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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 151
(EXTRAORDINÁRIA)
EM 18 DE OUTUBRO DE 1923
Presidência do Ex,mo Sr. Afonso de Melo Pinto Veloso
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Marques Loureiro
Sumário. — Abertura da sessão. Leitura da acta. Expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Morais Carvalho dirige duas preguntas ao Sr. Ministro das Finanças, relativamente a aumento da circulação fiduciária e ao pagamento dos juros do 1.º trimestre aos subscritores do empréstimo em ouro, e pede providências ao Sr. Presidente do Ministério para que a Junta de Freguesia do Monte Redondo, concelho de Tôrres Vedras, tome posse do seu cargo.
Responde lhe o Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia).
O Sr. António Maria da Silva (Presidente do Ministério) promete ordenar as providências pedidas pelo Sr. Morais Carvalho.
O Sr. Carvalho da Silva, fazendo algumas considerações sôbre a resposta dada pelo Sr. Ministro das Finanças ao Sr. Morais Carvalho, dirige ao Sr. Presidente do Ministério a mesma preguntA sôbre aumento da circulação fiduciária, preguntando também ao Sr. Ministro das Finanças se foram empenhados determinados títulos da divida pública.
Responde-lhe o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Carlos de Vasconcelos comunica à Câmara ter ficado constituída a comissão de inquérito ao concurso para o fabrico de moedas.
O Sr. Álvaro de Castro, chamando a atenção do Sr. Ministro das Colónias para a questão levantada na sessão anterior pelo Sr. Cunha Leal, faz algumas considerações, pedindo ao Sr. Ministro que faça declarações sôbre o assunto, e termina requerendo a generalização do debate sôbre o caso do aumento da circulação fiduciária.
É rejeitado o requerimento do Sr. Álvaro de Castro.
Efectuada a contraprova requerida pelo Sr. Cunha Leal com a invocação do § 2.º do artigo 116.º do Regimento, verifica-se Ter sido rejeitado por 37 votos e aprovado por 28.
Autorizado o Sr. Ministro das Colónias a responder às considerações do Sr. Álvaro de Castro com prejuízo da ordem do dia, S. Ex.ª usa da palavra, dando largas explicações sôbre o assunto em debate.
Usam em seguida da palavra para explicações os Srs. Cunha Leal e Álvaro de Castro.
Volta a usar da palavra o Sr. Ministro das Colónias, prestando novos esclarecimentos.
É aprovada a acta e concedida uma autorização.
O Sr. Carlos de Vasconcelos (em nome da comissão de inquérito ao concurso das moedas, expõe à Câmara algumas dúvidas levantadas na comissão sôbre a amplitude dos seus poderes.
O Sr. Presidente declara que vai consultar a Câmara sôbre se a mesma comissão pode ouvir outras pessoas além do Sr. Lúcio de Azevedo.
Usam da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Almeida Ribeiro e Carlos de Vasconcelos.
O Sr. Presidente faz algumas considerações sôbre o estado da questão, a fim de esclarecer a Câmara sôbre o que vai resolver.
Usam ainda da palavra sôbre o modo dê votar ou Srs. Carlos Pereira e Cunha Leal.
O Sr. Almeida Ribeiro requcre que seja novamente tida à parte da acta da sessão anterior onde vem inserto o requerimento do Sr. Carlos de Vasconcelos.
Lida na Mesa, usam ainda da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Aníbal Lúcio de Azevedo, Carlos de Vasconcelos, Fausto de Figueiredo, Carvalho da Silva, Jorge Nunes, Almeida Ribeiro e Lúcio de Azevedo.
O Sr. António Correia requere que a sessão seja prorrogada até se liquidar o incidente em debate e que o Sr. Lúcio de Azevedo seja convidado a declarar perante a Câmara os nomes das pessoas envolvidas no caso do concurso da Casa da Moeda.
E rejeitado o requerimento do Sr. António Correia.
Efectuada a contraprova requerida pelo Sr. António Correia, confirma se a rejeição.
Usa da palavra para interrogar a Mesa o Sr. Jorge Nunes.
Seguem-se no uso da palavra os Srs. Tavares de Carvalho, Aníbal Lúcio de Azevedo e Velhinho

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Diário da Câmara dos Deputados
Correia (Ministro das Finanças), que declara que vai ordenar um inquérito sôbre o assunto.
O Sr. Fausto de Figueiredo, em nome da comissão de inquérito, usa da palavra declinando os poderes que lhe foram conferidos.
O Sr. Presidente declara que vai. apresentar a Câmara o pedido de demissão da mesma comissão.
Usam da palavra os Srs. Lúcio de Azevedo, Jorge Nunes, Sr. Presidente, António Correia, António Mata, novamente, o Sr. Lúcio de Azevedo e Carvalho da Silva.
O Sr. Presidente pronuncia algumas palavras, interpretando o pensamento da Câmara sôbre a questão debatida, e encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 15 horas e 15 minutos.
Presentes à chamada 39 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 41 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão.
Abílio Correia da Silva Marçal.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Ferreira Vidal.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Angelo de Sá Couto da Cuuha Sampaio Maia.
António Abranches Ferrão.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António de Sousa Maia.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
João Baptista da Silva.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Mariano Martins.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Vasco Borges.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Virginio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Francisco Cruz.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João José Luís Damas.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
Lourenço Correia Gomes.

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Sessão de 18 de Outubro de 1923
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Pedro Góis Pita.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vergílio Saque.
Não compareceram os Srs.:
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso Augusto da Costa.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Américo dá Silva Castro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António de Mendonça.
António Resende.
António Vicente Ferreira.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Preiria.
Francisco Coelho de Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cangado.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge de Barros Capinha.
José Cortês dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Maximino de Matos.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo Limpo de Lacerda.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
As 15 horas principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 39 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Do Ministério da Guerra, respondendo ao ofício n.º 604 relativo ao requerimento do Sr. Garcia Loureiro.
Para a Secretaria.

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Diário da Câmara dos Deputados
Da comissão de homenagem à memória de Carvalho Araújo, pedindo auxílio para o levantamento dum monumento àquele ilustre marinheiro.
Para a Secretaria.
Do Sr. Pina de Morais, agradecendo o voto de sentimento pela morte de seu pai.
Para a Secretaria.
Requerimento
Do tenente António Pedro de Carvalho, pedindo para continuar no serviço activo do exército à semelhança do que sucede aos oficiais milicianos.
Para a comissão de finanças.
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de
Antes da ordem do dia
O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: havia pedido a palavra para antes da ordem do dia na sessão de ontem, mas nem então nem ontem consegui que ela me fôsse dada.
Assim, inscrevi-me novamente para chamar a atenção do Sr. Ministro das finanças, para dois assuntos da maior importância, um dos quais já ontem foi aqui abordado pelo Sr. Cunha Leal, e é o que diz respeito ao aumento da circulação fiduciária.
Sr. Presidente: devo dizer a V. Ex.ª e à Câmara, que as respostas dadas pelo Ministro das Finanças, Sr. Velhinho Correia, por forma alguma me puderam satisfazer.
Eu peço â S. Ex.ª que em resposta às minhas considerações, seja o mais sucinto e breve possível, e que à pregunta que vou formular, se sim ou não foi aumentada a circulação fiduciária, S. Ex.ª sob sua honra declare à Câmara se foi ou não foi.
Nada mais.
S. Ex.ª deve esta resposta clara á Câmara e ao país; e devo desde já dizer que se ela não nos satisfizer, não abandonaremos a questão.
Um outro ponto para que desejo chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças respeita ao empréstimo ultimamente votado e que se convencionou chamar «empréstimo ouro».
Segundo as condições do empréstimo, os subscritores ficavam com direito ao vencimento do juro do 1.º trimestre, ou seja o que acaba em Setembro.
Fixaram-se nas condições da subscrição quais as épocas em que os subscritores deveriam entregar o dinheiro, determinando-se que, quando qualquer dêles não pagasse as fracções na devida época, podê-lo-ia fazer até 15 de Dezembro, levando-se-lhe mais 6 e 4/2 por cento.
Porém, consta-me, embora por forma alguma eu queira acreditar, que aos subscritores que não entregaram ainda as suas prestações se lhes nega o juro do primeiro trimestre, o que e contrário às condições então estabelecidas.
Sr. Presidente; como disse, não sei se isto é verdade; e, por isso, peço ao Sr. Ministro das Finanças que me dê sôbre o caso uma resposta clara e peremptória, isto é, se os subscritores têm ou não direito a receber o juro.
Sr. Presidente: êste lado da Câmara nunca se cansou a demonstrar quanto era ruinosa a operação, que para nós era de descrédito e não de crédito, dadas as condições onerosas em que ela era feita.
Todavia, pior do que votá-la, é não cumpri-la, visto que representa o descrédito e a desconfiança para futuras operações.
Peço, pois, ao Sr. Ministro das Finanças que seja o mais concreto possível, na resposta às duas preguntas que fiz a S. Ex.ª
Aproveitando estar no uso da palavra, peço ao Sr. Presidente do Ministério a sua atenção para o seguinte:
Há cêrca de um ano que se fizeram as eleições gerais para as juntas de freguesia, e foi, portanto, eleita uma nova junta para a freguesia de Monte Redondo, concelho de Tôrres Vedras.
Porém a verdade é que, apesar de a eleição ter decorrido nos devidos termos, o administrador do concelho recusa-se absolutamente a facultar os meios para a nova junta entrar em exercício.
Eu peço ao Sr. Presidente do Ministério que dó ao seu subordinado instruções claras e terminantes para que cumpra a lei, isto é, para que a nova junta, que foi eleita por sufrágio do povo daquela freguesia, possa tomar o lugar que lhe foi destinado.

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Sessão de 18 de Outubro de 1923
Desejava ainda que o Sr. Presidente do Ministério se dignasse informar a Câmara sôbre se de lacto existe ou não crise ministerial.
Parece mo que o Poder Legislativo tem o direito de saber se o Govêrno está ou não completo, tanto mais que veio publicada nos jornais uma carta do Sr. Ministro da Agricultura, pedindo a sua demissão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia): — Ouvi com a máxima atenção as considerações do ilustre Deputado Sr. Morais Carvalho.
Tenho a declarar a S. Ex.ª, acêrca dá pregunta que me fez há pouco, o que já disse ontem nesta Câmara.
Na pregunta feita pretendeu S.. Ex.ª, como já pretenderam outros Deputados, envolver uma questão política, mais do que pròpriamente uma questão de carácter financeiro.
A questão de carácter financeiro que deve interessar S. Ex.ª, como parlamentar, é a seguinte:
Ó Orçamento Geral do Estado tem um deficit de 1:000 contos diários, deficit que é preciso extinguir o mais ràpidamente possível, envidando nesse sentido todos os esfôrços aqueles que não querem que o País se afunde, e desejam que êle saia da situação difícil em que se encontra.
A pregunta de S. Ex.ª envolve mais uma preocupação política do que pròpriamente uma preocupação acêrca da circulação fiduciária.
Sôbre a circulação fiduciária devo dizer o seguinte, sob minha, palavra de honra, visto que S. Ex.ª se. me dirigiu nesse sentido.
Sob minha palavra de honra, direi o seguinte: há um facto e êsse é importante.
Convém, ou não convém aumentar a circulação fiduciária? 0 Digo que não.
E para isto que reüniu o Parlamento. É para isto que. peço a colaboração de todos os parlamentares, para fazerem uma obra que interessa ao País.
A Câmara sabe que vão entrar em discussão as propostas de finanças.
V. Ex.ª tem de encarar o problema sob vários aspectos.
Nessas propostas aumentam-se os tributos e faz-se uma larga redução das despesas.
Tudo isso está na ordem do dia...
O Sr. Morais Carvalho (interrompendo): — Fiz uma pregunta concreta, a que V. Ex.ª não responde.
O Orador: — Quando as propostas vierem à discussão, haverá o ensejo de esclarecer a situação no ponto em que não estiver esclarecida.
Àpartes.
O Sr. Morais Carvalho: — O Sr. Ministro tem de responder à pregunta que formulei.
Aumentou ou não a circulação fiduciária?
O Orador: — Já disse da maneira mais terminante que o Govêrno não saïrá fora da lei. Não deseja sair fora da lei.
Interrupções.
O Govêrno não pretende sair fora da lei.
Devem, pois, todos tranquilizar-se.
O Sr. Morais Carvalho: — Mas V. Ex.ª não responde se aumentou a circulação fiduciária.
O Orador: — O Govêrno garante que não deseja aumentar a circulação fiduciária.
O Sr. Nuno Simões: — Mas não garante que não aumentou a circulação fiduciária.
O que importa é que garanta que não aumentou a circulação fiduciária.
O Orador: — O Sr. Morais Carvalho põe a questão como entende; e eu, por isso, tenho o direito de pôr a questão um pouco diferente do que S. Ex.ª entende. A liberdade deve ser a mesma.
Interrupções.
A minha questão no fundo é a mesma.
A minha questão não é de detalhe.
O Sr. Morais Carvalho preocupa-se com detalhes meramente políticos.
O Sr. Nuno Simões (interrompendo): — É uma questão moral.

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Diário da Câmara aos Deputados
O Orador: — O que convém saber é se se deve elevar a circulação fiduciária.
O Sr. Carvalho da Silva: — Mas V. Ex.ª aumentou ou não a circulação fiduciária?
O Orador: — O problema não é êsse. O problema, é se, dada a situação difícil criada ao País pelo Poder Legislativo — e eu não enjeito a cota parte que me pertença nessas responsabilidades — no aumento do deficit devem ser tomadas as medidas necessárias para obviar a êsse mal. O que interessa principalmente é essa questão.
Só o que é preciso saber é se é preciso ou não aumentar a circulação fiduciária. Êste é que é o problema.
O Sr. Morais Carvalho: — O problema não é êsse. Só o que se quere saber é se se aumentou ou não a circulação fiduciária.
Apoiados.
O orador: — Eu penso que não se deve aumentar a circulação e só V. Ex.ªs, que aqui estão reünidos para isso resolverão. O que eu sei é que feitas aã rectificações nós temos um deficit de 1:000 contos por dia.
V. Ex.ªs não se interessam por isto?
O Sr. Nuno Simões: — Temos tanto interêsse como V. Ex.ª
O Orador: — Aqui tem V. Ex.ª a situação. É preciso ou não aumentar? V. Ex.ªs o dirão; e devem lembrar-se que temos- 1:000 contos por dia de deficit.
O Sr. Morais Carvalho: — O que V. Ex.ª quere dizer é que aumentou.
Apoiados.
Vários àpartes.
O Orador: — Quanto à segunda parte, a que respeita aos títulos, eu irei informar-me pois nada até hoje chegou ao meu conhecimento; mas vou informar-me e direi a V. Ex.ª o que houver a êsse respeito.
O discurso será publicado na íntegra guando a orador haja restituído as notas taquigráficas.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — O ilustre Deputado Sr. Morais Carvalho chamou a minha atenção para um caso da posse de uma junta de Monte Redondo, concelho de Tôrres Vedras, dizendo que a autoridade não a tinha deixado tomar posse.
Em mandei instruções, para o governador civil transmitir ao seu delegado, ordenando-lhe o cumprimento da lei.
A outra pregunta é com respeito à crise ministerial.
Devo dizer que o Sr. Ministro da Agricultura ainda pertenço ao Ministério.
S. Ex.ª escroveu-me uma carta que é do conhecimento público, pois foi publicada na imprensa.
Pelos serviços que S. Ex.ª tem prestado, eu instei com S. Ex.ª para. que ficasse no Ministério, pois aí mesmo tinha oportunidade de explicar a conveniência de se extinguir ou não o Ministério da Agricultura.
Se houver crise, na devida oportunidade informarei V. Ex.ª
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: ontem o Sr. Cunha Leal tratou nesta Câmara da questão da circulação fiduciária.
Hoje o Sr. Morais Carvalho fez uma pregunta ao Sr. Ministro das Finanças, e S. Ex.ª não respondeu.
Isto não pode ser.
O país precisa saber se foi o n não aumentada a circulação fiduciária em 115:000 contos ou mais, tudo fora dos limites da autorização.
O Sr. Ministro das Finanças recusou-se a responder, a dar contas ao Parlamento e ao país da aplicação dos dinheiros públicos.
Ao Sr. Presidente do Ministério formulo esta pregunta:
Aumentou-se ou não a circulação fiduciária?
Igualmente desejo que o Sr. Ministro das Finanças me responda a outras preguntas que lhe vou formular.
É certo ou não, que o Govêrno na gerência do seu antecessor empenhou em Londres dois títulos da dívida externa que estavam na posse da Fazenda Pública?
Sim ou não?!

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Sessão de 18 de Outubro de 1923
Desejo saber se o Govêrno foi quem ordenou ao Banco de Portugal que não fizesse descontos dos bilhetes do Tesouro em determinadas condições.
Desejo saber se os bilhetes do Tesouro têm sido descontados a 36 por cento ao ano.
Desejo saber se o Govêrno mandou emitir mais quatro milhões de títulos da dívida. consolidada.
Devo lembrar que o actual Ministro das Finanças, quando Simples Deputada, ao apresentar a proposta da comissão, disse que ela deveria subir o câmbio à casa dos quatro e, se não subisse, séria uma operação ruinosa.
Como pode continuar nas cadeiras do poder êste homem?
Seria esta franqueza igual à sinceridade com que fez a declaração que considerava o aumento da circulação fiduciária um crime de lesa-Pátria?
O país não tem o direito de saber tudo isto?
Espero que o Sr. Ministro das Finanças ou o Sr. Presidente do Ministério respondam concretamente às preguntas que formulei e cuja resposta o país precisa saber.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia): — Preguntou o Sr. Carvalho da Silva se era verdade estarem empenhados, em Londres, papéis da dívida pública.
Devo dizer que não é verdadeiro tal facto, embora seja frequente uma operação de tesouraria nessas condições.
Com respeito ao Banco de Portugal, êste nas Suas funções de desconto opera como qualquer outro banco: não tem que se integrar na orientação do Govêrno.
Sôbre o assunto não há determinação alguma da parte do Govêrno.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Comunico a V. Ex.ª que a comissão que há-de ouvir o Sr. Lúcio de Azevedo se encontra instalada, tendo escolhido para presidente o Sr. Fausto de Figueiredo e para secretário a mim participante. Surgiram algumas dúvidas, das quais a Câmara terá conhecimento pelo presidente da comissão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro: — Sr. Presidente: ao mesmo tempo que, sobressaltado com as notícias vindas nos jornais a propósito do caminho de ferro e pôrto de Lourenço Marques, eu telegrafava a um dêsses jornais, A Pátria, lavrando o meu protesto, o Sr. Cunha Leal, naturalmente agitado pelos mesmos pressentimentos, levantava nesta Câmara a questão, em termos que obrigaram o Sr. Ministro das Colónias a fazer declarações na verdade peremptórias, claras o concludentes.
Só tenho que louvar o Sr. Ministro pela atitude assumida e pelas declarações que fez no Parlamento.
Infelizmente, os jornais continuaram com uma notável insistência a dar a público a informação de que o Sr. Augusto Soares, chefe da missão em Londres, se encontrava negociando o convénio.
Novamente se punha a questão pedante a opinião pública e novamente se impunha um formal desmentido por parte do Sr. Ministro das Colónias.
Seria absurdo e pareceria a todos extemporâneo e exótico que eu a propósito duma notícia, anónima me julgasse obrigado a manifestar o meu protesto e quisesse levantar a questão no Parlamento. Precisava e preciso, por isso, justificar a razão do meu sobressalto.
Creio que êste momento não é já aquele em que mais convenha fazer-se o Silêncio perante as negociações.
Como Nação precisamos de nos afirmar e o Parlamento precisa, como representante dela, de sustentar, desde já, para coarctar a liberdade dos negociadores, que não está disposto a permitir negociações que possam redundar na absorpção de Lourenço Marques pela União Sul-Africana.
O Sr. Cunha Leal leu já à Câmara um telegrama que deve ser para todos nós bastante elucidativo. Infelizmente a pessoa que estava à frente das negociações na África do Sul não tinha aquela linha de conduta precisa para afastar proposições que eram essencialmente contrárias ao brio e interêsses nacionais.
Apoiados.
Eu, que ainda mantenho a opinião de que a assinatura do modus vivendi foi um êrro, êrro em que colaboraram o Sr. Ministro das Colónias e o então Alto Comissário, Sr. Brito Camacho, não posso dei-

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Diário da Câmara dos Deputados
xar passar êste propósito sem fazer calorosa justiça à patriótica atitude de S. Ex.ª em lace das exigências da União Sul-Africana.
Fala-se na formação duma companhia particular para a exploração do caminho de ferro de Lourenço Marques e do seu pôrto. Dois engenheiros subscreveram uma proposta nêsse sentido, que foi enviada ao Ministério das Colónias. Essa proposta chegou a sofrer o estudo duma comissão que, felizmente, contava no seu seio com dois patriotas que lhe recusaram o seu assentimento. Essa proposta foi apresentada a algumas horas da partida dos negociadores para Londres.
Mas esta proposta que esporàdicamente surge nestas negociações não é de agora, vem de mais longe.
Quando as negociações se estavam realizando na África do Sul, o general Freire de Andrade telegrafava ao Alto Comissário de então dizendo-se satisfeito com o facto de o primeiro Ministro da União parecer disposto a propor ao Govêrno da província a constituição duma companhia para dirigir os serviços do pôrto e fazer obras no caminho de ferro de Lourenço Marques.
Mais tarde, ao longo, das negociações, na segunda conferência dos delegados, acordou-se em aceitar a formação duma junta mixta autónoma administrativa em que tivessem representação os interêsses comerciais e industriais do Transvaal. Não posso afirmar se esta proposta foi feita aos negociadores por parte da União, más posso afirmar que as negociações se romperam única e exclusivamente porque os negociadores do Transvaal exigiam nessa junta a maioria de representantes, donde eu concluo que a proposta da criação da junta mixta autónoma tinha já sido feita ao general Smuts.
Se efectivamente qualquer dos negociadores actuais, com responsabilidades nas negociações realizadas na África do Sul, entrasse em negociações em Londres não poderia retirar essa proposta, que foi aceite quási totalmente, é Que liberdade tem, pois, êsse negociador, cujo critério está tam abaixo de qualquer crítica, que antes de partir não deixa de exprimir o seu sentimento numa proposta que o Ministério das Colónias não aceitou, felizmente, convencido e muito bem, de
que o País a reprovaria, incondicionalmente?
Mas, Sr. Presidente, é-me grato fazer aqui os maiores e mais rasgados elogios à pessoa do Sr. Augusto Soares, velho republicano e uma das figuras mais categorizadas do País; mas S. Ex.ª estava absolutamente contra-indicado para uma missão como é a do negociação do convénio ou dum empréstimo, sendo S. Ex.ª o presidente do conselho de administração da Companhia de Moçambique.
Apoiados.
O Sr. Cunha Leal: — V. Ex.ª dá-me licença? Se não estou em êrro o Sr. Ministro disse que estava negociando um empréstimo; os telegramas dizem que está negociando um convénio.
O Orador: — Mas os interêsses da Companhia de Moçambique, infelizmente todos os conhecemos. A Companhia é essencialmente constituída por capitais estrangeiros à ordem do estrangeiro.
Não são êstes pròpriamente os interêsses da província de Moçambique.
Apoiados.
E ultimamente uma grande operação que se pretende, fazer com respeito ao pôrto da Beira é bem o significado de que êsses capitais são orientados por uma política estranha, que procura introduzir-se no território da província para mais fàcilmente dominar.
Apoiados.
É um passo dado para a construção do caminho de ferro da Beira.
Agora vamos, porventura, cometer um êrro: deixar os capitais estrangeiros construir o pôrto da Beira, para mais tarde querermos emendar o êrro, resgatando-o. Mas o que se tem feito na África Oriental não tem sido senão resgatar os erros feitos anteriormente.
Apoiados.
A preocupação de todos os Govêrnos não tem sido senão salvaguardar, duma maneira excessiva talvez, más necessária, a nossa soberania.
Somos, por vezes, obrigados a resgatada em condições bem desastrosas.
Desejaria que o Sr. Ministro das Colónias fizesse as suas declarações, mas desejaria também, e muito mais, que S. Ex.ª declarasse, desde já, que as negociações

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não importam o arrendamento do caminho de ferro e pôrto.
Pregunto: a aceitar-se a proposta para fazer a administração conjunta do pôrto de Lourenço Marques, pregunto se amanha a Espanha não terá também igual direito, por proposta idêntica, respeitante ao caminho de ferro do hinterland?
Aonde iríamos? O alargamento viria até a Europa.
O Govêrno deixe bem patente a incompetência do Sr. Augusto Soares para dirigente dum convénio ou dum empréstimo.
Chamo a atenção do Sr. Ministro das Colónias para um outro caso: o processo dum funcionário do Ministério das Colónias pertencente à província de Moçambique, e que à província de Moçambique deveria regressar em face da lei. É o Sr. Dr. Teixeira Coelho, engenheiro maquinista dos caminhos de ferro de Lourenço Marques.
Aguarda há seis meses o regresso à colónia, pois que a isso se opõe o actual director dos caminhos do ferro, Sr. Sá Carneiro.
Se alguém poderia dar a informação deveria ser o Sr. engenheiro Cabral e não o Sr. Sá Carneiro.
Abrange ao mesmo tempo o cargo de chefe de tracção e oficinas.
Foi feito um inquérito aos seus actos, que foi absolutamente favorável ao engenheiro Cabral.
Eu faço juízo por um despacho sôbre êsse inquérito.
O requerimento foi indeferido, e tendo recorrido para o Conselho Colonial, e o Conselho reconheceu que o funcionário tinha razão, saindo ilibado do inquérito, o mesmo não tendo sucedido ao director do caminho de ferro, que entendeu que não devia dar conhecimento do despacho.
O que se não compreende é que, passado tanto tempo, o engenheiro que no inquérito ficou mal ferido, seja quem informe a respeito dum engenheiro ou funcionário.
Eu não peço a V. Ex.ª que faça seguir êsse funcionário, como é da lei, para o seu lugar; mas o que desejo é que V. Ex.ª lhe mande dar conhecimento oficial da informação que sôbre êle foi prestada ao Alto Comissário, para que êsse funcionário possa recorrer.
Creio que a inquisição acabou e que os processos inquisitoriais acabaram.
A ninguém assiste o direito de se pôr atrás do anonimato para ferir um funcionário honesto, que por todos é respeitado.
Aguardo que o Sr. Ministro das Colónias tome ás providências que o caso requere, certo de que justiça será feita.
Ao terminar as minhas considerações, Sr. Presidente, desejo ainda referir-me a um assunto que diz respeito ao Sr. Ministro das Finanças.
Novamente aqui foi tratada a questão do aumento da circulação fiduciária; e eu, como toda a gente, como todo o País, desejo a nitidez e a clareza.
Revoltou-me a emmaranhada exposição que o Sr. Ministro das Finanças aqui fez e que nos deixou a certeza absoluta de que a circulação fiduciária foi aumentada em condições gravosas, ilegais e condenáveis.
Apoiados.
Êste problema não pode ficar em suspenso, e por isso eu requeiro que o debate seja generalizado, a fim de que possa definitivamente esclarecesse um problema que devo ser completamente esclarecido.
Nós faltaríamos ao respeito que a nós mesmos devemos se consentíssemos que um Ministro não quisesse responder pelos actos que ilegalmente pratica.
Apoiados.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador haja revisto as notas taquigráficas.
Foi rejeitado em prova e contraprova, com invocação do § 2.º do artigo 116.º, pedida pelo Sr. Cunha. Leal, o requerimento do Sr. Álvaro de Castro,
O Sr. Ministro das Colónias (Rodrigues Gaspar): — Sr. Presidente: eu vim à Câmara especialmente para esclarecer certas dúvidas que ontem aqui foram apresentadas pelo ilustre Deputado Sr. Cunha Leal.
Já no outro dia expliquei à Câmara, e hoje expliquei pessoalmente ao Sr. Álvaro de Castro, a situação especial em que me encontrava, e que por isso só tencionava aqui falar pela primeira vez quando se tratasse da interpelação do Sr. Álvaro de Castro.

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Sou, porém, forçado a acabar com um boato que pode ter consequências sérias; e é por isso que, verdadeiramente à sobreposse, uso da palavra neste momento, respondendo simultaneamente ao Sr. Ganha Leal e ao Sr. Álvaro de Castro, que hoje abordou o mesmo assunto.
Sr. Presidente: as minhas palavras tiveram uma interpretação diversa daquela que eu quis dar-lhes.
O boato, que tanto me impressionou também, foi o de que se estava tratando de negociar um empréstimo em Londres, para a metrópole e para a província de Moçambique, hipotecando ou dando como caução o caminho de ferro e pôrto de Lourenço Marques.
Ao mesmo tempo dizia-se igualmente que se estava a tratar da. convenção entre Moçambique e a União Sul-Africana, com a idea de entregar o caminho de ferro e pôrto de Lourenço Marques a uma companhia portuguesa e que esta seria naturalmente a forma de tudo se facilitar,- p empréstimo e a convenção.
Eram êstes os tópicos principais dos boatos em virtude dos quais o ilustre Deputado Sr. Cunha Leal levantou na Câmara, e muito bem, a questão, a fim de que ela ficasse esclarecida.
Eu disse que a idea de entregar o caminho de ferro e o pôrto de Lourenço Marques a uma companhia não era nova, sendo defendida como uma solução pelo falecido Deputado Sr. Leote do Rêgo, que entendia ser a melhor que poderia tomar-se.
Eu tive ensejo de declarar na última sessão em que falei que tinha repudiado, que repudiava e que repudiaria sempre tal idea.
Êste foi sempre o ponto de vista que defendi, sem consultar ninguém, porque não podia deixar de repugnar-me o pensamento sequer de consentir o predomínio estrangeiro sôbre o que é português.
Apoiados.
Quanto ao facto de entregar o pôrto e caminho de ferro de Lourenço Marques a uma companhia, eu já tive, Sr. Presidente, ocasião de dizer nesta Câmara que achava inoportuna semelhante operação.
Desnecessário será dizer e explicar à Câmara mais uma vez a razão por que assim o entendo e entenderei.
Repudio e repudiarei sempre semelhante operação, podendo assim a Câmara estar completamente certa de que, emquanto aqui estiver e os assuntos coloniais passarem pelas minhas mãos, nunca darei o meu assentimento a semelhante operação, isto é, a entrega da administração do pôrto e caminho de ferro de Lourenço Marques a uma companhia, muito embora portuguesa.
Ainda mesmo, Sr. Presidente, que pudesse haver quaisquer roturas de negociações que nos levassem a ceder, eu preferia, Sr. Presidente, cair aqui para depois me poder encontrar no meu lugar de Deputado.
E esta, Sr. Presidente, a minha opinião sôbre, êste assunto; e francamente não sei o que mais será necessário dizer para tranquilizar o Parlamento e o País.
Eu devo dizer, Sr. Presidente, que não fui bem compreendido na sessão passada relativamente ao empréstimo, pois, frisei de uma maneira clara e precisa a distinção que havia entre negociações para o convénio e negociações pára o empréstimo, nada havendo He comum entre uma e outra cousa.
Há na verdade, Sr. Presidente, alguns assuntos a tratar em Londres relativamente a Moçambique, para o que foi encarregado o Sr. Dr. Augusto Soares, que é uma pessoa, como todos conhecem, distinta e elevada, que já exerceu o lugar de Ministro dos Negócios Estrangeiros, sendo altamente considerado tanto aqui como no estrangeiro.
O Sr. Dr. Augusto Soares, Sr. Presidente, foi realmente a Londres tratar de um empréstimo com uma casa inglesa, pára a província de Moçambique, não tendo porém êste assunto nada com a questão da convenção.
Estando ao mesmo tempo em Londres o general Smuts mostrou desejos de ter uma conversa com o Sr. Dr. Augusto Soares a fim de ter conhecimento da nossa opinião sôbre a nova convenção, cujos preliminares, como a Câmara sabe, o Sr. Dr. Augusto Soares está encarregado de negociar.
Não está, pois, o Sr. Dr. Augusto Soares, como a Câmara vê, a tratar da convenção; tem apenas trocado impressões com o general Smuts sôbre a forma de negociar a nova convenção.

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Poderá de facto amanhã o Sr. Dr. Augusto Soares ser encarregado de tratar da nova convenção, porém, por emquanto, não foi encarregado de tal, estando apenas a tratar do empréstimo, assunto êste que nada tem que ver com a convenção.
Os jornais, Sr. Presidente, dizem diversas cousas e pela forma como lhes convém; porém, a questão está no pé em que eu a expus à Câmara, isto é, que o Sr. Dr. Augusto Soares se encontra em Londres a tratar de um empréstimo e não da nova convenção, tendo de facto já tido conversas com o general Smuts sôbre as bases da nova convenção.
O Sr. Nuno Simões: — Então está certo: foi justamente isso o que os jornais disseram.
O Orador: — Os jornais estabeleceram uma espécie de intriga entre negociações para o empréstimo e negociações para a convenção.
E é isto que não está certo.
O Sr. Cunha Leal: — O discurso que V. Ex.ª fez aqui na Câmara e que veio publicado nos jornais foi, ao que parece, fornecido por V. Ex.ª, pois, nem de outra forma gê justifica, visto que tendo eu falado muito mais tempo do que V. Ex.ª, os jornais tivessem apenas publicado o pequeno resumo do que eu disse e desenvolvido largamente o que V. Ex.ª aqui disse.
O Orador: — Eu hoje mandei pedir as notas taquigráficas do meu discurso e delas, segundo vi, não consta semelhante cousa.
A Câmara certamente faz-me a justiça de acreditar que eu nunca usei de habilidades, e muito menos seria capaz de o fazer tratando-se de uma questão magna como esta.
O Sr. Augusto Soares foi encarregado de tratar do empréstimo e dos preliminares com o general Smuts acêrca das negociações para o convénio.
Portanto, não é nenhum delegado do Govêrno que tenha poderes para negociar o convénio.
Disse o Sr. Cunha Leal que está em Londres para negociar o empréstimo uma
pessoa que sustentou a idea da entrega do caminho de ferro e pôrto de Lourenço Marques a uma companhia.
Repito que a única pessoa que foi a Londres para negociar o empréstimo e tratar dos preliminares sôbre que hão-de assentar as negociações para a convenção foi o Sr. Augusto Soares.
Com S. Ex.ª foi o engenheiro Sr. Sá Carneiro, mas simples é ùnicamente como técnico.
O Sr. Sá Carneiro não vai negociar cousa nenhuma.
Há uma referência do Sr. Cunha Leal. que é exacta.
É certo que houve uma reunião para o estudo das bases do convénio, reunião a que compareceram os Srs. Ernesto de Vasconcelos, Ivens Ferraz, chefe de gabinete do Sr. Alto Comissário, Sá Carneiro e Bulhão Pato, e de facto o Sr. Sá Carneiro propôs como solução a entrega do caminho de ferro e pôrto de Lourenço Marques a uma companhia, opinião que foi secundada pelo Sr. Bulhão Pato e combatida pelos Srs. Ivens Ferraz e Ernesto de Vasconcelos.
Mas, repito-o, o Sr. Sá Carneiro está em Londres ùnicamente como técnico, na sua qualidade de antigo administrador do caminho de ferro de Lourenço Marques e não como delegado para negociar seja o que fôr.
O Sr. Augusto Soares está tendo apenas conversas preliminares.
Uma voz: — E no emtanto roubam-nos a casa.
O Orador: — Esteja V. Ex.ª tranquilo, que o pé de cabra ainda está cá.
O Sr. Nuno Simões: — Então guarde-o V. Ex.ª bem.
O Orador: — O Sr. Sá Carneiro foi apenas como técnico para poder dar de pronto esclarecimentos e mais nada. Isto é que eu desejo que fique bem claro.
Sr. Presidente: para concluir, em resumo, eu direi:
Não posso admitir que entre a província de Moçambique e a União Sul-Africana haja qualquer falta do respeito mútuo. Não posso admitir qualquer cousa

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em que haja a deminuïção da nossa soberania. Êste é um ponto perfeitamente assente.
Por consequência, nesta ocasião não se está a tratar do negociações para uma convenção, mas apenas se trata de negociar um empréstimo. E mais nada.
O Sr. Augusto Soares não tem poderes para assinar qualquer convenção.
Creio ter dado as explicações que são necessárias para satisfazer o espírito da Câmara.
Quanto ao caso do funcionário a que só referiu o Sr. Álvaro de Castro, eu devo informar S. Ex.ª que vou estudar o processo; e, se êle tiver direito de ir para as cadeias, irá como fôr de justiça.
Por último cumpro-mo agradecer aos Srs. Cunha Leal e Álvaro de Castro as referências elogiosas que me fizeram.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador haja revisto as notas taquigráficas.
O Sr. Cunha Leal: — Não tenho empenho nenhum em estar a massacrar o Sr. Ministro das Colónias, que sei estar doente. Se se tratasse do Sr. Velhinho Correia que está bem disposto que até faz moeda falsa, então sim, massacrá-lo-ia.
Levantei a questão, porque vi nos jornais que se estava em Londres tratando da convenção; mas pelas declarações do Sr. Ministro das Colónias ficámos sabendo que o Sr. Augusto Soares tem poderes apenas para tratar de um empréstimo e mais nada!
Os meus receios justificam-se no passado. Por exemplo, o Sr. Freire de Andrade, que não tinha autorização para substituir o Alto Comissário, exorbitou das funções e instruções que se lhe tinham dado.
Depois dêste exemplo, o que fez o Govêrno? Mandou êste negociador à Sociedade das Nações.
É por estas,e outras que eu acreditei no que os jornais afirmaram.
Eu tenho muita consideração pelo Sr. Augusto Soares; mas sei que S. Ex.ª é um leigo em matéria de caminhos de ferro, e sei que o conselho técnico pensa que o melhor que temos a fazer é entregar o nosso caminho de ferro a uma companhia particular.
As minhas palavras não representam um ataque ao Sr. Ministro das Colónias. O que digo significa apenas a minha estranheza pelo facto de S. Ex.ª ter escolhido para nossos delegados pessoas que já têm patenteado o seu modo de ver por forma diversa da idea de S. Ex.ª que nós também defendemos.
E quando digo nós refiro-me a S. Ex.ª, ao Sr. Álvaro de Castro, à minha pessoa e à Câmara, que tem dado assentimento aos altos sentimentos patrióticos do Sr. Ministro das Colónias.
Ora S. Ex.ª mandou para Londres pessoas cuja opinião não está definida por maneira a durem-nos a impressão de que nunca reflectirão uma corrente de opinião que nós reputamos prejudicial.
Entende o Sr. Ministro que uma tal circunstância não constitui perigo algum.
Oxalá que assim seja.
Em todo o caso esta nossa discussão não será estéril, visto que as nossas palavras hão-de ser conhecidas pelos nossos delegados e êles ficarão sabendo que encontrarão a nossa reprovação unânime sôbre tudo aquilo em que saiam das bases o princípios defendidos sempre pelo Sr. Ministro das Colónias.
Eu não teria nomeado o Sr. Sá Carneiro, como não teria nomeado, o Sr. Freire de Andrade para qualquer espécie de representação diplomática.
Eram estas as considerações que tinha a fazer, protestando contra a escolha dos delegados que foi feita, não havendo nas minhas palavras qualquer intuito político, mas tam somente o desejo de defender os interêsses nacionais.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro: — Sr. Presidente: agradeço as declarações do Sr. Ministro com respeito à reintegração do Sr. engenheiro Cabral.
Com respeito ao papel que incumbe aos nossos negociadores em Londres, direi que as explicações do Sr. Ministro satisfariam por completo, se nelas viesse a declaração de que ao Sr. Augusto Soares haviam sido dadas as necessárias instruções para que não deixassem de ser seguidos os pontos de vista aqui defendidos pelo Sr. Ministro das Colónias e por diversos membros desta Câmara.

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Seria, pois, conveniente que S. Ex.ª dissesse se de facto determinara que o Sr. Augusto Soares não fôsse além de designados limites.
Eu bem sei que o convénio deverá ser aqui discutido; mas seria conveniente que nas conversas preliminares não se chegasse a pontos melindrosos, pois que difícil de retirar será qualquer cousa que tenha sido lançada sôbre a Mesa das conferências.
Quanto aos poderes conferidos ao Sr. Augusto Soares para negociar um empréstimo, tenho a objectar que houve um procedimento ilegal.
O Sr. Augusto Soares não podia negociar nenhum empréstimo para Moçambique, sem que a iniciativa dêsse empréstimo fôsse tomada em conselho legislativo da colónia.
Apesar de eu ter requerido ao Ministério das Colónias certos documentos por várias vezes, nunca mós forneceram.
Nessa colecção de documentos, o último que nela se insere é referente ao Sr. Freire de Andrade, a propósito de uma local publicada no Daily Mail, de Joanesburgo, em que dizia pouco mais ou menos o seguinte:
O Sr. Freire de Andrade, inteiramente conformado com os pontos de vista do Sr. Smuts, vai a Lisboa convencer o Govêrno desta opinião.
O Sr. Freire de Andrade viu-se obrigado a fazer uma declaração que foi transcrita no próprio jornal em que dizia não estar convencido, mas que vinha ser o» propagandista das ideas do Sr. Smuts, em Lisboa.
Pode ser que também as negociações de Londres não cheguem a resultado algum positivo, mercê da atitude patriótica de V. Ex.ª; mas, porventura, lá vem o Sr. Sá Carneiro, engenheiro distintíssimo, fazer entre nós a propaganda daquilo que já no Cabo sé procura fazer.
É por isto que eu protesto contra a nomeação de uma pessoa contra-indicada, porque toda a sua mentalidade gira à volta da entrega do caminho de ferro.
Disse O Sr. Ministro das Colónias, embora ligeiramente, que seria, porventura, mais económico, sob o ponto de vista da administração, entregar o caminho, de ferro a uma companhia particular.
Eu permito-me discordar dêsse argumento. Não é mais económico nem podia ser.
Os caminhos do ferro de África não servem para dar receitas ao Estado. E infeliz do Estado Português se se convencesse, de que a sua melhor obra de colonização, o seu melhor instrumento de fomento, devia estar nas mãos de uma companhia particular.
É por isso que a União não tem um único caminho de ferro entregue a particulares.
Nó pacto fundamental que se fez frisou-se que os caminhos de ferro não poderiam ser administrados para dar receitas, porque eram instrumentos de fomento necessários ao País, e não poderiam ser considerados como instrumentos produtores de receitas.
Ora, como a opinião do Sr. Sá Carneiro não é baseada nestes princípios, lamento que êle faça parte da comissão, por êste motivo e porque estou convencido que êle não deixará de criar uma situação difícil ao Sr. Augusto Soares, embora V. Ex.ª não tivesse limitado a êste senhor o seu campo de acção.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Colónias (Rodrigues Gaspar): — Sr. Presidente: pedi a palavra para esclarecer ainda alguns pontos a que se referiu o Sr. Álvaro de Castro.
Não seguirei a ordem cronológica das considerações feitas por S. Ex.ª Há uma parte, porém, que convém já esclarecer.
Disse S. Ex.ª que discordava de mim quanto ao meu modo de ver sôbre o caminho de ferro e pôrto de Lourenço Marques, com respeito a julgar mais vantajosa a sua exploração por uma companhia.
S. Ex.ª não percebeu bem o que eu disse. O que eu afirmei foi que quando mesmo me convencesse de que a forma de obter melhor eficiência para o caminho de ferro e pôrto de Lourenço Marques seria entregá-lo a uma companhia, mesmo que ou estivesse convencido disso não o faria.
O Sr. Álvaro de Castro: O Sr. Sá Carneiro como técnico e informador é que pode ter uma opinião diferente da de V. Ex.ª

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O Sr. Presidente do Ministério e Ministro da Guerra (António Maria da Silva): — Fica com a sua opinião.
O Sr. Álvaro de Castro: — Não é tanto assim. Há muitas opiniões do negociadores que nunca ficaram só com êles.
O Orador: — Eu tenho para mim como indispensável reformar toda aquela organização, todo aquele sistema do caminho de ferro e pôrto de Lourenço Marques. Há muita cousa ali susceptível de deminuïção de despesa.
Mas, não basta que o Sr. Ministro assim pense; é necessário alguém que execute.
De há muito tempo temos tido a preocupação de saber quem á que deve ir a Lourenço Marques com essa incumbência.
Não necessitava de uma criatura que soubesse muito de caminhos de ferro e de pôrtos; felizmente temos muitas pessoas conhecedoras dêsses assuntos.
Do que necessitava era de quem conhecesse todo aquele maquinismo.
Não queria uma pessoa que fôsse para lá seis ou oito meses enfronhar-se no assunto para depois fazer alguma cousa; o que eu queria era arranjar alguém que exercesse uma acção imediata, e então todas as informações mo davam o Sr. Sá Carneiro como sendo uma pessoa que tinha toda a autoridade para reformar todos aqueles serviços.
Estava, pois, indicado o Sr. Sá Carneiro.
Chamei S. Ex.ª e convidei-o a desempenhar essas funções, dizendo-lhe o que pensava.
S. Ex.ª concordou em que eu tinha razão, mas desculpou-se de não querer ir, acrescentando que não me faltariam engenheiros distintos que pudessem ocupar êsse lugar.
Respondi que efectivamente não me faltavam engenheiros, mas faltava-me quem tivesse conhecimentos especiais sôbre aquele assunto.
Eu quero — disse-lhe — alguém que chegue lá e possa agir imediatamente. Instei imenso com o Sr. Sá Carneiro para que fôsse para Lourenço Marques.
Depois de muitas instancias S. Ex.ª aceitou e foi logo pôsto em contacto com
o Sr. Alto Comissário da província, que concordou com a nomeação de S. Ex.ª Quando depois se tratou da necessidade de ir alguém a Londres e foi indicado para essa missão o Sr. Augusto Soares, o Sr. Alto Comissário da província foi o próprio que disse que quem devia acompanhar o Sr. Augusto Soares a Londres era o Sr. Sá Carneiro, visto ser um homem conhecedor do assunto a versar — caminhos de ferro e pôrto de Lourenço Marques.
Mas, quem foi encarregado da missão não foi o Sr. Sá Carneiro, mas sim o Sr. Augusto Soares.
È agora devo dizer que o Sr. Augusto Soares, em virtude de conferências longas que tivemos, está perfeitamente integrado no meu ponto de vista; e as bases que S. Ex.ª levou são concretas, donde não pode sair de forma alguma. Creio que isto esclarece V. Ex.ª Permita-me ainda V. Ex.ª que diga que de facto é essencial, preciso, que os Srs. Ministros venham à Câmara dar conta dos seus actos.
Eu, podendo fazê-lo, tenho nisso o maior empenho; mas todos também devem concordar que por vezes há situações que podem ser prejudiciais para o próprio país se deminuirmos a autoridade de pessoas encarregadas de certas missões. Quanto à questão do empréstimo quero também negar a opinião do Sr. Álvaro de Castro.
Quando chegar a ocasião, S. Ex.ª verá que tudo foi respeitado. Não pretendo agora dizer o que se está fazendo neste momento; o. que lhe posso afirmar é que às negociações estão a aproximar-se do meu ponto de vista, não podendo, contudo, entrar em pormenores.
Isto, relativamente ao empréstimo; porque, quanto à convenção, parece-me que o Sr. Augusto Soares só se encontrou uma vez, creio que num jantar, com o general Smuths, tratando ùnicamente de estabelecer pontos de contacto, a fim de poder entrar em negociações.
Sr. Presidente: creio ter assim explicado a minha acção como Ministro das Colónias.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Acta aprovada.

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O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Sr. Presidente: o presidente da comissão de inquérito tem necessidade de sair desta casa do Parlamento, e fui eu incumbido de expor à Câmara as dúvidas que há no meio da comissão.
Pelo requerimento que foi enviado para a Mesa, parece que à comissão compete ùnicamente ouvir o ilustre Deputado Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo.
Em tais condições, a maioria da comissão é de opinião que não tem que ouvir essas declarações, pois o Sr. Lúcio de Azevedo as pode fazer à Câmara.
Se alguma cousa incumbe à comissão, é fazer a inquirição de testemunhas e de documentos para formular uma opinião, e indicar à Câmara o resultado dos seus trabalhos e qual o destino a dar ao respectivo processo.
Nestas condições requeiro a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se à comissão de inquérito é concedido êsse mandato.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Deixe-me V. Éx. a manifestar a minha estranheza por o Sr. Carlos de Vasconcelos vir preguntar qual é o âmbito da comissão.
No espírito de S. Ex.ª não pode haver dúvidas.
Eu é que penso que esta Câmara legalmente não pode dar poderes a uma comissão para inquirir testemunhas e proceder a investigações.
Não se pode fazer senão por um projecto de lei apresentado pelo Senado e convertido em lei.
Só assim terá poderes.
Dizia eu que não sendo assim, não sendo por meio duma lei, a comissão por V. Ex.ª nomeada não pode ter outra missão que não seja a que claramente, mas também restritivamente, indica o requerimento do Sr. Carlos de Vasconcelos.
Interrupção do Sr. Lúcio de Azevedo, que não se ouviu.
O Orador: — Acaba o Sr. Lúcio de Azevedo de me dizer, em aparto, que tem o máximo empenho em que a comissão nomeada veja todo o processo relativo ao fornecimento em questão; e desde que S. Ex.ª director do estabelecimento onde êsse processo corre, tem êsse desejo, eu creio que nada obstará, mesmo sem lei especial, a que essa comissão de inquérito proceda ao exame do referido processo e traga à Câmara os resultados dêsse exame.
Mas isto ùnicamente porque o Sr. Lúcio de Azevedo, por um pundonor que muito o honra, deseja que a comissão faça êsse exame, e o autoriza, na sua qualidade de director geral dêsse estabelecimento.
Permita me porém a Câmara que eu lhe patentei a minha descrença, aliás firmada pelas lições da experiência, na eficácia dos inquéritos dêste género, quer para o efeito do apuramento de responsabilidade de carácter criminal, quer para o efeito do apuramento de responsabilidades de caracter disciplinar.
As responsabilidades de ordem criminal destrinçam-se nos organismos próprios e competentes, criados e mantidos pela República, e êsses organismos são os tribunais.
As responsabilidades de ordem disciplinar averiguam-se por sindicâncias feitas nos termos da lei.
Todavia estamos em presença duma deliberação da Câmara e essa deliberação tem de cumprir-se, mas tem de cumprir-se nos precisos termos do requerimento apresentado pelo Sr. Carlos de Vasconcelos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — As minhas palavras foram suficientemente claras, e por isso estranho as considerações que sôbre elas acaba de fazer o Sr. Almeida Ribeiro.
Eu disso que falava em nome da comissão e disse que a maioria dessa comissão é que tinha dúvidas.
Eu expus as minhas dúvidas e pedi à Câmara as instruções necessárias para desempenhar a minha missão.
Disso S. Ex.ª ainda que a comissão tinha poderes para ouvir o Sr. Lúcio de Azevedo sôbre os nomes dos políticos e examinar os documentos de um concurso.
Ora eu creio que a comissão terá que ouvir aqueles que na imprensa já afrontaram êsses nomes.

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São êstes pontos que eu desejo ver esclarecidos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Em vista das declarações dos Srs. Almeida Ribeiro e Carlos de Vasconcelos, vejo-me na necessidade de resumir à Câmara os pontos que devem ser postos à votação.
Efectivamente esta Câmara não pode ter funções policiais; e para as ter seria necessário que se votasse uma lei especial.
Como tal não se fez, a comissão tem o direito de ouvir quem quiser, mas não oficialmente.
É nesse sentido que vou consultar a Câmara.
O Sr. Carlos Pereira: — Se a comissão foi nomeada apenas para saber os nomes dos políticos que pretenderam influir no processo das moedas, ela cumpre a sua missão ouvindo o Sr. Lúcio de Azevedo.
Isto e mais nada.
Tenho dito.
O Sr. Cunha Leal: — Estamos aqui apenas a fazer actos de pura fantasia.
Imaginemos que nós nomeamos uma comissão para ouvir as declarações do Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo. Neste caso, tinham-se substituído as declarações do Sr. Lúcio de Azevedo por um relatório.
Não foi para isto que se nomeou a comissão.
O Sr. Carlos Pereira (interrompendo): — O Sr. Carlos de Vasconcelos apenas quis saber os nomes.
E ou declaro que as declarações que eu fizer levo-as até onde quiser...
O Orador: — Pode dizer ou deixar de dizer o que quiser; mas ninguém tem o direito de exigir que em vez de ser ouvido por todos o seja apenas por alguns.
Isso só redundará em desprestígio do Parlamento.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Desejava que a Mesa nos dissesse qual o requerimento feito, e que motivou a discussão que se está fazendo.
O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário vai ler a acta na parte referente ao incidente.
Leu-se na Mesa a acta da sessão anterior.
O Sr. Lúcio de Azevedo (sôbre o modo de votar): — Julgo do meu dever esclarecer a Câmara, porque me parece que ela não está suficientemente esclarecida e não se tem referido às determinantes das minhas afirmações.
Tendo um jornal atribuído à minha pessoa responsabilidades num concurso que ainda nem sequer se tinha realizado, acusando-me de responsabilidades graves, tive ocasião de dizer que supunha ser esta campanha derivada de interêsses feridos, porquanto não se tendo realizado até então o concurso, não podendo eu, portanto, intervir, mostrando a minha parcialidade por êste ou por aquele, só assim só explicaria uma tal atitude para comigo.
Tendo o Sr. Ministro das Finanças de então, Sr. Vitorino Guimarães, solicitado de ruim o estudo da conveniência ou inconveniência de serem adquiridos os discos no estrangeiro, fui acusado de ter tomado o partido de qualquer entidade num convénio que, de facto, não se realizou.
Ora eu disse, e repito, que de facto alguns políticos e certas entidades — e quando me referi a políticos não disse que eram parlamentares, porque há políticos de todas as categorias — me procuraram para fazer êsse oferecimento, não por concurso público, como defendi desde a primeira hora, mas em descoberto, ficando assim lesados os interêsses do Estado.
Foram estás informações que dei à Câmara, e que mantenho.
Estava resolvido a dizer quais as entidades que pretendiam sem concurso público fazer êsse oferecimento, o que representava para o Estado uma operação de alguns milhares de contos para a totalidade do fornecimento.
O Sr. Carlos de Vasconcelos (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: o Sr. Carlos Pereira disse que esta questão provinha de, no Parlamento, o Sr. Lúcio de Azevedo ter feito determinadas afir-

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mações, e ter eu pedido os nomes, e que a comissão seria ùnicamente para a declinação dos nomes.
A comissão não podia, de facto, pedir penalidades para ossos políticos que tinham pretendido influir junto de S. Ex.ª
Sr. Presidente: vejo que o presidente dessa comissão já pediu a palavra, e assim mais concreta e claramente apresentará o seu modo de ver sôbre o assunto.
A meu ver, Sr. Presidente, vamos assistir a uma. fantochada, pois que esta não é mais do que uma fantochada; e, se bem que a frase seja um pouco áspera, é no emtanto verdadeira.
Disse o ilustre parlamentar Sr. Lúcio de Azevedo que no assunto se achavam envolvidos determinados políticos parlamentares e não parlamentares.
O Sr. Lúcio de Azevedo: — Não parlamentares.
O Orador: — Nesse caso, não têm razão de ser as considerações que desejava apresentar, e termino esperando que o presidente da comissão diga à Câmara qual a nossa atitude.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Fausto de Figueiredo: — Sr. Presidente: agradeço à Câmara o ter-me escolhido para fazer parte da comissão.
Porém, devo dizer com toda a franqueza que não nos prestamos a cousas que possam por qualquer forma desprestigiar ainda mais o Parlamento e até os políticos.
A isso não nos prestamos por princípio nenhum.
V. Ex.ªs compreendem muito bem que o requerimento feito pelo ilustre Deputado Sr. Carlos de Vasconcelos tinha por fim esclarecer uma questão e nada mais.
Não trato eu, Sr. Presidente, como Deputado de apreciar neste momento a atitude do Sr. Lúcio de Azevedo, com quem aliás tenho relações que muito prezo; porém, a questão' foi levantada pelos jornais e trazida ao Parlamento pelo ilustre Deputado Sr. Lúcio de Azevedo.
Foi isto que levou o Parlamento a ocupar se do assunto; mas a ocupar-se dele a sério, com o intuito, claro está, de conhecer pelo Sr. Lúcio de Azevedo quem foram êsses políticos que desejariam levar S. Ex.ª à prática de um crime.
Se a Câmara entende que o Sr. Lúcio de Azevedo tem no seu dossier elementos, provas, para se conhecer quem foram êsses políticos, eu nesse caso pregunto à Câmara quais as penalidades que hão-de ser aplicadas a essas pessoas.
Foi dito aqui nesta Câmara que a comissão se devia limitar a ouvir o Sr. Lúcio de Azevedo.
Eu digo francamente a V. Ex.ª que não estou disposto, pelo meu lado, e creio poder, falar em nome dos meus colegas da comissão, a desempenhar tal papel.
Apoiados.
Não me furtarei ao prazer de ouvir o Sr. Lúcio de Azevedo, apresentando nomes e factos; mas apesar disso eu preciso saber quais as penalidades a aplicar, sem o que a comissão não vai comprometer o seu prestígio, embora o desprestígio fique a cada um.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: tem esta questão dois aspectos inteiramente diversos: o aspecto legal e o aspecto moral.
Levantou o Sr. Almeida Ribeiro dúvidas sôbre quais as atribuïções da Câmara no que se refere a comissões de inquérito; mas, se algumas dúvidas houvesse a apresentar sôbre o aspecto. legal, elas deveriam ter sido apresentadas ontem.
Desde que a comissão foi nomeada, não podemos deixar de atender ao aspecto moral, tornando-se necessário que arrangemos um aspecto legal que salvaguarde bem o moral.
De contrário, o Parlamento ficaria muito mal colocado nas resoluções que tomasse.
Evidentemente, a comissão não pode ter só as atribuïções de preguntar ao Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo quais os nomes comprometidos; porque ou S. Ex.ª só os quere dizer à Câmara por entender que a ela não devem ser apresentados e, nesse caso, a comissão, embora ouvindo-os da bôca S. Ex.ª, também os não poderia vir dizer à Câmara, ou o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo não se importa que a comissão os divulgue e, em tal caso, pode hoje mesmo declará-los perante nós todos.

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Em questões desta ordem não pode haver outro critério que não seja o de tudo esclarecer, tornando-se necessário dar à comissão todos os poderes não só para bem do prestígio do Parlamento, mas até porque o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo é certamente o primeiro a desejá-lo.
Um àparte do Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo.
O Orador: — Nestas condições, se não há lei que permita à Câmara ir até onde seja necessário, preciso é que se vote um projecto que, sob o ponto de vista moral da questão, não permita que seja quem fôr possa dizer lá fora que a Câmara procura ocultar factos de natureza irregular que o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo tenha de revelar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: estamos a protelar a solução do caso e a desviá-lo do verdadeiro ponto de vista sob que devia ser encarado.
Há muito que nos habituámos a ouvir Deputados defenderem-se nesta casa com explicações que lhes não são pedidas pela Câmara, como se ocupassem aqui os cargos de directores de quaisquer serviços. Houve um jornal de Lisboa que atacou o director da Casa da Moeda; e S. Ex.ª, que dera todas as explicações e respondeu a todas as preguntas perante o Sr. Ministro das Finanças, entendeu por bem vir ao Parlamento, que para o caso não é o lugar próprio, fazer acusações graves e, o que é pior, insinuações que podem envolver numa atmosfera de suspeições os políticos da República Portuguesa.
Quanto aos actos praticados e os que se atribuem ao Sr. director da Casa da Moeda, só o Sr. Ministro das Finanças é que por agora tem o dever de proceder.
Desde que os jornais se ocuparam do caso, desde que se estabeleceu uma polémica, o Ministério das Finanças, para prestígio da República e da sua administração, tem de proceder já, imediatamente.
Mas que se não caia mais em sindicâncias de que não resulta absolutamente nada!
Sr. Presidente: uma vez que o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo, director da Casa da Moeda, esquecendo-se de que estava nesta Câmara, falando não como funcionário, mas como Deputado, tam infeliz foi na sua exposição que até lançou uma nota de suspeição sôbre políticos que a princípio dizia serem parlamentares, mas que pelas suas declarações recentes se verificou não serem parlamentares, por honra de S. Ex.ª e para que se não suponha que desta questão de modus faciendi acêrca do inquérito se pode chegar ao ponto de inquirir e de tomar providências que competem aos tribunais, o Sr. Aníbal Lúcio s6 tem de declarar aqui já, imediatamente, os nomes dos políticos visados.
Apoiados.
Que êsses homens se enlameiem a si, mas não a nós todos.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: ouvi a leitura da acta da sessão de ontem e pedi à Mesa a gentileza de ma ceder por alguns momentos para a ler agora no que se refere ao assunto em debate.
O orador consulta a acta da sessão anterior.
Sr. Presidente: a letra do requerimento do Sr. Carlos de Vasconcelos contém duas partes bem distintas.
A primeira é a função da comissão, e a segunda é o fim que se visa.
Quem apura responsabilidades não é uma comissão de inquérito. Desde que não há nada expresso em contrário, quem apura responsabilidades são os tribunais.
A comissão tem a sua função demarcada no requerimento do Sr. Carlos de Vasconcelos, requerimento a que nada me custa prestar a minha homenagem como ditado pelo mais puro desejo de prestigiar o Parlamento.
Dizia eu, Sr. Presidente, que em face da letra do requerimento e tal como está aprovado, o que há a fazer é convidar o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo a, perante uma comissão, declinar os nomes dos políticos a que quere referir-se.
É isto o que está no requerimento que se votou.
A função, portanto, da comissão é ouvir do Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo os nomes das pessoas.

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O Sr. Fausto de Figueiredo: — Não acha V. Ex.ª que isso é pouco demais para o prestígio das pessoas que fazem parte dessa comissão?
O Orador: — Isto é o que está no requerimento, mas agora surge outro aspecto: os nossos colegas que são membros da comissão declaram-se não dispostos a limitar o seu trabalho a isto que eu suponho ser a deliberação da Câmara quanto à função dessa comissão, acham que isso é pouco demais para êles. Acham que é necessário fazer mais alguma cousa. E um critério que eu respeito muito em relação aos dois parlamentares que o expuseram; mas parece-me que não modifica em nada êsse critério o que está deliberado.
Pode a Câmara modificar nesse sentido a deliberação tomada; mas para isso, como já disse, é necessário que se vote uma lei.
De resto, Sr. Presidente, devo dizer a V. Ex.ª e à Câmara que, desde que o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo já aqui declarou terminantemente que os políticos a que aludiu não são parlamentares, o caso, quanto a mim, interessa-me minimamente.
Eu poderia, como parlamentar, interessar-me, se porventura se tratasse de parlamentares, mas como se trata apenas de políticos o caso pouco me interessa e creio mesmo que não deve interessar à Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo: — Sr. Presidente: o Sr. Jorge Nunes estranhou há pouco que o administrador da Casa da Moeda viesse trazer à Câmara êste assunto.
Pois eu entendo que, sendo acusado publicamente, era aqui no Parlamento, onde tenho assento, que devia levantar o meu protesto.
Também S. Ex.ª estranhou que eu não indicasse logo os nornos.
Foi S. Ex.ª infeliz, porque se esqueceu de que numa ocasião análoga, em que foi convidado a indicar nomes, S. Ex.ª disse que não era polícia.
O Sr. Jorge Nunes (interrompendo): — Nessa ocasião referi-me a um caso passado, mas que não me dizia respeito. As situações eram diferentes.
S. Ex.ª vai como Deputado justificar a sua atitude como director da Casa da Moeda, quando apenas tinha de se dirigir ao seu superior hierárquico.
O Orador: — Sr. Presidente: eu trouxe êste assunto à Câmara, repito-o, porque, tendo-me sido atribuídas responsabilidades, que eu engeito, entendi do meu dever de homem público e parlamentar trazer aqui o caso, dizendo desde logo a V. Ex.ª, quando se me pediu que indicasse nomes, que, porque o caso è complexo e muito delicado e não pode ser versado em meia dúzia de palavras, eu só declararia os nomes dos indivíduos que pretenderam induzir-me a cometer um acto de má administração perante uma comissão que estivesse disposta a examinar o processo do princípio ao fim.
O processo é bastante volumoso e compõe-se de muitos elementos — motivo por que eu não poderia resumir as minhas explicações a uns breves minutos.
Só a uma comissão ou a um tribunal êle devo ser presente.
br. Presidente: fui acusado publicamente; e como parlamentar entendi que essa comissão devia ser constituída com maioria dos meus adversários políticos e apenas com a representação dum correligionário meu, tam seguro eu estou da honestidade das minhas acções.
Sou eu próprio que peço ao Sr. Ministro das Finanças que desde já me considere suspenso e que ordene um rigoroso inquérito aos meus actos como administrador da Casa da Moeda, a fim de que possam ser apuradas as minhas responsabilidades.
Como homem de bem, como republicano de princípios, eu tenho procurado toda a vida honrar os meus progenitores; e por isso não posso admitir que um jornal, por motivos que desconheço, embora dêles suspeite, tivesse iniciado contra mim uma campanha insidiosa, atribuindo-me responsabilidades que não tenho.
Eram estas, Sr. Presidente, as declarações que eu queria fazer a V. Ex.ª e à Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Correia (para um requerimento): — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª

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que se digne consultar a Câmara sôbre se permite que a sessão seja prorrogada até se liquidar êste assunto, e que o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo seja convidado a declarar perante esta casa do Parlamento os nomes que só perante uma comissão S. Ex.ª desejava referir.
Foi rejeitado.
O Sr. António Correia: — Requeiro a contraprova.
Procede-se à contraprova.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: se V. Ex.ª me permite, embora estejamos numa contraprova, eu lembro à Câmara que, depois das declarações do Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo, talvez fôsse mais prático dividir o requerimento do Sr. António Correia em duas partes, uma referente à prorrogação da sessão e a outra relativa ao convite ao Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo pára aqui declarar os nomes.
O Sr. Presidente: — Como V. Ex.ª sabe, estamos numa contraprova e por isso já não pode ter oportunidade a divisão do requerimento que V. Ex.ª lembra à Câmara.
Pausa.
Foi rejeitado, em contraprova, o requerimento do Sr. António Correia.
O Sr. Jorge Nunes: — Sr. Presidente: devemos tratar êste caso com a maior serenidade, tanto mais que, como há pouco disse, esta questão está deslocada.
O Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo, como director da Casa da Moeda, e simplesmente nessa qualidade, foi acusado.
S. Ex.ª não tem satisfações de nenhuma espécie a dar ao Parlamento, por mais elevada que seja a sua categoria política. S. Ex.ª, como director da Casa da Moeda, só pode dar satisfações à Câmara por intermédio do Sr. Ministro das Finanças, e nenhum Deputado tem o direito de se lhe dirigir, fazendo preguntas sôbre os serviços que lhe estão confiados, senão por intermédio do Sr. Ministro.
Esta é que é a boa doutrina, e necessário se torna que a estabeleçamos, porque já não é a primeira vez que em lugar de responder o titular da respectiva pasta responde outro, como se fôsse S. Ex.ª o encarregado dêsses serviços.
Sr. Presidente: desde que se trata de um caso que de alguma maneira pode bulir com o carácter de um homem — e eu não quero fazer ao carácter do Sr. Lúcio de Azevedo a mais leve, a menos lisonjeira referência.
O Sr. Ministro das Finanças não tem outro caminho a seguir que não seja o de mandar proceder a um rigoroso inquérito, aplicando as diversas sanções ao jornalista, se caluniou, ou ao chefe dos serviços, em caso contrário.
O Sr. Almeida Ribeiro: — O Ministro não pode aplicar sanções contra os jornalistas.
O Orador: — O Ministro não pode aplicar sanções, mas pode chamar à barra dos tribunais o jornalista que caluniou.
Sr. Presidente, desde que assim é, desde que estamos de acôrdo, nós chegámos a esta situação quási que ridícula de estabelecer grupos e grupelhos, secções e sub-secções de julgadores ou inquiridores.
Não pode ser.
Os homens que ocupam as cadeiras do Govêrno é que respondem perante o Parlamento pela boa ou má conduta dos seus executores.
E, portanto, lá fora quê O Sr. director da Casa da Moeda, deve pedir um rigoroso inquérito aos seus actos, a menos que se repita aquela fórmula um pouco interessante do Sr. António Maia, que como Deputado pedia ao Sr. Ministro da Guerra que procedesse contra o capitão António Maia.
Eu ainda compreenderia que o Sr. Lúcio de Azevedo, visado por possíveis suspeições, pedisse um rigoroso inquérito aos seus actos como director da Casa da Moeda. O que eu não compreendo é que S. Ex.ª tam lamentàvelmente tenha confundido a sua qualidade de parlamentar com a de funcionário do Estado, vindo à sua Câmara pedir um inquérito aos seus actos quando o devia fazer ao seu superior hierárquico que é o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Lúcio dê Azevedo: — Não fui eu quem pediu o inquérito; foi um membro dêsse lado da Câmara — o Sr. Carlos de Vasconcelos.

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O Orador: — É preciso acabar duma vez para sempre com êste malfadado hábito das mútuas recriminações o que o Parlamento proclamo bem alto que não acoberta criminosos, nem procura esconder escândalos.
Sr. Presidente: em presença das graves insinuações feitas pelo Sr. Lúcio de Azevedo, a Câmara tem o direito de exigir a divulgação dos nomes daqueles indivíduos que procuraram corromper o director da Casa da Moeda, e o Sr. Aníbal de Azevedo o dever de os apontar ao País.
Eis, Sr. Presidente, o que se me oferece dizer sôbre o assunto.
O orador não reviu.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: eu fui um dos Deputados que ao ouvir ao ilustre Deputado Sr. Lúcio de Azevedo as graves acusações que S. Ex.ª dirigiu a alguns políticos, que procuraram entravar a sua acção, como director geral da Casa da Moeda, mais se salientaram para que os nomes dêsses indivíduos fossem apontados à Câmara.
Hoje, porém, em face do esclarecimento dado por S. Ex.ª de que nenhum dos indivíduos que eram atingidos fazia parte do Parlamento, eu não me sinto obrigado a fazer coro com aqueles Srs. parlamentares que ainda insistem pela revelação dêsses nomes, visto que não sendo essas criaturas Deputados ou Senadores, o caso passa a não me interessar porquanto o nome delas naturalmente pertence aquela falange de políticos com os quais não quero qualquer espécie de camaradagem.
Há nesta Câmara muitos Deputados honestos, que devem estar a coberto das acusações que se fazem aos Parlamentares.
Vozes: — Todos. Todos.
O Orador: — Todos, não. Muitíssimos são honestos. Faço esta afirmação e assumo a responsabilidade de todas as minhas afirmações, como a de todos os meus actos.
Tenho dito.
O Sr. Lúcio de Azevedo: — Desejo salientar que tenho melindre em relatar nomes, porque entendo que o processo tem que ser previamente examinado. Sem o
conhecimento do processo nada significam. É necessário que a comissão examine o processo.
Nada mais quero dizer à Câmara.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia): — Sr. Presidente: tenho estado seguindo, como é de meu dever, com a máxima atenção os oradores que se têm ocupado dêste incidente motivado pelo caso das moedas.
Entendo dever elucidar a Câmara sôbre êste assunto, e explicar alguns pontos que se me afigura não estão esclarecidos. Estava o processo pendente quando tomei conta da pasta das Finanças.
Trata-se da cunhagem duma moeda subsidiária que o Parlamento tinha votado quando se tratou do empréstimo.
Não faço nenhuma revelação dizendo que se tratava com a maior urgência de que essa moeda entrasse em circulação.
O meu antecessor tinha já tido uma certa intervenção no processo.
Chamei-o e disse-lhe o estado em que encontrei êsse processo. Não havia concurso pendente.
Era um. processo comercial sem que se tivesse tomado qualquer deliberação.
A minha preocupação era ràpidamente pôr em circulação essa moeda.
Pretendia, primeiro, que a amoedação se fizesse em Portugal.
Disseram-me que isso era impossível; e eu cheguei à conclusão de que era possível, mas num largo espaço de tempo. Poderia fazer a fundição e a cunhagem em alguns meses, mas num tempo muito superior ao que desejava.
O Sr. Lúcio de Azevedo: — Informei a V. Ex.ª que essa cunhagem poderia fazer-se em quinze meses, sendo o trabalho normal.
Mas também disse que com trabalho aturado e serviço continuado poderia gastar-se apenas seis meses.
O Orador: — Não vi maneira de V. Ex.ª fazer essa cunhagem em seis meses.
Uma voz: — Mas V. Ex.ª á não pode dizer isso. Sabe mais que o director da Casa da Moeda?
Vários àpartes.

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O Orador: — O próprio director da Casa da Moeda...
Interrupções.
O que podia era nomear-se uma comissão para apreciar o projecto e indicar ao Govêrno o caminho a seguir para poder atingir o seu fim: pôr em circulação essa moeda.
Propôs que se fizesse em concurso público, e concordei com isso, mas que fôsse aberto o concurso o mais ràpidamente possível.
Apareceu no entretanto esta campanha.
Queria que se fizesse o mais ràpidamente possível essa cunhagem, mas sem de maneira nenhuma sair das normas legais da boa e leal administração que convém ao prestígio do Govêrno.
Deveria, portanto, abrir-se o concurso público.
O Govêrno concordou com isso e assim mandou imediatamente abrir concurso.
Apareceu depois nós jornais essa campanha; e eu, então, peguei em todos os jornais que foram publicados e que se ocuparam do assunto, e enviei-os por meio de um oficio ao Sr. Ministro, da Justiça. Fiz isto com o intuito de que S. Ex.ª interviesse no caso mandando ouvir todas as pessoas que tenham a fazer declarações para que toda a verdade se pudesse apurar.
O Sr. Ministro da Justiça, porém, pegou nos ditos jornais e mandou-os para a Procuradoria da República junto da Relação.
O caso não poderá prosseguir sem se fazer um inquérito ordenado por mim, razão por que pedi imediatamente ao Sr. Ministro da Justiça, meu colega, que nomeasse um juiz para fazer imediatamente êsse inquérito.
Estou, pois, aguardando que S. Ex.ª mande êsse juiz, ao qual estou pronto a dar todos os elementos precisos para êle averiguar o que há, ouvindo todas as pessoas que tenham de fazer afirmações a êste respeito a fim de que toda a verdade se esclareça.
É esta, pois, a situação do Govêrno, aguardando somente a vinda dêsse juiz a fim de que êle possa depois proceder ao inquérito e apurar toda a verdade.
Devia talvez, Sr. Presidente, ter começado por aqui; porém, digo isto à Câmara para que ela possa bem avaliar as minhas intenções.
Relativamente à parte administrativa devo dizer à Câmara que já recebi hoje o resultado dêsse concurso, cujas provas deverão ser entregues à comissão, da qual faz parte o Sr. Lúcio de Azevedo, que terá de ser substituído, caso S. Ex.ª persista no seu propósito de deixar de fazer parte dessa comissão.
O Sr. Lúcio de Azevedo: — Já declarei a V. Ex.ª por mais de uma vez que não desejo por forma alguma continuar afazer parte dessa comissão.
O Orador: — Dada a insistência do Sr. Lúcio de Azevedo, S. Ex.ª será então substituído nessa comissão, à qual serão presentes as propostas recebidas, sendo o assunto em última instância resolvido pelo Poder Executivo, se assim se julgar conveniente.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Fausto de Figueiredo (em nome da comissão): — A comissão que a Câmara nomeou para tratar do caso do Sr. Lúcio de Azevedo dá a sua demissão, porque entende que não seria prestigiante desempenhar-se do papel que lhe pretendem dar, o qual consiste em ouvir do Sr. Lúcio de Azevedo os nomes que S. Ex.ª se recusa a indicar nesta Câmara, vindo depois trazê-los aqui, não tendo, portanto, a mesma comissão mais nenhum elemento nem nenhum meio para poder actuar no sentido de qualquer procedimento que se impusesse.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vou pôr à votação da Câmara o pedido de demissão da comissão.
O Sr. António da Fonseca: — O Sr. Lúcio de Azevedo pediu a palavra e eu julgo que será melhor ouvir primeiro o que S. Ex.ª entenda dever dizer à Câmara.
O Sr. Lúcio de Azevedo: — Há talvez uma solução.
Se S. Ex.ª o Sr. Ministro das Finanças permitir que eu traga à Câmara o

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processo e aqui o historie, para depois indicar nomes, eu estou pronto a fazê-lo.
O Sr. Jorge Nunes: — Sr. Presidente: não nos devemos constituir em tribunal. Iríamos dar uma prova de desconfiança ao Sr. Ministro das Finanças, uma vez que S. Ex.ª ordenou um inquérito.
Desde que V. Ex.ª nos vai dizer que procuraram corrompê-lo, é absolutamente necessário que indique nomes.
O Sr. Lúcio de Azevedo: — Eu não disse que me tentaram corromper, mas sim que procuraram desviar-me da directriz que eu entendia dever seguir.
O Sr. Presidente: — Parece-me, por conseguinte, que a súmula dêste debate é a seguinte: a Câmara, reconhecendo que não está em causa nenhum parlamentar e que, portanto, se trata dum incidente completamente estranho ao âmbito da Câmara, e, dadas as explicações do Sr. Ministro das Finanças de que vai mandar proceder a um rigoroso inquérito, resolve dar por findo êste incidente.
Apoiados.
O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: não contava de forma alguma intervir neste incidente. Queria antes que êle fôsse derimido entre ás criaturas que de princípio começaram tratando esta questão; mas, desde que do mim partiu um requerimento pedindo a prorrogação da sessão, e que o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo fôsse convidado a indicar os nomes das pessoas que tentaram suborná-lo como Director da Casa da Moeda...
O Sr. Lúcio de Azevedo: — Eu não fiz a declaração de que tentaram subornar-me, não empreguei tal termo.
O Orador: — Se o Sr. Lúcio de Azevedo não empregou o termo subornar deixou nitidamente expressa essa idea.
Ainda, até ontem, pairava no ar a suspeita de que se encontrassem envolvidos no assunto alguns Parlamentares; mas, felizmente, essa dúvida ficou hoje desfeita.
S. Ex.ª declarou ainda que não tinha responsabilidade alguma nas acusações
que lhe fazia um jornal e que, se S. Ex.ª quisesse dar foros a uma chantage, poderia dizer que nessa questão estavam envolvidos políticos altamente cotados na política portuguesa, que junto de S. Ex.ª lhe indicavam um caminho que, se o tivesse seguido, acarretaria prejuízos para o Estado.
Tendo a Câmara votado o meu requerimento para a prorrogação da sessão, bem como para. se fazer um convite ao Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo, afim de indicar os nomes dessas pessoas, estranho que o Sr. Lúcio de Azevedo mais uma vez se esquecesse de indicar o nome dessas criaturas.
S. Ex.ª ou assumia a responsabilidade dos seus actos ou então não teria a leviandade de dizer aqui que havia políticos que estavam metidos nesta questão.
Por que motivo não indicou S. Ex.ª o nome dos políticos que tentaram desviá-lo do soa dever?
Então não é legítimo que todos nós levantemos protestos contra os pueris preconceitos que lavam S. Ex.ª a não querer declarar êsses nomes?!
Não seria melhor que S. Ex.ª tivesse estudado o processo antes de vir para a Câmara insinuar e lançar suspeitas sôbre todos os políticos?!
A todos nós compete exigir que êsses nomes venham a público, para que não fique suspensa uma. acusação desta ordem.
Não quero alongar-me em considerações, mas não posso calar a estranheza que me causa a insistência de S. Ex.ª em não querer declinar os nomes das pessoas que vagamente insinuou!
A culpa foi do Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo, que trouxe êste facto para a Câmara.
Mais uma vez lavro o meu protesto em consequência de S. Ex.ª não ter imediatamente declinado os nomes dos políticos que estão envolvidos neste caso, embora já não subsista a dúvida de que os políticos, a que se referiu o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo, sejam parlamentares.
Não se trata de políticos parlamentares; mas eu lavro o meu veemente protesto contra a semcerimónia, a facilidade com que se trazem para o Parlamento casos desta natureza, que por um lado po-

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dem atingir o nosso orgulho de homens de bem, ou de qualquer figurei marcante do regime, e por outro lado dão aso àqueles que estão espreitando o menor ensejo para atacar sem reservas a honestidade e a dignidade dos homens da República, para ferirem consequentemente o regime.
Apoiados.
Protesto, portanto, veementemente contra a semcerimónia, a facilidade com que aqui se levantam suspeições contra políticos parlamentares, ou não parlamentares, embora a nossa honra esteja acima destas calúnias, o que pode prejudicar a administração republicana.
No meio de todo êste incidente houve realmente uma vantagem: é que as declarações do Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo, até ontem tam nebulosas que podiam atingir o Parlamento, não dizem respeito a qualquer parlamentar.
Assim bem foi que se tivesse levantado esta questão.
E agora aqueles que são políticos e não têm assento nesta casa que chamem à responsabilidade o Sr. Ministro das Finanças, ou o Govêrno, para que se faça luz completa sôbre êste assunto, de maneira que com evidente satisfação de nós todos sejam desmentidas as suspeições que foram assacadas no Parlamento da República aos altos políticos.
O orador não reviu.
O Sr. António Maia: — Sr. Presidente: justificadamente se pôs de parte a nomeação de uma comissão de inquérito, visto saber-se sobejamente que nenhum político visado é parlamentar.
Ora eu que não tenho partido (o directório do meu partido sou eu próprio e os políticos do meu partido são constituídos por mim próprio) tenho mais autoridade do que ninguém para falar, porquanto, como Deputado, além de representar o País, represento igualmente o meu partido na Câmara.
Estranho por isso que o Partido Nacionalista tomasse a atitude que tomou numa questão em que há políticos visados, que tanto podem ser membros dum directório como correligionários de menor categoria. Digo Partido Nacionalista, como podia dizer Partido Democrático, ou o Partido Católico.
Outro caso. estranho: é que, tendo-se levantado dúvidas sôbre a legalidade do concurso, o Sr. Ministro das Finanças não tenha dito à Câmara que vai anular êsse concurso, para se efectuar outro.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo: — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer a V. Ex.ª e à Câmara que só a muita paixão posso atribuir o calor e veemência com que falou o Sr. António Correia.
Quando ontem falei nesta Câmara em chantage que se estava fazendo num jornal contra mim não foi com intuito de fazer insinuações a altos ou baixos políticos proeminentes ou não proeminentes. Referi-me, duma maneira geral, a políticos, sem indicação do categoria.
O Sr. António Correia (interrompendo): — Não tendo V. Ex.ª especificado no sou discurso se aludia a altos políticos; ignorava-se o intuito de V. Ex.ª, por isso que entre êsses políticos podia haver antigos Ministros, embora não fossem parlamentares. E um antigo Ministro não é qualquer político.
O Orador: — Acima de tudo sou democrata, filho do povo, e, assim, não lido só com altas individualidades da política.
Não pretendo eximir-me a responsabilidades. O assunto é complexo e delicado, de modo que uma simples enumeração de nomes nada adiantaria. V. Ex.ª ficava sem saber nada.
Conheço o processo como os meus dedos, e é o meu conhecimento dêle e a ignorância por parte da Câmara a seu respeito que me levam a dizer que só a comissão poderá ajuizar do alcance da minha afirmação.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente; a solução adoptada parece-nos a pior. Dela discordamos em absoluto, porquanto pior do que o facto de o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo dizer os nomes julgamos ainda o de se não dizerem. Entendemos que o assunto devia ficar esclarecido, pelo menos em relação aos nomes, e lamentamos que a comissão se tenha

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visto forçada a abandonar a sua missão por a Câmara lhe não dar os poderes de que precisava.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A Câmara aguarda, portanto, o resultado do inquérito do Sr. Ministro das Finanças para tomar conhecimento do assunto, e dispensa por emquanto a comissão de qualquer diligência.
A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 25 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante
Requerimento
Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me sejam fornecidas, com a maior urgência possível, as informações seguintes:
1.º Número de oficiais promovidos ao abrigo das leis n.º 8798, 778, 1:239,1:250 e Doutras, em que a promoção se tenha feito por equiparação e sem vaga nos respectivos quadros;
2.º Número de oficiais que excedem os quadros em consequência daquelas leis referido a 30 de Junho próximo passado.
N. B. Desejo e requeiro ùnicamente o número de oficiais, discriminando os postos e os anos de serviços a que pertencem os promovidos;
3.º Número de oficiais que, ao abrigo das disposições legais, estuo providos de dois cavalos, indicando da mesma maneira os postos e as armas ou serviços dêsses oficiais;
4.º Número de oficiais que tendo direito a dois cavalos têm apenas um;
5.º Número de oficiais que têm um cavalo por disposição legal e estão providos;
6.º Número de oficiais que, tendo direito a dois ou a um cavalo, estão desprovidos.
N. B. Para os n.ºs 4.º, 5.º e 6.º requeiro a discriminação referida no n.º 3.º;
7.º Mapa da distribuïção dos cavalos e muares pelas unidades e estabelecimentos militares, referido a 30 de Junho de 1923;
8.º Número de alunos que no próximo ano lectivo frequentarão o Instituto Feminino de Educação e Trabalho, o Colégio Militar e o Instituto Profissional de Pupilos do Exército, discriminando os anos dos cursos que frequentem.
18 de Outubro de 1923. — O Deputado, Henrique Pires Monteiro.
Declaração de voto
Declaro que dei a minha aprovação para prorrogação da sessão até a ultimação do esclarecimento da questão em causa, mas afirmando que só à comissão parlamentar, nomeada na sessão passada, farei as declarações a que me comprometi. — Aníbal Lúcio de Azevedo.
Para a acta.
Ofício
Do oficial da polícia judiciária militar, pedindo autorização para serem intimados a comparecer oportunamente, para serem ouvidos num auto de corpo de delitco, os Srs. Sousa Rosa, Álvaro de Castro e Homem Cristo.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
O REDACTOR — João Saraiva.

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