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REPÚBLICA PORTUGUESA
SESSÃO N.º 89
EM 29 DE JUNHO DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeita
João de Ornelas da Silva
Sumário. - Abre a sessão com a presença de 42 Srs. Deputados.
É lida a acto, que adiante se aprova com número regimental.
Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Constando de Oliveira requere que se inscreva para discussão o parecer n.° 779.
O Sr. Júlio Gonçalves requere que se discuta a emenda do Senado ao projecto referente ao empréstimo para a Escola Industrial da Figueira da Foz.
O Sr. Cortês dos Santos formula um requerimento relativo ao projecto de lei sôbre o Montepio dos Sargentos.
Continuam em discussão os pareceres n.ºs 829-C, 829-H e 946 sôbre o reconhecimento de revolucionários civis.
O Sr. Carvalho da Silva, que ficara com a palavra reservada, conclui o seu discurso, requerendo que sejam retirados da discussão.
Falam sôbre o modo de votar os Srs. Américo Olavo, Cancela de Abreu, Constando de Oliveira, Ribeiro de Carvalho, Sá Pereira e Carvalho da Silva, que retira o seu requerimento.
Os pareceres são rejeitados na generalidade. É aprovado um requerimento do Sr. Viriato da Fonseca, para que continue a discussão do parecer n.º 861.
É aprovado o requerimento do Sr. Constando de Oliveira, acima referido.
O Sr. Nuno Simões interroga a Mesa sôbre a ordem dos trabalhos da sessão. Responde o Sr. Presidente. E aprovado, em prova e contraprova, o requerimento do Sr. Júlio Gonçalves.
É pôsto à votação o requerimento do Sr. Cortês dos Santos, usando da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Carvalho da Silva, o requerente e Jaime de Sousa.
O requerimento é aprovado.
Ordem do dia. - O Sr. Presidente anuncia que o Sr. Pedro Pita deseja tratar em negôiio urgente do decreto que criou novas comarcas.
Levanta-se discussão sôbre se o assunto se pode tratar na ausência do Sr. Ministro da Justiça, falando os Srs. Jaime de Sousa, Pedra Pita, Joaquim Ribeiro, Lopes Cardoso, Tavares de Carvalho, Ribeiro de Carvalho e Cancela de Abreu.
O negócio urgente é rejeitado em prova e contraprova.
Continua a discussão sôbre a proposta de alteração ao Regimento, para o fim de abreviar a discussão do Orçamento.
Em contraprova faz-se a votação do artigo 1.°, que é aprovado.
Sôbre o artigo 2.°, o Sr. Pedro Pita apresenta uma emenda, que é admitida, seguindo-se o Sr. Cancela de Abreu, que fica com o palavra reservada.
Antes de se encerrar a sessão. - O Sr. Pinto Barriga protesta contra o decreto da criação de novas comarcas.
O Sr. Carvalho da Silva exprime o desejo de que a acta consigne a atitude da minoria monárquica, para o efeito de haver número nos trabalhos da sessão.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão .- Projectos de lei.
Abertura da sessão, às 15 horas e 25 minutos.
Presentes à chamada, 42 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 36 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
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Américo Olavo Correia do Azevedo.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Constando do Oliveira.
Francisco Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
João José da Conceição Camoesas.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José Cortês dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Valentim Guerra.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amaro Garcia Loureiro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Maria da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Martins do Paiva.
Delfim Costa.
Feliz do Morais Barreira.
João Estêvâo Aguas.
João de Ornelas da Silva.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Carvalho dos Santos.
José Miguel Lamartino Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Nuno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
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António Resende.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Augusto Pereira Nobre.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Ernesto Carneiro Franco.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Jorge de Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Pelas 15 horas e 10 minutos principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 42 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 25 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Pedido de licença
Do Sr. Deputado Domingos Pereira, quinze dias.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Representação
Da Câmara Municipal do S ar doai e de Meda, reclamando contra o decreto n.° 10:776, de 19 de Maio de 1925, que modifica serviços da instrução primária.
Para a comissão de instrução primária.
Telegrama
Do professorado do concelho da Lagoa, protestando contra os decretos n.ºs 10:776 e 10:729.
Para a Secretaria.
Ofícios
Do Ministério do Interior, respondendo ao pedido feito pelo Sr. Deputado Alberto Jordão, em ofício n.° 279.
Para a Secretaria.
Do Ministério das Finanças, enviando 150 exemplares do orçamento dos Caminhos de Ferro do Estado para 1925-1926,
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a fim de serem distribuídos pelos Srs. Deputados.
Para a Secretaria.
Do Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Sátão, pedindo modificação no decreto n.° 10:776.
Para a comissão de instrução primária.
Do presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal da Chamusca, acompanhando uma representação que solicita a revogação ou modificação do decreto n.° 10:776.
Para a comissão de instrução primária.
Do juiz de direito da 3.ª vara da comarca do Lisboa, pedindo autorização para que o Sr. Deputado Hermano do Medeiros compareça no tribunal da mesma vara no dia 7 de Julho próximo, pelas catorze horas, para depor como testemunha nuns autos cíveis do embargo do terceiro.
Negado.
Comunique-se.
Do presidente do 2.° Tribunal Militar Territorial do Lisboa, pedindo a comparência, naquele Tribunal, no dia 27 do corrente, por doze horas, a fim de deporem como testemunhas na audiência do julgamento doa tenentes Argentino Herculano de Seixas e Alberto Ribeiro da Silva Moura, aos Srs. Deputados Ribeiro de Carvalho o Agatão Lança.
Arquive-se.
O Sr. Presidente: - Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia.
Antes da ordem do dia
O Sr. Constâncio de Oliveira: - Peço a V. Exa., Sr. Presidente, se digne consultar a Câmara, quando fôr oportuno, sôbre se permite que entre em discussão, antes da ordem do dia, o parecer n.° 779, que autoriza o Govêrno a fornecer o bronze necessário para o busto ao benemérito Joaquim Lopes.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Julio Gonçalves: - Requeiro a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre se permite que entro em discussão a emenda vinda do Senado ao parecer n.° 350, que trata de autorizar o Governo-a contrair um empréstimo para a construção do edifício para a escola industrial na Figueira da Foz.
É um projecto do alta importância porque a escola actualmente encontra-se num edifício impróprio, com gravo prejuízo para o ensino.
Sr. Presidente: a discussão a fazer não levará com certeza 5 minutos, visto que a emenda introduzida pelo Senado consiste em dizer que êsse empréstimo deve ser feito em ouro o não em moeda portuguesa.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Cortês dos Santos: - Sr. Presidente: requeiro a V. Exa. para que a Câmara seja consultada oportunamente sobre se permite que entro em discussão, depois dos projectos que já se encontram marcados, uma emenda vinda do Senado ao parecer n.° 196, que criou o Montepio dos Sargentos, tanto mais que a emenda pouca importância tem, porque é uma questão de redacção.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão os projectos n.ºs 829-C, 829-H e 946, relativos ao reconhecimento de revolucionários civis.
Continua no uso da palavra o Sr. Carvalho da Silva.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: fez-se de facto justiça republicana aprovando o requerimento que há dias enviei para a Mesa, pedindo para que fossem discutidos conjuntamente todos os projectos referentes a revolucionários civis. De facto apareceu mais de um projecto.
E, a propósito, ocorre-me preguntar a V. Exa. se não tem mais nenhum revolucionário sôbre a Mesa.
O Sr. Presidente: - Não vejo mais nenhum.
O Orador: - Apresenta agora o Sr. Brito Camacho uma dúvida acêrca deste-
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projecto do lei: é que não está autenticada a assinatura do requerimento do revolucionário Sr. Pais Gomes, e assim o Sr. Brito Camacho presume que a assinatura não seja do próprio.
Vou ler o requerimento, porque entendo que a Câmara devo ficar bem elucidada sôbre a justiça do requerente.
Quantas vezes, no cumprimento do nosso dever, temos de saltar por cima daquilo que o coração nos ditaria; mas nós, que sempre temos combatido a existência da entidade oficial revolucionário civil, que sempre temos combatido que qualquer pessoa que tenha efectivamente tomado parto numa revolução possa saltar por cima de direitos de outros pelo simples facto de o não ter, que entendemos que se não deve premiar qualquer acto de revolucionário, nós não podemos deixar de combater esto projecto de lei, bem como um outro em que o Sr. Eusébio Leão, Ministro de Portugal em Roma, pede para também ser considerado como revolucionário civil.
Não podemos deixar de protestar contra esta circunstancia, de homens que se encontram nas posições mais elevadas da República, de homens que amanhã precisarão, porventura, do se impor contra revolucionários civis, darem o exemplo do requererem para serem considerados revolucionários civis!
Em tais condições entendo que é um péssimo procedente êste, mas porque entendo também que se deve esperar por que venha à discussão desta Câmara o parecer relativo ao processo do Sr. Eusébio Leão, Ministro de Portugal em Roma, requeiro que, juntamente com o parecer em discussão, só discuta êsse projecto que tem do ser julgado pela Câmara.
Nestas circunstâncias requeiro que o projecto de lei seja retirado da discussão até que chegue o parecer respeitante ao Ar. Eusébio Leão.
O orador não reviu.
O Sr. Américo Olavo: - V. Exa. e a Câmara calculam o constrangimento em que me encontro numa questão desta natureza e em presença do facto estranho na legislação de qualquer país do mundo do haver indivíduos oficialmente, legalmente considerados revolucionários civis.
Eu tenho pelas pessoas a quem interessa o projecto que está na Mesa muita estima pessoal o muita consideração, mas não posso ficar calado; não compreendo que pessoas que não necessitam de cousa alguma, pois já dentro da República têm exercido os mais altos cargos (Apoiados) venham a esta Câmara apelar para a situação que o Estado criou para acudir a indivíduos que têm grandes dificuldades.
Sr. Presidente, encontro-me em presença de pessoas que têm desempenhado os mais altos cargos, como ministro e governador civil, e portanto não posso deixar do lavrar o meu protesto.
Apoiados.
E preciso que se diga bem alto que os republicanos não pedem lugares; aceitam aqueles para que são nomeados.
Todos nós nos sacrificamos pela Pátria e pelas instituições, e basta-nos a glória de as servir o melhor possível.
Protesto, pois, contra semelhantes projectes.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Não tenho o requerimento do Sr. Eusébio Leão, pois me disseram que está na comissão de petições; mas tenho aqui um grande dossier do projectos para revolucionários civis.
Para prova disto, eu apresento à Câmara três projectos que estão para ser discutidos no Senado, um com 3, um com 28 e outro com 119 revolucionários civis!
Eu pregunto a V. Exa., Sr. Presidente, só êste escândalo pode continuar, e se V. Exa. não deve advertir o Senado para que não atenda o requerimento do Sr. Dr. Eusébio Leão, porque uma vez êle deferido, convertido em projecto o votado ali, ao abrigo da lei, irá para o Diário do Govêrno, mesmo que aqui não seja discutido.
Depois da lei n.° 1:691, de 11 de Novembro, êles ficam com a regalia de aposentação o do pensões para as famílias, mesmo que morram de morte natural.
Por isso, Sr. Presidente, o que se torna indispensável é que se revogue aquela lei.
Os revolucionários civis já tinham mui-
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tas regalias, e, com aquela lei, ainda ficaram com mais.
Só V. Exas. lerem os artigos 2.° e 3.°, ficam abismados do que só mande abonar pensões, que representam 50 por cento e mais dos ordenados.
Nós abstraímos sempre de questões pessoais. Há um ilustre pretendente, que eu suponho que precisa de obter a sua reforma. Se, porventura, falta um ano . para êle a obter, votem embora uma compensação especial, porque não a achamos tão vexatória, embora não concordemos com ela.
Mas onde a indignação sobe de ponto é no facto de um representante diplomático de Portugal no estrangeiro, homem válido e que ainda hoje exerce as suas funções, vir requerêr ao Parlamento para ser reconhecido como revolucionário civil, como se isto não produzisse lá fora um péssimo efeito!
Francamente, Sr. Presidente, isto excede todas as marcas, e é preciso que se tenha descido muito neste País para que haja pessoas que possam pensar que aqui só deferem todos os requerimentos, por mais extraordinários e inconcebíveis que êles sejam.
Tenho dito.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Constância de Oliveira: - Sr. Presidente: eu pedi a palavra quando estava usando dela o ilustre Deputado o Sr. Américo Olavo.
Naturalmente não ocorreu a S. Exa. que a razão principal que levou os requerentes a pedirem para gerem reconhecidos como revolucionários civis foi a de obterem, não para si, mas para as suas famílias, por morte deles, as pensões a que têm direito desde que os seus requerimentos sejam deferidos.
Exactamente porque o Parlamento tem sido generoso em distribuir pensões às famílias do indivíduos falecidos, e porque a lei n.° 1:691 beneficia com essa regalia aqueles que sejam reconhecidos como revolucionários civis, é que a maioria dos requerentes de agora, os quais eu reconheço como tendo prestado relevantes serviços à República - sem nunca lhe terem pedido qualquer compensação - pede para se colocar ao abrigo de uma disposição que lhes concede pensões, não para êles, repito, mas para suas famílias.
Êles receiam que não haja para as pessoas de suas famílias a mesma generosidade que tem havido para as do outros que tem morrido o que tinham por igual a obrigação de ser previdentes e do evitar, portanto, que o Parlamento tivesse de vir votar, pensões, Mas o mal está no que apontou o Sr. Cancela de Abreu; o mal é a lei n.° 1:691. Essa lei, com efeito, nunca devia ser publicada e a sua revogação era necessária imediatamente para evitar que estivéssemos aqui a reconhecer mais revolucionários. Mas justo é dizer, Sr. Presidente, que muitos dêles vêm simplesmente pedir as garantias dessa lei, não por êles, que a maioria ficou satisfeita com o facto de só ter proclamado a República, que era o seu ideal, mas por serem bons chefes de família e recearem que estas, após a sua morte, não ficassem em boa situação.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Ribeiro de Carvalho (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: as palavras de alguns Srs. Deputados obrigam-mo também a explicar o meu voto nesta questão, voto que é absolutamente contrário aos projectos em discussão. Concordo que sejam galardoados os actos praticados com risco da liberdade e da própria vida, por criaturas pobres que pela República se sacrificaram. Mas não confundamos. Não compreendo que homens da situação social o política do Sr. Ricardo Pais Gomes, que é director geral dum Ministério e que já foi Ministro duas ou três vezes na República, homens da categoria do Sr. Eusébio Leão, nosso Ministro de Portugal em Roma, venham fazer um requerimento dêsses, como qualquer popular que se bata na Rotunda!
Ora, Sr. Presidente, factos dêstes são tristes e deprimentes para todos os que são republicanos.
Se os Srs. Eusébio Leão e Ricardo Pais Gomes, por condições especiais da
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suas vidas, precisam de qualquer auxílio ou benefício da República, tragam aqui um projecto de lei especial; venham dizer à Câmara de que auxílio ou benefício precisam, e, se justo fôr, eu serei o primeiro a dar o meu voto favorável. Mas, pelo amor de Deus, incluir S. Exas. numas listas de revolucionários civis não é com o meu voto que êsse facto triste e deprimente se pratica nesta Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Sá Pereira (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: cumpre-me como relator da comissão de petições desta casa do Parlamento dizer a V. Exa. alguma cousa em resposta ao muito que se disse aqui a respeito dos projectos ora discussão.
Quanto a mim, não pode ainda ser nesta casa do Parlamento ventilada a situação (se é que ela existe) a que se refere o requerimento apresentado pelo Sr. Eusébio Leão, porque não é ainda oficialmente do nosso conhecimento. Não sei mesmo se existem no Senado os projectos em discussão reconhecendo três revolucionários civis.
Sei, todavia, que. se trata de pessoas que à República prestaram assinalados serviços, e por isso a comissão de petições não teve dúvida em dar a sua aquiescência.
Na parte relativa ao Sr. Pais Gomes, a comissão não fez senão deferir o requerimento de S. Exa., apresentando um projecto de lei de harmonia com o que era de seu desejo.
Não estava mais no âmbito da comissão de petições desta Câmara.
Eu tenho pelo Sr. Ricardo Pais Gomes a mais elevada consideração e profunda estima, nunca podendo esquecer que êle é um velho republicano, com grandes serviços prestados à República no tempo da propaganda e ainda depois dela proclamada. Ora êstes factos são suficientes para calarem no meu ânimo.
Devo ainda dizer a V. Exa. que há um caso para mim fundamental, e é que S. Exa., apresentando o requerimento que apresentou, demonstrou ser o que sempre foi: um republicano modesto, que não se envergonha de se equiparar aos humildes homens do povo.
E digo isto tanto mais à vontade,, quanto sou avesso ao reconhecimento de revolucionários civis, a não ser daqueles que realmente prestaram bons serviços à República.
Respondendo agora aos Srs. Deputados monárquicos, devo dizer que da parte da. República tem havido tanto escrúpulo no. reconhecimento de revolucionários civis, que a maior parte dos verdadeiros republicanos ainda não foi reconhecida como tal.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: quando há pouco apresentei o meu requerimento, tinha a intenção de fazer com que os pareceres em discussão não fossem votados, pelo menos por agora; mas, vendo a atmosfera que há na Câmara a respeito deles, peço a V. Exa. para retirar êsse meu requerimento, a fim de que os pareceres possam ser rejeitados.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - O Sr. Carvalho da Silva desiste do seu requerimento, e assim continuam em discussão os pareceres. Tem a palavra o Sr. Paulo Cancela de Abreu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Desisto da palavra.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Américo Olavo.
O Sr. Américo Olavo: - Desisto da palavra.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a votação na generalidade.
São rejeitados os pareceres na generalidade.
O Sr. Presidente: - O Sr. Viriato da Fonseca requereu que continuasse a discussão, já interrompida, do parecer n.° 861, que diz respeito a uma emenda vinda do Senado. Os Srs. Deputados que aprovam, queiram levantar-se.
É aprovado o requerimento.
O Sr. Presidente: - O Sr. Constância de Oliveira requereu que seja inscrito,
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antes da ordem do dia e sem prejuízo dos oradores inscritos, o parecer n.° 797. Os Srs. Deputados que aprovam, queiram levantar-se.
É aprovado o requerimento.
O Sr. Nuno Simões (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: estão inscritos no período de antes da ordem do dia alguns pareceres que não demandam para ser discutidos a presença de qualquer Ministro.
Como não há Govêrno, parecia-me que V. Exa. poderia dar preferência a êsses pareceres, para que não se levantassem obstáculos à discussão de quaisquer outros.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:-Estou de acordo com V. Exa., mas tenho que pôr à votação os requerimentos que estão sôbre a Mesa.
Assim, o Sr. Júlio Gonçalves requereu para que entrassem em discussão, sem prejuízo dos oradores inscritos, as emendas do Senado ao parecer n.° 300. Os Srs. Deputados que aprovam...
O Sr. Nuno Simões (para interrogar a Mesa): Sr. Presidente: desejava que V. Exa. me dissesse se só trata apenas de emendas vindas do Senado ou do parecer.
O Sr. Presidente: - É uma emenda ao parecer.
É aprovado o requerimento.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: - Estão de pé 6 Srs. Deputados e sentados 62. Está aprovado o requerimento.
Foi lido na Mesa o requerimento do Sr. Cortês dos Mantos, referente, à discussão da emenda do Senado ao projecto relativo ao Montepio dos Sargentos.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: eu entendo que a Câmara não pode discutir propostas da importância desta sem estar presente o Govêrno.
Já há o precedente do suspender os trabalhos parlamentares até que haja Govêrno; porque não se faz o mesmo agora?
O orador não reviu.
O Sr. Nuno Simões (sobre o modo de votar): - Na verdade não se pode compreender que se estejam a discutir pareceres que demandam a presença do Govêrno; mas eu lembrava que talvez se pudessem discutir aqueles que foram da iniciativa do Govêrno e que não necessitam de novamente ser ouvida a sua opinião.
Não sendo assim, acho melhor o critério do Sr. Carvalho da Silva para não estarmos a perder tempo a discutir pareceres que não devem ser discutidos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Cortês dos Santos (sobre o modo de votar): - O meu requerimento era apenas para se discutirem umas emendas do Senado que já foram discutidas na presença do Sr. Ministro da Guerra, que neste caso é dispensável.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (para explicações): - Eu não conheço as emendas; mas por princípio entendo que não devem ser distribuídas sem a presença do Govêrno, ou então que a Câmara suspenda os seus trabalhos, como já aqui se fez nas mesmas condições por um requerimento do Sr. Manuel Fragoso.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: - As emendas do que truta o requerimento são para a fundação de um montepio para os sargentos de mar e terra, que é uma antiga aspiração dessa classe.
Elas já foram discutidas largamente na presença do Sr. Ministro da Guerra e por isso não vejo razão para as observações do Sr. Carvalho da Silva. Devemos votar as emendas.
O Sr. Carvalho da Silva (interrompendo): - Mas V. Exa. foi um dos que apro-
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vou o requerimento do Sr. Manuel Fragoso.
O Orador: - Mas neste momento não aprovo. Escolha V. Exa. outra oportunidade.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Posto à votação o requerimento, foi aprovado.
ORDEM DO DIA
Foi aprovada a acta.
O Sr. Presidente: - O Sr. Pedro Pita deseja tratar em negócio urgente do decreto publicado no Diário do Govêrno de ontem sôbre a criação de algumas comarcas.
Negócio urgente
Desejo tratar em negócio urgente do decreto publicado no Diário do Govêrno de ontem, sob o n.° 10:883, que cria algumas comarcas.
Sala das Sessões, 29 de Junho de 1925. - Pedro Pita.
O Sr. Jaime de Sousa: - Peço a palavra sôbre a forma de votar.
O Sr. Presidente: - Tem V. Exa. a palavra.
O Sr. Jaime de Sousa: - Sr. Presidente: é o assunto anunciado no negócio urgente, que V. Exa. submete à apreciação da Câmara, um daqueles assuntos para o qual julgo absolutamente indispensável a presença do Sr. Ministro da Justiça.
Não apoiados.
Apoiados.
Trata-se de um decreto que revoga, em parte, a nossa legislação judiciária.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Nem mais, nem menos.
O Sr. Nuno Simões: - E contra a expressa indicação da Câmara.
O Orador: - Eu não sei se são boas ou más as disposições do decreto.
O que sei é que é indispensável, assim o julgo, que o Sr. Ministro da Justiça esteja presente para esclarecer a Câmara, e dizer se é conveniente ou não tal decreto.
De ânimo leve, sem mais exame, e sem saber se convém ou não à administração da justiça a doutrina, o pronunciar-se a Câmara não acho bom nem oportuno.
Por minha parte, votarei contra o negócio urgente.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita: - Desejo esclarecer a Câmara acerca do decreto em questão.
Se não fôr êste decreto imediatamente discutido pela Câmara, e se sôbre êle a Câmara não fizer uma votação, amanhã serão feridos direitos já adquiridos.
Eu não julgo indispensável a presença do Sr. Ministro da Justiça nesta Câmara. Pelo contrário, o Sr. Ministro da Justiça dispensou a Câmara a habilitá-lo para publicar o decreto, para publicar esta monstruosidade.
Não faz sentido que no dia 27, dois dias depois de o Govêrno estar demissionário, aparecesse no Diário do Govêrno um decreto entrando em vigor, produzindo os seus efeitos!
É isto que importa: ver se deve ser pôsto em execução.
De resto, não é preciso muito tempo para mostrar, em face das suas disposições, que pela primeira vez há um Ministro que salta por cima do Poder Legislativo.
O orador não reviu.
O Sr. Joaquim Ribeiro: - Sr. Presidente: entendo que êste projecto não precisa da presença do Ministro para ser discutido.
Há precedentes de se discutirem projectos sem a presença do respectivo Ministro.
Apoiados.
É singular: quando há projectos bons, decretos bons, a Câmara não quere dispensar a presença do Ministro respectivo; mas em certos casos passam projectos, como sempre passaram sendo eu Ministro da Agricultura, e sem que fôsse pedida a minha presença, processos monstruosos.
É um projecto de uma grande injustiça e de uma iniquidade tal que lamento que a Câmara o não tenha revogado.
No emtanto era um decreto que protegia os fabricantes de aguardente da Madeira.
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Cada um puxa para si, e, em sabendo bem, ninguém reponta.
Tenho a dizer que não reputo de imoralidade a criação das novas comarcas.
Só as novas comarcas agora criadas tiverem meios do vida, devem manter-se.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Lopes Cardoso: - Sr. Presidente: não se trata neste momento de apreciar qualquer doutrina cuja discussão exija a presença do Sr. Ministro da Justiça.
Se o Sr. Ministro da Justiça houvesse cumprido o seu dever, trazendo à Câmara uma proposta sôbre o assunto, a discussão seguiria as normas regulares e regimentais, e nesse caso a Câmara podia ter dúvidas em tratar do caso na ausência do Ministro.
Mas não se trata disso.
Trata-se do um decreto que o Sr. Ministro da Justiça entendeu que podia publicar e que dentro em pouco deverá entrar em vigor, criando situações novas com que poderão invocar-se direitos adquiridos que os interessados farão valer quando venha a revogar-se o decreto.
Não se trata de ver se há comarcas a criar ou se as criadas devem manter-se, como supõe o Sr. Joaquim Ribeiro.
O que se pretende é apurar só o Sr. Ministro da Justiça podia ou, não publicar êsse decreto.
Eu entendo que não podia.
S. Exa. foi além das suas atribuições.
O Sr. Ministro da Justiça alterou em muitos pontos, a nossa organização judiciária.
Cria direitos novos a magistrados; legisla usurpando funções do Congresso da República.
Mas há mais: o Sr. Ministro da Justiça impõe condições às câmaras onde foram criadas essas comarcas que as colocam anima situação de manifesta desigualdade em relação àquelas onde essas comarcas já existem.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro da Justiça com a publicação do sen decreto prescindiu inteiramente do Parlamento e até dos seus colegas de Ministério, e, nestas condições, não temos que preocupar-nos "agora com a ausência de S. Exa.
Tenho pele Sr. Ministro da Justiça rama ^consideração que vem já de longos tempos; isso, porém, não mo impede de estranhar o procedimento de S. Exa.
Conheço - e alguns eu tenho verberado nesta casa do Parlamento - vários abusos do Poder; mas igual a êste, em matéria judicial, ainda não tinha visto, sobretudo por ter sido praticado por um magistrado judicial.
Tenho dito.
O Sr. Pedro Pita: - É lamentável que o Sr. Joaquim Ribeiro, numa questão que nada tem do pessoal e não sei com que propósito, tenha procurado atingir-me.
De facto, foi votado pelo Senado um projecto respeitante ao fabrico da aguardente na Madeira, projecto que não deu protecção a uns com prejuízo de outros, e projecto com o qual - posso dizê-lo - eu nada tive, visto que não fui eu que o apresentei e nem sequer o defendi.
Êsse projecto foi apresentado no Senado pelo Sr. Godinho do Amaral e relatado pelo Sr. Medeiros Franco, pessoas que nem são meus correligionários.
Eu podia dizer que não tinha nada com êsse projecto, podia procurar essa situação fácil; mas não, votei e interessei-me por êsse projecto.
Basta dizer que a cana que se vendia a 1$60, no ano seguinte vendeu-se a 3$00, conseguindo-se assim dar ao produto um preço mais remunerador.
O Sr. Joaquim Ribeiro como tem mais uma comarca em Ferreira do Zézere, lembrou-se de me atacar por eu me insurgir contra o Ministro que faz disposições que vão destruir a nossa organização judiciária.
Vozes: - Um verdeiro bodo.
Vários àpartes.
O Orador: - Não me parece que o Sr. Joaquim Ribeiro tivesse direito de me magoar.
Eu não fui autor dêsse projeto, mas sim um democrático, assim como democrático foi o relator. Mas não enjeito a responsabilidade de o apoiar, pois estou convencido que se fez um grande benefício a quem trata com a terra.
O nosso colega Sr. Aires de Ornelas preferiu abandonar a cultura, perdendo 60 contas, a vender o produto por preço tam baixo.
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Eu, que era ao tempo um modesto lavrador dos bens que tinha herdado de meu pai, preferi dar às vacas as canas, criando erva, e vendê-la por 1$600 réis.
Sr. Presidente: nunca os meus dinheiros chegaram para muito, tanto que, quando quis comprar aqui uma casa onde vivesse, me vi obrigado a vender aquela que tinha no Funchal e tudo aquilo que meu pai me havia deixado na Madeira.
Vêem, pois, V. Exas. que o único interêsse que eu podia ter era o de ver remunerado convenientemente um produto da minha terra.
Mas, admitamos, por um momento que, de facto, se estabeleceu uma injustiça. Que tem que ver ter-se feito uma cousa, para se justificar outra?
O que eu pretendo é evitar que êste decreto produza os seus efeitos.
Elo é um diploma que foi publicado ao abrigo de uma autorização sôbre ordem pública o em termos que a própria Constituição não permite.
Sabe-se até que nem todos os Ministros estavam de acordo na sua promulgação, e, tanto assim é, que êle foi publicado sem a assinatura de todos êles.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Joaquim Ribeiro: - Quando há pouco me referi a um projecto de lei que aqui passou sôbre a Madeira, o Sr. Pedro Pita julgou que eu fiz uma alusão a êsse projecto, pretendendo ser-lhe desagradável.
Enganou-se, porque eu apenas queria dizer que o projecto, injusto de facto, passou sem protesto.
E S. Exa. não devia esperar da minha pessoa outra explicação que não fôsse esta.
Falou também S. Exa. na cana do açúcar do Sr. Aires de Ornelas e na sua produção agrícola, também de cana, a qual dou toda às vacas da Madeira.
Mas, uma vez que o Sr. Pedro Pita se referiu a êsse projecto, eu direi o que êle foi.
Como V. Exas. sabem, ninguém na Madeira podia, por lei, modificar a capacidade das suas fábricas de aguardente. Pois houve alguém, e foram várias pessoas, que modificaram os seus alambiques, no sentido de obterem uma maior produção do que aquela que lhes era permitida.
Eram oito, nove ou doze pessoas - não me recordo agora bem do número - que deviam ter sido sujeitas à sanção da lei por terem prevaricado.
Apareceu depois aqui uma lei que dizia que a todos aqueles que até à data - que era quatro meses atrás - tivessem aumentado a sua capacidade do destilação era garantida essa mesma capacidade, quere dizer, os outros não podiam aumentar essa capacidade, mas a êstes era-lhes garantida a que tinham aumentado.
Parece me que isso era bem escandaloso, e que a Câmara tinha feito bem não permitindo a sua efectivação.
Foi com essa intenção que aqui veio o Ministro no dia seguinte apresentar uma proposta do lei para que a Câmara inutilizasse o trabalho que tinha feito na véspera, mas até hoje o respectivo parecer dorme na comissão de agricultura. Pois era um acto do justiça que se praticava. Mas o que se vê é que quando chega a ocasião de cada um tratar dos seus interêsses ou da sua clientela política, não se importa de protestar, mesmo quando sã trata de qualquer cousa útil.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita (para explicações): - Sr. Presidente: discutia-se o votar ou não votar o meu negócio urgente quando o Sr. Joaquim Ribeiro se referiu a um caso respeitante à Madeira, tendo eu visto nessa referência uma insinuação directa.
Sr. Presidente: o Sr. Joaquim Ribeiro,, querendo demonstrar a monstruosidade dessa lei, produziu esta afirmação: que pela legislação que então vigorava não era permitido, antes mesmo era proibido, aumentar a capacidade de produção das fábricas de destilação.
Todo o raciocínio do Sr. Joaquim Ribeiro partiu desta base, mas eu estou pronto a demonstrar a qualquer Sr. Deputado, que por isso se interêsse, que, longe de ser proibido aumentar a capacidade de produção dos alambiques, era, pelo contrario, permitido por essa lei aumentá-la.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Ribeiro de Carvalho (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que me diga o que está em discussão, porque parece, pelo número de pessoas que têm falado, que estão já em discussão dois negócios urgentes: um referente à criação das comarcas e outro referente ao regime do fabrico de aguardente na Madeira.
O orador não reviu.
O Sr. Tavares de Carvalho (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: não estando presente o Sr. Ministro da Justiça, nem o Sr. Presidente do Ministério, entendo que não se deve votar êste negócio urgente.
Aproveito a ocasião para também dizer, sem espírito jurídico, que não tenho, que Sabrosa, minha terra, uma das atingidas pela lei, tem dezassete freguesias, distando algumas delas da sedo da comarca actual 11 quilómetros, sem terem uma estrada, nem mesmo um caminho através das serras.
Dou, portanto, o meu voto a êsse projecto.
Interrupção do Sr. Cancela de Abreu, que não se ouviu.
O Orador: - Entranhou V. Exa. há pouco que eu não tivesse espírito jurídico; agora estranho eu que V. Exa. ma interrompa som minha licença.
Terminando, Sr. Presidente, direi quê entendo que êste negócio urgente não deve ser votado, visto não estar presente o Sr. Ministro da Justiça.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: acabam de falar Ferreira do Zêzere e Sabrosa, mas não falou o País, porque o País não é nem Ferreira do Zêzere, nem Sabrosa.
Não falou ainda o Sr. Dinis de Carvalho, naturalmente porque S. Exa. ainda não viu o Diário do Govêrno, porque vem lá metida a sua comarca. É caso para dar os parabéns a S. Exa.
Pois, Sr. Presidente, nem Ferreira do Zêzere, nem Sabrosa, nem Sardoal constituem o País, e parece-me que o País é que tem o direito de falar aqui.
E o que é que o País diz quando ouve um homem de bem, como é o Sr. Joaquim Ribeiro, dizer nesta casa que cada um puxa para si? O País diz que é esta a moral da República, a moral do regime.
O Sr. Joaquim Ribeiro puxa para Ferreira de Zêzere, o Sr. Tavares de Carvalho puxa para Sabrosa, o Sr. Dinis de Carvalho puxa para Sardoal e o Sr. Nuno Simões com certeza que puxará para cada serra e cada monte.
O que é curioso, acerca de tudo, é que o próprio Ministro da Justiça, em vez de puxar para o País, puxa para Macieira de Cambra, e eis aí está como cada qual puxa o seu carrinho, não tratando ninguém de defender os interêsses nacionais.
Sr. Presidente: sôbre a questão das comarcas já tive ocasião de me pronunciar, mas é preciso que a Câmara saiba que o decreto não trata apenas da criação de comarcas, cria lugares correspondentes a essa comarcas; cria uma secretaria especial, cria novos lugares nos Tribunais da Relação de Lisboa e Pôrto, aumenta as despesas, o que é escandaloso, ê porá isso chamo a atenção do Sr. Almeida Ribeiro, que o das pessoas da maioria a quem reconheço mais categoria para se pronunciar; o que é mais curioso ainda, é que o decreto, longe de autorisar o Govêrno a criar qualquer cousa, é uma lei que o autoriza a suprimi-la! E espantoso!
Termino as minhas considerações afirmando mais uma vez que é espantoso que o Sr. Adolfo Coutinho falte não só ao respeito à lei o às indicações do Parlamento, mas também ao respeito à sua própria pessoa e à sua toga de magistrado, porque, se tudo isto respeitasse, êle não assinaria êste decreto!
Tenho dito.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, guando, nestes termos, restituir as notas taguigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Lopes Cardoso: - Sr. Presidente: ao entrar nesta Câmara vinha resolvido a levantar esta questão em negócio urgente, mas o Sr. Pedro Pita antecipou-se ao meu desejo, e levantou-a.
Pelo que tenho ouvido até agora mais
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me convenço que êste pedido de negócio urgente é de aprovar, porque, caso contrário, ficaremos numa situação equívoca. As opiniões pessoais têm-se dividido de tal forma neste debate que convém que olhemos para êle com a maior atenção.
Vale o decreto ou não vale o decreto?...
É necessário que isto se explique, e quanto antes, e não poderá esclarecer-se sem que o negócio urgente seja votado.
Devo dizer mais uma vez que êste decreto é uma monstruosidade, e todos os que são entendidos em matéria de direito da mesma forma devem pensar. Com efeito êste decreto vem alterar a organização judiciará, o que compete privativamente ao Congresso da República. Com efeito, Sr. Presidente, quem conhece bem a Constituição não pode deixar de reconhecer que se legislou muito além do que por ela é permitido. Estabelecem-se novos encargos para os corpos administrativos, o que não pode ser decretado pela forma que se adoptou.
Sr. Presidente: deixe-me V. Exa. dizer - e nisto não vai a mais leve censura aos ilustres colegas que desempenham as funções de Ministério Público nas comarcas de Lisboa e Pôrto, porque êles são magistrados muito sabedores e adentro das suas funções- são completos e dignos de todo o respeito - uma cousa é "promover" e outra é "julgar" e, contudo, neste decreto tudo se confunde admitindo-se que magistrados do Ministério Público que, há 20 ou mais anos, se limitam às funções de promotores sejam habilitados a julgar, arvorados em juizes de qualquer instância, postos a julgar as mais difíceis e variadas questões de direito. Ora, não faz realmente sentido que a um agente do Ministério Público, que durante anos comodamente gozou a situação que pretendeu, em que exclusivamente se dedicou a uma determinada especialidade de processo, seja conferida, por um decreto elaborado de ânimo leve, a competência precisa para julgar problemas os mais complexos. Não pode ser!
Disse há pouco um Sr. Deputado - não me recordo quem - que não havia promoções nem situações ilegalmente criadas. Há, sim senhor! Os julgados municipais têm um juiz e um sub-delegado do Procurador da República.
Os primeiros, que podem não ter conhecimentos alguns sôbre o registo predial, são nomeados conservadores; os segundos são nomeados contadores.
E por esta irregular forma se permite que os funcionários dos julgados extintos ingressem em quadros, que exigem habilitações especiais e concursos por provas públicas!..
Tenho fé em que a Câmara votará o negócio urgente do Sr. Pedro Pita, e então haverá ensejo de fazer mais largas referências ao que acabo de apontar.
E realmente extraordinário que um Ministro, depois de ter perdido a confiança do Parlamento, publique um decreto desta natureza, que é absolutamente contrário ao critério manifestado ultimamente por todos os Ministros da Justiça que precederam o actual, que sempre indicaram a necessidade de reduzir o número das comarcas existentes.
E assim que quando eu estive no Poder anunciei que ia apresentar uma proposta suprimindo quarenta comarcas, e o Sr. Ministro que me substituiu decretou mesmo que se procedesse à escolha das comarcas que deveriam ser extintas.
Por êste decreto criam-se novas comarcas, invocando-se como único fundamento o facto dos julgados municipais estarem afastados da sede das comarcas a que pertencem.
Se se fôsse dar uma comarca a todos os concelhos que estão afastados das sedes comarcas, eu não serei exagerado dizendo que teríamos de aumentar em vinte e tantas as comarcas existentes.
Se não há meios de comunicação a culpa não é nossa, e isso não pode servir de pretexto para aumentar o número de comarcas.
O distrito que me elege, e que conheço melhor, tem concelhos sem ligações ordinárias com sede das comarcas respectivas, e nem por isso, apesar de toda a dedicação que tenho pelo meu círculo, terei a coragem de fazer uma proposta criando comarcas novas.
Mas se passarmos da organização judiciária para a administrativa, vemos que há concelhos que nem mesmo têm ligações com os distritos.
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Argumentar-se com êste motivo para retalhar a organização judiciária, não é justo, não é digno, nem é do direito.
Tenho dito.
Foi rejeitado em prova e contraprova, requerida pelo Sr. Artur Brandão, com invocação do artigo 116.º, § 2.º, feita pelo Sr. Cancela de Abreu, por 33 contra 23 Srs. Deputados, o pedido de negócio urgente do Sr. Pedro Pita.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão a proposta de alteração ao Regimento.
Vai fazer-se a contraprova do número 1.º da proposta.
Efectuou-se a contraprova com contagem.
O Sr. Presidente: - Estão de pó 21 Srs. Deputados o sentados 34. Está aprovado o número 1.°
Está em discussão o número 2.°
O Sr. Pedro Pita: - Sr. Presidente: não há ainda muitos anos que um Ministro das Finanças, o Sr. Pina Lopes, depois de demissionário mandou para o Diário do Govêrno um decreto referente à reforma da Guarda Fiscal, e, perante um decreto publicado em tais condições, o Parlamento não hesitou em suspender a sua execução.
Como do ano para ano só modifica tudo!
Sr. Presidente: águas passadas não movem moinhos, diz o rifão.
Para mim. entendo que não cumpriria o meu dever se, tendo levantado a questão nesta Câmara, não tocasse mais nela.
Infelizmente, quando a Câmara quiser reconsiderar, se quiser reconsiderar, irá encontrar situações criados e erário público mais sobrecarregado.
Interrupção do Sr. Cunha Leal, que se não ouviu.
Sr. Presidente: "águas passadas não movem moinhos". Vou fazer, porém, uma tentativa, mandando para a Mesa um projecto de lei declarando nulo e sem efeito o célebre decreto.
Sr. Presidente, não tem a maioria nenhuma espécie de atenção para com as minorias desta Câmara.
Tendo pedido a palavra para negócio urgente, fi-lo porque, não sendo o Sr. Cunha Leal, leader do Partido Nacionalista, bacharel em direito, deveria o negócio urgente ser pôsto por quem tivesse preparação jurídica, por alguém que tivesse de facto uma função junta dessa minoria
E de estranhar, o estranho-o, que a maioria tivesse negado que o assunto fôsse tratado.
Está no seu direito. Simplesmente não tem u maioria que estranhar, IKMYI ninguém poderá estranhar, que à falta de atenção que houve para connosco nós não correspondamos com demasiada deferência.
Tem sido sempre um êrro colocar as oposições em circunstâncias de se poderem estar em relações de irredutibilidade com as maiorias.
Estabelecem-se assim duas para os outros condições que tornam uns filhos o outros enteados permanentemente; e estabelece-se uma luta entre esses princípios, e do tal ordem, que, ainda que não seja senão por uma questão do ressentimento, não podem ser amistosas as relações entre êsses irmãos.
Sr. Presidente, pretendeu-se fazer aprovar por esta Câmara uma proposta da alteração do Regimento, no sentido do facilitar a discussão do Orçamento. Esta proposta a quem aproveita, principalmente, é a quem governa, pois o Orça. mento dá lhe meios para poder governar.
Da nossa parte a maioria encontrou boa vontade, e corria tudo numa paz tão completa, que a proposta ia sendo discutida som dificuldades. Isto representa que nós estamos a facilitar a vida dos governos futuros da maioria. Se é assim, porque não teve a maioria por nós aquela consideração, deixando tratar do negócio urgente que há pouco por êste lado da Câmara foi apresentado?
O que pode esperar a maioria, nestas condições, da nossa boa vontade na aprovação do medidas que só interessavam à mesma maioria?
O que seria a nossa situação nesse caso? Não tínhamos direito à nossa função só apenas aqui defendêssemos e tratássemos dos interêsses da maioria.
Qual foi a nossa atitude ao discutir-se esta proposta?
Foi a de não a discutirmos na generalidade, e o primeiro artigo foi votado sem
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que nenhum de nós tivesse pedido a palavra. Agora cumpre-nos protestar contra semelhante decreto, que em testamento o Sr. Ministro da Justiça fez publicar no Diário do Govêrno. Por êsse decreto qualquer Ministro da Justiça pode criar as comarcas que quiser!
Acerca dêste assunto o Sr. Ministro do Trabalho disse-me que não concordava com semelhante decreto; quere dizer que nem o Poder Executivo estava de acordo na sua publicação.
Perante êste facto, êste lado da Câmara quere discutir a proposta do alteração do Regimento.
O Sr. Velhinho Correia (em àparte): - O que se tem de fazer é votar os seis duodécimos.
Estabelece-se sussurro.
O Sr. Lopes Cardoso (em àparte): - Nem ao menos a terminologia jurídica foi respeitada!
O Orador: - Desde o dia em que vi aqui o Sr. Ministro da Justiça definir o que era corpo de delito como se fôsse um cabo da esquadra do Rato, fiquei inteirado da sua sciência jurídica!
Eu julguei que a proposta do Sr. Sá Cardoso fôsse de carácter transitório, mas vejo agora que a proposta é de carácter permanente, colocando-nos nas condições de discutir o Orçamento pelo método de João de Deus.
Antigamente aprendia-se a ler soletrando, hoje aprende-se pelo método João de Deus, silabando. Aplica-se ao Orçamento o método João do Deus. Antigamente discutia se o Orçamento artigo por artigo, isto é, soletrava-se; agora discute-se capitulo por capítulo, isto ó, silabando. Aplica-se o método João de Deus ao Orçamento.
Não deixa de ser interessante, mas tem apenas um inconveniente: a discussão do Orçamento nestes termos não passa de ser uma brincadeira. Desaparece a discussão na generalidade. Quere dizer, o modo como o Orçamento é elaborado, o sistema, oã processos são postos de parte, não têm discussão. Faz-se a discussão na especialidade por capítulos, e as diversas emendas que são mandadas para a Mesa, e qual é a discussão delas?
Então, sim, é que se dá a valorização do escudo, e tenho grande fé que o escudo se valorize, pelo que o Sr. Velhinho Correia tem escrito, e como é homem que sabe e que vai para o Banco de Portugal, uma vez 14 , a cousa endireita-se pela certa. A libra passa a valer 30 réis e o dólar fica a 3 por 1 real.
O Sr. Cunha Leal: - V. Exa. pode dizer-me se o Sr. Afonso Costa aceita a presidência do Ministério?
O Sr. Carvalho dos Santos: - Já não vem o Sr. Afonso Costa.
O Sr. António Maria da Silva é que é o escolhido.
Vários àpartes.
O Orador: - Disse já o Sr. Velhinho Correia que tem prejudicado a sua vida com o estudo de questões financeiras, mas desta vez tem recompensa. Vai para o Banco de Portugal; e eu antes quero que vá S. Exa. de quem sou amigo de que outra pessoa que me seja indiferente.
O Sr. Velhinho Correia: - Deixe lá aprovar esta cousa...
O Orador: - Então rejeitam o negócio urgente e a oposição não há-de fazer valer os seus direitos?
Um àparte.
O Orador: - Por que se queixam, se não têm razão nenhuma? Não se lembram de que já houve um momento em que se viveu aqui uma vida de trabalho? E porquê? Porque todos nós somos ciosos dos nossos direitos, do uso dêsses direitos, e porque todos nos sentimos quando apenas se nos opõe o argumento o}p número, que, embora vença, nunca convence. Quando se trata de igual para igual, ou quando se trata com consideração, é fácil trabalhar e produzir obra útil.
Um àparte do Sr. Velhinho Correia.
O Orador: - Vou responder ao àparte ao Sr. Velhinho Correia, mas deixe-me S. Exa. principiar pelo fim. A maioria entendeu dever-me negar a urgência para discutir o caso que eu tinha apresentado, porque não estava presente o Govêrno,
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mas esqueceu-se que ainda anteontem eu tinha requerido que se discutisse sem a presença do Sr. Ministro das Finanças a proposta dos duodécimos, que aproveitava muito mais à maioria do que a nós. Isto esqueceu. E que manifestei uma isenção que, afinal, não passou de uma idiotice; mas prometo não voltar a ser idiota.
O Sr. Velhinho Correia disse que se pode vir a dar o caso de o futuro Govêrno daqui a dias suspender o decreto, e eu disse a S. Exa. que o Ministro que não teve escrúpulo em, depois de demissionário, mandar para o Diário do Govêrno êste decreto, também não os terá em, passados três dias, fazer todas as nomeações e empossar os funcionários nomeados, de modo que, mesmo revogado o decreto, êle não deixará de produzir efeitos no que tem de prejudicial para o Estado. A oportunidade para tratar do caso era agora.
O Sr. Velhinho Correia: - E o decreto já tem o visto do Conselho Superior de Finanças?
É preciso que V. Exa. tenha em conta que, uma vez feitos os despachos de nomeações, os indivíduos nomeados têm direito a ocupar os seus lugares.
Trocam-se explicações entre o orador e o Sr. Velhinho Correia.
O Orador: - Então V. Exa. não vê que nós tínhamos rejeitado que os magistrados que fossem para as ilhas tivessem o benefício de 25 por cento na contagem do tempo de servido, e que isso vem incluído no decreto?
Estabelece-se diálogo entre o orador e o Sr. Velhinho Correia.
Sussurro.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.
O Orador: - Continuando na apreciação do assunto que se discute, declaro que, para se ver a diferença que há entre o que hoje é o Regimento da Câmara e o que passaria a ser se esta proposta fôsse aprovada, é conveniente compararmos as disposições actuais com o que ficaria.
Pelo Regimento actual, a discussão do Orçamento faz-se do seguinte modo: discussão do cada um dos orçamentos na generalidade e discussão na especialidade, por cada artigo; e ou já discuti e votei um Orçamento, em tempos que já lá vão, e que parece que já passaram há um século, de forma que, se cada artigo tinha vários números, ainda se fazia a discussão o votação por cada número.
Tudo isto desaparece, porém, pelo alçapão desta proposta, passando apenas a haver uma só discussão: a da especialidade.
Quere dizer: nunca se foi tam longo, porque sómente uma vez se propôs que houvesse apenas uma discussão na generalidade, que abrangesse todos os orçamentos!
Efectivamente, há absoluta necessidade de uma discussão, pelo monos, na generalidade, onde se façam afirmações do princípios, afirmações doutrinárias.
Sr. Presidente: sem prescindir do direito do continuar a discutir esta proposta, nem de mandar na devida altura para a Mesa um aditamento que declare apenas com aplicação a êste ano as resoluções que se pretendem tomar, termino, enviando para a Mesa a seguinte
Proposta
Proponho a seguinte emenda: em vez de "as três primeiras horas" "as duas primeiras horas". - Pedro Pita.
Tenho dito.
O orador não reviu, nem os apartes foram revistos pelos oradores que os fizeram.
É lida e admitida a proposta do Sr. Pedro Pita.
O Sr. Carvalho da Silva: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: - Estão sentados 51 Srs. Deputados e de pé 2.
Não há número.
Vai fazer-se a chamada para a votação nominal.
Procede-se à chamada.
O Sr. Presidente: - Rejeitou a admissão 1 Sr. Deputado, e aprovaram-na 57 Srs. Deputados.
Está admitida o em discussão a proposta do Sr. Pedro Pita.
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O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: está em discussão o n.° 2.° da plataforma Sá Cardoso, plataforma que deixou de ter oportunidade, visto que se passaram já os factos com os quais ela tinha relação.
Supunha eu, mesmo, que esta última circunstância seria suficiente para que fôsse retirada da discussão a respectiva proposta, tanto mais que nem está presente o sen autor, nem ninguém do Govêrno, e julgo que não estamos dentro do Regimento, discutindo nestas condições.
Mas, se dúvidas pudesse haver sôbre a legalidade desta discussão, elas desapareciam em face da disposição expressa do artigo 176.° do Regimento.
Eu pregunto a V. Exa. com que direito deixa de ordenar o cumprimento do artigo 176.° do Regimento, visto que ninguém pediu a dispensa do Regimento para êste efeito.
O Sr. Sá Cardoso pediu, de facto, a dispensa do Regimento, julgando que se tratava de uma proposta, mas, desde que se convenceu de que se tratava de uma questão prévia, desistiu do sou pedido.
Isto é uma razão mais que suficiente para nos julgarmos autorizados a discutir o assunto o mais largamente possível, pois que, além do cerceamento completo dos direitos do Parlamentar, além do cerceamento absoluto da primeira função de Parlamento, constitui uma manifesta infracção do artigo 176.° do Regimento.
O Sr. Sá Cardoso não pensou devidamente, quando redigiu o documento que enviou para a Mesa.
Basta ler o n.° 2.°, em discussão.
Como é que se pode dizer - "as três primeiras horas da ordem do dia" - quando, nos termos do Regimento, a ordem do dia tem apenas três horas?
Para V. Exa. ter a certeza disto, vou ler o artigo que a êste ponto se refere.
É o artigo 21.°, que foi em tempos alterado, mas que, neste ponto, mantém a mesma disposição.
Por consequência, só em sessão prorrogada a duração da ordem do dia vai além de três horas.
O Sr. Sá Cardoso é que, numa proposta política, atabalhoadamente arranjada na reunião do seu centro, veio dizer que as três primeiras horas da ordem do dia seriam destinadas à discussão dos orçamentos.
O Sr. Ministro da Justiça é que havia de gostar desta disposição, porque, assim, nunca mais se discutia a história das comarcas.
Quando apresentei a minha dúvida à Mesa, uma grande parte da maioria, tendo à frente o Sr. Alberto Xavier, manifestou-se ruidosamente contra mim, querendo, porventura, no seu tem de mofa, dar a entender que eu era um ignorante do Regimento, dizendo que o caso era para ser apreciado na discussão da especialidade.
Esta atitude e a aquiescência do Sr. Afonso do Melo, visto que em contrário S. Exa. se não manifestou, fizeram com que eu me convencesse de que a gaffe legislativa do Sr. Sá Cardoso teria o devido correctivo.
Depois do Govêrno ter anunciado a sua demissão, iniciou-se a discussão dos restantes artigos da proposta dos duodécimos, e au, como sabia que o § 2.° do artigo 109.° do Regimento ordenava que as questões prévias e propostas de aditamento fossem discutidas e votadas primeiro que a lei a que respeitem, interroguei a Mesa sôbre se a proposta do Sr. Sá Cardoso seria ou não discutida na especialidade.
Presidia à sessão o Sr. Domingos Pereira que, com grande surpresa minha e erradamente informado, declarou considerar a proposta do Sr. Sá Cardoso aprovada na generalidade e na especialidade.
Protestei contra o facto e comigo protestaram igualmente as minorias monárquica e nacionalista.
Eu dei a entender que não cederia perante a violência que se pretendia praticar e que usaria de todos os meios ao meu alcance para evitar que ela se praticasse.
Por isso bom foi que, com o acordo da Câmara, e mau grado as nebulosas considerações do Sr. António Maria da Silva para engazupar as minorias, fazendo-lhes ver que estavam enganadas, repito, bom foi que tivesse vingado a boa doutrina, o que, aliás, era de esperar ocupando a Presidência o Sr. Domingos Pereira.
Sr. Presidente: os grandes parlamentaristas - e eu não me considero nesse número - dizem que a principal função do
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Parlamento é a de discutir e votar o Orçamento.
Já no artigo 26,° da "sagrada", ou melhor, da esfrangalhada Constituição, isso se consigna:
Veja, pois, a Câmara como, contra a doutrina dêste artigo, tantas vezes defendida pelo Sr. Afonso Costa, se tem defendido a tremenda inconstitucionalidade de não votar anualmente os impostos.
Dir-me hão que, desde que as receitas sejam votadas, implicitamente fica autorizada a cobrança de impostos.
Mas não é isso que diz a Constituição; não basta aprovar o Orçamento das receitas, é preciso, também, autorizar o Poder Executivo a cobrar os impostos.
Se, realmente, os próprios parlamentaristas entendem que a função primacial do Parlamento é votar os orçamentos, porque não os votamos nós?
O Sr. Velhinho Correia: - Porque muitos entendem como V. Exa., isto é, que a melhor forma de votar o Orçamento, é não o votar.
O Orador: - É exactamente para votar o Orçamento que V. Exa. vota os seis duodécimos.
Discutam-se sim os Orçamentos, mas numa discussão que não seja uma burla.
O termo não é meu: é do Sr. Afonso Costa que bastas vezes o empregou no tempo da Monarquia.
Já em 1922 o Orçamento foi discutido num regime especial proposto pelo Sr. Alberto Xavier e, salvo êrro, êsse regime especial começava por estabelecer que o Orçamento tinha uma discussão na generalidade.
Sr. Presidente: a proposta Alberto Xavier vigorou na discussão do Orçamento no tempo do Govêrno do Sr. António Maria da Silva, apesar das restrições que continha o de a discussão do Orçamento se ter iniciado em data muito anterior à que nos encontramos.
S. Exa. só conseguiu publicar o Orçamento no Diário do Govêrno alguns dias depois de começado o ano económico.
Quere dizer, o Sr. António Maria da Silva, que tanto alarde faz do facto de ter havido orçamentos no tempo do seu Govêrno, esqueceu-se desta circunstância.
Portanto, viveu-se do mesmo modo em regime de ilegalidade, porque S. Exa. não tinha pedido qualquer duodécimo, e tanto assim, que veio depois ao Parlamento pedir um bill de indemnidade.
Aqui está o grande regime de legalidade de que o Sr. António Maria da Silva tanto se gaba, mas que indo agora, provavelmente, tomar conta do Poder, não conseguirá, apesar de todas as violências e de todas as tentativas do Sr. Velhinho Correia.
Não se conseguiu isto com as propôstas Alberto Xavier e António da Fonseca.
Sr. Presidente: certamente, V. Exa. lembra-se em que consistia a proposta António da Fonseca.
S. Exa. em Maio de 1923, veio com uma proposta concebida, pouco mais e a menos nestes termos: a discussão far-se-ia qualquer que fôsse o número do Deputados presentes, e as votações só teriam lugar quando houvesse o número necessário.
Perderam-se 8 ou 10 dias na discussão desta proposta que melhor fora apresentada na discussão do Orçamento, o ainda, à sombra da mesma proposta, foi votada uma outra sôbre estradas, da autoria do Sr. António da Fonseca.
Foi depois disto, que as oposições entenderam dever tomar uma atitude mais enérgica, para evitar essa arbitrariedade, e foi então que a minoria nacionalista, abandonou os trabalhos parlamentares.
Estamos quási precisamente na mesma situação.
Sr. Presidente: eu já sei que o Sr. Velhinho Correia, está de atalaia para propor cousa parecida àquela que se continha na proposta do Sr. António da Fonseca, mas eu já declaro que, se S. Exa. propuser mais restrições, o Orçamento até ao dia 15 do Julho não começa a ser discutido.
Porque isto já é inadmissível o representa um atentado contra a principal função que compete a um Parlamento, além. de ser também uma alteração ao Regimento que só podia ser discutida depois de ter o parecer da respectiva comissão.
Isto fará, em resumo, com que o Sr. Velhinho Correia, vindo com o sistema da rolha, não permitir que falemos durante o tempo que quisermos e entendermos suficiente para nos pronunciarmos.
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O Sr. Afonso Costa, no tempo da Monarquia, em discursos que eu aqui tenho transcritos, em parte, dizia que não consentia que lhe cortassem a palavra, pelo facto de já ter usado dela durante um certo período de tempo.
O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): - No tempo da Monarquia havia a regra de que, quando os orçamentos não estavam aprovados a tempo, continuavam a vigorar os anteriores.
Era isto que a República devia também ter adoptado.
O Orador: - O Sr. Afonso Costa, numa memorável sessão de 19 de Maio de 1908, isto é, nos saudosos tempos da propaganda, a propósito de uma autorização legislativa de duodécimos, levantou-se do lugar que então ocupava, e que me parece que é o que ocupa hoje o Sr. Sá Pereira, e disse:
Leu.
Vejam V. Exas.: no tempo da Monarquia, o Sr. Afonso Costa insurgia-se contra os duodécimos, chamando-lhe uma burla orçamental, quando afinal êles são o "a b c" financeiro da República, constituindo uma cousa absolutamente corrente!
O Sr. Brito Camacho (interrompendo): - Mas quem diz a V. Exa. que o Sr. Afonso Costa não está furioso em Paris, por o Parlamento não ter ainda votado o Orçamento?
Risos.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): - É por isso mesmo que êle para cá não quere vir.
O Sr. Carvalho da Silva (interrompendo): - É até essa a razão porque S. Exa. não vem governar.
O Orador: - Eu também aqui tenho extractos dos discursos do Sr. Brito Camacho no tempo da Monarquia.
S. Exa., com a autoridade e com os conhecimentos que todos nós lhe reconhecemos, disse então que queria uma República proclamada por todos os portugueses, como nós dizemos agora que queremos uma Monarquia proclamada por todos os portugueses.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): - Mas também lhes servia se fôsse apenas proclamada por parte.
Risos.
O Orador: - O Sr. Brito Camacho disse mais que a preocupação dos republicanos era criar escolas, porque não desejavam o analfabetismo.
Eu tenho aqui também um discurso proferido por S. Exa., em Agosto de 1908,. em que S. Exa., ao lado do falecido Sr. João de Meneses, combateu violentamente uma proposta do Sr. Pereira dos Santos, para haver duas sessões nocturnas por semana, dizendo que não podiam, que era uma violência, que era impossível aprovar o Orçamento, etc.
Já vêem V. Exas. com quem estou acompanhado na minha opinião...
O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): - É que os Deputados republicanos dessa sessão legislativa trabalhavam muito.
O Orador: - V. Exa. quere concluir que agora &o não trabalha?
A sua modéstia leva-o até o ponto de se julgar abrangido na classificação de cábulas, com que são agraciados os seus, correligionários?
O Sr. Velhinho Correia: - Eu refiro-me à generalidade dos Srs. parlamentares.
O Orador: - V. Exa. não pode acusar êste lado da Câmara de não trabalhar.
Se não discutirmos mais profundamente e com mais consciência os assuntos de que a Câmara trata, é porque é impossível estudá-los devidamente, dada a brevidade com que são tratados.
O Sr. Velhinho Correia: - Mas veja V. Exa. a sessão de hoje perdida para discutir disposições regimentais que existem em todos os países do mundo!...
O Orador: - Eu hoje tenho tido a sorte de encontrar à mão sempre uma resposta. para dar ao Sr. Velhinho Correia.
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Uma vez, a propósito de um projecto apresentado à última hora, no tempo da Monarquia - levantou-se indignado o Sr. Brito Camacho a protestar.
É testemunha disso o Sr. Jaime de Sonsa.
O Sr. Velhinho Correia: No tempo da Monarquia esperavam que fechasse o Parlamento o punham depois no Diário do Govêrno as leis.
O Sr. Carvalho da Silva: - Isso é o que a República adopta.
O Sr. Jaime de Sousa: - O que havia era um limito para as considerações do qualquer orador, e êste é um princípio que é preciso estabelecer.
O Orador: - Isto vem a talho de foiço e ninguém melhor do que os Srs. Brito Camacho o Jaime de Sousa podem confirmar o que disse.
Mas eu tenho aqui, que posso ler, só S. Exa. insistir muito mais ainda.
Tenho aqui matéria sôbre o Orçamento no tempo da Monarquia que levaria a expor as sessões que S. Exa. quisesse.
O Sr. Velhinho Correia: - Podia adoptar-se o seguinte: não havendo uma proposta orçamental votada a tempo, subsistir a anterior.
O Sr. Brito Camacho: - Havia uma solução ainda melhor: não estando votado o Orçamento até 30 de Junho, considera-se dissolvido o Parlamento.
O Orador: - Há hoje quem entenda que é inútil discutir os orçamentos, não em princípio, mas porque os orçamentos são constantemente falseados.
O que está aqui com um sinal encarnado são créditos votados pelo Govêrno.
São 76:334 contos.
Tirando 35:000, que foram para Angola, o rosto foi consumido em serviços autónomos, até para a próspera Caixa Geral de Depósitos e para outros serviços nos Caminhos de Ferro do Estado.
O Sr. Velhinho Correia tem o costume de invocar o que se passa lá fora.
E o patriotismo de S. Exa. é êste: não quere saber se o que se faz cá é bom ou mau; lá fora faz-se; e se lá fora se faz, é bom!
Eu não sou desta opinião o pela circunstância do lá fora o Orçamento ser discutido desta ou. daquela maneira, não quero que em todas as condições se adopte a doutrina como fundamental.
Não é precedente que possa ser invocado.
Lá fora a discussão do Orçamento pode ser feita em termos mais simples.
Os parlamentares, quando os Governos lhos merecem confiança, e não cometem abusos, assim procedem.
Mas cá dentro não há comparação com o que se passa em Franga, na Itália, na Inglaterra, na China ou no Japão, em que os orçamentos são discutidos doutra forma.
Os Governos dão aí garantias.
Só podem ser admitidas no Orçamento verbas autorizadas.
Nós vamos ter um debato político. Sobe ao Poder por exemplo o Sr. António Maria da Silva, e vamos ter um debato político de, pelo menos, durante três dias. São três sessões, e só faltam dez sessões para o Parlamento se encerrar.
Algumas sessões serão ocupadas com outros assuntos, Serão assim sois sessões ou ainda- monos para discutir os orçamentos do onze Ministérios, serviços autónomos, Caixa Geral de Depósitos, serviços florestais, institutos sociais, etc.
De maneira que, quando muito, teremos para discutir o Orçamento apenas quatro sessões.
Serão doze horas do discussão, só fôr aprovada a proposta do Sr. Sá Cardoso, que ou entendo que não pode ser aprovada.
O Sr. Velhinho Correia quere que se discutam apenas as verbas ai torneias. Porquê?
O Sr. Velhinho Correia: - Só aquelas cuja alteração é solicitada por um certo número de Deputados.
O Orador: - Verbas que precisam ser alteradas, disso S. Exa.
No Ministério da Guerra, por exemplo, há verbas que é preciso reduzir.
Seja como fôr, quer vigorem as disposições da proposta do Sr. Sá Cardoso, quer vigorem quaisquer outras, mais restritivas, a verdade é que não haverá tempo
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para se discutirem os orçamentos até 15 de Julho.
E agora permita-mo V. Exa. que eu faça uma pregunta ao Sr. Velhinho Correia.
Diga-me V. Exa.: para que foi que o Govêrno quis o Parlamento fechado durante o mês de Maio?
Se não fôsse isso, já os orçamentos estariam, por certo, votados.
O Sr. Velhinho Correia: - Não acredito que o Parlamento vote os orçamentos sem que previamente estabeleça disposições especiais para a sua discussão. Não sendo assim, só se conseguirá a votação dos orçamentos uma vez que todos estejam de acordo.
O Orador: - Quere V. Exa. ver como estamos de acordo?
Quando retiniu o Congresso para prorrogar a sessão, eu mandei para a Mesa uma moção manifestando êsse desejo.
O Sr. Velhinho Correia: - O que eu vou propor é que o Sr. Presidente da Câmara marque para a discussão de cada orçamento um número limitado de sessões, findo o qual a matéria seja considerada discutida. É o que se faz em Inglaterra.
O Orador: - O meio em Portugal é diferente.
O que era absolutamente necessário era marcar um prazo às comissões da Câmara para elaborarem os seus pareceres sôbre o Orçamento.
Com que autoridade é que o Sr. Sá Cardoso, fazendo um jôgo político, apresentou aqui esta proposta, quando os pareceres do Orçamento ainda não estão todos distribuídos?
É lamentável que a Mesa não tivesse lembrado aos Srs. relatores dos pareceres a necessidade de cumprirem o seu dever!
Não sei, Sr. Presidente, mas amanhã preguntarei a V. Exa. quantos pareceres estão distribuídos. Quero saber quem são os respectivos relatores para saber se são os mesmos pimpões que aqui costumam protestar contra as nossas afirmações.
Sr. Presidente: se tivesse saúde e resistência garanto a V. Exa. que esta discussão não terminaria emquanto os pareceres do Orçamento não estivessem todos elaborados.
As minorias sentem-se perfeitamente à vontade neste assunto, têm toda a autoridade para o discutir à, larga, porque só à maioria pode ser atribuída a responsabilidade de não se terem distribuído os pareceres, não sabendo nós, portanto, o que pensam as respectivas comissões.
O Sr. Velhinho Correia: - Mas, quem diz a V. Exa. que não há pareceres distribuídos?
O Orador: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que me diga quais são os pareceres do Orçamento distribuídos até agora?
Como é que se pode aprovar a proposta do Sr. Sá Cardoso desde que se tome como ponto de partida, uma discussão que não se sabe como há-de ser feita?
Sr. Presidente: é interessante também o facto de não estarem presentes os Srs. Deputados que compõem o grupo parlamentar da Acção Republicana, com excepção do Sr. Viriato da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Previno V. Exa. do que tem apenas um minuto para poder usar da palavra.
O Orador: - Muito obrigado.
Sr. Presidente: a proposta do Sr. Sá Cardoso, é assinada pelos Srs. Sá Cardoso, Viriato da Fonseca, o único que está presente, António Correia, Manuel Alegre.
O Sr. Manuel Alegre: - Também está presente.
O Orador: - Ora ainda bem que está presente o Sr. Manuel Alegre para S. Exa. dizer o motivo por que assinou esta proposta.
V. Exa. concorda com os termos em que ela está redigida?
Realmente não compreendo que V. Exas. tivessem assinado esta proposta e não digam a razão por que o fizeram.
O Sr. Viriato da Fonseca: - Basta V. Exa. ler o parecer do meu relatório sôbre o orçamento do Ministério das Finanças
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para vêr o interêsse que eu tenho em que seja discutido o Orçamento.
O Orador: - Então se V. Exa. queria que os orçamentos fossem discutidos, não devia ter assinada esta proposta.
O Sr. Viriato da Fonseca: - Achava que assim a discussão era muito mais fácil.
O Orador: - Como havemos amanhã de discutir um orçamento cujo parecer não foi elaborado?
Queremos uma informação do respectivo relator; mas como, se ninguém redigiu o parecer?
Do maneira, que, Sr. Presidente, anda tudo à inversa do que devia andar.
O Sr. Presidente do Ministério que Deus haja, Sr. Vitorino Guimarães, é que foi o principal culpado dêste facto porque, constantemente, trouxe aqui propostas que não fizeram senão empatar a discussão do Orçamento.
Foi a proposta do fundo de maneio, o contrato dos fósforos e várias outras propostas que S. Exa. aqui trouxe, que originaram largos debates.
O adiamento dos trabalhos parlamentares foi unicamente por culpa do Govêrno; porque os governos agora, como têm muito respeito pela Constituição, chegam, batem o pé, e dizem que, Be lhe não votam isto ou aquilo, vão-se embora.
Como ao Sr. António Maria da Silva não convinha que o Govêrno saísse, porque andava a fazer um guisado, o adiamento foi por diante; porém o guisado ganhou esturro e ficou tudo estragado.
Sr. Presidente: também o Sr. Adolfo Coutinho e em testamento fez publicar o decreto das comarcas, que é tudo quanto há de mais ilegal.
S. Exa. não quis publicá-lo durante o interregno parlamentar para se livrar da tunda que calculava apanhar no Parlamento, e por isso reservou essa publicação para agora, porque deve ir à sua terra qualquer dia, bem como outros Srs. Deputados, onde serão recebidos com grande estrondo.
O Sr. Presidente: - É a hora de se encerrar a sessão. V. Exa. deseja concluir
as suas considerações ou ficar com a palavra reservada?
O Orador: - Fico com a palavra reservada.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, tiver devolvido as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
Os "àpartes" não foram revistos pelos oradores que os fizeram.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: foi há pouco rejeitado um negócio urgente apresentado pelo Sr. Pedro Pita.
Apesar de não estar presente nenhum membro do Govêrno, eu quero levantar o meu protesto contra o decreto n.° 10:883, que foi publicado no Diário do Govêrno.
Êste decreto, Sr. Presidente, na sua contextura jurídica tem muito que se lhe diga, tanto mais que traz aumento de encargos para as comarcas criadas.
Uma voz: - Não apoiado.
O Orador: - Traz aumento de encargos, e o Código Administrativo não diz que as câmaras municipais tenham obrigação de sustentar a justiça.
O Sr. Júlio Gonçalves (interrompendo): - V. Exa. está confundido. As câmaras municipais não são obrigadas a lançar impostos, porque é facultivo acoitarem as comarcas ou não.
Trocam-se àpartes entre o orador e vários Srs. Deputados.
O Orador: - Formulo, pois, o meu mais veemente protesto, reservando-me para apresentar uma proposta revogando êste decreto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar, e desejo que isto fique consignado na acta, que não fomos nós que contribuímos para que se realizasse a sessão de hoje. Se isso dependesse de nós, teríamos saído da sala.
Tenho dito.
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O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã à hora regimental, com a seguinte ordem de trabalhos:
Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores que se inscrevam):
Parecer n.° 350 (emendas do Senado) que autoriza o Govêrno a contrair um empréstimo para construção da Escola Industrial de Bernardino Machado, na Figueira da Foz, e a de hoje, menos os n.ºs 948 e 946.
(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam):
A de hoje e parecer n.° 861, que dispensa do pagamento da taxa militar os indivíduos que, tendo prestado serviço de campanha por mais de um ano em França ou em África, foram julgados incapazes do serviço militar.
Parecer n.° 797, que autoriza o Govêrno a ceder à comissão promotora do monumento ao patrão Joaquim Lopes em Paço de Arcos o bronze para o mesmo e a fundição no Arsenal do Exército.
Parecer n.° 196 (emendas do Senado), que cria em Lisboa o Montepio dos Sargentos de Terra e Mar.
Ordem do dia:
A de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 35 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Projectos de lei
Do Sr. Deputado Francisco Cruz, determinando que em designadas condições possa ser requerida aos juizes de direito das respectivos comarcas a criação de assembleas eleitorais primárias.
Para o "Diário do Governo".
Dos Srs. Deputados João Camoesas, Pina de Morais, Ribeiro de Carvalho, Rocha Saraiva e Hermano de Medeiros, isentando de adicionais sôbre as contribuições do Estado a indústria e comércio de livros de autores portugueses.
Para o "Diário do Governo".
Do Sr. Deputado Custódio de Paiva, substituindo os n.ºs 1.° e 2.° e suas alíneas, os n.ºs 4.°, 5.° e 7.° e alínea a) da tabela dos emolumentos judiciais, aprovada pelo decreto n.° 10:291.
Para o "Diário do Governo".
Do Sr. Deputado Pedro Pita, declarando nulo e sem efeito o decreto n.° 10:883, de 27 de Junho de 1925.
Para o "Diário do Governo".
O REDACTOR - Sérgio de Castro.