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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 4
EM 5 E 6 DE DEZEMBRO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia
PRIMEIRA PARTE
Sumário. — Aberta a sessão com a presença de 62 Srs. Deleitados, é lida a acta da sessão anterior e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Rodrigues Gaspar interroga o Sr. Ministro das Colónias nobre o que há a respeito da nomeação de um comissário do Govêrno junto da Companhia de Moçambique.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferreira) responde ao orador.
Voltam a usar da palavra os Srs. Rodrigues Gaspar e Ministro das Colónias sôbre factos relativos ao Ministério das Colónias.
O Sr. Carvalho da Silva requere que se abra uma inscrição especial sôbre a matéria.
Usam da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Vitorino (Guimarães, Álvaro de Castro e Cai valho da Silva.
O requerimento é rejeitado em prova e contra-prova.
É aprovada à acta da sessão precedente.
Os Srs. Rodrigues Gaspar e Ministro das Colónias usam da palavra para explicações ainda acêrca dos assuntos anteriormente visados.
É lida uma última redacção.
Ordem do dia. — Prossegue a discussão generalizada acêrca das interpelações dos Srs. Paiva Gomes e Velhinho Correia ao Sr. Ministro das Finanças, relativamente ao empréstimo de 430:000 libras feito pelo Estado a vários Bancos.
O Sr. António Fonseca interroga a Mesa sôbre o tempo durante o qual pode usar da palavra, em virtude do adiantado da hora.
O Sr. Presidente responde que o orador dispõe ainda de três horas.
O Sr. António Fonseca desiste da palavra.
O Sr. Paulo Menano requere a interrupção da sessão por duas horas.
O requerimento é aprovado em prova e contraprova.
O Sr. Presidente interrompe a sessão pelas 19 horas e meia para reabrir às 21 horas e meia.
Reaberta a sessão, o Sr. Morais Carvalho requere que ela seja prorrogada, até se liquidar a matéria em debate.
Aprovado.
Usam da palavra os Srs. Ministro das Finanças (Cunha Leal) e Fausto de Figueiredo, que entendem que a discussão não deve prosseguir sem a presença dos Deputados interpelantes.
O Sr. Carlos Pereira usa da palavra mandando para a Mesa uma moção.
Sôbre o modo de votar a sua admissão falam os Srs. Ministro das Finanças, Carvalho da Silva, Velhinho Correia, Ministro das Finanças, João Camoesas e Francisco Cruz.
O Sr. Agatão Lança interroga a Mesa sôbre uma interpretação regimental.
É aprovada a admissão da moção do Sr. Carlos Pereira, em prova e contraprova com contagem.
Falando sôbre a matéria o Sr. Fausto de Figueiredo pede que lhe seja reservada a palavra e requere que a sessão se interrompa à meia noite e 38 minutos para reabrir às 15 horas do dia 6.
É aprovado o requerimento e interrompida a sessão.
SEGUNDA PARTE
Reaberta a sessão, o Sr. Fausto de Figueiredo conclui o seu discurso.
Seguem-se no uno da palavra os Srs. Velhinho Correia, Abranches Ferroo, Morais Carvalho e António Fonseca.
O Sr. José Domingues dos Santos usa da palavra para explicações.
Usa da palavra para interrogar a Meta o Sr. Carvalho da Silva, respondendo-lhe, o Sr Presidente.
O Sr. Cunha Leal (Ministro das Finanças) responde às considerações feitas pelos oradores que entraram no debate sôbre a questão do empréstimo de 430:000 libras a algumas casas bancárias.
Seguem-se no uno da palavra os Srs. Rêgo Chaves, Paiva Gomes, que pede autorização para alterar os termos da sua moção, Marques Loureiro e Almeida Ribeiro.
A Câmara autoriza o Sr. Paiva Gomes a substituir a sua moção.
O Sr António Maria da Silva faz algumas considerações sôbre o assunto em discussão, seguindo-se-lhe ainda o Sr. Paiva Gomes que envia para a Mesa um aditamento à sua moção.
O Sr. Paiva Gomes requere a votação nominal para a sua moção, à qual é concedida também a
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Diário da Câmara dos Deputados
prioridade na votação, a requerimento do mesmo Sr. Deputado.
Lida na Mesa, usa da palavra sôbre o modo de votar o Sr. Carvalho da Silva.
É aprovado o requerimento para a votação nominal.
Procedendo-se à chamada, disseram «aprovo» 32 Srs. Deputados e «rejeito» 38.
É aprovado um requerimento do Sr. Sá Pereira pedindo a votação nominal para a moção do Sr. Rêgo Chaves.
Procedendo se à chamada, disseram «aprovai» 30 Srs. Deputados e «rejeito» 40.
É lida na Mesa a moção do Sr. Morais Carvalho, para a qual é requerida votação nominal pelo Sr. Cancela de Abreu.
Usam da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Ministro das Finanças, Morais Carvalho, Almeida Ribeiro, Jorge Nunes, Abranches Ferrão, Ferreira da Rocha e novamente o Sr. Ministro das Finanças, António Fonseca e Ferreira da Rocha.
O Sr. Ministro das Finanças faz uma declaração à Câmara.
O Sr. Presidente dá explicações à Câmara sôbre o modo como considera a moção do Sr. Morais Carvalho.
Usa da palavra para interrogar a Mesa o Sr. António Fonseca.
Usa ainda da palavra, sôbre o modo de votar, o Sr. Carvalho da Silva.
Consultada pelo Sr. Presidente, a Câmara resolve que a moção do Sr. Morais Carvalho não pode ser considerada uma questão prévia.
Rejeitado o requerimento do Sr. Cancela de Abreu, a Câmara rejeita em seguida a moção do Sr. Morais Carvalho.
Usa da palavra o Sr. Vicente Ferreira (Ministro das Colónias).
Lê-se na Mesa uma nota de interpelação.
O Sr. Plínio Silva usa da palavra para interrogar a Mesa, respondendo-lhe o Sr. Presidente.
O Sr. Plínio Silva reclama contra o facto de lhe, não terem sido enviados alguns documentos pelo Ministério do Comércio, respondendo-lhe o Sr. Pedro Pita (Ministro do Comércio).
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 15 horas e 25 minutos.
Presentes 52 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 67 Srs. Deputados.
Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Pais da Silva Marques.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Germano José de Amorim.
Joaquim Brandão.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Henrique de Abreu.
Lúcio de Campos Martins.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano Martins.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela do Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Quoiroz.
Vitorino. Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
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Aires do Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Olavo Corroía de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Estêvão Águas.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Salema.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Pedro Ferreira.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Nuno Simões.
Pedro Góis Pita.
Vasco Borges.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriquos Godinho.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso Augusto da Costa.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Américo da Silva Castro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Dias.
António Mendonça.
António Resende.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Jaime Duarte Silva.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João Pina de Morais Júnior.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Jorge Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Júlio Gonçalves.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
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Diário da Câmara dos Deputados
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Maximino de Matos.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Viriato Gomes da Fonseca.
PRIMEIRA PARTE
O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à chamada.
Procedeu-se à chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 53 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Abriu-se a sessão às 15 horas e 30 minutos e leu-se a acta da sessão anterior.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se o expediente.
Foi lido o seguinte
Expediente
Ofícios
Do Banco Agrícola Industrial Visiense, pedindo para não ser abrangido nas medidas financeiras relativas a Bancos.
Do Ministério do Comércio, comunicando não poder mandar os cinco processos relativos aos Caminhos de Ferro do Estado, mas sim as suas cópias, se forem pedidas pelo Sr. Plínio Silva.
Do Senado, comunicando a constituição da sua Mesa.
Do Senado, comunicando ter enviado para a Presidência da República a proposta de lei que regula o provimento dos auditores.
Para a Secretaria.
Do Senado, devolvendo, com alterações, a proposta de lei que aplica várias sanções às embarcações estrangeiras que pesquem nas águas territoriais portuguesas.
Para a comissão de pescarias.
Telegramas
De José Luís e Jaime Carlos, de Pampilhosa da Serra, protestando contra actos do administrador do concelho.
De Arnaldo Gascão, de Chaves, pedindo protecção para as pretensões dos estropiados da Grande Guerra.
Do Centro Comercial do Pôrto, pedindo para serem revistas pelo Parlamento as propostas de finanças.
Para a Secretaria.
O Sr.. Presidente: — Está aberta a inscrição para antes da ordem do dia.
Pediram a palavra vários Srs. Deputados.
Antes da ordem do dia
O Sr. Rodrigues Gaspar: — Sr. Presidente: sou forçado a tratar hoje nesta Câmara de alguns assuntos relativos à pasta das Colónias e que, após uma discussão travada ontem no Senado, me obriga realmente a fazer algumas observações.
Tendo pedido a comparência do Sr. Ministro das Colónias devo começar por agradecer a S. Ex.ª o ter comparecido a esta parte da sessão para ouvir as considerações que tenciono fazer.
Antes, porém, de entrar nas considerações de ordem geral, eu solicito de S. Ex.ª a seguinte informação: o que há sôbre a nomeação de um administrador da Companhia de Moçambique por parte do Govêrno?
Depois da resposta do Sr. Ministro das Colónias, peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, para continuar no uso da palavra.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferreira): — Diz que é com certeza de boa tática parlamentar, pelo menos sob o ponto de vista do Sr. Deputado interpelante, que, seni anunciar interpelação, se faca uma pregunta e se peça uma resposta.
Coloca mal o interpelado e, bem assim) o interpelante.
Mas aceita o caso tal como lhe é apresentado, porque não pretende tirar nenhum efeito, nem político nem de qualquer outra ordem, do assunto e, apenas, justi-
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ficar ou, melhor, formular uma resposta nos termos mais comedidos que lhe fôr possível, em harmonia, de resto, com a forma como foi feita a pregunta.
Antes, porém, de iniciar a resposta devo fazer um pequenino preâmbulo que mais não seja para mostrar à Câmara que já esperava a pregunta como espera o que se lhe vai seguir, segundo presume.
Dizem aqueles viajantes e pessoas que do assunto trataram, que os peles vermelhas, quando pretendiam declarar guerra a uma tríbu adversa, lhe mandavam espetar uma seta numa casca de árvore do território da tríbu inimiga, seta que era acompanhada de vários objectos de significação simbólica e que representam o totem, o escudo, o brasão da outra tríbu.
Há muito tempo que encontra setas na porta do gabinete, nos corredores do Ministério o da Câmara, e até na imprensa, de modo que a declaração de guerra (Apoiados) estava feita, e sôbre êsse ponto estava precavido, pois só as setas e os totens...
Uma voz: — Antes isso!...
O Orador: — Mas para completar o simile, dirá que recebeu também já emissários que o preveniram da parte da maioria que se êle, orador, fizesse determinada cousa que a êste assunto se prende, a guerra rebentaria na passada segunda-feira.
Levou dois dias a demora.
Iniciou-se ontem no Senado com uma, escaramuça, e aceita as cousas como elas são, sem prazer, é certo, mas também sem embaraço nenhum.
Apoiados.
Aceita-as como elas são postas.
Apoiados.
O Sr. Rodrigues Gaspar (interrompendo): — Eu não pus a questão nesse pé!...
O Orador: — S. Ex.ª fará o que entender. Como teve informação de que da maioria democrática lhe queriam fazer guerra, tem o direito do tirar como conclusão que começaram as hostilidades.
Sabe S. Ex.ª, o Sr. Presidente, e a Câmara, que esto Govêrno foi nomeado no dia 15 do mês passado.
Estava, êle orador, no Ministério das Colónias, não pode precisar a hora, mas diga-se pelas sete horas da tarde, e recebeu das mãos do seu ilustre antecessor a pasta das Colónias.
No dia seguinte, depois do meio dia, estava no Ministério e foi informado de que um funcionário dêsse Ministério, que exercera as funções de chefe de gabinete do seu antecessor, estivera ditando a uma empregada um decreto.
Achou o caso um pouco estranho e como na informação se precisassem nomes, horas e local, êle, orador, que gosta de andar direito, e que não aceita fàcilmente certas situações desagradáveis ou humilhantes que lhe queiram impor (Apoiados), aguardou que o decreto lhe fôsse apresentado e, para que o não deixasse de o ser, deu ordem para que todos os diplomas que tivessem de ir para o Diário do Govêrno lhe fossem mostrados, e aconteceu que o único que não tinha ido foi precisamente o tal decreto que mandava nomear o bacharel José Domingues dos Santos para o cargo de administrador da Companhia de Moçambique.
Nestes termos, fez o despacho que o caso impunha.
O Sr. secretário geral em cumprimento da ordem por êle, orador, dada e baseada numa informação que está junta ao processo e se encontra ao dispor da Câmara — e crê que está nas suas atribuïções mandar publicar no Diário do Govêrno todos os documentos para se tornarem públicos — em cumprimento da ordem, dizia, que deu ao Sr. secretário geral, fez expedir uma comunicação para que prestassem esclarecimentos alguns funcionários cujas respostas passa a ler.
Abstendo-se de qualificar os termos da última resposta lida, lê seguidamente o relatório do secretário geral e pede à Câmara que note os seguintes factos: no dia 16 de Novembro, o Ministro das Colónias era êle, orador.
Nesse dia, no seu gabinete, sem sua ordem, ou conhecimento, foi lavrado um decreto, nomeando determinado indivíduo para certo lugar.
Não pode aceitar semelhante acto pela forma por que foi levado a efeito.
O discurso será publicado na íntegra revisto pelo orador, quando, nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram evadas.
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O Sr. Rodrigues Gaspar: — Agradeço muito penhorado a resposta dada pelo Sr. Ministro das Colónias e começo por prestar algumas informações a S. Ex.ª
Não costumo fazer interpelações sem mandar aviso prévio.
Não formulei uma, interpelação sôbre qualquer assunto de modo que fôsse necessário ao Sr. Ministro compulsar sequer documentos. S. Ex.ª trazia bem na mente qualquer acto que tivesse cometido e isso bastaria, como resposta, à minha pregunta.
Era o que havia acêrca de uma nomeação e S. Ex.ª ou podia resumir e dizer: não está ninguém nomeado ou vou nomear alguém.
É o que fez S. Ex.ª, de uma maneira muito detalhada; e que não foi apanhado de surpresa prova-o a circunstância de S. Ex.ª já vir munido de documentos.
V. Ex.ª viu, não houve aqui qualquer pregunta de algibeira, ou para tirar qualquer efeito do que S. Ex.ª disse.
Devo desde já declarar não ter o menor fundamento a suspeita dó que o meu pedido de palavra para tratar dêste e de outro assunto que vou referir linha por fim enviar qualquer seta quer contra S. Ex.ª o Ministro das Colónias, quer contra o Govêrno.
É preciso que as questões se esclareçam e precisamente porque ainda desejo ver claramente.
Eu é que formulei a pregunta, esperando pela resposta respectiva, a que vou responder, se a minha voz permitir que a resposta se possa fazer ouvir da Câmara, para cuja benevolência apelo, em virtude do meu estado de saúde.
Explicarei que, se pedi a palavra hoje, é porque, visado ontem no Senado, só posso defender-me nesta casa.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferreira): — Não fiz no Senado amais ligeira alusão a êste facto.
O Orador: — Mas a respeito de outro despacho, de que vou ocupar-me, devo dizer à Câmara que sempre nutri pelo ilustre Ministro das Colónias a máxima consideração, derivada não de relações que me não honro de ter com S. Ex.ª mas porque aqui na Câmara tive oculto de ver que, quando tratava de qualquer assunto, era de uma forma muito concreta.
Eu com todo ò prazer entreguei a pasta, fazendo os cumprimentos que é costume fazer, mas que eu fiz não pró forma, porque não costumo dar-mo a essas jesuitadas, mas fi-lo porque o senti, pela muita consideração que tenho por S. Ex.ª, e disse o que sentia.
Depois S. Ex.ª pediu-me para que eu marcasse um dia pura o pôr a par do que se passava no Ministério. Eu respondi que estava sempre ao dispor de S. Ex.ª para lho dar os esclarecimentos que me pedisse. Mais tarde, encontrando S. Ex.ª na rua do Ouro, eu disse a S. Ex.ª que no dia 16 estava ao dispor de S. Ex.ª, mas S. Ex.ª acrescentou que nesse dia não podia ser por ter Conselho de Ministros.
Como a Câmara vê, não houve entre nós senão relações de mútua consideração.
Se havia dúvida sôbre qualquer ponto, era natural que, pelo correio, pelo telégrafo, por qualquer meio usado, se viessem pedir explicações, mas nunca apresentar o caso como S. Ex.ª o apresentou sob o aspecto de escândalo. Não se fazia isso se houvesse a mínima consideração pelo Ministro antecessor.
Apoiados.
Não apoiados.
Nem ao menos houve consideração pelo Chefe do Estado.
Apoiados.
Não apoiados.
Àpartes.
O Sr. Carvalho da Silva: — Se houvesse respeito pela Constituïção, nem isso se teria feito.
O Orador: — V. Ex.ª respeita muito a Constituïção.
Risos.
Não há nada como pôr as cousas como elas só passaram, e eu gosto sempre de tudo claro.
Vamos aos factos: deu-se uma vaga na administração da Companhia de Moçambique aí por meados de Outubro.
Seria irrisório que eu, para nomear um administrador por parte do Govêrno, levasse até ao dia 16 Para quem pensar bem e já tenha sido Ministro, sabe como estas cousas se passam.
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O decreto não foi à assinatura no dia 3 por não ter ido na pasta. Foi no dia 10 à assinatura do Presidente da República.
Seguia-se depois o referendum. Reconheci então que não tinha sido cumprida a ordem que eu dera e não vinha o nome que eu marcara.
Vários àpartes.
Reconheci que não tinha sido êsse o nome que indicara.
Nunca gostei de, em qualquer documento que tem a assinatura do o u trem. fazer alterações sem que essa pessoa tenha conhecimento da referida alteração.
Já no tempo da monarquia isso se fazia e por sinal apanhei uma descompostura de um Ministro por não ter querido rasgar um decreto que tinha a assinatura do Chefe do Estado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (interrompendo): — Se V. Ex.ª tivesse feito agora o mesmo, não teria sucedido o que sucedeu; não teria havido falsificação.
O Orador: — V. Ex.ª não tem o direito de falar em falsificações.
Eu poderia riscar o nome e pôr a ressalva ao lado, é assim que se tem feito, mas, como se tratava de uma cousa grave, eu levei o decreto ao Chefe de Estado para o substituir.
Eu conto: quando referendara o decreto, deu-se pelo êrro e logo me pus em comunicação com o Chefe do Estado, e S. Ex.ª disse-me que fizesse outro porque igualmente o assinaria. Isto passou-se na tarde do dia 15 e dei ao chefe do meu gabinete ordem para se fazer novo decreto.
Estou convencido de que não haverá ninguém que venha fazer afirmações sôbre palavras do Chefe do Estado, que não fossem verdadeiras.
O meu chefe de gabinete não deu nesse dia execução à minha ordem por ser feriado, mas sim no dia seguinte.
O decreto com a assinatura do Sr. Presidente da República está aqui para que a Câmara saiba.
Eu pregunto: o que há nisto de extraordinário?
Dias depois de serem exonerados os Ministros, e, quantos decretos não são referendados? Eu tenho em minha casa um volume deles.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferre rã) (interrompendo): — Fui eu quem lhos enviou!
O Orador: — Êstes casos, Sr. Presidente, só podem impressionar aqueles que estão alheios a tais factos.
Sr. Presidente: eu nunca temi a verdade, amo-a sobretudo quando se tem a consciência tranquila de bem proceder.
Não há que temer a verdade, antes pelo contrário, Sr. Presidente, tenho um grande prazer em expor à Câmara a verdade tal como ela é.
V. Ex.ªs devem compreender muito bem quanto é ridículo o facto de se dizer que se foz um decreto, a que eu poderei chamar uma cópia.
Sr. Presidente: para mostrar à Câmara como tudo isto é extraordinário, basta indicar lhe a forma como o inquérito foi ordenado, o que é verdadeiramente extraordinário.
Eu devo dizer, mais uma vez, que as minhas considerações não têm por objectivo derruir a estabilidade do Govêrno, antes pelo contrário, e a êste respeito seja-me permitido fazer umas leves considerações para servirem de base ao meu modo de proceder.
Estamos em presença de um equívoco, sem dúvida, pois que se disse ao Chefe do Estado que os nacionalistas estavam aptos para governar, quando nós estamos num País de regime parlamentar, reconhecendo todos nós que o Partido Nacionalista não tinha, nem tem, os meios parlamentares constitucionais para governar.
Ter os meios para governar, Sr. Presidente, não é somente dispor de homens com toda a sciência para governar; é necessário dispor de outros meios para poder efectivar essa administração, e êsse modo é apenas o apoio parlamentar.
O que se vê. Sr. Presidente, é que isso foi uma figura, que nem chega a ser de retórica.
Mas, Sr. Presidente, apesar de tudo isto, apresentou-se um Govêrno que bem pode dizer-se filho de uma figura tolerada, pois a verdade é que, Sr. Presidente, todos poderão dizer que estão aptos para governar, muito embora não tenham os meios indispensáveis para governar.
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Sr. Presidente: eu não tenho em mira atacar o Govêrno, pois o meu desejo é apenas referir-me a alguns pontos da declaração ministerial.
O Sr. Presidente: — Devo prevenir V. Ex.ª de que são horas de se passar à ordem do dia.
Vozes: — Fale, fale.
O Orador: — Sr. Presidente: o que é um. facto é que, numa hora grave para a administração pública, houve um movimento pouco vulgar no Ministério das Colónias, dir-se-ia até que parecia que os lobos tinham descido ao povoado.
Entraram pelo Ministério, e em todas as repartições, para ver se lá podiam encontrar alguma cousa extraordinária.
Isto passou-se numa sexta feira, em vésperas de um sábado, por isso que se dizia que na segunda-feira o Partido Democrático atiraria abaixe o Govêrno. É aproveitar emquanto é tempo!
Risos.
Estamos em vésperas de sábado e é preciso andar depressa!
Risos.
Se não há lugares, salvemos ao menos algum correligionário que haja por aí entalado.
E então para salvar a situação apontava-se o processo dum funcionário que o Ministro anterior demitira.
Venha de lá imediatamente o processo!
Risos.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferreira): — Estou ouvindo V, Ex.ª corn muita atenção!
O Orador: — Eu não culpo V. Ex.ª Não foi V. Ex. a que foi baralhar tudo isto.
Risos.
Se Aponto à Câmara êstes pequenos casos é porque o entendo necessário para a história dos acontecimentos. É porque reputo, curioso saber-se o motivo de toda esta azai ama em volta de uma vaga que já se tinha dado há bastante tempo. E qual foi, afinal, êsse motivo?
É simples.
Foi porque o chefe do Gabinete do Sr. Ministro das Colónias não quis perder aquilo que julgava ser uma excelente conveniência.
Esta afirmação foi-me dada na Rua do Ouro por um correligionário de S. Ex.ª, naturalmente para poupar o seu comentário de que tal não poderia suceder, visto que já tinha um candidato.
Risos.
Eu não sei se o actual chefe do Gabinete do Sr. Ministro das Colónias é ou não meu correligionário; eu tenho tantos que nem os conheço.
O que sei é que, quando foi do Govêrno de Pimenta de Castro, êsse cavalheiro se salientou no Ministério do Interior pelos seus vivas ao ditador, naquela época em que os monárquicos gritavam no seu jornal: «general vista a farda; general ponha a espada!»
Risos.
Mas sei, também, que depois do 14 do Maio, o chefe do Gabinete do Ministro das Colónias era precisamente êsse cavalheiro dos vivas ao general.
Risos.
Sr. Presidente: eis, ràpidamente, a trajectória de toda esta questão.
Há factos que, considerados isoladamente, pouca ou nenhuma significação têm, mas que encarados em conjunto estabelecem uma base de doutrina a que podemos chamar a sciência aplicada.
Assim, é preciso ligar todos êstes factos, formar com êles um grupo de doutrinas para se poder ver como encapotadamente se pretende fixar um verdadeiro programa invisível de governação pública.
Há um facto que é já do domínio público: a demissão do Governador da Guiné que é democrático.
Como foi dada essa demissão?
Por deferimento do pedido de exoneração dirigido por êsse governador ao Ministro das Colónias, que o fez — di-lo S. Ex.ª — deveras contristado por se tratar de um indivíduo que tinha sido seu condiscípulo.
Perdoe-me S. Ex.ª, mas eu no seu lugar teria procedido doutra maneira para com o meu amigo e antigo condiscípulo.
Eu tê-lo-ia chamado, ter-lhe ia preguntado se êle tinha perdido a cabeça e, depois duma ligeira troca de palavras, demovê-lo-ia do seu propósito.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferreira): — Ter-lhe-ia mesmo pedido desculpa!
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O Orador: — O que é facto é que o secretário é mais outro autor do diversas proezas, num processo muito curioso que foi ràpidamente resolvido.
Encontramos reünido o verdadeiro corpo do doutrina.
O governador da Guino, Sr. Velez Caroço, é um homem a quem a nossa província da Guiné deve os mais altos serviços.
Apoiados.
E um oficial com grande vontade de acertar e trabalhar, procurando por todos os meios desenvolver a província e conseguiu-o.
Apoiados.
Merece de todos nós a mais alta consideração pelos seus serviços, porque, devo dizer-se, vários estrangeiros e muitos que visitaram a Guiné prestaram a êsse oficial o melhor preito de homenagem. Apoiados.
Mas êsse oficial foi, realmente, aqui muito discutido a propósito dum processo dum secretário do govêrno por faltas que tem cometido para com êste governador, mas que êle por virtude de ordem do Ministro mandara sindicar.
Tem Cs to secretário alta protecção, e por isso o governador foi atacado.
Alegando o governador no seu requerimento que não tinha os meios de manter a disciplina na província da Guiné, apresenta a sua exoneração.
Diz o Sr. Ministro das Colónias que êste facto representa uma desconfiança aos seus actos.
Devo dizer que o governador da Guiné nesse requerimento estava bem convencido de que a disciplina não podia ser mantida; eu não.
Hoje, porém, reconheço que S. Ex.ª tinha razão nos argumentos apresentados no seu requerimento.
Sem mais troca de explicações foi dada a exoneração ao governador imediatamente.
Ao mesmo tempo mandava-se ver um processo já resolvido pelo Ministro, e dava-se um novo castigo (Apoiados) por faltas das, mais graves que se podem assacar a um funcionário de alta posição.
Não apoiados.
Apoiados.
Não tinha autoridade, nego-lha por completo, o Sr. Ministro das Colónias de examinar êsse decreto de exoneração: o funcionário recorreria para o Supremo Tribunal Administrativo.
Apoiados.
Não está, repito, na alçada do Ministro analisar um decreto de que ninguém pode recorrer. Assim se demonstra que os homens mais ponderados, homens do estudo, homens que meditam antes de lançar qualquer parecer, quando vão para as cadeiras do Poder perdem a noção das cousas o se julgam senhores absolutos.
Portanto pregunto: quem é que está na boa doutrina? Quem é que está em desacôrdo com a declaração ministerial?
Seria eu que exonerei um funcionário prevaricador (Não apoiados do Sr. Ministro das Colónias) ou é S. Ex.ª que abusando da ranis alta posição, assim procedo?
Julgo ser verdadeira ima entrevista dum jornal em que o Sr. Presidente do Ministério dizia que tinha feito o seu Ministério tanto a pressa — e eu estou de acôrdo — (Risos) que até para não ir acordar o Sr. Presidente da República se tinha pôsto a jogar. Imaginei que isto era uma forma de pôr em evidência a rapidez com que só formavam Ministérios, mas agora vejo que há um Ministro que protege o jôgo.
O Sr. Carlos de Vasconcelos (interrompendo): — Há outros Ministros que o protegem, ainda mais.
Mas não são dêste Ministério.
Se querem os nomes posso dizê-los.
O Orador: — Há até um processo volumoso.
Havia um alto funcionário que jogava a batota com outros funcionários.
Foi confessado por êle próprio.
Mas foi reintegrado nas suas funções.
Isto é moralizar?
Não, isto é desmoralizar a administração pública.
Apoiados.
Afirmar-se que se punem os cúmplices e premiá-los assim, é o próprio Govêrno a pôr-se em desacôrdo contra o que vem defendido na declaração ministerial.
Sr. Presidente: quero confessar que nunca imaginei que certas acções se
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exercessem no Ministério com tanta persistência, de modo a evitar que os processos chegassem às mãos do Ministro.
Por diversas vezes ordenei que o processo me fôsse entregue para eu o estudar. Nunca o recebi e até ultimamente, chamado o funcionário que o tinha em seu poder, disse-me imediatamente: vou já buscá-lo. Mas não mais apareceu com o processo.
Todavia êsse processo aparece logo que o actual Govêrno toma posse. Agora é que eu, ligaudo os factos, vejo tudo que se estava passando.
O Sr. Carlos Pereira, chefe do Gabinete do Ministro das Colónias, que foi governador da Guiné, não é pessoa estranha ao secretário do Govêrno da Guiné, Sebastião Barbosa, nem também ao Sr. Bastos Pinto. As relações que existem entre êles é que podem realmente levar à conclusão de que, de facto, tudo se procurou fazor para que fôsse logo exonerado o governador Sr. Velez Caroço e que dos dois processos importantes que estavam no Ministério, um, já resolvido, fôsse anulado com q decreto de exoneração do governador, e o outro, contendo crimes, fôsse anulado por completo, dando-se 34 contos ao autor das façanhas que do mesmo processo constam.
Quero ainda fazer justiça ao Sr. Ministro das Colónias, declarando que estou certo de que S. Ex.ª, sabendo da relação de certos factos, não, teria despachado como despachou.
Há anos foram pedidas umas concessões de terrenos na Guiné.
Em última análise, essas concessões não foram feitas, alegando-se a razão de não existirem terrenos livres. Era tudo explorado pelos indígenas.
Quem assim falava era o governador Sr. Carlos Pereira, então no exercício daquelas funções na Guiné. Mais tarde houve novo podido de concessão dos mesmos terrenos, que não foi atendida, porque, assim foi dito, subsistiam as razões pelas quais se havia negado satisfação aos pedidos anteriormente feitos.
Passa-se tempo, e sai do govêrno da Guiné o Sr. Carlos Pereira. Então é êle próprio que requere 25:000 hectares de terreno, exactamente daquele terreno que S. Ex.ª informara que estava todo explorado pelo indígena,
Quem informava favoravelmente a pretensão do Sr. Carlos Pereira?
O encarregado do govêrno, Sebastião José Barbosa, o actual secretário, que eu exonerara pelo facto apontado de jogar a batota.
Quem informava a mesma pretensão, como chefe de circunscrição?
O Sr. Bastos Pinto.
Êste indivíduo é aquele sôbre quem pesa o processo de que constam crimes, e que foi anulado.
Nos factos passados não há que notar apenas a circunstância de recair informação favorável sôbre o pedido de concessão de terrenos que anteriormente haviam sido negados pelo peticionário, quando governador, sob o pretexto de estarem todos explorados. Há que atender-se também à circunstância de o peticionário ter passado procuração para tratar desta questão ao próprio chefe da circunscrição, Sr. Bastos Pinto.
Sr. Presidente: o governador, Sr. Caroço, protestou contra êstes factos, e veja V. Ex.ª se, ligando-se todos êles, não chegamos realmente à conclusão de que se favorecem as imoralidades.
E veja a Câmara que sou eu, Deputado da oposição, quem está defendendo a declaração ministerial, que foi atacada por um membro do Govêrno que a apresentou.
Sr. Presidente: não serve para mim o argumento de que o Ministro despachou sôbre um parecer dum conselho de disciplina, visto que já não sou novo e já passei pela pasta das Colónias várias vezes.
A República é prejudicada não tanto pelo excesso de funcionários, como pela ruindade dum grande número dêsses funcionários.
Isso é que revolta aqueles que amam a República por princípio. É que neste país não se fala senão em roubos; mas, por mais sindicâncias que se façam, não se encontra nunca qualquer culpado.
Sr. Presidente: quando uma vez fui para o Ministério das Colónias toda a gente apontava que havia um director geral que tinha cometido graves faltas, mas que nenhum Ministro se atrevia a mexer-lhe, tais eram as protecções de que êle gozava.
Quando o respectivo processo chegou às rainhas mãos notei que o conselho
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disciplinar, composto pelos directores gerais, apenas lhe aplicava a pena de 120 dias de suspensão.
Estudei o processo, e, apesar de se tratar da opinião dum conselho disciplinar, fiz os considerandos devidos ao meu despacho e dei-lhe a demissão, porque era assim que devia proceder para moralizar a administração republicana.
Apoiados.
Não me servi da benevolência que todos apontam, e que realmente tem sido um dos nossos males; não me servi dessa benevolência porque sei que nem todos podem resistir a essa dualidade que há dentro do mesmo indivíduo: um eu em que o coração nos indica que sejamos compassivos, e outro eu que nos diz que temos deveres a cumprir e que isso é mais alto que os rebates do coração.
Doutra vez que fui para o Ministério das Colónias tive conhecimento de que alguns lobos também haviam descido ao povoado e quiseram arranjar lugares de comissários do Govêrno junto de emprêsas que nada tinham com o Estado. Mandei buscar o processo; eram 29 lugares, a que eu chamei a minha peruada, por o caso ser próximo do Natal, e foi duma vez uma peruada, pois mandei a respectiva exoneração para a Presidência da República.
Criei assim inimigos, mas cumpri o meu dever.
Apoiados.
E por isso não me venham dizer que o parecer dum conselho disciplinar deve seguir-se. Êle deve ou não seguir-se conforme a moralidade do caso e os interêsses do Estado.
E por estas e outras que nós vemos a cada passo os mais criminosos desejarem a queda dum Govêrno, porque dizem: «Não, com êste Ministro não se faz nada, esperemos por outro». E é por isso que temos caído neste descalabro da administração pública.
Sr. Presidente: vou terminar as minhas considerações, agradecendo a amabilidade da Câmara em me ter escutado. Simplesmente quero ainda dizer que não se deve explorar com a situação do Partido Republicano Português. Êle tem dado e está dando as maiores provas de patriotismo.
Apoiados.
Se quisesse deitar o Govêrno a terra, tinha-o feito no primeiro dia da sua apresentação, e se aqui, numa votação a que assisti, o Govêrno teve maioria de dois votos, isso deve-se, digo-o com íntimo prazer da minha alma, à votação de quatro monárquicos.
Não, o Partido Republicano Português é claro nas suas afirmações. Não há que estar à espera que êle envie setas; não, nem eu aqui usei da palavra para dirigir as setas a que se referiu o Sr. Ministro das Colónias; foi simplesmente para defender um acto meu em virtude do que se tinha passado na outra Câmara e para pôr a claro o que são actos de administração.
Sr. Presidente: quando um partido tem a maioria que o meu tem, não se negando a governar, mas indicando a união de todos, e suporta um Govêrno contra a sua indicação, é porque é um partido que põe acima dos seus interêsses os da República.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A Câmara viu há pouco que eu interrompi as considerações do Sr. Rodrigues Gaspar quando tinha passado o período de antes da ordem do dia. Porém a Câmara entendeu que S. Ex.ª podia continuar a usar da palavra com prejuízo da ordem do dia. Agora o Sr. Ministro das Colónias pediu a palavra para responder àquele Sr. Deputado. Entendo que a Câmara lògicamente permitirá que S. Ex.ª possa usar da palavra.
Apoiados gerais.
Tem a palavra S. Ex.ª
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferreira): — Sr. Presidente: razão tinha eu quando interpretei o significado das setas. Era a declaração de guerra.
Sôbre êste caso que claramente expliquei, abstendo-me de comentários, do decreto de nomeação do Sr. José Domingues dos Santos, bordou-se, como tinha sido anunciado, uma série de considerações, feitas pelo Sr. Rodrigues Gaspar, meu antecessor na pasta das Colónias. E S. Ex.ª, que começou por dirigir-me algumas amabilidades, para que eu não tivesse
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ilusões sôbre o acto do guerra que êle estava praticando, levou a sua impetuosidade, digamos, até ao ponto de me acusar do protector do batoteiros
Está bem. Ensinaram-me na gramática latina que «nos termos em que se faz a pregunta, e que só dá a resposta», e assim era justo que eu, descendo ao terrapleno para onde S. Ex.ª me chamou lhe respondesse com outro caso, mas quero guardar a necessária serenidade, quero manter-me quanto possível no campo, dos factos, sem deixar, porém, de sublinhar com os necessários comentários algumas das afirmações de S. Ex.ª
O Sr. Rodrigues Gaspar, a propósito do actos que praticou e de outros que S. Ex.ª imagina que pratiquei ou deixei de praticar, foi robuscar e remexer toda essa verrina, ou todas essas acusações vagas, infundadas, a maior parte delas caluniosas (apoiados das direitas e não apoiados das esquerdas) que surgem da intriga que floresce exuberantemente nas possessões ultramarinas.
Também já estivo nas colónias o também, já vi como essa vegetação cresço exuberante, o conheço também, embora não os provasse, os fructos amargos que da dá. Foi pena que S. Ex.ª, fazendo-mo uma interpolação não anunciada, viesse aqui desfiar um rol de acontecimentos a que eu felizmente posso responder porque, conhecendo certos processos, tive o cuidado de me acautelar.
Sr. Presidente: fez S. Ex.ª comentários acompanhados por várias pessoas com gargalhadas, e disse que em dois anos tinha moralizado o que eu em quinze dias desmoralizara.
O que admira é que S. Ex.ª nesses dois anos não castigasse.
Apoiados.
O Sr. João Camoesas: — A opinião pública é que há-de fazer justiça.
Vários àpartes.
O Orador: — O Sr. Rodrigues Gaspar acusou-me e eu tenho o direito de me defender, ruas peço o favor de me deixarem falar.
Vários por ordem para não fazer conclusão.
Certas pessoas dotadas de grande habilidade parlamentar têm o costume de diluir, do emmaranhar os factos capitais, para formularem hipóteses e darem um aspecto muito diferente ao caso e desvirtuarem os factos.
Ora não fui eu que vim para a praçae pública, nem para a tribuna apontar factos que decerto modo oram desprimorosos e colocavam mal o Sr. Rodrigues Gaspar; S. Ex.ª não me merecia isso, o Sr. Rodrigues Gaspar não era Ministro das Colónias no dia 16, a não ser que houvesse dois Ministros das Colónias.
O Sr. Rodrigues Gaspar até ao dia 15 podia praticar todos os actos como Poder Executivo, isto até às 5 horas, mas depois não o podia fazer.
Apoiados.
Haverá um meio fácil de remediar o caso: S. Ex.ª dava-me couta do lapso, chamemos-lhe assim.
Chamemos lapso para não dizer outra cousa.
vá. Ex.ª podia-me ter referido o facto, o então o processo honesto seria eu fazer o decreto o levá-lo ao Sr. Presidente da República para assinar.
Teria sido um desprimor, uma precipitação, mas foi um facto.
Mas repito que não tive o propósito sôbre esta questão de fazer alarme, e quis apenas informar-me do que só tinha passado.
Quanto ao facto apenas tirei conclusões, e não fui eu que o analisei aqui.
Cabe a glória à pessoa que me interpelou.
Há uma cousa curiosa que já ontem notei no Senado: é que em questões de moralidade não têm os membros do Partido Democrático o devido respeito e consideração para com os seus adversários, exigindo, porém, que tenham para com êles todas as deferências.
Sôbre o assunto fez o Sr. Rodrigues Gaspar algumas considerações referindo factos que devem ser verdadeiros porque S. Ex.ª o disse, mas que não tenho meio de verificar.
Os factos que se passaram, e que eu conheço, são da maior simplicidade como a Câmara vai ver.
No dia 16 do mês passado, sendo eu Ministro das Colónias, um funcionário do meu Ministério foi ao gabinete ministerial e emendou um decreto que tinha já a assinatura de S. Ex.ª o Chefe do Estado,
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Eu pregunto se no dia 10 era ainda Ministro das Colónias o Sr. Rodrigues Gaspar.
Êste é o lacto.
Há pouco tive ocasião do dizer «apoiado» finando o Sr. Rodrigues Gaspar afirmou que os ex-Ministros muitas vezes referendam documentos, como já o tem feito e até por lealdade o teria patenteado para eu ver.
Mas êsses casos são muito diferentes dêste.
O caso a que S. Ex.ª se referiu em especial respeitara a um diploma de uma concessão que tinha sido dada ao tempo em que o Sr. Rodrigues Gaspar era Ministro, e Chefe do Estado o Sr. António José de Almeida.
Desejou-se que eu referendasse um diploma, o que recusei, porque nessa data já não era Ministro, e mandei-o a quem de direito cumpria, apesar de se tratar do um atraso da burocracia.
No caso presente, porém, é tudo novo, alo o nome do nomeado.
Estou de acôrdo um que se emendo qualquer êrro do um diploma, uma data mi um urro de redacção, ou uma lei mal citada, mas não se alterando o diploma.
No caso presente a alteração é fundamental.
Trata-se da substituição de um nomeado por outro.
Desejo notar bem o caso para que fique bom esclarecido.
Eu já disse que muitas vezes se usa a habilidade de emmaranhar uma questão em certo número de episódios para a diminuir, o por isso eu estou repetindo a explicação do caso.
O Sr. Rodrigues Gaspar quis dizer que o decreto era regular, e para prova diz que estava assinado pelo Sr. Presidente da República o referendado por S. Ex.ª
Eu tenho aqui outro decreto que vou mostrar a S. Ex.ª e que não teve o destino devido.
O decreto nomeia o Sr. José Domingues dos Santos, membro da maioria, para administrador por parte do Govêrno junto da companhia de Moçambique.
Ainda sôbre o mesmo assunto e para mo colocar mal perante as susceptibilidades republicanas, fez o Sr. Rodrigues Gaspar uma afirmação que chega a ser pueril. Disse S. Ex.ª, à falta do melhor, que eu fiz um inquérito aos actos do Chefe do Estado.
Eu fiz apenas um inquérito aos actor, do funcionários do meu Ministério, e mais nada.
Nesse inquérito provou-se que o decreto foi feito por quem não o poderia fazer: pelo Sr. Rodrigues Gaspar quando já não era Ministro.
S. Ex.ª, depois, desenvolvendo o seu programa do guerra, voltou aqui com o caso do antigo secretário do Govêrno da Guiné, Sr. Sebastião Barbosa.
Sr. Presidente: para êstes casos do disciplina burocrática existo um regulamento disciplinar que foi promulgado pois um govêrno democrático, creio que por iniciativa do chefe do partido, Sr. Afonso Costa.
Sempre que se formulam acusações contra um funcionário, e que essas acusações excedem êstes pequenos incidentes da vida normal numa repartição, faz-se um inquérito que é submetido a um conselho de disciplina, o êsse conselho da disciplina, depois de julgar os factos, estabelece a pena a aplicar.
O Ministro ou se conforma ou modifica essa pena, devendo justificar o sou despacho, que será publicado no Diário do Govêrno conjuntamente com o parecer do conselho do disciplina.
Contra o Sr. Sebastião Barbosa levantou-se, na Guiné, uma campanha que teve pleno desenvolvimento depois dumas eleições de Senador.
Um Sr. Vergilio Cardoso, administrador do circunscrição, formulou contra o Sr. Sebastião Barbosa uma longa sério de acusações, as mais variadas e das mais comprometedoras, se por acaso fossem provadas.
O governador da província da Guiné, no uso das suas atribuïções, mandou proceder a um inquérito, mas a corta altura determinou que se fizesse uma sindicância.
Começou essa sindicância, mas o acusado recorreu para o Conselho Colonial, o Oslo Conselho mandou anular o processo do sindicância, por acórdão de 21 de Maio de 1923.
Todavia ficou subsistindo o inquérito, bem como o processo disciplinar, e o Ministro das Colónias de então, o Sr. Rodrigues Gaspar, nomeando relator um fun-
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cionário do seu Ministério, suspendeu o Sr. Sebastião Barbosa das suas funções com dois terços do vencimento de categoria.
Tudo o que constava do processo de sindicância foi anulado, excepto aquela parte que era objecto do inquérito disciplinar. Êsse inquérito foi remetido ao Conselho de Disciplina, que determinou o seguinte:
Leu.
Sem querer fatigar a Câmara, eu vou ler quais eram as acusações formuladas contra o Sr. Sebastião Barbosa:
Leu.
Cansaria demasiadamente a Câmara se fôsse ler todas as conclusões do processo; mas êle encontra-se no Ministério das Colónias à disposição de todos os Srs. Parlamentares que o queiram consultar.
O Sr. Álvaro de Castro (interrompendo): — Não há uma conclusão donde se infira que a perseguição era decida et motivos rio ordem política?
O Orador: — Sim, senhor.
O Sr. Álvaro de Castro: — Quem nomeou o sindicante?
O Orador: — Foi o Sr. Rodrigues Gaspar.
Sr. Presidente: não compreendo bem a lógica do Sr. Rodrigues Gaspar, mandando submeter processos ao conselho disciplinar, o depois, quando as resoluções dele não lhe convém, mete-as na gaveta, como sucedeu no caso do Sr. Sebastião Barbosa, em que mandou ouvir novamente o governador, que repetiu as acusações que eram falsas.
O Sr. Álvaro de Castro (interrompendo): — V. Ex.ª diz-me se o governador tinha sido acusado por êsse funcionário?
O Orador: — Sim, senhor. O Sr. Sebastião Barbosa, quando ainda secretariava, o Govêrno da Guiné, formulou, contra o governador Sr. Velez Caroço, uma série de, acusações.
O processo foi ao governador para informar, o deu-se um caso singular, que foi o Sr. Rodrigues Gaspar, sem dúvida nos melhores intuitos de justiça, determinar que fôsse enviado o processo ao Conselho...
Sr. Presidente: a lógica seria ter suspendido o Sr. Sebastião Barbosa, pelo inquérito a que se estava procedendo, e o Sr. governador, pelas acusações que lhe eram feitas.
Porém, S. Ex.ª, sem dúvida por ponderosas razões, entendeu que não valia a pena avaliar das acusações feitas pelo secretário e lançou o seguinte despacho:
Leu.
Sr. Presidente: de facto, jogar é um acto punível, e o que admira é que nem o Sr. Ministro nem o governador mandassem instaurar o processo criminal por êste motivo, visto que jogar não é um delito punível pelo regulamento disciplinar.
Isto não se fez, não sei porquê.
Mas, Sr. Presidente, no desejo He ferir sem consideração por pessoa alguma, sem consideração pela pessoa que ocupa o lugar de Ministro das Colónias, e sem consideração pelas pessoas que estão fora desta Câmara, e apenas com o propósito de guerra, o Sr. Rodrigues Gaspar veio falar do chefe do meu gabinete, o meu particular amigo, capitão-tenente Sr. Carlos Pereira.
Sr. Presidente: eu não dei despacho nenhum sôbre pedidos de concessão do Sr. Carlos Pereira e o mesmo não poderá dizer o Sr. Rodrigues Gaspar.
Vozes: — Ouçam! Ouçam!...
O Orador: — Eu não fiz concessão de terrenos ao Sr. Carlos Pereira e o mesmo não poderá dizer o membro da maioria, Sr. Paiva Gomes.
Não assinei o decreto de aprovação dos estatutos da Companhia que explora essas concessões, e o mesmo não poderá dizer o Sr. Rodrigues Gaspar.
Eu tenho a certeza de que S. Ex.ªs não assinavam tais decretos, se Cies não fôssem absolutamente legais.
Sr. Presidente: o meu chefe de gabinete, num movimento de indignação pelo que ontem se passou nesta Câmara, veio hoje pedir-me a exoneração do seu cargo, pedido que não aceitei.
Eu não podia, no curto intervalo do algumas horas, fazer reunir a documenta-
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cão relativa a êste caso; mas já que o Sr. Rodrigues Gaspar acusou sem documentos, creio que também eu posso fazer a minha defesa nas mesmas condições.
No emtanto posso afirmar que os documentos aparecerão.
O Sr. Carlos Pereira foi governador da Guino em 1910.
Eu leio a V. Ex.ªs
Leu.
Como informação devo dizer que êstes povos não consentiram a entrada de brancos e foi necessário fazer uma ocupação militar.
Consultando os documentos, eu verifiquei que o Sr. governador da Guiné, tardiamente, mandou dizer que, se se fizesse uma concessão de terrenos, a população indígena emigraria para a Guiné.
Mas porque vem a propósito dêste caso o Sr. Carlos Pereira?
A explicação é esta: porque constou que eu pensava dar ao Sr. Carlos Pereira uma prova de confiança do Govêrno e uma recompensa dos serviços valiosos que tem prestado à República, e porque estava vago o cargo de delegado do Govêrno junto da Companhia de Moçambique é que eu o nomeava.
Ora porque isto constou é que se fez esta campanha.
Felizmente que o Sr. Carlos Pereira saberá justificar-se, mas julgo do meu dever dizer aqui em sua justiça aquilo que merece.
Chamam a minha atenção para alguns actos praticados pelo Sr. Rodrigues Gaspar; um foi quanto à questão do Sr. Sebastião Barbosa, e o outro diz respeito a um processo que esteve sumido numa gaveta desde 20 de Agosto dêste ano: é o processo do Sr. Manuel Bastos Pinto. Neste caso o Sr. Rodrigues Gaspar esqueceu-se do parecer do conselho disciplinar, e em vez de aplicar a pena meteu o processo na gaveta.
O Sr. Rodrigues Gaspar (interrompendo): — V. Ex.ª está dizendo uma cousa que não é verdade; eu mandei chamar a mim êsse processo.
O Orador: — V. Ex.ª tem razão e peço desculpa de me ter esquecido de uma minudência; de facto V. Ex.ª tinha pedido o processo, mas êle tinha desaparecido.
Pelo que V. Ex.ª acaba de dizer vê-se bem qual a sua acção disciplinadora no seu Ministério.
Eu digo a V. Ex.ªs: realmente tem-me acontecido o mesmo precalço; tenho pedido vários processos o dizem-me que não estão, que foram enviados ao Sr. Rodrigues Gaspar e que ainda não voltaram.
Interrupção do Sr. Rodrigues Gaspar que não se ouviu.
O Orador: — Mas, se os processos não apareciam, os funcionários responsáveis por êsse facto tinham de dar conta deles.
Vou ler a V. Ex.ªs, por muito que os canse e me canse a mim, o parecer do conselho disciplinar sôbre êste processo do Sr. Manuel Bastos.
Peço a V. Ex.ªs um pouco de atenção porque êle é importante e porque destrói aquela fantasia, aliás luminosa e brilhante, do Sr. Rodrigues Gaspar, que pelo visto é hábil em fogos de artifício parlamentar.
Assinam êsse parecer altos funcionários do meu Ministério de que não vale a pena dizer os nomes, porque, tendo eu lançado o meu despacho sôbre o parecer, a responsabilidade das consequências passa a ser minha.
Diz o parecer:
Leu.
Até aqui chegou a minha acção.
O funcionário regressa ao seu lugar e, se lá lhe reconhecerem culpabilidade, renovam o processo, mas organizando-o em termos que não sejam imperfeitos.
Sôbre isto eu não podia fazer outra cousa.
O Sr. Rodrigues Gaspar, ex-Ministro das Colónias, tomou essa resolução £ sabem V. Ex.ªs porquê?
Porque em sua consciência entendeu também não haver motivo para fazer outra cousa senão confirmar estas conclusões, e então teve um rebate da consciência não praticando essa ilegalidade.
Sr. Presidente: eu não desejo embrenhar-me com S. Ex.ª em considerações de ordem política.
S. Ex.ª, querendo ainda ferir o Sr. Carlos Pereira, que nada tem com a questão, veio falar em evoluções políticas. Se S. Ex.ª me dá licença, eu limito-me a dizer que êsse é um assunto sôbre o qual todos temos de estar calados.
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Não vale a pena andarmo-nos a acusar de evoluções políticas. O que fica apurado de tudo isto é que os homens mudam como na canção em que se diz que são volúveis as mulheres.
Acho bem que assim seja, que se acomodem a novas orientações políticas.
Veja V. Ex.ª: já houve um tempo em que estava de relações cortadas com vários membros da maioria e hoje não estou de relações cortadas com nenhum, e até me arrependo de só ter dado tal facto.
A seguir ressuscitou nesta casa, o Sr. Rodrigues Gaspar, o famoso caso da demissão do Sr. Velez Caroço.
Êsse é um dos casos mais típicos duma certa psicologia, se não de todos, de muitos membros do Partido Democrático, isto é, a obrigação dos adversários receberem todas as desconsiderações o a obrigação correlativa de pedirem desculpa.
No dia 16 de Novembro, horas depois de tomar posso e não tendo praticado, como acto ministerial, outra cousa senão o compromisso de honra no Palácio de Belém, e umas vagas o apagadas considerações no acto de posse, entre as quais figuravam, muito sinceramente ditas, palavras de estima e apreço pelo meu antecessor, dizia eu, horas depois do tomar posse recebia o seguinte requerimento, cuja data não posso precisar se é de 15 ou 16 porque está emendada; mas seja 15 ou 16, a data em que êsse requerimento entrou na respectiva repartição foi a 16.
Peço à Câmara que aprecie bem os termos em que está redigido êsse requerimento feito por um governador colonial que está na Metrópole:
Leu.
Sr. Presidente, declaro que li, reli e pasmei.
Pensei então: êste Sr. Velez Caroço será um oficial que fez o curso pouco mais ou menos ao mesmo tempo do que eu, com quem nunca tive muita intimidado, mas que conhecia de vista tendo assim umas reminiscências de escola? Parece que sim, que era o mesmo.
Pensei depois: mas que haveria eu feito para justificar tal requerimento? Não percebia.
Podia dar ao caso duas interpretações, ambas cias conducentes à mesma resolução tomada por S. Ex.ª: ou S. Ex.ªs se sentia doente e fatigado e me vinha confessar publicamente que perdera a confiança na sua acção, quere dizer, que êle próprio desconfiava de si mesmo, ou então que eu não lho merecia confiança.
Em qualquer dos casos ou só tinha um caminho a seguir, deferir êsse requerimento o assim fiz.
Apoiados.
Mas parece pitoresco que só pretendia naturalmente que, ao receber o requerimento que o Sr. Velez Caroço me atirava à cara, chamasse S. Ex.ª e lhe dissesse: venha cá. retiro esto papel, aliás então porque está zangado? Que lho fiz eu?
Era isto naturalmente que se queria que eu fizesse, mas, Sr. Presidente, deixe-mo V. Ex.ª que diga que a essas cousas é que eu me não presto.
Apoiados.
Uma voz: — Nem qualquer Ministro se deve prestar a isso!...
O Orador: — O Sr. Velez Caroço, diz que é êste o seu costumo quando há mudança de Govêrno, e que juntamente com o telegrama de cumprimentos envia o seu pedido de demissão para assim obter do novo Ministro uma ratificação ou uma negação do confiança.
No caso presente, porém, como já tive ocasião de dizer, S. Ex.ª dispensou-se da primeira parte e cumpriu só a segunda. A questão é que êste seu requerimento foi já um cumprimento, e dos bons, embora dado de certo modo, que eu não usaria...
Mas, pregunto: — que sabia S. Ex.ª que eu ia fazer? Sabia isto; que eu ia repor as cousas no verdadeiro pé; que eu ia fazer justiça e que não me prestava a sancionar os actos praticados contra vários funcionários e insistentes acusações, que o inquérito prova que...não estão provados.
Na ocasião não adivinhava mas, pelo que o Sr. Rodrigues Gaspar acabou do dizer o pelo que ontem se disso no Senado, cheguei a essa conclusão. Não fico consolado com ela pelo contrário.
Devo chegar agora àquele ponto um bocadinho grave do discurso do Sr. Rodrigues Gaspar, ponto grave que S. Ex.ª decerto vai explicar, porque, se o não fi-
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zer, tomarei como uma afirmação do pouco apreço em que S. Ex.ª tem a vulgar honorabilidade de que toda a gente se pode gabar.
Disse S. Ex.ª que eu protegia os jogadores. Não vale a pena levantar a acusação. Deixá-la ficar.
Apoiados.
Sôbre o caso do Sr. Bastos Pinto a que já me referi, o cujo despacho citei, bordou o Sr. Rodrigues Gaspar algumas considerações além daquelas a que aludi, o salientou o facto do eu ter mandado pagar, em prémio dos seus maus serviços, uns vinte e sete contos, segundo creio, pois não sei a quantia, nem tenho que saber. Mandei pagar para cumprir a lei. Se êle recebeu vinte e sete contos, foi por que não os recebeu em devido tempo.
E, olhe, Sr. Presidente, tanto pior para êle, pois significa que durante vinte o sete meses esteve individado e vivendo não sei como. E, afinal de contas, porquê? Porque lhe intentaram um processo que correu tumultuado, incompleto e imperfeito.
O Sr. Rodrigues Gaspar, vestindo-se com a túnica do Catão que, do resto, muito bem lhe fica, falou nas durezas de coração que o homem que ocupa uma posição elevada na administração do país deve ter, fazendo apenas justiça. Sem dúvida.
Mas calar o coração não é só para não fazer bem, para não fazer justiça ou para não favorecer os amigos, é também para não perseguir os adversários (Apoiados), para não meter na pasta processos que não lhe convém despachar, porque o despacho para ser feito com consciência e com a tal dureza do coração podia ser favorável aos outros.
Finalmente, pretendeu S. Ex.ª tirar certos efeitos do facto apenas anunciado de eu ter pensado em executar alguns actos que poderiam favorecer o Sr. capitão-tenente Carlos Pereira, antigo governador da Guiné, oficial distinto e que conhece muito bom o Ministro das Colónias.
Eu podia dizer a S. Ex.ª que o caso não é virgem o, assim, talvez o Sr. Rodrigues Gaspar conheça a pessoa que por decreto de 18 de Abril foi nomeada para a Companhia do Cabinda, ou a pessoa, possivelmente a mesma, que foi nomeada, interinamente, para o Caminho de Ferro do Benguela, afora outras pequenas cousas. Mas será S. Ex.ª quem dirá o nome dessa pessoa, só quiser, porque eu não estou para o acompanhar nesse ponto, embora a pessoa visada tenha assento nesta Câmara.
O Sr. Sampaio Maia: — E essas comissões são subsidiadas?
O Orador: — Sim, senhor! Tenho informações de que são subsidiadas.
O Sr. Sampaio Maia: — Fico sciente!
O Orador: — O que eu desejo acentuar é que uma pessoa que tem categoria para exercer o cargo de chefe de gabinete, como o Sr. Carlos Pereira tem, está também à altura do exercer um cargo de delegação do Govêrno junto de uma Companhia, tanto mais que êle tem publicado vários trabalhos sôbre administração colonial e trabalha há muitos anos na Repartição do Cartografia, sendo por todos os motivos um colonial distinto.
O decreto que nomeou o Sr. José Domingues dos Santos não vai para o Diário do Govêrno emquanto eu aqui estiver. Apesar do Sr. Carlos Pereira já me ter feito saber que desistia, ou é que tenciono insistir para que aceito. Se não acertar, outra pessoa irá para lá, da, minha escolha. Só quiserem apanhar a bóia no ar, deitem-me abaixo!
Tenho dito.
Apoiados.
Vozes: — Muito bem.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, houver devolvido as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro que se abra uma inscrição especial sôbre o assumo, que reputamos de grande importância.
O Sr. Presidente: — Vou consultar a Câmara sôbre o requerimento do Sr. Carvalho da Silva.
O Sr. Vitorino Guimarães (sôbre o modo de votar): — Em nome da maioria democrática, declaro que não votaremos êsse requerimento porque achamos abso-
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lutamente desnecessário generalizar a discussão, pois que, dada a categoria das pessoas que discutiram o assunto e a forma como foi debatido, a Câmara está esclarecida e orientada.
Aproveitemos agora o tempo noutros assuntos que exigem muito o nosso exame.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro (sôbre o modo de votar): — Êste lado da Câmara não vota o requerimento do Sr. Carvalho da Silva, porque entende que o Sr. Ministro das Colónias já pôs a questão com toda a clareza e defendeu absolutamente o seu procedimento como Ministro.
Antes de concluir, seja-me permitido congratular-me pelo facto do ex-Ministro das Colónias, Sr. Rodrigues Gaspar, ter sido restituído à sua plena voz.
Risos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — Depois do que foi dito na imprensa, isto é, que a maioria viria, aqui, levantar uma questão perante a qual nenhum Govêrno resistiria, eu julgava que não fôsse essa maioria a primeira a fugir à discussão. Não nos importa isso quanto à defeca ou ataque ao Govêrno; mas salientamos o facto para que o País veja e aprecie.
O orador não reviu.
Seguidamente foi pôsto à votação o requerimento, sendo rejeitado.
O Sr. Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Procede-se à contraprova e contagem.
O Sr. Presidente: — Estão sentados 73 Srs. Deputados, e 13 de pé.
Está rejeitado.
É aprovada a acta.
O Sr. Rodrigues Gaspar (para explicações): — Sr. Presidente: sinto deveras que o Sr. Ministro das Colónias me tenha respondido por uma forma tam agastada que mo pareceu denunciar que S. Ex.ª está muito molestado.
Tornou S. Ex.ª a falar em «lapso» referindo-se ao que eu afirmara ter sido efectivamente uma falta que só por mim e S. Ex.ª o Sr. Presidente da República podia ser remediada.
Disse o Sr. Ministro das Colónias que não tinha a responsabilidade de ter trazido esta questão para a Câmara.
Eu também não tenho interpretes nas Câmaras, e o que apareceu nos jornais também não partiu de inim como se vê pela leitura das notícias, mas partiu certamente do Govêrno.
Disse S. Ex.ª que tinha recebido emissários do meu partido, com respeito a esta nomeação em causa, e eu peço a S. Ex.ª que declare quem são êsses emissários, visto que o meu partido não encarregou ninguém dessa missão.
É preciso serenidade para tratar certas questões e não nos deixarmos levar por paixões, e desde que o Sr. Ministro se referiu ao facto de ter ordenado um inquérito, eu tenho que explicar a minha acção com a verdade nua e crua.
Sr. Presidente: nas minhas considerações não fiz acusações especiais e no que disse; parece que S. Ex.ª não apanhou a razão de ser da minha obra.
Quanto ao governador da Guiné, eu disse-lhe que não fizesse o requerimento que me informou que ia fazer, mas S. Ex.ª teimou e apresentou o requerimento, como se sabe.
Àpartes.
Mais tarde ouvi dizer que havia razão.
Montavam companhias coloniais, e vi que havia ligação entre os factos ocorridos o a transferência, do secretario do Govêrno e doutros funcionários.
Àpartes.
Eu continuo p. dizer que só por más informações S. Ex.ª o Sr. Ministro das Colónias disse o que ouvimos, porque doutro modo julgo-o incapaz de tais afirmações.
S. Ex.ª também afirmou que eu metera na minha gaveta um determinado processo não lhe dando andamento.
É falso.
S. Ex.ª não apanhou bem o que en disse, que, tendo-me alguém pedido que fôsse benevolente com o funcionário em questão, e que, tendo-me outra pessoa dito também que o processo era muito importante, eu chamara o respectivo director
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geral e entreguei-o nas mãos dêsse funcionário, que era o Sr. Santos Monteiro.
V. Ex.ªs compreendem muito bera que o Ministro, tendo muitos assuntos, e importantes, a tratar, não pode esperar que lhe tragam aquilo que pede; no emtanto, quando, de facto, comecei a compreender que havia realmente vontade que o processo não me viesse parar às mãos, mandei chamar à minha presença o próprio Sr. Santos Monteiro, e, tendo-lhe falado sôbre o assunto, êle disse-me que me havia 'de trazer o processo; porém, não mais me apareceu, tendo-se dado o caso de eu no dia seguinte ter feito entrega da minha pasta.
O que posso garantir à Câmara é que, se tivesse continuado na pasta das Colónias, êle havia de me entregar o processo; porém aproveitou-se justamente da minha saída para que o processo não chegasse ao meu poder.
Eu, Sr. Presidente, aponto êste facto para mostrar a V. Ex.ª que na verdade houve a dentro do Ministério a preocupação de que o processo não mo viesse parar às mãos.
O Sr. Minjstro das Colónias, Sr. Presidente, foi duma grande injustiça para com a minha pessoa, falando em perseguições políticas, tanto mais quanto é certo que tenho sempre pugnado contra as perseguições políticas; porém, o que eu vejo com profundo desgosto é que se estão fazendo grandes perseguições políticas ao Partido Democrático, não só no que diz respeito à pasta das Colónias, mas a todas as outras pastas.
Todos sabem, Sr. Presidente, a forma como se está procedendo com os homens dêsse partido, os quais aliás, aqui têm estado a ajudar o Govêrno, discutindo as propostas que aqui tem apresentado, pois a verdade é que se não pode dizer que nós não deixamos governar (Apoiados), e bom será, Sr. Presidente, que se não. abuse dessa circunstância, visto que estamos aqui pugnando não somente pelos mais altos princípios partidários, mas sim também poios altos interêsses do país e da República.
Referiu-se ainda o Sr. Ministro das Colónias a Ministros que fizeram concessões; porém, eu devo dizer à Câmara que não acusei o Ministro por fazer concessões, simplesmente citei factos, e nada mais.
Para outras concessões apareceram informações favoráveis; por consequência, com informações favoráveis, evidentemente que os Ministros tinham de despachar.
O que houve aqui de notar foi a diversidade de procedimento; é que para os mesmos terrenos houve informações em certa ocasião num sentido, e noutras ocasiões em sentido diverso.
O Sr. Carlos de Vasconcelos; — Sete anos depois, modificadas todas as condições.
O Orador: — Sr. Presidente: o que citei foram factos, não atacando Ministros. Apenas o que mostrei foi a legalidade dos factos, o mais nada.
Finalmente, o Sr. Ministro das Colónias disse que eu lhe tinha assacado a responsabilidade ou tinha feito a acusação de proteger jogadores.
Tenho a dizer a S. Ex.ª que nas minhas palavras nunca vai a intenção de ofender quem quer que seja, nem preciso disso para nada. O que tive em vista foi condenar o procedimento dêsse encarregado do Govêrno, que jogava com os sou s subordinados, dando-lhe apenas vinte dias de suspensão. Evidentemente que, dando êsse castigo, deminui-lhe enormemente a pena, não dando o verdadeiro valor a um acto que julgo criminoso perante o Código Penal.
Sr. Presidente: terminarei dizendo ainda que realmente lamento que o Sr. Ministro das Colónias me respondesse duma maneira tam agastada, indo mesmo buscar casos que nada têm com o assunto e ligando a minha atitude de hoje com qualquer cousa que lhe tenham dito de que havia guerra ao Govêrno. Contra isso é que eu protesto, porque, desde que me constou que no Senado só havia afirmado que fora anulado um despacho que eu tinha dado, porque não se achava justo, eu entendi que devia hoje mesmo explicar a minha atitude, e ao mesmo tempo preguntar ao Sr. Ministro das Colónias o que havia a êsse respeito.
Não falei em qualquer inquérito; foi S. Ex.ª quem expôs o assunto à Câmara como melhor entendeu.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Ministro das Colónias. (Vicente Ferreira): — Sr. Presidente: ouvi as explicações que o Sr. Rodrigues Gaspar entendeu dever dar à Câmara.
Na parte em que essas explicações a mim se dirigem, agradeço.
O Sr. Rodrigues Gaspar, ao tomar a palavra para explicações, entendeu formular uma nova acusação, isto é, a do que ou mo tinha agastado.
Nada disso.
Eu não me agastei. Fiz a minha, defesa o melhor que pude, e creio que a fiz bom, porque estou convencido de que a Câmara me dá inteira razão.
Apoiados.
Eu sei que é doloroso, para políticos apaixonados, confessá-lo; mas esta é que é a verdade.
Com todas as suas palavras, o que o Sr. Rodrigues Gaspar não conseguiu destruir foi o facto de no dia 16, quando eu já ora Ministro das Colónias, ter sido feito um decreto que eu não assinei.
Não há habilidades que possam destruir a veracidade dêste facto.
Quando uma questão é;inni posta nos termos em que o Sr. Rodrigues Gaspar a trouxe, o que há a fazer da parte do interpelado é dizer tudo.
Uma voz: — O que não há é o direito do uma sessão perdida por causa de só discutir a legalidade dum emprêgo.
O Orador: — Não fui ou quem trouxe para aqui esta questão, nem sou eu quem quero entrar no caminho de envolver no caso o nome de outras pessoas.
Justificou S. Ex.ª a sua interpelação, alegando o que lera nos jornais.
Eu não disse uma única cousa aos jornalistas.
As cousas que constam do inquérito que mandei fazer foram do conhecimento apenas dos meus colegas de gabinete, do pessoal do meu gabinete e do funcionário do Ministério que fez o inquérito, e ainda das pessoas ouvidas.
Se. o caso chegou aos jornais, tenho tanta culpa disso como S. Ex.ª tem das ameaças e do tantas outras cousas que lá vêm.
Disse ainda S. Ex.ª que o governador da Guino teve razão no requerimento que foz.
Eu admiro muito, realmente, a clarividência que êsse governador teve o a facilidade com que previu os actos que eu ia praticar, mas é-mo lícito preguntar se isso não resulta dum rebato do consciência pelas injustiças cometidas.
Apoiados.
Que o governador na Guino previa as minhas decisões, disse o Sr. Rodrigues Gaspar.
Mas que motivos tinha S. Ex.ª para prever as minhas resoluções, antes de eu tomar conhecimento dos acontecimentos?
Não, o caso não é êsse.
O caso tem outro aspecto e não vale a pena insistir nele.
Relativamente ao facto de ou referir que o Sr. Alfredo Gaspar tinha o processo na gaveta, eu não queria referir-me ao acto material.
É uma imagem que nós usamos para fazer ver que ternos um processo pendente, sem ter despacho: o que não se deu despacho ao processo em questão é um facto.
Queixou-se, porém, S. Ex.ª de que lhe tinham sonegado o processo. Mas no meu gabinete isso não acontece, porque tenho métodos de organização, tomo as minhas notas, tenho a minha agenda, para não ser iludido.
E deixo-me S. Ex.ª que lhe diga que estranho a sua fraqueza. Esteve lá S. Ex.ª dois anos — para bem do País. quero creio — e saiu com esta impressão: que havia funcionários que ocultavam processos, protegiam indivíduos acusados de crimes, e todavia S. Ex.ª não teve tempo, não teve coragem ou paciência para metê-los na ordem.
Pois eu aqui declaro a S. Ex.ª e à Câmara: demore-me eu no Ministério metade do tempo que S. Ex.ª lá esteve, e prometo que Cies entram na ordem, ou cousa grave acontece.
Não posso admitir que o Ministro abdique de tal modo da sua autoridade que seja possível darem-se impunemente os factos de que S. Ex.ª acusou os funcionários do Ministério das Colónias.
Apoiados.
Eu quero antes crer que o Sr. Rodrigues Gaspar não quiz tomar uma decisão, porque ela lhe repugnava ou levava-o a uma violência que se não compadeço com o seu temperamento.
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S. Ex.ª voltou a insistir na sua acusarão do que ou, tendo aprovado as conclusões do conselho disciplinar, deixei impunes funcionários sôbre os quais posavam graves acusações.
Já disse o que tinha a dizer sôbre o assunto.
Dispenso-me por isso, do reeditar as considerações que já fiz em esclarecimento da minha atitude.
Finalmente, S. Ex.ª falou em perseguições a pessoas filiadas no Partido Democrático.
É uma afirmação que, como tantas outras que S. Ex.ª faz carece em absoluto de fundamento.
Onde estão as pessoas dêsse Partido, vítimas da perseguição ou, sequer, duma desagradável justiça do Govêrno?
Quererá o Partido Democrático apontar como uma dessas vítimas o Sr. Caroço?
Mas tal caroço me pertence ao Govêrno, pertenço a êsse Partido, que o engulirá como quiser.
Risos.
O Sr. governador da Guino, saltando por cima das velhas praxes sempre seguidas em tais casos, entendeu que o melhor cartão de cumprimentos a enviar ao Ministro era o documento que lho enviou.
Fez bem? Fez mal? Procedeu conforme as instruções do seu Partido? Não procedeu?
Não sei, nem me importa saber.
O que sei é que o Ministro das Colónias em presença dum tal documento não podia proceder doutra forma.
Apoiados,
O outro caso é o do decreto. Não se trata de perseguições, nada havendo no meu espírito contra o Sr. José Domingues dos Santos. Mantenho com S. Ex.ª vagas relações e deu-se até um incidente em que tive do intervir; mas um dêsses incidentes que nunca produzem divisões entro homens, concorrendo até por vezes para cimentar amizades. Dado êsse incidente, apartámo-nos como pessoas que se respeitam o que, não podendo ser amigas, pelo menos se estimam. Eu é que podia replicar que talvez da parto dos democráticos tenha havido perseguições, mas não valo a pena tornar a insistir em cousas já ditas e reditas.
Um àparte do Sr. Álvaro de Castro que se não ouviu.
O Orador: — O ilustre Deputado e meu amigo Sr. Álvaro de Castro dá-me razão para sustentar a doutrina de que posso anular um despacho pelo qual se lavrou um decreto que não foi publicado, pois que, em quanto se acha na secretaria do Ministério, o decreto é um simples documento de expediente.
Fez ainda o Sr. Rodrigues Gaspar afirmações de natureza política e, embora a política geral do Ministério me não pertença, eu julgo interpretar o sentir dos meus colegas declarando á Câmara que o Govêrno não solicita apoios.
V. Ex.ªs dão êsse apoio porque entendem que o devem dar, podendo negá-lo quando entenderem que o não devem dar. Não mo sustentaria neste lugar um minuto se tal apoio tivesse sido podido. Disse o Sr. Rodrigues Gaspar que estávamos aqui tolerados. Não aceitamos semelhante tolerância.
Apoiados,
Estamos aqui por direito próprio, num lugar que legitimamente conquistámos.
Muitos apoiados.
Quando V. Ex.ªs não estiverem do acôrdo, o caminho está indicado. Não praticamos bravatas, mas também, não mendigamos apoios.
Muitos apoiados.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu,
O Sr. Presidente: — Vai ler-se uma última redacção:
Projecto de lei n.º 476
Que estabelece que nos arrendamentos de prédios rústicos, metade da renda seja paga em moeda corrente e a outra metade em géneros quando exigidos pelo senhorio ou pelo arrendatário.
Aprovado.
Remeta-se ao Senado.
O Sr. Presidente: — As comissões da Câmara dos Deputados acham-se já constituídas. Dispenso-me de fazer a leitura dos respectivos nomes, que amanhã figurarão já na lista das comissões. Os Srs. Deputados poderão consultar êsse livro para verificar se as indicações da Câmara foram respeitadas.
Vai entrar-se na ordem do dia.
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O Sr. António Fonseca: — Peço a V. Ex.ª o favor do informar de quanto tempo posso dispor para usar da palavra.
O Sr. Presidente: — Passou-se agora à ordem do dia.
O Orador: — V. Ex.ª está disposto a interromper a sessão, ou a levar as três horas a seguir?
O Sr. Presidente: — Segundo a disposição regimental, a Câmara consagra três horas à ordem do dia. A Câmara, porém resolverá como entender.
O Orador: — V. Ex.ª informa-me se está alguém inscrito para esta sessão?
O Sr. Presidente: — Além de V. Ex.ª, está inscrito o Sr. Abranches Ferrão.
O Orador: — Se V. Ex.ª tem a disposição de fazer seguir a sessão por mais três horas, entendo não ser possível continuar falando.
Desisto por agora da palavra.
O Sr. Paulo Menano: — Requeiro a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se permite seja suspensa a sessão por tempo suficiente para jantarmos.
É aprovado o requerimento.
O Sr. Maldonado de Freitas: — Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, deu o mesmo resultado.
O Sr. Presidente: — Está interrompida a sessão até às, 21 horas e meia.
Eram 19 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.
Eram 22 horas.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão das interpolações dos Srs. Paiva Gomes e Velhinho Corroía ao Sr. Ministro das Finanças, sôbre a cedência a bancos e banqueiros de 430. 000 libras.
O Sr. Morais Carvalho: — Peço a V. Ex.ª o obséquio do consultar a Câmara sôbre se permite que a sessão seja prorrogada até se liquidar o assunto em discussão. Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.
O Sr. José Novais: — Requeiro a contraprova.
O Sr. Presidente: — Nesta altura já não posso dar seguimento ao requerimento de V. Ex.ª
O Sr. José Novais: — Nesse caso desisto do meu requerimento,
O Sr. Presidente: — Não há mais ninguém inscrito.
O Sr. Ministro das Finanças: — Peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Sr. Presidente: trata-se de um caso de consciência, pois na verdade, Sr. Presidente, repugna-me fundamentalmente que, havendo pessoas inscritas, como por exemplo o Sr. António Fonseca, o os dois apresentantes da questão, os Srs. Paiva Gomes e Velhinho Correia, se encerre assim o debate não estando S. Ex.ªs presentes, se bem que não tenha culpa do facto, pois a verdade é que se a sessão foi prorrogada não fui eu que o requer, nem nenhum dos Deputados nacionalistas.
Repugna-me o facto, Sr. Presidente, se bem que não possa deixar de sentir que a ausência de S. Ex.ªs parece obedecer a um determinado propósito, isto ó, para que se tratem ràpidamente questões que interessam tam fundamentalmente ao país.
Lamento, Sr. Presidente, o facto, tanto mais quanto é certo que eu ainda me lembro das sessões que aqui se realizaram, em que aios não deixávamos de comparecer, conservando-nos até as 4 e õ horas da madrugada nesta Câmara.
Se bem que isto assim seja, repugnante, repito, que só votem as moções que estão sôbre a Mesa, sem que os Deputados que as assinam estejam presentes.
Se o Parlamento quere manifestar por esta forma ao Govêrno o seu alheamento
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dos trabalhos parlamentares, tem o dever de o fazer claramente.
Eu é que não posso dizer à Mesa que, em vista dos Srs. Deputados que haviam pedido a palavra não se terem resolvido a comparecer, a discussão seja encerrada.
Eu não tenho mais nada a dizer ao Parlamento senão isto.
A questão das libras arrasta-se há muito tempo.
Estávamos em sessão prorrogada tratando do assunto, e se V. Ex.ªs querem dar a discussão por encerrada, eu nada tenho com isso, na certeza de que o Parlamento não pode fazer jôgo encoberto contra o Govêrno.
O Parlamento fará as votações como entender, e o Govêrno aguarda os seus resultados; na certeza de que não tem culpa que os Srs. Deputados que se inscreveram não comparecessem.
O Sr. Vitorino Godinho: — Mas V. Ex.ª disse que isto não era uma questão de Govêrno, e sim uma questão aberta.
O Orador: — Mas V. Ex.ª há-de permitir que enjeite completamente a minha responsabilidade pela falta de comparência dos Srs. Deputados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Fausto de Figueiredo: — Sr. Presidente:, eu era uma das pessoas que se haviam inscrito para discutir esta magna e importantíssima quentão, que entendo deve ser apreciada ampla e serenamente.
Porém o Sr. Ministro das Finanças pôs um ponto que é de ponderar por todos nós, e, em assunto desta natureza, não sei se praticaríamos um acto capaz, votando com tam pequeno número de Deputados.
O Sr. Carvalho da Silva: — Mas com êste pequeno número de Deputados não se pode votar.
O Orador: — Se a Câmara entende, não tenho dúvida em me inscrever para apreciar o assunto em discussão, deixando à responsabilidade da minha consciência a razão porque o faço.
Tenho dito.
O Sr. Carvalho da Silva (para um requerimento): — Sr. Presidente: como se trata de uma questão muito importante, e há alguns Srs. Deputados inscritos, requeiro a V. Ex.ª que a sessão seja encerrada e prossiga amanhã a discussão.
O Sr. Presidente: — O requerimento de V. Ex.ª para que a sessão seja encerrada, parece-me não estar dentro das normas parlamentares e regimentais.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: não há o número necessário de Deputados, e o assunto pela sua importância não pode ser tratado com o número de Deputados que estão presentes.
Àpartes.
Assim não deve V. Ex.ª continuar os trabalhos.
Àpartes.
O Sr. Carlos Pereira (sôbre a ordem): — Sr. Presidente: a questão de que se trata é muito importante o grave, e representa interêsses materiais.
Sr. Presidente: os discursos que se têm pronunciado podem dividir-se em dois grupos.
Num dêles têm lugar os que se referem ao aspecto jurídico da questão e que analisam os vários despachos que se lavraram com o fim de defender os interêsses do Estado.
Analisada a questão sob o aspecto jurídico, salientou-se que nem houve acôrdo quanto à natureza dos contratos.
Outras considerações foram feitas em que, deixando-se o aspecto jurídico, se pôs o aspecto moral, o que revelava as intenções do primeiro Ministro que despachou.
Assim nós ouvimos as explicações do Sr. Ministro das Finanças em que S. Ex.ª estranhou, direi mesmo que verberou, o alheamento, numa sessão tam importante, até mesmo dos seus próprios correligionários.
De facto, se à primeira vista parece que há alheamento, não há, pois que Deputados, como o Sr. Velhinho Correia e outros, não estão presentes por não saberem; mas o Sr. Velhinho Correia já mandou dizer que deixava tudo para vir ao Parlamento.
Eu, se falo, não é no sentido de gastar tempo, mas sim para que lá fora não
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se diga que o Parlamento se desinteressa duma questão desta importância o ou. que sôbre o assunto tenho opiniões fornadas que bastam à minha consciência para saber como votar, pedi a palavra par i reconhecer aquilo que o Sr. Ministro das Finanças também tinha reconhecido: que há a necessidade- de sôbre êste assunto incidir um ponderado e — porque não di-zê-lo? — largo debato. Fechar o debate seria desprestigiar-nos. Estou certo de que êle se não fechará porque dentro das disposições regimentais, na invocação oportuna delas em seguida à admissão da moção que vou mandar para a Mesa. eu terei gasto tempo para falar, mas para falar salvaguardando o Parlamento das acusações injustas que lá fora tantas vezes lhe fazem e que talvez agora com aparência de muita justiça lhe pudessem e devessem mesmo ser-lhe feitas.
Mando para a Mesa a minha moção.
Tenho dito.
G orador não reviu.
É lida na Mesa a moção do Sr. Carlos Per fira.
É admitida.
Moção
A Câmara dos Deputados, ouvidas as explicações do Sr. Ministro das Finanças, reconheço a necessidade de sôbre êste assunto incidir um ponderado debate.
Sala das Sessões, 5 de Dezembro de 1923. — Carlos Pereira.
O Sr. Carvalho da Silva (para um requerimento): — Sr. Presidente: requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º do Regimento.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal) (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: não estava prorrogada a sessão, mas teria de haver sessão nocturna. Todos o sabiam e não o ignorava, pelo menos, um dos apresentantes dêste assunto. Não fui directamente prevenido, nem me foi solicitado que por qualquer forma concorresse para que não houvesse sessão, e, no emtanto, os apresentantes da questão julgaram-se dispensados do dever de vir aqui.
Nessas condições, se a sessão fôr encerrada, peço a V. Ex.ª e à Câmara que não considerem como ofensa o facto de eu, amanhã ou depois, tendo afazeres inadiáveis, como tiveram certamente essas pessoas, porventura me dispensar também de comparecer.
Antecipadamente apresento a V. Ex.ª e à Câmara as minhas desculpas, não me cabendo dúvida de que concordarão em que o procedimento que para comigo houve da parte das pessoas a que me referi não pode deixar de ser igualado pelo meu para com essas pessoas.
Um àparte do Sr. Carlos Pereira que se não ouviu.
O Orador: — Evidentemente, julgo que todas as pessoas podiam faltar, menos quem apresentou a questão e o Ministro. Apenas reivindico para o Ministro o mesmo direito que essas pessoas se arrogaram.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que o meu ilustre amigo Sr. Morais Carvalho, que é quem por parte da minoria monárquica se incumbiu de tratar dêste assunto, se retirou por ter constatado não haver número. Só por tal motivo não está aqui, pois que nós não temos por norma vir à Câmara para levantar, questiúnculas o não aparecer para tratar das questões de alto interêsse nacional.
Tenho dito.
O orador mio reviu.
O Sr. Velhinho Correia (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: pela minha parte não me desinteresso desta questão. De resto, desde que fui um dos Deputados interpelantes, não podia desinteressar-me dela.
Simplesmente estava convencido de que não havia sessão esta noite.
Foi esta a razão por que não vim mais cedo; mas, uma vez avisado, apressei-me a comparecer e, se houver número, aqui estarei para continuar a intervir no debate.
Quanto ao Sr. Paiva Gomes, tenho a. dizer que a S. Ex.ª interessa tanto esta questão como a mim. Se S. Ex.ª não está presente, tal facto deve-se apenas à mes-
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ma circunstância por que ou também não estava.
São estas as explicações que eu tinha a dar à Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Sr. Presidente: nesta sessão, tam em família, devo declarar que, se o Parlamento não se dispuser a trabalhar, o acto do aumento da circulação fiduciária terá de ser repetido forçosamente.
Êste procedimento da Câmara, Sr. Presidente, não se justifica de maneira nenhuma, tanto mais quanto é certo que assuntos há e importantes a tratar.
Não posso, portanto, Sr. Presidente, deixar de protestar contra esta atitude da oposição, pois a verdade é que nós, quando na oposição, nunca procedemos de tal forma, estando aqui muitas vezes até às quatro e cinco horas da madrugada.
A Câmara, portanto não se deve admirar, repito, de que eu amanhã, por quaisquer circunstâncias, não possa igualmente aqui vir, o que aliás será de todo o ponto justificável, visto que tenho muitos assuntos a tratar, julgando-me além disso com o mesmo direito a faltar às sessões.
Situações como esta, Sr. Presidente, não se justificam nem mo podem agradar, porquanto govêrnos de simples expediente não convêm à Nação, nem eu na verdade vim para aqui para me sujeitar a tal.
O meu desejo, Sr. Presidente, é trabalhar com o Parlamento, e assim não posso deixar de protestar contra a atitude da oposição, pois, na verdade, dir-se há que S. Ex.ªs se combinaram para aqui não vir, protesto esto que eu igualmente dirijo a alguns Deputados do meu partido..
O Sr. Maldonado de Freitas: — O que eu posso garantir a Ar. Ex.ª é que a mais de um Deputado eu ouvi dizer que já tinham passado a palavra e que não vinham à sessão.
O Orador: — Seja como fôr, o caso é que não tem justificarão alguma a meu ver.
A minha estranheza é para todos os Deputados, quer da maioria quer da minoria.
O Parlamento não tinha o direito de fazer o que fez em face dos meus desejos de trabalhar com êle.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. João Camoesas: — Já há dias que estamos a viver de surpresas de uma mais ou menos disfarçada provocação.
Sabe V. Ex.ª em que condições foi marcada sessão para esta hora da noite: já perto das 19 horas e meia, inesperadamente para muitos Deputados que não estavam na sala, sem que se tenha feito a aplicação do preceito regimental,
O Sr. Presidente (interrompendo): — Eu tenho feito cumprir o Regimento.
O Orador: — Limitei-me a rememorar factos sem nenhum propósito de discutir ou de comentar a forma como V. Ex.ª interpretou o Regimento e a ninguém é lícito tirar ilações políticas dêste facto.
A única cousa que orienta a nossa acção é o sentimento da Pátria.
Não houve, certamente, da parte de qualquer dos Deputados que iniciaram êste debate qualquer propósito político ou pessoal.
A situação é esta: há uma sessão cuja parte destinada à ordem do dia foi posta em discussão quási no fim da hora em que costumam terminar os trabalhos da Câmara. Por essa circunstância, muitos Deputados não puderam ter conhecimento de que havia sessão nocturna, nem modificar a sua vida para aqui comparecerem.
É lícito a cada um de nós dar ao facto a interpretação que quiser.
Pelo Partido Republicano Português posso assegurar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que ninguém conseguirá, sem o nosso protesto, tirar qualquer conclusão política do que se passou.
Eu não quero de maneira nenhuma discutir a estranha teoria que o Sr. Ministro das Finanças desenvolveu em relação à obrigação de comparecer no Parlamento; ela vale os próprios termos em que foi exposta e perderia o seu sabor se eu fizesse algum comentário.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente: sinto, como parlamentar e como português, ouvir pronunciar continuamente as palavras «violências» e «provocações», porque, com infinita amargura, venho verificando que, em 13 anos de República, temos atrabiliàriamente confundido tudo e todos.
E com tanta amargura eu constato êste facto, quanto é certo que o meu espírito de republicano e de patriota impede-me de ter qualquer interêsse que não seja o de contribuir para o bem do País e da República.
Toda a gente enche a bôca de sacrifícios pela causa da República.
Por ela todos sofreram, todos se bateram, todos se sacrificaram.
Eu não quero duvidar da sinceridade de todas essas vítimas do seu ideal, e se não duvido, maior autoridade tenho para reivindicar para mim o direito de me englobar no número daqueles que, de verdade, prestaram à República, todos os serviços de que eram capazes.
Republicano de sempre, tanto nas boas como nas más horas, eu não posso, porém, deixar de confessar â minha profunda amargura pela obra nefasta realizada nestes últimos 13 anos.
É realmente doloroso constatar como a boa vontade é o esfôrço de tantas pessoas animadas da esperança de melhores dias se perderam perante o egoísmo e a ambição dos homens.
Os crimes sucedem se porque a sua impunidade constitui um verdadeiro incitamento.
Verifico, com infinita mágoa, que, tendo a Câmara resolvido, num nobre gesto, uma obra de moralidade republicana, ninguém se lembra já de que, porventura, alguns camaradas tona de ir ao tribunal prestar contas.
Não deixam que se apurem responsabilidades.
Falo em nome da Nação e da República o tenho autoridade para falar aqui e lá fora.
Falo alto, com orgulho e muita coragem, porque o que digo se baseia; em factos, se baseia numa vida inteiramente devotada à causa da República e da Pátria.
Sinto-o profundamente na, minha alma de português e republicano.
O meu protesto veemente vem da minha alma de republicano e patriota. Sinto-me apoucado por indivíduos a quem se costuma chamar prestigiosas pessoas. Chamam-me talassa ou cousa semelhante.
Nunca me importei com êsses epítetos, porque sempre cumpri o meu dever de republicano e de patriota.
Tive ontem ainda ocasião, de ver num jornal umas insinuações que me magoam profundamente.
Apelo para a imprensa do meu País, que julgo ser o porta-voz da opinião pública.
Acusaram-me de ter ontem votado aqui a favor duma certa emprêsa muitos contos, como se a Câmara dos Deputados fôsse capaz,de votar alguma cousa com interêsse próprio.
De resto, tenho a coragem de afirmar bem alto que essa imprensa tinha por dever ser justa e reflectida.
Deve saber que para uma obra progredir, e para que quem ocupar as cadeiras do Poder possa lançar impostos, é preciso que haja matéria colectável, e que em toda a parte: do mundo se dão prémios de protecção.
Todos os povos pretendem hoje bastar-se a si próprios.
Os que estão em civilização atrasada pensam o contrário das garantias a determinadas emprêsas; isto em toda a parte.
E é assim que os Govêrnos, para que a riqueza do País se desenvolva, dão subsídios o garantia de juros, a determinadas empregas.
Assim sucedo em toda a parte.
Em Portugal, na hora que passa, que é mais grave pela circunstância de haver pouca produção, o problema deve merecer todo o carinho dos homens públicos, estimulando os factores de riqueza com prémios de produção.
Só com aumento de produção o País se poderá saber e, portanto, nunca será demais proclamar a necessidade de os Poderes Públicos ligarem ao assunto toda aquela atenção que sempre lhes deverão merecer os problemas que interessam ao ressurgimento nacional.
Muitos mesmo, os que porventura queiram ficar de bem com a sua consciência, tenho a certeza de que me hão-de dar razão inteira e completa.
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Tem-se feito uma obra profundamente negativa, mais: prejudicial e criminosa.
É ver, por exemplo, a portaria, para não lhe chamar a «porcaria», com que num dêstes dias veio pejado o Diário do Govêrno, e que não chegou a ser discutida nesta Câmara, o que é uma cousa monstruosa!
Refiro-me a essa lei sôbre o inquilinato das propriedades rústicas.
A Câmara dos Deputados deixou pasmar um ano sem discutir uma lei desatas!
Basta arranjar um pequeno comércio ou indústria para que imediatamente lhe seja aplicada a lei.
O desgraçado proprietário nunca mais será, senhor da sua propriedade!
Ainda na gerência do Govêrno transacto protestei contra determinada autoridade, porque um homem, que era visado como ladrão, não havia sido processado, visto que o Presidente do Ministério, fazendo ouvidos moucos às considerações que aqui apresentei, consentia na impunidade.
Silo homens que procedem assim, e contra quem apresentam factos fundamentados o concretos, que merecem o apoio e defesa calorosa daqueles que nos acusam de provocadores.
O Sr. Tavares de Carvalho (interrompendo): — Está fora da ordem.
O Orador: — Estou a falar dentro da ordem e tanto que aqueles mesmos que reparam na forma atrabiliária como decorrem os negócios da administração pública o reconhecem.
Apoiados.
Agora V. Ex.ª pode falar.
Fale!
Tem o direito de falar e de me interromper quando quiser, que eu continuarei nas minhas considerações, dispensando-me de lhe responder.
Sr. Presidente: nem todas às pessoas que tiveram conhecimento dêste facto tiveram a coragem de protestar, mas eu posso afirmar que protestei sempre junto dos meus correligionários. Tenho, portanto, autoridade para falar.
V. Ex.ª, Sr. Presidente, que me conhece dos tempos de Coimbra, sabe que êste é o meu feitio. Nunca deixei de apoiar, mesmo que seja um inimigo, contanto que tenha a razão por seu lado.
E, nestas circunstâncias, pregunto: é porque motivo não havemos de aceitar as cousas tal como são?
Sr. Presidente: eu estou convencido de que daquele lado da Câmara não virão as provocações nem as violências, porque há o direito dó esperar dum Govêrno presidido por um grande homem, por um grande português e republicano, como é o Sr. Ginestal Machado, que êle remedeie um pouco as avarias da nau, que não sei se se poderá levar já a bom pôrto.
Nestas condições pregunto: — Não há o dever de se lhe dar todas as facilidades?
Entendo que sim, para que o Govêrno possa levar a bom têrmo a obra que se propôs realizar, e, só conseguir fazer parar esta derrocada, já terá feito um grande serviço.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Agatão Lança (para interrogar a Mesa): — Sendo hoje a primeira vez que faço uso da palavra depois que V. Ex.ª foi eleito para êsse lugar, aproveito a ocasião para prestar a homenagem do meu alto respeito a V. Ex.ª
Desejo interrogar a Mesa acêrca da forma como V. Ex.ª interpretou o Regimento.
Eu manifestei a minha opinião de que a sessão não devia ser prorrogada, porque entendi que quando a Câmara se manifestou favoravelmente a que o orador continuasse no uso da palavra, implícitamente êsse orador usava da palavra no período da ordem do dia; foi esta a minha convicção.
O Regimento marca quatro horas de sessão, divididas em dois tempos.
Logo a manifestação da Câmara para que o orador continuasse no uso da palavra correspondia a uma votação da Câmara para que falasse com prejuízo da ordem do dia.
Pelo que exponho, julgo que V. Ex.ª interpretou rigidamente o Regimento.
Eram estas as considerações, Sr. Presidente, para que eu desejava chamar a atenção de V. Ex.ª o da Câmara, não para remediar a situação hoje criada, mas com
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o fim de prevenir idêntica situação de futuro, interpretando-se o artigo 20.º do Regimento conforme a sua letra e o seu espírito, tal como se tem feito nas sessões, legislativas passadas. O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Talvez que o Sr. Agatão Lança tenha toda a razão, mas a verdade é que o artigo 21.º do Regimento, que S. Ex.ª invocou, não diz que a sessão durará quatro horas, porquanto por deliberação da Câmara, tomada na sessão de 21 de Junho de 1920, a redacção dêsse artigo foi alterada, suprimindo-se-lhe as palavras quatro horas, e empregando-se a expressão de que três horas são destinadas à ordem do dia.
Certamente que as considerações de S. Ex.ª foram produzidas em face de algum exemplar do antigo Regimento, que não contém a rectificação.
Poderá. a interpretação que eu dei ao artigo 21.º do Regimento ter sido rígida, mas é a única que eu lho, podia dar, e convencido estou do que a Câmara, consentindo que o Sr. Rodrigues Gaspar falasse além do período destinado para antes da ordem do dia, pronunciando-se com as vozes de fale, fale, o que, a meu ver, não representa resolução colectiva da Câmara, não queria de. forma nenhuma prejudicar os trabalhos dados para ordem do dia, sacrificando o tempo a esta destinado.
Em todo o caso, creio que ô melhor que há a fazer, para se chegar a uma conclusão, é S. Ex.ª concretizar numa proposta o seu pensamento sôbre a interpretação a dar ao artigo 21.º, tanto mais quanto é certo que S. Ex.ª declarou que interpretava o sentimento geral da Câmara.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Agatão Lança: — Se bem que o artigo 21.º do Regimento esteja alterado, como V. Exia acabou de dizer, o que é verdade é que a interpretação que por outras vezes tem sido dada a êsse artigo é diferente da que hoje V. Ex.ª lhe deu, tendo-se prejudicado sempre a ordem do dia. Mas não tenho dúvida em apresentar, oportunamente, uma proposta para se esclarecer a interpretação do artigo 21.º
O Sr. Presidente: — Vai votar-se em contraprova a admissão da moção do Sr. Carlos Pereira.
Foi rejeitada por 1 Sr. Deputado e aprovada por 54.
O Sr. Fausto de Figueiredo: — Sr. Presidente: começo por lamentar a ausência dos Srs. Paiva Gomes o António Fonseca, mas ainda bem que está presente o Sr. Velhinho Correia, que deu origem a esta discussão.
Sr. Presidente: êste assunto é daqueles que é necessário analisar serenamente e com toda a justiça para chegar a uma conclusão que pràticamente defenda os interêsses do Estado.
Sr. Presidente: o Sr. Rêgo Chaves, ex-Ministro das Finanças, fez ontem o seu depoimento e S. Ex.ª encarou a questão sob o ponto de vista dos factos, da moralidade e da justiça.
Tenho anuí a moção de S. Ex.ª e pelo que vi nos documentos que compõem o processo chego à conclusão de que aqueles que intervieram no assunto defenderam os interêsses legítimos do Estado de uma forma diversa, e em contraposição àquela apresentada pelo Sr. Paiva Gomes.
No seu depoimento o Sr. Rêgo Chaves diz à Câmara, com aquele desassombro que o caracteriza, os fundamentos com que tinha feito a operação, e consubstancia na sua moção essas razões e fundamentos.
O Sr. Rêgo Chaves, Ministro das Finanças em 1919, diz que nesse momento a acção da praça era do tal modo que preocupava aqueles que tinham responsabilidades na pasta das Finanças.
Àpartes.
Essas dificuldades de ordem financeira para o Estado o a situação cambial levaram o Sr. Rêgo Chaves a intervir por forma que só tornasse prática.
Sr. Presidente: podia o Sr. Rêgo Chaves, então Ministro das Finanças, limitar-se única e simplesmente a intervir no mercado entregando à praça 400:000 libras. Era assim que tinham feito os seus colegas e seus antecessores, era assim mesmo que o Ministro das Finanças Rêgo Chaved já tinha feito. Isto consta do processo e era bom que a Câmara o conhecesse. O Sr. Rêgo Chaves enviava aos Bancos um memorandum com a data de 8
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de Outubro de 1919, nos seguintes termos:
Leu.
Era tal o interêsse que o Sr. Rêgo Chaves tinha em pôr um dique ao câmbio, que mandava publicar nos jornais a nota seguinte:
Leu.
Esta nota está apensa ao processo e o Sr. Rêgo Chaves procedeu assim para que o câmbio se nRo agravasse; mas S. Ex.ª verificou em pouco tempo que não seria essa a única, forma do pôr um travão à marcha do câmbio e S. Ex.ª fez depois aquela aliança a que ontem se referiu.
E, Sr. Presidente: a razão por que assim procedeu o ilustre Deputado Sr. Rêgo Chaves já eu a disse à Câmara, sendo no emtanto bom dizê-lo mais uma vez, isto é, S. Ex.ª entendeu que com o acôrdo de algumas entidades bancárias da praça poderia, na verdade, de alguma forma evitar que a especulação se fizesse.
Foi isto o que S. Ex.ª disse e todos aqueles que têm memória se deverão recordar do facto.
Eu não quero, Sr. Presidente, dizer neste momento que o Sr. Rêgo Chaves como Ministro das Finanças se tenha enganado nos seus cálculos; porém, o que é um facto é que êles não deram os resultados desejados.
O Ministro, Sr. Presidente, no meu modo de ver, não tem que procurar elementos de informação, se bem que eu tenha a certeza absoluta, como a Câmara a terá também, de que o Sr. Rêgo Chaves procedeu com toda a sinceridade e com todo o patriotismo.
S. Ex.ª conversou com alguns directores de casas bancárias e Bancos, segundo disse, com o intuito de que a especulação se não fizesse; porém, o facto não deu os resultados desejados.
S. Ex.ª pretendeu criar tinia situação de aliados, segundo disse, chegando até a citar a casa Torlades; porém, a casa Torladas não foi um dos aliados do. Sr. Ministro das Finanças em 1919, isto conforme se verifica por uma carta, a propósito da operação, que se encontra junta ao processo.
Na verdade, a casa Torlades entende que a sua missão não é a de fazer negócios bancários, e, em relação a câmbios, diz que tratava apenas de adquirir as cambiais necessárias para a sua vida comercial.
Portanto, ela não estava na situação de aliada que o Sr. Rêgo Chaves referiu ontem. E ainda bem que não estava, ainda bem que V. Ex.ªs sabem que a casa Torlades, sendo uma sociedade anónima por cotas e com responsabilidade limitada, e não tendo de facto a situação de casa bancária, não poderia ser chamada por S. Ex.ª para aquela conferência confidencial e diplomática que levasse S. Ex.ª a considerá-la como aliada.
Ainda bem que o Sr. Ministro das Finanças do então assim procedeu, porque, se há casas bancárias neste país que dalgum modo têm contribuído para que algumas cousas interessantes se façam, há outras que têm exercido na vida da nação influências absolutamente nefastas.
Apoiadas.
E eu não conheço nada, da casa em questão, a não ser que ela não foi senão uma beneficiada do célebre contrato Furness, pelo qual algumas centenas de contos entraram nos seus cofres, e tem feito fornecimentos de trigo ao Estado, bem como contratos relativos a tabacos, etc. Portanto, nada nela justificava a aliança que S. Ex.ª disse que teve com algumas entidades.
Mas essa casa veio pedir então ao Sr. Ministro das Finanças 100:000 libras em condições iguais às dos mais Bancos. S. Ex.ª deferiu, e deferiu, a meu ver, muito bem, porquanto se o não tivesse feito certamente não atingia, pelo menos em parte, aquele seu objectivo; é que S. Ex.ª não tinha nesse momento maneira de travar a marcha do câmbio, e S. Ex.ª queria por todos os modos demonstrar ao país o à praça que as necessidades do Estado não se compadeciam de maneira nenhuma com essa marcha descendente do câmbio.
Sr. Presidente: se falo, por excepção, em casas, não quero com isto dizer que me mova simpatia dê ordem pessoal por nenhuma das partes em questão. Falo porque é preciso que todos nós digamos a verdade toda, interpretando o sentir do Sr. Rêgo Chaves e avaliando da sinceridade do seu pensamento.
Sr. Presidente: o Sr. Rêgo Chaves disse ontem à Câmara que não fez mais em
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virtude das dificuldades financeiras do Tesouro, das quais não me ocupo neste momento, porque talvez ouvisse a argumentação de que o Estado não poderia ter dificuldades de tanta monta; ou as poderia resolver como tantos outros, o têm feito.
Não o quis,, porém, S. Ex.ª fazer, mas disse-nos ontem que, seguindo as pisadas dos seus antecessores, não fez mais do que acautelar os interêsses do Estado, e diz-nos S. Ex.ª que vendeu libras e não emprestou libras.
Mas nos considerandos da sua moção o Sr. Rêgo Chaves diz-nos o seguinte:
Leu.
É, portanto, o Sr. Rêgo Chaves, autor da operação, que nos diz que não fez empréstimos de libras, mas vendeu libras, porque não queria perder a posição que tinha nos Bancos de Londres. E por isto que lamento que o Sr. António. Fonseca, única pessoa de direito que tem intervindo neste debate, não esteja presente, porque na verdade, só uma pessoa que conheça direito me pode dizer se o Sr. Rêgo Chaves vendeu libras.
Como é que eu, que de direito sei tam pouco, posso, na verdade, por êstes considerandos da moção do Sr. Rêgo Chaves, discutir êste ponto de direito?
Todavia, há um ponto de facto, é êsse é que não ouvi discutir ainda. Êsse ponto de facto é que o Sr. Rogo Chaves lançou na praça, as libras, vendendo-as.
Disse S. Ex.ª ontem que nesta operação os Bancos é que prestaram serviços ao Estado e não êste aos Bancos.
O Sr. Rêgo Chaves, quando Ministro, das Finanças, na única intenção de estabilizar o câmbio, cedeu as libras à praça; mas viu que o câmbio cada vez se agravava mais.
S. Ex.ª, embalado pelo canto de sereia dalguns Bancos, que lhe diziam que a única forma de estabilizar a nossa divisa cambial seria a de lhes entregar uma certa soma de libras ouro, fez uma série de manobras financeiras, que deram o resultado de tornar ainda pior a situação.
Esta é que é a situação de facto.
Toda a gente vivia então do optimismo, convictamente esperançada de que a crise cambiai, tendo atingido a sua maior acuidade, breve se resolveria. Era esta então a situação da praça. O Sr. Velhinho, Correia sabe-o bem. S. Ex.ª deve recordar-se de que foi na segunda quinzena de Setembro que eu apresentei a minha proposta de navegação, em que, para os devidos efeitos, era considerado o câmbio de 30.
O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): — Mas dias depois os banqueiros — segundo S. Ex.ª então afirmou — declaravam que não se responsabilizavam na tornar firme a operação constante da proposta.
O Sr. Rêgo Chaves (interrompendo): — Eu nunca afirmei tal cousa, porque não é verdade. Nunca os banqueiros se me dirigiram a declarar que não tornavam firme a operação.
Mas mesmo que eu tivesse de confirmar a afirmação dá V. Ex.ª, isso em nada destruiria às palavras do Sr. Fausto de Figueiredo.
O Sr. Velhinho Correia: — Se havia em muitos espíritos êsse optimismo, em muitos outros havia decidido pessimismo.
Entanto isto é assim que houve sempre compradores para libras.
O Orador: — O Sr. Velhinho Correia não tem razão. Nessa altura todas as operações a prazo se faziam em condições inferiores às operações a contado.
Interrupção do Sr. Velhinho Correia: que não se ouviu.
O Orador: — Sr. Presidentes não estou neste momento discutindo a mentalidade ou psicologia dos homens que fazem afirmações desta natureza, mas ùnicamente a lógica e o raciocínio que a elas devem, presidir.
Sr. Presidente: nesta questão que é decapitai importância não há apenas, como a Câmara vê, questões de direito a debater; há uma importantíssima questão de facto a ajuizar, e essa não pode passar despercebida á todas aquelas pessoas que, apreciando a questão, lhe queiram dar o seu voto com toda a lealdade e justiça.
Tem-se discutido amplamente nesta Câmara, qual a natureza da operação, mas, ainda mais, quem foi o Ministro que nela.
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interveio e qual o ponto de vista das pessoas que nela tinham entrado.
Qual é a natureza desta operação?
É o depoimento do maior responsável neste processo que no-lo responde: «Vendi libras».
Mas, apesar do Sr. Rêgo Chaves dizer que vendeu libras, há quem entenda que não se trata de uma operação de venda...
Trocam se explicações, simultaneamente, entre o orador e vários Sr. Deputados que o cercam.
No meu modesto entendimento sôbre assuntos desta natureza, eu considero que o despacho do Sr. Cunha Leal vem definir a natureza de tal operação.
Interrupção do Sr. Abranches Ferrão que não foi ouvida.
O Orador: — Não queira S. Ex.ª que eu vá discutir consigo pontos de direito. — Mais do que audácia seria insensatez entrar nessa discussão com V. Ex.ª, que é um distintíssimo professor de direito e a quem eu presto toda a minha consideração.
Mas deixe-me, porém, dizer S. Ex.ª porque é que eu entendo que o Sr. Cunha Leal, no seu despacho, definiu, pelo menos para mim, á natureza desta operação.
Das suas palavras se compreende que se trata de uma operação de empréstimo.
Pelo despacho 4o Sr. Cunha Leal encontramo-nos em presença de uma operação de duplo empréstimo, porque duplo e recíproco feito juro consignado no despacho.
Vêem V. Ex.ªs, portanto, como o Sr. Cunha Leal veio imprimir a esta operação um carácter em condições que a Câmara não pode deixar de ponderar.
Eu tenho pelos ilustres jurisconsultos dó meu país o máximo respeito e consideração, mas colocam-nos na situação de não podermos definir convenientemente ò despacho do Sr. Pores Trancoso.
E antes de eu, com toda a minha incompetência, me abalançar à tentativa de fazer a definição dêsse despacho, não posso deixar de chamar a atenção da Câmara para uma cousa que não sofre contestação: as várias sucessões da não entrega das libras.
No despacho do Sr. Peres Trancoso há qualquer cousa que deve ser encarada sob o ponto de vista jurídico.
Mas a propósito de jurisconsultos, por quem, como disse, tenho a mais alta consideração, lembro-me de um caso bastante típico.
Eu sou da Beira, e lá na minha terra levanta se sempre na quadra de verão a questão das águas, derivada da falta de água para a rega das propriedades, o que obriga a determinar as horas em que a pouca água que há deve ser distribuída, marcando-se uma hora para Fulano, outra para Sicrano, outra para Beltrano.
Mas os meus conterrâneos avançam sempre um pouco e roubam a água ao vizinho, donde resulta a zaragata e os correspondentes processos-crimes que, no verão, abundam no tribunal da minha comarca como cogumelos.
Aconteceu que, um dia, encontrando-se o juiz em face de tantos processos para julgar, proferiu a seguinte sentença: «a água é pouca e vai funda e quem puder regar que regue!»
Parece-me que o conto não é mal aplicado.
Sr. Presidente: argumenta-se com o que dizem os códigos; está bem, mas a verdade é que no despacho há uma determinação que diz: «quando não haja prejuízo para qualquer das partes».
Ouvida a Procuradoria da República, diz: não é de considerar essa hipótese, visto que só poderia dar-se tendo-se a aspiração de ver a libra na casa dos 26.
Ora eu pregunto se haverá alguém que possa assegurar que nunca mais teremos a libra nessa casa ou mesmo na dos 50.
Ninguém!
Quanto a mim, o despacho do Sr. Trancoso não foi mais do que uma simples prorrogação.
Ai de nós, no dia em que discutirmos ou tentarmos deminuir, quer a Procuradoria Geral da República quer o Conselho Superior de Finanças, que neste País têm uma alta função.
Se entrarmos por êsse caminho, podemos amanhã ir discutir o Poder Judicial, e temos o renversement de toda a vida até agora seguida.
Faço esta declaração para que não se veja em nenhuma das minhas palavras qualquer cousa de desprestígio para essas
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instituições, que são em absoluto de prestigiar e não de deminuir.
Dada, pois, esta explicação que julgo necessária, vou prosseguir nas minhas considerações.
Sr. Presidente: o Govêrno de então entendeu dever fazer uma consulta à Procuradoria Geral da República sôbre o valor jurídico do despacho proferido neste processo e quais as consequências para o Estado, no caso da falta de cumprimento por parte dêste.
A pregunta era concreta e a resposta devia ser concreta.
Sr. Presidente: se a minha incompetência não é tam grande, se o meu raciocínio é do aceitar e se o despacho do Sr. Peres Trancoso tem aquela interpretação jurídica que é de dar, julgo que o princípio consubstanciado na moção do Sr. Paiva Gomes não é de cumprir nem de executar.
Sr. Presidente: a hora vai. bastante adiantada, e como tenho ainda de discutir pontos importantes que constam dêste processo, peço a V. Ex.ª se digne consultar a Câmara sôbre se consente que a sessão seja interrompida, ficando eu com a palavra reservada para amanhã.
O Sr. Presidente: — Vou pôr à votação o requerimento formulado pelo Sr. Fausto de Figueiredo.
Consultada a Câmara foi aprovado.
O Sr. Presidente: — A sessão continua amanha à hora regimental.
Está interrompida a sessão.
Eram 37 minutos.
SEGUNDA PARTE
O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos de 6 de Dezembro.
O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Fausto de Figueiredo.
O Sr. Fausto de Figueiredo: — Sr. Presidente: na altura era que ontem deixei as minhas considerações sôbre o assunto em discussão, parecia ter já demonstrado, pelo menos, que a moção apresentada pelo Sr. Rêgo Chaves, ao tempo Ministro das Finanças, punha a Câmara em condições do ajuizar com clareza da razão de ser desta operação.
Mas muito mais há ainda a dizer; e eu folgo por ver que se encontra presente o Sr. Paiva Gomes, que foi o interpelante nesta questão, porque é possível que, com o que vou dizer, S. Ex.ª possa de alguma maneira ter razões fundamentadas para modificar a minha opinião.
Demonstrei ontem à Câmara que o despacho lançado neste processo pelo Sr. Cunha Leal tinha imprimido natureza a esta operação.
Continuo hoje a afirmá-lo, porque, com a opinião de S. Ex.ª, estamos em face de um empréstimo em ouro, feito aos Bancos e banqueiros, e de empréstimo de escudos ao Estado, com o natural juro em ouro.
Tinha eu dito ontem, também, que neste processo há questões de facto e de direito, e que portanto era necessário não esquecê-las paru que os interêsses do Estado fossem devidamente acautelados.
Continuo a fazer a mesma afirmação.
A Câmara ouviu ontem o depoimento que o Sr. Rêgo Chaves fez, e tomou conhecimento das várias razões de ordem diplomática que o levaram a efectuar esta operação.
É de respeitar a opinião do Sr. Rêgo Chaves?
Não é de respeitar?
Sr. Presidente: para mim entendo que sim, porque ninguém melhor do que S. Ex.ª, autor desta operação, poderá informar a Câmara com segurança e clareza das razões e fundamentos que o levaram a fazer, a operação nos termos em que a fez.
Chamo a atenção da Câmara para o considerando n.º 6 da moção do Sr. Rêgo Chaves.
Ora ou vejo que a questão, por parte daqueles que a analisaram o assimilaram, foi posta pôr forma que à atitude do Sr. Rêgo Chaves nenhum reparo ou critica foi feito.
Desde que assim é, pregunto: Qual é a opinião que deve predominar?
Evidentemente, a da pessoa que negociou.
Sr. Presidente não desejo imiscuir-me nas questões de direito, porque de direito nada sei; todavia quero chamar a atenção da Câmara para vários pontos interessan-
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tes e para a sua respectiva interpretação, visto parecer-me ser ela a única consentânea com os interêsses do Estado.
Sr. Presidente: nem os Srs. Deputados interpelantes, nem a Procuradoria Geral da República, tinham de uma maneira clara definido esta operação.
Era uma operação de report ou uma operação de dívida ou venda?
Ora a opinião de S. Ex.ª contraria em absoluto a opinião consignada na moção do Sr. Rêgo Chaves, única onde se declara que se trata de"uma operarão de venda.
Mas, seja como fôr, o que é certo é que o Estado, pelo menos até determinadas datas, não nos aparecia como negociador de cambiais.
O Estado, como disse o Sr. Rêgo Chaves, recebia as suas cambiais por intermédio da Agência Financial, mas não tinha a dentro daquilo a que pròpriamente só chama receita, nenhuma outra forma de adquirir, libras, que não fôsse a conversão dos escudos.
Disse ontem e afirmo novamente hoje — êste é o ponto moral da questão, questão de facto que não pode ser esquecida — que se o Sr. Rêgo Chaves não tivesse procedido por essa maneira não havia necessidade de lançar na praça essas libras e receber em troca escudos.
Não via forma infelizmente do guardar reserva ouro, neste momento; e muito menos o Sr. Rêgo Chaves devia fazer essa operação.
Mas, Sr. Presidente, há de facto, neste processo cousas extraordinárias, para que vale a pena chamar a atenção da Câmara, porquanto houve desigualdades flagrantes.
Houve um processo para com o Banco Espírito Santo, Banco Português e Brasileiro e a Casa Torlades, e houve um processo totalmente diverso para com o Banco Colonial.
Todas estas quatro casas haviam recebido nas mesmas condições as libras do Sr. Rêgo Chaves, então Ministro das Finanças.
Porém em certa altura passou-se alguma, cousa de anormal.
É que o Banco Colonial é obrigado a entregar num prazo curto as 30:000 libras, não se aceitando a sua troca em Lourenço Marques dessas libras, como êle pedia.
E de facto extraordinária esta situação anormal; o eu desejava que o Parlamento fôsse elucidado sôbre isto, embora o Sr. António Fonseca se houvesse já referido ao facto.
Desejava que o Sr. António Maria da Silva, que ao tempo sobraçava a pasta das Finanças, dissesse a razão por que adoptou uma maneira tam abrupta, violenta e até desumana para com o Banco Colonial, anulando um despacho, em que S. Ex.ª consentia na entrega pura o simples das libras em Lourenço Marques, para no prazo do quinze dias entregar essas libras.
Portanto houve uma desigualdade de tratamento para com o Banco Colonial em relação aos outros bancos.
Desejaria que o Sr. António Maria da Silva me fizesse o favor de dizer a razão que o levou a tornar tal atitude.
O Sr. António Maria da Silva: — V. Ex.ª fala numa desigualdade havida entre o Banco Colonial e os outros Bancos?
O Orador: — Vejo que neste caso há uma desigualdade de tratamento entre o Banco Colonial o as outras casas bancárias.
O Sr. António Maria da Silva: — Respondo a V. Ex.ª para me não ser preciso usar da palavra.
O Banco Colonial, numa dada época, pediu para solucionar o seu caso, pagando antecipadamente 30:000 libras, dizendo que havia facilidade no pagamento, desde que o Alto Comissário de Moçambique, Sr. Brito Camacho, consentisse na saída das libras que lá tinha.
Telegrafei ao Sr. Brito Camacho, dizendo qual a pretensão do Banco Colonial em Alto Comissário do Moçambique respondeu-me que o Banco Colonial não tinha libras. O que tinha era notas-ouro do Banco.
Êste procedimento por parte de um Banco é absolutamente inclassificável. Nestas, circunstâncias mandei que entrasse com as libras, pois não se admite que só brinque com o Estado desta maneira.
Um procedimento dêstes é absolutamente desonesto.
O Orador: — Agradeço as explicações dadas à Câmara pelo Sr. António Maria
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da Silva e outra cousa não era de esperar de S. Ex.ª que é um verdadeiro homem de bem.
Creio que pela forma como expus a questão ela ficou colocada nos seus verdadeiros termos.
A atitude tomada pelos Srs. Paiva Gomes e António Fonseca creio que não foi a melhor para acautelar os interêsses do Estado, porque uma discussão destas pode prejudicar os interêsses do Estado e das casas bancárias que têm o direito de ser respeitadas.
Disse o Sr. António Fonseca na sessão de anteontem que, fossem quais fossem as calúnias que aparecessem nesta Câmara, por mais variados que fossem os boatos, o que era preciso é ter a coragem de falar e dizer a verdade com aquela lealdade e sinceridade que S. Ex.ª costuma pôr nas suas cousas.
A meu ver a questão saiu muito mal do Conselho Superior de Finanças, pois não compreendo qual atitude se tomasse apenas porque um dos seus membros não estava de acôrdo com a decisão tomada. Julgou ter assim servido os interêssses do Estado? Eu julgo o contrário.
A questão deve ser encarada sob vários aspectos; e um dêles é a informação dada pelo Sr. Ministro Rêgo Chaves.
S. Ex.ª tentou pôr um travão na marcha do câmbio, mas não o conseguiu. E então S. Ex.ª seguiu o processo de lançar portarias sôbre portarias; e, entre elas, apareceu o decreto de 20 de Dezembro que determina liquidar em escudos as operações existentes nessa data.
Sabem V. Ex.ª qual era o câmbio a essa data? Era a 19!
O que resultou disto foi essas 400:000 libras não renderem 50:000 contos!
Era esta a situação criada pelo decreto, aliás com o mais louvável intuito e desejo único de ver se podia acudir à situação cambial que era das mais graves.
São cousas da máxima complexidade e cajás consequências é precisa atender.
Continuou-se a viver no regime das prorrogações até o Govêrno do Sr. António Maria da Silva, em que o Sr. Portugal Durão mandou ouvir, e quanto a mim muito bem, a Procuradoria Geral da República e o Conselho Superior de Finanças.
Êsses corpos emitiram o seu parecer e deram a sua opinião.
Sr. Presidente: desde que a operação não foi levada a cabo, não se pode discutir ou aceitar outra doutrina que não seja a apresentada pelo Sr. Cunha Leal, Ministro das Finanças.
É indispensável acautelar os legítimos interêsses do Estado.
Tudo quanto eu tenho dito não passa de uma sugestão e não é uma proposta.
Sr. Presidente: eu não sei qual é a decisão que a Câmara tomará nesta questão. Estão pendentes as moções dos Srs. Paiva Gomes e Rêgo Chaves.
Parece-me que a minha sugestão é a melhor; é a que se deve atender; mas se a Câmara resolver o contrário, bom será que todos reflictam nas consequências que podem advir para o Estado.
Sr. Presidente: vou terminar as minhas considerações; mas é possível que eu use de novo da palavra. Todavia direi que não se pode fazer outra cousa que não seja exigir as dívidas aos Bancos e às casas bancárias. Um dos Bancos tem 22:000 centos, outro 12:000 contos e uma. casa bancária tem 100 contos o portanto não têm de se preocupar com a moção do Sr. Paiva Gomes.
O que é preciso é pagar ao Estado.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador haja revisto as notas taquigráficas.
O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: vão ser muito limitadas as minhas considerações, porque o assunto está devidamente esclarecido. Cada um de nós já sabe, efectivamente como há-de votar em harmonia com a sua consciência, com as suas responsabilidades e no intuito de melhor servir os interêsses do Estado.
Começo por dizer que não tinha, nem podia ter, qualquer intuito menos leal ou menos correcto, ria carta que mandei ao Sr. Presidente do Ministério a propósito desta questão.
Desejava, apenas, que um problema desta ordem não fôsse decidido sem que o Parlamento se pronunciasse, estando principalmente anunciada como estava uma interpelação do Sr. Paiva Gomes.
Como era também a minha intenção de não resolver êste problema sem se realizar
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essa interpelação, como, de resto, tive ocasião de significar a algumas pessoas que desejaram saber a minha opinião sôbre o assunto, entendi também que de forma nenhuma o Sr. Ministro das Finanças o devia resolver sem que a Câmara dos Deputados sôbre êle se pronunciasse; e a verdade é que não tenho nesta altura razão para me arrepender do que fiz, principalmente depois das palavras que ouvi do Sr. Ministro das Finanças declarando nesta Câmara que no seu entender a operação devia ser liquidada como preceituam as disposições regulamentares ou como preceituam alguns diplomas publicados no fim do ano de 1919, quere dizer liquidação feita em escudos e por uma soma muito inferior àquela que a meu ver se deve pedir em harmonia com a análise de todo o processo. Esta opinião também acaba de ser trazida a esta Câmara pelo Sr. Fausto de Figueiredo que ainda há pouco citou essa mesma legislação para fazer, crer a V. Ex.ªs e ao País que os Bancos que deviam ao Estado as conhecidas e sabidas 400:000 libras, não as deviam pagar na* espécie e moeda que receberam, mas de certa maneira em harmonia com alguns decretos de Dezembro de 1919;
Ora, para contrariar a opinião de S. Ex.ªs, eu vou analisar o que são êsses decretos.
Pelo decreto n.º 4:176 de Abril de 1918, foram realmente proibidas a partir de 1 de Maio operações de praça, desde que elas não correspondessem a um acto comercial ou não representassem uma. cobertura necessária. Qualquer que seja a classificação desta operação, ou seja uma operação de empréstimo, ou seja uma operação do venda e compra, a verdade é que ela não estava abrangida por êste decreto, visto que o decreto permitia ás vendas a prazo desde que elas fossem para cobertura de qualquer operação.
Ora o Estado vendendo libras, mas contratando õ seu recebimento, daí a um certo tempo, fez nem mais nem menos do que uma operação de report.
Foi publicado, depois, outro diploma que também não tem aplicação ao caso, porque como se tratava duma operação contratada pelo Sr. Ministro das Finanças ela não carecia duma autorização dada por S. Ex.ª a si mesmo.
Seguiu-se a portaria n.º 2:044 que não tem, nenhuma aplicação à operação de que se trata, visto que era uma operação tratada com o Estado.
Vem por último o decreto também já citado de 20 de Dezembro de 1919 que determinava no seu artigo 10.º como as operações deviam ser liquidadas. Mas o que nenhum orador leu e esta cousa de ler os diplomas simplesmente na parte que interessa, um determinado objectivo, não lendo o resto, não está bem — foi o § 3.º dêste mesmo artigo.
Ora quem examine todo êste processo, vê que há nele sucessivas prorrogações em que ambas as partes estão de acôrdo. Portanto, não tinha que haver liquidação em escudos, ao câmbio da ocasião, como sustentam alguns oradores que olvidaram êste assunto.
Mas tem sido muito debatida esta questão, sob êste aspecto: trata-se duma operação de empréstimo ou trata-se de uma operação de venda?
Eu devo dizer à Câmara que de qualquer forma a verdade é que o Estada teve sempre esta preocupação: foi a de não perder á sua posição em escudos.
Esta declaração foi feita pelo próprio Sr. Rêgo Chaves. A verdade é que S. Ex.ª fez esta declaração por mais, de uma vez tendo-a confirmado na sua moção.
O Estado, Sr. Presidente, não pretende perder os juros das libras no emtanto, pode perder não só os juros mas também o capital.
Do que não resta dúvida, Sr. Presidente, é de que se trata de uma operação de venda; pois a verdade é que o Estado vendeu as libras no próprio dia em que as comprou.
Pode-se assim, a meu ver, Sr. Presidente, classificar essa operação de report sem juro, quando ela se poderia ter feito com juro.
Isto, Sr. Presidente, está previsto no Código Comercial. Além disso, consultando eu as maiores autoridade sôbre o assunto, vi que realmente se pode realizar uma operação de bancos e banqueiros de report com juro.
Esta, Sr. Presidente, é a opinião de uma autoridade belga muito conhecida e autorizada, que diz na verdade que pode haver rio alto comércio operações de: report com juro.
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Houve na verdade, Sr. Presidente, uma operação de venda; porém o que é certo, pela leitura do processo, é que ao mesmo tempo se realizou uma compra, não estando infelizmente os Bancos dispostos, ao que parece, a pagar as taxas da operação ao Estado.
Tem-se afirmado por mais de uma vez, Sr. Presidente, que nós devemos sustentar a fórmula de liquidação proposta pelo Conselho Superior de Finanças, pois que -se assim não fôr, e levada a questão para os tribunais, o Estado certamente perderá a qnestão.
Sr. Presidente: eu devo dizer à Câmara que, a ser adoptada a solução do Conselho Superior de Finanças, o Estado terá um grande prejuízo; pois a verdade é que tendo de pagar corça de 40:000 contos, receberá apenas o m troca 3:000 a 4:000 contos.
Ora, Sr. Presidente, eu devo dizer francamente u Câmara que a obrigação do Estado no momento difícil que 56 atravessa, e que é de grandes sacrifícios, não só para os contribuintes, como para todos os funcionários do Estado, é não deixar perder assim uma tam grande quantia.
Não creio, pois, Sr. Presidente, que o assunto, mesmo quê;seja levado para os tribunais, possa ser prejudicial para o Estado.
Não sei realmente, Sr. Presidente, qual será o resultado final desta questão; porém eu entendo que o Estado tem o direito de reclamar a quantia entregue aos banqueiros.
Sr. Presidente: tem-se afirmado que o Govêrno no primeiro vencimento não tinha os escudos necessários para entregai aos banqueiros; porém, eu devo dizer a V. Ex.ª que não posso de maneira nenhuma aceitar tal doutrina, por ser quanto, a mim inexacta. A verdade é que o Estado podia muito bera ter realizado os escudos necessários para tal, isto é, podia, a meu ver, ter pago a operação que tinha realizado com os banqueiros.
Não posso, portanto, aceitar essa doutrina.
Quem propus a, prorrogação foram os próprios banqueiros e não foi o Estado.
Eram estas as considerações muito sumárias que eu tino a á fazer, pois desejava apenas definir a minha atitude, que, não é senão a de bem servir o Estado, ao serviço do qual eu ponho todo o meu zêlo, esforço e trabalho. Neste lugar eu defendo os interêsses do Estado. De lastimar é que sejam os próprios banqueiros, e não o Estado, que venham lembrar a prorrogação, e o Estado que fale em renúncia a êsse capital.
Sr. Presidente: nós devemos ter em atenção o no máximo cuidado os interêsses do Estado.
Eram estas as considerações que eu tinha a fazer.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador haja revisto as notas taquigrájicas.
O Sr. Abranches Ferrão: — Sr. Presidente: depois das considerações feitas pêlos oradores que me precederam, eu estou convencido de que a Câmara já está suficientemente orientada acêrca do que foi, e em que estado actualmente se encontra, o debatido caso das 400:000 libras. E nem por isso tomaria tempo à Câmara se não fôsse a circunstância de eu ter dado sôbre o assumo, como Ministro da Justiça no Govêrno transacto, a pedido dos meus colegas, um parecer que foi exposto e apreciado em conselho de Ministros.
Eu entendo, Sr. Presidente, que o caso das libras se pode o deve encarar sob dois aspectos diversos: o aspecto jurídico e o aspecto moral.
Sob o aspecto jurídico, é para mim evidente que o Estado, cedendo as libras aos bancos, realizou com Cies um empréstimo caucionado. Assim o reconhece o Estado e assim o reconhecem as entidades bancarias às quais foram cedidas «libras, através de todas as peças do processo.
O Estado cedeu libras, impondo a obrigação de lhe ser feita, passado um determinado prazo, a restituição do mesmo número de libras.
Sempre os Bancos reconheceram que tinham de fazer entrega de libras e nunca o Estado deixou d& entender que efectivamente libras lhe eram devidas.
Não há diferença fundamental entre o que eu penso e aquilo que a Procuradoria da República deixou exarado no seu parecer que se encontra fazendo parte do processo.
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Também a Procuradoria da República entende que o Estado, com a operação realizada, ficou com o direito de exigir a restituição das libras que cedeu e os Bancos com a obrigação correlativa de fazerem entrega do mesmo número de libras que receberam. Apenas a Procuradoria da República afirma tratar-se de um contrato inominado, isto é, do um contrato que não pode enquadrar-se em nenhuma das categorias do contratos que se acham regulados nas nossas leis, e eu digo tratar-se de um empréstimo. Os resultados porém, são sempre os mesmos.
Já aqui se disse: como é que pode tratar-se de um empréstimo caucionado, se de facto o Estado dispôs das importâncias pelos Bancos depositadas e que teriam servido de canção à restituição das libras?
Supondo mesmo que o Estado estava inibido de dispor da caução, e dispôs apesar disso dela, o facto não tem importância alguma para caracterizar juridicamente a operação que se realizou. Quando muito, tal facto provaria apenas que o Estado não tinha procedido como seria lógico. Nada mais.
Portanto, encarada a operação no seu início, evidente é o direito. de o Estado exigir a restituição das libras que cedeu.
Temos, porém, que atender à situação posteriormente criada pelos despachos ministeriais lançados no processo. Há um, então, que reveste uma especial importância: o despacho do Sr. Peres Trancoso.
Os Bancos devedores iam pedindo sempre prorrogações do prazo para a entrega das libras e como o agravamento cambial se ia sempre acentuando, e o prejuízo para os Bancos, a srrem obrigados a restituir as libras, a tornar-se cada vez maior pediram um dia para que o prazo fôsse prorrogado até quando não houvesse, nem para o Estado nem para êles, prejuízo na entrega das libras.
O Sr. Peres Trancoso concordou, exarando o seguinte despacho:
Leu.
Êste despacho veio alterar a situação primitiva.
Se o Estado amanhã reclamar dos Bancos a entrega das libras, certamente êles virão retorquir que há um despacho por virtude do qual só ficaram obrigados a restituir as libras quando isso lhes não cause qualquer prejuízo.
Pode dizer-se, e parece que já aqui o ouvi afirmar, sendo também essa a opinião da Procuradoria Geral da República, que visto tratar-se de um prazo indeterminado, como o que foi concedido pelo despacho Peres Trancoso, poderá sempre o credor, aqui o Estado, exigir, quando o entenda, o cumprimento da obrigação. A verdade, porém, é que tal doutrina, quanto ao despacho Peres Trancoso, pode dar lugar a sérias dúvidas.
Realmente, é pelo menos sustentável que o facto a que se refere aquele despacho Peres Trancoso, o da libra voltar ao cambio da data da operação, bom poderá dar-se, o, se assim se pensar, o prazo mencionado não seria indeterminado, mas determinado.
Em qualquer caso, a verdade é que o assunto só nos tribunais seria presumivelmente resolvido, se porventura hoje o Estado fizesse a exigência integral das libras que cedeu.
Aqui tem V. Ex.ª, Sr. Presidente, aquilo que penso, encarada a questão sob o ponto de vista jurídico: vejo que haveria grandes dificuldades por parte do Estado se porventura êle, depois dos despachos lançados no processo, quisesse exigir integral e imediatamente a entrega das libras.
Sob o ponto de vista moral, também me permito, Sr. Presidente, fazer algumas considerações. E não pode o assunto deixar de encarar-se sob tal aspecto, sobretudo depois das considerações aqui produzidas pelo ilustre Deputado, Sr. Rêgo Chaves, Ministro das Finanças no tempo em que se realizou a operação das libras,, considerações essas que causaram no meu espírito, como certamente no espírito de toda a Câmara, uma funda impressão.
Em certa altura da gerência da pasta das Finanças que lhe estava confiada, entendeu o Sr. Rogo Chaves que devia actuar na praça no intuito de evitar um' agravamento cambial que, a produzir-se, acarretaria um grave prejuízo para os interêsses do Estado e para a economia nacional.
Por outro lado, o Estado tinha disponibilidades em ouro, mas era melindrosa! a situação do Tesouro pela penúria e m
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que se encontrava rio tocante a escudos. O que fez o Sr. Rêgo Chaves? Começou por vender libras à praça. Em breve, porém, reconheceu que isso não bastava, pois, a continuar nesse caminho, não tardaria que o Estado se desfizesse de todas as suas disponibilidades em ouro, sem que conseguisse impedir o agravamento cambial que pretendia evitar.
O Sr. Rêgo Chaves imaginou então uma operação de outra ordem, a meu ver muito inteligentemente.
Em vez de vender pura o simplesmente libras, fez uma operação diversa: cedeu libras a determinadas entidades bancárias, impondo a estas a obrigação de restituirem, passado um curto prazo, o mesmo número de libras, e de caucionarem a operação com os escudos correspondentes ao valor das libras cedidas ao câmbio do dia da cedência.
Obtinha desta forma o Estado os mesmos escudos que obteria desfazendo-se das libras por meio de venda, não perdia a sua posição ouro, é interessava numa melhoria cambial as entidades, bancárias devedoras ao Estado.
Desta forma, o Estado, melhorando o câmbio, perdia, certamente com a operação realizada, mas ganhava por outro lado, e em grau muito mais elevado o próprio Estado de economia nacional.
Os Bancos foram na operação, uns verdadeiros aliados do Estado, sendo até certo, como o afirmou; o Sr. Rêgo Chaves, que prestaram um maior serviço ao Estado do que o Estado lho prestou a êles. E para compreender que assim é, basta observar que poderiam ter comprado as libras na praça, visto assim não terem de dispor de mais escudos do que aqueles que dispuseram aceitando o oferecimento do Estada.
A situação era, portanto, esta. O câmbio, em vez de melhorar, foi-se depois sucessivamente agravando, os Bancos iam pedindo ao Estado contínuas prorrogações do prazo de pagamento; e o Estado ia-lhes concedendo, pelo menos, nos primeiros tempos, as prorogações pedidas porque se não encontrava em condições financeiras, como foi afirmado pelo Sr. Rêgo Chaves, de fazer entrega das importâncias com que as entidades bancárias tinham caucionado a cedência das libras.
As contas foram-se agravando até chegar-se ao ponto em que estamos.
Ora a verdade é que o Estado, com a operação da cedência das libras, não pretendeu realizar um acto de especulação, nem tam pouco é essa a função do Estado. Por outro lado o Estado recebeu das entidades bancárias às quais cedeu libras os escudos que no momento de tal cedência essas libras valiam, e aproveitou-se, para as suas necessidades, dêsses mesmos escudos. O Estado recebeu, portanto, de facto e utilizou valores em escudos perfeitamente correspondentes aos valores ouro que cedeu. Pode dizer-se que não teve assim qualquer prejuízo.
Tendo em atenção as considerações que ficam, expostas, quere-me parecer que bem pode a Câmara conformar-se, quanto à liquidação da operação realizada, com os pareceres emitidos pelo Conselho Superior de Finanças e pela Procuradoria Geral da República, eu, quando muito, liquidar a operação ao câmbio por que foi liquidada operação idêntica com o Banco Colonial.
São estas, Sr. Presidente, as considerações que entendi dever fazer sôbre, o assunto com inteira imparcialidade.
Parece que o Sr. António da Fonseca estranhou no seu discurso que o Govêrno anterior, a que me honro de ter pertencido, tivesse dúvidas sôbre a forma como se deveria fazer a liquidação do caso das libras, e consultasse para as desfazer algumas instâncias, e não as tivesse tido o chefe do Govêrno quando, numa ocasião em que anteriormente ocupava a cadeira de Ministro das Finanças, obrigou o Banco Colonial a restituir integralmente as libras que lhe foram cedidas em circunstâncias perfeitamente idênticas.
Não tem razão o Sr. António da Fonseca. O Govêrno do Sr. António Maria da Silva procedeu neste assunto com o maior cuidado e com o maior patriotismo.
A situação mudou muito, como atrás deixei explicado, depois que o Banco Colonial fez entrega ao Estado das libras que êste lhe cedera. Até aí compreende-se quê não surgissem dúvidas.
Depois, porém, do despacho do Sr. Peres Trancoso, essas dúvidas surgiram, e natural era por isso que o Govêrno consultasse as entidades de direito para
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que lhe fornecessem os necessários elementos de modo a poder tomar-se uma resolução acertada. Foi o que fez o Govêrno do Sr. António Maria da Silva, e não teria cumprido o seu dever se outro tivesse sido o seu procedimento.
Tenho dito.
O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: nos termos do Regimento, mando para a Mesa a minha moção.
Leu.
É a seguinte:
Moção
A Câmara, considerando — quanto aos factos ocorridas desde as operações iniciais inclusive, em Setembro de 1919, até hoje — que todos êles denotam pela orientação, seguida, pelas delongas havidas, por quási todos os despachos lavrados e pareceres emitidos, a mais completa incapacidade administrativa; e considerando — quanto à essência das mesmas operações e dos direitos e obrigações delas emergentes e quanto, à forma da sua liquidação — que o Poder Legislativo, e por maioria de razão a Câmara dos Deputados isoladamente, não é o competente para definir aquelas o estabelecer esta, continua na ordem do dia.
Sala das sessões, aos 6 de Dezembro de 1923. — Morais Carvalho».
Sr. Presidente: sendo meu parecer que o Poder Legislativo não é o mais competente para resolver o caso em discussão, eu não quero contribuir, demorando mais esta discussão, para que fique sem solução um caso que é mais uma prova da incompetência de um regime que dura há treze estirados anos.
Apoiados.
Eu podia estranhar que, tendo passado pelo Govêrno, especialmente pela pasta das Finanças, um número indeterminado de ministros, nenhum, num tam grande espaço de tempo, desde Setembro de 1919, tenha tido ocasião de resolver, a questão. Mas não o faço.
O que não posso deixar de dizer é que não se compreende esta orientação, ou. melhor, esta desorientação de nada resolver, deixando sempre as questões som solução, e que isso só significa a incompetência administrativa dos govêrnos, e da qual resultam os maiores prejuízos para o País.
Apoiados.
O Sr. Rêgo Chaves, que é quem tem no caso as maiores responsabilidades, veio. fazer à Câmara o que chamou o seu depoimento.
Não tenho eu, nem ninguém nesta Câmara decerto, motivos para duvidar das afirmações do S. Ex.ª; mas se nós analisarmos detalhadamente o processo, chegamos à conclusão de que os documentos estabelecem o contrário do que S. Ex.ª diz.
O processo diz que foram os bancos que pediram as libras, e S, Ez. a diz que foi o Estado que ofereceu as libras.
O processo diz que, quando chegou o primeiro prazo de vencimento, focam os bancos que pediram ao Ministro das Finanças que lhes dêsse, uma prorrogação para a entrega das libras, o S. Ex.ª veio dizer que não, que foram as circunstâncias aflitivas do Tesouro, por ter de pagar mil e tantos contos, que motivaram a prorrogação, e que essa concessão não representa um favor do Estado aos bancos, mas dos bancos ao Estado.
Sr. Presidente: disse ainda o ilustre Deputado Sr. Rêgo Chaves que esta operação não pode. ser encarada à face dos textos frios e da leitura árida dos documentos, mas que tem de ser olhada levando em atenção aquilo que era a política financeira do Govêrno.
Disse S. Ex.ª, e concretizou êsse dizer em alguns, considerandos da sua longa moção, que no momento em que S. Ex.ª geriu a pasta das Finanças o País atravessava uma difícil situação económica e financeira, e que, por isso, muita gente especulava na praça, motivo por que S. Ex.ª procurou as entidades menos acusadas de especulação, aliando-se com elas para contrariar, a influência nefasta dos especuladores E então S. Ex.ª não encontrou melhor meio do que fornecer libras a essas entidades e interessá-las na melhoria do câmbio, porque tendo elas que pagar essas libras ao fim de determinado prazo, quanto mais baixa estivesse a libra mais lucrariam com a operação.
Êste foi o pensamento que orientou a acção do Sr. Rêgo Chaves neste assunto.
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Mas se as entidades bancárias com as quais o Sr. Rêgo Chaves se aliou tinham benefícios na melhoria cambial, naturalmente o pensamento de S. Ex.ª era o de que, quando chegasse a data do vencimento, essas entidades fossem obrigadas a entrar com as libras em seu poder. E por isso não se compreende que, tendo-se o câmbio agravado, não se mantivesse o mesmo propósito de exigir a entrega das libras. Foi S. Ex.ª até quem consentiu na prorrogação da data do primeiro vencimento.
Entre os meios apontados pelo Sr. Rêgo Chaves para obviar a êstes inconvenientes, parece-me que S. Ex.ª se esqueceu de que haveria um mais fácil: era que os Bancos fossem autorizados a entregar as libras em escudos ao câmbio do dia.
Se os Bancos, desde que houvesse, como houve, um agravamento cambial, ficavam dispensados de entregar as libras, desaparecia, naturalmente, o êxito da operação que o Sr. Rêgo Chaves tinha descoberto, visto que êles estavam dispensados de qualquer obrigação e não tinham interesso na melhoria cambial.
Isto quanto à operação em si.
Vêm depois os sucessivos despachos dos diferentes Ministros prorrogando os prazos; e eu não compreendo porque, estando já muito mais agravada a situação cambial, a nenhum dos Ministros das Finanças, ocorreu uma de duas cousas, conforme a sua orientação: ou obrigar os Bancos a entrarem com as libras, do que teria vindo algum benefício pára o Estado e para os próprios Bancos, que teriam liquidado numa situação mais favorável, ou então resolver desde logo o caso, fazendo a conversão das libras em escudos, evitando que se arrastasse em quatro anos uma situação que trouxe até o descrédito para algumas entidades bancárias nesta operação envolvidas.
Sr. Presidente: neste processo, a meu ver, tudo é digno de censura. Até os próprios pareceres das várias entidades consultadas dão lugar a reparos.
O Conselho Superior de Finanças, primeiramente ouvido, saltou para fora do âmbito da consulta. A Procuradoria Geral da República, consultada única e exclusivamente sob o aspecto jurídico da questão, entendeu que também devia dar parecer sôbre aquilo em que não foi consultada. Isto pelo que respeita ao passado.
Vejamos agora, em face dos factos, tais como êles são, o que é que convém fazer.
Há na Mesa duas moções, salvo êrro uma do ilustre Deputado Sr. Paiva Gomes e outra do ilustre Deputado Sr. Rêgo Chaves;
Ambas elas se pronunciaram no sentido de que ao caso deve dar-se a solução que entendermos.
Ora, Sr. Presidente, parece-me que, se dos três poderes do Estado um há que não deve ser chamado a resolver a questão, designadamente nos termos em que ela está posta, êsse é o Poder Legislativo; e ainda muito menos pode resolver a questão a Câmara dos Deputados isoladamente, por uma simples moção.
Trata-se de executar um contrato, cuja natureza júridica eu também me absterei de apreciar neste momento, porque não sei se êle irá até ao Poder Judicial, e não quero que amanhã, perante os tribunais, se possa argumentar com a minha opinião para dela tirar qualquer elemento em detrimento dos interêsses do Estado.
Trata-se, repito-o, de cumprir um contrato. Mas pode êle ser cumprido nas precisas condições em que foi celebrado?
Talvez que sim, talvez que não.
Há muita cousa a ponderar, a considerar; mas o Poder Executivo que resolva o assunto.
E se a sua deliberação não fôr de harmonia com os interêsses do Estado, o Poder Legislativo aqui está para pedir contas aos Ministros.
O Poder Executivo deve entregar o caso aos tribunais.
Esta é que me parece ser a verdadeira maneira de resolver o assunto: e é nesse sentido que foi orientada a moção que tive a honra de mandar para a Mesa.
Como disse, não desejo alongar as minhas considerações. Só me resta fazer votos, para que na resolução que o Sr. Ministro das Finanças, ou quem quer que seja, haja de tomar sôbre o assunto, e quanto mais depressa melhor, Deus lhe ponha a virtude, para que se não continue numa situação deprimente para o Es-
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tado, para o Govêrno e paria o Parlamento.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
Foi lida e admitida a moção do Sr. Morais Carvalho.
O Sr. António da Fonseca: — Uso péla segunda vez da palavra neste debate. Posso garantir desde já que o faço pela última vez e é por me ver forçado a tal, por isso que quero apreciar algumas das considerações apresentadas nesta Câmara pelo Sr. Rêgo Chaves. Antes, porém, do o fazer, como se suscitou uma: questão de incompetência da Câmara para se ocupar dêste assunto, exporei a minha opinião sôbre essa tese.
Sei que o Senado e a Câmara dos Deputados não são evidentemente competentes para indicarem ao Poder Executivo os trâmites num acto de administração; mas sei ao mesmo tempo que o assunto foi trazido à Câmara por um Sr. Deputado.
Ora em qualquer assunto de administração pública, que, porventura, possa ventilar-se nesta Câmara, ela, tora o direito de dizer ao Poder Executivo qual o sentido em que entende que um determinado acto de administração pública deve ser resolvido.
Evidentemente não compete ao Poder Legislativo dizer que não prorrogue, que obrigue a pagar, ou qualquer outro despacho dêste género; mas compete ao Poder Legislativo dizer ao Poder Executivo qual o sentido em que, na sua opinião, os interêsses do Estado ficam melhor acautelados.
Estamos, portanto, dentro da nossa acção, dentro do nosso papel, dentro das nossas atribuïções, votando qualquer moção que indique ao Sr. Ministro das Finanças o melhor caminho a seguir, para o efeito de acautelar os interêsses do Estado na questão das 400:000 libras.
Não posso, por isso, aderir à moção do Sr. Morais Carvalho, por me parecer que essa moção deminuíria na realidade as funções do Parlamento.
Apoiados.
O Sr. Rêgo Chaves, explicando os motivos que o haviam levado, como Ministro das Finanças, a dar as 400:000 libras, disse que necessitando escudos e desejando acudir à praça com libras, porque não havia libras na praça, o pretendendo; para melhorar o câmbio, além dos meios do que dispunha, fornecer escudos à praça, aliou à sua política financeira algumas instituições bancárias e ofereceu-lhes esta operação.
Não fez o Sr. Rogo Chaves nenhuma reserva para nenhuma entidade bancária, mas pareceu-lhe talvez valioso com algumas fazer uma reserva da qual resultaria a sua complacência.
É o que parece depreender-se das palavras de S. Ex.ª, em relação a uma das entidades.
Com efeito o Sr. Ministro das Finança» teve ensejo de ler um ofício dos constantes do processo e do qual se verifica que uma determinada instituição bancária pediu ao Sr. Ministro das Finanças a venda das libras.
Creio ter ouvido dizer ao Sr. Rêgo Chaves que S. Ex.ª soube da necessidade que êsse ontro Banco teve de libras, para servir a sua clientela. De facto é isto o que consta do processo. É até isso que se conclui das expressões do Sr. Rêgo Chaves.
Efectivamente assim foi; porque segundo me consta, e agora também pelas afirmações do Sr. Rêgo Chaves, realmente o Sr. Ministro das Finanças reüniu numa conferência vários representantes de diversas entidades bancárias, para estudarem êste problema e acertarem com êle o modo de realizar à operação.
Se efectivamente foi um favor que as casas bancárias fizeram ao Estado, como das próprias declarações do. Sr. Ministro das Finanças do tempo, Sr. Rêgo Chaves, tem de concluir-se, igual favor lhes fez o Estado. Pelo menos uma ou duas dessas casas tinham pedido ao Estado a venda simples e pura das libras.
Mas fôsse ou não fôsse um favor feito pelo Estado aos Bancos; ou pelos Bancos ao Estado, o que é facto é que a operação se fez e fez-se naqueles termos, como as próprias entidades bancárias confessam e como se conclui do processo, segundo expressamente declarou o Sr. Rêgo Chaves. O pensamento era não deminuir a posição do Govêrno e, portanto, não vender pura e simplesmente as libras.
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O Sr. Deputado disse que devia também ter vendido. Mas não vendeu. Foi uma expressão, de que S. Ex.ª se serviu, quando usou da palavra há dois dias.
Tomei nota dela, porque é efcctivamente mais um pequeno argumento a juntar àqueles donde é possível concluir que de facto não se tratou de uma operação do venda. O que havia, era simples: fazer uma combinação com os Bancos para regar a praça com libras.
As libras são do Estado português, que não as quere perder em nenhuma situação.
Nisto, estamos de acôrdo com o Sr. Rêgo Chaves.
A informação é sôbre um ofício em que se pede a primeira prorrogação.
Com pesar o digo: se o Estado não pede escudos, havia várias maneiras de resolver o, assunto: — ou o Estado dizer que não podia pagar, ou arranjar por qualquer processo os escudos necessários para receber, as libras.
Podia fazer como se fez. no caso do Banco Colonial, em que as libras foram entregues em determinado dia.
Mas não.
Então o Estado teria recebido as libras dos banqueiros.
O Banco Ultramarino não quis fazer êsse favor ao Estado, não sabe bem porquê.
Na verdade, numa situação como aqui nos descreveu o Sr. Rêgo Chaves naquele momento em que havia necessidade de um concurso dos Bancos para a melhoria cambial, necessidade de escudos para o tesouro português, é estranho que houvesse entidades, como a casa Torlades, que tivessem prestado serviços bancários e colaboração, não sendo Bancos, e que fôsse recusado o auxílio dos Bancos.
O Sr. Rêgo Chaves: — Tinha obrigação de lhes prestar justiça.
O Orador: — Eu não podia; deixar de fazer estas afirmações, em relação aos Bancos, sôbre o que consta do processo.
O Sr. Rêgo Chaves: — Pretendi demonstrar que faço justiça ao Banco Ultramarino:
Vinha contrato para abertura de um crédito para pagamentos, e estava prestando auxílio ao Estado.
O Orador: — Em todo o caso, para prestar outra caução, evidentemente iria encontrar, naturalmente, o Banco Ultramarino.
É possível quê nessa mesma altura houvesse outro Banco, e fôsse dispensado êste Banco de fazer qualquer espécie de operação.
Nesta altura fazia-se uma transferência duma certa importância, que não foi tam pequena como isso.
O Banco Ultramarino não precisava fazer êste serviço ao Estado.
Àparte esta estranheza, fez realmente bem.
E porque é que agora o Sr. Rêgo Chaves manda para a Mesa uma moção, encontrando uma fórmula para a liquidação, diversa da que, porventura, no próprio momento em que, se fez a primeira prorrogação, e sem nenhuma espécie de encargos, S. Ex.ª fez, sem nenhuma protecção para o Estado português?
Porque é que S. Ex.ª sendo Ministro das Finanças, não entendeu dever liquidar a operação?
O Sr. Rêgo Chaves é, precisamente o Ministro que faz as prorrogações por prazo mais curto: nunca por prazo superior a um mês.
Fez mais S. Ex.ª quando Ministro das Finanças.
Fez mais: numa determinada altura julgava Absolutamente profícuo não ter em consideração qualquer prorrogação; e á prova está em que indeferiu categoricamente uma prorrogação.
Sistematicamente, S. Ex.ª entende que haveria necessidade de liquidar a operação, nos precisos ferinos em que se havia feito.
Não era preciso saber se ia liquidar em escudos ou não.
Apoiados.
O Sr. Rêgo Chaves: — V. Ex.ª dá-me licença?
Outros motivos me levaram a isso.
Primeiro, a operação foi feita pelo meu antecessor em fins de Julho.
Depois, pensando que a publicação do decreto de aumento da circulação fiduciária fôsse superior ao valor do escudo, tive a indicação do meu aliado do ontem, para a operação se fazer.
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O Orador: — O que teria acontecido se nos meses, porque são alguns meses, durante os quais o Sr. Rêgo Chaves fez a prorrogação, lhe tivessem dito: pagamos, mas não ao melhor câmbio?
S. Ex.ª não quereria de forma alguma esta situação.
Chegámos à altura em que o Sr. António Maria da Silva obriga o Banco Economia a entregar libras ao câmbio 5.
O Banco Economia faliu, como toda a gente sabe, entre outros motivos, porventura, por causa dos juros do empréstimo, porque tem pago rigorosamente os juros sem nenhuma espécie dê preocupação de câmbios.
Interrupção do Sr. Pego Chaves.
O Orador: — O seu pensamento era êste: — eu não abandono as libras.
Eis que se chega à altura de pagar ao Banco; e o Sr. António Maria da Silva, Ministro das Finanças, não teve nenhuma espécie de consideração pelos prejuízos.
Quando se propôs ao Banco Economia o pagamento em libras, não se teve também em consideração o terem sido emprestadas ao câmbio 26 1/8.
E agora que nós chegámos à altura em que o câmbio está a 2, já há pontos de vista morais, já há enormes prejuízos, já há situações de praça, já há créditos, etc., etc., parecendo que a mesma idea de pagar varia duma determinada época em diante, em função do câmbio.
Se o pagamento da dívida dos bancos ao Estado era justo em 1921, quando o Govêrno do Sr. António Maria da Silva impôs ao Banco Colonial o pagamento das libras que lhe cedera, £ porque não é agora justo em relação a outras entidades igualmente devedoras?
Tem-se falado muito, em torno desta questão, do ponto de vista moral em que ela tem de ser, também apreciada, quanto aos bancos que são ainda devedores do Estado.
Mas como podemos nós entrar em linha de conta com o aspecto moral ao apreciar a posição dêsses bancos, quando com êle nos não preocupamos ao tratar-se de outras entidades que já foram obrigadas a pagar?
Eu não sei o que motivou a falência do Banco Economia, mas estou absolutamente convencido de que para essa falência muito deveria ter concorrido a satisfação do encargo de juros a que o Estado o obrigava.
Sr. Presidente: prometi não me alongar em considerações sôbre o assunto o não me alonguei.
Entendo que a Câmara é competente para dar ao Ministro das Finanças, não um despacho, mas uma indicação.
Apoiados.
Levadas as cousas ao ponto a que o foram, mal ficaria se terminássemos por reconhecer a incompetência da Câmara em tratar do caso.
Apoiados.
Não seria, certamente, bem apreciado lá fora que após o largo exame dum processo que foi facilitado a todos os Srs. Deputados, acabássemos por dizer que nada tínhamos com isso.
É realmente indispensável dar ao Ministro das Finanças a directriz que o conduza à liquidação dêste malfadado processo.
Desejava muito que fôsse votada a moção do Sr. Paiva Gomes, porque, em minha opinião, ela é a única que, pondo a questão nos seus verdadeiros termos, lhe dá a devida solução.
O Estado não pode seguir uma política de funil. A doutrina que aplica a um tem de ser aplicada a todos os outros em igualdade de circunstâncias. Sem isso não se terá feito uma obra de justiça.
Termino, Sr. Presidente, fazendo votos por que a questão seja ràpidamente resolvida.
O Sr. Abranches Ferrão (interrompendo): — Eu desejaria ouvir a opinião do V. Ex.ª em relação a um facto que no meu espírito modifica a posição dos bancos em face do Estado; êsse facto é o que diz respeito ao decreto do Sr. Pêros Francisco...
O Orador: — A minha opinião é precisamente a mesma da Procuradoria Geral da República. Escusado se torna, pois, que eu novamente a exponha.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador haja revisto as notas taquigráficas.
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O Sr. José Domingues dos Santos: — Sr. Presidente: não é bem sôbre o assunto em discussão que eu desejo usar da palavra. Faço-o simplesmente para dar algumas explicações à Câmara à qual peço desculpa de, por esta forma, ter escalado a palavra. Se assim procedo, porém, é porque não encontro outra forma de o fazer.
Não assisti ontem à discussão havida nesta Câmara a propósito duma nomeação feita pelo Ministério das Colónias; e não assisti propositadamente.
De algum tempo a esta parte que, a propósito dum caso em que incidentalmente me achei envolvido, o meu nome vem sendo badalado em certa imprensa sem que eu, por qualquer forma, tenha dito aquilo que poderia dizer. Considerei-me sempre absolutamente estranho a tudo quanto se passava.
Ontem, porém, o meu nome foi repetido várias vezes. Senti-me, então, na obrigação de dizer à Câmara alguma cousa que a pode interessar.
Não pedi nada, absolutamente nada ao Sr. Ministro das Colónias do gabinete transacto. Fui inteiramente estranho à nomeação feita por S. Ex.ª Tratando-se dum logar naturalmente desejado por várias pessoas, eu tenho, por isso, motivos para- lhe testemunhar os meus agradecimentos pelo facto de se ter lembrado do meu nome.
Sou, Sr. Presidente, um homem pobre — e isto não vai como censura aos que são ricos. Sou um homem que não, pertence a companhias e isto não vai como censura aos que pertencem a companhias. — Sou chefe de família numerosa que sustento, e à República tenho dado toda a minha dedicação, todo o meu esfôrço e todo o meu dinheiro.
Isto deveria merecer às pessoas que militam, embora, em partido oposto, o respeito que homens honrados devem merecer a homens honrados.
Infelizmente não se procedeu assim. A atitude assumida para comigo tem, pois, o aspecto dum agravo pessoal.
Não apoiados.
Êsse aspecto não interessa à Câmara interessa só a mim; eu não sou pessoa que me deixe agravar sem desforço.
Simplesmente não quero que, por minha causa, o Sr. Ministro das Colónias
tenha de abandonar o seu lugar. S. Ex.ª poderá continuar a sobraçar a sua pasta com aquela proficiência que nós estamos vendo.
O Sr. Ministro das Colónias declarou que o chefe do sou gabinete desistira do lugar para que tinha sido nomeado, e que nunca me nomearia para êle.
Não era precisa a declaração.
Eu nunca aceitaria um lugar para o qual fôsse nomeado por uma pessoa que não me merecesse confiança.
Para evitar que eu chegasse a êsse lugar era absolutamente desnecessário que S. Ex.ª fôsse levado a desfazer um decreto, atingindo assim o próprio nome do Sr. Presidente da República.
Tenho dito.
Vozes da esquerda: — Muito bem.
Vozes da direita: — Não apoiado.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Eu dei a palavra ao Sr. José Domingues dos Santos na ocasião em que se estava debatendo o caso das libras fornecidas aos bancos de Lisboa, sem poder supor que se ia renovar um debate já extinto. E como o Sr. Ministro das Finanças tinha — como reparei depois — pedido a palavra antes do Sr. José Domingues dos Santos, vou concedê-la agora a S. Ex.ª e não a darei a mais nenhum Sr. Deputado para se referir a uma questão já tratada.
O Sr. Carvalho da Silva: — V. Ex.ª não pode adoptar para êste lado da Câmara procedimento diverso do que usou para aquele lado (apontando para o lado esquerdo).
O Sr. Presidente: — V. Ex.ª nem sequer tem o direito de formular o desejo de que eu não adopte um. procedimento diferente para um lado ou para o outro, porque tem a certeza de que eu sou incapaz de o fazer.
O Sr. Carvalho da Silva: — O Sr. José Domingues dos Santos referiu-se os Deputados que na sessão de ontem abordaram o assunto, e eu julgo-me no dever de explicar o sentido das minhas palavras!
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O Sr. Presidente: — Se eu concedesse a V. Ex.ª a palavra para explicações tinha de a conceder a todos os outros Srs. Deputados!
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Pela mesma razão que V. Ex.ª deu a palavra ao Sr. José Domingues dos Santos e consentiu que êle se referisse ao debate de ontem, também deve permitir que dêste lado da Câmara se dêem explicações!
O Sr. Presidente: — Sr. Paulo Cancela de Abreu...
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — O que eu estou a ver é que uns são filhos e outros entoados!
O Sr. Presidente: — Eu tenho direito, ao respeito de V. Ex.ª...! Muitos apoiados.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Peço a palavra para explicações!
O Sr. Carvalho da Silva: — Peço a palavra para explicações!
Vozes da esquerda.
Ordem, ordem!
Ordem, ordem!
O Sr. Presidente: — Eu declarei que não sabia o que o Sr. José Domingues dos Santos ia tratar! Se eu soubesse, também não lhe tinha dado a palavra!
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Devia ter-lha retirado!
O Sr. Carvalho da Silva: — Peço a palavra para interrogar a Mesa!
O Sr. Presidente: — Tem S. Ex.ª a palavra.
O Sr. Carvalho da Silva: — Eu desejo explicar a V. Ex.ª e à Câmara em poucos minutos o sentido das minhas palavras de ontem. Entendo que tenho êsse direito, porque o Sr. José Domingues dos Santos aludiu aos Deputados que ontem falaram sôbre o caso referente a S. Ex.ª Não só tenho êsse direito, mas até o dever pela consideração que devo à Câmara! É preciso que não se interpretem erradamente as minhas palavras!
O Sr. José Domingues dos Santos: — Eu não fiz referência alguma especial!
O Sr. Presidente: — O Sr. José Domingues dos Santos tratou a questão sob o ponto de vista pessoal; e eu não consentirei que se venha enxertar no assunto em discussão o debate que já ontem se liquidou!
O Sr. Carvalho da Silva: — Reconheço, assim, que V. Ex.ª não adopte para êste lado da Câmara, o mesmo procedimento...
Vozes da esquerda: — Ordem, ordem.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Pedi a palavra para declarar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que aceito todas as moções que se encontram sôbre a Mesa e que solucionam o assunto, menos a que foi apresentada pelo Sr. Morais Carvalho.
Não é por cobardia que eu não quero assumir todas as responsabilidades do meu despacho; mas devo dizer que, muito antes de ter despachado, procurei penetrar no foro íntimo da minha consciência.
Nele se estabeleceu um debate, não sôbre um acto meu, mas sôbre uma intenção minha. E por isso tive de fazer uma carta que se encontra junto ao processo. Sinto, pois, que de maneira nenhuma tenho o direito de despachar sôbre o processo e, sim, de aceitar naturalmente as indicações que a Câmara me queira dar.
De modo que declaro a V. Ex.ª que todas as soluções me servem; e logo que a Câmara resolva aprovar qualquer daquelas moções, eu limitar-me hei, seja ela qual fôr, a transcrevê-la sôbre o processo e a despachar em conformidade com ela.
Ora, depois de tanto barulho e complicações, eu só posso aceitar da Câmara uma indicação clara. Por isso não aceito a moção em que se diz que seja eu quem resolva.
O orador não reviu.
O Sr. Rêgo Chaves: — Eu pedi à palavra, Sr. Presidente, porque tencionava responder a algumas das considerações feitas pelos Srs. Morais Carvalho e António Fonseca para repor no seu verdadeiro pé alguns factos. S. Ex.ªs discuti-
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ram o meu despacho do Setembro de 1919 e despachos subsequentes nas prorrogações do prazo, dando a característica dum verdadeiro contrato. Eu não sou jurisconsulto; ruas tinha a certeza do que dentro do Parlamento encontraria jurisconsultos que por qualquer forma dessem uma interpretação parecida com aquela que eu de momento tinha dado a1 operação.
A minha moção é uma moção do depoimento.
Podem V. Ex.ªs discutir hoje que eu poderia ter feito uma operação duma forma ou de outra, e que podia dar ou tirar esta ou aquela condição; mas a minha moção traduz aquilo que hoje, a quatro anos de distância, mo recordo ter sido efectivamente o que guiou a minha mão quando dei o meu despacho. Mas V. Ex.ªs, apreciando o meu despacho inicial sôbre a operação, esqueceram-se de salientar um facto que é importante: o ter havido um comprador que me veio comprar determinada mercadoria, que oram as libras, e que me entregou os mesmos escudos que entregaria a qualquer outra entidade que quisesse também vender libras.
A mais nada era obrigado êsse comprador.
O complemento dêsse despacho marca um objectivo que não consta das próprias palavras do despacho, o que é essencialmente importante. A obrigação que o devedor contraiu é uma obrigação em troca da vantagem que lhe foi prometida, e que não consta do despacho: a aliança que eu tinha feito com certas entidades para que a situação cambial se não agravasse.
Disse o Sr. António Fonseca que eu tinha sido terminante no meu despacho. Era dever meu dar um despacho terminante, porque essa liquidação tinha de fazer-se.
Procedi de harmonia com a minha moção que considera os pareceres da Procuradoria da República e do Conselho Superior de Finanças, mas tendo assim a coerência do meu modo de pensar. A minha moção, embora não o pareça, é a mais violenta porque obriga os Bancos a restituir as libras.
Um ilustre jurisconsulto, o Sr. Abranches Ferrão, analisou a operação sob. dois aspectos: o aspecto jurídico e o aspecto moral.
Eu que não sou jurisconsulto estranhei que se viesse com um aspecto moral que pode influir no critério dos juizes.
O Estado sujeitou-se a ganhar tudo ou a ganhar nada. A minha moção, por isso. é a mais violenta e está de harmonia com o aviso que fiz às entidades que comigo colaboraram.
Creio ter dito o bastante para que Câmara fique bem elucidada o poder votar.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Paiva Gomes: — Peço a V. Ex.ª que consulto a Câmara sôbre se permite que eu substitua alguns termos da minha, moção, que ficará assim concebida:
«A Câmara dos Deputados considerando» que a reentrega das libras cedidas aos Bancos Português o Brasileiro, Espírito Santo Silva & Ca. e à Sociedade Torlades & Ca. no montante de 400:000, é dívida em cheque sôbre Londres, bem como o pagamento dos respectivos juros, tudo em inteira harmonia com os termos contratuais de mútuo consenso aprazados.
Considerando que o Banco Colonial Português pagou, em cheque sôbre Londres, as 30:000 libras que lhe haviam sido cedidas precisamente nas mesmas condições, em obediência ao despacho ministerial de 25 de Abril dó 1921, embora a divisa cambial tivesse baixado de 21 3/4 a 5 1/2 passa à ordem do dia. — António de Paiva Gomes».
Foi autorizado.
O Sr. Marques Loureiro: — Sr. Presidente: entre os pareceres que me foram distribuídos como relator da comissão de comércio e indústria apareceu um assunto que dizia respeito ao fornecimento de vinte e quatro toneladas de ferro.
Esse fornecimento foi feito com pagamento em libras.
Esta resolução, com que o Sr. Ministro das Finanças concordou,, rendeu ao Estado, em vez do quinze contos, cento e noventa.
Apoiados.
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Devo esta explicação porque me encontro ligado por laços de sangue a um dos interessados.
Isto não influi na votação de qualquer moção. Interessa-me pouco qual seja a opinião que o meu partido deseje manifestar. Creio que cada um tem inteira liberdade para afirmar o que lhe pareça mais justo.
A minha opinião tenho a presa, por mim, pelo meu trabalho e até pelo meu próprio sangue, a um processo. E exposta a minha maneira de ver, quis apenas salientar que já houve neste país, e recentemente, um Ministro das Finanças que num caso que se me afigura bastante parecido com o que está em debate, emitiu a opinião, conforme com o parecer da comissão de inquérito, de que o pagamento deveria ser efectuado em libras. Apesar do enorme prejuízo, pagaram em libras os que não haviam ganho nessa negociação cousa que se parecesse sequer com o juro dessas próprias libras.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir, nestes termos, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: vou dizer muito poucas palavras.
Julgo-me obrigado a fazê-lo por duas razões, em primeiro lugar porque quando pela primeira vez o Sr. António Fonseca aqui falou no caso das 430:000 libras, eu interrompendo-o uma vez ou outra, me manifestei no sentido de ser indispensável a acção imediata do Estado, para receber o seu crédito; e, em segundo lugar, porque quando principiou o debate pela exposição do Sr. Paiva Gomes, eu me salientei de alguma maneira, embora involuntariamente, a tomar apontamentos do que S. Ex.ª ia dizendo.
Efectivamente eu não conhecia o processo, querendo esclarecer-me para poder votar, e, como não tinha tido a coragem do pedir o processo para o levar para casa a fim de o estudar e no decorrer das sessões não era já possível fazê-lo, queria apreender o assunto tam bem quanto possível para chegar ao fim do debate suficientemente esclarecido.
São estas as razões por que poucas palavras vou dizer, e a parte mais interessante delas será quási uma declaração da voto.
Antes porém de chegar a essa declaração de voto, devo dizer que não me parece que esta Câmara, não obstante as conceituosas considerações já feitas a êsse respeito, tenha competência para eficazmente — e peço à Câmara que não esqueça êste advérbio — declarar se determinadas pessoas, chamadas casas bancárias, devem ou não determinada quantia ao Estado.
Também mo parece que esta Câmara, não tem competência para eficazmente definir os actos praticados por diversos Ministros das Finanças, desde 1919 até hoje, neste caso das 430:000 libras, actos a que corresponderam outros da parte de diversas casas bancárias.
Essa definição teria o interêsse prática de fixar os direitos e os deveres resultantes dêsses actos e eu continuo a entender que não é ao Poder Legislativo que compete definir êsses deveres.
Por isso, Sr. Presidente, eu não quero decidir se o contrato ou contratos feitos entre os sucessivos Ministros das Finanças e diversas casas bancárias são contratos de venda, contratos de empréstimo caucionado ou qualquer outra cousa.
Nesta parte das minhas considerações a que só muito pretensiosamente poderia chamar capítulo, limitar-me hei a dizer que o depoimento feito pelo Sr. Rêgo Chaves, pessoa que pela sua atitude neste debate marcou um carácter e um aprumo moral a que presto homenagem, não me convence nem de que tenha havido um determinado contrato de venda? nem um contrato diverso.
S. Ex.ª pode ter tido uma intenção qualquer; mas a verdade é que S. Ex.ª praticou actos que não podemos isolar uns dos outros.
Temos de os considerar em conjunto e ao mesmo tempo, com os actos dos banqueiros respectivos.
Dizer como disse S. Ex.ª que o sou despacho ou parte do seu despacho, define a natureza jurídica do acto praticado, parece-me que é um ponto de vista porventura pouco defensável.
Poderia S. Ex.ª ter tido a intenção de praticar um acto jurídico, mas se do conjunto do seu despacho ou dos sucessivos despachos, dos restantes Ministros das Fi-
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nanças e ainda dos actos praticados pelos banqueiros, resulta uma cousa diversa, os actos do então Ministro das Finanças, não colhem para a definição, legalmente feita pelo instituição a que compete definir os direitos e deveres que de todos êsses actos derivam para o Estado e para os banqueiros.
Não sei se fui suficientemente claro.
Parece-me que sim; e, se faço esta declaração nítida, é porque me parece que embora como depoimento, as declarações do Sr. Rogo Chaves, fossem muito interessantes e porventura de uma importância que vai além das paredes desta sala, as suas palavras não alteram a situação de direito resultante dos diversos actos praticados.
Sr. Presidente: haverá porventura que abrir uma excepção às minhas palavras, com relação à competência da Câmara para definir direitos, desde que fôsse apresentada nesta casa uma proposta nítida, do transacção, porque o Ministro não se encontrava habilitado e autorizado a tratar a transacção.
Àpartes.
Então o Parlamento tinha que ver todo o aspecto jurídico da questão e porventura pronunciar-se por uma lei sôbre uma transacção.
Mas não é êste o caso quanto à transacção.
Àpartes.
A Câmara não tem que se envolver em apreciações jurídicas.
O que me parece, é que o Sr. Ministro das Finanças no exercício das suas funções de Ministro, terá que anular o processo como defensor que é dos interêsses do Estado, que correm pela sua pasta, e terá que lavrar outro qualquer despacho.
O último despacho até agora lançado, é do anterior Ministro.
Acho-o incompleto.
Necessita ser completado, por que é vago, e necessita ser bem definido por quem tem a gerência dos negócios públicos.
Àpartes.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal) (interrompendo): — Se a Câmara o V. Ex.ª em especial considerarem o despacho vago, tem de dizer o sentido em que êle devo ser interpretado, em que sentido êle é vago, e como deve ser completado, e não simplesmente dizer que é vago.
Peço a palavra.
O Orador: — Peço licença para dizer que me parece que a Câmara não tem a competência para substituir-se ao Sr. Ministro das Finanças nas suas funções próprias.
Disse eu que o despacho do Sr. Peres Trancoso tinha alguma cousa de vago, não só porque a audição do texto dele ine deixou essa impressão, mas, também, porque vi que o parecer da Procuradoria Geral da República o classifica de uma maneira equivalente, tanto que êsse parecer diz que o Govêrno faria bem em aplicar o artigo 743.º do Código Civil que é precisamente o texto que se refere às prestações que não têm prazo definido, indicando a forma dê corrigir êsse aumento.
E pouco mais ou menos isso que me parece necessário que o Sr. Ministro das Finanças faça no desempenho da sua função própria.
Tem para o fazer, pelo menos, a indicação da Procuradoria Geral da República que achou que havia lugar a proceder de alguma maneira nos termos do artigo 743.º
Depois, naturalmente, o Sr. Ministro das Finanças exige o pagamento daquilo que julgar devido ao Estado; e, se êsse pagamento se não faz voluntariamente, tem de recorrer aos tribunais, porque só êsses têm competência para, de uma maneira eficaz e não por um simples debato oratório, resolver sôbre o assunto.
Estabelece-se discussão entre o orador e o Sr. Ministro das Finanças.
O Orador: — Parece-me que não me fiz compreender.
Tudo quanto aqui deliberarmos não importa nenhuma obrigação para ninguém; porque nós, uma das casas do Congresso da República, não temos competência para obrigar o Estado.
Podemos dar simplesmente uma orientação que nada obriga.
Um àparte do Sr. Ministro das Finanças.
O Orador: — Aceito a rectificação, mas, emfim, do debate pode resultar uma orientação para o Sr. Ministro das Finanças,
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mas sem que produza efeitos decisivos sôbre quaisquer pessoas estranhas ao meio em que nos encontramos.
Por consequência, Sr. Presidente, solução final: o Sr. Ministro das Finanças vai despachar conforme uma das moções apresentadas, a que fôr votada; e, seguidamente, vai fazer cumprir êsse despacho, mas, como pode encontrar da parte dos interessados a recusa de voluntariamente se prestarem a tornar bom o seu despacho, declaro que darei o meu voto à moção do Sr. Paiva Gomes, porque entendo que ela 6 a que corresponde as necessidades de momento.
Tenho dito.
O orador no o reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Era minha idea explicar a interpretação se porventura não estivesse coacto; mas nestas condições eu vejo que não tenho que dar à Câmara a minha impressão pessoal, e por isso desisto da palavra.
Tenho dito.
O Sr. António Maria da Silva: — Sr. Presidente: não tencionava usar da palavra neste debato, primeiro porque êste assunto seria melhor versado por. jurisconsultos que tem assento nesta Câmara, e, em segundo lugar, porque julgo o assunto esclarecido.
Porém, como várias vezes se fez alusão ao Govêrno da minha presidência devo dizer da minha justiça.
Só mandei entregar as liaras ao Banco Colonial Português é porque não posso admitir que se tenha seguido uma doutrina para o Banco Colonial Português e outra para os outros Bancos.
Vê V. Ex.ª que a situação moral é inteiramente diversa, e êste despacho não pode legitimamente visar qualquer solução sôbre o assunto que se ventila neste momento.
Repito: se o Banco Colonial Português não tivesse procedido pela forma que eu referi, ficaria na situação dos restantes. Êle teve o justo castigo do mau acto que praticou; e não me parece que se possa visar qualquer solução jurídica durante o decurso das negociações havidas até agora para a realização final dêste assunto.
Em mais de um Conselho, a que eu presidi, êste assunto foi ventilado sempre com o desejo de o resolver por uma forma conveniente e por uma forma justa.
Não podemos abstrair o intento do Ministro que entregou as libras.
Êsse intento revela-se através deste processo, inclusivamente numa nota oficiosa que diz que o director geral da Fazenda Pública agiu por mandato do Ministro.
O intento dêste era associar-se com algumas casas bancárias para baixar o câmbio.
Foi o Ministro infeliz e não conseguia o objectivo, é certo; mas não se pode destruir a intenção honesta quando o Parlamento entregou ao Ministro um instrumento legal para providenciar em matéria de câmbios.
Há muita gente neste país que tem. horror às responsabilidades, o é por isso que êste assunto tem sido debatido pela forma como se sabe. Eu sou o primeiro que afirmo que o Ministro, Sr. Peres Trancoso, redigiu um despacho que pediu efectivamente ter tido outra redacção, servindo-se até — sem ofensa para o Sr. Rêgo Chaves — duma portaria mandado liquidar certa operação. Eu divergi da sua opinião porque entendia que era justo que o Ministro obrigasse os particulares não obrigasse o Estado. Mas seja como fôr, como o assunto era de direito, entendeu o Govêrno da minha presidência que devia consultar uma estação jurídica para definir o contrato ou como tinha sido feita a operação entre o Estado e os particulares, embora no Govêrno houvessem jurisconsultos, alguns dêles professores de direito.
Através de larga discussão vimos o que convinha ao Estado e a maneira de elucidar a questão à vista de todos, sem dissous; simplesmente com a preocupação de praticar uma obra justa e não sermos instrumento de ninguém. O Ministro de então, o Sr. Abranches Ferrão, redigiu as preguntas à Procuradoria Geral da República para se saber qual era o melhor caminho a seguir com vantagem para o Estado.
É por isso que o Sr. Rêgo Chaves disse há pouco que se a questão fôsse para um tribunal e se interpretasse o despacho do Sr. Peres Trancoso, dando-lhe vi-
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lor jurídico nos termos em que está concebido, o Estado ficaria com os escudos que representaram as libras ao câmbio do dia em que se fez a operação.
E porque não resolveu o Conselho de Ministros a questão?
Porque alguns dos Ministros lembravam-se dum caso anterior, da primeira vez que êste assunto veio à Câmara, e não quiseram resolver ràpidamente a questão, para que se não dissesse que o faziam por modo de que ela aqui fôsse versada.
Recordam-se V. Ex.ªs certamente de que uma vez, antes de se encerrar a sessão, o Sr. António Fonseca interrogou o Ministro das Finanças do meu Govêrno, o Sr. Vitorino Guimarães, preguntando-lhe pelo caso das libras.
Êste senhor leu à Câmara o que então podia ler e declarou que não lhe bastava uma consulta a uma entidade, e que ia ouvir outras.
A Procuradoria Geral da República respondeu ao Ministro que era o Poder Executivo quem devia resolver a questão. Do mesmo parecer eram também os Srs. Almeida Ribeiro, António Fonseca e até alguns Deputados nacionalistas.
Quero, portanto, afirmar à Câmara que circunstâncias independentes da minha vontade me impediram de comparecer à sessão nocturna, mas em qualquer momento não me dispensava de dizer à Câmara o que acabo de referir.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paiva Gomes: — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa um aditamento aos considerandos da minha moção.
Lido na Mesa, foi admitido.
O Sr. Presidente: — Está encerrada a discussão.
Vão votar-se as moções.
O Sr. Paiva Gomes: — Requeiro para a minha moção a prioridade e votação nominal.
O Sr. Presidente: — A moção de V. Ex.ª tem de ser a primeira a ser votada, porque foi a primeira a ser apresentada.
O Sr. Paiva Gomes: — Apesar disso, eu insisto no meu requerimento.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Paiva Gomes.
Procedeu-se à chamada para a votação nominal da moção do Sr. Paiva Gomes.
O Sr. Presidente: — Disseram «aprovo» 32 Srs. Deputados, e disseram «rejeito» 38. Está, portanto, rejeitada esta moção.
Disseram «aprovo» os Srs.:
Alberto da Rocha Saraiva.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António de Paiva Gomes.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Marques Loureiro.
Júlio Henrique de Abreu.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel. Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Disseram «rejeito» os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Álvaro Xavier de Castro.
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Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Baltasar do Almeida Teixeira.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio do Vasconcelos.
Constâncio do Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Leite Pereira.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
João Estevão Águas.
João do Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Mário de Magalhães Infante.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Vergílio da Conceição Costa.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo do Carvalho Guimarães.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se a moção do Sr. Rêgo Chaves.
O Sr. Sá Pereira: — Requeiro votação nominal para a moção do Sr. Rêgo Chaves.
Aprovado.
O Sr. Plínio Silva: — Requeiro a dispensa da leitura dos considerandos desta moção.
Assim se resolveu.
Foram lidas na Mesa as conclusões.
Procedeu-se à chamada.
O Sr. Presidente: — Disseram «aprovo» 30 Srs. Deputados e disseram «rejeito» 40.
Está rejeitada a moção do Sr. Rêgo Chaves.
Disseram «aprovo» os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alfredo Jordão Marques da Costa.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Álvaro Xavier de Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Correia.
António Pais da Silva Marques.
Artur Brandão.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Constâncio de Oliveira.
Domingos Leito Pereira.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
João Estêvão Águas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
Lourenço Correia Cromes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Mário de Magalhães Infante.
Paulo da Costa Menano.
Vergílio da Conceição Costa.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Disseram «rejeito» os Srs.:
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto da Rocha Saraiva.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
António Abranches Ferrão.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Marta da Silva.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
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Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Custódio Martins de Paiva.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
Joaquim Brandão.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
Júlio Henrique de Abreu.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Foi lida na Mesa a moção do Sr. Morais Carvalho.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro votação nominal.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal) (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: julgo prejudicada a moção do Sr. Morais Carvalho, em face da rejeição da moção do Sr. Rêgo Chaves, porque a Câmara nega ao Poder Executivo a faculdade de resolver a questão.
O Sr. Morais Carvalho (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Finanças não tem razão. As conclusões das duas moções são inteiramente diversas.
O Sr. Rogo Chaves entende que é ao Poder Executivo que compete resolver a questão; eu entendo que não é o Poder Legislativo que a deve resolver. Pode ser o Poder Judicial.
O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal)(sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: o Podei Judicial só pôde ser ouvido quando na interpretação dum contrato exista um conflito entro o Poder Executivo e os interessados. Fora disso não tem que intervir.
O Sr. Almeida Ribeiro (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: não me parece exacto o que acaba de dizer o Sr. Ministro das Finanças, isto é, que a Cismara, rejeitando a moção do Sr. Rêgo Chaves, tenha negado ao Poder Executivo competência para resolver o assunto.
O Sr. Jorge Nunes (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: nós tínhamos neste caso, três caminhos a seguir: ou entregar a questão aos tribunais, ou entrarmos no campo da conciliação entre o Poder Executivo e a outra parte interessada, ou deixar estar o processo a dormir na secretaria do Ministério das Finanças.
A moção do Sr. Paiva Gomes apresentava como meio de solução o recurso aos tribunais; e a Câmara, rejeitando-a, pôs de parte esta hipótese.
Vozes: — Nunca!
O Orador: — Quem ler a moção tem que reconhecer que há um só recurso: que é o tribunal.
Mas, porque encaro ò assunto no campo das realidades, eu confesso que, indo-se para êsse caminho, o Estado nunca receberia nada.
Em conclusão: em presença da decisão da Câmara o Sr. Ministro das Finanças só tem uma cousa a fazer: é pôr uma pedra sôbre a questão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Abranches Ferrão: — Não compreendo que o Poder Executivo fique inibido de resolver a questão.
O que indicou a Câmara?
Que não estava de acôrdo em que só resolvesse a questão pela forma proposta pelo Sr. Rêgo Chaves, nem com a formula preconizada na moção do Sr. Paiva Gomes.
Quere dizer, a Câmara indica ao Ministro que resolva o assunto por uma maneira que seja mais harmónica com os interêsses do Estado.
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O Sr. Ferreira da Rocha: — As moções apresentadas foram duas. Estabelece-se numa uma forma de transacção. Rejeitei essa moção porque entendo que a Câmara não tem competência para a propor ou aceitar.
Só pode transaccionar quem tem poderes para alienar e só pode alienar cousas do Estado a soberania por uma lei e não por uma resolução da Câmara.
Aprovei a moção do Sr. Paiva Gomes, para significar que reconheço ao Estado
O direito de exigir o cumprimento integral das obrigações por parte dos Bancos.
O facto de ser rejeitada essa moção não quere dizer que fiquemos prejudicados no direito que temos de apreciar qualquer assunto, quando êle vinha à tela da discussão, em qualquer tempo e sob qualquer outra forma.
Além disso, Sr. Presidente, nós ainda temos uma outra moção para votar, a qual indica ainda um outro caminho.
O assunto, Sr. Presidente, a meu ver, não está finalmente resolvido, podendo êle ser novamente debatido nesta Câmara amanhã mesmo, por proposta do qualquer Deputado.
Eram estas, Sr. Presidente, as considerações que tinha a fazer para justificar até certo ponto, a minha atitude e a minha maneira de votar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr.. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Sr. Presidente: a verdade dos factos é esta:
Eu não viria à Câmara com esta questão; pois, a verdade é que, Sr. Presidente, eu tenho a coragem suficiente para resolver o caso sem, me importar com os ataques que me possam dirigir.
Porém, desde que a Câmara siga o caminho a que já me referi, eu, Sr. Presidente, como Ministro das Finanças não poderei seguir outro caminho. Não poderei despachar sôbre êste processo, sendo somente a Câmara que tem do despachar.
Esta, Sr.. Presidente, é a minha opinião, tanto mais quanto é certo que a moção diz muito claramente o seguinte:
Leu.
Não posso, portanto, como a Câmara vê despachar sôbre êste processo, pois, a verdade é que fico sem saber o que hei-de exigir.
A Câmara, no emtanto, resolverá como julgar mais conveniente, mas, se eu não posso ir para os tribunais, como mo proíbe também a resolução do Sr. Rêgo Chaves,, se não adopto a solução do Conselho Superior de Finanças, que não foi detalhada, que me resta?
A Câmara já mediu bem as consequências do despacho do Sr. Peres Trancoso?
O despacho diz que o capital não é devido.
Digam o que quiserem; mas a dívida ficou anulada, pois se transformou uma dívida de capital numa dívida de juros.
Àpartes.
Não há senão duas soluções — digam o que disserem os jurisconsultos:
Ou se dá valor ao alvitre do Sr. Paiva Gomes, ou se dá validade a uma nova solução.
Àpartes.
Eu, como Ministro das Finanças, assim o entendo; e se há pessoas mais inteligentes, que vejam a solução de outra maneira, que venham para o meu lugar.
Ou é bastante o despacho do Sr. Peres Trancoso, e então não há solução nenhuma senão aquela que indica o Conselho Superior de Finanças, ou não é bastante, e então temos que aplicar a lei de responsabilidade ministerial.
Àpartes.
Se o Parlamento rejeita as duas soluções, que venham depois os conselheiros resolver a questão, porque eu, como Govêrno, governo-me pela minha cabeça, e não pela deles.
Àpartes.
A Câmara que tenha coragem na sua resolução; porque a própria minoria deixou-me dúvidas na votação quanto ao valor do numero para poder tirar uma dedução.
Aprovar a moção do Sr. Morais de Carvalho é indicar-me a porta da rua.
A Câmara só pode fazer uma cousa, que é indicar a solução.
Se não o fizer, a solução da questão fica pendente, emquanto eu ocupar a pasta das Finanças.
Quanto à indicação de alguns conso-
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lheiros, não a aceito, e devolvo-a à procedência.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Fonseca: — Sr. Presidente: eu considero a segunda parte da moção do Sr. Morais de Carvalho prejudicada.
Peço licença paru chamar a atenção de V. Ex.ª, Sr. Presidente, para o artigo 109.º do Regimento que diz o seguinte:
Artigo 109.º Em qualquer estado do debate, poderá suscitar-se uma questão ou moção de ordem.
São moções de ordem: a questão prévia, o adiamento, a invocação do Regimento, a apresentação de propostas para eliminação, emendas, substituições ou aditamentos, o a proposta para se passar à ordem do dia.
§ 1.º A questão prévia dá-se sempre que um Deputado proponha que a assemblea, por qualquer motivo, não pode deliberar concernentemente à matéria que só discute; e, sendo apoiada por cinco Deputados, considerar-se há admitida, entrará em discussão e será resolvida antes da questão principal.
Ora, é justamente o que o Sr. Morais de Carvalho propôs à Câmara.
A sua questão deve ser tomada como questão prévia e, quando não seja assim, não pode deixar de considerar-se prejudicada; porque a Câmara, após uma votação que fez, perante uma moção, não pode julgar-se incompetente para tomar uma deliberação.
Isso seria desvirtuar completamente todo o significado da votação que se fez.
A segunda parte da moção proposta pelo Sr. Morais de Carvalho está prejudicada pelos factos, assim como se julgou prejudicada pelos factos a moção do Sr. Carlos Pereira.
Não me parece que possa interpretar-se de outra maneira.
Resta apenas votar a primeira parte, em que o Partido monárquico toma esta operação como uma censura aos actos da administração republicana.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — V. Ex.ª dá-me licença?
O que a moção diz é que a Câmara e incompetente para decidir o assunto e não para discutir.
O Orador: — A Câmara julgou-se competente; e tanto que discutiu o assunto e decidiu sôbre êle na votação das moções. Essa parte da moção está prejudicada pelos factos.
Quanto às consequências das votações realizadas não me parecem que elas poisam ter uma gravidade tam grande como lhe estão a atribuir. A Câmara não concorda com as resoluções apresentadas, mas não quere dizer que amanhã não possa resolver o assunto.
O Sr. Ministro dás Finanças deve deixar ficar o processo como entende, até que alguém, ou mesmo S. Ex.ª, queira tomar qualquer deliberação, do que não está inibido por qualquer votação da Câmara.
Apoiados.
A sua situação fica na mesma.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ferreira da Rocha: — A situação tal como o Sr. Ministro das Finanças a apresenta, é a seguinte: S. Ex.ª entende — e a meu ver, muito bem — que não pode resolver o assunto, não já pela sua incompetência como membro do Poder Executivo mas porque as suas intenções foram postas em dúvida.
O Sr. Ministro das Finanças aproveitou, portanto, à interpelação que lhe foi feita para nela encontrar a directriz do seu procedimento. Mas a forma porque a questão foi encarada deu em resultado que nenhuma indicação parlamentar foi, dada ao Ministro.
A situação é inconveniente para o Po» der Executivo, é inconveniente para o Poder Legislativo?
Eu creio que todos nos podemos ainda entender para chegar a uma solução.
Não há nada que impeça a Câmara de tratar o assunto em segunda interpelação. E assim, eu mando para a Mesa uma nota de interpelação ao Sr. Ministro das Finanças, interpelação que poderia ser marcada para amanhã, e a propósito da qual a Câmara poderá tomar sôbre o assunto uma resolução definitiva.
O orador não reviu.
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O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Não posso, por agora, considerar-me habilitado a discutir a interpelação anunciada pelo Sr. Ferreira da Rocha.
Tenho outros assuntos mais importantes de que me ocupar, como sejam, por exemplo, as propostas de finanças.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Eu vou pôr à votação a moção do Sr. Morais Carvalho, porque, em meu entender, não está prejudicada.
O Sr. António Fonseca: — A Câmara tanto se julgou competente para indicar uma solução que a rejeitou.
Logo, não pode haver dúvidas sôbre a sua competência.
Não se trata dos meios de efectivar essa solução.
Trata-se apenas de definir a forma de liquidação. Se a Câmara se julga com competência para julgar do assunto, não mo parece que V. Ex.ª tenha de deixar de submeter a moção à votação.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: parece-me haver um equívoco da parte do Sr. Ministro das Finanças; porquanto, a moção apresentada pelo Sr. Morais Carvalho, representa o modo de sentir dêste lado da Câmara, sem o mais leve intuito político.
Parece concluir-se das considerações que tenho ouvido, que a rejeição que a Câmara acaba de fazer das duas moções é interpretada como reprovação de qualquer das soluções apresentadas.
Sr. Presidente: a moção do Sr. Morais Carvalho não é mais do que uma explicação do voto da Câmara, porquanto nela não se concorda ou discorda de qualquer das soluções, mas antes se faz sentir que não é ao Poder Executivo que compete a resolução do assunto.
Nestas circunstâncias, torno a repetir, a moção não tem qualquer intuito político, mas simplesmente manifestar que é à Câmara que compete resolver a questão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vou consultar a Câmara sôbre se considera a moção do Sr. Morais Carvalho como uma questão prévia.
Consultada a Câmara, esta rejeitou.
Foi rejeitada a votação nominal requerida pelo Sr. Cancela de Abreu, bem como a moção da autoria do Sr. Morais Carvalho.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferreira): — Sr. Presidente: permita V. Ex.ª que eu solicite a atenção dos Srs. Deputados, especialmente dos Deputados da maioria, porquanto tenho de invocar o testemunho deles.
Estava em serviço no meu Ministério quando fui prevenido de que o Sr. José Domingues dos Santos fizera referências a algumas palavras que êle supunha ter eu proferido aqui, tirando dela determinadas conclusões.
Parece-me que S. Ex.ª entendeu que eu, ontem, durante a discussão aqui travada sôbre a sua nomeação para o cargo de delegado do Govêrno junto da Companhia de Moçambique, tivera dito que nunca o nomearia.
Ora, eu não disse semelhante cousa. E faço esta afirmação por um dever de lealdade, por amor à verdade e pelo respeito que devo a mim próprio.
Eu disso e, repito que o decreto que foi discutido, julgo-o mal promulgado e mal redigido, e que não o mandava para o Diário de Govêrno.
Sustento que se me tivesse prevenido de que se tratava apenas de corrigir um lapso, um êrro, isto é, que se tratava apenas de fazer uma alteração autorizada por quem de direito, eu tê-lo ia mandado para o Diário do Govêrno; mas com a minha assinatura e não com a de outro.
justa é a pura verdade e disto podem V. Ex.ªs tirar as conclusões que quiserem.
Lamento, Sr. Presidente, que o Sr. Deputado a quem me referi, não esteja presente, se bem que por um dever de lealdade lhe tivesse feito saber que viria à Câmara ocupar-me do assunto; porém S. Ex.ª mandou-me dizer que não poderia esperar por ter de ir para o comboio.
Lamento, repito, que S. Ex.ª não esteja presente.
Não quis, porém, deixar de dar estas
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explicações à Câmara pela muita consideração que tenho por ela, visto que dela faço parte.
Termino, pois, Sr. Presidente, lamentando mais uma vez que, sôbre assuntos desta natureza, pessoas levianas pronunciem palavras que possam dar lugar a casos tam desagradáveis como êste.
De resto, Sr. Presidente, e para concluir, devo dizer que não só das minhas, palavras como dos meus actos, assumo toda a responsabilidade; mas as que outros me possam atribuir não estou disposto a assumi-las.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se uma nota de interpelação enviada para a Mesa pelo Sr. Ferreira da Rocha.
Foi lida.
É a seguinte:
Nota de interpelação Desejo interpelar o Sr. Ministro das Finanças sôbre os despachos ministeriais exarados no último trimestre de 1921 sôbre o processo referente à cedência de libras pelo Estado a alguns bancos. — Manuel Ferreira da Rocha.
O Sr. Plínio Silva: — Se bem que eu ontem tivesse pedido a palavra, V. Ex.ª não ma concedeu, estando eu no emtanto, certo de que não houve da parte de V. Ex.ª o mínimo propósito de me coartar um direito que me assiste.
Desejo, Sr. Presidente, chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para um assunto muito urgente e importante, para o qual necessitarei apenas de alguns minutos, razão por que eu espero que tanto V. Ex.ª como a Câmara estarão de acôrdo em que eu use da palavra.
O Sr. Presidente: — V. Ex.ª tem razão, pois, a verdade é que o seu nome acha-se aqui inscrito.
A minha falta, porém, deve-se ao facto do nome de V. Ex.ª ter sido escrito com uma caligrafia mais pequena, do que os outros, razão por que me passou despercebido.
Foi esta, repito, a única razão do lapso havido.
O Sr. Plínio Silva: — Sr. Presidente: agradeço a V. Ex.ª a generosa concessão que me acaba de fazer para aproveitar a ocasião de estar presente o Sr. Ministro do Comércio e o Sr. Presidente do Ministério para tratar de um caso de certa gravidade.
Em 28 de Novembro dêste ano solicitei que me fossem fornecidos cinco processos relativos a um fornecimento de carvão pela casa Evans & Read Coal Co. Ltd., à Administração Geral dos Caminhos de Ferro do Estado; reparação e aquisição de vapores para o Sul e Sueste; construção de novas oficinas no Barreiro pela casa Bourdenose; aquisição de máquinas e ferramentas para as ditas oficinas, e processos de aquisição de material ferroviário para os caminhos de ferro do Estado por conta das reparações en nature.
Com espanto meu, recebi per intermédio de V. Ex.ª uma comunicação do Sr. Ministro do Comércio em que declara que não me pode fornecer os referidos processos, mas que me serão enviadas cópias se forem pedidas.
Esperava que êsses processos me fossem facilitados imediatamente, porque isto de se dizer que me vão ser fornecidas cópias, equivale ao mesmo que nunca as ter, pois os processos são extraordinariamente volumosos e essas cópias levariam anos a tirar.
Acresce ainda que o Sr. Ministro do Comércio, teve interferência directa num dêsses processos, e sabe que alguns me podem ser desde já entregues.
Apelo, pois, para o Sr Ministro do Comércio o para o Sr. Presidente do Ministério, para que me sejam fornecidos já, senão todos, pelo menos dois ou três processos, porque desejo tratar do assunto imediatamente nesta Câmara.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio (Pedro Pita): — Em primeiro lugar, não compreendo a razão por que o Sr. Plínio Silva chamou também a atenção do Sr. Presidente do Ministério, para a questão do fornecimento de documentos pertencentes ao meu Ministério; em segundo lugar, já por mais de uma vez tenho declarado que é preciso não confundir o Ministro do Comércio com o consultor jurídico dos caminhos de ferro, porque são duas entidades absoluta-
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mente distintas; em terceiro lugar, tenho a dizer ao Sr. Plínio Silva que me prontifiquei a dar a S. Ex.ª as cópias dos processos, muito embora isso representasse muito esfôrço para o pessoal do Ministério, mas, caso S. Ex.ª queira, tem êsses processos à sua disposição no Ministério, nos lugares onde só encontram.
S. Ex.ª não pode exigir que eu lhe entregue processos que dão para carregar qualquer carroça e são. além disso, processos importantes.
Faço, porém, a S. Ex.ª esta declaração: todos os pareceres estão às suas ordens nas respectivas repartições.
O Sr. Plínio Silva (interrompendo): — Há processos que são de pequeno volume e alguns estão na secretaria do Ministério do Comércio o outros em outras secretarias do Estado.
O Orador: — Sob a minha responsabilidade não saem das repartições nenhuns processos; mas, se a Câmara os mandar entregar, eu entrega-los-hei imediatamente.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã à hora regimental, com a seguinte ordem de trabalhos:
Antes da ordem do dia:
A de hoje.
Ordem do dia:
A de hoje, menos a interpelação.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 15 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Projecto de lei
Dos Srs. Pires Cansado e Sousa Coutinbo isentando de contribuição predial durante vinte anos os proprietários que fizerem plantações frutíferas ou florestais em terras algarvias.
Para o «Diário do Govêrno».
Do Sr. Juvenal de Araújo concedendo aos empregados aposentados das administrações dos concelhos e bairros a melhoria de vencimentos constante do decreto n.º 8:927, de 19 de Junho do 1923.
Para o «Diário do Govêrno».
Comissões
Grupo A
Administração pública:
Abílio Marçal.
Alfredo de Sousa.
Custódio de Paiva.
Feliz M. Barreira.
José da Costa Gonçalves.
Administrativa — Luís Tavares de Carvalho.
Agricultura:
Francisco do Amaral Reis.
João Luís Ricardo.
João Salema.
J. Serafim de Barros.
José Gomes de Vilhena.
Caminhos de ferro:
J. Estevão Águas.
J. Cortês dos Santos.
Júlio Gonçalves.
Luís da Costa Amorim.
Plínio Silva.
Colónias:
Abílio Marçal.
Alfredo Gaspar.
A. Paiva Gomes.
Delfim Costa.
Francisco Amaral Reis.
F. Velhinho Correia.
Jaime de Sousa.
J. Norton de Matos.
Comércio e indústria:
Aníbal de Azevedo.
Carlos Pereira.
Teixeira Vaz Guedes.
J. Domingues dos Santos.
Sebastião Herédia.
Correios e telégrafos:
Custódio de Paiva.
Germano de Amorim.
Luís de Amorim.
Plínio Silva.
Malheiro Reimão.
Estatística:
António do Mendonça.
Delfim Costa.
Gomes de Vilhena.
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Diário da Câmara dos Deputados
Valentim Guerra.
Vítorino Godinho.
Finanças:
A. Portugal Durão.
A. Paiva Gomes.
Carlos Pereira.
F. Rêgo Chaves.
F. Velhinho Correia.
L. Correia Gomes.
Mariano Martins.
Júlio de Abreu.
Guerra:
A. Pinto da Fonseca.
J. Estêvão Águas.
J. Cortês dos Santos.
Tomás Sousa Rosa.
Vitorino Godinho.
Infracções e faltas:
Américo S. Castro.
Almeida Ribeiro.
Germano de Amorim.
M. de Sousa Dias Júnior.
Pedro de Castro.
Instrução especial e técnica:
Augusto Nobre.
Luís da Costa Amorim.
J. Domingues dos Santos.
Marcos Leitão.
Teófilo Carneiro.
Instrução primária:
Marques de Azevedo.
Tavares Ferreira.
Baltazar Teixeira.
Mariano Felgueiras.
Marcos Leitão.
Instrução secundária:
Alberto Vidal.
Baltasar Teixeira.
João Camoesas.
Sousa Coutinho.
Marcos Leitão.
Instrução superior:
Augusto Nobre.
João Camoesas.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Manuel Sousa Coutinho.
Legislação civil e comercial:
Crispiniano da Fonseca.
Amadeu de Vasconcelos.
António Dias.
Vergílio Saque.
Alfredo Sousa.
Legislação criminal:
Adolfo Coutinho.
Crispiniano da Fonseca.
António Resende.
Pedro de Castro.
Vasco Borges.
Marinha:
Portugal Durão.
Alfredo Gaspar.
António Mendonça.
Jaime de Sousa.
Mariano Martins.
Eclesiásticos:
Amadeu de Vasconcelos.
Narciso da Silva Matos.
Manuel Fragoso.
Pedro de Castro.
Valentim Guerra.
Estrangeiros:
Portugal Durão.
Bartolomeu Severino.
Jaime de Sousa.
J. Domingues dos Santos.
Vasco Borges.
Obras públicas:
Amadeu de Vasconcelos.
Aníbal de Azevedo.
Plínio Silva.
Sebastião Herédia.
Malheiro Reimão.
Orçamento:
Abílio Marçal.
Adolfo Coutinho.
Pinto da Fonseca.
Tavares Ferreira.
Paiva Gomes.
Bartolomeu Severino.
Velhinho Correia.
J. Luís Ricardo.
Mariano Martins.
Pescarias:
Crispiniano da Fonseca.
Estêvão Águas.
João Salema.
J. Oliveira Salvador.
M. de Sousa Coutinho.
Previdência social:
Américo de Castro.
António da Silva Marques.
J. Luís Ricardo.
Tavares de Carvalho.
Maximino de Matos.
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Sessão de 5 e 6 de Dezembro de 1923
Petições:
Delfim Lopes.
Correia Gomes.
Manuel Fragoso.
Paulo Limpo Lacerda.
Pedro Sá Pereira.
Recrutamento:
Alves da Cruz.
Barros Capinha.
Oliveira Salvador.
Tavares de Carvalho.
Sousa Rosa.
Redacção:
A. Marques de Azevedo.
Júlio de Abreu.
Regimento:
Almeida Ribeiro.
Baltasar Teixeira.
Delfim Lopes.
J. T. Vaz Guedes.
Vergílio Saque.
Revisora de contas:
António Resende.
Mariano Felgueiras.
Saúde e assistência pública:
Alves da Cruz.
João Camoesas.
Luís Damas.
Serafim de Barros.
Maximino de Matos.
Trabalho:
Narciso de Matos.
Barros Capinha.
Pedro Sá Pereira.
Teófilo Carneiro.
Vasco Borges.
Para a Secretaria.
Grupo B
O Partido Nacionalista reconduz nas comissões os representantes que nelas figuravam na sessão legislativa passada e substitui e nomeia os que actualmente são Ministros e os que faltam em qualquer das comissões para preencher as vagas existentes, nos termos seguintes:
Administração pública:
Substituir Pedro Pita por João Marques da Costa.
Colónias:
Substituir Eugénio R. Aresta por Viriato Gomes da Fonseca.
Correios, telégrafos e indústrias eléctricas: Nomear Vergílio Costa.
Finanças:
Nomear Alberto Xavier.
Guerra:
Nomear David Augusto Rodrigues.
Instrução especial e técnica:
Substituir Vicente Ferreira por Ferreira de Mira e nomear Joaquim de Oliveira.
Instrução primária:
Substituir Ginestal Machado por Jordão Marques da Costa e nomear Artur Brandão.
Instrução secundária:
Substituir Ginestal Machado por João Bacelar e nomear Joaquim de Oliveira.
Legislação civil e comercial:
Substituir Pedro Pita por Moura Pinto.
Legislação criminal:
Orçamento:
Substituir Vicente Ferreira por Viriato da Fonseca; Cunha Leal por David Rodrigues e nomear João Bacelar.
Recrutamento:
Nomear David Rodrigues.
Regimento:
Substituir Lopes Cardoso por Jaime Cansado.
Carlos Olavo, José de Magalhães e Lino Neto figuram como nacionalistas para o eleito da contagem das comissões.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 4 de Dezembro de 1923. — Álvaro de Castro
Para a Secretaria.
Exmo. Sr. Presidente — Declaro a V. Ex.ª que a minoria monárquica indicou para seu representante na Comissão do Orçamento o Sr. Manuel Duarte. — Aires de Ornelas.
Para a Secretaria.
Grupo E
Administração pública — Carlos Olavo Correia de Azevedo.
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Diário da Câmara dos Deputados
Agricultura — Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Caminhos de ferro — António Alberto Tôrres Garcia.
Colónias:
Fausto Cardoso de Figueiredo, José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Comércio e indústria — Nuno Simões.
Correios, telégrafos e indústrias eléctricas — Américo Olavo Correia de Azevedo.
Estatística — Mário Pamplona Ramos.
Finanças:
Fausto Cardoso de Figueiredo. António Pinto de Meireles Barriga.
Infracções e faltas — Alberto da Rocha Saraiva. —
Guerra — António Alberto Tôrres Garcia.
Instrução especial e técnica — Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Instrução primária — João Pires de Morais Júnior.
Instrução secundária — Francisco Manuel Homem Cristo.
Instrução superior — Alberto da Rocha Saraiva.
Legislação civil e comercial — António de Abranches Ferrão.
Legislação criminal — João Baptista da Silva.
Marinha — Armando Pereira da Costa Agatão Lança.
Negócios eclesiásticos — António de Abranches Ferrão.
Negócios estrangeiros e direito internacional — Nuno Simões.
Obras públicas e minas — António Alberto Tôrres Garcia.
Orçamento:
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
Petições — José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Previdência social — Alberto da Rocha Saraiva.
Pescarias — Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Recrutamento — Francisco Dinis de Carvalho.
Regimento — António de Abranches Ferrão.
Saúde e assistência pública — Francisco Dinis de Carvalho.
Trabalho — João Pina de Morais Júnior.
Para a Secretaria.
Aditamento de um considerando à moção do Sr. Carlos Pereira
Considerando que todos os despachos ministeriais tendentes a excluir as entidades devedoras das libras cedidas, do encargo da reentrega, são írritos e nulos; — A. Paiva Gomes.
Rejeitado.
Requerimentos
Requeiro que, pelo Ministério da Agricultura, me seja fornecida, com a maior urgência, cópia da representação que a União dos Moageiros, Ltd. fez ao Sr. Ministro da Agricultura, acêrca da distribuïção do trigo que a mesma União dos Moageiros importou, e que se encontra no Tejo.
Mais desejo cópia de toda a correspondência trocada entre o Ministério da Agricultura e esta emprêsa.
Cópia do despacho que S. Ex.ª o Ministro deu, para que a distribuïção se fizesse.
Cópia de qualquer inquérito que haja sido feito às fábricas de moagem de Portalegre, Grato, Ponte de Sor e Abrantes, acêrca da quantidade de trigo que está em armazéns destas fábricas. — António Correia.
Expeça-se.
Declarações de voto
Declaro que rejeitei as moções dos Srs. Paiva Gomes e Rêgo Chaves, por entender, que não compete ao Poder Legislativo regular a forma de pagamento das libras cedidas pelo Poder Executivo. — Baltasar Teixeira.
Para a acta.
Declaro que, tendo sido rejeitada a moção do Sr. Paiva Gomes, na minha involuntária ausência, aprovei a moção do Sr.
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Sessão de 5 e 6 de Dezembro de 1923
Rêgo Chaves, por ser, das duas que faltavam votar, a que me parecia mais adequada à resolução imediata de um assunto cujo protelamento será prejudicial ao prestígio da administração pública e aos interêsses económicos da Nação. -Afonso de Melo.
Para a acta.
Declaro que rejeitei as moções dos Srs. Paiva Gomes e Rêgo Chaves, por entender que não compete ao Poder Legislativo regular a forma de pagamento das libras cedidas pelo Estado. — Nunes Loureiro.
Para a acta.
Declaro que rejeitei as moções dos Srs. Paiva Gomes e Rêgo Chaves, por entender que não compete ao Poder Legislativo regular a forma de pagamento das libras cedidas pelo Estado. — Custódio de Paiva.
Para a acta.
Os REDACTORES:
Avelino de Almeida.
João Saraiva.