O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.° 57

EM 21 DE MARÇO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Joaquim Narciso da Silva Matos

Sumário. — Aberta a sessão com a presença de 38 Srs. Deputados, lê-se a acta e dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia.- O Sr. Tavares de Carvalho ocupa-se da carestia da vida e do problema do pão.

O Sr. Ministro da Guerra. (Américo Olavo) promete transmitir as considerações ao orador ao Sr. Ministro da agricultura.

O Sr. Estêvão Águas requere que seja pôsto à discussão com dispensa do Regimento um projecto relativo às pensionistas do Montepio da Guarda Fiscal.

O Sr. João Bacelar requere que se consulte a Câmara sôbre se permite que sejam discutidos os pareceres n.ºs 624 é 625.

O Sr. Ministro da Instrução (Helder Ribeiro) presta esclarecimentos acerca do encerramento de uma escola em Felgueiras e sôbre a nomeação de um professor para o Conservatório Nacional de Música.

O Sr. Jorge Nunes tem a palavra para explicações.

O Sr. Presidente do Ministério (Álvaro de Castro} comunica à Câmara a normalização dos serviços públicos e as circunstâncias em que ela se realizou.

É aprovado o requerimento do Sr. Estêvão Águas.

O Sr. Presidente do Ministério comunica à Câmara algumas intenções do Govêrno quanto a melhoria económica dos funcionários públicos.

Sôbre o projecto relativo às pensionistas do Montepio da Guarda Fiscal usam da palavra os Srs. Morais Carvalho, Francisco Crus, Viriato da Fonseca, e António Correia.

É aprovado o projecto e dispensada a leitura da última redacção.

É aprovado o requerimento do Sr. João Bacelar.

É aprovado, sem discussão, na especialidade e na generalidade, o parecer n.º 624.

É aprovado, sem discussão, na generalidade, o parecer n.º 625.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu requere a contraprova e invoca o § 2.º do artigo 116.° do Regimento. É confirmada a aprovação.

É aprovado o parecer na especialidade e dispensada a leitura da última redacção dos dois projectos.

Ordem do dia.

É aprovada a acta.

Aprova-se uma última Redacção.

O Sr. Jaime de Sousa manda para a Mesa dois pareceres por parte da comissão de marinha.

Prossegue a discussão do parecer n.° 607.

O Sr. Sousa da Câmara pede à Mesa que o informe sôbre se o Sr. Ministro da Agricultura já se declarou habilitado par a responder a uma interpelação.

Continua no uso da palavra o Sr. Carvalho da Silva, que conclui o seu discurso.

Sôbre a ordem, usa da palavra o Sr. Lelo Portela, que manda para a Mesa uma moção, que é admitida.

O Sr. Ministro do Trabalho (Lima Duque) manda para a Mesa uma proposta, requerendo a urgência. Aprovado.

O Sr. Velhinho Correia manda para a Mesa o novo parecer da comissão de finanças sôbre o n.º 584, que modifica a lei do sêlo.

Lê-se e entra em discussão na generalidade.

Usam da palavra os Srs. Morais Carvalho e Barros Queiroz.

Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Paulo Cancela de Abreu reclama contra a apreensão do jornal «A Vanguarda».

Responde-lhe o Sr. Ministro da Justiça (José Domingues dos Santos).

O Sr. Carvalho da Silva pede esclarecimentos sôbre uma anunciada viagem do Chefe do Estado aos Açores.

O Sr. Presidente do Ministério responde que não 1êm fundamento os boatos a tal respeito.

O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem.

Abertura da sessão, às 15 horas e 48 minutos.

Presentes à chamada, 38 Srs. Deputados.

Página 2

2 Diário da Câmara dos Deputados

Entraram durante a sessão 46 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Alberto Ferreira Vidal.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Álvaro Xavier de Castro.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Pais da Silva Marques.

António Vicente Ferreira.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.

Ernesto Carneiro Franco.

Francisco Cruz.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Germano José de Amorim.

Jaime Júlio de Sousa.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João Estêvão Águas.

João Salema.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Carvalho dos Santos.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José Pedro Ferreira.

Luís António da Silva Travares de Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Manuel Alegre.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel de Sousa da Câmara.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mario Moniz Pamplona Ramos.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Tomé José de Barros Queiroz.

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio Saque.

Viriato Gomes da Fonseca.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Alberto Lelo Portela.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Américo da Silva Castro.

Amaro Garcia Loureiro.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Correia.

António Lino Neto.

António Maria da Silva.

António de Sousa Maia.

Artur Brandão.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Custódio Martins de Paiva.

Delfim Costa.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco Dinis de Carvalho.

João José da Conceição Camoesas.

João de Ornelas da Silva.

João Pereira Bastos.

João Pina de Morais Júnior.

Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.

Joaquim Brandão.

Joaquim Dinis da Fonseca.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José António de Magalhães.

José Domingues dos Santos.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

Júlio Henrique de Abreu.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel de Sousa Coutinho.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mário de Magalhães Infante.

Nuno Simões.

Paulo Cancela de Abreu.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Vasco Borges.

Vitorino Henriques Godinho.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Abílio Marques Mourão.

Afonso Augusto da Costa.

Página 3

Sessão de 21 de Março de 1924 3

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto Xavier.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

António Abranches Ferrão.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Albino Marques de Azevedo.

António Dias.

António Ginestal Machado.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António de Mendonça.

António de Paiva Gomes.

António Pinto de Meireles Barriga.

António Resende.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Augusto Pereira Nobre.

Augusto Pires do Vale.

Carlos Cândido Pereira.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Constâncio de Oliveira.

Custódio Maldonado de Freitas.

David Augusto Rodrigues.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Domingos Leite Pereira.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Francisco Manuel Bromem Cristo.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Hermano José de Medeiros.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

Jaime Duarte Silva.

Jaime Pires Cansado.

João Baptista da Silva.

João José Luís Damas.

João Luís Ricardo.

João de Sousa Uva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge de Barros Capinha.

José Cortês dos Santos.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Marques Loureiro.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José de Oliveira Salvador.

Júlio Gonçalves.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel Duarte.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Mariano Martins.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Maximino de Matos.

Paulo da Costa Menano.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Sebastião de Herédia.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomás de Sousa Rosa.

Valentim Guerra.

Vergílio da Conceição Costa.

O Sr. Presidente (às 15 horas e 50 minutos): — Estão presentes 48 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Leu-se a acta e o seguinte

Expediente

Telegramas

Dos 200 primeiros sargentos ajudantes em preparação para oficialato, em Mafra, de todas as unidades do exército, pedindo para se interceder junto do Ministro da Guerra no sentido de as suas promoções serem feitas, contando antiguidades desde as datas em que se teriam efectuado se os artigos 10.° e 11.° da lei de 1915 não tivessem sido revogados.

Para a Secretaria.

Ofícios

Da Câmara Municipal de Silves, pedindo para ser convertida em lei a proposta apresentada à Câmara em 20 de Janeiro último pelo ex-Ministro do Comércio e Comunicações, Sr. António Fonseca, para ser modificada a lei n.° 1:218, de 28 de Novembro de 1921, e decreto n.° 9:131, de 20 de Setembro de 1923, respeitantes a estradas e turismo,

Para a Secretaria.

Página 4

4 Diário da Câmara dos Deputados

Da Câmara Municipal de Borba, solicitando que seja convertida em lei a proposta apresentada à Câmara em 25 de Janeiro último pelo ex-Ministro do Comércio o Comunicações Sr. António Fonseca e Ministro dás Finanças para ser modificada a lei n.° 1:238 é decreto n.° 9:131, respeitantes a estradas è turismo.

Para a Secretaria.

Do Ministério da Guerra, comunicando estar à disposição do Sr. Francisco Dinis de Carvalho, para consulta, o processo referente à reforma do major médico Francisco Cortês Pinto, a que se refere o ofício n.° 224, de 13 do corrente.

Para a Secretaria.

Carta

Da viúva do antigo Deputado Sr. Gàudêncio Pires de Campos, agradecendo a toda a Câmara o voto de sentimento pela morte de seu marido.

Para a Secretaria.

Requerimento

Do primeiro cabo n.° 129 da 1.ª companhia, João António Gonçalves, requerendo para se lhe tornar extensiva a lei n.° 1:170, visto que em serviço da Pátria se inutilizou, ficando cego e sem um braço.

Para a comissão, de guerra.

Antes da ordem do dia

O Sr. Tavares de Carvalho: — Como não se encontra presente o Sr. Ministro da Agricultura, peço ao Sr. Ministro da Guerra o favor de lhe transmitir as considerações que vou fazer.

Torna-se absolutamente necessário que o Sr. Ministro da Agricultura dê as ordens precisas para que o preço do pão não seja mais elevado em Setúbal, como conseqüência da Direcção do Sul e Sueste estar cobrando pelo transporte das farinhas e trigos uma determinada taxa.

Sei, pelo Sr. Ministro da Agricultura, que essa taxa deve ser reduzida a metade; informa-me, porém, o Sr. director dó Sul e Sueste, de que, embora o Sr. Ministro me tivesse dito que ia tratar do assunto, a ordem para só cobrar a taxa reduzida ainda não foi recebida ha Direcção do Sul e Sueste.

Peço, pois, ao Sr. Ministro da Guerra o favor de chamar a atenção do Sr. Ministro da Agricultura para o caso; esperando que S. Exa. dê as ordens necessárias e imediatas no sentido de que a Direcção do Sul é Sueste não continue a cobrar a taxa anterior, porque isso pode dar lugar a que o preço do pão se eleve mais.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que transmitirei ao Sr. Ministro da Agricultura as considerações que acaba do fazer o Sr. Tavares de Carvalho.

O Sr. Novais de Medeiros: — Não estando presente o Sr. Ministro da Justiça, poço a V. Exa. o obséquio do mo reservar a palavra para quando S. Exa. a comparecer na Câmara.

O Sr. Estêvão Águas: — Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa um projecto de lei que tem por fim atender à situação desgraçada em que se encontram as pensionistas da guarda fiscal, isto é para que lhes sejam concedidas as vantagens já dadas às pensionistas do Estado, e que constam das disposições do artigo 30.° da lei n.° 1:452.

Êste projecto, Sr. Presidente, tem apenas um artigo estando o Sr. Ministro das Finanças de acordo com êle, razão por que peço a V. Exa. o obséquio de consultar a Câmara sôbre se permite que êle seja desde já discutido com urgência e dispensa do Regimento.

Tenho dito.

O orador não reviu:

O Sr. João Bacelar: — Sr. Presidente: peco a V. Exa. o obséquio de consultar a Câmara sôbre se permite que entrem desde já em discussão os pareceres n.ºs 624 e 625, os quais têm apenas um artigo, estando, além disso, do há muito na lista dos trabalhos desta Câmara.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. João Salema: — Não se encontrando presente o Sr. Ministro do Interior, peço a V. Exa. o obséquio de me-

Página 5

Sessão de 21 de Março de 1924 5

reservar a palavra para quando S. Exa. •esteja presente.

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Helder Ribeiro): — Sr. Presidente: pedi a palavra para dar à Câmara umas informações sôbre dois assuntos aqui versados e relativos ao meu Ministério.

Um dos assuntos foi tratado pelo ilustre Deputado Sr. Morais Carvalho, que chamou a minha atenção para o facto de terem sido encerradas em Felgueiras duas escolas pelo inspector escolar.

S. Exa. mostrou a sua estranheza por esse facto, mas cumpre-me dizer que êsse encerramento se fez legalmente e em face das leis, e uma das razões que o determinaram foi o ministrar-se nessa escola, a par da instrução a crianças de tenra idade, noções do política que ofendiam as leis e a República.

O facto tardou tanto a ter repercussão nesta Câmara sem, dúvida por não haver sérios motivos para reclamações.

O Sr. Morais Carvalho: — Não foi por isso, mas sim por não me chegar a palavra.

O Orador: — Outro ponto sôbre que desejo esclarecer a Câmara e o Sr. Jorge Nunes é o do provimento, da cadeira de italiano do Conservatório dê Música. De facto, o processo está mal frito, mas, quanto a mim, podem ser aplicadas as disposições do regulamento do Conservatório para músicos e musicógrafos.

As reclamações contra a admissão ao concurso dum súbdito italiano que não está naturalizado foram presentes por alguns professores do Conservatório ao meu antecessor, mas particularmente.

O Sr. Jorge Nunes levantou as suas dúvidas, e eu direi a S. Exa. que de facto o processo não está bem. Poder-se-iam dispensar, contudo, certas formalidades em benefício do ensino da cadeira de italiano, mas eu vou remeter à Procuradoria Geral da República, a fim de ela dar o seu parecer e habilitar o Ministro a resolver.

O orador não reviu.

O Sr. Jorge Nunes: — Quando ontem pedi ao Sr. Ministro do Comércio a gentileza de transmitir ao Sr. Ministro da

Instrução as minhas considerações, logo esperei uma resposta do respectivo Ministro.

Vejo que o Sr. Ministro da Instrução concordou com as minhas palavras, dando assim mais uma prova da inteireza do seu carácter e são critério.

Entendeu, e muito bem, que se não compreendia que num Instituto como o Conservatório se admitissem a concurso, para o lugar de professores, indivíduos a quem se não exigisse qualquer habilitação literária, porque a verdade é que apenas se exigia a apresentação do atestado de bom comportamento moral e civil e o de não ter doença contagiosa.

Quando ontem reclamei contra o facto já tinha a certeza antecipada de que, sendo dado conhecimento da minha reclamação a S. Exa., o seu procedimento não seria outro, concorrendo assim para o prestígio da República e do País, pelo que felicito S. Exa.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Pedi a palavra para comunicar à Câmara a normalização dos serviços públicos, e para tornar conhecidas dos Srs. Deputados as circunstâncias em que êsses serviços se normalizaram.

Antes de haver conhecimento das determinações do Govêrno, quer por medidas publicadas no Diário do Govêrno, quer por deliberações do Conselho de Ministros, no dia, seguinte já se esboçava o declínio do movimento que se pretendeu levar a cabo.

Seguidamente às deliberações aqui tomadas; manifestou-se da parte da maioria dos funcionários, digamos assim, o propósito de se manterem nas suas repartições e entrarem na normalidade dos serviços cumprindo os seus devores.

Essa atitude dos funcionários, defendida por alguns dos melhores que ao serviço do Estado se encontram, concorreu para a normalização rápida dos serviços.

A acção disciplinar do Govêrno, desde que tinha de se exercer de harmonia com a lei, no dia da existência da greve, deixou de poder aplicar-se, visto ter deixado de existir o estado da greve, para existirem apenas faltas isoladas de funcionários a quem terá de aplicar-se a lê-

Página 6

6 Diário da Câmara dos Deputados

gislação em vigor que se traduz na nota da falta, e perda de vencimentos, como é normal em todos os serviços, quando essas faltas não são justificadas.

Aproveito a ocasião -para fazer uma declaração, que aliás já foi feita em nota oficiosa publicada em todos os jornais.

Contrariamente à afirmação produzida, e creio que vinda a lume em notícias dos jornais, de que a entrada de alguns funcionários ao serviço dê determinadas repartições era feita por virtude de compromissos tomados pelo Governo com o comitê dos funcionários, tenho a declarar, como o fiz já em Conselho de Ministros, que é inteiramente destituído de verdade o Govêrno haver tomado quaisquer compromissos, como também nada prometeu aos funcionários que não quiseram entrar no serviço normal das repartições.

A atitude de hoje é a que tive ocasião de expor à Câmara; e é essa que o Govêrno mantém perante as leis.

Não tem de retirar nenhuma palavra pronunciada, nem de modificar qualquer atitude assumida.

A entrada dos funcionários ao serviço e a normalização dos serviços são ainda conseqüência da compreensão que os funcionários todos tiveram de que á hora não era para criar embaraços ao Estado, mas para o rigoroso cumprimento dos deveres.

Não tenho senão de aplaudir a acção dêsses funcionário que, desde a primeira hora, ponderaram a necessidade de não perturbarem os serviços públicos, e ainda o proceder daqueles que; num momento de arrependimento, sentiram que o seu acto não estava em harmonia com aquilo que o Estado lhes exigia, que êles mesmo se obrigaram ao entrarem para o serviço do Estado.

Não tenho, repito, senão de aplaudir os funcionários pela compreensão que tiveram dos seus deveres para com o País e para com a República.

A atitude do Govêrno é a mesma: reconhece essa base de justiça nas reclamações dos funcionários, e crê que o Parlamento aprovará as medidas que se tornem necessárias para que se possa ocorrer à situação dos funcionários.

O orador não reviu.

É aprovado o requerimento do Sr. Estêvão Águas para que entre imediata-

mente em discussão o projecto de lei n.° 676, que inclui nas disposições da lei n.° 1:452, de Junho de 1923, as pensionistas do Montepio dz Guarda fiscal.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: não me ocorreram há pouco algumas considerações que desejava fazer sôbre a maneira de acudir à situação do funcionalismo.

O Govêrno tinha estudado uma fórmula que consistiria em tratar primeiro da situação dos funcionários com numerosa família, o que acarretaria de começo uma despesa mínima, indo sucessivamente alterando esta situação de maneira a poder acudir a todos os funcionários em circunstâncias difíceis isto, é claro, depois de a Câmara ter votado as medidas financeiras que permitissem realizar tal objectivo mas creio que alguma cousa se poderia fazer, de outra maneira, proporcionando aos funcionários a facilidade de obter dos estabelecimentos do Estado, ou dele dependentes, certos géneros de primeira necessidade, de modo a aliviar os seus orçamentos caseiros.

Esta fórmula foi estudada pelos directores gerais de alguns Ministérios.

De qualquer maneira porém a intervenção do Parlamento é necessária e urgente e o Governo, logo que tenha um estudo concreto feito e possibilidades de realização, pedirá ao Parlamento que, por sua vez, estude o assunto conjuntamente com os Ministros que tiverem de intervir na sua discussão.

Tenho dito.

O orador não reviu.

É lido na Mesa e Aposto em discussão na generalidade o projecto dê lei sôbre as pensionistas do Montepio da Guarda Fiscal.

É o seguinte:

Senhores Deputados. — Ao promulgar-se a lei n.° 1452, de 20 de Julho de 1923, deixou de ser atendida, por lapso, uma classe de pensionistas que, por não ter até então pesado sôbre as despesas do Estado recebendo ajudas de custo de vida ou subvenções diferenciais, não ficaram ao abrigo do disposto no artigo 30.° daquela lei.

Página 7

Sessão de 21 de Março de 1924 7

Refiro-me às pensionistas do Montepio da Guarda Fiscal, instituição oficial criada por decreto n.° 3:114, de 5 de Maio de 1917.

Srs. Deputados: julgo desnecessário encarecer os serviços prestados ao Estado pelo pessoal da guarda fiscal.

Sabeis bem que é êle o agente da recolha dos milhares de contos que o Estado recebe pelos rendimentos das alfândegas, rendimentos do pescado, rendimentos de exportação e importação, é êle que, no seu exíguo número para tam grande extensão de fronteiras, impede, no mais que pode, o rendoso mester dos contrabandistas no êxodo dos produtos mais essenciais à vida económica da Nação.

E porque assim é e trabalha numa missão tam árdua e odiosa, é êle ainda que arrisca, pelos interêsses do Estado, a toda a hora e a cada momento, a sua vida e os interêsses da sua família.

Ao falecerem, deixam, os que são sócios do Montepio da Guarda Fiscal, uma exígua importância como pensão à sua família, exígua porque deminuta e exígua é também a contribuição com que mensalmente concorrem, visto o seu irrisório vencimento não permitir maior contribuição.

Parece-me portanto, por todo o exposto, que é da maior justiça, da maior equidade, o Estado auxiliar os pensionistas do Montepio da Guarda Fiscal, tal como o faz a todas as pensionistas actualmente existentes.

É confiado nesse espírito de justiça e de equidade, que tenho a honra do submeter à aprovação da Câmara o seguinte projecto de lei:

Artigo único. As pensionistas do Montepio da Guarda Fiscal são incluídas nas disposições do artigo 30.° da lei n.° 1:452, de 20 de Julho de 1923.

Sala das sessões, 20 de Março de 1924.— João Estêvão Águas.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: o Sr. Estêvão Águas, pela proposta que mandou para a. Mesa e cuja leitura acaba de ser feita pelo Sr. secretário, pretende equiparar as pensionistas da guarda fiscal às demais pensionistas do Estado e, assim, fazer com que elas sejam abrangidas pelas disposições do artigo 30.° da lei de subvenções votada o ano passado.

Parece-me absolutamente justo tal propósito mas para que se não trate apenas» de uma promessa, será bom chamar ai atenção do Govêrno e é isso o que eu, estou fazendo neste momento para a necessidade de que com as pensionistas-não suceda o que está sucedendo, que é terem direitos mas não terem pensões~

Um àparte que se não ouviu.

O Orador: — A verdade é que o salutar princípio do artigo 30.°, que o Sr. Estêvão Águas deseja tornar extensivo às pensionistas da guarda fiscal, não está sendo aplicado, de modo que as desgraçadas, que não têm por costume lançar bombas ou fazer greves revolucionárias, se encontram numa situação de verdadeira, miséria, para o que chamo não só a atenção do Govêrno, mas a de toda a Câmara.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Francisco Cruz: - Sr. Presidente: apenas duas palavras.

Em nome do Partido Nacionalista, devo declarar que damos o nosso voto ao projecto em discussão, sentindo apenas que o Govêrno não tivesse encarado a situação em que se encontram estes prestantes servidores do Estado, que são os soldado, da guarda fiscal, visto que se não pode-exigir honradez e trabalho a quem passa uma vida de miséria, e a guarda fiscal a quem cumpre defender os interesses do Estado, está miseravelmente remunerada.

Chamo, pois, a atenção do Govêrno que remedeie esta situação.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Viriato da Fonseca: — Sr. Presidente: a proposto de pensionistas, ouvi dizer qualquer cousa que não me parece representar a verdade.

Na lei n.° 1:452 ficou exarado que todas as pensionistas que vivessem no regime de ajuda de custo de vida, com subvenções de qualquer espécie, passassem a ser integradas no regime de percentagem e coeficientes.

Página 8

8 Diário da Câmara dos Deputados

Para isso se fez uma tabela que se refere a todas as pensionistas.

É possível que em algumas repartições, por quaisquer motivos de expediente, êste assunto não tenha andado, com a rapidez que seria pára desejar; todavia tem sido dado o dinheiro necessário e estão tomadas todas as providências para que todas as pensionistas recebam aquilo a que têm direito.

Um àparte do Sr. Morais Carvalho, que não se ouviu.

O Orador: — Quanto a êsse caso, trata-se de um serviço autónomo, e por tal motivo desconheço o que se passa.

O que porém é certo é que ainda não há duas horas que fui procurado pela comissão de pensionistas que comigo se avistou dezenas e dezenas de vezes e que me veio agora agradecer o serviço que eu tinha prestado, pois já estavam recebendo as pensões a que tinham direito.

Tinha, pois, de restabelecer a verdade a tal respeito.

Quanto propriamente ao projecto em discussão, acho-o de toda a justiça, visto que a todas os pensionistas se quis tornar extensivo o mesmo direito.

Dou-lhe o meu voto e suponho que a facção a que pertenço o mesmo fará também.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: dou em absoluto o meu voto ao projecto em discussão, mas, visto que se trata de soldados da guarda fiscal, permita-me V. Exa. que eu renove o apoio que tenho feito ao Sr. Ministro das Finanças, para que acuda à situação em que êsses soldados se encontram, situação de verdadeira miséria o que os obriga a sair do serviço logo que lhes é possível.

Êste facto não pode ser indiferente para a Câmara e para o Sr. Ministro das Finanças, pois se me afigura que representa um dos factores mais importantes para a carestia da vida, sobretudo nas terras raianas de Espanha.

Estou certo portanto de que o Sr. Estêvão Águas, autor do projecto em discussão, e que é também o comandante da guarda fiscal, conjuntamente com o Sr. Ministro das Finanças, empregará os seus

esfôrços para que tal situação de miséria tenha o seu termo o mais ràpidamente possível.

Tenho dito.

O orador não reviu.

É aprovado o projecto na generalidade e na especialidade.

O Sr. Estêvão Águas: — Requeiro a leitura da dispensa da última redacção.

É aprovado.

O Sr. Presidente: — O Sr. João Bacelar requere que entrem imediatamente em discussão os pareceres n.ºs 624 e 625.

Os Srs. Deputados que aprovam queiram levantar-se.

Está aprovado.

Lê-se, sendo aprovado, sem discussão, o parecer n.° 624.

É o seguinte:

Parecer n.° 624

Senhores Deputados. — A vossa comissão de guerra foi presente a proposta de lei da iniciativa do ex-Ministro da Guerra, António Maria da Silva, e subscrita-também pelo ex-Ministro das Finanças, João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes, e apresentada na sessão transacta com data de 29 de Outubro de 1923, que foi inscrita com o n.° 616-D.

Tal proposta de lei tem por fim abrir um crédito especial na importância de 413.000$ a favor do Ministério da Guerra para despesas com o recrutamento militar, revistas de inspecção, transportes, melhoria e reforma de oficiais nos termos da lei n.° 1:332 e aquisição de um terreno em Coimbra para a conveniente instalação do pôsto de telegrafia sem fios naquela cidade.

A vossa comissão de guerra nada tem que objectar, concordando plenamente com a proposta de lei apresentada, por ter a justificá-la a exigüidade de verbas do orçamento do Ministério da Guerra.

Sala das Sessões, 10 de Janeiro de 1924. — João Pereira Bastos — Vitorino Godinho — José Cortês dos Santos — Lelo Portela (com declarações) — Albino Pinto dá Fonseca — Tomás de Sousa Rosa, relator.

Senhores Deputados.— À vossa comissão do recrutamento, foi presente a pró-

Página 9

Sessão de 21 de Março de 1924 9

posta de lei n.° 616-D, já relatada e apreciada pela comissão de guerra desta Câmara.

Nada tem esta comissão que dizer em contrário do que consta do parecer junto da comissão de guerra e assim entende que tal proposta de lei merece a vossa aprovação.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 11 de Fevereiro de 1924. — Luís António da Silva Tavares de Carvalho — José de Oliveira Salvador — F. Dinis de Carvalho (com declarações) — Lelo Portela (com declarações) — Garcia Loureiro (com declarações)— Tomás de Sousa Rosa, relator.

Senhores Deputados.— A proposta de lei n.° 616-D, da autoria dos Srs. Ministros da Guerra e das Finanças, verdadeiramente justificada, destina-se a abrir um crédito especial da quantia de 413.000$, a favor do Ministério da Guerra, para ser inscrito no actual Orçamento de 1923-1924, aos artigos 20.° e 55.° dos capítulos 1.° e 6.° da despesa ordinária e num capítulo novo (capítulo 16.°) da despesa extraordinária do referido orçamento e não no capítulo 27.°, como indica o mapa anexo.

A vossa comissão de finanças dá o seu parecer favorável à aprovação da proposta ministerial.

Sala das sessões da comissão de finanças, 13 de Fevereiro de 1924. — T. J. de Burros Queiroz — Jorge Nunes (com declarações) — Crispiniano da Fonseca — Alfredo de Sousa — Júlio de Abreu. -M. Ferreira de Mira (com declarações) — Constâncio de Oliveira (com declarações) — Paiva Gomes — Lourenço Correia Gomes, relator.

Proposta de lei n.° 616-D

Senhores Deputados.— Achando-se já completamente esgotada a verba de 240.000$, para despesas com o recrutamento e revistas de inspecção, consignada

no actual orçamento do Ministério da Guerra;

Tendo sido insuficiente a verba para «Despesas de transportes», autorizada no orçamento do mesmo Ministério, para o ano económico próximo findo, o estando em dívida a várias companhias e emprêsas contas referidas a êsse ano económico;

Não comportando a verba de 100 contos, descrita no orçamento ào^ referido Ministério, actualmente em vigor, no artigo 55.°, a importância necessária para o completo 'pagamento de melhoria de reforma a oficiais, nos termos da lei n.° 1:332, relativa ao ano de 1920-1921;

Sendo indispensável a aquisição de 4:088m2,2õ de terreno na Quinta de Montes Claros, em Coimbra, para a conveniente instalação do pCsto de telegrafia sem fios, naquela localidade:

Tenho a honra de submeter à vossa aprovação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É aberto pela presente lei um crédito especial no Ministério das Finanças, a favor do Ministério da Guerra, da quantia de 413.000$, destinado a despesas com o recrutamento militar e revistas de inspecção, transportes de pessoal e material, melhoria e reforma a oficiais nos termos da lei n.° 1:332 e aquisição de 4:088m2,25 de terreno na Quinta de Montes Claros, em Coimbra, para conveniente instalação do pôsto de telegrafia, sem fios, naquela cidade.

Art. 2.° A importância do crédito indicada no artigo anterior será inscrita no actual orçamento do Ministério da Guerra na despesa ordinária é extraordinária, conforme o mapa que vai junto e que faz parte integrante da presente proposta de lei, onde se descrevem os capítulos, artigos, rubricas e importâncias respectivas.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrária.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 29 de Outubro de 1923.— António Maria da Silva — João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Página 10

10 Diário da Câmara dos Deputados

[Ver valores da tabela na imagem]

Mapa a que se refere a adjunta proposta de lei e que dela faz parte integrante

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 29 de Outubro de 1923. — António Maria da Silva.

Lê-se e entra em discussão o parecer n.° 620.

É aprovado na generalidade.

É o seguinte:

Parecer n.° 625

Senhores Deputados.— A vossa comissão de saúde e assistência pública verifica pela leitura do relatório do projecto de lei, correspondente a êste parecer, que é muito precária a situação dos serviços de protecção e assistência a expostos e crianças abandonadas no distrito de Coimbra.

Pela última reforma do regime tributário da República, foi extinto o real de água, donde advinha o maior rendimento para a manutenção daqueles serviços e, por isso, acha esta comissão muito justo que se lhes dê uma compensação por intermédio dum adicional sôbre o imposto de transacções, que bem pode considerar-se o sucedâneo do real de água.

Mas esta comissão fundamenta também o descalabro dos serviços hospiciais de Coimbra na sua integração, pelo decreto de 22 de Fevereiro de 1911, na Maternidade da Faculdade de Medicina, estabelecimento êste que é chamado à prática de funções pedagógicas, pelas suas clínicas ginecológica e de partos, e em que o serviço hospicial só poderá produzir confusão o até involuntário abandono na sua parte administrativa.

Por isso, em quanto não fôr presente a esta Câmara uma medida que procure re-

modelar os serviços de assistência, fazendo interessar nele todas as entidades que devem e podem ser chamadas a fazê-lo, é esta vossa comissão de parecer que deve ser votado o projecto de lei em» questão. — Alberto Cruz João Camoesas — F. Dinis Carvalho (com declarações) — José de Magalhães (com restrições).

Senhores Deputados.— A Maternidade de Coimbra, criada por decreto com fôrç& de lei do 22 de Fevereiro de 1911, possuía receitas se não suficientes, pelo menos regulares para se poder manter.

Por virtude da desvalorização da moeda a sua situação económica e financeira passou a ser desastrosa e prejudicial para aqueles que a ela têm necessidade de recorrer para satisfação das suas necessidades.

Procurando obviar a êsse gravíssimo mal e obter receitas para manter a vida útil da Maternidade do Coimbra foi a esta Câmara presente o projecto de lei n.° 465-F da autoria do Sr. João Bacelar.

Sôbre êsse projecto deu o seu parecer favorável à vossa comissão de saúde e assistência pública.

Visa o projecto a cobrar no distrito de Coimbra sôbre o imposto de transacção o adicional de 4 por cento para ser entregue à comissão administrativa da mesma. Maternidade.

Página 11

Sessão de 21 de Março de 1924 11

A vossa comissão de finanças, que apreciou o projecto, dá-lhe o seu parecer favorável.

Sala das sessões da comissão de finanças, 12 de Fevereiro de 1924.— T. J. Barros Queiroz (com declarações)— Jorge Nunes (com declarações) — Crispiniano da Fonseca — Alfredo de Sousa — Constando de Oliveira (com declarações) — Paiva Gomes — Júlio de Abreu (com declarações) — Ferreira de Mira (com declarações) — Lourenço Correia Gomes relator.

Projecto de lei n.° 465-F

Senhores Deputados.— Por decreto com força de lei de 22 de Fevereiro de 1911 foi extinto o antigo hospício dos expostos -e das crianças abandonadas do distrito -de Coimbra, e simultaneamente criada uma Maternidade anexa à Faculdade de Medicina da Universidade da mesma cidade, para a qual passaram o edifício, cêrca e mobiliário do extinto hospício, as suas receitas e encargos, ficando à Faculdade de Medicina a administração dessas receitas, sob condição de lhes dar a aplicação exclusiva que lhes destinavam as leis anteriores, a vontade dos testadores e as disposições do citado decreto.

Ficou, portanto, a cargo da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, para exercer por intermédio da comissão administrativa da sua Maternidade, a obra de assistência que até então pertencia ao antigo hospício.

A esta assistência procurava ocorrer-se com os seguintes recursos:

Uma parte do imposto do real de água do distrito, fixado há 62 anos em «2 réis em canada de vinho e em arrátel de carne».

Os juros do capital de 10.342$85 administrado pela Santa Casa da Misericórdia de Coimbra, ou sejam 501$80 em cada ano.

Os juros de títulos de dívida pública fundada no valor nominal de 18.950$, ou sejam 397$94 em cada ano.

Renda de partes dispensadas ao edifício, que orça por 432$20 em cada ano.

Esta receita, que não atingia em cada ano a importância de 10.000$, era já antes da Grande Guerra insuficiente para o custeio da secção hospicial da Maternidade.

Sucedeu que com a carestia de vida

provocada pela guerra, e desvalorização da moeda, se tornou tam deficiente esta receita, que não só foi mester recusar assistência a muitas crianças que dela careciam, mas até, para ocorrer às necessidades mais urgentes das internadas, deixaram de se pagar os vencimentos ao pessoal, e contraíram-se dívidas, havendo mesmo a registar o facto, aliás louvável, de um funcionário da Maternidade ter prestado todos os seus recursos e criado encargos pecuniários inultrapassáveis, para acudir às necessidades dêste estabelecimento.

O déficit era gravoso em extremo; a comissão administrativa da Maternidade solicitou instantemente providências; e quando estava para ser apresentado a V. Exas. um projecto de lei actualizando a receita oriunda do imposto do real de água, sobreveio a lei n.° 1:368, de 21 de Setembro de 1922, que no seu artigo 69.° extinguiu aquele imposto, sem que providência alguma fôsse tomada para substituir, no distrito de Coimbra, a principal, embora exígua, fonte da receita da assistência aos expostos e abandonados.

A esta necessidade, que não é mester encarecer, pretende obviar o presente projecto de lei:

Artigo 1.° No distrito de Coimbra será lançado sôbre o imposto de transacções, e cobrado juntamente com êste, o adicional de 4 por cento, que será entregue à Comissão Administrativa da Maternidade para aplicar exclusivamente ao pagamento dos encargos e custeio das despesas da sua secção hospicial.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 22 de Março de 1923. — João Bacelar.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°

Procede-se à contagem.

O Sr. Presidente: — Estão sentados 54 Srs. Deputados e de pé 1.

Está, portanto, aprovado.

É aprovado na especialidade, sem discussão, o parecer n.° 625.

Página 12

12 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. João Bacelar: — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.

É aprovado.

O Sr. Presidente: — Vai passar-se à

ORDEM DO DIA

O Sr. Jaime de Sousa: - Em nome da comissão de marinha, mando para a Mesa dois pareceres: um relativo ao monumento aos mortos da guerra e o outro regularizando as taxas de pilotagem.

O Sr. Sousa da Câmara (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejava que V. Exa. me dissesse se na Mesa já existe alguma comunicação do Sr. Ministro da Agricultura declarando-se habilitado 'a responder à minha nota de interpelação.

O Sr. Presidente: — Na Mesa não há qualquer comunicação nesse sentido.

O Sr. Sousa da Câmara: — Nesse caso, peço ao Sr. Ministro da Guerra a fineza de lembrar ao seu colega da pasta da Agricultura para comunicar à Mesa que já se acha habilitado a responder à minha interpelação, uma vez que S. Exa. pessoalmente me informou de que se encontrava habilitado a fazê-lo.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: V. Exa. diz-me, por favor, se o Sr. Ministro das Finanças se encontra presente?

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro das Finanças não; está presente, mas o Sr. Ministro da Guerra declara-se habilitado a entrar na discussão.

O Orador: — Então começo por preguntar ao Sr. Ministro da Guerra se durante a discussão desta proposta tenciona apresentar algumas bases ou artigos novos...

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — À pregunta graciosa e interessante de VV Exa. devo responder que o que está em discussão são as bases 3.ª e 5.ª e que não tenciono apresentar quaisquer bases ou artigos novos.

O Orador: — Como se vê, o Sr. Ministro da Guerra não pode ou não sabe responder-me, mas, como já se encontra presente o Sr. Ministro das Finanças, espero que S. Exa. me elucide.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Não tenciono apresentar nem bases, nem artigos novos.

O Orador: — Todo êste projecto em discussão não representa mais do que uma série de autorizações absolutamente inconstitucionais. Êle é mais um rasgão na Constituição, dado pelos defensores da pureza augusta da Constituição.

Quanto às bases do projecto, uma, a que se refere ao funcionalismo, é inconstitucional e a outra, a base 5.ª, representa um grande prejuízo para a economia da Nação.

Todos conhecem a crise que neste momento atravessa a viticultura nacional.

Lançar-lhe mais um imposto é agravar essa crise, cujas conseqüências podem até atingir profundamente a própria economia do País.

É vulgar ouvir dizer que o vinho não é artigo de primeira necessidade é que, portanto, deve ser tributado mais fortemente.

Quem tal afirma esquece-se que o vinho é artigo que tem uma grande importância na vida económica do País.

Apoiados.

Devemos lembrar-nos de que foi exactamente por virtude da situação em que se encontraram os vinhateiros até determinada altura quê se evitou ao País uma crise ainda mais grave do que aquela que sofreu, e que são os trabalhos das vinhas os únicos em que encontram colocação os trabalhadores rurais nas épocas em que não há outros trabalhos dos campos.

É, pois, uma errada orientação, que se pretende seguir, a de sobrecarregar de impostos os vinhos.

Quanto a vinhos generosos, fazendo os cálculos sôbre o que se diz no parecer, encontramos o seguinte:

Leu.

É também necessário reparar que a vi-

Página 13

Sessão de 21 de Marco de 1924 13

ticultura está actualmente em más condições por causa de não haver exportação.

Ainda há pouco a Câmara ouviu da boca do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros a enumeração das dificuldades que existem para colocar os nossos vinhos em Concorrência com os espanhóis nos mercados da França.

É por isso indispensável que esta base não seja aprovada.

Torna-se preciso acudir à viticultura nacional por maneira a evitar a eclosão da pavorosa crise de que ela está ameaçada e não me parece que a melhor forma de afastá-la seja o lançamento de mais impostos.

O imposto, excedendo um determinado limite, converte-se num factor restritivo do consumo.

Ouvi citar que a iniciativa desta base é do Sr. Barros Queiroz. Estou certo de que S. Exa. emitirá a sua opinião e, porque todos a desejamos ouvir, vou dar, por agora, como findas as minhas considerações.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Lelo Portela: — Obedecendo às praxes regimentais, envio para á Mesa a minha Moção concebida nos seguintes termos:

A Câmara dos Deputados, reconhecendo que o Estado não deve tomar medidas que prejudiquem a exportação dos produtos nacionais, ou prejudiquem a sua concorrência, em mercados estrangeiros com produtos congéneres;

Reconhecendo mais que a indústria nacional deve ser favorecida, devendo procurar desenvolver-se e dar-se o máximo incremento sobretudo à indústria de transformação de matérias primas nacionais, evitando assim que estas sejam exportadas directamente para o estrangeiro dó onde serão mais tarde importadas em forma de produtos;

Reconhecendo que um dos principais produtos, de exportação é o vinho (generoso e com um), e que uma das indústrias que mais interessam À economia nacional é a da transformação das sementes oleaginosas e matérias similares em óleos industriais; - Entende que tanto os vinhos de expor-

tação como os óleos vegetais não devem ser onerados de maneira a prejudicar a exportação daqueles e a fabricação dêstes últimos.

21 de Março de 1924.— Lelo Portela.

Sr. Presidente: o parecer em discussão versa assuntos políticos, administrativos e tributários.

Aos primeiros diz respeito a base 3.ª que contém matéria, a meu ver, inconstitucional.

Pretende-se, por essa base, regular os direitos políticos e civis dos funcionários.

Os direitos civis e individuais dos cidadãos são iguais para todos e, garantidos pela Constituição da República. Por isso, entendo que a base em discussão contém matéria inconstitucional e não deve entrar em discussão.

E, demais, a base como está redigida pode servir nas mãos de um Govêrno que queira vingar-se ou exercer represálias de arma contra os seus inimigos políticos.

Na base 5.ª o imposto de produção representa um sistema novo a aplicar na tributação e nele está incluído o vinho de pasto, o que é injusto, porque é um dos produtos que não têm acompanhado a elevação de preços como a Câmara sabe e eu vou demonstrar.

Tomando-se em consideração o preço da mão de obra e os preços dos produtos importados para o tratamento dos vinhos antes da guerra, e comparando o preço por que se vende o vinho, encontraremos a diferença que é enorme.

Os preços dos vinhos comuns antes da guerra não aumentaram mais de oito vezes quanto aos vinhos licorosos, há diferença de preços entre os vinhos do Alto Douro e os do baixo Douro, mas nem uns nem outros acompanham a desvalorização da moeda.

Em resumo, os vinhos aumentaram 800 por cento, 900 por cento e 1:200por cento, mas os produtos importados como o enxofre e o sulfato subiram a 3:000 e 3:200 por cento.

Não vejo que o legislador tivesse em conta esta desporporção.

Daqui depreende só a falta de conhecimento das pessoas que tiveram interferência na elaboração dêste projecto.

Quando entrei na apreciação dele alguém me disse que quem pagaria o im-

Página 14

14 Diário da Câmara dos Deputados

;posto seria o consumidor, mas tal não é exacto porque o preço da venda mantém a mesma percentagem.

Eu entendo que a Câmara deve tratar com atenção e cuidado os interêsses nacionais e por isso não deve dar o seu voto à base 5.ª

Mas ainda mais: a base 5.ª contém matéria que se refere a produtos oleaginosos -pretende-se lançar um imposto de $10 por quilograma em óleos vegetais que não sejam azeites.

A Câmara desconhece o que é a indústria da fabricação de óleos em Portugal, mas certamente não desconheço que uma das nossas principais riquezas são as sementes oleaginosas. Até aqui as sementes que vinham das nossas colónias eram remetidas para o estrangeiro, onde em fábricas eram transformadas em óleos; hoje já temos em Portugal fábricas que fazem essa transformação e abastecem não só Portugal, mas até chegam a fazer exportação para o estrangeiro.

Hoje já se tem procurado prejudicar essa indústria e mais ainda prejudica-se o comércio da nossa navegação em beneficio da estrangeira.

Sr. Presidente: considero esta medida altamente ruinosa para o País, e espero ouvir da parte do Sr. relator ou do Sr. Ministro das Finanças os necessários argumentos que me demonstrem o contrário.

Em minha opinião, tudo quanto seja dificultar o desenvolvimento da nossa exportação é prejudicar os interêsses nacionais, é contribuir 'para a desvalorização da nossa moeda.

Uma das principais causas da desvalorização da nossa moeda tem sido, decerto, essa guerra de tarifas existente entre nós e a França, que não tem permitido que possamos exportar para aquele país os nossos produtos.

Posso afirmar, sem receio de errar, que deve andar à volta de 1.500:000 libras a importância dos produtos que deixamos de exportar por aquele motivo.

Sussurro na sala.

Eu não sei, Sr. Presidente, se êste assunto interessa ou não à Câmara; todavia, não continuarei as minhas considerações, sem que, pelo menos, o Sr. Ministro das Finanças ou o Sr. relator me presa devida atenção.

O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara e especialmente a do Sr. Ministro das Finanças.

O Orador: — Sr. Presidente: desejava preguntar ao Sr. .Ministro e ao Sr. relator se estão ainda na disposição de defender esta monstruosidade.

O Sr. Lúcio de Azevedo (interrompendo): — V. Exa. dá-me licença? V. Exa. está em equívoco, porque esta proposta não é do Sr. Ministro nem do proponente, mas sim da comissão, e eu já dela não faço parte.

O Orador: — Eu não sei de quem é a proposta; o que verifico é que toda a gente a enjeita. Ninguém assume a responsabilidade da sua apresentação nem do seu relato.

Nestas condições, espero que alguém apareça a assumir a responsabilidade desta verdadeira monstruosidade, pois de contrário resultam inúteis os meus esforços para demonstrar os prejuízos que semelhante proposta trará à economia nacional.

Sr. Presidente: se esta proposta fôr por diante tal como se encontra, será mais uma machadada vibrada na viticultura nacional e na nossa indústria de transformação, visto que, criando leis que estabelecem taxas verdadeiramente proibitivas, êste País não têm amanhã autoridade para negociar tratados de comércio.

Sr. Presidente: reconheço que o esfôrço feita por mim para convencer a Câmara de que esta proposta é uma monstruosidade que não deve ser aprovada não foi perdido, pois um Sr. Deputado acaba de me dizer que a proposta vai ser retirada da discussão.

Assim nada mais tenho A dizer.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi lida e admitida a moção do Sr. Lelo Portela.

O Sr. Ministro do Trabalho (Lima Duque): — Vou mandar para a Mesa uma proposta, para a qual requeiro urgência, abrindo um crédito especial de 500.000$ para reforço do orçamento das despesas do Ministério do Trabalho e do Instituto

Página 15

Sessão de 21 de Março de 1924 15

de Seguros Sociais Obrigatórios e de Previdência Social.

Foi lida a proposta e votada a urgência.

Para a comissão de previdência social.

Para o «Diário do Governo».

O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: pedi a palavra, em nome da comissão do finanças, para dizer que, tendo a Câmara resolvido que as emendas que estavam na Mesa sôbre a proposta em discussão fossem à referida comissão para dar parecer em quarenta e oito horas, essa comissão reuniu, trabalhou o formulou o parecer que vou mandar para a Mesa.

Todos estão de acordo em que êle seja discutido já, para se criar, receita, e de certo a Câmara assim resolverá.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Tendo o Sr. Pereira Bastos requerido para ser convocada a comissão de guerra a reunir na próxima segunda-feira durante a sessão, vou consultar a Câmara sôbre essa autorização.

Foi dada a respectiva autorização.

O Sr. Presidente: — A Mesa fez a seguinte nomeação:

Substituir na comissão de finanças os Srs. António Paiva Gomes, Amadeu Leite de Vasconcelos e Alfredo Pinto do Azevedo e Sousa pelos Srs. Jaime Júlio de Sousa, Vergílio Saque e Ernesto Carneiro Franco.

O Sr. Presidente: — Tendo a Câmara resolvido, na sessão do anteontem, que, passadas quarenta e oito horas, entrassem em discussão as emendas à lei do solo, com parecer ou não, e tendo êsse parecer sido apresentado pelo Sr. Velhinho Correia, vai ler-se para entrar em discussão.

Leu-se.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: já agora é sina minha, pois que já sucedeu ao discutir as propostas de finanças durante o consulado financeiro do Sr. Álvaro do Castro, iniciar as minhas considerações fazendo um protesto-não só contra a forma como são elaboradas essas propostas, como também contra a forma por que elas se discutem, e assim êste parecer, inteiramente diverso do que foi apresentado primeiramente á Câmara, e cuja leitura mal ouvi do meu lugar, entra em discussão sem haver tempo, não direi para fazer um estudo consciencioso, mas, ao menos, para se ler com atenção o que vamos discutir.

Apoiados.

Pregunto se em matéria desta importância, que contende com toda a vida pública, é possível fazer trabalho bom, tendo de discutir um parecer com onze páginas dactilografadas o que entra em discussão abruptamente.

Podia assim fazer-se se se tratasse de um ponto secundário, do uma simples modificação; mas não, trata-se do um parecer com moldes absolutamente novos, e de uma proposta que altera o que ainda há poucos dias foi legislado.

O parecer vem alterar a taxa do papel selado, que ainda não há quinze dias foi posta em vigor por uma lei do 1 de Março corrente, que foi publicada no Diário do Govêrno há pouco mais de uma semana.

Sr. Presidente: o Sr. Presidente do Ministério todos os dias muda de planos financeiros, ou de colaboradores, porque S. Exa. não tem planos, e tanto que, quando formou Govêrno, andou à procura de quem se encarregasse da pasta das Finanças, e, não encontrando, teve de resolver-se a tomar conta dela, mas pelo que tem feito mostra que não tinha-preparação alguma para a sobraçar.

Não sei se a nova proposta relativa ao sêlo terá aquela filosofia que S. Exa. declarou que tinham as suas primeiras propostas, dizendo que não as lera, e que assinara de cruz.

Não sei mesmo se terá conhecimento desta proposta.

Devo dizer que, nas condições em que a discussão se inicia, não posso fazer as considerações que faria se tivesse tido tempo para sôbre a proposta fazer um estudo mais profundo.

Tinha vindo eu hoje preparado para entrar na discussão daquela outra monstruosidade que era a proposta para a qual ontem o Sr. Presidente do Ministé-

Página 16

16 Diário da Câmara dos Deputados

rio pediu a discussão imediata. Gastei toda a manha a estudar essa proposta e mais detidamente as bases 3.ª e 5.ª, de que S. Exa. declarou fazer questão.

Eu não sei se as considerações já produzidas pelo meu colega Sr. Carvalho da Silva no seu discurso tam documentado levaram a Câmara, e porventura p Sr. Presidente do Ministério, a ver quanto era irrealizável essa proposta, que, especialmente no que respeita aos vinhos, vem colocar a agricultura numa situação desgraçada.

Mas, como dizia, vinha preparado para entrar nessa discussão, e de repente ela é interrompida, lê-se na Mesa um parecer que levou meia hora a ler, o nós temos, então, de fixar a nossa atenção, dum momento para o outro, numa proposta da maior complexidade e importância.

Nestas condições, desculpar-me hão V. Exa. e a Câmara se, na apreciação que vou lazer de alguns dos números da nova tabela do imposto do sêlo, eu não mostrar aquele estudo que gostaria de poder mostrar, mas que a escassez de tempo absolutamente me impediu de fazer.

Sr. Presidente: logo no número 1.°, que respeita à abertura de créditos, vejo qualquer cousa que me parece merecedora da crítica.

Diz-se nesse número:

Leu.

Assim, o sêlo é logo colado nas cartas em que se pede a abertura do crédito, de modo que, se eu amanhã me dirigir a um Banco a pedir uma abertura de crédito, pelo simples facto de fazer êsse pedido, que pode não ser atendido, tenho de colar um sêlo na minha, carta.

Diz-me, particularmente, o Sr. Barros Queiroz, ilustre presidente da comissão de finanças, que assim não é.

Se assim fôsse, parece-me que seria uma monstruosidade; mas, no emtanto, desculpe-me S. Exa. que lhe diga que é o que se depreende do artigo, tal como está redigido.

O Sr. Barros Queiroz: — Se V. Exa. reparou na redacção, verá que há só motivo para colar o sêlo quando o crédito fôr aberto.

O Orador: — Desculpe-me o ilustre presidente da comissão de finanças, mas não
posso concordar com as considerações de S. Exa.

Não posso deixar de aceitar a rectificação quanto ao espírito dêste artigo, mas creio que S. Exa. será o primeiro a concordar, quando da discussão na especialidade, que êste artigo carece, ao menos, doutra redacção.

A seguir há uma alteração pelo que respeita a verba «acções», e então diz-se:

Leu.

Esta taxa de 5 por cento é uma taxa mais pesada que aquela que se encontra na tabela de 1921.

Mus, se do que se trata propriamente é duma actualização de contribuições, não se compreende que sejam modificadas para mais as taxas que não são fixas e que já estão estabelecidas em função do valor sôbre que recaem.

Desde que o valor sôbre que recaem é mais alto, devido à desvalorização da moeda, já aí tem o Estado a compensação.

Mas esta taxa de 5 por mil deve ser tomada em consideração, ao mesmo tempo que a taxa que vem adiante estabelecida sob o n.° 14 para as sociedades, e OHL que se vê que as sociedades com qualquer forma jurídica pagam sôbre o capital com que se constituírem, ainda que não realizado imediatamente, 4 por mil; de modo que, e embora seja certo que as sociedades têm uma individualidade diferente da dos seus associados, não havendo dúvida, nenhuma de que é do bolso dos seus associados que saem estas taxas, parece-me que há uma duplicação de impostos.

Assim, fica o imposto sendo de 9 por mil, quási um imposto de 1 por cento sobre o capital que vai onerar as sociedades logo à nascença, quando, porventura, mais careciam do amparo do Estado para caminhar.

O Sr. Barros Queiroz: — Essa duplicação de taxas já existia na tabela anterior, e todavia nunca ouvi V. Exa. protestar contra isso.

O Orador: — Acusa-me o Sr. Barros Queiroz do facto de eu nunca ter protestado quanto aos impostos já em vigor sob estas próprias rubricas na tabela de 1902.

Em primeiro lugar as taxas então em vigor eram inferiores às que a comissão

Página 17

Sessão de 21 de Março de 1924 17

agora propõe, e a propósito dêsse aumento de percentagens devo fazer as mesmas -considerações que fiz acerca de outras taxas fixadas também em relação ao valor sôbre que recaem, isto é, incidindo elas sôbre uma moeda desvalorizada, a actualização do imposto encontra-se feita pelo facto de caírem sôbre um valor mais alto; em segundo lugar eu não podia ter protestado contra a tabela porque, graças a Deus, ainda não era então Deputado.

Vejamos agora outra rubrica da proposta: a que respeita a aforamentos.

Ao passo que pela tabela de 1921 se pagava 1,5 por cento sôbre o valor dum foro, agora pagam-se 3 por cento sôbre 20 pensões quere dizer, é um imposto 60 vezes superior ao imposto da tabela de 1902.

Contra êste exagero de taxa lavro também o meu protesto.

Sr. Presidente: passarei em claro, porque não tive tempo de apreciar com cuidado a tabela, nem sequer quási de a ler uma vez, passarei em claro, repito, sobre algumas rubricas que se seguem, tanto mais que sei que sôbre algumas delas falará também, em nome dêste lado da Câmara, o meu ilustre correligionário Sr. Carvalho da Silva.

A propósito das apólices de seguros, não posso deixar de chamar a atenção da Câmara, e em especial do Sr. Presidente 4a comissão de finanças, para a taxa, que me parece exagerada, que recaí sôbre êsses títulos.

As apólices de seguros ficam a pagar, quando se trata de seguros de vida è de seguros contra desastres no trabalho, sôbre a soma dos prémios recebidos, 2, por cento, sendo seguros de qualquer outra natureza 5 por cento.

Sr. Presidente: sabe V. Exa., escusando portanto de me alargar em considerações, qual o papel social importantíssimo que os seguros representam, não me padecendo, pôr conseqüência, justo que se onere um acto que às vezes se não pratica com aquela freqüência que seria de desejar, que se onere, repito, com uma taxa que vai até contribuir para que os seguros sejam ainda menos freqüentes do que são actualmente.

O Sr. Barros Queiroz: — V. Exa. dá-me licença?

V. Exa. refere-se à taxa a incidir nas apólices de seguros; ora, o que a comissão de finanças se propõe adoptar é mais simples para as companhias e para o Estado.

Hoje há uma dificuldade enorme em selar aquele grande número de títulos, sujeitando-se as companhias constantemente a multas e a toda a espécie de fiscalização.

O sistema do colectar pelos prémios recebidos.

O Orador: - Então, quando é pago o sêlo?

O Sr. Barros Queiroz: — Trimestralmente ou semanalmente, as companhias são obrigadas a enviar à inspecção de seguros uma nota circunstanciada dos seguros efectuados e, segundo essa nota, assim lhes é aplicada a taxa. Quanto ao exagero das taxas, também S. Exa. não tem razão, porquanto sôbre seguros de qualquer natureza já as companhias pagam pelo seguro de um ano 4,52 por cento.

Quanto aos acidentes de trabalho e seguros de vida, concede-se protecção a êsses seguros que têm um carácter social e humanitário, o que não passou despercebido à comissão de finanças, e decerto não pode passar despercebido à Câmara.

A comissão de finanças reduziu onde entendeu que era justo reduzir.

Se V. Exa. não deseja que o interrompam, peço-lhe que o diga sinceramente.

O Orador: — Sr. Presidente: agradeço ao Sr. Barros Queiroz o favor das suas explicações.

Não pense S. Exa. que eu me incomodei ou de qualquer forma me foi desagradável a sua interrupção, pois que ela é prova do cuidado com que segue a discussão desta proposta.

Eu até tenho muito prazer em dizer a S. Exa. que a sua atitude me é muito agradável, ao contrário do quê supõe, atitude que até provoca da minha parte uma certa extranheza, tam habituados estamos nós a ver que nesta Câmara, a propósito dos diplomas mais importantes, quer os Ministros, a cujas pastas mais directamente respeitam, quer os próprios relatores, se desinteressam das questões, mostrando assim que o que desejam é que se vote, não

Página 18

18 Diário da Câmara dos Deputados

se importando que se vote bem ou mal. De modo que a atitude do Sr. Barros Queiroz, presidente da comissão de finanças e que, segundo vejo, teve parte importante na confecção desta proposta, não pode ler senão o meu agradecimento.

Mas, voltando à questão dos seguros, agradeço as explicações de S. Exa. e continuo a pensar que a taxa de 5 por cento ainda é exagerada.

Quanto aos arrendamentos, a comissão de finanças propõe, em vez das taxas que estavam em vigor e que por terem sido estabelecidas não de uma forma fixa mas em atenção já ao valor dos actos a tributar, a comissão de finanças propõe novas taxas e mais agravadas, ou melhor dizendo, propõe uma taxa uniforme de 4/1000 sôbre o valor de arrendamentos.

Sr. Presidente: esta taxa de 4/1000 sôbre os arrendamentos é também muito superior àquilo que actualmente se achava em vigor, e, como já disse a propósito de outras rubricas anteriores sôbre as taxas que recebem não sôbre valores fixos mas variáveis, essa tributação mais alta não a contribuição se justifica.

Além disso, Sr. Presidente, a comissão de finanças introduziu nesta rubrica uma alteração importante àquilo que se encontrava em vigor desde a tabela de 1902 e vem a ser a seguinte: até aqui o sêlo de arrendamento era pago no acto do contrato e só era cobrado conjuntamente com a contribuição predial; ora a comissão de finanças propõe agora que o sêlo de arrendamento se cobre também conjuntamente com a contribuição predial.

Isto, Sr. Presidente,1 além de ser uma inovação, para que não encontro justificação, traz como conseqüência que é mais um imposto que vem recair sôbre os proprietários urbanos que já se encontram numa situação desgraçada, porque se o sêlo continuasse a ser cobrado, como até aqui, no acto do arrendamento, o seu pagamento naturalmente iria recair sôbre o arrendatário que vive numa legislação verdadeiramente excepcional e que nos seus radicalismo» não encontra paralelo com as legislações estrangeiras.

Espero que na especialidade esta inovação se não mantenha ou que, quando a Câmara entenda que deve subsistir, a cobrança se faça como até aqui.

Vamos agora analisar a rubrica 27,

que estabelece uma taxa, a meu ver, verdadeiramente exorbitante, de 10 por cento sôbre os bilhetes de assistência a diversões de qualquer natureza, a exposições ou espectáculos públicos, sejam quais forem, em qualquer casa ou recinto em que realizem.

Mesmo que esta taxa se aplicasse apenas aos espectáculos de diversões, ela seria exorbitante, porque 10 por cento sôbre o valor de todos os bilhetes é uma cousa extraordinariamente gravosa.

A indústria de espectáculos, que passou uma época de relativa prosperidade, começa agora a lutar, como todas as indústrias, com uma grande crise, e por isso o lançamento dêste pesado imposto sôbre o valor dos bilhetes é tornar ainda pior uma indústria de que vivem muitas centenas de, pessoas

Espero que a Câmara tome em consideração o que acabo de dizer e que, quando se discutir a proposta na especialidade, deminua esta taxa de 10 por cento, que é intolerável, com a agravante de ser extensiva a bilhetes de assistência às exposições que podem ter um fim de educação artística proveitosa para o público.

A rubrica que se segue, sôbre bilhetes de passagem, parece-me também inaceitável, dando-se até o caso de que, segundo me parece, a Câmara não pode, pelo menos nesta sessão legislativa, ocupar-se do assunto, visto que já o apreciou e rejeitou.

Efectivamente, quando há três ou quatro semanas, discutimos aqui uma das várias propostas sôbre o sêlo, o Senado introduziu em emenda uma tributação bastante onerosa também sôbre os bilhetes de passagem, e essa emenda foi rejeitada.

Todos nós sabemos as dificuldades com que lutam as emprêsas de transporte, apesar das tarifas elevadas que existem; e se fôr aprovado êste imposto de 5 por cento sôbre a importância dos bilhetes de passagem, ou agravamos a situação, que já não é próspera, dessas emprêsas, oi£ contribuímos para o aumento dos preços dos bilhetes; de qualquer das formas tornamos pior o que já é mau.

É certo, Sr. Presidente, que a Comissão de finanças, ouvindo as considerações que aqui foram produzidas quando da discussão das emendas introduzidas pelo Senado na proposta anterior, afixou uma

Página 19

Sessão de 21 de Março de 1924 19

taxa mais baixa aos bilhetes de passagem por via marítima, quando essas passagens se realizem do continente para as ilhas ou vice-versa e para o estrangeiro.

Semelhante distinção tem a sua razão de ser. Realmente, pretende-se por esta forma não afastar dos portos nacionais, e designadamente do porto de Lisboa e do porto de Leixões, o tráfego internacional que, se daqui fôsse afastado, não poderia senão beneficiar os portos concorrentes estrangeiros.

Em todo o caso, repito-o, parece-me que a taxa de 5 por cento estabelecida para os transportes dentro do país é exagerada.

Sr. Presidente: para que V. Exa. verifique quanto são fundadas as críticas dês-te lado da Câmara sôbre a forma tumultuosa como se elaboram os diplomas que saem do Parlamento, basta que se atente na rubrica 76, que diz assim:

Leu.

Quere -dizer, decorreram apenas 20 dias sôbre a publicação da última lei do sêlo votada pelo Parlamento e já a comissão de finanças vem propor uma alteração a êsse diploma.

Isto denota a razão que nos assiste quando criticamos a precipitação com que se está legislando em assuntos de tanta importância como são todos aqueles que se relacionam com os impostos.

Os recibos e quitações, que também tinham uma tributação fixada — não por uma maneira uniforme, mas por uma taxa ad valorem — sofrem agora novo aumento; e assim mais uma vez se prova que do que se trata não é apenas de actualizar os impostos mas de, por qualquer forma, obter dinheiro para fazer face à voragem do Estado.

Sr. Presidente: até aqui tratava a proposta, que estou apreciando, de verbas que já se encontravam incluídas na tabela do sêlo em vigor e que passam a ter uma tributação diferente; daqui em diante e a propósito do artigo 3.° da proposta, terei de ocupar-me de rubricas inteiramente, novas, isto é, de factos que até êste momento estavam isentos de qualquer imposto de sêlo e que a comissão de finanças, indo ao encontro dos desejos do Sr. Presidente do Ministério, de não deixar passar cousa alguma som que seja selada, entendeu dever tributar.

Assim, Sr. Presidente, na base respeitante à Administração do Pôrto de Lisboa se vê que nada escapa, sendo tudo selado, como por exemplo: os boletins de despacho para- consumo, de reexportação, de transferências, de trânsito, ou de baldeação, para modificação dos volumes nos armazéns, de extracção de amostras nos cais, para saída de mercadorias nacionais para volumes e para medição de mercadorias.

Tudo é objecto de tributação, sendo a taxa de $20; porém, como esta quantia está ainda sujeita, segundo me parece, ao coeficiente de multiplicação por 5, temos que cada boletim que é necessário preencher para o transito das mercadorias pela alfândega fica sujeito a um imposto de 1$.

Quere dizer, Sr. Presidente, é mais um imposto que vem recair sôbre os géneros de qualquer espécie que transitem pelas alfândegas; é mais um imposto que vem contribuir para a carestia da vida.

É, Sr. Presidente, uma máxima nova que a República adoptou desde que é regime neste País; é a máxima de que o povo, ao contrário do que se disse no tempo da propaganda, deve pagar mais; não poderá pagar mais, mas deve pagar mais.

O que é um facto, Sr. Presidente, é que não só esta rubrica como todas as demais propostas pela comissão vêm contribuir poderosamente para o aumento do custo da vida.

Sr. Presidente: na verdade não me foi possível, pela leitura rápida que fiz da proposta em discussão, fazer, uma análise completa e com cuidado de cada uma das rubricas novas que a comissão de finanças propõe, razão por que me referirei apenas a algumas.

Assim, por exemplo, a rubrica que tem o n.° 3 diz o seguinte:

Leu.

Vem agravar mais ainda a situação, já de si precária, do comércio de vinhos.

É sina do regime fazer tudo fora de propósito e ao contrário do que devia ser. Assim, quando o dinheiro era a rodos e os bancos inventavam indústrias para aplicar os seus capitais, nessa altura qualquer pessoa diria que era o momento oportuno para aplicar os impostos; mas não se fez assim.

Página 20

20 Diário da Câmara dos Deputados

A República esperou que a rarefacção se tivesse produzido e que o dinheiro tivesse-desaparecido dos bancos, para então vir pedir dinheiro ao público, para lançar mais impostos e os seus empréstimos, embaraçando toda a vida económica do País o lançando nela uma perturbação extraordinária.

Durante a guerra, quando a França importava os nossos vinhos, não seria a ocasião oportuna para lançar uma tributação?

Mas nesse tempo a República não pensou nisso o agora vem lançar taxas que anulam quási por completo o comércio.

Ainda há pouco o ilustre sub-leader dêste lado da Câmara, a propósito do parecer da comissão de finanças elaborado sôbre a proposta do Sr. Velhinho Correia, teve o ensejo do demonstrar a V. Exa. o à Câmara que o imposto de 5 centavos por litro nos vinhos comuns, e de 20 centavos nos vinhos generosos, tornava por assim dizer impossível a continuação do comércio de vinhos, vindo agravar as condições já difíceis da agricultura nacional.

Pois, não contente com isso, a comissão de finanças, querendo achar matéria, nova para tributar com sêlo, vai buscá-la às bebidas engarrafadas, tributando-as com verbas que, parecendo pequenas, tais como vêm apontadas, são na verdade grandes, porque não podemos esquecer que todas as taxas sofrem a multiplicação pelo coeficiente 5.

Sr. Presidente: a comissão mantém ainda a rubrica 16.a que aplica o imposto de 1 por mil sôbre o valor das partilhas judiciais. Creio que o Sr. Ministro das Finanças está em desacôrdo com êste imposto, pois trouxe à Câmara uma proposta de eliminação da contribuição de registo acerca dessas partilhas judiciais.

Sr. Presidente: muitas outras considerações por certo suscitará a apreciação desta nova proposta quando com vagar e detidamente eu a possa estudar, e por isso algumas considerações não me dispensarei de formular quando se entrar na discussão da especialidade.

Antes de terminar, por agora, não quero deixar de pôr em relevo um facto,
e é que o novo trabalho lançado pela comissão de finanças, refundindo por completo aquilo que o respectivo Ministro aqui nos tinha trazido primeiramente, é mais um cheque dado a S. Exa. é a demonstração mais completa de que o Sr. Álvaro de Castro não está devidamente habilitado para exercer o cargo que desempenha, é a demonstração mais evidente de que as propostas que S. Exa. tem apresentado à apreciação da Câmara não podem ser agravadas, ainda com profundas alterações, devendo ser refundidas por completo como incompatíveis com a legislação em vigor.

É necessário o desconhecimento do que seja a legislação do sêlo em vigor para que um Ministro das Finanças apresente uma proposta multiplicando por 15 ou 20 todas as taxas da tabela de 1902. Não, Sr. Presidente, isto não pode ser.

Pareço que o Sr. Álvaro de Castro anda mal inspirado. Os colaboradores que S. Exa. tem escolhido para suprirem a sua insuficiência também não estão à altura do papel que desempenham.

O Sr. Alberto Xavier foi o primeiro a mostrar a sua incompetência com aquele desgraçado decreto publicado no Diário do Govêrno de 7 de Fevereiro, se não estou em êrro, que causou pânico no País, e agora o Sr. Velhinho Correia, que por uma votação unânime desta Câmara tinha sido retirado do exercício da sua pasta, e que volta a dar cartas em matéria de finanças, mostra igualmente, pelo parecer da comissão de finanças, que não está à altura de desempenhar o papel que assumiu, visto que apresentou sôbre o sêlo uma cousa que foi retirada da discussão, por se entender que não podia continuar a ser apreciada.

Sr. Presidente: também não deixarei de frisar, antes de concluir as minhas considerações, que os Ministros das Finanças da República, quando vêm pedir novos agravamentos de contribuições, dizem sempre: «chegou a hora dos sacrifícios», como se fôsse o primeiro aumento que pedissem.

Porém, o pior é que essa hora não acaba de soar, porque é necessário que continue o desatino, verdadeiramente espantoso, que tem sido a administração da República nestes últimos seis anos.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

Página 21

Sessão de 21 de Março de 1924 21

O Sr. Barros Queiroz: — Sr. Presidente: A comissão de finanças, coadjuvada por alguns Deputados, procedeu à revisão da proposta que a esta Câmara trouxe o Sr. Vitorino Guimarães, o ao parecer elaborado pelo Sr. Velhinho Correia:

Nesse exame a comissão verificou que muitas das rubricas inscritas na proposta e no parecer já estavam corrigidas pela lei n.° 1:552, e que não careciam, por isso, de uma discussão especial, neste momento, porque não resultaria dêsse facto nenhuma utilidade.

Verificou também que muitas outras rubricas eram susceptíveis de correção, mas que, pela sua insignificância de produção de imposto, não valeria perder dias e dias a discuti-las.

Por êste motivo destacou apenas dessa proposta aquelas rubricas que entendeu susceptíveis de produzir mais impostos, sem gravame especial para o contribuinte.

Em regra as taxas adoptadas pela comissão são inferiores àquelas que propozeram os Srs. Vitorino Guimarães o Velhinho Correia; todavia, algumas delas merecem referência especial.

Assim, propõem-se para entrada em divertimentos públicos uma taxa de 10 por cento sôbre o seu custo.

Sr. Presidente: pareceu-me que esta taxa é muito elevada o tive a honra de propor a sua redução para 5 por cento, visto que, apesar de se tratar de divertimentos, grande número de pessoas emprega a sua actividade no teatro, dele vivendo.

Outra taxa, que de algum modo constituo a base económica desta proposta, é a que s o refere ao sêlo; sôbre os transportes.

A comissão entendeu que o sêlo deve ser proporcional ao custo dêsses transportes. Defendo inteiramente êste princípio.

Apoiados.

É bom não esquecer que, neste fomento, os transportes em Portugal são os mais baratos. Isto poderá parecer paradoxal num País que não tem carvão, mas è a verdade.

Por isso eu sustento que a percentagem do 5 por cento sôbre os transportes representa uma taxa justa.

Outra taxa que influi grandemente na economia da proposta ô a que se refere ao sêlo de recibo. Era relação à que

actualmente vigora, essa taxa é, de facto elevada.

Se é certo que a taxa agora estabelecida correspondo praticamente a 10 centavos por 100 escudos o que do resto, não pareceu exagerado à comissão não é menos certo quê ela vem simplificar extraordinariamente a sua aplicação por parte do público que para a fazer tem presentemente do se socorrer dum determinado número de operações e de fórmulas que nem sempre estão ao alcance de todos.

Pôr êsse processo desaparecerão inteiramente as dificuldades hoje existentes, porquanto basta separar três algarismos à quantia a tributar para se saber qual o sêlo a aplicar.

Outra verba que parece, igualmente, elevada é aquela a que largamente se referiu o ilustre Deputado Sr. Morais Carvalho: a que diz respeito a companhias de seguros.

Julgo que a taxa estabelecida pela comissão não é em nada exagerada e tem a grande vantagem de dar a essas companhias, que são seguradoras dos bens dos outros, uma tranqüilidade que elas geralmente não tem, visto não estarem seguras em relação ao fisco.

O sistema seguido até hoje é complicado e as companhias de seguros estão sempre sujeitas às multas da fiscalização, além de terem de dar uns tantos por cento para a Assistência Pública.

Agora, as companhias ficam isentas da estampilha nos contratos.

Presta-se um serviço também à Casa da Moeda, livrando-a da fabricação dêsses selos.

O Estado cobra aquilo que realmente é verdade, e a taxa não é elevada, apesar de parecer que o é.

A comissão de finanças, estabelecendo o sistema que estabeleceu, pôs em execução um sistema de maior simplicidade e estabeleceu uma taxa menor que a de hoje.

A comissão de finanças praticou um acto de justiça livrando as companhias reseguradoras de pagarem novo sêlo por seguros feitos em outras companhias.

Entendeu a comissão que, tratando-se dum acto de previdência social, convinha facilitar determinados seguros por todas as maneiras, e nesse sentido baixou a taxa

Página 22

22 Diário da Câmara dos Deputados

a 2 por cento para os seguros ou acidentes de trabalho.

Mas não havia só esta consideração a atender; havia outra que é, tratando-se duma medida adoptada pela República, duma previdência tendente a acudir na invalidez àqueles que trabalham, não era justo que o Estado fizesse dela uma fonte de receita em prejuízo do segurado, isto é, dos operários que beneficiam com êsse seguro. E, no emtanto, a taxa que se aplica de 2 por cento deve produzir uma receita considerável.

Êstes são, Sr. Presidente, os pontos essenciais das modificações a introduzir na tabela em vigor.

As outras verbas são apenas correcções, actualização de taxas, tornando harmónicas entre si algumas dessas taxas que o não estavam.

Criaram-se, por exemplo, algumas taxas novas que, aliás,, estavam no parecer do Sr. Velhinho Correia, entre elas há uma, e essa é de facto, a que tem valor, que cria o sêlo para as bebidas engarrafadas. Restringiu-se a aplicação dêsse sêlo apenas às bebidas engarrafadas e não às bebidas fornecidas por qualquer outra forma.

De modo que as considerações que o meu ilustre colega Sr. Morais Carvalho fez acerca da protecção à viticultura nacional são inteiramente ou quási inteiramente descabidas.

Não é coleclado com o sêlo o vinho vendido á copo, vendido em pipas, vendido em barris, vendido em garrafões, quere dizer o grande, o enorme consumo de vinho não é atingido pela lei do sêlo.

O Sr. Morais Carvalho: — V. Exa. dá-me licença?

As considerações que eu fiz referiam-se não somente à proposta que está em discussão, mas àquela que estava em discussão há uma hora ou duas isto é referiam-se também à base 5.ª da proposta do Sr. Velhinho Correia.

O Orador: — De modo que, como V. Exa. acaba de ver, apenas fica sujeito a êste imposto aquele vinho que é fornecido engarrafado, rotulado, tal como é vendido, por exemplo, nos restaurantes e hotéis que por êle levam um preço exorbitante que chega a ser uma extorsão, e

não se compreendia que o Estado não recebesse qualquer cousa dessa extorsão.

Quanto às águas, minerais, entendeu a comissão dividi-las em duas secções, medicinais e águas minerais de mesa, de modo a tornar o imposto sôbre águas minerais de mesa, engarrafadas, quási insignificante, $04 cada garrafa de meio litro e tornando mais caro êsse imposto para aquelas águas que são consideradas medicinais.

Ainda há um pequeno imposto sôbre as aguardentes. Não é atingida a aguardente destinada a qualquer combinação, necessária em muitos casos para o fabrico dos vinhos.

Trata-se apenas de aguardente de venda ao público. Não me interessa nada que o. público beba garrafas de aguardente.

O resto são cousas insignificantes, tratando-se, por vezes, da aplicação da proposta do Sr. Velhinho Correia.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Antes de se encerrar a sessão.

O Sr. Presidente: — A discussão dêste parecer continua na próxima sessão.

Vou dar a palavra ao Sr. Carvalho dos Santos.

O Sr. Carvalho dos Santos: — Desejava falar na presença do Sr. Ministro do Trabalho.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Paulo Cancela de Abreu.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Chamo a atenção do Sr. Ministro da Justiça.

Sr. Presidente: o jornal A Vanguarda é um jornal republicano. Escusado será dizer que nenhuma ligação tenho com êsse jornal e os seus redactores.

Queixa-se o Sr. director da Vanguarda de ter tido sucessivas apreensões.

Parece-me que, existindo uma lei de imprensa, não há nada que justifique essas apreensões. O Govêrno tem dentro da lei de imprensa maneira de proceder contra o jornal que, porventura, exorbite nos seus processos.

Parece-me que o caminho é chamar à responsabilidade o seu director por qualquer artigo.

Página 23

Sessão de 21 de Março de 1924 23

Não sucedeu assim com o jornal A Vanguarda, que foi apreendido várias vezes. Diz-se que a causa da apreensão foi qualquer apreciação feita acerca do Chefe do Estado.

Com respeito a êste caso, direi apenas que quem se sujeita a amar sujeita-se a padecer.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro- da Justiça (José Domingaes dos Santos): — De facto, tive conhecimento de uns artigos publicados no jornal A Vanguarda, mas não sei qual o procedimento que se tomou. Transmitirei ao Sr. Ministro do Interior as considerações de V. Exa.

Tenho dito.

O Sr. Carvalho da Silva: — Os jornais noticiaram que estava em preparação uma viagem do Chefe do Estado aos Açores e que se preparavam para essa viagem um cruzador e vários outros barcos de guerra.

Como estamos em maré de impostos, e compressão de despesas, gostava de saber, e o País também, se o Sr. Presidente do Ministério dentro do seu programa tem mais esta compressão de despesas.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério (Álvaro de Castro): — Tenho a responder a S. Exa. que não tem fundamento a notícia a que aludiu.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão» é no dia 24, às 14 horas, com a seguinte ordem dia.

Antes da ordem do dia: A de hoje, menos os pareceres n.ºs 624 e 625.

Ordem do dia:

Interpelação do Sr. Vitorino Guimarães ao Sr. Ministro das Finanças.

Parecer n.° 584, que altera a tabela do sêlo em vigor, e a ordem do dia de hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 45 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante

Pareceres

Que abre um crédito de 413.000$ a favor do Ministério da Guerra com designadas aplicações.

Aprovado.

Para a comissão de redacção.

Dispensada a leitura da última redacção.

Que lança um adicional de 4 por cento sôbre o imposto de transacções no distrito de Coimbra, para a Maternidade de Coimbra.

Aprovado.

Para a comissão de redacção.

Dispensada a leitura da última redacção.

Da comissão de marinha, sôbre o n.° 627-C, autorizando a cedência do bronze e fundição para o monumento aos mortos da Grande Guerra.

Para a comissão de guerra.

Da mesma, sôbre o n.° 657-D, que autoriza o Govêrno a elevar as percentagens sôbre as taxas de pilotagem.

Para a comissão de comércio e indústria.

Propostas de lei

Dos Srs. Ministros das Finanças e do Interior, abrindo um crédito especial a favor do Ministério do Interior, de 300.000$, para reforço da dotação do capítulo IV, artigo 25.°, da despesa ordinária do respectivo orçamento.

Para o «Diário do Governo».

Dos mesmos, elevando a 5:000.000$ o «fundo permanente para fardamento» da Guarda Nacional Republicana.

Para o «Diário do Governo».

Projecto de lei

Do Sr. Sá Pereira, referente aos funcionários públicos.

Para o «Diário do Governo».

Últimas redacções

Do projecto de lei n.° 624, que abre um crédito de 413.000$ a favor do Minis-

Página 24

24 Diário da Câmara dos Deputados

tério da Guerra para despesas com recrutamento, revistas de inspecção, transportes, melhoria de reforma a oficiais e aquisição de terreno no Pôrto para instalação de telegrafia sem fios.

Dispensada a leitura da última redacção.

Remeta-se ao Senado.

Do projecto de lei n.° 205, que dispensa do novo concurso para promoção os aspirantes de finanças com o concurso

da alínea a) do n.° 8.° do artigo 65.° do decreto n.° 5:024, de 8 de Maio de 1919.

Aprovada.

Remeta-se ao Senado.

Do projecto de lei n.° 625, que lança um adicional de 4 por cento sobre o imposto de transacção para a Maternidade de Coimbra.

Dispensada a leitura da última redacção.

Remeta-se ao Senado.

O REDACTOR—Avelino de Almeida.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×