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REPÚBLICA PORTUGUESA
ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 88
VIII LEGISLATURA - 1965 5 DE JANEIRO
Projecto de proposta de lei n.º 506/VIII
Regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais
1. Durante largos anos - mais concretamente, até à promulgação da Lei n.º 83, de 24 de Julho de 1913 - a responsabilidade das entidades patronais pelos acidentes de trabalho fundou-se no conceito da culpa aquiliana, tradicional no direito romano, genericamente consagrado no artigo 2398.º do Código Civil e, posteriormente, em disposições dispersas por vários outros diplomas legais (Decretos de 6 e 14 de Abril de 1891, de 30 de Junho de 1884, de 6 da Julho de 1895, etc.) Com base em tal principio só haveria lugar a reparação pelos acidentes de trabalho quando estes fossem devidos a culpa ou negligência da entidade patronal, incumbindo ao trabalhador fazer a prova desse elemento indispensável da responsabilidade.
2. A insuficiência da protecção decorrente da aplicação daquele critério, e a reacção que, consequentemente, por toda a parte ía suscitando, até pelo reconhecimento da dificuldade dos trabalhadores em reunir suficiente prova de culpa da entidade patronal, deu origem, nos países de legislação social mais progressiva, à teoria da responsabilidade contratual, segundo a qual as entidades patronais são, por força do contrato de trabalho, responsáveis, em princípio, pelos acidentes durante ele ocorridos, desonerando-se assim os trabalhadores da prova da culpa correspondente As entidades patronais só se consideram isentas dessa responsabilidade quando demonstrem que o acidente não foi devido a culpa ou negligência sua, mas a caso fortuito ou de força maior, ou a culpa do trabalhador ou de terceiros.
Na prática, porém, e não obstante a sua formulação teórica aparentemente autónoma, a nova teoria apenas se traduzia, em relação à anterior, numa inversão do ónus da prova, que passava a pesar sobre a entidade patronal, continuando a deixar sem protecção os inúmeros acidentes devidos a caso fortuito, a força maior ou a simples imprevidência dos trabalhadores.
Porque inspirada, todavia, na necessidade de neutralizar a aplicação rígida da teoria da responsabilidade delitual, a teoria da responsabilidade contratual chegou a ser consagrada pela legislação suíça (1881 a 1911), dando origem, noutros países (v. g. a Bélgica), a uma forte corrente jurisprudencial, aliás perfeitamente compreensível, dada a propensão dos tribunais, pelas razões já referidas, para se tornarem cada vez menos exigentes em relação à prova a produzir pelas vítimas dos acidentes de trabalho quanto à existência de culpa por parte das entidades patronais.
Outros países, no entanto, foram mais longe na sua reacção, como a França, onde a teoria da responsabilidade contratual não logrou sequer impor-se à doutrina e à jurisprudência, em virtude da insatisfação que ela mesma provocava perante o reconhecimento, cada vez maior, da insuficiência de qualquer construção baseada no conceito clássico de culpa.
3. A teoria da responsabilidade sem culpa, ou da responsabilidade objectiva, encontrou, por isso, fácil acolhimento e rápida consagração em matéria de acidentes de trabalho, e dela nasceu a teoria do risco profissional que, abstraindo da noção de culpa, baseou a responsabilidade emergente dos acidentes de trabalho no risco que é inerente ao exercício de toda e qualquer actividade profissional, fazendo recair sobre as entidades patronais que dessa actividade, fonte de riscos, auferem lucros, a obrigação de reparar os danos correspondentes
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Logo consagrada na Alemanha, pela Lei de 6 de Julho de 1884, a nova doutrina rapidamente se difundiu à Áustria (Lei de 23 de Dezembro de 1887), Noruega (Lei de 23 de Julho de 1894), Itália (Lei de 17 de Março de 1898), Inglaterra (Lei de 6 de Agosto de 1897), França (Lei da 9 de Abril de 1898), etc.
Tudo isto, porém, respeitava apenas aos acidentes de trabalho.
No referente às doenças profissionais, apenas a lei federal suíça, de 23 de Março de 1877, tornaria extensivos os princípios aplicáveis em matéria de responsabilidade por acidentes de trabalho às indústrias susceptíveis de provocar certas doenças graves, posteriormente enumeradas pelos Decretos de 19 de Dezembro de 1887 e de 18 de Janeiro de 1901, orientação que foi seguida pela Alemanha, mandando equiparar, pela Lei de 11 de Fevereiro de 1929, algumas enfermidades contraídas no local da trabalho aos acidentes deste resultantes.
4. No nosso pais, a teoria do risco profissional só veio a ser consagrada pela referida Lei n.º 83, de 24 de Julho de 1913, que foi também o primeiro diploma a estabelecer um verdadeiro regime jurídico de reparação para os acidentes de trabalho, já que até então, e a julgar pelo que se dizia no relatório do Decreto n.º 5673, de 10 de Maio de 1919, «a indemnização pelo desastre no trabalho em Portugal era apenas uma platónica disposição do Código Civil (artigo 2398.º)».
Com efeito, foi a Lei n.º 83 que veio consagrar entra nós os princípios então dominantes nas legislações estrangeiras sobre a caracterização dos acidentes de trabalho, responsabilidade das entidades patronais e sua transferência para instituições de seguro privado (mútuas de patrões e companhias de seguros), e, quanto a este último aspecto, só era ultrapassada, ao tempo, por aquelas legislações que, como a alemã, haviam instituído, desde início, o seguro social obrigatório.
Regulamentada por vários diplomas, entre os quais se destacam os que aprovaram o Regulamento dos Desastres no Trabalho (Decreto n.º 938, de 9 de Outubro de 1914) e o Regulamento da Lei dos Desastres do Trabalho (Decreto n.º 4288, de 9 de Março de 1918), que àquele se veio substituir, a Lei n.º 83, abstraindo da circunstância de não prever a reparação das doenças profissionais, constituiu, sem dúvida, um diploma informado por aberto espírito de protecção ao sinistrado, a quem só em caso de dolo era recusado o direito à reparação.
5. Posteriormente, o Decreto n.º 5637, de 10 de Maio de 1919, veio tornar extensivo a toda a actividade profissional o âmbito de aplicação da legislação sobre acidentes de trabalho. O que de mais inovador, porém, se continha nos seus preceitos era o estabelecimento do seguro obrigatório, a criação de mútuas distritais e a inclusão no conceito de desastre no trabalho de «todos os casos de doenças profissionais devidamente comprovadas». Na prática, todavia, nem a obrigatoriedade do seguro, nem a extensão do regime às doenças profissionais tiveram execução, o mesmo sucedendo com o seguro mútuo, que nunca foi organizado.
6. E, deste modo, chegamos a 1936, com a publicação da Lei n.º 1942, que, embora substituindo o risco profissional pelo risco de autoridade que autonomiza a reparação da prestação directa de trabalho, foi estruturalmente orientada ainda pelo princípio da responsabilidade patronal e, bem assim, pelo da transferência desta para o seguro privado.
Não obstante aquela inovação doutrinal, razões de ordem económico-social aconselharam ao legislador, como se depreende do relatório da proposta apresentada à Assembleia Nacional em 9 de Dezembro de 1933, limitações não só no âmbito da responsabilidade como no próprio campo de obrigatoriedade do seguro, motivo por que passaram a ser mais numerosos do que anteriormente os casos de isenção da responsabilidade e a obrigatoriedade do seguro passou a ser apenas imposta às empresas com mais de cinco trabalhadores.
A evolução que, entretanto, se operou na quase universalidade das legislações, revelou uma progressiva tendência para rever tais princípios à luz dos conceitos que regem o sistema dos seguir os sociais obrigatórios, dada a natureza dos riscos protegidos e o especial relevo que os acidentes de trabalho e as doenças profissionais assumem como riscos originados directamente na prestação do trabalho.
Foi assim que no parecer da Câmara Corporativa (n.º 39/VII), sobre a proposta em que veio a converter-se a Lei n.º 2115, se encarou o problema, preconizando-se a integração daqueles eventos no âmbito do seguro social obrigatório, «à medida que as circunstâncias o permitam».
E daquela evolução resultou que esta integração se está a processar na maioria dos países, sendo já muito reduzido o número dos que ainda conservam o seguro privado, pelo menos como sistema exclusivo de cobertura, tal como se verifica no inquérito preparatório da 47.ª sessão da Conferência Internacional do Trabalho.
7. Ao elaborar-se a presente proposta de lei, não podia deixar de considerar-se este problema, já que o regime jurídico da reparação depende, fundamentalmente, do sistema que se adoptar em matéria de cobertura e garantia do risco. A orientação que se impunha era, necessàriamente, a de, não deixando de ter em conta a referida tendência, estruturar o regime jurídico da reparação por forma a que ele seja válido e eficaz dentro da moldura oferecida pelo sistema de garantia actualmente em vigor e no qual ainda se combinam o seguro privado paia os acidentes de trabalho e o seguro social para as doenças profissionais.
8. Segundo a Lei n.º 1942, a transferência da responsabilidade patronal para o seguro privado não só pode ser substituída por caução ou prova de capacidade económica perante a Inspecção-Geral de Crédito e Seguros, como está condicionada, na sua obrigatoriedade, à exploração «de alguma indústria em estabelecimento adequado, empregando normalmente mais de cinco trabalhadores...» (artigo 12.º).
Deste condicionalismo e da posição dos trabalhadores sujeitos aos efeitos de um contrato de seguro a cuja celebração e execução são de todo estranhos resulta, não raras vezes, a impossibilidade de tornar efectivos, na prática, direitos judicialmente reconhecidos, dada a insolvência total ou parcial das entidades patronas Para eliminar tão grave situação todas as legislações que ainda adoptam o seguro privado têm instituído um «fundo de garantia», alimentado por receitas de vária ordem, fundo que se prevê na presente proposta de lei e cuja gestão se confia à Caixa Nacional de Seguros de Doenças Profissionais (base XXXII).
9. Um dos aspectos mais estudados nas reuniões internacionais em que se debatem os problemas actuais dos seguros sociais é o do ajustamento das prestações à variação das condições económicas, ou seja, da sua actualização
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perante a desvalorização da moeda. Sem se desconhecerem as dificuldades das soluções neste campo, entendeu-se ser possível enfrentar desde já o problema, dada a flagrante justiça que o esforço nesse sentido representa, esperando-se, confiadamente, que as disponibilidades do Fundo de Garantia e Actualização de Pensões permitam ir corrigindo, em razoável medida, pelo menos, as situações de mais acentuados desníveis (base XXXII, n.º 3), designadamente pelo que respeita ao sector das doenças profissionais.
10. Relativamente ao campo de aplicação da lei, generalizou-se, como parece impor-se, a obrigatoriedade do seguro, elimmando-se as limitações actuais, já que só essa generalização obstará aos inconvenientes apontados (base LIII).
11. Como não podia deixar de ser, na estruturação da lei tiveram-se em conta os mais autorizados ensinamentos da doutrina, o estudo das legislações estrangeiras similares mais evoluídas, as correntes da jurisprudência nacional, na já longa aplicação do texto vigente, e as convenções e recomendações internacionais, como as que foram aprovadas na referida 47.ª sessão da Conferência Internacional do Trabalho (1963).
Da utilização de todos estes dados resultaram a introdução de alguns preceitos inovadores e a correcção de princípios que informam determinadas normas fundamentais do texto vigente. Assim, definiu-se o acidente de trabalho com base nos elementos essenciais do seu conceito e com fundamento no risco do trabalho, eliminando-se da definição aquilo que só circunstancialmente, em algumas legislações, a acompanha (base II, n.º 1), e definiram-se, igualmente, os elementos de tempo e de local do trabalho (idem, n.º 3), procurando-se, outrossim, configurar os limites dos chamados acidentes in itinere ou de trajecto, fonte de numerosas controvérsias judiciais [base II, n.º 2, alínea c)]. No que respeita à classificação das incapacidades, introduziu-se o conceito de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, cuja reparação se entendeu dever diferenciar do regime aplicável à incapacidade geral de ganho [base XV, alínea b)].
Aperfeiçoaram-se as regras dos importantes institutos da caducidade e prescrição e de vários outros preceitos fundamentais, cuja redacção tem suscitado problemas complexos de interpretação e aplicação, como os que prevêem a isenção de responsabilidade nos casos de trabalho ocasional ou acidental, a predisposição patológica e a lesão ou doenças anteriores (bases XXXI, VIII e XXIV).
12. Revestem ainda relevante importância as inovações introduzidas no que respeita ao regime de reparação, salientando-se, neste capítulo o reconhecimento do direito às prestações legais por parte dos familiares da vítima no caso de acidente atribuído a falta indesculpável desta (base VII, n.º 2), a extensão do direito de reparação aos menores de 18 anos e aos filhos ou familiares de 21 ou 24 anos, enquanto frequentarem o ensino médio ou superior, bem como aos incapacitados por doença física ou mental (base XXI), a possibilidade de acumulação das prestações da viúva e filhos com as de outros beneficiários até ao limite do salário (base XXII, n.º 1), o limite mínimo da desvalorização que confere direito à reparação (base XV, n.º 3), as restrições ao despedimento sem justa causa de trabalhadores em regime de incapacidade temporária e a obrigatoriedade, em certa medida, de ocupação de trabalhadores durante o período de incapacidade temporária parcial (base XVII, n.ºs 1 e 2).
13. Uma das mais graves lacunas do texto vigente é a que respeita à quase total carência de normas impostas pela natureza específica das doenças profissionais, o que, designadamente no caso das doenças de carácter evolutivo e irreversíveis, como a silicose, tem suscitado sérias dificuldades na decisão de inúmeros e complexos pleitos judiciais. Por isso se introduziram, na medida em que a lei, como lei de bases, o permitiu, as normas que pareceram mais adequadas à regulamentação exigida pela natureza e características especiais destas enfermidades, tanto no que respeita ao regime jurídico da sua reparação, como à sua prevenção, neste caso de predominante importância.
14. No que respeita à prevenção, não é necessário salientar o significado de que ela se reveste relativamente à sinistralidade do trabalho e forçoso é reconhecer as insuficiências existentes neste domínio. Basta, porém, o gravame económico que para a economia nacional constituem os acidentes do trabalho e as doenças profissionais, para plenamente justificar todas as medidas que no domínio da prevenção são propostas e devem ser tomadas, gravame que facilmente se pode deduzir dos dados estatísticos que foi possível recolher e que constam dos seguintes quadros, unicamente relativos a acidentes cuja responsabilidade foi transferida para entidades seguradoras.
Acidentes com incapacidades temporárias nos anos de 1958 a 1962.
Número de acidentes ............................. 1 438 340
Número de dias perdidos .........................18 242 899
Indemnizações pagas ........................367 342 000 $00
Despesas com tratamentos ...................457 851 000 $00
Acidentes com incapacidades permanentes nos anos de 1958 a 1962.
Número de diminuídos físicos ...................... 164 026
Pensões pagas .............................. 201 695 000$00
Pensões remidas ............................ 62 778 000$00
Para que seja eficiente deve, todavia, a acção preventiva ser orientada e organizada através da centralização coordenadora das actividades de todos os serviços e entidades interessadas na prevenção, como, aliás, em toda a parte tem sido reconhecido e praticado, centralização que na presente proposta de lei se encontra consignada na base XXXIV, n.º 2, mediante a instituição para o efeito, de um órgão adequado.
15. Finalmente, no que respeita à adaptação e readaptação profissionais e colocação dos sinistrados, não podiam deixar de ser consideradas a oportunidade e a justiça dos princípios estabelecidos e das orientações recomendadas nas mais recentes reuniões dos organismos internacionais de carácter social.
Para a plena consecução deste objectivo mostra-se naturalmente indicado o aproveitamento de todos os serviços e instalações que já existem, tais como o Fundo de Desenvolvimento de Mão-de-Obra, o Instituto de Formação Profissional Acelerada, o Instituto de Orientação Profissional, o Centro de Recuperação de Diminuídos Físicos e outros (base XXXVII, n.º 2), pensando-se, para o aspecto específico da readaptação profissional dos diminuídos físicos, criar um organismo de formação adequado, em conjugação com os serviços de recuperação clínica já existentes, o mesmo devendo suceder com o serviço de colocação dos sinistrados a integrar com prioridade, nos
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organismos de colocação profissional em funcionamento ou em montagem nos departamentos competentes.
De entre todos estes organismos a cuja colaboração há que recorrer para a plena prossecução dos objectivos pretendidos, dois há, porém, que merecem especial referência, não só pela sua maior ligação com a política social da prevenção e reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, mas também pela sua maior eficiência e capacidade de actuação.
São eles a Caixa Nacional de Seguros de Doenças Profissionais e o Gabinete de Higiene e Segurança do Trabalho da Junta da Acção Social, do Ministério das Corporações e Previdência Social, organismos criados, respectivamente, a 27 de Abril e 30 de Novembro de 1962.
Destina-se a primeira, como no relatório do respectivo diploma instituidor expressamente se afirma, «a assegurar a reparação das doenças profissionais por ela cobertas o a recuperação dos trabalhadores que delas sejam vítimas, bem como a prestar colaboração pelos meios tio seu alcance, aos sei viços a quem incumbe a prevenção das mesmas doenças». Por sua vez, quanto ao Gabinete de Higiene e Segurança do Trabalho, depois de se afirmar que «mais do que reparar económica e socialmente os efeitos da doença importa sobretudo evitar que ela surja», aponta-se ao novo organismo, também no seu diploma instituidor, a missão de «investigação e estudo, ordenados a um mais amplo conhecimento e divulgação dos princípios e métodos da prevenção de acidentes de trabalho e doenças profissionais».
E, pois, com a plena consciência do que «o surto de industrialização que o País atravessa acentua cada vez mais as necessidades apontadas, não só pelo crescimento da população fabril, mas porque o reapetrechamento industrial e a utilização de novos processos técnicos impõem, também, o recurso a novos meios de acção para se atenuar o decorrente agravamento dos índices de sinistralidade no trabalho», que o Governo, confiado na bondade da orientação e na justiça das soluções preconizadas, tem a honra de apresentar à Assembleia Nacional a seguinte proposta de lei sobre o regime dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.
BASE I
Finalidade da lei
1 A presente lei destina-se a definir o direito dos trabalhadores ou dos seus familiares à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho e doenças profissionais.
2 Quando na presente lei se usa a expressão «acidentes de trabalho», deve entender-se como nela abrangidas as doenças profissionais.
BASE II
Conceito de acidente de trabalho
1 Considera-se acidente de trabalho todo o evento que se verifique no local e no tempo do trabalho e que produza, directa ou indirectamente, lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte a morte ou redução na capacidade de trabalho ou de ganho.
2 Considera-se, ainda, acidente de trabalho o ocorrido nas seguintes circunstâncias.
a) Fora do local ou tempo do trabalho, se tiver lugar na execução de serviços determinados pela entidade patronal ou por esta consentidos,
b) Na execução de serviços espontaneamente prestados e de que possa resultar proveito económico à entidade patronal,
c) Na ida para o local do trabalho ou no regresso deste quando for utilizado transporte da entidade patronal ou por esta fornecido, ou quando o acidente seja consequência de particular perigo do percurso normal ou de outras circunstâncias que tenham agravado o risco do mesmo percurso.
3 Entende-se por local de trabalho toda a zona de laboração ou exploração da empresa e por tempo de trabalho, além do período normal de laboração, o que preceder o seu início em actos de preparação ou com ele ligados e os que se lhe seguirem em actos também com ele relacionados e, ainda, as interrupções normais ou forçosas de trabalho.
4 Se a lesão, perturbação ou doença forem verificadas no local e no tempo do trabalho, ou nas circunstâncias previstas no n.º 2 desta base, presumem-se, até prova em contrário, consequência de acidente de trabalho, e se as mesmas forem reconhecidas a seguir a um acidente presumem-se consequência deste.
BASE III
Relação das doenças profissionais
1 As doenças profissionais constarão, taxativamente, de lista organizada e publicada pelo Ministério das Corporações e Previdência Social, sob parecer do Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica.
2 A doença resultante de uma causa que actue continuadamente em consequência da actividade exercida, mas que não esteja incluída na lista das doenças profissionais, será considerada como acidente de trabalho.
BABE IV
Âmbito da lei
1 Têm direito a reparação os trabalhadores por conta de outrem em qualquer actividade, quer esta seja ou não explorada com fins lucrativos.
2 Consideram-se trabalhadores por conta de outrem os trabalhadores vinculados por um contrato de trabalho ou por contrato a este legalmente equiparado, e também os aprendizes, os tirocinantes e os que em conjunto ou isoladamente prestem determinada actividade, desde que devam considerar-se na dependência económica da pessoa servida.
3 Os servidores civis do Estado só se consideram abrangidos por esta lei quando não sejam subscritores da Caixa Geral de Aposentações.
BASE V
Trabalhadores estrangeiros
1 Os trabalhadores estrangeiros que exerçam a sua actividade em Portugal consideram-se, para os efeitos desta lei, equiparados aos trabalhadores portugueses, se a legislação do respectivo país conceder a estes igual tratamento que aos seus nacionais.
2 Sob a condição de reciprocidade estabelecida no número, anterior, consideram-se nele abrangidos os familiares da vítima aos quais, esta lei conferir direito a reparação.
3 Os trabalhadores estrangeiros vítimas de acidente em Portugal ao serviço de empresa estrangeira e com direito a reparação reconhecido pelo respectivo país consideram-se excluídos do âmbito desta lei.
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BASE VI
Trabalhadores portugueses no estrangeiro
Os trabalhadores portugueses vítimas de acidente de trabalho no estrangeiro ao serviço de empresa portuguesa terão direito os prestações previstas nesta lei, salvo se a legislação do pais onde ocorreu o acidente lhes reconhecei direito à reparação.
BASE VII
Descaracterização do acidente
1 Não dá direito a qualquer reparação o acidente que tiver sido intencionalmente provocado pela vítima.
2 Não dá direito, do mesmo modo, a reparação por incapacidade temporária ou permanente.
a) O acidente que resultar exclusivamente de falta grave e indesculpável da vítima,
b) O acidente que resultar de ofensas corporais voluntárias, provocadas, indesculpàvelmente, pela vítima.
BASE VIII
Exclusões
1 São excluídos do âmbito da presente lei.
a) Os acidentes ocorridos na prestação de serviços eventuais ou ocasionais, de curta duração, que não sejam prestados em actividades que tenham por objecto exploração luciativa,
b) Os acidentes ocorridos na execução de trabalhos agrícolas de curta duração, se o destinatário do serviço trabalhar habitualmente só ou com membros da sua família e chamar pata o auxiliar, acidentalmente um ou mais trabalhadores.
2 A exclusão prevista na alínea b) do número anterior não abrange os acidentes que resultem da utilização de máquinas.
BASE IX
Reparação
O direito à reparação, compreende as seguintes prestações.
1) Em espécie
a) Assistência médica e cirúrgica, tanto geral como especializada,
b) Hospitalização, internamento em casas de repouso ou convalescença e tratamentos termais,
c) Assistência farmacêutica e acessórios,
d) Transportes,
e) Fornecimento de aparelhos de prótese e ortopedia sua renovação e reparação normais,
f) Reabilitação profissional, sempre que as circunstâncias o justifiquem e permitam,
g) Reparação ou substituição dos aparelhos de prótese e ortopedia, deteriorados ou inutilizados em consequência do acidente.
2) Em dinheiro
a) Indemnização por incapacidade temporária absoluta ou parcial para o trabalho.
b) Indemnização em capital ou pensão vitalícia correspondente à redução na capacidade geral de ganho, em caso de incapacidade permanente,
c) Pensões, no caso de morte, aos familiares da vítima,
d) Despesas de funeral.
BASE X
Assistência medica
1 A assistência médica e cirúrgica compreende todos os cuidados de observação e tratamento, médico e cirúrgico, quer destinados à cura, quer à recuperação, nomeadamente a reabilitação física com ou sem internamento, bem como todas as despesas acessórias adequadas à reintegração fisiológica e funcional da vítima.
2 As entidades patronais são obrigadas a assegurar imediatos socorros às vítimas de acidente de trabalho e o seu transporte ao médico ou estabelecimento hospitalar mais próximo.
3 Os médicos e os estabelecimentos hospitalares ou análogos não poderão recusar-se a prestar às vítimas de acidentes de trabalho os socorros de urgência de que estas careçam.
4 As empresas serão obrigadas a instalar, nos centros de trabalho, caixas ou postos de socorros, consoante o número de trabalhadores ao seu serviço e a sua capacidade económica, e a habilitar um ou mais trabalhadores com o curso de socorristas do trabalho.
BASE XI
Hospitalização
A hospitalização, internamento e tratamentos previstos na alínea b) da base IX devem ser feitos nos estabelecimentos mais adequados ao restabelecimento e reabilitação da vítima.
BASE XII
Transportes
1 O fornecimento ou pagamento dos transportes abrange não só as deslocações necessárias à observação e tratamento, como as exigidas pela comparência a actos judiciais.
2 O transporte deve obedecer às condições de comodidade impostos pela natureza da lesão ou doença.
3 Quando a vítima for do sexo feminino, ou menor de 14 anos, ou quando a sua avançada idade ou a natureza da lesão ou da doença o exigirem, o direito a transporte será extensivo à pessoa que a acompanhar.
4 Tanto a vítima como, nos casos, previstos no número anterior, a pessoa que a acompanhar, terão direito a ser reembolsadas das despesas de alimentação e de hospedagem necessárias.
BASE XIII
Prótese e ortopedia
O fornecimento, renovação e reparação dos aparelhos de prótese e ortopedia deverão ser os necessários e adequados à máxima recuperação da capacidade geral de ganho ou de trabalho da vítima.
BASE XIV
Recidiva ou agravamento
O direito às prestações previstas no n.º 1 da base IX, alíneas a) a f), inclusive, mantém-se após a alta, seja qual foi a situação nesta definida, em caso de recidiva ou agravamento e abrange as doenças intercorrentes relacionadas directa ou indirectamente com as consequências do acidente.
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BASE XV
Incapacidade
1 Se do acidente resultar redução na capacidade de ganho ou de trabalho da vítima, terá esta direito às seguintes prestações.
a) Na incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, uma pensão vitalícia igual a retribuição-base,
b) Na incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, uma pensão vitalícia compreendida entre metade e dois terços da retribuição-base, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível,
c) Na incapacidade permanente e parcial, uma pensão vitalícia correspondente a dois terços da redução sofrida na capacidade geral de ganho,
d) Na incapacidade temporária absoluta, uma indemnização correspondente a dois terços da retribuição-base,
e) Na incapacidade temporária parcial, uma indemnização correspondente a dois terços da redução sofrida na capacidade geral de ganho.
2 Salvo tratando-se de doenças profissionais, serão obrigatòriamente remidas as pensões de reduzido montante e poderá ser autorizada a remição daquelas que não representem um valor económico apreciável quando deva considerar-se economicamente mais útil o emprego judicioso do respectivo capital.
3 Não conferem direito a pensão as capacidades permanentes de reduzido grau de desvalorização, mas o capital que corresponderia à sua remição reverterá para o Fundo de Garantia e Actualização de Pensões previsto na base XXXII.
BASE XVI
Casos especiais de reparação
1 Quando o acidente tiver sido dolosa ou intencionalmente provocado pela entidade patronal ou seu representante, ou tiver resultado da falta de observância, por parte das mesmas, das disposições legais ou instruções emanadas dos órgãos competentes sobre higiene e segurança do trabalho, às pensões e indemnizações previstas na base XV fixar-se-ão segundo os regras seguintes.
a) Nos casos de incapacidade absoluta, permanente ou temporária, as pensões ou indemnizações serão iguais à retribuição-base,
b) Nos casos de incapacidade parcial, permanente ou temporária, as pensões ou indemnizações correspondentes terão por base a redução de capacidade resultante do acidente.
2 O disposto no número anterior não prejudica a responsabilidade civil ou criminal em que a entidade patronal ou o seu representante, tiver incorrido.
BASE XVII
Ocupação e despedimento durante a incapacidade temporária
1 É vedado às entidades, patronais fazer cessar sem justa causa, a relação de trabalho com os trabalhadores vítimas de acidente ao seu serviço enquanto estes se mantiverem em regime de incapacidade temporária.
2 Durante o período de incapacidade temporária parcial as entidades patronais serão, nos termos e na medida que vierem a ser regularmente estabelecidos, obrigadas a ocupar os trabalhadores vítimas de acidente ao seu serviço em trabalho compatível com o seu estado e a remunerar o trabalho produzido com retribuição correspondente, nunca inferior à devida pela capacidade restante e com base na retribuição do dia do acidente.
3 A existência de justa causa para os efeitos do n.º 1 deverá ser declarada pelo tribunal do trabalho a requerimento da entidade patronal.
BASE XVIII
Determinação da incapacidade temporária e permanente
Na avaliação da incapacidade temporária atender-se-á não só à natureza e gravidade da lesão ou doença, como à profissão e idade da vítima, na determinação da incapacidade permanente atender-se-á, além disso, ao grau de possibilidade de readaptação à mesma ou outra profissão e a quaisquer outras circunstâncias que naquela incapacidade possam influir.
BASE XIX
Prestação suplementar
Se, em consequência da lesão resultante do acidente a vítima não puder dispensar a assistência constante de uma terceira pessoa, terá direito a uma prestação suplementar, não superior a 25 por cento do montante da pensão, fixada judicialmente na falta de acordo.
BASE XX
Familiares com direito a pensão
Se do acidente resultar a morte da vitima, terão direito a pensão.
a) A viúva, enquanto se mantiver no estado de viuvez,
b) O viúvo, se afectado de doença física ou mental que lhe reduza sensivelmente a capacidade de trabalho, ou de idade superior a 65 anos, à data da morte da mulher, enquanto se mantiver no estado de viuvez,
c) O cônjuge divorciado ou judicialmente separado a data do acidente, com direito alimentos,
d) Os filhos legítimos, legitimados ou perfilhados, incluindo os nascituros, nas condições previstos na lei civil,
c) Os ascendentes,
f) Outros parentes sucessíveis
BASE XXI
Pensões por morte
1 Os familiares da vítima receberão as seguintes pensões anuais
a) Viúva, se o casamento tiver sido anterior ao acidente 30 por cento do salário anual da vitima até perfazer 65 anos o 40 por cento a partir desta idade ou no caso de doença física ou mental que afecte sensivelmente a sua capacidade de trabalho. Passando a segundas núpcias, receberá, por uma só vez, o triplo da pensão anual, e perderá o direito à pensão se tiver porte escandaloso,
b) Viuvo, se o casamento tiver sido anterior ao acidente e se verificarem as condições referidas na alínea b) da base anterior 30 por cento do salário anual da vítima,
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c) Cônjuge divorciado ou judicialmente separado à data do acidente, com direito a alimentos a pensão estabelecida nas alíneas anteriores e nos mesmos termos,
d) Filhos legítimos, legitimados ou perfilhados, incluindo os nascituros, nas condições da lei civil, até perfazerem 18 anos, ou 21 e 24 enquanto frequentarem, respectivamente, o ensino médio ou superior, e os afectados de doença física ou mental que os incapacite para o trabalho 20 por cento do salário anual da vítima se for apenas um, 40 por cento se forem dois e 50 por cento se forem três ou mais Se forem órfãos de pai a mãe, receberão o dobro destes montantes,
c) Ascendentes e quaisquer parentes sucessíveis até aos 18 anos, ou 21 e 24 enquanto frequentar em, respectivamente, o ensino médio ou superior, ou sem limite de idade quando afectados de doença física ou mental que os incapacite sensivelmente para o trabalho, desde que, em relação a todos eles, a vítima contribuísse, com carácter de regularidade, para a sua alimentação 10 por cento da retribuição-base a cada um, não podendo o total das pensões exceder 30 por cento,
f) Se não houver cônjuge ou filhos com direito a pensão, os herdeiros incluídos na alínea anterior, e nas condições nela referidas, receberão, cada um, 30 por cento do salário anual da vítima, até perfazerem a idade de 65 anos, e 40 por cento a partir desta idade ou no caso de doença física ou mental que os incapacite sensivelmente para o trabalho, não podendo o total das pensões exceder o salário anual da vítima, para o que se procederá a rateio, se necessário.
2 Se por morte da vítima houver concorrência entre o cônjuge viúvo e divorciados, entre divorciados, ou entre estes e cônjuge separado judicialmente, será a respectiva pensão repartida em partes iguais por todos os que a ela teriam direito.
3 Se a vítima não deixar familiares com direito a pensão, será devido ao Fundo de Garantia e Actualização de Pensões o capital correspondente a três vezes a retribuição anual.
BASE XXII
Acumulação e rateio das pensões por morte
1 As pensões referidas na base anterior são acumuláveis, mas o seu total não poderá exceder o salário anual da vítima.
2 Se as pensões referidas na alínea c) da base anterior adicionadas às previstas nas alíneas a), b), c) e d) excederem o salário da vítima, serão as prestações sujeitas a rateio, enquanto aquele montante se mostrar excedido.
3 Se o cônjuge sobrevivo falecer no decurso da pensão devida aos filhos, sei á esta aumentada nos termos da parte final da alínea d) da base anterior.
4 As pensões dos filhos da vítima serão, em cada mês, as correspondentes ao número daqueles que estiverem vivos nesse mês e com direito a pensão.
BASE XXIII
Despesas de funeral
A reparação das despesas de funeral será igual a 30 dias da retribuição, elevada para o dobro quando haja transladação.
BASE XXIV
Predisposição patológica e Incapacidade
1 A predisposição patológica da vítima de um acidente não exclui o direito à reparação integral, salvo quando tiver sido causa única da lesão ou doença.
2 Quando a lesão ou doença consecutivas ao acidente forem agravadas por lesão ou doença anteriores ou quando estas forem agravadas pelo acidente, a incapacidade avaliar-se-á como se tudo resultasse do acidente, salvo se pela lesão ou doença an tenores a vítima já estiver a receber pensão.
8 No caso de a vítima estai afectada de incapacidade permanente anterior ao acidente, a reparação por este devida será apenas a correspondente à diferença entre a incapacidade anterior e a que for calculada como se tudo fosse imputado ao acidente.
4 Se a lesão ou doença anteriores ao acidente tiverem determinado a reversão de capital para o Fundo de Garantia e Actualização de Pensões, nos termos do n.º 3 da base XV, sobre este Fundo recairá o encargo pela parte correspondente.
5. Confere ainda direito à reparação a lesão ou doença que se manifeste durante o tratamento de lesão ou doença resultante de um acidente de trabalho e que de tal tratamento seja consequência.
BABE XXV
Observância de prescrições clínicos e cirúrgicas
1 As vítimas de acidente devem submeter-se ao tratamento e observar as prescrições clínicas e cirúrgicas do médico designado pela entidade responsável e necessárias à cura da lesão ou doença e da recuperação da capacidade de trabalho.
Não conferem direito às prestações estabelecidas nesta lei as incapacidades que sejam judicialmente reconhecidas como consequência de injustificada recusa ou falta de observância das prescrições clínicas ou cirúrgicas ou como tendo sido voluntariamente provocadas, na medida em que resultem de tal comportamento.
3. Considera-se justificada a recusa de intervenção cirúrgica quando esta, pela sua natureza ou pelo estado da vítima, ponha em risco a sua vida.
BASE XXVI
Acidente originado pelos companheiros ou terceiros
Quando o acidente for originado por companheiros da vítima ou terceiros, o direito à reparação emergente desta lei não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos da lei geral.
BASE XXVII
Lugar do pagamento das prestações
1 O pagamento das prestações será efectuado no lugar da residência da vítima ou seus familiares, salvo se outro for acordado.
2 Se o credor das prestações se ausentar para o estrangeiro, o pagamento será efectuado na sede da instituição de seguro, salvo se outro lugar de pagamento for acordado.
BASE XXVIII
Revisão das pensões
1 Quando se verifique modificação da capacidade de ganho da vítima proveniente de agravamento, recidiva,
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recaída ou melhoria da lesão ou doença que serviu de base à reparação, as respectivas, prestações poderão ser revistas e aumentadas, reduzidas ou extintas de harmonia com a alteração verificada.
2. A revisão só poderá ser requerida nos dez anos posteriores à data da fixação da prestação, salvo tratando-se de doenças, profissionais com carácter evolutivo, caso em que a revisão pode ser requerida sem limite de tempo.
3. A revisão poderá ser requerida uma vez em cada semestre, nos dois primeiros após, e uma vez por ano nos anos imediatos.
BASE XXIX
Retribuição-base
1. As indemnizações e pensões serão calculadas com base na retribuição que a vítima auferia no dia do acidente, se esta representar a retribuição normalmente recebida pela vítima.
2. Entende-se, por retribuição tudo quanto a lei considere considere elemento integrante e todas as prestações que revistam carácter de regularidade.
3. Se a retribuição do dia do acidente não representar a retribuição normal, será esta calculada pela média tomada com base nos dias de trabalho e correspondentes retribuições auferidas pala vítima no período de três meses anteriores ao acidente e, na falta deste elemento, segundo o prudente arbítrio do juiz, tendo em atenção a natureza dos serviços prestados, a categoria profissional da vítima e os usos.
4 Se a vítima for um aprendiz ou tirocinante, ou menor de 18 anos, percebendo ou não atribuição, as indemnizações e pensões terão por base.
a) No primeiro caso, a retribuição média de um trabalhador da mesma empresa ou empresa similar e categoria profissional correspondente à aprendizagem ou tirocínio da vítima;
b) No segundo caso, a retribuição média de um trabalhador de maioridade da mesma empresa ou empresa similar.
5 Em caso algum a retribuição a considerar poderá ser inferior que, resulte da lei, de despacho de regulamentação da trabalho ou de convenção colectiva.
BASE XXX
Limites na retribuição-base
Para o cálculo das prestações previstas nesta lei, poderá, o Ministro das Corporações e Previdência Social fixar, por decreto, limites às ritribuições-base e estabelecer, para o efeito, diversos escalões.
BASE XXXI
Caducidade e prescrição
1 O direito de acção respeitante às prestações fixadas nesta lei caduca no prazo de um ano, a contar da data da cura clínica ou, se do evento resultou a morte, a contar desta.
2 As prestações estabelecidas por decisão judicial, por instituição de previdência ou acordo das partes prescrevem no prazo de um ano, a partir da data do seu vencimento.
BASE XXXII
Fundo de Garantia e Actualização de Pensões
1 Para assegurar o pagamento das prestações por incapacidade permanente ou morte, da responsabilidade de entidades insolventes, constituído (na Caixa Nacional de Seguros de Doenças Profissionais um fundo, gerido em conta especial, denominado Fundo de Garantia e Actualização de Pensões.
2 O Fundo de Garantia e Actualização de Pensões fica sub-rogado em todos os direitos dos vítimas de acidentes, ou seus familiares, para reembolso do montante das prestações que haja liquidado.
3 Na medida em que as possibilidades do Fundo e permitiram, poderá o Ministro das Corporações e Previdência Social autorizar que, complementarmente, sejam por ele integradas pensões reconhecidamente desactualizadas.
BASE XXXIII
Receitas do Fundo de Garantia e Actualização de Pensões
Constituem receitas do Fundo de Garantia e Actualização de Pensões.
a) As importâncias provenientes do reembolso de prestações pelo Fundo liquidadas,
b) As importâncias arrecadas por força do n.º 3 da base XV,
c) As importâncias referidas no n.º 3 da base XXI,
c) As multas impostas por infracção aos preceitos desta lei e seu regulamento.
d) Quaisquer outras importâncias que venham a ser-lhe legalmente consignadas.
BASE XXXIV
Princípios sobre prevenção
1 Ao Governo incumbe decretar as medidas de segurança, higiene e profilaxia necessárias à protecção da saúde, integridade física e vida dos trabalhadores, e fiscalizar o seu cumprimento.
2 O Governo promoverá a criação de um órgão adequado à direcção e coordenação de todas as entidades e serviços, oficiais, e privados, interessados na prevenção, à centralização dos elementos estatísticos e investigação das causas dos acidentes e ao estudo das providências a adoptar em matéria de prevenção.
BASE XXXVI
Deveres de segurança e higiene
As entidades patronais e os trabalhadores são obrigados a cumprir as normas de prevenção e higiene contidas em leis, regulamentos e instruções emanados dos órgãos ou autoridades competentes, sem prejuízo do dever de assegurarem as elementares condições de segurança e higiene nos locais de trabalho.
BASE XXXVI
Serviços de segurança e higiene
As entidades patronais devem constituir, conforme a sua capacidade económica e a gravidade ou frequência do risco da respectiva actividade, serviços e comissões de segurança, de que façam parte trabalhadores, encarregados e técnicos, com o objectivo de vigiar o cumprimento das normas de segurança e higiene no trabalho, investigar as causas dos acidentes, e, em colaboração com os serviços técnicos sociais das empresas, organizar a prevenção e assegurar a higiene nos locais de trabalho.
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BASE XXXVII
Adaptação, readaptação e colocação
1 Aos trabalhadores afectados de lesão ou doença que lhes reduza a capacidade de trabalho ou de ganho, em consequência de acidentes de trabalho, será facultada, quando as circunstâncias o justifiquem e permitam, a utilização de serviços de adaptação ou readaptação profissionais e de colocação
2 O Governo criará os serviços de adaptação ou readaptação profissionais e de colocação, utilizando, tanto quanto possível, os serviços e instituições já existentes, por forma a garantir a máxima coordenação e a mais estreita colaboração, não só entre aqueles serviços e instituições, como entre eles e os serviços das empresas e do seguro.
BASE XXXVIII
Admissão de trabalhadores sinistrados do trabalho
As empresas de reconhecida capacidade económica e na proporção do seu pessoal serão obrigadas a admitir trabalhadores que tenham sido vítimas de acidentes de trabalho ao seu serviço, em actividades compatíveis com a lesão ou doença de que se encontrem afectados.
BASE XXXIX
Reparação das doenças profissionais
Haverá direito à reparação emergente de doenças profissionais quando, cumulativamente, se verifiquem as seguintes condições.
a) Estar o trabalhador afectado da correspondente doença profissional,
b) Ter sido exposto ao respectivo risco pela natureza da indústria, actividade ou ambiente do trabalho habitual,
c) Não ter decorrido, a contar da cessação da exposição ao risco e até à data do diagnóstico inequívoco da doença, o prazo paia o efeito fixado na relação a que se refere o n.º 1 da base III, salvo tratando-se de doenças causadas pela inalação de poeiras de sílica, pelo rádio, raios X e substâncias radioactivas, cujo prazo será de dez anos.
BASE XL
Período de imputabilidade das doenças profissionais
1 São responsáveis pela reparação emergente de doenças- profissionais, e na proporção do tempo de trabalho prestado a cada uma delas, as entidades patronais por conta de quem a vítima trabalhou na mesma indústria ou ambiente nos dois anos anteriores à cessação do trabalho de que resultou a doença, ou, em termos idênticos, as instituições de seguro que cobriam o risco.
2 No caso de silicose, o período referido no número anterior será o que resultar dos elementos averbados na carteira de sanidade e, na falta destes, de cinco ou dez anos, conforme seja ou não de contracção recente, pericialmente comprovada.
BASE XLI
Repartição especial da silicose com incapacidade
1 Os trabalhadores a quem, por estai em afectados de silicose com incapacidade, não seja permitido trabalhar em meio ou ambiente susceptível de provocar o agravamento da doença, terão direito,, durante um ano, se antes não tiverem obtido outro emprego, a ser- pagos, pela entidade patronal, da diferença entre o montante da pensão correspondente à sua incapacidade e a retribuição que auferiam.
2 Se a entidade patronal transferir o trabalhador para serviços isentos do risco, com retribuição correspondente não fica obrigada ao pagamento da diferença estabelecida no número anterior senão pela importância necessária para integrar a retribuição que o trabalhador auferia anteriormente.
3 Se o trabalhador se despedir com justa causa, ou for despedido sem justa causa, mantém-se para a entidade patronal a obrigação estabelecida no n.º 1 desta base pelo período de tempo que ainda falte decorrer até se completar o prazo de um ano, ou até o trabalhador obter outro emprego.
BASE XLII
Responsabilidade especial na repartição da, silicose
1 As entidades patronais que admitirem ou mantiverem ao seu serviço trabalhadores com inobservância das medidas prescritas nas bases XLV e XLVI, ou a instituição seguradora que, nessas condições, tenha assumido, a cobertura do risco, serão exclusiva e integralmente responsáveis pela reparação correspondente à incapacidade ou morte da vítima e não poderão aproveitar da caducidade prevista na lei .
2 O disposto no número anterior é igualmente aplicável à admissão de trabalhadores considerados inaptos no exame médico previsto na base XLV
BASE XLIII
Caducidade e prescrição nas doenças profissionais
1 O direito de acção respeitante às prestações fixadas nesta lei caduca, tratando-se de doenças profissionais no prazo de um ano, a contar da comunicação formal à vítima do diagnóstico inequívoco da doença.
Se não tiver havido comunicação formal do diagnóstico ou se a comunicação tiver sido feita no ano anterior à morte da vítima, o prazo de um ano contar-se-á a partir deste facto .
2 As prestações estabelecidas por decisão judicial ou acordo das partes prescrevem no prazo de um ano a partir da data do seu vencimento
BASE XLIV
Participação obrigatória das doenças profissionais
1 As entidades patronais são obrigadas a participar aos tribunais do trabalho e à Inspecção do Trabalho todos os casos de doenças profissionais, de que tenham conhecimento e de que sejam vítimas trabalhadores ao seu serviço, igual obrigação recaindo sobre a instituição se seguro que cubra o risco.
2 A entidade patronal ou a instituição de seguro que infringirem o disposto no número antecedente não poderão aproveitar da caducidade prevista no n.º 1 da base anterior, sem prejuízo da sanção penal que corresponda à infracção.
Base XLV
Carteira de sanidade
1 As entidades patronais cujas actividades determinem sujeição ao risco de silicose não poderão admitir ao seu
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serviço trabalhadores som prèviamente os submeter H exame médico, nos termos da legislação em vigor, destinado a verificar se estão afectados daquela enfermidade, devendo em relação a cada um deles ser passada uma carteira de sanidade conforme regulamento a emanar dos Ministérios das Corporações e Previdência Social e da Saúde e Assistência.
2 O exame médico será renovado periodicamente, em função do risco da actividade, dos locais onde esta é exercida e do estado sanitário dos trabalhadores.
3 Os Ministros das Corporações e Previdência Social e da Saúde e Assistência poderão determinar a obrigatoriedade do exame e da carteira de sanidade a que se referem os números anteriores em relação a outras doenças profissionais cuja gravidade e extensão os imponham.
BASE XLVI
Obrigatoriedade de exame medico
0s trabalhadores que, a data da entrada em vigor desta lei, se encontrem ao sei viço de empregas compreendidas 110 âmbito da base anterior, serão, no prazo regulamentarmente estabelecido submetidos ao exame médico previsto na mesma base
BASE XLVII |
Qualificação sanitária dos trabalhadores
O estado sanitário dos trabalhadores, para efeitos de registo na carteira de sanidade prevista na base XLV, deverá ser qualificado em função da sua aptidão paia o trabalho nas actividades que determinem sujeição ao risco da silicose.
BASE XLVIII
Reparação especial da silicose sem incapacidade
1 Os trabalhadores afectados de silicose de que não resulte incapacidade, mas os impeça de trabalhar em meio ou ambiente em que a doença possa ser agravada, terão direito, durante seis meses, se antes não tiverem obtido outro emprego, à retribuição que auferiam, paga pela entidade patronal.
2 Não é devida a reparação estabelecida no número anterior se a entidade patronal transferir o trabalhador para serviços isentos do risco, com a retribuição que ele recebia anteriormente.
3 Se o trabalhador se despedir com justa causa ou foi despedido sem justa causa, mantém-se para a entidade patronal a obrigação estabelecida no n.º 1 desta base pelo período de tempo que ainda faltar decorrei até se completar o prazo de seis meses ou até o trabalhador obter outro emprego.
BABE XLIX
Extensão do regime especial de reparação da silicose.
O Ministro das Corporações e Previdência Social poderá, por decreto, tornar extensivas a outras espécies de pneumoconioses as normas especiais de reparação contidas nesta lei quanto à silicose, desde que a gravidade e a extensão daquelas doenças o aconselhem.
BASE L
Nulidade dos actos contrários à lei
1 Toda a convenção contrária às disposições desta lei ou com elas incompatível é nula de pleno direito.
2 São igualmente nulos os actos e contratos simulados que tenham por efeito a renúncia aos direitos nesta lei consignados
BASE LI
Inalienabilidade, impenhorabilidade e irrenunciabilidade dos créditos. Privilégios creditórios.
Os créditos provenientes do direito à reparação estabelecido por esta lei são inalienáveis, impenhoráveis e irrenunciáveis e gozam dos mesmos privilégios creditórios que a lei geral consigna para garantia das retribuições do trabalho, com preferência a estes últimos na classificação legal.
BASE LII
Proibição de descontos nos salários
As entidades patronais não poderão descontai qualquer quantia no salário dos trabalhadores ao seu serviço a título de compensação pelos encargos resultantes desta lei, sendo nulos os acordos realizados com esse objectivo.
BASE LIII
Sistema e unidade do seguro
1 Enquanto outro regime não foi instituído, e sem prejuízo do disposto no número seguinte, as entidades patronais são obrigadas a transferir a responsabilidade pela reparação prevista nesta lei para entidades legalmente autorizadas a realizar este seguro, salvo se lhes for reconhecida capacidade económica para, por conta própria, cobrir os respectivos riscos.
2 A obrigatoriedade de transferência da responsabilidade prevista no número anterior abrangerá os riscos emergentes quer de acidentes de trabalho, quer de doenças profissionais, salvo quando a reparação destas estiver a cargo da Caixa Nacional de Seguros de Doenças Profissionais.
3 Nos casos previstos no n.º 1 da base XVI a instituição seguradora será apenas subsidiariamente responsável pelas prestações normais previstas nesta lei.
4 O seguro de todos os riscos só pode ser transferido para uma única entidade seguradora
BASE LVI
Apólice uniforme
1 O Governo, pelos Ministérios das Finanças, das Corporações e Previdência Social e da Saúde e Assistência, publicará, de harmonia com os princípios estabelecidos nesta lei e seu regulamento, o modelo da apólice uniforme do seguro de acidentes de trabalho e doenças profissionais.
2 São nulas os cláusulas adicionais que contrariem as da apólice uniforme prevista no número anterior.
BASE LV
Esta lei entra em vigor com o decreto que a regulamentar, ficando revogada a Lei n.º 1942, de 27 de Julho de 1936, o Decreto n.º 27 649, de 12 de Abril de 1937, e demais legislação complementar.
Ministério das Corporações e Previdência Social, 26 de Dezembro de 1964 - O Ministro das Corporações e Previdência Social José João Gonçalves de Proença.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA