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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

1918-1919

SESSÃO N.º 19

EM 6 DE FEVEREIRO DE 1919

Presidência do Exmo. Sr. Zeferino Cândido Falcão Pacheco

Secretários os Exmos. Srs.

Luís Caetano Pereira

Guilherme Martins Alves

Sumário. — Verificando-se, pela chamada, haver na sala 19 Srs. Senadores, o Sr. Presidente declara aberta a sessão, aprovando-se em seguida a acta da sessão anterior. Leu-se o expediente. O Sr. Senador João José da Silva, antes da ordem do dia, faz várias considerações sôbre as novas tabelas dos conservadores do registo predial, achando-as exageradas; o Sr. Senador Carvalho de Almeida lê documentos vários, cópias de depoimentos feitos perante a policia internacional dos Aliados contra o Sr. Senador Alfredo da Silva; o Sr. Senador Severiano José da Silva requere, e é aprovado, que se generalize o debate sôbre êsse assunto; o Sr. Senador Alfredo da Silva responde às acusações que lhe foram feitas, considerando-as falsas e ilegítimas, e o Sr Senador Carvalho da Silva, replicando, diz que se limitou a trazer à Câmara, as provas que lhe pediram e que tinha em seu poder. Intervém ainda no debate os Srs. Senadores Luís Gama, que apresenta uma moção, que foi aprovada, tendente a fixar a doutrina de que o Senado nada tem com questões desta natureza, e Machado Santos, que produz novas acusações contra o Sr. Alfredo da Silva, o qual se defende com o mesmo calor com que o fez da primeira vez em que falou.

É concedida a urgência e dispensa do Regimento para o projecto de lei, vindo da. outra Câmara, autorizando o Govêrno a tomar quantas medidas julgar convenientes para debelar rápida-mente a revolução monárquica do norte. Aprova-se sem discussão, depois do Sr. Ministro da Marinha declarar que a autorização solicitada não envolvia nem a faculdade do Govêrno criar novos impostos nem a de contrair empréstimos.

Entra em seguida em discussão o projecto de lei que regula os termos em que os Srs. Senadores perderão, de futuro, o seu mandato. Falam os Srs. Senadores Pinto Coelho, Castro Lopes, Alfredo da Silva, Carneiro de Moura, Luís Gama e Oliveira Luzes, sendo o projecto aprovado com algumas emendas.

A sessão encerra-se às 18 horas e 6 minutos, marcando-se a seguinte para o dia 10, à hora regimental,

Senhores Senadores presentes à abertura da sessão:

Alfredo Monteiro de Carvalho.

Alfredo da Silva.

Artur Jorge Guimarães.

Carlos Frederico do Castro Pereira Lopes.

Cláudio Pais Rebêlo.

Francisco Nogueira de Brito.

Francisco Vicente Ramos.

Germano Arnaud Furtado.

Guilherme Martins Alves.

João da Costa Couraça.

João José da Costa.

João José da Silva.

João Lopes Carneiro de Moura.

José Epifânio Carvalho de Almeida.

José Maria Queiroz Veloso.

Luís Caetano Pereira.

Luís Xavier da Gama.

Tiago César de Moreira Sales.

Zeferino Cândido Falcão Pacheco.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Adolfo Augusto Baptista Ramires.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Alberto Correia Pinto de Almeida.

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António Maria de Azevedo Machado Santos.

Arnaldo Redondo de Adães Bermues.

Constantino José dos Santos.

Domingos Pinto Coelho.

Francisco Martins de Oliveira Santos.

João da Costa Mealha.

João Viegas de Paula Nogueira.

José Júlio César.

José Tavares de Araújo e Castro.

Júlio Dantas.

Luís Caetano Pereira da Costa Luz (Visconde de Coruche).

Severiano José da Silva.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

Adriano Xavier Cordeiro.

Alberto Cardoso Martins de Meneses de Macedo.

Alberto Carlos de Magalhães e Meneses.

Alberto Osório de Castro.

Amílcar de Castro Abreu e Mota.

António Augusto Cerqueira.

António de Bettencourt Rodrigues.

António Maria de Oliveira Belo.

António da Silva Pais.

Cristiano Magalhães.

Duarte Leite Pereira da Silva.

Eduardo Ernesto de Faria.

Fernando de Almeida Cardoso de Albuquerque (Conde de Mangualde).

Francisco do Livramento Gonçalves Brandão.

João Rodrigues Ribeiro.

João de Sousa Tavares.

José António de Oliveira Soares.

José Freire de Serpa Leitão Pimentel.

José Joaquim Ferreira.

José Marques Pereira Barata.

José Novais da Cunha.

José Ribeiro Cardoso.

José dos Santos Pereira Jardim.

Júlio de Campos Melo e Matos.

Júlio de Faria de Morais Sarmento ((Visconde do Banho).

Luís Firmino de Oliveira.

Manuel Homem de Melo da Camara (Conde de Águeda).

Manuel Jorge Forbes de Bessa.

Manuel Ribeiro do Amaral.

Mário Augusto de Miranda Monteiro.

Pedro Barbosa Falcão de Azevedo e Bourbon (Conde de Azevedo).

Pedro Ferreira dos Santos.

Sebastião Maria de Sampaio.

Às 14 horas e 50 minutos, estando presentes 19 Srs. Senadores, o Sr. Presidente declara aberta a sessão.

É lida e aprovada a acta da sessão anterior.

Às 15 horas estão presentes 22 Srs, Senadores.

Dá-se conta do seguinte

Expediente

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja indicado a que Mosteiros e Conventos se referem os livros existentes no chamado Arquivo dos Próprios Nacionais.

Pelo Ministério da Justiça que me seja dito qual a data do primeiro livro paroquial de cada uma das seguintes freguezias: Alhandra Setúbal, as 4 freguesias. (Anunciada, Graça, S. Sebastião e S. Julião) e Azeitão (Vila Fresca e Vila Nogueira).

Refiro-me evidentemente à data mais antiga.— Nogueira de Brito.

Mandou-se expedir.

Notas de interpelação

Declaro que desejo interpelarão Sr. Ministro do Comércio sôbre o estado de conservação de estradas nacionais e distritais — Tiago Sales.

Mandou-se expedir.

O 3r. João José da Silva: — Continuando no uso da palavra, que me ficou reservada na sessão anterior, passarei a ocupar-me da tabela de emolumentos das conservatórias do registo predial, apresentada por decreto de 26 de Abril de 1912. E, para se fazer uma idea exacta da constituição das verbas da dita tabela, será necessário um exame retrospectivo e em confronto da mesma com as tabelas anteriores, a começar pela tabela anexa e,o decreto de 1 de Julho de 1863.

Emolumentos fixados por esta tabela:

Descrição e inscrição, 80 réis; inscrição, averbamentos, cancelação e outros actos, 40 réis.

A execução dêste decreto foi regulamentada pelo regulamento de 24 de Agosto de 1854, que não fez alteração alguma na tabela.

Êstes vencimentos eram mínimos, porque na própria tabela foram arbitrados

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vencimentos aos conservadores, ajudantes e amanuenses.

Veio depois a tabela aprovada por decreto de 24 de Abril de 1873, na qual foram fixadas as seguintes verbas de emolumentos:

Nota de apresentação, 100 réis; descrição, 100 réis; inscrição de 50$000 a 100$000 réis, 50 réis; de 1:000$000 réis a 20:000$000 réis, desprêso de qualquer fracção, por cada 100£000 réis, 50 réis; de valor indeterminado, 500 réis; cancelamentos, 500 réis; averbamentos, 250 réis.

Como se mostra, o limite máximo do valor para o efeito de cálculo do emolumento pela inscrição era de 20:000$000 réis, de maneira que o emolumento da inscrição não podia exceder a 10$000 réis.

Na tabela anexa ao regulamento de 20 de Janeiro de 1898 fixaram-se os seguintes emolumentos:

Nota de apresentação, 100 réis; descrição, 100 réis; inscrição de 50$000 réis a 100$000 réis, 50 réis, e daí por diante proporcional e indefinidamente, por cada 100$000 réis, 50 réis; de maneira que pela inscrição dum prédio ou crédito hipotecário do valor de 100:0005000 réis pagava-se o emolumento de 50$000 réis, e assim indefinidamente, aumentando sempre 50 réis por cada 1ÔO$000 réis.

Foi, finalmente, publicada a tabela em vigor, anexa ao decreto de 26 de Abril de 1918, na qual se fixaram, entre outras, as seguintes verbas de emolumentos:

Nota de apresentação, $20; descrição, $20; inscrição de 50$ a 100$, $10, e assim proporcional, indefinidamente e sem limitação alguma, por cada 100$, despresada qualquer fracção que não preencha esta quantia, $10; de maneira que pela inscrição dum prédio ou crédito hipotecário do valor de 100.000$ o emolumento será de 100$, de 150.000$ será de 150$, e assim sucessivamente, aumentando sempre $10 por cada 100$, até o infinito.

Ora devemos confessar que um tal emolumento é uma exorbitância, uma extorsão legal, um verdadeiro desaforo. O conservador fica sendo sócio, em conta de participação, do comprador e do credor, sem emprego de capital e sem se expor às contingências e perigos do negócio, devendo notar-se que êstes encargos oneram sobremaneira a propriedade.

Os emolumentos são equiparados a tributos, e devem ser moderados, em harmonia com o trabalho de quem pratica os actos pelos quais saio devidos e-com as circunstâncias de quem os há-de pagar.

Dir-se há que os conservadores têm o direito de viver desafogadamente â custa dos emolumentos que percebem, Assim é, porque dignus est - operarius - mercede sua, sed est modus in rebus, deve-se pagar a quem trabalha, mas em todas as cousas há a maneira de ser, e ninguêm tem o direito de locupletar-se á cuata da factura alheia. A carestia da vida tem entrado em todas as casas, mas esta situação económica é transitória e os emolumentos são permanentes.

Dir-se há que os conservadores não têm vencimento, nem aposentação, mas poderão exercer a profissão da advocacia, e quási todos são advogados, e podem fazer-se substituir quando se inhabilitem para o serviço.

Dir-se há que os contribuintes não reclamaram contra o aumento das verbas de emolumentos, e, portanto, conformaram-se com êle, mas esta coarctada não tem valor algum. Os contribuintes estão dispersos por todo o país e não há entre êles coesão e unidade moral para fazerem uma reclamação colectiva. Alêm disso, ignoram geralmente tais aumentos, e só os conhecem quando têm de os pagar, e exigindo-lhes maior quantia do que esperavam, espantam-se, exasperam-se, barafustam, mas pagam com língua de palmo, e ninguêm lhes acode.

Quem devia representar e protestar eram as associações de classe, tais como a Associação Central de Agricultura Portuguesa, a Associação de Proprietários de Lisboa, a Liga Agrária do Norte, a Associação de Agricultores e Proprietários do Norte de Portugal, os sindicatos e associações agrícolas do continente, etc. Mas as dilações, que são peculiares à nossa gente, a somnolência, o desconhecimento do que se passava, ou a presunção de que quaisquer reclamações seriam desatendidas, como geralmente acontece quando os governos não se preocupam muito com o interêsse dos povos, fez talvez com que corressem à revelia êste e outros negócios que interessavam a todo o país.

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Eu como representante da Nação, é que não deixarei passar em julgado tal enormidade.

Nas comarcas de Lisboa e Pôrto são muito frequentes as transacções de grande valor sôbre prédios rústicos e urbanos.

Nas outras comarcas são muito raros. Por isso sou de parecer que a comissão respectiva, que tem a seu cargo rever os decretos publicados pelos diferentes Ministérios, prestará um grande serviço ao país e defenderá a causa da justiça, restabelecendo para as comarcas de Lisboa e Pôrto a tabela anexa ao decreto de 20 de Janeiro de 1898, que representa uma boa retribuição, e que para as outras comarcas seja reduzido a metade o aumento das verbas de emolumentos de, tabela anexa ao decreto de 26 de Abril de 1918. E, se assim proceder, merecerá o galardão dos actos meritórios e o reconhecimento dos povos A exultabent essa humiliata. Continuarei a singrar nas mesmas águas, quando me fôr possível. Tenho dito.

O Sr. José Epifânio Carvalho de Almeida: — Antes de começar a leitura dos documentos que fiquei de apresentar hoje nesta Câmara, devo fazer uma rectificação aos extractos que alguns jornais publicarão acêrca do que eu aqui ontem disse. Declarei que traria à Câmara a prova da existência de capitais alemães na Companhia União Fabril, mas não declarei que podia afirmar ou documentar o monarquismo do Sr. Alfredo da Silva, nem a existência do aparelho de telegrafia sem fios na fábrica do Barreiro. O que apenas disse foi «que era o que por aí se dizia». Feitas estas declarações, que são absolutamente necessárias, passo a fazer a leitura dos documentos a que ontem me referi, a fim de V. Exa. e o Senado poderem avaliar do valor dos mesmos.

Leu.

V. Exas. estão vendo que estas declarações são precisas.

Leu.

Tenho ouvido falar em algumas dezenas de libras; porêm não o posso afirmar por isso que não o sei. E esta urna das declarações que fazem parte de processo que estou lendo à Câmara.

Leu.

Diário das Sessões do Senado

O Sr. Alfredo Monteiro: — V. Exa. ontem fez declarações mais concretas do que as de hoje. Parece-me que está fugindo um pouco.

O Orador: — Estou apenas lendo os documentos a que ontem mo referi.

Leu.

O Sr. Presidente: — V. Exa. tem apenas um minuto para acabar a leitura que iniciou.

O Sr. Severiano José da Silva: — Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que seja generalizado o debate, com prejuízo da ordem do dia.

Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.

O Orador: — Existem nestes depoimentos termos que eu não desejaria usar. Vejo-me, porêm, obrigado a isso por estarem neles, escritos.

O Sr. Alfredo Silva: — Faça favor de ler tudo.

O Sr. Luís Gama: — V. Exa. poder-me há dizer qual a profissão do individuo que faz essas declarações?

O Orador: — Foi guarda livros da Casa Tinoca Limitada.

Leu.

São êstes os documentos a que ontem me referi.

Tenho dito.

O Sr. Alfredo da Silva: — Sr. Presidente: o que ontem se passou nesta Câmara, e de que tive hoje conhecimento pelos jornais, e o ocorrido hoje não tem precedentes na história dêste Parlamento ou de qualquer outro. (Muitos apoiados).

Sr. Presidente: não tenho condições oratórias para bem modelar um discurso; no emtanto vou responder com serenidade às considerações feitas pelo Senador Carvalho de Almeida.

Ao que se vê é esta, Sr. Presidente, a gratificação que se dá em Portugal a um homem trabalhador, honrado e com uma vida cheia de iniciativa, em favor da economia nacional e do desenvolvimento de indústrias fundamentais para o nosso país.

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Aquele Sr. Senador fez várias e especialíssimas acusações, uma verdadeira mistura ou salada de perfídia o delação, onde sem olhar á qualidade se utilizou de arguições de toda a espécie e de toda á gente.

Sr. Presidente: eu tenho a minha consciência tranquila e a confiança na justiça que me fará a Câmara que me está ouvindo.

O Sr. Carvalho de Almeida apresentou três acusações e que são: a primeira de caracter político: favorecer os monárquicos em revolta comunicando com êles por um pôsto de telegrafia sem fios montado nas fábricas do Barreiro. Começou hoje por dizer que desta acusação não tinha provas e se limitava a reproduzir o que ouvira dizer. A segunda acusação é de ser germanófilo; terceira de ter ocultado, como gerente da Companhia União Fabril, a existência de capitais alemães na mesma.

Começarei por referir-me à prime;ra acusação, que envolve insinuações do caráter político. Irei depois ás restantes; todas são de igual valor.

Estive, com efeito, matriculado, ou, como se diz, inscrito no partido monárquico regenerador liberal, no tempo em que o mesmo foi chefiado pelo Sr. João Franco, e nessa situação política fui Deputado da Nação.

Quando o Sr. João Franco abandonou a chefia do partido regenerador liberal ou no mesmo dia, ou no dia seguinte, despedi-me do partido regenerador liberal, declarando, em carta publicada no Diário de Noticias, que me retirava da política, e nunca mais fiz parte de nenhuma agremiação política, quer monárquica, quer republicana. Quem afirmar o contrário, mente.

E se estou neste lugar é porque fui eleito como representante da indústria de Lisboa, tendo eu declarado que abstinha por completo a política das funções que vinha exercer, e V. Exas. devem ter visto que tenho sido um dos mais silenciosos membros desta Câmara, exactamente porque no período parlamentar que temos atravessado tem-se tratado mais da questão política que das questões que interessam às fôrças produtivas do país, e daí a figura apagada que eu tenho tido nesta casa do Parlamento.

Eu repito: não tenho tido, desde que o Sr. João Franco deixou o partido regenerador liberal, filiação partidária de qualquer espécie, apesar de ter sido solicitado por vários partidos da República para me inscrever neles, e não oculto a V. Exa. que aquela que mais me tentou foi a orientação política a que presidiu o falecido, e ainda creio que chorado, Dr. Sidónio Pais.

Apesar, porêm, de ser por vezes instado escusei-me sempre para fins políticos, não negando nunca a minha fraca-colaboração económica, que pode ter sido inepta, mas que foi sempre sincera e desinteressada.

Fiz parte dama corporação, talvez a mais alta que tem havido na República, o Conselho Económico Nacional, e se essa corporação se dissolveu, ou por outra, se foi a Belém o seu presidente apresentar a sua demissão ao Chefe de Estado, não foi, Sr. Presidente, e estão aqui muitas pessoas que o sabem, por eu ter deixado de empregar todo o meu esforço em benefício do país e em serviço dele, tanto quanto pude, tanto quanto soube e em quanto me foi possível e pelo mesmo Conselho julgado útil, ao sentirmos a ineficácia da nossa acção, todo o Conselho se demitiu.

Desculpe-me a Câmara que lhe roube algum tempo na minha defesa, mas eu necessito de o fazer.

Levantaram-se dúvidas, fizeram-se insinuações o acusações graves; tudo precisa esclarecer-se.

Disse tambêm o Sr. Carvalho de Almeida que se faz por aí acusação de que eu estava interessado no movimento monárquico ou que tinha ligações com monárquicos. Ora eu devo dizer a V. Exas. que se eu tive uma efémera acção política, ainda não há muito, foi no sentido, de procurar exactamente a êste país um caminho em que se unissem todos os esforços, e do qual resultaria não a queda da República, mas, porventura, o esfacelamento das fôrças políticas monárquicas e a consequente consolidação do regime republicano pela integração de elementos valiosos na sua acção governativa.

Já vê V. Exa. e a Câmara que quem assim procede e quem assim procedeu não está metido em conspiratas; preparou.

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pelo contrário, um plano que as teria em absoluto evitado.

O que se passou no norte do país, Sr. Presidente, soube-o quando da apresentação do Ministério, e eu nada diria sôbre a minha, acção política se não fôsse posta aqui em jôgo e não se fizesse a insídia duma minha fantástica intervenção em política monárquica, que eu nada fiz para praticar. Creia a Câmara que nos factos que neste momento lançam o país numa desgraçada guerra civil nenhuma interferência tive, próxima ou longínqua, e torpe e é uma insídia vil o dizer-se que eu trabalhei, eu trabalho, ou tenho ligação com o movimento monárquico do norte. Lastime que êsse movimento se desse, que é desgraçado, mesmo debaixo do ponto de vista monárquico, e o que a num país importa, debaixo do ponto de vista nacional, como desgraçado o será tambêm debaixo do ponto de vista conservador. E, som ser conservadora, a República tambêm tam pouco viverá; isso, porêm, para mim seria o menos, mas o peior é porque tambêm o não seguir-se uma orientação conservadora atingiria o país na sua estrutura e vitalidade. É isso que me aflige, menos pelo presente que pelo futuro.

Sr. Presidente: há muitos factos que me desgostam neste momento, como português, e que me entristecem, como insignificante cidadão dêste país. Tenho momentos de desânimo, tenho monentos em que o meu desejo é ir para um sítio era que viva uma vida tranquila, que aqui se não vive. Está-se num desassossêgo permanente. Ignora-se o dia de amanhã.

Quem tem responsabilidades administrativas, como eu, vê diante de si dias cheios de hesitação e de perigos para todos, desde os que têm muito ou pouco que perder até aqueles que só vivem do trabalho de cada dia.

Mas, Sr. Presidente, não é por estes processos que se me faz arredar pé nem largar o meu posto. Não Isso é não conhecer a minha natureza combativa. Actos corço aquele que acaba do se praticar na Câmara, são daqueles que em vez de me aproximar duma reforma a que a minha idade e o passado de actividade que tenho tido me dariam direito me chamam à actividade.

Já o Senado vê como eu poderia ter Ligações com o movimento do Pôrto, se o
condeno e o lamento e se tive uma acção política que a frutificar o teria evitado.

Tenho pena, sim, de não ter ligações com o Pôrto como tenho em virtude de lá ter haveres meus e dos meus administrados e não poder orientar os meus empregados ali na sua administração no período de crise que ali se tem atravessado.

Devo acrescentar a isto que o isolamento em que está o norte de Portugal chega-me a surpreender, porque parece que essa^ parte do país já não è portuguesa. Êsse isolamento, Sr. Presidente, faz sofrer muita gente e prejudica muita outra que nada tem com a aventura monárquica.

Sôbre a tal telegrafia sem fios, digo com franqueza, que eu o que tenho pena é que uma pessoa que deve ser inteligente e ilustrada, que deve compreender as responsabilidades da sua situação no Senado, venha fazer-se eco de boatos, de cousas vagas e absurdas como o de ligações por telegrafia sem fios com monárquicos, sem pensar que isso poderia prejudicar, um colega na Câmura. Porque a verdade, Sr. Presidente, é que o Sr. Carvalho de Almeida chamou a si o papel de denunciante e de delator... dum colega, sem razão, sem fundamento, só para denunciar, acusar...

Que tristeza!... que tristeza!...

O Sr. Carvalho de Almeida (interrompendo): — Eu o que fiz, não foi por espírito do delação; fi-lo por espírito de patriotismo. V. Exa. julgará todavia, como quiser, que eu assim o julgarei para mim.

O Orador: — Bem... O Sr. Carvalho de Almeida fez acusações por patriotismo, mas fez-se tambêm eco daquilo que ouviu, o que é inteiramente inadmissível, se não tinha a convicção do que veio aqui afirmar ou insinuar.

Depois, Sr. Presidente, foram lidos os tais depoimentos, dos quais, eu creia-o V. Exa. e creio-o a Câmara não pude ouvir todos os nomes.

O primeiro pareceu-me que era dum Henriques da Silva... ex-empregado da Companhia União Fabril, ao que pareceu e dela foi despedido.

O Sr. Carvalho de Almeida (interrompendo): — Sim senhor.

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de 6 de Fevereifo de Í919

O Orador:— Foi êsse depoente meu empregado. Funcionário era êle tam importante, que me não lembra sequer, ao ouvir o áeu nome, do lugar que ocupou.

Mas antes de entrar na especialidade •da "matéria referente ao tal Silva, vou dizer algumas palavras relativas ás minhas relações com o Sr. Martirn Weinstehr •donde proveta a acusação basilar do meu. pretenso germanofilismo.

Conheci aqueíe senhor numa assemblea geral da Companhia Aliança Fabril, pequena companhia que foi a base para criar o que se chama hoje a grande União Fabril. O Sr. Weftistein representava 'um •então grande accionista da Aliança Fabril o Sr. Motti o uma comunhão de interêsses fez-nos trabalhar juntos.

Assim, conheci aquele senhor e o conhe-

cimento que adquiri nas relações que com

.ele tive das. suas qualidades e carácter

ligou-me a êle por relações de amizade.

Não há nisto crime, nem me envergonho de o referir. Portugal não estava em guerra com a Alemanha. Bem depois dêstes factos procurava até Portugal desenvolver as relações com a Alemanha, criando uma companhia em Angola no género das companhias inglesas da costa oriental •em que entraram capitais portugueses e alêmães.

Isto é um facto;

Organizou-se -uma missão de estudo às nossas possessões da África Ocidental composta de técnicos alêmães e portugueses. Tratava-se do caminho de ferro do Humbe, se bem me recordo, e doutros empreendimentos ligados ao mesmo.

Ao mesmo tempo promovia-se a- formação da Companhia já referida e era eu convidado pelo Sr. Weinstein para ser o presidente dessa empresa que seria poderosa e lucrativa.

(jSabem V. Exas. qual foi a minha resposta?

Negativa em absoluto. Tambêm' posso dar testemunha disto.

A minha resposta foi: essa Companhia é, na minha opinião, contrária aos interêsses portugueses, nunca devia portanto ser consentida. Essa companhia teria*sido um desastre pára a nossa África1.

. E neguei-me a qualquer colaboração -— contrariando-a mesmo no que pude.

Instou-se comigo, fizeram se-me solicitações; porêm a mim, convencido como estava de ser prejudicial a companhia às nossas colónias, ninguêm me moveu na minha resolução.

Em Sintra o Ministro da Alêmanha veio pessoalmente convidar-me para êsse cargo porque visto ecr fazer guerra a essa companhia, porque, rialmente lhe declarava guerra aberta, por a considerar prejudicial aos interêsses da soberania portuguesa, o Govêrno alêmão queria entregando se me a presidência que eu pudesse verificar que a minha atitude era injustificada e que na presidência da companhia tinha situação para evitai actos prejudiciais aos interêsses portugueses.

Fique a Câmara sabendo, e pela minha honra juro que digo a verdade. Nada houve que me movesse; e desde então o Sr. Eosen ficou fazendo uma tal apreciação do meu carácter que me levou a rejeitar o que tanta gente lhe solicitava quando se declarava a guerra e, antes de partir, veio a minha casa despedir-se de mim e disse-me que antes de partir devia à minha integridade de carácter todas as homenagens, não tendo encontrado, em toda a sua carreira, quem lhe tivesse revelado têmpera superior ou, porventura, igual em questões de honra, carácter e patriotismo.

É certo que eu fui à estação do caminho de ferro entregar um ramo de flores à esposa do Sr. Eosen.

£ Que admira isso, se essa senhora era a mulher dum indivíduo com o qual eu mantinha amigáveis relações e que fora pessoalmente despedir-se de mim?

Pois eu vi dias depois, tendo de ir a Madrid, o embaixador de Inglaterra naquela corte Mr. Harding entregar um ramo de flores à esposa do Sr. Rosen, e. não me consta que a Inglaterra tivesse censurado o seu representante por ofere-1 cer flores à esposa do ex-Ministro dum país inimigo.

Eu não cometi um acto condenável; cometi uín acto de cortesia. Assim ô entendo em minha coflsciência.

Vou passar à questão dos capitais alêmães na Companhia União Fabril.

O Sr. Martin Weinestein, que muito auxiliou a União* Fabril, tinha capitais

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empregados nesta companhia. Foi assim credor e accionista de certa importância desta companhia.

O Sr. Weinstein era um homem muito inteligente e, quando a Inglaterra entrou na guerra contra a Alemanha, isto é muito antes de Portugal estar no conflito, logo previu que os bens alemães seriam arrolados, porquanto Portugal viria por certo a ter de entrar no conflito ao lado da sua velha aliada.

Weinestein dizia-me: preocupa-me o meu crédito na Companhia, porque você não pode pagar-me prontamente, e o arrolamento de bens de alemães vem a dar-se, é questão de tempo. Mas £ Companhia pagou prontamente tudo o que devia à firma do Sr. Weinestein, recorrendo a créditos que pôde, com a minha intervenção e responsabilidade pessoal obter, e com suprimentos que obtive no Banco Ultramarino, onde empenhei haveres meus, ficando assim a Companhia com o mesmo crédito que possuía aqui e no estrangeiro e sem capitais do Sr. Weinestein ou de qualquer outra firma alemã.

Quanto às acções, tenho a dizer que, em 4 de Agosto de 1913, Weinestein ainda possuía, números redondos, 600 acções da Companhia União Fabril que, nessa data, pôs ao portador.

O dividendo de 1913 ainda foi Weinestein que o recebeu em 1914. Neste ano, porêm, Weinestein que, logo qut se iniciou a guerra, tratara de liquidar o grosso dos seus bens em Portugal, anunciou-me o seu intento de vender as suas acções da Companhia União Fabril, preguntando com quantas eu queria ficar. Fixado o preço, declarei que lhe ficava com todas, e observou-me logo:

É preciso, porêm, que você me pague prontamente, porque eu quero aproveitar o câmbio para a transferência do valor da venda.

Foram para o Montepio por isso os títulos adquiridos e outros para fazer dinheiro, e ainda lá estão, e parte por causa dum saldo que devo.

O resto dêsse pagamento, como êle queria realizar o dinheiro, fez-se parte em dinheiro e o resto sacando êle sôbre mim 120 ou 150 contos, não me recordo já.

Isto não são cousas fictícias, são factos. A transacção ficou assim completa e ultimada muito antes de Portugal entrar em guerra com a Alemanha. Tudo isto está verificado por peritos competentes.

As letras sacadas por Weinestein foram por êle descontadas no Banco de Portugal e, ao aparecerem mais tarde estas letras a cobrança, houve reparos do Govêrno Português, mas por fim esclareceu-se o assunto por completo e eu paguei as letras ao Banco de Portugal. O credor era então já aquele Banco e o pagamento era, portanto, devido e legítimo.

Aqui tem V. Exa. e a Câmara como é que Weinestein esteve interessado na União Fabril e como de lá saiu.

Para que se haviam de viciar os livros? Para que eram, ou podiam ser, em tais condições, essas pretendidas manigâncias de emendas, de tirar folhas de um livro de registo de títulos?

Quanto a conta dinheiro, a escrituração é por partidas dobradas. Todos os livros jogam uns com os outros. Só quem não sabe o que é uma escrituração por partidas dobradas é que pode supor possíveis tais manobras e com a facilidade que os tais depoentes apresentaram. Uma conta está na letra U e passa para a letra A; isto é de dar vontade de rir...

Eu tenho, e não posso deixar de ter, muitos inimigos, porque é isso que acontece a quem tem feito a sua carreira como eu.

Assim que se declarou a guerra europeia e Portugal entrou no conflito caíram sôbre mim as dificuldades com a Inglaterra, e foram tais, que eu me vi obrigado a fazer um relatório que enviei, em 19 de Outubro de 1915, ao cônsul britânico em Lisboa para que êle fizesse, em meu nome, saber ao Govêrno Inglês que a Companhia não era inglesa, que era portuguesa, e que os seus capitais eram portugueses.

Nesse relatório, porque os ingleses são práticos, eu pus, em cifras claras, o volume das transacções que tinha, como gerente da União Fabril, com a Inglaterra.

Sabe V. Exa. o que aconteceu?

Veio a resposta em 19 de Novembro transmitida pelo cônsul, dizendo as condições em que se davam todas as facilidades para eu poder continuar a negociar com a Inglaterra. Eram:

1.° Deixar o Sr. Weinstein de fazer parte dos corpos gerentes da Companhia.

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2.° Passar o seu lugar a ser ocupado por um proposto do Govêrno de Sua Magestade Britânica.

3.° Que os livros e o arquivo da Companhia fossem verificados por um perito nomeado pelo Govêrno Britânico.

Ouvi o meu conselho de administração.

O Sr. Weinstein tinha-se retirado para Espanha, já não estava, portanto, em serviço.

Assim o n.° 1.° estava satisfeito, com o n.° 3.° concordou-se, com o n.° 2.° não pôde aceitar-se por ser contrário dos estatutos, propôs-se em substituição a nomeação dum controle.

Comunicámo-lo ao Govêrno Inglês e êste, por fim, por intermédio do Ministério dos Estrangeiros, em nota de 13 de Janeiro de 1916, que eu tenho aqui, fez-me saber as condições em que se levantavam todos os embaraços e dificuldades, que eram precisamente as da minha contraproposta e relações com a Inglaterra.

O Govêrno Inglês nomeou, portanto, o perito que fez todos os exames aos livros, correspondência, títulos e arquivos da Companhia — êste fez o seu relatório, que creio que foi por completo satisfatório.

Nomeou-se o controle e a Companhia União Fabril tem tido todas as facilidades no seu comércio com os países aliados, apesar das calúnias dos seus inimigos que são muitos, como a Câmara teve aqui mesmo a prova.

Devo ainda observar a V. Exa. que Portugal não estava então ainda em guerra com a Alemanha. Estava a Inglaterra, e por isso justifica-se que o exame e o lugar de controle fôsse feito e ocupado por delegados daquele Govêrno. As relações e movimento no estrangeiro duma casa como a União Fabril são extensos e por isso justifica-se que procurassem com estas medidas criar facilidades indispensáveis a uma casa de tal importância.

Assim, em vez de estarmos a cada passo de ter de responder a preguntas dos emissores ingleses, fizemos entrar a censura em casa e assim abreviámos todas as comunicações com o estrangeiro.

Passamos a ter todas as facilidades para nos mexermos como se fôssemos uma sociedade inglesa.

Isto nada tem de atentatório para a soberania nacional.

Vejam V. Exas., pensem, reflitam, e apelo mesmo para o Sr. Carvalho de Almeida a quem nunca falei, e apenas conheço de nome e há muito tempo, não tendo razão nenhuma para supor que S. Exa. não seja um homem de bem...

O Sr. Carvalho de Almeida (interrompendo): — Desejo que V. Exa. saia daqui reabilitado das acusações que eu não fiz, mas de que me fiz eco; e declaro que a defesa de V. Exa. me está agradando.

Desejo que V. Exa. saia daqui ilibado. É êsse o meu maior desejo.

O Orador: — Quem não tem um inimigo?

Quantas vezes se passa por êles sem sequer os conhecer... e êles a fazerem insinuações.

Quanto à tal casa de Sintra, suponha V. Exa. que eu, que frequentei a casa dêsse homem, Martin Weinstein, e de quem era amigo, tinha comprado a sua mobília. O que tinha isso de censurável?

Para comprar essa casa não precisava ir pedir dinheiro a amigos ou inimigos, usava apenas dum direito de cidadão, visto os móveis terem sido leiloados. Nem isso porêm fiz; outrem comprou o mobiliário, por certo por isso não ser defeso.

Pareceu-me que o Sr. Carvalho de Almeida, no que veio aqui dizer, não se esquece que era sócio ou gerente de concorrentes da Companhia União Fabril, a Sociedade Indústria e Adubos e a Sociedade Tinoca.

Tenho aqui as escrituras.

Era, tambêm, o Sr. Azancot um interessado e colega do Sr. Carvalho de Almeida naquelas firmas. E a propósito eu vou contar o que se passou comigo quando hoje saltava para o meu automóvel para vir para a Câmara.

Chegou-se junto de mim um empregado meu que me disse tinha de me contar um caso grave. Chama-se êste empregado Soares Folkier, que declarou ter um cunhado na casa dos Srs. Azancot e Carvalho de Almeida e que fora chamado por êsse parente em Junho de 1918, convidando-o a ir para a casa do Sr. Azancot que é a mesma do Sr. Carvalho de Almeida, o qual lhe dava uma boa gratificação e mais ordenado se lhe dissesse

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que havia na União Fabril falsificações de escrita e irregularidades!

O Sr. Folkier recusou tam indigna proposta.

Fala-se nos papéis, que o Sr. Carvalho de Almeida leu, em gratificações a empregados em certa data em que outros não receberam.

Vou explicar. Eu tenho um sistema de exigir trabalho como de pagar correspondentemente.

No fim do ano, na véspera do Natal, distribuo da Companhia gratificações c. todos os empregados, até o mais modesto operário. Depois, quando são fechadas as contas, fica reservada certa verba para se repartir pela parte pensante do pessoal, e assim essa distribuição faz-se portanto, não a todo o pessoal, mas apenas ao que mais concorreu para os resultados do ano.

Disse o Sr. Machado Santos, segundo os jornais, que eu tinha prejudicado o Estado em dezenas de contos. Se S. Exa. estivesse presente gostaria de obter da sua pessoa uma resposta concreta, porque eu nunca julguei que tivesse prejudicado o Estado fôsse no que fôsse. Se o Sr. Carvalho de Almeida, depois do que me ouviu, perfilha aquelas acusações que leu, feitas por vários indivíduos, eu então peço que fique cópia delas para eu poder depois tirar certidão, defender-me e acusar perante os tribunais.

E a Câmara se me não julga digno do estar aqui, eu sairei humilhado, mas não convencido da minha culpabilidade e sairei, dizendo que se fez uma injustiça!

Mas nas mãos de V. Exa. e da Câmara eu entrego me confiadamente à sua decisão.

Vozes: — Muito bem.

O Sr. João José da Silva: — Ter-se há a Câmara constituído em Tribunal do Justiça para julgar das acusações feitas ao Sr. Alfredo da Silva?

O Sr. Presidente: — Não, senhor.

O Sr. Luís Gama: — Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte moção:

O Senado, afirmando o seu propósito de se ocupar dos assuntos de interêsse nacional, que competem a esta assemblea, manifesta o desejo de que se não tratem os de ordem pessoal ou da competência doutros Poderes do Estado, passa à ordem do dia. — Luís Xavier da Gama.

Não compreendo que esta Câmara possa arvorar-se em Tribunal de Justiça para julgar quem quer que seja. Os depoimentos lidos já tinham sido apresentados à comissão ou tribunal competentes, que os deve ter apreciado. Logo, se não lhes deu andamento, foi porque entendeu que o seu valor pouco era, não havendo neles motivo para subsequentes procedimentos. Assim, como se pretendo deslocar a questão para aqui? Que temos nós com semelhante assunto?

Falo sempre com sinceridade. Deixe-me, pois, V. Exa. Sr. Carvalho de Almeida, dizer-lhe que foi enganado na sua boa fé. E foi enganado porque os autores dêsses depoimentos são oficiais do mesmo ofício, resultando as suas acusações de rivalidades que existem entre a Tinoca e a União Fabril. Ora o Senado nada tem com isso.

Se se entende que o Sr. Alfredo da Silva foi um mau patriota e que deve prestar contas dos seus actos, é aos tribunais que compete pedir-lhas. Pôsto isto, permita-me V. Exa. que diga com franqueza que acho perfeitamente, absolutamente descabida a leitura dos documentos que o Sr. Carvalho de Almeida trouxe a esta Câmara. Os depoimentos agora revelados, foram feitos perante uma comissão que não lhes deu andamento. Quererá porventura V. Exa. pedir providências ao Govêrno para proceder contra uma entidade como aquela que ouviu os depoentes, arguindo-a de ter interêsse em ocultar a falsificação duma escrita?

Foi por a polícia internacional dos aliados não ter dado anda mento ao processo, que eu disse que a situação do Senado não é a um tribunal, porque nem as disposições do Regimento, nem a Constituição da República lhe permitem que tais funções assuma.

Estas questões só nos tribunais devem ser levantadas. Se alguém pretender servir-se desta sala para derimir questões pessoais, não o poderemos consentir, por isso não ser próprio desta casa.

Tenho dito, Sr. Presidente.

O orador não reviu.

A moção foi lida na Mesa e admitida pelo Senado.

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O Sr. Carvalho de Almeida: — Quero acentuar mais uma vez, Sr. Presidente, ao Sr. Alfredo da Silva, que comecei por fazer uma rectificação à notícia dos jornais de hoje, relativa às provas que viria aduzir perante V. Exa. O que prometi ontem, fi-lo hoje: trouxe as provas que tinha. Quanto aos entendimentos do Sr. Alfredo da Silva com os revoltosos do Pôrto por meio de telegrafia sem fios, é isso voz corrente. E por o ser, é que me julguei no direito de pedir esclarecimentos ao Govêrno sôbre tam grave assunto.

É claro que não teria ontem feito as acusações que fiz se não as pudesse comprovar, porque não formulei essas acusações para que o Senado se arvorasse em tribunal, que o não é, mas simplesmente com o desejo de esclarecer um caso que atingia o mesmo Senado no seu prestígio.

O Sr. Alfredo da Silva: — V. Exa. perfilha êsses depoimentos ou não?

O Orador: — Não, senhor. Se os perfilhasse era porque conhecia integralmente a questão e eu não a conheço bem. As acusações que fiz eram baseadas nos documentos que tinha. Depois de ouvir a defesa de V. Exa. fico convencido de que não praticou um crime da natureza daquele do que o arguiam.

E, de resto, Sr. Presidente, o meu desejo é que o Sr. Alfredo da Silva possa sair perfeitamente ilibado das acusações que ontem aqui fiz e que constam dos documentos que já tive ocasião de ler à Câmara.

O Sr. Alfredo da Silva: — V. Exa. mantêm as suas acusações?

O Orador: — Um tribunal competente é que poderá resolver o assunto.

O Sr. Alfredo da Silva: — O assunto é bastante delicado; ou V. Exa. retira as acusações que fez, e então o incidente fica liquidado, ou não as retira, isto é, mantêm as acusações que fez, e nesse caso o meu procedimento tem de ser diferente, pois, como V. Exa. e a Câmara compreendem, estamos aqui falando ao País, por intermédio dos jornais. Repito: ou V. Exa. retira as acusações que fez, e assim fica liquidado, ou as mantêm e nesse caso o meu procedimento tem de ser muito diferente.

O Orador: — Como a Câmara compreende, eu não posso perfilhar essas acusações por isso que elas não são feitas por mim. Constam, porêm, dos documentos que tive ocasião de ler à Câmara.

O Sr. Alfredo da Silva: — Então não as perfilha...

O Sr. Carvalho de Almeida: — Naturalmente.

O Sr. Machado Santos: — Antes de mais nada, Sr. Presidente, devo dizer a V. Exa. e à Câmara que concordo absolutamente com a doutrina da moção apresentada pelo Sr. Luís Gama. Em face das declarações do Sr. Carvalho de Almeida, e da defesa do Sr. Alfredo da Silva, eu vou dizer à Câmara o que penso sôbre o assunto.

Não me resta, Sr. Presidente, dúvida nenhuma de que houve uma falsificação.

Pela defesa do Sr. Alfredo da Silva, reconhece-se que êsse Senador foi amigo, do Sr. Martin Weinstein e averigua-se que apenas ofereceu um ramo de flores à espêsa do Sr. Ministro da Alemanha, depois de feita a declaração de guerra,, na ocasião em que êsse diplomata deixou o nosso país.

Há, porêm, alguma cousa mais. Há pouco, Sr. Presidente, pessoa absolutamente idónea, afiançou-me, ali fora, nos corredores da Câmara, que em Outubro do ano passado, o vapor Lisboa, da Companhia União Fabril, transportou para Vigo, consignado a alemães, um carregamento de 4:000 caixas de gasolina, destinadas aos submarinos inimigos. Isto se foi verdade, representa um crime de alta traição.

Quanto aos depoimentos que acabam de ser lidos, a Câmara, por emquanto não tem de se pronunciar sôbre êles. O que há a fazer é enviá-los à polícia? Só depois disso e do Govêrno os analisar é que se pode proceder contra a pessoa que neles é visada.

Até lá todos os juízos terão de ser suspensos. É esta a declaração que tenho a. fazer a V. Exa. e à Câmara.

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O Sr. Alfredo da Silva: — Ouvi a declaração do Sr. Carvalho de Almeida e devo dizer que a impressão que me ficou de S. Exa. não pOde ser mais favorável, porque S. Exa. sinceramente disse perante a Câmara o que a sua consciência lhe ditava, Ao Sr. Machado Santos direi que S. Exa. fez-me pena, porque depois do que acabava de passar-se ninguêm podia super que da boca dêsse Senador saíssem LS afirmações que todos ouvimos. Efectivamente, o Sr. Machado Santos saíssem desta sala e. chegando aí à escada encontroa logo pessoa categorizada que o autorizou a poder lançar sôbre a minha honra uma acusação tremenda, mal eu tinha provado a inanidade doutras.

Porque semelhante perseguição? Incomodo aqui V. Exa.?

Nunes, e incomodei e podia tê-lo incomodado se quisesse.

O Sr. Machado Santos sabe que isso não é muito difícil.

Mas ramos ao que importa. O vapor Lisboa fez duas viagens a Santander, em datas que não posso precisar. Mas se fôr necessário, trarei à Câmara os documentos da alfêndega respeitantes is duas viagens do referido vapor, para que tudo se verifique. Afirmo, porêm, desde acue da primeira viagem o Lisboa levou 60 toneladas de tabaco da Companhia Mercantil Internacional e trouxe soda cáustica; da segunda, levou areia, porque não havia frete, carregando tambêm sede, cáustica, de que eu necessitava por ter as fábricas paralisadas.

Assim, Sr. Machado Santos, a acusação que V. Exa. fez aqui é uma infâmia, o o acto que V. Exa. praticou não se pratica no Parlamento.

Tenho dito, Sr. Presidente.

O Sr. Machados Santos: — Querem ver a V. Exa. e à Câmara as palavras que proferi: o assunto é de polícia e ao Senado nada interessa; é um case que o Govêrno terá de apreciar, depois co que se passou nesta Casa do Parlamento.

Há meses já que eu sabia que sôbre o Sr. Alfredo da Silva posavam graves acusações. Era a voz corrente em Lisboa Dizia-se, até, que S. Exa. ir ser preso e que fornecia gasolina aos alemães.

Vozes: — Provas! Provas!

O Orador: — O que desejo é que as provas pedidas nada provem contra o Sr. Alfredo da Silva. Mas, que isso seja averiguada pela polícia. Parece-me que O principal interessado em que o assunto se, esclareça, em que se faça sôbre o caso um rigoroso inquérito, é o Si. Alfredo da Silva; depois, somos nós todos.

Já diziam os romanos que, «não bastava que a mulher de César fôsse honesta;

O Sr. Alfredo da Silva (para explicações): — Sr. Presidente! Eu já expliquei tudo e fiz até uma curta auto-biografia. Posso afirmar que «esta da gasolina», é como a da telegrafia sem fios. E como cão posso andar â gastar tempo ceai provas, direi que provem a minha culpabilidade, para eu depois provar a
minha inocência (Apoiados).

O Sr. Presidente: — Vai ler-se a moção mandada para a Mesa pelo Sr. Senador Luís Gama.

Lida na Mesa a moção, foi posta à votação, sendo aprovada.

O Sr. Luís Gama: — Peço a V. Exa.

Sr. Presidente, que faça consignar na acta que a minha moção foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Ministro da Marinha (Tito de Morais): — Sr. Presidente: peço a, V. Exa. que submeta à apreciarão do Senado uma proposta de lei vinda da Câmara dos Deputados, que tem carácter urgente, e que em por fim pedir uma autorização para o Govêrno poder tomar as medidas necessárias para a dobei ação da insurreição monárquica e acudir a vários serviços que se ligam com os acontecimentos do norte do país.

É lida na Mesa a seguinte:

Proposta de lei

Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a tomar todas as medidas do carácter militar e financeiro conducente a debelar inteira e rapidamente a actual insurreição monárquica.

Art. 2.° O Govêrno, logo que seja definitivamente sufocado o movimento ou insurreição monárquica dará conta ao Congresso da República do uso que tiver

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feito da autorização constante do artigo antecedente.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Palácio do Congresso da República, em 5 de Fevereiro de 1919.— J. Nunes da Ponte — Francisco dos Santos Rompana — João Calado Rodrigues.

O Sr. Castro Lopes: - Requeiro urgência e dispensa do Regimento para a proposta a que acaba de se referir o Sr. Ministro da Marinha.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se a proposta.

Seguidamente lê-se a proposta na Mesa.

O Sr. Presidente: — Vai-se proceder à votação nominal.

Seguidamente procedeu-se à votação nominal.

Aprovaram a dispensa do Regimento os seguintes Srs. Senadores:

Adolfo Augusto Baptista Ramires.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Alberto Correia Pinto de Almeida.

Alfredo Monteiro de Carvalho.

Alfredo da Silva.

António Maria de Azevedo Machado Santos.

Arnaldo Redondo de Adães Bermudes.

Carlos Frederico de Castro Pereira Lopes.

Cláudio Pais Rebêlo.

Constantino José dós Santos.

Domingos Pinto Coelho.

Francisco Martins de Oliveira Santos.

Francisco Nogueira de Brito.

Francisco Vicente Ramos.

Germano Arnaud Furtado.

Guilherme Martins Alves.

João da Costa Mealha.

João José da Costa.

João Lopes Carneiro de Moura.

João Viegas de Paula Nogueira.

José Epifânio Carvalho de Almeida.

José Júlio César.

José Maria Queiroz Veloso.

José Tavares de Araújo e Castro.

Júlio Dantas.

Luís Caetano Pereira.

Luís Caetano Pereira da Costa Luz (Visconde de Coruche).

Luís Xavier da Gama.

Severiano José da Silva.

Tiago César de Moreira Sales.

O Sr. Presidente: - A Câmara aprovou a dispensa do Regimento para a discussão da projecto indicado pelo Sr. Ministro da Marinha.

É lido na Mesa o projecto.

O Sr. Castro Lopes: — Declaro, era nome da maioria, que aprovo o projecto que acaba de ser lido na Mesa, tanto mais não havendo nele nada que autorize a Govêrno a lançar impostos, ou a contrair empréstimos.

O projecto é aprovado sem mais discussão.

O Sr. Ministro da Marinha (Tito de Morais): — Declaro ao Senado que o projecto que acaba de ser aprovado se refere apenas aos serviços e diligências consignados nos considerandos da mesma proposta, e que não envolve, conseguinte-mente, a faculdade de se lançarem impostos, nem do se contrair qualquer empréstimo. Trata-se apenas de autorizar o Govêrno a dotar-se com os recursos financeiros indispensáveis para esmagar os revoltosos.

O Sr. Castro Lopes: — Requeiro a dispensa da última redacção para a proposta que acaba de ser aprovada.

O Senado aprova a dispensa pedida. É lida na Mesa a seguinte proposta apresentada pelo Sr. Severiano José da Silva.

Proposta

Artigo 1.° Os Senadores perdem os seus lugares na respectiva Câmara nos seguintes casos:

1.° Quando perderem a qualidade de elegíveis;

2.° Quando, sem motivo justificado, não tomarem assento na respectiva Câmara até a oitava sessão ordinária da legislatura, ou não comparecerem a dez sessões consecutivas;

3.° Quando renunciarem ao mandato que lhes foi conferido pelos eleitores, devendo em todo o caso apresentar a sua renúncia ao presidente da respectiva Câmara;

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4.° Quando, durante a sessão legislativa, forem nomeados pelo Govêrno para emprego ou comissão retribuída que lhe não pertença por lei, regulamento ou concurso, excepto no caro de transferência para cargo de igual categoria e retribuição.

§ 1.° As faltas serão verificadas pela comissão do Regimento de faltas e infracções, que emitirá parecer sobro a sua participação quando se pretenda justificá-las.

Sala das sessões do Senado, em 3 de Fevereiro de 1919.— João José da Silva (com a declaração de que se conforma com a proposta, não obstante Mie parecer mais conforme aos princípios que a penalidade fôsse cominada por uma lei, com sanção pelas faltas cometidas pelos Senadores) — Alfredo Monteiro de Carvalho.

Transformada em projecto de lei e aprovado com as emendas feitas durante a sua discussão.

Foi admitida.

O Sr. Luís Gama: — Não há número. Requeiro a contagem.

O Sr. Presidente: — Há número.

O Sr. Severiano José da Silva: — Proponho que seja substituída no parecer da comissão a palavra «proposta» por «projecto de leia.

É aprovada esta proposta.

O Sr. Pinto Coelho: — Parece que se trata só duma substituição de pala\ra, mas a verdade é que essa substituição traz como consequência uma diferença importante de trâmites a seguir. Estou perfeitamente de acôrdo com a proposta conforme as considerações que ontem aqui fiz. Antes, porêm, de prosseguir, e por ai devia ter começado, permita-se V. Exa. que agradeça a todos os Senadores que ontem falaram depois de mim as amáveis referências que tiveram para comigo. O Sr. Carneiro de Moura chegou a dizer que eu era o enfant gaté desta casa. Peço licença para dizer a S. Exa., como já particularmente o fiz, que me parece imerecida a classificação, porque a característica do enfant gaté é achar pouco tudo quanto lhe fazem, ao passo que eu sou o mais sensível que é possível a todas as provas do consideração que me são dirigidas, e agradeço-as de todo o coração.

Entendo que não é por via regimental que se pode introduzir uma penalidade tam grave, como é aquela de que se trata, e importa perda a um Senador eleito da. sua qualidade de Senador.

Chamo a atenção da Câmara para o confronto, que me parece muito sugestivo, dos artigos 170.°, 171.° e 172.° do Regimento com os artigos 20.° e 21.° da Constituição, nos quais se mencionam factos e circunstâncias que são defesas aos Senadores; simplesmente o Regimento, depois dessas disposições, não apresenta a sanção da perda do mandato, e a Constituição, pelo contrário, depois dêsses artigos, num parágrafo único, pretende estabelecer doutrina sôbre o assunto.

Leu.

Como já ontem aqui disse, não posso crer que os redactores do Regimento não tivessem inserido a penalidade por esquecimento ou lapso.

Pois não era natural que, depois de se ter dito o que não era permitido fazer, se dissesse qual a sanção aplicável a quem violasse o preceito adoptado? pode admitir-se que, em caso tam grave, houvesse esquecimento?

Mas, repito, esta minha ilacção adquire um valor muito frisante desde que se comparem as disposições do Regimento com as da Constituição. E essa comparação parece que é de grande importância. E como o Congresso tem poderes constituintes, entendo que êle pode resolver a dificuldade introduzindo na Constituição ou no Regimento as disposições que achar convenientes para regular as circunstâncias em que um Senador perde o seu mandato, ou promulgando uma lei que a tal se destine.

Dou o meu voto ao projecto em discussão. Entendo que não se trata duma simples ampliação do Regimento, sendo indispensável uma lei, elaborada por um Congresso com atribuições constituintes, que regule de vez a questão.

O orador não reviu.

O Sr. Castro Lopes: — A hora vai adiantada, e esta discussão tambêm. Já ontem tínhamos votado êsse projecto se não fôsse a falta de número.

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O Sr. Luís Gama: — Que hoje se repete.

O Orador: — Sendo assim, V. Exa. sabe de quem é a culpa. Poucas considerações tenho a fazer por serem desnecessárias. Responderei apenas ao Sr. Dr. Pinto Coelho, dizendo que a comissão aceita a proposta apresentada pelo Sr. Severiano José da Silva.

O Sr. Pinto Coelho: — Não sabia que a perfilhava, senão não teria falado.

O Orador: — Estamos pois de acordo. Visto que se trata duma proposta que tem que ir à outra Câmara, mando para a Mesa a seguinte

Emenda

Proponho que no artigo 1.° do projecto de lei em discussão se acrescente à palavra «Senadores» a de «Deputados» e no § 1.° do artigo 4.° se acrescente igualmente a mesma palavra «Deputados». Acrescentar ao projecto o artigo.

2.° Fica revogada a legislação em contrário.— Castro Lopes.

Vozes: — Não há número.

O Sr. Luís Gama: — Requeiro a contagem.

O Sr. Presidente: — Há número. Vai ler-se.

Leu-se na Mesa a proposta e o projecto com a alteração proposta.

O Sr. Alfredo da Silva: — Proponho uma alteração ao artigo 2.° Êsse artigo tal como está redigido, pode dar lugar a certas dúvidas, e assim proporei, na discussão na especialidade, que se modifique aquela redacção.

O projecto é aprovado na generalidade. Entra em discussão na especialidade.

É aprovado o artigo 1.°

Entra «m discussão o artigo 2.°

O Sr. Alfredo da Silva: — Mando para a Mesa a seguinte proposta de emenda:

Proponho que no n.° 2.° do artigo 1.° do projecto de lei de aditamento ao Regimento Interno do Senado sejam acrescentadas as palavras «nas mesmas condições» entre as palavras «comparecerem» e «dez». — Alfredo da Silva. É admitida.

O Sr. Adães Bermudes: — Parece-me que êsse projecto de emenda não satisfaz, porque as disposições que ficarem consignadas devem ser de tal maneira claras, que a perda do mandato se faça automaticamente. Ora, se a perda do mandato, no caso das dez faltas, fica dependente de justificação, as dez faltas podem dar-se no princípio da sessão legislativa e a justificação ficar para o fim da sessão. Assim, o Senado podia chegar a não poder funcionar.

Deve ser, pois, essa expressão substituída por outra, como esta: «quando, sem consentimento da Câmara, dêem mais de dez faltas consecutivas».

Vozes: — Isso está previsto na proposta.

O Orador: — Nesse caso, desisto de fazer qualquer proposta de harmonia com as considerações que a Câmara acaba de me ouvir.

Lê-se a proposta de novo.

É aprovada a proposta do Sr. Alfredo da Silva.

O Sr. Machado Santos: — Requeiro a contraprova.

Feita a contraprova, reconhece-se que foi aprovada a proposta mencionada.

É lido o artigo com a emenda.

É lido o n.° 3.°

O Sr. Pinto Coelho: — Pregunto: entende-se que a renúncia fica exclusivamente dependente do arbítrio do Senador, ou é necessário que a Câmara dê a sua aprovação a essa renúncia? Creio que é da praxe a Câmara aceitar ou não a renúncia; e, desde que a Câmara a não aceita, o Senador tem de continuar no exercício das suas funções.

O Sr. Machado Santos: — Parece-me que a Câmara, representada pela Mesa, costuma sempre insistir com o Senador para que desista da renúncia.

O Sr. Luís Gama: — Eu tenho dúvidas sôbre se o Senador pode renunciar. E aprovado o artigo 3.º Lê-se o artigo 4.°

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O Sr. Carneiro de Moura: — Peço a eliminação do artigo 4.°, por a sua doutrina figurar na Constituição de 1911,

O Sr. Machado Santos: — Mas o facto de ficar no Regimento não prejudica a Constituição.

É aprovada a emenda apresentada pelo Sr. Carneiro de Moura.

São lidos os §§ 1.° e 2.°

O Sr. José Júlio César: — Manda para a Mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o último período do § 2.º fique assim redigido:

«Serão ouvidos, nos termos gerais de direito, os respectivos interessados, «onde o prazo de trinta dias, quando notificados aos interessados por editais no Diário do Govêrno, reduzido a quinze».— José Júlio César.

Lida na Ilesa, foi admitida.

O 3r. Luís Gama: — Não concordo com uma tal disposição, porque, com ela, caímos no mesmo mal. Os Senadores que estão no norte, ficam da mesma forma lesados, pois, devido à revolta, não pedem justificar a sua ausência.

Por consequência, voto a primeira Q a segunda parte da emenda. A última parte, referente aos éditos de trinta dias, não a posso votar nas actuais circunstâncias, porque não sei o tempo que durarão as operações no norte contra os revoltosos, visto estarmos em dois países: os de lá não teem o Diário do Govêrno de cá e os de cá não lêem o de lá...

(Risos).

O Sr. Queiroz Veloso: — Desejava que me dessem uma explicação: o interessado deve ser sempre ouvido, mas só no caso de perder o mandato?

Vozes: — Há-de ser sempre olvido.

O Sr. Queiroz Veloso: — Pois eu propunha a eliminação dessa parte do artigo.

O Sr. Luís Gama: — E quem não pode vir também perde o mandato?

Uma voz: — Justifica a falta.

O Orador: — E quem não puder justificar a falta?

O Sr. Queiroz Veloso; — Lá está a comissão de infracções para apreciar essa circunstância.

O Sr. Luís Gama: — Não posso concordar com a doutrina exposta pelo Sr.- Queiroz Veloso. No estado de guerra em que nos encontramos não só pode saber onde estão os Senadores que faltam às sessões. Não há correios, não há telégrafo, não há emfim maneira de comunicar com todo o país.

Podemos, por isso, eliminar do Senado pessoas que tenham tanta, vontade de colaborar connosco como V. Exa. deve ter.

O Sr. Queiroz Veloso: — Mas o parecer da comissão de infracções tem de vir sempre ao Senado...

O Sr. Luís Gama: — Mas eu o que não queria era que tal doutrina fôsse sequer apresentada ao Senado.

O Sr. Castro Lopes: - Requeiro que seja prorrogada a sessão até se votar o projecto.

Foi aprovado.

O Sr. Luís Gama: — Não tenho desejos de estar aqui a fazer discursos, nem mesmo o que digo, de discurso pode classificar-se. O que pretendo é tratar a questão com a maior lialdade e sinceridade, não desejando que me tomem por impertinente por usar da palavra mais duma vez sôbre o mesmo assunto. Mas não posso deixar de o fazer visto que o meu empenho é o de que mais tarde se não possa dizer que a lei foi mal feita e que por êsse facto se praticam abusos.

Estou absolutamente de acôrdo com as observações feitas pelo ilustre Senador que me antecedeu no uso da palavra. V. Exa. dá o prazo de quinze dias para a justificação depois de ser publicado o aviso no Diário do Govêrno. Pois contento-me com êsse prazo, que julgo preciso para emquanto durar o estado anormal em que nos encontramos, isto é, o estado de guerra.

Por consequência, todo aquele que passados quinze dias, depois de feita a pu-

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blicação do aviso no Diário do Govêrno não comparecer, e emquanto durar o estado de guerra, será eliminado dessa Câmara. Pode muito bem acontecer que Senadores haja que tenham muito empenho em vir para Lisboa, a fim de comparecerem às sessões e não o possam fazer, devido à dificuldade que existe em passar do norte para o sul. E para a Câmara saber até onde vão essas dificuldades? Um parente meu que foi ao Pôrto, havia quinze dias que não dava notícias suas. Pois ontem recebeu-se um telegrama dele, datado de Vigo, dizendo que regressaria cá por Madrid.

Já vê a Câmara as dificuldades que há em regressar do norte, neste momento.

O Sr. Afonso de Melo: —A minha opinião é a de que o projecto deve ser votado tal como está.

O Orador: — Desde que a Câmara tome o compromisso a que já me referi, estou de acordo.

O Sr. José Júlio César: — Peço a V. Exa., Sr. Presidente, se digne consultar a Câmara sôbre se permite que eu retire a minha proposta.

(A Câmara resolveu afirmativamente).

O Sr. Oliveira Luzes: — Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer um aditamento
ao projecto que se discute, no sentido de todo e qualquer Senador poder justificar a sua ausência até quinze dias depois de feita a publicação do aviso, chamando-o, no Diário do Govêrno, isto emquanto durar o estado de guerra em que nos encontramos.

O Sr. Presidente: — Tendo o Sr. José Júlio César retirado a sua proposta, não sei se terão lugar as observações de V. Exa.

O Orador: — Se o projecto ficar como a proposta enviada para a Mesa não faço reparos nenhuns.

O Sr. Presidente: — Não está mais ninguêm inscrito. Vão ler-se os dois parágrafos.

Lidos, foram postos à votação sendo em seguida aprovados.

O Sr. Castro Lopes: — Requeiro a V. Exa. a dispensa da última redacção. Foi aprovada.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é na segunda-feira, sendo a ordem do dia —pareceres de comissões.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 5 minutos.

O REDACTOR—Adelino Mendes.

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