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REPÚBLICA PORTUGUÊS
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA
ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.° 91
X LEGISLATURA - 1972 28 DE JANEIRO
PARECER N.° 33/X
Proposta de lei n.° 17/X
Organização Judiciária
A Câmara Corporativa, consultada, nos termos do artigo 103.º da Constituição, acerca da proposta de lei n.º 17/X, sobre a Organização Judiciária, emite, pela sua secção de Interesses de ordem administrativa (subsecção de Justiça), à qual foram agregados os Dignos Procuradores João de Matos Antunes Varela, Joaquim Trigo de Negreiros, António Maria de Mendonça Lino Netto, Álvaro Henriques da Silva Tavares, Arnaldo Pinheiro Torres, Paulo Arsénio Viríssimo Cunha, António Afonso Amaral e José Hermano Saraiva, sob a presidência de S. Ex.ª o Presidente da Câmara, o seguinte:
I
Apreciação na generalidade
1. Está, decorrida uma década desde a data em que esta Câmara se debruçou pela última vez sobre problemas de organização judiciária 1.
Louvou-se então que o Governo, sanando algumas obnubilações, tivesse dado cumprimento no preceito constitucional que atribuía à competência exclusiva da Assembleia Nacional a matéria de organização dos tribunais.
O tema já antes havia preocupado a Câmara, no parecer n.º 13/VII. Neste parecer declarou-se «haver toda a conveniência em entregar a um órgão diferente do Governo a disciplina jurídica fundamental de uma série de actos através dos quais ele pode diminuir as garantias de independência dos juizes ordinários». Acrescentou-se: «a divisão dos poderes tem aqui também bom lugar para ser consagrada 2».
O preceito constitucional era, nessa data, o da alínea c) do artigo 93.º nascido da revisão operada pela Lei n.º 2048, de 11 de Junho de 1951.
Dispõe presentemente a alínea b) do artigo 93.º da Constituição Política, segundo o texto da Lei n.º 3/71, de 16 de Agosto, constituir matéria da exclusiva competência da Assembleia Nacional a aprovação das bases gerais sobre
comissões permanentes ou temporárias».
Na última alteração do texto não houve mais, como a Câmara acentuou 3; do que um agrupamento de textos anteriores.
O que nas regras constitucionais referidas está em causa é a garantia de independência dos tribunais. E nenhum outro factor contribuirá mais, além da honestidade dos juízes, para a segurança das pessoas, para o prestígio dos tribunais e para o bom nome do País do que uma
1 Parecer n.º 3/VIII, de 23 de Fevereiro de 1963, em Pareceres da Câmara Corporativa, 1962, p. 155.
2 Pareceres da Câmara Corporativa, 1959, II. P. 99,
3 Parecer n.º 22/X, em Actas da Câmara Corporativa, nº 67, de 16 de Março de 1971.
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independência efectiva dos órgãos judiciários, independência que, passo (e em todos os passos), deve ser defendida zelosamente.
Pode certamente sustentar-se que a necessária independência da magistratura em relação ao Governo só aparentemente se assegura com a medida constitucional. É que essa independência resulta, não do facto de pertencer exclusivamente à Assembleia Nacional a fixação do estatuto próprio dos juízes, mas do conteúdo do próprio estatuto 4.
Não é, porém, despicienda aquela medida, quando menos pela consagração que representa de um princípio válido, nem deixa de Ter relevo que o Governo submeta à Assembleia Nacional os problemas de organização judiciária, ainda que, como na presente hipótese, tenham âmbito limitado.
2. Na panorâmica legislativa nacional em matéria de organiza» a Novíssima Reforma Judiciária, de 1841.
Seguiram-se-lhe como obras de remodelação e de codificação os estatutos Judiciários de 1927, de 1928, de 1944 e finalmente de 1962.
Nos períodos intercalares, porém a soma de diplomas publicados sobre organização judiciária é muito elevada 5. E não lhe fica muito distante o número de estudos e de projectos que não chegaram a ser consagrados em leis.
Pode surpreender-se em alguns diplomas a marca de tendências políticas dominantes na época da respectiva promulgação, especialmente projectada num de dois rumos: fortalecimento da competência dos tribunas ordinários com competência especializada: afeiçoamento do sistema de recrutamento dos magistrados, nos diversos graus, a uma autonomia da classe, ou intervenção mais ou menos selectiva da Administração.
Houve, portanto, reformas e diplomas que se explicam pela projecção da filosofia política dominante sobre as estruturas judiciais.
Muitos outros diplomas, porém, visaram sòmente resolver dificuldades no exercício do múnus magistrático ou na actividade dos funcionários de justiça, em ordem a assegurar pontualidade de execução, celeridade, adequação, fortalecimento dos meios, melhoria de qualidade.
A adaptação da Organização Judiciária à evolução económica e social, geral ou regional, é outra inesgotável determinante de providências legislativas. Cresce populacionalmente uma região, uma cidade ou uma vila, desenvolve-se a respectiva economia, e logo a maior intensidade da vida de relação e dos negócios reclama que esteja próxima ou em melhores condições de funcionamento a instituição que deve resolver os diferendos e resistir a instituição que deve resolver os diferendos e resistir a paz jurídica ou social; mas se, inversamente, aqui ou além, a emigração vultosa ou outras causas reduziram a população activa e a recessão marchou a economia, a máquina judiciária fica a mais ou empolada
Vem daí que, mesmo nos períodos dominados por uma mesma filosofia de Governo, a actividade legislativa em matéria de organização judiciária é uma constante.
Assim é que, para exemplificar, no período que decorreu entre a vigência do Estatuto judiciário de 1944 e a promulgação do Estatuto Judiciário de 1962, foram pelo menos publicados os seguintes diplomas sobre organização judiciária:
Decreto-Lei n.º 36 551, de 22 de Outubro de 1947, que deu nova redacção ao artigo 585.º do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 37 166, de 17 de Novembro de 1948, que introduziu diversas alterações no Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 37 684, de 22 de Dezembro de 1949, que introduziu alterações nos artigos 577.º, 579.º e 602.º do estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 38 973, de 29 de Outubro de 1952, que alterou o artigo 504.º do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 39 155, de 2 de Abril de 1953, que alterou os artigos 565.º, 566.º, 568.º, 572.º, 574.º, 575.º, 577.º, 627.º, 658.º, 661.º e 682 do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 39 260, de 20 de Agosto de 1953, que alterou a escriturações exigida nos serviços burocráticos das secretarias judiciais;
Decreto-Lei n.º 39 704, de 22 de Junho de 1956, que alterou os artigos 285.º, 518.º a 522.º, 527.º a 537.º, 549.º, 562.º, 583.º, 594.º, 597.º, 599.º, 602.º e 612.º e 617.º do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 42 187, de 27 de Maio de 1959, que revogou o § 2.º do artigo 282.º do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 42 756, de 23 de Dezembro de 1959, sobre o artigo 289.º do estatuto Judiciário e sobre o quadro do pessoal da secretaria do Conselho Superior Judiciário;
Decreto-Lei n.º 42 816, de 25 de Janeiro de 1960, que deu nova redacção ao artigo 53.º do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 43 460, de 31 de Dezembro de 1960, que deu nova redacção aos capítulos I e II do Título único da parte IV do Estatuto Judiciário e permitiu ao presidente da Ordem dos Advogados providenciar sobre os quadros dos Conselhos Superior, Geral e Disciplinar;
Decreto-Lei n.º 43 623, de 27 de Abril de 1961, que revogou os artigos 291.º e 353.º do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 44 177, de 26 de Dezembro de 1961, que deu nova redacção aos §§ 3.º e 4.º do artigo 41.º do estatuto Judiciário.
Na última década, após o estatuto Judiciário de 1962, foram publicados pelo menos os seguintes diplomas:
Decreto-Lei n.º 44 959, de 5 de Abril de 1963, que deu nova redacção ao n.º 3 do artigo 162.º do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 45 134, de 13 de Julho de 1963, que criou as comarcas do Barreiro e de Cascais e dispôs sobre o n.º 1 do artigo 393.º do estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 45 732, de 27 de Maio de 1964, que deu nova redacção aos artigos 30.º e 38.º do Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 46 140, de 31 de Dezembro de 1964, que deu nova redacção a diversos disposições do Estatuto Judiciário, aumentou o quadro de juízes
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da Relação de Lisboa e criou as comarcas do Seixal e de Benavente;
Decreto-Lei n.° 46 538, de 16 de Setembro de 1965, que alterou os antigos 6.º e 178.° do Estatuto Judiciário:
Decreto-Lei n.º 47 139, de 6 de Agosto de 1966, que introduziu diversos alterações ao Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.º 47 691, de 11 do Maio de 1967, que estabeleceu providências sobre a comarca de Cascais o criou as comarcas de Loures e de Oeiras;
Decreto-Lei n.° 49 401, do 24 de Novembro de 1960, que criou um lugar do auditor jurídico no Ministério do Interior;
Lei n.º 4/70, de 20 de Abril, que instituiu os tribunais de família;
Decreto-Lei n.º 487/70, de 21 de Outubro, que introduziu diversas alterações ao Estatuto Judiciário;
Decreto-Lei n.° 281/71, de 24 de Junho, que alterar diversas disposições do Estatuto Judiciário.
3. Pretendeu-se demonstrar, pelas fontes e pelo elemento histórico, que a política legislativa em matéria de organização judiciada sofre, como todos os ramos de actividade legislativa, alguns influxos da filosofia política dominante, embora fosse desejável que constituísse ramo isento, a partir de um sistema constante o efectivamente aplicado de recrutamento dos juízes, que seleccione bons técnicos e pessoas idóneos e depois lhes confira segurança e independência a todos os níveis 6.
Também se pretendeu demonstrar que outros influxos prejudicam a perenidade das leis sobre organização judiciária, determinando que a oscilação entre a codificação e as leis avulsas seja uma constante sem remédio.
Mudam, porque são variáveis no tempo e no espaço, os condicionalismos: terão de actualizar-se a cada passo as estruturas. Ainda, como acentua a proposta de lei em análise é verdadeiro que em «matéria de organização judiciária as transformações graduais ou sectoriais se mostram geralmente preferíveis às grandes reformas sistemáticas. Estas perturbam os serviços, e, por vezes, também os espíritos, ao passo que aquelas se assimilam melhor, sem sobressaltos inconvenientes».
As reformas sectoriais ou parciais, retalhando embora o corpo jurídico codificado, não serão, portanto, necessàriamente um mal. E ainda que em certo prisma possam rotular-se assim - como um mal -, será este necessário: ou para remédio pronto de situações impostas por alterações sócio-económicas ou sócio-políticas, ou até para a obtenção de fermentações graduais e sujeitas ao cadinho da experiência, com vista a uma nova codificação, devidamente pensada e estruturada.
4. Como repetidamente se tem assinalado e bem vincadamente registou no relatório do Decreto-Lei n.º 37 047, de 7 de Setembro de 1948, existe uma profunda conexão entre os sistemas processuais e a Organização Judiciária. Esta tem de poder servir eficazmente aqueles tem de existir entre ambos uma perfeita adaptação.
Ora, a criação dos tribunais colectivos é fruto dessa relação, é fruto de duas «forças» em perpétuo movimento de ajustamento ou coaptação.
A sede do problema está na oral idade. Não na oralidade da discussão, sempre admitido com poucas excepções e reparos e, quando necessário, posta em paralelo ou harmoniosamente concertada com a discussão escrita, mas na oralidade da Instrução, na concentração e na imediação da relação entre o julgador e as provas.
Processo oral contrapõe-se, portanto a processo escrito: produção oral das provas contrapõe-se a registo escrito ou gravado das provas.
O regime processual da oralidade, tantas vezes discutido por sequazes e adversárias, não está presentemente em causa, designadamente o não está, directa ou indirectamente, em qualquer das bases da proposta de lei em apreciação.
Está porém, sujeita a parcial exame a instituição que deve particularmente servi-lo: o tribunal colectivo.
O regime escrito das provas garantia (e garante ainda, em limitados casos) um recurso de plena jurisdição. A apelação permitia então à Relação o total conhecimento das provas, em integral sentido da regra de competência que lhe atribui o julgamento da matéria de facto e de direito.
O regime da oralidade exigiu uma contrapartida da garantia que o registo escrito facultava. Em lugar da decisão sobre a prova dos factos pelo juiz singular, mas sujeita a integral poder de censura pelo tribunal de recurso, atribui-se aquela decisão a um colégio, inicialmente o júri 7 e depois um corpo de três juízes, com inelutável limitação do papel a desempenhar pelo tribunal de recurso, que não pode decidir sobre provas que não viu, não ouviu, nem pode ler.
5. O tribunal colectivo, formado por juizes, terá feito o seu aparecimento em Portugal, para as causas criminais, com a Lei de 12 de Junho de 1901 (artigo 1.°). E encontrou, para as mesmas causas, a sua renovação com o Decreto n.º 13 255, de 9 de Março de 1927.
Com o Decreto n.° 16 489 de 15 de Fevereiro do 1929, que aprovou o Código de Processo Penal, o tribunal colectivo ficou a coexistir com o júri, tendo este competência limitada a causas do certa natureza.
Nas causas cíveis, o tribunal colectivo teve a sua consagração com o Decreto n.º 21 694, de 29 de Setembro de 1932. que extinguiu a jurisdição comercial e os tribunais privativos do comércio que havia em Lisboa e Porto. Ao tribunal colectivo, composto por três juizes (artigo 13.º), foi atribuída competência para julgar as acções de valor superior a dez contos.
As alternativas para a instituição do tribunal colectivo poderiam consistir na repetição do julgamento oral perante o tribunal de recurso, ou em lançar mão dos sistemas de gravação e filmagem; mas estes não se mostram, ao menos no estado actual, acessíveis e idóneos, e ao sistema do segundo julgamento perante o tribunal de recurso opõem-se visíveis dificuldades, de muito relevo, a começar pela multiplicação dos tribunais de recurso de 2.ª instância, em ordem a evitar um impeditivo distanciamento das partos e das provas.
Não estão pelo menos à vista, ou para futuro próximo, melhor solução do que a do tribunal colectivo para a ne-
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6 Beling - Derecho Procesal Penal, p. 53 (tradução espanhola) - aponta a influência política como circunstância que mina a confiança na conservação do direito e, em consequência, a autoridade do estado.
7 Pelo Código do Processo Civil de 1876, artigo 400.º o júri funcionava quando nisso acordassem as partes em dele desistir. Nos demais casos, o regime era de registo escrito.
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cessidade geral e para o anseio colectivo de boa justiça: com autenticidade e diligência, principalmente 3.
Não se pretende significar deste modo que o tribunal colectivo se tenha valorizado por constantes boas provas. Com mais ou menos razões lhe têm sido atribuídos, sucessiva ou cumulativamente, importantes defeitos: tendência para a autocracia no domínio das provas e para um demasiado e perigoso subjectivismo na descoberta da verdade; frustração da colegialidade, por desinteresse de alguns e incompetência na fraqueza de outras perturbações no serviço das comarcas, por deslocações dos juizes titulares: antecipação do julgamento das questões de direita, com ajustamento dos respectivos problemas pelas posições tomadas na matéria de facto.
Como em todas as disputas vivazes, o exagero terá frequentemente perturbado a destrinça entre o autêntico e o fantasioso. Mas não resta dúvida do que, pelo menos nos apontados domínios, tem havido realidades a pedir correcção.
A formação dos homens para as missões constitui sempre factor de primordial importância, e não poderá negar-se que algumas vezes se terá verificado maior defeito nos homens que na instituição servida; mas em muitos casos é o próprio sistema legal que fomenta o defeituoso funcionamento da instituição.
A constituição do tribunal colectivo tem sido sujeita a experiências com alguns frutos positivos, mas sempre a evidenciar que a administração da justiça se não compadece com soluções que desviem os olhos do seu primado para razões oportunistas ou de ordem material.
Até ao Decreto-Lei n.° 33 547, de 28 de Fevereiro de 1944, que aprovou o Estatuto Judiciário desse ano, o tribunal colectivo foi constituído por três juízes de direito: o da causa o os de duas comarcas limítrofes.
Apontou-se então, além de considerável ónus financeiro, que os serviços das comarcas resultavam prejudicados por frequentes deslocações dos juizes titulares e que os juizes adjuntos, ausentes das suas comarcas e dos seus lares, frequentemente mal instalados e ainda preocupados com os malefícios da interrupção pura o serviço, cuja responsabilidade directamente detinham, não logravam reunir as condições essenciais de espírito para a função de julgar.
O Decreto-Lei n.° 33 547, de 23 de Fevereiro de 191144, e o Estatuto que aprovou não PC propuseram resolver o problema, mas apenas minorar alguns dos seus inconvenientes. O tribunal colectivo passou a ser constituído por dois magistrados de carreira e um substituto legal do juiz em cuja comarca corresse a causa. Presidia o juiz da causa.
Desta experiência resultou benefício económico, mas também um considerável agravamento de defeitos de tribunal colectivo.
Com honrosas excepções, «os conservadores ou exerciam a advocacia e eram suspeitos ou a não exerciam e eram incompetentes 9». Muitos deles seriam sobretudo pessoas ressentidas por prejuízos materiais e desinteressadas da função de julgar.
Numa palavra, expressa no relatório do Decreto-Lei n.º 37 047, de 7 de Setembro de 1948, alcançou-se atenuar, em 1944, alguns inconvenientes do regime anterior, «mas à custa da diminuição do próprio tribunal colectivo».
Surgiu então o esforço necessário ao sinal contrário, o esforço destinado, na expressão de José Alberto dos Reis, a «elevar o nível de qualidade do tribunal colectivo».
Com o Decreto-Lei n.º 37 047 as comarcas do continente, com excepção do Lisboa e Porto, foram agrupadas em círculos judiciais e cada círculo judicial passou a ser presidido por um juiz qualificado, com a missão essencial de presidir no tribunal colectivo, tirar acórdão e proferir as decisões de direito nos respectivos processos; os vogais eram juízes de direito. Em Lisboa e Porto os colectivos formam-se por agrupamentos dos juizes criminais com os juizes correccionais e das varas cíveis com os juízos cíveis, sendo presididos pelo juiz do juízo criminal ou da vara do processo.
Dez anos depois, o Decreto-Lei n.º 41 337, de 28 de Outubro de 1957, registou que «na actual composição dos tribunais colectivos, dentro da jurisdição cível, não falta quem tenha visto a origem de um duplo mal: uma carga excessiva de trabalho [...] por um lado, e uma falta de colaboração activa da parte dos adjuntos do colectivo, por outro. Pois a esse duplo mal [...] arrisca-se a nova solução (que consistia na substituição dos juízes dos juízos por corregedores de outras varas), muito sèriamente, a substituir um outro duplo inconveniente: primeiro, um esforço exagerado imposto aos corregedores; segundo, a falta de uma participação activa que, por essa mesma razão, seria igualmente licito esperar de alguns dos adjuntos dos tribunais colectivos».
Surgiu então a figura específica do corregedor adjunto. As suas funções são, nos tribunais colectivos cíveis, o julgamento colegial da matéria de facto e a colaboração da sentença nos processos que para o efeito lhe forem distribuídos.
A Lei n.º 2113, de 11 de Abril de 1962, não modificou imediatamente a estrutura dos tribunais cíveis de Lisboa e Porto, mantendo para as varas o regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 41 337 e regulando diversamente o tribunal colectivo dos juízes cíveis, que é presidido pelo juiz da causa e tem como adjuntos juízes de outros juízos, com distribuição dos feitos para a sentença entre todos.
Porém, retomando a ideia de dois juízes ambulantes., referida já no relatório do decreto-Lei n.º 33 547, de 23 de Fevereiro de 1944, a Lei n.º 2113 (base VI) atribuiu, com a alusão ao sistema de dupla corregedoria, um carácter transitório à orgânica dos tribunais colectivos.
6. As sumárias notas que precedem visam demonstrar que se toda a organização judiciária está permanentemente, sujeita a pressões que a adaptem a novas concepções processuais e a novos condicionalismos sócio-económicos o capítulo da estrutura dos tribunais colectivos não só está também sujeito a pressões idênticas, como ainda não terá encontrado a fórmula, ideal e a composição mais conveniente para a realização da justiça.
Sem optimismos que possam considerar-se exagerados, parece possível concluir que as últimas, providências sobre a constituição dos tribunais colectivos cíveis em Lisboa e Porto, designadamente nas varas, alcançaram uma desejável melhoria de qualidade, com intervenção efectiva e interessada de todos os seus vogais no julgamento da matéria de facto.
Não havendo, segunda parece, outra perspectiva realizável, pelo menos a curto prazo o que é fundamental é que se mantenha a preocupação de assegurar o melhor e mais perfeito rendimento dos tribunais colectivos, subordinando quaisquer novas providências legislativas ao objecto de qualidade.
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4 Em contrário, as declarações de voto do Digno Procurador Adelino da Palma Carlos nos pareceres n.ºs 51/VI (Pareceres da Câmara Corporativa, 1957, vol. I. p. 433) e 3/VIII (Pareceres da Câmara Corporativa, 1962, p. 126).
5 José Alberto dos Reis, Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 81, p. 355.
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Para o Ministério Público se transferiram os poderes e funções atribuídos ao juiz pelo Código de Processo Penal para a fase da instrução preparatória, abrangendo-se nesta fase «todo o conjunto de provas que formam o corpo de delito e tem por fim reunir os elementos de indiciação necessários para fundamentar a acusação» (artigo 12.º e seu § 2.° do Decreto-Lei n.º 35 007).
Ao Ministério Público se atribuiu ainda o exercício da acção penal declarada pública (artigo 1.º do mesmo decreto-lei).
Considerado o processo, na sua dinâmica, um conjunto de relações jurídicas orientadas para um fim global, temos que «a relação jurídica central que forma o núcleo das relações processuais e a que se estabelece entre o arguido e o Estado, na sua dupla forma tribunal-arguido, Ministério Público-arguido, ao lado da qual nos surgem, porém as relações que intercedem entre o Ministério Público e o tribunal» 12.
12. A tradição latino-europeia aproximam-se, no entanto, do sistema do nosso Código de Processo Penal atribuindo a investigação preparatória criminal a juizes de instrução, embora com particularidades variáveis de país para país. Só a distinção ou separação entre juízo de instrução e juízo de julgamento se processou mais cedo nos países mais representativos.
Os juízes de instrução são, em regra magistrados que reúnem os poderes jurisdicionais - e os poderes de disciplina - necessários para averiguar a infracção criminal, as suas circunstâncias úteis e a culpabilidade do agente. Por vezes são-lhes atribuídos também poderes de julgamento para as infracções menores ou para intervirem como adjunto e em tribunal colegial.
Em Espanha, a velha Ley do Enjuiciamiento Criminal, de 1882, embora actualizada por diversos diplomas, nomeadamente pela Lei n.º 3/67, mantém aquela estrutura:
Para a instrução das causas criminais são, em regra, competentes os juízes de instrução do partido (artigo 14.º). Quando haja pluralidade, será designado um para a causa (artigo 303.°).
É ao juiz de instrução que compete na fase instrutória (do sumário), a própria ordem de detenção (artigo 502.º).
Contra as decisões do juiz de instrução podem interpor-se recursos de reforma, de apelação e de queixa (artigo 216.º).
Encerrada a instrução, o respectivo juiz mandará remeter o processo que reúne indícios suficientes ao tribunal competente para concluir da infracção (artigo 622.°) .
Cumpre, no entanto, salientar que a Lei n.º 3/67, declarando o propósito de aceitar mais amplamente o princípio acusatório, criou um regime de fronteiras menos nítidas entre a jurisdição de instrução e a jurisdição de julgamento.
O processo inicia-se pelas chamadas diligências prévias (ou sumário prévio), constituindo um sumário abreviado e destinado a assegurar o êxito da investigação antes que a intervenção obrigatória do arguido possa ser prejudicial, e passa depois a uma fase só de instrução preparatória propriamente dita, com a colaboração do arguido e já de natureza contraditória.
As duas fases são presididas pelo juiz de Instrução, que adquiriu competência para o próprio julgamento de todas as infracções que tenham certos limites punitivos (os do n.º 3 do artigo 14.°) .
As funções jurisdicionais na fase de diligências prévias e na fase pròpriamente dita de sumário competem ao juiz de instrução.
No dizer de José Almagro Nosete 15, esta reforma com o sonho de ampliar o jogo do princípio acusatório ao sumário, toma a parte pelo todo e, sem mais, chega à conclusão (porque também mantém a base do que não pode haver condenação sem acusação) de que pode existir um processo de natureza acusatória formal (quando o que caracteriza precisamente este sistema é a divisão em duas fases), suprimindo justamente a crucial, na sua nota fundamental (a separação de funções), à custa de uma liberalização da instrução.
Em França, o Código de Instrução Criminal de 1808 assentou na distinção de funções: função de demanda (poursuite), a cargo do Ministério Público, função de instrução, a cargo de juízes do instrução, e função de julgamento, a cargo da jurisdição de julgamento.
Ao juiz do instrução foi atribuída a qualidade de oficial superior da Polícia Judiciária, mas não era mais do que um simples agente de informação encarregado de procurar e de reunir as provas 16.
A jurisdição de instrução somente lhe foi atribuída peta Lei de 17 de Julho de 1856.
Pelo Código de Processo Penal de 1939, o juiz de instrução conservou a qualidade de oficial da Polícia Judiciária, que o colocou na dependência do Ministério Público.
Todavia, o juiz de instrução manteve funções jurisdicionais. Além das ordens de prisão, que pode proferir, é ele quem, finda a instrução, declara se as provas recolhidas são ou não suficientes para justificar o juízo de culpa, se o arguido deve ou mão ser presente à jurisdição repressiva o de julgamento.
A Lei n.º 70/643, de 17 de Julho, introduziu importantes alterações tendentes a reforçar a garantia dos direitos individuais, embora pelas medidas tomadas sobre a repressão dos crimes e delitos contra a segurança, do Estado viesse a ser conhecida sobretudo por «lei anticasscur»
Criou-se o regime do contrôle judicial, destinado a substituir, em regra, a detenção preventiva. Esta terá lugar, todavia, se o suspeito se subtrair voluntàriamente às obrigações impostas para a situação de liberdade controlada, ou se, em função da gravidade da pena correspondente aos factos investigados, as obrigações possíveis para o regime de contrôle parecerem insuficientes.
Ampliou-se o princípio indemnizatório da detenção provisória ordenada em procedimento que não conduziu à acusação.
Terminada a instrução, se os factos constituem contravenção ou delito, a ordem de remessa do processo ao tribunal do polícia ou ao tribunal correccional põe termo à definição provisória ou à situação de contrôle mas no caso de constituírem delito pode, excepcionalmente, ser mantida uma ou outra situação, mediante despacho «especialmente fundamentado».
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14 Prof. Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, I, p. 30.
15 Naturaleza delNucco Ptroceso penal, p. II ( a referência é feita por tradução quase literal).
16 G. Stefani e G. Levasseur, Procédure penale, 4.ª ed. P. 258
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porta medidas limitativos da liberdade das pessoas e dos direitos conferidos pelas leis gerais para a defesa directa dos seus interesses patrimoniais e morais; e tais medidas podem, para mais, ser tomadas pela força e pertencer à iniciativa do órgão encarregado da instrução preparatória, portanto sem passarem, pelo menos desde início ou até às primeiras consequências, pelo cadinho da jurisdicional, com toda a garantia de imparcialidade.
Em suma: é reconhecível que ao direito de punir que cabe ao Estado se contrapõe um direito de liberdade dos indivíduos 24 e que o objecto do processo penal será o conflito entre esses dois direitos 24.
A reposição do juiz nu sua vocação de julgador, alheando-o da instrução preparatória, constitui medida do defesa da liberdade dos indivíduos, tomadas, antes de mais, sob o angulo da perspectiva da imparcialidade e da objectividade do seu julgamento.
Mas há aspectos do conflito que se põem logo na fase instrutória quando é necessário que às exigências do êxito investigatório se contraponha o direito dos indivíduos a sua liberdade, amplamente considerada (compreendendo todos os direitos referidos no artigo 8.º da Constituição Política).
A abertura da instrução preparatória pressupõe o juízo de suspeita; o seu objectivo é o juízo de probabilidade, com que se encerra.
A função ou actividade instrutória é portanto, de obtenção ou recolha de provas e exige «os poderes do disciplina e coacção enquanto inteiramente necessários àquele fim» 25.
Não se trata, porém, de poderes ilimitados. São antes poderes legalmente regulados e sujeitos a restrições impostas pelos direitos fundamentais de esfera jurídicas de pessoas.
O artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 33 007, de 13 de Outubro de 1945, e o n.º 2 do artigo 53.º do Decreto-Lei n.º 35 042, de 20 de Outubro de 1945, cometeram, respectivamente, ao Ministério Público e aos inspectores da Polícia Judiciária os poderes e funções que o Código de Processo Penal atribuía ao juiz, mas não também os poderes e funções jurisdicionais, como logo se vê, quanto à detenção do disposto nos §§ 3.° e 4.º do artigo 21.º daquele primeiro diploma.
A Câmara está informada de que a reforma do processo penal em fase final de preparação não modifica as actuais características estruturais. Deixa, entretanto, de haver pronuncia provisória, coincidindo a formação da culpa com o termo do toda a instrução (preparatória e contraditória).
Desenvolve-se a concepção da instrução contraditória não apenas como meio de defesa do arguido, mas sobretudo como forma específica de antecipação da defesa na fase instrutória do processo, antes da pronúncia.
Todavia, o suspeito ou arguido é chamado, pelo seu interrogatório, à colaboração na fase instrutória tão cedo quanto possível, e a instrução contraditória continua a ser facultativa para os processos por infracções do menor gravidade.
O interrogatório do arguido na fase instrutória assumirá, assim, maior relevo, aperfeiçoa-se a regulamentação da detenção sem culpa formada e da liberdade provisória, fazendo tender para regime regra, de preferência à detenção tal como no actual direito francês.
É, porém, na intervenção do juiz, para a validação da prisão e para as demais funções jurisdicionais, que continua o ponto fulcral das garantias individuais.
A função jurisdicional constitui, portanto, a garantia concedida às pessoas contra possíveis violações da sua esfera jurídica individual na fase da instrução preparatória do processo criminal.
Exercê-la também aqui, com imparcialidade o sem suspeição, é fundamental.
15. Para as comarcas em que o Ministério Público ao dispõe normalmente do auxílio da Polícia Judiciária já o Decreto-Lei n.º 35 007 procurou concertar, em bons termos, os poetares necessários à condução da instrução preparatória com as funções jurisdicionais. Manteve estas funções nos juízes e alheou estes magistrados dos objectivos da fuso instrutória do processo (com o desvio que é possível divisar no preceito do seu artigo 38.º).
Mas no prosseguimento do princípio acusatório em processo penal, com a separação lógica e necessária das funções de investigação e de julgamento e cometimento daqueles ao Ministério Público, seguindo-se como problema associado, o da integração da Polícia Judiciária no plano geral do sistema processual comum e das instituições do prevenção e repressão criminal» 26.
A Polícia Judiciária resulta de uma necessidade dos grandes meios, onde e mais intensa, e frequentemente mais complexa e grave, a criminalidade. Corresponde ao objectivo de apetrechar mais eficazmente, técnica, qualitativa e quantitativamente, os órgãos encarregados de proceder à fase preliminar da Acusação.
Curando apenas disto, deste afeiçoamento de técnicas e de meios a maiores exigências do ambiente, logo se vê que a Polícia Judiciária tem a sua sede própria no corpo institucional do Ministério Público. E assim ficou estabelecido nos artigos 2.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 35 042, de 20 de Outubro de 1945, completando o esquema de nítida separação entre órgãos d investigação criminal e órgãos de julgamento.
Este figurino ficou, no entanto, relativamente prejudicado em relação à Polícia Judiciária. O Decreto-Lei n.º 35 042, de 20 de Outubro de 1945 (artigos 8.º e 44.º), responsabiliza os subdirectores administrativamente e pela boa execução
Dos serviços de investigação (cf. nomeadamente, os n.ºs 3.º e 6.º do artigo 44.º ) e também lhes comete funções jurisdicionais, reservadas pela lei geral à judicatura (cf. o artigo 8.º e o n.º 19.º do artigo 44.º).
O sistema não é satisfatório: na frase de Sentís Melendo 27, como órgão da justiça penal, o juiz instrutor terá muito mais de instrutor do que de juiz.
É necessário evitar que isso suceda. Resume-se no relatório da presente proposta de lei:
... é necessário que o zelo dos objectivos da investigação criminal não ofenda as garantias que a lei assegura aos indivíduos. Ora, a separação das funções as pessoas responsáveis constitui o mais seguro caminho para alcançar esse intento.
Neste passo, principalmente, se explica a criação dos juízes de instrução.
16. Esta Câmara acentuou no seu parecer sobre a proposta lei n.º 14/X, sobre a revisão da Constituição
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23 Prof. Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, I, p. 28.
24 Ottorino Vanini. Mannale, p. 24.
25 Prof. Cavaleiro de Ferreira, Scientia Jurídica, tomo XIX, n.ºs 101-102, p. 16C6.
26 Do relatório do Decreto-Lei n.° 35 042, de 20 de Outubro de 1957, p.177.
27 Sentís Mebendo, El Proceso Penal, Buenos Aires, 1957, p. 177.
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Política ( parecer n.º 22/X, em Actas da Câmara Corporativa, n.ºs 67, de 16 de março de 1971), Ter o nosso país «uma importante tradição de protecção constitucional aos particulares, em matéria criminal, que não encontra paralelo
Na generalidade das constituições estrangeiras».
E acrescentou que a proposta de revisão se caracteriza por importantes inovações no domínio dos direitos individuais, com a previsão de novas garantias, particularmente em matéria criminal.
Estes espírito do diploma fundamental deve encontrar a devida projecção na programação legislativa do Governo.
Aplaude-se, portanto, o critério que presidiu à criação de juízes de instrução com o particular desígnio de servirem de guardiões imparciais de legalidade no plano em que o zelo dos investigadores pode chocar-se com os direitos fundamentais da pessoa humana e tender para menosprezá-los
17. Como corolário de tudo quanto só deixou exposto, a Câmara manifesta a sua concordância na generalidade à presente proposta de lei n.º 17/X, sobre organização judiciária.
II
Exame na especialidade
Base I
18. No sistema do nosso direito processual penal, com o esquema dos órgãos encarregados de proceder à instrução preparatória, a intervenção de juizes de instrução compreende-se melhor para as comarcas de Lisboa e Porto. E nessas comarcas que a Polícia Judiciária, abarcando a investigação criminal comum, põe agudamente o problema da diferenciação entre a função instrutora e a função jurisdicional.
Convém, porém, ter presente que existe uma inspector a da Polícia Judiciária da comarca de Coimbra e uma brigada na comarca do Funchal. Nessas comarca, como potencialmente em outras também, poderá vir a verificar-se; a necessidade de juízes de instrução quando os juízes do tribunal de comarca não possam assegurar eficazmente o desempenho das funções que para aqueles estão previstas.
Entende-se, portanto, ser justificado conceder no Governo a possibilidade do criar juízos de instrução nas comarcas em que as circunstâncias os imponham.
Reconhece-se até que a perfeição do sistema tende para a completa separação entre jurisdição do instrução e jurisdição de julgamento, portanto para a criação generalizada de juízos de instrução.
Entretanto, porém, a Câmara que a melhor expressão formal para a base I é a seguinte:
BASE I
Nas comarcas em que o volume de processos penais o justificar, haverá juízos de instrução criminal cuja competência abrange os próprios feitos instruídos pela Polícia Judiciária.
Base II
19. Indicam-se nesta base as atribuições previstas para os juizes de instrução.
Nas comarcas de Lisboa e Porto eles substituirão os subdirectores da Polícia Judiciária nas funções jurisdicionais que a estes estão presentemente atribuídas.
A justificação desta inovação está amplamente tentada na apreciação na generalidade.
Conjugada a primeira com as demais funções previstas para os juizes de instrução exercer a jurisdição durante a instrução contraditória nos processos comuns e nos processos do segurança instruídos pela Polícia Judiciária, dirigir a instrução contraditória e proferir os despachos de pronuncia ou equivalentes e os despachos de não pronúncia -, torna-se nítido o propósito de demarcar e autonomizar o juízo de instrução (com a fase instrutória e com a fase complementar, suposta a acusação deduzida, já de certo modo contenciosa) e o juízo de julgamento.
É, porém, certo que a instrução comporta duas fases com características diversas: a primeira, é secreta, a cargo do Ministério Público, e tem por base o juízo de suspeita e por objectivo fundamentar a acusação e alcançar o juízo de probabilidade; n segunda destina-se a uma revisão judicial dos fundamentos da acusação, comporta esclarecimentos e novas indagações e supõe a colaboração possível do acusado. Com o seu encerramento se destruirá ou confirmará o juízo de probabilidade.
O espírito que se exige do responsável pela segunda fase não é o mesmo que se exige do responsável pela primeira fase: há no segundo um apelo à valoração imparcial das provas, enquanto no primeiro se exige sobretudo o bosquejo interessado dos elementos de prova sobre a culpa do suspeito, e na obtenção, tantas vezes difícil, dos elementos probatórios que se fomenta a parcialidade possível, o espírito de competição; na valoração dos provas e possível correcção ou complementaridade da instrução faltam, ou pelo menos são de fraca intensidade, os estímulos prejudiciais.
Concilia-se, portanto, com os superiores interesses da justiça que o juiz de instrução, embora dirigindo uma nova investigação (sui generis contraditória), reúna ou detenha as funções jurisdicionais.
Por outro lado, bem se pode considerar que, reservando a função de julgamento a juizes que estiveram alheados da própria instrução contraditória e da pronúncia (do juízo de probabilidade), se dá a estes o tonnus ideal de imparcialidade.
20. Culminando a fase instrutória, no conjunto das duas subespécies, com a apreciação de mérito (ou de demérito) sobre a acusação deduzida, logicamente decorre que caiba ao juiz de instrução proferir os despachos de pronúncia ou equivalentes e os despachos de não pronúncia.
Se se pretendo levar tão longe quanto possível o princípio separatista entre a jurisdição instrutória e a jurisdição de julgamento, natural é também que se cometa à primeira proferir os despachos de pronúncia nu equivalentes o os despachos de não pronúncia, mesmo na hipótese de não ter havido fase de instrução contraditória.
A Câmara antevê, com o não é difícil, que a criação de juizes de instrução com a ampla competência indicada na base II da proposta de lei implicara consideráveis revisões da orgânica dos tribunais criminais, nomeadamente no número de juízos criminais e de juízos correccionais existentes em Lisboa e Porto, se como é também de prever, nestas comarcas forem criados.
Não está nossa circunstância, como é óbvio, razão de censura. O Governo terá certamente considerado este aspecto da economia da proposta de lei e providenciará para que se processem, os ajustamentos convenientes.
Não se formula consequentemente, qualquer sugestão para que seja alterado o n.º 1 da base II.
21. O n.° 2 da base II relega para diploma regulamentar as regras sobro n distribuição do serviço entre os diversos juízos de instrução quando haja pluralidade em alguma comarca.
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A preocupação fundamental deve incidir sobre, os, pontos de uma equitativa distribuição do serviço entre, todos e sobre a organização possível, e talvez necessária, de turnos.
Nada há a observar.
Assim, a base II merece a esta Câmara integral aprovação.
Base III
22. Do exame comparativo da base II da presente proposta de lei com as base VI e VIII da Lei n.º 2118, de 11 de Abril de 1962, alcança-se que a composição dos tribunais colectivos dos juízos criveis de Lisboa e Porto continuará a ser a actual, enquanto relativamente à composição dos colectivos das varas se omite que os juízes adjuntos não sejam titulares de qualquer tribunal, indicando-se apenas na proposta do lei que os adjuntos serão também corregedores.
A Câmara reafirma, nesta oportunidade, que considera a estrutura dos tribunais colectivos essencial puni bem servir o sistema da oralidade nu produção da prova, e, portanto, indispensável para servir eficazmente a justiça dentro dos esquemas processuais vigentes. E exprime também a sua convicção de que a experiência dos corregedores-adjuntos que não são titulares de qualquer tribunal resultou numa melhoria da qualidade do serviço, que é preciso defender (cf. supra, n.ºs 5 e 6).
A base III não exclui, é certo, a manutenção do sistema actual. Apenas reivindica para o Governo maior liberdade de escolha nas soluções possíveis, uma das quais é a actual.
Admitindo que a disposição mais maleável possa servir apenas para, em casos particulares, se encontrarem soluções adequadas, a Câmara não sugere, embora com reservas, diversa reducção para o n.° 2 da base III.
23. O n.º 4 da base III visa dar «carta branca» ao Governo para regular a distribuição do serviço entre os juízes vogais dos colectivos dos tribunais cíveis de Lisboa e Porto.
O n.º 2 da base VII da Lei n.º 2113 fixou o sorteio como modo de atribuir o encargo de lavrar sentença final entre os membros do colectivo das varas. E o n.° 2 de base VIII adoptou a mesma, regra para os colectivos dos juízos civeis.
Não está neste ponto suposta qualquer questão que afecte uma escolha dos juízos para proferir sentença em cada processo por modo diverso do do sorteio. Está apenas em causa o remédio para situações de desequilíbrio na distribuição do serviço, no seu conjunto, entre juizes igualmente qualificados e comprometidos em tarefas comuns, ainda que parcialmente.
Só o estudo das circunstâncias de cada caso e das suas possíveis modificações permitirá. em cada momento, encontrar a solução mais consentânea com uma equilibrada repartição de encargos.
Portanto, nenhuma alteração se propõe para a base III.
Base IV
24. A base XIII da Lei n.º 2113, de 11 de Abril de 1962, apenas contempla a composição do tribunal colectivo do crime para funcionar em plenário. E o artigo 32.º do Estatuto Judiciário compõe o colectivo dos juízos criminais, que é presidido pelo presidente do juízo por onde corre o processo o tem como adjuntos dois juízes dos juízes correccionais.
Não há na lei actual qualquer previsão relativa ao funcionamento dos tribunais colectivos dos juízos correccionais e do tribunal de polícia, o que se compreende, porque a lei processual comete ao juízo singular, nos feitos quo lhe são sujeitos, as funções de julgamento e ordena a redução a escrito da prova nos casos em que se não prescinda de recurso.
Nestes passos, a organização judiciária, do sector criminal e o próprio processo penal estão atrasadas relativamente à evolução da organização judiciária destinada a servir a jurisdição civel e o processo civel.
Também no cível, em Lisboa e Porto, o colectivo das varas foi constituído pelo presidente da vara por onde corria o processo e teve como adjuntos juizes civeis: também no processo cível houve tempo (o tempo anterior ao Código de Processo Civil de 1961) em que nas causas da competência dos juízos cíveis que admitissem recurso intervinha o juiz singular e reduzia-se a escrito a prova.
É previsível que o processo penal venha a registar evolução paralela à que se registou no processo civil.
O regime da redução a escrito da prova implica uma morosidade na administração da justiça penal que é inconveniente (às vezes é até desprestigiante) e suscita grandes dificuldades de serviço para os juízos, correccionais e para o tribunal de policia. É verdadeiramente um regime que pode classificar-se de obsoleto e que nem sequer poderá explicar-se pelas garantias que oferece, uma vez que para as infracções mais graves se considerou suficiente em sua substituição o tribunal colegial.
O processo de ausentes é, porventura, outro em que se explica mal a redução a escrito das provas. A ausência dos réus é, em grande número de casos, voluntária ou consciente, o que torna injustificada particular protecção: em todos os casos, constitui violação do dever que cada pessoa tem de possuir um domicílio conhecido, onde possa ser encontrado ou feito conhecimento do seu paradeiro.
Tem-se, pois, por exagerada a garantia que se confere ao processo de ausentes, garantia onerosa para os serviços judiciais, que umas vezes redunda em labor inútil, pela faculdade concedida ao réu de pedir segundo julgamento ou ao tribunal de o ordenar oficiosamente, e outras, pelo grande volume de extractos escritos, torna impraticável uma ulterior ,apreensão conscienciosa dos factos provados.
A intervenção do tribunal colectivo, acrescida da posição de justificar as respostas aos quesitos em termos de representar breve extracto da prova ouvida e da sua identificação, poderá constituir alternativa útil e mais consentânea com as realidades.
Pretender o Governo dispor da possibilidade de constituir tribunais colectivos nos juízos correccionais e no tribunal do policia supõe, portanto, alterações do processo penal, nos planos da oralidade e dos recursos, para as infracções menores e também, possivelmente, no plano dos processos de ausentes.
Consideram-se muito carecidos de revisão esses dois aspectos da problemática do processo penal, e não pode deixar de louvar-se o primeiro e essencial indicativo de que o Governo se propõe realizar esse trabalho.
Concedo-se assim, concordância ao n.º l da base VI da proposta de lei.
25. Em contrário do disposto no artigo 32.º do actual Estatuto Judiciário, admite-se no n.° 2 da base IV da proposta de lei que o tribunal colectivo dos juízos criminais possa, ser constituído por adjuntos de outros juízos criminais, dos juízos correccionais ou do tribunal de polícia.
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O paralelismo com a jurisdição civel levaria a criar, também para a jurisdição criminal ao nível dos juízos criminais, corregedores-adjuntos não titulares de qualquer tribunal. Mas tal não se justificaria presentemente, por acentuada diferença de condicionalismos, e menos se justificará, ainda com a criação de juizes de instrução, que serão susceptíveis de aliviar consideràvelmente o serviço nos juízos criminais.
O mesmo se não dirá da composição do colectivo dos juízos criminais com três juizes qualificados, os corregedores. Sempre que isso seja possível, é desejável; quando o não seja, há-de compor-se o colectivo com os elementos mais disponíveis dos juízos correccionais ou do tribunal de polícia.
Nada há, portanto, a objectar ao n.º 2 da base IV.
26. Sendo instituídos colectivos dos juízos correccionais e do tribunal de polícia, não ficaria curial a intervenção neles de juízes mais qualificados.
A composição dos colectivos dos juízos correccionais e do tribunal de polícia com outros juizes de juízos correccionais ou do tribunal de polícia estabelece, aliás, perfeita paridade com a jurisdição cível no momento actual.
Assim, nada há a objectar ao n.° 3 da base IV.
27. Contràriamente ao que sucede na jurisdição cível, o julgamento da matéria do facto e da matéria de direito em processo penal compete ao tribunal colegial e é feito, quando possível, logo após o encerramento da audiência de discussão.
Nestes termos, a atribuição ao juiz presidente do colectivo do encargo de tirar acórdão é uma imposição lógica do sistema.
Também o n.º 4 da base IV não merece objecções à Câmara.
Base V
28. O Estado não pode desinteressar-se de dois aspectos fundamentais dos seus serviços: em primeiro lugar, o da sua eficiência; em segundo lugar, o do seu custo.
A eficiência do serviço judiciário exige que o tribunal não esteja excessivamente distante dos povos a que se destina. Não é legítimo criar situações em que o ónus da distância a percorrer ou uma excessiva incomodidade possam conduzir os interessados a sofrer a injustiça, abdicando da protecção dos seus direitos violados ou ameaçados.
É o que sobremodo interessa salvaguardar na divisão judiciária do País.
Todavia, justificam-se as providências que conciliem esse primado com o da economia possível.
Como já se acentuou (cf. supra, n.ºs 2 e 7), a evolução demográfica e económica altera ao longo dos tempos as veras necessidades de cada região, cidade ou vila.
O remédio tradicional para alterações substanciais tem sido o de criar comarcas ou extinguir comarcas, alterar-lhes a classe, aumentar ou diminuir o número de juízos por comarca, substituir julgados por Comarcas ou comarcas por julgados.
Propõe-se agora uma alternativa: servir mais do que uma comarca pelo mesmo juiz.
Não se vê nenhum inconveniente para o sistema, que, pelo contrário, permitirá evitar o mal maior da extinção de comarcas ou de transformação de comarcas em julgados municipais e poderá constituir solução temporária, fácil de adoptar e de suprimir, para situações que possam também apresentar perspectivas transitórias.
Entre o juiz pràticamente inactivo ou muito pouco activo numa só comarca e o juiz servidor suficiente em duas comarcas, há que optar pelo segundo. Não só a economia da medida (importante aspecto, mas de somenos na grandeza do problema) depôe em tal sentido: à própria formação do magistrado melhor convirá o aproveitamento razoável das suas potencialidades.
A Câmara entende que a base V tem plena justificação.
Base VI
29. A base VI respeita à organização do Ministério Público e sua representação junto dos tribunais.
Cuidando da representação do Ministério Público no Supremo Tribunal de Justiça, a alínea a) do seu n.º l comete-a ao procurador-geral da República ou ao seu ajudante, por ele designado.
A base XVI da lei n.º 2118 não faz referência à representação pelos ajudantes do procurador-geral da República, mas o artigo 176.° do Estatuto Judiciário atribui ao procurador-geral a faculdade de designar um dos seus ajudantes para as secções cíveis e outro para a secção criminal.
Não há, pois, neste ponto qualquer inovação a registar. Consagrou-se na própria lei, o que é tradicional e não carece da revisão.
A representação do Ministério Público junto das Relações por ajudantes do procurador-geral com a categoria de procurador da República é também tradicional e corresponde ao que se dispôe na alínea b) do n.º l da base XVI da Lei n.º2113.
Não se verifica, ainda, qualquer inovação na atribuição da representação do Ministério Público junto dos plenários criminais a magistrados com a categoria de adjunto de procurador da República. A lei n.º 2113 designava-os por «ajudantes de procurador da República», mas o Decreto-Lei n.º 49 410, de 24 de Novembro de 1969, consagrou a designação de «adjuntos de procurador da República».
30. A alínea c) do n.º l da base XVI da Lei n.º 2113, cometia também a ajudantes de procurador da República a representação do Ministério Público nos tribunais de comarca da sede dos actuais círculos judiciais, mas o n.º 2 da mesma base estabelece o princípio da progressiva substituição desses magistradas por delegados de procurador da República.
Não é fundamentalmente diferente nem mais rígido o que se propõe na alínea c) do n.º 1 da base VI da presente proposta de lei. Só que o n.° 8 da mesma base confere a possibilidade de atribuir a um adjunto de procurador da República a representa-lo do Ministério Público em grupos de círculos judiciais. Acrescenta-se que essa atribuirão de funções pode ser feita «exclusiva ou cumulativamente».
Como se deixou referido no primeiro Capítulo (apreciação na generalidade), a Câmara entende que é a descentralização dos adjuntos de procurador da República que melhor poderá responder ao que desta classe de magistrados é lícito esperar em matéria de reais benefícios, aceitando, todavia, que possa justificar-se em alguns casos a nomeação de adjuntos para servir em grupos de círculos (cf. supra, n.ºs 9 e 10).
Não se considera, em regra, satisfatória, ponderadas as dificuldades que projecta para as funções específicas dos adjuntos, a atribuição da representação do Ministério Público em comarcas sedes de círculo com carácter de exclusividade, mas afigura-se que manter essa possibili-
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dade é, no entanto, desejável. Só uma apreciação de circunstâncias concretas, que n fio está no alcance da Câmara, permitiria uma eventual tomada de posição em contrário.
Quando, porém, se declara (no n.º 3 da base VI) que aos Adjuntos de procurador da República pode ser atribuída cumulativamente a representação do Ministério Público em grupos de círculos judiciais, certamente se quis aludir a uma representação feita em conjunto por adjuntos e por delegados.
Convém explicitar esta ideia, o que impõe alteração de redacção do referido
n.º 3 da base VI e, por conveniência formal, também o seu desdobramento.
31. Em matéria de representação do Ministério Público ao nível de delegados de procurador da República, a única inovação trazida pela presente proposta de lei é a da faculdade, quando as circunstâncias do serviço a justifiquem, do cometer a um só magistrado fungues em grupos de comarcas, varas ou juízos.
A Câmara declarou justificada inovação semelhante paru os juizes, e pelas mesmas razões dá a sua concordância à medida proposta para o Ministério Público.
Há, aliás, precedentes na nossa legislação verificados para a representação do Ministério Público em grupos de varas ou de juízos.
32. Não vem proposta qualquer alteração relativa à representação do Ministério Público nos julgados municipais.
Essa representação, feita por inerência pelo notário, não é em regra satisfatória.
Como se reconheceu no relatório do Decreto-Lei n.° 44 278, de 14 de Abril de 1962. «os funcionários que julgam ou que representam o Ministério Público nesses
Tribunais não são magistrados de carreira e não dispõem, por isso, da preparação profissional indispensável ao difícil mister de julgador ou de representante do Estado. Além disso, exercem quase sempre contrafeitos a função que lhes cabe por inerência, porque ela lhes talhe, em larga medida, o exercício da advocacia.»
Pode, justificadamente, acrescentar-se que também a remuneração auferida não é estimulante.
O mal é, portanto, de toda a orgânica dos tribunais municipais, e não cabe aqui estudar e propor os seus possíveis remédios. Nem nos contornos dessa orgânica se divi a melhor solução para a representação do Ministério Público.
33. Comete-se finalmente, a representação do Ministério Público nos juízos de instrução a inspectores da Polícia Judiciária e, mais concretamente, ao inspector da Policia Judiciária que tenha dirigido a instrução preparatória, alvo caso de impedimento.
Receia-se que este novo encargo de serviço possa causar alguns embaraços aos inspectores da Policia Judiciária e a esta própria, exigindo aumento de quadros. Mas não deixa de compreender-se e de aceitar-se que nenhum outro magistrado será mais indicado do que o inspector que dirigiu a instrução preparatória, pelo conhecimento que já possui dos elementos colhidos na primeira fase do processo, para promover o que, for dorido em matéria de jurisdição, para intervir na fase complementar ou de instrução contraditória e para deduzir a acusação ou proferir o parecer negativo, de abstenção.
Haverá, pois, que prover às possíveis dificuldades no serviço, se se verificarem, por outras vias, todas ao alcance do Governo.
Só que a regra relativa à representação do Ministério Público nos juízos de instrução está formulada para as comarcas onde existam subdirectorias da Polícia Judiciária, ou, pelo menos, onde esta tenha inspectores, e pode suceder, como resulta da base I, que outros juízos de instrução venham a ser criados em comarcas não providas de órgãos próprios da Policia Judiciária, ou em que esses órgãos próprios existam, mas não ultrapassem o nível de brigadas.
Nessas comarcas é, naturalmente ao respectivo adjunto do procurador da República, se for o exclusivo representante do Ministério Público, ou a este e ao delegado, que caberá a representação do Ministério Público nos juízos de
Instrução.
34. Haverá, portanto, que, em parte, redigir em melhores termos a base VI.
Propõe-se a seguinte redacção:
BASE VI
1. ........................
a) ........................
b) ........................
c) ........................
d) ........................
e) Nos juízos de instrução criminal das sedes das comarcas em que a Policia Judiciária disponha de inspectorias, pelo inspector que tenha dirigido a instrução preparatória e, nos demais, pelo representante do Ministério Público junto de comarca sede, ou, que tenha tido a seu cargo a fase preliminar do processo.
2. ......................
3. Aos adjuntos de procurador da República pode ser atribuída, exclusiva ou cumulativamente com delegados de procurador da República, a representação de Ministério Público em grupos de círculos judiciais.
4. Aos delegados de procurador da República pode ser atribuída a representação do Ministério Público em mais de um tribunal de comarcas, vara ou juízos.
5. No caso de impedimento do inspector que tenha dirigido a instrução preparatória, a Polícia Judiciária designará qual o inspector que deve substituí-lo no juízo de instrução criminal.
III
Conclusões
35. Nos termos expostos, esta Câmara concede também na especialidade, a sua concordância à proposta de lei n.º 17/X, com as alterações antes referidas nas bases I e VI, para as quais é proposta a seguinte redacção:
BASE I
Nas comarcas em que o volume de processos penais o justificar, haverá juízos de instrução criminal cuja competência abrange os próprios feitos instruídos pela Polícia Judiciária.
BASE IV
1. .......................
a) .......................
b) .......................
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c) ......................
d) ......................
e) Nos juízos de instrução criminal das sedes das comarcas em que a Polícia Judiciária disponha de inspectorias, pelo inspector que tenha dirigido a instrução preparatória e, nos demais, pelo representante do Ministério Público junto da comarca sede, ou, se houver mais do que um, por aquele que tenha tido a seu cargo a fase preliminar do processo.
2. ......................
3. Aos ajudantes de procurador da República pode ser atribuída, exclusiva ou cumulativamente com delegados de procurador da República, a representação do Ministério Público em grupos de círculos judiciais.
4. Aos delegados de procurador da República pode ser atribuída a representação do Ministério Público em mais de um tribunal de comarca, vara ou juízo.
5. No caso de impedimento do inspector que tenha dirigido a instrução preparatória, a Polícia Judiciária designará qual o inspector que deve substitui-lo no juízo de instrução criminal.
Palácio de S. Bento, 27 de Janeiro de 1972.
António Miguel Cacito.
José Alfredo Soares Manso Preto.
José Augusto Vaz Pinto.
José Gabriel Pinto Coelho.
Manuel Duarte Gomes da Silva.
Adelino de Palma Carlos ( vencido em parte. Quanto às bases I e II da proposta de lei, defendi que deveriam criar-se juízos de instrução criminal não só para os efeitos instruídos pela Polícia Judiciária, mas também para aqueles que correm perante organismos com competência instrutória especializada, como, por exemplo, a Direcção-Geral de Segurança. Qualquer que seja a natureza dos crimes perseguidos, têm de dar-se a todos os cidadãos iguais garantias de defesa.
Quanto às bases III e IV, emiti novo voto de discordância com a instituição de mais tribunais colectivos antes de se procurarem remédios para as deficiências do seu funcionamento, renovando as críticas contra estes que contam dos meus votos de vencimento nos pareceres n.ºs 51/VI e 3/VIII. A verdadeira omnipotência dos tribunais colectivos em matéria de apreciação da prova continua a ser constante motivo de alarme para todos os juristas. Os tribunais da Relação - que têm competência para o julgamento da matéria de facto - estão pràticamente inibidos de utilizá-la, em matéria cível por força do artigo 712.º do Código de Processo Civil e em matéria penal por via do assento de 29 de Junho de 1934 (Diário do Governo, 1.ª série de 11 de Junho do mesmo ano). A obrigação de o tribunal colectivo fundamentar as suas respostas aos quesitos cuja matéria julgar provada, imposta pela nova redacção do artigo 653.º do Código de Processos Civil, não dá nenhuma espécie de garantia. Tal obrigação é por vezes frustrada com fundamentações do género: «O conjunto da produzida.»
Poderia, por exemplo, estudar uma solução análoga à dos artigos 271.º e 272.º da reforma do processo operada em França pelas ordenanças e decretos de 22 de Dezembro de 1958, segundo a qual, nas causas em que é admissível recurso, a qual, nas causa em que é admissível recurso, a prova é recolhida antes do julgamento por um juiz inquiridor e perante ele reduzida a escrito, o que facilita e torna mais sérias e ponderadas a discussão e a decisão do tribunal de 1.ª instância e possibilita a apreciação ampla, do feito pela instância de recurso.
Por outro lado, a solução de atribuir por distribuição a emissão da sentença a qualquer dos juizes do tribunal colectivo, que apareceu no artigo 36.° do Estatuto Judiciário como forma de a todos igualmente interessar na apreciação da matéria de facto e assim se combater um dos defeitos atribuídas ao órgão colegial, também não é satisfatória. Em primeiro lugar, esta solução só é admitida nos Tribunais Cíveis das Comarcas de Lisboa e Porto; nas outras comarcas, a sentença é sempre proferida pelo corregedor do círculo, se o valor da acção exceder a alçada da Redacção, ou pelo juiz da causa, se o não exceder (Estatuto Judiciário, artigo 34.º).
Em segundo lugar, este sistema contraria abertamente um dos princípios
inspiradores das reformas do processo iniciados entre nós com o Decreto
n.º 12 353, de 22 de Setembro de 1926. Uma das ideias mestras desse decreto era a de que o juiz da causa deveria ad initio aperceber-se dela em todos os seus aspectos. Daí se lhe impor a apreciação liminar da petição inicial e o dever de rejeitá-la em certos casos, a emissão do despacho saneador e a elaboração da específicação e do questionário de forma que, quando se chegasse à altura do julgamento, esse juiz sentenciasse com pleno conhecimento dos problemas convertidos. Podendo agora a sentença ser elaborada por outro juiz que, como membro do tribunal colectivo, só haja intervindo na audiência geral, o apontado objectivo está completa e lamentàvelmente inutilizado. Decerto a recolha da prova por um juiz que não seja o julgador também pode ter inconvenientes; mas entre dois males deve escolher-se o menor.
Eis, em resumo, algumas das razões por que sustento que, antes de pensar em criar mais tribunais colectivos, haveria que estudar-se a fundo o seu funcionamento, para dar à administração da justiça uma seriedade mais necessária que a sua celebridades.
João de Matos Antunes Varela.
Joaquim Trigo de Negreiros (venci-lo, em parte, quanto às bases III e IV, pelas razões constantes do voto do Digno Procurador Adelino de Palma Carlos).
António Maria de Mendonça Lino Netto.
Álvaro Rodrigues da Silva Tavares.
Arnaldo Pinheiro Torres.
José Hermano Saraiva.
Eduardo Augusto Arala Chaves (relator). (A lei processual que regula a actividade investigatória comum é a mesma que disciplina a actividade investigatória dos organismos de competência especializada. Considerado o exercício das funções jurisdicionais, a diferença está em que na investigação comum é confiado a juizes ordinários, mesmo que o organismo competente seja a Polícia Judiciária, ao passo que não sucede necessàriamente assim nas investigações a cargo de organismos de competência especializada.
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28 DE JANEIRO DE 1972 1135
No melhor espírito da última revisão constitucional, a presente proposta de lei supõe necessária, para garantia, das liberdades individuais, separação de funções que assegure o máximo de imparcialidade e de isenção aos juízes encarregados de velar pela respectiva observância, exercendo funções jurisdicionais.
Por identificação de razão, a mesma providência é desejável para os organismos de competência investigatória especializada, e por maioria de razão quando não sejam juizes ordinários os responsáveis pelas funções jurisdicionais.
Declará-lo, por coerência, na parte de apreciação na generalidade, pareceu-me devido. Mais até, que a Câmara, dada a importância e o melindre da questão, conferisse relevo ao apontamento pela manifestação de uma esperança em que venha a ser feita conveniente generalidade dos princípios enformadores da presente proposta de lei. Votei nesse sentido.)
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