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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 9
EM 13 DE DEZEMBRO DE 1923
Presidente o Ex. mo Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Ex. mos Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia
Sumário. — Aberta a sessão com a presença de 72 Srs. Deputados, é lida a acta da sessão anterior e dá-se conta do expediente.
Antes da Ordem do dia. — O Sr. António Maia chama a atenção do Sr. Ministro da Guerra para a situação do director da Aeronáutica Militar e pede providências.
Responde-lhe o Sr. Ministro da Guerra (António Carmona).
Para explicações tem a palavra o Sr. António Maia.
Usa da palavra para interrogar á Mesa o Sr. António Correia.
O Sr. Pires Monteiro requere que seja discutida na ordem do dia, imediatamente à proposta n.º 517-B, a proposta n.º 616-A.
Depois de o Sr. Presidente prestar esclarecimentos, é pôsto à discussão o requerimento, usando da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Almeida Ribeiro e Carvalho da Silva. O requerimento é rejeitado e em seguida aprovado em contraprova.
Entra em discussão o parecer n.º 442, que considera em vigor a doutrina dos artigos 10.º e li. «da lei n.º 415, de 10 de Setembro de 1915, e desde a data em que esta deixou de ter os seus efeitos.
Sôbre a generalidade usa da palavra o Sr. António Fonseca.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Ferreira) manda para a Mesa, requerendo urgência, uma proposta de lei que autoriza a província de Moçambique a contratar e contrair empréstimos com designada aplicação.
A provada a urgência.
O Sr. Ministro do Comércio (Pedro Pita) envia para a Mesa uma proposta de lei que rectifica a lei orçamental n.º 1:449, de 13 de Julho de 1923, na parte relativa ao Ministro do Comércio e Comunicações. Requere a urgência, que é aprovada.
E aprovada a acta da sessão anterior.
Ordem do dia. — Prossegue o debate politico determinado pelas declarações do Govêrno acêrca dos últimos acontecimentos ocorridos em Lisboa.
Sôbre a ordem, usa da palavra o Sr. Fernando Freiria.
Secundam o orador nas suas referências ao general comandante da primeira divisão os Srs. Álvaro de Castro, Ministro da Guerra (António Carmona) e Presidente do Ministério (Ginestal Machado).
E lida e admitida a moção do Sr. Fernanda Freiria.
Sôbre a ordem, usam da palavra os Sr. Amadeu de Vasconcelos, António Maria da Silva e Agatão Lança.
E prorrogada a sessão até final do debate.
O Sr. Presidente do Ministério (Ginestal Machado) responde aos oradores precedentes.
Voltam a falar, para explicações, os s rs. António Maria da Silva, Presidente do Ministério (Ginestal Machado), Agatão Trança e novamente o chefe do Govêrno.
Sôbre a ordem usa da patavina o Sr. Álvaro de Castro.
Acêrca da, doutrina contida na moção dêste orador fazem uso da palavra os Srs. António Maria da Silva, Carvalho da Silva, Presidente do Ministério (Ginestal Machado) e José Domingues dos Santos.
O Sr. Carlos de Vasconcelos requere prioridade para a moção do Sr. Álvaro de Castro. Rejeitado.
Interroga a Mesa o Sr. António Maia.
E aprovada a moção apresentada pelo Sr. Tôrres Garcia na sessão precedente.
É rejeitada a moção do Sr. Carvalho da Silva, em prova e contraprova.
E aprovada a moção do Sr. Fernando Freiria.
É posta á votação a viação do Sr. Álvaro de Castro.
Sôbre o modo de votar usa da palavra o Sr. Vasco Borges, que requere que a moção seja dividida em duas partes.
Aprovado.
O Sr. Carlos de Vasconcelos requere votação nominal para a primeira parte. Aprovado.
O Sr. António Maia requere que se proceda, antes à votação da segunda parte, Aprovado.

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É aprovada a segunda parte da moção.
É lida a primeira parte. Feita a votação nominal, verificou-se haverem rejeitado a primeira parte da moção 53 Srs. Deputados, contra 42 que aprovaram.
O Sr. Presidente do Ministério comunica à Câmara que vai transmitir o resultado da votação ao Sr. Presidente da República.
Em seguida e encerrada a sessão e marcada a imediata com a respectiva ordem.
Abertura da sessão às 16 horas e 42 minutos.
Presentes 72 Srs. Deputados. Entraram durante a sessão 41 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leito de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia. António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Mendonça.
António de Paiva Gomes.
António de Sousa Maia.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Domingos Leite Pereira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Hermano José de Medeiros.
João Estêvão Aguas.
João José da Conceição Camoesas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
José Cortês dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel de Sousa da Câmara.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Valo Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques. Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.

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António Abranches Ferrão.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António Pinto de Meirelos Barriga.
António Vicente Ferreira.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Delfim Costa.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mário de Magalhães Infante.
Nuno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Vasco Borges.
Vergílio da Conceição Costa.
Srs. Deputados que faltaram a sessão:
Afonso Augusto da Costa.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte da Silva.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Jorge Barros Capinha.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos Paulo da Costa Menano.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Viriato Gomes da Fonseca.
O Sr. Presidente (às 15 horas e 40 minutos): — Estão presentes 72 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Leu-se a acta e o seguinte
Expediente
Ofícios
Do Comité Nobel do Parlamento Norueguês, enviando exemplares duma circular nobre a distribuïção do Prémio Nobel da Paz em 1924.
Para a Secretaria.
Do Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal do Meda, contra a

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proposta de lei que cria um imposto sôbre os vinhos.
Para a comissão de finanças.
Do Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Vila Real, idêntico ao anterior.
Para a comissão de finanças.
Telegramas
Da Câmara Municipal de Aveiro, juntas de freguesia de Gouveia, Associação dos Artistas e Associação dos Manufactores de Tecidos de Gouveia, pedindo a conservação das escolas primárias superiores.
Para a Secretaria.
Das juntas de freguesia da Conceição, Ourique e Garvão, pedindo para ser mantida a comarca de Ourique.
Vara a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Ourique, idem.
Para a Secretaria.
Representação
Dos secretários aposentados das administrações dos concelhos e bairros, pedindo melhoria de vencimentos.
Para a comissão de finanças.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: — Está aberta a inscrição para antes da ordem do dia.
O Sr. António Maia: — Sr. Presidente: mais uma vez tenho de chamar a atenção do Sr. Ministro da Guerra para um facto já por mim apontado, qual seja o de estar dirigindo os Serviços de Aeronáutica um oficial que, por lei, não pode ocupar êsse lugar.
Mais uma vez me vejo obrigado, pois, a solicitar a atenção do Sr. Ministro da Guerra para o decreto n.º 9:246, que, fôra de toda a legalidade, dá uma gratificação, ou, para melhor dizer, concede uma gratificação que, por lei, não pode ser criada, a não ser por êste Parlamento, e assim, Sr. Presidente, peço a atenção da Câmara para êste caso.
O artigo 3.º do decreto n.º 4:029 foi modificado por uma autorização publica da na Ordem do Exército n.º 11, de 7 de Outubro de 1918.
Sr. Presidente: quando num dia dêstes chamei a atenção do Sr. Ministro da Guerra para semelhante caso, S. Ex.ª declarou-me categòricamente que faria cumprir a lei; porem, isto passou-se deve haver mais de quinze dias, e até hoje o director da Aeronáutica continua no seu pôsto.
Se isto é cumprir a lei eu não sei, francamente, o que seja deixar de a cumprir.
Sr. Presidente: eu sol, e S. Ex.ª o Sr. Ministro da Guerra sabe-o também, que o Sr. director da Aeronáutica está incompatibilizado com todos os oficiais, pois a verdade é que os comandantes das várias unidades não desejam continuar a comandá-las senão quando o director da Aeronáutica esteja por lei onde deve estar.
Sei mais, e o Sr. Ministro da Guerra sabe-o também, que alguns oficiais se dirigiram ao Sr. director da Aeronáutica, fazendo-lhe sentir a incompatibilidade que existe, não tendo S. Ex.ª até hoje adoptado qualquer resolução.
Eu sei que S. Ex.ª prometeu pedir a sua exoneração; mas, se bem que tivesse feito esta promessa, há talvez uns oito dias, até agora ainda não se exonerou.
Isto não pode continuar, pois é preciso que as leis se cumpram, custe o que custar, dos a quem doer, e, assim, não é lícito que o Sr. director da Aeronáutica, que tem todas as indicações necessárias para abandonar o seu lugar, se conserve nêle, mercê duma política extraordinária.
Devo dizer que, não tenho ligação de espécie alguma com o serviço da aviação, porque pedi a demissão do meu lugar. O que não posso admitir é que um oficial que tem dado provas cabais de que não tem competência para ocupar aquele cargo, como demonstrei numa interpelação que fiz ao Sr. Ministro da Guerra, continue ao serviço da aviação.
Havendo realizado em Junho essa interpelação, admiro-me de que até hoje ainda não houvesse um Ministro da Guerra que tivesse a energia necessária para cumprir a lei.
Pregunto: porque se não cumpro a lei? Espera-se que haja uma insubordinação para depois fazer cumprir a lei? E isso que se deseja?

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Creio que a acção do Sr. Ministro da Guerra deve ser evitar essas faltas.
Diz-se que, estando a fazer-se uma sindicância, não é ocasião para exonerar o director da Aeronáutica.
Sou inteiramente de opinião contrária. Se se está fazendo uma sindicância, e essa sindicância visa actos do director da Aeronáutica, há muito tempo que êle devia estar afastado dêsse serviço.
Evidentemente, quando um indivíduo é acusado de qualquer irregularidade no serviço que desempenha, a primeira cousa a fazer é afastar do serviço êsse indivíduo, o que se não tom feito até hoje.
Que protecção merece êsse oficial, para continuar desempenhando o lugar, quando de mais a mais se vai fazer uma sindicância?
É preciso que a Câmara tome conta dêste assunto, ou que o Sr. Ministro da Guerra o resolva imediatamente dentro da legalidade.
Estranho tanto mais êste facto quanto é verdade que foi o Sr. Ministro da Guerra que declarou formalmente à Câmara que ia cumprir a lei.
Porque não se fez cumprir até hoje a lei?
Espero que S. Ex.ª responda. O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Guerra (António Óscar Carmona): — Efectivamente numa das sessões passadas o Sr. António Maia referiu-se à situação do Sr. director da Aeronáutica Militar, e pediu-mo que fizesse cumprir a lei, o que eu prometi o ainda prometo hoje. Porém, devo dizer que o cumprimento da lei não se podo fazer duma maneira rígida, com prejuízo do serviço.
O Sr. António Maia referiu-se nossa ocasião a vários oficiais que estavam fôra da lei. Fui eu que espontâneamente indaguei quais oram êsses oficiais, para os colocar dentro dela, o não o fiz em virtude da interpelação do Sr. Deputado.
Depreendi, das informações que colhi, que tais oficiais eram necessários ao serviço o foi por reconhecer essa necessidade, o para evitar irregularidades que eu ainda não resolvi êste assunto.
Não posso tratar de todos os assuntos ao mesmo tempo. Tenho de observar a sua ordem '0 a sua urgência.
Não posso de um momento para o outro pôr êsses homens na lei, porque se trata de cinco oficiais que prejudicariam o serviço com a saída dos lugares que ocupam. Êsses oficiais não podiam ser deslocados do serviço que estão desempenhando, sem prejuízo do serviço.
Êsses oficiais estão fôra da lei V Vou estudar o assunto por forma a cumprir a lei, mas cumprir a lei por forma que não seja em prejuízo do serviço.
Cumprirei a lei de uma maneira, clara e nítida, mas não podia, logo que cheguei ao gabinete, mandar imediatamente embora os oficiais que indiquei.
O único competente, para resolver êste assunto, sou eu. Se, porventura, não resolver bem, haverá punição para o meu acto. Prometo dentro dos bons princípios militares cumprir o meu dever.
Efectivamente, êsses oficiais não estão ali em conformidade com as disposições legais. Mas não fui eu quem os colocou fôra dessas disposições.
Parto do princípio de que foi a necessidade do serviço urgente que obrigou os meus antecessores a proceder, como procederam. Êsses indivíduos foram colocados na situação que têm, porque os meus antecessores assim o julgaram necessário.
O assunto será estudado e resolvido em conformidade com as necessidades do serviço.
Quere isto dizer que ficarão fôra da lei?
Uma solução que o Parlamento pode dar é colocar êsses oficiais dentro da lei, ficando onde estão.
É esta a minha opinião.
Se foi errada, assumo plena responsabilidade. O meu desejo é acertar. O que não faço é cousas atrabiliárias que prejudiquem o serviço.
Encontrando-me há meia dúzia de dias neste lugar, não posso responder por cousas feitas há muito tempo por outros. Não posso ser responsável por irregularidades cometidas. Não é justo, nem razoável. Não acoito situações dessas.
O Sr. António Maia: — As explicações que o Sr. Ministro da Guerra deu à Câmara não me satisfizeram. S. Ex.ª disse que havia quatro ou cinco oficiais fôra da lei, e eu digo que são apenas dois, pois os outros estão ocupando lugares que não

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existem por lei mas que são indispensáveis.
Quando um oficial de engenharia vai para um regimento de cavalaria dirigir obras, o Ministro manda-o para lá adido e assim não fica fôra da lei, e assim o Sr. Ministro da Guerra podia fazer agora, e se estão fôra da lei foi o director de aeronáutica que lá os pós o está na alçada do Ministro meter o director da aeronáutica dentro da lei.
S. Ex.ª diz que não pode cumprir a lei som desorganizar os serviços.
A lei é só uma!
São só dois os oficiais que estão fôra da lei e que se podem meter dentro da lei sem prejudicar os serviços, isto 6, colocando-os adidos.
Repito, as palavras do Sr. Ministro da Guerra não podem ter satisfeito a Câmara, pois eu já demonstrei que S. Ex.ª pode cumprir a lei sem prejuízo para o serviço.
S. Ex.ª também não me respondeu ao facto de eu dizer que por um decreto se modificou uma lei.
O decreto n.º 940 que não tem fôrça de lei vai criar uma gratificação especial para um indivíduo que está fôra da lei e assim fica com uma gratificação superior à que tem o que está dentro da lei, pois êste fica recebendo uns escassos 905, emquanto o que está fôra da lei recebe 440 e tantos escudos.
Pois, até hoje, Sr. Presidente, ainda não houve sequer uma solução para isso. Para se ver se realmente certos indivíduos foram desempenhar serviços dentro ou fôra da lei, levou-se quantos meses?
Não, Sr. Presidente! É preciso que encaremos o problema como devo ser encarado. E preciso que o Sr. Ministro da Guerra meta tudo dentro da lei como aqui prometeu; o que eu continuo esperando de S. Ex.ª
O director da aeronáutica prometeu pedir a sua exoneração, mas veja a Câmara quem é êsse oficial: 8 dias são passados e, ainda não fez semelhante pedido. Isto tem uma classificação, que omito por não ser própria do Parlamento!
O Sr. director da aeronáutica, como o Sr. Ministro da Guerra sabe, está incompatibilizado com todos os aviadores, e apesar disso S. Ex.ª não abandona o cargo, só porque perde 235 escudos por mês!
É preciso que se liquide o assunto, e o Sr. Ministro da Guerra tem obrigação de o fazer para evitar casos graves.
Tenho dito.
O orador não reviu,
O Sr. António Correia (para interrogar a Mesa): — Eu tinha pedido há pouco a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Agricultura, mas desisto da presença de S. Ex.ª para me ocupar do assunto.
O Sr. Presidente: — S. Ex.ª está inscrito depois dos Srs. Júlio de Abreu, Vitorino Godinho o Pires Monteiro, como Consta da inscrição de ontem, que estou seguindo.
O Sr. Pires Monteiro (para um requerimento): — Requeiro que, logo em seguida à votação da proposta relativa aos Transportes Marítimos, entre em discussão o projecto n.º 666-A, relativo a, aplicação da lei que concede pensões de guerra aos agentes de segurança pública, em casos especiais.
Julgo que êste requerimento não encontrará oposição da maioria, visto que a Câmara deseja legislar de uma maneira definitiva sôbre o assunto.
O Sr. Presidente: — Tenho á lembrar a S. Ex.ª que a Câmara resolveu que se discutissem em primeiro lugar as propostas de finanças. Precisa, portanto, a Mesa de saber se S. Ex.ª faz o seu requerimento com ou sem prejuízo da discussão dessas propostas.
O Sr. Pires Monteiro: — A Câmara resolverá sôbre a oportunidade do projecto, mas o meu intuito era que êle fôsse discutido o mais ràpidamente possível. As propostas do Sr. Ministro das Finanças são realmente de grande urgência, mas o projecto a que me referi é também urgênte, e estou certo de que a sua discussão não levará muito tempo.
Peço, pois, que o projecto n.º 666-A seja inserido em primeiro lugar na ordem do dia.
Foi consultada a Câmara sôbre o requerimento formulado pelo Sr. Pires Monteiro.

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O Sr. Almeida Ribeiro (sôbre o modo de votar): — Por muito que seja nosso hábito alterar a cada momento as nossas próprias deliberações, tratando-se, como se trata, de propostas de finanças que interessam não só à vida do Estado, mas principalmente à economia nacional, entendo que a discussão dessas propostas não deve ser preterida pela do projecto da iniciativa do Sr. Pires Monteiro, embora tal projecto seja realmente interessante e a sua apreciação muito convenha aos altos interêsses do Estado. Quere-me parecer, por isso — e o Sr. Pires Monteiro é o primeiro a reconhecer que as propostas de finanças são urgentes — que estas sejam discutidas em primeiro lugar, seguindo-se-lhes o projecto da iniciativa do Sr. Pires Monteiro.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sôbre o modo de votar): — A Câmara resolveu há mais de três semanas que o projecto de lei da iniciativa do Sr. Pires Monteiro fôsse discutido no prazo regimental com ou sem parecer.
Foi posteriormente a essa resolução que a Câmara deliberou discutir as propostas de finanças. K como o projecto de lei em questão não tem larga discussão, pois encerra uma medida com que todos estão de acôrdo, parece-me que bem andará -a Câmara em votar o requerimento feito pelo Sr. Pires Monteiro.
Mas não posso deixar de frizar a circunstância de ter -sido hoje o Sr. Almeida Ribeiro quem, em nome da maioria certamente, reclamou a discussão das propostas de finanças, discussão que já devia ter sido iniciada na têrça-feira, e que não foi, sendo ainda ontem protelada pelo debate político.
O orador não reviu.
Pôsto à votarão o requerimento, foi rejeitado,
O Sr. António Correia: — Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, revi ficou se que tinha sido aprovado.
O Sr. Presidente: — A fim de cumprir n deliberação tomada pela Câmara, vai discutir-se o parecer n.ºs 142, visto encontrar-se presente o Sr. Ministro da Guerra.
Leu-se na Mesa.
Entrou em discussão.
O Sr. António Fonseca: — Sr. Presidente: parece-me que a primeira cousa que eu devo fazer é elucidar a Câmara inteiramente sôbre qual o alcance que tem êste projecto e quais as suas conseqüências.
A lei n.º 4:413, de 10 de Setembro de 1915 estabelece no artigo 10.º que o número mínimo de sargentos ajudantes a promover anualmente a alferes para as armas de cavalaria e infantaria será, respectivamente, de 7 e 37; o no artigo 11.º estabelece que o número mínimo de sargentos a promover anualmente a alferes para os quadros auxiliares de engenharia e artilharia será, respectivamente, de 2 e 8.
Era esta a legislação em vigor desde 1915.
Em 10 de Maio de 1919 publicou-se um decreto com fôrça de lei, n.º 5:586, cujos considerandos, ou melhor, cujos fundamentos convém recordar à Câmara.
Não há no exército português a promoção de sargentos pelos mínimos que se estabelecia na lei de 1915.
O que se pretende com o presente projecto?
Pretende-se restabelecer os mínimos da lei n.º 415, a partir da data em que deixaram de existir. Trata-se, pois, não só de estabelecer que de futuro haverá um determinado número de promoções de sargentos de cavalaria e artilharia para os quadros auxiliares de engenharia e artilharia, mas também que esta disposição se aplica desde 1919, data em que deixou de ter efeito a lei de 10 de Setembro de 1915.
Sr. Presidente: êste meu hábito de estudar as cousas militares, apesar de ser paisano, embora tivesse sido sargento miliciano, permito-me fazer a observação exacta das conseqüências desta lei, o verificar que em 1919 foram promovidos para, os quadros auxiliares de engenharia e artilharia, respectivamente 1 e 8, para cavalaria, 3, o infantaria, 37.
Em 1920, promoveram-se 38, quando havia a promover 16; em 1921, promoveram-se 12, e havia a promover 44,

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e em 1022-1023 não se promoveu ninguém, havendo, portanto, 54 sargentos por cada ano com direito a promoção.
Sr. Presidente: verifica-se, pois, que até ao fim do corrente ano terão de promover-se, pelo menos, 173 oficiais. Estas são as conseqüências imediatas da proposta que se discute.
Quando no ano passado se discutia o Orçamento Geral do Estado, eu tive ocasião de intervir na discussão do orçamento do Ministério da Guerra, de duas maneiras: uma discutindo nesta Câmara, outra na imprensa, o nossa altura tive ensejo de resumir sucintamente as minhas considerações pela elaboração de quadros que ficaram ao alcance de todas as pessoas que porventura se interessem pela situação do exército, podendo-se fàcilmente verificar que se realmente há uma pletora de funcionários nos vários serviços públicos, é nos serviços militares o militarizados que ela mais se fez sentir.
Sr. Presidente: e minha intenção, logo que se inicie a discussão do Orçamento Geral do -Estado, fazer uma apreciação mais genérica de tudo quanto são serviços militares e militarizados, isto é, do exército, marinha, guarda fiscal e polícia. Nessa ocasião terei ensejo de mostrar a V. Ex.ª a situação dêstes serviços em confronto com as alterações que se têm feito desde 1914 para cá e de demonstrar que se, de facto, há uma pletora de funcionários, não é ela que faz sossobrar o País pelo estado agudo das suas finanças.
Fui ou quem ontem, quando se quis iniciar a discussão desta proposta, manifestou o desejo de que estivesse presente o Sr. Ministro da Guerra, cumprindo assim uma disposição regimental que a êsse respeito é clara e expressa, o êsse meu desejo não tinha outro fim que não fôsse o de colher, através das considerações do Sr. Ministro da Guerra, a opinião do Govêrno sôbre a nova questão militar.
Sr. Presidente: não se pode deixar de reconhecer que fazer a redução dos quadros, o já não digo dos de 1914, é absolutamente impraticável.
Apesar de todas as leis, encontrámo-nos numa situação em que, obstando ás promoções do exercito e da marinha, se […] continuado a fazer promoções no exercito e marinha.
Conheço casos, a despeito de todas as moções votadas nesta Câmara, de promoções, que, se são de justiça e verdade para todos, também devem ser promovidos sargentos.
Apoiados.
Não podemos estar a fazer esta cousa de adoptar para as classes mais desprotegidas menos direitos.
O Sr. Presidente: — Previno V. Ex.ª de que deu a hora de passar-se à ordem do dia. Se V. Ex.ª quere ficar com a palavra reservada...
O Orador: — Se a Câmara consentir, durante cinco minutos terminarei as minhas considerações.
Vozes: — Fale, fale.
O Orador: — Êste processo que estamos adoptando de discutir leis parcelares encarando uma determinada questão mínima, não tem trazido à República nem à administração do Estado senão gravíssimos inconvenientes, por vezes injustiças flagrantíssimas, e algumas vezes certos embaraços graves, o êstes não deixam de ser agraves.
Não é assim que se devem estudar as questões.
Vamos mandar para a Mesa uma moção pedindo a nomeação de uma comissão para estudar êste problema do exército português, e nada mais útil do que nêste momento ela ser nomeada para estudar com cuidado, meditar com atenção, a fim de se não fazer aquilo que é menos necessário, mas o que é mais normal.
Essa moção foi longamente estudada: é a conseqüência lógica de todas as minhas afirmações, feitas aqui e na imprensa, a propósito do assunto, e tive a satisfação de ver a Câmara inteira som discordância de nenhum voto.
Espero que seja nomeada uma comissão para esse efeito; mas, como se tratava da votação do Senado e o Senado se não ocupou dessa proposta, não se fez isso.
Não vamos substituir-nos àquilo que é função do estado maior.
O problema da defesa nacional não está neste momento, nem será fácil estar, absolutamente acautelado.

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Fez-se a demonstração, e não vi que ninguém fizesse, sequer, o esbôço de qualquer tentativa para de alguma maneira contrariar as minhas afirmações.
Ouvi dizer aqui que a promoção no exército não era aquilo que para o sou prestígio conviria para lhe garantir eficazmente todo o interesso que a essa instituição devo estar ligado.
Tenho pena de que, efectivamente, essa comissão se não constituísse, a despeito de tudo, de todas as tentativas isoladas em benefício do problema.
Tenho visto sair os ministérios o não estudarem o problema.
Todavia tem havido promessas.
Permita-me que lho diga, Sr. Ministro da Guerra, precisamente porque muita consideração e respeito tenho por S. Ex.ª, sem nenhuma espécie de agravo para a instituïção que tanto respeito, que desta vez não está na posição em que devia estar.
É preciso fazer uma reforma do exército, assentar entre nós todos republicanos, sem distinção de partidos, numa política militar indispensável para a defesa dos nossos interêsses internos e externos.
Sr. Presidente r deploro realmente que o meu projecto de resolução não tivesse tido seguimento, mas essa circunstância não me impede de encarar novamente êste problema que considero basilar para a vida da Nação, a fim de que um dia se possa acordar dêste sonho em que têm caído os problemas militares.
O Sr. Pires Monteiro: — Não apoiado.
O Orador: — Eu não me refiro a pessoas...
O Sr. Pires Monteiro: — Tenho na comissão de guerra um projecto de lei para reorganização do exército, mas ainda não tem parecer.
O Orador: — E exactamente isso; temos do juntar às tentativas ministeriais as tentativas da comissão de guerra, mas o facto é que não temos saído do cáos em que se verificou que estávamos em 1914.
Termino, Sr. Presidente, lamentando que êste projecto de lei venha à discussão e que uma resolução tomada unânimemente pela Câmara não tenha podido tomar dois minutos de atenção ao Senado mesmo para ser rejeitado.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Deu a hora de se passar à ordem do dia.
O Sr. Ministro das Colónias (Vicente Porreira): — Sr. Presidente: se pedi a palavra, interpondo-me entre os assuntos de antes da ordem do dia o a discussão política, é porque um assunto do interêsse nacional a isso me obriga. E tenho muita satisfação em ser o porta-voz de um acto que muito vem beneficiar a província do Moçambique.
Vou ter a honra de mandar para a Mesa uma proposta de lei autorizando aquela província a realizar uma sério de empréstimos destinados ao seu fomento o desenvolvimento.
Não vou agora ler a proposta de lei, mas desejo esclarecer a Câmara sôbre a sua importância e, portanto, apresentar as razões que me levam a pedir, como desde já peço, que para a sua discussão seja concedida a urgência, o não peço a dispensa do Regimento, como seria o meu desejo, porque o assunto é de alta importância o sem dúvida as comissões parlamentares hão-de querer estudá-lo.
Simplesmente ouso pedir a essas comissões toda a rapidez compatível com um cuidadoso estudo, porquanto esta proposta para surtir os efeitos que dela se esperam devo ser aprovada antes do 31 do mês corrente.
Por esta proposta, se fôr aprovada, a província do Moçambique fica autorizada a contrair empréstimos até a importância de 7 milhões de libras esterlinas. Devo, porém, dizer à Câmara que não se trata desde já do levantar na praça de Londres um empréstimo dessa importância mas posso afirmar com muita satisfação patriótica que há negociações entaboladas que permitem esporar para já o empréstimo de 5 milhões, em duas séries iguais.
Todos nós sabemos qual a situação um pouco embaraçada de todos os mercados da Europa, e por outro lado as condições em que se encontra a província de Moçambique, rodeada de ambições o más von-

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tades de estrangeiros, para que saibamos compreender o grande esfôrço que representa a promessa dêste empréstimo.
Para fazer justiça, devo citar à Câmara os nomes dos negociadores dêsse empréstimo, que devem merecer os louvores do País.
Apoiados.
São os Srs. Augusto Soares, coronel Ivens Ferraz, e ainda em parte o coronel Sá Carneiro.
Como V. Ex.ª, Sr. Ministro, e a Câmara sabem, na Africa do Sul agitam-se dois problemas que interessam à nossa província de Moçambique.
O principal deles é a renovação de uma convenção que há pouco foi terminada.
Está a Câmara informada que da parte dos representantes da União se fizeram exigências que pareceram incompatíveis com o brio e dignidade nacionais, e que por êsse motivo foram repelidas. Não era, porém, segredo na União que Moçambique se se não encontrava embaraçada para a sua vida normal, todavia encontrava dificuldades em reünir os capitais necessários para a larga obra de fomento do que carece, e pôs-se então êste dilema: não havendo convenção, difìcilmente haveria empréstimo. Felizmente as circunstâncias mudaram e parece que há a certeza de conseguir, se n Parlamento prestar a sua colaboração patriótica, o empréstimo para obras de fomento, sendo a convenção feita em ocasião oportuna o em termos que inteiramente deixem ressalvada a nossa independência.
Apoiados.
Sr. Presidente: como tive ocasião de dizer, êste empréstimo destina-se a realizar um certo número de obras de fomento que aqui vêm indicadas nas seis rubricas.
Como é do conhecimento geral, a província de Moçambique dispõe na costa oriental de Africa dos melhores portos para servir o Interland.
Tem-se escrito em publicações estrangeiras, e tem-se dito por discursos diplomáticos de pessoas de responsabilidade, que nós, portugueses, por mal compreendidos ciúmes, não nos ligamos a êsses nossos vizinhos.
E fácil ver que essa afirmação não tem base sólida, e a prova é que os propósitos desta proposta aproveitarão também
ao Interland, que com a nossa província confina.
Termino, porque a Câmara tem de se ocupar de assunto não mais importante que êste, mas mais palpitante, e peço que a Câmara dedique a sua atenção a esta proposta, de modo a ser discutida o mais ràpidamente possível.
Se fôsse possível entrar em discussão amanhã mesmo seria o melhor, porque, depois de apreciada nesta Câmara, tem ainda do ir para o Senado a discutir, e, porventura, de ir também a uma sessão conjunta, para depois ir à sanção do Chefe do Estado, a fim de ser convertida em lei.
Peço, pois, à Câmara que ràpidamente aprecie esta proposta, que é de urgência.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovada a urgência para a proposta apresentada pelo Sr. Ministro das Colónias.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações e, interino, do Trabalho (Pedro Pita): — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de lei para corrigir um êrro do orçamento do Ministério do Comércio, pois que, devido à precipitação com que foi elaborada a lei orçamental, faz com que exista uma diferença de mais de 377 contos na parte que diz respeito a edifícios públicos.
A Câmara sabe que, devido à carestia da vida, foi necessário aumentar os salários aos operários, e aumentou-se o preço também dos materiais.
O Govêrno está entre êste dilema: ou despedir os operários ou mantê-los, emendando o orçamento.
Em minha opinião, o Estado não devia fazer obras por sua conta, mas por empreitada.
Apoiados.
Mas não é neste momento que isso se devo fazer, porque estão paradas muitas obras particulares.
Nestas condições, venho pedir à Câmara os meios para mais algum tempo continuarem obras que estão começadas, mesmo porque seria causar bastantes prejuízos e elas pararem, pois se deteriorariam.

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Há por exemplo, uma parte das obras da Casa Pia, que está sem cobertura, e continuar assim é muito prejudicial.
A proposta tom, pois, por fim acudir a êsse estado de cousas e à situação dos operários que ficariam nesta ocasião sem trabalho.
Requeiro a urgência para a minha proposta.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovada a urgência para a proposta do Sr. Ministro do Comércio.
Foi aprovada a acta.
O Sr. Presidente: — Vai passar-se á ordem do dia, continuando o debate político sôbre os últimos acontecimentos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Fernando Freiria: — Sr. Presidente: em cumprimento das disposições do Regimento, mando para a Mesa a minha moção:
Moção
A Câmara dos Deputados, reconhecendo que a fôrça armada o a polícia cumpriram com brio, lealdade e patriotismo o sou dever na manutenção da ordem pública, saúda essas corporações, e continua na ordem do dia. — Fernando Freiria.
Sr. Presidente: justo é que comece por explicar a minha comparência na Câmara, de onde tenho estado afastado alguns meses.
Justo é que o explique para que a minha consciência fique tranqüila, porque, tendo sido eleito pelos Srs. Deputados independentes para os representar no Conselho Parlamentar, entendi que, falando-se em dissolução do Parlamento, eu devia aproximar-me dos meus colegas para saber o seu modo de pensar, o como eu deveria votar, sendo necessário.
E esta a razão por que vim à Câmara o tomei a palavra nesta altura do debate político, visto que não tive oportunidade de dar esta explicação antes da ordem do dia.
Mas, filiando na discussão do debato político, eu quero fazê-lo apenas como militar, o explicar a minha atitude.
Começo por dizer que me senti alarmado profundamente, como decerto toda a opinião pública, com as locais que o Diário de Lisboa tem publicado.
Por ter a honra do pertencer ao exército português, julgo dever chamai a atenção do Govêrno, e em especial a dos Srs. Ministros do Interior e da Guerra, para as considerações que vou fazer.
Eu, como militar e como Deputado, tenho o direito de querer levantar o prestígio das instituïções militares.
Do que se lê no referido jornal, conclui-se tratar-se de alguém adentro do exército o da República, de alguém que à República o ao exército tem prestado o máximo do sou esfôrço.
Muitos apoiados.
Trata-se de alguém cujo passado"responde pelo presente e pelo futuro. Êste distintíssimo oficial foi o primeiro executante desse feito notável do exército, realizado sob o impulso do nosso ilustre colega nesta Câmara, Sr. Norton de Matos, quando Ministro da Guerra, e a que q público chamou o milagre de Tancos.
Êste oficial foi o principal elemento com que o Sr. Norton de Matos contou para organizar, com os fracos recursos do exercito português, o C. E. P.
Este oficial serviu comigo no alto cargo de comandante da 1.ª divisão, quando ocupei as cadeiras do Govêrno, num momento em que também as agitações revolucionárias fervilhavam a cada canto.
Êste oficial, posso dizê-lo invocando a minha palavra de homem sério, de Deputado e de militar, foi o melhor executor das directivas que lhe dei.
Pois é êste oficial que um jornal aponta como um dos principais agentes revolucionários.
Eu apelo para o Sr. Ministro da Guerra, militar brioso que se encontra nas cadeiras do Poder, simplesmente como militar, para que S. Ex.ª esclareça a Câmara sôbre o que se diz no Diário de Lisboa.
Outros factos se assinalam nesta mesma local, alguns dos quais até atentatórios da disciplina, mas eu não quero tomar mais tempo à Câmara, e vou terminar as minhas considerações.
Estou certo de que o Sr. Ministro da Guerra explicará à Câmara a atitude do Sr. general comandante da 1.ª divisão,

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que, para prestígio do sou cargo, é necessário que tique impoluto.
Sr. Presidente, como militar eu não deleguei em ninguém o encargo de fazer a afirmação de que o exército português pretende a dissolução parlamentar. Não doleguei nem delego, porque isso é contrário ao meu modo de pensar.
Como Deputado, entendo que devo ficar acima do todas as lutas da política partidária, mantendo-me dentro da Constituïção.
Tenho dito.
Vezes: — Muito bem! O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro: — Sr. Presidente: ou tinha pedido a palavra antes do Sr. Fernando Freiria usar dela, justamente para me referir ao assunto de que S. Ex.ª se ocupou.
Eu desejava, na verdade, preguntar ao Sr. Presidente do Ministério, embora S. Ex.ª não tenha nenhuma responsabilidade na entrevista publicada no Diário de Lisboa, se êle tinha conhecimento dum movimento feito por radicais e democráticos em que aparecesse o general Sr. Roberto Baptista.
E necessário que o Sr. Presidente do Ministério nos tranquilize a todos, pondo inteiramente a verdade a nu.
Por mim, não me surpreende a publicação desta entrevista, porque até já houve quem, carinhosamente, espalhasse por toda a parte, nos corredores desta Câmara e lá fôra, que eu estava comprometido num movimento revolucionário radical contra o Govêrno!
A questão a que se referiu o Sr. Freiria não teria nenhuma espécie de importância se se limitasse a falar no general Sr. Roberto Baptista, porque toda a gente sabe quem é êste ilustre e distinto oficial e o respeito a que êle tem direito de todos os portugueses; mas, infelizmente, o efeito que desta notícia se pode tirar é o de que o exército emprega a sua acção não para defender a República, mas para fins políticos.
Contra isto é que eu protesto, chamando a atenção do Sr. Presidente do Ministério.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Guerra (Óscar Carmona): — Sr. Presidente: deve dizer que é com muita satisfação que eu vou responder às preguntas que o Sr. Fernando Freiria acaba de me fazer.
Antes de as formular, porém, S. Ex.ª pôs em relêvo — e com muita justiça — a figura do general Sr. Roberto Baptista, comandante da 1.ª divisão do exército, visado num artigo do jornal o Diário de Lisboa, artigo que me causou, como não podia deixar de ser, a mais extraordinária surprêsa.
Devo dizer à Câmara, para seu conhecimento e para formal desmentido de possíveis boatos em contrário, que o general Sr. Roberto Baptista colaborou comigo, desde a primeira hora do movimento, com um zêlo, dedicação e boa vontade verdadeiramente notáveis.
Apoiados.
O movimento, segundo informações que tinha em meu poder, deveria iniciar-se às 7 horas.
Eu fui nessa ocasião à Rotunda onde se dizia estarem reunidas as fôrças sublevadas, mas não vi quaisquer agrupamentos que me parecessem suspeitos. Dirigi-me ao grupo de metralhadoras pesadas; nada vi de sensacional.
Em seguida fui ao batalhão de sapadores, onde encontrei tudo em sossêgo. Segui para casa o nada notei que me fizesse supor em presença dum movimento revolucionário.
Ora o que eu fiz — uma visita aos quartéis — fez, também, o Sr. Roberto Baptista o foi, por isso, acusado no Diário de Lisboa.
Nesse caso eu reclamo, também, para mim a qualidade de revolucionário.
Risos.
O Sr. Pereira Bastos: — O general Sr. Roberto Baptista não fez mais do que a sua obrigação.
Muitos apoiados.
O Orador: — Posta a questão nestes termos, não me parece necessário descer ao exame do artigo do jornal em questão.
Muitos apoiados.
Basta dizer que o general Sr. Roberto Baptista se mostrou, em todas as emergências, um militar inteiramente digno dêsse nome.
Apoiados gerais.

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O Sr. António Maria da Silva: — O intuito dêsse artigo é bastante claro!
O Orador: — Perante a evidente união, disciplina e patriotismo do exército português, o intuito só pode ser o de perturbar e dividir.
Apoiados gerais.
A tropa — permita-me a Câmara o têrmo pouco parlamentar — só pensa, neste momento em manter a ordem, mais nada.
Apoiados gerais.
Quanto à dissolução parlamentar, creio bem que o exército não pensa nisso. Trata-se, naturalmente, duma afirmação fantasiosa como tantas outras.
Apoiados.
Relativamente às considerações feitas pelo Sr. Álvaro de Castro, nada tenho a dizer, visto que o Sr. Presidente do Ministério a elas se referirá.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Sr. Presidente: depois das palavras claras, sinceras e terminantes do ilustre titular da pasta da Guerra que eu, apesar de o conhecer há apenas um mês, considero como um amigo velho, tanto tenho apreciado as suas altas qualidades de nobreza infelizmente já invulgares, — podia dispensar-me de usar da palavra.
Vou, entretanto, fazê-lo, não para rectificar as notícias dos jornais ou para ratificar as palavras terminantes do Sr. Ministro da Guerra, mas tam sòmente para esclarecer a Câmara.
O general Sr. Roberto Baptista, ilustre comandante da 1.ª divisão, bem como os comandantes militares Srs. Pereira Bastos, comandante dó Campo Entrincheirado e Vieira da Rocha, comandante da Guarda Republicana, cumpriram inflèxivelmente o seu dever pondo-se imediatamente ao lado do Govêrno para manter a ordem.
No emtanto, pela forma como tem sido apreciada a sua acção, quási parece tirar-se a conclusão de que fugiu cada um para seu lado.
Risos.
E assim que se aprecia a dedicação, o zêlo e o patriotismo de todos aqueles que com seu decidido esfôrço jugularam logo de entrada o movimento revolucionário que se desenhava.
O general Sr. Carmona, quando aceitou o meu convite para colaborar comigo no Govêrno, pôs-me uma única condição, a condição de expurgar a política do exército.
Muitos apoiados.
Torneio compromisso de auxiliar, quanto me fôsse possível, o ilustro Ministro da Guerra na realização do seu objectivo, porquanto eu pensava, como S. Ex.ª, que o exército só deve ter uma política: a política da Nação e da República.
Apoiados.
O exército para cumprir a sua nobre missão precisa estar afastado, como colectividade, de todas as preocupações de sectarismo partidário.
E esta a orientação do Sr. Ministro da Guerra, é esta a orientação do Govêrno a que presido, o nêste sentido tenho dado toda a colaboração ao Sr. general Carmona, como S. Ex.ª o confirmará.
A propósito seja-me permitido, mais uma vez, prestar as minhas homenagens ao Sr. general Roberto Baptista, comandante da divisão, ao Sr. general comandante da Guarda Republicana, o ao Sr. Major General da Armada, pela acção que desenvolveram para a manutenção da ordem.
Quando, às considerações produzidas pelo Sr. Álvaro de Castro, relativamente à sua atitude; cumpre-me declarar, embora considere isso desnecessário, pois S. Ex.ª está acima de -toda e qualquer insinuação malévola, que S. Ex.ª é um dos meus mais ilustres correligionários por quem tenho todo o aprêço.
Desde a primeira hora S. Ex.ª comunicou-me que estava ao lado do Govêrno pronto a cumprir o que êste lhe determinasse.
As cousas, porém, seguiram por maneira que foi escusado incomodar S. Ex.ª
Eu até tenho acanhamento em dar um desmentido a uma cousa que está desmentida por sua própria natureza.
O Sr. Álvaro de Castro estava com a revolução radical!
O desmentido está na própria afirmação, que é um disparate.
O Sr. Álvaro de Castro, que é um homem de bem, se entendesse que devia inclinar-se para as esquerdas, o que não

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seria crime nenhum — silo opiniões, o as opiniões respeitam-se — teria a franqueza do declarar que discordaria da acção do seu partido.
Nada tenho que desmentir, tenho só que dizer que continuo tendo toda a considerarão pelo Sr. Álvaro de Castre
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
Foi lida na Mesa e admitida a moção do Sr. Fernando Freiria.
O Sr. Amadeu de Vasconcelos: — Sr.
Presidente: raras vozes uso da palavra nesta Câmara e, portanto, se tômo agora parte nesta discussão é porque um motivo forte a isso me obriga.
Afirmou ontem o Sr. Presidente do Ministério que o Govêrno estava ainda tratando do rescaldo revolucionário.
Procurou hoje a Câmara ir ao encontro dos esforços do Govêrno e alguma cousa, já se conseguiu.
Com o concurso de todos os lados da Câmara desfez-se qualquer jôgo que se procurasse fazer sôbre a lealdade do exército.
Proclamou-se pela bôca de oficiais distintos do nosso exército, que têm assento nesta casa do Parlamento, a doutrina de que ao exército cumpro, como seu primordial dever, obedecer.
É uma verdade assente por todos, a começar por aqueles que honrada o dignamente vestem uma farda de oficial ou de soldado.
A mesma doutrina foi ainda há pouco proclamada na Câmara Francesa, pelo maior dos comandantes modernos: o general Foch.
Essa figura indiscutível, a maior entre as dos maiores exércitos de todo o mundo, acusada na Câmara Francesa de, em uma determinada circunstância, não ter sabido desobedecer a uma — ordem emanada do Govêrno, disse: «Ao exército assiste a obrigação de obedecer».
Se o exército francês não compreendesse que o seu primeiro dever é obedecer, não teria hoje a França a sorte que tem.
Com aquela verdade que o Parlamento e o País tem o direito de exigir, refiro-me, Sr. Presidente, a uma pregunta que hontem aqui foi feita pelo ilustro Deputado o Sr. Vasco Borges ao Sr. Presidente do Ministério, pregunta sobre a qual êle insistiu por uma resposta, isto é, se era verdade ou não, que tivesse sido posta ao Chefe do Estado, pelo Govêrno, a necessidade urgênte o inadiável da suspensão de garantias e da dissolução do Parlamento.
Espero, pelo menos pelo que diz respeito á última parto, que S. Ex.ª nos vai dizer com a nobreza do sou carácter, e com o seu espírito de patriotismo o lealdade, que isso não é verdade.
Eu não tenho dúvida de que S. Ex.ª nos vai dizer, tranquilizando assim o Parlamento e o País, que isso é absolutamente falso.
Sr. Presidente: uma prova de que V. Ex.ª não pode deixar de pensar assim deu-se ainda hoje nesta Câmara, em que um membro do Ministério apresentando uma proposta de lei da qual certamente hão-de advir benefícios para o País, S. Ex.ª apelou para o patriotismo da Câmara, pois a verdade é que S. Ex.ª sabe muito bem que na discussão dessa proposta, como do todas as que êste Govêrno tem trazido à Câmara, ela tem procedido com todo o patriotismo
As notícias isoladas publicadas nos jornais, se não são da responsabilidade de quem as firma, são, no emtanto, da responsabilidade daqueles que as levam para o conhecimento do público.
Refiro-me à entrevista publicada no Diário de Lisboa de têrça-feira, em que um membro do Govêrno, dos mais categorizados, disse que o Govêrno tom do seguir o seu caminho para bem se desempenhar do seu mandato; mas o que não podo fazer por emquanto, por isso que, se bem que tivesse sido jugulada a rebelião da rua, tinha ficado de pé a rebelião do Parlamento.
Estou em condições especiais adentro dêste lado da Câmara para falar, pois a verdade é que sou um dos parlamentares que foram de parecer que o Partido Nacionalista fosso ao Poder, e isto por uma razão que era comum a ambos os partidos, ao Nacionalista o ao democrático, a que tenho a honra de pertencer. Ao contrário do que se tem dito, nunca ouvi ao meu partido sustentar a necessidade de ser êle o único detentor do Poder
Muitos apoiados.

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Peço a todos que me ouvem e que têm estado aí, mais pela fôrça das circunstâncias e para bem servir a República, me digam se eu não tenho razão; (Apoiados) pois que Governos que aí se têm sentado, embora apoiados por êste lado da Câmara, foram constituídos por elementos alheios a êste partido.
Se há alguém que se tenha de queixar é êste lado da Câmara dos agravos políticos dum Ministro que aí se senta e que conquistou êsse lugar pela sua inteligência; Ministro que tem tido o apoio dêste lado da Câmara, apoio que até muitas vezes foi negado a Ministros dêste lado da Câmara, e tanto assim que quando o Sr. Velhinho Correia pediu urgência o dispensa do Regimento para as suas propostas, o que foi combatido enérgica, tenaz o brilhantemente pelo Sr. Cunha Leal, êste lado da Câmara rejeitou essa urgência, e agora concedeu essa urgência ao Sr. Cunha Leal, quando na comissão de finanças se poderia ter rejeitado tudo, que afinal não era mais do que o trabalho do Sr. Velhinho Correia.
E indispensável que o Sr. Presidente do Ministério nos diga toda a verdade do que se tem passado e influiu extraordinàriamente para bem de nós todos e para o restabelecimento da ordem em Lisboa, trazendo a tranqüilidade aos espíritos, que é indispensável para a tranqüilidade da Nação.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Maria da Silva: — Sr. Presidente: antes de mais nada quero associar-me em nome dêste lado da Câmara àqueles justos elogios que nesta casa do Congresso foram feitos a um ilustre republicano e um distinto militar, o Sr. General Roberto Baptista.
Referiu-se o Sr. Presidente do Ministério também aos Srs. Vieira da Rocha e Pereira Bastos; a estes ilustres militares quere êste lado da Câmara significar a sua simpatia e em especial ao Sr. General Pereira Bastos, que eu como Presidente do Ministério tive a honra de colocar no alto lugar de confiança que hoje exerce, som me preocupar se era ou não meu correligionário, sabendo apenas que era um autêntico homem de bem e um militar brioso.
Iguais demonstrações de aprêço eu apresento ao ilustre oficial Major General da Armada.
Sr. Presidente: os motivos que levaram o Sr. Nuno Simões a fazer a sua declaração de voto são os mesmos que me levaram a votar a generalização do debate, porque entendia que o Govêrno devia ser claro, pois não podemos sair daqui sem que nìtidamente fique esclarecida a situação do Govêrno para com o Parlamento.
Nunca fiz política com nenhum caso de ordem pública, como não a fiz com Govêrno algum, procurando sempre auxiliar todos.
Estou convencido de que o Sr. Presidente do Ministério esclarecerá êste ponto: foi ou não pedida em Conselho de Ministros a dissolução do Parlamento?
O caso fundamental é êste, e seria impertinência da minha parte se porventura produzisse mais palavras, porque desde que êle foi investido na qualidade de Presidente do Ministério, porque o seu partido declarou que tinha as condições de Govêrno, veio ao Parlamento e encontrou sempre da parte dêste lado da Câmara não aquela espectativa fiscalizadora que se lhe prometeu, excepto em relação a assuntos de ordem pública que têm absoluto apoio, mas espectativa fiscalizadora em relação a medidas de Govêrno, em relação à administração pública.
A pretensão dêste Govêrno de acertar a vida política, de arrumar a casa, tem sido a pretensão dos Governos da minha presidência e até no que diz respeito a compressão de despesas, já eu, como Ministro das Finanças, era o porta-estandarte dessa compressão.
Desde já afirmo que em tudo quanto fôr justo, em tudo quanto convier ao país, daqui não há-de sair uma voz que não seja uníssona no sentido da boa administração.
Folgo muito que o Sr. Ministro das Colónias trouxesse hoje ao Parlamento uma proposta relativa a um empréstimo para fomento da província de Moçambique, só sendo de lamentar que S. Ex.ª não fizesse justiça ao seu antecessor que gizou êsse plano, que seguiu as negociações.
Não fica mal fazer justiça a quem de direito, porque isso não deminue absolutamente em nada a posição do Ministro,

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como não me deminuída a mim se um dia tivesse de prestar homenagem a todos aqueles que houvessem contribuído para o engrandecimento do país.
Sr. Presidente: a dissolução foi inscrita no estatuto basilar do nosso país, não como arma contra o Partido Republicano Português, porque êste partido não é prejudicial à política e à República; é um partido que a tem defendido em todos os momentos da história política do país e por vezes até, para a defender, tem deixado que a seu lado batalhem criaturas que anteriormente tiveram torvos desígnios na história política do nosso país.
Precisamos entender-nos.
Se êste Ministério, ou qualquer outro, deixar de cumprir o seu dever, não será, vá a frase, por cascas de laranja que se atirem daqui, mas o que ninguém compreende é que nos estejamos a comportar pela forma como nos temos comportado para afinal se proceder para connosco como os jornais anunciam.
Eu compreendo, Sr. Presidente, que o Sr. Ginestal Machado, ilustre Presidente do Ministério, tenha aquelas reservas absolutamente legítimas no sentido da averiguação e castigo de quem seja criminoso, o desde já digo a S. Ex.ª que, se se encontram responsáveis no seio do Partido Republicano Português, sejam ou não parlamentares, tenham maior ou menor hierarquia, estejam onde estiverem, os castigue inexoràvelmente, mas que proceda com os outros partidos da mesma forma.
Afirmou-se, Sr. Presidente, que no meu Govêrno, em virtude de informações da polícia, se conservavam detidas várias pessoas, sem culpa formada.
E cedo para falarmos nosso assunto.
Quando for oportuna essa discussão, eu falarei altivamente nesta casa do Congresso da República, dizendo que há muita gente que deseja que os outros não procedam com legitimidade, para porventura evitar responsabilidades.
Há boatos, e boatos: uns não nos incomodam, outros temos que os repelir.
O Sr. Álvaro de Castro, no discurso que ontem pronunciou, declarou que só o determinavam os supremos interêsses da República e que desprezava as calúnias.
Eu digo também a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que quero repelir desde já o seguinte: é que algumas horas depois do movimento, quando êle já tinha sido sufocado, se dizia pelos cafés que, se a alguém devia ser atribuída a culpa, era à minha pessoa.
Chega a ser interessante, eu de gorra com sindicalistas o comunistas que quiseram assaltar o Ministério do Interior, dizendo-se mesmo que êsses que colaboraram na assalto ao Palácio de Belém são porventura aquelas mesmas pessoas que escrevem ou inspiram aquilo que há pouco se leu relativamente ao Sr. general Roberto Baptista.
É que há criaturas que têm esta maneira de proceder: quererem mostrar que não lhes cabem quaisquer responsabilidades e dali gritam ou cantam muito alto para convencerem da sua inocência.
O nosso desejo, Sr. Presidente, é que acabe esta situação de aventureiros políticos com letreiro ou sem letreiro que nos perturbem o fazem a verdadeira conspiração, não deixando que se trabalhe, complicando a vida do um o de outro Govêrnos, procedendo de tal forma que não há maneira de que uma situação de ordem perdure.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Agatão Lança: — Sr. Presidente: fui eu o primeiro Deputado que tive a honra de pedir ao Govêrno que viesse à Câmara, como era da praxe, dar conta do que se passou na noite de segunda-feira.
Nessa altura logo disse que achava indispensável que viesse o Sr. Presidente do Ministério, assim como os Srs. Ministros da Guerra e da Marinha.
O Sr. Presidente do Govêrno não pôde vir nêsse dia o veio ontem e se ontem não me inscrevi para falar sôbre êste assunto foi por ter feito uma pregunta ao Sr. Presidente do Govêrno: se êle achava inconveniente fazer declarações mais largas sôbre o que se tinha passado, se achava que essas declarações podiam ser prejudiciais à ordem publica.
Como S. Ex.ª me respondeu afirmativamente, não me inscrevi ontem para falar.
Hoje, porém, que a ordem pública parece estar absolutamente garantida, hoje que mais largamente o assunto tem sido debatido nesta Câmara, não podia eu dei-

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xar do usar da palavra, embora deseje ser bastante rápido nas minhas considerações.
Pelo lugar que ocupo nesta Câmara o até corto ponto por aquilo que me foi dado presencear durante a revolução ou — chamemos-lhe antes assim — alteração da ordem, não poderia deixar de formular algumas preguntas ao Sr. Presidente do Ministério.
Não podia também deixar de aproveitar este momento para chamar a atenção do S. Ex.ª para alguns pontos que, embora pareçam, insignificantes, tem para mim importância, porque me preocupam sempre devoras todas as cousas que possam envolver desprestígio do Govêrno o que possam significar uma denegação de justiça.
Esporo que o Sr. Presidente do Ministério, com aquela lealdade e com aquela nobreza que todos lhe reconhecemos, me responda sob sua palavra, de uma maneira firme e terminante, às preguntas que vou ter a honra de lho formular o que são as seguintes:
Pediu, ou não, o Sr. Presidente do Ministério a dissolução do Parlamento ao Chefe do Estado?
Pediu, ou não, conjuntamente, a suspensão de garantias?
£ Pensou, ou não, em dissolver a marinha do guerra?
São estas as preguntas, que para mim têm um significado muito especial, às quais julgo que toda a Câmara desejaria ouvir uma resposta completa (Apoiados) do Sr. Presidente do Ministério, sob sua palavra, aquela palavra honrada que é timbro de S. Ex.ª 1, honrado republicano e devotado patriota. —
Certamente o Sr. Presidente do Ministério pretendo reservar se para no fim do debate responder a todos os oradores, e ou, por tal motivo, continuarei no uso da palavra para fazer outras considerações, se bem que me fôsse particularmente agradável ouvir desde já a resposta terminante e concreta que certamente S. Ex.ª, acedendo gentilmente ao meu convite, vai dar às minhas preguntas.
Desejo ainda preguntar ao Sr. Presidente do Ministério se S. Ex.ª, por aquele inquérito que naturalmente mandou fazer pelas autoridades próprias, já averiguou onde se deu o início da alteração da ordem.
Desejava que o Sr. Presidente do Ministério me dissesse do onde é que partiu o primeiro sinal de revolução e se não havia alguém que tivesse desejo de apressar essa revolução.
O Govêrno deve saber tudo isto, porque, senhor de todos os elementos e até prevenido com muita antecedência da eclosão do movimento, deve já estar a par de tudo, tendo na sua mão os inquéritos a que, sem dúvida, mandou proceder.
Desejo saber se o Govêrno, pela pasta da Marinha, mandou estar de prevenção todos os navios.
Desejava saber se de facto alguém houve que tentasse hostilizar, intrigando, uma parte do exército contra a marinha, corporação gloriosa a que eu, como marinheiro, muita honra tenho em pertencer.
Sr. Presidente: se eu pudesse continuar as minhas considerações depois de ter ouvido a resposta clara, como certamente vou ouvir, da bôca do ilustre Presidente do Ministério, certamente as minhas palavras podiam tomar um rumo diferente, mas como porventura isso não poderá suceder, e eu terei do voltar a usar da palavra, não quero por isso terminar as minhas considerações sem dirigir mais uma pregunta inocente, que quási poderá chamar-se pueril, ao Govêrno.
Sabe a Câmara que um velho oficial da marinha de guerra, o capitão do fragata João Manuel de Carvalho, num acto de desvairamento, cometeu a infeliz acção de ir a bordo dum destroyer que tinha uma limitada guarnição, com dois oficiais apenas, um aspirante e um oficial maquinista, e fazendo-se acompanhar por dois ou três sargentos e três ou quatro marinheiros, entrou no navio, assumiu o seu comando e permitiu, ou não soube evitar, que seis tiros de granada fôssem dados, embora para o ar, de bordo dêsse barco de guerra.
Isto é um caso lamentável que tem forçosamente de ser punido. Mas eu pregunto ao militar brioso o disciplinado que é o Sr. Ministro da Guerra se numa determinada noite e numa determinada cidade tivessem estado numerosas tropas concentradas por ordem do Govêrno e essas tropas tivessem dignamente cumprido todas as ordens dêsse mesmo Govêrno, e se no fim do tudo, quando o Govêrno estivesse senhor da situação e o

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Sr. Ministro da Guerra, um oficial ilustre e distinto, tendo assumido o comando das tropas, se dirigisse ao local onde elas estavam concentradas, e tendo à frente dêsses oficiais os comandantes das unidades e o comandante da divisão, se nesta ocasião o Sr. Ministro da Guerra, ao agradecer a maneira como as suas ordens haviam sido executadas, um oficial subalterno, por exemplo um capitão, passasse à frente dos seus camaradas, fizesse a continência e dissesse a S. Ex.ª que era preciso ir mais longe, que queria o exército prestigiado, mas que não se devia sair dali sem que êle ficasse mais prestigiado ainda, eu pregunto ao alto critério de S. Ex.ª e ao das Câmara que me escuta qual o procedimento que adoptaria perante a atitude dêste oficial.
Eu pregunto à Câmara e ao Sr. Ministro da Guerra como se deveria classificar o acto dêste oficial.
Sr. Presidente: deixo ao esclarecido espírito do Sr. Presidente do Ministério o responder a esta minha hipótese, que representa um acto tam grave como o que foi cometido pelo capitão de fragata Sr. João Manuel de Carvalho.
O Sr. Presidente do Ministério, quando ontem falou nesta Câmara, certamente por lapso, deixou de se referir à atitude assumida pela marinha de guerra. S. Ex.ª esqueceu-se da alta prova de disciplina e ordem dada pela marinha de guerra, não se solidarizando com a guarnição dum navio — para cooperar na revolta.
Esqueceu-se ainda o Sr. Presidente do Ministério de dizer à Câmara que no quartel de marinheiros não estavam 800 homens armados, mas apenas 40 e tantas praças, que dormiam, excepção feita dos homens da guarda.
Esquecera-se o Sr. Presidente do Ministério, o que muito deve ter regozijado aquelas pessoas que têm uma estima muito especial pela marinha de hã seis anos a esta parte, esqueceu-se de dizer que os marinheiros cumpriram o seu dever, como a guarda republicana.
Esqueceu-se de dizer que no Arsenal da Marinha se defenderam da investida dos revolucionários, como a guarda republicana.
Apoiados.
Mesmo nas horas graves, se é necessário ter energia para castigar quem merece, também é preciso o espírito de justiça.
Tenho razão de falar aqui, com a plena liberdade de palavra dum homem que sabe cumprir o seu dever, e tomar a responsabilidade dos seus actos em todos os campos.
Podia ter como testemunha o Sr. Presidente da República, que entrou no Arsenal da Marinha onde eu estava também.
Estava disposto a ir a bordo do navio revoltado, se bem que já a essa hora tivesse tomado o compromisso de não dar tiros, nem permitir a entrada de nenhum revolucionário. Isto conseguiu-se com o prestígio do meu nome conhecido, e amizade que os meus camaradas da marinha possam ter por mim.
Assim o fizeram.
O capitão-tenente Sousa Coutinho por ordem do com andante da Armada percorreu todos os navios. Procedeu à execução da ordem exacta.
No Douro apenas se haviam dado actos revolucionários por parto dum pequeno número de pessoas.
O resto da tripulação estava tranquilamente dormindo.
Mas disse ao Sr. Presidente do Ministério que ora necessário que, nas horas graves, os homens que têm a função de governar não perdessem o espírito da justiça.
Desejo chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério para alguma cousa que reputo muito grave.
Assumo a responsabilidade das minhas palavras. Como homem de bem e republicanos, sou incapaz de prejudicar a acção da justiça.
Não ficaria bem com a minha consciência se não tivesse vindo à Câmara chamar a atenção de V. Ex.ª acêrca dum tremendo facto que vou apresentar à Câmara.
Sr. Presidente: não ignora V. Ex.ª, não ignora a Câmara, não ignora o país, que, talvez devido ao entranhado amor que os marinheiros têm à Republica, a corporação da Armada é a que mais tem sofrido, porque os elementos de terra desvairados e ambiciosos encontram ali um belo campo para a satisfação ilegítima e desmedida das suas ambições. Dá-se isto desde

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há alguns, anos para cá, e dá-se pelas graves injustiças que foram cometidas e não foram reparadas, e dá-se porque os Govêrnos sabem mandar os oficiais a tempo ocupar os seus postos. Pessoas que constantemente intervêm em movimentos insurreccionais, são essencialmente nefastas a qualquer corporação armada. Concordo plenamente com isso, porque tal gente não serve para a disciplina e deve ser expulsa. A expulsão, porém, deve fazer-se com critério seguro, com justiça absoluta, dizendo-se cara a cara aos acusados a razão por que são punidos.
Não ignora V. Ex.ª e muito menos o ignoram os homens que constituíram o Govêrno da Presidência do Sr. António Maria da Silva, Govêrno com quem estou muitas vezes em desacôrdo e que ataquei violentamente, do que não me arrependo, que êsse Govêrno mandou sair de Lisboa, o muito bom, determinados elementos por serem demasiadamente irrequietos e poderem comprometer a ordem pública. Êsse Govêrno mandou sair de Lisboa várias praças da Armada, para bem delas mesmas, afastando-as dos nefastos centros políticos e dos cafés, colocando-as fôra da alçada dos revolucionários permanentes, fazendo, assim, com que essas praças pudessem tranquilamente trabalhar e dignamente continuar a ser bons elementos dentro da corporação.
Pois êsses elementos, que O Govêrno do Sr. António Maria da Silva mandou sair porque podiam ser fàcilmente sugestionados para entrar num movimento contra o Govêrno, essas praças, que tinham um critério político acentuadamente radical, foram chamados pelo actual Govêrno, que se diz conservador! Isto foi um péssimo acto político que dou em resultado haver a perturbação na noite de segunda-feira o que pode ter como conseqüência tirar o pão que êsses homens ganhavam para o sustento das suas mulheres o dos filhos.
Foi esta a bela obra praticada pelo Sr. Ministro da Marinha!
E uma das praças que foi abatida é o sargento artilheiro n.º 904, que conta já 18 anos de serviço na Armada portuguesa!
Diga o Sr. Ministro da Marinha se é humano, se é justo, que se atirem para a 3 rua assim dum momento para o outro homens nas circunstâncias dêste. Se há cousas contra êstes homens de que as instâncias superiores de Marinha tenham conhecimento e não constem das suas cadernetas nem dos arquivos do Estado, eu peço a S. Ex.ª e creio que toda a Câmara me acompanha neste pedido, peço ao Sr. Ministro da Marinha que dê notas do culpa a êstes homens. Não basta uma informação dada por alguém, que nem sequer tem a coragem moral do a assinar, para assim se pôr fôra da corporação da Armada um homem com dezóito anos de serviço, tirando-se-lhe o pão, assim como a sua mulher e filhos. Apoiados.
Estou certo de que não há ninguém bem formado, não pode haver um coração de português que não se revolto contra êste critério, que é absolutamente injustificável.
Sr. Presidente: para que as minhas palavras não sejam deturpadas por aquelas pessoas que têm um especial empenho em tudo confundir o tudo baralhar, torno a dizer a V. Ex.ª que ou, que também sou oficial de marinha, entendo que é necessário afastar da corporação da armada determinados elementos que têm dado provas do seu constante irrequietismo e rebelião, não sendo, portanto, bons elementos de disciplina; entendo, porém, quê isso se deve fazer em obediência a um critério militar, a um critério de justiça, fixando-se as suas culpas num artigo de lei existente, ou, se não existir nada suficiente, num artigo que possamos fazer, mas, repito, que isso seja só feito através de um critério militar o não através do critério político, porque isto de política é uma grande roda em que os homens que estão hoje do cima passam a estar amanhã de baixo o no dia em que vier um Govêrno da sua feição êles são reintegrados e colocados nos seus antigos postos, recebendo os vencimentos em atraso.
Ora isso é que é de tremendas conseqüências para o prestígio da corporação, para a manutenção da disciplina, porque êsses homens, amanhã, poderão olhar com menos respeito para os seus superiores dizendo: «que me importa que me ponham fôra da corporação, se passado pouco tempo lá estarei de volta?»
Sr. Presidente: creio que a Câmara não pode deixar de concordar com estas minhas palavras.

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Dito isto, termino as minhas considerações por afirmar a V. Ex.ª e ao Govêrno que outros intuitos não tenho que não seja esclarecer tudo o que se passou, porque só pela verdade me entendo e se podem desfazer determinados equívocos de que podem resultar novos dissídios entre republicanos e as mais fundas divergências entre os homens que procuram servir a República, uns de uma maneira outros de outra.
É necessário que o Govêrno mantenha a ordem, evidentemente, mas que o não faça praticando actos que nos levem a não considerá-lo como Govêrno da Nação, mas como Govêrno que quere ver todas as fôrças armadas prestigiadas, que quere ver o equilíbrio entre todas essas fôrças para trabalharem na regeneração financeira e económica do Estado.
É preciso que não se pratiquem actos que só podem provocar descontentamentos e casos de indisciplina, que todos os amigos da ordem desejam evitar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Maia: — Requeiro que V. Ex.ª consulte a Câmara sôbre se ela consente em que a sessão seja prorrogada até finalizar a discussão do assunto em debate.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Sr. Presidente: quis também tomar parte nêste debate o meu ilustro antecessor reste lugar, Sr. António Maria da Silva, a quem eu devia responder imediatamente, o que não fiz por não ir já a tempo o meu pedido de palavra.
Devia esta explicação a S. Ex.ª pela consideração devida à sua situação e ainda pela estima que tenho por S. Ex.ª, que através de tudo espero ver mantida.
Quis S. Ex.ª entrar neste debate, sabendo as responsabilidades que sempre recaem sôbre quem ocupa êste lugar do chefe do Govêrno e tendo eu ontem declarado, claramente, que por emquanto, reputo inoportuno entrar em minúcias sôbre o movimento revolucionário que acaba de dar-se e que foi d minado, felizmente, no seu início, estando-se ainda nos trabalhos que classifiquei de rescaldo; oportunamente, porém, não deixaria de dar conta à Câmara de todos os actos praticados.
Tenho no emtanto verificado que se pretende que o Govêrno responda por supostas intenções que lhe querem atribuir.
Ora eu em presença de uma tam estranhável situação nada mais tenho a dizer senão que o Govêrno a que presido nunca saiu da Constituïção.
Apoiados.
Se eu quisesse saír para fôra da Constituïção, não estaria agora na Câmara.
Causa-me estranheza que se queira responsabilizar o Govêrno por supostas intenções. Mas, ao mesmo tempo, isso dá-me a entender que realmente os actos do Govêrno não são censuráveis e assim vá de atribuir-lhe intenções que possam merecer censuras. Movimentos desta natureza dão-se em todas as sociedades mesmo as mais avançadas, sendo necessário para completa tranqüilidade passar algum tempo, pois que, acontece como nos abalos sísmicos, que passado o grande abalo, fica a terra ainda incerta.
Evidentemente em dois, três ou seis dias, apesar do movimento ter sido sufocado, não é possível repor tudo nos seus lugares, nem se pode vir dizer como e quando isso se fará.
Apoiados.
Sem que, haja estabilidade completa na ordem, o Govêrno não pode responder inteiramente a todas as preguntas feitas como seria o seu desejo.
Mandei inquirir, e está-se a inquirir.
Que situação seria a minha se viesse aqui com inconfidência sôbre êsses inquéritos, quando se me impõem todas as reservas até final dêsses inquéritos que não chegaram ainda ao fim.
Entretanto, não posso conceber que se me pregunte o que fiz, como procedi, o que vou fazer, sem as respectivas diligências chegarem ao fim.
Há certamente um equívoco lamentável, porque decerto a Câmara tem o mesmo desejo que o Govêrno, que se mantenha a ordem e que tudo se apure.
Àpartes.
A Câmara deve julgar o Govêrno, como é seu dever e direito.
Julgue o Govêrno, mas tem que aplicar a devida sanção parlamentar.

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A Câmara diz se o Govêrno lhe merece ou não confiança, e o Govêrno sabe o que tem a fazer.
Apoiados.
Evidentemente, quem acusa e julga tem êsse direito, mas é sôbre provas e não por suposições, por intenções, por propósitos, e antecipadamente.
Àpartes.
Grande agitação na Câmara.
O Orador: — Quando a Câmara me consentir, prosseguirei.
O Sr. Presidente: — Peço ordem.
Uma voz: — O Partido de S. Ex.ª e os seus correligionários é que o impedem de falar, fazendo barulho.
Pausa.
Restabelece-se o silêncio na Câmara.
O Orador: — A Câmara quere julgar, o Govêrno está aqui para ser julgado, mas cônscio dos seus deveres, mesmo para se defender entende que não pode aqui ainda fazer declarações, trazer factos que podem prejudicar a acção das entidades competentes, e profere ser condenado, substituído, mas não atraiçoar o que entende ser a sua missão.
Apoiados.,
Àpartes.
A Câmara entende que o Govêrno não pode manter a ordem, que não corresponde ás necessidades do País, tem a franqueza de o declarar, e o Govêrno não está mais um momento nas suas cadeiras.
A Câmara diz que o Govêrno se vá embora, e o Govêrno cumpre a determinação da Câmara.
Mas a Câmara julga o Govêrno, e o País por sua vez julgará também a Câmara.
Apoiados.
Àpartes.
E eu, dêste alto lugar, afirmo a V. Ex.ªs e ao País que nunca pensei, nem penso, em violar a lei fundamental da República.
Respondo pelos actos do Govêrno, o assim devo declarar mais uma vez à Câmara e ao País que nunca pensei, nem penso, em violar a lei fundamental do País.
Declaro que tenho procedido e orientado a minha acção, tendo em vista a República, e tendo em vista as necessidades supremas do País.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bom. O orador não reviu.
O Sr. António Maria da Silva: — Sr.
Presidente: o Sr. Ginestal Machado, Presidente do Ministério, quis ter a atenção, que muito lhe agradeço, de pedir a um dos seus colegas do Ministério para me comunicar que não tinha usado da palavra logo a seguir ao meu discurso, por menos consideração para comigo.
O facto de eu ter muita consideração por S. Ex.ª, o facto de o considerar um republicano, que não é capaz de mentir e que é incapaz de violar a Constituïção, de que o não acusei, não me impede do direito que me assiste de instar com S. Ex.ª para que esclareça uma determinada situação, mesmo para que o País faça a justiça de nos julgar a todos. ' Torna-se absolutamente necessário que os factos se esclareçam.
Eu não acusei S. Ex.ª de violar a Constituïção.
Bom é que nos entendamos, pois a verdade é que S. Ex.ª não respondeu nos termos precisos às preguntas que eu lhe fiz.
Acusa-se o Govêrno da sua Presidência de ter pedido a suspensão das garantias e a dissolução do Parlamento no Quartel das Metralhadoras após o movimento sedicioso que foi jugulado prontamente devido às fôrças de terra e mar, guarda republicana e polícia, que mais uma vez mostraram ter cumprido o sou dever.
Diz S. Ex.ª que não pretende violar a Constituïção.
Eu bem sei que não é violar a Constituïção solicitar o Presidente do Govêrno aquelas medidas ao Presidente da República nos termos precisos da Constituïção, porém, isso é diferente de as ter pedido logo após o movimento e no local onde foi feito.
E um conflito entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo; mas êsse conflito não se resolvo sacudindo-nos desta casa para que o rescaldo se faça à vontade.

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Não atacamos o Govêrno, antes nos colocamos inteiramente a seu lado, em tudo o que diga respeito à ordem pública.
Como exigir então a dissolução do Parlamento?
Para onde caminhamos?
Então nós, que lho demos os elementos de Govêrno que não tinha, correspondendo ao apêlo patriótico que nos fez, somos considerados pelo Sr. Presidente do Ministério como criminosos?!
Não encontro razão alguma para admitir que o Sr. Ginestal Machado, republicano digno, homem que se elevou pelo seu trabalho, pessoa raramente inteligente, venha aqui mistificar-nos, não respondendo claramente às preguntas que lho fiz.
Apresentou S. Ex.ª ou não ao Chefe do Estado o dilema demissão ou dissolução parlamentar?
E isto que precisamos saber para que o País possa julgar-nos a nós e a S. Ex.ª Tenho dito.
Vozes: — Muito bem! Muito bem! O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Sr. Presidente: não contava voltar a usar da palavra nesta sessão, mas vejo-me forçado a fazê-lo para responder ao Sr. António Maria da Silva, que quis ter a amabilidade de me considerar raramente inteligente.
Possivelmente êste momento não será um daqueles tais raros momentos, porque continuo a não perceber a insistência de S. Ex.ª
Eu já declarei a S. Ex.ªs que nunca pensei em violar a Constituïção.
E isto o que posso dizer e mio tenho que declarar mais nada.
Agitação.
O Orador: — S. Ex.ªs não querem ouvir e eu não estou para falar não sendo ouvido.
S. Ex.ªs têm o direito de julgar o Govêrno como entenderem, supondo o que supuserem e quando fôr oportuno; quando chegar o momento conveniente, como S. Ex.ªs também não quererão violar a
Constituïção quando forem govêrno e, portanto, eu continuarei a ter o meu lugar de Deputado, eu direi tudo o que tiver a dizer. Mas, nêste momento, só tenho a dizer que nunca pensei em violar a Constituïção, nem em forçar alguém a violá-la.
Se acham que as minhas explicações não são claras, signifiquem-mo claramente. Eu saberei então o que tenho a fazer e V. Ex.ªs continuarão a obra que nós não soubemos realizar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Agatão Lança: — Sr. Presidente: começo por estranhar a atitude verdadeiramente inexplicável do Sr. Presidente do Ministério e que eu nunca esperei de um homem correcto como o Sr. Ginestal Machado, não respondendo a uma única das minhas preguntas, inteiramente correctas o que tinham apenas como resposta «sim» ou «não», e não tendo feito sequer a mais leve referência às minhas considerações. Estranho magoadamente o procedimento do Sr. Ginestal Machado, mas porque quero ser para com S. Ex.ª mais correcto do que o foi para comigo, eu direi que vou pôr de parte todas as considerações que fiz há pouco, quási todas as preguntas que lhe dirigi, visto que S. Ex.ª quando respondeu ao Sr. António Maria da Silva entendeu dever observar que, prosseguindo ainda o inquérito, nada de definitivo conhecia ainda, se bem que eu não possa compreender que, tendo vindo ontem e hoje à Câmara para um debato sôbre os acontecimentos, S. Ex.ª não viesse ao conhecimento, pelo menos, daqueles factos que os Ministros do seu Govêrno conhecem.
Por conseqüência, ou insisto apenas pela resposta clara a três preguntas que vou fazer. Não me satisfaço com que o Sr. Presidente do Ministério diga que não pensou em saltar por cima da Constituïção, visto que a dissolução do Parlamento é constitucional, como constitucional seria, dissolvido o Parlamento, S. Ex.ª pedir a suspensão de garantias ao Sr. Presidente da República, embora, conseguidas estas duas cousas, S. Ex.ª estivesse habilitado a exercer uma ditadura inteiramente nefasta para a República e para o País,

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É por isso que formulo as seguintes preguntas:
Pediu ou não pediu o Sr. Presidente do Ministério a dissolução do Parlamento ao Chefe do Estado?
Pediu ou não pediu S. Ex.ª 1, conjuntamente, a suspensão do garantias?
Para tranquilidade do País, para tranqüilidade da fôrça armada, para tranqüilidade de todos os patriotas que sabem o que é necessário à defesa nacional e colonial, convido ainda o Sr. Presidente do Ministério a declarar ou não se pensou ou não, se resolveu ou não, em determinada hipótese, dissolver a marinha de guerra.
Estou certo de que a estas três preguntas o Sr. Presidente do Ministério não deixará de responder de uma maneira terminante, com a palavra «sim» ou «não», que outra resposta lhe não pode ser dada de boa fé.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Sr. Presidente: estou certo de que o ilustre Deputado Sr. Agatão Lança não julgou que eu não tivesse por êle toda a consideração.
Não quis, porém, que a tal respeito pudesse ficar qualquer dúvida no espírito de alguém e só por isso eu torno a ocupar a atenção da Câmara, visto que as declarações que já fiz são as únicas que julgo poder fazer.
O ilustre Deputado quis fazer-me várias preguntas e eu entendo que por emquanto não posso ser preguntado dessa maneira. Quando julgar oportuna a ocasião, poderão formular as preguntas que entenderem e eu a todas elas responderei. A tal respeito não posso dizer mais nada. Posso, no emtanto, assegurar a consideração que todos temos pela marinha. £ Porque nos vêm dizer que nós quisemos fazer a dissolução da armada? V. Ex.ªs já viram algum acto por nós praticado contra a marinha de guerra?
Eu não pratiquei nenhum acto que fôsse desprimoroso para a marinha de guerra; eu sempre prestei o meu preito à marinha e ainda hoje, sem nenhum propósito de a bajular, prestei a justa homenagem ao Sr. major general da armada.
O ilustre Deputado interrogou-me sôbre as minhas intenções e eu não posso responder sôbre as minhas intenções mas pelos meus actos.
Apoiados.
Então, não fui eu o primeiro a dizer que tinham sido os marinheiros que escoltaram os seus camaradas presos?
O Parlamento, se entender que o Govêrno não corresponde ao que deve, terá o direito e até o dever de lho indicar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro: — Das declarações que o Govêrno acaba de fazer conclui-se que o Govêrno não praticou nenhum acto atentatório da Constituïção; há portanto o direito de lhe significar a nossa confiança.
Parece-me, pois, absolutamente necessário que o Parlamento dê ao Govêrno a indicação do sou modo de ver.
Apoiados.
Quere-me parecer que o Parlamento por agora, cingindo-se apenas às palavras do Govêrno e aos seus actos, tem a obrigação e o dever de aceitar a declaração do Sr. Presidente do Ministério. Emquanto S. Ex.ª demonstrar, como já demonstrou claramente, que o não move o propósito de atentar contra a Constituïção ou praticar actos que estejam fôra do âmbito dessa Constituïção, não é justo nem legítimo supor que o homem que se senta naquelas cadeiras como Chefe do Govêrno não tem as intenções que os seus actos justificam.
A dissolução do Parlamento pode ser concedida por deliberação do conselho parlamentar, mas nunca o poderá ser por imposição das armas.
Muitos apoiados.
Nestas condições, eu mando para a Mesa a seguinte moção: Leu.
A Câmara dos Deputados, ouvidas as explicações do Govêrno, reconhece que êle tem procedido dentro da Constituïção, de molde a prestigiar as Instituições, e, dando-lho o seu inteiro aplauso pela sua acção perante o movimento revolucionário que prontamente sufocou, aproveita êste momento para saüdar o exército e a armada, a guarda republicana o fiscal e a polícia cívica, pela fidelidade, dedicação

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e zêlo com que, ao lado dos poderes constituídos, procederam na manutenção da ordem, e passa à ordem do dia. — Álvaro de Castro.
O Sr. António Maria da Silva: — Sr. Presidente: contra o que esperava tenho de novo de usar da palavra para dar explicações, visto que o Sr. Presidente do Ministério continua a afirmar que eu o acusei de violentar a Constituïção, o que só, se pode atribuir a um deleito de audição, uma vez que eu reputo S. Ex.ª inca paz de o fazer.
Eu gosto que, haja estabilidade de Governos. Tenho defendido isso e muito desejava que depois de eu estar um certo tempo, já notável em vida de Ministérios, naquele lugar, quem me fôsse substituir estivesse também o tempo indispensável para efectuar uma obra patriótica, como deseja o Sr. Presidente do Ministério e eu anteriormente desejava. Mas ou fiz uma pregunta muito diferente daquela a que respondeu o ilustre Presidente do Ministério. Preguntei-lhe se era ou não verdade ter S. Ex.ª pedido ao Chefe do Estado, no quartel de metralhadoras, como lei dito, a dissolução do Parlamento o a suspensão de garantias. S. Ex.ª respondeu-me dizendo que não quere violar a Constituïção.
Ora como eu já sabia ou presumia, por anteriores discursos de S. Ex.ª, que êle saïria pela porta fácil de que o pedido de dissolução era legítimo porque está inscrito no estatuto basilar do nosso País, antecipadamente lhe declarei que êsse pedido só seria legítimo perante um conflito entre os Poderes Executivo e Legislativo, o que se -não dá, e então aquele pedido, após um movimento sedicioso e com as razões que se dizem ter sido apresentadas, era ilegítimo e: até criminoso.
Apoiados da esquerda.
Não posso entender que o Sr. Presidente do Ministério se escudasse, para não nos responder claramente, em qualquer sigilo de averiguações, porque isso nada tem com o que lhe preguntámos. Mas S. Ex.ª não quis responder e mandou-nos para a situação de lhe votarmos uma moção de desconfiança. Como não temos a avidez do Poder ou a sua nostalgia, queríamos estar seguros com a resposta à pregunta que eu fiz, para que não só honrássemos o Govêrno e a fôrça armada por ter mantido a ordem, mas também para fazermos justiça por S. Ex.ª não ter praticado o acto de que o acusam. Porêm, S. Ex.ª não quere responder. Eu podia preguntar, se quisesse ser impertinente, se aqui há cousa, mas não o quero fazer.
Entretanto, perante uma moção de confiança ao Govêrno afirmo que a voto quem quiser, mas entendo que quem se senta nas cadeiras do Parlamento não podo dar um voto de confiança a um Govêrno que quis sacudir os parlamentares, querendo colocá-los na situação, que não temos, de criminosos responsáveis do movimento sedicioso.
Apoiados da esquerda.
Mas o Sr. Presidente do Ministério está ainda a tempo. S. Ex.ª que declare que não pediu a dissolução nas circunstâncias que se apontam, e S Ex.ª não me ouvira falar mais em semelhante assunto.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: pôs o ilustre Deputado Sr. Álvaro de Castro, ilustre leader da minoria nacionalista, a questão de confiança política ao Govêrno.
Facilmente compreendem V. Ex.ª e a Câmara a situação embaraçosa em que nos encontramos para votar essa moção, visto que somos adversários intransigentes do Govêrno.
Já ontem tive ensejo de enviar para a Mesa, em nome dêste lado da Câmara, uma moção que representa o nosso sentir.
Se a moção do Sr. Álvaro de Castro, fôsse apenas de apoio ao Govêrno para a manutenção da ordem, nós dar-lhe-íamos a nossa aprovação, não só porque somos partidários acérrimos dela mas porque nêste momento, apesar de o Govêrno não ser nosso correligionário, reputamos altamente prejudicial a sua saída das cadeiras do Poder.
Nestas condições fica bem assente que, apesar de não votarmos a moção do Sr. Álvaro do Castro, por virtude dos termos em que está redigida, entendemos que o

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Govêrno deve manter-se naquelas cadeiras a bem do princípio da ordem.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Sr. Presidente: a muita consideração que tenho pelo Sr. António Maria da Silva leva-me novamente a pedir a palavra, não podendo, todavia, acrescentar mais nada ao que já disse.
Aproveito o ensejo para declarar à Câmara que, agradecendo as palavras do Sr. Álvaro de Castro, aceito, em nome do Govêrno, a moção por V. Ex.ª apresentada.
O Sr. José Domingues dos Santos: —
Sr. Presidente: por parte do Partido Republicano Português já o Sr. António Maria da Silva fez uma pregunta que êste lado da Câmara julga indispensável para votar a moção do Sr. Álvaro de Castro.
O Partido Republicano Português leu a notícia, que em todos os jornais foi publicada, de que na noite do movimento revolucionário o Govêrno havia podido ao Sr. Presidente da República a dissolução do Parlamento e a suspensão das garantias constitucionais. Êste facto, produzido na mesma noite em que se deu o movimento revolucionário, coloca-nos na situação de não ter confiança no Ministério que por essa forma se desloca do Parlamento.
É impossível a vida governativa sem uma estreita colaboração entre os Poderes Executivo e Legislativo.
É impossível a vida governativa sem a estreita colaboração entre o Govêrno e o Poder Legislativo sem a confiança existente entre o Govêrno e a maioria. N Do estreitamento entre os dois Poderes depende a governação do Estado. É impossível governar som esta colaboração íntima.
Estamos numa situação em que o Parlamento não pode ter confiança no Govêrno. O Govêrno, pela bôca do Sr. Ginestal Machado, não respondeu ao Sr. António Maria da Silva.
O Sr. António Maria da Silva preguntou ao Sr. Presidente do Ministério se a dissolução tinha sido ou não pedida ao Sr. Presidente da República.
Limitou-se S. Ex.ª a responder que nunca foi seu pensamento sair da Constituïção.
Não era isto o que lhe preguntava.
Somos homens de inteligência; temos obrigação de nos entender e obrigação de falar claro.
Ainda há bem pouco tempo que nesta Câmara S. Ex.ª disse que era preciso falar claro ao País, falar-lhe a linguagem da verdade em todos os assuntos, ainda nos de carácter político.
S. Ex.ª entrincheirou-se numa reserva que se não justifica.
Um dos Ministros do Govêrno de S. Ex.ª disse aqui que ou lhe aprovariam as propostas de finanças na semana passada, ou abandonaria esta casa. Isto com ou sem parecer.
Que é feito dêsse Ministro que ainda aqui não apareceu esta semana para a aprovação das suas propostas de finanças, e ainda hoje não aparece aqui depois de se dizer que havia incompatibilidade com o Parlamento?
Se assim é, como é que o Govêrno pode governar?
Talvez saibamos a razão da sua ausência.
Quere abrir um conflito entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo.
O propósito é demasiadamente transparente.
Nunca foi nosso intento agravar ninguém: prometemos manter uma espectativa parlamentar. Não prometemos apoio porque sabíamos bem que a organização do Ministério, desde a primeira hora, não oferecia condições de Govêrno.
Demos-lhe, contudo, com a nossa espectativa uma facilidade que não demos sequer ao próprio Govêrno do nosso partido.
Apoiados.
Em troca desta situação, em troca dêste apoio, porventura em seguida ao movimento revolucionário que era dirigido contra o Partido Republicano Português, a primeira cousa que se pede é que se dissolva o Parlamento!
Não podemos aceitar esta situação.
Sabemos qual a responsabilidade dêste momento. Pezamo-la bem; mas acima de qualquer responsabilidade está ainda a dignidade partidária.
Nunca conseguirão transformar êste

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Diário da Câmara dos Deputados
partido num frangalho que se possa agitar à vontade dum qualquer Ministro que, ao assumir o Poder, declare que ali está por direito de conquista.
Não somos vencidos; nós, vencidos ou vencedores, não acoitamos a situação de nos amarrarem ao carro triunfal passeando-nos pelas ruas.
Seremos absolutamente imperturbáveis na defesa dos nossos direitos e no cumprimento dos nossos deveres.
Apoiados.
Essa moção, que foi mandada para a Mesa pelo Sr. Álvaro de Castro, não pode ser aprovada por nós, dêste lado da Câmara, porque o silêncio do Sr. Presidente do Ministério sôbre as preguntas nítidas e concretas que lhe foram feitas representa uma confissão.
Apoiados.
S. Ex.ª pediu a dissolução do Parlamento, o que demonstra que está incompatibilizado com a maioria dêle.
Apoiados
A situação é esta. Não fômos nós quem a criou!
Apoiados.
Das suas conseqüências não queremos nós as responsabilidades!
Muitos apoiados.
Aceitamos a situação tal como no-la apresentam!
Apoiados.
É para mostrar que não temos a nostalgia do Poder, somos nós os primeiros a preconizar a formação de um Govêrno nacional!
Apoiados.
Se houver patriotismo e republicanismo acima das nossas paixões, ainda há-de falar a consciência do País, que exigirá a formação de um Govêrno nacional.
Muitos apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Não havendo mais ninguém inscrito, vai proceder-se à votação das moções.
Nesta altura, o Govêrno retira-se da sala.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Requeiro prioridade para a moção apresentada pelo Sr. Álvaro de Castro e votação nominal.
Vozes: — Apoiado! Muito bom!
O Sr. Presidente? — São, portanto, dois requerimentos que o Sr. Carlos de Vasconcelos acaba de formular.
Vai votar-se o requerimento sôbre a prioridade.
Procede-se à votação.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está rejeitado.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Requeiro prioridade para a moção apresentada pelo Sr. Tôrres Garcia.
O Sr. Presidente: — Não é necessário fazer tal requerimento, porque é a primeira moção que se vai votar.
O Sr. António Maia: — Mas o Sr. Carlos de Vasconcelos tinha feito dois requerimentos...
O Sr. Presidente. — O requerimento apresentado pelo Sr. Carlos de Vasconcelos para a prioridade na votação da moção do Sr. Álvaro de Castro foi rejeitado. Na altura, portanto, em que tenha de ser lida essa moção, será pôsto h votação o requerimento para sôbre êle incidir votação nominal.
Leu-se na Mesa a moção apresentada pelo Sr. Torres Garcia, do teor seguinte:
Moção
A Câmara dos Deputados, tomando conhecimento, pelas declarações do Sr. Presidente do Ministério, da restauração da ordem pública, saúda as fôrças de terra o mar pela sua admirável fidelidade à Constituição da República, e passa à ordem do dia.
Sala das Sessões, 12 de Dezembro de 1923. — A. A. Torres Garcia.
Foi posta á votação.
O Sr. Carlos Olavo: — Só os monárquicos é que não votam a saüdação à fôrça pública!...
O Sr. Presidente: — Está aprovada. Vai votar-se agora a moção apresentada pelo Sr. Carvalho da Silva.
Leu-se na Mesa.
É a seguinte;
A Câmara, ouvidas as declarações do Chefe do Govêrno, e esperando a oportu-

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Sessão de 13 de Dezembro de 1923
nidade em que, sem os inconvenientes justificadamente apresentados por S. Ex.ª, possa apreciar os últimos acontecimentos, saúda desde já as fôrças de torra e mar, pela prontidão e decisão com que souberam contribuir para o restabelecimento da ordem, e passa à ordem do dia.
Sala das Sessões, 12 de Dezembro de 1923. — Artur Carvalho da Silva.
Procedeu-se à votação.
O Sr. Presidente: — Está rejeitada.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º do Regimento.
Trocam-se àpartes.
Procedeu-se à contraprova e a contagem.
O Sr. Presidente: — Estão levantados 51 Srs. Deputados e sentados 47.
Está rejeitada.
Vai votar-se a moção apresentada pelo Sr. Fernando Freiria.
Leu-se na Mesa. Procedeu-se à votação.
O Sr. Presidente: — Está aprovada. Vai votar-se a moção apresentada pelo Sr. Álvaro de Castro.
Leu-se na Mesa.
O Sr. Vasco Borges: — Requeiro que essa moção seja dividida em duas partes, diferençando-se a que diz respeito á saüdação a fôrça armada da outra parte.
O Sr. Plínio Silva: — A saüdação parece-me que está prejudicada.
Já foram aprovadas três saüdações!...
O Sr. Presidente: — Segundo o requerimento formulado pelo Sr. Vasco Borges, a primeira parte termina na palavra «sufocou».
Posto à votação o requerimento, foi aprovado.
O Sr. Presidente: — E, agora a altura de submeter à votação o requerimento há pouco formulado pelo Sr. Carlos de Vasconcelos para que se faça votação nominal,
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Peço que a votação nominal recaia apenas sôbre a primeira parte.
Foi aprovado.
O Sr. António Maia: — Requeiro que se vote primeiro a segunda parte da moção e, a seguir, a primeira parte, ficando assim a votação nominal para o fim.
Foi aprovado êste requerimento.
Lida a segunda parte da moção e posta a votação, foi aprovada,
É a seguinte:
...aproveita êste momento pára saüdar o exército e a armada, as guardas republicana e fiscal e a polícia cívica, pela fidelidade, dedicação e zêlo com que ao lado dos poderes constituídos procederam na manutenção da ordem, e passa h ordem do dia. — Álvaro de Castro.
Leu-se a primeira parte,
É a seguinte:
A Câmara, ouvidas as explicações do Govêrno, reconhece que êle tem procedido dentro da Constituïção, de molde a prestigiar as instituïções e dando-lhe o seu inteiro aplauso pela sua acção perante o movimento revolucionário que prontamente sufocou,...
Procedeu-se à chamada.
O Sr. Presidente: — Disseram «aprovo» 42 Srs. Deputados e «rejeito» 53.
Está rejeitada.
Disseram «aprovo» os Srs.:
Abílio Marques Mourão.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Correia.
António Lino Neto.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira,

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Diário da Câmara dos Deputados
David Augusto Rodrigues.
Francisco Cruz.
Hermano José de Medeiros.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Peneira de Mira.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vergílio da Conceição Costa.
Disseram «rejeito» os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Maria da Silva.
António Mendonça.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
António de Sousa Maia.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João Estêvão Águas.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Januário do Valo Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Entra na sala o Sr. Presidente do Ministério.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Ginestal Machado): — Sr. Presidente: pedi a palavra simplesmente para declarar a V. Ex.ª e à Câmara que, em virtude do resultado da votação que acaba de ser feita, vou expor ao Chefe do Estado a situação criada ao Govêrno.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã, 14, à hora regimental, sendo a ordem dos trabalhos a seguinte:
Antes da ordem do dia:
Parecer n.º 442 e a que estava marcada.

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Ordem do dia:
Projectos n.ºs 617-B, 616-A, 616-I, pareceres n.ºs 544, 616-E, 442, 205, 615. Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 30 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Declarações de voto
Declaro que rejeito a primeira parte da moção apresentada pelo Sr. Álvaro de Castro, por o Sr. Presidente do Ministério se ter recusado a responder às preguntas categóricas que lhe formulei sôbre gravíssimos factos passados, de natureza política. — Agatão Lança.
Declaro que rejeito a primeira parte da moção do Sr. Álvaro de Castro, não pròpriamente por eu não ter confiança na acção do Govêrno, mas porque das declarações do Sr. Presidente do Ministério à Câmara claramente se depreendeu o intuito do Govêrno de reclamar a dissolução do Parlamento, dissolução esta que, a ser concedida, me parece de desastrosos efeitos para os interêsses nacionais. — Abranches Ferrão — A. Barriga.
Para a acta.
O REDACTOR — Avelino de Almeida.

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