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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 74

EM 20 DE ABRIL DE 1926

Presidência do Exmo. Sr. Alfredo Rodrigues Gaspar

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Mariano de Melo Vieira

Sumário.-Respondem à chamada 40 Srs. Deputados Aberta a sessão, procede-se à leitura da acta, que é adiante aprovada, e dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia.- O Sr. Manuel José da Silva reclama providências em benefício das vitimas dos abalos sumiços ocorridos na Horta

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes) responde que já tinha elaborado nesse sentido uma proposta de lei, que envia para a Mesa, com o pedido de urgência e dispensa do Regimento.

O Sr. Sant'Ana Marques protesta contra o aumento das avenças no imposto de transacções. Responde o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Manuel Serras defende a remodelação dos serviços de emigração, nos termos duma proposta apresentada ao Parlamento, cuja discussão requere.

O Sr. Presidente do Ministério (António Mana da Silva) dá o seu assentimento às considerações do orador antecedente.

O Sr. António Augusto Rodrigues pede que se conclua a construção dalgumas estradas no distrito de Castelo Branco.

O Sr Ministro do Comércio (Gaspar de Lemos) dá explicações.

O Sr. Alberto Vidal requere que seja discutido com urgência o parecer n.° 32.

O Sr. António Cabral protesta contra a proibição da mesma no concelho de Sátão.

O Sr. Ministro das Finanças promete transmitir as considerações do orador ao Sr. Presidente do Ministério.

É concedida a urgência e dispensa do Regimento para a proposta de lei do Sr. Ministro das Finanças abrindo um crédito de 500 contos destinados a socorrer os povos do distrito da Horta sinistrados pelo ciclone e cataclismo sumiço a proposta entra em discussão e é aprovada depois de usarem da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Dinis da Fonseca, Sant'Ana Marques, Crispiniano da Fonseca, Filomeno da Câmara, Amâncio de Alpoim, Pires Monteiro, Cunha Leal, Manuel José da Silva e Ministro das finanças.

O Sr. Presidente propõe um voto de sentimento pela morte do antigo Deputado Sr. Agostinho Lúcio da Silva. Em nome dos vários lados da Câmara associam-se à proposta os Srs. Carvalho da Silva, Sant'Ana Marques, Alberto Dinis da Fonseca, Francisco Cruz, Crispiniano da Fonseca, Ramada Curto, Paiva Gomes, Álvaro de Castro e Ministro das Finanças. É aprovada a proposta do Sr. Presidente.

São aprovados os requerimentos dos Srs. Manuel Serras e Alberto Vidal.

Ordem do dia. - Continua em discussão a proposta relativa ao régie da indústria e comércio dos tabacos

O Sr. Ministro das Finanças envia para a Mesa uma proposta de lei estabelecendo um régie provisório. Requere urgência e dispensa do Regimento, que a Câmara concede, depois dalguns Srs. Deputados usarem da palavra sôbre o modo devotar.

A proposta r entra em discussão, usando da palavra os Srs. Álvaro de Castro, Marques Loureiro, Cunha Leal e Carvalho da Silva.

O Sr. Presidente interrompe a sessão, marcando a continuação dos trabalhos para as 2 horas e 30 minutos.

Reaberta a sessão, prossegue o debate sôbre o orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações e parecer n.° 45-B.

O Sr. Presidente encerra depois a sessão, marcando a seguinte para o dia imediato, com a respectiva ordem de trabalhos.

Abertura da sessão, às 15 horas e 15 minutos.

Presentes à chamada, 40 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 78 Srs. Deputados.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

Responderam à chamada os Srs.:

Abel Teixeira Pinto.
Adolfo Teixeira Leitão.
Alberto Carlos da Silveira.
Alberto Nogueira Gonçalves.
Alfredo Pedro Guisado.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amâncio do Alpoim.
António Augusto Rodrigues.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António José Pereira.
António Maria da Silva.
António de Paiva Gomes.
Artur Brandão.
Artur Saraiva de Castilho.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos de Moura Carvalho.
Custódio Martins de Paiva.
Dagoberto Augusto Guedes.
Domingos António de Lara.
Domingos José de Carvalho Araújo.
Guilhermino Alves Nunes.
Henrique Pereira de Oliveira.
Joaquim Maria de Oliveira Simões.
José Carlos Trilho.
José Domingues dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
Luís da Costa Amorim.
Luís de Sousa Faísca.
Manuel José da Silva.
Manuel Serras.
Rafael Augusto de Sousa Ribeiro.
Rodrigo Luciano de Abreu e Lima.
Severino Sant'Ana Marques.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Valentim Guerra.
Viriato Sertório dos Santos Lobo.
Vitoríno Máximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Srs.:

Adolfo de Sonsa Brasão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Alberto Dinis da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal Alberto de Moura Pinto.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Alfredo da Cruz Nordeste.
Álvaro Xavier de Castro.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Pereira Peixoto Beleza.
António Albino Marques de Azevedo.
António Ferreira Cabral Pais do Amaral.
António Ginestal Machado.
António Leite Magalhães.
António Lino Neto.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Marques Guedes.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur da Cunha Araújo.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Rebelo Arruda.
Bernardo Pais de Almeida.
Carlos de Barros Soares Branco.
Custódio Lopes de Castro.
Daniel Rodrigues Salgado.
Delfim Costa.
Diodo Albino de Sá Vargas.
Eduardo Fernandes de Oliveira.
Eduardo Ferreira dos Santos Silva.
Elmano Morais Cunha e Costa.
Felizardo António Saraiva.
Filemon da Silveira Duarte de Almeida.
Filomeno da Câmara Melo Cabral.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Cruz.
Francisco Godinho Cabral.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Henrique Maria Pais Cabral.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime António Palma Mira.
João Bernardino de Sousa Carvalho.
João da Cruz Filipe.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João Tamagnini de Sousa Barbosa.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.

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Sessão de 20 de Abril de 1926 3

Joaquim Nunes Mexia.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Maria Alvarez.
José de Moura Neves.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José Rosado da Fonseca.
José Vicente Barata.
Lourenço Correia Gomes.
Luís Gonzaga da Fonseca Moreira.
Manuel Alegre.
Manuel da Costa Dias.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Manuel Homem de Melo da Câmara.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano de Melo Vieira.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Raul Lelo Portela.
Rui de Andrade.
Sebastião de Herédia.
Vasco Borges.

Não compareceram à sessão os Srs.:

Afonso Augusto da Costa.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Pinheiro Tôrres.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Ferreira.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro da Cunha Ferreira Leite.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Alves Calem Júnior.
António Araújo Mimoso.
António Augusto Alvares Pereira Sampaio Forjaz Pimentel.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António José de Almeida.
António Lobo de Aboim Inglês.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Fuseta.
Domingos Augusto Reis Costa.
Domingos Leite Pereira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Indalêncio Froilano de Melo.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Águas.
João Lopes Soares.
João Raimundo Alves.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Joaquim Toscano Sampaio.
José António de Magalhães.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José do Vale de Matos Cid.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa Coutinho Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Góis Pita.
Raul Marques Caldeira.
Tomé José de Barros Queiroz.
Zacarias da Fonseca Guerreiro.

Às 15 horas principiou afazer-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 40 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Leu-se a acta.

Deu-se conta do seguinte

Oficio

Do Ministério do Comércio, enviando um exemplar do orçamento do mesmo Ministério e um mapa das alterações a fazer no mesmo orçamento.

Para a Secretaria.

Carta

Do Sr. Ministro da Agricultura, comunicando não poder comparecer à sessão da noite, em que está inscrito o negócio urgente do Sr. Jorge Nunes.

Para a Secretaria.

Representação

Da comissão paroquial do Centro Católico de Casegas, pedindo que seja aprovado o projecto de lei sôbre reconhecimento de personalidade jurídica às igrejas.

Para a Secretaria.

Telegramas

Pedindo a aprovação do projecto reconhecendo personalidade jurídica à Igreja:

Das Irmandades do concelho de Setúbal, Cassurães (Mangualde), Pessegueiro (Vouga);

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4 Diário da Câmara aos Deputados

Das Confrarias de S. João de Areias, Santa Comba Dão, Beiriz o S. José Ribamar (Póvoa de Varzim);

Das Irmandades do Pôrto;

Das Juventudes Católicas de Arrifana (Guarda) e Vagos;

Da Câmara Municipal de Sever do Vouga;

Do Centro Católico de Ariz (Marco de Canaveses);

Dos católicos de Oliveira do Conde (Carregal do Sal);

De comerciantes de Sever do Vouga.

Para a Secretaria.

Da Câmara Municipal de Penalva do Castelo, protestando contra a concessão de personalidade jurídica a Igreja.

Para a Secretaria.

Dos sargentos de infantaria n.° 35 e adidos de infantaria n.° 28, de Coimbra, pedindo a aprovação do projecto de lei n.º 54-K.

Para a Secretaria.

Dos sargentos enfermeiros das colónias, de Lourenço Marques, pedindo para serem reformados no pôsto do tenente.

Para a Secretaria.

Dos viticultores, sindicatos agrícolas e câmaras municipais da região vinícola do Dão, pedindo para ser incluída aquela região na proposta de lei publicada no Diário do Govêrno, 2.ª série, de 18 de Fevereiro de 1926.

Para a Secretaria.

Pedindo para ser aprovado o projecto reconhecendo personalidade jurídica à Igreja:

Das Juntas do Freguesia de Mões e Pepim (Castro Daire), do Feital, Póvoa (Trancoso), de Decermilo (Sátão), do Ribeirão (Trufa), do Mouronho (Silvares). do Beiriz (Póvoa de Vaizim) e de Vagos.

Para a Secretaria.

Propostas de lei

Dos Srs. Ministros das Finanças e do Comércio, reforçando com 1:000.000$ a

verba do artigo 39.° do capítulo 5.° da proposta orçamental do Ministério do Comércio e Comunicações para o actual ano económico.

Para a comissão do Orçamento.

Dos Srs. Ministros das Finanças e da Instrução, aumentando com um observador chefe de serviço, e fixando-lhe o vencimento, o pessoal do Observatório Astronómico da Universidade de Coimbra.

Para a comissão de instrução superior.

O Sr. Presidente: - Vai entrar-se no período de

Antes da ordem do dia.

O Sr. Manuel José da Silva: - Sr. Presidente: recorda-se, decerto, V. Exs. das considerações que há dias fiz nesta Câmara, pondo a ao corrente do lamentável desastre ocorrido na Horta, por virtude de um violentíssimo abalo sísmico. As consequências dêsse abalo foram na verdade de uma latitude superior àquela que as primeiras notícias faziam antever.

No emtanto, desde o início, todos nós ficámos convencidos da necessidade do poder central actuar em termos de poder levar a essa gente do distrito da Horta a certeza de que os poderes públicos da República olhavam para êles numa altura de verdadeira desgraça.

Os abalos sísmicos continuam. Não sei se com as mesmas lamentáveis consequências, mas seja como fôr, o que é certo é que o Govêrno não pode manter-se indiferente, perante a situação dessa pobre gente.

O Sr. Ministro das Finanças, respondendo em nome do Govêrno às considerações que fiz, e aos alvitres que formulei, S. Exa., e muito bem, afirmou perante a Câmara o seu bom propósito de cumprir, neste lance, o seu dever. Mas, Sr. Presidente, se a acção do Govêrno se torna necessária, não é só em palavras mas em factos. E assim, creio bem que o Sr. Ministro das Finanças, na intenção de honrar as suas palavras, proferidas perante a Câmara e registadas nos anais parlamentares, S. Exa. decerto, deve ter já estudado a esta hora, a melhor forma de prestar assistência a essa gente.

Confesso que se não se estivesse no es-

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Sessão de 20 de Abril de 1926 5

paço da sessão legislativa, em que é restringida, por virtude das chamadas leis-travão, a iniciativa dos Deputados, eu apresentaria as providências que entendesse compatíveis com a situação.

Infelizmente a iniciativa dos Deputados é restringida, repito, e ao Govêrno cabe essa iniciativa. Estou certo que o Govêrno está estudando o assunto, mas eu não quis deixar de aproveitar o ensejo de chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças, provocando da parte de S. Exa. aquelas explicações que sejam a primeira etapa das providências a tomar; e que não podem ser demoradas.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Já há dias o Sr. Manuel José da Silva se tinha referido a êste assunto que mereceu, como devia merecer, dada a sua importância e gravidade dos acontecimentos que se passaram no distrito da Horta, a justa atenção do Govêrno.

Não se trata só de obviar a alguns dos inconvenientes resultantes dos desastres provenientes do ciclone passado e dos recentes abalos sísmicos.

Caiu sôbre êsse distrito, como já disse nesta Câmara uma outra calamidade de ordem fiscal. É que devido ao atraso dos serviços fiscais, só êste ano começa, por assim dizer, a vigorar para aquele distrito o regime criado pela lei n.° 1:368, e os contribuintes do distrito da Horta vêem-se coagidos a pagar as contribuições de 1922-1923 até o exercício corrente.

As palavras de S. Exa. são justas. O Poder Executivo não as desconhece, e procura atenuar em pronto os males de que sofre actualmente o povo do distrito da Horta, pelo que tenho presente uma proposta abrindo um crédito na importância de 500 contos, para reparações aos lesados, fixando a verba de 500 contos por não saber o montante dos prejuízos.

Concede também uma verdadeira moratória no pagamento das contribuições, dando um prazo de 10 anos para o seu pagamento, que será feito em prestações, quer para os exercícios passados, quer para o ano económico corrente.

Como se trata de uma proposta que, julgo, deve estar no ânimo da Câmara, ouso pedir a V. Exa. se digne consultá-la sôbre se concede a urgência e a dispensa do Regimento, na devida altura.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Sant'Ana Marques (para explicações}:- Como o Sr. Ministro das Finanças acaba de tratar de um assunto que se prende com os encargos do contribuinte, aproveito o ensejo para dizer a S. Exa. que no distrito de Portalegre as avenças do imposto de transacção, que S. Exa. recomendou que não subissem, foram aumentadas, e a tal ponto que as Associações Comercial e Industrial pretendem vir em comissão a Lisboa tratar do assunto.

Também ao concelho de Ponte de Sor foi um empregado de finanças com o intuito de aumentar o imposto de transacções.

Sabida como é a situação aflitiva do contribuinte, temos de aceitar uma de duas: Ou o Sr. Ministro das Finanças se esqueceu de fazer a devida recomendação, ou se a fez, não foi atendida.

Sr. Presidente: é desnecessário manifestar a urgência que há na resolução dêste assunto, e por isso desejava ouvir o Sr. Ministro das Finanças.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Não sei se o Sr. Sant'Ana Marques ouviu a resposta que eu dei há dias ao Sr. Carvalho da Silva sôbre o mesmo assunto que S. Exa. agora tratou.

Eu dei instruções, por uma circular, para que as avenças do imposto sôbre transacções não fossem aumentadas.

Vou renová-las, mais uma vez, e, devo ainda informar a Câmara que, dentro de pouco tempo, aqui trarei a proposta de lei sôbre impostos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Manuel Serras: - Sr. Presidente: numa das últimas sessões foi aqui ventilado pelo Sr. Rafael Ribeiro um dos problemas que mais interessam ao País e, que eu, pela circunstância especial de ser funcionário ligado aos serviços que a êsse problema dizem respeito, estou em condições de esclarecer.

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6 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Rafael Ribeiro fez também justiça ao funcionário ilustre e homem de bem, que é o Sr. Filipe Mendes que, como V. Exas. sabem, durante dois anos, seria o Govêrno Civil de Lisboa.

Foi resposta ao Sr. Rafael Ribeiro, o Sr. Presidente do Ministério disse, com a maior clareza, que se tornava necessário remodelar os serviços de emigração, e que aguardava até que esta Câmara se pronunciasse acerca de uma proposta de lei que já esteve na ordem do dia, mas que, por quaisquer motivos, dela desapareceu.

Se não se estivessem dando acontecimentos de certa maneira graves, como seja certa e determinada campanha que eu vejo nalguns jornais da capital, não tomaria tempo à Câmara: mas, infelizmente para o País e para nós Deputados, nem sempre se encontra acolhimento nas colunas dos jornais, para as nossas razões, para os nossos motivos de queixa e para aqueles argumentos que, em regra, empregamos em homenagem à verdade.

Já há três anos que nesta casa do Parlamento se arrasta uma proposta de lei que autoriza o Poder Executivo a remodelar os serviços de emigração. Essa proposta foi da iniciativa do Govêrno do Sr. Álvaro de Castro, e S. Exa. sabe bem os esfôrços empregados pelos funcionários da emigração, no sentido de que êsses serviços fossem remodelados.

Não se percebe portanto porque é que no Século se levantou agora uma campanha de insídias, de calúnias e de insinuações, exactamente quando o Govêrno está disposto a fazer a remodelação dêsses serviços, desde que o Parlamento a tal o autorize.

Sr. Presidente: em volta dêsses serviços há dois cancros: es agentes de emigração e as companhias de navegação; e ambos êles têm bastante dinheiro para poderem pagar essas campanhas, e, por isso, elas subsistem.

O Século está, pois, neste momento, como que arrombando uma porta que já está aberta.

Se, porventura, desta casa do Parlamento tivesse partido qualquer determinação que impossibilitasse o Govêrno de actuar no sentido do remodelar a actual legislação caótica dos serviços de emigração, ainda seria justificada essa campanha; assim, ela é apenas determinada por mesquinhas vinganças pessoais, com que o País nada tem.

A campanha de outros jornais é feita por agentes de passagens e passaportes, que a pagam a tanto por linha.

É necessário que se dêem facilidades a quem precisa de ir para o estrangeiro, e. é essa, precisamente a opinião do Sr. Presidente do Ministério, que entende que é absolutamente urgente que se reformem êsses serviços.

Porem, certos e determinados jornais, especialmente O Século, entendem que são êles que devem orientar e dirigir a acção do Estado, o que é deveras curioso.

Peço a V. Exa., Sr. Presidente, que consulte a Câmara sôbre se ela permito que na ordem da noite, e, sem prejuízo das propostas que lá estão, seja incluída a proposta autorizando o Poder Executivo a remodelar os serviços de emigração, bem como o parecer n.º 122, referente aos engenheiros civis do Ministério do Comércio,

Quero terminar as minhas considerações, afirmando à Câmara que. quando se discutir a proposta a que há pouco me referi, ou lerei alguns documentos que possuo pura demonstrar.a V. Exas. quais são os interêsses ocultos e verdadeiramente escuros que existem por detrás dêste problema.

E a propósito, Sr. Presidente, devo declarar que tenho visto, com muita mágoa, que no próprio elevador desta casa do Parlamento, sobem cavalheiros que já andaram em carros celulares, e, que aqui vêem mendigar favores junto de alguns Srs. Deputados. Sr. Presidente: nós não estamos aqui para atender os interêsses dêsses cadastrados, mas sim os do Estado.

Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Câmara se permite que os pareceres n.ºs 39 e 122, entrem ca ordem da noite de uma das próximas sessões.

Tenho dito.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Já tive o ensejo de me referir nesta Câmara ao assunto versado pelo Sr. Manuel Serras.

Nós temos que fiscalizar a emigração,

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principalmente a que se dirige para a América do Norte.

Brevemente farei publicar toda a legislação existente sôbre o caso.

É preciso dar assistência médica ao emigrante.

Apoiados.

A exploração que se faz hoje com os brancos é igual à que se fazia antigamente com os pretos.

É justo, porém, conceder todas as facilidades àqueles que viajam por necessidade de comércio ou por turismo.

Quanto aos vistos, devemos manter o princípio da reciprocidade.

Apoiados.

Convém, num assunto como êste, que o Parlamento lhe dedique toda a atenção.

Nós não podem os dispensar o agente, contanto que êle não seja um explorador por conta do Estado. O Govêrno desde resolver o assunto de uma forma razoável.

O Sr. Sant'Ana Marques: - V. Exa. podia tê-lo resolvido.

O Orador: - É preso por ter cão e por não ter. Se o Govêrno usa de autorizações, é mau; se não usa, mau é.

O Parlamento é que deve pronunciar-se.

O orador não reviu.

O Sr. António Augusto Rodrigues: - Desejava que o Sr. Ministro da Justiça ouvisse estas minhas ligeiras considerações. Porém, como S. Exa. não está presente e como é difícil chegar-nos a palavra, aproveito a presença do Sr. Presidente do Ministério para pedir a S. Exa. o favor de transmitir àquele seu colega da pasta da Justiça as minhas considerações.

O decreto sôbre serviços jurisdicionais e tutelares dos menores, de 15 de Maio de 1925, não obstante a sua doutrina constituir uma das mais nobres iniciativas da República, contém uma disposição que actualmente dá lugar a uma gravíssima injustiça, que de certo modo pode afectar a própria ordem social.

Refiro-me ao disposto no § 9.° do artigo 47.° que permite a penhora sôbre salários e ordenados, nos termos do decreto de 21 de Outubro de 1907.

Abstenho-me de apresentar qualquer projecto de lei que resolva o assunto, convencido de que o Sr. Ministro da Justiça tomará em atenção as minhas palavras e providenciara a fim de que esta inconveniente disposição seja modificada, tendo em atenção as actuais circunstâncias e o valor da moeda.

Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para o estado em que se encontram as estradas no meu distrito.

As reclamações feitas a êste respeito são gerais e portanto é muito provável que as minhas palavras se percam no eco de tantas reclamações. No emtanto confio em que o Sr. Ministro do Comércio, com os desejos que tem de ser útil ao seu País, há-de providenciar para que êste estado de causas se modifique.

Chamo, em especial, a atenção de S. Exa. para que ordene a conclusão das estradas já começadas, como entre outras são as seguintes do meu distrito: entre a Sertã e Vila Velha de Ródão, desde Proença-a-Nova; entre Oleiros e Castelo Branco; da Lousa a Belver, desde a Sertã e reparar a estrada de Tomar à Sertã, não esquecendo a ponte da Bouça, sôbre o Zêzere, em estado adiantado de construção e cuja conclusão se impõe pois com ela se estabelece a ligação dos distritos de Leiria a Castelo Branco.

Aguardo que S. Exa. satisfaça êste meu pedido, que se me afigura de inteira justiça e utilidade não só para as regiões servidas por aquelas estradas mas também para o País.

Tenho dito.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Gaspar de Lemos): - Sr. Presidente: ouvi as reclamações do Sr. António Augusto Rodrigues e tenho a declarar que as tomo na devida consideração.

Pelo que diz respeito à conclusão de estradas, estou em princípio inteiramente de acordo com S. Exa.; mas encontro-me desprovido de recursos para mandar proceder a essa conclusão.

Espero, no emtanto, que a Câmara, à qual o assunto está afecto, tomará em conta a necessidade de destinar algumas verbas para a conclusão das estradas já começadas, especialmente daquelas que constituem vias de ligação importantes.

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8 Diário da Camaradas Deputados

a quando se discutir ou o orçamento do meu Ministério ou a proposta de empréstimo.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar ao Sr. António Augusto Rodrigues que transmitirei as suas considerações ao Sr. Ministro da Justiça.

Tenho dito,

O Sr. Alberto Vidal: -Sr. Presidente: o parecer n.º 32 roles e a uma proposta de lei vinda da outra casa do Parlamento e- que concede à Câmara Municipal do Ovar o direito de expropriação de vários terrenos, a fim de só construir um novo bairro para substituir as casas devoradas por um incêndio há cêrca de dois anos.

As obras estão paradas e é de absoluta necessidade e urgência que continuem, o que não poderá acontecer sem a aprovação desta proposta.

Requeiro, portanto, a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que êste parecer seja discutido com urgência.

Tenho dito,

O orador não reviu.

O Sr. António Cabral: - Sr. Presidente: já tinha pedido a palavra na sessão anterior para chamar a atenção do Govêrno para um Telegrama que recebi do concelho de Saião em que me é comunicado o seguinte:

Leu.

Como V. Exa. vê, Sr. Presidente, pareço que, som motivo algum, numerosas fôrças da guarda republicana e da polícia impediram a realização da feira do Pereiro, no concelho do Sátão.

Quem não faz esta comunicação não é nenhum anónimo: é o Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal, Sr. Domingos Dourado.

Estamos habituados a ouvir falar muito de liberdades aos republicanos, mas quando se trata de as praticar vem o abuso da fôrça impedir aos povos que realizem os actos mais naturais e mais convenientes aos seus interêsses.

Se o Govêrno ignora os motivos desta prepotência, deve informar-se, para castigar os culpados se realmente, como creio, há responsabilidades nesta violência inexplicável.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer ao Sr. António Cabral que comunicarei ao Sr. Presidente do Ministério as suas considerações.

Tenho dito.

foi lida na Mesa a proposta do Sr. 3Imtsi.ro das Finanças para a qual requereu a urgência e dispensa do Regimento.

É a seguinte:

Artigo 1.° É aberto no Ministério das Finanças a favor do Ministério do Interior um crédito extraordinário até a quantia de 500:000 o qual constituirá o capítulo 9.º da despega extraordinária da proposta orçamental para o corrente ano económico de 1925-1926 do segundo dos referidos Ministérios sob a seguinte rubrica: para socorrer os povos do distrito da Horta sinistrados pelo ciclone e cataclismo sísmico.

Art. 2.° A importância referida no artigo 1.° será distribuída por uma comissão funcionando na sede do distrito sob a presidência do governador civil e constituída pelas seguintes entidades: Presidente da Junta Geral. Presidente da Associação Comercial. Delegado de Saúdo e Engenheiro Chefe da Circunscrição Industrial.

Art. 3.° As contribuições industrial e predial e imposto sôbre a aplicação de capitais (Secção A) ainda em divida e referentes aos anos económicos do 1922-1923 a 1924-1925 no distrito da Horta serão pagas em 10 prestações anuais, suspendendo-se o respectivo relaxe que só prosseguirá em relação a cada prestação quando não paga nos respectivos prazos.,

§ 1.° Qualquer contribuinte poderá antecipar o pagamento de qualquer número de prestações em divida com a dedução de 6 por cento sôbre a importância respectiva.

§ 2.° O disposto neste artigo o seu § 1.° é igualmente aplicável às mesmas contribuições e imposto relativas ao ano económico de 1925-1926 devendo para êsse

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efeito a respectiva Repartição de Finanças processar a cada contribuinte dez conhecimentos não podendo cada um deles ser da importância interior a 5$.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário. - Armando Marques Guedes.

Foi dispensado o Regimento e concedida a urgência para a referida proposta, que entrou em discussão.

O Sr. Carvalho da Silva: - A minoria monárquica entende que é necessário acudir à situação em que se encontra o distrito da Horta e dá o seu voto à proposta do Sr. Ministro das Finanças, e dá-o também para a moratória concedida às contribuições em atraso, porque o contribuinte não á culpado de que as repartições de fina iças tenham atrasado a cobrança das contribuições; mas êste lado da Câmara lembra também ao Sr. Ministro das Finanças de que não ê só o distrito da Horta que se encontra nessas condições e que para o continente de vem ser dadas as mesmas facilidades de pagamento, principalmente pura o imposto pessoal do rendimento, para que os contribuintes não tenham de pagar quatro anos atrasados de impostos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Dinis da Fonseca: - Êste lado da Câmara associa-se, com todo o prazer, a essa proposta que, embora não vá por completo eliminar o mal daquela ilha, em todo o caso deminui a situação aflitiva em que se encontram os seus habitantes.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Sant'Ana Marques: - Este lado da Câmara aprova a proposta do Govêrno, mas, como fez o Sr. Carvalho da Silva, chama a atenção do Sr. Ministro das Finanças para a necessidade de suspender o imposto de rendimento, porque, pela forma como está sendo cobrado, representa uma enorme injustiça.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Crispinino da Fonseca: - Êste lado da Câmara dá a sua aprovação à proposta ministerial.

Tenho dito.

O Sr. Filomeno da Câmara: - Em nome dêste lado da Câmara declaro que votamos a proposta do lei apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças.

Tenho dito.

O Sr. Amâncio de Alpoim: - A minoria socialista dá o seu voto à proposta.

Tenho dito.

O Sr. Pires Monteiro: - Embora seja contrário a aumentos das despesas, eu dou, neste caso, o meu voto à proposta.

Tenho dito.

O Sr. Cunha Leal: - Em nome da União Liberal Republicana dou o meu voto à proposta.

Tenho dito.

O Sr. Manuel José da Silva: - Em primeiro lugar devo saudar o Govêrno pelo carinho que demonstrou procurando atenuar os males de que, neste momento, enferma o distrito da Horta, e agradeço a todos os lados da Câmara que significaram o seu apoio à proposta do Sr. Ministro das Finanças.

Sei que o crédito proposto não é suficiente, mas, como sou informado de que a sua insuficiência é determinada pelas fracas disponibilidades do Tesouro, basta-me êsse facto para não fazer reparos.

Aproveito a oportunidade para chamar a atenção do Govêrno para o seguinte.

Pela carta de lei de 10 de Abril de 1880 os distritos insulares foram beneficiados com a seguinte disposição:

Leu.

Esta lei especial não foi revogada por nenhuma outra lei especial.

No emtanto, dentro da nossa defeituosa legislação, foram distribuídas circulares considerando como caduca esta carta do lei, quando na verdade não há disposição nenhuma de lei que tal autorize.

Assim, atendendo a que alguns distritos que vivem no redime de autonomia, que do bom grado aceitaram, como por exemplo o Funchal, Ponta Delgada, Angra do Heroísmo, excluindo a Horta, poderão julgar que só trata de uma excepção, eu, Sr. Presidente, aproveito a ocasião para mandar para a Mesa um artigo novo, que nos termos da legislação vigente, isto é, da lei-travão, necessita ter o

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concordo do Sr. Ministro das Finanças, esperando e a que S. Exa. apoie a sua doutrina, levando assim a Câmara a aprová-lo.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Sr. Presidente: registo com satisfação as declarações feitas por todos os lados da Câmara no sentido de votarem a proposta de lei que tive a honra de enviar para a Mesa, proposta essa que tem por fim abrir um crédito de 500 contos, não sendo talvez esta a quantia exacta A despender, visto que ainda se não sabe qual a gravidade do desastre causado com o abalo sísmico.

O Sr. Manuel José da Silva acabou de mandar para a Mesa um artigo novo, que na verdade contém afirmações e doutrinas com as quais ,eu concordo; porém, pode trazer complicações, razão por que pudico que seria talvez melhor S. Exa. retirá-lo, tanto mais quanto é certo que eu estou na disposição de apresentar à Câmara uma proposta de lei sôbre modificações a introduzir na legislação tributária vigente.

Assim eu entendo que melhor seria S. Exa. retirar a proposta para melhor regularidade dos trabalhos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Não há mais ninguém inscrito.

Vai votar-se.

Os Srs. Deputados que aprovam a proposta na generalidade queiram levantar-se.

Está rejeitada.

O Sr. Manuel José da Silva: - Requeiro a contraprova.

Feita a contraprova, verificou-se que a proposta tinha sido aprovada.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se o artigo 1.°

Foi lido e seguidamente aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se o artigo

2.°

O Sr. Manuel José da Silva: - Mando para a Mesa uma proposta de emenda.

É a seguinte:

Art. 2.° Que se acrescente a expressão: "o presidente da câmara municipal".- Manuel José da Silva.

Foi aprovada, bem como o artigo 1.°, salva a emenda.

Foram aprovados os artigos 3.° e 4.°

O Sr. Manuel José da Silva: - Peço a V. Exa. o obséquio de consultar a Câmara sôbre se dispensa a leitura da última redacção.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Tendo falecido o Sr. Dr. Agostinho Lúcio da Silva, eu creio interpretar o sentir de toda a Câmara propondo que na acta, da sessão de hoje se lance um voto de sentimento pelo seu falecimento.

O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: em nome dêste lado da Câmara, associo-me ao voto de sentimento proposto por V. Exa. pela morte do Sr. Dr. Agostinho Lúcio da Silva.

Tive a honra de ser seu amigo, e por isso tive ensejo de apreciar as suas qualidades de carácter e inteligência, motivo por que não posso deixar de me associar, em nome da minoria monárquica, ao voto de sentimento proposto por V. Exa.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Sant'Ana Marques: - Sr. Presidente: pedi a palavra para, em nome do Grupo Agrário, me associar ao voto de sentimento proposto por V. Exa. pela morte do Sr. Dr. Agostinho Lúcio da Silva.

S. Exa. foi um distinto médico, e era dotado de altas qualidades, razão por que é merecedor do voto de sentimento proposto à Câmara, e a que eu não posso deixar de me associar.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Alberto Dinis da Fonseca: - Em nome da minoria católica, associo-me ao voto de sentimento que V. Exa. acaba de propor pelo passamento do antigo parlamentar Dr. Agostinho Lúcio da Silva.

Tenho dito.

O orador não reviu.

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O Sr. Francisco Cruz: - Encarregam-me os parlamentares do Partido Nacionalista da pungente missão de, em seu nome, me associar ao voto de sentimento que V. Exa. propôs pela morte do Dr. Agostinho Lúcio da Silva.

Eu tive mais de uma vez oportunidade de com S. Exa. trabalhar, e pude avaliar quanto era nobre, quanto era gentil e formosa a sua alma.

O sanatório dos ferroviários de S. Brás de Alportel muito lhe deve.

S. Exa. nunca se poupou a esfôrços e canseiras, para minorar a situação de muitos desgraçados.

Associo-me pois, comovidamente, em meu nome e no dos parlamentares meus correligionários, ao voto de sentimento proposto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Crispiniano da Fonseca: - Sr. Presidente: pedi a palavra para, em nome dos Deputados da Esquerda Democrática, me associar ao voto do sentimento pela morte do Sr. Dr. Agostinho Lúcio da Silva.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ramada Curto: - Associo-me ao voto de sentimento pela morte do Sr. Dr. Agostinho Lúcio da Silva, em nome do Partido Socialista.

Tenho dito.

O Sr. Paiva Gomes:-Uso da palavra para declarar que os parlamentares do Partido Republicano Português se associam sentidamente ao voto de sentimento que V. Exa. propôs à Câmara pelo falecimento do médico Agostinho Lúcio da Silva, que foi chefe dos serviços de saúde dos caminhos de ferro.

Tenho dito.

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Em nome do Govêrno associo-me ao voto de sentimento que V. Exa. propôs à Câmara.

Tenho dito.

O Sr. Álvaro de Castro: - Associo-me ao voto de sentimento que V. Exa. propôs.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Câmara, considero aprovado o voto de sentimento.

Está em discussão a acta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Ninguém pede a palavra, considero-a aprovada.

O Sr. Presidente:-Vou pôr à votação

O requerimento feito há pouco pelo Sr. Manuel Serras para que seja incluída na ordem da noite a proposta sôbre a emigração.

Procede-se à votação. Foi aprovado.

O Sr. Presidente: - O mesmo Sr. Deputado requere também que na ordem da noite seja incluído o projecto de lei n.° 964-A.

Vai votar-se.

Procede-se à votação.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: - O Sr. Alberto Vidal requere que na ordem do dia seja incluído o parecer n.° 32.

Vai votar-se.

Procede-se á votação.

Fui aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Continua em discussão a proposta dos tabacos,

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem V. Exa. a palavra.

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Sr. Presidente: segundo o compromisso que ontem foi assumido pelo Govêrno perante esta Câmara, vou enviar para a Mesa uma proposta de lei tendente a estabelecer a administração provisória da indústria e comércio de tabacos, desde 1 de Maio próximo futuro até o momento em que entre em vigor o novo regime que o Parlamento vote.

Cria-se uma administração provisória

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que deverá gerir a indústria e comércio de tabacos até o momento, repito, em que entre em vigor o novo regime que o Parlamento estabeleça.

Como se torna indispensável dotar desde já essa administração coti1 os meios necessários à sua acção, a proposta que apresento consigna a faculdade de- aberturas de créditos, precisos para a compra de rama de tabaco, destinada a laboração das fábricas durante o prazo de, pelo menos, três meses, e para a aquisição de todos os acessórios indispensáveis à indústria.

Esta proposta que remeto para a Mesa é já do conhecimento de muitos dos Srs. parlamentares, pois que eu tive o cuidado de a distribuir aos leaders dos diferentes lados da Câmara.

O Govêrno não faz dela questão fechada. O Parlamento fará a sua discussão e votação como entender. O que é necessário e que ela seja aprovada com toda a urgência possível. Assim eu peço para ela a urgência e dispensa do Regimento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se a proposta que acaba de ser apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças.

Foi lida na Mesa.

É a seguinte:

Artigo 1.° É o Govêrno autorizado até 31 de Agosto de 1926 a abrir no Ministério das Finanças os créditos especiais que forem necessários para ocorrer às despesas com a aquisição de tabaco em rama e matérias primas para o fabrico e venda dos tabacos no continente da República, durante os meses de Junho a Agosto do corrente ano.

§ único. É desde já aberto para os fins dêste mesmo artigo um crédito especial da quantia de 10:000.000$ que será inscrito no orçamento do Ministério das Finanças para o corrente ano económico de 1925-192G onde constituirá o capítulo 32.º, artigo 104.°, da despesa extraordinária, sob a seguinte rubrica: "Para despesas inerentes à aquisição do tabacos em rama, matérias primas, acessórios e quaisquer outras relativas ao exercício da indústria dos tabacos".

Ari. 2.° Aos tabacos não manufactura dos, folha, talo, rolo, e às matérias primas indispensáveis para o fabrico de tabacos, excepto papel, a que se refere o artigo 1.°, é aplicável o disposto no n.° 3.° do artigo 7.° do contrato anexo à carta de lei de 27 do Outubro de 1906.

Ari. 3.° Para que não cesse a laboração das fábricas e o comércio dos ábacos a partir de 1 de Maio do 1926. é constituída uma comissão administrativa provisória sob a presidência do director geral da Contabilidade Pública e de que lar ao parte o actual director geral dos Serviços Administrativos e de Contabilidade da Companhia dos Tabacos do Portugal e o engenheiro consultor da mesma Companhia, bem como o secretario-comissário da fiscalização dos tabacos.

Esta comissão instalar-se há oito dias antes do termo do contrato do 8 do Novembro de 1906 e funcionará até que entre em vigor o novo regime de exploração da indústria dos tabacos.

§ único. O presidente da comissão percebem a gratificação líquida mensal de 2.000$ e o secretário-comissário a de 2.0COr§, gratificações estas que serão liquidadas e pagas em conta do crédito aberto pela presente lei.

Art. 4.° A comissão administrativa provisória procederá, com autorização prévia do Ministro das Finanças, h, compra dos tabacos e matérias primas indispensáveis para a laboração sem interrupção das actuais fábricas, pelo período fixado no artigo 1.º da presente lei, não sendo aplicáveis às referidas aquisições as formalidades a que pelas leis da contabilidade vigentes estão sujeitos os fornecimentos ao Estado.

§ 1.º A Direcção Geral da Fazenda Pública fornecerá as cambiais necessárias em face da requisição da secretaria da fiscalização dos tabacos, requisitando, por seu turno, da repartição competente da Direcção Geral da Contabilidade Pública as quantias necessárias à respectiva cobertura.

§ 2.° Quando haja conveniência ou necessidade de efectuar os pagamentos em moeda nacional a mesma secretaria requisitará à aludida repartição as importâncias precisas.

Art. 5.° Para os tabacos que ficarem em depósito por virtude da presente lei, se qual fôr o estado de fabricação em

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que se encontrarem, depois de estabelecido o novo regime que vier a ser adoptado a partir de l de Maio de 1926, vigorará a doutrina do artigo 15.° do contrato anexo à lei de 27 de Outubro de 1906, com as modificações posteriormente introduzidas.

Art. 6.° O Govêrno tomará todas as providências que julgue necessárias à execução desta lei.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrário.

Ministério das Finanças, 20 de Abril de 1926. - Armando Marques Guedes.

O Sr. Presidente: - Vou pôr à votação da Câmara o requerimento do Sr. Ministro das Finanças para que seja concedida a urgência e dispensa do Regimento para esta proposta.

O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: não conheço, nem é possível haver crime maior na vida de um país do que esto que o Govêrno acaba de praticar, numa questão tam importante para ã vida financeira do Estado.

Sabendo-se desde 1891 que o contrato dos tabacos terminava em 30 do Abril dêste ano, há um Govêrno que deixa estar esta questão por resolver até dez dias antes do terminado o prazo do contrato que era explorado pela actual Companhia.

É nesta altura, tendo sido indispensável que ontem fôsse obrigado pela Câmara a tomar o compromisso do trazer aqui uma proposta, que a vem trazer hoje para solucionar aquilo que há muito tempo deveria ter preocupado o Govêrno.

Vem fazer-se ao País a afronta de estabelecer a régie dos tabacos, o pior do todos os sistemas!

Apoiados.

Não apoiados.

E o mais pernicioso de todos os sistemas para a opinião pública, que não pode esquecer os escândalos dos Transportes Marítimos, dos Bairros Sociais e tantos outros.

Não apoiados.

O Sr. António José Pereira: - É preciso acabar com estas histórias.

V. Exa. não tem o direito de estar a protelar os trabalhos da Câmara. Nós não consentiremos.

O Orador: - V. Exa. tem ante o País a tradição do contrato dos tabacos.

Não podemos resolver êste problema sem acarretar ao País prejuízos de dezenas de milhares de contos? Esta questão não só resolvo com simples palavras.

Muito cara tem custado ao Estado a questão dos tabacos. E não se sabe ainda o preço que há-de custar pela precipitação, pela falta de estudo o competência que tem presidido aos contratos feitos com a Companhia dos Tabacos. É indispensável...

Interrupção do Sr. Vítorino Guimarães que se não ouviu.

O Orador: - V. Exa. devia recolher-se ao silêncio e não vir aqui falar neste assunto. V. Exa. tem uma das maiores responsabilidades nesse regime.

Não apoiados.

Nova interrupção que também se não percebeu, pelos protestos ruidosos da Câmara.

O Orador:-Já lá vamos. Quando da legislatura passada, esto lado da Câmara instou por que fôsse discutida a questão dos tabacos, e o Sr. Vitorino Guimarães, que agora acaba do me interromper, levantou-se do seu lugar para dizer que não poderia ser então discutida.

Era, disso S. Exa., uma plataforma eleitoral para os diferentes partidos fazerem a sua propaganda, em torno da solução a adoptar.

Pois, senhores, o Sr. Vitorino Guimarães, que num parecer da comissão do comércio e indústria é censurado por essa atitude, o Sr. Vitorino Guimarães, cujas responsabilidades são censuradas nesse parecer, tem a falta de ponderação necessária para vir, ainda hoje, revestir-se de autoridade para falar nesta questão, depois do ter causado ao País prejuízos gravíssimos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carvalho da Silva: peço a V. Exa. para não discutir a proposta, que ainda não está em discussão...

O Orador: - Eu serei breve quanto possível; mas quero lembrar à Câmara que não delibere de ânimo leve sôbre esta questão.

Ao menos, só reconhecer a urgência e

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dispensa, do Regimento para a discussão duma proposta desta importância, que não vá infringir pelos seus artigos, os contratos existentes com a Companhia dos Tabacos, para que mais tarde não venham a resultar prejuízos gravíssimos.

É preciso, repito, que a Câmara não discuta de afogadilho, sem saber o que discute e vota, numa questão que pode trazer ao País prejuízos de dezenas de milhares de contos.

Creio ter deixado na Câmara pôsto o meu modo de ver e o da minoria monárquica.

Não queremos responsabilidades, nem a temos de resto, na demora da discussão que tem havido num assunto desta meticulosidade.

Resolva a Câmara como entender, mas a opinião pública já sabe que, com tal proposta, a maior receita do País não será arrecadada, com prejuízo do ressurgimento financeiro da Nação.

O orador não reviu.

O Sr. Álvaro de Castro: - Pedi a palavra para requerer que seja votada separadamente a urgência e a dispensa do Regimento.

Não creio que, numa questão desta magnitude, alguém se encontre agora devidamente habilitado a discutir as várias questões que a proposta suscita.

Requeiro, pois, que seja votada separadamente a urgência da dispensa do Regimento.

O orador não reviu.

O Sr. Cunha Leal (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: como o governo tinha anunciado que traria uma proposta neste género à Câmara, a União Liberal Republicana acha-se habilitada a discuti-la. Não lhe dará o seu voto aprovativo, por entender que não lho deve dar. Mas, reconhecendo a grande urgência que há em esclarecer a opinião pública a êste respeito e não querendo que mais tarde, alguém possa dizer que, por sua culpa, se não discutiu o problema, a União Liberal Republicana vota a urgência e dispensa do Regimento, embora declare, desde já. como disse, que rejeitará a proposta ministerial.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Marques Loureiro (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: foi um ilustre Deputado da minoria nacionalista que suscitou há tempos ao Govêrno a atitude que êle agora toma e de que se desobriga com a proposta de lei que hoje trouxe. Foi? com efeito, o Sr. Aboim Inglês quem lembrou oportunamente que não havia maneira de o Parlamento habilitar o Govêrno com medidas definitivas para o novo regime dos tabacos e que por isso se tornavam indispensáveis mediei is provisórias que estabelecessem uma ponte de passagem do actual monopólio para o regime futuro.

Compreendem V. Exa. e a Câmara a situação em que se encontra, neste momento, a minoria nacionalista, não vendo presente êsse seu ilustre correligionário, a quem pela sua alta competência e pela sua sua vasta erudição, o assunto estava entregue, podendo nós, portanto, seguir na sua esteira, sem necessidade de profundar as opiniões que emitisse.

O Partido Nacionalista, no emtanto, das próprias declarações de S. Exa. e das que ontem aqui se repetiram conclui que não deve negar a urgência e dispensa do Regimento requeridas. Acompanhará a discussão que se fizer, da minha parte, é claro, com aquela inferioridade que é característica (Não apoiados) de forma a que não chegue o dia 1.° de Maio, sem que o Govêrno encontre um rumo para dar a êsse negócio, que há muito já se deveria ter principiado a discutir.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Manuel José da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: estamos em presença de um facto e os factos têm maior eloquência do que as palavras. Sem procurarmos neste momento discutir a quem cabem as responsabilidades políticas- porque outras não podem apontar-se- de se ter chegado a 10 dias do terminus do contrato do monopólio actual, sem que os poderes constituídos da República se tivessem pronunciado sôbre a solução a dar ao problema dos tabacos, uma destas três soluções podiam ser perfilhadas pelo Govêrno no momento actual: ou prorrogar por um tempo maior ou menor o regime do monopólio actual, ou aceitar um regime sui generis, tal como

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se encontra definido pela proposta e em que o Estado não prorrogando o monopólio, não deixa de manter em laboração as fábricas que lhe estavam confiadas ou ainda - terceira solução-nada fazer e ficarmos durante um ou dois meses sem saber em que regime vivíamos e trazendo assim justamente alarmada a opinião pública, especialmente a do público fumador.

Entendo, portanto, que a proposta do Sr. Ministro das Finanças, foi bem oportuna. Classificando-a assim, não quero, no emtanto, desde já, arriscar a opinião de que tivesse sido a mais conveniente. No emtanto, como solução geral, das três que desenhei, evidentemente perfilho esta, anunciando comtudo, que algumas das disposições da proposta não merecerão o meu aplauso.

O certo, porém é que, se a Câmara, no dizer de toda a gente, se sentia habilitada a julgar qual o regime definitivo que convém adoptar, com mais fortes razões deve estar habilitada a julgar dum regime provisório.

Assim, entendo que a Câmara fará bem discutindo, e desde já, o assunto com a maior largueza e o melhor desejo de bem acertar.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pestana Júnior (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: a Esquerda Democrática vota a urgência e dispensa do Regimento requeridas. Entendo que a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Ministro das Finanças não é a que melhor acautela os interêsses do Estado, nem a que melhor defende as conveniências do público, ainda que provisoriamente adoptada.

Duma rápida leitura feita por nós, já podemos dizer que ela, tal como está, não merece a nossa aprovação.

A Câmara deve estudar com toda a atenção o assunto, de forma a que no dia 30 de Abril se saiba qual o regime, embora provisório, em que vamos entrar, visto que todos estamos de acordo em que não é possível, até essa data, discutir por completo a proposta que está na ordem do dia.

Daremos o nosso voto de urgência e dispensa do Regimento para esta proposta de lei. Faremos sôbre ela um largo debate.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ramada Curto (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: a minoria socialista vota a urgência e dispensa dó Regimento para a proposta.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção dá Câmara. O Sr. Álvaro de Castro requereu que o requerimento da Sr. Ministro das Finanças seja dividido em duas partes, votando numa a urgência e noutra a dispensa do Regimento.

O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: entendo, sem dúvida, que a proposta é de absoluta urgência e pena é que tenha vindo aqui tam tarde. Mas entendo que, em nenhumas condições, aquela rápida leitura a que se referiu o Sr. Pestana Júnior é suficiente para com consciência se discutir um assunto que, como êste, é na verdade complexo.

Entendo, portanto, que a proposta devia ser discutida ou hoje na sessão nocturna ou na sessão de amanhã. É impossível que uma proposta e mormente desta importância, possa ser discutida com consciência meia hora depois de ter sido dada para ler aos Deputados, num exemplar que o Sr. Ministro das Finanças fez distribuir.

Sussuro.

E pregunto aos Srs. Deputados que estão a protestar contra as minhas afirmações onde tiveram tempo para ler êste documento com atenção, como podem ajuizar conscientemente do seu valor. Pregunto a S. Exa. se é assim que entendem que cumprem os seus deveres perante o País e os seus eleitores.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Vitorino Guimarães: - Sr. Presidente: não tencionava usar da palavra sôbre o modo de votar, porque entendo que só quando há declarações precisas a fazer é que se deve usar dêsse meio.

Sou, porém, chamado a dizer qualquer cousa em resposta ao Sr. Carvalho da

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Silva, e foi isso que me levou a pedir a palavra nesta ocasião.

Antes de me referir a êsse assunto permita-me V. Exa., Sr. Presidente, que eu chame a atenção de V. Exa. para a atitude verdadeiramente patriótica de todos os grupos republicanos aqui representados, que entenderam que efectivamente a questão era de urgência e que não podíamos estar a perder tempo, fazendo as suas declarações em termos sóbrios e não aproveitando o ensejo para, sôbre o modo de votar, fazerem uma crítica da proposta.

Estamos dispostos daqui por diante a protestar para que êstes atropelos constantes se não repitam.

Mas, Sr. Presidente, eu pedi a palavra para declarar que votamos a urgência e dispensa do Regimento e que não compreendemos as hesitações do Sr. Carvalho da Silva.

Não se trata de uma questão fechada, e S. Exa. pode apresentar as, emendas que quiser, discutindo com toda a largueza.

De resto, S. Exa. já queria ontem discutir, em negócio urgente, êste assunto, o que prova que estava habilitado para a discussão.

Não compreendemos, portanto, os melindres que S. Exa. tem em dar o sou. voto à urgência e dispensa do Regimento para a proposta do Sr. Ministro das Finanças.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António José Pereira (para explicações):- Sr. Presidente: não me compete a mim, na situação de simples Deputado disciplinado e arregimentado num partido, tomar parte em discussões desta natureza, principalmente a propósito do modo de votar. Essa tarefa incumbe aos leaders.

Mas não pareça estranho que eu use da palavra neste momento, pelo facto de ter de definir a minha atitude do há pouco, em resposta a uma referência feita pelo Sr. Carvalho da Silva, que deu a entender que eu queria, impedir que S. Exa. falasse.

Devo dizer que desejo sempre que todos os lados da Câmara se manifestem com toda a largueza que julgarem necessário. O que eu não posso tolerar - e foi êsse o motivo da minha exaltação de há bocado - é que alguém nesta Câmara pretenda impor aos outros o seu modo de ver sôbre determinado assunto.

Era esta a declaração que eu tinha a íazcr.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi aprovado o requerimento do Sr. Álvaro da Castro, para serem votarias, separadamente, a urgência e a dispensa do Regimento.

Postas à votação, foram aprovadas a urgência por unanimidade e a dispensa do Regimento por maioria.

O Sr. Álvaro de Castro:-Sr. Presidente: começo por fazer a afirmação audaciosa de que é mai" complexo e mais difícil discutir o regime transitório proposto pelo Sr. Ministro das Finanças do que discutir o futuro regime dos tabacos, com a régie ou com a liberdade.

Qualquer dêstes regimes termina automaticamente todas as condições anteriores da exploração dos tabacos.

Só êste facto mostra quanto a discussão é simples, porque, pode dizer-se, a não ser unicamente para a crítica do que foi o regime do monopólio privado, não interessa o regime passado para o estabelecimento do regime futuro.

Mas propor à Câmara a manutenção do regime anterior, imaginando que se altera a parte superficial da administração superior, é cometer um êrro crasso, um desconhecimento absoluto das normas que se encontram no diploma que estabeleceu o regime do monopólio privado.

Reconheço que na Câmara sou o único que me encontro inabilitado a discutir êste problema.

Qual a situação do Estado em relação aos 800:000 quilogramas de tabaco que a Companhia no fim do contrato tem de entregar ao Estado?

Liquida já os 800:000 quilogramas ou liquida-os no fim do regime provisório que o Sr. Ministro das Finanças estabelece?

Di-lo, porventura, a proposta?

Quais são as vantagens ou desvantagens para o Estado de não liquidar imediatamente os £00:000 quilogramas de tabaco?

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Num relatório preliminar, num relatório sumário, simples, em quatro palavras, diz o Sr. Ministro das Finanças qualquer cousa que esclareça o meu espírito?

Sr. Presidente: postas estas observações que seriam o suficiente para rejeitar in limine a proposta do Sr. Ministro das Finanças, eu passo a fazer considerações propriamente sôbre a proposta.

Não falo, nem preciso falar, sôbre quem pesam as responsabilidades de até agora não estar resolvido pelo Parlamento o problema do regime dos tabacos; creio que essas responsabilidades pertencem íntegras ao Govêrno e pertencem particularmente ao Sr. Ministro das Finanças.

É certo que o Parlamento levou tempo a estudar a proposta dos tabacos, mas, também só verificou que o Parlamento procedera ràpidamente, porque já tinha dado parecer numa proposta anterior apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças do então, Sr. Pestana Júnior.

O tempo que se perdeu, o estudo profundo que se foz dessa proposta, não foi no Parlamento, mas, fera do Parlamento, e eu compreendo que, efectivamente, o Partido Democrático esteja inteiramente habilitado a fazer essa discussão, porque a fez anteriormente nas suas reuniões partidárias.

Sr. Presidente, não é segredo para ninguém, já o disse há muito tempo, que sou pelo regime de liberdade, regime que defenderei na ocasião própria, não gastando agora palavras nem cansando a Câmara a discutir êsse assunto, mesmo para que se não diga que com as minhas palavras pretendo demorar a votação da proposta do Sr. Ministro das Finanças.

Mas, porque sou partidário do regime de liberdade, não comprendo a adopção do um regime provisório que seja já o encaminhar para uma solução qualquer.

Compreendo o statu que; não conheço mesmo nenhum caso jurídico em que o Estado determine a alteração de um determinado instituto que não seja, quando não tenha tempo do determinar a nova alteração que previamente foi marcada, que não seja, repito, a continuação do regime anterior, porque é aquele que suscita menos dificuldades.

Aceito que o Sr. Ministro das Finanças tenha quaisquer razões profundas para alterar êsse regime e estabelecer um regime

provisório, mas, é preciso que S. Exa., com a sua palavra autorizada, com relatório ou qualquer cousa nos justifique a razão da adopção de um novo regime que é uma réyie incompleta com todos os perigos que pode importar a régie e ainda mais aqueles que importam o regime provisório. v

Sr. Presidente: não votarei a abertura, sem limite, dos créditos a que se refere o artigo 1.°

Não me interessa a mecânica administrativa a que fica sujeito êste regime provisório; desejaria, contudo, que a proposta esclarecesse qual a situação dos vários organismos que passam a funcionar dentro desta nova situação, porque, lendo os textos da lei, os textos dos contratos anteriores a esta proposta, não a fico conhecendo nem fico assegurado de que o regime se possa manter tal qual o concebeu o Sr. Ministro das Finanças.

Eu creio que a forma simples que apareceu já aqui em discussão na generalidade da proposta é esta: temos a indústria concentrada e essa concentração mantém-se, substituindo as administrações pelo Sr. director geral da Contabilidade Pública.

Mas, todo o resto se mantém?

Todo o mecanismo que constitui o monopólio privado gira unicamente à sombra destas pessoas a que se refere a proposta?

O Sr. Pestana Júnior: - O Estado está empatado com a Companhia, porque duas pessoas são da Companhia o duas do Estado.

O Orador: - Mas não é propriamente a Direcção que dificulta os faz surgir os vários problemas; a situação jurídica dentro dêste novo regime é toda a mecânica geral de um larguíssimo organismo que se estendo a todo o País, não encontrando nenhuma disposição que dê direito ao Estado a obrigar essas entidades a permanecer na situação jurídica que tinham ao tempo do monopólio privado.

Tudo isto é confuso, tudo isto é arbitrário, e, como o meu espírito não está suficientemente esclarecido - e lamento que eu seja o único que não esteja esclarecido - emquanto a proposta conservar esta feição o as palavras do Sr. Ministro

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das Finanças não lançarem luz sôbre todos os pontos que julgo obscuros não aprovo esta proposta.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Marques Loureiro: - Sr. Presidente: de harmonia com os preceitos regimentais, vou ler a seguinte moção, que mando para a Mesa:

A Câmara dos Deputados, reconhecendo a necessidade de providenciar sôbre o regime a adoptar para a indústria e comércio dos tabacos em Portugal imediatamente ao termo do contrato ainda em vigor, mas lamentando que a proposta em discussão não satisfaça as exigências ocorrentes e a escassez de tempo possa impedir que minuciosamente seja apreciada, continua na ordem do dia. - José Marques

Loureiro.

Li, antes de ser enviada para a Mesa, a proposta que o Sr. Ministro das Finanças, na observância gentil de uma velha praxe parlamentar, distribuía por cada um dos grupos que tem representação nesta Câmara; o, a cada linha que ia lendo, o lápis ia singelamente anotando as dúvidas que são próprias da profissão do foro de. modo que, ao chegar ao fim da proposta, ela estava cheia de traços, representando cada um deles uma pregunta que a cada um de nós era sugerida.

Sôbre a maneira como durante o mês de Maio será exercida a indústria e o comércio de tabacos, não há uma única palavra nesta proposta.

No seu artigo 1.° diz-se:

Leu.

Eu devo declarar à Câmara que, por meu mal, está lendo as cousas em duplicado, em virtude de um defeito visual que há dias me ataca; mas, pedindo a outras pessoas que me lessem esta proposta, eu verifiquei que nela apenas se fala no comércio e fabrico de tabacos a partir de 1 de Junho.

O Sr. Ministro das Finanças poderá dizer-nos que o mês do Maio será abastecido com os 800:000 quilogramas de tabaco que a Companhia tem de entregar ao Estado no terminas do monopólio. Mas nesta proposta não se alude a nada disso, o que é grave (Apoiados), especialmente se conjugarmos êste facto com as declarações que o Sr. Ministro das Finanças aqui fez ontem sôbre o assunto. Não existe aqui uma única palavra sôbre o preço por que virão a ser pagos êsses 800:000 quilogramas de tabaco.

E para onde vai o lucro que, porventura, possa resultar dessa transacção?

A cada passo se lê nesta proposta que são autorizados créditos extraordinários para o fabrico e venda de tabaco, mas nada se diz sôbre a aplicação dos possíveis lucros resultantes dessa exploração.

As receitas arrecadadas entram também na Contabilidade Pública, para contra-partida dêsses inúmeros créditos extraordinários?

Alude-se aqui, noutra passagem desta proposta, ao tabaco que se encontre em manipulação à data em que comece a vigorar êsse regime provisório. Mas esqueceu-se de indicar como e de que maneira êsse tabaco há-de ser pago.

Será nas condições do § único do artigo 6.° do contrato?

Creio que não, porque não se verificam as hipóteses do § único. Êsse § único diz o seguinte:

Leu.

Não é um monopólio que continua num regime provisório; é qualquer cousa que ninguém sabe o que é, nem mesmo, talvez, o próprio Sr. Ministro das Finanças. É qualquer cousa de criação tam estranha que não pode compreender-se.

Mas o que existe é na Companhia algum tabaco que ela é obrigada a entregar.

O que se faz dêsse tabaco ? Previnem-me que o tabaco que se encontrar no fim
do regime é submetido a uma disposição idêntica à do artigo 15.°, que diz o seguinte:

Êste artigo 15.° alude, no emtanto, apenas aos direitos a pagar por êsse tabaco. Prevê a hipótese, muito bem, de continuar o sistema da régie ou qualquer outro, e então determina que o tabaco que não estiver manipulado, se continuar o regime da liberdade, pagará direitos; se se voltar ao sistema do exclusivo pagará o que se determinar.

Mas se se fôr para um regime diferente da régie ou da liberdade, o que se fará?

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Esta proposta de lei não digo que tenha de ser refundida, porque se me afigura que no regime de discussão em que estamos vivendo nesta Câmara, embora postergando todos os outros assuntos, não haverá tempo bastante para a melhorar convenientemente, a fim de se saber no fim o que votamos, mas parece-me que tem de ser posta de lado completamente.

Dentro da sua economia aparece-nos uma comissão administrativa provisória, composta por dois funcionários, cuja competência não discuto, e por mais dois funcionários da Companhia dos Tabacos. Ora eu pregunto: com que direito o Parlamento vem determinar que dessa comissão administrativa façam parte tais ou tais funcionários?

Então nós já não temos respeito pela liberdade individual dum cidadão, para o expropriarmos como se expropria um prédio?

Atrás disto, embora querendo olhar bem de frente, cara com cara, olhos com olhos, vejo pontos de vista suspeitos e as interrogações que surgem ao meu espírito amarguram-me a alma.

Ir buscar-se o actual director geral dos Serviços Administrativos e de Contabilidade da Companhia dos Tabacos e o seu engenheiro técnico, obrigando-os a constituir esta comissão, oito dias antes da data em que termina o contrato, isto é, depois de amanhã, fazer porventura com que êles percam os seus contratos ou desprezem os interêsses que lhes estão confiados, representa para mim um caso suspeito, uma dúvida que é dolorosa. Mas quere-se significar que há um conluio? Então rasguem-se os contratos. Quere isto significar que estamos de pernas atadas perante a Companhia?

O que vejo, realmente, é uma comissão administrativa composta por quatro membros, sendo dois técnicos do assunto, que amanhã sem dificuldade, diante dos outros dois ingénuos e simples, embora honrados, levarão não digo "a água ao seu moinho", mas as receitas para a Companhia com tanto geito que quando êles derem por isso já será tarde para remediarem o caso.

Posso ver também uma negativa sempre formal dêstes dois funcionários perante as decisões dos outros dois, no receio de serem enganados, havendo, portanto, um empate na votação. E quem desempata? 4Será o voto relapso de Minerva?

Não, êsse voto - que me perdoe o Sr. Carvalho da Silva - será sempre o do Govêrno.

Se nos pudéssemos fiar nos números, se êles tivessem aquela suprema eloquência de que não há recurso, não sendo afinal, como já disse, apesar de ser bacharel, punhais que ferem os outros, mas nunca aqueles que os manejam, então num determinado regime provisório podíamos todos saber de certeza o que dá o vício de fumar tributado, todos nós poderíamos saber o que vale essa fonte de receita para a ressurreição económica de Portugal.

Mas não, não se dá isso, e assim todas as dúvidas e suspeições são legítimas. Mesmo por outra circunstância: é que logo na proposta se diz que os funcionários públicos que vão fazer parte da comissão receberão desde logo a gratificação de 2.500$ um e 2.000$ outro. Não há, porém, uma palavra única para os outros dois altos funcionários da Companhia dos Tabacos, quando é certo que, se são funcionários distintos, como devem ser, não poderão deixar de se fazer pagar correspondentemente.

Nada disto se pode admitir de ânimo leve.

Era preciso que fôsse tudo a descoberto, feito às claras, mas eu vejo, ao contrário, tudo nas trevas.

Há aqui alguma cousa misteriosa e não há nada que nos garanta nesta proposta que êste regime seja a favor do Estado. Parece, sim, uma experiência, ponte mal segura, que dê passagem para a régie.

Apoiados.

Compreende-se a plena liberdade de fabricação, havendo fábricas administradas pelo Estado e outras por particulares.

Tudo se compreende menos o que está nesta proposta.

Durante êste regime provisório não se poderá vender tabaco estrangeiro.

Tudo isto não passa de uma camouflaqe.

Aqui também não há uma palavra para o pessoal, e há pessoal com direitos adquiridos.

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O Sr. Ministro das Finanças, se bem percebe as declarações que fez hoje ao mandar para a Mesa a sua proposta disse que, o regime que ela preconizava vigoraria apenas até ao momento em que entrasse em vigor o novo regime, que se tratava de uma questão aberta e que era necessário discutir com urgência a mesma proposta.

Esqueceu-se, no emtanto, S. Exa. de que, marcando se na proposta a instalação da comissão administrativa até oito dias antes de acabar o regime actualmente em vigor, assim se davam dois dias somente para a discussão da proposta.

Ora pregunto só em dois dias esta Câmara, já não digo o Senado, pode fazer na discussão conscienciosa dessa proposta, mesmo que nesta Câmara se não discuta mais nada. E claro que não quero admitir a hino tese de que estivéssemos aqui a trabalhar até às 10 horas da manha para continuarmos às 2 horas da tardo, como lembrou o Sr. Presidente do Ministério. Isso só se faz uma vez.

Mas de resto, em que bases nós podemos fixar para discutir com conhecimento de causa a proposta de lei? Eu não exijo que o Sr. Ministro das Finanças de um dia para o outro aos apresente um relatório completo; mas, se isso não é fácil a S. Exa. que porventura pode ter mais à mão os elementos que precisa, menos o é para nós.

Como é que, por exemplo, poderemos atender à circunstância do falecimento de um dos funcionários que se vão nomear - e oxalá que não morra, porque não desejo a morte de ninguém - ou no caso dele se negar a desempenhar a ir is não do que o querem incumbir, no que está no sen direito? Será por aquela disposição que diz que o Govêrno fica autorizado a tomar todas as providências que julgue necessárias? Mas o caso apontado será uma providência? Quero crer que não.

Estou certo de que não terão necessidade os meus colegas desta casa de apresentarem alterações e emendas sôbre alterações a emendas, de forma a modificarem por completo esta proposta de lei. Estou certo de que será o Sr. Ministro das Finanças que. depois de prestar as suas declarações ao Parlamento, o que S. Exa. fará com certeza sem mais demora, usando do direito que se me afigura também ser dever de elucidar a Câmara, se encarregará de pôr tudo em pratos limpos.

De resto afigura-se-me que o Govêrno tem maneira do nos demonstrar a nós, que nos batemos pela liberdade e aqueles batalhadores que podem sucumbir pela forra dos números, reis que se não convencem com as razões invocadas, que a liberdade de fabrico não é o regime que convém adoptar em Portugal. Assim averiguar-se ia se efectivamente os defeitos do regime que preconizamos se as "asneiras" que dizíamos eram ta m grandes que se impunha ,a adopção da régie. E assim teríamos o triunfo do regime pela qual o Govêrno e a maioria pugnam como se defendessem uma justa causa.

Êsse regime, só pela forma como a maioria o tem defendido, dá-nos desde já a, certeza de que não é o que mais convém ao País, porque não tem ponta por onde se lhe pegue. Aquilo que e justo por si se impõe, não precisando do grandes defesas.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Amâncio de Alpoim (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: pregunto a V. Exa. qual é a ordem de inscrição que está na Mesa. Antes de mim creio que estavam apenas dois Srs. Deputados para falar. Eu era o terceiro e não havia, mais ninguém inscrito sôbre a ordem. Sei agora, porque me informaram particularmente, que há vários oradores inscritos sem que eu os tivesse ouvido pedir a palavra nestes termos. Pregunto a V. Exa. se vingou a praxe de "particularmente", na Mesa, se pedir a palavra sôbre a ordem porque, se assim é, quero que a minoria socialista tenha êsse direito ...

O Sr. Presidente: - Quando aqui cheguei à Mesa, encontrei vários Srs. Deputados inscritos e tenho-lhes dado a palavra pela ordem de inscrição. Não é do presumir que a Mesa tivesse feito qualquer excepção...

O Orador: - Fica entendido que só pode pedir particularmente, na Mesa, a palavra sôbre a orcem.

Tenho dito.

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O Sr. Cunha Leal (sobre a ordem): - Sr. Presidente: nos termos regimentais, vou mandar para a Mesa a seguinte moção:

A Câmara dos Deputados, considerando que não é conveniente aos interêsses do Estado estabelecer, ainda que provisoriamente, o regime da régie dos tabacos, continua na ordem do dia.- Cunha Leal.

Sr. Presidente: não pertencem à União Liberal Republicana as responsabilidades de tam tarde ter sido discutida a questão dos tabacos. Creio que o Sr. Ministro das Finanças mandou a tempo e horas a sua proposta para a Mesa. Mas logo a seguir começou o exame dessa proposta na respectiva comissão e mais uma voz se registou, dentro da vida publica portuguesa, uma estranha anomalia. Não há Poder Executivo; não há Poder Legislativo; há só Partido Republicano Português!

Apoiados e vão apoiados.

Nestas condições o relator da proposta em discussão, e os restantes membros da comissão, começaram por estabelecer êste princípio : como somos representantes do Partido Republicano Português, em quanto êste, partido nos não der concretas indicações acerca do regime que vai defender, nós não relatamos. Primeira pausa. Começou o Partido Republicano Português - que é Poder Executivo e Legislativo - sem contrafacção nem misturas a discutir o caso e então assistimos, através das notas oficiosas, a uma discussão que é a primeira discussão sôbre tabacos absolutamente extra parlamentar.

Questão aberta? Questão fechada? Passavam-se entretanto os dias e o Partido Republicano Português continuava imperturbável a reunir e a fazer a mesma pregunta: questão aberta? questão fechada? E ainda no dia de hoje não sabemos se esta questão é aberta ou fechada para o Partido Republicano Português, e o Govêrno, ao que parece, alheando-se da resolução do seu. Partido, resolveu considerar, aberta a questão dos tabacos.

Primeira pausa, portanto.

Ainda que se não definisse bem o critério da maioria, ainda que não soubesse ao certo que considerava a questão dos tabacos como questão fechada, em todo o caso esboçava-se dentro da maioria uma corrente que era predominante, a da defesa da régie.

Só depois disso os relatores das comissões de comércio e indústria e das finanças se declararam habilitados a relatar.

Então decorre o tempo que fôr necessário para fazer o seu estudo do acordo com êsse critério, porque êles não são representantes do Parlamento dentro das comissões, mas sim representantes dum grupo que ainda não tinha definido o seu critério, e, de demora em demora, de discussão em discussão, resultou que assistimos a êste espectáculo das comissões parlamentares só ao fim de 48 dias darem os seus pareceres. E então é que começaram as pressas; antes mesmo dos parlamentares terem feito um estudo consciencioso se decidiu que entrasse imediatamente em discussão a questão dos tabacos.

Neste ponto o Parlamento cumpriu mais do que o seu dever, porque assumiu uma responsabilidade, para a qual não estava preparado, discutir antes de ter estudado convenientemente êsse assunto.

A seguir decidiu-se, por proposta aprovada por quási todos os cru pôs parlamentares, que o problema dos tabacos fôsse discutido em todas as sessões diurnas.

O Parlamento, portanto, cumpriu o seu dever, quem o não cumpria, não digo que tenha sido o Sr. Ministro das Finanças, mas a maioria pai lamentar que proporcionou as cousas de forma que os relatores não estivessem habilitados com o seu pensamento a tempo e horas, e, porventura, não cumpriram os relatores os os seus deveres, porque só depois de 48 dias trouxeram os seus pareceres.

Em nome, pois, da União Liberal Republicana alijo quaisquer responsabilidades na demora da discussão dêste momentoso assunto.

Mas uma cousa são as responsabilidades e outra cousa é evitar os erros futuros.

Por consequência, varrendo a nossa testada e declarando que as responsabilidades desta demora não nos cabem, ocorre preguntar se realmente esta proposta vem remediar um êrro do passado, e, se nesses termos, estabelecendo já nós as sanções morais que é preciso estabelecer a respeito daqueles que não cumpriam o

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seu dever, havemos de votar no sentido de evitar maiores inconvenientes.

Há pouco declarei que nós não aprovaríamos esta proposta. Pretendo justificar o voto da União Liberal Republicana, demonstrando que temos serieis razões para assim proceder e que não fomos levados a esta conclusão definitiva apenas pelo desejo de fazer oposição ao Govêrno.

Quais são as vantagens que adviriam da aprovação desta proposta, e qual ó, em última análise, o seu significado?

Esta proposta é a ante-câmara da régie.

O Govêrno e a maioria estão tam certos, tam seguros de arrancar a votação da régie ao Parlamento que antes mesmo de chegar ao prazo em que se podem tornar donos da casa estão como que pedindo as chaves para a ir varrendo e limpando.

Tem por consequência o Govêrno e a maioria a certeza de que vão aprovar a régie, e nestes termos querem pô-la em execução o mais ràpidamente possível. Quais as vantagens?

Primeira: os operários ficarão menos tempo sem trabalho.

De facto, esta vantagem existe. De facto, se formos imediatamente fazer uma encomenda de 10:000 toneladas de tabaco, evidentemente estaremos mais cedo habilitados a ter matéria prima para ser trabalhada, do que se fizermos a mesma encomenda daqui a 10 ou 20 dias, quando terminar a discussão do regime dos tabacos. É uma vantagem real. Mas eu pregunto à consciência de todos, se essa vantagem será suficiente para ocorrer aos enormes inconvenientes que desta resolução venham a derivar para o Estado.

Ainda uma outra cousa. Dizem que é a época própria para fazer encomendas de matéria prima.

Não sei se é, se não é, porque, como já declarei, não sou técnico em questões tabaqueiras, nem sequer sabendo fumar.

Mas, examinando os pareceres de outros mais entendidos do que eu nesta questão vejo que a matéria prima vem de diferentes origens: Estados Unidos, Antilhas. Brasil, índias Holandesas, Filipinas, colónias portuguesas e Argélia. Evidentemente as épocas de colheita não podem ser iguais para todas as regiões, e, por consequência, a circunstância de

Abril ser bom mês para comprar tabaco, não impossibilita depois, os que forem manufactures da matéria prima, de a comprar em outras regiões, embora ela tenha uma época em que pode ser comprada em melhores condições.

Imaginemos que Abril era o mês próprio. Nestas condições, se vamos comprar apenas o que basta para o funcionamento das fábricas durante três meses, o que sucede nas outros nove meses?

Vamos comprar em más condições, e o facto de termos adquirido tabaco para três meses, em condições melhores, não representa uma vantagem tam grande que seja tomada na devida consideração.

Estabelecidas as vantagens que apontei, para aquilo que se pretende fazer, eu peço a todos V. Exas. que escutem com atenção os inconvenientes que derivam da adopção do regime provisório.

O Sr. Álvaro de Castro há pouco levantou uma questão que é importante.

Que marcas vão fabricar êstes provisórios fabricantes de tabaco? As marcas que pertencem ao Estado, ou simultaneamente as que pertencem ao Estado e à Companhia?

Se vão fabricar as marcas que pertencem à. Companhia, faz-se isso por uma expoliação dos direitos da Companhia, ou com prévio acordo com ela?

Estas pregantas, hão-de ter da parte do Sr. Ministro das Finanças, a natural resposta.

Não me consta que haja acordos com a Companhia, e como me parece que não podemos estar a expropriar todos os dias os direitos dos outros, tenho que tirar a conclusão de que as marcas que se vão fabricar não são as da Companhia, mas, apenas, aquelas que são pertença do Estado.

E então, vamos tirar esta conclusão:

Em primeiro lugar, o gosto e o paladar do público não se alteram com facilidade.

Nós iremos, portanto, fabricar tabaco para três meses, iremos fabricar só determinadas marcas, que são aquelas que pertencem ao Estado Mas, daqui a 20 ou 30 dias, estabelece-se o regime da liberdade, porque eu quero partir da hipótese que esta Câmara não aprova a régie. Imaginemos, portanto, que vem o regime da liberdade.

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A quem se irá vender os "menos" que ficaram em armazém?

Reparem os Srs. parlamentares que, para dois ou três meses de venda, temos tabaco que basta, dados os 800:000 quilogramas que o Estado, naturalmente, por virtude dos seus contratos vai comprar à Companhia dos Tabacos Portugueses. Portanto, o tabaco a fabricar é para ser vendido mais tarde, mas só de certas e determinadas marcas, que são aquelas que pertencem ao Estado. A quem vendemos depois êste tabaco?

Dadas as suas desproporções em relação ao paladar do público, é manifesto que o vendedor quando fôr adquiri-lo, há-de procurar fazê-lo nas proporções do gosto do consumidor.

Explique o Sr. Ministro das Finanças se de facto já fez qualquer acordo com a Companhia, no sentido de poder fabricar todas as marcas, porque se o não fez e vem apresentar esta proposta, os conselheiros técnicos do Ministério das Finanças aconselharam neste momento uma leviandade.

Existe uma outra questão entro a Companhia e o Govêrno.

Todas as máquinas que estão dentro, das fabricas são pertença da Companhia?

São pertença do Estado?

São pertença da Companhia e do Estado simultaneamente?

Eu creio que esta questão não se encontra resolvida, porque a Companhia diz que a maquinaria que adquiriu à custa dos seus lucros lhe pertence.

É claro que o Estado pode responder que na verdade ela retirou dos seus lucros uma parte para comprar êsses maquinismos, mas também o Estado deixou de receber a comparticipação nesses lucros, e que as maquinas lhe pertencem.

Portanto, pertencem todas as máquinas ao Estado?

É uma outra pregunta a que, naturalmente, o Sr. Ministro das Finanças vai responder, para elucidar o meu espírito. Não queremos esta nova complicação, de ir laborar com máquinas cuja propriedade amanhã a própria Companhia nos venha contestar.

Um outro problema, que também é de considerar.

O Estado português tem o direito a receber da Companhia ao terminar o contrato, pagando-o de certa forma estipulada ao longo dos contratos e decretos que foram publicados, 800:000 quilogramas de tabaco.

Esta quantidade deveria ser paga em determinadas condições; mas um decreto, creio que da autoria do Sr. Daniel Rodrigues, estabeleceu a favor da Companhia e contra o Estado uma forma de pagamento que prejudica o Estado em mais de 10:000 contos.

Há muitas pessoas que sustentam que êsse decreto nesse ponto é ilegal.

Precisamos de saber se o Sr. Ministro das Finanças está de acordo ou pretende contestar êsse decreto.

Que providências toma o Sr. Ministro das Finanças? Porventura a Companhia entrega os 800:000 quilogramas de tabaco, reservando-se depois o Estado e a Companhia o direito de discutir o preço? Ou ficará o Estado desarmado? Vai o Estado fazer laborar as fábricas através de todas as complicações que surjam a respeito da propriedade .das máquinas? Estas preguntas exigem sérias respostas e são bastantes para que o Sr. Ministro das Finanças considere que, embora tenhamos os operários mais 20 ou 2õ dias sem trabalho e lhes paguemos, será isto preferível a irmos criar conflitos de direito que não sei como virão a ser solucionados.

E a situação do operariado? Outros tanto, mas ninguém mais do que eu tem defendido o direito que aos operários assiste de não serem lançados na miséria. Uma das razões que me levou a querer uma protecção talvez exagerada para a indústria nacional é exactamente a de termos que respeitar essa situação. Êste novo regime provisório, todavia, estabelece de repente uma situação de direito que até agora não existiu. Os operários estavam divididos em dois grupos: os da antiga régie que passaram para a Companhia e os que apenas a esta pertenceram. É um só dia que êstes venham a estar ao serviço do Estado, criar-se-lhes há uma situação jurídica e moral completamente diferente. Pense o Govêrno nas consequências de tal facto e medite se as vantagens do seu novo regime provisório, que não sabemos ao que vem, são suficientes para compensar,

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além dos inconvenientes já citados, mais êste a que acabo de me referir.

Sr- Presidente: por todas estas razões, a União Liberal Republicana chegou a uma conclusão: pretende-se estabelecer a régie de facto, antes porventura de uma dócil maioria ter estabelecido a régie de direito, e, seguidamente, urna vez estabelecido êste regime provisório, complicar-se há a questão dos tabacos por tal forma que não chegue ao fim.

Ora Sr. Presidente: não vejo que, trabalhando-se com boa vontade, o Parlamento não possa ter aprovado dentro de quinze dias o novo regime dos tabacos. Poderemos porventura ultrapassar na sua discussão o dia 30 do Abril? Que importa do Estado terá ainda, que discutir muitas cousas com a Companhia, como, por exemplo, a questão das máquinas, a recepção do tabaco, etc.

Que se impõe, portanto? Discutir a questão dos tabacos, discuta-se apressadamente, mas sem que as pressas sejam tantas que ela acabo por não ficar completamente esclarecida. Esta questão dos tabacos vai-se complicando muito. Na sua aparente simplicidade, ela está agitando as paixões, e, se por ora se trata apenas de um movimento subterrâneo, um dia virá em que poderá fazer explosão.

Não queira o Govêrno, com a aprovação desta proposta, dar ao Pais a impressão de que se pretende, por todas as formas, impor a régie, mesmo antes do o Parlamento a ter votado.

Faço um apelo sincero aos homens que dentro desta sala só encontram.

Não fala o homem apaixonado pela política, fala o homem que vê as enormes complicações que para a República podem derivar da circunstância, de a todo o custo se querer impor o regime da régie; fala a consciência republicana de um homem que quere evitar à República novos dissabores, novas complicações novas desilusões. Não por um espirito sectário, não por qualquer prurido do contrariar outro Partido mas porque a sua com consciência lho ordena, êsse homem dirige-se à consciência da Câmara para lhe dizer que nem deve votar esta proposta de carácter provisório nem a proposta de régie definitiva. E faz êste apelo em nome do interêsse nacional, em nome da consciência republicana, em nome do que sento o povo e que, por acção reflexa, é necessário que nós acabemos por sentir, também, dentro desta sala!

Sr. Presidente: está explicada a razão do voto da União Liberal Republicana.

Sr. Presidente: tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

É lida na Mesa e admitida a momo do Sr. Cunha Leal.

O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: cumprindo as prescrições regimentais, começo por enviar para a Mesa, a seguinte moção:

A Câmara, reconhecendo que o regime dos tabacos, a partir de 1 de Maio de 1926, devia há muito ter sido determinado;

Considerando que da demora nessa resolução resultam graves prejuízos ao Pais; e

Considerando que a proposta em discussão é absolutamente confraria às indicações da opinião pública:

Passa à ordem do dia.

Sala das Sessões, 20 de Abril de 1926. - Artur Carvalho da Silva.

Sr. Presidente: procurarei ser um calmo quarto possível, se bem que o procedimento da Câmara, se bem que a forma por que ela está encarando uma das questões mais importantes para a vida financeira e económica do Estado seja de molde a justificar todos os protestos contra um Parlamento que se dispõe a tratar de tam magno assunto sem o conhecer, visto que, tendo sido distribuído apenas um exemplar da proposta do Sr. Ministro das Finanças a cada grupo, evidente é que a maioria dos Deputados não a leu.

Para se ver que o que se pretende é nem mais nem menos do que estabelecer, de facto, a regi e, a régie ser tempo indeterminado, basta ser o artigo 3.° da proposta, que diz:

Leu.

Dentro disto, Sr. Presidente, cabe tudo. Pode mesmo vir a representar a régie definitiva, se um dia a maioria, de acordo com o Govêrno resolver retirar da discussão a proposta relativa à questão dos tabacos. O que se quere é dirigir ao País a afronta de se mostrar que não há a menor consideração pelos seus protestos, pe-

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las manifestações da opinião pública. E diz-se que vivemos num regime de opinião!

Mas o que é êsse regime de régie que a Câmara quere pôr em prática e que esto lado já condenou?

É o regabofe dos Transportes Marítimos, dos Bairros Sociais e da Exposição do Rio de Janeiro!

É uma régie à vara larga em que o Govêrno pretende arruinar a melhor fonte das receitas do Estado!

Há uma parte que eu desejo salientar, para que não passe sem reparo.

Alguns Srs. Deputados têm dito que é a primeira vez que se discute a questão dos tabacos sem que as receitas respectivas estejam presas à questão financeira; operações financeiras que eu tenho ouvido condenar aos republicanos, mas que eu quero pôr em confronto com as que a República tem feito.

A operação feita em 1891 foi feita por homens de Estado previdentes que não comprometeram as receitas do País; porque se fez uma dívida amortizável e a isso se deve podermos discutir a questão dos tabacos em plena liberdade, neste momento.

Então onde está a moralidade da República para dizer que só hoje é que vem a questão dos tabacos livres da questão financeira!?

Fez-se a redução dos juros das obrigações do empréstimo de 1891 e declarou-se que dessa medida resultava uma grande economia.

Mas o Estado deixa de pagar aquilo que o decreto tinha determinado que não pagasse? Não! O Estado tem de pagar aquilo que o decreto do Sr. Álvaro de Castro dizia que não devia pagar.

Não houve economia; o que houve foi o lançamento do nosso descrédito lá fora.

O Sr. Amâncio de Alpoim: - V. Exa. está a fazer obstrucionismo?

O Orador: - Estou a fazer discussão.

O Sr. Amâncio de Alpoim: - Não é essa a impressão que nos dá.

O Orador: - É que V. Exa. tem sempre impressões erradas.

Mas, continuemos.

Sr. Presidente: o contrato do 1906 diz o seguinte:

Leu.

Isto é bem claro. Ninguém poderá ter dúvidas sôbre qual deva ser a importância a pagar à Companhia por êsse tabaco que ela do ver á deixar em existência no terminus do contrato.

Quando há dias o Sr. Ministro das Finanças declarou que se teria do ir para uma arbitragem, 110 tocante ao preço dos 800:000 quilogramas de tabaco reconheci que era necessário que qualquer Sr. Deputado viesse demonstrar que não existe disposição legal que permita à Companhia considerar revogada a disposição que previdentemente foi introduzida no contrato de 1906, relativamente ao preço dos 800:000 quilogramas de tabaco.

No desastrado contrato de 1918, pelo qual se permitiu o aumento de 50 por cento no preço do tabaco, não se fala nos 800:000 quilogramas.

Houve depois o acordo de 4 de Agosto de 1924, acordo baseado na lei n.° 1:565, de 22 de Março do mesmo ano.

Nessa lei diz-se o seguinte:

Leu.

Como foi nesta lei. que se baseou o acordo de 4 de Agosto de 1924, nenhuma realidade tem qualquer disposição dês-se acordo, tendente a modificar as condições de preço por que devem ser entregues os 800:000 quilogramas.

Mas ainda há mais. Tendo-se suscitado dúvidas sôbre se eram ou não contidas nos termos da lei n.° 1:565 algumas disposições do acordo do 4 do Agosto de 1924, foi nomeada, por portaria de 4 de Setembro, uma comissão composta de magistrados e dalgumas outras pessoas, para verificar se estavam ou não as disposições dêsse acordo dentro dos limites da autorização a que se refere a lei n.° 1:565.

Essa comissão apresentou o seu relatório, no qual diz o seguinte:

Leu.

Quere isto dizer que nenhuma autorização legal poderia justificar a alteração estabelecida no acordo de 4 de Agosto de 1924.

Não é só no que diz respeito aos 800:000 quilogramas que é indispensável ponderar muito a proposta em discussão. A proposta tem mais importância pelo

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que nela se não contém, do que por aquilo que nela se contém.

Apoiados.

Sr. Presidente: se nos lembrarmos do prejuízo que a questão dos 800:000 quilogramas causará, se vingar - e não pode vingar porque a Companhia não tem direito a fundamentar reclamações em contratos que não têm fôrça legal (Apoiados)- vemos que o Estado perderá, pelo menos, mais de 10:000 contos, e eu pregunto:

Que autoridade têm para vir acusar os monárquicos aqueles que ao Estado causam prejuízos desta natureza?

A previdência dos homens da monarquia, que fizeram o contrato de 1906, impõe-se à gratidão dos portugueses e à consideração de todos aqueles que, depois de terem andado pelos comícios a procurar desacreditar-nos, devem ajoelhar ante a memória de muitos deles, e perante muitos que estão ainda vivos, porque representam o patriotismo da defesa dos interêsses do Estado. E pondo em confronto as tremendas culpas, espantosas culpas, que a República cem na questão dos tabacos e em todas as outras verificamos a enorme diferença.

Basta ver esta disposição do artigo 15,° do contrato de 1906, e confrontá-la com a disposição do artigo 6.° da lei n.° 1:545, que diz o seguinte:

Leu.

Quere isto dizer que uma disposição destas, claramente marcada e estabelecida, foi desrespeitada por parte da Companhia, e isto por culpa da República.

Assim, Sr. Presidente., eu devo dizer que aqueles que andaram pelos comícios a clamar contra os homens da monarquia, relativamente à questão dos tabacos, hão-de reconhecer que não tinham razão e que são absolutamente verdadeiras as acusações que eu tenho feito, que são absolutamente prejudiciais para o País, pela incompetência e pela precipitação com que estão tratando a questão dos tabacos.

Mas ainda há mais; pois a verdade é que está claramente estabelecido no decreto de 1906, no seu artigo 13.°, o seguinte:

Leu.

Encontrando-se ainda estabelecido no n.° 1.° do artigo 6.º o seguinte!

Leu.

O que se vê, Sr. Presidente, é que foi estabelecida uma disposição em virtude da qual a Companhia deixa de pagar ao Estado êsses 3?920 por cada quilograma de tabaco importado.

Eu pregunto, na verdade, ao Sr. Ministro das Finanças se a aprovação duma proposta nestas condições não será prejudicial para o Estado.

Postas em relevo estas circunstâncias, eu pregunto ao Sr. Ministro das Finanças, ao Govêrno, que tem a responsabilidade de não ter feito com que a maioria resolvesse a questão dos tabacos mais ràpidamente e a tempo, se esta proposta não poderá trazer prejuízos muito mais graves para o País.

O Sr. Presidente do Ministério e o Govêrno actual continuam seguindo as velhas normas do Partido Democrático, que coloca os interêsses do seu partido acima dos interêsses da Nação.

A proposta do Sr. Ministro das Finanças não diz cousa alguma a favor dos operários.

Nem o mais leve benefício para a classe operária dos tabacos.

A monarquia não ia para os comícios apregoar bacalhau a pataco ...

O Sr. Manuel Fragoso: - Isso não fica bem na boca de V. Exa.

O Orador: - Não, na minha boca nunca entrou bacalhau a pataco.

A monarquia garantia aos operários o seguinte:

Leu.

Na moeda actualizada dava 6:000 e tantos contos.

O Sr. Amando de Alpoim (interrompendo): - Eu conto com o voto de V. Exa. a favor dos operários quando a proposta se discutir na especialidade.

O Orador: - Pode V. Exa. contar com êsse voto, porque sou sincero.

Nunca andei poios comícios a prometer aos operários aquilo que lhes não podia dar no dia seguinte.

Se V. Exa. me preguntar se eu entendo que devem ser concedidas melhorias de situação aos operários, eu direi que sim, principalmente em tudo que constitua providências e garantias de seguro

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para a doença, para a velhice e para a invalidez.

Mas, precisamente porque assim penso, é que entendo que essas reclamações devem ser formuladas de maneira a poderem ser atendidas, isto é, que dentro de uma indústria, operários e patrões se entendam, procurando respeitar mutuamente os seus direitos, e não se considerando inimigos.

O quê não serve é a República distribuir anualmente 330 contos de lucros pelos operários dos tabacos, quando devia dar-lhes 6:000.

O Sr. Amâncio de Alpoim (interrompendo):-Isso é uma consequência do monopólio que V. Exas. fizeram.

O Orador: - Não apoiado.

Eu pregunto a V. Exa. se também é consequência do monopólio o facto de, na partilha de lucros aos administradores de vários estabelecimentos do Estado, cada um deles receber cêrca de 200 contos por ano.

É porventura justo que aos outros se regatei uma simples parcela de lucros, quando o Estado é tam pródigo para certas e determinadas criaturas?

Se eu fôsse funcionário público, e me competisse receber alguma participação de lucros, se a achasse exagerada, revoltar-me-ia, e, apesar de não andar a pregar pelos comícios,, saberia pegar na parte que reputava excessiva e distribuia-a pelo operariado.

Na suposição, infelizmente errada, de que a régie constituiria um regime capaz de produzir os mesmos lucros do que a indústria particular, nós vemos que, na proposta que foi apresentada a esta casa do Parlamento, se estabelece que, ao passo que para todos os operários e empregados a partilha de lucros é de 400 contos, para cinco administradores - que seriam dos tais amigos do povo, é claro- se destinam 500 contos, fora os vencimentos.

E a isto que se chama régie; é a isto que se chama um regime democrático.

A régie é um regime largamente experimentado na República; é um regime experimentado, como disse há pouco, em todos os serviços públicos, mas sobretudo nos Transportes Marítimos, serviços êstes que serviriam em toda a parte do mundo

para dar muitos lucros, mas que nas mãos do Estado deram um prejuízo de 400:000 contos.

É a êste prejuízo que se quere chegar?

É a isto que se quere reduzir a melhor receita do Estado?

Mas ainda sôbre a proposta em discussão, eu direi a V. Exa. que, em relação ao artigo 1.°, o começo da régie, isto é a sinfonia, consiste no seguinte :

Leu.

E o começo da régie.

Ora se há Deputados que tivessem adoptado uma posição definida nesta questão, eu desde já digo ao Sr. Amâncio de Alpoim, como à Câmara, que tenho a coragem de ser um deles, dizendo aquilo que 80 por cento de V. Exas. pensam, mas não dizem.

Eu defendo para a indústria dos tabacos o regime do monopólio privado, e defendo-o porque a régie é um monopólio que o Estado não sabe explorar.

Condeno a régie; condeno também a liberdade, porque ela para a indústria dos tabacos é o monopólio de facto, mas com nenhuma garantia para os milhares de famílias que vivem dela.

Entendo que tanto pelo Estado, cujos interêsses é preciso defender, como pelos operários, cujos interêsses é preciso não esquecer também, o monopólio privado é de aconselhar.

Defendo, emfim, aquilo que V. Exas. pensam no seu íntimo, mas que não tem coragem de defender por causa do que andaram a pregar nos comícios contra os "manipólios", como pregaram contra os "jesuítas".

Risos.

O que mais convém ao Estado é realmente o monopólio privado, mas desde que se marquem na lei todas as garantias para os operários, todas as cautelas para o Estado e um mínimo de receita para o mesmo Estado.

Sr. Presidente: o artigo 2.° diz que continua livre de direitos a importação de tabaco em folha e em rama.

Esta é uma medida natural.

Mas o artigo 3.° é curiosíssimo e peço para êste ponto a atenção do Sr. Ministro das Finanças.

Diz êste artigo:

Lê.

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... E do que fazem parte" ... diz-se aqui.

Mas isto não quere dizer que essa comissão seja composta exclusivamente por estas pessoas.

Quere dizer que deles farão parte êstes senhores.

Ora, como nós sabemos quais são os intuitos do Estado, com relação à régie, desejo que o Sr. Ministro das Finanças me diga se o facto de se dizer aqui "e de que farão parte", quere dizer que serão apenas constituídos por estas pessoas.

Quem foi que disse ao Sr. Ministro das Finanças que êstes dois funcionários da Companhia dos Tabacos aceitavam êstes lugares?

Quais são os vencimentos que têm, porque aqui nada se estabelece?

Já o Sr. Marques Loureiro teve ensejo de irisar que parece concluir-se da leitura desta proposta que qualquer entendimento houve entre o Govêrno e a actual Companhia concessionária.

Desejava que o Sr. Ministro das Finanças fizesse o favor de me elucidar, na resposta, que, seguramente, pela soa amabilidade, não deixará de dar aos Deputados que têm usado da palavra, se teve qualquer conversa com representantes da Companhia dos Tabacos para o regime provisório a adoptar a partir de 1 de Maio.

Se a teve. espero que S. Exa. me diga também quais as bases em que assentava o regime a estabelecer e quais eram, porventura, as garantias.

O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Eu terei ensejo de dar resposta às preguntas do V. Exa. quando usar da palavra para responder a vários Srs. Deputados.

O Orador: - Muito bem! Agradeço a V. Exa.

É indispensável sabermos isto para podermos apreciar côas cientemente a proposta.

Acho curiosa a afirmação que aqui se faz "para não parar a laboração". Mas quem garante ao Sr. Ministro que Lá tabaco para manipular de forma a não parar a manipulação?

E caso o não haja, pregunto a S. Exa.: que culpa tem os opormos da Companhia dos T. baços, quer sejam os que fiquem na régie, quer os admitidos pela Companhia, que o Govêrno tenha propositadamente protelado a discussão desta proposta para que se vejam prejudicados, numa época de grandes dificuldades de vida para toda a gente, sem ter trabalho?

Está ou não o Govêrno na disposição de pagar como deve - por isso que êles não têm culpa alguma no caso-aos operários o empregados, a partir de 1 de Maio?

Se o está, faz o seu dever, visto que é o responsável pela situação. Mas não deixa, contudo, de mostrar mais uma voz ao Pais quantos prejuízos acarreta a sua estada no Poder.

Um Govêrno que provocou esta situação nem mais uma hora devia sentar-se naquelas cadeiras.

Sr. Presidente; O artigo 4.° diz:

Leu.

Pregunto ao Sr. Ministro das Finanças: £0 em concurso público que se fazem estas compras?

Vejo que são aqui dispensadas todas as formalidades das leis de contabilidade.

"O Estado não pode ser comprador", dizia o Sr. António Maria da Silva a respeito dos trigos, dessa régie. igual a esta outra régie que se pretende fazer.

Sr. Presidente: o artigo 5,° estabelece:

Leu.

Êste artigo resultou de qualquer combinação como a Companhia dos Tabacos? Se não resultou, chamo a atenção do Sr. Ministro das Finanças para o perigo que dêste artigo pode resultar.

Chamo tanto mais a atenção de S. Exa. quanto é certo que, por vezes se empregam palavras que podem servir de argumento, para postergar direitos incontestáveis.

E assim que na base 18.° da proposta por S. Exa. apresentada ao Parlamento, S. Exa. não acode aos interêsses do Estado com a devida ponderação, seguramente não por falta de vontade em acertar.

A base 18.° está em contradição com as disposições legais.

S. Exa. diz:

Leu.

A disposição do contrato de 4 do Agosto não tem validade, está revogada.

Sr. Presidente: apresentei quais os pé-

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rigos gravíssimos de se votar de ânimo leve qualquer proposta relativa aos tabacos.

O Sr. Álvaro de Castro disse que estava mais ou menos indicado, para um regime provisório que consistisse em salvaguardar os interêsses do Estado, uma curta continuação do regime já. existente. Sou inteiramente da opinião do Sr. Álvaro de Castro e entendo que uma vez salvaguardados os interêsses do Estado era muito preferível a continuação, embora com curta duração, do actual regime de indústria e fabrico dos tabacos que a adopção de um regime novo.

O Govêrno apresentando esta proposta quere pôr em prática um plano ha muito tempo por êle preparado. Não se trata de uma questão aberta como diz o Sr. Ministro das Finanças; o Govêrno pôs esta questão fechada ao Parlamento e pô-la fechada porque para regime provisório só poderia adoptar-se dois processos, a continuação do actual regime de exploração por monopólio particular ou a régie, havendo ainda a atender que o Sr. Presidente do Ministério declarou ontem que nunca aceitaria a prorrogação do regime do monopólio particular, embora com curta duração.

Ora se eram duas as soluções possíveis e o Sr. Presidente do Ministério fazia questão de uma delas evidentemente fez questão fechada.

Assim se demonstra que a régie é um número fundamental do programa do Govêno e porque essa régie é absolutamente condenada pela opinião pública, não havendo jornal algum que a defenda, a não ser um jornal do Partido Democrático, a proposta apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças representa uma afronta ao País, representa uma afronta à imprensa, representa uma afronta a todos os órgãos da opinião pública.

Não lhe daremos o nosso voto; mas, não só lhe não daremos o nosso voto, podem os Srs. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças contar com uma oposição que por todos as formas empregaremos, fazendo quanto em nossas fôrças caiba para evitar mais esta calamidade nacional, a da régie.

Embora os ilustres leaders dos outros lados da Câmara, dizendo condenarem a régie, tenham tratado esta proposta, que outra cousa não é senão a entrada franca e aberta na régie, com carinho e cuidado, eu direi a V. Exa. que outra e bem outra será a nossa atitude; havemos de fazer tudo para evitar que esta proposta seja aprovada.

Os ilustres Deputados republicanos dos diversos lados da Câmara que têm falado acerca da proposta da régie em discussão parecer n.° 133 - eclaram que são irredutíveis nesse ponto de vista; pois bem, façamos o que disse o meu ilustre colega Sr. Pinheiro Tôrres: constituamos um bloco contra a régie.

Nós estamos no nosso pôsto, prontos a ajudar todos aqueles que queiram impedir que se adopte, de facto, essa verdadeira afronta ao País, essa verdadeira calamidade nacional.

Resta ver como os ilustres Deputados cumprem aquilo que prometeram.

Nós estamos no nosso pôsto; vamos a ver se êles desertam ou não.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi admitida a moção.

O Sr. Presidente: - Interrompo a sessão para continuar às 21 horas e 30 minutos.

Eram 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 21 horas e 50 minutos.

Prossegue o debate sôbre o orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações e o parecer n.° 46-B que lhe respeita.

Continua em discussão o capítulo 2.° sôbre a Secretaria Geral do Ministério e serviços de obras públicas.

O Sr. Manuel José da Silva: - Sr. Presidente: referindo-me em primeiro lugar à moção enviada para a Mesa pelo Sr. Amorim Ferreira, eu devo dizer francamente a V. Exa. e à Câmara que ela, a meu ver, não deveria ter sido aceite na Mesa, por o Regimento a isso se opor.

Quanto à questão prévia não posso estar do acordo com ela, por isso que ela nos termos do nosso Regimento só pode ser posta nos seguintes casos:

Leu.

O que se não dá no caso presente, que na verdade nada tem que ver com as ver.

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bas consignadas no capítulo 2.° do orçamento em discussão.

Interrupção do Sr. Amorim ferreira que não se ouviu.

O Orador: - O que diz, Sr. Presidente, a moção que se encontra sôbre a Mesa ?

Diz que se deve manter o principio do pagamento da fiscalização dos caminhos de ferro com receitas provenientes de um imposto único a estabelecer lançado sôbre as receitas das companhias concessionárias.

O facto de se exigir que deve ser um imposto único dá-mo a impressão de que êsse facto pode até certo ponto levar as companhias a eximirem-se do pagamento dessa contribuição.

Interrupção do Sr. Soares Branco que se na o ouviu.

O Orador:-Do facto, o decreto n.° 11:283 fala de sobretaxas a cobrar; porém, êsse diploma em vigor deixa de o estar, quando haja um diploma igual que o substitua ou modifique.

Sr. Presidente: vamos à questão principal, que é a da moção apresentada a propósito do capítulo 2,° e relativa aos serviços de fiscalização dos caminhos de ferro.

O que se teve em vista com essa moção?

Arrancar à Câmara um voto que ao Govêrno servisse para orientar a sua política em matéria tributária relativamente a caminhos de ferro.

Devo aqui dizer que o assunto dos impostos relativos às emprêsas ferroviárias é muito mais complexo do que pode supor-se.

Basta dizer que há impostos sôbre as emprêsas ferroviárias que estão englobados no regime actual de tarifas.

Há nesta Câmara quem conheça melhor do que eu as dificuldades que existem para se fazer de facto um sistema de tarifas, harmónico com os interêsses das emprêsas e do Estado e não em detrimento da economia geral.

Sendo assim, se a Câmara fôsse dar o seu voto ao ponto de vista consignado nessa moção em nada se traduziria êsse seu gesto ou dura ensejo a que, possivelmente, qualquer Ministro, não digo o actual que é um profundo respeitador da Constituição - ou não fora S. Exa. um velho republicano- invocando essa doutrina, fôsse decretar, à la diable, quaisquer disposições no sentido de remodelar o sistema tarifário.

Não se podia fazer a modificação do sistema de imposto relativo às emprêsas de caminhos de ferro, sem trazer uma proposta ao Parlamento. O Parlamento terá então um admirável ensejo de pronunciar-se sôbre a parte de ordena geral aprovando ou recusando o voto à conveniência de legislar na matéria e discutindo essa proposta nos seus detalhes.

Mas suponhamos que por virtude das dificuldades do Govêrno - e elas são tantas! - não se podia em determinado prazo de tempo tratar dêste problema. Temos outro ensejo admirável para nos pronunciarmos sabre esta doutrina ou sôbre as que porventura apareçam em sentido contrário: falando a propósito de um documento que já foi distribuído na Câmara e que figura sob a rubrica de orçamento ordinário da Inspecção Geral dos Caminhos de Ferro.

Àparte do Sr. João Luis Ricardo.

O Orador: - A comissão do Orçamento se pensa como V. Exa., pensa contraditoriamente com o seu procedimento nesta Câmara. Está pendente da apreciação da Câmara o decreto relatório ao contencioso administrativo, como está o dos caminhos de ferro. No emtanto discutiu-se aqui o orçamento do Ministério do Interior. Figura no Orçamento aqui aprovado a verba necessária para fazer face a êsses encargos ...

O Sr. Alberto Dinis da Fonseca: - Havendo uma proposta em sentido contrário ...

O Orador: - É bem certo.

Ora, Sr. Presidente, se há de facto o desejo de resolver as questões, de não perdermos tempo, devemos tratar as questões apenas na altura própria. A comissão do caminhos de ferro não pôde ainda retinir desde o começo da sessão legislativa. Várias circunstâncias - e uma delas muito para respeitar, a da ausência forçada, que todos lamentamos, do Sr. Barros Queiroz - a têm impedido de

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reunir. Já tem, no emtanto, relator não sei como, mas eu já nada sei em matéria de Regimento...

Mas a comissão que reúna e que traga o produto do seu trabalho à Câmara para que nós possamos pronunciar nos sôbre êle, no bom desejo de acertar. No emtanto, surge o ponto de vista do Sr. Ministro do Comércio, traduzido em proposta. A Câmara há-de pronunciar-se também sôbre êle, decerto no bom desejo do igualmente acertar. Mas estar a votar uma cousa no ar, que pode traduzir-se em última análise, num prejuízo para o Estado, para isso não podem contar com o meu voto. Uma única atitude, seja qual fôr o porto da Câmara em relação ao assunto em debate, é exigível da parte do Sr. Ministro do Comércio.

Para êsses, S. Exa. não pode invocar nem afazeres nem importância superior de outros assuntos, seja qual fôr a orientação da Câmara.

No emtanto, há um procedimento que se impõe da parte do Sr. Ministro do Comércio, e pena é que não tivesse tido já efectivação. Mas, em todo o tempo, é tempo.

Está em pleno vigor, repito, até ser modificado ou revogado por um diploma de igual fôrça, o decreto n.° 11:283. Por êste diploma, as companhias têm de entrar com determinada quantia para satisfazer os encargos da fiscalização. Por informações que chegam ao meu conhecimento, não sei se com verdade, foram feitas várias démarches pelas companhias no sentido de lhes ser aplicada a moratória ultimamente decretada para as contribuições gerais do Estado.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Gaspar de Lemos) (interrompendo): - Êsse alvitre foi-me, de facto, apresentado pelas companhias, mas eu não o aceitei.

O Orador: - À declaração do Sr. Ministro é interessante e digna de registo, mas só terá o devido valor quando S. Exa. usar dos meios necessários para obrigar as companhias a entrar com as importâncias em dívida. O que importa é que o Estado se encontre habilitado com os meios financeiros necessários para satisfazer os encargos da fiscalização. O que existia anteriormente era um arremedo de fiscalização, porque, por muito boa que fôsse a vontade de alguns dos seus membros, a sua eficiência não se fazia sentir.

Sr. Presidente: êste incidente da moção do Sr. A morim Ferreira veio perturbar, sem nenhuma vantagem, a marcha da discussão do orçamento. Veja V. Exa. os inconvenientes do toda a ordem que resultariam se porventura essa doutrina fôsse seguida. A propósito de cada capítulo, e dentro de cada capítulo em relação a cada artigo, apresentarem-se moções, nem no fim da sessão legislativa o orçamento estaria discutido.

O próprio Sr. Amorim Ferreira reconheceu êsse inconveniente.

Interrupção do Sr. Amorim Ferreira, que não se ouviu.

O Orador: - Eu tenho cumprido o meu dever como Deputado da Nação. Tenho dito. O orador não reviu.

O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: ao iniciar as minhas considerações começo por declarar que a minha posição é interessante perante a proposta do Sr. Amorim Ferreira, interessante principalmente por ser representante do Estado junto da primeira Companhia de Caminhos de Ferro, cujo capital, na maioria, pertence ao Estado.

Se o Estado unificar os seus impostos, que mal pode vir daí?

Mas se nós estamos sempre a protestar contra a falta do unificação dos impostos porque não se há-de aplicar êsse princípio aos caminhos de ferro?

Porque não se faz a unificação das tarifas?

Também não vejo o motivo porque é que a moção do Sr. Amorim Ferreira não pode ser aprovada!

Eu verifico que de facto os vencimentos atribuídos ao pessoal não são excessivos, tanto mais que eu sou daqueles que entendem que só se deve exigir trabalho a quem se paga.

Não admira que se proteste ou reclame contra uma percentagem única, lançada a todos. É fácil de compreender.

Se há emprêsas que prosperam, outras há em que as receitas baixam.

Se as tarifas são diferentes, os encar-

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gos não o são; portanto não é possível estabelecer uma percentagem única para todas. Deve ser maior para umas e menor para outras.

É indispensável a. melhoria dos serviços dos caminhos de ferro e o desenvolvimento da sua acção.

A fiscalização, quando organizada devidamente segando as leis de contabilidade pública, sôbre os processos de pagamento ao pessoal, é vantajosa. Pretende--se equiparar os vencimentos do director da fiscalização ao de idênticos funcionários de emprêsas particulares.

Admitamos que também se incluía na organização do Conselho Superior de Finanças êsse princípio de que os fiscalizados nunca, poderiam receber mais do que o fiscal; V. Exa. estão a ver que o ilustre presidente dêsse Conselho, o Sr. Paiva Gomes, que pelos se n s serviços muito bem merece da Nação, poderia atribuir para si vencimento igual ao do Sr. Presidente da República Imaginem ainda V. Exas. que a Inspecção do Comércio Bancário inscrevia também êsse princípio na sua organização; imediatamente o inspector diria: "eu tenho que receber tanto como ganha o governador do Banco de Portugal e o do Banco Nacional Ultramarino".

Um princípio dêstes, que é extraordinariamente suspeito, não pode ser sancionado pelo Parlamento, evitando que êle produza os seus efeitos.

É esta a razão porque eu voto a moção do Sr. Amorim Ferreira.

Eu não discuta já a organização quanto ao pessoal; o que comesto é que um organismo que não goza de autonomia tenha o direito do lançar ilimitadamente impostos, cobrá-los e distribuí-los como melhor entender.

E, porque o Parlamento tem abdicado dos seus direitos, consentindo aos Governos que reincidam na prática abusiva de lhe invadir as suas atribuições, é necessário pôr termo a tal processo.

Eu não receio aqueles que pregam as suas doutrinas anti-parlamentaristas na tribuna ou na imprensa, mas sim os que à sucapa, sobrepticiamente, vão pondo em prática uma obra anti-parlamentarista, que nós raramente discutimos, apostados como estercos, quási sempre, em não criar dificuldades ao Poder Executivo.

Não vejo, portanto, como já disse há pouco, nenhum inconveniente em que essa moção seja aprovada. Por ela, não se suspende o decreto, mas apenas se diz ao Govêrno que, em vez de estar todos os dias a declarar que vai providenciar - não tendo ainda pensado sequer um momento em o fazer - procure, em matéria de impostos de fiscalização, conciliar os interêsses do Estado com os da Companhia e com os do público, que devemos acautelar e defender.

Se é êsse o desejo do Govêrno, então o Sr. Ministro do Comércio que não se demore em trazer ao Parlamento uma proposta de lei nesse sentido.

Sr. Presidente: eu devo dizer à Câmara que desde pequeno me habituei a admirar o Sr. Ministro do Comércio e a respeitá-lo pelo seu carácter e inteligência, e assim não posso deixar de chamar muito particularmente a atenção de S. Exa. apara êste assunto, tanto mais quanto é certo que S. Exa., como Ministro do Comércio, sabe muito bem a política seguida, e assim, deve estar convencido de que êsse decreto saiu de cá, sendo da mesma origem.

Assim, eu devo dizer que, se S. Exa. não tratar de o modificar, nada se fará sôbre o assunto, não se tomando providências algumas relativamente fiscalização dos caminhos de ferro.

Não posso, como Deputado da Nação, deixar de chamar a atenção de S. Exa. sôbre o assunto, a fim de que S. Exa., como membro do Poder Executivo, tome as providências que o caso requere, de forma a que nos meses de Maio e Junho a cobrança dêsse imposto possa estar efectuada,

O assunto não pode estar à mercê dos caprichos de quem quer que seja e assim, se êsse organismo não tem competência para estudar o assunto, então o que S. Exa. tem a fazer é dispensá-lo. - Não posso, pois, deixar de chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para o assunto, tanto mais quanto é certo que até lá temos grandes receitas a cobrar.

Eu, numa noite que nunca mais perdi de memória, quando passei pelas cadeiras do Poder, autorizei pela primeira vez, por um diploma, que fossem aumentadas as tarifas.

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Apresentei um projecto de lei para estabelecer doutrina, que faz parte não da legislação sôbre tarifas, mas da criação de um fundo especial. Resultou que dêsse aumento havia de dispor-se a parte necessária para cobrir as despesas de exploração, não se atribuindo um centavo ao capital.

O Estado deve compreender que é indispensável melhorar os serviços, em material, linhas, etc., porque daí resulta benefício para o próprio Estado.

Os Caminhos do Ferro do Estado cobram hoje tarifas mais elevadas do que as emprêsas particulares.

Apoiados.

Não é justo que, à custa das receitas dessas emprêsas, se ponham em prática fantasias, que, sendo muito interessantes, podem não dar resultado algum favorável, nem para o Estado nem para as emprêsas.

Tenho dito.

O Orador não reviu.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Gaspar de Lemos): - Sr. Presidente: pedi a palavra porque não quero deixar sem resposta as considerações feitas pelo Sr. Jorge Nunes e para declarar que aceitei a moção do Sr. Amorim Ferreira, seguro e certo de que ela apenas significa um voto da necessidade de simplificar os impostos e reuni-los num só, e também para mostrar o propósito em que estou do que êsse assunto seja devidamente estudado, como já o está sendo pelo actual inspector geral, engenheiro Sr. Sequeira, que é um ferroviário distintíssimo e pessoa de uma grande honorabilidade, que tomou o compromisso de estudar o assunto, embora declarando que o não podia estudar só por si, vista a sua grande complexidade.

Logo que êsse estudo esteja concluído, apresentá-lo hei ao Parlamento.

O orador não reviu.

O Sr. Francisco Cruz: - Sr. Presidente: enferma do grandes e graves defeitos a nossa legislação ferroviária. Avulta principalmente a complexidade de impostos, a sua duplicação em alguns casos, a exagerada actualização dos mesmos impostos, a desigualdade de tratamento entre as emprêsas particulares e os Caminhos de Ferro do Estado, a deficiência da acção fiscalizadora do Govêrno nos Caminhos de Ferro do Estado, a deficiência das emprêsas e das fôrças vivas no Conselho Consultivo dos Caminhos de Ferro e a deficiência na organização comercial, quer das emprêsas, quer do Estado, para que regionalmente se estudem as condições em que se encontram os produtos nas várias regiões, e assim na sua condução cheguem proporcionalmente aos mercados compradores, e ainda a inconstitucionalidade da legislação ferroviária, principalmente em sobretaxas, e sobretudo o decantado decreto n.° 11:283.

Não. quero, porque não está em discussão o decreto n.° 11:283, fazer largas considerações sôbre êle; mas apenas, com entusiasmo, com vontade de acertar, com conhecimento do causa e com aquela consciência que dá a um homem honrado um estudo sôbre uma questão momentosa como esta, declarar que dou o meu voto à moção do Sr. Amoiim Ferreira, englobando os impostos, que, como já afirmei, são complexos e duplicados.

É bom que a Câmara saiba, porque a sua maior parte parece que ignora, que nas várias concessões às emprêsas ferroviárias, feitas pelo Estado, apenas se impunha o imposto de trânsito.

Depois, mercê das complacências, das transigências das emprêsas, o Estado, que não é nenhuma vestal como eu provarei dentro em breve quando tiver oportunidade do fazer algumas considerações sôbre o magno problema dos tabacos, o Estado não tem de administrar, tem apenas de fazer aquela política, alta, nobre, equilibrada, para que todos os elementos de trabalho conjuguem os seus esfôrços para o engrandecimento da nossa querida Pátria.

O Estado é um pôssimo administrador aqui e em toda a parto, mas pior talvez em Portugal porque a maior parte dos funcionários são burocratas, instrumentos de propaganda das muitas coteries que infelizmente vivem em Portugal. Alguns há no emtanto, e por êsses eu tenho muito respeito o consideração, que são funcionários do Estado, procuram sempre engrandecer e dignificar a sua função.

Sr. Presidente: a nossa legislação ferroviária enferma de graves defeitos, e entre êles avulta, a meu ver, a da comple-

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xidade e duplicação em alguns casos dos impostos.

É sôbre isso que eu quero chamar mais uma vez a atenção da Câmara.

A maior parte dos indivíduos que passam pelas cadeiras do poder têm uma grandeza meramente platónica que muitas vezes os surpreende, porque quando se julgam muito elevados caem precipitadamente. Por isso, e visto a comissão dos caminhos de ferro não ter reunido por uma consideração especial para como seu digno presidente, o velho republicano e grande patriota Sr. Tomé de Barros Queiroz (Muitos apoiados), eu quero lembrar que é tempo de começarmos a arrumar a casa, de pormos de parte muita legislação que não aproveita ao País, mas apenas a uma ou outra coterie, ou mais ainda a um ou outro indivíduo.

Quando o Estado começou a fazer concessões às emprêsas ferroviárias havia apenas o imposto de trânsito, 5 por cento. Vem depois um imposto quási criminoso, o do sêlo, que era de 5 por cento. E seguiram-se todos os outros a ponto de se chegar a êste estado de cousas: a soma dos impostos vai a mais de um oitavo da receita bruta das emprêsas.

E há casos como êste: o imposto de solo é de 5,5 por cento, porque êle é de 5 por cento, mas as emprêsas têm de concorrer com meio por cento para o cofre de emolumentos dos empregados das finanças, sem êles fazerem absolutamente nada,

Oh Sr. Presidente, se a gente se lembrar que um vagão completo chega a pagar 1.500$ e 1.600$

Só de imposto de sêlo um vagão completo, para vir de qualquer parte que não seja muito longe para a posse do consignatário, paga 80$, isto além do imposto de trânsito de 5 por cento, único imposto que à maior parte das emprêsas lhes foi imposto pela concessão que tiveram do Estado e do imposto de transacção que ninguém sabe o que seja em emprêsas ferroviárias, a não ser na venda de sucata.

Mas há mais, Sr. Presidente.

As emprêsas ferroviárias têm ainda a seu cargo o imposto para tuberculosos, imposto êste que sendo extraordinariamente humanitário representa, para as emprêsas, um imposto quási duplicado, porque a maior parte delas, por imposição do Estado, tem de dar assistência médica aos seus doentes e ainda têm de pagar o imposto de tuberculização que é aplicado não se sabe em quê.

Se se quere manter êsse imposto, então deixe-se às emprêsas inteiramente essa receita para elas poderem fazer face aos seus doentes do tuberculização. E, como se ia dizendo, de tudo isto resulta um gravame enorme, pois parece que ninguém compreende que êsse aumento de impostos que é feito às emprêsas ferroviárias resulta em prejuízo do público e da economia do País!

As emprêsas, para fazerem face à exploração e melhorarem os seus serviços, carecem de receitas e, desde que o Estado lhe leve essas receitas, elas não podem melhorar nada as suas instalações e material.

Folgo, por isso, Sr. Presidente, com as palavras do Sr. Ministro do Comércio e felicito o Sr. Amorim Ferreira.

O Sr. Ministro do Comércio, olhando a questão muito por alto, com vontade de servir a Nação, pondo de parte caprichos, compadrios, pressões e pedidos por mais altos que êles sejam, dignificará êsse lugar.

Devo dizer que poucos indivíduos que tem passado por aquelas cadeiras tem tido a coragem moral precisa para realizar uma obra de engrandecimento própria deles e do País.

Faça S. Exa. uma obra elevada, vá até o fim, tenha a coragem para arcar com uma obra dessas. Folgo de registar as suas palavras.

Começou S. Exa. por fazer alguma cousa de útil. Arrume S. Exa. a casa, mas faça-o devagar, com consciência.

Não quero fazer agora mais considerações; reservo-me oportunamente para as produzir, quando estiver em discussão o célebre decreto n.° 11:283, e termino dizendo que dou o meu voto à moção do Sr. Amorim Ferreira.

O orador não reviu.

O Sr. Luís da Costa Amorim: - Concordando, em princípio, com a moção do ilustre Deputado Sr. Amorim Ferreira, não posso de forma nenhuma concordar com a sua redacção.

Essa moção, tal como está redigida, diz "que se mantém o princípio do paga-

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mento da fiscalização dos caminhos de ferro com receitas provenientes do imposto único a estabelecer".

Ora não se compreende que se mantenha o que ainda não existe. Eu compreendo que a Câmara manifeste o desejo de que êsse princípio se estabeleça, mas emquanto êle não fôr estabelecido, e para que as Companhias realmente, como é sou desejo, paguem a fiscalização, então necessário 6 que se mantenha, e o verbo "manter" aqui tem inteira aplicação, o princípio do pagamento das sobretaxas em harmonia com o decreto n.° 11:283.

Por isso, em conformidade com estas breves considerações que acabo de formular, mando para a Mesa a minha moção, concebida nos seguintes termos:

"A Câmara, reconhecendo a vantagem de se estabelecer o princípio do pagamento de fiscalização dos caminhos de ferro com receita proveniente dum imposto único lançado sôbre as receitas das Companhias concessionárias, resolve, emquanto não fôr legislado sôbre o assunto, manterá forma de pagamento pelas sobretaxas consignadas no decreto n.° 11:283, e passa á ordem do dia".- O Deputado, Luís da Costa Amorim.

Foi admitida.

O Sr. João Luís Ricardo: - Eu tinha declarado que aceitava a moção do Sr. Amorim Ferreira, mas, depois das considerações do Sr. Luís da Costa Amorim, entendo que deve ser aprovada a sua moção.

Realmente, pode dar-se o caso de se chegar ao fim da sessão legislativa e não se ter tomado qualquer resolução sôbre o estabelecimento do imposto único.

É necessário que realmente se resolva o assunto, não só a respeito do orçamento que está em discussão,- mas porque, votado êste princípio, se facilita o trabalho a fazer para se relatar o orçamento da fiscalização, que êste ano vem àparte exactamente por ser uma receita diferente da que havia até agora.

Declaro, portanto, em nome da comissão do Orçamento, que aceito de preferência a moção do Sr. Luís da Costa Amorim.

O orador não reviu.

O Sr. Francisco Cruz: - É de estranhar que tendo o Sr. João Luís Kicardo declarado que aceitava a moção do Sr. Amorim Ferreira, declare agora que aceita outra.

Parece impossível que elementos da Câmara não reconheçam a forma atrabiliária como decorre a arrecadação de vários dinheiros públicos e a deficiente organização de transportes, organização deficiente quer da parte das emprêsas, quer da parte do Estado.

É preciso que da parte da maioria haja para com aquele seu representante nas cadeiras do poder, que é o Sr. Ministro do Comércio, aquele procedimento que leve S. Exa. a não se sentir vexado, como deve sentir-se depois das palavras que pronunciou.

Com profunda mágoa, e até mais do que mágoas vejo como decorre em Portugal a vida, no que respeita à administração pública.

O orador não reviu.

O Sr. Rafael Ribeiro: - Peço a V. Exa., Sr. Presidente, o favor de me informar se a Câmara admitiu a moção do Sr. Costa Amorim.

O Sr. Presidente: - Sim, senhor; foi admitida.

O Orador: - Uma vez que foi admitida chamo a atenção de V. Exa. para as bitolas que regulam o Regimento desta Câmara. Há duas, uma para a maioria e outra para a minoria.

Na sessão de 9 de Março apresentei uma moção, na discussão do orçamento do Ministério do Interior, a respeito da Imprensa Nacional. O Sr. Presidente, Daniel Rodrigues, não a aceitou por estar fora da ordem, e na discussão do Orçamento se não admitirem moções. Estranho, portanto, que a moção do Sr. Costa Amorim tivesse sido admitida, se bem que com ela concordo. Devia suceder a essa moção o mesmo que à minha, que não foi aceita na Mesa.

Peço a V. Exa. que mande lavrar na acta o meu protesto contra êste procedimento.

O orador não reviu.

O Sr. Amorim Ferreira: - Peço a V. Exa. que me informe se tenho ou não

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direito a usar segunda vez da palavra nesta discussão como apresentante duma moção que foi admitida pela Câmara e aceita pelo Sr. Ministro do Comércio e pelo Sr. relator da comissão do Orçamento.

O Sr. Presidente: - Se estabelecemos êsse precedente as alterações feitas ao Regimento de nada servem.

Êste é o meu modo de ver.

O Orador: -Entendo que estamos em frente dum caso especial. Normalmente não devia, de facto, ter sido aceita nem admitida pela Câmara a minha moção; mas estamos em frente dam facto consumado, isto é, tal como a questão foi posta pelo Sr. relator da comissão do Orçamento, havia uma questão a resolver por meio duma proposta, dama moção, ou doutro documento que fatalmente tinha de ser recebido na Mesa.

A aprovação pura e simples do orçamento do Ministério do Comércio, tal como foi apresentado nesta Câmara, podia significar uma resolução antecipada, sôbre um assunto que está pendente do parecer da comissão para onde foi enviado o decreto n.° 11:283, por deliberação da Câmara.

O Sr. Manuel José da Silva: - A moção Paiva Gomes não determinou que os diplomas respectivos ficassem suspensos. São para todos os efeitos diplomas que estão em pleno vigor, que só podem ser modificados por diplomas de igual fôrça.

Isto é que é doutrina jurídica. Tudo quanto não seja isto, é procurar perturbar a questão.

O Orador: - Sobre a constitucionalidade dêsse decreto a própria Câmara teve dúvidas, que estão expressas na moção do Sr. Paiva Gomes, quando diz:

Leu.

Quere dizer, a Câmara aprovando esta moção manifestou ter dúvidas sôbre a constitucionalidade dêste decreto. Não deve, pois, passar sem por qualquer forma expor a soa opinião sôbre um assunto que, embora precisando de exame ulterior e detalhado, deve em todo u caso ficar esboçado nas suas linhas gerais.

A aprovação pura e simples do orçamento do Ministério do Comércio, tal como foi apresentado a esta Câmara, podia representar a aprovação de todos os princípios consignados no referido decreto, e tenho a certeza de que esta Câmara os não aprovará a todos.

Há, pelo menos, um que briga com todas as afirmações que aqui têm sido produzidas: é o que se refere à criação dum fundo especial manobrado e dirigido pela Inspecção Geral dos Caminhos de Ferro.

A fiscalização das companhias deve ser paga pelas próprias companhias.

Além do que venho apontando, Sr. Presidente, reconhece-se, e deve reconhecer-se, que as companhias não são inimigas do Estado, mas sim suas colaboradoras na administração do património nacional, até que o Estado queira resgatar e tomar posse daquilo que a elas estava confiado, devendo, pois, facilitar-se-lhes a sua missão, e foi nesse sentido que eu procurei introduzir o princípio de que o imposto deve ser englobado para facilidade da fiscalização e que entre nos cofres do Estado num imposto único a estabelecer. A Câmara, reconhecendo êsse princípio, prestará um alto serviço à Nação, não se tratando duma bagatela, como prova a apresentação dêste número: em 1924 as companhias entraram com 20:000 contos ...

O Sr. Manuel José da Silva (interrompendo): - Além daquele com que faltava entrar...

O Orador: - Nestas condições, e tendo sido posteriormente apresentada à minha moção uma outra que eu julgo absolutamente desnecessária, visto que em face da minha as companhias se não poderão recusar ao pagamento a que forem sujeitas e que o Estado justamente lhes exije, e não podendo a Câmara duvidar, que não pode, das palavras do Sr. Ministro do Comércio, de que os pagamentos exigidos serão satisfeitos, parece-me que não é necessária a moção do nosso ilustre colega Sr. Costa Amorim. O principio que S. Exa. pretende afirmar já está contido na minha moção, desnecessário sendo também o aditamento da parte final, em face das considerações apresentadas pelo Sr. Ministro do Comércio.

Tenho dito.

O orador não reviu.

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O Sr. Marques Loureiro (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: fez o Sr. Manuel José da Silva um discurso durante os trinta minutos que as disposições regimentais determinam. Foi admitida a moção do Sr. Amorim Ferreira e à roda disto tudo levantou-se um incidente.

O Sr. Manuel José da Silva desde logo declarou que, bem ou mal, tendo sido admitida aquela moção, isso equivalia a nina proposta sôbre a qual se tinha de fazer uma inscrição e se reservava o direito de falar.

De facto, assim se fez e já hoje S. Exa. nos deliciou com um novo discurso, simplesmente a pretexto da moção que tinha sido apresentada.

Pediu a palavra o apresentante da moção, o Sr Amorim Ferreira.

E, como de harmonia com as disposições regimentais, S. Exa. não podia novamente usar da palavra, V. Exa. por uma gentileza, que não por uma excepção, gentileza que concede a todos os Deputados, permitiu que S. Exa. fizesse um longo e interessante discurso a título de explicações.

Isso é que não me parece carta.

Se o Sr. Manuel José da Silva, que é independente...

O Sr. Manuel José da Silva (interrompendo): - Eu, da segunda vez, não pedi a palavra sôbre o capítulo em discussão, mas sim sôbre a moção apresentada.

O Orador: - Mas, dizia eu, se o Sr. Manuel José da Silva usou duas vezes da palavra, uma a pretexto do capítulo, a outra a pretexto da moção, parece-me que o Sr. Amorim Ferreira, que, demais a mais, é o pai da criança, tinha o direito do defender a sua moção.

E eu, Sr. Presidente, que incidentalmente intervim na discussão e aceitando a doutrina da moção, julgo-me no direito, e até como padrinho, de pedir a V. Exa. a palavra para, sôbre a moção, fazer algumas considerações.

É por isso que peço que V. Exa. me esclareça sôbre se posso ou não falar sôbre a moção, como fez o Sr. Manuel José da Silva, para, e desde já o declaro, contrariar tanto quanto puder e souber as considerações de S. Exa.

O Sr. Presidente: - Eu devo dizer a S. Exa. que, como alguns Srs. Deputados entendem que aparecendo moções podem, sôbre elas, novamente usar da palavra, o mais que posso fazer é sôbre êste assunto consultar a Câmara.

O Orador: - Mas o Sr. Manuel José da Silva usou mais de uma vez da palavra sem necessidade de se consultar a Câmara.

E S. Exa. acaba de confirmar as minhas palavras.

V. Exa., porém, em todo o caso resolverá.

O orador não reviu.

O Sr. Rafael Ribeiro: - Sr: Presidente: na última sessão em que se tratou da discussão do orçamento do Ministério do Comércio o Sr. Presidente, que era o Sr. Daniel Rodrigues, irreflectidamente aceitou a moção do Sr. Amorim Ferreira.

E, como a Câmara admitiu, o Sr. Daniel Rodrigues pôs à discussão a moção conjuntamente com o capítulo 2.°

Parece-me portanto que é o capítulo 2.° e a moção que se encontram em discussão.

Como é que V. Exa. interpretou o n.° 4.° das alterações ao Regimento, a propósito da discussão orçamental? Dando regimentalmente o direito a cada deputado do sôbre cada capítulo usar da palavra por trinta minutos? A mim parece-mo que chegam os trinta minutos, mas julgo que não tem sido respeitada essa disposição regimental. E tanto assim que o Sr. Manuel José da Silva, que admiro muito pelo seu trabalho e pela sua inteligência, já por duas vezes usou da palavra sôbre o capítulo 2.° do orçamento do Ministério do Comércio.

Parece-mo que sôbre êste capítulo só poderia usar da palavra uma vez e durante trinta minutos.

O Sr. Manuel José da Silva (interrompendo): - Suponha V. Exa. que todos os Srs. Deputados usavam da palavra durante meia hora a propósito do capítulo em discussão e que o último tinha apresentado uma moção que não era admitida e nova moção era apresentada e assim sucessivamente.

O que sucederia?

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O Orador: - O Sr. Presidente concedeu já por duas vezes a palavra ao Sr. Manuel José da Silva e há pouco não consentiu que o Sr. Amorim Ferreira usasse da palavra.

Eu. Sr. Presidente, perante esta desigualdade de direitos, o que dosejo saber é quantas vezes posso usar da palavra sôbre o capítulo em discussão.

O Sr. Presidente: - Eu não posso dar novamente a palavra a V. Exa. porque, como sabe, o n.° 4.° das alterações ao Regimento a propósito da discussão do orçamento não permite que qualquer orador use da palavra mais de trinta minutos. Por isso ou consultar a Câmara sôbre se consente que V. Exa. uso novamente da palavra.

O Sr. Marques Loureiro (sobre o modo de votar): - Receio que a Câmara considere sôbre a irreflecção do Sr. Presidente, que era o Sr. Daniel Rodrigues, em ter aceitado a moção do Sr. Amorim Ferreira, Sr. Presidente: a moção foi aceita pelo Sr. Ministro do Comércio. S. Exa. solidarizou-se coai a moção apresentada pelo Sr. Amorim Ferreira.

Se a Câmara não permite que se fale sôbre essa moção, se porventura não puderem ser elucidados sôbre os motivos que levam a Câmara a rejeitar essa moção, é o Sr. Ministro do Comercio quem fica em cheque.

Era esta a declaração que desejava fazer.

O orador não reviu.

O Sr. Paiva Gomes: - Sr. Presidente: não há dúvida nenhuma que estamos em presença duna. facto consumado, e não temos outra cousa a fazer senão arrumar êste assunto.

Estamos em face duma moção. V. Exa., Sr. Presidente, deve conduzir a discussão de forma a que se dê plena satisfação à circunstância de a moção ter sido aceita. Nada mais.

Sendo assim, permita V. Exa. que eu diga que o que se passa sôbre êste assunto deve servir de lição à Câmara.

IS ao bá maneira de discutir orçamentos desta forma.

Incluir moções, projectos ou propostas de lei na discussão do orçamento é a negação absoluta de boa regularidade de sei vi cos.

Mas, enfim, Sr. Presidente, há que arrumar êste assunto.

O Orador não reviu.

O Sr. Manuel José da Silva: - Sr. Presidente: os acontecimentos que se vêem desenrolando desde a última sessão não me causam nenhuma surpresa.

Desde o primeiro momento em que a Câmara admitiu a moção Amorim Ferreira, eu marquei nitidamente as consequências dêsse facto.

Sr. Presidente: êste precedente, como muito bem disse o Sr. Paiva Gomes, não pode servir senão de lição para a Câmara. Na discussão do Orçamento só se podem modificar as verbas para mais por proposta do Ministro, e para menos por proposta de qualquer Deputado.

Tudo quanto não seja isto é sair das disposições do Regimento.

O ar. Amorim Ferreira apresentou a sua moção que foi admitida, tendo entrado na discussão com a matéria principal que não tem nada com a chamada questão provia, visto que esta só existe quando tem uma ligação íntima com a questão principal que se discute.

Outras moções surgem e eu afirmo a V. Exa. que dentro dos textos regimentais todos os Deputados podem inscrever-se a propósito dessas moções.

Pode dar-se até o seguinte caso: suponha V. Exa. que, sôbre um capítulo, todos os Deputados usavam da palavra durante meia hora. Terminada essa discussão um Deputado apresentava uma moção que era admitida. Os outros Deputados estavam inibidos de a discutir. Ora isto não está certo.

O que importa é que todos nós, no bom desejo de acabar com esta questão de "lana caprina", continuemos na discussão do Orçamento.

Pontos bem em foco os altíssimos inconveniente s que resultariam da aprovação da moção Amorim Ferreira, sem vantagem que se tenha apresentado claramente, eu entendo que a Câmara, tendo em atenção as considerações feitas pelo Sr. relator, pelo apresentante da moção Costa Amorim, e até pelo Sr. Ministro do Comércio. - que não tenho dúvida de que vai levantar-se e dizer que realmente a

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doutrina da moção Costa Amorim é aceitável - entendo, repito, que a Câmara deve estar sôbre esta matéria mais do que esclarecida. Nestas condições se nós passássemos a votar era alguma cousa do útil, porque teríamos ensejo de prosseguir num trabalho tam necessário como é o da discussão do Orçamento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Cunha Leal: - Julgava eu que a discussão do Orçamento era uma cousa diferente do que está sendo.

Julgava eu que a discussão do Orçamento não servia para a propósito de cada uma das suas verbas se levantarem dúvidas ou questiúnculas. Mas aquelas que foram levantadas pelo Sr. Amorim Ferreira são tudo quanto há de mais extraordinário. Lendo a moção de S. Exa., efectivamente, não verifico a que propósito foi apresentada, a não ser para enredar a discussão. Diz essa moção, segundo vejo no Boletim das Sessões desta Câmara, o seguinte:

Lê.

E claro que redigida desta forma, ela queria dizer que havia já estabelecido pela Câmara o princípio do imposto único. Declarou-me, porém, o Sr. Amorim Ferreira que havia aqui um êrro de tipografia e que êle tinha, redigido a sua moção nos seguintes termos:

Lê.

É claro que faz a sua diferença. Assim, o Sr. Amorim Ferreira pode apenas à Câmara dos Deputados que declare que é seu pensamento determinado nesta hora o estabelecimento de um imposto único em matéria ferroviária. Mas, pregunto eu: a que propósito vem isto na discussão do Orçamente?

Apoiados.

Se o Parlamento, representado só pela Câmara dos Deputados, tivesse maneira de, com uma resolução sua alterar as leis em vigor no País, evidentemente a aprovação desta moção significava que o decreto n.° 11:283 ficava derrogado. Contudo, desde o momento em que tal facto se não dá, que significa a moção? Nada. É apenas o comprometimento de uma opinião, comprometimento que acho inútil.

Apoiados.

Pois se nós pedimos às comissões parlamentares para se pronunciarem sôbre a constitucionalidade do decreto, como é que neste momento vamos afirmar que aquilo que é, segundo expressão do decreto, o direito do Estado impor às companhias o pagamento de uma percentagem sôbre as sobretaxas, se considera um imposto, que o mesmo será considerar desde já como inconstitucional o decreto. Quere dizer, no momento em que nós resolvemos mandar para as comissões um determinado decreto para se apreciar da sua constitucionalidade, na discussão do Orçamento apareço uma moção, a propósito não sei do quê e sem que a Mesa o impeça, concluindo que o decreto é desde já inconstitucional. Isto chama-se em linguagem académica uma habilidade, e a Câmara, admitindo que se apresentasse durante a discussão do Orçamento uma moção que com aquela discussão nada tem, cometeu um eiró palmar.

O Sr. Manuel José da Silva: - V. Exa. dá-me licença?

De facto, V. Exa. tem razão quando diz que a votação da moção não pode implicar a anulação do decreto. O decreto está e continuará em pleno vigor. No emtanto, a votação da moção poderá ter uma significação : é servir de escudo às companhias que até hoje não quiseram pagar o que se determina por aquele decreto.

Apoiados.

O Orador: - V. Exa. tem absoluta razão.

Se fora da discussão do Orçamento nos vierem pedir que examinemos a situação dos impostos que oneram os caminhos de ferro, uns pagos pelas Companhias, outros pelo público, eu estou pronto a aprovar êsse pedido, mas meterem isso na discussão do Orçamento, fora de todo o propósito, no sentido de anular uma resolução anterior da Câmara, contra tal revolto-me em absoluto.

Eu compreendo muito bem que os outros tenham habilidades, mas também compreendo que nós façamos por não cair nelas.

O Sr. Francisco Cruz: - V. Exa. é que

está a fazer uma habilidade!

E, entretanto, o Estado continua a roubar aquilo que é dos outros.

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O Orador: - Os grandes palavrões nunca tiveram grande efeito sôbre mim. Dou-lhes o valor que merecem.

O Sr. Francisco Cruz: - Mas era bom que V. Exa. os tomasse a peito.

O Orador: - Os grandes palavrões só servem muitas vezes para tirar efeitos.

Mas discutamos o caso com serenidade.

A Câmara um dia resolveu ter dúvidas sôbre um determinado decreto, mandando-o por isso baixar às comissões.

Mas suspendia-se ou não?

Toda a nossa discussão andou à volta dêste facto, o ponto de vista que prevaleceu foi o de que o decreto continuasse em vigor.

Em todo o caso, alguém mais abelhudo, lembrou que não se fizessem nomeações, não porque estivesse suspenso o decreto, mas como uma homenagem à Câmara dos Deputados.

Os decretos não estão suspensos; o Poder Executivo, se quiser, pode nomear quem lhe aprouver, mas põe-se em conflito com a Câmara dos Deputados, por virtude dessas nomeações.

No emtanto elas são absolutamente legais, porque os decretos só podem ser suspensos pelo Parlamento, isto é, por ambas as Câmaras, e não apenas pela Câmara dos Deputados.

Não só êste decreto, como todos os outros publicados em idênticas circunstâncias, produziram já os seus efeitos.

Mas, de repente, surge urna habilidade a querer destruir uma resolução anterior da Câmara.

Que culpa temos nós de que o Sr. Daniel Rodrigues tivesse a sua opinião obliterada, certamente pelo facto de ter mudado de nome, e aceitasse na Mesa a moção do Sr. engenheiro Amorim Ferreira?

No emtanto. visto que o Sr. Daniel Salgado a aceitou, temos de a discutir; mas ao menos deixem-nos discuti-la livremente, e reprovemo-la depois.

A redacção da moção do Sr. Costa Amorim é muito diferente da do Sr. Amorim Ferreira.

O Sr. Costa Amorim diz:

Leu.

Quere dizer, o Sr. Costa Amorim não afirma que aqueles 1,25 por cento sejam um imposto, ao passo que o Sr. Amorim Ferreira o declara.

E esta a diferença essencial - e não é pequena - entre as duas moções.

A moção do Sr. Costa Amorim estabelece um princípio digno de um bom republicano: "o de que não há nenhuma companhia, por mais poderosa que seja, que esteja acima da República".

Por ela, o Parlamento impõe às companhias ferroviárias o cumprimento de uma lei que êle ainda não revogou.

Ela estabeleço também que as companhias têm o direito do ter um imposto único, para maior facilidade de cobrança; mas, que emquanto isto se não aprovar, terão de cumprir as leis do País.

Estas palavras não são minhas, mas sim do Sr. Costa Amorim.

Tudo o que não fôr isto, significa não servir os interêsses da República.

Nestas condições, nós damos a nossa aprovação à, moção do Sr. Costa Amorim. apesar de a julgarmos desnecessária; mas, não a damos à do Sr. Amorim Ferreira, porque a consideramos foi a da discussão, irregular e ofensiva de resoluções já tomadas pelo Parlamento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Francisco Cruz: - Pedi a palavra apenas para, em resposta ao orador anterior, dizer que eu não uso de habilidades, se porventura S. Exa. se quis referir a mim, quando discutiu a moção do Sr. Amorim Ferreira.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Rafael Ribeiro:- Sr. Presidente: a Câmara não suspendeu nenhum decreto, mas a verdade é que o Sr. Presidente do Ministério, em resposta a um ilustre parlamentar, disse que o Poder Executivo não executaria nenhum diploma que o Parlamento suspendesse.

Isto é a verdade dos factos que não pode admitir nem discussão nem sofismas.

O Sr. Cunha Leal (interrompendo}:- É bom que as cousas se ponham no seu verdadeiro lugar.

Como é que V. Exa. quere que um Ministro, na elaboração de um Orçamento, se vá antepor à lei?

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Sessão de 20 de Abril de 1926 41

O Orador:-Mas a verdade é que o Ministro da Guerra já tem feito cumprir decretos que esta Câmara suspendeu.

Para quê, então, estamos discutindo êste assunto há duas sessões?

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Cunha Leal (em àparte): - Realmente V. Exa. foi muito profundo!

O Sr. Rafael Ribeiro: - Nem todos podem ter a inteligência de V. Exa.

O Sr. Cunha Leal: - V. Exa. tem mais do que eu, mas não faz uso dela!

O Sr. Manuel Serras (para um requerimento): - Requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se ela concede prioridade de votação para a moção apresentada pelo Sr. Costa Amorim.

É concedida.

O Sr. Marques Loureiro: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.

Procede se à contagem, sendo novamente concedida a prioridade de votação requerida por 55 votos contra 8.

É aprovada a moção do Sr. Amorim Ferreira.

É a seguinte:

A Câmara, reconhecendo a vantagem de manter o princípio do pagamento da fiscalização dos caminhos de ferro, como receita proveniente de um imposto único a estabelecer, lançado sôbre as receitas das companhias concessionárias, e a necessidade de lhe ser ràpidamente apresentado o parecer das comissões sôbre o decreto n.° 11:283, passa à ordem do dia - Amorim Ferreira.

Continua em discussão o orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações.

É aprovado o capítulo 2.° e entra em discussão o capitulo 3.°

O Sr. Rosado da Fonseca: - Sr. Presidente: com atenção e com estranheza o que se diz no parecer a respeito do artigo 17.° do capítulo 3.°, sôbre reparação de estradas. Diz o referido artigo 17.°:

Leu.

E no parecer da comissão diz-se:

Leu.

Salvo o devido respeito pelo parecer da comissão, não posso concordar com a medida preconizada, porquanto, se na verdade é irrisória a verba consignada, mais irrisória ela será agora que a pretendem modificar para menos em relação ao Orçamento de 1925-1926. Neste Orçamento havia ainda a dotação de 20:000 contos, verba que vejo reduzida agora para 4:214 contos. Diz-se, para justificar isto, que é êste o rendimento provável do imposto de turismo. Estranho que no Orçamento se preconize esta redução num serviço que é tam importante e que é preciso manter, não com medidas excepcionais de empréstimo, mas com verba constante.

Esta verba, que era consignada, deve manter-se, e vou dizer porquê.

Eu bem sei que a reparação das estradas não pode r ser feita apenas à custa desta verba. E necessário que se entre noutro caminho, que se vão buscar receitas avultadas, de forma que a reparação se faça no mais curto espaço de tempo possível. Mas o que é certo é que não sabemos qual o resultado prático, qual a orientação da Câmara sôbre a possibilidade de realização de um empréstimo de 300:000 contos.

Creio que não foi apenas uma vez que falharam propósitos desta natureza. Eu, que tenho esperança de que seja votado êste empréstimo, não posso, à sombra dessa esperança, concordar com a pretendida eliminação da verba que citei. Além disso, segundo ouvi aqui dizer, a orientação a seguir na reparação das estradas obedece a um critério que faz tomar em primeira linha a necessidade da reparação do que aqui se chamou a "espinha dorsal da nossa rede de estradas".

Parece-me inconveniente a orientação que se está seguindo, pois, assim, as pequenas estradas ficam sem reparação.

A verba proveniente da receita do turismo e receita geral não chega. A comissão podia aumentá-la.

O Sr. João Luís Ricardo: - Não é da competência da comissão.

O Orador: - Bastava conservar a verba, que estava.

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42 Diário da Câmara dos Deputada

O Sr. Francisco Cruz: - V. Exa. escusa de se cansar; depois da atitude da maioria, não é preciso dizer mais nada.

O Orador: - Com uma verba tam deminuta é estar a brincar às estradas.

É absolutamente necessário que esta verba de 20:000 contos seja mantida.

O Sr. Amorim Ferreira: - Será conveniente que V. Exa., Sr. Presidente, peca silêncio à Câmara. Com o sussurro que se está fazendo não há possibilidade de se ouvir o orador.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.

O Orador: - Eu já vou terminar.

É necessário que S. Exa. o Sr. Ministro do Comércio preste a sua especial atenção a êste artigo para que a dotação não seja uma miséria.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Gaspar de Lemos): - Sr. Presidente: cumpre-me declarar que concordo absolutamente com o alvitre do Sr. relator.

Reconheço que a verba de 4:000 contos é irrisória, dado o fim a que se destina, e confio em que a Câmara irá resolver o problema das estradas, votando a proposta de lei que lhe foi apresentada.

Aproveito êste ensejo para enviar para a Mesa três propostas relativas ao capítulo em discussão, em harmonia com o alvitre da comissão.

Tenho dito.

O orador não reviu.

As propostas soo as seguintes:

Propomos que seja elevada a escudos 5:946.960$ a verba do artigo 16.° do capítulo 3.° - O Ministro das Finanças, A. Marques Guedes - O Ministro do Comércio e Comunicações, Manuel Gaspar de Lemos,

Propomos que seja elevada a escudos 8:000.000$ a verba do artigo 20.° do capítulo 3.°, destinando-se 6:000.000$ a estradas, exclusivamente para acabamento de lanços já começados e em especial dos

que estiverem interceptados por falta de pontes, e 2:000.000$ para pontes. - O Ministro das Finanças, A. Marques Guedes - O Ministro do Comércio e Comunicações, Manuel Gaspar de Lemos.

Propomos a elevação a 1:000.000$ da verba do artigo 21.° do capítulo, 3.°, destinados a pagamento de material e mão de obra para construção e em especial para reparações. - O Ministro das Finanças, A. Marques Guedes - O Ministro do Comércio e Comunicações, Manuel Gaspar de Lemos.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão realiza-se hoje, à hora regimental, com a seguinte ordem de trabalhos:

De tarde:

Proposta de lei n.° 170, que estabelece o regime provisório de indústria de tabaco a adoptar desde l de Maio próximo até que entre em vigor o novo regime.

Parecer n.° 133, que regula o novo regime de fabrico e comércio de tabacos no continente da República.

A noite:

Proposta de lei n.° 170, que estabelece o regime provisório de indústria de tabaco a adoptar desde 1 de Maio próximo até que entre em vigor o novo regime.

Negócio urgente do Sr. Jorge Nunes sôbre a inconstitucionalidade do decreto E.° 11:056, do 1 de Abril corrente.

Projecto de lei n.° 1-C. que concede personalidade jurídica a quaisquer igrejas ou confissões religiosas.

Proposta de lei n.° 5, que regula o Habeas Corpus.

Parecer n.° 57, que revoga o decreto n.° 11:306, de 30 de Novembro de 1925.

Carecer n.° 58, que aprova com alterações o decreto n.° 11:016, de 1 de Agosto de 1925.

Parecer n.° 39, que autoriza o Govêrno a reorganizar os serviços de emigração.

Parecer n.° 122. que dá ingresso no quadro técnico dos engenheiros civis do Ministério do Comércio, na situação de adidos aos actuais engenheiros auxiliares do quadro técnico das obras públicas com mais de dez anos de serviço e diplomados com o curso de engenharia civil.

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Sessão de 20 de Abril de 1926 43

Parecer n.° 32, que declara de utilidade pública e urgente a favor da Câmara Municipal de Ovar a expropriação de designados terrenos.

Está encerrada a sessão.

Eram 0 horas e 30 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Propostas de lei

Do Sr. Ministro da Marinha, determinando que os oficiais que, tendo satisfeito às condições para o pôsto imediato, não puderem ser promovidos, por terem sido julgados incapazes pela Junta de Saúde ou atingidos pelo limite de idade, sejam promovidos ao pôsto imediato e na mesma data reformados ou passados aos quadros de reserva ou auxiliar.

Para o "Diário do Govêrno".

Dos Srs. Ministros do Comércio e das Colónias, prorrogando o prazo a que se refere a base 2.a da lei n.° 1:353, de 25 de Agosto, e o artigo 12.° do contrato de 8 de Novembro de 1922, entre o Govêrno Português e a Marconi's Wireless Telegraph C°, Ltd.

Para o "Diário do Govêrno".

Do Sr. Ministro das Finanças, autorizando o Govêrno a abrir, no Ministério das Finanças, até 31 de Agosto de 1926, os créditos necessários para despesas com aquisição de tabacos em rama e matérias primas para o fabrico e venda dos tabacos no continente, durante os" meses de Junho a Agosto do corrente ano.

Aprovada a urgência e dispensa do Regimento.

Projecto de lei

Do Sr. Sá Vargas, mandando colocar, desde já, nos quadros doutros liceus das respectivas cidades os professores efectivos dos liceus de Garrett, Sampaio Bruno e Infanta D. Maria

Para o a Diário ao Govêrno".

Substituição

Substituir na comissão do Orçamento o Sr. António Augusto Tavares Ferreira pelo Sr. Guilhermino Alves Nunes.

Para a Secretaria.

Renovações de iniciativa Declaro que renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 801-D, publicado no Diário do Govêrno de 31 de Julho de 1924. Em 20 de Abril de 1926. - Sebastião de Herédia.

Junte-se ao processo e envie-se à comissão de administração pública.

Declaro que renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 945-D, publicado no Diário do Govêrno, a série, de 15 de Junho de 1925.

Em 20 de Abril de 1926. - M. Costa Dias.

Junte-se ao processo e envie-se à comissão de finanças.

Pareceres

Da comissão de administração pública sôbre o n.° 136-E, que determina que o vencimento inicial do visitador da Casa Pia de Lisboa seja o de 3.° oficial, passando a ser o de 2.° quando tenha 10 anos de serviço, e o de 1.° quando tenha 15.

Para a comissão de finanças.

Da comissão de legislação civil e comercial sôbre o n.° 14-C, que determina que a cadeia de Chaves sirva também de cadeia de depósito ou concentração de presos das comarcas circunvizinhas.

Para a comissão de administração pública.

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me sejam facultados para consulta os processos dos mutilados de guerra, nos quais foram modificadas as relações das juntas médicas ou permissão para que os possa consultar nas respectivas repartições do mesmo Ministério. - José de Moura Neves.

Expeça-se.

Requeiro que seja presente novamente à comissão de guerra, a fim de ser devidamente apreciada, a petição documentada do ex-sargento de artilharia António Antunes Guerra, que se acha no arquivo desta Câmara.

20 do Abril de 1926. - Abel Teixeira Pinto.

Junte-se ao processo e emite-se à comissão de guerra.

O REDACTOR - Herculano Nunes.

33 - Imprensa Nacional -1925-1926

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