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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 85

EM 24 DE JUNHO DE 1925

Presidência do Exmo. Sr. Afonso de Melo Pinto Veloso

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva

Sumário. - Abertura da sessão Leitura da acta. Correspondência.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Velhinho Correia reclama a presença do Sr. Ministro das Finanças para usar, então, da palavra.

O Sr. Jaime de Sousa pede que lhe seja reservada a palavra para quando esteja presente o Sr. Ministro das Colónias.

O Sr. Pedro Pita declara aguardar a presença de qualquer membro do Govêrno para usar da palavra.

O Sr. Estêvão Águas requere a inscrição, no antes da ordem do dia, dos pareceres n.°s 739 e 516.

O Sr. Sá Pereira usa da palavra para interrogar a Mesa, respondendo-lhe o Sr. Presidente.

O Sr. Ferreira da Rocha estranha a ausência dos Srs. Ministros e faz algumas considerações sôbre a situação actual da nossa colónia de Macau, pedindo a vinda do Sr. Ministro das Colónias ao Parlamento para se ocupar dêste assunto.

O Sr. Pires Monteiro requere a discussão de um projecto de lei.

Usa da palavra para interrogar a Mesa o Sr. Ferreira da Rocha.

Usa da palavra para explicações o Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho).

O Sr. Velhinho Correia, achando-se já presente o Sr. Ministro das Finanças, faz algumas considerações sôbre o modo de aplicação do imposto sôbre transacções.

Usa da palavra, para responder ao orador antecedente, o Sr. Presidenta do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães}, que termina requerendo que entre em discussão na próxima sessão uma proposta de duodécimos que envia para a Mesa, pedindo para ela a urgência e a dispensa do Regimento.

O Sr. Pedro Pita ocupa-se da situação em que te encontram alguns civis, presos como suspeitos de estarem implicados no movimento de 18 de Abril, e cujas responsabilidades não estão ainda averiguadas, após dois meses de detenção.

Responde lhe o Sr. Presidente do Ministério.

Volta a usar da palavra para explicações o Sr. Pedro Pita.

O Sr. Carvalho da Silva faz algumas considerações sôbre a situação dói presos a que se referiu o Sr. Pedro Pita, e ocupa-se da nomeação do Sr. Ministro do Interior para a vaga deixada por João Chagas no conselho de administração da Companhia Portuguesa, pedindo que o Presidente do Ministério o esclareça sôbre o assunto.

Responde-lhe o Sr. Presidente do Ministério.

Volta a usar da palavra,, para explicações, o Sr. Carvalho da Silva.

É aprovada a acta.

É aprovado um requerimento do Sr. Sá Pereira para entrarem em discussão na próxima sessão dois pareceres.

É aprovado um requerimento idêntico do Sr. Pires Monteiro, tendo usado da palavra, sôbre o modo de votar, os Srs. Jaime de Sousa, Pires Monteiro, Carvalho da Silva e Hermano de Medeiros. Feita a contraprova, verifica-se ter sido rejeitado.

É rejeitado o requerimento do Sr. Estêvão Aguas, apresentado no começo da sessão e aprovado o do Sr. Pedro Pita.

Submetido à votação da Câmara, o requerimento do Sr. Presidente do Ministério referente à urgência e dispensa do Regimento para a sua proposta de lei sôbre duodécimos, usam da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Carvalho da Silva e Pedro Pita, sendo aprovado em seguida o mesmo requerimento.

Feita a contraprova requerida pelo Sr. Carvalho da Silva cem a invocação do § 2.° do artigo 116.º do Regimento, verifica-se ter sido aprovado por 42 Srs. Deputados e rejeitado por 18.

Usa da palavra para interrogar a Mesa o Sr. Estêvão Aguas.

É aprovado um requerimento do Sr. Estêvão Aguas.

São admitidas à discussão algumas proposições de lei.

Ordem do dia (discussão do negócio urgente apresentado pelo Sr. Cunha Leal). - O Sr. Cunha Leal expõe à Câmara o seu negócio urgente, fazendo largas considerações sôbre o caso da falsifi-

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2 Diário da Câmara dos Deputados

de um chegue, feita pelo adido militar de Portugal em Paris, ex-capitão Almeida Pinheiro.

Responde-lhe o Sr. Presidente do Ministério, segundo se o Sr. Cunha Leal, para explicações.

O Sr. Carvalho da Silva requere a generalização do debate.

É aprovado.

Volta a usar da palavra o Sr. Presidente do Ministério.

Usam em seguida da palavra, para explicações, os Srs. Cunha Leal, António Maria da Silva e Ginestal Machado, que fica com a palavra reservada.

O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão às 16 horas e 29 minutos.

Presentes à chamada 42 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 39 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:

Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusto do Portugal Durão.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amadeu Leito de Vasconcelos.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Francisco da Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
João Baptista da Silva.
João José da Conceição Camoesas.
João de Ornelas da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
José Cortês dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais do Carvalho Soares de Medeiros.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano Rocha Felgueiras.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Valentim Guerra.

Srs. Depilados que entraram durante a sessão:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio do Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Lino Neto.
António de Mendonça.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Ernesto Carneiro Franco.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Hermano José de Medeiros.
João Estevão Aguas.
João José Luís Damas.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Ribeiro do Carvalho.
José António do Magalhães.
José Domingues dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.

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Sessão de 24 de Junho de 1925 3

Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alfredo Pinto do Azevedo e Sousa.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo da Silva Castro.
António Albino Marques de Azevedo.
António Correia.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Resende.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Augusto Pereira Nobre.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Jorge Barros Capinha.
José Carvalho dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mário de Magalhães Infante.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.

Às 15 horas e 20 minutos principiou a fazer-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 42 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Leu-se a acta.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Ofícios

Do Senado, comunicando ter mandado arquivar a proposta de lei n.° 458, desta Câmara, que autorizava o Govêrno a modificar as disposições legais relativas à

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4 Diário da Câmara aos Deputados

exportação de mercadorias o alterava a organização da Junta do Fomento Agrícola.

Para a comissão de agricultura.

Do Ministério da Justiça, respondendo ao ofício n.° 302, relativo a um podido do Sr. Sampaio Maia.

Para a Secretaria.

Do Ministério da Marinha, acompanhando uma nota para inclusão de designadas quantias no capítulo 5.°, artigo 35.°, do orçamento dêste Ministério para 1925-1926.

Para a comissão do orçamento.

Das Câmaras Municipais do Portalegre, Mértola e Alportel, contra o decreto n.° 10:776.

Para a comissão de instrução primária.

Do governador civil de Bragança, acompanhando petições das Juntas do Freguesia do Espinhosela o Parâmio, pedindo um subsídio que lhos atenue o prejuízo causado pelas trovoadas.

Para a comissão de finanças.

Telegramas

Dos aspirantes de finanças do distrito do Aveiro, contra o projecto do lei do Sr. Vergílio Saque.

Do núcleo do professorado de Miranda do Douro o da Câmara Municipal do Marinha Girando, pedindo a revogação do decreto n.° 10:776.

Para a Secretaria.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Vai entrar-se no período de autos da ordem do dia.

O Sr. Jaime de Sousa: - Sr. Presidente: desejava ocupar-mo da situação criada, poios acontecimentos da China à nossa colónia do Macau; mas, não se encontrando presente o Sr. Ministro das Colónias ou dos Estrangeiros, não é útil usar da palavra. Peço, portanto, a V. Exa. a fineza de ma reservar para quando qualquer de S. Exa. estiver presente.

O orador não reviu.

O Sr. Estêvão Aguas: - Sr. Presidentes desde há muito que existe nesta Câmara para discussão, o parecer n.° 739, que trata da prorrogação do prazo para que certos funcionários do Ministério das Finanças, ao abrigo de determinadas leis, fossem reformados em capitães da guarda fiscal, o pudessem requerer a sua admissão nesta nova corporação.

Tenho a informar que há simplesmente três funcionários da idade do 73 anos, que, por motivos estranhos à sua vontade, não requereram na devida altura a sua inscrição. Foi para melhorar a situação dêsses velhos que se apresentou êste projecto, a fim do prorrogar por mais do 30 dias o prazo de inscrição.

Por Osto motivo, peço a V. Exa. que a devida oportunidade se digne consultar a Câmara sôbre se permite que êste parecer seja inscrito no período antes da ordem do dia.

Aproveito o ensejo do estar no uso da palavra, para igualmente pedir a V. Exa. só digno consultar a Câmara sôbre se consente que no mesmo período seja incluído o parecer n.° 516, que trata do uma concessão aos alunos do Colégio Militar.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Sá Pereira: - Era 15 do corrente fiz um requerimento que tinha por fim pedir a V. Exa. para se dignar consultar a Câmara sôbre se permitia que fossem discutidos dois projectos referentes a revolucionários civis, vindos do Senado.

Creio que o Sr. Presidente, que não ora V. Exa. não submeteu êsse requerimento à votação; pelo que peço á V. Exa. para não informar, e, em caso afirmativo, para o submeter à votação.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: - Sr. Presidente: pedi a palavra para quando estivesse presente qualquer dos Srs. Ministros.

No emtanto, não posso deixar do usar da palavra mesmo assim, quanto mais não seja para protestar contra o facto do numa República parlamentar os Ministros se sentirem no direito de não comparecer na Câmara, a fim do responderem as preguntas dos Deputados

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Sucede o caso curioso de as sessões decorrerem assim: uma, por falta de número não abro; outra, encerra-se, devido a uma circunstância anormal; e ainda por vezes, os Srs. Ministros sentem-se na necessidade de não vir à Câmara naquele certo período antes da ordem do dia, em que os Srs. Ministros respondem às interpelações que os Deputados têm o legítimo direito de lhas fazer. Protesto contra esta prática absolutamente fora das praxes parlamentares.

Não estando presentes os Srs. Ministros, a quem mo queria dirigir, recorro a V. Exa. para transmitir ao Sr. Ministro das Colónias as seguintes considerações:

Sabe V. Exa. que, no presente momento, circunstâncias graves surgiram na China que, porventura, põem em perigo a situação da nossa colónia de Macau. Afirma-se que o Govêrno pretende enfiar dois navios de guerra àquela nossa colónia e uma expedição militar.

Desejo que o Sr. Ministro das Colónias venha elucidar a Câmara sôbre o valor dessa expedição e a utilidade que pretende dela tirar. Pretendo pedir a V. Exa. que transmita ao Sr. Ministro das Colónias a necessidade que vejo de considerar a situação especial da nossa colónia em face do problema que está agora debatendo-se, para resolver que a expedição a organizar deva ser principalmente destinada a garantir aos habitantes portugueses de Macau, na catástrofe que se aproxima, as subsistências, visto que seria pela fome que certamente os habitantes de Macau seriam vencidos, se se chegasse a um conflito armado.

É preciso que o Govêrno saiba que não pode contar com as potências estrangeiras, para acudir à situação dos portugueses de Macau, quando todos os estrangeiros estiverem quási rendidos pela fome na China. Tem de contar com as medidas que adoptar, para garantir da fome os portugueses do Macau.

Peço ao Govêrno que aproveite agora o ensejo de dar execução àquelas medidas que o Govêrno de 1922 queria executar e que a revolução de 19 de Outubro impediu de se realizarem imediatamente.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pires Monteiro: - Requeiro que seja pôsto em discussão imediatamente antes da ordem do dia, o projecto de lei n.° 923, sôbre o sêlo da independência.

O Sr. Ferreira da Rocha: - V. Exa. diz-me se o Sr. Vitorino Godinho se encontra na sala, como Deputado ou como Ministro do Interior?

Faço esta pregunta visto que, estando presente quando me dirigi ao Govêrno, não respondeu, dizendo que iria transmitir ao seu colega as considerações que eu havia feito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho): - Entrei na sala quando o Sr. Ferreira da Rocha acabava de falar, e dirigi-me ao Sr. Almeida Ribeiro.

Garanto que não tive ensejo de ouvir nenhuma das considerações feitas pelo Sr. Ferreira da Rocha.

S. Exa. sabe perfeitamente que tenho muita consideração pelo ilustre Deputado, Sr. Ferreira da Rocha, como por todos os Srs. Deputados.

Nem sabia se outro meu colega estaria presente quando entrei na sala, e fui falar ao Sr. Almeida Ribeiro.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: - Não pretendi afirmar que o Sr. Ministro do Interior tivera menos consideração por mim.

Não preciso do atestados de consideração passados por S. Exa.

Quis apenas afirmar mais uma vez que não se prestigia o Parlamento estando ausentes os Ministros para responderem aos Deputados, ou procurando indagar o que êles disseram para lhes responder.

O orador não reviu.

O Sr. Velhinho Correia: - Pedi a palavra, quando estivesse presente o Sr. Ministro das Finanças, para tratar de um caso que se me afigura de importância para a vida financeira da República.

Nesta Câmara foi votado, em Abril passado, um projecto de lei que se tinha resolvido retirar da discussão exactamente dois ou três dias depois da revolução.

A aprovação dêsse projecto de lei passou despercebida ao Sr. Ministro das Fi-

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6 Diário da Câmara dos Deputados

nanças, preocupado com a questão da ordem pública.

Trata-se do seguinte: pelo artigo 1.° que passou para o Senado, isentam-se do pagamento do imposto pelo valor das transacções, 121 classes de contribuintes, num total de 449 classes.

Quere dizer que três quartas partes dos contribuintes do imposto sôbre o valor das transacções foram isentas.

Isentaram-se do mesmo imposto as grandes emprêsas de pesca, mas não se isentaram as operações que se realizam depois da lota ou venda do peixe.

Estabeleceu-se que o imposto não recaísse nas seguintes classes:

Leu.

Devo dizer que pela lei n.° 1:368 só pagavam os indivíduos que tivessem mais de 1.500$ de proventos por ano, e seja essa quantia está actualizada.

Havia classes que pagavam 14$ de imposto e que passaram a pagar $54, e o Estado vem a receber menos,

Leu.

Êste projecto foi por mim assinado em 1923, fazendo eu depois por que a minha assinatura não figurasse.

Finalmente, por consenso da Câmara, foi retirado da discussão.

Com surpresa o projecto voltou para a discussão, sendo aprovado sem ninguém dar por isso.

Está hoje na outra casa do Parlamento.

Peço ao Sr. Ministro das Finanças a sua atenção para êste caso.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério, Ministro do Interior e interino da Guerra (Vitorino Guimarães): - Ouvi com toda a atenção as observações feitas pelo Sr. Velhinho Correia.

Eu tenciono seguir essa discussão no Senado, onde farei o possível para que não seja aprovado, visto o prejuízo que causa ao Estado.

Se não o conseguir, ainda restam ao Poder Executivo recursos para o mandar suspender.

Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para apresentar uma proposta, para a qual requeiro urgência e dispensa do Regimento para entrar amanhã em discussão.

Sr. Presidente: estamos a 24 de Junho.

Faltam só seis dias para o ano económico, e não é possível discutir-se o Orçamento.

Eu tenho ouvido a êste respeito as promessas mais calorosas, mas nada se tem feito.

Digo-o com muito pesar; a verdade é que o Parlamento continua numa completa esterilidade, arrastando-se num debate político que, de há muito, já devia ter terminado, nada se tendo feito de útil ou de profícuo para o País.

Assim, é deveras contrariado que eu apresento esta proposta de lei, pela qual venho pedir ao Parlamento conceda a votação de seis duodécimos. E, faço isto, porque é opinião do Govêrno que não há vantagem em se prorrogar mais o Parlamento, pois que não podemos pensar, de maneira nenhuma, em votar o Orçamento.

Êste é um caso que não nos pode envaidecer, nem orgulhar; mas o facto é que, não tendo o Orçamento deixado de ser apresentado sempre dentro do prazo fixado pela Constituição, e, não lhe faltando também, os respectivos pareceres, ainda não foi iniciada a sua discussão. E hoje, não podemos pensar, repito, que ela se possa fazer num prazo relativamente tam curto.

Ainda há poucos dias se tomou o compromisso de se discutirem as propostas sôbre estradas, fundo de maneio, orçamentos, etc.; mas, afinal, só a paixão política tem dominado os espíritos.

Nestas condições, Sr. Presidente, mando esta proposta para a Mesa, requerendo para ela a urgência o dispensa do Regimento, a fim de que amanhã entre em discussão, com prejuízo do todos os assuntos marcados para a ordem do dia.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Pita: - Em 18 de Abril, como toda a Câmara sabe, houve um movimento militar.

Foram presos, com o pretexto de terem tornado parte nesse movimento, vários civis, alguns dos quais são meus correligionários.

Não se reclamou, até agora, contra a continuação dessas prisões, para que se não pudesse dizer que nós procurávamos dar uma situação de privilégio a êsses indivíduos.

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Mas, Sr. Presidente, nesta altura, decorridos mais de dois meses, há indivíduos presos por simples suspeitas, sem haver possibilidade de demonstrar a sua culpabilidade nesse movimento.

É tempo de reclamar do Govêrno que ponha termo a êste estado de cousas.

Apurem-se as responsabilidades, mas apurem-se.

Não é legitimo que em regime republicano se mantenha esta situação de se conservarem presos, durante dois meses, diversos indivíduos, somente porque há um "diz-se", vago, de que êles tiveram com participação num movimento revolucionário.

Eu creio que não há nada mais justo do que esta reclamação; e, por isso, espero que o Sr. Presidente do Ministério a tome na devida consideração, fazendo com que, ràpidamente, se apurem as responsabilidades, se as houver, ou se restituam os presos à liberdade, no caso ao se provar, como estou convencido, que se provará, a não culpabilidade da maior parte.

Desejo também chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério para o seguinte facto ocorrido em Vila Flor: trovoadas violentas arrasaram estradas, pontes, caminhos, etc., computando-se em milhares do contos os prejuízos sofridos por aquela povoação.

Era de toda a justiça que se tomassem providências para acudir àquele estado de cousas e melhorar a situação daqueles que realmente foram vítimas dessa tempestade.

Por último, requeiro a V. Exa., Sr. Presidente para consultar a Câmara sôbre se permite que entre em discussão a proposta de lei vinda do Senado, referente a postos agrários.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério, Ministro das Finanças è interino da Guerra (Vitorino Guimarães): - Devo dizer ao Sr. Pedro Pita que já ontem o Sr. Carvalho da Silva chamou a minha atenção para o facto de estarem presos indivíduos que, segundo S. Exa., não tinham culpabilidade nos acontecimentos de 18 de Abril, apesar de serem disso acusados.

Respondi então a S. Exa., que disso nada o Govêrno sabia, visto que as investigações estão entregues à autoridade militar, e que ela não tinha qualquer má vontade contra êsses presos.

Se os conserva ainda debaixo de prisão é porque não pôde, certamente, apurar até agora todas as responsabilidades que sôbre êles impendem, ou porque encontrou motivos para isso.

De harmonia coma promessa que fiz, ao chegar hoje ao Ministério da Guerra chamei, para o facto, a atenção das autoridades competentes, e pedi informações para sabor se têm sido cumpridas todas as formalidades legais que competem à. defesa de cada um dos presos.

Com relação à trovoada de Vila Flory devo dizer que já recebi um telegrama nesse sentido, e que as providências que o Govêrno vai tomar são idênticas às que ia tem adoptado para outras localidades,, onde se têm dado sinistros semelhantes, e, que êste ano têm sido infelizmente, muitas.

O Ministro da Agricultura vai enviar ali um técnico, para depois o Govêrno ver quais as providências que há-de tomar, principalmente com relação à situação dos. indigentes, porque temos informações de que nessa região há indivíduos que ficaram na mais absoluta miséria.

O Govêrno não descurará, pois o assunto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Pita (para explicações): - Sr. Presidente: eu agradeço ao Sr. Presidente do Ministério a resposta que deu às minhas considerações, e permito-me lembrar a S. Exa. que as prisões foram efectuadas pela Polícia de Segurança do Estado, que durante mais de um mês conservou êsses indivíduos presos, entregando-os por fim à autoridade militar. Ora a, verdade é que todos os serviços que acabo de citar estão subordinados ao Govêrno.

Não se compreende, portanto, que às reclamações que se venham apresentar pela morosidade dos processos o Govêrno responda invariavelmente que são assuntos que correm pelas autoridades militares.

Parece que há possibilidades bastante para que o Govêrno faça com que essas autoridades andem depressa-

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8 Diário da Câmara dos Deputados

Desculpe-me o Sr. Presidente do Ministério que lhe diga que S. Exa. bem sabe que isso compete ao Ministro da Guerra. Se há um só instrutor o não chega, chegam 10, chegam 20, contanto que não continuem presos indivíduos nestas condições. Se o Sr. general da divisão não encarrega número suficiente do oficiais para fazer os processos, que o Govêrno chame a sua atenção.

Tem-se chegado a isto, Sr. Presidente! Parece que a liberdade dum cidadão é cousa a que se não liga importância.

Mas é preciso que se veja que há mais ainda: rigorosamente êstes indivíduos deviam já estar em liberdade, visto que a Constituição estabelece que ninguém pode estar preso mais de 8 dias sem culpa formada.

Sr. Presidente: se ou reclamo duma maneira geral, reclamo ainda mais duma maneira especial, tratando-se daqueles que, sendo meus correligionários, têm o direito a exigir de mim uma assistência moral que eu tenho tanto mais o dever do dar-lhes quanto é certo que são inocentes.

Não há o direito, pois, de proceder assim, nem mesmo com o pretexto do que as investigações demoram; porque mesmo assim, há o recurso de nomear oficiais suficientes para fazerem ràpidamente êsses inquéritos e para mostrarem ràpidamente, também a culpabilidade ou inculpabilidade dos indivíduos.

Eu espero que S. Exa. dê, portanto, as ordens no sentido de que se não continue com êste estado de cousas, que representa uma iniquidade.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: são dois os assuntos de que desejo ocupar-me. O primeiro é aquele a que se referiu também o Sr. Pedro Pita, respeitante a presos civis, acusados de terem tomado parte no movimento de 18 de Abril, sem que tivessem alguns lá estado e tendo sido presos dias depois do movimento se realizar.

Muitos deles estão exactamente nas mesmas condições - posso-o afirmar a V. Exa. - em que estiveram, com a mais flagrante injustiça, os Srs. Cunha Leal o Garcia Loureiro, quando presos por ocasião dêsse movimento.

A Câmara foi trazido um processo, com o depoimento do várias testemunhas, documentos que se constatou depois serem absolutamente falsos. E o Sr. Cunha Leal se não fôsse Deputado, se a questão não tivesse sido levantada nesta Câmara, estaria ainda hoje a ser vítima das perseguições de inimigos seus, como muitas das pessoas que estão agora no Forte de S. Julião.

Diz o Sr. Ministro da Guerra que o que só dá com os presos em questão é devido à morosidade dos processos. Não se compreende que, à sombra dum decreto publicado pelo Govêrno, as simples investigações feitas na Polícia do Segurança do Estado possam constituir, por si só, o corpo do delito.

Eu creio que o Sr. Ministro da Guerra não quero que isto assim continue e que permaneçam numa quási miséria as famílias dêsses indivíduos, que viviam apenas do trabalho dêstes.

E a única maneira que S. Exa. tem de evitar esta injustiça é a de pôr em liberdade as pessoas que assim se encontram; porque, do contrário, continuarão por um mês ainda ou mesmo mais nesta situação revoltante, o que é uma injustiça a que S. Exa. por certo não quero associar-se. Espero que S. Exa. tome as providências precisas.

Era êste e primeiro assunto para o qual desejava chamar a atenção de S. Exa. Em segundo lugar, Sr. Presidente, tenho a dizer que noticiaram os j ornais que tinha sido nomeado para a vaga deixada pelo Sr. João Chagas no Conselho de Administração da Companhia Portuguesa o Sr. Ministro do Interior.

No tempo da Monarquia, naquele ominoso tempo da Monarquia, quando um Ministro que opupasse as cadeiras do Poder pensasse em fazer reservar para si qualquer lugar, toda a gente se levantaria em grita contra êle o haveria não sei quantos comícios na Avenida Almirante Reis a protestar contra a nomeação escandalosa. Mas, Sr. Presidente, em presença do que a Constituição da República diz nos artigos 20.° 21.°, do duas uma: ou o lugar em questão é considerado de eleição dos accionistas, e, consequentemente, a pessoa nomeada representa os interêsses dos accionistas, e nesse caso está abrangida pelo artigo 21.° da Constituição (Apoiados), ou representa o Esta-

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do, como já ouvi sustentar, e, consequentemente, sendo remunerado como um emprego, está dentro do artigo 20.° da Constituição.

Qualquer dos casos está claramente abrangido pela nomeação do Ministro do Interior.

O Sr. Cunha Leal: - V. Exa. dá-me licença?

Como V. Exa. aludiu ao que se passava nos ominosos tempos da Monarquia, seja-me permitido aludir ao que sucedeu nos ominosos tempos da República com os Srs. Duarte Leite, Sidónio Pais e outros.

Foram, pela circunstância de terem sido nomeados Ministros, sendo apenas delegados da Companhia dos Caminho do Ferro, delegados portanto dos accionistas, demitidos; pediram a sua demissão dêsse cargo, e nunca mais regressaram a êle.

Não se trata duma comodidade social dêsses senhores.

Isto não era no tempo da Monarquia; foi dentro da República.

Eram delegados, apenas, do Govêrno, e pediram a demissão para assim bom servirem a República. Parece que é êste o bom princípio.

O Orador: - Ouvi as declarações do Sr. Cunha Leal; eu nenhuma dúvida ponho em que assim sucedesse, respeitando-se as fórmulas e a moral administrativa.

Mas a República caminha; as cousas caminham. Isto para trás não pode voltar, como eu ouço dizer constantemente.

Não; vai para diante, e muito para diante, puxado pelas locomotivas da Companhia dos Caminhos de Ferro, a toda a velocidade.

Segando o artigo 21.° da Constituição, em qualquer dos casos o Sr. Ministro do Interior perde o mandato de Deputado; é nula e de nenhum efeito a sua nomeação.

É assim que tem de ser posta a questão, caso a nomeação tenha sido feita, ou para quando, porventura, a nomeação se fizer, tanto mais que o Sr. Ministro do Interior declarou nesta casa do Parlamento que, de facto, tinha apresentado a sua candidatura para êsse lugar.

Desejo, portanto, que o Sr. Presidente do Ministério me faça o favor de esclarecer sôbre êste ponto importantíssimo.

Há dias preguntava eu se êste artigo 20.° da Constituição havia sempre sido respeitado.

Hoje não quero alongar mais as minhas considerações sôbre a maneira como êste artigo tem sido respeitado.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério, Ministro das Finanças e interino da Guerra
(Vitorino Guimarães): - Respondendo às considerações do Sr. Carvalho da Silva, tenho a dizer o que ontem disse e já hoje repeti em resposta ao Sr. Pedro Pita.

Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para levantar uma afirmação do Sr. Pedro Pita e também de V. Exa., quando se referiram à autoridade militar.

Eu referi-me à autoridade militar, tendo talvez sido mais explícito e concreto referindo-me à polícia judiciária.

A autoridade militar entregou êsse serviço a um delegado da polícia judiciária, que ficou - com todos os poderes para proceder conforme o Código de Justiça Militar, que, sendo independente como o Poder Judicial, pode considerar-se como um ramo dêsse Poder.

O Sr. Carvalho da Silva (interrompendo): - Isso era nos tempos normais.

O Orador: - A polícia judiciária tomou nota da culpa.

O caso foi levantado ontem, e tenho todas as informações para dizer que é assim.

Creio que estando entregue o caso à justiça militar, não pode esta justiça estar sujeita às ordens do Ministro.

Quanto à segunda parte das suas considerações, devo dizer que a vaga deixada no conselho de administração dos caminhos de ferro não é de um representante do Estado.

Tem de fazer-se por parte dos accionistas uma eleição.

Parece-me que não é atacada a Constituição. O que a Constituição diz é que ninguém pode exercer o cargo. Ora, até ao momento, ninguém exerce êsse lugar vago pelo falecimento de João Chagas.

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10 Diário da Câmara aos Deputados

São estas as declarações que tenho a fazer.

A Constituição mio foi desrespeitada.

E esteja V. Exa. seguro que a Constituição será respeitada.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: - Segundo as declarações do Sr. Presidente do Ministério, não se trata do uma nomeação para um lugar.

É de um representante dos accionistas. É o caso concreto do artigo 21,° da Constituição.

O Sr. Ministro do Interior não pode, portanto, servir êsse lugar som perder o seu mandato. Não pode ser escolhido, ou perde o lugar de Deputado.

Ficamos, pois, sabendo que o caso é o previsto no artigo 21.° da Constituição.

Declarou o Sr. Presidente do Ministério que não houve infracção da Constituição, mas não é assim,

Há uma clara e incontestável infracção do artigo 21.° da Constituição.

O Sr. Ministro do Interior não pode de nenhuma maneira ser eleito para êsse lugar; e, se o fôr, perde não se o seu lugar do Ministro, mas também o de Deputado.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi aprovada a acta.

Admissões

São admitidas à discussão as seguintes proposições de lei:

Projecto de lei

Dos Srs. Cortês dos Santos, Lúcio do Azevedo e Constando do Oliveira, aumentando os foi os a dinheiro tanto para efeito do pagamento como para o do remissão, depois do l de Janeiro de 1919. Para a comissão de legislação civil e comercial.

Proposta de lei

Do Sr. Ministro do Interior, dando nova redacção ao artigo 1.° do Regulamento da polícia cívica do distrito do Ponta Delgada.

Para a comissão de administração pública.

O Sr. Presidente: - Encontram-se sôbre a Mesa vários requerimentos que não podem pretender a discussão imediata dos projectos a que só referem, visto que já está marcado para ser agora discutido o negócio urgente do Sr. Cunha Leal.

O requerimento do Sr. Sá Pereira, que vou pôr à votação, é para que a discussão do parecer a que diz respeito seja feita amanhã.

Foi aprovado o requerimento do Sr. Sá Pereira.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o requerimento do Sr. Pires Monteiro.

O Sr. Jaime de Sousa (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: é natural que, por uma distracção de momento, os Srs. Deputados que fizeram êstes requerimentos não tivessem reparado nos projectos que constituem a ordem do dia.

Já existem marcados para antes da ordem do dia variadíssimos projectos, uns com prejuízo o outros sem prejuízo dos oradores inscritos, havendo até alguns com dispensa do Regimento.

Desta maneira, preterindo constantemente os projectos já marcados, cometem-se gravíssimas injustiças, contra as quais ou protesto.

Estão na ordem do dia pareceres que interessam verdadeiramente aos açoreanos o madeirenses, e eu vejo que a Mesa, sistematicamente, vem aceitando requerimentos para discutir vários pareceres antes disso.

Protesto, portanto, contra as votações a que V. Exa. vai mandar proceder.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pires Monteiro (sabre o modo de votar): - Sr. Presidente: estou inteiramente de acordo com as considerações que o Sr. Jaime do Sousa acaba do fazer.

Devo, porém, esclarecer S. Exa. dizendo que não se trata de qualquer novo projecto de lei.

O meu requerimento é apenas para que êsse projecto seja discutido imediatamente ao que presentemente se está discutindo antes da ordem do dia.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: o projecto

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cuja discussão foi requerida pelo Sr. Pires Monteiro, diz respeito à criação de um novo sêlo e à expropriação de um prédio dos condes de Almada.

Relativamente à expropriação, o projecto deixa os inquilinos dêsse prédio sem nenhuma indemnização, depois de terem gasto centenas de contos em obras.

Pelo que se refere à criação de um novo sêlo, entendo que a Câmara não pode, qualquer que seja o motivo, continuar criando selos dia a dia e desrespeitando interêsses absolutamente legítimos.

Em tais condições, não damos o nosso voto ao requerimento do Sr. Pires Monteiro.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Hermano de Medeiros (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: reforçando as considerações do Sr. Jaime de Sousa, eu protesto também contra a preterição dos projectos marcados para ordem do dia pelos constantes requerimentos apresentados nesta Câmara.

Existe marcado um projecto que interessa enormemente à economia dos Açores; o eu ficaria mal com a minha consciência se deixasse de protestar, não contra o modo como V. Exa. dirige os trabalhos, mas contra a intromissão de projectos que se antepõem ao que se refere aos Açores.

Tenho dito.

O orador não reviu.

foi rejeitado em contraprova o requerimento do Sr. Pires Monteiro.

Foi rejeitado o requerimento do Sr. Estêvão Aguas.

O Sr. Presidente: - Vae votar-se o requerimento do Sr. Pedro Pita.

O Sr. Pedro Pita requereu que fôsse discutido o projecto de lei n.° 904.

Vai consultar a Câmara.

Consultada a Câmara resolveu afirmativamente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Presidente do Ministério requereu que a sua proposta acerca de duodécimos fôsse discutida com urgência e dispensa de Regimento na próxima sessão.

Vou consultar a Câmara.

O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: não foi para mim novidade o requerimento do Sr. Presidente do Ministério. Quando S. Exa. protestou contra a demora do debate político, e quando se discutiu a questão de Macau, para à qual eu pedi a prorrogação da sessão, nós já sabíamos que o Govêrno não queria que se discutíssemos orçamentos. Isto não é novidade, porque também não é novidade que não haja contas do Estado. E um processo que vem de há muito tempo.

Devia ser êste o principal assunto de que o Parlamento se deveria ocupar, mas não querem sabor quais as contas, do Estado. Ainda há dias foi publicada no Diário do Govêrno a conta das verbas desde Julho a Abril, com um déficit de dezenas de milhares de contos, o que prova que não é verdade o que o Sr. Presidente do Ministério disso numa entrevista no Diário de Lisboa, ao afirmar que o déficit ora pequeno o que seria extinto no próximo ano.

O que vem o Sr. Presidente do Ministério apresentar à Câmara?

Uma proposta do seis duodécimos com urgência e dispensa do Regimento, por forma que as comissões não se podem manifestar.

Já sabemos o que o Govêrno quero. Vamos a ver o que a Câmara resolve.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Pita (sobre o modo de votar): - Tratando-se de um assunto tam importante, a minoria nacionalista não quere, ocupando tempo, prejudicar êsse assunto. E amanhã faremos os comentários que êsse documento merece.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação.

Procedeu-se à votação.

O Sr. Presidente: - Está aprovado.

O Sr. Carvalho da Silva: - Requeiro a contraprova o invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.

Procedeu-se à contraprova.

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O Sr. Presidente: - Estão de pé 18 Srs. Deputados e sentados 42, Está aprovado.

O Sr. Estêvão Águas (para interrogar a mesa): - V. Exa. talvez não tivesse ainda ouvido bem o meu pedido. Eu tinha requerido que os pareceres a que fiz referência ficassem incluídos no período antes de se entrar na ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Nesses termos proponho dúvida em consultar a Câmara.

Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai entrar-se ir discussão do negócio urgente do Sr. Cunha Leal.

Tem a palavra o Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Presidente do Ministério levanta-se para iniciar o seu discurso.

O Sr. Cunha Leal: - V. Exa. é capaz de me explicar se o Sr. Presidente do Ministério vai ocupar-se do negócio urgente que eu lhe tinha anunciado?

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): - Não tive o menor intuito em ser desprimorou para V. Exa., mas, como no outro dia terminou as suas considerações pedindo-me esclarecimentos, eu ia dar-lhos.

O Sr. Cunha Leal: - Creio que falando antes de V. Exa. lhe presto um serviço.

O Sr. Presidente do Ministério, Ministro das Finanças e interino da Guerra (Vitorino Guimarães): - Falarei depois.

O Sr. Cunha Leal: - Sr. Presidente: talvez para demonstrar que fui impertinente em ter reavivado esta famosíssima questão do furto cometido pelo ex-capitão do exército português, Almeida Pinheiro, o Sr. Presidente do Ministério fez, na passada quinta-feira, notar que era esta a quarta vez que o assunto era tratado na Câmara dos Deputados.

Se bem que, em qualquer hipótese, me fôsse possível responder que, em matéria de defesa dos interêsses do Estado, quod abundant non nocet, eu, com toda a lealdade, darei a mão à palmatória, o confessarei que fui realmente impertinente, se, ao longo do debate, que se vai travar, o Sr. Ministro da Guerra conseguir fazer a prova de que, nesta questão, os interêsses do Estado foram convenientemente defendidos e do que se procedeu contra os culpados com uma inflexível e implacável justiça.

Mas se, pelo contrário, apesar dos três avisos anteriores, vier a demonstrar-se que, ao longo dos sucessivos Ministérios democráticos o afins, que desde Agosto
de 1922 - data do furto - se têm succedido no Poder, houve sempre o propósito como o de não esclarecer o caso, de não perseguir os culpados e de não defender
á Fazenda Nacional, então a Câmara e o País que tirem as conclusões lógicas de
tais factos.

E, nessa hipótese, não serei eu o impertinente, e outros deverão ser acusados de menos cautelosos, para não dizer menos honestos, na defesa do património comum o da moralidade republicaria, sem poderem alegar a falta de repetidos avisos, que tanto os magoam. E, sem mais comentários, entremos na matéria.

No ano do 1922, estava trabalhando, sob as ordens do adido militar do Portugal em Paris, o capitão-aviador Almeida Pinheiro.

Em certa data, êste homem, que gozava de crédito junto das pessoas honradas, surge colocado numa posição mais do que equívoca. Foi o caso do o Ministério da Guerra ter recebido aviso da chegada do material de aviação, que fora comprado em França pelos serviços dirigidos pelo sobredito adido militar, trado esta compra importado em corça de 250:000 francos; o aparecia, consecutivamente, o pedido de reembolso desta quantia por parle do organismo liquidatário do C. E. P. que a pagara por conta do Ministério da Guerra.

Calcule-se a surpresa do pessoal dêste Ministério, onde ninguém se recordava de ter sido feita uma tal encomenda, não havendo mesmo verba orçamental por onde tal importância pudesse ser paga! Começam, portanto, as averiguações, sôbre tam suspeito caso.

E ouvido, a propósito, o próprio adido militar em Paris, e, ao que pároco, reconhece-se, a pouco o pouco, que o ex-ca-

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pitão Almeida Pinheiro inventara toda uma complicada correspondência entre o Ministério da Guerra o aquele alto funcionário, que, em certo telegrama cuja expedição êle desconhecia, reconhece até a falta do imprescindível número do ordem.

Pressupõe-se a existência dum cúmplice que de Lisboa expedia as falsas notas do Ministério da Guerra.

Toda esta complicada rede de falsificações visava, naturalmente, à realização duma compra de material feita em termos de Almeida Pinheiro poder auferir larguíssimas comissões e percentagens.

Em 18 de Agosto do 1922, como conclusão destas averiguações preliminares, surgia uma participação contra o, hoje tam falado, adjunto do adido militar português em Paris, em que se expunha detalhadamente o que venho do dizer e se concluía por acusar Almeida Pinheiro de falsificador.

Recebida pelas autoridades superiores uma tal participação, imediatamente se deveria ordenar o levantamento de auto de corpo de delito, tomando como base aquele documento.

Não me consta que assim se tivesse procedido.

O processo que, segundo declarações feitas à imprensa pelo tenente-coronel Sr. Oliveira Simões, existia no cofre do Ministério da Guerra - rival, neste ponto, do cofre de Madame Humbert - resumia-se, afinal de contas, à referida participação e aos documentos a ela adstritos. Parece que nenhum seguimento, pelo menos imediato, se deu ao caso. E muito felizes nos devemos ainda considerar por não ter levado sumiço a própria participação!

Tem o Sr. Ministro da Guerra o dever de nos elucidar cabalmente a êste respeito.

E, assim, para facilitar o apuramento da verdade e sistematizar êste debate, farei, nesta altura das minhas considerações, as seguintes preguntas, que ficam aguardando a devida resposta:

1.ª Foi de facto, levantado um auto de corpo de delito tomando como base a participação de 18 de Agosto de 1922?

2.ª Na hipótese afirmativa, em que data foi ordenado um tal procedimento?

3.ª Na hipótese negativa, a quem é que devemos imputar a responsabilidade desta omissão, ou, para empregarmos uma linguagem mais jurídica, quem foi o encobridor do crime?

Vejamos, por outro lado, quais as consequências que deveriam ter derivado, para a posição oficial do ex-capitão Almeida Pinheiro, da descoberta de factos tam sintomáticos como aqueles que alarmaram o Ministério da Guerra o devem ter, igualmente, alarmado a pessoa que então exercia o cargo do adido militar de Portugal em Paris.

Almeida Pinheiro - é bom recordá-lo - exercia funções diplomáticas, circunstância que foi até invocada no processo que lhe foi movido em Paris por ter, quando guiava um automóvel, morto, acidentalmente, um transeunte.

Ora, se um militar gatuno constitui uma desonra para um exército, um diplomata falsificador e larápio representa, diante de estrangeiros, um enxovalho para uma Nação em poso.

Logo, pois, que as suspeitas sôbre a conduta de Almeida Pinheiro assumiram um certo carácter de gravidade - e em Julho a situação do adido militar em Paris tinha que estar fixada, pois êle próprio reconhecera a falsificação da sua correspondência- deveria Daquele que já então era um presumido delinquente ser afastado, discretamente, do exercício das suas funções; ,e, a partir de 18 de Agosto, um tal afastamento deveria tornar-se definitivo até apuramento final das responsabilidades imputadas ao adjunto do Sr. adido.

Se assim se tivesse feito, ter-se-ia evitado um novo crime, o furto de 240:000 francos, que, no decurso do mês de Agosto, Almeida Pinheiro levantou da conta do Tesouro na agência do Banco Nacional Ultramarino em Paris, por meio de cheques, dos quais os dois últimos têm as datas de 22 e 26 de Agosto, ambas elas posteriores - uma de 4 outra de 8 dias - à participação a que vimos aludindo.

Num país normal, em 26 de Agosto já Almeida Pinheiro não deveria andar em liberdade.

Uma quarta pregunta acho, pois, conveniente fazer neste momento:

4.ª Quais as razões que podem explicar o ter continuado em exercício Almeida Pinheiro, a partir do dia em que o Ministério da Guerra e adido militar ré-

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conheceram a existência do documentos falsificados por aquele ex-capitão que, do mais a mais, durante as ausências do adido militar, ficaria perfeitamente à vontade para cometer novas proezas?

Foi - repito - durante o mês de Agosto de 1922 que Almeida Pinheiro levantou 240:000 trancos, que não oram seus, para os utilizar em proveito próprio.

Em fins de Agosto sai de Paris absolutamente à vontade.

Som novidade decorrem os 30 dias do mós de Setembro.

Novos 20 dias do mês do Outubro passam tranquilamente.

E é então quando, por infelicidade é do presumir que Almeida Pinheiro esteja já a bom recato, só toma conhecimento do farto.

É, de facto, em 20 de Outubro que o adido militar português em Paris recebe da agência do Banco Nacional Ultramarino em Paris - assim o afirma aquele, como veremos - uma nota do estado da couta do Corpo Expedicionário Português, o por ela constata a existência do desfalque.

Farei a êste respeito, mas na sua altura, os comentários devidos.

Neste momento importa-me averiguar se Almeida Pinheiro saiu de Paris com qualquer espécie de licença.

Tenho a absoluta certeza do que não, pela simples razão de que um tal favor não poderia ser concedido exactamente quando Almeida Pinheiro tinha que ser chamado a prestar contas à justiça a. propósito do famoso caso do material de aviação.

Tal licença, nessa hora, significaria um acto do cumplicidade,

De resto, já aqui, nesta Câmara, dois Srs. Ministros disseram que Almeida Pinheiro fugiu em fins do Agosto, e quem tem licença não foge.

Portanto, depois de uma primeira grave o criminosa irregularidade, Almeida Pinheiro ausenta-se sem licença.

Muito antes do 20 de Outubro completa-se o prazo necessário para ser considerado desertor.

Deveria, pois, o adido militar, bastante tempo antes de descoberto o furto dos 240:000 francos, ter adoptado determinados procedimentos contra o sou esquivo, o seu fugitivo adjunto.

Vejamos quais:

1.° Levantamento de um auto de corpo do delito por deserção, o segundo auto que deveria estar em curso antes do descoberto o desfalque dos 240:000 francos;

2.° Por virtude da constatação da deserção, deveriam ter sido expedidos mandados de captura contra Almeida Pinheiro,

Não me consta que nada disso tivesse sido feito, e por isso faço ao Sr. Ministro da Guerra as seguintes preguntas:

5.ª "Foi, de facto, antes de 20 de Outubro levantado ao ex-capitão Almeida Pinheiro qualquer auto por deserção?

6.ª Foram, antes de 20 de Outubro, passados mandados do captura contra o desertor?

7.ª Na hipótese de não ter havido qualquer dêstes procedimentos, quem foi o encobridor que impediu o livre exercício da justiça militar?

Vimos já que o adido militar português em Paris afirma só ter em 20 do Outubro de 1922 tomado conhecimento do furto cometido por Almeida Pinheiro no período que decorro entre 16 e 26 de Agosto. Nesse mesmo dia, 20 de Outubro, aquele funcionário escreve ao director geral da agência do Banco Nacional Ultramarino em Paris uma carta que começa assim:

"Recebi hoje a minha conta corrente referida a 30 de Setembro ...".

Dizem-me que o adido militar em Paris recebia todos os meses a conta corrente referida ao fim do mês anterior, como, do rosto é natural que sucedesse a dentro dos moldes duma boa administração.

Ei êste um dos pontos principais que um inquérito sério tem de averiguar.

Porque, a ser assim, o adido militar deveria um mês antes, pelo menos, ter recebido a conta referente a 30 do Agosto, e doía teria já que constar a existência do furto.

Para boa discriminação de responsabilidades, importa saber o que devemos, ao certo, pensar a êste respeito.

Sucede ainda que a fuga de Almeida Pinheiro, ocorrida em fins de Agosto, deveria ter causado um natural sobressalto em quem nessa data, por expressa deter-

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minação de seu cunhado, Sr. Barbosa de Magalhães, ao tempo Ministro dos Negócios Estrangeiros, se conservava em Paris, em comissão gratuita de serviço público, apenas para ultimar a liquidação das contas, tam complicadas, do Corpo Expedicionário Português. Do fugitivo Almeida Pinheiro só poderia pensar mal, pessimamente, o Sr. adido, pelas razões que já alegámos.

De resto, em carta por êste escrita em 20 de Outubro ao chefe da repartição do gabinete do Ministério da Guerra, êste péssimo conceito é confirmado nos seguintes e precisos termos:

"Trata-se de mais uma proeza do capitão F. de Almeida Pinheiro, que passou cheques em seu nome, com a sua letra e a minha assinatura falsificada".

Êsse homem, depois de disfrutar uma escandalosa protecção, desmascarara-se e fugira. Pois bem, durante dois meses não passou pela cabeça ao Sr. adido inteirar--se das contas do Estado e do Banco Nacional Ultramarino, na parte respeitante aos sen s serviços! Seja.

Um inquérito rigoroso, se o quiserem ordenar, nos dirá, porém, se de facto era isso ou não a prestação mensal de contas da parte do Banco Nacional Ultramarino.

Constatada a existência do furto, o Sr. adido militar dirige-se ao director geral da agência do Banco Nacional Ultramarino em Paris, e pede-lhe para que lhe sejam novamente creditados os 240:000 francos levantados por Almeida Pinheiro. Do resultado das suas diligências apenas até agora se tornou público o que consta do seguinte trecho duma das cartas do Sr. adido:

"Devo acrescentar que o director do Banco, não querendo tomar, por si só, a responsabilidade de creditar aquelas importâncias, me declarou, no emtanto, que, "embora me considere a descoberto", me pagará os cheques necessários para assegurar os pagamentos que ou tiver de aqui fazer, até que receba as instruções do governador".

Ora a posição do Estado, quanto a prejuízos materiais, só pode ser uma das duas seguintes:

1) Ou a asinatura dos cheques é verdadeira, e, nessa hipótese, quem ficou prejudicado foi o Estado;

2) Ou a assinatura dos cheques é falsa, e, nesse caso, quem perdeu foi o Banco Nacional Ultramarino.

Reconhecendo o adido militar a existência duma falsificação, era sou dever exigir, como exigiu, que lhe fossem creditados do novo os 240:000 francos. Se o Banco Nacional Ultramarino com isso se conformasse bem estava. Caso contrário, o Estado intentaria uma acção nos tribunais para revindicação dessa importância, e, provada a falsidade das assinaturas pelo exame pericial, os tribunais não poderiam deixar do condenar o Banco a fazer o que lhe era reclamado.

Foi assim que se procedeu? Dizem as minhas informações que não, e acrescentam que se chegou a um acordo entre o Ministério da Guerra e o Banco, pelo qual o Estado perdeu cêrca de dois terços dos referidos 240:000 francos!

Se assim foi, importa saber quem foram os intervenientes nestas negociações, e o motivo por que êles lesaram os interêsses do Estado, isto, é claro, na hipótese de se vir a reconhecer que as assinaturas dos cheques em questão são falsas.

Que o Banco se encontre nesta posição, nada mais lógico, porque em negócios cada um chega a brasa à sua sardinha, e, por causa dos accionistas, os directores do Banco dificilmente poderiam tomar outra atitude, emquanto não fôsse constatada oficialmente a falsificação. Mas que o Estado se condene a si... próprio a perder um franco que seja nesta questão só é admissível, dado que haja dúvidas sôbre a falsificação das assinaturas. E creio que, tirando estas conclusões, não preciso de andar aos pontapés à lógica.

O que acabo de dizer justifica que eu faça nesta altura mais as seguintes preguntas, a que o Sr. Ministro da Guerra, bem informado sôbre a matéria, vai por certo responder:

8.ª É ou não exacto que a agência em Paris do Banco Nacional Ultramarino mandasse todos os meses a conta corrente do Sr. adido militar, referida ao último dia do mês anterior?

9.ª Na hipótese afirmativa, por que é que não foi possível constatar, durante o mês de Setembro, a existência do furto?

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10.ª Foram de novo creditados ao Estado os 240:000 francos levantados por Almeida Pinheiro?

11.ª No caso afirmativo, em que data deu o Banco a sua aquiescência a essa operação?

12.ª No caso negativo, chegou-se a algum acôrdo com o Banco Nacional Ultramarino? Em que consistiu êsse acôrdo? Por quem foi negociado? Por quem foram ordenadas as negociações?

A constatação do "mais esta proeza" do Almeida Pinheiro dovoria dar lugar a um procedimento judicial contra o incriminado.

Poderia intentá-lo o Banco, no caso de vir a provar-se a falsificação, porque- então seria êle o lesado. Mas em qualquer hipótese, quem não poderia deixar de proceder era o Estado Português. Quando um capitão do exército português comete um acto delituoso como aquele que comei ou Almeida Pinheiro, o Estado submete-o a julgamento, e, para isso, começa por organizar-lhe um processo. Existe êsse processo? O que até agora apareceu, trazida pela mão do Sr. Presidente do Ministério, foi uma participação documentada a propósito de um crime que não é o furto dos 240:000 francos. Em que data começaram as averiguações sôbre êste outro caso? Quem procedeu a elas? Foi feito exame às assinaturas dos cheques? Se não tinha já sido passado mandado de captara contra Almeida Pinheiro, por ser desertor, foi agora remediada essa falta? Ignora-o o público, ignoramo-lo todos nós.

O que sabemos apenas é que o Sr. adido militar achava conveniente que o Banco Nacional Ultramarino entregasse o caso às justiças francesas, o que no Ministério da Guerra havia hesitações a êste respeito. Claro que o Sr. adido muito mais partidário deveria ser de procedimento imediato da justiça militar e que não devo ter descansado emquanto tal procedimento não houve.

Estas considerações impõem-me que, antes de terminar, eu faça ainda ao Sr. Ministro da Guerra as seguintes preguntas:

13.ª Foi, porventura, ordenada a organização de um processo relativo ao furto do 240:000 francos? Em que data? Está o processo concluso? Constatou-se,

por exame pericial, a falsificação das assinaturas? Foi passado mandado de captura contra o criminoso?

14.ª No caso de se não ter organizado tal processo, quem é o responsável?

Sr. Presidente: sem mais palavras, singelamente, vou terminar, aguardando que o Sr. Ministro da Guerra me responda. Só depois desta resposta poderão começar a apurar-se as responsabilidades da pessoa que então exercia em Paris as funções de adido militar do Portugal.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Vitorino Guimarães): - Não pode estranhar o Sr. Deputado interpelante, nem pode estranhar a Câmara, que eu não venha tambem habilitado como desejaria, sôbre o assunto do que trata esta interpelação, não só pelo pequeno período de tempo em que eu me propusera estuda Io, mas ainda porque alguns documentos que foram pedidos para Paris ainda não chegaram as minhas mãos.

Não achei impertinente que o Sr. Cunha: Leal tivesse levantado novamente êste caso, aqui na Câmara; se alguns reparos fiz, foi ao requerimento feito então pelo Sr. Carvalho da Silva, para que a sessão fôsse prorrogada até se esclarecer devidamente o assunto.

Deixarei propositadamente para o fim a resposta concreta às preguntas feitas também concretamente pelo Sr. Cunha Leal, por desejar antes fazer algumas considerações que, em muitos pó; tos, poderão já esclarecer o assunto.

A primeira proeza do capitão aviador Sr. Almeida Pinheiro só foi conhecida no Ministério da Guerra pela participação entrogue em 18 de Agosto de 1923 ao respectivo Ministro de então, Sr. general Correia Barreto, que, em despacho do 2& do mesmo mês, mandou que se procedesse às devidas investigações e, no caso de haver motivo para isso, se levantasse o respectivo auto de corpo de delito. O processo por falsificação que, em virtude dêste despacho, então foi instaurado contra aquele oficial, encontra-se já concluso no mesmo Ministério, aguardando que se efectue a captura, em virtude de o réu, como oficial, não poder ser julgado à revelia.

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Em todo o caso, devo declarar que já mandei levantar contra o falsificador o respectivo auto militar, independente daquele processo, que diz respeito, mais propriamente, à parte comercial do delito.

O actual Ministro do Interior, então nosso adido militar em Paris, encontrava-se em Lisboa à data da falsificação dos choques, tendo êstes sido vendidos pelo Banco ao Sr. Almeida Pinheiro. Como poderia ser então verdadeira a assinatura daquele senhor, aposta nos cheques pelo último?

Demorou-se então em Lisboa o nosso adido militar em França até 30 de Agosto daquele mesmo ano de 1922. Não é, portanto, de estranhar, que êle só tivesse dado pela falsificação dos cheques ao ser-lhe apresentada a conta corrente do Banco Nacional Ultramarino, em 20 de Outubro do mesmo ano.

O coronel Sr. Freiria, quando Ministro da Guerra, tratou então realmente, com o Banco Nacional Ultramarino, uma forma amigável de resolver o assunto.

O ilustre chefe do Govêrno leu depois vários documentos, entre êles da secretaria do Tribunal do Comércio, de 23 de Junho de 1923, em que se declarava estar-se seguindo o processo. Êste é, no emtanto, bastante desordenado, devendo esta desordem ser atribuída à instabilidade dois nossos Ministérios.

O orador leu ainda a correspondência trocada nessa altura com a direcção do Banco Ultramarino, em que êste mostra a necessidade do uma demanda, para poder reembolsar o Estado das importâncias dos cheques falsificados.

Também leu um telegrama do Sr. Norton de Matos, negando que tivesse recebido em Angola o Sr. Almeida Pinheiro, não tendo tido conhecimento, ao menos, da sua estada ali.

Ocasionalmente, encontra-se agora em Lisboa o tenente-coronel Sr. Achemann, que trouxe a cópia das suas coutas com o Banco Ultramarino, não constando destas quaisquer emendas ou rasuras.

Mandados de captura já foram passados muitos contra o Sr. Almeida Pinheiro, estando avisados todos os nossos consulados no estrangeiro.

Infelizmente, aquele senhor não tem sido encontrado em parte alguma: quando muito, tem-se sabido que estivera num ou noutro ponto, mas que já se havia ausentado.

O Sr. Brito Camacho (interrompendo).- Naturalmente, é êle mesmo quem informa o Govêrno de se ter já ausentado.

Risos

O Sr. Presidente do Ministério, Ministro das Finanças e interino da Guerra (Vitorino Guimarães): - Refere-se depois ao caso do desaparecimento de 150:000 lençóis, lendo a propósito um telegrama do Sr. Lelo Portela, segundo o qual nada se encontra já em Paris, pertencente ao antigo C. E. P.

De resto, o número de lençóis distribuídos pela administração militar inglesa aos nossos hospitais e ambulâncias em França, foi apenas de 15:416, dos quais vieram ainda alguns milhares para Portugal.

Como era possível terem-se então extraviado 150:000 lençóis?

O orador respondeu por último às preguntas feitas concretamente pelo Sr. Cunha Leal, sendo as suas respostas as seguintes:

1.ª Foi levantado um auto de corpo de delito contra o Sr. Almeida Pinheiro, tomando como base a participação de 18 de Agosto de 1922.

2.ª Êsse procedimento fora ordenado em 29 do mesmo mês, por despacho do então Ministro da Guerra.

3.a Prejudicada.

Quando ia para responder à 4.ª pregunta o Sr. Ministro do Interior, interrompendo, respondeu:

O capitão Almeida Pinheiro deixou de estar ao serviço em 30 de Junho. Depois dêste dia, continuou ainda em Paris, mas desligado do serviço.

Continuando, o orador, respondeu depois às seguintes preguntas:

5.ª Não foi levantado ainda qualquer auto de deserção contra Almeida Pinheiro.

6.ª Os primeiros mandados de captura de que tem conhecimento, por emquanto, são de 7 de Novembro; em todo o caso, já se deviam ter feito antes as devidas convocações para se apresentar.

7.ª Não houve quaisquer intuitos, por parte dos vários Ministros da Guerra que se têm substituído, de encobrir o delito.

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18 Diário da Câmara dos Deputados

8.ª Não tem ainda os elementos necessários para o poder afirmar categoricamente, mas tem conhecimento de que o Banco Ultramarino só costuma enviar trimestralmente, as suas contas correntes.

9.ª Prejudicada.

10.ª Ainda não foram creditados ao Espado os 240:000 francos levantados por Almeida Pinheiro, mas o Estado não os pode perder.

11.ª Prejudicada.

12.ª Houve do facto uma tentativa, feita pelo Sr. coronel Freiria, não para um acordo, mas para um entendimento com o Banco Ultramarino.

13.ª Ainda não foi ordenada a organização dum processo relativo ao furto do 240:000 francos.

14.ª Ninguém pode ser responsável por essa falta, em virtude do se ter estado simplesmente à espera do se chegar a qualquer acordo com o Banco Ultramarino.

Em todo o caso a organização dêste processo já foi ordenada por mim, tendo despachado também no sentido de se intentar a devida acção contra o Banco Nacional Ultramarino.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Cunha Leal: - Disse poderem estar todos satisfeitos, visto que a interpelação já teve a virtude, ao menos, de forçar o Govêrno a fazer a reivindicação, para o Estado, de quantias que andavam perdidas.

Disse o Sr. Ministro da Guerra - acentuou - que a certa altura, se estabeleceram entendimentos junto do Banco Ultramarino.

Mas quem autorizou êsses acordos surdos?

Mas há mais.

Disse o Sr. Ministro do Interior, que o capitão Almeida Pinheiro havia sido desligado do serviço em 30 de Junho; mas então ficam destruídas as afirmações, feitas há dias pelo mesmo membro do Govêrno, segundo as quais se não tinha procedido logo contra o Sr. Almeida Pinheiro em virtude da sua qualidade de diplomata.

Se estava desligado já do serviço, porque recearam os Ministros da Guerra tomar a iniciativa do qualquer procedimento contra o mesmo senhor?

Na verdade, segundo as suas informações, Almeida Pinheiro saía do serviço em 30 do Junho, mas saía louvado pelo próprio adido militar em França.

Deviam estar já instaurados os três processos: por falsificação, por deserção o por furto.

Contudo, só o primeiro se encontra ainda organizado.

O orador estranhou depois que, tendo anunciado há onze dias a sua interpelação e dito logo quais os pontos que desejava esclarecidos, o Sr. Ministro da Guerra tivesse vindo ler à Câmara apenas os documentos referentes a 1922.

Já se foz o exame à escrita do Banco Ultramarino?

Êle, orador, sabe bem que êsse exame se não podia fazer senão amigavelmente, nas circunstâncias actuais.

Mas porque se não telegrafou ao nosso Ministro em Paris, a fim de êste pedir à direcção do Banco Ultramarino que lho facilitasse a realização dêsse exame?

Porque se não anunciou também na devida altura ao Banco Ultramarino que Almeida Pinheiro se encontrava afastado do serviço ?

Tudo é estranho neste caso, afirmou.

Nós, Deputados, é que não queremos ser encobridores de criminosos.

E o Sr. Ministro da Guerra, para manter o seu nome honrado, vai certamente ordenar um inquérito rigoroso, para que tudo só esclareça.

Êle, orador, pretende ser então ouvido, pois talvez tenha interessantes detalhes a fornecer.

Quanto ao telegrama do Sr. Norton de Matos, continuo a garantir que Almeida Pinheiro esteve em Loanda, tendo mesmo entrado no Palácio do Govêrno.

Se então não foi preso, foi porque não quiseram prendê-lo.

Mas o inquérito, imparcial o rigoroso, vai esclarecer todos êstes pontos.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, guando, nestes termos., restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Carvalho da Silva (para um requerimento):- Sr. Presidente: requeiro a

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Sessão de 24 de Junho de 1925 19

V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se ela permite a generalização do debate.

Consultada a Câmara, é consentida a generalização do debate.

O Sr. Presidente do Ministério, Ministro das Finanças e interino da Guerra
(Vitorino Guimarães): - Sr. Presidente: serei breve ao responder às considerações que acaba de fazer o Sr. Cunha Leal.

S. Exa., por assim dizer, nada do novo trouxe ao debate, nem destruía nenhuma das afirmações por mim feitas.

Sr. Presidente: devo dizer a V. Exa. e à Câmara que, só querem atirar responsabilidades para cima do actual Govêrno por factos passados em 1922-1923, pela simples razão de ser Govêrno neste momento, eu posso então dizer que as mesmas responsabilidades cabem ao próprio Sr. Cunha Leal, que desde então até hoje já foz parto também do um Govêrno.

Parece-me que poderia, por minha vez, preguntar à Câmara o que fez o Govêrno do Sr. Ginestal Machado, isto ó, que providências tomou em relação à questão que se debate.

É claro que não as podia tomar pela mesma razão que eu não as tomaria, se não fôsse chamada a minha atenção e se não tivesse necessidade de ir estudar o processo.

Se com S. Exas. só tivesse dado o mesmo, certamente, como patriotas, como republicanos o bons portugueses que são, procederiam como eu.

O que não posso consentir é que se queira dar a impressão de que o actual Presidente do Ministério é que é o réu.

Quanto à acusação que se fiz ao adido militar, em Paris, de então, não me parece que seja de aceitar; porque, segundo as informações, o delinquente, ex-capitão Almeida Pinheiro, já só ausentara do Paris quando o adido ali chegou.

Portanto êste não podia prendê-lo.

Do resto não mo parece - e os jurisconsultos entendidos em questões de justiça militar, mo dirão - não me pareço que o adido tivesse competência para levantar um auto de deserção, visto que êle tinha já sido demitido dêste lugar, embora com louvor, no dia 30 de Junho dêsse ano.

Não se tratava portanto de um sou subordinado, o portanto, repito, parece-me que o militar não tinha jurisdição para levantar um auto de deserção.

O crime de deserção só se deu desde que o oficial em questão não se apresentou às intimações dos periódicos. Sr. Presidente: não posso deixar de levantar a acusação de que houvesse uma protecção desusada para o referido oficial, porque o que concluímos da leitura dos documentos que aqui tenho, da correspondência trocada constantemente com o Ministério da Justiça o com o Ministério dos Estrangeiros, é que se tem feito, através de todo êste tempo decorrido, os. maiores esfôrços para êsse criminoso ser preso. A verdade é que os avisos têm chegado, infelizmente, sempre um pouco tarde. Dir-se-ia que êsse criminoso tinha uma polícia talvez montada para o prevenir, porque muitos são os telegramas de vários cônsules que dizem que não encontram vestígios da sua passagem. Há outros telegramas dizendo que elo passou em tal lugar usando vários nomes, mas que não foi apanhado. E o extraordinário é que esteve no Brasil o consta que lá cometeu uma burla do muito maior importância do que as duas do que é acusado aqui. Mas só depois de conhecida essa burla se requisitou para lá a captura.

Devo dizer a V. Exa. que, apesar de haver essa ordem de prisão expedida para todos os consulados, fiz agora novamente remetê-la, enviando fotografias do delinquente, para ver se é possível prendê-lo.

O Sr. Cunha Leal: - V. Exa. dá-me licença?

Creio que, numa das consultas ao advogado francês, êste respondeu que uma. das causas principais do só poder ter dado o roubo era o facto do os cheques serem passados a favor do Almeida Pinheiro e não dos fornecedores. V. Exa. não estranha também esta circunstância?

O Orador: - Não estranho o caso, porque era costumo fazer-se isso. No processo tenho aqui um cheque fotografado em que se dá o mesmo caso. As facturas e que eram falsificadas.

O Sr. Cunha Leal: - Mas V. Exa. se fôsse chefe dum serviço acharia bem que se tivesse facturado material cujo fornecimento não tivesse sido verificado?

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20 Diário da Câmara dos Deputados

O Orador: - Devo dizer a V. Exa. que procederia conforme o que estivesse regulado.

O Sr. Ferreira da Rocha: - Mas como é que V. Exa. procederia? Apagava ao fornecedor directamente ou arranjava um intermediário?

O Orador: - Conforme, se fôsse êsse o hábito... E parece - pelo menos deduz-se isso das notas do Ministério da Guerra- que se confiava muito na boa vontade de Almeida Pinheiro.

O Sr. Ferreira da Rocha: - Via-se que havia vontade mas era de o ver levar o dinheiro!

O Orador:-Estávamos arranjados se começássemos a desconfiar de toda a gente...

O Sr. Ferreira da Rocha: - Se não houvesse ordem de pagar ao Sr. Almeida Pinheiro, nunca se tinha dado o roubo. Houve negligência no caso.

O Orador: - Achava muito natural essa ordem.

O Sr. Ferreira da Rocha: - No tempo do Sr. Achomann também o Sr. Almeida Pinheiro era o constante pagador.

Porque é que o adido militar carecia do pagador?

E o auto não é só do Sr. Vitorino Godinho, é também do seu antecessor.

O Orador:-Era muito natural que fôsse encarregado do efectuar os pagamentos, visto fazer parte do Conselho Administrativo.

Sr. Presidente: visto que o debate está generalizado, é natural que tenha novamente de usar da palavra. E, como o inquérito vai fazer-se, teria ocasião de prestar mais esclarecimentos, que porventura venha a colhêr.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Cunha Leal (para explicações): - Sr. Presidente: pedi a palavra na altura em que o Sr. Presidente do Ministério se referiu à inacção do Govêrno a que pertenci; mas, como está presente o Sr. Ginestal Machado, que presidiu a êsse Ministério, S. Exa. melhor do que eu poderá dar explicações.

Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para de novo fazer agitar a Câmara sôbre êste ponto que é essencialíssimo: na primeira questão procedeu-se de forma que tornou possível o furto. Havia um homem que falsificava facturas de conivência provável com o fornecedor e a ordem do pagamento dos cheques ora passada ao próprio fadário! De maneira que a simplicidade no furto era a maior de todas.

Isto é para a Câmara ver como é que os desleixes duma administração podem proporcionar aos outros as condições para que se tornem ladrões.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Maria da Silva (para explicações):- Sr. Presidente: tendo pedido o Sr. Cunha Leal um rigoroso inquérito respeitante às revelações feitas por S. Exa., e tendo o Sr. Presidente do Ministério declarado que lhe faltavam alguns elementos para poder dar uma resposta concreta às preguntas que lhe foram dirigidas, acrescentando que ia proceder a um rigoroso inquérito, entendi que era desnecessária a generalização do debate, porque nenhum dos Deputados presentes pode tratar do assunto mais proficientemente do que tratou o Sr. Cunha Leal.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ginestal Machado (para explicações). - Sr. Presidente: como faltam poucos minutos para se encerrar a sessão, e como não queria começar ás minhas considerações, embora curtas, e interrompê-las para amanhã as continuar, e ainda porque o que eu tenho a dizer resume-se a pouco, queria pivguntar a V. Exa. se me pode conceder 10 minutos, porque do mais não necessito para fazer as declarações que entendo necessárias; se V. Exa. entende que não pode conceder-me êsses 10 minutos, peço-lhe que mo reservo a pá lavra para amanha.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Como já deu a hora de se encerrar a sessão, entendo ser

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Sesaão de 24 de Junho de 1925 21

melhor ficar V. Exa. com a palavra reservada para amanhã.

A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, sendo a ordem dos trabalhos a seguinte:

Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores que se inscrevam):

Projecto de lei n.° 829-C, que reconhece como revolucionário civil o cidadão Manuel de Almeida Morais.

Projecto de lei n.° 829-H, que reconhece como revolucionária civil a cidadã Ermelinda Rosa e como revolucionário militar d) 31 de Janeiro do 1891 o cidadão Augusto César da Costa Rebelo.

Projecto do lei n.° 946, que reconhece como revolucionário civil o cidadão Ricardo Pais Gomes.

Projecto de lei n.°904-J, que autoriza o Govêrno a comprar ou a expropriar duas propriedades destinadas o estabelecimento de dois postos agrários na província do Algarve.

(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam):

A que estava marcada e parecem.0 739, que concede um novo prazo de 30 dias para os funcionários a que se refere o artigo 1.° da lei n.° 1:141 poderem requerer a sua aposentação.

Parecer n.° 516. que abrange pelo preceituado no decreto de 8 de Julho de 1913 os alunos externos do Colégio Militar em determinadas condições.

Ordem do dia (1.ª parte):

Proposta do lei n.° 947, que autoriza o Govêrno a proceder à cobrança dos rendimentos do Estado relativos ao ano económico de 1925-1926 e a efectuar o pagamento das despesas dos serviços públicos nos meses de Julho a Dezembro de 1925.

Debate sôbre as irregularidades atribuídas ao ex-capitão Almeida Pinheiro no exercício do cargo que exercia em 1922 de adjunto do adido militar português em Paris.

E a que estava marcada para hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Requerimentos

Do Sr. Pires Monteiro, para entrar em discussão, depois do parecer n.° 850, o n.° 923, sêlo da independência.

Rejeitado.

Do Sr. Pedro Pita, para discussão da proposta de lei n.° 904-1, sôbre expropriação de terrenos para postos agrários no Algarve.

Aprovado.

Do Sr. Sá Pereira, para entrarem em discussão dois pareceres da comissão de petições, relativos a revolucionários civis, e um projecto referente ao Sr. Ricardo Pais Gomes.

Aprovado.

Propostas de lei

Do Sr. Ministro das Finanças, isentando de impostos municipais os géneros e objectos destinados ao fornecimento dos serviços do Estado.

Pára o "Diário do Govêrno".

Do Sr. Ministro da Guerra, dando as vantagens consignadas no artigo 5 ° da lei n.° 940, de 13 do Fevereiro de 1920, aos oficiais de aviação militar em determinadas condições.

Para o "Diário do Govêrno".

Do Sr. Ministro das Finanças, para que a cobrança dos rendimentos do Estado continue a efectuar-se no ano económico de 1925-1926, nos termos das disposições legais vigentes, nos meses de Julho a Dezembro (duodécimos).

Aprovada a urgência e dispensa do regimento.

Pareceres

Da comissão de petições, sôbre um requerimento do Sr. Senador Ricardo Pais Gomes, em que pede o reconhecimento como revolucionário civil.

Da mesma, sôbre os projectos de lei n.° 829-C e 829-H, reconhecendo como revolucionários civis os cidadãos Manuel de Almeida Morais e Augusto César da Costa Rebolo e a cidadã Ermelinda Rosa.

O REDACTOR - João Saraiva.

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