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REPÚBLICA

PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

lsT. 23

EM 6 DE FEVEREIRO DE 1924

Presidência do Ex,mo Sr, António Xavier Correia Barreto

Secretários os Ei.raos Srs,

Luís iDOcâDcío Ramos Pereira

João Manuel Pessanha Yaz das Neves

Sumário. — Respondendo h chamada 30 Srs. Senadores, o Sr. Presidente abriu a sessão. Procedeu-se à leitura da acta, que foi aprovada, e deu-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Ribeiro de Melo fala acerca do provimento de Ministro na legação de Inglaterra, e da entrevista de um oficial de marinha publicada em um jornal.

O Sr. Procôpio de Freitas alude à expulsão de sargentos e outras praças de pré da armada. A ambos os Sr». Senadores responde o Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva)

Entra na sala o Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro). Explica a sua ausência à última sessão. Acerca de uma entrevista com um oficial de marinha declara que as competentes sanções serão aplicadas. Pelo que respeita ao provimento da legação de Londres diz que o Sr. Ministro dos Estrangeiros informará com-pletamente o Senado.

É rejeitado o pedido do Sr. Procôpio de Freitas para um negócio urgente, em prova e contraprova.

O Sr. Ribeiro de Melo requere que seja publicado, conjuntamente com o discurso de S. Ex.a,o artigo que leu num jornal da manha. Foi aprovado.

"Ordem do dia.— Continua a discustão, na generalidade, do projecto de lei n.° 068 (selo), falando os Srs. Joaquim Crisóstomo, que havia ficado com a palavra reservada, Medeiros Franco e Artur Costa. Foi aprovado na generalidade. Na especialidade fala sobre o artigo 1." o Sr. Oriol Pena. • Apresenta depois uma proposta de substituição que foi admitida.

Antes de se encerrar a sessão.—O Sr. Pro-còpio de Freitas insta por que se resolva rapidamente a questào dos sanatórios da Madeira.

O Sr. Alvares Cabral protesta, não só contra a venda do Avenida Palace que é pertença do Estado, mas também contra o pedido do exclusivo de cantarias artificiais.

O Sr. Santos Garcia refere-se a falta, de trans-

portes de produtos da indústria corticeira do sul do País e o Sr. Joaquim Crisóstomo insta feia conclusão do inquérito aos actos dos administradores dos bens dos inimigos na Horta. A todos os Srs. Senadores responde o Sr. Presidente do Ministério (Álvaro de Castro). Encerra-se a sessão.

Abertura da sessão às 15 horas e 20 minutos.

Presentes à chamada 30 Srs. Senadores.

Entraram durante a sessão 12 Srs. Senadores.

faltaram à sessão 28 Srs. Senadores.

Srs. Senadores presentes à sessão:

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

Álvaro António Bulhão Pato.

António da Costa Grodinho do Amaral.

António Maria da Silva Barreto.

António de Medeiros Franco.

António Xavier Correia Barreto.

Artur Augusto da Costa.

Artur Octávio do Rego Chagas.

Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.

César Procôpio de Freitas.

Constantino José dos Santos.

Elísio Pinto de Almeida e Castro.

Francisco José Pereira.

Francisco de Sales Ramos da Costa.

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Diário das Sessões do Senado

Frederico António Ferreira de Simas.

Herculano Jorge Galhardo.

João Carlos da Costa.

João Manuel Pessanha Vaz das Neves.

Joaquim Crisóstomo da Silveira Jii-nior.

Joaquim Manuel dos Santos Garcia.

Joaquim Pereira Gil de Matos.

Joaquim Xavier de Figueiredo Orlo! Pena.

José António da Costa Júnior.

José Augusto Ribeiro de Melo.

José Duarte Dias de Andrade.

José Machado Serpa.

José Mendes dos Reis.

Luís Inocêncio Ramos Pereira.

Raimundo Enes Meira.

Sr s. Senadores que entraram durante a sessão:

Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.

César Justino de Lima Alves.

Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.

Jorge Frederico Velez Ca'roço.

José Joaquim Fernandes Pontes.

Luís Augusto de Aragão e Brito.

Pedro Viçgolino Ferraz Chaves.

Roberto da Cunha Baptista.

Vasco Crispinianq da Silva.

Rodrigo Guerra Álvares Cabral.

Silvestre Falcão.

Tomás de Almeida Manuel de Vflhe-na (D.).

STB. Senadores que 'não compareceram à sessão:

Abílio de Lobão Soeiro. Aníbal Augusto Ramos de Miranda. António Alves de 'Oliveira Júnior. António Gomes de Sousa Varela. Augusto Oasimiro Alves Monteiro* Augusto de Vera ^Cruz. Ernesto Júlio Navarro. 'Francisco António * de Paula. Francisco Xavier Anacleto da Síh». João Alpoim Borges 'do Canto. João Catanbo de Meneses. João Maria tia Cunha Barbeia. João Trigo MotiiJho. Joaquim Teixeira da 'Silva. José Augusto «fc

José Joaquim Fernandes de Almeida.

José Joaquim Pereira Osório.

José Neponmceno Fernandes Brás.

Júlio Augusto Ribeiro da Silva.

Júlio Ernesto de Lima Duque.

Luís Augusto Simões de Almeida.

Manuel Gaspar de Lomos.

Nicolau Mesquita.

Querubim da Rocha Vale Guimarães.

Ricardo Pais Gomes.

Rodolfo Xavier da Silva.

Vasco Gonçalves Marques.

Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.

O Sr. Presidente:-

chamada.

Fez se a chamada.

•Vai proceder-se à

O Sr. Presidente ; — Estão presentes 30 -Srs. Senadores.

Eram 15 horas e 15 minutos. Está aberta a sés silo,. Vai ler-se a acta. Leu-se.

O Sr. Presidente:—Está em discussão.

Pausa.

Como nenhum ST. Senador 3>ede & palavra, considera-se aprovada.

Vai ler-se o

Expediente

Telegramas

Da Câmara Municipal de 'Matozinfaos, enviando condolências jjelo íulecimento do Dr. Teófilo Braga.

Para a Secretaria.

Da Câmara Municipal de Fafe, protestando contra a extinção das escolas primárias superiores.

Para a Secretaria,

. .Do presidente do .conselho ,escolar do Porto, pedindo .a aprovação ido projecto do edifício para a Escola Industrial Infante D. .Henrique. Para a .Secretaria.

Das Câmaras Municipais de Vian-a do Castelo e Mafra, apresentando pêsames pelo falecimento do Dr. Teófilo

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Sessão de 6 de fevereiro de 1924

Dos alunos da Faculdade de Farmácia de Coimbra, protestando contra o projecto •de lei sobre praticantes de farmácia.

Para a Secretaria.

Representação

Da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, protestando contra as disposições do decreto n.° 9:354, que extingue as escolas primárias superiores.

Para a Secretaria.

Projectos de lei

Do Sr. Joaquim Crisóstomo, mantendo a divisão comarca existente em 8 de Janeiro de 1924.

Para a 2.a Secção.

Do Sr. Costa Júnior, sobre a substituição temporária de farmacêutico legalmente habilitado por aluno com o 4.° -ano de qualquer das três Faculdades de .Farmácia.

Para a l.a secção.

Parecer

Da comissão de faltas, sobre a justificação do Sr. Ribeiro de Melo. Aprovado.

Antes da ordem do dia

O Sr. Ribeiro de Melo: — Sr. Presidente: primeiro os meus agradecimentos sinceros a esta Câmara por haver permitido que eu trate em negócio urgente o que se refere à forma como foi provida a legação de Portugal em Londres.

Sr. Presidente: trata-se de um assunto da mais alta importância, trata-se de um caso de absoluta, rigorosa moralidade, que é preciso que o Senado, com a ponderação que lhe assiste, faça saber e constar ao Sr. Ministro dos Negócios Es-Irangeiros e ao Governo, como foi infeliz a, deliberação tomada em Conselho de límistros, provendo a legação política de Londres na pessoa do, Sr. Dr. Augusto de Castro, actual director do jornal Diário de Noticias, que, como toda a .gente sabe, é o órgão da moagem.

Sr. Presidente: já eu tive a felicidade de me referir ao assunto estando presente o Sr. Presidente do Ministério. Eespondeu S. .Ex.a que razões de varia-díssima ordem haviam imperado no espí-

rito do Governo para oferecer a legação de Londres ao Sr. Dr. Augusto de Casfro.

Pena foi, .Sr. Presidente, que então não estivesse presente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, principal responsável ou co-responsável desta nomeação que afronta o espírito da Nação, para não dizer que ofende os princípios dos republicanos.

Sr. Presidente: não são precisos dois anos para fazer esquecer a entrevista que Jo Sr. Dr. Augusto de Castro teve com o Chefe de Estado da vizinha nação espanhola, e aS palavras que então S. Ex.a escreveu.

Não foram precisos dois anos para que se esquecesse a política nefasta, que o Diário de Noticias íez nas suas primeiras colunas contra a política inglesa, e não esqueceram, Sr. Presidente, todos aqueles que se interessam pela nossa política internacional, a forma como S. Ex.a procedeu para com uma das mais altas figuras da política britânica, que chegou a merecer reparos da individualidade atingida a ponto de pedir uma espécie de satisfação ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Refiro-me à pseudo entrevista que S. Ex.a teve com Lord Curzon, cuja assinatura foi, ou parece ter sido, falsificada.

Sr. Presidente: o Sr. Dr. Augusto de Castro, director do Diário de Noticia», órgão da moagem, político apenas dos seus interesses pessoais, político que somente conhece a política da moagem, foi guindado — por influências estranhas ao Partido Republicano Português, por influências estranhas aos Partidos organizados da República— foi guindado ao alto lugar de Ministro de Portugal em Londres.

. E fez-se isto, Sr. Presidente, atentando-se contra as praxes internacionais, dando-se publicidade ao convite do Governo sem estar assegurado o agrément do Governo Britânico.

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Diário da Câmara do» Deputado*

Uma pessoa muito chegada ao Sr. Dr. Augusto de Castro disse-me que esse convite não seria aceito; e que dentro em breve iria S. Ex.a declinar o honroso convite.

Mas não foi o declínio do honroso convite qae levou o Sr. Dr. Augusto de Castro ao Palácio das Necessidades, mas sim os agradecimentos pela oferta de tam alto cargo.

Sr. Presidente : se o Governo presidido pelo grande republicano Álvaro de Castro está satisfeito com tal nomeação, não o podem estar nem o Senado, nem o País, e mormente os republicanos. E estes últimos porque não querem ver mais ama padaria inglesa dentro dos organismos republicanos.

Sr. Presidente: se altas influências, e altas ea tam altas que atingem o próprio Chefe de Estado da República Portuguesa, intervieram nesta nomeação, mal vai, Sr. Presidente, aos destinos da República e a todos nós, porque temos o dever de defender os interesses da República, tendo sobretudo e principalmente em vista o melhor respeito, a maior consideração e a maior competência na escolha para os altos cargos da República de individualidades estritamente republicanas.

O Sr. Procópio de Freitas: — Apoiado.

O Orador: — Sr. Presidente: tal não se fez, e tal não se tem praticado em regra, por culpa não do povo republicano, não dos partidos organizados da Republica, mas por culpa das influências estranhas e que sistematicamente têm entravado a acção ministerial republicana, nesta resistência passiva de que a República tem sido vítima seguramente desde 1914 para cá.

O Sr. Procópio de Freitas: — Apoiado.

O Orador: — Sr. Presidente: infelizmente eu faço parte do funcionalismo do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Não entrei pela janela, alcancei o meu lugar por concurso, em 5 de Agosto de 1910.

Era então já, republicano, como repu-. blicano sou ainda hoje, e como espero , morrer abraçado ao ideal republicano.

Mas é que então eu era um republicano cheio de amor e fé, esperançada no ressurgimento do meu País pela manhã gloriosa em que se proclamou a República.

Era um idealista porque esperava que os republicanos do meu País iriam fazer o ressurgimento da Pátria e da nacionalidade, sem ódios, sem rancores, com aquela correcção e alma eminentemente republicanas, que pretendiam a regeneração dos sistemas políticos, a moralidade na administração da Nação.

Idealista eu fui, Sr. Presidente, e, apesar dos ataques que o meu ideal republicano tem sofrido, apesar dos latrocínios e desvarios cometidos dentro da administração republicana, apesar de eles terem sido tantos, não conseguiram ainda amortecer em mini o espírito arreigado de republicano, que à outrance, acima de tudo, pugna pela pureza dos princípios, quere que o Governo da República estabeleça, de uma vez para sempre, a moralidade-do regime.

Quero preguntar ao Governo, e sobretudo ao Senado, se se pode admitir que, Ministros republicanos, como o é indiscutivelmente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, possam continuar neste-ambiente de irregularidades e de atentados ao regime, a ponto de se não saber ainda hoje, passados 13 anos depois da proclamação da República, se à representação internacional convém que o Governo republicano nomeie pessoas estritamente republicanas, ou se exigem que para as principais Itógações da Europa sejam escolhidas pessoas desafectas ao regime.

Era esta a questão que eu queria p&r ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, se estivesse presente.

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Sessão de 6 de Fevereiro de 1924

Se assim fosse, ainda o Sr. Ministro

Por ordem da Moagem, que é um Estado dentro do Estado, que ato se gaba de fazer Governos, se vier o agrément e o Sr. Augusto de Castro for para Londres, implantar-se há mais uma padaria inglesa.

O Senado deve ter bem presente a entrevista que o Sr. Augusto de Castro teve com Sua Majestade o Rei de Espanha e, sobretudo, a resposta que Trindade Coelho, no jornal A Pátria, deu ao Ministro de Portugal em Londres.

A esta hora está o Chefe do Estado, juntamente com os republicanos do Porto,. festejando a data gloriosa da Eevolução de 31 de Janeiro.

Talvez a esta hora o Chefe do Estado

Como sacrilégio à memória desses pre-•cursore'8 da Eepública, o Governo do Sr. Álvaro de Castro, tendo na pasta dos Negócios Estrangeiros o Sr. Domingos Pereira, nomeia o Sr. Augusto de Castro, representante da Moagem, Ministro de Portugal em Londres.

Nestas considerações, sou apoiado por muitos dos meus correligionários do Partido Republicano Português, que não podem consentir, de modo nenhum, que se mantenha uma tal nomeação.

; E não se há-de manter, Sr. Presidente !

E não se há-de manter desde que o -olho vigilante da República e dos republicanos faça ver que tal acto vai de encontro às próprias instituições republicanas, que nós todos juramos defender.

Se for preciso abrir a crise ministerial, que se abra o mais depressa* possível e que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros vá para a Presidência da Câmara dos Deputados, pois é lá que S. Ex.a tem o seu lugar de direito — e é o caso de se aplicar a frase inglesa: the right man in the right place.

Sr. Presidente: o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não tem feito a política que a República exige; antes tem continuado a baralhar as cartas do jogo político a que todos nós temos assistido.

É isto o que pensam os republicanos, e é por isto que eles amanhã, se preciso, for, não digo que irão ao Monsanto, mas darão o seu esforço para uma violência.

A justiça popular virá mais depressa do que nós sonhamos, desde que saibamos que a fome é má conselheira.

O Governo deve promover o barateamento da vida e o congraçamento da família portuguesa.

Isto não se faz, porém, e a situação agrava-se.

Veja o Senado como determinadas figuras que não estão arregimentadas em partidos políticos se estão dirigindo ao Parlamento.

Vejam-se as entrevistas do Diário de Lisboa.

Há pouco quando entrou pela última vez para o edifício do Congresso da República o féretro do eminente republicano Teófilo Braga, dizia o cronista parlamentar do Diário de Lisboa, na Câmara dos Deputados:

Leu.

E contra isto, Sr. Presidente, apenas protestou uma pessoa, o Sr. Vice-Presi-dente da Câmara dos Deputados.

Mas há mais.

Porque se não tomam as providências necessárias? Vem uma outra entrevista no mesmo jornal, realizada com o comandante Filomeno da Câmara, em que se fazem referências desprimorosas para o Congresso da República.

Sr. Presidente: essas referências são estas :

Leu.

Sou um novel parlamentar, e, portanto, não me toca tanto a mim como aos velhos parlamentares uma reacção imediata sobre estas palavras.

Isto é uma afronta aos representantes da opinião pública, Sr. Presidente.

Muitos apoiados.

Mas, com dor o digo, Sr. Presidente, se efectivamente foram estas as palavras proferidas pelo comandante Filomeno da Câmara, desejo preguntar ao Sr. Ministro da Marinha se tomou já algum procedimento contra este comandante.

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Diário das Sessões do Senad»

pasta da Guerra, meu actual correligionário, respondeu a uma entrevista do Sr. general Gomes da Costa publicada n~im jornal de Lisboa?

Respondeu mandando-o para o forte de Eivas, onde cumpriu a pena disciplinar que lhe aplicou o Sr. Ministro da Guerra.

E uma das pessoas que hoje mais defendem a ditadura disse então quo a disciplina não era somente para a& praças e sargentos, era também para os oficiais, muito principalmente para os onciais de alta patente.

Tem V. Ex.a o precedente aberto, Sr. Ministro da Marinha.

£ O que é que V. Ex.a vai fazer ao comandante Filomeno da Câmara, que afrontou o Parlamento chamando-lhe r&-pazío de S. Bento?

Não é ele mais patriota que o último dos patriotas que tenha aqui assento, não é mais republicano que qualquer dos republicanos que tenha assento em qualquer das duas Camarás, não é ele maior defensor da liberdade, mais respeitador da Constituição, mais amigo do povo, do que os parlamentares que têm a honra de se sentarem no Congresso da República, que são homens briosos e dignos, portugueses honrados, e que devem pelo menos por isso merecer o respeito e consideração a criaturas que têm um galão dourado e largo nos punhos do seu dólman.

No Ministério da Marinha tem-se aberto uma grande brecha de má vontade co:itra as praças e sargentos que se têm revoltado, e muitas vezes com carradas de razão, contra as injustiças que lhes são feitas.

Eles pereceram no 14 de Maio, e V. Ex.a fez então também parte dos revolucionários.

Para derrubar a dinastia de Sidónio Pais, apareceu a marinha como um dos factores mais importantes, nesta contenda entre os republicanos constitucionais e os que o não eram.

Depois em Monsanto lá vemos escalar aquela serra, onde tremulava o pavilhão da monarquia, os marinheiros, a verterem o seu sangue para o triunfo mais •uma vez da República.

E não foi o Sr. Filomeno da Câmara, e poucos ou nenhuns foram os oficiais de patente superior da marinha, que são

hoje os que dirigem, os que querem disciplinar a marinha, a maruja e os oficiais inferiores dependentes do Ministério da Marinha, que se bateram pela liberdade.

Para os inferiores é que o Sr. Ministro-da Marinha deve olhar, perdoando-lhes as faltas, porque esses, coitados, em regra, siio arrastados pelos chefes ou chefetes-das revoluções, e ser implacável para os-dos galões largos, que andam à capucha tentando conquistar as simpatias da própria maruja para implantar a ditadura em Portugal.

E o que é mais para estranhar é que^ no próprio jornal Diário de Lisboa vêm duas entrevistas. Uma, do velho glorioso republicano de sempre. Magalhães Lima, defendendo a Constituição em toda a sua pureza, reavivando aqueles sãos-princípios proclamados em õ de Outubro* de 1910. A outra é de um novo, João de Castro, que, enfileirando com Cunha Leal,. Filomeno da Câmara e tantos outros, defende a ditadura.

Precisamente este novo João de Castro., que se formou com o dinheiro do Estado,, com o auxílio da República, ó que é menos republicano e menos patriota.

O velho Magalhães Lima ataca a ditadura que se premedita, que anda na forja, e o Sr. Filomeno da Câmara, afrontando o rapazio de S. Bento, diz que tem a espada já desembainhada para comandar os marinheiros contra os parlamentares.

Mas a resposta mais grandiosa que se podia dar àqueles que pretendem atingir a Constituição da República, e que andam reúnindc todos os desordeiros da Nação para implantarem o regime da ditadura, é este artigo «Frente a frente», escrito-por um bom republicano de sempre, Mayer Garção . . . (Muitos apoiados), que deve-merecer no Senado a honra de ser publicado no Diário das Sessões, possivelmente até publicado no Diário do Governo, como a resposta mais formal às afrontas qu& nos dirigem todos esses mazorqueiros.

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competência que mereçam a honra de um convite para, essas legações, e termos de ir .enfarinhar-nos na moagem, buscando um dos seus melhores arautos para ir ocupar esse lugar.

«jSerá este porventura, o desejo do Sr. Ministro dos Estrangeiros? ,;Terá o Governo desojo d» lançar este escárnio à face dos republicanos?

Não são só os republicanos que com isto se sentem; sente-se também a maior ria da Nação, a parte da Nação, que come o pão da moagem, que se gaba de ter invadido os partidos republicanos.

Desde o Sr. Presidente da República ao mais humilde funcionário do Estado, ninguém pode ver bem tal nomeação; ela é imprópria dum Governo republicano, suja as mãos dum Ministro da República, deminui de republicanismo o Governo do Sr. Álvaro de Castro! E então:, se o Governo tem necessidade de dizer que não pode manter essa nomeação, que o diga sem f demora.

I É. espantoso tudo isto, Sr. Presidenteí

Não quero nem desejo cansar a atenção da Câmara, mas ponho à disposição do Senado as entrevistas publicadas no Diário de Noticias e a réplica que lhe deu o Sr. Trindade Coelho. Possa ela levar o 'Senado a revigorar a sua fé republicana e dizer depois se o Governo Álvaro de Castro pode manter a nomeação do Sr.> Augusto do Castro para a legação de liohdres.

Se- houvesse responsabilidade ministerial, ver-se-iam, Sr. -Presidente, quem eram os culpados no assunto.

Foi o Sr; Barbosa de Magalhães, acompanhado e apoiado pelo Sr. António-Maria da Silva, que começou esta1 obra.

Jiistá agora nas cadeiras do Poder um Governo independente, sob o ponto de vista partidário.

Ele quere entrar no verdadeiro caminho da administração pública,; ele quere.;

produzir uma obra compatível com as circunstâncias da Nação; entretanto, começa por cometer a nomeação do homem da farinha.

Não sei, Sr. Presidente, se há políticos a que a moagem deva alguma cousa; se há, a moagem que lhes pague.

Mas a Nação e a República ó que não podem consentir que o Sr. Augusto de Castro, o maior dos moageiros, baixarei formado em direiío> que nunca abriu banca de advogado, vá representar Por-tugal em Londres.

Ainda me lembra que o Sr. Augusto de- Castro, quando iniciou a sua carreira de/ dramaturgo no antigo Teatro de D. Amélia, numa comédia intitulada O chá das cinco, viu assistir a ela muitos republicanos de fresca data.

A bem dizer, "foi só a alta aristocracia que assistiu a essa representação, a convite especialmente feito, em termos rendilhados, pelo Sr. Augusto de Castro, porque S. Ex.a nas suas afirmações e nos actos públicos da sua vida fazia questão de mostrar que defendia o regime monárquico na sua qualidade de sobrinho e herdeiro das tradições políticas de José Lu-ciano de Castro.

Em 1922, pairava no "espírito público a impressão de que

'Essa impressão pode ter desaparecido do espírito dos seus correligionários mo* nárquicos, que podem achar boa essa política, mas quem não a acha assim são aqueles que se integraram na República com espírito firme de lealmente satisfazerem aos interesses da Pátria e da República, inclusivamente o Sr. Álvaro de Castro e talvez até o Sr. Domingos Pereira, quando a valer consultarem a sua consciência de republicanos.

Num trabalho de três anos, eu tenho cortado dos jornais -de-maior publicidade todas as notícias que dizem respeito à nossa política internacional.

Todos esses- artigos, por assim dizer, são de animosidade contra a política de salamaleques.

Eu não sei se a Sr. Augusto de Castro tem a coragem de aceitar o lugar de Ministro de Portugal em Londres.

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publicanos, eu na"o tenho dúvida nenhuma em podir à Câmara que me permita ler artigo por artigo dos publicados no Diário de Noticias. E, se o Sr. Ministro dos Estrangeiros quiser ver as cousas com um critério ponderado e for aquela criatura que tem necessidade de imprimir um carácter republicano a todos os actos da sua pasta, S. Ex.a concluirá que deveria ter hesitado em fazer convite ao Sr. Augusto de Castro para nosso Ministro em Londres.

Eu sei qus o Sr. Ministro da Marinha, que aliás me está honrando com a saa atenção, apenas pode fazer no caso presente um papel de espectador, e possível é que, mesmo que S. Ex.a deseje transmitir ao seu colega a parte principal das minhas palavras, não o possa fazer com-pletamente.

Mas, se S. Ex.a quisesse ser gentil, poderia fazer sentir ao Sr. Presidente do Ministério para não perturbar a doença do Sr. Ministro dos Estrangeiros, — a situação deprimente em que o Governo se colocou com o arauto da moagem, mandando o Sr. Augusto de Castro para a legação de Londres.

O Sr. Ministro da Marinha, que é um republicano sincero, embora não seja partidário, que é um oficial disciplinado e disciplinado!', com franqueza, sendo um patriota e republicano como é. não poderá sentir-se com a consciência tranquila na sua cadeira de Ministro, se, porventura, o Governo mantiver tal nomeação, pois S. Ex.a amanhã será salpicado' com a farinha da moagem e amanhã irão dizer que também é um fiscal da moagem» com interesses ria Companhia de Portugal e Colónias.

Eis a que ponto está reduzida a nossa legação em Londres:—Portugal e Colónias.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva): — Sr. Presidente: sendo este. a primeira vez que tenho a honra de falar nesta casa do Parlamento, é de meu dever saudar a Câmara, a quem apresento os protestos da minha maior consideração.

Ouvi as palavras proferidas pelo Sr, Senador que tratou do assunto relativo à

nomeação do nosso Ministro em Londres e devo dizer que, sendo esta a primeira vez que falo no Senado, lamento não poder responder, com precisão e com o acerto devido, às considerações feitas pela ilustre Senador. Mas o íissunto de que se trata tem ligações com questões de ordem política internacional, e eu. confesso, não estou habilitado, não só por ser Ministro da Marinha, como também por ser a primeira vez que me encontro a tratar de questões de ordem política, a dar uma resposta completa, como era meu desejo.

Em todo o caso esforçar-me hei por transmitir ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e ao Sr. Presidente do Ministério as considerações que S. Ex.a fez, lamentando não o poder fazer fielmente e por isso desejo que S. Ex.a me dê alguns apontamentos que me auxiliem nesta missão.

S, Ex.a referiu-se também a um facto que diz respeito ao meu Ministério.

Eu, como Ministro da Marinha, devo dizer u Câmara que não permito, nem devo -permitir, qualquer falta de respeito pelo Congresso da República.

Muitos apoiados.

Tenho sido quási só militar durante toda a minha vida, mas como militar cultivo o princípio da máxima lealdade, e por isso devo declarar, com a máxima lealdade, que, infelizmente, não li a entrevista em que há referências que parecem pouco primorosas para o Congresso da República. Vou, porém, lê-la atentamente, e> se no meu espírito houver a mais pequena indicação de menos respeito para o Congresso da República, procederei dentro das atribuições que a lei me confere.

Mas S. Ex.a não se referiu só a este facto, disse que eram perseguidas praças da Armada que são bons republicanos.

Devo declarar, Sr. Presidente, que republicanos é quási a totalidade dos militares da Armada, lamentando muito que se pretenda fazer distinção entre comandantes, oficiais inferiores e praças.

São tam bons republicanos os oficiais, como os sargentos, corno as praças, e quaisquer considerações que tendam a concorrer para a divisão entre os militares da Armada ó injusta e perigosa, porque pode produzir a indisciplina.

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são aquelas que obedecem aos seus superiores.. És sés homens são bons republicanos porque têm a confiança do Ministro, e o Ministro não podia deixar de ser bom republicano porque tom a" honra de ser Ministro da Èepública.

Desejo dizer, por último, quo, se as praças têm dado provas do seu bom republicanismo também as têm dado os oficiais, porque não conheço nenhum movimento em que o sacrifício não fosse feito por todos.

Fiz estas considerações no sentido de defender a Armada. Mas se houver militares da Armada que façam excepção, não os defenderei, nem aqui, nem em parte alguma,

Vozes:—Muito bem!, muito bom! O orador não reviu.

/

O Sr. Ribeiro de Melo (para explicações}-.— Sr. Presidente: agradeço ao Sr. Ministro da Marinha a resposta que me acabou de dar.

Efectivamente S. Ex.a não podia ver nas minhas palavras nenhuma insinuação à sua fé republicana, antes eu afirmei a S. Ex.a que tinha a maior admiração pelas suas qualidades de oficial da Armada e pelas provas já dadas como republicano, e tenho a certeza de que S. Ex.a ha-de manter na corporação da Armada aquele espírito de paz o de concórdia de que tanto é mester nessa corporação, não só no que diz respeito aos subalternos como aos oficiais de alta patente, corno seja o Sr. Filomeno da Câmara, cuja entrevista, como já disse, foi publicada no dia 5 do corrente no Diário de Lisboa.

Mas agora que está presente o Sr. Presidente do Ministério, que é o responsável pela política geral do gabinete e que ó um republicano com quem eu conto, gos-taria de ouvir a S. Ex.a, que acaba de chegar da cidade invicta onde se prestou ao Sr. Presidente da República, uma grandiosa recepção, gostaria de ouvir, repito, se S. Ex.a. conhece a entrevista do Sr. Augusto de Castro, que eu cognominei de arauto da Moagem, publicada no Diário de Notícias, entrevista realizada com o Chefe do Estado da Nação vizinha; se S. Ex.a conhece os artigos de fundo publicados no mesmo jornal; se sabe de

uma entrevista com Lord Cursoh,-entrevista que- foi malsinada; se S. Ex.a cc-nhece à doutrina desses artigos que não podem, .de maneira alguma, ser de simpatia para a política britânica; se S. Ex.a está ao par dos protestos • da opinião republicana, que não tolera, nem pode admitir a nomeação do Sr. Augusto" do Castro para a nossa legação em Londres, o se S. Ex.a está disposto a sustar • o despacho que^foi dado, independentemente da resposta do Governo britânico, dando o seu agrément a essa nomeação.

E preciso que o'Sr.-Presidente do Ministério diga se foi constrangido que fez essa nomeação, .ou sé a fez, voluntariamente, como republicano, pura salvar a nação. • . .

ji( preciso que o Sr. Presidente do Ministério diga quo não tem receio das altas individualidades e das críticas que lhe possam fazer o Diário de Notícias, e se quere ficar bem com a consciência republicana, ou se mantém^ contra a vontado de todos, essa nomeação, fazendo com que a República passe a sor enfarinhada pela nomeação do Sr. Augusto de Castro para a legação do-Londres.

Desejo também saber se o Sr. Presidente do Ministério conhece a entrevista do Sr. Filomeno da Câmara, publicada no Diário de Lisboa, na qual esse oficial chamou rapazio aos parlamentares, e se S. Ex.a está resolvido a aplicar-lhe a mesma doutrina, que foi aplicada ao brioso oficial Gomes da Costa. :

A nomeação do Sr. Augusto de Castro não pode manter-se, porque ela envergo-nhã a consciência republicana, sob pena do Sr; Presideâte do Ministério poder contar amanhã com o -nosso protesto que. possivelmente irá até mais longe do que S. Ex.a pensa.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro do Castro): — Sr. Presidente: no último dia de sessão no Senado, alguns Srs. Senadores fizeram várias considerações sobre a não presença de membros do Governo nesta Câmara.

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ligavam à pasta das Finanças, por circunstâncias estranhas à minha vontade fui lorçado a faltar à sessão do Senado.

Devia também uma explicação à observação aqui levantada de não haver sido nomeado nenhum Sr. Senador para fazer parte da grande comissão encarregada dos funerais de Teófilo Braga. • Esta explicação era talvez desnecossá-ria, porque seria grande a minha ousadia, incluindo neissa comissão qualquer membro do Senado, sem que este tomasse sobre o assunto uma resolução.

Isso seria .colocar o Senado ao dispor do Poder Executivo.

Para essa grande comissão entraram realmente alguns Srs. Deputados, mas foi a Câmara dos Deputados que resolveu nomear alguns dos seus membros para acompanharem todos os trabalhos referentes aos funerais de Teófilo Braga. Se o Senado tivesse tomado uma deliberarão de igual natureza, da mesma forma seriam nomeados alguns Srs. Senadores para fazerem parte dessa grande comissão.

Quanto à observação aqui feita relativamente ao dia do funeral, cevo dizer que no domingo havia o inconveniente da grande despesa que tal facto acarretaria para o Estado, visto como, realizando-se o funeral nesse dia, seria considerado feriado e domingo, e daí a pagar-se ao dobro os vencimentos dos funcionários dei alguns serviços do Estado. E se se realizassem os funerais no dia õ isso serlí;, protelar o funeral demasiadamente.

E assim, o Governo não quis nem demorar para muito tarde o funeral, nem que ele se realizasse num dia muito próximo, tendo ainda em atenção a economia que se podia fazer.

Aqui estão pois, as explicares que eu devia ao Senado, e as minhas desculpa» por não ter comparecido nesta Câmara não querendo de forma alguma, esta minha atitude representar uma falta de consideração.

Quanto La observações do Sr. Eibeiro de Melo, que eu ouvi em parte nestas segundas considerações que S. Ex.a fe7, já tive ocasião de falar aqui no assunto.

É um caso que está absolutamente afecto ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e o titular da pasta responderá quando as suas condições de saúde o deixem aqui vir.

Mas o que eu quero frisar bem, é que_o Sr. Presidente da República foi absolutamente estranho a essa nomeação. Não interveio, nem por actos nem por palavras, para que ao Sr. Augusto de Castro fosse feita esta, ou aquela nomeação.

Nem mesmo dentro das atribuições que a Constituição lhe confere, S. Ex.a fez valer a sua opinião sobre este caso, e devo dizer também que o Governo não recebeu pressões de ninguém para que este acto se realizasse.

O Poder Executivo não recebe pressões de ningiôm para praticar determinados actos, pode praticá-los depois de várias circunstancias, mas não são pressões, são factos que muitas vezes nos obrigam a resolver os assuntos por esta, ou por aquela forma.

Neste ponto o Sr. Ribeiro de Melo não foi justo nas suas considerações, e eu já tive ocasião de aqui expor as razões que levaram o Governo a tomar essa resolução.

Parece-me que o Governo.procedendo como procedeu, não praticou um acto que envergonhasse a República.

Todos os que me conhecem sabem que eu era incapaz de obedecer a pressões e S. Ex.a, apesar do seu grande republicanismo, que eu sou o primeiro a apreciar e aplaudir, não pode apresentar a questão senão de uma forma unilateral.

Q,uanto às referências que S. Ex.a fez a uma entrevista que eu tive ocasião de ler no comboio, devo dizer a S. Ex.a como Presidente do Ministério, que o Sr. Filo-rneno da Câmara, assim como todos aqueles que vestem uma farda e que vêm para a imprensa fazer afirmações daquelas, denunciam um espírito pouco disciplinado, o que estão expostos a sofrer as sanções, que o Governo não hesitará em aplicar qualquer que seja o seu pOsto.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: —Comunico à Câmara que o Sr. Procópio de Freitas pediu a palavra para um negócio urgente, qual é o do afastamento do serviço activo de algumas praças da armada.

Os Srs. Senadores que consideram urgente este assunto, tenham a bondade de se levantar.

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O Sr. Ribeiro de .Melo:—Roqueiro a contraprova. • • - ,

O Sr. Procópio de Freitas: — Trata-se de um assunto de defesa da República.

Feita a contraprova foi considerado urgente o assunto.

-O Sr. Procópio de Freitas : — Sr. Presidente : senão fosse a minha ausência de Lisboa e portanto a impossibilidade de comparecer às. sessões desta Câmara, já há mais tempo teria tratado do assunto a que me vou referir.

Sr." Presidente: há muito tempo já, que fui informado da existência, na Majo-ria General, da -Armada, de uma lista de sargentos e praças da armada, todos acérrimos defensores da República, e com bom comportamento, aos quais devia ser dada baixa do serviço da armada.

De vez em quando, várias tentativas se fizeram no sentido de dar execução a essa lista, mas por que se têm levantado os protestos, tem havido sempre retraimento na sua execução.

Durante muito tempo não readmitiram ninguém no corpo de marinheiros, e estou convencido de que o objectivo seria talvez poderem ser esses sargentos e praças abatidos ao efectivo. '

Devo, antes de mais nada, declarar que se trato deste assunto é porque o meu espírito se revolta contra tudo que é ilegal e injustiça.

Com o pretexto'desse desgraçado acontecimento de 10 de Dezembro, foi dada ordem para, no prazo de 24 horas, serem» postos fora do serviço da armada muitas praças e 17 ou 18 sargentos.

Poucos dias antes de ou sair para a Madeira, quando aqui me referi a esse lastimável acontecimento, protestei contra os actos praticados pelo Governo a esse respeito. E assim, fui para a Madeira na convicção de que o Governo que sucedesse ao do Sr. .Ginestal Machado anularia todas as ordens dadas e tudo ficaria sem efeito.

Infelizmente tal não sucedeu, e segundo me informam, foram abatidos mais praças ao efectivo da armada.

No meu modo de ver, não houve fundamento algum legal para esses sargentos o essas praças serem abatidos ao serviço efectivo. E se nós estamos numa

democracia, como me parece que estamos, devemos respeito à lei. Lá diz a Constituição que ninguém é obrigado a fazer senão aquilo que a lei manda.

Segundo uns artigos que li publicados no jornal A_Imprensa Nova, em que se fazem ataques tremendos à acção do Sr. Ministro da Marinha e do Sr. Major General da Armada, S. Ex.a-o Sr. Ministro da Marinha "declarou que era, de facto, ilegal o acto praticado pela Majoria General da Armada pondo fora da armada esses sargentos e praças.

Diz-se aí também que a Majoria se tinha fundamentado em um decreto do Governo Provisório.

A meu ver, e de mais algumas pessoas que sabem interpretar leis, este decreto apenas teve execução na ocasião em que foi publicado; mas, admitindo mesmo que ele ainda esteja em vigor, nele não se fala em sargentos, de maneira que pelo menos o acto praticado contra esses sargentos foi absolutamente arbitrário, foi o poder pessoal e mais nada.

Diz-se ainda no mesmo jornal que o Sr. Ministro da Marinha declarara que, de facto, essas praças e sargentos eram bem corportados, mas que havia informa-.ções secretas dos seus comandantes.

Diz igualmente o referido jornal que o Sr. Ministro da Marinha declarara que apesar de ser ilegal o procedimento do Sr. Major General da Armada, mantinha essa ilegalidade, porque, para a não manter, tinha que demitir o Sr. Major General da Armada e, a ter que demitir esse oficial, preferia demitir-se a si próprio.

O procedimento ilegal do Sr. Major General da Armada, com o consentimento do Sr. Ministro da Marinha, levantou vários protestos, e daí resultou que começaram a ser readmitidas algumas dessas praças e sargentos.

^Mas quere a Câmara saber como é que essas praças e sargentos estão sendo readmitidos ?

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sés sargentos e praças. Isto é irrisório !

Alguns desses sargentos e. praças já estão reintegrados, mas há ainda outros que o não foram. 5 Entre os sargentos há um que tem 27 anos do serviço efecnvol '; Imagine Y. Ex.a, Sr. Presidente, um sargento com 27 anos de servigo efectivo posto fora do serviço!

E porquê? Porque o quo se pretende é talvez desbravar o terreno para a tal futura ditadura militar, e portanto traíam do afastar da armada aqueles elementos capazes dos maiores sacrifícios, para nf,o permitirem que se restabeleça cm Portugal um regime de tirania, como foi o do Sidónio Pais.

Apoiados.

Se estamos, de facto, numa dnnocrícia, cumpra-se a lei.

Eu fui sempre daqueles que pugnaram pelo cumprimento da lei, porque só o cumprimento da lei é que podo dar tranquilidade aos cidadãos.

Apoiados.

You eontc.r a V. E?:.a, Sr. Presidente, o à Câmara a fornia como na armada se está procedendo para com funcionários republicanos.

'NCL polícia marítima há um funcionária, retintamente republicano e .cumpridor dos seus c.evercs, o Sr.' Leopoldo Alves, que há dias foi chamado pelo chefe do Departamento Marítimo do Centro para lhe dizer que não merecia a sua confiança política. O Sr. Leopoldo Alvos responde;>lhe que 6 possival que assim seja porque ele ó republicano, o talvez o chefe do Departamento não o seja. Poucos dias depois era o Sr. Leopoldo Alves afastado do sei-viço dajDolíeia marítima.

Este funcionário —garanto i. Y. Ex.n, Sr. Presidente, à Câmara o ao Sr. Ministro— tem sido zeloso no cumprimento dos soas deveres, e ainda úliirnaincnt.;, quando esteve no Funchal, os seus serviços mereceram o elogio do toda a imprensa.

O ciíefo do Departamento Marítimo c.o Centro não tovc escrúpulo em aceitar ésso cargo quando para ôle foi noiiof.do por ocasião do movimento de 19 de Outubro, mas depois passou a ser um perseguidor dos homens que entraram nesse movimento.

O Sr. Almirante Neuparth, I:it(.-ndoire

de Marinha, a quem o chefe do Departamento está directamente subordinado, atestou ;perante o Sr. Ministro da Marinha os tons serviços prestados polo Sr. Leopoldo Alves, e ôste funcionário voltou para o serviço da polícia .marítima.

Aproveito a ocasião para prestar a êsso Sr. Almirante as minhas homenagens.

Há pouco tempo tive ocasião de me referir a rns castigos aplicados a uns sargentos do marinha que se reuniram na barra do Aveiro para. festejar o aniversário da Eepúbíica, fazendo a continência à bandeira ao ser esta içada no mastro do farol e c ando nessa ocasião uma salva de 21 tiros de morteiros.

Como na torre, por «baixo do mastro, há ama coroa real, os sargentos resolveram tapá-la com uni pano preto emquanto faziam a continência à bandeira, destapando-a depois sem lhe ter causado dano algum.

Este acto dos sargentos de taparem a coroa foi interpretado como uma censura a actos de superiores, porque todos os oficiais que foram capitães do porto entenderam deixar ficar a coroa como estava quando foi implantada a República.

; Porvontura passou pela mente dos sargentos censurar superiores com o acto ruo praticaram! Já é preciso forçar muito a imaginação para dar tal interpretação a esse acto.

Xo Funchal, no dia 5 do Outubro, alguns republicanos lembraram-se de festejar Osso dia, fazendo uma manifestação à guarnição da canhoneira «Beira», que se encontrava no porto, e pediram ao patrão--rncr, qv.o estava exercendo as funções do capitão do porto, para os acompanhar a fim do apresentar uma comissão ao comandante da referida canhoneira.

Os manifestantes notaram que a fortaleza do Santiago não tinha içada a bandeira nr.cional, e mostraram o seu descontentamento, indo ato falar com o comandante militar, a quem levaram uma bandeira para ser içada na fortaleza, que tinha salvado ,go meio dia sem bandeira, o que ó ilegal.

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bandeira nacional e ter salvado sem bandeira.

É assim. ;Infelizmente ó assim que se está procedendo dentro desta desgraçada República!

Não posso deixar passar estes factos sem o meu mais veemente protesto. Ao meu espírito repugna tudo quanto seja arbitrariedade e injustiça.

Mas, voltando à questão das praças, estou absolutamente convencido de que não há lei nenhuma que permita o que se fez, mas mesmo que quisessem argumentar com a opinião de que o decreto do Governo Provisório ainda vigora, o que elo não pode é aplicar-se aos sargentos, por isso que a eles se não refere.

As praças mal comportadas, as que são, de facto, inconvenientes na armada, dêern--Ihes baixa em harmonia com a lei, mas a homens bem comportados, leais servidores da Eepública que serviram a armada durante longos anos, como o sargento Lino, que tem 27 anos de serviço, e outros, além de ser ilegal a forma como se procedeu, é uma ingratidão, unia. injustiça, uma violência inqualificável.

Se eu quisesse cansar a atenção da Câmara muitas mais cousas contaria acerca da Majoria General da Armada, assumindo eu sempre inteira responsabilidade do que digo; mas não desejo abusar da Câmara e fico-me por aqui.

Aproveitando o estar no uso da palavra, desejava chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças para uni assunto que julgo de urgente resolução, o que é o que diz respeito aos sanatórios da Madeira.

Evidentemente que não foi para tratar deste assunto que a Câmara me concedeu autorização para falar, mas suponho que ela me desculpará.

O or-ador não reviu.

O Sr. Presidente:—Lembro a S. Ex.a que há mais oradores inscritos para antes da ordem do dia e que a Câmara reconheceu a urgência para outro assunto.

O Orador: — Tem V. Ex.a razão. Nesse caso, termino por aqui as minhas considerações.

O Sr. Carlos Costa í—Peço a palavra sobre o assunto das praças da armada,

a que se referiu o Sr. Procópio de FreL tas. «

O Sr. Presidente: —Não lhe posso conceder a palavra para tratar desse assunto, a não ser que S. Ex.a requeira a generalização do debate e que a Câmara aprove.

O Sr. Carlos Costa: — Era só para fa-.zer umas ligeiras considerações.

O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva):—Sr. Presidente : prestei, como devia, toda a atenção às considerações acabadas de formular pelo Sr. Procópio de Freitas acerca dos marinheiros e sargentos que foram separados do serviço da armada, porque entendo que devia responder a S. Ex.a tarn claramente, quanto possível, para que dúvida nenhuma possa resultar das minhas palavras.

Começou o Sr. Procópio de Freitas por fazer referência a uma entrevista publicada num jornal. A esse respeito, tenho a dizer que não posso responder pelas palavras que nessa entrevista foram postas na minha boca, pelo motivo de que, no dia seguinte â publicação dessa entrevista, em nota oficiosa do meu Ministério, desmentia o que nesse jornal se dizia.

Feita esta afirmação, devo declarar que, quando assumi a pasta da Marinha, encontrei, de facto, abatido ao efectivo' um certo número de praças e sargentos. Não foi um acto meu como Ministro, mas do Governo anterior.

Procurei, como devia, inquirir das causas determinantes desse acto, e reconheci que esses sargentos e essas praças haviam sido abatidos ao efectivo da armada porque faziam, a bordo dos navios e em diferentes serviços, propaganda revolucionária e dissolvente. Essas informações tinham sido prestadas não por entidades alheias ao Ministério, mas pelos respectivos comandantes, chefes de serviço e oficiais dos diferentes serviços da Armada, e foram dadas ao Sr. Major General da Armada.

Eeconhecido esse facto, procurei indagar da legalidade do acto praticado, e verifiquei que ele havia sido efectivado ao abrigo de um decreto do Governo Provisório da Eepública, que ainda não está revogado.

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major general da armada e o comandante ' do corpo d<_ marinheiros='marinheiros' desde='desde' todas='todas' praças='praças' ao='ao' p='p' cabos.='cabos.' as='as' podem='podem' grumetes='grumetes' efectivo='efectivo' abater='abater' ato='ato' armada='armada' da='da'>

Sustento que este decreto ;iao foi revogado, pelo motivo de que ele coexistia com o regulamento disciplinar dossa época, e assim como podia coexistir aozi outro regulamento disciplinar posterior.

O Sr. Carlos Costa: — Mas esse dsere-to era provisório.

O Orador:— Mas não foi revogado.

O Sr. Carlos Costa:—V. Ex.a náo teve informaçues seguras,.

O Orador:—Peço o favor Já mtt nfio interromperem, porque também não interrompi o Sr. Procópio de Freitas.

A seguir, frisou o Sr. Pr c copio de Freitas a questão dos sargentos.

De facto, como já disse, fortra i."jatido s alguns sargentos ao serviço da armada, também pela mesma razão de serem perturbadores da disciplina. Além disso, êssos sargentos eram readmitidos e a readinissão dos militares representa apenas om. contrato unilateral, pelo qual o militar se obriga a servir por mais três anos. Querc dizer, quando esse militar é reputado inconveniente para o serviço, o Estado tem o direito de o abater ao efectivo.

O Sr. Procópio de Freitas: — Crie-ae V. Ex.a a legislação, que eu dou-me por convencido.

O Orador: — Seguindo nas minhas considerações, devo dizer que esse acto não me pertence, mas eu, pesando bera as minhas re&ponsabilidades e tencio comandantes e chefes de serviços, qie declaravam que esses homens faxiam a Jordo dos seus navios e nos diferentes serviços propaganda revolucionária e ('i s sol vente, não podia reintegrá-los, porque se os reintegrasse seria desleal para cera a minta corporação e até mesmo para com t. ração, porque não têm lugar nas navios, nem nos quartéis homens que vão pare. bordo fazer propaganda dissolvente e revolucionária.

Ficou assente que, desde qi e houvesse

qualquer oficial que informasse bem só bro a conduta desses homens, eles se-riura reintegrados.

Muitos já o foram. Nenhum oficial, teria de abonar pelo futuro; não se lhe impôs isso, como se tem dito cá fora.

Por piores que sejam os juízos que possam cair sobre mim, emquanto encontrar chefes que cumpram dignamente com es seus deveres e não queiram a bordo propaganda revolucionária, entendo que cevo defendê-los aqui e em toda a parte, cobrindo-os com a minha autoridade.

Não tenho em mira ferir ou prejudicar ninguém; mas, por maior Cjue seja a mi-nlia compaixão para com esses homens, os meus sentimentos afectivos pela República e pela nação são ainda muito maiores.

Convém que a armada seja uma força disciplinada.

Tais tão as razões que eu desejava apresentar a esta Câmara em defesa dos dos meus actos, julgando que assim rcs-pCi.cli convenientemente ao Sr. Procópio de Freitas.

O orador não reviu,

t

O Sr. Procópio de Freitas: — Sr. Presidente: devo declarar a V. Ex.u e à Camará que, a meu ver, ficam absolutamente de pé as minhas afirmações.

Disse o Sr. Ministro da Marinha que os sargentos e praças foram abatidos ao efectivo em vista de informações dadas pelos comandantes, que esses homens faziam a bordo propaganda dissolvente.

^Conste, isso nas cadernetas e informações semestrais? Não. São informações reservadas5 e a lei não permite tais in-ibrmaçõas. Foi, portanto, mais uma ilegalidade.

Diga-se a esses sargentos e ,a essas praças de que são acusados, para se poderem defender. Isto é que é próprio duma democracia.

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que são enviadas ao comandante do corpo de marinheiros.

Tenho muita consideração pelos meus camaradas, mas a verdade ó que as tais informações reservadas, alóm de serem ilegais, são quási sempre ditadas por um sentimento de má vontade, ou por urna, paixão 'qualquer e, portanto, quási nunca são justas. Q

Dizem que esses homens fazem propaganda dissolvente, porquê?

Se é por eles em conversas manifestarem o seu desagrado pelos Governos que não têm defendido os interesses da República, ou-por terem entrado num movimento revolucionário, então tinham que ser afastados do serviço muitos militares do exército e da armada.

O que há-, Sr. Presidente, é uma manifesta perseguição a pessoas que honesta e patriòticamente entraram, no movimento de 19. de.Outubro, feito por alguns daqueles que não tiveram coragem para a ele se oporem, e depois de julgarem morto esse movimento . passaram a perseguir os que nele entraram.

Relativamente aos artigos publicados no jornal A Imfn^nsa Nova, vi, de facto, uma nota oficiosa do-Ministério da Marinha desmentindo ..umas afirmações feitas num desses artigos; mas é verdade também que, no dia .seguinte, o mesmo jornal e O Século piiblicarani uma carta do autor desse artigo mantendo tudo o que havia dito.

Continuo tendo a mesma opinião em que estava. As palavras do Sr. Ministro da Marinha não me satisfizeram.

O orador não reviu.

O Sr. Ribeiro de Melo : — Sr, Presidente: peço a V. Ex.a que consulte a Câmara se consente que o artigo «Frente a frente» de Mayer Garção publicado hoje num jornal . de Lisboa seja reproduzido no meu discurso como se tivesse sido lido por

mim.

Foi rejeitado na primeira votação e aprovado em contraprova.

ORDEM'DÓ. 1)IÀ

Continuação da discussão na generalidade do projecto de lei n.° 568

O Sr. Joaquim Crisóstomo:—Sr. Presidente : na última sessão, sustentei que o

projecto em discussão 'não correspondia aos fins que o Governo tinha em vista, e afirmei que, se .dependesse de mim, o que faria era .elevar a 15 vezes a taxa, quere dizer,, continuava em vigor a tabela de 1902 multiplicada pelo coeficiente 15.

Esta era a maneira mais «vidente de se actualizar a lei, porque não é fácil presentemente conhecer-se a-lei que hoje vigora.

Nas disposições deste projecto, algumas há com as quais estou em completo desacordo e .sobre as quais eu mandarei na devida oportunidade emendas para a Mesa.

Mas não quero deixar de agora frisar certos pontos.

A propósito, do artigo 1.°, consigna-se nele -várias excepções, .uma delas referente ao imposto de -selo para cheques à vista, que pela doutrina do projecto continuarão a ter o selo que.têm actualmente.

Francamente, nãa.posso perceber a causa desta, excepção .'Quem deposita, dinheiro nos Bancos é quem p tem. Só veria razão para esta' excepção se ela- abrangesse os cheques até 50 ou .100$, mas para os su^ periores a esta quantia o-imposto deve ser actualizado-.

Na devida oportunidade eu mandarei para a Mesa uma proposta no sentido de ser excluída essa excepção.

Quanto às- avenças já expus a minha opinião sobre este assunto.

Como por esta forma o Estado pode , ser defraudado, entendo que se devia incluir uma disposição na lei, para que as avenças por tempo superior a 30 dias ficassem ^sujeitas a ser alteradas pela lei.

Há aqui ainda uma outra taxa quo se exclui, de forma que quem comprar um prédio por 1:000 contos tem de pagar não por uma taxa agravada mas por uma taxa actual. .;

Por esta maneira de legislar, quem aproveita são os ricos, não os pobres, porque quando houvesse um fundo de protecção para facilitar transacções por propriedade, teria de se .estabelecer um limite mínimo, pois a lei actual estabelece uma determinada percentagem, 0,75 por mil. Quere isto dizer que, se um contrato for de 2:000$, dever-se há pagar 1$80.

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Ministro das Finanças, que, quando aqui apresentou os' seus relatórios — ou epístolas, como lhe chamou o Sr. Querubim Guimarães— disso que faria pagar os ricos. Mesmo que se queira levar até certo ponto o gravame do selo. dever-se-iam excluir as transacções de valor inferior a um, determinado limite.

É possível que o Sr. relator, que com certeza estudou o assunto, dê explicações cabais que até certo ponto destra amo mau efeito que deve ter produzido no espírito da Câmara o ter-se introduzido um preceito desta natureza, ou então foi lapso.

A doutrina será até certo pouto justa, mas o que tem de ficar na lei é com certa limitação.

Há um artigo no Código do Processo que estabelece que, quando o tutor não apresentar contas voluntariamente até determinado tempo, serão acrescentados 5 por cento ao valor.

É claro que se tivermos de pedir contas a um tutor anteriormente a 1914, acrescentando a esse valor 5 por cento, manifestamente o tutelado ou interdito fica altamente prejudicado.

É de toda a conveniência que esse preceito seja modificado, mas nunca nos termos genéricos em que se acha consignado no projecto.

O que há a fazer é procurar uma percentagem razoável e equitativa quanto possível.

Não compreendo bem o altance desta disposição. Se há assunto em cue eu considere que a lei deve ser aplicada sem serem respeitados os direitos adquiridos, este é um déies.

Não devemos fazer distinção entre as acções pendentes .e as que se tenham a propor. Não há motivo para qce se cou-signe uma determinação desta natureza relativamente às acções de despejo. Apesar de ser especialista em assuntos jurídicos, não atinjo o motivo por que se faz esta excepção.

Desejo ouvir a este respeito o Sr. Relator, e portanto, ou seja para o senhorio ou inquilino, para o autor ou réu, deve convir alargar a alçada.

Se as alçadas se justificam e muito bem que os códigos as estabeleçam, necessário é que seja em toda a sua extensão, e não se abram excepções para o caso das acções de despejo.

Sr. Presidente: os argumentos produzidos em relação às acções de despejo são igualmente aplicáveis às acções pendentes.

Nós não devemos ter preocupações desta natureza, quando se trata de um principio que tem a extensão e a importância daquele de que se trata. ,

Ai»da se se tratasse de reduzir as alçadas, vá; mas alargá-las ó que nunca.

Desde que se estabeleceram as alçadas e se permitiu recorre:: das instâncias inferiores para a superiores, também quan* to maior for a faculdade concedida aos litigantes, tanto mais se beneficia da acção da justiça.

A justiça não é só um tribunal, são todos os tribunais.

Pena é que a nossa legislação, mais por uma tolerância com a tradição do que por uma afirmação de direito processual, ponha assuntos no lugar em que eles justamente não deveriam estar. A justiça é só uma; a Justiça intervém no princípio superior da moral e tanto existe numa causa de pequeno valor, como numa de valor avaliado.

Entendo pois, que estes dois princípios não têm razão de existir nesta lei; e assim, quando se tratar" da discussão na especialidade, mandarei para a Mesa uma proposta de eliminação.

Há aqui um artigo 7.° que foi introduzido pela Secção. Já a ôle se referiu largamente o Sr. Querubim Guimarães, demonstrando que ele era inexequível.

Compreendo o alcance de quem o fez; mas se há razão por um lado para ele se ter con&ignado na proposta, por outro, permito-me dizer que quem o redigiu foi pouco feliz na redacção.

Este preceito foi reproduzido no decreto n.° 8:436, de Setembro de 1922.

Tem por fim o seguinte:

O escrivão recebe nestes casos uma determinada quantia a título de preparo, que é destinada ao papel selado do processo.

Portanto, se o papel selado for elevado consideravelmente de $30 para 1$00, ó justo também que o escrivão receba, não o preparo que a tabela vigente estabelece, mas um preparo maior.

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Assim ficaria resolvida a questão, e não teria o escrivão de estar a ajustar com a parte, nem tam pouco intervir o juiz, ao qual faltam elementos para poder determinar essa quantia.

Com estas alterações, se bem que a lei não fique perfeita, é certo que ficaria muito melhor que aquilo que está; pelo menos ficaria menos irritante, e portanto, anais prática.

O orador não reviu.

O Sr. Medeiros Franco : — Sr. Presidente : tenho pena de não ter ouvido as considerações feitas na última sessão pelo Sr. Joaquim Crisóstomo acerca do projecto do lei que se discute.

Também eu, Sr. Presidente, tenho algumas considerações a fazer, e principalmente na especialidade. A propósito de cada artigo, direi da minha justiça.

Concordo, em princípio, como projecto de lei em discussão; o mesmo é que dizer que lhe dou o meu voto na generalidade.

Mas desejava desde já fazer algumas observações acerca de diversos artigos deste projecto.

E astdm, pelo que respeita ao § 1.° dó artigo 1.° do projecto em discussão, concordo, Sr. Presidente, com as considerações, que há pouco fez o ilustre Senador Sr. Joaquim Crisóstomo.

Não se percebe que, num projecto de lei tendente a actualizar o imposto do solo, -e tendente por outro lado a obter uma maior arrecadação de receita para o Estado, não se compreende, repito, que tenham ficado de fora precisamente aqueles actos cuja taxa é estabelecida em função -do valor atribuído ao acto a tributar.

Percorrendo a tabela do selo de 3 de Novembro de 1921, que é por sua vez a tabela de Agosto de 1902 com as modificações que lhe trouxe a lei n.° 926, e a lei n.° 1:333, de 31 de Agosto de 1921, isto é, aquela que eleva a 50 por cento as taxas em vigor, vejo que o projecto de lei em discussão não realiza aquela função a que se propôs, qual era, a de actualizar tanto quanto possível o imposto do selo, e ao mesmo tempo obter para o Estado uma maior receita.

Percorrendo essa tabela, verifico que quási todos os números dela, ou uma grande parte, se compreendem naquela determinação pela qual o imposto do selo

é fixado em função do valor atribuído ao acto a tributar.

Uma grande parte efectivamente da matéria colectável sobre que incide o imposto de &êlo está compreendida, nesta designação.

Vejamos, Sr. Presidente, começa pelas acções ou títulos representativos de capital de qualquer sociedade, sem excepção das parçarias marítimas, conforme o valor nominal.

Nesta lei de agora, quando se trata de arrendamentos, quando se trata de recibos, quando se trata de avenças, Sr. Presidente, verifica-se que todos estes actos ficam exceptuados da nova tributação, e conseqúentemcnte fica o Estado privado daquela receita que se propôs arrecadar com esta proposta de lei.

E se há matéria em que haja flagrante injustiça ó aquela que se refere às letras.

Isto é uma flagrante injustiça e é necessário que sejam incluí das na matéria geral deste projecto também as letras; porque o comércio pode e deve pagar o imposto de selo, porque assim é necessário e o Estado bem carece.

Sr. Presidente: não posso, é claro, acompanhar toda a tabela neste sentido, mas o que posso garantir é que a maior parte da matéria colectável que é baseada na tabela de 1902, actualizada pela de 1921, é estabelecida em função do valor atribuído ao acto a tributar.

Mas há uma cousa que preciso que o Sr. relator esclareça e para isso peço a atenção de S. Ex.a

Sabe V. Ex.a muito bem que os livros dos notários para testamentos, para abertura de sinais, etc., esses livros de notas pagavam até hoje $30 por cada meia folha de duas laudas, como muito bem diz a tabela de 1902.

Pregunto se não são exceptuados estes livros da multiplicação pelo factor 5 e se os notários vão passar a pagar 3x5 15, l$50, por cada meia folha de duas laudas destes livros.

Estas desigualdades não se me afiguram justas e eu desejava que o Sr. relator me dissesse se apreciou este assunto e se, no caso de eu apresentar alguma emenda, S. Ex.a concorda com ela.

Há outro assunto que mereceu também a minha ateu cão.

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expressão «forma externa dos contratos», vem o Estado a ficar prejudicado com esta medida. O Código Civil, nalgumas das suas disposições, exige para a forma externa dos contratos determinados documentos como elementos absolutamente indispensáveis da existência jurídica dos contratos.

Esta disposição, portanto, ó lesiva dos interesses do Estado. E, assim, basta um exemplo: o acto ou a venda, para a sua demonstração, exigia ato à importância de 200$ mero título particular; de 200$ a 400£ uma escritora pública.

Multiplique V. Ex.a estas importâncias por 10 e \er-se há que efectivamente grande número de contratos de veada foge ao imposto, e até, em muitas partes, fugirão ao manifesto para o pagamento da décima.

A meu ver é absolutamente indispensável fazer desaparecer esta disposição do artigo 3.° do projecto em discussão, porque vai prejudicar altamente o Estado, além da lesão manifesta que vão sofrer os funcionários que lavram esses actos, porque efectivamente se é justa a actualização do imposto, não é justo que à cesta dessa actualização vão a ser cerceados nos seus intorêsses" os notários e demais funcionários que vão lavrar es-tes ac':o&.

Na especialidade terei ocasião de apresentar uma emenda neste sentido, porque, ao passo que estou defendendo os interesses do Estado, de igual modo defenderei os particulares e evitarei os ludíbrios a que tal disposição daria lugar.

Há ainda um outro artigo que se me afigura também qne não é de aprovar. Refiro-me ao artigo 4.° da proposta.

Sr. Presidente: vinha o Código Civil desde 1868 a exigir para. a realização de alguns contratos, como doação, hipoteca, etc.. uiaa escritura pública. Toda a legislação posterior tem igualmente mantido esta obrigação no tocante a actos respeitantes a imobiliários quando o valor seja superior a 50$.

Em 18" de Setembro de 1922, reorganizada, pode dizer-se, toda a legislação referente à vida notarial, não hesitou o legislador em manter o mesmo princípio. Fez mais ainda: exigiu para todas as vendas, cessões onerosas, doações a título gratuito ou oneroso, não só os títulos particulares, mas foi mais adiante: exigiu

até documentos autênticos, extra-oficiais, para que ficassem as partes mais perfeitamente garantidas na realização dos seus- , contratos..

Por esta disposição, só de 500$ para cima se exige a escritura pública. Daí para baixo será um instrumento fora das notas. Claro é que um instrumento fora das notes ó também um documento autêntico, mas não pode ser um documenta da mesma força e das mesmas garantias-jurídicas e sociais que têm as escrituras públicas, que ficam exaradas nos livros próprios, e os registos dos documentos autênticos extra-oficiais lavrados fora das notas, embora fiquem registados, não são-elementos para depois tirar cópia, porque não têm força.

Por consequência julgo que prejudicamos o Estado, porque por essa província fora, pelos Açores e em toda a parte,, embora a propriedade se valorizasse, ainda a maioria dos contratos se estão-fazendo por quantias que regulam entre 100)3 e 1.000$. V. Ex.a vê que não é justo, nem legítimo que se forcem os funciona--rios públicos a ver reduzidos os seus rendimentos, não fazendo as escrituras que, evidentemente, dão maiores rendimentos, ficando sem compensação nenhuma por--que deixam de perceber aqueles emolumentos que até agora têm percebido.

Entendo que se praticaria um acto de justiça e de defesa dos interesses das partes e ao mesmo tempo de defesa dos. funcionários públicos que intervêm nestes actos, eliminar aquele artigo. Só assim se manteria o critério jurídico estabelecido pela reforma da autOTia do Sr. CatanhO', de Meneses.

Esta proposta de lei merecia de facto uni longo estudo. Eeconheço, porém, que o Sr. Ministro das Finanças precisa que esta proposta se converta em lei, porque-' tem necessidade urgente de ver actualir-zados os impostos para o Estado.

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acertada, que defenda os interesses do Estado e das partes.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro d© Castro): — Pedi a palavra para dizer a V. Ex.a e à Câmara que o artigo não é da minha autoria. Foi apresentado na outra Câmara por um Sr. Deputado. Nem falei sobre ele porque tinha pressa de que se fizesse a votação da proposta de lei.

O orador não reviu.

O.Sr. Artur Costa : — Esta proposta de, lei íoi submetida à l.a Secção com a nota de muito urgente, pelo que a l.a Secção se viu forçada a estudá-la em pouco tempo, sem quási ter ensejo de apreciar as disposições com as quais se relaciona.

Efectivamente esta proposta de lei está longe de ser uma obra perfeita, mas ó preciso procurar, com a maior .brevidade possível, aumentar as receitas do Tesouro, e esta proposta vem beneficiar essa situação.

Os ilustres oradores que se ocuparam do assunto encontraram, na proposta em discussão, defeitos espantosos, e por pouco não julgaram que nenhum dos seus artigos merecia aprovação.

Eu sei que na Câmara dos Deputados existe uma proposta de lei mais ampla com respeito às modificações da legislação sobre o selo. É nessa proposta que, efectivamente, é preciso estudar com cuidado, prudência e moderação as modificações a íazer, e quando esta proposta que agora se discute for posta em prática ver-se hão os inconvenientes que tem, os quais se remediarão na proposta de lei que está na Câmara dos Deputados.

Os Srs. Joaquim Crisóstomo e Medeiros Franco atacaram a excepção que está consignada no § 1.° do artigo 1.°

Leu.

-Na Secção tive a honra de apresentar uma proposta de eliminação dalgumas palavras deste parágrafo, mas a doutrina que pretendia estabelecer não foi aceita, e por isso não pôde ser incluída na redacção submetida agora ao Senado. Diziam os meus contraditores que havoria complicação de taxas, razão por que eu vi rejeitada a minha proposta.

O ilustre Senador Sr. Medeiros Franco atacou também o artigo 3.° na sua redacção, especialmente na parte que se refere à forma externa dos contratos. Devo dizer que, pelo que ouvi a S. Ex.a, se me afigura que lhe assiste razão, porque se de facto não ficar bem explicado este artigo 3.° pode dar lugar a ludíbrios contra o Estado; mas devo também dizer que não estou de acordo com S. Ex.% quando receia que a supressão, ou eliminação destas escrituras públicas possa trazer prejuízo social e material para as partes.

Não sou, pois, da sua opinião neste caso. Simplesmente estou de acordo em que ela prejudica, e muito, os funcionários notariais. No que eu 'nãojestou de acordo é quando S. Ex.a me diz que discorda ou quere que se suprima o artigo 4.°, e não há meio de me convencer de que o facto de um prédio que se transmitiu na vigência do Código Civil por 60$, pelo qual era exigida uma escritura pública, se tudo se actualizou, £ havemos de deixar as partes obrigadas a pagar 15$ de .selo e 12$ ou 15$ da escritura por um prédio que vale 200$?

S. Ex.a, que é um homem de bom senso, há-de certamente reconhecer que isso não era justo. Estou de acordo que o limite que está seja excessivo, porque de facto, todas- as partes têm a tendência para baixar o preço dos prédios, não só para pagar menos contribuição, mas também para evitar as escrituras.

Passemos ao meio termo. Não me importo nada em aceitar uma emenda para baixar este limite.

Não me preocupa se esse limite pode trazer deminuição de receita para o Estado, porque o Sr. Ministro das Finanças há-de ser forçado a trazer uma proposta d© lei ao Parlamento para actualizar os valores das propriedades nas matrizes no seu valor aproximado.

Na eliminação que S. Ex.ft propõe é que não posso concordar.

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colegas, no que praticaram um acto que bastante os dignifica, porque realmente na província os proventos dos notários são, em diversas terras, muito reduzidos, e altamente seriam prejudicados com o limite estabelecido nesta proposta de lei. Em todo o caso parece-me que em uma nova reforma dos serviços notariais é que melhor se poderiam atender as suas justas reclamações.

Vai, por consequência, o papel para 1$.

Concordo em que não deva ser mais do que isso, porque os impostos mio podem ir de rompante.

Se, porventura, se tivesse pensado em ir a pouco e pouco —e no caso do ísêlo assim ten^sido— em outros assuntos, se assim se tivesse feito no que respeita por exemplo, aos tabacos e fósforos, melhor teria sido.

Nestas condições, se algum Sr. Senador entender que deve mandar para a Mesa qualquer emenda em tal sentido, e o. não terei dúvida em a aceitar.

Estando a estudar-se uma nova lei do selo, bom é que ela venha completa.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: — Não está mais ninguém inscrito sobre a generalidade da proposta de lei.

Pausa.

O Sr. Presidente: — Vai votar-se. Posta à votação a proposta na generalidade, foi aprovada.

O Sr. Presidente:—Vai ler-se o artigo 1-°

Lido na Mesa o artigo 1.°, foi posto à diwussão.

O Sr. Oriol Pena: — Sr. Presidente: ouví com muita atenção a parte da discussão do. artigo 1.° feita pelo Sr. Joaquim Crisóstomo e mais demoradamente as considerações do Sr. Medeiros Franco.

OcupAram-se S. Ex.8s, bem como os outros Senadores que ouvi, dos aspectos jurídicos, para os quais não tenho competência, rotando até que muito se magoou o Sr. Medeiros Franco no que respeita aos úteis funcionários públicos, que :são os notários.

Ocorre estranhar que S. Ex.5S vissem

só a lesão em vários pontos do artigo, no que ela pode afectar os interesses de funcionários públicos, não se lembrando de que afecta, sobretudo, a eterna vítima: o contribuinte.

Por melhor que fosse o modo como S. Ex.as deduziram a sua argumentação, — o Sr. relator estava até hoje com muita ternura— não posso deixar de fazer algumas considerações sobre um número do § 2.°, ein que se englobam as excepções a fazer.

Na alínea a que me vou referir, o que existe já, representa, a meu ver, um princípio anti-económico e altamente nocivo para o Estado e para a sociedade. Eefiro-me ao n.° 3.°

No meu entender, os cheques à vista, nominativos, ou ao portador ou ainda feitos à ordem deviam ser isentos de qualquer taxa.

Nesse sentido vou mandar uma proposta de emenda para a Mesa, que vou procurar justificar com as considerações que me, sugeriu esta redacção do § 3.°

É sabido que uma das causas das grandes aflições em que se encontra não só o Estado, mas todo o comércio do País, vem, confessadamente—e chamo para isto a atenção do Sr. Ministro das Finanças — da falta de numerário para lhe fazer face, por o portador das notas não as fazer depositar nos Bancos, só o levantando por meio d9 cheques, quando dele tivesse necessidade.

Esses cheques deviam ser completa-mente livres de qualquer taxa.

Sem ter a pretensão de conhecer o que as legislações estrangeiras estabelecem a respeito dos cheques, posso asseverar que, tendo tido ocasião de ver cheques de várias origens, ainda não vi com selo senão os de Portugal.

V. Ex.a sabe e o Sr. Ministro das Finanças tinha obrigação de o não ignorar, que uma das causas do descalabro em que está o comércio e das dificuldades do Estado é a de se não reputar suficiente o numerário.

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procurando, por meio da imprensa de grande circulação, convencer o público e todos as portadores de dinheiro de não terem a menor vantagem em conservar um pataco em casa, que melhor e mais bem arrecadado está nos bancos e casas bancárias.

Desde o momento em que o bilião e quatrocentos milhões de papel fiduciário não esteja a servir de pé de meia na algibeira dos particulares devia chegar e bem para as necessidades de desconto e outras operações semelhantes.

Sabe perfeitamente V. Ex.a, ou devia sabô-lo, que uma das causas de não afluir aos bancos o volume monetário vem, em grande parte, da desconfiança que há no Estado e da desconfiança que pode haver nos bancos, porque, vivendo nós uma vida de incerteza e., tendo uma legião de gente, na sua maioria sem cultura suficiente, imaginam o dinheiro mais seguro em casa do que nos bancos.

Mas há também outro facto que concorre para essa ausência de capital nos bancos: ó í> selo dos cheques, antigamente de 10 réis e actualmente de 60 réis.

Esta questão do selo nos cheques tem trazido algumas perturbações e dificuldades aos seus .portadore* e, como não é a sua importância que vai salvar as finanças públicas, entendo por todas as razões deverem os cheques ser isentos de selo.

Não sei se estou em erro, o Sr. Joaquim Crisóstomo está aqui ao lado, pode dizer-mo, mas tenho visto cheques ingle« sés, alemães e italianos, sem selo.

, O Sr. Augusto de Vasconcelos: — Os

ingleses têm selo.

O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Os americanos também têm.

O Orador: — Não tenho idea de os ter visto e em todo o caso não vejo para o cheque interno qualquer vantagem em lhe dificultar a popularização, bem pelo contrário, julgo da maior conveniência torna--Io um instrumento absolutamente livre, porque, como todos nós sabemos, ó um instrumento de vida curtíssima.

O Sr. Augusto de Vasconcelos:—Em Inglaterra o cheque é selado, mas lá a

facilidade em selar é enorme, porque há um único selo, a estampilha dos correios,

O Orador:—Mas cá não há isso; tem que ser o selo de tinta de óleo, não porque isso estivesse previsto na lei, mas por determinação de uma simples circular da repartição superior da administração pública.

Suponhamos uma cousa. Quantos cheques se emitem em Portugal pelos diferentes organismos, bancos, banquetas e casas bancárias.

Serão dois milhões?

O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Dá mais,, e podia-se empregar por exemplo uma taxa fixa.

0 Orador: — Mas isso é nocivo.

1 Sabem V. Ex.as o que acontece neste santo País que se chama Portugal?

E que o econoniizador de pequenos volumes de dinheiro não o leva à casa bancária.

Afirmo não ser com esta medida, nociva para a concorrência da economia particular aos depósitos nos bancos que se salvam as finanças públicas e antes se agrava a situação do País.

Os senhores estão para aí a imaginar uma receita colossal proveniente dos aumentos violentíssimos de taxas consignados neste projecto, mas estou convencido de que, na prática, isto não dá nada do-que pensam.

Deve-se fazer desaparecer completa-mente o selo do cheque, declarando-se aqui ser o cheque absolutamente livre.

Nesse sentido, vou mandar uma emenda para a Mesa, embora esteja convencido de ser perfeitamente prosa perdida o que estou a dizer, como se estivesse a falar no deserto.

Não posso contudo deixar de afirmar que isto vem criar mais dificuldades ao-comércio, quê já está lutando com enormes dificuldades em obter descontos, mesmo que sejam pequenos.

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E como o cheque é um título com curta vida, quando muito oito dias, não vejo inconveniente algum que isso se faça.

Lavrado este meu protesto, e não fazendo tenção, por agora, de me ocupar doutro assunto englobado em todos estes parágrafos, e já foram tratados por distintos colegas meus, mando para a Mesa a seguinte proposta do emenda:

Proponho» que no n.° 3.° do artigo 1.° se cortem as palavras: «avista» e substituam pelas palavras: «são extintas.— Oriol Pena.

lates de se encerrar a sessão

O Sr. Procópio de Freitas:—Sr. Presidente: chamo a atenção do Sr. Ministro das Finanças para a necessidade que há de resolver o mais rapidamente possível a questão da venda dos bens dos Sanatórios da Madeira.

Estive há pouco no Funchal, e tive ocasião de ver o estado em que se encontrara alguns desses edifícios.

Um deles está perfeitamente a desmoronar-se.

Dentro clêsses edifícios existem roupas preciosíssimas, « objectos de outra natureza muito preciosos também e que de dia para dia se estão deteriorando mais.

Peço ao Sr. Ministro das Finanças que se resolva este assunto o mais depressa possível, porque chega mesmo a ser criminoso prolongar por mais tempo esta situação.

A quinta da Vigia, SanfAna e outras belas quintas, tendo dentro delas verdadeiras preciosidades, roupas de linho excelentes, que estão já algumas completa-mente deterioradas etc., tudo isto representa grandes valores que se estão a perder.

Batendo que este assunto se tem de resolver o mais depressa possível, e os edifícios devem ser vendidos cada um de per si, sendo o produto dessa venda e:a-iregue à Câmara Municipal do Funchal.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro dás Finanças (Álvaro de Castro):—-Sr. Presidente: emreferôa-cia às considerações do Sr. Procópio de Freitas, tenho a comunicar a S. Ex.*,

que há muito tempo que essa questão se está a estudar, e que estão ultimando-se os trabalhos»

O orador não reviu.

O Sr. Álvares Cabral: — Peço a atenção do Sr. Presidente dó Ministério já que o Sr. Ministro do Comércio e Comunicações não tem vindo a esta Câmara, para dois assuntos importantes.

O primeiro refere-se a uma notícia que trouxeram os jornais, que tinha chegado a Lisboa um capitalista britânico para comprar o Avenida Palace pela quantia de 6:000 libras.

Deve saber o Sr. Ministro"das Finanças que, se esse hotel for vendido agora, é a terceira vez que se pratica este acto ilegalmente, porque esse hotel é pertença do Estado conforme a portaria cuja cópia tenho & honra de entregar a V. Ex,a

Há ainda um outro assunto de grande oportunidade que desejo tratar.

O Diário do Governo, de 31 de Dezembro último, n.° 303, traz publicado um aviso que diz:

Leu. -

Ora esta concessão a ser feita representa, nem mais, nem menos do que um monopólio, além de que o fabrico artificial de pedras de cantaria e alvenaria é já aplicado há bastante tempo na nossa construção particular e até na construção das casas económicas a que se está procedendo na Ajuda.

Peço pois a atenção de S. Ex.a para estes casos que são muito importantes.

O Sr. Presidente do Ministério e Minis-tra das Finanças (Álvaro de Castro): — Pedi a palavra para dizer a S. Ex.a que este assunto corre pela pasta do Comércio e que eu comunicarei ao respectivo titular as considerações que acaba de fazer o Sr. Alvares Cabral.

O orador não reviu.

O Sr. Santos Garcia:-—Sr. Presidente: pedi a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Comércio; mas como S. Ex.a não veio a esta Câmara peço ao Sr. Presidente do Ministério o favor de lhe transmitir as considerações, que vou fazer.

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•contram-se na contingência de terem de fechar as suas portas em consequência de -os caminhos de ferro não fornecerem os vagões necessário para o transporte dos fardos de cortiça; essa falta acarreta um •empate de capital e conseqúeiitemente uma falta de numerário indispensável para se continuar a laborar. Como se trata dum assunto importante, peço a V. Ex.a que faça com que o Sr. Ministro do Comércio dê providências nesse sentido. Tenho dito.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Pedi a palavra para declarar que comunicarei ao Sr. Ministro do Comércio as consideraçães que acaba de fazer o Sr. Santos Garcia.

O orador não reviu.

O Sr. Joaquim Crisóstomo : — Sr. Presidente: em 15 de Maio de 1921, foi ordenado pelo Ministério da Justiça um inquérito para apurar das graves irregula-ridades praticadas por ocasião do arrolamento e arrematação dos bens dos inimigos alemães. Procedeu a esse inquérito o juiz Sr. Dr. Lopes da Silva, o qual depois de o ter concluido entregou o respectivo relatório no Ministério da Justiça.

O processo continua no Ministério da Justiça e eu consegui que o Sr. Abran-•ches Ferrão me prometesse estudá-lo.

Estão apurados factos gravíssimos e eu, para poder aqui documentar considerações que desejava fazer, pedi que me fosse fornecida cópia dos principais documentos do processo. Nunca acederam ao meu pedido e vi-me forçado a fazer

um requerimento em papel selado a fim de ver se, por esse novo meio, conseguia o que desejava. Foram infrutíferas as minhas tentativas. Enviou-se o'processo à Intendência- dos Bens dos Inimigos, que foi de parecer que se não podia certificar o que eu desejava, e o Sr. Ministro indeferiu o meu requerimento.

A justiça não pode estar satisfeita. É necessário que o processo se liquide e me sejam fornecidos os documentos que pedi.

Trata-se de casas, de edifícios e objectos que estão na cidade da Horta obso-lutamente abandonados. Ninguém toma conta desses valores a não ser para se assenhorear deles.

Necessário é que o Sr. Ministro das Finanças tome providências.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Esteja V. Ex.a descansado que empregarei os devidos cuidados e cautelas para que o Estado não perca esses valores.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão será na sexta feira sendo a ordem do dia a continuação da discussão da proposta de lei relativa ao imposto do selo, a continuação da interpelação do Sr. Lima Alves e ainda outros projectos que estavam já dados para ordem do dia, que são os n.08 136, 256, 303, 496, 479, 466, 342, 482, 440, 420, 10, 360, 368, 597, 501, 455, 247, 332, 458, 511, 521, 523, 534 e 560.

Está levantada a sessão.

Eram 19 horas.

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