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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 49

EM 11 DE MARÇO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva

Sumário.—Aberta a sessão com a presença de 43 Srs. Deputados, lê-se a acta e dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Alfredo de Sousa requere que, na sessão imediata e antes da ordem, se discuta o parecer n.º 642.

O Sr. Tavares de Carvalho ocupa-te da exportação de peles e cabedais.

O Sr. António Mata insta pelo pagamento de determinadas melhorias aos oficiais superiores do exército.

Responde-lhe o Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo) e tem a palavra para explicações o Sr. António Mata.

Entra em discussão a pró posta n.º 665 (abertura de um crédito especial a favor do Ministério da Justiça), a qual é aprovada, depois de ter usado da palavra sôbre o artigo 1.° o Sr. Aforais Carvalho.

Entra em discussão o parecer n.° 560 (anexando ao concelho a freguesia de Santa Maria de Setúbal a península de Tróia), que é rejeitado depois de terem usado da palavra os Sr. Jorge Nunes e Alfredo de Sousa.

Entra em discussão o parecer n.º 560 (de 1920) sôbre uma petição do capitão picador Salvador José da Costa. Aprovado, depois de usar da palavra o Sr. Lelo Portela.

Entram em discussão as alterações introduzidas pelo Senado na proposta de lei n.º 302 (autorização ao Govêrno para negociar um acordo com a Companhia dos Tabacos). Aprovadas depois de usarem da palavra os Srs. Ferreira de Mira Almeida Ribeiro, Morais Carvalho e Ferreira da Rocha, tendo o segundo e o terceiro falado duas vezes.

É aprovado o requerimento feito pelo Sr. Alfredo de Sousa.

É aprovada a acta.

Comunica-se uma substituição e lê-se uma nota de interpelação.

Ordem do dia.— Prossegue a discussão sôbre a especialidade da matéria da proposta de lei

n.º 622 (autorizando a provinda de Moçambique a contrair empréstimos).

O Sr. Delfim Costa conclui as suas considerações sôbre o artigo 1.º

Os Srs. Rodrigues Gaspar e Ferreira da Rocha apresentam propostas sôbre o artigo 2.º

O Sr. Ministro da Marinha requere que na sei-são imediata, antes da ordem, se discuta o parecer n.º 636. Aprovado.

Sôbre o artigo 2.º da proposta n.º 622 pronunciam-se também os Srs. Jaime de Sousa, Ministro das Colónias (Mariano Martins), Ferreira da Rocha e Rodrigues Gaspar.

É rejeitada a proposta de Sr. Ferreira da Rocha e aprovada a do Sr. Rodrigues Gaspar.

Os Srs. Rodrigues Gaspar, Ferreira da Rocha e Portugal Durão apresentam propostas sôbre o artigo 3.º, tendo usado da palavra, a seguir, os Srs. Ministro das Colónias (Mariano Martins) e Ferreira da Rocha.

É rejeitada uma proposta da comissão de colónias e são aprovadas as dos Srs. Ferreira da Rocha, Portugal Durão e Rodrigues Gaspar.

Fica prejudicado o artigo 3.º da proposta.

É aprovado o artigo 4.º sem discussão.

É aprovado o artigo 5.º com uma emenda do Sr. Rodrigues Gaspar.

São aprovados sem discussão os artigos 6.º e 7.º

Sôbre o artigo 8.º apresentam emendas os Srs. Ferreira da Rocha e Rodrigues Gaspar, que usam da palavra, bem como os Srs. Ministro das Colónias f Mariano Martins) e Jaime de Sousa.

Aprovado o artigo com o aditamento do Sr. Rodrigues Gaspar.

É rejeitada a proposta do Sr. Ferreira da Rocha.

É aprovado o artigo 10.º e último.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro) manda para a Mesa uma proposta de lei incluindo nas leis do sêlo em vigor determinada verba e aplicando ao imposto do sêlo a doutrina do artigo 59.° da lei n.º 1:368.

Aprovada a urgência e dispensa do Regimento, usam da palavra sôbre a generalidade os Sr. Morais Carvalho e Presidente do Ministério, tendo

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aprovado o artigo 1.° com uma emenda dêste último.

É aprovado o artigo 2.°, depois de falar o Sr. Morais Carvalho.

É aprovado o artigo 3.º e último.

Entra em discussão o parecer n.º 584 (reforma da lei de sêlo).

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Estrangeiros apresenta uma nova proposta, requerendo para ela prioridade de discussão. Aprovado, em prova e contraprova.

Fala sôbre a generalidade o Sr. Carvalho da Silva, que fica com a palavra reservada.

Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Sá Pereira alude à forma como está decorrendo determinada sindicância. Responde-lhe o Sr. Ministro do Interior (Sá Cardoso).

O Sr. Carvalho da Silva trata do modo como se está cobrando o imposto de transacções, respondendo-lhe o Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro).

O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem.

Abertura da sessão às 15 horas e 31 minutos.

Presentes 45 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 52 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Alberto Ferreira Vidal.

Alberto Lelo Portela.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Dias.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António de Mendonça.

António Pais da Silva Marques.

António Resende.

António de Sousa Maia.

Augusto Pereira Nobre.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.

Delfim do Araújo Moreira Lopes.

Delfim Costa.

Ernesto Carneiro Franco.

Francisco Dinis de Carvalho.

Hermano José de Medeiros.

Jaime Júlio de Sousa.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João José da Conceição Camoesas.

João de Ornelas da Silva.

João do Sousa Uva.

João Vitoriuo Mealha.

José Carvalho dos Santos.

José Cortês dos Santos.

José Domingues dos Santos.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Mendes Nunes Loureiro.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José Pedro Ferreira.

Luís da Costa Amorim.

Manuel do Brito Camacho.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel do Sousa da Câmara.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Maximino de Matos.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Sebastião de Herédia.

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio Saque.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Afonso do Melo Pinto Veloso.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alfredo Ernesto do Sá Cardoso.

Álvaro Xavier de Castro.

Amaro Garcia Loureiro.

Américo Olavo Correia de Azeredo.

Ângelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

Aníbal Lúcio do Azevedo.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Correia.

António Lino Neto.

António de Paiva Gomes.

António Pinto de Meireles Barriga.

Artur Brandão.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Constancio de Oliveira.

Custódio Martins de Paiva.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco Cruz.

Jaime Pires Cansado.

João Estêvão Águas.

João Pereira Bastos.

João Pina de Morais Júnior.

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Joaquim Brandão.

Joaquim Dinis da Fonseca.

Jorge do Vasconcelos Nunes.

José Marques Loureiro.

José Novais do Carvalho Soares de Medeiros.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Manuel Alegre.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel de Sousa Coutinho.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Mariano Martins.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Nuno Simões.

Paulo Cancela de Abreu.

Tomás de Sousa Rosa.

Tomo José de Barros Queiroz.

Vasco Borges.

Viriato Gomos da Fonseca.

Vitorino Henriques Godinho.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Marques Mourão.

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso Augusto da Costa.

Alberto Carneiro Alves dá Cruz.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alberto Xavier.

Albino Pinto da Fonseca.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Américo da Silva Castro.

António Abranches Ferrão.

António Albino Marques de Azevedo.

António Ginestal Machado.

António Maria da Silva.

António Vicente Ferreira.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Cândido Pereira.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Custódio Maldonado Freitas.

David Augusto Rodrigues.

Domingos Leite Pereira.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco da Cunha Rogo Chaves.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Germano José de Amorim.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

Jaime Duarte Silva.

João Baptista da Silva.

João José Luís Damas.

João Luís Ricardo.

João Salema.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Narciso de Sousa Matos.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge de Barros Capinha.

José António de Magalhães.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

José de Oliveira Salvador.

Júlio Gonçalves.

Júlio Henrique de Abreu.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel Duarte.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mário de Magalhães Infante.

Paulo da Costa Menano.

Paulo Limpo do Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Valentim Guerra.

Vergílio da Conceição Costa.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Às 15 horas e 10 minutos principiou a fazer-se a chamada.

O Sr. Presidente: — Estão presentes 45 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Leu-se a acta.

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Deu-se conta do seguinte Expediente

Telegrama

Dos oficiais de justiça de Sintra, pedindo a aprovação imediata da proposta sôbre tabela de emolumentos.

Para a Secretaria.

Ofício

Do Senado, devolvendo com alterações a proposta de lei que autoriza o Govêrno a negociar um acordo com a Companhia dos Tabacos.

Para a Secretaria.

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me seja fornecida cópia de um parecer da Procuradoria Geral da República respeitante a uma consulta feita pelo Sr. Ministro da Guerra (major Ribeiro de Carvalho) acerca de um requerimento datado de 20 de Novembro do capitão António Maia. — António Maia.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me seja dada autorização para consultar o processo individual do capitão do secretariado militar, Sr. António Vitorino Soares, existente na 1.ª Repartição da 1.ª Direcção Geral do mesmo Ministério.

11 de Março de 1924.— João de Ornelas da Silva.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério do Comércio e Comunicações, sejam enviados com urgência a esta Câmara todos os relatórios, planos e mais documentos que possam instruir a proposta de lei n.° 562-A, que concede a autorização para construir e explorar uma ponte sôbre o Tejo requerida pelos engenheiros civis Afonso de Pena Beuf e, Henrique Pereira Pinto Bravo.

11 de Março de 1924.—Jaime de Sousa.

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de

O Sr. Alfredo de Sousa: — Sr. Presidente: desejo fazer algumas considera-

ções na presença do Sr. Ministro do Trabalho, mas, como S. Exa. não está presente, reservo-me para usar da palavra em outra ocasião.

Todavia aproveito o ensejo para pedir a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre se consente que amanhã, antes da ordem do dia e sem prejuízo dos oradores inscritos, entre em discussão o parecer n.° 652.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: desejava falar com a presença do Sr. Ministro do Comércio, para tratar de assuntos importantes, como, por exemplo, a exportação de peles que são novamente importadas. Porém, como S. Exa. não está presente, reservo-me para usar da palavra em outra ocasião.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Maia: — Sr. Presidente: sou forcado a mais uma vez chamar a atenção do Sr. Ministro da Guerra, para o facto de ainda não terem sido pagas aos oficiais do exército as melhorias a que têm direito, desde Janeiro a Junho.

Já os Srs. general Carmona e major Ribeiro de Carvalho frisaram, nesta Câmara, a justiça que assistia aos Srs. oficiais.

Porém, li nos jornais, antes das férias do Carnaval, que o Sr. Ministro das Finanças tencionava, à sombra da lei-travão, não pagar.

Sr. Presidente: que me conste, as autorizações concedidas ao Govêrno não permitem de forma alguma que se vão cortar essas melhorias que são devidas por leis especiais.

Por conseguinte, de novo insto com o Sr. Ministro da Guerra para que sejam pagas aos oficiais do exército as melhorias em atraso, pois é a única classe que ainda as não recebeu.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Sr. Presidente: sabe V. Exa. que da parte do Sr. Ministro das Finanças não há outro interêsse que não seja o de compensar toda a gente que presta

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serviço ao Estado e entregar o que é devido aos Srs. oficiais do exército; trata-se, apenas, segundo creio, porque o assunto foi resolvido anteriormente à minha entrada para a pasta da Guerra, de uma questão de oportunidade. O Ministério das Finanças é que, neste momento, não está habilitado com a soma indispensável para acudir a essa despesa e, como V. Exas. sabem, sem dinheiro não se pode pagar.

O Sr. António Maia sabe muito bem que o exército custa hoje ao Estado uma soma muito importante, verba que é preciso comprimir implacàvelmente V. Exas. sabem muito bem que neste País o delírio de criação de serviços e o delírio de promoções foi tal que a quási totalidade das verbas destinadas ao exército é aplicada a pessoal.

Eu reconheço ò direito que assiste aos Srs. oficiais; simplesmente, não tendo dinheiro, não posso pagar. K necessário que o exército seja àquilo que deve ser, isto é, um instrumento para fazer a guerra.

Tomo êste compromisso o hei-de cumpri-lo emquanto aqui estiver.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Maia: — Sr. Presidente: agradeço a explicação do Sr. Ministro da Guerra e mais uma vez chamo a atenção da Câmara para o facto de S. Exa. reconhecer que, na verdade, essas melhorias são devidas aos Srs. oficiais do exército.

Contudo a explicação satisfaz-me em absoluto, porque não posso deixar de atender a falta de recursos com que o Estado luta.

Sr. Presidente: apesar disto, não posso deixar de salientar que não vim pedir nada que não seja devido ou que por qualquer forma vá aumentar as despesas, visto que se trata de verbas que de há muito estão previstas.

O que julgo muitíssimo prejudicial para a, disciplina é que se pague aos sargentos e não s© pague aos oficiais.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Não me parece que oficiais que são perfeitamente conscientes da acção que tOm de desempenhar se indisciplinem porque o Estado não pode acudir

desde já ao pagamento de determinada dívida. Estou convencido de que os oficiais não têm ao Estado qualquer má vontade por êsse facto.

O Orador: — Perdão! O que eu disse é que o pagamento somente a uma parte do exército é que provoca a indisciplina, e êsse pagamento foi feito precisamente a uma classe, a dos sargentos, que está melhor remunerada que a dos oficiais.

Para terminar, devo dizer que me satisfaz a declaração do Sr. Ministro de que, oportunamente, serão -pagas essas melhorias.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão o parecer n.° 665 que abre um crédito especial de 3:100.000$ a favor do Ministério da Justiça para reforço da verba orçamental destinados a transporte de degredados e dos serviços prisionais, correccionais e de protecção a menores.

Foi aprovado sem discussão na generalidade.

O Sr. Presidente: — Está em discussão o artigo 1.°

O Sr. Morais Carvalho: — A proposta do lei em discussão, para se abrir um crédito especial pelo Ministério das Finanças a favor do Ministério da Justiça, com o fim de se fazer face a despesas com serviços prisionais — crédito de importância tam elevada, como é êsse que o Sr. Ministro da Justiça vem pedir à Câmara, visto que é pouco mais ou menos o triplo, do que vinha computado no orçamento — denota mais uma vez o pouco cuidado com que são elaborados os orçamentos e a pouca importância que infelizmente um diploma da natureza do Orçamento Geral do Estado pode merecer ao País.

Não posso deixar de tomar em consideração que a desvalorização crescente da moeda por certo modo obriga, de facto, a reforçar a verba orçamental que havia sido fixada, mas o reforço da verba não tende simplesmente a fazer face a essa desvalorização da moeda, e por isso a conclusão a tirar é que os cálculos orça-

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mentais não são feitos com aquele rigor, com aquele cuidado o precisão que eram inteiramente devidos, porque o País tem o direito de conhecer como se gastam os dinheiros do Estado.

Feito este reparo, e sendo informado de que realmente a verba reclamada é necessária, para que possam continuar a funcionar regularmente as prisões, limito-me a lavrar um protesto contra a forma imperfeita por que em geral são calculadas as despesas no orçamento geral do Estado.

O orador não reviu.

Em seguida foram aprovados os artigos 1.° e 2.°

O Sr. António Resende: — Requeiro que seja consultada a Câmara sôbre se dispensa a leitura da última redacção.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o parecer n.° 560, que anexa ao concelho, e freguesia de Setúbal a península do Tróia.

Leu-se. É do teor seguinte:

Parecer n.° 360

Senhores Deputados.— À vossa comissão de administração pública foi presente o projecto de lei n.° 492-A, já aprovado pelo Senado, que anexa, para os efeitos administrativos ao concelho e freguesia de Santa Maria de Setúbal, e para os efeitos judiciais à comarca do mesmo nome a península de Tróia.

O seu parecer é de que ela merece a vossa inteira aprovação.

Lisboa e sala das sessões da comissão de administração pública, 26 de Junho de 1923.— Abílio Marçal — Custódio de Paiva — Costa Gonçalves — F. Dinis Carvalho — Alberto Vidal, relator.

Senhores Deputados.—A vossa comissão de legislação civil e comercial nada tem a opor, à proposta de lei n.° 492-A, vinda do Senado, pela qual se procura anexar a península de Tróia, administrativamente, à freguesia de Santa Maria, do concelho de Setúbal, e judicialmente à comarca de Setúbal.

Sala das sessões da comissão de legislação civil e comercial, 26 de Junho de 1922. — Carlos Pereira — Vergilio Sa-

que — Crispiniano da Fonseca — António Pinto Barriga (com declarações) — Alfredo de Sousa relator.

Proposta do lei n.° 492-A

Artigo 1.° A península de Tróia, em frente de Setúbal, limitada do norte e nascente pelo Rio Sado do poente pelo Oceano Atlântico e pelo sul pelas Valas da Comporta, fica pertencendo administrativamente ao concelho e freguesia de Santa Maria de Setúbal, e judicialmente à comarca do mesmo nome.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Palácio do Congresso da República, 27 de Abril de 1923.— António Xavier Correia Barreto — Luís Inocêncio Ramos Pereira — António Gomes de Sousa Varela.

Projecto de lei n.° 288

Senhores Senadores.— A península de Tróia, situada na margem esquerda do rio Sado, em frente de Setúbal, do que dista corça de 4 quilómetros, sendo limitada ao norte e ao nascente pelo dito rio Sado, do poente pelo Atlântico e do sul pela vala da Comporta, tem pertencido administrativamente ao concelho do Santiago do Cacem e parece que judicialmente à comarca de Grândola, mas tanto duma como doutra, destas vilas dista muitos quilómetros, com a agravante de não estar ligada com elas por qualquer via de comunicação regular.

Nestas condições, e estando sob a directa influência de Setúbal, tudo aconselha que seja anexada, tanto administrativa como judiciàriamente, ao concelho de que esta próspera cidade é sede, e por isso temos a honra de submeter à vossa apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A península de Tróia, em frente de Setúbal, limitada no norte e nascente pelo rio Sado, do poente pelo Oceano Atlântico, e pelo sul pelas valas da Comporta, fica pertencendo administrativamente ao concelho, e freguesia de Santa Maria de Setúbal e judiciàriamente à comarca do mesmo nome.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões do Senado, 6 de Setembro de 1922. — Manuel Gaspar de Lemos — Herculano Jorge Galhardo.

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Penhores Senadores.— A Acossa comissão da administração pública, tomando conhecimento do projecto de lei n.° 298, da iniciativa dos Srs. Gaspar do Lemos e Herculano Galhardo, e considerando que êle tem por objecto a mudança do, pelo menos, parto duma freguesia para outro concelho, torna-se preciso observar a êsse respeito, para o Poder Legislativo p odor tomar conhecimento dolo, o disposto no artigo 5.° da lei n.° 621, do 23 do Junho de 1916, pelo que, em quanto só não mostrar observada essa disposição legal, deverá sustar-se o prosseguimento do aludido projecto.

Sala das sessões da comissão, 18 de Novembro do 1922.— Godinho do Amaral — Joaquim Pereira Gil — Ricardo Pais Gomes, relator.

O Sr. Presidente: — Está em discussão o artigo 1.°

O Sr. Jorge Nunes: — Sr. Presidente: o parecer vem à discussão sem se ter procedido à formalidade elementar, que é de uso; do respectivo referendum, Nestas condições, chamo a atenção da Câmara, dizendo que não pode merecer a aprovação do Parlamento.

O orador não reviu.

O Sr. Alfredo de Sousa: — A comissão de legislação civil dou o seu parecer porque a comissão de administração pública já emitira parecer favorável. E verdade que só não cumpriram as formalidades exigidas pela lei, segundo as quais teria havido o referendum preceituado no Código Administrativo.

É rejeitado.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o parecer n.° 560 (de 1920), sObre a petição do capitão picador Salvador José da Costa.

Leu-se. É do teor seguinte:

Parecer n.° 560

Senhores Deputados.— À comissão de guerra foi presente a petição do capitão picador, Salvador José da Costa, que, segundo alega, não tendo obtido reparação pelos prejuízos sofridos desde Dezembro de 1917, como requereu nos termos

do decreto n.° 0:172, de 24 de Fevereiro d 1919, vem solicitá-la ao Parlamento.

Contendo a petição deficientes pontos, foram por esta comissão solicitados ao Ministério da Guerra os esclarecimentos precisos.

Por êles e pela ordem daqueles pontos, verifica a comissão:

1.° Que da nota de assentos enviada pelo Ministério da Guerra nada consta no «registo disciplinar». Mas do uma nota igual enviada pelo peticionário é devidamente autenticada no Ministério das Colónias, onde está servindo dêsde Junho de 1919, consta o castigo de «dez dias de prisão disciplinar» aplicado em 4 de Outubro do 1918, por haver tomado parte num jantar em um restaurante. De ambas as notas de assentos consta da casa «notas biográficas» a verba de transferência do regimento de artilharia n.° 2 para o regimento de cavalaria n.° 7, por motivo disciplinar, correspondente àquele castigo.

Assim, a comissão é do parecer que o averbamento existente no Ministério das Colónias do castigo aludido e que foi sem dúvida, pela sua redacção e pela data da aplicação, de natureza de perseguição política, deve ser mandado anular, como anulado está no Ministério da Guerra, o bem assim a nota existente nas notas biográficas o Ordem do Exército n.° 19, 2.º série, de 31 de Outubro de 1918.

2.° Que não vê MotiVo para ser presente a Conselho de Guerra, pois reconhece ao peticionário o seu grande amor e dedicação pela República, por quem, como bom patriota, se tem sacrificado e dado todo o seu esfôrço.

3.° Que, nos termos das disposições em vigor, seja averbado, se a isso tiver direito e como aos demais militares se fez, o tempo que serviu, como do campanha, nas operações no norte do País, em Janeiro o Fevereiro do 1919.

4.° Que ao Poder Executivo se recomendam os serviços prestados, em faço dos documentos apresentados ou do informação que possa exigir a quem de direito, para os fins do recompensa moral.

5.° Que, não tendo a comissão, instituída por decreto n.° 5:172, de 24 de Fevereiro do 1919, considerado o requerente ao abrigo das suas disposições, pode o deve o peticionário apresentar a sua ré-

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clamação à comissão de reparações pelos prejuízos causados pela insubordinação monárquica.

6.° Que seja relegado ao Poder Executivo o facto de não estar ainda satisfeito o serviço que o peticionário prestou na censura postal.

Todas estas resoluções devem ser transmitidas aos Srs. Ministros da Guerra e das Colónias.

Sala da comissão de guerra, 5 de Agosto de 1920.— João Pereira Bastos — Tomás de Sousa Rosa — Júlio Cruz — Viriato Gomes da Fonseca — Albino Pinto da Fonseca — João E. Águas.

Senhores Deputados.— A comissão de guerra, em presença do requerimento do Sr. Sá Pereira e referente ao parecer n.° 560, e ponderando a doutrina do mesmo parecer, julga e resolve que nada mais lhe tem a acrescentar.

Sala das Sessões, 23 de Maio de 1923. — Tomás de Sousa Rosa — José Cortês dos Santos — António de Mendonça — Albino Pinto da Fonseca — João Estêvão Águas.

Exmo. Sr. Presidente da Câmara dos Deputados. — Salvador José da Costa, capitão picador, em comissão no Ministério das Colónias, tendo tido conhecimento de que na nota de assentamentos, enviada não sabe por que repartição, e pedida pela comissão de guerra da Câmara dos Deputados, em virtude da reclamação do requerente, não se acha averbado um dos castigos, sofrido no regimento de artilharia n.° 2 em Outubro de 1918, e não sendo essa nota cópia fiel da folha que o acompanha, e transitou, por todos os regimentos o colónia da África Ocidental, e se acha depositada no Ministério das Colónias, ocasionando assim não parecer verdadeira a sua reclamação, o que ouviu afirmar por alguns membros na comissão de guerra dessa digna Câmara, no respeitante aos castigos, envia a cópia janta da sua folha, pedida oficialmente, esperando seja averiguada a causa dessa eliminação que tanto o prejudicou em sua dignidade e para que o requerente não encontra explicação, porquanto tendo indagado particularmente no Ministério da Guerra, na respectiva repartição, aí lhe foi dito não constar ter-se enviado nota

dos assentos a essa digna Câmara; mui respeitosamente

Pede a V. Exa. lhe seja feita justiça como requeiro.

Lisboa, 6 de Agosto de 1920.— Salvador José da Costa, capitão picador.

Exmo. Sr. Presidente da Câmara dos Deputados.— Salvador José da Costa, capitão picador do exército, fazendo serviço no Ministério das Colónias como ajudante de campo do Governador Geral de Angola, vem perante a digna Câmara de que V. Exa. é ilustre Presidente expor os seus sofrimentos morais e materiais, por isso que o facto de a Republica ter novamente reconquistado o seu lugar para que o abaixo assinado cooperou em nada lhe serviu, continuando a sofrer as conseqüências de ter prestado serviços no período que vai de 14 de Maio de 1915 a 8 de Dezembro de 1917; podendo isto justificar-se no período do sidonismo, mas nunca após êsse nefasto crime, em que os seus correligionários em vez de o levantar moral e materialmente, dando seguimento aos seus inúmeros requerimentos e vendo da sua justiça, que ressalta, segundo opiniões extra-oficiais, se limitaram a indeferir, permitindo que os intermediários a quem não convém a reabilitação do abaixo assinado, vençam, conseguindo os seus fins.

Antes de narrar por quanto tem passado e o que tem sofrido desde 9 de Dezembro de 1917 até esta data, necessita o abaixo assinado expor: que para fazer face às perseguições e seus resultados devido ao período sidonista, teve de vender quanto possuía em Évora por 2.700$, como se pode verificar da Conservatória dessa cidade, e a sua casa ficou em Lisboa, por ter sido desterrado, nunca mais a pôde reunir, devido à mudança fora das suas vistas e o conservar-se fechada até hoje, por as suas circunstâncias lhe não permitirem fixar-se; encontrando-se hoje toda inutilizada; era a casa com que criou treze filhos, dos quais quatro estiveram conjuntamente na guerra, morrendo um em resultado da mesma.

Posto isto passa a narrar os acontecimentos.

Por indicação de V. Exa. em 14 de Maio de 1915, ao Sr. Norton de Matos, chefe de gabinete da Secretaria da Guer-

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ra, ficou o abaixo assinado fazendo serviço no gabinete, onde se conservou oficialmente até passar ao Ministério do Interior por ser requisitado para a Guarda Nacional Republicana, continuando ainda assim a prestar serviços voluntariamente o com sanção do então Ministro da Guerra, Sr. Norton de Matos.

Do inúmeros dêsses serviços, que não estão registados, sem culpa do requerente, são testemunhas V. Exa., os Srs. Drs. Afonso Costa, Augusto Soares, Domingos Pereira e os Srs. Pereira Bastos, Tomás do Sousa Rosa, Vitorino" Guimarães, Américo Olavo, Carlos Olavo, Herculano Galhardo, Roberto da Cunha Baptista, Almeida Santos e tantos outros, Senadores o Deputados de todos os partidos o especialmente do Partido Democrático.

Em Dezembro do 1917, estando o abaixo assinado em Canas de Senhorim, foi por ordem do Sr. Ministro da Guerra para o Pôrto, onde chegou em 1 de Dezembro; os serviços que aí prestou sabem-nos todos os membros do Govêrno de então e foram classificados, pelo telefone, pelo então Presidente do Conselho; aí cumpriu,o seu dever junto ao Sr. Dr. Afonso Costa, de quem se despediu no dia 8 à noite, em que aquele ilustre homem de Estado foi proso, e trouxe duas cartas para Lisboa, uma das quais ainda não pôde entregar. Quais foram os seus serviços nesses oito dias podem testemunhá-lo os Srs. Drs. Afonso Costa e Augusto Soares.

Apresentou-se o abaixo assinado na Divisão declinando a qualidade em que se achava no Pôrto e que era conhecida da mesma, e recebeu guia para Lisboa, onde não receou apresentar-se e foi logo desterrado para a Figueira da Foz, para onde teve de ir sem a família, começando desde então a ter do fazer despesas superiores aos seus vencimentos.

Não sossegou ali; logo em 25 de Janeiro recebeu uns quesitos da repartição dos inquéritos aos Ministérios e Repartições do Estado, assinados pelo juiz Sr. Alfeu Cruz, em que se lho atribuíam falsidades sôbre o incêndio do Depósito de Fardamentos em 1916, deturpando a verdade dos factos, ao que o requerente respondeu altivamente e sem receios, percebendo qual era o fim em vista.

Em meados de Fevereiro de 1918 re-

cebeu ordem inesperada de marchar para Almeida, onde era mandado residir sem comissão, ficando separado da família, que acabava do chegar à Figueira da Foz, o onde não conhecia ninguém. Aí só conservou até fins de Maio, em que o mandaram apresentar na Secretaria da Guerra. O que aí passou e as dificuldades que lhe criaram em todas as cousas da sua vida constam de reclamações e notas; tendo por fim de viver numa caserna da praça e beber só leite; aí valeram-lhe alguns correligionários que logo o estimaram.

Tendo vindo a Lisboa por interferência pessoal do Sr. Freitas Soares, então chefe do Gabinete, voltou à Figueira; da forma porque falou então ao Ministro da Guerra e manteve as suas afirmações liberais são ambos testemunhas o constam duma carta do Sr. Chefe do Gabinete.

Chegado à Figueira desenvolveu-se uma perseguição atrás de dois criminosos que ainda julga impunes, Dr. Costa Alemão e administrador Mimoso Ruiz, e dum oficial, major Tôrres, antigo perseguidor de republicanos.

Em 30 de Julho foram-lhe enviados uns quesitos, sendo arguido de ter diariamente reuniões, etc., respondendo altivamente, expondo a verdade; não contentes, em 19 de Setembro repetiram os quesitos, tendo a mesma resposta; quer uns quer outros' desonram quem os fez.

Havia todo o interêsse em encontrar um motivo que justificasse o procedimento, ê êsse motivo dou-se em fins de Setembro; o abaixo assinado assistiu a um jantar num restaurante público, tendo sendo visto e cumprimentado pelo seu comandante, que não viu nada de extraordinário nesse acto pois bastou êsse facto para que recebesse da 5.ª Divisão ordem de 10 dias de prisão disciplinar com comêço em 5 de Outubro.

As fatalidades que se originaram dêsse facto que (caso extraordinário) os seus camaradas monárquicos julgaram injusto, foram enormes!

O abaixo assinado reclamou; veio uma sindicância em que só cometeram as maiores arbitrariedades, e de que são testemunhas os chefes políticos de dois partidos naquela localidade, que foram testemunhas, Dr. Manuel Gaspar de Lemos, Dr. José Maria Cardoso, Dr. Manuel Gomes Cruz o Dr. Adelino Fer-

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reira Mesquita e todos os seus camaradas e republicanos da Figueira da Foz de nada lhe valeu; em 19 era dada ordem para marchar para Nelas, para onde era transferido por castigo.

Ora tinham-se dado as seguintes circunstâncias, a que hoje por ter passado tempo, se dá pouca importância, mas que na ocasião representaram para o requerente o maior sofrimento que é possível ter.

Um filho seu que tinha estado na guerra, em duas campanhas na província de Moçambique, chegava a Lisboa doente e sem o ver há uns três anos.

Tendo conhecimento das circunstâncias que se davam, desorientou-se e contra a intimativa do médico e família pôs-se a caminho para a Figueira com mulher e duas filhas com acesso de febre; durou apenas três dias e o requerente teve de marchar na véspera dele falecer, sem lhe poder acudir nem assistir à sua agonia; uma filha que muito estimava e que começara a adoecer quando da sua prisão, faleceu dois dias depois, e o requerente teve de vir de Nelas assistir aos seus enterros.

É difícil explicar as circunstâncias que se acumularam para se dar êste desenlace, mais fácil é sofrê-las que narrá-las, mas foram causa primordial o seu castigo!

Chegado a Nelas, comandava o regimento um oficial que justificadamente o não é hoje, e que era todo das juntas do Norte; é de prever as circunstâncias que se deram, quer da parte dêle, quer da divisão, comandada por Paulo de Quental com um chefe de estado maior da mesma qualidade; os acintes foram imensos, até que a junta do Norte desafivelou a máscara mandando a circular, que o comandante leu em reunião de oficiais; ali mesmo preguntou o requerente pelas vias competentes se essa circular vinha oficialmente; ao que o coronel se recusou a responder, fugindo da sala.

Tinham-se extremado os campos.

Tendo chegado ao quartel o tendo-lhe alguns oficiais mostrado os jornais em que o comandante da 2.a divisão e chefe do estado maior faziam declarações a favor da Junta do Norte, pediu pelas vias competentes ao comandante do regimento para permitir que em seu nome e de al-

guns oficiais telegrafasse ao Sr. Ministro da Guerra dizendo-lhe que, ao contrário de outros oficiais, «lhe testemunhávamos o nosso franco e leal apoio para a manutenção da ordem e defesa da Pátria e da República».

Deu-se o que se tinha de dar: a divisão castigou-o com cinco dias de prisão disciplinar, que cumpriu, e dos quais reclamou, havendo sindicância e resultando o ser transferido para Elvas, onde quando chegasse havia ordem de marchar para Viana do Castelo!

Marchou em 20 para a Pampilhosa, onde chegando lhe disseram que não havia comboios para os lados de Lisboa; foi à Figueira pôr a sua família, falou numa das noites no teatro a favor da nossa intervenção na defesa da Pátria e marchou para Coimbra, onde lhe foi dada guia para se apresentar em Aveiro no Quartel General, onde então apenas havia oficiais da guarnição, e as tropas monárquicas se achavam quási envolvendo aquela localidade; frisa este facto porque é uma verdade: um grande número de indivíduos não tinham naquela altura coragem para se manifestar e esperavam a ocasião oportuna; êle não-tergiversou; e tendo contra si, se êles vencessem, «o ter modificado o itinerário indo de castigo, indo apresentar-se numa localidade a combatê-los sem que a ela pertencesse». Claro que nada o salvaria.

Em Aveiro trabalhou dia e noite, como diz o Sr. major Castilho Nobre, como um «negro» e como o sabem os oficiais todos que ali tiveram intervenção, até a entrada dos vitoriosos no Pôrto; pois apesar disso e do abaixo assinado ter visto os serviços que prestou cada um dos que ali compareceram, nem sequer se lhe fez urna referência, vendo-se obrigado a requerer que ao menos lhe seja averbado, para os fins convenientes, o tempo que fez serviço de campanha!

Vencia a República! O abaixo assinado sentia-se satisfeito e esperava, logo que serenassem os ânimos, fazer os seus requerimentos para que lho fôsse feita justiça e castigados aqueles que lhe tinham maculado a folha de serviços de 34 anos de oficial com castigos injustos o que, parece inacreditável, ainda hoje lha pejam!

Em 10 de Março de 1919 requeria o abaixo assinado a S. Exa. o Ministro da

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Guerra, ao abrigo do decreto n.° 5:172, para que se dignasse deferir «sejam chamados à responsabilidade todos aqueles que o perseguiram ou deram apoio a essa perseguição e lho seja dada a reparação moral e material que nas suas reclamações instantemente pediam».

Tendo constituído advogado o Sr. capitão J. Ribeiro Gomes, por V. Exa. o não poder fazer, foi indagar do motivo por que não tinha solução o seu requerimento e depois de muito trabalho, soube que o requerimento tinha sido arquivado com o deferimento favorável do Conselho de Ministros de 6 de Maio próximo passado!

Admirou-se o requerente que se arquivasse um requerimento deferido em vez de lhe dar andamento, e foi-lhe dito pela repartição que assim se tinha feito porque não tinha sido deferido individualmente pelo titular da Guerra!

Vendo o requerente que nada conseguia, fez novo requerimento em que pedia fôsse dado o deferimento individual a fim de se proceder; em 4 de Novembro tinha conhecimento oficial de que êste requerimento fora indeferido pelo Conselho de Ministros que já tinha deferido, cerceando-lhe os meios de tirar da sua folha tam injustos castigos!

Em princípio do ano passado, andando em serviço da República, veio o requerente a Lisboa e teve conhecimento de que os seus colegas da censura tinham requerido lhes fossem pagos os vencimentos que deixaram de receber com a saída violenta do serviço; para o requerente dava se uma circunstância superior aos demais, era que êle e o Sr. Salvador Sabóia, empregado dos correios, foram os únicos que foram mandados sair da censura por uma ordem dimanada da Rotunda quando os revolucionários ainda ali se encontravam; pois êste senhor e outros receberam, e ao requerente foi negado, apesar das boas informações e do ser de todos da censura o que mais o mais difíceis serviços prestou à Pátria o à República!

O abaixo assinado não compreende êste procedimento para com êle; nada o justifica e se não visse elevar e dar valor a indivíduos que o pasmam por não lhes saber os sacrifícios, poderia talvez calar-se ; assim não; e é em último recurso,

pois só lhe resta depois apelar para a Sociedade, que vem perante a digna Câmara na pessoa de V. Exa. respeitosamente pedir-lhe seja dado andamento aos seus requerimentos, para que presente a um conselho de guerra, aí se prove se delinqüiu ou não nos castigos que lhe foram dados, seguindo-se o procedimento em qualquer dos casos.

Que sejam indagados os seus serviços prestados à Pátria e à República, como também requereu, procedendo-se para com êle como se procedeu com os demais cidadãos, especialmente nas condições em que se encontrou quando fez parte do quartel general em Aveiro, em Janeiro e Fevereiro de 1919, e o resultado lhe seja averbado, para honra de seus filhos.

Que lhe sejam satisfeitos os vencimentos que deixou de receber, por ter saído violentamente da censura por ordem dos revolucionários, como se fez a tantos outros, tendo ficado em desigualdade de circunstâncias.

Finalmente seja indagado da verdade dos factos que narra pelos documentos existentes e testemunhas que cita.

Saúde e Fraternidade.

Lisboa. 14 de Fevereiro de 1920. — Salvador José da Conta, capitão picador em serviço no Ministério das Colónias.

O Sr. Lelo Portela: — Sr. Presidente: havia pedido a palavra, antes da ordem do dia, mas V. Exa. não ma concedeu, embora a Câmara tivesse resolvido que o parecer entrava em discussão sem prejuízo dos oradores inscritos.

O Sr. Presidente: — Devo dizer ao Sr. Deputado que o inscrevi para antes da ordem do dia, mas não lhe dei a palavra porque S. Exa. não estava presente.

O Sr. Lelo Portela: — Tenho estado sempre na sala.

O Sr. Presidente: — Está em discussão o parecer n.° 560.

O Sr. Lelo Portela: — Antes de entrar na discussão da generalidade do parecer, devo informar V. Exa. de que tenho estado sempre presente nesta sala...

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O Sr. Presidente: — Devo esclarecer V. Exa. que o parecer que se discute só tem discussão na especialidade.

É aprovado, sem discussão, o parecer da comissão de guerra.

O Sr. Almeida Ribeiro: — Como já só encontram nesta Câmara as emendas introduzidas pelo Senado à proposta do acordo com a Companhia dos Tabacos, emendas que não alteram essencialmente a matéria por nós aprovada, requeiro que essas emendas entrem imediatamente em f discussão.

É aprovado.

Lêem-se e entram em discussão.

O Sr. Ferreira de Mira: — Sr. Presidente: ignoro as razões que levaram o Senado a incluir na proposta de lei o parágrafo único ao artigo 5.°

É possível que êle seja de uma grande utilidade. Eu desconheço-a e por isso desejaria que o Govêrno, que certamente acompanhou -a sua discussão nossa Câmara, me dissesse quais tinham sido essas vazões.

O Sr. Almeida Ribeiro: — A razão do parágrafo que o Senado adicionou ao artigo 5.° da proposta presumo que esteja no facto de haver grande dificuldade em adquirir sêlos e outras fórmulas de franquia nas casas em que êles se anunciam e que o fazem apenas para os seus proprietários usufruírem as regalias concedidas por lei.

Por êste parágrafo, os estabelecimentos nos quais fôsse dada a licença para venda de tabacos ficariam obrigados a vender todas as fórmulas de franquia.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: eu não compreendo o motivo que leva o Parlamento a introduzir numa proposta de acordo entre o Estado e uma companhia particular a alteração que deve recair sôbre os direitos relativos aos artigos de fumar, ainda além do prazo da concessão.

Creio que uma tal doutrina não pode ter cabimento numa proposta desta natureza.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr Presidente: suponho haver engano do ilustre Deputado que mo precedeu no uso da palavra quanto à interpretação do artigo introduzido pelo Senado.

O Senado pretendeu, e muito bem, que a Companhia tinha de pagar um aumento dos direitos em relação ao aumento dos seus preços de venda.

O Senado, introduzindo esta disposição que a Câmara dos Deputados indevidamente não tinha consignado, procedeu, no entanto, mal em não a incluir nas bases do acordo, mas em artigo separado, e seria conveniente que o Sr. Ministro das Finanças soubesse que a Câmara dos Deputados, dando o seu voto a êste artigo do Senado, o faz com a convicção do que o Govêrno o incluirá no próprio acordo o não quando o contrato fôr findo, porque nessa altura a Companhia recusaria ao Govêrno o direito do fazer êsse aumento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: êste artigo foi introduzido no Senado com o assentimento do Sr. Ministro das Finanças, o S. Exa. que viu ò alcance dolo, certamente que o fará entrar nas condições devidas no contrato com a Companhia dos Tabacos.

O orador não reviu.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: a precipitação com que esta proposta foi trazida à Câmara e o tempo que me faltou para ler com cuidado o artigo 15.° do contrato de 1906, fizeram com que, a propósito do artigo 6.°, novo, da autoria do Senado, eu produzisse considerações que foram, com inteiro fundamento, rebatidas pelo ilustre Deputado Sr. Ferreira da Rocha.

A argumentação expendida por S. Exa. tem razão de ser e com ela me conformo em absoluto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foram aprovados o artigo novo do Senado e os artigos 7.° e 8.° da Câmara dos deputados.

Foi aprovado o requerimento do Sr. Alfredo de Sousa, para entrar em discussão na próxima sessão, sem prejuízo dos ora-

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dores inscritos, o parecer n.° 662, que altera as disposições legais que actualmente regulam os contratos de empreitada.

Foi lida uma nota de interpelação do Sr. Lelo Portela.

Foi aprovada a acta.

O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Contínua em discussão o parecer n.° 622, sôbre o empréstimo a Moçambique. Tem a palavra, para prosseguir as suas considerações, o Sr. Delfim Costa, que a tinha reservada.

O Sr. Delfim Costa: — Sr. Presidente: começo por saudar a colónia de Moçambique por ver realizado o seu objectivo da realização do empréstimo sem recorrer à União Sul-Africana, porque se a isso fôsse obrigada certamente que lhe seriam impostas condições leoninas e até ameaçadoras para a sua independência.

Desde há muito que sou partidário de que a província de Moçambique necessita de criar vida própria. Desde 1909, época em que se realizou o primeiro convénio com a África do Sul, que toda a gente reclama a libertação de Moçambique da tutela sul-africana.

Há dúvidas sôbre se a colónia terá capacidade pára suportar os encargos que êsse empréstimo lhe trará. Eu sou de opinião que tem e que as obras de fomento devem fazer-se ràpidamente à custa do empréstimo, amortizando êsses empréstimos com aquilo que nos orçamentos anuais se vai dispensando para obras que ao fim de determinado número de anos não se vêem.

Estou convencido de que Moçambique tem condições de vida para fazer face aos seus encargos.

E, sendo assim, a Câmara vê bem qual é a vantagem de realizar essas obras ràpidamente e não fazer como se tem feito com o caminho de ferro do Moçambique, que está sendo construído há mais de dez anos e tem apenas perto do 50 quilómetros.

É esta a forma de criar riqueza e desenvolver uma colónia?

O caminho de ferro de Quelimane serve

também o rico distrito de Tete, mas foi feito por uma companhia inglesa e não me consta que ninguém tivesse receio de desnacionalização.

Pedir um empréstimo para obras de fomento e pagar a tempo os compromissos não é desnacionalizar, mas nacionalizar.

A via férrea de Lourenço Marques não serve uma pequena região o nós temos apenas construídos 190 quilómetros.

A outra obra quero referir-me. Trata-se da irrigação e drenagem do vale de Limpopo que é uma região fertilíssima.

Houve um governador de iniciativa que mandou fazer o estudo de irrigação e drenagem e um engenheiro inglês da colónia do Natal disso que considerava o valo do Limpopo mais valioso do que as minas do Kand, pois esta bela região está desprovida de tudo.

Afirmo que me não atemoriza a desnacionalização da colónia por meio de empréstimos; o grande perigo é não realizar obras de fomento e deixar que companhias estrangeiras as façam. Isto, sim, é que me atemoriza e não os empréstimos.

Mas, Sr. Presidente, tem-se seguido na província de Moçambique, uma política que muita gente classifica a política do porto do caminho de ferro de Lourenço Marques. Nós legámos ao porto e caminho de ferro de Lourenço Marques cinco milhões em detrimento do desenvolvimento agrícola da colónia.

O porto e caminho de ferro de Lourenço Marques é a maior garantia da nossa independência em Moçambique. E mesmo uma manifestação, grandiosa; o primeiro porto de toda a África, rival do porto do Durban, em que os ingleses gastarem milhões de libras.

Aqui podem, no porto de Lourenço Marques, entrar navios de grande tonelagem, o que não acontece no porto inglês.

Isto levantou em todo o Natal verdadeiro alarme, porque aí se tinham feito enormes gastos.

O dinheiro que nós gastámos no nosso porto dignifica-nos aos olhos do mundo.

Ainda hoje no Século vem uma notícia relativa ao porto de Lourenço Marques, considerando o uma maravilha à custa do nosso esfôrço.

Portanto, o nosso dinheiro tem sido bem aplicado, o assim não posso deixar de aprovar que só faça o empréstimo, porque

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as receitas hão-de cobrir as despesas actuais, pagando integralmente o empréstimo.

Não tenho dúvidas sôbre isso.

Nestas condições, não posso deixar de defender o empréstimo, destinado não a criar o hinterland, mas a fomentar a província e os interêsses nacionais.

Tenho dito.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

É aprovado o artigo 1.°

Lê-se o artigo 2.°

O Sr. Rodrigues Gaspar: — Mando para a Mesa uma proposta de aditamento.

Proponho que ao artigo 2.° se acrescente o seguinte parágrafo:

§ 3.° Os empréstimos e os seus respectivos encargos serão satisfeitos na mesma espécie de moeda em que tiverem sido contraídos os empréstimos. — A. E. Gaspar.

Foi lida, admitida e entrou em discussão.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Para alguma cousa deve servir a experiência, alguma cousa devemos aproveitar da lição dos factos.

Êste artigo 2.° é a transcrição da lei n.° 1:131, que autoriza o empréstimo para Angola.

Todos sabemos quais as conseqüências desta disposição.

Fica a colónia autorizada a contrair empréstimos, e Angola realisou-os em escudos na metrópole e em Angola; à sombra desta disposição.

Amanhã far-se-há o mesmo em Moçambique, e as conseqüências peço a V. Exas. que meditem bem nelas.

Reparem V. Exas. o que significa um empréstimo em escudos, adquirindo escudos na metrópole.

As conseqüências económicas são desastrosas se ámanhã qualquer colónia vier procurar no mercado português milhões de libras para as suas necessidades.

Outra hipótese é procurar escudos moçambicanos em Moçambique. Só podem ser obtidos pelo aumento da emissão extraordinária da circulação das colónias.

O resultado em Angola foi o que se

sabe, o que deu porventura causa à minha saída de Ministro.

O mesmo dar-se há em Moçambique, servindo-se do processo de transferências entre Moçambique e Lisboa.

Proponho simplesmente a eliminação dêste parágrafo, ficando a colónia de Moçambique autorizada apenas a realizar empréstimos em ouro.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva): — Sr. Presidente: pedi a palavra para solicitar de V. Exa. que consulto a Câmara sôbre se permite que entre amanhã em discussão, antes da ordem do dia e com prejuízo dos oradores inscritos, o parecer n.° 636, que se refere a um reforço de verba de que muito careço.

Tenho dito.

O orador não reviu.

É Lida e admitido a emenda enviada para a Mesa pelo Sr. Ferreira da Rocha, do teor seguinte:

Proponho a eliminação do § 2.° do artigo 2.° — Ferreira da Rocha.

O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: eu não sei qual seja a vantagem na eliminação do § 2.° do artigo 2.° em discussão.

Disse o Sr. Ferreira da Rocha que a lição dos factos nos ensina a ser prudentes o porventura a reconhecer a necessidade de eliminar êsse parágrafo. Ora eu creio que a lição dos factos nos ensina a ser prudentes, sem dúvida, mas não vejo que tenha havido imprudência na execução da matéria idêntica á do parágrafo 2.° pelo que diz respeito ao financiamento de Angola nos últimos tempos.

Dessa execução resultou, sim, que se fez uma série de empréstimos em escudos, de importâncias elevadas, que provocaram o desenvolvimento largo e rápido de todos os elementos de vida de Angola.

Portanto, só posso reconhecer vantagens para a província de Angola na aplicação da doutrina equivalente à do parágrafo 2.° Não vejo, por conseqüência, que haja razão para se suprimir êste parágrafo.

De resto, a base 65.ª, que tanto se tem discutido aqui, e que permite às colónias

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fazerem empréstimos, mantem-se de pé, e, portanto, não é suprimindo êste parágrafo que se suprime a doutrina dessa base que permite às colónias fazerem empréstimos largos, os quais só carecem de sanção dêste Parlamento em determinadas condições.

Por outro lado, não faz sentido que nós suprimamos êste parágrafo 2.° e que continuemos a manter de pé a doutrina da base 65.ª

Se, porventura, o parágrafo 2.° está a mais, não faz mal, porque não vai contra a doutrina da base 65.ª, e a sua supressão nesta altura poderia induzir em êrro algumas pessoas de que nós cortávamos à província a faculdade da realização de empréstimos nas condições da base 65.ª

Nestas condições, voto contra a eliminação do § 2.° do artigo 2.°

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins): — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar a V. Exa. e à Câmara que acoito a proposta apresentada pelo Sr. Rodrigues Gaspar.

Quanto à proposta do Sr. Ferreira da Rocha, entendo que a Câmara não deve aprová-la, porque realmente a colónia de Moçambique, independentemente dos empréstimos internos, é necessário que tenha também a margem suficiente para fazer aquelas, operações de crédito necessárias para liquidar situações anteriores.

Disse S. Exa. que alguma cousa devemos concluir dos factos produzidos, como aqueles que se deram na província de Angola, em que, à sombra de uma autorização de empréstimo, se fez um aumento de circulação fiduciária.

Assim é, mas o que se deu em Angola foi a transformação de um empréstimo interno em externo e daí a origem da crise que a província atravessa.

Porém, se efectivamente êsse facto nos devo servir de lição, não é para suprimirmos êste § 2.°, mas para impedirmos que Moçambique faça com o Banco Ultramarino aquilo que Angola fez.

Disse ainda S. Exa. que, se a província necessitasse do empréstimos internos, o Parlamento poderia autorizá-los.

Ora nós não somos senhores dos trabalhos parlamentares e portanto podia

dar-se o caso de que, quando a província necessitasse de realizar créditos urgentes, o Parlamento não lhos poder votar com a devida urgência.

Nestas condições, entendo que devemos até afirmar à província de Moçambique que ela pode estabelecer os empréstimos internos precisos para sair de dificuldades de momento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: o assunto parece-me que fica resolvido pela manutenção do § 2.°

Certamente a maioria vai votar com o Sr. Ministro das Colónias.

Portanto, as minhas palavras ficam simplesmente como protesto a registar para que daqui a alguns anos, quando as conseqüências aparecerem, se saiba que alguém previu o perigo e o apontou, como alguém previu e apontou o perigo quando se tratou do empréstimo de Angola.

Mas não é verdade que o § 2.° signifique a manutenção da base 65.ª, como disse, um orador antecedente.

Portanto, se não se der uma autorização especial à colónia de Moçambique, ela continuará autorizada a fazer o empréstimo em moeda estrangeira, como cabe dentro da autorização dada pela lei.

Mas o que se pretende não é isso, é dar uma autorização parlamentar além do montante que a autorização já autorizava.

Tem-se dito que se vai dar uma autorização para um empréstimo que não vá tam longe como êsse parece ir:

Àpartes.

O que aqui se tem dito, pela boca do Sr. Ministro das Colónias e dos Srs. Deputados que aqui têm tratado do assunto, é que a colónia precisa fazer um empréstimo para alcançar material para obras e para certos trabalhos.

Mas foi-se mais além disso, e para essa iniciativa não entrou a colónia, nem foi chamado o Parlamento.

Disse o Sr. Ministro das Colónias que seria um êrro fazer-se um empréstimo interno em moeda estrangeira.

Erro seria procurar amanhã que a colónia venha a fazer um empréstimo em escudos em Portugal, tendo de os transformar em moeda estrangeira.

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O que se fez em outra colónia não há necessidade de fazer em Moçambique por semelhança.

Não creio que o Parlamento tome tal iniciativa, e, se a tomar, eu fico esperando o arrependimento futuro.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Rodrigues Gaspar: — Sr. Presidente: o Sr. Ferreira da Rocha fez considerações de muito valor que devem pesar bem na sua consciência, pois são filhas da experiência do que sucedeu com o empréstimo de Angola.

Pena foi que S. Exa. não fizesse essas mesmas considerações na comissão do colónias quando foi dado parecer sôbre êste empréstimo.

De facto, a iniciativa do Conselho do Moçambique é do empréstimo em ouro e creio até que o Sr. Ministro das Colónias apresentou esta proposta baseado no que só fez em Angola.

S. Exa. chamou a atenção da Câmara, e muito bem, para o resultado do que só fez em Angola e estou de acordo com o que S. Exa. disse.

O grande êrro cometido em Angola foi contrair um empréstimo em escudos de Angola.

Depois chegou-se ao estado desgraçado que todos sabemos.

Não será com o meu voto que em Moçambique se procederá do mesmo modo, porque entendo que se praticou um êrro gravíssimo.

Trata-se de um caso de administração em que a própria colónia deve intervir, estabelecendo as bases do empréstimo a autorizar.

Já aqui se disse que a Câmara deveria autorizar certas somas para obras de fomento.

As particularidades do contrato não se discutem aqui, por.que isso compete especialmente à responsabilidade da colónia, tendo a fiscalização da metrópole, e oxalá ela se faça de facto numa questão tam importante como esta dos empréstimos.

Concordo com as considerações feitas pelo Sr. Ferreira da Rocha, mas não ponho do lado a opinião que tenho sôbre a necessidade de só manter o § 2.°

Acho que êle deve ficar para evitar que amanhã surjam as dificuldades para a rea-

lização de qualquer obra de fomento que possa ser efectuada só com escudos de Moçambique.

Retirando se o referido parágrafo, teríamos, então, para aquele caso de discutir um novo empréstimo em escudos.

Voto, pois, pela manutenção do § 2.°, convencido de que na administração do Moçambique só hão de ter em vista os erros cometidos na província de Angola.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Não há mais ninguém inscrito.

Vai votar-se a proposta de eliminação do § 2.º

Foi lida na Mesa e seguidamente rejeitada.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Requeiro a contraprova.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Invoco o § 2.° do artigo 116.°

Seguidamente procede-se à contraprova e contagem.

O Sr. Presidente: — Estão em pé 35 Srs. Deputados, sentados 24.

Está rejeitada.

Foi lido e aprovado o aditamento e o artigo 2.°

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro da Marinha requereu que entrasse na ordem do dia de amanhã, com prejuízo dos oradores inscritos, o parecer n.° 636.

Foi aprovado.

foi lido e pôsto em discussão o artigo 3.°

O Sr. Rodrigues Gaspar: — Pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de aditamento.

Proponho que ao artigo 3.° se acrescente o seguinte:

§ 2.° Por capital realizado ou efectivo entender se há o produto líquido do empréstimo depois de deduzidos todos os encargos o comissões que possam resultar da aplicação do respectivo contrato.— Alfredo R. Gaspar.

Foi lida e admitida na Mesa e ficou em discussão,

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O Sr. Ferreira da Rocha: — Parece-me a redacção dêsto artigo do projecto insuficiente, por isso proponho a modificação da redacção, sem prejuízo do aditamento, da seguinte forma:

Os encargos totais dêstes empréstimos não poderão, em cada ano, exceder a soma que resultaria da aplicação, sôbre o capital efectivamente realizado, do uma percentagem não superior à taxa do juro legalmente autorizado nas operações de crédito do Banco emissor da colónia.

§ único. Para êste efeito consideram-se encargos não só os juros como a importância que, em cada ano, corresponde à soma total das despesas e margem emissão.— Ferreira da Rocha.

Tenho dito.

O Sr. Portugal Durão: - O artigo 3.° diz o seguinte:

Leu.

Se neste artigo estão incluídos os encargos da amortização do empréstimo, se isto é assim, fica a colónia impossibilitada de fazer empréstimos com amortizações a curtos períodos.

Há ainda uma questão que me parece importante, a do empréstimo em escudos.

O Sr. Ferreira da Rocha levantou, e muito bem, esta questão, porque o empréstimo em escudos tem como conseqüência o aumento da circulação fiduciária; portanto é necessário estabelecer uma diferença da taxa de juro para os empréstimos em escudos e para os empréstimos em ouro.

Nesse sentido mando para a Mesa a seguinte proposta do emenda.

Proponho que à palavra «autorizado» se acrescente «para a moeda respectiva».

11 de Março do 1924.— Portugal Durão.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi lida na Mesa a proposta do Sr. Ferreira da Rocha.

Foi lida e admitida na Mesa a proposta de emenda do Sr. Portugal Durão.

O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins): — Pedi a palavra para declarar que aceito as propostas dos Srs. Rodrigues Gaspar o Ferreira da Rocha.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Não esperava que os efeitos do § 2.° do artigo 2.° se fizessem sentir tão cedo.

A proposta do Sr. Portugal Durão não resolve o assunto.

O segundo facto será o aumento constante da taxa do juro.

Como a taxa não é fixa, ela será aumentada, o sucederá como ainda há pouco tempo, pois que o Banco aumentou a taxa de 10 por cento para 12 por cento.

Como é lógico, de todos êstes encargos ficará a nota sujeita a depreciação com prejuízo para a economia da colónia.

Será, pois, êste o resultado da aprovação do § 2.° do artigo 2.°

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Vai votar-se a emenda da comissão ao artigo 3.°

Leu-se.

Foi rejeitada.

Em seguida foi rejeitado o artigo 3.°, sendo aprovada a proposta de substituição apresentada pelo Sr. Ferreira da Rocha e a emenda do Sr. Portugal Durão.

O Sr. Presidente: — Vai votar-se o aditamento ao artigo 3.° proposto pelo Sr. Rodrigues Gaspar.

Leu-se e foi aprovado.

Foi aprovado em seguida o artigo 4.° e seu parágrafo.

O Sr. Presidente: — Está em discussão o artigo 5.°

Leu-se.

O Sr. Rodrigues Gaspar: - Mando para a Mesa uma emenda.

Leu-se e foi admitida.

É a seguinte:

Substituir as palavras «receitas da província» por «receitas gerais da província ». — Rodrigues Gaspar.

Foi aprovada a emenda apresentada pelo Sr. Rodrigues Gaspar e o artigo 5.°

Foi aprovado o artigo 6.° sem discussão.

Foi aprovado o artigo 7.° e parágrafos.

A requerimento do Sr. Cancela de Abreu, procedeu-se à contraprova da votação do artigo 7.º e parágrafos, tendo sido novamente aprovado por 52 votos e rejeitado por 6.

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O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o artigo 8.°

Leu-se.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: o artigo que está em discussão é deplorável porque significa o desconhecimento do que é a administração das nossas colónias e das necessidades da nossa província de Moçambique, e qual a aplicação do dinheiro que se pretende levantar por empréstimo.

Supõe-se que a colónia de Moçambique precisa de realizar empréstimos no valor designado na proposta, supõe-se que a colónia tomou a iniciativa de realizar êsse empréstimo, e deve supor-se também que a colónia sabia em que pretendia, aplicar êsse empréstimo e que o Govêrno central não apresentava esta proposta ao Parlamento sem estar convencido de que o capital a levantar era necessário e sem poder dizer à Câmara qual a utilização que queria dar-lho.

Assim, transforma-se a proposta numa mera autorização de ir buscar dinheiro para aplicar vagamente em obras de fomento que desconhecemos no seu plano, nas suas intenções e nos seus presumíveis resultados.

O Sr. Brito Camacho, antigo Alto Comissário de Moçambique, discutiu o projecto na generalidade e referindo-se à maior parte dás designações que vagamente são feitas da aplicação do empréstimo, S. Exa. teve ocasião de demonstrar que essas designações, na sua quási totalidade, não tinham aplicação de resultados úteis. O Parlamento tinha o direito de exigir agora ao Sr. Ministro das Colónias a apresentação da resenha completa das atribuições das várias verbas, para que soubéssemos em que ia ser gasta a importância que se pretende levantar.

Creio que o Sr. Ministro das Colónias não tem elementos para apresentar essa resenha e estou convencido de que, se S. Exa. usasse da palavra, ver-se-ia obrigado a fazer considerações gerais sôbre as necessidades de Moçambique, aquelas considerações gerais que todos aprendemos quando ainda em escolas de colonização pretendemos saber o que eram as nossas colónias; aquelas considerações gerais fáceis de fazer acerca das necessidades vagas duma colónia, mas não podemos di-

zer, com números e com factos, em que ia ser aplicado o empréstimo ou, ao menos, dizer para cada uma das obras a importância que presumivelmente lhes será destinada.

Um Parlamento que, votando um empréstimo para uma colónia, vota sem saber a designação a atribuir a cada uma das obras a realizar, não se prestigia aos seus próprios olhos e é preferível eliminar-se.

Assim eu, reconhecendo que o Sr. Ministro das Colónias certamente não tem elementos, porque, por desgraça nossa, os serviços de administração colonial não são suficientes a documentar S. Exa., relativamente às importâncias que devem ser atribuídas à designação das várias obras a realizar com êste empréstimo, mando para a Mesa uma proposta dum novo parágrafo nos seguintes termos:

A distribuição das importâncias realizadas pelas despesas acima referidas deponde do orçamento especialmente aprovado pelo Govêrno Contrai em Conselho de Ministros.

Assim a Câmara, embora não faça desde já a designação completa das importâncias a atribuir a cada uma das desposas, encarrega o Govêrno de, em Conselho de Ministros, fazer essa distribuição, garantindo-se tanto quanto possível que ela será feita com o cuidado de fiscalização que é de supor existir em todos os Governos.

Tenho dito.

Foi admitida a proposta do Sr. Ferreira da Rocha.

O Sr. Rodrigues Gaspar: — Sr. Presidente: pedi a palavra especialmente para mandar para a Mesa um aditamento às alíneas que vêm inscritas no artigo 8.°, e essas em harmonia com o considerando da proposta apresentada à Câmara pelo Ministro das Colónias de então, Sr. Vicente Ferreira.

O Sr. Ferreira da Rocha fez algumas considerações lamentando que a proposta não esteja completa, isto é, indicando as verbas especiais para cada uma das alíneas.

De facto, isso seria mais completo para o nosso espírito, estarmos a ver em que se gastava cada uma das verbas, mas para o facto da autorização que o Parlamento tem a dar em nada adiantava.

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Evidentemente, essas obras têm de ser organizadas, hão-de ser estudadas pelas comissões respectivas, pelas entidades que sôbre elas se hão-de pronunciar com conhecimento de causa, fazendo os respectivos orçamentos.

De resto, de que serviria que se apresentasse aqui um orçamento feito há três ou quatro anos, se agora teria com certeza de ser alterado, atenta a grande diferença de preços que existe actualmente?

Portanto, sob o ponto de vista prático, não tem valor a argumentação do Sr. Ferreira da Rocha, nem a Câmara estava habilitada para saber se era de mais ou de menos a verba aplicada a cada obra.

É por isso, Sr. Presidente, que dou o meu voto à proposta tal como está, incluindo uma alínea, porque, como já disse, as alíneas existentes não estão em harmonia com o considerando da proposta.

Quando o Sr. Vicente Ferreira trouxe à Câmara está proposta, disse que dêste empréstimo seria aplicada parte ao pagamento de dívidas de obras de fomento já realizadas, mas na redacção das alíneas não se cita o pagamento dêsses débitos. É isso o que faço mandando para a Mesa o seguinte proposta de aditamento:

Acrescentar no artigo 8.° a seguinte alínea:

g) liquidação de débitos vencidos correspondentes a despesas feitas com obras de fomento.— A. R. Gaspar.

foi admitida.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Peço a atenção do Sr. Ministro das Colónias, e até mesmo do ilustre autor da proposta que acaba de ser admitida, para S. Exas. verem os inconvenientes que resultariam da aprovação dessa proposta.

Sr. Presidente: vai aparecer sancionada por nós uma lei, isto é, votada pelo Congresso da República, para a realização dum empréstimo que tem como uma das verbas de aplicação a liquidação de débitos por despesas já realizadas.

Compreende-se como isto é, sob o ponto de vista moral da administração pública e dos princípios legalistas que temos de respeitar, absolutamente impossível.

Então o empréstimo é para liquidar débitos provenientes de despesas já feitas? é que o Parlamento pode aprovar

uma lei nesses termos, sem se dizer que despesas são e qual a importância dessas despesas?

Sr. Presidente: veja V. Exa. a impossibilidade, a inconveniência da aprovação de uma emenda dessa natureza, tanto mais que nem se cita a importância que se destina ao pagamento das dívidas.

Dêste modo fica qualquer administrador autorizado a pegar na importância total, e a desviar dela a importância que quiser a fim de pagar despesas já realizadas e não liquidadas.

Como precedente, como princípio de administração para nós que somos parlamentares, que entendemos que o Parlamento deve cumprir aquela missão para que foi criado, a missão é péssima.

Como é que nós podemos incluir nas verbas de aplicação do empréstimo, sem, aliás, lhe fixar a respectiva importância, o pagamento de dívidas que foram contraídas e que com certeza foram liquidadas por não haver verbas orçamentais bastantes para essa liquidação?

O que haveria a fazer, portanto, era suprimir o artigo por completo, procedendo-se à liquidação dessas despesas, organizando-se os respectivos orçamentos para que sejam devidamente aprovados, ou aprovar o artigo, introduzindo-lhe aquele aditamento que há pouco sugeri.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins): — Sr. Presidente: pedi a palavra para responder em breves considerações àquelas que acaba de produzir o Sr. Ferreira de Rocha.

Disse há pouco S. Exa. que o Ministro das Colónias não podia ter elementos para saber como se devia fazer a aplicação em obras de fomento da verba votada no. Parlamento.

Devo dizer a S. Exa. que não fui eu que apresentei esta proposta ao Parlamento, não fui eu que estudei o assunto antes dêle aqui vir; quem apresentou essa proposta foi o Sr. Vicente Ferreira, correligionário de S. Exa.

Como justificação da proposta apresentada, encontrei dois anexos em que estão discriminadas as verbas da aplicação do empréstimo.

Porque o Sr. Rodrigues Gaspar apre-

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20 Diário da Câmara dos Debutados

sentou urna nova alínea ao artigo 8.°, dizendo que do empréstimo se reservava uma parto para pagamento de despesas já feitas, o Sr. Ferreira da Rocha protestou contra a redacção dessa alínea dizendo que era um acto profundamente irregular tirar-se do empréstimo qualquer verba para pagamento de despesas anteriormente feitas.

Devo dizer a S. Exa. que são desposas já efectuadas em obras de fomento, como foi a aquisição de uma draga, de uma carvoeira, de guindastes eléctricos para o caminho de ferro de Lourenço Marques, etc.

O Banco Nacional Ultramarino acedeu ao pedido do Sr. Alto Comissário, supondo que em breve o empréstimo do Sr. Brito Camacho se realizaria e que então seria embolsado da quantia que tinha adiantado.

Não só tendo realizado o empréstimo nessa ocasião, é de necessidade distrair do produto do empréstimo de agora uma parte para se efectuar o pagamento do dinheiro que foi adiantado para a aquisição de material que constitui instrumentos do fomento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: acompanho o Sr. Ministro das Colónias naquelas considerações que faz, quási que de carácter pessoal, a respeito das pessoas que apresentam as propostas.

Para mim há um só Ministro das Colónias, e é-me indiferente que êsse lugar estivesse ocupado por um correligionário meu ou por qualquer outra pessoa no momento em que a proposta foi apresentada, como me é indiferente saber quem era o Alto Comissário que comprou ou deixou de comprar a draga a que o Sr. Ministro se referiu.

Para mim o assunto está nestes termos: trouxe-se à Câmara uma proposta de empréstimo em que na distribuição das suas verbas, som se designar a respectiva importância, se diz que parte é destinada a pagar débitos derivados de despesas ainda não liquidadas.

O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins) (interrompendo): — Despesas feitas em obras de fomento.

O Orador: — Nas obras que V. Exa. quiser. Não ha dentro da contabilidade, nem da fiscalização da administração financeira das colónias, nenhuma distinção entre obras de fomento o obras de qualquer outra natureza para o efeito do poderem ser feitas desposas sem que as respectivas verbas estejam orçamentadas e os preceitos legais sejam cumpridos, não havendo forma de um Parlamento sanar uma situação destas pela aprovação dum empréstimo em que só inclua uma disposição como aquela a que me referi, em vez do tal se fazer pela aprovação dos créditos necessários ou de orçamentos.

Como me pode afirmar o Sr. Ministro das Colónias que é preciso um empréstimo?

Porque é que a liquidação dessas despesas não outra no orçamento da colónia quando elaborado e submetido à apreciação do Govêrno?

Porque se não fazem os diplomas de abertura de créditos, como manda a lei?

Que tem que ver um empréstimo, para obras a fazer de futuro, com as obras já feitas no passado?

Por amor a princípios, por amor às fórmulas, por amor aos preceitos legais e por respeito à moral de administração, recuso o meu voto à disposição duma lei em que me dizem que parte dum empréstimo, sem se designar que parte é essa, vai ser aplicada ao pagamento da dívida por despesas que anteriormente se realizaram e que não foram devidamente liquidadas.

Para tal não era necessário o artigo, e melhor fora não o ter inscrito na proposta, deixando que por meio de orçamentos e distribuição de verbas o caso se resolvesse.

Tenho dito.

O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente : mais uma vez está vendo mal o ilustre Deputado que me precedeu quanto à matéria em debate.

De facto, quem incluiu o artigo 8.° nesta proposta bem podia ter-se dispensado de o fazer, porque isso seria o mesmo que confiar, quer no Conselho Legislativo da província, quer em todas as entidades que têm de executar esta autorização, mas houve evidentemente da parte

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do Sr. Vicente Ferreira um escrúpulo que julgo legítimo, trazendo a discriminação da forma como deveria ser aplicado êste empréstimo.

Sucede, porém, que o Sr. Rodrigues Gaspar, ilustre relator do parecer da comissão de colónias,, vem ainda, na mesma ordem de ideas, completar êsse artigo com uma outra alínea cuja redacção é justíssima, e não só é justa, mas séria, porque, tendo a província de Moçambique necessidade de verba para melhoramentos de caráter económico e sabendo-se que há verbas que estão em débito referentes a obras já realizadas, verbas que não atingem uma quantia muito elevada, mas que, para bom crédito da província, é necessário que sejam saldadas imediatamente, eis a razão, absolutamente lógica, por que eu voto não só o artigo 8.° como a alínea g), apresentada pelo ilustre relator da comissão.

Sr. Presidente: tanto o artigo 8.° como o 9.° poderiam deixar de figurar nesta proposta, mas êles servem para bem fazer a demonstração dos intuitos sérios e honestos que movem a província de Moçambique e todos aqueles que elaboraram esta proposta de lei, e não posso ser suspeito apreciando Cesses intuitos, porque não foi dêste lado da Câmara que partiu tal iniciativa.

É fazendo justiça a êsses intuitos que aprovo o artigo em discussão, assim como a alínea g), que o ilustre relator do parecer da comissão de colónias enviou para a Mesa, por a achar absolutamente lógica e razoável.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Rodrigues Gaspar: — Sr. Presidente: sinto discordar das considerações feitas pelo Sr. Ferreira da Rocha.

O Sr. Ministro das Colónias explicou o que significava o pagamento dessas dívidas, ainda não liquidadas.

O Alto Comissário de Moçambique, Sr. Brito Camacho, vendo a necessidade inadiável de acudir com material ao porto de Lourenço Marques, fez a aquisição dêsse material, pagando em ouro, mas não pôde, dentro da verba do orçamento, fazer a liquidação dessas contas.

Trata-se, efectivamente, de obras de fomento que a província ainda não pagou,

e o que a boa moral aconselha não é que se não pague, mas sim que se pague.

Se tivéssemos de discutir se foi bem ou mal aplicada essa verba para requisição de material, então é que poderia haver discordância — por mim repito que foi bem feita essa aquisição — mas o que não sofre discussão é que há necessidade de pagar as dívidas, e só com a realização dum empréstimo é que - se pode fazer o pagamento.

Não tem actualmente o orçamento de Moçambique meios de satisfazer a êsse compromisso.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Não há mais ninguém inscrito.

Vai votar-se.

É aprovado o artigo 8.°

É aprovado o aditamento do Sr. Rodrigues Gaspar.

É rejeitado o parágrafo novo do Sr. Ferreia da Rocha.

Lê-se e entra em discussão o artigo 9.°

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: também a lição dos factos e a experiência da maneira como a lei n.° 1:131 foi interpretada em Angola me levam a pedir à Câmara que seja esclarecida a redacção do artigo 9.° em discussão.

Êste artigo foi copiado da lei n.° 1:131 que autorizou o empréstimo para Angola. A sua forma de dizer é vaga de mais e, embora estivesse na intenção da Câmara o sentido de que seria o Conselho Legislativo da colónia que aprovaria as condições do empréstimo, não foi assim que se praticou em Angola. Ora para evitarmos a repetição de factos dessa natureza, assim como para garantirmos aquela mesma doutrina que foi invocada pelo Sr. Ministro das Colónias, relator o Deputados que aprovaram a imediata discussão desta proposta de lei, eu sugiro um esclarecimento que impeça que o contrato a realizar seja feito sem a prévia concordância da colónia do Moçambique.

Todos nós conhecemos as célebres bases que foram distribuídas na Câmara e que o Sr. Ministro das Colónias acabou de dizer que eram a 7.ª edição das negociações para o contrato, havendo já depois delas umas três ou quatro propostas do empréstimo a realizar. Pelas bases que vieram ao conhecimento particular dos

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membros desta Câmara, tiveram êles conhecimento do que não só tratava só dum contrato de empréstimo, mas dum contrato mixto do empréstimo o empreitada. A Câmara negou-se a discutir nesses termos, entendendo que am contrato mixto era inconveniente para os interêsses da colónia e mesmo do País.

Nestas condições, proponho a seguinte redacção do artigo 9.°:

A autorização conferida por esta lei será libada pela colónia do Moçambique nos termos das bases orgânicas, codificadas pelo decreto n.° 7:008, do 1920, depois de aprovado em conselho legislativo e devidamente sancionado o respectivo diploma em que serão expressas todas as cláusulas dos contratos a realizar.- Ferreira da Rocha.

Espero que a minha proposta terá a plena aprovação do Sr. Ministro das Colónias e de Sr. relator, exactamente porque foram S. Exas. que afirmaram que era no Conselho Legislativa que se discutia o empréstimo, e que aqui só tínhamos que dar a autorização superior para o empréstimo.

S. Ex»a vai, portanto, aceitar, com certeza, a rainha proposta para garantia de que o contrato há-de ser discutido no Conselho Legislativo da colónia.

O orador não reviu.

Foi lida e admitida a proposta de substituição.

O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins): — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar à Câmara e ao Sr. Ferreira da Rocha que aprovo a proposta de substituição que S. Exa. mandou para a Mesa, porquanto a doutrina defendida é a derivada da leitura das bases jurídicas que determinam a autonomia administrativa o financeira das colónias.

O Sr. Delfim Costa: — Pela minha parte, como membro da comissão de colónias, não tenho dúvida em aceitar a emenda na certeza do que não era necessária, visto que o ad referendum não significa que não possa sofrer alterações no Conselho Legislativo.

É rejeitado o artigo.

É lida a substituição.

O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: ouvi o Sr. Ministro das Colónias declarar que estavam pendentes negociações para a execução do contrato. Está-se na base das negociações; portanto, a fazer-se aprovar o artigo novo da proposta, que é, segundo julgo, inconveniente, a redacção dada à proposta de substituição, pela mesma razão de estarem em curso negociações, irá pela sua aprovação fazer parar todas as negociações até que o Conselho se pronuncie.

Julgo inconveniente que êsse artigo se-vote, e por isso o rejeito.

O orador não revia.

O Sr. Ferreira da Rocha: — V. Exa. tem de me perdoar que, sôbre o modo do votar, eu discuta ô artigo, visto que sou obrigado a tal por um Deputado da maioria.

Pelo facto de se multiplicarem as respectivas cláusulas, as negociações pararão. Isto é único!

As negociações pararão pelo facto de se dizer que a condição de o Conselho se pronunciar fica garantida?

Não se fazem concursos para a realização de empréstimos o não só continuam as negociações?

Porventura não temos aprovado leis, ficando ao Conselho o direito do discutir as cláusulas?

Onde existe então aquela coerência de princípios que nos levou a afirmar que a outra instituição, e não a nós, pertencia ò direito de discutir as bases do empréstimo?

Tenho dito.

Foi aprovada a proposta de substituição, da autoria do Sr. Ferreira da Rocha, ao artigo 9.º e bem assim o artigo 10.º

O Sr. Delfim Costa: — Requeiro a dispensa da leitura, da última redacção.

Foi aprovado.

O Sr. Lourenço Correia Gomes: — Peço a V. Exa., Sr. Presidente, só digne consultar a Câmara sôbre se permite que comissão do finanças reúna amanhã, pelas 16 horas.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: pedi a palavra para ocu-

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par a atenção da Câmara com uma pequena proposta, para a qual desde já peço a urgência o dispensa do Regimento.

Refere-se ela a dois assuntos que, de certo, são do conhecimento da Câmara.

Trata-se da inclusão, na lei do sêlo, do uma nova rubrica destinada -a atingir o tabaco já importado ou a importar, e ainda de aplicar ao imposto de sêlo a doutrina do artigo 59.° da lei n.° 1:368, que manda calcular o sêlo, não com a libra a 4$50, mas ao câmbio médio do trimestre anterior.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Aprovada a urgência e dispensa do Regimento.

O Sr. Paulo Cancela da Abreu: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°

Feita a contraprova, verifica-se, estarem de pé os Srs. Deputados e sentados 4, pelo que foi aprovada.

Foi lida na Mesa a proposta.

Artigo 1.° É incluída nas leis do sêlo em vigor a verba seguinte:

Por cada grama de tabaco pôsto à venda, importado dentro do actual regime de direitos aduaneiros, qualquer que seja a forma da sua apresentação, 0$03.

Art. 2.° É aplicável ao imposto de sêlo a doutrina do artigo 59.° da lei n.° 1:368, de 21 de Setembro de 1922.

Artigo 3.° Fica, revogada a legislação em contrário.—Álvaro de Castro.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: as considerações que vou fazer? propósito desta nova proposta sobre imposto do selos acabada do enviar para a Mesa pelo Sr. Ministro das Finanças provêm da estranheza que semelhante facto me causa por ainda há poucos dias ter sido votada nesta Câmara e na outra um diploma destinado também a introduzir alterações na tabela do solo o S. Exa. não ter aproveitado o ensejo para apresentar a proposta que hoje submete à apreciação da Câmara.

Acresce ainda, Sr. Presidente, que está na ordem do dia desta casa do Parlamento uma nova proposta sôbre imposto

de sêlo, que particularmente mo informam entrará em discussão amanhã, do que resulta que, no curto espaço de duas ou três sessões, a atenção da Câmara é chamada sôbre o mesmo assunto por três diplomas diferentes.

Isto denota a ligeireza com que se legisla neste país e o pouco cuidado que há da parte do Parlamento no estudo das questões que devem ser sujeitas à sua apreciação.

Contra êste sistema de legislar por conta-gotas, ou, em nome dêste lado da Câmara, lavro o meu mais enérgico protesto.

Quanto ao assunto da proposta em discussão, eu creio que o pensamento do Sr. Ministro das Finanças foi o de, por qualquer forma, sujeitar a um imposto compensador o tabaco que à sombra da lei anterior entrasse no País.

Para obviar a rasa quantidade enorme de tabaco com falta de tributação, S. Exa. propõe que êsse tabaco fique sujeito a uma nova taxa, que será do trinta Centavos por cada grama.

Só êste é o pensamento de S. Exa., a redacção do seu artigo é defeituosa e pode dar lagar a que na prática o fim que S. Exa. tinha em vista seja iludido.

Com efeito, no artigo 1.° diz-se o seguinte:

Leu.

Como diz a legislação fiscal tem de ser interpretada no sentido restrito, é natural que a nora proposta só BO aplique ao tabaco que venha a importar-se.

Parece-me que S. Exa. acautelaria melhor a sua proposta se antes da palavra «importado» se introduzisse «que tenha sido ou venha a ser importado».

Por esta forma, e com a simples introdução desta nova palavra, melhor acautelado ficará o fim que tem em vista o Sr. Presidente do Ministério.

Por agora tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Concordo com o alvitre de S. Exa. e nesse sentido vou enviar para a Mesa a competente emenda.

O Sr. Carvalho da Silva: — Não eu porque a Câmara rejeitá-la-ia.

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O Orador: — Não rejeitava, pois é uma emenda verdadeiramente republicana.

Risos.

Aprova-se a proposta na generalidade e passa-se à especialidade.

Seguidamente foi lida na Mesa e admitida a proposta de emenda do Sr. Ministro das Finanças, do teor seguinte:

Proponho que antes da palavra «importado» se intercalem as palavras «que tenha sido ou venha a ser». — A. de Castro.

O Sr. Presidente: — Como ninguém pede a palavra, vai fazer-se a votação.

Foram lidos na Mesa a emenda e o artigo 1.° que ficaram aprovados.

Entra em discussão o artigo 2.°

O Sr. Morais Carvalho: — Eu concordo em parte com a matéria do artigo 2.° em discussão, mas parece-me que outra é a opinião da maioria desta Câmara, por isso que há poucos dias, seis ou sete, quando aqui foram discutidas as emendas feitas pelo Senado às alterações da tabela de sêlo, esta Câmara rejeitou uma disposição aprovada pelo Senado, contendo a mesma matéria que é contida neste artigo.

Chamo para o caso a atenção de V. Exa. Sr. Presidente, pois, segundo creio, o Regimento não permite que a Câmara, na mesma sessão legislativa, se ocupe do mesmo assunto depois de êle já haver sido versado uma vez e ter sido rejeitado.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Cancela de Abreu: - Invoco o artigo 127.° do Regimento.

O Sr. Presidente: — O artigo 127.° do Regimento refere-se a projectos e propostas rejeitados. Ora no caso presente não se trata de projecto ou propostas mas simplesmente de um artigo.

O Sr. Cancela de Abreu: — É uma maneira habilidosa de sofismar o Regimento.

São aprovados os artigos 2.° e 3.°

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.

Aprovado.

Entra em discussão o parecer n.° 684, sôbre a reforma da lei do sêlo.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Mando para a Mesa uma proposta tendente a simplificar a discussão da proposta relativa à lei do sêlo.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: Vejo que o Sr. Presidente do Ministério acaba de mandar para a Mesa quaisquer alterações, porventura importantes, ao parecer n.° 584.

Como faltam apenas alguns minutos para se encerrar a sessão, eu lembrava a S. Exa. a conveniência de iniciar a sua Discussão na sessão de amanhã, para assim podermos estudar essas alterações.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Não se trata de alterações, mas sim dum extracto da tabela grande, com o fim de simplificar a discussão do parecer n.° 584. A minha proposta do hoje não é mais do que uma súmula da proposta-base.

foi aprovado em prova e contraprova, por 42 contra 15 Srs. Deputados, o requerimento do Sr. Presidente do Ministério.

Entrou em discussão a proposta, do Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: não sei já quantas vezes esta Câmara há-de ocupar-se de uma reforma de imposto de sêlo; mas sei que êste nome de sêlo está sendo uma cousa de que a República muito abusa, contribuindo poderosamente para um maior agravamento do preço do custo da vida.

O Sr. Presidente do Ministério, que tantas vezes tem conferências com as juntas de freguesia, pode enviar-lhes esta proposta com uma dedicatória amável, declarando que ela visa a baratear a vida.

Na verdade, é mais uma prova de que o grande financeiro da República é o Sr. Velhinho Correia, e tem,a gente saudade do tempo em que o Sr. Álvaro de Castro, sentado no seu fauteuil de leader nacionalista atacava rudemente o Govêrno da presidência do Sr. António Maria da Silva e os seus colegas de Ministério quando

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diziam ser necessária a votação desta proposta.

Mudou de opinião o Sr. Álvaro de Castro, e hoje sentado na sua cadeira de Presidente de Ministério, está justamente a cumprir o que lhe manda a mesma maioria que S. Exa. tanto combateu.

Diz-se que a vida está cara e então vem o parecer n.° 584 e propõe a criação de vários impostos entre os quais êstes que vou citar a V. Exa.:

O restabelecimento da contribuição de renda de casa, e pena é que S. Exa. não tivesse apresentado esta proposta à Câmara naquela célebre sexta-feira em que houve uma manifestação junto desta casa do Parlamento, manifestação que tanto encheu S. Exa. de prazer e de orgulho.

Era então que S. Exa. poderia ter respondido a essa manifestação popular, como disse no Terreiro do Paço e como mandou os seus delegados dizer, que o Chefe do Govêrno está absolutamente de acordo com o povo.

Ora, como assim é, lá vai o estabelecimento da contribuição de rendas de casa, embora agora se lhe chame sêlo, sendo de 5 por cento para o inquilinato de habitação e de 10 por cento para o inquilinato comercial. Mas, como se isto ainda fôsse pouco, S. Exa., para satisfazer as reclamações das juntas de freguesia, estabelece, entre outros, os seguintes impostos, a título de sêlo:

Quem quiser abrir um estabelecimento em Lisboa ou Pôrto pagará, por uma só vez, 1:50C$, mas, por ano, há também o sêlo da licença anual de porta aberta, e então o Sr. Presidente do Ministério, continuando, como o Sr. Velhinho Correia, a ter horror ,às portas abertas, estabelece um novo imposto, aumentando de 25 por cento o imposto, que era de corça de 960$ e que, assim, fica em cêrca de 1:300$. E com certeza para agradar ao comércio de Lisboa e Pôrto, que tanto trabalhou para a implantação da República, e tanto está hoje a verificar que fez obra asseada. Isto, porém, não é nada, porque o Sr. Presidente do Ministério e o Sr. Velhinho Correia querem também, selar, por exemplo, os chamados artigos de luxo, os quais passam a pagar um sêlo de 10 por cento sôbre o custo. É duplicação do imposto sôbre o valor das transacções, desta vez mais agravado»

É para baratear a vida e mostrar às juntas que devem agradecer ao Sr. Presidente do Ministério a obra que está realizando ao lado do povo no Terreiro do Paço, mas não em S. Bento. Mas o que são artigos de luxo? Um fato que custa 380$ é um artigo de luxo.

Ora, sabe V. Exa. por quanto hoje se encontra um fato, e então lá vão 10 por cento para baratear o lato. Para umas botas que custem mais de 80$ lá vão 10 por cento e assim se obrigarão as juntas a andar descalças, talvez para evitar que tantas vezes caminhem para junto de S. Exa. a apresentar reclamações.

Mas ainda é pouco.

Vejamos o que diz a lei com respeito a uma leitaria que por exemplo venda vinhos, cerveja e bebidas alcoólicas, pois terá de pagar selos do seguinte modo:

Leu.

Por esta emenda apresentada pelo Sr. Presidente do Ministério o seio custa 750$ por ano, para venda de bebidas alcoólicas, com excepção dos vinhos comuna, pelos quais se pagam outros 750$, pagando pois ao todo 1:500$.

Mas temos ainda que referir o que se paga, por exemplo, pela venda de bolos.

Não sei porque o Sr. Presidente do Ministério não tributa também as papas, porque com papas e bolos se enganam os tolos.

Risos.

Àpartes.

Tributa os bolos com um sêlo que anda por 60 centavos, mas não sei se foi alterada a verba.

Tudo isto é para alargar a capacidade tributária do comércio para que pague estas contribuições, mas estou convencido de que uma certa dose de bom senso fará com que não cheguem a ser discutidas.

A proposta tributa ainda outros artigos.

Assim, um artigo que se venda num estabelecimento, se êsse artigo tiver uma letra ou sinal indicando a sua proveniência ou fabrico, tem de levar um sêlo.

Os colarinhos que nós usamos, por exemplo, e que quási sempre têm um nome, tem de ter um sêlo de 60 ou 240.

Ó Sr. Presidente do Ministério quer talvez até que se amarrotem os colarinhos.

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26 Diário da Câmara dos Deputados

Um pires, ou um prato que tenham a marca da fábrica, levara um sêlo.

Depois do deixarem as juntas sem botas, vão tirar-lhes as meias.

Mas não são apenas as botas e as meias, são também as camisas de forma que o Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, «amo contente com o que tem arrancado ao povo com os seus impostos ainda quere que fiquemos sem camisa!

O Sr. Presidente: — Deu a hora de se entrar no período destinado para antes de se encerrar a sessão!

O Orador: — Nesse caso desejo ficar com a palavra reservada.

Ficou com a palavra reservada.

O orador não reviu.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. Sá Pereira: — Peço a atenção do Sr. Ministro do Interior para uma reclamação que recebi acerca de uma sindicância que se está fazendo ao tenente Ma^ tos da guarda republicana, porque parece que essa sindicância não está correndo nos devidos termos.

Entrego êsses documentos a S. Exa. para proceder conformo fôr de justiça.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Sá Cardoso): - Não tenho conhecimento, do caso, todavia vou estudar os documentos que me foram fornecidos e procederei consoante os desejos do ilustre Deputado.

O orador não reviu.

O Sr. Marques Loureiro: — São gerais as queixas contra o pagamento das rendas das casas das escolas primárias, que em alguns pontos do País estão em atraso de 2 a 4 anos.

O Parlamento votou um aumento das rendas, mas por um despacho do anterior Ministro da Instrução essa lei não é aplicável aos edifícios que estão alugados ao Estado.

É o Ministro sobrepondo-se ao Parlamento; isto é, uma verdadeira ditadura, que tanto só tem combatido nesta casa, porquanto vem num despacho dizer que

aquilo que o Parlamento tinha votado depois de larga discussão não obrigava o Estado.

Mas não se ficou por aqui: muitos professores não são pagos, e nas repartições respectivas se informa não haver forma de lhes pagar por falta de verba para isso, porquanto a verba fora desviada para só fazer pagamento aos professores das escolas primárias superiores.

Quanto às casas, algumas estão abandonadas. O Estado contudo cobra-lhes a contribuição, não permitindo a cobrança da respectiva renda.

Se me interessa a sorte dos humildes, também me interessa o prestígio do Estado.
Devemos cumprir todos o nosso dever, impondo aos que ocupam as casas que cumpram também o seu dever.

O Govêrno começa por dizer que o pessoal é pouco, o que tem impossibilidade de fazer processar as folhas.

Devo salientar que há por aí círculos escolares que são filhos, outros são enteados. A êstes não se paga. Estão os professores sem ter o seu ordenado.

Há uma grande má ventado contra os professores, porque, diz-se, êles não trabalham.

E então nada ganham; morrem de fome.

É indispensável pagar o que seja justo.

Confio em que o Sr. Ministro da Instrução, além das boas palavras, que lhe agradeço, se não esquecerá das acções.

As reclamações que acabo de formular são justas, e, estou certo, são absolutamente exactas. Se o não forem, ainda assim as minhas palavras não serão perdidas, porque medeia muito pouco tempo entre elas e às informações que me foram dadas; mas, seja como fôr, tomadas por S. Exa. as providências que o caso requere, dar-me-hei por satisfeito porque terei contribuído, dum certo modo, para o prestígio da República, que vejo muito abalado.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Helder Ribeiro): — Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as palavras do ilustre Deputado Sr. Marques Loureiro.

Algumas reclamações de que S. Exa. se fez eco não são para mim já desço-

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Sessão de 11 de Março de 1924 27

nhecidas. Nos poucos dias de gerência do meu Ministério de toda a parte tem chegado até mim reclamações que estou procurando satisfazer, sendo o caso para mim mais urgente o que só refere ao pagamento dos professores. Ainda hoje tomei uma resolução em virtude da qual confio poder chegar a um resultado satisfatório, que é pagar-se os vencimentos a êsses professores.

Devo dizer que já me chegaram aos ouvidos algumas reclamações quanto ao pagamento de rendas de casas, mas ainda não tive ensejo de procurar instruir-me sôbre as causas porque êsses pagamentos estão ainda sendo feitos pela lei antiga.

O que posso garantir a V. Exa. é que dedicarei todo o meu cuidado, cuidado que já me merece, à questão do pagamento aos professores, porque acho que esta situação não se pode manter.

O mesmo cuidado me merecem, as outras questões relativas ao material e rendas das casas, porém como há pouco que estou ocupando 6sto lugar ainda não me consentiu providenciar tam ràpidamente quanto seria para desejar.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: estou informado de que as repartições do finanças estão obrigando os contribuintes a pagar o imposto do transação por meio de avença. Ora isso é absolutamente contrário às disposições da lei n.° 1:368, que no seu artigo 6.° estabeleço o seguinte:

Leu.

Quere dizer: só quando os contribuintes desejarem é que pagam, por avença.

Contra esta disposição, porém, está a exigir-se que os contribuintes, só paguem por meio de avença, isto para os obrigarem a pagar quantias superiores àquilo que devem pagar.

Estou convencido do que o Sr. Ministro das Finanças não tem conhecimento dêste facto, e por isso levo-o ao seu conhecimento para S. Exa. providenciar.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: não tinha realmente conhecimento oficial do assunto de que tra-

tou o Sr. Carvalho da Silva, porque ainda não tive nenhuma reclamação sôbre êle.

O que me parece, porém, mais lógico é que as pessoas prejudicadas apresentem as suas reclamações no Ministério das Finanças.

De resto, parece-me que há até vantagem para o Estado em que não haja avença, o só porque havia ás vezes dificuldades na cobrança do imposto só estabeleceram as avenças, mas, na verdade, a lei não obriga ninguém a avençar-se.

Desde, portanto, que mo sejam apresentadas reclamações, eu procederei conforme a lei.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Amanhã há sessão, às 14 horas, com a seguinte ordem do dia:

Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores que se inscrevam).

Parecer n.° 636—crédito especial de 2.000:000$ para o Ministério da Marinha.

Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam:

Parecer n.° 451—Crédito de 20.000$ a favor do Ministério das Finanças.

Parecer n.° 624—Crédito do 413.000$ a favor do Ministério da Guerra.

Parecer n.° 652 — Que autoriza a revisão de contratos do empreitadas.

Ordem do dia:

Parecer n.° 584 — Que reforma a lei do sêlo.

Parecer n.° 642-C — Empréstimo para construção de estradas, e os pareceres n.ºs 544, 616-E, 205, 615 e 447 hoje em tabela.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas 50 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Últimas redacções

Do projecto de lei n.° 612, que autoriza as Juntas Gerais dos distritos do Faro, Beja e Évora a cobrar durante dois

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anos um imposto adicional à contribuição industrial, destinado às despesas com a rede telefónica interurbana.

Do projecto de lei n.° 551, que autoriza o Govêrno a proceder às obras de que carece o porto comum de Faro e Olhão.

Do projecto de lei n.° 569, que fixa a melhoria de vencimentos a abonar ao pessoal da Imprensa Nacional que execute trabalhos extraordinários.

Do projecto de lei n.° 662, que reforça com 46.000$ designadas verbas do orçamento do Ministério das Finanças para 192&-1924.

Dispensada a leitura das ultimas redações.

Remetam-se ao Senado.

Substituição

Comissão de redacção: Substituir o Sr. Marques de Azevedo pelo Sr. Vergílio Saque.

Para a Secretaria.

Nota de interpelação

Declaro desejar interpelar o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros sôbre as negociações havidas para a realização de um acordo comercial com a França.

11 de Março de 1924.— O Deputado, Lelo Portela.

Expeça-se

Parecer

Da comissão de legislação civil e comercial, sôbre o n.° 585-A, que divide o concelho de Alenquer em cinco assembleas eleitorais.

Imprima-se.

O REDACTOR—Avelino de Almeida.

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