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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 25
EM 22 DE JANEIRO DE 1924
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Hermano José de Medeiros
Sumário.- Abre a sessão com a presença de 46 Srs. Deputados.
É lida a acta.
Dá-se conta do expediente.
Admissões.
Antes da ordem do dia. — Continua a discussão do parecer n.° 631 — refôrço de verbas no orçamento do Ministério da Guerra.
Usam da palavra os Srs. Francisco Crus, António Maia, Carvalho da Silva e Pires Monteiro.
O debate fica pendente.
São aprovadas as actas das duas últimas sessões.
É lançado na acta um voto de sentimento pela morte do antigo Deputado às Constituintes, Bernardo Lopes da Silva, associando-se os Srs. Almeida Ribeiro, Carvalho da Silva, Ferreira de Mira e Presidente do Ministério (Álvaro de Castro),
É rejeitado um negócio urgente do Sr. Cancela de Abreu, sôbre a projectada viagem do Sr. Presidente da República à cidade do Pôrto.
Usam da palavra para explicações os Srs. Presidente do Ministério e Cancela de Abreu.
O Sr. Carlos Pereira, em negócio urgente, trata das reclamações da classe telégrafo-postal. Responde o Sr. Ministro do Comércio (António Fonseca) e usa da palavra o Sr. Moura Pinto.
Ordem do dia.— Parecer n.° 634 — remodelação da lei do sêlo pela elevação das taxas fixa».
Termina a discussão, tendo usado da palavra o» Srs. Alfredo de Sousa, Pedro Pita, Presidente do Ministério, Dinis da Fonseca e Cancela de Abreu.
O Sr. Carvalho da Silva requere que entre em discussão o parecer n.° 617-B, sôbre os Transportes Marítimos do Estado,
Usa da palavra o Sr. Ministro das Colónias. Dá explicações o Sr. Presidente. Seguem-se os Srs. Nuno Simões, Carlos de Vasconcelos, Jaime de Sousa, Presidente do Ministério e Aires de Ornelas.
O Sr. Delfim Costa propõe uma alteração na acta, respondendo o Sr. Nuno Simões. Seguem-se os Srs. Carlos Pereira e Carvalho da Silva.
O Sr. Presidente dá explicações.
Mandam propostas de lei para a Mesa os Srs. Ministros das Colónias e do Comércio.
O Sr. Correia Gomes requere que na sessão seguinte se discuta o parecer n." 442, requerimento que o Sr. Ministro do Comércio impugna e sôbre que dá explicações o Sr. Presidente.
Continua a discussão do parecer n.° 617 — autorização para alienar a frota marítima do Estado.
Usa da palavra o Sr. Cancela de Abreu, que apresenta uma substituição ao artigo 2.º Responde o Sr. Ministro do Comércio.
O debate fica pendente.
O Sr. Jaime de Sousa manda para a Mesa quatro pareceres da comissão de marinha.
Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. João Camoesas trata da situação dalgumas praças da armada.
Responde o Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva), replicando o Sr. João Camoesas, voltando a usar da palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Sá Pereira troca explicações com o Sr. Presidente do Ministério acerca da situação cambial.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Propostas de lei — Um parecer — Um requerimento.
Abertura da sessão, às 10 horas e 30 minutos.
Presentes à chamada, 46 Srs. Deputados.
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Entraram durante a sessão 54 Srs. Deputados.
Srs. Deputados que responderam à chamada:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Maria da Silva.
António Resende.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Delfim Costa.
Francisco Cruz.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Pina, de Morais Júnior.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
Júlio Henrique de Abreu.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Nano Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Valentim Guerra.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Abílio Marques Mourão.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Abranches Ferrão.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Correia.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António de Mendonça.
António Pinto de Meireles Barriga.
António de Sousa Maia.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Dinis de Carvalho.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João Estêvão Águas.
João José da Conceição Camoesas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João de Sousa Uva.
José Carvalho dos Santos.
José Cortês dos Santos.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mariano Martins.
Mário de Magalhães Infante
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Mário Moniz Pamplona Ramos.
Pedro Góis Pita.
Tomé José de Barros Queiroz.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso Augusto da Costa.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Américo da Silva e Castro.
António Ginestal Machado.
António Pais da Silva Marques.
António do Paiva Gomes.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Salema.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Domingues dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirile Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos.
Paulo Limpo dó Lacerda.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Vasco Borges.
Vergílio da Conceição Costa.
Ás 15 horas e 20 minutos principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 46 Srs. Deputados;
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Odícios
De D. Laura Santos da Fonseca, agradecendo o voto de sentimento pelo falecimento de seu marido, João Filipe da Fonseca, chefe da secção taquigráfica do Senado.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Marinha, pedindo autorização para o Sr. Agatão Lança poder depor no auto dê corpo de delito sôbre os acontecimentos revolucionários a bordo do contra-torpedeiro Douro.
Concedido.
Telegramas
Da Emprêsa do Jardim Passos Manuel, do Pôrto, solidarizando-se com a representação dos empresários.
Para a Secretaria.
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Da Câmara Municipal de Condeixa, protestando contra a extinção de comarcas.
Para a Secretaria.
Representação
Da comissão executiva da Câmara Municipal de Santarém, protestando contra a extinção da sua Escola Primária Superior.
Pára a comissão de instrução primária.
Requerimento
Do capitão reformado, José Lourenço Flores, requerendo para ser ampliado o prazo a que se refere o artigo 3.° da lei n.° 1:170, de 1921.
Para a comissão de guerra.
Admissões
São admitidas as seguintes proposições de lei já publicadas no «Diário do Govêrno»:
Propostas de lei
Do Sr. Ministro do Trabalho, substituindo o artigo 97.° e seus parágrafos do decreto n.° 5:640, de 10 de Maio de 1919.
Para a comissão de previdência social.
Do mesmo, revogando os decretos n.°s 4:159 e 4:544, de 26 de Abril e 19 de Junho de 1918.
Para a comissão de obras públicas e minas.
Projectos de lei
Do Sr. Carlos Pereira, criando a aposentação dos oficiais de justiça.
Para a comissão de legislação comercial.
Do Sr. Lourenço Correia Gomes, determinando que os membros das Câmaras Legislativas não sejam incluídos na expressão de «funções públicas» do artigo 5.ª da lei n.° 1:354, de 22 de Setembro de 1922.
Para a comissão de finanças.
Dos Srs. Silva Matos, Marques de Azevedo, Pires Monteiro, Artur Brandão e Crispiniano da Fonseca, fazendo a concessão para construção e exploração do caminho de ferro Póvoa-Viana e Barcelos-Braga.
Para a comissão de caminhos de ferro.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia.
Continua a discussão do parecer n.º 631.
O Sr. Francisco Cruz: — Sr.Presidente: triste é dizê-lo — mas os factos falam mais alto do que os argumentos que nesta Câmara se têm produzido — o facto é que, sob qualquer dos aspectos por que encarêmos a administração pública, ela tem sido verdadeiramente lamentável.
Na pasta da Guerra, também as cousas, infelizmente, não têm corrido como seria para desejar, tanto mais que, durante a discussão do último Orçamento, verificou-se que muitas das verbas nele inscritas não podiam de forma alguma chegar para a manutenção dos respectivos serviços.
Sr. Presidente: eu peço ao Sr. Ministro da Guerra, soldado brioso, homem inteligente e verdadeiro patriota, que empregue todos os seus esfôrços no sentido de conseguir que o orçamento da sua pasta corresponda às necessidades dos serviços, pois muitos há que podiam ser dispensados e outros aproveitados com melhor proveito para a economia nacional.
Pela pasta da Guerra, passaram como Ministros dois civis que não fizeram obra melhor.
Sr. Presidente: relativamente ao primeiro reforço de verba para pagamento de gratificações de comandos e comissões, quero chamar a atenção do Sr. Ministro da Guerra para o decreto n.° 9:246, da autoria do civil Ministro da Guerra Sr. António Maria da Silva, que, no seu testamento-bôdo, elevou ao triplo as diferentes gratificações que existem no exército.
Em lugar de seguir o critério anteriormente seguido, alterou para 1 1/2, para 2 e para 3 a percentagem estabelecida para serviços que nunca tiveram gratificação.
É claro que isto dá resultados que nunca mais terminam e é origem das maiores monstruosidades.
Todos êstes factos devem ser do conhecimento do Sr. Ministro da Guerra, porque ao seu Gabinete já deviam ter chegado numerosas e justificadíssimas reclamações contraísse decreto.
Cito à Câmara, ao acaso, um exemplo que será suficientemente eloquente e elucidativo para a Câmara poder chegar à
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conclusão de que está em presença dum decreto perturbador e iníquo que devia, antes de mais nada, ser revogado.
Um promotor dos tribunais militares, em regra um indivíduo com um curso, tem de gratificação 75 escudos. Pois um chefe de repartição da Administração Militar, muitas vezes um indivíduo sem curso, tem de gratificação 150 escudos.
É isto justo, é isto admissível?
O Sr. Nuno Simões: — As reclamações de V. Exa. visam só factos sucedidos depois de ter deixado a pasta da Guerra, o general Sr. Carmona?
O Orador: — Devo dizer ao Sr. Nuno Simões que esta bancada foi sempre por mim honrada.
A insinuação de S. Exa., portanto, não me atinge.
O general Sr. Carmona não chegou a apresentar ao Parlamento a proposta que hoje se discute.
Se o tivesse feito, naturalmente eu seria levado a fazer as considerações que estou produzindo neste momento.
Sr. Presidente: como se vê, as cousas não correm pelo Ministério da Guerra melhor ao que correm por outros Ministérios.
Sussurro.
Eu queria mostrar à Câmara e, em especial, ao Sr. Ministro da Guerra, os motivos que me levaram a usar da palavra sôbre o assunto em discussão, porque não é meu costume falar simplesmente pelo prazer de falar.
Vejo, porém, que o Sr. Ministro da Guerra, conversando animadamente com o Sr. Ministro do Comércio e Comunicações, não me ouve, e que a Câmara, preocupada certamente com outros assuntos mais importantes, me não dispensa atenção.
Nestas condições, eu terei sem dúvida de me ver obrigado a desistir da palavra.
O Sr. Presidente: — Peço ordem.
O Orador: — A Câmara não liga importância a estas cousas.
Não importa, contanto que me deixe falar e esclarecer o País, ao qual me di-
rijo, para que êle tenha conhecimento da situação em que tudo isto se encontra.
A concessão de gratificações que o estado do Tesouro Público mal comporta e que são, além disso, o pomo de discórdia entre a família militar, não interessa à Câmara mas interessa certamente ao País, que não quere o seu dinheiro malbaratado e o exército desunido e desprestigiado.
Dizia eu, Sr. Presidente, que as cousas pelo Ministério da Guerra não iam melhor do que pelos outros Ministérios, e de facto assim é. E para flagrante exemplo conto a V. Exa. o seguinte caso:
Houve um sargento que ao aproximar-se a guerra tratou de se reformar. Morto Machado dos Santos, que sempre se negou a passar-lhe um atestado de bom republicano, êsse sargento foi reformado em capitão...
O Sr. Artur Brandão: - Isso é inaudito!
O Orador: — Ouça V. Exa. Como havia falta de subalternos na arma de engenharia, a que êle pertencia, ficou ao serviço.
Isto é simplesmente espantoso, mas o mais espantoso, querem V. Exas. ver?
Êsse capitão foi há pouco promovido a major!
O que acabo de dizer é positivamente autêntico.
Acontece isto emquanto outros foram afastados para fora das fileiras, vivem com grandes dificuldades. São homens que se bateram valentemente na guerra, e são honrados oficiais!
Apoiados.
É preciso dar uma diversa interpretação à lei, pois V. Exa. não pode esquecer êsses homens, pois a Pátria não os pode esquecer, visto que êles se bateram por ela.
Quando foram para a guerra ninguém lhes preguntou se eram monárquicos ou republicanos; foram como portugueses.
Outro ponto da proposta do Sr. Ministro da Guerra trata dos estabelecimentos fabris e depósito de material.
Tudo o que S. Exa. lá pede é contrário à economia do País, pois é muito superior ao que vem consignado no Orçamento.
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S. Exa. pede reforço de verbas também para estabelecimentos de ensino militar, onde se ministra a verdadeira educação social militar.
S. Exa. tem nas propostas do Sr. Cunha Leal muito por onde se pode nortear,
S. Exa. tem também que actualizar as pensões.
S. Exa. sabe que os estabelecimentos de ensino vivem com grandes dificuldades.
S. Exa. devia criar um colégio militar no Porto, igual ao de Lisboa, para descongestionar a avalanche de rapazes que vêm para Lisboa.
São estabelecimentos que fazem muita falta, pois os estabelecimentos do ensino particular são insuficientes.
Apoiados.
Nos estabelecimentos oficiais, como o Colégio Militar, onde há a verdadeira disciplina, não a de caserna, mas a verdadeira disciplina para formar militares disciplinandos e disciplinadores.
Ninguém pode mandar ou obedecer, sem saber uma cousa e outra, e tanto assim que um rapaz, que no seio da família é endiabrado, depois de um ano de Colégio Militar, já tem outros hábitos que no futuro de muito lhe servem.
A chamada compressão de despesas, levada ao rubro, não diz nada, e permita S. Exa. que lhe diga que cora respeito à supressão de divisões esta não traz economia.
O facto de S. Exa. acabar com algumas divisões, em vez de trazer economias, dará ensejo a despesas.
Só o transporte de mobiliário dessas divisões, para as arrecadações, o transporte dos oficiais que fazem serviço e suas famílias ocasionará tais despesas que não compensarão as economias que houver durante vinte anos com a supressão das divisões.
Hei-de provar com números que essas despesas poderão orçar por 6:000 contos.
For isso quero lembrar ao Sr. Ministro da Guerra que será bom não persistir no seu pensamento de acabar com algumas divisões, o que será origem de despesas infinitamente maiores.
Não tenho relações pessoais com o ilustre Ministro da Guerra, senão há dois
ou três dias, mas tenho por S. Exa. a maior consideração, pois dizem-me que se trata de um oficial brioso, do que tem dado muitas provas.
Não sou daqueles que fazem obra por boatos que muitas vezes não passam de infâmias.
Trato das questões frente a frente, e assim levanto a minha voz.
Dentro dos limites da minha inteligência e do meu esfôrço, trato dêste assunto, chamando a atenção do Sr. Ministro da Guerra para que estude esta questão, que só me afigura do fácil remédio, o que está servindo de pomo de discórdia na família militar.
Espero que o Sr. Ministro atenderá a minha reclamação.
O orador não reviu.
O Sr. António Maia: — Vou chamar a atenção do Sr. Ministro da Guerra para um assunto de que já me ocupei: o do decreto n.° 9:246.
Estranhei então que a verba pedida fôsse tam pequena e direi porquê.
Quando era Ministro da Guerra o Sr. António Maria da Silva, publicou-se um decreto que classifico de monstruoso, o que com certeza foi feito por quem esperava não voltar a arcar com a responsabilidade do poder, porquanto nesse decreto lêem-se cousas que são absortamente extraordinárias, contendo além disso disposições ilegais.
Já tive a; honra de chamar a atenção do Sr. Ministro da Guerra, Sr. general António Carmona, para êsse facto, mas não quero deixar de chamar também a atenção do actual Sr. Ministro da Guerra, porque de facto se trata de um assunto muito importante.
Assim vejo, por exemplo, na alínea e) do decreto n.° 9:246, o seguinte referente à aeronáutica militar: «director com brevet ou sem brevet».
Direi que não há lei nenhuma, não há nenhum decreto que autorize qualquer oficial que não tenha qualidade de observador piloto a ser director da aeronáutica.
Mas há mais.
Na mesma alínea há o seguinte, que é absolutamente extraordinário: que o oficial que está dentro da lei tem uma gratificação inferior àquela que está fora da lei!
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Veja-se o absurdo do decreto!
Dá-se maior gratificação a quem não está dentro das leis!
Tendo brevet ganha 90$. Director sem brevet, ganha 225$.
Mas há mais. Adjunto sem brevet de piloto 90$. Adjunto com brevet 30$.
Parece que houve o firme propósito de dar uma menor gratificação àqueles que tinham direito a recebê-la maior, aos que estavam dentro da lei.
Comparando as várias alíneas, observa-se o seguinte.
Um adjunto que esteja dentro da lei tem por êste decreto 30$, ao passo que o adjunto, capitão, em serviço na secretaria da guerra, tem. 42$. Quere dizer, o mesmo indivíduo, um dentro da lei, como director da aeronáutica, tem só 30$, e o outro adjunto, sem brevet de piloto, recebe 42$.
Já tive ensejo de chamar a atenção do antigo Sr. Ministro da Guerra e agora chamo a atenção do actual para o facto de não terem sido pagos os vencimentos dos oficiais desde Janeiro.
O general Sr. Carmona prometeu que trataria do assunto. Infelizmente S. Exa. saiu do Ministério e nada pôde fazer.
Os oficiais não recebem, como era de justiça, os seus vencimentos desde Janeiro.
A respeito das considerações feitas pelo Sr. Jorge Nunes, lastimo não ter estado presente para as ouvir.
Medidas mais radicais e maiores reduções, de despesa, apresentou-as, por exemplo, o Govêrno, da presidência do Sr. Ginestal Machado, e quem tinha trazido a proposta à Câmara foi o general Sr. Carmona, proposta que já estava elaborada. Não vejo, pois, razão para tanta oposição.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: imparcial como sou, devo dizer que o Sr. Ministro da Guerra não tem responsabilidade absolutamente nenhuma na elaboração desta proposta de lei, que é uma conseqüência do decreto n.° 9:246 do Govêrno do Sr. António Maria da Silva.
Não é, por conseqüência, ao actual Sr. Ministro da Guerra que as minhas pala-
vras se dirigem, mas sim à Câmara e ao Sr. António Maria da Silva.
Eu pregunto, Sr. Presidente, que autoridade tem um Parlamento, que a toda a hora, sem olhar às circunstâncias em que o País se encontra, vota as mais impensadas medidas que acarretam aumentos de despesa constantes — eu pregunto: que autoridade tinha o Sr. António Maria da Silva, como Presidente do Ministério, quando dizia nesta casa do Parlamento que êste não olhava para os interêsses do País e não lhe dava os meios precisos para satisfazer os encargos do Estado?
Mas, então, o Sr. António Maria da Silva que assim falava, teve tanta pressa ao sair do Ministério em elaborar aquele decreto?
Não vale a pena estar a alongar-me em considerações a êste respeito, e por isso limito-me a chamar a atenção da Câmara para factos dêstes, a fim de que êles se não repitam; apelar para o patriotismo da Câmara e dos Governos para que olhem para a situação em que o País se encontra e não continuem, neste caminho verdadeiramente criminoso de lançar a Nação no abismo.
Já não é tempo de remediar êste caso porque se isso se pudesse fazer, esforçar-se-ia êste lado da Câmara para que a proposta em discussão se não aprovasse.
Dêste modo, termino as minhas considerações, pedindo o favor ao Sr. Ministro da Guerra de me elucidar sôbre se, na verdade, o reforço de verba que S. Exa. pede é suficiente até o fim do actual ano económico.
Isto quere dizer que só nas despesas citadas, e para as quais se pede o reforço, o Estado gasta no ano económico 9:000 a 10:000 contos.
É a obra do Sr. António Maria da Silva!
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pires Monteiro: — Sr. Presidente: tendo tido a honra de relatar o orçamento do Ministério da Guerra, mal me parecia que não expusesse a V. Exa. e à Câmara a minha maneira de ver sôbre, a proposta de lei em discussão.
O artigo 1.° reforça várias verbas do orçamento do Ministério da Guerra, e eu
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devo afirmar que não sendo a proposta de lei precedida de um relatório que a elucide, ver-nos-íamos obrigados a negar o nosso voto, porquanto o Sr. Ministro da Guerra, logo na discussão na generalidade, declarou que já tinha encontrado elaborada a proposta pelo seu antecessor, confiando ao critério do Poder. Legislativo o destino definitivo que ela pudesse ter.
Devo dizer à Câmara que me merece o maior elogio a obra de compressão de despesas que o Govêrno tem procurado realizar.
O Govêrno vendo que não podia ficar em palavras, reconhecendo a absoluta necessidade de realizar imediatamente a obra que se pedia e que o País insistentemente reclamava, começou por reduzir despesas a importâncias maiores ou menores, conforme as exigências dos diferentes Ministérios. Pelo Ministério da Guerra, ao invés do que sucedeu nos outros Ministérios, traz-nos o respectivo Ministro um pedido de reforço de várias verbas.
A principal culpa pertence aos antecessores do actual Sr. Ministro da Guerra, que não adoptaram um certo número de medidas, um grande número de medidas mesmo, que levantassem o prestígio do exército e procurassem estimular as boas vontades que existem nos quadros de oficiais e de sargentos, ou que não apresentavam as indispensáveis reformas para conseguir uma maior eficiência das instituições militares e aquela economia por que o País pugna e o Tesouro exige. Não se fez isto e, hoje, encontramo-nos em face de um pedido de reforço de várias verbas sem qualquer explicação do titular da pasta da Guerra.
Era indispensável que o Sr. Ministro da Guerra, quando trouxe esta proposta de lei ao Parlamento,,a justificasse devidamente, e dissesse as razões, explicasse os motivos, e apresentasse os argumentos que o levaram a não poder adoptar qualquer outra solução.
Pela pasta da Guerra têm sido anunciadas várias medidas todas tendentes a prejudicar a actual organização do exército. Assim, no primeiro relatório do actual Govêrno, anunciou-se a possível supressão de quatro unidades do exército e de algumas unidades regimentais.
Para êste facto já tive a honra de chamar a atenção do Sr. Ministro da Guerra. No segundo relatório, anunciou-se um facto muito mais grave e para êle chamo a atenção do Sr. Ministro da Guerra, estando convencido de que S. Exa. não pode adoptar um critério tam simplista para reduzir as despesas do seu Ministério.
Nesse segundo relatório anuncia-se que a economia produzida pela redução do serviço militar, a um grande número de mancebos produzirá 8:000 contos.
É lamentável que se adopte tal critério, porque dentro da possibilidade financeira do Estado o Sr. Ministro da Guerra pode adoptar outras medidas que não alterem nem prejudiquem a essência do serviço militar português, que é desde 1911 o chamado serviço pessoal obrigatório.
Não sei qual será a orientação do Ministro a êste respeito, mas se se fizer essa redução de 8:000 contos nas verbas destinadas às escolas de recrutas, temos que admitir que se procura restringir ao Exército Português o condenado sistema da remissão de serviço militar.
Embora o Govêrno mereça o meu aplauso nela política que deseja fazer relativamente à compressão de despesas, neste ponto estou em formal desacordo.
É indispensável que se continue com o sistema actualmente em vigor, e necessário é que se realizem importantes reformas de onde poderão resultar economias, talvez próximas de 20:000 contos, mas não é admissível que pelo critério mais simples, pela menor resistência que se possa encontrar, se vão deixar apenas no serviço militar aqueles que não possam pagar a remissão.
Seria interessante que o Sr. Ministro da Guerra tranquilizasse, já não digo o País, que estará na sua grande maioria indiferente aos destinos do exército, mas aqueles que querem o exército moderno, isto é, a nação armada.
Lastimo que a proposta de lei do Sr. Ministro da Guerra não seja precedida dum relatório justificativo do reforço de várias verbas que se pedem, porque, como relator do Orçamento da Guerra, afirmo a V. Exa. que todas as verbas que foram pedidas pelos antecessores do Sr. Ministro da Guerra foram rigorosamente obser-
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vadas e, portanto, não se justifica por despesas posteriores" um tam notável reforço de verbas do Ministério da Guerra.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ordem do dia.
O Sr. Hermano de Medeiros (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: pregunto a V. Exa. em que altura se efectiva a votação da Câmara que determinou que antes da ordem do dia se discutisse a momentosa questão dos Transportes Marítimos.
O Sr. Presidente: — Êsse parecer está inscrito no «antes da ordem do dia», mas para ser discutido sem prejuízo dos oradores inscritos, e há uma proposta do Sr. Ministro da Guerra que tem de ser discutida mesmo com prejuízo dêsses oradores.
V. Exa. não reviu.
O Sr. Hermano de Medeiros: — Requeiro, então, para ser discutido com prejuízo dos oradores inscritos êsse parecer.
O Sr. Presidente: — V. Exa. não pode fazer requerimentos, tendo pedido a palavra para interrogar a Mesa.
O Sr. Hermano de Medeiros: — Peço a palavra para um requerimento.
O Sr. Presidente: — Darei a palavra a V. Exa. na devida altura. Estão em discussão as actas das duas sessões anteriores, pois que a penúltima não foi aprovada.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Como ninguém peça a palavra, considero-as aprovadas.
Procede-se a segundas leituras e à votação do expediente que dependia de resolução da Câmara.
O Sr. Presidente: — Comunico à Câmara o falecimento do Deputado às Constituintes Sr. Bernardo Lopes da Silva, que, sendo um velho republicano, foi também auditor do Ministério das Colónias.
Proponho, pois, que se lance na acta um voto de sentimento.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: êste lado da Câmara associa-se ao voto de sentimento proposto por V. Exa. Trata-se de mais um nosso antigo companheiro de trabalho que desaparece do nosso convívio, e cuja falta muito sentimos pela valiosa colaboração que nos prestava. Portanto, a nossa aprovação ao voto proposto por V. Exa. é perfeita e completa.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Sr. Presidente: em nome do Grupo de Acção Republicana Parlamentar associo-me ao voto de sentimento proposto por S. Exa.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: por parte da minoria monárquica associo-me comovidamente ao voto de sentimento proposto por V. Exa.
O orador não reviu.
O Sr. Ferreira de Mira: — Sr. Presidente: em nome da representação parlamentar nacionalista nesta Câmara, associo-me ao voto de sentimento proposto por V. Exa.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: associo-me ao voto de sentimento proposto por V. Exa., em nome do Govêrno.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Em virtude das manifestações da Câmara, considero aprovado por unanimidade o voto de sentimento que propus.
Chamo a atenção da Câmara.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu deseja ocupar-se, em negócio urgente, das enormes despesas que, apezar da situação do País, no dizer de S. Exa., se pretendem fazer com a viagem Presidencial ao Pôrto. Os Srs. Deputados que autorizam queiram levantar-se.
É rejeitado.
Protestos da minoria monárquica.
Trocam-se vários apartes.
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O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: — Rejeitaram a autorização 46 Srs. Deputados e aprovaram 20.
Está rejeitado.
Novos protestos da minoria monárquica.
Negócio urgente
Desejo ocupar-me, em negócio urgente, das avultadas despesas que, não obstante a situação do País, se projectam fazer por ocasião da próxima viagem presidencial ao Porto, nomeadamente com a ida ali da divisão, naval e de toda a numerosa e cara companhia lírica de S. Carlos, propositadamente para dar um espectáculo de gala, — Paulo Cancela de Abreu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: pedi a palavra para explicações a fim de dizer que entendo que o Parlamento rejeitou muito bem o negócio urgente, porque o assunto não merece a discussão da Câmara.
Apoiados da maioria.
O Sr. Presidente da República vai no dia 31 próximo ao Pôrto, como era legítimo que fôsse, pois, que se trata duma festa da República, a festa inicial da República, a que S. Exa. n~so podia faltar. Mas a exploração que se pretende fazer com a viagem de S. Exa. merece na verdade que não fiquem em silencio por parte do Govêrno as declarações necessárias para tranqüilizar o espírito público e principalmente o monárquico.
S. Exa. vai ao Pôrto, mas pão vai gastar na sua viagem cem contos nem nada que se pareça com isso.
O Estado republicano nada tem com a viagem da companhia lírica, Ela vai ao Pôrto à sua custa; vai como quere e quando quere.
Os navios vão ao Pôrto porque já estavam destinados a saír para viagem de instrução. É natural que se faça coincidir essa viagem com a data da comemoração do 31 de Janeiro.
E eis aqui ao que se reduz tudo quanto
se tem procurado inventar para mais uma campanha ignóbil contra a República.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — O assunto que eu pretendia tratar em negócio urgente e do domínio público.
Não houve ainda nenhum desmentido da parte do Govêrno.
Não nos importa que o Presidente vá ao Pôrto ou vá onde quiser; o que nos importa é a despesa que se terá de fazer com essa viagem.
Sussurro.
O Sr. Presidente: — V. Exa. tem a palavra sòmente para explicações.
O Orador: — E o que estou fazendo. Estou explicando que desejava tratar dêste assunto em negócio urgente para saber quem paga as despesas com a récita de gala que se projecta levar a efeito no Pôrto, indo ali, para êsse fim, a companhia de S. Carlos.
Protestos da maioria.
Na ocasião em que se estão pedindo novos impostos, não faz sentido que se vá gastar dinheiro desta maneira.
Por agora nada mais digo.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — O Sr. Carlos Pereira deseja tratar, em negócio urgente, das reclamações da classe telégrafo-postal.
Os Srs. Deputados que autorizam, queiram levantar-se.
Está autorizado.
Tem a palavra o Sr. Carlos Pereira.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: uso da palavra sem qualquer intuito de marcar uma posição de defesa ou de ataque às reclamações dos funcionários dos Correios e Telégrafos, Pretendo apenas obter do Sr. Ministro do Comércio informações sôbre o assunto que se me afigura momentoso.
É público e notório que os funcionários telégrafo-postais apresentaram determinadas reclamações ao Sr. Ministro do Comércio.
Ora para que o Pais, saiba o que há acerca dessas reclamações, é que eu pedi a palavra, para que, quem de direito, que é
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o Sr. Ministro do Comércio, nos dê informações a tal respeito e não tenhamos de aceitar aquelas que, por formas várias, nos são oferecidas. Pregunto, pois, a S. Exa. o que há a tal respeito.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António da Fonseca): — O assunto a que se referiu o Sr. Carlos Pereira é na verdade de alta importância e gravidade.
A classe telégrafo-postal apresentou ao Govêrno duas reclamações. Consiste uma na remodelação geral de todos os serviços da Administração Geral dos Correios e Telégrafos.
A outra é de natureza financeira; refere-se ao pagamento de determinadas melhorias de vencimento.
Estas reclamações foram apresentadas em apoio de exposições que ao Govêrno tinham sido feitas pelos funcionários especialmente encarregados de tratarem dêste assunto, e assim eu recebi antes da reclamação dos telégrafo-postais uma proposta para ser presente ao Parlamento, elaborada pelo Conselho de Administração dos Correios e Telégrafos, no sentido de pedir autorização para a remodelação dos respectivos serviços dentro de determinadas bases. Foi só depois de eu ter recebido esta proposta, que me encontrei com uma comissão de funcionários que veio insistir pela rapidez na resolução do assunto.
A respeito da reclamação eu respondi que não estava autorizado a fazer qualquer remodelação, sendo, portanto, necessário entregar o assunto ao Parlamento, para que êste o apreciasse como melhor entendesse, autorizando o Govêrno a fazer a remodelação ou fazendo-a êle próprio.
Julgo que tal resposta não poderia desagradar aos interessados, visto que não seria legítimo seguir outro caminho Sem desrespeito pela Constituição.
Antes de tudo a Constituição tem de ser como é, na realidade a lei fundamental do País.
O Govêrno estuda as bases propostas pela comissão, segundo ela informa sôbre a tabela, organizadas sôbre os trabalhos elaborados em diferentes congressos, e até sôbre reclamações instantes do pessoal, no sentido de acautelar tanto quanto possível os interêsses de toda a classe.
Sucedo até que em certo o determinado lugar público se procurou faltar ao mais rudimentar respeito devido ao administrador geral, acusando-o de falta de interêsse por esta questão, quando elo tem sido sempre quem se tem interessado duma maneira absolutamente insofismável.
A segunda reclamação baseia-se numa informação que representa um trop de zêle, baseado numa goffe.
Na nota oficiosa - que tive ocasião de mandar ontem para a Imprensa, dizia que reconhecera que a informação era menos exacta, e dizia que essa informação menos exacta era a, origem da questão.
Houve um jornal da manhã, de grande circulação, que entendeu ter o direito de tratar desta questão, afirmando que havia quem tivesse tenção de fazer uma manifestação de desagrado ao Sr. Araújo, quando em todos os países o funcionário que fizesse cousas semelhantes, seda irremediavelmente demitido.
Apoiados.
A questão passou-se da seguinte maneira: publicou-se a lei n.° 1:452, em quer se estabelecem certas melhorias, como aplicação de efeitos retroactivos de Janeiro de 1923.
O Sr. António Maia: — Há apenas um engano.
Para o exército não tem êsse efeito.
Uma voz: — Nem para a marinha.
O Orador: — Nem para o exército, nem para a marinha, há aplicação retroactiva, quanto à lei.
O que eu digo é outra cousa, e não me parece que seja esta a hora própria de me lembrarem o facto que nada tem com a aplicação da lei n.° 1:452.
A lei estabelece a data de Janeiro de 1923.
Depreendeu-se porem de vários artigos da lei que a retroactividade era de Julho de 1922, e não de Janeiro de 1923, o começou a correr entro â classe telégrafo-postal esta opinião.
O Sr. director do serviço de contabilidade trouxe-me o assunto para despacho, mas como se tinha dado a circunstancia de ou ter sido em tempo Ministro das Finanças e funcionário, depois, das finanças, não podia neste, nem em nenhum outro
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assunto, assinar de cruz, e então desejei estudá-lo e estudei-o.
Verifiquei que era errada toda a aspiração de classe, e ontem tive ocasião de chamar ao meu gabinete o chefe da contabilidade, Sr. Faria, que acabou por se convencer inteiramente que a informação partiu de um êrro, não sendo legítima.
Impossível era fazer-lhes e que queriam, como já lhes havia dito o Sr. António Maria da Silva.
Apoiados.
Não sei se estas cousas são feitas por uma espécie de maçonaria, que pretende imiscuir-se nos serviços públicos; não sei se a ponto de arrastar estas criaturas para o crime, sistema que tem sido uma das graves causas da nossa situação.
Eu não posso, a não ser que o Parlamento o estabeleça, sejam quais forem as conseqüências, autorizar uma despesa importante que obrigaria o Estado a autorizá-la para todo o funcionalismo, que, tem igual direito e iguais regalias.
Não seriam então 3:000, mas perto de 70:000 contos.
Parece-me que nos encontramos num momento em que temos de reflectir sôbre as conseqüências dos nossos actos, e, porventura, sôbre a gravidade da situação criada ou a criar.
Por isso agradeço muito ao Sr. Carlos Pereira o ensejo que me deu de trazer êste esclarecimento à Câmara, desde que se fala numa nota oficiosa, publicada nos jornais pelo Ministério do Comércio, embora um deles alterasse o texto propositadamente, tirando três ou quatro palavras fundamentais, para que fôsse contestada esta esperança que se tinha dado indevidamente a uma classe inteira.
Agradeço a circunstância de S. Exa. me haver colocado em condições de poder versar o problema, para que o Parlamento veja a gravidade do momento.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: pedi a palavra para agradecer ao Sr. Ministro do Comércio as suas explicações, e salientar novamente que a classe ferroviária do Estado não recebeu a aludida subvenção desde Julho de 1922.
Apartes.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Moura Pinto: — Se S. Exa. permite que o elucide, direi que houve uma classe que não foi considerada no aumento feito e que veio pedir que fôsse atendida desde Julho de 1922.
A comissão de finanças, de que eu fazia parte, reconheceu que tal doutrina era atentatória dos interêsses do Estado, e os próprios interessados assim reconheceram, sendo-lhes apenas pago o aumento desde Janeiro, época em que tinham feito a reclamação.
Era isto o que queria dizer.
Apartes.
O orador não reviu.
ORDEM DO DIA
Parecer n.° 684, remodelação da lei do sêlo pela elevação das taxas fixas
O Sr. Presidente: — Vai proceder-se às votações que ficaram pendentes da sessão de ontem.
Vai votar-se a admissão da proposta do Sr. Presidente do Ministério.
Leu-se e foi admitida.
Foram aprovadas várias propostas de emenda e o artigo 1.°
O Sr. Presidente: Vai votar-se o artigo 2.° da proposta.
O Sr. Alfredo de Sousa: — Peço a palavra.
O Sr. Presidente: -Tem V. Exa. a palavra.
O Sr. Alfredo de Sousa: — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa dois artigos novos.
Se é justo que se valorizo o valor do sêlo quanto à sua importância, justo é que se autorize a valorização dos contratos sôbre que êle incide e ao mesmo tempo é necessário chamar a atenção da Câmara para a diversa legislação civil e criminal no que diz respeito à fixação de quantias sôbre que incide o sêlo, e assim vou mandar para a Mesa dois artigos novos.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita: — Sr. Presidente: não faz sentido num projecto de lei que
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tem por fim melhorar as receitas do Estado, elevando as taxas de imposto do sêlo, introduzir uma emenda que, não tendo nada que ver com essas taxas, vai prejudicar o Estado na aplicação dessas mesmas; taxas.
Apartes.
Em primeiro lugar e sôbre o aspecto por que encaro o 1.° artigo do Sr. Alfredo de Sousa, dele não resulta para o Estado um benefício, mas sim um prejuízo.
Apartes.
Pela legislação actual, só podem ser feitos fora das notas notariais os contratos inferiores a 50$, e todos os outros são feitos por escritura.
Sob o ponto de vista fiscal, e é esta a característica que interessa a esta proposta, a actual legislação estabelece que o instrumento feito fora das notas tabeliárias é um papel selado e leva um sêlo fixo de $60.
Se a escritura é nos livros do notário, leva um solo fixo de 6$ e as respectivas cópias são em papel selado.
O Estado iria, portanto, perder a diferença que vai entre a quantia fixada e o aumento que se quere fixar. Isto sob o ponto de vista fiscal; mas, se atendermos ainda a que a maior parte dêsses contratos são contratos de compras e vendas de propriedades, o Sr. Alfredo de Sousa sabe que não há hoje propriedade nenhuma que valha 50$, e aquelas que só possam vender por tal preço é porque estão na matriz por um valor diminutíssimo e é bom que paguem em solo o que não pagam na contribuição de registo.
Ainda sob o ponto de vista dos contratos a fazer por escritura, não há razão alguma para permitir que se façam por outro modo.
Em primeiro lugar é principalmente na escritura que está a garantia do contrato e depois há toda a vantagem de ficarem os contratos arquivados nos cartórios donde se tiram cópias.
Sr. Presidente : eu creio que, se se fossem a admitir artigos novos, exceptuando das disposições desta lei, agora êstes contratos, logo outros, amanhã os processos, etc., não valia a pena estarmos a votar um aumento de sêlo da qual nada resulta. E justamente pela tributação a que êstes contratos ficam sujeitos que se poderá corrigir um pouco a falta que resul-
ta para o Estado da contribuição de registo que deve ser paga e que não é.
Sr. Presidente: não quero alongar as minhas considerações, e creio ter mostrado que, nem êste é o momento mais oportuno, nem esta a proposta mais própria para introduzir estas modificações.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Alfredo de Sousa: — Sr. Presidente : salvo o devido respeito e a muita consideração que tenho pelo Sr. Pedro Pita, parece-me que S. Exa. não tem razão nas observações que acaba de fazer.
Começou S. Exa. por dizer que êste artigo não tem relação com a proposta que se discute.
Ora, Sr. Presidente, porque se trata exactamente de aumentar o sêlo, é que êsse artigo se impõe.
Já desde o Código Civil, e portanto desde 1868, a todos os contratos cujo valor não fôsse excedente a 50$ não era exigida escritura publica. Portanto, se vamos actualizar as taxas do imposto do sêlo, devemos também actualizar o valor dos contratos. Isto parece-me inteiramente justo.
As considerações feitas pelo Sr. Pedro Pita, a respeito da não garantia dos títulos, não têm razão de ser, porque êles são feitos pelo notário e registados por extenso nos competentes livros.
Quanto ao Estado, êle apenas deve exigir do contribuinte o que fôr justo, e aplicando-se o princípio antigo de que «havendo igual razão deve haver igual disposição», o artigo que mandei para a Mesa tem toda a oportunidade.
Igualmente devo acentuar que sôbre os meus artigos foram ouvidos os vários leaders da Câmara, e se não ouvi o Sr. Pedro Pita foi porque não o encontrei.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara
A proposta do Sr. Alfredo de Sousa, pelo decorrer da discussão, verifica-se que importa diminuição de receitas.
Nestes termos está incurso no artigo 1.° da lei n.° 954.
S. Exa. não reviu.
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O Sr. Alfredo de Sousa (para explicações): — Sr. Presidente: peço licença para discordar da opinião de S. Exa., porque a minha proposta não importa diminuição de receitas. Pelo contrário consigna que os títulos que agora pagam $60, passem a pagar 3$.
Como é, pois, que lia diminuição de receitas?
Por essa mesma razão, também os parágrafos do Sr. Barros Queiroz não podiam ser aceitos.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: deseja apenas afirmar que efectivamente a proposta do Sr. Alfredo de Sousa traz deminuição de receitas, quer em relação à tabela actual, quer à que ficar de futuro.
Nestas condições, julgo que a Câmara rejeitará.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Dinis da Fonseca: — Sr. Presidente: parece-me que o novo artigo mandado para a Mesa pelo Sr. Alfredo de Sousa merece a aprovação, porque dentro do imposto exagerado que vai pedir-se indistintamente a toda a gente, representa uma ligeira atenuação num dos seus aspectos.
Toda a gente sabe como são frequentes os pequenos contratos e a proposta em discussão tem por fim atenuar um pouco o imposto de sêlo, razão por que cabe inteiramente dentro da lei que a Câmara vem de votar.
Portanto, ela é absolutamente justa e tem perfeito cabimento no assunto que se discute.
Para o demonstrar, basta citar que pela taxa do 5 muitos contratos haverá que terão de pagar de imposto de sêlo quási tanto como o valor do contrato,
Êste agravamento de taxas, que a lei vem introduzir na tabela, é contra o que já estava estabelecido.
Disse o Sr. Pedro Pita que não há contratos de 50$. O que eu digo a S. Exa. é que êste aumento torna incomportável o solo.
Eu dou o meu voto ao artigo novo, e já que estou com a palavra direi que es-
tas autorizações depois na prática não têm dado bom resultado e mais tarde a Câmara queixa-se, pois não se atende aos verdadeiros interêsses.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: mais uma vez se demonstra que dêste lado da Câmara se fala com razão.
A matéria do artigo novo proposta pelo Sr. Alfredo de Sousa vem satisfazer inteiramente aquilo que eu há mais de um ano reclamo dos Ministros das Finanças.
Não se compreende que se faça actualização dos impostos e não se faça actualização dos valores mínimos das actos da vida civil de cada um.
Não se compreende que se aumente os emolumentos e se despreze os valores mínimos.
Diz o Sr. Pedro Pita que hoje já não há escrituras do valor de 50$; mas não é tanto assim, e quando isso fôr necessário só de sêlo tem de se pagar 18$, sem falar nas outras alcavalas.
Vê-se que uma escritura para uma venda importa, só com selos, notário, contribuição e outras alcavalas, em mais que 50$.
É indispensável que o artigo do Sr. Alfredo de Sousa seja aprovado.
Apoiados.
Sr. Presidente: esboçou-se por parte da maioria uma tentativa contra a admissão dêsse artigo novo, dizendo que a isso se opunha o artigo 18.° do Regimento. Que o artigo não tinha razão de ser, que o assunto estava deslocado.
Não era só quanto ao notariado que se devia proceder, era também quanto à contribuição de registo.
Reservo-me para analisar os artigos referentes às multas e alçadas que constam das emendas apresentadas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Tendo a Presidência entendido que a proposta do Sr. Alfredo de Sousa, por virtude do Regimento não permitir que durante a apresentação do Orçamento se apresentem propostas de discriminação de receita ou aumento de despesa sem o aceite do Sr. Ministro das Finanças, convido o Sr. Ministro das
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Finanças a declarar se concorda com a proposta apresentada.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro) de Castro): — Peço a V. Exa. o favor de me enviar a proposta para a assinar, visto que concordo com ela.
Leu-se, foi admitida e entrou em discussão.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: o artigo que se discute é mais importante que parece, e a sua, doutrina necessita ser apreciada com cuidado.
Certas despesas dos processos es tão elevados ao décuplo, o êle pode concorrer para deminuir o direito de defesa.
Apartes.
Quando me refiro à Relação, refiro-me também à primeira instância. Se a alçada da primeira instância é, pelo Código do Processo Civil, de 30$ a 50$, passa a ser de 300$ e 500$, o que é demasido quando se trata de processos de despejo, cujo valor, em rigor, é superior. Os interessados, especialmente em questões desta natureza que são mais graves por circunstâncias de ordem moral do que muitas vezes pelo seu valor. 6cam obrigados a conformar-se em absoluto com a sentença do juiz da primeira instância, que se pode acertar, pode também acontecer não acertar, porque isso é inteiramente humano e está na lógica dos acontecimentos.
Feitas estas restrições, parece-me que o artigo merece a aprovação da Câmara e vem satisfazer uma aspiração que ou salientei a vários Ministros da Justiça, que, aliás, nunca fizeram caso absolutamente nenhum, apesar das boas promessas havidas e de reconhecerem que as minhas reclamações eram inteiramente justas.
A matéria relativa a objectas perdidos o a achados são tem importância de maior, pois o que está consignado no Código raríssimas vezes se tem aplicado.
Tesouros escondidos, também não é cousa freqüente verificar-se no nosso País, a não ser no caso de algum rico avarento esconder a sua fortuna em sítio onde fàcilmente não possa ser encontrada, o a não ser a lenda que leva a lazer longas escavações, as disposições do Código Civil não se aplicam.
Feitos êstes ligeiros reparos, especialmente quanto à alçada das Relações, que acho exagerado ficar em quatro contos, dou o meu voto ao artigo em discussão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Dinis da Fonseca: - Tratando-se de alterar assuntos que se referem à competência dos tribunais, que se referem à aplicação das penas, que se referem à matéria do orfanologia, por um simples artigo apresentado de afogadilho, que mal ter tempo de ler e precisando ler pelo menos os textos, parece-me, Sr. Presidente, que não será fácil votar com a consciência de que estamos realmente a fazer uma obra que não acarrete inconvenientes na prática judicial.
Se porventura se entende — e eu posso estar de acordo com o Sr. Alfredo de Sousa—que há matéria sôbre a qual o Parlamento deve pronunciar-se com urgência, converta se o artigo num projecto de lei, peça-se a urgência, mas baixe à comissão respectiva para, no prazo de algumas horas, se verificar detalhada e conscienciosamente que resulta benefício para a prática judicial.
Ora alterar disposições do Código Civil e disposições do Código Penal sem que tenhamos tempo material de conhecer sequer as disposições que ficam alteradas, não me parece que eu, como Deputado, possa conscienciosamente dar o meu voto a um trabalho legislativo feito por esta forma; contra êste processo de legislar mais uma VPZ levanto o meu protesto.
Eu não compreendo nem admito que um Parlamento possa alterar disposições de leis vigentes, sem que ao menos seja fornecido aos Srs. Deputados que hão-de discutir o assunto um texto dessas alterações.
Sr. Presidente: de harmonia com estas considerações e ressalvando as boas intenções do ilustre Deputado proponente, e ainda mais declarando que da leitura do artigo mo parece que algumas dessas disposições - serão muito de aceitar, devo contudo dizer que, para que possamos conscienciosamente pronunciar-nos sôbre êle, é necessário que baixe à respectiva comissão, para que esta dentro do um curto prazo se pronuncie.
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Neste sentido requeiro a V. Exa., Sr. Presidente, que consulte a Câmara sôbre se permite que êste artigo novo baixe à respectiva comissão a fim de que ela num prazo quanto possível curto dê o seu parecer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Posto à votação o requerimento do Sr. Dinis da Fonseca, foi rejeitado.
O Sr. Dinis da Fonseca: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Feita a contraprova, verificou-se novamente a rejeição do requerimento por 46 8rs. Deputados levantados e 16 sentados.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Pedi a palavra para mandar para á Mesa um parágrafo novo destinado a excepcionar as acções judiciais de despejo.
Foi admitido.
O Sr. Presidente: — Como não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito vai votar-se.
Foi aprovado o artigo novo enviado para a Mesa pelo Sr. Alfredo de Sousa.
Foi aprovada a proposta de aditamento do Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Correia Gomes: — Pedia palavra para mandar para a Mesa uma proposta de um artigo novo.
Foi admitido e em seguida aprovado sem discussão.
Foi aprovado sem discussão o artigo 2.° da proposta.
O Sr. Correia Gomes: — Requeiro dispensa da leitura da última redacção.
Foi concedida a dispensa.
Documentações
Propostas que foram votadas e que tiveram o destino constante das respectivas rubricas:
Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a elevar as taxas fixas do imposto do sêlo constante da tabela anexa à carta de lei do 24 de Maio de 1902, multiplicando-as pelo factor 20.
§ único. Exceptuam-se os selos dos recibos dos juros dos empréstimos em escudos da dívida pública fundada.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados de Janeiro de 1924. — Álvaro de Castro.
Aprovada na especialidade.
Para a comissão de redacção.
Dispensada a leitura da última redacção.
Substitüição da alínea 1) do artigo 1.°, §2.°:
1) As taxas do imposto de sêlo respeitantes ao papel selado dos inventários orfanológicos do valor não excedente a cinco contos as quais continuam a ser as actualmente em vigor. — Paulo Menano — Barros Queiroz.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Aditamento ao artigo 1.°, § 2.° (excepção):
Alinea 3) as taxas do sêlo dos cheques à vista.— Paulo Menano.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Aditar ao artigo 1.° da proposta Barros Queiroz o seguinte:
§ 3.° Sôbre as taxas do imposto do sêlo respeitantes a papel selado em processos forenses, judiciais, não incidirão a favor do Estado quaisquer percentagens ou adicionais, sejam de que natureza forem, e nomeadamente as importâncias que pela tabela aprovada por decreto n.° 8:436, de 21 de Outubro de 1922, o Estado tem direito a perceber.
Câmara dos Deputados, 21 de Janeiro de 1924. — José Marques Loureiro.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Artigo 1.° O imposto de sêlo continua a reger-se pela legislação vigente, mas as suas taxas passam a ser as taxas presentemente em vigor, multiplicadas pelo factor 4.
§ 1.° Exceptuam-se da multiplicação pelo factor 4 as taxas do solo especial de Assistência Pública, as do sêlo das especialidades farmacêuticas e as taxas que
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são fixadas por percentagens ou em funções do valor atribuído ao acto a tributar.
§ 2.° Exceptuam-se também da mesma multiplicação:
1.° O papel selado cios inventários orfanológicos de valor não excedente a cinco contos o qual continua sujeito à taxa actualmente em vigor.
2.° Todo o restante papel selado cuja taxa passe a ser de um escudo por cada meia folha. — Barros Queirós.
Aprovado com substituição do n.° 1.° do § 2.°.
Para a comissão de redacção.
Proponho que o número «4» do artigo 1.º e § 1.° seja substituído pelo número «5».
21 de Janeiro de 1924. —Álvaro de Castro.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Artigo 2.° (novo). As avenças ainda não pagas e feitas por prazo que esteja decorrendo à data da publicação desta lei serão actualizadas de harmonia com as disposições do artigo 1.° — Paulo Menano.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Artigo novo. São elevados ao décuplo os valores fixados ou estabelecidos como limite, por disposição ainda vigente, anterior a l de Janeiro de 1919, para condicionarem a competência dos tribunais ou autoridades, alçadas, formas de processo, recursos, penas ou forma externa de contratos, ou ainda como quantitativo de multas, cauções e fianças.
§ 1.° São igualmente elevados ao décuplo os valores a que se referem os artigos 416.°, 419.° e parágrafos, 1190.° do Código Civil, e § 1.° do artigo 710.°, artigo 825.° e 839.° do Código do Processo Civil, e § 3.° do artigo 122.° do Código Penal e 212.º do Código Comercial.
§ 2.° Será também elevado ao décuplo o valor de prédios acabados em inventário antes de 1 de Janeiro do 1919, para o efeito do cálculo previsto no § 2.° do artigo 766.° do Código de Processo Civil.
§ 3.° O disposto no corpo dêste artigo é inaplicável ás causas pendentes à data da publicação da presente lei. — Alfredo Luís de Sousa.
Aprovado.
Artigo novo. Os contratos a que se refere o artigo 63.° do decreto n.° 8:373, de 18 de Setembro do 1922, de valor não superior a 500$ poderão ser lavrados por instrumento fora das notas, nos termos da 2.a parte do § 1.° do mencionado artigo.— Alfredo de Sousa.
Aprovado.
Aditamento:
§ .° Ficam exceptuados do disposto neste artigo quanto às alçadas as acções especiais de despejo. — Paulo Cancela de Abreu.
Aprovado.
Artigo novo. O imposto do sêlo cobrado por meio de estampilha nunca será inferior a $05, e o das letras não será inferior a $50. — Lourenço Correia Gomes.
Aprovado.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro que entre imediatamente em discussão o parecer n.° 617 B, que se refere aos Transportes Marítimos do Estado.
O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins) (sobre o modo de votar):— Sr. Presidente: o Sr. Carvalho da Silva acaba de requerer para entrar imediatamente em discussão a proposta relativa aos Transportes Marítimos do Estado; devo lembrar à Câmara que na ordem do dia, logo a seguir à questão do sêlo, está a proposta relativa ao empréstimo à província de Moçambique.
É preciso que a Câmara tome uma atitude definitiva sôbre essa proposta de empréstimo.
É preciso que a Câmara me diga duma maneira clara se quere ou não votar a proposta de empréstimo à província de Moçambique. Se a Câmara entende que essa proposta deve ser discutida, diga-o duma maneira clara; o que não pode ser é essa proposta estar todos os dias incluída na ordem do dia e o Ministro estar aqui todos os dias á espera que essa discussão se faça.
Vozes: — Venham as bases.
O Orador: - Quais bases? Como se quere as bases de um contrato que não existe?
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O Sr. Nuno Simões: — A Câmara já reconheceu que o havia, com o próprio voto de V. Exa., se não estou em êrro.
O Orador: — Se a Câmara o reconheceu, estava equivocada.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Cumpre-me elucidar a Câmara sôbre a inscrição da ordem do dia de hoje.
Estava em primeiro lugar a proposta de lei que acabou de ser votada, a seguir está o parecer n.° 584 que reforma a lei do sêlo, parecer que foi relatado pelo Sr. Velhinho Correia. A seguir está a proposta de lei que autoriza a colónia de Moçambique a contrair um empréstimo. De maneira que o requerimento do Sr. Carvalho da Silva envolverá não só a preterição da discussão do empréstimo mas sobretudo e em primeiro lugar a reforma, da lei do sêlo.
É sôbre isto que ã Câmara vai tomar uma resolução.
O Sr. Nuno Simões (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejava que V. Exa. me dissesse se efectivamente há ou não há uma resolução da Câmara em relação à proposta de empréstimo à província de Moçambique. Se não estou em êrro, a Câmara resolveu não discutir essa proposta emquanto não fossem do conhecimento de todos os Srs. Deputados as bases do empréstimo.
Peço a V. Exa. que esclareça êste assunto que reputo fundamental.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro de Colónias (Mariano Martins) (para explicações): — Sr. Presidente: pedi a palavra novamente para dizer ao Sr. Nuno Simões que não tenho conhecimento de que a Câmara resolvesse não discutir a proposta de empréstimo sem conhecer as bases do contrato. Não estava na sala quando se tomou essa resolução, porque, se estivesse, havia logo dito que não há possibilidade de publicar no Diário do Govêrno as bases dêsse contrato e por uma razão simples: porque não existe êsse contrato.
As negociações que foram encetadas em Londres pelo Sr. Augusto Soares e pela casa Armstrong ainda não foram reduzidas a escrito.
O Sr. Nuno Simões: — Mas o que tem graça é que o Sr. Presidente do Ministério discutiu-as.
O Orador: — Aquele documento que se encontra nas mãos de alguns Deputados é simplesmente uma fase das negociações; segundo me consta é a 7.ª proposta feita, pela casa Armstrong aos negociadores do contrato, proposta que ainda não é a definitiva, pois que as negociações continuam.
Não há portanto contrato algum.
O Nuno Simões: — A deliberação da Câmara foi tomada, de acordo com o Sr. Presidente do Ministério; deve constar da acta.
O Orador: — Quere dizer, que também houve equívoco da parte do Sr. Presidente do Ministério.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — O equívoco existiu também na comissão de colónias, porque se disse que era necessário que o projecto fôsse aprovado até 3.1 porque se tinha do responder os prestamistas de Londres.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: — Como V. Exas. vêem labora-se num equívoco, o que de resto se nota em vários trabalhos parlamentares. É lamentável que nas bancadas ministeriais só não dê opinião, e assim acontece que se encontre um Ministro a pedir urgência para uma questão, e vir outro que pede o contrário, como sucedeu ontem, em que foi pedida a urgência de discussão do projecto sôbre os Transportes Marítimos antes da ordem, em quanto que o Sr. Ministro da Guerra pediu â dispensa do Regimento para uma proposta sua, e assim inutilmente ocupamos uma sessão.
Ora isto não pode ser. Julgo de toda a vantagem, para a obra do Parlamento, que ela seja feita segundo um acordo para a discussão dos projectos.
O País sabe que há uma despesa mensal de 200 contos, aumentando sucessivamente, e que por isso se torna necessária uma resolução da Câmara. É uma vergonha para o Parlamento Português não resolver êste assunto.
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Preparam se as cousas de tal maneira que parece que o Parlamento está a brincar,
Acabemos com esta questão dos Transportes Marítimos.
Está na ordem do dia uma proposta que devo levar muito tempo a discutir: o empréstimo de Moçambique.
Julgo razoável que a proposta sôbre o empréstimo de Moçambique fique para ordem do dia de amanhã, passando para o primeiro lugar a proposta de sêlo, e que neste momento se discuta imediatamente, para acabar com esta discussão, a proposta sôbre Transportes Marítimos do Estado.
Voto neste sentido.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro); — Sr. Presidente: o Sr. Jaime de Sousa não tem inteiramente razão. Tem-se discutido a proposta sôbre o sêlo, e existe o imposto de sêlo. O meu requerimento ficou prejudicado com a proposta do solo.
Q Sr. Carvalho da Silva fez um requerimento para a discussão dos Transportes Marítimos.
Parece-me que êsse requerimento será de votar, entrando-se na ordem do dia.
A questão dos Transportes Marítimos tem muita importância realmente, mas a verdade é que há interêsses mais altos que se torna necessário acautelar.
Quere-me parecer que, nestas condições, o chefe do Poder Executivo deve ter o direito da última palavra quanto a oportunidade da discussão das medidas que apresenta ao Parlamento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Aires de Ornelas: — Sr. Presidente: eu não consegui perceber a razão que levou o Sr. Ministro das Colónias a usar da palavra sôbre uma questão tam simples com tanto calor e tamanha exaltação.
Quando aqui se tratou da questão do empréstimo a Moçambique, resolveu-se que a sua discussão fôsse demorada até se conhecerem os termos do acordo, e porque resolveu a Câmara assim? Porque o documento que tinha sido distribuído a alguns Deputados fez levantar
no seu espírito tais apreensões que a Câmara entendeu suspender essa discussão.
Agora vem o Sr. Ministro das Colónias e diz-nos que não há acordo e que o documento em questão representa apenas uma das bases do empréstimo. Mas se assim é, mais uma razão para esperarmos pelo termo das negociações.
Nestas condições, a minoria monárquica não dá o seu voto para que a discussão da proposta de empréstimo se realize.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins): — Começou o Sr. Aires do Ornelas por estranhar que eu tivesse pôsto grande calor e exaltação pás palavras que há pouco pronunciei. S. Exa. não me conhece pessoalmente, porque se conhecesse não teria levantado um, tal reparo. Êsse calor e essa exaltação não significam que eu estivesse zangado. É apenas uma questão de feitio e mais nada.
Quanto ao documento a que S. Exa. se referiu, devo declarar duma maneira formal que êle não é um acordo, mas sim a sétima proposta feita pela casa Armstrong aos negociadores do empréstimo.
As negociações continuam, não estando, portanto, qualquer cousa definitivamente assente sôbre o fornecimento, da mão de obra, materiais, empreitadas, etc.
Nestas condições, eu não podia mandar publicar no Diário do Govêrno um documento que não existe.
Quanto à discussão da proposta só quando forem conhecidos os termos do acordo, eu não posso concordar com o alvitre de S. Exa.
O que é que está em discussão? É uma proposta de autorização para a realização do empréstimo. Só depois de votada essa proposta é que o Estado, por intermédio dos seus representantes, pode fazer uma operação. O contrário seria começar pelo princípio em vez de se começar pelo fim.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Delfim Casta (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: parece-me que a Câmara está laborando num equívoco.
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O que é preciso é que S. Exa. a consulte sôbre se consente que a acta seja alterada; nela se diz que a proposta de empréstimo não pode ser discutida sem a publicação da minuta do contrato. Ora, como se há-de publicar a minuta do contrato sem se votar primeiro a respectiva autorização! Requeiro, pois, a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se concorda com que seja alterada a disposição consignada na acta.
O orador não reviu.
O Sr. Nuno Simões (sobre o modo de votar ): - Sr. Presidente: não posso deixar de manter o meu ponto de vista. O Sr. Delfim Costa acusou a Câmara de um equívoco, mas quero crer que S. Exa. não foi solidário, pois que, acompanhando sempre estas questões com muito interesse certamente se achava presente na ocasião em que se discutiu a proposta do autorização.
O que, porém, é necessário é votar o requerimento do Sr. Carvalho da Silva sôbre os Transportes Marítimos. De contrário, o debate sôbre o modo de votar prolongar-se há indefinidamente.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: ao contrário do que disse o Sr. Delfim Costa, não há nenhum equívoco.
Por mais que se fale em proposta de acordo, o que interessa é saber se os negociadores ingleses, tam cautelosos na seqüência das suas disposições, ainda mantêm o disposto no artigo 29.°, pelo qual pretendiam a aprovação do Parlamento.
Um àparte do Sr. Ministro das Colónias.
O Orador: — Nestas circunstâncias, desejo declarar a V. Exa. que mantenho a minha afirmação, de que não laboramos em equívoco, pois procedemos consciente-mente e debaixo das mais graves apreensões ao votarmos como votamos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: para elucidação do Sr. Ministro, que não estava na Câmara nesse momento, devo lembrar
que foi o Sr. Presidente do Ministério quem, interrogado pelo Sr. Cunha Leal, disse que havia umas bases do acordo que estavam inteiramente adstritas á proposta de autorização
Todos concordaram e até mesmo a única pessoa que tinha defendido a proposta, o Sr. Rodrigues Gaspar, declarou que se lhe estava a atribuir aquele menino, mas que estava como se tivesse passado por uma misericórdia, já se admirando de que aparecesse com outro menino filho daquele.
Vejo que o Sr. Rodrigues Gaspar já foi entregar a criança à misericórdia e quem doía tomou conta foi o Sr. Ministro das Colónias. O que é certo, porém, é que são duas cousas adstritas — a autorização e o acordo — e que não se pode votar a proposta do empréstimo sem dependência da discussão e da votação do acordo que se refere à aplicação do dinheiro.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Da acta da sessão de 21 de Dezembro consta que o Sr. Cunha Leal fez primeiro um requerimento, e que depois, tendo-se levantado divergências na Câmara, modificou para um outro, que é o que foi aprovado na sessão de 23 de Dezembro.
O requerimento do Sr. Carvalho da Silva foi rejeitado e não houve outra deliberação, e assim o que vai entrar em discussão não é a proposta do empréstimo, mas a da lei do sêlo. Dou esta informação à Câmara para que ela fique bem elucidada sôbre o que vai votar. Porei agora à votação o requerimento do Sr. Carvalho da Silva, para que, em vez da proposta de lei que reforma a lei do sêlo, relatada pelo Sr. Velhinho Correia, entre em discussão a proposta sôbre os Transportes Marítimos do Estado.
O Sr. Ministro do Comércio (António da Fonseca): — Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa uma proposta de lei.
Um àparte do Sr. Paulo Cancela de Abreu.
O Orador: — A proposta é de remodelação dos serviços e quadros dos correios
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e telégrafos e as bases anexas que tenho a honra de propor à Câmara.
A alta importância que tem esta proposta justifica a urgência que vou pedir para ela e assim requeiro a V. Exa., Sr. Presidente, assim como peço o favor de lembrar às respectivas comissões que essa urgência seja de facto efectiva e se patenteie pelo trabalho.
Mando para a Mesa a proposta e peço urgência.
Foi aprovada a urgência.
O orador não reviu.
O Sr. Correia Gomes: — Sr. Presidente: pedi no princípio da sessão a palavra para um requerimento e até agora não me foi dada.
Eu requeria para que amanhã em primeiro lugar, com prejuízo dos oradores inscritos, entrasse em discussão o projecto n.° 442, que tem apenas um artigo.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Esta forma de trabalhar é inteiramente improdutiva, (Apoiados), e nós vemos que fica por discutir a proposta dos Transportes Marítimos do Estado que há muito está em discussão.
Uma voz: — Há meses.
Outra voz: — Há anos.
Vários àpartes.
O Orador: — Diz o Sr. Correia Gomes que o projecto tem um só artigo, mas quem nos garante que êsse artigo não leva vinte dias a discutir?
Por esta forma não se discute nada.
Parece-me que nos termos regimentais êsse requerimento não pode ser votado agora.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Lembro que o requerimento de V. Exa. não pode ser votado agora; êle será votado na sessão de amanhã, visto agora só se poder votar requerimentos adistritos à matéria.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão o artigo 2.° do projecto 617-B, au-
torização para alienar a frota marítima do Estado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Peço desculpa ao Sr. Ministro do Comércio de o ter interrompido.
Já na última sessão tive ensejo de expor ao Sr. Ministro do Comércio as razões que me levaram a concordar com os termos da proposta, embora discorde em princípio com a sua generalidade.
Agora, para não tomar muito tempo à Câmara, vou enviar desde j á para a Mesa quatro propostas, sendo uma de substituição ao artigo 2.°; as outras três são de artigos novos.
Julgo desnecessário repetir os argumentos que me levaram a elaborar estas propostas.
Chamo, porém, a atenção do Sr. Ministro para o § único por mim proposto.
Acho indispensável esta disposição para evitar que se possa fazer de futuro venda dos navios em completa liberdade.
De harmonia com as razões que já tenho exposto, redigi dois novos artigos que tendem a evitar o cambão.
No artigo 4.° antevejo uma cousa que não está prevista na lei, que é a hipótese de não aparecerem compradores para os navios.
Sr. Presidente: eu não sei o que é que o Sr. Ministro do Comércio pensa acerca da alienação dos navios a estrangeiros; eu tenho muitas dúvidas a êsse respeito, mas lembrava-me do seguinte: depois de aplicadas as disposições que proponho, o Govêrno, por proposta do Sr. Ministro do Comércio, ouvidas as associações comerciais, o Tribunal de Contas e o Conselho Superior de Finanças, isto é, autoridades competentes para emitirem o seu parecer, daria aos navios o destino que julgasse conveniente.
Se o Govêrno entendesse que poderia aplicá-los em serviço das colónias, aplicá-lo-ia; se entendesse que devia entregá-los a determinadas emprêsas ou companhias, entregá-lo-ia; se entendesse dever entregá-los ao Ministério da Marinha, entregá-lo-ia da mesma forma, mas o que é preciso é que êste assunto deixe de voltar ao Parlamento.
Chamo também a atenção do Sr. Ministro do Comércio para o artigo 5.° que proponho, que tem por fim autorizar o
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Govêrno e a comissão liquidatária a proceder a uma nova avaliação dos navios antes de os pôr em praça.
Q artigo 10.° que mando para a Mesa, pedindo a V. Exa. que o ponha em discussão na devida altura, é aquele que diz que fica revogada a legislação em contrário.
O Sr. Carlos Pereira apresentou artigos novos e propostas de substituição ou aditamento acerca dêste assunto, e há uma sôbre a qual desejava ouvir a opinião do Sr. Ministro do Comércio e da qual discordo inteiramente, porque tem por fim dar direito de opção aos actuais fretadores dos navios. Não há nada que justifique semelhante doutrina.
Qualquer indivíduo deve ir com a certeza de que cobrirá a praça com maior lance.
Parece-me que tudo quanto seja restringir a liberdade -de concurso à praça em favor de A, B ou C, porque esta disposição só vai beneficiar os actuais fretadores de navios, não deve merecer o aplauso nem do Sr. Ministro do Comércio nem da Câmara.
Sr. Presidente: isto até dá lugar a que deixem de haver concorrentes aos navios afretados, porque todos já sabem que o seu lance vai ser preterido por o daqueles que tenham afretado êsses navios. De forma que esta disposição vem prejudicar os interêsses do Estado.
Para não demorar mais esta discussão, que não tem sido demorado por culpa dêste lado da Câmara, mas, como muito bem disse o Sr. Jaime de Sousa, por culpa de alguns membros do Govêrno, mando para a Mesa as minhas emendas, devendo V. Exa. pô-las à discussão pela respectiva ordem.
Tenho dito.
O orador não reviu.
É lida e admitida a proposta de substituição do Sr. Paulo Cancela de Abreu ao artigo 2.°
É a seguinte:
Esta alienação será feita em concurso público, nas condições seguintes:
1.° Os compradores só poderão ser cidadãos portugueses, ou sociedades portuguesas, e os navios ficarão sujeitos a todas as condições estabelecidas pelo Acto Geral de Navegação, devendo, porém,
todas as respectivas tripulações, ser portuguesas;
2.° Os compradores só poderão ceder, vender ou hipotecar os navios ou fazer quaisquer transferências dos seus direitos sôbre êstes, observando-se o disposto no número anterior e com prévia autorização do Govêrno, que, no prazo de dois meses a contar da data do respectivo pedido, deverá concedê-la ou declarar que prefere exercer o direito, com que fica, de readquirir os navios sob avaliação a que se deverá proceder por dois peritos, nomeados pelas partes interessadas e por um terceiro nomeado por acordo, ou, na falta de acordo, pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;
3.° O 4.° da proposta, ficando de dez dias o prazo aí fixado;
4.° O 5.° da proposta, reduzindo a três os cinco anos aí indicados;
§ único. O disposto nos n.os 1.° e 2.° dêste artigo aplicam-se em todas as alienações futuras dos navios a que esta lei se refere.
Lisboa, 17 de Janeiro de 1924. — Paulo Cancela de Abreu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Sr. Presidente: na última sessão em que aqui só discutiram as bases em que o Govêrno pode fazer a alienação dos navios dos Transportes Marítimos do Estado, o Sr. Paulo Cancela de Abreu, que ficou com a palavra reservada, manifestou desejos de saber qual era a minha opinião acerca desta questão da utilização actual dêsses navios. Devo informar S. Exa. à que as minhas opiniões neste assunto estão fixadas e são conhecidas desde 1919. Efectivamente, quando fui Ministro das Finanças, numa larga comissão composta por todos os membros das comissões de finanças, comércio e indústria e de marinha, sustentei que a única cousa que havia a fazer aos navios dos Transportes Marítimos do Estado era vendê-los um por um em hasta pública.
Aqui tem S. Exa. como estou inteiramente à vontade e de acordo com o pensamento que orientou a proposta de lei do Sr. Pedro Pita, porque não trata ela senão de fazer em 1923 uma cousa que eu tinha proposto em 1919, com a diferença de que a operação nessa altura era
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muito mais realizável, já pelas circunstâncias da situação financeira do Estado, já pelo melhor estado dos navios e até pela situação internacional, pois toda a gente sabe que há actualmente nos diversos estaleiros do mundo um excesso de tonelagem que não é aproveitado.
Portanto, eu sou absoluta monte partidário da venda dos navios, e sou partidário de todas as propostas que possam favorecer aquela e que tendam a evitar complicações, aceitando tudo o que a Câmara quiser votar sôbre esta matéria, visto que o Govêrno não faz questão de nenhum princípio.
Aceito tudo, desde que tudo se confirme essencialmente em servir eficazmente os interêsses do Estado, facilitando quanto possível a rápida resolução da venda, ficando o listado em condições do se ver livres dêsses navios, de forma a não haver êste desiquílibrio naval que ama aba pode ser maior.
Nesse intuito me parece que algumas das propostas do Sr. Carlos Pereira estão inteiramente nestes termos.
Na realidade S. Exa. pretende deminuir os encargos.
Com efeito às formas para pagamento que a Câmara queira adoptar, nada tenho a objectar.
Mas chamo a atenção para a proposta que dá o direito de opção.
Êste direito dado a qualquer entidade não representa para o Estado nenhuma vantagem, porque as pessoas a quem êsse direito é dado só tem inconvenientes com êle.
S. Exa. manda para a Mesa a proposta para significar que é justo que se dê esta vantagem às pessoas que têm prestado ao Estado o serviço de êle não ter os barcos imobilizados.
Entende S. Exa. que é de grande vantagem para êstes homens; mas S. Exa. não ignora que esta circunstância embaraça a procura, porque muitas pessoas se recusarão a concorrer nestes termos.
Pode assim dar-se a circunstância de serem arrematados por um preço baixo por falta de concorrentes.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu mandou para a Mesa várias propostas, algumas que se referem ao artigo 2.°
Esta substituição do artigo 2.° não tem o mérito que S. Exa. entende. Pretende
S. Exa. acabar com o cambão, mas não pode deixar de reconhecer quam fácil é fazer o cambão em cartas.
Esta cousa dos sobrescritos dentro dos quais se encontram as propostas tem inconvenientes mais graves do que a venda em hasta pública.
Suponhamos que há quem ofereça por tonelada, o outro oferece duas libras e um xelim.
Evidentemente, se não houver mais concorrente, é adjudicado a quem oferece êste lanço.
Mas pela proposta do Sr. Pedro Pita, se houvesse quem oferecesse uma libra e dois xelins, ora a êste que era arrematado.
Não acha V. Exa. isto mais conveniente?
Àparte do Sr. Paulo Cancela de Abreu.
O Orador: — Diga V. Exa. o que quiser porque eu continuo a sustentar a impossibilidade de evitar o cambão, a menos que se tome a resolução de hoje metermos nu cadeia, conservando-os incomunicáveis, todos os possíveis concorrentes.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — O meu fim é cortar-lhes as voltas.
O Orador:- V. Exa. não consegue cortar nada.
Nós não somos, evidentemente, pessoas para comprar navios, mas se o fôssemos, já a estas horas estávamos fartos de conhecer os concorrentes. E nestas condições, como seria possível evitar o cambão?
O Sr. Norton de Matos: — Para vender, concurso público; para comprar em carta fechada. Não há que sair daqui.
O Orador: — É êsse o meu modo de pensar.
Referiu-se ainda o Sr. Paulo Cancela de Abreu a uma circunstância que é realmente de ponderar. Referiu-se S. Exa. às condições em que o Estado fica em relação aos barcos alienados.
Pareceu-me que V. Exa. tinha estabelecido uma outra cousa, fixa e determinada;
O que acontecerá é que a primeira praça, pela avaliação, ficará assim deserta,
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e os pretendentes irão à segunda praça, e dando-se essa facilidade apontada, ninguém iria à segunda praça e iria à terceira.
Apartes.
Entendo, pois, e que é preferível que o Estado fique autorizado a fazer a primeira praça pela avaliação.
A não ser que fôsse um louco, ninguém iria arrematar uma cousa por um preço, quando depois se pode fixar um preço mais baixo.
Como penso assim, julgo que se deveria anunciar logo a primeira e segunda praça.
Àpartes.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu falou em: se autorizar uma nova avaliação.
Essa avaliação não tem de ser autorizada, porque a avaliação já está feita, e a fazer-se uma nova avaliação isso iria demorar muito, e cada mês que passa é um prejuízo novo para o País.
Àpartes.
Para avaliar uma cousa, que se tenha de vender acautelando os interêsses do Estado, julgo-me sempre autorizado, e se eu fizesse essa nova avaliação, de certo ninguém podia dizer que eu procedia mal.
Mas há outra espécie de avaliação, que é mais importante, que é um problema suscitado pela proposta ,do Sr. Jaime de Sousa, para a qual chamo a atenção da Câmara, porque tem, vantagens e apresenta um princípio altamente moral e justo, apezar de poder ter também inconvenientes.
Parece-me que a proposta de S. Exa. é de atender; mas a Câmara deve votá-la com cautela pelas conseqüências a que pode levar.
Qual é o pensamento de S. Exa.?
É o de que à primeira praça não vai ninguém, e que os navios, antes da segunda praça, devem estar à disposição de quem os queira examinar.
Depois a adjudicação faz-se, com carácter provisório, visto que o arrematante pode requerer ao Estado que mande o navio ou navios arrematados para doca seca, a fim de haver uma vistoria, quê será paga pelo requerente.
Se dessa vistoria resultar a verificação de inavegabilidade de qualquer barco, a praça será anulada. E isto uma garantia
de que a arrematação é feita em termos absolutamente honestos.
De resto, o Sr. Jaime de Sousa — êle mesmo o disse — não inventou esta forma de praticar; ela é corrente em toda a parte onde se procede à venda de navios. Tem isto, todavia, os seus inconvenientes. Podemos correr o risco de ficar com a sucata.
Mas o Estado não perde em boa honestidade de negócio; só pode perder o trabalho de fazer nova praça.
Parece-me ter respondido às considerações aqui feitas sôbre as propostas que se encontram na Mesa.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: — Por parte da comissão de Marinha, mando para a Mesa quatro pareceres, sendo um relativo ao projecto de construção e exploração do arsenal estabelecido na margem esquerda do Tejo, e os três restantes sôbre projectos de transferências de verbas.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Nuno Simões: — Sr. Presidente: eu tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Marinha, porque desejava formular umas preguntas a S. Exa.
O Sr. Presidente do Ministério, porém, antecipou-se na resposta. Trata-se do caso dos navios que iam ao Norte por ocasião da visita do Sr. Presidente da República. Desisto portanto de falar.
O orador não reviu.
O Sr. João Camoesas: — Sr. Presidente: pedi a palavra para antes de se encerrar a sessão para tratar, na presença do Sr. Ministro da Marinha, da situação criada a certas praças da armada que tendo passado à reserva, foram ultimamente mandadas reintegrar umas e reformadas outras.
Afigura-se-me que a situação dessas praças, embora com esta atitude do Govêrno, não é de defender quer dentro do ponto de vista legal, quer dentro do ponto de vista moral.
Em primeiro lugar trata-se de praças, segundo as minhas informações, todas de bom comportamento e, em segundo lugar,
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não houve em relação a elas nenhum processo disciplinar anterior, não compreendendo eu que uma instituição militar possa viver de tal sorte que as pessoas que compõem os diversos quadros dessa mesma instituição possam ser licenciadas ou dispensadas, a não ser nos termos dos respectivos regulamentos e vencidos determinados períodos.
A situação criada a essas praças da armada não é legal e não é, justa, porque se trata de pessoas com um largo número de anos de serviço e que mais de uma vez se têm batido pela Pátria e pela República, tanto em Portugal como nas colónias, merecendo por isso serem tratadas no mesmo pé de egualdade a todos os indivíduos que compõem a instituição respectiva.
Já no outro dia disse que o único fiador do militar é o Regulamento Disciplinar ou o Código de Justiça do Exército. Se um militar comete delictos qualificados no Código de Justiça ou no Regulamento Disciplinar, a atitude a tomar para com êle só pode ser uma: puni-lo.
Fora disso, fazer qualquer cousa que possa significar prejuízo ou penalidade afigura-se-me não só injusto, mas prejudicial para o prestígio da instituição.
E porque disso estou convencido, chamo a atenção do Sr. Ministro da Marinha para tomar qualquer medida consentânea com os factos.
Se as praças delinqüiram, que sejam punidas, mas o que não deve fazer-se é punir alguém por poder, em determinada oportunidade, praticar o delicto.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva): — Sr. Presidente: devo dizer a V. Exa. o à Câmara que o facto do abatimento de um certo número de praças ao efectivo da armada não,me pertence, porque foi em resultado de resoluções do Govêrno transacto.
Quando eu assumi a pasta da Marinha procurei, em primeiro lugar, indagar quais as causas determinantes dêsse facto, tendo sido informado de que os sargentos e praças abatidos ao efectivo da armada o foram em resultado de informações dos Srs. comandantes, chefes de serviço e oficiais, que declararam que és s sés sargentos e praças faziam a bordo dos navios propa-
ganda revolucionária e dissolvente. As informações dêsses oficiais, todos chefes de serviço, e que merecem toda a confiança, foram tidas naturalmente na devida consideração.
Devo dizer a V. Exa. que se é certo serem muito para considerar as opiniões políticas republicanas de sargentos ou praças — e merecem-me respeito todas elas — devo contudo dizer que entendo que dentro do quartel ou de um navio só há que cumprir os preceitos militares, e nunca servirem-se dêsses lugares para emitir opiniões políticas.
Devo ainda dizer a V. Exa. que qualquer atitude que tome para evitar que militares possam utilizar armas em favor de qualquer paixão política; tudo quanto fizer nesse sentido faço-o em favor da Pátria, e estou convencido que V. Exas. me aplaudirão, porque entendo que armas postas nas mãos dos militares não lhes pertencem.
Não são dos generais, nem dos almirantes, nem dos comandantes, nem dos sargentos ou praças, são armas da Nação para defesa dos seus interêsses; e quando quaisquer elementos pretendam utilizar essas armas para fins diferentes daqueles que a Nação quere, êsses elementos desvirtuam o fim para que foi criado o exército.
Como Ministro da Marinha sou igualmente chefe da corporação da armada, e não devo esconder a minha pessoa ou autoridade, deixando a descoberto a pessoa do Sr. major-general da armada, do Sr. comandante do Corpo de Marinheiros e de todos os Srs. oficiais, porque, eu como Ministro, desapareço de um momento para o outro, e essas entidades existem sempre.
As pessoas podem mudar; as entidades é que não mudam.
Quanto à forma como êsses sargentos e praças foram afastados do serviço, se pelo aspecto moral se justifica porque as informações foram dadas pelos comandantes, também se justifica pelo aspecto legal, e como não pretendo deixar no espírito de V. Exa. a dúvida de que se tivessem cometido ilegalidades, fui examinar o processo, e reconheci que há um decreto do Govêrno Provisório da República, que não fui revogado, e que diz o seguinte: e todos os grumetes e segundos marinheiros graduados que forem considerados ele-
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mentos perturbadores da disciplina podem ser abatidos ao efectivo pelo comandante,do Corpo de Marinheiros». Portanto essa entidade tem essa atribuição, não precisando de despacho algum, nem de qualquer outro preceito.
Diz também êsse decreto que, quando as praças tiverem um curso superior, pode essa entidade propor o seu abatimento ao efectivo até cabos de marinha.
Daqui se conclui que, desde que haja elementos perturbadores, tanto o Sr. major general da armada como o Sr. comandante do corpo do marinheiros podem abater ao efectivo.
Diz-se que também sargentos foram abatidos ao efectivo; foram-no porque eram sargentos já todos reconduzidos, e êstes depois de reconduzidos podem ser abatidos ao efectivo da armada se à armada não convierem»
Havia simplesmente um acto que não era legal, e era que esses sargentos deviam ter sido reformados, isto é, os que tinham o tempo da lei, reconhecendo que isso de facto tinha sido uma ilegalidade já remediei o caso todos os sargentos são reformados!
Pode ter havido injustiças?
Pode, sem dúvida. Quando pela fôrça das circunstâncias um Govêrno, se decide, e muito bem a abater ao efectivo da armada elementos prejudiciais à ordem pública, pode acontecer que alguns tenham sido abatidos duma forma menos justa.
Porém o que posso afirmar é que desde que sou Ministro têm sido admitidos muitos sargentos e praças, desde que haja qualquer senhor, oficial que dê a informação que êsse sargento ou praça foi mal abatido.
Esta tem sido a minha conduta que julgo a mais conveniente quer para os interêsses da Nação quer para os interêsses da armada.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. João Camoesas: - Sr. Presidente: agradeço as explicações que o Sr. Ministro da Marinha acaba de dar, e quero frisar que não fiz nenhum ataque aos chefes e comandantes.
Concordo absolutamente com S. Exa. na parte em que disse que a marinha era fraca defesa da Nação.
De facto assim é, e o partido de que tenho a honra de fazer parte não concorda com a intervenção da fôrça armada na política, nem também com a intervenção da política na fôrça armada.
A minha intervenção é motivada pela situação política das pessoas em questão.
O Sr. Ministro da Marinha, referindo-se a um decreto do Govêrno Provisório, que disse não estar ainda revogado, afirmou que êsses sargentos e praças haviam sido abatidos nos termos dêsse mesmo decreto.
Ora, Sr. Presidente, êsse decreto foi publicado a quando da implantação da Re-pública, e posteriormente já foram publicados também muitas leis e regulamentos que naturalmente revogaram a legislação anterior;
Nestas condições, quere-me parecer que a reforma ou abatimento ao efectivo de praças só pode ser feito depois de instaurado e resolvido o competente processo disciplinar, e não por informações prestadas por quaisquer autoridades militares.
Em minha opinião, talvez por ser civil, afigura-se-me que o critério do Sr. Ministro da Marinha é discutível, e por êste motivo eu lembro os relevantes serviços prestados por ossos marinheiros, alguns dos quais se bateram em África.
Creio, portanto, que é inaplicável ao caso o decreto do Govêrno Provisório.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva): — Sr. Presidente: desejo dizer ao ilustre Deputado que sendo consultadas as repartições competentes, elas confirmaram a opinião de que êsse decreto não foi revogado, porque nesse tempo também existia o Regulamento Disciplinar.
Contudo, eu não largarei de mão o assunto, e, se realmente reconhecer que sôbre êle pode haver, dúvidas, consultarei a Procuradoria Geral da República.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Sá Pereira: — Sr. Presidente: tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Instrução Pública, porque desejava tratar com S. Exa. um caso bastante melindroso,
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Sessão de 22 de Janeiro de 1924 27
que me consta ter ocorrido no seu Ministério.
Mas, como S. Exa. não está presente, peço ao Sr. Presidente do Ministério o favor de lhe comunicar o desejo que tenho de amanhã trocar com S. Exa. antes da ordem do dia algumas palavras acerca do assunto referido.
E aproveito o ensejo para preguntar ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças como estão marchando os negócios públicos referentes à questão cambial.
Inegavelmente ela alarmou na semana passada o espírito público, mas, devido à intervenção enérgica do Parlamento o à atitude assumida pelo Govêrno, tomou uma feição mais agradável.
Contudo, creio que hoje o câmbio se agravou, o que é mau sintoma, e por isso peço a S. Exa. que me diga se o Govêrno está satisfeito com o que se tem feito até agora, ou se está na disposição de tomar mediadas mais enérgicas para que a especulação termine para sempre.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: pedi a palavra para responder ao Sr. Sá Pereira que comunicarei ao Sr. Ministro da Instrução o seu desejo, e, quanto à parte cambial, devo dizer que é do conhecimento da Câmara que votou a autorização ao Govêrno, a qual infelizmente ainda não está votado no Senado, que os factos vieram confirmar as palavras que aqui produzi, de que a alteração que se tinha dado no câmbio era uma manobra feita com intuitos inconfessáveis.
Efectivamente, quem analisar a marcha do câmbio desde o dia 9 a 21 correntes, verifica que êle atingiu o máximo no dia 17, mas imediatamente se fez sentir nele a atitude da Câmara, a sua decisão, tranqüilidade e a aprovação do uma medida que colocou na mão do Govêrno uma boa arma de combate à especulação.
Eu estou convencido, e os factos o confirmam, que as medidas já tomadas, e que agora o Parlamento completará, darão o melhor resultado.
Folguei muito até que o Sr. Sá Pereira me fizesse essas preguntas para eu ter o prazer de responder, esclarecendo V. Exa. e esclarecendo o País, que deverá ter toda a confiança no futuro.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã, 23, às 14 horas, com a seguinte ordem de trabalhos:
Antes da ordem do dia: A de hoje, menos a proposta de lei n.° 617-B.
Ordem do dia:
A de hoje, menos a proposta de lei n.° 634, e em primeiro lugar;
Proposta de lei n.° 617-B, que autoriza o Govêrno a proceder à alienação dos navios que constituem- a frota marítima do Estado.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Propostas de lei
Do Sr. Ministro do Comércio, autorizando o Govêrno a reorganizar os serviços dos correios, telégrafos, telefones, semáforos e fiscalização das indústrias eléctricas, sob os princípios de designadas bases.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de correios e telégrafos.
Para o «Diário do Governo».
Do Sr. Ministro das Finanças, sujeitando a custas os processos contenciosos relativos às contribuições e impostos julgados pelas comissões criadas pelo artigo 74.° da lei n.° 1:368.
Para o «Diário do Governo».
Parecer
Da comissão de legislação civil e comercial, sôbre o n.° 606-D, que autoriza a junta da freguesia de Ai pendurada a vender os baldios julgados dispensáveis.
Para a comissão de finanças.
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28 Diário da Câmara dos Deputados
Requerimento
Requeiro que pelo Sr. Ministro da Instrução Pública me sejam fornecidas com toda a brevidade possível:
Cópia do despacho que suspendeu a Janta Escolar de Elvas, e da informação ou informações que o determinaram.
Cópia do despacho que anulou o que suspendeu a citada Junta Escolar e igual-
mente da informação ou informações que o motivaram.
Cópia das passagens referentes à mencionada Junta que se encontram na sindicância instaurada ao professor Mourato de Almeida, do concelho de Elvas, e bem assim do relatório do respectivo sindicante. — João Camoesas.
Expeça-se.
O REDACTOR—Herculano Nunes.