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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 45
EM 27 DE FEVEREIRO DE 1924
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário.— Aberta a sessão com a presença de 41 Sm. Deputados, foi lida a acta e deu-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Carlos Pereira una da palavra sobre as disposições do decreto n.° 9:435.
O Sr. Maldonado Freitas pede que a Moagem seja obrigada a satisfazer os seus débitos ao Estado e defende as disposições do decreto n.° 9:435 atacadas pelo Sr. Carlos Pereira.
Entra em discussão a proposta de lei n.º 658, dos Sra. Ministros das Finanças e Comércio, transferindo verbas no orçamento do Ministério do Comércio.
Sôbre a generalidade, usa da palavra o Sr. Carvalho da Silva.
A proposta é aprovada na generalidade e na especialidade, sendo dispensada a leitura da última redacção.
O Sr. Ministro do interior (Sá Cardoso) requere que se inscreva para antes da ordem, da seguinte sessão, o parecer ra.° 569.
O requerimento é aprovado, depois de usar da palavra sôbre o modo de votar o Sr. Carvalho da Silva.
A aprovação é confirmada em contraprova.
Entra em discussão o parecer n.º 651, sôbre a proposta de lei n.° 648-1, que altera o artigo 1.° da lei n.° 1:356, de 15 de Setembro de 1922.
Sôbre a generalidade pronunciam-se os Srs. Alberto Jordão, Carvalho da Silva, António Correia e Tôrres Garcia.
É rejeitado, confirmando-se a rejeição em contraprova, um requerimento do Sr. Carvalho da Silva para que prossiga a discussão com prejuízo da ordem do dia.
O Sr. Agatão Lança requere, e é aprovado, que a discussão prossiga até à reunião do Congresso.
Continuando a discussão, usam ainda da palavra sôbre a generalidade os Srs. Francisco Cruz, Américo Olavo, Sarros Queiroz, Ministro do Interior (Sá Cardoso) e Correia Gomes.
Aprovada a generalidade.
Entra em discussão o artigo 1.°
Sôbre êle usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Alberto Jordão e Correia Gomes, que apresenta uma proposta de nova redacção, que é admitida,
É aprovada a acta da sessão anterior.
É comunicada a substituição de dois membros de uma comissão.
É admitido um projecto de lei.
Interrompem-se os trabalhos para se reunir o Congresso.
Reaberta a sessão, entra-se na ordem do dia.
Ordem do dia.— Continuação do debate sôbre a interpelação do Sr. Cunha Leal ao Sr. Ministro das Colónias acerca dos Altos Comissariados.
Usa da palavra o Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins), ficando com ela reservada.
Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Tavares de Carvalho ocupa-se da carestia de vida e o Sr. Carvalho da Silva da modificação do regulamento da lei sôbre o imposto de transacções, respondendo-lhes o Sr. Ministro do Interior.
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem.
Abertura da sessão, às 15 horas ê 35 minutos.
Presentes à chamada, 41 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 63 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal.
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Albino Pinto da Fonseca.
Amadeu Leito de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio do Azevedo.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António de Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Resende.
António Vicente Ferreira,
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Carlos Cândido Pereira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
João Cardoso Moniz Bacelar.
Joaquim António do Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
José Cortês dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís dd Costa Amorim.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Tomé José de Barros Queiroz
Ventura Malheiro Reimão.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a Sessão:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Lino Neto.
António de Paiva Gomes.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Francisco Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Estêvão Águas.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Júlio Henrique de Abreu.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegro.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Nuno Simões.
Plínio Octávio do Sant’Ana e Silva.
Vasco Borges
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
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Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Lelo Portela.
Alberto do aloura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Américo da Silva Castro.
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Maria da Silva.
António de Sousa Maia.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Pires do Vale.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Eugénio Rodrigues Aresta
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
João Baptista da Silva.
João Luís Ricardo.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
José Carvalho dos Santos.
José Joaquim Gomos de Vilhena.
José Miguel Lamartine Prazeres da Couta.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José do Oliveira da Costa Gonçalves.
José do Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalve.
Juvenal Henriques de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel da Sousa Dias Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Vergílio da Conceição Costa.
O Sr. Presidente: — (às 15 horas e 40 minutos): — Estão presentes 41 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Leu-se a acta e o seguinte
Telegramas
Da Associação dos Armadores e Agentes da Navegação do Pôrto, pedindo para não serem alteradas as taxas das Cartas de Saúde.
Do pessoal de finanças de Setúbal e Cadaval, pedindo o cumprimento das leis sôbre melhorias.
Para a Secretaria.
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia e tem a palavra o Sr. Carlos Pereira.
Antes da ordem do dia
O Sr.. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: segundo li nos jornais, o Sr. Ministro do Trabalho esteve no Senado. Não sei a razão por que S. Exa. fez o propósito de não vir a esta casa do Parlamento dar conta do decreto n.° 9:435, decreto que é inconstitucional e até escandaloso. O Sr. Ministro do Trabalho permitiu-se, não sabemos com que juízo, conceder uma licença permanente a um funcionário que tem a obrigação de trabalhar todos os
Mário de Magalhães Infante.
O Sr. Ministro do Trabalho, para desmentir o nome do seu Ministério, decretou que êsse funcionário tivesse uma licença permanente, sobrecarregando assim outro funcionário que ficou com todo o trabalho
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que no hospital cabia à pessoa beneficiada com a licença.
O Sr. Ministro do Trabalho, não sabemos com que intuito, quis reformar o inspector do mesmo hospital; como, porém, isso representava um acto ilegal, a pretensão de S. Exa. não foi por diante e agora parece que está no propósito de não vir à Câmara dar explicações dos seus actos, mas eu também estou no propósito, Sr. Presidente, de não deixar êste assunto, isto é, de falar todos os dias sôbre êle, até que o Sr. Ministro do Trabalho se resolva a vir aqui,
Hei-de, Sr. Presidente, empregar todos os meus esfôrços no sentido de que êste estado de cousas não continue, usando para isso de todos os meios ao meu alcance. S. Exa., quer queira, quer não queira, há-de aqui vir dar contas dos seus actos e há-de revogar todas as disposições inconstitucionais e escandalosas do regulamento que publicou.
Não querendo cansar mais a Câmara, visto mesmo nada mais ter que fazer senão malhar em ferro frio, espero no emtanto, que, de tanto malhar, êle venha a aquecer, e fico me por aqui até à próxima sessão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar ao ilustre Deputado Sr. Carlos Pereira que transmitirei ao meu colega do Trabalho as considerações que S. Exa. acaba de fazer.
É lido um oficio do Senado, comunicando que por lapso havia marcado a sessão do Congresso para hoje, às 15 horas e 30 minutos, quando deveria ser marcada para as 17 horas e 30 minutos.
O Sr. Maldonado Freitas: — Sr. Presidente: se bem que não esteja presente nem. o Sr. Ministro da Agricultura, nem o Sr. Ministro do Trabalho, vou fazer as considerações que desejo formular, esperando que o Sr. Ministro do Comércio, que se encontra presente, faça o favor de as transmitir aos seus colegas.
Desejo referir-me, em primeiro lugar, a um assunto de muito interêsse para a Câmara.
Consta, Sr. Presidente, que, por efeito de uma portaria publicada não há muito tempo, foi abolido o imposto de transacções sôbre todas as farinhas destinadas ao fabrico de pão, portaria essa que veio restabelecer o que se achava revogado pela lei a.° 1:368 na parte respeitante a farinhas.
O facto é que, em virtude disto, se vai dar à Moagem, em prejuízo do Estado, um benefício de perto de 30:000 contos.
Se bem que o Sr. Ministro da Agricultura tivesse, numa reunião, feito declarações importantes, o certo é que desta forma vai entregar à Moagem uma quantia avultada em prejuízo do Estado.
Êste assunto é da máxima importância e pena tenho de que êle seja levantado por uma pessoa, como eu, que não possui dotes oratórios.
Não apoiados.
Mas sou honrado e patriota e desejo uma República honesta e por isso me manifesto assim.
Apoiados.
Referindo-me agora, Sr. Presidente, ao assunto aqui levantado pelo ilustre Deputado Sr. Carlos Pereira relativamente ao Hospital de D. Leonor, devo dizer que S. Exa. foi mal informado.
Não há a imoralidade que se aponta com respeito ao inspector que está ha sete meses sem ir ao estabelecimento termal. S. Exa. acha-se dentro da lei e o mesmo sucede em todos os países, além de que S, Exa. está encarregado de fazer a estatística, que pode fazer em qualquer lugar.
O Sr. Carlos Pereira e os seus amigos que vejam bem o que por lá há de muito mais grave. Ao pessoal devem-se há dois meses os ordenados.
Deve-se à fábrica Vulcano, deve-se às fábricas de Guimarães. Para isto é que o Sr. Carlos Pereira e os seus amigos deviam olhar; para o estado antiquado em que se encontra êste estabelecimento, que está em condições inferiores aos estabelecimentos análogos do tempo do Marquês de Pombal.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio (António da Fonseca): — Pedi a palavra para dizer ao Sr. Maldonado de Freitas que transmitirei aos meus colegas as considerações de S. Exa.
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O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão a proposta de lei 11.° 658.
Leu-se.
É a seguinte:
Proposta de lei
Artigo 1.° — São transferidas, no orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações, em vigor para o actual ano económico, do capítulo 12-A; «Fundo de Protecção à Marinha Mercante e portos nacionais», e dos artigos 115.°-F, «Prémios de Construção», e 155.°-G, «Caixa de Previdência e Assistência dos Oficiais e Tripulantes da Marinha Mercante», respectivamente, as quantias de 4:302.793$46 e 1:075.968036, para o capítulo 4.°, «Administração Geral das Estradas e Turismo», pela forma seguinte: artigo 32.°, «Reparação de Estradas», 5:000.000$; artigo 35.°, «Construção de Estradas de 1.ª e 2.ª ordem», 300.000$; artigo 36.°, «Construção e reparação estradas e caminhos não incluídos na rede do Estado», 78.491$82.
Art. 2.° A verba de 5:000.000$, a que se refere o artigo anterior, será exclusivamente destinada à reparação, com pavimentos aperfeiçoados, das estradas nacional n.° 67 (Lisboa a Cascais) e distritais n.° 151 (Lisboa a Sintra) o n.° 153 (Cascais a Sintra), devendo, quanto à primeira, executar-se gradualmente, o novo traçado já aprovado pelas estações competentes do Ministério do Comércio e Comunicações.
§ único. É autorizada a Administração Geral das Estradas e Turismo a promover e aceitar o concurso que, em dinheiro, materiais ou trabalho possam prestar-lhe, para a reparação das estradas referidas neste artigo, quaisquer entidades ou particulares.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Em Fevereiro, de 1924.— O Ministro das Finanças, Álvaro de Castro — O Ministro do Comércio e Comunicações, António Fonseca.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: apenas dois minutos para declarar a V. Exa. e à Câmara que votamos a proposta, pois é indispensável atender à situação em que se encontram as estradas, que, apesar da elevação dos° impostos
criados pela República, nada têm beneficiado.
Longas considerações teria a fazer, mas guardo-as para depois, visto que não queremos prejudicar a proposta de aumentos à polícia.
Foi aprovada a proposta na generalidade.
Foi aprovada na especialidade, sem discussão.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Ministro do Interior (Sá Cardoso): — Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que entre amanhã em discussão, antes da ordem do dia, o parecer n.° 569, que estabelece melhorias de vencimentos por trabalhos extraordinários.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: não podíamos continuar neste regime que prejudica o tempo que é destinado para se tratar de assuntos de interêsse nacional, que não cabem noutra altura da sessão.
Apoiados.
O Sr. Presidente: — V. Exa. não está falando sôbre o modo de votar.
O Orador: — A maioria pode vencer os nossos propósitos pelo número, mas nós também podemos entrar no caminho das violências.
Vários apartes.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se o requerimento do Sr. Ministro do Interior. Procedeu-se à votação.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro a contraprova o invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procedeu-se à contagem para a contraprova.
O Sr. Presidente: — Estão de pé 21 Srs. Deputados e sentados 38.
Está aprovado.
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O Sr. Carvalho da Silva: — As violências da maioria hão-de acabar!
Desprezam-se as questões importantes como a do pão!
O Sr. Presidente: — Vai ler-se o parecer n.° 651, sôbre a proposta de lei que aumenta os vencimentos ao pessoal da corporação da polícia cívica do País.
O Sr. Pedro Pita: — Requeiro a V. Exa., Sr. Presidente, se digne consultar a Câmara-sobre se dispensa a leitura.
Consultada a Câmara, foi dispensada a, leitura.
O parecer é o seguinte:
Parecer n.° 651
Senhores Deputados. — A situação da corporação da polícia cívica do pais impõe-se à atenção e ao estudo do Parlamento.
As más condições materiais do seu pessoal têm causado embaraços e trazido aos seus serviços dificuldades e imperfeições que urge remediar.
A tanto se destina a proposta de lei n.º 648-I, de autoria do Sr. Ministro do Interior, à qual esta comissão de administração pública dá parecer favorável.
Pertence à comissão de finanças o estudo dessa proposta sob o ponto do vista financeiro, estabelecendo os limites e os termos em que deve ser estabelecida a melhoria de situação dêsses funcionários.
Para ola, pois, esta comissão envia a proposta ministerial, que confia ao seu ponderado estudo; simplesmente parece a esta comissão que para uma equitativa distribuição dos benefícios a conceder à polícia deve ser revogada a disposição do § 2.° do artigo 8.° do decreto de 27 de Maio de 1911, e essa revogação lembra e propõe como matéria dum artigo novo.
Sala das sessões da comissão de administração pública., 11 do Fevereiro de 1924.— Carlos Costa — Alfredo de Sousa — Custódio de Paiva - Alberto Vidal — Abílio Marçal.
Senhores Deputados. — À apreciação da vossa comissão de finanças foi presente a proposta de lei n.° 648-1, da autoria dos Exmos. Srs. Ministros do Interior e Finanças, destinada a melhorar os vencimentos da polícia do país e que no momento que
passa estão sofrendo horrivelmente com o custo da vida.
De há muito que as polícias do país sentem êsse pêso esmagador e de há muito também que o Govêrno tem pensado em lhe melhorar as agruras da vida.
E como o Estado não pode nem deve manter em situação precária aqueles que o servem e muito menos o deve fazer com as organizações que têm a seu cargo a manutenção da ordem e a defesa dos cidadãos, o Sr. Ministro do Interior e o Sr. Ministro das Finanças entenderam e muito bem que deviam trazer à Câmara a presente proposta de lei.
Entende a vossa comissão de finanças que os serviços do segurança pública, especialmente em Lisboa e Pôrto, necessitam duma forte reorganização, não só quanto ao número e qualidade do que têm de servir nessas organizações, mas também à distribuição dos serviços e à forma do melhor servirem os interêsses das populações e do Estado.
Como, porém, essa forte reorganização não pode ser feita tam ràpidamente quanto o exigem as necessidades dos que trabalham, a vossa comissão de finanças aceita como remédio de momento a solução apresentada na, proposta indicada.
Alguns reparos lhe merece á proposta de lei n.° 648-I. como sejam os seguintes:
Propõem-se gratificações especiais e mensais para vários indivíduos, de entre as quais a vossa comissão de finanças concorda com as que respeitam aos professores, aos telefonistas o inspectores da polícia, não concordando com as outras por ter reconhecido a sua não justificação, por circunstâncias que julga supérfluo estar a enumerar.
Colocam-se os agentes da polícia de investigação em situação do inferioridade à, dos cabos efectivos, quando êstes, para poderem ingressar no quadro dos agentes, têm de submeter-se a concurso especial, sendo certo que os agentes em todas as organizações da polícia foram sempre classificados em primeiro lugar.
Procura-se reduzir a porcentagem aos reformados da polícia, quando a maior parte dêstes infelizes passam uma vida aflitíssima, devido à doença, que os obriga a despesas extraordinárias com o seu tratamento, tornando-lhes mais difícil o fim da vida e postergando-se, sem nada
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que o justifique, a doutrina da portaria n.º 3:520, do 28 de Março de 1923, que lhes lixou a pensão de reforma em 75 por cento dos do activo.
Em todas as organizações da polícia os reformados eram-no sempre com os vencimentos por inteiro, como base do direito que lhes estava consignado; a isso valia o cofre de pensões, cujos fundos davam os rendimentos suficientes para tal, e quando os não possuísse, as aposentações eram limitadas a 80 por cento das disponibilidades do cofre, salvo êrro.
Como, segundo as informações colhidas, essas disposições não têm sido mantidas pelo conselho administrativo, entende a vossa comissão de finanças que cumpre ao Sr. Ministro do interior velar pelo cumprimento da lei neste caso.
Verificou a vossa comissão de finanças que a direcção da polícia de investigação criminal n ao está servida por chefe de secretaria privativo, de que pode resultar, e resulta; anomalia em serviços daquela importância, resultando estar muitas vezes impedido nesse serviço um agente do activo, com prejuízo dos serviços que no activo pode prestar.
Propõe a vossa comissão de finanças que nesse lugar seja provido um chefe de investigação na situação de reforma, que não tenha menos de dez anos nessa categoria, sem que do seu provimento resulte a menor despesa para o Estado.
Nestes termos, a vossa comissão de finanças entendeu que devia substituir a proposta de lei n.° 648-1 por um projecto de sua iniciativa, onde se procurou atender às reclamações que lhe foram apresentadas sôbre a proposta o se procura acautelar o melhor possível os interêsses do Estado.
É êste, pois, Srs. Deputados, o parecer da vossa comissão de alianças, sôbre a proposta de lei n.º 648-I, que procuramos substituir pelo projecto que segue:
Artigo 1.° O art. 1.° da lei 11.° 1:356, de 15 de Setembro do 1922, fica alterado da seguinte forma:
Artigo 1.º Para efeito da aplicação da lei do melhoria de vencimento à polícia cívica de Lisboa e Pôrto, serão aplicados os seguintes vencimentos mensais, sôbre os quais receberão as porcentagens da tabela n.° 4:
[Ver valores da tabela na imagem]
Chefes efectivos da polícia de investigação criminal, administrativa e segurança pública o secretários da polícia de Lisboa e Pôrto.
Sub-chefes e sub-secretários
Agentes e cabos efectivos
Cabos graduados
Guardas:
1.ª classe
2.ª classe
Com mais de um ano de serviço
Com menos de um ano de serviço
§ único. As restantes corporaçõesda polícia cívica do continente e dos distritos autónomos das ilhas adjacentes será aplicada a disposição dêste artigo com a dedução de 25 por cento nas quantias mensais indicadas.
Art. 2.° Os vencimentos dos agentes e cabos efectivos, cabos graduados e guardas de qualquer classe da polícia, de Lisboa e Pôrto serão acrescidos, da, importância diária de 1$50, como auxílio de fardamento, alterando-se assim o disposto no artigo 4.° da lei 1:097, de 29 de Dezembro de 1920, e os das restantes polícias do País da importância diária de 1$ pelo mesmo fim.
Art. 3.° Os funcionários de que trata o artigo anterior perceberão mais, acrescidas aos seus vencimentos, as seguintes quantias diárias por readmissão;
[Ver valores da tabela na imagem]
Em Lisboa e Pôrto:
Aos 5 anos de serviço
Aos 10 anos de serviço
Aos 15 anos de serviço
Nos restantes distritos do País:
Aos 5 anos de serviço
Aos 10 anos de serviço
Aos 15 anos de serviço
Art. 4.° Os professores de francês e inglês, os telefonistas e os instrutores, da polícia cívica de Lisboa, terão direito às seguintes, gratificações mensais:
1 professor de francês
1 professor de inglês
3 instrutores a
4 telefonistas a
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§ único. Ao pessoal equivalente que actualmente existe na polícia do Pôrto será aplicada a disposição dêste artigo.
Art. 5.° É revogado o § único do artigo 4.° da lei n.° 1:097, de 29 de Dezembro de 1920.
Art. 6.° O pessoal aposentado das polícias do País continuará a perceber 75 por cento do total dos vencimentos melhorados por lei para o pessoal em activo serviço, percentagem que lhe foi fixada 'pela portaria n.° 3:520, de 28 de Março de 1923.
Art. 7.° A secretaria da polícia de investigação criminal de Lisboa terá à sua frente um chefe da mesma polícia na situação de reforma, que conte pelo menos dez anos naquela categoria.
§ 1.° O chefe de polícia que fôr nomeado nos termos desta lei não terá direito a qualquer aumento no seu vencimento ou pensão de reforma, pelo desempenho das suas funções, mas todavia participará, como os agentes, dos emolumentos que a êstes cabem.
§ 2.° A nomeação nos termos dêste artigo será feita pelo Ministro do Interior a seguir à publicação desta lei.
Art. 8.° O quantitativo das multas a que se refere a artigo 486.° do Código Penal em vigor é, por efeito da sua actualização, elevado a 300$.
Art. 9.° São elevadas ao duplo todas as multas em geral, fixadas pelos vários regulamentos em vigor, cuja imposição cabe às diferentes polícias do País.
§ 1.° A pena de multa aplicada em processo sumário policial não está sujeita ao aumento a que se refere êste artigo, mas será variável de dez a dois mil escudos.
§ 2.° A indemnização a que alude o artigo 34.° do decreto n.° 8:435 será também variável de vinte a quinhentos escudos, e substituível como a multa por prisão à razão de quatro escudos por dia.
Art. 10.° É elevada ao décuplo a tabela de emolumentos policiais a que respeita o artigo 147.° do decreto n.° 4:166, de 27 de Abril de 1918, e colocada em pleno vigor, com aplicação a todas as polícias do País.
Art. 11.° Os emolumentos atribuídos ao director da Polícia de Investigação Criminal e seus adjuntos serão iguais aos que actualmente recebem o director
da Polícia Administrativa e o comissário geral de polícia, para o primeiro, e aos que recebe o comissário adjunto para os segundos.
Art. 12.° As despesas do expediente da Polícia de Investigação Criminal, até ao fim do corrente ano económico, serão pagas pelo Conselho Administrativo da polícia, do produto das multas que ali dão entrada, depois de visadas pelo director da Polícia de Investigação Criminal.
Art. 13.° Pela aplicação das multas nos termos dos artigos 8.° e 9.° e seus parágrafos, e actualização de emolumentos nos termos do artigo 10.°, todo o seu produto reverterá para o Estado, cabendo aos funcionários que dumas e de outros comparticipem, apenas a mesma importância que lhes cabia antes da entrada desta lei em vigor, sem prejuízo do disposto nos artigos 11.° e 12.° desta lei.
Art. 14.° O director da Polícia de Investigação Criminal enviará ao Ministério do Interior, devidamente documentado e até o dia 10 de cada mês, mapa discriminativo das contas da receita e despesa do cofre daquela polícia.
Art. 15.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da comissão de finanças da Câmara dos Deputados, 14 de Fevereiro de 1924. — T. J. Sarros Queiroz (com declarações) — Jorge Nunes (com declarações) — M. Ferreira de Mira (com declarações)— Crispiniano da Fonseca (vencido em parte) — Alfredo de Sousa — Constâncio de Oliveira (com declarações) — Júlio de Abreu (com declarações) — Paiva Gomes (com declarações) — Lourenço Correia Gomes, relator.
Proposta de lei n.° 648-I
Senhores Deputados. — Considerando que as corporações policiais dentro dos princípios fundamentais duma sociedade organizada constituem a garantia da sua própria estabilidade moral e jurídica;
Considerando que a situação em que actualmente se encontram as diferentes polícias do país é deveras precária devido ao agravamento das nossas condições económicas e financeiras;
Considerando a imediata e absoluta necessidade de manter os corpos de polícia em condições de poderem velar pelo direi-
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to que a cada um pertence, impondo com independente autoridade o necessário cumprimento das leis;
Considerando que essa manutenção só poderá efectivar-se se aos organismos policiais fôr facultada pelo Estado a condição de desempenharem a sua função com independência e honestidade;
Considerando que os actuais vencimentos das corporações policiais não constituem remuneração suficiente de missão tam árdua e arriscada como é a que pertence a cada um dos elementos que as compõem.;
Considerando que urge evitar o despovoamento das esquadras policiais pela razão da insuficiência de remuneração;
Considerando que para ocorrer a tal encargo se torna possível o aumento das receitas que as polícias cobram para o Estado, pela actualização de multas, licenças e outras fontes de receita; Considerando que é de toda a justiça que se estenda aos contraventores da lei o pagamento das multas de harmonia com a desvalorização da moeda, porquanto, não é racional que todo o cidadão pague as cousas necessárias à vida por vinte e mais vezes o seu antigo custo e os infractores das disposições legais estejam beneficiando com a estabilidade das multas que por leis antigas foram fixadas;
Considerando que o aumento resultante dessa actualização está computado aproximadamente num rendimento de 3:300.000$ anuais pelo que diz respeito à polícia de Lisboa;
Considerando que as receitas provenientes das restantes polícias, incluindo a do Pôrto, podem resultar um rendimento igual ou até superior ao que vem a dar a de Lisboa;
Considerando ainda que vai ser apresentada à Câmara dos. Deputados uma proposta de lei criando o imposto de segurança pública, o qual deve produzir receita apreciável para o Estado; por isso, temos a honra de apresentar a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° O artigo 1.° da lei n.° 1:306, de 15 de Setembro de 1922, fica alterado da seguinte forma:
Artigo 1.° Para o efeito da aplicação da lei de melhoria de vencimentos à polícia cívica de Lisboa e Pôrto, serão apli-
cados os seguintes vencimentos mensais, sôbre os quais recairão as percentagens da tabela n.° 4:
[Ver valores da tabela na imagem]
Chefes efectivos da polícia de segurança
Chefes de polícia de investigação criminal e administrativa
Sub-chefes e sub-secretários
Cabos efectivos
Agentes
Cabos graduados
Guardas de 1.ª classe
Guardas de 2.ª classe:
Com mais de um ano de serviço
Com menos de um ano de serviço
§ 1.° Os secretários das polícias de Lisboa e Pôrto terão de melhoria a importância bastante para que somada com os seus vencimentos perfaça um quantitativo igual à totalidade dos vencimentos e melhoria de um chefe de polícia.
§ 2.° AS restantes corporações de polícia cívica do continente e dos distritos autónomos das ilhas adjacentes será aplicada a disposição dêste artigo, com a dedução de 40 por cento nas quantias mensais indicadas.
Art. 2.° Aos cabos efectivos e agentes, cabos graduados o guardas de qualquer classe será abonada, além dos seus vencimentos, a importância diária de 1$50 para auxílio de fardamento, ficando por esta forma alterado o disposto no artigo 4.° da lei n.° 1:097, de 29 de Dezembro de 1920, pelo que respeita à polícia cívica de Lisboa e Pôrto.
§ único. Ao pessoal equivalente das restantes polícias do país será abonada a importância diária de 1$, para os efeitos dêste artigo.
Art. 3.° Os funcionários de que trata o artigo anterior perceberão além dos vencimentos citados as seguintes gratificações diárias de readmissão:
[Ver valores da tabela na imagem]
Em Lisboa e Pôrto:
Aos cinco anos de serviço.
Aos dez anos de serviço
Aos quinze anos de serviço
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[Ver valores da tabela na imagem]
Nos restantes distritos:
Aos cinco anos de serviço
Aos dez anos de serviço
Aos quinze anos de serviço
Art. 4.° Os mecânicos, electricistas, telefonistas, chauffeurs e identificadores do pôsto antropométrico e outros especializados nos diversos serviços a seu cargo, da policia cívica de Lisboa, terão direito mensalmente às seguintes gratificações:
1 mecânico
1 electricista
4 telefonistas a
8 chauffeurs a
19 identificadores
3 enfermeiros a
2 praticantes de farmácia a
3 instrutores a
1 professor de francês
1 professor de inglês
§ único. Ao pessoal equivalente que actualmente existe na polícia do Pôrto deverá ser aplicada a disposição dêste artigo.
Art. 5.° As disposições dos artigos 1.° e 2.° desta lei entram em vigor, para as polícias de Lisboa e Pôrto, a partir de 1 de Janeiro de 1924.
§ único. Os abonos resultantes da aplicação dêste artigo não são extensivos aos funcionários que à data da publicação dêste diploma tenham sido expulsos, demitidos OD despedidos.
Art. 6.° Ao pessoal aposentado das polícias competirá um vencimento total, melhorado, igual a 55 por cento dos vencimentos melhorados, do pessoal de igual categoria em actividade, excepto para os guardas de 1.ª e 2.ª classe, cuja percentagem será de 60 por cento, considerando os de 2.ª classe como tendo mais um ano de serviço.
§ único. Nenhum aposentado das polícias perceberá, pela aplicação desta lei, menor vencimento melhorado do que aquele que lhe competia pela aplicação da portaria n.° 3:520, de 28 de Março de 1923.
Art. 7.° O quantitativo das multas a que se refere o artigo 486.° do Código Penal em vigor será, por efeito da sua actualização, elevado a 300$.
Art. 8.° Pelo que respeita a multas em
geral, cuja imposição cabe às diferentes polícias, e estão fixadas pelos vários regulamentos em vigor, é o seu quantitativo elevado até vinte vezes.
Art. 9.° Pela aplicação das multas nos termos dos artigos 7.° e 8.° 'reverterá todo o produto da sua actualização para o Estado, cabendo aos funcionários que por lei comparticipem delas apenas a mesma importância que lhes caberia se a multa fôsse aplicada antes desta lei entrar em vigor.
§ único. A doutrina dêste artigo tanto se aplica às multas em geral como aos emolumentos a cobrar, cuja parte excedente na sua totalidade igualmente reverterá para o Estado.
Art. 10.° É restabelecida para os efeitos da aplicação desta lei aos emolumentos das polícias a tabela á que se refere o artigo 147.° do revogado decreto n.° 4:166.°, de 27 de Abril de 1918.
Art. 11.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões, 6 de fevereiro de 1924. — O Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, Álvaro Xavier de Castro — O Ministro do Interior, Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Entra em discussão na generalidade,
O Sr. Alberto Jordão: — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer a V. Exa. e à Câmara que, em princípio, e de um modo geral, acho absolutamente justa e de aprovar a doutrina constante do parecer que está em discussão e se refere à melhoria de situação da corporação da polícia cívica do país.
Por várias vezes têm sido atendidas as reclamações do funcionalismo público, constituído, em grande parte, por revolucionários civis, mas tem sido sempre esquecida a polícia, lançando a corporação à margem, como se na verdade ela não desempenhasse uma importante função na nossa sociedade.
Não hesita êste lado da Câmara em dar a sua aprovação à doutrina constante do parecer, doutrina essa de tal forma moldada que não de lugar a irregularidades na sua execução, e a impressão de que não temos uma noção exacta das necessidades da corporação da polícia, quer seja a de Lisboa, quer seja a do Pôrto, quer seja a das províncias.
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Se, pois, êste lado da Câmara dá o seu voto de aquiescência ao parecer em discussão, não deixa de acrescentar que seria muito conveniente que pudéssemos ir mais além na pequena distribuição que se vai fazer.
E certo que as circunstâncias em que se encontra o Tesouro não permitem esbanjamentos, mas como em determinadas emergências tem havido tantas e tantas facilidades, ao menos que se abra agora um pouco a porta da benesse para se atender às reclamações da polícia, que bem dignas são de tomar em consideração.
Reparando, porém, no projecto, verifica-se que mais uma vez se estabelece uma diferença demasiadamente sensível entre a corporação de Lisboa, do Pôrto e a das províncias.
Assim é que se estabelece uma dedução de 25 por cento na polícia das províncias, relativamente à de Lisboa e Pôrto.
Não concordo com essa diferença, de remuneração.
Estabeleça-se, embora, qualquer diferença, mas a que se propõe é demasiada.
Hoje a vida não é só cara em Lisboa, é cara em todo o país, e se porventura existe ainda uma pequena diferença no que respeita às rendas das casas, o certo é que géneros há de primeira necessidade que na província custam muito mais caros do que na capital.
Aponto, por exemplo, o que se passa com a batata que nas cidades provincianas se está já vendendo à razão de 2$ por cada quilograma, quando em Lisboa se obtém mais barata.
Também não estou de acordo, com a diferença que se estabelece relativamente ao fardamento dos homens que constituem a corporação da polícia, por não se me afigurar razoável, visto que o pano é, por via de regra, fornecido pelas mesmas fábricas, custando o mesmo preço.
Aprovando, por conseqüência, em princípio, a intenção que transparece do parecer, qual é a de melhorar as condições de vida da polícia do país, reservo-me para, na especialidade e à medida que forem sendo discutidos os diferentes artigos, apresentar algumas propostas de emenda.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: não usamos nós, adversários intransigentes do regime, os processos que os republicanos adoptaram no tempo da monarquia, combatendo a polícia e tudo que representasse o princípio da autoridade, propaganda de que, aliás, o país está a colhêr os frutos que todos vêm.
Apesar de adversários intransigentes do regime, somos cada vez mais partidários do princípio da autoridade, somos cada vez mais respeitadores do princípio da ordem, por entendermos que é preciso prestigiar e dar mais fôrça à polícia e a tudo que represente, repito, o princípio da autoridade.
Seja a polícia composta de republicanos ou não republicanos, isso para nós pouco importa, porque a polícia, representando o princípio da autoridade, tem de ser respeitada por todos aqueles que tenham a noção do perigo.
Presta a polícia relevantes serviços à sociedade, e a nenhuma corporação mais que à polícia incumbe o dever de ser paga como deve, porque, além de a vida estar cada vez mais cara, a missão da polícia é cada vez mais espinhosa e mais árdua, mercê da propaganda e da obra da República.
Nestas condições, só é de admirar que há mais tempo se não tenham atendido as justíssimas reclamações da polícia de todo o país.
Dando o nosso voto ao projecto, não quero dizer que concordemos com o quantitativo a estabelecer.
No emtanto, estamos dispostos a não retardar a aprovação desta proposta, contribuindo assim para que à polícia sejam dados aqueles vencimentos a que ela tem direito, uma vez que os actuais apenas habilitam a morrer de fome.
Não podemos, porém, deixar de reconhecer que êste processo de melhorar a situação de quem precisa, pelas suas já conhecidas conseqüências, não é aquele que o Parlamento devia seguir.
O único processo seguro está no barateamento da vida.
Infelizmente, é isso que nós não vemos.
O que tem feito o Govêrno nesse sentido?
Quais são as medidas que o Govêrno tomou para resolver, por exemplo, o pró-
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blema do barateamento do pão, cada vez mais caro e pior?
Sr. Presidente: há nesta proposta uma disposição que pela iniqüidade que encer-ra me obriga a juntar os meus protestos aos que há pouco formulou o Sr. Alberto Jordão.
Refiro-me à diferença de 25 por cento, estabelecida para os vencimentos da polícia da província em relação aos da de Lisboa e Pôrto.
É certo que alguma diferença tem de haver, dado que a polícia destas duas cidades tem mais que fazer e corre mais perigos do que a da província, onde, felizmente, ainda não chegaram os perigosos efeitos da propaganda republicana, mercê, em parte, dos bons princípios cristãos, divulgados por essa prestigiosa classe, que é o clero.
Há ainda outro facto para o qual chamo a atenção do Sr. Ministro do Interior.
A proposta cria uma gratificação especial para os professores de francês e inglês na corporação da polícia.
Ora nessa corporação, e prestando igualmente óptimos serviços, existem também professores primários, aos quais não è extensiva a gratificação.
Não se me afigura justa uma tal excepção e, porque assim penso, julgo indispensável remediá-la.
Não mando, porém, para a Mesa qualquer proposta nesse sentido, para que se não possa dizer que nós pretendemos fazer política com o caso.
Estou, todavia, certo de que o Sr. Ministro do Interior tomará na devida conta o meu reparo.
Sr. Presidente: tendo feito à proposta em discussão aquelas objecções que tinha necessidade de fazer, e não desejando demorar a sua aprovação, termino fazendo votos por que a situação da polícia seja melhorada, como é de justiça.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Correia; — Sr. Presidente: depois das considerações que há pouco fez o Sr. Alberto Jordão, relativas à polícia da província, que fica, por esta proposta, em manifestas condições de desigualdade em relação à polícia de Lisboa e Pôrto, eu poderia talvez dispensar-me de usar da palavra. Não o faço, po-
rém, porque entendo não ser demais insistir na injustiça de tal desigualdade.
A polícia da província atravessa hoje uma crise tam grande, se não maior, que a de Lisboa e Pôrto. E se ela não corre os perigos desta última, tem as mesmas dificuldades, sobretudo nas cidades fronteiriças, onde, mercê do contrabando, os géneros são muito mais caros do que em Lisboa e Pôrto.
Sei que êste projecto está já assinado pelo Sr. Ministro das Finanças e que não é possível um aumento do despesa, mas confio em que o Sr. Ministro do Interior encontrará meio de melhorar a vida da polícia da província, que trabalha de dia e de noite, pois está muito reduzida e mal ganhando para não morrer de fome.
Na discussão na especialidade terei ocasião para apresentar alguma proposta de emenda.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Tôrres Garcia: — Sr. Presidente: principio por declarar que voto a proposta apresentada, e não o parecer da comissão.
Estando nós em regime de compressão de despesas, entendo que se deve estudar êste problema, e, principalmente, a sua utilidade.
Nos distritos onde há guarda republicana, que tem a seu cargo a polícia rural, porque não se cria uma secção de polícia urbana?
Na especialidade, apresentarei uma série de artigos novos para que as medidas que vão ser tomadas se restrinjam às corporações da polícia de Lisboa e Pôrto, criando-se nas províncias mais uma secção da guarda republicana. Com esta medida realizamos uma grande economia e damos que fazer à guarda. Esta minha proposta constituiria uma questão prévia, que eu não, levanto, porque se está discutindo com urgência.
Quereríamos mais atenção para a guarda republicana, que pesa, como V. Exa. sabe, sôbre o Orçamento do Estado, e cuja função é restrita. Deveria estender-se aos serviços rústicos e aduaneiros, o aos serviços desempenhados pela polícia e guarda fiscal.
Mas, para que o nosso trabalho possa
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ser inteligente, devia estabelecer-se a questão prévia.
Não quero, porém, impedir que, com brevidade, se vote a parte respeitante às corporações de Lisboa e Pôrto.
Quanto ao parecer em discussão, deve ser rejeitado in limine, e aprovadas as disposições da proposta do Sr. Ministro do Interior, e que a comissão de finanças repeliu por completo.
O Sr. Correia Gomes: — Eu não.
O Orador: — V. Exa. assina sempre sem restrições.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — É a hora de se passar à ordem do dia.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro a prorrogação da sessão até se votar a proposta, com prejuízo da ordem do dia.
É rejeitado.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Estavam de pé 37 Srs. Deputados e sentados 31, sendo, portanto, rejeitado.
O Sr. Agatão Lança: — Requeiro que se continue na discussão da proposta de melhoramentos à polícia até á hora da reunião do Congresso.
Vozes: — Muito bem.
O Sr. Hermano de Medeiros: — É o mesmo requerimento.
Vários àpartes.
O Sr. José de Magalhães: — Então isto é uma brincadeira!
O Sr. Pedro Pita: — A diferença consiste em o primeiro requerimento ser feito pelo Sr. Carvalho da Silva e o segundo pelo Sr. Agatão Lança. Nada mais. Isto não é sério. Todos os Deputados têm iguais direitos
Àpartes vários.
Sussurro.
É aprovado o requerimento do Sr. Agatão Lança.
O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente: na verdade, o «àparte» do ilustre Deputado Sr. José de Magalhães tem cabimento.
Isto parece uma brincadeira.!
Não se brinca assim com cousas sérias, porquanto entendo que todos os Deputados, sejam da direita ou da esquerda, têm igualdade de direitos dentro desta casa do Parlamento. São sofismas grosseiros que V. Exa. como Presidente da Câmara e dirigente dos trabalhos, tinha obrigação de não consentir.
Mas, porque o assunto merece de todos os Deputados o maior acolhimento, continuo a apreciá-lo, declarando à Câmara que a proposta em discussão merece o meu voto inteiramente. Digo mais: acho pouco ainda aquilo que se dá a servidores do Estado, a quem cumpre velar e defender os interêsses e a vida dos cidadãos, e que deviam ser melhor remunerados, para poder haver o direito de fazer, uma melhor selecção.
É preciso que o Estado pague melhor aos seus servidores, para fazer a selecção dos que trabalham com honestidade e competência.
De mal o menos. Esta proposta merece inteiramente o meu voto.
Quero também referir-me a outros servidores do Estado, como à guarda fiscal, que continuam sendo remunerados miseravelmente.
Apoiados.
Sinto não estar presente o Sr. Ministro das Finanças para chamar a atenção de S. Exa. para a situação em que se encontram as praças da guarda fiscal.
Auferem 150$, cousa com que se não pode viver.
Peço ao Sr. Ministro do Interior o favor de comunicar ao Sr. Ministro das Finanças e Presidente do Ministério a referência feita à guarda fiscal, para que é preciso olhar com cuidado.
O Estado não pode exigir dedicação dos serviços quando não paga como deve.
Voto a generalidade da proposta.
O orador não reviu.
O Sr. Américo Olavo: — Pedi a palavra para fazer algumas considerações sôbre o artigo 1.° da proposta em discussão.
É preciso falar claro. As condições do serviço de polícia nas cidades de Lisboa
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e Pôrto não são iguais ás do mesmo serviço nos restantes pontos do País.
Se formos a fazer comparações entre as condições de vida em cada ponto da província e em Lisboa e Pôrto, temos de constatar que nestas duas cidades são mais difíceis.
Se fôssemos a entrar nesse caminho, teríamos de fixar para cada uma das polícias vencimentos conforme as dificuldades de vida nas respectivas localidades. De resto, é necessário dizer-se também que a alteração das disposições entregues à nossa aprovação não é de propor por qualquer Sr. Deputado, visto que elas trariam aumento de despesa. Só o Govêrno poderá propor isso, mas entendo que ò não deverá fazer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Barros Queiroz: — Sr. Presidente: na proposta apresentada à Câmara pelo Sr. Ministro do Interior, melhorando os vencimentos da polícia do Taís, estabelece-se que os da polícia de Lisboa e Pôrto sejam acrescidos de 40 por cento em relação aos da polícia dos outros pontos. A comissão de finanças reconheceu que devia reduzir essa diferença a 25 por cento, quanto às restantes corporações de polícia cívica.
Nesta altura da discussão não é possível à comissão de finanças nem a qualquer Sr. Deputado modificar a percentagem no sentido de a deminuir, pois à lei travão impede que se proponham aumentos de despesa.
Devo, porém, dizer que reputo os vencimentos fixados para a policia das províncias insuficientes em muitas terras, para o custeio da vida, como insuficientes são os propostos para a polícia de Lisboa e Porto.
Um Estado que queira manter o princípio da autoridade tem de remunerar convenientemente os seus agentes.
Confesso que desejava que o Sr. Ministro do Interior tivesse trazido á Câmara uma proposta que melhor remunerasse a polícia.
Voto pois, a proposta como um começo de justiça, visto que esta não é integralmente feita.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Interior (Sá Cardoso): — Sr. Presidente: estou absolutamente de acordo com as considerações aqui produzidas, todas tendentes a mostrar que os vencimentos da polícia do País, ainda depois do aumento proposto, ficam longe de satisfazer às necessidades actuais da vida. Mas a verdade é que não tive possibilidade de conceder maior aumento.
Para se exigirem bons serviços há que pagá-los bem; todavia é justo reconhecer que, não obstante a exiguidade dos vencimentos, a corporação da polícia tem patenteado possuir em elevado grau o. sentimento de honestidade, pois tem sabido sempre resistir às tentativas de corrupção que de toda a parte surgem.
Quanto à diferença para menos nos vencimentos da polícia das províncias, devo dizer que é meu entender que em geral a vida na província não é tam difícil como nas cidades de Lisboa e Pôrto.
Além disso, esta melhoria não é só para atender à carestia da vida; é também para compensar um pouco os riscos constantes em que está a polícia de Lisboa e Pôrto.
Á polícia da província não tem, também, aquela necessidade de se apresentar rigorosamente uniformizada como em Lisboa. Em todo o caso, tendo em consideração os desejos manifestados pelo ilustre Deputado, tomarei a iniciativa dê reduzir de 25 a 20 o aumento que temos a fazer.
Concordo com o projecto apresentado pela comissão, mas quando se discutirem os diferentes artigos terei ocasião de me referir a êle.
Na proposta não vem mencionado a quanto monta a receita para fazer face às despesas, mas estou informado pelo Sr. relator de que essa receita deve ser superior a 7:000 contos.
Tenho elaborada uma proposta de lei criando o imposto de segurança pública, destinado a fazer face às despesas com a guarda republicana e a polícia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Correia Gomes: — Sr. Presidente: ouvi o Sr. Tôrres Garcia declarar que votava a proposta do Sr. Ministro do Interior e não a dá comissão, porque a primeira tinha sido feita por entidades côa}-
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petentes, em quanto que a segunda fora elaborada por pessoas que não tinham conhecimento dos serviços da polícia.
Devo declarar a V. Exa. que o parecer da comissão foi acompanhado por pessoas da máxima competência nos serviços policiais e não poderia a comissão proceder do outra forma.
Devo ainda dizer à Câmara que no parecer se encontram vários erros provenientes da falta de revisão, mas estão elaboradas as respectivas emendas, que em devida altura serão enviadas para a Mesa.
Sôbre o ponto relativo à polícia da província, devo dizer que a comissão atendeu várias reclamações que lhe foram apresentadas, declarando, todavia, em nome da mesma comissão, que aceito a indica-cação apresentada pelo Sr. Ministro do Interior.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovado o parecer na generalidade, e seguidamente foi lido o artigo 1.°, que entrou em discussão.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: poucas palavras direi, porque não desejo alongar a discussão desta proposta.
Todavia desejo frisar uma circunstância. Quando há pouco V. Exa. declarou que ia entrar-se no período destinado à ordem do dia, nenhum Deputado se levantou para requerer que a discussão do parecer prosseguisse com prejuízo da ordem.
Esperei propositadamente que algum Sr. Deputado republicano apresentasse o requerimento que eu tencionava submeter à apreciação da Câmara, e só quando vi que nenhum o fazia, é que me resolvi a apresentar o meu.
Foi depois de a Câmara ter rejeitado o meu requerimento que o Sr. Agatão Lança se levantou, dando lugar a que a Câmara votasse ao Sr. Agatão Lança aquilo que me- tinha rejeitado a mim.
O Sr. Presidente: — Tenho a observar a V. Exa. que a matéria em discussão é a do artigo 1.°
O Orador: — Tenho pena de que V. Exa. não me tivesse dado a palavra há pouco sôbre o modo de votar.
Sr. Presidente: eu acho absolutamente justo êste artigo, e há mais de três meses, quando nesta casa do Parlamento o Sr. António Maria da Silva apresentou uma proposta para ser concedida uma pensão à viúva do agente que foi vítima de um infamíssimo atentado, nós dêste lado da Câmara dissemos ser indispensável acudir à situação miserável em que se encontrava e encontra a polícia do País.
Quem tiver a consciência do perigo que ameaça a sociedade não pode deixar de estar ao lado daqueles que estão encarregados de manter a ordem, e foi por êsse motivo que rejeitámos a proposta de amnistia que foi apresentada pelo Sr. Agatão Lança.
Nestas condições, declaro que êste lado da Câmara vota o artigo 1.° por o achar absolutamente justo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Alberto Jordão: — Sr. Presidente: mantenho o ponto de vista que há pouco expus à Câmara a respeito da corporação da polícia e, transigindo, agradeço ao Sr. Ministro do Interior o facto de ter concordado em apresentar a proposta de emenda a que fiz referência.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Correia Gomes: — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa seguinte emenda:
Artigo 1.° Para efeito da aplicação da lei de melhoria de vencimentos, à polícia cívica de Lisboa e Pôrto serão aplicados os seguintes vencimentos mensais, sobro-os quais recairão as percentagens da tabela n.° 4 da lei n.° 1:355, de 15 de Setembro de 1922.— Lourenço Correia Gomes.
foi lida a emenda do Sr. Correia Gomes, admitida e seguidamente entrou em discussão.
Foi aprovada a acta.
Admissões
Projecto de lei
Do Sr. Dinis de Carvalho, criando a freguesia de Vila Nova de S. Pedro com vários lugares e casais, desanexados da
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freguesia de Manique do Intendente, concelho de Azambuja.
Para a comissão de administração pública.
Justificação de falias
Do Sr. Bernardo Ferreira de Matos, de 19, 20, 21, 22 e 25 do corrente.
Para a comissão de infracções e faltas.
O Sr. João Camoesas: — Requeiro a V. Exa. para consultar a Câmara sôbre se consente que durante a sessão de amanhã reúnam as comissões de instrução
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: — O Grupo Parlamentar Democrático propõe as seguintes substituições:
Comissão de instrução especial e técnica:
Substituir os Srs. José Domingues dos Santos e Teófilo Pais Carneiro pelos Srs. Cortês dos Santos e António Mendonça.
O Sr. Presidente: — Está interrompida a sessão para se retinir o Congresso.
Eram 17 horas e 30 minutos.
Reabertura da sessão às 18 horas e 55 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: — Continua em discussão a interpelação do Sr. Cunha Leal ao Sr. Ministro das Colónias.
Tem a palavra o Sr. Ministro das Colónias.
O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins): — Sr. Presidente: desejo em primeiro lugar fazer uma ligeira rectificação a rima afirmação produzida pelo Sr. Norton de Matos.
Disse S. Exa. que das palavras por mim proferidas podia depreender-se que não é o Ministro das Colónias que tem de responder à interpelação do Sr. Cunha Leal, mas o próprio Sr. Norton de Matos, defendendo assim a doutrina de que no Parlamento só o Ministro das Colónias pode responder pelos actos administrativos dos governadores gerais ou Altos Comissários.
Na verdade, assim é e, porque assim o entendo, evidentemente não podia ter pro-
ferido as palavras que S. Exa. me atribui.
O que eu disse foi que só por uma ficção constitucional se poderia ter anunciado ao Ministro das Colónias uma interpelação que, pelo modo como foi feita, era dirigida aos actos administrativos do Alto Comissário da província de Angola, e como ou nesse momento não tinha os elementos precisos para responder às afirmações feitas pelo Sr. Cunha Leal limitei-me tam somente a expor êsse meu critério e a disser que o Sr. Norton de Matos, com o conhecimento perfeito que tem dos seus actos administrativos, melhor do que eu se referiria ao caso o daria as necessárias explicações.
Evidentemente, Sr. Presidente, toda a gente sabe que, se eu me dei por habilitado a respondei ao Sr. Cunha Leal, foi porque assim tinha de ser, porque, na verdade, eu não sabia em que termos ia S. Exa. fazer a interpelação que apresentou sôbre o regime dos Altos Comissariados.
O Sr. Cunha Leal: — V. Exa. dá-me licença.
A minha interpolação não foi feita acerca do regime dos Altos Comissariados, mas sim sôbre resultados que se tenham colhido até agora do regime dos Alto Comissariados.
O Orador: — Eu, como Ministro das Colónias, só poderia ter conhecimento das cousas em grande; dos casos miúdos de administração não tenho conhecimento senão depois de devidamente informado, e, como nosso momento eu não tinha elementos e como melhor do que eu os possuía o Sr. Norton de Matos, pelo conhecimento perfeito que tem dos seus próprios actos administrativos, só S. Exa. podia dar explicação às acusações que o Sr. Cunha Leal tinha produzido.
O Ministro das Colónias não pode ter conhecimento do que se pratica pôr todas as colónias, não tem conhecimento dos actos praticados pelos Alio s Comissários senão quando os auditores fiscais mandam os seus relatórios chamando a atenção do Ministro para quaisquer casos que reputem monos regulares; por isso o Ministro não pode ter conhecimento dos actos praticados pelos Altos Comissários, por-
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que êsses actos administrativos são praticados doutro da sua competência.
Na verdade, o que o Sr. Cunha Leal fez não foi uma interpolação sôbre a aplicação do regime dos Altos Comissariados, o que S. Exa. fez foi uma interpelação aos actos administrativos do governador geral do Angola, porque o tanto de se ter criado o lugar de Alto Comissário não q urre dizer que tenha desaparecido o lugar de governador gorai.
As funções do Alto Comissário são funções de direcção, são funções legislativas.
Na verdade as funções dos Altos Comissários foram criadas para que a acção legislativa dos governadores coloniais pudesse ser sancionada mais ràpidamente do que se o respectivo estudo tivesse sido feito na metrópole.
Os governadores coloniais têm uma certa competência, os seus diplomas legislativos entram imediatamente era vigor, provisoriamente.
Os Altos Comissários têm também a função legislativa de orientação porque, se bem que haja um Conselho Legislativo em cada colónia, primordialmente todas as questões que interessam à colónia devem ser tratadas pelo Conselho Legislativo, mas o certo é que o Alto Comissário pode tomar uma iniciativa legislativa, e então como governador geral vai ao Conselho Legislativo e propõe uma corta medida; se o Conselho Legislativo recusa a sua sanção, o Alto Comissário pode pôr em execução, pode promulgar a medida que o Conselho Legislativo não aprovou.
Desta maneira o Alio Comissário tem as funções legislativas que o Executivo tem para todas as colónias.
Mas, como já disse, o que o Sr. Cunha Leal atacou não foram os actos do Alto Comissariado a êsses não se referiu S. Exa. atacou, sim, actos administrativos que pertenciam ao governador geral do Angola.
Até mesmo quando o Sr. Cunha Leal disse que o Sr. Norton de Matos tinha praticado um acto pessoal, quando foi da publicação do decreto n.º 50, passando por cima do visto do Conselho Superior de Finanças, ainda isso mesmo não é um acto pessoal, porque, havendo-se dado poderes aos governadores das províncias para passarem por cima do visto do Conselho Superior do Finanças; S. Exa. não
tinha necessidade alguma de usar de um acto de poder pessoal, publicando qual-quer decreto.
Um dos artigos do decreto n.° 7:12 só manda publicar no boletim oficial os contratos e a negação do visto.
Do que não há dúvida ô de que, segundo as leis, se pode chamar à responsabilidade seja quem fôr, intentando-se até um processo criminal.
A acção do governador é complexa, pois é perfeitamente de administração e exercida por portarias provinciais e despachos.
Relativamente às portarias, o Ministro tem delas conhecimento; porém, no que diz respeito aos despachos, só o tem quando há reclamações tendenciosas, ou quando os auditores as comunicam.
Repito, Sr. Presidente, há uma grande diferença entre Alto Comissário e governador, e os actos que o Sr. Cunha Leal atacou, praticados pelo Sr. Norton de Matos, são actos de governador e não de Alto Comissário.
Relativamente aos Poderes Legislativo e Executivo, devo dizer que as direcções gerais têm obrigação de ler os diplomas legislativos e chamar a atenção dos Ministros se alguns forem ilegais.
Os actos que o Sr Cunha Leal criticou derivam da promulgação de despachos, e daí o não ter o Ministro conhecimento deles.
Babemos perfeitamente quando um acto é da responsabilidade do Alto Comissário ou do governador geral.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): — V. Exa. quere dizer que nem o Alto Comissário nem o governador geral podiam publicar o decreto.
O Orador: — O governador não precisa publicar decretos, basta publicar despachos.
O Sr. Cunha Leal: - Para frisar bem a nota do poder pessoal, bastava fazer uma cousa muito simples, que era dizer: fica o Conselho sabendo o sabendo o País que não é preciso o «visto». Passa-se por cima do Conselho Executivo e da lei
O orador: — V. Exa. sabe que o Parlamento tem dado autorizações ao Poder
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Executivo para promulgar determinadas leis, e há sempre um artigo que diz que ao Poder Legislativo serão prestadas contas do uso que o Poder Executivo fez dessas autorizações.
O Sr. Cunha Leal: — À sombra de que autorização foi publicado o decreto?
O Orador: — Não o considero um decreto.
Considero-o um despacho produzido pelo governador geral de Angola.
Pois então tinha sido contratada uma certa quantidade de pessoas, pessoas que tinham já recebido adiantamentos para viagem, que tinham recebido vencimentos adiantados, quantias essas que o Estado tinha despendido, e depois de tudo feito o Conselho Superior de Finanças dava esses contratos como nulos?
Fez muito bem o Sr. Alto Comissário e ou suponho que qualquer pessoa que estivesse nas suas circunstâncias não podia nem devia proceder de modo diferente, porque em primeiro lugar estão os interêsses do Estado.
Talvez na redacção dêsses contratos, porque, como a Câmara decerto não ignora, foi o Alto Comissário que, quando esteve em Lisboa, fez os contratos dessas pessoas, talvez na redacção dêsses contratos, repito, S. Exa. tivesse praticado um êrro de ofício, mas, dadas as circunstâncias que apontei, o que S. Exa. tinha a fazer, pelas altas funções que exerce, era atender aos altos e sagrados interêsses do País, e se realmente se considerassem nulos os contratos, como pretendia o Conselho Superior de Finanças...
O Sr. Cunha Leal: — Há duas cousas a atender, uma é o êrro inicial e outra a forma de remediar êsse êrro.
O Orador: — Não há dúvida de que os contratos têm um êrro inicial, e foi êsse êrro que viciou os contratos, mas o Sr. Alto Comissário procurou honestamente dar-lhes remédio, partindo do princípio de que os dinheiros do Estado são sagrados.
Quarenta pessoas foram contratadas e V. Exa. sabe que a passagem para Angola é hoje qualquer cousa de respeitável.
Imagine V. Exa. a quanto montaria o fabuloso prejuízo que o Estado viria a ter se êsses contratos não fossem por diante.
Não se pode, portanto, dizer que o Sr. Norton de Matos tivesse praticado o êrro inicial.
Repito: o Ministro das Colónias só teve conhecimento da prestação de contas feitas pelos Altos Comissários lendo os diplomas e lendo os relatórios.
Dos actos do governador geral só se to roa conhecimento quando chegam as portarias oficiais.
Sr. Presidente: o Ministério das Colónias tem conhecimento das portarias, mas não tem conhecimento dos despachos senão quando há reclamações graciosas ou quando os auditores as comunicam.
O Sr. Cunha Leal (em àparte): — Mas então o relatório do auditor fiscal não existia no Ministério das Colónias?
O Orador: — Realmente o relatório foi entregue no Ministério das Colónias, mas em ocasião que já não era oportuna.
Pregunto. Qual era a obrigação do auditor, quando viu publicado o decreto n.° 50? Era fazer a respectiva comunicação, e não o fez. Esperou dois anos, e só quando chegou à metrópole é que o redigiu e entregou.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): — V. Exa. dá-me licença?
O Sr. Alto Comissário chegou a Angola em Abril de 1921, e o relatório foi entregue em Junho de 1922. Logo não é um espaço tam longo como V. Exa. quere demonstrar.
De resto, se o auditor teve pouca pressa em apresentar o relatório, muito menos pressa têm tido os Ministros para o apreciar.
O Orador: — Eu não apreciei já êsse relatório, porque neste momento êle não se encontra no Ministério das Colónias.
O Sr. Panlo Cancela de Abreu (em àparte): — Isso é interessantíssimo. Documentos oficiais que desaparecem dos Ministérios.
O Orador: — Sr. Presidente: reatando o fio das minhas considerações, devo di-
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zer que os actos a que o Sr. Cunha Leal fez referência, durante a sua interpelação foram praticados pelo Sr. Norton de Matos na qualidade de governador geral, e, portanto, para poder responder ao Sr. Cunha Leal, necessitava de colhêr primeiro os necessários elementos.
As comunicações do Sr. Cunha Leal podem considerar-se uma reclamação graciosa de pessoas que têm interêsses na província.
O Sr. Cunha Leal: — V. Exa. há-de me permitir que eu faça uma pequena observação. Desejava que V. Exa. me dissesse quem são as pessoas em nome das quais aqui venho fazer reclamação.
O Orador: — Perdão. Nas minhas palavras não há a mais leve sombra de insinuação, e, se disse isto, foi porque V. Exa. falou no nome do Sr. Pombeiro e de outros.
O Sr: Cunha Leal: — Peço a V. Exa. que me considere sempre falando como Deputado e reclamando em nome da Nação.
O Orador: — Não empreguei essa expressão com o intuito de fazer a mais leve insinuação e, apenas, no bom sentido do termo. Realmente, qualquer membro do Parlamento, tendo tomado conhecimento de qualquer acto ilegal praticado 'por um agente do Poder Executivo, pode vir ao Poder Legislativo fazer a devida reclamação. E foi o que, no caso presente, sucedeu. O Sr. Cunha Leal tomou conhecimento de diversos actos praticados na administração da província de Angola e veio ao Parlamento torná-los públicos, mas eu é que não posso, neste momento, dar a devida resposta às reclamações de S. Exa.
O Sr. Cunha Leal: - Eu não reclamei. Expus factos!...
O Orador: — ... Porque tenho primeiramente que me informar das razões por que se praticaram êsses actos e as necessidades a que se desejava obtemperar. Conhecidos os factos, é que eu posso formar, então, o meu juízo seguro, e ou concordava com as medidas tomadas,
ratificando assim a minha confiança ao Alto Comissário ou ao governador, ou não concordava e mandava imediatamente anular os diplomas provinciais, o que implicaria o pedido de demissão daqueles funcionários.
Se o Sr. Cunha Leal me pedisse a minha opinião concreta sôbre as reclamações que apresentou nesta casa do Parlamento, eu responder-lhe-ia que não podia fazê-lo e pedir-lhe-ia que fizesse a sua exposição por escrito...
O Sr. Cunha Leal: — Mas eu já disse a V. Exa. que não fiz reclamação alguma porque não tinha que reclamar nada! Expus factos. E se os factos por mim apresentados não ferem a sensibilidade de V. Exa., isso é consigo, é com a Câmara e não comigo! Eu não tinha que me importar absolutamente nada com o resultado do apuramento que V. Exa. fizesse. Expus factos praticados pelo Alto Comissário de Angola para a Câmara dos Deputados os analisar, e, a resposta ao que eu afirmei tenho que a ouvir agora e não daqui a mais tempo!...
O Orador:—Perfeitamente. S. Exa. usou de um direito, apresentando reclamações.
O Sr. Cunha Leal: — Não reclamei nada, Sr. Ministro! Expus factos e só factos!...
O Orador: — Mas os factos que S. Exa. apresentou podiam não ser verdadeiros e eu era obrigado a ir informar-me devidamente, para formar o meu juízo...
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Quere dizer, o papel do Ministro é meramente passivo!... O melhor é acabar com o Ministério das Colónias!
O Orador: — V. Exa. pensa que eu desempenho no Ministério das Comissões papel passivo?!...
Por várias vezes já tenho mandado anular actos praticados por governadores das colónias, por serem ilegais, dando satisfação às reclamações apresentadas. O que ninguém pode é obrigar-me a dar a minha opinião de um momento para o outro, sem ter estudado o assunto.
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O Sr. Cunha Leal veio reclamar uma acção ministerial no sentido da exposição dos factos que expôs, mas eu tenho de ser ponderado nas deliberações que tomo e sou obrigado a estudar conscienciosamente o assunto.
O Sr. Paulo Cancela dê Abreu: — Basta ler o Boletim Oficial de Angola!
O Orador: — O governadores têm competência para praticar determinados actos dentro das leis orgânicas da administração civil e financeira das colónias, mas o Ministro das Colónias está no pleno direito de não concordar com êsses actos e não os sancionar, circunstância que pode levar os governadores a pedir a sua exoneração.
Procedeu-se conforme já se tinha praticado com outros governadores.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Os relatórios das auditoras fiscais têm de se apresentar mensalmente.
O Orador: — Poucos auditores têm feito relatórios.
Á fiscalização administrativa não se tem feito convenientemente porque as pessoas escolhidas não têm a elevação, nem a compostura e a intelectualidade precisas para a fazerem»
Para se fazer uma fiscalização é preciso muita elevação moral.
O Sr. Cunha Leal apresentou os actos praticados com um aspecto de tamanha irregularidade que, se o Sr. Norton de Matos não estivesse em Lisboa e não fôsse Deputado, eu teria de mandar a súmula do discurso do Sr. Cunha Leal para Angola e só depois da resposta poderia dar explicações.
A opinião publica estava alarmada, mas felizmente o Sr. Norton de Matos tem assento nesta Câmara e suprimiu as deficiências do Ministro;
Estabelece-se diálogo entre o orador e o Sr. Cunha Leal.
Vozes: - Ordem! Ordem!
O Sr. Presidente agita a campainha.
O Sr. Cunha Leal (em àparte): - É absolutamente indispensável que V. Exa. tenha em seu poder o relatório, para ler o que nêle se encontra.
O Orador: — O Sr. Norton de Matos justificou já perante a Câmara os actos administrativos praticados no exercício das suas funções de Alto Comissário, a que o Br. Cunha Leal havia feito referência na sua interpelação. A Câmara que faça o seu juízo. Pela parte que me toca devo declarar que julgo não podermos acompanhar o Sr. Cunha Leal nas conclusões finais do seu discurso, nem tam pouco aprovar a sua moção, tanto mais quanto é certo ter sido S. Exa. o primeiro a ressalvar a honestidade pessoal do Alto Comissário e a afirmar que a responsabilidade de todas as irregularidades apontadas se devia imputar aos altos funcionários da província.
O Sr. Presidente: — São horas de se passar ao período de antes de se encerrar a sessão. V. Exa. termina, ou deseja ficar com a palavra reservada?
O Orador: — Nesse caso, ficarei com a palavra reservada. O orador não reviu.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: li nos jornais que o Govêrno, em resposta à comissão promotora da última manifestação contra a carestia da vida, havia declarado que ia enfrentar com energia o problema da vida cara. A verdade é que até agora não vi que tivessem sido tomadas nesse sentido quaisquer medidas.
Se o Govêrno não encontra na legislação em Vigor os elementos indispensáveis para agir com eficácia, que o diga, porque o Parlamento não lhe regateará, certamente, os meios que a tal o habilitem.
O que não pode ser é que emquanto a resposta do Govêrno não tem uma efectivação prática, a resposta do Comércio continuo sendo, como têm sido, tam provocadora e alarmante.
Li hoje no Diário de Noticias que a carne continua faltando em Lisboa, mas que de sexta-feira em diante ela aparecera em abundância, porém a preços elevadíssimos.
Se o Sr. Ministro da Agricultura se encontrasse presente, preguntar-lhe-ia que razão se pode dar para não haver carne
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em Lisboa o havê-la nas localidades circunvizinhas. No Seixal, de onde vim hoje, há carne que se vende a 8$.
É necessário que o Govêrno tome medidas para modificar o actual estado de cousas em relação à carestia da vida, que está assumindo proporções assustadoras.
Ninguém pode viver! Há dois messes a esta parte os aumentos nos géneros de primeira necessidade têm atingido uma percentagem não inferior a 100 por cento.
A não ser o comércio de comestíveis, o outro está quási paralisado, visto que todo o dinheiro é pouco para os comerciantes de víveres.
Espero que o Govêrno, auxiliado pelo Parlamento, onde tem tido uma grande maioria a apoiá-lo, aplique a sua energia no sentido de melhorar êste estado de cousas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Interior (Sá Cardoso): - Respondendo ao Sr. Tavares de Carvalho, direi que aos Srs. Ministros por cujas pastas correm os assuntos quê S. Exa. versou comunicarei as palavras que S. Exa. proferiu.
Devo, porém, informar que o Sr. Presidente do Ministério já tomou certas resoluções que vão ser postos em prática e que de alouro modo servirão de entrave à ganância que se está desenvolvendo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Peço ao Sr. Ministro do Interior o obséquio de transmitir ao seu colega das Finanças as considerações que vou fazer.
A Direcção Geral dos Impostos entendeu dever publicar, a título de regulamento de diversas disposições de lei umas exigências contrárias à letra da legislação.
Nestas condições, Sr. Presidente, lançando-se impostos exorbitantes aos comerciantes, não se faz senão agravar cada vez mais o custo da vida.
Não é desta forma que se pode resolver o assunto, antes pelo contrário, pois o comerciante, desde que lhe lancem contribuições, não pode necessàriamente deixar de aumentar o preço dos géneros, o que realmente vem agravar cada vez mais
a situação em que nos encontramos, o que pode até levar à perturbação da ordem pública.
Não se pode, na verdade, tornar responsável o comércio pelo agravamento do custo da vida.
O agravamento dos géneros provém de vários factores muito principalmente da desvalorização da nossa moeda.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Como é que V. Exa. explica que a batata, que se estava vendendo ao preço de $80 o quilograma, se esteja vendendo já hoje a
O Orador: — Não há dúvida alguma de que há especuladores, e que essa especulação deve ser reprimida, o que porém se não pode dizer é que o agravamento da vida se deve única e simplesmente ao comércio, que tem de vender os seus gêneros, não pelo preço por que os comprou, mas sim pelo preço por que terá de adquirir outros, para substituir aqueles que tem em armazém.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Como é que V. Exa. explica que fera de Lisboa haja carne, e se esteja vendendo ao preço de 8$ o quilograma, e em Lisboa não a haja, e a que há se esteja vendendo ao preço de 16$ e 18$ o quilograma?
O Orador: — Eu não duvido, repito, de que haja especulações, que desejo francamente que sejam reprimidas, porém o que é um facto é que, aumentando-se os impostos pela forma como a Direcção Geral dos Impostos os está aumentando, isso vem agravar ainda mais o custo da vida, e é justamente para isso que eu peço ao Sr. Ministro do Interior o favor de chamar a atenção do Sr. Ministro das Finan-ças.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Interior (Sá Cardoso): — Sr. Presidente: ouvi com a máxima atenção as considerações apresentadas pelo Sr. Carvalho da Silva, podendo S. Exa. estar certo de que as transmitirei ao Sr. Presidente do Ministério, que é também Ministro das Finanças.
Uma cousa disse, porém, S. Exa. que
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me deixou um pouco impressionado, isto é, que o augmento dos géneros só não deve somente aos comerciantes; mas sim ao agravamento do câmbio, quando até certo ponto assim não ó.
Todos temos visto que sempre que se dá uma melhoria de câmbio os géneros não voltam a ser vendidos pelos preços que tinham anteriormente, mas sempre que se dá um agravamento de câmbio, os preços dos géneros sobem logo.
No emtanto, pode S. Exa. estar certo de que não deixarei de transmitir ao Sr. Ministro das Finanças as considerações que fez.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente : — A próxima sessão é amanhã, sendo a ordem dos trabalhos a seguinte:
Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores que se inscrevam):
Parecer n.° 661, que altera o artigo 1.° da lei n.° 1.356, de 15 de Setembro
de 1922.
Parecer n.° 569, que fixa a remuneração por trabalhos extraordinários ao pessoal da Imprensa Nacional e da Casa da Moeda.
(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam):
A que estava marcada.
Ordem do dia: A que estava marcada.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 55 minutos.
Documentos mandados para durante a sessão
Parecer
Da comissão de instrução especial e técnica, sôbre o n.° 651-L, que confere o título de engenheiro auxiliar aos diplomados com qualquer dos cursos .especiais dos institutos industriais ou outros equivalentes.
Imprima-se.
Requerimento
Requeiro que, pelo Ministério da Marinha, me seja permitido consultar o processo da aplicação da contribuição industrial aos tripulantes de navios, que julgo estar na Intendência de Marinha. — Agatão Lança.
Expeça-se.
O REDACTOR—Avelino de Almeida.