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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 83

EM 10 DE MAIO DE 1926

Presidência do Exmo. Sr. Alfredo Rodrigues Gaspar

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Mariano de Melo Vieira

Sumario. - Respondem à chamada 41 Srs. Deputados. É lida a acta, que adiante se aprova com número regimental. Dá-se conta do expediente.

Admissões.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Sampaio e Maia requere que entre em discussão o parecer n.º 163, sendo aprovado o requerimento. Entra em discussão o respectivo parecer, que é aprovado sem discussão, sendo a última redacção dispensada.

O Sr. Domingos Lara manda para a Mesa um projecto de lei, requerendo a urgência, que é concedida.

O Sr. Moura de Carvalho trata de uma agitação económica na provinda de Angola. Responde-lhe o Sr. Presidente do Ministério (António Maria da Silva).

O Sr. Mário de Aguiar censura a ausência dos membros do Govêrno nos trabalhos parlamentares, trata da questão das estradas, de diplomas publicados pela pasta das Colónias e da greve em algumas escolas superiores. Respondem os Srs. Presidente do Ministério e Ministro da Instrução (Santos e Silva).

Ordem do dia. - Negócio urgente do Sr. Cunha Leal sôbre o funcionamento das fábricas de tabacos.

O Sr. Alfredo Nordeste, que ficara com a palavra reservada, conclui o seu discurso. Fala o Sr. Henrique Cabral, respondendo-lhe o Sr. Nordeste, para explicações. O Sr. Lino Neto apresenta e justifica uma moção de ordem, que é admitida. Segue-se o Sr. Raul Portela, que fica com a palavra reservada.

Interrompe-se a sessão às 19 horas e 30 minutos para reabrir às 21 horas e 30 minutos.

Entra em discussão o projecto de lei n.° 1-C, que concede personalidade jurídica a quaisquer igrejas ou confissões religiosas.

Usa da palavra para uma questão prévia o Sr. Manuel José da Silva. Seguem-se os Srs. Pinto Barriga e Moura Pinto.

Encerra-se a sessão, marcando-se sessão diurna e nocturna para o dia seguinte.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. - Projectos de lei. Pareceres. Requerimentos.

Abertura da sessão, às 15 horas e 12 minutos.

Presentes à chamada, 41 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 84 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:

Adolfo de Sousa Brasão.
Alberto Carlos da Silveira.
Alberto Dinis da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Pinheiro Tôrres.
Alexandre Ferreira.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
António Augusto Rodrigues.
António Maria da Silva.
António de Paiva Gomes.
Artur Saraiva de Castilho.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bernardo Pais de Almeida.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos de Moura Carvalho.
Dagoberto Augusto Guedes.
Domingos António de Lara.
Eduardo Ferreira dos Santos Silva.
Elmano Morais Cunha e Costa.
Felizardo António Saraiva.
João da Cruz Filipe.
João Estêvão Aguas.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

João Pina de Morais Júnior.
João Tamagnini de Sousa Barbosa.
José Carlos Trilho.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José de Moura Neves.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Lourenço Correia Gomes.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Maximino de Matos.
Paulo Limpo de Lacerda.
Rui de Andrade.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Valentim Guerra.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Abel Teixeira Pinto.
Adolfo Teixeira Leitão.
Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Alfredo da Cruz Nordeste.
Alfredo Pedro Guisado.
Álvaro da Cunha Ferreira Leite.
Álvaro Xavier de Castro.
Amâncio de Alpoim.
Amílcar da Silva Ramada Curió.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Álvares Pereira Sampaio Forjaz Pimentel.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Ferreira Cabral Pais do Amaral.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António José Pereira.
António Leite de Magalhães.
António Lino Neto.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur da Cunha Araújo.
Artur Virgínio do Brito Carvalho da Silva.
Augusto Rebelo Arruda.
Carlos de Barros Soares Branco.
Custódio Lopes de Castro.
Custódio Martins de Paiva.
Daniel Rodrigues Salgado.
Delfim Costa.
Diogo Albino de Sá Vargas.
Domingos Augusto Reis Costa.
Domingos José de Carvalho Araújo.
Eduardo Fernandes de Oliveira.
Filemon da Silveira Duarte de Almeida.
Filomeno da Câmara Melo Cabral.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Cruz.
Francisco Godinho Cabral.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Guilhermino Alves Nunes.
Henrique Maria Pais Cabral.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime António Palma Mira.
João Baptista da Silva.
João Bernardino de Sousa Carvalho.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Raimundo Alves.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Maria de Oliveira Simões.
Joaquim Toscano Sampaio.
Jorge do Vasconcelos Nunes.
José Domingues dos Santos.
José do Vale de Matos Cid.
José Vicente Barata.
Luís de Sousa Faísca.
Manuel da Costa Dias.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Manuel Homem de Melo da Câmara.
Manuel José da Silva.
Manuel Serras.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Pedro Góis Pita.
Rafael Augusto do Sousa Ribeiro.
Raul Lelo Portela.

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Rodrigo Luciano de Abreu e Lima.
Sebastião de Herédia.
Severino Sant'Ana Marques.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Zacarias da Fonseca Guerreiro.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Nogueira Gonçalves.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Aníbal Pereira Peixoto Beleza.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Alves Calem Júnior.
António Araújo Mimoso.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António José de Almeida.
António Lobo de Aboim Inglês.
Armando Marques Guedes.
Artur Brandão.
Augusto Pires do Vale.
Carlos Fuseta.
Domingos Leite Pereira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Henrique Pereira de Oliveira.
Indalêncio Froilano de Melo.
João Lopes Soares.
João Salema.
Joaquim Nunes Mexia.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José António de Magalhães.
José Maria Alvarez.
José Rosado da Fonseca.
Luís Gonzaga da Fonseca Moreira.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mariano Melo Vieira.
Nuno Simões.
Raul Marques Caldeira.
Vasco Borges.
Viriato Sertório dos Santos Lobo.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas.

Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 41 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 12 minutos.

Leu-se a acta e o seguinte

Expediente

Ofícios

Do Ministério do Comércio, satisfazendo ao requerido pelo Sr. João Tamagnini e comunicado no ofício n.° 614.

Para a Secretaria.

Do mesmo, respondendo ao ofício n.° 566, em que se comunicou o requerimento do Sr. Zacarias Guerreiro.

Para a Secretaria.

Do mesmo, pedindo o andamento da proposta de lei n.° 139-C, apresentada pelo Sr. Ministro do Comercio e se encontra na comissão de caminhos de ferro.

Para a comissão de caminhos de ferro.

Do Conselho Superior de Finanças, comunicando a publicação de um despacho que manda abonar uma remuneração ao terceiro oficial da Administração dos Edifícios e Monumentos. António Miranda Boavida.

Para a comissão de contas publicas.

Do mesmo, comunicando a publicação do despacho que mantém o contrato relativo ao fornecimento de um automóvel para serviço do Ministério das Colónias.

Para a comissão de contas públicas.

Da Câmara Municipal de Paredes, pedindo a aprovação do projecto sôbre condução de automóveis.

Para a Secretaria.

Da Câmara Municipal de Baião, secundando a petição da do Cartaxo sôbre construção e reparação de estradas.

Para a comissão de obras publicas.

Das irmandades do Senhor Jesus, Almas e Apostolado da Oração de Favaios, concelho de Alijo; do pároco, associações religiosas e junta de freguesia de Vilar de Ferreiros, concelho de Mondim de Basto; do pároco das freguesias de Amoreira e Serra d'El-Rei; da junta de paróquia de Alvorninha, concelho de Caldas da Rainha, pedindo a aprovação do projecto que dá personalidade jurídica às igrejas e confissões religiosas.

Para a Secretaria.

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4 Diário da Câmara dos Deputados

Do presidente da mesa da assemblea magna do pessoal dos tabacos, enviando uma moção, unanimemente aprovada, pedindo a respectiva leitura para conhecimento dos Srs. Deputados.

Para a Secretaria.

Do 3.° distrito criminal de Lisboa, pedindo autorização para deporem como testemunhas em processo crime os Srs. Armando Agatão Lança e Alberto Lelo Portela.

Negado quanto ao Sr. Agatão Lança.

Comunique-se que o Sr. Artur Lelo Portela não é Deputado.

Do 4.° Juízo de Investigação Criminal de Lisboa, avisando de que se acha novamente designado o dia 18 do corrente, pelas 13 horas, para serem ouvidos como testemunhas, os Srs. Cunha Leal e Álvaro de Castro, no processo que o Banco de Portugal move contra o Sr. Amâncio de Alpoim.

Comunique-se.

Carta

Do Sr. Domingos Lara, pedindo um passaporte especial para sair para Espanha.

Por determinação do Sr. Presidente requisite-se êste passaporte.

Telegramas

Das Câmaras Municipais de Tomar e Pôrto, enviando sentimentos pelo falecimento do Sr. Tomé de Barros Queiroz.

Para a Secretaria.

Do presidente da assemblea magna dos delegados das associações comerciais, industriais, engenheiros, arquitectos, construtores civis e sindicatos operários do Pôrto, apoiando a proposta de lei tendente a resolver a crise de habitação.

Para a Secretaria.

Pedindo a aprovação do projecto reconhecendo a personalidade jurídica à igreja:

Da junta de freguesia e Irmandade de Santos Evos (Viseu).

Da junta, regedor e pároco de Paranhos (Amares).

Da junta e regedor de Pinheiro (Guimarães).

Do pároco, junta e irmandade do Lago (Amares).

Da junta e regedor de Paredes (Amares).

Da junta de Condomil (Cerveira).

Do pároco e paroquianos de S. Sebastião (Guimarães).

Irmandade da freguesia da Pena (Lisboa).

Da junta, irmandade, pároco e regedor de Riba Fria (Saníins do Douro).

Da junta e regedor de S. Mateus de Oliveira (Famalicão).

Da junta e regedor de S. Tiago da Cruz (Famalicão).

Da junta e confraria de Paços da Serra (Gouveia).

Da junta de Cassurrães (Mangualde).

Da junta, regedor, irmandade e Misericórdia do Souto (Sabugal).

Do clero arciprestado de Alfaiates (Sabugal).

Da junta, regedor, confraria e pároco de Linhares (Celorico).

Da janta de Monte Redondo (Arcos de Valdevez).

Do pároco, irmandades, regedor e junta do Passo Pandeiro (Arcos de Valdevez).

Da junta, regedor e pároco de Taíde (Póvoa de Lanhoso).

Do regedor e junta do Monte (Fafe).

Da junta de Guilhadezes (Arcos de Valdevez).

Do clero arciprestado de Penacova.

Da junta de freguesia da Infesta (Celorico de Basto).

Da junta de Sabrosa.

Das irmandades de Sabrosa.

Das Câmaras Municipais de Tarouca e Sabrosa.

Do pároco e junta de Riba Mouro (Moura).

Da junta, pároco e regedor de Perro (Viana do Castelo).

Das confrarias, junta e pároco da Bemfeita (Arganil).

Do pároco, irmandades, regedores e juntas de Sampaio, Jolda e Rendufe (Arcos de Valdevez).

Do pároco, regedor e junta de Revelhe (Fafe).

Do pároco, regedor e junta de Friastelas (Ponte do Lima).

Dos párocos de Azinhaga e Pombalinho (Santarém).

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Da junta e regedor de Mondim (Tarouca).

Das juntas, regedores e párocos de Cabaços, Fojo e Lobal (Ponte do Lima).

Da junta da Granja (Tarouca).

Do clero arciprestado de Boticas.

Do Centro Católico, do Sobral de Casepe e Cazegos (Tortosendo).

Do pároco, junta e confrarias de Agra (Ponte da Barca).

Da junta de Grimancelos (Barcelos).

Da junta de Cambezes (Monção).

Das irmandades e pároco de Capareiros (Viana do Castelo).

Da junta, regedor e pároco de Miranda do Douro).

Da junta de Capareiros (Viana do Castelo).

Da junta e pároco do Carvoeiro (Viana do Castelo).

Para a Secretaria.

Admissões

São admitidas as seguintes proposições de lei, já publicadas no "Diário do Governo":

Propostas de lei

Do Sr. Ministro da Guerra, determinando que os sargentos ajudantes, primeiros e segundos sargentos e equiparados reformados, ou que o venham a ser em determinadas condições, conservam o pôsto da reforma, mas com a pensão e vencimentos de tenente para os sargentos ajudantes e primeiros sargentos e de alferes para os segundos sargentos.

Para a comissão de guerra.

Do Sr. Ministro das Finanças, concedendo à Câmara Municipal do Pôrto determinadas faculdades para completar e pôr em funcionamento a rede de esgotos da cidade.

Para a comissão de administração pública.

Do mesmo, elevando a 1,75 por cento a percentagem pela venda de valores selados estabelecidas pelo § -2.° do artigo 14.° do decreto n.° 7:027-A, de 15 de Outubro de 1920.

Para a comissão de finanças.

Do mesmo, dispensando a Câmara Municipal de Aveiro do pagamento de direitos pela importação de materiais para a construção e exploração dos serviços da iluminação pública no respectivo concelho. Para a comissão de administração pública.

Projectos de lei

Do Sr. Rafael Ribeiro, concedendo as vantagens dadas às tropas que tomaram parte nas operações do sul de Angola, desde Agosto de 1914 até a rendição das fôrças alemãs, às que destacaram para as colónias nos termos do decreto de 11 de Setembro de 1925.

Para a comissão de guerra.

Dos Srs. Abel Teixeira Pinto e Manuel Serras, criando uma assemblea eleitoral em Aveiras de Baixo, concelho de Azambuja.

Para a comissão de administração pública.

Do Sr. Pereira Forjaz, modificando o § único do artigo 30.° do decreto n.° 5:787-F, de 10 de Maio de 1919.

Para a comissão de saúde e higiene públicas.

Do Sr. João E. Aguas, sôbre contagem de tempo de serviço, para aposentação, aos tesoureiros da Fazenda Pública.

Para a comissão de finanças.

Antes da ordem do dia

O Sr. Sampaio Maia: - Sr. Presidente: encontra-se há muito com os pareceres das respectivas comissões um projecto de lei referente ao sargento Joaquim Gonçalves Azevedo; militar que foi condenado numa pena disciplinar, verificando-se pelo respectivo parecer que essa pena foi injustamente aplicada.

O projecto tende em parte a remediar essa injustiça.

Nestes termos, requeira a V. Exa. para que êste parecer entre imediatamente em discussão.

Peço a V. Exa. que logo que haja número submeta o meu requerimento à aprovação.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi rejeitado o requerimento.

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6 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Sampaio Maia: - Requeiro a contraprova.

Procedeu-se à contraprova e contagem.

De pé 20 Srs. Deputados.

Sentados 45 Srs. Deputados.

Foi aprovado.

Leu-se.

Foi aprovado sem discussão na generalidade e na especialidade.

O Sr. Pina de Morais: - Requeiro dispensa da última redacção.

Foi aprovado.

Parecer n.° 163

Senhores Deputados. - A vossa comissão de guerra, sciente dos considerandos do projecto de lei n.° 54-1 e à face da documentação que se lho facultou, das determinantes da redacção do respectivo texto, que tem fundamento, quanto ao artigo 1.°, na correcção pela amnistia da errada classificação de uma falta disciplinar, e, quanto ao artigo 2.°, na utilidade do aproveitamento no serviço efectivo do exército, de quem por tal êrro dele foi afastado e em devido apreço merece que sejam tidos os seus serviços prestados à Pátria e República, é de parecer que, não havendo qualquer oposição da parte da nossa comissão de finanças, que sôbre o assunto terá de ser ouvida, deveis aprovar o referido projecto de lei.

Sala das Sessões, 12 de Abril de 1926. Alberto da Silveira (vencido) - Henrique Pires Monteiro (com declarações) - Manuel da Costa Dias - Manuel José da Silva (com declarações) - Viriato Sertório dos Santos Lobo - José de Moura Neves - João Tamagnini, relator.

Senhores Deputados. - A vossa comissão de finanças, tendo examinado o projecto de lei n.° 54-I, que tem por fim a reintegração no serviço efectivo do exército do segundo sargento Joaquim Gonçalves de Azevedo, é de parecer que êle merece a vossa, aprovação desde que ao seu artigo 2.° sejam acrescentadas as seguintes palavras: "sem direito, todavia, a qualquer abono de vencimentos relativamente ao tempo por que esteve afastado do serviço militar".

Sala das sessões da comissão, 21 de Abril de 1926. -Daniel Rodrigues - Artur Carvalho da Silva (com declarações) - João da Cruz Filipe - Felizardo A. Saraiva - Álvaro de Castro - Lourenço Correia Gomes - João Tamagnini - Manuel da Costa Dias, relator.

Projecto de lei n.° 54-I

Senhores Deputados. - Considerando que o segundo sargento de artilharia de campanha n.° 178 da 2.a bataria de artilharia n.° 3, Joaquim Gonçalves de Azevedo, na situação do licenciado, prestou relevantes serviços ao seu País, no Brasil, no ano de 1916, antes do seu alistamento, dignificando a República e divulgando a necessidade imperiosa da intervenção de Portugal na Grande Guerra, concorrendo com a sua acção para a organização de um Batalhão de Voluntários Portugueses ali residentes que regressaram ao País no vapor Desna, da Mala Real Inglesa, em 26 de Maio de 1916, e que seguiram na sua maioria para França, fazendo parte do Corpo Expedicionário Português, e para Moçambique, na expedição contra os alemães;

Considerando que da sua acção no Brasil resultou a organização da Grande Comissão Pró-Pátria Portuguesa, que tinha por único objectivo auxiliar as despesas a fazer com a entrada de Portugal na guerra e da distribuição de tabaco e agasalhos aos soldados em campanha;

Considerando que êstes factos se provam pelas referências feitas na imprensa fiuminense daquela época com extractos, nome e fotografias do referido sargento;

Considerando que o mesmo sargento prestou relevantíssimos serviços à República, quando da revolta no Pôrto, em 13 de Fevereiro de 1919, combatendo os revoltosos monárquicos com energia e decisão, tendo passado as privações do cárcere;

Considerando ter sido êsse período o momento mais crítico para a República, mostrando todos aqueles que combateram os monárquicos o terem feito com firmeza, valentia e é inegualável:

Considerando ser da maior conveniência para a República conservar nas fileiras do exército elementos de maior confiança;

Considerando que, tendo sido promovido a segundo sargento para o quadro

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permanente, por necessidades da guerra, em 16 de Novembro de 1917, nos termos da circular n.° 54 da 3.ª Repartição da 1.ª Direcção Geral do Ministério da Guerra, de 2 do citado mês, que dispensou o respectivo concurso e apenas exigiu o curso da classe de sargentos, passou ao quadro miliciano em obediência à instrução 5.a da portaria n.° 2:350, de 26 de Junho de 1920;

Considerando que durante a sua permanência na Escola de Tiro de Artilharia de Campanha lhe foi atribuído o cometimento de uma falta disciplinar pelo comandante interino da sua bataria, que não cometeu, nos termos indicados no auto de averiguações apenso ao seu processo, como se deduz da declaração passada pelo comandante do grupo escolar de batarias a que o mencionado s argento pertenci a e que também comandou a bataria, na qual se afirma categoricamente, na mesma época, que procurou sempre cumprir com zelo e dedicação ao serviço os seus deveres militares, havendo manifesta discrepância entre o critério dos referidos oficiais;

Considerando que a pena que lhe foi aplicada e que produziu o seu licenciamento é de natureza injusta e não traduz a expressão da verdade na sua redacção, visto que a falta, se a houve, apenas poderia ser considerada como falta de observância à regra 4.a do artigo 2.° do regulamento disciplinar do exército de 2 de Maio de 1913;

Considerando ter o mesmo sargento tomado parte na campanha contra os alemães em Moçambique, pagando assim o seu tributo como português;

Considerando ainda ter o referido sargento adquirido doenças graves em campanha, pelas quais foi obrigado a regressar à metrópole por opinião da Junta Central de Saúde daquela província:

Temos a honra de apresentar à Câmara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É concedida amnistia à infracção disciplinar atribuída ao segundo sargento miliciano n.° 178 da 2.a bataria do regimento de artilharia n.° 3, Joaquim Gonçalves de Azevedo, na situação de licenciado, nos termos do artigo 40.° do regulamento disciplinar do exército de 2 de Maio de 1913.

Art. 2.° Será imediatamente reintegrado no serviço efectivo do exército e considerado, para todos os efeitos, sargento do quadro permanente desde 28 de Junho de 1919, data da assinatura do Tratado de Paz com a Alemanha.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões, Abril de 1926. - João Pina de Morais Júnior - Manuel Gregário Pestana Júnior - Alfredo da Cruz Nordeste.

O Sr. Domingos Lara: - Pedi a palavra para enviar para a Mesa um projecto de lei.

Poucas palavras preciso dizer para o justificar.

V. Exa. quando foi Presidente do Ministério teve ocasião de verificar em que condições está a polícia de Coimbra. Pois ainda êsses serviços se fazem pelo decreto de 30 de Abril de 1918, quando todas as polícias têm os seus serviços modernamente organizados.

Requeiro a urgência.

Foi aprovada a urgência.

O orador não reviu.

O projecto de lei vai adiante publicado por extracto.

O Sr. Moura Carvalho: - Sr. Presidente: para as considerações que vou fazer devia talvez aguardar a presença do Sr. Ministro das Colónias, mas porque S. Exa. tem o hábito cómodo de não frequentar esta Câmara no período de antes da ordem do dia, e porque já tenho estado inscrito alguns dias sem lograr a assistência de S. Exa. aproveito a oportunidade de estar presente o Sr. Presidente do Ministério, e peço a sua atenção para as minhas palavras.

Segundo uma notícia publicada num jornal de Lisboa, e até agora não desmentida, produziu-se em Loanda uma qualquer agitação, perante a qual o governo da província se viu forçado a adoptar algumas providências repressivas e enérgicas. Esta notícia deu ocasião a que em Lisboa se aventassem hipóteses da maior gravidade, sem que o Govêrno entendesse até êste momento pronunciar-se de qualquer modo sôbre o caso.

Todos conhecem a agudeza que atingiu a crise que assola a província de An-

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gola. E em épocas de crise, e demais de crise tam incomportável, é mais fácil o desencadear de paixões legítimas ou ilegítimas que sejam. Interesses feridos, ambições de mando e predomínio contrariado originaram, é certo, em Angola, e sobretudo em Loanda, uma onda violenta de paixões. Foram estas paixões que fizeram agora explosão, sob qualquer pretexto? Ou a agitação que se anuncia ter-se dado seria antes motivada por qualquer fundamento legítimo, como há quem o afirme?

É isto que se não sabe e é isto o que é preciso saber-se.

Era meu propósito levantar nesta Câmara a situação de Angola, as culpas e responsabilidades que à metrópole pertencem na crise que a colónia atravessa e perante a qual, vem a talho de foice dizê-lo, um dos principais elementos dela, o Banco Nacional Ultramarino, se fixou e se comporta como uma esfinge, que tudo domina do alto do seu olímpico desdém, sem que o Estado se lembre, como lhe cumpre, em nome dos mais altos interêsses nacionais, de fazer terminar o domínio da esfinge.

Mas, Sr. Presidente, desisti do meu propósito em virtude da escolha acertada do novo dirigente dos destinos de Angola, em quem todos depositamos a mais justificada confiança, ao lado do qual todos estamos para lhe dar a fôrça do nosso apoio. Mas por algumas razões foi que, não só pelo simples prazer de gastar papel e tinta, eu requeri que me fôsse fornecida cópia de todas as instruções e de toda a correspondência respeitantes ao modus vivendi entre Angola e S. Tomé para o fornecimento de mão de obra indígena. Conheço os melindres do caso e compreendo que o Govêrno queira manter sôbre êle a mais prudente atitude, mas isso não obsta a que o País precise de saber o que se passou, quanto mais não seja para ficar sossegado.

Foi para isso que usei da palavra, e é isso o que espero do Govêrno.

Tenho dito.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Sr. Presidente: agradeço ao Sr. Moura Carvalho as referências que fez ao novo Alto Comissário de Angola, referências aliás justas, como S. Exa. teve ensejo de observar, porque o Sr. Vicente Ferreira, independentemente dos seus conhecimentos como financeiro, é uma pessoa a quem os assuntos coloniais não são estranhos, colaborando directamente com o Govêrno, o que me parece excelente, porque até então havia como que uma desconexão absoluta entre êsses altos funcionários e a metrópole. O Sr. Vicente Ferreira tem já apresentado alguns trabalhos, e outros está completando, dos quais, estou convencido, resultará uma obra útil, proveitosa e definitiva.

Emquanto ao caso a que S. Exa. se referia, não o conheço, tanto mais que o Sr. Ministro das Colónias nada me comunicou sôbre o assunto. Todavia, vou procurar avistar-me com S. Exa. e ver se consigo que êle ainda hoje venha a esta Câmara dar as informações que tiver.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Mário de Aguiar: - Sr. Presidente: por várias vezes tenho aqui protestado contra a falta de trabalhos do Govêrno apresentados à discussão e à nossa apreciação. Por várias vezes eu mo tenho queixado e tenho ouvido queixas de muitos Srs. Deputados pela falta de colaboração que há, da parte do Govêrno, nos trabalhos parlamentares.

Acontece sempre, Sr. Presidente, que quási todos os Ministros, por cujas pastas correm os assuntos mais palpitantes do País, por onde correm os assuntos mais graves e que mais afectam a nacionalidade, não vêm sequer ao Parlamento, para o fim de os Deputados poderem apresentar as suas reclamações. Em contraste, vejo também que sempre que se trata de banquetes não falta nenhum dos Srs. Ministros, desde o Sr. Presidente do Ministério até o último, e isto segundo a ordem que lhes dá o Diário do Govêrno.

Ainda na semana passada houve vários banquetes, a que não faltou nenhum dos Srs. Ministros.

Ai é que ninguém falta, porque a ordem é comer; e também já se estão preparando as mesas para servir êsse lauto, que se chama o banquete dos tabas . s

É esta a única orientação política e administrativa que o Govêrno teve!

Nós queremos aqui falar sôbre diver-

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sos assuntos que interessam ao País; mas, como os Srs. Ministros não estão, nós temos do falar para as cadeiras.

O Sr. Ministro do Comércio não tem a mínima noção do Estado em que se encontram as estradas do País.

S. Exa. vai daqui para a Figueira da Foz em salão reservado, não sentindo, por isso, os mesmos incómodos que sofrem tantas pessoas que são obrigadas a andar por essas malfadadas estradas, por onde nem sequer já podem transitar, em muitas regiões, os carros do correio, o que faz com que êsses serviços tenham do ser leitos a pó, com grave prejuízo para as respectivas populações.

Há dias, por necessidade da minha vida, eu tive de percorrer parte das estradas do círculo do Arganil; não fui lá por política, mas sim por necessidade profissional, e então tive ensejo de ver como essas estradas estão, tendo até o cuidado de tirar várias fotografias, para se poder ver bem aqui o lastimoso estado em que essas estradas se encontram.

É uma vergonha!

O Sr. Ministro do Comércio vem aqui o contenta-se em apresentar uma simples proposta, não a acompanhando com o carinho que lhe deviam merecer os serviços que lhe estão entregues.

Se o Sr. Ministro do Comércio não quero saber destas cousas, que as entregue ao Sr. administrador geral das estradas.

Também queria referir-mo a assuntos que correm pela pasta das Colónias.

Já o ilustre Deputado Sr. Moura Carvalho, acentuou, e muito bem, que o Sr. Ministro das Colónias nunca vera ao Parlamento, apesar do pela sua pasta correrem os assuntos mais palpitantes e graves da actualidade, o que ú urgente resolver.

É preciso que isto termino!

O Sr. Ministro das Colónias está praticando actos abusivos; está tomando uma atitude digna de toda a censura.

S. Exa. publicou aqui na metrópole alguns diplomas em que são visados alguns governadores do Ultramar, os quais vêm depois dizer claramente, em diplomas oficiais, que leram boquiabertos aqueles decretos e que não lhes obedecem!

Isto é vergonhoso, e é necessário que termine para bem do prestígio da autoridade, que todos que ali se sentam deviam esforçar-se por manter.

Em Angola passam-se também casos que já aqui foram citados, mas que ainda merecem referência.

Está ali um juiz encarregado de fazer uma sindicância, o tam ditatorialmente está exercendo as suas funções, que até está demandando inquéritos; e, contra a vontade da própria colónia ali continua permanecendo, apesar de já ter recebido cêrca de 400 contos.

O Conselho Legislativo já pediu ao Sr. Ministro das Colónias para que êsse juiz sindicante regresso à metrópole; mas S. Exa., em vez de atender êsse pedido justíssimo, reforçou a verba destinada a êsse magistrado, o que quero dizer que elo continuará, não sabemos por quanto tempo, a exercer as suas funções, ganhando 1 conto de réis por dia.

Isto é deminuir o prestígio de todos aqueles que, longe da Pátria, lutam pelo bem das nossas Colónias!

Não há um Ministro que defenda e proteja as nossas colónias; pelo contrário, prejudica-as, fazendo-lhes criar um déficit cada vez maior!

Também queria ainda referir-me a assuntos que correm pela pasta da Instrução. Não está o respectivo Sr. Ministro, mas, como o Sr. Presidente do Ministério se encontra na sala, eu peço a S. Exa. o favor do lhe transmitir as minhas considerações.

Como V. Exas. sabem, está em greve uma grande parte das escolas superiores do País, e essas greves vêm-se sucedendo, por motivos vários, há alguns meses a esta parte.

Essas greves duram há muitos meses.

Não quero saber dos motivos, nem tenho elementos para aquilitar da sua justiça. O que sei é que estamos perante greves que fatalmente prejudicam o ensino público e são elementos de desordem e de irregularidades nas escolas superiores.

E a verdade é que, apesar dessas greves durarem há muito tempo, o Sr. Ministro da Instrução Pública, que é dos Ministros mais assíduos nesta Câmara - não posso deixar de o reconhecer - ainda não trouxe uma única declaração, uma única informação acerca dessas greves.

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Não compreendo que o Sr. Ministro de Instrução não possa, informar o Parlamento, ao qual deve todas as explicações sôbre os seus actos. O Parlamento está no seu direito de fazer todas as preguntas que entenda, a bem dos serviços públicos.

É necessário, pois, que o Sr. Ministro venha ao Parlamento dizer quais os fundamentos dessas reclamações e quais as providências que entende dever tomar.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Vou comunicar ao Sr. Ministro da Instrução as considerações feitas pelo ilustre Deputado, Sr. Mário de Aguiar, sôbre as greves em alguns estabelecimentos de ensino superior.

Posso dizer em primeiro lugar que só por lapso do ilustre Deputado disse não ter o Sr. Ministro trazido ao Parlamento qualquer informação sôbre essas greves.

O Sr. Ministro não se limitou a qualquer informação: trouxe uma proposta de lei que está nas comissões. Como o assunto corre por várias escolas que estão dependentes de diversos Ministérios, do Comércio, Agricultura, Instrução Pública, etc,, o Govêrno aguarda o parecer das. comissões sôbre essa proposta de lei que tem de ser discutida no Congresso da República.

Portanto o Govêrno trouxe uma proposta de lei para prover de remédio a algumas das reclamações apresentadas pelos alunos das escolas que dizem respeito a modificações na legislação vigente.

Lamentável é que os rapazes, que tiveram conhecimento dessa proposta de lei, porquanto fora nomeada uma comissão composta dos directores dêsses estabelecimentos de instrução e de outras pessoas, não voltassem às aulas.

É para lamentar que êsses rapazes comecem a vida por um acto de indisciplina que não pode acreditar a geração nova.

Apoiados.

Apesar de o Govêrno poder ter procedido diferentemente, não trazendo ao Congresso da República proposta de lei alguma emquanto os alunos não entrassem nas aulas, preparando assim a sua educação para mais tarde exercerem os mais altos cargos; apesar disso trouxe a proposta de lei, que alguns poderão entender que não devia ter sido apresentada, e essa proposta de lei está pendente do Parlamento.

O orador não reviu.

O Sr. Mário de Aguiar (para explicações): - Ouvi as considerações feitas pelo ilustre Presidente do Ministério, mas não posso deixar de acentuar que S. Exa. me veio dar razão. Se o Sr. Ministro da Instrução trouxe ao Parlamento providências para solucionar o conflito, essas providências não foram acompanhadas do interêsse do Sr. Ministro da Instrução para a solução rápida da questão.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Não só o ilustre Ministro da Instrução mas eu mesmo tenho pedido às várias comissões que estão estudando a proposta de lei para darem o seu parecer.

O Orador: - O que é certo é que, se essa demora fôr até o fim do ano, os rapazes perdem o ano escolar.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - O ilustre Deputado sabe que o melhor processo para formular reclamações não é fazer greves; demais a mais tratando-se de alunos que precisam estudar e comparecer nas aulas.

Já o Sr. Ministro ponderou aos alunos a inconveniência de persistirem numa greve que só os podia prejudicar. Os directores das Escolas responderam que estão dispostos a prolongar o ano lectivo.

Realmente os alunos não têm direito, depois duma greve, a virem pedir um perdão de acto.

O orador não reviu.

Entra o Sr. Ministro da Instrução.

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Santos Silva): - A actual greve académica reveste um aspecto muito diverso das greves académicas anteriores. A greve académica, que tanto tem preocupado as atenções do Govêrno, é a resultante do choque de interêsses de diversas classes escolares, interêsses antagónicos, os quais

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dão à greve um cunho tam especial que em algumas das suas facetas deixa de ser uma luta de classes, para ser até uma luta de sexos escolares.

A greve não foi provocada por qualquer acto do Govêrno.

As classes académicas procuram cada uma delas conquistar - como dizer - o seu estatuto profissional e entendem que as leis em vigor não lhes dão as garantias a que se julgam com direito por virtude dos diplomas dos seus cursos.

O Govêrno desejou encontrar uma solução rápida e justa da questão e, por isso, procurou ouvir as emaranhadas reclamações do todas essas classes para assim poder satisfazer todas as que fossem consideradas justas. O Govêrno nomeou para êsse fim uma comissão do professores, à qual deu as mais honradas indicações, garantindo-lhe que devia trabalhar e tomar resoluções com a mais perfeita liberdade.

Podem juntar-se em dois grupos o conjunto dessas reclamações académicas.

O primeiro referindo se à forma de recrutamento do professorado para as escolas técnicas e para os liceus. O segundo à garantia do título de engenheiro.

Quanto ao recrutamento do professorado, o Govêrno disse à comissão que desejava libertar de quaisquer influências pessoais ou políticas êsse recrutamento; em troca só exigia que êle dêsse garantias de conquistar um bom professorado.

Mas outra questão mais delicada é a que se refere ao uso do título de engenheiro.

E em torno dela que se têm manifestado calorosa e contraditoriamente algumas classes académicas.

A comissão debateu êstes assuntos em quinze longas sessões.

O relatório dêsses trabalhos foi já presente às comissões parlamentares; é um grosso volume de muitas dezenas de páginas.

O Govêrno como era seu dever, logo que lhe foram entregues os resultados dos trabalhos dessa comissão, apresentou ao Parlamento as propostas indispensáveis para a resolução dêsses problemas.

Essas propostas encontram-se no seio das comissões da Câmara dos Deputados. Interrupção do Sr. Mário de Aguiar que não se ouviu.

O Orador: - As classes académicas é que não corresponderam à lealdade do Govêrno.

Desde que aqui foram trazidas essas propostas, os estudantes deviam ter-se apresentado imediatamente nas suas escolas.

Não o fazendo, elas mostraram não saber corresponder à atitude de simpatia que para com elas tivera o Govêrno.

O Sr. Mário de Aguiar: - Acho pouco: acho que o Govêrno devia também ter encarado a questão sob o ponto de vista pedagógico.

O Orador: - Não estamos em presença de uma questão pedagógica.

Quanto ao carinho que essas classes devem merecer ao Govêrno, estou convencido de que êle lhes não tem faltado, quer da minha parte, quer da parte do Sr. Ministro do Comércio.

Estão em greve classes académicas pela solidariedade que quiseram dar a outras classes académicas.

A questão reveste um aspecto muitíssimo delicado.

Ao Parlamento compete um papel importante na sua solução; o que infelizmente reconheço é que, não voltando os estudantes às aulas imediatamente, verão perdido um ano escolar.

O Sr. Mário de Aguiar: - Mas não acha V. Exa. uma demora demasiada no parecer dessas comissões?

O Orador: - O meu desejo seria, na verdade, que êle tivesse sido já apresentado, mas o certo é que nós não podemos achar muito que essas comissões levem vinte dias a dar o seu parecer, quando a comissão de estudos técnicos levou mais de um mês.

O Sr. Mário de Aguiar: - Em conclusão: os rapazes têm o ano perdido, não é verdade?

O Orador: - Mas como quere V. Exa. que eu remedeie o facto?

O Govêrno fez tudo quanto podia para o evitar.

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Se chegamos a êsse resultado só às classes académicas em litígio êle se pode atribuir.

Tenho dito.

O Sr. Mário de Aguiar não fez a revisão dos seus "àpartes".

É aprovada a acta.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do negócio urgente apresentado pelo Sr. Cunha Leal

O Sr. Alfredo Nordeste: - Sr. Presidente: afirmei a V. Exa. e à Câmara, na sessão passada, que o Govêrno desde o dia 1 do corrente está fora da lei.

Apoiados.

Apesar do ilustre Deputado da maioria, o Sr. João Camoesas ter afirmado que as desvairadas minorias não haviam produzido argumentos em favor do seu ponto de vista, eu continuo a afirmar que o Govêrno está fora da lei desde o dia 1 do corrente.

É do conhecimento público que o Govêrno desde êsse dia tem comprado material, adquirido matérias primas e efectuado pagamentos de salários sem estar para isso devidamente autorizado.

E, desde que assim é, ficou exuberantemente demonstrado, à face dos textos legais, que o Govêrno se encontra em regime de ditadura desde 1 do corrente.

Eu vou de novo, Sr. Presidente, citar os textos legais em que mo fundei, para demostrar que a minha afirmação correspondia à verdade.

Sr. Presidente: o n.° 26 do artigo 3.° da Constituição da República estabelece um princípio muito claramente, e sem oferecer dúvidas nenhumas.

É evidente que esta disposição não permite, não dá o direito ao Govêrno de conceder a si próprio urna acção que só pode ser concedida pelo Poder Legislativo.

É verdade que na última parte dêste artigo nós encontramos a palavra "poderão", palavra que o Sr. João Camoesas citou por várias vezes, naturalmente para chamar a minha atenção.

Esta palavra a poderão estabelece na verdade uma faculdade, faculdade esta, no emtanto, que só pertence ao Poder Legislativo.

Apoiados.

Se na verdade o Sr. João Camoesas não tivesse absolutamente arreigada a idea de defender através de tudo a règie, necessàriamente que não chegaria a essa conclusão, visto que essa. faculdade pertenço única e exclusivamente ao Poder Legislativo.

O Sr. João Camoesas, nos apartes que me dirigiu, honrou-me muito, pois a verdade é que tendo S. Exa. dito que as minorias não tinham apresentado argumentação alguma em defesa da liberdade, S. Exa. não fez senão dirigir apartes quando usei da palavra.

S. Exa. estranhou que eu citasse esta disposição da Constituição para confirmar bom a afirmação que tinha apresentado; ficou surpreendido até, talvez por desconhecer esta disposição da Constituição da República; mas não é preciso ir buscar esta disposição da Constituição da República. por isso que o Código Civil estabelece o mesmo princípio.

Assim, Sr. Presidente, ou vou ler à Câmara o que diz o artigo 567.° do Código Civil.

Sr. Presidente: como a Câmara acaba de ver, esta disposição é, nem mais nem monos, a cópia do que sé encontra na Constituição da República.

Esta faculdade, repito, pertence única e simplesmente ao Poder Legislativo, e assim só a êste compete conceder o exclusivo da exploração da indústria e comerdes tabacos.

Veio porventura o Govêrno, como era da sua obrigação, ao Parlamento buscar essa obrigação ordinária no dia l do corrente, para depois vir ao Parlamento pedir um bill de indemnidade para esta situação perfeitamente anormal em que entrou desde essa data?

O Govêrno, Sr. Presidente, desde que não veio ao Parlamento pedir essa autorização, entrou na verdade numa ditadura ordinária, tendo eu mesmo dúvidas sôbre se o Parlamento lhe poderá dar, ou não, um bill de indemnidade.

Assim, Sr. Presidente, desde que o Govêrno entrou nesse caminho, todos os actos que tenha praticado, ou venha a praticar, estão fora da lei.

O Govêrno, repito, nestas condições, está fora da lei.

É preciso que isto se diga, para que todo o País saiba a situação em que

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o Govêrno se encontra acerca do assunto.

Disse o Sr. João Camoesas que as suas considerações apenas se baseavam em argumentos, mas S. Exa. falou de tudo, monos dos tais argumentos, que tam bem tinha arrecadado e que não apresentou em defesa da régie.

Entre considerações de ordem vária S. Exa. apresentou esta: que a opinião pública não estava ao lado das minorias.

Suponhamos que não valem nada êstes dois órgãos da imprensa: o Século e o Diário de Notícias, suponhamos que não valem nada os outros órgãos da imprensa partidária, que, no dizer do Sr. João Camoesas, servem apenas de propaganda partidária.

Fica então de pé aquele solar eleitoral que trouxe à maioria 86 Deputados, e a êste lado da Câmara apenas 6.

Apreciando a opinião pública do meu País pela representação da maioria desta Câmara, eu vejo que, emquanto 180:000 votos dão 86 Deputados, 90:000 dão apenas 6.

E esta a opinião pública que o Sr. João Camoesas sustenta?

Isto é uma blague!

Só como blague eu aceito êsse argumento do Sr. João Camoesas.

Ninguém me venha convencer do que um órgão da imprensa que tem uma tiragem de 100:000 exemplares não tenha a acompanhá-lo a opinião pública.

Pausa.

O Orador: - Continuando nas minhas considerações, eu quero dizer que, tendo caducado o contrato do 1906 em 30 do Abril findo, nós entrámos em plena liberdade de fabrico e venda de tabaco.

Nem todas as disposições do contrato de 1891 caducaram, visto que na lei de 1906, estabelecendo os princípios em que só foz o contrato para a exploração do fabrico do tabaco e venda do mesmo, ficavam de pé ainda algumas disposições da lei do 1891.

E na verdade assim!

Mas as disposições que estão de pó, da lei de 1891, do nenhuma sorte prejudicam a minha afirmação.

Estão de pé, realmente, as disposições 15.a e 16.a da lei do 1891, mas não estão de pé para de qualquer maneira prejudicarem a inteira liberdade de fabrico e comércio de tabacos, liberdade em que nos encontramos desde o dia 1 do corrente mês.

Essas disposições - claramente se verifica, lendo-as - tiveram apenas em vista, quando foram metidas na lei de 1891 e respeitadas pelo decreto de 1906, proteger o operariado da Companhia.

De resto, elas já não são um princípio novo; em toda a legislação anterior, onde houve necessidade de arrumar a questão dos tabacos, encontramos sempre disposições de protecção ao operariado da Companhia dos Tabacos.

Por consequência, o argumento de que não está inteiramente revogada pelos textos legais a doutrina da lei 4e 1891 e do decreto de 1906, só se pode admitir para as disposições que estabelecem protecção para os operários da Companhia dos Tabacos.

Essas é que estão de pé; mas em que prejudicam elas o regime da liberdade, perfeito, completo, em que nós entrámos a partir do dia 1 dêste mês?

Absolutamente em nada, visto que não regulam êsse caso.

Logo, com os textos na mão, tendo feito a sua leitura o ao mesmo tempo interpretando-os, não só como sei, mas como tem sido normalmente interpretados até pela jurisprudência dos tribunais (Apoiados), tenho a convicção do que não exagero quando afirmo a V. Exa. e à Câmara que o Govêrno está fora da lei, que o Govêrno está em ditadura.

Apoiados.

Eu sei que o Govêrno assim o não entende, porquanto até hoje não veio à Câmara, sequer, pedir aquela autorização a que a Constituição e até as leis gerais do País, como eu já aqui referi, o obrigavam se quisesse ter algum respeito pelo Parlamento.

Mas pode o Govêrno pensar o que quiser, porque as minorias têm também o direito do lutar até à última pelo que julgam ser os seus interêsses e de exigir que êle, pelo menos, diga as razões por que continua no exercício das suas funções sem cumprir aquilo que nós reclamamos com os textos legais na mão.

Apoiados.

E se porventura o Govêrno, depois da maneira correcta como as minorias apre-

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sentam as disposições de lei, os textos legais, para fundamentarem a sua afirmação de que êle está fora da lei, não vier ao encontro dos nossos desejos, para explicar as razões por que continua numa ditadura ordinária, como eu já disse, sem preocupações de nenhuma espécie, nem aquela de vir à Câmara pedir um bill de indemnidade, as minorias - pelo menos a nossa - ficam com o direito de proceder conforme entenderem, conforme a sua consciência lhes indicar.

Apoiados.

E com tanta mais autoridade, quanto é certo que vieram aqui com um estudo aturado para mostrarem sinceramente como entendem que deve ser resolvida a questão. Creio que quem procede como nós temos estado a proceder não pode nem deve ser apodado de desvairado, nem tampouco acusado de ter apenas um fim, fazer alarido, fazer barulho (Apoiados), mas não argumentar, não dar as razões em que fundamenta a defesa que faz do regime da liberdade. Se porventura se continuar a afirmar o que já se afirmou aqui nos últimos dias, há certamente o propósito de convencer aqui dentro e lá fora de ene não sabemos argumentar, - desvirtuando-se assim as nossas intenções e até as nossas palavras. Se isso se fizer repito, êste lado da Câmara não se poupará a qualquer esfôrço, pelo menos no sentido de exigir aquela satisfação que de direito lhe deve ser prestada.

Apoiados.

Sr. Presidente: vou terminar as minhas considerações,, e acabarei como comecei, afirmando que o Govêrno está fora da lei e que, quando faz a afirmação de que acabado o monopólio se entra legalmente no regime da régie, mostra ainda assim um propósito de desrespeitar a lei.

Já disse, Sr. Presidente, que êle não tinha de maneira nenhuma o direito de chamar a si uma cousa que só o Parlamento podia conceder. Procedeu atrabitràriamente e, depois de assim ter procedido, não veio sequer podír ao Parlamento o respectivo bill de indemnidade! Continuo, portanto, a afirmar: está fora da lei! Para isso basta recordar que o Govêrno deixou de obedecer, não só àquilo que resultava do próprio contrato com a Companhia dos Tabacos, mas até a textos legais posteriores, estabelecendo que, ao terminar o monopólio, se entraria imediatamente no regime da liberdade.

Apoiados.

E no regime de liberdade que nós estamos. Dêste lugar e em nome dêste lado da Câmara afirmo que ninguém deve obediência a qualquer determinação dimanada do Govêrno, que está exercendo as suas funções nas circunstâncias a que acabo de aludir.

Apoiados.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Henrique Cabral: - Sr. Presidente: não está propriamente em discussão o problema dos tabacos; mas sim o incidente que se enxertou na questão principal> achando-se na Mesa moções tendentes a definir a situação do Poder Executivo perante esta Câmara.

Quando aqui se iniciou o debate sôbre a questão dos tabacos. Longe de mim estava a idea de nele intervir. Entendo que questões desta natureza devem ser resolvidas por meio de um aturado estudo, com muita calma de nervos, com muita reflexão. Porque intervenho, pois. no debato? Porque, desde que à questão se deu o aspecto que se está dando, desde que aqui se estabeleceu um conflito levantado pelas oposições e, sobretudo, desde que determinados Deputados fizeram à maioria acusações que reputo graves, entendo que nenhum de nós aqui pode ficar calado, devendo todos nós fazer as suas afirmações.

Em meu entender, como no de toda a gente, é a questão dos tabacos uma questão nacional. Sendo uma questão nacional, como tal deve ser resolvida, sem paixões inferiores, será se transformar numa questão política, como aliás e infelizmente se tem transformado sempre que se tem agitado em Portugal, e, sobretudo, sem se transformar numa questão pessoal.

Um àparte do Sr. Pina de Morais.

O Orador: - Certamente V. Exa. não assistiu às sessões de quarta e quinta-feira.

O Partido Republicano Português trouxe à Câmara a sua fórmula de resolução do problema dos tabacos, tendo-se colocado

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dentro do aspecto de régie. Entendo que o Partido Republicano Português não tem nem mais nem menos direitos do que as oposições; êle tem o seu direito marcado dentro desta casa num completo pé de igualdade com o dessas oposições. Apresentou a fórmula da régie com o mesmo direito com que poderia apresentar qualquer outra. Têm as oposições o direito de contrariar essa fórmula, mas discutindo serenamente, procurando convencer-nos com argumentos e não apenas com gestos, sobretudo quando usados com violência e com mau humor.

Trazida à Câmara a proposta de lei sôbre a questão dos tabacos, esperava eu que ela fôsse apreciada como o deveria ser, tratando-se de uma questão nacional. Enganei-me, como mais de uma vez me tenho enganado, na minha boa fé republicana. Enganei-me, porque as oposições, desejando fazer uma questão meramente política (Não apoiados das direitas e extrema esquerda), conluiaram-se para empregar todos os seus esfôrços no sentido de evitar que a discussão decorresse serenamente e que o problema fôsse resolvido dentro do prazo necessário, em face dos interêsses nacionais.

Tenho ouvido com cuidado todos os argumentos apresentados, alguns deles sem base, a maior parte revelando única e simplesmente um sistema de ataque. Com desgosto vi que todas as oposições foram unânimes em atacar a acção administrativa do Estado como uma acção ruinosa, que não merece confiança, esquecendo-se todos, a isso levados pelas suas paixões, de que o Estado neste momento não é monárquico, mas republicano.

Um àparte do Sr. Carvalho da Silva.

O Orador: - Dizia eu que todas as oposições se conluiaram para fazer um ataque cerrado à administração do Estado, com excepção da oposição socialista. Todos afirmam que a principal razão por que as oposições não votam o sistema da régie para a exploração industrial dos tabacos é a de não terem confiança na acção do Estado.

Acostumei-me a ter, para mim, esta teoria: o Estado, em si, é uma entidade abstracta. Os homens que representam o Estado é que têm de responder perante a Nação pelos actos praticados. E eu posso, neste momento, formular esta pregunta: Quem tem no Poder Executivo, quem tem na acção e função administrativa é apresentado o Estado Português? Se eu quiser responder à pregunta terei de dizer: o Sr. Álvaro de Castro, o Sr. Ginestal Machado, o Sr. Pedro Pita, o Sr. Jorge Nunes, o Sr. José Domingues dos Santos, o Sr. Pestana Júnior, o Sr. Carlos de Vasconcelos, o Sr. Sampaio e Maia, o Sr. Lelo Portela, o Sr. Aboim Inglês e o Sr. Cunha Leal.

Todos êstes senhores têm representado o Estado Português desde 1910 para cá. Todos êstes senhores têm exercido livremente, sem coacções do Partido Democrático, a sua acção de homens públicos adentro do País. Quere isto dizer que eu atribuo a estas entidades as responsabilidades que elas nesta Câmara atribuem ao Partido Democrático?

Quere isto dizer que eu, neste instante, venha dizer que todos os actos de má administração ou algum acto de má administração que aqui tenha sido pôsto em evidência...

O Sr. Carlos de Vasconcelos: - V. Exa. dá-me licença? Da liberdade com que alguns dos homens públicos citados por V. Exa. têm tido nas cadeiras do Poder há o seguinte exemplo. Quando eu era Ministro das Colónias, em dada altura tive conhecimento de um telegrama qualquer que noticiava terem sido postas em vigor em Angola determinadas publicações, com características especiais. O Partido Republicano Português, conluiado então com êste lado da Câmara, ordenou-me que fizesse suspender imediatamente as referidas publicações.

A liberdade e a boa fé do Partido Republicano Português...

O Orador: - Já sabia isso tudo, Sr. Carlos de Vasconcelos, como sabia que V. Exa. foi Ministro ...

O Sr. Carlos de Vasconcelos: - Não preciso que V. Exa. mo recorde. Se V. Exa. teve espirito santo de orelha para mo dizer isso, eu responder-lhe hei simplesmente que o País conhece a minha acção como Ministro bem como a dos meus antecessores...

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O Orador: - Eu já tinha tido o prazer de citar, no número das pessoas que neste Pais têm feito, a meu ver, uma administração bem intencionada, a pessoa de V. Exa.

O Sr. Carlos de Vasconcelos: - Eu sei que não valho nada...

Não apoiados das esquerdas.

O Sr. Pestana Júnior: - Eu espero que V. Exas. não me aumentem o volume. Eu não sou alto, sou baixinho...

O Orador: - Dizia eu, antes de ser interrompido e amavelmente pelo Sr. Carlos de Vasconcelos, que as entidades que citei...

O Sr. Carlos de Vasconcelos: - V. Exa. tem a liberdade de dizer o que quiser!...

O Orador: - Tenho a liberdade de falar como Deputado, condicionando as minhas palavras à minha inteligência e à minha moral.

O Sr. Carlos de Vasconcelos: - Não faça V. Exa. alarme com tudo isso!

Vozes: - Mas quem é o orador?

O Orador: - Sr. Presidente: eu continuarei falando com toda a serenidade. Dizia ca a V. Exas. que todas as entidades que cita têm exercido altas, funções adentro do Estado Português.

Se quisermos ser justos na apreciação dos actos dos homens, temos de confessar que, em muitos dos actos condenáveis que se têm praticado neste País. não podemos pedir responsabilidades à família republicana. Temos de as pedir às pessoas que não comungam pela pureza do regime republicano e, antes pelo contrário, procuram atacá-lo em iodas as suas feições de lida administrativa.

Um dos maiores ataques dirigidos, nesta questão à maioria, vem da palavra eloquente do Sr. Cunha Leal, ataque feito com o calor costumado da sua frase, com a lucidez característica do sen espírito, com a veemência que lhe é habitual. S. Exa. com a sua inteligência - eu sou o primeiro a reconhecê-la, porque entendo que os homens só são dignos de si quando procuram pôr acima das suas paixões, a paixão superior da justiça - acusou êste lado da Câmara de defender interêsses menos correctos e menos honestos.

Sempre que o Sr. Cunha Leal fala nesta Câmara, sinto-me arrobado, sinto que alguma cousa de grande se manifesta.

Sr. Presidente: eu quero recordar, neste instante, uma posição que ocupei ao lado do Sr. Cunha Leal, três dias depois do 19 de Outubro, ouvindo-o falar da pessoa nunca esquecida do António Granjo.

O Sr. Cunha Leal foi grande nessa hora, como o tinha sido poucas horas antes, manifestando-se um homem de energia e do coração, de coração genuinamente português. O Sr. Cunha Leal foi então Presidente do Ministério. E êle que tem qualidades, que é enérgico, que é inteligente, a quem todos os homens dêste País conhecem os atributos de estadista sem igual, podia nessa época ter-se revelado o Messias, o Mussolini português, o salvador desta pobre Pátria. Não o foi, não o quis ser.

As responsabilidades ficam com êle; o direito do crítica fica para nós outros...

Nada há que mais fale à minha alma do republicano do que o ver na vida dos homens, quer particular quer pública, a coerência das acções.

Quando os homens tem valor e se afirmam no campo das ideas e dos actos, é necessário que a sua obra seja a de construir e não de demolir, de edificar e não do derruir.

Quando alguém acusa na nossa fronte um nosso adversário, entrando por vezes, na apreciação da sua honestidade, nós temos a tendência de acreditar em tudo o que se possa dizer.

Os homens são o que são através dos seus actos.

Isto vem a propósito de muita gente querer ver, por parto dos que defendem a regi e, única e simplesmente um sistema do suborno e de corrupção.

Eu vejo o problema com toda a honestidade, e julgo os outros por mim. Sou incapaz, portanto, de dirigir aos outros outra acusação que não seja esta: podem estar em êrro. Não vejo nas suas atitudes interêsses acoitos ou inconfessáveis.

Toda a gente tem o direito de duvidar

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da minha inteligência ou dos meus conhecimentos da minha sinceridade, não.

Posso dizer que, neste momento, falo em nome do meu partido. Acusem-nos as oposições de sermos menos inteligentes, de termos poucos ou nenhuns conhecimentos de ordem técnica na questão dos tabacos; digam-nos que não olhamos êste problema sob o ponto de vista nacional, mas o que as oposições não podem nem devem afirmar é que o Partido Republicano Português, dentro do seu ponto de vista, é menos honesto ou menos sincerq que qualquer outro lado da Câmara; que pretende impor determinada solução, quando é certo que o meu partido se tem esforçado para que êste problema dos tabacos se discuta com todo o detalho e dentro da maior liberdade.

Sejamos justos o honestos, julgando os homens como devem ser julgados.

Quem ler a história sôbre os tabacos verá que o momento de hoje, tiradas as figuras, tirado o scenário do hoje, é o mesmo do ontem.

Entendo que numa Câmara republicana, com sentimento verdadeiramente republicano, e não fingidamente republicano, sôbre questões da magnitude desta não devo proceder como se procedeu no tempo da monarquia.

Devemos ver êste assunto de uma maneira diferente: completamente alheados de paixões e tratando apenas do País sob o ponto de vista superior, inteligente e patriótico para resolver a questão, encarando-a pelo lado que maior soma de interêsse possa dar ao Tesouro Público.

Tenho atentado na circunstancia de, até em conversas íntimas o às vezes muito descuidadas, se importarem pouco do que as questões nacionais sejam tratadas com o critério de serem tornadas imediatamente em questões políticas.

Ainda há dias nesta Câmara ouvi afirmar que a questão dos tabacos é uma questão política.

Contesto-o; e acima de tudo uma questão de interêsse nacional, e assim entendo em nome do voto da Nação, em nome do princípio republicano. Esta questão é uma questão nacional; não é política.

Dizem que a maioria democrática e o Govêrno puseram mal a questão dos tabacos.

Digo e afirmo que as oposições é que puseram pessimamente a questão dos tabacos.

O Partido Democrático lançou ao País um manifesto em que faz afirmações doutrinárias.

Não conheço por parte das oposições que semelhantes afirmações se tivessem leito...

O Sr. José Domingues dos Santos: - Essa agora...

O Orador: - Porque é que a questão dos tabacos, neste momento, se tornou uma questão política?

E uma questão tam complexa que interessa todos os homens, porque é simultaneamente económica e política. Pela sua complexidade é uma questão política, mas acima de tudo há ambições.

"Os homens que ali estão não servem; é preciso que vão outros, porque estamos fora do Governo".

Apoiados.

E por isto que é uma questão política; e é preciso aproveitar o grande momento para que a nossa atitude se mostre, para que nós nos encontremos nas cadeiras do Poder.

As oposições têm êsse direito indiscutível, o de no campo político fazerem as suas afirmações sôbre o problema.

Mas a ambição é preciso ser condicionada e que a determine uma certa orientação em conformidade com os interêsses nacionais.

Pregunto: impõe o interêsse nacional que as oposições só levantem como um só homem para fazerem o que estão fazendo?

Dentro desta questão temos a encará-la sobretudo no seu aspecto fiscal.

Devo ser resolvida com o objectivo seguro do máximo rendimento para engrossar as receitas do Tesouro Público.

As minhas palavras têm autoridade, porque não são unicamente palavras da minha autoria. O País, em matéria de tabacos, tem um ponto de vista bem vincado : quere bom tabaco e barato.

Aos homens públicos interessa resolver o problema por forma a dar ao Estado melhor soma de receita.

Tenho ouvido aqui folar em nome da opinião pública, e ainda há pouco o Sr. Alfredo Nordeste...

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O Sr. Alfredo Nordeste: - Eu respondi ao Sr. João Camoesas. Quem falou em opinião pública foi o Sr. João Camoesas.

O Orador: - A opinião pública, quando não liberta de paixões, é condicionada. Mas, em matéria de tabacos, pregunto: é essa opinião manifestada pelas oposições, uma opinião sem parti pris de espécie alguma, sem pensamento reservado? é essa opinião a opinião espontânea do País?

O Sr. Alfredo Nordeste: - O Sr. João Camoesas que responda a V. Exa. quando chegar.

O Orador: - O Sr. João Camoesas tem idoneidade para responder, não foge a afirmações.

Tem-se discutido tanto a questão dos tabacos que até estou em situação do usar da palavra, quando aliás nunca fujo a afirmações e faço afirmações.

Em matéria de tabacos está neste momento a Câmara interessada na forma de resolver o assunto.

O Sr. Carvalho da Silva: - Não apoiado.

O Orador: - Eu sou dos que entendem que o homem público tem de agir em perfeita conformidade com a opinião pública; tem de legislar, sobretudo em questões desta natureza, ouvindo a opinião pública, mas a daqueles homens que representem opinião pública verdadeira, e não a opinião imposta peias suas paixões.

Se no primeiro caso o homem público pode incorrer num êrro, no segundo pode ir até contra os interêsses da Nação, o que é, porventura, bem. mais grave que o primeiro caso.

A questão dos tabacos foi mal posta, dizem, pelo Partido Democrático.

Não estou aqui a defender o Partido Democrático, pôsto que seja seu partidário. Estou precisamente dentro do seu pensamento, não tendo procuração para fazer a sua defesa.

É preciso que se diga que nunca, o que é contra a minha consciência de homem livre, recebi instruções do Partido Democrático, submetendo-me sempre às imposições da minha consciência, apenas.

Mas façamos justiça aos outros.

A discussão tem-se alongado. Mas o Partido Democrático pôs mal a questão?

Há preconizados os regimes da liberdade condicionada do Sr. Pestana Júnior, a liberdade absoluta do Sr. Cunha Leal, a liberdade do Sr. Aboim Inglês.

Estou perdido dentro da confusão, dentro do volume enorme de soluções que se pretende dar a êste problema.

Ninguém com verdade poderá dizer que está perfeitamente apetrechado para resolver o problema.

Seria preciso para discutir com serenidade êste problema versá-lo com inteira liberdade de acção.

Por isso digo, no uso legítimo de um direito que me foi conferido pela minha situação de Deputado, que nem as maiorias nem as minorias têm o direito de impor uma solução nem de impedir que usem da sua acção como entenderem.

Mas então para que foram essas sessões de quarta, quinta e sexta-feiras, para que foi todo êsse alarido, êsses tumultos.

A única frase que encontro no dicionário que classifica isso é: foi uma vergonha.

Foi uma vergonha para quem iniciou uma questão desta ordem, para quem faz parte do Parlamento e principalmente para a idea republicana.

E preciso que as paixões se abatam e os homens que combatem o façam com argumentos e não com sarrafo.

Analisando propriamente o incidente, vê-se o seguinte: o Poder Executivo encontra-se no dia 30 de Abril sem nada resolvido, e no dia 1 de Maio teve de tomar uma deliberação.

Àparte do Sr. Carvalho da Silva.

Vários apartes

O Orador: - Eu respondo a V. Exa. O Poder Executivo foi atirado para esta situação de facto. As oposições não estavam inteiramente de boa fé quando levaram o Poder Executivo a apresentar uma proposta de regime provisório.

Eu quando prefiro alguma expressão mais violenta não é com o fim de agravo pessoal nem colectivo, mas analisando bem o facto, vê-se que as oposições não estavam inteiramente de boa fé, pois não há nada que justifique os tumultos das sessões de quarta, quinta e sexta-feiras.

Há pouco o Sr. Alfredo Nordeste afir-

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mou que as oposições estavam no direito de ir para todos os campos.

O Sr. Alfredo Nordeste: - Eu não disse nada disso.

O Orador: - Se as oposições tivessem resolvido isto como deviam e feito uma discussão acertada, o Govêrno não chegaria o dia 30 de Abril sem que a Câmara não tivesse votado qualquer cousa.

No dia 1 de Maio, o Poder Executivo, ao abrigo duma disposição do contrato de 1906, tomou conta das fábricas e dos maquinismos da Companhia.

Ainda há pouco assisti à argumentação do Sr. Alfredo Nordeste, tendente a mostrar que a situação do Poder Executivo neste momento não é legal. Ouvi hoje aqui dizer que os números devem ser considerados com bastante cautela, visto que tanto nos servem para nos conduzirem a uma afirmativa como a uma negativa.

Eu direi, também, que as leis têm os seus interpretes. Uns mais inteligentes fazem uma interpretação mais Inteligente; outros menos inteligentes o menos rábulas fazem uma interpretação que fica um pouco mais abaixo.

Eu faço a minha interpretação. Não pretendo, porém, apresentá-la à Câmara, como sendo melhor que a dos outros ou coiro original.

Faço a minha interpretação e afirmo que tendo responsabilidades que vêm do. minha profissão, eu nunca as esqueço ainda que a minha profissão seja posta ao serviço do meu credo político.

Sumariamente direi o seguinte: pela legislação de 1888, não se deu ao Estado a faculdade de fabricar tabaco, porque não se pode dar essa faculdade ao Estado.

A legislação de 1888 simplesmente afirmou que o Estado tinha essa faculdade. São, pois, situações distintas. Uma cousa é dar uma faculdade e outra cousa é reconhecer uma faculdade. Conceder certa faculdade é tirá-la do predomínio de alguém para a transmitir a outrem. Reconhecer certa faculdade é simplesmente tornar clara uma situação que já existe.

Reconhecer ao Estado a faculdade de poder fabricar tabaco não é mais do que evidenciar uma faculdade que o Estado já tinha.

Ninguém de boa fé poderá contrariar esta doutrina, negando que o Estado, como suprema aspiração política da Nação, tenha todas as atribuições.

A legislação de 1888 reconhece ao Estado uma faculdade, não lha atribui.

A legislação de 1891, pelas razões que constam dos relatórios que precederam diversas propostas, traduz o que foi resolvido pelos Poderes do Estado -Legislativo o Executivo. Entenderam que o fabrico de tabacos poderia ser, em regime de monopólio, concedido a uma entidade particular. Deu-se assim a concessão do monopólio por prazos determinados.

E agora eu pregunto ao espírito jurídico desta Câmara o seguinte: essa concessão trouxe consigo o desaparecimento da faculdade do Estado?

Passando a outros ramos da administração pública, poderemos considerar a propósito a administração dos correios e telégrafos.

Alguém poderá negar a faculdade que o Estado tem de administrar os serviços dos correios e telégrafos?

Não!

Alguém poderá contestar ao Estado o direito de poder amanhã atribuir a uma entidade particular a exploração e administração dos correios e telégrafos? Não!

Se por qualquer circunstância fôssemos levados a entregar êsses serviços a qualquer entidade particular, o Estado perdia a faculdade de os retomar para si? Não!

Entendo, juridicamente, que o regime do monopólio é uma solução de continuidade, aberta na vida do Estado pelo que respeita a tabacos, que não traz o desaparecimento da faculdade anterior.

Essa solução de continuidade foi restrita a certo número de anos. Terminada ela, o Estado retoma a sua primitiva posição e de novo poderá adoptar outra solução de continuidade sob a forma ou regime que tenha por mais conveniente.

E como muita gente, nesta Câmara e fora dela, está agindo sob o que supõe um imperioso mandato da opinião pública, e como à frente dêsse mandato da opinião pública estão os grandes órgãos da imprensa, que, sem um único argumento de ordem jurídica, afirmam que automaticamente se entrou no regime da

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liberdade, é preciso demonstrarmos se de facto entrámos ou não nessa situação.

Dizem os homens de lei e dizem os parlamentares que, para demonstrarmos que se caiu no regime da liberdade, temos de socorrer-nos no Código Civil, na parte que diz respeito às disposições que regulam como norma de direito positivo a actividade do homem em face do direito da indústria.

Têm sido invocados inúmeros lugares comuns, têm sido proferidas dezenas de frases bombásticas para afirmar que o Poder Executivo está em ditadura: mas quando vamos para o ponto de vista jurídico constatamos que a maior parte das conclusões às premissas estabelecidas ficam no tinteiro.

Eu entendo que o artigo 567.° do Código Civil não tem aplicação ao caso.

O direito civil regula obrigações de carácter individual dos homens colocados perante os homens nas suas relações com o Estado.

Hoje ninguém de boa fé pode vir dizer que a liberdade do homem não está sujeita à s normas do direito civil. O homem não tem o direito de se dedicar a uma profissão sem se subordinar à autoridade do Estado.

O artigo 567.° do Código Civil não se prende, portanto, com a matéria em discussão.

Foi aqui invocada a parte do Código Civil que diz respeito ao direito originário.

Essa parte do Código Civil é de direito constitucional e não civil, e como tal não só não devo estar inserta no Código Civil, mas também devo ser relegada, segundo a opinião de Alexandre Herculano, à doutrina dos direitos originários do do mesmo Código, artigo 3.°, n.° 26.°

Ainda a propósito dêste artigo sou obrigado a dizer que a liberdade está ainda condicionada, nos termos em que demonstrei, à doutrina que diz respeito propriamente ao direito civil.

Eu entendo que os homens não formam o seu espírito apenas pelo seu estudo pessoal, mas também pelo estudo que fazem da opinião dos outros.

E já que aqui têm sido lidas várias passagens, seja-me permitido ler também uma passagem do comentador do citado artigo 3.°. n.° 26.°, alto espírito estudioso que foi meu professor e de alguns juristas, relativamente à interpretação dêsse número da Constituição da República:

Leu.

Socorreu se êste grande estudioso da opinião de tratadistas italianos e de outros; e assim eu concluo, na defesa da minha tese, que não há liberdade absoluta, porque toda ela tem de ser condicionada pelas relações do meio e do Estado.

Chego à conclusão, portanto, de que não se podia cair automaticamente no sistema de liberdade, pelo que diz respeito à liberdade de trabalho e do indústria.

Se entrarmos propriamente no que se refere à matéria de trabalho, eu citarei o que consta da legislação de 1890 e do 1891.

Os homens dêsse tempo, prevendo todas as situações, fizeram o decreto de Maio de 1890 que passo a analisar. Diz êsse diploma:

Leu.

Esta base 20.° deu origem ao artigo 15.° que é concebido nestes termos:

Leu.

Vamos analisar a disposição dêste artigo.

O regime de monopólio não é mais do que uma solução de continuidade, um arrendamento que um proprietário pode fazer das suas propriedades que administra directamente ou das suas fábricas, mas, se em determinado momento êle entender que devo passar a outro regime, pode fazê-lo sem que isso implique a perda total da sua situação anterior.

Se a legislação de 1888, que não atribui a ao Estado a faculdade de fabricar tabaco, está de pé, o que é que os homens de 1891 quiseram acautelar no artigo 15.°?

E ainda não ouvi ninguém dizer que êste artigo está revogado.

O Poder Legislativo, como todos nós sabemos, é muito moroso nas suas deliberações. E nós, que andamos a acusar o Poder Executivo de estar fora da Constituição, parece que nos esquecemos de que também, o Poder Legislativo não cumpre com as normas regulares que a Constituição lhe impõe, porque a sua função não é a de partir carteiras nem bater nelas com sarrafos do madeira.

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O artigo 15.° está de pé e dá ao Poder Executivo, e só a êle, a competência, antes de findar o contrato, de se passar ao regime de liberdade.

Só o Poder Executivo é o juiz da situação.

Leu.

Se o Poder Executivo Mo o fez, estava no seu direito.

Não se pode cair matematicamente no regime de liberdade, porque desde que chegado foi o dia 1 de Maio e o País não se tinha manifestado, o Govêrno continuava a ser o árbitro da questão, sem necessitar de prévia autorização do Legislativo.

Disse o Sr. Alfredo Nordeste que o Partido Democrático queria a régie, para engrossar as suas fileiras o eternizar-se no Poder.

Todos os dias a imprensa afecta ao partido de S. Exa. repete esta scie e como S. Exa. diz que a imprensa é o órgão pelo qual se devem guiar todas as opiniões, eu lembro que em 1924 não era Govêrno o Partido Democrático, aí por 22 de Março, mas uma grande figura de republicano, o Sr. Álvaro de Castro, e era também Govêrno o combatente violento, Sr. José Domingues dos Santos, que referendaram a lei n.° 1:565, tendente a dar uma autorização ao Poder Executivo para regular uma nova autorização.

Já nesse tempo se preocupavam com o contrato dos tabacos, mas não se lembraram da liberdade da indústria.

Porque é que neste momento o regime do liberdade os não preocupava?

E uma pregunta que eu deixo em suspenso, para que qualquer Sr. Deputado me responda.

O artigo 5.° até dá autorização ao Govêrno em matéria aduaneira.

Não é a mim que compete desenvolver toda essa teoria, mas estou convencido de que alguém o fará.

Parece-me que, em lace do Código Civil, da Constituição, da lei de 1888, da lei de 1890, da lei de 1891 e da lei de 1924, se demonstra que a situação em que o Poder Executivo se encontra - e para a qual foi atirado pelo Poder Legislativo - é uma situação perfeitamente defensável, não só adentro das boas normas da moral, como até mesmo adentro das próprias disposições legais,

Demonstrado isto, é necessário que eu diga que nunca fujo a fazer afirmações claras.

Entendo que acima de políticos somos republicanos, que acima de republicanos, somos portugueses, e que acima de portugueses - e isto é universal - somos honestos.

Não devemos atribuir responsabilidades aos outros quando também as temos.

Acho interessante a posição dos diversos lados da Câmara, neste momento.

Engrossam a voz, para dizer ao Executivo: V. Exas. estão em ditadura ordinária, V. lix.a3 estão fora da lei, e V. Exas. estão faltando ao acatamento que devem ao Poder Legislativo, não tem autoridade para dirigir ao Govêrno tais acusações.

Não me preocupa, por emquanto, o regime dos tabacos; é uma cousa que está pendente da resolução da Câmara.

E eu apelo para todos aqueles que são republicanos de verdade para que procurem resolver o problema com serenidade, sem paixões o sem violências.

Se pelo debate parlamentar resultar para a minha consciência de homem público, de político, e de honrado, mas modesto e desconhecido advogado da província, a convicção de que o regime da régie é atentatório dos interêsses do Estado, ou por outra, da Nação, eu direi então às oposições que podem contar com mais um voto contra êle.

Mas se, pelo contrário, as oposições reeditarem mais uma vez os fraquíssimos argumentos com que têm procurado convencer-nos, e as violências que ultimamente praticaram, eu direi que me não convenço com tais argumentos, nem me intimido com semelhantes violências.

Apoiados.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

Os àpartes não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Alfredo Nordeste (para explicações): - Já contava, desde quinta-feira, que o Sr. Henrique Cabral me havia de responder.

Eu vi que a lista de oradores, existente

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na Mesa, era alterada constantemente, e que da parte da maioria havia realmente o propósito de encarregar um jurista de me responder.

O Sr. Henrique Cabral (interrompendo): - Foi de minha espontânea vontade.

O Orador: - O Sr. Henrique Cabral foi meu companheiro de estudos naquela única escola de direito que então existia em Portugal, a Universidade de Coimbra; e por isso. lamento que S. Exa., para fazer valer aqui uma afirmação jurídica, tivesse de estabelecer um confronto entro um advogado de aldeia e um advogado da capital.

Penso que neste momento estão aqui apenas Deputados a tratar do assunto, e não advogados.

O meu ilustre colega e amigo, Sr. Henrique Cabral, que eu há muitos anos não tinha o prazer de ouvir, nas considerações que produziu teve sempre um propósito de ironia ou de censura.

Se realmente foi essa a intenção de S. Exa. eu quero dizer-lhe o seguinte: cada um interpreta as leis como quere, como pode e como sabe, e isto foi o que eu fiz.

O Sr. Henrique Cabral [interrompendo): - E, com muito brilho.

O Orador: - Outra censura foi ainda feita pelo Sr. Henrique Cabral: a de que eu, com uma voz forte e grossa, acusei o Govêrno dizendo que êle estava fora da lei.

Cada um tem a voz que Deus lhe deu. Sabe muito bem o Sr. Presidente do Ministério, que é sempre assim que eu falo, visto que é êste o meu tem normal de voz.

Sr. Presidente: eu tenho pena de ter de fatigar a Câmara com algumas considerações em resposta ao Sr. Henrique Cabral; mas creio que tenho o direito de pedir à, Câmara que me escute durante alguns minutos, desde que o Sr. Cabral relativamente ao negócio urgente do Sr. Cunha Leal, acerca da situação em que se encontra o Govêrno, esteve fazendo obstrucionismo durante duas horas e meia.

Desde que o Sr. Henrique Cabral fez, por assim dizer, obstrucionismo sôbre o negócio urgente do Sr. Cunha Leal, eu julgo-me com o direito de pedir à Câmara que me escute durante algum tempo.

O Sr. Henrique Cabral insistiu demasiadamente num ponto, isto é, na lei de 1891, e isto certamente para convencer a Câmara de que o Govêrno é o juiz, o árbitro da situação, não tendo podido deixar de fazer aquilo que fez.

Eu. Sr. Presidente, coloquei a questão em termos mais claros.

Voltando à lei de 1891, eu devo dizer que diz ela o seguinte:

Leu.

Ora, Sr. Presidente, o Govêrno poderá assim proceder, se o entender; mas nas condições que vou indicar à Câmara.

O Govêrno poderia assim proceder desde que tivesse autorização da Câmara para o fazer.

Esta é que é a questão.

E tanto assim é, que o Govêrno transacto procedeu desta forma.

O artigo 16.° diz o seguinte:

Leu.

Dizendo o artigo 15.° o seguinte:

Leu.

Não necessito, Sr. Presidente, de ir buscar a opinião de nenhum tratadista estrangeiro, pois a verdade é que na nossa terra temos também muito boa cousa; porém o que é necessário é fazer o contrário do que fez o Sr. Henrique Cabral, isto é, ler tudo, e não apenas referir-se a um pequeno número dessas considerações.

V. Exa. leu apenas o extracto que passou para os seus apontamentos, mas eu vou ler o que estava a seguir escrito:

Leu.

Continua ainda o comentador:

Leu.

Ora, Sr. Cabral, eu não teria usado da palavra para explicações se porventura V. Exa., quando leu aquela parte que se refere à liberdade de trabalho, a tivesse completado com o resto do comentário feito pelo nosso muito distinto e falecido professor Sr. Marnoco e Sousa.

V. Exa. citou muita legislação e bastante interessante. Citou a lei de 1888, a que eu já tinha feito referência; citou as leis de 1890, 1891, e até o decreto de 1906, que considera em plena execução

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as duas bases a que diz respeito o decreto de 1891.

Porém o que V. Exa. não conseguiu demonstrar, nem conseguirá, é que em virtude do que está exposto no n.° 26.° do artigo 3.° da Constituição, o Govêrno está dentro da lei. Isto é que V. Exa. não demonstrou, o tanto assim, que de tal maneira embaraçado se sentiu, que quando chegou a êste ponto passou adiante.

Mas, Sr. Cabral, admitamos, por instantes, que o Govêrno está bem na posição em que se encontra.

Pregunto: pode o Govêrno dispor das receitas?

Não pode, e então tenho eu razão na minha afirmação quando digo que o Govêrno está fora da lei.

Sr. Presidente: vou terminar referindo-me à disposição do Código Civil.

O Sr. Cabral fez curiosas considerações sôbre êste ponto, que também foi versado pelo meu colega Sr. Pedro Pita, afirmando que o artigo 067.° do Código Civil não tinha aplicação ao caso, visto que êle dizia respeito a relações entre indivíduos.

Só aconselho a S. Exa. que vá ver as fontes dêste artigo, que não o leia só por si, mas que vá ver o artigo 658.° do projecto donde aquele artigo nasceu, a páginas 123, e lá encontrará absolutamente demonstrado que quem tem razão sou eu.

Não tenho mais nada a dizer.

O orador não reviu.

O Sr. Lino Neto: - Começo por mandar para a Mesa a seguinte moção de ordem:

"Considerando que não é de adoptar, sôbre a indústria dos tabacos, qualquer regime provisório que substitua ou dispense a rápida discussão do respectivo regime definitivo;

Considerando, porém, que tendo findado o contrato com a Companhia, ao Po der Executivo cumpria receber e acautelar íntegro o valor nacional da mesma indústria, estabelecendo todas as providências a êsse fim conducentes dentro das suas atribuições, e pedindo ao Poder Legislativo as mais de que careça;

Considerando que importa abastecer o mercado pela venda dos 800:000 quilogramas que, por fôrça do contrato, foram entregues ao Estado pela Companhia:

A Câmara dos Deputados resolve autorizar a abertura dos créditos indispensáveis para a completa conservação do valor da sobredita indústria, devendo o Poder Executivo dar conta da sua aplicação em notas semanais no Diário do Governo". - Lino Neto.

Por esta moção define a minoria católica a sua atitude no presente debate.

Discute-se se, em 1 de Maio último, se teria ou não entrado automaticamente, sôbre tabacos, em regime de liberdade ou de régie, e conseqúentemente se as providências tomadas pelo Govêrno para a laboração das respectivas fábricas o foram ou não ao abrigo da Constituição.

Êste é, por certo, o assunto que está em causa. Não me desviarei, pois, dele.

Mas, ao invés de alguns oradores que me têm precedido, não visarei nas minhas considerações senão o Poder Público como princípio de ordem e o interêsse nacional como base de bem-estar da maior parte da população. Tudo o mais, viabilidade ou não viabilidade do Govêrno, é secundário para êste lado da Câmara.

Na questão em que vimos, julgo indispensável, antes de mais nada, para seu esclarecimento, que distingamos o exclusivo dos tabacos da sua forma de administração (régie ou liberdade). Não são uma e a mesma cousa.

O exclusivo dos tabacos existe em Portugal desde há mais de dois séculos, ininterruptamente, como se assinala num parecer das comissões de fazenda e legislação desta Câmara em 1864. A sua forma de administração é que tem mais ou menos variado durante êsse tempo.

O exclusivo foi prescrito pela necessidade de criar receitas para o Estado.

Poder-se ia discutir se é moral que o Estado venha explorando um vício como é o do tabaco, que interioriza a população, subalternizando-a a hábitos que não servem nem ao corpo nem à alma. Está, porém, já averiguado por uma larga experiência que, se o Estado o não explorar, êle, longe de cessar, se agrava mais ainda. Por isso, do mal o menos: tirem-se dele alguns rendimentos que redundem em proveito dos interêsses gerais da sociedade. É por esta mesma lógica que

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em todos os Estados modernos se tem também estabelecido o exclusivo das lotarias.

Certo é que o exclusivo dos tabacos tem durado em Portugal há mais de dois séculos e nada há a contra-indicá-lo.

Povo que vive em déficit permanente desde que temos orçamento como condição de funcionamento constitucional, não podemos desperdiçar receitas de que o Estado carece para o desenvolvimento da sua acção, para a realização dos progressos e aspirações da sociedade que representa.

Não pareça dificuldade à nossa afirmação da existência secular do exclusivo dos tabacos o ter já havido regime de liberdade.

O regime que se chamou de liberdade, e que se estabeleceu por lei de 13 de Maio de 1864, não foi senão de liberdade restrita, não revogou o exclusivo dos tabacos, e procurou apenas atender os interêsses do Estado por modo que não ficassem inferiores aos da régie.

E tanto assim que os artigos 5.° e 6.° do regulamento de 22 de Dezembro de 1864, sôbre o referido regime de liberdade, continuaram a proibir a cultura do tabaco sob o nome de "erva santa". O exclusivo, portanto, não deixou nunca do subsistir. Não há que invocar em contrário nem o artigo 3.°, n.° 26.°, da Constituição, nem os artigos 368.° e 567.° do Código Civil.

Um motivo manifesto de interêsse público o determinou e disposições formais de lei o sancionam.

O exclusivo dos tabacos está como que entranhado nos nossos costumes constitucionais.

Mas se o exclusivo dos tabacos tem subsistido, a sua forma de administração é que tem variado, sendo por concessão na maior parte da sua duração e liberdade restrita no período de 1864 a 1868.

O que terminou à meia noite de 30 de Abril último não foi o exclusivo dos tabacos para o Estado, mas a sua concessão à Companhia dos Tabacos de Portugal.

O exclusivo, êsse continua, tem de continuar, integro, como um valor da Nação; temos que o defender a todo o custo. Está nele uma das melhores esperanças, do nosso ressurgimento financeiro.

O Sr. José Domingues dos Santos: - E de estranhar que os católicos só orientem assim...

O Orador: - Não precipito V. Exa. juízos. Os católicos têm apenas a fôrça dos seus princípios para saberem sobrepor-se as paixões que os rodeiam, defendendo em tudo o interêsse nacional, o único que os preocupa.

Não se entrou automaticamente no regime de liberdade contra o que se tem pretendido. Para isso, a carta do lei do 14 de Setembro de 1890, que autorizou a concessão, exige que o Govêrno o declare primeiro por conveniente.

A 2.ª das bases anexas a essa lei assim o diz expressamente:

"O Govêrno fará anunciar com a maior publicidade, antes de terminar o prazo da concessão do exclusivo, se entende por conveniente passar ao regime da liberdade do fabrico".

E não o diz só para "antes de terminar o prazo". Di-lo ainda para antes da adjudicação do exclusivo:

"O Govêrno reserva-se o direito de, em Conselho do Ministros, não fazer a adjudicação se assim o entender por conveniente".

A faculdade da transcrita base 20.ª encontra se repetida na base 15.ª anexa a carta do lei de 28 de Março de 1891, que ratificou a renovação da concessão à Companhia dos Tabacos.

Ora, o Govêrno não anunciou por conveniente passar à liberdade da indústria dos tabacos.

Quererá isto significar que entrámos então automaticamente em regime de régie?

Também não. Falta-lhe, para tanto, como essencial a autorização parlamentar dos necessários créditos, sem a qual não é possível uma administração eficazmente progressiva; falta-lhe a sanção que compete ao Congresso da República nos termos da Constituição, artigo 46.°, n.° 3.° O próprio Poder Executivo o reconheceu trazendo à Câmara, a sua proposta de regime provisório dos tabacos,

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Temos, pois, de assentar, sem sombra de dúvida, que, actualmente, não estamos nem em regime de régie nem em regime de liberdade.

O Poder Legislativo é que tem de o determinar, não convindo que seja provisòriamente, porque em Portugal todos os provisórios tem o sestro de se tornarem eternos, mas para vigorar com carácter definitivo, como num País que sabe o que quere e para onde caminha.

Numa situação como aquela em que estamos, importa que o Puder Executivo deíeoda o valor nacional, que é a indústria dos tabacos, adoptando as necessárias providências conservatórias. Nesta conformidade tomou já conta das lúbricas e fê-las continuar em laboração.

Teria abusado das suas atribuições? Creio que não.

Os que pensam o contrário apoiam-se no artigo 26.°, n.° 22.°, da Constituição, que diz ser da competência privativa do Congresso da República a administração dos bens nacionais.

A esta objecção respondo distinguindo entre administração propriamente , dita, como é a de um proprietário sôbre os seus prédios, o administração de simples providências conservatórias, como é a do cabeça de casal nos inventários judiciais. A administração do Govêrno, na hipótese sujeita, é a administração de simples providências conservatórias; e, assim mesmo, como se lembra na moção que mandei para a Mesa, com a obrigação de dar contas em notas semanais no Diário do Govêrno.

O Sr. Pestana Júnior: - Simplesmente por essa administração o País fica ausente.

O Orador: - Sinto que assim seja, porque terá então deixado de ser representante do País o ilustre Deputado que acaba de interromper-me.

Demais, para efeitos de administração, tanto vale juridicamente mandar paralisar as fábricas como pô-las em laboração. Ora, se o Govêrno podia mandar paralisar as fábricas, pela mesma lógica as podia fazer andar. Tudo é igualmente administração.

O que êle não podia, porém, era ficar de braços cruzados, nem em face de uma Constituição que tem, entre as suas disposições, a do artigo 47.°, n.° 9.°, nem em face da consciência do todo e qualquer cidadão normalmente constituído, prezando a sua pátria. Agarremo-nos à letra da Constituição; mas não nos esqueçamos que só o espírito vivifica.

O exclusivo dos tabacos é um valor nacional, mas não é o mesmo parado ou em laboração. Em laboração é que êle tem a sua máxima importância, com os seus maquinamos a funcionar e os seus operários disciplinados numa tradição de trabalho. Era assim que estava, e é assim que o Govêrno tem de o continuar, até que o Parlamento se pronuncie.

Falta-lhe apenas autorização legislativa para os créditos a despender e bill de indemnidade para os que tenha despendido.

O Sr. Presidente do Ministério ç Ministro do Interior (António Maria da Silva): - O Govêrno não careceu ainda de despender nenhum crédito.

O Orador: - Mas, se o tivesse despendido, a minoria católica não teria dúvida em conceder-lhe bill de indemnidade, não só porque o Parlamento, apesar de solicitado para êsse fim, não deu ainda a sua solução, mas também porque estava em causa um alto interêsse nacional.

A verdade, porém, é que o exclusivo dos tabacos em regime de simples providências conservatórias não convém ao País. Há que dar-lhe a forma de uma administração definitiva e amplamente eficaz.

A ordem das ideas, que tenho vindo desenvolvendo, é principalmente com êsse objectivo.

Embora incidentemente, por estar fora do assunto em questão, seja-me permitido declarar já que a minoria católica é contra a régie.

Ela não é de votar por consideração alguma.

Não tem a seu favor nem os princípios económicos, que estão dominando por toda a parte, tendo sido o seu descrédito que impeliu os socialistas à criação e preferência das administrações autónomas, nem as tradições administrativas do nosso País, como a da administração da fábrica da Marinha Grande, que, apesar de

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traçada rigorosamente em moldes socialistas, está fracassando inteiramente. Isto, para não faiar já das administrações escandalosas dos Bairros Sociais, Transportes Marítimos, etc. A minoria católica. é por isso francamente contra a rêgie, por a considerar prejudicialíssíma para os interêsses nacionais.

Não compreende de outra forma a soa função nesta Câmara.

É tremenda a crise da Nação. A dívida pública e especialmente a flutuante revelam-se em proporções que chegam aos olhos de muitos a parecer o resultado de uma incapacidade administrativa. Só esta lembrança deveria vexar-nos.

Carecemos, pois, de muito patriotismo e ponderação para sairmos daquela crise. O exclusivo dos tabacos é um dos principais instrumentos para tam elevado fim.

Foi lida e admitida a moção enviada para a Mesa pelo Sr. Lino Neto.

O Sr. Lelo Portela: - Sr. Presidente: estando como está em discussão o negócio urgente do ilustre leader do meu partido, o Sr. Cunha Leal, que representou um debate essencialmente político, êle exige a presença não só do Sr. Presidente do Ministério como a do Sr. Ministro das Finanças.

Apoiados.

Sr. Presidente: tenho constatado que durante toda a sessão o Sr. Ministro das Finanças não tem estado presente, sendo êste aliás um assunto que corre pela sua pasta.

Desejava por isso saber quais os motivos, quais as razões por que o Sr. Ministro das Finanças não está presente; quuis os motivos, quais as razões que levaram S. Exa. não assistir a êste debate.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - O Sr. Ministro das Finanças está doente de cama, pelo que me pediu para o substituir, o que estou fazendo, ouvindo com toda a atenção o que V. Exa. está dizendo.

O Orador: - Sr. Presidente: não pode o Sr. Presidente do Ministério, nem V. Exa., nem a Câmara estranhar que eu fizesse esta pregunta.

O Sr. Ministro das Finanças tem sido na verdade bastante assíduo a êste debate, e assim não tendo comparecido hoje na Câmara, poderia ter acontecido muito bem que motivos de ordem política o impe dite sem de aqui vir.

Acabo porém de saber pelo Sr. Presidente do Ministério que motivos de saúde o impedem de aqui vir, o que sinceramente lamento.

Sr. Presidente: terminado o contrato com a Companhia dos Tabacos em 3U de Abril, o Govêrno entendeu, sem nenhuma providência administrativa que o autorizasse, que devia tomar conta das fábricas e maquinismos, e estava no seu direito; mas fez mais do que isso: pôs em laboração as mesmas fábricas.

E êsse o motivo de negócio urgente que ora se discute.

O Govêrno bem sabe que tinha praticado um acto de ditadura, e tanto assim que o Govêrno sentiu necessidade de vir aqui apresentar uma proposta de regime provisório e ainda mais: no primeiro dia após a extinção do contrato com a Companhia, o Sr. Ministro das Finanças usou da palavra para esclarecer a situação do Govêrno. Então chegou-se a esta cousa que e vexatória para a mentalidade do Sr. Ministro das Finanças, que me habituei a respeitar como um homem que teve sempre probidade intelectual: vi S. Exa. dar explicações que foram verdadeiros disparates. Trouxe argumentos que ficam mal ao seu saber e à sua inteligência.

S. Exa. afirmou esta teoria sibilina: que se tinha entrado automaticamente no regime da régie.

Se não se tratasse de um assunto de tal magnitude, não valeria a pena repisar os argumentos já expostos, mas é necessário que a opinião pública fique esclarecida. E esta a razão por que mais uma vez eu vou sintetizar os argumentos já aqui aduzidos.

Não é necessário apresentar grandes argumentos para demonstrar que estamos era regime de liberdade, baseados nos princípios da liberdade indhidual, que nós encontramos desde 1826, quando foi outorgada a Carta, Constitucional.

Sr. Presidente: já então, nesse estatuto fundamental, se sustentava a doutrina da liberdade de trabalho.

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O regime de tabacos tem passado por várias fases, mas qualquer delas não representa senão limitações ao princípio geral da liberdade, quer seja as do período de 1863 até 1888, quer seja a de 1888, - a da régie - todos êsses períodos correspondem a regimes excepcionais, votados por leis especiais, que vieram limitar o princípio fundamental da nossa legislação.

E não se diga que êsse princípio fundamental já não tem hoje aplicação, pela evolução dos tempos, porque ainda em 1911 foi inserido na Constituição da República o mesmo princípio fundamental da liberdade de trabalho. E assim, a não ser que quiséssemos chegar ao absurdo de que, terminado o contrato com a Companhia dos Tabacos, tínhamos caído num período em que não havia nem regime nem normas jurídicas, nós temos de concluir que entrámos na liberdade de trabalho. Não vamos apenas insistir sôbre êstes pontos de direito quê j á foram sobejamente demonstrados nesta Câmara, para afirmar que realmente após 30 de Abril nós entrámos no regime da liberdade.

Se considerarmos, por absurdo, que a doutrina expendida aqui pelo Sr. Ministro das Finanças é a exacta, e que de facto nós tínhamos entrado no regime da régie, nem por isso o Govêrno deixou de praticar actos de ditadura e de abuso do Poder, porque mesmo assim era necessário que os serviços estivessem devidamente regulamentados, no que se refere às receitas e às despesas, pelo Poder Legislativo.

Em matéria administrativa o Executivo não faz mais do que executar as deliberações do Legislativo.

É por isso que o Parlamento vota os orçamentos, que são o plano de administração dentro do qual o Govêrno tem de agir.

Sr. Presidente: esta é a situação que em matéria financeira se encontra estabelecida por todos os tratadistas. São as bases em que assentam os orçamentos do Estado.

São os princípios por que se regem todas as legislações, até a nossa.

São os pontos fundamentais dentro dos quais o Poder Executivo tem sempre que se circunscrever, sendo do Poder Legislativo exclusivamente a competência de marcar a acção administrativa do Govêrno.

Assim, Sr. Presidente, compulsando toda a legislação que havia sôbre contabilidade e sôbre leis orçamentais, verifico que já a lei n.° 1:881, no artigo 10.°, estabelece quanto ao Govêrno e funcionários a sua responsabilidade civil e criminal.

Se chegássemos ao absurdo de que efectivamente tínhamos entrado democraticamente no regime da régie, nem por isso o Govêrno deixou de praticar um acto de ditadura e excesso de Poder.

Apoiados.

Nem por isso se colocou dentro da lei, porque não estava autorizado legalmente.

Apoiados.

Daqui resulta a perfeita desordem e a perfeita anarquia em que se tem vivido, quando os Governos, saltando por cima do Parlamento e das leis, cometem um verdadeiro abuso do Poder.

Assim é que o Parlamento não tem podido seguir com aquele cuidado e minúcia uma questão desta natureza nos seus mínimos detalhes, e os mínimos detalhes nesta questão podem por vezes atingir avultadas quantias para os interêsses do Tesouro Público.

Sr. Presidente: foi assim que se tornou possível a desordem e a anarquia do Poder realizada por esta forma.

Só assim é que foi possível que se dêsse êste caso debatido de o Estado se encontrar perante a Companhia dos Tabacos numa situação em que o Estado tem pelo menos os seus interêsses feridos e prejudicados.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Não apoiado.

O Orador: - A Companhia era obrigada a entregar 800:000 quilogramas, e mais tarde, por virtude de um largo debate travado nesta Câmara, onde se demonstrou que a Companhia estava prejudicando os interêsses do Estado, foi votada uma lei que permite ao Poder Executivo, ao Ministro das Finanças fazer um acordo com a Companhia dos Tabacos.

E então, ao abrigo dessa lei, o Sr. Ministro das Finanças outorgou com a Companhia dos Tabacos, alterando a cláusula do contrato de 1906 estabelecendo para

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os 800.000 quilogramas de tabaco um preço muito superior.

Bem sei que é uma questão de detalhe, mas essa diferença de preço pode atingir qualquer cousa como 10:000 ou 11:000 contos.

Depois foi nomeada uma comissão de jurisconsultos para tratar do assunto, a qual declarou que a cláusula que elevou o preço era irrita e nula.

Sucede que o Sr. Ministro das Finanças, quando se encontrou com a Companhia, aceitou a constituição do um tribunal arbitral para resolver a questão.

A posição do Govêrno na defesa dos interêsses do Estado devia ser outra; somente teria de dizer à Companhia que essa cláusula não obrigava o Estado, porque era irrita e nula e não admitiria discussão em matéria litigiosa sôbre êste assunto.

É preciso dizer que quando se recorro a um tribunal arbitral é necessário assinar um compromisso no qual se estabelece o que é matéria litigiosa, e assim o Sr. Ministro teve de dar como litígio aquilo que para o Estado não devia ter sombras de dúvidas.

Terminado o contrato em 30 de Abril, o Sr. Ministro das Finanças praticou mais êste êrro.

Dizer à Companhia que o pagamento dos 800:000 quilogramas de tabaco se faria por encontro de contas, visto que ela ainda deve dinheiro ao Estado.

Isto representa em direito um pagamento por compensação.

Nestas condições, os interêsses do Estado não ficaram acautelados.

Dado que os tribunais arbitrais, quando têm que decidir de questões em que intervém o Estado, são por via de regra contra êle, sucederá que o Estado terá do pagar êsse tabaco por um preço muito superior ao que deveria pagar, havendo um prejuízo para o Tesouro Público que pode orçar por 10:000 a 11:000 contos.

Mas ainda há outro perigo.

A Companhia, uma vez que termine a concessão tem de entrar em dissolução, nos termos dos seus próprios estatutos. Emquanto se decide o pleito, a Companhia pode liquidar os seus haveres. Ora eu pregunto: se o tribunal só decidir a favor do Estado, e êste tenha saldo a seu favor, a quem vai exigi-lo?

O Sr. Presidente: - São horas de interromper a sessão. V. Exa. quere ficar com a palavra reservada?

O Orador: - Sim, Sr. Presidente.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe furam enviadas.

O Sr. Presidente: - Fica V. Exa. com a palavra reservada.

Interrompo a sessão até às 21 horas e meia.

Eram 19 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente (às 22 horas e 25 minutos): - Está reaberta a sessão.

Devia entrar em discussão o negócio urgente do Sr. Jorge Nunes, mas como não está presente o Sr. Ministro da Agricultura, ponho à discussão o projecto que concede personalidade jurídica à Igreja.

O Sr. Carlos de Vasconcelos (para um requerimento): - Requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se concede a dispensa da leitura do projecto de lei.

O Sr. Presidente: - Tinha dito há pouco que ia entrar em discussão o projecto de lei, mas o que está em discussão 6 a questão prévia sôbre a qual pediu a palavra o Sr. Manuel José da Silva.

O Sr. Manuel José da Silva: - Sr. Presidente: a fim de poder formular as considerações que me levaram a inscrever-me sôbre êste assunto, acerca de dois meses, eu pedia a V. Exa. fineza de me mandar o parecer da comissão de finanças a respeito da doutrina em debate.

Sr. Presidente: veio esta questão à Câmara, se bem me recordo, há aproximadamente dois meses.

A intensidade dos trabalhos parlamentares não permitiu, a despeito da boa vontade de todos, que esta questão fôsse encarada com a devida largueza e na devida oportunidade.

Confesso a V. Exa. que já me não lembrada da questão prévia. razão por que pedi o parecer da comissão de finanças relativo ao assunto.

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O projecto para o qual a Câmara reconheceu a conveniência de iniciar o seu estudo visa, segundo a doutrina do seu artigo 1.°, a conceder personalidade jurídica às igrejas, representadas pelos seus Ministros, representantes ou administradores.

Sôbre êste projecto de lei travou se uma ligeira discussão, e dessa discussão resultou uma deliberação da Câmara: a de fazer baixar à comissão de finanças a doutrina dele para que esta se pronunciasse sôbre se êle colidia ou não com as disposições da lei-travão.

A comissão de finanças, num parecer que mandou para a Mesa, emitiu de uma maneira vaga o seu modo de ver, que, podendo servir de escudo a uma sofistica em certo sentido também permitia escudar uma sofística em sentido contrário, mas deixa no emtanto antever um ponto de vista da maioria dos seus membros: de que a comissão de finanças entendia que a doutrina do projecto colide com a lei travão.

Foi esta, salvo êrro, a questão prévia, e vou sôbre êle emitir a minha opinião, entendendo, no emtanto, que a propósito de matéria em geral devo fazer, pelo menos, umas rápidas considerações tendentes a marcar a minha posição para o efeito de responsabilidades, tam, digna como a daqueles que têm defendido a doutrina do projecto ou a dos que a têm combatido.

Em matéria de política religiosa em Portugal tem-se especulado muito, e dessa especulação, que não tem sido unilateral porque tem sido geral, os únicos prejudicados têm sido, em primeiro lugar, a própria Igreja Católica e em segundo lugar a vida nacional.

Por minha parte, posso assegurar a V. Exa. que nunca fui daqueles que tem especulado com a questão religiosa de Portugal. Nunca militei como crente na Igreja Católica, mas olhando para a vida da Nação, não querendo tapar os olhos às revidados que os homens públicos devem respeitar, tenho do verificar que de facto há dentro de Portugal uma verdadeira consciência católica, independente, estranha a todas as especulações políticas.

Como político republicano, entendi sempre e entendo hoje que aos poderes públicos cabe por dever fundamental olhar para as aspirações dessa consciência religiosa, para sem vexame para os princípios, numa obra de concórdia para a vida nacional, procurarem uma forma airosa de entendimento.

Tenho em relação à Igreja Católica a posição de respeito que um homem do século XX deve ter em relação a um credo religioso; e foi com imenso prazer que verifiquei a tentativa feita por elementos da Igreja, de acordarem nas suas aspirações do credo religioso, alargando no emtanto a sua acção, procurando encontrar solução para um problema de interêsse nacional, e nucleando se as figuras marcantes em agremiado político, conseguindo assim ter a sua representação nas Câmaras Legislativas.

De facto, a Igreja e o próprio Estado tem beneficiado desta boa vida de relações entre os representantes do centro católico e os poderes públicos, não perdendo nunca Ossos representantes o ensejo de afirmarem publicamente que os poderes públicos da República não deixam de lhes testemunhar, como representantes da Nação e de um agremiado político, toda a consideração que êles bem merecem.

Desta boa maneira de tratar reciprocamente têm resultado, repito, vantagens para a Igreja e para o Estado.

Quiseram os católicos aproveitar-se do ambiente para trazer à Câmara uma proposta de lei visando uma das suas reivindicações fundamentais-a da personalidade jurídica da Igreja. E assim como os católicos dizem que seria êste o momento de admirável oportunidade para encarar êsse problema, dando a tranquilidade a tantos que se têm colocado em situação de resena, por entenderem que a República não os tem tratado como desejavam- eu, como republicano e numa função interpretativa do Estado republicano, digo que os católicos, trazendo esta questão nesta altura, talvez não tivessem prestado um bom serviço à Igreja.

Não deve porém, isto constituir qualquer elemento de restrição no intuito de os católicos não continuarem na sua acção.

Vamos então à questão do reconhecimento da personalidade jurídica da Igreja.

E porventura êste um ponto de vista novo trazido à discussão?

Não, Sr. Presidente.

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Um Govêrno, por sinal trabalhando em ditadura, o Govêrno de 1918, publicou um diploma consignando doutrina dentro da qual está expressamente estatuído o reconhecimento da personalidade jurídica da Igreja.

Mas da Igreja representada por quem?

Pela sua comissão de sustentação do e alto.

Quere dizer, um Govêrno da República procurando interpretar as aspirações dos católicos, e, no desejo honesto, quero crer, de intervir para uma acalmia geral de paixões, publicou êste diploma que mereceu da parte de muitos republicanos uma revisão tremenda, tam grande ou tam pequena que, volvidos cinco anos da sua publicação, dentro do campo parlamentar, uma figura então marcante dentro do partido republicano, e hoje marcante mas fora dêsse partido, o Sr. José Domingues dos Santos, era contra êsse projecto, comprometendo-se S. Exa. logo que as circunstâncias políticas o permitissem, fazer voltar em matéria de separação, ao decreto de 1911.

No emtanto, as circunstancias políticas não permitiram S. Exa. levar a bom termo o seu ponto de vista.

O Sr. José Domingues dos Santos (interrompendo): - Cheguei a apresentar o meu projecto, mas o que não consegui foi obter maioria.

O Orador: - Não há dúvida, tenho conhecimento dessa posição marcada por V. Exa. mas, também não ignoro, apesar de nessa ocasião não ser parlamentar, que V. Exa. teve de constituir um Govêrno, colocando-o em tais condições que não podia como Presidente do Ministério vir pugnar dentro do Parlamento pelo seu projecto de lei.

O Sr. Álvaro de Castro (interrompendo): - S. Exa. o Sr. José Domingues dos Santos, quando Ministro da Justiça, apresentou o projecto a que V. Exa. está fazendo referência, S. Exa. referiu-se a êsse facto, dizendo que o Conselho de Ministros não o tinha aceitado como obra do Governo e apresentou-o pessoalmente.

O Orador: - Não ignoro que o Sr. José Domingues dos Santos como Ministro trouxe à Câmara um projecto traduzindo o seu ponto de vista, e como político dentro do seu partido, vinha pugnando em matéria de separação pelo regresso à forma do decreto de 1911.

Sr. Presidente: como ia dizendo. S. Exa., em seguida teve de organizar Ministério dentro de urna forma política que lhe não permitia pugnar pela aprovação dêsse projecto de lei.

Talvez porque nesse momento outros assuntos mais importantes tivessem chamado a sua atenção.

O que é certo é que da parte de uma corrente forte da opinião republicana surgiu a animação de que a doutrina de 1918, sendo como era inconstitucional, visto ter sido feita em ditadura, devia ser abolida da nossa legislação, para se regressar à forma anterior, ou seja à forma de 1911.

O diploma de 1918 reconhecia personalidade jurídica, e a proposta de lei agora em discussão vai mais além.

É a política do Centro Católico que diz que essa personalidade jurídica deve ser atribuída à Igreja na pessoa do padre, etc.

Os católicos não aceitaram o regime de 1911, porque diziam que à sombra dele era possível a invasão de elementos não católicos, ao passo que a legislação de 1918 era feita de maneira que os católicos tinham a certeza de que as suas co-missõos só podiam ser constituídas por quem de direito, tendo o seu lugar marcado o próprio, padre.

E preguntamos nós: por que razão é que se os católicos tinham na nossa legislação um diploma que lhes concedia garantias tam largas em capacidade jurídica, não se aproveitaram dele?

Confesso que era fácil e ao mesmo tempo muito interessante fazer a história das razões que levaram os católicos a proceder desta forma.

Mas como isso não interessa ao estudo, eu ponho-as de parte para quando tiver de entrar no debate sôbre a matéria.

Mas eu devo dizer que neste momento desenham-se, dentro dos católicos, duas políticas: uma que dá a todos os fieis a faculdade de aceitarem a doutrina; outra, a dos padres, que não querem, dentro de cada aldeia, a valorização de elementos estranhos à sua pessoa.

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Dentro de cada uma destas aspirações dos católicos está uma aspiração política.

O Sr. Alberto Dínis da Fonseca: - Não apoiado!

O Orador: - Nós, republicanos, que temos dado aos representantes do Centro Católico, em tratamento, o melhor da nossa consideração e do nosso respeito, também devemos ter um direito igual àquele que têm os católicos, que é o de, à sombra dos nossos princípios, estudarmos os nossos deveres; nós, republicanos, à sombra dos princípios, temos de nos escudar.

O Sr. Alberto Dinis da Fonseca: - Nesse ponto, a nossa política é a de dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.

O Orador: - A República não pode dar a César o que é de César, porque a César já deu talvez mais do que aquilo que lhe era devido.

Ao Estado republicano é legítimo fazer a sua política, isto é, fazer um apelo aos católicos para que. de momento, não venham embaraçar a vida política com mais um factor para embaraços.

Creiam os católicos que, trazendo uma questão deitas e neste momento em que há, de fato, pessoas sinceramente desejosas de darem à Igreja o que ela merece, apresentam uma questão de uma gravidade enorme. Nós, republicanos, se formos dar mão à Igreja, não devemos esquecer que vamos levantar conflitos dentro da própria família republicana.

O Sr. Alberto Dinis da Fonseca: - Pelo contrário.

O Orador: - Não podemos tapar os olhos à realidade.

Bem sei que de todos os pontos do País têm chegado à Câmara dos Deputados telegramas solicitando a aprovação dêste projecto do lei, e também sei como essas cousas obedecem a um nobre e alto impulso, mas estou intimamente convencido de que a maioria das pessoas, a maioria mesmo das entidades que subscrevem êsses telegramas, pedindo a aprovação do projecto de lei que reconhece personalidade jurídica à Igreja, se tivesse sido devidamente informada por quem de direito, dentro do corpo católico, talvez que nesta hora o não quisesse.

O Sr. Dinis da Fonseca (interrompendo): - Faziam mais favor ao Estado reconhecendo o direito que nós temos, do que a nós próprios.

O Orador: - Sr. Presidente: quero terminar estas considerações de ordem gera fazendo um apelo aos católicos, para que olhem bem de frente a realidade das cousas.

Eu afirmo a V. Exas. o meu desejo em ver esta questão liquidada, e quanto a mim, penso que a primeira obra que os católicos têm a lazer é instituir "agremiações do culto" que já têm um diploma que as regula.

Feito êste apelo aos representantes dos católicos que têm assento no Parlamento - com os quais mantenho as melhores relações pessoais e de quem tenho recebido grandes" provas de deferência - devo dizer que a questão prévia posta pela comissão de finanças não tem razão de ser.

E não tem razão de ser porque, em consequência até da própria questão por mim formulada, resulta isto: se já existe um diploma reconhecendo personalidade jurídica à Igreja, â sombra de cujas normas a Igreja, pode adquirir os bens que quiser, não se pode considerar êste projecto abrangido pela lei travão.

Sendo assim, entendo que a Câmara tem de prosseguir, respeitando a sua deliberação, no estudo da proposta, e convencido estou de que os católicos, apreciando muito o ambiente que existe em todos os arraiais da República no sentido de lhes satisfazer as suas reivindicações, se comportariam nos termos que eu aconselho.

Lembro que se êste ambiente de concórdia existe hoje - oxalá êle por muito tempo se verifique - não é porque os republicanos, pelo menos aqueles que estudam as questões, não devessem ter muito sérias apreensões a respeito das relações entre o Estado e a Igreja.

Refiro-me ao assunto que está em ordem do dia, não da Câmara, mas na ordem do dia dos problemas da nacionali-

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dade: refiro-me ao problema do Padroado do Oriente.

Não sei o que se passa nas chancelarias, e mesmo que o soubesse talvez não estivesse autorizado a fazer considerações importunas: no emtanto tenho a impressão de que neste momento factores poderosos de valimento actuam junto da outra parte contratante, que não Portugal, no sentido de levar essa parte contratante a procedimentos tocando fundamentalmente o prestígio da Nação Portuguesa.

Suponhamos, por hipótese, que a outra parte contratante toma uma atitude que representa um naufrágio para os interêsses nacionais, e eu pregunto se não é legítimo o Estado defender-se.

Sr. Presidente: porque conheço das intenções de muitas das figuras marcantes do meio católico português - refiro me ao da política e até da. própria Igreja - estou convencido de que dentro da sua esfera de acção não deixarão de trabalhar, e neste momento mais do que em nenhum outro, no sentido de levar a Santa Sé ao convencimento do que em homenagem aos próprios interêsses da Igreja tem de tratar Portugal com o respeito devido aos seus interêsses.

O Sr. Dinis da Fonseca (interrompendo): - Mas, se em Portugal se lhes negam direitos que lhes são reconhecidos em todos os Países civilizados, não se argumente com a atitude dei Santa Sé em relação a Portugal, e deixemos o problema do Padroado, que é um reflexo do mau tratamento que o Estado dá à Igreja Católica.

O Orador (continuando): - A Igreja Católica tem neste momento o ambiento que lhe permite realizar inteiramente a sua função, e encontra para um certo número de pequeninas questões a solução legítima ; e da parte dos Poderes Públicos estou e isto de que os católicos encontrarão de futuro a menina boa vontade iniciada nos últimos anos.

Foi um êrro trazer esta questão neste momento.

Esta questão, longe de pacificar, pode acender as paixões e ser inconveniente até mais para a própria Igreja do que para o Estado Republicano.

O Sr. Lino Neto (em àparte): - Precisamente neste momento há por êsse País fora freguesias onde as autoridades perseguem os católicos, impedindo-os de exercer o culto externo.

Nós queremos a paz, mas a paz com a nossa submissão a atropelos como êste, não a queremos!

As reclamações dos católicos são reclamações de direitos comuns.

E a verdade é que em várias partes do País os católicos estão sendo perseguidos.

O Sr. José Domingues dos Santos: - Os católicos estão gozando de mais regalias do que no tempo da Monarquia!

O Sr. Lino Neto: - Não faça V. Exa. confrontos!

Não se trata aqui de Monarquia ou República.

Sou católico e sou português, e os católicos têm direitos como V. Exa.

O Sr. José Domingues dos Santos: - Mas êles querem mais direitos do que eu tenho.

O Sr. Lino Neto: - Os católicos querem apenas os seus direitos.

Trocam-se àpartes entre vários Srs. Deputados, que não foram entendidos.

O Orador: - Sr. Presidente: vejo que o debate se vai animando, e felizmente que eu estou na situação de analista.

As minhas palavras não têm nenhum sentido reservado.

Quando digo que tenho respeito pelos católicos, é porque o tenho na verdade.

Quando digo que é necessário que se dê aos católicos alguma cousa do muito que pedem, digo a verdade.

Mas também a digo, quando afirmo que seria melhor que os católicos, em vez de andarem a solicitar por assinaturas e telegramas...

O Sr Lino Neto (interrompendo): - Nós não andamos a solicitar...

O Orador: - Perdão!

Há freguesias onde andaram os chamados leaders locais a pedir assinaturas e a mandar telegramas. Qualquer que seja

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a atitude do Estado republicano, o único caminho que os católicos têm a seguir é fazer saber à Santa Sé que, acima, muito acima de qualquer pequeno capricho de represália, há a conveniência, a altíssima conveniência para o País, no qual estão integrados os interêsses de uma população católica avultadíssima, de neste momento a Santa Sé ter por êstes direitos todo o respeito.

O Sr. Lino Neto (interrompendo): - E para dizer a V. Exa. que a Santa Sé não faz represália nenhuma.

Relativamente à intervenção dos católicos nas obras de interêsse para o País, êles estão aqui com tanto patriotismo, pelo menos, como todos os outros parlamentares que se encontram na Câmara.

Creia V. Exa. que os sentimentos católicos são compatíveis com os sentimentos da Pátria, e até se avigoram e fortalecem no sentido de que Portugal mantenha sempre o prestígio da sua história.

O Orador: - Isto não foi para forçar o Sr. Lino Neto a fazer estas considerações, mas foi porque o Sr. Dinis da Fonseca dissera que esta atitude da Santa Sé podia até certo ponto ser justificada.

Referiu-se também S. Exa. a graves atropelos cometidos a respeito das disposições legais em vigor.

O Sr. Lino Neto (interrompendo): - Há párocos, por exemplo, que, estando separados da Igreja católica, por virtude de factos supervenientes da sua vida, se encontram à frente de igrejas que são edifícios do Estado, e aí mantidos pelas autoridades administrativas contra a reclamação dos católicos.

Esta situação é legítima, é natural, é digna para qualquer pessoa que tenha uma sombra de consciência?

É precisamente para remediar casos como êste que se apresentou êste projecto de lei.

O Sr. Daniel Rodrigues (interrompendo): - A culpa é dos crentes; não é das autoridades, porque êles é que fazem essas imposições.

O Sr. Lino Neto: - A culpa não é dos crentes, é dos republicanos, que não sabem fazer republicanismo, e é por isso que o País ainda está cheio destas anomalias.

O Orador: - O decreto de 1918 marcou uma política, aquela que foi reputada de momento como a mais conveniente dêste somatório de interêsses da Igreja e do Estado. Êsse decreto deu à Igreja certas regalias, mas a Igreja até hoje não quis aproveitar-se dessas vantagens; integrando-se dentro da política dêsse decreto, ela não quis usufruir de todos os benefícios que se continham nesse decreto, e vem agora pedir a personalidade jurídica representada na Igreja.

O Sr. Daniel Rodrigues (interrompendo): - O projecto dos Srs. Deputados católicos não pede a personalidade jurídica para a Igreja; o que pede é â entrega dos bens aos titulares da Igreja.

O Orador: - O projecto em questão visa a deslocar a personalidade jurídica já legitimamente reconhecida.

Sr. Presidente: eu, como representante do Estado Republicano, e desejoso de contribuir para a cimentação de paz e concórdia entre êstes dois Poderes, entendo que os católicos, integrando-se dentro da política do decreto de 1918, prestavam um grande serviço a ambas as partes.

O Sr. Dinis da Fonseca (interrompendo): - Mas V. Exa. sabe que há párocos com presbitérios que lhes têm sido tirados.

Quere dizer, a lei do inquilinato não permite que se ponham inquilinos na rua, e o Estado nem ao menos quere dar essa regalia aos párocos.

O Orador: - Nós estamos todos animados de tratar duma questão que interessa a todos, e não de pequenas hipóteses.

O Sr. Dinis da Fonseca (interrompendo): - Isto não são questões pequenas; têm-se dado em todo o País.

O Orador: - Eu estou na intenção de proceder de harmonia com a minha lógica, e a minha lógica não é filha de paixões, mas filha das razões que apresento ou que outros apresentam.

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Ora, Sr. Presidente, se os católicos me justificarem as razões que os levaram a não aceitar as disposições do decreto de 1918 talvez esteja de acordo com êles; no emtanto as razões que saltam à minha inteligência não são para justificar, desejando apreciar com justiça por que razão não se integraram no decreto de 1918.

O Sr. Joaquim Dinis da Fonseca (interrompendo): - Quem manda não ê o Sr. Ministro da Justiça. Quem manda é uma personalidade anónima que está representada na comissão da Lei da Separação, que interpreta o decreto de 1918 como quere e como entende, além do referido decreto estar alterado por portarias abusivas.

Como quere, pois, V. Exa. que a Igreja aceitasse uma cousa, que o Estado começasse por não aceitar?

O Orador: - Não me consta que as figuras marcantes da Igreja tenham incitado os fiéis a constituir essas comissões.

O Sr. Joaquim Dinis da Fonseca (interrompendo): - Em quási todo o Alentejo essas comissões estão constituídas.

O Orador: - Sr. Presidente: vamos a ser leais. A Igreja, credo político, é absolutamente indiferente que a personalidade seja reconhecida na comissão de sustentação do culto no pároco ou em qualquer outra.

O Sr. Lino Neto (em àparte): - Mas à Igreja não é isso indiferente.

O Orador: - Sr. Presidente: assim não chegamos ao fim. O próprio decreto de 1918 respeita a hierarquia da Igreja, e tanto assim que o próprio pároco pode fazer parte da comissão de sustentação do culto, servindo de presidente.

Sr. Presidente: a respeito das considerações e da propaganda que tem sido feita pelo admirável órgão jornalístico As Novidades, que eu leio sempre com o maior prazer, dada a forma como se comporta nos assuntos de interêsse nacional que ventila, levantou-se nos arraiais católicos uma certa celeuma que, se é certo não motivou uma scisão, originou certas dificuldades para a Igreja.

A atitude marcada pelo centro católico, para mim, como republicano, foi muito de agradar. Disseram: os senhores têm o direito de ter uma política que convenha aos interêsses da Igreja, e aqueles que não quiserem, por justos melindres, fazer a defesa dessa política, têm o direito complementar, que é o de não terem política nenhuma.

Eu olhei para êste programa com muito respeito, e acho que foi formidável. No emtanto, não ignoro que há muitos católicos que não aceitaram as resoluções do centro católico, e continuam a fazer a apologia desta política. Peguem no estandarte da Igreja, e coloquem-no no nosso campo, o monárquico, porque êle serve melhor os interêsses da Igreja.

O Sr. Alberto Dinis da Fonseca (interrompendo): - A resistência que os católicos encontram da parte dos republicanos é que dá azo a isso. Porque dizem: Dos republicanos não há nada a esperar.

O Orador: - Mas que recuso eu aos católicos?

Porque não fazem a sua regulamentação, de harmonia com a legislação vigente?

O Sr. Lino Neto (interrompendo): - A primeira a fazer, é meter na ordem a comissão da Lei da Separação.

O Orador: - Conheço em Lisboa uma pessoa notavelmente eminente nos meios intelectuais, que é um distinto profissional da medicina, e cujo nome não vem para o caso.

Há tempos, conversando com S. Exa., disse-me êle, num momento em que a vida pública portuguesa estava seriamente ameaçada, que essa era uma excelente ocasião para encararmos o problema religioso.

Pois eu agora, ao contrário de S. Exa. direi que o momento actual é esplêndido para se não tratar dêsse assunto.

Apoiados.

Tenho dito.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

Os àpartes não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

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Sessão de 10 de Abril de 1926 35

O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: O Sr. Manuel José da Silva pôs a questão com o brilho que o caracteriza, e tratou principalmente da questão prévia que forma a base desta discussão. Mas, como eu não desejo cansar a Câmara com questões que se não prendam com esta, vou referir-me unicamente ao parecer da comissão de finanças.

Eu, há pouco, aceitei a confissão útil do Sr. Daniel Rodrigues, para êste ponto de vista. S. Exa. confessou que as cultuais já tinham personalidade jurídica pela Lei da Separação, que diz num dos seus artigos o seguinte:

Leu.

Se a Igreja tem personalidade jurídica, tem também todas as faculdades de aquisição.

E, assim, não obstante a consideração que tenho pelo Sr. Daniel Rodrigues, eu estou absolutamente divergente com a opinião de S. Exa. sôbre êste ponto.

O Sr. Moura Pinto (interrompendo): - Na minha lei eu fugi a dar-lhe qualquer nome; deixei que êle lhe fôsse dado pelos interessados.

O Orador: - Perfeitamente. Mas, Sr. Presidente, passando à segunda parte, vemos o seguinte do parecer da comissão de finanças.

Leu.

O Sr. Moura Pinto diz também, sôbre êste mesmo assunto, o seguinte, na sua lei:

Leu.

V. Exas. verificam, portanto, que não tem razão de ser nem a primeira premissa, nem a conclusão a que chegou o Sr. Daniel Rodrigues.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Moura Pinto: - Sr. Presidente : não tomarei muito tempo à Câmara. Devo dizer com relação à questão prévia que a acho um mero incidente que, para mim, não tem importância de maior. Para falar com franqueza, direi que estou mesmo convencido de que a questão prévia não foi senão um compasso de espera destinado a permitir que não só os católicos, como todo o resto da Câmara, pudessem estudar devidamente a questão, não se tomando deliberações precipitadas, que não servissem- já não digo a causa dos católicos ou qualquer entra em particular - mas a causa bem importante da tranquilidade pública.

Repito, Sr. Presidente, que a questão prévia foi, como digo, um mero incidente; não tenho pela questão prévia a menor preocupação. Com efeito, não nos convinha enxertar nas complicadas questões nacionais que presentemente preocupam a opinião pública, uma questão religiosa sempre grave.

A Câmara, a meu ver, não pode, mesmo em face dos textos legais, dar um voto favorável à questão prévia. A questão prévia afirma que a circunstância de se conceder capacidade ou personalidade jurídica a qualquer confissão religiosa traria deminuição de receitas no Orçamento Greral do Estado. Confesso que o argumento deve ter dado que fazer. Êle é na verdade gracioso. Isto de considerar que pelo facto de alguém, no pleno gozo de um direito, o exercer, pode resultar uma deminuição de receita para o Estado, é ir muito longe. Vale a pena considerar se da circunstância de o nosso Código Civil estabelecer a maioridade aos 21 anos completos, não origina também uma deminuição de receitas, para o Estado, e se será melhor transferir essa idade para os 60 anos e avaliar se isso pode dar ao Estado qualquer espécie de vantagens.

Não entendo, repito, o argumento; êle não tem nenhuma razão de existir, a não ser que êle seja da natureza daquele que era usado por um homem que foi um grande estadista, e que se referia à questão das azeitonas. A personalidade jurídica, à cata da qual os católicos andam com toda a fé, interêsse e fervor de crentes que desejam garantias para o exercício da sua crença, já existia na lei. Não existirá como os católicos a desejam, mas existe como é possível, em face das circunstâncias actuais da vida portuguesa e em condições de dar garantias a quem sinceramente queira exercer a sua crença católica. O mesmo se dá para as crenças de qualquer natureza, porque a lei não faz distinção entre os cultos.

Essa personalidade existe, repito; e,

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sendo assim, julgo não ser descabido o dizer à Câmara quais as razões que me orientaram quando elaborei êste artigo. Tenho apenas o receio de ser fastidioso...

Vozes: - Fale! Fale!

Eu pensei - fazendo então parte dum agrupamento político que tinha nesta questão as suas ideas assentes em relação ao meio político e ao meio religioso do País -que devia marcar uma atitude em face da igreja católica, porque todos nós sabemos que a maioria dos cidadãos portugueses é católica, e eu entendi que não tinha o direito de influir na vida e na organização duma crença religiosa com uma larga tradição, com uma vida própria, com uma hierarquia própria.

O Sr. Afonso Costa, estadista a cajá inteligência eu rendo o meu preito, teve, ao fazer a sua lei de separação, a preocupação, aliás defensável por todos os que viram a questão pelo mesmo aspecto de S. Exa.. de influir consideràvelmente em nome do Estado na igreja católica, em rendições do acelerar uma evolução, por estar convencido de que a tendência em Portugal seria para a organização de uma igreja privativa portuguesa.

Efectivamente, lendo a sua lei com cuidado, encontram-se-lhe disposições fundamentais que tinham mais ou menos em vista auxiliar a criação de uma igreja lusitana.

É um ponto de vista defensável pelos que tiveram uma certa maneira de ver em face das cousas nacionais; mas eu nunca o perfilhei nem o perfilharei.

Entendi que a religião é um fenómeno de consciência respeitável e sagrado, que me devia ser inteiramente estranho emquanto não viesse chocar-se com a tranquilidade da vida dos cidadãos ou da vida do Estado.

Eu não quis de forma nenhuma que no decreto que elaborei ficasse tosse o que fôsse que pudesse prejudicar até certo ponto esta minha maneira de ver sôbre o assunto.

Aqui tem portanto V. Exa. dois critérios diferentes.

Um critério intervencionista e um critério absolutamente estranho a qualquer intervenção.

Eu. Sr. Presidente, devo dizer em abono da verdade que ao elaborar o meu decreto tive em vista meter-me dentro da Constituição, isto é, centro do espírito da Constituição Política da República Portuguesa, pois o meu único desejo é que o Estado, relativamente a matéria religiosa, seja inteiramente neutro.

Foi êste, repito, o meu único ponto de vista ao elaborar o decreto.

Não concordo com a opinião dos católicos, desejando regressar ao direito comam, pois a verdade é que isso não traz vantagens nenhumas, nem para os católicos nem para o Estado, tanto mais quanto é certo que a igreja católica em Portugal tem uma situação especial.

Portanto o meu decreto pretende o mais possível considerar exactamente direitos comuns, sem ofensa nem perigo para o Estado e para o legítimo exercício das liberdades religiosas.

Assim entendo que os católicos não podem dentro do direito comum fazer exercer o seu direito de reunião, porque o fazemos considerar exclusivamente delimitado ou regulado pela disposição que em Portugal rege o direito de reunião.

Não; nós sabemos que a vida religiosa é. por assim dizer, uma continuidade que convém ser exactamente um agregado de fins e de conjunto, e seria mau da parte do Estado fazer permanecer a idea do só licitar licença para reuniões.

O seu direito de exercício está, exactamente, nas mesmas circunstâncias. Se assim é, não podia exigir deles, nem tinha sequer o direito de o fazer, desde que se não tratasse de exercício de natureza congreganista, todas as cautelas, todos os cuidados e garantias que são exigidos a tantas outras actividades para que possam exercer e reunir em conjunto.

Sr. Presidente: sabia também que não era legítima a continuação de praticar a monstruosidade sem nome de permitir direitos ou forçar organismos de natureza religiosa a interpor direitos desde que homens sem pudor e sem nenhuma espécie de vergonha, e em obediência a um estreito sectarismo ou intuitos políticos, pretendam especular com os direitos dos outros.

Em tais condições, era indispensável garantir aos católicos que só êles, em determinadas circunstâncias, o podiam fazer.

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Sabia também que não são propriamente os católicos que têm de definir quem tem a sua crença religiosa.

Educados como fomos, quási todos nós, nos preceitos dessa religião, não nos fica bem, qualquer que tenha sido a evolução do nosso espírito, qualquer que seja o estado de consciência a que chegámos, não nos fica bem empecer os fenómenos que se traduzem no País que se governa, o que até a um estadista livre pensador ficaria mal.

Eu sabia que só determinadas entidades da Igreja podem definir quem seja ou não católico, visto as hierarquias estabelecidas; e se na minha lei eu não fiz logo o reconhecimento expresso dessas hierarquias, foi porque tive uma razão de Estado para o não fazer. Então ainda não existia junto de Roma uma legação nossa. Apenas existiam conversas que, devo declarar, já de longe vinham, para o seu estabelecimento, e eu entendi que era do meu dever sacrificar o que pensava aos meus deveres de homem público, que nem sempre tem o direito de exprimir por leis, decretos ou portarias aquilo que pensa, porque tem de ser intérprete das conveniências do seu país. Por isso, Sr. Presidente, fui cauteloso na redacção do relatório que precede a lei, dizendo:

Leu.

Porque tinha em vista satisfazer todos os requisitos essenciais a uma modificação justa e nobre da Lei da Separação da Igreja do Estado, eu disse:

Leu.

Sr. Presidente: fugi também cautelosamente no artigo a declarar que o organismo que se pretendia formar era destinado a dirigir o culto, porque seria teimosia ou loucura pretender que a Igreja aceitasse em Portugal aquilo que não tinha aceitado em França nem em outros países, e que eu sabia representar qualquer cousa como a execução dos seus princípios fundamentais.

Para quê, Sr. Presidente, inscrever na lei inúteis palavras?

Para quê, por fôrça de um partido ou de um homem, pretender que outro homem, partido ou qualquer seita religiosa aceite aquilo que é absolutamente inaceitável e contrário aos princípios fundamentais que orientam êsse organismo?!

Para quê?

Eu sabia que a Igreja, dentro da sua hierarquia, entende que ela se exerce do grau mais elevado ao grau menor, desde o Papa, ao cardeal, ao arcebispo, ao bispo, ao padre. Para quê, pois, estabelecer que homens que não tinham essa qualidade, haviam de ser os dirigentes do culto?

Por êstes motivos escrevi cautelosamente que estas corporações teriam a seu cargo a sustentação do culto católico.

Também neste artigo eu referi que essa obrigação seria feita na área de cada freguesia.

Para êste ponto preciso de chamar muito a atenção da Câmara, nomeadamente a dos meus ilustres colegas católicos, para que se veja que não foi debalde que escrevi estas palavras. E que a personalidade, tal como eu entendia que devia dar-se, não era à Igreja, funcionando propriamente em Roma, com as suas aspirações e manifestações de associação em terra portuguesa. Não era êsse o meu pensamento. O que eu pensava é que a Igreja constitui uma célula, que necessita de ter as suas regalias para exercer a sua actividade.

A Igreja agrega em torno de si os fiéis, constituindo assim um só corpo. Mas essa personalidade, permita-me a Câmara, melhor se lhe poderia chamar personalidade diplomática.

Aquela personalidade que eu quero para todos os cidadãos portuguesas para exercerem as suas crenças; mas essas prerrogativas devem ser dadas aos cidadãos e não a qualquer entidade.

A situação é de melindre, porque existindo uma Igreja que tem a sua sede em Roma, e funcionando junto de nós uma representação dessa Igreja, há uma série de circunstâncias que devemos atender.

Eu não desejo que ninguém estranho a Portugal tenha de intervir na protecção aos cidadãos do meu País.

E necessário que a situação de direito criada aos católicos tenha a protecção que merece e os seus direitos sejam reconhecidos pelo Estado.

Quando eu no decreto determino que as igrejas se organizem por freguesias, socorro-me da tradição.

O português, por via de regra, não conhece outra cousa que não seja a sua freguesia; vê a igreja da sua terra acima de

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todas e como não encontrava nada na doutrina religiosa que se opusesse a isso, eu quis marcar as garantias do exercício religioso.

Foi esta doutrina que eu fixei e que é compatível com as leis do País.

Sr. Presidente: o artigo ficou, não digo generoso, mas justo.

Agora as leis são sempre duras na sua aplicação, mas ninguém pode dizer que ím excessivo.

A lei não foi tam odienta como dizem; a forma como foi posta em prática é que foi agressiva e grosseira, em termos absolutamente intoleráveis.

Os católicos não se podem queixar da lei.

Aqueles que isso têm propalado não mostram mais que um espirito sectarista, e assim o demonstram as reclamações que apresentam.

Eu não venho fazer afirmações que assim não sejam, e que não sejam de todos conhecidas.

Mas eu entendo que uma corporação destinada a sustentar o culto, desde que não tenha junto de si o seu pastor de almas ou o seu Ministro, será uma fantasia, ou então um organismo odioso e conflituoso, porque o padre terá em pouca conta aquelas ovelhas que pretendam imiscuir-se nas suas funções.

E, para que tais complicações se não dessem, logo a seguir ao § 2.°, o decreto afirma que podem fazer parte dêsses organismos os Ministros da religião.

E assim julgo ter contribuído com uma forma que me parece original - porque não me consta que ela exista em qualquer outra parte - e que estava dentro da tradição e do sentimento religioso do País, para a constituição de um organismo ao qual não receei atribuir a capacidade jurídica.

E é por isso que o § 1.° expressamente afirma que tal organização fica com essa capacidade.

Mas essa capacidade jurídica expressa no § 1.° precisa, porventura, de ser regulada, não só no interêsse do Estado, como no da própria Igreja Católica.

O decreto era, propriamente, num conjunto de me lidas de ocasião, as que mais oportunas me pareceram para obter uma certa pacificação.

Ressente-se, sem dúvida, da precipitação do momento em que foram elaboradas, e, especialmente daquele melindre que era necessário pôr na sua execução, tanto mais que eu não sou uma pessoa demasiadamente audaciosa, e não estou também convencido de que tenha na mão os elixires com que possa dar remédio a certos males que afligem o País.

Mantendo, pois, êste estado de serenidade de apreciação dos meus actos, eu devo afirmar a V. Exas. que não tenho a impressão de que tivesse feito uma obra intangível e perfeita.

A regulamentação desta capacidade jurídica, julgo-a, portanto, necessária; mas não julgo que seja possível, neste momento, atribuir à Igreja Católica maior capacidade jurídica do que aquela que aqui lhe está consignada.

O que eu pretendi, e isso já decerto os meus ilustres colegas Deputados católicos entenderam, foi fazer uma íntima ligação entre os católicos e o seu pastor, entre o padre e os fiéis, de nenhuma maneira querendo colocar os fiéis na dependência espiritual do seu pastor, e não querendo também de maneira alguma, em relação a uma capacidade jurídica e temporal, que o padre ficasse em condições de poder de alguma maneira oprimir ou deminuir aquela livre e nobre expansão religiosa, que os fiéis tivessem de ter em harmonia com os preceitos da sua crença.

E, Sr. Presidente, se eu não queria católicos que constituíssem o espinho de todos os momentos, a agressão permanente do pastor, também não podia querer que o pastor tivesse na sua mão cajado com que pudesse zurzir ovelhas. Não. O pensamento da minha lei era essa justa harmonia entre os católicos de um lado e entre os pastores do outro lado. Isão há nada na lei que impeça essa harmonia, essa obediência do católico ao pastor e êsse sentimento que o pastor deve ter de que é padre português em relação a católicos portugueses.

Sr. Presidente: a capacidade jurídica já se não pode considerar dentro daquela situação especial em que se considera a crença como um fenómeno de consciência. Não. A capacidade jurídica é já um direito ou uma soma de direitos garantidos na nossa legislação para aqueles que realizam um certo número de actos ou chegaram a uma certa altura da sua evolu-

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ção. Ora em relação à capacidade jurídica, eu quero-a exercida de comum acordo entre dirigentes espirituais e os católicos.

Em relação à crença no que ela tem de doutrina, de princípio superior espiritual, eu entendo que ela deve ficar sendo pertença do pastor, do dirigente espiritual. Assim nem há conflitos por parte dos católicos, por motivos de natureza espiritual com o seu pastor que êle não tenha por si o direito de dirimir sozinho, nem há também um conflito temporal entre os dirigentes religiosos e entre aqueles que constituem os fiéis a dirigir.

Mas afastei-me, e era isso que eu não queria, do ponto restrito que eu tinha a considerar. É que desde que uma lei dá a alguém uma determinada capacidade jurídica, é de todo o ponto infantil, é de todo o ponto risível levantar na Câmara uma questão prévia entre se a capacidade jurídica em tais circunstâncias é motivo para deminuir ou não a receita orçamental.

Existe a capacidade jurídica?

Não existe a capacidade jurídica em relação à matéria contida no projacto de lei do Sr. Lino Neto? Não existe a capacidade jurídica em relação à matéria contida no projecto de lei da comissão? Isso não importa. O que eu quero é que fique bem afirmado que os católicos, desde que satisfaçam determinados requisitos, têm essa capacidade jurídica. E é absolutamente absurdo e insustentável vir para uma Câmara dizer que essa capacidade jurídica diminui, de alguma forma, a receita orçamental.

Nunca os direitos que são legítimos deixam de se conceder com argumentos dessa espécie.

Quanto à segunda parte, no que diz respeito à concessão de templos e alfaias religiosas, é uma redundância do projecto de lei do Sr. Lino Neto o pretender obter qualquer cousa que já existe na lei, como ainda há pouco afirmaram à Câmara os meus ilustres colegas Srs. Manuel José da Silva e Pinto Barriga.

De forma que a questão prévia não poderá ser considerada senão como uma questão irritante, se a Câmara de alguma forma lhe dêsse o seu voto. E digo mais: o votar esta questão prévia, como meio de impedir que o problema tenha a sua natural e lógica solução, pretender com a questão prévia lançar uma pedra sôbre aquilo que tem de ser a natural aspiração dos católicos, seria uma empresa vã e irrisória, que não há o direito de, nesta hora, trazer para o tablado do Parlamento e da opinião pública.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, guando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã com a Seguinte ordem de trabalhos:

De tarde:

Negócio urgente do Sr. Cunha Leal, sôbre o actual funcionamento das fábricas de tabacos.

Parecer n.° 133, que regula o novo regime de fabrico e venda de tabacos.

A noite:

Parecer n.° 45-(h), orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações.

Parecer n.° 45-(l), orçamento do extinto Ministério do Trabalho.

Está encerrada a sessão.

Eram 0 horas e 30 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Projectos de lei

Do Sr. Jaime Palma de Mira, concedendo isenção de franquia postal à correspondência entre a "Lutuosa dos Funcionários Administrativos" e os seus associados.

Para o "Diário do Governo".

Do Sr. Sant'Ana Marques, para que os indivíduos que tenham exercido por mais de dez anos os lugares de escrivães das execuções fiscais possam ser nomeados aspirantes de finanças, independentemente de concurso.

Para o "Diário do Governo".

Do Sr. Domingos António de Lara e mais cinco Srs. Deputados, autorizando o Govêrno a reorganizar os serviços policiais do distrito de Coimbra.

Aprovada a urgência.

Para a comissão de administração pública.

Para o "Diário do Governo".

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Pareceres

Da comissão de agricultura, sôbre o n.° 44-N, que manda proceder nos postos agrários da Bairrada e Dois Portos ao estudo especial da preparação dos vinhos elementares, a fim de aperfeiçoar o seu fabrico e fixar os melhores tipos regionais.

Para a comissão de comércio e indústria.

Da comissão de finanças, sôbre o n.° 5-B, que regola a distribuição das receitas obtidas por virtude das disposições da lei n.° 1:363, de 13 de Setembro de 1922, pelos estabelecimentos de ensino secundário.

Imprima-se.

Da comissão de finanças, sôbre o n.° 14-C, que determina que a cadeia de Chaves sirva de cadeia de depósito ou concentração de presos das comarcas circunvizinhas.

Imprima-se.

Requerimentos

A fim de atender à urgência do assunto, rogo-lhe se digne transmitir ao Sr. Ministro da Guerra o seguinte:

Consta que a repartição respectiva do Ministério da Guerra propõe a promoção de alguns sargentos, que não têm o curso da Escola Central de Sargentos, ao abrigo do disposto na lei n.° 1:856 e por errada interpretação dêste diploma.

De facto, a interpretação autêntica das leis pertence ao Congresso da República, no uso das suas atribuições constitucionais. O projecto de lei foi emendado no Senado, mas a Câmara dos Deputados não aceitou as modificações e o Congresso da República aceitou a orientação da Câmara dos Deputados.

Na sessão do Congresso afirmei, com o aplauso e rotação favorável dos Srs. Congressistas, que a Escola Central de Sargentos tinha uma importante função na cultura indispensável dos oficiais provenientes da classe dos sargentos e não se deram circunstâncias justificativas da dispensa daquele conveniente meio de selecção. O prestígio do exército impõe a frequência daquela Escola Central de Sargentos e havendo graduados, que fizeram o sacrifício material daquela frequência, não seria justo prejudicá-los, em proveito de outros, que não quiseram habilitar-se com aquela condição legal.

De resto, a interpretação do Poder Legislativo, a que o actual Sr. Ministro da Guerra assistiu, não oferece dúvidas. Só os sargentos com o curso da Escola Central de Sargentos podem ser promovidos. - Henrique Pires Monteiro.

Expeça-se por transcrição ao Sr. Ministro da Guerra.

Requisito, pelo arquivo do Ministério das Finanças, um exemplar dos relatórios dos Ministros das Finanças e propostas apresentadas ao Parlamento, designadamente depois de 1890, que pelo mesmo arquivo me possam ser fornecidos.

10 de Maio de 1926. - F. G. Velhinho Correia.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja fornecido com urgência:

a) Cópia da correspondência recebida e expedida e das ordens e determinações transmitidas quanto às avaliações de prédios urbanos no concelho de Viseu, desde 1920;

b) Nota das despesas pagas por tal serviço, com indicação de anos e de pessoas a que respeitem;

c) Teor das autorizações sancionando tais despesas e dos pedidos a tal respeito formulados.

Câmara dos Deputados, 10 de Maio de 1926. - José Marques Loureiro.

Expeça-se.

O REDACTOR - Sérgio de Castro.

33 - Imprensa Nacional - 1925-1926

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