O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1497

REPÚBLICA PORTUGUESA

ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 137

VII LEGISLATURA 1961 29 DE JUNHO

Projecto de proposta de lei n.º 522

Saúde mental

1. A promoção da saúde mental visa permitir aos indivíduos, sob o ponto de vista sanitário, a realização das suas potencialidades pessoais e a sua conveniente integração no meio familiar, social e cultural. Compreende, por isso, não só a prevenção e tratamento das doenças mentais, mas, sobretudo, a recuperação dos diminuídos, restabelecendo neles, na maior medida do possível, a estabilidade do respectivo equilíbrio psíquico.
Reduzida a mortalidade geral e a incidência das doenças transmissíveis, tornou-se a saúde mental, hoje em dia, um dos mais importantes problemas da saúde público, dos países civilizados.
Sobretudo depois da última guerra, foram feitos extensos e pormenorizados estudos sobre o assunto. E verificou-se pela primeira vez, por exemplo, e além do mais, a grande importância dais doenças desta natureza na diminuição da rentabilidade económica dos países.
Segundo determinadas estatísticas, cerca de 12 por cento dos indivíduos com mais de 20 anos sofrem ou sofreram de perturbações do foro psiquiátrico, dos quais 1 por cento de oligofrenias, 7 por cento de psicopatias ou psiooneuroses e os restantes 4 por cento de outras doenças mentais (esquizofrenias, psicoses ma-níaco-depressivas, psicoses orgânicas e senis). As neuroses ligeiras e as outras doenças determinadas em parte por factores psíquicos ainda fazem subir a percentagem de anomalias desta índole. E tal é o quadro triste que os técnicos apresentam u nossa consideração: a frequência e a longa duração de muitas destas doenças fazem com que, por exemplo, nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, cerca de 40 a 50, por cento dos leitos dos hospitais estejam hoje ocupadas por doentes psiquiátricos.
No nosso país (e embora se não haja ainda efectuado em pormenor um estudo estatístico adequado), se compararmos o censo de 1940 com o de 1950, verifica-se um aumento geral de 10.7 por cento 110 número de doentes mentais. E os inquéritos já levados a efeito em determinadas zonas pelo Instituto de Assistência Psiquiátrica mostram a importância que o problema assume e a necessidade de o considerar, na sua integralidade, com energia n com rapidez.

2. A Lei n.º 2006, de 11 de Abril de 1945, que tão brilhantemente reformou entre nós a assistência, psiquiátrica, criou um surto de interesse que fez duplicar, em pouco mais de dez anos, o número de leitos existentes: de 4000 passou-se para 8000 camas, aproximadamente.
Na situação presente, e atendendo aos doentes actualmente internados ou em tratamento, ao tipo da nossa cultura, à circunstância de a população portuguesa ser talvez das mais jovens da Europa, (este facto tem grande importância, pois o aumento da população urbana e o envelhecimento são dos factores que mais decididamente contribuem para a necessidade de maior número de camas para os doentes mentais) e atendendo ainda no desenvolvi m unto do serviço social especializado e da assistência extra-hospitalar, parece seguro que, para Portugal, a permilagem adaptada pela Organização Mundial de Saúde para os países da Europa Ocidental deve ser reduzida para cerca de 1.5 por cento.
Esta permilagem e o previsível aumento da população nos próximos dez anos deverá por isso determinar um programa de construções que permita atingirem-se cerca de 16 000 leitos em 1970. Tal é o limito técnica-

Página 1498

1498 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 137

mente aconselhável para uma luta eficaz no campo das doenças mentais entre nós.
Nenhum país possui, nem talvez venha a possuir, as camas reputadas teoricamente suficientes para todos os seus doentes mentais. Mas não é este, aliás, o conteúdo exclusivo dos programas de saúde mental: o que interessa sobretudo é, desse ou doutro ânodo, dar ao doente a possibilidade de cura e de recuperação social, a fim de o tornar válido e socialmente útil.

3. A presente proposta de lei continua a dispensar atenção preferencial às medidas de carácter preventivo e de higiene mental com vista u defesa e conservação da saúde dos indivíduos, sobretudo durante a infância e a adolescência. Na verdade, a profilaxia das doenças mentais acompanha de perto a evolução da medicina preventiva nos outros campos da saúde pública.
As medidas mais eficazes e económicas são, portanto, as de natureza preventiva, conjugadas com o tratamento precoce em regime ambulatório ou domiciliário. Por isso, neste campo, os serviços sociais têm tanta importância como os próprios hospitais psiquiátricos. Estes últimos falharão nas suas missões, ou não as prosseguirão integralmente, se não forem apoiados por serviços sociais especializados e actuando por métodos actuais.
Salienta-se nesta proposta de lei a atenção que merece a promoção da saúde mental infantil, não só pela prevenção e despiste das doenças, mas também pelo tratamento e recuperação dos afectados ou diminuídos psíquicos. De facto, não grande mundo da saúde mental, a recuperação da infância (e da adolescência,) significa uma preferência pelas medidas preventivas ou outras que conduzam à diminuição da morbilidade ou da incidência geral das doenças e anomalias mentais. A infância mentalmente recuperada constituirá mais cedo um elemento activo da população; quanto mais cedo a criança for recuperada, tanto menos, como adulto, se tornará pesada à sociedade e aos próprios serviços de saúde mental, que então a teriam de suportar em tratamento mais demorado e de resultado problemático.

4. Entre a Lei n.º 2006 e a presente proposta há diferenças bastante sensíveis, que resultam da grande evolução verificada nos últimos anos pelo que respeita a promoção da, saúde mental. Destacar-se-ão algumas delas.
A primeira diferença - e talvez a mais importante- resulta da própria evolução havida e está já, de certo modo, contida no que foi dito.
O objectivo da presente lei não se circunscreve ao mero aspecto da assistência psiquiátrica, hoje subordinado e de alguma forma supletório. Ao contrário, apresenta-se como sendo a promoção da saúde mental, tarefa activa que não aguarda a verificação do caso de doença, mas lhe antepõe um esforço para manutenção do estado sanitário positivo.
5. Reporta-se outra das diferenças à integração ou reintegração do doente no seu meio social, isto é, à sua recuperação para a complexidade da vida humana. É que não bastará fazer profilaxia o tratar os doentes, se se não conseguir que, através da terapêutica ocupacional e de outras medidas, eles se adaptem a sua própria vida ou à profissão mais indicada ao seu déficit básico ou ao de que porventura fiquem a sofrer.
Por outro lado, a experiência revelou que os doentes carecendo de ser tratados devem ter o direito de livremente procurar qualquer hospital, sem formalidades
desnecessárias e, tanto quanto possível, sem serem segregados do convívio social.
Os serviços de recuperação devem por isso ser localizados, preferentemente, fora dos hospitais psiquiátricos, pois é hoje geralmente aceite que muitos doentes, mesmo quando não completamente curados, podem ter em liberdade uma vida social útil.

6. Outra diferença importante reside no facto de se considerarem expressamente incluídos no âmbito da saúde mental o alcoolismo e as outras toxicomanias, ao lado das doenças psíquicas propriamente ditos.
Na verdade, os internamentos verificados nos últimos dez anos no nosso maior hospital psiquiátrico revelam, que cerca de 10 por cento do total das admissões resultaram de psicoses alcoólicas.
É do conhecimento geral que os alcoólicos têm a capacidade de trabalho afectada e a resistência diminuída, pelo que entre eles se verificam os maiores índices de mortalidade. Em Franca, apurou-se que são responsáveis por 40 a 50 por cento dos acidentes mortais de viação e por 20 por cento das doenças profissionais, e que sofrem de acidentes de trabalho com frequência três vezes superior a dos Outros trabalhadores. É também entre nós as consequências sociais do alcoolismo e o seu papel na desagregação da família e na criminalidade são de sobejo conhecidas.
O que na lei agora é decidido quanto ao alcoolismo postula a necessidade de uma campanha destinada a dar a conhecer ao público os malefícios que o abuso do álcool pode provocar e a organizar em bases técnicas os programas de luta contra esta toxicomania. Por isso, a presente proposta prevê a criação, junto do Instituto de Saúde Mental, de uniu comissão de estudo e informação sobre o alcoolismo e as outras toxicomanias.

7. uma outra diferença reside no expresso reconhecimento do princípio da unidade da promoção da saúde mental, quer no que diz respeito ao agrupamento dos estabelecimentos e serviços, quer pelo que se refere à evolução da doença dos indivíduos.
É sempre vantajoso que o doente seja seguido, no decurso das evolução da sua doença, pelo mesmo médico ou pela mesma equipa clínica, pois o conhecimento do seu modo individual de reacção é muito útil para uma terapêutica eficaz. Ora em psiquiatria, mais do que em qualquer outro ramo da medicina, a necessidade do conhecimento íntimo e profundo do doente, do seu meio ambiente, das suas acções e reacções (e isto muitas vezes só se consegue ao cabo de longos e repetidos contactos) torna mais imperioso que cada doente seja tratado pelo mesmo clínico.
Esta é Tinia das razões por que a competência técnica dos serviços de promoção da saúde mental é definida em função de áreas de recrutamento geográfico dos doentes e estas são traçadas conforme os necessidades específicas dos agrupamentos populacionais dessas áreas.

8. Uma política de saúde exige flexibilidade e variedade de serviços. Mas exige também uma posição, porventura mais definida, da parte do Estado, garantindo (ainda que sempre supletivamente) a existência deles, já acompanhando a sua organização e actividade em termos de não haver inconvenientes disparidades em matéria de tanto relevo. A estas necessidades se pretendeu também obviar.
E igualmente se considerou conveniente reforçar o regime de defesa dos direitos individuais, particularmente delicada no caso dos internados em regime fechado.

Página 1499

29 DE JUNHO DE 1961 1499

Bem se compreende, lia verdade, que o estatuto do doente mental nessas condições seja a de uma incapacidade jurídica quase total. Mas exactamente por isso, e porque a incapacidade é imposta por motivos técnicos, em princípio susceptíveis de discussão, é que se julgou da maior necessidade assegurar sempre, dentro do conveniente equilíbrio dos interesses em jogo, a maior latitude de defesa possível às garantias individuais de cada um.

9. Outra diferença importante: a presente proposta de lei prevê uma curatela especial, destinada aos doentes que fiquem temporariamente inibidos de gerir os seus bens.
Na verdade, os grandes progressos verificados recentemente no tratamento das doenças mentais fizeram que se deixasse de olhar o doente psíquico como muito provavelmente destinado a uma evolução crónica e presumivelmente incapacitado, de forma definitiva e permanente, de reger a sua pessoa e bens. Hoje, em princípio, apenas deve ser considerado como um indivíduo transitoriamente incapaz de cuidar de algum ou alguns dos seus interesses. É esta situação de obnubilação temporária das faculdades que motivará cada vez menos o recurso ao processo de interdição e levará a recorrer, nos países que o prevejam, a um instituto de aplicação e suspensão mais rápidas e, por conseguinte, mais adequadas ao ritmo de progresso da medicina, nos sectores da saúde mental.
De futuro, e nos casos normais, a evolução da doença nem já terá duração suficiente para permitir recorrer à interdição do doente. Por isso, a Organização Mundial de Saúde recomenda repetidamente, há já algum tempo, a instituição de uma curatela especial, aplicável aos doentes momentaneamente incapacitados, quer internados, quer não.

10. A evolução dos métodos utilizados na promoção da saúdo mental e o alargamento do âmbito de acção dos serviços implicam não só a preparação do pessoal técnico adequado às necessidades, mas a intensificação da sua formação.
As Faculdades de Medicina é cometida a incumbência da preparação activa do pessoal médico especializado. Mas ao Instituto de Saúde Mental incumbe também promover a preparação e o aperfeiçoamento do pessoal indispensável, desde o médico (na diversidade das suas especializações e subespecializações) aos trabalhadores de serviço suciai, de enfermagem e das técnicas auxiliares, sem esquecer o recurso a pessoal especializado estrangeiro e aos estágios, em centros de saúde mental de outros países, do pessoal reputado necessário.
Tais são as linhas gerais da proposta de lei que o Governo tem a honra de submeter à apreciação da Câmara Corporativa e da Assembleia Nacional.

BASE I

1. A promoção da saúde mental, visa a estabelecer o equilíbrio psíquico da pessoa humana, e abrange a acção profiláctica, a acção terapêutica e a acção recuperadora.
2. A acção profiláctico é exercida por medidas de carácter preventivo geral e por medidas de higiene mental, individuais ou colectivas. As providências dirigidas à saúde mental da infância devem ser consideradas com particular interesse.
3. A acção terapêutica consiste no tratamento das doenças e na correcção das anomalias mentais, bem como no tratamento das toxicomanias, em regime ambulatório, domiciliário, de colocação familiar ou de hospitalização.
4. A acção recuperadora realiza-se pela aplicação de medidas psicopedagógicas, sociais o de outras naturezas, destinadas ao treino e readaptação dos portadores de doenças e anomalias mentais, bem como de toxicomanias, para sua integração, tão completa quanto possível, no meio social.

BASE II

No campo da saúde mental, incumbe ao Estado:
a) Orientar, coordenar e fiscalizai1 a acção profiláctica, terapêutica e recupera dor a no domínio das doenças e anomalias mentais, bem. como das toxicomanias;
b) Estimular e favorecer as iniciativas particulares que contribuam para a realização de qualquer das formas de actividade que promovam, a saúde mental, autorizando o funcionamento de estabelecimentos adequados e aprovando os respectivos regulamentos gerais;
c) Criar e manter os serviços considerados necessários à promoção da saúde mental.

BASE III

1. A acção do Estado será exercida pelo Ministério da Saúde e Assistência, por intermédio do Instituto da Saúde Mental.
2. O Instituto terá sede em Lisboa e gozará de personalidade jurídica e de autonomia técnica e administrativa.
3. A direcção do Instituto será exercida por um psiquiatra e assistida de uni conselho técnico de saúde mental.

BASE IV

1. Compete ao Instituto de Saúde Mental dar execução, em geral, às funções do Estado enumeradas na base II e designadamente:
a) Sob parecer do respectivo conselho técnico, fixar as condições de funcionamento dos estabelecimentos e serviços destinados à realização de qualquer das modalidades de promoção da saúde mental;
b) Intensificar a colaboração entre estabelecimentos e serviços já existentes ou que vendam a criar-se;
c) Cooperar com os organismos que se ocupem da higiene mental no estudo dos problemas relativos às condições económico-sociais e de trabalho e aos factores sanitários que influam na morbilidade das doenças e anomalias mentais, bem como das toxicomanias;
d) Promover a preparação e o aperfeiçoamento do pessoal médico, psicológico, de serviço social, de enfermagem e auxiliar técnico, necessário no funcionamento dos serviços de saúde mental e de outros correlativos;
e) Promover a investigação científica e prestar a assistência técnica que no campo da saúde mental lhe for solicitada;
f) Proceder aos exames médico-legais que lhe sejam requisitados pelas entidades competentes, nos termos da lei e sem prejuízo dos recursos nela estabelecidos;
g) Assegurar o registo dos doentes admitidos em estabelecimentos oficiais e particulares e elaborar as estatísticas relativas nos serviços de saúde mental.

Página 1500

1500 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 137

2. Os serviços de saúde, hospitalares e assistenciais prestarão ao Instituto, dentro das suas possibilidades, a colaboração de que este carecer para conveniente realização dos seus fins.
3. As funções atribuídas ao Instituto de Saúde Mental não prejudicam as que por lei competirem aos serviços prisionais e jurisdicionais de menores.

BASE V

1. Ao conselho técnico incumbe emitir parecer sobre os assuntos relativos à promoção da saúde mental e, obrigatoriamente, sobre:
a) Os planos de saúde mental;
b) As medidas destinadas no aperfeiçoamento da formação do pessoal médico, de serviço social, de enfermagem e auxiliar, bem como acerca das providências destinadas a promover o aumento do seu número e a melhoria das suas condições de trabalho;
c) Os programas de investigação científica a realizar e financiar pelo Instituto ou com a sua colaboração.

2. O conselho técnico será presidido pelo director do
Instituto e constituído pelos seguintes vogais:
a) Os professores de Psicologia e de Psiquiatria das Faculdades de Letras e de Medicina;
b) Um professor universitário de Sociologia;
c) O director do Instituto António Aurélio da Costa Ferreira;
d) Os delegados do Instituto nus zonas norte u centro;
e) Os directores e chefes de serviço dos hospitais e dispensários de saúde mental do distrito de Lisboa, nos termos dos regula mentos respectivos;
f) Um representante da Igreja Católica.

3. Podem ser convidados a participar nas reuniões do conselho, para exame dê questões que interessem às suas funções ou serviços, os demais professores das cadeiras de Psiquiatria das Faculdades de Medicina e outros médicos ou funcionários dos estabelecimentos oficiais ou particulares.

BASE VI

1. Para efeitos da organização dos serviços de saúde mental, o País é dividido em três zonas, correspondentes às zonas hospitalares do Norte, Centro e Sul, com sedes, respectivamente, no Porto, Coimbra e Lisboa.
2. Com superintendência na respectiva zona, funcionarão no Porto e em Coimbra delegações do Instituto, às quais especialmente incumbirá orientar e coordenar tis respectivos centros de saúde mental. Nos distritos onde existam serviços previstos nesta lei poderá haver subdelegações.

BASE VII

1. O serviço do Instituto é assegurado, em cada zona, por centras de saúde mental.
2. Os centros gozarão de autonomia técnica e administrativa e terão área de actuação de base geográfica, de acordo com as necessidades específicas dos agrupamentos populacionais.
A sede dos centros será, de preferência, na sede dos distritos ou dos regiões, hospitalares. Os centros funcionarão integrados com os restantes serviços de saúde e assistência, de modo a constituírem com eles centros médico-sociais locais.

3. As suas direcções compete:
a) Orientar, coordenar e fiscalizar as actividades dos centros;
b) Organizar, de acordo com as indicações médico-psicológicas e sociais, os processos de admissão em estabelecimentos adequados dos doentes do foro mental;
c) Propor a concessão de subsídios;
d) Assegurar o registo dos doentes em estabelecimentos oficiais e particulares;
e) Elaborar as estatísticas relativas à sua área.

BASE VIII

1. Os centros de saúde mental, dirigidos por psiquiatras de reconhecido mérito e competência, deverão dispor, no todo ou em parte, de serviços diferenciados para menores e adultos.
2. Os. estabelecimentos oficiais de saúde mental integrados nos centros terão receitas próprias, podendo ser-lhes concedida autonomia técnica e administrativa.
Os mesmos estabelecimentos terão ainda capacidade jurídica para aceitar heranças, legados ou doações e podem receber subsídios do Estado, das autarquias locais, dos organismos corporativos ou de coordenação económica e das entidades particulares.
3. É facultado aos referidos estabelecimentos receber pensionistas, competindo ao Ministério da Saúde e Assistência aprovar as tabelas das respectivas pensões e honorários clínicos.
4. Deverá reverter a favor dos assistidos ou de suas famílias uma quota-parte do produto líquido do trabalho remunerado que realizarem.

BASE IX

São especialmente destituídos á promoção da saúde mental infantil os seguintes estabelecimentos e serviços:
a) Os dispensários de higiene e profilaxia mental infantil, destinados à prevenção, tratamento e recuperação dos menores que não necessitem
de ser hospitalizados;
b) As brigadas móveis, dependentes dos dispensários e destinadas a observação e selecção de menores para fins terapêuticos e de recuperação;
c) Os serviços especializados de psicoterapia e psicopedagogia infantil;
d) As clínicas psiquiátricas infantis paru tratamento das perturbações psíquicas agudas e das anomalias do comportamento;
e) Os serviços destinados ao tratamento de menores epilépticos, com perturbações motoras ou com deficiências sensoriais;
f) Os estabelecimentos destinados à recuperação de menores educáveis;
g) Os estabelecimentos destinados à educação e tratamento de menores dependentes e treináveis;
h) Os serviços de colocação familiar e de assistência domiciliária;
i) Os lares educativos.

BASE X

Incumbe ao Instituto António Aurélio da Costa Ferreira a orientação psicopedagógica dos serviços de ensino destinados à reeducação dos menores com anomalias mentais e a preparação do pessoal docente e técnico necessário aos mesmos serviços.

Página 1501

29 DE JUNHO DE 1961 1501

BASE XI

1. São especialmente destinados à promoção da saúde mental dos adultos os seguintes estabelecimentos e serviços:

a) Dispensários destinados à profilaxia, terapêutica e recuperação dos portadores de doenças e anomalias mentais que não necessitem de; ser hospitalizados;
b) Brigadas móveis dependentes dos dispensários e destinadas a percorrer regularmente as áreas que lhes forem demarcadas, dando consultas, despistando e diagnosticando os portadores de doenças e anomalias mentais e tomando as medidas adequadas de profilaxia e higiene mental;
c) Hospitais psiquiátricos, destinados ao tratamento com internamento dos portadores de doenças e anomalias mentais;
d) Clínicas e serviços psiquiátricos, autónomos ou agregados a hospitais gerais;
e) Serviços de recuperação para doentes de evolução prolongada;
f) Secções psiquiátricas em asilos gerais;
g} Estabelecimentos para tratamento e recuperação de alcoólicos e outros toxicómanos;
h) Estabelecimentos destinados ao tratamento e correcção dos portadores de anomalias mentais sem psicose e, principalmente, dos delinquentes;
i) Serviços destinados ao tratamento dos doentes mentais tuberculosos, em hospitais psiquiátricos ou em sanatórios;
j) Hospitais de dia e hospitais de noite, em ligação com os hospitais psiquiátricos ou com os hospitais gerais;
g) Serviços de dia, destinados especialmente à. assistência dos doentes senis e dos deficientes mentais;
m) Serviços oficinais adequados (oficinas protegidas);
n) Serviços de colocação familiar e de assistência domiciliária;
o) Clubes de portadores ou de antigos portadores de doenças e anomalias mentais.
2. Será autorizado o funcionamento de instituições particulares com finalidades semelhantes às dos serviços e estabelecimentos oficiais previstos nesta base, nas condições a estabelecer em regulamento.

BASE XII

1. Os serviços referidos nas bases, anteriores deverão, tanto quanto possível, funcionar agrupados, para garantia da unidade da promoção da saúde mental através da concorrência das actividades profilácticas, terapêuticas e recuperadoras.
3. Deverá procurar conseguir-se que o portador de doença ou anomalia mental ou de tóxicomania seja acompanhado, na respectiva evolução, pelo mesmo médico ou pela mesma equipa clínica.

BASE XIII

1. As clínicas e os serviços psiquiátricos das Faculdades de Medicina gozam de autonomia técnica. Deverão, no entanto, coordenar as suas actividades com as do centro de saúde mental da área respectiva.
2. Quando se mostrar conveniente, as Faculdades de Medicina poderão exercer a sua actividade pedagógica e científica nos serviços dependentes do Instituto
de Saúde Mental. lies te caso, os referidos serviços gozarão de autonomia técnica, sob a chefia do professor de Psiquiatria da Faculdade de Medicina respectiva, sem embargo do funcionamento em estreita colaboração com o estabelecimento em que se encontrem integrados.
3. As clínicas psiquiátricas universitárias poderão solicitar dos serviços de saúde mental, sem. prejuízo da actividade destes, dos direitos dos próprios doentes e de terceiros, os doentes e elementos necessários ao ensino e à investigação.
4. A coordenação da actividade das clínicas psiquiátricas das Faculdades com a dos centros de saúde mental e dos serviços deles dependentes será assegurada pelo director do centro e pelos professores de Psiquiatria daquelas clínicas.
5. Os médicos e outro pessoal técnico dos serviços do Instituto poderão trabalhar nos serviços adstritos às Faculdades de Medicina, nos termos dos respectivos regulamentos e sob orientação do competente professor de Psiquiatria.
6. As. Faculdades de Medicina deverão participar activamente na preparação do pessoal médico especializado nos serviços de saúde mental.
BASE XIV
1. As instituições particulares de assistência que prossigam actividades ligadas à saúde mental gozam de autonomia técnica e administrativa.
2. O Instituto de Saúde Mental exercerá sobre as instituições particulares a conveniente acção orientadora e fiscalizadora, dentro dos limites da lei. Designadamente, ficarão dependentes do prévio parecer favorável do Instituto a abertura, bem como as obras de construção, ampliação ou grande remodelação de edifícios das instituições, casas de saúde, hospitais ou serviços de entidades privadas que se destinem a prestar assistência no campo da saúde mental.
3. Sob parecer fundamentado do Instituiu, a Direcção-Geral de Saúde poderá determinar o encerramento dos estabelecimentos ou serviços destinados ao tratamento ou recepção de portadores, de doenças ou anomalias mentais, de alcoólicos e de outros toxicómanos, que funcionem sem observância das disposições da presente lei e respectivos regulamentos.

BASE XV

1. No Instituto de Saúde Mental ou nos estabelecimentos e serviços dele dependentes poderão funcionar cursos e estágios para formação, especialização e aperfeiçoamento do pessoal médico, do serviço social e de enfermagem e dos outros técnicos que se tornem necessários.
2. Ao Ministro da Saúde e Assistência cabe autorizar o contrato de pessoal especializado estrangeiro, quando o não haja em Portugal, e, bem assim, conceder bolsas de estudo a pessoal médico ou outro para praticar em quaisquer serviços de saúde mental de outros países.

BASE XVI

1. A observação de menores portadores de doença ou anomalia mental ou de toxicomania, para efeitos da sua orientação educativa e eventual hospitalização, poderá ser requerida aos centros de saúde mental pelos pais, tutores ou quaisquer pessoas de família que, na falta daqueles, os tenham a seu cargo. Poderá também ser solicitada, nos termos regulamentares, pelos tribunais de menores e pelas demais pessoas ou entidades que, nos termos da legislação sobre saúde e assistência, possam promover ou requisitar socorros.

Página 1502

1502 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 137

2. Os menores em idade de instrução obrigatória que não sejam susceptíveis de educação em classes normais ou especiais deverão ser apresentados nos estabelecimentos referidos nas alíneas f) ou g) da base IX.

BASE XVII

A hospitalização dos afectados de doença ou anomalia mental ou de qualquer toxicomania pode fazer-se em regime aberto ou fechado.

BASE XVIII

1. A admissão em regime de hospitalização poderá ser pedida pelo próprio, pela sua família ou tutor ou ainda pelas pessoas ou entidades a quem incumbam os encargos com esta admissão. Poderá também ser requisitada pelos tribunais ou outras autoridades.
As autoridades policiais deverão requisitar a hospitalização sempre que ocorram razões de ordem, tranquilidade, segurança ou moralidade pública, informando, porém, a direcção do estabelecimento das circunstâncias que determinaram a requisição.
2. A justificação para admissão em regime aberto será feita pelo médico do dispensário ou do estabelecimento em que deva fazer-se a hospitalização.
3. A justificação para admissão em regime fechado será feita por atestados, válidos por dez dias, passados por dois médicos, sempre que possível psiquiatras, não parentes ou afins do doente, nem dependentes do estabelecimento onde "haja de ser hospitalizado.
4. A passagem do regime aberto para o regime fechado será determinada pelas indicações médicas ou pelas necessidades de segurança e ordem pública e carece sempre da justificação exigida para esta última forma de hospitalização.
5. Em caso de admissão de urgência, reconhecida pelo director do estabelecimento, a justificação de hospitalização deverá ser feita no prazo máximo de oito dias, a contar da admissão, prorrogável por igual período se o director do estabelecimento reputar a alta perigosa para o próprio doente ou para a ordem, segurança e tranquilidade públicas. Mas, passada essa prorrogação, a situação do doente terá de estar regularizada nos termos gerais estabelecidos.
6. Qualquer pessoa ou entidade poderá requerer ao tribunal da comarca que conheça da legalidade da admissão em regime fechado e, se houver suspeita de erro ou abuso, mande proceder a exames médico-forenses ou outras diligências, a fim de decidir consoante lhe parecer mais conforme ao estado do hospitalizado. Porém, a confirmação judicial da admissão não obsta a que, a todo o tempo, se apliquem as disposições relativas à alta dos doentes.
7. O hospitalizado tem direito a escolher advogado que vele pela legalidade do regime que lhe é aplicado. Se o não fizer, ser-lhe-á nomeado defensor oficioso, quando necessário.
8. Os directores dos estabelecimentos que admitirem ou mantiverem a hospitalização sem ser nos termos e condições estabelecidos nesta base incorrerão nas penas do artigo 291.º do Código Penal.
9. O processo previsto no 11.º 6 é isento de custas. Mas se o requerente tiver procedido com má fé ou com negligência grave ficará sujeito às penas e responsabilidades estabelecidas na lei.

BASE XIX

1. A alta dos hospitalizados pode ser dada:

a) Por iniciativa do director do respectivo estabelecimento;
b) A pedido dos próprios hospitalizados, suas famílias, tutores ou curadores;
c) Por ordem dos tribunais ou pela Inspecção Superior de Saúde e Assistência.
2. No caso de a alta ser pedida nos termos da alínea f) do número anterior, os directores dos estabelecimentos apenas poderão recusá-la com fundamento em perigo para o próprio hospitalizado ou para a segurança, tranquilidade e ordem pública.
Mas da sua decisão cabe recurso para o tribunal da comarca, que praticará as diligências necessárias ao apuramento da verdade.
3. Se a recusa for confirmada, não se admitirá recurso de nova recusa da alta quando esta for pedida antes de decorridos três meses sobre a decisão que houver confirmado a recusa anterior.
4. Se o director do estabelecimento a quem for ordenada a alta a reputar perigosa para o próprio hospitalizado ou para a segurança, tranquilidade e ordem pública, assim o comunicará imediatamente às competentes autoridades policiais, podendo nesse caso reter o hospitalizado por 48 horas, improrrogáveis.
5. As infracções ao que se dispõe nesta base fazem incorrer os directores dos estabelecimentos nas penas referidas no n.º 8 da base anterior.
6. É aplicável o n.º 9 da mesma base aos processos previstos nos n.ºs 2 e 3 da presente.

BASE XX

1. O hospitalizado tem o direito de contactar ou corresponder-se livremente:
a] Com. o tutor ou curador e com as pessoas de sua família ou que por ele revelem interesse;
b) Com os ministros da sua religião;

) Com os seus advogados ou outros mandatários;
d) Com. o director do estabelecimento, o Instituto de Saúde Mental, a Inspecção Superior de Saúde e Assistência e a Procuradoria da República.
2. A correspondência enviada pelo hospitalizado poderá ser remetida ao seu tutor ou curador por ordem do director do estabelecimento, sempre que:
a] O destinatário solicitar ao director do estabelecimento que lhe não seja enviada essa correspondência;
b) O médico assistente considerar que a correspondência é contrária aos interesses do doente.
3. O director do estabelecimento poderá também determinar que a correspondência dirigida ao hospitalizado lhe não seja entregue se, no parecer do médico assistente, a sua leitura prejudicar o tratamento. A correspondência não entregue será devolvida à procedência, sempre que seja possível identificar o remetente, ou, caso contrário, arquivada, comunicando-se o facto ao tutor ou curador do doente.
4. Os contactos do hospitalizado com o exterior serão regulados pela mesma forma, na parte aplicável.

BASE XXI

O director do Instituto ou os directores dos centros e estabelecimentos de saúde mental poderão propor a confirmação judicial das medidas de segurança adequadas, com relação aos hospitalizados que se mostrem perigosos ou anti-sociais.

Página 1503

29 DE JUNHO DE 1961 1503

BASE XXII

As regras relativas à admissão, à passagem de regime aberto para fechado, à alta dos hospitalizados e ao exercício de livre contacto exterior são aplicáveis a todos os estabelecimentos de saúde mental, oficiais ou particulares.

BASE XXIII

Incumbe especialmente ao procurador da República zelar pela salvaguarda da liberdade individual em todos os casos de hospitalização, tomando conhecimento das restrições impostas em execução da presente lei e seus regulamentos, e providenciar, em cada caso, pela forma legal adequada. Designadamente, deverá intervir sempre que, por qualquer razão, tenha suspeita de que indevidamente se mantém o internamento ou o isolamento de algum doente.

BASE XXIV

1. Poderá ser nomeado curador às pessoas maiores ou emancipadas, hospitalizadas ou não, que, por motivo de doença ou anomalia mental, bem como de toxicomania, «se mostrarem temporariamente incapazes ou estejam impedidas de reger a sua pessoa e administrar os seus bens.
2. O regime jurídico da curatela será estabelecido na lei civil, que deverá considerar especialmente os casos de urgência.

BASE XXV

1. Junto do Instituto de Saúde Mental funcionará uma comissão para estudo e informação sobre o alcoolismo e outras toxicomanias, à qual compete, neste assunto:

a) Organizar programas de lutas profilácticas;
b) Orientar campanhas educativas;
c) Submeter à aprovação do Ministro da Saúde e Assistência as medidas convenientes para melhor combater os referidos males sociais.

2. A comissão será constituída pelo director do Instituto, que presidirá, por delegados das direcções-gerais do Ministério da Saúde e Assistência e por delegados dos Ministérios do Interior, Justiça, Exército, Marinha, Ultramar, Educação Nacional, Economia e Corporações e Previdência Social e do Subsecretariado de Estado da Aeronáutica.

Ministério da Saúde e Assistência, 17 de Junho de 1961. - O Ministro da Saúde e Assistência, Henrique Miranda de Vasconcelos Martins de Carvalho.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Página 1504

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×