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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 134

EM 30 DE JULHO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Francisco da Cruz.

Sumário. — Abertura da sessão. Leitura da acta. Correspondência.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Francisco Cruz faz algumas considerações sôbre a necessidade de discutir a proposta de lei relativa às estradas, requerendo que seja dada para a ordem do dia da sessão imediata.

O Sr. Jaime de Sousa ocupa-se da forma como se está fazendo na Alfândega de Ponta Delgada a cobrança do imposto de transacções.

O Sr. Viriato da Fonseca manda para a Mesa um parecer da comissão de guerra, explicando as razões por que está apenas assinado por quatro membros da mesma comissão.

O Sr. Lelo Portela chama a atenção da Sr. Ministro da Guerra para a situação em que se encontra a aviação militar.

Responde-lhe o Sr. Vieira da Rocha (Ministro da Guerra), que envia para a Mesa uma proposta de lei, pedindo para ela a urgência e a dispensa do regimento.

Volta a usar da palavra, para explicações, o Sr. Lelo Portela.

São aprovadas a urgência e a dispensa do regimento requeridas pelo Sr. Ministro da Guerra para a sua proposta, entrando esta em discussão, depois de lida na Mesa.

Usam da palavra os Srs. Dinis da Fonseca e Viriato da Fonseca.

O Sr. Hermano de Medeiros (para interrogar a Mesa) estranha que se tenha preterido a discussão do projecto de lei sôbre o porto artificial de Ponta Delgada.

Responde-lhe o Sr. Presidente.

Segue-se no uso da palavra o Sr. Morais de Carvalho.

O Sr. Presidente anuncia que vai passar-se à ordem do dia.

Ordem do dia. — É aprovada a acta. É concedida uma licença. É aprovado o requerimento do Sr. Francisco Cruz.

Efectuada a contraprova requerida pelo Sr. Francisco da Cruz

Nunes Loureiro, tendo sido invocado o § 2.º do artigo 11.º do Regimento pelo Sr. Pedro Pita, verifica-se que o requerimento do Sr. Francisco Cruz é aprovado por 17 Srs. Deputados e rejeitado por 42.

O Sr. Presidente do Ministério requere que entrem imediatamente em discussão os pareceres n.ºs 731, e 754.

É aprovado.

Lido na Mesa o parecer n.° 731, é aprovado na generalidade, sem discussão.

É aprovado sem discussão o artigo 1.º

O Sr. Francisco Cruz usa da palavra para interrogar a Mesa, respondendo-lhe o Sr. Presidente.

Lido na Mesa o artigo 2.°, usa da palavra o Sr. Sá Cardoso que manda para a Mesa uma proposta de substituição.

É admitida.

Usam em seguida da palavra es Srs. Carvalho da Silva e Rodrigues Gaspar (Presidente do Ministério) que envia para a Mesa uma proposta de emenda.

É admitida, e em seguida são aprovadas as propostas dos Srs. Sá Cardoso e Rodrigues Gaspar.

É aprovado o artigo 2.°, salvas as emendas.

São aprovados os restantes artigos do projecto em discussão e dispensada a leitura da sua última redacção a requerimento do Sr. Carlos Pereira.

Entra em discussão o parecer n.º 734, depois de ter usado da palavra para interrogar a Meta o Sr. Hermano de Medeiros, a quem responde o Sr. Presidente.

Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Sá Cardoso e Rodrigues Gaspar (Presidente do Ministério).

Volta a usar da palavra, para explicações, o Sr. Carvalho da Silva.

É aprovada a generalidade do parecer em discussão.

São aprovados sem discussão os artigos 1.° e 2.°

Efectuando-se a contraprova da votação dêste último artigo, a requerimento do Sr. Carvalho da Silva, que invoca o § 2.º do artigo 116.° do Regi-

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mento, verifica-se ter sido aprovado por 60 votos contra 4.

É aprovado sem discussão o artigo 3.°

O Sr. Rodrigues Gaspar (Presidente do Ministério) requer e que entre imediatamente em discussão o parecer n.° 757.

É aprovado, entrando em discussão.

Lido na Mesa, usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Presidente do Ministério, Carvalho da Silva e Morais de Carvalho, sendo aprovada em seguida a generalidade do parecer em discussão.

Entrando em discussão o artigo 1.º, o Sr. Presidente envia para a Mesa uma, proposta de emenda.

Usa da palavra para interrogar a Mesa, o Sr. António Correia.

É aprovada a emenda do Sr. Presidente do Ministério.

É aprovado o artigo 1.°, salva a emenda.

É aprovado o artigo 2.°

Ô Sr Pereira da Silva (Ministro da Marinha) requere que entrem imediatamente em discussão os pareceres n.ºs 794 e 637.

O Sr. Cunha Leal requere que lhe seja dada a palavra para um negócio urgente.

É rejeitado.

Efectuada a contraprova, requerida pelo Sr. Hermano de Medeiros, com invocação do § 2.° do artigo 116 ° do Regimento, verifica-se ter sido aprovado por 23 votos e rejeitado por 37.

É aprovado o requerimento do Sr. Ministro da Marinha, tendo usado da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Pedro Pitu e Presidente do Ministério.

Entra em discussão o parecer n.º 794, usando da palavra o Sr. Pedro Pita.

O Sr. Jaime de Sousa manda para a Mesa um parecer da comissão de marinha.

Segunda parte da ordem do dia.—(Continuação da discussão do parecer n.° 761, sôbre inquilinato).

Usam da palavra os Srs. Morais de Carvalho, Carlos de Vasconcelos, Pinto Barriga e João Camoesas.

Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Pamplona Ramos chama a atenção do Sr. Ministro da Instrução para a desigualdade de tratamento que se quere adoptar ao magistério dalgumas disciplinas.

Responde-lhe o Sr. Abranches Ferrão (Ministro da Instrução}.

O Sr. Garcia Loureiro chama a atenção do Sr. Ministro da Instrução para o funcionamento da Junta Escolar de Elvas, respondendo-lhe o Sr. Abranches Ferrão,

O Sr. Carvalho da Silva dirige algumas considerações ao Sr. Ministro das Finanças sôbre o modo como está sendo feita a cobrança da contribuição predial urbana.

Responde-lhe o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. António Correia ocupa-se da situação precária dos reformados da Guarda Fiscal, respondendo-lhe o Sr. Ministro das Finanças (Daniel Rodrigues).

O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão às 15 horas e 25 minutos.

Presentes à chamada 40 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 49 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Alberto Ferreira Vidal.

Alberto Lelo Portela.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Álvaro Xavier de Castro.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Amaro Garcia Loureiro.

António Albino Marques de Azevedo.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Dias.

António Pais da Silva Marques.

António Vicente Ferreira.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Carlos Cândido Pereira.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Custódio Martins de Paiva.

Francisco da Cruz.

Francisco Dinis de Carvalho.

Jaime Júlio de Sousa.

João Baptista da Silva.

João José da Conceição Camoesas.

João Salema.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Cortês dos Santos.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

José Pedro Ferreira.

José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.

Luís António da Silva Tavares do Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Manuel Alegre.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Sebastião de Herédia.

Valentim Guerra.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

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Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António de Abranches Ferrão.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Correia.

António Ginestal Machado.

António Lino Neto.

António Maria da Silva.

António de Mendonça.

António do Paiva Gomes.

António Pinto de Meireles Barriga.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.

Constâncio de Oliveira.

Delfim Costa.

Ernesto Carneiro Franco.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Hermano José de Medeiros.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

João Estêvão Águas.

João Luís Ricardo.

João de Ornelas da Silva.

Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.

Joaquim Dinis da Fonseca.

José António de Magalhães.

José Carvalho dos Santos.

José Domingues dos Santos.

Júlio Gonçalves.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel de Sousa Coutinho.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Matias Boleto Ferreira de Mira»

Pedro Góis Pita.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Vasco Borges.

Vergílio Saque.

Vitorino Henriques Godinho.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Marques Mourão.

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso Augusto da Costa.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto Xavier.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Américo da Silva Castro.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Resende.

António de Sousa Maia.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Artur Brandão.

Augusto Pereira Nobre.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Custódio Maldonado de Freitas.

David Augusto Rodrigues.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Domingos Leite Pereira.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco da Cunha Rogo Chaves.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Germano José de Amorim.

Jaime Duarte Silva.

Jaime Pires Cansado.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João José Luís Damas.

João Pereira Bastos.

João Pina de Morais Júnior.

João de Sousa Uva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim Brandão.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge Barros Capinha.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Marques Loureiro.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José de Oliveira Salvador.

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4 Diário da Câmara dos Deputados

Júlio Henrique de Abreu.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel Duarte.

Manuel de Sousa da Câmara.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mariano Martins.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mário de Magalhães Infante.

Maximino de Matos.

Nuno Simões.

Paulo Cancela de Abreu.

Paulo da Costa Menano.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomás de Sousa Rosa.

Tomo José de Sarros Queiroz.

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio da Conceição Costa.

Às 15 horas e 15 minutos começou a fazer-se a chamada.

O Sr. Presidente: — Está aberta a sessão.

Estão presentes 40 Srs. Deputados.

Foi lida a acta.

Leu-se o seguinte

Expediente

Oficio

Do Senado, enviando uma proposta de lei que reorganiza os serviços do Ministério da Instrução Pública.

Para as comissões de instrução superior, secundária, instrução primaria e especial e técnica, conjuntamente.

Telegramas

Da Junta Geral do Distrito de Viseu, apoiando o projecto do Sr. Baltasar Teixeira.

Para a Secretaria.

Do Grupo dos Modestos, pedindo a abolição do § 2.° do artigo 1.° do projecto de lei do inquilinato.

Para a Secretaria.

Do professorado primário do Pôrto, sem colocação, pedindo protecção para as suas reclamações.

Para a Secretaria.

Da Mesa do Hospital de Vieira, implorando a conservação dos bens imóveis que lhe foram doados.

Para a Secretaria.

Representações

Da Câmara Municipal de Faro, pedindo um diploma para poder exigir das emprêsas mineiras o pagamento do imposto ad valorem pelos minerais e derivados exportados.

Para a Secretaria.

Da Federação dos Bombeiros Portugueses, pedindo que as associações e corporações de bombeiros sejam abrangidas pelas disposições do § 2.° do artigo 1.° e § 3.° do artigo 5).° da lei do inquilinato.

Para a comissão de legislação civil e comercial.

O Sr. Francisco Cruz: — Desejava usar da palavra quando estivesse presente o Sr. Ministro do Comércio; mas não o estando, reservo as minhas considerações para quando S. Exa. esteja presente.

É por isso peço a V. Exa. que me reserve a palavra para outra ocasião.

Aproveito o uso dá palavra para pedir à Câmara que realize aquela obra tam necessária ao progresso do país, discutindo e votando o projecto de lei das estradas que há muito tempo está na ordem do dia, e que dia a dia é preterido pelos meus colegas, que requerem a discussão de projectículos interessando à sua política de compadrio e, portanto, sem utilidade para o país.

Por isso quero lavrar o meu protesto pela demora na discussão de uma lei que tam urgente é para a economia do país.

As estradas são um meio formidável para o desenvolvimento e prosperidade do país, pois que os produtos precisam de circular, para abastecerem os mercados.

Vou, pois, pôr à prova a Câmara, fazendo um requerimento que V. Exa. submeterá à apreciação da Câmara, na devida altura, para que o projecto de lei sôbre estradas entre em discussão em se-

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guida à lei do inquilinato, sendo inscrito em, primeiro lugar na ordem do dia.

É vexatório, criminoso, que se esteja pagando um imposto para estradas, precisando estas de reparação, porque se encontram intransitáveis.

Ainda ontem o Sr. Pedro Pita se referiu à forma atrabiliária e vergonhosa como decorrem os trabalhos parlamentares.

Visto estar no uso da palavra, chamo a atenção do Sr. Presidente do Ministério para a forma como correm os serviços nas várias repartições do Estado, onde muitos assuntos estão sem solução.

Chamo, pois, a atenção dos Srs. Presidente do Ministério e dos outros membros do Govêrno, para que, dada a sua boa vontade de acertar, providenciem no sentido de que os variados assuntos pendentes de solução nos diversos Ministérios sejam resolvidos para honra e prestígio do regime e de nós todos.

Peço a V. Exa. para consultar a Câmara, a fim de entrar amanhã, na primeira parte da ordem do dia, a proposta das estradas.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Jaime de Sousa: — Desejava fazer algumas considerações com respeito ao Ministério das Finanças, no que se refere a uma cobrança de 70 por cento, na Alfândega de Ponta Delgada, contra a qual estou recebendo reclamações.

O Sr. Carlos Pereira: — Esse aumento já foi tratado por vários Ministros, havendo despachos para não se cobrar êsse adicional.

O Orador: — A interrupção, muito a propósito, do Sr. Carlos Pereira, mais vem confirmar o que vinha dizendo; mas o que muito admira é que na Direcção Geral das Alfândegas me dissessem que não havia lá reclamações.

Desejava pois que o Sr. Ministro providenciasse no sentido de não cobrarem êsse imposto.

Pedia também a V. Exa. para pôr em discussão o projecto das Juntas Autónomas de Ponta Delgada, que por qualquer alteração foi mudado de lugar.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — A ordem de inscrição é a seguinte: Leu.

O Orador: — Eu concordo com a oportunidade do projecto n.° 794, e desejo que êle seja discutido ràpidamente.

O Sr. Viriato da Fonseca: — Mando para a Mesa um parecer da comissão de guerra, mas que não tem as assinaturas precisas.

Há seis dias que eu ando a ver se consigo assinaturas, mas alguns membros dessa comissão já dela não fazem parte, como o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. António Maia; outros estão doentes; de forma que é preciso que V. Exa. faça substituir os membros que faltam.

Eu cumpro o meu dever enviando o parecer para a Mesa.

O orador não reviu.

O Sr. Lelo Portela: — Pedi a palavra com a presença do Sr. Ministro da Guerra; o, sendo a primeira vez que me dirijo a S. Exa. nesta Câmara, cumpro gostosamente o meu dever apresentando os meus cumprimentos a um oficial brioso e distinto como o Sr. Ministro da Guerra, que, pelo seu valor, lealdade e coragem, mereceu as mais eloqüentes referências de Mousinho de Albuquerque.

Sr. Presidente: cumprimentando o Sr. Ministro da Guerra e sabendo antecipadamente que S. Exa. é um oficial que deseja ^honrar o lugar que ocupa e prestigiar o exército, eu chamo a atenção de S. Exa. para a situação em que se encontra actualmente a aeronáutica militar.

São conhecidos da Câmara e do país os acontecimentos que se desenrolaram na Aeronáutica Militar, e as conseqüências que daí advieram, determinando que êsse departamento das instituições militares fôsse dissolvido.

Foi com muita mágoa e tristeza que constatei, ao ler o parecer da comissão do orçamento relativo ao Ministério da Guerra, que todas as verbas destinadas à Aeronáutica Militar, tanto para o material como, para o pessoal técnico, haviam sido eliminadas.

Não se compreende que possa actualmente existir um exército sem aviação

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nem aeronáutica, e estou convencido de que o Sr. Ministro da Guerra não deixará de olhar com o cuidado necessário para esta questão, tornando as medidas necessárias para pôr um termo a êste estado de cousas. Assim, tenho a convicção de que S. Exa. vai reorganizar a aviação militar, aproveitando os elementos que nela existem e criando outros.

Devo, contudo, chamar muito especialmente a atenção do Sr. Ministro da Guerra para os graves prejuízos de ordem material, e até pessoal, que resultam do facto de se encontrarem nos cais trinta aviões que não têm actualmente o pessoal especializado para os poder experimentar e ver se satisfazem às condições das casas contratantes.

Mas os prejuízos de ordem pessoal não são menores, visto que encontrando-se actualmente os oficiais de cavalaria e de infantaria a fazer serviço na aviação, e os oficiais da aviação a fazer serviço em cavalaria e infantaria, uma grande parte dos nossos pilotos, tendo ainda pouca prática, perde por completo o treino adquirido por falia de elementos de vôo. Assim, se amanhã êsses indivíduos tiverem de ser novamente aproveitados, terão de começar a sua instrução.

Sr. Presidente: não quero alongar-me nas minhas considerações, e estou convencido de que o Sr. Ministro da Guerra há-de olhar com atenção para o assunto que acabo de expor-lhe, satisfazendo o país e o exército a que preside,

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Vieira da Rocha): — Sr. Presidente: é a primeira vez que tenho a honra de falar nesta Câmara, e sinto não ter os dotes oratórios que atraem as multidões, o que só os grandes privilegiados do dom da palavra podem fazer, individualidades estas que, como os grandes artistas da pintura, da música ou do mármore, fazem extasiar os ouvintes ou os observadores em fronte das suas obras primas.

Tenho de limitar as minhas exposições ou discursos às fórmulas simples da análise e da sintaxe, nos termos vulgares, terra a terra, dos assuntos concretos a tratar; mas se me faltam os dotes oratórios, não me faltam aqueles de
apresentar a V. Exa., Sr. Presidente; as minhas saudações pelo lugar que V. Exa. desempenha nesta Câmara, saudações de muita consideração e respeito pelo que êsse lugar representa.

Aos ilustres Deputados, representantes da soberania popular, eu rendo igualmente as minhas homenagens, sem distinção de partidos que representem ou da situação de independentes nesta Câmara, pois sei que todos têm os olhos fitos nos destinos da Pátria.

É esta palavra que liga tantos homens para um fim comum de nos elevar mutuamente, elevando-a.

É nesta orientação que desde a fundação de Portugal até hoje nos temos lançado sempre nos maiores perigos para a ver sempre grande, sempre imensa, sempre respeitada em todo o mundo. Foi nessa intenção que entrámos na guerra em 1914, foi igualmente nessa orientação que há pouco mais de dois anos dois oficiais aviadores da nossa marinha de guerra se lançaram pelo espaço fará, através do Atlântico, para irem abraçar os seus irmãos de além-mar, dessa nova Pátria que nós criámos o que nós desenvolvemos, que se chama Brasil, mostrando igualmente ao mundo que a navegação regular aérea não era mais do que um problema da mecânica aplicada e da matemática, e ainda recentemente dois oficiais da nossa aviação militar, majores Sarmento Beires e Brito Pais, da nossa aviação terrestre de combate, que tivemos, e que brevemente será reorganizada, se lançaram numa viagem de longo curso de Lisboa a Macau, chamando a atenção da aeronáutica mundial para o sou feito, e que esta Câmara já tanto enalteceu.

Sr. Presidente: é nesta forma de grandezas o concepções que eu a vejo bem alto, aos olhos dos Srs. Deputados, e eu, encontrando-me hoje aqui por circunstâncias políticas do partido a que há muito tempo tenho a honra de pertencer, também venho juntar os meus esfôrços aos dos ilustres Deputados nesse engrandecimento que esta legislatura já tanto lhe tem dado.

Agradeço as palavras imerecidas que me foram dirigidas durante o debate político e posso afirmar a V. Exa. que elas me servirão de incentivo no meu trabalho

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e de alta consideração por todos os ilustres Deputados.

Sr. Presidente: ditas estas palavras de cumprimento que eram o meu dever fazer, eu vou tratar do assunto especial de que se ocupou o ilustre Deputado Sr. Lelo Portela.

Como S. Exa. sabe a aviação em Portugal foi estabelecida em 1914 e por isso é um organismo ainda moderno, embora tenha tido uma evolução extraordinária motivada pela Grande Guerra.

Por circunstâncias especiais encontrei, ao tomar conta da pasta da Guerra, a nossa, aviação dissolvida e êsse facto chamou imediatamente a minha atenção, visto ser uma das armas mais notáveis da guerra, que tanto se evidenciou em combates.

Entendo, portanto, que essa arma tem de ser reorganizada solidamente de forma a satisfazer os interêsses da defesa nacional e os interêsses de ordem política, de ordem material e de ordem militar.

Encontram se hoje espalhados pelos vários regimentos do país os distintos aviadores que tanto têm engrandecido a nossa Pátria pelos seus feitos, impondo-se ao respeito do próprio estrangeiro, e entendo que esta situação não deve perdurar por mais tempo.

Os Srs. oficiais da aviação não podem continuar fora do seu mester, porque a aviação não é uma arma em que se possa estar muito tempo sem fazer treinos, tanto mais que é muito arriscada.

Nesta ordem de ideas estudei a forma de reorganizar novamente a aviação e trago à Câmara uma proposta de lei nesse sentido.

Em virtude da quantidade de material que temos nos caís, em vista dos depósitos-escolas de aerosteiros não terem pessoal suficiente e ainda por motivo da enorme quantidade de dinheiro que nessa aviação se tem despendido, eu entendo que a resolução dêste assunto não pode ter delongas e assim peço a V. Exa., Sr. Presidente, a fineza de consultar a Câmara sôbre se concede a esta minha proposta a urgência e dispensa do Regimento.

O Sr. Lelo Portela: — Pedi novamente a palavra simplesmente para agradecer ao Sr. Ministro da Guerra as suas explicações, explicações que, de resto, não
vieram senão confirmar aquilo que eu esperava do alto espírito militar de S. Exa. Aproveito a ocasião para declarar que o meu partido dá o seu voto ao requerimento formulado pelo Sr. Ministro da Guerra.

É aprovado o requerimento do Sr. Ministro da Guerra.

Lê-se e entra em discussão d proposta apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Dinis da Fonseca: — Sr. Presidente: por muita que seja - e é - a consideração pessoal que tenha pelo ilustre titular da pasta da Guerra, não posso deixar de julgar estranho o requerimento de S. Exa. pedindo urgência e dispensa do Regimento para a discussão duma proposta cujas disposições apenas podemos entrever através a rápida leitura que acaba de ser feita na Mesa leitura que, pela sua extensão, nos deixa perceber que se trata duma proposta realmente importante.

E tanto mais estranho é o requerimento de S. Exa. quanto é certo que nem houve a atenção de mandar distribuir — como é de bom uso — um exemplar por cada agrupamento político desta Câmara, nem se deu aos parlamentares as vinte e quatro horas que é costume dar-se-lhes sempre que se trata do qualquer diploma importante -e de carácter argente. Nem sequer houve o cuidado de o mandar publicar no Diário do Govêrno.

Estranho é, pois, um tal procedimento por parte dos membros do Poder Executivo para com o Poder Legislativo. Vai isto dito sem qualquer intenção reservada, sem nenhuma má vontade para com o Sr. Ministro da Guerra, mas tam somente pelo direito que tenho como representante da Nação de me queixar do mau hábito que, por vezes, há da parte dos Ministros, de fazer do Parlamento uma simples chancela, levando-o a votar, sem estudo, sem análise e sem elementos de apreciação, as medidas que êles se lembram do lhe apresentar.

De duas uma: ou os Ministros querem que nós lhe votemos tudo, sem mais reflexões, sempre que se trate de assuntos técnicos, porque não temos competência para as fazer, ou essa competência existe, as nossas reflexões são permitidas e necessárias e, nesse caso, êles têm o dever

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de apresentar aqui as questões por forma a que possamos desempenhar consciente-mente o nosso papel de representantes da Nação, mas representantes «de verdade».

Nestes termos fica o meu protesto, protesto que infelizmente não é a primeira vez que faço e que, neste momento, abrange o próprio procedimento da Mesa, que, nos termos do Regimento, não deveria ter admitido êsse requerimento, visto que á ela compete, mais do que a ninguém, zelar pela autoridade moral do Parlamento.

Eu não tenho aqui o Regimento, mas posso afirmar que nele existe uma disposição pela qual a urgência e dispensa do Regimento só podem ser concedidas desde que se trata de um projecto ou de uma proposta simples, de um só artigo e que possa ser fàcilmente apreendido...

O Sr. Lelo Portela: — Se de facto no Regimento existe essa disposição, ela era atingida pelo próprio requerimento do Sr. Ministro da Guerra, inteiramente justificada, dada a urgência do assunto a tratar, pela declaração há pouco feita pelo Sr. Viriato da Fonseca de que não era possível reunir a comissão de guerra para assinar o parecer relativo à proposta ministerial.

O Orador: — Eu ainda não me insurgi contra o pedido de urgência para esta proposta.

Simplesmente estranhei que não nos tivessem dado ao menos vinte e quatro horas para a estudar ou para se saber o que nela se contém.

Creio que, fazendo esta exigência, eu estou dentro do espírito do Regimento; e creio ainda, Sr. Presidente, que, fazendo-a, pugno pela autoridade moral que é preciso que nós dignifiquemos dentro do Parlamento.

Ninguém pode acreditar que nos seja possível votar conscientemente qualquer medida de complexidade como é a que se traduz da proposta que se está discutindo, sem que tenhamos tomado conhecimento dela, pelo menos, com a antecipação de algumas horas.

Lavrado assim o meu protesto, que repetirei tantas vezes quantas forem necessárias, resta-me significar que me parece que êle devia ser atendido por V. Exa. a fim de que não mais se repetissem factos como êstes, que eu reputo atentatórios da nossa dignidade como parlamentares. E a V. Exa. compete zelar por ela.

Que haja necessidade de reorganizar e com urgência os serviços da aviação, compreendo; mas que haja necessidade de com a mesma urgência, nesta altura da discussão, com um orçamento deficitário, que está para se discutir, pedir que se criem novos serviços a título de reorganização dos mesmos, aumentando as despesas, não compreendo. E também não compreendo que haja nesta proposta uma disposição segundo a qual se dará ao Sr. Ministro da Guerra a faculdade de sacar os créditos que entender para a reorganização dos serviços em questão. Parece-me que isso é uma cousa absolutamente impossível de atender, neste momento, em que nos encontramos em face de um orçamento deficitário.

Eu não votarei novas despesas e não sei como as poderão votar os restantes membros desta casa do Parlamento.

Terminando estas minhas ligeiras considerações — nem podiam deixar de o ser visto que apenas vagamente pude tomar conhecimento de uma ou outra das disposições da proposta pela leitura rápida que foi feita na Mesa — declaro que votarei a urgência da reorganização dos serviços da aviação.

Confiarei na lealdade do Sr. Ministro da Guerra, para que faça uma reorganização; e, confessando a minha ignorância com respeito à técnica militar, deixarei aos técnicos a responsabilidade de fazer essa reorganização como entenderem melhor para prestígio do exército.

Mas, como parlamentar, opor-me hei a que essa reorganização se faça à custado quaisquer aumentos de despesa. É êsse o meu dever como parlamentar e defensor da economia da Nação.

Tenho dito.

O orador não reviu,

O Sr. Viriato da Fonseca: — Fazendo parte da comissão de guerra eu tenho de proferir neste momento algumas palavras em nome dela, a propósito do assunto que se está discutindo.

Não pode a comissão de guerra elucidar a Câmara sôbre o teor da proposta

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do Sr. Ministro da Guerra, visto que ela vem para o debate sem haver tempo de a estudarmos.

Farei, porém, o meu dever de lembrar à Câmara que está pendente do estudo da comissão de guerra uma proposta de reorganização do exército, na qual se contam também os serviços da aviação.

É pois necessário que a proposta sujeita agora à resolução da Câmara não vá do nenhuma maneira pôr em cheque aquela reorganização que está já em estudo.

Quanto à questão dos créditos, sou também até certo ponto da opinião emitida pelo Sr. Dinis da Fonseca.

É necessário notar que êsses créditos não devem ser necessários porquanto as verbas documentais destinadas ao serviço da aviação devem bastar.

É de notar que nestes últimos tempos me passaram pelas mãos créditos para a aviação que representam nada mais nada menos do que 34:000 contos, e se agora se pedem novos créditos também para a aviação, no estado em que o País se encontra isso é de apavorar.

Para êste ponto, pois, é que eu chamo a atenção da Câmara, a fim de ela ver se as cousas se podem resolver sem termos de recorrer a novos créditos. Termino lembrando novamente que sem pretender manifestar-me contra a aviação, se devia esperar pela discussão da nova reorganização do exército.

Tenho dito.

O Sr. Hermano de Medeiros (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: a Câmara tinha resolvido que logo a seguir ao parecer sôbre as Misericórdias não podia ser discutido algum parecer sem ser o que se refere à Junta Autónoma de Ponta Delgada.

Ora já ontem, contrariamente a essa deliberação da Câmara, se procedeu de modo diferente, intercalando entre êsses dois pareceres uma proposta de lei do Sr. Ministro da Marinha; e hoje o Sr. Ministro da Guerra conseguiu fazer votar a urgência e dispensa do Regimento para a sua proposta sôbre os serviços da aviação, saltando também por cima da deliberação anterior da Câmara. Contra êste facto protesto, e convido V. Exa., com o meu maior respeito, a fazer cumprir o Regimento.

O Sr. Presidente: — Devo dizer a V. Exa. que o seu protesto é inoportuno e extemporâneo. Eu pus o requerimento do Sr. Ministro da Guerra à votação da Câmara; e a Câmara, na sua soberania, aprovou-o, até por unanimidade. Ora a mim não me compete ir contra as resoluções da Câmara.

Apoiados da maioria.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer a V. Exa. que êste lado da Câmara, conquanto tenha muito desejo de ver solucionado por uma forma definitiva o problema da aviação, sente que uma proposta de lei da importância daquela que o Sr. Ministro da Guerra enviou para a Mesa pudesse ter entrado em discussão com tanta rapidez que não dá tempo a que os Srs. Deputados, que queriam ocupar-se do assunto, o façam com aquele conhecimento de causa que seria para desejar.

Já um ilustre membro da comissão de guerra, falando em seu nome, acabou de pôr alguns reparos à discussão e votação que a Câmara pretende fazer.

S. Exa. chamou a atenção desta Câmara para o facto de estar pendente da comissão de guerra uma proposta que reorganiza os serviços do exército — proposta sôbre a qual já incidiu o seu estudo e que vai adiantado, segundo S. Exa. nos diz, e que pode porventura ser prejudicada pela proposta de lei que o Sr. Ministro da Guerra acaba de enviar para a Mesa.

Ora quando os técnicos assim se pronunciam, não será para estranhar por certo que nós, os que não temos a honra de pertencer ao exército, nos achemos ainda mais embaraçados para intervir na discussão.

Esperamos, no emtanto, que os ilustres militares que fazem parte desta Câmara, quando se discutir na especialidade o assunto, o esclareçam inteiramente por forma a que possamos emitir o nosso voto com perfeito conhecimento de causa.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — É a hora de se passar à ordem do dia. Está em discussão a acta.

Pausa.

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O Sr. Presidente: — Como ninguém peça a palavra, considero-o aprovada.

Dá-se conta do expediente que depende de resolução da Câmara.

É o seguinte:

Pedido de licença

Do Sr. Cancela de Abreu, 15 dias.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

O Sr. Presidente: — Chamo a atenção da Câmara.

O Sr. Francisco Cruz requereu para que seja discutido, na primeira parte da ordem do dia de amanhã,, o parecer referente às estradas. Os Srs. Deputados que aprovam queiram levantar-se.

É aprovado.

O Sr. Nunes Loureiro: — Requeiro a contraprova.

O Sr. Pedro Pita: — Invoco o § 2.° do artigo 116.°

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à contraprova.

O Sr. Almeida Ribeiro (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejo que V. Exa. me diga qual o parecer de que se trata.

O Sr. Presidente: — É o que se refere às estradas.

Procede-se à contraprova.

O Sr. Presidente: — Estão de pé 42 Srs. Deputados e sentados 17.

Está rejeitado.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — Sr. Presidente: estão inscritos para o período de «antes da ordem do dia» dois pareceres, que já tem sido prejudicados na discussão, o que eu considero de muita urgência serem aprovados. De mais, são dois assuntos que naturalmente pouca discussão levantarão. Requeiro, pois, a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que os pareceres n.ºs 731 e 754 entrem em discussão imediatamente, com prejuízo da ordem do dia.

Consultada a Câmara, é considerado aprovado o requerimento.

O Sr. Morais Carvalho: — Requeiro a contraprova.

Procedendo-se à contraprova, dá o mesmo, resultado a votação.

O, Sr. Presidente: - Vai ler-se o parecer n.° 731.

Leu-se e entrou em discussão na generalidade.

É o seguinte:

Parecer n.° 781

Senhores Deputados.— Sôbre a presente proposta de lei a vossa comissão de administração pública não pode deixar de emitir parecer favorável. Pelos próprios considerandos que a antecedem se aprecia e justifica quanto é necessária a sua promulgação, visto ela visar a estabelecer, tanto quanto o permitem as circunstâncias do Tesouro, o equilíbrio das verbas que, como diferença de subsídio para alimentação, são abonadas aos cabos e soldados da guarda nacional republicana, e, como ração, na marinha de guerra, ficando, porém, ainda muito aquém das verbas que nesta última corporação são abonadas actualmente aos sargentos.

A proposta está por isso por demais justificada se se atentar que as verbas para diferença do subsídio para alimentação aos cabos e soldados da guarda nacional republicana, desde a publicação da lei n.° 1:039, de 1920, tem tido, em virtude da carestia da vida, sucessivos aumentos, estando hoje em 2$40 diários, ao passo que as gratificações de efectividade dos sargentos da mesma guarda, que de facto substituíram o subsídio para alimentação fixado no decreto n.º 5:568, de 1919, e a diferença de subsídio existente nessa data, não tiveram o menor acréscimo desde a publicação daquela lei.

Pelas razões de diferenciação, que não podem deixar de existir, entre a alimentação dos cabos e soldados, e a dos sargentos, o tendo ainda em atenção que pelas funções especiais do serviço e condições de vida dêstes funcionários estão êles, em geral, impossibilitados de só

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aproveitarem das vantagens económicas das messes ou rancho em colectividade, se justifica também muito justamente a percentagem de 30 por cento que é proposta sôbre a verba que é abonada aos cabos e soldados.

Pelos fundamentos expostos, pois, a vossa comissão de administração pública manifesta, como já disso, inteira concordância com a doutrina da presente proposta de lei, recomendando, portanto, a sua aprovação.

Sala das sessões da comissão de administração pública, 14 de Maio de 1924. — Amadeu de Vasconcelos — Costa Gonçalves — Alberto Jordão (com declarações) — Vitorino Mealha (com declarações) — Custódia de Paiva—Carlos Olavo, relator.

Senhores Deputados.— A vossa comissão de finanças, apreciando a proposta de lei n.° 670-B, dos Srs. Ministros das Finanças e Interior, verifica que ela trará ao Tesouro Público uma despesa anual de 522.840$50, compensada já por economias em reduções de despesa feitas na guarda nacional republicana, a quem a referida proposta se refere.

E como a proposta de lei n.° 670-B se limita a aumentar o subsídio de alimentação dos sargentos da guarda nacional republicana, e esta comissão julga absolutamente indispensável êsse aumento e êle cabe dentro das verbas totais orçadas, a vossa comissão de finanças dá o sou parecer favorável à proposta.

Sala das sessões da comissão de finanças, 21 de Maio de 1924.— F. G. Velhinho Correia — Pinto Barriga (com declarações) — Jaime de Sousa — Carlos Pereira —Vergílio Saque — Crispiniano da Fonseca — Amadeu de Vasconcelos — Lourenço Correia Gomes, relator.

Proposta de lei n.° 670-B

Senhores Deputados, — Considerando que antes da aplicação da lei n.° 1:039 os sargentos da guarda nacional republicana percebiam a mesma diferença de subsídio para alimentação que as praças da mesma guarda;

Considerando que a prática demonstrou que era inconveniente a continuação do abono aos referidos sargentos, da «gratificação de efectividade», por ser uma verba fixa, e que é de conveniência.

a sua substituição pelo «subsídio para alimentação», porquanto êste tem-se fixado tanto quanto possível, tendo em atenção as dificuldades da carestia da vida;

Considerando que não arranchando os referidos sargentos em colectividade se levantam para êstes maiores dificuldades para poderem prover à sua alimentação;

Considerando que por tal facto se impõe que o abono da diferença de subsídio para aqueles sargentos seja, portanto, superior ao que é percebido pelos cabos e soldados daquela corporação;

Considerando que pelas reduções já efectuadas na guarda nacional republicana, ao abrigo do artigo 83.° do decreto n.° 8:064, se conseguiu a verba necessária para cobrir êste e outros aumentos, como seja o de auxílio diário para alimentação aos cabos e soldados;

Considerando que o conveniente esclarecer de ora avante, quanto aos sargentos da guarda nacional republicana, a aplicação da lei n.° 1:452, de 20 de Julho de 1923:

Temos a honra de apresentar a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É extinta a «gratificação de efectividade» abonada aos sargentos da guarda nacional republicana, nos termos da lei n.° 1:039, devendo ser-lhes abonado em seu lugar o antigo «subsídio para alimentação», a que se refere o decreto n.° 5:568, de 10 do Maio de 1919, e a diferença do mesmo subsídio, percebida pelos cabos e soldados da mesma guarda, acrescida de 30 por cento.

Art. 2.° O encargo resultante da presente lei será satisfeito pelas disponibilidades existentes no capítulo 4.°, artigo 22,°, do orçamento do Ministério do Interior, do corrente ano económico, sob a rubrica «Pessoal dos quadros—Guarda nacional republicana», transferindo-se a quantia de 159.614$55 da sua rubrica «Melhorias de vencimentos concedidas pela lei n.° 1:039, de 28 de Agosto de 1920», para a de «Diferença de subsídio de alimentação».

Art. 3.° A melhoria de que trata a lei n.° 1:452, de 20 de Julho de 1923, continuará a abonar-se aos sargentos da guarda nacional republicana, em perfeita paridade com os sargentos do exército, tomando-se para tal efeito como gratifi-

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cação de efectividade a parte do «subsídio de alimentação», que corresponda ao quantitativo da gratificação de efectividade, percebida pelos sargentos do exército.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões, em Março de 1924.— O Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, Álvaro de Castro — O Ministro do Interior, Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

É aprovado na generalidade sem discussão.

É aprovado, sem discussão, o artigo 1.°

Lê-se na Mesa o artigo 2.°

O Sr. Francisco Cruz: — Desejava interrogar a Mesa sôbre o seguinte assunto: um ligeiro incidente não me permitiu assistir à votação do requerimento que eu havia feito para que fôsse discutido amanhã, na primeira parte da ordem do dia, o projecto sôbre estradas.

Desejava saber se a Câmara aprovou ou rejeitou.

O Sr. Presidente: — A Câmara rejeitou.

O Orador: — Fica o país sabendo que a maioria não quere discutir o projecto das estradas.

Entra em discussão o artigo 2.°

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Sá Cardoso sôbre o artigo 2.° da proposta em discussão.

O Sr. Sá Cardoso: — Pedi a palavra para dizer que quando a proposta foi elaborada supunha eu que teria aplicação durante o ano económico que findou, e, por conseqüência, havia necessidade de fazer esta transferência; mas visto que não teve aplicação para o ano passado, proponho a eliminação dêste artigo 2.°

Mando para a Mesa uma proposta nesse sentido.

Proponho que a verba de 159.614$55 seja substituída por 700.000$.— Sá Cardoso.

Isto não representa uma despesa para o ano económico.

Quando apresentei a proposta, tinha efectuado reduções na guarda republicana que me permitiam fazer esta despesa sem acréscimo no orçamento. Tem de fazer-se a transferência dentro do orçamento do ano anterior, visto não poder referir-me ao novo orçamento, por não estar aprovado.

O orador não reviu.

Foi lida, admitida e entra em discussão.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: trata-se duma necessidade inadiável.

Ainda que de nenhuma maneira a votação desta verba possa satisfazer o que se pretende dar aos sargentos da guarda republicana, porque a vida está cada vez mais cara, e de tal forma que se vê dia a dia a necessidade de acudir às classes dos funcionários que estão na situação de miséria, acho indispensável esta proposta.

Mas não podemos deixar de chamar a atenção da Câmara para a necessidade de se não continuar nesse caminho. Êle leva-nos a um fim que não podemos saber qual seja, mas que será, com certeza, uma grande catástrofe.

Apoiados.

Reconheço ser indispensável fazer melhorar as condições de vida não só dos sargentos da guarda republicana, mas da maior parte do funcionalismo público, que não pode viver com o que hoje recebe.

É preciso reduzir o funcionalismo pára se poder pagar a quem trabalha, sem haver necessidade de exigir ao contribuinte os impostos exaustivos que a Câmara tem estado a votar.

Não apoiados.

A dez meses de sessão legislativa, depois de outra longa sessão, ainda a Câmara não tem pensado a sério na situação do País.

Tem o nosso voto a proposta, mas chamamos mais uma vez a atenção da Câmara para a situação do país e necessidade de lhe acudir.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — Mando para a Mesa uma proposta de emenda.

Leu-se, foi admitida e entra em discussão.

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É a seguinte:

Substituir «o corrente ano económico» por «no ano económico de 1923-1924».— A. R. Gaspar.

É aprovada a proposta do Sr. Sá Cardoso.

É aprovada a emenda do Sr. Presidente do Ministério.

É aprovado o artigo, salvas as emendas.

Entra em discussão o artigo 3.°, sendo aprovado sem discussão.

É aprovado o artigo 4.° sem discussão.

O Sr. Carlos Pereira: — Requeiro dispensa de leitura da última redacção.

Aprovado.

O Sr. Presidente: — Entra em discussão o parecer n.° 754.

O Sr. Hermano de Medeiros: — Peço a palavra para interrogar a Mesa.

O Sr. Presidente: — Tem V. Exa. a palavra.

O Sr. Hermano de Medeiros: — É contra minha vontade que venho falar, e é a primeira vez que aborda o assunto sôbre o qual desejo interrogar a Mesa.

Desejava, que V. Exa. me dissesse o que se está passando no que respeita a um miserável subsídio dos parlamentares.

Ainda não está em pagamento êsse subsídio, e é bom que o país saiba que êsse subsidio não serve a ninguém.

Não podemos produzir trabalho e vir para aqui sem ter com que nos mantermos, porque a Constituição não determina que sejamos ricos.

O Sr. Presidente: — O subsídio será pago logo que venha autorização para despender a verba.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente : é bom que o Sr. Álvaro de Castro, autor dêsse superavit que tanto deslumbrou o País, vá vendo os resultados da sua obra e que o País não deixe de notar que todos os dias se estão a vender os valores do nosso Património Nacional, sem se saber como há-de ocorrer-se às despesas públicas depois de tudo vendido nesta absoluta liquidação que o Sr. Álvaro de Castro começou a fazer no nosso País.

São mais 2:200 contos para um crédito especial resultante da diferença das verbas do Orçamento geral do Estado que serviu de base ao Sr. Álvaro do Castro para êle apregoar o seu superavit.

São mais 2:200 contos a demonstrarem ao Sr. Álvaro de Castro como os seus cálculos estavam certos; e ao votarmos mais êste crédito especial, eu pregunto ao Sr. Presidente do Ministério, que com o Sr. Álvaro de Castro tem íntimas relações, se S. Exa. pretende continuar a vender a prata do Estado, se S. Exa. pretende continuar no caminho encetado pelo Sr. Álvaro de Castro?

O Sr. Presidente do Ministério é uma pessoa muito cheia de recursos parlamentares, por forma a não responder nunca às perguntas que lhe são formuladas; mas eu insisto nessa pregunta porque tenho o direito de saber se S. Exa. está disposto, para ocorrer às despesas públicas, a continuar a vender a prata e tudo quanto tem valor no Património Nacional. Igualmente desejo saber, no caso de efetivamente essa prata ser vendida, em que condições ela vai para fora do País.

Se o Sr. Presidente do Ministério não se dignar informar-me a este respeito, declaro a S. Exa. que a propósito de todos os artigos desta proposta e a propósito dos de todas que têm motivo a aumentos de despesa não deixarei de repetir esta pergunta ao Sr. Presidente do Ministério com o desenvolvimento bastante para que S. Exa. se veja obrigado a reconhecer os direitos dos representantes da Nação, respondendo às perguntas que êles lhe formulam.

Por agora, tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Sá Cardoso: — Sr. Presidente: não sei se êste crédito para a guarda republicana tem relação com. a prata, mas creio que não.

Apoiados.

A prata que saiu levou o caminho que tem tido muito ouro e muita prata, com a diferença de que esta saiu às claras e toda a gente sabe para onde foi.

O Sr. Carvalho da Silva propositadamente não quis ler o parecer nem a pró-

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14 Diário da Câmara dos Deputados

posta que foi apresentada, e por isso as suas considerações foram descabidas» S. Exa. veio falar do Ministério Álvaro de Castro a propósito duma lei votada em Maio de 1923.

O Sr. Carvalho da Silva (interrompendo): — Mas a despesa existia ou não quando V. Exa. foi Ministro do último Govêrno?

O Orador: — Justamente para obviar a êste inconveniente é que no passado ano económico se propunha esta verba.

É uma despesa que está criada, mas para a qual se não criou a respectiva receita.

No orçamento do Ministério do Interior lá figura esta verba; e, assim, Sr. Presidente, não há razão da parte do Sr. Carvalho da Silva em procurar por qualquer forma deminuir a acção do gabinete Álvaro de Castro, que de facto nenhuma responsabilidade tem no assunto.

Entendo, pois, Sr. Presidente, que a Câmara deve votar sem mais discussão êste crédito, que aliás é absolutamente indispensável.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidenta do Ministério d Ministro dó Interior (Rodrigues Gaspar): — Eu não sei francamente o que é que o Sr. Carvalho da Silva deseja que lhe diga sôbre êste crédito de 2:200 contos depois das declarações feitas pelo Sr. Sá Cardoso.

O Sr. Carvalho dá Silva: — O que eu desejava é que V. Exa. esclarecesse a Câmara e o País sôbre as perguntas que fiz. Vejo, porém, que V. Exa. nada nos diz sôbre o assunto, isto é, não quere dizer à Câmara de quais os meios de que se vai servir para ocorrer à satisfação dêste crédito.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — São os meios ordinários que se costumam empregar.

O Sr. Carvalho da Silva: — O Govêrno para ocorrer a êste deficit do tesouraria precisa de continuar a vender ou empenhar a prata.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — V. Exa. quere que eu a cada operação tenha de dizer o que penso relativamente ao modo de satisfazer os encargos do Estado?

O Sr. Carvalho da Silva: — O que se vê é que V. Exa. não quere dar ao Parlamento a mais leve informação acerca do destino da prata.

E assim, não nos dizendo nada sôbre o assunto, nós não podemos dizer o que pensamos sôbre a abertura dêste crédito.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — V. Exa. já sabe muito bem que a prata

Há-de ser transformada em ouro.

O Sr. Carvalho da Silva: - Transformada em ouro, mas como?

V. Exa. insiste em não responder.

Porém há-de responder, por isso que qualquer representante da Nação tem o direito de lhe exigir uma resposta sôbre o assunto.

Nesta altura trocam-se vários àpartes.

O Orador: — Isto não pode ser, pois o Govêrno não tem o direito de ocultar ao país o que há, não só relativamente ao destino da prata, como se a Moagem já pagou ao Estado os 7:200 contos que lhe deve.

O Govêrno não tem o direito, repito, de ocultar ao país o que há sôbre o assunto.

O que eu quero é que o país saiba o que se está passando com a administração, do Estado.

É indispensável que o país seja esclarecido.

Muitos apartes.

O Sr. Presidente: — Peço ordem.

Muitos àpartes.

O Orador: — O que é preciso saber é o que é feito da prata.

São os amigos do povo que tudo lhe querem ocultar.

O Sr. Presidente: — Eu já tinha pedido ao Sr. Carvalho da Silva que restringisse as suas considerações; mas não o pôs-

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só fazer em virtude das interrupções de V. Exas.

O Orador: — Eu vou terminar.

O que vejo é que se oculta tudo ao país e que a República caminha por um caminho que afunda o país.

O orador não reviu.

Foi aprovada a generalidade do parecer em discussão.

Leu-se o artigo 1.° e foi aprovado.

Leu-se o artigo 2.° e foi aprovado.

O Sr. Carvalho da Silva: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°

Procedeu-se à contagem.

Estavam de pé 60 Srs. Deputados e sentados 4.

Foi aprovado.

Foi aprovado o artigo 3.°

Foi requerida a dispensa da última redacção pelo Sr. Presidente do Ministério e seguidamente aprovada.

A requerimento do Sr. Presidente do Ministério, entrou em discussão o parecer n.° 767.

Leu-se.

É o seguinte:

Parecer n.° 757

Senhores Deputados.— A apreciação da vossa comissão de administração pública foi presente a proposta de lei n.° 709-K, destinada a abrir um crédito especial de 10.600$ a favor do Ministério do Interior e destinado a fazer face aos excessos de despesa com investigações e inquéritos, 'facilitando assim a arrumação de tais serviços extraordinários.

A vossa comissão de administração pública dá o seu parecer favorável a esta proposta.

Sala das sessões da comissão de administração pública, 16 de Junho de 1924. — Abílio Marçal — Amadeu de Vasconcelos—Alberto Jordão (com declarações) - Costa Gonçalves — Custódio de Paiva.

Senhores Deputados.— A proposta de lei n.° 709-K, da autoria do Govêrno, visando a abrir um crédito de 10.600$ a favor do Ministério do Interior, destinado a reforçar a verba do artigo 17.°, capítulo 3.°, do orçamento do ano económico de 1923-1924, sob a rubrica «Investigações e inquéritos», mereceu o parecer favorável da vossa comissão de finanças.

Sala das sessões da comissão de finanças, 14 de Junho de 1924. — Carlos Pereira (com restrições) — Crispiniano da Fonseca — Pinto Barriga (com declarações) — Vergílio Saque — Joaquim de Matos — Jaime de Sousa - F. G. Velhinho Correia (com declarações) — Lourenço Correia Gomes, relator.

Proposta de lei n.° 709-K

Senhores Deputados: — A verba inscrita no orçamento do Ministério do Interior para o - ano económico corrente e destinada a abonos provenientes de investigações e inquéritos é apenas de 2.400$00, importância calculada suficiente para satisfação dos respectivos encargos ao tempo da confecção da proposta orçamental para o dito ano.

Sucede, porém, que os inquéritos e sindicâncias que posteriormente à aprovação do orçamento têm sido ordenadas são em número tam elevado e alguns de períodos relativamente longos, que não podem ser satisfeitos por deficiência da verba respectiva.

Tornando-se, portanto, indispensável efectuar-se o pagamento dos abonos aos interessados, que o vêm reclamando com o direito que lhes assiste:

Temos a honra de submeter à apreciação desta Câmara a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É aberto no Ministério das Finanças, a favor do Ministério do Interior, um crédito especial da quantia de 10.600$ para reforço da verba inscrita no capítulo 3.°, artigo 17.°, da despesa ordinária do orçamento do segundo dos citados Ministérios do ano económico de 1923-1924, sob a rubrica «Investigações e inquéritos».

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, Maio de 1924. — O Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, Álvaro de Castro — O Ministro do Interior, Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

O Sr. Carvalho da Silva: — Mais uma, peça do superavit — dez mil e seiscentos contos.

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E indispensável que o Sr. Presidente do Ministério explique a razão por que vem agora à Câmara êste crédito e não veio o crédito ilimitado para compra de acções de Bancos e Companhias.

Temos nova edição dos Transportes Marítimos e Bairros Sociais.

É levar para dentro de instituições particulares a política e os péssimos processos da administração do Estado.

O Estado já não merece confiança ao País, e o que se vai fazer mais faz fugir os capitais para o estrangeiro.

Ocorre preguntar se tudo isto não vai agravar o câmbio.

É preciso que V. Exa. explique porque não fez publicar êste crédito pela mesma forma como procedeu com o crédito ilimitado.

Julgo ter dito o bastante para lavrar o meu mais veemente protesto contra esta tirania exercida pela maioria parlamentar, não deixando que os Deputados usem da palavra nos espaços «antes da ordem do dia» e «antes de se encerrar a sessão».

Espero, pois que o Sr. Presidente do Ministério de novas explicações acerca da maneira como estão correndo os negócios públicos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — Sr. Presidente: agradeço ao ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva os seus conselhos para que eu não saia fora do bom caminho.

O Sr. Carvalho da Silva (em aparte): — Já saiu.

O Orador: — Eu estou em desacordo com S. Exa. porque hoje é princípio assente que o Estado devo ter interêsses nos Bancos e Companhias de que depende a vida do Estado.

Não quero deixar de lamentar que S. Exa. a propósito dêste assunto em discussão tenha vindo falar noutro, visto que o parecer em debate visa a abrir um crédito para pagar sindicâncias e inquéritos que estão parados por falta de verba.

Como devo pugnar sempre pela verdade, e a verdade há-de ressaltar dêsses inquéritos e sindicâncias, não hesitei em pedir a palavra para a imediata discussão dêste projecto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: em poucas palavras responderei ao Sr. Presidente do Ministério.

Inúmeras vezes nesta Câmara tem sido reconhecido que a intervenção do Estado, e em qualquer serviço, é sempre altamente perniciosa.

Nestas condições, o Sr. Presidente do Ministério, sustentando, como sustentou, que era preciso que o Estado, interviesse na administração de Bancos e sociedades particulares, defendeu, um princípio absurdo, cuja prática é bastante perigosa.

Mas há mais: o Sr. Presidente do Ministério defendeu êste crédito porque êle se refere a inquéritos e sindicâncias.

Pois bem: o Sr. Presidente do Ministério defende a abertura de créditos para sindicâncias que são precisas, e ao mesmo tempo origina, pela mistura da política com os negócios, a necessidade de próximas e futuras sindicâncias, idênticas às dos Transportes Marítimos e Bairros Sociais.

Sr. Presidente: mais uma vez protesto contra a ditadura que o Govêrno está a fazer empurrando para fora do país os capitais que tam precisos são para a melhoria da situação que o nosso pais atravessa.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: o Sr. Presidente do Ministério, nas palavras que proferiu em resposta às considerações do ilustre sub-leader dêste lado da Câmara, e meu particular amigo, Sr. Carvalho da Silva, demonstrou que é exímio em dar respostas que nada esclarecem.

Trata-se, neste projecto, do pedido de abertura de um crédito de 10.600$ para reforço de determinada verba orçamental.

S. Exa., porque se trata de uma quantia pequena, julgou que não podia decretar por si só, e entendeu, e muito bem, que necessitava de vir ao Parlamento.

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Mas o que o Sr. Carvalho da Silva mostrou foi o contraste do procedimento do Sr. Presidente do Ministério, pois que, quando se trata do quantias pequenas, pede autorização ao Parlamento, mas quando se trata de gastar dezenas de milhares de contos na compra de acções de Bancos e Companhias para o Estado intervir na sua administração, S. Exa. julga-se autorizado a decretar, sem mais autorizações.

Sr. Presidente: foi para êste contra-senso que se chamou a atenção do Sr. Rodrigues Gaspar, e S. Exa. nada respondeu a êste respeito.

Disse o Sr. Presidente do Ministério que é princípio assente que o Estado tenha intervenção na direcção das companhias que com êle tenham contratos.

Ora, Sr. Presidente, o princípio assente é precisamente o contrario.

Ainda há dois dias li num jornal uma entrevista dada por um membro do Govêrno actual, em que se dizia a propósito dos roubos do Lazareto que o Estado não tinha capacidade administrativa.

De facto, é sempre mau que o Estado se meta a administrar, ou a exercer qualquer indústria ou comércio, porque vai levar a estabelecimentos que têm uma administração modelar aqueles princípios desgraçados que tam célebres se tornaram nos Bairros Sociais. e nos Transportes Marítimos.

Sr. Presidente: eu volto a preguntar ao Sr. Presidente do Ministério porque é que S. Exa. não se julgou habilitado a decretar a abertura dêste crédito, e se julga apto o decretar a abertura de créditos ilimitados, num momento em que o País luta com as maiores dificuldades o em que vemos o Sr. Ministro das Finanças mandar publicar só no fim dêste mês a declaração de que a Junta de Crédito Publico está habilitada a fazer face ao pagamento dos cupões, quando o deveria estar já há muito tempo.

Espero que o Sr. Presidente do Ministério queira explicar à Câmara êste contrassenso devir pedir autorização para 10 contos e não pedi-la para quantias ilimitadas.

Tenho dito

O orador não reviu.

Foi aprovado na generalidade o projecto.

O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro a contraprova o invoco o § 2.° do artigo 116.°

Feita a contraprova, verificou-se estarem sentados 59 Sr s. Deputados e de pé 3, pelo que foi considerado aprovado.

O Sr. Presidente: — Comunico à Câmara que o Grupo Parlamentar dos Deputados Independentes indicou o nome do Sr. Dinis de Carvalho para substituir o Sr. António Maia na comissão de guerra.

Foi lido o artigo 1.°

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — Sr. Presidente: atendendo às despesas feitas posteriormente a essa proposta, envio para a Mesa uma proposta de emenda.

Lida na Mesa, foi admitida.

É a seguinte:

Proponho que a verba de 10.600$ seja substituída por 15.000$.— Alfredo Rodrigues Gaspar.

O Sr. António Correia (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: V. Exa. comunicou à Câmara que o Grupo dos Deputados Independentes tinha indicado o nome do Sr. Dinis de Carvalho para substituir o Sr. António Maia na comissão de guerra.

Pedia a V. Exa. o favor de me informar se já há dias não tinha sido indicado o nome do Sr. Viriato da Fonseca para substituir o Sr. António Maia.

O Sr. Presidente: — Vou mandar Verificar na Secretaria.

Foi aprovado o artigo 2.°, bem como o emenda e também o artigo 2.°

O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva): — Sr. Presidente: requeiro a V. Exa. que entrem imediatamente em discussão as propostas n.ºs 794 e 637.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — Requeiro a dispensa da última redacção para os pareceres que acabaram do ser votados.

Foi aprovado.

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18 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Presidente: — Vou submeter à votação da Câmara um requerimento do Sr. Cunha Leal para tratar em negócio urgente, estando presente o Sr. Ministro das Colónias, da nomeação, para Alto Comissário da província de Angola, do Sr. Almeida Santos.

Posto à votação o requerimento foi rejeitado em prova e contraprova requerida pelo Sr. Hermano de Medeiros, com invocação do § 2.° do artigo 116.°, por 37 Srs. Deputados, e aprovado por 23.

O Sr. Presidente: — Tendo o Si. Ministro da Marinha requerido para entrar em discussão o parecer n.° 737, vou consultar a Câmara nesse sentido.

C Sr. Pedro Pita (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: desejo chamar a atenção de V. Exa. para o facto de não sendo Deputado o Sr. Ministro da Marinha, não poder formular êsse requerimento.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro da Marinha pedia, a palavra nessa qualidade; mas trata-se de um caso em que o

Regimento diz...

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — Como é necessário resolver o assunto, faço meu o requerimento do Sr. Ministro da Marinha.

Posto à votação o requerimento foi aprovado, entrando em discussão na generalidade o parecer que foi lido.

O Sr. Pedro Pita: — Sr. Presidente: a proposta de lei que está em discussão não foi apresentada há muitos dias, visto que tem a, data de 2 do corrente e traz já a, assinatura do actual Ministro das Finanças.

Parece-me que seria natural que as respectivas comissões desta Câmara se pronunciassem sôbre o assunto.

Creio que seja conveniente a alienação dos navios de guerra em questão; mas acho que não seria demais que as comissões só pronunciassem, tendo sido ouvidas.

Haveria vantagem em o Estado aproveitar ainda alguns dêstes navios, neste momento em que a venda dos navios mercantes do Estado tem tido tara maus resultados, chegando alguns a ser retirados da praça, por terem lanços irrisórios?

É sabido que as condições da praça neste momento não são de desafogo, motivo por que tem havido dificuldades nessas vendas e nos necessários depósitos.

Sr. Presidente: tratando-se duma venda de navios de guerra admiro-me da simplicidade com que isto se faz.

O Almirante Reis tem a sua acção ligada à vida da República.

O cruzador Gabriel ainda há pouco fez serviço; e nós não temos tantos barcos, que possamos desperdiçá-los.

É necessário saber bem qual é o destino do produto dessa venda.

Àpartes.

Sr. Presidente: não tenho ã honra de fazer parte da nossa marinha; o que sei é o que pode saber um simples curioso; mas sei que estamos reduzidos a poucos navios.

O Adamastor está inutilizado, e ouvi dizer que o Vasco da Gama também o está.

Não acho, pois, bem que as comissões técnicas desta Câmara se não pronunciassem num assunto de tanta importância.

Com que consciência poderá a Câmara dar o seu voto à proposta, quando o próprio Sr. Ministro da Marinha diz o seguinte:

Leu.

São as únicas razões que se o Sr. Ministro da Marinha apresenta.

Evidentemente, que se o Sr. Ministro da Marinha diz que êstes barcos estão incapazes para o serviço, que são mesmo insusceptíveis de reparações, é porque alguém o afirmou; S. Exa. é, de facto, um oficial muito distinto, mas, sob o ponto de vista de engenharia naval (e nisto não faço injúria alguma a S. Exa.) não é um técnico.

As informações dadas pelo Sr. Ministro da Marinha os exames a que, porventura S. Exa. mandou proceder, são bastantes para poder afirmar-se que os barcos estão incapazes?

Ainda que S. Exa. me mereça muita consideração — que a merece — Aposso eu aceitar tal afirmação, sem mais nada, de que os barcos são insusceptíveis de

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reparações, que estão perdidos para a nossa marinha? Confesso que não.

São realmente as comissões da Câmara que têm o dever de examinar os processos que certamente estão feitos, ver em que condições êsses pareceres foram dados, para depois nos poderem dizer aquilo que viram, aquilo que apuraram, a fim de que nós, baseando-nos um pouco na sua opinião, possamos votar conscienciosamente.

Eu declaro a V. Exa., Sr. Presidente, que não sei como hei-de votar.

Não poderá haver outro destino a dar a êstes navios?

Quem me diz que o Estado não lucraria mais aproveitando êstes navios para construção e reparação de outros navios?

Repito: sou leigo nesta matéria; mas parece-me que um barco poderá estar inutilizado, mesmo insusceptível de reparação, e, no emtanto, poder utilizar-se o seu costado, as suas chapas, o seu maquinismo, as peças necessárias para que êsse navio produza, aplicado na construção ou reparação de outros navios, valores mais apreciáveis.

Sr. Presidente: eu sei que esta proposta tem em vista formar o fundo que eu chamaria de beneficiação da actual frota naval, a construção de navios que constituam os elementos de que carecemos para a nossa defesa marítima; mas, Sr. Presidente, sendo êsse plano interessante, mau será que S. Exa. queira começar por recursos tam deminutos como êstes serão certamente para se conseguir uma garantia que não é preciso ser-se da especialidade para logo se saber que é limitadíssima.

Repito, estou inteiramente convencido de que o produto desta venda será insignificante, será irrisório.

Já uma vez, há anos, se tentou vender em hasta pública alguns navios julgados em condições de não servirem ao fim a que eram destinados, isto é, à marinha de guerra. E lembro-me bem que êsses navios foram vendidos em condições péssimas, produzindo uma verdadeira insignificância, tendo sido aproveitados para sucata, com proveito para quem os tinha arrematado; mas, no fundo, sem resultado para o Estado, que recebeu uma verba insignificante, miserável, por essa operação.

Receio que as condições da praça, que não eram então o que hoje são, porque toda a gente tinha facilidade em recorrer ao crédito e ser servido, porque toda a gente tinha um crédito umas poucas de vezes maior que a sua fortuna pessoal, receio, repito, que as condições da praça não tornem viável a tentativa de venda dêstes navios.

Calcule V. Exa. o que não será agora, quando aqueles indivíduos que tinham o maior crédito estão hoje reduzidos aos seus próprios recursos, sem poderem obter qualquer empréstimo, dando mesmo as mais seguras garantias.

É preciso não esquecer que atravessamos um momento em que indivíduos, garantindo mesmo em hipotecas propriedades que valem dez vezes mais, não conseguem obter qualquer empréstimo, não porque haja desconfiança, porque tenham menos crédito, mas porque não há, de facto dinheiro que possa ser emprestado a êsses indivíduos. É vulgar comerciantes que nunca recorreram ao crédito, comerciantes que se em tempo tivessem recorrido ao crédito encontrariam com certeza quantias muito importantes, verem-se hoje na necessidade de oferecerem grandes vantagens sem mesmo assim encontrarem as quantias de que carecem.

Mas, Sr. Presidente, há ainda a acrescentar, porque é preciso não esquecê-lo nunca, que neste momento em que se vai anunciar a venda dêstes navios está a fazer-se a venda dos navios dos Transportes Marítimos do Estado.

Todos sabem o que se tem passado com a venda dêsses navios. O Pôrto, por exemplo, que é um vapor explêndido e que pode fazer concorrência em comodidade e conforto com vapores estrangeiros que fazem as viagens a que se destinava, foi arrematado por uma insignificância, o mesmo acontecendo a outros dos melhores navios.

E é neste momento, quando se verifica que a razão por que êsses navios não são adquiridos é a falta de numerário, que se quere ver se podem ser reduzidos a dinheiro mais três navios de guerra, que se diz estarem inutilizados para o serviço.

Francamente, Sr. Presidente, embora tenha todo o prazer em prestar justiça ás boas intenções do Sr. Ministro da Mari-

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nhã, achando-se esta proposta desacompanhada de qualquer relatório que a justifique, eu fico hesitante, sem saber como lhe deva dar é ,meu voto. Para quem gosta de votar com consciência não é indiferente o colocar-se nesta situação. Não gosto de abandonar a sala na ocasião das votações. Gosto sempre de votar; e, estando dentro da sala, sou forçado a fazê-lo porque o próprio Regimento me não permite a abstenção. Sendo assim, se eu tenho de votar, pregunto a mim mesmo se o meu dever não é rejeitar esta proposta.

O único fundamento apresentado para a venda dos três navios é o de que êles estão completamente inutilizados. Ora, embora o meu convencimento não se possa basear em argumentos seguros, quere-me parecer que, pelo menos ao que respeita ao S. Gabriel, se chegou ràpidamente demais à conclusão de que está inutilizado e incapaz de sofrer reparações pára continuar ao serviço. Eu lembro-me de que nós tínhamos um navio a que chamavam Pimpão, e que tendo sofrido várias reparações, se transformou num cruzador couraçado, que é o Vasco da Gama, e que há muitos anos está prestando o serviço que a um barco dêsses compete. E quem me diz se o S. Gabriel, levando uma reparação tam grande como aquela, não ficaria também em condições de vir a prestar serviço durante ainda muitos anos?

Veja V. Exa., Sr. Presidente, o que em tam poucos anos se tem passado. Nós perdemos a República, perdemos o S. Rafael, consideramos inutilizado o Almirante Reis, e êste já nos acostumamos a assim o considerar, vendo-o eu há muito desmantelado quando tenho de atravessar o Tejo.

Vamos agora considerar inutilizado o S. Gabriel, não sei bem como, e já ouvi também falar no Adamastor, tendo daqui a pouco nas mesmas condições o Vasco da Gama. E eu pregunto, Sr. Presidente, o que é que nos fica? Nada, por assim dizer.

Ficam os dois cruzadores adquiridos há três ou quatro anos, o Carvalho Araújo e a República, quatro destroyers, outros tantos submarinos e umas canhoneiras que certamente não resistirão a uma onda maior, se para as ondas a valer as tiverem de mandar.

Quando temos viva na mente a história brilhante da nossa marinha de guerra, notabilizada pelos seus grandes e continuados feitos heróicos, quando nos lembramos de que foi numa verdadeira casca de noz que Vasco da Gama conseguiu chegar até à índia e Pedro Álvares Cabral ao Brasil, confrange-se-nos a alma ao ver que estas unidades são liquidadas em hasta pública, sem ao menos serem substituídas.

Sr. Presidente: o Almirante Reis simboliza a acção gloriosa que em 5 de Outubro teve na revolução que implantou a República.

Pois até êsse vai desaparecer.

Não sou daqueles que têm a fobia dos santos; e por isso, lastimo também que desapareça o cruzador S. Gabriel, que lembra a nau das descobertas marítimas.

Esta proposta é daquelas que nunca deveriam ser discutidas sem que as acompanhasse um parecer das comissões competentes.

Gostaria que alguém me dissesse se dispõe dos devidos informes sôbre a necessidade da venda dêstes navios, para a aprovar com a consciência tranqüila de que cumpriu assim o seu dever.

Algumas razões tinham aquele? que diziam que a marinha devia empregar-se na marinha veleira.

Quere dizer que foi um êrro grave ter vendido um barco que estava em condições de poder ser aplicado ao comércio ainda durante muitos anos.

Fazia-se a afirmação de que não estava em condições. Outras afirmações ainda vieram.

Depois veio o arrependimento; e os que se arrependeram do mal não se ocuparam mais dêste problema.

Eu tenho um medo horrível dos males sem remédio, porque perante o irremediável não servem de nada nem as censuras, nem as recriminações, nem as lamentações.

Ora nos últimos tempos temo-nos encontrado permanentemente perante situações irremediáveis.

É claro, o resultado é dizer-se: agora já não há remédio; e nem ao menos as responsabilidades se destrinçam.

Ainda hoje se deu nesta Câmara um caso que justifica inteiramente esta minha afirmação.

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O Sr. Cunha Leal quis tratar da nomeação de um governador interino para Angola.

A Câmara recusou. Por várias vezes tem recusado ao mesmo ilustre colega a palavra para tratar de assuntos respeitantes de Angola, no tempo do Alto Comissário Norton de Matos.

No Emtanto pode-se hoje verificar o que foi a situação criada a Angola, e que se teria evitado se a tempo se tivesse tratado dela.

Entretanto, a mesma Câmara pode verificar que a situação criada a Angola, também por se não ter a tempo tratado dela, era por tal modo grave que não havia fácil remédio a dar-lhe e que a maior parte das pessoas indigitadas ou convidadas para a direcção da província recusavam semelhante honraria. O que é pior é que a situação está cada vez a agravar-se mais, a complicar-se mais, ninguém querendo sacrificar-se para procurar repor a província na situação anterior.

Isto serve apenas como exemplo para demonstrar como é perigoso resolver de leve — e já não quero dizer levianamente — casos desta natureza, colocando-nos na contingência de termos de continuada-mente bater nos peitos, arrependidos das nossas culpas.

Eu desejaria que uma proposta desta natureza tivesse a justificá-la, pelo menos, já não digo os pareceres de uma dúzia de comissões que, de resto, costumam ser ouvidas sôbre assuntos insignificantes, mas com relatório que nos habilitasse, dentro dos nossos conhecimentos e das nossas faculdades, a julgar da sua oportunidade e da sua vantagem. Eu sei que o Sr. Ministro da Marinha é um marinheiro muito distinto, com muito amor à sua profissão, para que pretendesse dar por incapazes navios que visse ainda estarem em condições de prestar serviços. Sei que S. Exa. pensa que quantos mais e melhores navios, melhor.

Mas, Sr. Presidente, errar é próprio dos homens.

E lembro-me até, por se ter falado não há muito na perda do Pêro de Alemquer, que há um oficial de marinha que desejaria até morrer dentro dêsse barco, oficial de marinha que creio chamar-se Macieira, oficial de marinha distintíssimo, admirado não só por nacionais, como por estrangeiros, com um passado brilhantíssimo, que tinha um s grande amor pelo barco onde tinha feito a sua carreira, e que teve um grande desgosto quando teve de o deixar.

Sei isso muito bem.

Sei, Sr. Presidente, que para a maioria dos oficiais da marinha de guerra os navios são as suas noivas, as suas esposas, uns entes que muito querem, razão por que sei muito bem que o Sr. Ministro da Marinha, fazendo a afirmação que nos fez de que êsses navios se encontram completamente inutilizados para o serviço do Estado, nos fala verdade.

Porém, quem me diz a mim que S. Exa. não esteja enganado, ou que a pessoa que foi encarregada de fazer á vistoria se não tenha enganado também?

Quem me diz a mim, Sr. Presidente, que se não tenha procedido às necessárias investigações para se tentar o salvamento dêsses navios; para se tentar o aproveitamento dêsses barcos?

O Sr. Presidente: — Previno V. Exa. de que são horas do se passar à segunda parte da ordem do dia, e assim se V. Exa. quiser poderá ficar com a palavra reservada para amanhã.

O Orador: — Nesse caso ficarei com a palavra reservada para a sessão de amanhã.

O orador não reviu.

O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa um parecer da comissão de marinha.

O Sr. Presidente: — Continua em discussão na generalidade o parecer n.°761.

Tem a palavra o Sr. Morais de Carvalho.

O Sr. Morais de Carvalho: — Sr. Presidente: o ilustre Deputado, o Sr. Carvalho da Silva, iniciando ontem a discussão sôbre o parecer n.° 761, declarou à Câmara qual era o modo de ver da minoria monárquica acerca do assunto, tam melindroso como êste é, e a que se chama a questão do inquilinato.

S. Exa. declarou que sôbre o assunto se abstenha inteiramente de quaisquer considerações de ordem política.

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Eu lamento que não se possam acautelar igualmente os interêsses dos inquilinos e dos proprietários.

A política, como já tive ocasião de dizer à Câmara, nunca pode escolher entre o bom e o mau. O mais que pode fazer é escolher entre dois males o menor.

Eu aplico êste princípio à questão em debate. Perante as restrições exageradas, nós só teríamos que voltar ao Código Civil; mas temos de olhar paca as situações criadas.

Êste lado da Câmara não pode por forma alguma aceitar o princípio de que o proprietário pode aumentar as rendas à sua vontade.

A liberdade das rendas é um princípio que nós não podemos aceitar neste momento.

Mas, embora pensemos assim, entendemos no emtanto que não haveria inconveniente, antes haveria vantagem, em dizer-se ou deixar-se perceber na lei que o regresso ao regime de liberdade era o ideal. Deveríamos até estabelecer essa tendência, como se tem feito noutras legislações e designadamente na legislarão francesa, embora as circunstâncias de momento aconselhem aquelas restrições que há pouco apontei.

Sr. Presidente: há nesta questão do inquilinato duas ordens de inquilinos a considerar: aqueles que usam da casa para fins de habitação própria, e aqueles que usam da casa para emprêsas comerciais ou industriais. Carecem os primeiros duma protecção, duma espécie de assistência por parte da lei, em face das circunstâncias anormais em que o problema da habitação se põe ao legislador? Evidentemente que merecem. Mas já o ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva chamou ontem a atenção da Câmara para o que se pratica noutros países, em que a necessidade dessa assistência é reconhecida, como por exemplo na Inglaterra e na Suíça, mas onde ela é feita não por parte dos proprietários, mas por parte da colectividade.

A êste respeito lembrarei até a V. Exa. que, já durante a permanência no poder do actual Ministério Trabalhista Inglês, foi apresentada na Câmara dos Comuns uma proposta no sentido de não poder ser exigido o cumprimento da lei na totalidade aos trabalhadores em chômage; e no emtanto essa proposta foi repelida pelo Parlamento Inglês tendo em consideração não que os desprotegidos da fortuna não merecem protecção do legislador, mas porque não é justo que essa assistência seja fornecida por aqueles indivíduos a quem coube em sorte ter como inquilinos operários sem trabalho.

É preciso ainda notar que entre nós e nas actuais circunstâncias — refiro-me agora às circunstâncias criadas pela lei — a assistência em benefício do inquilino se encontra feita não apenas a cargo do proprietário, mas, também, do novo inquilino.

É um privilégio para determinados inquilinos em detrimento de outros.

Quando se diz, por exemplo, no inquilinato comercial que a lei estabelecendo a restrição das rendas visa a beneficiar o comércio em geral, emite-se, a meu ver, um princípio que não pôde ser fundamentado.

O que se faz com essa restrição é simplesmente beneficiar os comerciantes ou industriais que já se encontram estabelecidos, criando para aqueles que iniciam a sua vida condições de verdadeira excepção, extraordinariamente gravosas na maior parte dos casos. Êstes, porventura porque encontram o limite ao estabelecimento das rendas, vão pagar ao senhorio rendas menores, mas têm de dar ao antigo inquilino um traspasse exigido de pronto, traspasse por vezes exageradíssimo, que muito concorre para tolher os primeiros passos do novo comerciante, ou do novo industrial. Quere dizer, esta disposição da lei, longe de constituir um benefício para os inquilinos, é um prejuízo.

Êste é um dos contrassensos a que nos conduz a legislação actual.

Embora pensando assim, nós entendemos, repito, que não se pode passar de repente do regime de restrição apertada em que vivemos para um regime de liberdade absoluta.

E isto não só no que respeita ao inquilinato de habitação, como ao inquilinato comercial ou industrial.

Esta questão da restrição das rendas tem também um aspecto fiscal muito para ponderar em qualquer circunstância, mas muito especialmente desde que se trata dum Estado cujas finanças se encontram na situação calamitosa que o Orçamento

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Geral do Estado a cada passo nos revela.

O Estado procura receitas em toda a parte.

Vai descobrir fontes de rendimento onde êle não existe, e no emtanto tem aqui uma matéria colectável importante que põe de parte.

Sr. Presidente: não é apenas no que diz respeito à contribuição predial urbana que a questão se põe: é também em relação à contribuição de registo, à contribuição industrial e ao imposto sôbre é valor das transacções, nos termos em que êle foi estabelecido pelo decreto, não sei se constitucional, de Janeiro dêste ano.

Com respeito à contribuição predial o caso é evidente.

Desde que o Estado não pode cobrar as percentagens devidas pelo contribuinte, em relação ao valor constante da matriz, intuitivo é que a restrição das rendas proíbe absolutamente que o Estado tire da contribuição predial urbana aqueles rendimentos que devia tirar.

Basta ver os orçamentos no capítulo das receitas, designadamente na parte que 'se refere às receitas da contribuição predial urbana, para imediatamente se notar que o Estado perde milhares de contos por ano.

Da mesma maneira, quanto à contribuição de registo, que é na verdade um imposto sôbre o capital que se cobra, de ordinário, nas transacções quer por título oneroso, quer por título gratuito.

Mas, Sr. Presidente, o prejuízo do Estado também se faz sentir em face da lei do inquilinato, tal qual se encontra estabelecida, no que respeita à contribuição industrial.

Não ignora a Câmara que a contribuição industrial entre nós, tal qual como ela é regulada pela lei n.° 1:368, de 21 de Setembro de 1922, consta de duas partes: uma taxa que a lei, não sei porquê, denomina anual, paga adeantadamente, e uma taxa complementar que é paga por uma percentagem sôbre os lucros.

Como é que pela lei n.° 1:368 é calculada a taxa anual ou á taxa fixa da contribuição industrial?

Paga um tanto por cada empregado, e paga uma percentagem sôbre o valor locativo dos prédios, resultante do arrendamento.

De modo que V. Exa. e a Câmara vêem que o comerciante e o industrial estão sujeitos, por igual, à contribuição industrial que os que exercem as profissões liberais, enfim, todos aqueles que a essa contribuição estão sujeitos têm de pagar uma taxa fixa, adiantadamente, que é calculada numa percentagem, salvo êrro, de 5 por cento sôbre o valor locativo dos prédios, conforme êsse valor consta do contrato de arrendamento, percentagem de 5 por cento, que se eleva a 10 por cento.

Já vê, portanto, quanto a lei é interessante, debaixo do ponto de vista da contribuição industrial e que qualquer modificação que na matriz predial resulte, tenha por fim alterar nos contratos de arrendamentos o próprio imposto sôbre o valor das transacções, que, em regra, consiste numa percentagem de 1 por cento que em certos casos vai até 10 por cento, sôbre o montante das transacções.

Cada um dos indivíduos a êle sujeitos pode, nos termos ainda da lei n.° 1:368, pagar por meio de avença.

Quere dizer, o contribuinte em vez de ter estado a escriturar dia a dia, em livro especial, as transacções que faz, para submeter êsse livro à fiscalização dos empregados da Fazenda Pública, pode contratar com a Fazenda Pública, por meio de avença, uma quantia para pagar anualmente, independentemente dêsse livro e dessa fiscalização.

Mas um decreto de Janeiro dêste ano estabelece as bases para se fixar o máximo dessa avença e entre as bases e o decreto, a que me refiro, de Janeiro dêste ano, encontra-se o valor locativo da casa ocupada pelo contribuinte, isto é, pelo industrial, ou pela comerciante.

Com efeito êsse decreto manda ter em consideração as despesas com empregados, água, seguros, telefone, mas principalmente a renda.

Todas as despesas somadas e depois multiplicadas por cinco, e depois o produto, representam o mínimo sôbre que pode recair a avença.

Já V. Exa. vê qual a influência extraordinária que pode ter o valor locativo da casa, e ainda para ter em conta a receita para aplicação do imposto do sêlo.

Sr. Presidente: o parecer em discussão

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altera em vários pontos a proposta vinda do Senado, que por soa turno já é muito diferente da proposta do actual Sr. Ministro da Justiça, que a apresentou no Senado não como Ministro, mas como Senador, sendo então um projecto simplesmente.

Por êsse projecto o Sr. Catanho do Meneses procurava apenas num único artigo atacar uma das facetas dêste problema do inquilinato.

Pelo seu projecto, S. Exa., hoje Ministro, pretendia que o contrato de arrendamento não caducasse pela transmissão do prédio, fôsse qual fôsse o título de transmissão.

Quere dizer, S. Exa. procurava revigorar o artigo 34.° do decreto n.° 5:411, de Abril de 1919, que neste particular mantinha o que estava no Código Civil, que fora derrogado pelo decreto anterior sôbre inquilinato.

Esta determinação única, que S. Exa. propunha, não deixava de ser grave, porque representava a transformação do contraio de arrendamento de natureza meramente temporária num contrato perpétuo que aliás o Código Civil impunha com algumas condições.

Mas o Senado entendeu bem que a questão do inquilinato era mais complexa do que se depreendia do projecto de S. Exa. e que tinha outros aspectos que era necessário tomar em consideração.

Bem sei que S. Exa. considerava que havia outros pontos a tratar, mas considerava que êsse era o mais urgente.

Então, o Senado formulou uma proposta que veio para esta Câmara, o que a comissão de legislação civil não atendeu. Não quero agora, na discussão da generalidade, entrar na apreciação pormenorizada da proposta vinda do Senado, e das emendas introduzidas pelas comissões de legislação civil e de comércio e indústria; mas isso ficará para a discussão na especialidade, porque é nosso propósito procurar tanto quanto possível conseguir um ponto de conciliação nas divergências entre senhorios e inquilinos — divergências que o são só na aparência.

Sr. Presidente: não deixarei no emtanto de desde já salientar quanto brigam com os princípios, que nos ensinaram nas escolas e que sempre nos habituámos a defender, as disposições da proposta do Senado com aquelas que contem matéria manifestamente retroactiva, em que o legislador substituindo-se ao Poder Judicial vai decidir para um lado e para o outro questões já pendentes, e por assim dizer intervir no que se podem chamar direitos adquiridos, quer para uma quer para outra das partes.

O artigo 2.° da proposta do Senado estabelece uma regra; e, depois, em parágrafos subseqüentes, admite excepções.

Mas, sem querer cansar a atenção da Câmara, desejo notar a precipitação e pouco cuidado que houve em elaborar a proposta.

Diz-se que a regra estabelecida pelo Senado sofre duas excepções; e, realmente, não se vê motivo para as excepções irem recair sôbre aqueles casos em que o Senado entende as deverá admitir.

Assim, a regra é esta:

Leu.

Tal é a excepção 1.ª

Leu.

Quere dizer: quando o inquilino deixou de pagar a renda, então há uma excepção à regra estabelecida: o senhorio terá o direito de fazer manter a acção de despejo iniciada, e o inquilino depois de citado ainda tem novo prazo para pagar, embora tenha de depositar a renda em duplicado.

Isto para as acções intentadas de futuro; mas as já intentadas que podem ter durado anos, porque as acções de despejo arrastam-se por vezes anos te anos, se estiver intentada, o inquilino pode depositar a renda, mas por êste lado não fica sujeito à obrigação de a depositar em duplicado.

Qual a razão que justifica esta diferença?

O legislador não diz a razão por que se não estabelece essa regra para os processos já intentados.

Dizia eu que o artigo 2.° estabelece uma excepção.

A proposta diz:

Leu.

Eu pregunto se êste princípio é justo, se êste princípio é com justiça defendido pelos que se arvoram em defensores dos direitos dos inquilinos.

Leu.

Ou há razão para uns e para outros, ou não há razão para ninguém.

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Agora, que há processos com os quais já só gastaram milhares de escudos, não se justifica êste princípio. Para futuro, sim, quando os processos estão em começo; mas não para o caso presente, em que os processos já são volumosos.

Não compreendo também que a acção de despejo seja só para os casos de sublocação e não para as modificações que o inquilino faça no prédio.

Não compreendo qual o critério do Senado.

Eu posso, porventura, com as alterações que fizer no prédio, prejudicar a sua conservação e resistência; mas no entanto o senhorio não têm o direito de intentar contra mim qualquer acção, podendo, todavia, fazê-lo, se eu sublocar a casa.

Sr. Presidente: deve ter havido razões muito ponderosas...

O Sr. José Domingues dos Santos: — Apoiado.

O Orador: — ... para legislar desta forma; e o Sr. José Domingues dos Santos, que acaba de me dar um «apoiado» quando eu disse que devia ter havido razões ponderosas, vai certamente fazer a defesa desta e doutras disposições.

Igualmente o Sr. Ministro da Justiça, apesar de não ser o autor dêste projecto, vai dar-nos explicações, porque nós estamos aqui de boa fé e no desejo de colaborar num assunto do qual devem ser arredadas todas as paixões políticas.

Sr. Presidente: na discussão, na especialidade, terei ocasião de tratar desenvolvidamente alguns dos pontos que agora versei, e ainda de ocupar-me de outros a que por brevidade agora me não referi.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Sr. Presidente: ligeiras considerações vou fazer sôbre o discurso produzido pelo Sr. Carvalho da Silva.

Não me parece que seja esta a ocasião para virmos aqui mostrar a nossa erudição sôbre as diversas leis do inquilinato que vigoram no estrangeiro.

A Associação de Comércio e Indústria, de cujo parecer tive a honra de ser relator, limitou-se a encarar o problema dentro do espaço, e apresentar algumas soluções que, não sendo absolutamente radicais, porque não vêm solucionar de pronto o problema, são, no emtanto, de atender, porque colocando-se no campo neutral das lutas entre senhorios e inquilinos, deu tanto a uns como a outros prerrogativas que representam um meio de o Estado poder também exercer a sua fiscalização.

O Sr. Carvalho da Silva, que igualmente se colocou no mesmo pé de neutralidade, abdicando dos seus princípios para chegar a um campo de conciliação, referindo-se ao parecer da comissão de comércio e indústria, limitou-se a aventar a hipótese de se estabelecerem as comissões de avaliação no caso dos traspasses, visto o senhorio poder mancomunar-se com o inquilino em detrimento do Estado.

Não há dúvida de que S. Exa. tem razão; e os factos demonstram todos os dias que essa mancomunação pode ser vulgar e muito difícil de impedir.

No emtanto, a proposta da comissão de comércio e indústria tende a dificultar a lesão dos interêsses do Estado; e se o Sr. Carvalho da Silva concretizar as suas palavras num artigo ou parágrafo que obedeça à doutrina por S. Exa. emitida, eu, pessoalmente, não terei dúvida em lhe dar a minha aprovação, pois isso representará mais um elemento que o Estado põe ao seu lado na fiscalização dos seus rendimentos.

A propósito dessa proposta a comissão de finanças apresentou uma emenda ao proposto pela comissão de comércio e indústria que, até certo ponto, é de aceitar.

Não pode ser absolutamente aceitável, porque o princípio que a comissão de comércio e indústria quer estabelecer, dando nova participação ao senhorio na percentagem sôbre á sublocação, é um princípio da mais alta justiça e tende a atender a uma situação, de facto, deprimente para o senhorio, que é a de se ver coagido a não actualizar as suas rendas por um conjunto de circunstâncias meramente políticas.

Sr. Presidente: com estas palavras terminarei as minhas considerações ; eu compreendo mais o domicílio político do que o pão político; e se compreendo todas as restrições no direito de propriedade em

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favor da colectividade, em face dos princípios mais esquerdistas, não posso compreender que essas restrições se façam em detrimento duma classe somente.

Mas, se em face dos princípios tenho de reconhecer tudo isso, não posso também deixar de atender às dificuldades do Estado, que não pode arcar com despesas grandes que lhe resultariam do princípio do domicílio político.

Podendo aceitar em princípio a idea do domicílio político, como uma idea absolutamente radical, eu não posso, de facto, preconizá-la neste momento, porque as circunstâncias impedem a sua efectivação.

Também concordo com as comissões arbitrais; mas na comissão de legislação civil e comercial deu-se-lhes uma tal amplitude de poderes que se me afigura perigosa a nomeação dessas comissões.

Procurarei tornar aceitável essa idea pela Câmara.

Quando as ideas são apresentadas em todo o seu radicalismo, em geral causam n m perto receio; se elas forem devidamente ponderadas, atendendo a circunstâncias de momento, de acaso, então podem ser aceitáveis, e, assim, iremos chegando à efectivação total dessa idea.

Parece-me, Sr. Presidente, que mais nenhuma afirmação produziu o Sr. Carvalho da Silva, em que fizesse referência ao parecer da comissão do comércio e indústria, e, portanto, ponho ponto nas minhas considerações.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Meireles Barriga: — Sr. Presidente: marca o Regimento no seu artigo 103.° o seguinte:

Leu.

O problema do inquilinato, Sr. Presidente, que já de há muito devia estar resolvido, vai seguindo o mesmo caminho do decreto n.° 5:411, encontrando-me eu perfeitamente à vontade para falar sôbre o assunto.

Não sou, Sr. Presidente, nem inquilino, nem senhorio, pois habito em casa própria, encontrando-me por isso, repito, perfeitamente à vontade para tratar, como representante da nação, dêste assunto.

O problema do inquilinato, Sr. Presidente, é daqueles que, a meu ver, só se

poderão resolver pela melhoria da moeda, pelo equilíbrio orçamental, o que, na verdade, é um tanto ou quanto difícil, atenta a situação em que nos encontramos.

Hoje, Sr. Presidente, a construção custa 40 vezes mais do que custava antes da guerra, facto êste que se deve, em parte, não só à aplicação das oito horas de trabalho como à dificuldade que há em se obter capitais, pois a verdade é que os operários hoje não aplicam a actividade que aplicavam dantes, e o juro com que dantes se obtinham capitais, que era de 6 por cento, hoje está elevado a 9 e 12 por cento.

A meu ver, Sr. Presidente, a lei do inquilinato deve ser feita apenas para proteger aqueles que necessitam, pois a verdade é que, Sr. Presidente, aqueles que habitam casas antes de 1914 encontram-se numa situação excepcional. É isto que se dá no inquilinato de habitação dá-se, em mais larga escala, no inquilinato comercial, isto é, numa proporção muito mais grave, visto que os proprietários dessas casas não podem aumentar as suas rendas, facto êste que, a meu ver, não pode deixar de ser considerado pela Câmara, visto que representa uma grande desigualdade.

É indispensável resolver o problema do inquilinato. Por que forma? Devem proteger-se igualmente os ricos e os pobres? Seria injusto fazer-se isso. Bem sei que é difícil fazer uma destrinça, mas há diversas soluções.

Há a arbitragem. Trás dificuldades, mas é ainda a melhor.

Vários Srs. Deputados trocam simultaneamente explicações com o orador.

O Orador: — O que é necessário é que nos fixemos num ponto concreto sôbre o qual deva recair a nossa votação.

O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Aceitamos os aumentos aprovados pelo Senado e autorizamos agora o senhorio a semestralmente lançar uma percentagem até 20 por cento da renda primitiva.

O Orador: — A proposta, quanto à arbitragem, não é clara. Deixa de pé o artigo 5.°

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Êste parecer está feito com um pouco de precipitação — e nisto não vai censura para ninguém — de forma que é necessário uma cuidadosa discussão para não haver más interpretações depois na execução da lei.

O Sr. Carlos de Vasconcelos: — O parecer aceita as comissões arbitrais, mas quere limitar-lhe os poderes.

O Orador: — Agradeço a V. Exa. a sua explicação, mas entendo que ainda assim não fica bem esclarecido o texto da lei. Trata-se do seguinte: Qual é o sistema que se quere pôr em vigor? É o dos coeficientes ou o das arbitragens? Não sei, e isto tem importância para uma discussão na generalidade.

O Sr. Morais Carvalho: — Se bem compreendi os pareceres, o sistema estabelecido é o seguinte: mantém-se o artigo 5.°, quere dizer, aplicam-se os coeficientes, e êles continuam a vigorar emquanto as comissões de arbitragem, se forem votados, os não alterarem. Estas comissões só começam a vigorar em 1 de Janeiro, mas os coeficientes continuam a vigorar se elas não os alterarem.

O Orador: — Eu realmente acentuei que devia ser essa a interpretação que se devia dar; mas o que é indispensável é tornar essa interpretação bem definida, para evitar confusões.

O que eu quis salientar é que isto não estava claro.

Os esclarecimentos foram-me dados por quem não pertence à comissão.

O sistema proposto é o de se fazer a cobrança até 31 de Dezembro, excepto se o senhorio quiser uma arbitragem.

O critério é a multiplicação pelo coeficiente de 1914.

O que se quere realmente é fazer a distinção entre rendas.

O sistema da arbitragem pode resolver a questão.

Uma venda grande pode ser o indicador da riqueza de cada um.

Na especialidade ter-se há de fazer a discussão, sobretudo se não passar o sistema da arbitragem.

O Sr. João Camoesas: — V. Exa. dá-me licença?

Há pessoas ricas que pagam rendas pequenas. Êsse indicador falha.

O Orador: — O que é indispensável é estabelecer categorias, sujeitas a êsse sistema, o único que pode resolver esta dificuldade.

O problema que suscitei é que é necessário fornecer maior rendimento ao proprietário, e é preciso ao mesmo tempo assegurar a estabilidade do lar.

É, realmente, um dos aspectos que vinca a comissão.

O princípio de retroactividade é do Código Civil.

Haveria graves dificuldades em aplicar-se na lei do inquilinato o princípio da retroactividade, sobretudo para aquilo que está legislado.

Há rendas reais e legais.

Há nelas uma profunda diferença. A renda legal é a estabelecida pela lei; ô muito menor do que a recebida.

O proprietário arrenda o prédio, e fica na situação de receber por fora uma quantia que equivale ao próprio valor real.

Há casos de abuso de funções e. constata-se a necessidade de legislar para não se chegar a uma especulação.

O que é certo é que é necessário atender à lei, mas nunca em prejuízo daqueles que habitam as casas.

Como os tribunais podem ter diferentes opiniões, êste artigo tem de ser esclarecido e modificado.

Também o § 2.° do artigo 1.° apresenta outra redacção diferente da que veio do Senado e diz:

Leu.

Êste ponto também tem de ser atendido e modificado.

Temos de atender às condições do inquilinato comercial no que respeita às necessidades do processo de mudança e traspasse.

Àpartes.

Sr. Presidente: também o artigo 2.° diz na emenda feita pela respectiva comissão o seguinte:

Leu.

Isto vai de encontro aos princípios estabelecidos na primeira proposta.

Temos de seguir um critério em que haja um meio de defesa na execução du-

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ma sentença num processo de despejo, que não está estabelecido.

Àpartes.

Num caso vincado já, dum mandado de despejo, só está suspenso pelo cordão umbilical dum atestado de doença.

Àpartes.

É necessário proteger a estabilidade do lar, o que não quere dizer que os senhorios não possam exercer o seu direito de propriedade.

É necessário estabelecer bem até que ponto pode ir uma execução dum julgamento que ainda não lavrou sentença.

Àpartes.

Não compreendo como é que o Senado propõe e aprova esta emenda.

Leu.

Eu pregunto: depois de haver sentença á execução continua?

Verifica-se também a acção de despejo noutros casos e suspende-se naqueles que não deve ser.

Isto não é justo.

O artigo 2.° tal como está na proposta do Senado tem de ser muito pensado para ser modificado.

Diz o Senado:

Leu.

Quando não há contrato não se pode intentar a acção de despejo; o senhorio fica sem direito contra o inquilino. Isto é um caso em que é preciso vincar com cuidado, e na especialidade deve ser emendado.

O artigo 3.° diz:

Leu.

Ora em 1911 havia facilidade em alugar casas - e isto estava bem.

Hoje, o que se está fazendo é uma especulação; e só se compreende dentro do inquilinato comercial.

Sr. Presidente: dentro do inquilinato comercial, na realidade deve permitir-se ò trespasse para o mesmo ramo porque a um comerciante que fez a sua casa à custa de muito trabalho deve ser permitida a compensação. Todavia, sou de opinião que, quando assim não fôr, devo haver umas certas restrições na sublocação.

Interrupções dos Srs. José Domingues dos Santos e Carvalho da Silva.

O Orador: — Vem, depois, na lei um outro preceito que me parece interessante, o qual é que a sublocação se faça pelo mesmo preço da venda.

Neste ponto devo dizer que quem subloca quere ter um pequeno benefício, e, nestas condições, entendo que o artigo tal como está não deve ser aceito.

Relativamente à forma como se farão as arbitragens também não posso concordar, pois diz-se que as comissões de arbitragem serão constituídas por um juiz togado e dois árbitros.

Entendo que esta forma não é feliz; porque estando os nossos juizes sempre tam ocupados com serviços judiciais, haverá uma demora enorme na resolução dêsses assuntos, pelo que julgo que o árbitro de desempate deve ser outra pessoa.

Sr. Presidente: o § 2.° diz o seguinte, que é muito interessante:

Leu.

Vêem, pois, V. Exas. que esta fixação de rondas é curiosa; e, por êste motivo, êste artigo deve ser estudado com a máxima ponderação.

Sr. Presidente: uma outra atribuição da comissão arbitral é a seguinte:

Leu,

Acho legítimo que alguém que seja proprietário tenha o direito de instalar-se em casa sua, desde que indemnize o inquilino; mas, tal como está redigido, o artigo presta-se a abusos.

Diz, o artigo:

Leu.

Desta forma pode qualquer senhorio, casado, com quatro ou cinco filhos, reclamar para si um prédio inteiro de quatro ou cinco andares.

Repito, o artigo tal, como está redigido pode dar lugar a abusos.

Sôbre o sistema de arbitragem sinto não ter agora ao mm dispor alguns apontamentos que possuo acerca da legislação estrangeira para fazer a sua comparação com a nossa legislação.

Diz a alínea c).

Leu.

isto é, beneficia realmente um preceito que me parece salutar, mas, pode ir muito longe; porque muitas destas obras ficam depois a cargo dos inquilinos, e pareço-me que não é justo que isto se dê.

Desde que haja uma comissão de arbitragem e se prescreve que o senhorio tenha de conservar a casa perfeitamente

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habitável, não é legítimo que se faça essa exigência.

O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Podia ser aceitável estabelecendo-se uma indemnização ao inquilino.

O Orador: — Como eu desejo tratar mais detidamente dêsse assunto, ao fazer-se a discussão na especialidade, vou continuando a apreciar os princípios gerais desta lei.

Diz ainda esta lei:

Leu.

Sustenta-se, por conseqüência, o princípio de que essa arbitragem sôbre qualquer matéria, de direito ou de facto, se resolve sem possibilidade, de recurso,

É indispensável que sôbre êsse princípio se estabeleçam algumas restrições que são importantes.

Terei ocasião de falar também sôbre êsse assunto e então com mais elementos de que não disponho neste momento.

Sr. Presidente: nestes termos e porque me limitei a versar o aspecto geral da questão, eu dou por findas as minhas considerações.

O orador não reviu.

O Sr. João Camoesas: — Sr. Presidente: o primeiro aspecto que fixa a minha atenção, pelo que diz respeito ao parecer em discussão, é o da técnica parlamentar que conduziu a apreciação dêste assunto pelo caminho que êle tem seguido.

Afigura-se-me que o projecto inicial visava tam somente a obviar a alguns inconvenientes que a experiência revelara em matéria de inquilinato.

Quere-me parecer, por isso, que se não trata duma nova e completa legislação sôbre o inquilinato, mas apenas do resolver alguns dos seus aspectos mais imediatos e urgentes.

Em todo o cago, desde que o problema foi pôsto perante o Congresso, natural é que êle queira considerá-lo em toda a sua amplitude.

Isso não deve, porém, impedir, em meu entender, a adopção de medidas de circunstância para pôr termo a inconvenientes que têm alarmado a opinião pública e que podem assumir dum momento para o outro os mais graves aspectos.

Assim, sou inteiramente de opinião que uma comissão respectiva devia proceder a uma investigação, rigorosa e justa, das condições em que se encontram os inquilinos e os senhorios, procedendo-se entre nós como se faz lá fora: nomeando-se um técnico especializado para proceder a êsse inquérito.

Desta forma é que nós depois poderíamos analisar o assunto de harmonia com a realidade e com as regras de direito aplicável.

Infelizmente, Sr. Presidente, êstes processos de trabalho, que são hoje os preferidos em todo o mundo civilizado, não têm alcançado uma corrente de simpatia para serem adoptados neste País; pois a verdade é que o Parlamento Português Republicano funciona nos mesmos termos em que funcionava o Parlamento da monarquia, apresentando por conseqüência os mesmos vícios e as mesmas deficiências; funcionando, repito, o Parlamento da República nos precisos termos em que funcionou o Parlamento da monarquia nos últimos tempos.

Chegámos aos mesmos processos, verdadeiramente deploráveis, isto é, chegámos à mesma forma de se fazer obstrucionismo sôbre diversos assuntos, e que faz com que muitos parlamentares se encontrem hoje completamente esgotados e sem fôrças para apreciar e estudar devidamente assuntos como êste que são da mais alta importância.

Ao terminar, pois, Sr. Presidente as minhas primeiras considerações sôbre o projecto de lei em discussão, eu devo dizer que não posso deixar de condenar inteiramente os processos parlamentares que se têm seguido, quer por parte dás comissões, quer por parte dos oradores que têm entrado nas discussões que se têm feito nesta casa do Parlamento, pois, na verdade, não posso deixar de os considerar improfícuos e até indecorosos.

Gostaria que V. Exa. transmitisse à comissão mais directamente interessada o meu alvitre do que não deixe de mão o problema em todas as suas determinantes e procure munir-se de todos os elementos de informação, de forma que as providências legislativas, em lugar de serem o resultado de empirismos, sejam de facto as regras determinadas pela própria observação dos fenómenos.

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E, postas estas considerações preambulares, dizendo respeito apenas ao ponto de vista da técnica parlamentar, início as minhas considerações acerca da generalidade do parecer, dizendo a V. Exa. aos princípios gerais que determinam a minha orientação nesta matéria.

Primeiro do que tudo entendo que a necessidade de habitar é correlativa do direito à vida.

Quer queiramos, quer não, a realidade é isto: não se pode viver sem habitar!

A existência desta necessidade originou o aparecimento de instituições sociais, para a satisfazerem.

Até aqui essas instituições sociais, como em regra todas as outras de actividade económica; eram realizadas livremente, pela actividade voluntária das pessoas que se dispunham a construir casas para alugar, levadas a isso por motivo do lucro e pela segurança que a propriedade urbana dava às suas fortunas. Fundamentalmente, por conseqüência, construir casas para alugar era um negócio, a. como todos os negócios, susceptível de risco. Pois neste momento o negócio de alugar casas resultou um mau negócio. E é êste o ponto da questão.

O Sr. Presidente: — É a hora de se encerrar a sessão.

V. Exa. quere terminar ou fica com a palavra reservada?

O Orador: — Fico com a «palavra reservada.

O orador não reviu.

O Sr. Pamplona Ramos: — Pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro da Instrução para a desigualdade de tratamento que se quere adoptar com relação aos candidatos ao magistério das disciplinas de modelação e desenho. Êstes candidatos estão, pelo que dispõe o § único do artigo 7.° dum decreto publicado em 1921, em igualdade de circunstâncias com os candidatos ao magistério da disciplina de educação física.

Uns e outros deverão adquirir a sua educação profissional nas escolas normais superiores.

Pois, apesar disto, aos candidatos ao magistério de educação física foi concedida a entrada nessas escolas, mas aos candidatos ao magistério de modelação e desenho nem sequer foram aceitos os requerimentos que fizeram.

Há pois uma manifesta desigualdade de tratamento que representa uma ilegalidade perante a lei, que deve ser igual para todos.

Espero que S. Exa. o Sr. Ministro da Instrução tome as devidas providências, que antecipadamente agradeço, a fim de que a situação desse candidatos, que tam prejudicados estão sendo, se defina com inteira justiça.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Abranches Ferrão): — Ouvi com toda a atenção as considerações do Sr. Pamplona Ramos e cumpre-me dizer a S. Exa. que as tomo na devida consideração e que vou estudar o caso que apontou, para lhe dar a solução que fôr justa.

O orador não reviu.

O Sr. Garcia Loureiro: — Chamo a atenção do Sr. Ministro da Instrução para o assunto a que vou referir-me.

Há tempo o presidente da junta escolar de Elvas enviou ao Sr. Ministro da Instrução um ofício pedindo providências para o facto de êle se encontrar sozinho naquela junta, visto que os vogais não comparecem, porque uns pediram escusa e outros pediram a demissão.

Devo dizer que êste caso, quanto a mim, merece capital importância, porquanto o Ministro da Instrução anterior ao actual nomeou, nos termos da lei, o presidente da junta escolar.

Não é meu correligionário mas é republicano.

Êste facto, como já disse, tem para mim capital importância, porque em Elvas êste facto dá a impressão de que o Estado republicano não tem por aqueles indivíduos que são republicanos aquele carinho que devia ter. Todos afirmam isto.

Creio que o presidente da junta escolar já transmitiu um ofício pedindo providências, e até hoje nenhuma resposta ainda recebeu nesse sentido.

Chamava a atenção de V. Exa. para esta situação.

Tenho pena de não estar o Sr. Presi-

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dente do Ministério para chamar a atenção de S. Exa. para o facto...

O Sr. Carvalho da Silva (interrompendo): — V. Exa. fala em nome dos eleitores de Elvas?

O Orador: — Falo em nome da nação, e tenho autoridade para o fazer sem ter de pedir licença a V. Exa. Jamais consentirei que, seja quem fôr, correligionários meus ou de V. Exa., calquem a lei.

O Sr. Carvalho da Silva: — E em nome dos eleitores que protesta?

O Orador: — É em nome da lei que falo.

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Abranches Ferrão): — Recebi efectivamente no meu Ministério q ofício a que o Sr. Garcia Loureiro se referiu.

Mandei informar para saber como os factos se estão passando.

Tenha S. Exa. a certeza de que procederei por forma a não me preocupar com interêsses políticos de republicanos ou monárquicos.

Procurarei pelo Ministério da Instrução, no tocante propriamente a fiscalização, ser justo fazendo cumprir a lei, doa a quem doer, num espírito intransigentemente republicano.

É isto que tenho a dizer a S. Exa.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Em primeiro lugar agradeço a V. Exa. ter-se demorado na Câmara até agora, para ouvir as considerações que desejo fazer perante o Sr. Ministro das Finanças.

Não demorarei muito a atenção de V. Exa. procurando apenas tratar do seguinte:

A lei estabelece para os prédios inscritos na matriz anteriormente a 1914, 30 por cento; para os posteriormente inscritos, 15 por cento; para os outros 10 por cento.

A Direcção Geral dos Impostos, numa daquelas circulares, põe inteiramente de lado o artigo, infringindo a lei.

Estando um prédio inscrito na matriz, não se pode sustentar que o proprietário

esteja pagando contribuição maior do que deve pagar.

O Estado não pode permitir que se façam ladroeiras; e estou convencido de que o Sr. Ministro das Finanças dará as suas instruções para que não seja permitida a incidência do imposto em tais condições.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Finanças (Daniel Rodrigues): — Ouvi as considerações feitas pelo Sr. Carvalho da Silva; e devo dizer que à primeira vista parece que S. Exa. tem razão.

Vou dar instruções ao director geral das Contribuições e depois darei conta ao ilustre Deputado do que se passar sôbre o assunto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para a situação difícil em que se encontram os soldados da guarda fiscal reformados, aos quais até hoje não foram enviados os títulos de renda vitalícia a que têm direito, não tendo recebido o aumento que lhes foi concedido.

Assim, peço a S. Exa. que tome providências para que esta situação termine, pois que êsses soldados estão atravessando as mais precárias circunstâncias, e não só os reformados mas os que estão ao serviço.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Finanças (Daniel Rodrigues): — É verdade que os soldados da guarda fiscal em serviço e os reformados estão atravessando uma situação difícil.

Já tratei com o Sr. Director Geral da Contabilidade Pública dêste assunto, que está correndo os termos necessários para ter uma rápida solução.

Os títulos de pensão vitalícia estão sendo actualizados conforme a lei.

É isto que afirmo a V. Exa.

Tenho dito.

O orador não reviu.

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32 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanha, 31, às 14 horas, com a seguinte ordem do dia:

Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores que se inscreveram):

Proposta de lei n.° 801, que autorizou o Govêrno a reorganizar provisoriamente a Aeronáutica Militar, e a de hoje.

Sem prejuízo dos oradores que se inscreveram:

A de hoje.

Ordem do dia: A de hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 21 horas e 15 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Propostas de lei

Do Sr. Ministro da Guerra, autorizando o Govêrno a reorganizar provisoriamente a Aeronáutica Militar.

Aprovada a urgência e dispensa do Regimento.

Dos Srs. Ministros do Interior e Finanças, autorizando o Govêrno, pelo Ministério do Interior, a despender com os agentes da Polícia Preventiva e 'da Segurança do Estado em Lisboa a importância de 15.000$ mensais.

Para o «Diário do Govêrno».

Do Sr. Ministro do Comércio, criando dois selos postais, um com o valor de $15 e outro com o de $30, tendo êste uma sobrecarga «Multa», revertendo o produto da venda para a subscrição promovida pela comissão executiva do monumento ao Marquês do Pombal.

Para o «Diário do Govêrno».

Pareceres

Da comissão de comércio e indústria, sôbre o n.° 740-K, que autoriza a Câmara Municipal de Albufeira a arrecadar designados impostos para abastecimento de águas, esgotos e iluminação eléctrica.

Para a comissão de finanças.

Da mesma, sôbre o n.° 760-B, que torna extensiva à Junta Geral do Distrito de Faro a doutrina do § 1.° do artigo 1.° da lei n.° 1:453, ficando esta Junta autorizada a elevar as percentagens estabelecidas.

Para a comissão de finanças.

Da comissão de legislação civil e comercial, sôbre o n.° 653-A, que cria uma assemblea eleitoral na freguesia de Cachopo, concelho de Tavira.

Imprima-se.

Da comissão de. finanças, sôbre o n.° 776-A, que determina que o antigo professor do 1.° grupo do Liceu Central de Passos Manuel, de Lisboa, Manuel Borges Grainha, fique adido ao mesmo liceu.

Imprima-se.

N.° 731, que extingue a gratificação de efectividade dos sargentos da guarda republicana.

Aprovado com alterações.

Para a comissão de redacção.

Dispensada a leitura da última redacção.

Da comissão de administração pública, sôbre o n.° 616-H, que eleva Vila Nova de Portimão à categoria de cidade.

Imprima-se.

Da comissão de finanças, sôbre o n.° 740-K, que autoriza a Câmara Municipal de Albufeira a arrecadar designados impostos para abastecimento de águas, esgotos e iluminação eléctrica.

Imprima-se.

Da mesma, sôbre o n.° 760-B, que torna extensiva à Junta Geral do Distrito de Faro a doutrina do § 1.° do artigo 1.° da lei n.° 1:453, ficando esta Junta autorizada a elevar as percentagens estabelecidas.

Imprima-se.

Da comissão de marinha, sôbre o n.° 790-A, que autoriza a Junta Autónoma das Obras do Pôrto do Funchal a contratar a construção dum porto artificial naquela cidade.

Para a comissão de obras públicas.

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Da comissão de administração pública, sôbre o n.° 775-C, que alterou a lei n.° 15, de 7 de Julho de 1913, que regulou todos os assuntos sôbre caça;

Para a comissão de agricultura.

Da mesma, sôbre o n.° 717-C, que autoriza o Govêrno a ceder o bronze e fundição do busto para o monumento ao patrão Joaquim Lopes, a erigir em Paço de Arcos.

Para a comissão de guerra.

Da mesma, sôbre o n.° 695-H, que cria-a freguesia de Barcarena, concelho de Oeiras.

Para a comissão de legislação civil e comercial.

Da comissão de guerra, sôbre o n.° 754-G, que abre um crédito de 2:000.000$ a favor do Ministério da Guerra para despesas com a manutenção da ordem pública.

Para a comissão de finanças.

Últimas redacções

Do projecto de lei n.° 754, que abre um crédito de 2:200.000$ a favor do Ministério do Interior para satisfazer os encargos da execução da lei n.° 1:436, de 31 de Maio de 1923.

Dispensada a leitura da última redacção.

Remeta-se ao Senado.

Do projecto de lei n.° 757, que abre um crédito de 15.000$ a favor do Ministério do Interior para reforço da verba inscrita no orçamento sob a rubrica «Investigações e inquéritos».

Dispensada a leitura da ultima redacção.

Remeta-se ao Senado.

Do projecto de lei n.° 731, que extingue a gratificação de efectividade dos sargentos da guarda nacional republicana, substituindo-a pelo antigo subsídio de alimentação.

Dispensada a leitura da última redacção.

Remeta-se ao Senado.

Negócio urgente

Desejo ocupar-me, em negócio urgente, com a presença do Sr. Ministro das Colónias, da nomeação do Sr. Almeida Santos para governador, interino, de Angola, por considerar tal nomeação prejudicial aos interêsses da colónia. — Cunha Leal.

Rejeitado.

Substituição

Substituir na comissão de guerra o Sr. Tôrres Garcia pelo Sr. António Mendonça.

Para a Secretaria.

O REDACTOR—João Saraiva.

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