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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 164
(EXTRAORDINÁRIA)
EM 20 DE NOVEMBRO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Afonso de Melo Pinto Veloso
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. — Aberta a de 46 Srs. Deputados.
É lida a acta.
Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Vergílio Saque requere que, logo que haja número, se discuta o parecer n.º 563.
O Sr. Cancelando Abreu ocupa-se dos vencimentos do Alto Comissário de Moçambique.
Aprova-se o requerimento do Sr. Vergílio Saque.
Entra em discussão o parecer n.º 563. É aprovado na generalidade a na especialidade, depois de usarem da palavra os Sra. Vergílio Saque e Juvenal de Araújo.
O Sr. Marques Loureiro, requere, e é aprovado, que entre em discussão o parecer n.º 599.
O Sr. Almeida Ribeiro usa da palavra sôbre a generalidade e propõe uma substituição que é aprovada, depois de rejeitado o artigo 1.º
É aprovado o artigo 2.º e dispensado, e leitura da última redacção.
Lêem-se dois ofícios, em que se formulam pedidos que são negados.
Lê-se uma carta do Sr. Eugénio, Apresta instando pela aceitação da sua renúncia.
O Sr. Abílio Marçal propõe que a Mesa procure demover o Sr. Eugénio Aresta da sua resolução. Associam-se às palavras do Sr. Abílio Marçal os Srs. Ferreira de Mira e Carvalho da Silva.
Ordem do dia. — Prossegue o debate político sôbre a apresentação do Govêrno.
Usam da palavra os Srs. Abranches Ferrão e Vitorino Guimarães, que requere que, depois do debate político, se abra uma inscrição especial sôbre o relatório financeiro anexo à declaração ministerial.
Usam da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Presidente do Ministério (Ginestal Machado) Ministro das Finanças (Cunha Leal), Vitorino Guimarães e Carvalho da Silva.
O requerimento é aprovado.
Usam ainda da palavra no debate político os Srs. Fausto de Figueiredo, Presidente do Ministério, José Domingues dos Santos, e, de novo, o Sr. Presidente do Ministério.
Encerrado o debate político, o Sr. Ministro das Finanças apresenta uma proposta de lei para a qual pede urgência e dispensa do Regimento.
Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Jorge Nunes, Ministro das Finanças e, de novo, o Sr. Jorge Nunes que requere que a proposta apresentada baixe à comissão de finanças, sendo discutida amanhã com ou, tem parecer. Aprovado.
Sôbre as considerações do Sr. Ministro das Finanças usam da palavra os Srs. Vitorino Guimarães e Velhinho Correia.
O Sr. Presidente encerra á sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem.
Abertura da sessão, às 15 horas e 20 minutos.
Presentes à chamada, 46 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 61 Srs. Deputados.
Srs. Deputados que responderam à chamada:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Angusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Ferreira Vidal.
Albino Pinto da Fonseca.
Angelo de Sá Conto da Cunha Sampaio Maia.
António Augusto Tavares Ferreira.

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Diário da Câmara dos Deputados
António de Paiva Gomes.
António de Sousa Maia.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Jaime Duarte Silva.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton Matos.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Sebastião de Herédia.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão.
Abílio Marques Mourão.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo da Silva Castro.
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Góis Pita.
Vasco Borges.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.

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Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Afonso Augusto da Costa.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Dias.
António Maria da Silva.
António de Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Resende.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes.
Pires Monteiro.
João Estêvão Águas.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge Barros Capinha.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Viriato Gomes da Fonseca.
Às 15 horas principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 46 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Do Ministério das Colónias, satisfazendo ao pedido de documentos feito pelo Sr. Henrique Pires Monteiro.
Para a Secretaria.
Carta
Do Sr. Mário Infante, agradecendo o voto de sentimento pelo falecimento de uma pessoa da sua família.
Para a Secretaria.
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia.
Antes da ordem do dia
O Sr. Vergílio Saque: — Sr. Presidente: pedi a palavra para requerer a V. Ex.ª se digne consultar a Câmara sôbre se permite que entre imediatamente em discussão o parecer n.º 563, que se refere a um assunto muito importante.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: apesar de não estar presente ainda nenhum dos membros do Govêrno o que atribuo ao facto de ainda não estar concluído o debate político resultante da sua apresentação, tomo a liberdade de pedir a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o favor de transmitir ao Sr. Ministro das Colónias, as considerações que vou fazer.
Noticiaram os jornais hoje, em nota oficiosa, a propósito dos boatos acêrca dos vencimentos do Alto Comissário de Moçambique, que o Sr. Vítor Hugo de

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Diário da Câmara dos Deputados
Azevedo Coutinho, passava a receber «apenas», diz a nota, a módica quantia de 4:320 libras não acrescentando, o que os jornais já em tempo noticiaram, que era que S. Ex.ª ia receber 10 libras diárias, como ajuda do custo, sempre que se deslocasse da sede do distrito, incluindo a própria província de Moçambique.
Acrescenta a nota que é muito pouco, pois que o governador da África do Sul ganha 12. 500 libras, o da Rodésia, 6:000 e o da Companhia de Moçambique 3:600 libras.
Sr. Presidente: êste confronto que se pretende fazer, e que, certamente; tem origem nas próprias, repartições do Alto Comissariado de Moçambique, é absolutamente ridículo e contraproducente, não só pelo que diz respeito à categoria de alguns dos funcionários, como ainda pela situação financeira e, valor da moeda dos países a que ela se refere.
O que temos nós com que a África do Sul pague 12:500 libras a um funcionário?
Nós apenas temos de nos preocupar com o que se passa na nossa casa, e, assim como não podemos admitir que quem é rico gaste tanto como quem é pobre, não podemos tolerar que quem é pobre gaste tanto como quem é rico.
Sr. Presidente: eu tive o cuidado de mandar, sabeis numa, casa bancária, qual o câmbio do dia, e informaram-me de que é de 2 3/64, ou seja a libra cheque a 117$25(1).
Querem V. Ex.ª saber a miséria que vai receber o Sr. Vitor Hugo?
Sem as ajudas de custo são 499. 524$32 por ano, ou sejam 500 contos números redondos.
Mas, se S. Ex.ª amanhã fôr visitar a província, como é natural que o faça, o Sr. Vítor Hugo, que não é dos miseráveis, vai receber a miséria aproximada de 1:000 contos.
Sr. Presidente: desde que temos novo Govêrno, é natural, que se mude de processos, e por isso, peço a V. Ex.ª se digne chamar a atenção do Sr. Ministro das Colónias para êste escândalo.
Eu não sei quanto ganhava o Sr. Brito Camacho, mas presumo quererá quantia muito inferior, e todavia não me consta que S. Ex.ª tivesse passado miséria.
Mas há mais.
Anunciaram os jornais que o Sr. Vítor Hugo leva três secretários, os quais vão ganhar 3:000 libras cada um, ou sejam cêrca de 360 contos anuais.
Veja V. Ex.ª, Sr. Presidente, e veja a Câmara, quanto vai custar ao país o Sr. Vítor Hugo é o seu estado maior.
Sr. Presidente: a pasta das Colónias é ocupada pelo engenheiro Sr. Vicente Ferreira. Eu, seu adversário político, tenho muito prazer em prestar homenagem a S. Ex.ª e às suas qualidades de carácter e competência, e estou certo de que, na bancada do Govêrno, S. Ex.ª há-de continuar a dar provas dessas qualidades.
Assim, recebendo as indicações que V. Ex.ª lhe transmitirá, o Sr. Ministro das Colónias, estou certo, vai providenciar para que o decreto seja anulado, se já foi publicado, ou em caso contrário suspender a sua publicação, de modo que os vencimentos do Sr. Alto Comissário de Moçambique sejam reduzidos às devidas proporções.
Limito por agora as minhas considerações, visto o Regimento não permitir que fale mais de dez minutos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Está sôbre a Mesa um requerimento formulado pelo Sr. Vergílio Saque; para entrar imediatamente em discussão o parecer n.º 563.
Consultada a Câmara, foi aprovada a discussão imediata.
Foi lido na Mesa, o parecer.
Parecer n.º 563
Senhores Deputados. — A vossa comissão de administração pública julga sobejamente demonstrada, pelo relatório que o antecede, a conveniência da aprovação do projecto de lei criando um adicional de 5 por cento sôbre os impostos municipais cobrados na alfândega do Funchal, com o fim de permitir que a câmara municipal da referida cidade reorganize o seu serviço de extinção de incêndios, que hoje bem longe está de satisfazer a sua missão.
Que uma tal lei será bem aceita pela população, provam-no à evidência as representações que originaram o projecto e o parecer do povo funchalense expresso na sua imprensa e reuniões públicas.

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Reconhecida a falta de recursos com que luta aquela câmara para empreender essa reorganização, e ainda a urgência com que ela se impõe, visto de qualquer demora poderem resultar perdas de vidas e de bens nos casos, infelizmente sempre prováveis, de incêndio, justa é também a aprovação da autorização à aludida câmara municipal, para, com êsse fim especial, poder contrair na Caixa Geral de Depósitos um empréstimo até 600. 000$, caucionado pelo produto do referido imposto adicional de 5 por cento.
Sala das sessões da comissão de administração pública, 26 de Junho de 1923. — Abílio Marçal, presidente — Alfredo de Sousa — Vitorino Mealha — Costa Gonçalves — Alberto Vidal — Custódio de Paiva, relator.
Senhores Deputados. — O projecto de lei n.º 549-A, da autoria do Sr. Vergílio Saque, é destinado à criação dum adicional de 5 por cento sôbre todos os impostos municipais cobrados pela alfândega do Funchal, para ser aplicado no custeio e instalação dos serviços da extinção de incêndios naquele concelho.
A vossa comissão de finanças, concordando com o projecto, que não traz encargos para o Tesouro, dá-lhe o seu parecer favorável.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 6 de Junho de 1923. — Júlio de Abreu — Crispiniano da Fonseca — Mariano Martins (com restrições) — Viriato da Fonseca — F. do Rêgo Chaves (vencido) — Aníbal Lúcio de Azevedo — Vergílio Saque — Lourenço Correia Gomes, relator.
Projecto de lei n.º 549-A
Senhores Deputados. — O serviço de extinção de incêndios está a cargo das câmaras municipais; muitas destas, todavia, não dispõem de recursos para colocarem-no em razoáveis condições de eficiência.
O Funchal é uma das localidades em que êsse serviço se encontra em mais lamentável atraso, embora esta cidade, pela sua dilatada área e crescente importância, bem mereça ser acautelada contra desastres semelhantes a alguns que ultimamente se têm repetido com assustadora frequência.
No intuito de facultar à câmara municipal daquela populosa cidade os meios indispensáveis para a reorganização do seu serviço de incêndios, quási inexistente no momento actual, tenho a honra de submeter à vossa apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º Sôbre todos os impostos municipais cobrados pela Alfândega do Funchal é criado o adicional de 5 por cento, destinado à reorganização do serviço de incêndios naquela cidade.
§ único. A direcção da Alfândega do Funchal porá mensalmente à ordem da Câmara Municipal da mesma cidade a quantia arrecadada nos termos dêste artigo.
Art. 2.º É autorizada a Câmara Municipal do Funchal a contrair na Caixa Geral de Depósitos um empréstimo de 600. 000$, caucionado pelo adicional criado pelo artigo anterior.
Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrário.
Câmara dos Deputados, 13 de Junho de 1923. — O Deputado, Vergílio Saque.
O Sr. Vergílio Saque: — Sr. Presidente: tem o presente projecto de lei o fim de criar um adicional de 5 por cento sôbre todos os impostos municipais a cobrar na Alfândega do Funchal e destinado exclusivamente à aquisição de material necessário para o serviço de incêndios na mesma cidade.
Sabe V: Ex.ª que, não só nas ilhas como em todas as principais cidades do continente, o serviço de incêndios deixa muito a desejar.
Não desconhece V. Ex.ª que, devido à deficiência da organização dêsses serviços e à falta de material, se têm dado lamentáveis acidentes e ocorrências, como aquele que há tempo se deu na cidade de Coimbra.
Só ao heroísmo do pessoal de incêndios se deve, muitas vezes, hão sucederem maiores desgraças.
Como autor do projecto, e pelas informações que me foram dadas, estou convencido de que êste adicional será recebido de bom grado pela população daquele distrito e que a Câmara lhe dará o seu absoluto e completo apoio.
Tenho dito.
O orador não reviu.

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O Sr. Juvenal de Araújo: — Sr. Presidente: achando-se, em discussão o parecer n.º 563, pedi a palavra para declarar a V. Ex.ª, em meu nome e no dêste lado da Câmara, que, damas o nosso voto muito caloroso ao projecto de lei a que êsse parecer diz respeito, cônscios de que ligamos a nossa intervenção, parlamentar à prática dum acto de inteira justiça.
Com efeito, a conversão dêsse projecto em lei corresponderá à realização de um dos serviços públicos mais instante e ansiadamente reclamados pela população funchalense.
Quem tiver passado pela ilha da Madeira terá, decerto, observado quanto entre os últimos vinte anos, se tem ampliado a área da cidade, e quanto ali se tem desenvolvido o movimento de construções.
Por outro lado, não há ninguém que desconheça quanto por toda a parte se têm aperfeiçoado os sistemas de extinção de incêndios, de modo a poderem ser prestados os socorros rápidos, prontos e eficazes que são a característica principal dessa ordem de serviços.
Pois, Sr. Presidente, apesar de todas estas circunstâncias, a Madeira encontra-se hoje, no tocante a material de incêndios, quási nas mesmas condições em que se encontrava há vinte anos, estando apenas, entregue, pode dizer-se a um elemento de ordem moral, que, aliás, tem obrado verdadeiros prodígios: a bravura, o heroísmo do Corpo dos Bombeiros Voluntários do Funchal, a cujos serviços e a cujo espírito de sacrifício eu rendo aqui, em pleno Parlamento, as homenagens mais profundas, da minha comovida admiração.
Êsses homens, têm obrado, como disse, autênticos prodígios, dispondo de material antiquado, rudimentar e na sua maior parte inadaptado ao fim para que foi criado, mas, nunca hesitando, em surgir em todos os momentos de perigo, cumprindo galhardamente a sua alta missão, de defensores, das vidas e das propriedades dos cidadãos.
Foi nestas circunstâncias que começou de reconhecesse a necessidade imperiosa de proceder quanto antes à reorganização dos serviços de extinção de incêndios.
O alto custo do material, por um lado e os reduzidos recursos normais da Câmara Municipal, por outro lado, levaram-nos à convicção de que se teria de lançar mão de um recurso de carácter extraordinário.
Veio ao encontro desta idea o projecto de lei que neste momento se discute, autorizando a Câmara a contrair na Caixa Geral de Depósitos um empréstimo de 600 contos, caucionado por um adicional de 5 por cento sôbre os impostos municipais cobrados na Alfândega do Funchal.
É uma nova contribuição; é certo, que se cria, mas tendente à realização dum dos maiores e mais urgentes melhoramentos de que o Funchal necessita.
Apoiamos, pois, com muito aprazimento, o projecto e permita-me V. Ex.ª, Sr. Presidente, que eu, talvez, fora das praxes parlamentares, mas interpretando um, sentimento duplo de reconhecimento e de justiça da terra que, represento nesta, casa do Congresso, da República, agradeça a toda a Câmara o apoio que está dando a êste projecto e que constitui a mais segura demonstração de que o Parlamento não esquece os interesses insulares.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se na generalidade.
Foi aprovado na generalidade o projecto de lei n.º 549-A.
Em seguida, foi aprovado na especialidade.
O Sr. Carlos Pereira: — Peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se autoriza, a dispensa da leitura da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Marques Loureiro: — Requeiro a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se consente, que entre imediatamente em discussão o parecer n.º 599.
Foi aprovado.
Parecer n.º 599
Senhores Deputados. — O Sr. Viriato da Fonseca, um dos mais dedicados trabalhadores do Parlamento e que também é o Presidente da Comissão Central de reclamações do funcionalismo público, apresentou-a esta Câmara um projecto de lei destinado a atender os assistentes dos Institutos de Medicina Legal de Lisboa.

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Pôrto e Coimbra, por, reconhecendo a necessidade de os atender, ter verificado que só por uma lei especial êste caso de ser remediado.
Não precisa a vossa comissão de finanças encarecer nem justificar a necessidade do projecto, porquanto as considerações nele exaradas pelo seu autor são mais que suficientes para o justificar.
A vossa comissão de finanças dá-lhe o seu parecer favorável.
Sala das sessões da comissão de finanças da Câmara dos Deputados, 31 de Julho de 1923. — Vergílio Saque — Mariano Martins (vencido) — Viriato da Fonseca — Júlio de Abreu — Aníbal Lúcio de Azevedo (vencido) — F. G. Velhinho Correia — S. de Herédia — Lourenço Correia Gomes, relator.
Projecto de lei n.º 591-B
Senhores Deputados. — No quadro dos Institutos de Medicina Legal de Lisboa, Pôrto e Coimbra, existe o cargo de assistente, que em geral é desempenhado pelos professores das respectivas Faculdades de Medicina.
Por essa função, que representa um acréscimo de trabalho profissional e técnico, estabelece a lei uma gratificação, inscrita no orçamento do Ministério da Justiça.
Essa gratificação é:
Para Lisboa, 500$ anuais.
Para o Pôrto, 360$ anuais.
Para Coimbra, 300$ anuais.
Acontece porém que, para o Instituto de Medicina Legal de Coimbra, foi nomeado, há anos, mediante concurso, um médico, para exercer êsse cargo, o qual não exerce nenhum outro cargo público, recebendo dos cofres, públicos somente a gratificação orçamental de 25$ mensais.
Outrora, tal quantia poderia significar alguma cousa e, tinha um certo valor relativo; actualmente, porém, ela perdeu toda a significação e relatividade, perante a enorme desvalorização da moeda dando lugar a uma situação deprimente e vexatória, em relação a funcionários de menor categoria, que percebem muito maiores vencimentos melhorados, visto que em todo o funcionalismo civil, em actividade de serviço, seja qual fôr a categoria, êsses vencimentos não descem abaixo de 300$ mensais.
Reconheceu, a Comissão Central, que trata das reclamações dos funcionários públicos, sôbre melhoria de vencimentos, que aquela gratificação, como todas as outras não especificadas na lei, não podem ser melhoradas ou actualizadas pelas leis de melhorias.
Considerando porém que a todos os cargos dos Institutos de Medicina Legal, que não são cumulativamente desempenhados por professores das Faculdades de Medicina, foi arbitrado um vencimento fixo orçamental;
Considerando, como agora se verifica, que nos cargos de assistentes, podem, mediante concurso ser providos indivíduos que não são professores daquelas Faculdades, nem exercem qualquer outro cargo público;
Considerando que, na actualidade, é por demais exígua e irrisória uma tal gratificação, considerada como única remuneração de tam alta, sapientíssima, e delicada função, como é a que compete aos assistentes de medicina legal, mormente quando se trata de investigações scientíficas em causas crimes, tais como autópsias, identificações, etc.:
Tenho a honra de submeter a apreciação dos Srs. Deputados a seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º São arbitrados aos indivíduos que exercerem o cargo de assistente dos Institutos de Medicina Legal, quando não exerçam mais nenhum cargo público, os seguintes vencimentos anuais:
Categoria, 800$.
Exercício, 160$.
§ único. Quando exerçam qualquer outro cargo público, somente terão direito à gratificação orçamental estabelecida.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
Lisboa, 24 de Julho de 1923. — Viriato Gomes da Fonseca.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: parece-me de toda a justiça considerar a singular situação dos assistentes do Instituto de Medicina Legal, dos quais aqueles que não exercem nenhum outro cargo público estão sobrecarregados com serviços próprios do Instituto, recebendo uma simples remuneração de 25$, o que, como se compreende, é absolutamente insustentável.

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Não se compreende que serviços desta ordem, como autopsias, exames médicos e outros delicados trabalhos que por vezes são intensivos, sejam, remunerados com essa gratificação,
Para evitar criar uma nova categoria de vencimentos, para o efeito de melhorar a situação dêstes funcionários, parece-me preferível equiparar os seus vencimentos às tabelas dos assistentes das Faculdades de Medicina, e por isso vou mandar, para a Mesa uma proposta de substituição ao corpo do artigo do projecto de lei.
O orador não reviu.
Foi admitida a proposta do Sr. Almeida Ribeiro.
É do teor seguinte.
Proposta
Proponho que o corpo do artigo 1.º seja substituído como segue:
Artigo 1.º Os assistentes do quadro privativo de qualquer instituto de medicina legal que não exerçam nenhum outro cargo público, terão, direito aos vencimentos designados nos artigos 48.º e 67.º da organização geral do ensino médico, aprovada por decreto n.º 4:625, de 12 de Julho de 1918, com as melhorias que pela legislação ulterior lhes competirem. — Almeida Ribeiro.
Foi aprovado o projecto de lei n.º 599 na generalidade.
Foi rejeitado o artigo 1.º e aprovada a substituição.
Foi aprovado o § único.
Foi aprovado o artigo 2.º
O Sr. Almeida Ribeiro: — Requeiro a dispensa da leitura, da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: — Vão ler-se dois ofícios.
São os seguintes:
1.º Do Presidente do 2.º Tribunal Militar Territorial, de Lisboa, pedindo a comparência, no dia 27, dos Srs. Francisco Dinis de Carvalho, João Estêvão Águas, Almeida Ribeiro, Lino Neto e Henrique Pires Monteiro.
Negado.
Comunique-se.
2.º Do Presidente da 1.ª Vara do Tribunal do Comércio de Lisboa, pedindo a comparência dos Srs. Alberto Xavier e Tôrres Garcia naquele Tribunal no dia 30 de Novembro.
Negado.
Comunique-se.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se uma carta do Sr. Eugénio Aresta.
Lê-se a carta em que o Sr. Deputado insta pela aceitação da renúncia do seu mandato, pedida em 20 de Junho passado.
O Sr. Abílio Marçal: — V. Ex.ª informa-me se já se fizeram diligências para S. Ex.ª desistir do seu pedido?
O Sr. Presidente: — Não me consta que fossem feitas diligências oficiais.
O Sr. Ferreira de Mira: — Dou, e o meu partido também, toda a adesão à proposta do Sr. Abílio Marçal.
O Sr. Eugénio Aresta foi nesta Câmara um colega da maior distinção (Apoiados); todos os assuntos que S. Ex.ª aqui tratou foram estudados com muito cuidado e com muita seriedade.
Apoiados.
Era bom que a Mesa realizasse, as costumadas diligências.
Apoiados.
O Sr. Carvalho da Silva: — Êste lado da Câmara dá todo o apoio à proposta do Sr. Abílio Marçal.
O Sr. Presidente: — Em vista da manifestação da Câmara, considero a proposta do Sr. Abílio Marçal aprovada.
Apoiados.
ORDEM DO DIA
Prossegue o debate político sôbre a apresentação do Govêrno.
O Sr. Abranches Ferrão: — Todas as correntes políticas com representação nesta Câmara definiram já a sua atitude perante o actual Govêrno.
Alguns Deputados independentes encarregaram-me também de definir a sua, mas antes de o fazer permita-me, Sr. Presidente, que eu apresente as minhas

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saudações ao ilustre Presidente do Ministério, Sr. Ginestal Machado.
S. Ex.ª tem já dado manifestas provas das suas sólidas qualidades do inteligência, de serenidade e de previdência; oxalá que essas qualidades orientem a acção governativa de S. Ex.ª
As minhas saudações vão igualmente para todos os colaboradores do Sr. Presidente do Ministério e muito especialmente para os ilustres titulares da pasta das Finanças o dos Negócios Estrangeiros, os Srs. Cunha Leal e Júlio Dantas, com os quais eu já tive a honra de colaborar no Ministério presidido pelo Sr. Cunha Leal.
Tive então ensejo de bem apreciar as altas qualidades de S. Ex.ªs e certo estou eu de que elas mais uma vez se patentearão na gerência dos negócios das pastas que S. Ex.ªs sobraçam.
Por maiores porém que sejam as qualidades de inteligência e acção dos membros do Govêrno, a verdade é que elas por si só não bastam para que o Govêrno possa levar a cabo a grande obra do ressurgimento nacional.
Para isso tornava-se ao Ministério absolutamente, indispensável um largo crédito de confiança, por parte do país, que não tem, e um sólido apoio parlamentar, que por completo lhe falta.
Tomando conta do Poder nas condições em que o fez, assumiu o Partido Nacionalista uma tremenda responsabilidade perante o país: a responsabilidade de nada poder fazer o Govêrno saído do seu seio e a responsabilidade ainda maior de nada ter deixado fazer, por se ter oposto à formação de um Govêrno em que se empregassem as fôrças das várias correntes republicanas.
Eu não chego mesmo a compreender a maneira como a crise política foi resolvida. Num sistema parlamentarista não se explica, na verdade, que um Govêrno tome conta das rédeas do Poder som ter previamente assegurada uma maioria parlamentar que o apoie.
Apoiados da esquerda.
Sr. Presidente: das rápidas considerações que já fiz pode fàcilmente depreender-se qual será a minha atitude perante o Govêrno que acaba de se formar. Essa atitude é de expectativa. Apreciaremos — eu e alguns Deputados independentes — os actos do novo Govêrno com inteira imparcialidade, pautando o nosso procedimento pelo sou procedimento.
Da parte dêsses Deputados independentes, em cujo nome falo, o Govêrno não encontrará dificuldades no seu caminho, a não ser que êste não seja aquele que melhor conduza à defesa dos interêsses nacionais.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Vitorino Guimarães: — Sr. Presidente: juntamente com a declaração ministerial ontem lida pelo chefe do Govêrno, foi apresentado à Câmara um relatório sôbre a situação actual das finanças públicas.
Ora como nesse relatório se fazem afirmações que o Partido Republicano Português não pode deixar passar sem uma minuciosa análise, porquanto, tem o direito de dizer ao País a forma como administrou os dinheiros do Estado, e como são irróneas algumas dessas afirmações, eu pregunto a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se está na disposição de abrir uma inscrição especial sôbre êsse relatório, ou se entende que êle deve ser discutido ao mesmo tempo que a declaração ministerial.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Tratando-se de duas questões diferentes, entendo que sôbre o relatório apresentado pelo Sr. Presidente do Ministério se deve abrir um debate especial.
O Sr. Vitorino Guimarães: — Nesse caso requeiro que, em seguida ao debate político, se faça uma inscrição especial para apreciação do referido relatório.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Pedi a palavra para dizer à Câmara que o relatório por mim lido na sessão de ontem e que hoje foi distribuído, constitui, por assim dizer, o relatório duma proposta que o Sr. Ministro das Finanças tenciona apresentar ao Parlamento o que é de carácter urgentíssimo.
Quando tiver de se apreciar essa proposta — e convencido estou de que a Câmara a apreciará imediatamente — os membros desta casa do Parlamento po-

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derão então, com toda a oportunidade, ocupar-se das afirmações contidas no relatório em questão.
O orador não reviu.
O Sr. Vitorino Guimarães: — Eu mantenho o meu requerimento.
Apoiados.
Sôbre lições de patriotismo nós podemos responder ao Sr. Presidente do Ministério que a hora que passa não é mais grave do que há oito dias.
Muitos apoiados.
Não votaremos propostas de finanças sem que elas tenham sido previamente submetidas ao exame das respectivas comissões.
Poderemos, quando muito e a exemplo do que há pouco fez o Partido Nacionalista, marcar um prazo certo para essas comissões apresentarem os seus pareceres. Outra cousa, não.
Muitos apoiados.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Tenho a declarar que acatarei integralmente todas as resoluções da Câmara. A Câmara é soberana e resolve.
Se, porém, a Câmara não quiser, na ocasião em que se discutir o relatório, apreciar, simultaneamente, a proposta que tenho a honra de submeter à sua apreciação, indica-me que, pela falta de recursos do Estado, eu tenho de mandar suspender os pagamentos.
Vozes da esquerda: — Ora! Ora!
Sussurro.
O Orador: — E como isso será uma consequência inevitável da deliberação da Câmara, ninguém terá que estranhar que eu cumpra os seus votos.
Muitos apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Se bem entendi, o Sr. Vitorino Guimarães requereu uma discussão especial sôbre o relatório ontem apresentado pelo Sr. Presidente do Ministério, tendo o Chefe do Govêrno declarado que seria mais conveniente guardar essa discussão para quando se discutisse a proposta que o Sr. Ministro das Finanças vai apresentar.
Ora ou pregunto a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se qualquer votação sôbre o assunto impede a votação da dispensa do Regimento para a discussão dessa proposta.
O Sr. Presidente: — Não, senhor.
O Sr. Fausto de Figueiredo: — Sr. Presidente: sem querer imiscuir-me na contendo política, mas tendo sido um dos trinta e nove Deputados que apresentaram uma moção em relação ao Govêrno do Sr. António Maria da Silva, em que se reconhecia que o Govêrno de S. Ex.ª não correspondia naquele momento às necessidades nacionais, devo a mim próprio a obrigação de apreciar, embora ràpidamente, a actual situação política, emitindo como Deputado independente a minha opinião. E digo como Deputado independente, porquanto alguns colegas meus desta Câmara entendem que é incompreensível a situação de Deputado independente.
Quando os meus eleitores do círculo da Covilhã entenderam dever dar-me procuração para os representar em Cortes eu tomei o compromisso de me manter fiel aos princípios que então defendi.
Foi assim, Sr. Presidente, que durante muito tempo eu entendi, como aliás o entenderam muitos outros Srs. Deputados, dar o meu apoio ao Govêrno do Sr. António Maria da Silva, e fi-lo até o momento em que me convenci de que o Govêrno podia e devia prestar serviços ao País, pois a verdade é que, logo que me convenci do contrário, deixei de lhe dar o meu apoio.
Mas, Sr. Presidente, não fui eu que falando nesta Câmara lhe fiz sentir êsse facto, mas sim também o próprio partido a que S. Ex.ª pertence.
Eu, Sr. Presidente, devo dizer em abono da verdade que gosto de fazer justiça a toda a gente e assim eu não posso, ao referir-mo a S. Ex.ª, deixar de dizer o que sinto e é que o Sr. António Maria da Silva prestou de facto ao País relevantes serviços (Muitos apoiados). S. Ex.ª durante os dois anos que esteve no Govêrno demonstrou-nos uma elevada inteligência e um grande patriotismo.
É absolutamente justo que isto se diga, e a Câmara toda durante êsses dois anos pensou da mesma forma.

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Por igual, Sr. Presidente, eu mio posso deixar de salientar a colaboração dos seus colegas no Gabinete, como a do Sr. Domingos Pereira, que é incontestavelmente uma figura de relêvo e que igualmente prestou ao País relevantes serviços.
Devo também salientar, Sr. Presidente, o nome do Sr. Rodrigues Gaspar, que na pasta das Colónias revelou o seu talento e a sua honestidade.
Apoiados.
Por egual, Sr. Presidente, ficaria mal com a minha própria consciência se não me referisse também ao Sr. Joaquim Ribeiro que na pasta da Agricultura prestou igualmente relevantíssimos, serviços ao País, como por exemplo, o de ter acabado com o pão político.
Não posso também, Sr. Presidente, deixar de me referir aos dois Ministros independentes, Srs. Abranches Ferrão e Rocha Saraiva, que se mais não fizeram foi porque as circunstâncias o não permitiram.
Feita assim a devida justiça a todos aqueles que fizeram parte do Govêrno transacto, justo é, Sr. Presidente, que alguma cousa eu diga relativamente ao Govêrno actual da presidência do Sr. Ginestal Machado.
O Sr. Ginestal Machado, Sr. Presidente, aceitou as responsabilidades do Poder por circunstâncias muito especiais da política portuguesa.
O Sr. Ginestal Machado, Sr. Presidente, entendeu que não podia no momento em que era chamado a constituir Govêrno, deixar de aceitar êsse encargo, que se o honrou, não deixou, no emtanto, de lhe impor uma responsabilidade tremenda, e oxalá, Sr. Presidente, que os seus actos possam corresponder às aspirações de todos nós.
Sr. Presidente: a situação é realmente gravíssima e necessário é que os actos dos homens correspondam às palavras e assim, sendo o Govêrno do Sr. Ginestal Machado constituído por homens experimentados, êle dá-nos a certeza absoluta de que, se não puderem arcar com as responsabilidades tremendas, será o primeiro a sair daquelas cadeiras.
Declarou, Sr. Presidente, o Sr. José Domingues dos Santos, leader do Partido Republicano Português, que o sou partido se conservará na expectativa. Nem outra podia ser a atitude do Partido Republicano Português, e é, essa aliás a situação de nós todos, convencidos, no emtanto, como estamos, de que os seus actos hão-de corresponder às suas palavras.
O País, Sr. Presidente, está cansado de ver que até hoje se não tem feito uma obra profícua e assim empenhados estamos todos nós em que a situação se modifique.
O Sr. Ginestal Machado é de facto uma figura de relevo adentro desta casa do Parlamento e cuja competência, inteligência o honestidade ninguém poderá negar.
Junto dêle encontram-se amigos meus que muito prezo, e entre outros saliento o Ministro das Finanças, Sr. Cunha Leal.
S. Ex.ª assumiu, neste momento grave da nacionalidade, a tremenda responsabilidade do sobraçar a pasta das Finanças.
S. Ex.ª, que tem um talento privilegiado, que discutiu nesta Câmara, com a proficiência que todos lhe conhecem, os assuntos de finanças nas suas mais pequenas minúcias, encontrou-se com a coragem para arcar com a responsabilidade de sobraçar a pasta das Finanças.
Ora a Câmara e o País conhecem-no bem para saberem que, se, de facto, os elementos não lhe faltarem é capaz de dar conta do seu recado, e oxalá que o faça no mais curto espaço de tempo, porque isso bem preciso é para todos nós que constituímos a família portuguesa.
Apoiados.
Na pasta das Colónias, encontra-se por igual um colega nosso na Câmara, o Sr. Vicente Ferreira, cujo nome também me permito salientar.
S. Ex.ª, realmente, sobraça uma das pastas que neste momento, como, aliás, muito bem diz a declaração ministerial, precisa de ser olhada com aquele cuidado, interesso e carinho necessários para que as colónias produzam e se desenvolvam, mas não atrofiando e aniquilando a metrópole.
Êste é o problema e tem de ser o critério, e o Sr. Vicente Ferreira, que pràticamente conhece as colónias, com certeza que há-de olhar com carinho, interêsse e dedicação para o nosso problema colonial, a fim de que êle ràpidamente possa ser para a metrópole aquilo que de há longos anos é uma aspiração.
É claro que saliento estas três figuras

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do Govêrno, apesar de todas merecerem a minha consideração, porque as conheço de perto o estou convencido de que, se os meios lhes não faltarem, hão-de levar a cabo a obra que se propõem realizar.
Mas por egual saúdo todos os restantes membros do Govêrno.
Sr. Presidente: falou-se aqui na Câmara, o quem o disse foi o Sr. Sá Pereira, aliás fiel às suas tradições o princípios e coerente com os seus modos de ver anteriores, o que é uma cousa que nem sempre predomina em toda a gente, que o Govêrno não oferecia condições de segurança, porque êle era ultra-conservador, e não sei mesmo se lhe chamou ultra-reaccionário.
Ora eu entendo que o momento não vai nem para Govêrnos conservadores, nem para Govêrnos radicais; o momento vai para medidas urgentes e eficazes que sirvam para pôr cobro à situação aflitiva que o País atravessa, e elas podem ser aplicadas por qualquer Govêrno.
Tenho a certeza absoluta de que os homens que se sentam naquelas cadeiras ou hão-de enveredar por um caminho de medidas daquela natureza, ou então não realizam a obra em que todos nós confiamos.
Sr. Presidente: a declaração ministerial, por lapso certamente, não nos diz uma palavra sôbre a questão social neste país.
Vê-se que a pasta do trabalho foi confiada, aliás muito bem, ao Sr. Pedro Pita, que a sobraça conjuntamente com a pasta do Comércio, mas sôbre a pasta do Trabalho o Govêrno não nos diz uma palavra, e é preciso que o Govêrno, na verdade, pense na questão social em Portugal, não só para a resolver, mas apresentando à Câmara quaisquer medidas que possam contribuir para que a origem do mal social se dissipe, deminua ou desapareça no nosso País.
O Govêrno, nesse capítulo, é omisso, mas não só os serviços de assistência, como outros, precisam de ser encarados pelo Sr. Pedro Pita, e certamente S. Ex.ª terá ensejo de ver que ê]es interessam à sociedade portuguesa, encontrando-se muitas vezes nêle o fulcro de toda a desordem que vai pelo país fora.
Apoiados.
Sr. Presidente: alguma cousa mais poderia dizer se tivesse colorido de frase ou a vaidade de apresentar ideas.
Mas como tal não sucede, limito-me a repetir o que já disse, mantendo-me fiel aos princípios que tracei: aguardo a obra do Govêrno para então me pronunciar acêrca dela, mas porque conheço os seus membros julgo que êles merecem o apoio de todos os bons portugueses.
Apoiados da direita.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Sr. Presidente: tem de ser as minhas primeiras palavras, palavras de íntimo reconhecimento a todos os ilustres Deputados que se pronunciaram neste debate; acêrca da declaração ministerial.
De todos eu ouvi palavras amáveis e, mais do que isso, palavras excessivas de amabilidade; de muitos dêles palavras amigas que eram de esperar, visto que com muitos íntimas e estreitas relações eu mantenho.
Falaram os meus correligionários, não me podiam ser desagradáveis certamente.
Falaram adversários políticos, da extrema, direita à extrema esquerda, e se em alguns as relações pessoais poderiam ter influído para que pudessem ser sob o ponto de vista pessoal benévolos nas suas apreciações, outros houve com quem tenho apenas relações de cortesia, como sucedo com o Sr. Aires de Ornelas, que, com toda a sua correcção que a Câmara conhece, quiseram também ser amáveis para comigo, e, na extrema esquerda, o meu amigo, e amigo dos que mais estimo, o Sr. Sá Pereira, que hoje não está presente, mas que teve a gentileza de me dizer que o não estaria por motivo de fôrça maior, foi talvez o que ao maior exagero levou as referências que quis fazer ao Presidente do Ministério, filhas apenas, já se vê, da sua boa amizade.
Quanto ao que disseram os meus correligionários, e o primeiro foi o Sr. Álvaro de Castro, não tenho que fazer referências.
Quem no debate político falou em primeiro lugar foi o Sr. José Domingues dos Santos que também quis, pessoalmente, ser de extrema amabilidade para comigo.
S. Ex.ª fez várias anotações à declaração ministerial, fez-lhe várias referências,

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como era natural, tendo, quanto à constituição do Govêrno, notado certos factos que convém esclarecer.
Disso o Sr. José Domingues dos Santos, e começou por aí, que o Partido Democrático não se declarara inabilitado de governar.
Nenhuma passagem da declaração ministerial, nem nenhuma passagem dos meus discursos depois do ser Presidente do Ministério, em qualquer parte onde tenha falado, contém qualquer indicação atinente a levar S. Ex.ª à convicção do que eu tivesse dito que o Partido Democrático não estava habilitado a governar.
Prendem-se êstes factos com a solução da crise e, embora ligeiramente, porque o momento não é muito para palavras, mas antes para acções, eu quero dizer a V. Ex.ª o que se passou.
Entre o meu ponto de vista e o ponto de vista do Sr. José Domingues dos Santos há uma diferença fundamental, embora haja pontos de contacto e nós possamos até estar de acôrdo em muitos deles. O Sr. José Domingues dos Santos acha, como eu, que a situação é difícil, é melindrosa ou, pelo menos, delicada e entende que, para a resolver, para procurar o necessário remédio ou, numa palavra, para pôr o problema em equação, convinha que todos os partidos republicanos se coligassem o formassem um Ministério que, não se podendo chamar nacional, embora nacional fôsse o objectivo, fôsse aquilo a que se poderia chamar, como já foi dito, um Govêrno do salvação nacional.
O Partido Nacionalista, a cujo directório eu tenho a honra de presidir, pensa de maneira diferente.
Acha a situação delicada, acha a situação melindrosa, mas entende por isso mesmo que nem todas as fôrças organizadas da República deviam ligar-se e comprometer-se na obra a realizar, dada a sua extraordinária magnitude e por maior que sejam a boa vontade, a competência e o patriotismo de quem o tiver que executar.
E peço licença para nesta altura abrir mm parêntese na minha exposição para dizer ao ilustre Deputado Sr. Vitorino Guimarães, que ao depois falou, que nunca pretendi dar lições do patriotismo a ninguém.
Se apoio para o patriotismo da Câmara, é porque o suponho.
Porque me disseram já aqui, e tenho que o acreditar, sou uma pessoa com uma certa inteligência e, se não acreditasse no patriotismo da Câmara, não viria para êste lugar, sabendo que não tenho maioria.
Confio em que o patriotismo da Câmara me deixará caminhar, tanto mais que não tenciono de modo algum fazer aquilo a que se chama política partidária.
Fechado êste parêntese, devo dizer ao Sr. José Domingues dos Santos que embora podendo haver uma ou outra opinião contraria, o Partido Nacionalista, na sua quási totalidade, entendeu desde a primeira hora que não convinha para a República, nem para o País — e o que não convém à República é convicção minha que não convém ao País — que todas as fôrças da República se comprometessem na tentativa do dar remédio à situação melindrosa em que o Estado se encontra. É um ponto de vista que pode ser combatido, mas é legítimo e defensável.
O Sr. José Domingues dos Santos e parece-me que uma grande parte do seu partido, se não a sua totalidade, pensavam que deviam ligar-se todos.
A uma das mais altas individualidades do Partido Democrático, o Sr. Afonso Costa, quando me deu a honra de me procurar, e nas duas entrevistas realizadas, apresentei o meu ponto de vista, que era, simultaneamente, o do meu partido. Na verdade, os factos são de tal ordem, as circunstâncias são tam difíceis que, por maiores que sejam as competências, por mais completos que sejam os auxílios e as facilidades que os homens podem prestar, aos que governam, não se sabe se um Ministério só poderá levar a termo a obra que se torna necessário ou, pelo menos a que é absolutamente essencial e urgente.
Foi só por êste critério que o Partido Nacionalista entendeu associar-se a outros para a constituição do Govêrno que se pretendeu organizar.
Concordando, porém, com os outros partidos, concordando com a Nação que é preciso fazer alguma cousa ou, antes, muita cousa, deu ao Sr. Afonso Costa ou ofereceu-lhe, visto que S. Ex.ª não pôde ou não quis aceitá-lo, um apoio que era

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tal que se traduzia numa palavra que era errada — apoio absoluto.
Os homens não podem lidar com o absoluto; poderão contemplá-lo; mas para bem se acentuar que espécie de apoio se dava ao Sr. Afonso Costa, ofereceu-se a S. Ex.ª um apoio inteiro, absoluto.
É certo que o Partido Nacionalista nunca tinha tido na sua curta vida ocasião de mostrar como era capaz de cumprir o que prometi, mas os partidos que o antecederam, e os homens não mudaram todos, tiveram ocasião de provar que quando prometiam sabiam cumprir.
Sem nenhuma idea reservada, expôs o Partido Nacionalista, a sua opinião. Os homens não determinaram os acontecimentos, sendo frequentemente por êles arrastados.
No fim da sua oração, aludiu o Sr. José Domingues dos Santos a possíveis perseguições, a possíveis actos políticos de natureza partidária; todavia, quis ter a bondade de dizer que não acreditava que, estando eu à frente do Govêrno, factos desta natureza se realizassem.
Agradeço, na parte que me diz respeito, a confiança que mostra nas minhas qualidades, que de resto não são superiores às dos outros membros do Govêrno.
Nós compreendemos o melindre da situação, mas o Govêrno tem uma noção alta da palavra «política».
O Govêrno é incapaz de entrar nessa política pequenina, sectária, em que republicanos persigam republicanos.
É necessário que todos nos compenetremos da obra que é preciso realizar, para normalizar a vida do País e da República.
Permita-me o Sr. José Domingues dos Santos que lhe diga sinceramente que nunca na minha orientação política entrou o intuito de procurar engrandecer o meu Partido diminuindo os Partidos adversários.
Eu não tenho o critério mesquinho de querer ser mais rico do que os outros, empobrecendo-os.
Estimaria — muito naturalmente — que o meu Partido fôsse o mais forte possível, mas não à custa do enfraquecimento dos outros Partidos da República.
Eu estou neste lugar medindo bem as minhas responsabilidades e entendo que devo estar acima dos Partidos, desejando o seu engrandecimento e garantindo-lhes os meios legítimos de se fortalecerem..
Hei-de manter, custe o que custar, a todo o cidadão português o uso daquelas liberdades essenciais que a Constituïção garante e que estão sobretudo estabelecidas na nossa consciência de republicano.
Apoiados.
Quando se é essencialmente republicano, existe o dever de ter como primeiro, objectivo a garantia das liberdades de todos; refiro me, evidentemente, às liberdades legítimas, porque as outras não são liberdades, mas licenças, o contra estas o Govêrno tem de ser inflexível, atendendo a que uma das características da República traduz-se no cumprimento rígido das leis.
Já dizia um escritor romano, quando a República foi proclamada em Roma, que no regime republicano a lei tinha de ser cumprida inexoravelmente.
O Sr. José Domingues dos Santos pode acreditar que não é propósito dêste Govêrno, nem do Partido a que tenho a honra de pertencer, prejudicar ou diminuir os engrandecimentos do Partido Republicano Português.
Nós todos estamos convictos de que, para segurança da República, é indispensável a existência de duas grandes fôrças, uma na esquerda e outra na direita, sem confusões, embora ligadas naquilo que é essencial, mas, de resto, cada uma tendo o seu campo próprio, cada uma desenvolvendo-se sem se deminuírem reciprocamente.
É esta a política que eu sempre defendi e que tenho por orientação, mantendo-me sempre acima das paixões do estreito partidarismo.
Isto tive eu ocasião de dizer ao Sr. Afonso Costa na primeira entrevista que tive com S. Ex.ª e de repetir ao Sr. António Maria da Silva, quando da minha posse, a que S. Ex.ª teve a gentileza de assistir, honrando-me com amáveis palavras.
Estas afirmações fi-las eu e tenho muito prazer em as reproduzir aqui.
O Govêrno não vem armado do propósito de perseguir ninguém; vem apenas a favor da lei, e, se a lei determinar que vá contra aqueles que a infringirem, o Govêrno fará justiça sem pestanejar.

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O superior desejo que nos anima é guiado pelo sentimento de dedicação à República e ao País.
Ainda o Sr. José Domingues dos Santos estranhou que junto da declaração ministerial viesse um curto relatório acêrca do problema financeiro, que, todos estamos de acôrdo, é fundamental.
Emquanto se não regularizar a situação do Tesouro, tudo o que quisermos fazer é em vão; marchamos na areia.
Estranhou S. Ex.ª que nesse relatório se diga aquilo que afinal não é mais do que a verdade.
O meu ilustre colega das Finanças terá ocasião de esclarecer a Câmara, melhor do que eu, quando, como já está resolvido por unanimidade, se abrir uma inscrição especial sôbre o assunto.
Mas disse o Sr. José Domingues dos Santos que nós não devíamos vir alarmar o País.
Eu pregunto a S. Ex.ª se não foi um alarme maior a declaração de que era absolutamente indispensável a formação um Ministério de Salvação Pública.
Nesta frase «salvação pública» poderia supor-se que havia alguma cousa de tam grave que obrigava todos a reunir-se na mesma responsabilidade, ao passo que eu declarei que o meu Govêrno apresentará sucessivas propostas que hão de resolver a questão.
Depois dêste problema é que poderemos tratar das questões que são as únicas que enchem as galerias — as questões políticas.
O que primeiro se impõe é o assunto financeiro, de natureza técnica, que em regra desinteressa, não digo aos parlamentares, mas que nunca consegue trazer meia dúzia do pessoas às galerias.
Já vê S. Ex.ª que quem primeiro disse que a situação era pavorosa e excepcional não fomos nós foram S. Ex.ªs, dando-nos a honra de nos convidar para um Ministério, e nós, tomando o Poder, vemos que a situação é delicada.
Mas o estado em que se está não tem solução?
Na consciência de S. Ex.ª pode considerar-se que não seja êsse estado solúvel com uma administração rigorosa e com continuidade administrativa, e que em poucos meses não possamos ter uma vida não desafogada, porque isso não será dado durante muito aos povos europeus, mas relativamente tranquilizadora?
As cousas estão acima dos homens, mas de uma, maneira evidente vemos que as nações europeias não terão tão depressa a sua vida regularizada, e isso não verão aqueles que como eu já estão adiantados em anos.
Assim o Govêrno não se demorará em apresentar aquelas providências que para isso julga indispensáveis e confia no Parlamento para as apreciar e corrigir, mas sem embaraçar a acção do Govêrno.
Já vê S. Ex.ª que os seus reparos, tam delicadamente feitos, não tinham razão de ser.
Disse também o Sr. Domingues dos Santos que neste relatório que apresentei se aludia a não se terem cobrado todos os impostos que se deviam cobrar quando a culpa era nossa.
Todos sabemos, e eu, sem vaidade de espécie alguma, quando aqui se discutiu o regime tributário, tive ocasião de dizer que se praticava um êrro do certa gravidade em remodelar inteiramente todo um regime fiscal, porque a história mostrou que um regime fiscal novo só passados muitos anos é que dá resultados.
Nós alterámos de fond en comble o nosso regime fiscal, e, sem desprimor para os empregados de finanças, tive ocasião de dizer aqui numa sessão, e até as 6 da manhã, quanto me parecia errado fazer uma tal remodelação do sistema tributário quando ela não se poderia pôr em execução.
Disse S. Ex.ª que fomos os culpados de não se terem nomeado os quatrocentos fiscais, mas S. Ex.ª não estará convencido de que com êsses fiscais nomeados pudesse dar rendimento o novo sistema fiscal.
S. Ex.ª é homem de bem, não vai dizer isso, mas mesmo que assim fôsse, se nós éramos minoria como podíamos impedir que o Sr. Lima Basto, que então era Ministro das Finanças, dissesse à sua maioria que necessitava para efectuar a cobrança dos impostos da nomeação dêsses quatrocentos empregados, e que importariam os nossos protestos senão tínhamos os votos necessários para nos impormos? Por isso não posso estar de acôrdo com a observação de S. Ex.ª a

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êsse ponto da minha ligeira declaração ministerial.
Apoiados.
Terminando, falou S. Ex.ª em perseguições.
Repito, não consentirei perseguições a ninguém.
Acho deminuïção de prestígio da autoridade perseguir alguém.
Apoiados.
Procurarei fazer cumprir as leis, mas sentir-me-ia deminuído no lugar que ocupo só desmerecesse do conceito da Câmara, se realmente consentisse, estando no Poder, que se fizessem perseguições fôsse a quem fôsse.
Disse S. Ex.ª que o Partido Republicano Português aguardava os actos do Govêrno e procederia conforme fôsse necessário.
Tomo nota, o espero que não será S. Ex.ª nem eu que viremos dizer um. ao outro que não cumprimos a nossa promessa; eu, cumprindo a declaração ministerial, e S. Ex.ª não deixando de dar o seu apoio para se prover de remédio a situação melindrosa do País.
Vozes: — Muito bem.
O Orador: — Depois usou da palavra o Sr. Aires de Ornelas o já tive ocasião de agradecer as declarações de S. Ex.ª
A minoria monárquica diz não criar embaraços à acção governativa, e assim espero do patriotismo de S. Ex.ªs, porque, embora tenham uma bandeira diferente da nossa, ambas estão confundidas com a bandeira da Pátria.
S. Ex.ª notou uma omissão na declaração do Govêrno por não haver uma referência acêrca de Igreja.
Estranhou o facto, mas não há motivo, porque neste momento não há reclamações, a não ser um projecto pendente do Parlamento dando satisfação a certas reclamações.
O Partido Nacionalista tem já manifestado o seu sentir a êsse respeito e eu já o tenho significado.
Como na ocasião presente não existe reclamação alguma dos católicos, tudo leva a crer que há calma nos espíritos e tanto assim que na tentativa da formação dum Govêrno Nacional eu vi que os católicos não eram desafectos à formação dêsse Ministério.
Ora, tendo eu já expendido e manifestado as minhas opiniões a êsse respeito e tendo na tribuna pública feito certas declarações e afirmações que como homem de honra tomo como compromisso, pois não digo hoje uma cousa para amanha a não cumprir, julguei-me dispensado de vir aqui na declaração ministerial dizer qualquer cousa, embora os católicos e a Igreja me mereçam toda a consideração, do que tenho dado provas e ainda por ocasião do aniversário do Sr. Patriarca eu o felicitei calorosamente.
Não tenho nada que ciar nem V. Ex.ªs pão pessoas de pedir, mas sim de reclamar.
A religião tem direito a exigir á tolerância e a máxima liberdade; já Mirabeau o dizia.
Não me parece que os reparos do ilustre leader monárquico, bem como os do meu amigo Lino Neto, tenham razão de ser.
O Sr. Aires de Ornelas falou na questão colonial que de facto é a mais séria que preocupa o Govêrno no momento actual.
O Govêrno entende que é preciso definir a política colonial do forma que resulte um conjunto harmónico.
Apoiados.
As colónias não podem viver àparte da metrópole.
Mas evidentemente que o Govêrno, para se desempenhar dessa função, precisa que se defina uma política colonial que não pode ser a política de nenhum partido, mas uma política de regime acêrca das colónias, que até hoje não foi definida.
A declaração do Govêrno a êste respeito parece-me clara. Não visa pessoas, visa factos, porque quem a escreveu não teve em vista pessoas, mas os acontecimentos.
De modo que, sob o ponto de vista colonial, o Govêrno, pela pasta das Colónias, orientará a política colonial, de maneira a salvaguardar a soberania da Nação, ao mesmo tempo que se estreitem as relações com as colónias vizinhas e que é indispensável aproveitar porque temos de ter uma vida de convivência, porque há interêsses comuns.

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Não quero alongar muito o debate; por isso vou reduzir as minhas considerações, embora não deixe de responder a todos os Srs. parlamentares que entraram no debate político.
Seguiu-se no uso da palavra o Sr. Joaquim Ribeiro, que teve palavras de amizade o simpatia para comigo e S. Ex.ª sabe bem que lhas retribuo.
No entretanto, S. Ex.ª fez-me uma censura que eu não mereço.
Disse S. Ex.ª que eu não tinha o direito de trazer para o meu Ministério um Ministro — evidentemente que não quis referir-se ao meu particular amigo Sr. Vasconcelos e Sá — que tinha sido sub-secretário de Estado no tempo da ditadura de Sidónio Pais.
S. Ex.ª é muito novo, por isso seria conveniente lembrar que o Sr. Ministro da Agricultura foi um dos oito oficiais que em 5 do Outubro ficaram no seu pôsto e que com a sua acção permitiram que eu mo encontrasse neste lugar, que S. Ex.ª esteja onde está e a República seja o regime da Nação.
Devo lembrar que o Sr. Ministro da Agricultura ostenta no seu peito a Cruz de Guerra e a medalha de valor militar ganha em África, porque S. Ex.ª em frente do inimigo que tinha rompido uma das faces do quadrado, pôs de parte os seus ferros cirúrgicos, empunhou uma espada, evitando que houvesse grande massacro, o por isso sustenta no peito a medalha de ouro de valor militar. V. Ex.ª, que também se bateu com heroísmo nos campos de batalha, compreende bem as minhas palavras.
Nada mais tenho a dizer; falei de um herói a outro herói.
Sinto não ver presente o Sr. Sá Pereira, para agradecer os elogios excessivos que me fez, ao mesmo tempo que me ia chamando conservador.
Para que não haja confusões eu devo esclarecer.
De facto, sou conservador porque entendo que existe a continuidade histórica nos acontecimentos.
Embora seja conservador, o meu objectivo não é andar para trás, porque nós temos do ir para diante; neste sentido sou conservador, o que não inibo que se queira andar para diante.
Quero mesmo progredir mais do que aqueles que me acusam, por vezes, de conservantismo.
Quero progredir sem parar; e quando se quere transformar tudo — é fatal — tem de se parar para dar lugar à reparação dos estragos que sempre só causam quando se avança demais.
Falou depois o Sr. Nuno Simões que manifestou a sua estranheza por não encontrar na declaração ministerial qualquer alusão à greve marítima.
Sinto não ver S. Ex.ª aqui presente, mas nem por isso deixarei de responder-lhe.
Não posso acreditar que o Sr. Nuno Simões, querendo reflectir, deixe de reconhecer que não podia fazer semelhante reparo.
Então porque há uma greve marítima, tinha isso de ser considerado na declaração ministerial?!
E sabe S. Ex.ª se o Govêrno fez já alguma cousa para solucionar êsse conflito?
Se todos os actos de administração pública tivessem de figurar na declaração ministerial, certamente que ela passaria a constituir grossos volumes que a biblioteca do Congresso não comportaria e estaríamos aqui, indefinidamente, a ler êsses volumes.
Se S. Ex.ª quere saber o que pensa o Governa sôbre a greve marítima, nada mais tem do que interrogar o Sr. Ministro da Marinha, por cuja pasta êsse assunto corre, e dêle obterá todas as explicações.
O que posso desde já declarar é que êsse conflito há-de ser resolvido sem quebra do prestígio da autoridade, que hei-de manter custe o que custar.
Também falou o Sr. Nuno Simões de política internacional e colonial.
Com respeito à política internacional, é manifesta a declaração ministerial. Disse S. Ex.ª que é necessário reformar o Ministério dos Negócios Estrangeiros, de forma a torná-lo mais um instrumento de acção económica do que diplomática. Isso mesmo diz a declaração ministerial e repeti-lo há S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros sempre que a Câmara o exija.
Não me parece, pois bem cabida a referência do Sr. Nuno Simões.
Quanto à política colonial, quando a Câmara queira ouvir o Sr. Ministro das

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Colónias, S. Ex.ª dirá o que queiram saber os Srs. parlamentares.
E, Sr. Presidente, é necessário que todos nos empenhemos por que se defina, de vez, uma política colonial portuguesa.
Notemos, porém, que já a tivemos.
Ao contrário do que muita gente julga, a nossa acção, da qual resulta a posse das colónias, não foi uma aventura; ela obedeceu a programas e tivemos uma política colonial e tam notável que foi seguida por povos estrangeiros. Não é, pois, mais do que reatar a tradição o estabelecermos definitivamente uma política colonial.
Supõe muita gente que apenas ao espírito aventureiro de muitos se deve o facto de os portugueses terem dado mundos novos ao mundo.
Não foi só isso; foi mais alguma cousa: foi a consequência de um plano vastíssimo, embora com meios pobríssimos — e nisso é que está toda a grandeza heróica! — metòdicamente seguido.
De maneira que a República, estabelecendo uma política colonial, reata a tradição nacional que deve sempre considerar, desde que tem o objectivo de se integrar na nação.
De mais nada falou o ilustre Deputado, que eu tomasse nota.
Depois disso, e hoje já, o Sr. Abranches Ferrão, a quem agradeço as palavras amáveis que me dirigiu, também estranhou a solução da crise. Já esclareci qual havia sido,, o critério do Partido Nacionalista para não se associar numa obra de Govêrno com outros partidos e, portanto, nada tenho a dizer em resposta a S. Ex.ª
Por último, tomou a palavra o meu querido amigo Sr. Fausto de Figueiredo, e a sua amizade também o levou a fazer considerações várias a meu respeito, que agradeço.
Notou S. Ex.ª uma omissão na declaração ministerial: é a de nela nada se dizer acêrca da Assistência Pública. Com certeza que o grande interêsse que S. Ex.ª tem pela instituição que superiormente administra, é que o levou a semelhante referência.
Então poderá S. Ex.ª ou alguém supor que êste Govêrno se desinteressava da obra da assistência, que se desinteressava da obra de sanidade pública, que se desinteressava da obra de previdência social?!
Então o Govêrno republicano, o Govêrno nacionalista podia, por acaso, desinteressar-se dêsse problema?!
Nós, neste momento, conforme se evidencia na declaração ministerial, necessitamos regularizar a vida do Estado, sobretudo, a vida do Tesouro Público, promover o desenvolvimento imediato da riqueza, porque estamos convencidos de que, para, de vez, se equilibrar a vida financeira da Nação, é necessário aumentar a riqueza pública.
Estamos convencidos de que é necessário ir ao potencial de riqueza que, quer na metrópole, quer nas colónias, é considerável, tornando-a em realização da imediata utilização; por isso, não nos referimos a todos os problemas que sobremaneira interessam o Govêrno.
Alguns deles, como o da assistência, correm pela pasta do Trabalho sôbre cujo destino o Parlamento terá que pronunciar-se ràpidamente; mas, mesmo que o não faça, o Govêrno encarregará da sua gerência alguém, porque, realmente, os assuntos de que se trata necessitam ou de transitar para outra ou outras pastas ou de ter um Ministro que, especialmente, só ocupe dêles, não porque faltem qualidades ao Ministro do Comércio que, interinamente, se encarregou da pasta do Trabalho, mas porque, realmente, já são tam absorventes os trabalhos da sua pasta, que entregar-lhe duas, apesar da sua inteligência e mocidade que é uma das suas grandes vantagens, significaria exigência demasiada.
Não se lhe deve pedir tamanho esfôrço. Nada há que possa fazer acreditar que o Govêrno, uma vez desaparecido êste embaraço de momento, não entenda que devam ser considerados, e criteriosamente considerados deverão ser, todos êsses problemas que são fundamentais para a República.
E muito há a fazer, visto que a obra de assistência, de previdência social e de sanidade pública, encontra-se ainda hoje, como V. Ex.ªs sabem, no mesmo pé em que estava no princípio do século passado.
Entretanto tudo isso requero recursos e, como o Sr. Ministro das Finanças, dentro em pouco, confirmará à Câmara, nós estamos carecidos de recursos mesmo para o essencial.

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Para que vir, pois, com promessas, não podendo cumpri-las imediatamente?
Eu timbrarei em não prometer daqui senão o que possa fazer, custe o que custar.
Para que serviria vir aqui prometer que ia fazer grandes reformas nos serviços de assistência se eu não tenho recursos para os executar? Não! Entendo que, pelo que devo a mim próprio e à Câmara, apenas devo prometer o que tenha possibilidade imediata de fazer.
Sr. Presidente: terminando, eu quero repetir a V. Ex.ª aquelas palavras com que terminei a declaração ministerial.
Tem por objectivo principal o Govêrno pôr engordem a situação do Estado, extraordinariamente perturbada sob o ponto de vista financeiro.
Sob a pasta que eu dirijo estão os serviços que têm de garantir a outra ordem. Serei inflexível na manutenção da ordem pública e para o conseguir eu conto com a Câmara inteira, esperando manter a ordem com as leis vigentes e, se elas não chegarem, apresentarei novas propostas como aquelas que eu, como leader de toda a Câmara, já tive ocasião de apresentar.
Estou convencido de que não será preciso recorrer a êsses extremos.
Concluindo, podem V. Ex.ªs estar certos do que eu procurarei garantir todas as liberdades legítimas, mas que serei inexorável contra todos os abusos.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador foi muito cumprimentado.
O orador não reviu.
O Sr. José Domingues dos Santos: — Sr. Presidente: não quero alongar êste debate, mas é forçoso que em resposta ao Sr. Presidente do Ministério, em nome deste lado da Câmara, eu levante algumas afirmações feitas por S. Ex.ª
Começou S. Ex.ª por afirmar que o Partido Republicano Português estava impossibilitado de governar. Tal afirmação carece de fundamento, porque o meu partido entende que neste momento todos os republicanos se devem unir em tôrno de um programa mínimo de salvação nacional.
O meu partido entende que a política financeira não pode ser uma política de descrédito, porque a situação em que se encontra o país resulta da falta de confiança.
Afirma-se por toda a parte, sabe-o V. Ex.ª, que a maior causa do descalabro financeiro deriva principalmente da falta de confiança dos capitais portugueses no Estado português.
Pois como quere V. Ex.ª que os capitais portugueses tenham confiança no Estado quando se vem declarar na própria Câmara que êsse mesmo Estado não tem um centavo para pagamentos? Por acaso uma casa comercial pode ter crédito, declarando-se em estado de falência?
O Partido Republicano Português diverge, nesse ponto de vista, da política financeira do actual Govêrno.
Sr. Presidente: em resposta às afirmações produzidas aqui pelo Sr. Jorge Nunes, a quem não respondi desde logo porque esperava responder ao Sr. Presidente do Ministério, direi que efectivamente não há possibilidade de entre o meu partido e o partido de S. Ex.ª haver identidade de opiniões e processos.
Se assim fôsse, não haveria necessidade de partidos diferentes.
Temos realmente critério diverso, processos diversos.
Afirmar que todos nós estamos identificados dentro do mesmo programa e dos mesmos processos seria pregar a desnecessidade de partidos.
Todos queremos a salvação da Pátria, a salvação da República; marchamos para a mesma finalidade, mas por caminhos diversos, e, se outra razão não existisse para demonstrar que é, de facto, fundamental a diferença de processos e de critério, bastaria a diferença de critério que nos separa em política financeira.
V. Ex.ªs são partidários duma política financeira que é inteiramente diversa da nossa.
Nós queremos uma política financeira de verdade, mas de reserva; V. Ex.ªs querem uma política de descrédito, às claras.
Não apoiados.
Na declaração ministerial faz-se a afirmação de que o imposto pessoal de rendimento é incobrável, pretendendo-se assim pôr de parte uma afirmação que em política financeira é fundamental para o Partido Republicano Português.

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Diferença de processos têmo-los necessàriamente, e querem V. Ex.ªs ver o que há já em matéria de processos? Querem V. Ex.ªs saber o motivo porque ontem aludi a possíveis perseguições?
Foi o Govêrno do Sr. António Maria da Silva autorizado a fazer a reforma da polícia; fê-la pondo à frente dessa policia um homem que não é nosso correligionário; pois o Govêrno de V. Ex.ª, assim, que assumiu o Poder, substituiu imediatamente êsse magistrado, que pertence ao Partido Nacionalista.
Temos efectivamente processos e critérios diversos.
Sr. Presidente: o Partido Republicano Português não contesta os altos serviços prestados à Pátria e à República pelo Sr. Ferreira do Amaral, não contesta a idoneidade de S. Ex.ª para bem desempenhar o lugar para que foi nomeado, mas o que afirmo é que o Sr. Marrecas Ferreira é igualmente idóneo, tem igualmente prestado serviços à República, devendo merecer a confiança do Govêrno de V. Ex.ª
Sr. Presidente: falei neste ponto apenas por incidente e para demonstrar qual era o meu pensamento ao falar em possíveis perseguições. Sabem V. Ex.ªs que já nas colunas dos jornais se fala em futuras perseguições; era preciso naturalmente afirmar que o Partido Republicano Português não poderá consentir que se faça o afastamento sistemático de todos os republicanos desde que não sejam correligionários de S. Ex.ª
Temos evidentemente processos diversos e critério diverso.
O Partido Republicano Português, quando pela minha bôca ontem falou, se mais detidamente não apreciou a declaração ministerial não foi por menos consideração, mas porque entendeu que essa declaração era semelhante às outras, um conjunto de aspirações vagas, esperando que elas se traduzam em propostas de lei que possam ser discutidas e apreciadas. O Partido Republicano Português declarou que aguarda a obra de V. Ex.ªs para sôbre ela se pronunciar. E essa obra útil aos interêsses da Pátria e da República? Terá o nosso apoio; em caso contrário, de forma alguma lhe daremos o nosso voto.
Uma cousa quero dizer, o talvez fôsse êsse o motivo principal por que pedi a palavra.
Ouvi atentamente as declarações feitas pelo Sr. Presidente do Ministério, mas há uma afirmação que eu esperava ouvir e que não ouvi, e era essa exactamente que eu queria ouvir, porque para nós é essencial.
Eu terminei ontem por dizer ao Sr. Presidente do Ministério: governe, mas dentro da lei e da Constituïção. E esperava que S. Ex.ª me dissesse que nunca sairia fora da lei e da Constituïção.
Vozes: — Disse, disse.
O Orador: — Sr. Presidente: tenho motivos para fazer esta pregunta, e um dêsses motivos é a afirmação contida no jornal dirigido por um correligionário de S. Ex.ª e que aqui tenho na minha frente.
Diz êsse jornal: para a frente, seja como fôr.
Seja como fôr, não; «para a frente, mas dentro da Constituição».
Precisamos ter a garantia absoluta de que S. Ex.ª nunca saïrá da Constituïção; só assim poderemos acompanhar a obra política de S. Ex.ª
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Como não está mais ninguém inscrito, considero encerrado o debate.
O Sr. José Domingues dos Santos: — Então o Sr. Presidente do Ministério não responde?
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Sr. Presidente: nunca supus que o Sr. José Domingues dos Santos esperasse que eu dêsse resposta a uma pregunta de tal natureza.
Nem percebo bem a pregunta de S. Ex.ª
Preguntou S. Ex.ª se eu quero governar dentro da lei e da Constituïção.

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O Sr. José Domingues dos Santos: — O que eu pregunto é se V. Ex.ª nunca saïrá fora da Constituïção.
O Sr. Moura Pinto: — Prometemos; sair menos vezes, que V. Ex.ª
Risos.
O Orador: — Pois então o Govêrno, sujeita a estar aqui a governar sem maioria e V. Ex.ª ainda quer maior prova de que o Govêrno respeita a Constituïção?
Não posso dar mais nenhuma prova de momento.
Os meus actos é que hão-de demonstrar a V. Ex.ª se realmente eu vim para aqui com simulacro de respeito ao regime parlamentar.
Pois então eu venho aqui entregar-me nas mãos de V. Ex.ªs, que podem já neste momento, se quisererem, obrigar-me a sair por aquela porta, visto que têm a maioria, e V. Ex.ª ainda quere mais garantias de respeito ao regime parlamentar?
Que mais quere V. Ex.ª?
É como o caso de omissão de que falaram os Srs. Lino Neto e Aires de Ornelas.
Eu não tenho que fazer novas declarações visto que o meu partido no seu manifesto já declarou mais os seus pontos de vista sôbre o assunto.
Apoiados.
Que declarações, pois, hei-de eu fazer?
V. Ex.ª perdõe-me, mas não têm mais que aguardar os meus actos.
Como quere V. Ex.ª que eu esteja agora a tomar compromissos?
Parece-me uma cousa de gente nova, mais do que realmente somos, embora V. Ex.ª seja mais novo do que eu.
Não compreendo essa exigência de V. Ex.ª
Pois então acontece êste caso extraordinário, de que não tenho idea, de um Govêrno não ter maioria na Câmara, que está disposto a, honestamente, podem V. Ex.ªs acreditar, governar com à colaboração do Parlamento, a trazer medidas que julgo indispensáveis para assim corresponder àquilo que me propus fazer e que entendo ser do interêsse da Nação, e fazem-me semelhante pregunta?
Desejo, repito, governar com o Parlamento, e creio que com isto lhes digo tudo, não sabendo o que mais lhes possa dizer.
O Govêrno, Sr. Presidente, está animado das melhores intenções, esperando para poder realizar a sua obra, a colaboração do Parlamento, pois, de contrário, não teria acedido aos desejos do Sr. Presidente do República, quando me pediu para organizar ràpidamente um Ministério.
Acedi aos desejos do Sr. Presidente da República, organizando nessa mesma noite um Ministério, convencido de que assim prestava um serviço ao país.
Organizei, pois, êsse Ministério, no mais curto prazo de tempo possível, conforme os desejos manifestados pelo Sr. Presidente da República, e aqui estou, não tendo outros propósitos senão o de governar com o Parlamento.
V. Ex.ªs terão muito tempo para apreciar os meus actos, porém por emquanto nada mais lhes posso dizer.
Não tenho outros propósitos, repito, senão o de governar com o Parlamento, não sendo lícito pôr em dúvida as minhas palavras ou intenções.
Não sei o que é que V. Ex.ªs querem que lhes diga mais, pois a verdade é que nada mais lhes posso dizer.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. José Domingues dos Santos: — Agora já nos disse alguma cousa; isto é, que não tem outro propósito senão o de governar com o Parlamento.
O Sr. Presidente: — Não há mais ninguém inscrito.
Está, pois, encerrado o debate político.
Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal: — Sr. Presidente: a propósito do modo de votar, eu declarei a minha intenção de pedir à Câmara que simultaneamente discutisse e votasse uma proposta de lei tendente a habilitar o Govêrno com os meios constitucionais para viver; porém, duas observações foram feitas que me pareceram, discordar do meu modo de ver, uma das quais feita

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pelo ilustre Deputado Sr. Vitorino Guimarães, que entende que o assunto se não deve discutir sem o parecer da respectiva comissão, e a outra feita, pela Sr. Plínio Silva, que declarou, que não era dos meus hábitos ou processos, visto que venho agora, a propósito do mesmo assunto, apregoar aquelas mesmas teorias por mim já defendidas a quando do infeliz Ministério a que pertenci, presidido pela alta figura do Sr. Álvaro de Castro, e que aqui foi trucidado logo à nascença sem nenhuma piedade pelas suas boas intenções.
Ora eu quero dizer ao Sr. Plínio Silva que não pretendi, nem pretendo ser original: o que sempre tenho, pretendido ser é coerente.
Muitos apoiados.
Assim a circunstância há pouco notada por, S. Ex.ª, e na qual se quis ver uma falta de originalidade, da minha parte, apenas prova a minha coerência. Incoerente seria eu se perante determinada situação, tivesse, sustentado a necessidade de tomar certa medida para fazer vingar, o espírito das leis, e pouco tempo depois, em presença de idêntica situação e apenas porque tinha mudado de lugar viesse, sustentar exactamente o contrário.
Muitos apoiados.
Evidentemente eu tinha de ser pouco original para ser muito coerente.
Muitos apoiados.
Por outro lado, preciso fazer uma declaração ao Sr. Velhinho Correia. É que eu, a não ser, nesta, circunstância verdadeiramente, excepcional em que tenho de pagar imediatamente os vencimentos aos funcionários pondo absolutamente de parte a idea de aumentar a circulação fiduciária, jamais virei a esta Câmara pedir dispensa do Regimento para a discussão de propostas de carácter financeiro que eu venha, porventura, a apresentar. O País terá necessidade de as conhecer para se interessar por elas e por isso eu estou no firme propósito de não permitir que em sua volta, se estabeleça a cumplicidade, do silêncio.
Muitos apoiados.
Não quero uma política de cumplicidade em matéria financeira. Política clara, muito clara, para que todos vejam.
Muitos apoiados.
Nestas condições, a promessa fica feita e V. Ex.ª hão-de ter brevemente a certeza do que afirmo.
Sr. Presidente: a pessoa que faz tais declarações tem a obrigação moral de imediatamente começar a trabalhar no sentido de confirmar o que o Govêrno apenas pretende fazer uma política de verdade para que o País sinta a necessidade dos seus sacrifícios, e do seu esfôrço.
Por várias vezes tenho ouvido afirmar que nós marchamos sempre entre um pessimismo que vê tudo negro; ou um optimismo que vê tudo cor de rosa. Eu sou pessimista à minha maneira. Conheço as dificuldades, mas não hesito em ir direito ao meu alvo. Não sou dos que ficam no caminho, e, tanto assim é que, eu ainda espero ver transformada em simpatia a antipatia que o Partido Democrático parece manifestar por mim.
Eu declarei no meu relatório que encontrei uma situação menos regular quanto a circulação fiduciária. Declarei, também que estava, disposto a fazer, uma política de verdade. E querem V. Ex.ªs ver quanto o meu espírito é cauteloso, que chega quási a duvidar de si próprio? Tendo eu defendido aqui determinados princípios, não me atrevi a vir novamente; sustentá-los sem ouvir o parecera da Procuradoria Geral da República sôbre aqueles pontos que, se me afiguravam duvidosos.
Eu vou ler à Câmara a minha consulta e a resposta da Procuradoria.
No dia 16, isto é, um dia depois da minha posse, dei a seguinte ordem ao Director Geral da Fazenda Pública:
Leu.
Eu poderia ficar-me dentro desta interpretação para ocultar uma parte da minha proposta de lei, e procurava socorrer-me dêste princípio para dizer, que estava dentro da boa interpretação; mas a seguir a Procuradoria acrescentava:
Leu.
Esta é a situação. Como é, pois que eu teria, à face da resposta à minha última pregunta, que interpretar a respostas à primeira?
É que neste ponto as interpretações dos juristas eram diferentes. A Procuradoria quis talvez colocar-me com a sua resposta em condições de renovar a convenção, mas ou, sabia que a segunda resposta dava, a entender qualquer cousa e

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por isso procurei saber do Sr. Director da Contabilidade Pública o que havia, e S. Ex.ª informou-me de que a opinião da Procuradoria, já consultada sôbre um caso análogo, era contrária à renovação da convenção.
Poderia ainda socorrer-me da interpretação dada pelo Sr. Presidente do Ministério, anterior, mas entendi que o não; devia, fazer e que só devia apelar para o Parlamento, para que êle por qualquer forma interpretasse a lei de maneira a que não houvesse dúvidas e amanhã não se. pudessem levantar quaisquer questiúnculas.
É assim, que eu procuro cumprir, os meus propósitos manifestados, na oposição!
Apoiados.
A proposta de lei que eu nestas condições elaborei, e sem a qual ou sem outra semelhante não posso viver, diz o seguinte:
Leu.
Compreendem V. Ex.ªs, para não haver dúvidas sôbre o alcance da medida que lhes venho aqui trazer, que o artigo 2.º pretende ser uma interpretação do contrato entre o Estado e o Banco de Portugal; aliás podia ser uma simples interpretação dó Poder Executivo, mas como tenho dúvidas, coloco aqui o artigo 2.º exactamente para que V. Ex.ªs me dêem uma interpretação.
Mas vejamos as bases da minha proposta:
Leu.
Verificam V. Ex.ªs que o que pretendo é o seguinte: aquilo que me parece não corresponder, a uma situação absolutamente legal, legalizá-lo; a seguir, que V. Ex.ªs me munam com um instrumento sôbre é qual não possa haver dúvidas análogas às que houve com a convenção de 29 de Dezembro de 1922.
O Sr. Velhinho Correia: — As dúvidas tinhas-as V. Ex.ª!
V. Ex.ª dá-me licença?
O que V. Ex.ª pretende é uma lei que se pode chamar de capucho, porque estando o Banco, e o Poder Executivo de acôrdo, ela não é precisa para nada.
O Orador: — O Sr. Velhinho Correia — e vem a propósito esta afirmação — está com um espírito essencialmente oposicionista.
Eu já pedi autorização tanto a S. Ex.ª como ao Sr. Presidente do Ministério para fazer uso de uma carta que em papel comercial foi dirigida pelo Sr. Velhinho Correia ao Sr. Presidente do Ministério:
Leu.
Eu sei que o Sr. Velhinho Correia era. incapaz de resolver o problema no sentido em que mostrou receio de que eu o resolvesse, e como quero que os interêsses do Estado, sejam acautelados, vou mandar copiar, todo o processo e enviá-lo à Mesa desta Câmara para que todos o possam; consultar e desde já me declaro habilitado: a responder a qualquer interpelação.
Eu tinha dúvidas sôbre a convenção e fui procurar o Sr. Director Geral da Fazenda Pública, que também teve dúvidas, e o parecer da Procuradoria da República, também mostrou dúvidas; logo são três entidades a terem dúvidas.
Estou certo de que a Procuradoria Geral da República, sempre estará superior ao Ministro das Finanças, ao Director Geral da Fazenda Pública e até — desculpe V. Ex.ª a heresia — ao Sr. Velhinho Correia!
Para a minha proposta peço urgência e dispensa do Regimento.
Isto é para dizer que seja qual fôr a votação da Câmara sôbre a urgência e dispensa, do Regimento me sujeito a essa deliberação, mas não estranhem V. Ex.ªs que eu, que entendo que ao País é necessário falar a linguagem da verdade, declare aquilo que será uma consequência lógica dêsse facto: que suspendo os pagamentos sem um minuto de hesitação, continuando a viver e a vir ao Parlamento, e não morro por isso nem o País morre, porque o País tem muitos recursos, o que é preciso é não os malbaratar. É necessário que não deixemos chegar êste País à situação da Áustria e da Alemanha. Isso é que eu não quero e porque não quero é que eu entendo ser necessário dizer-lhe que está cheio de chagas, mas que essas chagas podem curar-se.
É necessário, dizer-lhe: não ignores a tua doença, é preciso que vejas a tua situação, sendo necessário o sacrifício de todos trabalhando sem descanso.

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Não vim para a pasta das Finanças por uma questão de capricho; trabalho, e, permitam-me V. Ex.ªs Que diga, empregando uma linguagem rude, trabalho como um cão, não em nome de qualquer vaidade, não supondo que trago a V. Ex.ªs obra perfeita, mas acreditando em mim próprio que não sou mais estúpido que outro qualquer e que a soma de trabalho, de boa vontade, de dedicação e de esfôrço patriótico que hei-de pôr na minha obra há-de ser bastante para realmente fazer uma obra boa.
Sr. Presidente: com estas palavras de fé, com estas palavras com que exponho ao País a, sua situação, outro intuito não tenho senão fazê-lo compreender a natureza, do sacrifício, que tem de suportar. Afirmo a V. Ex.ªs que o meu desejo de trabalhar é enorme, que ainda esta semana procurarei trazer à Câmara as primeiras medidas severas de cortes profundos de dezenas de milhares de contos no Orçamento Crer ai do Estado.
Dito isto, ouso esperar da Câmara que não me recusará os meios suficientes para trabalhar, porque nunca vi ninguém conseguir descobrir que de nada pudesse fazer-se, alguma cousa, e a situação em que me encontro neste momento é positivamente a de quem está diante do nada.
Não tenho recursos, pretendo criá-los, a não ser que V. Ex.ªs disse me impeçam; mas, não tenho hesitação alguma sôbre o que vai ser o vosso procedimento.
V. Ex.ªs vão dar-me: os necessários meios de trabalhar, de procurar, equilibrar o Orçamento, vão trabalhar comigo com uma dedicação, como se fossem meus correligionários.
São portugueses e eu não pretendo ter o privilégio do exclusivo do patriotismo.
V. Ex.ªs são tanto como eu.
Não somos mais uns do que outros. Entendamo-nos, trabalhemos, e isto a bem, porque a mal, como disse o Sr. José Domingues dos Santos, acho que é muito perigoso para o País.
Mando para a Mesa a minha proposta de lei.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taguigráficas; que lhe foram enviadas.
Foi lida na Mesa a proposta.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: nós temos sempre reclamado contra os requerimentos de urgência o dispensa do Regimento, mas a situação em que se encontra o Sr: Ministro das Finanças e o Govêrno é de tal forma grave que nós nenhuma dificuldade queremos crear ao Grovêrno para conseguir os meios precisos para poder pagar ao funcionalismo público; mas parece-me que o Sr. Ministro das Finanças não deixará de concordar com o pedido que fazemos que a sua proposta fique para ser discutida amanhã em primeiro assunto, para termos tempo de ler e estudar a proposta apresentada.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: eu tinha feito um requerimento, mas V. Ex.ª não o pôs à votação, não sei por que motivo, dando aliás a palavra sôbre o modo de veiar ao Sr. Carvalho da Silva.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro das Finanças requereu a urgência e dispensa do Regimento para a proposta que apresentou, e êsse requerimento tinha de ser pôsto à votação.
Àpartes.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Sr. Presidente: se V. Ex.ª me dá licença, eu tenho a dizer à Câmara que se fiz o meu requerimento é porque a urgência se impõe.
Logo que vim ocupar a pasta das Finanças, tomei conhecimento de qual era o estado das nossas finanças.
Declarei ao Banco de Portugal que não autorizava que se pusesse uma única nota nova em circulação.
Preguntei ao Banco se êle nos seus depósitos, tinha quantias que permitissem fazer os primeiros pagamentos.
Disse-me que sim; marcando naturalmente um limite.
Não me oponho a que a discussão da minha proposta fique para amanhã.
De resto isso vai permitir que, logo que termine a sua discussão no Senado, eu possa apresentar as primeiras propostas de redução de despesas.

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Assim não tenho dúvida em aceitar o alvitre do Sr. Carvalho da Silva, havendo, portanto, o tempo necessário para fazer os estudos indispensáveis para tranquilizar não só a Câmara, mas também o País.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: — Requeiro que a discussão da proposta do Sr. Ministro das Finanças e o anexo à declaração ministerial fiquem para a sessão de amanha, tenham ou não parecer da comissão respectiva.
O Sr. Vitorino Guimarães: — Pedi a palavra apenas para declarar, em nome do Partido Republicano Português, que concordo com o modo de ver do Sr. Jorge Nunes.
O Sr. Ministro das, Finanças (Cunha Leal): — Concordo com o requerimento do Sr. Jorge Nunes e retiro o meu.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Jorge Nunes.
O Sr. Vitorino Guimarães: — Sr. Presidente: pedi a palavra para explicações, contra o meu uso, porque não quero deixar de fazer algumas considerações a propósito das palavras proferidas ontem pelo Sr. Ministro das Finanças e hoje pelo Sr. Presidente do Ministério.
Disse o Sr. Presidente do Ministério que sabia que o patriotismo dêste lado da Câmara não era diferente do de S. Ex.ª
Porque era exactamente êsse o meu critério é que há pouco achei extraordinário que se apelasse para o nosso patriotismo, pedindo, que votássemos a urgência é dispensa do Regimento, sem a apreciação dás comissões, para medidas importantes, quando é certo que tantas vezes essa concessão nós foi negada.
Não é porque não reconheçamos que efectivam ente há casos em que essa concessão se deve fazer; mas a verdade também é que, fazendo-se diversas referências a contratos do Banco e a legislação variada, nós não ternos elementos aqui para poder imediatamente apreciar o assunto.
Não é por se esperar mais 24 horas que as dificuldades do Sr. Ministro das Finanças se tornarão invencíveis e assim amanhã poderemos vir para a discussão habilitado com os necessários elementos de estudo
Devo também declarar ao Sr. Ministro das Finanças, em nome do Partido Republicano Português, que se S. Ex.ª fôr para diante, com toda a energia, na política que anuncia de compressão de despesas, da nossa parte não encontrará qualquer oposição.
Disse S. Ex.ª que há-de cair sôbre a sua pessoa muita antipatia; pois desde já podemos tomar o compromisso de que compartilharemos dessa antipatia, desde que a compressão de despesas se faça duma forma patriótica e com equidade, como é de esperar de S. Ex.ª
Fui eu o Ministro das Finanças que realizou a Convenção com o Banco de Portugal de 29 de Dezembro, e por isso, e porque S. Ex.ª já tinha conhecimento confidencial do caso, escusava de ter feito qualquer consulta ao Director Geral da Fazenda Pública.
Sr. Presidente: quanto às últimas palavras do Sr. Ministro das finanças, que trabalha com todo o cuidado e energia para melhorar a situação do Estado, devo dizer que ninguém as põe em dúvida.
S. Ex.ª segue um critério pessimista e de descrença, e eu acho que isso nunca serviu em tempo algum pára fazer progredir o crédito do Estado.
Dêste lado da Câmara adopta-se o critério da fé e da esperança.
Porém, a verdade é que, apesar da divergência dêstes critérios, no fundo estamos todos de acôrdo.
S. Ex.ª terminou as suas considerações dizendo que o País está cheio de recursos, e o que é necessário é aplicá-los com critério.
Faça o Sr. Ministro das Finanças essa obra, e conte S. Ex.ª com o nosso auxílio, tanto quanto fôr possível;
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: pedi a palavra para explicações, que não serão longas, visto amanhã tencionar ocupar algum tempo à Câmara na análise das propostas que o Sr. Ministro

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Diário da Câmara dos Deputados
das Finanças mandou para a Mesa, e do relatório que S. Ex.ª apresentou ao Parlamento.
Leu S. Ex.ª uma carta que eu enviei ao Sr. Presidente do Ministério, há três ou quatro dias...
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Mas eu pedi autorização a V. Ex.ª
O Orador: —...e disse que se tratava de uma carta em papel comercial, não é exacto.
Trata-se de uma carta escrita em papel que tem, o meu nome ao canto dêsse papel.
É, pois, uma carta escrita em papel timbrado e não em papel comercial.
É bom fazer esta distinção, por causa das dúvidas e confusões.
Sr. Presidente: permitiu-se o Sr. Ministro das Finanças, num dos seus arrancos oratórios, que constituem evidentemente uma fôrça de S. Ex.ª neste meio parlamentar, fazer a comparação das minhas fracas e modestas qualidades de homem que pretendo interpretar leis, com as de outras pessoas, algumas das quais não r fazem parte desta Câmara.
Ora, eu devo dizer ao Sr. Ministro das Finanças que o meu passado de homem de trabalho resiste, a comparações, quaisquer que elas sejam, visto que, em todas as circunstâncias da minha vida e por todas as escolas por onde passei, marquei o meu lugar, como S. Ex.ª entre os primeiros.
Digo isto, não por vaidade que seria inoportuna neste momento, mas para lembrar a S. Ex.ª e à Câmara que onde não chega a minha inteligência tem chegado sempre o meu esfôrço, trabalho e boa vontade de acertar, de maneira a dar contas dos meus raptos, em todas as conjunturas e circunstâncias.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal) (interrompendo): — Mas eu não pus em dúvida as qualidades de V. Ex.ª
Apenas frisei que não seria extraordinário, para mim, como para V. Exa, como para ninguém desta Câmara, que não seja bacharel em direito, ter um bocadinho, de conhecimento de interpretação de leis do que a Procuradoria Geral da Republica.
O Orador: — Agradeço as explicações que S. Ex.ª me dá, porque elas eram precisas, depois do acolhimento que, por algumas pessoas, essas palavras tiveram.
Sr. Presidente: para terminar, devo manifestar o meu regozijo pela forma como S. Ex.ª deseja resolver a situação do Estado com o Banco de Portugal.
Eu terei amanhã ocasião de provar que afinal, as notas não eram falsas, e com as próprias palavras do Sr. Ministro das Finanças afirmar que elas ficam tendo a mesma cobertura que eu queria que elas tivessem.
Amanhã terei ensejo do desenvolver êste ponto, sem,que as minhas palavras possam ser classificadas de obstrucionismo, pois o que pretendo demonstrar é que S. Ex.ª, com a proposta que trouxe, apenas vem confirmar que vai seguir a mesma orientação que eu pretendia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi lida na Mesa uma nota, nomeando o Sr. Albino Pinto da Fonseca para substituir o Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo na comissão de finanças, durante o impedimento dêste.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Vitorino Guimarães.
Previno V. Ex.ª de que a sessão se encerra às 19 horas e 20 minutos.
O Sr. Vitorino Guimarães: — Visto o adiantado da hora, peço a V. Ex.ª que me reserve a palavra para amanhã.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a seguinte ordem dos trabalhos:
Proposta de lei n.º 616-F, que autoriza o Govêrno a celebrar com o Banco de Portugal um contrato conforme especificadas bases e a renovar com o mesmo Banco a convenção de 29 de Dezembro de 1922.
Debate sôbre o apenso financeiro à declaração ministerial.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas.

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Sessão de 20 de Novembro de 1923
Documentos mandados para a Mesa durante
Projecto de lei
Dos Srs. Marques Loureiro e Vitorino Mealha, elevando à categoria de cidade Vila Nova de Portimão.
Para o «Diário do Govêrno».
Proposta de lei
Do Sr. Ministro das Finanças, autorizando o Govêrno a celebrar um contrato com o Banco de Portugal, conforme designadas bases.
Admitida.
Para a comissão de finanças.
Requerimento
Requeiro que seja promulgado como lei o projecto de lei n.º 30-EE aprovado nesta Câmara em 9 de Setembro de 1921.
20 de Novembro de 1923. — António Maia.
Junte ao processo e informe.
O REDACTOR — Avelino de Almeida.

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