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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSOES
2.º SUPLEMENTO AO N.º 45
ANO DE 1939 13 DE MARÇO
II LEGISLATURA
CÂMARA CORPORATIVA
Parecer sôbre a proposta de lei n.º 50
(Fomento mineiro)
Foi esta Câmara Corporativa consultada, nos termos do artigo 103.º da Constituição, acerca da proposta de lei n.º 50, sobre fomento mineiro. Apesar do reduzido prazo facultado para a análise da referida proposta, que pela importância e complexidade do assunto merecia demorado estudo, emite sobre ela esta Câmara, tam conscienciosamente quanto possível, e por intermédio das suas secções de «Minas, pedreiras e águas minerais» e de «Finanças e economia-geral», em conjunto, ouvidas as secções de Justiça» e «Transportes e turismo», o seguinte parecer:
Apreciação na generalidade
A actividade mineira em Portugal desde os primeiros tempos
São muitos e de vulto os vestígios que, no nosso País, ainda hoje se encontram atestando a importância das explorações romanas e árabes.
Datam da fundação da nacionalidade portuguesa as primeiras mercês, respeitantes a minas, concedidas por cartas regias. Em 1210 D. Sancho I fez a doação a Ordem de Santiago da exploração do ouro da Adiça e de Sesimbra, que já vinha do tempo dos mouros.
D. Diniz concedeu minas de ferro, estanho e azeviche (lignite) e foram-se mantendo sempre, mais ou menos, os incentives a mineração, até que, no reinado de D. Duarte, foi promulgada a primeira lei de minas, incluída no artigo 26.º do título XXIV, livro II, das Ordenações Afonsinas. Esta lei permitia já a exploração de minas em todo o País, mediante o pagamento de um dízimo ao rei e outro ao proprietário do solo.
Mais tarde D. Afonso V concedeu ao Duque de Bragança, seu tio, o estabelecimento de uma ferraria no têrmo da cidade de Lisboa e ao Bispo da Guarda o estabelecimento de ferrarias em Caria e em qualquer outra parte do reino.
As concessões notáveis dadas por D. João II, dispensando aos concessionários diversas regalias e isentando-os do pagamento de tributes durante o primeiro período de lavra (de um a cinco anos), são já disposições de verdadeiro fomento mineiro.
Passados não muitos anos, D. Manuel I procurou igualmente dar incremento a indústria mineira, datando d'essa época a lavra dos jazigos cupríferos do Alandroal, Terena, Juromenha e Aljustrel, e de alguns de estanho na Beira e em Trás-os-Montes.
Foi grande o interesse pelas minas nesse reinado, tanto que, por alvará de 3 de Junho de 1516, foi criada, uma nova lei de minas, conhecida pelo nome de «Regimento de Aires do Quintal», que foi pelo mesmo alvará nomeado feitor-mor das minas do reino.
Era já bem estudada esta lei e por ela se concediam diversas isenções e privilégios as empresas mineiras, que, sendo ainda obrigadas a pagar ao rei o «quinto», nada tinham a pagar aos proprietários do terreno além da indemnização pelos estragos causados.
Veio depois a notável lei de minas de 1557, promulgada pela Rainha D. Catarina, regente do reino, a qual, não alterando as bases do «Regimento de Aires do Quintal», permitia a venda livre de metais e estabelecia prémios para os pesquisadores de minas. Por essa lei, além do direito ao «quinto» sobre o produto- bruto da mina, o rei podia tomar para si um
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quarto da mina, contribuindo, para a sua lavra, com as despesas correspondentes.
Isto passava-se no ano de 1557 e esta lei foi, durante quási três séculos, o Código Mineiro Português.
Por uma provisão de 1638 foi dada ordem para se retirar certa quantia da alfândega a fim de ser aplicada na exploração de minas de estanho de Viseu. E em 1653 foi publicado um regimento de mimas que, entre outras disposições, dizia: «entrando por terras lavradias em que se faça perdas aos particulares paga-se-lhes sendo maninhas não». Por este mesmo regimento estabeleceram-se novos prémios para os descobridores de minas e deram-se privilégios aos trabalhadores, como o da isenção não só do serviço militar como da obrigação de darem aboletamento. Veio depois o regimento de 1675, que isentava os oficiais, empregados nas minas, do serviço de milícias.
A criação de áreas cativas também é antiga, bastando citar a concessão que foi dada em 1709 a Manuel da Cruz Santiago, pelo prazo de quarenta anos, do privilégio da lavra de todas as minas de Portugal. Por alvará de 23 de Outubro de 1764 foi concedida, por quarenta anos, a administração das minas a quem as abrisse por sua conta, pagando à Real Fazenda o «quinto» do carvão, ouro, cobre, prata, chumbo, estanho, antimónio e outros metais.
No princípio do século passado surgiu mais uma tentativa de «fomento mineiro»; em Julho de 1801 foi publicado um decreto encarregando da suprema inspecção das minas o presidente do Erário, e da sua direcção o intendente geral de minas.
Foram nesse tempo contratados mineiros e fundidores estrangeiros, e disso se encarregou o nosso Embaixador em Berlim, que fechou contrato com três técnicos, um dos quais o Barão d'Eschwege, que, mais tarde, se tornou célebre entre nós.
Era então intendente geral de minas o grande geólogo, lente de metalurgia, José Bonifácio de Andrada e Silva, que intentou, em todas as regiões do País, a lavra de jazigos de ferro, carvão, antimónio e chumbo, restaurou as ferrarias da foz do Alge e conseguiu fazer trabalhar com bastante actividade as minas de carvão de S. Pedro da Cova e de Buarcos (Cabo Mondego).
Apesar da grande competência dos seus dirigentes, esta organização não deu o resultado próspero que dela se esperava, sendo de algum interesse transcrever o que sobre isso diz uma publicação antiga, que ao mesmo se refere:
«Apenas a Mina de S. Pedro da Cova dava lucros, que eram absorvidos pelas despesas das outras minas. As substituições sucessivas de funcionários superiores, a ausência de pessoas mais ou menos habilitadas para os trabalhos de minas e ferrarias, e depois as lutas entre os empregados da Intendência, luta que transparece nos documentos da época, concorrem para êsse mau resultado, mostrando bem as dificuldades que os Governos têm em fazer prosperar, por sua conta, as industrias desta ordem».
É frequente não serem os grandes mestres os melhores dirigentes de empreendimentos industriais, mas, apesar do insucesso desta tentativa, não se deve deixar sem uma referência a memória de José Bonifácio de Andrada e Silva, ilustre entre os ilustres da classe mineira em Portugal.
Fez os seus primeiros estudos no Brasil, veio depois para Lisboa e, sob a protecção do Duque de Lafões, entrou, ainda muito novo, para a Academia Real de Ciências; pouco tempo passado, seguiu em viagem pela Europa para completar os seus estudos de história natural e metalurgia, tendo para isso visitado a Franca, a Itália, a Alemanha, a Dinamarca, a Holanda e a Suécia. De regresso ,a Portugal foi nomeado intendente geral de minas, com a graduação de desembargador da Relação do Pôrto, e, sendo-lhe conferido o grau de doutor em ciências naturais, foi então encarregado da criação de uma cadeira de metalurgia na Universidade de Coimbra, cadeira que regeu até 1807, data da primeira invasão francesa.
Muito havia ainda a dizer sobre a vida deste ilustre português, mas não é essa a feição deste relatório.
Publicou vários trabalhos sobre minas e minérios, e entre eles:
«Uma memória sobre a nova mina de ouro da outra banda do Tejo»; descrição dos caracteres distintivos de alguns minerais, tais como spodumen e outros; estudo sobre as minas da Suécia, especialmente sôbre as minas de Uto; descrição sobre as minas de Salha, etc.
Foi José Bonifácio de Andrada e Silva talvez mau administrador, mas grande professor, homem de letras e académico célebre, e, além de sócio da Academia Real de Ciências, pertenceu às Academias de Estocolmo, Copenhague e Turim, à Sociedade de Investigadores da Natureza de Berlim, de Geologia de Londres, de História Natural de Paris, a Academia Imperial de Medicina do Rio de Janeiro, etc.
Depois da época que, resumidamente, se acaba de referir, e durante o primeiro quartel do século passado, pouco ou nenhum desenvolvimento tomaram as minas em Portugal, pois foram votadas quasi ao abandono, em virtude das invasões francesas e das lutas liberais que mais tarde se lhes seguiram.
A Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos tem em seu poder um grande manuscrito, infólio, do maior interèsse, onde estão transcritos os relatórios do Barão d'Eschwege e de outros, bem como a nota da distribuição dos minérios pelas diferentes províncias do Pais, e mais informações que mostram o conhecimento que o seu autor tinha dos nossos jazigos mineiros. É interessante o título dêsse manuscrito:
«Relatório sôbre o exame do estado das minas e estabelecimentos metalúrgicos deste reino, de que foi encarregado o coronel Barão d'Eschwege, pelo decreto de Sua Majestade em data de 2 de Janeiro de 1824».
A partir dessa época, durante um largo período, mantiveram-se as minas ainda em débil actividade, procurando-se debelar êsse mal com a publicação das necessárias leis e decretos, tais como a lei de 1836, que reformou a de 1557, as de 1850, 1852, 1890 e 1917 e, finalmente, o decreto n.° 18:713, de 11 de Julho de 1930, ainda hoje em vigor.
Como acaba de ver-se, embora resumidamente, muito se tem feito em Portugal para tentar o desenvolvimento mineiro.
Recursos do País em minérios metalíferos
Portugal não é um país tam pobre em minérios metalíferos como muitos supõem; mostra-se mesmo, por enquanto, bastante mais rico nestes minérios do que nos não metalíferos.
É verdade que no nosso País, pelos trabalhos de estudo e exploração até agora realizados, se tem constatado que os minérios metalíferos se encontram, em geral, em jazigos com pequeno desenvolvimento.
Mas, embora pequenos, êsses jazigos são frequentes, mesmo muito frequentes, e, no seu conjunto, conquanto não se prestem a grandes explorações, permitem as explorações médias e pequenas, que, com as suas mo-
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destas produções, bastante concorrem para a nossa economia.
Por não estar ainda completa a estatistica referente ao ano de 1938, vejamos o que diz a de 1937 para os principais minérios, medida a sua produção anual em toneladas métricas:
Minérios metalíferos:
Estanho................................ 1:643
Volfrâmio.............................. 1:794
Ferro.................................. 7:700
Titânio................................ 1:456
Lítio.................................. 110
Cobre (precipitado).................... 353
Resíduos de pirites com 7,6 por cento de cobre............................... 7:787
Pirites de ferro....................... 604:141
Sulfato de bário com 3 gramas de radio.................................. 1,2
Minérios não metalíferos:
Carvão................................. 240:000,
Caulino................................ 11:355
Enxofre (das pirites).................. 13:230
A produção actual de minérios de estanho, de volfrâmio e mesmo de pirites, não entrando em linha de conta com a produção espanhola, coloca-nos entre os primeiros produtores europeus desses minérios. Hoje o ferro das pirites é aproveitado economicamente e tem variadas aplicações.
Se voltar um dia a ser bastante compensadora a exploração dos minérios de urânio (rádio), de antimónio e de lítio, passaremos a ser um dos países maiores produtores dêstes minérios na Europa.
Minérios cujo reconhecimento é considerado de maior urgência
O relatório que acompanhou a proposta de lei agora apresentada frisa bem o insuficiente reconhecimento das possibilidades mineiras do país.
Parece, contudo, depreender-se que, embora venham a merecer uma relativa atenção todos os minérios metalíferos no plano de reconhecimento mineiro a que se refere esta proposta, figurarão, em primeiro lugar, por ser o seu reconhecimento de maior urgência, o ferro, o carvão, os óleos minerais e, talvez, os sais de potássio.
Incontestavelmente devem merecer a primeira atenção aqueles a que poderemos chamar minérios potenciais, como sejam o carvão e o ferro, pois podem determinar, quási só por si, o engrandecimento económico de um país ou de uma região.
Assim foram êles considerados até não há muitos anos; porém, depois, o petróleo veio a equiparar-se-lhes e rápidamente a ultrapassa-los, ocupando êste, hoje, o primeiro lugar entre os produtos indispensáveis à economia mundial.
É bem demonstrativo o que se passou em Inglaterra, que é, actualmente, um dos primeiros países industriais da Europa. A parte rica e próspera de culturas e pastagens era a parte este da Inglaterra. Nesta região estabeleceram-se os romanos e aí nasceram depois os poderosos arcebispados, travaram-se as principais batalhas da sua história, surgiram os grandes castelos e os grandes centros de população, ao passo que a região ocidental, montanhosa e fria, formada de terras estéreis, não tinha senão uma escassa população, miserável. Então ainda se ignoravam, ou, melhor, ainda eram inaproveitados, os ricos depósitos de carvão ocultos no seu subsolo.
Uma vez encontrada a utilidade dêsse combustível mineral e descoberta tam importante riqueza, tudo mudou naquela região, e a vida tomou, rapidamente, uma intensidade e uma animação extraordinárias, onde tudo era quási deserto ainda dois séculos atrás.
apesar de Portugal ser um velho país, muito visitado, muito percorrido e muito prospectado, devem existir ainda vastas regiões cuja mineração poderá um dia, representar riqueza inesperada.
Muito há a esperar, também, dos nossos importantes jazigos de ferro de Moncorvo, Guadramil, Orada, Monges e muitos outros. Está-se, actualmente, procedendo, com o melhor critério, ao reconhecimento dos nossos jazigos de carvão, do que já largos proveitos se tiraram.
Para se fazer uma ideia da importância que têm, na economia mundial, estes dois minérios, basta ver as estatísticas; mas, para isso, devemos reportar-nos a anos atrás, porque as actuais ou são falsas, por informações propositadamente erradas, ou falseiam a nossa análise, pela febril preparação guerreira que vai por êsse mundo.
Por ser o mais próximo e de maior sossêgo industrial, foi escolhido o ano de 1936, em cuja estatística figura o pêso dos minérios em milhares de toneladas:
[Ver Tabela na Imagem]
como quási todos estes países não se limitam a trabalhar o minério de ferro que produzem, pois importam-no em larga escala, é de interêsse também conhecer a sua produção de ferro e aços, medida, igualmente, em milhares de toneladas:
[Ver Tabela na Imagem]
completa-se esta análise apreciando, também, a importância dos efectivos de pessoal empregado nestas indústrias:
[Ver Tabela na Imagem]
Possibilidades do desenvolvimento mineiro do País
No que diz respeito aos restantes minérios com que a natureza nos dotou, o emprêgo dos processos modernos, tanto de reconhecimento como de concentração e
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separação, permitem tornar próperas explorações que eram economicamente impossíveis ainda há bem poucos anos.
Dispõe actualmente a indústria mineira de processos científicos de prospecção, como sejam: os processes geofísicos, como os gravimétricos, radioeléctricos, processos electro-magnéticos, etc., e, para o aproveitamento e concentração de minérios, são inúmeros os processos descobertos nos últimos tempos, tanto mecânicos como electro-magnéticos, electro-estáticos e químicos, sendo dos que maiores benefícios trouxeram à indústria mineira o da flutuação, que começou a ser empregado, com maior frequência, há pouco mais de vinte anos, quando da Grande Guerra.
Anos antes tinha sido descoberto e tinha revolucionado a indústria mineira o processo de cianuração, que permitiu o tratamento de muitos minérios de ouro, que não era amalgamável ou susceptível de ser separado por qualquer dos meios até então conhecidos.
Este mesmo processo de separação veio salvar muitas e importantes empresas da África do Sul, que estavam trabalhando em precárias circunstâncias, permitindo-lhes o aproveitamento do ouro das suas entulheiras, já considerado como perdido.
Muito haveria ainda a dizer sobre este ponto tam importante para a indústria mineira, e muitas vezes se tem constatado que o aparecimento de um novo processo industrial pode revolucionar, completamente, uma tal indústria, e aquilo que nos parece inaproveitável virá, talvez num dia próximo, a ser de grande valor para considerar.
Igualmente convirá não esquecer que minérios que hoje não têm, interêsse económico alguma vez se podem tornar do maior valor, como se deu com bastantes no decorrer do último século.
0 dizer-se que uma região está já visitada, estudada e mesmo até pesquisada não impede que se não venham a encontrar aí, mais tarde, outros minérios de grande interesse.
Podem citar-se alguns exemplos que são dos nossos dias e passados em regiões bem conhecidas e visitadas.
Perto de Trancoso foi, durante a Grande Guerra, explorada uma mina de estanho (Massueime), donde extraíram algum minério, e a ganga do filão foi toda rejeitada para a entulheira. Mais tarde alguém descobriu que grande parte dessa entulheira era constituída por ambligonite, que é um muito apreciado minério de lítio. Fez-se a sua escolha e enriquecimento, o que permitiu uma exportação proveitosa durante alguns anos.
Passado pouco tempo, foi descoberto, ao sul da Guarda, numa região onde constantemente se faziam pesquisas mineiras de estanho e volfrâmio e por onde tinham passado alguns técnicos de reconhecido valor, um extensíssimo jazigo de lepidolite, minério de lítio também, com perto de 5 quilómetros de extensão.
Esse minério aflora por toda a parte e por toda a parte aparecem fragmentos de filão espalhados pelos terrenos; na povoação de Gonçalo vêem-se as suas calçadas feitas, quasi que exclusivamente, com esse minério, que, pela sua contextura e cor, se reconhece a muitos metros de distância.
Há poucos anos, também, não muito longe da estação de Pataias, na linha de Oeste, foi registado um jazigo de bauxite (minério de alumínio), de fraco teor, é verdade, mas que toda a gente poderia ver numa trincheira da própria linha e que, numa grande frente, apresenta uma cor muito característica. Até então ainda ninguém havia reparado nele.
Quem tenha passado, frequentemente, na estação de Mangualde há-de ter notado, por vezes, junto a linha, uns montes de feldspato, que ali esperam ser embarcados para as fábricas de cerâmica.
Com êsse mineral é muito frequente aparecer o berilo (minério de glucínio), pois só em 1922 se fizeram os primeiros registos dêste minério sôbre um jazigo existente em Mesquitela; porém, hoje, ali e noutros sítios, são inúmeros os registos de berilo.
Todos estes minérios se encontram em regiões bastante visitadas, mesmo por mineiros, e é de prever que muito se poderá ainda encontrar que ofereça bem maior interêsse em regiões menos conhecidas. Não são muito importantes os minérios citados, mas, nas mesmas circunstâncias, podem ser descobertos jazigos de minérios de grande valor industrial.
0 futuro de uma região ou do País pode estar, pois, à mercê de uma nova descoberta ou de uma melhor coordenação e aproveitamento de descobertas; o que anteriormente se desconhecia, ou somente constituía simples especulação científica, pode, mais tarde, modificar-se em larga escala e ter uma influência apreciável na nossa economia.
Bastante tem, sido já feito; muito falta ainda fazer.
Conclusão
Pelo exposto e em concordância com o que se diz no bem elaborado relatório que antecede a presente proposta, acha esta Camara que muito se faz sentir a necessidade de atribuir ao Estado um papel mais activo, do que até agora tem tido, nos trabalhos de reconhecimento e pesquisa de minas e de serem dados incentivos à colaboração das entidades particulares nesses trabalhos e ao interesse dos capitais pelas explorações mineiras.
Considera, portanto, a Câmara da maior oportunidade e muito para louvar a iniciativa do Governo com a apresentação da proposta em exame.
Estudo e crítica das bases
BASE I
Por esta base compete ao Estado, como única entidade capaz de o realizar, o estudo sistemático da riqueza mineira do País, trabalho este que já por vezes se tentou, mas que até hoje nunca obteve a realização prática e o desenvolvimento que merece.
A par dos notáveis trabalhos geológicos realizados têm sido feitos, é certo, alguns interessantes estudos mineralógicos, mas sempre limitados a zonas restritas e incidindo mais sôbre o aspecto científico do que sôbre a orientação económica e prática.
A presente proposta de lei, criando novos serviços e propondo-se realizar trabalhos de tam grande envergadura, não faz qualquer alusão à possibilidade de virem a ser criadas para esse fim dotações especiais destinadas ao «fomento mineiro».
Natural seria que a essas dotações, uma vez criadas, se adicionasse o produto das pequenas, mas múltiplas, receitas recebidas pela Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos.
Um pequeno subsídio de 1:000 contos, já concedido para ocorrer as despesas a fazer com o reconhecimento e pesquisas mineiras, servirá, possivelmente, para permitir o comêço da organização dos serviços a que se refere a presente proposta de lei.
Em face, porém, da incerteza da hora actual, deve prever-se a urgente necessidade de colhêr ràpidamente
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os benefícios em vista, e para isso e precise contar com avultadas somas a despender, não só em trabalhos de reconhecimento e pesquisas, como na completa organização dos muitos serviços indispensáveis ao seu cabal aproveitamento.
Esta seria talvez a oportunidade de serem criados entre nos os elementos de estudo e de auxilio técnico, cuja falta, de ha muito, se faz sentir, designadamente:
a) Escolas de ensino elementar de minas
As secções de estudo poderão dispor dos engenheiros e condutores formados pelas escolas portuguesas, e de técnicos especializados, estrangeiros, contratados, como se prevê na proposta de lei; mas não lhes será possivel arranjar o pessoal auxiliar indispensável para a execução de tam variados serviços.
Existem em Portugal duas escolas superiores de engenharia de minas; existem duas escolas de ensino técnico industrial, que fornam excelentes condutores de minas; mas não existe uma única escola de ensino elementar de minas.
Estas deveriam ser criadas junto dos principais centros mineiros do País. Aí receberiam instrução os futuros capatazes, os colectores e os pesquisadores auxiliares, o que muito viria facilitar a execução dos trabalhos prometidos.
Esses mesmos capatazes, mais tarde, seriam de excelente aproveitamento, fazendo-os substituir aos inúmeros dirigentes, de improvisada técnica, que se encontram espalhados pelas pequenas explorações mineiras do País.
b) Instalações laboratoriais para análise e estudo de minérios
Conviria ampliar-se o laboratório químico-metalúrgico que já existe junto dos Serviços Geológicos, dotando-o do material e pessoal técnico necessario para, ocorrer as necessidades de analise e estudo criadas pela presente proposta de lei.
Nesse laboratório seriam feitas as análises químicas, mineralógicas e petrográficas necessárias, como também, se os seus serviços o permitissem, se executariam as análises de que as empresas mineiras necessitassem, a um preço justo e tal que favorecesse a sua frequência.
Igualmente deveria criar-se, junto a êsse laboratório e dispondo dos maquinismos necessários, uma secção para ensaios industriais, onde um pessoal especializado faria o estudo do aproveitamento, concentração e enriquecimento dos variados minérios que para ali fôssem enviados, completando-se, assim, o estudo do valor industrial dos jazigos descobertos.
c) Arquivo da nossa riqueza mineira
junto do Museu de Mineralogia dos Serviços Geológicos deveria ser criada uma secção mineralógica, com as características de um arquivo da nossa riqueza mineira.
Aí, por zonas mineralógicas, ou por minas, e devidamente separadas, se fariam figurar, para cada zona ou mina, exemplares dos minérios tal como são encontrados, exemplares das rochas encaixantes, exemplares das rochas conexas e de toda a mais documentação que pudesse interessar à geologia local. Igualmente, sempre que fôsse possível, por cada zona ou por cada mina, deveria existir um resumo com a descrição do jazigo, com dados estatísticos e técnicos e ainda com os croquis e mais detalhes que o caracterizassem.
Aí seriam, também, elaboradas a planta mineralógica e a planta mineira do país e bem assim as necessárias plantas parcelares, em maior escala, das zonas de maior interêsse.
Um arquivo assim organizado seria da maior importância técnica para orientação dos mineiros e empresas que se propusessem realizar trabalhos em determinada zona que lhes fôsse familiar.
O facto de se apresentarem, tanto as rochas como os minérios, com o aspecto tal qual foram encontrados constituiria um verdadeiro museu prático e bem diferente do que apresentam ao visitante os grandes museus, cuidadosamente organizados e muito necessários também, mas com exemplares escolhidos entre os melhores, limpos e até pulidos, por vezes, o que de modo algum educa e prepara a vista dos pesquisadores, que nunca ou só muito raramente virão a encontrar exemplares semelhantes.
BASE II
Esta base não é mais do que complemento da base I mostrando as diversas modalidades com que o estado se propõe efectivar o estudo mineralógico do País.
Pelo n.º 2.º desta base é o Govêrno autorizado a executar ou a fazer executar trabalhos em áreas declaradas cativas, em zonas livres, e em áreas de concessões mineiras já dadas.
No que se refere a «áreas cativas», em pouco difere a presente proposta de lei do que já consta do artigo 5.º e seus parágrafos do decreto n.º 18:713, de 11 de Julho de 1930.
A única diferença que ela apresenta é a de o próprio Estado os trabalhos de reconhecimento, pesquisa e outros que até agora eram sempre adjudicados a terceiros.
Quanto a trabalhos de prospecção e pesquisa executados pelo estado em «zonas livres», não se faz na presente proposta de lei qualquer referência que possa alterar o disposto nos artigos 7.º e seguintes do decreto n.º 18.713, sôbre manifesto e registo mineiros. Ma, uma vez revelada a existência de minério, em condições proveitosas, pelos trabalhos realizados pelo estado, numa «zona livre», imediatamente apareciam inúmeros registos que cobririam essa zona.
Sem dúvida que isso seria, também, uma forma de fomento mineiro, mas não deve ser êsse o espirito da proposta de lei, porque, se assim fôsse, não poderia advir para o estado qualquer compensação pelos trabalhos realizados, como se encontra previsto na base IV.
Para não fugir à ideia que imperou na elaboração da presente proposta de lei, sugere a Câmara que no n.º 2.º da base II fique expresso que o Estado deverá declarar cativas as áreas onde se proponha promover trabalhos.
Quanto a trabalhos de prospecção e pesquisa «áreas de concessões mineiras já dadas«, julga a Camara Ter interpretado a ideia que presidiu a esta disposição considerando que a intervenção do estado se dará geralmente em trabalhos de prospecção e pesquisa de jazigos de natureza diferente dos que estiverem sendo explorados, e, só em casos muito excepcionais, nas concessões que estejam em lavra activa.
Depreende-se da redacção da base II, completada pelo que se diz na base V, que o estado pretende conseguir um mais completo conhecimento da riqueza mineira do País, riqueza que, uma vez executados os referidos trabalhos e pesquisas, deverá ficar grandemente valorizada.
Como adiante se verá (base V), disso pode beneficiar também o concessionário, pois que, ficando com o reconhecimento do seu jazigo realizado, só virá a Ter dispêndio quando se aproveitar do que tiver sido reconhecido pelo estado.
O Estado fará a despesa com todos os trabalhos em conjunto e os concessionários farão o pagamento dos
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encargos que lhes corresponderem, num longo prazo, pelo minério que extraírem, e só à medida que o extraírem.
BASE III
Por esta base e marcado um prazo de sessenta dias, a contar da data da publicação desta lei, para a apresentacão de um plano de reconhecimento do País.
Lembra esta Câmara que à palavra «plano» se acrescente a palavra «geral», para dar a idea de que se trata de um trabalho sumário, como que de um esbôço do que se pretende realizar. Para a elaboração de um plano complete de reconhecimento mineiro do País, o período de sessenta dias seria excessivamente escasso, tornando quási que impossível a sua realização com o necessário cuidado e bom critério que exigia um trabalho desta natureza.
BASE IV
Esta base refere-se às condições em que devem ser propostos para concessão os jazigos evidenciados pelo Estado, bem como às condições que deverão presidir à cedência de áreas cativas a terceiros.
O Estado, na sua qualidade de prospector e pesquisador, fica, pelo disposto no n.° 1.° desta base, com a faculdade de negociar, em termos justos, as concessões que tiver evidenciado pelos seus trabalhos de prospecção e pesquisa.
0 n.° 2.° desta base refere-se às condições de adjudicação de áreas cativas. Esta Câmara, interpretando a ideia que presidiu a, redacção dêste n.° 2.°, alvitra que seja substituído pelo seguinte:
2.° 0 Estado pode adjudicar, em hasta pública, a prospecção e pesquisa em áreas cativas, reservando aos adjudicatários o direito à concessão dos jazigos evidenciados.
BASE V
Esta base é, sem dúvida, uma das mais importantes da presente proposta de lei, pois diz respeito ás relações do Estado com os concessionários, uma vez que sejam postas em vigor as normas estabelecidas para a execução do fomento mineiro.
As disposições insertas nesta base modificam bastante algumas da actual lei de minas.
Pelos artigos 40.º a 43.º do decreto n.° 18:713, o concessionário é obrigado a pesquisar, estudar e explorar sòmente o minério ou minérios que tenham sido indicados no respectivo alvará de concessão.
O artigo 41.º do referido decreto estabelece que:
0 alvará de concessão, assinado pelo Chefe do Estado e referendado pelo Ministro do Comércio e Indústria, será passado de harmonia com o modêlo E anexo a êste decreto e mencionará as condições especiais a que se obriga o concessionário que digam respeito à lavra propriamente dita, etc.
O artigo 42.º do mesmo decreto estabelece que:
As concessões mineiras são dadas por tempo ilimitado, desde que os concessionários cumpram as obrigações indicadas nos respectivos alvarás de concessão e as disposições do presente decreto e mais legislação aplicável.
O artigo 43.° preceitua que:
«0 concessionário pode requerer na Repartição de Minas autorização para o aproveitamento de quaisquer outras substâncias, isto é, diferentes das que lhe forem indicadas pelo alvará de concessão.
Em face das disposições da actual lei de minas e das indicações normalmente inscritas nos próprios alvarás, a leitura da base v pode deixar a impressão de que, num futuro mais ou menos próximo, alguns concessionários poderão ver modificadas, com novas obrigações, as condições de trabalho que motivaram e presidiram à organização e instalação da sua indústria.
Aparentemente, vêem-se ameaçados nas suas prerrogativas e, por correrem mais riscos, recearão, de certo, um maior afastamento dos capitais, que já tanto faltam nestes empreendimentos.
Não é, porém, bem assim, pois que os concessionários ficarão, agora, com a faculdade de obter capitais, com o penhor da sua própria concessão, conforme lhes é facultado pelo disposto na base x desta proposta de lei.
Igualmente a execução dos trabalhos a que se refere a base v pode, também, em muitos casos, ser de vantagem para os concessionários, conforme já se expôs quando se aludiu às disposições da base II.
São importantes e de apreciar, igualmente, as disposições das bases XI e XII , que muito poderão vir a beneficiar alguns concessionários.
Tem esta Câmara mais algumas referências a fazer sobre a base v:
Na alínea b) desta base lê-se:
«Realizar êsses trabalhos com subsídio do Estado», e nada mais se preceitua. Na alínea a) da mesma base frisa-se que os trabalhos realizados pelos concessionários serão fiscalizados pela Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos.
Afigura-se que deverá ser mais necessário que o Estado exerça a sua fiscalização sôbre trabalhos que esteja subsidiando e também sôbre aqueles que, embora sejam executados por terceiros, são de sua conta.
Tendo em atenção o que atrás se disse e as considerações agora feitas, é esta Câmara de parecer, em primeiro lugar, por julgar mais apropriado o têrmo, que se substituam no n.° 1.° desta base as palavras «optarem por» pela palavra «escolherem».
Que na alínea a) do mesmo número seja eliminada a frase: «e sob a fiscalização da Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos», ficando a mesma alínea com a redacção seguinte:
a) Realizar os trabalhos por sua conta dentro de um prazo determinado, se ainda os não tiver realizado.
Igualmente, sugere esta Câmara que seja inserto, depois da alínea c) desta base e antes do seu n.° 2.°, o período seguinte:
A fiscalização dos trabalhos a que se referem as alíneas anteriores, quando não empreendidos directamente pelo Estado, competirá à Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos.
Em virtude do n.° 3.° desta base, os concessionários poderão requerer que sejam realizados pelo Estado, ou por êle subsidiados, trabalhos de prospecção e pesquisa na área das suas concessões.
Se o Estado pudesse vir a ter, dentro de um curto prazo, todos os seus serviços convenientemente organizados e largamente providos, tanto de material apropriado, como de pessoal técnico competente, ninguém melhor do que êle poderia executar aqueles trabalhos.
Há, porém, a notar que se trata de uma nova organização de serviços, em que quási tudo está ainda por fazer, e, uma vez que se dê começo aos estudos e trabalhos propostos, deverão certamente considerar-se como de primordial urgência aqueles que mais íntima ligação tiverem com a economia e com a segurança nacional.
Tal como se encontra redigido, êste n.° 3.° da base v poderá dar lugar a situações de difícil solução.
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Por essa disposição, muitos concessionários poderão pretender obter do Estado a execução de trabalhos de prospecção e pesquisa em zonas não só muito afastadas, como ainda nada tendo de comum com o piano geral estabelecido de acordo com o disposto na base III desta proposta de lei.
Pelas razões apresentadas, lembra esta Câmara a redacção seguinte para este n.° 3.° da base v:
3.° Os detentores de concessões mineiras poderão, tendo em atenção o piano geral a que se refere a base III, requerer que sejam realizados ou subsidiados pelo Estado trabalhos de prospecção e pesquisa na área das suas concessões, mediante a obrigação de reembolso em prazo determinado ou pagamento da taxa a que se refere o número anterior.
Para uma melhor compreensão do disposto no n.° 5.° desta base, a Câmara e de parecer que este número deve ser aprovado com a seguinte redacção:
5.° 0 subsidio a que se refere esta base não poderá exceder 50 por cento do custo efectivo dos trabalhos e só poderá ser pago, uma vez aprovado o piano destes pela Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos, perante os documentos, confirmados pela fiscalização, comprovativos dos trabalhos que tiverem sido efectuados, em realização do mesmo piano, e das somas neles despendidas.
No n.° 6.°, na sua primeira parte, são definidas as bases que devem presidir ao calculo da taxa a que se referem os numeros anteriores.
Não modificando a idea da proposta de lei, aconselha esta Camara, para essa primeira parte, a redacção seguinte:
6.° Em principio a taxa a que se refere esta base deverá, tida em conta a riqueza evidenciada do jazigo, remunerar suficientemente o capital despendido e prover à sua amortização.
No segundo período deste mesmo n.° 6.° é tratado o caso especial dos concessionários que tenham requerido a realização de trabalhos de prospecção e de pesquisa feitos directamente pelo Estado ou por ele subsidiados e que se não encontrem dependentes do «plano geral» e seus programas a que se refere a base III desta proposta de lei.
Diz mais êsse, período que se deverá fazer a reforma dos alvarás, com as novas condições especiais de exploração, sem dispêndio para o concessionário.
Pela redacção apresentada pode parecer que só seriam obrigados a reforma dos alvarás aqueles concessionários que requeressem trabalhos ou subsidies do Estado, o que deve ser contrario a idea que presidiu a elaboração desta proposta de lei.
Sendo o alvará o único documento do contrato de concessão que fica existindo, natural e que mencione sempre as condições especiais que forem criadas pela aplicação das disposições da presente proposta.
E, por isso, esta Câmara de parecer que se deve destacar a obrigação e fazê-la abranger todos os concessionários que se encontrem ao abrigo deste n.° 6.°
Embora ainda se esteja tratando da base V, não se pode deixar de chamar a atenção para o n.° 2.° da base VI, que, certamente por lapso, ficou deslocado.
Este n.° 2.° refere-se as condições que deverão presidir ao calculo da taxa quando haja minério já evidenciado pelo concessionário; portanto, o lugar destas disposições esta naturalmente indicado junto das restantes incluídas na base V.
Pelas considerações expostas, julga esta Camara que o n.° 6.° da base v deve ser desdobrado em tres numeros e acrescentar-se-lhe o que consta do n.º 2.º da base VI, ficando com a seguinte redacção:
6.º Em princípio a taxa a que se refere esta base deverá, tida em conta a riqueza evidenciada do jazigo, remunerar suficientemente o capital despendido e prover à sua amortização.
7.º No caso previsto no n.º 3.º, o subsídio ou a realização das pesquisas pelo estado poderão ser condicionadas por obrigações especiais, quanto a prazo de exploração, aproveitamento industrial e outras.
8.º No caso de haver pesquisas realizadas ou subsidiadas pelo Esta, serão excluídos da taxa e condições especiais os minérios evidenciados por trabalhos já realizados pelos concessionários.
9.º A reforma dos alvarás para a inscrição das taxas e obrigações especiais a que se referem os números anteriores desta base far-se-á sem encargo algum para o concessionário.
BASE VI
Já foi indicada por esta Câmara a eliminação do n.º 2.º desta base e a sua passagem para a base V, em virtude da grande ligação que tem com os seus restantes números.
Com a eliminação proposta passará o n.º 3.º da presente base para o n.º 2.º.
Refere-se êste n.º 3.º à penalidade a impor pela falta, por parte dos concessionários, da entrega de relatórios dos trabalhos e das necessárias peças desenhadas que lhes tenham sido pedidos pela Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos. Afigura-se, a esta Câmara, de excessiva rigidez a aplicação da pena, única, de caducidade da concessão por uma falta que, por vezes, se pode apresentar com atenuantes de valor.
É, portanto, de parecer esta Câmara que a falta apontada se pode dar em circunstâncias tais que tornem bastante a aplicação das penalidades a que se refere a actual lei de minas (decreto n.º 18:713, de 11 de Julho de 1930). Ficará, porém, ao critério da fiscalização a aplicação de uma ou outra penalidade, conforme a gravidade da falta cometida.
Lembra, por isso, esta Câmara que aquele número da base VI fique com a redacção seguinte:
2.º A falta de cumprimento do disposto nesta base, não tendo justificação aceitável, dará lugar à aplicação das penas de multa ou de caducidade, conforme a sua gravidade.
BASE VII
Estabelece esta base que o Govêrno poderá determinar quais os trabalhos que constituem lavra activa, em cada mina, e quais os fundamentos em que terá de assentar uma tal classificação.
Por não se compreender claramente o que se pretende definir com as palavras «cada grupo de concessões mineiras», e procurando evitar qualquer errada interpretação dessa expressão, lembra esta Câmara a sua substituição pela expressão «às concessões mineiras»; e mais adiante, onde se diz «lavra activa das minas», alvitra esta Câmara que se eliminem, por desnecessárias, as palavras «das minas».
Esta base refere-se, no restante, às normas a que deve obedecer a aprovação do plano de lavra, preceituando que a sua importância deve ser proporcionada à da concessão e ao valor reconhecido ou presumível do jazigo.
Esta Câmara é de parecer que se mantenha a condição de que a importância do plano de lavra deva ser proporcionada ao valor reconhecido do jazigo, mas não com-
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corda em que se obrigue um concessionário a executar um plano de lavra baseado no valor presumível de um jazigo.
A não ser em circunstâncias muito especiais e bastante raras, os jazigos mineiros do nosso País não se apresentam em condições de, pelo seu valor presumível, darem qualquer garantia ao trabalho a efectuar.
Compreendia-se que isso se pudesse dar numa concessão situada numa zona onde a mineralização fosse muito regular e característica, o que, geralmente, não acontece.
Dentro do têrmo «reconhecimento de um jazigo» já está incluída a idea de, a par do minério directamente avaliado, se contar com minério provável e com minério possível.
Pelas razões expostas, é de parecer esta Câmara que deve ser eliminada a palavra «presumível» na redacção desta base, ficando, portanto, as suas últimas linhas como segue:
. . . ser proporcionada à da concessão e ao valor reconhecido do jazigo.
BASE VIII
Estabelece as condições em que é possível a transmissão de uma concessão mineira que se encontre em regime de suspensão de lavra. Diz a proposta que o novo adquirente ou deverá tomar o compromisso de, em determinado prazo, retomar a lavra activa, ou adquirir a concessão para constituir justa reserva de outra concessão em activa exploração.
Parece a esta Câmara que também se deveria considerar a necessidade de se adquirir uma concessão ainda não explorada ou em regime de suspensão de lavra para constituir reserva necessária a utilizar, dentro de um prazo mais ou menos longo, por qualquer indústria nacional de reconhecida importância.
Desejaria, por isso, esta Câmara que nesta base VIII, depois das palavras «em outra concessão», se acrescentasse «ou que constitua reserva reconhecida necessária a qualquer indústria nacional».
BASE IX
Esta base refere-se exclusivamente à demarcação, concessão, paralisação e desmembramento dos coutos mineiros, e bem assim ao cálculo e distribuição do respectivo imposto proporcional.
As disposições desta base diferem bastante do que está preceituado nos artigos 44.° e seguintes do decreto n.º 18:713, no que diz respei-to à demarcação e concessão de coutos mineiros.
Para o efeito da demarcação estabelece esta base, como condição primordial, a finalidade de assegurar «justas reservas», considerando como reservas as que forem proporcionais às instalações e actividade das minas em lavra activa.
0 têrmo «justas reservas» quere, certamente, indicar que se fará o cálculo das reservas de minérios necessários para garantir uma longa e intensa exploração. Como êsse cálculo será, certamente, feito por quem tenha a prática de tal trabalho, é de prever que, atendendo às dificuldades de avaliação, que são quási normais nestes serviços, se conte, com largueza bastante, o que se considera reserva proporcional às instalações.
A boa prática aconselha que se deve entrar sempre em linha de conta com a possibilidade de a exploração mineira, num prazo mais ou menos longo, melhorar as instalações existentes ou mesmo substituí-las por outras de maior importância.
Deve também partir-se do princípio de que uma empresa que se propõe fazer uma exploração mineira merece que lhe criem algumas probabilidades de se
engrandecer ou, pelo menos, de melhorar as suas condições de exploração e tentar uma maior compensação para os capitais que empregou nessa indústria, que é, sem dúvida, uma das que maiores riscos oferecem.
É ainda natural que se proporcione aos concessionários a maneira de se aproveitarem de uma melhoria ocasional do mercado dos minérios. É bem justo que uma exploração mineira que esteja trabalhando em condições precárias, como tantas vezes acontece, possa tirar um desfôrço e compensar-se, pelo menos em parte, dos capitais, por vezes elevados, que os seus estudos, as suas esperanças e a sua coragem a induziram a empregar em tam duvidosa indústria.
Para que fique alguma liberdade mais, ainda que muito pouca, nas normas que devem presidir a demarcação de coutos mineiros é esta Câmara de parecer que o n.° 1.º desta base IX deverá ser redigido como segue:
1.° A demarcação de novos coutos mineiros terá, principalmente, como finalidade assegurar uma exploração remuneradora, pela manutenção de justas reservas, em harmonia com as suas instalações e actividade, às minas em lavra activa e, de entre estas, em primeiro lugar, as que produzam matérias primas próprias para as indústrias nacionais.
Sôbre o preceituado nos n.ºs 2.° e 3.° desta base nada se oferece a esta Câmara dizer.
No que se refere ao n.° 4.° desta base, compreende-se a intenção que o ditou, pois é vulgar ver mais de um concelho exigir da emprêsa detentora de um couto mineiro a totalidade da percentagem calculada sobre o imposto proporcional.
As normas do detalhe da execução dêste preceito devem caber aos regulamentos a publicar e, por isso, esta Câmara limita-se a lembrar que, em vez de o cálculo ser feito especificadamente para cada concessão, o seja, em conjunto, sobre cada grupo de concessões respeitantes a cada freguesia.
BASE X
Para o estudo e crítica da base x foi designada a secção de Justiça desta Câmara, que apresentou o seu parecer subsidiário, que se transcreve na íntegra, tendo sido seu relator o digno Procurador Dr. Afonso de Melo Pinto Veloso:
«1. A base x da proposta, sobre a qual especialmente cumpre a secção de Justiça emitir o seu parecer, contém o preceito de que sôbre as concessões pode, mediante prévia autorização do Ministro do Comércio e Indústria, ser constituída hipoteca para garantia de créditos destinados a trabalhos mineiros. Designa também as duas modalidades por que essa hipoteca pode ser constituída e o processo de lhes assegurar a efectivação.
No lúcido relatório que se precede a proposta explica-se a oportunidade desta innovação, tanto pela conveniência de firmar, por modo expresso, a doutrina, entre nós controvertida, de que as concessões mineiras são susceptíveis de hipoteca, como pela necessidade de promover a aplicação de capitais ao fomento mineiro, pelo oferecimento de garantias reais que demovam os capitalistas de seu habitual retraimento.
0 primeiro objectivo é evidente que pode ser realizado pelo publicação da lei, sendo, portanto, apenas necessário ponderar se esta obedece a um sistema jurídico conveniente e se a redacção dos seus preceitos é a mais adequada ao fim visado.
0 segundo objectivo é preferentemente de carácter económico e social, mas, como informa toda a estrutura
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da proposta, convém tê-lo presente no exame das condições em que êste novo sistema hipotecário é instituído.
2. Efectivamente, entre nós não foi ainda pràticamente admitida hipoteca sôbre o direito a uma concessão mineira, não obstante haver quem sustente que, sendo esta uma convenção entre o Estado e a emprêsa concessionária, dá origem a um direito real susceptível de ser hipotecado e arrematada, embora a lei de minas torne a alienação sempre dependente de autorização do Govêrno.
É desta opinião o Dr. Cunha Gonçalves (Tratado de Direito Civil, vol. 3.°, p. 445), que entende, ainda, não ser mesmo precisa autorização governamental para a hipoteca, visto que esta, só por si, não importa a alienação da mina, e cita, além do artigo 138.° do decreto de 20 de Setembro de 1906 e dos artigos 888.° e 894.° do Código Civil, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de l3 de Junho de 1886, por seu turno citado, ao que se depreende, no livro A indústria mineira em Portugal do Dr. Manuel Rodrigues Júnior.
Em verdade, o decreto de 20 de Setembro de 1906, assinado pelo então Ministro do Ultramar, Aires de Ornelas, admite, pelo artigo 166.°, o registo da hipoteca das concessões mineiras situadas em território das Companhias Majestáticas; mas e ainda mais expresso o artigo 128.°, referente a concessões mineiras nos outros territórios coloniais, pois diz que «dos contratos de arrendamento ou hipoteca de que fôr objecto qualquer concessão mineira será enviada copia à autoridade que tiver feito a concessão, para ser junta ao respectivo processo depois de registada no livro competente».
Certo é, porém, que o decreto de 30 de Setembro de 1892, que então regulava as concessões mineiras na metrópole, não continha disposição que se referisse a hipoteca de minas e, conquanto dissesse, no artigo 43.º, que a concessão era dada por tempo ilimitado, sob condigno sòmente de o concessionário cumprir as obrigações legais, declarava, no artigo 42.º, que a propriedade das concessões mineiras era intransmissível sem autorizado do Govêrno; e a reforma da legislação mineira de 15 de Agosto de 1930, decreyo n.º 18:713, apesar de bem posterior à citada legislação ultramarina, não só não adoptou as referências que lá se fazem à hipoteca, como foi ainda mais longe do que o decreto de 1892 nas restrições postas à liberdade do concessionário.
No artigo 30.° determina que sôbre Concessões mineiras não podem ser celebradas quaisquer contratos sem prévia autorização do Ministro respectivo e, nos artigos seguintes, ao mesmo tempo que trata das condições em que poderão realizar-se transmissões e arrendamentos, omite-se qualquer referência à hipoteca, apenas prevendo o artigo 53.º a hipótese de se dar a venda judicial ou qualquer outra forma de alienação forçada, não se podendo daqui concluir que fôsse prevista a hipótese da hipoteca e respectiva execução.
Por seu turno, o artigo 894.º do Código Civil, ao declarar que só pode hipotecar quem pode alienar e só podem ser hipotecados os bens que podem ser alienados, enuncia uma regra geral, que seria preciso inverter para se concluir que todos os bens que podem ser alienados podem ser hipotecados, o que aliás é falho de verdade jurídica, não se podendo portanto tirar dela ilação decisiva sôbre a constituição legitima de hipotecas mineiras. Mais lògicamente se poderá concluir da proibição de contratar sem autorização do Govêrno, expressa no artigo 30.° do decreto n.° 18:713, em vigor, e da permissão de alienar com essa autorização, expressa no artigo 51.°, que, sendo inerente a hipoteca a alienação virtual da cousa hipotecada, só deve ser autorizado a hipotecar quem pode ser autorizado a vender. Mas como não existe disposição expressa, a dúvida e legítima e a hipoteca, de facto, não tem sido admitida na metrópole.
3. É pois oportuno verificar se a natureza jurídica da concessão mineira se coaduna no instituto hipotecário. A urgência dêste parecer - e também porque seria talvez insperiente nesta conjuntura - afasta-nos de apreciar as três teses principais que se tem defrontado acêca da propriedade dos jazigos minerais, por uns, seguindo Dunoyer e a legislação civil do tipo napoleónico, atribuída ao proprietário do solo, por outros, como, Turgot, atribuída ao descobridor, como primeiro ocupante, e por outros muitos considerada como do domínio do Estado.
Entre nós o artigo 49.° da Constituição Política expressamente a considera, com outras riquezas naturais existentes no subsolo, como pertencentes ao domínio público do Estado, ficando assim com fôrça constitucional um princípio que tenha orientado de há muito a nossa legislação mineira e estava consignado no artigo 1.° do decreto n.º 18:713, ainda vigente. A França, não obstante o espírito do Código promulgado por Luiz XVIII em 1816 e já seguido no titulo II do Código Civil de Napoleão (1804) pela adopção da forma lapidar do artigo 552.º (La propriété du sol emporte la propriété du dessus et du dessous), considerou, na sua lei mineira de 1810, a mina como propriedade separada da do solo e como concessão perpétua, mas modificou êste último critério na lei de 9 de Setembro de 1919, onde estabeleceu que as concessões são temporárias e revertem ao Estado, pelo que o concessionário não passa de «Titulaire d'un droit réel de jouissance, à objectif limité» (Josserand, Cours de droit civil, vol. 1.°, pp. 1483 e 1956), podendo ser desapossado da concessão e indemnizado, não pelo Estado, mas pelo seu sucessor, pelo que o artigo direito do proprietário do solo, o coclo usque ad inferos, se desdobra em três direitos imobiliários: o da superfície; o do jazigo do subsolo; o do valor da concessão, que é uma. espécie de imóvel por disposição da lei. 0 Brasil expurgou do seu Código Civil de 1916 toda a referência a exploração mineira, pois se limita a dizer que os minerais contidos no subsolo são acessórios do solo (artigo 61.º) e que são bens públicos os bens dominiais que constituem o património dos Estados, dos municípios ou da União, como objectos de direito pessoal ou real de cada uma dessas entidades (artigos 60.º a 67.º). A organização estadual da República Brasileira outorgou aos Estados componentes da União a atribuição de legislar sôbre as explorações mineiras das respectivas áreas. Afastou-se, assim, da tradição unitária do nosso interessante direito colonial antigo, cujo último grande diploma mineiro, a lei de 24 de Dezembro de 1734, acentuou pertencerem a Coroa «as minas de diamantes, assim como as de metais». Porém, a actual Constituição, de 10 de Novembro de 1937, regressa a tradição, pelo poder conferido à União de legislsr sôbre minas, que equipara a bens do domínio federal, deixando apenas aos Estados a faculdade de elaborar regulamentos e suprir as lacunas da lei federal sôbre as riquezas do subsolo, mineração, etc. (artigo 16.ª, base XIV, n.° 18.°, alínea a).
A Itália, cuja riqueza mineira foi sempre relativamente deminuta, manteve até há pouco as leis particulares das suas antigas regiões, que oscilavam entre o conceito do Direito Romano clássico (Digesto, VIII, 4; Comm. praed., 13, I) o qual nec privato nec publico nomine autorizava escavações em prédio alheio contra vontade de sen dono, e o conceito do Direito Bizantino (Cod. Theod., XI, 19, 10) que reconhecia a faculdade de abrir mima, compensando-se o dono da terra. As prementes necessidades da guerra de 1914-1918, dando lugar a publicação de vários diplomas pelo Govêrno de
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Roma, prepararam a elaboração do diploma unificador de 29 de Julho do 1927, inspirado no princípio da dominialidade, que subtraíu o subsolo à acessão do solo, em nome do interêsse público.
As concessões mineiras - diz Fulvio Maroi, professor da Faculdade de Direito de Turim (Enc. Ital., v. Miniera) - deixaram de ser autorizações dadas pelo dono do terreno, para se converterem em «vera concessioue amministrativa», com declaração na fôlha oficial e inscrição no registo predial e hipotecário, adquirindo assim «il carattere di un vero e proprio diritto patrimoniale di natureza reale».
Citamos apenas estes três países para não alongar o parecer. Bastantes são, no entanto, para mostrar que, não obstante a superfície do solo ser de um particular, existe o domínio do Estado sôbre as riquezas do subsolo, e a concessão, dada por êste, para elas serem exploradas representa um direito real patrimonial, susceptível de hipoteca. Assim o dizem, com efeito, expressamente, a citada lei francesa de 1919, artigo 1.°: o artigo 810.° do Código Civil brasileiro, que estende às minas e pedreiras o poderem ser objecto de hipoteca «independentemente do solo em que se acham»; a lei italiana, já referida, de 1927, n.° 1:443, segundo a qual o direito do concessionário é «idòneo a essere oggetto d'ipoteca».
Com tais autoridades e em tam boa companhia não há, pois, motivo para que entre nós se não adopte a mesma orientação.
4. Segundo o sistema da proposta, a hipoteca pode recair sôbre a concessão mineira:
a) Mediante autorização prévia do Governo;
b) Para garantia de créditos destinados a trabalhos mineiros.
Evidentemente, a primeira cláusula é de manter, dado o interesse público da concessão e as relações jurídicas entre o Estado e o concessionário, tanto mais que é tradicional na nossa legislação, e existe nas alheias, a intervenção do Governo em todos os actos da exploração mineira que possam contender com a propriedade do Estado, a índole da concessão ou mesmo o plano da lavra da mina. A nossa lei de minas em vigor, por exemplo, determina a autorizaçao do Governo para o fraccionamento ou redução da área da concessão (artigo 49.°), seu arrendamento ou transmissão (artigo 51.°), e estatue, como já dissemos, que sem tal autorização não podem vàlidamente ser celebrados quaisquer contratos, competindo ao Ministro do Comércio e Indústria certificar-se não só das respectivas garantias, mas também da idoneidade dos contratantes (artigo 50.°).
A segunda cláusula, cumulativa, é possível que, na prática, pareça por vezes platónica; mas não pode duvidar-se de que está rigorosamente dentro dos princípios que informam o regime mineiro, não passando a sua mais ou menos perfeita observância de simples tarefa de fiscalização administrativa.
5. A hipoteca mineira poderá ser simples ou com declaração de cessão.
Na hipoteca simples, o credor, idênticamente aos demais credores hipotecários cuja preferência é regulada pelo Código Civil, tem o direito de requerer o pagamento do seu crédito, por meio do processo de execução competente, o qual segue no tribunal judicial os trâmites ordinários até ao acto da hasta pública. Só nesta altura o processo assume carácter de especial, pois que, em vez da arrematação, o juiz requisitará à Direcção Geral de Minas a abertura de concurso para adjudicação da concessão, e fixará o montante da quantia que, como base do pedido, cada concorrente há-de depositar;
e só no caso de não aparecerem concorrentes a novo concurso, com redução de metade na base de licitação, poderá o credor requerer a entrega da concessão, no prazo de quinze dias, sob pena de a mina ser considerada livre para nova concessão.
Àparte as modalidades desta forma processual, é a hipoteca simples a que está prevista, como regra, em quási todas as legislações.
Na hipoteca com declaração de cessão, o credor que tiver de usar da execução não necessita de promover a arrematação da mina hipotecada, visto que, munido da decisão judicial, toma a posição do executado concessionário, da qual só pode ser inibido se lhe não for reconhecida a necessária capacidade financeira e a idoneidade técnica, sua ou do seu proposto. Não o diz a proposta, mas êste reconhecimento deve ser atribuição da Direcção Geral de Minas, com homologação do Ministro.
Ambas estas espécies de hipotecas têm a sua razão de ser.
As circunstâncias peculiares dos empreendimentos mineiros não são de molde a atrair a confiança dos capitalistas, a não ser que uma mineração, já em plena actividade, ofereça tal possança que a sua reputação de solidez rapidamente se estabeleça. É o caso dos poderosos jazigos de carvão, de ferro, de cobre, de mercúrio, de diamantes, etc., aos quais acodem capitais, fàcilmente obtidos por meio da emissão de acções ou obrigações, de letras, e, quando muito, da hipoteca simples, do tipo proposto.
Mas há outros jazigos minerais, aqueles em que o credor, por circunstâncias várias, se arrisca a perder tudo ou quási tudo, e êsses só podem oferecer uma garantia aproveitável: a de o credor continuar a exploração, pondo em jôgo recursos financeiros e experimentados técnicos, para aproveitar as despesas, por vezes muito avultadas, do primeiro estabelecimento. É a hipótese prevista para a hipoteca com declaração de cessão.
A Câmara Corporativa não repele, nem olha com desconfiança, estas novas aplicações do direito hipotecário. 0 direito está, por natureza, em constante evolução. A hipoteca, que clàssicamente se adstringia à cousa imóvel, já mesmo entre nós se aplica sôbre navios e sobre viaturas automóveis. A França, que já tinha a hipoteca marítima, criou, por lei de 5 de Julho de 1917, a hipoteca flurial e, por lei de 9 de Setembro de 1919, estabeleceu a hipoteca mineira. 0 direito civil germânico criou as cédulas hipotecárias, em que a hipoteca surge como que independente do crédito, e o moderno Código Civil Alemão (§ 1117), tal como a nossa legislação posterior ao Código Civil e tal como a lei hipotecária espanhola (artigos 142.° e 143.°), admite a hipoteca para garantia de créditos futuros e eventuais. Na Itália também se está entendendo que, em face dos artigos 1969.°, n.ºs 3.° e 4.°, e 2007.° do Código Civil, «non si dubbita che si possono avere ipotechi per crediti eventuali» (F. Maroi, cit.). Facilitar a mobilização de créditos em favor da indústria mineira, que tanto interessa desenvolver, adaptando o regime hipotecário à natureza especial das concessões, e, portanto, intento muito de aplaudir.
6. Uma séria objecção acode, no entanto, desde já:
Como conciliar o direito do credor hipotecário com o direito que o Estado se reserva, em nome do interêsse público e na sua função dominial, de decretar a caducidade da concessão?
Segundo o artigo 90.° da lei de minas de 1930, as concessões revertem para o Estado tanto em virtude de desistência do concessionário, como por aplicação da pena de caducidade, estabelecida nos artigos 83.° e
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83.° Os motivos, taxativamente indicados, são quatro, e, segundo a presente proposta, acrescerá mais um, o que está previsto no n.° 3.º da base VI.
Do mesmo modo, a já citada lei ultramarina de 1906 estabelece também (artigo 144.°) a sanção da «perda de direitos mineiros», com reversão da concessão para o Estado, aplicável em circunstâncias numerosas, especificadas em vinte e um artigos, sem embargo de haver ainda a pena de «apreensão e confiscação», aplicável nos casos dos artigos 19.º e 118.°
Ora, se ate agora não coexistiram pràticamente a hipoteca e a caducidade na metrópole, certo e que tem coexistido no ultramar desde 1906, onde o concessionário pode hipotecar a concessão, embora só prèviamente autorizado, sendo obrigado a enviar pública-forma do contrato a autoridade que fez a concessão, para ser junta ao processo depois de registada no livro competente (artigo 128.°). Isto se tem feito sem embaraços, pois não tem havido necessidade de alterar a lei, que vigora ha tam longo decurso de tempo, sendo de notar que as ligeiras modificações feitas a referida lei de 20 de Setembro de 1906 pelo decreto n.° 23:704, de 26 de Marco de 1934, apenas respeitam as pesquisas mineiras e revogam a alínea d) do artigo 19.° e o artigo 140.°, que se não referem a encargos da concessão.
Em verdade, não ha motivo para atritos quanto a hipoteca simples, que é a unnica prevista para as colónias, visto que esta espécie de hipoteca não obriga a tradição imediata da concessão mineira para a posse do credor.
Ao invés do que se dá com as hipotecas do solo, que constituem ónus real dêste e o acompanham até liquidação da divida, a hipoteca mineira não atinge os ricos depósitos do subsolo, que, como bens do Estado, continuam sempre virtualmente livres, para serem explorados por aquele a quem fôr outorgado o poder legal para tanto, isto é, a concessão.
Deste modo, o credor hipotecário assegura-se da preferência para pagamento de seu crédito pelo produto da liquidação da concessão mineira, e nada mais pode esperar que a efectivação judicial dêsse privilégio, quando a requeira. Corre o risco, como qualquer outro credor hipotecário comum, de não receber a totalidade, ou mesmo parte, do seu crédito, se foi imprudente no montante da quantia emprestada e a tempo não procurou, ou não obteve, o refôrço da hipoteca. A sua base de garantia e o valor que um novo concessionário tiver oferecido para tomar conta da exploração. Nem a outro fim conduz o mecanismo processual pôsto a funcionar nos termos dos n.ºs 4.º e 7.º da base X da proposta.
7. A hipoteca com declaração de cessão oferece-nos outro aspecto. É princípio do nosso direito civil (artigo 903.º do Código Civil) que o credor não pode, na falta do pagamento, apropriar-se do prédio hipotecado senão arrematando-o em praça. O artigo 765.º do Código Civil brasileiro insere, o mesmo princípio, por forma mais lata: é nula a cláusula que autoriza o credor penhoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objecto da garantia se a dívida não fôr paga no vencimento. Estes preceitos obedecem a fortes razões de ordem moral, que são obvias. Efectivamente, é para evitar que o credor possa receber, sem avaliação nem arrematação, o objecto destinado ao preferente pagamento de sen crédito, cujo valor é em regra, inferior ao dêsse objecto - abusando assim na inferior situação do devedor ou prejudicando os demais credores - , que as diversas legislações consignam preceitos como os citados e como os do artigo 304.º do Código Civil, referente ao penhor.
Ora a proposta diz que o credor «toma a posição do concessionário devedor». Poderemos interpretar esta maneira de dizer como se o legislador tivesse aqui o pensamento de fazer a transmissão da concessão para o credor, por meio de um traspasse obrigatório, incluindo activo e passivo?
Parece-nos que não, se tal modo a innovação contrariaria as regras do direito civil, que informam a instituição do crédito hipotecário ou penhoratício, e tais os perigos que dela podem resultar, quer para os demais devedores, quer para o próprio credor hipotecário. 0 concessionário de uma mina, pelo facto de hipotecar a sua concessão, não fica sòmente obrigado a pagar com esta a dívida hipotecária, pois responde por todas as dívidas que tiver contraído, com hipoteca ou não, e há-de assegurar o pagamento, não só com o direito e acessórios da concessão hipotecados, mas também com todos os seus outros haveres.
Tomar a posição do concessionário e, pois, simplesmente, como diz o relatório ministerial, o acto de o credor, em execução do sen crédito, registar a mina em seu nome, desde que satisfaça às condições legais, isto é, desde que «disponha da necessária capacidade financeira e, por si ou seu proposto, tenha a indispensável idoneidade técnica» - como e a própria expressão do texto do n.° 3.º da base X.
Mas, nestas condições, subsiste o grave óbice, que nem o relatório nem o texto da lei esclarecem: o credor da hipoteca com declaração de cessão fica com o direito de receber precipuamente a concessão, parando-se como que por suas mãos, sem se atender ao valor real, efectivo, da concessão e instalações acessórias e a existência de outros credores com direito a serem pagos pelo que sobrasse depois do descontado o valor do crédito hipotecário?
É manifesto que não pode ser assim. Se o fôsse, não deixaríamos de enunciar a nossa discordância.
Trata-se simplesmente de uma base legislativa, destinada a ulterior desenvolvimento, e neste se mostrará, por certo, que esta innovação introduzida no nosso direito mineiro, e também no nosso direito civil, irá sòmente até ao ponto de aplicar à hipoteca com declaração de cessão certos preceitos tradicionais do nosso direito sôbre o penhor, expressos no artigo 864.º do Código Civil já citado, equiparando assim a preferência que dá o penhor sôbre o móvel que dêle é objecto à preferência que, pela presente proposta, o credor fica tendo, não sôbre um imóvel, mas sôbre um direito à concessão administrativa da exploração de uma mina.
Segundo êsse artigo 804.º, podem as partes convencionar que a venda se faça extrajudicialmente ou que o credor fique com a cousa empenhada pela avaliação que fizerem louvados nomeados de comum acôrdo. Esta disposição não poderá, no entanto, ser aplicada tal qual está a concessão mineira. Por um lado, a venda da concessão só pode fazer-se por meio de concurso, com diversas condições legais pré-estabelecidas, perante a Direcção Geral de Minas, - e, aliás, na hipótese sujeita, nem tal concurso poderia ter lugar, visto que a concessão passa logo para, o credor e só para êle, a menos que renuncie ao seu direito.
Por outro lado, na louvação (dada a índole especial desta transmissão e a necessidade de acautelar interêsses, que podem ser muito valiosos, por parte de terceiros) deve exigir-se intervenção do Estado. Só assim se poderá esperar que esta espécie nova da hipoteca com declaração de cessão, sendo, como é, interessante, se não preste a que o credor, abusando do estado de depressão em que se encontrar o devedor, ou aproveitando-se do desinterêsse dêste pelo seguimento da execução, ou ainda mancomunando-se com êle, obtenha a conces-
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são por preço muito inferior ao real, com grave lesão de outros credores, quando não do próprio devedor.
8. Antolham-se-nos ainda outros problemas que suscitam a adopção da hipoteca com transmissão precípua da concessão.
Os artigos 48.° e 49.° da lei de minas de 1930, bem como o n.° 2.º da base IX desta proposta, prevêem dois casos em que se pode dar fraccionamento da concessão ou desmembramento de couto mineiro, ou redução das áreas respectivas, seja por iniciativa do concessionário, seja - e é a hipótese da proposta - por iniciativa do Ministro do Comércio e Indústria, ao fim de um ano de suspensão da lavra.
Parece-nos que a constituição de hipoteca com declaração de cessão terá como lógica consequência invalidar a faculdade que a lei dá ao concessionário de tomar a iniciativa de requerer e obter o fraccionamento ou a redução da área, a menos que o credor em tal expressamente consinta. Com efeito, o ónus hipotecário não pode acompanhar cada fracção, nem é de admitir a redução da área, contra vontade do credor, visto que a posição do devedor tem de ser, emquanto durar a hipoteca, igual à que tinha no momento da constituição desta, para que o credor goze, sem forçada deminuição, do direito de tomar a posição do concessionário, ou seja de ser investido na integridade da concessão que foi objecto da hipoteca. Tal é, segundo a base X, a característica essencial da garantia que o contrato lhe concede. Na nossa legislação há, de resto, uma situação jurídica semelhante a esta: a do prazo enfitêutico, que não pode ser reduzido nem desmembrado sem o expresso consentimento do senhorio directo.
Quanto à iniciativa do Ministro, prevista no n.° 2.° da base IX, é certo que apenas pode exercer-se sôbre os coutos mineiros, cujo desmembramento poderá fazer-se nas concessões que o constituem. Mas como o artigo 44.° do decreto n.° 18:743 diz que o conjunto de concessões denominado couto mineiro corresponde para todos os efeitos legais a uma só concessão, não nos repugna admitir que a hipoteca com declaração de cessão possa ser constituída sôbre êle, sem necessidade de um instrumento notarial acêrca de cada uma das concessões que o compõem.
Pelo facto, pois, de uma hipoteca com declaração de cessão ser constituída sôbre um couto mineiro, fica o Ministro privado do poder de o desmembrar emquanto tal hipoteca subsistir? A nossa resposta é pela afirmativa, pois prevalecem sempre as razões já dadas e deve entender-se que o Ministro, ao dar o consentimento para o contrato da hipoteca, desde logo aceita as consequências que desta derivam.
9. A dúvida que acabámos de expor pode parecer ociosa a quem observar que o Ministro só pode desmembrar os coutos mineiros quando haja decorrido um ano sôbre a suspensão da lavra das respectivas minas e portanto quando pode ordenar ou ter ordenado que se dê a concessão por caduca. Mas é precisamente aqui que reside novo aspecto da questão, que é necessário encarar e resolver. A base X, ao passo que detalhadamente regula acûrca do credor por hipoteca simples, designando-lhe mesmo um prazo terminal de quinze dias para declarar se quere ficar com a concessão, nada estabelece quanto à outra espécie de hipoteca. No entanto, corrigir a partir daqui não se trata só de execução judicial; pode dar-se também a circunstância de o concessionário abandonar a exploração da concessão, bem como a de, por facto dêle, lhe ser dada por caduca a mesma concessão; em qualquer destas circunstâncias nos parece dever ficar expresso que o credor hipotecário com declaração de cessão seja notificado para usar do seu direito de se substituir ao concessionário devedor, independentemente da execução, que não chegou a intentar.
10. 0 n.° 1.° da base X determina que o registo das hipotecas mineiras será feito na Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos.
Êste registo não pode ser facultativo; e forçoso que seja obrigatório; e, como se vê do n.° 5.°, tem de compreender, além da concessão pròpriamente dita, os seus acessórios, sem os quais, aliás, a concessão se desvalorizaria. É o que acontece com as fabricas, sujeitas a registo nas conservatórias do registo predial, para as quais o artigo 180.º, § 3.°, do respectivo Código estatue que, além dos edifícios, logradouros e pertenças, se compreendem na hipoteca os maquinismos e móveis destinados à exploração, inventariados no título constitutivo da hipoteca, os quais não poderão ser alienados, onerados ou retirados dos respectivos edifícios sem licença do credor.
É certo que junto as minas existem instalações que, além da maquinaria, representam por vezes edificações muito valiosas. Sôbre estas temos a informação de que já tem sido admitidos registos hipotecários em algumas conservatórias do registo predial como destacadas da exploração mineira. Mas ha manifesto inconveniente para o regular funcionamento das minas, e portanto para o interêsse nacional, em admitir que se subtraiam a exploração de uma concessão mineira os acessórios que lhe pertencem, ou pelo menos os essenciais.
Deve por isso ser explicito que a pessoa, singular ou colectiva, que se garantir com hipoteca mineira, seja uma só para a concessão e para as instalações acessórias, que serão especificadas no instrumento da celebração do contrato hipotecário.
Quanto à repartição em que se há-de fazer o registo, trata-se de mais uma especialidade da proposta, todavia similar da adoptada para as colónias, onde, como já se disse, o artigo 128.° da lei de 20 de Setembro de 1906 manda que do contrato de hipoteca se envie certidão a autoridade que fez a concessão, a fim de ser registada no livro competente.
Êste sistema tem vantagem e pode ter desvantagem. Os problemas de caracter jurídico que um registo pode suscitar são frequentes e por vezes melindrosos, pelo que só devem ser confiados a pessoa especializada ; e também podem estar registadas na conservatória do registo predial da área da mina outras hipotecas - quer sôbre o solo, quer sôbre o subsolo não compreendido na exploração mineira, quer sôbre edifícios e até, segundo já se referiu, sôbre adjacências ou acessórios de mina - que possam contender com o registo feito em diversa repartição.
Por êste lado, seria de aconselhar que se fizesse o registo nas conservatórias do registo predial, embora com obrigação de ser logo enviada certidão do registo a Direcção Geral de Minas, a fim de ali ser transcrito e anotado.
A circunstância de as explorações mineiras se estenderem, por vezes, a área de mais de uma conservatória, quer pela extensão subterrânea das minas, quer pela constituição de um couto mineiro, não obstaria àquele registo, pois se poderá determinar que seja competente a conservatória da área em que estiver a bôca ou entrada principal da mina, ou a sede do couto.
Por outro lado, todavia, e de reconhecer que todos os registos referentes as concessões, compreendendo a sua história legal, desde o início das pesquisas até ao alvará de concessão, ao arrendamento, as transmissões, aos fraccionamentos, aos contratos autorizados de toda
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a natureza, são exclusivamente feitos na Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos e que a concentração dos registos em uma só repartição central pode tornar mais fáceis as diligências e consultas dos interessados e poupar-lhes algumas despesas.
De resto, o exemplo das conservatórias especiais já está dado, entre nós, com as do registo comercial e da propriedade automóvel.
11. Finalmente, a base X, n.ºs 4 a 7, estabelece um processo especial para a execução fundada em hipoteca mineira simples.
Trata-se sòmente de bases, que não carecem de conter preceitos minuciosos. No entanto, parece-nos que nelas convenientemente foram delineados os tramites a seguir depois de a execução chegar ao ponto em que compete ordenar a hasta pública, de modo que esta se efective por intermédio da Direcção Geral de Minas e com as fórmulas do concurso para nova concessão. 0 credor hipotecário, seguro pelo seu direito de preferência, conforme a prioridade do registo, é pago do que lhe fôr devido pelo produto obtido. Não diz a base o que se fará quando haja mais de um credor e a quantia obtida exceda o valor do crédito hipotecário que justificou a execução ; mas nem é preciso dizer que, para o omisso, regulação as disposições aplicáveis do Código do Processo Civil».
É esta Câmara de parecer que devem ser aprovadas todas as sugestões apresentadas pela secção de Justiça, bem como as rectificações, por ela elaboradas, da base X da proposta de lei, que será transcrita adiante, no seu lugar proprio.
ASE XI
Para o estudo e crítica da base XI foi designada a secção de Finanças e economia geral desta Câmara, que apresentou o seu parecer subsidiário, que se transcreve na íntegra, e do qual foi relator o digno Procurador desta Câmara Dr. Albino Vieira da Rocha:
«A secção de Finanças e economia geral foi designada para emitir parecer acêrca da base Xi da proposta de lei n.° 50, sôbre fomento mineiro. Consta esta base de dois números, onde se contêm duas isenções. No primeiro número é autorizado o Govêrno a conceder a isenção de direitos de importação para maquinas, utensílios e materiais não susceptíveis de ser econòmicamente produzidos no País e que se destinem a instalações que as empresas mineiras se proponham fazer, mediante plano aprovado pela Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos, para tratamento e transformação dos minérios extraídos.
A secção de Finanças e economia geral e de parecer que êste número deve ser aprovado com a redacção proposta, adicionando-se à palavra «máquinas» a expressão «e suas pertenças».
Ha na realidade cousas que não estão nem são integradas nas máquinas e que no entanto podem considerar-se como pertenças destas para o efeito do seu complete funcionamento, tais como grelhas, crivos, maxilares de quebradores, esferas para moinhos de bolas, etc.
Também a estas pertenças deve ser concedida a isenção proposta para as próprias máquinas.
No segundo número o Govêrno e autorizado a conceder a isenção de contribuição industrial durante cinco anos as emprêsas que se proponham instalar novas indústrias destinadas ao aproveitamento e transformação de minérios nacionais.
Também a secção de Finanças é de parecer que êste número deve ser aprovado com as seguintes alterações:
Deve ser retirado o limite de prazo. 0 Govêrno ficará autorizado a conceder a isenção da contribuição industrial pelo prazo que julgar necessário em cada caso concreto.
Tratando-se de instalar novas indústrias para o aproveitamento e tratamento de minérios nacionais e não apenas uma determinada indústria ou várias indústrias para o aproveitamento e tratamento da um determinado minério, parece mais razoável que o Govêrno fique árbitro de fixar em cada caso concreto a duração do prazo da isenção.
Já a lei n.° 677, de 13 de Abril de 1917, isentava de imposto proporcional os carvões fósseis e os minérios de ferro e outros metais aplicados na indústria siderúrgica nacional e dispunha que os estabelecimentos metalúrgicos em que se tratassem aqueles minérios de ferro ficavam isentos do imposto industrial durante cinte anos.
O decreto n.° 18:713, de 11 de Julho de 1930, isentava de contribuição industrial durante quinze anos, a contar da instalação, os estabelecimentos metalúrgicos em que fôssem tratados minérios de ferro e de imposto proporcional os carvões minerais e os minérios de ferro quando aplicados na indústria siderúrgica nacional.
Também à expressão «novas indústrias» se deve acrescentar a expressão «e novos processos industriais», pois as mesmas razões de protecção as «novas indústrias de aproveitamento e transformação de minérios justificam que idêntica protecção se estenda aos novos processos indústriais ».
Oxalá que os trabalhos de prospecção e pesquisa a realizar pelo Govêrno em execução do plano do reconhecimento mineiro do País venham demonstrar a realidade da antiga suspeita de que o subsolo de Portugal é rico de existências minerais utilizáveis e que assim se manifestem as condições para que sejam coroados de êxito os sacrifícios consentidos pelo Estado e traduzidos nas isenções concedidas».
É esta Câmara de parecer que devem ser aprovadas todas as sugestões apresentadas pela sua secção de Finanças e economia geral, fazendo, porém, notar que a isenção de direitos ali proposta devia ser, nas mesmas condições, extensiva as máquinas e suas pertenças, utensílios e materiais destinados a desmontes e mais serviços necessários às explorações mineiras.
É da maior justiça o que se sugere e muito contribuiria para o desenvolvimento da indústria mineira no nosso País, tanto mais que se trata de maquinas e outras peças que a indústria nacional não pode fabricar, não só por serem de aços especiais, como por corresponderem a patentes de invenção entregues a determinadas fábricas que detêm o exclusivo do seu fabrico.
Por outro lado, não é para estranhar a sugestão apresentada per esta Câmara, pois que de igual modo se precede, já há bastante tempo, com as máquinas e outros produtos da indústria destinados:
As mimas de carvão, decretos n.° 11:852, de 3 de Julho de 1926, n.° 25:379, de 2 de Julho de 1935, e n.° 27:249, de 24 de Novembro de 1936;
A construção e reparação de estradas, artigo 17.º do decreto n.º 10:244, de 3 de Novembro de 1924;
Ao material fixo e circulante de caminhos de ferro, decreto n.° 13:829, de 11 de Junho de 1927;
Às empreitadas de portos de mar, isenções e importações temporárias, decretos n.° 19:464, de 11
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de Março de 1931, 11.° 22:555, de 22 de Maio de 1933, e n.° 24:934, de 10 de Janeiro de 1935; As empreitadas de obras públicas e outras.
Poder-se-á alegar que são quasi todos êsses trabalhos de interêsse público e geral; porém as explorações mineiras não o são menos. As minas são uma propriedade do Estado que permite a sua exploração a particulares.
Não se pode deixar de ter em conta que as explorações mineiras, em geral, surgem em locais distantes, onde nunca poderia ser montada qualquer indústria, por nada haver que o indicasse.
Aí vão as minas proporcionar, possìvelmente por muito tempo, a vida, o trabalho e o pão a populações que viviam, por vezes, em plena miséria, e que, melhorando assim as condições da sua existência, muito modificarão, pelo seu número e novas possibilidades, a feição da sua terra.
Por outro lado vemos que as máquinas aplicadas nas empreitadas de estradas, como, por exemplo, os quebradores, vem substituir os nossos excelentes operários britadores e privá-los do seu trabalho útil e económico, pois dão grande rendimento com reduzido desperdício; ao passo que os mesmos quebradores mecânicos se tornam indispensáveis nas minas, onde não é possível uma preparação de minério de grande importância não recorrendo aquele meio mecânico, sem o qual grande número de explorações mineiras ficariam impossibilitadas de trabalhar.
A rectificação da base XI, de harmonia com as sugestões apresentadas, será redigida adiante, no sen lugar próprio.
BASE XII
Para o estudo e crítica da base XII foi designada a secção de Transportes e turismo desta Câmara, que apresentou o seu parecer subsidiário, que se transcreve na Integra, e do qual foi relator o digno Procurador desta Câmara o engenheiro António de Vasconcelos Correia:
«A secção de Transportes e turismo da Câmara Corporativa, consultada subsidiàriamente sôbre a base XII da proposta de lei n.° 50, relativa a fomento mineiro, vem apresentar o seu parecer.
De um modo geral concorda esta secção com a idea fundamental a que obedece a base em estudo.
Entende, porém, que convirá introduzir algumas modificações na sua redacção, conforme a sugestão que junta e que a seguir se procura justificar.
Toda a exploração mineira que não utilize à bôca da mina a mineiros que dela se extraem tem fatalmente de contar, na avaliação das suas despesas globais, com uma verba para o transporte dêsses minérios e, portanto, não é apenas o custo dêsse transporte que torna viável ou não essa exploração.
Do confronto entre o conjunto de todas as despesas e encargos que oneram a exploração mineira até à entrega dos seus produtos ao seu comprador e as possibilidades de receita derivadas da natureza dos minérios extraídos e das circunstâncias mais ou menos favoráveis que se encontrem nos mercados consumidores é que poderá tirar-se a conclusão se a laboração da mina é ou não econònicamente viável.
Por esta razão julgou-se conveniente dár uma forma ligeiramente diferente às primeiras considerações do n.º 1.° da base que se comenta.
Como possível auxílio a certas explorações mineiras, menciona a proposta de lei n.° 50 a faculdade de o Govêrno poder:
a) Isentar de imposto ferroviário o transporte, no País, dos minérios em questão;
b) Fixar uma tarifa especial compatível com as condições em que venha a fazer-se a exploração mineira de certos jazigos.
Analisemos cada uma destas alíneas separadamente:
a) A isenção do imposto ferroviário não se afigura a esta secção a forma mais recomendável para se prestar o auxílio que se pretende.
Aquele imposto tem destino fixado no decreto n.º 13:829, de 17 de Junho de 1927, e da sua importância total só 20 per cento revertem para o Tesouro. Os 80 por cento restantes são destinados ao Fundo especial de caminhos de ferro. Todas as disponibilidades deste têm de ser aplicadas em melhoramentos das instalações ferro via rias, como se determina no artigo 14.° do já citado decreto.
É facto bem conhecido que as receitas ferroviárias tem sofrido importantes deminuições desde 1929 e, por esse motivo, tem igualmente decrescido a importância do imposto ferroviário e, consequentemente, as receitas do Fundo especial.
Deste mal tem, naturalmente, resultado insuficientes dotações para obras que deviam ser custeadas pelas receitas daquele Fundo e atrasos na execução dêsses trabalhos.
Esta secção julga, por isto, inoportuno que sejam levados a conta do Fundo especial de caminhos de ferro encargos que êle não pode actualmente suportar por falta de disponibilidades e que não estão previstos na lei que o organizou.
Mais lógico parece que o subsídio que o Govêrno se resolver a dar a certas explorações mineiras provenha das receitas próprias das minas ou das receitas gerais do Estado, tanto mais que quer umas quer outras devem crescer por motivo do desenvolvimento da exploração mineira e dos transportar que lhe são inerentes.
Estas considerações levaram esta secção a sugerir um novo número, o n.º 7.°, no projecto da nova redacção da base XII.
No modo de ver desta secção, só seria aceitável o que a êste respeito vem mencionado na proposta de lei em estudo se o Fundo especial de caminhos de ferro pudesse ser compensado, por meio de novas receitas, dos encargos que sôbre êle recairiam em virtude do que e proposto nesta base.
b) A disposição que se refere a fixação de uma tarifa especial sem acôrdo prévio das emprêsas ferroviárias para o transporte de minérios desde o local da mina até no pôrto de embarque, como se indica no n.° 1.° da base XII, ou até ao local da sua transformação, como se menciona (no n.° 5.º da mesma base, e matéria nova em caminhos de ferro.
Não vê, entretanto, esta secção razões suficientes para repudiar o princípio em casos tam excepcionais como os previstos nesta base, mas parece-lhe vantajoso que as emprêsas, transportadoras sejam também ouvidas, quanto mais não seja a titulo informativo.
Na nova redacção que esta secção apresenta introduziu-se uma emenda neste sentido, no seu n.° 2.º
No n.º 3.° da proposta de lei em estudo julgou-se indispensável modificar a forma de levar a efeito a idea nela contida.
Em primeiro lugar não concorda esta secção com o recurso ao Fundo especial de caminhos de ferro, que se prevê no final dêste n.° 3.°, pelas razões que já expôs quando ha pouco tratou da isenção do imposto ferroviário, nem julga de aceitar o processo para o cálculo do reembolso indicado no mesmo número, porque a aplicação dêle criaria uma situação às emprêsas transporta-
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doras que se supõe não ser a que se pretende proporcionar-lhes.
Não se procura, certamente, impor às empresas transportadoras, em nenhuma hipótese, a obrigação de subsidiarem as empresas mineiras.
Compreende-se que o Estado o faça, desde que se dêem as circunstâncias previstas no n.° 1.° da base XII — para que as empresas mineiras nessas condições possam manter a sua exploração com alguns lucros, porque se os não tiverem certamente suspenderão a sua laboração.
Mas se às empresas mineiras se deseja assegurar um lucro, não deve este ser obtido à custa de prejuízos das empresas transportadoras, que também precisam realizar lucros para poder viver.
Quando o Estado entre no caminho de subsidiar certas empresas mineiras porque sem esse auxílio estas não possam manter a sua exploração, é razoável que as empresas ferroviárias reduzam, tanto quanto seja possível, o preço do transporte desses minérios, colaborando assim com o Estado para se tomar viável uma exploração mineira que é útil ao País. Mas esta redução não pode ir até ao ponto de se privarem as empresas transportadoras de qualquer margem de segurança e muito menos de terem como certo um prejuízo, que seria tanto maior quanto maior fosse a tonelagem de minérios que houvesse a transportar.
Nas condições indicadas na proposta de lei n.º 50 seria certo o prejuízo para as empresas ferroviárias, porque há importantes encargos e várias despesas que não poderiam ser incluídas na avaliação do reembolso previsto se se mantivesse a redacção do n.° 3.° da base XII.
De facto, com essa redacção, não poderiam ser considerados nem a renda fixa de 6 por cento da receita das antigas linhas do Estado, que é paga a este pelas empresas arrendatárias dessas linhas, nem o adicional de 5 por cento que há muitos anos incide sobre as receitas das tarifas especiais em vigor nas mesmas linhas e cujo produto reverte para a assistência aos ferroviários das linhas arrendadas, nem as despesas com o transporte de material vazio, que oneram os transportes de minérios por forma muito sensível, visto não haver quási nunca, entre nós, tráfego compensador entre o porto de embarque do minério e a mina, nem as despesas com água, óleos de lubrificação, materiais para em-panques, documentação, etc.
A redacção que lembramos para este n.° 3.° da base XII permite que sejam tidos em conta, para o cálculo daquele reembolso, todas as despesas e encargos ocasionados pelo transporte suplementar de qualquer tonelagem de minérios que se realize além da que já era transportada anteriormente. Não serão, porém, levadas em conta verbas para pagamento de juros ou amortização das obrigações emitidas pelas empresas, nem para qualquer amortização do custo das linhas, do material circulante ou de quaisquer instalações existentes na rede ferroviária, nem os referentes a despesas gerais dos serviços.
Esta secção entende, -ontudo, que à importância dos encargos e despesas que o transporte de qualquer tonelagem suplementar provoque deve acrescentar-se uma margem, que na hipótese que estamos considerando deve ser muito reduzida, e, por isso, na nova redacção que esta secção tem a honra de sugerir se fixa em 2 por cento daquela importância.
Servirá esta insignificante margem para fazer face a quaisquer imprevistos ou para assegurar um ligeirís-simo lucro, cuja legitimidade ninguém pode contestar.
Atendendo a que, em certos casos, poderá impor-se a necessidade de se recorrer à camionagem por não ser servida por caminho de ferro a mina a explorar, julgou-se conveniente o acrescentamento de mais um número à base xii, para se prever essa hipótese».
Nestes termos a secção de Transportes e turismo da Câmara Corporativa apresenta a, seguinte redacção base xii:
1.° Quando se verifique a existência de jazigos mineiros que, pela sua riqueza e extensão, convenha explorar, porque de tal exploração podo resultar não só a utilização de grande quantidade de pessoal, mas também o aproveitamento, em favor da economia nacional, de valores conservados inactivos, e que se reconheça a inviabilidade económica da sua exploração, mesmo que o preço de transportes por caminho de ferro tenha sido já reduzido em relação aos preços das tarifas em vigor, poderá o Govêrno fixar uma nova tarifa especial com preços ainda mais baixos para o transporte desses minérios desde o local da mina até ao porto de embarque que mais convenha utilizar, e bem assim conceder à empresa mineira respectiva um subsídio, de modo que se torne economicamente possível a exploração desses jazigos.
2.° A tarifa especial a que se refere esta base será fixada pelo Governo, ouvidas a Direcção Geral de Caminhos de Ferro, a Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos e as emprêsas de transporte interessadas.
3.° Quando a tarifa especial fixada nos termos dos numeras anteriores for insuficiente para cobrir a importância das despesas e encargos originados por este transporte suplementar acrescida de 2 por cento dessa importância, deverá o Governo reembolsar a empresa transportadora da insuficiência que houver.
4.° Compete à-s empresas ferroviárias, baseadas nas estatísticas gerais referentes à exploração de toda a rede a seu cargo, fazer a prova, perante a Direcção Geral de Caminhos de Ferro, da insuficiência do frete previsto na nova tarifa especial para cobertura da importância total a que se refere o inúmero anterior.
5.° A doutrina desta base é também aplicável ao transporte do minério até ao local da sua transformação no País, quando esta não possa realizar-se economicamente junto à mina.
6.° Quando haja conveniência em utilizar a camionagem como meio de transporte dos minérios nas condições previstas no n.° 1.°, poderá o Governo, ouvidos a Direcção Geral dos Serviços de Viação, a Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos e o Grémio dos Industriais de Transportes em Automóveis, fixar, para este serviço especial de camionagem, uma tarifa compatível com a natureza deste meio de transporte e tam reduzida quanto for possível.
7.° Para fazer face ao pagamento dos subsídios e reembolsos a que se refere esta base deverá no Orçamento Geral do Estado ser inscrita verba que para tal seja suficiente».
Quanto à primeira parte do parecer subsidiário desta secção de Transportes, tem esta Câmara a observar que muitas vezes o preço do transporte é bastante superior ao valor do próprio minério à boca da mina.
Nestes casos é, evidentemente, o custo dos transportes que impossibilita a exploração mineira e por isso procura o Governo, pelos meios ao seu alcance, dar, em alguns casos, a solução necessária a tal dificuldade,
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quer desonerando o transporte do imposto ferroviário, quer fixando uma tarifa especial. Julga, portanto, esta Câmara que é preferível e até necessário que se adopte a redacção proposta pelo Govêrno no n.° 1.° da base XII. No que diz respeito à alínea a) do referido parecer da secção de Transportes, na sua primeira parte, julga esta Câmara que as emprêsas ferroviárias não ficarão prejudicadas com a aplicação da isenção do imposto ferroviário e a isso se deverão subordinar, visto que não existe actualmente outro processo de beneficiar o custo dos transportes evitando o prejuízo directo das próprias emprêsas.
Como justificação do que vem de se dizer, lembra esta Câmara que a isenção do imposto ferroviário que se estabelece nesta base é perfeitamente compreensível. Em geral, as isenções de certos tributos que atingem determinada matéria colectável não se estabelecem senão para que certas actividades possam subsistir. 0 Estado atendendo ao interêsse colectivo, assegura, por essa forma, a essas actividades as suas indispensáveis condições de existência.
As emprêsas ferroviárias nada teriam a ganhar com a suspensão da lavra de uma mina, porque, não podendo esta trabalhar, percentagem alguma entraria no Fundo especial de caminhos de ferro. Uma vez essa mina em laboração activa, a emprêsa ferroviária que fornecesse os seus transportes não só receberia o equivalente a todas as despesas do transporte de minério, como a percentagem de 2 por cento sugerida pela própria secção de Transportes, e sòmente deixaria de entrar no Fundo especial a percentagem correspondente a êste Fundo, o que também se dava com a mina parada.
Quanto à segunda parte do referido parecer, ainda na sua alínea a), observa esta Câmara que o Fundo especial, longe de ter um destino absolutamente rígido, e só êsse, não o tem sido assim considerado, pois que a legislação tem permitido o reembôlso, com sacrifício dêsse mesmo Fundo, aos concessionários de minas de carvões nacionais e até aos exportadores de toros de madeira para minas.
A não ser que, de futuro, o Govêrno preveja, em orçamento, qualquer verba para ocorrer aos subsídios de transporte a que se refere a base em discussão; o auxílio que o Govêrno pretende conceder à indústria mineira só se poderá realizar recorrendo ao Fundo especial de caminhos de ferro.
Se o Govêrno encarasse qualquer outra possibilidade não teria proposto a presente solução; e, se o Fundo especial fôr insuficiente para o fim para que foi destinado, o Govêrno, certamente, lhe cocfederá os reforços necessários, como já o tem feito.
Consequentemente, esta Câmara não concorda com a oportunidade da introdução na base XII da doutrina contida no n.° 7.° do parecer apresentado pela secção de Transportes e turismo.
Quanto à fixação de tarifas especiais, não vê inconveniente algum que para isso sejam sempre ouvidas as emprêsas ferroviárias, antes pelo contrário.
Pelo que alvitra que a redacção do n.° 2.° da base XII seja substituída pela seguinte:
2.° A tarifa especial a que se refere esta base será fixada pelo Govêrno, ouvidas a Direcção Geral de Caminhos de Ferro, a Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos e as emprêsas transportadoras interessadas.
Impõe-se frisar de novo que muitas minas não podem manter a sua laboração, não pelo custo da sua exploração, mas sim pelo custo incomportável dos transportes.
Nestas condições, não é a exploração pròpriamente dita que o Govêrno pretende conceder o auxílio, mas sim deminuir o custo proibitivo dos transportes, beneficiando não só a mão de obra, como ainda as próprias emprêsas ferroviárias, por promover um mais intenso e constante tráfego nas suas linhas.
Entende esta Câmara justo que, além do pagamento do custo exacto do transporte dos minérios, e só esse, se admita a cobrança, pelas emprêsas transportadoras, de uma percentagem de 2 por cento, como margem de segurança, que pode até representar, per vezes, um pequeno lucro.
Lembra esta Câmara para o n.° 3.° da base XII a seguinte redacção:
3.° Quando a tarifa especial fixada nos termos do n.° 1.° seja insuficiente para cobrir o custo do transporte de minério acrescido de 2 por cento, poderá o Govêrno reembolsar a emprêsa transportadora da insuficiência que houver, por força do Fundo especial de caminhas de ferro, emquanto o não possa realizar de outra forma.
Quanto ao n.° 4.º da base XII, concorda esta Câmara com a redacção da proposta apresentada pelo Govêrno, visto que o que se pretende compensar e a insuficiência da importância destinada a cobrir o custo de um determinado transporte, o do minério, e não o de qualquer outro.
No que diz respeito ao n.° 3.° da base XII, julga esta Câmara indispensável esclarecer que a sua doutrina só será aplicada quando o tratamento ou transformação do minério no País não possa realizar-se econòmicamente junto a mina e, portanto, deverá adoptar-se a redacção sugerida pela secção de Transportes.
Quanto ao que se diz no referido parecer subsidiário da secção de Transportes e na sua redacção, alvitrada para o n.° 6.°, referente à camionagem, considera esta Câmara justa e da maior vantagem a introdução do mesmo principio, tanto mais que bastantes minas são obrigadas a utilizar êsse meio de transporte, único compatível com a sua situação.
Por isso, esta Câmara da a sua aprovação à redacção do n.° 6.° da base XII, que, não fazendo parte da proposta de lei apresentada, e agora sugerida pela secção de Transportes e turismo.
Atendendo a que as restituições as emprêsas ferroviárias, segundo julga esta Câmara, devem ser pagas pelo Fundo especial de caminhos de ferro, emquanto o não puderem ser de outra forma, dever-se-ia, equitativamente, prever a maneira de dar uma compensação correspondente, quando necessário, ao transporte por camionagem, a fim de esta ser levada a aceitar êsse transporte sem qualquer prejuízo e mesmo com uma pequena margem de lucro, como foi previsto no n.° 3.° desta base para as emprêsas ferroviárias.
Em conclusão, a Câmara Corporativa sugere as seguintes:
Alterações as bases propostas
BASE II
2.° Os trabalhos a que se refere esta base tanto poderão ser feitos em áreas declaradas cativas pelo Estado, como em zonas livres, como em áreas de concessões mineiras já dadas; mas se tiverem de ser empreendidos em zonas livres, deverão declarar cativas as respectivas áreas em relação as substancias em estudo.
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3.° O Ministerio do Comércio e Indústria poderá contratar o pessoal indispensável, nacional on estrangeiro, para a execução ou fiscalização dos trabalhos a que se refere esta base, e bem assim autorizar a ida ao estrangeiro de funcionários da Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos, para estudo de assuntos relacionados com prospecções e pesquisas mineiras no País.
BASE III
1.° No praso de sessenta dias, a contar da publicação desta lei, a Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos apresentara ao respectivo Conselho Superior um plano geral de reconhecimento mineiro do País, estabelecendo, em função da sua importância para a economia nacional, a ordem de precedência dos diversos minérios nos trabalhos a empreender. O parecer do Conselho Superior de Minas e Serviços Geológicos será submetido a despacho do Ministro do Comércio e Indústria no prazo de quinze dias, a contar da apresentação do plano geral da Direcção Geral.
2.° Uma vez aprovado, será o plano geral de reconhecimento mineiro realizado gradualmente, estabelecendo-se com a antecedência necessária o programa de trabalhos a executar em cada ano.
BASE IV
2.° 0 Estado pode adjudicar, em hasta pública, os trabalhos de prospecção e pesquisa em áreas cativas, reservando aos adjudicatários o direito a concessão dos jazigos evidenciados.
BASE V
1.° Quando, aprovado o programa de prospecção e pesquisa de determinado minério, se verifique ser necessário estender os trabalhos a áreas já concedidas, serão notificados os concessionários para escolherem um dos regimes seguintes:
a) Realizar os trabalhos por sua conta dentro de um prazo determinado, se ainda os não tiverem realizado;
b) Realizar esses trabalhos com subsidio do Estado;
c) Realização das pesquisas pelo Estado ou seus empreiteiros.
A fiscalização dos trabalhos a que se referem as alíneas anteriores, quando não empreendidos directamente pelo Estado, competira a Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos.
3.° Os detentores de concessões mineiras poderão, tendo em atenção o plano geral a que se refere a base III, requerer que sejam realizados ou subsidiados pelo Estado trabalhos de prospecção e pesquisa na area das suas concessões, mediante a obrigação de reembolso em prazo determinado, ou pagamento da taxa a que se refere o número anterior.
5.° 0 subsídio a que se refere esta base não poderá exceder 50 por cento do custo efectivo dos trabalhos e só poderá ser pago, uma vez aprovado o plano destes pela Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos, perante os documentos, confirmados pela fiscalização, comprovativos dos trabalhos que tiverem sido efectuados, em realização do mesmo plano, e das somas com eles despendidas.
6.° Em princípio, a taxa a que se refere esta base devera, tida em conta a riqueza evidenciada do jazigo, remunerar suficientemente o capital despendido e prover a sua amortização.
7.° No caso previsto no n.° 3.°, o subsidio ou a realização das pesquisas pelo Estado poderão ser condicionados por obrigações especiais, quanto a prazo de exploração, aproveitamento industrial e outras.
8.° No caso de haver pesquisas realizadas ou subsidiadas pelo Estado, serão excluídos da taxa e condições especiais os minérios evidenciados por trabalhos já realizados pelos concessionários.
9.° A reforma dos alvarás para a inscrição das taxas e obrigações especiais a que se referem os números anteriores desta base far-se-á sem encargo algum para o concessionário.
BASE VI
2.° A falta de cumprimento do disposto nesta base, não tendo justificação aceitável, dará lugar a aplicação das penas de multa ou de caducidade, conforme a sua gravidade.
BASE VII
0 Govêrno poderá definir, em relação as concessões mineiras, quais são os trabalhos que constituem lavra activa, entendendo-se sempre que a sua execução deve estar integrada num plano de aproveitamento oficialmente aprovado e a sua importancia ser proporcionada a da concessão e ao valor reconhecido do jazigo.
BASE VIII
A autorização para a transmissão de concessões mineiras em regime de suspensão de lavra não poderá ser dada sem o compromisso, por parte do adquirente, de, em determinado prazo, retomar a lavra activa e fazer as instalações julgadas indispensáveis, a não ser que a concessão adquirida se destine a constituir justa reserva de exploração activa, realizada em outra concessão, ou que constitua reserva reconhecida necessária a qualquer industria nacional.
BASE IX
1.° A demarcação de novos coutos mineiros terá, principalmente, como finalidade assegurar uma exploração remuneradora, pela manutenção de justas reservas, em harmonia com as suas instalações e actividade, as minas em lavra activa, e, de entre estas, em primeiro lugar, as que produzam materias primas próprias para as indústrias nacionais.
BASE X
1.° Sôbre as concessões mineiras, bem como sôbre as instalações acessórias, e para garantia de créditos destinados a trabalhos mineiros, pode ser constituída hipoteca, mediante prévia autorização do Ministério do Comércio e Indústria.
2.° 0 registo das hipotecas mineiras e obrigatório e compreenderá, além da concessão, as instalações acessórias, que serão inventariadas aos respectivos títulos constitutivos.
3.° São nulas as hipotecas sobre concessões mineiras cujos títulos constitutivos não fizerem expressa menção da autorização previa a que se refere o n.° 1.° e do inventario a que se refere o n.° 2.°
4.° As hipotecas mineiras podem ser simples ou com declaração de cessão. Estas, quando registadas, dão ao credor o direito de, pelo abandono ou pela caducidade da concessão, ou por meio de execução judicial, se substituir directamente ao concessionário devedor, não lhe podendo ser recusada pelo Governo a transmissão da concessão, desde que disponha da necessária capacidade financeira; e, por si ou seu proposto, tenha a indispen-
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sável idoneidade técnica. Se o credor não usar do seu direito no prazo que lhe fôr designado, esta hipoteca passara a ter apenas os efeitos da hipoteca simples.
5.º A hipoteca só será admitida a registo com declaração de cessão quando do seu titulo constitutivo constar a autorização expressa do devedor para tal efeito. 0 registo desta hipoteca impede, além da alienação da concessão e dos acessórios, o fraccionamento on a redução das áreas das concessões hipotecadas sem autorização expressa do respectivo credor.
6.° Logo que se realizem as condições necessárias para que o credor hipotecário com declaração de cessão vá substituir o concessionário devedor, proceder-se-á a avaliação do valor da transmissão, por meio de peritos, em maioria nomeados pelo Governo, e, descontada do montante da avaliação a importancia da divida, o credor depositara o que sobrar, a fim de se dar pagamento aos restantes credores, conforme fôr de lei, ou, caso os não haja, de se fazer entrega ao substituído.
N.°s 7.°, 8.°, 9.°, 10.°, respectivamente, como os n.ºs 4.°, 5.°, 6.° e 7.° da proposta.
BASE XI
1.° Fica o Govêrno autorizado a conceder isenção de direitos de importação para as maquinas e suas pertenças, utensilios e materiais não susceptíveis de ser economicamente produzidos no País e que se destinem a instalações que as empresas mineiras se proponham fazer, mediante piano aprovado pela Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos, para o desmonte, extracção, tratamento e transformação dos minérios.
2.° Igualmente fica o Governo autorizado a conceder isenção de contribuição industrial, pelo prazo que em cada caso julgar conveniente, as empresas que se proponham instalar novas industrias ou novos processes industriais destinados ao aproveitamento e transformação dos minérios nacionais.
BASE XII
1.° Quando se verifique que, por efeito das despesas de transporte no País, e economicamente inviável a exploração de jazigos mineiros que pela sua riqueza e extensão sejam susceptíveis de empregar grandes massas de mão de obra ou de representar aumento sensível de riqueza para a economia nacional, poderá o Govêrno isentar do imposto ferroviário os transportes desses minérios desde o local da mina até ao porto de embarque, e bem assim fixar uma tarifa especial compatível com a sua exploração.
2.° A tarifa especial a que se refere esta base será fixada pelo Governo, ouvidas a Direcção Geral de Caminhos de Ferro, a Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos e as empresas transportadoras interessadas.
3.° Quando a tarifa especial fixada nos termos do n.° 1.° seja insuficiente para cobrir o custo do transporte de minério, acrescido de 2 por cento, poderá o Govêrno reembolsar a emprêsa transportadora da insuficiência que houver, por fôrça do Fundo especial de caminhos de ferro, emquanto o não possa realizar de outra forma.
4.° Compete as companhias de caminhos de ferro fazer a prova, perante a respectiva Direcção Geral, da insuficiência do frete pago para cobertura das despesas a que se refere o número anterior.
5.° A doutrina desta base e também aplicável ao transporte do minério até ao local da sua transformação no País, quando esta não possa realizar-se economicamente junto a mina.
6.° Quando haja conveniência em utilizar a camionagem como meio de transporte dos minérios, nas condições previstas no n.° 1.°, poderá o Governo, ouvidos a Direcção Geral dos Serviços de Viação, a Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos e o Grémio dos Industriais de Transportes em Automóveis, fixar para êste serviço especial de camionagem uma tarifa compatível com a natureza deste meio de transporte, e tam reduzida quanto for possível.
BASE XIII
0 Ministro do Comércio e Indústria fica autorizado a publicar os regulamentos necessários a execução desta lei.
Palácio de S. Bento, 2 de Março de 1939.
António de Vasconcelos Correia (assessor, sem voto).
Leopoldo Barreiro Portas. Rui Enes Ulrich (vencido, por concordar inteiramente com o parecer subsidiário da secção de Transportes e turismo, discordando
pois das considerações da proposta apresentada com relação a base XII).
Albino Vieira da Rocha (vencido, pelas mesmas razões).
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Ezequiel de Campos.
José Caetano Mazziotti Salema Garção (relator).
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA