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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENADO
SESSÃO N.º 98
EM 16 DE AGOSTO DE 1922
Presidência do Exmo. Sr. José Joaquim Pereira Osório
Secretários os Exmos. Srs.
João Carlos da Costa
João Manuel Pessanha Vaz das Neves
Sumário. - A sessão abre às 15 horas e 25 minutos, com 24 Srs. Senadores presentes. Lê-se e aprova-se a acta. Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Vicente Ramos requere que se discutam antes da ordem do dia os projectos de lei n.ºs 206 e 213, o que é aprovado. O Sr. Ribeiro de Melo, que ficara com a palavra reservada, prossegue nas suas considerações sôbre a promoção a generais de três coronéis e sôbre o julgamento dos implicados nos acontecimentos de 19 de Outubro. Responde-lhe o Sr. Ministro da Justiça. Discute-se a proposta de lei n.º 213, falando sôbre ela os Srs. Vicente Ramos, Ribeiro de Melo, Alves Monteiro e Silva Barreto, sendo a proposta aprovada.
Ordem do dia - Prossegue a discussão da proposta de lei n.º 86, sôbre expropriações. Continuam no uso da palavra os Srs. Medeiros Franco, Herculano Galhardo, Pereira Gil e Ministro da Justiça.
É aprovado o requerimento do Sr. Ramos da Costa para se sustar a discussão.
É aprovada a proposta de lei n.° 206.
Antes de se encerrar a sessão, o Sr. Pereira Osório ocupa-se de casos censuráveis sôbre emolumentos judiciais.
Abertura da sessão às 16 horas e 20 minutos.
Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:
Álvaro António Bulhão Pato.
Aníbal Augusto Ramos de Miranda.
António Maria da Silva Barreto.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
César Justino de Lima Alves.
Francisco António de Paula.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Francisco Vicente Ramos.
Frederico António Ferreira de Simas.
Joaquim Pereira Gil de Matos.
Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.
José Augusto Ribeiro de Melo.
José Augusto de Sequeira.
José Duarte Dias de Andrade.
José Joaquim Fernandes Pontes.
José Joaquim Pereira Osório.
José Mendes dos Reis.
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Luís Augusto Simões de Almeida.
Manuel Gaspar de Lemos.
Querubim da Rocha Vale Guimarães.
Rodolfo Xavier da Silva.
Rodrigo Guerra Álvares Cabral.
Silvestre Falcão.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Abílio de Lobão Soeiro.
Alfredo Narciso Marçal Martins Portugal.
António de Medeiros Franco.
Augusto de Vera Cruz.
Constantino José dos Santos.
Francisco José Pereira.
Herculano Jorge Galhardo.
João Catanho de Meneses.
João Carlos da Costa.
João Manuel Pessanha Vaz das Neves.
João Maria da Cunha Barbosa.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
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Joaquim Teixeira da Silva.
José António da Costa Júnior.
Nicolau Mesquita.
Tomás de Almeida Manuel de Vilhena (D.)
Vasco Gonçalves Marques.
Srs. Senadores que faltaram à sessão:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
António Alves de Oliveira Júnior.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Gomes de Sousa Varela.
António Xavier Correia Barreto.
Artur Augusto da Costa.
Artur Octávio do Rêgo Chagas.
Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.
César Percópio de Freitas.
Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Ernesto Júlio Navarro.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
João Alpoim Borges do Canto.
João Trigo Motinho.
Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Machado Serpa.
José Nepomuceno Fernandes Brás.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Júlio Maria Baptista.
Luís Augusto de Aragão e Brito.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Raimundo Enes Meira.
Ricardo Pais Gomes.
Roberto da Cunha Baptista.
Vasco Crispiniano da Silva.
Pelas 15 horas e 20 minutos o Sr. Presidente manda proceder à chamada.
Fez-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 24 Srs. Senadores. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.
Leu-se.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada. Vai ler-se o
Expediente
Telegrama
Da junta de freguesia de Cantareira, protestando contra o projecto de expropriações.
Para a Secretaria.
Requerimento
Da Câmara Municipal de S. Pedro do Sul, protestando contra o projecto que obriga as Câmaras a edificar prédios para habitação dos magistrados.
Para a Secretaria.
Relatório
Da comissão parlamentar de inquérito ao extinto Ministério dos Abastecimentos e Transportes.
Para o "Diário".
Ofícios
Da Câmara dos Deputados, acompanhando a proposta de lei que actualisa as pautas de importação e exportação.
Da Câmara dos Deputados, acompanhando a proposta de lei que concede melhoria de situação aos funcionários públicos aposentados.
Para as comissões de administração pública e finanças.
Autorizado o Govêrno a proceder à remodelação dos serviços públicos.
Para a comissão de administração pública.
Do Sr. José Borges Pacheco de Faria, agradecendo ao Senado as palavras de elogio a seu falecido filho Álvaro de Faria Roby.
Para a Secretaria.
Projectos de lei
Do Sr. Ribeiro de Melo, sôbre provimento sem concurso de cônsules e vice-cônsules em lugares de terceiros oficiais do Ministério dos Negocios Estrangeiros.
Para segunda leitura.
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Do Sr. Teixeira da Silva, em que a Escola Madeira Pinto, em Angra do Heroísmo, passará a constituir uma Escola Industrial e Comercial.
Para a comissão do comércio.
Do Sr. Ramos de Miranda, criando três juízos de investigação criminal junto às companhias do caminho de ferro.
Para a comissão de legislação.
Do Sr. Teixeira da Silva, sôbre alterações no n.° 13.° do artigo 461.° do decreto n.° 7:917.
Para a comissão do comércio.
Do Sr. Vicente Ramos, sôbre privilégios e garantias de estabelecimentos comerciais e industriais instalados em prédios ao abrigo do decreto n.° 5:411, de 17 de Abril de 1919.
Para primeira leitura.
Do Sr. Teixeira da Silva, sôbre construção dum sanatório na Ilha do Pico.
Para primeira leitura.
Do Sr. Costa Júnior, concedendo uma pensão à viúva do Dr. Joaquim Sabino de Sousa.
Para primeira leitura.
Pedido de licença
Do Sr. Joaquim Crisóstomo, solicitando autorização para não comparecer à sessão de amanhã.
Concedido.
Parecer
Da comissão de faltas, sôbre justificação de faltas dos Srs. Sousa Varela e Joaquim Crisóstomo, e pedido de licença do Sr. José Pontes.
Aprovados.
Proposta de substituição
Estando ausente nas ilhas adjacentes o Sr. Aragão e Brito, que representa os senadores independentes na Comissão Interparlamentar do Comércio, requeiro a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre se autoriza a sua substituição pelo Sr. Joaquim Crisóstomo. - Vicente Ramos.
Concedido.
Antes da ordem do dia
O Sr. Vicente Ramos: - Sr. Presidente: pedi a palavra pára mandar para a mesa um relatório da comissão de inquérito ao Ministério dos Abastecimentos, pedindo a V. Exa. o favor de o mandar publicar no Diário do Govêrno.
Sr. Presidente: como a inscrição para antes da ordem do dia é muitíssimo reduzida, eu pedia a V. Exa. que consultasse a Câmara sôbre se permite que entrem em discussão antes da ordem os projectos de lei n.° 206 e 213 que estão marcados na ordem do dia, mas em segundo lugar.
Estou certo que terão uma rápida discussão e não ficarão preteridos com a discussão dos outros projectos que estão na primeira parte da ordem.
Posto à votação foi aprovado.
O Sr. José Augusto de Sequeira: - Pedi a palavra para instar mais uma vez por uns documentos que pedi há mais de dois meses pelo Ministério da Agricultura, acêrca de negociações e contas do liceu municipal de Portalegre.
Até agora não recebi êsses documentos, pelo que pedia a V. Exa. que tomasse providências, a fim de êles me serem remetidos.
O Sr. Vasco Marques: - Peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Eu agora não posso dar a palavra a V. Exa.; havia uma inscrição que se esgotou.
O Sr. Vasco Marques: - Eu peço desculpa a V. Exa., mas Aquando se pôs o requerimento à votação julguei que era sem prejuízo do antes da ordem.
O Sr. Presidente: - Houve equívoco da parte de V. Exa., no emtanto, eu estou convencido, desde que o assunto que V. Exa. tem a tratar não seja demorado, que a Câmara autoriza que V. Exa. use da palavra.
O Sr. Vasco Marques: - Eu não posso dizer o tempo que me demorarei, portanto peço a V. a fineza de me reservar a palavra para a sessão de amanhã.
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O Sr. Ribeiro de Melo (para interrogar a Mesa): -- Para preguntara V. Exa. se respeita a inscrição da sessão de ontem, pois fiquei com a palavra reservada para a sessão de hoje antes da ordem.
O Sr. Presidente: - V. Exa. tem razão:, não verifiquei se efectivamente algum Sr. Senador tinha ficado com a palavra reservada para a sessão de hoje; foi um esquecimento. Tem portanto V. Exa. a palavra.
O Sr. Ribeiro de Melo: - Os 15 minutos que pelo regimento me permitem falar antes da ordem do dia são meus, portanto, por mais agradável que queira ser aos Srs. Senadores interessados em que se discutissem os projectos de lei para os quais pediram urgência o Sr. Vicente Ramos, Júlio Ribeiro e Mendes dos Reis, pela natureza dos assuntos que tenho de tratar, não posso desta vez satisfazer a S. Exas. Tenho nisso o maior pesar.
Continuando nas considerações que ontem foram interrompidas em face do Regimento desta Câmara e muito principalmente também porque eu não logrei dos meus Pares autorização para poder continuar no uso da palavra até concluir as minhas considerações que seriam talvez restringidas então, mas que hoje terei de prolongar por fôrça das circunstâncias e porque me chegaram outros assuntos que sou obrigado a tratar com urgência, começarei por dizer que julgo de toda a conveniência em dar o mais rápido andamento a êsse arrastado processo que diz respeito aos oficiais presos na Torre de S. Julião da Barra, porque a consciência nacional que tam abalada ficou com as trágicas mortes do 19 de Outubro não se compadece com tamanha demora e já crepita de justificado espanto, quiçá de indignação, porque em homenagem às vitimas exige o castigo dos verdadeiros culpados que serão todos menos êsses por quem pugno e quero continuar a defender com extremada justiça.
Tratarei agora de um assunto que reputo da maior importância e ao que tenho de me referir sob o ponto de vista político.
Os três ou quatro requerimentos enviados à mesa do Senado, cujos signatários são os coronéis que, por uma proposta de lei do Sr. Ministro da Guerra, serão promovidos por distinção ao generalato, não deverão ser aceitos pela Câmara.
Não posso ser insensível ao texto dos requerimentos dos Srs. Pereira Bastos e Roberto Baptista porque, dêste lugar, lhes quero prestar homenagem pelas suas qualidades de oficiais briosos do exército e pelo muito que respeito as suas virtudes de cidadãos.
Referir-me hei mais especialmente ao Sr. Roberto Baptista, com quem mantenho as mais estreitas relações, não só de amizade como de coleguismo.
Não tem S. Exa. razões de ordem moral ou militar para dirigir ao Senado um requerimento daquela natureza.
A extrema sensibilidade de valoroso oficial do exército e os arreigados princípios democráticos de S. Exa., chocaram-se com as notícias que vieram a público em alguns jornais desta cidade e, sobretudo, com a política que anda pelas secretarias de Estado e pelos corredores das Câmaras, proclamando doutrinas que é necessário repudiar de uma vez para sempre.
Eu encaro talvez esta questão por um prisma diferente daquele que tem sido ventilado aqui pelos oradores que me precederam. Aceito e defendo estas promoções porque sinto, como nunca, a necessidade de republicanizar os altos postos do exército, porque reconheço a vantagem que há em substituir generais que não inspiram confiança à República por outros que a mereçam, que tenham largas folhas de serviços ao regime e sôbre os quais não possa recair a menor suspeita ou discussão.
Eu entendo que o Senado não deve considerar os requerimentos citados porque não podemos sequer admitir que S. Exas. se considerem deminuídos no seu prestígio de militares ou na sua honradez de cidadãos, pelo facto de essas notícias que correm pelos escusos caminhos dos bastidores da política e que de modo nenhum, por mais habilidosos que pareçam atingem sequer no mínimo tam altas patentes do exército e tam grandes figuras da política activa da República.
Sr. Presidente: neste momento eu quero abrir um parêntesis para estranhar a solicitude, a pressa com o Sr. Presidente do Ministério veio ao Senado desfa-
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zer essa atoarda, como êle correu apressada e aflitosamente à sua cadeira de Presidente de Ministério e Ministro do Interior, para vir dizer à Câmara Alta, eu seja o Senado, que nada disso é verdade, que não existia entre o Govêrno e entre os partidos constitucionais da República, a menor combinação, o mais leve tratado para que o Govêrno continuasse nas cadeiras do poder à custa de duas ou três promoções a generais do exército.
Eu estranho que S. Exa. tivesse feito tam apressadamente tais declarações sem que alguns dos Srs. Senadores lhe tivesse experimentado a sua sensibilidade. E eu tenho razões para o estranhar, Sr. Presidente, porque, quando faço a comparação entre o procedimento que ontem teve o Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior com outros factos que por dever e obrigação o deveriam fazer correr à Câmara do Senado a dar explicações cabais e concretas por que à boa razão muito mais impressionaram a opinião pública e muito mais sacudiram a própria opinião republicana, S. Exa. mimoseou-nos com a costumada ausência. Refiro-me neste momento, Sr. Presidente, ao caso Rugeroni, ao caso do Século, em que um jornal vespertino, A Capital, acusa às claras e peremptoriamente um estrangeiro que é um dos directores ou co-proprietário de um dos jornais de maior circulação de Lisboa, de espião e traidor à Pátria e à República. Não obstante as palavras que me pareceram garantir que seriam inexoravelmente castigados os seus autores se não fôssem verdadeiras, isto é, se se reconhecesse que o que dizia o jornal A Capital era falso, o Sr. Presidente do Ministério ainda não se apressou em vir dizer à Câmara, que é o mesmo que dizer ao País, quais as razões porque se não concluiu ainda o inquérito judicial e porque chantage jornalística era o Sr. Rugeroni acusado de espião à Pátria e à República. O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, que assume a responsabilidade política do Govêrno que chefia, porque nos baixos bastidores da política republicana e intriga malfazeja do nosso País se levantou a desconfiança de que o Govêrno tinha transaccionado a continuação no poder, tinha transaccionado a própria viagem do Chefe do Estado, do preclaro Chefe do Estado, do honrado Presidente da República, ao Brasil, com a promoção de três oficiais ao generalato, tendo sôbre os seus ombros de republicano tantas outras questões bem mais interessantes e muito mais sérias e graves do que esta, porque, Sr. Presidente, nós sabemos que dadas as qualidades dos coronéis que o Sr. Ministro da Guerra resolveu promover a generais, não pode haver a menor suspeita, e são todos unânimes em endereçar as suas homenagens a êsses oficiais, e reconhecer como um acto e justiça a promoção que o Sr. Ministro da Guerra pretendeu levar a efeito na proposta que apresentou, e que a outra Câmara muito bem aprovou, e que com certeza receberá também a aprovação unânime do Senado, veio pressuroso fazer êsse desmentido, oficial, que se dispensava, mas não procede assim quando outros assuntos exigem pela mesma via o seu autorizado desmentido ou confirmação.
Eu gostaria também de ver o Sr. Presidente do Ministério solícito, como ontem foi, explicar ao Senado as razões por que o inquérito que se está fazendo aos Transportes Marítimos do Estado ainda se não concluiu, e porque é que continuam em liberdade todos aqueles que cometeram os latrocínios, os roubos, e que levaram a administração dêsses Transportes Marítimos ao descrédito e à vergonha nacional. Eu gostaria também de ver o Sr. Presidente do Ministério, um dos chefes do Partido a que eu tenho a honra de pertencer, dizer as razões porque não veio ao Senado dar explicações cabais e completas dos últimos acontecimentos que se desenrolaram em Lisboa.
Eu tenho o direito, como Senador, de preguntar qual a atitude do Govêrno, o que êle pensa, e o que tenciona fazer para acudir à situação miserável em que se encontra a nossa situação económica que atrofia não só o proletariado, como o funcionalismo público e ainda aquelas famílias que sentem a fome cada vez mais próxima e que muitas vezes, não digo amaldiçoem as instituições, mas que já não olham para elas com aquele carinho e com aquele amor, que eu apesar de tudo ainda sinto pela República.
Bem mais importante seria que o Sr. Presidente do Ministério viesse ao Senado e dissesse aos Senadores que a greve teve ou não carácter político, que nasceu ou
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não de uma especulação política, e das razões porque foi demitido o Comissário dos Abastecimentos, e se essas razões foram efectivamente aquelas anunciadas pelos jornais, ou se foram outras que o Senado ignora.
Em vejo que o Senado, que deveria estar bem informado por quem de direito a respeito da política geral do País, tem necessidade de recorrer aos jornais para saber o que se passa.
Eu já estou a ver o Sr. Ministro da Justiça a tomar as suas costumadas notas; eu já sei que S. Exa., amável como é, me vai responder e defender o Govêrno a que êle pertence, e do qual é um dos mais dignos ornamentos.
Eu já sei também que vou ser estranhado por S. Exa. pelo facto de me ter referido nesta hora grave o quási ao encerrar da sessão legislativa a todos os assuntos que por assim dizer têm complicado a dura situação de governar.
Basta olhar para o rosto de S. Exa. para que nós tenhamos imediatamente uma resposta franca, leal e sincera.
Mas preferiria antes ouvir uma resposta do Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, porque se estou certo que a resposta do Sr. Ministro da Justiça vai agradar de antemão, e outra cousa não posso esperar de S. Exa., que é um leal republicano, um grande patriota e uma das criaturas mais dignas do Govêrno, e aquela que mais se impõe à consideração do Senado, a do Sr. Ministro do Interior, nesta altura, teria outro significado e valor, visto ser o único responsável nos casos a que aludo.
De resto, se as palavras do Sr. Ministro da Justiça, que são sempre atenciosas e sumamente delicadas, me agradam por um lado, deixam-me também ficar em dúvida sôbre o que seja o pensar político e as intenções do Govêrno em matéria de ordem pública, que já chegam a provocar da minha parte fortes reparos pela forma como tem sido mantida, pois estou vendo as prisões pejadas de bravos e destemidos republicanos.
Eu vou mais uma vez referir-me ao julgamento dos implicados no 19 de Outubro.
Sabe V. Exa., como Ministro da Justiça que é, que êsses julgamentos, por mais que os queiram apressar, não se realizarão antes decorridos quatro meses. Temos portanto de esperar ainda mais quatro meses para termos o prazer e a satisfação de estreitar nos nossos braços de republicanos, oficiais que têm apenas um crime: o crime de darem o grito de revolta para proclamarem mais uma vez os indefectíveis princípios da República e da democracia implantados em 5 de Outubro de 1910. S. Exa. que conhece bem todos os trâmites que são precisos seguir para se efectuar êsses julgamentos, S. Exa. que é um distinto jurista, que me diga se será ao menos possível realizar êsses julgamentos antes do prazo de tempo que citei, uma vez que os processos estão ainda no início do sumário de culpa.
Estou certo que S. Exa. me dirá que isso é impossível. E basta-me para me servir de escudo na próxima defesa que tenciono fazer para deferimento da petição que ao Senado endereçou o nosso colega Procópio de Freitas.
O Sr. Presidente: - Estão esgotados os 15 minutos durante os quais V. Exa. podia falar antes da ordem do dia.
O Orador: - Nesse caso peço a V. Exa. para me inscrever"novamente para amanhã, antes da ordem do dia, e entretanto ouvirei a resposta que o Sr. Ministro da Justiça certamente me vai dar acêrca das considerações que acabei de fazer.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): - Sr. Presidente: se V. Exa. mo permite, eu darei desde já algumas informações sôbre os pontos a que o ilustre Senador Sr. Ribeiro de Melo se acaba de referir.
É evidente, por todos os modos, que mais satisfaria o Senado, e mais satisfaria principalmente o Sr. Ribeiro de Melo, uma resposta dada pelo Sr. Presidente do Ministério, e digo isto, porque foi S. Exa. mesmo que o declarou.
Mas, como sôbre os diversos assuntos a que S. Exa. se referiu o Govêrno é, como não podia deixar de ser, inteira e completamente solidário, o Senado certamente me desculpará se eu prestar algumas informações.
O Sr. Ribeiro de Melo, que é uma pessoa ilustrada, fez algumas observações a que eu procurarei na medida do possível dar uma resposta.
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S. Exa. interessando-se pelas cousas públicas está ao facto delas, ao facto do que se tem passado e de tudo que se pode relacionar com isso.
Permita-me portanto S. Exa. que lhe diga - e com toda a sinceridade, como S. Exa. usou - que eu estou convencido que as palavras de V. Exa. foram mais para provocar uma explicação da parte do Govêrno, para que se saiba o proceder do Govêrno, não porque S. Exa. não saiba porque é que o Govêrno tem procedido desta ou daquela maneira em relação aos assuntos a que S. Exa. se referiu.
Não o nega S. Exa., é evidente, não o podia negar. É sempre agradável à Câmara que, sôbre qualqner assunto, o Govêrno venha dar explicações ao país, e muito mais salutares porventura, e muito mais perfeitas são essas explicações quando o Sr. Presidente do Ministério, como êle fez no caso da nomeação dos generais, prevendo atoardas que se chegaram a propagar, se apressar a vir ao Senado dar as explicações mais peremptórias mais cabais, mais terminantes, a semelhante respeito.
Não é por isso, evidentemente que não é por isso, que S. Exa. o Sr. Ribeiro de Meio falou, não foi por o Sr. Presidente do Ministério vir aqui querer evitar que se levantassem boatos sôbre a nomeação dos generais, S. Exa. veio aqui por um preito de consideração para com o Senado, por um preito de consideração para com o país. Parece-me que não é condenável que êle sê apressasse a vir dar explicações ao Senado sôbre semelhante assunto.
Razão haveria para quando êsses boatos se levantassem, razão haveria para que S. Exa. condenasse o procedimento do Govêrno, o seu silêncio, a sua passividade, os seus braços cruzados diante dum facto que não importava unicamente um desprestígio para o poder, mas importava uma indignidade do poder. Um Govêrno que usasse de tais meios para sustentar-se no poder era um Govêrno que não se devia apresentar às Câmaras, depois de estar a pactuar, miseravelmente, por êsse acervo de mentiras, a sua estada no poder. (Apoiados).
V. Exa., Sr. Ribeiro de Melo, que é uma pessoa inteligente e patriota, que é uma pessoa que começa por honrar os outros para que se honre a si mesmo, S. Exa. compreende bem que não se podia conceber nunca que o Govêrno entrasse nessas combinações que importavam uma indignidade pessoal de tal ordem que revoltava as consciências republicanas contra a moralidade do Govêrno e contra a moralidade pessoal de cada um dos seus membros. S. Exa. compreende que se estivesse no caso que está em discussão, era S. Exa. o primeiro que se apresentava aqui ao Senado a dar as explicações mais cabais sôbre o assunto, fazia o mesmo que o Sr. Presidente do Ministério fez.
E V. Exa., decerto, repito, com as suas palavras quis apenas prestar mais uma vez um grande serviço ao seu partido; V. Exa. quis, certamente, que se esclarecesse mais semelhante facto.
O Govêrno não está no poder à custa de quaisquer negociações, à custa da viagem do Sr. Presidente da República, à custa de ninguém. S. Exa. é o primeiro a confessar que êsses cidadãos mereciam ser promovidos. E para que havia o Govêrno de querer sustentar-se no poder à custa de quaisquer negociações? Sustentar-se no poder... Porque? Por vaidade, seria a maior das estultícias. O Govêrno está no seu lugar cumprindo simplesmente o seu dever e arriscando, como todos sabem, a vida a toda a hora. E o Govêrno só pode ter uma tranquilidade, a tranquilidade da sua consciência por cumprir um alto dever. Nada mais.
Quanto ao caso Rugeroni, eu posso, melhor que o Sr. Presidente do Ministério, dar explicações cabais a S. Exa. e ao Senado. Não serão as minhas explicações tam nítidas e eloquentes como as do ilustre chefe do Govêrno, mas podem ser cabais. E porque? Porque o assunto corre pela minha pasta, pela secretaria que eu dirijo.
Logo que um tal assunto ficou afecto à pasta da justiça, eu não me contentei com ofícios, sempre dilatórios, ou com quaisquer outros papeis escritos, que às vozes só servem para complicar as questões. Pedi ao Sr. Procurador da República que viesse falar pessoalmente comigo. Dei-lhe instruções, não escritas, mas as mais terminantes, para que os seus subordinados, delegados do Procurador da
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República, tomassem conta da causa. E não me contentei só com isto. Fiz mais. Chamei os delegados a quem cumpria tratar do assunto e dei-lhes também as mais rigorosas instruções, dizendo-lhes que procedessem imediatamente ao corpo de delito. Disse-lhes que isso seria fácil, porque, desde que a Capital falava por formatam peremptória, mostrando conhecer claramente a questão, eram as acusações da Capital a base do processo, devendo o director dêsse jornal ser chamado a juízo.
Já foi chamado o director ou redactor da Capital, continuando a formação do corpo de delito. E a câmara compreende que eu não posso dizer que o corpo de delito tem de terminar em certo prazo. Isso seria contra os princípios constitucionais, visto que, perante a Constituição, o Poder Judicial é independente. O que eu posso é accionar quanto possível o andamento do processo, mas sem me imiscuir na acção da justiça. Foi o que eu já fiz e continuarei a fazer.
A inquirição das testemunhas prossegue. O caso há-de apurar-se; o que o Govêrno não pode certamente, é intrometer-se, repito, na acção dos tribunais.
O Sr. Ribeiro de Melo (interrompendo): - Temos as obras de Santa Engrácia...
O Orador: - Perdão! V. Exa. é uma pessoa extremamente correcta; e parece-me que depois das explicações sinceras que eu lhe dei, depois de V. Exa. me dizer essa frase tam amável de que me fotografava na alma, sabendo que eu sou homem dum só rosto e duma só fé, não tem razão em dizer o que disse, pois eu podia ser então um obreiro das Obras de Santa Engrácia...
O Sr. Ribeiro de Melo: - Mas é que há os inquéritos.
O Orador: - Ah! sim, nos inquéritos posso eu intervir. Mas como V. Exa. falou nas obras de Santa Engrácia e como então eu era um obreiro delas, eis a razão das minhas palavras. (Pausa).
O inquérito a tal respeito não está completo. Mas creia V. Exa. de que muito brevemente o estará.
Hei-de chamar o delegado do Procurador da República e há de fazer-se tudo aquilo que necessário fôr aos altos interêsses e ao prestígio da República, que todos nós devemos olhar com carinho e com enternecimento.
Falou o ilustre Senador a respeito de greves. O que pensa o Govêrno a respeito de semelhante assunto?
O Govêrno pensa que as greves não significam mais no caso presente que explorações ocultas, venham elas donde vierem, sôbre espíritos fracos que aceitam aquilo que lhes parece mais verosímil, quando afinal, é tudo quanto há de mais inverosímil. O motivo real da greve não foi o preço do pão. Se se viesse fazer a demonstração de que o pão podia ser dum ti; o único e podia vender-se por um preço inferior a $80, eu compreenderia que as classes trabalhadoras, aquelas que são muitas vezes, quando trabalham, a verdadeira alma da nação, pelo que respeita ao trabalho e ao labor, essas tinham grande autoridade para o fazer, se mostrassem clarissimamente que era um crime de lesa humanidade estar a vender pão ao proletariado por aquele preço, quando efectivamente devia ser muito abaixo dêsse fixado de $80.
Fez-se essa demonstração?
Como V. Exa. tem conhecimento não se fez, e daí o ter falhado absolutamente todo o movimento, porque a causa que tinha a defendê-lo era apenas esta simulação a respeito do preço do pão.
Era uma causa que o país não podia apoiar, que se viu que não era causa, mas unicamente o pretexto para os distúrbios que se levantaram, e de mais a mais causas sem fundamento, em cujo processo não podemos ver em muitos dêles senão a malvadez, se não o propósito de alarmar para evitar o trabalho, porque era uma causa em que se empregavam todos os meios, empregava-se a dinamite, a pedra, matando crianças e mulheres.
Evidentemente uma causa que se serve de tais meios é uma causa perdida e não era honesta, por isso falhou.
O Govêrno entrou, porventura, em algum pacto com êsses grevistas? Não, Sr. Presidente, absolutamente não.
O Govêrno nem de longe nem de perto pactuou com os grevistas, o que
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disse foi que retomassem o seu trabalho honesto, e só depois de retomado o trabalho honesto, se alguma negociação se pudesse fazer, só nesse caso se faria.
Qual a razão da demissão do Sr. Peres Trancoso?
A razão foi porque apareceu nos jornais esta notícia, em que se narravam factos que eram verdadeiramente degradantes para quem estava no poder, degradante porque se inculcava que tinha havido uma transacção entre o Govêrno e os grevistas que tinha por base êstes pontos. Primeiro, que o pão baixasse de $80 para $60, segundo que se abrisse a sede da Confederação Geral do Trabalho, terceiro que a Batalha pudesse circular, e quarto, para fechar com chave de ouro, isto é, que fôsse preso aquele dos indicados pelos grevistas como tendo sido o assassino do tipógrafo que morreu.
V. Exa. compreende e o Senado, dentro de tantos artigos, não sendo um só verdadeiro, o Govêrno tinha absoluta necessidade de repudiá-los por inteiro, e repudiou-os por uma nota clara e explícita. Na imprensa os clamores eram grandes, na Câmara dos Srs. Deputados a indignação esboçada contra o Govêrno quando pareceu àquela Câmara que o Govêrno tinha pactuado com os grevistas e preguntava-se: pois então nestas circunstâncias o Govêrno desce do poder para se tornar solidário com os crimes dos grevistas?
Foi êste o motivo que provocou a demissão do Sr. Peres Trancoso.
O Sr. Trancoso pediu a demissão pelas acusações que lhe foram feitas na Câmara dos Deputados e porque efectivamente, a ser verdade o que se afirmava A Capital, o Sr. Trancoso teria exorbitado absolutamente das suas funções.
Por isso o Sr. Trancoso pediu a sua demissão e êsse pedido foi sem delongas, imediatamente aceito.
Falou o ilustre Senador nas condições do proletariado. Essas condições do proletariado que trabalha, que compreende bem os seus deveres cívicos, que vê diante de si os interêsses nacionais, os de sua família, tem-nas o Govêrno na maior atenção. Por tais condições tem o Govêrno, como deve ter o maior carinho, e todo o seu empenho deve ser logicamente minorar a êsse proletariado, tanto quanto possível, a sua situação económica. (Apoiados).
Ainda ontem foi apresentada na Câmara dos Deputados uma proposta de lei, para ver se de algum modo se entrava esto comércio mais que ilícito, vergonhoso (apoiados), que não recua, que não para, diante das circunstâncias angustiosas com que tantos têm de lutar, para se lembrar apenas dos seus cofres e fazer fortunas em meses, que dantes só se ganhavam quando os cabelos brancos pediam repouso.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O Orador: - Está, pois, apresentada essa proposta. O Govêrno está longe de supor que ela não tenha defeitos, que ela não seja susceptível do ser modificada. Ela será em breve submetida à apreciação das Câmaras, porque estou convencido de que as respectivas comissões lhe darão ràpidamente o seu parecer. E então é de crer que o Parlamento introduza a essa proposta as alterações de que ela necessitar, porque todos nós, Govêrno, Deputados ou Senadores, compreendemos quanto é triste a situação das classes trabalhadoras. Convenço-me de que todos trabalharão afincadamente para que essa proposta possa representar um documento que venha minorar a situação desgraçada em que quási todos se encontram. Os altos ricos e só os altos ricos (apoiados), não sentindo a miséria do proletariado - porque se a sentissem também sofreriam - olham só para os seus interêsses, deixando à margem aqueles que trabalham.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O Sr. Ferreira de Simas: - Mando para a Mesa um parecer.
É lido o projecto n.° 213.
É o seguinte:
Artigo 1.° Aos filhos varões do falecido primeiro tenente Augusto Henrique Metzner é-lhes revalidada a pensão que usufruem nos termos do decreto com fôrça de lei n.° 3:632, de 29 de Novembro de 1917.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
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Palácio do Congresso da República em 28 de Julho de 1923. - Domingos Leite Pereira - Baltasar de Almeida Teixeira - João de Ornelas da Silva.
Entra em discussão na generalidade e na especialidade.
O Sr. Vicente Ramos: - A comissão de redacção da Câmara dos Deputados não inscreveu o nome completo dêsse indivíduo, o que pode dar como resultado dificuldades na recepção da pensão pelos filhos. E a não poder dar-se a execução ao projecto, é preferível que êle volte à Câmara dos Deputados com uma emenda que nesta Câmara lhe seja introduzida, pelo que mando para a mesa uma proposta de alteração no sentido indicado.
O Sr. Ribeiro de Melo: - Desejo declarar, e é bom que fique estabelecido, que não há conveniência em discutir projectos cujos pareceres não tenham sido impressos. E quando a urgência fôr reconhecida, convinha então que se distribuíssem os pareceres impressos da outra Câmara ou então mandar tirar à Secretaria umas dezenas de cópias dos pareceres manuscritos das nossas Comissões, e distribui-los pelos Senadores que mostrem interêsse em discutir êsses projectos.
Êste critério devia ser sempre aplicável a todos os projectos que ao abrigo do § único do artigo 84 nos aparecem de surpresa à nossa apreciação.
A Câmara que resolva e o Sr. Presidente que convenha em aceitar a minha indicação como boa e de utilidade para a reputação do Senado.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: - Tenho a dizer em especial ao Sr. Ribeiro de Melo que ontem foi lido êste projecto e os pareceres, e em virtude do requerimento do Sr. Vicente Ramos é que foi pôsto na ordem do dia.
É já tardia porque foi já votado que entrasse em discussão hoje, dispensando-se a publicação.
O Sr. Ribeiro de Melo: - Expendo esta doutrina para que a Câmara não estranhe a minha intervenção de ora avante quando os projectos não estiverem suficientemente esclarecidos.
O Sr. Presidente: - Quanto á proposta do Sr. Vicente Ramos, como no projecto primitiva existe a palavra Henrique, a comissão de redação poderá remediar o inconveniente sem necessidade do projecto ir à outra Câmara.
O Sr. Vicente Ramos: - Se a comissão de redação pode alterar a proposta que veio da Câmara dos Srs. Deputados, ou pode identificar a pessoa de quem se trata, eu nenhuma dúvida tenho em retirar a minha proposta de aditamento.
Como o Sr. Ribeiro de Melo diz que ignora o fundamento desta proposta de lei, eu direi que o caso é da maior simplicidade.
Foi concedida uma pensão à viúva e filhos do primeiro tenente Sr. Metzner. Posteriormente, um decreto alargou o usufruto da pensão até a maioridade dos filhos quando estudassem com aproveitamento, mas resultou que, quando êles chegaram á época em que mais careciam de assistência, ela faltou-lhe. O Sr. Ministro da Marinha e o Sr. Ministro das Finanças, atendendo à injustiça de que essas crianças estavam sendo vítimas, apresentou; a proposta de lei de que nos ocupamos e que foi aprovada, sem discussão, na Câmara dos Srs. Deputados.
Eis os fundamentos desta proposta de lei que eu espere esta Câmara aprovará.
Estando no uso da palavra, peço a V. Exa. para informar o Senado do que significa o uso da palavra antes da ordem do dia. O Regimento diz. que, antes de se começarem os trabalhos, haverá uma hora para se falar.
O Regimento diz que há um certo periodo antes da ordem do dia em que cada orador pode fazer uso da palavra por um quarto de hora.
Mas houve um orador que esgotando um quarto de hora ficou com a palavra reservada. Hoje continuou e acabando o quarto de hora pediu para continuar com a palavra reservada.
Ora isto é que é preciso, que fique esclarecido.
O Sr. Presidente: - Pouco tenho que esclarecer. Não tenho ligado grande importância ao assunto, contudo...
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O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Prejudica os oradores que querem usar da palavra inscritos hoje.
O Orador: - Termino, mandando para a Mesa um projecto de lei e um requerimento e declarando que retiro a minha proposta.
O Sr. Alves Monteiro: - Tendia a proposta do Sr. Vicente Ramos a tornar mais claro o projecto, mas o que é certo é que não há outro primeiro tenente com aquele apelido, e desde que fique bem consignada e patente a quem aproveita o projecto de lei, não precisa qualquer alteração.
O Sr. Silva Barreto: - A comissão de redacção não tem competência para alterar êsse nome, pois que não se trata de simples redacção.
Se o Sr. Vicente Ramos retira a proposta, eu então perfilho-a.
Foi lida a proposta do Sr. Vicente Ramos, perfilhada pelo Sr. Silva Barreto, sendo admitida.
Foi aprovado o projecto na generalidade e na especialidade, com o aditamento do Sr. Vicente Ramos.
O Sr. Silva Barreto: - Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.
Foi dispensada.
O Sr. Pereira Gil: - Em nome da comissão de faltas, envio para a Mesa a seguinte proposta:
Proponho que na comissão de faltas e infracções os Srs. Senadores Medeiros Franco e Silva Barreto substituam na sua ausência os Srs. Senadores Artur Costa e Godinho do Amaral. - O presidente da comissão. - Joaquim Pereira Gil.
Aprovado.
O Sr. Teixeira da Silva: - Mando para a Mesa um projecto de lei.
O Sr. Presidente: - O Sr. Joaquim Crisóstomo mandou para a Mesa uma carta pedindo licença para se ausentar. Consulta- a Câmara sôbre se consente a licença pedida.
Foi concedida.
Foram aprovadas as propostas enviadas para a Mesa pelos Srs. Vicente Ramos e Pereira Gil, para substituição de alguns Srs. Senadores em comissões.
O Sr. Medeiros Franco: - Em nome da comissão de legislação civil e criminal, mando para a mesa um projecto de lei, devidamente relatado, requerendo para êle a aplicação do § único do artigo 84.° do regimento, a fim de ser dado para a ordem do dia de amanhã.
O Sr. Herculano Galhardo: - Em nome da comissão de finanças, pedi a palavra para, com a devida licença, devolver à Mesa três projectos de lei que foram enviados à comissão de finanças, mas sôbre os quais, em harmonia com deliberações anteriores, a comissão se considera mal habilitada a resolver, visto não terem os pareceres das comissões técnicas. São os projectos de lei n.ºs 36, 37 e 238.
Mando também para a Mesa hm primeiro parecer, que não é parecer, da proposta de lei n.° 239, visto a comissão de finanças não o considerar suficiente porá apreciar essa proposta.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Sr. Presidente, requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se consente a urgência para o projecto de lei apresentado pelo Sr. Vicente Ramos.
Consultada a Câmara, foi rejeitada a urgência.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Requeiro a contra-prova.
Feita a contra-prova, foi aprovada a urgência.
O Sr. Ramos de Miranda (para interrogar a mesa): - Sr. Presidente: peço a V. Exa. o favor de me informar se já foi enviado para a mesa o parecer relativo à proposta de lei n.° 219, para a qual a Câmara concedeu que entrasse em ordem do dia, logo que fôsse apresentado o respectivo parecer.
O Sr Presidente: - Já está na mesa êsse parecer.
O Orador: - Peço a V. Exa. a fineza de o dar para ordem do dia de amanhã.
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ORDEM DO DIA
Continuação da discussão da proposta de lei n.° 86
O Sr. Medeiros Franco: - Sr. Presidente: ontem fiz algumas considerações acêrca da proposta de lei em discussão, e pretendi demonstrar que a lei de 26 de Julho de 1912, pelo que respeita à matéria de expropriação, era superior e trazia mais vantagens do que as disposições gerais de direito para as quais a remete a proposta de lei vinda da Câmara dos Deputados.
Fazendo a análise da lei de 26 de Julho de 1912, nos artigos que a êste assunto se referem, e confrontando as disposições dessa lei com as disposições gerais de direito, ou seja com o artigo 266.° e seus números do Código do Processo Civil, eu cheguei à conclusão de que a determinação do valor da propriedade, feita nos termos da lei de Julho de 1912, tomando por base o § 6.° e seguintes, longe de vir trazer aquela injustiça e iniquidade de que muito se tem falado nesta casa do Parlamento, pelo contrário, vinha interpretar em termos hábeis as disposições dessa mesma lei, e trazer, quanto possível, a satisfação aos expropriandos e aos expropriantes.
Por consequência, quando o rendimento colectável fôr bastante, suficiente e necessário para a satisfação da indemnização dos expropriandos e para não deixar lesar os expropriantes, os peritos vão dizer que o rendimento colectável é bastante para satisfazer as necessidades e os direitas duns e doutros.
O rendimento colectável muitas vezes é superior ao valor da propriedade, mas na sua quási totalidade êle é porém inferior ao valor do prédio.
Nestas condições e nos termos do § 6.°, se fôr averiguado que o rendimento colectável é inferior ao rendimento efectivo, êsse valor será corrigido nos termos da lei de 1917, isto é, pela média do vencimento dos três últimos anos.
Eu confrontei o § 6.° do artigo 16.° da lei de 1912 com o artigo 5.° da lei de 1917, mas, ainda se podem dar as hipóteses referidas nos §§ 7.° e 8.° da lei de 1912.
Quando o rendimento colectável fôr exageradamente elevado em comparação: com o rendimento correlativo em três anos antes da expropriação, tomar-se há como base o rendimento colectável anterior a êsse ano.
Mas, é preciso, interpretando em termos hábeis êste § 7.°, correlacioná-lo com o § 6.°, e especialmente com a sua parte final, isto é, quando do rendimento dos três últimos anos se verificar que é também inferior ao rendimento efectivo será êsse rendimento rectificado nos termos da lei de 1917.
Isto é, sem embargo da rectificação que os peritos vão realizar quando vão verificar se efectivamente o rendimento colectável é inferior ao rendimento efectivo; se o prédio não estiver inscrito será avaliado pela forma legal do processo.
O espírito do legislador foi não dar àqueles que têm os seus prédios inscritos, e àqueles que o não tem, hipóteses absolutamente diferentes pelo que respeita, à determinação do valor da propriedade.
Isto é a quarta parte do valor que resultar do rendimento colectável.
Eu ontem por lapso cheguei a dizer que se podia elevar a cinco vezes mais.
Foi lapso, porque apenas se pode elevar a uma quarta parte acima.
Isto porque muitas vezes sucede que o rendimento efectivo de um prédio pode resultar do grande número dos seus moradores, número tam grande que vá produzir um valor muito superior àquele que o prédio realmente tem. Por isso, e para não lesar os expropriantes, a lei acautelou êste assunto, dizendo que é necessário reduzir às devidas proporções o número de moradores na propriedade para o rendimento não subir além do que é necessário.
Mas eu vi que as disposições contidas na lei de 1912 estão consignadas no artigo 516.° e seguintes do Código do Processo Civil, onde se trata de expropriações por utilidade pública. Quere dizer o Código do Processo Civil já condensou na secção 10.ª de expropriações a matéria que vinha na lei de 1850, onde se tratava de expropriações, mas a lei de 1800 trata da forma mais sob o ponto de vista administrativo.
O Código do Processo Civil veio depois estabelecer a forma adjectiva de fazer as
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expropriações e de determinar, também o valor.
E como a proposta a remeteu a termos gerais de direito, nós só temos que ir às disposições gerais do Código do Processo Civil.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - As expropriações por utilidade pública não estão regulamentadas no Código do Processo Civil.
O Orador: - Estão aqui...
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Esse Código está errado.
O Orador: - Eu devo dizer que êste Código me foi fornecido pela Secretaria do Congresso.
Parece-me que não tenho necessidade de dizer à Câmara que a minha argumentação era toda na melhor boa fé. Devo mesmo dizer que, por mais de uma vez, um contínuo desta Câmara me veio pedir êste Código, o que queria dizer que naturalmente outros parlamentares o queriam também para consulta, e que eu lhe respondi sempre dizendo que, tendo pedido a palavra sôbre êste assunto, precisava do Código.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Ninguém duvida da sua boa fé. (Apoiados).
O Orador: - Mas confrontando a matéria da lei de 1912 com as disposições gerais de direito para a determinação do valor do prédio não podemos atender apenas ao seu rendimento, temos de atender também a outros factores.
A lei de 1912 diz que o valor só pode ir uma quarta parte acima do rendimento colectável; ao passo que o Código do Processo Civil não fixa o valor dentro do qual se há-de estabelecer o critério dos peritos.
Eu ontem tive ocasião de dizer que o critério estabelecido pela lei de 1912, modificado ê corrigido pela lei de 1917, era o critério estabelecido pelo § 1.° do artigo 223.° do Código do Processo Civil. Mas era diferente porque, ao passo que essa lei tomava, por base os últimos 3 anos, o Código do Processo Civil tomava por base os últimos cinco anos.
Ora julgo que, tomando-se por base os últimos cinco ou três anos, e tratando-se de prédios urbanos e rústicos, arrendados antes da grande elevação de rendas, a lei de 1912, pelo que respeita à determinação do valor, é muito superior ao Código do Processo Civil, porquanto as rendas têm-se elevado, consideràvelmente, nos últimos três ou quatro anos.
Eu sei que me podem argumentar que na determinação do valor de um prédio, não se atende apenas ao rendimento.
Mas, a quem me argumentar assim eu direi que não se trata neste particular de uma lei de carácter particular, trata-se de uma lei de interêsse de ordem pública, como é uma lei de expropriação por utilidade pública. Por isso eu entendo que nós não podemos admitir como defensáveis os considerandos a que ontem um ilustre Senador se referiu, considerandos que foram apresentados no projecto de lei do Sr. Álvaro de Castro na Câmara dos Deputados.
Êste projecto pouco contrariava a lei de 1912: apenas o fazia na parte que respeita â nomeação de louvados e nada mais.
Nós não estamos tratando de um projecto em que se possa pôr perfeitamente no mesmo pé de igualdade o Estado e o particular.
Eu creio que se trata de um projecto muito mais importante como seja um projecto de expropriação por utilidade pública. Em matéria desta natureza é necessário que nos convençamos que os particulares se devem sacrificar quanto possível aos interêsses da colectividade.
Ai de nós se o não fizermos. Ai de nós se os homens de Estado não forem de encontro às correntes modernas da vida económica, e não forem de certa forma satisfazer as necessidades de interêsse público.
Serve isto para dizer que quando o prédio expropriado tiver por vezes o valor colectável inferior ao seu rendimento efectivo, e quando o rendimento efectivo seja corrigido nos termos da lei de 1912, tratando-se de uma lei de expropriação por utilidade pública em que todos têm de ceder uma parte, nós não podemos seguir o critério do n.° 1.° do artigo 253.°, mas limitar nos apenas às alíneas do § 9.° 4o artigo 16.° da lei de 1912.
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Parece-me que nestas condições e tratando-se de prédios rústicos não me resta a menor dúvida que a lei de 1912 satisfaz cabalmente o expropriado e o expropriante.
Pelo que respeita a prédios urbanos, êste é o assunto mais importante da questão.
Tratando-se de prédios urbanos e sabendo-se que a lei do inquilinato não permite o aumento do rendas, o assunto merece maior ponderação.
O prédio urbano dado de arrendamento não têm, ou não pode ter, aumento de rendas nos termos da lei do inquilinato.
Mas pode suceder. Sr. Presidente, que o contrato de arrendamento seja feito muito recentemente, seja feito êste ano, seja feito o ano passado. Nessas condições, eu pergunto, Sr. Presidente, se o valor do rendimento é determinado pelo que está nos contratos, e sendo assim, sendo o valor determinado pelo rendimento nos termos gerais de direito, o expropriando nada sofre, ou pouco sofre, porque o valor da renda está actualizado nos termos da lei de 1912 conjugada com a lei de 1917. O expropriando pouco ou nada sofre. Mas diz-se: êsse prédio pode estar arrendado há vários anos e como os arrendamentos não têm podido ser aumentados, porque é proibido, mesmo com o consentimento do inquilino, não é possível nos termos da lei de 1912, ou antes da de 1917, dar um rendimento que seja correspondente ao seu rendimento actual. Mas vamos a ver se isso é possível fazer-se pelas regras gerais de direito.
Sabe V. Exa. e sabe a Câmara que, determinado o valor do prédio pelo seu rendimento, êsse rendimento não pode deixar de ser aquele que o senhorio recebe, mas pode ser que o prédio esteja sub-arrendado, e todas essas rendas e subtendas hão-de influir para o estabelecimento da média, pelo parágrafo 1.º do artigo 253.° do Código de Processo Civil. Mas os arrendamentos na sua maioria constam de documentos autênticos ou autenticados, quando os peritos têm de indicar quais as bases de que se serviram para fazer a avaliação, tenham indicado uma base que não seja aquela que corresponde ao que o senhorio tenha recebido, e o expropriante nessa altura virá com embargos e terá muita facilidade em os vencer porque irá procurar na Repartição de Finanças os contratos de arrendamento que demonstrarão quais os rendimentos que êle tem recebido nos últimos 5 anos, e, Sr. Presidente, dá-se mais uma circunstância: é que pelo artigo 2:400 e tantos do Código Civil, havendo documentos autênticos ou autenticados, não pode existir prova testemunhal, e isto quere dizer, Sr. Presidente, que os peritos têm de tomar uma base pela lei; essa base é a do rendimento dos últimos 5 anos. Mas poderão dizer-me: o expropriando cuja propriedade vale 10 podia valer 100 porque as propriedades em volta estão arrendadas por 100. Mas, Sr. Presidente, trata-se do rendimento dessa propriedade e os expropriantes viriam com embargos dizendo que o que o senhorio tem percebido de renda dessa propriedade nos últimos 5 anos é o que consta nos documentos que estão na Repartição de Finanças.
E não pode de forma nenhuma adoptar outra base senão aquela que consta nos documentos autenticados ou mesmo particulares, mas legalizados pela lei n.° 2:422 do Código Civil; fica para todos os efeitos um beco sem saída.
Pelo que respeita ao rendimento de vários prédios fica-se numa situação muito pior do que aquela que está consignada na lei de 1912, rectificada pela lei de 1917, porque a base do rendimento deverá ser adoptada sob pena de a expropriação não poder prosseguir, não poder ser adoptada senão pelo rendimento dos últimos cinco anos. O expropriando pode dizer que recebe 100, mas na repartição está que só recebe 10, como não se pode aduzir provas testemunhais; está provado para todas os efeitos que o expropriando ficaria mais lesado do que pelos termos da lei actual.
Eu não quero fatigar a Câmara, por isso poucos momentos mais demorarei a sua atenção.
Mas dir-me hão: como resolver o assunto?
O assunto é difícil de resolver, não pode ser tratado de ânimo leve; mas dizer-se que a sua solução está apenas neste projecto da Câmara dos Srs. Deputados, remetendo-o para as disposições gerais de direito com preterição da lei de 1922, é que me parece não ser forma de resolver; basta para isso que eu consiga demonstrar que a base do rendimento não
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pode ser favorável ao expropriando, que pelo contrário o prejudicará, trazendo demoras à sua expropriação e lesando fundamentalmente os seus interêsses.
Era possível que se estabelecesse um critério para actualizar os valores não modificando a lei adoptada pela base de 1912; talvez um critério que não pode nesta altura ser simplista mas casual para satisfazer as reclamações dos expropriandos; mas êsse critério é muito difícil de encontrar precisamente porque a lei do inquilinato vem levantar nesta altura um grande obstáculo e é de tal forma que vem alterar o valor dos prédios sem alterar as rendas, por isso não há solução possível. Eu sou de opinião que nesta altura conservemos a disposição de 1912, e quando por mera transigência, e quando muito para satisfazer as necessidades dos reclamantes, se adopte o parecer da comissão de legislação, que de certa forma quere contemporizar e atenuar os prejuízos que porventura resultem do artigo 6.° e seguinte da lei de 1912.
Eu li, Sr. Presidente, o pertence ao n.° 86, o parecer da comissão de administração pública. Não concordei com o parecer porque nele vi mesmo algumas inexactidões.
O próprio parecer chega a concluir que o melhor seria a Câmara não tocar na lei das expropriações.
O artigo 15.° da lei de 1912 não prevê o caso de a expropriação ser objecto de combinações amigáveis. O que prevê é uma cousa diversa.
Isto é, a comissão de administração pública está dando razão às minhas considerações: é que as alíneas contidas neste parágrafo, estão já consignadas no número 1.° e seguintes do artigo 353.° do Código do Processo Civil. Por consequência, embora a comissão de administração pública chegue a afirmar que o projecto em discussão trata simplesmente da actualização do valor do prédio, eu sustento que nada há neste projecto que se refira à actualização do valor. Apenas o artigo 1.° diz que para se determinar o valor se hão-de seguir os termos gerais de direito. Se a comissão quisesse a actualização do valor, devia ter estabelecido um contra-projecto.
Sr. Presidente: eu não quero alongar-me nas minhas considerações; sei que outros oradores vão usar da palavra, alguns dêles irão fazer afirmações de carácter naturalmente filosófico e social acêrca desta lei. Devo dizer a V. Exa. que, tendo pela lei de 1912 a maior simpatia e reconhecendo por outro lado que a época que decorre é de tal forma que se nos impõe o dever de começar a realizar a socialização do Estado para irmos ao encontro das reivindicações económicas dos povos, temos necessidade de evitar que se levantem as barreiras da opinião pública, sendo preferível que os homens públicos e os parlamentos saibam ir ao encontro dessas aspirações votando leis como aquela que foi votada em 1912 sôbre expropriações, por isso que o fim dessa lei é não só beneficiar a colectividade, mas também os expropriantes, e, acima de tudo, beneficiar a colectividade; e o que são afinal de contas todas as limitações de propriedade que as próprias leis consignam senão um benefício a favor da colectividade, por consequência, Sr. Presidente, se é certo que as expropriações por utilidade pública podem causar qualquer prejuízo aos expropriandos, êsse prejuízo, todavia, sendo em benefício da causa pública, deve merecer, sobretudo dos parlamentos actuais a melhor consideração.
O Sr. Herculano Galhardo: - Em primeiro lugar desejo preguntar a V. Exa. se depois de usar da palavra como presidente da comissão de finanças para responder a alguns Srs. Senadores, eu posso usar da palavra depois como simples Senador?
O Sr. Presidente: - V. Exa. está inscrito como presidente da comissão e como simples Senador.
O Orador: - É que por uma questão de hábito quando trabalho pela comissão de finanças costumo obedecer ao critério da comissão e quando estou no Senado como Senador obedeço ao meu critério.
Eu agora desejo apenas responder pela comissão, por isso é que fiz esta pregunta e vou portanto usar da palavra como presidente da comissão, depois falarei como simples Senador.
Sr. Presidente: lamento que não esteja presente o Sr. Machado Serpa que mais
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vivamente atacou o parecer da comissão de finanças.
Os jornais noticiaram que entre a comissão de finanças e a comissão de legislação civil do Senado houve conflito. Nunca houve conflito; por outro lado começou a dizer-se que a comissão de finanças era contra o projecto.
Também não era contra o projecto, e isto concorrerá para que a discussão começasse agressivamente para a comissão de finanças, como se ela fôsse responsável pelas reclamações que na Mesa do Senado estavam contra o projecto.
É preciso, Sr. Presidente, que êste ponto se esclareça, porque da parte da comissão de finanças não houve a menor má vontade contra o projecto em discussão. O projecto quando foi discutido pela primeira vez na comissão de finanças, essa comissão estava completa, e por maioria de 6 votos contra 1, votou-se a rejeição pura e simples do projecto. Assim ficou estabelecido que, se elaborasse um parecer contrário ao projecto.
Depois atendendo ao parecer da comissão de legislação viu-se que melhor seria proceder por outra forma.
Interrupção do Sr. Pereira Osório que não se ouviu.
O Orador: - V. Exas. têm distinguido tanto o presidente da comissão de finanças que êle agora vê-se obrigado a cumprir o seu dever até ao último estremo.
Se o projecto tal como veio da Câmara dos Srs. Deputados tivesse sido enviado à comissão do finanças, esta comissão, possivelmente, teria dito que não era da sua competência apreciá-lo sem vir acompanhado do parecer da comissão técnica. Mas não, o projecto veio acompanhado do parecer da comissão de legislação. E agora, digo eu o mesmo que já afirmou, perante o Senado o Sr. Medeiros Franco: Sinto que até agora se não tenha discutido o projecto nem os pareceres das restantes comissões: caíu-se em massa sôbre a comissão de finanças num ataque em coluna. Foi assim que se começou a discutir o projecto.
Então, para que é que foi consultada a comissão de finanças? Foi para isto?
O Sr. Pereira Osório: - V. Exa. é que influiu para isso.
O Orador: - Tinha o dever de o fazer embora fôsse V. Exa. quem assim o deliberou por alvitre meu.
Sr. Presidente: a comissão, tendo resolvido inicialmente, por maioria de seis contra um, dar parecer contra o projecto de lei, reconsiderou em vista do parecer da comissão de legislação.
A comissão de finanças no cumprimento do seu dever já estava estudando as propostas de finanças e o que se passava na Câmara dos Deputados e sabia que em todos os pareceres daquela Câmara se não continha esta doutrina.
Estamos a ver, Sr. Presidente, qual foi o pensamento do autor da proposta de lei e o das comissões da Câmara dos Deputados. E a comissão de finanças que estava ao facto do que naquela Câmara se passava, vendo que na proposta da comissão de legislação civil se tratava dum múltiplo, começou a pensar que havia duas cousas que estavam ligadas.
Tratava-se de arranjar um ponto de conciliação entre o artigo 22.° e um parágrafo do artigo 26.° com a lei do inquilinato.
Disse-se que o assunto nada tinha com a lei do inquilinato, mas ontem os àpartes caíram sôbre o Sr. Medeiros Franco, pela forma que todos viram, falando-se na lei do inquilinato.
A comissão de finanças tinha razão em que a proposta de lei relativa à contribuição predial, a proposta de lei relativa ao inquilinato e a proposta em discussão, estavam intimamente relacionadas.
A comissão tinha a esperança de que em breve as propostas de finanças a ela viriam e na parte respectiva, já em termos de conciliação com a lei do inquilinato. E como a comissão de finanças, que tem o dever de ver a alguma distância, não olha só para o terreno que tem debaixo dos pés, compreendeu a necessidade de que êstes três assuntos se não separassem.
É isto má vontade contra o projecto em discussão?
Não me parece que o seja.
Mas alguns Srs. Senadores estavam impacientes; desejavam instantemente o parecer.
Costumando sempre cumprir tanto quanto possível com o seu dever e tendo-se orientado no assunto pelo bem do
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país, a mesma comissão sentiu-se vexada, mas não estove com demoras e apressava-se em enviar para a mesa o parecer que era contra a oportunidade da discussão. Merecia ela. ser tratada pela forma como o foi pelo Sr. Machado de Serpa, que sinto não ver presente - merecia ser achincalhada.
Vamos vê-lo. Peço à Câmara a paciência de ouvir ler o parecer.
Êste parecer é acusado de banalidade, duma peça sem valor.
Sr. Presidente: a comissão de finanças, que é composta por Senadores que não afrontam ninguém com a sua imodéstia, limitou-se a estudar como pôde e soube os pareceres e o projecto em face dos quais emitiu a sua opinião. Tem dado pareceres banais, mas pareceres banais têm aparecido muitos pareceres na defesa do Senado, que todavia não têm sido achincalhados, porque não é habito desta Câmara fazê-lo.
Mas, Sr. Presidente, admito que é êste um processo parlamentar, mau processo, lamentável processo, mas um processo desde que se é correcto, como aliás o foi o Sr. Machado Serpa, que se fez ouvir com delicadeza e a graça que esta Câmara tanto lhe aprecia. S. Exa. fez uma crítica áspera ao parecer, enchendo-o de ridículo. Creio que o parecer da comissão de finanças não merecia semelhante crítica.
Ora, Sr. Presidente, o que é que há de ridículo neste parecer?
S. Exa., referindo-se à transformação por que passou a cidade do Rio de Janeiro, disse que ali não se caminha com velocidade de tartaruga, como aqui sucede: fez-se um plano completo de modificação da cidade e realizou-se essa modificação em poucos anos, não sendo depois disso mais necessária essa lei e, quando fôr precisa outra, torna-se a votar. Não queira S. Exa. comparar o Rio de Janeiro com as cidades do Pôrto e Lisboa, porque não há semelhança possível de condições.
Mas, Sr. Presidente, o Sr. Machado Serpa atacou particularmente êste parágrafo, achincalhando-o, empregando para isso todos os recursos da sua graça, e contudo êste parágrafo é digno de ser meditado.
Se V. Exas. tiverem acompanhado as conferências sucessivas que se têm realisado entre os diversos países, hão-de ter certamente notado que é pensamento constante em todos êles que é preciso ir de encontro ao que lá fora se passa, se não quizermos ser guiados, não digo já por virtude duma invasão, mas pelas ideas dos outros.
Êste parágrafo, inspirado da maior modéstia, foi objecto de escárneo e pouco apreço por parte de alguns Srs. Senadores.
Se eu tiver ainda de usar da palavra não farei a comissão de finanças responsável pelo meu modo de ver, mas provarei à Câmara quanto razão ela teve para fazer as afirmações que se contêm no parecer.
Pois não é maior desgraça milhares de famílias ficarem sem os seus entes queridos do que alguns proprietários perecerem alguns contos de réis? E ainda está para se demonstrar se êstes ficam realmente prejudicados.
O que quero dizer o parecer? Que a comissão discorda apenas da oportunidade de tratar do assunto, visto que estamos a poucos dias de o poder fazer mais cabalmente e com maior justiça.
Haverá então necessidade de introduzir algumas emendas na lei de 1912, mas não derruí-la nas suas bases.
Peço ao Senado, que me ouviu com muita paciência, o favor de fazer justiça à comissão de finanças, que não quiz contrariar o projecto, quiz apenas proceder com a cautela que o caso requeria.
Insisto na conveniência de aguardar alguns dias que aqui cheguem as propostas de finanças. Faço-o com inteira boa fé, visto que estou convencido que elas aqui. virão breve, e mau será que não venham. Ha toda a probabilidade de virem já harmonizados os artigos que colidem com a lei do inquilinato, e então poderemos, sem risco de produzir causas de perturbações, legislar sôbre êste assunto com a devida justiça.
O Sr. Pereira Gil: - Só duas palavras para justificar o parecer da comissão de legislação.
As expropriações por utilidade pública são, em geral, uma violência para os expropriados; sobretudo essa violência é enorme quando se trata da casa onde vi-
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veram entes queridos cujos descendentes lá esperavam viver também com seus filhos.
Eu creio que devemos estar todos de acôrdo em que o bem individual temi de se sacrificar ao bem colectivo, e é por isso que as lei de expropriações por utilidade pública são decretadas em todos os países.
Foi decretada no Brasil essa lei de expropriação de circunstância, chamemos-lhe assim, para sanear o Rio de Janeiro, e embora sacrificasse o bem individual de muitos, era para bem de todos essa lei.
Mas a lei de expropriações deverá ir até o ponto de expropriar aquilo que o indivíduo tem e que lhe é mais caro, sem ao menos se lhe pagar o seu justo valor? Essa é que é a grande questão.
Se V. Exas. lerem o parecer da comissão de legislação verão que o valor inscrito na matriz deixou de ser a base imediata da tributação predial e não pode, portanto, continuar a servir de base imediata para a avaliação do prédios em caso de expropriação, sem grave iniquidade contra o particular.
Restabelecer a equidade anterior é decerto o intuito do projecto.
E por isso que no parecer se propõe um artigo único para que continue a lei de 1912, porque a comissão entendeu que não era o momento oportuno para derrogar as disposições do artigo 16.° com uma proposta vinda da outra casa.
Mas, era preciso dar garantias ao expropriando a quem a lei do inquilinato não tinha consentido o aumento das suas rendas.
Se fôssemos a tomar o valor da matriz para a avaliação, êle ficava realmente defraudado.
Eu ainda me lembrei de procurar o valor multiplicando o valor da matriz existente nas repartições de finanças pela relação entre o escudo-ouro na ocasião do lançamento dêsse valor e no momento em que se fizesse a expropriação; mas isso iria talvez longe de mais, è para procurar um elemento seguro eu fui ao coeficiente que está determinado para a contribuição rústica, e assim, tanto para prédios urbanos como para prédios rústicos, o valor será multiplicado por êsse coeficiente, isto no caso do os peritos, nos termos da lei de 1912, verem que não podem dar o valor real à propriedade, pois, como brilhantemente demonstrou o ilustre Senador Sr. Medeiros Franco, fica perfeitamente provado que os peritos têm na lei de 1912 os elementos necessários pára avaliarem a propriedade pelo seu valor real.
Entendeu, pois, a comissão de legislação que não havia prejuízos para ninguém mantendo intacta a lei de 1912, lei que pelo regulamento de 15 de Fevereiro de 1913 se aplica também a emprêsas, e particulares.
Como V. Exas. sabem, emprêsas e particulares vendem muitas vezes por 10 aquilo que compraram por 5, e para êsses casos é talvez conveniente que se apliques o princípio estabelecido na proposta que veio da Câmara dos Deputados.
Eu vou mandar para a Mesa uma proposta, acrescentando ao artigo da comissão de legislação o seguinte parágrafo:
"§ único. Quando a expropriação interessar a qualquer emprêsas ou particular, a avaliação far-se há nos termos gerais de direito".
Dá-se também o caso de grande número de expropriações estarem feitas há 3 e 4 anos por câmaras municipais, mas ainda pendentes dos tribunais.
É portanto natural que a lei não se aplique a essas expropriações que estão já feitas, embora não tenha passado em julgado a sentença que fixa a indemnização.
Eu mando, pois, para a Mesa êste acrescentamento ao contra-projecto apresentado peia comissão de legislação:
"Artigo novo. O disposto nesta lei não se aplica às expropriações por utilidade pública já efectuadas, embora não tenha ainda passado em julgado a sentença que tiver fixado o preço da respectiva indemnização.
"§ único. Consideram-se expropriações efectuadas as referentes a prédios que se encontram já em poder das entidades expropriantes".
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Menezes): - Sr. Presidente: apesar de V. Exa. me ter concedido a palavra pelo lugar que ocupo, eu devo dizer
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à Câmara que falo única e exclusivamente na qualidade de Senador, pois não quero de maneira nenhuma que as minhas considerações signifiquem de longe ou de perto a intromissão do Govêrno em semelhante assunto.
Tanto a Constituição actual como a Constituição de 1826 estabelecem que é garantido o direito de propriedade, salvo as excepções que vêm claramente expressas na lei.
Foi êsse o princípio também observado pelo legislador civil de 1867 no artigo 2187.° do Código Civil, que dava ao proprietário a mais ampla liberdade de gozo, fruição e transformação, mas esta faculdade podia ser absolutamente restringida por disposições especiais da lei.
Se a Constituição assim procede, se a nossa lei fundamental sôbre direito civil assim se conduziu, qual a razão disto? Essa razão parece-me não ter sido outra senão esta, que eu quero dizer bem alto porque representa o meu pensar de há muito tempo: é que acima do direito da propriedade há os interêsses da colectividade. (Apoiados).
A propriedade foi criada para servir a colectividade.
Afirmar o contrário é inverter as cousas.
Assim interpretada à luz dêste princípio a lei de expropriações, nós vemos que o princípio estabelecido na lei de 23 de Julho de 1850 não traduzia absolutamente o princípio que emanava da constituição então vigente.
E não traduzia, porque aplicando-se como se aplicava essa lei nos processos de expropriação nos termos gerais, dava-se na prática o resultado de que quando se tratava dum processo de expropriação entendia-se que, tratando-se dum negócio em que o Estado tinha de pagar, observava-se, e eu o vi muitas vezes em cousas minhas e muitos jurisconsultos hão-de ter visto, que os períodos eram sempre largos e condescendentes, e era expropriante não aquilo que representava o justo louvor da propriedade, mas sim aquilo que criava margem a fazer-se a expropriação, não como objecto de utilidade pública mas como exploração particular. (Apoiados).
E porque num regime republicano não devia continuar tal estado de cousas, sucedeu que para corrigir semelhantes abusos veio a lei de 26 de Julho de 1912. Ela não foi feita sôbre o joelho. Consulte-se o Diário das Câmaras e veja-se o tempo que ela levou, os jurisconsultos eminentes que entraram na sua discussão, as objecções apresentadas contra os velhos sistemas estabelecidos na lei de 1850 e na de 1887 que ficaram completamente derruídas perante a argumentação republicana.
O Sr. Querubim Guimarães: - É fácil provar o contrário.
O Orador: - Agradeço que o faça, por que estou sempre pronto a receber lições, tanto mais quando vêm duma pessoa tam autorizada como S. Exa.
Mas, dizia eu, veio a lei de 1912, de argumentos sólidos, que no dizer do Sr. Senador que me interrompeu são fracos, e que vou ver destruídos pela sua palavra fulminantemente. E digo fulminantemente porque para mim foi fulminante a afirmação.
Dizia eu, Sr. Presidente, que os intuitos da lei de 1912 foram honestos, que se compadecem com os princípios que acabo de expor e que parece serem aqueles que devem merecer a atenção desta Câmara, que está certamente possuída do desejo de fazer uma lei que sirva os interêsses gerais e nacionais, sem atender a quaisquer outras considerações.
Veio a lei de 1912, e veio sob que fundamento? Veio dizer ao expropriado que não lhe pagasse o valor estimativo. O valor estimativo é uma cousa variável que eu não posso pagar. Eu só posso pagar o valor que esteja em relação com o rendimento.
O Sr. Pereira Osório: - Ainda ninguém argumentou aqui com o valor estimativo.
O Orador: - O que eu ouvi aqui foram argumentos de carácter estimativo. V. Exa. disse porque não se há de empregar a palavra "estimativo"?
O rendimento é que serve de base para o pagamento. Quem, por qualquer circunstância, quer sair dêste princípio, há-de cair só no princípio do valor estimativo. Quem sustentar o pagamento além do valor do rendimento, sustenta o pagamento
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do valor estimativo. E estas minhas afirmações concordam com as afirmações alevantadas que fez o Sr. Herculano Galhardo, com aquele brilhantismo e a aquela firmeza, com aquela maneira - permita-se-me a expressão - cortante e concisa com que S. Exa. costuma encarar os assuntos, influindo neles com os argumentos dimanados da sua razão. Eu não venho acrescentar nada ao que S. Exa. disse, pois S. Exa. estabeleceu a verdadeira doutrina. O Estado não obriga a propriedade senão pelo que ela vale; atende ao valor do rendimento.
O Sr. Pereira Osório: - É isso o que a gente quere.
O Orador: - O Estado atende ao rendimento que a propriedade é capaz de produzir.
O Sr. Pereira Osório: - É isso o que a gente deseja.
O Orador: - É isso o que a gente quere e deseja... É isso o que quere e deseja o grupo a que V. Exa. pertence.
(Trocam-se àpartes entre o orador e vários Srs. Senadores).
O Orador: - Um grupo é uma reunião de pessoas e como S. Exas. estão agrupadas pelo mesmo pensamento, eu peço desculpa ao Sr. Dr. Alfredo Portugal se o coloco nesse grupo.
O Sr. Alfredo Portugal: - Tenho honra em pertencer a êsse grupo.
O Orador: - Parece que S. Exa. se sentiu magoado com a palavra "grupo", quando nela não há a menor ideia de ofensa.
Todos aqui sabem qual o meu procedimento; se por acaso no calor dá discussão solto algema palavra que vai ferir ouvidos mais melindrosos, logo peço desculpa, o que não faz mais se não me engrandecer.
Visto que a lei de 1912 tinha adoptado o critério de que as corporações que tinham direito a expropriar não deviam ter obrigação de pagar o rendimento se não pelo rendimento efectivo de cousa expropriada, e êste assunto se prende intimamente com as propostas de finanças e lei do inquilinato, não se julgue que eu viesse defender o princípio dê não pagar ao proprietário aquilo, que seja justo.
Venho apenas mostrar a conveniência de se esperar como diz o Sr. Herculano Galhardo, porque se tem esperado hoje algum tempo, também espera mais sete dias para assim se pormenorizar a lei do inquilinato e as propostas de finanças com a lei das expropriações. E, então, ver-se há o critério a seguir para considerar o rendimento do prédio? e como é um princípio que sustento que o proprietário tem direito a exigir como rendimento aquilo que o Estado atribuo ao rendimento para efeitos de contribuição predial, por que seria injusto que para exigir-se a contribuição predial partisse do princípio de que o prédio tinha um certo rendimento.
Se partisse do princípio de que o prédio tinha um certo rendimento, principalmente quando se trate de prédios urbanos, e ao mesmo tempo fôsse concedido aos senhorios o direito de elevar as rendas ainda estava bem; mas não tendo êsse direito, isso é que acho injusto e emquanto eu fôr ministro da Justiça não permitirei que os proprietários sejam lesados dêsse modo.
Nestas circunstâncias, visto que as propostas de finanças estão prestes a vir ao Senado e entre elas há-de vir uma que permita a elevação das rendas, parece-me que em assunto de tal magnitude era bem que o Senado esperasse mais uns dias até aparecer essa proposta. No entretanto, repito, isto significa apenas uma opinião pessoalíssima de senador que me honro de ser, significa apenas um grito da minha consciência contra os abusos de que eram vítimas o Estado e as Corporações Administrativas segundo a lei de 1850, mas, repito, não representando êste alvitre uma opinião do Govêrno, sendo apenas a opinião do mais humilde senador que aqui se senta nesta Câmara.
Eu, Sr. Presidente, submeto, como não posso deixar de submeter, à decisão que tenho de acatar, do Seriado que em sua alta sabedoria há-de proferir em última palavra sôbre êste assunto.
Tenho dito.
O Sr. Ramos da Costa: - Requeiro a V. Exa. que consulte o Senado, visto es-
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tar por pouco tempo a chegar da Câmara dos Deputados as propostas de finanças, entre elas a proposta de lei do inquilinato, sôbre se autoriza a que se suste a discussão dêste projecto até êsses documentos chegarem ao Senado.
O Senado aprovou êste requerimento.
Foi aprovado sem discussão, tanto na generalidade como na especialidade, o proposta de lei n.º 206.
O Sr. Ramos de Miranda: - Requeiro dispensa da última redacção para a proposta de lei n.° 206.
O Senado aprovou êste requerimento.
A proposta é a seguinte:
Artigo 1.° As promoções dos médicos da Armada realizam-se, satisfeitas as condições gerais de promoção e tirocínios legais, nos termos seguintes:
a) A promoção a primeiro tenente faz-se nas condições das leis vigentes;
b) Serão promovidos a capitães-tenentes os médicos navais que tiverem vinte anos de serviço, a contar de 1 de Janeiro do ano em que ingressaram no quadro de saúde naval;
c) Serão promovidos a capitães de fragata os médicos navais que tiverem vinte e cinco anos de serviço, a contar de 1 de Janeiro do ano em que ingressaram no quadro de saúde naval;
d) Serão promovidos a capitães de mar e guerra os médicos navais que tiverem trinta anos de serviço a contar do dia 1 de Janeiro em que ingressaram no quadro de saúde naval.
Art. 2.° Para os médicos da Armada, compreendidos nesta lei, será o limite de idade fixado em sessenta e quatro anos, para o serviço activo.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, em 31 de Julho de 1922. - Domingos Leite Pereira - Baltasar de Almeida Teixeira - João de Ornelas da Silva.
Senhores Senadores. - A comissão de marinha do Senado, apreciando a proposta de lei n.° 206, considera de justiça e imediata necessidade a sua aprovação, de justiça, porque ela vem remediar os inconvenientes da errada aplicação dos médicos navais, da lei n.° 971, de 17 de Maio de 1920; de imediata necessidade, porque ela deve auxiliar um pouco a normalização dos serviços médicos da Armada, fazendo com que não fiquem desertos como até aqui os concursos para oficiais daquela especialidade. Acha porém a vossa comissão de marinha que mais vantagens sé devia conceder a uma classe cujas habilitações scientíficas só são excedidas pelos dos engenheiros construtores navais, e assim teria visto com prazer e como manifestação de justa recompensa levar a promoção dos médicos navais até um pôsto mais elevado, o que certamente traria como resultado a afluência de candidatos aos concursos para o serviço de saúde naval. É de esperar que uma futura reorganização dos serviços da marinha de guerra estabeleça esta justa disposição. Pelas razões expostas no princípio dêste parecer, a vossa comissão de marinha acha que deveis aprovar a proposta de lei n.° 206.
Sala das sessões, 11 de Agosto de 1922. - Abílio Soeiro - José Machado Serpa - João Carlos da Costa - Joaquim Teixeira da Silva - Silvestre Falcão.
Senhores Senadores. - A lei n.° 971, de 17 de Maio de 1920, só deveria aplicar-se às classes que tivessem oficiais supranumerários. Erradamente se lhe deu aplicação na classe dos médicos navais, onde só havia oficiais médicos efectivos. Dessa errada aplicação da lei resultou não ascenderem aqueles médicos além do pôsto de primeiro tenente, o que importa injustiça, desrespeito por direitos adquiridos e deixar de haver concorrentes a médicos navais a tal ponto que três concursos sucessivos ficaram desertos. Para remediar semelhantes inconvenientes, os Srs. Ministros da Marinha e das Finanças apresentaram a proposta de lei n.° 206, já aprovada na Câmara dos Deputados. A vossa comissão de finanças concorda com o parecer da comissão dê marinha, estudou, como devia, a referida proposta de lei sob o seu aspecto financeiro e verificou que o aumento de despesa não será de tal modo apreciável que possa influir no critério a seguir para a sua apreciação. Com efeito, o pequeno aumento de despesa resultante das promoções será corrigido pela economia a prever pelas vagas que necessária-
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mente se darão nos postos mais elevados que não serão preenchidos emquanto os oficiais dos postos imediatamente inferiores não atingirem o número de anos exigidos para a promoção. Além disso. Dão haverá que criar receita para acudir à despesa que resultar das promoções a efectuar em virtude da nova lei, que o orçamento do Ministério da Marinha consigna verba para tais aumentos. Esta proposta de lei acaba com iniquidade de que estão sendo vítimas os oficiais médicos navais que actualmente só podem ascender ao pôsto de primeiro tenente, ficando assim colocados na vexatória situação de inferioridade relativamente aos seus colegas do exército e das colónias. Igualmente regularizará o funcionamento dos serviços de saúde naval, agora deficientes por não oferecerem garantias aos médicos que pretendam servir na armada. A vossa comissão de finanças, pois, é de parecer que esta proposta de lei deve merecer a vossa aprovação.
Sala das sessões, 15 de Agosto de 1922. - Herculano Jorge Galhardo - José Mendes dos Reis - Frederico António Ferreira de Simas - Vicente Ramos, relator.
O Sr. Pereira Osório: - Peço a atenção da Câmara e do Sr. Ministro da Justiça para o seguinte: os tribunais portugueses, em matéria de emolumentos, estão injustamente sendo alvo de enorme descrédito, sendo vulgar dirigirem-lhes os epítetos mais afrontosos para o seu prestígio, e tudo isso provém do desconhecimento ou errado conhecimento da forma como êles funcionam, sendo o Estado o principal culpado de as cousas assim se passarem.
Não é novo o que vou contar, mas um dos muitos que se observam diariamente nos tribunais e que pela sua importância excepcional merece uma referência imediata para que o País saiba quanto é injusto na apreciação que faz dos magistrados e oficiais de justiça e o Sr. Ministro da Justiça, cajá presença aproveito, procure remediar o mal, o que considero fácil, bastando fazer com que o Estado e aqueles funcionários recebam separado e directamente o que lhes pertence de emolumentos e salários, de modo que as partes saibam detalhadamente quanto pagam e a quem.
Houve ùltimamente no Tribunal do Pôrto um inventário - o maior que até a data lá tem corrido - por morte do banqueiro Joaquim Pinto da Fonseca, no valor de 3:000 contos. No fim do inventário, que foi trabalhoso, foi à conta e contaram-se de salários e emolumentos 19 contos e tal. Ora quem recebe tal conta para a pagar fica aterrado, julgando que todo êsse dinheiro é para a magistratura e oficiais de justiça que intervieram no processo, sem repararem que, mesmo que fôsse, pouco excederia 1/2 por cento.
Mas a verdade é muito outra, pois que quem come a parte de leão é, o Estado, mas isto feito sub-repticiamente, de modo que na aparência quem tudo recebe são aqueles funcionários e daí os epítetos mais degradantes para o prestígio da alta função dos tribunais que sobres êles são lançados.
Querem V. Exas. Sr. Presidente e Ministro da Justiça saber como se desdobra e o destino que teve aquela importante quantia, que quem a foi entregar ao escrivão do processo saiu cora a impressão de que toda ela era para o Tribunal?
Eu explico: para 2 juizes, 2 delegados, 2 curadores, 2 escrivães, 2 oficiais de diligências, 2 peritos, 6 louvados e 2 contadores, porque houve uma deprecada para Braga onde existiam bens, 4 contos, que dá uma média de 200$ para os 20 magistrados e funcionários que intervieram no processo e para o Estado 15 contos! Figura nestes 15 contos uma verba extraordinária!
Sabe o Senado quanto custou a certidão de óbito? 11 contos, por virtude de uma disposição introduzida rio Código do Registo Civil no tempo do Govêrno de António Granjo, salvo êrro!
O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo): - Isso está errado, com certeza.
O Orador: - Eu não fiz as contas. Se estão bem ou mal não sei; eu estou simplesmente a constatar um facto.
Pausa.
Desses 10 contos e tanto em que importo a certidão de óbito, 118$ foram para o conservador do Registo Civil, o resto para o Estado.
O mapa de partilhas enche oito cadernos de papel e é muito complicado, pois
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por êsse trabalho, o mais importante e de maior responsabilidade recebeu o escrivão 140$.
Ora, como quem vai pagar deixa a importância na mão do escrivão, no cartório, sucede que o odioso recai todo no tribunal.
É contra êste facto que me revolto e chamo a atenção do Sr. Ministro da Justiça, a quem incumbe zelar o bom nome dos tribunais. Já não pretendo privar o Estado das importantíssimas somas que diariamente cobra nos processos, tornando a justiça cada vez mais cara, contra os princípios democráticos pregados no tempo da propaganda em que se prometia ir embaratecendo a justiça até a sua gratuitidade, mas que se estabeleça o meio de receber directamente aquilo que lhe é atribuído, para que não sofra o justo pelo pecador.
Sendo assim, prestigiam-se a Justiça e os tribunais, e livram-se os magistrados e funcionários de justiça de ouvir referências pouco lisonjeiras e agradáveis.
Tenho dito.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): - Ouvi com muito interêsse a exposição que acaba de fazer o nosso estimado Presidente, Sr. Pereira Osório.
Espero trazer ao Parlamento uma proposta de lei sôbre emolumentos e salários judiciais. Talvez nessa proposta de lei ou na sua regulamentação se possa inserir uma disposição que acabe com o estado de cousas a que o ilustre Senador aludiu e, como muito bem disse, desprestigia a justiça quando a verdade é que a nossa magistratura é digna e alevantada e os empregados judiciais cumprem devotadamente o seu dever, apesar de estarem numa situação incomportável com o custo da vida, salvo, é claro, raras excepções, como sucede em todas as classes.
O Sr. Pereira Osório: - Agradeço ao Sr. Ministro da Justiça a promessa que faz de que o caso que apontei vai ser remediado e peço-lhe que essa proposta de lei, sôbre emolumentos judiciais, venha quanto antes ao Parlamento.
Não há nenhum magistrado ou funcionário judicial que tenha hoje de vencimento o triplo do que tinha antes da guerra e todavia, a vida encareceu dez ou onze vezes mais.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Sr. Presidente: desejava que o Sr. Ministro da Justiça me informasse se tenciona nomear algum juiz para desempenhar as funções de presidente do tribunal criado pela lei n.° 969, de 11 de Maio de 1920.
Há um mês que o referido tribunal se encontra sem presidente, e, portanto, impossibilitado de funcionar, o que representa um grande inconveniente para os serviços da administração da justiça.
Os arguidos de vadiagem entregues a êsse tribunal não podem ser postos em liberdade sem que sejam julgados, conforme determina o artigo 28.° da lei de 20 Julho de 1912.
Se muitos são criminosos, é certo que entre êles figuram alguns inocentes, e não é justo que se mantenha na prisão, por longo tempo, um indivíduo que, pela sua regular conduta, tem direito a gozar as regalias que a Constituição garante a todo o cidadão português.
Quem indemniza as vítimas do arbítrio policial que, depois de passarem alguns meses de privações e de miséria no Limoeiro, são julgadas e absolvidas? Que transtornos morais e materiais sofrem aqueles que por uma vingança são privados da sua liberdade e enclausurados numa prisão, em contacto com a escória da sociedade?
Apesar do orgulho de alguns patriotas, somos um povo que só lhe falta andar de tanga para se confundir com os selvagens do interior do continente africano. Estou plenamente convencido que o Sr. Ministro da Justiça ponderando bem as considerações que venho formulando não deixará de, com a possível urgência, providenciar no sentido de ser nomeado um juiz para o aludido tribunal.
Sr. Presidente: sei que S. Exa. já apresentou na outra Câmara uma proposta extinguindo o desastrado Tribunal de Defesa Social, mas, emquanto o Parlamento não se pronunciar definitivamente, é indispensável que êle esteja apto a julgar de harmonia com a lei que o criou.
Não é lícito ao Poder Executivo suspender qualquer ramo de serviço público,
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com o fundamento de discordar da sua má organização e das condições em que funciona.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): - Acabo de ouvir as considerações do Sr. Joaquim Crisóstomo a respeito do Tribunal de Defesa Social. S. Exa. queixou-se de que estando tantas pessoas para responder se não tenha nomeado um juiz para que o tribunal funcione.
Quem ler o meu relatório, embora pequeno, que precede a proposta de lei apresentada por mim na outra Câmara para a extinção dêsse tribunal, de maneira que os delitos que estavam a ser afectos passem para os tribunais comuns, há-de ver as razões que me lavaram a apresentar essa proposta e a extinguir o Tribunal de Defesa Social.
A comissão respectiva já apresentou o seu parecer, e em breve a Câmara discutirá essa proposta.
Se eu nessa proposta defendo a necessidade de se extinguir o Tribunal de Defesa Social, parece-me que está na lógica esperar algum tempo que essa proposta seja aprovada a fim de que a doutrina que eu sustento tenha completa execução. Desde que eu julgo o tribunal comum mais competente para julgar dos delitos, estou convencido que a demora reverterá mesmo em benefício das criaturas que tiverem de ser julgadas.
O Sr. Presidente: - Está sôbre a Mesa um telegrama de D. Maria do Carmo Roby agradecendo ao Senado o ter aprovado o projecto de lei concedendo uma pensão à família do capitão Roby.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Sr. Presidente: começarei por dizer que a resposta do Sr. Ministro da Justiça não me satisfez, atenta a forma ambígua como se defendeu, deixando de declarar se tenciona, ou não, nomear um juiz, para o Tribunal de Defesa Social.
Entendo que S. Exa., se fôsse sincero, devia pronunciar-se por uma forma terminante, pois detesto situações sibilinas, que só denotam fraqueza e falta de coragem moral de quem as prepara.
Ninguém melhor do que o Sr. Catanho de Meneses, velho advogado, deve saber que o Poder Legislativo é independente do Poder Executivo.
Uma proposta de lei, apresentada ao Parlamento, manifesta tam somente o modo de pensar sôbre um determinado assunto do Ministro que a apresentou.
Desde que é afecta a qualquer das câmaras, até ser convertida em lei, pode mediar um espaço de tempo superior à vida normal dum homem de estado. Quere dizer, se o Sr. Meneses morrer aos 70 anos, pode baixar à campa fria, sem ter a suprema alegria de ver publicada no Diário do Govêrno a sua brilhante obra ministerial, extinguindo o já célebre Tribunal de Defesa Social! Cada instituição deve manter-se dentro das suas respectivas funções: O Poder Legislativo faz as leis, o Poder Executivo respeita-as e executa-as, boas ou más que sejam. Eu, que acompanho a crónica parlamentar do meu país há 30 anos, não tenho conhecimento de nenhum Ministro da monarquia ou da república haver respondido a qualquer parlamentar, nos termos anti-constitucionais, em que o acaba de fazer o Sr. Catanho de Meneses. Porque S. Exa. não concorda com o Tribunal de Defesa Social, reduz a pedaços o Diário do Govêrno em que foi publicada a lei que o criou e lança-os no caixote do lixo.
Fraca idea faz o Sr. Meneses do que sejam as atribuições dum Ministro da Justiça.
Nunca supus que as cadeiras do Poder num regime democrático fôssem ocupadas por individualidades em quem não predominam princípios nem sentimentos liberais. Um dos nossos grandes males consiste na facilidade com que se inventam ministros. Hoje fabricam-se pelo processo, que o notável artista Bordalo Pinheiro, nas Caldas, punha em execução no barro as suas geniais concepções. Basta ter vida, ter figura humana e saber ler e escrever para se possuir todos os requisitos e qualidades dum bom governante em Portugal!! Abençoada terra, que tantos homens de talento produz!! E ficamos por aqui.
Sr. Presidente: a resposta do Sr. Ministro da Justiça, sôbre o assunto a que me referi, contrasta com as informações oficiais que tenho, pois consta-me que a verdadeira causa por que ainda não foi provido o cargo do presidente do aludido
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tribunal é por não haver júri algum que o queira aceitar.
Até me dizem que o Sr. Catanho de Meneses já convidou e mandou oferecer o lugar a mais de um magistrado, e que todos êles o recusaram.
Terá o Sr. Ministro da Justiça receio de que os bombistas saibam que S. Exa. diligencia fazer funcionar aquele tribunal? Nem sempre é fácil estar bem com Deus e com o Diabo, porque num país como o nosso a verdade vem sempre à tona de água.
Emquanto eu fôr senador da república não consentirei sem o mais enérgico protesto, que pode ir até a violência, que um Ministro diga no Parlamento que não preenche nos termos da lei um lugar que se acha vago, e de que depende a liberdade de muitos cidadãos indevidamente presos, só porque apresentou às Câmaras um projecto extinguindo êsse lugar. Prometo voltar ao assunto, se no prazo de 15 dias o Sr. Ministro da Justiça não nomear um juiz para o tribunal a que me tenho referido. Tenho dito.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã à hora regimental com a seguinte ordem do dia:
Projectos n.ºs 234, 229, 184, 208, 44, 87 e 98.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 5 minutos.
O REDACTOR - Adelino Mendes.