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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 37

EM 19 DE FEVEREIRO DE 1926

Presidência do Exmo. Sr. Alfredo Rodrigues Gaspar

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Mariano de Melo Vieira

Sumário. - Abre a sessão com a presença de 44 Srs. Deputados.

É lida a acta, que adiante a aprova com número regimental.

Dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Rafael Ribeiro troca explicações com o Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes) acerca do decreto n.° 10:838 e de determinada aplicação do Código de Justiça. Militar. O Sr. Alberto Dinis da Fonseca trata dou interêsses agrícolas da região de Tomar e Abrantes. O Sr. Pereira Forjas pede providências para acudir ao estado de mina em que se encontra a ponte sôbre o nó Lima, e apresenta wn projecto de lei. O Sr. Alberto Jordão refere-se às condições deploráveis em que se encontra o troço de esteada de Elvas ao Cara, trata do regime de trabalho dos presos correccionais, da instrução de recrutasse manda para a Mesa um projecto de lei. Respondem os Srs. Presidente do Ministério (António Maria da Silva e Minislro da Guerra José de Mascarenhas) O Sr. Francisco Cruz protesta contra a apresentação de pareceres, sem que as respectivas comissões tenham reunido.

Ordem do dia. - O Sr. Ministro da Instrução Pública (Santos Silva) apresenta quatro propostas de lei, para que requere urgência, e o mesmo faz o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges} para uma proposta da sua iniciativa, sendo admitidas essas propostas. É rejeitado um negócio urgente do Sr. Ramada Curto para tratar da apreensão de cartas dirigidas a um advogado, tendo usado da palavra os Srs. Vitorino Guimarães, Carvalho da Silva e o requerente. O Sr. Felizardo Saraiva desiste de usar da palavra para tratar da questão das comissões de verificação de poderes, e requere que se suspenda o debate até ser apresentado o acórdão sôbre a eleição do circulo do Funchal O Sr. Sampaio Maia troca explicações com o Sr. Presidente, e sôbre o assunto usam da palavra os Srs. Manuel José da Silva e Carvalho da Silva.

É admitida uma proposta do Sr. Manuel José da Silva e é aprovado o requerimento do Sr Felizardo Saraiva.

O Sr. Fonseca Rosado realiza a sua interpelação sôbre a importação de trigo exótico, feita pela Manutenção Militar, sendo o debate generalizado a requerimento do Sr. Raimundo Alves.

Usa da palavra o Sr. Ministro da Agricultura (Tôrres Garcia).

O Sr. Tavares Ferreira manda para a Mesa o parecer sôbre o orçamento do Ministério das Finanças, apresentando o Sr. Agatão Lança o da comissão dos Negócios Estrangeiras.

É lido na Mesa o acórdão sôbre a eleição do Funchal, que manda proceder a um inquérito.

Os Srs. Mário de Aguiar e Carvalho da Silva protestam, e o último troca explicações com o Sr. Presidente acerca da ordem dos trabalhos.

Antes de se encerrar a sessão. - E dada a palavra ao Sr. Pedro Pita, mas o Sr. Carvalho da Silva reclama para si êsse direito. Levantam-se reclamações, e a sessão encerra-se, marcando-se a imediata para o dia 22.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. - Substituição na comissão do orçamento. - Renovação de iniciativa. - Acórdão. - Projectos de lei. - Propostas de lei. - Pareceres. - Nota de interpelação.

Abertura da sessão às 15 horas e 15 minutos.

Presentes à chamada 44 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 65 Srs. Deputados.

Srs. Deputados que responderam à chamada:

Adolfo do Sousa Brasão.
Adolfo Teixeira Leitão.
Alberto Carlos da Silveira.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alexandre Ferreira.
Alfredo Pedro Guisado.
Alfredo Rodrigues, Gaspar.
António Augusto Álvares Pereira Sampaio Forjaz Pimentel.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Ferreira Cabral Pais do Amaral.
António José Pereira.
Artur da Cunha Araújo.
Artur Saraiva de Castilho.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bernardo Pais de Almeida.
Carlos de Barros Soares Branco.
Dagoberto Augusto Guedes.
Domingos António de Lara.
Domingos Leite Pereira.
Felizardo António Saraiva.
Filemon da Silveira Duarte de Almeida.
Francisco Godinho Cabral.
Henrique Maria Pais Cabral.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João da Cruz Filipe.
João Tamagnini do Sousa Barbosa.
Joaquim Toscano Sampaio.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carlos Trilho.
José Maria Alvarez.
José Mendes Nunes Loureiro.
José de Moura Neves.
José Rosado da Fonseca.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Laís da Costa Amorim.
Luís de Sousa Faísca.
Manuel da Costa Dias.
Manuel José da Silva.
Rafael Augusto de Sousa Ribeiro.
Viriato Sertório dos Santos Lobo.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Zacarias da Fonseca Guerreiro.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Abel Teixeira Pinto.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Diais da Fonseca.
Alberto do Moura Pinto.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alfredo da Cruz Nordeste.
Álvaro Xavier do Castro.
Amâncio de Alpoim.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
Angelo de Sá Conto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Pereira Peixoto Beleza.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Rodrigues.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António Lobo de Aboim Inglês.
António Maria da Silva.
António do Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Marques Guedes.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Virgínio do Brito Carvalho da Silva.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Custódio Lopes de Castro.
Custódio Martins de Paiva.
Daniel José Rodrigues.
Delfim Costa.
Domingos Augusto Reis Costa.
Eduardo Fernandes de Oliveira.
Eduardo Ferreira dos Santos Silva.
Elmano Morais Cunha e Costa.
Filomeno da Câmara Melo Cabral.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cruz.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime António Palma Mira.
João José da Conceição Camoesas.
João Lopes Soares.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Pina do Morais Júnior.
João Raimundo Alves.
João Salema.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Maria do Oliveira Simões.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José António do Magalhães.
José Domingos dos Santos.
José do Valo do Matos Cid.
Lourenço Correia Gomes.
Luís Gonzaga da Fonseca Moreira.
Manuel Alegre.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Manuel Serras.
Mariano do Melo Vieira.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.

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Pedro Góis Pita.
Raul Lelo Portela.
Raúl Marques Caldeira.
Rodrigo Luciano de Abreu e Lima.
Severino Sant'Ana Marques.
Vasco Borges.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Alberto Nogueira Gonçalves.
Alberto Pinheiro Tôrres.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro da Cunha Porreira Leite.
António Albino Marques de Azevedo.
António Alves Calem Júnior.
António Araújo Mimoso.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António José de Almeida.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Rebêlo Arruda.
Carlos Fuseta.
Diogo Albino de Sá Vargas.
Domingos José de Carvalho Araújo.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Guilhermino Alves Nunes.
Henrique Pereira de Oliveira.
Indalêncio Frodano e Melo.
João Baptista da Silva.
João Bernardino de Sousa Carvalho.
João Estêvão Aguas.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Brandão.
Joaquim Nunes Mexia.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José Vicente Barata.
Luís António Guerreiro Júnior.
Luís Vieira de Castro.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel Homem de Melo da Câmara.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Rui de Andrade Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.

Ás 15 horas principiou a fazer-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 44 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Leu-se a acta.

Deu-se conta do seguinte

Ofícios

Do presidente do Conselho Superior de Finanças, comunicando ter dado entrada na Secretaria Geral do mesmo Conselho um contrato celebrado entre a Faculdade de Medicina da Universidade do Pôrto e Alfredo Pinheiro para secretário do Instituto de Higiene, anexo à mesma Faculdade.

Para a comissão de contas públicas.

Do Ministério das Finanças, respondendo ao ofício n.° 261, transmitindo o requerimento do Sr. João Tamagnini Barbosa.

Para a Secretaria.

Do Sr. Ministério das Colónias, satisfazendo ao requerido pelo Sr. Carlos de Vasconcelos, comunicado no ofício n.° 265.

Para a Secretaria.

Telegrama

Do administrador do concelho de Nelas, pedindo para ser pôsto na ordem do dia o projecto restabelecendo os administradores de concelho.

Pura a Secretaria.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Vai entrar-se no período de "antes da ordem do dia".

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4 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Rafael Ribeiro: - Sr. Presidente: há dias, dois ilustres membros desta Câmara, os Srs. Marques Loureiro e Carvalho da Silva, chamaram a nossa atenção para o facto de o Poder Executivo estar exhorbitando das soas funções, legislando sôbre matéria que é da exclusiva competência do Poder Legislativo. Os dois ilustres parlamentares protestaram então contra a matéria do decreto n.° 11:440, de 9 do corrente, que, sob o pretexto de regulamentar o artigo 8.° da lei n.° 1:668, do 9 do Setembro de 1924, aumentou o imposto criado por essa lei.

Sr. Presidente: há um preceito constitucional, a alínea a) do artigo 23.°, que nos diz que é privativo da Câmara dos Deputados a iniciativa sôbre impostos. £ Corno entender, pois, que o Poder Executivo lance impostos? Não é já só o caso do decreto n.° 11:440. Antes, pelo decreto n.° 10:838, de 9 de Junho, o Sr. Vitorino Guimarães, Ministro das Finanças de então e hoje leader da maioria desta Câmara, fez a mesma cousa.

Segundo o disposto na base C da lei n.° 1:770, de 25 de Abril, os acendedores portáteis e isqueiros só são permitidos depois de pagarem um imposto de sêlo que não excederá 30$ cada um, além do custo do solo metálico e das taxas do contrastaria que forem exigidas. Nada mais do que isto diz a lei sôbre impostos a pagar pelos acendedores portáteis e isqueiros. (?Pois o que fez o Sr. Vitorino Guimarães ao regulamentar a lei n.° 1:770?

Veja-se o que diz o § único do artigo 37.° do decreto n.° 10:838: o imposto do sêlo será, dentro de cada ano civil, de quantia invariável, seja qual fôr a data do seu pagamento. Eis um imposto novo demarcado, não por nós, pelo Poder Legislativo, que para isso temos competência privativa, mas pelo Poder Executivo! Se a lei nos diz que os acendedores portáteis e isqueiros só serão permitidos depois de pagarem um imposto de sêlo que não excederá 30$ cada um, como é que o Poder Executivo, regulamentando esta disposição, vem dizer, não que o imposto será de 30$, como manda a lei, mas que será, dentro do cada ano civil, de quantia invariável, seja qual fôr a data do seu pagamento? Como assim?

Mas o Sr. Vitorino Guimarães não se ficou por aqui. Em vez de, dentro das disposições da lei, só regulamentar o pagamento do imposto de 30$ devidos pelos acendedores portáteis e isqueiros, alargou-se mais, e foi até à tributação de quaisquer outros objectos portáteis destinados ou aplicáveis a substituir o uso dos palitos ou pavios fosfóricos. Isto não é uma disposição legal, pois que ela não consta da lei n.° 1:770.

Sr. Presidente: parece-me que o Sr. Vitorino Guimarães caiu sôbre a alçada da chamada lei de responsabilidade ministerial, pois que a doutrina do § único do artigo 37.° do decreto n.° 10:838 é um crime contra a guarda e o emprego constitucional dos dinheiros públicos, porquanto só trata da ilegal o arbitrária imposição dum tributo, e, consequentemente, de indevida cobrança de impostos.

Sr. Presidente: e já que falei sôbre os diplomas referentes à importação e fabrico dos fósforos, não quero também deixar do chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para uma incompreensível disposição do decreto n.° 11:148, de 15 de Outubro último, que estabeleceu o tipo do acendedores e isqueiros.

Diz o artigo 3.° dêsse decreto, que são" considerados portáteis, para o efeito da proibição, quaisquer tipos de acendedores ou isqueiros de fabrico nacional. E quanto aos do fabrico estrangeiro? Êsses são privilegiados?

Sr. Presidente: estando no uso da palavra, aproveito a ocasião de pedir ao Sr. Ministro das Finanças o favor do transmitir ao seu ilustre colega da Guerra as considerações que passo a fazer.

O general comandante da 2.ª Divisão do Exército está interpretando erradamente a disposição do artigo 249.° do decreto n.° 11:292, do 20 do Novembro, ou? seja do Código do Justiça Militar. Diz essa disposição que os oficiais que desempenharem funções nos tribunais militares devem ser habilitados com um curso professado numa escola militar, exigido para. a promoção a oficial do quadro permanente e pertencer ao activo do exército e da armada, quando outra cousa não fôr determinada no presente Código. Vista esta disposição, pregunto: Quais são os escolas militares que habilitem para a promoção a oficial dos quadros permanentes? Responde a base 12.ª do decreto n.° 11:294, de 30 de Novembro, que cla-

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ramente diz que os estabelecimentos do instrução militar destinados a preparar os oficiais de carreira para os quadros permanentes são a Escola Militar e a Escola Central do Sargentos. Ora, sendo assim, como entender, que o general comandante da 2.ª Divisão do Exército não nomeie para fazer parte do júri do tribunal de Viseu os oficiais que têm o curso da Escola Central de Sargentos, nomeando só os que têm o curso da Escola Militar? Isto é arbitrário o ilegal.

Um outro assunto, para o qual peço a atenção do Sr. Ministro das Finanças, com o pedido de o transmitir ao seu colega da Guerra: é a maneira como se está cumprindo a disposição do artigo 32.° da lei n.º 1:668, de 9 de Setembro de 1924. Por disposição dêste artigo foi mandado abonar aos sargentos do exército, sob a rubrica do "Subsídio de alimentação", a importância que então era despendida com a alimentação dos cabos o soldados do exército, incluindo a ração de pão. Pois os jurisconsultos do Ministério da Guerra entenderam que tal disposição só se entende com os sargentos do activo. Esta interpretação não é jurídica nem legítima, e por isso de esperar é que se lho ponha cobro.

Tenho dito.

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - O Sr. Rafael Ribeiro acaba de tratar um assunto que já está merecendo a minha atenção, porque reputo bastante omissa o de difícil execução a nossa legislação sôbre o uso dos isqueiros o acendedores, porque além dos inconvenientes e dificuldades a que o Sr. Rafael Ribeiro se referiu, outra dúvida muito maior se levanta, qual é a do saber quando só deve incriminar e punir o uso dos acendedores.

Já encarreguei o juiz auditor do Supremo Tribunal do Contencioso Fiscal de elaborar um decreto para ir ao meu exame, e nossa ocasião terei oportunidade para estudar o aspecto da questão que o Sr. Rafael Ribeiro acabou de levantar.

Não só trata de um imposto novo, mas sim de uma taxa, e sabe S. Exa. a diferença grande que existo entre uma e outra cousa.

Mas, emfim, é um assunto a estudar, não tratarei oportunamente dele, tomando na devida consideração as observações de S. Exa.

Transmitirei ao Sr. Ministro da Guerra as reclamações que S. Exa. fez, com relação a assuntos que correm pela sua pasta.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Alberto Dinis da Fonseca: - Sr. Presidente: ontem o meu amigo e ilustre parlamentar, Sr. Artur Castilho, fez-se eco nesta Câmara de uma campanha que se vem fazendo contra determinadas regiões, o que eu julgo gravo para os interesses do País.

Como as principais regiões visadas são os concelhos de Tomar e de Tôrres Novas, que pertencem ao meu círculo eleitoral, eu julgo do meu dever fazer algumas considerações, a fim de esclarecer o problema.

O ilustre parlamentar, Sr. Artur Castilho, pôs o problema com aquela correcção e imparcialidade que são próprias do seu carácter, dizendo que era necessário estudar devidamente o assunto.

Assim deve ser, mas parece-me que não é assim que o entendem certos elementos que, tomando o número e o seu próprio interesso como razões justificativas, pretendem resolver injusta e precipitadamente um problema que deve ser muito bem ponderado em todos seus aspectos.

Se só pretende que não só aplique aguardente de figo nos vinhos generosos, estamos de acordo; se se pretende que não se distilo farinha do pau ou cereais necessários à alimentação pública, também estamos de acordo; mas se, porventura, se quere ir mais além, e se se pretende que os povos dessas regiões distilem e vendam livremente o seu figo, com isso é que não estamos de acordo.

O figo, nessas regiões, é consumido, na própria alimentação - o figo bom - ou na distilação - o figo do monte -, e a razão por que se distila não é só porque se não come todo, mas sim porque os resíduos que ficam depois da distilação servem para alimentação do gado.

Não há na lei qualquer preceito que proíba essa distilação, nem há interêsses que possam ser invocados para que ela não seja permitida.

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6 Diário da Câmara dos Deputados

Diz-se que a aguardente de figo luto deve ser aplicada nos vinhos; mas eu afirmo que, desde que ela seja devidamente rectificada, poderá servir para tal efeito.

Diz-se mais que o álcool de figo não é álcool industrial, que não é igual ao de vinho, e que não pode nem deve ser aplicado nos vinhos.

Ora o álcool de figo, depois de devidamente rectificado, não se distingue do álcool vínico.

O Sr. Dogoberto Guedes (interrompendo): - V. Exa. defende então que se beneficiem os vinhos com álcool de figo?

O Orador: - Êsse problema foi recentemente tratado na Revista Agrícola Portuguesa, e tem dois aspectos. Porém, o mais importante é o aspecto económico.

E certo que nós devemos proceder de maneira a que lá fora só acreditem as marcas dos nossos vinhos; mas é preciso que também atendamos a que os seus preços devem ser abordáveis.

O Sr. Visconde de Pedralva, quando foi Ministro da Agricultura, disse que não era necessária a importação de álcool, visto que nós tínhamos cá um produto que podia ser aplicado em igualdade do circunstâncias.

Para que vamos nós, pois, prejudicar essas regiões se todos são agricultores? E não são só os interêsses do sul, mas também os do Douro, que são prejudicados.

Repito: se se fala da proibição da distilação de milho, de trigo, de farinha de pau, de melaço, de açúcar, etc. está bem; mas com relação a um produto como o figo, que é, naturalmente, fermenticida, isso é que não está certo.

O que é preciso é evitar as falsificações.

Na Revista Vinícola, página 66, V. Exas. encontram o seguinte:

Leu.

Como V. Exas., vêem é preferível o emprego da aguardente de figo para vinhos de consumo imediato.

O Sr. Dagoberto Guedes: - Dizem que se encorporam mais fàcilmente e é mais económico.

O Orador: - Para os vinhos generosos é preferível o álcool puro.

Eu quis varrer a minha testada, e também porque entendo que devemos atender as reclamações na medida do possível.

Apoiados.

O discurso será publicado na íntegra t revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Dagoberto Guedes não fez a revisão dos seus "àpartes".

O Sr. Pereira Forjaz: - Sr. Presidente: não sei se só encontra na sala o Sr. Ministro do Comércio ou algum membro do Govêrno porque antes de fazer as considerações parei as quais pedi a palavra desejo chamar a atenção do titular na pasta do Comércio para o estado em que se, encontra a velha e histórica ponte que passa sôbre o Lima e que deu o nome à mais linda vila de Portugal: Ponte de Lima. E urgente que S. Exa. mando proceder a uma vistoria e às mais urgentes reparações, pois ameaça ruína êsse monumento nacional. O rodar de camiões pesadíssimos têm feito progredir assustadoramente o estado do deterioração. Espero que o Sr. Ministro do Comércio determine prontas providencias.

Pedi a palavra para apresentar um projecto de lei que tem por fim inaugurar eficientemente aquilo que se poderá denominar a política da família; e digo inaugurar, porque as medidas já promulgadas sôbre vinculação da terra e imposto de rendimento não tem tido aquela constante aplicação que ora para desejar.

Numa das últimas estatísticas demográficas verifica-se que no distrito de Lisboa, em 1918, morreram 38:000 pessoas e nasceram apenas 20:000 crianças. No distrito do Pôrto, em 1919, nasceram 19:000 crianças e 20:000 foi o número dos óbitos! Isto denuncia uma baixa de natalidade que se irá avolumando só não lhe acudirmos depressa; isto seria até um tenebroso índice dum suicídio nacional! As raças suicidam-se como os indivíduos; no século IV A. C. a Grécia florescente decaiu depois que Platão e Aristóteles popularizaram a esterilidade; dois séculos após a mesma Grécia já não tinha soldados para opor às legiões romanas e perdia a sua independência.

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Se Portugal não tem braços que cheguem para si próprio e deixa incultos os latifúndios alemtejanos, como os há-de ter para amanhar as suas vastas colónias? A Itália tem uma hiper-população e não tem domínio colonial, vão divulgando os publicistas que mais de perto privam com o Duco. Esta fórmula, que eu colhi na própria Itália e a dois passos de Mussolini, é própria para nos fazer reflectir. Quando se falava na Alemanha da eventualidade duma guerra com a França, os alemães diziam sorrindo: "Como poderemos nós ser vencidos? Não teremos a combater senão exércitos compostos de filhos únicos". Todos sabemos que esfôrço foi necessário a todo o mundo para que a soma das batalhas que a França anualmente perdia, na frase de Moltke, não produzisse uma grande derrota da latinidade.

Ora a família portuguesa tem já hoje muitos germes de derrocada No domínio das ideas o sou principal adversário é o individualismo revolucionário, que conduz ao direito ao divórcio, ao direito ao adultério, à união livre; no domínio dos costumes, a organização da luxúria, as práticas anticoncepcionais e abortivas; mas onde se encontram a meu ver os principais venenos da família, êsses que fazem aproximar a catástrofe a largos passos, é na economia e na legislação.

Ao ver tantos trabalhadores exercendo o seu mester em péssimas condições e repousando em tugúrios de morte lenta, onde vivem de fome, e viver de fome, ainda é pior que morrer do fome, tanta mulher abandonando o lar atrás de uma profissão, como se para trabalhar deixasse de ser mulher, tanta criança a exercer esfôrço superior ao seu organismo, eu tenho vontade de gritar aos dirigentes desta sociedade: "Tomai sentido, porque, se criais riqueza, destruis simultaneamente o lar!".

É para a promulgação de leis favoráveis à família que devemos aqui chamar a vossa esclarecida atenção.

Como pode hoje um português, de mediana abastança, com seis ou mais filhos, educar a todos convenientemente?

As propinas de matrícula em todos os estabelecimentos de ensino do Estado são pesadíssimas. Os livros, sobretudo os estrangeiros, são imensamente caros! Assim se vai alastrando o neomaltusianismo e a moda tenebrosa do filho único.

E se as famílias são numerosas, na ânsia de que os mais velhos comecem a ganhar, nem as primeiras letras lhe são ensinadas e surgem perante a civilização êsses produtos tam saborosamente portugueses: os analfabetos. Se os filhos cursam instrução primária, vá de os empregar em seguida. Lugar ao raquitismo Nacional e a essa anemia cerebral colectiva, que os comícios tem alimentado. O projecto do lei que vou mandar para a Mesa modifica, em conjunto, todas as propinas em todos os estabelecimentos do ensino em Portugal; do que era um imposto individual faz-se um imposto familiar; no que era uma tributação constante faz-se uma tributação proporcional.

Exemplificando, consideremos uma propina actual de 40$. Mediante a multiplicação pelo coeficiente geral que proponho 6-n/4, em que n representa o numero de filhos do chefe de família, essa propina, torna-se função dos encargos que pesam sôbre êsse chefe; se êle tem um filho único é n igual a um e a propina eleva só para 50$; se tem dois filhos, n igual a, dois e a propina mantém-se em 40$; se têm três filhos é n igual a três e a propina passa a 30$; se tem quatro, a propina vai para 20$; se cinco, a propina, baixa a 10$ apenas; se tem seis ou mais a propina anula-se e daí em diante o Estado ministra instrução gratuita. Todas as deficiências que uma lei assim genérica pode conter, julgo que estão previstas.

Há um casal pobríssimo com um único filho a educar? Apresenta um atestado de pobreza e os conselhos poderão isentar da matrícula 5 por cento da sua população escolar. Ficam lesados os interêsses do Estado, o que só a experiência pode dizer? Nada mais fácil de o remediar acrescendo às matrículas uma faixa conveniente. O que é necessário é que as famílias numerosas sejam fortemente protegidas por uma nação que precisa delas a todo o transe para viver e para progredir. A Academia Francesa distribuiu em 1925, ao lado dos prémios de virtude Montyon, 315 prémios às famílias mais numerosas. Nós que não temos prémios as distribuir, compensá-lo hemos pela medida que acabo de apresentar.

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Foi com muito prazer que eu vi no Congresso Luso-Espanhol de Coimbra o professor Vitorino Guimarães, ilustre leader da maioria e então Presidente do Ministério, manifestar, logo no princípio do seu discurso o seu culto peia família. Efectivamente, a Pátria, como sindicato de família, tem do ser considerada em segundo lugar, no domínio do sentimento. E para a crise do lar que deve ir neste momento a nossa atenção, e a instrução dos filhos desempenha nessa crise um papel primordial. Conta-se que Afonso de Albuquerque durante uma grande tempestade, em que a sua caravela esteve prestes a sossobrar, tirou uma criança dos braços da mãe e elevando-a para o Céu, disse : "Deus! Por amor dêste inocente dignai-vos perdoar aos culpados!" Seja também a protecção que dispensarmos às crianças portuguesas como que o pára-raios que afaste de nós aquele castigo colectivo que por tantas culpas acumuladas temos merecido!

Nessa orientação envio para a Mesa êste projecto de lei que tende a alcançar uma mais justa repartição no imposto das propinas.

Projecto de lei

Artigo 1.° Todas as propinas a pagar nos estabelecimentos de ensino são modificadas mediante a multiplicação pelo coeficiente - em que n representa o numero de filhos do pai do educando.

Art. 2.° A formula constante do artigo 1.° não é aplicável às matriculas que dizem respeito a trabalhos laboratoriais nem a quaisquer outros que importem despesas para os estabelecimentos de ensino.

Art. 3.° Nos requerimentos de matrícula deve mencionar-se o número do irmãos dos educandos, fazendo-se a prova de existência dêstes pelos meios legais.

Art. 4.° Mediante a apresentação de atestados de pobreza pelos educandos, os Conselhos Escolares poderão isentar do propinas até õ por cento das populações escolares correspondentes.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrário.

O Sr. Alberto Jordão: - Sr. Presidente: nesta casa do Parlamento raro é o dia em que não é reclamada a presença do Sr. Ministro do Comércio, sem que, todavia, S. Exa. se digne aqui comparecer.

Nestas condições, eu peço a atenção do Sr. Presidente do Ministério para as considerações que vou fazer, pedindo a S. Exa. do antemão que as minhas reclamações não sejam atiradas para o cesto dos papeis velhos.

Toda a gente tem pedido a atenção do Govêrno para o problema das estradas, o mais momentoso dos que actualmente afectam a economia nacional. O caso, porém, que eu vou apresentar é daqueles que colidem com e brio nacional. O bocado de estrada, que liga Elvas ao Caia, no caminho do Badajoz, é o pior que pode imaginar-se.

Já tem sucedido por mais de uma vez que alguns indivíduos que se encontram em Badajoz, querendo regressar ao País, por mais que procurem um carro para o transporte, recebem invariavelmente esta resposta: "Os carros espanhóis não servem para serem danificados nas estradas ordinaríssimas do Portugal".

Eu pregunto se isto não é um caso de brio nacional?

E absolutamente necessário acabar com êste indecoro nacional.

O Sr. Fernandes de Oliveira: - Eu já fiz essa reclamação Trata-se do uma empreitada, mas até hoje o empreiteiro nada fez, é já lá vão mais do dois meses.

O Orador: - Eu recomendo o caso ao Govêrno e espero que êle o tomará na devida conta.

Desejo ainda chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério pelo que se refere à situação dos indivíduos que estão a cumprir penalidades correcionais e que passam o dia em imaginários trabalhos.

Nalgumas comarcas dá-se o caso extravagante que vou referir. Esto regime é uma panaceia que serve esplendidamente aos vadios que conseguem assim passar uma vida admirável. O que pensará o Govêrno, e especialmente o Sr. Ministro da Justiça, sôbre isto?

Visto que está presente o Sr. Ministro da Guerra, desejava ainda solicitar a atenção do S. Exa. para o seguinte: Sou informado do que a instrução a recrutas se está ministrando por meio de núcleos de instrucção. Os mancebos que

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deverão pertencer a determinada unidade vão todos para uma certa povoação e vão agregar-se, muitos em determinado regimento. É no núcleo que se lhes ministra a instrução os oficiais são em geral completamente desconhecidos para êle.

Há muitos que ficam sem fazerem a escola do recrutas a que têm direito, e daí deve haver - julgo eu - prejuízo para a própria instrução, ou, melhor, para a vida do soldado e para aquela relativa intimidade que deve haver entre êle e os seus superiores. Depois são mandados para as suas respectivas unidades, e encontram-se do novo em face de sargentos e oficiais absolutamente desconhecidos também. É uma situação que, de momento, lhes pode trazer cortas dificuldades. Parece me isto tudo um mau sistema, salvo o devido respeito pela opinião do Sr. Ministro da Guerra, porque creio que a criação dos referidos núcleos é da iniciativa do S. Exa.

Mas há mais ainda. Havendo alguns oficiais, muito zelosos como militares, que foram ao Ministério da Guerra pedir a atenção de quem de direito para êste assunto, possivelmente até que não só tivessem dirigido ao Sr. Ministro da Guerra - e eu estou quási certo que não foi efectivamente a S. Exa. que se dirigiram - ouviram esta estranha resposta: Vocês terão muita razão, mas nós queremos que assim seja!

Acho, Sr. Presidente, que, como argumento, é... pouco!

Eu agradeceria, pois, ao Sr. Ministro da Guerra a fineza de me elucidar sôbre a questão que acabo de versar.

Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para mandar para a Mesa um projecte de lei relativo aos armazéns gerais e industriais.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O projecto de lei vai adiante por extracto.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Alberto Jordão versou um problema altamente interessante: o das estradas.

Se a memória me não atraiçoa, aquela estrada a que S. Exa. se referiu já está convenientemente dotada. Eu desejarei muito que a sua reparação se faça, não pelos processos que tecnicamente se têm usado mas por aqueles que nos dêem a convicção de que, durante certo tempo, valerão alguma cousa. Sem utilizar a ferramenta indispensável e o material suficientemente resistente, é despender dinheiro, com a certeza de que, tempos passados, voltaremos à mesma situação.

Efectivamente a questão a que se refere o Sr. Alberto Jordão representa qualquer cousa de deminutivo para o nosso brio. Os passageiros que chegam nas condições que S. Exa. apontou à fronteira portuguesa, são obrigados a ir a pé até à localidade onde se dirigem e, de resto, preferem isso a qualquer meio de transporto por estradas, tal é o estado em que elas se encontram.

Folgo em poder dizer à Câmara que a proposta de lei sôbre estradas prometida na declaração ministerial, e que é um dos assuntos de capital importância para êste Govêrno, vai ser apresentada na semana próxima à consideração do Congresso da República. Está já na última revisão, e eu muito folgo em que V. Exas., os ilustres membros desta casa do Parlamento e os da outra, lhe dêem sanção final, satisfazendo assim as aspirações de todos nós, que são as aspirações do País, e colocando o instrumento primacial do tráfego nas condições de poder satisfazer à finalidade a que se destina.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (José de Mascarenhas): - Sr. Presidente: devo declarar que foi com a maior satisfação que ouvi o Sr. Alberto Jordão referir se a um assunto de ordem militar.

Não considero o exército como uma casta isolada; é-me, sempre, por isso, muito agradável ver que civis só interessam pelas questões que dizem respeito ao exército.

Os núcleos do instrução não foram feitas pelo mero capricho de quem quer que fôsse, como S. Exa. pareceu querer dar a entender, quando aludiu à resposta que no Ministério da Guerra fora dada aos oficiais do que falou.

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Êsses oficiais não tinham que tratar do assunto, nem que fazer observações. Dentro do exército as ordens cumprem-se e nada mais há que retorquir. Mal de noa se os inferiores estivessem constantemente a discutir as ordens dos seus superiores.

Mas, referindo me directamente ao assunto por S. Exa. versado, eu dir-lhe-hei que a medida adoptada não representa de modo algum uma inovação. Já foi o ano passado tentada e com magníficos resultados em todos os países da Europa.

Se S. Exa. tivesse lido o que ultimamente se publicou em França sôbre os núcleos de instrução a recrutas, veria que lá, como na Itália, se foi muito mais longe ainda. Nós não o podemos fazer porque não dispomos dos grandes recursos que êsses dois países têm: campos de instrução, etc.

A escola de recrutas não pode ser dada nas unidades, porque é necessário tirar o instrutor à vida dos grandes centros.

Quando se trata de dar instrução aos recrutas é necessário também que os chefes apreendam alguma cousa. Nós não podemos ter um efectivo de guerra, durante a paz, nas unidades.

Para cada unidade iriam uns tantos recrutas, mas pelo processo que se usava, que instrução poderíamos ministrar a um coronel, um major?!

Passavam os anos e êles nunca poderiam comandar um regimento.

O que leva muita gente a falar é o prejuízo que pode advir para o comércio e para as próprias famílias dos recrutas; mas nas questões militares, que têm um interesse nacional, visto que o exército se fez para a defesa do País, temos de pôr de parte os interêsses particulares, para olharmos de muito mais alto os assuntos.

Temos de dar à tropa a instrução que lhe deve ser dada. Mas pelo novo sistema que se adopta, poderemos obter a instrução do coronel, do major e de todos os oficiais por aí abaixo.

Mais tarde tentaremos, eu o farei ou, se eu não. estiver já nestas cadeiras, quem vier substituir-me estou certo que o fará, porque isto foi estudado e aprovado no Estado Maior do Exército, levar a instrução até ao comandante do regimento e até ao próprio general talvez.

Nós não temos, infelizmente, nem a terça parte do material que devíamos ter nas unidades.

Com cavalos sucede o mesmo.

Ora suponhamos que um determinado regimento tem 20 cavalos, para onde são mandados 150 recrutas; outro há que tem 30 e para lá vão também uns tantos recrutas. Se eu juntar os cavalos de que dispõem essas duas unidades, posso ministrar uma instrução mais frequente e mais igual a todos os homens, que doutra maneira não conseguiriam instrução senão do longe em longe.

Lá fora ainda gê vai mais longa: instruem-se recrutas fora das cidades por completo, por forma a constituírem grandes unidades...

O Sr. Alberto Jordão: - V. Exa. dá-me licença?

Uns oficiais vão para fora, ficando somente alguns. Parece-me- que êsses oficiais são prejudicados sob o ponto de vista de promoção.

O Orador: - V. Exa. desconhece esta parte, e não é obrigado a conhecê-la.

Uma das condições de promoção ao pôsto imediato é terem uma escola de recrutas.

De maneira que os nomeados para a instrução de recrutas são os oficiais que necessitam dessa instrução.

Pareço-lhe que ficam prejudicados, mas não ficam.

Os que estão à frente são os que têm primeiro que ir.

Se se fossem buscar outros, então é que os outros podiam ser promovidos, prejudicando os que tinham necessidade desta instrução para promoção.

E uma cousa necessária; é da lei. Não sou eu que o determino; nem eu assumia a responsabilidade de tal facto.

Podiam amanhã vir dizer-me que não podiam ser promovidos por não terem instrução.

Se não houver oficiais nestas condições, evidentemente, quando recebam instrução, são os outros.

Não podia gastar dinheiro ao Estado, indo buscar outros oficiais a outros regimentos, quando os tinha ali.

Essa forma, a que V. Exa. se refere, existia nos exércitos permanentes.

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Teve o seu tempo, na guerra.

Nem por isso os soldados ficaram peores, é certo.

Mas está posta de parte hoje.

Não há que atender a pessoas. Tanto faz o oficial ser dêste ou daquele regimento; isto tanto na guerra como na paz.

Os soldados não conhecem os oficiais: o que prevalece, principalmente, é a instrução que deve ser ministrada.

Doutra maneira ficaremos neste gâchis em que temos vivido até hoje.

O Sr. Aboim Inglês: - A que critério obedece êsse ponto?

O Orador: - Evitar o transporte de muito material, e portanto, redução de despesa.

O segundo ponto é abastecer as unidades.

Também há a qualidade.

O Sr. Aboim Inglês: - Tive de assistir ao transporte; e vi atirarem-se com as armas...

O Orador: - A culpa não é de ninguém. É apenas de o exército não dispor de material suficiente.

Já V. Exa. vê que o atirarem as armas...

O Sr. Aboim Inglês: - Eu não sou técnico; mas não há um limite? Não são duplicados?

O Orador: - Não, senhor.

O Sr. Aboim Inglês: - Havia quem dissesse que havia quem se aproveitasse das ajudas de custo.

Os "àpartes" não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Francisco Cruz: - Desejo protestar contra o facto de haver já processos relatados sem que as comissões tenham reunido.

Apoiados.

Lavro o meu protesto e lamento o facto.

Isto é uma forma jesuítica de fazer trabalho.

Apoiados.

O orador não reviu.

O Sr. Alberto Vidal: -Peço a V. Exa. consulte a Câmara sôbre se concede a comissão de verificação de poderes reunir durante a sessão.

Concedido.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se uma nota de interpelação.

Foi lida na Mesa a nota de interpelação anunciada.

Vai nos documentos enviados para a Mesa durante a sessão.

E aprovada a acta.

ORDEM DO DIA

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Santos Silva): - Envio para a Mesa quatro propostas de lei, requerendo a urgência.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges): - Envio para a Mesa uma proposta, pedindo para ela a urgência.

Foi aprovada a urgência.

As propostas de lei vão adiante publicadas por extracto.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ramada Curto deseja tratar, em negócio urgente, de alguns casos de violação de correspondência e domicilio particulares. Vou, pois, consultar a Câmara sôbre se aprova êste negócio urgente.

O Sr. Vitorino Guimarães (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: a maioria democrática não votará êsse requerimento, visto que os factos enunciados no pedido de negócio urgente feito pelo Sr. Ramada Curto, a terem-se dado, o que duvidamos, constituiriam um caso que pertence aos tribunais competentes e consequéntemente não tem esta Câmara que ocupar-se deles.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Para que a minoria monárquica possa dar o seu voto ao pedido de negócio urgente feito pelo Sr. Ramada Curto, desejo previamente saber se essa discussão será feita com prejuízo do debate relativo à comissão de verificação de poderes.

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O Sr. Ramada Curto (sobre o modo de votar): - Ao que parece, o Sr. Vitorino Guimarães não apreendeu bem o assunto do meu negócio urgente. Parece-me que a violação do correspondência o domicilio, a apreensão de papéis a advogados, são casos que o País deve avaliar.

Não pertencem apenas aos tribunais; pertencem também ao Parlamento.

Ter-se há descido já tanto neste País, que não se deva considerar assim?

Trata-se da garantia que tem os advogados de inviolabilidade dos seus papéis.

O que se faz pertenço à categoria de processo marroquino.

É uma violação do segrêdo profissional;

E mais um atentado contra a Constituição, a juntar aos muitos pie nesta República se têm praticado.

Quanto às considerações do Sr. Carvalho da Silva, tenho a dizer que o meu negócio urgente não impedirá que se trate do assunto a que S. Exa. se referiu.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Procede-se à votação do negócio urgente.

Foi rejeitado.

O Sr. Carvalho da Silva: - Requeiro a contraprova.

Procede-se à contraprova.

O Sr. Presidente: - Está rejeitado. Os Srs. Deputados que admitem as propostas apresentadas pelo Sr. Ministro da Instrução, queiram levantar-se.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Estão admitidas.

O Sr. Felizardo Saraiva: - Sr. Presidente: dada a votação de ontem, o visto a comissão de verificação de poderes ter pedido autorização a. Câmara para ir reunir a fim de lavrar o acórdão sôbre a eleição de Funchal, eu, que estava inscrito para falar sôbre a proposta do Sr. Manuel José da Silva, desisto da palavra, e peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se ela consente que se suspenda a discussão dêste assunto, até que a comissão apresento o seu acórdão.

O orador não reviu.

O Sr. Sampaio Maia (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: quando ontem o Sr. Manuel José da Silva mandou para a Mesa um negócio urgente, que envolvia uma proposta sôbre a qual eu entendia que a Câmara já deliberara, eu preguntei a V. Exa. se a Câmara pode ocupar-se dele nesta legislatura.

Lembro-me que V. Exa. hesitou e não deu resposta; depois encerrou a sessão, e eu fiquei convencido de que êsse assunto urgente tinha sido admitido na Mesa.

Como é que depois disto apareço no uso da palavra o Sr. Felizardo Saraiva?

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Como eram horas de se encerrar a sessão, não submeti o assunto à Câmara e o Sr. Felizardo Saraiva estava inscrito sôbre o modo de votar.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Manuel José da Silva: - Tem V. Exa. razão, Sr. Presidente, a matéria do artigo 127.° do Regimento não é aplicável à minha proposta, porque se refere às propostas apresentadas pelos Ministros, e o que eu mandei para a Mesa foi uma proposta do deliberação e não era igual àquela que tinha sido rejeitada. Era uma proposta do acordo com a lei eleitoral o a Constituição, deixando à, Câmara a liberdade de apreciar os processos eleitorais, e em relação à questão que está posta e uma proposta com o fim simples de solucionar os casos especiais.

Portanto, V. Exa. não poderá, fazer mais do que pôr à votação da Câmara a proposta.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: - Este lado da Câmara, querendo facilitar a solução dêste caso, dá o seu voto ao requerimento do Sr. Felizardo Saraiva, com a condição de que o assunto não fique esquecido.

Devo ainda dizer ao Sr. Manuel José da Silva que não quisemos fazer nenhuma ameaça.

Ao mesmo tempo, votando assim o requerimento do Sr. Felizardo Saraiva, nós afirmamos o desejo que temos de que se realize a interpelação do ilustre Deputado

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Sr. Rosado da Fonseca sôbre um assunto da maior importância para a economia nacional, e mostramos mais uma vez quanto sabemos manter-nos numa linha que entendemos que só pode prestigiar o Parlamento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Chamo a atenção da Câmara. O Sr. Sampaio Maia tinha invocado o artigo 127.° do Regimento.

A proposta mandada, porém, para a Mesa pelo Sr. Manuel José da Silva não é uma proposta de lei; e, por isso, a Mesa não teve dúvidas em a aceitar.

Os Srs. Deputados que a admitem, queiram levantar-se.

É a seguinte:

Proponho a constituição e eleição de uma comissão especial de verificação de poderes, com a missão de julgar os processos eleitorais ainda pendentes, e composta de cinco membros eleitos em lista incompleta de três nomes. - Manuel José da Silva.

Em seguida, aprova-se o requerimento do Sr. Felizardo Saraiva, para que se suspenda a discussão do assunto até a 1.ª comissão de verificação de poderes se pronunciar sôbre êle.

O Sr. Presidente: - Vai realizar-se a interpelação do Sr. Rosado da Fonseca aos Srs. Ministro da Guerra e da Agricultura.

O Sr. Rosado da Fonseca: - Sr. Presidente: ao chegar-me a palavra nesta altura para realizar a minha interpelação, é caso para dizer: até que emfim.

Efectivamente, há um mês, seguramente, que eu tenho a gritar dentro da minha carteira um bocado de qualquer cousa a que se convencionou chamar pão, para sair de lá e mostrar-se no seu triste aspecto aos olhos dos vivos, aos olhos daqueles que costumam comer pão; mas, houve por bem o Sr. Vitorino Guimarães, a quem quero neste momento fazer algumas observações, impedir-me, em nome da maioria, de fazer tam depressa quanto era para desejar as considerações que o caso que mo propus tratar merecia. Com efeito S. Exa. de uma forma indignada, para não dizer mais alguma cousa, parecendo que eu já lhe tinha feito um mal enorme ou ao seu partido, deu-me quási a entender que eu me devia recolher ao meu lugar humilde e com medo, não insistindo no pedido de palavra.

O Sr. Vitorino Guimarães: - V. Exa. dá-me licença?

É para dizer que as minhas palavras não tiveram nada de ataque pessoal, visto que, apesar de não conhecer V. Exa., tenho por - informações obtidas a maior consideração por si. O que quis expor foi um princípio em nome da maioria, e sinto que fôsse a propósito do negócio urgente apresentado por V. Exa. que o tivesse de fazer, tanto mais que reconheço que o assunto da sua interpelação tem toda a vantagem de ser tratado.

O Orador: - E mais tinha se o fôsse nesse momento!

Mas, agradecendo as palavras amáveis que o Sr. Vitorino Guimarães acaba de me dirigir, não posso, entretanto, concordar com. essa maneira de estabelecer princípios, porque uma cousa é estabelecer princípios para casos gerais e outra cousa é afirmar princípios em frente de casos concretos. Eu dou toda a razão a S. Exa. quando deseja que a propósito de tudo se não atropele a ordem de trabalhos da Câmara com pedidos de negócios urgentes; mas há, porventura, o direito de estabelecer um princípio tam rígido que quâsi se pode considerar uma norma? Então, acabem-se no Regimento com os pedidos de palavra para negócios urgentes.

Apoiados.

De resto, é do lamentar que só naquela altura se tivesse querido impor aquele princípio, porque eu já vi tratar, depois disso, em negócios urgentes de muitos casos especiais. Por isso, desculpe o Sr. Vitorino Guimarães que eu diga, já que afirma não se tratar de um caso pessoal, que fico com a impressão de que fui um. infeliz sofrendo a aplicação do princípio, por ser o primeiro Deputado a apresentar um negócio urgente, tanto mais que declarei previamente, pedindo a palavra sôbre o modo de votar, que não tinha a intenção de colhêr de surpresa os Ministros, visto que, querendo tratar o caso a

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sério e com honestidade, não queria eu centrar S. Exas. impossibilitados de me responderem, mas que no emtanto, tinha a certeza de que tanto o Ministro da Guerra, como o seu colega da Agricultura, nada mais me poderiam dizer naquela data do que me vão dizer hoje. E tanto assim era, que S. Exas. logo se deram por habilitados a responder ao meu negócio urgente.

Portanto, espero que S. Exa. fique a meu respeito com outro conceito, e que nunca mais, a propósito do qualquer assunto que aqui traga, pense que eu quero fazer política baixa ou pôr em cheque os Ministros, ou abrir seja a quem fôr. A minha posição, realmente, nesta Câmara é esta: tratar todos os casos de interêsse nacional com aquela elevação à qual eu posso pretender chegar sem me preocupar com pessoas, será deixar rastejar a minha própria dignidade pelo campo reles a que se chama baixa política.

Apoiados.

Fiquemos, pois, assim entendidos!

Sr. Presidente: peço agora aos Srs. Deputados o favor da sua especial atenção, bem como peço a atenção do Sr. Presidente do Ministério, se S. Exa. entender que deve prestar-me êsse favor, para o caso que voa tratar, e que teve o momento próprio para ser tratado: que era aquele em que eu pretendia tratá-lo, porque, como muito bem disse o Sr. Cunha Leal, nas três razões que apresentou para votar o negócio urgente: se estava eminente a realizarão de uma ilegalidade, evitava-se; se essa ilegalidade já se tinha praticado, sabia-se quem tinha sido o seu autor ou autores, para sôbre êles cair a sanção da lei.

A terceira razão é um assunto de interêsse nacional.

Há casos que precisam a intervenção imediata dos poderes públicos. O caso na sua simplicidade é apenas êste: numa época em que as indústrias particulares de moagem, ama grande parte da indústria particular se dirigia aos poderes públicos pedindo que autorizasse a importação de trigo exótico, o Govêrno, o Sr. Ministro das Finanças negava essa autorização, dizendo que havia o trigo nacional suficiente. No mesmo momento a Manutenção Militar dirigia-se ao Conselho de Comércio Agrícola que lhe de parecer favorável e a Manutenção Militar num simples bilhete disse ao Ministro que tinha comprado, isto para não se dizer que era contrabando.

O Ministro da Agricultura, que estava na disposição de fazer cumprir a lei, deu, ordem para que êsse trigo não fôsse despachado na Alfândega. Mas a vida é um sonho, o Sr. Ministro saiu de Lisboa e o trigo desapareceu dos porões dos navios o foi aparecer na Manutenção Militar.

O Sr. Raimundo Alves: - Para que é que o Sr. Ministro da Agricultura saiu de Lisboa?

O Orador: - Eu não estou aqui encarregado de verberar o procedimento do Sr. Ministro da Agricultura. Houve no Govêrno muito pior.

Diversos àpartes.

O Orador: - É claro que o chefe é que ordenou; êle tem à roda de si os como hei-de dizer...

O Sr. Amâncio de Alpoim: - São os seus satélites.

O Orador: - Como bom chefe e com receio que os soldados ficassem sem pão e certamente sem saber que havia um despacho, deu logo ordem para se despachar o trigo.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - E não tenha V. Exa. dúvida que fiz bem.

V. Exa. está dando ao caso ar de tragédia.

O Orador: - Não é tragédia. V. Exa. está dando às minhas palavras um tal valor que me coloca num pedestal que não mereço, nem desejo.

O meu empenho é unicamente rasgar os véus.

Eu não quero insistir...

Uma voz: - A Câmara já percebeu tudo.

O Orador: - O Sr. Ministro da Agricultura deu ordem...

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O Sr. Ministro da Agricultura (Tôrres Garcia): - Eu não dei ordem senão por intermédio do Sr. Ministro das Finanças.

O Orador: - É a mesma cousa.

O caso frisante é êste; o resto não tem importância.

O que é preciso frisar é que a Manutenção Militar fez uma importação ilegal de 7.000:000 quilogramas de trigo no momento em que havia trigo em Portugal, e em que à industria nacional se recusava autorização para importar.

Os exemplos devem partir do Poder, o quem tem responsabilidades não deve perder nunca a ocasião de fazer cumprir a lei, começando por cumpri-la.

E possível que na mente do alguns dos Deputados presentes se esboce uma defesa para a Manutenção Militar, mas os factos são evidentes e falam claro.

Pelo decreto n.° 10:554, de 14 de Fevereiro de 1925, a Manutenção Militar tinha autorização para fazer uma importação de 24:000 toneladas em cada ano para ocorrer ao abastecimento, cai casos excepcionais, dos principais centros de consumo durante dez dias.

Esta obrigação, que era imposta à Manutenção Militar, dava-lhe o direito de fazer a importação.

Foi â sombra dêsse direito que ela foz a importação? Não foi. A Manutenção Militar dirigiu-se à Bolsa Agrícola, pedindo autorização para importar; a Bolsa negou-lha e o Sr. Ministro da Agricultura, ao ter conhecimento de que o barco entrara no Tejo, mandou apreender o trigo.

A Manutenção tinha ao tempo o direito de fazer esta importação, mas com a obrigação de manter a reserva calculada em 10.000:000 de quilogramas de trigo, reserva em que não podia tocar senão em casos excepcionais. A lei é rigorosa nesse ponto.

Se é certo que a lei lhe dava êsse direito, impunha-lhe também a respectiva obrigação, e assim a Manutenção Militar, se não estava fora da lei num caso, estava-o no outro.

Em meu entender esta faculdade desapareceu.

Em momentos anormais, quando o comércio do trigo e das farinhas panificáveis se encontravam num estado quási caótico, sucedeu muitas vezes haver, nos principais centros de consumo, falta de farinha para o abastecimento das populações, e então nasceu êste decreto.

Posteriormente foi imposta à indústria particular a obrigação de ocorrer a todos êsses fornecimentos pelo artigo 9.° do decreto n.° 10:694.

Parece-me que a nossa vida em Portugal corre em condições normais, não se justificando por forma alguma o estabelecimento do decreto n.° 10:554.

Não tem, portanto, a Manutenção Militar nenhum fundamento legal que a autorize à importação que fez.

Mas isto é um episódio apenas da vida verdadeiramente irregular da Manutenção Militar.

Êste estabelecimento do Estado, que devia restringir o seu labor às suas funções normais, que são as de fornecer pão ao exército, aos hospitais e casas de caridade, fez a importação de 7.000:000 de quilogramas do trigo para distribuir a respectiva farinha pela indústria de panificação particular, tendo oferecido para o Pôrto farinha do trigo n.° 1. Isto é quási o mesmo que impedir a indústria particular de moagem, - que tem o trigo nacional com pesos específicos arrumados pela acção do inverno, - de vender mais uma saca de farinha emquanto a Manutenção Militar tiver êsse produto. É absolutamente inadmissível esta concorrência desleal que tantos prejuízos acarreta para a indústria particular de moagem. Acontece ainda o seguinte: era tal a ânsia de qualquer cousa, que em Janeiro comprou 7.000:000 do quilogramas de trigo que deveriam chegar até Agosto, e para essa compra anunciou-se concurso. Pois em seguida declarou a manutenção que desejava comprar a particular, e no dia seguinte chamou um dos proponentes e comprou mais caro!

Houve nesta compra um prejuízo, em virtude de alteração cambial, de 70 a 80 contos.

Eu não tenho nada com isso, mas é para a Câmara ver que a Manutenção Militar podia ter feito as importações trimestralmente em muito melhores condições de preço.

Ela faz à indústria particular uma concorrência desleal, porque está em condições superiores, como V. Exa. vai ver.

O trigo que nesse momento havia em

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Portugal na posse da indústria particular era trigo nacional, pois essa indústria vê-se agora agravada pela superior qualidade do trigo importado.

E justo que o Estado seja concorrente a uma indústria a quem vai cobrar uma grande parte das suas contribuições?

Mas então o que é isto? Que trabalho é êste?

E é a indústria particular, que tem capitais de que paga juros, que tem empregados e maquinismos que lhe acarretam encargos grandes, que tem compromissos sem nome com a aquisição de trigo: que tem de pagar contribuições pesadíssimas - e o Sr. Ministro das Finanças sabe bem quantos milhares do contos paga a indústria moageira - e é a indústria particular, repito, que se vê prejudicada por um estabelecimento do Estado, que não paga contribuições, que tem a mão de obra quási do graça, que se vê assim agravada!

Por êste modo defrauda-se o próprio Estado, obrigando muitas indústrias a fechar as suas portas, fazendo com que deixem de entrar nos cofres do Tesouro importantes verbas resultantes dos impostos que sôbre elas são lançados. Esta concorrência é verdadeiramente vergonhosa.

Eu não sei se V. Exas. sabem que estava estabelecido um diagrama, que era de 52 quilogramas de primeira para 26 de segunda. Ha aqui lavradores, homens que conhecem, portanto, o que é trigo e que sabem que no passado ano cerealífero a colheita, foi baixíssima em geral. l Como é que se pode fazer em Dezembro, depois dum período do humidade grande, uma extracção de 78? A moagem particular não pode fazê-lo. O povo, o desgraçado que tem fome, nem êsse pode comer o pão de segunda.

A indústria particular era obrigada assim a um diagrama sem poder ter colocação para parte da sua farinha. Mas a Manutenção Militar tinha colocação corta para esta farinha. Tem um armazém infalível, onde pode metê-la sem que haja qualquer direito para repontar: é a barriga do soldado. E o desgraçado soldado ou tem de levar êsse pão intragável; e então gasta as poucas economias que consegue com o sen trabalho para obter outro, ou escreve do quartel, todos os dias, aos seus irmãos, aos pais que deixou em casa, arrancando-lhes um bocado do pão da sua boca, para assim poder comer qualquer cousa que o alimente de íorma razoável. E consente-se nisto! E possível que em Portugal, que quere estar à altura das nações civilizadas, que está (ao que parece) para cá de Marrocos, se dê a um soldado, cujo primeito dever é a disciplina, um incentivo cotidiano de indisciplina, como é êste?

Eu tenho aqui um exemplar curioso. Está aqui a gritar há mais de um mês. Depois de lhe tirar uma abundante vegetação que o cobria, ainda se apresenta como V. Exas. vêem.

(Mostra um pão).

Pausa.

E êste o pão do soldado! Eis o grande fruto da Manutenção Militar e que a indústria particular não pode consumir!

Mas a Manutenção Militar importa, e importa à vontade, o que quiser, porque pode importar.

Àparte do Sr. Pires Monteiro que não se ouviu.

O Orador: - Para demonstrar a V. Exa., visto que está receoso de que a aparência que êste pão tem seja dos anos, para demonstrar a verdade das minhas afirmações, vou ler à Câmara a análise feita num estabelecimento que deve merecer todo o crédito, análise feita por ordem do próprio Ministério da Guerra, e que, segundo me consta, lá não existe. A análise que vou ler foi feita a requerimento dum oficial que se indignou contra isto, que fez a devida participação para o Ministério da Guerra, e em virtude da qual foi feita essa análise, do que tenho aqui urna cópia.

Leu.

Não compreendo como, tendo ido esta análise para o Ministério da Guerra, de Já desaparecesse sem que se tomassem quaisquer medidas sôbre êsse facto!

O Sr. Ministro da Guerra (José de Mascarenhas): - As minhas mãos não chegou.

O Orador: - Faço a justiça do acreditar que V. Exa. não tivesse conhecimento dêste caso.

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Mas, Sr. Presidente, devo acrescentar mais a tudo isto que a Manutenção Militar, desde que o comércio do trigos está Intimamente ligado com a economia agrícola, que é como dizer com a própria economia nacional, anda mais na baila, tendo despertado mais interesso a governantes o governados, que a Manutenção Militar tem-se salientado no nosso meio comercial, no mercado de trigos, digamos assim, por uma forma verdadeiramente extraordinária, que eu poderei classificar como função perturbadora do mercado nacional do trigos, perturbação que pode ir até a desorganização da própria economia.

A Manutenção Militar não tem feito senão estabelecer a perturbação absoluta, porque depois de incitar os agricultores a não venderem e os industriais a não comprarem por mais que o preço da tabela, iam os seus delegados, com as algibeiras recheadas de cheques, a procurar o lavrador o oferecer-lhe mais dinheiro do que a tabela permitia. Quero dizer, fixa-se o preço da tabela, mas elementos oficiais andam a provocar o lavrador a pedir mais dinheiro para depois e meterem na cadeia.

Isto, Sr. Presidente, não faz senão estabelecer a confusão.

O resultado foi que todos aqueles que tinham os seus trigos fizeram 6sse fornecimento à Manutenção Militar, porque para transporte pagava $04; quere dizer, pràticamente pagava $08, acima da tabela.

E não se diga que a Manutenção Militar pagava inconvenientemente acima da tabela, porque, a determinada altura, oferecia quatro vinténs, indo buscar o trigo a casa do lavrador.

Então os quatro vinténs eram para transporte, e a Manutenção Militar ia lá buscar o trigo?

Sr. Presidente: mais tarde, depois de ter feito compras por preço superior à tabela, a Manutenção Militar declarava que comprava trigo ao preço da tabela, mas pôsto à porta da Manutenção.

Isto é simplesmente vergonhoso, porque primeiro que tudo revela uma tal desorientação, que não há cabeça, por mais inteligente que seja, capaz de a entender.

Sr. Presidente: como V. Exa. e a Câmara vêem, é um estabelecimento do Estado que incita a lavoura à rebeldia, e é o primeiro a não cumprir a lei.

Interrupção do Sr. Pires Monteiro, que não se ouviu.

O Orador: - O lavrador vendia o trigo pelo preço da tabela, mas a Manutenção apareceu a oferecer mais dinheiro, o que deu em resultado o lavrador retrair-se nas vendas.

Sr. Presidente: não há o direito de levar ao seio da lavoura uma confusão desta natureza, tanto mais que se trata do uma classe que tem dado grandes provas do abnegação, deixando na mão dos Ministros o estipular os seus lucros.

Apresenta-lhe o preço do custo, e diz-lhe: marque o lucro.

Parece-me que uma classe que assim procede tem o direito do ser respeitada e tratada com correcção.

De resto, sabem V. Exas. muito bem que, em regra, o lavrador é uma criatura ingénua, e a única escrita que sabe fazer e tomar os seus apontamentos e fazer algumas contas na mortalha do livro que fuma no primeiro cigarro.

Sabe que dão tanto, procura quem lhe dê mais, e não se preocupa com as grandes congeminações dos mercados.

É exactamente no dia em que o mercado se realiza que êle sabe os preços pelo comprador ou pelo amigo.

Sr. Presidente: mas como ia dizendo, a Manutenção Militar fez saber que comprava trigo ao preço da tabela, pôsto à porta da Manutenção, quando a verdade é que a lei estipula que o preço do trigo é x, metade em sacaria do comprador e pôsto na estação mais próxima da origem.

Apoiados.

Nestas condições, diz o lavrador, e com certa razão: para que estou eu a semear trigo?

Para depois troçarem de mim?

Sabem V. Exas. bem que há muitas outras culturas em que o capital pode ser aplicado, e com mais probabilidades de rendimento, porque a cultura do trigo é a mais ruinosa que a lavoura tem.

Em um estabelecimento do Estado, e por pessoa que conhece êstes assuntos, verificou-se que o produto da cultura de um ano não chegava para fazer a despesa do ano seguinte.

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Isto foi apurado por um estabelecimento do Estado.

Está presente o Sr. Ministro da Agricultura, que pode confirmar esta minha asserção.

É preciso que quem dirige os interêsses da Nação pense neste caso a sério, porque a Manutenção Militar, orientada por esta forma, mantendo o regime de verdadeira anarquia em que vive, pode até ser um elemento de graves perturbações sociais.

Sr. Presidente: há para mim um ponto de interrogação desde o primeiro momento em que êste caso surgiu.

O que é a Manutenção Militar dentro do Estado?

É dizem, um estabelecimento autónomo.

Mas eu também sou autónomo, pelo mono; neste caso

Isto é autonomia, creio eu, mas será êsse o caso da Manutenção Militar?

Como é que há dentro do Estado um estabelecimento do Estado que não tem leis para viver?

Mas afinal de contas o que é o Estado, que não tem o direito de impor aquelas normas que decreta a todos aqueles para quem as faz?

Mas então isto não é, nem mais nem menos, um Estado sem soberania?!

Um Estado que não faz, que não pode fazer cumprir a lei, que não pode fazer cumprir as normas que decreta, o que quero impor aos seus concidadãos, o que representa?

Falta de soberania, nada mais, nada menos; é o que é.

E um Estado som soberania o que é?

E a anarquia.

Sr. Presidente do Ministério: aproveitando a presença de V. Exa.. permita-me que lhe diga. visto que pelo facto de estar à frente do Govêrno, é quem tem a responsabilidade do que se passa no País, é quem tem a responsabilidade da observância da lei, que não pode permitir-se que factos como êstes se repitam, factos para os quais não pode V. Exa. invocar desconhecimento, porque, se directamente os não conhece, tem no seu gabinete quem o pode informar.

Isto não é um caso esporádico, é um sintoma.

Casos dêstes não se devem dar, ou então temos de concordar que tudo isto é um ficção.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - V. Exa. dá-me licença?

O que se deu foi o seguinte:

Sabia que estava à descarga no Tejo um barco com carregamento de trigo, e que por cada dia que passava pagava o Estado mais 500 libras.

Que fiz eu?

Levei o caso a Conselho, que resolveu ordenar que o trigo fôsse descarregado o mais ràpidamente possível, o que se averiguasse a quem cabia a responsabilidade de tal facto.

Aqui tem V. Exa. como se passou o caso que reveste esta simplicidade.

O Orador: - Mas eu quando reatei as minhas considerações, dirigindo-me a V. Exa., não era para frisar êste caso, porque eu já rinha dito que não insistia nêle pelos motivos que o Sr. Ministro da Agricultura pode explicar a V. Exa.; tanto assim que o que comentei foi apenas o facto de se consentir que o trigo tivesse sido entregue a um delinquente, quando assim não devia ter acontecido (Apoiados). Era realmente necessário evitar que o Estado tivesse de pagar 500 libras por dia, mas não devia ser entregue à Manutenção esse trigo, tanto mais que havia mais entidades que dele precisavam. Se me dirigi a V. Exa., pedindo a sua atenção, é porque como Presidente do Ministério, ainda que não tenha uma ligação directa com o ca-so, como têm os seus colegas da Guerra e da Agricultura, contudo tem a responsabilidade, inerente ao seu cargo de toda a política do Gabinete, e, assim, não podia desinteressar-se do assunto, que, de resto, não é um caso isolado, mas quási um sistema na nossa administração pública.

Apoiados.

V. Exa. efectivamente tem de interessar-se por êle, de forma que o seu Ministério faça entrar na lei e na ordem uma entidade que anda fora duma e doutra cousa.

Esperando que V. Exa. tenha em atenção êste meu pedido, e esperando que os

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Srs. Ministros da Guerra e da Agricultura desculpem o tempo que lhes tomei, prometo não largar de mão o assunto, esperando até um mês, como fiz agora, ou mais se fôr preciso, todos os casos que aparecerem neste género, interessando-me pouco pelas pessoas que neles entrarem, como no caso presente, que nem as conheço, mas simplesmente para atender ao que julgo ser o cumprimento do meu dever.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

Os "àpartes" não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Correia Gomes (em nome da comissão de finanças): - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se autoriza que a comissão de finanças reúna segunda-feira durante a sessão.

Consultada a Cântara, foi concedida a autorização.

O Sr. Ministro da Guerra (José Mascarenhas): - Sr. Presidente: pedi a palavra para responder à interpelação realizada pelo Sr. Rosado da Fonseca na parte referente à acção do meu Ministério.

A Manutenção Militar dirigiu-se ao Ministério da Guerra pedindo para que fôsse autorizada a descarga de um navio que tinha adquirido carregado de trigo, por lho constar que a Alfândega não o deixava descarregar por determinação da Bolsa Agrícola.

Dirigi-me, por isso, ao Sr. Presidente do Ministério para explicar que o caso estava dando um prejuízo de 000 libras por dia para o Estado o foi assim que se autorizou a descarga.

Interroguei também o Sr. director da Manutenção Militar para saber em que autorização se tinha baseado para fazer a importação do trigo e quais as razões imperiosas que o legavam à aquisição, S. Exa. disse-me que o decreto n.° 10:554 autorizava aquele estabelecimento do Estado a fazer determinada importação do referido cereal e que as razões da aquisição eram: não ter reserva alguma para fornecer pão ao exército, tendo já mesmo adquirido farinha à própria moagem, apesar de ter feito a aquisição no País de 3 milhões de quilogramas, mas que não tinham chegado ainda à Manutenção em virtude do desgraçado estado das nossas estradas.

Apoiados.

Há, realmente, sempre uma dificuldade enorme em fazer chegar às estações de caminho de ferro o trigo que vem dos campos. E - acrescentou S. Exa. ia dar-se a encorporação dos recrutas o o exército não podia estar dependente da chegada ou não aos celeiros da Manutenção do trigo nacional. Tinha, portanto, sido obrigado a providenciar e, como não carecia do autorização da Bolsa Agrícola - e eu acredito-o porque não conheço disposição em contrário - ordenou, por isso, a importação do trigo necessário.

O Sr. Rosado da Fonseca disse que a Bolsa Agrícola se tinha negado a consentir nessa importação. Ora a Manutenção não tinha de pedir qualquer autorização, mas simplesmente comunicar a importação, o que, de facto. fez.

O Sr. Rosado da Fonseca: - Mas pediu-a e só depois de lhe ser recusada ô que se limitou a fazer a comunicação.

O Orador: - Se pediu, não devia tê-lo feito, porque entendo que a Bolsa Agrícola não tem que interferir em questões de defesa nacional, porque pode não se tratar de casos de momento, mas de carácter mais grave e que convém fiquem secretos. Numa guerra, por exemplo, o Ministério da Guerra, tendo de realizar medidas especiais, não pode estar dependente da Bolsa Agrícola; o muito que pode fazer é comunicar o caso ao Sr. Ministro da Agricultura.

O Sr. Rosado da Fonseca: - V. Exa. dá-me licença?

O papel da Bolsa Agrícola é o de informar. O Sr. Ministro da Agricultura é que autoriza ou não.

O Orador: - Mas o que fez a Manutenção? Comunicou a importação de trigo

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20 Diário da Câmara dos Deputados

à Bolsa Agrícola, e fê-la à sombra do decreto n.° 10:554 que lhe permite realizar uma importação até 24:000 toneladas por ano. Estava, portanto, dentro da lei para fazer a importação.

O Sr. Rosado da Fonseca: - Mas a Manutenção tinha a reserva obrigatória dos 10 milhões de quilogramas?

O Orador: - Não tinha.

O Sr. Rosado da Fonseca: - V. Exa. é que lhe consentiu isso?

O Orador: - Não, senhor; a Manutenção Militar tem administração autónoma e, portanto, eu não tenho de intervir nada nas suas acções.

O que é facto é que a importação foi legal porque não excedeu a autorização que lhe estava concedida.

Mostrou ainda V. Exa. um pedaço de pão que estava estragado e a análise que foi feita.

Se a análise o doa impróprio para o consumo, êle não foi consumido.

A análise é feita exactamente para justificar a não distribuição do pão, o se isso não se fizesse o oficial teria cometido um acto muito grave.

O pão não é sempre assim, como pode V. Exa. verificar quando êle é distribuído por ocasião das greves em Lisboa. Não é só o soldado que come êste pão; mas também os oficiais que não podem comprar do outro.

Só há uma forma de remediar o mal: é V. Exas. aumentarem a verba orçamentada para as rações, pois com o que está no Orçamento não posso dar aos soldados nem galinha nem pão de primeira.

Referiu-se ainda V. Exa. à concorrência desleal que está fazendo a Manutenção Militar à indústria particular.

A Manutenção Militar tem autonomia financeira e administrativa; não pesa no Orçamento do Estado, pois tudo é pago pelos seus fundos.

A própria mão de obra é igual ou superior à de cá de fora.

Trocam-se àpartes.

O Orador: - A Manutenção Militar tem de fazer as importações que forem necessárias dentro da lei, a não ser que esta seja revogada.

Tenho dito.

Os àpartes não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Raimundo Alves (para um requerimento): - Requeiro a generalização do debate.

Foi aprovado o requerimento.

O Sr. Ministro da Agricultura (Tôrres Garcia): - Sr. Presidente: a lei que regula o comércio de trigos no País é a lei n.° 1:294, que ainda está do pé. Os decretos que têm sido publicados estão dentro das normas dessa lei e pretendem regular apenas o consumo e a venda do pão nos dois centros de consumo de Lisboa e Pôrto.

Por essa lei e pelo decreto que a regulamentou, não há dúvida nenhuma de que a Manutenção Militar tem, essencialmente, a seu cargo:

Leu.

E, integrando as suas operações de importação de trigos na importação geral, tem o dever de para as realizar, pedir a necessária autorização ao Ministério da Agricultura, o único que regula a importação de trigos em Portugal.

O Sr. Aboim Inglês (em àparte): - O Sr. Ministro da Guerra diz que a Manutenção Militar não tem de pedir autorização; o Sr. Ministro da Agricultura diz que tem. S. Exas. é que nos devem mostrar quem tem razão.

O Orador: - A lei fundamental, que é a lei cerealífera n.° 1:294, de 31 de Julho do 1922. e o seu decreto regulamentar, que é o n.° 8:361, de 1 de Setembro de 1922, determinam o que acabo de expor à Câmara. Posteriormente, e isso já numa longa série de decretos periodicamente expedidos, mas sempre dentro dos princípios fundamentais da lei, pretendia-se ocorrer sobretudo, exclusivamente até, ao abastecimento dos dois grandes centros: Lisboa e Pôrto. Nessa série de decretos está compreendido o n.º 10:504, de 14 de Fevereiro de 1920, citado pelo Sr. Ministro da Guerra, decreto que alargava as atribuições conferidas pela Base VII da

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lei n.° 1:294 à Manutenção Militar, a fim de que ela, em caso de anormalidade, pudesse fazer face às necessidades do consumo de Lisboa e Pôrto durante dez dias, para o que lhe era facultada a importação de 24 milhões do quilogramas, devendo com êles constituir uma reserva de que não poderia fazer uso som autorização do Ministério da Guerra e do Ministério da Agricultura.

Vários àpartes.

O Orador: - Por êste decreto n.° 10:554 era, realmente, cometida à Manutenção Militar a obrigação de fazer faço às necessidades do consumo das duas cidades em caso de alteração da ordem pública, etc., mas veio mais tarde o decreto n.° 10:694, de 14 de Abril de 1925, que, como de costume, revogou toda a legislação em contrário e passou a atribuir a responsabilidade dêsse abastecimento à indústria particular, para o que até instituiu, dentro dessa indústria, uma comissão, tendo a seu cargo fazer as importações sob consulta o autorização do Ministério da Agricultura.

Não há aqui nenhum conflito de opiniões entre dois Ministros, mas sim uma intepretação diferente dada ao assunto pela Manutenção Militar. E que a Manutenção Militar supõe que o decreto n.° 10:694 não revogou o que estava estabelecido no decreto n.° 10:554, e foi assim que, em certa altura, dirigiu ao presidente do conselho administrativo da Bolsa Agrícola o oficio cujo conteúdo vou ler à Câmara.

Dizia êsse documento:

Leu.

Não há aqui nenhuma referência ao decreto n.° 10:554, e a Manutenção Militar apenas comunica que vai importar trigo exótico para ocorrer às necessidades dos seus fornecimentos oficiais.

Pronunciou-se, como não podia deixar de se pronunciar, o Conselho do Comércio Agrícola, entidade consultiva que funciona junto da Bolsa Agrícola. Apreciou o Conselho a respectiva legislação e verificou que, de facto, a autorização concedida à Manutenção Militar tinha sido revogada pelo decreto n.° 10:694. O parecer elaborado pelo Conselho, que chegou até a mim, diz o seguinte:

Leu.

O meu despacho foi o seguinte:

Leu.

Foi êste o meu despacho o enviado à Alfândega.

Vozes: - Muito bem.

O Orador: - A Manutenção Militar, vendo-se a braços com esta dificuldade, apelou para o seu superior e ò Sr. Ministro da Guerra, invocando motivos imperiosos como o do ter que se pagar 500 libras por cada dia que estivesse no Tejo o navio - 500 libras é de considerar - despachou o pedido da Manutenção.

O Sr. Presidente do Ministério já explicou à Câmara e eu não tenho mais que dizer.

A segunda parte vou dela dar conhecimento à Câmara, pois é um assunto que deve ser esclarecido.

Apoiados.

Vozes: - Muito bem.

O Orador: - A Manutenção Militar tem autonomia administrativa e financeira.

O Sr. Amancio de Alpoim: - Então não tem de dar satisfação ao Sr. Ministro da Guerra?

O Orador: - Não tem.

Vários àpartes.

O Sr. Rosado da Fonseca: - Se não há ninguém que possa tomar a mão à Manutenção Militar, pode fazer o que quiser.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Dentro da lei.

Vários àpartes.

O Orador: - A Manutenção Militar foi alargando as suas instalações bem ou mal; quanto a mim, mal.

Apoiados.

Tenho mantido sempre esta opinião, e não podia deixar de a manifestar aqui.

Apoiados.

A Manutenção Militar é um estabelecimento do Ministério da Guerra, e, portanto, adstrito à função de defesa nacional, mas essa função não a pode levar a

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22 Diário da Câmara dos Deputados

intervir normalmente no abastecimento público.

Na época calamitosa do "pão político" poude estender a sua acção, pelo seu alargamento, desde a vigência do antigo director Vasconcelos Dias, ficando em condições de ir além das necessidades do exército.

Hoje mantém em laboração nada menos que três moagens que garantem uma produção muito superior às necessidades do exército.

Interrupções.

A indústria particular em Portugal, na ânsia de adquirir matéria prima, alargou as suas instalações para comparticipar em proporções superiores no rateio.

De maneira que essa indústria entrou em crise no dia em que excedeu as necessidades do consumo.

Apoiados.

Quando é feito o cálculo para o carvão do uma máquina económica é sempre feito em cálculo para a carga máxima.

Não sendo assim, sofrer-se hão as consequências.

De maneira que a intervenção da Manutenção Militar, no comércio particular das farinhas, veio agravar a situação.

Se não esclareço melhor o problema é isso devido, não à minha falta de vontade, mas sim à insuficiência de conhecimentos técnicos da minha parte.

Não apoiados.

Mas parece-me que o que digo corresponde à verdade.

Num determinado momento, e, principalmente ao abandonar-se, felizmente para todos nós, o tremendissimo regime do "pão político", a indústria de moagem, devido ao regabofe anterior, pretendeu reagir contra as novas normas, e, por isso, foi preciso ao Estado fazer uso da Manutenção Militar, para obstar a êsses excessos. E, então, em 1924, ainda foi necessário empenhar a Manutenção Militar nesse desideratum, tendo eu ocasião de verificar que ela se portou absolutamente à altura da missão que o Estado lhe confiou.

Mas o novo sistema estabeleceu-se, e hoje, de facto, a indústria particular sente-se perturbada, até mesmo pela Manutenção Militar, e por isso fala e reage.

São, pois, absolutamente razoáveis e de aceitar as considerações produzidas pelo Sr. Deputado interpelante.

O diagrama oficial que se tem mantido" estava inteiramente a carácter da modalidade especial que a Manutenção Militar oferece dentro da indústria: uma grandíssima extracção de farinha de 1.ª para comerciar no mercado particular, e uma pequena quantidade de farinha de 2.ª para fabricar o pão que a disciplina obriga as tropas a comerem.

De maneira que hoje, que as cousas estão a caminho de uma normalidade completa, as indústrias agrícolas e de moagem reclamam pelo regresso da Manutenção Militar às normas antigas, que são aquelas que ainda estão estatuídas na lei.

E ou tenha esta opinião: só saiu de facto qualquer decreto regulando a industrialização da Manutenção Militar, as leis fundamentais que regulam o assunto é que vigoram, e, portanto, a Manutenção" Militar devo remeter-se àquilo que elas determinam.

Apoiados.

E, o que é que elas determinam?

Conjugada a lei n.° 1:294 com o decreto n.° 10:694, ela fica unicamente com a função de abastecedora do exército, como muito bem disse o ilustre Deputado interpelante.

E, agora, eu vou dizer, francamente, como êsse facto, realmente grave, da importação, veio perturbar a actividade económica nacional.

Já aqui afirmei que se estava a fazer a averiguação, o mais completa possível, da existência de trigo nacional dentro do País, para que, só no último extremo, quando fôsse moído o último grão, se fizesse qualquer importação.

Mandei pelo Ministério da Agricultura fazer uma nova chamada extraordinária,, para ver se evitava que se fizesse a importação, visto que eu entendia que ela não era conveniente para os interêsses do Tesouro, pois que tudo aconselhava que a saída de ouro para o estrangeiro fôsse a menor possível.

Apoiados.

Estava-se na prática disto, quando surge êste incidente: a compra do trigo pela manutenção militar e a entrega dos seus produtos à indústria nacional.

Mandei estudar o pedido para importação de trigo exótico, feito pela indústria particular, que deveria ser reduzida ao mínimo. Autorizei-a porque como Minis-

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tro eu não podia sancionar uma situação contrária à justiça que a todos assiste.

Estabelecem se diálogos entre o orador e vários Srs. Deputadas que o cercam.

O Orador: - Isso teve uma repercussão que reputo prejudicial para o País, porque precipitou a importação de trigo exótico que podia passar talvez para 60 dias mais tarde.

O ideal seria até nada importar êste ano.

A Manutenção Militar fundamentou o seu pedido no decreto n.° 10:554.

Eu por meio de um ofício dirigido ao director da Manutenção solicitei que me fôsse indicado qual era a parte da importação destinada às necessidades do exército, para que só a parte restante pagasse o direito diferencial como é de lei.

A resposta que obtive foi esta:

Leu.

Devo dizer à Câmara que esta última informação é grave. Estou informado que a Manutenção Militar vendeu, por toda a parto, farinha de trigo importado e fazia a propaganda dos seus produtos, distribuindo tabelas de farinha, estando há um mós a fornecer 132 padarias independentes de Lisboa. Isto constitui matéria grave de acusação para a Manutenção Militar...

O Sr. Joaquim Ribeiro: - Hoje que há normalidade, há, talvez, razão para protestar, mas houve um período em que a Moagem não queria vender.

O Orador: - Eu não quero referir-me ao aspecto militar da questão, nem a quanto ela estará sob a alçada dos regulamentos disciplinares ou do Código de Justiça Militar. Desejo agir como Ministro da Agricultura inteligente ou desinteligentemente, mas conforme aquilo que a minha consciência me impõe. Vou comunicar ao Sr. Ministro da Guerra o que se passa e se o não fiz há mais tempo, foi porque aguardava esta interpelação.

Estou informado que os factos invocados pela Manutenção Militar não correspondem à verdade. Espero que o Sr. Ministro da Guerra - e toda a gente que conhece o seu carácter não o pode duvidar- mandará inquirir o que se passa na Manutenção Militar, averiguando como êsse estabelecimento cumpra as leis. S. Exa. é uma das pessoas a quem ninguém nega, certamente, idoneidade para intervir na questão.

Se a Manutenção Militar está de facto industrializada - e não conheço diploma - algum que tivesse regulamentado tal princípio, consignado apenas, doutrinàriamente num decreto de 1918, se assim é - ela tem de regular-se pelas leis gerais, não podendo, portanto, fazer quaisquer importações de trigo exótico senão nos termos dessas leis.

O facto aduzido pelo Sr. Deputado interpelado, de ela ter ido, nas condições que referiu, a oferecer seis vinténs a mais além do preço da tabela, foi perturbador e representa um impedimento para se acreditar o manifesto, tornando-o credor da confiança do lavrador, tanto mais que tos lavradores até à data têm honrado os seus compromissos.

Não devemos, todavia, esquecer que a Manutenção Militar tem fornecido aos estabelecimentos hospitalares e de assistência milhares e milhares de contos que o Sr. Ministro da Guerra não referiu há pouco.

E uma bela contra-partida das vantagens que há pouco se apontaram: não pagar contribuições, ter o pessoal mais economicamente.

Há efectivamente uma larga imobilização de capitais nestas circunstâncias. Temos de considerar isto e não esquecer que há uma bela obra de... assistência não direi, porque podia ver-se no termo um sentido pejorativo: a da instituição, em Lisboa, no Campo de Santa Clara, da mess dos oficiais.

Tanto o Ministério da Guerra como o Ministério da Agricultura nada têm que ver com aquela modalidade de prestação de contas, que é feita pelo Conselho Superior de Finanças.

De maneira que, neste caso particular, o Ministro da Guerra fará o que julgar conveniente; e tenho a certeza que será em harmonia com os interêsses inferiores, com todos os poderes estabelecidos.

Tenho dito.

Os àpartes não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Tavares Ferreira: - Mando para a Mesa o parecer do orçamento do Ministério das Finanças.

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24 Diário da Câmara aos Deputados

O Sr. Agatão Lança: - Sr. Presidente: mando para a Mesa o parecer do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se um acórdão da comissão de verificação de poderes sôbre a eleição do Funchal, propondo um inquérito.

Foi lida na Mesa.

Protestos da minoria monárquica.

O Sr. Carvalho da Silva: - Isto é espantoso! É uma vergonha. Não há dignidade; isto é intolerável.

A maioria quere prejudicar a minoria monárquica; e nós aqui estamos.

O Sr. António Maria da Silva julga-se o dono do País!

Isto é uma verdadeira vergonha: é uma provocação.

O orador não reviu.

O Sr. Mário de Aguiar: - Depois não querem rcvoluç5es. Todas são legítimas. O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: - Peço a V. Exa., Sr. Presidente, o favor de me dizer se V. Exa. marcou para ordem do dia da próxima sessão, como foi resolvido, a continuação do debate sôbre a proposta do Sr. Manuel José da Silva.

É um negócio urgente.

O Sr. Presidente: - Já não está em debate.

O Sr. Carvalho da Silva: - Eu peço a V. Exa. que seja o Presidente desta Câmara o não o seja dum partido.

Apoiados.

Não apoiados.

Tenho por V. Exa. o respeito devido à situação que ocupa; quero tê-lo: mas foi votado há pouco um requerimento do Sr. Felizardo Saraiva para continuação do debate.

Apoiados.

Se quere que nós respeitemos a sua alta posição, peço a V. Exa. que nos respeite também.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - V. Exa. não tem o direito de se dirigir à Mesa nesses termos.

Não apoiados.

Apoiados.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: - V. Exa. não pode ser partidário nesse lugar. Tem de ser o Presidente da Câmara.

Vozes: - Isto não pode ser!

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Como Presidente da Câmara, chamo à ordem V. Exa.

V. Exa. não pode dirigir-se assim à Mesa.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: - Lamento que V. Exa. esteja a saltar por cima do Regimento.

Não pode ser partidário dum partido que se julga o dono do País.

Peço a palavra para antes do se encerrar a sessão.

Vozes: - Não pode ser.

O Sr. Presidente retine a campainha.

O Orador: - Eu pedi a palavra para antes do se encerrar a sessão e antes do Sr. Pedro Pita.

O orador não reviu.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Pedro Pita para antes de se encerrar a sessão.

O Sr. Carvalho da Silva: - V. Exa., repito, não pode saltar por cima do Regimento da Câmara, nem dos meus direitos.

Não pode ser; e há-de dar-me a palavra.

Vários protestos por parte da minoria monárquica.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é na segunda-feira, 22, à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:

A mesma da sessão de hoje e mais a interpelação do Sr. João Soares ao

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Sessão de 19 de Fevereiro de 1926 25.

Sr. Ministro do Comércio e Comunicações.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Acórdão

Da 1.ª comissão de verificação de poderes, para que se proceda a um inquérito que abranja todos os factos constantes do protesto relativo à eleição do candidato a Deputado pelo círculo n.° 43 (Funchal) o cidadão Luís Lopes Vieira de Castro.

Para a Secretaria.

Substituição

Substituir na comissão do Orçamento o Sr. Velhinho Correia pelo Sr. João da Cruz Filipe.

Para a Secretaria.

Renovação de iniciativa

Renovo a iniciativa da proposta de lei n.° 896-C.

Câmara dos Deputados, 19 de Fevereiro de 1926.- O Ministro das Colónias, Ernesto Maria Vieira da Rocha.

Junte-se o processo e envie-se à comissão de colónias.

Projectos de lei

Do Sr. Alberto Jordão, dando a classificação de chefes de repartição aos chefes dos armazéns gerais industriais, criados pelo decreto n.° 783, de Agosto de 1918.

Para o "Diário do Governo".

Do Sr. Rafael Ribeiro, reorganizando os quadros dos Ministérios, suas dependências e serviços autónomos.

Para o "Diário do Governo".

Do Sr. António Pereira Forjaz, modificando as propinas a pagar nos estabelecimentos de ensino.

Para o "Diário do Governo".

Do Sr. Agatão Lança, contando o tempo de serviço aos empregados que prestaram serviço nos antigos paços e que são hoje funcionários do Estado.

Para o "Diário do Governo".

Propostas de lei

Do Sr. Ministro da Instrução Pública, fixando o quadro do pessoal do Hospital Escolar, com os vencimentos designados na tabela anexa que faz parte da presente lei.

Aprovada a urgência.

Para a comissão de instrução superior:

Para o "Diário do Governo".

Do mesmo, determinando que seja fundamentada, em todas as faculdades universitárias, a não recondução ou exclusão dos assistentes.

Aprovada a urgência.

Para a comissão de instrução superior.

Para o "Diário do Governo".

Do mesmo, substituindo por outros os artigos 149.° e 102.° do regulamento da Faculdade Técnica da Universidade do Porto.

Aprovada a urgência.

Para a comissão de instrução especial.

Para o "Diário do Governo".

Do mesmo, determinando que as dissertações inaugurais dos alunos das Faculdades de Medicina para o título de doutor, e dos das Escolas Normais Superiores para admissão aos exames de Estado, voltem a ser impressas como anteriormente à lei n.° 970, do Maio de 1920.

Aprovada a urgência.

Para a comissão de instrução superior.

Para o "Diário do Govêrno".

Do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, aprovando, para ratificação, o protocolo assinado em Berne, em 24 de Junho de 1923, e a declaração do Ministro de Portugal em Berne relativos à adesão, por Portugal, às cláusulas financeiras e às económicas do Tratado de Paz assinado naquele dia na referida cidade.

Aprovada a urgência.

Para a comissão dos negócios estrangeiros.

Para o "Diário do Governo".

Pareceres

Da comissão do Orçamento, sôbre o orçamento do Ministério do Interior para 1926-1927.

Imprima-se com urgência.

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Da mesma, sôbre o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros para 1926-1927.

Imprima-se com urgência.

Nota de interpelação

Em 19 de Janeiro findo, dirigi ao Sr. Ministro da Instrução Pública a nota de interpelação seguinte:

Sôbre o problema do educação física nos liceus e sôbre a execução da lei n.° 1:406, de 18 de Agosto de 1923, nas Universidades (Boletim Oficiai do Congresso n ° 27).

Já o Sr. Ministro da Instrução Pública se declarou habilitado a responder a esta interpelação. Neste momento, ratifico-a, resumindo os seus pontos essenciais, esperando que o Sr. Ministro da Instrução Pública, a cujas qualidades de grande competência pedagógica e de fé patriótica presto sincera homenagem, se dignará esclarecer, em resposta por escrito, qual a resolução dos assuntos indicados.

A educação física nos liceus é deficiente o prejudicada pela extensão absorvente dos programas do formação intelectual. Esta opinião é unânime para quantos não estão obcecados por um particularismo inadmissível, e procuram a instrução e educação cuíca e física da nossa mocidade. Afirmou-a o Exmo. Sr. general Bernardo de Faria, como director do Colégio Militar, na recente abertura das aulas, dizendo:

"Há manifestamente um prejudicial predomínio do esfôrço intelectual sôbre o esfôrço físico. E como é imposto êsse excessivo estorço intelectual? Obrigando o aluno a uma tal dispersão diária de atenção, que o impede de se iniciar na faculdade de raciocinar. E mesmo quanto à natureza do esfôrço físico considerado, não é marcado claramente lugar para jogos, que constituem um dos melhores meios de prover ao desenvolvimento físico como escola do iniciativa, decisão e vontade.

São o único campo em que a actividade da criança pode encontrar compensações para o regime de passividade a que está sujeita. Passa o dia a obedecer, porque tudo lhe está meticulosamente regulado; o levantar e o deitar, as refeições, os trabalhos intelectuais e ginmástica chamada clássica".

Muito justamente afirmou nas suas notáveis conferências para o Curso Normal de Educação Física, o ilustre especialista, Sr. Pinto de Miranda:

"A educação física não tem por objectivo simplesmente a cultura física. E alguma cousa mais, é um elemento importante de educação geral. Não é um fim, é um meio".

Neste momento, um devotado cultor de educação física, o Sr. professor Aníbal Pinheiro sustenta em um jornal do Lisboa, Diário de Noticias, uma campanha rigorosamente fundamentada confia o absurdo excesso do cultura mental em prejuízo do desenvolvimento físico dos alunos.

Conhece o Sr. Ministro da Instrução Pública muitos- outros trabalhos, que sôbre o assunto existem e ao seu espírito suficientemente culto não escapam os vícios dos programas dos liceus, tanto mais que é um distinto professor do ensino liceal e abalizado médico.

Já nomeou uma comissão de professores, que recebeu instruções bera claras, definindo os pontos do vista do Sr. Ministro da Instrução Pública, tendentes a suprimir a cansaço mental produzido pelos actuais programas; sabemos que tenciona completar essa comissão com professores liceais de educação física.

Essa comissão sob o impulso firme e criterioso do Sr. Ministro da Instrução Pública não se eternizai á, mas estamos convencidos, em breve apresentará o relatório dos seus trabalhos, que remedeie o deplorável estado de cousas.

O Curso Normal de Educação Física não satisfaz as exigências pedagógicas da formação dos professores, sendo indispensável a Escola Normal do Educação Física, criada em 1911 o ainda não efectivada.

Um acordo com os outros departamentos ministeriais interessados - Guerra, Marinha, Comércio e Agricultura - permitiria uma melhor e mais económica efectivação dêsse pomo essencial do programa do cultura física.

Á Franca, por exemplo, tem o seu alto comissariado de educação física e despor-

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Sessão de 19 de Fevereiro de 1926 27

tos (instrução escolar, post-escolar e militar) subordinado ao sub-secretário do ensino técnico. É o conhecido Frantz Reichel, o activo secretário geral das últimas Olimpíadas, o incumbido da secção post-escolar e da vulgarização dos desportos no exército.

O conde de Baillet Latour, presidente do Comité Olímpico Internacional, diz:

"O nosso objectivo deve ser, por um trabalha persistente, desenvolver a educação física da mocidade e estimular os que não possuírem as qualidades atléticas, levando-os a realizar exercícios compatíveis com o seu desenvolvimento, que serão uma útil distracção e uma garantia de saúde. O desporto é uma necessidade social e. ao mesmo tempo, o meio mais seguro de regenerar a raça empobrecida pelo esfôrço violento da guerra".

E de justiça prestarmos homenagem à brilhante representação diplomática do desporto português na VII Olimpíada, a única grande realização de Portugal, devida ao entusiasmo e à magnífica actividade do Senador Sr. José Pontes, que tem sido o vibrante impulsionador do desporto o a quem se devo a iniciativa do Grupo Parlamentar de Estudos de Educação Física e Desportos.

A acção dêsse Grupo tem vencido a inércia burocrática oficial, que com raras e brilhantes excepções, tem descurado a educação física.

Ainda nos surpreende a indiferença oficial pela nobilíssima função educativa da Associação dos Escoteiros do Portugal, onde encontraríamos, um poderoso meio de desenvolvimento físico e cultura cívica, se nos liceus fossem criados grupos de escoteiros, como já existem em alguns. Em todos os liceus, com o incitamento oficial, se deveriam criar êsses grupos de escoteiros ou grupos de adueiros, irmanados no mesmo grande objectivo.

Finalmente, a lei n.° 1:406, de alto alcance moral, de prestígio para as instituições militares e de justa selecção do escol, criando nas Universidades cursos de desenvolvimento físico e conhecimentos militares, não tem sido cumprida. Qual é o motivo? Esta lei tem um fim educativo, que não escapará ao Sr. Ministro da Instrução Pública.

Evita essa lei que os rapazes, alunos das Universidades e futuros dirigentes da colectividade procurem processos do não cumprir o primeiro dever cívico - o serviço militar; permite-lhes que venham às fileiras como oficiais milicianos, após a conclusão dos respectivos cursos superiores.

Essa lei não traz encargos para o Estado.

Cumpro um dever de representante da Nação chamando a esclarecida atenção do Sr. Ministro da Instrução Pública para as questões expostas, e solicitando:

1.º Que o ensino de gimnástica seja ministrado em todas as classes, num mínimo de duas lições semanais;

2.° Que sejam constituídos grupos de escoteiros em todos as liceus, reservando-se as tardes de sábado para os seus exercícios (depois das 12 horas não haveria aulas).

3.° Que seja criada a Escola Normal de Educação Física, de acordo com todos os Ministérios interessados.

4.° Que a lei n.° 1:466 seja cumprida ou imediatamente substituída por outras disposições, que melhor correspondiam aos seus objectivos.

Confio absolutamente na iniciativa realizadora do Sr. Ministro da Instrução Pública, que adoptará a melhor solução e procuro com esta interpelação dar mo deste concurso a tarefa do Grupo Parlamentar de Estudos do Educação Física e Desportos.

Saúde e Fraternidade.

Palácio do Congresso da República, 19 de Fevereiro de 1926. - Pires Monteiro.

Expeça-se.

Requerimentos

Requeiro, pelo Ministério do Comércio, cópia do contrato de concessão feita pelo Estado à Companhia do Caminho de Ferro de Penafiel à Lixa e também do último concurso para a exploração do mesmo caminho de ferro.- Luís Gonzaga da Fonseca Moreira.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja fornecida nota de todas as delegações, agências ou sucursais da Caixa Geral de Depósitos, seus funcionários, nomes e quantias percebidas por

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cada um, incluindo directores, membros do conselho fiscal e mais pessoal do outra qualquer natureza, tanto dessas sucursais e delegações provincias, como da sede e delegações ou sucursais de Lisboa, devendo incluir-se na nota pedida as gratificações, subvenções ou percentagens de cada um dos citados funcionários. - Sant'Ana Marques.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me seja enviada cópia do relatório do inquérito industrial do Parque Automóvel Militar, realizado em 1926.

Sala das Sessões, 19 de Fevereiro de 1926. - Henrique Pires Monteiro.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, seja indicada a base para a inscrição de 6.601.864$50 destinada a subsídio de alimentação a 4:785 sargentos.

Sala das Sessões, 19 de Fevereiro de 1926. - Henrique Pires Monteiro.

Expeça-se.

O REDACTOR - Sérgio de Castro.

33 - Imprensa Nacional - 1925-1926

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