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REPÚBLICA
PORTUGUESA
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EM 4 DE MARÇO DE 1925
Presidência do Ex.mo Sr. António Xavier Correia Barreto
Secretários os Ex.mos Srs,
Luís Inocêncio Ramos Pereira Aprigio Augusto de Serra e
Sumário.'—As 15 horas e 25 minutos, com 26 Srs. Senadores presentes, o Sr. Presidente declara aberta a sessão.
Aprova-se n acta.
Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia.— O Sr. Júlio Ribeiro reclama providências que impeçam o encerramento do Asilo da Infância Desvalida, da Guarda.
Ordem do dia.—Entra em discussão "o projecto de lei n.° 802, sobre a venda de baldios, falando -os Srs. Procôpio de Freitas, Domingos Frias, D. Tomás de Vilhena e Godinho do Amaral, sendo o projecto retirado da discussão.
Prossegue o debate sobre a apresentação do,'Mi-nistério, continuando o Sr. Joaquim Crisóstomo no uso da palavra, que lhe ficara reservada da, sessão anterior. Falam mais os Srs. José Pontes e Ferraz Chaves, respondendo a todos os oradores o Sr. Presidente do Ministério.
Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Lima Duque refere-se ao manifesto do Partido Nacionalista, publicado hoje,, para rectificar afirmações que ali se fazem; o Sr. D. Tomás de Vilhena dá explicações a propósito dê-afirmações que fés quando discutiu a declaração ministerial.
Aberta a sessão às 15 horas e 2õ minutos. . > . •--.-.- .' .....'
Presentes à chamada 26 Srs. Senadores. ••''"-' . Entraram durante a sessão 21'Srs. Senadores. -'•--..' .•
Faltaram 24 Srs. Senadores.
Sr§. Senadores presentes à abertura ,da sessão: ' .
! Aniónio da Costa Godinho do Ama-, ral. .
António Maria da Silva Barreto. .
António Xavier Correia Barreto. Aprígio Augusto de Serra e Moura. Artur Octâvio do Rego Chagas. César Procôpio de Freitas. Domingos Frias de Sampaio e Melo. Ernesto Júlio Navarro. Francisco Josó Pereira. Francisco Vicente Ramos. Hérculano Jorge Galhardo. Joaquim Pereira Gil de Matos. Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.. . /
José António da Costa Júnior. José Augusto de Sequeira. José Duarte Dias de Andrade. Josó Joaquim Fernandes Pontes. Josó Machado Serpa. Júlio Augusto Ribeiro da Silva. Júlio Ernesto de Lima Duque. Luís Augusto de Aragao e Brito. Luís Augusto Simões de Almeida. Luís Inocêncio Ramos Pereira. Pedro Virgolino Ferraz Chaves. . • Rodrigo Guerra Alvares* Cabral.-., Vasco Crispinianq da Silva.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
, Álvaro António Bulhão Pato. :
Artur Augusto da Costa. • • ^ • -
César Justino de .Lima Alves. - Cònstantino José dos Santos. :
Duarte Clodomir Patten de ;Sá Viana*
Francisco António de Paula.
Francisco de Saíes: Ramos da Costa.
Frederico António Ferreira de; Siinâs.
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Diário das Sessões do Senado
João Catanho de Meneses. João Manuel Pessanha Vaz das Neves. João Maria da Cunha Barbosa. Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior. Joaquim Slafluol dos Santos Garcia. José Joaquim Pereira Osório. José Nepomuceno Fernandes Brás, Manuel Gaspar de Lemos. Querubim da Rocha Vale Guimarães. Roberto da Cunha Baptista. Rodolfo Xavier da Silva. Tomás de Almeida Manuel de Vilhena (D.).
Srs. Senadores que faltaram à sessão:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Alfredo Karciso Marcai Martins Portugal.
Aníbal Augusto Ramos de Miranda.
António Alves de Oliveira Júnior.
António Gomes de Sousa Varela.
António de Medeiros Franco.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.
Augusto de Vera Cruz.
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
João Alpoim Borges do Canto.
João Trigo Motinhò.
Joaquim Teixeira da Silva.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto Ribeiro de Melo.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Mendes dos Heis.
Nieolau Mesquita; .
Raimundo Enes Meira. .
Ricardo Pais Gomes.
Silvestre Falcão.
Vasco Gonçalves Marques.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
O Sr. Presidente (Às 15 horas e 20 minutos):---Vai.,proceder-se à chamada. Fez-se a chqi&ada.
O Sr. Presidente (Às, J£ horas e 26 mi-jiutos}*. — 'Eatao: presente» í2@ Srn. Senadores. . , ,
Está aberta, a sés silo. . - Vai ler-se a acta. >>, •
Leu-se. .,,..:
O Sr. Presidente : — Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada.
Vai ler-se o
Requerimentos
De Francisco Coelho Dias, Francisco António, Eduardo José Ferreira, Eduardo da Assunção Pereira, Higino Barrão, Eugênio Pereira de Lemos, José Bcnedy, Álvaro Brandão, David Paulo, Adalberto dos Santos Alves Pereira, Raul da Silva, José Joaquim Pereira, José Tomás de Sousa, Leonardo de Sousa, Moisés Martins. José de Jesus Gabriel, Carlos Antunes e João Ferreira Pires, pedindo para serem reconhecidos revolucionários civis ao abrigo da lei n.° 1:691. •
fará a comissão de petições^. -
Do Sr. Francisco de Sales Ramos da Cos';a:
Requeiro que, nos termos da 2.a parte do íirtigo 32.° da Constituição da República, seja mandado promulgar como lei o projecto de lei n.° 373.—O Senador, Francisco de Sales Ramos da Costa. . . . Para a Secretaria. • -
Requeiro que, nos termos dá 2.* parte do artigo 32.° da Constituição da República, seja mandado promulgar como lei o projecto de lei n.° 343.—-O Senador, Francisco de Sales Ramos da Costa. . Para a Secretaria* .
Ofício •
Do juiz sindicante aos Transportes Ma--rítimos do Estado, pedindo autorização; para depor como testemunha o Sr. Pro-cópio de Freitas. •- Autorizado. . •
Dê-se conhecimento ao interessado. ' '
Projectos de lei
Do Sr. Costa Júmor, - colocando no serviço activo do exército o tenente José Dias de Carvalho, " * ' • '
Para a 2.a secção.
.- - , ' • ,/*> ••'.' \
Do Sr. Procópio de Freitas; reintegrando na armada e imediatamente transferindo para a guarda republicana b cidadão Miguel Fernandes. _ .
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Sesaãp de 4 de^Março de 1920
.. Representação
Da Liga dos Oficiais da Marinha Mercante Portuguesa, pedindo' a inadiável alteração .ao chamado -Acto de Navegação.
'Para a l.a Secção' • •=" '•
Untes dai ordem do dia
O Sr. Júlio Ribeiro : — Sr. Presidente: há na Guarda uma casa do beneficência, o Asilo da Infância Desvalida, que es'tá niima situação , verdadeiramente aflitiva.
Aquelas crianças, órfãos de pais e da sorte, não têm actualmente os recursos indispensáveis à sua sustentação. E isto devido ao Governo não lhes ter dado o subsídio que está orçado e que -lhes pertence.
É um pavor o que se passa naquela casa de beneficência.
Sr. Presidente: é absolutamente necessário acudir àquele asilo. À direcção, formada de homens de grande generosidade e erguido coração, já fez sciehte a autoridade do que se passa aí de horrível, declarando que ou lhe é entregue o dinheiro a que tem direito, e quê está orçado, ou que terá de fechar as portas e entregar as crianças às famílias, e à.s autòri-, dades aquelas que. não a tiverèni.
Eu peço a V. Ex.a, Sr. Presidente, para transmitir aos Srs^Mínistros do Trabalho e das Finanças a situação aflitiva em que se encontra este asilo a fim de sé çoder evitar a catásfrpfe que sé avizinha e' que é pára lamentar.' , '. . - ' -
Disse.' "" '' . ' '.'„'."'. . : ....
O Sr. Presidente: •=— Transmitirei.. aos Srs. Ministros do Trabalho e -Finanças as considerações de V. Ex,* , , ^. '.".-._ .. ...',, ^
,Frires«e:-T^^:maír nnguém inscrito para: antes d& > .ordem do ; * dia, vai passar:-s,e. à. .-.,[, •-..,. • .^
' '
O Sr. resi
O Sr. Presidenter^-.Está eiti; discussão na generalidade e^
" Ê' o : seguinte .v ... *.:..:»../ ^ • :
.;!.,-, • Projecto Ae^ei. n.°: 802 ,. . ""'
: Artigo,!.?, São áutoriziãdas as. Câmaras Municipais.:de .Lam.ego, Resende, Sinfães, Castro Daire -é;..Tarojica -.à - vender em hasta pública,; independentemente .do preceituado .mas leis. de .desamortização, os baldios sitos ^iios respectivos; concelhos que puderem ser dispensados do logradouro comum. . , ;•- . . .
Art. 2.° Fica- revogada a legislação. em-contrário. -: . - . .
Salaj das Sessões do Senado, 16.de.Jar -neiro dê 1925. -r- António da Costa* Godi-nho do Amaral. -\. ••••
Artigo 1.° São autorizadas as Câmaras Municipais de Lamego, Resende, Sinfães, Castro Daire, Tarouca, Paços de:Ferrei-rã- e Marco de. Canaveses a vender em hasta pública,, independentemente, do preceituado nas leis • dê desamortização, os baldios : sitos . nos respectivos concelhos que puderem ser .dispensados, do logradouro comum. ..-••• ...
Art. 2.° Fica revogada a .legislação em. contrário. . ••'•••:.••' .
.Sala das Sessões;da 2.a Secção do Senado, 22 de Janeiro de 1925. —f) Presidente, António Xavier. Correia Barreto — : O Secretário,. António da-.. Costa Godinhó. do Amaral. ••••. j • , . .
Q Sr. Procópio de Freitas>v^-r Sr. Presidente: já há tempos foi discutido nesta Câmará'um .projecto.: idêntico,. a,.êste, , e eu manifestei' a minha: opinião desfavorável a •
êiev -.^-5.--, , :, ••-; ••>.-•.;•-.' -e: • - .
Lembra-me bem que na discussão inter- -; veio até o nosso colega Sr.\ Lima Alves, dizendo que os baldios apenas poderiam prodtíçHv algumar!;c9usá pa;;pfimeira~ cultura, f .vi:stJOfrteremLfumaf;pe,quen.a altura; de}
'
.
Mas,. *n ao , é , por-j este • :mçítÍK o , que não:. concordo *íQni •; ] a : ; iY.enda, , , ó ,-. pocque esses-baldios r«ãáj inuito;.'.útei& a(5s,pí)brç8j: que se/servem. d.êles>,para apascéiita.ção de ga^ , dossiê \para obtereràvlenha Inão só •$ara*a-. cozinha, como para o seu aquecimento no, inverno.! '-.ir;í ,'.v"7..n. -;ar: o v?.:-- • •;•.'""
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Diário das Sessões do Senado
O Sr. Domingos Frias de Sampaio e ílelo :—Sr. Presidente: o projecto do lei, da iniciativa do ilustre Senador Godiriho do Amaral, que V. Ex.a acaba de pôr em discussão, tem por fim autorizar certas câmaras municipais do distrito de Viseu a venderem os terrenos baldios dispensáveis do logradouro comum, independentemente das leis de desamortização.
Vem esse projecto já aprovado da 2.a Secção e acrescido de outros municípios do distrito do Porto, aos quais se entendeu que devia tornar-se extensiva a mesma regalia.
Creio bem que se uma elasticidade maior fosse proposta para semelhar.te medida, ela receberia de igual sorte um favorável acolhimento, pois que o Senado, agindo sempre sobre ò influxo de uma igualdade bem entendida, não quereria de certo distinguir com situações privilegiadas alguns municípios do País.
Por isso, Sr. Presidente, sem me pronunciar neste momento sobre a conveniência da autorização constante do projecto que a 2.a Secção aprovou com a ponderação que ó habitual, limito-me a mandar para a Mesa uma proposta tendente a tornar extensiva essa autorização c. todas as camarás municipais do continente e ilhas, com base naquele preceito que manda que onde há a mesma razão devo haver a mesma disposição legal.
É lida e admitida.
É a seguinte:
Proponho que a autorização contida no artigo 1.° do projecto seja extensiva a todas as câmaras municipais do continente e ilhas.—Domingos Frias.
Para a 2." Secção.
O Sr. D. Tomás de Vilhena: — Sr. Presidente: como tenho um bocadinho de experiência destas cousas, continuo a insistir e a não me conformar com estas autorizações às câmaras municipais (Apoiados) para venderem baldios. É um facto mais que sabido que o que tinha algum valor já há muito tempo voou Deus sabe para onde.
Tirar os baldios aos povos, baldios que são o sen natural desafogo, on Apoiados. Eu, Sr. Presidente, quando fui governador civil de Braga, tive muitas vezes ocasião de evitar vendas de baldios. Mas tem passado muito tempo depois disso e eu sei que algumas parcelas de terreno com importância foram vendidas, como em português se costuma dizer, por «dez réis de mel coado». Alguma cousa que existe é preciso conservá-la para logradouro dos povos. E aqui está como eu, apesar de ser tido como um conservador ferrenho, estou sempre ao lado dos povos naquilo que é justo. Tenho dito. O orador não reviu. O Sr. Godinho de Amaral:—É para dizer aV.Ex.3 que concordo com a emenda mandada para a Mesa pelo Sr. Domingos Frias. Mas tenho de responder ao Sr. D. To-m\s de Vilhena para dizer a S. Ex.a que já o Código Administrativo estabelece que as câmaras niuuicipais podem vender os baldios, em certas condições. No emtanto, as câmaras municipais não podem cumprir as disposições estritas do artigo 183.° o seguintes do Código Administrativo e do vários decretos, em que se estabelece qno tinha de ser criada uma comissão para indicar os baldios que podem ser vendidos. Ato hoje essa comissão não funcionou e portanto não se pôde ainda fazer um cadastro dos mesmos baldios. Ora, como há várias formalidades que não podem ser cumpridas, é por isso quo têm sido apres Biitados sobre o assunto vários projectos de lei, entre os quais este que está agora em discussão. Tenho dito. O orador não reviu. Ò Sr. Presidente:—Êste: projecto de lei tem de baixar à secção. . Como nenhum dos projectos dados para ordem do dia pode ser discutido, uns, por não estarem presentes os seus autores, outros por necessitarem da presença dos Srs. Ministros,, dou a palavra ao Sr. Joaquim Crisóstomo, para continuar as suas considerações sobre a declaração ministerial.
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ticos, o Governo assenta na. força que lhe promana ou advém do bloco.
Tivo o cuidado de ir. ao dicionário ver o que é um bloco: é um corpo sólido e consistente, que não se desagrega com facilidade. ^E que. consistência;tem este bloco? É constituído por forças, por elementos do Partido Democrático, pelos alvaristas e pelos independentes. Nunca pude compreender a situição do Sr. Álvaro de Castro dentro do bloco. Ontem, o Sr. Álvaro de Castro pertencia ao Partido Democrático e como naturalmente não concordou com os processos políticos desse partido, afastou-se para formar um grupo aparte. A breve trecho, nós vemos novamente o Sr. Álvaro de Castro unificado no bloco com o Partido Democrático. Mas há um outro elemento desse bloco, os independentes. Esse faliu positivamente,, desapareceu como elemento constituinte do bloco. Um bloco desta natureza, formado por alvaristas, na sua maioria dissidentes do Partido Democrático, sem elementos independentes, porque os poucos de valor que havia, como o Sr. Fausto de Figueiredo, renunciaram, e outros como os Srs. Agatão Lança e Torres Garcia, filiaram--se no Partido Democrático, e ainda outros como o Sr. António da Fonseca, estão representando o país no estrangeiro, o que demonstra que os independentes não dispõem'de nenhuma força, tanto que não têm nenhum representante no Governo, com o que eu muito folgo, não pode ser considerado como bloco. Ora se nós fizermos um confronto entre o actual Governo e o Governo presidido pelo Sr. Rodrigues Gaspar, vemos que há uma manifesta incoerência política por parte de grande número dos homens que hoje compõem este Governo. O Sr. Rodrigues Gaspar que representa no Partido . Democrático a corrente das direitas..... . . : . ; - • O Sr. Júlio Ribeiro (interrompendo):— No meu partido não há correntes, há um só programa. O Orador:— Seja como for, o Sr. Rodrigues Gaspar organizou • um Governo conservador dentro do Partido Democrático e dele fizeram parte como Ministro dos Negócios Estrangeiros p Sr. Vitòrino Godiaho, como Ministro do Trabalho o Sr. Xavier da Silva, e como Ministro da Guerra o Sr. Vieira da Rocha; e agora, sendo Presidente de Ministério o Sr. Vitòrino Guimarães, que representa a parte esquerdista desse mesmo Partido, lá estão outra vez como Ministros esses mesmos senhores, o que é incoerência personificada. É preciso liaver coerência,' ó necessário que os políticos categorizados mantenham uma linha de conduta firme. Assim, Sr. Presidente, não podemos fár zer um juízo aproximado do que sejam os princípios ou a orientação de qualquer desses políticos. Tenho lido na imprensa noticiosa que o Sr. Presidente do Ministério se propõe seguir as ideas do Governo passado. Por mais que cogite, não descubro nenhuma idea do Governo que caiu. A sua'obra foi, como todo o. país sabe, absolutamente violenta, arbitrária e despótica ; dela não resultaram nenhumas vantagens para o país. Um Governo que não manifestou nenhum propósito de afirmar a sua orientação acentuadamente nacional, Se se quere afirmar que se perfilha como boa a reforma do regime bancário ou a dissolução da Associação Comercial, francamente não felicito o'Governo por isso. •• . . Era preferível que o Sr. Vitòrino Guimarães declarasse que ia estudar com toda .a atenção os problemas pendentes, e que procuraria solucioná-los dentro dos altos interesses do país, do que declarar que perfilha a obra do Governo passado, que foi uma obra atrabiliária. . .
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tendo a obra de um Governo que saiu sem que tivesse a seu lado a parte serena e pensante do país, a parte valiosa da opinião pública.
Nunca vi, Sr. Presidente, um Governo fazer tantos despautérios em tam pouco tempo.
Ainda hoje vi publicada no Diário de Noticias uma nota oficiosa da administração do Porto de Lisboa, em que se acusa um Ministro do Governo passado de haver demitido, sem processo, os administradores dessa instituição, entre os quais figura um dos mais distintos nomes do Partido Democrático, o Sr. Rodrigues Gaspar.
Abusando das suas atribuições, também o Sr. Ministro das Colónias se permitiu autorizar uma larga emissão de obrigações em Angola.
Quere dizer: acumulam-se os erros, os abusos e as prepotências desse Governo. Assim, não parece legítimo nem regular que uma mentalidade da categoria da do Sr. Vitorino Guimarães venha declarar publicamente que perfilha as ideas dum Governo que, desrespeitando a lei e violando a Constituição, se permitiu ultrajar direitos sacratíssimos e investir contra a consciência nacional.
O Sr. Ministro da Guerra, ontem, quando eu fazia uso da palavra e afirmava que a causa principal que determinou a queda do Governo do Sr. José Do-mingues dos Santos fora uma manifestação ostensiva da Guarda Kepublicana, declarou que essa afirmação era menos exacta. Eu quero documentar o que disse, para que se não suponha que venho para aqui fazer afirmações sem elementos, sem provas.
Numa local do Diário de Noticias do dia 11 do mês findo diz-se o que eu aqui afirmei.
É verdadeira essa notícia? Não sei. Como não son o comandante da Guarda Kepublicana, não posso responder. Agora, O que não compreendo é que um jornal da categoria do Diário de Noticias, que se não é o de maior ó pelo menos dos de maior tiragem, se permitisse trazer a público uma notícia desta gravidade sem qae ela lhe tivesse sido transmitida por pessoa competente e de categoria, que assumisse a responsabilidade, quando ela lhe fosse exigida.
Houve naturalmente alguém, com categoria superior na Guarda Republicana, qc.e transmitiu esta notícia ao referido jornal, sem o que ele não a teria publicado. Mas se ela não era verdadeira, o dever do Sr. comandante da Guarda Republicana, que certamente dela tomou conhecimento, era imediatamente desmenti-la.
Os homens públicos não têm obrigação de andar todos os dias pelos jornais a íazer desmentidos; mas há acusações de tal gravidade que não podem passar despercebidas. Se o jornal se recusasse a fazer a rectificação, então demonstrava-se que havia procedido de má f é e o caminho a seguir era recorrer aos tribunais, para o que lá está a lei de imprensa. A propósito de lei de imprensa, devo também expor a minha opinião. A República Portuguesa vive hoje numa situação muito melindrosa pnrante a imprensa. Os órgãos de grande circulação, como sejam o Século, o Diário de Noticias, a Época, o Correio da Manhã e tantos outros, estão enfeudados ou a partidos que são inimigos da República, ou a entidades que acentuadamente a hostilizam, quando 6 certo que a imprensa deve ser considerada o quarto poder do Estado. Foi pela imprensa que as ideas liberais se propagaram.
A República Portuguesa acha-se neste momento numa situação bastante difícil para com a imprensa. Não serei eu quem irá defender um projecto no sentido de ser votada uma verba para a imprensa, quo alvitre a idea de o Estado ter um órgão oficioso para o defender; mas o que desejo é chamar a atenção do Governo para este assunto, que me parece de capital importância. Nós sabemos que a opinião simplista se deixa envenenar pelas notícias perniciosas dadas pela imprensa, com manifesta má fé, e que as consequências devem ser muito desastrosas para a República e para o País. Este assunto não deve ser abandonado por completo, como o está sendo. É necessário que se pense, dois minutos nele.
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com o banco, como fez Augusto Fuschini' em 1893 com a Companhia dós Caminhos de Ferro, encaminhar as cousas noutro' sentido, de forma a melhor zelar os seus interesses, relembro a opinião dum ilustre publicista, que. tem aplicação ao caso, embora fosse escrita muito anteriormente à publicação .do decreto n.° 10:974, à dissolução da Associação Comercial e tantas outras medidas atrabiliárias do Governo do Sr. Josó~-Dommgues dos Santos. O que esse publicista escreveu ó perfeitamente o quadro que nós presentemente atravessamos, quando atinai uma das funções do Estado deveria ser orientar a imprensa tanto quanto pudesse. •
Eu estou convencido de que a Câmara ignora unia local publicada ontem no Século, em que se dizem verdadeiras inconveniências dos parlamentares, como a de que aos Srs. Deputados e Senadores devia ser colocada unia rolha na boca para não dizerem asneiras. Quando a imprensa "diz isto impunemente dos representantes da Nação, Para este ponto chamava a atenção do Sr. Presidente do Ministério, pois que, sendo S. Ex.a um bom republicano, compete-lhe estudar este assunto pela melhor forma. Embora não .considere como constitucional a chamada ao Poder do Sr. Vito-rino Guimarães, nem por isso deixo de respeitar S. Ex.a e todos os seus ilustres colegas do Governo e de os considerar como tal no exercício das osuas funções. O que não posso de forma nenhuma é aceitar inconveniências da natureza daqueles que ou, com profunda mágoa, vi publicadas num dos jornais principais do País, O Século. E digo com profunda mágoa, porque este jornal já tem prestado relevantes serviços à Kepública. Sr. Presidente : empregou o • Estado alguns milhares ds contos em acções de bancos, não com o •propósito,: que seria de louvar, de compartilhar dos lucros, pois se o banco dá lucros aos accionistas era razoável que o Estado deles também aproveitasse, mas para lhe permitir tomar parte directa nas suas administrações. São inúmeras, Sr. Presidente, as irrer- guláridades pratiéadas nó 'domínio do Governo anterior/ ••••••• _•- Relatam os jornais —•- e ó bom que' ó Governo tome conhecimento disso e lhe dê remédio se ainda for tempo,— que tendo sido nomeado um determinado engenheiro, ou dois mesmo j para irem representar Portugal numa conferência em Londres, o anterior Ministro do Comércio, Sr. Pires Monteiro, sé havia recusado a autorizar a .despesa precisa para que esses engenheiros "seguissem aquele destino. Todavia, apesar dessa recusa, muito justa, muito legítima^e aceitável em presença das circunstâncias desgraçadas do nosso Tesouro, ó Ministro do Comércio do Governo passado, Sr. Plínio Silva, concedeu á verba, que é de 8 libras por dia, dizendo os' jornais que passados poucos dias a Associação dos Engenheiros se deu pressa a admiti-lo como seu sócio, o que até ali não quisera fazer. Sr. Presidente: mais de. uma vez tenho ouvido falar do apoio do bloco. Ora, não pode haver maior divergência de critério e de opinião do que a que existe dentro do bloco. Basta ver o que sucedeu no ano de 1924 em matéria de escolas primárias superiores. O Sr. António Sérgio suprimiu-as ; o Sr. Helder Ribeiro restaurou aquelas que funcionavam nas capitais de distrito; o Sr. Abranches Ferrão reorganizou-as, e o Sr. Sousa Júnior restaurou-as todas. Quere dizer: num ano. legislou-se nesta matéria quatro vezes sob aspectos diferentes: • Na matéria de escolas industriais deu--se aproximadamente o mesmo. O Sr. Nuno Simões criou -várias escolas, ,0 Sr. Pires Monteiro'foi-lhe no encalço, seguiu--Ihe as pisadas, mantendo não só as criadas, mas criando ainda outras. Pois o Sr. Plínio Silva, de acordo com o Sr. Sousa Júnior, extinguiu a maior parte delas. Nesta questão das escolas industriais devo dizer que discordo de "tudo quanto se tem feito, pois raros são os Ministros que se têm dado ao cuidado de ler qualquer coútfa. sobre esta matéria, a não ser sob o aspecto técnico, não se preocupando com o aspecto jurídico.
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reorganizando em todo o país as escolas industriais, e num artigo preceituava que o Governo ficava autorizado a criar escolas industriais sempre que houvesse verba no orçamento para tal fim. Pois, Sr. Presidente, à sombra deste preceito têm sido criadas e continuam a criar-se dezenas de escolas.
Mesmo que se queira reconhecer lega-lidade à legislação sidonista. o que é certo é que, pelo decreto a que acabo do referir-me, se fez uso duma autorização que já havia caducado. Demais, ao tempo em que foi publicado esse decreto, já estava reunido o Parlamento, e, conseqiiente-mente, as autorizações tinham caducado e o Supremo Tribunal de Justiça, dando provimento a um recurso interposto pelo Sr. Germano Martins, decidiu que todos os diplomas legislativos emanados do Governo desde a abertura do Parlamento sidonista eram írritos o nulos, e não produziam efeito algum.
Mas, se doutrinàriamente os diversos Ministros do Comércio do bloco têm procedido sem nenhuma orientação, é, todavia, verdade que em matéria de interesse pessoal, em questões puramente pessoais,, essa divergência tem sido muito mais acentuada.
O Sr. NUDO Simões nomeou para director da Escola Industrial da Horta o reitor do liceu da mesma cidade. A seguir o Sr. Pires Monteiro, estudando o assunto e verificando que havia uma lei que proibia os reitores dos liceus de serem directores de qualquer outro estabelecimento de "ensino, anulou essa nomeação e nomeou para o referido cargo um ilustre médico da cidade da Horta.
A breve trecho caiu o Sr. Pires Monteiro e foi substituído nas, suas funções pelo Sr. Plínio Silva, que, apesar de o director dos respectivos serviços lhe dizer que a exonerarão havia sido legal; pondo de parte preconceitos legislativos e o prestígio inerente ao seu cargo de Ministro, para atender a pedidos do pessoas amigas, anulou o despacho referente ao último nomeado e colocou o primeiro.
Apesar de tudo, -essa escola não funciona, sendo para lamentar que se criem escolas com a mesma facilidade com que os rapazes fazem bonecos nas paredes, sem nenhum propósito de prestar um serviço ao país, porquanto aqueles que as
criam sabem de antemão que não têm verba para ocorrer às necessárias despesas.
Pois se o Estado Português se deixa arrastar aos tribunais, se se deixa qualificar de caloteiro, não pagando as míseras rendas das escolas, deixando dezenas de rapazes sem instrução, Esta matéria da falta de pagamento das rendas não devia ser tratada aqui, mas num tribunal especial, em que os homens, públicos fossem chamados à responsabilidade, e é pena que as minhas palavras soem agora e daqui a cinco minutos já ninguém pense nelas. Muitos não chegam mesmo a prestar atenção ao que eu digo. Eu ouço falar todos os dias em respon-sabilidades para os bombistas, para a Legião Vermelha, para os que atentam contra a vida dos Presidentes da República, etc. Há tempo fui procurado por um rapaz que saiu do exército por haver terminado o tempo. Era um antigo aluno da Casa Pia. Não me conhecia .senão por ler o meu nome nos jornais. Pediu o meu auxílio para de qualquer forma'se empregar, por isso que havia dois meses que não tinha que comer, nem casa para habitar. Trabalho há seis meses para colocar este. rapaz e ainda não o consegui. Vem isto a propósito de criminosos. Este homem, que é estruturalmente honrado, que passa fome, porque come metade daquilo que devia comer, não encontra protecção de espécie alguma. Pede trabalho por toda a parte, a carpinteiros, pedreiros, barbeiros, otc., e encontra sempre fechadas todas as portas. Mas dizia eu que a responsabilidade tem cê vir de cima. Quando se diz aos Governos que castiguem e que promovam, o cumprimento da lei temos de dizer que os Governos olhem primeiro para si.
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nários públicos. Pedi essa lista há cerca de um mês, mas até hoje não ma mandaram, quando o podiam fazer facilmente.
Não vejo o Sr. Ministro da Instrução, mas pouco importa, porque eu pouco efeito espero tirar das minhas palavras. O que noto, porém, é que nas províncias eni' que o ensino é principalmente ministrado nas escolas primárias oficiais, estas escolas têm. mandado de despejo, por falta de, pagamento das instalações, isto quand© há dinheiro a- rodos para outras cousas.
Os instrumentos escolares são conduzidos para vários estabelecimentos e assim dispersos.
A Moagem conseguiu importar trigo quanto quis, deixando de satisfazer o diferencial que correspondo hoje a 8:000 ou 10:000 contos. Se estivéssemos à espera dessa receita para satisfazer qualquer encargo, poderiam penhorar-nos tudo, porque dali não se pode contar nem com um centavo. Não ó só nestes ramos de serviços públicos-que os interesses do Estado estão sendo lesados. Vou contar à Câmara o que se passa •em matéria de aguardente na ilha da Madeira. Foi nesta casa apresentado um projecto que correu os seus trâmites. Os beneméritos da humanidade que entendem <_. que='que' naquela='naquela' de='de' aprovado='aprovado' aguardente='aguardente' horrores='horrores' afirmavam='afirmavam' aumentar='aumentar' fosse='fosse' projecto='projecto' se='se' era='era' um='um' não='não' sofrer='sofrer' género='género' madeira='madeira' primeira='primeira' a='a' necessidade='necessidade' passaria='passaria' ilha.='ilha.' é='é' ilha='ilha' destinado='destinado' esse='esse' p='p' produção='produção' da='da'> Esses beneméritos esforçaram-se o mais que puderam para que esse projecto fosse votado aqui com a maior urgência e-, se não fosse uma proposta apresentada pelo Sr. Artur Costa, ele teria passado na primeira sessão em que se tratou do assunto; mas, em face dessa proposta, o projecto baixou à Secção e a sua aprovação não se efectuou. Quando o projecto voltou à discussão, fui-o apreciando, evitando que fosse votado no primeiro dia e no segundo tam-• bem, ruas no terceiro já não o pude conseguir. A alguns Deputados que junto de mim instaram pela aprovação do projecto, eu disse: — ^ Mas porque é que os senhores não o apresentaram na outra Câmara? Procurei saber a razão e descobri-a. Porque o Senado não tem iniciativa em matéria de impostos; .apenas se votava aqui a autorização e depois, passarfdo o projecto à outra Câmara, dizia-se lá: — Este assunto não tem importância e, se vamos introduzir no projecto um artigo tributário, terá de voltar ao Senado, o que é uma delonga muito prejudicial porque as fábricas estão a abrir. Pois, Sr. Presidente, como ia dizendo, o projecto passou, não se incluindo nenhum preceito respeitante à tributação; e a estação agrária do Funchal vendo que o excesso de produção de aguardente não beneficiava o Estado nas condições em que o devia beneficiar, pois para isso era necessário actmilizar o imposto, dirigiu-se ao Ministro da Agricultura de então, Sr. Joaquim Ribeiro, fazendo-lhe sentir a necessidade da publicação dum diploma antes de começar o fabrico da aguardente. Mas há mais, Sr. Presidente.
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essas fábricas e fez levantar a uma o competente auto, perante algumas testemunhas.
O proprietário foi intimado a pagar a respectiva multa, isto além de lhe sor fechada a fábrica por cinco anos.
^Pois sabe V. Ex.:i o que resolveu o tribunal, a quem o caso foi sujeito?
jPara, vergonha de magistratura, anulou o processo e absolveu o réu! Chamo para este caso a atenção do Sr. Ministro da Justiça.
E preciso, portanto, que o Sr. Ministro competente olhe a sério para esta questão da aguardente da Madeira. Se se pagasse o imposto quo se devia pagar, as receitas da estação agrária da Madeira seriam muitíssimo maiores do que são.
Que se providencie, portanto, em tal sentido, apresentando-se ao Parlamento, se tanto for preciso uma proposta de lei salvaguardando os interesses do Estado.
Vou agora referir-me a outro assunto, que se não interessa muito a opinião pública, interessa, no emtanto, ao prestígio do nosso País., perante o estrangeiro. E o caso Yeiga Simões.
Sei que alguns parlamentares têm pedido licença para examinar o respectivo processo, outros tSm pedido cópia de documentos, mas tom-se feito de tal caso um assunto inquisitorialmente fechado.
Isto não se coaduna com os princípios de liberdade e do igualdade, já não direi ^de fraternidade.
Se porventura é preciso colher elementos para que no Parlamento se tratem os diversos assuntos da administração pública, ^porque é que há-de escapar à regra o caso Veiga Simões?
O Sr. Vicente Ramos (interrompendo}:— Devo Informar V. Ex.a que, tendo pedido^ para ver o processo a que V. Ex.a se refere, me foi dito que o poderia ir examinar depois das duas horas da tarde.
O Sr. Procópio de Freitas: — O mesmo se deu comigo.
O Sr. Querubim Guimarães:—Foram felizes...
O Orador: — Parece que há uma diversidade de procedimento entre o quo só
deu com o Sr. Vicente Ramos e o que se passou com o Sr. Querubim Guimarães» Mas seja como for, não me proponho intervir no assunto directamente, nem examinar os respectivos documentos. s O que me não posso ó privar do direito de estranhar quo o Sr. Veiga Simões ainda não tenha sido julgado.
O Sr. Querubim Guimarães : — Segundo se tein dite nos jornais, o processo foi arquiva io em testamento pelo Sr. João de Barres...
O Sr. Júlio Ribeiro :—Então é caso arrumado.
O Orador: — Arrumado ou não arrumado, convém que seja esclarecido.
Apoiados.
E o que ó facto-é que alguns funcionários se recusaram a desempenhar as funções de julgadores e que o Ministro nomeou três directores para darem o seu parecer.
Esse parecer foi conservado secreto* durante muito tempo c corre à última hora quo o processo está arquivado.
Há dois julgamentos: um, o dos tribunais, outro o da opinião pública. Não sei qual destes ó o mais importante.
Os tribunais podem pôr na rua um in.-divíduo, acusado de ter sido incendiário-ou assassino, mas 6sse indivíduo pode ter a condenação da opinião pública. E também podo acontecer o contrário . . .
Não quero que as minhas píilavras sejam semente lançada à terra, apenas desejo que o Sr. Ministro, por cuja pasta corre este assunto, se apresso na devida oportunidade a dar conhecimento dele ao Senado—estou convencido de quoS. Ex.ao> fará — dando-se publicidade aos documentos respectivos, para quo o interessado possa ter consideração pública, se for um inocente, e ter a condenação que lhe cabe> se for um delinquente.
Em matéria de relações externas promete-nos o Governo muito.
Já estou habituado a promess-as e sempre tenho ouvido dizer que, politicamente, quem mais promete mais falta.
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vivendi com o Brasil, com a França e com todos os outros países.
E, sob este ponto de vista, permita-me V. Ex.a, Sr. Presidente, salientar o que disse aqui mais de uma vez ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Domingos Pereira, a' quem acusei, de não dar um passo para a frente.
,;E, Sr. Presidente, quais as consequências, da morosidade com que assuntos, •desta ordem se tratam?
E o País estar a sofrer.com tudo isto.
As negociações com a França foram-se demorando o dificultando e só agora, à última hora, é que só deu pressa em resolver o assunto, precisamente no momento •mais importante para a sua solução. Estou absolutamente convencido e creio que não estou em erro dizendo que o modus vivendi ainda não será assinado por todo •o ano de 1925.
Já em França os vinhateiros não só •contentam com a legislação alfandegária, querem que seja elevado o imposto sobre os vinhos de pasto e licorosos. Ainda há pouco tempo falei a esto respeito com o Sr. Augusto de Vasconcelos, que havia pouco antes regressado de França, o qual me disse que, tendo trocado impressões com o Ministro do Comércio , francês c com outras entidades interessadas no assunto, estes lhe afirmaram que o modus vivendi era facílimo de conseguir.
Por consequência, estou convencido de -que se S. Ex.a em voz de^r representar •Portugal na Conferência da Paz, simplesmente para nos dar conhecimento do que se -passa lá fora—quando o que nós precisamos é de conhecer o que se passa cá em casa — tivesse sido encarregado pêlo •Governo de negociar Q modus vivendi com a França, este assunto já estaria a estas •horas resolvido a contento de todos.
Este problema é da mais alta importância para o País e não se compadece com pequeninas cousas. Em Portugal •segue-se neste assunto o mesmo critério que têm as crianças, isto é, não nos im--portamos de ser prejudicados, desde que vejamos os outros igualmente prejudicados.
Sr. Presidente: vou agora chamar a atenção do Sr. Ministro da Marinha para •um escândalo "que se passa no seu Ministério, onde há um organismD para .dar «que fazer a" .muitos oficiais de marinha.
A falta -de navios para comandar, estão empregados numa comissão chamada de pescarias.
Ora essa comissão é o que se chama um poder dentro do Estado. Compartilha perfeitamente desses excessos da burocracia portuguesa, em que o Ministro não pode dar um passo, como' se fosse um ce-guinho, sem que seja pela mão dos respectivos-chefes de repartição.
.Este abuso está sendo cometido por muitos funcionários públicos.
Sem desejar ser desagradável para quem quer que se senta naquelas cadeiras, direi que os Srs. Ministros não são uns técnicos das suas pastas.
Assim, o Sr. Ministro do Trabalho-não pode ter conhecimento da legislação do seu Ministério; seria preciso que S. Ex.a possuísse uni longo tirocínio nas várias categorias e serviços desse Ministério, como aconteceu com Elvino de Brito, que foi de amanuense até Ministro.
Assim, aparece-lhe um processo para despacho e, se nele não puser o «concordo» ou «não concordo», o Ministro não caminha, c os processos acumulam-se.
Os funcionários julgam-se com qualidades que não têm, e até põem em dúvida a nossa competência para legislar.
A comissão de pescarias não viu com bons olhos uma lei aprovada no Parlamento cm 1924, sobre o uso do canhão na pesca da baleia.
Mas como essa comissão não tinha votos no Parlamento e, portanto, não podia fazer obstrucionismo, nem podia, é clara, evitar que a lei fosse publicada no Diário do Governo, resolveu não cumprir a lei. E disse: o Parlamento autoriza o uso do canhão na pesca da baleia, mas nós cá estamos para, quando nos vierem solicitar a licença, lha recusarmos.
A comissão de pescarias, não sei se é urna secção da Sociedade Protectora dos Animais, constituída pelos tais técnicos que naturalmente nunca viram pescar uma baleia, e se fazem idea do que ela seja é por a terem visto pintada. Entende que a baleia não pode ser pescada nos Açores senã.o com o arpão, embora ela seja pes-cacla em quási todos os países do mundo com o auxílio do canhão.
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E claro ^que a indústria da pesca da baleia está muito adiantada nos outros países, mas não é a pesca costeira, é a do alto mar.
No alto mar a indústria exerce-se em vapores de 2:000, 3:000 toneladas e além desses em embarcações de 500 ou 600 toneladas que têm montado à proa um pequeno canhão.
Mas porque nós não-podemos montar nas costas dos Açores, devido à falta de portos próprios e à agitação do mar, um serviço de pesca da baleia igual ao que os noruegueses e suecos têm, a comissão de pescarias não consente que se substitua pelo canhão o arpão.
Se eles vissem o que se faz lá fora, miidavam de opinião, isto sem querer melindrar com as minhas considerações essa comissão. Estas considerações são filhas apenas da mágoa que eu sinto por ver como se tratam estes assunlos.
Tenho um relatório em que se diz que se podiam montar de melhor modo os processos de aproveitamento das baleias. Assim, em vez de se fazer a destilação por processos antigos, podiamos, pó? exemplo, aproveitar os torresmos, que são deitados ao mar, e fazer uma fabrica de adubos químicos, dos mais aproveitáveis para as terras dos Açores.
E de esperar que o Sr. Ministro tome na devida atenção as minhas reclamações, porque o assunto precisa de resoluções imediatas; e eu, sem lisonja para o Sr. Ministro da Marinha, estou absolutamente convencido de que as minhas palavras serão ouvidas por S. Ex.a
Eu sou um descrente nos homens, mas acredito no Destino Superior, forte, que nos há-de impelir para uma finalidade segura; e se não acredito nos homens em geral, acredito no Sr. Ministro da Marinha em particular.
Vou agora chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para o seguinte:
Existem tribunais judiciais para julgar as execuções por falta de pagamento à Fazenda Nacional. Eu não desejo ser desagradável ao tribunal da l.a instância das execuções fiscais; mas custa-me que num País pobre, onde foram abolidas as prerrogativas reais e as imunidades, onde vivemos democraticamente, ganhando hoje o pão de amanhã, haja funcionários que estão auferindo ganhos inclassificáveis.
Há funcionários que auferem vencimentos superiores ao seu trabalho, como por exemplo os funcionários das Execuções Fiscais da l.a Instância de Lisboa; só no último semestre entraram nos cofres públicos cerca de 500.000$ destinados a esses funcionários, o que daria uma percentagem para o juiz de cerca de 50 contos e de 30 contos para o delegado. Quere dizer, um juiz além do sou vencimento, recebia mais cerca de 5 contos mensais, o que vai mnito. além das possibilidades do Estado,' para remunerar os seus funcionários.
E necessário que o Sr. Ministro possua uma nota das quantias que receberam esses funcionários; e, se não há lei que limite os vencimentos, então S. Ex.a estude a questão e traga-a ao Parlamento, para que não se diga que dentro duma EepúblicÊ. democrática há funcionários que recebem vencimentos mensais que davam para sustentar uma dúzia de trabalhadores.
Este assunto deve ser encarado com cuidado, especialmente pelo Sr. Ministro das Finanças que ó um zeloso defensor dos interesses do Estado.
Se esse dinheiro fosse para distribuir eficazmente, eu não levantaria aqui a minha voz, chamando a sua atenção para o assunto, mas desde que esse dinheiro vai ser canalizado para uma entidade, ainda que ela fosse meu irmão ou meu pai, eu não deixaria de protestar e pedir medidas num sentido em que o Estado não ficasse prejudicado.
Não discuto, não é com isso que se combate o déficit, mas é das pequenas quantias juntas que se fazem as grandes e avultadas fortunas. Por hoje, resolvi ficar por aqui para não cansar mais a atenção da Câmara nem íatigar os ilustres Ministros, que bem precisam descansar e aproveitar o tempo na solução dos magnos problemas das suas respectivas pastas. Vejo na presidência de Ministério o Sr. Vitorino Guimarães.
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o passo, aceitemos os factos tais quais eles são.
Eu, como amigo e como admirador de S. Ex.a, direi que não prevejo um longo futuro ou uma larga vida ministerial a S. Exra
E pela seguinte razão: em 1916, o Sr. Mesquita Carvalho pôs o dilema «ou dissolução ou revoluçcio»; eu hoje substituirei esse dilema pelo seguinte: «solidariedade republicana —entre parêntesis— demo-, cracia ou ditadura reaccionária, forças vivas em-acção».
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. José Pontes:—Sr. Presidente: vou tratar de assuntos de política geral, a muitos dos quais já rn,e tenho referido desta cadeira.
A minha política é muito construtiva, muito nacional; e como toda a Câmara, por uma gentileza que eu muito agradeço, e pela gentileza dos leaders, me permite que nos dias de apresentação dos Governos, eu exponha os meus pontos de vista, vou- continuar a fazer, desta cadeira, mais propaganda, a dizer o que penso sobre os problemas que constituem a minha exteriorização profissional.
Assim, essa minha política diz respeito à assistência aos humildes e aos inválidos, ao aformoseamento, físico à assistência aos inválidos.
Sr. Presidente : votou esta Câmara algumas leis que dizem respeito à pasta do Trabalho, à assistência aos inválidos da guerra.
Entendo que devemos trabalhar na guerra, nas obras de reeducação.
V. Ex.% Sr. Presidente, como um dos chefes do exército, deve sentir-se como eu, magoado por essa obra de reeducação, que se fez em tempo de guerra, não prosseguir.
E essa obra foi bela e grandiosa.
O Hospital de Arroios, que por uma lei foi entregue aos hospitais civis, ainda não está na posse destes, por faltar uma regulamentação.
Por contingências da 'vida, íui atirado para uma linda praia do norte.
E eu vi que esses homens que vão para o mar em frágeis batéis, no trabalho duro da luta com o oceano, afrontando a morte; não têm a assistência da terra portuguesa.
Nesse rincão lindo do Minho, que se chama a Póvoa de Varzim, vejo os marítimos de cara tostada, sofrendo constan-temente> as intempéries, - lutando com o mar, sem terem uma enseada para se abrigarem.
Um dia, um homem que é hoje Ministro da Marinha, a instâncias minhas, e levado pelo seu bondoso coração, foi à Póvoa e verificou a necessidade urgente de acudir a esses homens, conseguindo junta do Sr. Ministro do Comércio, para esse fim, 100 contos que para pouco chegaram.
Para o coração do Sr. Ministro da Marinha, e para o Sr. Pereira de Lima, que é um bom português, apelo para que justifiquem esses 100 contos, que se destinam a uma obra de economia, porque è preciso que esses homens, modestos trabalhadores do mar, criem alentos,- e que não digam que aqueles que falam a sua língua os abandonam.
E é por isso, Sr. Presidente, que eu estou contente por ver que nessas cadeiras estão sentados bons amigos, bons corações de portugueses.
E já que falei dos humildes, ó preciso-também falar dos válidos. E dirijo-me ao Sr. Ministro da Instrução, meu colega, um bom amigo, que também se preocupa com estes problemas. Ombros fortes, a obra forte, corações magníficos, façamos do nosso povo um povo forte, uma falange fortíssima de gente portuguesa. E preciso que o problema da educação física seja visto com olhos de ver pelos homens do Governo, como uma necessidade imperiosa.
E preciso que este problema, pelo qual já alguma cousa se tem feito, continue a ser, estudado com carinho.
E preciso que viva na alma de todos a necessidade de valorizar o homem português para que ele possa ser herdeiro do grande nome que% fez grande a terra que ó de todos nós.
É preciso que o homem português mc-todize a sua energia, que faça forte o seu organismo, para que amanhã, são de corpo e são de alma, possa resistir a todas as dificuldades, e não lamuriar constante-mente que Portugal vai decrescendo.
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porquo não tem uin físico são. E preciso que neste país haja sol, .alegria e felicidade cm toaa a parte, e que não estejamos aqui a discutir ninharias. Abaixo esta maneira de ver! '
E preciso que acordemos energias. Por isso estou contente de ver nas cadeiras do Poder alguém que olhe para os inválidos.
L necessário que se veja que aqueles homens não estão ali simplesmente para levar pancada.
E preciso que lhes dêmos a nossa amizade, o se desmerecerem da nossa confiança os declaremos maus portugueses.
Mas se ôles quiserem efectivar qualquer, obra de fomento não queiramos que nos digam que os parlamentares são simplesmente homens que criticam e não ajudam ninguém.
Ma! vai aos nossos corações de portugueses, sentimentais e bons, que se critique uma obra que B ao está ainda feita. Vejo ali, naquelas cadeiras, amigos, e eu não quero desmerecer da amizade deles. como não quero que desmereçam da confiança que tenho neles.
O Sr. Presidente do Ministério é um homem são e o mais honesto que entre homens públicos tenho visto. Dele há muito que esperar.
Devemos, pois, não regatear elogios àqueles que se apresentam cheios de boas •intenções.
Pelo Ministério do Trabalho há muito que fozer. Há pouco disse eu que cometemos um crime não tendo unia escola de reeducação, mas cometemos também um -desacato de termos uma lei que manda criar uma comissão para fazer a revisão das tabelas de invalidez e estarmos a re-^gular-nos pelas francesas.
Por isso mesmo está em dificuldades o Sr. Ministro da Guerra, sobre a resolução do problema dos mutilados da guerra.
A campanha que se faz contra o Parlamento é aciutosa, porquanto o Parlamento tem votado várias medidas sobre os mutilados.
O que é preciso é fazer uma distinção, qual é a de que os mutilados da. guerra estão suficientemente protegidos pelas leis votadas, mas o que não estão suficiente--mente protegidos são os doentes da guerra.
Sou amigo de quási todos os Ministros, mas essa amizade não me cega se por
acaso o Governo não souber cumprir o seu dever.
Sr. Presidente do Ministério, eu saúdo V. Zx.a e, saudando A7". Ex.a, saúdo todos os S3us colegas do Gabinete. E a V. Ex.a, Sr. Presidente do Ministério, que é uma grande alma de português, um homem que se elevou a uma alta posição, um homem que tem feito a sua carreira por concursos em que foi sempre o primeiro classificado, um homem que vem de uma família modesta, mas que é hoje uma grande figura nacional, um homem que é estudioso e que é, sobretudo, uma das pessoas mais sérias que eu tenho encontrado na minha vida, é a V. Ex.a que eu confio o problema do ressurgimento nacional.
Se V. Ex.a está no firme propósito de ler na devida atenção esse assunto, desde já posso afiançar, pela boa e leal camaradagem que sempre encontrei nesta Câmara, que aqui só encontrará V. Ex.a apoio e amizade franca.
O orador não reviu.
O Sr. Ferraz Chaves:—Sr. Presidente:* pedi a palavra quási que para reeditar as considerações que fiz quando da apresentação dos últimos Governos a esta Gamara. A minha situação a isso rne obriga, mas não "quero repetir essas palavras, porque se o fizesse iria causar a atenção do Senado.
Quero dirigir as minhas saudações a todo o Governo e muito especialmente àqueles dos seus membros com quem eu tenho maiores relações de amizade.
Dirijo as minhas saudações ao Sr. Presidente do Ministério e a alguns dos Srs. Ministros que, pela situação especial em que estão para comigo, também exigem que eu os especialize.
Aos Srs. Ministros dos Estrangeiros e da Justiça, meus condiscípulos, c ao Sr. Ministro do Interior, meu velho amigo, eu cumprimento afectuosamente.
Com esta saudação eu não quero excluir qualquer dos outros membros do Governo, porque de cada um do S. Ex.as eu espero ver produzir uma obra benéfica para o País. '
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nhãs considerações, permita-ine V. Ex.a — visto quo não tenho a honra de fazer parte desta Câmara— que dirija à Presidência do Senado e a todos os -seus ilustres membros as minhas mais sinceras e cordiais saudações." Faço-o muito sinceramente o não no cumprimento de. um dever protocolar do cortesia, como da primeira vez que aqui entrei, fazendo parto do Ministério presidido pelo Sr. António Maria da Silva, como Ministro das Finanças.
Dessa vez as minhas saudações foram, na verdade, protocolares, mas foram realmente de tam grande correcção, de tam .decidida estima o carinho as provas que esta Câmara mo quis dar durante o tempo que ocupei essa pasta, que não podia deixar de guardar na minha alma uma verdadeira o sincera gratidão, pela forma como fui tratado.
Sr. Presidente: não quero de maneira nenhuma demorar as considerações quo vou fazer, porque há muitos problemas que reclamam a atenção do Governo, assuntos cloi grande gravidado a resolver e sobre os quais o Governo, essencialmente parlamentarista comove e como tem obrigação do ser, em obediência à- Constituição, não pode apresentar à consideração do Parlamento qualquer proposta de lei, pois quo, se o fizesse sem ter terminado este debate, poderia esse seu acto representar nm desprimor para-uma das Câmaras.
Assim, embora fosse de minha vontade esplanar com certo desenvolvimento determinados assuntos, terei de ser mais sintético do que porventura desejava, para abreviar o debate.
Começando por responder ao primeiro orador que falou nesta Câmara sobre apresentação do Governo, o meu querido correligionário e amigo Sr. Catanho do Meneses, eu direi quo ninguém mais do quo eu lamenta o acontecimento político que se deu, qual foi a da oposição nacionalista abandonar os trabalhos parlamentares.
Sobre este caso, só tenho que reeditar as palavras que proferi na .Câmara dos Deputados, declarando que lastimo profundamente o acto quo só praticou, mas que eu de maneira nenhuma censuro, visto quo apenas tonho que atender a que, existindo dentro' desse agrupamento polí-
ticos republicanos dos mais antigos e dedicados, se esse acto- foi praticado foi porque S. Ex.as entenderam que assim melhor serviam a República, pois não podia ser outra a sua orientação. . Mas, como já disso na outra Câniora e-repito agora, eu lastimo profundamente o-facto o se dependesse da vontade do homem quo hoje preside ao Governo pôr termo a essa situação que —porque não dizê-lo?— causa dificuldadesà normalidade da vida política do País, não seria por mini nem pelos restantes membros do Ministério que o conflito s'e não resolveria com toda. a altivez o dignidade que são-próprias dos homens políticos.
Antes de entrar propriamente na parte concreta do discurso do Sr. Catanho de Meneses, eu não posso deixar, porque gosto sempro do falar com sinceridade, de dirigir as minhas saudações ao Governo anterior e sentir a sua saída das cadeiras do Poder, porque a obra que estava fazendo, nomeadamente a obra económica e financeira, era digna do respeito e do auxílio de todos os parlamentares, porque os seus efeitos seriam de-grande benefício para o País.
E, mesmo se assim não fora, ou não teria declarado, ao assumir o Poder, que nas suas linhas gerais seguiria completa-mente essa política, embora nas modalidades'técnicas várias modificações entenda que. devam ser introduzidas.
Agradeço, Sr. Presidente, em meu nome e no do Governo, ao Sr. Catanho de Meneses, bem como a todos os outros Srs. Senadores, os cumprimentos quo me dirigiram e as palavras de carinho e consideração que para nós tiveram.
Alguns desses cumprimentos seriam apenas protocolares e de cortesia; mas, em grande parte, eles são também verdadeiramente sinceros.
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Falou o Sr. Catanho de Meneses na constitucionalidade deste Governo.
Embora tal caso não seja de molde a ser discutido ou debatido por mini, devo dizer que, se aceitei o honroso encargo que me" confiou o prestigioso cidadão que, para honra do país. hoje presido à República Portuguesa (Apoiados), foi porque convencido estava de que o poderia fazer dentro da Constituição, e eu jamais sairia •dela.
Poucos dias antes tinha havido uma votação importante, tam eloquente que ela marcava a verdadeira orientação política a seguir, o verdadeiro critério económico e financeiro a considerar.
Não estou aqui porque desejasse esta situação; mas os acasos atiraram-me para ela e eu não podia, de maneira nenhuma, recuar diante das responsabilidades que tinha de assumir.
Mas já que estou falando na constim-cionalidade do Governo, quero levantar uma questão de facto, perante o Senado e perante o país.
Depois do constituído o Governo, tive conhecimento de que uma das acusações que se faziam para lhe negar todas as condições de constitucionalidade era a de que ou havia sido encarregado por S. Ex.a o Sr. Presidente da Eepública de formar Ministério antes de terem sido ouvidos os representantes de todos os agrupamentos políticos republicanos. • Tal afirmação é absolutamente destituída de verdade.
Apoiados.
Efectivamente, podia dar-se essa interpretação ao facto de se dizer que o Sr. Presidente da República havia manifestado desejos de que eu fosse encarregado de presidir à nova situação política, antes de Lie ser entregue a opinião do agrupamento de que tenho a honra de fazer parte.
Mas o que se não disso foi que à hora marcada pelo Sr. Presidente da República, para lhe ser presente a opinião do Partido Republicano Português, não pude eu comparecer, nem o Sr. Caíanho de Meneses, ilustre membro da Junta Parlamentar do mesmo partido nesta Câmara.
De facto, o ilustre Chefe de Estado havia-me feito convite e ao Sr. Catanho de Meneses para nos avistarmos com S. Ex.a às 5 horas da tarde.
Mas só próximo dessa hora ó que se conseguiu fazer a relinião do grupo parlamentar do Partido Republicano Português.
E corno seria uma grande descortesia não comparecer à hora marcada, nós ali fomos para nos desobrigar de um dever de cortesia e para dizer a S. Ex.a que aponas comparecíamos para não faltar à entrevista marcada, mas que nada podíamos declarar em nome do nosso partido.
O ilustro Chefe do Estado pediu-nos que, logo que o partido a que pertencíamos tivesse tomado qualquer resolução, lha comunicássemos.
Na ocasião em que saíamos do Paço, esperavam a vez de ser recebidos pelo Sr. Presidente da República os representantes do Partido Nacionalista, os representantes da Acção Republicana e creio que um representante dos parlamentares independentes.
Só próximo das 10 horas da noite, depois da reunião do grupo parlamentar do Partido Republicano Portuguôs, é que novamente eu e o Sr. Catanho de Meneses pudemos voltar a avistar-ncs com b Chefe do Estado e fazer entrega a S. Ex.a das resDluções tomadas por esse partido.
Foi nessa ocasião que S. Ex.a maniies-tou desejos de me encarregar de formar Ministério.
O Sr. Catanho de Meneses:—Y. Ex.a não precisa que eu confirmo as suas palavras.
Todos sabem que elas correspondem à verdade [Apoiados], mas eu não quero deixar de declarar, sob minha palavra de honra, que V. Ex.a tem narrado fielmente os factos que se passaram.
O Orador: — Não aceitei logo tam honroso encargo-; e não o pude aceitar apesar do grande desejo de prestar esse grande serviço ao meu país, porque, fazendo parte de um partido político, não tinha de olhar para os benefícios ou sacrifícios que daí me resultariam, mas tinha de ouvir previamente os meus pares, pois que, se eu quisesse ter uma vida liberta, não me teria filiado num partido político.
Apoiados.
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lucilo; mas como a minha consciência me dizia que não podia .isoladamente ser útil à colectividade-e sobretudo à orientação do agrupamento de que faço parte, é evidente que não podia aceitar tal encargo sem ouvir a opinião do meu partido e só depois dele me ter dado, por assim dizer, essa autorização e a certeza de que encontraria todo o apoio e boa vontade nas démarches que -se seguissem, aceitei.
Entendo que devia fazer estás afirmações, que destroem em grande parte muitas das que se,têm feito, entre as quais a de que o ilustre Chefe do Estado não tinha andado em todos os seus actos com aquela lealdade que é .própria das suas altas funções e de um homem da grandeza moral de'S. Ex.a
Respondendo agora às considerações feitas sobre a declaração ministerial, tenho a dizer ao Sr. Catanho de Meneses, que falou em nome da representação do Partido Republicano Português nesta Câmara, que sei bem quanto me cumpre zelar os interesses do Estado e o crédito do País. Suponho que todos me fazem a justiça de acreditar que ponho sempre o bom nome do País e o crédito do Estado acima de tudo. ' ' —
Já aqui tive ensejo de dizer que, efectivamente, os homens são diferentes nas suas modalidades, mas não me repugna dizer que nas suas linhas gerais, no seu objectivo principal, p Governo nada tem que pôr de parte da orientação financeira anteriormente seguida. • Falou também o ilustre Senador Sr. Catanho de Meneses da função conciliadora que o Governo terá de exercer.
Não tenham dúvidas V. Ex.as e o Senado. Por parte de todo o Governo serão feitos todos os esforços para que efectivamente a conciliação se estabeleça, para que uma maior harmonia haja entre às diversas classes da sociedade portuguesa. Mas ó bom entendê-lo, Sr. Presi^ dente, sem que isso represente, de maneira nenhuma^ transigência do Estado, sem que represente abdicação de princípios, sem que represente menos dignidade, dos homens que ,se sentam nas cadeiras do Poder. E é tam fácil que essa conciliação se estabeleça que me parece não ser necessário chegar aos extremos a que. S. Ex.a se referiu.
Tratem todos de cumprir a lei, tratem de ter o respeito. 'e consideração pelos outros que querem 'para si próprios, que é muito fácil depois estabelecer a desejada conciliação.
Sei que é difícil a situação; não .sei bem quem são os maiores desrespeitado-res da~ lei, tantos são os que procuram achincalhar os que têm nas suas mãos as rédeas do Governo. E portanto bom que nos entendamos e parece que ó fácil en-tendermo-nos. Dentro dos nossos princípios de respeito mútuo não encontrarão outro Governo mais conciliador do que este. Fora deles, o Governo saberá cumprir o seu dever, porque todos os que o compõem, quando assumiram os seus altos lugares, sabiam bem o momento grave que atravessamos e qual a posição que iam tomar. Não queremos a luta, mas se no-la declararem temos do a aceitar, ficando com a nossa consciência tranquila por a culpa não ser nossa.
Sr. Presidente: querendo, como disse, fa^er uma obra de conciliação, não nos move nenhuma má vontade contra qualquer classe.
Achamos que efectivamente é necessário que todas as classes, todos os organismos se unam para que se complete, por assim dizer, o todo qiíe forma a nação. Mas, Sr. Presidente, também é bom não esquecer, e eu gosto de dizer as cousas com toda a clareza, para que bem nos compreendamos, que, acima de tudo, a principal força que domina na sociedade é o trabalho.
Vejo'chamar nos jornais a determinadas classes «forças vivas». Chego mesmo a preguntar a mim próprio se o trabalho é uma força morta.
Apoiados.
É preciso que as classes intituladas", «forças vivas» não se esqueçam de que são classes secundárias. Se amanhã, num ierreno produtivo, pusermos um -homem, na força da vida, completamente abandonado, ele pode "viver ; se no • meio dum deserto pusermos um homem coberto de ouro ele morrerá no fim de poucos dias.
E por isso, Sr. Presidente, que eu tive ocasião de dizer numa declaração que fiz, ao tomar posse do Governo, que a riqueza só por si é improdutiva e que o trabalho sem a riqueza apenas produz menos.
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mara para que se saiba que à frente do Governo está um homem com todos os desejos de auxiliar todas as classes, não podendo de forma alguma esquecer as classes trabalhadoras. Emquanto elas se mantiverem dentro) da ordem e dos bons princípios prestar-lhes hei todo o meu auxílio, todo o meu amparo, todo o meu carinho. Muitas delas atravessam neste momento uma crise bastante grave, cujos efeitos se estão fazendo sentir.
Mas, Sr. Presidente, o meu desejo é que a harmonia se1 estabeleça entre as classes produtoras e trabalhadoras.
Era tam fácil, se muitos não se deixassem dominar pela ganância, reconhecer a imensa justiça que há na grande maioria das reclamações que chegam até nós!
Mas, Sr. Presidente, não deve tremer ninguém com a atitude do Governo, porque o seu principal objectivo ó estabelecer a harmonia, a concórdia nesta sociedade que tam agitada anda, sem que, no fundo, razão haja para essa agitação.
Sr. Presidente: o meu ilustre amigo Sr. Catanho de Meneses teve ocasião de falar, em palavras eloquentes, do ilustra homem de Estado que preside ao Governo Francês — Henriot—e disse que S. Ex.a tinha afirmado há pouco que a palavra «República» encerra «ainda» Esperança.
Sr. Presidente: aceitando este princípio, quero dizer que a palavra «República» não encerra «ainda», encerra sempre Fé e Esperança.
Muitos apoiados da direita.
Não tenho dúvida nenhuma sobre isso, porque se às vezes aparecem dias sombrios é por culpa dos homens; a idea, na sua alta significação, quando seja verdadeiramente orientada, concorre sempre para o progresso e desenvolvimento dos povos.
Sr. Presidente : mais concretamente falou o Sr. Catanho de Meneses na obra de Assistência.
Posso concretizar tudo o que queremos fazer no seguinte: todos os serviços de assistência e protecção às classes desprotegidas merecem toda a nossa atenção.
Procuraremos por todas as maneiras remediar, tanto quanto possível, a situação dos desprotegidos, mas tendo sempre a verdadeira orientação de que se trata dum direito e não duma esmola.
Apoiados das esquerdas.
Nisto sintetizei qual será o. nosso critério e a nossa orientação.
Referiu-se depois S. Ex.a à necessidade dum Código Administrativo.
Sentimos que é na verdade necessário, inadiável, encarar esse problema, porque tendo passado tantos anos de República, não há ainda um Código Administrativo Republicano.
Só o Governo tiver a duração suficinte, não tenha S. Ex.a dúvidas que será um dos problemas que iremos encarar, mas não pode ser dos primeiros, porque temos efectivamente assuntos de tal gravidade e de tal urgência a estudar, que absorverão todo o tempo destes primeiros dias.
Quanto propriamente aos assuntos que S. Ex.a tratou com mais desenvolvimento, que foram os assuntos de justiça, também sei que se torna efectivamente necessário acudir-lhe, e devo dizer que em breve o Governo decretará uma remodelação doa serviços relativos a menores delinquentes, renovando a legislação que foi decretada em 1911 e criando novas escolas de reforma, sem aumento de despesa.
Efectivamente o Governo, nas reformas que anuncia, tem de encarar acima de tudo o problema financeiro, não fazendo despasas sem saber aonde há-de ir buscar a respectiva receita.
A política do Governo tem de ser, acima de tudo, a do equilíbrio orçamental, para consolidar o crédito do País e .se entrar depois no caminho do progresso.
Quanto ao regime penal, o Governo reconhece a necessidade urgente de remodelar a legislação vigente, que já tem mais de 40 anos de existência, para a harmonizar com os princípios modernos. O Governo seguirá de perto o congresso de criminologia que se vai realizar em Londres.
O Governo reconhece a necessidade de também estudar outros assuntos, como o do kabeas corpus e o da lei do inquilinato.
Com respeito a esta lei, temos de tratar de a prorrogar quanto antes.
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Falou depois o ilusfre Senador Sr. D. Tomás .de Vilhena, a quem agradeço as palavras de consideração pessoal que teve para comigo, que, de resto, jái^ão é a primeira vez que me dirige, pois o mesmo - fez quando já de outra ocasião tive a honra de ser Ministro das Finanças. . •
Agradeço também a S. Ex.a a justiça que me fez sobre o meu modo de^ ser político.
Sr. Presidente : disse o ilustre Senador Sr. D. Tomás do Vilhena haver antigos monárquicos que têm aderido à República.
Eu direi a S. Ex.a que, efectivamente, muitos têm aderido ê que servem a República com toda a dedicação e lealdade.
Acho que ó mais natural que passem conservadores para o lado dos radicais, do ,que o contrário.
É talvez a diferença do nosso modo de ver. Tenho visto os periódicos que defendem as ideas políticas de S. Ex.a entoar hinos àqueles que trocam pelas fileiras republicanas as monárquicas. £ Porque não havemos nós de fazer o mesmo quando se dá o facto contrário?
Ora o Sr. D. Tomás de Vilhena disse que devemos orientar-nos, antes de mais nada, pelos princípios de justiça e equidade que parece caberem bem tanto dentro da consciência de um republicano como na de um monárquico. Estamos de acordo e oxalá que todos procedessem sempre dentro dessa regra.
S. Ex.fl ficou muito admirado por eu ter declarado que seguia a orientação da obra financeira do Governo transacto. Se S. Ex.a tivesse sempre seguido o meu modo de ver e a minha orientação de Ministro das Finanças, não devia essa declaração causar-lhe grande espanto.
A obra financeira que se quere realizar neste País vem do tempo do Sr. Álvaro de Castro, mas não quero deixar de reivindicar um pouco para mim uma parte dessa obra, porque eu, em todas as propostas que tive a honra de apresentar no Parlamento e em todas as medidas que tive a honra de promulgar, nunca tive outra orientação nem outro critério que não fossem o estabelecimento de uma política profundamente radical, que, só não tinha o desenvolvimento social que eu desejava, era porque o meio mo não permitia.
• O Sr/ Silva Barreto:—^Pèço a palavra para um requerimento.
O Sr. Presidente:—Tem V. Exla á palavra. •
O -Sr. Silva Barreto: — Com a devida autorização do'Sr. Presidente do Ministério, que me permitiu que o interrompesse, requeiro a prorrogação da sessão até terminar esto debate.
Consultada' a Câmara, foi aprovado o requerimento.
O Orador:—Continuando as minhas considerações e a respeito da melhoria cambial a que se referiu o Sr. D. Tomás de Vilhena, de\o dizer que S. Ex.a fez considerações análogas às da declaração ministerial.
• Disse S. Ex.a que a-carestia da vida se manteve, apesar da melhoria cambial.
Efectivamente é um caso que o Governo já teve ocasião de salientar na declaração ministerial e para o qual procura a solução. Sabe S. Ex.a que, embora o facto seja de lastimar, não é contudo de admirar que tal fenómeno se tenha dado, porquanto ele se tem repetido noutros países.
Isto não é de maneira nenhuma defender o que se passa, porque, se assim fosse, não diria o Governo que ia empregar todos os seus esforços no sentido de que esse estado de cousas termine.
Quanto à questão do pão, poderá ela ser debatida em qualquer outra oportunidade, mas o que posso desde já dizer é que ela está resolvida. Houve demora na chegada do navio que trazia trigo para Lisboa e daí a falta de farinha.
Há, porém, unia afirmação nas palavras do Sr. D. Tomás de Vilhena que eu quero levantar.
Disse S. Ex.a que >a manifestação verdadeiramente imponente pelo número e respeitável pela ordem e correcção, que há clias foi a Belém, era composta de falsos trabalhadores.
Com certeza que tais palavras saíram dos lábios de S. Ex.a unicamente pelo calor da discussão e pela paixão que as ditou.
Eu tenho uma impressão completamente diversa da de S. Ex.a
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Podia realmente ter aparecido um ou on-tro especulador, porque os há em todos os campos; mas, quando uma manifestação se apresenta com aquela ordem e aquela correcção, não se pode duvidar que ela seja constituída pelos que trabalham e só-,frem, porque quando se não quere seguir esse processo., há muitos outros para protestar e fazer sentir a nossa orientação.
Sr. Presidente : também se referiu S. Ex.a, com muita indignação, aos ataques que os apaches andam praticando pelas' ruas da cidade.
Pareço que esse facto não atingiu a gravidade que S. Ex.a lhe deu.
Ele é mais filho da fantasia dos jornalistas do que doutra cousa; factos desses dão-se €;m todas as cidades de grande população e de forma alguma representam um perigo.
E pode S. Ex.a estar certo e a Câmara de que todos esses atentados serão reprimidos pelo Governo com toda a energia.
Sr. Presidente: o Sr. Procópio de Freitas fez várias considerações, repetindo vários argumentos já apresentados por outros ilustres Senadores, aos quais já respondi.
Já, sobre esses assuntos, mostrei qual o modo de ver e de sentir do Governo.
S. Ex.a falou, por exemplo, em exploradores e protegidos por políticos, afirmações que constantemente se estão fazendo sem, contudo, serem.comprovadas.
Sobre a questão financeira já tive ocasião de dizer a minha opinião.
Sobre a questão dos tabacos, o Governo entende que não há grande vantagem em se tomarem resoluções sobre esse assunto, visto o contrato terminar para o ano, quando funciona já outro Parlamento, que pode ter orientação diferente da do actual.
Só quanto aos fósforos o Governo, que é partidário do regime livre,' entende que se devem tomar resoluções imediatas, visto o respectivo contrato terminar em Abril próximo.
Sr. Presidente: a hora vai muito adiantada, e não tomem V. Ex.as como desprimor que eu abrevie as minhas considerações.
Falou também S. Ex.a num outro assunto que tem realmente importância, que é o da*s estradas.
Não tenha V. Ex.a dúvidas de que eu reconheço, tanto como o Senado, a ne-
cessidade que há de resolver este problema.
Se eu quisesse narrar factos como aquele a que aludiu o Sr. D. Tomás de Vilhena, contaria um que se deu outro dia comigo, na ida da estação do Entroncamento para Torres Novas, e assim repetiria a narração de S.. Ex.a
Mas, S. Ex.a ainda pôde ir de automóvel.
Eu nem isso pude conseguir. Tive de ir num carro.
Neste momento posso dizer a S. Ex.a — porque não é só da vontade do Governo que a solução do assunto depende— que hei de empregar todos os esforços para resolver esse grave problema, pois a continuarem as estradas no estado cm que sse encontram, daqui a pouco estaremos sem estradas no País.
Nisso não precisa o Governo de incentivo. '
Se tiver tempo, alguma cousa há de fazer.
Kek.tivamente a outros problemas, teremos ocasião de sobre ôles falar no decorrer de outras sessões, porque na verdade a hora vai adiantada, e eu não quero fatigar a atenção da Câmara.
Ao Ilustre Senador Sr. cónego Dias de Andrade agradeço as palavras de saudação que me dirigiu. E esteja S. Ex.a coni-pletamente tranquilo porque, em face das suas declarações de que não fará, nem o grupo a que pertence, uma oposição sistemática, e eu tenho de partir do princípio de que posso contar com a boa vonta-' de de S. Ex.a, os actos por nós praticados híio-de inteiramente corresponder às palavras constantes da declaração ministerial.
Temos de ser escravos dos nossos princípios, e eu não podia nunca ter outra orientação.
Ao ilustre Senador Sr. Lima Duque tenho de agradecer, em nome do Governo, o apoio que quis oferecer ao Ministério a que tenho a honra de presidir e das suas afirmações há apenas uma que vejo desde já necessidade de levantar: é aquela em que mostrou receios de que o acto eleitoral não vá decorrer com aquela liberdade que é absolutamente necessária.
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cabe, que a questão a tratar não depende dele, que apenas tem nesse ponto de obrigar ao cumprimento da lei, sendo sua1 obrigação manter aquela imparcialidade que é absolutamente necessária para prestígio das instituições.
Ao Sr. Vicente Ramos também agradeço as saúdavões que me quis dirigir em nome dos Senadores independentes. • A parte do seu discurso a que tenho de responder ó aquela que se refere ao: regime bancário.
Eu sigo nas suas linhas gerais a política financeira dó' anterior Governo; sigo também, portanto, essa reforma, mas nas suas modalidades técnicas farei modificações, que são necessárias.
No que se refere aos bancos regionais, devo dizer que, se nós consultarmos as estatísticas, vamos ver que há bancos com. o capital de 170 contos que têm 7:000 ou 8:000 contos de depósitos.
^Como ó que esse banco pode fazer transacções? ...
Ò Sr. Vicente Ramos: — As caixas económicas do meu distrito destinam os seus lucros à assistência e à instrução, e V. Ex.a é que lhe vai fechar as portas.
O Orador: — O assunto em breve ficará resolvido.
Quanto ao discurso do Sr. Joaquim Crisóstomo, S. Ex.a tocou tantos e tam variados assuntos, que seriam necessá rias longas horas para responder às suas considerações. . " •
Contudo, não quero deixar ;de dizer a . S.' Ex.a que lhe agradeço as palavras de amizade com que quis terminar as suas considerações, j9' só uma afirmação dever' corrigir. -••••.•
S. Ex.a parece que quis dizer que me deixei cegar pela ambição. Devo dizer que já teria tido outras ocasiões para ocupar ôste lugar, se o ambicionasse.
S. Ex.a acha que não era o: momento próprio para satisfazer as minhas vaida-des.' •'•"•'• -••-•- • .
Nas outras ocasiões é que eu achava que não era ò momento próprio; agora como se desenhavam perigos e sacrifícios^ aceitei.
Sr. Presidente: para terminar tenho que declarar ao Sr. José Pontes que S.r. Ex.a escusava de: apelar para mim para ò
auxiliar na cruzada de que S. Ex.a vem fazendo a propaganda.
Sabe S. Ex.a que me tem sempre encontrado ao seu lado, é agora no Governo me encontrara disposto a auxiliá-lo no que for compatível com os recursos do Tesouro.
.Quanto ao resto das suas palavras, S. Ex.a'pôs tanto calor, tanto entusiasmo no que disse, consequência ,da inalterável amizade e profunda estima que nos une há muitos anos, que eu não posso tomar as suas palavras senão'como uma prova dessa muita amizade e grande afeição.
Se tivesse essas qualidades que o meu querido amigo mó quis atribuir, seria eu um cidadão eminente, quando reconheço que sou apenas uma pessoa honesta e que se algum valimento tenho, é o do ser uma pessoa estudiosa," leal, que a simpatia, dos. meus correligionários tem feito elevar até a este lugar. .
Também agradeço ao Sr. Ferraz Chaves as suas palavras de saudação, e espero que S. Ex.a não se arrependerá, em virtude de actos do Governo, de as ter proferido.
Para terminar, direi que o principal objectivo do Governo, que é todo de paz, concórdia e tranqúiljdade, só poderá realizar-se desde quê sejamos auxiliados por todos, desde que todos sacrifiquem um pouco das suas paixões e se unam para trabalhar para o bem comum. ;
Quando assim, procedam sem abdicar de maneira nenhuma das suas convicções — porque há iim campo onde nos podemos todos encontrar—a obra do Governo será fácil e "da sua estada nas cadeiras do Poder alguma cousa de- profícuo e de grande resultará para o País: "Tenho;dito.' ". .- '
:Vóze$:—Muito bem.:;! ' "••'
" O 'orador não reviu.
O Sr. Lima Duque (para explicações):— Pedi: á palavra :pará explicações depois de ter"'lido,"'-agora'" inesínó, -o manifesto do Partido Nacionalista, publicado nos jornais.
Algumas asserções infiéis à verdade se contêm nesse documento, mas .uma, de entre elasy é absolutamente inexacta e necessita peremptória rectificação.
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provocou a scisão no Partido Nacionalista. Nada mais,falso.
.O .Sr. Álvaro de Castro, quando foi chamado a organizar Ministério pela primeira vez, ainda era nacionalista.
Apoiados.
Tendo, porém, como lhe cumpria, conferenciado sobre o assunto com o Directório desse Partido, entre S. Ex.a e o directório suscitaram-se divergências.
O Partido Nacionalista .não aceitava Ministério de concentração, e muito menos negociações com o Partido Democrático.
O Sr. Álvaro de Castro e muitos outros correligionários, assim como eu, tinham a opinião de que o momento político carecia de um Governo de cooperação de todos os partidos ou, não podendo ser, pela recusa de alguns agrupamentos partidários, devia organizar-se um Ministério de acordo com os democráticos, detentores das maiorias parlamentares.
A teimosia do directório nacionalista mantinha-se irreductível e por isso o Sr. Álvaro de Castro saiu com os seus amigos dessa agremiação.
Portanto, a scisão não se deu quando foi chamado ao Poder o Sr. Álvaro de Castro, da segunda vez; quando S. Ex.a organizou Ministério, ' fê-lo na qualidade de independente.
Apoiados.
Estes são os factos que nenhum sofisma pode deturpar.
Faço, portanto, a rectificação, além de outros motivos, porque a afirmação a que me refiro é tendenciosa e serve apenas para traduzir a insídia que o Sr. Presidente da República procedeu ,com menos imparcialidade., ... .
Tenho, individualmente, muita consideração pelos homens que .assinam o presente documento, mas, noto,,.cpm surpresa e mágoa, que não hesitassem em subscrever erros de tam fácil refutação e que só desprestigiam quem os apresenta eni documentos públicos, 4ue deviam primar pela sinceridade, pela lógica e pela -verdade. .-• *
Tenho dito. •• . , • ••• -.'-.•'..
Vozes :r~iy[nito:vbem, ntuíto bem.
O Sr,-D. Tomás de Vilhena (para expli-^i^rtSr.Presidente: sou absoluta-
mente intransigente com as minhas doutrinas, mas fui sempre de uma grande tolerância com os homens e tenho sempre mais prazer em. os julgar bons do que maus.
Quando me refiro a que este ou aquele • parlamentar foi monárquico ou deixou de o ser, registo apenas um facto verdadeiro e nada mais. .
Pelas circunstâncias qne se davam, fiz uma asserção apenas. Deste lado estavam. os veteranos da-República e eles entenderam que a situação era pouco respirável para eles; não se sentiam bem. E todavia, alguns deles arruinaram a sua fortuna com a política e depois de catorze anos de República não se sentiram bem nas suas cadeiras.
E ao mesmo tempo que isto acontecia, eu via dentro da actual situação homens que nem sempre haviam militado na .República. Não tenho, ó claro',, o direito de dizer que esses homens estejam de má fé a servir o país, pois cada um serve-o como entende.
Eu siírvo-o desta maneira e ninguém poderá dizer que não sou homem de bem, o mesmo sucedendo com os outros. A questão é clara.
E, já que estou no uso da palavra, devo dizer ao Sr. Vitorinp Guimarães, a quem gosto de ouvir pela sua maneira especial de falar, que sobre a preocupação de se dizer que nós, monárquicos, somos os retrógrados e que o radicalismo é o progresso, é que eu tenho dúvidas e dúvidas extraordinárias. Assim, vemos, por exemplo, que a Itália, com Mussolini, tem seguido por um caminho bastante afastado daqueles sãos e imortais princípios que geralmente costumamos chamar o progresso.
A Espanha segue mais ou menos o mesmo caminho....
O Sr. Pereira Osório;,:—E então «aquilo» lá vai bem... -
Vozes: — E o que se vê em Espanha...
O Orador: —V, Ex.as estão. enganados a respeito da Espanha; hão-de ver, Ijãp--de ver.
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glaterra depois da experiência trabalhista, voltou à sua tradição.
Parece-me que nós não estamos muito afastados do progresso e parece-me que aqueles que querem • galopar de mais é. que andam para trás.
De resto o Sr. Vitorino G-uimarães manteve aquela opinião que eu considerava que não podia fazer a sua felicidade, que ó seguir em matéria financeira e económica as pegadas dos seus antecessores.
Sr. Presidente: não felicito o Sr. Vitorino Guimarães por querer seguir essa orientação. Eu que tenho muito em conta o tato do Sr. Vitorino Guimarães, que está muito convencido do seu desejo de acertar, tenho medo que ele não possa levar a cabo o seu intento, porque a sua missão ó difícil.
V. Ex.* não tem no Parlamento aquele grupo homogéneo que precisa um homem nestas ocasiões, para fazer uma obra profícua neste país.
S. Ex.a tem de viver num constante trabalho de equilíbrio, que o há-de con-
sumir a toda a hora. Se quiser ter um pouco de ponderação e se quiser tomar o caminho das direitas, levantam-se logo contra si os das esquerdas, e' se S. Ex.a se inclina para a esquerda, levantam-se logo os das direitas, e isso há-de tirar-lhe o tempo para tratar dos assuntos que interessam a Nação, há-de dificultar a sua acção e a sua vida política.
É por isso que me parece quê o Governo da presidência de S. Ex.a não terá muitos dias de vida.
Eu não me alegro muito com isso, porque pode vir um outro Governo muito pior do que este.
O orador não reviu.
É posta à votação a moção do Sr. Joaquim Crisóstomo, sendo aprovada por unanimidade.
O Sr. Presidente:—A próxima sessão é na sexta-feira, 6, à hora regimental e com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Jbram 19 horas è 20 minutos.