Página 1
REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 6
EM 10 DE DEZEMBRO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Angelo de Si Couto da Cunha Sampaio Maia
Sumário. — Alerta a sessão com a presença de 38 Srs. Deputados, lê-se a acta e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. António Maia interroga a Mesa.
O Sr. Abílio Marçal requer e a discussão imediata do parecer n.º 470.
Têm a palavra para interrogar a Mesa os Sm. António Correia e Pires Monteiro, que manda para a Mesa dois requerimentos.
O Sr. Tavares Ferreira ocupa-se de assuntos referentes ao professorado primário, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Instrução Pública (Melo e Simas).
Volta a usar da palavra para explicações sôbre o mesmo assunto o Sr. Tavares Ferreira.
E pôsto à votação o primeiro requerimento apresentado pelo Sr. Pires Monteiro.
Sôbre o modo de votar usa da, palavra o Sr. Agatão Lança, que formula, por sua vez, um requerimento.
É aprovado o requerimento do Sr. Pires Monteiro.
Depois de o Sr. Almeida Ribeiro usar da palavra para interrogar a Mesa. É aprovado o requerimento do Sr. Agatão Lança.
Foi lida na Mesa e submetida à discussão a emenda do Senado rejeitando o artigo 3.º da proposta de lei n.º 113, que cria a Junta Autónoma do pôrto e barra de Vila do Conde.
É aprovada a rejeição do artigo.
O Sr. Agatão Lança ocupa-se da reintegração do ex-oficial Sr. João de Almeida no exército, pedindo esclarecimentos ao Sr. Ministro da Guerra.
O Sr. Ministro da Guerra (António Carmona) presta esclarecimentos, voltando a falar, para explicações, o Sr. Agatão Lança.
O Sr. Almeida Ribeiro chama a atenção do Sr. Ministro da Instrução para os inconvenientes de um decreto relativo aos estudantes de música que vão frequentar os conservatórios estrangeiros como pensionistas.
O Sr. Ministro da Instrução (Melo e Simas) promete estudar o assunto.
O Sr. Barros Queiroz requcre que se marque para discussão antes da ordem, sem prejuízo dos oradores que se inscrevam, o pertence ao parecer n.º 91.
Aprovado.
É aprovado, em contraprova, o segundo requerimento do Sr. Pires Monteiro.
É aprovada a acta da sessão anterior.
É concedida uma licença.
Para interrogar a Mesa usam da palavra os Srs. Júlio de Abreu e Pires Monteiro.
É aprovado o requerimento do Sr. Abílio Marçal para entrar em discussão o parecer n.º 479, depois de ter falado sôbre o modo de votar o Sr. Carvalho da Silva.
Discute-se na especialidade o parecer n.º 479, que autoriza a Câmara Municipal da Ser ta a elevar até 120 por cento o adicional sôbre todas as contribuições do Estado.
São aprovados o artigo 1.º da comissão de finanças, com uma emenda do Sr. Abílio Marçal, e um artigo novo do mesmo Sr. Deputado.
Ordem do dia. — Prossegue a discussão sôbre a proposta de lei n.º 617-B, que autoriza o Govêrno a alienar os navios que constituem a frota marítima do Estado.
Usa da palavra o Sr. Norton de Matos, a quem responde o Sr. Ministro do Comércio (Pedro Pita).
Usam da palavra os Srs. Pavio Cancela de Abreu, Velhinho Correia, Carlos Pereira, Francisco Cruz e Plínio Silva.
O Sr. Ministro do Comércio (Pedro Pita) encerra o debate sôbre a generalidade.
São aprovadas as moções dos Srs. Paulo Cancela de Abreu e Velhinho Correia.
É aprovada a proposta na generalidade.
Na especialidade, apresentam propostas de emenda ao artigo 1.º os Srs. Carlos Pereira, Ministro do Comércio (Pedro Pita) e Francisco Cruz, tendo usado da palavra os Srs. Carlos Pereira, Cancela de Abreu e Ministro do Comércio (Pedro Pita).
É rejeitada a emenda do Sr. Carlos Pereira
Página 2
2
Diário da Câmara dos Deputados
depois de usarem da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Plínio Silva e Ministro do Comércio.
É aprovado o artigo 1.º
O Sr. Francisco Crus retira a sua proposta âe emenda, autorizado pela Câmara.
É aprovada a emenda do Sr. Ministro do Comércio, depois de ter usado da palavra o Sr. Agatão Lança.
Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Júlio de Abreu pede providências contra irregularidades políticas praticadas no distrito de Bragança.
O Sr. António Correia insta pela comparência do Sr. Ministro da Agricultura na próxima sessão.
O Sr. Sá Pereira reclama contra a nomeação de um administrador de concelho.
O Sr. Sá Cardoso pede ao Sr. Ministro do Comércio a conclusão da ponte sôbre o Rio Coura.
A todos os oradores responde o Sr. Ministro do Comércio.
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 15 horas e 27 minutos.
Presentes à chamada 38 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 51 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Alberto Ferreira Vidal.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António de Sousa Maia.
Armando Pereira de Castro Agatão
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Custódio Martins de Paiva.
Francisco Cruz.
Hermano José de Medeiros.
João de Ornelas da Silva.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Pedro Ferreira.
Júlio Henrique de Abreu.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Nuno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
António de Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Correia.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António Mendonça.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Vicente Ferreira.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
Página 3
3
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
Joaquim António do Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Matias Boleto Ferreira de Mira»
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Góis Pita.
Vergílio Saque.
Não compareceram à sessão os Srs.:
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Américo da Silva Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Joaquim Alves dos Santos
Augusto Pereira Nobre.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amarai Reis.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Águas.
João José Luís Damas.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge Barros Capinha.
José António do Magalhães.
José Cortês do Santos.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Às 15 horas principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 38 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Leu-se a acta.
Página 4
4
Diário da Câmara dos Deputados
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Da Junta Escolar de Penola, contra a proposta que entrega às Juntas Gerais a administração do ensino.
Para a Secretaria.
Da Associação Comercial do Loanda, pedindo que seja suspenso o diferencial ide bandeira de modo a assegurar a importação e exportação.
Para a Secretaria.
Do congresso do oficiais de justiça, pedindo que sejam atendidas as suas necessidades.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Almeirim, protestando contra a proposta de finanças que cria o imposto do produção sôbre vinhos.
Pára a Secretaria.
Ofícios
Do Senado, comunicando ter enviado à Presidência da República, para promulgação ao abrigo do artigo 32.º da Constituïção, a proposta de lei que regula a situação dos professores das escolas militares.
Para a Secretaria.
Da Federação dos Amigos da Escola Primária do Pôrto, contra a projectada extinção das Escolas Primárias Superiores.
Para a Secretaria.
Do presidente do Sindicato Agrícola da Régua, contra as propostas de finanças, especialmente no que respeita ao tributo sôbre vinhos.
Para a Secretaria.
Do Agente Geral do Angola, remetendo três exemplares do livro Geologia e riqueza mineira em Angola o outros três do livro A pesca e induziria no distrito de Mossâmedes.
Para a Secretaria.
Representação
Da Câmara Municipal do Santarém,, contra a extinção das Escolas Primárias Superiores.
Para a comissão de finanças.
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na período de
Antes da ordem do dia
O Sr. António Maia (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: na sexta-feira passada chamei a atenção do V. Ex.ª para o lacto do ter sido aprovado por esta Câmara um requerimento que eu fiz, pedindo para ser inscrito na ordem do dia um projecto de lei referente ao exército, visto que já haviam passado os 20 dias regimentais.
Como êste prazo terminou ontem, peço a V. Ex.ª a fineza do me informar o motivo por que o projecto não figura na ordem do dia de hoje.
O Sr. Presidente: — Devo dizer a V. Ex.ª que o prazo dos 20 dias não terminou ontem, mas termina hoje, visto que ontem foi domingo.
O Sr. António Maia: — Quer-me parecer, salvo o devido respeito, que V. Ex.ª está equivocado, porquanto o Regimento diz 20 dias, e não 20 sessões.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Mas V. Ex.ª compreende que o projecto não podia ser marcado para hoje, visto que a ordem do dia foi organizada na sexta-feira, dia em que o prazo ainda estava decorrendo.
O Sr. António Maia: — Então peco a V. Ex.ª que o inscreva para a sessão de amanhã.
O Sr. Abílio Marçal: — Sr. Presidente: encontrando-se na Mesa o parecer n.º 479. peço a V. Ex.ª se digne consultar a Câmara sôbre se consente que êle entre em discussão.
O Sr. António Maia (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª o obséquio de me informar só consta alguma cousa na Mesa relativamente a um pedido de documentos que há bas-
Página 5
5
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
tante tempo fiz ao Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Presidente: — Não consta nada na Mesa.
O Orador: — Eu tenho podido a palavra com a presença do Sr. Ministro da Agricultura, mas como S. Ex.ª não está, peço a V. Ex.ª que me reserve a palavra.
O orador não reviu.
O Sr. Pires Monteiro: — Sr. Presidente: em primeiro lugar desejo preguntar a V. Ex.ª o motivo por que até hoje ainda não foi fixado para ordem do dia um projecto de lei que tive a honra de mandar para a Mesa em 29 de Outubro, e que segundo uma proposta do Sr. Almeida Ribeiro, e com um aditamento do Sr. António Maia devia ser discutido dentro dos prazos regimentais.
Devo informar que êsse prejecto refere-se a um assunto do maior interêsse social, por isso que trata de estabelecer pensões de sangue para aqueles indivíduos que, no cumprimento dos seus deveres, arriscam a vida, na segurança da ordem pública. Se mais cêdo não fiz a pregunta, foi porque tive a atenção que devia para com os meus colegas da Comissão de Legislação Civil, permitindo que êles tivessem tempo para elaborar o parecer e, porventura, um contra-projecto atinente a êsse assunto.
Nestas circunstâncias, desejava que V. Ex.ª me informasse quando tenciona marcar êsse meu projecto para ordem do dia.
Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para mandar para a Mesa dois requerimentos, que são os seguintes:
Requeiro, que pelo Ministério da Instrução, me seja enviada uma nota com o número de alunos que frequentaram cada liceu no ano lectivo do 1922-1923, discriminando o número de alunos que frequentaram os cursos complementares nos liceus contrais.
10 de Dezembro de 1923. — Henrique Pires Monteiro.
Requeiro, que pelo Ministério da Instrução Pública, me seja enviada uma nota indicando o número de alunos que no ano lectivo do 1922-1923 frequentaram as diferentes escolas primárias superiores do País.
10 de Dezembro de 1923. — Henrique Pires Monteiro.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Tavares Ferreira: — Sr. Presidente: peço a atenção do Sr. Ministro da Instrução para as ligeiras considerações que vou fazer.
Pela legislação de 1919, que actualmente ainda rege o ensino primário, as nomeações interinas para as escolas primárias eram feitas pelas juntas escolares.
Mas os alunos que as frequentavam levaram a Direcção Geral da Instrução Primária a enviar uma circular a todos inspectores, para que todas as vezes que se tivessem de fazer nomeações enviassem à Contabilidade todos os elementos por onde se pudesse averiguar dos direitos dos candidatos. Isto deu margem a que fossem suspensos muitos vencimentos e realizados bastantes inquéritos, o por uma lei que foi apresentada durante a discussão orçamental, todas as nomeações do ensino primário passaram a ser feitas pelo Ministério da Instrução, que as envia ao Conselho Superior do Finanças, para o respectivo visto.
Ora tudo isto estava muito bem, por isso que aquela medida visava a defender os direitos e regalias dos concorrentes. Porém, tal não tem acontecido agora, e por informações que tenho do alguns candidatos às interinidades do concelho do Barreiro, os direitos dêsses candidatos não foram rigorosamente observados.
Sr. Presidente: essas informações dizem-mo que uma das pretendentes, que já o ano passado tinha preterido outras, mas que apesar disso ficou em n.º 9. fez um requerimento fora do concurso, e em que foi lançado um despacho para ser colocada na primeira vaga.
Consta-me também que, para satisfazer êsse pedido, se invoca uma portaria de louvor que se publicou no ano passado, pelo facto do essa professora ter contribuído com 400$00 escudos para melhorias na casa da escola, ou da sua residência. Se tal critério se adoptasse, tinham-se de pôr de parte os concursos e, quando houvesse vagas, fazia-se leilão
Página 6
6
Diário da Câmara dos Deputados
para o provimento da escola, e quem dêsse mais dinheiro seria o preferido.
Esta maneira de prover lugares de professores seria de grande interêsse para o Estado, mas não se podia adoptar de forma alguma.
Espero que o Sr. Ministro de Instrução, cujo espírito de justiça é conhecido, não fará tal nomeação, que é contra o prestígio do ensino.
Já que estou com a palavra, chamo a atenção de S. Ex.ª para um assunto que se prende com um despacho qualquer que diz respeito à inspecção escolar de Paços de Ferreira. Quer pelos professores primários, num congresso realizado em. Lisboa, quer na imprensa, foram feitas acusações graves contra o inspector.
Foi ordenada uma sindicância, o sindicante iniciou os seus trabalhos e para que os trabalhos da sindicância corressem com mais liberdade e imparcialidade o núcleo de Paços de Ferreira propôs que o inspector fôsse suspenso, mas há pouco tempo foi levantada a suspensão a êsse Sr. inspector, com a agravante de se autorizar que êle fôsse residir no Pôrto; a muito mais do 5 quilómetros da sede do seu círculo, o que a lei não permite.
Chamo a atenção do Sr. Ministro da Instrução para êste assunto, pois recebi do núcleo escolar. do concelho do Paços de Ferreira um telegrama protestando contra o facto.
Como V. Ex.ª vê, é uma colectividade que representa o professorado daquele concelho que me pede que eu chame a atenção do Sr. Ministro da Instrução para êste facto, o que faço com todo o gosto, esperando que S. Ex.ª procederá como julgar mais conveniente ao prestígio da instrução e da lei.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Instrução Pública (Melo e Simas): — O Sr. Tavares Ferreira referiu-se a um requerimento para preencher um lugar vago de professora. Vou informar-mo do assunto e posso assegurar ao ilustre Deputado que darei um despacho em harmonia com, a lei e a justiça.
Quanto ao inspector escolar de Paços de Ferreira, não me lembro bem do que há, mas devo informar que o funcionário, não encontrando casa de residência na
sede do círculo, pediu para residir no Pôrto.
O Sr. Tavares Ferreira (interrompendo): — A lei não permite que o funcionário resida fora da localidade além de cinco quilómetros de distância.
O Orador: — O funcionário não encontra casa de habitação dentro do círculo escolar. Êste é o facto.
O Sr. Tavares Ferreira: — O núcleo escolar não representa contra êsse facto. O seu protesto é pelo inspector ser reintegrado antes de terminar a sindicância.
O Orador: — Posso assegurar ao ilustre Deputado que, se tiver despachado contra a justiça, não terei dúvida em reconsiderar e modificar o meu despacho, fazendo justiça.
O orador não reviu.
O Sr. Tavares Ferreira: — Folgo com a resposta do Sr. Ministro. Nem outra cousa era de esperar do espírito de rectidão de S. Ex.ª
O Sr. Presidente: — O Sr. Pires Monteiro requero que seja discutida imediatamente a emenda do Senado à proposta de lei, desta Câmara, n.º 113, emenda que rejeita o artigo 3.º da mesma proposta.
Consulto a Câmara sôbre êste requerimento.
O Sr. Agatão Lança (sôbre o modo de votar): — O requerimento do Sr. Pires Monteiro vem prejudicar os assuntos dados para antes da ordem do dia. Eu, por exemplo, estou inscrito, e por isso não posso votar o requerimento do Sr. Pires Monteiro.
Entendo que o requerimento só pode ser aprovado sem prejuízo dos oradores inscritos.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Pires Monteiro.
O Sr. Agatão Lança: — Requeiro a contraprova.
A contraprova confirma a aprovação.
Leu-se a emenda do Senado.
Foi aprovada sem discussão.
Página 7
7
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
O Sr. Agatão Lança: — As considerações que tenho a fazer são de ordem política, e portanto eram mais para serem feitas na presença do Sr. Presidente do Ministério, tanto mais que o Sr. General Carmona, por quem tenho a máxima consideração, afirma que não é político e o assunto é político; mas como não pode haver delongas eu passo a expor.
Sr. Presidente: diz-se por aí que se está tratando da reintegração no exército do Sr. João de Almeida. Diz-se por aí que uma alta individualidade do Partido Republicano Português tem. envidado todos os seus esfôrços para que essa reintegração se faça, e que isso sucedeu no último Govêrno presidido pelo Sr. António Maria da Silva. Diz se por aí que o:Sr. Ministro da Guerra mandou analisar o processo de reintegração do Sr. João. de Almeida.
O Sr. António Maria da Silva: — Não tive intervenção alguma nesse processo.
O Orador: — Aqui temos um desmentido do último Ministro da Guerra, mas não me basta, não fico satisfeito, desejo ouvir a opinião do actual titular da Guerra, na certeza de que só o Congresso da República pode resolver sôbre o caso, pois só êle tem competência para isso.
Desejo ama resposta para sossegar o espírito republicano, mas na certeza que, a fazer-se essa reintegração, tem igualmente de se fazer a de todos os oficiais em circunstâncias análogas.
Eu antes quero ver defronte de mim um adversário, do que aqueles que dizem manter a neutralidade, que depois quebram indigna e infimamente.
Desejo ouvir o Sr. Ministro da Guerra.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Guerra (General Carmona): — Em resposta ao Sr. Agatão Lança tenho a dizer que efectivamente existe no. Ministério da Guerra um processo para reintegração do Sr. João de Almeida.
Já fiz a primeira leitura e agora está numa comissão de que faz parte um oficial que é muito conhecedor da legislação sôbre o assunto.
Em qualquer caso só procederei como homem de bem.
O Sr. António Maria da Silva: — O requerimento para reintegração é do próprio?
O Orador: — Sim, senhor. É uma cousa, legal e coerente, o só fiz o que tinha a fazer.
Apoiados.
Mas se V. Ex.ª deseja examinar o processo, eu, como Ministro da Guerra, não vejo qualquer inconveniente nisso.
Tenho dito.
O orador, não reviu.
O Sr. Agatão Lança: — Agradeço ao Sr. Ministro da Guerra as suas explicações e a autorização que me concede para consultar o processo relativo à reintegração do ex-oficial do exército João de Almeida.
Das palavras de S. Ex.ª eu fiquei, porém, com a impressão de que as cousas poderão correr por forma bem diversa daquilo que nós supomos e desejamos.
Além disso, afigura-se-me que o Ministério da Guerra não deve perder tempo com o assunto.
A reintegração dêsse oficiais, como a de quaisquer outros nas suas condições, se poderia ser feita pelo Congresso da República, talqualmente se fez ainda há pouco tempo em relação a um oficial que o Govêrno anterior reintegrou.
Termino, Sr. Presidente, estranhando, que o Sr. António Maria da Silva tivesse afirmado, em àparte que me dirigiu, que não tinha conhecimento algum da existência do processo e, momentos depois, em àparte ao Sr. Ministro da Guerra, tivesse dado a perceber que conhecia os delineamentos dêsse processo...
O Sr. António Maia: — Era não era, andava lavrando...
O Sr. António Maria da Silva: — A interrupção de V. Exa é importuna e devolvo-a inteiramente. Eu não disse uma cousa e depois outra.
No àparte que dirigi ao Sr. Ministro da Guerra, ou limitei-me a fazer uma pregunta.
Não fiz qualquer afirmação.
O Orador: — Nestas condições, nada mais tenho a dizer sôbre o assunto.
Página 8
8
Diário da Câmara dos Deputados
Estudarei o processo e, se o julgar conveniente, virei a esta Câmara fazer as objecções que êle possa, porventura, sugerir-me.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: no Diário do Govêrno de 7 vem publicados um decreto, referendado pelo Sr. Ministro da Instrução Pública, em que se determina que o Govêrno passará a conceder pensões de estudo no estrangeiro a músicos.
Ora desejava saber se alguma lei autoriza êste decreto, visto que êle a não cita, e se houve algum entendimento entre S. Ex.ª e o Sr. Ministro das Finanças.
Trata-se de despesas públicas a pagar em ouro e estranho, por isso, que a assinatura do Sr. Ministro das Finanças não apareça nesse decreto.
Espero que o Sr. Ministro da Instrução Pública, esclarecendo o caso, dê à Câmara as necessárias aplicações.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Instrução Pública (Melo e Simas): — Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as considerações que acaba de fazer o Sr. Almeida Ribeiro e devo confessar que o fiz com bastante estranheza, visto que, não sendo eu inteiramente desmemoriado, e tendo o citado decreto sido publicado em 7, não tenho do caso a mais ligeira reminiscência...
O Sr. Almeida Ribeiro (interrompendo): — Eu recordo os termos do decreto...
O Orador: — Como já disse, não tenho idea de me ter ocupado do assunto contido nesse decreto.
Eu vou informar-me e, se tiver havido abuso, aplicarei energicamente a devida sanção.
Apoiados.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Peço a S. Ex.ª que fixe o caso, tanto mais que êle envolve um sensível aumento de despesa.
O Orador: — Chego quási a duvidar de que êsse decreto tenha sido assinado por mim...
Àpartes.
O Orador: — Só sei dizer a verdade e a verdade é esta: não me lembro de ter assinado êsse decreto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Devo dizer que as considerações que há pouco fiz não visam qualquer objectivo de natureza política.
Fi-las apenas para defender os interêsses do Estado, ao notar que. o decreto, acarretando aumento de despesa, não trazia a assinatura do Sr. Ministro das Finanças...
O Sr. Nuno Simões: — Devendo trazer a assinatura do dois Ministros, afinal não foi assinado por nenhum!
O Orador: — Nestes termos, só tenho que me aplaudir pela resolução que tomei de chamai para o caso a atenção do Sr. Ministro da Instrução Publica, e aplaudir S. Ex.ª pelas declarações terminantes que acaba de fazer.
O orador não reviu.
O Sr. Barros Queiroz: — Requeiro que entre em, discussão antes da ordem do dia. sem prejuízo dos pareceres já inscritos, pertence ao n.º 91.
É aprovado.
O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia.
O Sr. Júlio de Abreu: — Eu tinha pedido a palavra.
O Sr. Abílio Marçal: — Eu tinha foi to um requerimento para que fôsse posta em discussão uma proposta minha sôbre o projecto n.º 477, cuja votação tem de realizar-se.
O Sr. Presidente: — O Sr. Pires Monteiro requereu que o parecer n.º 100 seja discutido antes dos projectos inscritos.
É regeitado.
O Sr. Pires Monteiro: — Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, é aprovado.
É aprovada a acta.
É concedida licença de 60 dias ao Sr. Paiva Gomes.
Página 9
9
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
O Sr. Júlio de Abreu: — Pedia a V. Ex.ª o favor do mo informar se realmente fico inscrito para antes da ordem do dia.
O Sr. Presidente: — Está inscrito para antes da ordem.
O Orador: — Eu tinha pedido a palavra na outra sessão, e hoje tinha pedido a palavra também.
O Sr. Presidente: — Fica V. Ex.ª inscrito para quando esteja presente o Sr. Presidente do Ministério.
O Sr. Pires Monteiro: — Perguntava a V. Ex.ª quando tenciona pôr em discussão o projecto sôbre pensões a agentes do polícia do segurança a quem suceda desastre, apresentado em 20 de Outubro.
A Câmara deliberou que entrasse em discussão com ou sem parecer.
O Sr. Presidente: — Está marcado para a ordem do amanhã.
O Sr. Abílio Marçal requero que seja votado o artigo 1.º e único da proposta referente a contribuições das câmaras municipais.
Sôbre o projecto, que já foi discutido, ainda não houve votação por falta do número.
Vai proceder-se à votação.
O Sr. Carvalho da Silva: — Há tanto tempo já que êsse projecto foi discutido, que acho conveniente lembrar a Câmara o que disse nessa ocasião acêrca da percentagem que as câmaras municipais pensam lançar, elevando ao dôbro as contribuições já existentes o aumentadas.
Serão porventura 10 ou 12 vezes o que são.
Eu lembro isto à Câmara, porque entendo que tal autorização não pode do nenhuma maneira ser concedida.
Apoiados.
É aprovado o requerimento do Sr. Abílio Marçal.
Foi lida na Mesa a proposta do Sr. Abílio Marçal, do teor seguinte:
Emenda
Proponho que no artigo 1.º, entre as palavras «municipais» o «cuja» se intecalem as seguintes: «e obras de fomento», o se inscreva o seguinte artigo novo: «Fica revogada á legislação em contrário». — Abílio Marçal.
Foi aprovada.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2,º do artigo 110.º
O Sr. Álvaro de Castro: — Não está presente o Sr. Ministro das Finanças, cuja presença julgo necessária, para a votação desta proposta.
O Sr. Presidente: — Não julgo indispensável a presença do Sr. Ministro das Finanças neste momento.
O Sr. Álvaro de Castro: — Indispensável para conhecermos o seu voto.
Feita a contraprova, verificou-se estarem de pé 32 Srs. Deputados e sentados 40, sendo portanto aprovada a proposta.
O Sr. Abílio Marçal: — Requeiro dispensa da leitura da última redacção.
Aprovado.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ordem do dia: liquidação dos Transportes Marítimos.
Tem a palavra o Sr. Norton de Matos.
O Sr. Norton de Matos: — Sr. Presidente: em 1021 tive a honra do apresentar a esta Câmara um projecto de lei para que fossem distribuídos à província de Angola cinco navios dos Transportes Marítimos do Estado.
Tratava se nessa ocasião da formação — constava isto extra-oficialmente — de uma grande companhia do navegação que principalmente visava à navegação entro a metrópole e as nossas colónias, o também entro estas, sendo uma parto dêsses navios destinada à nossa navegação para o Brasil.
Foi isto principalmente que me levou à apresentação do meu projecto, visando à dotação da província do Angola com cinco navios, destinados não só à sua ca-
Página 10
10
Diário da Câmara dos Deputados
botagem, mas também à ligação das colónias portuguesas com as estrangeiras, o da província de Moçambique com a província de Angola, porque, se nós não olharmos com o maior cuidado para o problema da união interna, cada vez mais completa e perfeita, de todo o nosso domínio ultramarino, ligando as colónias da costa ocidental com a metrópole e com a província de Moçambique, praticamos um êrro grave o contribuímos para consequências económicas que serão altamente prejudiciais e desde já altamente perigosas.
Pensava eu com dois dêstes navios de maior tonelagem ligar as províncias de Angola e Moçambique, e trazer desta província o carvão de que temos absoluta falta em Angola, e que fica caríssimo indo da Europa, e poder assim exportar géneros para as vizinhas regiões da África do Sul.
Êste projecto não teve seguimento nesta Câmara. Infelizmente. Pensava-se na ocasião que tudo era pouco em questões de navios para o que havia em vista. Para o Brasil seguiu um dos navios dos Transportes Marítimos, dêsse tempo, carregado de portugueses, de que nós tanto precisávamos nas nossas colónias, e veio carregado de café — que, afinal, a nossa província de Angola produz quanto quer.
Apoiados.
As cousas mudaram o os destinos da nossa terra não permitiram que um projecto desta natureza, que naturalmente arrastaria outros idênticos para a província de Moçambique, e que era a constituição de duas marinhas coloniais mercantes, pudesse vingar.
Eu não sou bem de opinião daqueles que julgam que asses territórios, que só estão a desenvolver cada vez mais devido aos admiráveis esforços da nossa raça e às nossas eminentes qualidades de colonizadores, não precisam de ser dotados do todos aqueles elementos de progresso, entro os quais figura primordialmente tudo que diz respeito à marinha mercante, aos meios de comunicação marítima.
Em outras colónias — e tive sempre a convicção, desde que me conheço, de que nós podíamos fazer tanto e melhor como os outros fazem em matéria colonial — vejo que se procura ter marinha mercante sua, sustentada pelo seu comércio e pela sua riqueza, como sucede com a Austrália e com a África do Sul, que dispõem inteiramente dos meios necessários para o sou desenvolvimento.
Com os navios apresados aos alemães durante a guerra e nas condições daqueles de que se trata na proposta am discussão, formou a Austrália uma marinha mercante explorada pelo Govêrno dêsse domínio britânico, marinha que está prosperando admiravelmente, navegando por toda a parte do mundo — ainda há pouco tempo esteve no Tejo um dêsses navios — e da manutenção dessa marinha só têm resultado altíssimos benéficos quer para o domínio australiano, quer para a metrópole inglesa. Julgo que o mesmo podíamos fazer em Angola e em Moçambique. Se, então, se dotassem estas colónias com igual número de navios, talvez que as condições dos Transportes Marítimos do Estado não fossem aquilo que são actualmente o que, infelizmente, foram durante os últimos três anos. Passaram-se os factos que todos conhecem, e que eu de maneira nenhuma quero, pela parte que me toca, fazer recordar nesta Câmara.
Apresenta-se-nos agora uma. proposta de lei para resolver uma situação absolutamente critica e insustentável e que não podia continuar para decoro do País o bem de todos nós.
Apoiados.
Julgo que a solução encontrada pelo Sr. Ministro do Comércio é a melhor.
Desapareceu por completo, por circunstâncias diversas, a possibilidade de formar com os navios uma grande companhia nacional ou talvez duas que só pusessem exclusivamente à disposição do nosso serviço colonial pela forma por que eu anunciei no princípio das minhas considerações; desapareceu também a possibilidade do se constituírem êsses núcleos do marinha mercante nacional em Angola o Moçambique que, unidos e ligados fizessem o serviço de navegação de que tanto carecemos — e desapareceu pela simples razão de que êsses navios estão hoje do tal maneira avariados, precisam de reparações de tal natureza caras e consideráveis, que as colónias não poderiam arcar com elas, tendo de restringir as suas aspirações e de se limitar a pedir ao Govêrno e, nesta ocasião, à Câmara que
Página 11
11
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
lhes seja cedido um número restrito de navios que pouco pode ir além da sua cabotagem.
Nesse sentido eu terei ocasião de encarar o problema, se outros membros da Câmara o não fizerem, quando se tratar da discussão do projecto, na especialidade.
Quanto à generalidade da proposta de lei, dou-lho inteiramente o meu voto porque vejo acautelados os interêsses nacionais, a possibilidade de que os navios possam ir parar às mãos do estrangeiros, o que seria para mim, e certamente para todos, extremamente doloroso. Arrematados os navios um a um, talvez que se possam congregar esfôrços no sentido de que aqueles ainda possam vir a desempenhar a missão patriótica que há tanto tempo deviam desempenhar.
São êsses os meus votos. E, dando a minha aprovação a esta. proposta de lei, tenho a felicitar o Sr. Ministro do Comércio pela sua iniciativa e, principalmente, por ter sabido encarar com coragem e decisão um problema que necessitava de uma resolução urgentíssima para bem de todos nós e para decoro do País.
Tenho dito.
Apoiados.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pedro Pita): — Sr. Presidente: quero iniciar as minhas considerações poios meus agradecimentos ao ilustre Deputado Sr. Norton do Matos, pelas palavras que teve a amabilidade de mo dirigir. Essas palavras proferidas por S. Ex.ª têm para mim um valor especial.
Procurei, do facto, ràpidamente, o mais ràpidamente que ora possível, conhecer bem êste problema e encontrar para êle uma solução. Fui decidido, portanto, na resolução a tomar. Mas o reconhecimento do facto, feito por quem é, bem conhecido pelas suas faculdades do energia e decisão, desvaneço-me, confesso.
Procurarei, ainda, quando na especialidade se discutir a proposta, introduzir-lhe algumas modificações no sentido de acautelar ainda mais, se é possível, os interêsses do Estado. Há um cuidado que eu tenho e que procurarei, ainda pôr nele: é, acautelando êsses interêsses, não prejudicar o fim que a proposta tem em vista. O meu intuito principal, disse-o aqui na última sessão, é alienar os navios dos Transportes Marítimos do Estado, é livrar o Estado dêste cancro.
Toda a minha preocupação está em que não seja prejudicada a alienação dos navios.
Eu desejo, portanto, que se tomem todas as cautelas que sejam possíveis, mas só aquelas que sejam possíveis, sem que haja de prejudicar-se o fim da proposta. Ainda nisso eu vi pelas palavras do ilustre Deputado que nós estamos de acôrdo e até, também, estamos de acôrdo na parte em que S. Ex.ª afirma dever-se aumentar um pouco aquilo que esta proposta destina a Angola.
Se S. Ex.ª o Sr. Norton do Matos, que melhor do que eu conhece as condições os em que a navegação para Angola se pó dera fazer, entender que para essa navegação será pouco apenas um barco, e que, portanto, a ela se deverão destinar dois barcos, eu concordarei com isso e não deixarei de dar o meu apoio a qualquer proposta que, porventura, S. Ex.ª apresente nesse sentido.
Sr. Presidente: parque respondi ao ilustre Deputado Sr. Cancela de Abreu, porque acabo de responder ao ilustre Deputado Sr. general Norton de Matos, poderia parecer menos atenção da minha parte, deixar de responder a cada um dos Srs. Deputados que ainda venham a falar sôbre o assunto.
Creio que não está ninguém inscrito e, portanto, a declaração que vou fazer não tem, nem pode ter o intuito de ocultar qualquer pensamento mau.
O desejo de que esta proposta seja votada o mais depressa possível faz com que eu peça a todos os Srs. Deputados, que ainda queiram usar da palavra sôbre êste assunto, que me permitam dar a minha resposta a todos conjuntamente.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Comunico à Câmara que nomeio o Sr. António de Sousa Maia para substituir o Sr. Tôrres Garcia na comissão de guerra, da qual êste Sr. Deputado pediu escusa.
Página 12
12
Diário da Câmara dos Deputados
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: até que emfim, vou mandar para a Mesa uma moção que virá a obter aprovação do toda a Câmara.
É a seguinte
Moção
A Câmara, reconhecendo que a necessidade imperiosa da alienação urgente dos navios dos Transportes Marítimos do Estado não excluía absoluta conveniência de esta alienação ser feita em condições que, som a dificultarem apreciavelmente, permitem, entretanto, que se reaja, quanto possível, contra todos os embaraços que só oponham a uma justa valorização, continua na ordem do dia.
Sala das Sessões, 10 do Dezembro de 1923. — Paulo Cancela de Abreu.
Sr. Presidente: sôbre as águas límpidas do Tojo não pairam apenas, como de costumo, as meigas e brancas gaivotas; sôbre as águas límpidas do Tejo, embora isto pareça uma alteração zoológica, pairam, também, os corvos agoirentos que grasnam sôbre a presa, o dos quais nos temos do d ofender custe o que custar.
Precisamos dar caça aos corvos, mas decididamente.
Se é certo — e nisso todos estamos do acôrdo — que é indispensável acabar, urgentemente, com o cancro dos Transportes Marítimos, na frase do Sr. Ministro do Comércio, com aquele foco de infecção, na frase do Sr. António Maria da Silva; se é certo que se torna necessária uma cova bem funda o algumas pás do cal, colocando-se sôbre da uma pedra na qual, em vez das letras fatídicas T. M. E. Só leia o consagrado R. I. P., não é menos certo que tudo isso não deverá ser pretexto para se dar em desbarato aos corvos que grasnam sôbre o Tejo o único património que a guerra nos legou.
Por toda a parte se diz que é preciso acabar com os Transportes Marítimos do listado, por causa dos escândalos e dos erros do administração que neles se tem sucedido.
Mas, Sr. Presidente, entregar os navios ao desbarato, por causa dos escândalos e roubos que nos Transportes Marítimos se tem dado e que obrigam a acabar cora. êstes, é o mesmo que pensar-se em desbastar, por completo, o pinhal de Azambuja, porque é voz corrente que andam lá ladrões.
Se há escândalos, evitem-se êsses escândalos; se há ladrões, prendam-se êsses ladrões.
Quem tem um património a defender defende-o.
Se há necessidade de alienar os navios dos Transportes Marítimos do Estado, é porquê o Estado não tem condições para exercer uma fiscalização o administração eficazes.
Nestas condições, o porque não quero usar da palavra na especialidade, eu vou mandar para a Mesa algumas emendas e artigos novos, que V. Ex.ª poderá pôr à discussão na altura que tenha por conveniente.
O Sr. Ministro do Comércio concordou ante-ontem comigo em que o Estado corria o risco de ser vítima de especulações do toda a ordem, nomeadamente da- acção do cambau, fazendo-se a venda dos navios pela forma como está projectada. E S. Ex.ª reconhecendo êsse perigo, declarou que fazia do caso questão aberta, aceitando todas as emendas que fossem tendentes a resolver pelo melhor o assunto.
As razões pelas quais a lei n.º 1:946, de 9 de Setembro de 1922, não deu resultados, não derivam das circunstâncias em que só efectuou o concurso para a venda dos navios.
Elas derivaram exclusivamente das condições e restrições exageradas que foram impostas.
Derivaram do só começar por exigir um depósito de 500 contos; derivaram de se exigir a constituição de sociedades com determinado capital, de se exigir a participação do Estado nessas sociedades, de só dividirem os barcos em determinados grupos; de se exigirem carreiras determinadas, de se estabelecerem algumas restrições exageradas.
As particularidades da venda dos navios, quanto a prazos, não foram causa, directa ou indirecta, do fracasso da lei n.º 1:346.
O que faz então o Sr. Ministro do Comércio actual, e quanto a mim, muito bem?
Acabou com essas restrições que mais dificultavam a venda dos navios, mantendo ùnicamente a que respeita ao Acto do
Página 13
13
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
Navegação do 1863, e a condição do toda a tripulação ser portuguesa.
O resto desapareceu, pelo menos é isso o que se depreende; no emtanto isso, Sr. Presidente, não impede que nós nos asseguremos tanto quanto possível do todas as garantias necessárias para evitar os inconvenientes que eu já apontei na última sessão.
Sito muitos ossos inconvenientes, conforme eu vou expor à Câmara.
O primeiro inconveniente é o dêsses navios terem uma tonelagem que lhes dá um consumo de 40 a 50 toneladas de carvão por dia, pelo que se tornará difícil encontrar, comprador para êles, e, se os comprarem, há-de ser pelo preço que quiserem, caso contrário o Govêrno terá de ficar com êles, sendo os primeiros navios de que dificilmente só poderá desfazer.
Há navios que só a Emprêsa Nacional do Navegação poderá adquirir, visto que só ela está em condições do os poder mandar reparar.
Outros navios há que só encontrarão na praça um ou dois compradores, como por exemplo a Companhia Insulana do Navegação e uma outra companhia que se encontra nas mesmas condições.
O que se vê é que os navios são muitos e que os concorrentes hão-de ser poucos, e assim de esperar é que Cios sejam adquiridos pelos preços que êsses concorrentes quiserem, pois de admirar não será que êles se combinem entre si para os adquirir pelos preços que entenderem.
De maneira que o que é certo é que os navios são muitos e os compradores são poucos, de forma que o Govêrno há-de se ver na necessidade do os entregar por aquilo que êles quiserem.
Por isso, o resumindo, devo dizer que, mantendo os artigos 1.º e 2.º da proposta, na sua altura apresentarei um artigo novo que tem por fim ùnicamente regular a maneira de alienar êsses navios.
Agora chamo a atenção da Câmara para a matéria do artigo 3.º
Pelo que já aqui expus quanto a semelhante matéria, proponho o seguinte:
Leu.
Evidentemente que eu entendo que, apesar do todos os males, o Govêrno não deve desfazer-se dos navios, por menos de metade do seu valor.
Se os navios valessem hoje o que valiam em 1920 ou mesmo em 1921, aluda se compreendia que o Estado, no intuito de se desfazer dêles o dada a sua depreciação os vendesse por menos do metade do seu valor, mas hoje a média do valor dos navios não fôr superior a duas libras por tonelada, de forma que não só compreende que o Govêrno se desfaça dêles por menos do metade do seu valor, acusando quási que uma falência do próprio Estado.
Assim o cambão que se formar, já sabe que o Govêrno não se desfaz dos navios, por menos do metade do seu valor, e, como tem de haver um concurso, êles não sabem com quem tem do se haver para os navios que desejam, e dessa forma terão de os adquirir por um preço razoável para o Estado.
Quanto à avaliação dos navios, podem dizer-mo que já tenha havido, porventura, — isto sem querer fazer insinuações, porque não tenho elementos para o afirmar — intuitos preconcebidos sôbre certos navios, o nessas condições, para; os desfazer, eu envio para a Mesa um artigo novo, autorizando o Govêrno a mandar proceder, a nova avaliação quando o julgue necessário.
Será isso a matéria do meu artigo 5.º
Nesta conformidade e como sequência lógica do que eu proponho, evidentemente que há artigos na proposta ministerial que têm do ser suprimidos o outros modificados.
Por exemplo, o artigo relativo às carreiras para as colónias, pelas razões que expus, será suprimido.
E lembro ao Sr. Ministro do Comércio, só porventura não concordar com as minhas emendas, que não previu a hipótese dos vapores não adquirirem metade do seu valor.
Ora o artigo 22.º da lei n.º 1:346 diz em resumo que o Estado é liquidatário, mas ninguém pode fazer arrestos ou penhora nos navios.
Porém, dados os termos jurídicos dêste artigo, mesmo que os navios sejam vendidos, a mesma disposição mantém-se.
De maneira que eu proparei à Câmara que a redacção dêste artigo fique noutros termos.
Ninguém pode admitir que os navios, passando para os particulares, fiquem nas condições em que estavam na posso do Estado.
Página 14
14
Diário da Câmara dos Deputados
Quanto ao último artigo, eu já lembrei ao Sr. Ministro a conveniência de dizer nele quais as disposições de lei que ficam em vigor e quais as que ficam revogadas. Assim, proporei um novo artigo que o diga.
Na lei n.º 1:346 há disposições que respeitam à primeira sub-comissão liquidatária que evidentemente devem prevalecer. As disposições que respeitam à 2.ª sub-comissão, que já está dissolvida, devem desaparecer.
É de harmonia com esta orientação que eu proporei que o artigo 8.º que pelas minhas emendas passará a 10.º, fique redigido em termos tais que não haja lugar para duvidar.
Quanto ao que se refere aos navios para as colónias, eu lembraria que, além das colónias do Angola, Moçambique e Cabo Verde, a colónia da Guiné tivesse também um navio, embora de pequena tonelagem destinado ao seu tráfego comercial.
Depois de ouvir as considerações do Sr. Norton de Matos, que calaram no meu espírito, eu, não indo até ao ponto do S. Ex.ª, que pediu cinco navios para as colónias, faria entrega a Angola e Moçambique de dois navios para a navegação costeira e outro para a ligação com a metrópole.
O Sr. Norton de Matos: — Eu, há pouco, referi-me a uma proposta que tinha feito em 1921: Hoje, talvez,, as colónias não tenham no seu Orçamento dinheiro para consertar os cinco navios.
O Orador: — S. Ex.ª hoje mesmo reconhece essa impossibilidade.
De forma que mo parece que as condições que eu proponho remedeiam a situação de momento.
De resto, se depois o Estado vir que não pode vender os navios por metade do seu valor, o fim que lhes destinaria era aplicá-los ao serviço das colónias.
Apoiados.
E não sei mesmo se a colónia de S. Tomé e Príncipe, dado o seu desenvolvimento, não merecerá também que se leve em consideração o facto para lhe fazer entrega de qualquer navio.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro do Comércio disse que, embora o pagamento das prestações pela venda dos navios pudesse ir até cinco anos, elas eram garantidas por outras cauções além do valor dos navios, isto por eu dizer que porventura não haveria apólices de seguros para garantir os navios.
Se eu fiz esta afirmação, foi cingindo-me à idade dos navios.
Eu classifico navios velhos os construídos antes do 1900 e assim encontro nada menos que oito nessas condições.
O Pôrto, a celebro nau Catarineta, tem muito que contar e hei de mostrar o que foi a sua viagem ao Brasil, cujo insucesso foi devido talvez à pressa com que um Sr. Ministro quis embarcar, mas isso fica para depois.
Hei-de mostrar que, se os passageiros tivessem bebido a décima parte das águas minerais que iam a bordo, acontecer-lhes-ia o que aconteceu à gibóia, mas isso fica para depois.
Risos.
Àpartes.
Navios novos, classifico os construídos antes de 1910, e são onze.
Sr. Presidente: eu disse sem preocupações de ordem política que a instabilidade ministerial seria causa de o prazo do três meses marcados na proposta ser escasso para resolver o assunto, mas não feri a nota política.
O Sr. Ministro do Comércio porém, veio fazer referências ao que aconteceu na monarquia a respeito da instabilidade ministerial.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pedro Pita): — Eu não quis ferir a nota política, só respondi a V. Ex.ª
Àpartes.
O Orador: V. Ex.ª quiz ir buscar lã, permita a expressão, mas ficou mal.
Citou o Ministério de Hintze Ribeiro, chamado dos vinte e oito dias de Clarinha, mas todos sabem que os ministérios de pouca duração na monarquia eram uma excepção à regra, emquanto que na República são a regra geral.
Algumas poucas instabilidades de Govêrno na monarquia foram devidas aos desmembramentos dos grandes partidos, e na República nenhum Govêrno tem estado no Poder dois anos, à excepção do Sr. António Maria da Silva.
Àpartes.
Página 15
15
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
No tempo da monarquia, depois da convenção de Évora Monto, os Govêrnos na sua maioria não estavam no Poder menos de dois, três e quatro anos.
Posso apresentar exemplos da duração dos Govêrnos, como a Câmara vai ver, desde a convenção do Évora Monte:
Leu.
A Câmara vai ver agora em t rezo anos da República quantos Ministérios houve.
Leu.
O Sr. Ministro do Comércio veio falar no Ministério chamado dos vinte oito dias de Clarinha, mas eu vou mostrar à Câmara que na República ainda houve pior.
Um Ministério do Sr. Álvaro de Castro durou nove dias.
Mas o Sr. Fernandes Costa esteve seis dias e, para não fugir pela janela, teve que correr muito depressa para a porta.
Parece-me, pois, que o Sr. Ministro do Comércio fez mal em estabelecer confrontos que só sorvem para marcar o verdadeiro contraste entro o que sucedeu em oitenta anos de monarquia o treze anos de República.
E, para, terminar, lembro-me que só em 1920 houve quatro Govêrnos.
Ora suponhamos que em 1920 vigorava esta lei o que o comprador de um dos navios ia pedir autorização para o vender.
Como os Govêrnos não tiveram tempo sequer para dar despacho, eu pregunto se não seria fácil passarem-se três meses, sem que fôsse concedida a autorização pedida, correndo-se assim o risco de tal comprador vender o navio com um lucro extraordinário.
Se não se estabelecer uma restricção terminante quanto às várias vendas, o cambão compra os navios ao desbarato o depois vai vende-los pelo dôbro ou pelo triplo o, afinal, com tudo isto só perde o Estado que foi roubado durante nove anos o que não chega a tirar do único valor material que colheu com a guerra o necessário para satisfazer os próprios encargos o as consequências dos desleixes e das demandas dos Transportes Marítimos.
Lance-se o activo de um lado e o passivo do outro, e ver-se-há como, por melhor que os navios sejam vendidos, o saldo negativo vai ser fabuloso, sem uma única vantagem para a economia nacional.
Compreendia-se que, realmente, o Estado, que não tinha os navios tanto para negócio como para desenvolver o tráfico nacional, não se importasse do perder, se o nosso comércio marítimo alguma cousa lucrasse, mas a verdade é que, do setenta e dois navios, foram para Inglaterra quarenta o dois, dos quais ficaram vinte torpedeados, o alguns até misteriosamente, pois una houve, por exemplo, que ficou encalhado na costa francesa e que a casa Furriess não quis salvar, porque lhe convinha mais receber o lucro do seguro. Foi a França que o salvou.
Ficámos, portanto, reduzidos a quarenta navios, mas o Índia está reduzido a metade por virtude dos incêndios que sofreu o cujas causas é preciso averiguar. Disso se que êsse navio ardeu por causa do uma teimosia do Govêrno.
Os técnicos reclamavam que se fizesse a reparação precisa para evitar que as chapas das fornalhas tivessem o contacto que tinham com as madeiras. Tal não se quis fazer, e o navio acabou por se incendiar.
Há, também, quem diga que os vários incêndios nas mercadorias do Índia foram causados para encobrir diversas irregularidades.
O Figueira, para se desencalhar, custou-nos 100 contos, e isto porque, felizmente, apareceu um engenheiro português competente para o fazer, visto que uma casa inglesa exigia 300 contos, mas é preciso agora. repará-lo e isso custará mais de 600 contos, sendo talvez preciso outro tanto para reparar o molhe do pôrto do Leixões.
Se quisesse relatar todos os casos desta natureza, nunca mais terminava as minhas considerações o, por isso, termino-as mandando para a Mesa as minhas propostas de substituição e emenda que V. Ex.ª porá a discussão quando o entender conveniente.
Tenho dito.
É lida na Mesa e admitida a moção do Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: limitar-mo hei a ligeiras considerações, visto não haver dúvida alguma sôbre a oportunidade e a urgência desta proposta de lei.
Sabe V. Ex.ª e sabe a Câmara que eu
Página 16
16
Diário da Câmara dos Deputados
por duas vezes fui relator do propostas diversas, tendentes a dar destino à frota mercante do Estado, e todos conhecem a minha atitude e a minha posição em face da lei n.º 1:346.
Disse aqui a V. Ex.ª, à Câmara e ao Sr. Ministro de então que o Poder Executivo com a lei n.º 1:546 não resolvia o problema da frota mercante do Estado. Disse-o e repiti-o inúmeras vezes e, infelizmente, os factos vieram dar-me inteira razão.
Tem o Poder Executivo uma lei que o habilita a liquidar a frota mercante do Estado e apesar disso, não conseguiu o Govêrno fazer essa liquidação.
Porque?
Porque a lei que a Câmara votou não é, infelizmente, de molde a solucionar êsse problema.
O Sr. Queiroz Vaz Guedes reconheceu, quando Ministro do Comércio, a impossibilidade de proceder à liquidação da frota mercante do Estado em harmonia com a lei n.º 1:346, impossibilidade que eu tinha previsto a quando da discussão dos Transportes Marítimos.
E o que fez o Sr. Queiroz Vaz Guedes?
Trouxe a esta Câmara uma proposta para que a Câmara o autorizasse a aceitar uma proposta da Companhia Nacional do Navegação tendente a chamar a si uma grande parte da frota mercante do Estado.
Fui relator dessa proposta e aconselhei a Câmara a aceitá-la, se bem que eu reconhecesse nela alguns defeitos determinados pela lei n.º 1:346, lei em que o Govêrno se tinha do colocar para resolver o problema.
O Sr. Cancela de Abreu referiu-se a alguns factos que estão inteiramente desenvolvidos no parecer que então tive a honra de elaborar.
A proposta da venda isolada de navios, dizia eu nesse parecer é precisamente a mesma cousa que o Sr. Cancela de Abreu agora repetiu e que a Câmara acaba de ouvir.
Deserto o primeiro concurso, deserto o segando, restava a venda pura e simples, unidade por unidade, da frota mercante do Estado.
Foi o que prevem há já alguns meses e estou vendo que as minhas afirmações de sempre fizeram escola o constituem doutrina.
Repare o Sr. Ministro do Comércio o reparo a Câmara no seguinte facto muito importante.
A Câmara vai votar mais uma lei para resolver o problema dos Transportes Marítimos do Estado, e eu aqui, desde já, com pesar meu, faço a seguinte profecia: com esta lei há-de resolver-se tanto êsse problema como se resolveu com a lei anterior.
É minha convicção que a proposta de lei actual não é de moldo a resolver o problema da frota mercante do Estado som que haja ainda uma nova intervenção parlamentar, o para comparar esta minha asserção basta que as pessoas que amanha vão ter a responsabilidade de votar essa proposta atendam ao seguinte: há já mais de um ano, há mesmo perto de dois anos, que o Poder Executivo deixei de explorar directamente os navios da frota mercante do Estado, que os amarrou, começando depois a fretá-los, um por um, conformo encontrava fretadores em condições. E o que aconteceu?
Em todo êste período aconteceu o seguinte: é que, pode dizer-se, qualquer cousa como 100:000 toneladas das 150:000 existentes, qualquer cousa como por exemplo dois terços da frota mercante do Estado, não têm tido fretadores.
Nestas condições, sabido isto, como é que se insiste em trazer ao Parlamento uma proposta de lei tendente a vender os navios, um por um, como se agora houvesse compradores pura aquelas mesmas unidades que durante dois anos não tiveram ninguém que as fretasse, e então em condições do preço as melhores possíveis?
Pois se nestes dois anos uma grande parte da frota não tem tido ninguém que tome couta dela, apesar dos preços modestíssimos do Estado, como é que agora êsses navios vão ter pessoas ou entidades que os comprem, ficando sujeitas a todas as leis que regulam a exploração da marinha mercante?
E uma utopia. E um êrro.
Sr. Presidente: para êste assunto há só duas soluções; ou a solução que se indica, na proposta, mas que não é do aceitar, e o Sr. Ministro do Comércio já concordou com isso, que seria a de em certo
Página 17
17
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
caso os navios perderem a nacionalidade, ou então o problema terá de voltar de novo ao Parlamento, visto não me poder convencer de que para dois terços da frota mercante do Estado haja agora fretadores, quando durante êstes dois anos não houve quem quisesse fretar êsses mesmos navios.
Sr. Presidente: como desenvolvidamente mostrei no último parecer que apresentei à Câmara sôbre êste assunto, existem nesta ocasião 20 unidades, com 102:000 toneladas brutas, que estão amarradas no Tejo.
Êsses navios não tinham ninguém que os fretasse, apesar de o Estado estar a fretar nessa ocasião todos os navios para os quais havia fretadores, e em condições de preço de tal ordem que o Estado não tirava daí benefício algum. Pois apesar disso não havia quem os quisesse. Como é então que há hoje quem os compre?
Só nestas condições: com a certeza de que, passado algum tempo, os navios poderem mudar de bandeira. Mas é de recomendar essa solução?
E não sendo, que esperança tem o Sr. Ministro do Comércio de arranjar compradores para qualquer cousa como 20 unidades, qualquer cousa como 100:000 toneladas?
Evidentemente não há possibilidade.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro do Comércio sabe muito bem que não estou-fazendo estas considerações por obstrucionismo. e a isto se limitam as minhas considerações. Vou mandar para a Mesa uma proposta tendente, quanto a mim, a resolver o problema. Num país como Portugal, cujo comércio é feito na sua quási totalidade por mar; num País como Portugal que, como já tive. ocasião de dizer a esta Câmara, sob o ponto do vista comercial, é quási uma ilha, visto que 96 por cento do seu comércio exterior se faz pela via marítima, num país como o nosso, repito, entendo que o problema dos Transportes Marítimos só comporta, nêste momento, uma única solução, que é a venda, como o Sr. Ministro do Comércio pretende, pura e simples, em hasta pública ou em concurso público, do todos aqueles navios da frota mercante do Estado que tenham compradores e que êstes sejam portugueses.
Assim, estou convencido de que, devidamente acautelados êsses concursos, o Sr. Ministro do Comércio encontrará compradores para 20 unidades, ou seja para 50:000 toneladas.
O Sr. Ministro vai encontrar, pela sua proposta, solução ou destino para uma parte da frota, e eu não tenho dúvidas em concordar com essa solução; mas, pelo conhecimento que tenho dêste problema e pelo largo estudo que dele tenho feito, sou levado a concluir que S. Ex.ª, pelo que preconiza na sua proposta, ficará depois, permita-se-me a palavra «engasgado» com o resto dos navios, não tendo possibilidade de os aplicar à economia nacional.
Para obviar a êste inconveniente, mando para a Mesa uma proposta de substituição ao u.º 3.º do artigo 2.º
Não nos devemos esquecer de que a quási totalidade do nosso comércio externo é feita por mar e que, sendo nós ainda a terceira potência colonial, as nossas colónias vão dia a dia desintegrando-se da mãe Pátria, exactamente porque faltam as comunicações que deviam existir entre elas e a metrópole.
Eram estas as considerações que tinha a fazer sôbre o assunto e envio para a Mesa a minha proposta de substituição.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráfícas que lhe foram enviadas.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: a história está feita e refeita o não valeria muito a pena reeditar a scena que se refere aos Transportes Marítimos do Estado.
É preciso, todavia, apontar as cautelas necessárias na alienação da frota mercante do Estado.
O Sr. Cancela do Abreu disse que não há apenas voos de gaivotas sôbre o Tejo e parece que S. Ex.ª descobriu voos mais largos, voos de corvos que adejam em volta dos navios dos Transportes Marítimos.
O Sr. Ministro do Comércio trouxe à Câmara uma proposta com intuitos louváveis, porque do alguma forma vem trazer a resolução do problema; no emtanto, quer-me parecer que ela deve ser modificada de maneira a que não seja possível a transferência dêsses navios
Página 18
18
Diário da Câmara dos Deputados
para o estrangeiro, e isso não está acautelado suficientemente.
Lendo-se o n.º 3.º do artigo 2.º, verificar-se-há que com a palavra «livremente» está a possibilidade de mandar a frota outra vez para a Alemanha, o contra isso eu manifesto a rainha oposição mais formal e decidida.
Mas a proposta do Sr. Ministro do Comércio enferma, a meu ver, de algumas deficiências que na especialidade procurarei remediar e enferma também do desconhecimento da situação actual da praça.
Os navios vão à praça, nos termos desta proposta, pelas avaliações feitas.
Tenho a certeza de que ninguém iria à primeira praça, sendo desnecessário fazer conluios.
Eu tenho na minha frente a avaliação feita à frota do Estado e por ela se vê que ninguém pode concorrer, porque, sabendo nós que se estão a vender navios a duas libras a tonelada, ninguém vai comprar a quatro libras!
O Sr. Ministro do Comércio viu bem o caso porque, tendo a certeza de que ninguém iria à primeira praça, estabeleceu uma segunda praça, com 50 por cento. Então já haverá quem concorra. Assim S. Ex.ª terá elementos a quem possa vender êsses navios.
É natural que a essas entidades se lhes garanta qualquer cousa para manterem os serviços que já têm e que são benefícios para o País, e acho bem que o Estado dê o direito de opção às entidades que tem já serviços montados, como a Companhia Nacional de Navegação e outras.
Isto não representa favoritismo, mas o reconhecimento de uma necessidade.
Parece-mo que o Estado limitou demasiadamente os prazos, que a meu ver devem ser de sessenta dias, para pagamento da primeira prestação.
O Estado pede como caução as apólices dos seguros e, como a Câmara sabe, Ossos seguros são feitos em Inglaterra e o prazo que só marca de 8 dias é bem pouco para poder colhêr êsses documentos.
O Sr. Ministro do Comércio procurou servir as colónias, mas foi parcimonioso, pois deve saber que um só navio é pouco.
Agora há, portanto, a considerar ainda o facto de aquele n.º 3.º admitir a possibilidade da transferência dos navios para estrangeiros, cujo pensamento deve ser de que se não possa fazer qualquer transferência de direito, sôbre navios, emquanto não estiverem pagos.
Emquanto não estiverem pagos, essa transferência não se poderá fazer de direito, porém, desde que o seu pagamento seja feito integralmente, poderá fazer-se a transferência, mas só a nacionais.
Sôbre êste assunto da transferência dos navios para estrangeiros, bom será que êle fique claramente definido.
Devo dizer que na altura própria tenciono enviar para a Mesa uma emenda, do forma que fique claramente definido que os navios nunca poderão ser vendidos a estrangeiros.
Sr. Presidente: já só ventilou aqui uma questão, que é a do haver navios que, pela sua tonelagem, possivelmente não obtenham comprador.
De facto, há navios cuja tonelagem é tam grande que quási ninguém os poderá utilizar.
Isto é o mesmo que dizer ao Sr. Ministro do Comércio que vai ficar com uma grande quantidade do navios por vender, justamente aqueles do maior tonelagem.
Penso que êsses navios poderão fàcilmente ser trocados por outros que tenham as condições económicas necessárias, e que possam servir ao fim industrial que se tem em vista.
Eu não quero dizer com isto que se vá trocar por exemplo um navio de 80:000 toneladas por outro de 4:000 ou 5:000 toneladas.
Isso não se devo fazer, o estou certo mesmo de que não se fará.
Eu, Sr. Presidente, tinha uma proposta do artigo novo que tenciono mandar para a Mesa, a qual tem por fim permitir a troca dêsses navios por outros mais adequados ao fim industrial dos seus compradores; rnas de forma a que a tonelagem a entregar o a receber não seja inferior a 40 por cento.
Outras considerações me sugere ainda a proposta em discussão, mas como não quero alongar-mo em considerações que poderiam prejudicar a rápida liquidação do assunto, ou limito-me a mandar para a Mesa as minhas propostas de emenda.
Termino, Sr. Presidente, convencido de que tudo quanto se votar será em termos
Página 19
19
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
de não tornar possível a transferência da, frota mercante do Estado para entidades estrangeiras.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente: vou ser breve porque a questão carece do ser resolvida ràpidamente, tanto as demoras a têm prejudicado material e moralmente.
Eu entendo que o cambão desaparece logo que o depósito seja exigido, quer no concurso verbal quer no concurso em carta fechada, que é. incontestavelmente, o preferível. Êsse depósito deve, naturalmente, ser elevado — superior a duas dezenas de contos — para assim se afastar A concorrência desleal, ou, até, quaisquer brincadeiras de hipotéticos compradores.
Quanto ao artigo 1.º que se refere à primeira comissão entendo que tal comissão não pode continuar a ser constituída pelos elementos que actualmente a compõem, isto é, por contabilistas e juristas. Dada a depreciação dos barcos a alienar a existência nessa comissão de elementos técnicos torna-se indispensável...
Sr. Presidente: quando nesta Câmara. se discutiram as propostas do Sr. Lima Basto, eu tive ocasião de dizer que estava convencido de que os navios haviam de apodrecer, visto que as condições que essas propostas estabeleciam era de molde a ninguém querer tomar conta dos barcos.
Sr. Presidente: para, por agora, terminar, faço os mais ardentes votos para que a discussão dêste assunto não seja demorada, e reservo-me para, na especialidade, apresentar algumas emendas que a minha apoucada inteligência e muito patriotismo entenderem convenientes.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Plínio Silva: — Sr. Presidente: não desejo tomar muito tempo à Câmara, mas, como gosto de ser sempre coerente, não posso deixar de usar da palavra.
Lamento que as leis anteriormente votadas pelo Congresso da República não
tenham dado resultado algum, e tenho tanto mais autoridade para lamentar a orientação que tem sido seguida, quanto é certo que, quando pela primeira vez foi elaborado um parecer sôbre o destino a dar aos Transportes Marítimos do Estado, eu tive a honra de fazer parte de uma dessas quatro comissões que então se pronunciaram sôbre o problema.
Sr. Presidente: eu desejo neste momento, recordar à Câmara o parecer que, em Maio de 1920, foi elaborado por essa comissão, de que foi relator o nosso colega Sr. Velhinho Correia.
Diz assim:
Leu.
V. Ex.ªs notaram que através das várias declarações de votos uma há dentro do ponto de vista que a Câmara parece querer adoptar.
Foi a que eu mandei para a Mesa em 1920.
Veja a Câmara quão vantajoso teria sido para o Estado que nessa data fôsse seguido êste meu parecer.
Felicito o Sr. Ministro do Comércio por agora ter apresentado à Câmara uma proposta dentro desta formula, que é precisamente aquela que em 1920 eu preconizava, lamentando que S. Ex.ª, que então fazia parte duma das comissões que estudaram êste problema, não tivesse a opinião que então eu tinha.
Se V. Ex.ª tivesse esta opinião que tem agora, creio que teríamos feito uma obra de interêsse para o país.
Oxalá que êste exemplo sirva por forma que todos se convençam do que a questão apresenta solução mais prática do que aquela que se seguia.
Os trabalhos que o Sr. Velhinho Correia elaborou sôbre êste assunto mais uma vez me levaram a referir a êles com louvor, não só pelo que representam como trabalho, mas ainda como subsídio para o estudo histórico do problema.
Foi, como V. Ex.ªs vêem, trabalho inútil, tendo resultado da discussão sôbre êste problema um trabalho absolutamente improfícuo, de que provieram gravíssimos prejuízos para o país.
Folgo que o Sr. Ministro do Comer do tenha, ao tomar posse da pasta, olhado para o problema com verdadeira atenção, seguindo o caminho que apresentei à Câmara. E V. Ex.ª deve felicitar-se por
Página 20
20
Diário da Câmara dos Deputados
ver que todos os lados da Câmara estão concordes com a sua generalidade.
Tencionava apresentar algumas propostas de alteração a alguns artigos; mas mais ou menos os oradores que me tem precedido têm apresentado, pontos de vista com que concordo, e o Sr. Ministro também está de acôrdo mais ou menos com algumas que estão em harmonia com o pensamento de resolver a questão em atenção aos interêsses públicos nacionais, e por qualquer forma que impeça que os navios possam ir parar às mãos do estrangeiro.
Acho que realmente se devem tomar as cautelas e as medidas necessárias para que se não chegue a uma fórmula negativa.
Se os futuros compradores se convencessem de que seria essa a fórmula única para que o Estado teria de caminhar, abandonariam as praças sucessivas e os concursos que seja necessário estabelecer, e, assim, creio que realmente deve ficar bem exarado na lei a sair do Parlamento que se procure a venda dêsses navios, mas dependendo à outrance desta hipótese, que não se deve aceitar de forma alguma.
Quero ainda chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para o auxílio que é necessário prestar às colónias. É indispensável que as unidades que porventura possam ser cedidas às nossas colónias sejam, de facto, aquelas em condições de serem utilizadas nas melhores condições possíveis. O Sr. Ministro do Comércio deve, pois, ter o cuidado de que os navios que sejam julgados necessários para o fomento e desenvolvimento das nossas colónias sejam àqueles que realmente tenham as características necessárias para o seu útil e melhor aproveitamento.
Seria lamentável que na operação da venda dos navios só vendessem só unidades em melhores condições, e as que ficassem disponíveis não pudessem depois ser utilizadas.
Eu desejaria saber se o Sr. Ministro do Comércio se encontra habilitado para encarar as diferentes propostas de emenda e aditamento que hão de ser apresentadas o se não seria preferível para acelerar trabalho, encerrando-se hoje, como creio, a discussão na especialidade, analisar cuidadosamente as diferentes propostas de forma a evitar que a futura lei saia com disposições porventura antagónicas.
E, assim, parecia-me vantajoso que a Câmara se pronunciasse no sentido de que, encerrada a discussão na generalidade, fossem mandadas para a Mesa as diferentes alterações à proposta de lei, e que já foram anunciadas por vários Srs. Deputados que falaram sôbre o assunto, a fim de habilitar a Câmara a aprová-la, devidamente, facilitando se por êste modo a discussão do assunto na especialidade.
Para não complicar a discussão dêste assunto não mando para a Mesa proposta alguma, porque as que já foram anunciadas não satisfazem completamente, mas desejo que estas sejam bem apreciadas.
Folgo, ainda, com que o Sr. Velhinho Correia, que foi- um dos principais colaboradores de toda esta obra, tivesse declarado que estava convencido de que a solução preconizada seria a melhor.
Termino, pois, fazendo votos para que o assunto fique definitivamente resolvido, manifestando-me no sentido de que as propostas sejam desde já enviadas para a Mesa.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira (por parte da comissão do Orçamento): — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que se acha instalada a comissão de finanças, tendo nomeado para Presidente o Sr. Barros Queiroz e a mim para Secretário.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pedro Pita): — Sr. Presidente: dois minutos apenas para não prejudicar a votação na generalidade desta proposta de lei.
Pedi a palavra simplesmente para repetir mais uma vez aquilo que já tive ocasião de dizer, que o meu único desejo é ficar habilitado a poder alienar os navios do Estado. Todas as emendas que sejam apresentadas na discussão sôbre a especialidade e que não prejudiquem êste meu propósito e o fim que me fez. trazer esta proposta de lei, a todas aceito, lembrando apenas aos Srs. Deputados que, ao procurarem introduzir emendas nestas proposta de lei, tenham em vista o mesmo fim que eu tenho, isto é, a alienação da frota mercante do Estado.
Página 21
21
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
Eu não tenho medo do cambão, que se evita, ou não tenho medo de alienar essa frota por preço mínimo; do que eu tenho medo é de que êsses navios continuem no poder do Estado.
Ao Sr. Plínio Silva, a quem agradeço as referências que fez à minha proposta, tenho a dizer que a assinatura que pus nesse parecer a que S. Ex.ª se referiu com o aditamento com restrições, significa manifestamente que não concordei com êsse parecer, porque então como hoje tinha o mesmo ponto de vista: a alienação dos navios.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestas condições, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Como não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito, vai votar-se as propostas na generalidade.
Foi aprovada a moção do Sr. Paulo Cancela de Abreu.
Depois de lida foi aprovada a moção do Sr. Velhinho Correia.
O Sr. Agatão Lança: — Requeiro a contra-prova.
Feita a contraprova verificou-se o mesmo resultado.
Foi aprovada a proposta generalidade.
O Sr. Presidente: — Vai discutir-se na especialidade.
Leu-se o artigo 1.º
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de emenda ao artigo 1.º
Pelo que se diz nesse artigo, parece que a segunda sub-comissão não está em exercício porque alguns dos seus membros se escusam a fazer parte dela.
Tenho a certeza do que na segunda subcomissão a constituir pelo Sr. Ministro do Comércio não entrará qualquer funcionário do Estado.
Mando para a Mesa a seguinte:
Proposta de alteração
Artigo 1.º Substituir «1.ª «por «2.ª «.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 10 de Dezembro de 1923. — Carlos Pereira.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pedro Pita): — Sr. Presidente: há dias tive já ocasião de explicar à Câmara que não havia êrro na indicação da primeira sub-comissão em vez de ser segunda sub-comissão. Devo explicar mais uma vez que está primeira sub-comissão em vez da segunda, desde que essa comissão, num determinado momento, apresentou ao Ministro do Comércio, meu antecessor, a sua demissão. O Sr. Ministro do Comércio, com o fundamento de que essa comissão era constituída por uma lei, não tendo sido portanto nomeação sua, entendem não poder dar-lhe a exoneração pedida. Só quando essa sub-comissão declarou que não continuava nos seus trabalhos, e que o Sr. Ministro se arranjasse como quisesse, só em consequência disso o Sr. Ministro Vaz Guedes determinou num. seu despacho que as funções da segunda sub-comissão passassem para a primeira.
Disse o Sr. Carlos Pereira: «mas a segunda sub-comissão é composta de funcionários do Estado e o Ministro pode mandá-la fazer êsse trabalho». Devo dizer em primeiro lugar que é muito difícil mandar trabalhar uma comissão sem que seja obrigada a isso; em segundo lugar,, há que esclarecer ainda que esta segunda sub-comissão é composta não só de funcionários do Estada, mas de outros indivíduos que não são funcionários do Estado.
Devia dizer francamente à Câmara, se se tratasse de uma comissão nova, que não me importaria com isso, porém, o contrário disto creio que será desnecessário, tanto mais quanto é certo que a comissão que vai trabalhar neste assunto está constituída em condições de dar absolutas garantias ao Estado, pois é composta de um juiz de Relação, um ajudante da Procuradoria Geral da República, um vogal do Conselho Superior do Finanças, o Director da Contabilidade Pública, um perito contabilista e um comerciante indicado pela Associação.
Não compreendo, pois, o que mais seja necessário, porquanto entendo que há conveniência em que êsses indivíduos sejam de facto funcionários do Estado. Isso é uma garantia de que hão-de cumprir fielmente o seu dever.
Não me importa que seja nomeada uma outra comissão, se bem que entenda que
Página 22
22
Diário da Câmara dos Deputados
os indivíduos que compõem aquela a que já me referi dão inteira garantia para o Estado.
Eu devo mesmo dizer a V. Ex.ª, relativamente à sub-comissão a que se fez referência, que ela abandonou os seus trabalhos, e poderá continuar a exercer as suas funções, visto que isso não fazia sentido.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se a proposta enviada para a Mesa pelo Sr. Carlos Pereira.
Foi lida e admitida.
O Sr. Carlos Pereira — Sr. Presidente: devo dizer que concordo em parte com as considerações apresentadas pelo Sr. Ministro do Comércio.
As funções da comissão proposta pelo Sr. Ministro do Comércio são de mero leiloeiro.
É evidente que a primeira sub-comissão nos dá perfeita garantia do que os interêsses do Estado serão defendidos.
Mas estou certo de que os leiloeiros terão grande influência nesse leilão, pelo que é necessário acautelar a forma do leilão.
Mas a razão da minha emenda é porque, não tendo a certeza do ser aceita a proposta do Sr. Ministro do Comércio, julgo conveniente acautelar bem os interêsses do Estado.
Como o Sr. Cancela de Abreu fez considerações relativas às avaliações dos navios, eu lembrava que se fizessem novas avaliações.
Àpartes.
O Sr. Ministro do Comércio e interino do Trabalho (Pedro Pita) (interrompendo): — A segunda sub-comissão não tinha nenhum técnico, nenhum engenheiro naval, e a nova avaliação a fazer-se só poderia ser feita por um técnico.
Àpartes.
O Orador: — A comissão respectiva pode indicar um engenheiro.
Sr. Presidente: termino dizendo que não faço questão da alteração que propus.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: além das razões apresentadas pelo Sr. Ministro do Comércio a respeito da segunda sub-comissão, o que ú certo é que essa comissão deu provas da sua incompetência.
Sem atender às qualidades pessoais e morais das pessoas que a compõem, ela zelou de maneira bem duvidosa os interêsses do Estado.
O Sr. Carlos Pereira referiu-se a uma nova avaliação e essa avaliação cabe à sub-comissão.
A Câmara deve saber que, quando foi do concurso para a adjudicação da frota do Estado, houva vários pareceres. Houve um membro dessa comissão que, depois de dar um parecer contrário, veio dar um novo parecer favorável.
Mas há mais, Sr. Presidente. Quando foi da venda do vapor «Lima» — a Câmara sabe as condições escandalosas em que essa venda foi efectuada,- fazia parte da segunda sub-comissão um interessado da Empresa Insulana de Navegação.
No artigo que mando para a Mesa autoriza-se o Sr. Ministro do Comércio e a comissão liquidatária a mandarem fazer novas avaliações, avaliações que serão efectuadas por pessoas nas quais se confie e por peritos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações e, interino do Trabalho (Pedro Pita): — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa a seguinte proposta:
§ único. A 1.º sub-comissão a que êste artigo se refere, deverá ser agregado una oficial da armada da marinha de guerra, engenheiro construtor naval, nomeado pelo Ministro da Marinha. — O Ministro do Comércio, Pedro Pita.
Foi admitida.
O Sr. Francisco Cruz: — Para complemento dá proposta que o Sr. Ministro do Comercio acaba do apresentar, mando para a Mesa o seguinte:
§ único. A esta sub-comissão será agregado um engenheiro construtor naval, es-
Página 23
23
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
colhido pelo Ministro da Marinha. — Francisco Cruz.
Foi admitido.
O Sr. Plínio Silva: — Mando para a Mesa uma proposta do emenda à do Sr. Ministro do Comércio, acrescentando as palavras «engenheiros construtores navais».
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações e interino, do Trabalho (Pedro Pita): — Sr. Presidente: mando para a Mesa uma proposta do substituição à minha proposta anterior, de harmonia com a proposta do Sr. Francisco Cruz.
Foi rejeitada, a proposta do Sr. Carlos Pereira.
O Sr. Francisco Cruz: — Requeiro que me seja permitido retirar a minha proposta, visto que, do harmonia com ela, o Sr. Ministro do Comércio acaba de apresentar uma outra.
Foi autorizado a retirar a proposta.
Foi aprovado o artigo 1.º
O Sr. Júlio de Abreu: — Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério e Ministro da Justiça para um assunto que considero de uma certa gravidade, porém, como qualquer dêstes Srs. Ministros se não encontro presente, eu peço ao Sr. Ministro do Comércio o favor de lhes transmitir as considerações que vou fazer.
O Sr. Presidente: — Eu devo prevenir V. Ex.ª de que tem apenas 5 minutos para fazer as considerações que deseja.
O Orador: — Procurarei, Sr. Presidente, resumir tanto quanto possível as minhas considerações do forma a que não exceda os cinco minutos que tenho para chamar a atenção do Govêrno para o assunto que vou tratar.
Tenho recebido diversas cartas do distrito de Bragança, protestando contra o procedimento do actual Govêrno e muito principalmente contra o actual titular da pasta da Justiça relativamente a uma sindicância que se está fazendo contra o secretário geral do distrito e contra o secretário da administração.
Trata-se, Sr. Presidente, como já disse, de uma sindicância que se está fazendo a dois funcionários, ao secretário geral do distrito de Bragança e ao secretário da administração, lamentando eu, Sr. Presidente, profundamente que os sindicantes não mereçam confiança, pois a verdade é que um dos últimos sindicantes nomeados é primo do Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Nunes Loureiro (interrompendo): — Então o Ministro da Justiça, não pode ter primos?
O Orador: — Não resta dúvida de que os pode ter, porém, êste de que se trata é um político em evidencia no distrito de Bragança.
Antes da portaria ser publicada eu quis chamar a atenção do Govêrno, mas a palavra não me chegou a tempo de evitar que fôsse nomeado êste sindicante.
Aproveito esta ocasião para chamar a atenção do Sr. Minhtro do Comércio para transmitir ao Sr. Presidente do Ministério as minhas considerações.
O orado r não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações e, interino, do Trabalho (Pedro Pita): — Acabo de tomar apontamento de todos os assuntos do que o ilustre Deputado tratou o que eu fielmente vou transmitir ao Sr. Presidente do Ministério, certo de que S. Ex.ª tomará as providências que o caso pede.
O orador não reviu.
O Sr. António Correia: — Desde há muito que pedi documentos pelo Ministério da Agricultura, a fim de tratar de um assunto urgente. Como o Sr. Ministro da, Agricultura não tem vindo à Câmara, peço ao Sr. Ministro do Comércio a fineza de transmitir a S. Ex.ª o meu desejo de que em breve compareça para tratar dêsse assunto o que os referidos documentos me sejam dados com urgência.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações e, interino, do Trabalho (Pedro Pitei): — Transmitirei ao Sr. Ministro da
Página 24
24
Diário da Câmara dos Deputados
Agricultura as considerações do ilustre Deputado.
O Sr. Sá Pereira: — Peço ao Sr. Ministro do Comércio u fineza de transmitir ao Sr. Presidente do Ministério que eu acabo de receber uma carta e um documento, aquela protestando contra a nomeação do administrador do concelho, de Moncorvo e êste que demonstra os motivos dessa justa reclamação.
Espero que o Sr. Presidente do Ministério dê as providências que o caso requer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações e, interino, do Trabalho (Pedro Pita): — Sr. Presidente: pedi a palavra para afirmar ao Sr. Sá Pereira que transmitirei as considerações de S. Ex.ª ao Sr. Presidente do Ministério e lhe entregarei os documentos a que S. Ex.ª se referiu.
O Sr. Sá Cardoso: — Lastimo ter do cansar a atenção do ilustre titular da pasta do Comércio, mas devo chamar a atenção de S. Ex.ª para o lamentável estado em que se encontra a ponte de Caminha, que obriga, a quem dela tem necessidade de se servir a dar uma volta de 8 quilómetros.
Talvez se possam aproveitar alguns fundos que ainda restam para o seu conserto, dando por administração ou empreitada essa obra.
Garanto a V. Ex.ª que causa um grande transtorno a Caminha, bem como a todas as povoações importantes que a rodeiam, a falta dessa ponte.
Pedia a V. Ex.ª para tomar isto em consideração e mandar proceder à reparação da ponte.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações e, interino, do Trabalho (Pedro Pita): — Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Sá Cardoso sabe muito bem o desejo que tenho de satisfazer todas as reclamações no género das que me apresentou.
É desnecessário, portanto, dizer que eu tenho a melhor vontade de satisfazer a reclamação de S. Ex.ª
Já conheço o assunto e posso afirmar a V. Ex.ª que, com os recursos de que posso dispor, essa obra virá a fazer-se, porque não podem perder-se as quantias importantes que com a ponte já se despenderam.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã às 14 horas, com a seguinte ordem de trabalhos:
Antes da ordem do dia (sem prejuízo dos oradores que se inscrevam):
Pareceres n.ºs 100, 513. 593, 98, 617, 595, que já estavam em tabela.
Parecer n.º 91 (emendas do Senado) que aprova o contrato relativo à concessão e amarração dum cabo telégrafo-submarino na Ilha do Faial.
Ordem do dia:
Proposta de lei n.º 617-B, que autoriza o Govêrno a proceder à alienação dos navios que constituem os Transportes Marítimos do Estado.
Proposta de lei n.º 616-I, que remodela os quadros do funcionalismo público e reduz as despesas do Estado.
Parecer. n.º 544, que aprova para ratificação o protocolo assinado em Londres relativo a uma modificação do artigo 6.º da Convenção Internacional sôbre navegação aérea.
Projecto de lei n.º 616-E, que manda licencear todos os oficiais e sargentos milicianos que ainda estejam na efectividade do serviço e não satisfaçam a designadas condições.
Projecto de lei n.º 616-A, que considera para todos os efeitos mortos em serviço da Pátria os agentes da autoridade, mortos ou mutilados no exercício das suas funções em cumprimento dos seus deveres.
Parecer n.º 442, que considera em vigor a doutrina do artigo 11.º da lei n.º 415, de 10 de Setembro de 1915.
Está encerrada a sessão.
Eram 15 horas e 55 minutos.
Página 25
25
Sessão de 10 de Dezembro de 1923
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Substituïção
Substituir na comissão de guerra o Sr. Tôrres Garcia pelo Sr. Sousa Maia.
Para a Secretaria.
Requerimento
Requeiro que pela 10.ª repartição da Direcção Geral da Contabilidade Pública me seja fornecida, com urgência, cópia da folha de ajudas de custo apresentada
por Ricardo Roes y Alberiy, referente a uma sindicância a que procedeu em Agosto dêste ano, no Funchal.
Sala das sessões, 10 de Dezembro de 1923. — Morais Carvalho.
Expeça-se.
Constituïção de comissão
Comissão de finanças:
Presidente, o Sr. Barros Queiroz. Secretário, o Sr. Carlos Pereira.
Para a Secretaria.
O REDACTOR — Avelino de Almeida.