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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.° 50
EM 12 DE MARÇO DE 1924
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário.— Abertura da sessão.
Leitura da acta.
Correspondência.
Antes da ordem do dia.— O Sr. Ministro do Comércio (Nuno Simões) manda para a Mesa uma proposta de lei, requerendo a sua imediata discussão.
O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins) envia para a Mesa uma proposta de lei.
O Sr. Lelo Portela reclama a presença do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, e faz algumas considerações sôbre o acordo comercial entre Portugal e a Noruega.
Responde-lhe o Sr. Ministro do Comércio.
Usa da palavra para explicações o Sr. Lelo Portela.
O Sr. Morais Carvalho ocupa-se do encerramento, por ordem da autoridade, de algumas escolas particulares de ensino primário no concelho de Felgueiras.
Responde-lhe o Sr. Ministro do Comércio.
É aprovado o requerimento do Sr. Ministro do Comércio para entrar imediatamente em discussão a proposta de lei que enviou para a Mesa.
Entrando em discussão, usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Abílio Marçal, que manda para a Mesa duas propostas de emenda, e Ministro do Comércio.
A Câmara aprova na generalidade a proposta em discussão.
São admitidas à discussão as propostas do Sr. Abílio Marçal, que em seguida requere para elas a prioridade na votação.
A Câmara aprova a proposta do Sr. Abílio Marçal relativa ao artigo 1.°, sendo êste julgado prejudicado.
É aprovada em seguida a proposta do Sr. Abílio Marçal relativa ao artigo 2 °t que se considera prejudicado.
Aprovado o artigo 3.°, a Câmara dispensa a leitura da última redacção a requerimento do Sr. Abílio Marçal.
Entrando em discussão, na generalidade, o parecer n.º 636, reformando uma verba do orçamento do Ministério da Marinha, usam da palavra os
Srs. Morais Carvalho, Ferreira de Mira, Almeida Ribeiro, Carlos Pereira e Ministro da Marinha, (Pereira da Silva).
É aprovada a generalidade do parecer.
Entrando em discussão, na especialidade, e lido na Mesa o artigo 1.°, usa da palavra, o Sr. Ferreira de Mira, sendo aprovado em seguida o artigo,
É aprovado sem discussão o artigo 2.º e dispensada a leitura da ultima redacção da proposta a requerimento do Sr. Jaime de Sousa.
É aprovada a acta e concedida uma licença.
O Sr. Presidente chama a atenção da Câmara para a carta em que o Sr. Fausto de Figueiredo apresenta a sua renúncia ao lugar de Deputado.
Usam da palavra os Srs. Almeida Ribeiro, Rocha Saraiva, Pedro Pita, Carvalho da Silva, Lino Neto, Carlos Pereira, Lourenço Correia Gomes, Jaime de Sousa, que manda para a Mesa uma proposta, Francisco Cruz e Presidente do Ministério (Álvaro de Castro).
É aprovada em seguida a proposta do Sr. Jaime de Sousa.
E lida na Mesa uma nota de interpelação.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu pede a palavra para um negócio urgente. É rejeitada a urgência em prova e contraprova.
O Sr. Sousa Coutinho requere que na próxima sessão seja discutida, antes da ordem do dia, uma proposta de lei apresentada pelo Sr. Ministro do Comércio.
É aprovado.
Ordem do dia.— Continuação da discussão do parecer n.° 584. Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva e Marques Loureiro, que manda para a Mesa uma proposta.
Responde-lhe o Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças.
Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Alberto Jordão chama a atenção do Sr. Ministro da Justiça para a nomeação do secretário duma comissão concelhia dos bens da igreja, no distrito de Évora.
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2 Diário da Câmara dos Deputados
Responde-lhe o Sr. Ministro da Justiça (José Domingues dos Santos).
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 15 horas e 85 minutos.
Presentes à chamada 40 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 50 Srs. Deputados.
Presentes à chamada:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Lelo Portela.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Ginestal Machado.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
António Vicente Ferreira.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Carlos Cândido Pereira.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João de Ornelas da Silva.
João de Sousa Uva.
José Carvalho dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel do Sousa Coutinho.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Tomás de Sousa Rosa.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto da Rocha Saraiva.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Correia.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur de Morais Carvalho.
Bernardo Ferreira de Matos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Jaime Pires Cansado.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José do Oliveira da Costa Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.
Sebastião de Herédia.
Vasco Borges.
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Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Américo da Silva Castro.
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Mendonça.
António de Paiva Gomos.
António Pinto de Meireles Barriga.
António do Sousa Maia.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José do Amorim.
Hermano José do Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Duarte Silva.
João Baptista da Silva.
João José Luís Damas.
João Salema.
João Teixeira do Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim José de Oliveira
Joaquim. Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vergílio da Conceição Costa.
Pelas 15 horas e 35 minutos com a presença de 40 Srs. Deputados declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta.
Leu-s e o seguinte
Expediente
Ofícios
Do Ministério das Finanças, comunicando que o Sr. Ministro das Finanças se acha habilitado a responder à interpelação do Sr. Vitorino Guimarães.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Justiça, satisfazendo ao requerido em ofícios n.ºs 375 e 638 para o Sr. Angelo Sampaio Maia.
Para a Secretaria.
Da Associação do Classe dos Empregados Menores dos Correios e Telégrafos, agradecendo a aprovarão do projecto relativo a caixas-receptáculos nas escadas dos prédios.
Para a Secretaria.
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4 Diário da Câmara dos Deputados
Carta
Do Sr. Fausto de Figueiredo, renunciando o seu mandato de Deputado.
Para a Secretaria.
Requerimentos
Do alferes reformado António Manuel, pedindo melhoria de situação.
Para a comissão de guerra.
Do major de reserva Francisco Rosa Ventura, requerendo para passar ao exército activo.
Para a comissão de guerra.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — Mando para a Mesa uma proposta de lei, e peço para V. Exa. a consultar a Câmara a fim de entrar imediatamente em discussão.
O Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins): — Mando para a Mesa uma proposta de lei, fixando a constituição do Conselho de Administração do Hospital e Sanatório Coloniais a que se refere a base 2.ª do decreto n.° 5:726, de 10 de Maio de 1919.
O Sr. Lelo Portela: — As considerações que vou fazer dizem respeito ao Ministério dos Negócios Estrangeiros; mas S. Exa. mais parece Ministro dos países estrangeiros do que do nosso, pois rara vez vem a esta Câmara.
Sr. Presidente: eu quero referir-me à maneira como está sendo executado o acordo comercial entre a Noruega e o nosso País e que vem publicado no Diário do Govêrno de 12 de Junho do ano passado.
A repartição a que nele se faz referência não tem mais que fiscalizar o não pode impedir que os importadores venham negociar directamente com os exportadores portugueses.
Esta repartição procedeu da mesma, forma com a França, mas o Govêrno Francês chamou a atenção da Noruega e os importadores continuaram a entender-se directamente com os exportadores.
Chamo a atenção de V. Exa. para solicitar do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros o cumprimento da declaração de 12 de Junho do ano passado.
Devo dizer, também que o nosso Ministro na Cristiânia não tomou qualquer resolução sem que o Ministro dos Negócios Estrangeiros lhe dêsse qualquer indicação a êsse respeito.
Parece-me que bem, andaria o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros se fizesse cumprir o acordo.
Prestaria um bom serviço ao País beneficiando a exportação dos nossos vinhos.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — Transmitirei ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros as palavras do ilustre Deputado, mas desde já posso declarar que S. Exa. não descurará o assunto, assim como direi que o Sr. Lelo Portela foi injusto quando disse que o Ministro dos Negócios Estrangeiros é mais Ministro dos países estrangeiros que do nosso país. S. Exa. não 6 menos patriota que o ilustre Deputado, e se S. Exa. não tem vindo aqui é por motivo de serviço público.
Quanto ao nosso Ministro da Cristânia, não tem deixado de cumprir o seu dever.
O orador não reviu.
O Sr. Lelo Portela (para explicações): — Sr. Presidente: é para afirmar que quando disse que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros era mais Ministro dos países estrangeiros que do nosso país,, não quis deminuir o seu patriotismo, mas significar que S. Exa. andava por países-estrangeiros mais do que pelo nosso.
Quanto ao nosso Ministro na Cristiânia, sei que ainda há dois dias não tinha tomado resolução alguma.
O orador não reviu.
O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Instrução ou o Sr. Ministro do Interior.
Nenhum deles se encontra nesta casado Parlamento, o por isso peço ao Sr. Ministro do Comércio o favor de transmitir ao seu colega da pasta da Instrução as considerações que vou fazer.
Sabem V. Exa. e a Câmara que as Juventudes Monárquicas Conservadoras, nos termos dos seus estatutos, devidamente aprovados por lei, podem, ter escolas,
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onde se ministra o ensino primário. Essa prestante instituição chegou a ter três escolas em três freguesias do concelho de Felgueiras. Mas o inspector escolar do círculo de Amarante, Sr. José do Pinho, fez encerrá-las com o pretexto de que o professor não era diplomado.
Trata-se de escolas particulares, de escolas que são de utilidade, por isso que no nosso país a instrução primária se encontra tam pouco difundida. E de toda a utilidade que não só o Estado, como também as instituições particulares, possam ministrar, facultar ou facilitar a instrução primaria.
Essas escolas funcionaram durante algum tempo, sem reparo absolutamente de ninguém.
Parece-me que funcionaram, como escolas particulares que eram, ao abrigo da lei que permite o ensino.
Contudo o Sr. inspector escolar do círculo de Amarante, ao qual pertence o concelho de Felgueiras, para a fiscalização escolar, entendeu decerto por estreito espírito de partidarismo que devia mandar, encerrá-las.
Peço ao Sr. Ministro do Comércio o favor de transmitir ao Sr. Ministro da Instrução as minhas considerações, para que providencie no sentido de que as escolas que foram mandadas encerrar, e que evidentemente prestaram grandes serviços aos povos do concelho de Felgueiras, possam continuar a funcionar; como durante algum tempo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — Transmitirei ao Sr. Ministro da Instrução as considerações feitas pelo Sr. Morais Carvalho.
No emtanto, posso desde já afirmar que com certeza o inspector escolar de Amarante não procedeu por espírito de partidarismo estreito.
Certamente que a resolução do Sr. inspector escolar para mandar encerrar as escolas, baseia-se em razões de ordem higiénica, visto que as escolas em parte alguma podem funcionar senão nos termos da lei.
O Sr. Carvalho da Silva: — É higiene do partidarismo.
O Orador: — Devo dizer ao Sr. Carvalho da Silva que o partidarismo não está previsto na lei que regula o funcionamento das escolas particulares; e por isso o Sr. inspector escolar não podia ter fundamentado a sua resolução nesse motivo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Consulto a Câmara sôbre o requerimento do Sr. Ministro do Comércio para entrar em discussão uma proposta de lei de reforço de várias verbas.
Foi aprovado o requerimento.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se para entrar em discussão a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° A lei orçamental n.° 1:449, de 13 de Julho de 1923, na parte relativa ao Ministério do Comercio e Comunicações, é rectificada pela seguinte forma:
[Ver valores da tabela na imagem]
Capítulo 4.°
Capítulo 5.°
Capítulo 8.º
Capítulo 13.°
Art. 2.° Independentemente do disposto no artigo anterior, são reforçadas pela seguinte forma as dotações abaixo indicadas do capítulo 5.° do mesmo orçamento.
[Ver valores da tabela na imagem]
Art. 45.° Construção, reparação, melhoramentos e conservação de edifícios públicos
Art. 51.° Casas económicas de Lisboa
Art. 53.° Construção, reparação e melhoramentos de edifícios dos estabelecimentos de ensino industrial o comercial
Total
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 13 de Dezembro de 1923.— Pedro Góis Pita.
O Sr. Presidente: — Está em discussão na generalidade.
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O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: até que emfim temos um Govêrno que todos os dias nos dá provas da extraordinária facilidade com que se pode equilibrar o orçamento.
Temos um Govêrno que todos os dias apresenta propostas de lei que dizem respeito a verbas do reforço de 3:000 contos.
Depois desta, deve ser discutida outra pelo Ministério da Marinha que diz respeito à verba de 3:000 contos.
Depois parece-me que virá outra proposta de lei de reforço de verba, na importância de 5:000 contos.
Assim se demonstra a facilidade do Govêrno do Sr. Álvaro de Castro em resolver as dificuldades de dinheiro.
O que não posso deixar de reconhecer é o dinheiro mal gasto pelo Sr. Presidente do Ministério na quantidade de papel e tinta naquelas declarações ministeriais, que apresentava dia a dia no Parlamento, quando foi do começo do seu Govêrno, para mostrar a excelência da situação financeira do país com o fim de dizer que equilibraria o Orçamento num instante.
Reconheço ser indispensável a aprovação dêste reforço de verba, porquanto se refere à construção e reparação de edifícios públicos, onde os operários estão sem salários há cêrca de dois meses.
Por conseqüência, é preciso atender a essa situação.
Mas não posso deixar de frisar que essa situação é em grande parte devida à legislação da República contra a propriedade, que faz com que seja constante a crise de construções, obrigando o Estado a ter de empregar àqueles operários que não podem encontrar onde ganhem os seus salários para viver.
Não quero, Sr. Presidente, demorar a votação da proposta; e por isso termino pondo mais uma vez em foco a maravilhosa obra financeira do Sr. Álvaro de Castro e o seu tam anunciado equilíbrio orçamental, feito, como se vê, à conta de constantes reforços de verbas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Abílio Marçal: — Sr. Presidente: mando para a Mesa duas propostas de emenda à proposta em discussão,
Julgo que a Câmara bem andaria em as
aceitar, porquanto elas são preferíveis às disposições da proposta ministerial, quer sob o ponto de vista técnico, quer sob o ponto de vista legal. São as seguintes:
Propostas
Art. 1.° É rectificada nos seguintes termos a lei orçamental n.° 1:449, de 13 de Julho de 1923, na parte relativa ao Ministério do Comércio e Comunicações:
[Ver valores da tabela na imagem]
Capítulo 4.°
Capítulo 5.°
Capítulo 8.°
Capítulo 13.°
Em 12 de Março de 1924. — Abílio Marçal.
Art. 2.° É aberto no Ministério das Finanças, a favor do Ministério do Comércio e Comunicações, um crédito da importância de 2:800.000$00 para ocorrer às despesas do mesmo Ministério, previstas nos seguintes artigos e por êles distribuída.
Art. 45.° Construção, reparação, melhoramentos e conservação dos edifícios públicos
Art. 51.° Casas económicas de Lisboa
Art. 53.° Construção, reparação e melhoramentos de edifícios dos estabelecimentos de ensino industrial e comercial
Em 12 de Março de 1924.- Abílio Marçal.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — Pedi a palavra para declarar que aceito as propostas de emenda enviadas para a Mesa pelo Sr. Abílio Marçal e para dizer ao Sr. Carvalho da Silva que as suas objecções, cheias de grande partidarismo, não têm razão de ser.
A proposta que se discute não foi trazida à Câmara pelo actual Govêrno, mas sim pelo Sr. Pedro Pita.
Conquanto eu não tenha na sua apresentação a mínima responsabilidade, não
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deixo neste momento de a perfilhar e defender, visto que ela corresponde a uma instante necessidade.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — O que se prova é que os cálculos em que se baseou o Sr. Ministro das Finanças são inteiramente errados, porquanto as verbas consignadas no orçamento estão muito longe de corresponder à realidade.
É aprovada a proposta na generalidade.
Entra em discussão na especialidade.
São admitidas as propostas apresentadas pelo Sr. Abílio Marçal.
Lêem-se na Mesa e são aprovadas, bem como o artigo 5.°
O Sr. Abílio Marçal: — Requeiro dispensa da leitura da última redacção.
Foi aprovado.
Entra em discussão o parecer n.° 136.
É o seguinte:
Parecer n.° 636
Senhores Deputados. — A vossa comissão de marinha examinou atentamente a proposta de lei n.° 627-E, da iniciativa do Ministro da respectiva pasta, abrindo um crédito de 2:000 contos para reforço das verbas do capítulo 2.°, artigo 9.°, tornadas insuficientes para os encargos efectivos dessa rubrica, cujos serviços sofrerão na sua execução regular se esta autorização não fôr concedida.
O encarecimento da mão de obra e de todos os materiais tem continuado a acentuar-se por forma tam do conhecimento geral, que fàcilmente se compreende a necessidade desta proposta de lei.
Portanto a vossa comissão, apreciando-a sob o ponto de vista técnico e da sua in-dispensabilidade para o prosseguimento normal dos importantíssimos serviços de marinha dependente daquele capítulo e artigo do orçamento ordinário, é de parecer que devereis aprovar a referida proposta.
Sala das Sessões, 21 de Janeiro de 1924. — Alfredo Rodrigues Gaspar — Armando Pereira de Castro Agatão Lança — Delfim Costa—Carlos Pereira (com declarações) — José Morais de Medeiros (com
declarações) — António de Mendonça — Ferreira da Rocha (vencido) — Jaime de Sousa, relator.
Senhores Deputados. — O Sr. Ministro da Marinha apresentou à Câmara a proposta de lei n.° 627-E, destinada a abrir no Ministério das Finanças, a favor do Ministério da Marinha, um crédito especial de 2:000.000$ a fim de reforçar o artigo 9.° do capítulo 2.° do Orçamento Gorai do Estado para o corrente ano económico de 1923-1924.
Verificou a vossa comissão de finanças que sob a rubrica «Despesas gerais da armada» foi inscrita no Orçamento Geral do Estado do citado ano a quantia de 6:578.530$.
Não possui esta comissão elementos de informação, nem a proposta os contém, para poder ajuizar da necessidade do crédito pedido, a não ser a insistência do Exa. do Ministro proponente, pela necessidade, do crédito pedido.
Nestes termos, á vossa comissão de finanças, tendo em vista não prejudicar os serviços da armada, não se opõe a que se vote o crédito pedido.
Sala das sessões da comissão de finanças, 13 de Fevereiro de 1924.— Barros Queiroz (vencido) — Ferreira de Mira (vencido)— Jorge Nunes (vencido) — Custódio da Silva (vencido) — Paiva Gomes — Júlio de Abreu — Crispiniano da Fonseca — Alfredo de Sousa — Lourenço Correia Gomes, relator.
Proposta de lei n.° 627 - E
Senhores Deputados. — Considerando que a verba inscrita no capítulo 2.°, artigo 9.°, da tabela da despesa do Ministério da Marinha para o corrente ano económico de 1923-1924, se torna insuficiente para ocorrer aos encargos com os diversos serviços da armada;
Considerando que é necessário evitar que os mesmos serviços sofram no seu regular funcionamento:
Temos a honra de submeter à vossa esclarecida apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É aberto no Ministério das Finanças, a favor do Ministério da Marinha, um crédito especial da quantia de 2:000.000$, a fim de reforçar o capítulo
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2.°, artigo 9.°, «Despesas gerais da armada», da tabela da despesa ordinária dêste último Ministério para o corrente ano económico de 1923-1924.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 10 de Janeiro de 1924. — O Ministro das Finanças, Álvaro Xavier de Castro - O Ministro da Marinha, Fernando Augusto Pereira da Silva.
O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: V. Exa. entende que essa proposta de abertura de crédito pode ser submetida à apreciação da Câmara nos termos da lei votada há dias nesta Câmara?
O Sr. Presidente: — A lei a que V. Exa. se refere ainda não está em vigor, visto que nem sequer foi ainda aprovada pelo Senado.
O Orador: — Sr. Presidente: para confirmar a asserção por nós tantas vezes feita acerca dos errados cálculos orçamentais, nada melhor do que os sucessivos pedidos de crédito feitos por todos os Ministros a favor dos seus Ministérios.
Apesar do déficit confessado para o ano económico corrente ser de algumas centenas de milhares descontos, a verdade é que a subsistir êste regime de créditos de 2:000, 3:000 e 4:000 contos o déficit terá de ser consideràvelmente acrescido.
Naturalmente é com a mim de se servir de processos semelhantes que o Sr. Ministro das Finanças afirmou há dias numa reunião pública que o déficit, para o futuro ano económico, não iria além de 10:000 contos.
A Câmara votou ainda há pouco tempo uma proposta da autoria do Sr. Almeida Ribeiro, impedindo quaisquer aumentos de despesa desde que não houvesse a criação das receitas correspondentes.
Afirmou V. Exa., Sr. Presidente, que essa proposta não havia sido ainda convertida em lei.
Sr. Presidente: o que seria natural, depois do que afirmámos, é que os Srs. Ministros não se demorassem a vir trazer a esta Câmara aumentos de receita
para acudir a essas deficiências dos orçamentos ministeriais.
O que vai suceder nos próximos dias é que cada Ministro terá a cautela de vir apresentar créditos novos para acudir às deficiências dos respectivos orçamentos; e só quando tiver sido arrancada à magnanimidade da Câmara uma grande quantidade de contos para êsse fim é que será votada na outra Câmara essa proposta de criação de receita correspondente à despesa, mas quando já não tiver aplicação sôbre caso nenhum.
Isto é a justificação de serem os orçamentos uma ficção e uma verdadeira burla —desculpe-se-me o termo.
A Câmara não sabe se as verbas chegam, quando vota; e depois essas verbas têm de ser reforçadas mais tarde.
Contra esta forma de fazer administração protestamos nós.
Não posso atacar um Ministro que vem pedir um crédito desde que êle seja necessário, mas posso pedir responsabilidades a quem apresenta propostas de orçamento com cálculos errados. l
A responsabilidade é também da maioria parlamentar, que, para esconder a verdade desta desgraçada administração republicana, elabora orçamentos e aprova-os em tais bases.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ferreira de Mira: — Sr. Presidente: antes de entrar na apreciação do projecto que está em discussão, permita-se-me lembrar à Câmara o que representam os contínuos pedidos de novos créditos.
Êles representam a ilusão em que estamos de que os orçamentos aprovados são uma cousa real, quando não o são.
Juntam-se seis estadistas e resolvem fazer economias no papel. Cortam nos orçamentos determinadas verbas para apresentarem um déficit menor; mas, depois, vêm pedir-nos novos créditos.
Esta falsidade da vida financeira é a razão do descrédito e da situação em que nos encontramos.
Dito isto, eu não posso dar o meu voto à proposta em discussão.
Como vogal da comissão de finanças assinei vencido, como também assinaram os Srs. Barros Queiroz, Jorge Nunes e Custódio da Silva.
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Não fui pois só eu, mas até o Sr. Custódio da Silva que nunca foi nacionalista.
Assinámos vencidos, porque o projecto não tem a mais pequena base para o apreciarmos.
E tanto assim que o próprio relator, o Sr. Lourenço Correia Gomes, entendeu no seu parecer dever frisar a falta de documentos justificativos da proposta.
S. Exa. diz o seguinte no seu relatório:
«Não possui esta comissão elementos de informação, nem a proposta os contém, para poder ajuizar da necessidade do crédito pedido, a não ser a insistência do Exmo. Ministro proponente, pela necessidade do crédito pedido.
Nestes termos, a vossa comissão de finanças, tendo em vista não prejudicar os serviços da armada, não se opõe a que se vote o crédito pedido».
Estamos aqui fazendo alguma cousa que não deve ser apenas gastar tempo sem proveito para o País.
Eu pregunto se basta a autoridade moral do Sr. Ministro da Marinha ou de outro qualquer Ministro, seja qual fôr o seu passado e categoria, para que a Câmara lhe dê o sou voto.
É o desprestígio do Poder Legislativo esta forma de apresentar propostas e de elaborar pareceres dêste teor.
O Sr. Lourenço Correia Gomes não tinha o direito de formular um parecer em tais termos, e só podia dizer que se recusava a dar parecer pelas razões que apontava.
Creio ter justificado as razões por que não posso dar o meu voto à proposta em discussão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: pedi a palavra porque os ilustres Deputados que discutiram esta proposta acusaram a maioria de ter colaborado na elaboração de orçamentos que classificaram de irrisórios.
Sr. Presidente: é necessário afirmar por parte da maioria que tal acusação é absolutamente injusta.
A maioria, como toda a Câmara, colaborou nos orçamentos com todo o cui-
dado e boa vontade de defender os interêsses do País.
Simplesmente as circunstancias do ano passado eram diferentes das circunstâncias de hoje.
É sempre impossível fazer-se uma previsão completam ente exacta; e essa impossibilidade muito mais se acentua nas actuais circunstâncias em que há uma grande instabilidade nos valores.
Não admira, pois, que haja necessidade de o Govêrno vir ao Parlamento pedir o reforço dos orçamentos estabelecidos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: tratando-se de um reforço do verba para o Ministério da Marinha, eu venho solicitar do Sr. Ministro da Marinha que destine qualquer cousa dêsse reforço de verba para a compra de uma catraia que se empregue no serviço de picotagem da barra de S. Martinho do Pôrto.
A catraia que lá existe é já tam velha que não pode ser convenientemente utilizada.
Em nome dos que estão sujeitos a morrer nas ondas, eu faço êste pedido e espero que S. Exa. o tome em consideração.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva): — Sr. Presidente: pedi a palavra para expor à Câmara os motivos por que sou levado a solicitar o reforço do orçamento do meu Ministério, na parte respeitante a material..
Eu encontrei quási todos os navios em serviço na armada endividados pelo facto de não poderem pagar ao arsenal os respectivos trabalhos de reparações.
Resulta isto da circunstância de ser insuficiente o orçamento, o que não admira, visto que todos nós sabemos que quási dia a dia se alteram os valores do custo de material e da mão de obra.
Eu tenho aqui uma nota que justifica o pedido do reforço da verba orçamental. Não a leio porque seria cansar inutilmente a Câmara, visto que por uma simples audição os Srs. Deputados não poderiam reter os números indicados. Ponho-a, porém, à disposição de todos os
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Srs. parlamentares que a queiram examinar.
Tenho um cruzador no mar, em serviço de instrução de praças, aspirantes e oficiais. Não vejo em que possa fazer economias.
Tenho quatro canhoneiras no serviço da fiscalização da pesca, e todas são indispensáveis.
Não posso, portanto, reduzir os serviços nem, conseqüentemente, fazer economias.
Se V. Exas. quiserem, eu leio-lhes, verba por verba, as atribuições a dar a esta quantia de 2:000 contos; mas, pensando que êsses números não ficam suficientemente retidos na memória de V. Exas., entendo que é preferível pôr êstes números à disposição da Câmara, o que faço da melhor vontade.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovada a proposta na generalidade e posta à discussão na especialidade.
O Sr. Ferreira de Mira: — Sr. Presidente: aproveito a discussão desta proposta na especialidade -para responder às considerações agora feitas pelo Sr. Ministro da Marinha.
Disse S. Exa. que não lia aqui a documentação que possui para não fatigar a Câmara, mas que, no emtanto, conserva êsses números à disposição de todos nós. Seria muito mais útil e mais regular que essa documentação escrita tivesse acompanhado a proposta do Govêrno, para que a comissão de finanças pudesse dar o seu parecer com toda a consciência e o relator não tivesse de declarar que nada podia dizer, que não havia nada anexo à proposta.
Continuam, por conseqüência, tendo absoluta razão de ser as referências que fiz há pouco.
E nada mais acrescento porque à proposta consta só dum artigo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
É aprovado o artigo 1.°
É aprovado, sem discussão, o artigo 2.°
O Sr. Jaime de Sousa: — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.
Foi aprovado.
É aprovada a data.
Pedido de licença Do Sr. Cunha Leal. 30 dias.
Concedido.
Cumpra-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
O Sr. Presidente: — O Sr. Fausto de Figueiredo enviou a carta de que a Câmara tomou conhecimento pela leitura do expediente.
Nessa carta S. Exa. explica os motivos que o levaram a abandonar os trabalhos desta Câmara, renunciando ao seu mandato.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: todos nós temos assistido à obra parlamentar do Sr. Fausto de Figueiredo, e por isso, não podemos certamente resignar-nos a ver que êle abandona esta Câmara.
Qualquer divergência de ideas que tenha cada um de nós com S. Exa. não obsta-a que tenhamos uma grande consideração pelo seu bom pensar, pela sua, dedicação aos interesses nacionais, cabendo-nos o dever de demover S. Exa. do seu propósito manifestado na carta que enviou a esta Câmara.
Proponho, por isso, que a Mesa envide junto de S. Exa. todas as diligências para á desistência do seu pedido de renúncia.
Creio que toda a Câmara me acompanhará neste modo de sentir.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Rocha Saraiva: — Sr. Presidente: pedi a palavra para exprimir o meu desgosto pela renúncia do Sr. Fausto dê Figueiredo ao lugar que tam brilhantemente ocupava nesta Câmara.
Entristece-me ver que o Sr. Fausto de Figueiredo, pessoa a quem me prendem laços de amizade que muito me honram, a cuja inteligência, honradez e fé patriótica e republicana todos fazemos justiça, tivesse tomado a resolução de abandonar esta casa, do Parlamento.
Francamente custa-me a aceitar como boas as razões que S. Exa. apresenta para justificar a sua atitude.
Vive-se numa atmosfera de suspeições, é certo; mas em todo o caso essa atmos-
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fera não é tam carregada que a não possamos respirar, e, quanto maior fôr o número de pessoas honradas a respirar essa atmosfera, mais fàcilmente a tornarão purificada e respirável.
O Sr. Fausto de Figueiredo, efectivamente, não conseguia realizar uma grande parte dos seus propósitos; mas as circunstâncias nem sempre permitem que os homens públicos consigam realizar as suas aspirações; e daí a dizer-se que a obra dêsses homens não seja útil vai uma grande distância.
Todos estamos habituados à colaboração patriótica de S. Exa. e sabemos muito bem que a sua obra não foi inútil.
O Sr. Fausto de Figueiredo, homem de acção, na sua ânsia de realizar, na sua fé de conseguir uma obra concreta, queixa-se-nos de não a ter efectivado; mas S. Exa. deve contentar-se em ver realizada uma parte da sua obra-As circunstâncias não permitem que os homens possam realizar com as suas qualidades uma obra completa.
S. Exa. tem qualidades, possui prestígio; trabalhou nesta Câmara, e vejo com muita mágoa a resolução que S. Exa. tomou.
Quanto à sua obra na Assistência Pública, ela é digna de todo o elogio.
Durante o pouco tempo, que ali esteve realizou uma obra de justiça que imprimiu a todos os seus actos.
Associo-me por isso às palavras proferidas pelo Sr. Almeida Ribeiro, esperando que a resolução de S. Exa. não seja levada a efeito.
Oxalá as démarches a que a Câmara vai proceder demovam o Sr. Fausto de Figueiredo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita: — Sr. Presidente: o Sr. Fausto de Figueiredo numa carta que enviou para a Mesa é possivelmente quem inicia da parte daqueles que estão na política a marcha de retirada (Apoiados) que os acontecimentos talvez imponham.
Apoiados.
Sr. Presidente: é necessário na verdade uma resistência especial para aceitar sem revolta e sem repudiar a campanha de calúnia, a atmosfera de suspeição que se cria à roda dos políticos.
De facto o país atravessa um momento difícil, e a culpa é dos políticos. Há dificuldade em resolver o problema devido à carestia da Arida, e a culpa é dos políticos.
Esta culpa que assim se dilui por todos os políticos, não tem ainda a gravidade que tem as acusações de carácter pessoal, que têm as calúnias que se lhes assacam, e se propalam em roda dos políticos.
O político é uma pessoa que não tem o direito de possuir um vintém. (Apoiados). É uma pessoa que se anda bem posta, é porque o dinheiro lhe advém de processos ilícitos. Se anda mal pôsto, com os cotovelos rotos, é porque gasta o dinheiro indevidamente.
É esta a atmosfera que se cria em roda dos políticos.
Deve-se isto à política de certa imprensa.
Apoiados.
É ela que cria esta atmosfera em volta dos políticos e que dá curso à calúnia. E é assim que o povo se deixa encaminhar pela opinião duma corta imprensa.
Apoiados.
O Sr. Fausto de Figueiredo, cuja obra é formidável, se tem tido lucros pessoais, muito tem contribuído para o bem da colectividade.
No momento em que o Sr. Fausto de Figueiredo enviou uma carta a esta Câmara, carta em que se despede do -Parlamento, ficaria mal comigo mesmo se não proferisse as palavras que acabo de proferir, sentindo como sinto a atitude de S. Exa.
Sr. Presidente: é fácil ver entre aqueles mesmos que são nossos companheiros nesta Câmara alguns que foram visados por essa campanha de suspeições. Quantos há que têm sido tocados, e ainda agora vamos pode dizer-se no começo.
É absolutamente necessário que só tome a atitude de repúdio, enfrentando essa campanha.
Não acho por isso bem, não acho justa a renúncia do Sr. Fausto de Figueiredo.
Há espíritos que não estão habituados a luta de certa espécie e sentem a necessidade de desaparecer para que os deixem em paz. Parecerá esta a atitude do Sr. Fausto de Figueiredo.
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É justo que esta Câmara mostre a S. Exa. que repudia as campanhas que lhe foram feitas e que tem por S. Exa. uma consideração que a leva a manifestar-lhe o desejo de que S. Exa. continue a prestar ao País os seus serviços e a todos nós a sua colaboração.
O partido a que tenho a honra de pertencer não esquece que a República muito lhe deveu nas horas difíceis da sua implantação e por isso se associa às manifestações que lhe foram prestadas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Associo-me às palavras pronunciadas por todos os lados da Câmara acerca da carta de renúncia apresentada pelo Sr. Fausto de Figueiredo, porque reconheço em S. Exa. qualidades de inteligência e de trabalho que tem pôsto ao serviço do País.
Interpretando o sentir dêste lado da Câmara, associo-me às palavras dos oradores que me antecederam.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Lino Neto: — Lamento a resolução do Sr. Fausto de Figueiredo não só porque se trata de um companheiro leal e inteligente, mas também porque representa a sua atitude uma desistência perante uma vaga campanha.
Dizia um grande orador francês que quando tudo parece perdido é a hora das grandes almas: — chegou a hora para as grandes almas e para os grandes sacrifícios.
Por isso em nome da minoria católica, eu me associo às palavras que foram proferidas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: não é em nome da amizade pessoal que me ligada êsse Sr. Deputado que eu vou falar. Falo porque a carta de S. Exa. traduz o estado de alma em que a sociedade portuguesa se encontra e contra a qual temos de reagir.
Desse estado de alma somos muitas vezes os culpados com as discussões que aqui se travam e a que é necessário pôr termo de uma vez para sempre.
Trata-se de um republicano de sempre que nas horas indecisas da proclamação da República, quando lhe faltavam recursos materiais, os foi encontrar em Fausto de Figueiredo.
Trata-se de um republicano; e por isso eu peço à Mesa que faça todo o possível para convencer o Sr. Fausto de Figueiredo a desistir da sua renúncia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Correia Gomes: — Motivos muito particulares me obrigaram a pedir a palavra a V. Exa..
Foi em 1911 que eu insisti com Fausto de Figueiredo para entrar na actividade da vida política. É por isso que não posso deixar de proferir algumas palavras.
Lamento ver perdidas em S. Exa. todas as qualidades de energia que sempre demonstrou.
É absolutamente necessário que V.Ex.a, como Presidente desta Câmara, ao dirigir-se ao Sr. Fausto de Figueiredo, lhe faça sentir que êle e todos os que constituem o Parlamento, têm de manter-se nos seus lugares, continuando a lutar intransigentemente contra todos os maus actos e processos.
Estou certo de que a acção de V. Exa. não será perdida, porque o Sr. Fausto de Figueiredo, é um bom português e um bom republicano.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: depois das homenagens que hoje tem sido prestadas nesta Câmara ao Sr. Fausto de Figueiredo, eu julgo interpretar o sentimento geral da Câmara, mandando para a Mesa a seguinte proposta:
Leu.
Proponho que a Mesa da Câmara dos Deputados da República Portuguesa Taça junto do ilustre Deputado Sr. Fausto de Figueiredo as indispensáveis diligências - no sentido de demover S. Exa. do propósito de renúncia do seu mandato, transmitindo-lhe as demonstrações da alta consideração que esta casa do Parlamento acaba de dar-lhe.
Sala das sessões, 12 de Março de 1924.— Jaime de Sousa.
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Sr. Presidente: não julgo necessário acrescentar mais palavras para justificar a oportunidade desta proposta.
Ainda há poucos dias que a corporação da armada ficou devendo ao Sr. Fausto de Figueiredo um alto serviço, qual foi o de ter colaborado numa proposta de amnistia a alguns dos seus servidores que tinham sido colocados numa situação que era da maior urgência terminar.
Nestas condições, entendo que o desejo da Câmara é de que S. Exa. renuncie aos seus propósitos o volte ao Parlamento onde tem marcado bem as suas altas qualidades de inteligência o patriotismo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente: «orno português e como republicano, e não já como amigo pessoal de Fausto de Figueiredo, quero manifestar a minha profunda mágoa por ver afastar-se das lutas políticas um homem da sua envergadura.
Sr. Presidente: desde a Assemblea Constituinte até hoje, eu verifico que a sociedade portuguesa tem sofrido uma grande transformação.
A causa nacional que predominava nessa Assemblea foi dando lugar à causa dum partido, acabando de prostituir-se para ser a causa de algumas pessoas. .Sr. Presidente: é pois, com profunda mágoa que vejo afastar-se um combatente como Fausto de Figueiredo. Permita-me, pois, V. Exa. que formule os votos mais sinceros para que S. Exa. volte a esta Câmara, para ajudar com a sua acção a dignificar e a honrar a República.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: em nome do Govêrno desejo associar-me às palavras de V. Exa., relativamente à carta enviada pelo Sr. Fausto de Figueiredo, pois S. Exa. é um velho republicano e tem despendido a sua actividade em Portugal, realizando obras de grande utilidade, como as do Estoril.
Aplaudo, portanto, as palavras de V. Exa., no sentido de levar o Sr. Fausto de Figueiredo a desistir do seu intento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Encontra-se na Mesa uma proposta da autoria do Sr. Jaime de Sousa, para que junto do Sr. Fausto de Figueiredo sejam feitas as necessárias dêmarches no sentido de o demover dos seus propósitos.
Nestas condições, vou submeter à votação da Câmara a referida proposta.
Foi aprovada.
Leu-se na Mesa a seguinte
Nota de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro do Trabalho sôbre as condições da administração e resultados da exploração da Nacional Fábrica de Vidros da Marinha Grande, onde se fez a primeira tentativa de socialização da indústria.— Paulo Cancela de Abreu.
O Sr. Presidente: — Está sôbre a Mesa um pedido do Sr. Cancela de Abreu para se ocupar em negócio urgente da missão oficial do Sr. Alberto Xavier a Paris e a Londres.
Foi rejeitado.
O Sr. Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Feita a contraprova, verificou-se estarem de pé 36 Srs. Deputados e sentados 24, pelo que foi rejeitado.
O Sr. Sousa Coutinho: — Requeiro a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre só permite que entre em discussão, na sessão de amanhã no período de antes da ordem, a proposta apresentada pelo Sr. Ministro do Comércio alterando as leis que criavam as juntas autónomas de Vila Real e Tavira.
É aprovado o requerimento do Sr. Sousa Coutinho.
O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do parecer n.° 584
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: continuando as considerações que ontem iniciei, devo dizer a V. Exa. e à Câmara que mais uma vez em primeiro lugar se nota o que afirma o Sr. Velhi-
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nho Correia acerca da norma adoptada pela República na sua administração: isto é, em vez de se procurar deminuir as despesas por forma a aproximarem-se das receitas, pretende-se; fazer chegar as receitas ao montante das despesas. É esta uma norma de administração que bem faz diferenciar os republicanos dos monárquicos. Aqueles entendem que é preciso, sem olhar às despesas, aumentar as receitas os monárquicos, pelo contrário, têm como norma fundamental de administração a doutrina de que devem ser as despesas que têm de obedecer às possibidades das receitas. E só assim se pode esquecer a influência que na vida económica dum País tem um sistema de impostos só assim se pode administrar sem aniquilar as riquezas dum povo!
Logo, norma errada é esta que a República adoptou, e tanto mais errada quanto é certo que se há um processo eficaz de equilibrar ou melhorar as finanças do Estado, êsse processo é sem dúvida o de não se impedir o desenvolvimento ou criação de nova matéria tributável, porque é nossa matéria que pode o Estado encontrar maneira de ocorrer aos deficits orçamentais.
Mas não é assim que pensa a República, impossibilitada como está de levar o País a outro caminho que não seja o da sua completa perdição.
Sr. Presidente: antes de entrar novamente na apreciação das disposições desta proposta de lei seja-me lícito ler duas linhas do parecer do Sr. relator, linhas que demonstram bem a consciência com que a República tem olhado para os interêsses do País.
Diz S. Exa.:
Leu.
Está demonstrada a beleza, da obra do empréstimo e a consciência com que a República tem zelado os interêsses do País. Esta demonstração é feita pela voz dos seus mais altos vultos políticos. E não há dúvida de que o Sr. Velhinho Correia é um dos mais altos vultos da República, tanto assim que até o actual Govêrno não teve outro plano financeiro para adoptar senão o de S. Exa., que é o financeiro máximo do regime.
Mas, tratando-se do imposto do sêlo e da maneira que o Govêrno julga mais conveniente para resolver a situação do País,
alguma cousa tenho também que dizer acerca das vantagens ou desvantagens dêsse imposto do sêlo.
Sem dúvida, um sistema de impostos para ser menos defeituoso, visto que nenhum há que possa ser absolutamente perfeito, deve compor-se de impostos directos,e de impostos indirectos.
Efectivamente, os impostos indirectos são aqueles, que maiores receitas podem produzir, muito principalmente quando a tributação directa, está como sucede no nosso País, mais que esgotada.
Mas, se os impostos indirectos são um meio de obter receitas, não pode esquecer-se que para a harmonia dum sistema, tributário é indispensável atender à modicidade das taxas tanto nos impostos directos, como nos indirectos.
É isso, porventura, o que êste parecer nos traz?
Não, pelo contrário; êste parecer enferma, além de tudo, dum vício de origem, que é o de tributar principalmente-os géneros de primeira necessidade.
Apoiados.
É tributar os géneros de primeira necessidade que é sempre um crime, sem dúvida o é muito maior numa época em que a carestia da vida é o maior flagelo que está sofrendo a população portuguesa.
Logo de entrada nós encontramos neste parecer a criação de novas taxas de sêlos propostas pelo Sr. Velhinho Correia,e agora perfilhadas pelo Sr. Presidente do Ministério.
É sôbre que incidem algumas dessas taxas?
Por exemplo: vai-se logo esperar as mercadorias, ainda as de primeira necessidade, à sua chegada ao porto de Lisboa para se lhes lançar uma série de impostos a sobrepor àqueles que já existem e que agora se agravaram nas alfândegas. É verdadeiramente extraordinário que o mesmo Presidente do Ministério e Ministro das Finanças que ainda há dias, como ontem referi, declarava que êste Govêrno está ao lado do povo, que o povo pode contar com êle para o embaratecimento da vida, que êsse Presidente do Ministério, a que nós podemos chamar, em face da maneira como quere baratear a vida nesta casa do Parlamento, o barateiro de S. Bento, venha trazer-nos estas medidas.
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Sr. Presidente: para que se veja até que ponto são atendidas as reclamações acerca da carestia da vida, temos o ti.° 23 da tabela de luxo que diz:
«Comestíveis diversos, designadamente frutos, aves, peixe, etc.»
Assim vemos selar uma galinha e assim serão selados a pescada, o carapau, todo o peixe emfim.
Não há dúvida de que por esta forma se há-de baratear a vida-ato se chegarão bacalhau a pataco apregoado no saudoso tempo da propaganda.
Àpartes.
O Orador: — Nada é para admirar neste estado anárquico do regime republicano.
Não há dúvida que temos necessidade de tributar, mas não por esta1 forma, que chega ao extremo, que torna proibitivas todas as manifestações de luxo. O luxo não pode deixar de existir, porque êle tem uma larga importância na vida económica de uma nação.
O luxo não é só uma manifestação de riqueza é também proveitoso para as classes trabalhadoras, pois se amanhã os impostos lançados sôbre artigos de luxo forem tam fortes, tam violentos que se tornem impossíveis essas manifestações de luxo, todos os operários que viverem dessa indústria encontrar-se hão sem trabalho. E assim vamos prejudicar as. classes pobres.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças tem uma grande facilidade em resolver os problemas financeiros e equilibrar o Orçamento por processos que ninguém tinha descoberto ainda.
O Sr. Presidente do Ministério requereu a discussão do parecer n.° 584, que trata dos sêlos nos automóveis, e assim temos.
Leu.
No decreto de 1918 a que se refere o Sr. Presidente do Ministério nós encontramos o seguinte:
Leu.
Também como imposto de viação e turismo os automóveis pagam:
Leu.
É justo tributar em limites razoáveis as manifestações de luxo, mas é de mais
que um automóvel particular, e eu neste assunto falo perfeitamente à vontade porque o não tenho, nunca tive nem posso ter automóvel, passe a pagar 5.000$ por ano.
Sr. Presidente: como V. Exa. e a Câmara vêem, isto é verdadeiramente legislar com a maior das consciências porque é proibir à maior parte das pessoas quis têm automóvel que continuem a possuí-lo. E proibir isso é tirar lugar dos chauffeurs que ganham nesse ofício, é fazer uma crise nas oficinas de consertos e reparações de automóveis é abrir uma crise de trabalho, é baralhar ainda mais a economia da Nação, é acabar, por último, com a matéria colectável.
O Sr. Tôrres Garcia: — É muito possível que a intenção seja essa proceder assim para não se cobrar cousa alguma.
O Orador: — Efectivamente passa-se a não cobrar cousa alguma. Mas, Sr. Presidente, não é só isto. E já agora, porque nem tudo são cousas tristes, eu devo dizer a V. Exa. e à Câmara, citando os artigos de luxo que são tributados nesta proposta, que há um que talvez seja dos que mais interessam os Srs. Deputados, se não todos pelo menos alguns: é o que consta do n.° 51 da tabela e são obras de cabelo, cabeleiras e postiços de qualquer valor.
Sabe V. Exa. Sr. Presidente, que nós dêste lado da Câmara somos quási todos insuspeitos falando neste assunto, porquanto não usamos postiços de cabelo; mas talvez a alguns Srs. Deputados interêsse êste assunto. Ocorre-me agora preguntar ao Sr. Presidente e Ministro das Finanças se porventura qualquer portador dêstes objectos de luxo a que vulgarmente se chama «capachinhos», quando importado de Paris, estará sujeito, ainda mesmo quando se trate de um Deputado — porque neste ponto não há imunidades ao artigo 7.° que diz que êstes artigos estão abrangidos pelo artigo 59.° da lei n.° 1:358, isto é, que quando importados terão de pagar o solo ao câmbio médio do trimestre anterior.
Estou convencido de que êste artigo, para ficar bem demonstrada a isenção dos Srs. Deputados, há-de ser um daqueles que merecerão aprovação. E assim não se
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poderá acusar ninguém de ter legislado em benefício de si próprio.
Sr. Presidente: tributando-se o luxo não podemos esquecer também que há-pesadas taxas progressivas a incidirem sôbre as grandes fortunas ou fortunas regalares e até mesmo sôbre as pequenas fortunas, porque o processo adoptado pelo Sr. Ministro das Finanças em matéria de multiplicação de coeficientes é sempre dos mais extraordinários.
S. Exa. esquece que há impostos progressivos como o imposto pessoal de rendimento, como a contribuição de registo, como a taxa militar, que se formos multiplicar por 20 êsses rendimentos colectáveis toda a gente ficará colectada no ponto mais alto da escala e assim quem não tenha quási nada passa a ser colectado como se tivesse uma grande fortuna.
Quem tenha alguma cousa nesta terra fica absolutamente sem nada por se encontrar abrangido por taxas progressivas como se tivesse grande fortuna.
Eu pregunto se isto é ter conhecimento da situação de vida económica do País, da situação em que se encontra uma grande parte do comércio que, diga-se o que se disser, o comércio de géneros de primeira necessidade pode estar a ganhar, porque géneros de primeira necessidade são cousas que todos temos de comprar, mas, desde que se trate de artigos que não são de primeira necessidade, a Câmara está iludida se supõe que uma grande parte do comércio de artigos de luxo não está hoje a atravessar uma crise.
É preciso atender a tudo isto; mas, a nada atendeu o Sr. Presidente de Ministério, a nada disto atendeu o Sr. relator, pensando-se só em tributar e tributar perfeitamente à toa.
Mas, há mais, Sr. Presidente.
Tributar o luxo por maneira exagerada é eliminar a matéria colectável da contribuição industrial.
Evidentemente, se os comerciantes e industriais que fabricam e vendem artigos de laxo vivem cerceados os seus negócios limitarão a matéria colectável. E assim o Sr. Presidente do Ministério, julgando que vai arranjar uma grande receita, vai, pelo contrário, diminuí-la.
Não é êste o sistema de resolver a questão financeira, tanto mais que, fazendo votar a proposta, o Govêrno vai con-
tribuir para o encarecimento da vida e para a deminuição extraordinária da riqueza dos particulares. Desta proposta resultará uma receita inferior ao aumento de despesa que vai originar e ainda uma deminuição de receita aos impostos directos porventura tam grande como a receita que se cria aos impostos indirectos.
É êste um processo absolutamente errado que tem também de ser encarado sob o ponto do vista social.
Só quem não queira ver é que não reconhecerá que no nosso País existe um perigo social que não pode esquecer quem tenha a consciência dos seus deveres. E agravar o custo da vida neste momento, além do ser desumano por agravar ainda mais a miséria de tantas classes, é criar um estado de espírito mais propício para que êsse perigo se avolume. As cousas económicas e financeiras, as cousas que, emfim, dizem respeito à vida de um estado não podem ser olhadas com aquele critério superficial com que os encara o Sr. Presidente do Ministério. Se elas fossem como S. Exa. pensa, então não haveria nada mais fácil do que salvar um País arruinado como o nosso.
Quando é necessário restabelecer a confiança ao capital £0 que vemos nós? Vemos a apresentação de um parecer em que se estabelece um imposto de 80 por cento sôbre o capital de qualquer sociedade anónima que se queira constituir. Isto é verdadeiramente impeditivo, além de ser verdadeiramente espoliador. É evidente que uma das condições fundamentais pára que o País se possa salvar está na criação de emprêsas destinadas a medidas de fomento, a aumentar e a aproveitar as riquezas. Que loucura é, pois, esta de se querer-arrancar a qualquer sociedade logo 80 por cento do seu capital quando procure constituir-se?!
Em toda a parte onde convenientemente se encaram as cousas desta natureza, o primeiro cuidado dos governantes é estimular as iniciativas, isentando-as de contribuições no seu início.
Em Portugal pensa-se de modo diferente.
Se formos ver os impostos que sob o nome de sêlo se criam pela proposta encontramos cousas extraordinárias.
Um automóvel de aluguer, por exemplo, tem de pagar, por cada lugar além.
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do do chauffew, 30$ por ano, ou sejam 150$, sôbre a licença actual e além de todos os outros impostos que sôbre êle recaem.
Mas, para baratear os géneros, não há nada melhor do que o que vou citar. Além de tudo o que disse ontem, um comerciante tem de pagar:
Leu.
Cada sêlo chega a ser de 20$ a 30$, de modo que, se o comerciante, tiver vários letreiros, como é natural, pagará uma porção de centavos ou de milhares de escudos. Sôbre os livros de escrituração os selos que se criam são verdadeiramente elevados.
O Sr. Presidente (interrompendo): — V. Exa. tem de cingir as suas considerações à proposta do Sr. Ministro das Finanças.
O Orador: — Então a discussão do parecer n.° 584 está posta de parte?
O Sr. Presidente: — Por emquanto está.
O Orador: — Nesse caso não desejo bater no morto, embora me regozije com a morte do parecer n.° 584 e vou restringir-me à discussão da proposta apresentada pelo Sr. Presidente do Ministério.
Sr. Presidente: o artigo 5.° desta proposta é verdadeiramente uma monstruosidade. Nas multiplicações sucessivas do sentimento colectável da propriedade rústica, atendeu-se sempre às reclamações apresentadas pelos proprietários rurais por virtude de exageros no sentimento colectável; mas ao mesmo tempo que o Sr. Ministro das Finanças apresentou uma proposta pela qual são multiplicadas por vinte os rendimentos colectáveis de 1914 — o que significa que são multiplicados por cêrca de quarenta e uma vezes os rendimentos colectáveis de 1910 — coloca-se a propriedade rural na contingência de ser proibido a quem a possui o direito de reclamar. Isto é uma verdadeira espoliação.
Eu não vou ocupar-me largamente agora de cada um dos artigos desta proposta, reservando-me para, na especialidade, demonstrar o que êles são; mas devo, no
emtanto, constatar que uma grande parte dos novos selos foram da iniciativa do Sr. Velhinho Correia e agravam poderosamente o preço do custo da vida.
Assim, por exemplo, pelo que respeita às bebidas engarrafadas, às águas minero-medicinais, V. Exas. sabem que um adicional foi lançado estabelecendo um sêlo de $07,5 sôbre cada garrafinha de 0,25. Contudo, não se trata de um artigo de luxo.
Sôbre a cerveja, o imposto é duplo e em vez de se protegerem as fábricas de cervejas nacionais, o Sr. Presidente do Ministério cria para cada meia garrafa dessa bebida um adicional de $13.
Isto provavelmente foi para, favorecer a nossa indústria!...
Depois, passando aos outros artigos, nós encontramos o seguinte, relativamente a catálogos, reclamos, anúncios, etc.
Leu.
Quere dizer, trata-se de agravar mais a situação do comércio, que necessita para a propaganda dos seus produtos de calendários, catálogos, etc.
Há ainda um outro artigo sôbre seguros.
A Câmara sabe como a indústria de seguros está sobrecarregada de impostos.
Pois o Sr. Presidente do Ministério ainda a quere sobrecarregar mais com um sêlo.
Sôbre processos e despachos de justiça ainda é lançado um novo sêlo, para assim sobrecarregar mais quem, para fazer valer os seus direitos, tenha de recorrer à justiça do nosso país.
Também quem queira uma guia para pagar um imposto ao Estado tem de pagar, um sêlo para essa guia, o que é extraordinário.
Sr. Presidente: se formos ver quanto se paga pelo fabrico de cervejas e refrigerantes, encontramos ainda mais a aplicação de 1.000$.
Há ainda uma outra disposição para a qual não posso deixar de chamar a atenção da Câmara.
Sôbre clubes de recreio incide uma licença anual de 3.000$.
Ainda se compreendia essa incidência sôbre clubes onde se joga.
Devo dizer que sou contrário à regulamentação do jogo mas, pagando-se, compreendia-se essa verba.
Muito tenho a dizer sôbre a especiali-
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dade, e como gastaria algum tempo analisando vários artigos, vou terminar agora as minhas considerações, esperando que a Câmara pondere bem as considerações desta proposta em discussão, que, sendo aprovada, irá influir enormemente no aumento do custo da vida. Isto basta para que a Câmara não dê o seu voto à proposta tal como está.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Marques Loureiro: — Sr. Presidente: do estudo, tam minucioso quanto me foi possível fazer, nas curtas horas que mediaram entre a apresentação a esta Câmara da proposta do Sr. Álvaro de Castro e a sua entrada em discussão, arraigou-se no meu espírito a convicção de que se trata duma obra dispersa, tumultuaria e contraditória, quando o que deveria fazer-se era refundir num só diploma toda a legislação que diz respeito ao imposto do sêlo, relegando para outros diplomas doutrinas que nada têm com a lei do sêlo.
Neste sentido redigi uma proposta que vou mandar para a Mesa.
Sr. Presidente nem da minha parte, nem do grupo parlamentar a que pertenço, há o menor intuito de fazer obstrucionismo. Eu creio que estava em discussão uma proposta de certo valor, como é a das estradas. O tempo que a comissão levaria a fazer a compilação de tudo quanto respeita ao sêlo não era perdido, dando-se prioridade a uma questão que, sem dúvida, é da maior urgência.
Para demonstrar que não está no meu propósito fazer obstrucionismo, numa rápida análise, em cumprimento com a lei n.° 1:552 e com a de 3 de Novembro, vou mostrar à Câmara que da proposta em discussão não resulta só o caos, como já aqui foi dito pelo Sr. Velhinho Correia, mas a balbúrdia e a confusão.
Vejamos o que diz o artigo 2.° do projecto.
Leu.
Sôbre o que incide êste coeficiente? Incide sôbre toda a matéria considerada como sujeita a imposto de sêlo?
O orador é interrompido simultaneamente pelos Srs. Velhinho Correia e Carvalho da Silva, que mantém diálogo com o orador.
O Orador: — Confesso que, não obstante estar habituado a lidar com leis, fico confundido, porque nada entendo.
Mas no artigo imediato, que é o artigo 3.°, diz-se o seguinte:
Leu.
Porque é que êste projecto veio com tanta urgência que não pudesse ser estudado como devia ser?
Isto deve ser estudado com cuidado e muita atenção.
Talvez haja quem possa estudar êstes assuntos do repente; mas eu sou velho para aprender a estudar ràpidamente.
Veja V. Exa., por exemplo, o artigo 4.°:
Leu.
Se o projecto foi aprovado, nós não sabemos qual é a taxa do imposto do sêlo.
Na própria lei n.° 1:552 se diz que é o próprio Ministro que vai regulamentar a lei; mas em virtude de quê? Em virtude da ditadura desenfreada, da qual todos nós havemos de sentir as conseqüências.
Isto não pode ser, porque é necessário que alguma cousa útil se faça, sem pressas, mas com a serenidade precisa para que o Parlamento se pronuncie com conhecimento de causa.
Mas se quisermos prosseguir na análise de cada uma das verbas da proposta em discussão, ficaremos ainda mais às aranhas.
No artigo 5.° diz-se:
Leu.
Se bem compreendi as palavras do Sr. Carvalho da Silva, S. Exa. não está na boa razão.
O que se quis dizer neste artigo é que sôbre o rendimento colectável corrigido é que incide a multiplicação por 20.
Trocam-se explicações entre o orador e os Srs. Carvalho da Silva e Velhinho Correia.
O Orador: — Está bem. A redacção do artigo é que é defeituosa.
O que se quere dizer é que o valor nunca pode ser superior àquilo que fôr apurado na matriz, multiplicado por 20. Mas como se faz isso? Tirando uma certidão da matriz, isto é, lançando um novo imposto sobre o contribuinte, obrigando-o a tirar uma certidão que não é hoje muito barata.
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No n.° 10.° do artigo 5.° diz-se:
Leu.
Ora nesta proposta não há artigo 1.°, como não há, artigo 2.° nem 18.° Não há nada porque tudo e desconexo e imperfeito.
É esta obra que o Sr. Ministro das Finanças quere ver aprovada pela maioria desta Câmara?
Mas não fica por aí a proposta. Vamos ver. o artigo 39.° O gato, deve dizer-se, não é da responsabilidade do Sr. Velhinho Correia; o seu a seu dono. Trata-se duma invenção da proposta que se pretende fazer discutir.
Diz o artigo 12.°:
Leu.
Isto não é razoável, para não dizer que é deshonesto.
Isto não é razoável.
Nesse artigo 30.° da proposta alude-se a recibos.
A lei n.° 1:552 previne absolutamente a hipótese dos recibos.
Lá está actualizada a importância do recibo.
No entanto vamos ver os artigos 129.° e 130.° do parecer n.° 534.
Leu.
Não compreendo como temos de apreciar, a propósito de Lisboa, várias taxas de recibos, quando, precisamente, êsse acto de prestação está colectado em outros artigos.
Há uma inovação.
Diz o relatório que é um artigo novo que tem toda a razão de ser.
Eu entendo que não, porque em 25 anos de advogado nunca ouvi falar em contratos de aprendizagem.
Temos a preocupação de traduzir, num português mais ou menos mascavado, tudo que encontramos lá fora.
Em Portugal precisamos mas é de arranjar leis que estejam inteiramente conformes com o nosso meio.
O próprio Estado paga a aprendizagem: tem escolas de artes e de ofícios; e no Orçamento ha verbas para se pagar aos aprendizes alunos dessas escolas.
Dá-lhes até uma percentagem sôbre a obra que produzam.
Se V. Exas tiverem a preocupação de ir pelos estabelecimentos preguntar quanto é pago aos marçanos que lá estão a aprender para serem caixeiros, êles di-
zem-lhes que não estão a aprender: vão prestar serviços ao mestre e não para aprender.
Interrupções do Sr. Velhinho Correia.
O Orador: — Hoje são muito poucas as regiões do País onde se faz o contrato de aprendizagem; e mesmo se nós pensamos em fazer qualquer cousa de útil para o País, eu até propunha que se acabasse êste imposto, fazendo só a restrição de que os contratos fossem feitos com mestres que soubessem.
Quanto às bebidas engarrafadas, tenho pena de que não esteja na sala o Sr. Serafim de Barros para repetir a S. Exa. considerações que outro dia lhe fiz. Mas diz-se no relatório que êste imposto vem desde as propostas do Sr. Pina Lopes; mais tarde as propostas apresentadas pelo Sr. Velhinho Correia, que foram objecto de larga discussão na comissão de finanças, traziam na parte final precisamente a colecta sôbre os vinhos, mas não como motivo do sêlo; depois, nas propostas de finanças enunciadas pelo Sr. Cunha Leal, aludia-se também a essa colecta.
Pois o Douro, que todos nós respeitamos, e o meu respeito não quere dizer subserviência, porque se é um fidalgo arrumado a si o deve, o Douro atirou-se sôbre Cunha Leal dizendo que a sua obra era derrotista.
Nos jornais do Porto, dirigidos por pessoas que têm responsabilidades e que não podem ignorar a vida pública do País, salientava-se mesmo que as propostas de Cunha Leal mereciam toda a condenação.
Entretanto essa colecta vinha já do tempo do Sr. Pina Lopes, e a comissão de finanças, que na sua maioria é democrática, tinha-a aprovado.
O Sr. Alfredo Sousa: — O Douro protestou contra o imposto de produção de vinhos!
O Orador: — Eu sei muito bem o que se passou, porque tenho guardado os jornais e conheço até as declarações que o Sr. Serafim de Barros me fez a êsse respeito.
Basta apenas indicar que, o imposto indicado pelo Sr. Cunha Leal era em todo
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o caso bastante inferior àquilo que está nesta proposta.
Quere ver V. Exa.?
Leu.
Vê V. Exa. o que o Sr. Ministro das Finanças apresenta aos Deputados pelo Douro?
Vários Srs. Deputados interrogam o orador.
O Orador: — Mas há mais: procurou-se adoçar a pílula, que é bem amarga, da seguinte maneira:
Leu.
Andou bem o Sr. Velhinho Correia em dizer que a idea não era sua, mas de um fabricante de mixórdia que precisava de um sêlo que autenticasse a porcaria que lá fora fabricava.
O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): — Mas a aposição dos selos é facultativa,
O Orador: — Mas por êsse critério como é possível selar todas as garrafas?
O Sr. Velhinho Correia: — Tal qual como se faz com o tabaco o com os produtos farmacêuticos que são selados na alfândega.
O Orador: — Mas como é que se garante a genuinidade do produto?
Leu.
Sr. Presidente: também não vou discutir agora os contratos feitos pelas companhias, porque tudo isto é matéria que já está colectada.
Diz ainda o relatório apresentado pelo Sr. Presidente do Ministério, Álvaro de Castro.
Leu.
Como V. Exas. vêem, tudo isto é feito de uma forma verdadeiramente arbitrária e atrabiliária.
Sr. Presidente: outra descoberta que foi feita, foi a dos contratos de encampação.
Ora, isto de entregar ao senhorio o prédio arrendado, foi chão que nunca deu uva, quanto mais dar sêlo agora.
Relativamente às taxas, desejo salientar que é matéria descabida nesta proposta, pois melhor caberia numa outra referente a contribuições.
Quando vou pagar uma receita eventual e me dão um papel, não sei se se tratado uma guia ou conhecimento, e, portanto, só deve ou não ser selado.
O que aqui está é, positivamente, uma brutalidade.
É preciso que a taxa que incide sôbre os actos seja uma taxa racional para evitar que se continue praticando o que hoje se faz atrás da panela como lá fora se diz)
O Sr. Velhinho Correia: — Tudo isso tem sido invenção dos advogados.
O Orador: — Engana-se V. Exa. O tempo já não vai para advogados.
Anda tudo torto, é certo; mas a responsabilidade não é minha, que não costumo inclinar-me ao sabor das conveniências políticas.
A proposta fala ainda em:
Lê.
Declaro que não percebo, também, êste artigo. Deve ser deficiência minha, mas ainda assim eu gostaria de saber quais são os contratos onde há prorrogação ou renovação e como colectá-los.
Há apenas um caso em que êles existem, no caso de arrendamentos, mas êsse já está previsto na lei.
Então um contrato de empréstimo, por exemplo, tem prazo marcado?1 Não.
Eu desejaria que me explicassem como se pode exigir a cobrança sôbre esta venda de móveis, que até hoje se tem feito sem documento algum.
Exige-se agora um sêlo, mas realmente não sei como cumprir-se a exigência.
Qualquer pessoa pode vender uns móveis, para um qualquer estabelecimento, mas depois podem não ser retirados, porque a pessoa mudou de idea.
Há motivo para muitas e várias complicações.
Àpartes.
Com arrendamentos e traspasses, a complicação é ainda maior.
Faz-se por exemplo um arrendamento novo, a uma pessoa diferente.
De onde se deduz que houve traspasse?
Àpartes.
Se se quere considerar êsse problema, ataque-se a questão com utilidade e de um modo claro.
Para isso o Partido Nacionalista está
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no seu pôsto para fazer todos os sacrifícios pela Pátria, quando ela lhos imponha, mas com resultados úteis.
E certo que se estão fazendo constantemente traspasses, com prejuízo do fisco e mesmo dos donos dos prédios.
Se é necessário que êsses contratos sejam reconhecidos, altere-se então a lei do inquilinato, tirando-se assim margem para uma grande colecta para o Estado, e garantia para o proprietário.
Sei que o inquilino quererá dar ao senhorio o menor lucro possível, declarando um mínimo de traspasse, mas pode-se dar ao senhorio o direito de opção, e então já o preço será indicado com verdade e até exagerado para que o senhorio não use do direito de opção.
Assim já o Estado pode receber uma certa contribuição.
Assim será possível o Estado receber; mas, em quanto não se faça isso, não será possível.
Como tudo está nela feito, esta proposta 6 uma obra dispersa, que ainda mais nos vai lançar num novo caos.
Se a proposta que mandei para a Mesa fôr apreciada pela comissão de finanças, e se ela prestou atenção a outras propostas feitas, e quiser trabalhar, em três ou quatro dias poderá apresentar à Câmara um novo diploma, com tudo organizado por ordem alfabética, por exemplo, sôbre o imposto do sêlo, e de uma maneira clara que todos fora desta casa também compreendam, que nós a discutiremos se pode ou não subsistir, e tudo isto para que se não dê o que se 3a com a lei n.° 1:552.
Não será muito oportuno fazer-se referências mas elas tem de fazer se por amor à verdade.
Nessa lei n.° 1:552 estabeleceu-se que o papel solado seria de um escudo e dez centavos incluindo o papel — creio que essa emenda foi ao Senado — mas durante a discussão que houve nesta Câmara falhou apenas num escudo e assim deveria ser porque a lei diz.
Leu.
Creio ter dito o suficiente para justificar a proposta que enviei para a Mesa.
A comissão de finanças que tem no seu seio jurisconsultos prestigiosos decerto resolverá com toda a justiça esta cousa em que estamos todos empenhados que é a remodelação de todo o imposto de selo
de forma a sair daqui qualquer cousa que tenha pés, que tenha pernas e cabeça, porque a proposta em discussão, tal como foi apresentada, está positivamente sem cabeça.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: pedi a palavra para responder aos Srs. Marques Loureiro e Carvalho da Silva, mas mais especialmente ao Sr. Marques Loureiro.
Ouvi as judiciosas considerações feitas pelos oradores que falaram na generalidade da lei do sêlo; e embora o Sr. Presidente já tivesse dado a explicação de como é que deve fazer-se a discussão desta proposta, devo contudo dizer que êste projecto é da autoria do Ministro anterior e que tem o parecer, em todas as suas verbas, da comissão de finanças. Não sei se é um bom trabalho ou não, mas pelo menos tem o parecer da comissão de finanças assinado com discrepância apenas de dois dos seus vogais.
Como se tratava dum projecto que continha verbas que muitos se recusavam a votar e levantaria uma discussão muitíssimo grande, pensei propor à Câmara que se fizesse agora somente a discussão de determinadas verbas dêsse mesmo projecto.
Sr. Presidente: não vejo nenhuma espécie de vantagem em que êste trabalho volte novamente à comissão de finanças para que esta dê o seu parecer conforme.
O Sr. Marques Loureiro: — Doutra forma fica a jogar com a lei n.° 1:552.
O Orador: — Se V. Exa. me permite, eu contesto, porque a única cousa que encontrei como impossibilidade de ligação com a lei n.° 1:052 são as referências feitas ao projecto.
Também posso já afirmar que não ficará isenta de pecha se novamente fôsse à comissão para ela dar parecer.
Seria efectivamente vantajoso que a lei do solo ficasse unificada num só diploma.
Apoiados.
Simplesmente entendo que nesta hora acima desta razão há uma razão forte que prevalece sôbre todas as outras: é que é
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necessário votar urgentemente estas verbas da lei do sêlo, que não^ obedece a intuitos de ordem filosófica. Não sei em que filosofia possa fundar-se uma lei de sêlo. Há apenas a urgência do Estado em receber dinheiro.
Nesse ponto sou profundamente ignorante não conheço na verdade a alta filosofia da confecção de leis.
Uma voz: — V. Exa. apenas assinou...
O Orador: — Desgraçado Ministro das Finanças que tivesse de estar amarrado a uma carteira a fazer a lei do sêlo. Assim, sim.
Para isso é que tenho os funcionários técnicos que sabem precisamente como ela se organiza.
Mas tive a intervenção dum funcionário dos mais competentes.
O Sr. Marques Loureiro: - Deu muito más provas.
O Orador: — Daria; mas é o melhor que lá temos.
Por isso não posso aceitar a indicação de V. Exa., que aliás gostaria de aceitar, porque não tenho senão a responsabilidade de Ministro das Finanças.
Parece-me que ir à comissão será trabalho absolutamente inútil.
V. Exa. que a estudou tem a faculdade de apresentar emendas o as sucessivas alterações que entender.
Parece-me que é melhor votar estas taxas que não estão consignadas na lei do solo actual.
Parece-me que o problema a resolver é até êste os actos indicados pela comissão de finanças são ou não para taxar? Mais nada. Estão as verbas indicadas e a Câmara aprova-as ou não.
O Sr. Marques Loureiro: — V. Exa. esquece os 10 artigos a que se refere o parecer!
O Orador: — Mas já tenho uma proposta para mandar para a Mesa.
O Sr. Marques Loureiro: — Mas isso é que nós não sabíamos!
O Orador: — Isso, porém, não é culpa minha, mas da forma como o Regimento entende a discussão na generalidade. De maneira que não aceito a indicação do Sr. Marques Loureiro para a proposta baixar às comissões, e aproveito o ensejo para enviar para a Mesa uma proposta de substituição dos artigos a que se refere o parecer em discussão.
Sr. Presidente: o Sr. Carvalho da Silva fez também a sua crítica ao parecer quási na mesma orientação do Sr. Marques Loureiro; por isso, dispenso-me de fazer referência especial às palavras de S. Exa.
Ainda o Sr. Marques Loureiro disse que o Govêrno procurava obter receita por meio destas taxas. Eu já declarei outro dia no Senado, e digo-o agora aqui, porque gosto de pôr bem clara a política financeira do Govêrno, que não conheço processo absolutamente nenhum de equilibrar o Orçamento sem criar as receitas necessárias para isso. Mas no dia em que a Câmara me demonstrar que há outro processo, eu não tenho dúvida em o aceitar. Todavia, o País está numa situação que necessita de medidas urgentes.
O remédio só o podia dar o Parlamento com as medidas indispensáveis para dar o rendimento preciso.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — E não vêm mais?
O Orador: — Vêm muito mais que o Govêrno há-de propor.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Numa época em que tanto se apregoa a compressão de despesas vão quatro oficiais a Madrid, por causa do pontapé na bola.
O Orador: — Tenho muito prazer em que V. Exa. se refira a isso para eu explicar que não era decoroso deixar de ir a Espanha, tanto mais que era a equipe portuguesa a detentora da taça, actualmente, e nós...
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Bastava ir um oficial.
O Orador: — Não estamos em tamanha miséria que seja preciso fazer essa má figura.
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O que a V. Exa. lhe custa é ver que a República vai por um caminho em que não pode ser atacada.
Apoiados.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai passar-se ao período de
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Alberto Jordão: - Desejo chamar a atenção do Sr. Ministro da Justiça para
a nomeação do secretário da comissão concelhia dos bens da igreja em Évora.
Sr. Presidente: trata-se de um funcionário que tem pendente um processo disciplinar por ter recebido indevidamente dinheiro no exercício do seu cargo. Estou convencido de que, se o Sr. Ministro da Justiça soubesse isto, não o teria nomeado.
Desejava, pois, que S. Exa. olhasse para esta questão a fim de que a República se dignifique um pouco mais, evitando-se os percalços da natureza do que venho de referir, e ainda para que os adversários do regime não digam que são nomeadas pessoas para cargos cujo exercício necessita de uma idoneidade que não têm.
Chamo, pois, a atenção de S. Exa. para êste assunto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (José Domingues dos Santos): — Sr. Presidente: em primeiro lugar devo dizer que não fiz a nomeação de ânimo leve. Possuía as devidas informações sôbre as qualidades da pessoa nomeada, as quais me foram dadas pelo meu representante lá, que é o delegado, e ainda pelo administrador do concelho. Essas informações eram de molde a poder-se fazer a nomeação, que de resto não tem a mínima importância, porque não é remunerada nem dela pode advir qualquer inconveniente.
Sr. Presidente: quero ainda acentuar que o administrador do concelho não é meu correligionário...
O Sr. Alberto Jordão (em aparte): — Nem meu.
O Orador: —... nem tampouco o delegado.
Perante as informações que me foram prestadas nada tinha a opor à nomeação.
O Sr. Alberto Jordão: — Mas eu tenho a opor, porque garanto a veracidade das minhas afirmações.
V. Exa. mande pedir ao Ministério do Interior um processo de sindicância aos actos do oficial e do amanuense do Govêrno Civil de Évora, e verá como é verdadeiro o que há pouco afirmei.
O Orador: — V. Exa. é talvez um pouco precipitado nos seus juízos, uma vez que a sindicância a êsse funcionário está ainda decorrendo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã à hora regimental com a seguinte ordem do trabalhos;
Antes da ordem do dia (sem prejuízo dos oradores que se inscreverem):
A de hoje.
Proposta de lei n.° 668, que altera as leis que criaram as juntas autónomas dos portos de Tavira e Vila Real de Santo António.
Ordem do dia:
A de hoje.
Parecer n.° 068, que autoriza o Govêrno a adjudicar em concurso a construção e exploração de uma zona franca em Lisboa.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 55 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante
Negócio urgente
Desejo ocupar-me, em negócio urgente, da missão oficiai a Paris e Londres do director geral da Fazenda Pública, Sr. Alberto Xavier, e das versões e boatos vindos à imprensa sôbre os fins e resultados desta missão. — Paulo Cancela de Abreu.
Rejeitado.
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Propostas de lei
Do Sr. Ministro das Colónias, fixando a constituição do conselho de administração do hospital e sanatório coloniais a que se refere a base 2.ª do decreto n.° 5:726 de 10 de Maio de 1919.
Para o «Diário do Govêrno».
Do Sr. Ministro do Comércio, confiando a engenheiros de reconhecida competência, contratados pelas jantas autónomas, a direcção das obras dos portos de Tavira e Vila Real de Santo António.
Para antes da ordem do dia.
Últimas redacções
Do projecto de lei n.° 622, que autoriza a colónia de Moçambique a contrair empréstimos até 31:500.000$ (ouro) para obras de fomento.
Dispensada a leitura da ultima redacção.
Remeta-se ao Senado.
Do projecto de lei n.° 665, que abre um crédito de 3.100:000$ a favor do Ministério da Justiça para reforço de verbas de transporte de degredados, serviços prisionais e outros.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
Do projecto de lei n.° 667, que tributa com mais $03 cada grama de tabaco pôsto à venda e importado dentro do actual regime de direitos aduaneiros.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
Requerimento
Insto pela remessa da nota da receita do Estado nas diferentes comarcas, pedida ao Ministério da Justiça em 21 de Janeiro último, pelo ofício n.° 121.— Paulo Cancela de Abreu.
Expeça-se.
O REDACTOR—João Saraiva.