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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DO SENADO
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EM 4 DE JUNHO DE 1920
Presidência do ELmo Sr. António Xavier Correia Barreto
Secretários os Ex.mos Srs.
l Luís Inocêncio Ramos Pereira í Alfredo Augusto da Silva Pires
Sumário. — .!•> lõ horas c 5 minuto-,, abre a Cessão com 29 SJ-B. Senadores presentes. É tida e aprovada a achi. Dá-sc conta do expediente. O Sr Senador Soveral liodtigu.es alvitra que sejam licenceadas praças do exército para auxiliar os ceifas no Alentejo; o Sr. Senador Desidério Beça pede que se conceda à Sociedade de Instrução Militar preparatória N." l a sua antiga sede, que era no extinto convento de Santa Alai ta; o Sr. Senador Nunes do Nascimento insiste pelo imediato pagamento duma indemnização devida pelo Estado à Casa do Cadayal, pela expropriação do Colégio dos Lóios. em Évora. Responde aos oradores antecedentes o Sr. Ministro da Guerra. O Sr. Senador Heitor Passos pede que se aumente a subvenção para ajudas de custo aos sub-inspectores primários e pregunta se há ou não há exames de segundo (jrau. O Sr. Ministro da Instrução dá as respostas convenientes e pedidas pelo orador precedente.
Ordem do dia. — Discute-se o parecer n.° 359, nobre a promoção do coronel da reserva Henrique Ribeiro de Almeida. Fala o Sr. Senador Júlio Ribeiro, sendo o projecto com o pertence anexo, aprovado. Segue-se o projecto n.° 372, concedendo o bronze para o monumento aos mortos da Grande Guerra, a erigir em Chaves. É aprovado. O Sr. Senador Dias de Andrade realiza uma interpelação ao Sr. Ministro da Guerra, sobre o castigo aplicado ao tenente Miguel Bacelar Duarte, de Santo Tirso. O Sr. Minist) o da Guerra dá, explicações.
Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Senador Bernardino Machado refere-se à trasla-dação dos restos mortais do Dr. Sidónio Pais e à entreí/a da& insígnias da Torre e Espada à cidade de Lisboa.
Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Alfredo Augusto da Silva Pires.
Alfredo Narciso Marcai Mcirtins Portugal.
António Alves de Oliveira. António Gomes de Sousa Varela. António Maria da Silva Barreto. António de Oliveira e Castro. António Xavier Correia Barreto. Armindo do Freitas Ribeiro de Faria. Artur Octávio do Rego Chagas. Bernardino Luís Machado Guimarães. Bernardo Pais de Almeida. César Justino de Lima Alves. Desidério Augusto Ferro de Beça. Ernesto Júlio Navarro. Ezequiel do Soveral Rodrigues. Heitor Eugênio de 'Magalhães Passos. Hereulano Jorge Galhardo. João Carlos de Melo Barreto. Joaquim Pereira Gil de Matos. Jorge Frederico Velez Caroço. José Duarte Dias do Andrade. José Joaquim Pereira Osório. José Mendes dos Reis. José Nunes do Nascimento. Júlio Augusto Ribeiro da Silva. Luís Inocêncio Ramos Pereira. Manuel Augusto Martins. Raimundo Enes Meira. Ricardo Pais Gomes.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Abel Hipólito.
Alberto Carlos da Silveira.
Amaro Justiniano de Azevedo Gomes.
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Diário da* Sessões do Senado
Celestino Germano Pais de Almeida. Constando do Oliveira. Cristóvão Moniz. Francissc Vicente Ramos. Henrique Maria Travassos Valdês. João Joaquim André de Freitas. - José Augusto Artur Fernandes Torres. José Bionísio Carneiro de Sousa o Faro José Joaquim Fernandes de Almeida. José Machado Serpa. Luís António de Vasconcelos Dias. Manuel Gaspar de Lemos. Eodrigc Alfredo Pereira de Castro. Rodrigo Guerra Alvares Cabral.
Srs. Senadores que não compareceram à sessão.
Abílic de Lobão Soeiro.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Ar.tónio Augusto Teixeira.
António Maria Baptista.
António Vitorino Soares.
Arnaldo Alberto de Sousa Lobilo.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
Augusto César de Vasconcelos Correia.
Francisco Manuel Dias Pereira.
João Namorado de Aguiar.
Joaquim Celorico Palma.
José Jacinto Nunes.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Eamos Preto.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Nicolan Mesquita.
Pedro Alfredo de Morais Rosa.
Pedro Amaral Boto Machado.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Silvério da Rocha e Cunha.
Torcato Luís de Magalhães»
Vasco Gonçalves Marques.
Ás 15 horas e cinco minutos, estando presentes 29 Srs. Senadores, o Sr. Presidente declara aberta a sessão. Ã acta é lida e aprovada sem reclamações.
Procede-se à -leitura, do
Expediente
Pareceres
Da comissão de instrução sobre o projecto de lei n.° 273, determinando que possam ser nomeados professores efecti-
vos de designadas escolas primárias convertidas em oficiais, os professores dessas escolas quando satisfaçam exigidas condições.
Imprima-se e distribua-se.
Da comissão de marinha sobre o projecto de ]ei n.° 398, ig1 alando para todas as classes o plano de uniformes dos oficiais guardas-marinhas o aspirantes da armada.
Imprima-se e distribua-se.
Da comissão de legislação civil sobre o projecto de lei n.° 414, concedendo amnistia geial para todos os crimes políticos e religiosos.
Imprima-se e distribua-se.
Da comissão de finanças, sobre a representação do Monte-Pio Oficial relativa à lei n.° 957 de 3 de Março último.
Imprima-se e distribua-se.
Da comissão de faltas e infracções, sobre os pedidos de licença dos Srs. Senadores José Jacinto Nunes e Júlio Ernesto de Lima Duque.
Aprovado.
Qficio
Do Ministério das Finanças, satisfazendo o requerimento n.° 278, de 23 de Abril último, do Sr. Senador José Jacinto Nunes.
Para Q Secretaria e ao interessado.
Representação
Duma comissão de republicanos de Lisboa, protestando contra, o projecto de amnistia aos presos políticos.
Para G. comissão de legislação.
Últimas redacções
Foram aprovadas as últimas redacções dos projectos de lei n.08 190 e 371, convertendo em Escola Industrial a Escola de Carpiitaria de Bernardino Machado da Figueira da Foz e sobre pesca da baleia no mar dos Açores.
Antes da ordem do dia
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Sessão de 4 de Junho de
O Sr. Bernardino Machado: — Peço a V. Ex.a que me reserve a palavra para quando esteja presente algum dos Srs. Ministros.
O Sr. Soveral Rodrigues : — Tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Guerra a fim de dirigir a S. Ex.a unia reclamação dos lavradores do distrito de Beja, que estão altamente embaraçados com a falta de braços para os trabalhos agiíoolas.
Coino V. Ex.a sabe, o tempo tem corrido muito mal para as colheitas. Os calores têm sido excessivos e os trigos estão, como fé costuma dizer, chegados à foice, e se não forem ceifados, a maior parte deles está perdida.
Por isso pedia ao Sr. Ministro da Guerra que mandasse licenciar o maior número do praças que fosse possível e adiar para mais tarde as escolas de instrução.
, O Sr. Ministro da Guerra (Estêvão Aguas): — O Governo já tomou medidas a respeito do assunto a que S. Ex.a acaba de se referir, atendendo quanto possível os desejos dos sindicatos agrícolas e as necessidades do país.
Foram já expedidas ordens para que as praças que estão na recruta possam entrar no gozo de licença pelo tempo necessário para se proceder às ceifas.
Para precaver a hipótese de esses homens irem para o estrangeiro, determinou--se que fossem obrigados a ir às sedes dos concelhos e às regedorias, em determinados dias, apresentar as suas cadernetas. Não sendo isso possível os encarregados dos serviços sob as ordens de quem esses homens trabalharem serão os responsáveis pela sua apresentação.
Não se podia deixar de tomar esta precaução por virtude da crise que atravessamos da falta de braços para os nossos trabalhos agrícolas.
Espero que com esta medida será atenuada essa crise. Mas, se ela não for suficiente o Governo tomará em consideração o que V. Ex.a disse.
O Sr. Soveral Rodrigues (para eocplica-ções): — Sr. Presidente: cumpre-me agradecer ao Sr. Ministro da Guerra as claras e francas seguranças que dá relativamente à cultura alentejana, os braços de que neste momento tanto necessita.
Sei bem a atenção que merecem ao Sr. Ministro da Guerra todos os assuntos que interessam à riqueza do país, e por isso tenho esperança nas palavras de S. Ex.a
O Sr. Desidério Beça: — Sr. Presidente: pedi a palavra para quando estivessem presentes o Sr. Ministro da Guerra ou o Sr. Ministro do Interior, para referir um caso que me parece merecer toda a consideração.
Foi V. Ex.a, Sr. Presidente, como Ministro da Guerra do Governo Provisório, quem decretou a organização da Instrução Militar Preparatória em Portugal. Mais tarde, sendo Ministro o general Sr. Silveira, regulamentaram-se as respectivas sociedades, que foram constituídas, na sua quási totalidade, pelos antigos batalhões voluntários.
De entre essas sociedades, existe a n.° 9, que foi o antigo batalhão «Miguel Bombarda» o mais tarde «5 de Outubro», tendo combatido activa e lialmente em todos os momentos difíceis para a Kepública; e, por sua iniciativa, foi colocada a lápide comemorativa na casa que na Rotunda serviu de hospital de sangue por ocasião da revolução de 5 de Outubro.
Desde então para cá, essa sociedade tem sempre sido o que realmente deve ser, podendo considerar-se modelar, sem desprimor para ás demais.
Ela manteve simultaneamente escolas primárias para crianças e adultos, uma escola de habilitação porá sargentos e escola de música e canto coral.
Com grande dificuldade, conseguiu-se que o Estado lhe concedesse uma sede no Convento de Santa Joana a Santa Marta, onde essa sociedade se manteve, mostrando sempre ser uma elite verdadeiramente republicana.
Pelo dezembrismo foi abrutamente dasa-lojada da sua sede, para nela se estabelecer a administração geral de sopa económica.
Restabelecida a República, era imperioso dever do Governo restituir a sua antiga sede à Sociedade u.° 9, como, e muito bem, praticou com outras sociedades.
Mas tal não sucedeu, e, muito ao contrário, colocou-se ali uma repartição de finanças.
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Os corpos gerentes, constituídos por bons e liais republicanos, confiando sempre no novo advento da República, acei-tíiram e agradeceram a espontânea e generosa oferta do seu tesoureiro, o Sr. Amorim, estabelecido com mercearia em frente do edifício do convento, para guardar alguns móveis e o arquivo da sccie-dad'3 nuo canto do seu armazém de víveres.
Aí mesmo reuniu algumas vezes a direcção da sociedade, para não reunir no meio da rua, ou no campo onde ministrava s. instrução aos seus alistados, pois que a despeito de tantas- contrariedades e más vontades, sempre se esmerou en. cumprir o seu dever.
Tudo isto consta das actas da direcção e do processo que anda perignando pelos Ministérios solicitando a restituição da sede.
Suceõe, porém, agora, Sr. Ministro da Guerra, que a dona do prédio, vale:ido--se da circunstância que apontei, promoveu mandado de despejo ao referido Sr. Amorim, dizendo o advogado no requerimento básico que o inquilino dera fim diverso à casa alugada, onde funcionava «uma tai instrução preparatória».
Aqui tem V. Ex.a, Sr. Ministro da Guerra, como um advogado se permite o direito de referir-se num tom de menos consideração à instituição que S. Ex.a sabe muito bem ser a base fundamental da nossa organização militar.
Certamente este Sr. advogado escapou, por qualquer circunstância, de pagar o nobre tributo de sangue, dando, contudo, manifesta prova de desconhecer as principais leis do país.
Eu bem sei que o Sr. Ministro da Guerra nada tem com ê&te poiuo, restrito ao Sr. advogado, visto tratar-se duma questão jurídica; mas desejo cha-ruar a atenção de S. Ex.a para que, por qualquer forma e por intermédio do Ministério c.a Justiça, se faça sentir que, para exercer a sua nobre e distinta profissão, não devia ser desprimoroso para instituições classificadas por lei de beneméritas e patrióticas, como são as Sociedades de Instrução Militar Preparatória, r que tocos devemos rodear do máximo prestígio, como base que são da nossa organização militar. Do S. Ex.a o Sr. Ministro da Guerra espero contiadamente
Diário das Sesòões do Senado
que fará restituir à Sociedade n.° 9 a sua sede.
O Sr. Ministro da Guerra (Estêvão Águas):—As considerações do Sr. De-sidério .Beça tenho a dizer que tratarei com o Sr. Ministro Permita-me V. Ex.1 que eu o acompanhe nas suas palavras justas e sentida-mente patrióticas referentes a essa Sociedade e à Instrução Militar Preparatória, que é a base da organização militar do exército. Acerca do edifício para instalação dessa Sociedade, já falei com o Sr. Ministro das Finanças, e posso dizer que todo o Governo está ria intenção de dar melhor sede e instalação a iam benemérita Sociedade. Nessa ocasião o Sr. Ministro das Finanças disse-me que faria todo o possível para ampliar a casa de Santa Marta, a fim de cedor novamente à Sociedade de Instrução Militar Preparatória algumas das suas dependências. Não me afirmou que o fazia, mas disse-me que empregaria todos os seus esforços nesse sentido, visto que o edifício pertence ao Ministério das Finanças. Parece-me quo com estas palavras V. Ex.a ficará sabendo qual é a orientação do Governo sobre o assunto.
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a moralização dos costumes, dentro da maior economia para o Estado.
O Sr. Nunes do Nascimento: — Sr. Presidente : tendo, em tempos pedido a palavra, para quando estivessem presentes os Srs. Ministros da Instrução e do Comércio, esperei até agora, mas não foi possível ver S. Ex.as presentes. Em vista disso, resolvi, há dias, pedir a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Instrução; como também S. Ex.a não tenha comparecido e eu entendi dever fazer sobre o assunto, de que já, por mais duma vez, me ocupei, as minhas considerações, aproveitei a presença do Sr. Ministro da Guerra para as formular, pedindo a S. Ex.a a fineza de as transmitir aos seus colegas da Instrução e do Comércio.
Sr. Presidente: V. Ex.a e o Senado, certamente, desculpar-me-hão de eu voltar, mais uma vez, a falar no assunto, mas eu explico a minha insistência, qual é a de eu não ter sido atendido numa reclamação, aliás da máxima justiça. Refiro--me à célebre .^xpropriação do convento dos Lóios, em Évora.
Até agora, tudo quanto eu tenho dito a respeito do convento dos Lóios tem sido pregar no deserto. Eu com o caso do convento dos Lóios, lembra-me o Sr. Heitor Passos no seu pedido de documentos pelo Ministério da Instrução Pública, sem que, até agora, creio eu, tenha obtido o que Deseja.
O Sr. Heitor Passos: — Já falta pouco para um ano.
O Orador: — O caso é este: desde o primeiro dia em que tomei assento nesta casa do Parlamento, tendo conhecimento de que, já há dois ou três meses, o Estado devia e deve à casa Cadaval, por uma expropriação forçada, alguns contos de réis, sem que, mesmo recorrendo aos meios judiciais; essa casa pudesse conseguir o pagamento dessa importância, resolvi-me a tratar do assunto no Parlamento.
Da primeira vez em que falei no assunto, era Ministro das Finanças, o Sr. Rego Chaves, mas como S. Ex.a não comparecesse nesta Câmara, pedi ao Sr. Melo Barreto, que então ocupava a pasta dos
Negócios Estrangeiros, a fineza de transmitir as minhas considerações a esse seu colega. S. Ex.a, que se dignou ouvir-me, respondeu que transmitiria ao Sr. Ministro do Comércio o que eu dissera. Em vista disso, supus que o assunto corria pela pasta do Comércio, e na primeira oportunidade em que vi o Sr. Ernesto Navarro, que, então, sobraçava essa pasta, consultei-o sobre o assunto, respondendo-me S. Ex.a que ia chamar a atenção do Sr. director geral do seu Ministério para o caso, ou que já tinha chamado esse funcionário para esse fim. Esperei que esse director geral fizesse alguma cousa, mas o tempo passou-se, e o director nada fez, ou, se fez, não deu resultado, continuando a minha reclamação sem seguimento.
Pela saída do Sr. Ernesto Navarro do Ministério, foi ocupar o seu lugar o Sr. Jorge Nunes, e eu voltei à carga com o assunto.
Esse ex-Ministro, depois de me ouvir, respondeu que desconhecia a quentão, mas como o seu antecessor, Sr. Ernesto Navarro, se encontrasse presente, abandonou a sua cadeira de Senador e dirigindo--se à bancada ministerial, disse ao Sr. Jorge Nunes qualquer cousa, que eu calculei ser que o assunto já nào corria pela pasta do Comércio, que agora só podia ser pelo Ministério da Instrução Pública, e que era preciso que este Ministério entregasse ao do Comércio a verba respectiva para se poder fazer o pagamento. E aqui tem, V. Ex.a, Sr. Presidente, como tendo-me eu dirigido a todos os Ministros das Finanças, do Comércio e da Instrução que, ultimamente, têm gerido essas pastas, continuo absolutamente na mesma.
Quem não conhecer do que se trata, poderá imaginar que se trata duma questão de alta importância, quando, afinal, ela^é muito singela.
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A casa Cadaval, porém, entendo u que essa indenini/ação era insuficiente para lhe pagar o edifício, e usando dos ineios l que a lei lhe faculta, veio, num processo do embargos, exigir nova vistoria. Feita , esta nova vistoria, os três peritos que a ela procederam, fixaram em 10.000(5 a indemnização a pagar e em mais mil e tantos escudos para despesas de adaptação.
O Ministério Público que intervinha, oficiosamente, no processo, rcqncreu uma outra vistoria, a qual foi feitc, por cinco i peritos, sendo todos de opinião de que a | indemnização deveria ser de 10.0000 e de mil D tantos escudos a verba para despesas de adaptação. O processo seguiu os seus termos, e o Estado foi condenado nessa sentença.
O Ministério Público recorreu per dever de ofício, a Relação confirmou a sentença o o Supremo Tribunal do Ji.stiça fé?, o mesno. Fui, portanto, pelos "ribu-uafs proferida a última palavra sobre o assunto.
Há quatro ou cinco anos qne o edifício está na posse do Estado servindo para presos políticos e a diterenr-a entre o depósito feito e a quantia fixada para indemnização não tem sido paga ao iuteres-sado.
Trata-se do Estado pagar D.000£ ou 6.0005 que «leve.
Tenho ouvido dizer quási todos os dias que o Zstado *em muito que fazer, mas a primeira cousa ó arrumar a casa.
,; Sondo assim, não se deve começar por pagar a quem se deve?
NSo há maneira de o conseguir. Tenho--me dirigido a todos os Sr-3. Ministros que julgo terem intervenção no caso, peço por favor, recorro aos meios judiciais e nada obtenho.
Já se mo tem dito cm ar de gracejo que a casa Cadaval, interessada no caso. é rica e não precisa de dinheiro.
Isto não é razão para os particulares e muito menos para o Estado.
Espero que tenha sido hoje uma ocasião teliz aquela em que me ocupei deste assunto (5 que o Sr. Ministro ca Guerra, transmitindo o caso ao respectivo Ministro, concorra para que aquele pagamento se Eai;a.
A Câmara certamente me desculpará quo eu volte a este assunto, tantas vezes
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cuantas foram' necessárias até que se lhe cê salda.
O Sr. Celestino de Almeida : — ^Porque é cue V. Ex.a ncio apresenta um projecto de lei nesse sentido?
O Orador : — Se para cada dívida do Estado é preciso elaborar um projecto de lei, a fim de ^e conseguir o seu pagamento, teremos então muitíssimo que fazer.
Trata-se de um processo que correu todas as instâncias e sobre o qual os tribunais j ádisseram .a última palavra.
Peço portanto ao Sr. Ministio da Guerra o favor de transmh.T as minhas considerações ao Sr. Ministro da Instrução a tim de ver «o S. Ex.1"1 ntr-nde este pedido, que ó de toda a justiça; e, \isto que estou no uso da palavra vou, se V. Ex.'1 me der Jicença, referir-me a outro assunto.
O Sr. Presidente:—Permita V. Ex/' que o Sr. Ministro da Guerra responda à primeira parto do seu discurso.
<_ que='que' de='de' ilustres='ilustres' parlamentares.='parlamentares.' tag0:_='aguas:_' trasmitirei='trasmitirei' declaração='declaração' faço='faço' se='se' desse='desse' me='me' outros='outros' ex.1='ex.1' instrução='instrução' mas='mas' _='_' a='a' desde='desde' retirava-me='retirava-me' guerra='guerra' outra='outra' ao='ao' sr.='sr.' p='p' câmara='câmara' as='as' na='na' respcnder='respcnder' ministro='ministro' tenho='tenho' estêão='estêão' já='já' v.='v.' licença='licença' considerações='considerações' da='da' porque='porque' xmlns:tag0='urn:x-prefix:aguas'>
O Sr. Nunes do Nascimento: — O outro assunto que eu desejava tratar não corre pela pasta do Sr. Ministro da Instrução.
| Peço pais, a V. Ex.£ o favor, que agra-., deço, de lhe transmifr as considerações
. qne acaboi de fazer.
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meteu-me adoptar qualquer medida tendente a remediar semelhante estado de cousas; mas qualquer proxidêucia só pode ser útil se for adoptada muito rapidamente, isto é, antes de terminar o actual ano económico.
Desejava portanto saber se S. Ex.a tinha procedido no sentido da sua promessa.
Também careço de saber de vez se há ou não exames de segundo grau.
É certo que S. Ex.a já disse que não havia esses exames ; mas como nós estamos já habituados a ver que nem sempre vale a palavra dos Ministros, e eu não quero %isar o actual, embora se tenha lido nos jornais que o actual Ministro da Instrução está na disposição de não permitir o realização dos exames, o que é certo também é que esta descrença na palavra dos Ministros dá lugar a fazerem-se constantes pregimtas a esse respeito, havendo dificuldade em responder com segurança.
Desejava, pois, saber se S. Ex.a está na disposição de não fazer exames, tanto mais que estamos no fim do ano lectivo e ainda não vi publicado nenhum regulamento que fixe a maneira dos alunos transitarem das escolas primárias para os liceus.
A respeito deste assunto aguardo a resposta de S. Ex.a
Por último como vai passado quási um ano que requeri os documentos relativos às nomeações de professores para as es colas primárias superiores, faço mais um pedido a V. Ex-a e é que me sejam enviados os documentos que já se encontram no seu Ministério ; os outros virão conforme forem chegando ali.
Ainda a um outro ponto eu desejo referir-me.
Vi há poucos dias num jornal a notícia de que ia ser ou tinha sido nomeada uma comissão para proceder à reforma dos serviços do Ministério da Instrução — redução de quadros e intensificação do trabalho.
Vi lá, entre outros nomes o do Sr. Queiroz Veloso. Ora isto parece-me uma consa irritante, porquanto já nesta casa do Parlamento se disse que esse senhor era um dos tubarões da República, que tinha oito logares a desempenhar, e eu não posso compreender que um homem
que tem oito cargos se possa desempenhar bem deles. Positivamente esse homem não trabalha; esse homem mal pode, portanto, fazer uma conveniente redução no pessoal do seu Ministério, que teria como consequência uma produção de mais e melhor trabalho. E em assuntos desta natureza mal pode ter voz quem está habituado a fingir que trabalha, e que trabalha terrivelmente em sete ou oito empregos.
Espero que S. Ex.a dará as explicações que julgar convenientes acerca dos assuntos que acabo de expor.
O Sr. Ministro da Instrução (Vasco Borges):—Pedi a palavra para dizer ao Sr. Heitor Passos, relativamente ao primeiro assunto a que S. Ex.a se referiu, o aumento de subsídio aos inspectores de instrução primária quando saem em serviço, que esta situação não ó só dos inspectores, é de muitos outros funcionários.
Esse assunto vai ser remodelado num diploma que a todos diz respeito.
O Sr. Ministro das Finanças vai publicar um decreto obviando a esta situação precária, que, como disse, não é só para os inspectores.
Nesta ocasião há, por exemplo, para as escolas superiores, onde o júri dos exames tem de ser mixto, grande dificuldade em organizar esse júri, porque os professores de Lisboa, da Faculdade de Letras, e os de Coimbra, não se dispõem a sair dessas cidades apenas com o subsídio de 2ó>õO, que não lhes chega.
Essa situação é a de muitos funcionários, incluindo os de finanças, e por isso resolveu-se acudir a todos, incluindo-os no mesmo diploma. Esse diploma ou decreto já foi a Conselho de Ministros, onde obteve alterações que não permitiram que o mesmo decreto fosse publicado. Sê-lo-há em breve.
Pelo que respeita a exames de instrução primária, preciso dizer, sem que isso represente da minha parte um parti pris, pois não tenho, nem podia ter, neste lugar teimosias ou intenções reservadas. O meu desejo — o meu único desejo — é que se cumpra a lei, visto as leis serem feitas para se cumprirem.
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de prestigiai- a República cumprindo todas as leis.
Estou, como digo. na disposição de cumprir a lei, e cumpri Ia hei, emquaato me não convencerem de que há razão para haver exames de segundo gríri.
Se me convencer de que é de justiça a realização desses exames eu não me oporei a eles; mas por ora esto.i locge de mudar de opinião. Entretanto,, íb enviada à Câmara dos Deputados uma representação de professores e famílias de alunos, pedindo uma época transitória de exames de segundo grau. Essa representação foi sujeita à comissão respectiva, que sobre ela há-de dar um parecer, parecer que eu hei-de estudar, verificando se nele encontro ai giiLa argumento que me convença.
Roferiu-so S. Ex.a também a uni exame de admissão ao liceu, em substituição do exame de segundo grau.
Não u pcsso afirmar com inteira segurança, nas creio que vai amanhã par?: o Diário do Governo o regulamento. A demora tem sido motivada pela extensão do diploma, cuja revisão de provas tom sido morosa. E su*peito que quando esse regulamento for conhecido não causará receio algnm o que se exige nesse exame de admissão, que creio será simples, obedecendo ao princípio do menor esíòrço.
Aludindo u outro ponto do discurso de S. Es.a, dir-lhe-hei que já tem chegado à Direcção Geral do Ensino Primário as respostas ao meu pedido feito telegráfica-mente aos directores das escolas primárias superiores.
V. Ex.a, Sr. Senador, vai ter conhecimento imediato dessas respostas.
Pelo que respeita à organização ca comissão por mim nomeada, para dar parecer sobre os diversos magistérios, devo dizer que organizei essa comissão coui os directores gerais do meu Ministério.
Essas pessoas julgo-as as mais dignas e competentes para darem um parecer — um parecer, note V. Ex.a—sobre o assunto.
Pelo que respeita a presidente, eu não nomeei presidente. Mas se fosse da minha responsabilidade esse acto, eu não teria dúvida em defendê-lo.
Com relação ao director geral do ensino superior, devo dizer que te.1 funcionário é tam sabedor que não conhece apenas o que se passa na sua direcção geral,
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mas tem conhecimento exacto de todas as repartições do Ministério; é um funcionário muito distinto e muito inteligente. Não sei se ele tem mais lugares. Mas se os tem e os desempenha tam distintamente como o de director geral do ensino superior, Cie satisfaz cabalmente.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Heitor Passos (para explicações)'.— Sr. Presidente: pedi a palavra para agradecer a respotta do Sr. Ministro da Instrução Pública que me satisfaz absolutamente, com excepção da parte que se r«.'fore ao director gorai de instrução superior.
E impossível que êsso funcionário possa desempenhar cabalmente as funções de todos os seus cargos.
Já há bastante tempo que desta Câmara foi para o Ministério da Instrução Pública uma nota pedindo informações sobre os cargos dêsso funcionário e ainda até hoje não obtivemos resposta.
Não houve a coragem de se dizer ao Senado quais as oito ocupações do director geral do que se trata e o modo como se desempenha delas,
S. Ex.a o Sr. Ministro é um homem bom, cucipriu o seu fadáiio lançando a capa da sua misericórdia sobre esse funcionário.
O Sr. Ministro da Instrução Pública
(Vasco Borges): — Sr. Presidente: pedi a palavrf, para dizer apenas que não foi por falta de coragem . . .
O Sr. Heitor Passos (interrompendo}:— Então não custava nada ter respondido à nota a que me referi . . .
O Orador: — V. Ex.a a mim nunca mo preguntou nada, nem mesmo agora.
De resto, Sr. Presidente, sobre a competência desse funcionário, V. Ex.a deve concordar comigo.
V. Ex.a deve compreender que eu não posso estc.r a investir contra funcionários que não Eie dão razão alguma para isso ; são homens que me prestam a melhor ajuda para eu levar esta cruz ao calvário.
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tempo que lhe 6 determinado no Regula mento. Compreende-se. O contrário seria um milagre de ubiqúidade.
O Orador: — V. Ex.a deve compreender que não posso estar dentro do gabinete do Sr. Queiroz Veloso.
Quando preciso dele, ele aparece.
ORDEM DO DIA
Eiitra cm discussão o parecer u.° 350 e seu perteuce
São lidos na .Mesa.
Parecer n.° 359
Penhores Senadores.—Tendo sido sub-motido íio exame da comissão de petições do Senado o memorial do Sr. coronel do i[iiadro de referva, Henrique Ribeiro de Almeida, e tendo sido lido com a máxima atenção, julga a dita comissão que o papel desempenhado pelo Sr. coronel Ribeiro de Almeida, durante os acontecimento^ produzidos em 1919 na luta contra a rebelião rialist.i, foi um papel saliente e que contribuiu em grande escala para a repressão da rebelião.
A defesa de Mirandela e o comportamento da Mia guarnição suo bem do conhecimento do público.
Só este serviço prestado pelo Sr. coronel Ribeiro do Almeida o torna digno de figurar entre os beneméritos da República, e os outros que o mesmo Sr. descrevo no seu memorial mostram bem (pie ele foi um valente e dedicado militar republicano.
Julga esta (-.omissão que realmente o Sr. coronel pode ser considerado ao abrigo do artigo 75.° do Regulamento do Conselho Superior de Promoções, isto é, nas condições de «promoção por distinção».
Porém, esta alta recompensa é dada mediante proposta feita pelo chefe imediatamente superior, isto é, comandante da zona de operações, (pie para os casos sujeitos são os comandantes das 3.a e (>.a divisões do exército:
A proposta é finta ao Conselho Superior de Promoções.
Ignora esta comissão se tal proposta foi feita. pare< endo-lhe que não deverá o Senado antepor-se àquela estação ou, porventura, contrariá-la, se realmente a pro-
posta foi feita pela entidade competente.
jii de crer que não se tenha dado esta última hipótese e a comissão lembra que já se deu um facto análogo com o Sr. general Augusto César Ribeiro de Carvalho, porém a promoção deste senhor deu--se por uma proposta de lei apresentada por um dos membros do Parlamento e que foi aprovada. •
li, também de parei er esta comissão que se a firmeza da praça de Chaves muito contribuiu para a derrota dos realistas, o porte dedicado da guarnição de Mirandela secundou aquele acto, contribuindo igualmente para a vitória da República.
Sal/i das comissões do Senado, 26 de Abril de 1920. — António Nunes de, Oliveira— Pedro Amaral Boto Machado — António Gomes de Sousa Varela — João Namorado de Aguiar.
Pertence ao n.° 350
Senhores Senadores.— A vossa comissão de guerra, tendo examinado cuidadosamente o requerimento do coronel do quadro de reserva, Henrique Ribeiro de Almeida, cm que pede a sua promoção a general, por se julgar ao abrigo do artigo 75.° do regulamento do Conselho Superior de Promoções, e observando :
Que o requerente é oficial distintíssimo que, pelo seu valor e qualidades de militar brioso e valente, muito contribuiu para a resistência de Miraudela contra os revoltosos monárquicos em Janeiro e Fevereiro de 1919;
Que, aliando às suas altas qualidades de republicano sincero o seu elevado espírito de patriota, foi levado a prestar o seu concurso, não certamente por interesse próprio, mas pelo desejo que têm todos os bons republicanos de não ver menosprezada a nossa querida República;
Que prestou assinalados serviços tanto em Mirandela como no Porto, conformo diz e é sabido, por constar dos relatórios enviados ao então comandante, interino, da G/ divisão do exército, com sede em Chaves, Sr. coronel Augusto Cósar Ribeiro de Carvalho, hoje general, general João Pedroso de Lima,, comandante efectivo da mesma divisão, e coronel João Pereira Bastos, comandante da 3.a divisão ;
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conferido, além do mereeido louvor, o grau de cavaleiro da Ordem da Tcrre e Espada, de Valor, Lialdade e Mérito — Ordem do Exército n.° 22, 2.a série, de 1919;
Que a -oromoção por distingo deve basear-se nas propostas do comandante sob cujas ordens se distinguiu (artigo 70.° do regulamento do Conselho Superior de Promoções), ou na iniciativa do Ministro da Guerra, ouvido ainda' o icesmo Conselho,:
ti a comissão de parecer que o Senado não toms resolução sobre o assunto, mas simplesmente deve chamar para tal facto a atenção do Sr. Ministro da Guerra.
Sala das sessões da comissLO de guerra do Senado, 25 de Maio de 1920. — Alberto da Silveira — José Mendes dos Re>s — Artur Ostávio do Rego Chagas, relator.
O Sr. lúlio Ribeiro: — Sr. Presidente: quero apenas felicitar a comissão de guerra pelo seu parecer nesta propo-la, porq-ie, reconhecendo que o Sr. coronel Henrique Ribeiro dó Almeida ó um oficial distis-tísàimo qce, pelo seu valor e qualidades de militar brioso e valente, muito ccntri-buiu para a resistência de Mirandela contra os revoltosos monárquicos em Janeiro e Fevereiro de 1919, reconhece também que o galardão duma promoçELo por distinção s5 se deve efectivar por proposta, do Ministro da Guerra ou do comandante sobre cujas ordens praticaram os feitos que esse galardão justifica.
Felicito por isso a comissão de gi erra por esta opinião e felicito-me também por ver, embora tardiamente, que eu tinha estado com a boa doutrina nas quatro vezes que tenho votado contra promoções por distinção.
Disse.
Em seguida foi o parecer n." 359 aprovado.
Leu-se o projecto de lei n.° 372, qu? foi aprovado sem discussão, com o aditamento proposto pslo Sr. Ministro da Gvena «se no Arsenal de Exército existir bronze disponíveis.
E o seguinte:
Projecto de lei n.° 371!
Senhores Senadores.— A vila de Chaves, orgulhosa dos seus filhos que na Grande Guerra praticaram inigualáveis
actos de bravura, honrando e enaltecendo L sua tradição heróica, procura consagrar, como merecem, o» seus feitos e as suas virtudes. A memória dos que morreram vai erigir um monumento por subscrição pública. Para esse monumento, que terá quatro placas ornamentais de bronze, justo é que o Estado não negue o seu concurso e antes auxilio e promova por todas as formas o culta dos grandes mortos que à Pátria pertencem. Por isso tenho a honra de submeter à vossa esclarecida atenção o seguinte projecto de lei :
Artigo 1.° É o Estado, pelo Ministério da Guerra, autorizado a fornecer gratuitamente o bronze preciso para as quatro placas ornamentais do monumento aos seus mortos da Grande, Guerra que a vila de Chaves vai erigir por subscripçSo pública.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em cantrário.
Salas das Sessões, 6 de Maio de 1920. — Mesquita.
O Sr. Dias de Andrade: — Sr. Presidente: antes de abordar o assunto da minha interpolação em breves palavras e singelas considerações, eu tinha de fazer a V. Ex.a e a Câmara uma declaração clara, positiva e categórica: e é que nas minhas palavras e muito menos nas minhas intenções, não há o mais leve desprimor paru o ilustre oficial que é o Sr. Ministro da Guerra, a quem dirijo as minhas saudações, e ainda o de que não conheço nem tenho a mais leve relação pessoal com o oficial que foi vítima duma injustiça.
As minhas considerações são, pois, inspiradas apenas no cultD que devo à Justiça, no respeito que devo à Lei e aos direitos inauferíveis da consciência católica.
E posta assim a questão no terreno da legalidade e da justiça, eu vou, sumariamente, expor alguns factos que precederam o já célebre cano de Santo Tirso, e constituem o seu antecedente lógico.
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ao ser-lhe esta notificada, alegou não ter dinheiro para a passagem. Era já a segunda vez que esse soldado procedia in-corretamente, e dentro dos regulamentos militares, o tenente Bacelar Duarte aplicou-lhe o castigo de 10 dias de prisão disciplinar. Esse castigo foi tam justo, que o comandante do-batalhão de sapadores, o tenente-coronel Esteves, chamando u si a responsabilidade do caso, não só aprovou esse castigo, mas agravou-o para 15 dias.
Não sou eu versado na doutrina dos regulamentos militares, mas suponho que estou dentro da verdade, quando afirmo que, desde esse momento, o tenente Bacelar Duarte desapareceu militarmeute (Apoiados), isto é, desde o momento em que o comandante do batalhão chamou a si a responsabilidade e agravou mesmo o castigo. (Apoiado*). E nesta altura que entra em scena o general comandante da 3.a Divisão Militar. Esse general, vindo a Lisboa, conseguiu—não sei se o termo dovia ser arrancar—duma repartição do Ministério da Guerra, unia nota que lhe conferia plenos poderes e lhe dava competência sobre a 2.a companhia de sapadores, destacada cm Santo Tirso.
Em vista disso, mandou fazer uma sindicância à companhia sobre as causas do castigo do soldado, sindicância que foi feita por um major, sendo o comandante do batalhão um tenente-corouel. Suponho também que estou na verdade, dizendo que, segundo os regulamentos militare* uma sindicância só pode ser feita por um oficial mais antigo ou de patente superior à do sindicado.
Mas o que é facto, é que a sindicância fez se,. e, poucos dias depois, o tenente Bacelar Duarte era castigado nos seguintes termos:
«Que seja castigado o tenente Miguel Bacelar Duarte com 10 dias de prisão disciplinar por ter castigado uma praça capciosamente, sem procurar indagar as causas que tinham levado o soldado a solicitar a transferência, em que o general comandante da 3.a divisão tinha interferência directa, trazendo este facto menos prestígio para o mesmo Ex.mo General».
Sr. Presidente; eu não faço comentários, nem mesmo à palavra capciosamente; deixo-os à consciência de V. Ex.a, que é
oficial distintíssimo, e à consciência de todos os Srs. Senadores.
Mas há mais; passados alguns dias, o tenente Bacelar Duarte é punido nos seguintes termos:
«É castigado com mais 5 dias de igual pena (prisão disciplinar) por ter recebido a visita pascal na sua residência, dentro do quartel, infringindo assim o que determina .a Lei da Separação da Igreja do Estado».
Aqui, para bem se avaliar da enormidade do crime, do nefando crime cometido por esse oficial, e para se averiguar da justiça e da rectidão do juiz que o condenou, é preciso saber em primeiro lugar, o que é a visita pascal em Santo Tirso ; em segundo lugar, quem é o oficial; e em terceiro lugar, o que diz a Lei da Sepa-cão, que se alega ter esse oficial ofendido.
A visita pascal em Santo Tirso e em todo o Minho, é uma festa tradicional das mais belas que se realizam no Norte, e na qual tomam parte todas as classes sociais, independentemente de opiniões políticas. E em todo o Minho uma festa regional, em que muitas pessoas visitam outras, que merecem a sua consideração.
Foi esta visita que recebeu o tenente Bacelar Duarte dentro da sua residência, numa dependência do quartel. E não sou eu quem o afirma, afirma-o nin grupo de velhos e dedicados republicanos, numa carta que dirigiram, como protesto, ao comandante da 3.a Divisão Militar. Dessa carta, destaco eu um trecho, que ó o seguinte:
«Os amigos do brioso comandante, entro eles muitos dedicados o velhos republicanos, desejando provar a S. Ex.a a est;ma e consideração quo lhe tributam, não quiseram deixar que a sua casa fosse esquerda»...
Conhecido assim o grande delito, o nefando crime, cometido por esse oficial, é preciso saber-se quem é o tenente Miguel Bacelar Duarte.
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lantropia por actos praticados em campanha com risco da própria vida.
Já são conhecidos o autor do crime e o delito por ele cometido. Vejamos agora o que diz a lei que ele ó acusado de ter infringido. A Lei da Separação diz no artigo 1.°: «A República reconhece e garanle a pJeria liberdade de consciência... •». E nc artigo 3.°: «Dentro do território da República ninguém pode ser perseguido por motivos de religião...». Isto são disposições fundaicentais. A Lei da Separarão não tem nem podia ter disposições que colidissem com elas, e se porventura as tivesse, essas disposições eram preceitos mortos, perante o que claramente estatui a Constituição da República Portuguesa, no n.° 4.° do artigo 3..° e no artigo 80.° O Sr. Pereira Osório: — Trata-se de actos de culto, não é de princípios. O Orador: — São a exteriorização d^s crenças, dos princípios; afirmar um direito e não o assegurar politicamente se-rii uma mistificação indigna do Poder. Eu n£o encontro na Lei de. Separação disposição alguma que permita a Lplica-ção do castigo (Apoiados}, e eu suponho que a conheço. Depois da exposição singela e desapaixonada que acabo de fazer, parece-me que estou no direito de concluir qoe o castigo de cinco dias de prisão disciplinar aplicado ao tenente Miguel Bacekr Duarte constitui uma arbitrariedade e urna injustiça que é preciso remediar. E ao Sr. Ministro da Guerra, como chefe do exército, é que cumpre fazer a reparação duma injustiça (Apoiados), mandando, paias vias legais trancar o castigo que foi aplicado. O Sr. Ministro da Guerra (João Estêvão Aguas): — Sr. Presidente :_começo í)iário das Sessões do Senado por agradecer ao ilustre Secador Sr. Dias de Andrade as palavras que me dirigiu e "ambêm a fornia alevaiitada corno tratou do assunto. Vozes:—Muito bem, muito bem. O Orador: — S. Ex.:i dividiu a questão em duas partes : os seus antecedentes e propriamente o assunto de que se trata, que era o castigo de cinco dias de prisão aplicado ao tenente Miguel Bacelar Duarte. Sobre os antecedentes tenho a dizer a S. Ex.a que o assunto está afecto aos tribunal» competentes, a quem já pedi que, com a maior brevidade, dessem o seu acórdão para eu depois me manifestar. Acerca da segunda parte, que é a aplicação do castigo de cinco dias, S. Ex.a sabe que, as disposições regulamentares garantem o direito de reclamação a quem se julgue castigado injustamente. Além dessa reclamação ainda lhe assiste o direito de recurso, que vai ato a autoridade superior, que ó aquela que julga ou não procedente a acusação. Até hDje ainda me não chegou à mílo qualquer recurso apresentado pelo Sr. tenente Miguel Bacelar Duarte. A falta de reclamação importa o reconhecimento cio castigo pela pessoa que foi castigada. Eu não'sei se o Sr. tenente Miguel Bacelar Duarte fez ou não a reclamação ; se a fez, tem o tempo marcado pelo regulamento para a reclamação ser resolvida. Quando chegar h minha mão, eu resolverei conforme for de justiça. Compreende V. Ex.a muito bem que não posso dizer o que hei-de resolver. Se V. Ex.a me permitisse, sem querer de forma alguma modificar o convencimento em que V. Ex.1* está acerca da interpretação que deu à lei, informava V. Ex.a de que a residência do oficial é dentro do quartel o que a única porta de entrada para essa residência é a porta de entrada do quartel. Eu tenho o direito de, em minha casa, fazer o que muito bem entender, e não resta dúvida de que a Constituição assim o autoriz.a, mas temos de atender a que a porta dei entrada da residência daquele oficial era também a porta de entrada do quartel.
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cão ou que tenha parti pris na solução do assunto, quando ele me chegar à mão; digo isto por simples esclarecimento, que é necessário acentuar.
De resto, não posso de maneira algit-ma intervir no espírito dos tribunais.
O Sr. Dias de Andrade:—Agradeço ao Sr. Ministro da Guerra, sobretudo, a justiça que fez às minhas intenções e até às minhas palavras, que, creio, não traíram o meu pensamento.
Compreendo muito bem que S. Ex.a tem de esperar a sentença dos tribunais, porque é esse o seu dever; mas espero que, se o caso chegar até S. Ex.a, será feita àquele brioso e digno militar a justiça que ele merece.
- Sei que efectivamente a porta da entrada para o quartel é também a porta da entrada para a residência particular do oficial de que se trata, mas o lugar onde recebeu a visita pascal era a sua residência particular.
Eu queria que ficasse bem acentuado nesta Câmara e se soubesse no País e lá fora que um digno e brioso oficial do exército pode, em Portugal, ser católico, como católico é, e foi sempre, o ilustre general Foch, o grande homem da vitória, da justiça e da liberdade do mundo.
O orador foi cumprimentado por toda a Câmara.
O Sr. Alfredo Portugal: — Mando para a Mesa o parecer da comissão de legislação civil sobre o projecto de lei n.° 414.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Sousa e Faro: — Por parte da comissão de marinha, mando para a Mesa um parecer.
O Sr. Heitor Passos: — Mando para a Mesa um parecer.
O Sr. Bernardino Machado: — Sr. Presidente : eu não queria abusar da benevolência da Câmara, mas lambem não desejava deixar ficar para mais tarde algumas considerações que tinha a fazer.
Sr. Presidente : consta que numa entrevista com o Sr. Presidente do Ministério houve quem se permitisse declarar que o cadáver do chefe da aventura dezembrista 'não podia ser trasladado do Panteão Na-
cional e entregue à família, porque havia um movimento de opinião que o não permitiria.
Eu quero simplesmente dizer, diante dos membros do Governo que se acham presentes, que estou certo de que o Governo saberá responder, como é o seu dever, a esta insolente afirmação:
«O movimento da opinião,dezembrista».
Sr. Presidente: é triste que, efectivamente, isso se possa dizer, mas espero que o Governo dê o justo correctivo a esta impertinência.
Sr. Presidente: nas vésperas da posso do actual Presidente da Kepública, digno Presidente constitucional da República, fizeram-se trocas de condecorações pela nossa intervenção na guerra. De Portugal mandaram-se condecorações aos Chefes de Estado estrangeiros. Reciprocamente, os Chefes de Estado estrangeiros retribuíram essas condecorações com outras; e, Sr. Presidente, quando essas condecorações deviam constelar o peito do Presidente constitucional da República, elas fulguram no peito do segundo Chefe de Estado — pretenso Chefe de Estado dezembrista.
Veja V. Ex.a até onde se tem ido.
Mas, logo em seguida, instituíu-se a Ordem da Torre e Espada, do valor, lialdade e mérito republicano, ^e a quem se entregou a dignidade de chanceler dessa Ordem? Ao chefe do dezembrismo, ao sucessor do chefe da aventura de 5 de Dezembro, ao homem que declarou que seguiria a política do seu predecessor, com quem se tinha solidarizado.
Sr. Presidente: anuncia-se para domingo uma grande solenidade em Lisboa, que é a entrega das insígnios da Torre e Espada à cidade de Lisboa, mas é preciso não esquecer que o dezembriswo atacou, sobretudo, a cidade de Lisboa, a democrática cidade de Lisboa, porque foi esta cidade a que, sobretudo, mais sofreu os horrores do dezembrismo.
Para recordar esses hoirores basta lembrar a trágica leva da morte, e, Sr. Presidente, é preciso que se não diga que Lisboa vai receber das mãos do chancele r— pelas boas graças do chanceler — as insígnias da Torre e Espada.
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E preciso que isto se diga.
f. Mas quando é que, efectivamente, nós veremos a República dignificar-se, sobretudo os seus homens, que por ela têm dado o melhor de toda a sua vida. o que contrasta bem coin os adventícios que a atacam Q que não fizeram senão comprometer a sua honra e quâsi que ato o seu futuro?
A outros assuntos tinha de me referir, mas não desejo abusar por mais tempo da c;enerosi(iade da Câmara.
O Sr. Travassos Valdês :—Em nome da comissão de marinha, mando para a Mesa um parecer.
O Sr. Presidente: — A próxima sesscão ó na segunda-feira, à hora regimental, sendo a ordem do di.;t a discussão dos projectos de lei n.ot 369, 378, 392, 406 e 416.
Está encerrada a sessão.
Eram 16 horas e 4õ minutos.