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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIARIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 63
EM 14 DE ABRIL DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Luís António da Silva Tavares de Carvalho
Sumário.-Aberta a sessão com a presença de 41 Srs. Deputados, lê-se a acta e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia.-O Sr. Pamplona Ramos requere a discussão imediata do parecer n.° 845.
O Sr. Tavares de Carvalho ocupa-se do péssimo estado em que se encontram as notas do Banco de Portugal e as cédulas da Casa da Moeda, e chama a atenção para o jôgo ilícito. Requere que se discuta imediatamente o parecer n.° 877.
O Sr. Presidente informa que o referido parecer está dado para antes da ordem do dia .
O Sr. Marques de Azevedo participa à Câmara o falecimento do grande benemérito Gonçalo Pereira, de Barcelos, e propõe um voto de sentimento. É aprovado.
Lê-se na Mesa e entra em discussão ò parecer n.° 877.
O Sr. Dinis de Carvalho pregunta se foi ouvido sôbre êle o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães) dá o seu assentimento ao parecer.
O Sr. Tôrres Garcia analisa o projecto, ficando com a palavra reservada.
Ordem do dia.- São aprovadas as actas das sessões anteriores.
O Sr. Joaquim Ribeiro pede a palavra para um negócio urgente. Aprovado.
O Sr. Joaquim Ribeiro realiza o seu negócio urgente, ocupando-se da importação do álcool estrangeiro para tratamento dos vinhos do Pôrto.
Responde-lhe o Sr. Ministro da Agricultura (Amaral Reis}.
Prossegue a discussão, na especialidade, do parecer n.º 903 (fósforos).
Procede-se a uma contraprova pendente sôbre, um requerimento para que se discutam conjuntamente as bases A e B. É rejeitado o requerimento.
O Sr. Tôrres Garcia manda para a Mesa e justifica uma proposta, que é admitida.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães) declara aceitar a proposta do Sr. Tôrres Garcia.
Usam ainda da palavra os Srs. Carvalho da Silva e Morais Carvalho.
O Sr. Jaime de Sousa requere a prorrogação da sessão até se votar o assunto que se discute.
O Sr. Carvalho da Silva usa da palavra sôbre o modo de votar.
O Sr. Presidente observa que sôbre o modo de votar se não devem fazer grandes discursos.
O Sr. Jaime de Sousa, conformando-se com as observações do Sr. Presidente, desiste da palavra.
A Câmara aprova o requerimento do Sr. Jaime de Sousa.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães) responde aos Srs. Carvalho da Silva e Morais Carvalho.
É aprovada a moção do Sr. Portugal Durão.
São aprovadas as propostas do Srs. Tôrres Garcia, Jaime de Sousa e Paiva Gomes.
Sôbre a proposta de substituição apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças, à base A, requere votação nominal o Sr. João Camoesas. Rejeitado em prova e contraprova requerida pelo Sr. Morais Carvalho.
A proposta do Sr. Ministro das Finanças é aprovada, em prova e contraprova.
Fica prejudicada a proposta de aditamento de um parágrafo único apresentada pelo Sr. Tôrres Garcia.
Entra em discussão a base B.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães) apresenta uma proposta.
Sôbre o modo de votar a admissão usam da palavra os Srs. Morais Carvalho, Ministro das Finanças, Pinto Barriga, Álvaro de Castro e Carvalho da Silva.
É admitida a proposta e entra em discussão. Usa da palavra o Sr. Morais Carvalho, que fica com ela reservada.
Interrompe-se a sessão às 20 horas, para reabrir às 22.
Reaberta, o Sr. Morais Carvalho prossegue no
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uso da palavra e manda para a Mesa uma proposta de aditamento. É admitida.
O Sr. Carvalho da Silva requere a contraprova, verificando-se não haver número.
O Sr. Presidente levanta a sessão e marca a imediata, com a mesma ordem do dia.
Abertura da sessão às 15 horas e 19 minutos.
Presentes à chamada 41 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 27 Sr. Deputados.
Presentes à chamada;
Albano Augusto de Portugal Durão.
Albino Pinto da Fonseca.
Álvaro Xavier de Castro,
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira,
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco da Cunha Rego Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos,
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Larnartine Prazeres da Costa.
José Pedro Ferreira.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Nuno Simões.
Pedro Januário de Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Vitorino Henriques Godinho.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
António Abranches Ferrão.
António de Mendonça.
António Pinto Meireles Barriga.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Martins de Paiva
Francisco Coelho do Amaral Reis.
João Estêvão Aguas.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel do Sousa Coutinho.
Tomás de Sousa Rosa.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
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Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Américo da Silva Castro.
António Correia.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António de Paiva Gomes.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João do Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Maximino de Matos.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
As 15 horas principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 41 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler se a acta.
Eram l5 horas e 20 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Do Ministério do Interior, respondendo ao ofício desta Câmara relativo a um requerimento do Sr. António Correia e relativo ao conflito do Rosmaninhal.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Justiça, pedindo a inclusão no respectivo Orçamento de designadas verbas para o Instituto de Medicina Legal do Pôrto.
Para a comissão do Orçamento.
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Do Presidente do Conselho Fiscal da Caixa Geral de Depósitos, lembrando o compromisso do disposto no artigo 8.° da Base 3.a do decreto n.° 4:670, de 14 de Julho de 1918.
Para a Secretaria.
De António Alves Feliciano (primeiro sargento), pedindo a aprovação duma lei que melhorou a situação dos reformados da armada.
Para a Secretaria.
Telegramas
Do capitão aviador Pinheiro Correia, (de Bolama) agradecendo as saudações da Câmara.
Para a Secretaria.
Do Sindicato Agrícola de Santarém, protestando contra a pretensão da entrada de álcool estrangeiro.
Para a Secretaria.
Do pessoal dos fósforos, admitido depois do 1895, pedindo para ficar em igualdade de garantias com o demais pessoal.
Para a Secretaria.
Dos agricultores do vinho o cana sacarina do Funchal, pedindo para poderem fabricar álcool para tratamento do seus vinhos, o aguardente para seu uso privativo.
Para a Secretaria.
Dos reformados da guarda fiscal de Silves, pedindo que a receita de viação e turismo arrecadada nesse concelho seja destinada a estradas locais,
Para a Secretaria.
Requerimentos
De Augusto Ladeira, inspector escolar no círculo da Guarda, do padre Camilo Manuel e Rodrigo Diz, secretário da administração do conselho de Bragança, pedindo o reconhecimento como revolucionários civis.
Para a comissão de petição.
Representação
Dos secretários de finanças de segunda classe, na Direcção Distrital de Finanças de Leiria, pedindo a aprovação do projecto de lei do Sr, Lourenço Correia Gomes e a rejeição dum artigo do projecto do Sr. António Resende. Para a comissão de finanças,
O Sr. Presidente:- Vai entrar-se no período de
Antes da ordem do dia
O Sr. Pamplona Ramos:-Peço a V. Exa., Sr. Presidente, o favor do consultar a Câmara sôbre se consente que seja discutido imediatamente o parecer n.° 845, já aprovado no Senado.
O Sr. Tavares de Carvalho:-Sr. Presidente: como vejo presente o Sr. Ministro das Finanças, quero chamar a atenção do S. Exa. para o estado em que circulam as notas do Banco de Portugal no norte do País.
Já mais de uma voz tenho tratado do assunto nesta Câmara, e ainda não vi que as reclamações por mim formuladas fossem atendidas, e bem assim que terminasse a campanha que vem sendo feita por motivo das notas de há muito não serem substituídas.
Peço ao Sr. Ministro das Finanças a fineza de tomar providências no sentido do serem substituídas aquelas notas, porque sob êste pretexto tem-se feito uma grande campanha contra a República.
Sr. Presidente: aproveito o ensejo para chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior para a seguinte lista, de que me foi dado conhecimento, dos lugares e clubes onde se joga:
Clube Mayer, joga-se na garage.
Maxime-Club, entrada na Calçada da Glória.
Ritz-Club, joga-se na sobreloja.
Monumental, joga-se no interior, em uma dependência.
Bristol-Club, joga-se no 1.° andar do mesmo prédio.
Sporting-Club, joga-se nas salas.
Clube dos Patos, joga-se nas trazeiras do prédio.
Montanha-Clube, joga-se nas salas.
Clube do Figueira, idem.
Avenida, n.° 92, 2.°, idem.
Clube Romão Casales, Avenida da Liberdade, n.° 91, joga-se no rez-do-chão.
Ainda mais informações podia fornecer,
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mas reservo-as para outra ocasião, esperando que o Sr. Ministro do Interior tome as necessárias providências, tanto mais necessárias quanto é certo que as indicações por mim feitas foram-me fornecidas por pessoa fidedigna.
Sr. Presidente: visto estar no uso da palavra, peço a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre se permite que entre imediatamente em discussão o parecer que diz respeito aos oficiais nas situações de inactividade e disponibilidade.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:-Devo dizer a V. Exa. que o parecer indicado por V. Exa. é o primeiro que está dado para antes da ordem do dia.
O Sr. Marques de Azevedo:-Sr. Presidente: acabo de receber um telegrama comunicando a notícia do falecimento do Sr. Gonçalo Alves Pereira.
Poderá parecer estranho à Câmara que eu venha aqui invocar a memória dêste cidadão, mas trata-se de uma pessoa que soube fazer da máxima benemerência um título que o impôs ao nosso respeito e ao nosso reconhecimento.
Gonçalo Pereira partiu da sua terra natal, Barcelos, para o Brasil, onde arranjou meios de fortuna, que menos serviram para as suas comodidades do que para valer a muitas necessidades.
Há muitos anos que em Barcelos havia um centro republicano, servido por algumas aulas, cujos professores eram pagos pelo bolso de tam benemérito barcelense.
Em várias ocasiões os seus haveres serviram para acudir às necessidades de muitas instituições de caridade, e na sua terra natal criou-se uma escola agrícola, para a qual deu 100 contos, quando a moeda tinha ainda o valor ouro.
Ao Estado deu êle também 100 contos para a construção de um manicómio, e bastantes vezes a sua bolsa esteve pronta para valer a todas as instituições de beneficência.
Não me parece demasiado que a Câmara dos Deputados renda à memória do ilustre barcelense um testemunho de consideração pelas suas altas virtudes.
Por isso proponho que se lance na acta um voto de sentimento pelo falecimento
de Gonçalo Pereira, que soube sempre praticar o bem, na sua mais alta e nobre expressão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Joaquim Ribeiro:-Peço a palavra para um negócio urgente.
O Sr. Presidente: - Peço a V.Ex.a que, nos termos regimentais, comunique à Mesa o assunto do negócio urgente.
Foi aprovado o voto proposto pelo Sr. Marques de Azevedo.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o parecer n.° 877.
Foi lido.
O Sr. Dinis de Carvalho: - Sr. Presidente: trazendo o projecto de lei em discussão aumento de despesa, desejo saber qual a opinião do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): -Estou de acordo com o projecto de lei em discussão, que vem remediar a situação em que se encontram muitos oficiais que, havendo passado à licença ilimitada, não podem voltar ao exército, devido à paralisação que existe nas promoções.
Êsses oficiais, com gravo dano da sua especialização, têm de ser considerados separados do exército, porquanto só passados muitos anos é que podem alcançar vaga nos quadros.
Aparentemente, o projecto de lei traz um encargo para o Estado, mas êsse encargo é atenuado, porquanto há muitos oficiais que têm necessidade de pedir a concessão de licença ilimitada, e não o fazem com o receio de não poderem tam cedo regressar ao exército.
Sob o ponto do vista moral, traz uma grande vantagem, porque existem oficiais que há dezenas de anos estão separados do exército, em consequência de não encontrarem vaga.
O orador não reviu.
O Sr. Tôrres Garcia: - Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as palavras do Sr. Ministro das Finanças.
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Disse S. Exa. que o pequeno encargo que advém para o Estado, com o regresso aos quadros dos oficiais do exército que estão com licença ilimitada, pode ser suprido pelo maior número de pedidos para concessão de licença ilimitada.
Diz o Sr. Ministro das Finanças que o projecto de lei, permitindo a entrada no exército dos oficiais que actualmente não têm vaga, proporciona a êsses oficiais um maior treino e especialização nas armas a que pertencem, e, por isso, é vantajoso, impedindo a perda de qualidades militares aos indivíduos afastados do activo.
Diga-se o que se disser, a aprovação dêste projecto representa um agravamento do problema máximo do exército, que é a acumulação nos quadros dos oficiais.
Com êste projecto de lei pode suceder que alguém se aproveite desta nova vantagem, não para sair, mas para entrar.
A Câmara dos Deputados, que tem a iniciativa nas questões do ordem militar, cabem tremendas responsabilidades no que se tem feito neste assunto, que tem levado à crise mais grave, à, situação mais difícil que o exército português tem atravessado até hoje.
Não tarda o dia em que a Nação veja o exército apenas como instrumento de gasto e não como instrumento de defesa.
Sr. Presidente: a situação financeira do Estado não pode suportar o pesado encargo que lhe traz o número fabuloso que hoje representa a oficialidade do exército.
Eu bem sei que se alega, que há falta de oficiais em engenharia o artilharia a pé, mas isso nada tem que ver com o caso em si.
Eu bem sei que isto foi devido à organização de 1911, que fez com que todos vão procurar noutros serviços melhor remuneração, que esteja em melhor equação com o seu valor e merecimento; e os que saem do quadro, não voltam mais.
Em artilharia há ainda uma grande diferença: os de anilharia de campanha e artilharia a pé.
Uns deviam servir em batarias de costa, outros deviam servir em estabelecimentos fabris do Estado.
Uma bataria, por mais completa que seja, nada fará sem as tabelas de tiro, e eu vi na guerra ter que se fazer modificações do calibre, porque não havia tabela de correcções.
Teve até que se fazer correcção quanto à densidade, pêso, curva da terra e direcção dos ventos.
Há oficiais que deviam estar fazendo serviço em estabelecimentos fabris, pois aí exigem se aptidões matemáticas pelo rigor da fabricação.
Em engenharia há falta de oficiais, pois muitos vão para outros lugares mais rendosos.
Não se remediará o caso emquanto não se atribuírem a êsses oficiais vencimentos que estejam, de facto, em equação com o seu curso, com a sua alta cultura scientifica e com a sua inteligência. Tanto para os oficiais de artilharia, como para os do engenharia, nos seus vencimentos quási que não há diferença entre os dos oficiais das outras diversas armas. Mas, se há unidades, como a de engenharia, que necessitam de uma direcção técnica e competente, outras há em que os serviços têm decorrido normalmente, como, por exemplo, em sapadores mineiros.
Mas, Sr. Presidente, se isso ainda não chega, que se vá para aquela política que é indispensável para o exército: a da compressão do despesas absolutamente inúteis.
E eu vou frisar pontos absolutamente concretos.
Há organizações que se mantêm unicamente pelo poder da inércia, porque não representam nada como elemento de defesa.
Temos uma organização dos serviços de engenharia que custa caríssima ao Estado: é o serviço de torpedos fixos.
Quando de 1902 a 1904 fui estudado o plano de defesa do porto de Lisboa, com uma barragem de torpedos fixos muito a montante da foz, procedeu-se assim porque o alcance da artilharia naval não punha o pôrto de Lisboa a salvo do que se chama o forçamento de um porto por meio de uma esquadra.
Pois ainda hoje se encontra organizado da mesma maneira êsse serviço de torpedos fixos, apesar de os calibres dos canhões dos navios de guerra serem actualmente muito maiores. Êsse serviço, repito, custa caríssimo, porque tem adstrita uma unidade.
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Isto sabe-o toda a gente, dentro e fora do exército, ao mesmo tempo que também sabe que êle para nada serve.
Eu já fiz serviço durante quarenta dias nos torpedos fixos, como chefe do depósito do material, e posso afirmar a S. Exa. que não há lá nada, absolutamente nada que represente um serviço de defesa.
Só lá há sucata e ferrugem.
No emtanto, mantém-se aquela organização que, mesmo que se pudesse manter, para nada serviria. E ai daqueles que pretenderem afirmar aquilo que eu acabo de expor, porque lhe dirão logo que não percebem nada do assunto, embora as pessoas que dele pretendam tratar estejam em condições de, em qualquer campo, sustentar uma discussão sôbre o caso.
O serviço dos torpedos fixos é uma inutilidade dentro do exército, e, no emtanto, custa algumas centenas de contos ao Estado.
Êste serviço em toda a parte do mundo encontra-se entregue à marinha de guerra.
Apoiados.
Nós temos na barra de Lisboa um serviço militar pomposamente organizado e que não serve para cousa nenhuma.
Aí tinha, pois, S. Exa., o Sr. Ministro da Guerra, uma maneira de aliviar os serviços de engenharia e, remediar, até certo ponto, a falta de oficiais que lá há.
Mas, postas de parte estas armas, que realmente têm falta de oficiais, para o qual há remédios de muita natureza, sem serem aqueles de que consta a proposta que está sôbre a Mesa, vamos a ver o que sucede nas outras armas e servidos.
É sabido de todos que o excesso de oficiais em todas as restantes armas é enorme, e que tem grandes inconvenientes.
Há êste facto tremendo, Sr. Presidente, de se colocar o exército português, em face da Nação, numa situação difícil.
E que tendo nós de dar comissões de serviço a toda a gente que tem galões nos braços, vamos pejando os quartéis com mais oficiais. E a essa oficialidade faltam os elementos materiais para estudos, para treinos e para exercícios, porque não há material, nem sequer soldados.
Há regimentos no País em que, depois de terminada a instrução dos recrutas, não se consegue apurar o número de homens suficiente para organizar o quadro permanente.
De maneira que a maioria dêsses oficiais, não havendo nada que solicite a sua atenção e explicações, entram no caminho do abandono das suas funções.
O serviço dá-lhes apenas um dia por mês, e é quando dá; o quartel é longe, não têm que fazer, não vão lá.
Recomenda o Regulamento Geral que ao toque do render da guarda estejam no quartel os seus oficiais, mas êles, como não têm lá que fazer, não aparecem ali.
De maneira que estamos a criar a êsses homens uma situação que não merecem, e as minhas palavras ,agora, como sempre, são ditadas no sentido de protestar contra tudo aquilo que represente inferiorização, deminuição do prestígio do exército, que hoje, mais do que nunca, precisa de ser intangível.
Apoiados.
Precisa de ser indiscutível e dogmático.
De maneira que a minha atitude perante esta questão tem de ser em concordância com as minhas afirmações. Tudo que tenda a um agravamento do mal, que é entre todos o maior, tem de contar com a minha atitude; farei tudo quanto em mim caiba para que se não dê nada que represente reincidência.
Peio respeito que por êle tenho, e um pouco por propensão natural, pelo exército do meu país. pugnarei para o ver rodeado de prestígio. Afirmo que a situação que lhe criámos o compromete e o pode perder no conceito da Nação. Essa situação, sendo má intrinsecamente quanto à eficiência material do exército, destrói por completo os princípios com que a Re pública pretendeu organizar e orientar o exército, tornando-o democrático, tornando-o nacional, não casta, mas nação, em que os cidadãos, do um momento para o outro, comecem a ver que os seus princípios estão destruídos pelos factos.
Evidentemente que o cidadão a quem dirige as suas más apreciações é aos homens que constituem a organização militar. E não há ninguém que possa admitir hoje, sequer, a possibilidade que tal facto venha a dar-se.
Os escritores militares que mais pro-
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fundamente estudaram no último século os princípios de ordem social o psicológico, em que devem assentar as organizações armadas, afirmam, como verdade indiscutível, princípios fundamentais, o seguinte: os exércitos só são exércitos quando à volta dessa organização se desenvolva um meio patriótico tal, que forme dessa mole de gente, dessa nação, isso tudo que conscientemente realize e pratique o seu dever sem condicionalismos do qualquer ordem. O exército-nação não discute nunca a sua intervenção em qualquer acto que signifique defesa de interêsse nacional.
Não há castas criadas ao lado da Nação, quaisquer direitos diferentes. É a própria Nação em marcha, em defesa dos seus direitos e deveres.
Aqui, com a política militar que desgraçadamente temos, contribuímos a pouco e pouco para a destruição dêstes princípios, que são de todos os exércitos vencedores ou vencidos da última guerra.
Não são invenção nenhuma.
São do manual do chefe Napoleão Bonaparte. Todos que tentarem legislar em questões militares tom de meditar nesses livros, que não são técnicos, mas sim um conjunto de psicologia colectiva que reintegra o exército na Nação.
Temos que aproximarmo-nos dêsses princípios por necessidade.
Temos dispensado muitos oficiais que podiam ingressar.
A França, está isto escrito pelo comandante Graée do estado-maior do grande chefe, chamou ao serviço das fileiras os alunos do 1.° e do 2.° ano de todas as escolas militares.
Temos aqui, sem dúvida nenhuma, muitos condecorados com as mais altas medalhas militares.
Mas ninguém se lembrou em França de isentar homens no pôsto de capitães, e alguns no pôsto inferior, para irem concluir o seu curso nas escolas donde tinham saído.
Aqui fez-se o que se sabe por necessidade política.
Não havia oficiais de confiança para determinados cargos, tendo de se nomear capitães, majores, vindo para chefes de serviços administrativos ou comandos do artilharia e divisão oficiais de patentes superiores.
Chegámos por estes erros a uma situação deplorável.
Dizia-se que não havia oficiais superiores de artilharia para comandar em França os sois grupos de artilharia de campanha que nós ali mantínhamos. Notem bem: seis grupos de artilharia!
Para comandantes dêsses grupos nomearam-se, portanto, seis majores. Para substituir êsses majores foram nomeados capitães, para substituir os capitães foram nomeados tenentes e assim sucessivamente e com tal celeridade que há hoje majores de artilharia com oito anos de serviço.
Ora eu pregunto se isto é defender o prestígio do exército. . .
O Sr. Tomás de Sousa Rosa : - Essas promoções não foram resultantes da guerra, mas da paz.
O Orador: - Depois, como nem em todas as armas se fizeram idênticas promoções, começaram as reclamações daqueles que, tendo estado na guerra e cumprido o seu dever, se julgavam vitimas duma desigualdade o duma injustiça flagrantes.
O resultado foi a publicação duma série de decretos, depois da guerra, que nos levaram à presente situação.
E como nós temos no nosso exército o acesso dos sargentos ao oficialato - o que agora não discuto, embora discordo - regulado pela chamada lei do têrço, a apertada delimitação das promoções a oficiais, restringindo a promoção dos sargentos, levou êstes, também, a protestar.
Não só atendeu a que a classe dos sargentos já fora beneficiada com a guerra, em que muitas promoções se fizeram, de segundos a primeiros sargentos e de primeiros sargentos a sargentos-ajudantes, sem que muitos deles -a verdade deve dizer-se e eu posso dizê-lo porque fiz parte dum júri de exames do sargentos e fui até ser instrutor- tivessem aquela cultura indispensável a todo o homem que tem de conduzir homens, o que, se é sempre difícil, mais o é no exército, sobretudo em frente do inimigo. . .
O Sr. Presidente:-Deu a hora de se passar à ordem do dia. V. Exa. deseja terminar, ou ficar com a palavra reservada?
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O Orador:-Se S. Exa. não permite, fico com a palavra reservada. O orador não reviu. É aprovada a acta.
O Sr. Presidente : - O Sr. Joaquim Ribeiro deseja tratar em negócio urgente da anunciada importação de álcool estrangeiro. Os Srs. Deputados que aprovam queiram levantar-se.
Pausa.
Está aprovado.
O Sr. Carlos de Vasconcelos:-Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, é novamente aprovado.
O Sr. Joaquim Ribeiro: - Sr. Presidente: agradeço à Câmara o ter-me permitido usar da palavra sôbre o assunto do meu negócio urgente, assunto incontestavelmente momentoso que traz alarmada, e com razão, a viticultura nacional.
Lembro que foi uma questão idêntica um dos mais poderosos factores da republicanização do Ribatejo, à frente de cujos interêsses se encontrava então o Sr. José Relvas.
Presentemente à importação de álcool estrangeiro acarretaria a ruína da nossa viticultura.
Eu não sou do norte, mas defendi sempre e defendo ainda hoje as regalias que, justamente, são conferidas aos vinhos do Pôrto. Mas, o seu a seu dono. E se o Douro tem realmente direito a essas regalias, o sul tem, também, o direito de fabrico uno e exclusivo das aguardentes necessárias ao beneficiamento dos vinhos do Pôrto.
Se eu fôsse Govêrno, não teria permitido que no modus vivendi ultimamente realizado com a França se estabelecesse a entrada nesse país dos vinhos licorosos do sul, mas seria intransigente em reconhecer ao sul os direitos que legitimamente lhe pertencem.
Sr. Presidente: termino como comecei, por afirmar que a viticultura nacional está alarmada com a anunciada importação de álcool estrangeiro. É, pois, preciso que o Sr. Ministro da Agricultura diga claramente o que há a tal respeito, na certeza de que eu empregarei todos os meus esfôrços -certamente secundados
pela maioria da Câmara- no sentido de impedir a promulgação duma medida que tam profundamente iria afectar a economia nacional.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Agricultura (Amaral Reis): - Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Joaquim Ribeiro acaba de abordar um assunto que neste momento -eu sei-o - preocupa altamente a viticultura nacional.
Tenho recebido últimamente inúmeras representações de câmaras e sindicatos, protestando contra a entrada de álcool estrangeiro.
Sei que foi devido ao fabrico do álcool e da aguardente destinado aos vinhos do Douro, que se vendeu em grande parte a colheita de vinhos do ano que está correndo. Se assim não tivesse sucedido, todo o norte e mesmo o centro do País atravessariam hoje uma grave crise. Portanto, sou daqueles que entendem que a viticultura do sul necessita que lhe sejam comprados os seus vinhos para o tratamento dos vinhos do Douro, não sendo permitida a importação do álcool estrangeiro. Mas se assim penso, devo acrescentar também que só por culpa dos negociantes de álcool e aguardente é que poderia sentir-se a necessidade de importar êstes produtos do estrangeiro, visto que o álcool e aguardentes têm atingido ultimamente preços tam elevados, que, se assim continuarmos, êles serão incomportáveis com o fabrico dos vinhos do Douro, os quais não podemos de forma alguma impedir...
O Sr. Nuno Simões (interrompendo}: - V. Exa. dá-me licença? Sobretudo o que é necessário -e para êste ponto eu chamo também a atenção do Sr. Joaquim Ribeiro- é que a aguardente não atinja preços que vão ter uma natural repercussão no custo dos vinhos do Pôrto.
O Orador: - Certamente! Mas, Sr. Presidente, ainda não chegaram até mim reclamações da região do Douro sôbre a necessidade da importação do álcool e, mesmo que elas nos tivessem chegado, o Govêrno teria ainda outras medidas a tomar, porque podia mandar, por exemplo,
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imediatamente proceder ao inquérito sôbre a existência do álcool...
O Sr. Joaquim Ribeiro (interrompendo):- Mas V. Exa. é contrário à importação do álcool?
O Orador:-Absolutamente, a não ser que o nacional chegasse a atingir preços que fossem, como disse, absolutamente incomportáveis com o fabrico dos vinhos do Douro.
O Sr. João Luís Ricardo (em aparte) : - V. Exa. precisa estar acautelado com certas manobras, para não cair na esparrela.
Risos.
O Orador: - Eu não procederei de forma a neste momento "monarquizar" a República pelo facto de haver uma importação de álcool.
Disto podem também V. Exas. ficar absolutamente garantidos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:-Na última sessão ao discutir-se a base 1.ª do artigo 1.° o Sr. Ribeiro de Carvalho fez um requerimento para que se discutisse conjuntamente as bases l.ª e 2.ª. Foi votado o requerimento e rejeitado. Mas, pedida a contraprova, verificou-se não haver número. Feita a chamada, esta ratificou a falta de número.
Vai realizar-se, portanto, a contraprova do requerimento de S. Exa.
Procedeu-se à contraprova, sendo rejeitado novamente o requerimento por 57 votos contra 1.
Prossegue a discussão do parecer n.º 903.
O Sr. Tôrres Garcia: - Sr. Presidente: a votação que foi feita nesta Câmara sôbre a generalidade do projecto representa a aceitação por parte dela do ponto de vista defendido no parecer da comissão de comércio e indústria sôbre a proposta tendente ao estabelecimento da indústria dos fósforos em Portugal. De maneira que está aceita pela Câmara o princípio da associação do Estado ao capital das emprêsas já existentes ou que vierem a instalar-se e a cobrança do imposto sôbre os fósforos por meio do sêlo ou estampilha.
Entremos propriamente agora, Sr. Presidente, na apreciação do modus faciendi, que a comissão do comércio e indústria não se furtou a propor, tendo chegado a acentuar que em princípio devia dar se corpo, dar-se realidade, dar-se forma através duma proposta devidamente articulada.
Isto representa um propósito de se ir até o fim, como aliás é do nosso dever.
Mas o que foi apresentado pela comissão do comércio e indústria representa neste caso uma modalidade apenas, a de se realizar o objectivo que temos em vista e fê-lo de acordo (apraz-me declará-lo) com o Sr. Ministro das Finanças.
Entre S. Exa. e a comissão de comércio e indústria nunca houve, não podia haver (porque até a ausência de S. Exa. o teria impedido), quaisquer conflitos ou mal-entendidos.
Soube hoje, ao chegar a Lisboa, que isso tinha corrido e, portanto, entendi desde logo que devia fazer um desmentido categórico.
Não houve, não há e por muitos motivos não podia haver qualquer conflito ou, sequer, divergência entre a comissão do comércio e indústria e o ilustre Ministro das Finanças.
S. Exa. apresentará dentro dos princípios já consignados no parecer uma modalidade diferente para a execução dêsses princípios.
A Câmara apreciá-la há por certo como outra qualquer emenda que venha porventura melhorar o que está disposto, melhorar mesmo o que está escrito, porque a redacção foi precipitada, dada a falta de tempo,
A Câmara estudará essas modalidades que forem, porventura, surgindo, e aceitará aquela que melhor se ajuste ao seu pensamento.
Desde já declaro que a comissão de Comércio e Indústria aceitará qualquer emenda que tenda a melhorar o seu trabalho na parto articulada que mandou para a Mesa no seu parecer, apenas com o fim de, bem ou mal, dar forma, dar corpo ao modus faciendi do princípio que preconizava.
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Dito isto, passo a enviar para a Mesa uma proposta de aditamento à base A.
Trata-se de uma generalização do princípio que está consignado na referida base A.
O Sr. Carvalho da Silva: - Não quinhoará nos prejuízos?
O Orador: - Evidentemente.
O Sr. Carvalho da Silva: - Eu é que, evidentemente, aceito sempre uma sociedade dessas.
O Orador:-Em nome da comissão do comércio e indústria nada mais tenho a dizer.
Foi lida na Mesa e admitida a emenda, entrando em discussão.
É do teor seguinte:
Proponho que à base A seja acrescentado o seguinte parágrafo:
§ único. Se alguma empresa individual ou sociedade não constituída por acções ou por cotas se propuser exercer esta indústria, não poderá iniciar o fabrico sem que, mediante prévio acordo com o Govêrno, seja fixada e entregue ao Estado a parte no capital respectivo, pela qual o mesmo Estado não quinhoará nas perdas da empresa ou sociedade.- Tôrres Garcia.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vítoríno Guimarães):- Sr. Presidente: antes de mais nada, quero agradecer ao ilustre Deputado Sr. Tôrres Garcia a explicação que deu à Câmara, desnecessária, aliás, para ela, mas conveniente para o público, desfazendo a atoarda que se levantou, não sei com que intuitos, de que existia uma desinteligência entre mim e a comissão do comércio e indústria, e especialmente com o seu relator, o Sr. Tôrres Garcia.
Como S. Exa. demonstrou, nenhuma divergência há entre mim e aquele Sr. Deputado.
Não era de admirar que qualquer divergência houvesse, tanto mais que o Govêrno não fez do assunto uma questão fechada; mas o que não pode haver, e espero que nunca haverá, é qualquer conflito de ordem p os soai entre mim e o Sr. Tôrres Garcia.
Como todos quantos conhecem S.Ex.a, eu tenho pelo Sr. Tôrres Garcia a máxima consideração, que advém do apreço em que tenho as qualidades de carácter e de inteligência que exornam S. Exa., em quem reconheço grandes qualidades de trabalho e grande dedicação à República.
Repito: poderia haver entre mim e S. Exa. qualquer divergência de orientação, mas nunca um conflito pessoal.
Ditas estas palavras, vou terminar declarando que acho da maior vantagem que a Câmara aprove a proposta de emenda à base A que tive a honra de enviar para a Mesa, ampliada com a parágrafo que acaba de ser proposto pelo Sr. Tôrres Garcia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: não concordo com a maneira de ver do Sr. Tôrres Garcia.
A Câmara apenas se pronunciou sôbre a generalidade da proposta. Nada resolveu quanto a pontos concretos, como seja o da comparticipação do Estado em qualquer empresa que se constitua para o exercício da indústria dos fósforos.
Acentuou há pouco o Sr. Tôrres Garcia que nenhuma divergência houvera entre S. Exa. e o Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças.
Lamento isto, porque vejo que o Sr. Tôrres Garcia não pensou numa fundamental divergência que existe de facto entre S. Exa., como relator da comissão do comércio e indústria, e a opinião do Sr., Ministro das Finanças.
E o caso de no parecer daquela comissão se declarar que deverá ficar marcado na lei que o preço dos fósforos não poderá ser elevado, e o Sr. Ministro das Finanças entender que tal condição não deverá figurar na legislação.
Ora isto é uma divergência fundamental, pois não devemos esquecer os interêsses do consumidor, e é necessário que o Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças diga à Câmara terminantemente qual é a sua opinião sôbre tal ponto, que é bastante importante.
O Sr. Presidente do Ministério na emenda que apresentou hoje ...
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O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Eu não mandei nenhuma emenda para a Mesa.
O Orador:-E então engano meu.
Clamavam os Srs. republicanos contra os monopólios, pelo facto de constituírem um princípio restritivo à liberdade que tem qualquer indivíduo do exercer a sua actividade como entender e quiser.
Onde está o amor à liberdade?
A base A é a negação absoluta dos direitos de cada um, tam fortemente defendidos por palavras pelos Srs. republicanos.
Uma outra razão existe ainda para combater ,os monopólios e torná-los antipáticos. É que, não havendo concorrência, o consumidor fica à mercê dos mais arbitrários aumentos de preço.
Êste critério de o Estado querer obter receitas por todas as formas e processos, mesmo agravando o custo dos géneros de primeira necessidade, é absolutamente condenável.
È indispensável que o Sr. Presidente do Ministério nos declare se aceita ou não que na sua proposta seja introduzida uma emenda proibindo o aumento do preço dos fósforos.
O que se pretende fazer não é mais do que a entrega do monopólio à actual Companhia.
Mas eu pregunto: quem vai empregar o seu capital na administração duma empresa de fósforos em Portugal?
Se querem o monopólio, porque o não propõem abertamente?
Seria muito menos mau, porque dessa forma ainda haveria um concurso público que ofereceria algumas garantias ao Estado e ao consumidor.
Sr. Presidente: tanto na proposta da comissão de comércio e indústria, como na proposta do Sr. Presidente do Ministério, não só não se garante a importação de fósforos estrangeiros, mas, pelo contrário, se proíbe essa importação, estabelecendo-se o regime proteccionista à indústria nacional.
Eu concordo em que haja protecção á indústria nacional, mas é preciso que essa protecção fique estabelecida.
A protecção à indústria nacional deve assentar na diferença que existe entre o
custo da produção, incluídos os juros do capital, isto é, os lucros, e o custo dos fósforos importados do estrangeiro.
É indispensável um inquérito à indústria dos fósforos para se sabor a produção da indústria nacional e o preço dos fósforos estrangeiros, e só depois é que podemos estabelecer a protecção à indústria nacional.
Antes disso nada em consciência se pode fazer, e é muito mais de aceitar o que diz o Sr. Paiva Gomes; mas não pensa assim o Sr. Tôrres Garcia e a comissão de comércio e indústria.
Leu.
Vamos separadamente ver cada uma das três partes:
Primeira:
Leu.
O Govêrno pode autorizar a exportação de fósforos. Mas então também pode deixar de a autorizar.
Podia o Estado, entidade monopolista com interêsse nos lucros da Companhia, garantir o consumidor?
Segunda parte: diferencial alfandegária.
Eu faço justiça a S. Exa. quando merece..
Terceira parte: 25 por cento de quê?
É sôbre o quilograma ou sôbre a arroba?
S. Exa. não o diz;, porque não tem números nem dados, e assim tanto pode ser 25 por cento como 100 por cento.
Eu não compreendo que se diga superior a ... e não inferior a ...
O Estado fica interessado nos lucros da Companhia, e assim é fácil do ver o aumento do preço dos fósforos.
Depois há urna proposta apresentada pelo Sr. Tôrres Garcia, em nome do Govêrno, e assim na base B temos:
Leu.
Sôbre cada caixa de fósforos há uma diferença de preço que nunca excederá de 50 por cento do preço de cada caixinha do ano anterior.
O que se vê por tudo isto é que o consumidor fica explorado.
Isto, Sr. Presidente, é, nem mais nem menos, do que uma verdadeira protecção à exploração, o que se não pode admitir por princípio algum.
O facto é que, nó tempo da Monarquia, não era permitido o aumento do preço
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dos fósforos, o que agora se pretende estabelecer.
Agora pretende-se fazer justamente o contrário. Diz-se aí que a Companhia pode explorar à vontade, visto que, quanto mais aumentar os preços, maiores direitos virão para o Estado.
Isto é verdadeiramente inadmissível. Com isto não se faz senão garantir o monopólio à Companhia dos Fósforos, visto que se diz claramente que pode aumentar os seus preços, que pode explorar como entender o consumidor.
O Sr. Tôrres Garcia (interrompendo}:- V. Exa. há-de permitir que lhe diga que está sustentando um princípio que é absolutamente contrário ao que se encontra na emenda apresentada pela comissão de comércio e indústria, pois a verdade é que segundo ela poderemos ter em Portugal fósforos estrangeiros ao preço de $18 a caixa.
Isto, como a Câmara vê, é absolutamente o contrário, repito, daquilo que está sendo sustentado pelo Sr. Carvalho da Silva.
O Orador: - O que V. Exa. não pode negar é o que se encontra aqui, isto é, que a protecção à indústria nacional é tanto maior quanto mais ela aumentar o preço de venda dos fósforos.
Isto é o que V. Exa. não pode negar.
Interrupção do Sr. Torres Garcia que se não ouviu.
O Orador: - O que V. Exa. não ignora, nem a Câmara, é que as condições da indústria neste tempo eram bem diversas das de hoje.
A indústria nesse tempo não podia viver nem garantir a situação do seu operariado, razão por que foi feito o contrato de 1895.
O Estado em face dessa situação concedeu-lhe de facto o monopólio; porém, teve o cuidado de não permitir o aumento dos preços como agora se pretende fazer.
O Sr. Tôrres Garcia (interrompendo ) : - Não apoiado.
O Orador: - Eu é que francamente não compreendo o não apoiado do Sr. Tôrres Garcia, e não o compreendo tanto mais quanto é certo que S. Exa. já transigiu com o Sr. Presidente do Ministério aceitando a eliminação de uma parte da base A.
Mas, Sr. Presidente, o Sr. Tôrres Garcia, apesar de dizer que o direito proteccionista pode ser ou deve ser sôbre o preço da venda da caixa ao público, vai concordar comigo ao afirmar que êsse critério é perfeitamente insustentável.
Compõe-se do três partes o preço por que uma caixa de fósforos é vendida ao público: é o desconto de revenda com a respectiva comissão das fábricas para o comércio, é o imposto de sêlo estabelecido para estas fabricas e aquilo que a indústria recebe quando vende cada caixa, e suponhamos que o desconto de revenda é progressivo de 10 a l5 por cento. Como a Companhia não vende directamente, segundo informações que tenho, há uma comissão intermédia, supondo que tudo isto junto dá 18 por cento temos que a $30 cada caixa dá $05(4), com mais $10 para sêlo são $15(4). Êste é que é propriamente o custo de produção, incluindo nele o juro do capital.
Como vê o Sr. Tôrres Garcia, não é indiferente dizer-se tantos por cento sôbre o custo de venda de cada caixa.
O que é protecção feita à indústria? E o que tende a colocar a indústria nacional perante a indústria estrangeira em circunstâncias de com ela poder competir. Logo é sôbre o preço da produção a protecção a dar.
Sr. Presidente: não podemos abstrair esta circunstância, visto que vamos estabelecer nesta base qual o regime a adoptar. O artigo 1.° diz:
Leu.
Temos de ver que o consumidor não pode ser esquecido; tem de ser tomado com consideração por forma a que se não aumente o preço dos fósforos.
Então ocorre ver se aquilo que nas outras bases se estabelece, com relação a impostos a lançar sôbre a indústria dos fósforos, é, porventura, uma cousa que caiba dentro do actual preço de venda dos fósforos.
Sr. Presidente: variados são os cálculos feitos pelo Sr. Tôrres Garcia e pela comissão de comércio e indústria e os feitos pela comissão de finanças, porque o Sr. Presidente do Ministério e Ministro
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das Finanças não se deu ao trabalho de apresentar qualquer relatório justificativo da proposta que mandou para a Mesa.
O Sr. Torres Garcia diz, no parecer da comissão do comércio e indústria, que não tem dados para afirmar se realmente, os preços dos fósforos estão ou não actualizados; mas as circunstâncias de deminuição de tamanho, de alteração nas matérias primas, deminuiçâo do número dos fósforos em cada caixinha, são motivos que fazem adquirir a certeza de que o preço dos fósforos está mais do que actualizado. Todavia, o Sr. Paiva Gomes, relator da comissão do finanças, no seu parecer, afirma, o contrário. Eu confesso que, dentro dos elementos de que dispomos, não podemos garantir nem uma nem outra cousa. Mas é conveniente que levemos as nossas investigações, até ao ponto de podermos tirar qualquer conclusão.
Pelo contrato de 1895, alegam o Sr. Tôrres Garcia e o Sr. Paiva Gomes, e com razão, que a percentagem do imposto pago pelos fósforos tem deminuído espantosamente nos últimos anos, e que, tendo sido de 25 por cento, na maior parte da vigência do contrato, chegou a 4 por cento, estando actualmente em 7 por cento. Todavia, o Sr. Paiva Gomes no seu relatório diz que êsse imposto chegou a 39,7 por cento, nos últimos dois ou três anos.
É fácil, com um pouco de cuidado, chegar-se à conclusão do que os factos explicam essas circunstâncias. A base de tributação, pelo contrato de 1895, não era a produção de fósforos, mas o número de caixinhas que se produziam por ano, havendo um mínimo de 280.500$ para 750:000 grosas, ou sejam 108 milhões de caixinhas. Quero dizer, se a Companhia, por qualquer motivo, produzisse menos fósforos, não podia pagar menos do que aquela importância. Assim aconteceu no primeiro ano de exploração, em que a Companhia produziu 102 milhões de caixinhas, mas pagou 280.500$.
Consequentemente, esta verba não foi dividida pelos 108 milhões, mas por um número menor, pelo que o coeficiente obtido, em vez de ser de $00(256) foi $00(28), o imposto cobrado nos primeiros anos. Porém, desde que a produção aumentou, o imposto deminuiu, porque era apenas de 347 escudos por cada mil
Grosas.
Em tais condições, nós vemos que cada caixinha de fósforos pagava até a quantidade dos 108 milhões $00(256) e que daí para cima $00(24).
Sr. Presidente: é fácil encontrar uma outra explicação para a percentagem grande que a Companhia pagou.
Pelo contrato de 1895 havia três tipos de fósforos. Um que era vendido à razão de $00,5 cada caixinha, tendo cada 60 fósforos, e os outros dois à razão de $01, tendo umas caixas 50 a 55 fósforos e outras 35 a 40. Quero isto dizer que qualquer que fôsse o preço de cada caixinha, a importância cobrada pelo Estado era sempre igual.
Alas a Companhia, vendo-se em dificuldades ou por qualquer outro motivo, deminuiu a produção dos fósforos de $00(5), o que motivou deminuir a média, chegando-se aos 25 por cento.
Mas nós não podemos encarar a produção dos fósforos pelo número de caixinhas, porque o número de fósforos que cada uma deve ter é cada vez menor,
Nestas condições, o que temos a ver, e isso é que interessa ao consumidor, é quanto pagava cada fósforo de imposto para o Estado, e quanto passa a pagar pelas propostas actuais.
Sr. Presidente: dei-me ao trabalho de fazer êsses cálculos, e vi que cada fósforo amorfo, pelo contrato de 1895, pagava 47 milésimos de real de imposto.
Pelas propostas agora apresentadas, cada fósforo passa a pagar 1,5 real.
Quere dizer, o imposto que agora se pretende criar é, já no primeiro ano da vigência da proposta, cêrca de 59 vezes e meia o imposto pago pelo contrato de 1895.
Vamos a ver qual é o aumento de preço que os fósforos têm tido de 1895 para cá.
Chega-se à conclusão do que tem havido um aumento de 27 vezes e meia por cada fósforo.
O próprio Sr. Tôrres Garcia não o pode afirmar, porque não tem dados.
Como é que se pode saber qual é a actualização?
Temos 200 milhões de caixinhas, que dá 374 contos, e que, multiplicados por 22, dá 7:100 contos.
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Mas o Sr. Presidente do Ministério, não contente com isso, quere mais 20.000 contos de sêlo.
O Sr. José Domingues dos Santos: - V. Exa. está a fazer obstrucionismo.
V. Exa. está a defender os interêsses da Companhia.
O Orador: - V. Exa. falta à verdade dizendo que eu defendo és interêsses da Companhia, e é melhor V. Exa. ir aprender para ver que não estou, fora da ordem, pois se assim fosse já o Sr. Presidente me teria chamado à ordem.
Estabelece se diálogo entre o orador e o Sr. José Domingues dos Santos.
O Sr. Presidente: - Peço a V. Exa. que se dirija à Mesa.
O Orador: - Pela minha honra afirmo que não estou fazendo obstrucionismo.
Disso que actualização é uma cousa problemática.
É preciso saber qual o custo da produção.
O aumento da matéria prima é natural, visto que, em regra, vem do estrangeiro.
O Sr. José Domingues, dos Santos: - O que é que se discute? É a base l.ª?
O Orador: - A matéria prima custa mais 44 vezes.
Temos os salários. A tabela de 1895 é:
Leu.
Por conseguinte, quere isto dizer que é muito duvidoso, muito problemático que a actualização do preço dos fósforos não venha a ser excedida.
Para sabermos qual o regime que vamos adoptar, para o sabermos neste artigo 1.° que se refere a todas as bases, e eu agora não discuto senão as directamente ligadas com êste artigo, é fundamental sabermos se sim ou não a proposta actual vem trazer um aumento de prece dos fósforos.
Chamo, pois, a atenção da Câmara para estes pontos : a proposta actual, pela exigência da comparticipação do capital, representa um monopólio, de facto, da actual Companhia; essa exigência da comparticipação do capital representa a negação de cada um exercer a sua actividade como entenda e quere; a negação
dum direito, porque para alguém poder exercer esta actividade tem de pagar. Ora quem tem um direito tem-no e não precisa de o comprar.
A proposta actual, dizendo-se uma proposta de liberdade, é o pior de todos os monopólios, porque não só não fica, por ela, de maneira alguma, marcado o limite do preço dos fósforos, mas também a doutrina desta proposta representa entregar o consumidor à especulação, tornando a República interessada nesta exploração. Se o Estado deve ser um Órgão comum da Nação, não podem nem deve ser um órgão explorador do País.
Chamo também a atenção da Câmara para outro ponto importantíssimo e fundamental: sendo a importação de fósforos estrangeiros a única concorrência que pode estabelecer se aos desmandos duma entidade monopolista, pela doutrina desta proposta não só não fica garantida a concorrência, mas, mais do que isso, estabelece-se um imposto que varia proporcionalmente ao aumento de preços, um imposto que é tanto maior quanto maior fôr a exploração da Companhia ao consumidor.
Sr. Presidente: julgo ter dito o indispensável, com a certeza plena de que não fiz obstrucionismo, e preciso era que muitos dos Srs. Deputados da maioria, ao tratar-se dum assunto de tal magnitude, o tratassem tam largamente como eu acabo de o fazer, no estrito cumprimento do meu dever.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Morais Carvalho:-Sr. Presidente: depois do discurso, tam notável, tam cheio de dados, que acaba de proferir o ilustre sub-leader dêste lado da Câmara, e meu amigo, Sr. Carvalho da Silva, não vou, Sr. Presidente, repetir as considerações por S. Exa. feitas, com um brilho em que eu não saberia acompanhá-lo
Não posso, em primeiro lugar, deixar de estranhar a ausência de critério, por parte do Govêrno, ao discutir-se um assunto da magnitude dêste que ora ocupa a atenção da Câmara.
O Sr. Presidente do Ministério começou por perfilhar a proposta que à Câmara havia sido trazida pelo seu anteces-
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sor, o Sr. Dr. Pestana Júnior, e, depois, Sr. Presidente, no moio da discussão, ao sabor dela, conforme o próprio Sr. Presidente do Ministério confessou, dizendo que a proposta seria o que da discussão saísse, vem S. Exa. apresentar nova proposta de alteração, com critérios inteiramente diversos.
Quere dizer, Sr. Presidente, que num assunto que, do há muito, já devia estar estudado, e para cuja discussão se deveriam ter leito inquéritos o estudos que eram absolutamente indispensáveis, o Govêrno descurou inteiramente os interêsses do País.
E o Sr. Ministro das Finanças veio para esta discussão sem ter uma orientação firme o sem saber aquilo que desejava, esperando que da discussão saísse qualquer luz que o esclarecesse.
Sr. Presidente: no artigo 1.° e na base A, que é aquela que neste momento mais directamente nos interessa, embora nós não possamos, para formar um juízo completo, abstrair por completo do que noutras bases se declara e determina, porque entre elas há uma íntima correlação, como o acabou de demonstrar o meu ilustre amigo, Sr. Carvalho da Silva, diz-se o seguinte:
Leu.
Mas, Sr. Presidente, esta liberdade sui jeneris, de liberdade apenas tem o nome, redundando, de facto, num monopólio, e num monopólio que não pode ser exercido senão pela actual Companhia concessionária.
E é fácil prová-lo.
O exercício da indústria de fósforos poderá ser feito, nos termos da base A, pelas actuais fábricas ou por outras que venham a instalar-se, desde que entreguem ao Estado 25 por cento do seu capital realizado, em acções ou cotas preferenciais.
Basta que V. Exas. atentem bem na redacção infelicíssima desta base 1.ª, que contém doutrina que nem sequer se enquadra dentro dos moldes gerais da nossa legislação civil e comercial, para que V. Exas. cheguem à conclusão do que se vai dar um monopólio à actual Companhia concessionária, dizendo-se, é certo, que o exercício desta indústria será livre não só para as actuais fábricas, mas para outras que venham a instalar-se.
Ora, Sr. Presidente, note V. Exa. ° que não se diz que é livre o exercício da indústria para qualquer empresa futura, mas sim para fábricas que venham a instalar-se.
E, sabido como é que, por outra base, as fábricas só depois de instaladas e matriculadas no Comissariado dos Fósforos é que poderão importar as matérias primas essenciais ao exercício desta indústria, V. Exas. compreendem que não há forma de só conseguir a constituição de uma nova emprêsa ou companhia, que vá imobilizar capitais importantíssimos, porque para ela o exercício só é livre quando, repito, estiver essa fábrica instalada e matriculada.
Do modo que, Sr. Presidente, se eu amanhã me propusesse a constituir uma empresa dessas, natural era que havia de procurar arranjar capitais para ela.
Mas, como é que eu, sem ter a certeza de que essa matricula mo era concedida, havia de tentar arranjar capitais tam importantíssimos como seriam êsses para formar uma empresa, capaz de se bater com a actual Companhia?
Sr. Presidente: êste ponto parece-me muito importante, e, para êle chamo a atenção do Sr. Ministro das Finanças.
Êste é o primeiro óbice que na base A se encontra, para que não seja de facto possível amanha, o exercício da indústria do fósforos por outra qualquer empresa que não seja a actual Companhia concessionária.
Compreende, pois, V. Exa., Sr. Presidente, que, pela base A, conjugada com a base F, se torna absolutamente dependente o exercício da indústria e, portanto, a constituição de qualquer empresa. E esta dependência não é do concessionário, mas sim do Estado, o qual pode negar a matrícula, tornando assim ineficaz toda a actividade o todo o capital despendido até aí.
Mas, Sr. Presidente, êste é o primeiro óbice; não é, porém, o único.
É necessário ainda, para que qualquer fábrica actual ou futura possa exercer a sua indústria, que ela entregue ao Estado 25 por cento do seu capital social realizado, em acções ou cotas preferenciais.
Fácil é de ver, Sr. Presidente, com uma exigência desta natureza, se a Com-
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panhia actual se abalançará a exercer a sua indústria em tais circunstâncias.
Como se pode esperar que quem quer que seja vá angariar o capital indispensável para a montagem de fábricas tam importantes, desde que de antemão se diz ao capitalista que l/4 do capital que êle entregar será para o Estado, isto independentemente dos impostos estabelecidos na proposta e que sôbre essa indústria hão-de pesar, quando todos sabem e reconhecem que as emprêsas incipientes carecem de auxílio e incitamento?
Só doidos se arriscariam a tal.
E, sendo assim, isto não equivale a dizer-se que, de futuro, só a actual empresa concessionária poderá exercer a indústria dos fósforos?
Não, Sr. Presidente! Querem estabelecer a liberdade do fabrico dos fósforos ? Então estabeleçam uma liberdade real, e não venham sob a capa da liberdade criar uma cousa que não é mais do que um monopólio sem fiscalização.
Depois - e eu chamo para o caso a atenção do Sr. Ministro das Finanças, do Sr. relator e dos homens de leis que fazem parte desta Câmara - tanto na proposta do Sr. Ministro das Finanças como no § único do artigo novo da proposta da comissão se contêm doutrinas que não se enquadram adentro dos moldes gerais da legislação portuguesa.
As emprêsas que exercerem a indústria dos fósforos, depois de votada esta proposta, terão de entregar ao Estado 25 por cento do capital realizado em acções ou cotas diferenciais.
Acções ou cotas diferenciais são termos que não existem na legislação portuguesa.
É às acções privilegiadas estabelecidas no decreto n.° 1:645, de 15 de Julho de 1915 que a proposta em discussão se refere?
Se é, melhor seria que se empregasse a terminologia já aceita pela nossa legislação.
Tenho presente, Sr. Presidente, o decreto n.° 1:645, de 15 de Julho de 1915, que pela primeira vez introduziu na nossa legislação as acções privilegiadas.
Bastava o emprego da palavra "acções" para que não se pudesse referir senão a capital de sociedades anónimas ou de sociedades em comandita por acções, visto que só nas emprêsas constituídas por essa forma é que há acções.
Mas se alguma dúvida pudesse haver a êste respeito, bastaria examinar o relatório do respectivo decreto, onde se diz textualmente o seguinte:
Leu.
Criaram-se as acções privilegiadas nos termos dêste decreto. Sabe V. Exa. que as acções privilegiadas, que antes de 1915 não eram admitidas pela nossa legislação, foram criadas para proporcionar a emprêsas que sé encontravam em dificuldades grandes os meios de obterem novos capitais o possibilidade de os conseguirem.
Então disse-se aos detentores do dinheiro :
-Vão entrar para sociedades que já estão constituídas, mas dá-se-lhes uma garantia especial.
Por um lado mantêm se um dividendo que vai preferir o dividendo atribuído às demais acções; por outro, dá-se a êsse capital uma remuneração certa de 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 por cento, emfim, aquilo que se fixar.
Quere dizer: ficam quási na situação de obrigacionistas, visto que são pagos de preferência aos demais accionistas, mas, ao mesmo tempo, têm sôbre os obrigacionistas a vantagem do não terem limitada a remuneração do capital a uma taxa fixa.
Ora estas acções privilegiadas, que se criaram para sociedades já constituídas, quere o Govêrno que as emprêsas já existentes ou que do futuro venham a estabelecer se para exercer a. indústria de fósforos as tenham também, entregando ao Estado a quarta parte do capital nessas acções.
Dizia eu há pouco que uma imposição desta natureza torna impossível o exercício da indústria dos fósforos por qualquer empresa que não seja a actual concessionária.
Essa já tem as suas fábricas montadas, os seus serviços estabelecidos, tem um capital pequeno e fácil lhe é, portanto, amanhã, numa valorização do seu capital, que, para mais, não será fictícia, porque ainda poderá ficar muito aquém da verdade, elevar o seu capital a 15:000 contos ou 18:000 contos, o indispensável para dar em acções privilegiadas ao Estado 25 por cento, que êle requere sem que entre para lá um centavo de capital novo.
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Nessas condições é que o Sr. Ministro das Finanças quero obter dinheiro e nada obtém.
A conclusão a que se chega é que nenhuma empresa vem a constituir-se nestas condições.
Mas cotas privilegiadas não existem na nossa legislação.
Peço ao Sr. Ministro das Finanças que ouça a opinião dos jurisconsultos do seu Partido, que os tem de valor, sôbre se na actual legislação portuguesa existe o que S. Exa. aqui chama cota privilegiada.
Há sim acções privilegiadas, não preferenciais, que esto termo é novo.
O termo acções privilegiadas é que é legal, e os legisladores têm de se orientar pela terminologia técnica adoptada.
Foi a lei do 1915 revogada, e depois posta em vigor em 1918.
Agora cotas privilegiadas e preferenciais não existem na nossa legislação.
Se amanhã um notário conhecedor das leis do seu País, ao constituir-se uma sociedade por cotas, dizendo que determinadas cotas são preferenciais ou são privilegiadas, disser que tal não existe na legislação portuguesa, está no seu direito.
Isto não será o lugar próprio para fazer a definição de cotas privilegiadas ou preferenciais.
Mas o Sr. Tôrres Garcia no § único que mandou para a Mesa propõe que:
Leu.
Êste § único é ditado também pelo desconhecimento da nossa legislação comercial.
Eu não sei se o Sr. Tôrres Garcia, ou quem quer que seja, pode dizer que um indivíduo tom a obrigação do constituir uma empresa em nome individual de dar ao Estado uma parte correspondente ao capital empregado.
Na legislação inglesa o indivíduo que em nome individual exercer a indústria ou comércio, tem sempre uma responsabilidade ilimitada. Não há para êstes casos a responsabilidade limitada.
Podia ser uma lacuna da nossa legislação; mas é assim também na legislação francesa.
Como é que esta Câmara pode ir aprovar uma proposta que impõe ao individuo que exerce uma indústria individual que dê ao Estado 25 por cento ou a quarta parte dum capital que êle não tem?
É querer legislar uma cousa que na prática não terá aplicação possível.
É determinar a porcentagem de uma cousa indeterminada,
O Sr. Nuno Simões (interrompendo): - Por isso se diz que depois se fixará.
O Orador: - Mas ...
Leu.
Mas qual capital?
O indivíduo que exerce uma indústria ou o comercio individual não tem capital.
Responde por todos os seus bens. O Sr. Nuno Simões, que é homem de leis, sabe isso.
Na legislação inglesa pode de facto um indivíduo que vá exercer uma indústria ou o comércio dizer que entra com o capital de tantos contos. Limita a êsse capital a responsabilidade.
Em Portugal só as sociedades anónimas ou em comandita o podem fazer.
Disse o Sr. Paiva Gomes, numa das passadas sessões, que isto está ainda muito verde; eu digo porém que isto está muito verde o encarnado. É esta a maneira como a República legisla, sem pensar naquilo que vai fazer.
Eram estes os reparos principais que eu tinha a formular sôbre a base primeira agora em discussão, reparos que mo parecem absolutamente fundamentados, reparos que me parecem que são de molde a mostrar à Câmara que a base A, tal como está redigida, não deve merecer a aprovação do Parlamento, pois, na verdade, a redacção da base A é tam defeituosa que, a ser aprovada tal como está, não poderá ser posta em execução.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: - Peço a V.Exa., o obséquio de consultar a Câmara sôbre se permito que a sessão seja prorrogada até terminar a discussão do assunto que está em debate, com as interrupções que V. Exa. entender.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: sôbre um assunto desta importância não pode a Câmara de maneira nenhuma votar de afogadilho.
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Nós, Sr. Presidente, temos mostrado quanto desejamos que o Parlamento discuta e aprove êste assunto dos fósforos, porém, entendemos que êle não pode, nem deve ser votado de afogadilho.
A Câmara não pode de maneira nenhuma votar o requerimento do Sr. Jaime de Sousa, visto que, tendo funcionado da maneira como funcionou antes das férias, isto é, com sucessivas faltas de número, não tem autoridade para o fazer.
Sr. Presidente: o requerimento do Sr. Jaime de Sousa é atentatório do prestígio parlamentar, e como tal não pode ser votado.
O Sr. Presidente: -Peço a V. Exa. a obséquio de restringir as suas considerações; não é útil nem regimental fazer sôbre o modo de votar um longo discurso.
Não digo isto a V. Exa. por menos consideração, pois a verdade é que V. Exa. sabe bem a muita consideração que tenho não só por V. Exa. como pelo seu Partido; porém, o que não posso é permitir que sôbre o modo de votar se façam largas considerações, tanto mais quanto é certo que o Sr. Jaime de Sousa já pediu também a palavra sôbre o modo de votar, podendo ainda outros Deputados desejar fazer o mesmo.
O Orador: -Eu tenho também muita consideração por V. Exa., mas eu estou apenas manifestando a minha maneira de ver sôbre o assunto e assim não posso deixar de declarar que o requerimento do Sr. Jaime de Sousa é verdadeiramente atentatório do prestígio parlamentar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa:- Desisto da palavra, em virtude das aceitáveis ponderações de V. Exa.
Seguidamente é pôsto à votação o requerimento do Sr. Jaime de Sousa, que foi aprovado.
O Sr. Carvalho da Silva:-Requeiro a contraprova o invoco o § 2.° do artigo 116.°
Procede-se à contraprova que, confirmou a aprovação por 52 Srs. Deputados sentados e 6 de pé.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): - Sr. Presidente: serei breve nas considerações que vou fazer, não só porque não quero cansar a atenção da Câmara, como por ser urgente tornar-se qualquer decisão sôbre o assunto, visto que estamos a onze dias da terminação do actual contrato dos fósforos.
Não pretendo fazer quaisquer acusações, mas a verdade é que a forma como tem decorrido a discussão não traz nenhum proveito para o Estado.
Tenho a impressão de que o assunto já está suficientemente esclarecido e que, portanto, desnecessário só torna ocupar muito tempo com a discussão de cada uma das bases.
Sr. Presidente: estou em discordância com os Srs. Carvalho da Silva e Morais Carvalho, quanto à afirmação que S. Exas. fizeram de que a fórmula apresentada pela comissão de comércio e indústria conduz a um verdadeiro monopólio.
É precisamente o contrário.
A liberdade de indústria estabelecida sem peias de qualquer espécie é que viria na verdade favorecer os interêsses da actual Companhia.
Desde que não houvesse limitações, podia suceder o facto de qualquer concorrência ser sufocada pela actual Companhia, continuando assim esta numa situação de exclusivismo, sem que o Estado tivesse qualquer proveito.
Não sucederá isso com o sistema de protecção, e vem a propósito dizer ao Sr Carvalho da Silva a razão por que não concordo em que se fixe o preço de todos os fósforos.
À disposição do Sr. Carvalho da Silva, como à do qualquer outro Sr Deputado, ponho os cálculos que mandei fazer sôbre os elementos que colhi, de quais serão os resultados que advirão para o Estado da aprovação desta proposta.
Temos de reconhecer que a nossa indústria de fósforos é parasitária. Mas isso não é razão para a condenarmos. Ela não pode concorrer com a indústria similar estrangeira. Se queremos proteger a indústria nacional dos fósforos, devemos fixar um preço diferente para o fósforo estrangeiro.
Outras indústrias há no País em circunstâncias idênticas à dos fósforos, e as-
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sim é que as nossas pautas têm carácter proteccionista.
Lembro que na Itália o imposto do sêlo que incide em cada caixa de fósforos é de 200 por cento.
Nós estamos longe dêste exagero.
Tem-se dito que não houve tempo para colher elementos de estudo. Não é de aceitar semelhante afirmação.
Está pendente da discussão desta casa do Parlamento, desde 16 de Dezembro, a proposta apresentada pelo meu antecessor na pasta das Finanças, e parece-me que quatro, meses teriam sido tempo mais que suficiente, para quem desejasse estudar o assunto, de colhêr os elementos necessários para uma discussão conscenciosa e ponderada.
De resto, os elementos mais importantes são os extra-oficiais e não é preciso ocupar um lugar no Ministério para os adquirir.
Sr. Presidente: eu entendo que devemos manter a protecção à indústria nacional, e essa protecção não pode, segundo as informações que tenho, ser inferior a 75 ou 100 por cento. Ora êste meu critério de que é necessária a protecção à indústria nacional, faz-me achar inconveniente a fixação de preços.
Não tinha dúvida em aceitar que os fósforos vulgares não pudessem custar mais do que actualmente, mas, àparte a minha opinião de que o estabelecimento dessa cláusula não seria conveniente à protecção à indústria nacional, sucede ainda que, mesmo na defesa dos interêsses do consumidor, tal não era conveniente, porque a situação financeira e cambial do País é de molde -contrariamente ao pessimismo dos Srs. Deputados monárquicos-a fazer prever uma baixa no custo de todos os artigos.
Mas o actual preço dos fósforos não poderá deixar do manter-se, desde que fica autorizada a importação de fósforos estrangeiros, isto é, o Ministro das Finanças tem na sua mão o volante que há-de regularizar êsse comércio, desde que exista a concorrência da indústria estrangeira.
Quanto às considerações do Sr. Morais Carvalho, quere-me parecer que a opinião dos jurisconsultos desta Câmara não pode ser desfavorável ao parágrafo mandado para a Mesa pelo Sr. Tôrres Garcia, embora não houvesse ainda na legislação portuguesa o sistema das cotas privilegiadas.
Êsse sistema aparece agora, mas ninguém poderá deixar de lhe dar o seu apoio.
Os perigos apontados por S. Exa. não tem razão de existir, desde que se obriguem as fábricas a cumprir o seu dever.
Sr. Presidente: eram estas as considerações que, por agora, eu desejava produzir.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Não está mais ninguém inscrito.
Vai votar-se.
Foi aprovada a moção do Sr. Portugal Durão, do teor seguinte:
A Câmara, confiando que o Govêrno providenciará de maneira a impedir que a projectada liberdade de fabrico de fósforos resulte um monopólio de facto, quer em benefício da actual companhia, querem benefício de qualquer outra entidade, e que do novo regime não resulte nem aumento nos preços nem depreciação na qualidade, continua na ordem do dia,
6 de Abril de 1925.- A. Portugal Durão.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Sr. Presidente: requeiro a prioridade de votação para a emenda apresentada pelo Sr. Tôrres Garcia.
Aprovado o requerimento e a emenda.
Foram aprovadas as emendas do Sr. Jaime de Sousa ao artigo 1.°, a emenda do Sr. Paiva Gomes, e o artigo, salvas as emendas. Estas são do teor seguinte:
Emenda ao artigo 1.° da proposta de substituição:
Suprimir as palavras "são livres".
Sala das Sessões, 6 de Abril de 1925.- Jaime de Sousa.
Proponho que no artigo 1.° se intercale a palavra "acendalhas" entre "acendedores e pavios".
Proponho mais que na base A se substituam as últimas palavras pelas seguin-
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tes: "entreguem ao Estado 25 por cento do capital empregado no exercício da respectiva indústria".
6 de Abril de 1925.-Paiva Gomes.
O Sr. Presidente : - Vai votar-se a proposta de substituição à base A, apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. João Camoesas; - Requeiro votação nominal.
Foi rejeitado.
O Sr. Morais Carvalho:-Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Feita a contraprova, verificou-se estarem de pé 43 Srs. Deputados e sentados 17, pelo que foi considerado rejeitado.
Foi aprovada a proposta de substituição à base A, apresentada pelo Sr. Presidente do Ministério, do teor seguinte:
Proponho que a base A seja assim redigida :
O exercício da indústria do fabrico de fósforos no continente e ilhas adjacentes é livre às emprêsas ou sociedades respecvas, a actual ou outras que as constituam, que entreguem ao Estado, do seu capital social realizado, 25 por cento em acções ou cotas privilegiadas, com preferência sôbre lucros até 8 por cento.
Sala das Sessões, 6 de Abril de 1925.- O Ministro das Finanças, Vitorino Guimarães.
O Sr. Carvalho da Silva: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Feita a contraprova, estavam de pé 5 Srs. Deputados e sentados 55, pelo que foi considerada aprovada.
Foi considerada prejudicada a proposta do Sr. Paiva Gomes, e seguidamente aprovada a proposta de aditamento à base A, apresentada pelo Sr. Tôrres Garcia.
Proponho que à base A seja acrescentado o seguinte parágrafo:
§ único. Se alguma empresa individual ou sociedade não constituída por acções ou por cotas se propuser exercer esta indústria, não poderá iniciar o fabrico sem que, mediante prévio acordo com o Governo, seja fixada e entregue ao Estado a parte no capital respectivo, pela qual o mesmo Estado não quinhoará nas perdas da empresa ou sociedade.
6 de Abril de 1925.-Tôrres Garcia.
Foi lida a base B.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de substituição à base B, que acaba de ser lida.
A emenda é a seguinte:
Proponho que a base B da proposta em discussão fique assim redigida:
O Govêrno fixará anualmente o imposto a cobrar por meio de sêlo afixado sôbre cada uma das caixinhas fabricadas no continente ou importadas, o qual não deverá exceder meio centavo, ouro, por cada grupo de quarenta pavios ou palitos fosfóricos contidos em cada caixinha.- O Ministro das Finanças, Vitorino Guimarães.
Sr. Presidente: a razão desta proposta é a convicção, em que estou, de que se torna necessário fixar no padrão-ouro os respectivos direitos, isto para evitar os inconvenientes que foram apresentados durante a discussão, os quais poderiam trazer dificuldades à execução da lei quando se modificasse a situação cambial em que vivemos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Morais Carvalho (sobre o modo de votar a admissão): - Sr. Presidente: chamo a atenção de V. Exa. para o facto de, na base B enviada para a Mesa pelo Sr. Ministro das Finanças, se declarar que o Govêrno fixará anualmente o imposto a cobrar por meio do sêlo.
Sr. Presidente: a fixação dos impostos é prerrogativa do Congresso da República, e V. Exa. não pode admitir na Mesa qualquer proposta que seja inconstitucional.
Se, pelo artigo 26.° da Constituição, é prerrogativa do Congresso da República a fixação dos impostos, não pode V. Exa. admitir na Mesa uma proposta que, evidentemente, vai de encontro ao preceituado no artigo 26.° da Constituição.
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Espero que V. Exa. no desempenho das suas funções, não ponha à votação a proposta tal como está redigida, porque é inconstitucional.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): - Parece-me que as considerações apresentadas pelo Sr. Morais Carvalho não são de aceitar, porque a Câmara na sua doutrina constitucional fixa o máximo dêste imposto.
Portanto, o que aqui está compreendido na doutrina desta base, é exactamente aquilo de que se mostrou paladino o Sr. Morais Carvalho, e que é a defesa dos interêsses do consumidor.
Mas o princípio da fixação do imposto, isto é, o preceito constitucional, está completamente salvaguardado, dizendo se que não poderá exceder $00(5) (ouro).
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pinto Barriga :- Levanta-se uma discussão, Sr. Presidente, sôbre uma alas prerrogativas da Câmara: a do votar anualmente os impostos.
A proposta do Sr. Ministro das Finanças, cerceando essa prerrogativa, é inconstitucional (Apoiados e não apoiados) por uma razão muito simples: declara a Constituição, como disse, que é privativo desta Câmara o votar anualmente o imposto.
Ora, Sr. Presidente, é claro que desde que a fixação de um determinado imposto é dada ao Sr. Ministro das Finanças, não pode realizar-se o preceito constitucional ...
O Sr. Jaime de Sousa (interrompendo):- Mas a Câmara autoriza...
O Orador: Mas não pode autorizar, desde que a Constituição lhe impõe uma doutrina diversa.
Seria precisamente revogar uma disposição constitucional, que a Câmara deve ser a primeira a acatar.
As autorizações de que fala a Constituição, não se pode compreender que respeitem também, ao disposto no artigo 26.°, n.° 3.°, na sua parte final.
Isto é tanto mais certo, quanto certo é também que qualquer autorização, como V. Exas. sabem, não pode ser usada mais de uma vez.
A proposta do Sr. Ministro das Finanças visa a deixar a liberdade completa a S. Exa. e ao Govêrno em geral para fixar anualmente um imposto, o que é, repito, inconstitucional, porque impedirá esta Câmara de usar uma das suas prerrogativas que lhe concede a Constituição.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro: - Sr. Presidente: eu pedi a palavra para responder às objecções dos Srs. Morais Carvalho e Pinto Barriga.
Sou de opinião que ,é absolutamente constitucional a proposta que mandou para a Mesa o Sr. Ministro das Finanças.
Mesmo que ela preconizasse a fixação, por parte do Govêrno, de um imposto a cobrar por meio de selos colados nas respectivas caixinhas, ela era inteiramente constitucional, porque era o Parlamento que autorizava essa cobrança.
É o que determina esta base, que vai mais longe ainda, porque fixa o limite máximo do imposto.
Surpreende que seja o Sr. Morais Carvalho quem levanto esta ,questão, um Deputado monárquico, com prática de assuntos constitucionais, e que certamente conhece decretos já velhos e antigos que se referem aos direitos a cobrar sôbre trigo, o que é essencialmente variável, imposto que é fixado pelo Govêrno conforme o preço dos trigos.
O imposto que é cobrado pelo Instituto de Seguros Sociais, por exemplo, não tem limite algum e é fixado não pelo Govêrno, mas pelo próprio Instituto.
E isto faz se desde 1919, sem que até agora se tenha afirmado que tal cobrança é inconstitucional, porque de facto o não é.
O artigo invocado pelo Sr. Pinto Barriga é aquele que se refere à votação, pelo Parlamento, dos orçamentos...
O Sr. Pinto Barriga:-A última parte do artigo não tem relação alguma com a parte relativa aos orçamentos.
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O Orador: - Simplesmente o Parlamento não vota anualmente os impostos mas sim autorizações permitindo a cobrança de determinados impostos.
Depois como é que pode considerar-se delimitada com a aprovação dêste artigo da proposta a acção do Poder Legislativo?
Acaso o Govêrno impede o Parlamento de estabelecer êsse imposto?
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Ainda há pouco tempo o Parlamento votou uma lei que autoriza a cobrança de um imposto até 5 por cento para as misericórdias.
O Orador: - Nós estamos, pois, com esta discussão em volta de uma pretendida inconstitucionalidade a perder um tempo precioso
A palavra "autorização", pode ser substituída por qualquer outra.
No fundo trata-se apenas de um imposto que o Govêrno pode lançar dentro de determinados limites ..
Um àparte do Sr. Morais Carvalho.
O Orador:-Mas eu não tenho dúvida nenhuma em, muito constitucionalmente, votar ao Sr. Ministro das Finanças, com relação à quasi totalidade dos impostos, uma proposta ou um projecto indicando o máximo dentro do qual êles devam ser cobrados.
O que não dou ao Govêrno é o direito de estabelecer novos impostos, porque isso pertence privativamente ao Congresso da República.
O Govêrno não pode estabelecer impostos, mas dizer-lhe que fica autorizado a cobrar determinado imposto, dentro dos limites X a X, isso é inteiramente constitucional.
A Constituição só diz que os impostos são inicialmente da privativa deliberação do Congresso da República, mediante prévia votação da Câmara dos Deputados.
O Sr. Ministro das Finanças não podia apresentar a sua proposta ao Senado, mas apresentou-a na Câmara dos Deputados, e nós, no uso pleno das nossas prerrogativas, vamos votá-la.
Eu voto-a, porque a julgo constitucional, entendendo que o Sr. Presidente a deve aceitar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar}: - Sr. Presidente: não sou jurisconsulto, mas não é preciso ser jurisconsulto para ler o artigo 26.° da Constituição.
O Sr. Presidente do Ministério mandou para a Mesa uma proposta em que diz que o Govêrno fixará anualmente tal imposto. v
Não é preciso ser jurisconsulto para ver quanto isto é anti-constitucional.
Veio o Sr. Álvaro de Castro em defesa da constitucionalidade da proposta ministerial e, Sr. Presidente, é para admirar que S. Exa., com aquele inabalável respeito à Constituição que o levou a chefiar não sei quantas revoluções neste País, mas que o levou, também, a publicar quarenta e três decretos à sombra de uma autorização parlamentar, não venha dizer que é melhor votar se uma proposta em que se diga que o Govêrno fixará diariamente o imposto que quiser, porque também foi diariamente que S. Exa. fixou impostos em ditadura, à sombra da lei n.° 1:545, de que ainda anteontem o (Governo se serviu inconstitucionalmente mais uma vez.
Nestas condições, a Câmara votará como quiser, mas votará sabendo que vota contra a Constituição e no mesmo dia em que votou um monopólio a fingir que é liberdade.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pinto Barriga (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: apenas breves explicações, em resposta ao Sr. Álvaro de Castro.
Realmente, na primeira parte do n.° 3.° do artigo 26.° da Constituição há uma referência aos orçamentos, mas na parte final diz-se:
Leu.
Como tem sido isto interpretado? No sentido de que essa votação se faz nos orçamentos, mas o que o Parlamento toma é uma deliberação, não deixando ao Executivo a fixação dos impostos.
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Os exemplos aqui apresentados em contrário são todos relativos a taxas e a direitos alfandegários e, portanto, não são de considerar a respeito da matéria em discussão.
O Sr. Presidente: -Vou pôr à admissão da Câmara a proposta de emenda do Sr. Presidente do Ministério inteiramente convencido de que não pratico nenhum acto contrário à Constituição.
Som querer de modo nenhum intervir na discussão que acaba de ser feita, pois que não me compete, neste lugar, tomar parte nas discussões da Câmara, em todo o caso, para justificar a minha resolução do aceitar a proposta enviada para a Mesa pelo Sr. Presidente do Ministério, devo citar à Câmara o facto de ainda há poucos dias o Diário do Govêrno ter publicado um decreto da Direcção Geral das Contribuições e Impostos em que se fixam os limites da taxa complementar para o ano de 1924-1925, que é também uma taxa variável, não me parecendo que reduza ou restrinja as atribuições do Congresso da República.
É admitida e posta em discussão n proposta de emenda do Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães}.
O Sr. Morais Carvalho: - Sr. Presidente: acaba a Câmara de admitir a proposta do Sr. Ministro das Finanças, pela qual é ao Govêrno que, daqui para o futuro, competirá fixar anualmente o imposto a cobrar por meio do sêlo, imposto a fixar sôbre cada uma das caixinhas fabricadas no continente ou importadas, dizendo-se, Sr. Presidente, que êsse imposto não podorá exceder meio centavo em ouro por cada grupo de quarenta pavios ou palitos fosfóricos contidos em cada caixinha.
O primeiro reparo que a matéria contida nesta base me oferece é aquele para o qual já chamei a atenção de V. Exa., Sr. Presidente, quando pedi a palavra sôbre o modo de votar a admissão da nova redacção proposta pelo Sr. Ministro das Finanças.
Parece-me, Sr. Presidente, que o Parlamento, votando como votou, julgando constitucional um preceito desta natureza, mais uma vez abdicou duma das
suas primordiais funções; parece-me, repito, que o Parlamento de abdicação em abdicação levará fàcilmente todo o País ao convencimento de que a sua função não representa mais que uma excrescência, porque ela pode vir a ser substituída por outro Poder do Estado.
Sr. Presidente: é curioso também que o Govêrno nesta base fixa o imposto a cobrar em ouro, quando o Estado tem sido sempre antagonista do estabelecimento do padrão monetário ouro nos contratos entre particulares, com o fundamento de que a adopção de tal padrão implicaria uma quebra de confiança na moeda nacional.
Lembro-me que até foi êste o motivo por que no tempo do Govêrno da Presidência do Sr. Álvaro de Castro o Ministro da Justiça de então, o Sr. José Domingues dos Santos, fez publicar um decreto proibindo aos particulares, nos contratos entre si, fixarem em ouro as rendas dos seus prédios nos contratos futuros.
Dizia-se então que tal precedente importava de qualquer forma o desprestígio da moeda escudo e que o Govêrno não poderia sancionar tal desprestígio.
Sr. Presidente: vê-se que o Govêrno quere para si aquilo que não consente que os outros façam.
Para a cobrança dos seus impostos o Govêrno adopta o padrão-ouro, que reputa prejudicial nas relações entre particulares.
O imposto de meio centavo-ouro, por cada grupo de 40 palitos fosfóricos, equivale a um imposto de $11 por cada caixinha com 40 fósforos.
E sabido que os Governos em questão do impostos utilizam sempre os limites máximos que lhes são autorizados e, portanto, dizer-se que o imposto não poderá exceder meio centavo-ouro é o mesmo que dizer-se que o imposto será de meio centavo-ouro.
O meu ilustre colega, Sr. Carvalho da Silva, já demonstrou exuberantemente que tal imposto do $11 produzirá, inevitavelmente, um aumento no preço de venda dos fósforos ao público.
Propõe-se que êste imposto recaia sôbre cada caixinha contendo 40 fósforos.
Ora eu pregunto como se aplicará o imposto, só o fabricante oferecer ao mer-
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cado caixinhas com menos de 40 fósforos.
Há ainda a notar o caso de o fabricante meter em cada caixinha 50 ou 60 fósforos.
Neste caso aplica-se o imposto relativo a 40 fósforos, ficando os restantes, visto que a caixinha contém 50 ou 60 fósforos, isentos do imposto?
Isto são tudo inconvenientes a meu ver derivados desta forma rápida de redigir as propostas de lei, pois a verdade é que êstes assuntos devem ser muito estudados e muito ponderados.
Noto ainda que, dizendo a base A que é livre o exercício da indústria do fabrico dos fósforos no continente e ilhas adjacentes, e que legislando-se portanto pela presente proposta tanto para o continente como para as ilhas, na base B, ao contrário, se diga que o imposto é aplicado tam somente sôbre as caixinhas fabricadas no Continente, ou importadas, o que quere dizer que as caixinhas que forem fabricadas nas ilhas adjacentes ficam também isentas dêste imposto.
Eu compreenderia que na proposta se tivesse apenas regulado o fabrico de fósforos no Continente; mas desde que assim se não fez e desde que o fabrico dos fósforos passa pela presente proposta a ser regulado, quer no Continente, quer nas ilhas adjacentes, não compreendo portanto o que se acha consignado na base B.
É na verdade um critério diferente, razão por que eu devo já preguntar ao Sr. Ministro das Finanças se na verdade é intenção do Govêrno isentar do imposto os fósforos fabricados nas ilhas adjacentes.
O Sr. Ministro das Finanças (interrompendo):- Não, senhor.
O Orador:-Pela redacção da base B parece na verdade que os fósforos fabricados nas ilhas ficam isentos do imposto.
Assim, Sr. Presidente, eu devo dizer na verdade que não sei a que deva atribuir esta diferença de critério, pois a verdade é que se não compreende que sejam tributados os fósforos fabricados no Continente e isentos de tributação os fabricados nas ilhas.
Então mesmo com a disposição para entregar ao Estado 1/4 do seu capital, talvez surgissem capitalistas, dispostos a manter o fabrico de fósforos nas ilhas, desde que essas fábricas gozassem de uma situação de favor que as do Continente não têm.
O Sr. Presidente:-São horas de interromper a sessão. V. Exa. deseja ficar com a palavra reservada?
O Orador:-Fico com a palavra reservada.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Interrompo a sessão até às 22 horas. Eram 20 horas.
O Sr. Presidente (às 22 horas e 30 minutos): - Está reaberta a sessão.
Continua no uso da palavra o Sr. Morais Carvalho.
O Sr. Morais de Carvalho: - Sr. Presidente: a propósito da base B que está em discussão, poucas mais considerações farei depois daquelas que, antes da interrupção da sessão, tive a honra de proferir e sujeitar à apreciação da Câmara, mas não quero deixar de acentuar que, apesar da violência que a maioria empregou contra os Deputados da oposição, em tam reduzido número como nós somos, a sessão recomeçou meia hora após aquela que por V. Exa., Sr. Presidente, havia sido marcada para o início dos trabalhos desta Câmara na parte da noite e ainda sem que, evidentemente, haja o número de Deputados suficiente para votações.
Não queria eu deixar de acentuar isto, para mostrar quanta razão nos assistia quando há pouco negámos o nosso voto ao requerimento do Sr. Jaime de Sousa para que a sessão fôsse prorrogada.
Os Deputados da maioria, que tam prontamente deram os seus votos ao requerimento dêsse seu correligionário, não se mostraram igualmente pressurosos em acorrer ao Parlamento para perfazer o número preciso.
E pôsto isto, reatando as minhas considerações, eu quero agora frisar que o valor de $00(5) ouro que o Govêrno propõe como tributação a aplicar a cada caixinha, correspondendo hoje, pela cotação actual, a mais de $11, fará com que o preço de cada caixinha vá ser muito superior àquele que é actualmente.
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26 Diário da Câmara dos Deputados
Para que isso se não dê, eu enviarei para a Mesa uma proposta de aditamento à base l.ª, para que a tributação se faça sem que os actuais preços de cada caixinha de fósforos sejam aumentados, e servir-me hei até na minha proposta das próprias palavras que a êste respeito existem no processo da comissão de comércio e indústria, e assim proporei que ao final da base B se acrescentem as seguintes palavras, depois das últimas que nela se contêm;
Proponho que se aditem à base B, ou a seguir às palavras "em cada caixinha" as seguintes "cujo preço de venda não poderá exceder os actuais". - Morais Carvalho.
Mando para a Mesa a minha proposta e dou, por agora, findas as minhas considerações.
Lida na Mesa, é admitida.
O Sr. Carvalho da Silva: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Fez-se a contraprova.
O Sr. Presidente: - Estão sentados 48 Srs. Deputados e levantado 6. Não há número. Vai fazer-se a chamada.
Procedeu-se à chamada.
Disseram "aprovo" os Srs.:
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Álvaro Xavier de Castro,
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Maria da Silva.
António de Mendonça.
António Pais da Silva Marques,
António Pinto de Meireles Barriga.
António Resende.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança,
Artur de Morais Carvalho.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Eugénio do Vasconcelos.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio do Sousa.
João Luís Ricardo.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Júlio Henrique de Abreu.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Nuno Simões.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Disseram "rejeito" os Srs.:
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
João José da Conceição Camoesas.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
O Sr. Presidente: - Disseram "aprovo" 48 Srs. Deputados e "rejeito" 6. Não há número.
A próxima sessão é amanha, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.
Eram 10 horas e 55 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Parecer
Da comissão de colónias, sôbre o n.° 896-C, que autoriza o director do Colégio das Missões dos padres seculares de To-
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Sessão de 14 de Abril de 1925 27
mar a aceitar a doação dos edifícios do extinto convento de Cocujães, concelho de Oliveira de Azeméis.
Para a comissão de finanças.
Propostas de lei
Do Sr. Ministro das Finanças, relevando os importadores de cascos vazios, destinados à exportação de vinhos e seus derivados, da obrigação de os despacharem para consume por não haverem pedido renovação do prazo de importação temporária.
Para o "Diário do Governo".
Do mesmo, facultando o ingresso no quadro especial de escriturários aos empregados do tráfego e adventícios das alfândegas que antes da promulgação do decreto n.º l, de Maio de 1911, tenham prestado serviço no quadro aduaneiro por tempo não inferior a um ano.
Para o "Diário do Governo".
Contra projecto de lei
Proponho que as propostas do parecer em discussão sejam substituídas pelo seguinte contra-projecto de lei:
Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a estabelecer a exploração do exclusivo do fabrico e da venda de pavios ou palitos fosfóricos e de acendedores, de acordo com as bases seguintes:
Base l.ª A exploração da indústria do fabrico de pavios ou palitos fosfóricos e de acendedores e a venda respectiva poderá ser realizada por uma sociedade constituída pela actual companhia concessionária ou qualquer outra empresa capitalista idónea, pelos trabalhadores e pelo Estado.
A companhia pertencerá a direcção e administração da referida sociedade. Serão constituídos conselhos de operários de oficinas, região e exploração com função consultiva obrigatória acerca das condições de trabalho. Os operários participarão da gerência das obras de serviço social existentes ou a estabelecer, da de conselhos mixtos puritanos com delegados da companhia e do Estado, destinados à arbitragem dos conflitos e ao estudo dos problemas que interessem à indústria. A contabilidade da sociedade ficará a cargo
do Estado, sendo confiada a funcionários técnicos especializados da Caixa Geral de Depósitos, nomeados pelo conselho administrativo dêste estabelecimento e sujeitos à respectiva inspecção técnica.
Base 2.ª Os lucros líquidos da exploração, descontada uma remuneração ao capital calculado pela aplicação da taxa de desconto do Banco de Portugal e uma renda equivalente para o Estado, serão divididos em três partes iguais, cabendo uma ao Estado, outra á companhia e a última aos trabalhadores que entre si a dividirão como entenderem.
Base 3.ª Se a companhia concessionária não quiser participar da sociedade a que se referem estas bases, serão expropriadas por utilidade pública as suas fábricas, maquinismos, instalações, matérias primas e produtos em armazém, descontando-se no preço da expropriação a maior valia determinada pela anterior concessão e exploração do exclusivo. Para estipulação da importância da citada maior valia nomeará o Govêrno uma comissão de peritos com representação da companhia concessionária e presidida por um magistrado do Supremo Tribunal de Justiça. No caso de nenhuma outra empresa industrial querer participar da sociedade, nos termos destas bases, a sua direcção administrativa será confiada a um quadro de técnicos especializados, que na distribuição dos lucros haverá o quinhão que pela base anterior é atribuído à companhia, e o financiamento das operações necessárias ao funcionamento da indústria, incluindo o da expropriação, será feito pela Caixa Geral de Depósitos.
Art. 2.° E igualmente o Govêrno autorizado a expedir as providências e a elaborar os regulamentos necessários à completa e perfeita execução da doutrina contida nas bases.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 3 de Abril de 1925. -João Camoesas.
Prejudicado.
Admissão
Do projecto de lei do Sr. Velhinho Correia, alterando o Regimento da Câmara.
Para a comissão de Regimento.
O REDACTOR - Avelino de Almeida.