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REPUBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.° 58

EM 24 DE MARÇO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Francisco Cruz

Sumário.— Abertura da sessão.
Leitura da acta.
Correspondência.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Tavares de Carvalho ocupa-se da carestia da vida, instando pelas providências governativas que dêem remédio à situação.

Responde-lhe o Sr. Américo Olavo (Ministro da Guerra}.

O Sr. Almeida Ribeiro ocupa-se da publicação da lei n.° 1:564.

O Sr. Morais Carvalho chama a atenção do Govêrno para o caso da autoridade administrativa se ter recusado a requisitar um agente policial, para proceder a averiguações sôbre um crime de assassínio.

Responde-lhe o Sr. Ministro da Guerra.

Volta a usar da palavra para explicações o Sr. João Camoesas.

O Sr. Alberto Crus chama a atenção do Sr. Ministro da Agricultura para a crise económica que atravessam as povoações do norte, pelo excessivo preço do milho.

Responde-lhe o Sr. Joaquim Ribeiro (Ministro da Agricultura}.

O Sr. Ministro da Guerra envia para a Mesa duas propostas de lei, pedindo para elas urgência e dispensa de Regimento.

São concedidas.

Entra em discussão a primeira proposta do Sr. Ministro da Guerra, autorizando um crédito de 194 contos para reforço duma, verba orçamental do seu Ministério.

Usa da palavra o Sr. Morais Carvalho; e em seguida é aprovada a proposta em discussão.

Entra em discussão a segunda proposta, pedindo um reforço de verba na importância de 1:600 contos para o mesmo Ministério.

É aprovado sem discussão na generalidade e na especialidade, sendo dispensada a leitura da última redacção das duas propostas, a requerimento do Sr. António Correia.

É aprovada a acta.

São admitidas à discussão algumas proposições de lei.

O Sr. Velhinho Correia requere que prossiga imediatamente a discussão do parecer n.º 584 (lei do selo) prorrogando se a sessão até ser votado, isto com prejuízo da interpelação do Sr. Vitorino Guimarães.

Usam da palavra sôbre o modo de votar o Sr. Morais Carvalho e Francisco Cruz tendo o Sr. Morais Carvalho requerido a divisão do requerimento em duas partes.

O Sr. Presidente faz uma comunicação à Câmara relativamente à hora da chamada que será feita, de hoje em diante, às 2 horas da tarde.

O Sr. Carvalho da Silva requere votação nominal sôbre, o requerimento do Sr. Velhinho Correia.

É aprovado o requerimento do Sr. Morais Carvalho.

É aprovada, a primeira parte do requerimento do Sr. Velhinho Correia.

É aprovado o requerimento do Sr. Carvalho da Silva em contraprova.

Procedendo-se a chamada, verifica-se ter sido aprovada a segunda parte do requerimento do Sr. Velhinho Correia por 50 votos contra 21.

Ordem do dia. — (Continuação da discussão da proposta aumentando as taxas da lei do sêlo).

Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva e Paulo Cancela de Abreu que fica com a palavra reservada^ tendo o Sr. Presidente interrompido a sessão para prosseguir às 22 horas.

Reaberta a sessão, o Sr. Paulo Cancela de Abreu conclui as uvas considerações enviando para a Mesa uma moção, que é admitida.

Efectuada a contraprova o, requerimento do Sr. Morais Carvalho, que invoca o § 2.º do artigo 116.º do Regimento, verifica-se não haver número suficiente para o prosseguimento dos trabalhos.

O Sr. Presidente manda proceder à chamada, â qual respondem 34 Srs. Deputados.

O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.

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Abertura da sessão às 16 horas e 40 minutos.

Presentes à chamada 43 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 46 Srs. Deputados.

Presentes à chamada:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Alberto Carneiro Alves da Cruz,

Alberto Ferreira Vidal.

Alberto de Moura Pinto.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Amaro Garcia Loureiro.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Pais da Silva Marques.

António Resende.

Artur Brandão.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.

Francisco Cruz.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João José da Conceição Camoesas.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Carvalho dos Santos.

José Marques Loureiro.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José Pedro Ferreira.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel de Sousa da Câmara.

Manuel de Sousa Coutinho.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Nuno Simões.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Tomé José de Barros Queiroz.

Vergílio Saque.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Henriques Godinho.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Srs, Deputados que entraram durante a sessão:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Alberto Lelo Portela.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Álvaro Xavier de Castro.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

António Correia.

António Lino Neto.

António Maria da Silva.

António de Paiva Gomes.

António Pinto de Meireles Barriga.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Cândido Pereira.

Constâncio de Oliveira.

Custódio Maldonado de Freitas.

Custódio Martins de Paiva.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Ernesto Carneiro Franco.

Francisco Coelho do Amaral Reis;

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Hermano José de Medeiros.

João Estêvão Águas.

João Luís Ricardo.

João Pina de Morais Júnior.

Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.

Joaquim Brandão.

Joaquim José de Oliveira.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Domingues dos Santos.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Manuel Alegre.

Manuel de Brito Camacho.

Mário de Magalhães Infante.

Paulo Cancela de Abreu.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Sebastião do Herédia.

Vasco Borges.

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Srs. Deputados que não compareceram à sessão;

Abilio Correia da Silva Marçal.

Abílio Marques Mourão.

Afonso Augusto da Costa.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto Xavier.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Américo da Silva Castro.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

António Abranches Ferrão.

António Albino Marques de Azevedo.

António Dias.

António Ginestal Machado.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António de Mendonça.

António de Sousa Maia.

António Vicente Ferreira.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Augusto Pereira Nobre.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

David Augusto Rodrigues.

Delfim Costa.

Domingos Leito Pereira.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Germano José de Amorim.

Jaime Duarte Silva.

Jaime Júlio de Sousa

Jaime Pires Cansado.

João Baptista da Silva.

João José Luís Damas.

João de Ornelas da Silva.

João Pereira Bastos.

João Salema.

João de Sousa Uva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim Dinis da Fonseca.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge Barros Capinha.

José António do Magalhães.

José Cortês dos Santos.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José de Oliveira Salvador.

Júlio Gonçalves.

Júlio Henrique de Abreu.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel Duarte.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Mariano Martins.

Mariano Rocha Felgueiras.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Maximino de Matos.

Paulo da Costa Menano.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomás de Sousa Rosa.

Valentim Guerra.

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio da Conceição Costa.

O Sr. Presidente (às 15 horas e 40 minutos): — Estão presentes 43 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Leu-se a acta e o seguinte

Expediente

Ofícios

Do Ministério dos Estrangeiros para que no Orçamento para 1924-1925 seja adicionado no capítulo 4.°, artigo 23.° «Pessoal em disponibilidade» na secção «Fora do serviço, aptos», o seguinte:

Um chefe de missão de 1.ª classe..........2:062$50

Para a comissão do Orçamento.

Do Ministério da Marinha, satisfazendo ao pedido no ofício n.° 236 que comunicou o requerimento do Sr. João Bacelar.

Para a Secretaria.

Da Câmara Municipal do Pôrto, pedindo a discussão e aprovação da proposta que modifica a lei n.° 1:238.

Para a Secretaria.

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Da Câmara Municipal de Marvão, idêntico ao interior.

Para a Secretaria.

Da Câmara Municipal de Baião, enviando uma representação em que faz pedido igual aos das câmaras do Pôrto e Marvão.

Para a Secretaria.

Do juiz de Direito do 2.° Juízo de Investigação Criminal de Lisboa, pedindo informação, sôbre se a comissão parlamentar de inquérito ao extinto Ministério dos Abastecimentos, que funcionou em 1919, ainda existe, onde funciona e por quem é presidida.

Satisfaça-se.

Telegramas

Da Câmara Municipal de Alpiarça, protestando contra a base quinta da proposta do Ministro das Finanças criando um imposto especial sôbre vinhos e seus derivados.

Para a Secretaria.

Da Câmara Municipal de Gondomar, pedindo a urgente conversão em lei da proposta sôbre estradas.

Para a Secretaria.

Dos oficiais de justiça da comarca de Soure, pedindo a discussão urgente da proposta que melhora a sua situação.

Para a Secretaria.

Representações

Da comissão executiva da Câmara Municipal de Baião, pedindo a rápida discussão e aprovação da proposta apresentada em 25 de Janeiro último pelo ex-Ministro do Comércio, Sr. António da Fonseca, para que seja modificada a lei n.° 1:238, de 28 de Novembro de 1924 e decreto n.º 9:131 de 20 de Setembro de 1923, respeitantes a estradas e turismo.

Para a Secretaria,

Da comissão executiva do Congresso das Misericórdias, sôbre remodelação dos serviços de assistência.

Para a comissão de previdência social.

O Sr. Tavares de Carvalho: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. o obséquio de chamar a atenção do qualquer dos membros do Governo que se encontre presente.

Sr. Presidente: na nota oficiosa que o Govêrno enviou para os jornais diz-se ter êle adoptado medidas que devem atenuar a carestia da vida. Eu desejo bastante, antes do outras considerações que-desejo fazer, saber se as medidas que o Govêrno tem estudado são para apresentar ao Parlamento, ou para êle as resolver por si.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — V. Exa. fará as considerações que deseja, que eu depois lhe responderei.

O Orador: — Eu li, Sr. Presidente, num jornal de Setúbal, num artigo relativamente à carestia da vida com o título. Basta que a batata se tem vendido ao preço de três escudos o oitenta centavos o quilograma.

O Govêrno, Sr. Presidente; é que não diz «basta»! pois continua a olhar indiferente e serenamente para o preço dos géneros.

A lei publicada pelo Govêrno do Sr. António Marra Baptista fixou o preço dos géneros e eu creio, Sr. Presidente, que ela ainda não foi modificada por qualquer outra lei.

O Govêrno, Sr. Presidente, poderia criar um tribunal colectivo composto de magistrados, pois, felizmente a justiça ainda é composta, na sua grande maioria, de homens íntegros e honestos. O Govêrno poderia também mandar fechar os clubs onde se está jogando permanentemente, pois, a verdade é que êles concorrem e muito para a carestia da vida, visto que compram tudo por altos preços.

Chamo também a atenção do Govêrno para o que só está passando com a Companhia dos Fósforos, pois, é uma verdadeira roubalheira o que está fazendo, tendo feito desaparecer do mercado as caixas de 5 centavos, e colocando outras pintadas de encarnado que se estão vendendo no mercado ao preço de $20 cada uma.

O Governo ao que se vê Sr. Presiden-

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te, continua a olhar indiferentemente para tudo isto, dizendo que está a estudar.

Ora a meu ver, Sr. Presidente, os estudos fazem-se na escola; e eu entendo que os Ministros quando vão para aqueles lugares já devem levar os assuntos devidamente estudados.

Era assim, Sr. Presidente, que eu o faria se tivesse competência para exercer o lugar de Ministro, que não a tenho, nem mesmo para êste que estou ocupando.

O que eu espero é que o Sr. Ministro da Guerra que me está prestando atenção, transmita aos Srs. Ministros as minhas considerações, se fôr possível, no mesmo tem de indignação com que estou falando.

O que é um facto, Sr. Presidente, é que nós não podemos continuar à espera de que o Govêrno estude os assuntos, pois, até lá podemos morrer de fome.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Sr. Presidente: devia dizer ao Sr.Tavares de Carvalho que não correndo os assuntos, para que S. Exa. chamou a atenção do Govêrno, pela minha pasta, arei transmiti-los o mais rigorosamente possível aos Ministros que têm de intervir nessas questões. No emtanto permita-me V. Exa. que lhe diga que pena é que não tivessem escolhido para fazer parte do Govêrno pessoas como o Sr. Tavares de Carvalho que se julga com competência para isso.

O Sr. Tavares de Carvalho (interrompendo): — Peço desculpa a V. Exa. mas eu declarei muito claramente que me não julgava com competência para ser Ministro, nem mesmo até para bem ocupar o lugar que ocupo.

Felizmente conheço-me; porém o que não podemos é continuar neste estado de cousas, pois, a verdade é que temos fome.

O Orador: — Eu devo dizer a V. Exa. que relativamente à minha pasta tenho de facto assuntos que carecem de apreciação para os resolver V. Exa. porém referiu-se a assuntos que correm por outras pastas para os quais mostrou ter competência, e assim, natural é que eu

diga que pena é que não tivessem sido escolhidos para o Govêrno homens como o Sr. Tavares de Carvalho.

O Sr. Tavares de Carvalho (interrompendo): — A Câmara ouviu-me bem dizer, que não me julgava com Competência para tal.

Felizmente sei bem o que sou e o que valho.

Porém o que 6 um facto é que o Govêrno até hoje nada tem feito, passando o tempo todo em estudos, o que não pode ser pois, deve ter um pouco mais de atenção para com o povo que na verdade está a morrer de fome.

O Orador: — Sr. Presidente: eu tenho o hábito de ser sereno e calmo; e assim vou dizer o que tenho a dizer em resposta ao Sr. Tavares de Carvalho, sejam quais forem as interrupções que S. Exa. me faça.

Eu concordo com as considerações, e acho que S. Exa. está indicado para estar nestes lugares, visto saber a forma de se resolver o problema.

O que não posso aceitar é que S. Exa. diga que o Govêrno não trata insistentemente do assunto e que se limita a estudar. Direi a S. Exa. que só um génio é que poderia vir para o Govêrno sabendo tudo o que havia de fazer.

Diz S. Exa. que os clubs concorrem muito para o encarecimento da vida e que os Governos têm medo das revoluções. Ora os clubs são freqüentados por um número limitado de pessoas, embora sejam de má nota; e isso não pode influir de modo sensível na carestia da vida.

Eu acho óptima a atitude de S. Exa. reclamando uma acção mais enérgica do Govêrno, já para efeitos pessoais e políticos...

O Sr. Tavares de Carvalho: — Para efeitos políticos não!

O Orador: — S. Exa. certamente quererá mostrar aos seus eleitores que fiscaliza a acção do Govêrno, em benefício do Estado.

Eu vou transmitir fielmente aos meus colegas as considerações de S. Exa.

O orador não reviu.

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6 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Almeida Ribeiro: — Foi publicada recentemente uma lei a respeito de sargentos e que foi sustada pelo actual Govêrno, pelas faculdades que para isso tem.

Essa lei ficou suspensa somente na parte que traz aumento de despesa e em nada implica» com as promoções.

Parece-me de justiça que tratando se de uma reparação se devoa contar a antiguidade dessas promoções desde o dia em que foi publicado o decreto.

Peço a V. Exa. que faça estudar o assunto e resolva como é de justiça, tanto mais que não traz aumento de despesa, pois só se trata de promoção.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Eu também recebi um telegrama que deve ser igual ao que está na posse de V. Exa.

A Câmara sabe qual a minha opinião; mas a Câmara vogará como entender, uma vez que V. Exas. são os legítimos representantes do país.

O orador não reviu.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: há muitos dias que desejava chamar a atenção do Sr..Ministro do Interior para um caso de muita gravidade.

S. Exa. não tem estado presente, designadamente antes da ordem do dia; mas agora, aproveitando a ocasião de estar presente o Sr. Ministro da Guerra, peço a S. Exa. o favor de transmitir as minhas considerações ao Sr. Ministro do Interior.

No mês de Janeiro foi barbaramente assassinado na estação da Régua, por questões políticas, Manuel Monteiro, que ia com seu irmão Joaquim Monteiro.

Foi uma caçada ao homem feita por 8 ou 10 homens armados. Já foram presos 3, mas o resto anda à solta

A família do assassinado requereu que se chamasse a polícia de investigação criminal para fazer as averiguações necessárias para a descoberta dos autores do assassinato. A família encontrou toda a resistência da parte das autoridades competentes; e, então, pediu ao administrador do concelho que lhe fôsse consentido que a expensas da família mandasse vir a polícia de investigação a fim de proceder às averiguações. O administrador do

concelho quis ouvir a opinião do governador civil, que se opôs. E para êste assunto que ou desejava chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior; mas, visto que S. Exa. não está presente, peço ao Sr. Ministro da Guerra o favor de lhe transmitir as minhas considerações e fazer-lhe sentir que é de toda a justiça o deferimento do pedido da família a que me referi.

Não se trata apenas de um caso de desordem haja uma vítima.

O empenho das autoridades devia ser precisamente o de descobrir a verdade para que os criminosos possam receber o castigo que por lei lhes é devido; mas como se trata de um caso de natureza política, o pedido da família vai esbarrar de encontro à má vontade das autoridades.

Já no outro dia em que eu fiz referência acerca do encerramento de uma escola em Felgueiras, o Sr. Ministro da Instrução disse que as escolas tinham, sido. mandadas encerrar não só porque não se tinha cumprido a formalidade de pedir autorização com 15 dias de antecedência, mas principalmente porque nessa escola se fazia propaganda em detrimento do regime. Naturalmente os mesmos motivos vão opor-se ao deferimento da justa pretensão da família do assassinado.

Tenho dito.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra: — Vou transmitir ao Sr. Ministro do Interior as considerações de S. Exa. mas posso assegurar que não há pressões políticas que impeçam que êste Govêrno ou qualquer outro cumpra o seu dever.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr= João Camoesas: — Sr. Presidente: pedi a palavra para secundar as considerações apresentadas pelo Sr. Tavares de Carvalho e para discordar da doutrina apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra, quando respondeu àquele ilustre Deputado.

Afigura-se-me que o caminho a seguir não é chamar o Sr. Tavares de Carvalho ao Govêrno ou qualquer outro parlamentar, porque os Governos têm funções do Executivo; e, quando qualquer Deputado

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transmite ao Govêrno reclamação que recebeu ou que entenda fazer, o Govêrno tem de tomar providências porque é êsse o seu papel.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — V. Exa. está afirmando o que eu não disse. As minhas palavras foram estas: que se havia pessoas que conheciam tam bem a solução da carestia da vida deviam ir para as bancadas do Govêrno para resolverem êsses assuntos.

O Orador: — A minha função de parlamentar é chamar a atenção dos Governos para determinados problemas.

Como V. Exa. sabe a carestia da vida tem-se intensificado em Portugal há dois ou três meses, sem justificação. Há géneros que se vendem â 100 e 200 por cento a mais.

Isto não tem proporção nenhuma nem com a desvalorização da moeda, nem com a valorização do trabalho. Êste fenómeno impõe ao Govêrno uma atitude de intervencionismo enérgico, visto que êle se manifesta fora de todas as regras económicas o que faz supor a existência de certos factores de perturbação que devem ser metidos na ordem.

O Govêrno tem hoje à sua disposição um bom elemento, que é o Comissariado dos Abastecimentos, para executar os seus planos sôbre barateamento da vida. Deve, pois, dar-se a êsse Comissariado todos es recursos indispensáveis para êsse organismo desenvolver a máxima actividade na função que tem a desempenhar.

Para se avaliar do muito que ainda pode fazer êsse comissariado basta notar o que se dá com o abastecimento de peixe.

Sempre que há para venda qualquer quantidade de peixe trazida pelos vapores do comissariado, o mercado geral apresenta uma redução de 50 por cento no preço do peixe.

Tudo indica, pois, que se torna necessário colocar o Comissariado dos abastecimentos em condições de poder multiplicar a sua acção. Alvitro, pois, ao Govêrno que exerça a sua acção no sentido de tornar possível àquele organismo a execução de medidas que obriguem a uma redução geral de preços dos diversos ar-

tigos de primeira necessidade, como se dá já com o peixe.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Pelo que respeita às considerações feitas pelo Sr. João Camoesas em relação aos assuntos que correm pela minha pasta devo informar o seguinte:

Já ordenei que todas as viaturas que estavam ao serviço de diferentes unidades e estabelecimentos militares e que lhes não eram indispensáveis, passassem para o Parque de Automóveis para o efeito, de liquidação. São trinta e tantos automóveis ligeiros, além de side-cars, camiões o camionettes.

Ficarão apenas quatro automóveis ligeiros ao serviço do Ministério da Guerra. Também ordenei uma alteração na ração dos solípedes que representará uma economia mensal de 88 contos, sem prejuízo algum para a boa alimentação do gado.

Tomei igualmente uma medida da qual resulta o dispensarem-se 320 cavalos.

Como se vê tenho pôsto todo o meu cuidado era comprimir o mais possível as despesas do meu Ministério, tendo já obtido uma economia que ascende a alguns milhares de contos por ano.

Quanto à questão do peixe a que S. Exa. se referiu, embora o assunto não corra pelo meu Ministério, eu posso informar que o Ministério da Agricultura está tratando da aquisição de vapores.

Já vê pois a Câmara que o Govêrno não descura o assunto de economias, nem a questão do barateamento da vida.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. João Camoesas (para explicações): — Agradeço as explicações que acabam de ser dadas pelo Sr. Ministro da Guerra. Devo, porém, declarar que a minha crítica mantém-se de pé. Não ignoro que o Govêrno tem trabalhado no sentido que S. Exa. indicou; mas afigura-se-me que o problema da carestia da vida está assumindo uma tal gravidade que exige hoje uma acção muito mais enérgica e rápida da parte do Poder Executivo.

Numa das próximas sessões e estando presente o Sr. Ministro da Agricultura,

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8 Diário da Câmara dos Deputados

eu ventilarei o assunto com mais largueza do que hoje.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Alberto Cruz: — Quero aproveitar a presença do Sr. Ministro da Agricultura para versar um assunto que interessa de uma maneira especial à economia do norte do País.

Como já particularmente informei S. Exa., a população rural do norte do País luta com enormes dificuldades para adquirir o cereal necessário á sua alimentação, provindo essas dificuldades não só da falta do género, como ainda do elevado preço que é feito ao que existe.

Ainda há pouco eu tive conhecimento dum caso gravíssimo passado na barra do Douro e para o qual eu chamo a atenção do Sr. Ministro da Agricultura, convencido de que S. Exa. o desconhece, e de que conhecendo-o, S, Exa. porá toda a sua boa vontade em atender as reclamações dos povos que no seu patriotismo e na sua competência têm postos os olhos.

Há já dias que na barra do Douro se encontra um vapor vindo de Moçambique com um carregamento de 1:000 toneladas de milho.

Êsse milho, por várias razões, não foi ainda descarregado, e, se o não fôr tam cedo, poderá dar-se o caso de que, quando vier a sê-lo, nem sequer já sirva para dar aos animais.

As populações do norte atravessam neste momento as maiores vivicitudes, estando a comprar o milho para o seu pão entre 20$ e 30$ o alqueire,

O Sr. Ministro da Agricultura, que é do Norte, não desconhece a angustiosa situação dêsses povos. Não permitirá, por certo, que se cometa o crime de deixar inutilizar, cerca de 1:000 toneladas de milho, quando em grande parte do País elo se está vendendo por preços quási inacessíveis.

Tenho dito.

O orador não reviu,

O Sr. Ministro da Agricultura (Joaquim Ribeiro): — Sr. Presidente: ouvi com todo o interêsse as considerações que acaba de fazer o Sr. Alberto Cruz.

Ignorava inteiramente o caso que S. Exa. relatou à Câmara e para o qual S.

Exa. chamando a minha atenção, pediu providências. Elas não se farão esperar.

Se o milho que constitui o carregamento do barco a que S. Exa. se referiu fôr aproveitável para consumo público, hoje mesmo darei ordem para que, ao abrigo do artigo 5.° do regulamento do Ministério dos Abastecimentos, êsse milho seja pôsto em venda.

Apoiados.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa duas propostas de abertura de créditos especiais: uma para fazer face às despesas com a hospitalização de praças, e cuja verba se acha já esgotada; outra de 194.000$ para pagar aos fornecedores produtos farmacêuticos que, a não serem adquiridos agora, e teriam de ser por uma quantia muitíssimo mais elevada.

Como a Câmara vê, trata-se de duas propostas importantes, e isso me leva a pedir para elas a urgência e dispensa do Regimento.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam a urgência e dispensa do Regimento para a proposta apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra, de abertura de um crédito extraordinário para a aquisição de medicamentos, queiram levantar-se.

Pausa.

O Sr. Presidente : — Está aprovada.

O Sr. Morais Carvalho: — Requeiro ia contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°

Procede-se à contagem.

O Sr. Presidente: — Estão sentados 54 Srs. Deputados e de pé 2.
Está, portanto, aprovada.

Lê-se e entra em discussão.

É a seguinte:

Proposta de lei

Artigo único. É aberto pelo Ministério das Finanças, a favor do Ministério da Guerra, um crédito especial da quantia de 194.000$, destinado à Farmácia Gen-

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tral do Exército para aquisição imediata de agentes terapêuticos.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 24 de Março de 1924.— O Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, Álvaro de Castro — O Ministro da Guerra, Américo Olavo.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: mais um crédito extraordinário, e um crédito de cêrca de duas centenas de contos. Mais uma demonstração da maneira imperfeita e, por vezes, propositadamente errada como se elabora o Orçamento Geral do Estado.

Contra êste sistema de vir ao Parlamento todos os dias pedir o reforço de verbas para dotar serviços, ou para acrescentar dotações já previstas, levanto eu o mais enérgico protesto em nome da mino» ria monárquica.

Esta facilidade em conceder créditos extraordinários, longe de acautelar os dinheiros do Estado, antes incita ao seu desperdício perante a certeza que têm as administrações públicas de que o Parlamento lhes não faltará com os créditos precisos para os seus gastos.

Eu sei que o fim a que se destina o crédito de que trata a proposta em discussão é, por todos os motivos, respeitável; mas isso não me impossibilita de censurar o processo de que freqüentemente se tem lançado mão para satisfazer as despesas do Estado.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro da Guerra requere urgência e dispensa do Regimento para uma proposta de um crédito de 1:500,000$ destinados a reforçar a verba da dieta dos oficiais dos hospitais militares.

Concedida a urgência e dispensa do Regimento, entra em discussão.

É a seguinte:

Proposta de lei

Senhores Deputados. — Tendo sido aumentada a diária das dietas dos oficiais Q praças em tratamento nos hospitais militares, e sendo constantemente maior o número de doentes a cargo dêsses hospitais para o que se torna insuficientíssima a verba para êsse fim consignada no orça-

mento do Ministério da Guerra, actualmente em vigor:

Tenho a honra de submeter à vossa aprovação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º É aberto pela presente lei, no Ministério das Finanças a favor do Ministério da Guerra, um crédito especial dá quantia de 1:500.000$ destinada a reforçar a verba do fundo de tratamento hospitalar.

Art. 2.° A importância de 1:500.000$, de que trata o artigo anterior, será levada como reforço no artigo 11.° do capítulo 1.° do orçamento do Ministério da Guerra para 1923-1924.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em Março de 1924. — Álvaro de Castro. — Américo Olavo.

É aprovada na generalidade e especialidade sem discussão.

O Sr. António Correia: — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção para as duas propostas votadas.

Aprovada.

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ordem do dia. Está em discussão a acta.

É aprovada a acta.

Admissões

Propostas de lei

Dos Srs. Ministros das Finanças e Interior, abrindo um crédito de 300.000$ para reforço da dotação do capítulo 4.°, artigo 25.°, da despesa do orçamento do Ministério do Interior.

Para a comissão de administração pública.

Dos mesmos, elevando a 5.000:000$ o «fundo permanente para fardamento» da Guarda Nacional Republicana.

Para a comissão de administração pública.

Projectos de lei

Do Sr. Sá Pereira, mandando demitir todos os funcionários públicos civis ou militares que sejam comerciantes ou industriais.

Para a comissão, de administração pública.

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Do Sr. Velhinho Correia, restabelecendo até 31 de Dezembro do corrente ano, a lei n.° 375, de 2 do Setembro de 1915.

Para a comissão de administração pública.

O Sr. Velhinho Correia: — Requeiro que continue em discussão o projecto do sêlo, prorrogando-se a sessão até ser votado.

O Sr. Morais Carvalho (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: tem duas partes o requerimento do Sr. Velhinho Correia. A primeira é para que continue a discussão do projecto sôbre o sêlo, com prejuízo portanto da interpelarão do Sr. Vitorino Guimarães. A segunda, para que a sessão seja prorrogada até final da discussão do projecto, ou contraprojecto, do sêlo.

Suponho eu que será até se votar na generalidade e na especialidade. V. Exa. pode informar-me?

O Sr. Presidente: — Até se votar o projecto.

O Orador: — Quanto à primeira parte do requerimento do Sr. Velhinho Correia nenhuma dúvida temos nós dêste lado da Câmara em lhe dar o nosso voto.

Não vejo nisso inconveniente, visto a discussão já estar iniciada, com prejuízo da interpelação Vitorino Guimarães. A lei é defeituosa; todavia não vejo inconveniente na continuação da discussão. Ela pode até justificar-se.

Contra a segunda parte, porém, temos que protestar energicamente.

Apoiados.

Sobretudo por ser uma violência que se pretende impor à Câmara.

Apoiados.

Trata-se da criação dum imposto elevado que se não pode votar de ânimo leve.

A Câmara já teve a experiência a propósito doutros projectos e propostas.

Uma proposta destas não se pode votar de afogadilho.

A votação dos impostos é a função primacial o mais delicada de todas que incumbem a um Parlamento.

Por isso, e para mais nos termos em que a Câmara estava fazendo essa dis-

cussão, sem obstrucionismo, não há o direito de um Deputado da maioria vir pôr um requerimento desta natureza, que representa como que uma provocação ao País, porque respeita a uma lei tam importante como é a lei do sêlo que deve ser discutida sem obstrucionismo, mas com aquele cuidado e atenção que o Parlamento deve aplicar a todos os assuntos desta natureza.

Por conseqüência, nós dêste lado da Câmara, não temos dúvida em votar a primeira parte do requerimento do Sr. Velhinho Correia, no sentido de que o projecto continue em discussão; mas fazemos os mais enérgicos reparos e lavramos os mais enérgicos protestos contra a violência que se pretende praticar, prorrogando a sessão para atabalhoadamente, sem aquela discussão que é necessária, se votar êste projecto.

Tenho, porém, que requerer a V. Exa. que a votação do requerimento se faça em duas partes: a primeira quanto à continuação da discussão do projecto. A segunda quanto á prorrogação.

O orador não reviu.

O Sr. Francisco Cruz (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: em meu nome pessoal quero declarar que não voto o requerimento do Sr. Velhinho Correia, porquanto a experiência dos trabalhos parlamentares prova-nos que as prorrogações são prejudiciais ou inúteis.

Não posso continuar a permitir que o Regimento desta Câmara, que V. Exa. tem de fazer, respeitar, não seja comprido, abrindo-se as sessões à hora regimental, e durando as horas que o Regimento estabelece.

Protesto, declarando a V. Exa. quer em chegando a hora que o Regimento da Câmara determina, me retirarei, porque não sou a mais obrigado.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Concordo com as indicações do Sr. Francisco Cruz. Também acho que a hora da abertura da sessão é às 2 horas e por isso declaro que amanhã e dias seguintes ar primeira chamada será às 2 horas e a segunda às 2 horas e meia.

Vozes: — Muito bem.

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O Sr. Francisco Cruz: — Agradeço a V. Exa.

O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): — Em primeiro lugar desejo manifestar a V. Exa. a minha congratulação pelas palavras que V. Exa. proferia de que a hora regimental será a hora de começarem as sessões.

Em segando lugar, declaro que não reconheço à maioria o direito de fazer requerimentos desta natureza quando ela é a primeira a faltar à hora regimental.

Requeiro a V. Exa. a votação nominal para a segunda, parte do requerimento de Sr. Velhinho Correia.

É rejeitado o requerimento do Sr. Morais Carvalho.

O Sr. Morais Carvalho: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.

Feita a contraprova verificou-se estarem de pé 5 Srs. Deputados e sentados 57, sendo aprovado.

É aprovada a primeira parte do requerimento do Sr. Velhinho Correia.

É rejeitada a votação nominal para a segunda parte do requerimento do Sr. Velhinho Correia.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova o invoco o § 2.° do artigo 116.°

Feita a contraprova, verifica-se estarem de pé 49 Srs. Deputados e sentados 17, sendo aprovado.

Feita a votação nominal; verificou-se terem dito «aprovo» 50 Srs. Deputados e trejeito» 21.

Disseram «aprovo» os Srs.:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Ferreira Vidal.

Álvaro Xavier de Castro.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Correia.

António Lino Neto.

António Maria da Silva.

António Pais da Silva Marques.

António de Paiva Gomes.

António Resende.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.

Custódio Martins de Paiva.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Ernesto Carneiro Franco.

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

João Estêvão Águas.

João José da Conceição Camoesas.

João Luís Ricardo.

João Pina de Morais Júnior.

Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Domingues dos Santos.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Pedro Ferreira.

Lourenço Correia Gomes.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Manuel Alegre.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel de Sousa Coutinho.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Sebastião de Herédia.

Vasco Borges.

Vergílio Saque.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Henriques Godinho.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Disseram «rejeito» os Srs.:

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto da Rocha Saraiva.

Amaro Garcia Loureiro.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Custódio Maldonado de Freitas.

Francisco Cruz.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Brandão.

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Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Carvalho dos Santos.

José Marques Loureiro.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel de Sousa da Câmara.

Mário de Magalhães Infante.

Paulo Cancela de Abreu.

Pedro Góis Pita.

Tomé José de Barros Queiroz.

O Sr.. Presidente: — Vai entrar em discussão a proposta alterando a tabela do sêlo.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: vamos pela primeira vez nesta Câmara discutir um parecer que não é parecer, mas mais do que isto é um parecer ao quadrado da comissão de finanças.

Sr. Presidente: esta comissão, que se encontra numa situação crítica, salvo o devido respeito pelas pessoas que a compõem, resolveu por unanimidade, que o parecer do Sr. Velhinho Correia não era de molde a aceitar-se. Todavia, é êle quem continua a dar cartas nesta Câmara em matéria financeira e tanto assim que ainda há pouco apresentou um requerimento para que a sessão fôsse prorrogada até se votar, na generalidade e na especialidade o parecer ao quadrado da comissão de finanças.

Sr. Presidente: ouvi com a maior atenção a defesa que o Sr. Barros Queiroz fez do parecer; mas não posso deixar de reconhecer, a infelicidade extraordinária com que S. Exa. argumentou.

Nós estamos nesta Câmara a assumir uma gravíssima responsabilidade ante o País com a orientação que se está a adoptar em matéria de impostos. E nós, dêste lado da Câmara, não queremos ficar com a responsabilidade das conseqüências inevitáveis de uma orientação de tal ordem.

Sr. Presidente: o Sr. Barros Queiroz, ao defender o parecer, argumentou em primeiro lugar que as novas taxas não iam afectar os géneros de primeira necessidade e que, portanto, não se devia hesitar em lhe dar o voto.

Não me surpreenderia que qualquer pessoa não costumada a entregar-se a

êstes assufatos económicos e financeiros expusesse essa opinião; mas o que me surpreende é que uma pessoa da envergadura do Sr. Barros Queiroz venha defender um critério tam simplista como êste.

Sr. Presidente: já há dias eu tive ensejo de dizer nesta Câmara que era um êrro gravíssimo supor-se que o simples facto de as taxas não incidirem sôbre géneros de primeira necessidade não viria contribuir poderosamente para o seu encarecimento.

Eu não posso compreender como é que uma rode extraordinária de seios, lançada, sôbre todos os actos da vida, não vem contribuir para o aumento do seu custo, como por exemplo o agravamento das taxas da Exploração do Pôrto de Lisboa.

Sr. Presidente: por êste parecer cria-se uma série enorme de documentos, certidões, requerimentos, guias, etc., o que obriga o comerciante a ter quási que um empregado somente para êste serviço, ou a restringir a sua acção de trabalho para andar ao serviço do Estada.

Mas ainda outros impostos são criados, como por exemplo 5 por cento sôbre todas as tarifas de bilhetes, quer terrestres quer marítimos.

A este respeito, o Sr. Barros Queiroz argumentou de uma forma interessante, dizendo que as passagens já estão caras, e, portanto não faz mal que se lancem 5 por cento.

Ora eu entendo que quando as cousas estão caras, o primeiro dever seria fazer com que elas barateassem. E não é isso o que acontece com o agravamento de impostos.

Mas entre nós os vencimentos não estão em proporção com os vencimentos dos potros países; e aumentar os preços das passagens não é justo, porque quem viaja não é sempre para se divertir, mas por necessidade dos seus negócios e por outros motivos.

Logo o imposto vem reflectir-se no preço dos géneros, em que êsses indivíduos negoceiam.

Depois vêm os 5 por cento, sôbre os seguros, que já estão sobrecarregados de impostos.

Toda, a gente sabe que os proprietários urbanos não podem segurar os seus prédios em qualquer cousa que se pareça

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com o seu valor, porque o rendimento não lhes chega para pagar os impostos a que estão sujeitos.

Referiu-se o Sr. Barros Queiroz à diferença que havia entre os seguros de acidentes de trabalho, dizendo, em justificação, que êsse seguro representava uma previdência sociaL

Mas então os outros não são também de previdência social? Eu sempre ouvi dizer que um dos primeiros deveres do Estado é contribuir para estimular tudo quanto represente previdência dos cidadãos e concorra para que a riqueza da colectividade fique assegurada.

O que se tem feito a respeito da propriedade urbana é um crime. Dia a dia, por falta de boa construção o de reparações, assistimos ao desmoronar de prédios e é nesta, altura que o Sr. Barros Queiroz vem criar mais um imposto sôbre a habitação. E eu pregunto se a habitação não é uma cousa de primeira necessidade?

Há ainda mais a criação de um imposto de 10 por cento sôbre a receita bruta dos espectáculos públicos.

Diz S. Exa. que êsse imposto não faz mal porque não recai sôbre um género, de primeira necessidade.

Mas aqueles que vivem dessa indústria podem morrer de fome?

Então isto não é agravar a economia, nacional?

Sei que hoje foi presente ao Parlamento uma representação das emprêsas teatrais, e nessa representação verifica-se que essas emprêsas não podem suportar mais encargos.

A orientação que a Câmara está a tomar, levada pela opinião do Sr. Presidente do Ministério, em matéria do impostos, representa a certeza inevitável do que vamos levar o País a uma situação verdadeiramente mais ruinosa do que aquela em que êle já se encontra.

Lançar impostos sôbre todos os géneros, embora não sejam de primeira necessidade, é uma cousa que vai deminuir o consumo dêsses géneros. Ora a deminuição dêsse consumo, longo de beneficiar o Estado, só pode agravá-lo, porque representa a deminuição de matéria colectável que se encontra nas diversas cédulas de contribuição directa. E então chegamos a

esta conclusão: a diminuição dum consumo qualquer agrava e afecta os géneros de primeira necessidade. Por exemplo: neste parecer criasse um sêlo sôbre as bebidas engarrafadas; mas, como ao mesmo tempo a Câmara discutiu na última sessão uma outra proposta, que também tem o apoio do Partido Nacionalista, criando o imposto de produção sôbre os vinhos, temos que, os vinhos engarrafados passam a ter dois impostos, dizendo se que êles não são géneros de primeira necessidade.

Ora o, que se vai dar com isso?

Vai dar-se uma deminuição no consumo dos vinhos. Independentemente dos prejuízos que isso produz, para a viticultura nacional, como pela deminuição do consumo se dará uma deminuição no preço dos vinhos, o lavrador vai naturalmente, — e isto é humano! — procurar resacir-se dos prejuízos que isso lhe causa nos outros produtos da terra, cuja deminuição de consumo é porventura menos fácil de dar-se. E êsses são os géneros de primeira necessidade.

Apoiados.

Aí tem V. Exa. como um imposto, parecendo não incidir sôbre os géneros de primeira, necessidade é exactamente sôbre êles que vai incidir, aumentando assim consideràvelmente o custo de vida.

E isto é tanto mais perigoso quanto é certo que se dá num povo, ao qual, já pela exigüidade dos vencimentos e rendimentos da maior parte da sua população, lhe é impossível deixar de restringir os seus consumos. Ora ir provocar ainda mais a deminuição do consumo é um crime para o qual o Parlamento não pode deixar de reparar!

De resto a deminuição do consumo traduz-se também numa diminuição de produção e da massa do negócios; e isto representa a deminuição da matéria colectável, onde o Estado podia encontrar receita para compensar as suas desposas. Assim, êste caminho que se quer seguir é absolutamente errado, porque dá um circulo vicioso de onde é impossível sair.

Além disso, a deminuição da produção, que há-de ser uma conseqüência fatal da situação em que o País está vivendo, trará naturalmente um problema muito grave que ainda hoje felizmente se não faz sentir: é a falta de trabalho.

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Estamos assim a criar aqui a necessidade de dentro em pouco nós termos de lutar, como alguns países já lá fora lutam, com o extraordinário encargo dos sem trabalho, para os não deixarmos morrer de fome.

Será, então, mais um encargo para o Orçamento geral do Estado, e caír-se há noutro círculo vicioso: aumentam-se os impostos para se ocorrer às subvenções, e há-de ser também para ocorrer também às pensões, e aumenta-se a circulação fiduciária; por sua vez isso há-de tornar a vida mais cara, de que resultarão novos aumentos do impostos, para ocorrer às subvenções e pensões, e novo aumento de circulação fiduciária. E assim sucessivamente.

Desta forma o caminho que se está a adoptar leva-nos absolutamente à ruína. Ir-se há caminhando dêste modo, até que o Estado, pelo aumento constante dos impostos, há-de ver deminuída a sua matéria colectável para obter as receitas que carecer, indo até o aniquilamento da matéria colectável que resistir a esta onda de impostos.

Mas êste aniquilamento tem um perigo social: o de chegarmos a ponto de precipitar mais cedo o desenlace fatal da obra da República.

Não é êste o caminho que o pais pode seguir para sua salvação e para não aumentar mais o custo da vida.

Tem de se seguir uma orientação que atraia o capital, não só nacional que emigra mas o de fora que se queira empregar, como fez a Itália, sendo ao mesmo tempo necessária uma redução feroz de despesas.

A paixão política leva muitos Deputados, não só nesta casa, mas lá fora, a não verem que o país não pode viver com as despesas do Estado e a dizerem que a deminuição das despesas é mais uma questão moral que outra cousa.

Cirando cegueira é a dêsses homens, que não vêem que é uma necessidade imperiosa fazer isso para salvar o país.

Mas, Sr. Presidente, essa salvação, o Sr. Presidente do Ministério o disse, é impossível na Republica.

S. Exa. não quere saber do» argumentos que se lhe apresentam. S. Exa. entende que a Republica só pode viver com apostos, e, assim, os tem apresentado,

e ainda tem mais para apresentar a esta Câmara.

Sr. Presidente: se isso é assim, se a República, para viver, precisa de impostos para aumentar as suas receitas, só tenho a concluir das palavras do Sr. Presidente do Ministério o das dos Srs. Deputados republicanos que a República não pode continuar, porque será a morte do país.

Todos nós temos pessoas cujo futuro nos interessa, e não podemos deixar de ver que por êste caminho a República lhes prepara um futuro desgraçado, pois está fazendo uma obra que será a sua desgraça.

£ Quando chegará a hora em que havemos de ter a serenidade precisa para ver que êste caminho de aumento de impostos é o caminho da desgraça do país, e, conseqüentemente, dos que nos são queridos?

Talvez o Sr. Presidente do Ministério tenha razão; mas, sendo assim, ternos de reconhecer então que são loucos e incompetentes todos os economistas, quando afirmam que a maior causa» do sofrimento dum povo são os pesados impostos.

A primeira cousa que devíamos fazer seria criar nova matéria colectável, e nunca sobrecarregar demais a riqueza criada.

Mas a República tem impedido a criação da riqueza. Ela tem essa responsabilidade e a responsabilidade de ter feito a desgraça e a ruína do país, sendo necessário, sem perda de tempo, mudar de orientação.

Se assim é, porque não hão-de os Deputados republicanos, pelo menos aqueles que se apresentam pertencendo a um partido que se diz conservador na República, procurar opôr-se a esta onda que tudo quere submergir? Ou dá-se o caso de, pelo facto de também serem republicanos, isso os fazer esquecer que acima da República está o país?

Apoiados.

Parece que também isso os faz esquecer que acima da paixão política deve estar a paixão pelos entes que lhes são queridos.

Creio que chegou, porém, a hora de cada um pensar serenamente neste facto. E se porventura a República não pode mudar de orientação, orientação que é a morte do país, e não pode salvar o país,

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então é a hora de pensar em que venha quem o possa salvar.

Eu só desejaria que o Sr. Presidente do Ministério o os Srs. Deputados republicanos pudessem porventura contestar com argumentos os argumentos que lhos temos apresentado.

Mas, ao contrário, S. Exa.. por números, o até por A mais B, tem demonstrado que a República pode ser a ruína dêste país.

Demonstrado que a República há-de levar-nos a uma perda inevitável, é chegada a hora do os Srs. republicanos pensarem que a República não pode continuar.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: é voz corrente que o Sr. Presidente do Ministério, ao conversar com alguém que veio junto de S. Exa. reclamar contra a criação do imposto de consumo, lho declarou que tudo lhe sorvia desde que lho trouxesse dinheiro.

Esta frase que define e caracteriza um estadista, foi a resposta do Sr. Álvaro de Castro aos representantes da lavoura, dessa classe que é a origem essencial da riqueza pública.

Como tudo o que traz dinheiro serve a S. Exa., daí resulta que êsse consagrado estadista acha escusado estudar as propostas que subscreve e que os funcionários do seu Ministério elaboram.

E, quando êsses funcionários estão na Inglaterra, há sempre quem os substitua na elaboração dos diplomas bolchevistas que o Sr. Álvaro de Castro subscreve.

Sr. Presidente: parece-me que a confissão feita pelo Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças de que não estudou determinadas propostas, nem as fez, e a declaração de S. Exa. aos representantes da lavoura de que tudo que lho dêsse dinheiro lhe servia, definem e consagram a individualidade política do Sr. Álvaro do Castro, como Chefe do Govêrno.

Pois é êste homem que tem a estulta pretensão do criar a confiança do país e do melhorar a situação aflitiva em que Portugal se encontra.

Não é um estadista dêste estofo que poderá alcançar á confiança do país, nem a

melhoria da situação cambial, nem a melhoria do custo da vida.

O Sr. Presidente do Ministério, há dias transigiu em que a proposta relativa ao imposto do sêlo baixasse à respectiva comissão para que ela omitisse o seu parecer.

Quere dizer: o Sr. Ministro das Finanças, navegando nas águas do ilustre Deputado Sr. Marques Loureiro, e sabendo a orientação que aqui preconizámos no sentido de ser votada a proposta do Sr. Marques Loureiro, acabou por nos dar razão e por demonstrar ao país que foi devido à acção persistente e tenaz dêste lado da Câmara, que se reconsiderou e se evitou uma monstruosidade.

Sr. Presidente: eu não quero entrar na apreciação das conseqüências a que nos conduziram a boa fé e as boas intenções do Sr. Barros Queiroz.

S. Exa., como presidente da comissão de finanças, dou a sua colaboração ao Sr. Álvaro de Castro.

Confesso que me entristeceu esta atitude de S. Exa. e dos outros membros do Partido Nacionalista, que estão ligando as suas responsabilidades inteiramente às dó Sr. Presidente do Ministério, depois da promessa que fizeram de oposição vigorosa o tenaz a êste Govêrno.

Eu não quero apreciar os precedentes de ordem política que giraram à volta da constituição dêste Govêrno, nem as condições em que o Sr. Álvaro de Castro se desligou do Partido Nacionalista.

Em todo o caso, pelo que aqui se disse e vem na imprensa, é realmente para estranhar que homens de valor, — como os há naquele Partido — estejam colaborando com o Govêrno em vez de por todas as formas tratarem de derrubá-lo, substituindo-o por outro que tenha condições para salvar a situação do país.

Se não fôssemos nós, nesta altura, já estariam votadas e publicadas no Diária do Govêrno todas aquelas medidas financeiras que o Sr. Ministro das Finanças apresentou à Câmara o ainda aquelas que estão na forja e que porventura brevemente serão aqui trazidas.

Entristece-me ver que o Partido Nacionalista, repito-o, dê a sua colaboração ao Governo, depois de lhe ter feito uma declaração de guerra formal e de afirmar pela boca do próprio Sr. Barros Queiroz

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que não votava nem mais $01 de impostos, em quanto se não fizesse uma eficaz redução das despesas públicas.

Quem dá a sua colaboração a um Govêrno, demonstra que êsse Govêrno lhe merece confiança, e não pode amanhã livrar-se de ter sido solidário com os seus actos.

Não só lembra a comissão de finanças, nem se lembram os ilustres membros do Partido Nacionalista de que êste Govêrno não tem feito uma economia que possa considerar-se como tal.

Efectivamente a acção económica do acta ai Ministério, tem-se limitado a suprimir verbas que já não eram gastas.

Pede, com um arrojo extraordinário, sacrifícios ao país, impõe-lhe tributos, de um radicalismo que chega a ser bolchevista, o ao mesmo tempo manda à Espanha missões e equipes de foot-ball para recreio, com a peseta a 4$.

E isto mesmo, sob o ponto de vista desportivo, que não me interessa absolutamente nada, para fazermos a figura desastrada que sabemos.

Vi nos jornais, que êsse grande estaco maior que foi à Espanha, criou uma nova taça e uma nova organização foot-bolistica, e que essa taça vai ser disputada no próximo ano.

Quere dizer, agora passam os portugueses a ir à Espanha duas vezes por ano e os espanhóis a vir cá outras duas vezes, até que se crie ainda mais uma taça.

É uma pândega, um regabofe.

E é assim que só nega ao funcionalismo público aquilo de que êle carece, dizendo-se-lhe que não se lhe dá nem mais $01, sem que o Parlamento vote as medidas de finanças!

Porque é que o Govêrno, em vez de pagar êsse regabofe a Espanha, não deu em esmolas o dinheiro que assim se gastou?

Recepções, banquetes, bailes, etc., tudo isso é muito bonito; todavia não devemos fazer estadão de um luxo que não podemos ter.

Não me consta que a Espanha tenha mandado a Portugal uma missão tam grande como a nossa, apesar de com a desvalorização da nossa moeda, a peseta para tudo chega.

Para a nossa conveniente representa-

ção não bastariam o nosso adido militar em Madrid e o comandante da equipe?

Com todo o carácter de oficial, veio também na nossa imprensa a notícia de que se projectava a viagem do Sr. Presidente da República aos Açôres e Madeira. É verdade? Não é verdade? Pelo menos, lançou-se essa notícia a título de ensaio, para ver se pegava, se no espírito público não provocaria qualquer sentimento de revolta, visto que, depois da proclamação da República, nenhum Chefe do Estado realizou tal viagem às ilhas e nem por isso os seus habitantes deixaram de ser bons portugueses.

O Sr. Ministro da Marinha não desmentiu essa notícia no Senado, como o fez aqui o Sr. Presidente do Ministério. Disse ali o Sr. Ministro da Marinha que, real-mente, lhe tinha chegado aos ouvidos tal notícia, mas que não era verdade que o Sr. Presidente da República fôsse acompanhado de uma divisão naval.

O Sr. Álvaro de Castro afirmou que a notícia não era verdadeira, mas, em todo o caso, veremos o que nos dizem os factos lá para Maio.

A comissão de finanças e, nomeadamente, o seu presidente, que, dada a sua posição, considero o principal responsável pela obra produzida, certamente se desculpam com a alegação de que quiseram evitar um mal maior.

Ora, Sr. Presidente, o caminho que tinham a seguir os membros do Partido Nacionalista que fazem àparte da comissão de finanças ou que a ela foram agregados não era evitar um mal maior, mas sim qualquer mal numa, oposição tenaz, constante, ao nosso lado, visito que estamos no bom campo para quê as medidas preconizadas pelo Governo não fossem promulgadas.

Não me quero convencer de que, se o Partido. Nacionalista não o quisesse, a proposta seria aprovada, pois, não há medida que resista a uma oposição franca e persistente de um reduzido número de Deputados, quanto mais de cinqüenta e tantos.

Achei estranha a proposta que se fez para que a comissão de finanças pudesse agregar a si os parlamentares que entendesse, para, conjuntamente, trabalharem na revisão da proposta.

Nós percebemos bem; no emtanto, o alcance desta aspiração, mas percebemo-lo

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a tempo de nos defendermos e - permita-se-me - a frase de não nos deixarmos ir no embrulho, abstraindo, é claro, de deferências de ordem pessoal a que somos muito gratos.

É caso virgem, pelo menos desde que aqui me encontro, que, havendo uma numerosa comissão de finanças, para se ocupar de um assunto de tam pouca transcendência, que o Sr. Presidente do Ministério queria que fôsse discutido imediatamente, precisasse chamar a si a colaboração do representantes de todos os agrupamentos parlamentares.

Já tive ocasião de dizer á S. Exa. e à Câmara que desde 1827 até 1902, data da tabela do sêlo à volta da qual ainda hoje giram as disposições legais subseqüentes, os Governos da monarquia se viram na necessidade de promulgar 70 diplomas — leis, decretos e portarias — sôbre matéria de sêlo.

E note S. Exa. que se deu isto no tempo em que se sabia legislar, em que havia competências em mais elevado número, no tempo em que os Ministros das Finanças liam e estudavam as propostas que subscreviam e em que, atendendo as reclamações justas, não respondiam aos reclamantes que toda a maneira de arranjar dinheiro serve.

A grande maioria dêsses diplomas não se destinavam a criar novas verbas de incidência, mas sim a aperfeiçoar, a tornar exeqüíveis as disposições anteriormente promulgadas.

Tenho aqui a nota completa dêsses diplomas, entre os quais se encontra a conhecida tabela do sêlo de Barros Gomes, que originou os também conhecidos versos do Deputado Tavares Crespo, adaptação dos versos de Tomás Ribeiro no Dom Jaime.

Pois, abstraindo já da lei n.° 1:552, de 1 do corrente, de 1902 para cá, isto é, num período de apenas vinte e dois anos, foram promulgados outros setenta diplomas sôbre sêlo, a maior parte dos quais a partir de 1910, o que mostra a incompetência dos legisladores. Em quási cem anos, visto que de 1827 parte essa legislação, foram promulgados, cento e quarenta diplomas sôbre sêlo, alguns de grande importância.

Já V. Exa. vê como o assunto é complexo e difícil de resolver e como não se

lhe pode dar uma solução com a brevidade e simplicidade que lhe querem dar, e com o voto automático da maioria desta Câmara.

Sr. Presidente: há pessoas que por factos e incidentes passados dentro desta Câmara, tudo indicava que não mais levantariam cabeça. Não se compreende que o Sr. Alberto Xavier deixasse homem por si; e o mais lamentável é que fôsse uma pessoa que politicamente não poderia ter mais um papel de destaque na política.

Sr. Presidente: quando em Setembro de 1923 foram apresentadas as bases, fixava-se o coeficiente 8, 16.

Leu.

Ao tomar conhecimento dêstes coeficientes, bem como doutras disposições dessa base que iam afectar todos os impostos, e, portanto, o imposto do sêlo, o meu ilustre amigo Sr. Carvalho da Silva mostrou a monstruosidade que a aplicação dêsses coeficientes apresentava, nomeadamente pelo que dizia respeito à contribuição predial rústica.

Daqui resultou que êstes coeficientes, que na proposta inicial eram de 8, 12 e 16, aparecem mais tarde emendados, por milagre, quando a proposta foi impressa, com a indicação dos coeficientes 8, 9 o 10, tendo a comissão proposto, nas novas bases que redigiu, que êsses coeficientes fossem de 6, 9 e 12.

Temos, portanto, na proposta inicial 8, 12 e 16, isto é, na proposta que, subscrita pelo respectivo Ministro, foi enviada para a Mesa; temos depois na proposta impressa e distribuída com o respectivo parecer os coeficientes 8, 9 e 10, o temos finalmente na proposta de substituição da comissão de finanças, na base correspondente a esta, a indicação dos coeficientes 6, 9 e 12.

Sr. Presidente: voltando-se novamente a abordar êste assunto, o meu ilustre amigo Sr. Carvalho da Silva insistiu que na proposta inicial figuravam os coeficientes 8, 12 e 16. O Ministro proponente pretendeu desmentir esta afirmação, dizendo que houvera equívoco de redacção, que a sua intenção era desde o princípio que os coeficientes fossem 8, 9 e 10. O ilustre sub-leader monárquico insistiu na sua afirmação e garantiu que tinha ouvido o Sr. Ministro das Finanças de então

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afirmar claramente que tinha proposto os coeficientes 8, 12 e 16.

Pretendeu-se novamente desmentir a sua afirmação, e eu, que não tinha duvida de que quem estava com a verdade era o meu ilustre amigo Sr. Carvalho da Silva, tive o cuidado de ir à redacção desta Câmara consultar a tradução dos discursos e encontrei nessa tradução a demonstração absoluta de que quem dizia a verdade era o ilustre sub-leader monárquico e que quem estava fora da verdade era quem o tinha desmentido.

Sr. Presidente: na sessão n.° 144, de 26 de Setembro de 1923, o então Ministro das Finanças disse o seguinte, que se encontra a folhas 220 das traduções:

Leu.

Aqui está, portanto, a confirmação daquilo que foi afirmado pelo Sr. Carvalho da Silva em a aparte» ao Sr. Ministro das Finanças.

Confirma-se, portanto, inteiramente, não podendo haver equívocos, que o Ministro das Finanças de então propôs inicialmente que os coeficientes fossem 8, 10 e 16, e não 8, 9 e 10; quere dizer; demonstrou-se mais uma vez que alguma cousa havia de lucrar o país com a fiscalização da minoria monárquica.

O mais curioso ainda é que êsse Ministro, propondo os coeficientes 8, 12 e 16, veio afirmar depois que o nosso pais era o país da Europa que estava mais sobrecarregado.

Isto serve para demonstrar a V. Exa., Sr. Presidente, que nunca àqueles que são realmente trabalhadores e estudiosos escapam os erros, os equívocos, as erradas suposições, como era errada a suposição que se dava num caso desta natureza.

De maneira que isto quê trago à Câmara só serve para demonstrar que nós aqui estamos sempre com a verdade e que aqui há quem tenha o conhecimento exacto dos resultados da promulgação de medidas desta natureza.

V. Exas. calculam como é diferente propor para a contribuição predial rústica, em vez dos coeficientes 8, 12 e 16, os coeficientes 8, 9 e 10.

Isto serve para mostrar ao Sr. Álvaro de Castro-que se se incorre em faltas desta natureza quando se é o próprio autor das propostas, a que fará com aquelas

que S. Exa. nem sequer lê, limitando-se a assiná-las e enviá-las para a Mesa.

Sr. Presidente: a comissão de finanças, com os respectivos agregados, num entendimento talvez único, desde que me encontro nesta casa do Parlamento, da parte daqueles que não estão com o Govêrno duma maneira incondicional, havendo sempre o cuidado de assinar com restrições quando não se é vencido inteiramente, a comissão de finanças, repito, numa harmonia de vistas verdadeiramente enternecedora, abrindo os seus braços carinhosos ao Sr. Ministro das Finanças, arvorando-se em sua tutora, procurando dar a S. Exa. um pouco da noção do seu papel e das suas funções, a comissão de finanças, numa unanimidade de vistas digna de registar, foi à proposta que estava sendo discutida e que era a quarta ou quinta posterior à proposta inicial do ilustre Deputado Sr. Velhinho Correia, e procurou expurgar dela os seus defeitos os seus males e reconstituir uma contra proposta, como aqui se lhe chama, que até certo ponto vai satisfazer as aspirações do Sr. Ministro das Finanças, porque, com efeito, procura dar-lhe aquela receita que S. Exa. julga precisa para poder conduzir a barca governamental.

Eu, Sr. Presidente, se isto não é indiscrição, pedia ao Sr. presidente da comissão de finanças, Sr. Barros Queiroz, o favor de me informar qual é a receita provável em resultado da votação da contra-proposta apresentada pela comissão de finanças.

O Sr. Barros Queiroz: — Não conheço com exactidão essa receita, mas suponho que deve dar 15:000 a 20:000 contos.

O Orador: — É natural que o Sr. Barros Queiroz use de novo da palavra, na generalidade ou especialidade; e então por certo aproveitará essa ocasião para dizer à Câmara em que dados se funda para fazer o seu cálculo de 15:000 ou 20:000 contos.

Em todo o caso, devo dizer que há grandes financeiros, sobretudo no Ministério das Finanças, que fazem os seus cálculos desta maneira: nós vamos multiplicar o imposto do sêlo por 5, como ele deu 10:000 contos passará a dar 50:000 contos.

Ora isto que é assim para as altas capacidades financeiras que estão colabo-

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rando com o Sr. Ministro das Finanças, não o é para o Sr. Barros Queiroz, com certeza, e para aqueles que tenham uma noção, pequena que seja, de assuntos desta natureza; porque toda a gente sabe que o aumento do imposto provoca sempre uma fuga grande e, portanto, o seu decréscimo. Eu aponto à Câmara, por exemplo, o que está sucedendo com os cartazes de teatro: os cartazes de teatro pagavam um determinado sêlo, mas veio a nova lei e ficaram pagando a exorbitância de 5$ cada.

Naturalmente o Sr. Álvaro de Castro ficou esfregando as mãos de contente com a grande receita que daí adviria; porém, os empresários de teatro que não estiveram para brincadeiras, reuniram-se e resolveram fazer a pirraça a S. Exa. de não mandarem afixar mais cartazes.

Aqui tem V. Exa. como é difícil fazer hoje em dia cálculos sobre e rendimento de qualquer imposto.

A verba dos cartazes que suponho que era importante, ficou absolutamente anulada, e há mais: ficaram sem ocupação aqueles que se dedicavam à indústria da afixação de cartazes, e até porventura o Estado ficou sem a receita do aluguer dos locais onde era costume fazer-se essa afixação.

Aqui tem V. Exa. um caso que serve de exemplo flagrante para demonstrar como são falhas de base segura todas as conjecturas que se formem acerca da produtividade dos novos impostos.

E quere V. Exa. exemplo mais frisante que aquele que se deu com o imposto sôbre o valor das transacções?

Quere-se um êrro maior entre as previsões do Ministro de então e a realidade dos factos?

Apoiados.

Vejam V. Exas. o que se previu e o que êle deu, é como no relatório do orçamento dêste ano.

O Sr. Barros Queiroz: — V. Exa. dá-me licença?

É simplesmente para observar a V. Exa. que êsses cálculos saíram errados apenas para algumas pessoas, porque outras afirmaram que êles já estavam errados.

Eu tive ocasião de demonstrar que o imposto de transacções não daria nunca o que se supunha.

O Orador: — Sr. Presidente: ainda na mesma ordem de ideaa eu apresento um exemplo a V. Exa. e que constituirá a demonstração completa de que todas as suposições, todos os cálculos que se formulem acerca dêste imposto são inconsistentes.

E proposto aqui o aumento da taxa do papel selado e reincide-se no êrro de elevar a 1:500 a taxa de sêlo, e como no papel selado é proposta aqui também mas nisso não faço reparo tam grande porque não acho emfim uma exorbitância a elevação da taxa do sêlo de recibos a Viçou o que representa em cada conto a verba de 1$ que sinceramente confesso não acho exagerada e até quando se discutiram as outras tabelas eu estranhei, sempre que se continuasse a pagar nos selos de recibo as verbas proporcionais estabelecidas na tabela e que faziam com que por um conto se pagasse $35.

Não acho exagerado.

Em todo o caso, se o ilustre Deputado Sr. Barros Queiroz tivesse em seu poder dados estatísticos suficientemente desenvolvidos sôbre a receita obtida no papel selado e sôbre a receita obtida nos selos de quitação e quisesse fazer o cálculo aproximado do aumento que essa receita sofreu em relação à elevação dessas, taxas, S. Exa. não o podia fazer duma maneira conscienciosa porque, Sr. Presidente, são daquelas taxas em que, por assim dizer, se pode dar maior número de quebras, maior número de fugas ao imposto.

V. Exa. não ignora que apesar da taxa de sêlo de recibos não ser elevada até aqui, entre particulares, além de se divulgar cada vez mais o pagamento de ocasião, transação contra dinheiro, se dá a circunstância de na ocasião em que se apresentam facturas à cobrança o devedor, o que paga, se satisfazer em regra com a declaração de liquidado o a com qualquer outra forma que não possa servir de pretexto para que os fiscais de impostos não apliquem multa por falta de sêlo.

E isto não se passa só aqui — passa-se em Espanha e em Itália.

Cada país tem o seu termo consagrado. Na Itália o que em regra se lança nas facturas é a nota de anulado ou sem efeito.

Isto que se dava na vigência das taxas

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antigas, vai agora tornar ainda maior a fuga a êsse imposto de sêlo de recibos.

O papel selado nos tempos ominosos custava 100 reis, e em 1918 passou para o preço do $15. Posteriormente foi elevado a $30. Depois a Casa da Moeda alegou que o papel era muito caro e por um decreto ou portaria, passou o preço a ser de $33.

A comissão de finanças, o ano passado, propunha a multiplicação por 12 das taxas da tabela de 1912.

Nessas condições o papel selado passava a custar 1$20. Depois foi essa proposta retirada e o Sr. Álvaro de Castro propunha que a multiplicação da taxa de 1902 fôsse por 15. Assim, cada meia folha do papel selado passaria a custar 1$50.

Felizmente a Câmara resolveu por unanimidade que a taxa do papel selado não fôsse superior a 1$.

Eu pregunto ao Sr. Sarros Queiroz que razão houve para que a comissão de finanças entenda agora que aquele preço devia ser elevado a 1$50?

O papel selado — como dizia o mestre — é a lagezinha de toda a actividade administrativa; o papel selado para os certificados, para requerimentos, para tudo que se trata não só nos tribunais, mas de todos os actos da vida pública que tenham um carácter oficial.

Tudo necessita de papel selado até os próprios mortos para se certificar que morreram.

O Sr. Morais Carvalho (em àparte): — Se não, não vão para o outro mundo!

Risos.

O Orador: — Eu vou apresentar a V. Exa. um exemplo: para uma minuta que tive de fazer tive de pagar só de papel selado 33$.

Para que se mantém esta excepção?

É claro que o Sr. Barros Queiroz é o maior responsável na proposta em discussão.

O Sr. Barros Queiroz (interrompendo): — Eu não sou o Ministro nem o relator!

O Orador: — Se V. Exa. não é o Ministro nem é o relator, é pelo menos uma pessoa que tem responsabilidades quando

põe a sua assinatura em qualquer documento não é capaz de assinar de cruz aquilo que lhe apresentam. Mas ha uma outra circunstância: é que V. Exa. foi o primeiro que assinou o parecer e não o fez vencido.

Suponhamos um indivíduo que precisa de dinheiro para matar a fome. O único recurso que tem é hipotecar o seu prédio; e assim trata de fazer o seu contrato e um determinado capitalista. Porém, para arranjar todos os documentos precisos, para fazer essa hipoteca V. Exa. e a Câmara estão vendo que êsse desgraçado com papel selado, e o imposto de sêlo, terá de gastar aproximadamente dez vezes a renda anual que recebia pelo prédio.

Para isto eu chamo a atenção do Sr. Presidente da comissão de finanças o Sr. Barros Queiroz, assim como a atenção dos restantes membros da dita comissão, isto é, para os nossos financeiros inteiramente desconhecidos até agora, como por exemplo o Sr. Júlio de Abreu, que não conhecia como financeiro, embora seja. uma pessoa muito inteligente; o Sr. Vergílio Saque, que também o não conhecia como financeiro, Delfim Lopes, Jaime de Sousa, C. da Fonseca e mesmo o Sr. Pedro Pita que se bem que seja uma pessoa muito inteligente e a que não são extranhos quaisquer assuntos, em todo o caso não se tem dedicado a assuntos desta natureza.

Não posso também, Sr. Presidente, deixar de chamar a atenção da comissão de finanças para a verba relativa ao imposto das obrigações.

Eu, Sr. Presidente, não sou director, nem accionista, nem obrigacionista da Companhia Geral do Crédito Predial Português; porém, devo dizer em abono da verdade que ela não se encontra nas condições de quaisquer outras sociedades, tendo até hoje prestado relevantes serviços.

Daqui resulta um prejuízo para o devedor, visto que o valor da obrigação na; ocasião da emissão é superior ao da cotação, e ainda porque ficando o Crédito Predial obrigado a um sêlo 5/1000, esta importância vem onerar mais esta instituição de que qualquer outra de natureza diferente.

Parece-me que êste ponto deve ser pon

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derado pelo Sr. Presidente da comissão do Finanças pois, estou certo, de que encontrará fàcilmente maneira de isentar desta contribuição o Crédito Predial, visto que vem agravar a situação daqueles que àquela companhia recorrem.

O Sr. Barros Queiroz (interrompendo): — V. Exa. dá-me licença?

O Crédito Predial, goza de um privilégio que, em qualquer outro país, valia muito dinheiro. Não paga nada ao Estado, e não há razão, portanto, para o isentar dessa pequena quantia, que é apenas de $50 centavos por cada 100$.

Como o valor nominal das acções é de 90$, passam a pagar $45 de sêlo e 1$80 de comissão.

Trava-se diálogo entre o orador e vários Srs. Deputados.

O Orador: — O Sr. Tomé de Barros Queiroz afirma que essa instituição goza vantagens e privilégios que nenhuma outra tem. Mas nós vemos que emquanto outros organismos similares se tem desenvolvido extraordinariamente o Crédito Predial caminha apagadamente, embora com certo desafogo.

O Sr. Barros Queiroz: — As informações que V. Exa. possui acerca da situação do Crédito Predial não devem ter chegado até V. Exa. nesses termos, visto que o próprio administrador dessa instituição perante a comissão se conformou com a sua atitude.

O Orador: — Mas vamos à análise da proposta. O seu artigo 4.° por exemplo, diz:

Leu.

A comissão esqueceu-se de que estão aqui mencionadas taxas que já estavam sujeitas ao multiplicador. Uma delas refere-se aos clubes cuja taxa já estava fixada em 10$. Essa taxa, sujeita no multiplicador que agora se propõe, elevar-se-ia a 50$.

Eu não sou freqüentador de clubes, nem a êles pertenço. Sou por isso insuspeito quando afirmo que essa taxa é exagerada.

Creio que há um engano no que diz respeito a clubes, porque o que está é exagerado.

Sr. Presidente: é também interessante ver o aspecto da questão no que se refere a bebidas alcoólicas e vinhos generosos. Parece-me caminho errado.

Que autoridade teremos nós para pedir à França que deminua os seus encargos fiscais para os nossos vinhos só nós somos os primeiros a aumentá-los no nosso país?

Amanhã os mixordeiros podem ter conhecimento pelos jornais do que nós aumentámos os direitos sôbre vinhos comuns e generosos, e certamente vão ao Ministro da Agricultura de França e procuram decerto impor-se-lhe ao seu espírito, dizendo que Portugal aumentou os impostos sôbre os seus vinhos.

Êste aumento produzirá certamente um efeito moral naquele país com respeito às nossas pretensões sôbre esta questão.

Note, porém, a Câmara que se eu fôsse produtor de vinhos comuns não teria grande interêsse com o mercado de França, O grande mal para nós foi, emquanto durou a guerra e houve essa grande corrente de exportação de vinhos para França, não termos aproveitado e procurado outros grandes mercados, que, alcançados que fossem, faziam com que não tivéssemos de nos preocupar com a guerra de tarifas que a França nos está fazendo neste assunto.

A êste respeito tenho ouvido dizer que se tem feito muita cousa, mas nada aparece feito até hoje.

A guerra de tarifas não foi feita só a nós. Mas com os outros países a questão já está resolvida.

A Grécia já alcançou a suspensão dessa situação.

É a verdade revelada em anúncios publicados nos jornais.

Emquanto não estiver votado o tratado com a França a situação é a mesma.

Dos três países a quem se move a campanha, Portugal é o único que não assinou o modus vivendi, porque a razão da campanha contra nós é exactamente pela qualidade e boa colocação, que têm os vinhos portugueses.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros tem-nos dito aqui boas palavras, mas até agora nada de convénio.

A propósito da laxa de sêlo estabelecida de novo sôbre os vinhos engarrafados direi que ela é uma espécie do im-

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pôsto de consumo, agravando o custo da produção. O mesmo nas aguardentes...

O Sr. Barros Queiroz: — Não. É só sôbre a aguardente engarrafada.

O Orador: — ... necessárias para o tratamento de vinhos. Portugal atravessa uma crise, e é obrigado a pagar novos impostos que, embora não sejam pagos pelo produtor, vêm agravar a crise existente, por todos irem incidir não só no produtor mas no consumidor.

Primeiro para o produtor, depois para o consumidor, e para o produtor, pois êste é também consumidor, o porque é natural que o consumidor conheça o produto.

De maneira que já aqui foram apontadas estas incidências gerais sôbre os próprios vinhos, embora não sejam géneros de primeira necessidade.

Nós não temos aquela liberdade que outras nações tem, quando é certo que, se não foram suas inimigas durante a guerra, foram indiferentes à sorte da França.

Outro caso é o dos selos de arrendamento, que até aqui eram proporcionais degressivos. São agora progressivos.

Aqui, pela tabela de 1921, os arrendamentos pagavam:

Leu.

Agora propõe-se uma taxa proporcional de 4 por mil. Evidentemente que isto representa um agravamento.

O Sr. Presidente: — Como faltam apenas dois minutos para se encerrar a sessão, pregunto a V. Exa. se deseja terminar o seu discurso ou ficar com a palavra reservada.

O Orador: — Peço a V. Exa. que me reserve a palavra.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Fica V. Exa. com a palavra reservada.

A sessão continua às 22 horas. Está interrompida a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.

Eram 22 horas.

O Sr. Presidente: — Continua com a palavra o Sr. Cancela de Abreu.

O Sr. Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: muitas mais considerações acerca da matéria em discussão desejaria fazer mesmo porque num determinado número de pontos eu desejo ouvir a opinião autorizada do presidente da comissão de finanças, Sr. Barros Queiroz, o principal responsável pela proposta em discussão e suas conseqüências; mas, como na especialidade tenho muito tempo para o fazer, termino por aqui as minhas considerações, enviando para a Mesa a minha moção que é concebida nos seguintes termos:

«A Câmara, reconhecendo que a discussão e votação precipitadas de novos impostos mais agrava a já incompatível situação dos contribuintes, continua na ordem do dia».

O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que admitem a moção que acaba de ser lida na Mesa, queiram levantar se.

Foi admitida.

O Sr. Morais Carvalho: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°

Procedeu-se à contraprova.

O Sr. Presidente: — Estão sentados 23 Srs. Deputados e de pé 6.

Não há número. Vai proceder-se à chamada.

Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente: — Está encerrada a votação.

Disseram «admito» 11 Srs. Deputados, e «rejeito» 23.

Disseram «admito» os Srs.:

Carlos Cândido Pereira.

Custódio Maldonado de Freitas.

João José da Conceição Camoesas.

João Vitorino Mealha.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Carvalho dos Santos.

José Pedro Ferreira.

Paulo Cancela de Abreu.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Tomé José de Barros Queiroz.

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Disseram «rejeito» os Srs.:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Ferreira Vidal.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Américo Olavo Correia, de Azevedo.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Correia.

António Tais da Silva Marques.

António Resende.

Artur de Morais Carvalho.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.

Custódio Martins de Paiva.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Mendes Nunes Loureiro.

Lourenço Correia Gomes.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Plínio Octávio Sant'Ana e Silva.

Sebastião Herédia.

Vergílio Saque.

O Sr. Presidente: — Não há número.

A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com.a seguinte ordem de trabalhos:

Antes da ordem do dia: A de hoje.

Ordem do dia:

Parecer n.° 584, que modifica a tabela do imposto de sêlo;

Interpelação do Sr. Vitorino Guimarães ao Sr. Ministro das Finanças;

Os restantes hoje na tabela.

Está encerrada a sessão.

Eram 22 horas e 15 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Projecto de lei

Do Sr. Manuel de Sousa Coutinho, criando no Ministério da Guerra um serviço de inspecção às condições de segurança dos prédios urbanos da cidade de Lisboa.

Publique-se no «Diário do Governo» e volte para ser submetido, à admissão.

Pareceres

Da comissão de finanças, sôbre os n.ºs 600-E e 620-H, que concedem a todas as viúvas e órfãos de oficiais em designadas condições a pensão mensal de 3$ da carta de lei de 20 de Junho de 1880 e os benefícios das leis n.ºs 880 e 1:311.

Imprima-se.

Da comissão de legislação civil e comercial, sôbre o n.° 526-E, que constitui uma freguesia com sede em Queluz.

Imprima-se.

O REDACTOR—João Saraiva.

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