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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

SESSÃO N.º 47

EM 29 DE AGOSTO DE 1915

Presidência do Exmo. Sr. António Xavier Correia Barreto

Secretários os Exmos. Srs.

Bernardo Pais de Almeida

José Pais de Vasconcelos Abranches

Sumário.—Chamada e abertura da sessão. Leitura e aprovação da acta. Dá-se conta do expediente.

Antes -da ordem do dia.— O Sr. Presidente do Ministério (José de Castro) faz considerações relativas à situação do país, em relação às subsistências e à ordem pública, apresentando uma proposta de lei 'de autorização ao Govêrno, idêntica à que foi aprovada pela Câmara dos Deputados.

É aprovada a urgência e dispensa do Regimento.

Usam da palavra os Srs. José Maria Pereira, Celestino de Almeida, Presidente do Ministério (José de Castro), Estêvão de Vasconcelos, Faustino da Fonseca.

Em seguida, foi aprovada a generalidade e a especialidade daquela proposta de lei, sendo dispensada a última redacção.

Os Srs. Sousa Fernandes, Arantes Pedroso e Fortunato da Fonseca mandam pareceres para a Mesa.

O Sr. Ministro do Fomento declara estar assegurada a aquisição de farinhas para a alimentação pública.

O Sr. José Maria Pereira faz considerações sôbre o projecto relativo aos cafés sujos.

O Sr. Arantes Pedroso faz uso da palavra sôbre p mesmo assunto.

É lida a última redacção do orçamento do Ministério da Guerra.

É lida a proposta de lei relativa aos cafés sujos, sendo aprovada na generalidade e especialidade, sem discussão, com dispensa da última redacção.

Ordem do dia.— Orçamento do Ministério do Fomento. Proposta de lei n.° 16-H.

Usam da palavra os Srs.: Pais Abranches, que apresenta moção; Celestino de Almeida; Herculano Galhardo; Pina Lopes, que apresenta moção; e Ministro do Fomento.

É rejeitada a moção do Sr. Pais Abranches.

O Sr. Pina Lopes pede para retirar a sua moção.

É autorizado.

É aprovada a proposta do orçamento na generalidade, assim como o aditamento proposto pela comissão. Êste aditamento é aprovado tambêm na especialidade.

Em seguida é lida uma proposta orçamental.

Usam da palavra os Srs. José Maria Pereira e Herculano Galhardo, que fica com a palavra reservada.

Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. António Maria Baptista faz considerações relativas a obras do Ministério da Guerra e operários sem trabalho, pedindo para êstes a fiscalização respectiva.

O Sr. Estêvão de Vasconcelos faz considerações relativas à moção do Sr. Pais Abranches.

O Sr. Presidente encerra a sessão.

Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

António Joaquim de Sousa Júnior.

António José Lourinho.

António Maria da Silva Barreto.

António Xavier Correia Barreto.

Augusto Casimiro Alves Monteiro.

Bernardo Pais de Almeida.

Celestino Germano Pais de Almeida.

Faustino da Fonseca.

Francisco de Pina Esteves Lopes.

Herculano Jorge Galhardo.

Joaquim José de Sousa Fernandes.

José António Arantes Pedroso.

José de Castro.

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2 Diário das Sessões do Senado

José Estêvão de Vasconcelos.

José Maria Pereira.

José Pais de Vasconcelos Abranches.

José Tomás da Fonseca.

Luís Filipe da Mata.

Luís Fortunato da Fonseca.

Manuel Soares de Melo e Simas.

Rodrigo Guerra Álvares Cabral.

Simão José.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

António Alves de Oliveira Júnior.

António Maria Baptista.

Caetano José de Sousa Madureira e Castro.

Daniel José Rodrigues.

Daniel Telo Simões Soares.

Porfírio Teixeira Rebelo.

Remígio António Gil Spínola Barreto.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

Agostinho José Fortes.

Alberto Carlos da Silveira.

Alfredo José Durão.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Amaro de Azevedo Gomes.

António José da Silva Gonçalves.

Augusto César de Vasconcelos Correia.

Augusto Cymbron Borges de Sousa.

Bernardo Nunes Garcia.

Carlos Richter.

Duarte Leite Pereira da Silva.

Elísio Pinto de Almeida e Castro.

Francisco Vicente Ramos.

Frederico António Ferreira de Simas.

Jerónimo de Matos Ribeiro dos Santos.

João Maria da Costa.

João Ortigão Peres.

Joaquim Leão Nogueira de Meireles.

Joaquim Pedro Martins.

José Afonso Baeta Neves.

José Eduardo de Calça e Pina de Câmara Manuel.

José Guilherme Pereira Barreiros.

José Lino Lourenço Serro.

José Machado de Serpa.

Júlio Ernesto de Lima Duque.

Leão Magno Azedo.

Luís António de Vasconcelos Dias.

Luis Inocêncio de Ramos Pereira.

Pedro de Amaral Bôto Machado.

Ricardo Pais Gomes.

Vasco Gonçalves Marques.

Pelas 14 horas e 40 minutos o Sr. Presidente mandou proceder à chamada.

Tendo-se verificado a, presença de 23 Srs. Senadores, S. Exa. e declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão anterior, foi aprovada sem reclamação.

Mencionou-se o seguinte

Expediente

Ofícios

Do Ministério das Finanças enviando 56 exemplares das folhas para vulgarização n.ºs 1-C, 7 e 8, publicadas pela Direcção Geral da Estatística.

Para o «Sumário».

Da Câmara Municipal de Aveiro, enviando uma representação sôbre a remodelação da Escola Industrial de Fernando Caldeira.

Para o «Sumário».

Exmo. Sr. Presidente do Senado. — Para conhecimento do Senado e devida notificação nos respectivos livros de registo da Secretaria do Congresso, tenho a honra, de fazer V. Exa. sciente de que a proposta de lei que para esta Câmara o Senado expediu, como iniciativa sua, em 27 de Junho de 1914, determinando que possam nomear-se cônsules de 3.ª classe, com dispensa de concurso, designados indivíduos, não carece de seguimento e deve arquivar-se, porquanto a substituiu um equivalente projecto de lei já votado em ambas as Câmaras, juntamente com o Orçamento (1915-1916) do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Saúde e Fraternidade.

Palácio do Congresso, em 29 de Agosto de 1915. — Vítor Hugo de Azevedo Coutinho, Presidente.

Para o «Sumário».

Representação

De um grupo de pais, tutores e professores dum numeroso grupo de alunos reprovados no exame de instrução primária, 2.° grau, pedindo que haja uma nova época de exames em Outubro.

Par a o «Sumário».

Última redacção

Foi lida e aprovada a última redacção do orçamento do Ministério da Guerra.

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Proposta de lei

Artigo 1.° Os alferes médicos e farmacêuticos actualmente em comissão nos quadros de saúde das colónias, nomeados quer por portaria ministerial quer por portaria provincial, ao abrigo do artigo 78.° da carta de lei de 28 de Maio de 1896, quando contem quatro anos de serviço efectivo, são promovidos a tenentes e dão definitivamente entrada nos respectivos quadros de saúde.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões do Senado, em 24 de Agosto de 1910. — O Senador, Agostinho Fortes.

Teve segunda leitura e foi enviada à comissão de guerra.

Pedido de documento

Requeiro que, pelo Ministério de Instrução Pública, Repartição do Ensino Industrial e Comercial, me seja enviado um exemplar do relatório da comissão que foi incumbida de estudar uma reforma do ensino industrial e comercial.

Senado, 28 de Agosto de 1910.— O Senador, António José Lourinho.

Para a Secretaria.

Pareceres

A comissão de marinha mandou para a Mesa o seu parecer sôbre a proposta de lei n.° 105, alterando as designações dos oficiais inferiores da armada.

Imprima-se e distribua-se.

Da comissão de administração pública sôbre o projecto de lei n.° 104, encorporando na freguesia de Vendas Novas designadas herdades pertencentes à freguesia de Cabrela, concelho de Montemor-o-Novo.

Imprima-se e distribua-se.

Da comissão de administração pública sôbre o projecto de lei n.° 98, abrindo no concelho de Pôrto de Mós um prazo para reclamações de matrizes prediais.

Imprima-se e distribua-se.

Da comissão de administração pública sôbre o projecto de lei n.° 80, autorizando a câmara municipal de Alcobaça á venda de baldios, para construção duma estrada.

Imprima-se e distribua-se.

Foi lida na Mesa a seguinte

Proposta de lei

Artigo 1.° São conferidos ao Poder Executivo as faculdades necessárias para, na actual conjuntura, e emquanto persistirem as circunstâncias que a motivam, garantir a ordem em todo o país e salvaguardar os interêsses nacionais ou ocorrer a quaisquer emergência extraordinárias, de caracter económico ou financeiro.

Art. 2.° O Poder Executivo dará conta ao Congresso, na sua primeira reunião do uso que tiver feito das faculdades concedidas no artigo anterior.

Art, 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Palácio do Congresso da República, em 29 de Agosto de 1915.— O Presidente, Vítor Hugo de Azevedo.— O Secretário, Baltasar de Almeida Teixeira.

Foi aprovado e dispensada a última redacção.

Ò Sr. Presidente do Ministério e Ministro da Marinha (José de Castro): — Sr. Presidente: eu escuso de dizer ao Senado a situação em que nos encontramos, sob o ponto de vista da ordem pública. Todos têm lido e todos sabem a exposição que fez o Sr. Ministro do Interior sôbre êste assunto, mas há outro mais importante, o das subsistências, que é dum certo modo mais agitado, em virtude duma declaração intempestiva e até criminosa, feita por parte dos moageiros e panificadores.

É urgente que o Senado dê ao Govêrno a mesma autorização que já deu a Câmara dos Deputados, para o efeito de estar munido de todas as faculdades necessárias para tomar as medidas que julgar convenientes neste momento verdadeiramente extraordinário que atravessamos, a fim de providenciar, por todas as formas, para o efeito de não se dar uma crise de fome.

O Sr. Ministro do Fomento já empregou todos os meios, para que á fome se não dê, e S. Exa., por sua parte, exporá ao Senado o seu procedimento, para o efeito de mostrar que o Govêrno tem todo o interesse em evitar que se dêem perturbações da ordem pública, na hipótese de ser

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dadeiro o que afirmam aqueles que fizeram o aviso intempestivo e criminoso.

Eu desejo que S. Exa. exponha ao Senado as medidas que já empregou, algumas de grande importância, para significar à Câmara que o Govêrno não tem deixado de pensar neste assunto.

Requeiro, pois, Sr. Presidente, que a proposta de lei apresentada tenha urgência e discussão imediata, e seja dispensado o Regimento, porque o Govêrno precisa desta lei para continuar no caminho começado.

Desejo que o Sr. Ministro do Fomento diga tambêm o que se tem feito, para se ver que o Govêrno não tem dormido.

O orador não reviu.

O Sr. Celestino de Almeida: — Por parte da maioria evolucionista, declaro que aprovo a urgência e dispensa do Regimento para a discussão imediata da proposta que

Foi lida na Mesa.

O Sr. José Maria Pereira: — Sr. Presidente: ouvi a declaração feita pelo Sr. Presidente do Ministério, acêrca da proposta apresentada nesta Câmara, pedindo autorização especial para o facto não só de manter a ordem pública, mas ainda devem serem conferidas faculdades especiais, dados os factos que se estão passando.

Em nome da minoria unionista, igualmente declaro que aprovo a urgência e dispensa do Regimento.

A proposta entrou em discussão.

O Sr. José Maria Pereira: — Sr. Presidente: repetindo o que há pouco disse, ouvi com toda a atenção as palavras do Sr. Presidente do Ministério, acêrca da autorização que veio pedir a esta casa do Parlamento, para lhe serem concedidas faculdades no sentido de manter a ordem pública, para poder lançar mão de quaisquer medidas de carácter económico ou financeiro.

Tenho a declarar que a União Republicana acha absolutamente desnecessária a medida que o chefe do Govêrno vem pedir à Câmara. E acha-a desnecessária porque o Parlamento está aberto e ninguêm poderá ainda dizer se êle fechará no fim do mês ou se no mês de Setembro. Só quando esteja fixado de antemão é dia do encerramento dos nossos trabalhos é que o Govêrno poderá vir pedir-nos a autorização de que necessita neste momento.

Estando o Parlamento aberto, não pode o Poder Legislativo abdicar dos seus direitos a favor do Poder Executivo. Demais, Sr. Presidente, trata-se duma questão de ordem pública e nestas circunstâncias o Govêrno tem já nas leis em vigor, e até na própria Constituição, todas as garantias de poder exercer a sua acção no sentido de manter a ordem.

Vejamos o que diz a Constituição a tal respeito:

O artigo 47.°, que se refere às atribuições do Presidente da República, diz o seguinte:

Leu.

Passando ao artigo 48.° encontra-se disposto o seguinte:

Leu.

Temos mais o artigo 49.° que diz:

Leu.

Quere dizer, o poder executivo pode levar à assinatura do Chefe do Estado todos aqueles diplomas que julgue indispensáveis para provar ao bem da nação.

Mas o artigo 26.° diz ainda, no seu n.° 16, o seguinte:

Leu.

Como o Senado vê, nas circunstâncias actuais, o Govêrno, sem ter necessidade de vir lançar mão de medidas excepcionais, tem dentro da Constituição e das leis já votadas pelo Parlamento sôbre assuntos de ordem pública passados já há tempos, mas não esquecidos, todos os meios necessários para conseguir os seus fins.

Nestas circunstâncias, a União Republicana não pode dar o seu voto e não o dá, à proposta apresentada pelo Govêrno. Isto, porêm, não quere dizer que a União Republicana, ciosa da manutenção da ordem como o são todos os verdadeiros republicanos e patriotas, deixe de prestar ao Govêrno todo o seu concurso, todo o seu apoio, na defesa da República e do bem do país.

Sr. Presidente: a despeito desta declaração muito formal que a União Republicana faz neste momento, é de supor que a proposta — já o mesmo sucedeu na Câmara dos Srs. Deputados — seja aprovada aqui no Senado. Mas, Sr. Presidente, antes de se efectivar essa votação, eu vou dirigir ao chefe do Govêrno uma pregunta muito concreta à qual S. Exa. me respon-

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derá, por certo, com aquela lialdade que o caracteriza, fazendo afirmações tambêm concretas e precisas.

Diz assim a proposta do Govêrno:

Leu.

Ora a pregunta que eu faço é a seguinte:

Tenciona o Govêrno, em face desta autorização e no interregno parlamentar, iniciar ou levar a efeito qualquer operação, de carácter financeiro?

É uma pregunta muito concreta. Para orientação do meu espírito peço uma resposta tambêm concreta.

Sabe o Govêrno que o artigo 26.° da Constituição, no seu n.° 4.°, diz assim:

Leu.

Desde que eu vejo na proposta de lei, apresentada pelo Sr. Presidente do Ministério, uma autorização, para que o Govêrno possa adoptar medidas de carácter económico ou financeiro evidentemente eu vejo que nós vamos tambêm autorizá-lo a, no interregno parlamentar, poder contrair um empréstimo se, no seu entender, julgar que isso é conveniente aos interêsses do país.

Sr. Presidente: isto é uma prerrogativa do Poder Legislativo, e êste poder não pode nem deve abdicar das suas funções primaciais.

O Govêrno não pode realizar qualquer operação de carácter financeiro, sem que préviamente o Parlamento possa discutir e apreciar as bases dessa operação.

Sr. Presidente: ditas estas palavras, o mais claro que me foi possível, para exprimir a atitude da- União Republicana em face da proposta apresentada pelo Sr. Presidente do Ministério, aguardo as respostas concretas às minhas preguntas e, por agora, tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Sousa Fernandes: — Mando para a Mesa a última redacção da proposta n.° 16-G.

O Sr. Celestino de Almeida: — Sr. Presidente: vou fazer muito ligeiras considerações.

O Sr. Presidente do Ministério apresentou uma proposta, mas eu entendo que as leis vigentes concedem a S. Exa. os elementos indispensáveis para fazer face às circunstâncias de momento.

É isto que eu entendo; mas S. Exa. disse há pouco que estava completamente demonstrada a gravidade do momento actual, pelo que respeita á alteração da ordem pública.

Se assim não fôsse, desnecessário seria que S. Exa. viesse pedir ao Parlamento uma faculdade que lhe é necessária e que julga indispensável para poder assegurar a manutenção da ordem.

Quanto às circunstâncias de emergência, e quanto aos inconvenientes de ordem económica e financeira, direi muito sucintamente o seguinte:

Como essas circunstâncias de ordem económica e financeira são, por assim dizer, concretas e mais ou menos conhecidas, o Parlamento, naturalmente, não lhe negará os meios precisos para fazer face às dificuldades que se apresentarem.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro da Marinha (José de Castro): — Sr. Presidente: vou responder em primeiro lugar ao ilustre Senador Sr. José Maria Pereira.

S. Exa. disse que não era necessária esta autorização que o Govêrno vem pedir ao Parlamento, porque êste se encontra funcionando.

O Parlamento está aberto, mas pode fechar dum momento para o outro, e é para prevenir esta circunstância que nós vimos pedir a autorização que consta da proposta que está sôbre a Mesa.

Não sei, Sr. Presidente, quais serão as circunstâncias que se darão no decorrer da nossa vida ministerial; mas essa vida pode ser efémera e assim nós vimos pedir um certo número de medidas que habilitem êste Govêrno, ou outro, a fazer face às dificuldades que se apresentarem.

É preciso que o Govêrno esteja munida de certas faculdades para poder ocorrer a um certo número de exigências de administração pública.

É inútil dizer, Sr. José Maria Pereira, que eu não tenho nenhum interesse particular nesta autorização, que é tam somente inspirada no verdadeiro interesse do país.

S. Exa. não tem razão, pois, em dizer que esta lei é desnecessária, pois que, como já disse, ela não é para já; é para

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quando se encerrar o Parlamento. S. Exa. sabe bem que há medidas de tal natureza que exigem muita rapidez na sua execução; em duas ou três horas pode passar o tempo para a solução de casos importantes.

O Sr. José Maria Pereira (interrompendo): — Tratando-se duma questão de salvação pública, o Govêrno então procederá como de costume...

O Orador: — A verdade é só esta: nós não vimos pedir nada para emquanto o Parlamento estiver aberto, é para quando o Parlamento estiver fechado. Não queremos de modo nenhum — creia-o o Senado — tirar as prerrogativas ao Parlamento.

Então eu tenho a honra de fazer parte do Senado, e havia de querer tirar as minhas próprias prerrogativas?

Disse o Sr. José Maria Pereira que eu tinha meios na Constituição para poder fazer face às circunstâncias para que se vem pedir a autorização.

Peço desculpa a S. Exa., mas o Parlamento tem dado muitas autorizações e as suas palavras condenam de certo modo a obra dele.

Ora, eu não quero meter questões políticas em assuntos desta ordem.

Não é melhor pedir uma determinada autorização, do que estar a demorar e á espera que se tenha de declarar o estado de sítio do pais?

Fez o Sr. Senador José Maria Pereira uma pregunta concreta. Concretamente respondo a S. Exa., dizendo lhe que neste momento, nesta ocasião, não tem o Govêrno idea alguma de contrair qualquer empréstimo, nem de fazer nenhuma operação financeira.

O Sr. José Maria Pereira (interrompendo): — Registo as palavras de V. Exa.

O Orador: — Neste momento é isto, agora de futuro não sei nem posso saber...

O Sr. José Maria Pereira: — Se se der a autorização, é uma invasão de meios constitucionais que se faz. Primeiro é preciso estabelecer as bases, depoia...

O Orador: — Perdão! Perdão! Nós não temos nenhuma tenção de fazer quaisquer
operações financeiras. Mas se para isso formos autorizados pelo Parlamento, fá-las-hemos ou então convocaremos o Congresso.

O Govêrno tem todo o interesse em fazer tudo pela forma legal. Depois duma ditadura que encerrou as portas do Parlamento, fui eu que fiz com que elas se abrissem. Por consequência, não seria eu quem deixaria de respeitar as prerogativas do Parlamento.

Reforçando os meus argumentos anteriores, com relação a dizer a S. Exa. que já tínhamos uma lei, basta que eu lembre que a lei de 8 de Agosto não é mais do que isto, e nessa ocasião já havia a Constituição, o Partido Unionista, Evolucionista e Democrático, sendo aquela lei até votada por unanimidade.

Pois, então, fazendo parte do Govêrno entidades que tem trabalhado com os códigos, não haviam êles de saber que existiam leis que tornassem desnecessário vir de novo ao Congresso pedir que aprovasse esta?

Pelo que respeita ao Sr. Celestino de Almeida, disse S. Exa. que estavam diminuídas as circunstâncias que podiam motivar a alteração da ordem pública.

Por certo, mas não quere isso dizer que amanhã essas circunstâncias se não agravem, ao fechar o Congresso.

Àparte do Sr. Celestino de Almeida.

O orador: — S. Exa. queria dar-nos mais do que daquilo que pedimos.

Creio ter respondido ao Sr. José Pereira e bem assim ao Sr. Celestino de Almeida, que de certo modo ligou as suas considerações às que fez aquele ilustre Senador.

O Sr. Arantes Pedroso (por parte da comissão de Marinha): — Mando para a Mesa o parecer relativo ao projecto de lei n.° 100.

O Sr. Estêvão de Vasconcelos: — Devo declarar que voto contrafeito a autorização que o Govêrno vem pedir, não por que êle me inspire desconfiança, mas porque uma outra autorização foi dada pelo Parlamento e nem sempre foi usada como devia ser (apoiados gerais) e, ainda, porque em virtude da amabilidade, que resulta da conflagração europeia, nos vemos

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forçados a. abdicar dos nossos direitos, dando ao Poder Executivo atribuições que não teria o menor prazer em lhe dar.

Por consequência, declaro, e creio, pelos apoiados, que interpreto os sentimentos dos Srs. Senadores dêste lado, que voto constrangido essa autorização, e voto-a porque o Govêrno a julga indispensável (Apoiados) e sem ter o receio que alguns dos meus colegas da direita tem de que ela possa ser supérflua em virtude de que determina o n.° 16 do artigo 26.° da Constituição.

Leu.

É claro que se êste artigo da Constituição dêsse já ao Govêrno a possibilidade de dispensar qualquer autorização, se isto fôsse uma cousa evidente de certo que os Partidos Unionista e Evolucionista não teriam votado em 1914 a autorização que deram ao Govêrno.

Se a votaram então é porque a julgaram necessária e portanto não me parece que êste projecto seja uma cousa inútil.

Uma cousa peço ao Govêrno: é que, quando faça uso desta autorização, o faça únicamente para bem do país e da República, para o que fôr indispensável e absolutamente justificável pelas circunstâncias anormais em que nos encontramos em face do conflito europeu.

De resto, com relação ás considerações do Sr. José Maria Pereira relativamente a qualquer empréstimo, eu entendo tambêm que o Parlamento não pode deixar de ser ouvido sôbre tal assunto. Mas depois das declarações do Sr. Presidente do Ministério, eu não tenho dúvida em votar esta autorização, porque tenho a certeza de que, se fôr preciso fazer qualquer operação neste sentido, o Govêrno virá ao Parlamento apresentar as bases, e por isso não tenho dúvida, como disse, em votar a autorização que se discute.

O orador não reviu.

O Sr. José Maria Pereira: — Eu não venho neste momento fazer uma análise da resposta do Sr. Presidente do Ministério.

Agradeço ao Sr. Presidente do Ministério a forma precisa por que respondeu à minha pregunta.

Pedi eu ao Sr. José de Castro o obséquio de me dizer se, em face da autorização que o Parlamento lhe vai conceder, S. Exa. usaria dessa autorização no interregno parlamentar para levar a efeito qualquer operação financeira. A isto obtemperou o Sr. Presidente do Ministério que neste momento, (ao que eu em àparte disse, neste momento, 29 de Agosto) o Govêrno não pensava em fazer qualquer operação financeira, mas que, de futuro, não sabia o que aconteceria. Acrescentou, porêm, e a Câmara toda parece ter ouvido, porque o Sr. Estêvão de Vasconcelos tornou a falar no assunto, que, no caso de ter de recorrer a qualquer operação financeira, respeitaria, como é próprio do seu carácter, o que está disposto na Constituição. Pediria a convocação do Congresso para que êle se pronunciasse sôbre o assunto.

Estou satisfeito.

Ficam registadas as minhas preguntas e as respostas de V. Exas.

O orador não reviu.

O Sr. Celestino de Almeida: — Pedia palavra, Sr. Presidente, simplesmente para dizer que, quando foi votada a autorização de 8 de Agosto, as circunstâncias diferiam muito das actuais; não se estava, como agora, a setenta e duas horas após uma perturbação de ordem pública. E a situação financeira de então tambêm de forma alguma se pode comparar com a actual.

Foi por isso que eu há pouco disse que, com relação a circunstâncias emergentes de ordem económica, certamente o Congresso fornecerá elementos concretos para as resolver.

O Sr. Faustino da Fonseca: — Sr. Presidente: pedi a palavra simplesmente para declarar à Câmara que, tendo trazido ao Senado, e perante o Govêrno, as reclamações das comissões políticas de Lisboa, e vendo-as plenamente satisfeitas com a nota oficiosa do Govêrno e com as declarações respeitantes ao uso que fará da autorização pedida, dou o meu voto à proposta, congratulando-me com ela.

Foi aprovada a generalidade.

Foram aprovados es artigos 1.º, 2.° e 5.°

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro, interino, da Marinha (José de Castro): — Requeiro a dispensa da última redacção.

Foi aprovado.

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8 Diário das Sessões do Senado

O Sr. Ministro do Fomento (Manuel Monteiro): — Pedi a palavra para uma explicação, que devia ao Senado.

Eu declarei ontem aqui que tinha tomado todas as providências indispensáveis para assegurar o pão e as farinhas necessárias para o consumo da população do país.

Hoje posso dizer ao Senado que dessas providências resultou dispor o Govêrno de seis milhões de quilogramas de trigo, nada havendo pois a recear das ameaças dos moageiros e padeiros.

O Sr. José Maria Pereira: — Sr. Presidente: vou ser muito breve.

Preciso fazer uma declaração muito lial acêrca do incidente por mim levantado a respeito do projecto apresentado pelo Sr. Arantes Pedroso e relatado pelo Sr. Br, Celestino de Almeida.

Quando entrei porá o Senado, fui casualmente abordado por uma pessoa das minhas reações que muito superficialmente me falou no assunto e me disse que tinha procurado o Sr. Ministro das Colónias e que não tinha podido conseguir falar-lhe.

Daqui nasceu no meu espírito a suspeita de que o Sr. Ministro das Colónias poderia na melhor boa fé deixar-se arrastar por quaisquer influências nocivas; e assim, Sr. Presidente, quando vi apresentar o projecto e pedir a urgência, eu resolvi-me a pedir a palavra e fazer algumas observações.

V. Exa. compreende que é muito difícil numa simples e rápida leitura e sem consultar a legislação, conseguir fazer uma idea clara e nítida daquilo que nos é pôsto à votação (Apoiados).

Hoje, porêm, melhor informado, venho declarar que não tinham razão de ser as minhas suspeições do Sr. reitor do projecto, está muito acima de quaisquer suspeições que possam levantar-se.

É tam somente para declarar lialmente, como é próprio do meu carácter, que os receios que eu apresentara a respeito do projecto em questão, não tem razão de ser, êle vem antes resolver um assunto de interesse para um dos ramos da indústria nacional, e importantíssimo, como é o da indústria do café de Angola.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Arantes Pedroso: — Não tive dúvida em pedir ontem, como pedi, a urgência e dispensa do Regimento para a discussão do projecto sôbre o café sujo de Angola, porque já o havia lido e porque sei bem quanto êle foi minuciosamente estudado.

Agradeço as expressões; amáveis que me foram dirigidas pelo Sr. José Maria Pereira, e sendo S. Exa. o primeiro a reconhecer a necessidade desta lei, eu peço ao Sr. Presidente que ponha já à discussão êste projecto, tanto mais que essa discussão será rápida, pois que se trata dum só artigo.

A urgência já ontem foi reconhecida pelo Senado, que tambêm autorizou a dispensa do Regimento.

Foi lida na Mesa a última redacção do orçamento do Ministério da Guerra. Foi aprovada.

Seguidamente foi lida e entrou em discussão a proposta de lei sôbre o café sujo de Angola.

Foi aprovada sem discussão, na generalidade e na especialidade.

É a seguinte:

Proposta de lei

Artigo 1.° É prorrogado até 1 de Fevereiro de 1916 o prazo estabelecido no artigo 20.° do decreto n.° 771, de 19 de Agosto de 1914, e a partir do qual os cafés sujos ficam sujeitos ao direito de exportação de 25 por cento ad valorem quando exportados pelas alfândegas da, província de Angola, não compreendidas na bacia convencional do Congo.

Art. 2.3 É prorrogado até 1 de Fevereiro de 1916 o prazo estabelecido no artigo 5.° do decreto n.° 771, de 19 de Agosto de 1911, e a partir do qual os cafés sujos ficam sujeitos ao direito de exportação de 10 por cento ad valorem quando exportados pelas alfândegas da província de Angola, compreendidas na bacia convencional do Congo.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Palácio do Congresso da República, em 26 de Agosto de 1915.— Vítor Hugo de Azevedo Coutinho, presidente — Baltasar de Almeida Teixeira, 1.° secretário — Alfredo Soares, 2.° secretario.

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O Sr. Arantes Pedroso: — Requeiro que o projecto, ora aprovado, seja dispensado da última redacção.

O Senado aprovou êste requerimento.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, a proposta de lei n.° 16-H (orçamento do Ministério do Fomento.

Foi dispensada a leitura a requerimento do Sr. Estêvão de Vasconcelos.

É a seguinte:

(Proposta de lei n.° 16-H

Senhores Senadores.— Tem-se dito que o nosso país é essencialmente agrícola e, se esta afirmação não corresponde absolutamente a um facto, é certo que na agricultura devemos ver a nossa principal fonte de riqueza. Por outro lado à sombra dum regime imperfeito de protecção está criada uma situação industrial para a qual o Estado tem de olhar com a máxima atenção, desde que a guerra da Europa veio demonstrar-nos à evidência que é absolutamente necessário tratarmos de tirar da nossa capacidade produtiva e das nossas riquezas naturais o máximo do rendimento. O comércio mesmo, não tendo até hoje encontrado no Estado o apoio eficaz de que carece para exercer com a indispensável amplitude a sua acção primacial no desenvolvimento da riqueza do país, apela constantemente para os poderes públicos numa aspiração justificadíssima do progresso a que lhe dão direito as suas gloriosas tradições.

Sob êstes três aspectos tem de ser encarado o problema económico português, estando assim claramente indicado o critério a que a vossa comissão de orçamento havia de obedecer na apreciação do projecto do orçamento do Ministério do Fomento e respectiva proposta orçamental, na sua generalidade. Êsse trabalho, porêm, que mal poderia fazer-se em dias, não cabe no número exíguo de horas de que dispomos para examinar na especialidade o projecto que tarde foi enviado-a esta Câmara pela Câmara dos Deputados.

Podemos entretanto constatar que a resolução do problema económico foi de novo adiada para ocasião mais oportuna.

Estamos, porêm, convencidos de que na próxima sessão legislativa o Sr. Ministro do Fomento se empenhará em trazer ,à Câmara soluções -concretas sôbre os principais problemas da sua pasta, entre os quais julgamos dever apontar-lhe os que se referem aos terrenos incultos do país, à intensificação da produção por unidade de superfície cultivada e às culturas regadas. Pelo que diz respeito à indústria, indispensável nos parece que se acabe com situações artificiais, promovendo-se na medida do possível o desenvolvimento das indústrias susceptíveis de vida própria, principalmente daquelas que, robustecendo-se com o próprio desenvolvimento, possam vir a representar num futuro próximo um valor económico com que a nação possa e deva contar.

Para outro assunto chamamos ainda a atenção do Sr. Ministro do Fomento:

Foi por decreto n.° 789 de 22 de Agosto de 1914 estabelecida no pôrto de Lisboa uma zona franca destinada a receber as mercadorias exportadas do Brasil e das colónias portuguesas. Em 18 de Novembro do mesmo ano foi decretado que fôsse nomeada uma comissão com o fim de fazer a propaganda do pôrto franco de Lisboa, e estudar as medidas convenientes para o seu normal desenvolvimento.

Escusado é encarecer a importância destas medidas para as nossas relações com a República Brasileira, em cuja capital foram os referidos decretos publicados, no Boletim da Câmara Portuguesa de Comércio e Indústria do Rio de Janeiro n.° 11, de Novembro de 1914.

É de esperar que até Janeiro próximo futuro a comissão nomeada nos termos do decreto de 18 de Novembro de 1914, bem como a que foi nomeada em 8 de Setembro de 1913, em harmonia com a lei de 12 de Junho do mesmo ano, para estabelecer o pôrto franco de Lisboa, habilitem o Sr. Ministro do Fomento a propor ao Congresso da República os melhoramentos necessários para que o pôrto de Lisboa possa desempenhar para o comércio do mundo o papel que deve pertencer-lhe pela sua excepcional situação geográfica.

Uma alteração da maior importância foi introduzida na proposta orçamental primitiva durante a discussão na Câmara dos Deputados.

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Queremos referir-nos á transferência dos serviços de construção, conservação e reparação de estradas para as juntas gerais dos distritos, nos termos do decreto de 1 de Agosto de 1913.

Em nossa opinião esta transferência é, pelo menos, inoportuna, mas, não podendo um assunto de tanta importância ser discutido precipitadamente, a vossa comissão é de parecer que se aprove, a título de experiência, a emenda aprovada na Câmara dos Deputados.

O projecto do orçamento do Ministério do Fomento para o corrente ano económico, que em tempo devido foi apresentado na Câmara dos Deputados, apresentava as seguintes verbas de despesa:

[Ver valores na imagem]

Despesa ordinária

Despesa extraordinária

Despesa total

Da aprovação das alterações propostas pelo Sr. Ministro das Finanças em 11 de Junho último, e daquelas que foram propostas pela comissão do Orçamento da Câmara dos Deputados e ainda das que foram introduzidas durante a discussão na referida Câmara, resultou novo acréscimo de despesa de 2:920.966$46, salvo êrro, que teria a sua explicação na exiguidade do tempo que tivemos para examinar o projecto.

A despesa prevista é, pois, de escudos 17:981.222$00, distribuída pelas duas verbas seguintes:

Despesa ordinária

Despesa extraordinária

Despesa total

Julga a vossa comissão do Orçamento dever chamar a vossa atenção para as seguintes verbas parciais:

Despesa ordinária

Proposta do Sr. Ministro do Fomento para que a verba de 467.840$, inscrita no capítulo 2.°, artigo 23.°, para «Construção, reparação, conservação e melhoramentos de edifícios públicos», fôsse elevada a 876.840$.

Diferença para mais

Proposta do Sr. Ministro do Fomento para pagamento de despesas efectuadas pela Administração dos Caminhos de Ferro do Estado, a mais da dotação orçamental e ainda não legalizadas:

Em 1913-1914.

Em 1914-1915.

Capítulo 8.°, artigo 68.°-A

A primeira destas verbas justifica-a o Sr. Ministro do Fomento pela circunstância do Estado ter actualmente ao seu serviço 3;500 operários, era vez de 1:500, com os quais se contava na despesa primitivamente prevista.

A verba de 251.562$89 destina-se a legalizar os excessos de despesa da exploração dos Caminhos de Ferro do Estado nos anos de 1913-1914 e 1914-1915, proveniente da crise que começou a esboçar-se no final do ano de 1913.

Despesas extraordinárias

Capítulo 18.°— Caminhos de ferro do Estado:

Artigo 87.° Subvenção extraordinária concedida para ocorrer ao aumento de despesa e à diminuição de receitas que provêm da conflagração européia

Artigo 88.° Encargos dos empréstimos contraídos de conformidade com as autorizações constantes das leis de 29 de Outubro de 1909 e 3 de Abril de 1913

Total

Poderia esta despesa extraordinária deixar de ser inscrita no Orçamento, nos termos da legislação em vigor, como muito bem explicou o Sr. Ministro das Finanças na sua proposta de alterações, de 11 de Junho, a propósito da verba de 1:426.970$, primeiro prevista como despesa extraordinária a reembolsar. Na mesma proposta refere-se o Sr. Ministro das Finanças aos factos que se observam na Administração

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dos Caminhos de Ferro do Estado no ano económico findo de 1914-1910, os quais obrigaram à abertura dum crédito especial da quantia de 1:200.000$, conforme consta do decreto n.° 1:465, de 30 de Março de 1910.

Em vista do exposto, a vossa comissão é de parecer que aproveis o projecto de lei orçamental que veio da Câmara dos Deputados, aditando-lhe as seguintes disposições:

Artigo 1.° Para ocorrer ao déficit que, em consequência do estado de guerra na Europa, apresenta a administração dos Caminhos de Ferro do Estado, é o Govêrno autorizado a contrair com a Caixa Geral de Depósitos ou qualquer estabelecimento bancário um ou mais empréstimos até a quantia total de 2:000.000$ ao juro máximo de 5 3/4 por cento, com £ garantia do fundo especial dos mesmos caminhos de ferro, devendo pelas disponibilidades dêste fundo ser satisfeitos os encargos do aludido empréstimo.

§ único. Se as disponibilidades do fundo especial forem insuficientes para fazer face, no todo ou em parte, aos encargos de juro e amortização dêste empréstimo, inscrever-se há no orçamento do Ministério, do Fomento, em despesa extraordinária, a importância necessária para saldar os referidos encargos, a qual será entregue aos Caminhos de Ferro do Estado como subvenção a reembolsar.

Art. 2.° Do produto do espréstimo a que se refere o artigo anterior será escriturada na receita efectiva do Estado em conta do respectivo ano económico importância igual à que, como despesa extraordinária do Ministério do Fomento foi entregue à Administração dos Caminhos de Ferro para fazer face ao déficit do ano económico de 1914-1915.

§ único. O saldo que restar dêste empréstimo será aplicado ao déficit da Administração dos Caminhos de Ferro que se verificar no ano económico corrente, devendo escriturar se como receita do Estado importância correspondente à da despesa liquidada emquanto êsse saldo o comportar.

Destas disposições resultará uma redução do déficit do Orçamento não inferior a 700.000$, pela inscrição desta importância como receita do Estado.

Pelo que respeita à tabela de despesa, teve a comissão o pensamento de reduzir a despesa ordinária prevista para os caminhos de ferro do Estado o que conseguiu, na Direcção do Sul e Sueste, com a seguinte proposta de emenda, segundo a qual as despesas de exploração previstas serão reduzidas de 8.399$.

A redução de 20.000$, proposta para o § 1.° da secção 4.ª, combustível para locomotivas, resulta do estudo comparativo entre os orçamentos primitivos e rectificados, tendo em atenção a quilometragem actual, que é inferior á que foi prevista quando se elaborou o orçamento, e a desproporção em que foi calculado o consumo para o sul e sueste em relação ao do Minho e Douro.

O reforço proposto para os quadros corresponde a uma necessidade urgente de serviço e não representa aumento de despesa efectiva, visto que de facto se despendem já as verbas propostas com empregados auxiliares que interinamente suprem as deficiências dos quadros.

Por esta mesma ordem de considerações se justifica o reforço de 983$25, proposto para a dotação das oficinas, sem encargo real para as despesas de exploração.

Em tudo mais esta comissão entende que a tabela de despesa deve ser aprovada, tal como se propõe no projecto vindo da Câmara dos Deputados.

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[Ver valores na imagem]

Propõe-se para mais

Propõem-se para menos

Caminhos de Ferro do Estado

Direcções da Exploração

Art. 2.° Serviço de movimento:

Secção 2.ª — Despesas diversas:

§ 10.° Manobras de máquinas — que seja elevado
de 30.000$ a 35.000$ a respectiva verba

Art. 4.° Serviço de tracção:

Seccão 1.ª—Pessoal do serviço central:

Que seja eliminado em lugar de escriturário principal que passa para a dotação das oficinas

Secção 3.ª—Condução de máquinas:

§ 1.° Maquinistas—que seja aumentado o quadro com:

2 chefes de reserva, a 1$30

4 maquinistas de 1.ª classe, a 1$30

§ 2.° Fogueiros — aumentado o quadro com:

2 fogueiros de 1.ª classe, a $80

2 fogueiros de 2.ª classe, a $75

2 fogueiros de 3.ª classe a $70

Secção 4.ª — Material:

deduzida a verba para combustível, a 580.000$

Pessoal:

§ 4.° Alimentação—Fogueiros de locomovei que seja aumentado o quadro

para 14, a $65

em vez de 12, a $60

§ 5.° Limpeza de máquinas—Aumentando o quadro

com 10 limpadores a $50

Secção 6.ª — Revisão do material:

Aumentar — 1 fiscal de material, a 1$20

Suprimir — 2 serventes do depósito

12.446$00 20.845$00 Diferença para menos

Quadro do pessoal das oficinas gerais do Sul e Sueste

Aumentar:

1 desenhador principal

1 ajudante do chefe das oficinas, a 1$50

Reduzir: vencimento de 9 mestres de 1$50 a

Suprimir: 1 chefe de secção de contabilidade

Aumentar: um escriturário principal

Gratificação do encarregado do depósito de material

1.807$50 824$25 Diferença para mais

Sala das sessões do Senado, em 28 de Agosto de 1915.— Estêvão de Vasconcelos -Nunes Garcia — Agostinho Fortes — Daniel Rodrigues — José Maria Pereira (com declarações) — Celestino de Almeida (com declarações) — Herculano Jorge Galhardo, relator.

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O Sr. Pais Abranches: — Não pode deixar de lamentar que a comissão de fomento não houvesse sido convocada para apreciar devidamente o orçamento que acaba de ser pôsto em debate.

Entende que um orçamento tam importante, como é o do Ministério do Fomento, e que atinge uma despesa de 15:000.000$, devia ser apreciado com o máximo cuidado pela respectiva comissão e não aprovado de afogadilho, como vai suceder.

Antes de iniciar as suas pequenas considerações, manda para a Mesa a seguinte moção:

Moção de ordem

O Senado, reconhecendo que o orçamento da despesa do Ministério do Fomento, nas suas contas gerais e em especial as que dizem respeito às verbas para conservação, polícia e reparação de estradas, na importância de 650.997$, a que se refere o capítulo 2.°, no seu artigo 17.°, a fl. 5 e 30; à construção de estradas na importância de 437.000$, a que se refere o capítulo 2.°, no seu artigo 19.º a fl. 30; à agricultura na importância de 720.066$07, a que se referem os capítulos 3.° e 9.°, nos seus artigos 35.° a 47.° e 69.°, a fl. 31 a 45 e 49; à construção de novas linhas férreas na importância de 3:100.000$, a que se refere o capítulo 16.°, no seu artigo 65.°, a fl. 51; não representam o estudo minucioso que devia haver na confecção do Orçamento, e são exíguas porque se não pode desenvolver a agricultura nacional, o comércio e indústria, que altamente estão sendo prejudicados com o excessivo aumento de contribuições arbitrárias, tanto mais que as receitas públicas, subindo a mais de 11:500 contos, que no Orçamento Geraldo Estado, de 1909-1910, o davam margem a que se despendesse, com a conservação, construção de estradas, desenvolvimento da agricultura e construção de novos caminhos de ferro, uma verba superior a 8:000 contos, que muito podia contribuir para se dar trabalho ao operariado português, que vive na maior miséria e portanto para o desenvolvimento e bem estar do país.

Considerando que, não havendo tratados com a Espanha, a agricultura portuguesa está sendo altamente agravada;

Considerando que, com a revogação da lei de 19 de Junho de 1915, se deixaram, desde 19 de Julho de 1913, de fiscalizar e analisar os vinhos, azeites, vinagres, álcoois, bebidas refrigerantes, cervejas, leites, cereais, farinhas, pão, e que tambêm se deixou de fazer a inspecção minuciosa e diários das fábricas de panificação, o que obrigava os fabricantes a manterem o maior asseio e higiene nos seus estabelecimentos;

Considerando que a falta dessas fiscalizações e análises dá lugar a que se exponham à venda vinhos, azeites e outras bebidas, farinhas e pão respectivamente falsificadas e adulteradas, com grave prejuízo da saúde pública e que se tem vendido em média em Lisboa mais de 20:000 pipas de água misturadas com o vinho em cada ano, depois que deixou de haver a respectiva fiscalização, no que o Estado tem perdido mais de 200 contos por ano;

Considerando que o facto de se ter revogado a lei de 19 de Julho de 1905, que tam benéficos resultados trazia para o país na fiscalização dos produtos agrícolas, não trouxe economia alguma para o Estado, atendendo a que se continua a pagar ao pessoal que era encarregado dêsses serviços e que hoje se conserva adido a outras repartições;

Considerando que um Govêrno imposto pela revolução de 14 de Maio e seus compromissos políticos tem de defender os interêsses do país, desenvolvendo o seu fomento agrícola para dar trabalho ao operariado e opor-se a que continuem a falsificar o vinho, o azeite, o leite, pão, farinhas e outros géneros, que são um factor importante na alimentação pública, continua na ordem do dia.

Sala das sessões do Senado, em 29 de Agosto de 1915. — O Senador, Pais Abranches.

Seguidamente o orador faz algumas reflexões sôbre a verba de 650.000$, destinada a reparação de estradas; alude à verba de 720.000$, destinada à agricultura; refere-se à importância destinada à construção de novos caminhos de ferro e aduz algumas considerações sôbre a fiscalização de produtos agrícolas, chamando a atenção do Sr. Ministro do Fomento para essa fiscalização que, diz o orador, não existe, pelo que se comete toda a espécie de falsificações e irregularidades.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

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O Sr. Fortunato da Fonseca: — Mando para a Mesa um parecer.

O Sr. Presidente: — O Sr. relator tinha pedido £ palavra e tem preferência; mas êle deseja falar depois de V. Exa. Tem, portaste, a palavra o Sr. Celestino de Almeida.

O Sr. Celestino de Almeida: — Agradeço a V. Exa.

Entra nesta discussão com o doloroso constrangimento com que não entrei na discussão dos orçamentos anteriores; e isto pela insuficiência de tempo que houve para a elaboração do parecer da respectiva comissão do Orçamento do Senado, de que recebi um exemplar só no começo desta sessão.

Lamento êste facto que antevejo virá a repetir-se com os orçamentos dos Ministérios do Fomento e de Instrução, e tanto mais isto é para lamentar, quanto é certo que os orçamentos dos Ministérios do Fomento e de Instrução são de superior importância em face da situação em que se encontra a economia nacional.

Feito êste insignificante mas indispensável preâmbulo, passarei a fazer as ligeiras considerações que me são sugeridas pelo exame do orçamento da despesa dêste Ministério para o ano económico de 1915-1916..

No Orçamento apresentado em Janeiro de 1910, encontrava-se — grosso modo — uma verba total de despesa de 15:060 256$; verba esta que, na proposta de lei orçamental apresentada em Julho pelo actual Sr. Ministro do Fomento, se encontra bastante aumentada, por ter sido elevada a 16:577.360$.

Não é, porêm, esta última importância a que é apresentada a esta casa do Congresso, pois que, por mercê de alterações feitas na Câmara dos Deputados, bem mais elevada ainda se apresenta á discussão do Senado, atingindo cifra superior a 17 milhões de escudos, ou seja aproximadamente 17:242.000$.

Não repetirei as considerações que aqui por mais de uma vez formulei já, a propósito dos constantes aumentos de despesa, muito principalmente da despesa ordinária, por consideração com o Senado, e quási para comigo mesmo; o que não deixarei, porêm, é de frisar mais uma vez a gravidade de tais factos em face da precária situação financeira e económica do país, e da considerável diminuição de receitas do Tesouro Público.

E sem querer fazer de Cassandra, Sr. Presidente, direi que tudo isto me anuvia o espírito e causa as maiores preocupações ao meu republicanismo de sempre e fervoroso patriotismo.

Pregunto, porêm, a V. Exa., Sr. Presidente, e ao Senado: que melhoria de serviços, que propostas estimuladoras da produção nacional tem representação e garantia neste considerável aumento de despesa que acabei de apontar?

Se houvera encontrado na proposta de lei orçamental em discussão medidas, tendentes aos fins a que aludi, servir-me-ia êsse facto de atenuante, e quiçá mesmo — conforme os seus intuitos e alcance — de motivo para louvar, e não haveria feito a interrogação ao Senado; mas como nada encontrei com tal orientação, o que só com mágua confesso, por isso solicitei a coadjuvação do Senado, que por certo verá melhor do que eu a razão de ser do condenável aumento de despesa que para mim não tem motivo aceitável.

A justificação de tam consideráveis acréscimos de despesa, na ocasião presente, só poderia resultar da sua aplicação ao estimulo imediato, por exemplo, da reparação e alargamento da viação ordinária e do desenvolvimento da viação férrea; da cuidadosa intensificação da educação técnica, sobretudo da agrícola; do plantio florestal; da expansão comercial; do alargamento da navegação nacional.

As despesas desta ordem, estas sim, por serem de índole essencialmente reprodutiva, é que teria visto com satisfação mesmo considerávelmente acrescidas; tanto mais que só elas podem ser proporcionadoras — em futuro imediato umas, e mais longínquo outras — dos recursos próprios a fazerem face ás necessidades contributivas a que fatalmente teremos de ir parar, e vir a recorrer.

Sr. Presidente: a conservação e construção de estradas de viação ordinária ou férrea é o elemento de incitação inicial para a produção agrícola, pelo facto de permitir e promover a cultura em inúmeras regiões, onde ela era antes impraticável em condições remuneradoras, pela carestia exagerada, de transportes para os

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produtos nelas obtidos, pois vai às vezes tam longe a carestia dêsses transportes, para os locais de provável ou seguro consumo, que chega quási a duplicar o custo de produção, o que importa o impedimento de qualquer cultura ou produção, a não ser para as extintas necessidades locais. Há mais, porêm, pois que tratando-se de um país que tem justificadas pretensões, como o nosso, á fixação do turismo, só pode haver possibilidades de realizar tal empreendimento após o desenvolvimento e melhoria, por todo o país, da viação de toda a ordem, esforço êste mais do que justificável em face das vantagens económicas múltiplas que a acarretaria e da maior oportunidade e urgência.

Desde que, Sr. Presidente, a educação agrícola fôsse levada aos mais recônditos pontos do país pelo inúmero pessoal burocrático do Ministério do Fomento, numa utilização imediata, em ensino móvel ou fixo — êste último onde isso fôsse já exequível — seria a própria produção agrícola do país que com isso se apresentaria largamente beneficiada, devendo mesmo tal benefício fazer-se sentir já um pouco, na própria produção do próximo ano agrícola.

O plantio florestal, cujo início sistemático de realização poderia ser imediato, representaria uma criação de proveitosa riqueza futura, previdência adequada para uma melhoria de condições meteorológicas no país, e sobretudo revelaria a entrada era acção de um espírito de sequência prático e sensato, que importa que seja a verdadeira característica da administração republicana.

Sr. Presidente: dadas as variedades de sol e clima que resultam da nossa admirável e privilegiada situação geográfica, só à nossa pobreza de cultura técnica, se pôde e deve atribuir a minguada produção do nosso solo, e a proporção lastimosa dos nossos incultos, e ainda a relativamente diminuta variedades das nossas culturas, males êstes que importa encarar de frente, de vez, e fazê-los desaparecer; o que só se consegue com a rápida disseminação do ensino agrícola técnico a que me referi, e demais medidas de início imediato aludidas e ás quais, infelizmente, proposta alguma nos é apresentada, que visasse a satisfazer a sua mais que oportuna necessidade. Adiante, porêm.

Medidas doutra ordem, Sr. Presidente, tendentes a incitar amparar, cooperar mesmo com a iniciativa particular, para a obtenção de uma metódica expansão comercial, organizada e desenvolvida num espírito de sequência ininterrupto, teriam vindo na hora propícia, pois que a iniciativa particular hesitante e incerta, receberia de braços abertos a coadjuvação carinhosa a que lhe fôsse dispensada, resultando de tudo a animação imediata da permuta comercial do país, tam amortecida pelo agravamento cambial, pela intranquilidade interna, e pela repercussão inevitável da grande conflagração guerreira que assola a Europa.

E se elas visassem com ponderação e decisão ao alargamento da navegação nacional, singularmente facilitado pela nossa situação geográfica, pelas correntes emigratórias do país e posse de um extenso e rico domínio colonial, nada teria podido vir mais a propósito, e com melhor oportunidade, por se estar em face de uma ocasião única de nos abalançarmos a andar para a frente, por motivo da liberdade de navegação conservada nos mares onde deveríamos tentar desenvolver a nossa acção com proveitos múltiplos, entre os quais avultariam, sem dúvida, o menor êxodo de ouro para fora do país, por via da diminuição de serviços de natureza vária que nos são prestados pelas marinhas mercantes estrangeiras, e a verdadeira propaganda dos produtos nacionais, consequência certa do mesmo alargamento da navegação sob bandeira nacional.

O mesmo se daria, Sr. Presidente, com as providências que fossem tomadas com respeito às indústrias extractivas, que das circunstâncias excepcionais de altos preços, creadas para os seus produtos pelo grande ágio câmbio e raridade nos mercados habituais, receberam incentivo expontâneo de produção, ao qual não se tem dado amparo algum, vendo-se antes continuarem ao abandono grande número das concessões feitas, com enorme prejuízo da produção nacional, e ás quais desde o momento que não justificassem cabalmente a sua não exploração, deveriam haver sido imediatamente cassadas as respectivas concessões.

E se a tudo isto se acrescentar uma formidável sacudidela da tradicional inércia de uma grande parte da burocracia do

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fomento e da que lhe é alheia, que a levasse a aprontar com rapidez projectos e orçamentos variados, e adequados a uma utilização proveitosa das periódicas multidões dos sem trabalho, que se vem acoitar á sombra da previdência das obras do Estado, muita riqueza se teria procurado preparar e criar, e condenáveis desperdícios se teriam seguramente conseguido evitar.

É o acréscimo de despesa resultante do exposto, ou de incentivos e medidas de similar orientação, não obstante a situação financeira angustiosa em que o país se encontra, seria recebido de braços abertos, tanto nesta como na outra casa do Congresso, e seria votado pela unanimidade dos representantes da Nação.

É por êste caminho, Sr. Presidente, que se deveria ter procurado enveredar desde o início do regime republicano; confio firmemente em que nele se entrará em prazo mais ou menos curto. O que lamento é que as circunstâncias verdadeiramente excepcionais e extraordinaríssimas que vamos atravessando não hajam sido bastante poderosas e empolgantes, para haverem influenciado já em tal sentido a proposta orçamental que estamos apreciando, em parte por modificações de verbas, e quando não bastasse tal processo, bem vindas seriam as novas propostas de lei que acompanhassem a proposta orçamental, que, a mais do seu valor intrínseco para a economia nacional, teriam para nós, parlamentares, a estimável qualidade de representarem uma preciosa compensação ao fastio e indiferença produzidas por tantas outras, que a propósito das diversas propostas orçamentais nos tem sido apresentadas.

A dentro da República, Sr. Presidente, tem-se legislado muito, estou mesmo certo que em demasia, na melhor das intenções, tenho disso a certeza absoluta, o que não é motivo para nos regozijarmos, pois sendo em todos os Parlamentos do mundo, sempre maior a percentagem das leis nocivas que o das realmente úteis, não pode fazer excepção a esta regra geral, a obra legislativa por nós realizada.

Por isso, Sr. Presidente, não posso deixar de fazer fervorosos votos porque sejamos menos pródigos de leis, mais cautelosos nos propósitos de tudo remodelar num afan pernicioso que não encontra justificação possível na nossa boa vontade — até certo ponto compreensível — de progredir e andar para diante em tam grande atraso, em relação aos demais povos civilizados, nos deixou o regime caído a 5 de Outubro de 1910.

É preciso, porêm, ter muito cuidado, pois que os alicerces tradicionais próprios de os organismos sociais, por bem resistentes que sejam, não podem suportar indefinidamente todas as sacudidelas que se lhes queira imprimir, por melhor que seja a intenção que a elas possa presidir.

O que é preciso é cuidar de administrar com sensatez, com firmeza prudente, com competência e honestidade, e muito há que tentar neste sentido em todos os serviços do Estado, em todos os Ministérios, e não ocultarei. Sr. Presidente, que tenho a impressão de que o Ministério do Fomento-é um daqueles que nos deverá merecer mais especial atenção.

E tenho dito, Sr. Presidente.

O Sr. António José Lourinho: — Em nome da comissão de petições, mando para a Mesa três pareceres.

O Sr. Herculano Galhardo: — Sr. Presidente: pedi a palavra ria qualidade de relator da comissão do orçamento para responder às considerações feitas pelos ilustres Senadores Srs. Pais Abranches e Celestino d s Almeida, sôbre a generalidade do projecto em discussão.

Tenho de repetir o que ontem disse aqui sôbre a impossibilidade de ter convocado a comissão do orçamento e a comissão do Fomento.

São conhecidas as razões poderosas que levaram a maioria a apressar a discussão dêste orçamento e que me obrigaram a mim, que recebi o projecto vindo da Câmara dos Deputados ante-ontem ás 17 horas, a estudá-lo como relator até ontem às 14 horas, para o entregar o parecer a tempo de poder ser impresso e distribuído hoje. Teria sido impossível fazê-lo se tivesse convocado primeiro as comissões do orçamento e do fomento.

Ao Sr. Pais Abranches tenho a dizer que houve dificuldades de ordem técnica na construção do caminho de ferro de Évora a Ponte de Sor ao passo que várias razões determinaram a necessidade e conveniên-

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cia da construção do caminho de ferro do Vale do Sado.

Todos nós sabemos quanto há a esperar da província do Algarve, província que vive da sua exportação e que bem merece que o Estado olhe pelas suas comunicações com o resto do país.

Referiu-se tambêm à questão agrícola. O Sr. Ministro do Fomento vai responder a S. Exa. com maior competência de que eu poderia fazê-lo.

Referindo-me em especial ao discurso pronunciado pelo ilustre Senador Sr. Celestino de Almeida, parece me que no relatório da comissão S. Exa. encontrará a resposta à maior parte das suas considerações, pôsto que incompleta, falha de proficiência e insuficientemente pormenorizada por motivo de falta de tempo e natural incompetência de quem muito precipitadamente teve de apreciar o assunto como relator.

Plantio florestal. Efectivamente deve ser olhado com toda a atenção. Sabemos bem que o regime das águas é modificado com ã plantação de árvores nas montanhas.

Expansão comercial. V. Exa. viu que a comissão no parecer se referiu a êsse ponto e muito especialmente a existir já na lei o pôrto franco em Lisboa.

V. Exa. sabe que já foram nomeadas comissões para estudarem o aproveitamento natural do pôrto de Lisboa.

Quanto ao comércio, muito se deve esperar das suas tradições gloriosas, como V. Exa. vê, que se diz no parecer.

Referiu-se S. Exa. ao turismo e a diversas medidas tendentes a desenvolvê-lo.

Todos temos êsse desejo, mas não é nesta ocasião que o Govêrno pode tomar medidas de tal importância.

Parece-me que na generalidade das considerações que V. Exa. fez, a comissão responde no seu relatório com os possíveis pormenores.

O Sr. Pina Lopes: — Sr. Presidente: começarei por mandar para a Mesa a minha moção de ordem.

Leu.

Sr. Presidente: desnecessário será encarecer as vantagens que traria para o país êste caminho de ferro. Desde há muito que alguns países da Europa, como por exemplo a Suíça, a Itália e a França, devido às suas condições naturais, tem o turismo muito desenvolvido e a êle devem uma grande parte das suas receitas.

Em Portugal o turismo limita-se a uma repartição onde há inegavelmente muito patriotismo, muita competência e muito boa vontade, mas da qual poucos ou nenhuns resultados práticos tem sido colhidos.

E isso, não obstante a situação de Portugal ser privilegiada.

Mas nada pode fazer, porque não possui os indispensáveis elementos.

Era, pois, de toda a conveniência que no nosso país se estabelecesse em bases sólidas o turismo, proporcionando aos touristes todas as possíveis comodidades, que vão desde as facilidades aduaneiras, na ocasião do seu desembarque, até a construção de bons hotéis, óptimas estradas e magníficos caminhos de ferro, para os transportarem rapidamente aos pontos mais pitorescos do país e dali aos grandes centros europeus.

Só assim, Sr. Presidente, poderemos atrair ao nosso magnífico pôrto de Lisboa— que há-de inegavelmente, no futuro, ser o grande pôrto da Europa — os grandes atlânticos que, vindos do Novo Mundo, despejam diariamente na Europa milhares e milhões de forasteiros, espalhando ouro por toda a parte por onde passam.

É por isso que a construção dêste caminho de ferro que se traduziria de manifesta vantagem para o nosso país, é tambêm uma aspiração do distrito de Castelo Branco. Para prova disso basta que o Senado tome conhecimento duma entrevista que o Sr. Correia Mendes, então Governador Civil, e portanto, interpretando o sentir de todo o distrito, prestou ao Século.

Diz S. Exa. o seguinte:

Leu.

Ao Sr. Ministro do Fomento em quem todos nós reconhecemos a melhor boa vontade em ser útil ao seu País, eu peço que empregue todo o seu prestígio e valor no sentido de urgentemente se proceder ao estudo da linha férrea que, partindo do Entroncamento, atravesse os concelhos de Tomar e Ferreira do Zézere, bem como o distrito de Castelo Branco, de forma a entroncar com as linhas espanholas de Plascencia e a poder ligar Lisboa a Madrid por um trajecto de menos seis horas de duração do que actualmente.

Os clamores do distrito de Castelo

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Branco, são constantes e bem justificados sôbre a necessidade dêste caminho de ferro, visto que só assim poderia exportar a enorme quantidade dos seus produtos, como sejam, cereais, legumes, mel, cera, azeite, cortiças e madeiras que possui em quantidade excessiva, para as suas necessidades, a ponto de se venderem ali pinheiros que deitam dois óptimos barrotes, por dois centavos apenas.

Alêm disso o caminho de ferro da Beira Baixa serve pessimamente os habitantes do distritos de Castelo Branco. Êsse caminho de ferro não atende ás justas necessidades dos povos que atravessa visto, que não necessita trabalhar para aumentar as receitas, por contar com a garantia de juro, que o Govêrno é obrigado a pagar-lhe.

Seria, portanto, tambêm de toda a vantagem fazer-se o resgate dessa linha.

Deixo estas considerações â apreciação do Sr. Ministro do Fomento que procederá, por certo, em harmonia com os interêsses do Pais.

Aproveito a ocasião para chamar a atenção do Sr. Ministro do Fomento, para a necessidade que há em construir-se rapidamente o caminho de ferro que há-de ligar o norte do Alentejo, com a Beira Baixa. O Parlamento já habilitou o Govêrno com a verba precisa para a sua construção, mas ainda não foi estudado na parte compreendida entre Castelo de Vide e o ponto em que há-de entroncar com a linha da Beira Baixa.

Como a ligação daquelas duas províncias muito contribuirá para o seu desenvolvimento, pelas facilidades de transportes que vai proporcionar os seus produtos, eu peço a S. Exa., para que mande estudar a parte ainda não estudada, tam rapidamente quanto fôr possível.

Foi lida e admitida a moção apresentada pelo Sr. Pina Lopes.

O Sr. Ministro do Fomento (Manuel Monteiro): — Diz ao Sr. Pais Abranches que não deixa de tomar em consideração as ponderações de S. Exa., especialmente no que respeita à fiscalização dos produtos agrícolas.

Quando lhe fôr possível e se tiver ensejo, fará uma nova reorganização de serviços era que o princípio da fiscalização referida não ficará esquecido.

Quanto à insuficiência da produção agrícola, a que o Sr. Celestino de Almeida se referiu, está longe de satisfazer as necessidades do país, mas o Govêrno não descura o assunto. É um problema que depende de várias cousas, as quais não está na mão do Govêrno corrigir. Vários alvitres se tem apresentado, mas o que é indispensável é que o Parlamento, na próxima sessão legislativa, encare o problema e o resolva, no que prestará um grande serviço ao país.

Quanto à educação técnica, ela está justificada pela grande disparidade que tem havido entre a modernização dos ensinamentos que são necessários e a falta de instrução por parte das populações a quem compete recebê-las. As dotações consignadas neste orçamento mostram que o assunto não tem sido descurado e que se procura desenvolver consoante as forças orçamentais.

Relativamente à riqueza do nosso solo, S. Exa. tem razão no que disse, e já várias providências tem sido tomadas no sentido de melhor explorar todos os jazigos minerais que há no país.

Pelo que toca à viação acelerada, tambêm entende que é digna de atenção.

Finalmente, a respeito dos operários sem trabalho que, actualmente, são uns 3:500, pertencendo a maioria á indústria das construções, e tendo-se essas construções ressentido em virtude de várias circunstâncias alheias à vontade dêsses operários, não lhe pareceu justo que deixasse de os acolher ao Ministério do Fomento; no emtanto, alguma cousa se tem feito no sentido de diminuir os encargos que pesam sôbre o Estado.

Respondendo ao Sr. Pina Lopes, declara que está perfeitamente de acôrdo com as considerações de S. Exa. acêrca da indústria do turismo, que muito convêm desenvolver.

Disse S. Exa. que estamos num país em que não há estradas. Realmente assim é, e os esforços que se tem empregado para colocar as estradas em condições de poderem servir estão longe de atingir o desideratum que todos desejamos. O serviço dos caminhos de ferro tambêm deixa muito a desejar.

Finalmente, o orador, tendo respondido a todos os pontos tratados pelo Sr. Pina

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Lopes, promete tomar as suas observações na devida consideração.

O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

Lida e posta à votação, é rejeitada a moção do Sr. Pais de Vasconcelos.

Lê-se a moção do Sr. Pina Lopes.

O Sr. Pina Lopes: — Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que eu retire a minha moção.

Foi permitido.

O Sr. Sousa Fernandes (por parte da comissão de administração pública): — Mando para a Mesa um parecer relativo a uma proposta de lei.

Aprova-se a proposta de lei n.° 16—H, na generalidade.

Entra em discussão na especialidade.

São aprovados, sem discussão, os artigos 1.° e 2.°

Entra em, discussão, na generalidade, o capítulo 1.° do Orçamento.

O Sr. José Maria Pereira: — Sr. Presidente: hei-de ter toda a prudência para me conter dentro das praxes parlamentares para que não fim absolutamente ninguêm nas poucas palavras que eu vou proferir.

Se a União Republicana, por meio do seu leader, fez aqui a declaração de que, para não fazer obstrução na discussão do orçamento do Ministério do Fomento, aceitava a restrição do prazo de quarenta e oito horas para a sua entrada em discussão, se fez ainda o sacrifício de vir hoje aqui à sessão, depois dum trabalho extenuante que o Senado tem tido, é porque esperava que a discussão do Orçamento fôsse rápida; mas, adstrito a êste, vem um projecto de lei que deve ser largamente debatido.

E é deprimente para nós irmos votar um tal diploma sem o preciso e refletido estudo.

Nunca as concepções do fantástico, nunca as... (não pronuncio a palavra que meus lábios querem articular, pelo respeito que devo ao Parlamento), sugeriram um tal procedimento.

Trata-se, Sr. Presidente, de, à última hora e de afogadilho, fazer passar uma proposta regularizando a célebre questão das levadas da Ilha da Madeira; trata-se duma proposta que autoriza o dispêndio de 80:000;S e da extinção e criação de lugares, dum conjunto de medidas governativas que reclamam um estudo muito ponderado.

E, sendo assim, devo declarar muito terminantemente, em nome da União Republicana, que não voto tal proposta e que, para honrar o mandato que me conferiram, sairei da sala se a maioria insistir em querer enxertar na discussão do Orçamento uma proposta que pode trazer prejuízos para o Estado.

O orador não reviu.

O Sr. Herculano Galhardo: — Sr. Presidente: reconheço que ao Sr. Senador José Maria Pereira assiste justiça quando diz que a proposta em debate é de grande importância, mas as dificuldades da sua apreciação não são tantas que a mesma proposta deva ser retirada da discussão por êsse motivo.

Êste assunto foi largamente discutido na Câmara dos Deputados, e creio que da discussão que lá teve lugar todos tiveram conhecimento.

Nós todos, ou, pelo menos, a maioria da Câmara, reconhecemos a necessidade de votar o Orçamento e as leis anexas.

Ainda que S. Exa. declare que não vota esta proposta, eu entendo que a maioria a deve votar.

O Sr. José Maria Pereira: — E eu declaro que farei todo o possível obstrucionismo para que essa proposta se não vote.

O Orador: — A responsabilidade fica com S. Exa.; o projecto é importante, sem dúvida, mas, em vez de perdermos tempo com considerações genéricas, eu entendo que faríamos melhor dedicando o nosso estudo à parte do projecto que julgássemos mais digna de ponderação.

O Sr. Presidente: — Como estão inscritos dois Srs. Senadores que pediram a palavra para antes de se encerrar a sessão, e como faltam poucos minutos, se S. Exa. quere eu reservo-lhe a palavra para a próxima sessão.

O Orador: — Então peço a V. Exa. a fineza de me reservar a palavra para a primeira sessão.

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O Sr. António Maria Baptista: — Pediu a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro do Fomento, a fim de S. Exa. tomar providências quanto a umas obras que se estão fazendo no quartel a que êle, orador, pertence.

Presta a sua homenagem às classes trabalhadoras, pelas quais tem muita simpatia: mas renega e antipatiza com todos aqueles que demonstram a maior indolência e apatia pelo trabalho, tratando simplesmente de explorar os dinheiros do Estado.

Nas obras de duas casernas do regimento a que pertence estão empregados dezoito operários.

Essas obras duram há três meses e meio, quando bastavam quinze dias para serem levadas a cabo.

Os referidos operários, em lugar de trabalharem, entregam-se a vários géneros de sport e jogam, de quando em vez o foot ball.

Pede que estas suas considerações sejam levadas ao conhecimento do Sr. Ministro da Guerra.

Observado pelo Sr. Presidente de que está quási a dar a hora, o orador pede para ficar com a palavra reservada.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Estêvão de Vasconcelos: — Mando para a Mesa um parecer.

Eu não estava presente quando o Sr. Pais Abranches apresentou a sua moção. Nós não podíamos Brotar os considerandos; o que poderíamos votar seria a conclusão. Ora a conclusão é esta:

Leu.

O Sr. Pais Abranches: — Não vale a pena estar aqui a discutir isso. Já passou. É escusado estar a falar nesse assunto.

O Orador: — Eu estava a justificar os motivos por que rejeitei a moção de V. Exa.

V. Exa. veio fazer uma comparação que nos levaria a contos largos. Um dêles foi o da Sra. D. Maria Pia ter contraído um empréstimo da Caixa Geral de Depósitos, no valor de 300 contos, do qual veio um prejuízo para o Estado de 150 contos. Eu tenho a convicção de que actualmente se faz uma administração melhor e honesta.

O Sr. Presidente: — Logo há sessão, às 21 horas e meia, sendo a ordem da noite a continuação da discussão da proposta em debate.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas.

O REDACTOR — Alberto Bramão.

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