia um género que barateava no mercado e que melhoraria a nossa situação é nesta ocasião que se vai permitir a exportação.
Diz-se que Lisboa não consome tanta batata que a natureza nos deu; mas então porque não se manda batata para outros pontos do país onde ela está ainda a $70, $80 e $90, para terras que ainda pagam o pão político...
O Sr. Presidente: — V. Ex.ª tem três minutos.
O Orador: — £ Por que não se manda a batata para Coimbra, Viseu, Braga, Bragança e tantas outras terras onde ela se está ainda pagando por alto preço?
Nestas condições, indignadamente, eu peço as mais cabais explicações ao Sr. Presidente do Ministério. No caso de S. Ex.ª não se encontrar habilitado a dar-mas, eu espero que as minhas considerações sejam transmitidas ao Sr. Ministro da Agricultura cuja presença nesta Câmara aguardarei, não só para tratar dêste caso mas ainda para ajustar contas, a propósito doutros assuntos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — O Sr. Tôrres Garcia revoltou-se contra o facto de o Govêrno ter permitido a exportação da batata.
Não estou, porém, habilitado a dar a S. Ex.ª as explicações exigidas, porque não esperava as preguntas de S. Ex.ª e

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ainda por se tratar dum assunto que não corre pela minha pasta.
Estou, no emtanto, convencido de que o facto a que S. Ex.ª aludiu não foi ainda ultimado.
Eu compreendo a má vontade do ilustre Deputado contra a pretendida exportação da batata, e compreendo porque sei que há regiões no país, especialmente no norte, onde êsse género alimentício nem sequer aparece.
As reclamações de S. Ex.ª são, por isso, de atender e assim eu apressar-me hei a transmiti-las ao meu colega da pasta da Agricultura, convencido de que S. Ex.ª alguma cousa fará.
Eu sou daqueles que entendem que o Estado deve proteger a agricultura. Mas, infelizmente nós estamos habituados a ver que a agricultura nem sempre sabe corresponder a essa protecção e que, por vezes, invoca a produção excessiva dum determinado produto simplesmente para que a sua exportação seja, permitida e o possam vender mais caro.
Um país não vive sem o desenvolvimento dos seifs organismos económicos, mas é preciso que, por sua vez, êsses organismos se compenetrem das suas responsabilidades e dos seus deveres.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira: — Pela legislação tributária em vigor são autorizadas as câmaras municipais a lançar o imposto ad valorem, ou uma taxa adicional sôbre determinadas contribuições.
Acontece que a Câmara de Peniche optou pelo imposto ad valorem, imposto que é cobrado por meio de estampilha aposta sôbre os volumes saídos do concelho.
O rendimento dêsse imposto não tem, porém, atingido o que dele se esperava por falta de auxílio e assim êsse município pede que o Sr. Ministre das Finanças, em conformidade com o despacho de 5 de Janeiro de 1922, lhe permita que a secção da guarda fiscal existente nesse concelho, em Peniche de Cima, o auxílio na cobrança dêsse, imposto, nas horas ri e folga.
Aproveito o facto de estar no uso da palavra para novamente insistir para que me sejam fornecidos pelo Ministério das Colónias os documentos que me habilitem a apreciar as propostas de adjudicação da frota do Estado e a estudar o responso que desejo levar-lhes, uma vez que parece reservar-se-lhes um enterro de primeira classe.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Sr. Presidente: o caso da Câmara de Peniche, a que acaba de se referir o. Sr. Carlos Pereira, é um simples caso de expediente que deve ser resolvido pela Direcção Geral das Alfândegas.
A satisfação dêsse pedido não representa um favor, tanto mais que já têm sido deferidos bastantes pedidos idênticos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: a proposta que o ilustre Deputado Sr. Almeida Ribeiro acaba de mandar para a Mesa visa à convocação do Congresso para decidir sôbre a prorrogação da sessão legislativa além de 31 de Maio corrente.
Não sendo natural nem possível votar o orçamento, cuja discussão está pendente desta Câmara, até o fim do corrente mês, claro é que não nos podemos opor à aprovação da proposta do Sr. Almeida Ribeiro.
Não posso, porém, deixar de salientar, nesta oportunidade, que a culpa dó os trabalhos parlamentares não terem corrido com aquela proficuidade que seria para desejar, pertence exclusivamente à maioria não só porque não comparece às sessões, mas porque permite que a ordem do dia seja constantemente alterada.
Lembrarei, a êste propósito, o que sucedeu com o malfadado contrato, ou modus vivendi, dos tabacos que. tendo vindo à discussão desta Câmara acêrca de dois meses, tendo estado retirado da discussão durante quinze dias, voltou depois a ser incluído na ordem do dia e, em seguida a dois dias mais de discussão, foi retirado, sem que até agora saibamos o que é que o Govêrno resolve sôbre êsse assunto que é urgente que tenha uma solução.
De modo que nós não podemos, pelas considerações que apresentamos, negar o

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nosso voto à proposta do Sr. Almeida Ribeiro, mas não queremos deixar de protestar contra a forma por que por parte da maioria têm decorrido as discussões nesta casa do Parlamento. Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Não havendo mais ninguém inscrito, vai ler-se para se votar a proposta do Sr. Almeida Ribeiro.
Foi aprovada a proposta do Sr. Almeida Ribeiro, do teor seguinte:
Proposta
Não tendo ainda sido considerados alguns projectos de lei que muito importam à vida do Estado e ao bem geral da nação, nem havendo possibilidade do apreciá-los até 31 de Maio corrente: proponho que a Câmara dos Deputados tome a iniciativa da prorrogação da actual sessão legislativa, reunindo-se para isso o Congresso em sessão conjunta das duas Câmaras. -Almeida Ribeiro.
O Sr. Morais Carvalho: — Já ontem nesta Câmara o Sr. Leote do Rêgo verberou som indignação o atentado vilíssimo que havia sido praticado antes de ontem em Lisboa, em lugar que felizmente até então havia estado indemne de façanhas dêste jaez.
Êsse atentado, pelas condições em que foi praticado e pelo local em que sucedeu, provocou em toda a população da cidade justa e profunda indignação.
Quando o ano passado tive a honra de falar pela primeira vez nesta casa, fi-lo a propósito da comemoração que a Câmara dos Deputados quis fazer às vítimas do 19 de Outubro e então, ao lado da homenagem de respeito dêste lado da Câmara pelas vítimas dêsse sangrento acontecimento, eu tive ocasião de dizer que o que sobretudo tinha armado o braço dos assassinos tinha sido a impunidade para crimes anteriores.
Hoje felizmente não é apenas a impunidade; hoje é o incitamento que eu vejo nos números do jornal A Batalha publicados hoje e ontem.
É o incitamento ao crime, facto que é passivo do punição e para o qual chamo a atenção do Govêrno, porque não pode continuar a permitir-se.
O jornal A Batalha faz a apologia do crime. E certo que nos artigos consagrados ao assunto há uma ou outra frase que pretende lançar um pouco a dúvida, mas no fundo o público normal dêste jornal, quando tiver lido o que se escreve, fica com a consciência de que o homem que praticou o atentado de anteontem estava no legítimo direito de proceder como procedeu e pouco faltará para que essa vítima seja apresentada como o algoz, talvez como o verdadeiro autor do crime, e o outro, o que matou, de facto, como vítima.
Não pode ser! Não há sociedade civilizada que resista a esta propaganda.
Lembro que o Sr. Presidente do Ministério há cêrca de três meses, por motivos meramente políticos, não teve dúvida em mandar proibir a circulação dum jornal que só de política tratava, por se referir 'a um caso que então ocorrera.
Mas então um jornal que prega o incitamento ao crime, que provoca o assassínio, dizendo que é legítimo aquilo que se praticou, pode correr, sem peias de espécie alguma, com inteira liberdade?
Não pode ser!
Os panegiristas do Sr. Presidente do Ministério, quando querem fazer o seu elogio, dizem que a S. Ex.ª é devida uma obra fecunda, porque S. Ex.ª tem conseguido que haja ordem para se trabalhar neste país.
Pregunto, se é ordem aquilo a que estamos assistindo e se se pode consentir sem protesto desta casa do Parlamento.
Pregunto se o Govêrno não vai dar enérgicas providências nos termos da lei para que esta propaganda nefasta não continue a fazer-se com a liberdade que até hoje tem sido feita.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Na sessão de ontem, por motivo de trabalhos ligados a esta casa do Congresso, saí da sala um pouco antes de o Sr. Leote do Rêgo ter versado o mesmo assunto que hoje versou o ilustre Deputado Sr. Morais Carvalho.
Concordo inteiramente com S. Ex.ª
Custa-me a acreditar que neste país, considerado como país amoroso, possam existir feras da natureza daquela que praticou o atentado de têrça-feira.

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E vulgar dizer-se que o crime político comum é um crime social. É penoso dizê-lo, mas a verdade é que a imprensa nem sempre tem cumprido o seu dever nestes casos.
Há pouco tempo, não por motivos meramente políticos, como disse o Sr. Morais Carvalho, mandei proibir a circulação de dois jornais.
Um dêsses jornais não se referia ao Chefe do Estado com aquele respeito que lhe é devido.
Um outro publicava entrevistas que eram um incitamento ao crime e à desordem.
Por isso apliquei as disposições dum diploma do Govêrno Provisório.
Foi julgado o meu procedimento como atentatório da Constituïção e não sei se criminoso.
Ora hoje já se pede a execução da mesma lei no sentido de não deixar circular os jornais que publicam artigos indecorosos, como aqueles a que se referiu o Sr. Morais Carvalho.
Recordo-me de que tomei êsse compromisso de não consentir mais na apreensão de jornais, até a publicação do diploma novo sôbre liberdade de imprensa. Folgo muito de comunicar à Câmara que o Sr. Ministro da Justiça tem já muito adiantado o seu trabalho, e que em breve trará à Câmara, da reforma da actual lei de imprensa.
Sr. Presidente: há muitas pessoas que entendem que liberdade de imprensa é invadir a esfera de acção dos outros.
Eu entendo absolutamente o contrário, e sempre assim o entendi; e até sob êste ponto de vista vou além dos elementos mais avançados sob o ponto de vista intelectual, mas não intelectuais, que fazem propaganda de forma que os espíritos sem educação, obedecendo ao instinto, pratiquem actos como aquele que anteontem foi praticado no cemitério.
Emquanto o meu colega da Justiça não trouxer ao Parlamento o diploma a que me referi, mandarei que a autoridade administrativa cumpra o seu dever em harmonia com o que está estabelecido na lei.
Quanto ao crime que se perpetrou, é preciso que o delinquente seja punido com justiça e ràpidamente, porque infelizmente quando tais criaturas são condena-
das é caso para dizer-se que já se não lembram do crime praticado.
Isto não dignifica a Justiça.
Também não compreendo que possa circular um jornal que incita ao crime, nem é digno do nome de Jornalista quem assim procede.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: a propósito ainda das considerações do Sr. Presidente do Ministério, direi a V. Ex.ª e à Câmara que é de estranhar que, ao passo que há jornais em Lisboa que fazem a propaganda e o incitamento dos crimes, como por exemplo o jornal a Batalha, uma parte da imprensa, salvas honrosas excepções, entre as quais as dos jornais republicanos A Pátria, Mundo e Diário de Lisboa, não se referem senão ligeiramente à cobardíssima agressão de que foi vítima o nosso querido amigo e ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva.
O caso é tanto mais para estranhar quanto é certo que, tendo ocorrido há tempo na Sala dos Passos Perdidos um incidente com um Sr. Deputado, em que tomou parte o filho de um outro Sr. Deputado, sem contudo ter havido a violência, a cobardia e a falta de razão de agora, a imprensa fez larga reportagem sôbre o assunto.
Agora trata-se do que se passou com o ilustre Deputado monárquico, como se fôsse um simples caso de rua e até o órgão das juntas democráticas de Lisboa pela pena dum Sr. José do Vale, faz a apologia da agressão, apesar de ela. ter tido lugar sem que tivesse havido sequer previamente troca de palavras.
Ainda ontem falei com o meu colega que interveio no julgamento em que foi testemunha o tenente Carmo e êle disse-me que êste declarara que o tenente Martins não tinha sido morto por um acto de traição.
Entrando no assunto para que pedi a palavra, peço a atenção do Sr. Ministro da Justiça para o seguinte:
Foi publicada a lei n.º 1:345, de 20 de Agosto, que autorizou o Govêrno a remodelar os serviços do notariado e de harmonia com esta lei foi feita a remodelação pelo decreto n.º 8:373, de 18 de Setembro.

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Posteriormente porém o Sr. Abranches Ferrão publicou um novo decreto sôbre o mesmo assunto o nestas condições abusou da autorização concedida.
Com efeito a autorização, seguudo o artigo 27.º da Constituïção, só poderia ser usada uma vez.
Depois caducava.
Não quero discutir as vantagens ou os inconvenientes do último decreto, discuto apenas a sua legalidade.
Mas há mais!
Êste decreto foi rectificado quatro on cinco vezos, alterando se fundamentalmente nessas rectificações o seu texto.
Fez pois o Govêrno mais uma vez ditadura.
Não é verdade Sr. Ministro da Justiça?
Tenho dito.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: o que eu estranho é que o ilustre Deputado Sr. Cancela de Abreu tenha classificado de mão de mestre a feitura do decreto, quando S. Ex.ª há pouco tempo tanto reclamou contra êle.
O decreto foi apenas rectificado em alguns pontos, usando-se do uma faculdade que o Govêrno tinha e nada mais.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Marques de Azevedo: — Pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro da Trabalho para a situação precária em que ficou o Hospital de S. Marcos de Braga, em virtude da última catástrofe que ali se deu.
Secundando o apelo feito pelo jornal O Primeiro de Janeiro, para que o Sr. Ministro do Trabalho acuda a essa instituição.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Trabalho (Rocha Saraiva): — Para o assunto vou chamar a atenção do Instituto de Previdência Social, para ver se é possível acudir à situação em que se encontra o hospital de S. Marcos.
Tenho dito.
Foi aprovada a acta.
Pedidos de licença
Do Sr. Joaquim Narciso da Silva Matos, 40 dias.
Do Sr. Aires do Ornelas e Vasconcelos, prorrogação da licença que está gozando até o fim do corrente mês de Maio.
Para a Secretaria.
Concedido e comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Admissões
Projectos de lei
Dos Srs. João Salema e Adolfo Coutinho, autorizando a Câmara de Á rouca a vender ou aforar terrenos baldios dispensáveis ao logradouro comum.
Para a comissão de administração pública.
Do Sr. Carlos Olavo, extinguindo os actuais Círculos Escolares Ocidental e Oriental do Funchal e criando o Círculo Escolar do Funchal.
Para a comissão de instrução primária.
O Sr. Presidente transmite à Câmara os agradecimentos do Sr. Embaixador de Portugal no Brasil pelo voto de saudação que lhe foi dirigido por virtude de haver concorrido para o brilho do acto inaugural do pavilhão português na exposição do Rio de Janeiro.
O Sr. Presidente: — A Mesa acaba de ter conhecimento de que faleceu o antigo parlamentar Sr. Conde de Castelo de Paiva.
Por êsse infausto acontecimento proponho um voto de sentimento e que da resolução da Câmara se dê conhecimento à família.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: o falecido foi Deputado progressista em várias legislaturas e mostrou na sua Câmara e na vida publica qualidades que justificam a homenagem que V. Ex.ª propõe.
Foi governador civil de Aveiro, lugar que desempenhou com justos elogios, por isso êste lado da Câmara, lamentando a sua morte, associa-se comovidamente ao voto proposto por V. Ex.ª
Tenho dito.
O orador não reviu.

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Diário da Câmara dos Deputados
O Sr. Lino Neto: — Em nome da minoria católica associo-me ao voto de sentimento proposto por V. Ex.ª
O Sr. Vasco Borges: — Pedi a palavra para me associar em nome dêste lado da Câmara ao voto de sentimento proposto por V. Ex.ª
O Sr. Conde de Castelo de Paiva afastado da política dedicou-se com vantagem para o País a promover obras de fomento e economia social.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Queiroz Vaz Guedes): — Em nome do Govêrno associo-me ao voto da Câmara pelo falecimento do antigo parlamentar Sr. Conde de Castelo de Paiva.
O Sr. Presidente: — Em vista da manifestação da Câmara, considero aprovado o voto de sentimento proposto.
Vou submeter à aprovação da Câmara o requerimento do Sr. Júlio Gonçalves, para entrar em discussão antes da ordem do dia, e sem prejuízo dos oradores inscritos, o parecer n.º 350.
Procede-se à votação e foi aprovado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Procede-se à contraprova e à contagem.
O Sr. Presidente: — Estão sentados 58 Srs. Deputados e em pé 3. Está aprovado.
O Sr. Presidente: — O Sr. Crispiniano do Fonseca requere para entrar em discussão antes da ordem do dia, sem prejuízo dos oradores inscritos, o projecto de lei n.º 493, que já tem o respectivo parecer, sôbre a repressão do jôgo de azar. Vai votar-se.
Procede-se à votação.
O Sr. Presidente: — Está aprovado. Admissão de projectos.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se uma nota de interpelação. Foi lida na Mesa. É a seguinte:
Com toda a urgência desejo interpelar o Sr. Ministro da Agricultura sôbre o regime cerealífero, antes da discussão do orçamento do seu Ministério.
24 de Maio de 1923. — Joaquim Ribeiro.
O Sr. Abílio Marçal: — Em nome do comissão do orçamento, peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se permite que ela se reúna para trabalhos urgentes durante a sessão.
Consultada a Câmara, foi autorizado.
ORDEM DO DIA
Prossegue a discussão do parecer n.º 411-(g).
O Sr. Presidente: — Vai fazer-se uma contraprova.
Peço aos Srs. Deputados que ocupem os seus lugares.
Leu-se na Mesa a seguinte proposta:
Proponho que no capítulo 2.º, artigo 4.º, da proposta orçamental do Ministério da Instrução Pública para o ano económico de 1923-1924 sejam adicionadas as seguintes verbas respeitantes ao pessoal que do quadro especial do Ministério da Agricultura foí transferido para o Ministério da Instrução Pública:
[Ver valores da tabela na imagem]
Pessoal em disponibilidade, em serviço:
1 terceiro oficial
2 agentes de fiscalização a 600$
1 servente
Complemento de vencimentos a:
1 terceiro oficial
2 agentes de fiscalização a 120$
Total
Sala das sessões, em Maio de 1923. — João Camoesas — Vitorino M. Carvalho Guimarães.
Procede-se em seguida à contraprova.
O Sr. Presidente: — Está rejeitada a proposta.
Em seguida lê-se na Mesa uma emenda ao capitulo 2.º do orçamento de instrução para ser votada.

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Sessão de 24 de Maio de 1923
É a seguinte:
Proponho que a verba proposta no capítulo 2.º, artigo 6.º, da proposta orçamental do Ministério de Instrução Pública para o ano económico de 1923-1924, com aplicação a despesas de expediente e diversas da Secretaria Geral e Direcções Gerais do Ministério, seja distribuída nos termos seguintes:
[Ver valores da tabela na imagem]
Gabinete do Ministério
Secretaria Geral
Direcção Gerai de Ensino Primário
Direcção Geral de Ensino Secundário
Direcção Geral de Ensino Superior
Direcção Geral das Belas Artes
Conselho Superior de Instrução Pública
Inspecção Geral de Sanidade Escolar
Inspecção das Escolas Móveis
10.ª Repartição da Contabilidade Pública
Total
Sala das sessões, em Maio de 1923. — João Camoesas — Vitorino M. Carvalho Guimarães.
Foi aprovada e seguidamente aprovado também o capítulo 2.º, salva a emenda.
O Sr. Presidente: — Continua em discussão o capítulo 3.º
O Sr. Tavares Ferreira: — Mando para a Mesa uma proposta de rectificação de um número que vem errado no capítulo 3.º em discussão.
Foi lida na Mesa e admitida.
É a seguinte:
Capítulo 3.º, artigo 22.º — Ensino Primário:
Proponho que na rubrica «Subsídio nos termos do artigo 47.º do decreto com fôrça de lei n.º 5-. 787-A, de 10 de Maio de 1919», no parecer da comissão se rectifiquem 2. 500$ para 2:500. 000$. — O relator, Tavares Ferreira.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Vem muito a propósito do artigo 3.º do orçamento do Ministério da Instrução, que se está discutindo, fazer considerações sôbre o problema do analfabetismo em Portugal.
Já tive ocasião de ler à Câmara passagens de um discurso do ilustre Deputado Sr. Dr. Brito Camacho, proferido na sessão de 25 de Maio de 1908.
Tenho também aqui um trecho precioso de um discurso do Sr. Dr. António José de Almeida, na sessão n.º 22 do 3 de Julho de 1908.
O Sr. Dr. António José de Almeida disse o seguinte:
«A instrução pública é uma vergonha, e daí redunda que a raça, fraca fisicamente, é de uma indigência intelectual que causa calafrios».
Da mesma forma que o Sr. António José de Almeida, se pronunciou o Deputado republicano Sr. Feio Terenas na sessão n.º 25, de 8 de Julho de 1908.
Quem sabe? Talvez fôsse devido à instrução estar atrasada em Portugal que se tornou possível a proclamação da República...
Se a instrução estivesse um pouco mais aperfeiçoada, e, assim, todos pudessem ter a visão clara dos factos que necessàriamente iam acontecer, a República não teria sido um facto no nosso país, e com certeza não o seria hoje ainda, se a instrução do povo se tivesse aperfeiçoado dentro do actual regime.
Apoiados da extrema direita. Mas o Sr. Brito Camacho, que está presente, vai certamente pronunciar-se sôbre o assunto, para a Câmara saber se S. Ex.ª mantém ou não os pontos de vista que manifestou na sessão de 25 de Maio de 19,08, onde afirmou, entre outras cousas, que o analfabetismo era a «condenação inexorável da monarquia e seu maior crime», o que o primeiro cuidado da República seria criar escolas e remodelar o ensino, de forma a fazer dêste país de analfabetos um país de cidadãos com a perfeita compreensão dos seus deveres cívicos.
Ora vejamos como estas aspirações dos Srs. Deputados republicanos, manifestadas no tempo da propaganda, têm sido realizadas.

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Diário da Câmara dos Deputados
Basta ler o parecer n.º 71-(f), dado em 1922 pela comissão do Orçamento. Diz esto parecer:
«E nós? Continuamos a marcar um dos primeiros lugares entre os países de maior percentagem de analfabetismo...
Para nossa vergonha, essa elevadíssima percentagem de analfabetos pouco tem deminuido de então (1900) até hoje.
A eloquência dêstes números demonstra nos bom claramente que o magno problema do ensino popular contínua entre nós sem solução».
Veja a Câmara como é grande o contraste entre a realidade que a República nos oferece em matéria de instrução publica e as próprias aspirações reveladas pelos Deputados republicanos no tempo da monarquia, os quais chegaram a afirmar aqui que o analfabetismo era o maior crime, a maior vergonha da mesma monarquia.
É preciso que êsses senhores tenham agora a franqueza do confessar a sua desilusão e corajosamente digam que o analfabetismo é a maior vergonha, o maior crime da República.
Em 1900 havia em Portugal 5. 423:132 habitantes, compreendendo o continente o ilhas: 4. 261:336, isto é, 78,6% oram analfabetos e 1. 161:796 sabiam ler e escrever.
No continente, do 5. 016:267 habitantes, 3. 914:514, isto é, 78% eram- analfabetos, e nas ilhas, do 406. 865 habitantes, 346:822 (85. 2%) eram analfabetos.
Mas em. 1878 apenas 79,8:925 sabiam ler e escrever, e em 1890 êste número elevava-se a 1. 048:802 tendo, portanto, o analfabetismo deminuído dum modo apreciável.
Mas, além disto, êstes números carecem de correcções. Deu-lhas o Sr. Queiroz Veloso nesta Câmara, e delas resulta a conclusão do que a percentagem dos analfabetos, segundo os dados oficiais, não era em 1909 do 78,6 por cento, mas sim 60 a 65 por cento, visto que, entre outros factores, há que considerar as crianças do menos de 6 anos de idade, isto é, que não tinham atingido a idade escolar.
É interessante. Sr. Presidente, fazer também a comparação entre a porcentagem do analfabetismo e a percentagem das escolas primárias existentes no país.
Em 1899 havia em Portugal 4:451 escolas primárias, sendo 2:799 do sexo masculino, 1:330 do sexo feminino e 322 mixtas.
Em 1900 foram criadas mais 69 escolas, em 1901 mais 145 escolas, em 1902 mais 167, em 1903 mais 55, em 1904 mais 81, em 1905 mais 155, em 1906 mais 103, em 1907 mais 59, e em 1908 mais 36.
De 1899 a 1908 foram, portanto, criadas 870 escolas primárias, o que dá uma média de 104 por ano.
Assim em 1908 havia 5:321 escolas, sendo 3. 057 do sexo masculino, 1:715 do sexo feminino e 549 mixtas, o que corresponde aproximadamente u uma escola por 1:019 habitantes o a uma escola por 159 alunos.
E igualmente curioso fazer o confronto destas percentagens com o que se passava em 1908 nos países estrangeiros.
Ao passo que em Portugal havia uma escola por 1:019 habitantes, na Alemanha havia uma escola por 960 habitantes, na Bélgica uma escola por 1:000 habitantes, na Holanda uma escola por 1:100 habitantes, na Austria-Hungria uma escola por 1:180 habitantes e na Inglaterra uma escola por 1:360 habitantes.
Quero dizer, na Inglaterra e na Holanda havia menos escolas em 1908 do que em Portugal, se atendermos à proporção com o seu número de habitantes.
Nos vários distritos de Portugal o analfabetismo não tem deminuído em razoável proporção ao aumento do número das escolas.
O distrito de Bragança, por exemplo, em 1908, apesar de ser dos que tinham maior número de escolas, apresentava uma percentagem de analfabetos de 80,5 por cento. O mesmo sucedia com o distrito da Guarda.
Daqui se conclui que o mal do analfabetismo não só debela apenas com a criação de escolas. O mal cura-se especialmente pelo desenvolvimento do espírito educativo.
Há escolas no pais, pode dizer-se que abandonadas, com uma. frequência escolar muito reduzida, devido ao facto do não haver a propaganda indispensável para a frequência escolar.

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Sessão de 24 de Maio de 1923
Sr. Presidente: a propósito das escolas primárias superiores já o ilustre Deputado Sr. António Fonseca, segundo li no relato dos jornais, fez ontem largas considerações que me parecem, dignas de toda a alemão da Câmara.
De facto, a supressão, ou, pelo menos, a remodelação dos quadros do pessoal, quer docente, quer menor, das escolas primárias superiores impõe-se. São os seus próprios paladinos que o afirmam. Até agora ainda não vieram ao nosso conhecimento quaisquer dados que nos permitam concluir que a criação das escolas primárias superiores tenha trazido qualquer vantagem para o país.
Sr. Presidente: entendo que é necessário retribuir devidamente o professorado primário; mas entendo também que é preciso que da parte do professorado haja a compreensão de que é absolutamente indispensável que cumpra rigorosamente os seus deveres, fazendo da sua profissão aquilo que ela deve ser: um verdadeiro sacerdócio.
Há, com efeito, professores primários que cumprem o seu, dever, mas há muitos que o não cumprem.
Há professores em Portugal que subscreveram num subsídio para o assassino do malogrado Presidente Dr. Sidónio Pais, levado a efeito por um jornal da província!
Que autoridade podem ter êstes homens para darem lições de moral e de civismo nas suas escolas?!
Êste exemplo basta.
E é por isso que eu afirmo que, havendo sem dúvida professores honestos, outros há que merecem ser irradiados.
Sr. Presidente: no parecer dêste ano alguma cousa de interessante também existe em relação ao ensino secundário. Sobro elo nos pronunciaremos quando se discutir o capítulo respectivo.
Segundo se depreende dêste parecer, na proposta orçamental eram aplicados determinados decretos, relativos à instrução pública, que a comissão propõe que. num projecto de lei, que será discutido conjuntamente, sejam devidamente esclarecidos.
É a própria confissão, feita pela comissão do Orçamento, de que a proposta orçamental estava ilegalmente elaborada, sofrendo dos mesmos vícios do orçamento
do Ministério da Guerra, cuja matéria, segundo depreendo da leitura dos jornais, há de ser assunto de largo debate nesta Câmara.
Tenho dito.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: neste capítulo da instrução primária e normal inscrevem-se várias rubricas, acêrca das quais eu terei de fazer algumas preguntas ao Sr. relator.
O problema da instrução primária deve merecer particular interêsse ao Govêrno e à República.
O que se procura é remediar o mal enorme de os pais não mandarem os filhos à escola.
O regime das multas não dá nada porque não se aplica essa legislação.
Eu lembro outra forma mais eficaz que apresentarei em breve num projecto de lei, no qual figurará um factor psicológico que valeria mais do que as multas.
Nesse projecto eu consignaria o princípio que todos os mancebos analfabetos permaneceriam nas fileiras o dôbro do tempo que lá estão aqueles que sabem ler.
O português dá tudo, até o voto, para não sentir nos ombros as correias; por esta forma nós acabaríamos com essa clientela política que de nada nos servo. Ainda outra, disposição eu faria inserir pela qual nenhum português poderia emigrar e talvez se podesse considerar os analfabetos como menores para viverem sob o regime de tutela.
Com respeito às instalações das escolas V. Ex.ªs sabem que o Estado é caloteiro, pois deve a renda de casas há dois anos; ora eu pregunto: isto é moral?
Pelo que se vê, muita gente se queixa do Estado e desejava saber quais são ás rendas que o Estado deve.
Estou convencido de que o Estado se servirá de uma habilidade de interpretação para fugir ao cumprimento da lei.
Isto é moral, isto é justo?
Espero as explicações do Sr. Ministra da Instrução.
Tenho dito.
O Sr. Tavares Ferreira (relator): — Devo informar V. Ex.ª que a verba de renda de casas está aumentada neste orçamento.

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Diário da Câmara dos Deputados
Foi lida a moção do Sr. António Fonseca.
Moção
Considerando que os vencimentos e melhorias do pessoal do ensino da instrução primária geral, constituindo por 81:259 professores em serviço, 291 professores em inactividade, 511 serventes, 10 vigilantes e 35 outros empregados licenciados e em disponibilidade, atinge a avultada quantia de 46:570. 529$06;
Considerando que a êste enorme esfôrço feito em benefício da instrução primária não estão correspondendo os resultados úteis que seria legítimo esperar e todos desejam;
Considerando que esta deficiência, devendo atribuir-se a causas de diversa natureza, resulta também, e em grande parte, de não se estabelecer um regime de vencimentos que interêsse o professor não só na frequência da sua escola mas também no aproveitamento real dos seus alunos;
A Câmara dos Deputados exprime o desejo de que o Govêrno apresente ao Parlamento as propostas necessárias para:
1.º Distinguir nos vencimentos dos professores;
a) Vencimentos fixos, iguais para todos;
b) Subvenções ou melhorias estabelecidas para cada professor em harmonia com a categoria das terras de residência e em função dos seus encargos de família;
c) Gratificações de exercício dadas em proporção dos alunos julgados habilitados em provas fiscalizadas, aos professores das escolas cuja frequência não seja normalmente inferior a 75 por cento da população escolar.
2.º Promover a instalação das escolas em edifícios adequados à densidade da população escolar e, de um modo geral, todas as providências tendentes a conseguir a maior frequência das escolas primárias.
3.º Atribuir às câmaras municipais, sem prejuízo da inspecção exercida pelo Estado a, fiscalização administrativa dos serviços de instrução primária. — António Fonseca.
O Sr. Almeida Ribeiro (sôbre o modo de votar): — Requeiro que a moção seja votada por alíneas.
Foi aprovado o requerimento.
Aprovadas as alíneas a) e b), os n.ºs 1.º e 2.º
Para a comissão de instrução primária a alínea c) do n.º 1.º e o n.º 3.º
É submetido à discussão o projecto de lei constante do parecer 411-(g) e proposto pela comissão do Orçamento.
É aprovado na generalidade.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º do Regimento.
Aprovado.
É confirmada a aprovação por 58 votos contra 3.
Inicia-se a discussão na especialidade.
O Sr. Presidente: — Está em discussão o artigo 1.º Vai ler-se.
Foi lido na Mesa.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: creio que esto projecto se destina a reduzir despesas.
O Sr. Tavares Ferreira (relator), (interrogando): — V. Ex.ª dá-me licença?
Êste projecto não faz mais do que pôr em vigor a doutrina dum decreto que foi suspenso arbitrariamente pelo Sr. Leonardo Coimbra, quando Ministro da Instrução.
O Orador: — É lamentável que seja necessário que a Câmara lembre ao Poder Executivo o cumprimento dos seus deveres, pois não faz sentido que um Ministro da Instrução tivesse suspendido um decreto que representa a boa doutrina.
Para que não se suponha do qualquer modo que pretendemos evitar que se faça uma redução de despesas, damos o nosso voto ao artigo em discussão e aos artigos imediatos do mesmo projecto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Fonseca (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejava que V. Ex.ª me informasse sôbre seja foi votada uma proposta de eliminação, que mandei para a Mesa; relativa ao capítulo 3.º
O Sr. Presidente: — Em conformidade com o artigo 2.º da lei n.º 954, de 28 de

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Sessão de 24 de Maio de 1923
Março de 1920, a proposta de V. Ex.ª foi para as comissões do Orçamento e das finanças.
O Sr. Tavares Ferreira (relator): — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa a seguinte
Proposta de aditamento
Proponho que ao artigo 1.º se adicione mais o seguinte:
§ 3.º Se nenhum dos professores quiser voluntàriamente exercer o cargo de secretário das escolas normais primárias e primárias superiores, exercerá essas funções o professor que menos serviço tiver e em igualdade de circunstâncias o mais novo na idade. — Tavares Ferreira.
Foi admitida.
Foi aprovado o artigo 1.º
Depois de lido, foi aprovado sem. discussão o artigo 2.º
Entrou em discussão o artigo 3.º
O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: já há pouco o meu ilustre colega Sr. Cancela de Abren declarou que nós, dêste lado da Câmara, dávamos a nossa aprovação ao presente projecto de lei; pedi a palavra simplesmente porque, havendo neste projecto uma referência à lei n.º 488, a fim de se tornar aplicável aos professores primários que frequentem ou venham a frequentar qualquer curso, para que se diga expressamente que a comunicação que pela lei n.º 488 devia ser feita à câmara municipal respectiva passará a sê-lo à Direcção Geral de Instrução Primária, entendo que também devia haver uma outra referência à nomeação, embora a título interino, dos professores primários já providos em escolas e que requeiram matrícula no curso de habilitação para o magistério primário superior.
Desde que no projecto em discussão se manda, e a meu ver muito bem, que a comunicação que pela lei n.º 488 tinha de ser à câmara municipal respectiva, passe a ser feita à Direcção Geral de Instrução Primária, e a meu ver igualmente muito bem, porque as escolas primárias deixaram de estar a cargo das câmaras municipais, devia também haver qualquer referência no que respeita ao provimento a título interino dos professores primários.
O Sr. Tavares Ferreira: — Devo dizer a V. Ex.ª que para os professores interinos já está legislado de maneira que quando uma escola vaga, seja qual fôr o motivo, as leis vigentes já determinam a forma de preencher essa vaga; foi por isso que a comissão não fez referência a êsse ponto.
O Orador: — Agradeço a V. Ex.ª a sua explicação.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Como não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito, vai votar-se.
Foi aprovado o artigo 3.º
Depois de lido, foi aprovado, sem discussão, o artigo 4.º
Foram aprovadas as emendas propostas pela comissão do Orçamento.
São as seguintes:
Propostas
Capítulo 3.º, artigo 12.º: Proponho que, na emenda apresentada pela comissão, a êste artigo, se suprima a palavra «Braga». — Tavares Ferreira.
Capítulo 3.º, artigo 12.º:
Proponho que, na Escola Normal Primária de Lisboa, no pessoal adido se suprima um professor.
Artigo 15.º:
Proponho também que nas escolas primárias superiores abaixo designadas se suprima o seguinte pessoal adido:
Horta, dois professores.
Castelo Branco, dois professores.
Viseu, um contínuo.
Funchal, um professor.
Ponta Delgada, um professor.
Évora, um professor.
Santarém, um professor, um servente jardineiro, um guardaportão e um contínuo servente. — Tavares Ferreira.
Foi também aprovada a seguinte
Proposta
Proponho que sejam eliminadas as seguintes verbas inscritas no capítulo 3.º

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Diário da Câmara dos Deputados
do artigo 16.º, Pessoal na disponibilidade das escolas primárias superiores:
[Ver valores da tabela na imagem]
Uma professora de inglês prático, por ter sido colocada no quadro
Um professor de gimnástica, por ter entrado no quadro
Um professor de caligrafia, que faleceu
Um servente da Escola Primária Superior de Adolfo Coelho, por ter entrado no quadro
Total
Sala das Sessões, Maio de 1923. — João Camoesas — Vitorino M. de Carvalho Guimarães.
Foi aprovado o capitulo 3.º
Entrou em discussão o capitulo 4.º
O Sr. António Fonseca: — Sr. Presidente: apesar de não se tratar de uma moção, mas de uma proposta, nos mesmos termos do § 2.º da lei n.º 954, de 19 de Março, cuja interpretação, salvo o devido respeito que se deve as deliberações da Câmara e às declarações da Mesa, me parece absolutamente extravagante, apesar de tudo, vou mandar para a Mesa a seguinte proposta:
A Câmara, considerando que nas actuais circunstâncias do Tesouro não é possível manter, para, execução dos serviços públicos, mais órgãos do que os absolutamente indispensáveis;
Considerando que para assegurar os interêsses da instrução secundária, no curso complementar, bastam os liceus de Lisboa, Pôrto e Coimbra, centros universitários onde à lógico concentrar esto curso e onde nove liceus centrais existentes podem, por si sós, ministrar êste ensino ao escasso número do 1:800 alunos que actualmente se distribuem por 29 liceus;
Considerando que apesar da grande difusão dêste ensino, a frequência dos liceus, em vez de aumentar, tem deminuído;
Considerando que não é necessário, nem útil, por ser anti-económico, manter os liceus cuja frequência escolar no curso geral seja inferior a 200 alunos;
A Câmara dos Deputados, apreciando a proposta orçamental do Ministério da Instrução e tendo em vista o disposto no artigo 2.º da lei n.º 904, de 22 de Março do 1920, resolve:
1.º Reduzir a nacionais todos os liceus centrais do continente e ilhas adjacentes, com excepção dos actuais liceus centrais de Lisboa, Pôrto e Coimbra;
2.º Extinguir todos os liceus do continente, para o sexo masculino, cuja frequência no curso geral seja inferior a 200 alunos, ou sejam os liceus de Beja, Castelo Branco, Chaves, Lamego, Leiria, Portalegre, Póvoa de Varzim, Setúbal e Viana do Castelo;
3.º Fixar nos liceus nacionais: o pessoal em 9 professores, 1 professor de educação física, 1 chefe ou oficial de secretaria ou amanuense, conforme o que houver actualmente, 2 contínuos e 2 guardas; as gratificações a directores de classes, a directores de instalações, aos vogais dos conselhos administrativos, aos empregados auxiliares de gabinetes e bibliotecas, e aos empregados de secretaria e das classes em 320$, 160$, 288:5, 240$ e 150$, respectivamente, mantendo-se as demais gratificações; a verba para material o diversos em 3. 500$ além da renda das casas, sendo necessário, se outra menor não estiver proposta. — António Fonseca.
Sr. Presidente: não basta fazer a afirmação de que o país está a saque; é preciso tirar o país da situação de saque em que tem estado colocado.
Não basta fazer sistematicamente afirmações nos comícios, no Parlamento, na imprensa, nas declarações ministeriais, nos programas dos partidos de que se hão-de realizar economias e se hão-de comprimir despesas; não bastam estas afirmações, é preciso, realmente, realizar os actos que demonstrem que essas afirmações correspondem à situação e que efectivamente se entra numa política de compressão de despesas.
Sr. Presidente: êste Govêrno e outros Govêrnos anteriores desde a sua declaração ministerial até os discursos inflamados dos seus membros ou dos leaders das suas maiorias, nas ocasiões críticas e nos momentos em que se torna necessário fazer a agitação da opinião pública em benefício da política representada no Go-

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vêrno, sistematicamente se tem feito a afirmação de ser necessário comprimir as despesas, mas eu tenho de constatar que a essa política anunciada não tem correspondido, nem pelo Parlamento, nem pelo Govêrno, nenhuma espécie de actos que de facto tenham trazido para a economia da nação ou para o Orçamento Geral do Estado uma economia sequer apreciável.
A política do Govêrno e do Parlamento tem sido absolutamente diversa, não se tendo feito outra cousa seuão aumentar-se as despesas e deminuir-se as receitas, isto em contrário do que se tem afirmado.
A propósito lembro-me de que ao Partido Democrático são inteiramente aplicáveis umas palavras que eu há dias, num momento de ócio, encontrei num livro do Padre Manuel Bernardes.
Gosto de ler os bons autores e V. Ex.ªs vão ver como êles têm razão.
Diz o Padre Manuel Bernardes o seguinte:
«É muito difícil dar razão ao estômago que não tem ouvidos; desenganem-se, pois, todos os que têm súbditos à sua conta, que sep lhes não taparem a boca, dando-lhes de comer, não lha poderão tapar, impedindo que murmurem. Logo que Cristo deu pão às turbas no deserto logo o quiserem fazer rei».
Sr. Presidente: não julgo necessário comentar esta parábola para que toda a Câmara veja como estas palavras se podem aplicar ao rei desta República que é por agora, e muito bem, o Partido Republicano Português.
O Sr. Brito Camacho: — Isso agora é hipérbole, não é parábola.
Risos.
O Orador: — Sr. Presidente: com estas minhas propostas vai talvez dar-se êste caso extraordinário: eu proponho que se faça desde já uma cousa que imediatamente é útil, visto que vai deixar de pesar no Orçamento uma avultada importância, mas havemos de ver que essa proposta naturalmente é rejeitada e que dentro de dois dias o Sr. Ministro da Instrução, trazendo o seu projecto de reforma de todo o ensino, vai propor a mesma cousa.
O que o Ministro propõe poderá vir a ser bom para mais tarde, mas o que eu proponho é mau, porque é para já; e apesar de eu ter de há muito a convicção do fim que terá a minha proposta, não desisto de a mandar para a Mesa, pois procedo conforme a minha consciência no sentido de reduzir as despesas, pois acho que cada um está bem colocado quando julga cumprir o seu dever, e o meu dever de homem público e de Deputado é ver ùnicamente a causa pública e assim, se entendesse que é bom transformar liceus centrais em nacionais, ou mesmo extingui-los, não hesitaria em mandar essas propostas para a Mesa.
Sr. Presidente: em poucas palavras vou justificar a minha moção.
A frequência dos liceus decresce de ano para ano.
Há liceus com uma frequência mínima.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Mas provavelmente têm professores a mais.
O Orador: — Isso não têm, mas o facto é que há liceus com tani pequena frequência que não se justificam. — Ainda ontem o Sr. Ministro disse que se gastaram perto de 6:000 contos com os liceus.
Um àparte do Sr. Ministro da Instrução (João Camoesas), que não se ouviu.
O Orador: — Para o raciocínio de V. Ex.ª é a mesma cousa. Para o meu é que é diferente.
Pregunto, Sr. Presidente, se neste momento em que o país se debate com uma grave crise financeira, em que há que ocorrer a toda a sorte de expedientes, desde os empréstimos destinados a despesas improdutivas, como os deficits dos anos anteriores, até a estampagem do papel moeda, há o direito de ter um liceu na Póvoa de Varzim, simplesmente para que estas pessoas, algumas das quais têm os seus próprios negócios no Pôrto, deixem de ali ir frequentar o respectivo liceu.
Esta pequena comodidade seria para considerar, se houvesse o desafogo do Orçamento, mas, nas presentes circunstâncias, é verdadeiramente inadmissível.
Em todo o caso, o aspecto mais fundamental desta questão não é ainda o do

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número de liceus existentes no país, que, sendo tam pequeno e havendo tantos analfabetos, possui trinta e três liceus no continente e ilhas, dos quais só quatro é que são nacionais, e entre êstes há o feminino.
O Sr. Tôrres Garcia: — Seria interessante discriminar a frequência dos cursos de letras e sciências, para se ver como há liceus em cujo curso de letras há só um aluno ou dois.
O Orador: — Se virmos então o que pode custar ao Estado o ensino dum indivíduo que se dê ao luxo de querer estudar alemão, em vez de inglês, verifica-se uma cousa verdadeiramente extraordinária. Em Castelo Branco, por exemplo, tendo dois alunos querido aprender alemão, houve necessidade de arranjar um professor de alemão para êsses dois alunos.
A questão do elevado número de liceus tem outro inconveniente. Não há ninguém que ignore que esta circunstância coloca o Estado na quási impossibilidade de ter êsses liceus nas condições de material, pessoal e instalações próprias para que os respectivos serviços sejam uma cousa séria, como devem ser. Ora, se fôsse votada a minha proposta, não seria possível dotar os liceus de Lisboa, Pôrto e Coimbra com todas as condições de pessoal e material necessários para ficarem à altura da sua missão? Não seria isso preferível a ter liceus por todo o país? Permita-se-me até apresentar um alvitre ao Sr. Ministro da Instrução, embora isso exceda um pouco o âmbito das minhas considerações, que são de ordem financeira.
Como V. Ex.ª sabe, tenho-me ocupado dos orçamentos como uma pessoa que é capaz de estudar a técnica de cada serviço. Ocupei-me do orçamento do Ministério da Guerra e estou-me ocupando do orçamento do Ministério da Instrução, e, no emtanto, seria incapaz de fazer uma reorganização dos serviços militares ou dos serviços do ensino, porque uma cousa é o seu aspecto financeiro e outra é o seu aspecto técnico.
Mas, Sr. Presidente, saindo, muito embora do âmbito das minhas considerações, permita-se-me que eu sugira ao Sr. Ministro da Instrução que talvez houvesse uma proposta melhor do que a minha, que seria a da criação de três liceus em Lisboa, Pôrto e Coimbra, ùnicamente para o ensino dos cursos complementares, ou seja dos 6.º e 7.º anos. Na verdade, os cursos complementares, não constituindo pròpriamente um grau de ensino, representam um preparatório especial para as escolas superiores, e, por consequência, haveria toda a conveniência em que êsses cursos fossem professados numa escola própria, com professores especiais, com todo o material de laboratórios, etc., que fôsse necessário para o seu ensino, que já é superior ao dos anos anteriores.
O Sr. Presidente: — V. Ex.ª tem quatro minutos para concluir as suas considerações.
O Orador: — Eu resumirei as minhas considerações.
Sr. Presidente; o meu último número fixa o pessoal dos liceus naquilo que é o pessoal dos liceus nacionais.
E a consequência lógica do n.º 1.º
Quanto às gratificações de directores de classes, é curioso notar que há liceus que têm tantos professores como quaisquer outros e em que as gratificações a directores do ciasses incomparavelmente superiores às estabelecidas na maior parte dos liceus.
Sr. Presidente: podia fazer ainda muito mais considerações sôbre êste assunto, mas não vale a pena.
O Sr. Ministro da Instrução, não deixará de. apreciar estas minhas palavras, e irá talvez dizer-me que está de acôrdo comigo, em princípio, mas que acha melhor que fique para quando se tratar da reforma.
Sr. Presidente: porque S. Ex.ª teve a amobilidade de me mostrar alguns apontamentos da reforma, eu estou convencido de que ela é excelente, mas precisamente por êste facto é que ela terá nesta Câmara, um grande obstrucionismo, primeiro nas comissões, depois aqui, visto que, quando se tocar o sino grande dos interêsses locais, não há ninguém que não vai badalar, para defender os interêsses da sua terra.
Tenho dito.
O orador não reviu.

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O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: por muito interessante que seja a moção que acaba de enviar para a Mesa, o Sr. António Fonseca, nós, dêste lado da Câmara, continuamos a manter a idea de que, propostas dessa natureza, não podem ser incluídas na discussão do orçamento. E o próprio ilustre Deputado proponente foi o primeiro que veio dar razão ao nosso asserto, quando há pouco afirmou que, elaborada esta proposta, como já o fizera, em relação a outras que anteriormente enviara para a Mesa, era debaixo do ponto estritamente financeiro, porque S. Ex.ª, como modestamente declarou, era incapaz de reconhecer as necessidades técnicas dos serviços.
Sr. Presidente: o Sr. António Fonseca justificou a sua proposta pela necessidade de se tentarem fazer aquelas economias que há muito tempo vêm sendo prometidas nos tablados dos comícios e até nos discursos proferidos nesta casa do Parlamento.
Não direi que S. Ex.ª tivesse estado bradando no deserto, mas a verdade é que estamos em democracia e é axiomático que as democracias são os mais caros de todos os govêrnos, e o Sr. António Fonseca, justificando a sua proposta, desculpe-me S. Ex.ª, não fez mais do que perder o seu tempo.
O Sr. António Fonseca (em àparte): — A quem V. Ex.ª o diz!...
O Orador: — Eu sei que V. Ex.ª não tem ilusões. Faço-lhe esta justiça.
Sr. Presidente: quando pedi a palavra sôbre o capítulo 4.º do orçamento era precisamente para ressaltar o que havia de ilógico em existirem 33 liceus num país em que a instrução se encontra no estado em que todos nós sabemos.
Porém, o Sr. António Fonseca antecipou-se nossas observações, e fez acompanhar o seu asserto do números que inteiramente justificaram quanto tem de excessivo o número actual dos liceus, quer do continente quer das ilhas.
O próprio relatório diz-nos que em 1915-1916 era de 415 o número de professores efectivos e 246 o número do pessoal menor, mas em 1919, isto é, quatro anos depois, Ossos números subiram, respectivamente, a 478 e 378.
E isto, Sr. Presidente, o resultado de se inventarem funções para os cargos, em vez de se criarem cargos para as funções. O que se trata é do empregar gente, o que é necessário é fazer a vontade aos influentes locais o tratar do assegurar os votos.
Os interêsses do país são cousa secundária.
Sr. Presidente: têm dito os jornais, e o ilustre Deputado que acabou de falar confirmou, que o Sr. Ministro da Instrução brevemente trará à Câmara uma nova reforma do ensino.
Não estive presente à parte da sessão de ontem, em que o Sr. Ministro da Instrução se ocupou dêsse assunto, e, pela leitura dos jornais, não pude apreender o sentido em que S. Ex.ª tenciona fazer a reforma, se se referiu tam somente à reforma do ensino primário ou se se referiu também à reforma do ensino secundário, e se, porventura, declarou à Câmara quais as bases em que ia fazer essa reforma. Se o não fez, parece-me que era de interêsse para todos e até para S. Ex.ª, antes ainda de apresentar na íntegra ao Parlamento a sua nova proposta, elucidar a Nação,. embora em notas sucintas, sôbre a orientação que vai dar a essa reforma e designadamente a proposta do ensino secundário.
Sabe V. Ex.ª e sabe a Câmara que actualmente em França é êsse um ponto que está na tela da discussão e que a reforma ultima mente decretada pelo ilustre Ministro da Instrução Pública, o Sr. Leon Berard tem sido discutidíssima e que o regresso por S. Ex.ª preconizado à orientação humanista, só tem recebido de alguns uma defesa entusiasta, tem sido também por parte de outros alvo de ataques bastante grandes. Não sei o critério que o Govêrno e especialmente o Sr. Ministro da Instrução conta seguir a êste respeito, não sei se S. Ex.ª pensa em manter a distinção actualmente existente nos cursos secundários entre os cursos de sciências e cursos de letras; se S. Ex.ª conta manter o ensino por classes, as divisões de cada disciplina por um grande número de anos, ou se conta regressar ao sistema antigo, dando-se cada disciplina num ano só.
Sr. Presidente: gostaria, repito, que o Sr. Ministro da Instrução tivesse ocasião

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de elucidar o Parlamento sôbre a orientação da sua reforma, especialmente no que respeita ao ensino secundário.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: sou um pouco avesso a meter a fouce em seara alheia. Não desejaria tomar parte na discussão do orçamento do Ministério da Instrução porque não é meu hábito entrar na discussão dêste orçamento; pedi, porém, a palavra porque o Sr. António Fonseca veio bolir com certos aspectos da vida das ilhas adjacentes, um dos distritos das quais tenho a honra de representar nesta casa do Parlamento, e por tal forma que se fossem aceitos, se fossem votados pela Câmara na parte respeitante aos Açores, as aspirações e princípios expostos pelo Sr. António Fonseca na sua moção, grave prejuízo adviria não só para a instrução duma maneira geral, nos Açores, mas para os interêsses da população açoreana.
Sr. Presidente: a distância a que se encontram os dois arquipélagos Açores e Madeira não pode harmonizar-se de modo algum com a teoria expendida pelo Sr. António Fonseca de garrotar todos os liceus centrais e não sei quantos dos nacionais.
Sabe V. Ex.ª, Sr. Presidente, que as ilhas são separadas por uma distância importante que só pode ser percorrida em paquetes.
Em cada distrito é indispensável que haja não só um liceu central por arquipélago, mas um liceu nacional por distrito.
Portanto, Sr. Presidente, não é prático, sobretudo nas condições actuais dos tempos e de transporte da paquetes, trazer alunos dos dois arquipélagos para Lisboa, instalá-los na. capital e fazê-los viajar periodicamente entre os arquipélagos e o continente.
Na parte que diz respeito ao continente. não quero discutir que haja ou não, nas afirmações de S. Ex.ª, muito de aproveitar sob o aspecto da difusão larga que se fez de liceus pelo continente; poderá, porventura, ter aplicação a doutrina do S. Ex.ª quanto a uma melhor distribuïção do ensino, de forma a harmonizar não só os interêsses do Estado em matéria de economia, mas também sob o aspecto moral que S. Ex.ª diz que não é de resolver porque alguns liceus estão funcionando em circunstâncias que não podem ser aceitas como boas.
Portanto, Sr. Presidente, achando que a moção de S. Ex.ª poderá, porventura, ter certa aceitação no continente, não pode de maneira nenhuma ser aplicável às ilhas adjacentes. Era esta a parte principal das minhas considerações.
Sr. Presidente: eu sou das pessoas que fazem justiça aos parlamentares que, como o fer. António Fonseca com o seu talento e estudo, com as suas condições de velho parlamentar intervém nas discussões que aqui se levantam e S. Ex.ª mais uma vez prestou um grande serviço ao País chamando a atenção da Câmara para o formidável exagero que tem havido na distribuïção de liceus por todo o continente.
Efectivamente, o Liceu da Póvoa de Varzim, a uma, hora de distância do Pôrto, não pode considerar-se nas mesmas condições dos liceus das ilhas adjacentes, não podendo, portanto, aceitar-se em nenhum caso a doutrina de S. Ex.ª, que consistiria em suprimir os liceus centrais nas ilhas.
Sr. Presidente: se não estivéssemos na discussão do Orçamento Geral do Estado, Orçamento que é preciso votar e depressa, que é necessário examinar detalhadamente mas com rapidez, porque não há muito tempo para fazer tudo, eu ainda iria rebater afirmações de S. Ex.ª quando se referiu ao Partido Democrático, mas não é agora o ensejo; no emtanto devo dizer que S. Ex.ª foi fundamentalmente injusto com o Partido Democrático e tam injusto que S. Ex.ª, preocupadíssimo com a sua, moção fez afirmações que não são inteiramente, e em nenhum caso, de receber.
S. Ex.ª com um exame mais profundo, menos superficial, dos factos que se têm desenrolado desde que o Partido Democrático está governando, havia de ver que não são exactas as suas afirmações quando diz que só se tem procurado aumentar as despesas e descurado as receitas.
O Sr. António Fonseca: — Ainda há dois dias V. Ex.ª esteve a defender a

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diminuïção de receita que resultaria para o Estado do pagamento dos impostos aduaneiros pelos maquinismos destinados à fábrica de cimentes de Leiria.
O Orador: — Veja V. Ex.ª, Sr. Presidente, como se alteram as cousas.
Sr. Presidente: como o momento não é próprio para largas justificações, eu limito-me tam somente a declarar que bastante infeliz foi o Sr. António Fonseca ao acusar o Partido Democrático de menos zêloso na observância duma rigorosa e apertada deminuïção das despesas públicas.
Toda a discussão do Orçamento Geral do Estado, pela forma como tem decorrido, só tem mostrado quanto o Partido Democrático representado pela maioria desta Câmara tem pugnado pela redução das despesas.
Só pode, pois, atribuir-se a uma infeliz distracção do Sr. António Fonseca a afirmação contida na sua moção.
Termino, Sr. Presidente, afirmando mais uma vez que a doutrina expressa na moção do Sr. António Fonseca não pode de forma alguma ser aplicada às ilhas adjacentes na parte relativa aos liceus.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: é caso para nos felicitarmos o facto de já hoje terem falado sôbre o orçamento dois Deputados da maioria.
Os Srs. Carlos Pereira o Jaime de Sousa merecem por isso as nossas homenagens, visto que abriram uma excepção desde que o Orçamento Geral do Estado está em discussão.
Sôbre matéria de ensino secundário é também interessante ler o que diz o parecer do orçamento do Ministério da Instrução, relativo ao ano passado.
Desde que no parecer n.º 411-(g) dês-te ano se confirma o que foi dito no parecer n.º 71-(f) do ano passado, é oportuno recordar o que então foi escrito sôbre o assunto.
É o seguinte:
«No ano lectivo de 1917-1918 os liceus do continente tinham aproximadamente 12:000 alunos matriculados e 525 professores em exercício. Em 1918-1919 o número de alunos baixou a 10:602 e o dos professores elevou-se a 642, ou seja um acréscimo superior a 100. No corrente ano lectivo, a razão inversa dêstes números mais ainda se acentua. O número de alunos desceu a 9:614 e o dos professores subiu a 657.
Verifica-se, portanto, que o número de professores em vez de ser directamente proporcional ao dos alunos, o é inversamente. Causas várias o determinam.
O número das licenças, a elevação a centrais de quási todos os liceus, sem que a sua frequência e a sua situação o justifiquem, a acumulação de empregos públicos, incompatíveis no tempo e no espaço, a deminuïção dos tempos lectivos obrigatórios e a pequena remuneração das horas extraordinárias, que não torna apetecível a sua regência, são indubitavelmente as principais.
A estas pode ainda acrescentar-se o desejo de servir amigos, com as nomeações provisórias, que forçam muitas vezes a dispensáveis desdobramentos de turmas, com o pretexto da pequenez das respectivas salas.
O liceu feminino de Lisboa, por exemplo, não sendo o mais freqüentado, é contudo o que relativamente tem maior número de professores.
Para 555 alunos, estão em serviço 41 professores, ao passo que o Liceu de Camões, para 784 alunos, ou sejam mais 219, tem apenas 43 professores.
E mais flagrante se torna ainda esta disparidade, se o confrontarmos com o Liceu de Pedro Nunes, que para 560 alunos tem 30 professores.
A frequência irrisória do curso complementar de letras também não justifica que em todos os liceus exista êsse curso, pelo menos como está funcionando.
Há liceus que têm apenas um aluno!! nesse curso, sendo a frequência, na grande maioria dos restantes, inferior a dez».
Êstes edificantes números e os justos comentários que os acompanham reforçam consideravelmente o argumento de que é absolutamente indispensável deminuir as despesas que se estão fazendo com o ensino secundário no nosso País.
A falta de frequência dos liceus, dia para dia mais acentuada, provém corta-

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mente das circunstâncias actuais da vida e especialmente da sua carestia. A frequência dos liceus, obrigando os alunos a despesas muitas vezes incomportáveis, afasta-os naturalmente. E as necessidades presentes forçam-nos a procurar desde crianças uma ocupação remuneradora.
É notável a quantidade enorme de rapazes que actualmente se encontram empregados em bancos, companhias e casas comerciais.
Esta é a razão principal da deminuïção da frequência, nos liceus e em outros estabelecimentos de ensino.
Se até já há muita gente que sustenta ser preferível manter a criança analfabeta do que ensiná-la a ler e assim habilitá-las para poderem tomar conhecimento das doutrinas dissolventes agora em voga, e do que se escreve em jornais da natureza daquele a que há pouco aludiu o meu ilustre amigo Sr. Morais Carvalho!...
Tenho dito.
O Sr. Tavares Ferreira: — Em princípio estou de acôrdo com algumas das considerações feitas pelo Sr. António Fonseca.
Acho também que na sua maioria os liceus deveriam ser nacionais e não centrais, pois a frequência não justifica a existência de tantos liceus centrais.
A deminuïção de frequência acentua-se em quási todos os estabelecimentos. Várias são as causas dessa deminuïção; de entre elas avulta a dos efeitos económicos que a guerra trouxe.
Poucas famílias podem hoje mandar os seus filhos para os liceus. Onde a deminuïção de frequência mais se acentua é nos anos escolares para além do 3.º ano, o que prova que os alunos logo que fazem o 3.º ano se colocam em qualquer profissão da qual possam obter os recursos precisos para a vida que cada vez mais cara está.
Não me parece, porém, que a melhor ocasião para se modificar o estado de cousas seja a discussão da proposta orçamental.
Acho que a melhor oportunidade para se tratar do assunto é na discussão da reforma de ensino que o Sr. Ministro da Instrução vai apresentar ao Parlamento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Instrução Pública (João Camoesas): — Mando para a Mesa uma proposta de eliminação.
Sr. Presidente: o Sr. António Fonseca apresentou um problema interessante e grave.
Na verdade, o ensino secundário padece do defeito que S. Ex.ª acentuou.
Sr. Presidente: por consequência hoje como ontem encontro-me inteiramente de acôrdo com o ilustre Deputado Sr. António Fonseca, e só desejo como êle que a questão se encare com coragem, desprezando todo o particularismo, por mais democrática que seja a tendência organizadora dos serviços, atendendo sempre aos mais altos interêsses da Nação.
Mas, no emtanto, ontem como, hoje, há uma cousa em que nos encontramos o Sr. António Fonseca e eu: o problema é fundamental; e eu vejo o problema dentro do ponto de vista de melhor conjugação de interêsses, devendo procurar o maior rendimento para a Nação, e considerando, como devemos, o problema com a complexidade dos factos que o determinam para que êle possa dar uma melhor eficiência das cousas.
Temos por consequência dois critérios: o fiscal e o social.
O Sr. António Fonseca: — Não vejo em que êsses critérios colidem.
O Orador: — Neste Parlamento temos um caminho que urge seguir: procurar fazer a transformação dos serviços.
O Sr. António Fonseca: — Se V. Ex.ª fizer a transformação dos serviços, tem de dar-lhes verbas para que possa realizar-se. Eu não me oponho a isso.
O Orador: — O Sr. António Fonseca coloca-se sob um ponto de vista inteiramente pessimista.
A proposta que temos a honra, de trazer ao Parlamento corresponde a uma necessidade profunda.
Não posso admitir de maneira nenhuma que o, Parlamento da República deixe de a considerar como merece, pois que fora do Parlamento as pessoas especializadas, cuja opinião pude conhecer, são na maior parte a favor da remodelação.
É mister, porém, criar e desenvolver

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uma forte corrente de opinião que possa servir de apoio, embora com inteligência e ponderação o Parlamento entenda dever introduzir-lhe as correcções precisas, para a adopção do projecto a que me referi.
Trazendo um Ministro uma proposta em que se encare o problema da instrução, estou convencido de que nenhum Parlamento deixará de aceitar e discutir tam elevado assunto.
Uma das várias o terríveis heranças da monarquia foi a desarticulação dêsses órgãos dó instrução e não se vá, acusar a República de não ter olhado para o problema, porque nos seus primeiros anos dedicou-lhe o melhor do seu esfôrço e se mais não fez foi porque teve uma luta internacional que lhe levou o melhor de nove anos de energia, convindo não esquecer que os monárquicos — servindo-se até de terra estrangeira — em ataques constantes perturbaram a vida pública e como V. Ex.ª sabe não são de geração espontânea os órgãos da formação do aparelho da cultura superior. O problema é vasto e creio que não haverá nenhum português que não reconheça a necessidade imperiosa de se modificar o nosso sistema escolar porque, no estado em que se encontra, as verbas que lhe são destinadas são quási improdutíveis.
Isto é necessário resolver-se e estou convencido de que o Parlamento não descurará o assunto e que o agoiro do Sr. António Fonseca é infundado, pois, repito, não julgo que o Parlamento deixe de contribuir para que se resolva o problema da instrução.
Tenho também um pouco de confiança em mim, no poder da minha tenacidade, no ardor da minha convicção e se, porventura, eu não ignoro que é muito difícil pela palavra, pela sugestão, fazer mudar um homem de disposições, sobretudo quando elas se enraízam em pequeno, no emtanto não posso deixar de contar comigo, com os altos valores que aqui e lá fora me hão-de ajudar para fazer a larga agitação de ideas que hão-de imppr à consideração do País a proposta o que hão-de forçar o Parlamento a convertê-la o mais depressa possível em lei.
Ao Sr. Morais de Carvalho não posso, sob pena, de me desviar da orientação que é necessário manter na discussão do Orçamento, explicar, para o que seria necessário tempo de que não disponho, os princípios e orientação das propostas de lei que tivemos a honra de fazer elaborar, no emtanto, não posso deixar de dizer a S. Ex.ª desde já que o facto de não termos feito à volta dessa proposta uma larga discussão foi por não querermos fazer publicidade sôbre uma obra em formação em que não tenhamos chegado, nos pontos fundamentais, a uma definição precisa e que poderia ter o grave inconveniente de excitar oposições.
Não houve, portanto, o propósito de fazer uma obra secreta em que não colaborasse quem quer que seja que tenha boa fé e inteligência.
Como dê a hora de se encerrar a sessão, o orador fica com a palavra reservada.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é hoje, pelas 21 horas. Ordem da noite: pareceres 411-(g) e 411-(h).
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 30 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Pareceres
Da comissão de administração pública, sôbre o n.º 731-C, de 1921, que autoriza a Câmara Municipal de Oliveira de Frades a vender ou a aforar terrenos baldios.
Imprima-se.
Da comissão dos correios e telégrafos, sôbre uma petição da Companhia Inglesa «The Eastern Telegraph Company Limited».
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Da comissão de finanças, sôbre o n.º 167-D, que suprime os exames de 2.ª classe dos liceus e determina que todos os exames dos liceus sejam presididos pelos reitores.
Imprima-se.
Da mesma, sôbre o n.º 435-B, que conta aos juizes e delegados efectivos das ilhas, 25 por cento a mais do tempo de

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serviço ali prestado, para todos os efeitos.
Imprima-se.
Da comissão de finanças, sôbre o n.º 302-D, que autoriza o Govêrno a contrair um empréstimo para a construção dum edifício para a Escola Industrial Infante D. Henrique, do Pôrto.
Imprima-se.
Da comissão de administração pública, sôbre o n.º 205-A, que concede à actual Junta Geral do distrito de Santarém o edifício mandado construir pela Junta extinta.
Para a comissão de finanças.
Da comissão de finanças, sôbre o n.º 453-D, que regula as pensões de reforma do pessoal fabril dos Arsenais de Marinha e Exército e Fábrica Nacional da Cordoaria.
Imprima-se.
Da comissão de finanças, sôbre o n.º 408-B, que isenta de franquia postal a
correspondência que os estabelecimentos de beneficência façam transitar pelos correios portugueses em sobrescritos abertos.
Imprima-se.
Últimas redacções
N.º 411 (c), Orçamento do Ministério do Trabalho.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
N.º 411 (d), Orçamento do Instituto de Seguros Sociais Obrigatórios.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
N.º 204, que autoriza o Govêrno a aplicar o saldo do empréstimo realizado nos termos da lei n.º 869, a reparações de navios de armada.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
O REDACTOR — Avelino de Almeida.

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