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REPÚBLICA PORTUGUESA

ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 51

VII LEGISLATURA

ANO 1959 18 DE ABRIL

PARECER N.º 11/VII

Proposta de lei n.º 14

Plano director do desenvolvimento urbanístico da região de Lisboa

A Câmara Corporativa, consultada, nos termos do artigo 103.º da Constituição, acerca da proposta de lei n.º 14, emite, pela sua secção de Interesses de ordem administrativa (subsecções de Política e administração geral, Obras públicas e comunicações e Finanças e economia geral), à qual foram agregados os Dignos Procuradores Álvaro Salvação Barreto, José Seabra Castelo Branco, Francisco Manuel Moreno, Inácio Peres Fernandes, António Pereira Caldas de Almeida, Jorge Botelho Moniz, José Augusto Correia de Barros e Reinaldo dos Santos, sob a presidência de S. EX.ª o Presidente da Câmara, o seguinte parecer:

I

Apreciação na generalidade

A) O problema urbanístico em geral

1. O fenómeno «cidade» tem a sua origem mais remota no princípio da associação. Do homem como «animal social» resulta directamente que «o homem é um animal construtor de cidades»; e aqui se emprega a palavra «cidade» no seu sentido mais amplo de sociedade humana.
Se é sempre aquele princípio que tem comandado a formação de todos os agregados populacionais, e está, portanto, na sua génese unívoca, já, no entanto, há que distinguir a diversidade de factores que têm contribuído mais decisivamente, através dos séculos, para o desenvolvimento dos aglomerados urbanos, designadamente as cidades, tomada agora a palavra no seu significado restrito e corrente.
Factores de ordem geográfica, política, militar e religiosa, entre outros, determinaram a tendência para o desenvolvimento da concentração urbana na Antiguidade e na Idade Média. Mas as causas económicas, se, modernamente, adquiriram relevância predominante sobre, todas as outras, não deixaram de estar sempre presentes na evolução e crescimento das grandes urbes.
Para comprová-lo bastaria assinalar a circunstância tão comum da implantação de cidades em pontos estratégicos, sob o ponto de vista agrícola, industrial ou mercantil. Na Idade Média, por exemplo, a utilização da estrada comercial do Reno, para ligar as mais prósperas repúblicas italianas com a Flandres e a Inglaterra, contribuiu notòriamente para a criação de muitas cidades ao longo dessa via natural de transporte. É a proximidade do mar ou de outras riquezas naturais, nomeadamente os minérios, tem tido, como se sabe, uma influência vincada na localização de muitas cidades.
Compreende-se que, em todos os tempos, o factor económico tenha estado na base dos agregados humanos, certo como é que o homem tem o seu habitat próprio e natural na vida de relação, cheia de implicações económicas, onde se enquadra, com todas as dependências, limitações e sujeições impostas pela comunidade - ser eminentemente social e, por isso mesmo, dependente por excelência.
O reconhecimento da influência relevante do económico na formação das sociedades humanas não é de

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hoje; e tanto que, por exemplo, o problema é já posto com impressionante clareza e pleno de actualidade no famoso diálogo entre Sócrates e Adimante:

O que dá origem à sociedade não é a impotência em que cada homem se encontra de se bastar a si próprio e a necessidade que ele experimenta de muitas coisas? Assim, se a necessidade obrigou o homem a juntar-se a outro homem e uma outra necessidade a outro homem ainda, o complexo destas necessidades reuniu, num mesmo local, vários homens com o fim de se auxiliaram mutuamente, e a esta sociedade demos o nome de Estado.

Com esta e outras mais considerações, o filósofo acaba por condensar as suas ideias num conceito que veio a ser principio fundamental no serviço da ciência económica:

De onde se conclui que se fazem mais coisas, que se fazem melhor e mais facilmente, quando cada um faz aquilo para que é apto em tempo útil e desde que não tenha de preocupar-se com outra tarefa.

E o princípio da «divisão social do trabalho» já perfeitamente definido e que, por desenvolvimento e complementaridade, se continua num outro princípio seu derivado, o da «divisão técnica do trabalho», de aplicação generalizada com o progresso económico.

2. No rápido esboço que se deixou traçado não foi feita alusão expressa a tantos outros factores determinantes do fenómeno «cidade», entre os quais haveria que salientar forçosamente as razões de ordem espiritual e cultural que apontam para a elevação e aperfeiçoamento dos indivíduos, mercê da sua entreujuda, e para a soma de benefícios que o simples facto da existência de uma comunidade organizada manifestamente possibilita.
Tem sido, pois, um grande complexo de causas esse que vem desencadeando a progressiva concentração das massas populacionais em aglomerados urbanos, que culmina no extremo limite de «cidades-colossos», com milhões de habitantes.
Esta corrida acelerada do campo para a cidade, em torrente irreprimível (até agora, pelo menos!), levantou o problema crucial do urbanismo, sobre o qual se têm debruçado os estudiosos, sobretudo economistas e sociólogos, desde longa data, para o examinarem nos seus múltiplos aspectos e concluírem na sua generalidade por um diagnóstico carregado de tristes conclusões.
Certo que o processamento histórico da cidade não revela uma linha ascendente contínua no aumento populacional dos grandes centros urbanos. Há, pelo menos, uma interrupção, ou, melhor, um retrocesso, na marcha ascensional da concentração urbana - considerada esta como fenómeno geral e universal-, facto operado após o decurso da Antiguidade Clássica e já nos primeiros séculos da Idade Média. Enquanto naquele período aparecem cidades que atingem cifras demográficas muito altas, mesmo à luz da nossa época - tais como Roma (900 000 habitantes), Alexandria (500 000) ou Atennas (150 000) -, na primeira parte da época medieval os mais populosos centros urbanos não ultrapassavam 30 000 ou 40 000 habitantes.
Não seria lícito alongarmo-nos sobre o condicionalismo que provocou esta regressão do fenómeno geral do urbanismo, em que concordam os historiadores. Bastará dizer que, após a queda do Império Romano e a dominação dos «bárbaros», e sobretudo com as invasões muçulmanas na Europa, a cidade acusa um definhamento sensível, o sistema que passa a predominar é o de uma economia doméstica de base agrícola (economia dominial fechada). E é só nos séculos X, XI e XII que o progresso urbano volta a acentuar-se com a intensificação do comércio entre terras distantes, em que adquirem papel de maior relevo as mais florescentes cidades italianas (Veneza, Génova e Pisa), poderosos fulcros de ligação entre o Oriente e Ocidente, passando pelo Mediterrâneo, até à Flandres (Bruges) e daqui para o mar do Norte.
Mais tarde, com os Descobrimentos, tomaram os Portugueses, como é sabido, a primazia na rota do Oriente-Ocidente, e mudou o eixo comercial do Mundo, que passou de Veneza para Lisboa, transformando-se esta nossa cidade em grande empório mercantil, foco polarizante e irradiante no Mundo conhecido de então.
O progresso urbano acompanha toda esta evolução, em linha sempre ascendente, porque não mais se detém ou retrocede. Mas é depois com a primeira revolução industrial - eclodida em finais do século XVIII e projectada em cheio no século XIX - que a concentração demográfica se acelera a ritmo espectacular, principalmente no que se refere às grandes cidades. E é então, lògicamente, que o urbanismo adquire a feição de um grande problema nacional na generalidade dos países.

3. Como e porquê?
Embora o julgamento sobre este grande problema esteja concluído, quanto nos seus traços essenciais, não deverão deixar-se sem, pelo menos, uma rápida resposta as duas perguntas formuladas.
Simplesmente - e por maior comodidade - examiná-las-emos em conjunto, evidente como é que ambas as perguntas se entrelaçam uma na outra, e de tal forma que em muitos aspectos se não tornaria fácil destrinçá-las.
Um dos pólos de atracção da cidade situa-se no potencial de benefícios que pode proporcionar aos seus habitantes. Bastará dizer que, tratando-se de grandes aglomerados humanos, estes possuem necessàriamente os meios correspondentes para ocorrer às mais variadas necessidades suciais, nos seus múltiplos aspectos. E há, portanto, uma extensa rede de serviços de diferentes tipos, desde os que se reportam à administração do Estado ou do município e aos que se relacionam com as actividades económicas - comércio, indústria, transportes, crédito, turismo, etc. - até aos que entram no domínio do espírito ou da cultura - Universidades, escolas, academias, belas-artes, bibliotecas, museus, espectáculos, etc.
Não vale a pena discriminar mais, entrando pelo interminável labirinto dos multivariados serviços públicos ou actividades particulares - todos temos o panorama suficientemente à vista, para nos apercebermos do sem-número de possibilidades que a vida citadina comporta, em termos de acesso às mais diversas carreiras, de promoção a uma vida melhor para quantos se julguem aptos a conquistá-la, de maior facilidade de diversões e de conforto.
São estas inegàvelmente formidáveis solicitações que impulsionam os fluxos humanos e que explicam, consequentemente, a corrida vertiginosa do campo para a cidade. Só as profissões comerciais e os serviços públicos absorvem, a medida que as grandes cidades aumentam, um contingente enorme de população proveniente de regiões que se situam no seu raio de acção atractiva.
Por outro lado, e porque as maiores cidades são importantes centros de consumo e de distribuição, bem como repositórios inesgotáveis de mão-de-obra, as indústrias revelaram sempre tendência para ali se instalarem, contribuindo assim para o seu crescimento pletórico e desordenado; agravado ainda o facto com o

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conhecido fenómeno da «aglomeração» industrial, que condiciona a localização de muitas indústrias acessórias ou simplesmente relacionadas. E, sem sombra de dúvida, o mais alto nível de vida que a indústria proporciona, relativamente às actividades agrícolas, tem sido modernamente um dos factores primordiais do despovoamento rural e, consequentemente, do ingurgitamento das cidades.

4. Este facto da desmesurada concentração urbana é motivo bem justificado de fundas preocupações, tantos e tão ponderosos são os seus reconhecidos inconvenientes, em muitos aspectos, materiais ou morais, que a vida social comporta.
Repare-se que o fenómeno, encarado do ponto de vista universal, mais se agrava se tivermos em mente que a população do globo alimenta de 5400 indivíduos por hora, o que se traduz num crescimento anual de 47 milhões. E, a manter-se este andamento da curva demográfica, no ano 2000, segundo os dados fornecidos pelo Anuário Demográfico de 1957, das Nações Unidas, a população mundial - que é de 2737 milhões de almas - atingirá uma cifra dupla da actual ou ainda superior.
Não faltará, pois, um grande caudal de acréscimo demográfico para ajudar a concentração urbana. E compreende-se, assim, que, correspondendo às conclusões dos homens de ciência e até ao clamor público, os governos dos principais países tenham chamado a si a consideração prática do problema, promovendo estudos que ajudem a resolvê-lo, elaborando planos de actuação e criando órgãos para a consecução de tais objectivos.
O primeiro documento oficial sobre o papel das cidades na economia nacional é o relatório da comissão de urbanismo do National Resouroes Committee, feito nos Estudos Unidos e apresentado, em 1937, ao Presidente Roosevelt. Além de outros pontos que ali são focados, destacam-se pela sua importância: o problema demográfico, a vulnerabilidade da vida urbana, a indigência e o desemprego, a educação e a saúde pública (física e mental), o congestionamento do trânsito, a utilização desordenada do solo urbano e a especulação nas transacções sobre terrenos, as dificuldades de habitação e de transporte, a deficiente distribuição das indústrias.
Não seria adequado desenvolver aqui cada um dos assuntos indicados, mas não se deixará de fazer alguns breves apontamentos.
Sem embargo do crescimento demográfico, como fenómeno geral e universal, aquilo a que pode chamar-se o «suicídio biológico das cidades» é um facto, pois que o índice de natalidade, em regra, diminui à medida que aumenta a concentração urbana, sendo portanto mais baixo nas grandes do que nas pequenas cidades e mais baixo ainda quando o termo de comparação seja o aglomerado rural. Por seu turno, o índice de mortalidade, mesmo com o aperfeiçoamento dos serviços de saúde, tem de manter-se alto em razão de certas características específicas dos grandes centros: poluição da atmosfera, pela presença de gases produzidos pelas combustões industriais ou dos motores de explosão, acidentes de viação, ritmo de vida trepidante, ruídos incómodos, etc.
Quanto a Lisboa, por exemplo, quando comparemos o natalidade e a mortalidade nos últimos cinquenta anos, encontramos alternâncias de saldos fisiológicos positivos e negativos, com predomínio destes últimos. E se o resultado foi favorável no período de 1921-1930, já deparamos com saldos negativos nas duas décadas seguintes -1931-1940 e 1941-1950. O aumento da população de Lisboa, cifrado nestes dois últimos períodos em 114 789 e 81 255 habitantes, fez-se, pois e exclusivamente à custa da torrente imigratória.
O congestionamento na circulação de veículos de transporte constitui outro dos problemas agudos que afectam as grandes cidades, ao qual os urbanistas de todo o Mundo dedicam a maior atenção. E já têm sido realizados estudos meticulosos para determinar o «custo» da morosidade do tráfego em grandes cidades, como Nova Iorque, Paris e Berlim.
Para a primeira daquelas cidades - e considerada, apenas a City - apurou-se uma perda de 500 000 dólares por dia útil, ou seja cerca de 150 milhões de dólares por ano. Isto em 1920 ... e seguramente o custo do congestionamento circulatório só tem aumentado de então para cá.
Com referência à cidade de Paris calculou-se, para o ano de 1924, o prejuízo anual de l bilião de francos (valor da época !), assim dividido: 500 milhões sobre o comércio parisiense, 300 milhões como despesa suplementar para os automobilistas e 200 milhões que recaíram sobre os transportes colectivos.
Relativamente a Berlim, um inquérito feito em época mais recente (1939) e exclusivamente dirigido ao «tempo» perdido pela população laboriosa da cidade em razão do trânsito, computou essa perda em l 368 000 horas diárias, o que daria, só por si, para custear a instalação de 46 000 famílias por ano era cidades de população equilibrada.
Não é, todavia, o congestionamento do tráfego que deve considerar-se o único responsável pelos desgastes económicos peculiares aos grandes centros. O simples facto da enorme extensão territorial, abrangida nas áreas urbana e suburbana, exige longas deslocações dos habitantes entre as suas casas e os locais de trabalho, originando o fluxo e o refluxo de maciços caudais de população, sobretudo nas horas «de ponta», com manifestas dificuldades ou deficiências na organização e regularidade dos serviços de transportes.
Estes prejuízos são irremediáveis nas cidades-monstros, por mais esforços que venham a fazer-se para alterar a fisionomia das suas zonas centrais no sentido de organizar racionalmente as linhas de trânsito e afastar dessas zonas as actividades dispensáveis, inclusivamente muitos serviços públicos. Tal afastamento iniciou-se com a indústria, a primeira a fugir do centro para a periferia, não só porque as dificuldades do tráfego não permitiam a sua permanência ali, mas ainda porque a escassez do espaço e o preço incomportável da instalação fatalmente o impuseram. Porém, quanto à implantação industrial, o problema que presentemente se põe não é só o da sua localização periférica, mas também, como veremos adiante, o da sua equilibrada distribuição pela território nacional.
E, para terminar esta incompleta resenha dos inconvenientes da forte concentração citadina, tão incompleta que até deixou de lado alguns graves aspectos morais que envolve, assinalar-se-á ainda o facto sobejamente conhecido de aumentarem notòriamente, a partir de certa dimensão populacional, os encargos funcionais das redes de serviços urbanos. As despesas gerais per capita, variáveis naturalmente de país para país, chegam a duplicar ou triplicar quando se comparem cidades de 30 000 a 50 000 habitantes com os grandes aglomerados de l milhão ou mais.

5. A pressão intensa de todos estes males postulou lògicamente a busca de soluções para enfrentar uma situação séria; e séria a tal ponto que só não tem tido piores consequências em todos os países adiantados porque, nalguns deles, o crescimento demográfico acusa uma diminuição sensível. Mas, quando, mesmo por absurdo, se admitisse que as grandes cidades, por esse

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Mundo fora, não continuassem a intumescer, as suas proporções actuais seriam suficientemente alarmantes para justificar um conjunto de medidas atinentes ao seu melhor equilíbrio.
As reacções neste sentido podem dizer-se quase unânimes e sem discrepâncias. Onde surgem dúvidas, isso sim, é na espécie de providências propostas para a finalidade em vista, variáveis consoante os pressupostos básicos de que partem os seus proponentes, a concepção de vida que os orienta e, evidentemente, os pontos de aplicação local, ou seja a configuração e o condicionalismo próprios das regiões visadas.
Entre a variedade de pontos de vista há, no entanto, um conceito fundamental a que se chegou e é geralmente aceite: o da «dimensão óptima» aplicável à cidade. Se divergências existem, reduzem-se elas ùnicamente à fixação da cifra populacional apropriada.
Gaston Bardet, director de estudos do Instituto Internacional de Urbanismo Aplicado, de Bruxelas, com a autoridade de uma longa e meritória bibliografia da especialidade, encara o problema da dimensão óptima em termos concludentes:

Existe, com efeito, uma limitação biológica à concentração urbana. Nas nossas cidades morfològicamente concentradas verifica-se que, acima de um certo volume óptimo, uma aglomeração deixa de ser um meio biològicamente são. A experiência prova que este óptimo, a que chamaremos a cidade humana concentrada, é da ordem das 10 000 famílias (30 000 a 50 000 habitantes).
Esta cifra corresponde realmente, numa grande nação europeia, à cidade contemporânea óptima, tal como a soma de 5000 cidadãos correspondia à cidade platoniana. Permite todas as manifestações culturais que se podem reunir num município e no seu hinterland. Pelo menos, o número permite-o; quanto à qualidade, ela depende da adopção de uma política de regionalismo.
Este número é relativamente grande em relação ao volume dos escalões componentes, mas mostra-se necessário para realizar «este campo emotivo que confere à actividade do grupo a sua qualidade característica». Sem isso, a massa de conhecimentos e de experiências postas em comum seria insuficiente.
Acima deste limite, contudo, uma aglomeração monobloco é impotente para crescer por si, em movimento natural, e até para se manter sem que seja através da imigração. (Mission de l'Urbanisme).

Note-se que a dimensão óptima preconizada por Bardet se ajusta à cifra escolhida pelo pioneiro das cidades-jardins, Ebenezer Howard, para a sua garden-city de Letchworth (30 000 habitantes) e também para a de Welwyn, que foi delineada, para 50 000 habitantes.
Mas, visìvelmente, o número óptimo não pode ser idêntico para qualquer povo, sejam quais forem as suas condições. E tanto assim que, se nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha esse número anda à volta dos 50 000 habitantes, já na Suíça ou na Dinamarca ele pode fixar-se na ordem dos 10 000 habitantes. Factores diversos influirão decididamente na determinação deste óptimo de concentração urbana; e com certeza não lhe serão estranhas, ao lado do tipo de actividade predominante, as espécies de indústrias, o grau de cultura e a mentalidade do país considerado.
Importa, pois, determinar - como aconselha Boudeville - «a dimensão óptima dos diferentes tipos de cidade: cidades novas e velhas; cidades comerciais nascidas espontâneamente ao longo das vias de comunicação; cidades industriais resultantes de uma polarização em volta do uma actividade motora; cidades administrativas; cidades turísticas. Cada uma destas cidades tem um ritmo de crescimento próprio e uma dimensão óptima diferente» («L'Economie Régionale, Espace Opérationnels, in Cahiers de l'Institut de Science Economique Appliquée n.º 69, Junho de 1958).
O problema da «dimensão óptima» mais se complica se tivermos em conta que variados critérios podem tomar-se como base para a determinação do óptimo populacional: a saúde dos habitantes, o traçado físico da cidade, a segurança pública (criminalidade, etc.), a eficiência municipal, a educação e o ensino, a defesa em caso de guerra, a vida familiar, etc. Mas, se, consoante um ou outro destes pontos de vista, pode chegar-se a resultados diferentes, o certo é que muitos deles são coincidentes. Assim, quando se parta do critério da «segurança em caso de guerra atómica», obtém-se uma cifra ideal, entre 25 000 ou 50 000 habitantes, mas este mesmo resultado satisfaz às dimensões requeridas pela aplicação de outros pontos de vista, tais como o «traçado da cidade», a «saúde» ou a «segurança pública». O problema aqui reside, pois e fundamentalmente, numa escolha racional dos critérios que melhor possam servir, em geral, a população. (Vide Otis Dudley Duncan, «Optimum sixe of cities», in Citie and Society, 1957).
Repare-se que esta ideia da «dimensão óptima», quando à cidade, não é mero conceito teórico, pois que, bem ao contrário, apresenta um incontestável interessa prático. Não que possamos conceber a redução das actuais cidades superlotadas a esse tamanho ideal, mas porque já se toma perfeitamente realizável travar, com providências adequadas, o crescimento daqueles aglomerados urbanos que já atingiram ou excederam a cifra óptima desejável, ou prever, mediante planos locais ou regionais, o desenvolvimento racional daquelas cidades que ainda estão fiquem do óptimo demográfico prèviamente definido.
Mais ainda - e agora o escopo que nos parece primordial: o conceito da dimensão óptima é de valor inestimável pelo que respeita à criação de novos aglomerados urbanos, inteiramente concebidos e delineados segundo critérios científicos. E tal não quer significar que se excluam a realidade do homem e do viver social, cujo aperfeiçoamento e bem-estar é o fim último da cidade, entendida era termos actuais; donde resulta que a elaboração de todas as ciências em ordem aos planos urbanísticos está forçosamente condicionada aos fins humanos que, neste particular, são chamadas a servir.

6. Embora ainda não suficientemente elaborado o conceito de dimensão óptima urbana, foi dele que, consciente ou inconscientemente, partiram, desde o alvorecer do século XIX, as várias concepções de «cidade nova», quer como simples ideias generosas que nunca vieram a ter efectivação, quer, já mais tarde, como realizações práticas.
Podem citar-se entre as primeiras a cidade-modelo de Vitória, projecto de James Buckingham, e a de Hyggeia, pelo Dr. Richardson, ambas com o objectivo essencial de preservação da saúde humana. Seguem-se alguns projectos de cidade-nova com realização esporádica, tais como as aldeias de Sir Titus Salt, de Port-Sunlight, e o fabourg-jardin de Bournville.
Mas é indubitàvelmente com Ebenezer Howard, já no final do século XIX (1895), que surge e adquire projecção universal a concepção de um novo tipo de cidade: a garden-city.

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Howard construiu a sua teoria da cidade-jardim sobre três princípios básicos, ainda hoje válidos em grande parte e, aliás, aplicados pràticamente, salvo os ajustamentos derivados de novos condicionalismos:

a) Eliminação da especulação sobre terrenos, que passam a pertencer à comunidade;
b) «Contrôle» do especulação e limitação da população, definindo-se os limites do centro urbano por meio de uma «zona verde» circundante, para exploração agrícola, e fixando-se a dimensão da cidade-jardim em 30 000 habitantes;
c) Equilíbrio funcional, estabelecido mediante o estudo das necessárias relações entre a cidade e o campo e dos aspectos mais relevantes da estrutura urbana, designadamente: a residência, o mercado, a indústria, as funções políticas, sociais e espirituais, as diversões, etc.

A concepção de Howard veio a ser concretizada em Inglaterra, primeiro na cidade-jardim de Letchworth e depois na de Werwyn, ambas nos arredores de Londres. Insista-se, porém, em que a teoria da garden-city de Howard não se reporta a uma «cidade com jardins», como alguns erradamente supõem, referindo-se antes a uma «cidade no meio de um jardim» (a zona agrícola circundante), conforme resulta claramente dos princípios antes enunciados.
Outras concepções apareceram ainda, nomeadamente a de Wells (Antecipations), que antevê as futuras cidades disseminadas por extensas regiões urbanizadas. Esta noção pode condensar-se na fórmula «nem cidade nem campo», que, muito mais tarde, o famoso arquitecto Franck Lloyd Wright (The disappearing city) viria a perfilhar e a desenvolver na sua tese de uma broada-are-city, fundada no pressuposto de cada família possuir o seu acro de terreno, e que equivaleria, portanto, à disappearing city, isto é, à extinção da realidade urbana tal como a entendemos.
Não nos deteremos sobre o exame de várias outras fórmulas de cidade nova, a não ser para salientar a concepção de Clarence Perry sobre a «cidade celular», constituída, pois, por certo número de «células» ou «unidades de vizinhança» -neighbourhood units -, dotadas de muita autonomia (Planning for Machine Age). Esta fórmula não diverge fundamentalmente da sua equivalente latina - «cidade como conjunto de bairros» (quartiers) -, que actualmente inspira os urbanistas e também, no fundo, se assemelha à tese querida de Gastou Bardet, por ele denominada «cidade-federação».
A «unidade de vizinhança», que Clarence A. Perry desenvolveu e sistematizou em 1924 (Regional Survey of New-Work, tomo VII), desempenha hoje um papel relevante nos planos urbanísticos dos Estados Unidos e da Inglaterra, influenciando, em geral, a nova corrente do urbanismo no mundo contemporâneo (vide «Le Quartier urbaiu, noyau économique-social», por Catherine Bauer, in Habitation, Urbaanisme: et Aménagement des Campagnes, Nações Unidas, Novembro 1948, n.º 1). E registe-se, desde já, que a palavra «urbanismo», tantas vezes utilizada para trás na sua acepção inicial do afluxo à cidade e consequente despovoamento rural, aparece agora tomada num sentido, diverso e muito mais recente: a ciência das aglomerações urbanas.
Com semelhante significado, embora ainda sem a amplitude e o conteúdo científico que hoje se lhe atribuem, a palavra «urbanismo» foi empregada pela primeira vez em 1910.

7. Às considerações anteriores tiveram a intenção principal de destacar uma evolução que chegou até aos nossos dias e culmina no conceito de cidade nova.
Viu-se que a ideia não só é válida e útil para a implantação de aglomerados urbanos inteiramente novos, como também para os já existentes de volume populacional aquém ou além da dimensão óptima. Mas poderá a nova concepção de cidade ter aplicação útil até ao extremo limite dos aglomerados pletóricos, com milhões de habitantes?
Responde-se afirmativamente, sem quaisquer hesitações. E pode corroborar-se a afirmação com o caso típico de Londres e das suas cidades-satélites.
Assente que se impunha o descongestionamento da grande capital, os laboriosos estudos realizados para o efeito concluíram em dois sentidos fundamentais: a criação de cidades-satélites, com o objectivo primacial de transferir para elas uma grande parte das indústrias que proliferam na periferia e até no interior de Londres, acompanhadas da respectiva população fabril; a reconstrução de novos bairros da cidade em certas áreas mais devastadas pela última guerra, aplicando-se já a nova concepção das unidades de vizinhança, e bem assim a remodelação de outras zonas urbanas com toda a interferência possível do mesmo princípio urbanístico.
São oito as cidades-satélites de Londres - e já em 1958 o London County Council começou a estudar o estabelecimento de uma nona cidade-, projectadas para um total de 500 000 habitantes com as respectivas indústrias, e que actualmente estão ainda muito longe desta cifra-limite. Aproveitando-se pequenos ou médios aglomerados populacionais já existentes (entre 5000 e 25 000 habitantes), foi possível delinear as novas cidades com subordinação aos modernos critérios urbanísticos.
Assim, para a implantação da cidade-satélite de Harlow New Town escolheu-se uma região de características rurais, a 30 km de Londres, onde existia já uma pequena vila (com cerca de 5000 habitantes), em parte aproveitada para o conjunto do novo aglomerado citadino. Planeada para um máximo de 80 000 habitantes (já em 31 de Março de 1958 tinha 41 600) e dividida em seis unidades de vizinhança, cada uma com cerca de 15 000 pessoas, tudo ali foi previsto para proporcionar o maior bem-estar da população: delineamento racional das vias de comunicação, consoante o volume do trânsito, aproveitamento da «cintura verde» para a exploração agrícola, zonas residenciais, localização das indústrias, etc.
A cidade tem o seu town centre, onde se encontram instalados os serviços municipais, bem como as actividades próprias do centro comercial e cultural, além das diversões e de uma zona residencial. Por sua vez, cada unidade de vizinhança (e já funcionam pelo menos três) tem o seu subcentro, próximo da escola primária, onde está localizado o conjunto de lojas indispensável ao abastecimento diário da neighbourhood, e também um centro social.
O Greater London Plan (1944), que propunha a criação de novos aglomerados urbanos à volta de Londres, já não lhes chama cidades-satélites, designação sugestiva que tinha entrado no uso, mas podia deixar a impressão errada de que se tratava de descongestionar a capital mediante a construção de grandes «dormitórios» suburbanos, à semelhança, dos que se têm edificado nos arredores de todas as grandes cidades do Mundo.
Para acentuar bem a realidade de verdadeiros centros urbanos autónomos, com população que ali habita e trabalha, a nomenclatura oficial denomina-os hoje para e simplesmente new towns. E, com efeito, eles constituem, efectivamente, novas cidades, no pleno sig-

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nificado da expressão, com vida independente, e não simples cidades-salélites que gravitassem no sistema planetário de Londres.
Mas, como se salientou anteriormente, os modernos princípios urbanísticos não têm exclusiva aplicação ao caso das novas cidades que se estão construindo à volta de Londres e também noutras regiões da Inglaterra. Outrossim, os seus benefícios estilo sendo aproveitados para a edificação ou remodelação de novos bairros nas grandes cidades britânicas.
Cita-se, para elucidação, o caso frisante de uma extensa zona de Londres - Stepney-Poplar, de 3 milhas quadradas - quase totalmente destruída durante a última guerra e para a qual estão previstas onze unidades de vizinhança, das quais uma, pelo menos - o neighbourhood Landsbury -, se encontra em estado de notável adiantamento ou talvez mesmo já hoje inteiramente concluída. Do plano desta unidade de vizinhança constam, além dos edifícios para habitação, duas igrejas, uma católica e outra protestante, duas escolas dos graus primário e secundário, um centro comercial e mercado, um centro de assistência, uma creche e uma casa para velhos, uma junta do comércio, e também um community centre, uma public house e uma seamen's mission.
(Vejam-se, para maior esclarecimento do assunto, os minuciosos relatórios de viagens de estudo dos engenheiros Ferreira Pimentel e Silva Ferreira, in Boletim da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, 1954, 2.º vol., onde foram colhidos alguns dos elementos aqui apontados).

8. Já foi assinalado que o descongestionamento das grandes urbes, tal como está a ser pensado e posto em prática, tem como principal instrumento a transferência para outros locais daquelas indústrias cujo afastamento se mostre aconselhável ou, pelo menos, não apresente contra-indicações sérias.
Este problema e muitos outros relativos à política económico-social e urbanística da Grã-Bretanha foram exaustivamente estudados em vários documentos oficiais, que tomaram os nomes dos presidentes das comissões encarregadas de os elaborar - relatórios Barlow (repartição da população industrial), Scott (utilização do solo nas zonas rurais) e Beveridge (seguros sociais e serviços conexos).
Estes notáveis trabalhos, concluídos a partir de 1940, foram depois completados pelo relatório Reith, este tomado como base para a publicação de um importante diploma legislativo, o New Towns Act, 1946, que estabeleceu e regulou a criação das novas cidades inglesas.
Mas o que, por agora, mais importa sublinhar é o carácter de extensão a todo o território nacional que revestem os valiosos estudos efectuados nos últimos vinte ou trinta anos, não só na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos da América - incontestàvelmente precursores neste domínio -, mas ainda em outros países dos mais adiantados, como, por exemplo, a França e a Holanda.
Assim, é consolador verificar-se que constitui hoje preocupação saliente a investigação, à escala nacional, dos problemas da distribuição demográfica no sentido de promover o seu maior equilíbrio, corrigindo os graves defeitos que têm vindo a acumular-se em séculos de total abandono, por forma a assegurar o melhor possível os meios de vida necessários a toda a população, sem menosprezo das regiões menos favorecidas pelas riquezas naturais.
Há nisto, sem dúvida, o reflexo evidente da mentalidade dominante na nossa época, alicerçada essencialmente na ideia de justiça social: os conceitos aplicáveis aos homens, como seres desprendidos da terra, começam a aplicar-se também às várias terras entre si. E se, no fundo, é sempre o homem, que está no centro desta mentalidade, aqui o ângulo de visão passou a ser diferente e variam os termos de comparação - já não de homem para homem, mas de região para região.
Neste sentido além dos «planos locais» de urbanização e desenvolvimento, que desde há muito entraram na prática corrente, já em vários países estão em curso os «planos regionais» e caminha-se deliberadamente para o estabelecimento de «planos nacionais», onde se enquadrem e coordenem harmoniosamente os dois primeiros escalões - o local e o regional.
Calcula-se a transcendência que representa o levantamento de um plano nacional para, no quadro geográfico de certo país, definir as providências atinentes à melhor repartição dos homens em função dos recursos naturais e das actividades económicas. Tarefa complicada em extremo, laboriosa e demorada, que exige o concurso de especialistas em vários ramos da ciência e equipas de técnicos categorizados, com numeroso pessoal de execução ao seu serviço.
Na Grã-Bretanha, embora não exista pròpriamente um serviço de planeamento urbanístico à escala nacional, têm-se feito inquéritos ou estudos com essa característica, muitos dos quais já anteriormente citámos; e o mesmo acontece em alguns outros países. Mas o caso mais frisante é o da Holanda, onde funciona, desde 1941, um serviço próprio para o planeamento nacional e onde a lei prevê o determina a preparação de um plano nacional de carácter obrigatório, ao qual terão de subordinar-se os planos regionais das províncias e os planos municipais.
Entenda-se que o «planeamento» e os «planos» referidos se circunscrevem ao domínio urbanístico, embora forçosamente se integrem na noção mais vasta do «desenvolvimento» económico, que nos últimos anos tem sido preocupação premente e tema aliciante, tanto para os economistas teóricos, como para os economistas de acção.
De facto, o problema urbanístico, na acepção moderna, não é mais do que um caso particular desse outro problema mais lato do desenvolvimento. «Mise en valeur, développement, aménagement ne peuvent être de fait séparés. Nous l'avons dejà dit, l'aménagement n'est qu'un aspect de la mise en valeur et du développement». (L.-J. Lebret, «L'Enquête en vue de 1'Aménagement Regional», in Guide pratique de l'enquête sociale, IV, 1958).
E tanto assim é que a última palavra do legislador, em França, consagra inteiramente esta íntima relacionação e entrelaçamento dos «planos urbanísticos» e dos «planos de desenvolvimento».
Com efeito, em diploma muito recente estabeleceu-se naquele país e para o escalão regional a fusão dos dois planos até agora elaborados separadamente: o
«programme d'action régionale» (plano de desenvolvimento), previsto e regulado pelo Decreto de 30 de Junho de 1955, e o «plan d'aménagement régional» (plano urbanístico), estatuído pela Lei de 7 de Agosto de 1957. E o conjunto dos dois planos, no futuro obrigatòriamente fundidos num só, passa a denominar-se: «Plan regional de développement économique et social et d'aménagement du territoire».
O estabelecimento destes planos conjuntos, de desenvolvimento e urbanísticos, bem como a sua coordenação - tanto no quadro do Plano Nacional de Modernização e de Equipamento (o grande «Plano» francês, à escala nacional) como no quadro da política de «aménagement du territoire» - são assegurados por um «Comité des Plans Régionaux», criado pelo diploma em questão.

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(Decreto n.º 58-1459, in Journal Officiel, de 4 de Janeiro de 1959).
Como mais uma vez se confirma, os problemas do urbanismo ganharam tamanha, latitude e projecção nacional que não podem já desligar-se - porque ali integrados em alto grau - dessa ingente tarefa do «desenvolvimento» económico ou «acrescimento» económico, hoje pedra de toque na política de todos os povos.

9. Para se avaliar bem do alcance que hoje devem comportar os planos urbanísticos (em França mais correctamente denominados «programmes d'aménagement du territoire»), bastará dizer que eles incidem sobre três escalões: a estrutura rural, a estrutura urbana e o conjunto do território nacional.
O urbanismo, na acepção já universalmente consagrada de «arranjo do espaço» (aménagement du territoire), confinava-se inicialmente ao segundo daqueles escalões - a estrutura urbana.
O seu escopo essencial reduzia-se à elaboração dos traçados racionais para a edificação de novas zonas urbanas ou para a remodelação das já existentes. A sua função principal consistia em delimitar as zonas residenciais, comerciais e industriais, fixar a altura e densidade dos edifícios, a sua arquitectura e o traçado das ruas, bem como fazer o aproveitamento da superfície necessária para o delineamento de parques, campos de jogos e outros espaços livres.
Para se conseguirem tais objectivos, o urbanismo teria de ocupar-se também de muitos problemas com eles relacionados, nomeadamente a salubridade pública, a localização mais vantajosa para as escolas e outros edifícios de interesse geral, o estudo dos meios de transporte e do trânsito para o traçado das vias de comunicação e seus acessos, etc.
Só mais tarde, contudo, entrou na esfera do urbanismo o primeiro escalão apontado.- o espaço rural. Na Inglaterra, o movimento em prol do «arranjo dos campos» começa a partir de 1930, com o fim de defender as melhores terras de cultura e de criação pecuária contra a fúria dos construtores, impedindo a desarborização e regulamentando a utilização do «espaço». Era já a extensão a todas as zonas campesinas dos princípios até então aplicados apenas aos centros urbanos e, no máximo, às cinturas agrícolas que os envolvem (G. D. H. Cole, «Rapports entre la planification générale et l'habitation, l'urbanisme et l'aménagement des campagnes», in vol. cit., Nações Unidas, 1948).
Ainda antes deste movimento contemporâneo, que se concretiza, no domínio urbanístico, pelo regresso à terra, o famoso Le Corbusier, que muitos conhecem só pela sua tese da «construção em altura», afirmou ser necessário que «a vida rural, estiolada, exangue, que não subsiste senão mediante a seiva já desgastada de uma civilização caída, renasça esplêndidamente, reintroduzindo na civilização da máquina a presença bendita da natureza: não sòmente os seus produtos, mas ainda a sua profunda influência sobre os homens». E, olhando o problema pelo seu ângulo profissional de urbanista, rematava formulando este vaticínio:

A civilização da máquina, no seu segundo período, só poderá ser fundada sobre um ruralismo vivo, porque, mais uma vez, não poderá reformar-se a cidade senão pelo aménagement do campo (Sur leu quatre routes).

E para se aquilatar do círculo vasto em que se coloca a mise en valeur das zonas rurais é preciso dizer que ele se não circunscreve ao âmbito da agricultura, mas ascende a outros domínios do económico, do social e do espiritual. Em livro muito recente (1958), que se enquadra no espírito da actual e abundante bibliografia francesa sobre aménagement du territoire, considera-se como pilar fundamental daquela mise en valeur «o desenvolvimento das actividades do sector terciário na zona rural: turismo, vilegiaturas de Verão, casas de repouso, estabelecimentos culturais, hospitalares, etc.». (Louis Leroy, Exode ou mise en valeur des campagnes - título bem expressivo, que põe em destaque um sério dilema).
Aliás, não pode esquecer-se que, segundo a fórmula já radicada em Franca, o aménagement du territoire - esse novo «urbanismo», que interessa tanto à cidade como ao campo - tem em vista «a procura da melhor repartição dos homens em função dos recursos naturais e das actividades económicas, investigação não apenas para fins económicos, mas sobretudo para o bem-estar e florescimento da população», digamos - quanto a esta finalidade, de ordem cultural e espiritual- aquele «suplemento de alma » de que nos fala Bergson.
Nesta linha de orientação, está a França actualmente empenhada em descongestionar as suas grandes cidades, à semelhança do procedimento que analisámos em relação a Londres, descentralizando a sua indústria, em benefício das zonas rurais. Mas não bastam tais medidas de finalidade prevalentemente económica: é preciso descentralizar também a vida administrativa e intelectual, em benefício dos centros, urbanos médios ou pequenos. Assim o preconizam, muitos; e a opinião vai ganhando terreno dia a dia, como que para desmentir essa definição da França que J.-F. Gravier pôs a correr na capa do seu livro: Paris et le désert françaix. Caricatura realmente exagerada e a cores demasiado escuras, por certo, mas exactamente por isso bem sugestiva e até inteiramente louvável como grito de alarme.
E que há sobejas razões para alarme provam-no, em relação à cidade de Paris e sua zona suburbana, os números trazidos a público, em Fevereiro do corrente ano, por dois membros do Governo, Jean Berthoin, Ministro do Interior, e Maurice-Bokanowski, Secretário de Estado, ao anunciarem numa «conferência de imprensa» a criação do distrito da região de Paris.
Depois de referirem o ritmo acelerado no crescimento da região parisiense, «mas também muito anárquico», salientaram o facto de aquela região cobrir apenas uma superfície de 2,3 por cento do território nacional, abrigando, todavia, 17 por cento da população francesa: 7 840 000 habitantes no fim de 1957. E sobre o cruciante problema habitacional, além da notória carência de casas; dão-nos este quadro edificante: 50 por cento de habitações do aglomerado parisiense não têm água, 17 por cento não possuem instalações sanitárias, 60 por cento não excedem duas divisões.
Quanto à zona urbana pròpriamente dita, a sua densidade populacional média é de 275 pessoas por hectare (chegando a atingir 800 e 1000 em certos bairros); muito superior às outras capitais: Roma, 16; Berlim, 38; Nova Iorque, 99; Londres, 109; Moscovo, 149. E, só na cidade de Paris, publicam-se 83 por cento dos jornais e periódicos franceses, ali se encontrando 71 por cento dos empregados de seguros de toda a Franca, 66 por cento dos homens de letras, 61 por cento dos artistas, 51 por cento dos empregados dos bancos e bolsas, 42 por cento dos estudantes, 20 por cento dos funcionários. E não só esta grande concentração intelectual, comercial e administrativa, mas ainda uma proporção considerável de indústrias: óptica, 77 por cento; automóvel, 67 por cento; aeronáutica, 60 por cento; construções eléctricas, 55 por cento; indústrias químicas, 44 por cento, etc. (vide o jornal Le Monde - Sélection Heb-domadaire - 12-18 de Fevereiro de 1959).

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Não vale a pena alinhar mais números, porque estes são já suficientemente significativos; mas a prova exuberante de que a Frauda pretende ser mais do que «Paris e um deserto » fornece-a um recentíssimo diploma, publicado já este ano, onde se tomam providências acerca da descentralização dos estabelecimentos dependentes do listado ou submetidos ao seu contróle, cuja actividade for de ordem administrativa, industrial, comercial, científica, cultural ou social.
Com esta descentralização, relativamente a Paris, procura-se visar especialmente os estabelecimentos do Estado, de carácter industrial e comercial, abrangendo-se também nela, quer as «empresas nacionalizadas», quer as «sociedades de economia mista». E para tanto institui-se, junto do «Comissariado nacional do plano» (o grande «Plano», que já anteriormente citámos), uma a Comissão de descentralização», à qual ficam a competir algumas funções que, em razão do seu enorme interesse, não queremos deixar sem uma referência muito particular:
a) Estabelecer a lista dos serviços e estabelecimentos cuja presença na região parisiense, no todo ou em parte, não seja imposta pelas funções que desempenham ou pelas necessidades a que respondem;
b) Propor ao Governo as medidas de toda a ordem destinadas a assegurar a transferência progressiva, para o exterior da região parisiense, dos estabelecimentos acima referidos, segundo um plano cuja realização será escalonada em função das possibilidades materiais e financeiras. (Decreto n.º 58-1461, publicado no Journal Officiel, de 4 de Janeiro de 1959).
Os «planos de desenvolvimento» à escala regional - de que é tipo clássico o exemplo americano da T. V. A. (Tennessee Valley Authority), uma das experiências mais brilhantes, que data de 1933 - também entraram, como já se anotou, na órbita legislativa da França. São planos ainda mais vastos do que os simplesmente urbanísticos, designando-se por «programas de acção regional», «destinados a prolongar e a completar o plano nacional de modernização e de equipamento, projectando-o sobre a carta geográfica, tendo em conta as diversidades francesas e o aménagement rationnel du territoire».
Do relatório que antecede o «Programme d'action régionnel - Région de Bretagne» (Journal Officiel de 28 de Julho de 1956) destacamos ainda, pela sua importância como afirmação de princípios, a seguinte passagem:

A necessidade de conciliar os programas regionais entre si e com o plano nacional é evidente. Assim o objectivo final da acção empreendida não é somente a expansão de certa, região considerada isoladamente, mas antes uma expansão harmoniosa do conjunto da economia francesa em todos os seus componentes ...

(Vide também o plano corso, em cujo relatório figuram as mesmas afirmações acabadas de transcrever - Journal Officiel de 19 de Abril de 1957).
Esta orientação do legislador francês está na linha de pensamento das considerações feitas atrás, apenas com o maior relevo e valor prático da sua qualidade oficial. E resta acrescentar, para concluir, que ao último escalão dos três destacadas - o conjunto unitário do território nacional - já foram feitas no número anterior, embora com brevidade, as mais necessárias referências.

10. Ficaram suficientemente explícitos a transcendente relevância e o carácter complexo dos estudos urbanísticos. E do exposto decorre também a amplitude
e a dificuldade da missão que cabe ao urbanista no mundo contemporâneo.
Está hoje ultrapassado em alcance o clássico duelo urbanístico Lloyd Wright-Le Corbusier (a cidade «em extensão» ou a cidade «em altura»), em que afinal ambos os adversários saem vencedores ou vencidos conforme as circunstâncias especiais dos pontos de aplicação das duas teorias em presença. Com efeito, o problema do urbanismo tem-se ampliado a tal ponto que aquela, magna questão, ainda tão debatida, não passa, todavia, de mero pormenor numa tarefa de largueza impressionante. Nela estão em causa, ao lado das mais diversas ciências e técnicas cujo emprego não pode dispensar-se, alguns altos valores, concepções de vida e fins humanos a respeitar, por isso que o homem - em toda a sua plenitude de indivíduo e pessoa - é simultâneamente centro de toda a elaboração urbanística e ponto de mira de qualquer acção a desenvolver.
Assim se compreende que os programas de urbanismo só possam conceber-se e realizar-se, ao nível do nosso tempo, mediante um trabalho de equipa, em que hão-de participar solidàriamente o arquitecto e o economista, o engenheiro e o sociólogo, o geógrafo, o agrónomo, o higienista e o assistente social.
Cada um destes especialistas e outros mais terão o seu sector próprio de actuação, mais ou menos aturada e absorvente, pois o grau de contribuição das respectivas funções é essencialmente variável - não tem comparação possível a porção de trabalho que os engenheiros haverão de fornecer para os projectos urbanísticos, em confronto, por exemplo, com a ajuda que terá de pedir-se ao higienista.
Note-se, contudo, que - a par dos engenheiros e arquitectos - tem de exigir-se dos técnicos económicos uma contribuição permanente e exaustiva. Se, como já se acentuou, o novo urbanismo visa a conseguir a mais racional distribuição das populações em função dos recursos naturais e das actividades económicas, procurando o seu bem-estar e o seu florescimento (épanuuissement), não pode pôr-se em dúvida a larga missão que, nestes domínios, compete ao economista.
Nem vale a pena enunciar a longa série de problemas cujo exame e resolução entram na sua esfera de competência, desde os pertinentes à produção, e à produção trabalhadora, até à localização das indústrias e estudo da mão-de-obra respectiva, aos custos da concentração ou descentralização industrial, etc.
Sobretudo quando se passa do plano local para o regional, o concurso da ciência económica torna-se desde logo uma necessidade premente. E não surpreende, pois, que a economia regional - no relativo a processos de análise, métodos de observação e instrumental - esteja a tomar em nossos dias um incremento notável. Este ramo da Economia, de conteúdo teórico e prático, tem por fim o estudo do «espaço económico operacional» e é chamado a fornecer os subsídios ou soluções para a política de «arranjo e desenvolvimento do território», em que tomam papel preponderante os problemas industriais de estudo dos mercados e de localização das empresas.
A noção de «espaço económico» está hoje sistematizada; e para tanto foi decisivo em França o contributo do Prof. Perroux, que a considera em três acepções fundamentais: «espado homogéneo», «espaço polarizado» e «espaço-plano ou espaço-programa» (L'Europa sans rivages). Deste modo, tanto a «investigação cientifica aplicada», que aqui se socorre essencialmente da estatística descritiva e tem fins de utilização prática, como a «investigação operacional» - análise da escolha dos melhores meios que permitam atingir um fim determinado - fazem incidir os seus métodos de obser-

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vação sobre o espaço económico, encarando-o sob aquelas três ângulos diferentes que se integram na sua noção unitária.
Tem um interesse relevante para a economia regional o estudo do «espaço económico polarizado», pois a existência de «pólos de atracção», com maior ou menor força centrípeta, caracteriza genèricamente todas as regiões de um país. Entre a «região polarizada» e o seu «pólo» ou «pólos» desenvolve-se uma rede de trocas localizadas e interdependentes, e impõe-se medir todos estes fluxos e refluxos, como subsidio indispensável para a definição de uma política urbanística. E não só os fluxos dentro de certa região polarizada, mas também os que se estabelecem entre ela e outra sujeita à atracção de pólo diferente ou entre pólos diversos de igual ou diferente hierarquia (pólos locais, pólos regionais, nacionais ou mundiais).
Nunca será de mais ressaltar e encarecer o alcance prático de estudos deste tipo para os planos de «arranjo do espaço nacional», sobretudo se tivermos em mente o lugar preponderante que neles ocupam os problemas, da localização industrial e o extraordinário «efeito de polarização» engendrado pela implantação de certas indústrias, como autênticos «pólos de crescimento», que são (J. R. Boudeville, «L'Économie Régionale, Espace Opérationnel», in Cahiers de l'Institut de Science Economique Appliqués n.º 69, Junho de 1958).

11. Este problema da localização industrial e do seu corolário «descentralização» começa a reclamar, por toda a parte, a atenção dos economistas.
O problema central no domínio do urbanismo cifra-se no seguinte:

Uma política d'aménagement du territoire é rentável na medida em que o custo de desenvolvimento regional não excede o benefício previsto. Por outras palavras: o subdesenvolvimento regional e a concentração económica traduzem-se num custo para a colectividade, quer em razão de um acréscimo de certas despesas, quer por uma diminuição nos ganhos. Inversamente, uma política de descentralização traduz-se em certos encargos financeiros e económicos. Há um custo de expansão regional que corresponde não sòmente às despesas a efectuar para o promover, mas também à ausência de certas vantagens que se deparam em outras regiões. E a comparação destes dois custos - custo de subdesenvolvimento, por um lado, e custo de expansão, por outro - que deveria determinai as orientações políticas. (M. Penouil, «Note sur quelques aspects do la Politique l'aménagement du territoire». in Cahiers de l'Institut da Science Économique Aplliqués n.º 70, Julho de 1958).

Em certos aspectos esta comparação de custos levanta sérias dificuldades. É de salientar, por exemplo, que, se alguns dos elementos que compõem tais custos conseguem ter estatìsticamente uma avaliação tanto quanto possível rigorosa, outros não podem exprimir-se em termos monetários, e não resta outra alternativa que não seja a de os tomar em consideração mediante uma ideia simplesmente aproximada da sua importância.
Basta ver que o «custo do subdesenvolvimento regional» se compõe de elementos de variada natureza, fundamentalmente: «custos financeiros», «custos humanos», «custos económicos», «custos sociais». E, por seu turno, o «custo da descentralização e do desenvolvimento regional» desdobrasse também em vários componentes: «custos de aprovisionamento e mise en valeur», «custo das vendas» e «custos de transferência» (vide ob. cit).
A simples enumeração destes custos denuncia imediatamente a complexidade dos estudos relativos ao «arranjo do espaço nacional», onde ocupa lugar proeminente o problema da localização de indústrias e, dentro dele, o aspecto da descentralização, aplicável aos grandes aglomerados urbanos.
Nem todas as indústrias se encontram em condições idênticas em face do problema. Algumas têm uma localização imperativa, como é o caso das indústrias extractivas, implantadas nos locais da exploração do solo ou subsolo, definida que seja a sua viabilidade económica. Outras, como as indústrias pesadas, embora teòricamente localizáveis em qualquer parte, na prática são condicionadas sobretudo pelo custo dos transportes, dados as condições da matéria-prima ou da energia utilizadas, e devem instalar-se na proximidade dos jazigos abastecedores, ao longo das vias fluviais ou dos portos, constituindo verdadeiros «pólos de crescimento», por serem «indústrias motoras» que determinam a criação de novas indústrias acessórias ou relacionadas. Outras ainda - as indústrias ligeiras -, porque são caracterizadas pelo (predomínio da mão-de-obra sobre o consumo de energia e de matérias-primas, relativamente ao valor do produto final, permitem uma mobilidade maior do que as anteriores, embora esta característica se altere sempre que utilizem mão-de-obra altamente especializada, em regra de difícil recrutamento fora dos principais centros urbanos.
Uma parte das indústrias apontadas pode, sem riscos graves ou até com benefício, ser retirada das grandes urbes, tarefa, que aparece facilitada mercê do incremento nos meios de transporte e com os progressos crescentes da técnica, sobretudo quanto à utilização da energia eléctrica, que se dissemina a cada instante por todas as zonas rurais, emprestando-lhes uma das primeiras condições para a sua industrialização (vide ob. cit.).
Mas a descentralização tem a tolhê-la outros óbices, entre os quais há que destacar, principalmente quanto às indústrias ligeiras produtoras de bens de consumo, os custos resultantes do maior afastamento dos grandes mercados consumidores (custos de venda), expressos em maiores encargos de transporte e, relativamente à generalidade das indústrias, os custos de transferência, que muitas vezes ascendem a tão elevado montante que tornam impraticável a operação.
Esta última dificuldade faz com que, para inúmeros casos, a descentralização industrial seja concebida mais na sua variante de impedir a implantação de novas indústrias nas cidades já pletóricas do que, pròpriamente, mediante a transferência para outros locais das que ali se encontram instaladas. Não podendo ser atacada de frente, ladeia-se a questão; mas é evidente que não será curial generalizar semelhante atitude de espírito, confinando os objectivos de descentralizar a solução tão restrita como precária, sem comprometer a própria ideia do descongestionamento urbano, que foi o seu ponto de partida.
O caminho mais aconselhável parece ser, por isso, o de promover a transferência daquelas indústrias de possível afastamento, arbitrando às respectivas empresas, quando necessário, as compensações justas e adequadas, que podem ser de ordem vária, mas não deixarão incluir como regra as facilidades tributárias.
De qualquer modo, todavia, a política a seguir tem de ser confiada a um órgão superior, dotado dos meios de investigação necessários para abarcar a complexidade destes problemas em todas as suas implicações ou amplitude e revestido de autoridade executaria; portanto, órgão de estudo e órgão de decisão. Nem se

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compreenderia que fossem entregues à iniciativa dos empresários as decisões deste tipo, já que, ao pôr-se a hipótese de transferência para uma região subdesenvolvida, eles seriam determinados normal e exclusivamente pelos custos efectivos suportados pela sua empresa (simples parcela do custo total), com desprezo absoluto por todos os restantes, correspondentes aos encargos do desenvolvimento, a suportar pelo Estado, ou expressos em perdas sofridas pela Nação.
Por estes motivos, o sistema de estímulo à descentralização mediante subvenções requer cuidados especiais, pois que, quando concedidas aos empresários, «podem conduzi-los a descentralizar na medida em que contrabalancem as despesas resultantes da sua decisão. Mas no escalão nacional o ganho arrisca-se a ser nulo. Com efeito, para que a operação seja rentável, é necessário que a implantação de novas indústrias se traduza por uma mutação estrutural da região subdesenvolvida, único meio de diminuir o custo económico e o custo social da concentração» (M. Penouil, ob. cit.).
De tudo decorre, pois, a necessidade desse órgão investigador e decisório, à altura de abranger o conjunto do espaço económico, por forma a relacionar e coordenar os problemas conexos de região para região, possibilitando simultâneamente uma avaliação e comparação totais dos custos do subdesenvolvimento regional, por um lado, e da descentralização e desenvolvimento, por outro.

B) O problema urbanístico português

12. Com esta longa exposição, embora necessàriamente incompleta, sobre matéria estreitamente ligada com a proposta de lei, objecto do presente parecer - «Plano director do desenvolvimento urbanístico da região de Lisboa» -, houve o propósito confessado de destacar as grandes linhas do transcendente problema do urbanismo, quer na sua acepção primitiva e restrita de simples fluxo do campo para a cidade, quer no seu conceito moderno e notòriamente amplificado de «arranjo do espaço nacional».
Ao descrever tal evolução, simultâneamente histórica e conceptual, procurou-se também fazer ressaltar ou até mesmo desenvolver alguns aspectos que melhor poderiam aproveitar-se como subsídios para o estudo do caso português, ao qual vão cingir-se as considerações posteriores.
A tarefa surge assim facilitada, ao situarmos o problema em Portugal, e ser-nos-á possível avançar desembaraçadamente para o fim.
Para tanto servir-nos-emos de algum, material estatístico elaborado e publicado por autores portugueses, que pode fornecer ajuda preciosa aos objectivos visados com o presente parecer, e já que a carência de tempo não permitiu, com carácter original, mais do que a recolha e confecção de alguns dados estatísticos de secundária significação ou alcance, e mesmo assim só os de mais rápida obtenção.

13. O fenómeno da concentração urbana, nos termos em que o analisámos, pode dizer-se de carácter universal; é parte integrante no destino dos povos. E Portugal seguiu, portanto, esse destino.
Para maior simplificação e resultado mais expressivo, pelo que se refere ao nosso país, vamos reduzir a apreciação do problema às duas cidades de Lisboa e Porto.
Tomemos como ponto de partida dois quadros publicados no parecer sobre as contas públicas referente a 1951 (apêndice I «A População», in Diário das Sessões n.º 214, de 11 de Março de 1953), de que foi relator, como habitualmente desde há muitos anos, o Sr.º Deputado José de Araújo Correia.

População da cidade de Lisboa e sua zona suburbana

[VER TABELA NA IMAGEM]

População da cidade do Porto e sua zona suburbana

[VER TABELA NA IMAGEM]

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Para termo de comparação com os números acima registados é suficiente o «índice de aumento» de toda a população portuguesa (continente e ilhas) de 1890 (5 050 000 habitantes) para 1950 (8 441 000 habitantes). O referido índice é 167,1.
Os resultados da comparação são edificantes:
Tomado o máximo período conhecido, que antes se indicou (1890-1950, sessenta anos), enquanto a população geral aumentou de 100 para 167,1, a cidade de Lisboa subiu para 262,4 e a sua zona suburbana para 340,9; a cidade do Porto aumentou para 194,3 e a sua zona suburbana para 241,6.
Assim se demonstra a crescente pressão demográfica uns duas referidas cidades. Mas outras conclusões sugerem ainda os quadros apresentados.
Assim, é patente que o aumento total no período considerado é mais alto nas zonas suburbanas do que nas próprias cidades (Lisboa: 340,9, contra 262,4; Porto: 241,6, contra 194,3).
Por outro lado, o processo da concentração acelera-se a partir de 1920 em ambas as cidades e seus aglomerados suburbanos, sendo de salientar o extraordinário salto verificado na zona suburbana de Lisboa no decénio 1940-1950: enquanto a cidade passa de 709 179 habitantes para 790 434 (aumento: 81 205), os concelhos suburbanos sobem de 253 582 para 346 118 (aumento: 92 536). Isto em números Absolutos, porque, se mais rigorosamente cotejarmos os índices de aumento, encontra-mos ainda valores mais frisantes: enquanto no mesmo decénio de 1940-1950 o índice da população da cidade possa de 235,5 para 262,4 (aumento: 26,9), o índice relativo à zona suburbana sobe vertiginosamente de 249,7 para 340,9 (aumento: 91,2).
Outras ilações mais circunstanciadas poderiam tirar-se dos quadros indicados. Mas - e até para não diluirmos com pormenores a forte impressão de conjunto - limitar-nos-emos a observar:

a) A taxa de crescimento das duas cidades e subúrbios é muito superior à da população portuguesa em geral; esta subiu pouco mais de uma vez e meia no período 1890-1950, ao passo que Lisboa e seu aglomerado suburbano aumentaram, respectivamente, mais de duas vezes e meia e cerca de três vezes e meia e, quanto ao Porto, respectivamente, cerca de duas vezes e de duas vezes e meia;
b) A taxa de crescimento, tanto na capital do Sul como na do Norte, é nìtidamente superior nos aglomerados suburbanos, relativamente às respectivas cidades;
c) A taxa de crescimento é sensìvelmente mais alta na região de Lisboa do que na do Porto, quer quando se considerem ambas as cidades ou os respectivos aglomerados suburbanos;
d) O crescimento relativo ao último decénio conhecido (1940-1950) na zona suburbana de Lisboa adquiriu proporções jamais atingidas. (Em contrapartida, verifica-se no mesmo período, e em relação à cidade, um recuo no ritmo ascensional, que vinha a ser mais acelerado nos dois decénios anteriores, 1920-1930 e 1930-1940).

As observações registadas, quando as relacionemos com o problema urbanístico português e seguindo a mesma ardem das alíneas anteriores, permitem-nos formular as seguintes conclusões:

a) Estamos perante um fenómeno de concentração urbana progressiva, que se torna imperioso estudar, em ordem a definir a política de actuação mais adequada;
b) Os problemas urbanísticos das cidades têm de ser encarados em ligação com as zonas suburbanas, de importância crescente, impondo-se assim que se posse do escalão local ao escalão regional e justificando-se plenamente o plano regional de Lisboa, objecto da presente proposta de lei;
c) A pressão demográfica na região de Lisboa é bastante mais acentuada do que na do Porto (independentemente da importância relativa dos nossos dois maiores aglomerados urbanos);
d) Impõe-se estar atento ao crescimento demográfico da zona suburbana de Lisboa, frente aos números apurados no último decénio conhecido (1940-1950), e perante o próximo censo de 1960, em ordem sobretudo a corrigir eventuais defeitos da distribuição populacional na referida zona, orientando-a pela forma mais conveniente. A proposta de lei, que adiante examinaremos, pode e deve proporcionar, para os fins em vista, um contributo inestimável.

Interessa registar ainda que 2l,2 por cento da população metropolitana se concentra nas duas cidades de Lisboa e Porto, compreendidas as suas zonas suburbanas. No entanto, a grande maioria das cidades do continente e das ilhas adjacentes está abaixo dos 30 000, ou até dos 20 000 habitantes. Apenas seis cidades - Setúbal, Coimbra, Funchal, Braga, Évora e Covilhã - têm população superior.
Tal significa que até o próprio fenómeno da concentração urbana é, em Portugal, sobremaneira irregular, revelando um predomínio acentuado e quase exclusivo das duas maiores cidades, em detrimento dos outros centros urbanos e do País em geral.
É bastante elucidativo, a tal respeito, o quadro que seguidamente se inscreve, calculado, com referência ao ano de 1957, para as percentagens que cabem a Lisboa e Porto na arrecadação de alguns impostos, na construção de habitações, no movimento portuário e no total das sociedades existentes (ano de 1956, para este último caso):

[VER TABELA NA IMAGEM]

(a) Fogos construídoS.
(b) Navios entrados nos portos do Lisboa e Leixões (tonelagem bruta).

Todos estes dados se conjugam, ,pois, para o reforço das conclusões já tiradas sobre o considerável predomínio dos nossos dois maiores centros populacionais. E este é, sem dúvida, mais um importante facto a considerar em futuros planeamentos urbanísticos regionais, no sentido de promover o desenvolvimento de certas zonas do País, indubitàvelmente dotadas de boas condições naturais e que só aguardam o estímulo ou o auxílio dos sectores responsáveis.

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14. Porque faltam dados estatísticos a partir de 1950 para os fins antes assinalados, limitamo-nos a registar seguidamente alguns elementos indirectos que podem dar uma ideia de continuidade sobre o ritmo da concentração populacional em Lisboa e sua zona suburbana.

Referem-se esses elementos a alguns consumos expressivos, como sejam os de água, electricidade, gás e transportes, na cidade de Lisboa, e outrossim ao movimento de transportes entre Lisboa e alguns dos concelhos da sua zona de influência, tanto ao norte como ao sul do Tejo.

Desenvolvimento de alguns serviços na cidade de Lisboa

[VER TABELA NA IMAGEM]

(a) Em milhares.
(b) Em milhões (C. C. f. I..)

Fonte: Relatórios das empresas concessionárias.

Desenvolvimento dos transportes no estuário do Tejo

[VER TABELA NA IMAGEM]

Fonte: Relatórios da Administração-Geral do Porto de Lisboa.

Movimento ferroviário suburbano

[VER TABELA NA IMAGEM]

Fonte: Relatório da Sociedade Estoril.

Os quadros anteriormente insertos são bem significativos para a demonstração indirecta do crescimento populacional de Lisboa e da sua zona suburbana, a partir do último censo (1950). E pena foi que a escassez de tempo não tivesse permitido organizar mais alguns mapas estatísticos relativamente a outros índices indirectos, os quais por certo só confirmariam as conclusões que já largamente podem tirar-se dos quadros apresentados.

15. Uma das principais anotações registadas anteriormente [n.º 13, alínea a)] conduziu-nos à verificação do que «a taxa de crescimento, tanto na capital do Sul como na do Norte, é nítidamente superior nos aglomerados suburbanos, relativamente às respectivas cidades».
Neste particular, é curioso referir que idêntico fenómeno se tem manifestado dentro dos limites da cidade de Lisboa, entre as suas próprias freguesias, cuja
população tem migrado do centro para a periferia da zona urbana.
Em diploma legal muito recente (Decreto-Lei n.º 42 142, de 7 de Fevereiro de 1959), que visa a remodelação das freguesias de Lisboa, suprimem-se duas do centro da cidade (Conceição Nova e S. Julião) e criam-se dez novas freguesias, ajustando-se os limites de todas as restantes. Esclareça-se que, desde o começo do século até hoje, só uma freguesia foi criada, A da Penha de França, por decreto de 13 de Abril de 1918.
No relatório do novo diploma, depois de se sublinhar o rápido intumescimento populacional de Lisboa, desde que foram fixados os seus actuais limites por decreto de 18 de Julho do 1885, até ao censo de 1950, afirma-se que a agravar esta situação «está o facto do despovoamento das freguesias do centro da cidade, fenómeno comum às grandes cidades, cuja explicação se encontra na invasão dessa zona central pelo comércio e nas remodelações urbanísticas impostas pelo novo ritmo de vida

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das modernas urbes. Basta dizer que das quarenta e três freguesias de Lisboa, vinte e quatro, bem mais de metade, diminuíram de população no decénio de 1940 a 1950».
Para elucidação destes factos, inscrevem-se seguidamente dois mapas sobre a evolução demográfica de algumas dessas freguesias, que apresentam resultados flagrantes, quer das duas freguesias da área mais central, agora extintas, cujo declínio populacional é evidente, quer de freguesias já afastadas do centro ou localizadas na periferia, onde a curva ascensional tem um andamento mais expressivo.

Evolução demográfica em declínio (Lisboa)

[VER TABELA NA IMAGEM]

Evolução demográfica ascensional (Lisboa)

[VER TABELA NA IMAGEM]

Os mapas são suficientemente esclarecedores para dispensarem quaisquer comentários.
Mas imporTa, salientar, uma vez mais, neste ligeiro apontamento, que existe uma natural coincidência entre a migração, populacional do centro para a periferia da cidade e o forte movimento de concentração nos aglomerados suburbanos. E ocorre sublinhar também que a nova divisão administrativa «foi concebida tendo em vista o plano, director da urbanização de Lisboa - cujos estudos se encontram na fase final -, e parte não só da situação presente, mas também da evolução prevista. Integra-se no plano da Lisboa Nova como elemento que é da estrutura orgânica da cidade que se projecta, de acordo com as mais recentes aquisições da urbanística».
Estas afirmações, consignadas no relatório do Decreto-Lei n.º 42 142, sugerem-nos uma última anotação. Pretendemos referir-nos à feliz e, aliás, imprescindível coordenação de serviços que permitiu integrar a nova remodelação administrativa de Lisboa no plano urbanístico local com ela estreitamente relacionado; e acrescentar, em complemento lógico, que esse plano de escalão «local» não pode deixar de integrar-se harmoniosamente no «plano regional», que consta da proposta de lei cuja apreciação agora está em causa.

16. Examinou-se o fenómeno da concentração demográfica nas duas principais cidades do País e nas suas zonas de polarizarão. Mas o problema, circunscrito a estas duas regiões bem caracterizadas, e por mais importantes que elas sejam, tem necessàriamente, de enquadrar-se numa visão nacional, consoante o espírito hoje dominante em matéria urbanística e que na primeira parte deste parecer foi repetidas vezes assinalado. Planos locais e planos regionais são partes de um todo que será o plano urbanístico do conjunto do território, digamos, o plano de «arranjo, do espaço nacional» ou, mais simplesmente, o «plano nacional». E embora esse plano de conjunto não exista ainda, porque o seu levantamento é trabalho ingente e moroso, muito embora ponderosas razões de urgência aconselhem a inverter uma ordem natural, dando prioridade aos planos do escalão regional - como, aliás, está sucedendo já quanto aos planos locais, antecipando-se nos regionais -, o certo é que deverão, pelo menos, definir-se algumas linhas de orientação essenciais, à escala nacional, quais permissas-mestras em que terá de assentar uma política urbanística, para que seja conscienciosa.
Esta concepção do problema, no seu verdadeiro e amplo conteúdo, impõe-nos o exame de mais alguns elementos estatísticos, agora reportados a todo o País, pelo menos à metrópole (continente e ilhas), já que os territórios ultramarinos têm neste domínio uma singularidade próprias, apesar de deverem ser considerados numa útil coordenação global, podem no entanto ser tratados em alturas diferentes.
Para tal exame, que terá de ser breve, vamos socorrer-nos mais uma vez dos valiosos elementos que o Sr. Deputado Araújo Correia alinhou no seu já citado parecer sobre as contas públicas de 1951.
Comecemos pelo panorama demográfico provincial, para depois passarmos ao plano distrital. E logo aqui observamos um facto saliente, que justifica bem todas as apreensões sobre a irregularíssima distribuição populacional, no território metropolitano: quatro das nossas províncias - Estremadura, Douro Litoral, Beira Litoral e Minho - detêm na sua área (cerca de 2% por cento do total.) mais de metade da população portuguesa (4 617 000 habitantes, contra o total de 8441 000 habitantes - 54,8 por cento -, números referidos a 1950). Todas as restantes províncias - Beira Alta, Trás-os-Montes e Alto Douro, Ribatejo, Alto Alentejo, Baixo Alentejo, Beira Baixa, Algarve, bem como as ilhas adjacentes-, numa área de 77 por cento sobre o total, não albergam, mais do que 3 824 000 habitantes, o que dá - 45,2 em percentagem. A densidade da população oscila entre 27,3 no Baixo Alentejo e 293,5 no Douro Litoral. Se das «quatro afortunadas províncias» destacarmos a Estremadura e o Douro Litoral, verifica-se que estas, só por si, abrangem 33,6 por cento da população portuguesa metropolitana em 1950 (27 por cento em 1900 e 31,4 por cento em 1930).

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Passando agora ao escalão distrital, a irregularidade de repartição observada mantém-se ou até se acentua. Seis dos nossos distritos - num total de vinte e dois, incluídos quatro das ilhas - contêm, em 1950, mais de 50 por cento da população total (4 238 000 habitantes): Lisboa, Porto, Braga, Viseu, Aveiro, Santarém. A densidade da população vai desde os máximos de 461,3 no Porto e 447,0 em Lisboa até aos mínimos de 28 em Beja e 29,7 em Évora.
É bem elucidativo o quadro que 41 seguir se inscreve com- a população por distritos em 1890 é 1950 e respectivas diferenças em percentagem.

População presente

Variação

[ver tabela na imagem]

Como notas mais salientes podem apontar-se as seguintes:

a) O distrito do Porto, que era em 1890 o mais populoso de Portugal (546 540 habitantes, contra 495 963 no distrito de Lisboa), cede n. o seu lugar a este último, que atingiu em 1950 a cifra de l 226 815 habitantes, contra l 052 663 no distrito do Norte;
b) Consequentemente, a percentagem de aumento, de 1890 para 1950, foi muito maior no distrito de Lisboa (147,4 por cento) do que no distrito do Porto (92,6 por cento);
c) O maior acréscimo de população observa-se no distrito de Setúbal - 181,4 por cento -, o que é ilusório, salvo do ponto de vista administrativo, visto corresponder, este vertiginoso aumento, aos concelhos da margem sul do Tejo integrados no "espaço polarizado", que tem o seu "pólo" na cidade de Lisboa, principalmente Almada, Barreiro e Seixal.
d) As oscilações dos acréscimos populacionais são de uma amplitude flagrante: vão desde os máximos já assinalados - 181,4 por cento (Setúbal), 147,4 por cento (Lisboa) e 92,6 por cento (Porto) - até aos mínimos de 22,4
por cento (Guarda), 24,7 por cento (Viseu) e 26,4 por cento. (Bragança). Excluímos deste cortejo o caso particular das ilhas adjacentes, em que um dos distritos (Angra do Heroísmo) mostra percentagem ainda inferior aos mínimos antes registados (20 por cento) e noutro se verifica o resultado único e verdadeiramente excepcional de uma percentagem negativa, ou seja um decréscimo de 6,6 por cento na população do distrito da Horta durante o período considerado, 1890-1950.
As considerações anteriores corroboram quanto se escreveu já a respeito das regiões de Lisboa e Porto, demonstrando, agora mais directamente, a manifesta irregularidade na repartição populacional de todo o País.
Se esta irregularidade não pode referir-se tomando como padrão um critério exequível de uniformidade, que seria absurdo em face das diferentes condições naturais de cada região e não deve esquecer-se que a natureza postula desigualdade, nas coisas e nos homens -, a verdade é que lima atitude passiva de abandono, assente na fatalidade das circunstâncias, pode conduzir e está seguramente conduzindo a transmudar em realidade a incisiva caricatura a que aludimos para trás: "Paris e o deserto francês".
E não se por motivos de justiça está a impor-se uma atitude decididamente activa perante o excessivo desequilíbrio populacional no interior dos países. Do ponto de vista económico, aproveitar excessivamente as áreas de melhores condições actuais, com menosprezo absoluto das simplesmente razoáveis ou sofríveis, é caminhar para a saturação e inversão de sinais, transformando em mau ou péssimo o que poderia ser bom.
Assim se tem entendido quase por toda a parte, quer quanto à situação das nações entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos -, onde se busca um maior equilíbrio com vantagens económicas gerais, quer no pertinente às regiões também assim diversificadas no interior de cada país, relativamente às quais mais instante e sentida se nota a ambição de remediar o exagero das desigualdades existentes.
Nas considerações finais do seu citado estudo sobre a população o Sr. Deputado Araújo Correia escrevia já em 1953:
Talvez que em nenhum outro aspecto da vida nacional se justifique tanto o planeamento sensato e comedido como neste e talvez que em nenhuma outra esfera nacional ele pudesse dar tão grandes resultados, porque, como os números mostram, uma parte muito importante da população é rural u ainda vive em pequenas povoações a trabalhar nos campos por processos rudimentares. A agricultura continua a ser a fonte do seu sustento.
E à guisa de conclusão -em matéria que se prende directamente na proposta de lei agora em exame - afirma:
A concentração demográfica nas zonas costeiras é um grave sintoma ria vida interior do País. E a concentração em Lisboa e Porto, que prossegue, tornar-se-á muito séria dentro de duas ou três décadas. Em quase toda a parte se luta hoje contra esta tendência de fuga para as grandes capitais.
A inflação urbana, no passado feita na maior parte das vezes pela ignorância dos resultados sociais e éticos, hoje patentes a todos, está a ser combatida. O descongestionamento das grandes cidades é em muitos países considerado problema nacional. (Diário das Sessões n.º 214, de 11 de Março de 1953).

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17. Os raciocínios aduzidos e as conclusões formuladas foram com base nos números estatísticos reportados ao censo de 1950. Não será viável antes do próximo censo de 1960 trabalhar com segurança sobre novos números, mas é possível -e conveniente para uma ideia aproximada sobre a evolução posterior a 1950- elaborar estimativas pura situar no nosso tempo os dados que se desactualizaram.
Na nossa hipótese, pelo menos, o processo é admissível, desde que nos podemos contentar com- uma simples aproximação paru os fins visados e já que as séries demográficas conhecidas mostram, como regra, uma linha de crescimento contínuo, embora mais ou menos acelerado. Não haverá, pois, grandes probabilidades de erros muito grosseiros.
Nestes termos, calculou-se por extrapolação -com base no decénio 1940-1950 e para o meio dos anos de 1958 e 1959- a estimativa global da- população portuguesa (continente e ilhas) e a estimativa para cada um dos distritos e para as duas cidades de Lisboa, e Porto. Segue o respectivo quadro:

População calculada para o meio dos anos de 1958 e 1959

[ver tabela na imagem]

Os valores constantes do mapa organizado não invadiram nem alteram as ilações tiradas em relação a 1950, antes e naturalmente as reforçam.
Limitemo-nos, pois, a destacar que Portugal metropolitano terá, porventura e neste momento, excedido a cifra populacional de 9 milhões, que Lisboa será uma cidade de cerca do 860 000 habitantes e o Porto de mais de 300 000, isto sem contar com as populações caracterizadamente citadinas, que vivem nas suas redondezas.
A salientar, ainda, que Lisboa está ascendendo velozmente já hierarquia das cidades milionárias. E, por ironia do destino ou melhor consciência das realidades isto, que significaria honra e júbilo alguns anos atrás, é hoje motivo bem fundado para sérias apreensões.
18. Um dos aspectos que o planeamento urbanístico tem de encarar e resolver é, como se tem afirmado, o da localização das indústrias e, consequentemente, a não e delimitação das zonas industriais. Se tal planeamento, porém, respeita à região de Lisboa, torna-se evidente que o problema da repartição da nossa indústria adquire então importância primordial. E vamos por isso considerá-lo ao menos seja linhas muito gerais e enquadrado no conjunto nacional, aproveitando para u efeito alguns utilíssimos dados estatísticos coligidos e publicados em trabalhos portugueses de economia.
Se definirmos como regiões industriais aquelas em que a participação da população industrial na população activa é superior à média do País (25 por cento), depuramos com cinco distritos industriais: Aveiro, Braga, Lisboa, Porto s Setúbal. Outros seis distritos ainda apresentam uma população industrial de certa importância na região: Castelo Branco, Coimbra, Faro, Leiria, Santarém e . Viana do Castelo (entre 23 e 17 por cento). Nos restantes distritos a indústria não absorve mais de 14 por cento da população activa, não atingindo i mesmo 10 por cento em dois deles: Bragança e Vila Real. (F. Pereira de Moura, L. M. Teixeira Pinto e M. Jacinto Nunes, estrutura da Economia Portuguesa, 1954).
Da obra citada transcrevem-se adiante dois quadros muito significativos, reportados no censo de 1950: o primeiro com a distribuição da população industrial pelos vários distritos do continente e respectivas percentagens; o segundo também dirigido à população industrial, mas limitado às duas cidades de Lisboa e Porto e respectivos distritos.

Repartição regional da população industrial

[ver tabela na imagem]

A análise dos números registados permite concluir também sobre a. existência dos cinco "distritos industrializados" já enumerados antes. Mas permite ainda outras conclusões: que esses cinco distritos, só por si, representam 67 por cento da população industrial do continente; e que os dois distritos mais industrializados são, primeiro, o do Porto e, depois, o de Lisboa, ambos a uma grande distância dos três restantes.

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Quanto à primazia do distrito do Porto sobre o de Lisboa, ver-se-á, pelo quadro seguinte, que as coisas se não passam do mesmo modo quando comparadas as duas cidades. Mas verá que esclarecer ainda, estar incluída no distrito do Setúbal toda a população dos concelhos industrializados da margem sul do Tejo, que, efectivamente, se integram na região industrial de Lisboa (Barreiro, Seixal, Moita, Montijo e Almada).

População industrial em Lisboa e Porto

[ver tabela na imagem]

For grau de industrialização deve entender-se a percentagem de população industrial na população activa.
Como se verifica, a posição de Lisboa-cidade é mais do que dupla relativamente ao Porto-cidade, quando se tomem os números absolutos que exprimem as suas populações industriais: 103 400 unidades, contra 46 600 unidades. E o próprio grau de industrialização é também mais alto em Lisboa: 30 por cento, contra 25 por cento no Porto.

19. Com o aumento da população portuguesa, em geral, que tivemos ocasião de analisar em parágrafos anteriores, verificou-se obviamente um acréscimo correspondente na população activa do País, que em 1950 se cifrava em 3 196 000 pessoas, das quais 783 000 constituíam a nossa população industrial (cerca de 25 por cento).
Esta percentagem da população industrial sobre a população activa, quando tomemos como ponto de partida o censo de 1930, tem vindo a crescer sensivelmente: 17 por cento em 1930, 21 por cento em 1940 e 25 por cento em 1950. E tal parece demonstrar o esforço de industrialização que veio a processar-se de 1930 para cá e em que o País mais ainda se tem empenhado nos últimos anos.
Esta percentagem crescente da população industrial na população activa deve-se principalmente aos cinco distritos industrializados, onde o crescimento tem sido muito mais acentuado.
Para ajuizar o que tem sido a intensidade de crescimento na população industrial desses cinco distritos, relativamente aos restantes, durante o período 3930-1950, veja-se o quadro seguinte:

[ver tabela na imagem]

Os números, porque são suficientemente expressivos, não exigem grandes desenvolvimentos. A notar apenas - repetindo uma observação já feita antes- que a notável percentagem de aumento registada no distrito de Setúbal (148 por cento), e muito distante de todas as outras, é com certeza substancialmente devida nos concelhos industrializadas da margem sul do Tejo, e por consequência deveria rigorosamente ser acrescentada, em grande parte, à zona sul - Lisboa, cujo distrito apareço no quadro com a percentagem da acréscimo mais baixa de todas: 56 por cento.
Este e outros factos anómalos quanto ao estudo da repartição das indústrias impõem o abandono, para certos casos, do critério puramente administrativo da divisão por distritos, dando preferência ao das regiões industriais.
Transcrevem-se, a tal propósito, estas judiciosas afirmações, inserta em obra recente:

Sobre os números do censo de 1950 (que já sabemos falseadores da realidade do nosso ponto de vista) definimos concelhos industrializados aqueles em que a participação da população industrial na activa é largamente superior u média do País e construímos dois agregados com tais concelhos, que, pela sua proximidade geográfica, dependência comum de idênticos centros de consumo, recurso a análogas redes de transporte e manifesta interdependência de actividades fabris, pareceram autorizar a delimitação de núcleos bem diferenciados. Pode discutir-se a inclusão de certos concelhos e não temos dúvidas acerca da possibilidade de aperfeiçoar a estruturação estabelecida, sobretudo quando se dispuser de melhores elementos de informação; mas cremos que corresponde a uma realidade, bem mais profunda do que a divisão distrital, a delimitação das zonas industriais Norte e Sul, centradas, respectivamente, no Porto e em Lisboa, abrangendo a primeira quase todo o distrito do Porto, o sul de Braga e o norte dê Aveiro e abarcando a última uma "coroa" de concelhos industrializados desde Oeiras a Vila Franca de Xira e completando-se com os da margem sul do Tejo, polarizados para o estuário e a zona urbana, muito mais do que para Setúbal, sua capital administrativa. (Estudo sobre a Indústria Portuguesa, II Congresso da Indústria Portuguesa, 1957, F. Pereira de Moura e um grupo de trabalho por ele chefiado. Deste importante estudo se retiraram todos os elementos estatísticos que a presente parágrafo encerra).

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Na obra citada,, e em concretização do critério ali preconizado, incluem-se dois mapas referentes às zonas industrializadas rio Norte e do Sul, com a indicação rios concelhos abarcados por cada uma delas e a respectiva percentagem da população industrial na população activa.
Reproduzem-se as mapas referidos, dado a Réu grande interesse:

ZONAS INDUSTRIALIZADAS

ZONA NORTE

[ver mapa na imagem]

ZONA SUL

[ver mapa na imagem]

Do mapa relativo à zona industrializada do Sul

- aquela que directamente respeita u proposta de lei em exame - conclui-se que os concelhos da margem sul do Tejo, comparados com os da margem norte, acusam uma percentagem maior da população industrial sobre a população activa, todos acima de 40 por cento - desde os máximos de 70 e 62 por cento no Seixal e Barreiro até ao mínimo de 41 por cento em Almada.
Por seu turno, os concelhos da margem norte não excedem o limite de 40 por cento, que só é atingido no de Vila Franca de Xira, verificando-se a percentagem mínima no concelho de Lisboa - 30 por cento. E nem valeria a pena. insistir em que estamos trabalhando com números relativos (percentagens sobre a população activa de cada concelho), pois, evidentemente, a população industrial de Lisboa-cidade é, em números absolutos, muito superior à de qualquer outro concelho.

20. O estudo da- região industrial de Lisboa tem uma importância que não s preciso encarecer. A Comissão do Plano Regional de Lisboa e ao respectivo Gabinete, previstos na proposta de lei (bases XVI e XI), competirá, entre tantas, essa árdua tarefa, que se desdobra em vários compartimentos, designadamente o da localização das indústrias.
No domínio da localização, aproveitando os subsídios que a experiência de outros países já pode emprestar-nos, haverá dois aspectos primordiais a encarar: o das
indústrias já existentes, ç portanto instaladas em determinados Locais, e o das novas indústrias a criar, ainda sem localização fixada.
Compreensivelmente, o problema põe-se em termos diferentes num e noutro caso.
Quanto às indústrias existentes, o procedimento a adoptar será, como regra,, mante-las nos locais que elegeram, mesmo quando a sua localização apresente algumas desvantagens, já que os "custos" resultantes de uma transferência para outros lugares serão, em grande número de casos, incomportáveis.
Logo, porém, que os inconvenientes da localização actual de algumas indústrias atinjam certa medida, terá de ser encarada e sua transferência para outras zonas e tornar-se-á indispensável criar, um conjunto de estímulos, concedendo facilidades ou até estabelecendo um sistema adequado de compensações.
O nosso atraso do ponto de vista industrial transforma-se, neste caso particular, em circunstância feliz: não chegámos a pontos extremos de uma centralização industrial na zona urbana de Lisboa que imponham uma draconiana descentralização. Há, por certo, instalações fabris a mudar, mas a situação não assume os aspectos sérios de outros países mais industrializados.
O segundo aspecto a considerar - o das novas indústrias - apresenta-se muito mais facilitado, sob certo ângulo, pois aqui não haverá que entrar em consideração com os vários "custos" ocasionados por uma transferência de local e mensurá-los. Para as novas unida

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dês industriais que vão ser montadas terá de contar-se sempre com as "despesas de primeiro estabelecimento"; e "esta" são a, e normalmente, menos onerosas em áreas fora da cidade.
Aias, sob outro ângulo, o problema reveste-se de maior complicação. E forçoso determinar criteriosamente - tendo em conta os vários factores que integram o custo de produção - as áreas destinadas aos estabelecimentos fabris (zonas industriais); e nesta determinação adquirem peso fundamental as linhas de transporte para o acesso às matérias-primas e escoamento dos produtos fabricados para os mercados consumidores, o abastecimento de energia, o recrutamento da mão-de-obra e as relações de "aglomeração" industrial.
Mas, delimitadas que sejam as zonas industriais, aipos o exame aprofundado das suas múltiplas implicações, tudo se resume a encaminhar para lá as novas instalações fabris, sempre que possível com a faculdade de escolha, para as empresas, de uma ou outra zona, entro as várias existentes na região considerada. E entram em jogo, para o efeito, não só os serviços de licenciamento das novas indústrias, como também os serviços- municipais que concedem os licenças para construção e exploração, ambos em estreita subordinação legal as normas estabelecidas nos planos urbanísticos aprovados.

21. Referiram-se, muito genericamente, alguns dos requisitos exigíveis para a escolha das zonas industriais, em ordem ao regular funcionamento das explorações fabris; mas os outros condicionalismos não pode deixar de atender-se, entre os quais figura a defesa das áreas de maior produtividade agrícola ou de interesse florestal e a implantação de zonas residenciais para trabalhadores nas proximidades dos locais de trabalho.
Este último aspecto das zonas residenciais requer cuidados particulares, perante as modernas concepções urbanísticas, que condenam a formação de simples bairros operários, sem autonomia e vida própria, apenas grandes "dormitórios" em vez de centros comunitários com um mínimo de organização colectiva e de serviços d u interesse comum.
Para dar satisfação a este novo conceito - centrado no ideal da dignificação e aperfeiçoamento humanos - parece haver que seguir um de dois caminhos: ou se criam bónus residenciais integradas numa perspectiva de conjunto que tenha em vista a criação de novos aglomerados urbanos, com vida autónoma, ou se localizam essas zonas residenciais em espaços aproveitáveis de aglomerados já existentes. E nesta última hipótese, que será u normal, terá de prever-se e estudar-se o desenvolvimento da povoação escolhida, dotando-a com os meios correspondentes ao suplemento de população acrescido, por forma a promover o seu crescimento harmonioso.
O sistema adoptado em Inglaterra pelo Grenter London Plan (1944), que entrou em vigor com o New Townx Act (1946), foi, em regra, o aproveitamento de pequenos ou médios centros urbanos para implantação das cidades-satélites inglesas, oficialmente denominadas "cidades novas".
No quadro que a seguir se inscreve podem colher-se dados muito recentes sobre o desenvolvimento já atingido por essas cidades, reportado a 31 de Março de 1008. Note-se que a falta apenas a última cidade, a décima quinta, que foi criada em 1955 e ainda se encontra em fase incipiente - Cumbernauld, na Escócia H. Running, "The New Towns", 1958, in National provincial Book Review, Novembro de
1958.

Desenvolvimento das "novas cidades" inglesas até 31 de Março de 1968

[ver tabela na imagem]

Gomo se vê, apenas três cidades foram edificadas em lugares onde só existiam insignificantes aglomerados rurais de 60, 200 e 1150 habitantes: Newton, Peterlee e Glenrothes. Em todos os outros casos foram aproveitados pequenos e médios aglomerados, que, no entanto, chegavam a atingir os 25 000 habitantes. E registe-se apenas, quanto à evolução demográfica, que o aumento populacional das novas cidades é, em muitos casos, considerável; Harlow, por exemplo, quase decuplicou a sua população de 1947 (4500 habitantes) até 1958 (41600).

22. Têm sido muito discutidos, nos últimos tempos, alguns aspectos da localização industrial no nosso país, quer com referência aos casos particulares de certas indústrias, quer no que respeita, em geral, a irregular distribuição das unidades fabris por todo o território da Nação.

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Relativamente a região de Lisboa, as críticas incidem não só quanto a unidades industriais implantadas dentro do perímetro urbano ou muito próximo dele, mas ainda em relação as que se têm instalado, em curso sucessivo, em determinadas áreas dos concelhos industrializados de que Lisboa é o pólo de crescimento.
Citaremos apenas duas das críticas mais generalizadas presentemente e que tiveram eco era documentos oficiais. Assim, no parecer da Câmara Corporativa sobre o projecto do II Plano de Fomento (parecer n.º 3/VII "Metrópole", de que foi relator o engenheiro Ferreira Dias) podem ler-se, a propósito da discussão sobre a ponte de Lisboa, as seguintes e incisivas considerações:

Quando se vê a rapidez com que se montam indústrias ao longo da linha férrea do Norte, ocupando férteis terrenos de lezíria, num país de pedras, de areia e de terras delgadas, sente-se algum constrangimento. A lezíria é um dom do Tejo, semelhante aos nateiros do Nilo, de que já reza a história do tempo dos faraós; perdê-la, para a ir recuperar, talvez de pior qualidade, em terras regadas a 35 contos por hectare não é de aceitar sem discussão.
Criar uma via férrea, directamente ligada a Lisboa, cortando as magras areias pliocénicas da margem sul, em terrenos tão planos como os da margem norte, mas de muito menor valor agrícola, para onde se canalizassem novas indústrias, seria bem um pensamento ajustado a- qualquer plano de fomento. Nem de outra maneira se conseguirá dar à margem sul condições de vida própria, sem a transformar em mais um a "dormitório" de Lisboa.

Por seu turno, na Assembleia Nacional, o Deputado Araújo Correia, durante a discussão do II Plano de Fomento e também a propósito da ponte sobre o Tejo (Diário das Sessões n. 54, de 22 de Outubro de 1958), fez, entre outras, as considerações seguintes:
Lisboa, por força de uma política que considero anti-social, está a ser rodeada, gradualmente, de bairros industriais. E vão-se concentrando aqui, na medida que passam os anos, as actividades do País. Alarga-se e estende-se em todas as direcções. Só não o podia fazer para o sul, porque um obstáculo natural lhe tolhia o movimento. A ponte vem destruí-lo.

E mais adiante continua:

O alargamento de Lisboa para a Outra Banda, com a criação de novas indústrias, cria ainda incentivo para avigorar o poderio económico da cidade e, indirectamente, para enfraquecer uma parcela importante da vida provinciana. Em minha opinião, deviam opor-se dificuldades, e não dar facilidades, ao desenvolvimento industrial de Lisboa, até por uma questão de ordem estética. Num crescimento industrial harmónico, o caminho natural a seguir é criar indústrias em localizações apropriadas, como, aliás, se fez no passado e como, até espontaneamente, aconteceu nalguns casos em épocas mais recentes. Entre as mais conhecidas, podem citar-se S. João da Madeira, Tramagal e Estarreja.

Está aqui, indiscutivelmente, levantado um grande problema, que terá de ser enfrentado, para sobre ele se tomar posição, no nosso programa urbanístico, à escala nacional. Há que definir uma atitude neste particular aquando da elaboração necessária desse "plano nacional", ainda não determinado por lei, mas já previsto em documentos oficiais (vídeo relatório da comissão encarregada de elaborar as disposições regulamentares do estudo e realização dos planos de urbanização, Janeiro de 1958).
Aquela tomada de posição é tanto mais imprescindível quanto é certo dever ela constituir uma das grandes linhas de orientação abarcadas pelo conteúdo de qualquer programação para o a arranjo do espaço nacional, que é a concepção lata do urbanismo de hoje.
A tese do engenheiro Araújo Correia, pela qual, aliás, vem batalhando há muitos anos, enquadra-se no espírito hoje dominante em matéria de planeamentos ao nível superior. Filia-se em razões de justiça social que entraram já no património da humanidade e ali se consolidam cada vez mais, mas quer filiar-se também em motivos de ordem económica, expressos em maior rentabilidade global.
Se quanto às primeiras razões e a luz do nosso tempo não se descortinam argumentos que possam destruir a tese ou diminuir-lhe sequer a sua altura, já o mesmo não poderá dizer-se no campo da economia, ao menos em termos absolutos. O que equivale a concluir, relativamente u zona industrializada do Sul, por uma adesão em princípio à repartição mais equilibrada das nossas indústrias e, por consequência, ao descongestionamento da região de Lisboa.
Uma adesão definitiva, porém, supõe-se que exigirá o exame aprofundado da estrutura da nossa indústria por sectores, dirigido especialmente - a uma comparação de natos em função das localizações.
Certo que os anseios por uma repartição mais equitativa das indústrias, em todo o espaço nacional, estão hoje grandemente favorecidos pélas maiores facilidades de energia s pelo notório progresso dos transportes. Mas há outras variáveis a equacionar, e elas dependerão, em grande parte, do condicionalismo estrutural de cada indústria. E dependem também dos condicionalismos próprios de cada região, pois há, evidentemente, muito-) casos em que, mesmo a princípio se poderá afirmar não ser realizável o desenvolvimento de certas regiões, porque os encargos correspondentes seriam muito superiores ao benefício total que dele resultaria (financeiro, económico, social e humano).
Por isso se repele que uma conscienciosa tomada de posição sobre este transcendente problema tem de alicerçar-se em estudos pormenorizados e de base científica sobre a estrutura da indústria portuguesa e de cada um dos seus sectores, estudos que só recentemente se iniciaram entre nós com os trabalhos dos economistas portugueses atrás mencionados. Há que continuá-los e intensificá-los, sob pena -e só estamos a restringira-nos ao domínio urbanístico - de ser impossível ou precário o estabelecimento de um plano nacional de a arranjo" para o território português.

23. As considerações anteriores- levantam uma questão de fundo, porventura a maior que a presente proposta de lei suscita do ponto de vista concreto.
Queremos reportar-nos a circunstância, já tantas vexes assinalada, de os planos urbanísticos, na sua actual e tão lata concepção, interferirem fatalmente nos problemas do "desenvolvimento económico", sobretudo quando se encarem os escalões superiores - regional e nacional. E põe-se, por isso, a questão de saber se - não dispondo o País, por enquanto, de "planos regionais de desenvolvimento" nem de órgãos criados para os elaborar - vamos desde já fazer o planeamento urbanístico regional, em toda a latitude do seu moderno alcance, sem nos encontrarmos suficientemente preparados para obra de tamanha envergadura e forçados, portanto, a confiar ao órgão já existente do Ministério das Obras Públicas (Repartição de Estudos de Urbanização) e ao novo órgão agora, projectado (Gabinete do Plano Regional de Lisboa) funções tão amplas, sem

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que no menos tenhamos a possibilidade de coordenar a sua acção com a de outros órgãos especificamente apetrechados pura planear o desenvolvimento económico.
É parece não dever admitir-se a hipótese de atribuir ao futuro Gabinete do Plano Regional de Lisboa a função de um órgão dirigido ao planeamento económico (o que excederia manifestamente o âmbito do Ministério das Obras Públicas), muito embora ele tenha de ser dotado com o pessoal técnico indispensável ao estudo de certos problemas económicos, sobretudo os que respeitam ao vasto sector da localização das indústrias.
E de tal maneira é íntimo o relacionamento e entrelaçamento dos dois tipos de planos -"urbanísticos" (aménagement du territoire) e de desenvolvimento - que em frança, após a experiência de alguns anos, se reconheceu a estrita necessidade de os fundir num só, quanto ao escalão regional, criando assim um único plan régional de development économique et social et d'amenagement du territoire .
Esta importante medida, como já tivemos o ensejo de destacar (vide § 8), foi tomada em diploma legislativo muito recente (Decreto n. 58-1459, in Journal Offitiel de 4 de Janeiro de 1959), onde também se prescreve que o estabelecimento destes planos conjuntos, de desenvolvimento e urbanísticos, bem como a sua coordenação -tanto no quadro rio Plano Nacional de Modernização e de Equipamento (o grande "Plano" francês a escala nacional), como no quadro da política de aménagement du territoire -, são assegurados por um Comité deu Plans Régionaux, também criado pelo fitado decreto.
O exemplo da França corrobora as reservas que acabámos de fazer ao critério de atribuir, desde já, ao plano da região de Lisboa toda a amplitude que pode comportar o planeamento urbanístico regional nu sua moderna concepção.
Antes de termos órgãos próprios para o traçado dos nossos planos regionais de desenvolvimento, parece muito arriscado intervir decisivamente nos problemas que entram .no raio de acção daqueles planos, sob pena de - prejudicarmos a tarefa a empreender no futuro.
Isto não quer significar que deva travar-se a preparação ou elaboração do plano que consta da proposta de lei. Muito ao contrário, há que acelerá-lo ao máximo, para os fins que possam ser imediatamente prosseguidos; e, mais ainda, há que caminhar deliberada e rapidamente para a elaboração dos estudos e pura a estruturação dos órgãos indispensáveis ao estabelecimento dos planos de desenvolvimento do território português. E, neste sentido, emite a Câmara um voto em que põe o maior interesse e empenho, sugerindo ao Governo o exame deste importante problema nacional em termos de o encarar de frente no mais curto prazo possível.
Este se considera o caminho móis prudente a trilhar. E daqui resulta logo uma conclusão prática, qual é a de reduzir ao. mínimo reputado conveniente a área abrangida pelo plano urbanístico que é objecto da presente proposta de lei, ou, por outras palavras, a de não alargar a "região de Lisboa" em medida desproporcionaria as nossas possibilidades actuais.
Mas tal assunto, porque é matéria do "exame na especialidade", será, mais a frente, tratado com o desenvolvimento que a sua importância requer.

24. É óbvio que, além dos aspectos postos em relevo, um plano regional de urbanização abrange muitos outros, não sendo possível, como se calcula, desenvolvê-los a todos ou mesmo aflorá-los em termos de breve comentário, como, em regra, se tem procedido até agora. Valha, por isso, uma ou outra enunciação que houve o ensejo de fazer na primeira parte diste parecer, ao abordar-se o "problema urbanístico em geral".
Mas o critério adoptado não dispensa, uma referência particular u situação anómala da zona suburbana de Lisboa no concorrente ao problema da habitação e à consequente euforia construtora dos últimos anos.
O relatório da proposta de lei faz ressaltar este aspecto como em dos mau prementes a que os objectivos do plano devem dar satisfação. E o caso é descrito por forma tão pertinente e Lúcida que nos permitimos reproduzir aqui algumas dos passagens ali consagradas ao assunto:
À falta de um plano director do desenvolvimento cia área de influência da capital, não tem sofrido praticamente limitações a instalação de indústrias nos seus arredores, nem tem sido possível impedir o crescimento desordenado das povoações suburbanas e a criação de novos núcleos (populacionais, ao sabor das iniciativas particulares. Estas são movidas, na maioria dos casos, por simples propósitos de especulação de terrenos ou com o intuito de se evadirem da disciplina dos planos de urbanização ... E assim que os subúrbios de Lisboa têm sido progressivamente invadidos por uma intensa actividade de construção, que tão depressa destrói a expressão tradicional e a beleza peculiar das povoações arrabaldinas, como faz nascer múltiplos povoados amorfos e incaracterísticos, que tendem a rodear a cidade por uma cintura asfixiante - cada vez mais profunda, à medida que aumentam as facilidades de transporte que eles próprios reclamam - de meros amontoados de construções inestéticas, desprovidos de personalidade e de vida própria, verdadeiros dormitórios de massas populacionais muito importantes que diariamente afluem à capital para exercerem nela a sua actividade.
Aqui estão condensados os dados fundamentais da questão, que assim ficou escalpelizada. E a indisciplina na fúria construtora, e, pior do que isso, é uma actuação atrabiliária e a completa anarquia que reinam por aí fora, em domínios de tamanho melindre e projecção como esses de erguer novos agregados populacionais onde milhares de famílias não de viver e proliferar.
Esta anomalia, fértil em consequências danosas, que começam a transparecer a vista desarmada - e só há que vaticinar o seu agravamento -, manifesta já sinais alarmantes. E o tolhê-la - porque é muito tarde para evitá-la - seria, por si só, justificação bastante para o estabelecimento, no mais curto prazo possível, do plano regional de Lisboa.
O relatório da proposta evidencia também outros objectivas do planeamento regional em causa, designadamente a defesa das áreas próprias para a agricultura, a protecção e a expansão das áreas arborizadas, a valorização das zonas de interesse turístico, e mais particularmente a defesa do património de beleza natural e de valores monumentais, históricos, artísticos e arqueológicos.
O enunciado não suscitará contradita, pelo que se ajusta ao conteúdo e alcance próprios dos planos urbanísticos, até no seu primitivo conceito, hoje tão alargado; tanto mais que o devemos tomar como enumeração exemplificativa e nunca taxativa. Veremos contudo, mais adiante, ao entrarmos pelo exame na especialidade - e com referência à base II, onde aquele enunciado tem u sua concretização em projectada norma legal- se ali existe alguma importante omissão.

25. Ao concluir a apreciação na generalidade da proposta de lei, interessa reafirma a que na exposição

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feita, e apesar de muito longa, não se reputou aconselhável entrar pelos domínios do pormenor técnico quanto à concepção, elaboração ou execução dos planos urbanísticos, nem houve o intuito de desfibrar exaustivamente a matéria inesgotável do urbanismo.
Pareceu mais útil observar o fenómeno na sua funda essência, fixar os traços gerais de uma evolução histórica e conceptual e destacar apenas em grandes1 linhas alguns dos mais relevantes problemas, de molde a não obscurecer com minúcias uma visito global do tema urbanístico. Este, que foi o critério-regra deliberadamente escolhido, não impediu, contudo, o maior desenvolvimento num ou noutro ponto determinado, quer por assim se ter julgado contribuir mais expressivamente para uma boa apreensão de conjunto, quer também pela transcendência manifesta de alguns aspectos salientes do moderno urbanismo, como, por exemplo, a localização das industriai; e o seu corolário da centralização ou descentralização.
Resta acrescentar que também não houve a preocupação de resolver problemas, antes e fundamentalmente a de levantá-los, trazendo u superfície a evidência da sua magnitude e a imperiosidade do seu ataque frontal, no máximo, e- só raras vezes, se deixaram entrever princípios de solução, já que não existem dados suficientes para chegar n soluções definitivas e ser exactamente essa colheita de dados, em ordem a uma tomada, de posição, o desígnio imediato da proposta de lei que passaremos a examinar na especialidade.

II

Exame na especialidade

BASE -: I

26. O n. 1 desta base está redigido nos termos seguintes:

1. a Ministro dos Obras Públicas promoverá a elaboração, no prazo de três unos, do plano director do desenvolvimento urbanístico da região de Lisboa, abreviadamente designado por plano regional de Lisboa.
Sublinham-se apenas duas passagens: a primeira, porque sugere alguns comentários, e a segunda, porque merece reparo.
O prazo de três anos, fixado para a, elaboração do plano, parece ser realmente o mínimo de tempo indispensável para tarefa de tamanha largueza, em razão dos minuciosos elementos a colher e dos estudos de diversa índole a efectuar, onde se inclui também a necessária definição de grandes directrizes à escala nacional, prevista na base II.
Sob este ângulo, o prazo arbitrado não suscita discrepância, salvo o admitir-se que ele poderia ser ampliado com vantagem, em face da complexidade e morosidade do empreendimento. Mas supõe-se que tudo se prepare e oriente para uma cadência acelerada no ritmo dos trabalhos, o que implica deverem os serviços ser dotados com os meios pessoais e materiais imprescindíveis. E só nesta perspectiva se concorda com o prazo de três anos estipulado.
Mas, sob ângulo diferente, o problema inverte-se e já tem de raciocinar-se em termos exactamente opostos. E que existem factos clamorosos - como essa anarquia construtora n flagelar as zonas suburbanas de Lisboa e carregada de tremendas consequências, agravados dia a dia - que requerem uma pronta actuação, de modo a evitar-se, ao menos, a continuação sucessiva das anomalias mais gritantes.
Para obviar a tão pesados inconvenientes, a providência que primeiro saltaria ao pensamento, se não estivessem presentes, com todo o sen peso as razões aduzidas atrás, era encurtar sensivelmente o prazo de três anos fixado na proposta. Mas esta solução, pelo que se disse, é de arredar elimine, sob pena de ficarem comprometidas, ou mesmo inteiramente falhadas, as mais altas finalidades do plano.
Outra providência poderia ser a cisão do plano em duas partes: uma primeira fase, que disciplinasse em curto prazo o mais urgente aspecto da construção civil suburbana, e uma segunda fase, que cuidasse de todos os outros fins do planeamento. Mas não parece fácil, nem talvez factível, cindir uni semelhante plano, de tal modo aquele primeiro objectivo a considerar está relacionado e entrelaçado com a grande maioria dos outros aspectos a programar.
E surge naturalmente uma terceira solução, qual é a dê encarar desde já medida" acautelar, provisórias e à margem ;do plano, no sentido de travar com urgência a indisciplina da construção, estabelecendo limitações ou proibições relativamente a certas áreas já invadida" ou ainda imunes. Um rápido estudo feito por técnicos urbanistas poderia delimitar essas zonas sem grandes dificuldades e dentro de um relativo rigor, com todas as vantagens para a execução futura do plano.
Esta se reputa a orientação mais racional e prudente. Por isso, a Câmara entende dever propor que à base I seja acrescentado um novo número, com a seguinte redacção:

2. A. Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização fica encarregada de estudar e propor superiormente, dentro do prazo de um ano, as normas provisórias destinada-a a vigorar, até à data da provação do Plano Urbanístico da Região de Lisboa que repete mais urgentes sobre a disciplina de certos aspectos contidos no âmbito do referido plano, nomeadamente sobre a construção de edificações e certas áreas da região de Lisboa, definida no número seguinte.
Este novo número agora proposto não excluí que desde já se providencie no sentido de sujeitar a prévia autorização do Ministro das Obras Públicas todas as construções ou obras a fazer em determinados locais abrangido" na área do plano, conforme se dispõe na base V, adiante examinada.
À segunda passagem que merece reparo no texto da base I da proposta respeita à denominação adoptada: aplano director do desenvolvimento urbanístico da região, de Lisboa".
O nome que se preconiza não é só escusadamente longo, mas também nos parece menos correcto. Em primeiro lugar, não se vê motivo para se usar a expressão "plano director", quando é certo que um plano urbanístico, qualquer que seja, é sempre um plano que dirige, orienta e disciplina; consequentemente, pode considerar-se redundância, pelo menos neste caso, a conjugação das duas palavras. Aliás, o conceito da simples palavra "plano", sem qualquer qualificativo, é com certeza mais rico ou amplo, e qualquer adjectivação que se lhe acrescente só pode restringir-lhe o alcance, que não aumentá-lo.
De outro lado, não se concorda com o emprego da palavra "desenvolvimento", que modernamente entrou na terminologia técnico-económica, com a agravante de existir entre uma variedade de planos de diversos tipos os chamados "planos de desenvolvimento", que têm um âmbito ainda mais largo do que o "plano de arranjo do espaço nacional" (aménagement du territoire), digamos, o "plano urbanístico".

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Portanto, ou a palavra "desenvolvimento" aparece utilizada em sentido técnico, e presta-se a confusão lamentável, ou está empregada no seu significado corrente, e também nessa qualidade não tem ali justificação, uma vez que um aplano urbanístico" nem sempre será de desenvolvimento para todas as regiões, anãs acontecerá até normalmente que os seus resultados poderão exprimir-se em desenvolver algumas zonas em detrimento e outras.
Os fundamentos invocados levam a Gamara a propor que a denominação aplaudo director do desenvolvimento urbanístico da região de Lisboa", inserta no n. l da base I, seja substituída pela expressão mais simples ti mais correcta: plano urbanístico de região de Lisboa". E, dado que a denominação proposta é bem mais curta do que a inserta na proposta esta lei, já não se vê a necessidade de arranjar uma segunda designação abreviada, além de que a expressão "Plano Regional de Lisboa"- pelos motivos que acima se escreveram acerca dos planos de desenvolvimento - pode prestar-se u confusões que interessa evitar (vide também o § 23). Aliás, o nome escolhido - Plano Regional de Lisboa ajusta-se melhor a um futuro plano de desenvolvimento para a região de Lisboa do que ao plano urbanístico, objecto da proposta de lei.
E estas condições, propõe-se para o n. 1. da base I e seguinte redacção:

1. O Ministro das Obras Públicas promoverá a elaboração, no prazo de três anos, do Plano Urbanístico da Região de Lisboa.

27. Os n.º 2 e 3 da base I referem-se aos limites da região de Lisboa:

2. Consideram-se incluídos na região de Lisboa, para os fins desta lei, os seguintes concelhos:
a) Do distrito de Lisboa - Cascais, Lisboa, Loures, Mafra, Oeiras, Sintra, e Vila Franca de Xira;
b) Do distrito de Setúbal - Alcochete, Almada, Barreiro, Moita, Montijo, Palmeia, Seixa.1, Setúbal e Sesimbra.

3. O Ministro das Obras Públicas poderá determinar os ajustamentos na delimitação desta área que vierem a mostrar-se convenientes no decurso fia elaboração do plano.
Os concelhos indicados, das margens norte e sul do Tejo, não coincidem com imites que foram tomados em consideração para o delineamento dos mapas estatísticos insertos na alínea B) da apreciação na generalidade, referentes a Lisboa e seus aglomerados suburbanos, os quais foram organizados com base em elementos oriundos do Instituto Nacional de Estatística.
Convém analisar as diferenças existentes; e, para tanto, foram sublinhados acima os concelho em divergência.
Quanto à margem norte (distrito de Lisboa): o concelho de Mafra não foi incluído na delimitação do Instituto Nacional de Estatística e, do concelho de Vila Franca de Xira, só entraram em linha de conta as freguesias de Alhandra, Alverca do Ribatejo e Póvoa de Santa Iria.
Quanto à margem sul (distrito de Setúbal): não foram considerados pelo Instituto Nacional de Estatística os concelhos de Alcochete, Palmeia, Sesimbra e Setúbal, nem se contou com todo o concelho do Montijo, mas apenas com, duas freguesias - Sarilhos Grandes e Montijo.
Qual a razão de tamanhas divergências?
Parece ser fundamentalmente esta: o critério do Instituto Nacional de Estatística foi delimitar os aglomerados suburbanos de Lisboa -digamos, a sua zona urbana - onde grande parte da população é constituída por gente que exerce a sua profissão na cidade, vive nesses mesmos aglomerados, mas trabalhando em para onde e de onde diariamente se desloca, ou que unidades industriais polarizadas em Lisboa. Diferentemente, o legislador preocupa-se agora com definir a "região de Lisboa"; e aqui já o critério pode ser mais amplo, mus também por certo bastante mais arbitrário.
Se, porém, o desígnio visado é abranger todos os concelhos mais sujeitos à influência do aglomerado urbano de Lisboa, geral se compreenderia que se incluísse nos limites da região o concelho de Mafra a se desprezassem os de Arruda ou Sobral, mais próximos e não menos influenciados pelo núcleo polarizante de Lisboa. Esta incoerência acentuar-se-ia ainda ao considerarmos o caso edificante de Setúbal-concelho, com a sua autonomia citadina e industrial e os traços constitutivos de um "espaço económico polarizado" (embora com e pólo" de grau secundário), concelho esse que praticamente se encontra tão influenciado pelo "pólo" principal de Lisboa como estarão, por exemplo, Santarém ou Caldas da Rainha.
Os factos exemplificados teriam de considerar-se autênticas anomalias ou contrasensos quando o ponto de vista adoptado para definir a região de Lisboa tivesse assentado 110 índice "zona de influência" que conduziu os nossos raciocínios. Mas é aparente que não foi esse o critério orientador- da proposta de lei. E, ao pretendermos descortinar-lhe o sentido, talvez devamos inclinar-nos em duas direcções, no fundo convergentes.
Fixemo-nos primeiramente num dos objectivos assinados ao plano - o constante da alínea e) da base II. Ali se prescreve a defesa e valorização dos monumentos e locais de interesse histórico, artístico ou arqueológico, paisagens, estâncias de recreio ou repouso e outros locais de turismo". Se raciocinarmos então com base neste aspecto regional importantíssimo, prevenido naquela alínea, e que podemos englobar mi designação genérica do turismo, já todas as anomalias ou contra-sensos se transmitam em atitude coerente perante a realidade viva do interesse regional em função do seu desenvolvimento turístico. Setúbal, Palmeia e Sesimbra, com a beleza impressionante da Arrábida, o recorte atraente da costa e as suas praias de águas límpidas, o magnífico estuário do Sado - constituem sem exagero um dos mais belos circuitos turísticos do País, com ponto de partida na foz do Tejo. E também se explica perfeitamente - ou até se impõe, na sequência do critério indicado - inclusão de Mafra, com o seu monumental convento e também parte integrante de outro conhecido percurso de turismo da região de Lisboa, passando por Sintra, Praia das Maçãs e Ericeira.
Mas, independentemente dos motivos de ordem turística e sobrelevando-os, podem encontrar-se outros que justifiquem o alargamento da região de Lisboa para além da sua "zona de influência" imediata. Queremos referir-nos a alguns problemas de fundo que poderiam estar em causa perante o plano urbanístico da região de Lisboa, designadamente a descentralização de indústrias ou a eventual idade da criação de agregados populacionais -digamos, "cidades-novas"- em áreas sujeitas à jurisdição do mesmo plano.
Olhado por este novo prisma, o caso de Setúbal surgiria já com uma perspectiva totalmente diversa, pois para não se poderia admitira hipótese de canalizar algumas indústrias , tirando maior rendimento da sua capacidade portuária ainda ião insuficientemente aproveitada e obviando simultaneamente a sua posição desvantajosa de centro industrial "monotipo", razão primeira das crises que periodicamente atravessa.
Ao mesmo tempo, não pode esquecer-se a ideia quê existe da construção do canal Tejo-Sado, ligando os

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dois portos de Lisboa, e Setúbal, que tanto poderia contribuir para o desenvolvimento industrial desta última cidade e de toda a zona de Alcochcte.
Na mesma urdem de ideias, também não seria já a fama de seu monumental convento que implicaria a inclusão de Mafra. Antes, s acima disso, a circunstância de se encontrar num raio de 40 ou 50 km dentro do círculo do Lisboa e, portanto, com o afastamento considerado vantajoso para a criação eventual de novos aglomerados urbanos.
Os fundamentos apresentados explicariam, pois, n alargamento da região de Lisboa a concelhos já fora da zona de influência da cidade. Mas, sendo assim, seria coerente e talvez indispensável - incluir lambem os dois concelhos de Arruda e Sobral de Monte Agraço, omitidos no n. 2 da base I.
Julgamos ter sido esta a concepção de que partiu o autor da proposta de lei pura definir os limites da região de Lisboa. E ninguém duvidará de que estamos em presença de Tiniu concepção, lógica ou criticará u desmedida latitude da área projectada, dentro do pauto de vista em que se colocou o mesmo autor.
Poderia invocar-se uma vez mais o testemunho da França para demonstrar que, em princípio, os limites propostos para a região de Lisboa não eram excessivamente largos. E, assim, o critério seguido, ainda há bem pouco tempo, para a delimitação do novo "distrito da região de Paris" foi o de um raio de 50 km aproximadamente à volta da capital francesa.
O novo distrito abarca na sua superfície, do norte a sul, cidades como Senlis, Pontoise, Nantes, Rambouillet. Étampes, Fontainebleau, Melun, Manx, etc. E tudo indica que esses limites definirão também, pura o futuro, toda a zona que é costume chamar a "região parisiense" e que, actualmente, é muito mais reduzida. Pelo menos assim o declararam dois membros do Governo Francês, em recente conferência de imprensa. (V. Le Monde Selection Hebdomadaire - de 12-18 de Fevereiro de 1959).
Tudo é certo; mas, simplesmente e neste caso particular, os dados do problema são inteiramente diversos em França e em Portugal. Ali existem já planos- de desenvolvimento u escala regional, o que não sucede entre nós; ali se promoveu até a fusão dos dois tipos de plano regional, da desenvolvimento e urbanístico, e ali se torna possível, portanto, fazer um planeamento geral para uma área tão extensa e importante como n da região de Paris.
Não vamos reproduzir agora as considerações aduxidas 110 § 23 a propósito deste palpitante assunto, as quais rematavam - exactamente pela conclusão de ser prudente, no menos por agora, confinar n região de Lisboa a limites menos amplos do que os consignados nu proposta de lei.
E, a entender-se assim, parece que não haverá motivo para nos afastarmos sensivelmente do critério adoptado pelo Instituto Nacional de Estatística para a definição dos limites da área urbana e suburbana de Lisboa, apenas se divergindo dele ao considerarem-se na sua totalidade os dois concelhos de Vila Franca de Xira e Montijo, o que parece explicar-se até por um mero critério de simplificação.
Neste sentido se pronuncia a Câmara, propondo-se a alteração respectiva no n. 2 da presente base, que, mercê do aditamento já antes proposto, passaria a n. 3:

3. Consideram-se incluídos na região de Lisboa, para, os fins desta lei, os seguintes concelhos:
a) Do distrito de Lisboa: Cascais, Lisboa, Loures, Oeiras, Sintra e Vila Franca de Xira;
b) Do distrito de Setúbal: Almada, Barreiro, Moita, Montijo e Seixal.

E, considerando que os limites estabelecidos para a região de Lisboa poderão ser ajustados no decurso da elaboração do plano, se assim for julgado conveniente (actual n.º 3 da base I, com que inteiramente se concorda), a Câmara nada mais tem n objectar à delimitação fixada pela proposta de lei.

BASE II

28. Trata-se aqui matéria fundamental do domínio urbanístico, condensada nos múltiplos objectivos a prosseguir:

1. O plano regional de Lisboa será baseado em inquérito preliminar sobre os condicionamentos de nível nacional u que deva subordinar-se e sobre as características e tendências da região em todos os aspectos que interessem aos objectivos do plano.

2. A partir da análise dos resultados do inquérito serão definidas as linhas gerais do desenvolvimento da região abrangida, em especial no que se refere:
a) A distribuição da população pelos núcleos existentes e a mar e às limitações e características gerais a imprimir ao seu desenvolvimento;
b) As redes gerais de comunicações e transportes;
c) A definição das zonas a afectar a tipos especiais de utilização, tendo em lista, designadamente, a preservação de áreas adequadas- a exploração agrícola e ao povoamento florestal e a criação de espaços livres públicos e de instalações de interesse colectivo a integrar nas zonas rurais;
d) A definição das zonas especiais onde será autorizada ou interdita a criação ou o desenvolvimento de instalações de carácter industrial;
e) A defesa e valorização dos monumentos e locais de interesse histórico, artístico ou arqueológico, paisagens, estancias de recreio ou repouso e outros locais de turismo;
f) A organização geral dos serviços necessários ao abastecimento público (águas, electricidade, etc.) e ao saneamento urbano.
3. Fará parte integrante do plano regional de Lisboa o respectivo regulamento, no qual serão enunciadas as disposições gerais necessárias para garantir a efectivação das medidas previstas nó plano e os condicionamentos especiais a que deverão ajustar-se os planos de urbanização das povoações ou das zonas compreendidas na região de Lisboa.
Relativamente ao n. l da presente base, suscitam-se apenas ligeiros reparos sobre a sua redacção.
Assim, parece dever suprimir-se o adjectivo "preliminar" aposto à palavra (inquérito", pois que, se o plano realmente se baseia em inquéritos, estes têm de realizar-se antes do - seu estabelecimento, o que equivale u ser pleonástica aquela adjectivação.
Por outro lado, não será apenas um inquérito, mas serão porventura vários, não podendo esquecer-se que o Instituto Nacional de Estatística tem em curso um "inquérito industrial", que deverá fornecer preciosos subsídios para o plano em projecto; e, além disso, os inquéritos constituem, por sua vez, o - suporte necessário para os estudos a empreendei1, convindo, portanto, não deixar omissos estes últimos.
Por estas razões, sobretudo, se propõem alguns retoques na redacção deste número, que deverá ficar nos termos seguintes:

1. O Plano Urbanístico da Região de Lisboa será baseado em inquéritos e estudos sobre os condicionamentos de nível nacional a que deva subordinar-se

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bem, como sobre as características e tendências da região em todos os aspectos que interessem nos objectivos do plano.
Pelo mesmos motivos, o corpo do n.º 2 denta base deve também sofrer pequenas alterações, podendo ficar assim redigido:

2. A partir da análise dos resultados a que conduzirem, os referidos inquéritos ou estudos, serão definidas as linhas gerais do desenvolvimento da região abrangida, em especial no que se refere:

E segue-se uma enumeração em várias alíneas, donde só destacaremos aquelas que merecerem observações ou reparos.
Não se considera suficientemente clara a redacção da alínea a), propondo-se, por isso, algumas alterações, pela forma seguinte:

a) À. distribuição da população pelos núcleos já existentes e a criar, assim como à fixação das características gerais a imprimir ao seu desenvolvimento ou das limitações reputadas necessárias.

Relativamente a alínea c), interessa observar que, numa região cujo principal centro urbano é uma cidade tão populosa como Lisboa e, portanto, grande merendo de consumo, assumem altíssima importância os problemas do seu abastecimento. Neste particular, na zona suburbana têm de reservar-se áreas suficientemente extensas para a produção agrícola (principalmente nos sectores da horticultura s fruticultura) e ainda para outras actividades com ela relacionadas, nomeadamente a criação de gado com destino ao fornecimento de leite e a avicultura para o fornecimento de ovos e carne.
Se é certo que os progressos na rapidez dos transportes já permitem o abastecimento de "géneros frescos" em regiões mais distantes dos grandes centros consumidores, não pode deixar de encarecer-se a importante função de alguns concelhos suburbanos de Lisboa tradicionalmente têm desempenhado e devem manter, como fornecedores de tais géneros. Citem-se como exemplos Loures, Sintra e Vila Franca de Xira.

29. No concernente à alínea d) julga-se conveniente introduzir-lhe duas ligeiras alterações:

d) À delimitação das zonas especiais onde e será autorizada ou interdita a criação ou a expansão de instalações industriais;
Deve observar-se, em relação ao conteúdo desta alínea, que ela nada prevê a respeito de uma possível transferência de certas indústrias actualmente localizadas em zonas que o plano venha a declarar interditas e cuja manutenção se revele notoriamente prejudicial.
A proposta de lei, no seu articulado ou mesmo no relatório, não contém sequer as palavra sobre tão importante assunto. Compreende-se que o problema é delicado em extremo, mas tal não pode justificar a sua total omissão por parte do legislador.
Parece ser de encarar, pois, a inclusão de um preceito em tal sentido, muito embora possa manter-se integralmente a doutrina contida na citada alínea d), até para dar a ideia de que ali se pretende regular o caso regra, prevendo-se a excepção num novo número a introduzir na presente base.
As considerações já esplanadas -e que seria ocioso reeditar agora- quanto à necessidade de uma descentralização industrial nos casos mais flagrantes fundamentam em absoluto a inclusão desse anunciado preceito, embora formulado em termos prudentes, a saber:

4. Em diploma especial serão reguladas também as condições a que deve subordinar-se a transferência em casos excepcionais das indústrias cuja localização actual na região de Lisboa porventura se reconheça como altamente nocivas, fixando-se as zonas que devem considerar-se interditas para todas ou apenas paru determinadas instalações industriais e estabelecendo-se o, sistema de compensações a conceder às empresas abrangida.

Não suscitam comentário ou reparos as duas alíneas seguintes, e) e f), entendendo-se que u matéria fundamental respeitante aos objectivou do plano está contida aia enumeração analisada, salvo um aspecto que reputamos também muito importante e que não tem ali qualquer tratamento. Queremos referir-nos aos condicionamentos a estabelecer para assegurar dentro do possível a maior segurança e defesa das populações em emergências graves, designadamente o caso de guerra.
A consideração destas circunstâncias não pode, infelizmente, deixar de intervir na definição das linhas gerais do desenvolvimento da região abrangida , a que se reportam as várias alíneas enumeradas, puis, por exemplo, bem pode acontecer que, entre duas ou mais soluções possíveis para resolver determinada hipótese urbanística, se tenha de optar por aquela que melhor satisfaça aos apontados requisitos de segurança e defesa, mesmo com algum prejuízo para outros objectivos que normalmente se deveriam em absoluto respeitar.
Julga-se, pois, conveniente a inclusão de uma nova alínea na discriminação inserta no n. 2 da base em apreciação:

g) As condições de segurança e defesa - da população em emergências graves, nomeadamente o caso de guerra.

Poderia objectar-se, contra a pretendida inclusão desta alínea, que a sua matéria está naturalmente abrangida nos condicionamentos de nível nacional", a que se refere o n. 1. O argumento; que à primeira vista parece fundado, tem de ceder, contudo, perante a circunstância real de ser diferente a situação das várias regiões do País quanto aos condicionamentos necessários para garantir-lhes uma protecção eficaz. E mesmo quando assim não sucedesse, a situação de Lisboa, neste particular, é de tal forma ímpar entre a diversidade do território nacional - como alvo preferido para eventuais ataques - que seria sempre de estranhar não figurarem as "condições de segurança e defesa" no articulado que abarca os objectivos do seu plano regional.
Por último, uma simples referência ao n. 3 da base que está em exame, e apenas para um pormenor de redacção. Escreve-se ali que no regulamento do plano a serão enunciadas as disposições gerais necessárias ...". Ora nau se trata, com certeza, de mera "enunciação" de disposições nem sequer a expressão seria inteiramente correcta mesmo quando se referisse a um simples enunciado (enunciar disposições?).
Propõe-se, portanto, uma pequena alteração no aludido n.º 3:

3. Fará parte integrante do Plano Urbanístico da Região de Lisboa o respectivo regulamento, no qual ficarão consignadas as disposições gerais necessárias para garantir a efectivação das medidas previstas no plano ...

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BASE III

30. Transcreve-se esta base, fazendo-a acompanhar de alguns comentários e de um aditamento:

1. A aprovação do Plano Urbanístico da Região de Lisboa será da competência do Conselho de Ministros, mediante proposta do Ministro doa Obras Públicas e ouvida a Câmara Corporativa.
2. O diploma que aprovar o plano regional de Lisboa estabelecerá as condições em que deverá efectuar-se a sua revisão periódica e, bem assim, os prazos concedidos para a revisão dos planos de urbanização locais a que se refere, base IV.

Com referência ao disposto no n.º l, não deixará de registar-se a orientação do Governo, generalizando o uso da faculdade que lhe é conferida pelo artigo 105.º da Constituição Política para pedir o parecer da Cornara Corporativa sobre os projectos de diplomas legais que são da sua competência e revestem maior importância.
Quanto ao n. 2, nada há a objectar. Mas, porque ele se reporta ao diploma que virá a aprovar o plano, julga--se ser este o lugar adequado para acrescentar algo mais que parece não dever omitir-se.
Na própria redacção do aditamento que a seguir se propõe está implícita a sua justificação; e, em consequência, abstemo-nos de apresentar, por desnecessária:

3. No mesmo diploma serão também definidas as condições necessárias à execução do referido plano, em ordem a serem plenamente atingidos os seus objectámos, e designadamente a forma de assegurar tanto a indispensável coordenação das entidades interessadas como os meios de ordem administrativa e financeira adequados aos empreendimentos a realizar.

BASE IV

31. Está formulada nos termos seguintes:

Aprovado o plano regional de Lisboa, proceder-se-á imediatamente à revisão dos planos de urbanização locais que estiverem em vigor, tendo em vista o seu ajustamento ao referido plano regional, considerando-se desde logo revogadas as disposições que o contrariem.

Apenas um breve comentário v, esta base, por isso que, ao fazer-se a apreciação na generalidade da proposta de lei, já houve o ensejo de salientar a estrita necessidade de uma perfeita articulação e coordenação entre os planos urbanísticos dos três escalões - local, regional e nacional -, que constituem uma verdadeira hierarquia e, portanto, estão sujeitos à regra da subordinação do inferior ao superior.
A doutrina da presente base não faz mais do que confirmar estes princípios e tirar deles as suas naturais consequências. E, por isso, a Câmara se limita a propor uma simples alteração de forma, em ordem a uma formulação mais correcta:
Aprovado o Plano Urbanístico da Região de Lisboa, proceder-se-á imediatamente à revisão dos planos de urbanização locais que estiverem em vigor, a fim de os ajustar àquele referido plano, considerando-o desde logo revogadas as disposições que o contrariem.

BASE V

32. Esta base encerra alguns preceitos de carácter provisório com notório alcance prático:

1. Na área abrangida pelo plano regional de Lisboa, e até à aprovação deste, carecem de prévia autorização do Ministro das Obras Públicas, ouvidas a respectiva câmara municipal e a Comissão do Plano Regional de Lisboa:
a) A criação de novos núcleos populacionais e a construção, reconstrução ou ampliação de instalações industriais da 1. ou 2. classe, quando, num e noutro caso, se situem fora das zonas para esse efeito previstas nos planos de urbanização legalmente aprovados;
b) A exploração de novas pedreiras ou a ampliação dos que estejam sendo exploradas à data da presente lei e, bem assim, a execução de terra-plenagens importantes de qualquer natureza susceptíveis de alterar a configuração geral do terreno e o derrube de árvores em maciço de área superior a l ha.
2. Fica igualmente sujeita à prévia autorização do Ministério das Obras Públicas, por intermédio da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização e mediante parecer da respectiva câmara municipal, a construção de novas edificações nos aglomerados existentes, quando situadas fora dos seus perímetros actuais ou das zonas de expansão definidas nos planos de urbanização legalmente aprovados.
3. As autorizações serão negadas sempre que se verifique que da sua concessão poderá resultar inconveniente para a execução futura do plano regional.
4. O Ministro das Obras Públicas poderá fixar, por simples despacho, mediante proposta da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, os perímetros das povoações a considerar na aplicação do disposto nesta base.
5. As câmaras municipais não poderão conceder as licenças a que se refere o n.º 20. do artigo 51.º do Código Administrativo sem se mostrar ter sido concedida a autorização exigida nesta base.
A simples leitura da base transcrita denota imediatamente que a sua matéria se prende com o aditamento proposto pela Câmara ao ser analisada, a base I da proposta de lei: um novo número sobre disposições provisórias mais urgentes, destinadas a vigorar até à data da aprovação do Plano Urbanístico da Região- de Lisboa (vide § 26). E até poderia argumentar-se que, a fixar-se o regime de autorização prévia, previsto nesta base v, com carácter temporário (até à aprovação do plano), desaparece a necessidade daquele aditamento antes proposto, também de natureza transitória e abarcando fins semelhantes.
Concluir-se-ia, então, por que deveria adoptar-se, ou a solução contida naquele aditamento à base I, ou a que se encerra nesta base v, mas nunca as duas simultaneamente. Este raciocínio, que é lógico numa apreciação superficial do coso, parece não dever orientar-nos ao tomar-se uma consciência mais profunda da questão, pela análise das circunstâncias especiais que a rodeiam.
Assim, e em primeiro lugar, o aditamento preconizado para a base i tem um conteúdo muito mais lato do que a base v, o qual nem sequer pode ser definido antes de um estudo relativamente demorado, embora sumário (previu-se o prazo de um ano). Em segundo lugar, a indisciplina da construção é de tal modo alarmante e perniciosa que não se compadece com mais um ano de espera, impondo-se, portanto, e desde já, um regime de autorização prévia que previna os danos mais visíveis, independentemente de qualquer estudo de conjunto.
E, por último, dir-se-á que, sendo indiscutivelmente útil e necessário este regime provisório, ele terá forçosamente de ocasionar demoras, porventura longas, mercê dos cuidados que é preciso ter, dos vistorias a efectuar e do próprio sistema criado, em que a autorização tem

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de ser compreensivelmente precedida de pareceres dos serviços municipais respectivos e da Comissão do Plano.
Tudo aconselha, pois, a que se restrinja ao tempo mínimo a disciplina prevista nesta base v, pelo menos quanto ao seu n.º 1. E, se um ano já não é pouco - pelos prejuízos que pode causar aos interesses atendíveis daquela iniciativa particular, que actua de acordo com o interesse geral -, estender-se esta situação durante os três anos que levará a elaboração do plano parece de todo desaconselhável.
Realmente, decorrido o prazo de um ano, fixado naquele aditamento à base I, as normas provisórias postas em vigor funcionariam praticamente como um plano parcial e transitório (apenas para os fins mais urgentes) e os particulares saberiam já as restrições com que teriam de contar, independentemente das maiores demoras que, como vimos, item de implicar o regime de autorização prescrito no n.º l desta base.
Em conclusão, entende-se que se deve manter o regime estabelecido no n.º l da presente base, havendo apenas que conjugá-lo com a doutrina do aditamento proposto para a base I. Outrossim - e pelos fundamentos que adiante Vão ser invocados ao analisar-se a base vil -deve incluir-se uma referência ao Gabinete do Plano Urbanístico da Região de Lisboa, para o efeito de ser ouvido quando a Comissão do mesmo plano o não seja.
Restes termos, a Câmara propõe para o corpo do n. l da base v a seguinte redacção:
1. Na área abrangida pelo Plano Urbanístico da Região de Lisboa, e até a aprovação das normas previstas no n. 2 da base I, carecem de prévia autorização do Ministro das Obras Públicas, ouvidas a respectiva Câmara Municipal e a Comissão nu o Gabinete do referido plano:
Ainda quanto ao 11.º l, que estamos examinando, há algumas correcções a introduzir na, sua alínea b).
Assim, ao referir-se unicamente o caso das "pedreiras", excluem-se, por exemplo, os "barreiros" e os "areeiros", que estão sujeitos à mesma legislação e têm idêntico interesse- para os aspectos urbanísticos regulados na presente proposta- de lei, mostrando-se necessário, por isso, redigir a aludida alínea o) por forma a abranger esses outros casos não contemplados.
Por outro lado, quando ali se considera também a hipótese da ampliação das (pedreiras) que 'estejam sendo exploradas à data da presente lei, usa-se de uma expressão que dentro da terminologia mineira não chega a ter sentido prático, E que, por definição, tanto as "pedreiras", como os "barreiros" ou os "areeiros", não podem ser lavrados senão por constante ampliação, minuto a minuto, enquanto durar a lavra. E torna-se evidente, por isso, que a hipótese de interesse prático a alcançar pelo legislador será a ampliação da área de terreno declarada e na qual a exploração estava autorizada à data da presente lei.
Restas circunstâncias, a Câmara permite-se propor a alteração da alínea b) em causa, nos termos seguintes:
b) As novas explorações regidas pela legislação referente a pedreiras e a ampliação da área de terreno declarada e na qual a exploração estava autorizada à data da presente lei, bem como a execução de terra-plenagens importantes de qualquer natureza susceptíveis de alterar a configuração geral do terreno e o derrube de árvores em maciço de área superior a l ha.
Há também que prevenir a hipótese de a& normas provisórias previstas no aditamento proposto para a base I não alcançarem todos os casos regulados nas duas alíneas do n. l da presente base, convindo por isso introduzir um novo número que mantenha o regime de autorização, para esses mencionados casos, até à entrada em vigor do plano.
Deverá ser incluída tal disposição imediatamente em seguida e, como tal, ficando a constituir, o n. 2 da base v, nos termos seguintes:
2. Para os casos regulados nas alíneas precedentes e que não venham a ser abrangidos pelas normas provisórias previstas no n. 2 da base I, o regime de autorização prescrito no número anterior funcionará ata à aprovação do Plano Urbanístico da Região de Lisboa.
Ainda um outro número convirá inserir na presente base, com o objectivo de esclarecer e precisar que a prévia autorização do Ministro das Obras Públicas" não supre ou dispensa o licenciamento pelos serviços competentes quanto às obras ou trabalhos previstos nas duas alíneas do n. 1 Simplesmente; os interessados, quando pretendam requerer as respectivas licenças nos serviços próprios (câmaras municipais, Ministério da Economia, etc.) terão de apresentar-se munidos daquela "autorização prévia", sem o que os seus pedidos nem sequer poderão ser considerados.
Este outro número que a Câmara propõe parece dever incluir-se logo em seguida ao já anteriormente proposto e, portanto, ocupando na base o n.º 3. Poderia ficar com a seguinte redacção:
3. Para obterem o necessário licenciamento em, tudo quanto respeite ao conteúdo das duas alíneas do n. l, devem os interessados exibir, perante ou serviços competentes, documento que prove a autorização prévia exigida no corpo do mesmo número.
E já que se está tratando de autorizações para obras ou trabalhos, julga-se oportuno chamar a atenção para a vantagem, em certos casos, de só as conceder com duração limitada e a título precário. Tal sucederá, por exemplo, relativamente ao desmonte de rochas ou à lavra de areeiros em certas zonas onde convenha facilitar e acelerar a exploração.
Os interessados, cientes de que só durante certo prazo estão autorizados a fazer determinada exploração, procuram tirar dela o máximo proveito, dentro do prazo que lhes for assinado, sem prejudicarem quaisquer planeamentos futuros e, portanto, com benefício geral. O regime de autorização com prazo limitado revela-se, deste modo, um instrumento útil, que pode e deve generalizar-se a todas as áreas abrangidas pelos planos urbanísticos, por forma a retirarem-se delas certas riquezas naturais lá contidas durante os períodos de tempo em que tal não prejudique a realização escalonada dos mesmos planos.
E, em consequência dos dois aditamentos antes propostos, deve ficar automaticamente alterada a numeração da parte restante da base v, a respeito de cuja redacção nada há a por, salvo quanto ao actual n.º 2, que passará a n.º 4, onde convém fazer um ajustamento no sentido da sua maior precisão:
4. Até à aprovação do plano, fica também sujeita ti prévia autorização do Ministério das Obras Públicas, por intermédio da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização e mediante parecer da respectiva Câmara Municipal, a construção.

Por último -:e agora em comentário genérico sobre as restrições determinadas na presente base-, não deixará de registar-se que também em França se está a entrar decididamente pelo caminho da autorização prévia, quer ,para as edificações em geral, e extensiva a todo

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o território do Puís, quer pura o caso particular de certas* zonas regionais ou de construções afectas a fins determinados.

Do primeiro facto pode apresentar-se u prova concludente fornecida por um diploma publicado já no corrente ano e cuja matéria dispositiva envolve uma amplitude enorme, como pode avaliar-se pela transcrição do seu iirtigo l.n:

A licença para- construção pode ser recusada ou ser apenas concedida sob reserva da observação de prescrições especiais guando as construções, pela Fiua situnção, dimensões, aspecto exterior dos edi-' fícios ou obras a edificai1 ou a modificar, sejam d« natureza a prejudicar (porter atteintc) o carácter ou o interesse dos locais vizinhos, dos lugares ou paisagens naturais ou urbanos, bem como a conservação das perspectivas monumentais, ou ainda quando essus construções impliquem a utilização pelo município de equipamentos novos não

•previstos. (Decreto u." Õ8-1467, de 3.1 de Dezembro de 1958, in Joumal Oficiei de 4 de Janeiro de 1959).

• Do segundo facto —restrições dirigidas particularmente a certas regiões ou a determinados fins— pode citar-se um outro diploma, também pertencente a essa notável série de legislação urbanística publicada em 4

BASE vi

33. Está formulada do modo seguinte:

1. A Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização e as câmaras municipais serão competentes para promover o embargo e a demolição das obras executadas com violação do preceituado na bnse anterior.

2. A demolição será feita à custa dos proprietários e sem que estes tenham direito a qualquer indemnização.

3. A cobrança das importâncias a que der lugar a aplicação desta disposição, na falta de pagamento voluntário, competirá aos- tribunais das execuções fiscais, constituindo título executivo a certidão passada pelos serviços' donde conste o quantitativo despendido.

A base reproduzida, concernente ao embargo e demolição de obras feitas em contravenção da lei, con-

• fina-se nos moldes da- prática corrente, em matéria legislativa, para factos desta natureza, e não suscita, por isso, quaisquer observações.

BASE vn

34. Ê do teor seguinte:

1. A cooperação das diversas entidades interessadas na elaboração do plano regional de Lisboa será assegurada por intermédio de uma comissão, de carácter eventual, a constituir no Ministério das Obras Públicas e na dependência do respectivo Ministro, designada por Comissão do Plano Regional de Lisboa. • •

2..Compete a esta Comissão pronunciar-se e fa-

•zer recomendações sobre a .preparação e elaboração

do plano, assegurar a execução dos trabalhos do

. inqtiérito na -parte dependente dos organismos nela

representados) apreciar o projecto do plano e dar

parecer sobre os pedidos de autorização a que se refere a base v e sobre quaisquer assuntos determinados pelo Governo.

Não sugerindo anotações ou reparos o u.º l desta base, passa-se ao exame do seu u." 2, sobre o qual há que alinhar algumas considerações.

Antes -de tudo, e dado que se introduziu na base i o importante aditamento sobre sas normas provisórias destinadas a vigurar até à aprovação do Plano Urbanístico da Região de Lisboa», parece'impor-se a inclusão deste aspecto novo na competência consultiva _da Comissão 'criada pela base vn.

Não faria sentido, efectivamente, que a referida Comissão, tendo de pronunciar-se acerca da preparação e elaboração do plano e de apreciar o respectivo projecto, não fosse ouvida também sobre aquilo que poderíamos denominar, sem qualquer rigor técnico, um anteprojecto parcial do plano, apesar de muito restrito e de carácter provisório.

Por tal motivo, a Câmara propõe que se inclua essa particularidade na esfera de competência traçada pelo n.º 2 da base vii, propondo também que se altere a formulação ali adoptada, dividindo em alíneas a sua matéria, apeiias com o objectivo da maior clareza e de respeito pela prática consagrada na feitura das leis.

2. Compete à Comissão:

a) Pronunciar-se e fazer recomendações sobre a preparação e elaboração do plano;

6) Assegurar a execução dos trabalhos de inquérito e estudo na parte dependente dos organismos nela representados;

c) Apreciar o projecto das normas provisórias a propor superiormente, consoante o disposto no n.º 2 da base I;

d) Apreciar o projecto do plano;

e) Dar parecer sobre os pedidos de autorização a que se refere a base V;

f) Pronunciar-se sobre quaisquer assuntos relacionados com o plano e acerca dos quais o Governo julgue conveniente ouvir-la.

Da enumeração apontada infere-se que a Comissão têm uma competência consultiva ampla (e também competência coordenadora), que principalmente se desenha, não sobre pormenores, mas, antes, em grandes linhas e abarcando o conjunto dos problemas regionais, mima visão superior. Por aqui seríamos levados a concluir que o funcionamento da Comissão não será de periodicidade regular ou, se o for, deverá o período ser espaçado — digamos, uma reunião mensal ou quinzenal. E semelhante conclusão surge reforçada se tivermos em mente que aquele órgão colectivo tem uma larga composição (vinte s dois membros, se bem os coutámos na base VIII) ; e os órgãos deste tipo, numérico e representativo, não têm compleição apropriada para um estudo casuístico ou outro trabalho de minúcia.

Sendo assim — e era aqui que desejávamos chegar —, não se entende como seja possível conciliar o matiz desta Comissão com a espécie de competência enunciada na alínea e) do n.º 2: sdar parecer sobre os pedidos de autorização a que se refere a base VII e que já apreciámos.

Estes pedidos tudo indica que serão frequentes e, a ser assim, teríamos criado um órgão de conformação inadequada - aos fins visados ou, pelo menos, a todos os seus fins. E há, realmente, qualquer coisa de deslocado na inclusão desarmómca daquela alínea entre todas as outras enumeradas.

Pode seguramente objectar-se que, na diversidade do a expediente e desses pedidos, alguns haverá de grande

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importância ou delicadeza e requerendo até a definição de certos princípios gerais que só aquele alto órgão consultivo pode suficientemente elaborar. E também acontecerá apresentarem-se problemas com implicações em diversos sectores da administração pública que, para serem resolvidos, exijam o concurso colaborante de vários dos membros de uma comissão tão largamente representativa, como a que vai ser instituída.
A objecção posta é pertinente e nem seria fácil invalidá-la. Mas, de outro lado, os raciocínios anteriores também com ela não perderam a validade ou o merecimento.
Como afastar a dificuldade no campo prático?
O procedimento deverá ser, ao que parece, admitir e conciliar as duas situações existentes, dispensando a Comissão daquilo que poderemos chamar o expediente corrente (para o que não tem qualidade funcional) e confiando-lhe apenas a apreciação dos casos mais relevantes.
Neste sentido, propõe a Câmara que a alínea e) acima indicada passe a ter a seguinte redacção:

e) Dar parecer, para os fins consignados na base V, sobre os pedidos de autorização que o Ministro das Obras Públicas, em razão da sua importância,, entenda, dever submeter-lhe.

BASE VIII

35. Esta base dispõe sobre os componentes da Comissão em representação dos vários organismos interessados:

1. A Comissão do Plano Regional de Lisboa terá a seguinte composição:
a) O director-geral dos Serviços de Urbanização ; o director dos Serviços de Melhoramentos Urbanos da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização; o chefe do Gabinete do Plano Regional de Lisboa; um director de serviços da Junta Autónoma de Estradas;
b) Um representante da Câmara Municipal de Lisboa, três representantes das demais câmaras municipais dos concelhos da região de Lisboa a norte do Tejo e outros três das câmaras municipais dos concelhos da região de Lisboa a sul do Tejo;
c) Um representante do Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo;
d) Um representante do Secretariado da Defesa Nacional;
e) Um representante da Direcção-Geral de Administração. Política e Civil;
f) Um representante de cada uma das Direcções-Gerais dos Serviços Industriais, dos Serviços Florestais e Aquícolas e dos Serviços Agrícolas;.
g) Um representante da Direcção-Geral de Transportes Terrestres e outro da Administração-Geral do Porto de Lisboa;
h) Um representante da Direcção-Geral de Saúde;
i) Duas individualidades a designar pelo Ministro das Obras Públicas.
2. A composição fixada no número antecedente poderá ser ampliada, mediante portaria do Ministro das Obras Públicas, se tal vier a mostrar-se necessário.
3. Cabe ao Presidente do Conselho e aos Ministros da Defesa Nacional, do Interior, da Economia, das Comunicações e da Saúde e Assistência a designação dos vogais das alíneas c), d), e), f), y) e h), respectivamente.
Os representantes das câmaras municipais serão por elas designados. Excepto para a Câmara Municipal de Lisboa, ia escolha dos representantes será feita em reunião presidida pelo respectivo governador civil.
4. Por cada vogal será designado um suplente, que deverá substituí-lo nos seus impedimentos.
5. A nomeação dos vogais da Comissão será feita em portaria do Ministro das Obras Públicas.
Sem afectar a substância desta base, algumas observações há, no entanto, a fazer-lhe.
Antes de tudo, existe uma comissão, mas não se indica o seu presidente. Na base anterior está expressa a ideia de uma «comissão a constituir no Ministério das Obras Públicas e na dependência do respectivo Ministro»; mas tal não significa que incumba àquele membro do Governo presidi-la.
Julga-se, pois, que a intenção é conferir a presidência ao primeiro componente indicado - o director-geral dos Serviços de Urbanização -, aliás e porventura o funcionário mais categorizado, na hierarquia oficial, que tem assento na Comissão, não sendo natural que os representantes dos vários departamentos públicos tenham essa categoria, ressalvado o caso das «duas individualidades a designar pelo Ministro das Obras Públicas», consoante a alínea i), e que podem tê-la até superior.
A segunda observação, que também respeita à alínea a) da base em causa, consiste no título atribuído a quem superintende no Gabinete do Plano Urbanístico da Região de Lisboa, criado pela base XI. Chama-se-lhe «chefe do Gabinete», o que, sendo admissível, talvez não constitua a designação mais ajustada ao caso, de acordo com a nomenclatura tradicional no País para instituições daquela índole..
É certo que ao Gabinete - segundo o critério adoptado na Proposta de Lei - preside um engenheiro e que está também consagrada a denominação
«engenheiro-chefe» (ou engenheiro chefe de serviços»), pelo menos no Ministério das Obras Públicas. Mas, mesmo para o caso deste Ministério, talvez que a própria categoria hierárquica de chefe do Gabinete, «na dependência imediata do director-geral dos Serviços de Urbanização» (base XI), aconselhasse antes a intitulá-lo «director do Gabinete», analogamente a outros funcionários imediatamente dependentes do mesmo director-geral. que são os «directores de serviços».
De resto, esta é a regra na organização administrativa do Ministério das Obras Públicas e também noutros departamentos públicos. E repare-se em que não deve ter sido por mera coincidência que na própria redacção da, citada alínea a) foi colocado o chefe do Gabinete do Plano Regional entre dois directores de serviços do aludido Ministério, e não depois de ambos.
Reconhecendo-se, embora, que a questão é de somenos importância e que o título de «chefe» em nada diminui a pessoa a designar para o cargo, a Câmara, sem pôr qualquer nota de intransigência no seu parecer, julga preferível que se substitua por «director» a palavra «chefe» inserta na alínea a).
E ainda uma terceira observação, também quanto à mencionada alínea a), embora no fundo abrangendo toda a enumeração da base viu. É que não figura entre os membros da Comissão um só arquitecto, quer em estrita representação de uma actividade profissional de primeira grandeza, quando se considerem o âmbito e os fins de qualquer plano urbanístico, quer em razão do cargo que ocupe em qualquer dos organismos oficiais representados na Comissão.
Dir-se-á que o mesmo acontece relativamente à profissão de engenheiro; mas só formalmente a objecção é verdadeira, por isso que muitos componentes da Comissão têm obrigatoriamente esse título profissional. Dir-se-á ainda que podem ser arquitectos, por exemplo,

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os representantes das câmaras municipais ou do Secretariado Nacional da Informação ou, mesmo, uma ou ambas as «individualidades a designar pelo Ministro das Obras Públicas». A raciocinar por esta forma, estamos, porém, situados no campo das meras probabilidades e, portanto, a basear-nos em factos possíveis, sim, mas que podem - e até normalmente - não se realizar.
Parece aconselhável, pois, que seja acrescentado à alínea a) um novo componente da livre escolha do Ministro das Obras Públicas, obrigatoriamente arquitecto e com a necessária especialização urbanística. Ao mesmo tempo, e ainda quanto à alínea a), convirá precisar que o «director de serviços da Junta Autónoma de Estradas» também é designado pelo Ministro das Obras Públicas.
E, nos termos das observações feitas, a alínea d) do n.º 1 da base VIII passaria a ter a redacção seguinte:

a) O director-geral dos Serviços de Urbanização, que servirá de presidente; o director dos Serviços de Melhoramentos Urbanos da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização; o director do Gabinete do Plano Urbanístico da Região de Lisboa; um director de serviços da Junta Autónoma de Estradas e um arquitecto, com a necessária especialização urbanística, ambos da livre escolha do Ministro das Obras Públicas.

Por outro lado e embora se concorde em que o número de membros da Comissão já é vasto e não convém alargá-lo muito mais não parece possível prescindir-se da representação de alguns outros serviços- do Estado directamente interessados na preparação ou elaboração do plano regional de Lisboa - a Inspecção Superior do Plano de Fomento (Presidência do Conselho), a Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos, o Instituto Nacional de Investigação Industrial (Ministério da Economia) e a Direcção-Geral do Trabalho - e Corporações (Ministério das Corporações e Previdência Social).
Relativamente à Inspecção Superior do Plano de Fomento, não oferece dúvidas de que, tendo a seu cargo a centralização de tudo quanto respeite ao traçado e realização dos planos de fomento, não pode ficar estranha ao planeamento urbanístico regional, que manifestamente interfere em problemas do desenvolvimento económico. O mesmo poderá dizer-se a propósito do Instituto Nacional de Investigação Industrial, cujo concurso será difícil poder
dispensar-se em matéria de criação de novas indústrias ou reorganização das existentes, assim como para o exame do problema crucial da descentralização fabril. Também é de considerar o caso da Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos, porque convém assegurar uma necessária coordenação de esforços, tendo em conta a exploração do subsolo em geral e, em. particular, a exploração de pedreiras a que se refere a base V [n.º 1, alínea b)]. E, por último, quanto à Direcção-Geral do Trabalho e Corporações, os aspectos sociais que envolvem todos os planos urbanísticos, sobretudo nos escalões superiores, requerem a permanência na Comissão de um representante que. deles cuide especificamente.
Considerando todas estas razões, a Câmara entende dever propor a inclusão de representantes dos departamentos acima mencionados, integrando-os nas alíneas da presente base e criando uma nova alínea, segundo a ordem ali estabelecida.
Assim:
.............................................................................

e) Um representante do Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo e outro da Inspecção Superior do Plano de Fomento;
.............................................................................
f) Um representante de cada uma dás Direcções-Gerais dos Serviços Industriais, dos Serviços Florestais e Aquícolas, dos Serviços Agrícolas, de Minas e Serviços Geológicos, e outro do Instituto Nacional de Investigação Industrial;
........................................................................
h) Um representante da Direcção-Geral do Trabalho e Corporações;
........................................................................
Na mesma linha de pensamento - com vista à inclusão obrigatória de um arquitecto na estrutura da Comissão; também tudo aconselha a que não falte ali um especialista em economia, dada a visível importância que revestem as implicações económicas num plano já de escalão regional e, sobretudo, quando se trata, como aqui é o caso, da região industrializada de Lisboa.
Julga-se, por isso, plenamente justificável esse acrescentamento à estrutura do órgão consultivo em análise, ou, talvez melhor - para não aumentar mais ainda uma composição já tão larga -, incluir esse novo elemento entre as «duas individualidades a designar pelo Ministro das Obras Públicas».
E, a proceder-se conforme este último critério, haverá que modificar a formulação da alínea i), que agora passará a ser alínea j):.

j) Duas individualidades a designar pelo Ministro das Obras Públicas, uma delas, pelo menos, com a necessária especialização em economia;

Há ainda que aplaudir a doutrina contida no n.º 2 da base viu possibilidade de ser ampliada a composição definida, se tal vier a mostrar-se necessário -, bem como propor dois ajustamentos na redacção do n.º 3 da mesma base:

3. Cabe ao Presidente do Conselho e aos Ministros da Defesa Nacional, do Interior, da Economia, das Comunicações, das Corporações e Previdência Social e da Saúde e Assistência a designação dos vogais das alíneas c), d), e),f), g), h), e i), respectivamente. Os representantes das câmaras municipais, excepto o da Câmara Municipal de Lisboa, serão por elas escolhidos em reunião presidida pelo respectivo governador civil.
E resta, por último, fazer um comentário genérico ao conteúdo da presente base, apenas para salientar a rígida uniformidade na composição do importante órgão consultivo que vai ser criado, no aspecto da representação quase exclusiva de serviços do Estado e da correlativa ausência dos interesses, privados em ligação directa com o plano.
Sem embargo da vantagem dessa composição, em quanto se refere ao ponto fundamental da coordenação entre os vários serviços interessados, julga-se aconselhável emitir uma sugestão no sentido de se atenuar aquela rígida uniformidade, quer mediante a inclusão de novos membros - com o inconveniente de aumentar o seu número, já tão elevado, para o que esta Câmara também por sua iniciativa contribui -, quer preferentemente pela substituição de alguns representantes já ali incluídos, quando outros, recrutados nas actividades particulares, possam preencher sem prejuízo as respectivas posições.

BASE IX

36. Tem esta base a seguinte redacção:

1. Os vogais da Comissão do Plano Regional de Lisboa terão direito ao abono da importância de - 150$ por cada sessão a que assistirem.

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2. Aos vogais da Comissão, quando hajam de deslocar-se no desempenho das suas funções, serão abonadas as despesas de transporte correspondentes à sua categoria. Esta será equiparada à designada pela letra C no Decreto-Lei n.º 26.115, de 23 de Novembro de 1935, para os vogais que não forem funcionários do Estado ou dos corpos administrativos.

Mais uma vez se tem de registar a ignorância da proposta de lei - e supõe-se que não seja omissão propositada - a respeito do presidente da Comissão do Plano Urbanístico da Região de Lisboa.

Ainda poderia imaginar-se uma justificação para o facto quando nos reportemos ao que costuma designar-se por «senha de presença» e está regulado no n.º 1 desta base, mas já não há imaginação possível que possa alcançar as «despesas de transporte» abrangidas pela matéria do n.º 2. Além de que nada se dispõe acerca de «ajudas de custo», e é outra omissão que também se calcula não tenha sido deliberada.

Por todos estes motivos, esquematicamente apresentados, a Câmara entende dever propor as alterações que se julgam indispensáveis para dar inteira satisfação à finalidade da presente base.

BASE IX

1. Os membros da Comissão do Plano Urbanístico da Região de Lisboa terão direito ao abono da importância de 150 f por cada sessão a que assistirem.
2. Aos membros da Comissão, quando hajam de deslocar-se no desempenho das suas funções, serão abonadas as ajudas de custo e as despesas de transporte correspondentes à sua categoria. Esta será equiparada à designada pela letra C do Decreto-Lei n.º 26 115, de 23 de Novembro de 1935, para os vogais que não forem funcionários, do Estado ou dos corpos administrativos.

BASES X, XI e XII

37. Analisam-se em conjunto as bases X, XI e XII, não só porque a sua matéria está directamente ligada, como também porque se tenciona propor a eliminação de duas delas, por desnecessárias.
Eis o texto das aludidas bases:

BASE X

A elaboração do plano regional de Lisboa competirá à Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, que, para este efeito, fica autorizada a contratar técnicos urbanistas de reconhecida competência, em regime de prestação de serviços e nas condições que forem aprovadas pelo Ministro das Obras Públicas.

BASE XI

1. É criado na Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, e na dependência imediata do respectivo director-geral, o Gabinete do Plano Regional de Lisboa, chefiado por um engenheiro, civil com a necessária especialização, a nomear pelo Ministro das Obras Públicas de entre os funcionários do quadro da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização ou, mediante contrato, de entre técnicos de habilitação conveniente estranhos àquele quadro.
2. O chefe do Gabinete do Plano Regional de Lisboa, quando a escolha recaia em funcionário da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, terá direito a gratificação, a fixar pelo Ministro das Obras Públicas, com a aprovação do Ministro das Finanças.
3. O pessoal técnico, administrativo e menor necessário ao funcionamento do Gabinete poderá ser contratado ou assalariado para as categorias e nas quantidades que forem aprovadas pelo Ministro das Obras Públicas.
4. O Ministro das Obras Públicas poderá autorizar a elaboração, em regime de prestação de serviços, dos estudos especializados que se tornem eventualmente necessários, sendo as respectivas despesas aprovadas por despacho ministerial.

BASE XII

1. Compete ao Gabinete do Plano Regional de Lisboa tudo o que respeita à preparação e elaboração do plano, incluindo a execução das resoluções da Comissão a que se refere a base viu.
2. Passarão a ser exercidas por intermédio do Gabinete do Plano Regional de Lisboa as atribuições da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização referentes à urbanização da área da região de Lisboa e à fiscalização do cumprimento do Plano de Urbanização dá Costa do Sol, nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 37 251, de 28 de Novembro de 1948.
Comecemos por comparar as duas bases X e XI. Dispõe-se naquela que «a elaboração do plano regional de Lisboa compete à Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização» e prescreve-se nesta que «compete ao Gabinete do Plano Regional de Lisboa tudo o que respeite à preparação e elaboração do plano».
Logo à primeira leitura se conclui simultaneamente por uma duplicação e pela possibilidade de confusão. Duplicação ou repetição, porque duas vezes se está a declarar a competência para a «elaboração» do plano; possibilidade de confusão, porque, num caso, se inclui sómente a «elaboração» do plano e, no outro, a sua «preparação e elaboração». Ainda mais confusa a matéria, pela circunstância .de primeiramente se indicar apenas a Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização e depois se fazer referência exclusiva ao Gabinete do plano.
É verdade que na base XI está esclarecido que o Gabinete é um serviço dependente da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, mas tal não exclui a conveniência de retocar o articulado da proposta de lei em ordem à sua formulação mais correcta. Além de que - e nisso residiria a maior eventualidade de confusão - uma vez se menciona unicamente a «elaboração» e na outra a «elaboração» e «preparação», como já foi assinalado.
Por tudo isto se julga vantajoso suprimir uma das disposições citadas, com ajustamento da redacção filial. E parece preferível a eliminação da base X, porque, embora ela contenha outra matéria - autorização para «contratar técnicos urbanistas de reconhecida competência» -, esta poderá passar, e até com nítida vantagem de arrumação, para a base seguinte (XI), onde se trata do recrutamento de pessoal para assegurar os serviços do plano (n.ºs 3 e 4).
Suprimir-se-ia assim a base X; mas parece dever estender-se ainda mais este processo de eliminação, uma vez que a competência do Gabinete (base XII, n.º 1) pode exprimir-se em duas linhas de articulado e, sendo assim, tem o seu lugar próprio na base XI, onde se determina a criação do referido Gabinete.
Desta maneira ficaria reduzida a base XII ao seu n.º 2, cujo conteúdo também se
integra logicamente no âmbito da base XI e poderá, portanto, transferir-se para

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aquele local. O que - assim vistas as coisas - equivale a reunir numa só base a matéria que a proposta de lei distribui por três.
E assente o critério no aspecto da sistematização normativa, impõem-se alguns comentários sobre o estatuído na proposta de lei, para seguidamente se concluir pela redacção final da nova base que substitua as três ali articuladas.

38. Assim, quando na base X se autoriza a Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização a contratar «técnicos urbanísticos» «para o efeito da elaboração do plano, julga-se aconselhável prever a eventualidade de recrutar técnicos estrangeiros, se tal prática se reconhecer necessária, pelo maior grau da sua especialização ou da sua experiência. Isto, sem qualquer desdouro para os urbanistas portugueses, que, por mérito próprio e na carência de escolas adequadas ou de centros de estudos especializados, têm actuado em muitos casos com resultados brilhantes.
A este respeito não deixaremos de citar o qualificado depoimento do engenheiro chefe da Repartição de Estudos :de Urbanização, ao sublinhar algumas falhas nos nossos empreendimentos urbanísticos, fundamentando-as particularmente na «falta de técnicos especializados», e elucidando que «em 1942 só existiam no nosso país dois urbanistas diplomados (e hoje poucos mais se podem contar)».
Acrescenta ainda: «Pretendeu-se suprir em parte esta deficiência, chamando até nós reputados urbanistas estrangeiros. Veio primeiramente Alfred Agache, para o estudo da urbanização da Costa do Sol, e o seu trabalho pode ser apontado como um modelo de competência e seriedade. Seguiu-se-lhe um antigo colaborador: Etienne De Grõer. A permanência deste último entre nós foi relativamente prolongada e poderia ter tido decisiva influência na elevação do nível técnico. Infelizmente, a sua relutância em admitir a seu lado jovens técnicos portugueses -e o autor deste relatório bem o tentou conseguir - impediu que se formasse a necessária escola e os desejados discípulos» (vide o Boletim da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, vol, 1.º, 1954).
Aqui se aponta já a necessidade de estudos urbanísticos no nosso país; e desde há muito que se fazem diligências para a criação de um centro de estudos de
urbanismo, que só começou a funcionar ha cerca de um ano e é subsidiado pelo Ministério das Obras Públicas e pela Fundação Gulbenkian. Mas o Instituto Superior de Urbanismo, já legalmente previsto há bastantes anos, ainda não ultrapassou o domínio das aspirações ou dos projectos (vide o relatório citado e também a conferência pronunciada pelo engenheiro. Celestino da Costa in Boletim da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, 1953).
Continuando as observações ao articulado da proposta de lei, deve observar-se, quanto ao n.º 1 da base XI, que não se vê razão para que o director do Gabinete, quando recrutado entre os funcionários da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, tenha de ser forçosamente um engenheiro civil, parecendo mais correcto - mesmo apenas como afirmação de princípios - que o Ministro das Obras Públicas possa designar qualquer outro técnico devidamente especializado. Por outro lado, se é de exigir a «necessária especialização» quando o recrutamento -é feito através do quadro da referida Direcção-Geral, também se pensa que o mesmo requisito deverá impor-se quando a escolha recaia em técnico estranho àquele quadro. E, por isso, em vez de prescrever de uma forma mais vaga a exigência de «habilitação conveniente», convirá manter, para este último caso, o requisito da «necessária especialização», palavras que se supõe não terem sido empregadas só para evitar uma repetição. Aqui, porém, essa repetição não deve dispensar-se.

No n.º 2 da base XI, e consoante o exposto ao ser analisada a composição da Comissão do Plano (base viu), em vez de «chefe» convirá empregar com mais propriedade a palavra «director», e, no mesmo sentido de maior precisão,
mostra-se conveniente ajustar em conformidade o texto do n.º 1, substituindo «chefiado» por «dirigido».
Relativamente ao n.º 3 da citada base, admite-se o uso da expressão «pessoal ... contratado ou assalariado para as categorias e nas quantidades que forem aprovadas ..., mas parece preferível empregar «número» em vez dê «quantidades».
Resta dizer, para terminar as anotações sugeridas pelas três bases em epígrafe, que a autorização para contratar técnicos urbanistas, facultada pela base X suprimida, poderá transferir-se para o n.º 4 da base XI, onde também se regula matéria análoga.
E, com fundamento em todo o exposto, a Câmara Corporativa entende dever propor a fusão das três bases X, XI e XII numa só, procedendo-se para o efeito a uma nova arrumação e aos ajustamentos reputados indispensáveis.

NOVA BASE X

(Correspondente às bases X, XI e XII da proposta de lei)

1. E criado na Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, e na dependência imediata do respectivo director-geral, o Gabinete do Plano Urbanístico da Região de Lisboa, ao qual compete tudo o que respeite à preparação e elaboração do plano, incluindo a execução das recomendações da Comissão a que se refere a base VIII.
2. O Gabinete será dirigido por um técnico com a necessária especialização, a nomear pelo Ministro das Obras Públicas de entre os funcionários do quadro da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, ou, mediante contrato, de entre técnicos estranhos àquele quadro, também com a necessária especialização.
3. O director do Gabinete, quando a escolha recaia em funcionário da referida Direcção-Geral, terá direito a gratificação, a fixar pelo Ministro das Obras Públicas, com o acordo do Ministro das Finanças.
4. O pessoal técnico, administrativo e menor necessário ao funcionamento do Gabinete poderá ser contratado ou assalariado para as categorias e em número a determinar mediante despacho do Ministro das Obras Públicas.
5. Para a preparação e elaboração do Plano é autorizada a Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização a contratar técnicos urbanistas de reconhecida competência, nacionais ou estrangeiros, bem como a mandar elaborar os estudos especializados que eventualmente se tornem necessários, em qualquer dos casos sob o regime de prestação de serviços e nas demais condições aprovadas pelo Ministro das Obras Públicas.
6. Passarão a ser exercidas por intermédio do Gabinete do Plano as atribuições da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização referentes à urbanização da área dá região de Lisboa e à fiscalização do cumprimento do plano de urbanização da Costa do Sol, nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 37 251, de 28 de Dezembro de 1948.

39. O articulado desta base toca em problemas orgânicos e funcionais da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, alterando-se até a sua estrutura com a integração de um novo serviço - o Gabinete do Plano Urbanístico da Região de Lisboa.

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Pensa-se, pois, ter chegado a altura de alguma coisa se escrever relativamente à organização deste importante departamento do Ministério das Obras Públicas e sobre os marcos fundamentais da sua evolução até ao presente.
Só em 1934, pelo Decreto-Lei n.º 24 802, sé legislou em Portugal acerca da elaboração obrigatória, a cargo dos municípios, de planos de urbanização para os centros populacionais mais importantes, criando-se nessa altura uma Divisão de Urbanizarão, integrada na Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais e com funções fiscalizadoras em matéria de urbanismo.
Mais tarde, com o Decreto-Lei n.º 33 921, de 5 de Setembro de 1944, avança-se em grande passo no sentido de promover e estimular, com carácter de indispensabilidade e urgência e em moldes de civilização e progresso adequados, a urbanização de todas as sedes dos concelhos e de outros aglomerados populacionais importantes de todo o País. É mais um campo de acção dos serviços do Estado que vai estender-se, de norte a sul, a todos os recantos onde tem de fazer-se sentir a política de renovação empreendida".
Isto se lê no preâmbulo do diploma que, poucos meses depois, havia de cria a actual Direcção-Geral dos Serviços do Urbanização - Decreto-Lei n. 34337, de 27 de Dezembro de 1944 - , com o objectivo de reunir. num só departamento tudo o que constitui a intervenção do Estudo no vasto domínio dos melhoramentos urbanos o rurais, a fim de lhe dar unidade e maior eficiência".
Foi então instituída também, naquela Direcção-Geral e entre as suas repartições e serviços externos, a actual Repartição de Estudos de Urbanização, que posteriormente - com a reforma operada em 1948 (Decreto-Lei n. 37 009, de 12 de Agosto) e a consequente criação de direcções de serviços - passou a ficar subordinada imediatamente à Direcção dos Serviços de Melhoramentos Urbanos.
A estrutura actual dos serviços de urbanização, que constituem uma Direcção-Geral do Ministério das Obras Públicas, é a seguinte:
o dos Serviços de Melhoramentos Urbanos, compreendendo uma Repartição de Estudos de Urbanização, uma Repartição de Melhoramentos Urbanos e ama secção de expediente técnico;
Direcção dos Serviços de Salubridade, abrangendo uma repartição de Abastecimento de Agua, uma Repartição de Saneamento e uma secção de expediente técnico ;
Direcção dos Serviços de Melhoramentos Rurais, com uma repartição de Melhoramentos Rurais e lima secção de expediente técnico;
Repartição dos Serviços Administrativos , dividida em secções de contabilidade, de expediente e pessoal e de estatística;
Vinte direcções externas, uma em cada distrito do continente, uma no Funchal e outra nos Açores.
E este o esquema orgânico da Direcção-Geral dos Serviços de urbanização, no qual se projecta integrar agora um novo serviço, considerado de tamanho relevo que ficará em directa subordinação ao respectivo director-geral - o Gabinete do Plano Urbanístico da Região de Lisboa.
E falta só acrescentar algumas poucas palavras sobre um relatório de Janeiro de 1908, apresentado superiormente pela comissão encarregada de elaborar as disposições regulamentares do estudo e realização dos planos de urbanização (portaria de 8 de Janeiro de 1056).
Trata-se de um valioso estudo, em extensão e profundidade, onde se tratam minuciosa e conscientemente os vários problemas que entram na esfera do urbanismo, dentro da mais lata e moderna concepção, acompanhado de um projecto de actualização do diploma basilar que ainda é o Decreto-Lei n. 33 921, de 1944, anteriormente citado, e bem assim de uma súmula muito útil e actualizada da organização e princípios urbanísticos em que assenta a legislação de alguns países estrangeiros - Inglaterra, Espanha, França e Itália.

BASE XIV

40. E, finalmente, transcreve-se a base XIII da proposta de lei, a última do seu articulado e que foi concebida nos termos seguintes:
1. Os encargos a que der lugar a execução da presente proposta de lei serão suportados pelas dotações adequadas do orçamento da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização.
2. As importâncias que vierem eventualmente a ser fixadas como participação das câmaras municipais nos encargos a que se refere o corpo desta base darão entrada nos cofres do Estado, devendo ser abatidas ao montante a entregar anualmente pelo Comissariado do Desemprego, nos termos do artigo 12. do Decreto-Lei n. 34 337, de 27 de Dezembro de 1944.
Nada há que opor à formulação apresentada, salvo quanto ao n. 2 a referência feita ao a corpo desta base", que deverá ser substituída por "número anterior".
Efectivamente, desde que o legislador da proposta de lei seguiu na articulação o critério de dividir as "bases" - em "números", qualquer referência feita no n. 2 ao que está para trás deverá reportar-se ao n. l desta bases, ou ao número anterior", e nunca ao "corpo desta base", porque ela rigorosamente o não tem.
Nestas condições, n Câmara entende dever propor que a primeira parte do n. 2 da presente base passe a ter a redacção seguinte:
2. As importâncias que vierem eventualmente a ser fixadas como participação das câmaras municipais nos encargos a que se refere a alínea anterior darão entrada nos cofres do Estado ...
E só interessa dizer, para terminar, que, suprimidas como foram, no parecer da Câmara duas das bases da proposta de lei, esta última deverá passar para n. XI.

III

Conclusões

41. De harmonia com todas as considerações aduzidas, a Câmara dá a seu acordo à proposta de lei, na generalidade, e, quanto à especialidade, emite parecer no sentido de que lhe sejam introduzidos os aditamentos e alterações anteriormente propostos, que vão assinalados a itálico; tudo- nos termos seguintes:

BASE I

1. O Ministro das Obras Públicas promoverá a elaboração, no prazo de três anos, do Plano Urbanístico d a Região de Lisboa.
2. A Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização fica encarregada de estudar e propor superiormente, dentro do prazo de um ano, e normas provisórias destinadas a vigorar ale à data da aprovação do Plano

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Urbanístico da Região de Lisboa que repute mais urgentes nobre n disciplina de certos aspectos contidos no âmbito tio referido plano, nomeadamente sobre a construção de edificações em certas áreas da região de Lisboa, definida no número seguinte.

3. Consideram-se incluídos na região de Lisboa, para os uns desta lei, os seguintes concelhos:

a) Do distrito de Lisboa: Cascais, Lisboa, Loures, Oeiras, Sintra e Vila Franca de Xira;
b) Do distrito de Setúbal: Aunada, Barreiro, Moita, Montijo e Seixal.
4. O Ministro das Obras Públicas poderá determinar os ajustamentos na delimitação desta área que vierem a mostrar-se convenientes no decurso da elaboração do plano.

BASE II

1. O Plano Urbanístico da Regido de Lisboa será baseado em inquéritos e estudos sobre os condicionamentos de nível nacional a que deva subordinar-se, bem como sobre as características e tendências da região em todos os aspectos que interessem aos objectivos cio plano.
2. A partir da análise dos resultados a que conduzirem os referidos inquéritos ou estudos, serão definidas as linhas gerais do desenvolvimento da região abrangida, em especial no que se refere:
a) À distribuição da população pelos núcleos já existentes e a criar, assim coma à fixação das características gerais a imprimir ao seu desenvolvimento ou das limitações reputadas necessárias;
b) Às redes gerais de comunicações e transportes;
c) À definição das zonas a afectar a tipos especiais de utilização, tendo em vista, designadamente, a preservação de áreas adequados à exploração agrícola e ao povoamento florestal e a criação de espaços livres públicos e de instalações de interesse colectivo a integrar uns zonas rurais;
d) À delimitação Aos zonas especiais onde será autorizada ou interdita a criação ou n expansão de instalações industriais.
e) À defesa e valorização dos monumentos e locais de interesse histórico, artístico ou arqueológico, paisagens, estâncias de recreio ou repouso e outros locais de turismo;
f) À organização geral dos serviços necessários ao abastecimento público (aguas, electricidade, etc.) e ao saneamento urbano;
g) As condições de segurança e defesa da população em emergências grames, nomeadamente o caso de guerra.
3. Fará parte integrante do plano o respectivo regulamento, no qual serão enunciadas as disposições gerais necessárias para garantir a efectivação das medidas previstas no plano e o" condicionamentos especiais a que deverão ajustar-se os planos de urbanização das povoações ou das zonas compreendidas na região de Lisboa.
4. Em diploma especial serão reguladas também as condições s que de e subordinar-se a transferencia em casos excepcionais das indústrias cuja localização actual na região de Lisboa porventura se reconheça como altamente nociva, fixando-se as zonas que devem considerar-se interditas para todas ou apenas para determinadas instalações industriais e estabelecendo-se o sistema de compensações a conceder às empresas abrangidas.

BASE III

1. A aprovação do Plano Urbanístico da Região de Lisboa será da competência do Conselho de Ministros, mediante proposta do Ministro dos Obras Públicas e ouvida a Câmara Corporativa.
2. O diploma que aprovar o plano estabelecerá as condições em que deverá efectuar-se a sua revisão periódica e, bem assim, os prazos concedidos para a revisão dos planos de urbanização locais a que se refere a base IV.
3. No mesmo diploma seroo também definidas as condições necessárias à execução do plano, em, ordem a serem plenamente atingidos os seus objectivos, e designadamente a forma de assegurar, tanto a indispensável coordenação das entidades interessadas como os maios .de ordem administrativa e financeira adequados aos empreendimentos a realizar.

BASE IV

Aprovado o Plano Urbanístico da Região de Lisboa, proceder-se-á imediatamente u revisão dos planos de urbanização locais que estiverem em vigor, a fim de os ajustar àquele referido plano, considerando-se desde logo revogadas as disposições que o contrariem.

BASE V

1. Na área abrangida pelo Plano Urbanístico da Região de Lisboa, e até a aprovação das normas previstas no n.º 2 da base I, carecem de prévia autorização do Ministro das Obras Públicas, ouvidas a respectiva câmara municipal e a Comissão ou o Gabinete do referido plano:

a) A criação de novos núcleos populacionais e a construção, reconstrução ou ampliação de instalações industriais da 1. ou 2. classe, quando, num e noutro caso, se situem fora das zonas para esse efeito previstas nos planos de urbanização legalmente aprovados ;
b) As novas explorações regidas pela legislação referente a pedreiras e a ampliação da área de terreno declarada e na qual a exploração estava- autorizada à data da presente lei, bem, como a execução de terraplanagens importantes de qualquer natureza susceptíveis de alterai1 a configuração geral do terreno e o derrube de árvores em maciço de área superior a l ha.
2. Para os casos regulados nas alíneas precedentes e que não venham a ser abrangidos pelas normas provisórias previstas no n. 2 da base I, o regime de autorização prescrito no número anterior funcionará ata à aprovação do Plano Urbanístico da Região de Lisboa.
3. Para obterem o necessário licenciamento em tudo quanto respeite ao conteúdo das duas alíneas do n.º l, devem os interessados exibir, perante os serviços competentes, o documento que prove a autorização prévia exigida no corpo do mesmo número.
4. Até à aprovação do plano, fica também, sujeita a prévia, autorização do Ministério dos Obras Públicas, por intermédio da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização e mediante parecer da respectiva câmara municipal, a construção de novas edificações nos Aglomerados existentes, quando situadas fora dos seus perímetros actuais ou dos zonas de expansão definidas nos planos de urbanização legalmente aprovados.
5. Aã autorizações serão negadas sempre que se verifique que da sua concessão poderá resultar inconveniente para a execução futura do plano regional.
6. O Ministro das Obras Públicas poderá fixar, por simples despacho, mediante proposta da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, os perímetros das. povoações a considerar na aplicação do disposto nesta base.
7. As câmaras municipais não poderão conceder as licenças a que se refere o n.º 20.º do artigo 51.º do

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Código Administrativo sem se mostrar ter sido concedida n autorização exigida nesta base.

BASE VI

1. A Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização e as câmaras municipais' serão competentes para promover o embargo e a demolição das obras executadas com violação do preceituado na base anterior.
2. Á demolição será feita à custa dos proprietários e sem que estes tenham direito a qualquer indemnização.
3. A cobrança das importâncias a que der lugar a aplicação desta disposição, na falta de pagamento voluntário, competirá aos tribunais das execuções fiscais, constituindo título executivo a certidão passada pelos serviços donde conste o quantitativo despendido.

BASE VII

1. A cooperação das diversas entidades interessadas na elaboração do Plano Urbanístico da Região de Lisboa será assegurada por intermédio de uma comissão, de carácter eventual, a constituir no Ministério das Obras Públicas e na dependência do respectivo Ministro, designada por Comissão du Plano Urbanístico da Região de Lisboa.

2. Compete à Comissão:
a) Pronunciar-se e fazer recomendações sobre a preparação e elaboração do plano;
b) Assegurar a execução dos trabalhos de inquérito e estudo da parte dependente dos organismos nela representados ;
c) Apreciar o projecto dou normas provisórias a propor superiormente, consoante o disposto no n.º 2 da base I;
d) Apreciar o projecto do plano;
e) Dar parecer, para os fins consignados na base v, sobre os pedidos de autorização que o Ministro das Obras Públicas, em razão da sua importância, entenda dever submeter-lhe;
f) Pronunciar-se sobre quaisquer assuntos relacionados com, o plano e acerca dos quais o Governo julgue conveniente ouvi-la.

BASE VIII

1. A Comissão do Plano Urbanístico da Região de Lisboa terá a seguinte composição:
a) O director-geral dos Serviços de urbanização, que servirá de presidente; o director dos Serviços de Melhoramentos Urbanos da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização; o director do Gabinete do Plano Urbanístico da Região de Lisboa; um director de serviços da Junta Autónoma de Estradas, e um arquitecto, com n necessária especialização urbanística, ambos da livre escolha do Ministro das Obras Públicas;
b) Um representante da Câmara Municipal de Lisboa, três representantes das demais câmaras municipais dos concelhos da região de Lisboa a norte do Tejo e outros três das câmaras municipais dos concelhos da região de Lisboa a sul do Tejo;
c) Um representante do Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, e outro da Inspecção Superior do Plano de Fomento;
d) Um representante do Secretariado da Defesa Nacional ;
e) Um representante da Direcção-Geral de Administração Política e Civil;
f) Um representante de cada uma das Direcções-Gerais dos Serviços Industriais, dos Serviços Florestais e Agrícolas, dos Serviços Agrícolas, de Minas e Serviços Geológicos, e outro do Instituto Nacional de Investigação Industrial;
g) Um representante da Direcção-Geral de Transportes Terrestres e outro da Administração-Geral do Porto de Lisboa;
h) Um, representante, da Direcção-Geral do Trabalho corporações;
i) Um representante da Direcção-Geral de Saúde;
j) Duas individualidades a designar pelo Ministro das Obras Publicas, uma delas, pelo menos, com a necessária especialização em, economia.
2. A composição fixada no número antecedente poderá ser ampliada, mediante portaria do Ministro das Obras Públicas, se tal vier a mostrar-se necessário.
3. Cabe ao Presidente do Conselho e aos Ministros da Defesa Nacional, do' Interior, da Economia, das Comunicações, das Corporações e Previdência Social, da Saúde e Assistência a designação dos vogais das alíneas c), d), e),f), g), h) e i), respectivamente. Os representantes das câmaras municipais, excepto o da Câmara Municipal de Lisboa, serão por elas escolhidos em reunião presidida pelo respectivo governador civil.
4. Por cada vogal será designado um suplente, que deverá substituí-lo nos seus impedimentos.
5. A nomeação dos vogais da Comissão será feita em portaria do Ministro das Obras Públicas.

BASE IX

1. Os membros da Comissão do Plano Urbanístico da Região de Lisboa terão direito ao abono da importância de 150$ por cada sessão a que assistirem.
2. Aos membros da Comissão, quando hajam de deslocar-se no desempenho das suas funções, serão abonadas as ajudas de custo e as despesas de transporte correspondentes à sua categoria. Esta será equiparada à designada pela letra C no Decreto-Lei n.º 26 115, de 23 de Novembro de 1035, para os vogais que não forem funcionários do listado ou dos corpos administrativos.

BASE X

1. E criada, na Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, e na dependência imediata do respectivo director-geral, o Gabinete do Plano Urbanístico da Região de Lisboa, ao qual compete tudo o que respeite à preparação e elaboração do plano, incluindo a execução das recomendações de Comissão a que se refere a base VIII.
2. O Gabinete será dirigido por um técnico com a necessária especialização, a nomear pelo Ministro das Obras Públicas de entre os funcionários do quadro da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, ou, mediante contrato, de entre técnicos estranhos àquele quadro também com a necessária especialização.
3. O director do Gabinete, quando a escolha recaia em funcionário da referida Direcção-Geral, terá direito a gratificação, a fixar pelo Ministro das Obras Públicas, com o acordo do Ministro das Finanças.
4. O pessoal técnico, administrativo e menor necessário ao funcionamento do Gabinete poderá ser contratado ou assalariado para as categorias e em número a determinar mediante despacho do Ministro das Obras Públicas.
5. Para a preparação e elaboração do Plano é autorizaria a Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização a contratar técnicos urbanistas de reconhecida competência, nacionais ou estrangeiros, bem como a mandar elaborar os estudos especializados que eventualmente se tornem necessários, em qualquer dos casos sob o regime de prestação de serviços e nas demais condições aprovadas pelo Ministro das Obras Públicas.
6. Passarão a ser exercidas por intermédio do Gabinete as atribuições da Direcção-Geral dos Serviços de

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18 DE ABRIL DE 1959 657

Urbanização referentes u urbanização da área da região de Lisboa e à fiscalização do cumprimento do plano de urbanização da Custa do Sol, nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 37 251, de 28 de Dezembro de 1948.

BASE XI

1. Os encargos a que der lugar a execução da presente lei serão suportados pelas dotações adequadas do orçamento da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização.
2. As importâncias que vierem eventualmente a ser fixadas como participação das câmaras municipais nos encargos n que se refere o número anterior darão entrada nos cofres do Estado, devendo ser abatidas ao montante a entregar anualmente pelo Comissariado do Desemprego, nos termos do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 34 337; de 27 de Dezembro de 1944.

Palácio de S. Bento, 15 de Abril de 1959.

Afonso de Melo Pinto Veloso.
Augusto Cancella de Abreu.
António Jorge Martins da Mota Veiga.
Francisco Pereira de Moura.
João Faria Lapa.
José Seabra Castelo Branco.
Francisco Manuel Moreno.
Inácio Feres Fernandes.
António Pereira Caldas de Almeida.-
Reinaldo dos Santos.
José Pires Cardoso, relator.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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