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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADO
SESSÃO N.º 21
EM 22 DE JANEIRO DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. — Abre a sessão com a presença de 60 Srs. Deputados.
É lida a acta, que adiante se aprova. Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia — Prossegue a discussão do parecer n.º 813, alterações à lei do sêlo.
O Sr. Álvaro de Castro, que estava com a palavra reservada, conclui o seu discurso.
Seguem-se os Srs. Ministro das Finanças (Pestana Júnior), Carvalho da Silva e Ferreira da Rocha.
É aprovada a generalidade.
Ordem do dia.— Continua o debate sôbre a organização bancária.
O Sr. Nano Simões apresenta e justifica uma moção de ordem, que é admitida.
Usa da palavra o Sr. Abranches Ferrão.
O Sr. Júlio Gonçalves, requere e é aprovado, que a sessão se prorrogue até se concluir o debate.
Usa da palavra o Sr. Álvaro de Castro, que contesta a constitucionalidade do respectivo decreto.
Para explicações fala o Sr. Vasco Borges, seguindo-se o Sr. Álvaro de Castro, que sustenta os termos de uma moção de ordem, que é admitida, como admitida é uma moção apresentada e, justificada pelo Sr. Pedro Pita, que fica com a palavra reservada, pois que a sessão é interrompida às 19 horas e 30 minutos, para continuar às 21 horas e 30 minutos.
A sessão reabre às 22 horas, concluindo o Sr. Pedro Pita o seu discurso.
O Sr. António Maria da Silva, justifica uma moção de ordem que e admitida.
O Sr. Correia Gomes, requere e é aprovado que a comissão de finanças possa reunir no dia seguinte pelas 15 horas.
O Sr. Lino Neto justifica uma moção de ordem, que é admitida.
Segue-se o Sr. Carlos Pereira, depois de quem os Srs. Júlio de Abreu e Amadeu de Vasconcelos justificam moções de ordem, que são admitidas.
O Sr. Ministro das Finanças justifica a constitucionalidade ao seu decreto.
O Sr. Manuel Fragoso requere, nas cotações, prioridade para a moção do Sr. António Maria da Silva.
O Sr. Ferreira da Racha responde ao Sr Ministro das Finanças, que por sua parte replica ao Sr. Ferreira da Rocha.
Usa da palavra o Sr. Presidente do Ministério (José Domingues dos Santos), manifestando-se sôbre a aceitação e rejeição das moções.
Usam da palavra os Srs. Cunha Leal e Carvalho da Silva.
Os Srs. Velhinho Correia e Júlio de Abreu são autorizados a retirar as suas moções.
É aprovado o requerimento do Sr. Manuel Fragoso, precedendo-se à votação nominal sôbre a moção do Sr. António Mana da Silva, requerida pelo Sr. Sá Pereira.
A moção é rejeitada por 56 votos, contra 51, sendo rejeitado um requerimento do Sr. Lino Neto para em seguida se votar a sua moção.
O Sr. Júlio de Abreu requere, e é aprovado, que se vote imediatamente a moção do Sr. Amadeu de Vasconcelos.
O Sr. Correia Gomes requere, e é rejeitado, que para os efeitos da votação, a moção referida se divida em três partes.
A votação faz-se nominalmente, a requerimento do Sr. Júlio Gonçalves, sendo aprovada por 57 votos contra 8.
São aprovadas as duas primeiras conclusões da moção do Sr. Rêgo Chaves, considerando-se prejudicada a última.
É rejeitada a moção do Sr. Cunha Leal, ficando prejudicadas as moções dos Srs. Vasco Borges, Morais Carvalho, Nuno Simões e Carvalho da Silva.
A primeira parte da moção do Sr. Lino Neto é rejeitada, considerando-se prejudicada a segunda parte.
O Sr. Presidente do Ministério, agradece o voto da Câmara.
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Encerra se a sessão às 4 horas do dia 23, marcando-se a imediata para as 11 horas do mesmo dia.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Declarações de voto.
Abertura da sessão, às 15 horas e 20 minutos.
Presentes à chamada, 60 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 63 Srs. Deputados.
Presentes à chamada;
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Porreira Vidal.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro Xavier do Castro.
Américo da Silva Castro.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Maria da Silva.
António Paia da Silva Marques.
António Resende.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Constâncio do Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Coelho de Amaral Reis.
Francisco Cruz.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Jaime Júlio do Sousa.
João Baptista da Silva.
João de Ornelas da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Jorge Barros Capinha.
José Cortês dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mondes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José Pedro Ferreira.
Leonardo José Coimbra.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Nuno Simões.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Lino Neto.
António Mendonça.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Vicente Ferreira.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
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Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Germano José de Amorim.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Pires Cansado.
João Estêvão Aguas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.
Sebastião do Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Vitórino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires do Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Lelo Portela.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amaro Garcia Loureiro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Alberto Marques de Azevedo.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António de Sousa Maia.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Duarte Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José da Conceição Camoesas.
João Salema.
João Teixeira de Queiroz Vaz Quedes.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Serafim de Barros.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Mário de Magalhães Infante.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Pelas 16 horas e 20 minutos, com a presença de 62 Srs. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta e o seguinte
Expediente
Ofícios
Do Senado, comunicando ter enviado à Presidência da República, para promulgação, ao abrigo do artigo 32.° da Constituição, as seguintes propostas de lei:
Criando uma assemblea eleitoral em Almofala, concelho da Figueira de Castelo Rodrigo.
Proibindo nos salões cinematográficos a exibição de films contrários à moral e bons costumes.
Criando, nas escolas primárias oficiais, mutualidades escolares.
Cedendo um terreno ao Faial Sport Club.
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Criando a freguesia do Gagos, concelho da Guarda.
Exceptuando da aplicação das leis do desamortização, a Herdado do Mouro, situada na freguesia do S. Tiago de Rio de Moinhos.
Criando a freguesia de Lomba da Cruz, concelho do Nordeste.
Determinando, para os efeitos da lei n.° 1:114, a forma de nomeação do professores primários.
Alterando o artigo 1.° da lei do 23 de Agosto de 1913 (acendedores portáteis).
Alterando a constituição das assembleas eleitorais do concelho do Portalegre o criando um a assemblea eleitoral em Montargil o outra em Chança,
Para a Secretaria.
Do Senado, com uma proposta do lei que cria uma assemblea eleitoral na freguesia de Marcos da Serra, concelho de Silvos.
Para a comissão de administração pública.
Do Ministério da Guerra, acompanhando uma nota para alteração do orçamento daquele Ministério, relativa a aumento do gratificações do pessoal encarregado dw vigilância da propriedade imobiliária militar.
Para a comissão ao Orçamento.
Da Sociedade do Geografia de Lisboa, convidando S. Exa. o Sr. Presidente o uma deputação desta Câmara, a assistir à sessão solene comemorativa do 4.° Centenário de Vasco da Gama, no próximo dia 20, pelas 21 horas e meia, na sala «Portugal» da mesma sociedade.
Para a Secretaria.
Do Vigário Geral do Patriarcado de Lisboa, convidando V. Exa. o Sr. Presidente e Srs. Deputados a assistirem no próximo dia 25, pelas 11 horas a uma sessão solene e a uma comemoração religiosa nos Jerónimos, em Belém, em honra do grande português Vasco da Gama.
Para a Secretaria.
Representações
Do capitão Máiio Afonso de Carvalho, pedindo, para se lho contar a antiguidade do pôsto de tenente.
Para a comissão de guerra.
Do capitão reformado Daniel Rodrigo Gomes, pedindo para ser convertido em lei o projecto tornando extensivo aos oficiais do reserva determinadas vantagens da lei n.º 1:1132.
Para a comissão de guerra.
Telegrama
Dos banqueiros o bancos do Pôrto, reunidos na sua totalidade na Associação Comercial, pedindo para o decreto de reforma bancada ser transformado em proposta de lei.
Para a Decretaria.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: — Continua em discussão o parecer n.° 843, que introduz diversas alterações na tabela do imposto do sêlo.
O Sr. Álvaro de Castro: — Sr. Presidente: na sessão passada, tinha eu feito umas apreciações contrárias àquela que o Sr. Portugal Durão apresentara acerca da falta de trabalho como consequência das disposições da lei do sêlo.
A falta do trabalho depende de factores que em nada se relacionam com essa lei.
Àparte do Sr. Almeida Ribeiro.
O Orador: - O Sr. Almeida Ribeiro chamou a minha atenção, dizendo que as declarações do Sr. Portugal Durão já tinham vindo mencionadas numa reclamação apresentada a esta Câmara pela Associação Comercial do Lisboa.
O Sr. Maldonado de Freitas: - Também podia ser essa, o muito bem, a opinião do Sr. Portugal Durão.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Eu não quis deminuir o mérito das considerações do Sr. Portugal Durão; quis apenas dizer que também a Associação Comercial tinha apresentado a opinião que o Sr. Álvaro do Castro estava a refutar.
O Orador:— O facto do desemprego resulta de várias condições económicas, e não especialmente da falta do consumo de artigos e mercadorias sujeitas à lei do sêlo.
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O chômage dá-se em todos os países, principalmente naqueles cuja moeda se vai valorizando.
São êstes factos, e não a lei do sêlo, que produzem o desemprego.
Entre nós dá-se o desemprego em algumas indústrias, como a metalúrgica, que nada têm com a lei do sêlo.
Compreendo só que ninguém vá comprar hoje cofres ou camas, quando calcula que amanhã poderá comprar os mesmos artigos mais baratos.
O mesmo só dá com a indústria dos lanifícios.
Foi a greve dos comerciante e dos industriais que produziu o desemprego nas indústrias relacionadas com a lei do sêlo; queixem-se, pois, os operários dos seus patrões.
Disseram os Srs. Ferreira da Rocha e Portugal Durão que o imposto do sêlo não existo noutros países sob a forma de imposto do transacção.
Não é exacto que no Brasil não exista o imposto do transacção e não exista o imposto do sêlo, atingindo muita matéria colectável que em outros países é chamada imposto do consumo.
A diferença única é que o imposto de transacção é chamado pelos brasileiros «imposto de contas assinadas», quando se refere a vendas a prazo o «imposto de contas à vista», nas vendas a pronto.
A mecânica dêsse imposto é, no Brasil, muito mais feliz do que entre nós, e pona foi que o legislador quando quis introduzir em Portugal êsse imposto fôsse buscar o exemplo à França — pois a lei portuguesa é a tradução textual da lei francesa — em vez de ir buscar êsse exemplo ao Brasil, onde o imposto de transacção é muito mais perfeito, mais exacto e mais fàcilmente fiscalizável.
As «contas assinadas», que são um imposto sôbre as vendas a prazo, estão no nosso Código Comercial, mas com pouca latitude, ao passo que o Brasil deu a essa parte do Código Comercial uma graúda largueza, estabelecendo regras fixas, não só para a cobrança, como para o pagamento e fiscalização dêsse imposto, e dando ainda aos títulos representativos dessas «contas assinadas» o valor de documentos descontáveis nos bancos.
Assim, no Brasil, a criação dêste imposto traduziu-se numa vantagem grande para os comerciantes, que assim têm um título do segurança, que ao mesmo tempo lhes serve para adquirirem dinheiro no espaço que vai até o pagamento da mercadoria que venderam.
Nas «vendas â vista» o pagamento do imposto faz-se por uma escrituração especial, quinzenalmente, escrevendo-se as várias quantias correspondentes às diversas parcelas diárias, somando-as e inutilizando o sêlo correspondente ao imposto sôbre as vendas feitas.
É precisamente o nossa imposto de transacção.
E se alguém quiser dar-se ao incómodo de verificar quais os artigos exceptuados dêste imposto, verificará que as excepções existentes são as mesmas da nossa lei.
A lei francesa estabelece o chiffre d'affaires, e nela se encontram disposições referentes ao consumo das águas minerais, dos vinhos, das cervejas, etc., que são atingidos por um imposto de fabrico e de produção.
A própria Alemanha, que criou a maior carga de impostos em relação aos outros países, que tem a contribuição sôbre o acréscimo das fortunas, a contribuição extraordinária da guerra, a contribuição extraordinária sôbre as, fortunas, que tem o imposto sôbre rendimentos, o imposto sôbre transacções, o imposto que vai até 90 por cento sôbre as heranças, que criou a contribuição directa do chiffre d'affaires, não deixou de, por isso, ter um imposto de consumo sôbre cervejas, vinhos licorosos, águas minerais, aguardentes açúcar, sal, etc., etc.
E até, Sr. Presidente, quando se, tratou da reconstituição financeira da Áustria, apesar de neste país existirem impostos sôbre artigos que podiam ser atingidos por outros, como imposto de transacção, a Sociedade das Nações não aboliu nenhum deles.
A meu ver, não é demasiada a carga que têm de suportar os artigos que estão abrangidos pelo imposto de transacção, porque são até os próprios industriais, sem excepção de nenhum, que afirmam estar dispostos a pagar os impostos integralmente, simplesmente discordando da forma da cobrança, que classificam de vexatória. Ainda ontem o Sr. Botelho de Sousa, em nome dos industriais de saboa-
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ria o perfumarias, o afirmava no Diário de Noticias.
Eu reconheço cortas dificuldades aã aplicação do imposto a determinados artigos, mas com o que não posso concordar é que se deminuam as receitas do Estado, pedido que não é feito pelos industriais, tanto mais que não estamos numa situação do tal madeira desafogada, que possamos prescindir dessas receitas.
Infelizmente, Sr. Presidente, não temos, governantes e governados, o espírito do sacrifício suficientemente forte para suportar as cartas fiscais que outros países, com mais alta compreensão dos seus interêsses, têm consentido.
Cita-se sempre o exemplo da Inglaterra, que na verdade é maravilhoso.
Sr. Presidente: eu não deixarei de citar dois ou três números, que demonstram o que é para o contribuinte inglês a existência das contribuições, país em que o fisco só faz sentir mais do que em qualquer outro.
É curioso, para quem seguir as discussões do Parlamento Inglês, verificar quais os fundamentos para a apresentação de propostas de finanças, que em regra visam à alteração de taxas. Nenhum Ministro das Finanças, desde que há déficit, precisa de explicar se a fortuna pública suporta mais algum aumento de contribuições. Desde que é necessário alcançar o equilíbrio orçamental, a resposta é esta: em vez de uma percentagem de 5, paga-se uma percentagem de 7, 8 ou 10.
Interrupção do Sr. Almeida Ribeiro, que não se ouviu.
O Orador: — Sr. Presidente: basta lembrar que em 1915 estava a super toxe em 3 xelins o 10 dinheiros, e em 1918, pelas propostas do Mac Kenna e Bonar Law, passou para 6 xelins.
Para se fazer ideá do esfôrço que naquele país se despendeu, basta ver que em 1913—1914 as receitas oram do 47 milhões de libras e em 1918-1919, cassaram para 331 milhão de libras.
Eu pregunto se em Portugal se foz qualquer esfôrço semelhante a êste, de maneira a quási decuplicar as verbas da receita do orçamento. Tal esfôrço não foi feito.
Sr. Presidente: por todos êstes motivos, eu não concordo com a parte da proposta da comissão de finanças, em que se pretende alterar as taxas de determinados artigos de maneira a fazer com que êles tenham uma menor produtividade.
Citou-se aqui o exemplo dos tabacos para defesa da avença. Não deve adoptar-se êsse sistema no sêlo.
Estou convencido de que a perda da imposto, por êsse motivo, foi enorme. Ficava o Estado com a má vontade do consumidor, porquanto há sempre má vontade contra o Estado quando lança impostos, e não recebia a totalidade do respectivo rendimento.
Todos se queixaram das dificuldades resultantes do pagamento do imposto de transacções, e apesar disso o público não deixa de pagar, quási integralmente, êsse imposto.
Todas as pessoas que frequentam hotéis sabem que pagam por êsse imposta muito mais do que o Estado recebo.
Os Bancos têm ganho com êste imposto, como se sabe, devido ao pagamento ser por avença.
O Sr. Ministro das Finanças é o primeiro a confirmar o que estou dizendo.
Certamente que cada indústria tem de ter um tratamento especial. Creio que é esta a opinião do Sr. Ferreira da Rocha, defendida no parecer da comissão de finanças.
Não tenho elementos suficientes para me pronunciar por uma outra forma de cobrança, entendendo que sôbre o assunto se deve pronunciar à Direcção Geral de Contribuições e Impostos.
Estas oram as considerações que desejava fazer, e, como já disse, no primeiro dia em que usei da palavra, não vi em nenhum dos manifestos das associações comerciais ou industriais razões técnicas que provem as dificuldades da aplicação do sêlo em quási todos os produtos visados pela lei.
Apenas julgo de alguma dificuldade a selagem dos sabonetes, podendo adoptar-se para êsse artigo uma cinta que não prejudique a estética da sua apresentação.
Entretanto não tenho elementos para me pronunciar com segurança neste ponto.
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Não esqueci o manifesto de 4 de Outubro de 1924, publicado pelos interessados, que é um documento singularíssimo, parcial e de ataque à República e a todos aqueles que dentro da República procuram bem servir o País, e que não têm tido senão trabalho e dissabores, emquanto êles têm tirado todas as vantagens da sua situação, o que não conseguiriam se os homens que se sentam naquelas cadeiras procedessem por outra forma.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro- das Finanças (Pestana Júnior): — Sr. Presidente: apenas alguns esclarecimentos.
As reclamações feitas ao Govêrno não têm sido contrárias ao pagamento do imposto, como algumas vezes aqui dentro se tem querido demonstrar, mas sim, apenas, da parte do comércio e da indústria se tem procurado obter do Congresso a modificação da lei por forma que a sua aplicação seja mais cómoda.
Sôbre a generalidade da proposta nada mais há a dizer, e quando chegarmos à especialidade eu direi quais as modificações a apresentar.
Está provado que o Estado não pode prescindir dêste imposto, principalmente vivendo nós em regime deficitário.
É um imposto cujo rendimento nós podemos classificar seguramente- em mais de três dezenas de milhares do contos.
Vê a Câmara que não é êste o momento de, desejando nós o equilíbrio orçamental, pormos de parte uma receita que há a esperança de produzir um montante que, conforme já disse, deverá ser bastante elevado.
Na especialidade, Sr. Presidente, eu mandarei para a Mesa as modificações que entendo devem ser introduzidas na proposta vinda da comissão de finanças, de maneira a que o projecto sirva ainda melhor os interêsses nacionais, sem pôr de parte os legítimos interêsses das classes, que, junto do Govêrno e desta Câmara, têm reclamado.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Poucas palavras eu direi para não demorar a votação dêste projecto na generalidade. No emtanto, como o Sr. Ministro das Finanças, nas suas considerações de há pouco, se referiu a algumas vozes que nesta casa do Parlamento têm dito que o comércio e a indústria declaravam que não podiam pagar mais impostos, e como uma dessas vozes é a minha, e, como além disso, dêste lado da Câmara se tem afirmado que o País não pode pagar mais impostos, eu tenho a dizer a V. Exa., Sr. Presidente, e à Câmara que se em parte são certas as palavras do Sr. Ministro das Finanças, noutra parte elas não correspondem à verdade dos factos.
As fôrças económicas, em geral, têm feito a afirmação clara o categórica de que não podem pagar os impostos que se lhes estão exigindo.
Dada, porém, a resistência do Parlamento o a orientação que nele continua a dominar, bem como nas altas regiões da República, de que se hão-de cobrar mais impostos, as colectividades que representam as fôrças económicas declararam então que, ao menos, procurassem tornar êsses impostos uma cousa menos violenta na forma da tributação, e até mesmo na fiscalização que, porventura, essa tributação exigisse.
Mas que não fique o Sr. Ministro das Finanças na idea de que essas classes não afirmaram que não podiam pagar os impostos que se lhes exigem.
Dito isto, tenho ainda a declarar que êste lado da Câmara não concorda com uma afirmação feita pelo Sr. Álvaro de Castro. S. Exa. disse que os políticos da República se têm sacrificado para o comércio o a indústria enriquecerem. Isto não é verdade, e contra aquela afirmação eu protesto.
Quem se tem sacrificado, dorido aos desmandos administrativos dos políticos da República, são os contribuintes. Êsses é que são os sacrificados; não os homens que levaram o País à situação em que êle se encontra.
Quis o Sr. Álvaro de Castro dar a impressão de que o comércio e a indústria estavam a nadar em dinheiro e que tinham enriquecido.
A crise gravíssima que o comércio e a indústria atravessam não permite a S. Exa. fazer uma afirmação de tal ordem.
Apoiados.
Não pode êste lado da Câmara pernil ter uma tal afirmação, porquanto essas classes, se já estavam bastante sacrifica.
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das, agora aluda mais o ficam com o decreto do regime bancário, que há-de trazer às classes económicas a impossibilidade de recorrerem ao crédito que lhes é indispensável.
Dito isto, Sr. Presidente, tenho apenas de declarar que nós, dôsta lado da Câmara, sendo absolutamente contrários a qualquer agravamento tributário, só aprovaríamos a generalidade do projecto da comissão de imensas, e só renovaríamos qualquer das suas disposições, se do nosso voto dependesse serem mais atenuadas as deliberações que esta Câmara vai tomar. Porém, como isto não sucede, rejeitá-lo hemos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: porque não desejo demorar a votação da generalidade do projecto, não responderei agora a algumas considerações feitas poios Srs. Álvaro do Castro e Velhinho Correia.
Contínuo convencido de que a forma do importo sôbre o valor das transacções será a única de aceitar, e que todas as Outras, até mesmo a que consta, do parecer da comissão de finanças, hão-de levantar na prática sérias dificuldades.
Desde que a comissão de finanças rejeitou o meu projecto, eu não poderei agora renovar a iniciativa dêle, e por isso devo dizer a V. Exa., Sr. Presidente, e à Câmara que, apesar de vencido na comissão de finanças, dou agora o meu voto ao projecto da comissão, somente para não demorar a sua votação na generalidade e se passar à sua discussão na especialidade, na qual tomarei parte.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Não há mais nenhum orador inscrito.
Está encerrada a discussão na generalidade.
Vai votar-se.
Foi aprovado.
Foi aprovada a acta.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ordem do dia. Continua em discussão o decreto sôbre o regime bancário;
O Sr. Nuno Simões: — Nos termos regimentais, começo por mandar para a Mesa a seguinte moção de ordem:
Moção
A Câmara dos Deputados, reconhecendo que os fundamentos económicos invocados pelo Ministro das Finanças para decretar a reforma bancária não bastam para essa justificação, passa à ordem do dia.— O Deputado, Nuno Simões.
Sr. Presidente: vai longo êste debate sôbre a reforma bancária decretada pelo Govêrno, que tem sido motivo de vivos, e alguns justificado, ataques no Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças anunciou na declaração ministerial que faria a reforma bancária, e eu tive ocaaião, no debato político da apresentação do Govêrno, de dizer ao Sr. Ministro do Comércio, a quem compelia naturalmente fazer essa reforma, que me parecia que não só necessitava de reformar a legislação bancária o que bastaria fazer cumprir a legislação que tínhamos.
Dá-se, na verdade, a circunstancia do se não exercer em Portugal fiscalização, tanto sôbre as sociedades anónimas, dum modo geral, como sôbre aquelas que exploram a indústria bancária, menos, Sr. Presidente, porque nos faltem leis para que essa fiscalização se exerça o para que todas as sanções se apliquem, do que por não se fazer uma rigorosa aplicação dessas leis.
O Sr. Ministro das Finanças propôs-se dar á Câmara e dar ao País, a uma como motivo do estado e apreciação o ao outro como plano do restauração económica o financeira, um determinado número de medidas. Entregou S. Exa. hà Câmara, Sr. Presidente, para estudar o apreciar aquilo que deveria ser para S. Exa. a medida fundamental — a da Caixa da Conversão — e S. Exa. decretou, ao abrigo duma autorização que aqui se demonstrou já que está esgotada, uma reforma bancária, que assim pomposamente se lhe chamou desde a primeira hora.
Preciso, Sr. Presidente, de dizer, antes de mais nada, que estou nesta questão inteiramente à vontade (Apoiados) e que nem as restrições nem as insinuações (custa-me a pronunciar esta última palavra
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tendo de, referir-me a certas frases pronunciadas aqui pelo Sr. Ministro das Finanças), nem as restrições, nem as insinuações, repito, que S. Exa. quis pôr neste debate, de qualquer modo me impedirão, do qualquer forma impedirão a Câmara de dizer nesta questão tudo quanto tenho a dizer, tudo quanto ela terá de se declarar, de falar claro e alto ao País, como é necessário fazer.
Apoiados.
Ainda S. Exa. não pensava em vir a ocupar no Directório do seu Partido a alta posição que hoje ocupa, e já a minha voz se erguia, como aliás tantas outras, batalhando contra os monopólios nos termos criteriosos em que se devia batalhar.
Eu desejo, apenas, de há muito, que em matéria de monopólios se respeitem os interêsses do País acima de tudo, e que se não faça a especulação de ordem política que em volta de homens da mentalidade do Sr. Pestana Júnior jamais se deveria ter realizado.
Feitas estas declarações, querendo salientar que não receio nem essas restrições, nem essas insinuações, e repito que me custa a pronunciar tal palavra tratando-se do Sr. Pestana Júnior, meu velho amigo e pessoa a cuja inteligência ninguém pode deixar de prestar homenagem, e assente também que não me toca qualquer insinuação das que se andam fazendo lá por fora em relação a atitudes que a Câmara possa tomar neste assunto, desejo demonstrar agora que a moção que mandei para a Mesa corresponde inteiramente à verdade dos factos e que as justificações que o Sr. Ministro das Finanças pretende dar à sua medida não são bastantes, nem o s argumento s que S. Exa. empregou correspondem à verdade, nem o critério que S. Exa. procurou firmar no seu decreto tem a lógica da política financeira que se está fazendo em todos os países, e que é necessário fazer também em Portugal perante uma crise económica que atinge um momento dos mais agudos.
Sr. Presidente: quando tive a honra de passar pelo Ministério do Comércio, não há muitos meses ainda, foi-me anunciada no Senado uma interpelação sôbre a fiscalização das sociedades anónimas e dos bancos.
Dei-me imediatamente habilitado a responder a essa interpelação. Simplesmente se não realizou por ter tido de abandonar o lugar do Ministério mais cedo do que, porventura, esperava.
Sr. Presidente: tive pena do que essa interpelação se não tivesse realizado. Se tivessem sido ouvidos determinados esclarecimentos sôbre o que tem sido a fiscalização da indústria bancária no nosso País, talvez S. Exa. não tivesse publicado o decreto que motivou a discussão que se está travando nesta Câmara.
Há muitos meses que na imprensa e no Parlamento justíssimas reclamações há a respeito do modo como essa fiscalização se tem exercido.
Sou o primeiro a reconhecer a necessidade de colocar nos departamentos respeitantes às sociedades anónimas elementos de fiscalização do Estado. Êsses elementos não existem.
Apoiados.
Mas, sobretudo, a legislação que rege a indústria bancária não tem sido cumprida.
Apoiados.
Se em relação aos bancos emissores se não tem procurado fazer cumprir os contratos, em relação aos outros bancos e sociedades anónimas não se tem também procurado fazer a fiscalização necessária.
E sucede, os factos o estão demonstrando, que a falta dessa fiscalização tem causado os maiores desastres, não somente para os accionistas, mas para a economia pública de um modo geral.
Mas, sendo assim, havendo necessidade de fazer cumprir a lei em relação às sociedades anónimas, não era preciso publicar o decreto para garantir a sua fiscalização. Tal decreto não se justifica com os factos invocados.
O decreto do Sr. Ministro das Finanças é precedido de uns considerandos.
Analisemos com serenidade e sem paixão, que não é necessária, os considerandos.
Vozes: — Ordem, ordem.
O Sr. Presidente: — Peço aos Srs. Deputados o favor de não fazerem sussurro.
O Orador: — V. Exa. é muito amável classificando, apenas, de sussurro o que
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se está passando. É uma agitação suficientemente ruidosa para que não se possa usar da palavra.
O Sr. Ministro das Finanças, no primeiro considerando do sou decreto, considera fundamental o saneamento monetário e cambial do País. Mas não seria natural, em face do que se tem passado e ainda está passando, que houvesse ponderação da parte do Sr. Ministro?
O Sr. Ministro das Finanças, ao mesmo tempo que entrega ao Congresso da República o projecto da sua caixa do conversão, resolve, dentro do seu plano, decretar algumas medidas que, evidentemente, podiam estar dentro da ordem natural das cousas, mas, tendo de ocorrer ao problema bancário, publica um decreto que não deixa do enfermar dos dereitos de todas as organizações bancárias que temos tido.
Deve ter reconhecido S. Exa. que todas as disposições a respeito de economia bancária poderão ser oportunas e justificadas depois de resolvido problema da caixa de conversão, mas que nesta altura não correspondem de nenhum modo à lógica que deveria orientar o plano do Sr. Ministro das Finanças,
Inverteram-se os termos da questão.
Desejo alhear-me neste momento do aspecto constitucional da reforma bancária.
Nem sequer desejo invocar neste momento a disposição constitucional em que se estabelece expressamente que é privativo do Congresso da República criar bancos emissores.
O Sr. Ministro das Finanças não deixa de fazer transformações profundas na vida dêsses bancos, que hão-de reflectir-se no próprio fenómeno da emissão.
Sem estar em discussão a sua proposta da caixa do conversão, não será porventura inoportuno lembrar que um dos fins da caixa de conversão é valorizar a moeda nacional.
A valorização faz-se nos termos da proposta do conversão à custa da economia nacional.
Tais considerações vêm a propósito de ter o Sr. Ministro das Finanças considerado a reforma monetária como medida, de ordem parcelar, que outra cousa não é esta disposição.
O Sr. Ministro das Finanças tem entre os seus escritos, com certeza, O relatório sôbre a situação bancária, do ilustre Deputado Sr. Vitorino Godinho, meu amigo, escrito em 1902.
Por êsse relatório poderia ter averiguado que o número de bancos hoje é igual ao número do bancos em 1914, e que em todo o caso êsses bancos correspondem, muitos deles, a fusões já realizadas.
Não é necessário, quando um banco não pode viver, ordenar-lho que se funda; os bancos se convencem e se fundem antes que maior mal lhes suceda.
V. Exa. não ignora, e não ignora a Câmara, que, recentemente, suspenderam pagamentos vários bancos, e que se fundiram dois dos mais importantes: o Colonial e o Agrícola,
Existiam em 1914 vinte e cinco bancos, e êsse é o número que actualmente temos.
Mal fez o Sr. Ministro das Finanças no seu relatório em escrever certos considerandos, porque no momento em que as pessoas que dirigem as finanças do todos os países procuram informar-se do que em cada um deles se está passando, algumas afirmações do relatório não servem senão para aumentar o descrédito da banca portuguesa e para prejudicar o crédito que é, realmente, duma sensibilidade excessiva. O Sr. Ministro das Finanças bem o sabe, e ninguém o ignora.
Sabe muito bem o Sr. Pestana Júnior que, embora a reserva metálica dos bancos seja de 250:000 contos, os seus fundos de reserva, aplicados em títulos-ouro, correspondem a muito mais que os 200:000 contos.
Mau é que, num documento desta importância, o Sr. Ministro das Finanças não fôsse mais rigoroso na expressão dum pensamento que poderia ter outra justificação, sem carecer da deminuição dum número, pois êste facto pode representar também um prejuízo para o crédito, da banca portuguesa.
S. Exa. quero que acreditemos no seu pessimismo, mas não deixa de confessar que não possui estatísticas que o possam informar a respeito da situação das casas bancárias de Portugal.
Procedeu o Sr. Ministro a qualquer inquérito ou investigação de ordem particular para conhecer essa situação?
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Se assim é, porque não nos traz informações completas sôbre o assunto, nem nos apresenta factos concretos para justificar esta medida e as violências e radicalismos que dela resultam?
Sr. Presidente: não ignora V. Exa. e não ignora a Câmara que há muitas casas bancárias que, pela sua importância, constituem verdadeiros bancos, praticando actos que lhes não são permitidos e deixando de cumprir prescrições legais a que são obrigadas.
Se se exigisse a essas casas bancárias a obrigação de satisfazerem determinadas condições, não seria necessária esta reforma bancária, nem ela obriga mais do que a legislação existente.
O Sr. Ministro das Finanças defendeu, em seguida, o critério do capital mínimo em ouro, e sustentou que é o capital o elemento primário da função de crédito dum banco.
Mas então o Sr. Ministro — pessoa lida em cousas financeiras, não obstante todas as afirmações em contrário, porque S. Exa. possui uma grande cultura — pode fazer ama afirmação desta natureza?
Então S. Exa. não repara, não quere atentar nos dados que lhe fornece a estatística da situação bancária em Portugal?
Pois então ignora que os bancos mais importantes são os de capital mínimo, embora representem, pela massa dos depósitos, um capital enorme?
Não acredito que S. Exa. assim pense, e foi por não acreditar isso que me julguei na obrigação de fazer um comentário a êste considerando, não o julgando à altura da mentalidade do Sr. Ministro das Finanças.
Sr. Presidente: tenho presente na minha carteira a situação bancária de 1923, números oficiais, e basta confrontar alguns dos seus números para verificar que a função que o Sr. Ministro considera primária não o tem sido, nem o é, na vida dos bancos portugueses.
Por exemplo, os Bancos Aliança e Comercial, do Pôrto, e o Banco Lisboa e Açores são instituições bancárias de capital reduzido, e entretanto, confrontando o volume dos depósitos — principalmente os depósitos a prazo — com os dos outros bancos de maior capital, eu verifico que são êles dos que têm prestado melhores serviços à economia nacional, sem necessitarem da intervenção do Sr. Ministro das Finanças para cumprirem bem a sua, função.
É curioso que na reforma que estamos discutindo não aparece nenhuma disposição que integre os bancos em funções diversas daquelas que têm tido até agora. Não se lhes atribui qualquer nova obrigação que vá concorrer para esta finalidade tam importante dos considerandos do Sr. Ministro.
Apenas no capítulo XIII se consignam várias aspirações de crédito cooperativista. Sôbre crédito industrial ou agrícola, nem uma palavra sequer. Limitam-se até os créditos a longo prazo. Até aos capitais da Caixa Geral de Depósitos, que devem ser empregados nesses créditos, se pretende dar uma aplicação diferente, dando ao Banco de Portugal a função de redesconto e à Caixa Geral de Depósitos a de desconto.
Sr. Presidente: no considerando seguinte o Sr. Ministro das Finanças apresenta como fundamental a questão da fiscalização. Daqui vem o que pode ser considerado pomo de discórdia em certos meios políticos. Daqui nasce a base principal das acusações e das veemências de linguagem e de ataques que se têm procurado fomentar em volta desta questão.
Se há, como ontem afirmou aqui o Sr. Velhinho Correia, factos concretos e gravíssimos que demonstram que as leia não se têm cumprido, eu sou levado a preguntar porque é então que não se cumprem as leis.
Se não se executam as leis actuais, para que fazer leis novas?
Se houve bancos que deixaram de cumprir as obrigações que tomaram em, relação ao Estado e em relação aos seus accionistas, porque é que não se procede contra êles, em vez de vir com uma nova medida que para mais não serve senão para complicar e confundir uma questão já de si complicada e confusa como nenhuma outra?
Toda a fiscalização que competia ao Ministério do Comércio vai dar-se à Inspecção do Comércio Bancário. Esta Inspecção, porém, desaparece em virtude da proposta que cria a Caixa de Conversão.
Quere isto dizer que o Sr. Ministro das Finanças resolveu realizar por étapes, e fora do Parlamento, aquilo que ao Par-
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lamento entregou para ser devidamente apreciado?
Quere isto dizer que se procura concentrar na Inspecção do Comércio Bancário a função fiscalizadora da indústria bancária em Portugal, sabendo-se já que para um organismo diferente terá de passar essa atribuição?
Procura, então, o Sr. Ministro das Finanças iludir o espírito da sua proposta sôbre a Caixa de Conversão, começando desde já a fazer, som necessitar do Parlamento, um determinado número de medidas que achou necessárias para a efectivação do sou plano?
Porque não foi S. Exa. mais longo convertendo a sua proposta em decreto?
Sr. Presidente: já do há muitos anos toda a gente sabe que a maior parte das crises de ordem financeira o económica que se têm produzido em Portugal são, sobretudo, crises bancárias. Encontra-se isso documentado largamente no notável trabalho do Teixeira Bastos A Crise, e aos trabalhos do Luciano Cordeiro.
Está ainda na memória do todos o que se passou por ocasião da última crise bancária, chamada a crise dos bancos do Pôrto, tam largamente discutida.
Também não só ignora que o simples cumprimento duma disposição do Código Comercial, artigo 173.°, § 3,°, bastaria para evitar essa crise.
Polo que toca a bancos emissores o caso é muito mais grave.
Vários Ministros levaram os bancos à falta do comprimento dos seus contratos, até por meio de portarias surdas para se aumentar a circulação fiduciária.
O Sr. Ministro das Finanças no relatório da Caixa do Conversão elogia a Áustria por ter pôsto do parte a intervenção do Estado nos bancos emissores.
Porque seguiu então uma orientação diversa na sua reforma bancária?
O Sr. Ministro das Finanças ouviu o ilustre Deputado Sr. Cunha Leal, e certamente sabe das conclusões das conferências do Génova o de Bruxelas, a que assistiram membros do Parlamento dos mais graduados, conclusões que têm de ser respeitadas.
O Estado fez-se representar na conferência do Bruxelas, o surge agora querendo o contrário do que aí se determinou.
O Ministro das Finanças não pode deixar mal colocados os homens que assinaram tais convenções, tais compromissos.
Numa das conclusões da Conferência de Bruxelas repele-se a intervenção do Estado nas organizações bancárias.
Isto demonstra uma vez mais que a nossa política financeira é de senso.
Vamos marchando como Deus é servido.
Talvez não haja no mundo mais vasta o complicada legislação financeira que a nossa, e é certamente por isso que surgem tantas dificuldades.
Sr. Presidente: de tudo isto se conclui que o Sr. Ministro das Finanças não foi feliz em nenhum doa considerandos do seu decreto.
Êles não correspondem a qualquer lógica financeira, a qualquer princípio financeiro mundialmente estabelecido nem, sequer, à verdade dos factos e a muitas das afirmações do Sr. Ministro das Finanças.
Quando se debateu nesta Câmara a questão do programa ministerial, eu tive ocasião do fazer um rápido exame da situação.
Sabem V. Exas. que ela não é do molde a conduzir-se por desesperanças.
O problema consiste em realizar modificações na nossa vida económica, e o Sr. Ministro das Finanças, procurando atacar de frente, embora em termos os mais discutíveis, o problema monetário, compreendeu que êsse é o problema fundamentai do País, mas não é com a sua Caixa de Conversão que S. Exa. é vai resolver.
O Sr. Ministro das Finanças sabe muito bem que as suas propostas carecem de um largo estudo, e que elas estão insuficientemente documentadas, motivo por que torna medida de tanta monta, como a reforma bancária, não devia tê-la enviado para o Diário do Govêrno sem a trazer ao Parlamento, como lho cumpria.
Foram estas considerações como que uma declaração de voto.
O Sr. Ministro das Finanças não devia fazer a reforma bancária pela forma como à fez.
Bastava que com o seu colega da pasta do Comércio aplicasse a lei, não permitindo os abusos que têm sido praticados. Foi a má orgânica do Estado que permitiu semelhantes abusos, nalguns dos quais
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o Poder Executivo foi o primeiro a colaborar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi lida e admitida a moção do Sr. Nuno Simões.
O Sr. Abranches Ferrão: — Sr. Presidente: antes de mais nada, não posso deixar de protestar contra as palavras do Sr. Ministro das Finanças, quando, nos seus últimos discursos, quis estremar dois campos, a propósito da discussão da reforma bancária.
Disso S. Exa. que todos aqueles que não concordassem com a doutrina do seu decreto é porque estavam do acordo com o regime dos monopólios, com o regime dos abusos que têm sido praticados nos bancos e casas bancárias.
O Sr. Ministro das Finanças (interrompendo): — V. Exa. dá-me licença?
Vale a pena rectificar, porque ou não disse isso.
Numa exposição que fiz muito a correr, disso que compreendia que haja quem ataque a reforma bancária por interêsses, por necessidades, por quaisquer outras razões.
Mas aqueles que não têm êsses interêsses e essas necessidades só podem atacar a minha reforma bancária por uma questão especulativa.
Folgo do dizer que todos V. Exas. estão nestas condições: partem de um princípio doutrinário diferente do meu.
Distingo, pois, nos meus opositores duas categorias.
O Orador: — Agradeço as palavras de V. Exa. e a justiça que presta àqueles que não concordam com a dissertação de V. Exa.
Sr. Presidente: como faço parte de um agrupamento de Deputados que têm apoiado o Govêrno, para ressalvar a minha responsabilidade parece-me que o Govêrno não deve considerar esta questão com carácter essencialmente político.
Eu compreendo que o Sr. Ministro das Finanças, com a sua competência e inteligência, corte abusos, e toda a Câmara sabe que é necessário proceder-se a uma reforma bancária.
Antes, porém, de entrar na análise do decreto, devo preguntar à Câmara o seguinte: se uma autorização parlamentar dada ao Govêrno pode servir para mais de uma voz?
O Sr. Álvaro de Castro (interrompendo): — É V. Exa. que o pregunta?
O Orador: — Sim, senhor. Quere-me parecer que o Sr. Ministro das Finanças, fazendo uso dessa autorização, está fora da Constituição, visto ela já ter sido utilizada pelo Sr. Álvaro de Castro.
Ainda que assim não fôsse, eu pregunto se é de admitir que se altere ou anule um contrato bilateral entre o Estado e um particular sem o acordo do um dos contratantes.
Foi êste ponto que mais chocou a minha sensibilidade jurídica, visto que no contrato entre o Estado e o Banco de Portugal existo reciprocidade de obrigações.
Neste contrato estabelece-se a nomeação do mais dois governadores e no contrato anterior apenas se admitia a possibilidade de nomear um.
Por isto tudo, eu pregunto se é possível alterar o contrato apenas pelo livre arbítrio de uma das partes.
Das palavras do Sr. Ministro das Finanças parece depreender-se que será proibido ao Banco do Portugal fazer descontos directos.
Ora, sabendo-se que êsse banco é que tem sido o regulador da taxa de juro, e impedindo-se-lhe o exercício desta função, evidentemente que a taxa de juro vai ser maior.
O Sr. Ministro das Finanças não precisou bem o alcance desta disposição ao introduzi-la no decreto.
Sôbre o número do votos de que o Estado pode dispor nas assembleas gerais também afirmo a minha discordância em relação ao que se preceitua na reforma.
Note V. Exa.: eu não digo que o Estado não tenha o direito de proceder dessa maneira; no emtanto, isso vai contrariar absolutamente o que está na nossa legislação, colocando o Estado, como particular, numa situação privilegiada relativamente aos outros possuidores de acções. Eu compreendia que isso assim se fizesse para o Estado, desde que se fizesse também para os outros portadores de acções.
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O Sr. Ministro das Finanças, jurisconsulto hábil como é, sabe bem a razão por que a nossa legislação não permitiu que os portadores de acções tivessem tantos votos quantas acções possuíssem.
Outro ponto do decreto que me parece também absolutamente inaceitável é aquele em que o Sr. Ministro das Finanças coloca as instituições bancárias numa situação tal que ficam dependentes do seu arbítrio, e dependentes até às vezes por circunstâncias que podem não ter importância alguma.
Essa parte do decreto está redigida duma forma tam vaga que, na verdade, todas as arbitrariedades são possíveis.
Suponha-se, por exemplo, que um comerciante, em nome individual, precisa de descontos nos bancos, mas como um dia, vindo do estrangeiro e trazendo um lenço de seda na algibeira, que se esqueceu de manifestar, foi condenado por isso, não pode fazer descontos.
Suponha-se também que qualquer banco, ignorando que um indivíduo foi condenado por um pequeno delicto de contrabando, como o atrás relatado, lhe faz um desconto; pois isso é o suficiente para poder ser punido pelo Sr. Ministro das Finanças.
Eu concordo em que o Sr. Ministro das Finanças tenha uma interferência directa na aplicação de sanções aos bancos, mesmo para elas terem uma execução rápida, mas julgo também que os condenados devem ter a faculdade de recorrer, embora o recurso não tenha efeito suspensivo.
Mas se amanhã V. Exa., ou outra pessoa, quiser aplicar à risca aquilo que se encontra estabelecido no decreto, os bancos e casas bancárias ficam absolutamente dependentes da sua boa ou má vontade.
Não me pareço que isto seja uma cousa de aceitar!
Apoiados.
Aí tem V. Exa., Sr. Presidente — e não me quero alongar em considerações variadas sôbre outros pontos do decreto para não fatigar a Câmara— os pontos que me chocaram mais.
E devo dizer ao Sr. Ministro das Finanças — e de resto S. Exa. conhece-me bem, há muito tempo, para saber que o que sinto corresponde aquilo que penso — que falo com toda a sinceridade; estou convencido, e disse-o, que uma reforma do sistema bancário é necessária; estou convencido que se exige uma certa audácia para se poderem cortar todos os abusos, mas estou também convencido que o Sr. Ministro das Finanças, procedendo como procedeu, ofendeu a lei o cometeu uma arbitrariedade que a Câmara não pode admitir.
Apoiados.
Aqui têm V. Exas. a razão por que, só o Govêrno entende querer fazer desta questão uma questão fechada, apesar de fazer parte do bloco político, não poderei votar com êle.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio Gonçalves (para um requerimento): — Sr. Presidente; requeiro que V. Exa. consulte a Câmara sôbre se permite que se prorrogue a sessão até liquidação da questão bancária, tendo a Mesa a, faculdade de dar o intervalo necessário para os Srs. Deputados irem jantar.
Posto à votação, é aprovado o requerimento,
O Sr. Álvaro de Castro: — Sr. Presidente : o debate abrange duas questões. Uma de ordem constitucional, que poderia ser tratada em questão prévia, que é a validade da publicação do decreto, baseando-se nas autorizações dadas ao Govêrno; outra que é propriamente o valor do documento publicado pelo Govêrno a propósito da reforma do regime bancário.
Sr. Presidente: quanto ao primeiro ponto é estranho que nesta altura se levante a inconstitucionalidade da aplicação da lei n.° 1:545, para o efeito de se tomarem providências nos termos que essa lei autoriza, quando é certo que êste Parlamento de há muito consignou a doutrina, que passou a ser constitucional e pela prática, por resultar de uma interpretação do artigo 27.° da Constituição, da aplicação contínua das autorizações de carácter genérico conferidas pelo Poder Legislativo ao Executivo.
Não é de hoje, não é de ontem, esta doutrina, porque já a lei n.° 376 foi largamente aplicada na adopção de medidas
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de carácter financeiro, de carácter económico e de carácter administrativo, por Governos não só a quem directamente ela tinha sido concedida, mas por outros, e só em 1919 essa lei foi revogada com aplauso do Parlamento.
O Sr. Pedro Pita: — Não apoiado.
O Orador: — Eu digo com aplauso do Parlamento, porque a opinião da l ou mesmo 20 Deputados não constitui a opinião da Câmara.
O Sr. Pedro Pita: — Eu demonstrarei a V. Exa. que essa lei foi revogada, sim, mas com a precisa determinação de que já se devia considerar revogada.
O Orador: — Tem V. Exa. razão, mas emquanto não foi revogada foi usada.
De resto, o mesmo tem sucedido com outras autorizações, e foi por isso mesmo que com espanto, surpresa e admiração eu vi o Sr. Abranches Ferrão interrogar, alto e sonante, como se estivesse na sua cadeira de professor de direito administrativo, se a Câmara consentia que se usasse da lei n.° 1:545, estando ela esgotada, quando é certo que S. Exa., como Ministro da Instrução do Gabinete Rodrigues Gaspar, assinou vários decretos publicados ao abrigo da mesma lei.
Com espante, surpresa e admiração eu vi também o Sr. Abranches Ferrão preguntar como é que se derrogaram cousas contratuais por meio unilateral de ordem legistativa ou executiva, quando é certo que S. Exa., pertencendo a um Govêrno, perfilhou, senão aplaudiu, a medida tomada pelo Parlamento destruindo o acordo dos tabacos, feito de uma maneira unilateral, e eu aplaudi-o porventura por isso.
O Sr. Abranches Ferrão: — V. Exa. dá-me licença?
É para dizer a V. Exa. que os casos são absolutamente diferentes.
Só se fez o que V. Exa. citou na persuasão de que o Govêrno não se encontrava autorizado a contratar como contratou; mas o contrato com o banco emissor foi leito de harmonia com as disposições votadas pelo próprio Parlamento.
O Orador: — A lei n.° 1:545 — o Parlamento deve estar recordado — foi votada quando tive a honra de presidir ao Ministério.
A própria redacção da lei n.° 1:545 demonstra que essa autorização não é simples.
Na mesma lei consigna-se um grupo de autorizações relativas a todos os assuntos que tenham relação ou possam tê-la com matéria cambial. Êste decreto foi usado pelo meu Ministério larguissimamente.
É certo que ela já então foi impugnada por alguns Deputados aqui no Parlamento. Contudo nunca nesta casa se votou qualquer moção relativa a condenar o procedimento do Govêrno e a estabelecer a doutrina de que a lei n.° 1:545 tinha caducado para os efeitos do Govêrno dela poder usar. Bem pelo contrário, aqui se votaram até moções de aplauso e apoio ao Govêrno, demonstrando-se assim que o Govêrno bem tinha usado, legalmente, constitucionalmente, das autorizações que aí se continham.
No Ministério do Sr. Rodrigues Gaspar por igual se usou largamente da lei n.0 1:545, à sombra dela legislou-se por delegação do Poder Legislativo, e não ,me consta também que a Câmara tivesse votado qualquer moção, qualquer lei ou projecto condenando o procedimento dêsse Govêrno.
Houve até um decreto que levantou desde logo larga discussão: foi a reforma do Contencioso Fiscal.
Êle deu origem mesmo a uma interpelação feita por um Deputado da minoria nacionalista — se não estou em erro — mas a Câmara não concordou com as palavras dêsse Deputado, porque não votou a moção mandada para a Mesa pelo interpelante.
Mas não era preciso invocar a lei n.º 1:545.
Vejamos o que se passou com a lei n.º 1:344, que tem a vantagem de não estar agora em debate.
A lei n.° 1:344 foi usada pelo Ministério do Sr. António Maria da Silva, foi usada pelo Ministério a que presidi mais. largamente ainda, foi utilizada pelo Ministério do Sr. Rodrigues Gaspar.
Eu tenho aqui até dois dos decretos que resultaram dessa situação: e que extinguiu o Comissariado dos Abastecimen-
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tos e o que modificou a fiscalização junto da Companhia dos Tabacos.
Apreciemos a resolução do Supremo Tribunal do Justiça no que respeita ao contencioso administrativo, cujas atribuições como V. Exas. sabem, precisamente pelas autorizações concedidas pela lei n.° 1:344, passaram para o Supremo Tribunal do Justiça e Relações.
E o que sucedeu?
O presidente do Supremo Tribunal Administrativo, o Sr. Mesquita Carvalho, interpôs recurso para o Supremo Tribunal do Justiça do decreto que tinha extinto a jurisdição administrativa especializada.
Esse recurso foi julgado há 3 ou 4 dias, creio.
E qual o julgamento do Supremo Tribunal de Justiça?
Tendo-se invocado, porque se invocou, por parto do Sr. Mesquita Carvalho a inconstitucionalidade do uso dessas autosas autorizações para se extinguir o Supremo Tribunal Administrativo, a resolução do Supremo Tribunal de Justiça foi esta: considerar constitucional o decreto n.° 9:340, de 7 de Janeiro de 1924, que extinguira o primeiro dos tribunais referido, extinção feita pelo Govêrno à sombra da lei n.° 1:344.
Seria, pois, cómico, Sr. Presidente, que o Parlamento, assistindo impassível durante meses, o perante governos vários que tinham usado dessas autorizações parlamentares, só hoje acordasse com o sentimento de uma constitucionalidade que agora se tornará incompreensível, porque o sentimento e interpretação das leis não podem e não devem estar ao sabor de paixões de momento.
Apoiados.
Portanto, não posso ter dúvidas de que efectivamente a lei n.° 1:545 está em vigor, emquanto o Poder Legislativo a não revogar e de que o Govôrno tinha poder, por essa autorização, para legislar na matéria sôbre que legislou.
Tendo poder para legislar em matéria cambial usando da delegação do Parlamento, é como se o próprio Parlamento deliberasse, votasse ou expedisse um diploma à assinatura do Sr. Presidente da Republica, o facto que se deu no decreto em debate. Era, pois, constitucional êsse decreto, embora o Sr. Vasco Borges, também constitucionalista aflito nesta hora, mas aquele que mais fortemente, mais rudemente rasgou como juiz — porque S. Exa. quando Ministro essa sua qualidade invocou — rasgou como juiz — dizia — a Constituição, embora S. Exa., repito, se esforçasse por demonstrar a inconstitucionalidade do decreto publicado pelo Govêrno.
O Sr. Vasco Borges: — Não foi como juiz mas como Ministro que eu fiz isso. Declaro que tornaria agora a fazê-lo se fôsse Ministro.
O Orador: — Mas fazia uma asneira. Então V. Exa. como Ministro invoca o uso da missão adjudicatória para revogar sentenças do tribunais, o V. Exa. entende que isto é defensável?
O Sr. Vasco Borges: — Não revoguei cousa alguma.
O Orador:— V. Exa. opôs-se à execução, e na Constituição está que não pode opor-se.
O Sr. Vasco Borges: — Agora disse V. Exa. asneira.
Uma voz: — Asneira?
O Sr. Vasco Borges: — É uma asneira, repito, no uso do mesmo direito.
O Orador: — Eu disse o com justiça. V. Exa. como magistrado, ministro, deputado ou o que quiser, abusou da função judicial.
O Sr. Vasco Borges: — Nesse momento defendia o regime.
O Orador: — Do acordo; mas a decisão de um tribunal não pode ser revogada por um ministro.
O Poder Executivo, por delegação do Poder Legislativo, fica em plena posse da faculdade de legislar.
Apoiados.
Não se pode dizer que o Govêrno revoga matéria do Código Comercial, o que por delegação do Parlamento não podia fazer.
O Parlamento pode revogar as disposi-
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coes de qualquer artigo do Código Comercial.
Mas não reconheço aos deputados monárquicos o direito de pugnar pelo cumprimento exacto da Constituição dentro desta Câmara, como o reconheço aos deputados republicanos.
O regime monárquico viveu quási sempre em plena ditadura.
Apoiados.
Os diplomas capitais foram postos em execução por ditadura, por actos ditatoriais.
Apoiados.
Nesta matéria do regime bancário, regulado por legislação do Código Comercial e legislação fora do Código Comercial, o diploma referente a bancos é inteiramente ditatorial.
Apoiados.
Aí estabelecem-se disposições, algumas delas modificando profundamente o regime de falências, por exemplo, em relação aos bancos, concedendo ao Poder Executivo a faculdade de nomear comissários especiais para os bancos.
Apoiados.
Estabeleceram-se assembleas especiais de accionistas para interferirem na sua administração.
Quem quiser ler o relatório que precede o decreto n.° 814, verificará que muitas das razões invocadas hoje por todos os republicanos para mais fundamente se intervir na vida interna dos Bancos são ontem como hoje as mesmas.
Apoiados.
Entendo, por isso, e julgo que não há ninguém que assim o não julgue, que o modificar o regime bancário em condições de inteira utilidade e garantia para o Estado e para os particulares é necessário.
Esta reforma era urgente, era necessária e era até inadiável!
Atacaram-se até alguns preceitos que constam da legislação de 1896, quando é certo que a redacção é perfeitamente igual, como se fossem preceitos novos ou que aparecessem pela primeira vez na nossa legislação. Estavam efectivamente no esquecimento êsses preceitos, mas precisavam renovar-se na legislação, não importando nada que com untam ente com isso se estabelecessem determinações para que a execução dêsses preceitos fôsse completa, e perfeita.
Sr. Presidente: os Srs. Cunha Leal e Nuno Simões fizeram referência às conferências internacionais que se realizaram em Génova o Bruxelas acerca dos problemas financeiros que interessavam aos países mais ou menos combalidos com a guerra.
Efectivamente, dessas conferências saíram considerações sôbre essa matéria, mas o facto de se aderir a essas conferências não importa para nenhum país a obrigação de adoptar os princípios que nelas foram defendidos.
Essas conferências servem apenas para dar directrizes, mas não obrigam nenhum país a segui-las, tanto mais que são de carácter geral e não atendem à situação especial de cada país. Digamos que o que lá se estabelece é a filosofia dos fenómenos.
A Áustria, por exemplo, seguiu em parte o conselho da Sociedade das Nações, nomeando para a direcção do seu banco emissor um suíço dos mais competentes que por ela foi indicado, mas em Portugal muitos dos princípios que essas conferências estabeleceram, e de mais fácil execução, não foram seguidos, ou, se o foram, foi só muito tarde.
Assim, por exemplo, só muito tarde se começou a fazer em Portugal a obra de redução de despesas preconizada por essas conferências, e o aumento de receitas só a muito custo se conseguiu, mas com a sanção do Parlamento, quando por exemplo, na Áustria êle foi draconianamente imposto, arrancando-se ao Parlamento uma lei em que êle abdicava da sua principal prerrogativa, ficando uma comissão encarregada de conseguir, como da facto conseguiu, o salvamento daquele nação.
Mas em matéria bancária, mais particularmente, e nosso país se encontra numa situação especial, com referência a outras nações, não sendo conveniente que o Estado abandone inteiramente a função bancária, muito principalmente aquela que o interessa, que é a da banca que tem a faculdade de emissão de notas.
Apoiados.
E neste particular, sem emitir um princípio de posição em relação àquilo que entende o Sr. Ministro das Finanças necessário nesta matéria, eu não posso deixar de afirmar determinados princípios,
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que tem do estar acima do objecto concreto desta discussão, porque são princípios gorais de autoridade e autonomia do Estado, que não podem passar em julgado, quanto à competência que o Estado tem de determinar certas regras a certos bancos.
Os bancos emissores, pela razão mesmo de serem emissores, são sujeitos a limitações muito especiais, limitações que o Estado tem o direito de lhes impor, como tem o direito, de lhes impor as regras necessárias à consecução dos fins para que o Estado foi estabelecido; e nós, republicanos, não podemos esquecer-nos que os intuitos elevados da República não podem deixar de integrar-se de tal maneira nos órgãos financeiros que êstes não possam de momento a momento deixar, principalmente nos lances arriscados da vida do regime, de o auxiliar, dando-lhe a certeza que não servirão para perturbar a sua marcha.
Entendo, por isso, que mesmo que não se estivesse de acôrdo com certos princípios estabelecidos no decreto, se devia ressalvar a doutrina de que o Estado tem sempre o direito de impor condições aos bancos emissores.
São, realmente, bancos de capital privado, mas êles participam de uma função pública que pertence ao Estado, que o Estado não aliena, mas simplesmente autoriza o uso dela em certas o determinadas condições.
Apoiados.
Trata-se, repito, de bancos que participam do exercício de funções públicas que pertencem ao Estado e, portanto, êste tem o dever de não abandonar a respectiva indústria de uma forma decisiva.
Evidentemente que o Govêrno não pensou em substituir pelo decreto que publicou o que se encontra nos contratos, porque — já o declarou o Sr. Ministro das Finanças — entende que para tal necessário se torna realizar o competente acôrdo.
Sr. Presidente: como não vi ainda da parte dos interessados ser feita contra o decreto qualquer fundamentada reclamação junto do Govêrno ou do Parlamento, sou levado a concluir que o Sr. Ministro não publicou o seu decreto sem ter estudado o terreno e condicionado a acção futura do Ministério nessa matéria.
É na verdade audaciosa a declaração do um dos bancos emissores, de que jamais os seus corpos directivos tinham oferecido ao Govêrno a entrada a delegados seus no banco. É singular e audacioso.
Em 6 de Setembro de 1923, o Banco Nacional Ultramarino assegurava pela sua direcção, ao Ministério de então, a entrada de delegados administradores na direcção do Banco.
Há países que têm a maior liberdade bancaria, É exemplo disso a Inglaterra, que é uma monarquia; más há, uma República, a dos Estados Unidos da América, em que o regime bancário difere em muito do regime inglês. Nos Estados Unidos da América a intervenção do Estado em matéria bancária é absoluta. O Chefe do Estado goza do prerrogativas especiais sôbre tal matéria. Basta dizer que o Presidente da República pode regular diariamente o desconto em todas as praças da América.
Na Suíça é absoluta a intervenção do Estado, no Banco Federal.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Finanças já declarou, creio que na última sessão, que, atendendo a reclamações feitas por alguns bancos regionais acêrca da limitação do capital, tencionava referir-se a esta matéria.
Efectivamente os bancos regionais merecem toda a consideração pela função que representam de mealheiros populares, de verdadeiros bancos democráticos, que nós, os republicanos, não podemos combater, tratando-se do instituições contra as grandes aglomerações capitalistas.
Se efectivamente a obra da República se pudesse fazer na democratização do crédito dos bancos, seria uma maravilhosa obra; porque é absolutamente necessário desenvolver o espírito de economia do chamado pé de meia nas camadas populares e só os pequenos bancos o podem conseguir, inspirando uma grande confiança, dentro das pequenas terras da província.
Creio de uma maneira geral que o Govêrno não se absterá de tornar mais perfectível o decreto, e digo isto porque não há nenhuma obra perfeita que saia das mãos dos homens.
O Sr. Ministro das Finanças e o Govêrno procurarão certamente a perfectibilidade até atingir o máximo dela que
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possível, ouvindo as reclamações justas que a seu respeito sejam apresentadas.
Neste particular não posso legitimamente criticar o Govêrno pela medida que estamos discutindo, porque, se ocupasse as cadeiras do Poder neste momento, eu teria usado da autorização da lei n.° 1:545, como fez o Govêrno.
No plano financeiro e económico da política do Govêrno esta reforma do regime bancário representa efectivamente a pedra basilar do programa que se estabeleceu.
Não vou apreciar as várias disposições dêste diploma, porque algumas delas podem ter hoje um significado e amanhã outro.
Há uma parte muito interessante, que é aquela que se refere aos bens perdidos para o Estado.
Na verdade, eu chamo para êste ponto a atenção do Sr. Ministro das Finanças.
Sr. Presidente: parece-me que os prazos adoptados no decreto não são os melhores, pelo que sou de opinião que devem ser adoptados outros.
Mas, emfim, é um detalho que na devida ocasião, estou convencido, será tomado em conta.
Sr. Presidente: de qualquer maneira expendi a minha opinião, que me parece a mais conforme com a prática constitucional confirmada por êste decreto.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu, nem os «àpartes» foram revistos pelos oradores que os fizeram.
O Sr. Vasco Borges (para explicações). — Sr. Presidente: há pouco o Sr. Álvaro de Castro afirmou que eu, como juiz de direito, praticara uma asneira constitucional, rasgando uma sentença dos tribunais.
A educação e a correcção do Sr. Álvaro de Castro fazem-me acreditar que êle, ao referir-se ao facto, não o fez com o intuito de me agravar ou deminuir.
Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer à Câmara como o caso só passou, e para demonstrar como o Sr. Álvaro de Castro está em êrro.
Como juiz de direito, não rasguei sentença nenhuma.
O caso passou-se assim:
Um empregado da Administrarão do Pôrto de Lisboa furtou de dentro de uns caixotes desembarcados vário material cirúrgico.
Êsse empregado foi preso, confessou o delito, e foi depois julgado e absolvido.
Seguidamente êsse funcionário requereu que lhe fossem entregues os objectos furtados, e, pelas vias competentes, o tribunal oficiou à Administração do Pôrto de Lisboa para que êsses objectos fossem entregues ao gatuno.
Submetido o caso e minha apreciação, eu despachei no sentido de essa entrega se não efectuar.
Não revoguei sentença nenhuma, porque, apesar de o réu ter sido absolvido, o tribunal não tinha declarado que os objectos lhe pertenciam.
Com êste despacho, creio ter defendido o prestígio do Estado e aquela moral que iodos os republicanos devem defender.
Sr. Presidente: mas se alguém tinha autoridade paru me acusar dum facto que amanhã, nas mesmas condições, não terei dúvida em tornar a praticar, assumindo dele inteira responsabilidade, êsse alguém não poderia ser nunca o Sr. Álvaro de Castro. E porquê?
Porque o Sr. Álvaro de Castro, quando Ministro das Finanças, fez o seguinte:
Uma firma comercial, consignatária .de um navio alemão, requereu o pagamento de uma carga de pasta para papel.
O Estado entendeu que não devia pagar, e essa firma recorreu para o Tribunal do Comércio, onde lhe foi reconhecida razão, e enviada cópia da sentença para o Ministério das Finanças, a fim de êste lhe dar cumprimento.
Ali entenderam que não deviam pagar, opinião com a qual o Sr. Álvaro de Castro concordou, e só mais tarde é que S. Exa. mandou que se pagasse apenas 50 por cento.
Sr. Presidente: eu não quero neste momento discutir se o Sr. Álvaro de Castro, como Ministro das Finanças, fez bem ou mal, mas o que desejo acentuar é que S. Exa. não cumpriu a sentença, e, portanto, não tem autoridade para fazer reparos ao acto que eu pratiquei, com um aspecto muito diverso.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Álvaro de Castro: — Sr. Presidente: pedi a palavra para mo referir às declarações que o Sr. Vasco Borges acaba de fazer.
O caso a que S. Exa. fez referência passou-se já há bastante tempo, e recordo-me do seguinte:
Houve uma sentença que mandou pagar essa pasta do papel.
Era Ministro das Finanças o Sr. António da Fonseca.
Foi ouvida a Procuradoria Geral da República, que se pronunciou j como não podia deixar de ser, pelo pagamento, tanto mais que havia uma sentença judicial.
O Ministro das Finanças não tinha mais ao que dar cumprimento à determinação tribunais.
O Sr. Marques Loureiro (em àparte): — V. Exa. está iludido.
O Orador: — Não estou. Recordo-mo muito bom de um processo que foi levado ...
O Sr. Marques Loureiro (em àparte): — V. Exa. está iludido.
Se se recorda muito bem.
O Orador: — V. Exa. sabe que muitas rezes o Ministro não despacha no processo total, porque lhe é presente apenas mm a parcela do processo.
Todavia recordo-me de me ter sido presente o parecer da Procuradoria Geral da Republica, e mandei pagar, porque reconheci que não podia deixar de o fazer.
Trava-se diálogo entre o orador e o Sr. Marques Loureiro.
O Orador: — Quanto à palavra «asneira» , que proferi, não o fiz com o intuito de magoar o Sr. Vasco Borges.
O orador não reviu.
Foi lida na Mesa e admitida a moção do Sr. Álvaro de Castro.
É a seguinte:
Moção
A Câmara, considerando que as autorizações conferidas ao Poder Executivo pelo Legislativo, contidas na lei n. ° 1:545, do 7 de Fevereiro de 1924, estão em vigor ; e considerando que a reforma do regime- bancário, visando a defesa dos altos interêsses morais o materiais da República e a segurança dos interêsses do público em geral, se impunha como urgente e inadiável, continua na ordem do dia. — Álvaro de Castro.
O Sr. Pedro Pita: — Nos termos regimentais mando para a Mesa a minha moção:
Moção
A Câmara dos Deputados reconhece que a disposição contida no artigo 27.° da Constituição não permite que as autorizações concedidas ao Poder Executivo pelo Poder Legislativo possam ser usadas mais do que uma vez;
Reconhece igualmente que a autorização constante da lei n.° 1:545 não é suficiente para a publicação do decreto em exame, e já foi utilizada para a publicação, entre outros, dos decretos n.ºs 9:401 e 9:555, Cate último sôbre as relações entre o Banco de Portugal e o Estado; e passa à ordem do dia. — Pedro Pita.
Sr. Presidente: quero ao iniciar as minhas considerações afirmar que o faço inteiramente à vontade. Não encaixa na minha cabeça nenhuma das várias carapuças que têm sido talhadas por aqueles que querem a aprovação do decreto.
Podem dizer o que quiserem que eu conheço-me a mim próprio.
O Sr. Ministro das Finanças, com respeito aos monopólios dos fósforos e dos tabacos, arrombou uma porta que estava já aberta, pois toda a gente estava de acordo em que acabassem êsses monopólios.
Apoiados.
Dizem por aí os jornais que estão ao serviço do Govêrno que quem combate o decreto está vendido aos bancos.
Interrupção do Sr. Ministro das finanças.
O Orador: — São maus amigos. São como o amigo urso que para livrar o dono duma mosca o esborrachou.
Também se quere especular com a República e a alta Banca.
Esquece-se depressa o que se promete e esfrangalha-se a Constituição.
Apoiados.
Esquece-se, repito, tudo muito fàcilmente.
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Sr. Presidente: eu ainda hoje — e digo-o aqui porque não fui sidonista e até combati o sidonismo — respeito a coragem de Sidónio Pais. Êste teve coragem, sabia-a ter! Mas não tenho respeito pelos ditadores que se encobrem atrás de pretensas legalidades e da Constituição para fazerem ditadura.
Em 1919, quando em Janeiro se travaram as lutas que foram a revolução de Santarém e o assalto a Monsanto, todos sentiam ainda as consequências dos atropelos à Constituição, e mal aberto o Parlamento o Sr. António da Fonseca, verificando que as duas autorizações concedidas ao Poder Executivo pelo Legislativo e constantes das leis n.ºs 373 o 491 tinham dado lugar a usos e abusos inqualificáveis, apresentava um projecto de lei em cujo relatório afirmava que não tendo dúvidas de que o artigo 27.° da Constituição só permitia o uso das autorizações por uma vez, mas verificando o abuso que se tinha feito dessas autorizações, êle queria-as revogadas. Lembro-me bem do parecer da comissão de administração pública nessa altura, porque fui seu relator.
Sr. Presidente: o Diário das Sessões de 26 de Julho do mesmo ano transcreve o parecer e diz a seguir: «foi aprovado sem discussão».
Não é só esta a interpretação da Câmara dos Deputados; no Senado também se interpretou assim.
E é de notar que uma das pessoas que ouvi há pouco com entusiasmo apoiar o Sr. Álvaro de Castro foi o Sr. Sampaio Maia, que também assina o parecer a que mo referi!
O parecer do Senado, sucinto e culto, mostra bem que não houve divergência, sequer, sôbre esta matéria.
Era assim em 1919 e 1920, quando ainda se sentiam bem próximos os efeitos da ditadura. É agora de outra maneira quando acima de tudo se pretende saldar governos, não os querendo derrubar com medo da sua substituição.
Apoiados.
Sr. Presidente: realmente esta autorização de que agora se trata foi usada mais de uma vez. Basta ler vários decretos ultimamente publicados, e especialmente o n.° 9:505, regulando as relações entre o Estado e o Banco de Portugal. E que quando foi ficando mais distante a ditadura, quando foi esquecendo que só o acaso e o assassinato a fez tombar, se começou a inventar o sofisma do que só se não podiam usar as autorizações mais de uma vez para cada caso.
Ainda há pouco tempo, na discussão de uma hipótese semelhante, o Sr. Almeida Ribeiro põe seguramente esta doutrina. Agora, porque até não há possibilidade do manter semelhante doutrina, pois que, por muito elástica que seja a interpretação do artigo 27.° da Constituição, é sabido que já foi usada a autorização para o caso do Banco de Portugal. Diz-se que é o uso e abuso que dá lugar a poder usar-se das autorizações mais de uma vez, quando o Parlamento não tem faculdades constitucionais para tal declarar.
Apoiados.
Não há dúvida que se tem usado das autorizações para o mesmo fim mais de urna vez; mas é só por isso que êste decreto é inconstitucional? É fácil ler a autorização em que o Govêrno pretende basear-se.
Porque é que a palavra «directamente» foi ali posta? V. Exas. lembram-se todos que loi ainda com a preocupação de restringir esta autorização, foi ainda com a preocupação de não deixar o Govêrno usar desta autorização senão para os fins nela consignados.
Ora é isto com seriedade o que se fez?! E dentro desta autorização que se podem alterar as disposições da Constituição e se diz que o Govêrno está autorizado a alterar o Código Comercial?!
O Sr. Velhinho Correia vive neste mundo sem nunca ter sabido o que era pagar uma contribuição.
Interrupção do Sr. Velhinho Correia.
O Orador: — Pois eu tenho muito prazer em ter alguma cousa, que foi ganho com o meu trabalho!
Esta reforma não tem por onde se lhe pegue! Chegámos ao tempo do quero, posso e mando.
Não tenho por costume passar atestados de bom comportamento, nem fazer rapapés à inteligência de quem quer que seja.
Não tenho relações pessoais com o Sr. Ministro das Finanças, o que me não impede de dar aplausos à sua inteligência.
É por isso que reputo mais grave o
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seu acto. Uma pessoa inteligente pratica um acto com consciência e premedita.
Apoiados.
Tive vontade de falar depois do Sr. Álvaro de Castro, embora inscrito antes, não porque tivesse a pretensão de tomar rumo oposto àquele que S. Exa. tomasse. O que desejava era ver se da discussão de S. Exa. resultava alguma cousa que, ao menos, determinasse a votação que, porventura, a Câmara vai tomar.
Mas, S. Exa. foi buscar apenas no abuso o sou argumento, o único.
Abusos cuja defesa nada justifica, e ainda menos outro abuso.
Serviu se do abuso como arma, arvorando-a em defesa da Constituição.
Não sou dos que duvidam da sinceridade dos homens. Não duvido da sinceridade de que foi meu companheiro de tantas horas de luta.
Foi o meu chefe, e não posso duvidar da sinceridade de S. Exa. quando se bateu pela República.
Bateu-se em Santarém pela Constituição o pela República; e em 14 de Maio também se bateu por ela. Não esqueço êstes factos, que admiro.
Mesmo no seu discurso S. Exa. — há que reconhecê-lo — nada disse, nada argumentou: apenas se fez defensor de uma prática que é um abuso, repito.
Apoiados.
Como me sinto bem neste momento defendendo os princípios constitucionais!
O Sr. Álvaro de Castro (interrompendo) : - Não o fez V, Exa., mas fizeram-no colegas do seu Ministério,
O Orador: — É a história do lobo e do cordeiro: se não foste tu, foi o teu pai, ou o teu avô ou o teu bisavô.
Risos.
O Sr. Álvaro de Castro: — Mas V. Exa. assumiu as responsabilidades políticas dos seus colegas.
O Orador: — Assumi-as apenas para cair.
Sr. Presidente: no meio do seu discurso o Sr. Álvaro de Castro foi interrompido pelo Sr. Vasco Borges, que teve com êle um diálogo interessante e tam interessante que tivemos ocasião do verificar, não sendo bem o caso de ralharem as comadres e descobrirem-se as verdades, que o Sr. Vasco Borges se confessou réu de um crime e o Sr. Álvaro de Castro declarou que se ainda hoje estivesse no Poder usaria desta autorização. Para mim, que considero êsses factos criminosos à face da Constituição, tenho de reconhecer que S. Exas. se acusaram mutuamente.
Temos tido o podor bastante para fazer unir pedras estas, para sermos o papão que à criança pequena faz tremor apavorada só com idea que surge, em vez de ser numa noite escura, num dia, embora cheio do sol e de luz. Temos sido o papão que consegue unir aqueles que se acham irredutíveis; temos sido o papão que tem conseguido dar uma certa aparência de homogeneidade a uma cousa que toda a gente sabe que não existe...
Eu sei que nós, os que atacamos como eu ataco, somos porventura menos odiados por alguns do que o são aqueles que de mãos dadas e do braço dado se encontram há meses...
Não tenho porventura tanto mal querer de alguns como outros a quem aparentemente estão unidos.
O que é necessário, é que não governemos! Faz-se tudo para isso evitar!
O Sr. Cunha Leal: — V, Exa. dá-me licença?...
Todas as pessoas que andaram na Escola do Exército no meu tempo devem lembrar-se de um professor que logo dó entrada nos dava a seguinte lição de moral:
«Regula-se a nossa vida por um código que tem três artigos:
1.° António, tratado ti. — O professor em questão chamava-se António.
2.° Trata de ti, António.
3.° António, continua sempre a tratar de ti!...».
Risos.
O Orador: — Se não é censurável que os nossos adversários não queiram ver-se afastados das posições que ocupam, é, no emtanto, muito criticável que cheguem ao ponto, para isso, de esquecerem o que devem ao seu País e à República.
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Sr. Presidente: o Sr. Álvaro de Castro disse há pouco que o Parlamento nunca revogou os decretos que S. Exa. publicou, quando Presidente do Ministério, no abuso da referida autorização.
Não é exacto que o Parlamento nunca tivesse protestado. O Parlamento protestou. Sempre dêste lado da Câmara se ergueram vozes contra êsses decretos.
Mas por que é que o Parlamento não os revogou?
Ora, neste ponto, é que existe a parte criminosa, e essa é o receio de que nós, seus adversários, fôssemos ocupar as suas posições.
Sr. Presidente: até ao momento de se defender uma posição, eu compreendo e respeito, porque eu ser defender as posições que ocupo; mas, no momento em que a defesa dessas posições implica um enxovalho para aqueles que as desejam defender, isso é criminoso.
Sr. Presidente: disse ainda o Sr. Álvaro de Castro, procurando secundar a afirmação do Sr. Ministro das Finanças, que um dos bancos emissores, o Ultramarino, teria oferecido em Setembro de 1923 quatro administradores por parte do Estado.
Foi pena, Sr. Presidente, que o Sr. Álvaro de Castro lesse só uma parte dessa carta. Juro que não sei o que ela diz, mas calculo que não diz apenas o que S. Exa. leu.
Suponho que acrescenta: «Se me derem... isto». São duas cousas inteiramente diferentes.
Sr. Presidente: antes de mais nada, eu quero referir o que se passou anteontem nesta Câmara. Quero, principalmente, chamar a sua atenção para aquilo que aparentemente é uma transigência do Sr. Ministro das Finanças, mas que poderá ter sérias consequências.
Assim, eu não leio na lei o que o Sr. Ministro das Finanças disse, e nada me garante que amanhã S. Exa. abandonando as cadeiras do Poder, o seu sucessor, lhe dê a mesma interpretação.
Onde está aqui que os bancos emissores que têm contratos com o Estado poderão reformar os estatutos? O que está aqui é que terão de os reformar. De resto, nos considerandos do próprio decreto entende-se também isto mesmo, e o próprio Sr. Ministro das Finanças, no primeiro dia dêste debate, respondendo ao Sr. Cunha Leal, disse que não tinha de chegar a acordos com os bancos, visto que podia mandar.
Mas já não me admira que o Sr. Ministro das Finanças amanhã, também pelos poderes de que se julga investido, mande para o Diário do Govêrno um decreto dizendo que onde está «terão» se deverá ler «poderão».
O artigo 78.° também diz que os bancos emissores «procederão...». Ora esta palavra foi sempre uma imposição.
O Sr. Ministro quere agora recuar? Não, não pode emquanto estiver tam expressa como está neste decreto esta palavra.
O Sr. Presidente: — Peço a V. Exa. que me diga se deseja terminar agora o seu discurso ou ficar com a palavra reservada para depois da interrupção da sessão.
O Orador: — Pouco mais tenho a dizer, mas, entretanto, desejava que V. Exa. me reservasse a palavra.
O Sr. Presidente: — Fica V. Exa. com a palavra reservada.
A sessão continua logo, às 21 horas e meia.
Está interrompida a sessão.
Eram 19 horas e SÓ minutos.
O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.
Continua no uso da palavra o Sr. Pedro Pita.
Eram 22 horas.
O Sr. Pedro Pita: - Sr. Presidente: tenho de iniciar as considerações de conclusão do meu discurso, agradecendo à Câmara a atenção que teve a amabilidade de me dispensar quando falei na sessão da tarde.
Não tomarei muito mais tempo, não querendo corresponder à sua gentileza abusando da sua paciência.
Não se compreendem fàcilmente as razões que apresenta o Sr. Ministro das Finanças no relatório que precede o seu decreto. Há de facto flagrantes contradições entre os seus considerandos.
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Há no artigo 8,° do decreto uma disposição para a qual ou chamo a atenção da Câmara. O Sr. Ministro das Finanças obriga as sociedades que se constituem, o que costumavam depositar na Caixa Geral do Depósitos 10 por conto do seu capital, a depositarem 50 por conto, o assim um capital de 11:000 contos tem do depositar 5:500 contos, que fica, pelo monos, um mês sem receber juros.
Sr. Presidente: não procurarei fazer uma apreciação detalhada dêste decreto. Isso nunca mais acabava; não valeria a pena estar a procurar citar cada uma das disposições, o desacordo em que estão umas com outras, a falta de base em todas elas. Demais outras pessoas mais competentes do que eu já o têm feito nesta Câmara. Mas não quero deixar do fazer, pelo monos, aqueles, reparos que eu não tenho visto fazerem-se, reparos como os que primeiramente apontei.
Então pode permitir-se que fique na mão do Ministro das Finanças, discricionàriamente, o direito de conceder ou recusar sem ao menos a Inspecção do Comércio Bancário ter sequer a função de consulta?
Ah! não, Sr. Presidente! Eu estou certo de que isto não é legítimo.
O Sr. Velhinho Correia: - V. Exa. dá-me licença? Mas não é já da legislação de hoje a faculdade de o Ministro das Finanças conceder ou recusar a organização dum Banco.
O Orador: — V. Exa. está equivocado. Não é do Ministro das Finanças, mas do Ministro do Comércio, que ouve os conselhos respectivos.
O Sr. Velhinho Correia: — Mas em última instância fica o Ministro com a faculdade de permitir ou não a organização do banco.
O Orador : — Não há dúvida. Simplesmente o que V. Exa. não encontra é caso algum nessa legislação, que já vem de 1896, em que o Ministro recuse, quando o Conselho resolvo favoravelmente.
Sr. Presidente: no § 2.° do artigo 13.° determina-se um prazo dentro do qual as sociedades bancos hoje existentes têm de meter-se adentro das malhas dêste decreto. Mas como? Fazendo reforços do capital? Mas ignora o Sr. Ministro das Finanças que é absolutamente impossível conseguir aumentos do capital neste momento? Ignora S. Exa. que a falta, a escassez de escudos, de dinheiro, é tal que não permite reforços de capital? Ou estará S. Exa. convencido de que o desaparecimento do muitas instituições de crédito é uma vantagem ?
Se nós atendermos a uma regra geral, muito elementar, de economia, eu tenho de rir do sorriso do Sr. Velhinho Correia, para lhe dizer que a mercadoria se valoriza com a concorrência. E se hoje a taxa de juros é de 18 ou 20 por cento, não se dirá que se a concorrência deminuir essa taxa não aumentará. Ora, consideremos para o efeito da aplicação da regra de economia que frisei, como mercadoria a taxa do juro a aplicar. Quanto maior fôr a concorrência dos que fazem o empréstimo menor será essa taxa.
Sem mais nem menos surge o artigo 14.°, o então, tal como se fora na Rússia, o Sr. Ministro das Finanças diz: «Que me importa a mim que os senhores sejam os detentores do papel? Cá estou eu acima dos senhores! Acima mesmo dos que aí têm o seu dinheiro! Pratiquem os piores contratos, lesem à vontade os accionistas, porque eu, repito, estou igualmente acima deles!
Eu chego a duvidar, Sr. Presidente, de que na própria Rússia isto se faça!
O que pensa S. Exa. não me interessa. Interessa-mo o que aqui está escrito.
Mas, estabelecendo-se, como só estabelece, a obrigatoriedade do as sociedades-bancos se meterem dentro das imposições da lei num certo prazo, pregunto: pretende-se acautelar os interêsses do depositário? Pretende-se isso e manda-se liquidar forçadamente as instituições que dentro de 180 dias se não meterem adentro da lei?
Quais são então as garantias dos depositários?
Sr. Presidente: interessa-me agora outro aspecto do decreto.
Tenho ouvido afirmar que êste decreto cria seis nichos para dar a afilhados. Eu, porém, afirmo que os nichos são muitos mais e não é difícil ver isso.
Além dos lugares novos criados, a que já aqui se tem aludido, fala-se, no arti-
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go 55.°, no inspector do comércio bancário. É uma entidade nova.
O Sr. Ministro dós Finanças (Pestana Júnior): — Já existe hoje êsse lugar.
O Orador: — Temos mais no artigo 53.° uma referência aos encarregados da fiscalização.
O Sr. Ministro das Finanças interrompe o orador, havendo entre os dois, troca de explicações em diálogo.
O Orador: — Bem, Sr. Presidente, entende-se, pois, que não entrará mais pessoal para êstes serviços. Folgo em que assim seja.
Pelos termos do decreto - era para recear que o actual quadro de pessoal fôsse aumentado.
Há ainda a considerar o que, respeita a prescrição de certos bens que se chamam «abandonados». O Sr. Ministro das Finanças não emprega esta expressão «abandonados», com desconhecimento das condições em que ela existe no Código Civil. S. Exa. dá-lhe neste decreto um significado absolutamente novo, simplesmente para chegar ao seguinte: vamos tirar a uns para dar ao Estado.
O Sr. Ministro das Finanças (Pestana Júnior): — Essa disposição foi redigida por mim, desde a primeira à última linha, sem cooperação de ninguém.
Fui buscá-la à lei francesa.
A doutrina que V. Exa. pretende defender, segundo depreendo do enunciado das suas considerações, é a que foi defendida na Câmara francesa por grande número do deputados.
Porém, Mr. Poincaré, que era o Presidente do Ministério, com aplauso de toda a Câmara, mostrou que êsses Srs. deputados não tinham razão, porque os dividendos que não sejam levantados passam a ser considerados depósitos e as entidades que têm depósitos não podem alegar a prescrição.
O Estado não vem esbulhar ninguém de um direito prescritivel, mas do direito estabelecido pelo princípio que provém do abandono dêsses bens.
O Orador: — Gostei de ouvir ao Sr. Ministro das Finanças as razões que
S. Exa. teve para incluir neste decreto estas disposições.
Lamento não poder considerar triunfantemente respondida a observação que fiz. Lamento não ter podido compreender o alcance da argumentação do Sr. Ministro das Finanças.
Sr. Presidente: não foi devido a S. Exa. nem a mim que não compreendi êsse alcance, mas a não ter sido feita essa explicação na língua francesa.
Creio que, embora êsses argumentos tivessem colhido em França, e confesso nesse ponto a minha ignorância, a verdade é que o Sr. Ministro das Finanças veio em reforço da minha argumentação. Os capitais depositados, se não podem os depositantes alegar a sua prescrição, também os juros de depósito não podem prescrever.
Se não é o depositário quem os perde, é o depositante que os faz reverter para o Estado.
Não pode colhêr o argumento de que o Estado herdou.
Não posso compreender que depósitos feitos em francos sejam regulados também por esta disposição do decreto.
Passados quinze anos o Estado chamá-los há a si, sem ao menos procurar saber se há herdeiros, que tenham direito, a receber antes do Estado!...
Sussurro,.
O Sr. Presidente: — Não posso deixar V. Exa. continuar o seu discurso emquanto se não estiver em silêncio.
Apoiados.
O Orador: — É lógico que não interêsse a todos.
O Sr. Presidente: — Mas interessa-me a mim, e peço aos Srs. Deputados que, pelo menos, me concedam o favor de ouvir o Sr. Deputado.
O Orador: — A parte árida é certamente a interpretação de leis.
É natural.
Mas continuando: um indivíduo que vai fazer um depósito de valores num banco, ao acabar de fazer êsse depósito morre.
A família desconhece absolutamente que êsse indivíduo fez o depósito.
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Não o reforma. Passados quinze anos o Estado chama-o a si.
Não se sabe se existem filhos ou parentes com direito, porque o Estado chamou êsses bens a si, e não deu satisfação a ninguém.
O Sr. Velhinho Correia. — Mas só o depositante não è conhecido pelo, banco...
O Orador: — Não tem importância ser ou não conhecida a pessoa.
O Sr. Velhinho Correia: — Um banco não aceita um depósito de pessoa que não decline o seu nome.
O Orador: — Declina o seu nome, mas de que serve?
O Sr. Ministro das Finanças (Pestana Júnior): — V. Exa. dá-me licença?
Creio que está no Código Civil a respectiva iorma do processo,
No dia em que certos bens Deverem ser abandonados é prevenida a Inspecção do Comércio Bancário. Há um processo administrativo. Nesse momento citam-se as pessoas que se possam julgar com direito a reaver aqueles bens.
O Orador: — Sr. Presidente: em primeiro lugar, o esclarecimento dado pelo Sr. Ministro das Finanças tem para nós bastante interêsse, porque ficámos, sabendo aquilo que S. Exa. quis pôr aqui, mas que, de facto, não possam claro quanto era necessário para bem se entender.
O Sr. Ferreira da Rocha (interrompendo). — Mas o Sr Ministro pode publicar mais diplomas. Êle já se autorizou a êle próprio.
O Orador: — Sr. Presidente: não tenho o direito de abusar mais da atenção da Câmara.
Procurei, como disse a V. Exa., fazer uma apreciação muito ligeira,-porquanto vezes mais autorizadas do que a minha tinham procurada fazê-la, analisando detalhadamente as disposições contidas neste decreto.
Interessou-me apreciá-lo sob o ponto de vista da sua constitucionalidade, sob o ponto do vista da sua legalidade, o naquilo que respeita à matéria propriamente contida as suas disposições.
Não procurei fazer um exame rigoroso, porque, para isso, não me sentia com competência.
Mas, Sr. Presidente, se encarei o decreto sob o ponto de vista da sua constitucionalidade o legalidade, não deixei, contado, de ver e aprecia, o aspecto político que resulta da sua aprovação, e, porventura, da sua manutenção, porque entendo ser gravíssimo manter um decreto desta natureza que vai desrespeitar a lei fundamental do país, esquecendo que as sociedades não vivem sem ter uma lei que as regule. Não se vive em democracia, sem haver respeito pela lei.
Sr. Presidente: estou fatigado, e quando iniciei as minhas considerações eu já subia que não convenceria aqueles que não querem convencer-se. Já sabia que acima da Constituição, acima da lei e de respeito pelos princípios, havia para aqueles que dotem o Poder a preocupação de o não deixar. Para êsses havia a preocupação do não consentir que o Poder fôsse ocupado por adversários seus.
Sr. Presidente: afirmo a V. Exa. e à Câmara que, neste momento, falo com a maior sinceridade.
Mantenham-se no Poder, já que êle dá vida, já que o Poder é tudo para êles, mas não consintam essa monstruosidade.
Se é necessário, ferroem os governos que quiserem, e eu apelo paru a sua consciência lembrando-lhes que a, luta em que estrio empenhados pode sufocar a República. Lembro-lhes que não há maneira do estabelecer uma defesa de regime, se amanha todos se entrincheirarem de um Indo contra aqueles que não concordam com os seus processos. Assim só há um caminho: e da monarquia.
Lembro-lhes que não devem cavar entre a República e o monarquia uma trincheira que não possa ser fàcilmente transposta.
Lembro-lhes que não há regime que se mantenha quando tem a defendê-lo, apenas, uma fôrça e uma bandeira; mas, já que assim o querem, tenham a foiça necessária para saber agir dentro da lei, não tendo necessidade de fazer, pela fôrça, vingar monstruosidades como estas,
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com receio de que os seus adversários possam ocupar as suas posições. Tenho dito.
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O orador não reviu.
Os «àpartes» não foram revistos pelos oradores que os fizeram.
Foi lida e admitida a moção apresentada pelo Sr. Pedro Pita.
O Sr. António Maria da Silva: — Sr. Presidente: como me cumpre, vou enviar para a Mesa a minha moção de ordem, que é a seguinte:
A Câmara dos Deputados, reconhecendo a indispensabilidade de se modificar a legislação bancária, mas reconhecendo também a necessidade e a urgência de se modificarem algumas das disposições do decreto n.º 10:474, resolve submeter êste diploma imediatamente ao estudo das respectivas comissões, e passa à ordem do dia.
Sala das Sessões, 22 de Janeiro de 1925. — António Maria da Silva.
Sr. Presidente: na minha já larga vida parlamentar, posso afirmar, sem desmentido de quem quer que fôr, que não devo favores a fôrças vivas, que não sou caixeiro de bancos. Durante a minha vida
parlamentar devo-lhos acintosos ataques, e até, por vezes, insinuações.
Em outras legislaturas tive ensejo de classificar as instituições bancárias em bancos, banquinhos e banquetas, mas posso afirmar bem alto que nenhum governo da minha presidência — e V. Exa., Sr. Presidente, fez deles parte, honrando-me com a sua colaboração — prestou favores a fôrças vivam.
Sr. Presidente: sabe V. Exa. que em mais de um Conselho de Ministros se discutiu uma proposta, com várias medidas de carácter financeiro, trazida a esta Câmara pelo Ministro das Finanças, de então, o Sr. Velhinho Correia. Pois curioso é verificar neste momento que uma boa parto do decreto publicado pelo Govêrno actual é inspirada nas bases 14.ª e 15.ª, que então levantaram grande discussão.
O Sr. Vasco Borges (em àparte): se o autor é o mesmo! ...
Pois
O Orador: — Não sei se o autor é o mearão ou não.
O Sr. Vasco Borges (interrompendo): — V. Exa. quere ideas financeiras que não sejam do Sr. Velhinho Correia?
O Orador: — A responsabilidade dós se documento não pertence ao Sr. Velhinho Correia, mas sim a todos os Ministros dessa ocasião.
É curioso é que pessoas que se apodam tanto de radicais o esquerdistas publiquem um diploma inferior, isto sem ofensa, em matéria de radicalismo, a proposta a que venho de fazer referência.
Parece-me, pelo que ouvi, que toda a gente concorda na indispensabilidade da modificação do que há escrito sôbre legislação bancária.
Simplesmente num diploma desta magnitude e num momento em que tanto se ataca a República, parece-me que devia haver uma união sagrada em matéria de tal importância, levando, pelo menos, ao conhecimento dos partidos da República o que se determinava neste sentido.
Não se quis fazer isto, e por isso eu estou em antagonismo com o modo de proceder do Govêrno.
É necessário definir atitudes, porque se alguém, nesta casa do Parlamento, fizesse obstrucionismo, a responsabilidade dêsse acto e o julgamento da opinião pública somente sôbre essas pessoas recairiam.
Quem assim fala, conquistou já uma certa maioridade política e evidentemente que não está disposto a concordar com tudo quanto se faz.
Sr. Presidente: êste assunto tem sido tratado com um certo calor desta casa do Congresso e é bom que assim seja.
Eu gosto de ver realmente o Parlamento tratar assim assuntos desta natureza, porque transformar-se em pântano não faz bem.
Mas eu devo dizer a V. Exas. que há uma cousa que todos nós devemos colocar acima das nossas personalidades: é o País (Apoiados) e, se assim é, precisa-se naturalmente de harmonia entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo.
Para que isto se dêsse, em relação ao presente decreto, bastava que o Govêrno o trouxesse numa proposta ao Parlamento, a fim de ser sancionada e sujeitando-se a uma larga discussão política.
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Isto é, fazendo o que eu fiz, apesar das autorizações que me tinham, sido dadas,
Não quis o Govêrno, ou mais especialmente o Sr. Ministro das Finanças, proceder por esta forma, e então, Sr. Presidente, só há uma única maneira de remediar o mal: é enviar êste decreto para o seio das comissões, a fim de o estudarem, e de ràpidamente darem o seu parecer.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): — V. Exa. considera que, votada a sua moção, fica suspenso o decreto?
O Orador: — Evidentemente.
Implicitamente.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): — E só ou mandar para a Mesa um aditamento à moção do V. Exa. e suspendendo êsse decreto, V. Exa. aceita-o?
O Orador: — Devo dizer a V. Exa. que isso está contido na minha moção, mas V. Exa. pode mandar para a Mesa os aditamentos que quiser.
Sr. Presidente: temos os não temos o desejo de prestigiar o regime parlamentar?
Temos ou não temos o compromisso de honra de o fazer imediatamente?
Creio que não haverá uma única opinião em contrário.
Portanto, pregunto ou: sem que se ofendo a susceptibilidade do qualquer membro do Govêrno ou de qualquer parlamentar, pertencente ou não ao meu partido, por o decreto ser estudado pelas comissões?
Não o compreendo, senão pelo desejo do perturbar mais ainda a vida política da República.
Apoiados.
Neste momento, quando tanto se discute o Parlamento, quando tanto se injuriam os homens da República e os parlamentares, nós não devemos dar ao País a impressão do que estamos unidos para defender amigos ou quem quer que seja.
Por isso, estimaria muito que na remodelação que só vai fazer, os funcionários a nomear fossem pagos pelo Estado, porque isso seria muito mais interessante, muito mais conveniente e até muito mais decoroso.
Sr. Presidente: vi hoje escrito algures que o congresso do meu partido tinha votado qualquer proposta que o meu ilustre colega, Sr. Velhinho Correia, lhe tinha apresentado e que era semelhante ao presente decreto.
Mas, eu pregunto: o que tem êsse facto com o que nós estamos discutindo?
O que o congresso do meu partido votou foi a fiscalização, foi a sanção para os excessos, porventura, de qualquer crime, e a responsabilidade dessas palavras pertence ao Sr. Velhinho Correio.
Trocam-se apartes entre o orador e vários Srs. Depurados.
O Orador: — Seja como fôr, posso discutir aqui actos do meu partido, pois são discutíveis à face da Nação.
Apoiados.
O Sr. Ferreira da Rocha: — Mas não fazem lei aqui dentro.
Apoiados.
O Orador: — Evidentemente.
Não basta limitar o número de bancos para aumentar o crédito.
O Sr. Ministro das Finanças já mais. duma voz referiu o caso da representação do Banco de Inglaterra com o grupo dos cinco bancos ingleses reunidos; mas, com ôste decreto, não pode do forma alguma acontecer o que sucedo em Inglaterra.
Eu compreendo que se unam fortes organismos bancários, consorciando se para fim útil sob o ponto de vista financeiro o económico. E assim que êsses cinco bancos ingleses se juntam muitas vezes para fazer empréstimos de caracter internacional, mas não é assim, para êsse resultado, que o Sr. Ministro das Finanças criou o Conselho Bancário. eu pregunto: para, que queremos iludir-nos a nós mesmos?
É-nos permitido acaso ter birras de criança?
Não compreendo que nos tratemos como feras, embora em vários arraiais políticos estejamos divididos.
Não compreendo que só possa afirmar que nesta casa do Parlamento não se trabalha utilmente.
Não quero eu ter a responsabilidade de divergências políticas. Fique a responsabilidade a quem a quiser assumir, mas
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tenho a certeza de que mais uma Tez hei-de ser profeta nesta terra.
Hão-de amargar aquelas que se sentem: absolutamente teimosos nos seus intuitos, não querendo evitar a continuação de abusos.
Sr. Presidente: se atacar êste decreto não me animou qualquer intenção reservada nem o desejo de provocar mais perturbações na sociedade portuguesa; apenas usei dum direito queime determinou o meu amor à República e o meu amor ao Parlamento republicano, de que sou um dos fundadores.
Tenho dito.
O orador neto reviu.
Os «àpartes» não foram revistos pelos oradores que os fizeram.
Foi lida e admitida a moção do Sr. António Maria da Silva.
O Sr. Correia Gomes (para um requerimento): — Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permito que a comissão de finanças reúna amanhã, as 16 horas, e, no caso afirmativo, rogo a V. Exa. o obséquio de ordenar à Secretaria para fazer as devidas convocações.
Foi aprovado.
O Sr. Lino Neto: — Sr. Presidente: começo por mandar para a Mesa á seguinte
Moção de ordem
Considerando que a autorização concedida ao Govêrno pela lei n.° 1:545, de 7 de Fevereiro de 1924, tem sida por mais duma vez usada e para fins diversos daqueles para que fora votada com manifesto desprestígio do Poder Legislativo;
Considerando que, com o decreto n.° 10:474, novamente essa autorização foi excedida;
Considerando, porém, que è de manifesto oportunidade legislar sôbre a matéria que neste último decreto, se contém e que algumas das suas disposições mostram doutrina aceitável e útil para a defesa dos interêsses do Estado, que a êste pertence tutelar.
A Camara resolve:
1.º Que, sem demora, sejam sujeitos à apreciação e revisão da Câmara todos os decretos publicados à sombra da autorização concedida peia lei n.° 1:545, baixando os mesmos às respectivas comissões parlamentares.
2.º É especialmente, que o decreto n.° 10:474 seja já suspenso e feita a sua revisão, devendo o respectivo parecer ser dado no prazo máximo de oito dias, para entrar logo em discussão.
Sala das Sessões da Câmara, dos Deputados, 22 de Janeiro de 1925. -Lino Neto.
Sr. Presidente: a hora vai adiantada a Câmara deve estar fatigada por certo, e eu não deseja por isso alongar-me nas minhas considerações.
Todos os lados da Câmara definiram já, a sua atitude neste debate político.
A minoria católica quere também marcar a sua posição neste momento, desinteressando-se absolutamente do aspecto político da questão o ocupando-se simplesmente do ponto do vista administrativo que é fundamental para a vida da Nação.
Eu vi que se estabeleceram neste debate três correntes bem caracterizadas e definidas: uma, atacando o decreto por ser inconstitucional, outra por essa razão e acrescentando que êle era profundamente atentatório dos direitos individuais de propriedade e outra ainda dizendo que era necessário sustentar o decreto, considerando-o indispensável para a republicanização das finanças públicas.
Relativamente à primeira, devo dizer que efectivamente acho o decreto inconstitucional, não só porque êle resultou do uso duma autorização se que o Govêrno já se tinha, servido em outras ocasiões, mas também porque a matéria respectiva vai além dos limites dessa autorização. É portanto, indispensável, para o prestígio do Parlamento, que êsse decreto seja sujeito à revisão cuidadosa da Câmara dos Deputados. Mas a mesma lógica e a mesma razão que impõem a revisão para êste decreto, impedem na para outros como o decreto sobrei o contencioso fiscal, etc. Por essa mesma lógica a minoria católica entende que não pode ser só o projecto em discussão que deve ser revisto, as todos os outros, as mesmas condições, publicado em virtude da mesma autorização;
Foi com esta orientação que a minoria
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católica redigiu, a moção que enviei para a Mesa.
Outro ponto aqui ventilado consistiu em declarar que o decreto ataca a propriedade individual... O direito de propriedade deve adaptar-se às necessidades sociais.
Ninguém até hioje se lembrou de considerar ofensivas do direito de propriedade, as adaptações profundíssimas que em toda a parte se vêm fazendo às indústrias por virtude das exigências da aplicação do vapor e da electricidade. Pelo contrário. Mas isso que se dá quanto as indústrias dá-se também quanto aos bancos. Os bancos têm qualquer cousa que resulta mais da sociedade do que da iniciativa e acção daqueles que os administram. É portanto lógico que o Estado intervenha duma maneira muito especial e directa, não indo, no emtanto, demasiadamente longe nesta intervenção.
Não há dúvida que a reforma bancária é necessária.
Não estão só em jôgo os direitos de propriedade dos grandes accionistas; mas também os dos pequenos academistas e os daqueles que confiam os seus negócios aos bancos.
Muitas vezes êsses direitos de propriedade brigam uns com os outros e é o seu conjunto que deve defender-se, considerando a propriedade como uma fundão social.
É urgente e oportuna a reforma bancária.
Todos os lados da Câmara parece terem-se manifestado nesse sentido. O decreto em discussão tem algumas vantagens. Muitas das suas disposições são realmente aceita veia, porque são a cópia do que de interessante se encontra lá, fora; mas, há outras disposições nos diploma que, são contraproducentes e até por êsse motivo que o decreto não deve ser aceitamos seus precisos termos, sendo necessário que baixe às comissões respectivas para, que, em pouca tempo os estudem e para ser votado, na Câmara no mais curto prazo de tempo passível.
Mas a propósito da reforma é necessário: levantar um protesto.
Não compreendo o que seja republicanização das finanças públicas, como não sei o que seja a sua monarquização.
Querer-se há dizer com a palavra republicanização que se devem dar os lugares a indivíduos republicanos?
Se é isso, trata-se dum êrro? contra o qual a Câmara deve lavrar o seu protesto.
Os serviços públicos não podem tomar essa forma preceituaria.
Isso não pode ser republicanização, e contra essa republicanização protesto.
O País o que precisa é de homens competentes, honestos, à altura das circunstâncias, necessidades e condições sociais em que se encontra o País.
Moralização, ordem pública, moralização e honestidade ora todos os serviços públicos, isso é que importa.
Mas ouvi falar do respeito à Constituição.
Não ouço senão falar no respeito aos princípios.
Também os quero profundamente respeitados, mas como Junção social.
É necessário que os direitos dos portugueses sejam garantidos, sejam sagrados.
Não se compreendem direitos senão dentro da função social.
Não ouço senão falar em direitos, que é necessário respeitar.
O que é necessário é moralizar a administração pública.
O País está cansado de ter política.
Interrupção do Sr. Cunha Leal.
O Orador: — Eu fiz apenas afirmações de ordem geral. Não fiz afirmações de ordem restrita.
Simplesmente afirmei o meu propósito de me desempenhar de uma função que incumbe a êste lado da Câmara.
Nada mais.
Uma interrupção do Sr. Cunha Leal.
O Orador: — Fiz afirmações de ordem geral, repito.
É lida e admitida a moção do Sr. Lino Neto.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente, Constitucionalistas e Srs. Parlamentares defensores da Constituição: os que têm a coragem de afirmar que não têm feito ditaduras são só aqueles que têm tido sorte de ainda não se terem sentado naquelas cadeiras.
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Se êsses é que podem afirmar.
Em regra, só timidamente se pode afirmar não tecem feito ditadura, mas de tal forma que a gente chega a supor que talvez tivesse de pedir a outro poder o avaliar da constituicionalidade das leis.
Não ouvi uma palavra sôbre o direito de propriedade, aquele direito de propriedade que é feito do suor de cada um, aquele direito de propriedade que é o de detentor de uma mísera acção de qualquer batido ou sociedade anónima.
Que padece que não conta para, os políticos da minha terra!
O Govêrno não soube dizer nos mais nada do que era preciso legislar sôbre câmbios.
Sôbre a questão das sociedades anónimas, não permitir que o patrão das finanças se arrogue o direito de afirmar que só os 40 maiores accionistas podem deliberar, nada disse.
Não é possível dispor dos haveres dos portadores, que são às centenas de milhares.
O Sr. Cunha Leal: — Aqui, dentro do Parlamento, apoiadíssimo.
O Orador: — Quero antes olhar para os grandes detentores das fortuna da nossa terra.
Mas êste Govêrno, ou outro, há-de fazer isso, porque há-de haver a coragem fácil de pôr em jôgo a Nação.
Pois, então vêem V. Exas. que os organismos económicos, alheiados do interêsse geral, parecem contraverter-se nesta assemblea, quando afastados, dos seus interêsses de classe, e, precisamente, porque êsses interêsses de classe sentiram, ainda não ser possível fazer , categorização particular, porque se reconhece que o homem que os dirige é baixo até mais para que possa falar, pelo manos, nos termos em que aqui falo!
Discuto como quero, só e mais nada.
Encaro as questões como quero e digo as palavras que quero.
Agora, nesta altura em que tanta, cousa se mistura, nós continuamos a esquecer, o povo que fez a República, ao qual parece que todas as vozes de defesa emmudeceram dentro desta casa.
Quando em matéria de sêlo se pretendem fazer determinadas isenções, argumenta-se, por exemplo, para as águas minerais, que elas são remédios.
São remédios, mas usados pelos ricos.
Espero que aqueles que tanto defendem as isenções do sêlo mandem
Para a Mesa uma proposta isentado do sêlo os produtos farmacêuticos.
Sôbre o decreto em questão, se V. Exa. ou qualquer dos meus colegas me preguntasse se, eu subscreveria todas as suas disposições e se eu estivesse disposto a responder a essa pregunta, diria que as não subscreveria a todas.
Mas, nesta casa — uma casa essencialmente política — em que é preciso manter posições vou fazer em duas palavras uma análise, prometendo ser breve.
Não ouviu V. Exa. a indignação jurídica de um ilustre, orador desta Câmara sôbre o abandono dos bens em depósito dos bancos!
Preguntava onde estavam os oradores de há pouco, quando se, discutiu a lei n.° 1:368.
Como é frágil a memória doe homens, coma estamos em situação idêntica, como mudam fàcilmente de atitude!
Que, a Nação, os aprecie, e avalie, e agora direi, para aqueles que condenam o decreto em discussão, e condenam a própria dos seus correligionários.
Apoiados.
Pois então estranha-se que se fixe, o mínimo do capital para a constituição de um banco, ou então querem que os bancos pululem com cogumelos?
E não, se vê que foi êsse mesmo critério, seguido pelo próprio leader do Parlamento Nacionalista, que pôs em destaque isso a que desprezivelmente chamou critério?
Pois não, consta isso do projecto do Banco Central do Sr. Cunha Leal?
E — cousa interessante — o Sr. Cunha Leal e outros oradores, afinando pelo mesmo diapasão de S. Exa.: disseram com que direito o Estado criou dois lugares de vice-governadores e diz aos accionistas dos bancos, aos donos dos bancos: Receba em casa êsses intrusos que vão administrar.
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É que o Sr. Cunha Leal parte do princípio que os vice-governadores servem apenas para roubar o Estado. E, se emprego a palavra roubar, é porque S. Exa. a deixou transparecer nas palavras do seu relatório.
Mas agora direi: Mo só restabelece o Banco Central, coíbo queria o Sr. Cunha Leal, mas, como as operações dê compra e venda de cambiais são único recurso que temos, no dizer do ilustre leader nacionalista, S. Exa. foi exagerado nas suas afirmações, porquanto, para regular a matéria de troca do moeda, Sr. Cunha Leal, tem de se dizer aos bancos que não se podem constituir senão com determinado capital fixo.
Mas diz-se nos bancos que defendam aquilo que têm dentro de casa, que eu quero 25 por cento, mas 25 por cento, porquê? Por o Estado administrar, para o Estado repartir os meus prejuízos, porquanto a criação do banco central obedeceu à idea de haver sempre prejuízos; que era para tornar o banco solidário com o Estado nos prejuízos.
Mas querem V. Exa. depois desta gargalhada ao direito de propriedade, querem então o livre arbítrio? Pois êle cá está declarado. E também da mesma proposta. O Sr. Ministro das Finanças obriga a fazer-se um depósito caução, cujo quantitativo, cujo aumento ou deminuição deponde da simples vontade do Ministro. Mas S. Exa. diz mais: — Tens aqui 20 por cento que se rende o capital dessa propriedade que não quero saber se é tua e que eu te obrigo a entregar. E vou, só quiser, convertê-la em títulos do Estado.
Tens títulos ouro, moeda ouro? ....Tudo isso orienta tens nem sequer dormirá nos teus cofres; e isso será, pelo contrário, depositado no meti banco, no banco que eu criei. E tens de ser solidário nos prejuízos que o Estado tenha. Tens depósitos lá fora? Pois se os tens, está com êles sonegados.
Mudam, assim, os homens nas suas atitudes! Eu quis salientar isto à Câmara, e particularmente aos juristas, aos constitucionalistas, aos estrénuos defensores do direito dê propriedade; dessa propriedade que, quando estão êles de cinta a mandar, não conta muitas vezes para nada.
Urge salientar neste momento um facto para que nesta hora não passe despercebido. As direcções dos bancos e conselhos administrativos, com certeza com o dinheiro que administram, publicaram com grossos desmentidos nos jornais uma afirmação feita nesta casa do Parlamento. Ontem, quando um orador contraditava a oposição feita por tais senhores, eu quis interrompê-lo, de propósito, para obter o esclarecimento que obtive.
E fica assente isto. Que é preciso que o País saiba, que o povo que tam enganado anda, — esse povo, a quem se não fala a verdade, êsse povo a quem se diz que fecham fábricas, porque não podem vender os seus produtos, quando, o que havia a dizer; é que essas fábricas e oficinas fechavam para provocar a chômage (Apoiados), quando, o que havia a dizer, é que fechavam, como arma contra a República, para ver se os pobres operários no seu raciocínio simplista se deixam ludibriar.
Apoiados.
Em determinada altura o Banco Nacional Ultramarino, ao atravessar uma nova crise, por motivos que se não dizem, não já a boca pequena, mas a outra, em que à boca cheia se dizia que aquilo andava muito tremido, nessa altura o Banco Nacional Ultramarino, todo blandícias, todo veludo, dirige-se ao Estado e pede-lhe que o salve, e, como precisava que o salvasse, oferece-lhe vice-governadores com o placit do Govêrno e oferece com o placit do Govêrno entregar-lho toda a organização nas mãos do Estado. Porquê? Porque entre uma falência que era quási certa e a salvação através do Estado, era preferível à salvação através do Estado.
Fizeram-se démarchet e nesse sentido ajustaram-se as cousas e, depois dó- bem ajustadas, o Ministro das Finanças levou a Conselho de Ministros, levou aos seus colegas o resultado dêsse acôrdo, acordo que o Conselho de Ministros aprovou;
Depois o Ministro das Finanças caiu e ninguém mais pensou em fazer cumprir êsse acordo e, não sendo cumprido êsse acordo, o Banco Nacional Ultramarino devia ter-se tido da ingenuidade do Govêrno — e rido a bandeiras desprezadas, quando conseguiu os 20:000 contos para a salvação. E porque não se cumpriu?
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Porque se não fez cumprir?
Porque não fizeram cumprir?
São cousas que eu não quero dizer, porque ninguém me obriga a dizer. E, não o digo, porque sou republicano e não o digo porque sou português. E os defensores do Estado calaram-se, deixaram correr as cousas.
Suponha V. Exa. que o Estado tem contrario com qualquer casa bancária pela qual o lotado tem de receber determinada quantia. O Estado pagou em moeda valorizada, mas recebe em moeda desvalorizada.
Quem defende aqui dentro o Estado?
Ficamos vexados como portugueses e sentimos a obrigação de ir para casa.
Quem defende o Estado? Ninguém!
Roubar o Estado passa a ser virtude.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio de Abreu: — Sr. Presidente: limitar me hei a fazer ligeiras considerações sôbre a matéria em discussão, pois já tem sido largamente debatido por vários ^oradores encontrando-lhe uns defeitos e outros virtudes.
Discute-se o decreto n.° 10:474, tendente a regular o funcionamento dos bancos e casas bancárias, a fim de a todos sujeitar a um regime geral de previdência, fiscalização e defesa, que os leve a contribuírem directamente para o saneamento monetário e cambial, considerando que a reorganização financeira e económica do País depende principalmente da solução que fôr dada a tal problema.
Desde sempre que tenho ouvido nesta Câmara e aos meus colegas mais em evidência de todos os partidos que urgia remodelar a legislação bancária, pois que, à sombra da existente, bancos e casas bancárias de todas as espécies se tinham espalhado pelo País, entregando-se quási exclusivamente muitas destas a negócios de especulação cambial, auxiliando e assobiando se até à avalanche de intermediários comerciais que a guerra gerou, e que para outra cousa não têm servido senão para vexar o comércio honesto, arranjando, sem custo, enormes fortunas e fazendo encarecer o custo da vida, negociando se u escrúpulos.
Também a imprensa vem de há muito discutindo o assunto e pedindo providências legislativas que ponham cobro a tal estado de causas.
E, para ver quanta razão têm uns e outros, basta os factos escandalosos a que se têm referido vários oradores que me precederam, e nomeadamente o Sr. Velhinho Correia, que relatou factos concretos, documentando-os.
Ora, sendo isto assim, quem pode duvidar da necessidade da publicação de normas legais tendentes a moralizar o comércio bancário, acabando com os banqueiros som escrúpulos que só vivem da especulação cambial e garantindo aos que honestamente têm tal profissão que serão defendidos daqueles maus parasitas?
Convencido estou de que todos estão scientes de tal necessidade e que todos a reputam urgente.
E, sendo assim, bem andou o Govêrno em vir de encontro a êstes desejos, publicando o decreto n.° 10:474, com fôrça de lei, que, segundo o seu preâmbulo, vem moralizar o comércio de cambiais e consequente saneamento da moeda nacional.
Nestas condições, declaro que não compreendo a oposição rancorosa que se faz ao decreto, até por aqueles que mais gritavam a necessidade da reforma da legislação bancária, fazendo da discussão uma arma política contra o Govêrno, em vez de serenamente se tratar de propor, pelos meios legais, o melhoramento do decreto quanto à sua matéria, tanto mais que o Govêrno aceita todas as indicações do Parlamento, com quem quere viver em íntima colaboração, desde que não sejam tendentes a inutilizar a sua acção.
Tenho seguido com a máxima atenção toda a discussão e tenho observado »que muitos dos ilustres oradores não têm sequer tocado ao de leve em qualquer disposição do decreto, e, no emtanto, dizem que nele há aio sobrescritos (o que é o conhecerem-se certos meios!) e que só se pretendeu arranjar lugares chorudos à custa de certos bancos!
Que conceito fazem dos homens e até de si os que assim argumentam?
Sr. Presidente: eu não irei referir-me às disposições do decreto, quanto à sua mecânica, porque outros mais competentes o fizeram já, e com tanta clareza, sobretudo o Sr. Velhinho Correia, que me parece que toda a Câmara está convenci-
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da dos bons princípios que presidiram à, sua confecção, embora do v a sofrer quaisquer pequenas emendas, que venham a reputar-se necessárias, em virtude desta discussão e sobretudo da sua execução.
Confio, porém, que o Govêrno o regulamentará com toda a serenidade, o vou passar ao aspecto constitucional do decreto n.° 10:474.
Êste decreto foi publicado à sombra da lei n.° 1:045, de 7 de Fevereiro de 1921, que autoriza o Govêrno a tomar todos e quaisquer medidas tendentes a pôr côbro à desenfreada especulação cambial que do há tempos a esta parte tem reduzido a moeda nacional a um mínimo valor, contanto que com tais medidas se não aumentem ou deminuam quaisquer contribuições o impostos,
Estamos, pois, em presença duma lei de carácter tam amplo o genérico que à sua sombra qualquer Govêrno poderá legislar sôbre todos os assuntos que de porto ou longo se prendam com u questão cambial.
Não só trata duma autorização restrita, bem delimitada quanto ao assunto que abrange, a não ser sôbre o que diga respeito a contribuições e impostos, e, portanto, a sua utilização pode amplamente fazer-se, tomando uma série de medidas diferentes, desde que tendam a reprimir por qualquer modo a especularão cambial.
Não lho é aplicável o artigo 27.° da Constituição da República pela forma restrita que alguns pretendem, pois que o Govêrno a tem usado já várias vezes, mas para, tomar medidas diferentes, embora tendentes todas ao mesmo fim, e não é legítimo querer responsabilizar o Govêrno por fazer só aquilo a que está autorizado.
Eu sou dos que pensam que o Poder Legislativo não deveria dar autorizações tam amplas, e confesso que penso até que a representada pela lei n.° 1:145 foge um pouco aos preceitos constitucionais, mas desde que o Parlamento, na sua alta soberania, legislou assim, e para, que lançar responsabilidades para quem se limitou a cumprir?
É ou não verdade que os bancos tem cimo função importante e regularizado dos câmbios e o comércio de cambiais?
É ou não verdade que se tem atribuído a um grande número dêsses bancos as maiores culpas da especulação cambial a que assistimos?
Se assim é, indubitável se torna que, tendo o Govêrno legislado sôbre organização bancária, não excedeu a ampla autorização da lei n.º 1:045, pois que ainda não a tinha usado para o mesmo eleito, não ofendendo assim o artigo 27.° da Constituição.
Devo declarar, com lealdade, que é assim que esta Câmara por várias vezes soberanamente se tem pronunciado, o até há bom pouco tempo o próprio Supremo Tribunal de Justiça interpretou igualmente a respeito doutra autorização do carácter genérico dada ao Poder Executivo, e à sombra da qual se foi até à extinção do Supremo Tribunal Administram.
O Sr. Brito Camacho (em àparte): — Mau professor a Câmara.
O Orador: — Eu não sei se o professor é mau; o que sei é que só trata do Poder Legislativo, que tem por função não só legislar, mas também interpretar as leis.
Mas não se admire V. Exa. pois que mais digno de reparos se torna haver governadores civis nomeados e em exercício, o com vários Governos, que continuam a ser Deputados, porque declaram prescindir de remuneração, como se por tal fazerem os governadores civis deixassem de ser lugares do comissão retribuídos, e sem que os constitucionalistas de agora tivessem feito o mínimo protesto.
Não, Sr. Brito Camacho, a grande oposição que surge agora ao decreto em discussão, é uma questão política e que por isso não tem o dom de convencer com argumentos.
Uns querem que o Govêrno caia e portanto a Constituição segundo êles foi, por êste esfarrapada quando usou da autorização dada pela lei n.° 1:515.
Outros querem que o Govêrno caminho, o Ossos acham que bem procedeu publicando o decreto n.° 10:474.
Outros ainda, e nesse número mo incluo, discutem serenamente e apenas em faço das disposições legais se submetem, interpretando-as em harmonia com a lei e
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com os princípios estabelecidos por esta casa do Parlamento.
É absolutamente necessário que todos nós respeitemos os preceitos constitucionais, porque isso interessa a cada um do nós do per si o ao conjunto social, visto serem êles que marcam bem as garantias, direitos o obrigações de todos nós; mas é bom não estarmos continuamente em nome da Constituição a fazer insinuações só tendentes a deminuir os homens e abrir campainhas políticas em volta de questões tão importantes como a que se discute, para a qual é precisa a maior serenidade o circunspecção.
Está incompleta a obra do Govêrno, tem algumas faltas? Entende-se por forma bem legal.
O que ninguém poderá contestar é que, tendo o Govêrno publicado uma medida legal para efectivar a boa fiscalização dos bancos e casas bancárias, não consegue indirectamente influir na regularização da vida cambial, o portanto tem do julgar o decreto com fôrça do lei n.° 10:474 como constitucional, vista a autorização concedida pela lei n.° 1:545.
A hora vai adiantada e eu vou terminar mandando para a Mesa uma moção que resumo as minhas considerações.
Leu.
Tenho dito.
Foi lida e admitida a moção tio orador.
É a seguinte:
Moção
A Câmara, considerando que o Govêrno com a publicação do decreto n.º 10:474, não excedeu, nem abusou da autorização parlamentar que lho foi concedida pela lei n.° 1:545, de 7 de Fevereiro de 1024, pois que é inegável ser função das instituições bancárias o entregarem-se ao comércio de cambiais;
Considerando que as disposições do decreto 11.° 10:474 tendem sobretudo a fiscalizar as operações bancárias e moralizá-las de forma a com eficácia assegurar tanto os interêsses dos particulares, como os do Estado, reconhecendo a Câmara urgência na sua publicação que não permitiria as delongas do processo parlamentar em virtude dos factos graves trazidos à discussão o referentes a muitos estabelecimentos bancários;
Considerando que a Câmara confia em que o Govêrno, na aplicação do decreto, usará de toda a circunspecção o serenidade:
Considera o decreto n.° 10:474 dentro das normas constitucionais e passa à ordem do dia.
Câmara dos Deputados, 22 de Janeiro de 1925. - Júlio de Abreu.
O Sr. Amadeu de Vasconcelos: — Sr. Presidente: em obediência às praxes regimentais, vou ter a honra de mandar para a Mesa a seguinte moção:
Moção
A Câmara dos Deputados reconhecendo que o decreto n.° 10:474 não excede a autorização conferida ao Govêrno pela lei n.° 1:545, de 7 de Fevereiro de 1924, e que as circunstâncias económicas e financeiras do País de há muito impõem a modificação da lei bancária de J89fi:
Confia em que o Govêrno manterá intacto o prestígio do Poder o passa à ordem do dia.
Câmara dos Deputados, 22 de Janeiro de 1925. — Amadeu de Vasconcelos.
Sr. Presidente: desde a primeira hora que entrei nesta casa do Parlamento, tomei para comigo mesmo um compromisso de honra, que até ao presente tenho procurado manterei êsse era, o de não roubar tempo à Câmara, que por outros pudesse ser aproveitado com mais eficácia para os interêsses do País.
E assim, ou raramente, tenho feito uso da palavra.
Devo confessar a V. Exa., Sr. Presidente, que desde o inicio dêste debate, eu senti, por vezes, o desejo de entrar na discussão, o se o não fiz, foi porque tenho a consciência da minha pouca preparação, foi porque reconheci que a discussão dêste decreto reclama conhecimentos especiais que não possuo.
Não apoiados.
Tinha, portanto, resolvido não entrar no debate.
Porém, circunstâncias ulteriores forçam-mo a fazê-lo.
Sr. Presidente: serei o mais breve possível e desde já peço à Câmara que não tomo como desprimor o facto de eu não entrar na discussão, em detalhe, do decreto.
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Não o faço, porque nesta hora alta da discussão, as pessoas do maior competência desta Câmara já o fizeram, e ou nada do novo traria ao debate.
Mas, Sr. Presidente, circunstâncias imperiosas houve, que mo obrigaram ao sacrifício que estou fazendo.
Desde a primeira hora em que se iniciou êste debate, uma afirmação partiu do todos os lados da Câmara, e essa foi que a finalidade única dêste decreto, para o Govêrno, consistia em colocar alguns dos seus amigos, em lugares rendosos.
Sr. Presidente: faço parte do grupo de parlamentares que defenderam a organização dêste Govêrno, com o fim alto e bem intencionado do trazer a esta assemblea a resolução de problemas que de há muito era reclamada.
E, sem que nas minhas palavras, possa haver qualquer ofensa ou agravo para alguém, ou desejo afirmar que os amigos do Govêrno nunca pensaram nem pensam obter dele, qualquer cousa que signifique um favor.
Não queremos qualquer compensarão ao nosso trabalho, por mais insignificante que êle tenha sido.
Apoiados.
Sr. Presidente: nós tivemos unicamente em vista a defesa dos interêsses da República e do País.
Apoiados.
Apodaram-nos de vaidosos e ambiciosos, mas nenhum de nós pensou ou pensa em trocar os seus lugares de Deputados pelas cadeiras de Ministros.
Pousaremos bem ou mal?
O futuro o dirá. No presente, obedecendo à nossa consciência, entendemos que procedemos bem.
Posto isto, Sr. Presidente, o ainda para do alguma maneira desfazer a atoarda de que inimigos do regime e do nosso partido lançam mão, afirmando que nele, existe uma profunda divergência, eu devo dizer que pode existir essa divergência sôbre modos de ver, acerca de determinados pontos, mas isso não implica uma divergência fundamental de programa.
Estamos todos bom a dentro do nosso partido.
É nessa convicção que organizei a moção que tive a honra de mandar para a Mesa o que, merecendo a aprovação de todos os membros dêste lado da Câmara, será uma afirmação da unidade do meu partido, e fora o merecimento do acabar de uma vez, para sempre, com mal entendidos cora que tanto se tem explorado em detrimento da República e do País.
Para mais não vejo razão de ser nos fundamentos com que se procura atacar o decreto em discussão.
É inconstitucional?
Demonstrarei que não, pois que com êle se não excedo a autorização concedida ao Executivo à sombra, do qual foi publicado.
E desejaria começar por preguntar àqueles parlamentares, que lauto se batom pela inconstitucionalidade do decreto, e que já foram Ministros, se as suas consciências os não acusam de terem caído em falta semelhante.
É que desde que aqui entrei eu quási que, a toda a hora, tenho estado a ouvir a acusação do que sempre se tem abusado das autorizações parlamentares.
E no emtanto eu tenho a convicção do que o decreto é constitucional o se compreendo na autorização concedida.
Mas permitam-me V. Exa. que exponha o meu modo de ver.
Entendo que não foi excedida a autorização parlamentar.
Já hoje ouvi dizer que êste decreto deveria até ser considerado como regulamento.
Tal não pode ser. Entendo que as autorizações parlamentares são, nada mais com nada menos, do que uma delegação do Poder Legislativo no Executivo do poderes que pela Constituição lho são atribuídos,
Se assim é, o decreto publicado em virtude dessa autorização é uma delegação.
Dentro dêste princípio creio que nunca pode ser um regulamento; tem do ser considerado como lei, como se emanasse do Poder Legislativo.
Se assim é, como não pode deixar de ser, e creio que ninguém o contestará, pregunto agora à Câmara: que figura faríamos nós, Poder Legislativo, revogando hoje, anulando ou fazendo suspender um decreto, que nada menos significa do que uma lei que tivesse emanado directamente do próprio Poder Legislativo?
Só o poderíamos fazer só o Poder Executivo não se tivesse aproveitado da autorização nos precisos termos em que foi
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concedida ou em casos para os quais não foi determinada.
O Sr. Ferreira da Rocha (em àparte): — Foi precisamente o que se deu.
O Orador: — Perdão! Mas essa lei é moita clara e expressa, ser bem que bastante concisa. Ela diz:
Leu.
Sr. Presidente: pela própria letra desta autorização se vê que era impossível num único diploma, num determinado momento, legislar-se de maneira a satisfazer por completo ao fim a que visava.
Toda a gente se recorda da situação anormal e aflitiva em que estas autorizações foram concedidas.
Em toda a parte se gritava contra o agravamento sucessivo, progressivo- do custo da vida.
Em toda a parte se reclamava contra o agravamento da nossa divisa cambial.
Dizia- se aqui, de todos os lados da Câmara; da extrema esquerda à extrema direita se proclamava que de finança asfixiava o País, com as suas garras de rapina e de interêsses, e pediam-se medidas urgentes; e porque medidas urgentes — , infelizmente já bastas vezes o temos visto — não podem ser arrancadas dêste Parlamento, o Parlamento delegou-se Poder Executivo a faculdade de adoptar as providências que julgasse úteis; para melhorar a situação cambial, regulamentar o comércio bancário.
Nós estamos a justificar aquela decisão do Parlamento;
Há uma semana que estamos a discutir a constitucionalidade ou inconstitucionalidade dum decreto.
E eu pregunto: que tempo levaria a Câmara a discutir uma proposta de lei que visasse ao mesmo fim, que tivesse oitenta artigos como o decreto?
Podia a Câmara, em lugar de ter votado esta autorização nos termos vagos em que o fez ir mais longe o determinar as linhas gerais, dentro das quais, mais precisamente, a Govêrno tivesse de legislar.
Lembra-me ainda, repita da situação aflitiva em que nos encontroáramos ao votar aquela autorização. Por mim tam convencido estava de que era necessário actuar urgente e fortemente para impedir a Situação em que se encontrava o Estada — e recordo-me bem que na reunião do grupo parlamentar a que pertenço eu afirmei que votaria autorizações ainda mais amplas se preciso fôsse, reservando-me, apenas, o direito de depois, como Deputado, no Parlamento, pedir ao Govêrno estritas contas do uso que tivesse feito das mesmas autorizações.
Mas, porque se combate tanto êste decretar?
Porque é inconstitucional, afirma-se daquele lado da Câmara.
E é inconstitucional porque não cabe nos limites da autorização concedida, e porque o Govêrno já se serviu mais do que uma vez dessa autorização para o mesmo fim, o que a Constituição não permite.
É curioso que esta Câmara já se pronunciou indirectamente sôbre o caso.
Publicado pelo Sr. Álvaro de Castro, ao abrigo da mesma autorização, um decreto que se referia directamente à questão dos bancos, o levantada aqui a questão com os mesmos fundamentos dá sua inconstitucionalidade pelo Sr. Portugal Durão, essa moção foi rejeitada.
Quere dizer, a Câmara reconheceu a constitucionalidade dalguns diplomas que tinham sido publicados à sombra desta autorização, e reconheceu o muito bem, porque da própria letra desta, autorização se conclui a impossibilidade de um Govêrno, num só diploma, poder satisfazer aos fins a que ela visava.
Porque não havemos de reconhecer a latitude dessa autorização?
Ela foi redigida em termos tam latos, que a Câmara, reconhecendo-o, se apressou, a adicionar-lhe a restrição expressa de que o Governo só não serviria dela para legislar sôbre contribuições e impostos.
Mas o decreto que se discute é, portanto, absolutamente constitucional, sem mesmo ser necessário, para admitir e justificar esta afirmação; invocar-se o precedente de que a Câmara já reconheceu a inconstitucionalidade de meia dúzia de decretos publicados à sombra desta autorização.
Ora se, como eu entendo, êste decreto é constitucional, apenas temos de ver agora o outro argumento aduzido, de que as medidas tomadas não visavam à regulamentação do comercio bancário, nem à melhoria da nossa situação cambial.
Sr. Presidente: eu vi levantar-se de
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todos os lados da Câmara a acusação de que a alta finança era o factor primordial, do agravamento, do câmbio; e eu, sem querer relembrar à Câmara factos trazidos ao soo conhecimento pelo Sr. Ministro das Finanças, pelo Sr. Velhinho Correia e por tantos outros, tenho a convicção de que esta casa do Parlamento tem opinião que de alguma maneira, era necessário intervir na administração dos bancos, de forma a defender os interêsses do Estado, os interêssos dos próprios particulares.
Se o decreto de alguma maneira visa à melhoria cambial, como creio, eu não sei a razão por que se pede que êle seja anulado, tanto mais quanto é certo que todos nós, Deputados, temos a faculdade e o direito de promover a sua substituição por um projecto de lei.
Pelos próprios termos do decreto, só passados seis meses êle pode entrar completamente em execução, e dentro dêste espaço de tempo poderá ser aqui apresentado, discutido e votado qualquer projecto de lei que o substitua com vantagem.
Encaremos pois a questão franca e lealmente.
Se a Câmara tem êste direito, e ninguém lho contesta, para que se exige que imediatamente seja anulado ou suspenso o decreto?
Esta atitude não pode ter outro significado que não seja o de pretender-se que seja votada uma moção de desconfiança ao Govêrno.
Mas se o Governo publicou o decreto adentro da autorização, se êsse decreto visa aos fins que são determinados pela mesma autorização, para que se pretende derribar o Govêrno?
A Câmara poderá todos os dias encontrar ensejo para o fazer, e nunca com menos motivo do que hoje.
Sr. Presidente: eu não quero reeditar o que aqui já mais de uma vez foi dito e que não corresponde inteiramente à verdade».
Bem ao contrário, eu não acredito que haja nesta Câmara quem seja pelos bancos contra o Estado.
Mas receio do critério simplista do nosso povo e que a atitude que â Câmara está tomando possa dar lugar a que se pense que, com a nossa situação de Deputados, pretendemos defender quaisquer interêsses reservados e menos legítimos.
Não temos necessidade nenhuma de dar lá para fora mais um argumento contra o Parlamento, fornecendo-lhe mais uma arma contra nós próprios.
O Parlamento tem, pelo seu aturado trabalho, prestado relevantes serviço ao País.
Temos errado por vezes, talvez, mas alguma cousa de útil temos feito a aqueles que a de pertencem, quer aqui voltem, quer não, poderão sempre recordar-se com o orgulho de terem pertencido a êste Parlamento, e assim eu creio que poderemos todos saiu daqui com a consciência do bem termos servido o País.
Tenho dito.
Seguidamente foi lida na Mesa e admitida a moção.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Pestana Júnior): — Sr. Presidente: vieram os bancos emissores à cidade, por intermédio da grande imprensa e — vá lá — até pela pequena imprensa, pretendendo negar a veracidade das afirmações feitas, aqui, pelo Ministro das Finanças, quando, respondendo a alguns Srs. Deputados, asseverou que tanto o Banco Ultramarino domo o de Portugal, da parte de elementos representados, visto que juridicamente só as suas assembleas gerais têm mandato bastante para tanto, haviam feito; oferta da comparticipação por parte do Estado nas suas administrações.
Eu tenho de ser rápido porque é já muito tarde, mas não posso deixar de ler à Câmara o documento que existe no meu Ministério o que para ali foi enviado, certamente, por alguém que naturalmente, se julgou com poderes suficientes para poder fazer promessas em nome da assemblea do Banco Nacional Ultramarino.
Vou ler todo o documento para que não possa ficar no País qualquer dúvida sôbre o que nele realmente se contém.
Diz assim:
Leu.
Êste documento é dirigido ao Ministro Finanças.
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Não há referência a qualquer cousa que o banco pretendesse receber do Estado. O que está é isto: a gerência veria com bons olhos êsse desejo do Govêrno de interferir por banco emissor e disposta estava a conseguir, com a sua influência, dentro da assemble geral do banco, aquilo que o Govêrno pretendia.
O Sr. Vasco Borges: — Mediante um novo contrato que se fizesse!
O Orador: — Evidentemente! Mas, Sr. Presidente, o que significa isto?
Significa que não é a êste Govêrno que se deve, atribuir o ter tido idea de interêsse eficaz lia direcção dos bancos emissores, por maneira a garantir cada vez melhor a soberania nacional na parte que é exercida por êsses Bancos.
Quanto ao Banco de Portugal, e tam retorcido, caro catedrática a redacção dada ao n.° 1.°, da sua declaração que me não dispenso de a ler.
Leu.
E isto afirma-se e sela-se1 com a palavra de honra.
E porque não considero, apesar disso, que possa representar por si e em representação de instituições, que aliás, mesmo representam, uma grande maioria 4e acções e por consequência um grande número, de votos e pessoas, não se pode falar em nome da maioria da assemblea onde se firmem quaisquer espécies de combinação.
Julgo ter assim respondido com toda a clareza e simplicidade à douta agremiação da Faculdade de Direito.
E para poder julgar legítimo, o decreto em que reformei a legislação existente sôbre o regime bancário do País, e talvez até porque vi o meu antigo camarada e ilustre lente da Universidade de Lisboa defender doutrina contrária, eu que nunca fui urso na Universidade sem ter assim pretensão ao grau doutoral, sacrifiquei um pouco daquilo que por lá aprendi — e foi pouco — e um poucochinho daquilo que pude aprender cá fora e bada será.
S. Exa. não tesa absolutamente razão quando, com galhardia, pretende demonstrar que a autorização pedida pela lei n.° 1:545 está esgotada e são compreende no seu âmbito o decreto que eu publiquei, julgando-o por consequência inconstitucional.
Em duas palavras ditei qual o seu pensamento e como interpretei, o texto, da nossa Constituição, em conformidade, com o que eu, e a sagrada congregação da Faculdade de Direito comigo, entendi. Foi introduzido aqui, e vale a pena apelar para a memória: daquelas, que foram constituintes, foi introduzido na Constituição por proposta do Sr. António Macieira, poucos dias depois de aprovado o texto, até ao artigo 26.°, êste artigo 27.° com o pretexto de que era necessário cercearem-se os abusos que na monarquia se tinham praticado, usando-se as autorizações para aquilo que não eram concedidas.
Mas pregunta-se; 4.º artigo 27.° condiciona apenas as duas autorizações consignadas nos dois artigos anteriores?
Não, todos os juristas estão de acordo em que, não se referem a, essas autorizações, mas àqueles poderes que o Legislativo pode conferir num dado momento ao Executivo para mais ràpidamente a com mais eficiência êste modificar o estabelecido e cuja alteração era acenas da competência daquele.
Mas será esta matéria nova na nossa legislação?
Não, senhor.
Já uma vez o Sr. António Maria da Silva aqui falou em êsse, mostrando-se lido em certo, autor e dizendo-nos, que êle dizia: «nem inflação, nem deflação, mas estabilização».
Ora S. Exa. deve estar também lembrado que Jèse, comentando a Constituição italiana, afirma, que por uma disposição similar à nossa, quando o Parlamento usando dela dá ao Executivo, poderes para tomar todas as medidas sôbre um determinado assunto, êsses poderes não se esgotam emquato o legislativo não revoga a autorização concedida.
E que assim é, e que assim entenderam aqueles parlamentares constituintes que aqui se encontravam em 1919, até na dúvida nenhuma, até vendo-se os textos que o Sr. Pedro Pita aqui reproduziu.
Quem era constituinte nesse tempo não tinha que apreciar um parecer da comissão de legislação civil e criminal, revogando as autorizações concedidas ao Executivo, mas tinha que, interpretando o artigo 27.°, ver aquilo que nele se continha.
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Dar, de resto, poderes ao Executivo para tomar todas as medidas conducentes a um determinado fim, não pode evidentemente significar que uma vez tomada uma medida parcial êsses poderes caducam e se extinguem, mas significa que, dentro daquilo que se concedeu, todas as medidas que dai possam advir são autorizadas pelo Legislativo.
Dêste modo, alguém de boa fé — não ar boa fé vulgar, más aquela para que se apela sempre, não para fazer erudito barata, mas para fazer-se obra digna — pode dizer que dentro das medidas conducentes à melhoria do câmbio não está uma reforma bancária?
Então nós não sabemos que o câmbio é apenas uma operação de bancos?
Então nós não sabemos que ô câmbio, e tudo que com êle se liga, está adentro do nosso Código Comercial?
Não seria tomar medidas conducentes ao câmbio o regular o funcionamento dos bancos, o poder inspeccionar por parte do Estado como tutor supremo adentro da Nação de todos os interêsses, êsse mesmo funcionamento ? Apoiados.
Não está perfeitamente adentro dêste papel do Estado moderno, que é o genderme simples, a reforma bancária?
Não; por Deus que está.
Eu sei que uma outra objecção se faz — e ou já vi quererem com ela abrir cizânia entre mim e o meu ilustre colega do Comércio — qual vem a ser dê que isso do comércio bancário não deixa de ser comércio e, como há no Ministério do Comércio uma Direcção Geral de Comércio e Indústria, era por lá que se devia ter feito a reforma.
Também sabem pouco essas pessoas, e se eu não tenha culpa da minha insciência, não se me atribua a insciência dos outros.
Em todos os países sentiu-se tanto depois da guerra que o fenómeno bancário se tinha de tal maneira destrinçado dos fenómenos comuns comerciais e industriais que se resolveu tirar de dentro do Ministério do Comércio, ou cousa equivalente, e passar para o Ministério das Finanças, essa função de inspecção aos bancos.
Mas eu, que costumo Sempre responder não só os ataques que me fazem, mas a pequenas insinuações que se reproduzem, direi que tinha obrigação especial de intervir eficazmente nessa inspecção, não só por esta ordem do princípios, mas porque até pessoalmente não me dava garantias a repartição à qual estavam até aqui confiados êsses serviços.
Numa determinada altura, um banco hoje falido — e por isso posso declinar o seu nome som afectar as suas transacções — preguntava à Repartição do Comércio se podia fazer operações de cambiais.
A pregunta, era feita nos seguintes termos:
Leu.
Á resposta, imediata, foi no dia seguinte:
Leu.
Êste banco tinha acções por subscrever.
Leu.
Tinha acções por cobrar na importância de 450$ e tinha um capital negativo de 10 contos.
Pois bem, na opinião do director geral, êste banco estava em condições de poder funcionar, o que aliás não me causou admiração, porque êsse director geral era o director de um outro banco e o chefe da repartição era do conselho fiscal do banco falido.
Pelo menos haja pudor para que dêste lagar eu não tenha de fazer afirmações desta natureza,
O Sr. Ferreira da Rocha (interrompendo): — E êsse director geral ainda não foi demitido.
O Orador: — Presentemente ainda não foi demitido.
Por uma razão de ordem técnica todos êstes serviços devem estar concentradas no Ministério das Finanças.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): — Todas as vezes que um director geral procedo mal, V. Exa. castiga-o ou faz uma reforma de serviços?
O Orador: — Eu já disse a V. Exa. que por motivo de ordem técnica êsses serviços deviam estar concentrados no Ministério das Finanças.
Deviam estar concentrados, não só por motivos de ordem burocrática, como tam-
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bem por razões de ordem pessoal que indicaram que êsses serviços não deviam estar a cargo dessa individualidade.
Trocam-se àpartes.
Uma voz: — Foi pena V. Exa. não ter explicado isso nó relatório que precedeu o decreto.
O Orador: — Um decreto não é uma lição de direito comercial.
Esta reforma está autorizada por lei e no meu espírito não houve a menor dúvida.
Revoga-se uma disposição do Código Comercial.
Leu.
O banco tem na assemblea geral o número de votos que compete às acções. E V. Exa. sabe melhor do que ou o que se fazia dantes, em que funcionários públicos iam representar accionistas.
Eu tenho o direito de escolher dentro dos accionistas alguém de confiança para a República.
Sr. Presidente: eu era obrigado a fazer esta reforma bancária, porque a isso mo comprometera na declaração ministerial. Era obrigado, porque, homem do partido, e nunca me envergonho de dizer que o sou, tenho de sujeitar-me ao voto do meu partido.
Tinha feito, na declaração ministerial, inserir essa promessa, era obrigado a cumpri-la, mas toda a gente tinha obrigação de esperar, se não se tivesse essa simplista o bizarra concepção de governo, que o homem que assim tinha prometido agir, agiria no momento em que os interêsses superiores do País o determinassem.
Também eu fui atacado por ter fixado para os bancos o casas bancárias o mínimo de capital em ouro.
Oxalá que minha fôsse a razão em que esta disposição se fundamenta. Mas não é.
Ela é das reformas bancárias dos países que atravessaram a mesma calamitosa crise, onde se entendeu que era necessário cortar todos os voos aos baixistas, o colocá-los na situação de não obterem fabulosos lucros pela desvalorização da moeda.
Nato é minha, portanto, a idea. Ela foi pela primeira vez preconizada por aquelas pessoas, que não são, evidentemente, da minha pequena estatura mental, que foram encarregadas de organizar o Banco da Áustria, e foi seguida por essa grande figura que é o Presidente do Ministério e Ministro das Finanças da Polónia.
Já voem, portanto, V. Exas. que não vale a pena fazer tanto barulho, tanto ataque, descendo até a minudências, quando a Câmara, neste debate, só se devia preocupar com a urgência, necessidade e oportunidade de tal medida.
Mas, porque essas considerações foram feitas, V. Exas. compreendem que senão obrigação de responder aos oradores que me antecederam no uso da palavra, dando êstes esclarecimentos.
Sr. Presidente: tenho ouvido já fazer aqui a afirmação, a correligionários meus, que discordam da minha orientação, e visto mandar para a Mesa moções do desconfiança a mim, seu correligionário, que se encontra no exercício de uma função, cumprindo um programa de antemão conhecido.
Sr. Presidente: para terminar, eu lembrarei a V. Exa. e à Câmara aquela frase de Millerand, quando em certa altura, e depois de ter defendido em plena Câmara doutrina perfeitamente contrária aquela que depois votou, lhe disseram que êle era absolutamente incongruente. Como resposta declarou:
«A minha opinião, condicionada, porventura, por quaisquer interêsses pessoais, pertence a mim somente. Mas o meu voto pertence exclusivamente ao meu partido».
O Sr. Cunha Leal (em àparte): — Aviso aos incautos!
O Orador: — Tenho dito, Sr. Presidente.
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Manuel Fragoso:— Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa, o seguinte requerimento:
Nos termos do § único do artigo 59.º do Regimento, requeiro prioridade para a moção de ordem do Sr. António Maria da Silva. — Manuel Fragoso.
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O Sr. Presidente: — O requerimento do V. Exa. será, submetido à Câmara na altura própria.
O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: há pouco, interrompendo o Sr. Ministro das Finanças; tive ocasião de lhe preguntar se êle já Unha tomado qualquer procedimento disciplinar contra o funcionário que veio acusar perante o Parlamento.
Sr. Presidente: é tam fora dos costumes parlamentares e do bom senso político vir acusar-se funcionários públicos, em lugar de se punirem ou promover-se a sua punição, procurando-se acobertar atrás da responsabilidade do funcionário, que eu não quis deixar do lavrar o meu protesto desde logo, e repetido agora, afamando ao Sr. Ministro das Finanças que não tem nenhum Ministro o direito de vir acusar funcionários públicos para o Parlamento, seja o que fôr que êles tenham cometido, antes de ter tornado aquele procedimento disciplinar que a qualquer Ministro é permitido.
O Sr. Ministro das Finanças, que é de facto um ditador que não quere assumir a responsabilidade da sua ditadura, julgou que podia alterar, a ordem dos serviços públicos, somente porque simpatiza ou antipatiza com um funcionário que está à frente duma repartição.
Quero ainda frisar que o próprio funcionário que o Sr. Ministro das Finanças acusou de não lhe inspirar confiança na Direcção Geral do Comércio e Indústria, é um dos membros do Conselho Bancário criado por êste decreto.
Diz o artigo 76.°:
Leu.
Sr. Presidente: já que estou no uso da palavra, desejo referir-me também às palavras que o Sr. Ministro das Finanças pronunciou em defesa do seu decreto.
Não pretendo discutir as minúcias do decreto.
Afirmou S. Exa. que o decreto não fora discutido tecnicamente, que ninguém provara os inconvenientes que porventura possam resultar das disposições publicadas.
Não vou também fazer essa análise; recuso-me a fazia, por entender que, perante um acto de ditadura, não tenho senão que provar que de um acto de ditadura se trata; não tenho senão que o combater, não lhe dando sequer a categoria de diploma cujas disposições eu deva discutir imediatamente, porque não se trata de qualquer proposta de lei submetida ao Parlamento.
A discussão das minúcias do acto de ditadura, que o Sr. Ministro das Finanças praticou, terá de ser feita noutro lugar, fora da Câmara, naquele único terreno onde ela pode ser feita, no terreno da revolta legítima do seu não cumprimento.
Será nesse momento que o decreto sofrerá a discussão devida.
Não discutindo, portanto, as disposições do decreto, quero referir-me à atitude do Sr. Ministro das Finanças o às suas palavras que põem em destaque- a natureza do acto praticado.
Chamo a atenção da Câmara para a atitude do Sr. Ministro das Finanças relativamente à nomeação dos vice-governadores do Banco de Portugal e do Banco Nacional Ultramarino.
Da primeira vez que falou, S. Exa. disse que se não fôsse aquela disciplina partidária que faz recuar a perda do Poder para o partido em que se está filiado, S. Exa. não teria contratado com os bancos, limitando-se a ordenar.
Depois, logo a seguir, interpelado pelo ilustre leader do meu partido sôbre o que ficava em vigor, o Sr. Ministro das Finanças declarou que as disposições do seu decreto não entravam era execução senão quando as assembleas gerais dos bancos as houvessem aprovado. Era precisamente o contrário daquilo que o decreto dizia.
Mas, querendo ainda justificar a sua afirmação, citou o artigo 80.°
Eu pregunto: se estas disposições não são para entrar em vigor senão quando a outra parte as aceitar, para que vêm no decreto?
É que de facto o Sr. Ministro das Finanças — e nisso concordo com S. Exa. a — estava certo de que meteria no Banco de Portugal e no Banco Nacional Ultramarino todos os directores que quisesse.
O Sr. Ministro das Finanças pretendeu fazer uma publicação, não para inglês ver, mas para radicais verem.
S. Exa. quis continuar a vida financeira do bloco, mas colocando-se no radicalismo popular, a fim de que os nossos radicais
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o levassem a tinia situação a que nenhum dos governos anteriores tinha chegado.
Ouvi dizer ao Sr. Álvaro do Castro que a política da entrada de delegados do Govêrno nos bancos era para introduzir nas veias dêsses bancos sangue republicano.
O próprio Sr. Ministro das Finanças disse quais os fins verdadeiros do seu decreto.
Quanto à exibição de lucros fictícios a lei n.° 1:896 põe cobro a êsse abuso.
Adentro de um Estado individualista como é que se pode atribuir ao Govêrno a função de ser o director no emprego dos seus capitais?
Garante-se o lucro ou o prejuízo?
Também a legislação vigente previu quando no balanceamento de contas que se sejam pagos e fique na saca do banco. No decreto é que o Sr. Ministro das Finanças não tem meio de obrigar à reserva dêsse?
Isto é pueril porque é o próprio Código Comercial que o prova. O que está no decreto é que não se pode realizar.
Não há maneira de perceber como é que a lei pode evitar êsse inconveniente.
Nos mesmos termos compreende o regulamento que as verbas de depósito devem estar na conta de caixa se como é possível essa casa ter contas superiores?
Então há alguém que suponha que quem funda um banco não o faça senão para facilidades para si próprio?
Então seria possível não ter nos seus interêsses e dentro da lei o pagamento do seu empreendimento?
Há bancos cujos cheques não oferecem, porventura, confiança?
Julga então o Sr. Ministro das Finanças que a publicação do seu decreto é o suficiente para que êsses cheques inspirem confiança?
Leu.
Á parte que mais revolta é aquela em que se colocam os bancos na situação de não saberem o que podem ou o que não podem fazer.
Trocam-se explicações entre o orador e o Sr. Velhinho Correia.
Interrupção do Sr. Velhinho Correia.
O Orador: — Até essa mesma fiscalização, sem o pagamento da cota parte dos bancos, na parte que interessa à parte cambial, até essa mesma fiscalização já existe estabelecida por inúmeros diplomas publicados. Mas o decreto, não contente em usar da autorização nestes termos, permite êle próprio ao Governo publicar novos diplomas, porque diz o seguinte:
Leu.
Quere dizer: o Govêrno já por si próprio se autoriza, e qualquer dia nós teremos que vir aqui realizar uma lei feita por uma autorização em segunda instância.
Sr. Presidente : não quero já repetir o argumento da prescrição a que se referiu o ilustre colega Pedro Pita, mas não quero deixar de dizer que há um capítulo inteiro no decreto sôbre cooperativas, o qual não se pode entender como matéria cambial e em que aparece mais um lugar.
O Sr. Velhinho Correia: — Não é pago!
O Orador: — Tudo é pago em Portugal!
Trocam-se àpartes.
O Sr. Velhinho Correia: — Isto de cooperativas, é sempre de graça!
O Orador: — Reconhecendo ao Sr. Velhinho Correia uma autoridade enorme para falar em cooperativas, não lhe reconheço autoridade para dizer se êste lugar é ou não remunerado. Em todo o caso é mais um lugar que, se fôr desempenhado pelo Sr. Velhinho Correia, não é remunerado, mas que será remunerado no dia em que S. Exa. fôr substituído. Entretanto, é mais um administrador na Caixa Geral do Depósitos que com certeza vai interferir para conseguir empréstimos para os que ali representa.
Eu não sou jurisconsulto, — não era preciso dizê-lo à Câmara, porque a Câmara fàcilmente o perceberia nas minhas palavras, — mas sem querer repetir argumentos de constitucionalidade, daquela constitucionalidade que se conclui do texto escrito da Constituição, quero, pelo menos para mim, para quem os escritos da Constituição não representam tanto como as normas do direito publico, que em cada cidadão se encontram, protestar contra a forma como se pretende governar em
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Portugal, protestar contra a forma como o «bloco» inicia a administração pública no nosso País,
Efectivamente, que me importa que esteja na Constituição escrito que as autorizações se usam por uma ou mais vezes? O que quero saber é que se existe um Parlamento é para fazer leis, só existe um Parlamento é porque a Nação procura integrar na vida pública todos os cidadãos elegíveis, para que êles procurem no combato das opiniões achar a opinião máxima do País. E o que se está fazendo? E que um partido da Câmara, que um dia se juntou para fazer um «bloco», a fim do governar, mas sem ter a coesão necessária para garantir os Governos, inventa uma autorização para a si próprio se manter no Poder, fazendo desaparecer todos os meios do resistência da opinião pública, porque numa ditadura, — permita-se-me o têrmo, — politicamente cobarde, o «bloco» tem nas cadeiras do Poder homens que legislam, sabendo que no dia em que nós pretendemos levantar uma questão dos têm votos suficientes para abafar tudo.
Apoiados.
Quando essa política se iniciou, reuniu-se o partido do «bloco» num gabinete do Ministério do Interior, transportando para ali o Parlamento, e ali decidiu o que havia do ser publicado pelo Govêrno, para no outro dia se negar o direito de análise aos Deputados que não estivessem aliados no partido que detinha o Poder.
Apoiados.
Assim, o monopólio é perpétuo. Vive-se assim através de quatro anos, porque ao fim dêsse tempo, pois os Chefes de Estado são também pessoas a quem a comodidade agrada, fàcilmente é possível arranjar «comida» para mais quatro anos, até que um dia pela violência de meios se arranque dessa posição quem pela violência de meios nessa posição se colocou.
Muitos apoiados das direitas.
Num país em que toda a gente é revolucionária civil, eu honro-me de não o ser. Jamais defendi revoluções, e creio bem que ale mesmo no meu partido eu tenho sido um travão do todas as tendências revolucionárias. Isso não é segredo para ninguém. Toda a gente sabe que tenho sido até acusado pelos meus correligionários de fazer conluios e combinações para evitar revoluções. Mas digo a V. Exa. que dêsse papel de travão estou cansado, porque não é possível mante-lo, porque já me faltam os argumentos, porque já mo falta a capacidade para manter essa posição.
Muitos apoiados das direitas.
É para aí que vamos? Mas vamos com a responsabilidade daqueles que para aí nos levam.
Tenho dito.
Vozes da direita: — Muito bem, muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Pestana Júnior) (para explicações): — Sr. Presidente: vou pronunciar algumas palavras apenas, em resposta aã Sr. Ferreira da Rocha, palavras determinadas pela muita consideração política o pessoal que tenho por S. Exa. e ao mesmo tempo terei ensejo de elucidar a Câmara sôbre um ponta que pode dar lugar a especulações pequeninas, que é preciso desfazer.
Refiro-me àquela parte do discurso do Sr. Ferreira da Rocha, relativa ao facto do ser permitida, por êste diploma, a entrada de banqueiros nos bancos de redesconto.
Naturalmente o Sr. Ferreira da Rocha não estava presente ontem, quando num àparte ao discurso do meu ilustre correligionário Sr. Velhinho Correia, dei a devida explicação á Câmara.
Efectivamente, eu disse que nos bancos, de redesconto é costumo, e é bom hábito, terem entrada banqueiros.
Já a Câmara ouviu há dias ã leitura do texto dum folheto de Oliveira Martins, que eu adredo citei, e por isso não será para admirar que eu mais uma vez cito Oliveira Martins, sobretudo numa obra que é naturalmente desconhecida da maioria dos portugueses, porque teve uma edição muito restrita.
É um artigo dêsse escritor sôbre bancos, e destinava-se a fazer parte do um dicionário que não chegou a ser concluído.
Interrupção do Sr. Cunha Leal.
O Orador: — Da administração do Banco de Inglaterra fazem parte os repre-
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sentantes dos cinco grandes bancos ingleses.
Mas o Sr. Cunha Leal compreendera situação especial em que mo encontro neste momento para não lhe poder dar mais explicações, embora eu seja de opinião que o Estado deve intervir na administração do Banco de Portugal, que é o nosso banco emissor.
Direi no emtanto a V. Exa., como resposta à sua interrupção, que nenhum banqueiro da praça de Lisboa tem dentro do Banco de Portugal posição necessária para poder eleger por si só quem quer que seja.
Não há portanto o perigo de vermos entrar no Banco de Portugal, como directores, exclusivamente os representantes de qualquer casa bancária.
Mas, quando assim não fôsse, pela letra do artigo 87.° o governador, ou pelo meu decreto, um dos vice-govornadores em substituição do governador, tem sempre o direito de se opor a qualquer operação feita pela direcção do nosso banco emissor.
Sr. Presidente: devia esta explicação ao Sr. Ferreira da Rocha, e sobretudo à Câmara e ao País.
Julgo ter desfeito qualquer equívoco que houvesse da parte do alguns Srs. Deputados, que supuseram, que o Ministro das Finanças tinha querido beneficiar quem quer que fôsse.
Não quis, nem podia, pela simples razão de, neste momento, não haver pessoa nenhuma, colectiva ou singular, que possua um número bastante de acções para fazer vingar qualquer deliberação.
O Banco de Portugal, tal como está, em qualquer assemblea geral, tenho a certeza- de que não há pessoa nenhuma que disponha dele a seu belo talante.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério, Ministro do Interior e interino da Marinha (José Domingues dos Santos):— Sr. Presidente e Srs. Deputados: galhardamente, heroicamente, o Sr. Ministro das Finanças vem, desde a primeira hora em que se levantou êste debate, afirmando a sua responsabilidade, quási exclusiva, no decreto em discussão.
E se, porventura, neste lugar me encontrasse pelo desejo banal de aqui estar, ser-me-ia fácil a habilidade de ficar calado à espera da votação da Câmara, para ter o fácil pretexto amanhã de alijar da barcaça ministerial o Sr. Ministro das Finanças, chamando, para comigo colaborar, qualquer outra pessoa.
Não é êsse o meu intento, Sr. Presidente, nem é assim que quero aqui conservar-me.
Disse na primeira hora em que vim para êste lugar que nêle queria estar emquanto convencido estivesse do que podia governar, e que na hora em que me convencer de que não posso fazê-lo, preferirei sair, a ser um tolerado adentro do Parlamento, a ser um tolerado entro os políticos do meu país.
Não sou das pessoas que hipocritamente afirmam que vêm para estas cadeiras por um grande espírito de sacrifício.
Não faço sacrifício algum em estar aqui.
Estou aqui porque quero estar.
Quero continuar a estar e a governar, mas na situação de dirigir e mandar, e não na situação humilhante de pessoa parada, que com tudo transige, que tudo deixa correr, contanto que o Govêrno fique.
Sr. Presidente: quero assim afirmar perante a Câmara e o País, que o decreto da organização bancária, publicado no Diário do Govêrno, e assinado por todo o Ministério, é da responsabilidade de todo o Govêrno.
Se o Parlamento negar a sua aprovação a êsse diploma legal, não cairá o Sr. Ministro das Finanças, cairá todo o Govêrno. Êste diploma foi estudado por todos os Ministros, em sucessivas reuniões do Conselho de Ministros, e corresponde a um objectivo claramente marcado em declaração ministerial, que tive a honra de trazer a esta casa do Parlamento.
Nessa declaração dizia-se pouco mais ou menos o seguinte:
Há que cuidas, de fazer uma reorganização bancária.
O Govêrno não hesitará em regulamentá-la.
Quero dizer, desde a primeira hora o Govêrno afirmou o propósito decidido de fazer uma reforma bancária. Se o não tivesse feito, então tinha o Parlamento motivo para atacar o Govêrno por faltar ao que tinha prometido.
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Sr. Presidente: o que acontece com a reforma bancária, tem sucedido com tudo o mais que se encontra dentro do programa ministerial.
Trouxemos já várias propostas ao Parlamento. As mais importantes encontram-se já apresentadas, esperando o Govêrno que esta Câmara as discuta, sem demora, evitando que tenham o mesmo destino de todos os diplomas que às comissões são enviados.
As propostas que apresentámos encerram nina grande utilidade, o é indispensável, para honra de todos nós, que cias sejam discutidas.
Digam que essas propostas servem, e o Govêrno continua; digam, que elas não servem, e o Govêrno ir-se Lá embora.
Porém, não esperem que êste Govêrno se amoldo a situações fáceis.
Sr. Presidente: queremos que essas propostas sejam discutidas. Na devida oportunidade farei disso questão ministerial,
Êste Govêrno não é composto de homens que RO encontram aqui simplesmente para fazer expediente.
Para isso, não servimos.
Queremos realizar aquele programa ministerial que anunciámos ao País, e estamos na firme disposição de o realizar em intimo contacto com o Parlamento. Contudo, é preciso que êste se convença de que há necessidade do progredir, e que não pode servir do estorvo para que qualquer Govêrno caminhe.
A Constituição não impede que o Govêrno use desta autorização, o portanto esto decreto é absolutamente constitucional, está dentro das formas constitucionais.
O ilustre Deputado Sr. Pedro Pita, para demonstrar que esto diploma não é constitucional, foi servir-se de pareceres de comissões de há cinco anos.
Se formos a ver, muitas vezes o critério do constitucional ou inconstitucional é conforme servo à política dêste ou daquele partido.
Eu não quero fazer largos comentários nem análise detalhada dêste diploma; isso pertence ao Ministro das Finança», e a mim cumpre-me, apenas, pôr a questão política.
Sr. Presidente: foram apresentadas, sôbre este assunto várias moções e desde já declaro aceitar apenas as dos Srs. Velhinho Correia, Álvaro do Castro, Amadeu de Vasconcelos o Júlio de Abreu.
As outras moções não as posso aceitar.
Cada um de nós ficará na sua posição e ou não quero ficar aqui por favor, tolerado, mas sim de cabeça bem alta; de contrário saberemos o que temos a fazer, e a crise não será só do Sr. Ministro das Finanças.
Gosto de situações claras, quero saber com quem conto o queremos que só decida da nossa sorte.
O orador não reviu.
O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente: depois dos magistrais discursos dos Srs. Ferreira da Rocha e Pedro Pita, eu não vou dizer mais nada acêrca do decreto o apenas darei umas explicações.
Sr. Presidente: nu conduta do meu partido não há intuitos de revindicta para com o Govêrno, mas simplesmente o cumprimento do um iniludível dever, dever imposto pela consciência, afirmando mais uma vez a nossa absoluta intransigência perante o decreto inconstitucional.
O Partido Nacionalista não considera legal perante os termos da Constituição o decreto o contra, êle levantamos o nosso protesto,
Apoiados.
Sr. Presidente: governar não é descontentar sistematicamente uma maioria para servir as paixões — quantas vezes ignóbeis! — duma pequena minoria.
Assim, o partido a que pertenço entende que presta um serviço à República pregando a guerra contra o Govêrno, em nome dos interêsses nacionais ofendidos.
As promessas que aqui fiz em nome do meu partido, e que foram seladas com a palavra de honra, serão cumpridas.
Porque não reconhecemos constitucionalidade ao decreto do Sr. Ministro das Finanças, digo daqui, por expressa delegação do meu partido, que ninguém deverá cumpri-lo.
Apoiados.
Assumimos o compromisso do só governarmos, quer isoladamente, quer acompanhados, com a condição expressa de ser derrogado o decreto e todos os efeitos que dele tiverem derivado.
Esta declaração há-de naturalmente cumprir-se,
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Somos levados a n m conflito de republicanos contra republicanos. Eu não desejo essa guerra. Digo isto com o coração nas mãos. Não vou para ela com alegria, e muito menos o meu partido.
Iremos para ela só devido a uma imperiosa necessidade.
Não a queremos, e porque não a queremos, sinceramente desejamos que não nos forcem a essa guerra inglória.
Sr. Presidente: o actual Govêrno não pode caminhar porque está condenado a nada fazer ou a fazer cousas que hão-de levantar os protestos da Nação.
Assim, aconselhamos o Govêrno a que se demita o aconselhamos o Parlamento a que o faça cair.
Eram estas as explicações que eu tinha a dar à Câmara em nome do meu partido.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (para explicações): — Ouvi hoje, da boca do Sr. Álvaro de Castro, a afirmativa de que não pode permitir-se que dentro dum Estado republicano os bancos, embora constituídos por capitais particulares, não tenham nas suas administrações republicanos. Chama-se a isto republicanizar!
Protesto contra semelhante princípio, pois sou daqueles que, embora não se importem com a cor política dos indivíduos que administrem os bancos, entendem que os valores dos particulares devem ser administrados pelos seus donos, e não por intruso?.
Ao Sr. Ministro das Finanças, em resposta a um discurso que eu aqui proferi, ouvi dizer: «Temos de completar a nossa vitória! É necessário para isso republicanizar a banca!».
Protesto contra estas palavras do Sr. Ministro das Finanças.
Não foi para chamar a si o que a outrem pertence que tantos dos meus adversários honestos se bateram pela República. Faço essa justiça às suas boas intenções.
Foi também aqui sustentado pelo Sr. Presidente do Ministério e pelo Sr. Álvaro de Castro o princípio de que a lei n.° 1:545 continua em vigor. Quere então fazer se uma larga ditadura?
Em que triste situação ficará o Parlamento, consentindo que o Govêrno legisle à sombra duma autorização que já caducou!
O Sr. Álvaro do Castro, pretendendo provar que a lei n.° 1:545 está em vigor, apresentou o argumento de que só êle, quando fora Govêrno, publicara 39 decretos à sombra dessa autorização.
Isto é extraordinário!
Não se pode escarnecer mais do Parlamento.
Todos nós, que fomos trazidos aqui pelos eleitores para legislar e fiscalizar os actos dos Governos, ficaremos numa lamentável situação se não protestarmos energicamente contra o que se está pás s ando.
Sr. Presidente: uma das razões invocadas pelo Sr. Ministro das Finanças para justificar o sou decreto é que as direcções dos bancos criam dificuldades aos republicanos. Isto é uma acusação infundada. Tam infundada que são até os próprios comerciantes republicanos que vêm aos jornais apresentar os seus protestos contra semelhante afirmação.
Tudo nos mostra que o fim do decreto é criar lugares novos junto das administrações dos bancos para servir amigos políticos.
Sr. Presidente: vou terminar, afirmando a V. Exa. que mais uma vez esta instituição parlamentar do regime que se diz democrático falta àquilo que devia respeitar, que é o n.° 30.° da Constituição.
O Sr. Manuel Fragoso: — Sr. Presidente: o Sr. Carvalho da Silva está fora da ordem, porque está a usar da palavra para explicações há mais de meia hora.
O Orador: — Até admira que estando a explicar-me há tanto tempo V. Exa. ainda não tenha compreendido nada.
Mas mais uma vez digo que se ofendeu o artigo 30.° da Constituição, que diz que deve ser reconhecido o direito de reclamação, porquanto, legislando-se desta maneira, não se atenderam as reclamações públicas que foram feitas. Ainda não há meia hora V. Exa. teve a gentileza de me chamar à Mesa para me mostrar duas reclamações que foram enviadas a esta casa contra a publicação dêste decreto, mas a Câmara não quere saber delas.
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Assim, a Câmara vai legislar contra o Pais se aprovar a validado dêsto decreto.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: como a moção que teve a honra do enviar para a Mesa envolvo modificações ao decreto sôbre o redimo bancário, e quero transformá-la em projecto de lei. Assim, requeiro para retirar a minha moção, para depois a apresentar transformada em projecto de lei numa das próximas sessões.
Consultada a Câmara, é autorizado.
O Sr. Álvaro de Castro (para um requerimento): — Sr. Presidente: peço a V. Exa. a que consulto a Câmara sôbre se consente que eu retiro a minha moção.
Consultada a Câmara, é autorizado.
O Sr. Júlio de Abreu (para um requerimento): — Sr. Presidente: requeiro também para retirar a minha moção.
É autorizado.
O Sr. Presidente: — Não há mais nenhum Sr. Deputado inscrito.
Vão votar-se as moções.
Está na Mesa um requerimento do Sr. Manuel Fragoso, que se vai ler.
É lido na Metia e em seguida aprovado.
O Sr. Lino Neto (para um requerimento). - Sr. Presidente: requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que logo a seguir à moção do Sr. António Maria da Silva seja votada a moção nominal.
É rejeitado.
O Sr. Sá Pereira (para um requerimento): — Sr. Presidente: requeiro votação nominal para a moção do Sr. António Maria da Silva.
É aprovado.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para se votar, a moção do Sr. António Maria da Silva.
Lê-se na Mesa,
Diário da Camara dos Debutados
O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à chamada para a votação nominal, Procede-se à chamada.
Disseram «aprovo» os Srs.
Abílio Marques Mourão.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Moura Pinto.
António Abranches Ferrão.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Maria da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio do Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
João Baptista da Silva.
João de Ornelas da Silva.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano Martins.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Nuno Simões.
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Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Tomás de Sousa Rosa.
Vasco Borges.
Disseram «rejeito» os Srs.:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia do Azevedo.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio do Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Domingos Leite Pereira.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Germano José de Amorim.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Estêvão Aguas.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
José Cortês dos Santos.
José Joaquim Gomos de Vilhena.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Leonardo José Coimbra.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Alegre.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Lopes Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
O Sr. Presidente: — Disseram «aprovo» 51 Srs. Deputados, e «rejeito» 56. Está, portanto, rejeitada a moção.
Vai votar-se a moção do Sr. Cunha Leal.
O Sr. Júlio Gonçalves (para um requerimento). — Sr. Presidente: requeiro que se vote primeiro a moção do Sr. Amadeu de Vasconcelos.
É aprovado o requerimento.
O Sr. Cunha Leal: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: — Estão de pé 33 Srs. Deputados, o sentados 65. Está, pois, aprovado o requerimento.
O Sr. Correia Gomes (para um requerimento): — Requeiro que a moção do Sr Amadeu do Vasconcelos seja dividida em três partos: A primeira até as palavras «7 do Fevereiro do 1924» ; a segunda parte, o que se segue até a palavra «confia»; e a terceira parte desta palavra até o fim.
Posto à votação o requerimento, é rejeitado.
O Sr. Artur Brandão: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: — Estão levantados 55 Srs. Deputados e sentados 45.
Está, portanto, rejeitado novamente o requerimento de Sr. Correia Gomes.
O Sr. Júlio Gonçalves (para um requerimento). — Requeiro votação nominal para
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50 Diário da Câmara dos Deputados
a moção do Sr. Amadeu de Vasconcelos.
É aprovado,
Procede-se à chamada.
O Sr. Presidente: —Disseram «aprovo» 57 Srs. Deputados o «rejeito» 8. Está aprovada a moção.
Disseram «aprovo» 51 Srs.
Adolfo Augusto do Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Carneiro Alvos da Cruz.
Alberto Xavier.
Albino Finto da Fonseca.
Alfredo Finto de Azevedo e Sousa.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Anibal Lúcio do Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Domingos Leite Pereira.
Feliz do Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Diais de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Corroía.
Germano José de Amorim.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Estêvão Aguas.
João José Luís Damas.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
José Cortês dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Leonardo José Coimbra.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Alegre.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel deo Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Disseram «rejeito» os Srs.:
António Pinto de Meireles Barriga.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
João de Ornelas da Silva.
José António de Magalhães.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel de Brito Camacho.
Nuno Simões.
Vasco Borges.
O Sr. Rêgo Chaves (para um requerimento). — Sr. Presidente: requeiro a prioridade de votação para a minha moção, isto é, para duas das suas conclusões que não podem ser prejudicadas.
O Sr. Presidente: — A Mesa considera prejudicada apenas a terceira conclusão da moção do V. Exa.
O Sr. Rêgo Chaves: - A fim do facilitar a forma das votações, requeiro que a minha moção seja votada apenas com as duas primeiras conclusões, sem os considerandos.
Foram aprovados os dois requerimentos do Sr. Rêgo Chaves, assim como as duas primeiras conclusões da sua moção.
Foi rejeitada a moção do Sr. Cunha Leal, tendo ficado prejudicadas as moções dos Srs. Vasco Borges, Morais Carvalho, Nuno Simões e Carvalho da Silva.
O Sr. Presidente: - A segunda parte da moção do Sr. Lino Neto está prejudicada; mas a primeira não o está.
Vai votar-se.
Foi rejeitada.
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O Sr. Alberto Jordão: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procedeu-se à contraprova e contagem.
O Sr. Presidente: — Estão de pé 51 Srs. Deputados e sentados 11.
Está, portanto, rejeitada a primeira parte da moção do Sr. Lino Neto, estando, como já disse, prejudicada a segunda parte.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro da Marinha (José Domingues dos Santos) — Sr. Presidente: agradeço à Câmara a votação que acaba de fazer.
Sem palavras de acrimónia para ninguém o sem declarações de guerra para quem quer que seja, continuarei governando até que o Parlamento me diga que deve abandonar o Poder.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é hoje, às 14 horas, com a seguinte ordem dos trabalhos:
Antes da ordem do dia:
A de hoje.
Ordem do dia:
A de hoje, menos o debate sôbre a organização do regime bancário. Está encerrada a sessão. Eram 4 horas e 25 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Declarações de voto
Declaro que o meu voto à moção do Sr. António Maria da Silva não representa desconfiança ao Govêrno, mas apenas a expressa afirmação da minha não concordância com o decreto n.º 10:474, por o considerar, em minha consciência, atentatório da economia nacional. — Lourenço Correia Gomes.
Para a acta.
Declaro que o meu voto à moção do Sr. Amadeu de Vasconcelos respeita apenas à parte referente ao decreto, sendo de aprovação para a segunda e terceira parte da referida moção.— Lourenço Correia Gomes.
Para a acta.
1.° Entendo que os poderes conferidos ao Poder Executivo pela autorização contida na lei n.° 1:545 só acham ia, em parte, esgotados pelo uso de que ela foi feito; entendo, nestas condições, o decreto n.º 10:474.
2.° Reconheço:
a) Que é de manifesta oportunidade legislar sôbre a matéria regulada pelo decreto referido;
b) Que algumas disposições dêsse decreto contêm doutrina aceitável o útil relativamente à defesa dos interêsses públicos; mas
c) Que êsse diploma está longe de ser, sob o ponto de vista jurídico, financeiro o económico, tecnicamente perfeito.
3.° Tinha, portanto, como necessidade a modificação imediata do grande parte das disposições do decreto em questão, ainda que constitucional fôsse.
4.° Reputo, em face do artigo 27.° da Constituição, seja qual fôr das interpelações conhecidas, a aplicada ao Parlamento a única entidade legalmente competente para proceder àquela revisão e modificação. — Pinto Barriga.
Votei a moção apresentada pelo Sr. Amadeu de Vasconcelos certo de que o Sr. Ministro das Finanças virá a aperfeiçoar o decreto sôbre o regime bancário, aproveitando para isso os elementos dignos de atenção colhidos durante o debata parlamentar.— Dinis de Carvalho.
Para a acta.
O REDACTOR — Herculano Nunes.