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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 68

ANO DE 1940 26 DE JANEIRO

II LEGISLATURA

SESSÃO N.º 67 DA ASSEMBLEA NACIONAL

Em 25 de Janeiro

Presidente o Exmo. Sr. José Alberto dos Reis

Secretários os Exmos. Srs. Gastão Carlos de Deus Figueira
Alexandre de Quental Calheiros Veloso

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 14 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado, com emendas, o último número do Diário das Sessões.
O Sr. Deputado João do Amaral enviou para a Mesa um requerimento.
O Sr. Presidente declarou que enluva nobre a, Mesa uma representação das Misericórdias do Campo Maior e do Alandroal solicitando da Assemblea a ratificação do decreto-lei n.º 30:131, que estabeleceu regra» acerca do pagamento e remição de foros.
O Sr. Presidente declarou ainda que estava na Mesa uma comunicação do Govêrno sobre as reclamações que foram feitas contra o decreto relativo ao pagamento e remição de foros.

Ordem do dia. - Entrando-se na ordem do dia, procedeu-se à discussão, na especialidade, da proposta de lei em que se converteu o decreto-lei que reorganizou os serviços do Gamara Municipal de Lisboa.
Foi aprovada, com alterações, após um debate em que intervieram os Srs. Deputados Cortês Lobão, Cario Borges, Formosinho Sanches, Pires de Lima, Madeira Pinto a Cancela de Abreu.

Srs. Deputados presentes à chamada, 73.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão, 1.
Srs. Deputados que faltaram à sessão, 8.

Srs. Deputados que responderam à chamada:

Abel Varzim da Cunha e Silva.
Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho.
Alberto Cruz.
Alberto Eduardo Valado Navarro.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre de Quental Calheiros Veloso.
Álvaro de Freitas Morna.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Álvaro Salvação Barreto.
André Francisco Navarro.
António de Almeida.
António de Almeida Pinto da Mota.
António Augusto Aires.
António Augusto Correia de Aguiar.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Hintze Ribeiro.
António Maria Pinheiro Torres.
António Rodrigues dos Santos Pedroso.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Artur Ribeiro Lopes.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto Cancela de Abreu.
Augusto Faustino dos Santos Crespo.
Augusto Pedrosa Pires de Lima.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Moura de Carvalho.
Clotário Luiz Supico Ribeiro Pinto.
D. Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho.
Fernando Tavares de Carvalho.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Nobre Guedes.
Francisco de Paula Leite Pinto.
Gabriel Maurício Teixeira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Guilhermino Alves Nunes.
Henrique Linhares de Lima.
João Antunes Guimarães.

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JOÃO Botto de Carvalho.
João Garcia Nunes Mexia.
João Luiz Augusto das Neves.
João Maria Teles de Sampaio Rio.
João Mendes da Costa Amaral.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim Rodrigues de Almeida.
Joaquim Saldanha.
José Alberto dos Reis.
José Alçada Guimarãis.
José Dias de Araújo Correia.
José Maria Braga da Cruz.
José Maria Dias Ferrão.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Juvenal Henriques de Araújo.
Luiz Augusto de Campos Metrass Moreira de Almeida.
Luiz Cincinato Cabral da Costa.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Figueira.
Luiz José de Pina Guimarãis.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Pestana dos Reis.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama van Zeller.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Pedro Augusto Pinto da Fonseca Botelho Neves.
Sebastião Garcia Ramires.
Sílvio Duarte de Belfort Cerqueira.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Borges.

Srs. Deputado que entrou durante a sessão:

Joaquim Diniz da Fonseca.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alfredo Delesque dos Santos Sintra.
Angelo César Machado.
João Garcia Pereira.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Pereira dos Santos Cabral.
Júlio Alberto de Sousa Schiappa de Azevedo.
Manuel Lopes de Almeida.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 7 minutos. Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 73 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 14 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário da última sessão.

O Sr. Antunes Guimarãis: - Sr. Presidente: desejo fazer umas pequenas rectificações ao Diário. Assim, na p. 139, col. 2.a, 1. 29.ª, onde se diz: «Lagoa», deve dizer-se: «Lapa»; na p. 140, col. 1.ª, 1. 24.ª e 49.ª, onde se lê respectivamente: «passara» e «regando», deve ler-se, pela mesma ordem: «passará» e «inundando».

O Sr. Presidente: - Se ninguém mais quere fazer uso da palavra sobre o Diário, considera-se aprovado, com as rectificações apresentadas pelo Sr. Deputado Antunes Guimarãis.

O Sr. João do Amaral: - Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte

Requerimento

Tendo chegado ao meu conhecimento que as Misericórdias do Alandroal e de Campo Maior distribuíram há dias no tribunal de Eivas unia acção de remição de toro pagável em ouro ou prata, com base no valor atribuível a êsse foro em face do disposto 110 decreto-lei n.º 30:131, pendente de ratificação da Assemblea Nacional, requeiro que, pelo Ministério do Interior, me seja confirmada ou infirmada esta notícia; me seja dito se a situação financeira daquelas Misericórdias ó de molde a permitir-lhes fazerem a remição do dito foro por força dos seus recursos normais; e, no caso de, para esse efeito, forem recorrido ao crédito, me seja dado conhecimento do nome da entidade com quem eventualmente tenham contraído um em préstimo o das condições de garantia e juro em que esse empréstimo se teria realizado.

Sala das Sessões, 25 de Janeiro de 1940. - O Deputado João Mendes da Costa Amaral.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa uma representação das Misericórdias de Campo Maior e do Alandroal solicitando da Assemblea Nacional a plena ratificação do decreto-lei n.º 30:131, que estabeleceu regras acerca do pagamento e remição de foros.

É a seguinte:

Sr. Presidente da Assemblea Nacional. - Excelência. - As Misericórdias de Campo Maior e do Alandroal vêm, no exercício do direito de representação, pedir à Assemblea Nacional, a que V. Ex.ª tam digna e distintamente preside, a plena ratificação, nos termos do § 3.º do artigo 109.º da Constituição, do decreto-lei n.º 30:131, de 14 de Dezembro de 1939, que estabeleceu regras acerca do pagamento e remição de foros.
Entendem as referidas Misericórdias que as providências do decreto são de, verdadeiro e importante interesse público.
Foram algumas delas solicitadas até dos Poderes Públicos pelos dois institutos de assistência. Corresponde o novo diploma plenamente a consideráveis interesses da economia nacional. Nestes interesses participam legitimamente ambas as Misericórdias, que são pessoas de utilidade pública administrativa, e todos os que precisam da assistência e beneficência que àquelas incumbem por lei.
Como lhes cumpria, chamaram ambas as Misericórdias para o assunto oportunamente a equitativa e douta atenção do Governo. Não obstante os motivos por que assim procederam, alguns interesses particulares ainda não lhes perdoaram a exposição que apresentaram aos Poderes Públicos.
Fala-se absurdamente, a pretexto do decreto-lei n.º 30:131, em falta de respeito ao caso julgado.
Imporia distinguir entre o papel dos tribunais e o de quem exerça a função legislativa. Os tribunais julgaram como entenderam poder e dever fazê-lo dentro da legislação vigente, que não podiam ultrapassar.
O decreto-lei fez na legislação anterior as alterações que considerou necessárias e deu entendimento autêntico a disposições que, segundo se convenceu, demandavam interpretação legislativa.
Não colide nem podia colidir o decreto com nenhum caso julgado. Na verdade, em matéria de modo de

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pagamento de prestações contratuais aplica-se a legislação em vigor ao tempo do pagamento efectivo. Desta forma, a semelhante respeito, antes da data do pagamento n à o pode haver nem direito adquirido, segundo a velha terminologia, nem situação jurídica individual ou. concreta, nem caso julgado.
Não podia nenhuma sentença constituir caso julgado acerca do modo de pagamento de prestações futuras. Neste campo não pode concretizar-se qualquer situação jurídica antes de definida e regulada pela legislação aplicável, que será somente a que venha a estar em vigor à data em que se tornem efectivos os pagamentos contratuais.
A qualquer sentença é impossível regular profeticamente situações jurídicas que, sobretudo nas convenções de trato sucessivo, e em especial no tocante a contratos perpétuos, como é a enfiteuse, se hão-de definir somente anos, ou porventura séculos depois, pois ocasião do pagamento, e em face do conhecimento, que só a esse tempo poderá haver, da legislação que então vigore e seja ao pagamento aplicável.

I

Quanto ao medo de pagamento de prestações em dinheiro somente podem vir a definir-se situações jurídicas individuais ou concretas, por ocasião dos pagamentos efectivos, em presença da legislação que então vigore sobre o assunto.

São vulgares na nossa legislação, como nas legislações estranhas, disposições com força de lei que se aplicam a pagamentos oriundos de actos e contratos celebrados na vigência de diplomas anteriores.
Se o pagamento em moeda obedece a disposições especiais que vigorem à data em que aquele se efectue não há, a semelhante respeito e antes dessa ocasião, direitos adquiridos, ou, como hoje se diz, situações subjectivas, individuais ou concretas. Nem poderia havê-las emquanto não se conhecessem as disposições legais que viriam a ser aplicáveis ao pagamento, quando se realizasse.
A lei francesa de 25 de Junho de 1928 substituiu o antigo franco, definido pela lei de 7 de Germinal do ano 11, por novo franco constituído por 65,5 miligramas de ouro fino do toque de 900 milésimos.
Depois a lei monetária, de 1 de Outubro de 1936 substituiu o franco de 1928 pelo franco novíssimo, que seria definido ulteriormente por decreto em Conselho de Ministros, mas cujo peso não deveria ser inferior a 43 miligramas nem superior a 49 miligramas de ouro fino do toque de 900 milésimos.
Veio mais tarde ainda o decreto-lei de 30 de Junho de 1937, que, prevendo nova depreciação do franco, determinou genericamente que o peso respectivo viesse a ser fixado por um decreto em Conselho de Ministros.
Os pagamentos internos provenientes de contratos anteriores respectivamente aos diplomas de 1928, 1936 e 1937 passavam a ser feitos em francos dos novos tipos.
Dos pagamentos em francos ouro estipulados anteriormente às novas definições legais do franco apenas deixavam de, ser feitos nas novas moedas os de carácter internacional, ou sejam os resultantes de contratos que implicassem dupla transferência do dinheiro - de França para outro país, e daí para França (lei de 25 de Junho de 1928. artigo 2.º, 2.ª parte; lei de 1 de Outubro de 1936, artigo 6.º; lei de 18 de Fevereiro de 1937, artigo 2.º). E isto somente por virtude de excepção expressa em favor dos pagamentos internacionais (Esmein, Radouart et Gabolde, t. VTI do Traité Pratique de Droit Civil, por Planiol et Ripert, n.ºs 1:181 e 1:185, pp. 516 e 519; Dalloz, Recueil Périodique et Critique, ano de 1936, notas à lei monetária de l de Outubro de 1936, pp. 395 e 396, e ano de 1937, notas à lei de 18 de Fevereiro de 1937, pp. 65 e 66).
Se são mandadas aplicar aos pagamentos em dinheiro disposições legais posteriores aos contratos de que os mesmos pagamentos resultam é de toda a evidência que, em relação a prestações em dinheiro e quanto à matéria, regida pela nova lei, não há direitos adquiridos, segundo a terminologia jurídica tradicional, ou situações jurídicas individuais ou concretas, senão depois de realizadas as prestações. Como poderia, ser de outro modo, se a lei que deve reger os pagamentos será a lei que, à data deles, venha a achar-se em vigor?
A lei que rege os pagamentos monetários não tem efeito retroactivo, por não ofender direitos que se possam considerar adquiridos. Mas quando, por absurdo, se considerasse retroactiva, nem por isso deixaria de ser válida nos países em que, como actualmente acontece no nosso, a não retroactividade não é preceito constitucional que obrigue o legislador e de que as leis ordinárias se não possam afastar. Não deixaria, nem de ser válida nem de ser o que há de mais habitual, pois as leis que regem os pagamentos monetários aplicam-se correntemente aos pagamentos feitos em virtude de contratos anteriores.
A lei de 25 de Junho de 1928 admitiu os pagamentos em moedas de prata até ao limite de 250 francos.
Esta disposição é aplicável aos pagamentos que resultam de contratos celebrados na vigência de legislação anterior.
Sobre o limite para os pagamentos, em moeda de prata observa-se, portanto, não a legislação vigente ao tempo do contrato, mas a que esteja em vigor ao tempo do pagamento.
O que se dá nos outros países depara-se-nos também em Portugal.
Assim, o § 1.º do novo texto do artigo 727.º do Código Civil (decreto n.º 19:126, de 16 de Dezembro de 1930) determinou: «Se à estipulação em escudos acrescer a de metal da moeda em que deve ser feito o pagamento, sem que aliás se tenha designado a espécie dela, o devedor fá-lo-á em moeda corrente ao tempo do pagamento, contanto que essa moeda seja do metal estipulado».
Não se invoca aqui esta disposição para se apurar se de algum modo foi afectada pelo preceituado no artigo 25.º do decreto n.º 19:869, de 9 de Junho de 1931, mas a fim de se pôr em relevo a tendência para fazer reger os pagamentos monetários, em todos ou alguns dos seus aspectos, não pela lei do tempo do contrato, mas pela lei da data do pagamento.
Pela lei de 22 de Maio de 1911 o limite para cada pagamento em prata era de 10$.
O § 2.º do novo texto (decreto n.º 19:126, de 16 de Dezembro de 1930) do artigo 724.º do Código Civil estabeleceu:
«Tendo-se estipulado que o pagamento deverá ser feito em moedas de ouro e prata, sem se fixar a proporção de umas e de outras, será esta proporção regulada pela dívida originária e, não sendo isto possível, pagará o devedor metade em ouro e metade em prata».
O decreto n.º 19:871, de 9 de Junho de 1931, fixou como limite genérico para os pagamentos em moeda de prata a importância de 200$.
Sobre o limite dos pagamentos em prata quanto a foros providenciaram os decretos n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931, e n.º 21:199, de 4 de Maio de 1932.
Mas aqui limitamo-nos a pôr em evidência que, acerca dos pagamentos em prata e ouro, se observa também a lei vigente ao tempo dos pagamentos, embora seja diferente da que vigorava ao tempo dos actos e contratos.
Não há, pois, a este respeito situação jurídica individual ou concreta antes do pagamento.

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II

Situações jurídicas individuais ou concretas em matéria de pagamentos nos contratos de trato sucessivo

É nesses contratos que mais ocasiões há de se aplicarem as disposições genéricas que vão sendo sucessivamente promulgadas sobre paga intuitos e, em geral, acerca do cumprimento dos contratos. Além disso, é com relação a contratos perpétuos e outros de trato sucessivo que se estabelecem mais disposições especiais sobre pagamentos, aplicáveis a actos ou contratos, embora anteriores. Hasta lembrar as disposições sobre arrendamentos e enfiteuse.
Assim, quanto às rendas a dinheiro dos prédios místicos, tem, ainda mesmo em relação aos arrendamentos a longo prazo, sido facultado o pagamento de metade da renda em géneros (lei n.º 1:368, de 21 de Setembro de 1922; lei n.º 1:645, de 4 de Agosto de 1924; decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931).
Pelo que toca às rendas em trigo, tem, ainda mesmo com respeito a arrendamentos a longo prazo, sido permitido o pagamento de metade das rendas em trigo e de metade em géneros de cultura habitual do prédio arrendado, ou na quantia correspondente (decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931).
O mesmo regime tem sido mandado aplicar a arrendamentos ou vendas de cortiça (lei n.º 1:645, de 4 de Agosto de 1924, e decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931).
Diversas leis têm permitido o aumento directo da própria importância das rendas.
Têm sido permitidos tais aumentos de rendas pelo que respeita aos prédios urbanos (lei n.º 1:368, de 21 de Setembro de 1922; lei n.º 1:662, de 4 de Setembro fie 1924; decreto n.º 10:289, de 30 de Março de 1928; decreto;
n.º 16:731, de 13 de Abril de 1929; decreto n.º 17:331, de 13 de Setembro de 1929; decreto n.º 19:101, de 4 de Dezembro de 1930; decreto n.º 21:887, de 11 de Novembro de 1932; decreto n.º 22:661, de 13 de Junho de 1933; decreto n.º 23:875, de 19 de Maio de 1934; decreto n.º 24:887, de 9 de Janeiro de 1935; decreto n.º 25:502, de 14 de Junho de 1935; decreto n.º 25:851, de 14 de Setembro de 1935; decreto n.º 26:492, de 2 de Abril de 1936).
A faculdade de aumentar as rendas tem abrangido os arrendamentos a longo prazo (v, g. lei n.º 1:368, artigo 24.º; decreto n.º 15:289, artigo 27.º).
Também se tem legislado: sobre a actualização dos foros em dinheiro (artigo 4.º, § único, da lei n.º 1:645, de 4 de Agosto de 1924; artigos 2.º e 3.º do decreto n.º 12:335, de 18 de Setembro de 1926; artigo 7.º, alínea b), e artigo 8.º do decreto n.º 20:188, de 8jle Agosto de 1931, e novo texto do referido artigo 7.º, alínea b), constante do artigo único do decreto n.º 21:199, de 4 de Maio de 1932); sobre a redução a dinheiro dos foros em géneros (artigo 4.º, pr. da lei n.º 1:645); e sobre o pagamento em géneros e dinheiro dos foros em dinheiro (artigo 2.º do decreto n.º 12:335).
Todas estas disposições têm sido aplicadas aos pagamentos, qualquer que fosse a legislação vigente ao tempo dos aforamentos respectivos.
Quanto aos pagamentos na remição do foro, também artigos 7.º e 8.º; decreto n.º 21:199, com a nova redacção do artigo 7.º do decreto n.º 20:188).
Em matéria de aforamento têm sido aplicadas a aforamentos celebrados na vigência de legislação «anterior providências importantíssimas, como a que, em
relação aos emprazamentos de pretérito!, permitiu a redução de prestações incertas a prestações certas, a requerimento dos foreiros (artigo 1692.º do Código Civil).
O decreto n.º 11 de 10 de Janeiro de 1895, confirmado por lei de 14 de Fevereiro de 1896, proibiu que se exigissem, ainda mesmo em virtude, de emprazamentos de pretérito, outras prestações além de foro e laudémio.
Escusado é dizer que mais radical do que todas estas reformas, que atingiram contratos anteriores, foi a faculdade de remição de foros, não obstante o carácter perpétuo da convenção (decreto de 30 de Setembro de 1892; decreto de 23 de Maio de 1911 lei n.º 1:645, de 4 de Agosto de 1924; decreto n.º 12:335, de 18 de Setembro de 1926; §§ 1.º e seguintes do novo texto, aprovado pelo decreto n.º 19:126, do artigo 1654.º do Código Civil).

III

O suposto caso julgado

É evidente que a sentença não pode constituir caso julgado quanto ao modo de pagamento de prestações futuras.
A matéria em que o direito aplicável somente possa ser definido e concretizado em face das leis que à data do pagamento das prestações futuras venham a estar em vigor, e que o tribunal não poderá prever, não deve considerar-se julgada definitiva e incondicionalmente por, sentença anterior ao pagamento.
Tudo o que, em relação a prestações posteriores à sentença, possa, vir a ser regulado por futuras leis que então estejam em vigor escapa, por sua própria natureza, à esfera, do caso julgado.
É pois absurdo dizer que ofendem caso julgado as leis que venham a promulgar-se depois da sentença e sejam aplicáveis aos pagamentos futuros.
Entendendo-se que as leis reguladoras dos pagamentos, e vigentes à data destes, se aplicam, embora os contratos tenham sido celebrados no domínio de legislação diferente, não é admissível que qualquer sentença nessa matéria envolva caso julgado acerca de pagamentos futuros. Ao tempo da sentença não pode haver situação jurídica individual ou concreta a esse respeito, por nem sequer se poder saber antecipadamente qual a lei que virá a ser aplicável.
É, pois, infantil falar-se, no tocante ao regime de pagamento das prestações futuras, em ofensa de um caso julgado, que nunca poderia abranger o que dependesse ou pudesse depender de legislação posterior à sentença.
Esta somente julga o que pode julgar, e não lhe cabe regular minuciosamente prestações futuras, pois o julgador nem sequer pode prever a legislação que lhes será aplicável.
Os efeitos restritos do caso julgado quanto ao regime dos futuros pagamentos são hoje até assinalados claramente na 2.ª parte do artigo 671.º do Código de Processo Civil.
Se não pode existir nem situação individual ou concreta, nem caso julgado, sôbre o modo de pagamento de prestações futuras, por se lhes dever aplicar a legislação que a semelhante respeito, venha a vigorar ao tempo do pagamento, é rigorosamente jurídico o preceituado no artigo 6.º do decreto-lei n.º 30:131, que determina:

O disposto nos artigos anteriores é aplicável a todos os foros já vencidos e ainda não pagos.

Como ao modo de pagamento se aplica a legislação que esteja em vigor, não à data do vencimento da pres-

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tacão, mas à data do seu efectivo pagamento, nada devia obstar à aplicação do decreto-lei n.º 30:131 a foros já vencidos, mas ainda não pagos, à data do decreto.
O artigo 6.º limita-se a fazer aplicação dos princípios gerais.
Diz explicitamente o que, implícita mas necessariamente, já resultava de todo o sistema do decreto.

IV

Razão de ser das disposições do decreto

É de toda a evidência a legitimidade das disposições legais para se aplicarem a pagamentos que venham a ser feitos em virtude de contratos celebrados no domínio da legislação anterior.
Deveriam, porém, ter sido estabelecidas as providências contidas no decreto-lei n.º 30:131, de 14 de Dezembro de 1939, sobre pagamento de foros em ouro, em ouro ou prata e em ouro e prata?

A disposição do decreto sobre pagamentos em ouro é mais favorável aos senhorios directos do que costumam ser as disposições genéricas acerca de pagamentos em ouro.
Para mais, é apenas a reprodução da legislação especialmente em vigor sôbre o assunto, ou seja da alínea a) do artigo 7.º do decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931.º
E, quando houvesse dúvidas sobre a aplicabilidade dessa disposição durante a suspensão da convertibilidade das notas do Banco de Portugal, viria o decreto-
lei n.º 30:131 resolvê-las como lei interpretativa.
Segundo o § 1.º do novo texto do artigo 727.º do Código Civil, quando à estipulação em escudos acresce a de metal da moeda em que deve ser feito o pagamento, sem que aliás se tenha designado a espécie dela, o devedor fá-lo-á em moeda corrente ao tempo do pagamento, contanto que essa moeda suja do metal estipulado.
A aplicar-se essa disposição, o pagamento deveria ser feito em moedas de ouro do novo regime monetário de 1931. E, como tais moedas não se acham cunhadas, far-se-ia o pagamento em papel. Qualquer ágio que se pagasse seria, porém, o correspondente às moedas com o peso de ouro fixado pelo novo regime e não às moedas com mais peso de ouro fino do que as correspondentes do regime monetário de 1911. Nestes termos, é evidente que se pagaria menos do que as quantias correspondentes à multiplicação do número de escudos por 24,444, ou seja menos do que a importância que os enfiteutas deveriam pagar segundo o decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931, rectificado pelo decreto n.º 21:199, de 4 de Maio de 1932.
O sistema do decreto-lei é, assim, muito mais favorável aos senhorios directos do que seria a aplicação da regra geral do artigo 727.º, § 2.º, do nosso Código Civil, que corresponde ao sistema que rege os pagamentos internos nas leis francesas de 1928, 1936 e 1937.
Não se trata de sistema novo, pois o decreto-lei n.º 30:131 não fez mais que reproduzir o disposto na alínea a) do artigo 7.º do decreto n.º 20:188, modificado pelo decreto n.º 21:199.
Mandou essa disposição aplicar ao pagamento dos foros em ouro resultantes de aforamentos anteriores a 31 de Dezembro de 1920 o disposto no artigo 25.º do decreto n.º 19:869, de 9 de Junho de 1931, onde, com respeito às obrigações anteriores a este diploma e relativas ao pagamento em escudos ouro, se determinou que se pagasse o número de escudos convencionado multiplicado por 24,444.
É certo ter-se sustentado que depois da suspensão, pelo decreto n.º 20:683, de 29 de Dezembro de 1931, da convertibilidade da nota deixou de se aplicar o artigo 25.º do decreto n.º 19:869.
Quando assim fosse, daí não se concluiria necessariamente que as obrigações em ouro contraídas antes do decreto n.º 19:869 deveriam ser pagas em escudos ouro do regime monetário anterior ou em escudos papel com o ágio correspondente.
Poderia perfeitamente concluir-se que as obrigações em ouro contraídas antes do decreto n.º 19:869 seriam, nos termos do § 1.º do artigo 727.º do Código Civil, pagas em escudos ouro do novo sistema ou em escudos papel com o ágio correspondente aos novos escudos ouro.
E se, por motivo de equidade, pode aconselhar-se outra solução quanto aos pagamentos de actos e contratos cuja execução importe pagamentos em países estrangeiros de matérias primas e de outras despesas, nenhumas considerações poderiam justificar solução idêntica acerca de foros, cujo recebimento pelo senhorio directo não implica a necessidade para este de pagamentos externos ou internacionais. Trata-se de pagamento puramente interno.
Não se justifica, por conseguinte, que, em consequência da suspensão da convertibilidade das notas, se pagassem em escudos ouro de 1911, ou com o ágio correspondente, as obrigações resultantes de contratos antigos.
E, de mais a mais, a aplicação do artigo 25.º do decreto n.º 19:869 em matéria de foros foi mantida pela nova redacção do decreto n.º 20:188, fixada, no decreto n.º 21:199, posterior ao diploma que suspendeu a convertibilidade das notas.
A aplicação do referido artigo 25.º, que, com relação aos foros, foi ordenada já dentro do período de inconvertibilidade de notas, é, portanto, independente da convertibilidade do papel do Banco de Portugal.
Quando, porém, pudesse haver dúvidas sobre o assunto, fê-las-ia resolvido legitimamente o decreto-lei n.º 30:131, que a este respeito seria lei interpretativa. Teria estabelecido como interpretação autêntica que, em matéria de foros ouro, a aplicação do artigo 25.º do decreto n.º 19:869 é independente de estar ou não em vigor a convertibilidade das notas do Banco de Portugal.

O artigo 9.º da lei monetária de 29 de Julho de 1854 estabeleceu, como limite máximo de admissibilidade obrigatória de pagamento com moedas do prata, a quantia de 5$000 réis. O § único desse artigo tirou, porém, toda a eficácia jurídica à cláusula do pagamento em ouro ou prata, pois, ainda neste caso, mandava observar aquele limite máximo.
O decreto com força de lei de 22 de Maio de 1911, que reformou o regime monetário, não reproduziu no artigo 8.º a disposição do § único do artigo 9.º da lei de 1854. Voltou, portanto, a ser válida e eficiente a estipulação do pagamento em ouro ou prata e a proceder-se à escolha que tal cláusula importava.
Também o artigo 3.º, § 2.ª, do decreto n.º 19:871, de 9 de Junho de 1931, admitiu o pagamento em ouro ou prata e a escolha correlativa, por isso que não reproduziu o disposto no § único do artigo 9.º da lei ao 1854.
Quanto, em especial, a pagamento de foros, o § único do artigo 7.º do decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931, admitiu claramente a cláusula de pagamento em ouro ou prata. Esse parágrafo supõe que se fixa em cada caso, segundo o contrato ou a lei, a espécie, metálica em que o pagamento deva ser feito, o que exclue o pagamento até 10$ em prata e de todo o resto

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em ouro. No caso de estipulação do pagamento de foros em prata ou ouro, pagar-se-ia, pois, tudo em prata, ou tudo em ouro, segundo a escolha fosse feita pelo devedor, se lha desse o contrato, ou se este nada dissesse, ou pelo credor, se o contrato assim o declarasse expressamente (artigos 733.º e 1691.º do Código Civil).
O texto do referido artigo 7.º do decreto n.º 20:188, reformado pelo decreto n.º 21:199, manteve o § único do texto daquele artigo. E o princípio do novo texto do artigo 7.º distingue entre o pagamento sou só em ouro, ou só em prata, ou em ouro ou prata, ou em ouro e prata». Portanto, no caso de pagamento em ouro ou prata, é permitida a escolha dum ou doutro metal por aquele a quem a escolha pertença por lei ou contrato.
Na vigência dessas disposições, se se escolhia o ouro, fazia-se o pagamento multiplicando-se o foro por 24,444 (v. artigo 7.º, alínea a). Se se escolhia prata, multiplicava-se a prestação pelo coeficiente 10 (artigo 7.º, alínea b). É claro que, pertencendo a escolha ao devedor, êste preferiria a prata, e pagaria o foro com a aplicação do coeficiente 10 se o emprazamento fosse anterior a 31 de Dezembro de 1920.
É esta hoje exactamente a doutrina do artigo 1.º, alínea c), do decreto-lei n.º 30:131.
Neste ponto o novo decreto manteve fundamentalmente o regime anterior.

O artigo 7.º do decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931, determinou que dos foros estipulados em ouro e prata e provenientes de contratos anteriores a 31 de Dezembro de 1920 se pagariam 10$ em prata e o restante em ouro (v. nova redacção dada ao referido artigo pelo decreto n.º 21:J99, de 4 de Maio de 1932).
Razões decisivas houve para se alterar esse regime, e designadamente:
Não haver nenhuma circunstância que justificasse regras diferentes para os foros, segundo resultassem de contratos celebrados ou antes de 31 de Dezembro de 1920 ou depois dessa data;
A circunstância de o decreto de 22 de Maio de 1911, na parte em que fixava a quantia de 10$ como limite máximo da admissibilidade obrigatória dos pagamentos em prata, ter, à data dos decretos n.ºs 20:188 e 21:199, sido já substituído pelo § 2.º do novo texto do artigo 727.º do Código Civil (decreto n.º 19:126, de 16 de Dezembro de 1930), e depois pelo § 2.º do artigo 3.º do decreto n.º 19:871, de 9 de Junho de 1931.
Nos termos do § 2.º do artigo 724.º do Código Civil, quando nem estivesse fixada a proporção de moedas de ouro e prata, nem pudesse regular-se pela da dívida originária, tinha o devedor de pagar metade em ouro e metade em prata.
Os §§ 2.º e 3.º do artigo 724.º compreendem evidentemente a estipulação de moedas de prata e ouro sem designação de certa e determinada espécie, e, quando, por absurdo, isso se não desse com respeito ao § 2.º, seria este aplicável por analogia ao caso de estipulação de ouro e prata, sem especificação de moeda, pois o novo texto do artigo 727.º não regula a estipulação do pagamento de escudos em moedas de um metal ou outro.
É claro que na enfiteuse a proporção não se podia regular pela origem da dívida, pois o foreiro nada pagou inicialmente e o senhorio directo não recebeu inicialmente qualquer quantia (artigos 1653.º e 1657.º do Código Civil). Os foros pagáveis em moeda de ouro ou prata deveriam, portanto, pagar-se metade em ouro e metade em prata.
O decreto n.º 19:871 estabeleceu como limite máximo para a admissibilidade obrigatória do pagamento em moeda de prata a quantia de 200$. Obedeceu o decreto n.º 19:871 a orientação análoga à da lei francesa de 20 de Junho de 1928, que fixou em 250 francos o limite máximo de admissibilidade obrigatória de pagamento em moedas de prata.
O limite máximo de 10$ provém do regime monetário de 1911 e não se compreende hoje.
Cumpria ao legislador aplicar aos foros ou o regime genérico do decreto n.º 19:871, ou o regime, também genérico do § 2.º do novo texto do artigo 723.º do Código Civil.
Optou o autor do decreto-lei n.º 30:131 pelo sistema do Código, que parece, com efeito, o mais; razoável, por estabelecer como limite para a prata uma percentagem (30 por cento) e fugir a um limite fixo, que muitas vezes poderia absorver a totalidade da prestação.

V

A suposta contradição entre as disposições do decreto-lei n.º 30:131 e a política económica do Estado Novo quanto ao contrato de enfiteuse.

Tem-se pretendido mostrar que as disposições do decreto-lei n.º 30:131 sobre os foros são contrárias à política económica que o Estado Novo deveria seguir com respeito à enfiteuse.
Essa política económica que se invoca seria naturalmente, segundo o conceito dos senhorios directos, aquela que lhes assegurasse maiores vantagens...
O decreto-lei n.º 30:131 limitou-se, em matéria de enfiteuse, ou a aplicar a legislação anterior, devidamente interpretada, ou a mandar observar as disposições gerais da lei civil, em vez de estabelecer para os enfiteutas disposições desfavoráveis de carácter excepcional.
As disposições do decreto são análogas a outras que constam de anteriores diplomas do Estado Novo.
A legislação do Estado Novo manteve e regulou o instituto da remição, que agora se pretende considerar invenção perigosa da economia liberal, e, quanto ao cálculo dos foros para os pagamentos anuais e para a remição, procurou evitar que, a pretexto de actualização, se onerassem demasiadamente os foreiros (decreto n.º 12:33-3, de 18 de Setembro de 1926; novo texto do artigo 1604.º do Código Civil, aprovado pelo decreto n.º 19:120, de 16 de Dezembro de 1930; artigo 7.º do decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931, modificado pelo decreto n.º 21:199, de 4 de Maio de 1932).
Não há no novo decreto, quanto a enfiteuse, orientação de política económica diferente da de diplomas anteriores.
Como já se demonstrou, quanto a pagamento dos foros em ouro, manteve o novo diploma o disposto no decreto n.º 20:188, confirmado nessa parte pelo decreto n.º 21:199, que foi expedido já depois de suspensa a convertibilidade das notas, e. portanto, é aplicável, apesar da actual inconvertibilidade.
Como também fica demonstrado, o decreto-lei n.º 30:131 aceitou, muito aos foros, doutrina muito mais favorável ao senhorio directo do que a que resultaria da aplicação do § 1.º do novo texto do artigo 727.º do Código Civil.
Pelo que toca aos pagamentos em ouro ou prata, manteve o decreto-lei n.º 30:131 o disposto nos artigos 733.º e 1691.º do Código Civil e no § único do artigo 7.º do decreto n.º 20:188.
No que diz respeito aos pagamentos; em ouro e prata, limitou-se o decreto-lei n.º 30:131 a aplicar, em matéria da enfiteuse, a disposição genérica tio § 2.º do novo texto do artigo 723.º do Código Civil.
Ficou o autor do decreto muito alguém da equiparação do emprazamento ao arrendamento, que, no concernente ao modo dos pagamentos em dinheiro, foi

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defendida no relatório do decreto n.º 12:335, de lá de Setembro de 1926.
Se, como aliás era natural, se equiparassem nessa parte os dois contratos, aplicar-se-ia aos foros o disposto no artigo 1.º do decreto n.º 9:498, de 14 de Março de 1924.
Se assim se procedesse, fosse qual fosse a data da. legislação em vigor ao tempo da celebração do emprazamento, os pagamentos deveriam fazer-se em moeda corrente na data em que se efectuassem.
Assim, seriam feitos hoje em notas correspondentes à importância nominal do foro, ou na pior das hipóteses, em moedas de ouro do regime monetário em vigor ao tempo do pagamento, ou a quantia equivalente em notas. A haver ágio, seria referido às novas moedas de manos peso de ouro fino e não às moedas de regime monetário anterior.
Seguindo-se a orientação definida no relatório do decreto n.º 13:335, de 18 de Setembro de 1926, deveria, pois, aplicar-se à enfiteuse o disposto no decreto n.º 9:496, de 4 de Marco de 1924, cuja doutrina corresponde à hoje estabelecida no § 5.º do novo texto do artigo 727.º do Código Civil.
Do exporto resulta a todas as luzes que o decreto-lei n.º 30:131 não só não contrariou directamente a política do Estado Novo em matéria, de enfiteuse, mas ficou até aquém do pensamento a. os se respeito definido no relatório do decreto n.º 12:335.

VI

O carácter de legislação por via geral no decreto-lei n.º 30:131. Razões de interesse público e urgência

Tem-se procurado negar ao decreto-lei n.º 30:131 o carácter de generalidade que se exige nas leis.
Houve duas representações, à Assemblea Nacional contra a ratificação do decreto-lei n.º 30:131 e nelas deu-se como provável que seja muito restrito o número de foros em ouro, ou em ouro ou prata, hoje existentes. A generalidade da regra não depende, porém; do maior ou menor número de casos a que possa aplicar-se praticamente. Como escreve Duguit: «a regra é geral, ainda que de facto não se aplique senão uma única vez».
Foram as regras do decreto-lei n.º 30:131 estabelecidas genérica e abstractamente para todos os foros, presentes ou futuros, estipulados em ouro, em ouro e prata ou em ouro ou prata. Satisfez, pois, plenamente aos requisitos de disposição por via geral e nenhuma importância tem a este respeito a averiguação mais ou menos fantasiosa do número de foros que haja ou ... possa vir a haver nas condições indicadas.
A verdade, porém, é que até agora, sem ser em consequência de qualquer especial indagação, chegou já ao conhecimento das Misericórdias de Campo Maior
e Alandroal a existência dos seguintes foros, de que falam as representações contra o decreto: fôro de 472$85, de que é senhorio directo o Conde de Ervideira; fôro de 160f, de que é senhorio directo Pedro Lamas; outro, de que é senhorio directo Luiz Barreiros Lopes; e outro, de que são enfiteutas os herdeiros do Conde da Azarujinha.
Também se tem negado que ao decreto-lei n.º 30:131 corresponda qualquer urgência ou necessidade pública (artigo 109.º, n.º 1.º e § 3.º da Constituição).
Trata-se de interesse público:
a) Porque são de interesse público as providências sobre foros e acerca das alterações que neles deva exercer a mudança do valor de compra da moeda;
b) Porque as providências sobre o modo de pagamento de foros em dinheiro interessam a algumas Misericórdias, e não somente estas são pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, senão também as suas receitas têm aplicações de interesse público, designadamente as que são do exercício obrigatório das mesmas corporações (artigo 373.º do Código Administrativo).
As Misericórdias são, pois, pessoas colectivas de utilidade pública administrativa (artigos 359.º, 372.º e seguintes do mencionado Código) e acham-se sujeitas à tutela administrativa e financeira do Estado, e designadamente do Governo, do Tribunal de Contas, dos governadores civis (artigos 360.º, 361.º, 362.º, 363.º, 364.º, 365.º, 366.º, 367.º, 36S.º, 369.º, 370.º, 372.º, § único, 373.º, § único, e 376.º). Podem até as Misericórdias propor ao Governo a expropriação, por utilidade pública e urgente, de prédios rústicos ou urbanos indispensáveis à. realização dos fins desses institutos (artigo 374.º). •
Acham-se .as deliberações e eleições das Misericórdias sujeitas ao contencioso administrativo (artigos 365.º, n.º 1.º, 700.º. n.ºs 6.º e 11.º, 703.º, 706.º é § único, 710.º, n.º 2.º, 711.º, n.º 2.º).
Quanto à urgência, no sentido que à expressão dão o artigo 109.º, n.º 2.º, e seu § 3.º da Constituição, basta lembrar, por exemplo, que su aprovaram nos termos dessas disposições os 138O artigos do novo Código de Processo Civil (decreto-lei n.º 29:637 de 28 de Maio de 1939). Quais dessas disposições teriam carácter mais urgente do que as do decreto-lei n.º 30:131, destinadas a evitar que se façam aos foreiros exigências gravosas contrárias à equidade e ao sentido geral da nossa legislação?!
Era de toda a urgência evitar, por exemplo, que pela natural demora na promulgação de leis no sentido estrito se forçassem instituições de utilidade pública administrativa a encargos pesadíssimos e injustificáveis e se lhes pudesse fazer perder o ensejo de remição em termos equitativos.

Se as providências do decreto-lei n.º 30:131 se terão de aplicar a pagamentos feitos na sua vigência, o mesmo acontece em todas as legislações com providências congéneres.
Por isso mesmo, quanto ao modo de pagamento de prestações futuras, não pode haver direitos adquiridos, situações jurídicas, individuais ou concretas e caso julgado antes de definido o direito aplicável aos pagamentos, a que somente pode fazer-se no próprio momento em que os pagamentos se tomem efectivos em presença da legislação que se ache entoo em vigor.
As disposições do decreto, que honra a alta e nobre inteligência e a rasgada iniciativa, do seu ilustre autor, conformam-se com as tendências gerais do novo direito e até com a política económica seguida pelo Estado Novo quanto ao contrato de enfiteuse.
Deva ser ratificado o decreto. Assim prestará a Assemblea Nacional novo e importante serviço ao Pais e fará justiça a mais uma página brilhante da largo obra reformadora, do estadista insigne que a pasta da Justiça.

As Misericórdias de Campo Maior e do Alandroal.

O Sr. Presidente: - Está também na Mesa, e vai ser publicada no Diário das Sessões, uma comunicação do Govêrno sobre as reclamações que foram feitas contra o decreto-lei relativo ao pagamento o remição de foros.

É a seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assemblea

I

1. Nas representações dirigidas à Assemblea Nacional por D. Ana Pedroso Barata e José Pequito Rebêlo

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contra o decreto-lei n.º 30:131, de 14 de Dezembro de 1939, publicadas no Diário das Sessões de 23 do corrente, diz-se que este diploma atingiu:
a) Princípios fundamentais em matéria do direito de propriedade;
b) O cidadão nas suas garantias;
c) E os tribunais na sua dignidade.
Nas representações pretende-se demonstrar a acusação através de observações sobre as ideas bases em que o decreto-lei se inspirou e nas soluções concretas que nele se encontram.
Começarei pelas observações de carácter geral.

2.«Julgo ver nela (na lei), com efeito, afirmações e disposições gravemente subversivas da ordem económica e social, de preceitos constitucionais, do espírito do Estado Novo e da Revolução Nacional, de normas fundamentais do direito e da justiça».
E porquê?
Porque a expressão que se encontra no relatório «a dissociação prolongada entre a propriedade e o trabalho se Lhe dá nos tempos actuais uma situação juridicamente protegida», quere dizer segundo o contexto que se entende protegida no sentido de tolerada, ou posta em precário, o que afecta o direito de propriedade em geral, vi Pt o a enfiteuse ser uma propriedade e esta uma instituição não menos nobre do que o trabalho, sendo até conveniente que exista uma forma de propriedade dissociada do trabalho para que se tenha uma noção exacta da sua autonomia;
b) Porque o diploma se integra na evolução que a enfiteuse teve no século passado e essa evolução é contrária ao direito de propriedade;
c)Porque a deminuição dos direitos do senhorio directo e da sua situação evita o desenvolvimento da enfiteuse, da qual ainda muito há a esperar pelo seu poder fomentador e coloniza dor.

3. O diploma não contém qualquer alaque ao direito de propriedade, além do mais porque a Constituição o consagra em termos justos. Nem êsse ataque poderia estar no espirito do autor do projecto, que ainda há pouco escreveu: «... E realmente, se nos pusermos a averiguar da utilidade social da propriedade, verificaremos que ela, com as suas características fundamentais - disposição em vida e por morte -, é o estímulo mais forte da labuta incessante do homem e causa da produção, da riqueza, da invenção e da economia. E isto é muito, porque o progresso material se fez com estes elementos e não outros; e não pode haver neste ponto qualquer reserva ou rectificação, porque nos últimos séculos a propriedade privada deu de si conta maravilhoso ... Êste direito não é uma simples detenção, o proprietário não é um detentor, mas o titular de um verdadeiro direito e de um direito individual, como se disse na declaração de 1789 - que declarava ser a propriedade um direito individual e sagrado, de que ninguém poderia ser privado, a não ser quando a necessidade pública o exigisse e mediante justa e prévia indemnização.
A verdade do princípio não lhe veio porém do Declaração, mas da sua conformidade com a natureza humana, o interesse social e a tradição jurídica...».
São estes os princípios em que assenta o decreto e não outros.

4. Mas será o domínio directo uma forma de propriedade? Durante muito tempo disse-se que a propriedade de terra aforada estava no senhorio, depois passou a dizer-se que estava no senhorio e no enfiteuta em divisões sobrepostas, horizontais, e hoje há quem sustente - e é a maioria dos modernos jurisconsultos italianos 1 - que o senhorio não é proprietário, mas um credor garantido por um jus in re aliena, por um direito real sobre a propriedade do enfiteuta, quanto ao pagamento do preço da compra. Esta doutrina justifica-se com o fundamento de o senhorio não poder usufruir a propriedade nem dela poder dispor. E se, sob o ponto de vista formal, sob o ponto de vista da legislação, esta orientação pode oferecer dúvidas, e oferece-as, a verdade é que no ponto de vista económico não é assim, porque o seu conteúdo se integra nas formas de crédito garantido pela propriedade imobiliária: o domínio directo é o preço pago em prestações perpétuas. É do lado do enfiteuta um modo de adquirir a propriedade com mais facilidade e do lado do senhorio uma forma de obter um juro em anos sucessivos, uma colocação de capitais. Há-de ver-se adiante, e nos casos que estão ma base das reclamações, que os ascendentes dos actuais senhorios directos não aforaram a terra.
Esta já vinha aforada de há muito. Compraram um domínio directo que já tinha sido alienado várias vezes, e compraram-no, não para exercer qualquer função social, mas para obter uma renda, um juro do emprego do capital, como quem compra um título da dívida fundada ou uma renda perpétua.

5. Considerada embora a enfiteuse como propriedade, não poderá negar-se que esta propriedade sofre de defeitos graves. Sobre o mesmo prédio há dois proprietários, há dois direitos horizontais, com partilha apenas nos rendimentos. São dois senhores na mesma casa, e esta dualidade pode criar conflitos entre o enfiteuta e o senhorio.
Por outro lado, se o prédio é mais do que hipotecado, a verdade é que o senhorio directo não dá o seu suor nem o seu sangue, nem o seu dinheiro para que a terra produza. Indiferente ao sol e à chuva, aguarda apenas o vencimento do foro, para o receber, quer o trabalho do enfiteuta, ou a força da terra ou os capitais investidos produzam ou se percam nas contingências do tempo.
Êste facto não tira a legitimidade à enfiteuse nem quere significar que a propriedade pertence a quem nela trabalha; quere dizer que aquela lhe vem, não do que o senhorio faz, mas do que fez em leni pôs muito distantes. Adquiriu a terra que mais tarde aforou porque, tinha dinheiro, que representava trabalho. esforço acumulado, ou praticou actos que mereceram ser recompensados. Mas se a dissociação não lhe nega a legitimidade, em todo o caso faz reflectir sobre o conteúdo dessa legitimidade e força o legislador a pensar não só sobre a oportunidade de tal forma de propriedade, mas até onde pode ir a projecção do valor inicial e ato onde ela deve ser protegida, e quando deverá considerar-se o senhorio. A sua situação é diferente da do proprietário alodial que adquiriu um dia por trabalho acumulado em dinheiro ou por qualquer outro título, mas todos os dias tem de trabalhar, ou arriscar o valor da terra. E esta comparação, se não inutiliza o direito do senhorio, em todo o caso coloca-o, sob o ponto de vista económico, e até da opinião pública, numa situação inferior. Suponha a Assemblea um caso limite, sem dúvida, mas que está dentro do sistema: que determinado indivíduo tivesse um dia obtido domínios

1 Dusi. 1ntituzioni, I. p. 483; Gianturco, Istituzioni, E, 53: Fulei, Enfiteuse, n.º 8; Stolfi. Diritti reali di godimenti, n.º 808; Coviello, Trancrizione, 11, n.º 306; José Tavares, Principios Fundamentai, I. p. 616.

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directos bastantes para ele viver e a sua família e os seus descendentes através das gerações sem trabalhar. Estes indivíduos libertaram-se da lei do trabalho, e esta libertação seria, sem dúvida, odiosa. E este aspecto não escapou ao povo que costuma dizer a quem não trabalha: «se queres viver sem trabalhar compra foros».
Conhece-se a campanha que há em toda a parte contra os absentistas, os que entregam a exploração da terra e o seu risco a outrem, e que vão esgotando os patrimónios dos pequenos, iludindo-os com grandes lúcios, mas afinal em proveito próprio. Ora não há proprietário mais absentista que o senhorio directo. Ele, como nenhum outro, está longe da exploração e fora dos seus riscos. Sem dúvida que é a lei que o coloca nessa posição, e isso salva ã sua consciência, mas quem governa não pode deixar de considerar a instituição, sob este ponto de vista. E ninguém poderá afirmar que a crítica à enfiteuse é um ataque à propriedade. A propriedade é um direito que se pode dizer natural: a enfiteuse é uma forma civil de adquirir a propriedade. Pode suprimir-se essa forma sem destruir nem atingir a essência da propriedade. O quadro das propriedades imperfeitas tem variado com o tempo e não é o mesmo em iodos os países. O cardeal Verdier escreve 2: «O capitalista que sem deixar a cidade onde habita compra nas Landes numerosas propriedades que não visita e cujos rendimentos lhe são fielmente entregues pelos rendeiros não deixa de ser proprietário legítimo, é necessário dizê-lo claramente.
Mas administram os proprietários nestas condições a propriedade, como o fazia outrora o mestre da corporação ou como o fazem os proprietários que com os seus; trabalhadores cultivam a terra? Se a ordem natural e o interesse social exigem que estas propriedades sejam consideradas como legítimas, não exigem todavia com a mesma nitidez que elas sejam julgadas sagradas e úteis e que na distribuição dos frutos a parte maior lhes seja assegurada ne varictur».
O domínio directo é, pois, legítimo, visto ser uma criação da lei, mas não é a isso que no relatório se alude; o que se considerou foi a projecção que deve ter, se a sua protecção está em harmonia com as condições económicas e morais do tempo, porque, se não está, a mesma lei que cria pode suprimi-lo ou reduzi-lo.
Não se pôs uma questão de legalidade, ou de legitimamente quando muito de conveniência, mas nem mesmo êste aspecto se quis considerar porque não havia, que o fazer desde que o decreto não vinha formular princípios novos, seguiu a tradição.

6. Estas e outras considerações levaram por toda a parte os legisladores do século passado a revogai1 ou a reduzir as divisões horizontais da propriedade. Desaparecem os censos, as pensões, os dízimos, reduziu-se o conteúdo da enfiteuse e da sub-enfiteuse e permitiu-se a sua remição ou foi declarada temporária. Porque se fez? Porque todos estes encargos antigos, distantes, absorviam os rendimentos e aos homens que trabalhavam nas terras sujeitas a eles, que nelas gastavam o sangue e o suor e nelas investiam o sen pequeno património, pagas as pensões, pouco cabia das colheita? Naturalmente isto desanima vá-os e a produção tendia a cair. De resto, as dificuldades que a sobreposição de enfiteuses causa nas regiões do Norte, onde existem, e são bem conhecidas das pessoas que estudam as condições de vida das respectivas populações, dão idea, embora incompleta, do que seria a propriedade desse tempo.
Queixa-se às vezes o proprietário de que as contribuições lhe levam os rendimentos; pois em tempos distantes esses rendimentos eram absorvidos por pensões, censos, dízimos, foros, etc., lançados muitas vezes ao acaso ; e é daqui que vem a causa política do movimento pela terra livre, e foi depois do exame das condições económicas da exploração da propriedade fraccionaria, inferiores, ruinosas, que esse movimento só desenvolveu.

7. O movimento tem a sua repercussão em Portugal, Mousinho da Silveira, no relatório do decreto de 1832, escreveu: «A gente privilegiada vivia do suor alheio, estimava que os reis dispusessem dos bens do povo; porque de facto dispunham desses Itens a favor dêles.
Consultando os princípios que tenho exposto, é fácil entender que a natureza dos bens da Coroa era o sacrifício fie todo o bem possível a certo número de famílias, e que sem destruir a povoação do Reino e a subsistência das classes médias não podia continuar a existência de uma natureza de bens, nos quais o gozo consistia na destruição; a baixeza clava a quem tinha bens da Coroa esta esperança de os perpetuar, mas a conveniência lhes ditava toda a negação de os melhorar.
Por intervenção dos forais algumas terras melhores foram aproveitadas; mas quando os jornais dos trabalhadores se fizeram caros, e quando novos tributos apareceram, a sua agricultura não podia continuar e muita já concluída foi completamente abandonada.
Os litígios que eram consequências de uma natureza de bens, cujos bens eram particulares, se multiplicavam, e por seus exemplos geraram o descio do amor da propriedade rural: quem podia saber nunca se os bens seriam um dia declarados da Coroa?
................................................................................
Sem a terra ser livre em vão se invoca a liberdade política: esta liberdade, sendo a faculdade de usar do seu direito e incapaz de abusar do direito alheio, depende da legislação criminal e civil, e não pode durar no meio de substabelecimentos, cujo espírito é o de formar uma concatenação de escravos...
Fundado sobretudo no quadro de horror que oferece, um cidadão laborioso quando cheio de fadigas de um ano inteiro vê levantar a sua colheita a mil agentes da avidez do clero e dos donatários e fica reduzido ao miserável resto que a avidez deixa à mendicidade laboriosa...».
Aqui está o quadro das divisões horizontais e a sua acção na actividade agrícola. Por isso se inicia o movimento da libertação da terra, da libertação do proprietário, do homem da terra, do lavrador.
Primeiro em relação aos bens da Coroa; de certos rendimentos ou de alguns; depois de alguns foros, censos e pensões (decreto de 22 de Junho de 1846). depois a remição dos foros, censos ou pensões dos donatários e fazenda, (artigo 10.º), moratórias no pagamento de foros (artigo 15.º), depois dízimos (decreto de 30 de Julho de 1832). Seguem-se depois as leis de 4 de Junho de 1859 e instruções de 27 de Setembro do mesmo ano, etc. Mais tarde vem o Código Civil, que proíbe os laudémios de futuros, depois leis que reduzem os laudémios do Estado à quarentena, em seguida a remição do domínio directo. Uma série de diplomas destina-se a tornar a terra livre e a associá-la permanentemente com o trabalho. Mas é o Estado em relação aos seus bens que vai à frente do movimento.
Decreto de 23 de Maio de 1911 (concede e regula a remição do respectivo ónus aos enfiteutas e sub-enfi-

2 Problèmes sociaux, pp. 87 e sgs.

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teutas); lei n.º 301, de 3 de Fevereiro de 1915 (disposições apuráveis a foros na posse do Estado em virtude da Lei da Separação); derreto n.º 3:834, de 12 de Fevereiro de 1918 (contribuição de registo de foros. Remição de foros das corporações e corpos administrativos); decreto n.º 3:891, de 4 de Março de 1918 (isenção de contribuição de registo no resgate de foro de propriedades a adquirir para embaixadas); decreto n.º 4:252, de 8 de Maio de 1918 (suspensão de remições obrigatórias de foros durante o estado de guerra); decreto n.º 4:428, de 12 de Junho de 1918 (continuação da r em içá o de foros a dinheiro); decreto n.º 5:062, de 10 de Mato de 1919 (providências relativas à cobrança de foros o laudémios devidos ao Estado); lei n.º 1:174, de 1 de Junho de 1921 (remição e pagamento de foros, laudémios e pensões); decreto n.º 9:680, de 14 de Maio de 1924 (pagamento de foros, etc.); lei n.º 1:045 de 4 de Agosto de 1924 (redução a dinheiro dos foros em géneros); decreto n.º 11:887, de 6 de Julho de 1926 (remição de foros de bens das igrejas); lei n.º 1:883, de 22 de Julho de 1926 (remição de foros. Aumento de prestações); decreto n.º 12:335, de 18 de Setembro de 1926 (aforamentos de prédios rústicos e urbanos e remição de foros); decreto n.º 12:587, de 30 de Outubro de 1920 (alienações, desamortização e remição de fofos do Estado e das igrejas); derreto n.º 14:927, de 18 de Janeiro de 1928 (venda de foros, sensos e pensões); decreto n.º 13:076, de 14 de Fevereiro de 1928 (casas de beneficência. Pagamento, venda, e remição dos seus foros); decreto n.º 15:289, de 30 de Março de 1928 (contribuição predial rústica e urbana. Sua aplicação à enfiteuse); portaria n.º 5:425, de 14 de Junho de 1928 (pagamento de foros em géneros ou em dinheiro); decreto n.º 19:120, de 16 de Dezembro de 1930 (reforma do Código Civil. Artigos respeitantes à enfiteuse); derreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931 (pagamento e remição de foros).
O artigo 7.º do derreto n.º 20:188 foi esclarecido pelo decreto n.º 21:119, de 4 de Maio de 1932.

8. Esta orientação legislativa, não afecta o direito de propriedade, não o esquece nem o ataca. Pelo contrário, o que pretende é dar à propriedade todo o seu valor. Como se sabe, o século passado foi individualista, a legislação inspirou-se no individualismo. Podia fazer-se tudo o que nào era proibido, e o número de proibições reduzia-se ao mínimo. Ora a propriedade foi considerada como uma condição da liberdade - o homem tinha a sua existência externa na propriedade de onde o organizar-se o direito de propriedade como uma faculdade
geral indeterminada, que se aferia pela liberdade. O Proprietário tinha todos os direitos, salvo as limitações da lei, e só da lei, e estas limitações eram de carácter negativo. Nunca a propriedade atingiu em tempo algum a expressão jurídica que teve no século passado, pois até os limites do bem comum - sed at communes dizia S. Tomaz - e do domínio eminente desapareceram ou foram reduzidos mínimo.
Porque se fala então no movimento dissolvente do direito de propriedade do século passado, quando o tempo presente está a corrigir os seus exageros, afirmando que assim como um homem se deve à sociedade de que é colaborador efectivo, com obrigações positivas, assim também o proprietário no exercício do direito de propriedade tem de ter sempre diante dos olhos o interesso colectivo?

9. Afirma-se que a enfiteuse contribuiu para o povoamento do País e cultura da terra - factos que ninguém desconhece nem nega.
Em virtude da conquista sucessiva do País foram-se ocupando terras, vagas, e estas atribuídas à Coroa e aos beneficiários em grandes, lotes. A Coroa, que os não podia agricultar directamente, aforava umas para ter rendimentos próprios e outras para com eles pagar os preços dos serviços públicos então existentes, pois não havia então impostos.
O mesmo sucedia quanto aos bens de algumas ordens religiosas e dos donatários - aquelas; não podiam por si, em crebra, explorar a terna; e estes ou não podiam ou não queriam, e ambos preferiam um rendimento, ainda que mais pequeno, e que porventura seria o único possível, dada a falta de população.
Todos estes senhorios, ordens e donatários, foram o que se pode chamar agentes de povoamento3, e alguns terão realizado essa função, então dedicada, porque o homem que aforava a terra dirigia a população, era um elemento político. A sua acção não era puramente agrária, mas de educação, de direcção, de acção social e de defesa do País. É inspirado no mesmo alcance da instituição que se pretende hoje constituir a enfiteuse e dar-lhe o mesmo papel? Êsse tempo passou. A experiência do último século, em relação aos bens do Estado, foi definitiva. Com efeito o regime liberal teve à sua disposição domínios importantes, e que fez? Sôbre essa grande experiência Herculano4 escreveu: «Uma porção avultadíssima de propriedade rural. Calcular com alguma certeza os valores, os capitais possuídos por essas corporações abolidas, ou havidas por reversão gradual dos bens da Coroa, é dificílimo, senão impossível...A maioria enorme da riqueza territorial possuída então pelo Estado, a qual na máxima parte poderia ter caído em mãos laboriosas e humildes por emprazamento de superfície limitada, ou pelo menos poderia ser vendida depois de ratalhada, alienou-se por um sistema absolutamente contrário...!
Dividida, a propriedade, tornar-se-ia acessível a todas as condições e fortunas pelo emprazamento e pela venda de milhares de pequenos pecúlios. Em vez disso, caiu geralmente nas mãos de homens opulentos, trocou-se por capitais avultados. Em muitos casos foi- o rico proprietário que englobou nos seus extensos prédios vastos prédios nacionais, e isto num mercado onde reinava pela abundância a depreciação j do género e onde a concorrência era difícil. Outra parte serviu para converter muitos capitalistas em proprietários. Assim se anularam os mais importantes resultados que se deviam ter tirado da reivindicação parcial dos bens da Coroa para o património público e da extinção das corporações religiosas. Foi a ignorância que produziu o mal? Foi a persuasão de que a grande propriedade era mais útil do que a pequena? Não o cremos. A verdadeira, razão era o interesse pessoal dos homens influentes. Tinham-se inventado as indemnizações; tinham-se taxado os exílios, as perdas efectivas, os lucros errantes, as perseguições que se haviam padecido por causa das opiniões...Para as indemnizações a alienação em grande caminha por mais de um modo. O Há-de haver da conta de ganhos e perdas engrossava-se prodigiosamente ao lado do Deve, em branco. Os mercadores políticos que a escrituravam viam-se no Governo, no Parlamento, nos conselhos, nos altos cargos administrativos, judiciais e militares...».
E Oliveira Martins5 escreve.

«Mas Silva Carvalho, que auscultava os estômagos, sentira, a necessidade de os encher ... Os bens nacio-

3 José Pequito Rebêlo. O desastre das reformas agrárias, p. 23.
4 Opúsculos, III, p. 16.
5 Portugal Contemporâneo, 5.ª ed., II, p. 10.

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nais seriam vendidos em praça, porque essa publicidade e uma legalidade aparente convinham para ressalva, sem nada prejudicarem, pois a praça ficaria deserta por não haver dinheiro nem licitantes. Não havia dinheiro, é sabido, mas havia os papéis em poder dos clientes, e esses papéis recebia-os o Tesouro como dinheiro. Assim, sem bulir nos números da legalidade, obtinha-se o resultado desejado, porque o Ministro não dava os bens, dava os papéis com que eles se iam comprar em praça.
Êsses papéis eram os títulos de dívida pelo seu valor nominal (um valor fictício), eram o papel moeda, os recibos de ordenados vencidos, os títulos de emendas e direitos de pescaria extintos; eram finalmente os róis de indemnização por perdas e sacrifícios da guerra; papéis extravagantes, contas onde gran-capitãis chegaram a somar por centenas de milhares de réis as ferraduras perdidas de cavalos mortos».
Aqui está o intuito com que se alienaram os bens da Nação, as pessoas a quem se alienaram, o preço por que foram avaliados, e o dinheiro com que foram pagos. Eram bens da Nação que foram vendidos por mau preço e pior moeda.
Obteve-se o povoamento e a cultura? Para tirar uma conclusão basta examinar as transmissões sucessivas dos prédios a que se referem as representações, um dos quais pelo menos pertenceu à Casa do Infantado. Os aforamentos traduziram-se em vendas sucessivas de domínios directos.
Como se fez?

10. Não há interesse em examinar aqui a enfiteuse e o seu destino. O diploma não toma qualquer partido a esse respeito; seguiu a orientação de há bastantes anos. Mas quando o Estado tiver de tomar uma posição há-de considerar o problema em face da situação dos senhorios e enfiteutas e, superior às pretensões do uns e outros, resolverá em harmonia com o interesse colectivo. Todavia, pode dizer-se que não se vê como ela no continente possa vir a ter qualquer importância, e já a não tem há muito tempo. O aforamento é raro, o grande proprietário não afora e os pequenos não têm de aforar. Por outro lado, a questão só poderia pôr-se se tivéssemos um problema agrário de carácter social; mas, felizmente, não o temos; e se o tivéssemos ele não poderia ser resolvido com a simplicidade que se prevê. Os dados dos problemas mudam muito no tempo. O que ontem foi bom perde hoje a utilidade, porque podem mudar os costumes e as condições de vida, as concepções e os interesses, e muitas vexes mudam, embora alguns pensem que nada mudou.
Sem dúvida que a enfiteuse é uma forma fácil de adquirir a leira, mas é também uma forma onerosa de a manter. Depois, hoje há formas de crédito que tornam a aquisição menos dificultosa. Esta decadência da enfiteuse não se verifica apenas em Portugal. É um facto geral. Com efeito, em toda a parte se desenhou e prossegue um movimento no sentido de a reduzir ou extinguir, salvo nas grandes e extensas regiões coloniais. Na França e na Bélgica a enfiteuse é temporária, na Checo-Eslováquia de pouco valor o domínio enfitêutico. As reformas agrárias do oriente europeu não contaram com ela e também não, lhe dão grande importância as disposições legislativas com que se tem tentado na Inglaterra, Alemanha e outros países generalizar a propriedade privada 3.
De resto, a função social do senhorio, nos termos em que noutros tempos foi exercida, desapareceu. Exercem-na o Estado, a igreja e outras instituições por intermédio dos seus agentes. Certamente o grande proprietário rural pode e deve ainda exercer uma grande acção educativa, de protecção, de assistência e de composição de dissídios entre aqueles que vivem à sombra ou na zona de influência das suas propriedades, mas a industrialização da agricultura e os seus grandes riscos fazem-no estar atento a uma renda e a lucro e a redução do tempo presente absorve-lhe os dias que aquela atenção lhe deixa livre. Talvez se possa dizer dentro de pouco tempo que Bourget fixou no L'Émigré uma excepção.

II

11. Passemos ao problema jurídico, mas façamos algumas considerações preliminares.
O problema da desvalorização da moeda levanta grandes questões em matéria de pagamento de obrigações pecuniárias.
A obrigação tem uma causa, que nos contratos comutativos. é dominada pela equivalência de valores. Ora, nas obrigações pecuniárias quando se faz um contrato a moeda tem um certo valor, não apenas em relação ao objecto da compra, mas em relação a todos os outros produtos. Por isso se diz que é medida comum de valores.
Se o valor da moeda se modifica, a medida geral modifica-se e, por consequência, a sua posição perante tudo o que é medido passa a ser outra.
Deixemos porém de lado tantas consequências que derivam deste fenómeno e vejamos apenas um aspecto particular dele: a influência que exerce nos contratos contraídos antes da desvalorização e a executar depois desta por uma só vez ou em trato sucessivo, e ainda apenas o caso do estabelecimento do curso forçado no país em que havia um regime metálico.
Nós já temos história neste ponto, história antiga, de muito longe repetida com frequência, em todos os regimes, em todos os séculos 7 e por isso mesmo história rica, o que não quere dizer que tenha servido de muito.
Consideremos apenas o caso monetário que precede este em que vivemos - a crise de 1891.
Esta crise monetária e financeira obrigou a estabelecer o curso forçado, e já nela se levantaram logo - com menos intensidade, embora - os problemas a que aquele dá origem.
Como procederam os tribunais em relação à cláusula ouro?
A jurisprudência não foi uniforma, mas na sua generalidade negou valor à cláusula.
Umas vezes negaram a validade da cláusula invocando, ou: a) o caso de força maior que impedia o pagamento em espécies metálicas (acórdãos da Relação de Lisboa de 20 de Janeiro de 1894 e de 1 de Agosto de 1901), ou: b) a natureza de ordem pública do curso forçado. Dias Ferreira escreveu 8: «No entanto os incómodos da crise e a força da oposição encaminharam desde logo os tribunais para a jurisprudência de que o pagamento em notas do Banco era bem feito, mesmo que se houvesse estipulado expressamente pagar em ouro, visto ser caso de fôrça maior, conquanto algumas vezes se tenha decidido também, com fundamento no artigo 727.º e § único do presente Código e no artigo 315.º e § 3.º do Código de Comércio, que no caso de convenção deve ser cumprido pontualmente o estipulado

6 Truchy, Cours de Economic Politique, 11, p. 418.
7 Oliveira Salazar. O ágio do ouro; Marcelo Caetano, A depreciação da moeda depois da guerra.
8 Código Civil anotado, n, p. 62.

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A dispensa do pagamento na moeda convencionada só seria justa no caso de ter sido desmonetizada por lei a moeda estipulada (artigos 724.º e 725.º), e o caso de força maior só teria lugar se a dita moeda não existisse materialmente.
Mas como o - Código Civil se refere só a moeda metálica, vistos os artigos 724.º e 725.º e o § único do artigo 727.º, têm agora os tribunais na lei de 19 de Maio de 1893, §§ 1. e 2.º - que nas palavras «moeda corrente» abrange ou, antas, se refere principalmente às notas do Banco de Portugal -, algum fundamento para considerarem bem pagas em papel do Banco as obrigações contraídas em ouro».
Os jurisconsultos dividiram-se: mas a maioria, aliás sem uma absoluta convicção, admitiu a validade da cláusula.
O professor Guilherme Moreira9 diz: Parece-nos, assim, que, tendo-se especificado o metal em que a prestação deve ser cumprida, e não sendo convertível a nota, o devedor tem de efectuar o pagamento em moedas de ouro ou prata» 10.

12. As dúvidas tiveram em parte origem na falta de documentação económica dos jurisconsultos e dos tribunais, como diz Nogaro, e na convicção de que a nota do Banco não evolucionou, transformando-se de título fiduciário em moeda.
Hoje, porém, um grande número de jurisconsultos, e por toda a parte11, sustenta a nulidade da cláusula por contrário ao curso forçado, que é matéria de ordem pública.
Bertrand de Nogaro, na Revue e Trimestrielle, 1925, p. 5. escreve:
«Sou de opinião, mesmo na ausência ide disposições explícitas, que o curso forçado implica a anulação ou, ao menos a suspensão das cláusulas relativas ao pagamento em espécie».
As cláusulas, em vista da impossibilidade em que o devedor se encontra de pagar em numerário metálico, têm como fim o pagamento em moeda real, isto é, o pagamento em papel que constitue a circulação efectiva de uma soma determinada, segundo ágio entre o papel e a moeda .metálica, que não desempenha senão o papel de moeda de conta.
Ora êste desdobramento, pelo que respeita às transacções no interior do país, é manifestamente contrário aos princípios do nosso direito ...
Toda a argumentação (dos que dizem ser permitida) atesta uma insuficiente documentação económica e certa ingenuidade.
Por outro bulo. é evidente que o curso forçado não impede o público de comprar, em papel moeda inconvertível, divisas pagáveis em ouro ou em moedas estrangeiras.
A única observação exacta é que a proibição de uma discriminação entre as moedas legais, que se traduz por um ágio em favor das espécies metálicas, tende a fazer desaparecer estas.
Mas é um mal menor do que o bem daí resultante.
Os inconvenientes que resultam da cláusula de ouro nos pagamentos internos, segundo Nogaro, são os seguintes :
a) Quando nas relações internas os preços se fixam em ouro, ou em moeda, estrangeira de valor ouro, todos os preços sobem automaticamente na proporção da perda do câmbio.

b) A verificação do fenómeno do ágio tira ao cidadão a confiaaii^a no valor da moeda ide papel (ao contrário do que se diz em uma das representações) e incita-o a cobrir-se coai.tra o -risco de uma nova queda, aumentando os preços, criando assim uma novo depreciação em movimento acelerado. i
c) A cláusula ouro leva a parte que tem de fazer o pagamento em ouro a cobrir-se, adquirindo moedi estrangeira, o que faz aumentar as necessidades cambiarias sem justificação real, criando assim um elo-iiiênto passivo, inútil na balança de pagamento.
d) A experiência das últimas catástrofes monetárias, taiVcomo as -da Áustria, Polónia e Alemanha, põe em evidência a acção fatal exercida sobre o câmbio pela compra intempestiva de divisas estrangeiras, provocada primeiro pelas transacções interiores em ouro, depois pelos que queriam converter as suas economias em ouro, temerosos das sucessivas desvalorizações da moeda.
«>Eis a razão de ordem pública, diz ïïogaro,1 ignorada, sem culpa, por antigos jurisconsultos que hão foram testemunhas de fenómenos, desconhecida, mas sem motivo, por uma parte da 'doutrina contemporânea, justamente pressentida por alguns autores, como -Demogue, e pela jurisprudência francesa actual, qiie deve anular todo o contrato, toda a cláusula que derrogue o curso forçado e tenha como consequência fazer aparecer um ágio interior e leve os particulares a procurar ouro ou moedas estrangeiras para lá das necessidades normais das nossas n-ecessidades externas. \
Aqueles que procuram subtrair-se vnwffalmente à depreciação estipulando em ouro contribuem para acelerar a depreciação e arruinam o seu país, som eles mesmo escaparem ao desastre ...». !
Estes argumentos são iirespondiveis para qualquer jurista que tenha alguma documentação económica.
A moeda s em certo sentido a bandeira de um país e por isso, diz Demogue, deve banir-se turlo o que a pode desprestigiar.
Todavia, entre nós - em 16 de Dezembro de 1930 e com o decreto n.º 19:120 - altera-se o artigo 724.º do Código Civil e aorescenta-se-lhe um S ;>.". que diz: sO curso forçado da nota bancária não prejudica a validade da convenção de pagamento em moeda metálica nacional ou estrangeira,». :
Sem dúvida que toda a matéria do pagamento de obrigações pecuniárias do Código Civil precisa de ser modificada, o que se com-preende~por ter sido redigida em um tempo em que os regimes monetários eram outros, mas esta disposição creio ser -única no mundo.
13. A cláusula ouro reveste duas modalidades: ou se refere a uma moeda em ouro ou a um ralu-r ouro.
No primeiro caso obriga-se a entregar moedas ouro, no segundo obriga-se a entregar um peso iouro. Qualquer delas produz sobre, os regimes monetários os efeitos já referidos, -e portanto as duas modalidades devem ser consideradas contrárias à ordem pública. Mas vejamos o que estabeleceram os outros países.
Pela lei Joint Rexalution, de 5 de Junho de 1933, foi declarada nos Estados TTnidos nula i a cláusula ouro 12, nos termos seguintes: :
1.º E contrária à ordem pública toda a cláusula de pagamento em ouro nas obrigações públicas ou privadas ou em moeda ou numerário de espécies particulares, ou em moedas americanas medidas sejgundo o valor ouro ou moeda particular;

9 Obrigações, n.º 32.
10 Veja-se no mesmo sentido Marnoco e Sousa, Letras, livranças e cheques, II, n.º 248.
11 Lyon Caen e Renaud, Traité de droit commercial, IV, p. 583; Demogue, «Le cours forcé» (apud Journal des notaires, 1921. p. 137): Capitane, Ver. Heb. Dallos, 1926. pp. 1 e sgs.
12 Lecharny, «La politique économique du President Roosevelt», Revue de droit international, XII, p. 523.

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2.° Prescreve-se que toda a obrigação pública ou privada expressamente estipulada em ouro ou em moeda ou numerário particular pode ser paga dólar por dólar em moeda legal no momento em que se efectua o pagamento.
Pelo Gold Reserve act de 30 de Janeiro de 1934 o dólar foi desvalorizado de 25,8 grãos ouro para 15 3/2l com o toque 900/1000 ouro fino. Quere dizer: o dólar ouro foi desvalorizado em 40,94- por 100, e, como se vê, é pelo valor facial que se faz qualquer pagamento e pode ainda ser desvalorizado por simples decreto do Presidente até certa percentagem.
De resto, aquela lei decretou o curso forçado e a inconvertibilidade, e com efeito retroactivo, estabelecendo que a cláusula ouro nos contratos e obrigações anteriores ou posteriores era nula 13.
Revogaram também a cláusula ouro, e com efeito retroactivo, o Brasil, por decreto de 27 de Novembro de 1933, a Roménia, com a lei de 25 de Dezembro de 1926, a Bulgária (lei de 12 de Maio de 1935), a Dinamarca (lei de 27 de Novembro de 1936), o Egipto (lei de 2 de Agosto de 1914 e lei de 2 de Maio de 1935), a Jugo-Eslávia (lei de 24 de Abril de 1920) e a Grécia.
Alguns países reconhecem a cláusula mas anulam-na praticamente. São a Itália, a Hungria e a Noruega.
Com efeito, não revogaram a cláusula mas dispuseram que os credores só poderão exigir o pagamento em ouro quando as circunstâncias económicas o permitirem, o que quere dizer que está suspensa sine die.
Há países que reconhecem ainda a cláusula ouro, mas sujeita a muitas correcções.
Assim em França há jurisconsultos que afirmam que a cláusula ouro é incompatível com o curso forçado 14.
Outros sustentam que é válida (Mestre, La clause or); mas a jurisprudência francesa do Supremo Tribunal distingue entre as relações jurídicas internas e externas e anula-a nas relações internas. (Veja-se adiante a circular do respectivo Ministério da Justiça); mas o franco já foi demimuído no metal fino.
A Bélgica por decreto de 31 de Março de 1930 aboliu retroactivamente a cláusula ouro ou moeda ouro, mas só para certos contratos: arrendamentos, enfiteuse, empréstimos, etc..., estabelecendo que a cláusula pagamento em ouro ou em francos belgas com referência a uma moeda estrangeira é assimilada à cláusula ouro e que o pagamento se deverá fazer pela taxa de estabilização de 1926, aliás também não em vigor. A mesma solução foi seguida na Holanda por lei de 24 de Maio de 1937.
Esta lei anula a cláusula ouro nos empréstimos, rendas vitalícias, arrendamentos e ónus prediais, feitos antes de 1936, portanto com efeito retroactivo.
Na Alemanha o decreto de 28 de Setembro de 1914 suprimiu a cláusula ouro; depois da estabilização de 1924 a cláusula foi admitida mas o regime actual é muito confuso 13.
Na Inglaterra a cláusula ouro é admitida em geral, mas em certos casos especiais pode ser declarada nula.
Só na Suíça e talvez na Suécia parece vigorar ainda a cláusula ouro.
Que resulta de tudo o que acaba de dizer-se?
Que a cláusula ouro é incompatível com o modo de ser económico do tempo presente, pelo meai os na vida interna dos povos.

14. E em Portugal?
Fixemos primeiro o regime monetário de 1931.
A estabilização da nossa moeda em relação à libra de 1928 a 1930, as condições financeiras do País c outras levaram o legislador a estabilizar a moeda.
Foi esta medida consagrada nos decretos n. 19:869 e 19:870, de 9 de Junho de 1930.
O decreto n.° 19:869 obrigou, no artigo 13.°, o Banco de Portugal a (reembolsar os portadores de notas que o exigirem «em espécies ou em divisas ouro sôbre o estrangeiro, à escolha do Banco».
Mas o artigo 29.º, alínea b), deixava dependente de um futuro acôrdo entre o Govêrno e o Banco a fixação da data a partir da qual se tornava obrigatória para êste a conversão em espécie.
Quere dizer, o regime adoptado era um mixto de gold bullion standard e gold exchange, mas praticamente só o segundo esteve em vigor ê este mesmo ao lado das medidas restritivas do mercado cambial existentes.
Na realidade, como escreve: o Professor Marcelo Caetano 16: «tudo se ficou passando como dantes, salvo que a fixação do curso do câmbio deixou de estar dependente dos acasos da fortuna para ser rigorosamente determinada pela paridade entre as moedas estranhas e o escudo definido pela lei como moeda contendo 0,0739 de ouro com o título de 900/1000».
E em que bases assenta a reforma monetária no que se refere ao valor da moeda?
Entre os dois caminhos: ou manter o antigo escudo com o mesmo peso, ou adoptar uni escudo com o peso ouro que correspondesse à depreciação, seguiu o segundo, e com razão, porque de outro modo provocava uma perturbação enorme nos negócios.
No relatório do decreto n.° 19:869 lê-se:

«...em primeiro lugar o escudo anda hoje pela vigésima quarta parte do valor correspondente ao peso de ouro que lhe atribuiu a reforma de 1911, e as vantagens que advinham da adopção de uma unidade monetária como o antigo escudo ouro estão perdidas se quisermos aproveitar, com a mesma denominação, o valor actual.
É pena, embora outros países e designadamente a França, a Finlândia e a Roménia tenham hoje unidades monetárias de valor inferior ao nosso escudo.
É porém preferível utilizar na contabilidade o escudo com o seu valor de agora a empreender uma reforma ou para o repor no seu antigo nível de 1911 ou para lhe restituir aquele peso, mudando-lhe o nome.
As dificuldades num e noutro caso para a transformação de actos na vida económica diária e no ajustamento dos preços seriam tam grandes que deixariam a perder de vista as vantagens que pudessem ser encontradas numa unidade monetária de maior valor.
O problema deve pois ser resolvido no sentido do maior número de facilidades para o grande público.
A determinação do valor da nova unidade monetária, do novo escudo em relação às moedas estabilizadas estrangeiras, ou seja a fixação do peso de ouro fino que deve constituí-lo, é problema também simplificado pelas condições de facto em que a reforma intervém.
As apregoadas vantagens de desvalorizar a moeda, sob o ponto de vista da defesa do comércio e do estímulo à exportação, estão desacreditadas pela experiência, que não mostra ter algum país logrado por esse processo melhorias duradouras; por outro lado as grandes valorizações trouxeram no seu seio crises de tal modo graves que, aparte a Inglaterra, em que a restituição da libra ao antigo valor tinha um interesse transcendente na política e na finança, acabando por impô-la contra todos os inconvenientes, nenhum outro

13 Guiziotti. «L'évolution monétaire», Recueil do Cours, 1934, III, t. 49, p. 115; Sauser Hall, Recueil, 1937, II, p. 607.
14 Planiol, Traité, II. n.º 423; Capitant, nota em Dtoz, 1928, I, p. 26; Paniol e Ripert, VII, n.° 1:167.
15 Nusabarm, Recueil des Cours, 1933, n.° 43, I, p. 558.
16 A moeda portuguesa e a crise britânica, p. 7.

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país a realizou, e os que a tentaram, levados por um falso orgulho nacional, deixaram-se, a certa altura ficar prudentemente pelo caminho.
Outros elementos que complicariam, o problema e com que havia a contar estilo também lio j e simplificados; além de a libra-papel ter recuperado a sua antiga puridade com o ouro. os preços ouro baixaram com a presente crise económica, a ponto de desaparecer a anomalia que se estava verificando de uma desvalorização do próprio ouro a 40 ou 50 por cento.
Como noutros países tem acontecido, a baixa dos preços não se fez sentir tanto noa preços a retalho como nos preços por grosso; há uma certa força de resistência que, juntamente com a função de outros factores, se opõe a que o consumidor aproveite integralmente aquela baixa. Mas, mesmo assim, a estatística revela-nos que os preços a retalho são apenas vinte vezes o que eram em 1913 e 1914, e a libra vale à sua cotação actual sensivelmente vinte vezes o que valia então.
Significa isto que se passou para um certo equilíbrio de valores, resultado parcial do esforço de adaptação da economia nacional nos últimos anos e que convém não desperdiçar.
Depois de algumas oscilações o câmbio de Londres sobre Lisboa fixou-se, como se notou já, em 108$25 por libra, mas, ao pretender-se agora determinar com rigor o peso de ouro fino a atribuir ao novo escudo, deve ver-se que valor convirá atribuir, de futuro, àquela moeda.
As considerações acima não nos impedem de arredondar a cotação actual em valor que torne mais simples as conversões de moedas, sobretudo as de países com quem as relações económicas e financeiras de Portugal são mais estreitas e importantes.
Por isso se fixou o valor da libra em 110$, cotação a que o escudo-papel vale 1/24,444 do que valia pela reforma de 1911; o seu peso de ouro com o toque de 900/1000 será nesta conformidade de 0,0739».
O legislador podia ter dado ao novo escudo a equivalência do primeiro. Foi o que fez Roosevelt, e em França tem sido feito várias vezes. Mas para que invocar prática estrangeira? A coroa de 4 onças, que valia 6.400$, passou a valer em 6 de Março de 1822, 7.500$, em 3 de Março de 1847, 8.000$. E naturalmente ninguém reclamou; mas se alguém reclamou a reclamação não foi ouvida. Era a tradição, nossa e dos outros países 17. Mas o legislador português não quis.
Vara obter, pois, o valor de uma importância em ouro antigo multiplicava. por 2,444 o escudo-ouro ou o escudo-papel, mas o Banco não era ainda obrigado a pagar em espécies, pois esta obrigação estava dependente, quanto ao momento da sua execução, de acordo com o Governo (cláusula 15.ª do contrato com o Banco).
E emquanto vigorou nunca pagou em espécies, e mesmo que estivesse em execução completa a conversão da nota em espécies só era obrigatória para o Banco em quantia superior a 200 contos. E nem qualquer podia obter divisas e só quem obedecesse às instruções da Inspecção do Comércio Bancário.
E esta daria autorização a quem quisesse pagar foros?
Podia o senhorio comprar com os escudos divisas se delas precisasse, é certo, e fosse autorizado, mas para isso era preciso justificar o motivo da aquisição.

15. A queda da libra arrastou a queda do escudo e, afinal, da moeda de quási todos os outros países, se não de todos.
Esta queda geral, que constitue o fenómeno financeiro talvez mais importante do mundo, modificou a posição dos indivíduos nas suas relações económicas recíprocas, a posição dos mercados e até das nações.
Toda a maquinaria financeira do Estado ,e todos as processos até hoje inventados foram poucos para que cada país sã defendesse - a si próprio, mas só se encontrou alguma, defesa no sistema que os pode vir a matar - a autarquia. No respeito a pagamentos ouro já, se descreveu o que sucedeu pelo inundo. E entre nós?
O § 3.º do artigo 724.º do Código Civil continuou em vigor? A cláusula ouro está em vigor?
Vejamos a resposta, primeiro em relação aos pagamentos do Estado e de organismos públicos.
Tem o estado a faculdade de cobrar direitos em ouro por leis que vêm de 1918.
Aplicou-se desde essa época coeficientes que variavam com o câmbio.
Pois a partir de 1931 sempre o Estado recebeu os seus direitos pelo coeficiente 24,444. (Diário do Govêrno, 2.ª série).
A média trimestral do ouro:

Por cento
1930....................2,200
1931....................2,223
1931....................2,444
1932....................2,444
1933....................2,444
1934....................2,444
1935....................2,444
1936....................2,444
1937....................2,444
1938....................2,444
1939....................2,444

16. O Governo foi ouvido sobre os contratos com as empresas de fornecimento de energia eléctrica e também as repartições públicas. Que disseram?

Cópia

Em papel timbrado com o escudo da Câmara Municipal do Porto e os seguintes dizeres: Câmara Municipal do Porto - Secretaria Geral.

Cópia. - Ministério das Finanças - Direcção Geral da Fazenda Pública - Repartição do Tesouro.-Proc. n.° 7:018, liv. 106. - Serviço da República.
Exmo. Sr. governador civil do Pôrto:
Refiro-me ao ofício de V. Ex.ª de 18 de Agosto último, ao ofício da Municipalidade do Pôrto de 6 do mesmo mês, junto por cópia, e ao exemplar do contrato, que o acompanharam.
A base IV - Tarifas- do contrato de 18 de Julho de 1932, realizado entre a Câmara Municipal dessa cidade e a União Eléctrica Portuguesa para o fornecimento de electricidade, menciona uma moeda sem existência real - a que não se pode aplicar o artigo 724;.° do Código Civil -, visto que naquela data já tinha sido publicado o decreto n.° 19:869, de 9 de Junho de 1931, não havendo, assim, lugar à distinção entre o escudo-ouro e o escudo-papel.
É certo que o decreto n.° 20:683, de 29 de Dezembro de 1931, dispensou o Banco de Portugal [da obrigação de trocar as notas por metal, mantendo-lhe apenas a de as trocar por libras esterlinas à paridade legal, mas isso não impede que à face da lei possa haver uma única moeda - o escudo corrente-, não sendo, portanto, lícito aos particulares dar-lhe valores convencionais diferentes do que por ela estabelecido.
A definição da moeda é um acto de soberania do Estado, que não pode ser limitado por quaisquer convenções entre particulares.

17 Marcelo Caetano, A depreciação da moeda depois da guerra, p. 28

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A interpretação da cláusula do escudo-ouro está estabelecida autenticamente no artigo 25.º do referido decreto n.° 19:869.
O contrato de 1932 foi complementar e interpretativo do de 1927 na parte referente ao pagamento, acrescido de uma prorrogação de prazo de um contrato.
A nulidade da cláusula IV, seu objecto essencial, importa nulidade do contrato adicional. Fica assim em vigor apenas o contraio de 1927, que deveria ser interpretado de acordo com o decreto n.° 19:869, isto é, calculando o valor actuai do escudo-ouro pelo factor 24,444.
A razão de direito está aqui de resto, em pleno acordo com a lógica financeira e com a equidade.
Eis o que tenho a honra de transmitir a V. Ex.ª para seu conhecimento e da Exma. Câmara Municipal do Pôrto, para esta o fazer observar em obediência ao despacho ministerial de 31 do mês findo.
A bem da Nação. - Direcção Geral da Fazenda Pública. 4 de Novembro de 1936. - O Director Geral, A. Luiz Guines. - Está conforme. - Secretaria do Governo Civil do Porto, 7 de Novembro de 1936. - O Secretário do Governo Civil, Costa Lobo.

Está conforme. - Porto e Secretaria Geral, 24 do Novembro de 1936. - O Chefe dos Serviços, de Expediente, Henrique Baptista.

Está conforme. - Matosinhos e Secretaria Municipal, 27 de Janeiro de 1937. - O Chefe da Secretaria.

Procuradoria Geral da República - 1.ª Secção. - N.º 907, liv. 55. - Exmo. Sr. Ministro das Finanças. - Para o pagamento à União Eléctrica Portuguesa do fornecimento de electricidade aos Serviços Municipais Gás e Electricidade do Porto, aquela Companhia pretende servir-se da base IV - Tarifas - para o exigir ao câmbio da libra-ouro com abatimento de 15 por cento, ao passo que aqueles Serviços querem fazê-lo em escudos-ouro, actualizando-os pelo factor 24,444.
Ora aquela base, na- parte que diz respeito a este assunto, regula para «emquanto não vigorar a moeda escudos-ouro»; mas como já demonstrámos no parecer desta Procuradoria Geral de 19 de Dezembro último, desde 1 de Julho de 1931 vigora o regime monetário escudo-ouro, conforme dispõe o artigo 1.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho, devendo, por isso, o contraio respectivo ser abrangido pelo artigo 20.° do mesmo decreto.
E a«sim entendo, como já se disse no anterior parecer, que, em face da citada base IV, não é esta que se aplica, mas o referido artigo 25.°, e nestas circunstâncias o pagamento à União Eléctrica Portuguesa tem de ser feitorem escudos-ouro de 1911, actualizados pelo factor 24,444.
Esta doutrina não pode considerar-se modificada pelo decreto n.° 2-9:683, de 29 de Dezembro de 1931, pelo facto de o Banco de Portugal ser dispensado transitoriamente da obrigação de manter a estabilidade da moeda portuguesa, nos termos dos artigos 1.° e 5.° do decreto - n.º 19:869.
Foi votado por unanimidade pelo Conselho desta Procuradoria Geral.
Saúde e Fraternidade.

Procuradoria Geral da República, 30 de Maio de 1932. - O Ajudante do Procurador Geral da República, António de Oliveira e Castro.

Direcção Geral da Fazenda Pública. - 1.ª Repartição. - 8:938. - 31 de Maio de 1932. - Liv. n.° 102.

Concordo. Comunique-se. - Em 8 de Junho de 1932. - A. Oliveira.
Despacho. - Ministério das Finanças. - Gabinete do Sub-Secretário de Estado. - A interpretação da cláusula do escudo-ouro está estabelecida autenticamente no artigo 25.° do decreto n.° 19:869 e a ela não pode sobrepor-se outra convencionalmente estabelecida.
A definição da moeda é um acto de soberania do Estado que não pode ser limitado por quaisquer convenções entre particulares.
Quando foi realizado o contrato em causa, posteriormente à publicação do decreto n.° 19:869, já não havia lugar à distinção entre o escudo-ouro e o escudo-papel. É certo que o decreto n.° 20:683, de 29 de Outubro de 1931, dispensou o Banco de Portugal da obrigação de trocar as notas por metal, mantendo-lhe apenas a de as trocar por libras esterlinas, a paridade legal, mas isto não impede que à face da lei possa haver apenas uma única moeda - o escudo corrente-, não sendo, portanto, lícito aos particulares dar-lhe valores convencionais diferentes do por ela estabelecido.
Note-se que a moeda a que se refere a base VI do contrato em discussão não é uma moeda com existência real, não tendo portanto aplicação ao caso o artigo 724.° do Código Civil.
Há, pois, que considerar nula, por contrária ao direito público, a cláusula IV do contrato de 1932.
Resta-me os efeitos dessa nulidade.
Verifica-se que o contrato de 1932 não foi senão um contrato complementar e interpretativo do contrato de 1937, na parte referente à forma de pagamento, acrescido de uma prorrogação de prazo desse contrato.
A nulidade da cláusula IV, seu objecto essencial, importa nulidade do contrato adicional. Fica, assim, em vigor apenas o contrato de 1927, que deveria ser interpretado de acordo com o decreto n.º 19:869. isto é, calculando o valor actual do escudo-ouro pulo factor 24,444. A razão de direito está aqui, de resto, em pleno acordo com a lógica financeira e com a equidade.

Responda-se nestes termos à consulta da Câmara Municipal do Pôrto.

31 de Outubro de 1936. - A. Costa Leite.

Cópia. - Supremo Conselho de Administração Pública. - Consulta n.° 11. - Exa. Sr. Ministro do Interior. - Consulta V. Ex.ª este Supremo Conselho de Administração Pública sobre a execução da cláusula, abaixo transcrita, de um contrato realizado entre a Câmara Municipal de Coimbra e a União Eléctrica Portuguesa para o fornecimento de energia eléctrica, em vista da publicação dos decretos n.ºs 19:869 e 19:871, de 9 de Junho de 1931.
Emquanto não vigorar a moeda escudo-ouro o pagamento efectuar-se-á todo em escudos-papel, estabelecendo-se a equivalência, pelo câmbio médio da libra-cheque, preço de venda na Bolsa do Porto, desde que a sua desvalorização em relação à libra-ouro não seja superior a 15 por cento, porque, sendo-o, estabelecer-se-á a equivalência pelo câmbio médio de libra-ouro com o abatimento de 10 por cento.
Pretende V. Ex.ª e a Câmara Municipal de Coimbra saber o seguinte:
1.° Se entrou ou não em vigor o escudo-ouro;
2.° No caso afirmativo, se o pagamento deve fazer-se multiplicando os preços da tarifa pelo factor 24.444 ou continuar com as equivalências da libra, como anteriormente ao decreto n.° 19:869;
3.° Ainda nesta hipótese, se o valor da libra deve considerar-se fixo em 110$ nos termos dos artigos 1.° e 2.° daquele decreto n.° 19:869, ou sujeito a oscilações, para o efeito do cumprimento do estipulado na cláusula em questão.

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162 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 68

Respondendo às preguntas formuladas, entende este Supremo Conselho:
Quanto à primeira pregunta, que de facto entrou em vigor desde 1 de Julho de 1931 o escudo-ouro, em vista do disposto no artigo 1.° do decreto n.° 19:869.
Quanto â segunda pregunta, que o pagamento de energia eléctrica deve fazer-se multiplicando os preços da tarifa pelo factor 24,444, em vista do disposto no artigo 25.° do citado decreto, que determina que «os direitos e obrigações que por lei ou contrato estejam referidos ao escudo-ouro consideram-se desde 1 de Julho de 1931 referidos ao escudo-ouro definido no artigo 1.º deste decreto, multiplicando-se aquele por 24,444».
Quanto às restantes preguntas, ficam prejudicadas, em vista das respostas às preguntas anteriores.
V. Ex.ª, porém, resolverá como melhor lhe parecer.
Lisboa e Sala das Sessões do Supremo Conselho de Administração Pública, 9 de Março de 1932. - Alberto Osório de Castro - José Ribeiro Castanho (relator) - Amadeu Vítor de Miranda Monteiro - António Augusto Crispiniano da Costa - Miguel Homem de Azevedo Queiroz Sampaio e Melo.
(Tem o sêlo branco do Supremo Conselho de Administração Pública).
Está conforme. - Direcção Geral de Administração Política e Civil, 31 de Março de 1932. - O Director Geral, José Martinho Simões.
Está conforme a cópia existente no processo n.° 907, liv. 55, desta Procuradoria Geral da República.
Lisboa, 24 de Janeiro de 1940. - O Secretário da Procuradoria Geral da República, Carlos Cecílio Nunes Gois Mota.

Cópia. - Ex.mo Sr. Sub-Secretário de Estado das Finanças. - Para o pagamento à União Eléctrica Portuguesa do fornecimento de electricidade aos Serviços Municipais Gás e Electricidade do Porto, aquela Companhia pretende servir-se da base IV - Tarifas - para o exigir ao câmbio da libra-ouro, com abatimento de 15 por cento, ao passo que aqueles Serviços querem fazê-lo em escudos-ouro, actualizando-os pelo fautor 24,444.
Ora aquela base, na parte que diz respeito a êste assunto, regula para «emquanto não vigorar a moeda escudo-ouro», mas, como já demonstrámos no parecer desta Procuradoria Geral de 19 de Dezembro último, desde 1 de Julho de 1931 vigora o regime monetário escudo-ouro, conforme dispõe o artigo. 1.º do decreto n.° 19:809, de 9 de Junho de 1931, devendo por isso o contrato respectivo ser abrangido pelo artigo 25.° do mesmo decreto.
E, assim, entendo, como já se disse no anterior parecer, que, em face da citada base IV, não é esta que se aplica, mas o referido artigo 25.°, e nestas circunstâncias o pagamento à União Eléctrica Portuguesa tem de ser feito em escudos-ouro de 1911, actualizados pelo factor 24,444.
Esta doutrina não pode considerar-se modificada pelo decreto n.° 19:683, de 29 de Dezembro de 1931, pelo facto de o Batuco de Portugal ser dispensado transitòriamente da obrigação de manter a estabilidade da moeda portuguesa, nos termos dos artigos 1.° e 3.° do decreto n.° 19:869.
Foi votado por unanimidade pelo Conselho desta Procuradoria Geral.
Saúde, etc. - António de Oliveira e Castro.
Está conforme. - O Secretário da Procuradoria Geral da República, Carlos Cecílio Nunes Gois Mota.

Govêrno Civil do Porto - Ministério do Interior - Direcção Geral de Administração Política e Civil - Liv. 82 - N.° R - 11 - S. R. - Exmo. Sr. governador civil do distrito do Porto. - Tendo o Exmo. Ministro do Interior, por seu despacho de 30 do mês findo, concordado com o parecer emitido pela Procuradoria Geral da República sobre a consulta formulada pela Câmara Municipal de Gaia, relativa à conversão do escudo-ouro em escudo-papel, para efeito da liquidação das facturas de fornecimento de energia eléctrica pela Companhia Hidro-Eléctrica do Varosa, a seguir se transcreve, para conhecimento daquele corpo administrativo, o teor do aludido parecer:

«A comissão administrativa da Câmara Municipal de Gaia, por escritura de 5 de Janeiro de 1928, contratou com a Companhia Hidro-Eléctrica do Varosa o fornecimento de energia eléctrica.
No artigo 17.° do mesmo contrato ficou estipulado: Emquanto não vigorar a moeda escudo-ouro o pagamento efectuar-se-á em escudos-papel, estabelecendo-se a equivalência pelo câmbio médio da libra-cheque, preço da venda na Bolsa do Porto, desde que a sua desvalorização em relação à libra-ouro não seja inferior a 15 por cento, porque, sendo-o, estabelecer-se-á a equivalência pelo câmbio médio com o abatimento de 15 por cento.
Por deliberações tomadas nas sessões de 2 e 20 de Janeiro de 1932, foi o contrato modificado, segundo o acordo a que chegaram as duas partes contratantes.
Por escritura de 5 de Dezembro de 1933 foi o contrato novamente modificado, por virtude da qual passou a conversão do escudo-ouro em escudo-papel a ser feita nos termos do artigo 17.° e seu § único, que ficaram assim redigidos:
Artigo 17.° O escudo-ouro a que se refere o artigo 15.° é um escudo convencional da seguinte equivalência: 4$.50 equivalem a um soberano inglês (uma libra-ouro) de 7,98805 de ouro com o título de 916 2/3 por mil, ou sejam 7.32237 de ouro fino.
§ único. Se a Câmara de Gaia não pagar em ouro metálico, ou porque o escudo acima definido não vigore, ou porque não circule, ou ainda por qualquer outro motivo, o pagamento daqueles escudos-ouro será feito em escudos (moeda corrente), multiplicando-se o número de escudos-ouro pelo cociente da divisão por 4,5 da equivalência da libra-cheque em escudos (moeda corrente) no praça de Londres (cotação média do mês a que se refere a factura); mas quando na mesma praça a desvalorização da libra-cheque em relação à libra-ouro (metal) for superior a 15 por cento a conversão far-se-á tomando como base não a equivalência de libra-cheque em escudos, mas sim multiplicando-se os escudos-ouro facturados pelo cociente da divisão por 4,5 da semi-soma dos valores da libra-ouro (determinada, nos termos deste artigo, com base na cotação do ouro fino contido na libra-ouro metal na praça de Londres) com abatimento de 15 por cento e dos valores de libra-cheque, segundo a cotação da mesma praça (cotação média do mês a que se refere a factura).
O valor da libra, para base do pagamento da energia eléctrica, é determinado pela semi-soma de duas quantidades variáveis; uma, a libra-ouro, com desconto de 15 por cento; a outra, a libra-cheque, ambas segundo a cotação da praça de Londres.
Estando a Câmara de Gaia a pagar nos termos expostos o fornecimento da energia, pretende saber se é legal o procedimento adoptado.
Entendo que sim.
O artigo 25.º do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho de 1931, determina que os direitos e obrigações que por lei ou contrato estejam referidos ao escudo-ouro consideram-se desde 1 de Julho de 1931 referidos ao escudo-ouro definido no artigo 1.° deste decreto, multiplicando-se aquele por 24,444.

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Legislou-se, como se vê, sobre direitos e obrigações já estabelecidos, não podendo, portanto, aplicar-se a doutrina do referido artigo aos contratos celebrados posteriormente.
Assim, e porque no referido contrato de 5 de Dezembro de 1933 se estabeleceu que o pagamento de energia eléctrica fosse pago numa moeda convencional, o que, a meu ver, o decreto n.º 19:869 não proíbe, a Câmara Municipal de Gaia não pode eximir-se a realizar o pagamento segundo as cláusulas do contrato que está em vigor.
Este parecer foi votado no Conselho desta Procuradoria Geral por unanimidade».
A êste assunto se refere o seu ofício n.º 228, de 24 de Abril do corrente ano.

A bem da Nação.

Direcção Geral de Administração Política e Civil, 1 de Novembro de 1935. - O Director Geral, Mário Caes Esteves.

Está conforme. - Pôrto e Secretaria do Governo Civil, aos 28 dias do mês de Dezembro de 1936. - O Secretário do Governo Civil, Costa Lôbo.

17. Os contratos devem ser pontualmente cumpridos, diz o artigo 702.º do Código Civil; mas o princípio tem excepções.
Aquele que contratou, por erro, dolo ou coacção, ou estado de necessidade ou certas hipóteses, pode pedir a nulidade em determinados casos.
Mas, mesmo que o contrato não esteja viciado, pode um dos contratantes deixar de o cumprir por motivos supervenientes - o caso de força maior e o caso fortuito (Código Civil, artigo 705.º).
E quando é que há caso de força maior?
A questão tem sido largamente discutida. O conceito de caso de força maior não é entendido do mesmo modo pelos jurisconsultos. Podem supor-se duas hipóteses: ou o cumprimento é materialmente impossível, ou e de tal modo oneroso que excede toda a previsão, não a dos que contrataram, mas a previsão da generalidade dos contratantes; e cada uma delas corresponde a uma concepção. Mas aqueles que não dão ao caso de força maior a maior extensão fazem intervir na hipótese de grandes transformações a figura jurídica imprevisão.
Foram os canonistas medievais inspirados na doutrina cristã, que proibia todo o enriquecimento de um dos contratantes à custa dos outros, considerado contrário à moral, os primeiros a afirmar que não se devia ter em consideração para o cumprimento do contrato apenas a lesão contemporânea, mas também aquela que resultasse de modificações ulteriores, pois em ambos os casos havia usura.
E assim foram levados a subentender nos contratos a cláusula rebus sie stantibus 18.
Ora terá havido na história do mundo algum acontecimento financeiro tam grave como a queda da libra?
Ninguém poderá responder senão que nenhum até hoje excedeu este. Nem mesmo os descobrimentos e o potencial de ouro que deles veio para a Europa provocaram uma subversão tam profunda e tam ampla.
Basta notar que o ouro desapareceu da circulação em todo o mundo como moeda, que todas as notas de banco, e por toda a parte, deixaram de ser convertíveis, que as Casas da Moeda estão inactivas.
O ouro deixou de ser instrumento geral de trocas e deixou também de ser medida comum de valores.
Não mede, porque os Estados passaram a fixar directa ou indirectamente os- preços internos, umas vezes determinando-os por lei, outras vezes entregando essa função a certos organismos. Entre nós, por exemplo, aos organismos corporativos, que têm prestado neste ponto e na parte que dominam altos serviços.
Também nas relações externas o ouro não mede, não desempenha a antiga função.
O que mede os preços são as condições da balança de pagamentos, através dos direitos aduaneiros, das disposições do comércio bancário, dos acordos de vária natureza e de muitas outras providências.
O valor ouro, que é um valor universal, supõe um mercado único mundial, dominado pela livre concorrência. Esse mercado existe? A livre concorrência existe?
Em conclusão:
O Estado recebe os seus direitos em ouro pelo coeficiente 24,444 e manda pagar ou diz às Câmaras que devem pagar os fornecimentos de energia eléctrica pelo mesmo coeficiente.
Qual a razão por que os particulares hão-de receber ou pagar por coeficiente diferente? Pode afirmar-se depois de tudo o que se disse que a cláusula ouro está em vigor? E, estando em vigor, como se poderá determinar a forma do seu pagamento fora do coeficiente legal?
Mas não é necessário invocar nem a doutrina, nem a prática das nações, nem a moral, nem a tradição da jurisprudência portuguesa, nem a validade ou nulidade da cláusula ouro para resolver o caso das reclamações: a lei é expressa e clara.

III

18. O caso do primeiro representante é o seguinte:
A Herdade das Polvorosas pertencia à Casa do Infantado e foi arrematada perante a comissão interina da Junta do Crédito Público no dia ,29 de Abril de 1837, por Teixeira do Sampaio, depois Visconde do Cartaxo. Este vendou em 1862 a propriedade a três filhos. Era 1867, Alexandre de Sampaio, um dos filhos do Visconde, aforou a sua parte (terça) aos outros dois irmãos pela importância do 4:000$000 réis e o foro anual de 400$000 réis em ouro (moeda sonante). Foi então a terça parte avaliada em 12:000$000 réis, conforme se vê do título de contribuição de registo.
Em 21 de Março de 1868 foi este domínio directo vendido a António José de Andrade por 6:0005000 réis. o em 1882 novamente vendido a Manuel Lopes Maia pela importância de 6:000$000 réis.
Portanto, um domínio directo já constituído, tendo já passado por várias mãos.
Não parece ter sido para exercer uma função social, mas para colocar capitais e obter um juro.

19. Foi o senhorio recebendo os foros, até que chega a crise de 1891 e com ela o curso forçado. Discute-se a questão nos tribunais durante oito anos, tendo sido resolvida na 1.ª e 2.ª instância. Quando a questão está no Supremo as partes fazem uma transacção e a casa Bucknall obriga-se a pagar de futuro os foros em ouro e, quanto aos foros vencidos, pagou a quantia de 2:911$990 réis, com a declaração expressa de que esta quantia correspondia ao foro de 400$000 réis em moeda de ouro, pelo valor legal, com o correspondente ágio.
«Mas, por escritura de transacção de 11 de Abril de 1898, foi estipulado que as rendas relativas aos quatro anos decorridos de 1894 a 1897 seriam pagas em moeda de ouro, metal sonante, com o respectivo ágio, e as rendas relativas aos seis anos - 1898 a 1903 - seriam pagas em. notas do Banco de Portugal representativas de moeda de ouro, sem ágio algum».

18 Planiol et Rippert, Obligations, VI, n.ºs 391 e sgs.

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164 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 68

E assim foram decorrendo as relações entro senhorio e enfiteuta, até que, em 1933, o enfiteuta recusa-se a pagar em ouro, invocando o decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932.
Há larga correspondência, mas não chegam a acordo. Foi a questão levada ao tribunal.
O senhorio directo perdeu, em 1.ª instância e na Relação por unanimidade.
No acórdão diz-se que o pagamento na forma pretendida constituía um locupletamente a seu favor.
Recorreu para o Supremo e aí obteve vencimento mas por simples maioria, pois que em sentido contrário houve dois votos, um deles o do próprio relator.
Interposto recurso para o tribunal pleno, com fundamento em oposição deste acórdão com outros proferidos pelo mesmo tribunal, não se verificando oposição, a questão não voltou a ser apreciada. Terminada a fase declaratória, foi o acórdão dado à execução, a qual se inicia pela liquidação da quantia exequenda, feita a qual o enfiteuta compareceu no tribunal a pagar, do dia designado, os foros de 1932 a 1938, inclusive juros e custas, no total de 105.785$75, como tudo consta do termo do pagamento e quitação a fls. 363 e seguintes.

20. Antes de examinar a lei invocada o a decisão do tribunal explique-se o que pretendia o senhorio directo e o que queria pagar o enfiteuta.
O enfiteuta entendia que devia pagar 400$ a multiplicar por 24,444; o senhorio directo dizia que tinha o direito de receber em ouro ou pelo ágio internacional do ouro.
Reduzindo a números, e tendo em atenção o momento actual, o enfiteuta dizia que devia 9.777$60.
O senhorio que era credor, feitas as contas ao ágio actual de 47,77, de 19.108$.
Quere dizer: polo valor que o enfiteuta pretende pagar, um capital de 6 contos em 1882 tem em. renda perpétua o valor de 9.777$60, ou seja a taxa de juro de 66,66 por cento; pela forma como o senhorio directo quero receber, a taxa anda à volta de 400 por cento, livre do contribuição !!

21. Antes de pôr a questão no campo puramente jurídico, vejamos a questão no campo económico.
O senhorio diz-se proprietário ou com proprietário portanto, a sua parte pode ser sempre limitada polo rendimento da terra, pelo valor dos produtos da sua (?) terra.
A propriedade produz cortiça, trigo, talvez milho e azeite.
Ora os coeficientes de actualização, segundo o Instituto Nacional de Estatística, são para os géneros lá produzidos os seguintes:

Instituto Nacional de Estatística

[ver tabela na imagem]

Nota.- Os valores referem-se à venda por grosso.

Números-índices

[ver tabela na imagem]

Pela tabela transcrita vê-se que o coeficiente dos produtos agrícolas anela à. volta de 20, inferior portanto aos 24,444 por que o enfiteuta pretende pagar, menos de metade daqueles por que o senhorio quero receber.
Para se subtrair a este argumento, diz que o fôro não é tanto consequência, do prego dos géneros como da quantidade. Mas daqui resultaria o absurdo de numa propriedade aforada, já em plena cultura e em que não fosse possível ao depois haver produção superior à da época do aforamento, o foro ser superior, a aplicar-se o sistema do reclamante, cerca de três vezes o valor da produção.
Por outro lado, o aumento da produção é consequência de investimentos sucessivos de capitais e de trabalho e se o valor do foro fosse determinado fora do preço dos produtos ficaria por pagar o valor dos capitais investidos e dos salários dos trabalhadores.
A doutrina que o reclamante sustenta é incompatível com a enfiteuse. Com efeito, a enfiteuse perpétua tem na sua base a idea de que as valorizações sucessivas devem reverter para o foreiro, de modo que as prestações vão perdendo posição em face do rendimento do prédio até que deixe de constituir qualquer peso e com o dobar dos tempos se «corte suavemente a ligação entre o senhorio e o terreno»19.
No mundo moderno tem-se admitido a enfiteuse como uma forma de adquirir a propriedade, mas com destino a propriedade alodial, que é a mais perfeita, jurídica e socialmente. E como se entende que o enfiteuta há-de adquirir os capitais suficientes para poder libertar a propriedade? Com o desenvolvimento do seu rendimento, com o aumento dêste rendimento. No relatório do projecto de lei apresentado à Câmara Italiana em 1906 20 diz-se: «Nel frattempo l'enfiteuta avrà com-

19 José Rebêlo, O desastre das reformas agrárias, p. 34.
20 Pirro, Della enfiteusi, p. 632.

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pinto il miglioramento dei fundo; e com ragione e com utilitá sua e generale poderá deremir-se proprietário assoluto».
Mas se se fizesse o senhorio quinhoeiro na. quantidade, este momento u mica chegaria. Por isso no projecto do Código Civil Italiano se diz, o que aliás é doutrina nas enfiteuses perpétuas, que «o foro pode ser em géneros ou dinheiro, mas em quantidade fixa de produtos naturais, excluindo-se qualquer cota- proporcional, que exigiria uma fiscalização contínua do senhorio». Mas não vale a pena tanto argumento. O Código Civil Português (artigos 1656.º e 1692.º) opõe-se expressamente à pretensão do reclamante.
Deve, porém, acentuar-se que se o senhorio tivesse parte na quantidade tinha achado o processo mais espantoso de usura. A juros compostos qual seria o capital de um foro perpétuo?

22. A moeda é a expressão de um preço de aquisição e não uma simples designação formal. Ora o coeficiente 24,444 é hoje sensivelmente igual à elevação do custo da vida, que anda medido por 19,06; basta consultar a tabela dos índices.
Vê-se de tudo o que se expõe que o senhorio directo é, neste ponto, excepcionalmente beneficiado, porque nada perde, ao passo que outras rendas do passado perdem muito.
É possível que com os 9.777$60 não compre hoje a mesma cousa que comprava em 1862; mas esta desvalorização não vem da queda da moeda desde 1914 para cá, nem da inconvertibilidade; vem da sucessiva degradação que, com poucas excepções no tempo, o ouro teve no século passado.
Mas compra mais do que comprava em 1914, e é isso que importa.
Postas estas considerações, que demonstram inequivocamente que o senhorio directo nada perde com a importância que lhe queria pagar o enfiteuta e só deixa de se enriquecer à custa dele e com o pretexto do valor do ouro, passemos ao problema jurídico.

23. Em seguida à lei da estabilização, foi publicado o decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931, que dispôs:

Nos contratos de arrendamentos, enfiteuse ou sub-enfiteuse, anteriores a 31 de Dezembro de 1920, seja feito em ... ou só em ouro ... o pagamento da renda ou o pagamento e remição de foro obedecerão ias seguintes regras:
a) Tendo estipulado o pagamento em ouro, observar-se-á o disposto no artigo 25.º do decreto n.º 19:869, de 9 de Junho do ano corrente...

O decreto n.º 19:869, de 9 de Junho de 1931, dispõe no artigo 25.º:

Os direitos e obrigações que por lei ou contrato estejam referidos ao escudo-ouro consideram-se desde 1 de Julho de 1931 referidos ao escudo-ouro definido no artigo 1.º deste decreto, multiplicando-se aquele por 24,444.

O artigo 5.º do decreto n.º 19:870 diz:

O Banco de Portugal é obrigado a manter desde 1 de Julho de 1931 e na relação fixada no artigo 1.º do decreto n.º 19:869, a estabilidade do valor da moeda portuguesa.

Tal é o regime do pagamento da enfiteuse emquanto vigorou. Como se calculava então o foro? Multiplicava-se 400$ por 24,444 e obtinha-se 9.777$60, que seriam pagos em escudos-ouro ou em notas, à escolha do devedor.

24. Mas em Dezembro a libra caiu em Inglaterra decreta-se a inconvertibilidade e por toda a parte a moeda começa a subverter-se.
O decreto n.º 20:683, de 29 de Dezembro de 1931, no artigo 1.º, diz: «É o Banco de Portugal dispensado transitòriamente e até 30 do Abril de 1932 da obrigação constante do artigo 5.º do decreto n.º 19:870, de 9 de Junho de 1931, continuando a ser obrigatório para o Banco o reembolso das notas, previsto no artigo 10.º do mesmo decreto.
O Banco poderá porém fazer este reembolso em cheque sobre Londres na equivalência de uma libra esterlina por 110$, acrescida dos encargos referidos no § único do mencionado artigo 15.º».
Quere dizer: o decreto suspendeu os princípios da convertibilidade no que se refere ao ouro. Suspensa a convertibilidade, ainda se poderá fazer o pagamento de foros com o mesmo coeficiente?
Note-se o quê se disse sobre a natureza e extensão da convertibilidade.
Suponhamos, na pior das hipóteses, que não, que o decreto ficou sem efeito, arrastado pela queda da moeda - apenas uma suposição, porque a questão não é tam simples como a alguns se afigura.
Mas o que sucedeu depois?
Depois de suspenso o sistema no que se referia a pagamentos em ouro, foi publicado o decreto n.º 21:199, cujo artigo único diz o seguinte:

O artigo 7.º do decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931, fica tendo a seguinte redacção:
Artigo 7.º Nos contratos de enfiteuse ou sub-enfiteuse anteriores a 30 de Dezembro de 1920, em que se haja estipulado o pagamento do foro, sendo feito em ... ou só em ouro.
O pagamento e a remição do fôro obedecerão às seguintes regras:
a) Tendo estipulado o pagamento em ouro, observar-se-á o disposto no artigo 25.º do decreto n.º 19:869, de 9 de Junho do corrente ano.

Quere dizer: depois da suspensão da convertibilidade1 foi publicado um decreto que estabelece doutrina sobre os pagamento de foros ouro. E que diz esse decreto? Que para obter o valor do foro ouro se deve multiplicar por 24,444; isto é, pelo mesmo factor que tinha sido estabelecido no regime da convertibilidade.
Esta conclusão é uniformemente aceite pelos jurisconsultos que têm examinado o problema.
No processo Rebêlo-Bucknall há pareceres do Professor Dr. Alberto dos Reis e dos advogados, que foram presidentes da Ordem, Vicente Monteiro e Domingos Pinto Coelho, em que se afirma, mas sem qualquer dúvida, que o pagamento do foro te faz multiplicando o escudo por 24,444, em harmonia com o decreto.
A mesma conclusão defende o Professor Ruy Ulrich (parecer no processo entre a Câmara Municipal do Porto e a União Eléctrica). Nesse parecer escreve:

Com efeito, o decreto n.º 20:188, de 8 de Agosto de 1931, depois modificado pelo decreto n.º 21:19.9, de 4 de Maio de 1932, expressamente subordina ao referido artigo os contratos de enfiteuse e de sub-enfiteuse. Na verdade, aqueles decretos, regulando os referidos contratos anteriores a 31 de Dezembro de 1920, dispõem como se há-de fazer o pagamento do foro quando ele tiver sido estipulado em ouro, em prata, ou em ouro e prata, e sem que nesta última hipótese se ache fixada a proporção.
Se o pagamento estiver estipulado em ouro e prata, entender-se-á que 10$ serão pagos em prata e o resto em ouro, conforme se disse.

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Portanto o legislador aplicou a norma geral do decreto n.º 19:869 a todos os contratos de enfiteuse e sub-enfiteuse com a cláusula ouro. E note-se que o fez em 1932, quando já os decretos n.ºs 20:083, de 29 de Dezembro de 1931, e 21:190, de 2 de Maio de 1932, haviam adiado a entrada em vigor do novo regime monetário estabelecido no decreto n.º 19:869.
Quere dizer, o legislador entendeu, e bem, que aquele decreto nada tinha nesta parte com a inconvertibilidade das notas do Banco de Portugal, e tanto que o mandou aplicar quando tal inconvertibilidade foi mantida.
Por outro lado, o legislador mostrou assim bem claramente o carácter geral do preceito estabelecido pelo decreto n.º 19:869, mandando-o aplicar a todos os foros estipulados em ouro, sem temer que com isso tosse restringida, a ampla faculdade do artigo 726.º do Código Civil, expressamente confirmada para os emprazamentos do artigo 1686.º
Seria, na verdade, curioso que o artigo 23.º do decreto n.º 19:869 se considerasse aplicável aos contratos de enfiteuse e sub-enfiteuse, o que não parece poder ser hoje contestado...

O Professor José Gabriel Pinto Coelho 21, que aliás entende que a cláusula ouro devia vigorar em toda a sua pureza, escreve, referindo-se ao decreto de Maio de 1932: «Mas esta disposição, confusa e imprecisa, é, felizmente, restrita às prestações provenientes dos contratos de enfiteuse e sub-enfiteuse, em relação às prestações resultantes de qualquer outra obrigação; subsistem os princípios gerais por nós indicados».
Em 11 de Junho de 1932, em carta dirigida a Bucknall (a fl. 84), diz: «Para maior segurança do meu ponto de vista vou nesta data pôr anúncios nos jornais convocando os senhorios de foros em ouro para um movimento de representação ao Governo, no sentido de ser revogada a lei injusta...».
Na carta de 15 de Maio de 1933, dirigida ao procurador da firma Bucknall, diz: «Por outro lado, como a lei, na intenção do legislador, foi feita na hipótese de moeda estabilizada em uma certa base, como depois disso essa base mudou por ter o escudo acompanhado a descida da libra, parece-me fácil obter por representação dos interessados uma modificação da lei, no sentido de se modificar o factor de multiplicação».
E na carta de 21 de Janeiro de 1934 diz: «Só agora, regressado com mais demora do estrangeiro, pude ocupar-me do assunto, sobre o qual tencionava apresentar ao Ministro da Justiça uma representação pedindo que a questão fosse totalmente esclarecida. Mas agora, estudando a questão mais a fundo com o meu advogado, vejo que a lei é bastante clara ...,etc.».
Quando estava convencido de que o sentido da lei era...o que ela tinha..., disse que ia representar ao Governo..., parecendo-lhe fácil obter uma modificação.

25. Pretende o reclamante que não é assim, e para isso afirma que o artigo 7.º não revogou o artigo 724.º do Código Civil, porque o artigo limita-se «apenas a estabelecer a equivalência verbal e numérica entre as antigas unidades monetárias (moeda padrão) de ouro (mil réis ouro do escudo antigo e o novo escudo ouro), visto que pelo novo sistema monetário a relação ponderai entre aqueles e esta é de 1 para 24,444, segundo o disposto no artigo 25.º do decreto n.º 19:869 ... Era pois necessário alterar as expressões numéricas das pensões, mas não o seu conteúdo, nem a sua espécie, para manter o seu valor.
Esta necessidade, porém, surgiu - note-se bem - não no momento da publicação do decreto n.º 20:188, em relação aos foros, mas já antes, no momento do próprio decreto n.º 19:869, em relação a todos os contratos de que pudessem resultar prestações em ouro, ou que pudessem traduzir-se em prestações em ouro.
De tudo pé infere a inutilidade das definições do artigo 7.º do decreto n.º 20:188 quanto às prestações em ouro, embora por simples referência ao artigo 25.º do decreto n.º 19:869, porquanto tudo estava acautelado nestes artigos, em relação a todos os contratos e, portanto, em relação também aos emprazamentos».
Quere dizer, para se poder afirmar que não é o novo decreto que regula a questão é preciso concluir que ele é inútil e o que diz já estava dito.
Mas então publica-se uma lei inútil? Uma lei que diz somente o que já estava dito?
É evidente o absurdo. O decreto não veio determinar o valor ponderai, porque esse valor estava determinado na reforma monetária. Era aí o seu lugar próprio.
Também não precisava de declarar qual a forma de pagamento dos foros para quando se restabelecesse a reforma monetária, em toda a sua extensão, porque:
a) Não se publicam leis para vigorar quando for publicada uma outra lei que se não sabe quando poderá vir;
b) Nem para dizer o que já estava dito, porque a alteração do artigo 7.º é insignificante.
O decreto vem regular o que o reclamante não deseja..., mas não parece bastante que uma lei deixe de existir só porque não convém a qualquer.

26. Outro argumento é este ou parece ser este: aplica-se o factor 24,444 e obtém-se o resultado 9.777$60, não em moeda de papel, mas em ouro; como não há moeda de ouro paga-se em soberanos; como não há soberanos paga-se, pois, ao ágio internacional.
Para que serviu a primeira multiplicação? Há dois coeficientes para este foro?
Com efeito multiplica-se o estudo por 24,444. Depois terá de multiplicar-se o resultado por que factor? Onde está êsse factor? É o que resulta, da diferença entre a libra e o ouro? Mas se assim fôsse porque não multiplicava logo os 400$ pelo ágio do ouro?
A que conduzem...as interpretações erradas. Mas leia-se o que o reclamante escreveu, pois é elucidativo.

27. Posto isto, vejamos o que se legislou no decreto reclamado.
No relatório diz-se que quando, s111 harmonia com a lei anterior, o foro é em ouro, «obtém-se aplicando o coeficiente 24,444 (decreto n.º 20:188, alínea a), do artigo 7.º)».
E que diz o decreto?
No artigo 1.º, alínea b), dispõe-se: «Se se tiver fixado o foro em ouro, qualquer que seja a data do contrato, o pagamento será em moeda corrente, multiplicando-se o foro convencionado por 24,444».
Quere dizer: o decreto nada innova neste ponto. Reproduziu a legislação existente. E porque a reproduziu?
Adiante se dirá.

28. O caso da segunda reclamante é o seguinte: Por escritura de 3 de Janeiro de 1840 foi aforada a herdade de Xévora, tendo-se estipulado o foro anual de 400$000 réis, prata ou ouro.
Este fôro aparece pela primeira vez registado na Conservatória a favor de Justo Garcia em 1 de Junho de 1867, por o ter comprado a António José da Orta (Visconde da Orta) por escritura de 14 de Maio de 1857, la-

21 Obrigações, p. 111.

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vrada pelo notário da comarca de Lisboa, António de Abranches Coelho, nào constando porém da descrição qual o preço.
Posteriormente, é logo a seguir, aparece registado a favor do Dr. José Maria Barata Pedroso dos Reis e esposa, D. Baldomeira Cândida Mocinha Garcia Pedroso, por lhes ter sido doado por escritura de 29 de Novembro de 1879, lavrada a fl. -32 do liv. 127 do notário José Maria Nogueira, de Campo Maior, por D. Maria José Mocinha de Garcia, à qual coubera em meação, salvo o valor atribuído ao foro nas partilhas por óbiro de seu marido, Justo Marcos Garcia, como mostrou por carta de sentença de 26 de Fevereiro de 1872, pausada pelo referido escrivão notário José Maria Nogueira, do julgado municipal de Campo Maior.
(Também neste registo não consta o valor em que o dito foro fora doado ou coubera em meação à viúva).
O registo que segue é a favor de D. Ana Cristina Garcia Pedroso Barata, a quem fora adjudicado em legítima, no valor de S.922$43, na partilha por óbito de sua mãi, D. Baldomeira Garcia Pedroso Barata, levada a efeito por escritura de 22 de Maio de 7-9/5, lavrada pelo notário Canhão e à qual ficara em meação na partilha por óbito de seu marido, José Maria Pedroso Barata dos Reis, levada a efeito por escritura de 20 de Agosto de 1911, também do notário Canhão, não constando, porém, o valor em que a esta fora adjudicada.
Quere dizer, adjudicado em 1857 por 6:000$000 réis, doado mais tarde pelo valor de 11.077$ e em 1908 adjudicado por 9.922$43, mas incluindo outras propriedades.
Trata-se, portanto, de um foro a pagar em ouro ou prata. A senhoria queria que fosse em ouro, e de prata só se dizia obrigada a receber até à importância em que esta tem poder liberatório, segundo a lei de 1911.
Como em tempos se houvessem levantado dúvidas quanto à forma do pagamento das pensões respeitantes aos anos de 1924 e 1925, foi proposta acção no Tribunal, vindo o Supremo Tribunal de Justiça a decidir, por acórdão de 29 de Janeiro de 1929, que os

foros vencidos e os vincendos fossem pagos à senhoria directa em moeda metálica, prata ou ouro, ou no equivalente em escudos ao câmbio do dia do pagamento.

Correu a execução da sentença proferida e nela se levantou a questão de saber em que espécie de moeda devia realizar-se o pagamento do foro e, quanto a esta parte, o despacho do juiz de 1.ª instância, de 4 de Abril de 1930, estabeleceu que o aludido pagamento podia ser feito por alguma das três formas seguintes:
a) Em moeda metálica de prata, e pelo seu valor nominal ou facial, visto ela existir em curso legal no País;
b) Em moeda metálica de ouro;
c) Em escudos, a importância equivalente a 400$ ouro, ao câmbio do dia do pagamento.
O acórdão da Relação de Lisboa de 8 de Dezembro de 1930 revogou este despacho, mas o Supremo decidiu, por acórdãos de 2 de Junho de 1931 e 16 de Dezembro de 1932, este último em sessão plena, que transitaram em julgado, que o pagamento fosse feito na forma indicada pelo juiz da 1.ª instância, limitando porém o poder liberatório da prata a 10$, visto o que dispunha o decreto de 22 de Maio de 1911. Quere dizer: o Supremo, que tinha mandado pagar em ouro ou prata, manda agora pagar em ouro e prata.
Novas divergências suscitou tal decisão, pois as Misericórdias invocaram o decreto n.º 21:199, de 4 do Maio de 1932, artigo 7.º, e pretenderam pagar em sua conformidade; porém, o despacho de 31 de Maio de 1933 do juiz da 1.ª instância, de que se não recorreu, rejeitou a pretensão dos embargantes.
Pagaram as Misericórdias, mas em 1933 de novo estas opuseram embargos com fundamento naquele decreto, dizendo que deviam pagar nas seguintes condições:
a) Em 200$ prata, poder liberatório desta moeda, conforme o decreto n.º 19:871, de 9 de Junho de 1931;
b) Em 200$ ouro, pagos em escudos, conforme o valor fixado, nos termos dos decretos n.ºs 20:188. de 9 de Agosto de 1931, e 21:199, de 4 de Maio de 1932.
A requerente alegou a excepção de caso julgado, foi ela rejeitada por despacho da 1.ª instância de 6 de Outubro de 1934, despacho que os acórdãos da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça, respectivamente de 1 de Maio de 1935 e 25 de Maio de 1937, revogaram, ficando resolvido que, contra a pretensão dos embargantes, prevalecesse a aludida excepção.

29. O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de Janeiro de 1929, decidiu que

os foros vencidos e os vincendos fossem pagos à senhoria directa em moeda metálica «prata ou ouro», ou no equivalente em escudos ao câmbio do dia do pagamento.

O acórdão do mesmo Tribunal e sobre a mesma questão, nos embargos à execução, decidiu que o pagamento se fizesse:
a) Em moeda metálica de ouro;
b) Em escudos, a importância equivalente a 400$ ouro, ao câmbio do dia do pagamento;
c) Em prata até 10$.
É intuitivo que este acórdão é contrário ao anterior de 1929, sobre a mesma questão, porque o primeiro diz ouro ou prata e o segundo diz ouro e alguma prata.
Não é a mesma cousa. A obrigação que era alternativa converteu-se em simples. O tribunal de execução desnaturou o caso julgado. Poderia dizer-se de aplicar o disposto no artigo 675.º do Código de Processo Civil; mas digamos apenas que o segundo acórdão desprezou o que já tinha sido julgado, substituindo-o por nova decisão e esta manifestamente contra lei.
Mas o que diz o decreto reclamado neste ponto?
Acaso proibiu o pagamento dos foros em ouro ou prata? Privou da escolha do metal o senhorio ou o enfiteuta?
Não. Apenas, repetindo a lei anterior, disse que o quantitativo dos foros em prata se obtém multiplicando por 10 a prestação. Era o que já estava, mas se não estivesse podia fazê-lo de novo, porque é ao Estado quo cumpre determinar a equivalência da moeda, de ouro ou prata, quando estas desaparecem com os novos instrumentos monetários.
Disse que, dos foros em ouro e prata, a prata pode ir até 200$ para harmonizar a lei com o regime monetário, mas este foro, como resulta do contrato, foi constituído em ouro ou prata.

30. Como deveriam pagar as Misericórdias segundo-a lei 400$ a multiplicar por 10 = 4.000$, e foi por esta importância que a senhoria tem pago a contribuição. O Quanto foram obrigadas a pagar peio acórdão? 18.640$30.
Em 9 anos de foros a Misericórdia pagou 160.094$2õ.

Agora compare-se com o rendimento da propriedade. Esta esteve arrendada de 1904 a 1914 por 2.000$, como consta da respectiva escritura, que era dividida assim: para a senhoria e 1.600$ para a Misericórdia. De

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1934 a 1939 a renda foi estipulada em géneros, mas, feita a redução a dinheiro e tomando em conta os descontos sofridos no trigo, não atinge 40 contos. Os foros a pagar em harmonia com o acórdão representam neste período mais de 50 por cento da renda. E assim a senhoria, que no período da moeda estável recebia 1/3 do rendimento, passou a receber metade. E se o ágio do ouro continuar a subir, o rendimento poderá ser todo absorvido em cada ano e...até a propriedade! É justo? É legítimo?

31. Segundo o contrato, trata-se de uma obrigação alternativa: o pagamento deve ser feito em moedas de ouro ou moedas da prata. Esta clausula era válida à data do contrato. Acaso foi posteriormente alterada?
O Código Civil dispus no artigo 727.º, § 1.°:

Se à estipulação em escudos acrescer a do metal da moeda em que deve ser feito o paganismo, sem que aliás se tenha designado a espécie dela, o devedor fá-lo-á em moeda corrente no tempo do pagamento, contanto que essa moeda seja do metal estipulado.

E portanto era válida e continuou a ser a estipulação da moeda em prata.
E como nas obrigações alternativas, à falta de cláusula, a escolha pertence ao devedor, este podia escolher ouro ou prata.
Mas o regime monetário de 29 de Julho de 1854, artigo 9.º, que dispôs: «É extensiva às obrigações contraídas antes da promulgação desta lei, ainda mesmo quando tenham a designação de ouro ou prata, ou quando nelas se tenha declarado a espécie da moeda em que devem ser satisfeitas», teria alterado a cláusula? Sem dúvida. Mas depois do Código Civil a disposição deixou de ser de ordem pública. Pelo monos é a opinião do Dr. Guilherme Moreira 22. «Não pode aplicar-se de modo algum às obrigações contraídas posteriormente à - publicação no Código Civil, em que se estabeleceu o princípio de que as prestações em dinheiro serão feitas na fornia convencionada (artigo 723.º), sendo permitido às partes estipular livremente que a prestação em dinheiro, seja qual for a quantia, será paga em moedas de prata, de níquel ou de cobre». Veja-se Paulo Cunha23.
Portanto, depois do Código Civil o carácter de ordem pública da porção- de moeda subsidiária desapareceu e só vale na falia de convenção. Isto mesmo resulta. de leis posteriores e até em matéria de leis de foros que dizem: «se o pagamento for em prata», sem qualquer restrição.

32. E o diploma reclamado introduziu alguma emenda a este respeito?
Absolutamente nenhuma.
O que é que dizia a antiga legislação?
O artigo 7.º do decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932, a respeito dos pagamentos em praia, no artigo 1.ª, alínea c), diz:

Se se, tiver estipulado o fôro em ouro ou prato, o devedor poderá libertar-se julgando o fôro em moeda corrente e com a aplicação do coeficiente 10 se a enfiteuse fôr anterior a data prevista na alínea a); d) Se, no caso da alínea anterior, a escolha do metal pertencer por força do contrato ao senhorio, este poderá escolher o ouro e o pagamento será feito em moeda corrente, aplicando-se o coeficiente da alínea b).

Também neste ponto o decreto não innova.
Mas se innovasse, tê-lo-ia feito dentro dos mais rigorosos princípios do direito, da economia, da justiça e da moral.

33. Não tendo o decreto nada innovado nestes dois pontos, porque se publicou?
Nada innovou nestes dois pontos, mas innovou em outros.
Assim: em matérias de foros pagos em géneros e dinheiro estabeleceu-se, para melhor repartir o desequilíbrio da desvalorização da moeda, que melada dos foros sei ia sempre paga em géneros.
Depois: em matérias de foros urbanos considerou a parte do prédio em inquilinato comercial e a parte em inquilinato urbano, pois anteriormente só se atendia ao inquilinato de habitação, cujo coeficiente é inferior.
Em matéria de moeda subsidiária passou de 10§ para 200$ o valor liberatório da prata em harmonia com o novo regime monetário.
Quere dizer: nas duas innovações que fez o decreto interveio sempre em favor dos senhorios directos e no sentido de repartir com mais justiça o desequilíbrio criado pela queda da moeda.

34. O decreto teve ainda mais objectivos, e estão indicados no n.º 2 do relatório, e um outro ainda. Os acórdãos são manifestamente decisões contra lei. O primeiro considera de ordem pública o limite estabelecido para o poder liberatório da prata, mesmo contra a convenção, viola portanto as disposições do Código Civil e dá ao regime monetário uma natureza que ele não tem. O segundo, partiado do princípio de que a cláusula ouro subsiste no caso dos todos, manda calcular a forma do pagamento em referência a moeda que não existe, e, porque não existe, pelo seu ágio internacional, e com igual e manifesta violação de uma lei de ordem pública.
Estas decisões alteram o sistema monetário, e essa faculdade pertence aos orgãos legislativos, e, se é certo que duas decisões não constituem destruição, sob o ponto de vista teórico, de um regime monetário, o precedente pode generalizar-se.
Por outro lado, as decisões dos tribunais eram divergentes e as concordâncias manifestavam-se no próprio Supremo Tribunal, a quem incumbe definir a jurisprudência, mas sem infringir o sentido expresso das leis, e a questão não pode ser examinada pelo tribunal pleno.
Examinadas as decisões, viu-se que havia algum desconhecimento da natureza peculiar do sistema monetário, e foi para essa natureza que se procurou chamar a atenção dos tribunais. A lei não é uma simples expressão formal e puramente técnica que vira por si; pressupõe um conteúdo social, económico, político, etc., e é por isso que para conhecer em rigor as instituições jurídicas é necessário conhecer o seu conteúdo, a natureza dos interêsses que tutelam e o sentido dos seu objectivo.
É necessário conhecer as instituições sociais. O julgador que se dedica apenas ao estudo formal da lei pode conhecê-la no seu logicismo, na sua expressão técnica, mas não conhecerá em rigor a lei, e as suas decisões, longe de resolverem os problemas, mais ainda os agravam. Podem imobilizar uma atitude mas não resolvem nenhuma questão, porque ou esmagam os interêsses que deviam ser protegidos ou os tornam virulentos, colocando os que os defendem em estado de perturbar a paz social. Quis-se explicar no relatório o problema e chamar para êle a atenção dos tribunais. E poderia fazê-lo? Não parece de contestar esta facul-

22 Obrigações, n.° 32.
23 Obrigações, n. p. 162.

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dade, mas seja-me permitido inserir aqui a circular que, o Ministro da Justiça, em França, enviou em 1926 ao Procurador Geral.

35. Circular do Ministro da Justiça (16 de Julho de 1926).
Fui informado de que as convenções que têm por objecto iludir o pagamento em notas do Banco de França, tomadas pelo seu valor nominal, tendem a aumentar e os tribunais são ou serão frequentemente chamados para se pronunciarem sobre a sua validade.
As cláusulas mais usuais prevêem o pagamento em ouro ou em espécie metálica, em moedas estrangeiras valorizadas, ou em moeda fiduciária francesa, sobre a base ouro de uma moeda estrangeira, ou, segundo um índice económico, em cupões de renda de 4 por cento, 1925, com garantia de troca, ou, finalmente, em géneros ou. mercadorias.
Estas cláusulas levantam problemas práticos, acerca dos quais me parece indispensável chamar a vossa mais cuidadosa atenção: é necessário que nos negócios desta natureza os agentes do Ministério Público apresentera à audiência, conclusões cuidadosamente estudadas que coloquem o problema no seu verdadeiro sentido, apresentando-o como um dos mais graves da hora actual, visto que ele interessa evidentemente à ordem pública, ao crédito da nota do Banco de França e compromete gravemente o futuro económico do país.
Qual será a doutrina destas conclusões?
Certamente que não convém - agora que o Tribunal de Cassação se não ocupou ainda do conjunto da questão e não estabeleceu os princípios aplicáveis - dar, por via de circular, instruções determinando imperativamente o limite entre as cláusulas lícitas e aquelas que o não são.
As observações que só seguem não têm, na sua ordenada generalidade outro fim que não seja dar as directrizes nos vossos agentes, as indicações particulares a cada espécie, devendo apenas permitir determinar todas as distinções úteis às soluções que cada assunto comporta.

I

Antes de mais nada é incontestável que entre franceses e tratando-se de transacções que se efectuem no nosso território a cláusula «pagável em ouro ou e m espécies metálicas» é considerada nula por ser contrária às disposições inerentes às leis de ordem pública relativas ao curso legal e ao curso forçado das moedas nacionais (v. Tribunal de Paris, 22 de Fevereiro de 1924, D. P. 1924. 2. 17, S. 1925, 2. 43 e Journal Clunct, 1924, p. 691, com as conclusões do advogado geral Eugénio Dreyfus).
Está nos mesmos casos e pelo mesmo motivo a cláusula do pagamento em moedas estrangeiras.
Também não poderá ser válida a cláusula pagável em moeda legal francesa sobre, a base ouro ou de uma moeda estrangeira cotável, sentido o seu fim o pagamento de uma importância suplementar ou ágio igual à depreciação na moeda fiduciária em relação ao ouro ou à moeda estrangeira que se tem em vista e tende a reduzir a nota do Banco de França ao papel de simples moeda reguladora, desprovida de qualquer valor próprio; um tal resultado, evidentemente lastimável sobre o ponto de vista económico, é, além disso, directamente contrário às leis da circulação da moeda fiduciária francesa.
A questão, ainda não apreciada pela justiça, relativa à fixação de um preço variável de harmonia com um índice económico é mais delicada: se o preço é estipulado como variando em função de um dos elementos que serviram para o determinar, parece que não se pode contestar a validade dos contratos assim redigidos: é o caso da maior parte dos mercados denominados «em escala», nos quais a revisão está baseada sobre o preço das matérias primas constitutivas ou da mão de obra necessária. Mas quando se trata de um preço variável, conforme um dos índices dos preços por grosso e a retalho, à medida que são fixados periodicamente, ocorre preguntar se o fim de uma tal convenção não é na realidade o de escapar ao curso legal e ao curso forçado. Convém não menos notar que no geral a doutrina tende a admitir que os contratos de escala móvel são lícitos. (V. principalmente D. Hebd, 1926, n.° 14).
Competirá aos tribunais pronunciarem-se sôbre a validade da cláusula de pagamento em cupões da renda de 4 por cento, 1923, e dizer se uma tal cláusula não deve ser considerada também como uma forma de eliminar a moeda legal e se ela não chega em definitivo ao mesmo resultado do que aquelas precedentes cuja. nulidade não é contestável. Os vossos agentes, em qualquer estado da causa, não deixarão de frisar que entre as modalidades dos contratos privados e as cláusulas e condições de um empréstimo público, operação excepcional dos poderes públicos autorizados por uma lei especial, não há semelhança possível.
Competirá igualmente aos tribunais determinar em que limites e por que contratos a cláusula de pagamento em géneros ou mercadorias pode ser admitida sem ser considerada como uni meio de iludir as proibições da lei. (V. Tribunal de Ruão, 16 de Novembro de 1922, D. P., 1926. 2. 57).

II

Em matéria internacional as razões imperiosas por meio das quais o curso legal e o curso forçado se justificam nas relações internas já não poderiam ser invocadas; as prescrições imperativas das lei de ordem pública devem, neste caso, ceder e deixar livre curso às convenções das partes; com efeito não há que afastar convenções que, longe de pesarem intempestivamente sobre o nosso câmbio, são, pelo contrário, favoráveis ao crédito público quando obrigam o devedor estrangeiro, ou operador no estrangeiro, a importar para França espécies metálicas ou moedas cotadas (V. Cass. req. 7 da Junho de 1920, D. P. 1920. 1187, S. 1920. 1.193).
A jurisprudência terá sempre de determinar o que se deve entender por relações internacionais e definir com cuidado o campo de acção que lhes deve ser reservado. Bastará indicar aqui que os contratos pertencentes a esta categoria são aqueles que dizem respeito a operações que, realizando-se no território de dois Estados, se regulam por apelo de troca de um Estado sobre outro Estado e redundam finalmente num entendimento de país para país; é principalmente nas relações do comércio internacional que tais contratos são de uso corrente; admite-se sem estorço que os pagamentos internacionais a que visam êsses contratos possam efectuar-se por outra forma que não a da nota do Banco de França, e que eles escapam ao euro forçado; daí o recente acórdão do Tribunal de Cassação determinando que é «uma medida tomada no interesse nacional e restrita ao território da nação que a institue» (V. Cass. cv., 23 de Janeiro de 1924, S. cherrer North c. Banque hipotecário de Bale, Journal Clunet, 1924, p. 685).
Consequentemente, nas relações internacionais, o devedor francês não pode, fugindo ao curso forçado instituído em França, subtrair-se ao costume estabelecido (em moeda estrangeira, por exemplo), que expressa ou

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implicitamente aceitou por contrato; por seu lado o devedor estrangeiro, ou agindo no estrangeiro, tendo de efectuar um pagamento em França, também não pode opor-se à regra puramente interna do curso forçado.
Em compensação - e eis o ponto capital - as transacções internas efectuadas entre franceses e estrangeiros, tais como a venda ou arrendamento de imóveis situados em França, não dando lugar a qualquer movimento de fundos de país para país, devem, sem derrogação possível, terminar por uma liquidação em dinheiro legal francês; ou, pelo menos, só sob esta condição é que eles são susceptíveis de execução forçada em França. As leis monetárias são leis de ordem pública, obrigando todos os que habitam o território; não é possível eximir-se a elas por convenções particulares, e se fosse suficiente, para tornar válida a cláusula ouro e as cláusulas sucedâneas, fazer intervir na convenção um co-contratante estrangeiro (ou até fixar um lugar de pagamento no estrangeiro), inúmeras fraudes seriam para recear e contratos normalmente regidos pela lei francesa socorrer-se-iam arbitrariamente de qualquer elemento estrangeiro para se subtraírem às prescrições imperativas dessa mesma lei francesa.
O Sr. Ministro das Finanças, no ofício que me dirigiu chamando a minha atenção para estas questões, frisa este ponto da seguinte maneira:
«Uma distinção assaz frequentemente usada consiste em opor um contrato concluído em França, entre franceses, a um contrato no qual unia das partes é de nacionalidade estrangeira; esta distinção não assenta evidentemente sobre qualquer fundamento e na minha opinião não pode duvidar-se de que um contrato de empréstimo, de venda ou de locação de imóveis realizado em França entre um francês e um estrangeiro residente em França deve ser expresso em francos. Parece que por relações internacionais se deve entender o comércio internacional e todas as operações efectuadas com pessoas residindo no estrangeiro (seguros, corretagens, direitos de autor, patentes, etc.); por tudo o que diz respeito às questões de troca, é de facto a territorialidade e não a nacionalidade que importa».
O recente acórdão do Tribunal de Apelação de Paris adopta este critério e consagra este sistema nos seguintes termos:
«Considerando que a qualidade de estrangeiro que pertence ao credor mesmo domiciliado em país estrangeiro ao é suficiente por si para lhe permitir reclamar a execução sobre território francês de uma convenção que constitue uma infracção à ordem pública; que é a natureza da convenção em vista que convém ter em conta antes mesmo da personalidade dos co-contratantes;
Considerando que por motivo das necessidades do comércio externo, e no interesse das relações internacionais, as convenções de pagamento em ouro ou moeda estrangeira são plenamente válidas desde que se apliquem ao que se convencionou chamar as liquidações externas...únicas susceptíveis de escapar à aplicação das leis de ordem pública que regem as operações feitas em França» (C. Paris, 1.ª ch., 16 de Abril de 1926 D. Hebd., p. 273).
Estes princípios têm a mesma força e merecem a mesma aplicação quando se trata não já dos nossos nacionais contratantes com estrangeiros, mas de estrangeiros residindo em França, contratando entre si e dedicando-se a operações que se iniciaram, prosseguem e terminam no nosso território, como seja ia venda ou a locação de imóveis franceses.
Tais são, Sr. Procurador Geral, as considerações que na hora presente devem impor-se à vossa atenção e à dos seus agentes com o carácter premente de um problema de gravidade verdadeiramente excepcional; qual deva ser, na ordem da estabilização monetária, a obra ulterior do legislador e do governo, pertence desde agora os tribunais recusarem a sanção judicial às convenções que, procedendo de uma idea de desconfiança mais ou menos evidente em relação à moeda legal, são de natureza a agravar a depreciação da divisa francesa e trazer para a economia nacional um prejuízo irremediável.
Por tanto, quando acontecer que uma das cláusulas acima examinadas outro fim não tenha senão o de iludir o uso da moeda legal e negar o pleno valor liberatório da nota do Banco de França, os seus agentes, denunciada a fraude à lei, não deverão hesitar em requerer energicamente a nulidade, devendo os tribunais, além disso, apreciar se a nulidade desta cláusula - principalmente o caso de condição resolutória expressamente estipulada - não é de natureza a produzir a anulação da convenção no seu conjunto...

III

36. Acusa-se o diploma em reclamação de haver ofendido o caso julgado. As ofensas seriam duas:
1.ª Aplicar-se a nova lei à determinação da natureza das prestações no futuro;
2.ª Dizer-se que se aplica aos foros vencidos e não pagos.

37. O primeiro caso não constitue ofensa alguma ao caso julgado.
Com efeito, de futuro não se verificará o requisito exigido pelo artigo 2503.°, n.° 2.°, do Código Civil.
Nem se invoque em contrário o facto de trato sucessivo, pois com o trato sucessivo procura-se apenas estabelecer um processo mais célere e que menos dispêndio e tempo exija ao senhorio.
Por consequência, nunca o julgado poderia evitar que de futuro se levantasse a questão nos sucessivos pagamentos, sob pena de se negar valor às leis, às disposições de interesse público, às novas situações criadas. O que poderá haver é um problema de irretroactividade, mas já se viu que todas as leis desta natureza foram publicadas em toda a parte com efeito retroactivo.
A proibição da retroactividade da lei não é preceito constitucional em matéria civil, e frequentes vezes os diplomas legais estatuem de forma expressa a sua aplicação ao passado. Assim, e para exemplo, o decreto n.° 20:188, de 8 de Agosto de 1931, dispõe:

Artigo 1.° Nos arrendamentos de prédios rústicos anteriores a 1930, com renda fixada exclusivamente em trigo, seja qual for a fornia ou o título da constituição e o prazo da duração, as rendas ou as prestações destas ainda não vencidas serão pagas, quando assim seja exigido pelo senhorio ou pelo arrendatário, metade em trigo e a importância do valor legal da outra metade, à escolha do senhorio, em dinheiro ou em géneros da cultura habitualmente predominante no prédio arrendado, excluído o trigo.
Artigo 3.° Nos arrendamentos de prédios rústicos com renda fixada exclusivamente em dinheiro, sem determinação de metal ou de espécie, seja qual for a forma ou o título da constituição e o prazo da duração, sempre que assim seja exigido pelo senhorio ou pelo arrendatário, a renda será paga metade em moeda corrente e a outra metade em géneros da cultura habitualmente predominante no prédio arrendado, avaliada por acordo ou computada, em relação ao ano em que o contrato de ar-

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rendamento se tiver efectuado, pelo equivalente do preço actual desses géneros e fixada pela comissão.
Artigo 7.° Nos contratos de arrendamento, enfiteuse ou sub-enfiteuse anteriores a 31 de Dezembro de 1920, em que se haja estipulado o pagamento da renda ou do foro seja feito em dinheiro, ou em moeda corrente, em metal, metal sonante, ou só em ouro, ou só em prata, ou em ouro e prata, sem se fixar proporção desta última hipótese, o pagamento da renda ou o pagamento e remição do foro obedecerão às seguintes regras:
a) Tendo-se estipulado o pagamento em ouro, observar-se-á o disposto no artigo
25.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho do ano corrente;
b) Sendo-o em dinheiro ou em moeda corrente, ou em prata, multiplicar-se-á a prestação pelo coeficiente 10;
c) Sendo-o em metal, metal sonante, ou em ouro e prata, a proporção será de 10$ em .prata e o resto em ouro, nos termos das alíneas anteriores.
§ único. Quando se tenha estipulado o pagamento em ouro...

De resto, o artigo 727.° do Código Civil, no § único, dispõe que a obrigação se cumpre em moeda corrente ao tempo do pagamento, contanto que essa moeda seja do metal estipulado. É um princípio de todas as legislações, segundo o qual a moeda é determinada tempore solutioris.

38. O segundo caso merece apenas observações. O diploma fala em foros vencidos, mas não alude expressamente ao facto de haver caso julgado; pertencerá exclusivamente ao intérprete e ao julgador, que apreciará o problema em face do artigo 8.° do Código Civil. Pode pôr-se esta questão: Um caso julgado contrário aos princípios de ordem pública pode executar-se? Se o caso julgado for proferido por tribunal estrangeiro, não pode a sentença ser confirmada (Código de Processo Civil, artigo 1102.°, n.° 6.°). E se o fôr por um tribunal português?
No pensamento do signatário não houve o intuito de contrariar a prática tradicional do País, conforme a qual o caso julgado não é atingindo pelo decreto.

Mas isto é um problema de caso julgado que não há a tratar aqui.
Estes e não outros foram os principios em que se inspirou o decreto-lei n.º 30:131.

O Ministro de Justiça, Manuel Rodrigues Júnior.

ANEXOS

Registo do acórdão proferido nos autos cíveis de apelação, com o n.° 18, vindos da comarca de Lisboa, 1.ª vara, em que são partes: apelantes Jaime Augusto Dias de Freitas e outro, apelados Carlos de Lapa Salema e outros. - Acórdão a fl. 491.

Acordam em conferência na Relação:

Carlos Lapa Salema e outros propuseram acção executiva por dívida de foros contra Libânio Augusto Severo Dias de Freitas (Conde da Azarujinha) e sua mulher, actualmente representados pêlos apelantes Jaime Augusto Dias de Freitas, acção que correu pela 1.ª vara judicial da comarca de Lisboa. A dívida era proveniente dos foros devidos e não pagos referentes aos anos de 1923 a 1927, foros que consistiam na prestação da quantia certa e determinada de 80$000 réis por ano, pagos em metal sonante ouro ou prata, e que respeitavam à herdado denominada Carrascal, em Campo Maior.
Foi esta acção embargada pêlos então réus, Conde da Azarujinha e mulher, com o fundamento de que eles nunca se recusaram a pagar os foros em dívida na forma estipulada, e determinada na lei.
Apenas os autores é que exigiam em pagamento quantia muito superior àquela que por lei eram obrigados a pagar, pois exigiam que o pagamento fosse feito em moeda ouro, quando o estipulado era o pagamento em moeda de ouro ou de prata, cabendo ao foreiro, e não ao senhorio directo, a escolha do pagamento em uma ou em outra moeda, visto não haver estipularão em contrário. Os autores contestaram, dizendo que os réus embargantes não pagaram os foros, como confessam, porque pretendiam fazê-lo em moeda corrente no País, isto ó, pretendiam pagar os 80$ do foro em papel-moeda, o não em metal sonante ouro ou prata, como se havia convencionado. Mas como a moeda de prata com que os embargantes poderiam doso brigar-se deixou de ter curso legal desde o ano de 1917, tendo se até posteriormente proibido a compra e venda de moeda de prata cunhada e a sua fusão, os mesmos embargantes só podiam desobrigar-se perante os embargados pagando-lhes os foros em dívida em metal sonante ouro.
Foi proferida sentença (fl. 138) em que se julgaram improcedentes e não provados os embargos e em quo se condenaram os réus embargantes a pagar aos autores embargados o foro de 80$000 réis sobre a herdade denominada Carrascal, relativo aos anos de 1923 a 1927, com trato sucessivo para os anos que se fossem vencendo, em metal sonante ouro ou prata, se ambos os metais-moedas, ou qualquer deles, tiverem curso legal ao tempo do pagamento.
Em recurso apenas desta sentença foi ela confirmada na Relação pelo acórdão de fl. 211.
Recorreram de revista os embargantes para o Supremo Tribunal de Justiça.
Mas na sua minuta (fl. 239) limitaram o âmbito do recurso à parte do acórdão recorrido em que foram condenados em custas, selos e procuradoria.
Posteriormente vieram os mesmos embargantes, declarando estarem de acordo com ó decidido, visto terem circunscrito o recurso só às custas, requerer (fl. 251) que os autos fossem ao contador para por ele ser apurado o débito dos foros em moeda de prata, que era como eles pretendiam fazer o pagamento, e que, feita a liquidação, se intimassem os recorridos embargados para receber por termo nos autos o que fosse apurado nessa conta, sob pena de ser depositado o devido. Ouvidos os recorridos (fl. 203), disseram que, se os recorrentes estavam na disposição de pagar os foros de 1923 a 1930 em metal sonante ouro o os dos anos de 1931 e 1932 de harmonia com o disposto no § 1.° do artigo 7.° do decreto n.° 20:188, de 8 de Agosto do 1931, alterado pelo decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932, aceitavam que o processo fosse à conta para a liquidação, nesses termos, dos foros vencidos e que o recurso se circunscrevesse à matéria de custas.
Mas se não estavam, que, então, se devia conhecer de toda a matéria do acórdão recorrido, visto que foi de todo êle que os recorrentes recorreram.
A fl. 207, por despacho do relator, foi deferido o pedido dos recorrentes e mandados os autos ao contador para por elo sor apurado o débito nos precisos termos do acórdão da Relação como se pretendia, para os efeitos do pagamento.
A fl. 258 foi feita a liquidação dos foros de 1923 a 1932 em moeda de prata com curso legal à data em que se pretendia fazer o pagamento, com as correições do decreto n.° 20:188, de 8 de Agosto de 1931, alterado pelo decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932.

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Foi por despacho de fl. 258 v mandada intimar essa liquidação às partes e foi designado dia para comparecerem a fim de se proceder ao pagamento. Reclamaram os recorridos da liquidação feita a fl. 258 e recorreram para a conferência do despacho do relator de fl. 258 v.
No entanto, furam passadas guias para o depósito de 8.000$ em prata, destinados ao pagamento dos foros dos anos do 1923-1932, segundo a aludida liquidação (fls. 267 a 269).
Em conferência foi, pelo acórdão de fl. 271, desatendida a reclamação dos recorridos e confirmado o aludido despacho do relator de fl. 2f)8 v.
A fl. 280 foi julgado o recurso do revista interposto pelos embargantes do acórdão da Relação, restrito, porém, às custas, sendo negada a revista.
Do respectivo acórdão vieram os recorrentes e os recorridos requerer declaração, a fl. 288 e a fl. 291, respectivamente. Mas ambas as reclamações foram desatendidas pelo acórdão de fl. 298.
Requereram os embargantes recorrentes, a fl. 306, que, tendo sido relevado para a 1.ª instância o cumprimento do § único do artigo 635.º do Código do Processo Civil quanto ao depósito efectuado a fls. 267 e 269. se oficiasse à Caixa Geral do Depósitos, Crédito e Previdência ordenando que pusesse o referido depósito à ordem do tribunal de, 1.ª instância, para se apreciar se tal depósito estava de harmonia com a liquidação ordenada a fl. 258, e, portanto, se o depósito estava bem feito e em ordem a produzir a extinção da obrigação dos devedores relativa aos anos a que o pagamento, ou o depósito, respeitava.
Pelo despacho do relator do fl. 308 foi deferido esse pedido, mandando-se pôr o depósito à ordem do juízo de 1.ª instância para os fins o eleitos pretendidos poios requerentes.
Baixaram os autos à 1.ª instância para execução do julgado. Vieram os réus embargantes requerer que fôsse designado dia e hora no cartório para pagamento dos fôros vencidos em Dezembro de 1933 e em Dezembro do 1934 o que fossem intimados os autores embargados para os receberem (fls. 337 e 354), o que, no caso de não comparecerem, se procedesse ao seu depósito.
E requereram mais que em vista do que se passou no Supremo Tribunal de Justiça, fossem julgados válidos os depósitos efectuados, se a tanto os credores obrigarem, julgando-se desobrigados os devedores, em harmonia com o preceituado- no artigo 635.° e seu § único do Código de Processo Civil.
Não tendo compadecido os autores, foram fritos os depósitos, a fls. 349 o 351 e a fls. 362 e 370.
Foi proferida a sentença do fl. 365 para o cumprimento do citado § único do artigo 635.° e do ordenado pelo Supremo Tribunal.
Nela se decidiu que a liquidação feita pelo contador do Supremo Tribunal de Justiça a fl. 258 não estava de harmonia com o julgado, que os credores tinham direito a receber mais do que as quantias depositadas, pelo que tais depósitos não produziam efeito algum, e que podiam ser levantados.
E isto porque aquela liquidação foi feita reportando-se ao tempo em que o devedor pretendia pagar, e não ao tempo em que deveria ter pago ou em que deveria cumprir a obrigação, e a sentença que julgou os embargos acentuou e decidiu que o pagamento do foro devia ser feito em prata ou ouro, se ambos os metais-moedas, ou qualquer deles, tivessem curso legal ao tempo do pagamento.
Pediram os réus embargados aclarações desta sentença, visto ela não se ter referido aos depósitos feitos, a fl. 349 e a fl. 362, posteriormente à liquidação de fl. 258, nem ter dito se o seu decidir abrangia também
os foros que foram pagos havendo no País moeda de prata na ocasião do vencimento, que a sentença equipara a pagamento, e se abrangia os pagamentos feitos pêlos vencimentos posteriores à liquidação feita no Supremo Tribunal pelo respectivo contador.
Pelo despacho de fl. 372 foi dito que a sentença não continha ambiguidade ou obscuridade; que foi proferida em cumprimento do despacho do fl. 308, em referência ao despacho de fl. 257 e liquidação de fl. 208, não tendo sido ultrapassada a delegação feita por aquele primeiro despacho.
Da sentença atrás referida apelaram os réus embargante, a fl. 370, para esta Relação. Aqui, pelo acórdão de fl. 383. foi anulada a sentença recorrida pelo motivo de não ter conhecido dos efeitos dos depósitos efectuados posteriormente ao despacho de fl. 308, apesar do para isso ter sido chamada a atenção do juiz, do que devia conhecer, porque, tratando-se de uma execução com trato sucessivo, todos os depósitos anteriores à sentença se compreendessem no pedido da execução, e porque sobro todas as consignações tinha o juiz de se pronunciar importando tal omissão nulidade de sentença.
Baixou o processo à 1.ª instância e ali foi proferida então a sentença de fl. 407, que, orientando-se inteiramente pela sentença anulada, julgou, como esta, que a liquidação feita pelo contador do Supremo Tribunal de Justiça não estava feita de harmonia com o julgado, que os credores tinham direito a receber mais do que as quantias depositadas a fls. 269, 351, 362 o 370, pelo que tais depósitos não produziam efeito algum e podiam ser levantados.
Pediram os réus aclaração desta sentença, o que lhes foi indeferido polo despacho de fl. 415 r.
Da sentença e do despacho recorreram os mesmos réus, recurso que foi recebido como apelação, em ambos os efeitos.
É o recurso agora em causa, de que cumpre conhecer por ser a apelação o recurso competente e mostrar-se interposto em tempo devido.
Apenas se encontra nos autos a minuta dos apelantes.
A contraminuta dos apelados foi mandada desentranhar dos autos pelo despacho de fl. 475, confirmado pelo acórdão de H. 479 v, por não terem feito o preparo em tempo devido e não terem [trovado caso do torça maior.
Conhecendo:
Está definitivamente julgado pela sentença e pelo acórdão da Relação, que a confirmou, respectivamente a fl. 138 e a fl. 211:
1.° Que os réus, ora apelantes, devem aos autores, ora apelados, os foros relativos aos anos do 1923 a 1927 que incidem sobro a herdade Carrascal, de que os apelantes silo enfiteutas o os apelados senhorios directos, com trato sucessivo, para os anos quo se forem vencendo posteriormente a 1927 ;
2.° Que devem os mesmos réus pagar aos autores o foro estipulado no respectivo contrato, de 80$000 réis, sobre a referida herdade, em metal sonante ouro ou prata, se ambos os metais-moedas, ou qualquer deles, tiverem curso legal ao tempo do pagamento.
Os réus concordam que devem. E pretendem pagar, para o que tom consignada em depósito a importância dos foros vencidos. Mas pretendem pagar em moeda de prata em curso ao tempo em que tom feito os depósitos, com as devidas correcções legais, de harmonia com o artigo 7.°, alínea b), do decreto n.° 20:188, do 8 de Agosto de 1931, alterado pelo decreto n.° 21:199, de 4 do Maio de 1932. De lacto, o pagamento em metal sonante prata é uma das formas de pagamento do foro que se estipulou na escritura de redução do foro do 21 de Fevereiro de 1852, e isto mesmo foi já reconhecido judicialmente pela sentença o acórdão referidos.

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Mas dizem os autores: se ao tempo em que os foros se venceram e deviam ser pagos estivesse em curso a moeda do prata, estava muito bem, não teriam outro remédio senão aceitar o pagamento em moeda de prata. Mas como tal moeda não era moeda corrente no País ao tempo dos foros não pagos, pois por decreto n.° 3:296, do 16 de Agosto de 1917, as moedas de prata deixaram de ter curso legal no continente da República e ilhas adjacentes, o os furos vencidos o não pagos eram posteriores a essa data, não havendo, portanto, essa moeda - a única moeda em que os réus podiam fazer o pagamento para se desobrigarem era a moeda ouro, também estipulada no contrato.
Não diz a sentença apoiada expressamente só foi esto o critério em quo se baseou para decidir quo os autores têm direito a receber mais do que as quantias depositadas o paro declarar que os depósitos efectuados não produziam eleito algum, e que podiam ser levantados. Depreende-se, porém, que sim, pois nela se deixa ver que os depósitos feitos só relerem ao tempo em que o devedor pretende pagar e não ao tempo em que devia pagar. Do onde se infere que, como ao tempo em que os réus deviam pagar não tinha curso legal a moeda do prata, o depósito, para produzir efeitos de pagamento, só seria válido se fosse feito na outra moeda metálica, ouro.
E assim se deve interpretar a sentença, pois no caso contrário, não se vê ou só deduz outra razão de decidir.
Ora tal fundamento da sentença não está de harmonia com o próprio julgado que ela invoca, nem com a lei. Com efeito:
O que as instâncias julgaram foi que os foros em dívida devem ser pagos em metal sonante, ouro ou prata, se ambas as moedas, ou qualquer delas, tiverem curso legal ao tempo do pagamento. Tiverem é futuro.
Se quando fôr feito o pagamento, qualquer das moedas, ouro ou prata, tiveram curso legal, o pagamento faz-se-á em qualquer dessas espécies de moeda.
É êste o entendimento que deve ter o julgado.
Ora os réus, quando pretenderam efectuar o pagamento por meio da consignarão em depósito, podiam fazê-lo, como fizeram, em moeda de prata, porque a êsse tempo havia em curso a moeda do prata, pois nesta moeda fizeram o depósito.
De resto, mesmo ao tempo do vencimento dos foros do 1923 a 1927, objecto da acção executiva, havia moeda de prata com curso legal, que nunca de deixou do existir no continente o ilhas, pois o decreto n.° 3:296 do 15 e não de 10 de Agosto do 1917, invocado pêlos autores, ora apoiados, apenas mandou retirar da circulação, deixando de ter curso legal, as moedas do prata do antigo regime, como só vê do seu artigo 1.°, continuando, porém em circulação as moedas de prata de 1$, $30, $20 e $10, mandadas cunhar e emitir pelo Govêrno da República por decreto de 22 de Maio de 1911 (artigo 7.º). E posteriormente, pêlos decretos n.° 6:471, de 26 do Março de 1920, n.º 7:104, de 12 de Novembro do mesmo ano (respectivamente artigos 21.° e 5.°), foram proibidas, é certo, a compra e venda do moeda de prata, a sua fusão e a sua saída para fora do continente e ilhas (artigo 17.° do primeiro daqueles decretos), mas com isso apenas só teve em vista coibir a especulação e a rarefacção da moeda de prata no País, evitando-se precisamente o seu desaparecimento da circulação.
Portanto, ainda quo o julgado não só tivesse referido, como se referiu, ao tempo do pagamento, mas sim ao tempo do vencimento dos foros, ainda neste caso era admissível o pagamento em moeda do prata, pois que ela existia e tinha curso legal nessa época, como se viu.
Se para a sentença apelada os depósitos não eram válidos porque o pagamento devia ser feito em ouro por não haver prata e m curso quando se venceram os
foros de 1923 a 1927, não se compreende que decidisse o mesmo relativamente aos foros vencidos nos anos de 1932, 1933 e 1934, cujos depósitos também se fizeram, e estes na época do vencimento, quando é corto que nos referidos anos havia moeda de prata em circulação de 2$50, 5$ e 10$, como ainda hoje estão, o que ninguém contesta.
A decisão, portanto, quanto aos foros relativos aos aludidos anos devia ser outra que não a proferida. Estando, pois, decidido definitivamente quo os foros devidos devem ser pagos em moeda do ouro ou de prata, se ambas, ou qualquer delas, tiverem curso legal ao tempo do pagamento; havendo moeda de prata em circulação não só ao tempo em que os réus devedores consignaram em depósito, para efeito de pagamento, as respectivas quantias em prata com as correcções dos decretos n.ºs 20:188 e 21:190, mas também ao tempo em que se, venceram os foros em dívida: a conclusão é que todos os depósitos feitos pelos réus, ora apelados, pelas guias do fls. 267, 269, 349, 351, 362 e 370, são válidos e produzem efeitos de pagamento por constituírem as quantias a quo os autores têm direito a receber pêlos foros em dívida, em faço da lei e do julgado pêlos tribunais da instância.
Por estes fundamentos, revogam a sentença apelada, para julgarem, como julgam, extinta a obrigação dos apelantes para com os apelados da data dos respectivos depósitos.
Nas custas, selos e mínimo da procuradoria condenam os apelados.

Lisboa, 25 de Março de 1939. - Euclides de Meneses - Samprio e Melo - Teixeira Direito.

Está conforme.
Lisboa, 30 de Março de 1939.

Autos cíveis de agravo vindos da Relação de Lisboa, em que é agravante João José de Portugal da Costa Mexia de Matos e agravada Ana Cristina Garcia Pedro sã Barata.

Foi proferido o seguinte acórdão:

Acordam os do Conselho no Supremo Tribunal de Justiça:
Na comarca do Eivas. D. Ana Cristina Garcia Pedrosa Barata, na qualidade do senhoria directa tio foro anual de 400:000 réis (hoje 400$) metálicos, prata ou ouro, constituído por escritura pública, em 3 de Janeiro de 1840, e imposto numa herdado denominada de Xévora, com os respectivos anexos, propôs, em Abril de 1926, a acção executiva apensa contra o Dr. Ernesto Leite do Vasconcelos e espôsa, para dêles haver as anuidades já vencidas, correspondentes a 1924 e 1925, e bem assim as que se fôssem vencendo.
Citados, os enfiteutas deduziram embargos, que foram desatendidos na 1.ª instância o julgados procedentes na 2.ª; mas a autora recorreu para este Supremo Tribunal do Justiça, que, pelo acórdão que nos autos se vê de fl. 130 a fl. 132, concedeu a revista, que fôra pedida, anulando o acórdão da Relação e julgando definitivamente que fôssem pagos os foros vencidos e vincendos em moeda metálica, prata ou ouro, ou o equivalente em escudos, ao câmbio do dia. O recurso interposto da sentença não tivera eleito suspensivo, pelo que acção executiva prosseguiu, mas, junta aos autos a certidão de óbito da enfiteuta D. Joana Emília de Portugal da Silveira Mexia de Matos da Gama e Vasconcelos, deu-se cumprimento ao que determina o artigo 342.° do Código de Processo Civil. Procedeu-se ao incidente da necessária habilitação, tendo sido julgado herdeiro

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único da falecida seu pai, João José de Portugal da Costa Mexia de Matos, o qual ficou representando os enfiteutas desde logo e, por isso, veio êle a fl. 79 declarar que, do harmonia cora o que fôra decidido pelo acórdão já aludido dêste Supremo Tribunal, pretendia libertar-se da obrigação exigida por meio de pagamento de moeda de prata e requereu que o processo fosse remetido ao contador para que, em face do documento que apresentava e se vê a fl. 81, comprovativo do valor do escudo-prata, procedesse à respectiva liquidação, marcando-se depois dia para a exequente receber, por têrmo nos autos, a importância a que tem direito.
Foi ouvida a exequente, que sustentou não ser obrigada a receber em prata quantia excedente a 10$, em vista do preceituado no artigo 8.° do decreto do 22 de Maio de 1911, e o juiz veio a proferir o despacho que se lê de fl. 96 a fl. 106 v, em que, após longas considerações, determinou que os executados podiam efectuar o pagamento por qualquer das seguintes três formas: alínea a), em moeda metálica de prata e pelo seu valor nominal ou facial, visto ela existir com curso legal no País; alínea b), em moeda metálica de ouro e pelo seu valor nominal ou facial, pois também existe com curso legal no País; alínea c), em escudos a importância equivalente a 400:000 réis (400$) ouro, ao câmbio do dia do pagamento.
Por parte dos executados foi declarado e à cautela, segundo foi dito (fl. 108), que era escolhida a moeda de prata para o pagamento das prestações, mas, logo a seguir, do despacho foi interposto o recurso de agravo. Também a exequente recorreu da parte desfavorável do mesmo despacho. Entendia o representante dos executados ter sido ofendido o disposto no artigo 706.° do Código Civil e não se ter dado estrito cumprimento ao determinado no acórdão deste Supremo Tribunal proferido em 29 de Janeiro de 1929 (processo apenso), visto não se ter disposto, no despacho recorrido, que os foros em dívida podiam ser pagos, em escudos, na importância correspondente a 400$ prata.
Por sua parte a executada sustentou que o pagamento em prata não podia exceder a importância de 10$. Como o Tribunal da Relação bem ponderou, os recursos ficaram limitados à interpretação do acórdão final proferido no processo apenso. Nesse acórdão, como já foi relatado, este Supremo Tribunal determinou que os foros vencidos e vincendos fossem pagos em moeda metálica, prata ou ouro, ou o equivalente em escudos ao câmbio do dia do pagamento.
O tribunal da 2.ª instância, apreciando os considerandos que baseiam essa decisão de harmonia com o preceituado no artigo 8.° do decreto de 22 de Maio de 1911, reconheceu que o pagamento em prata estava limitado à quantia do 10$, e consequentemente, negando o provimento ao agravo interposto por parte dos executados, concedeu e quanto à que a exequente interpusera e mandou que o juiz da 1.ª instância restringisse a matéria da alínea d) do seu despacho à quantia de 10$, que também poderá ser paga em escudos-notas. Com esta decisão, constante do acórdão que se vê a fls. 158 e seguintes, se não conformaram os executados, que, no prazo legal, interpuseram o recurso de agravo, que é o competente.
Entende o recorrente que a decisão deste Supremo Tribunal no processo apenso (acórdão de 29 de Janeiro de 1929) é muito clara e terminante, não admitindo qualquer limitação ao pagamento em moeda de prata e, portanto, agora tudo se limita à interpretação daquele acórdão. Na minuta de fl. 168 trata-se de toda a matéria dos autos, muito doutamente, mas só é lícito agora apreciar o que importa à execução do que já foi decidido. Por certo que, nos termos finais do acórdão de 29 de Janeiro de 1929, se não encontra estabelecido qualquer limite à importância que pode ser paga em prata, mas tais termos não podem ser apreciados isoladamente e antes têm do sor atendidos do acordo com os considerandos que os fundamentaram.
Ora, no acórdão muito expressamente se foz referência à terminante disposição do artigo 8.° do citado decreto de 1911 e seria injurídico que, dura considerando baseado em claro preceito legal, se concluísse de forma oposta a esse preceito. Fundamentando a interpretação constante do acórdão agora em recurso, acresce a circunstância do já este Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de 9 de Novembro de 1928 (Colecção Oficial, ano 27, fl. 207), ter decidido, em questão similar, que o foro podia ser pago em prata até ao limite máximo de 105 e a restante importância em ouro, e isto do harmonia com o julgado nos acórdãos de 16 de Julho e 19 de Novembro de 1920, 22 de Janeiro de 1924 e 12 de Janeiro de 1926.
Por todo o exposto e considerando que o acórdão recorrido bem julgou e em harmonia com a lei o com o que por este Supremo Tribunal de Justiça fôra decidido no processo apenso, negam provimento ao recurso e, confirmando o acórdão recorrido, condenam o recorrente no pagamento das custas.

Lisboa, 2 de Junho do 1931. - Albuquerque Barata, Visconde de Oliva - Amaral Pereira - A. Brandão.

Está conforme. - Secretaria do Supremo Tribunal de Justiça. - 23 de Janeiro de 1940.- O Secretário, José de Abreu.

Acórdão a fl. 431. - Acordam na Relação de Lisboa:

Em Janeiro de 1840, como consta da escritura a fl...., foi aforada a herdade denominada de Xévora e seus anexos, hoje pertencente ao executado João José de Portugal da Costa Mexia de Matos, mediante o pagamento do foro anual de 400-3000 réis metálicos, prata ou ouro. Devido a desinteligências sôbre o quantitativo do foro em escudos-papel entre o foreiro e a senhoria directa, Ana Cristina Garcia Pedroso Barata, propôs esta a presente acção executiva, que foi julgada por sentença de 11 de Janeiro de 1927 (fl. 45), determinando que os foros vencidos e vincendos deviam, ser pagos em prata ou ouro, ou no seu equivalente em escudos, ao câmbio do dia do pagamento. Interposto recurso da referida decisão, a Relação de Lisboa, em acórdão de 17 de Dezembro de 1927, resolveu que a exequente tinha direito a receber apenas 8.000&, respeitantes aos foros de 1924 e 1925 (fl. 84 v).
Apreciando êsse acórdão, o Supremo Tribunal de Justiça revogou-o, mantendo a decisão da 1.ª instância (acórdão de 29 de Janeiro de 1929, fl. 130) e ordenando que os foros fossem pagos em moeda metálica, prata ou ouro, ou no seu equivalente em escudos, ao câmbio do dia do pagamento.
De novo, em 1.ª instancia, se suscitou a dúvida, quanto ao direito do executado, sobre a escolha da prestação metálica, sustentando o recorrente que não era obrigado a receber mais de 105 em prata, nos termos do artigo 8.° do decreto de 22 do Maio de 1911.
Apreciando o aspecto jurídico da questão, decidiu o juiz a quo que os foros podiam ser pagos por qualquer das forças:
a) Em moeda metálica de prata, e pelo seu valor nominal ou facial, visto ela existir com curso legal no País;
b) Em moeda metálica de ouro, pelo seu valor nominal ou facial;
c) Em escudos, a importância equivalente a 400$ ouro, ao câmbio do dia do pagamento (despacho de 4 de Abril de 1930, fl. 96).

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Este despacho foi revogado pelo acórdão da Relação de Lisboa de 8 de Novembro de 1930 (fl. 108), que ordenou ao juiz a quo que restringisse a matéria da alínea a) à quantia do 105. em vista do disposto no citado decreto de 1911. Confirmado o referido acórdão da Relação do Lisboa por acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Junho de 1931 e 16 de Dezembro de 1932 (fl. 259), ficou estabelecido definitivamente na decisão transitada em julgado que o pagamento só podia ser feito:
a) Em moeda metálica do prata, até 10$;
b) Em moeda metálica de ouro, pelo seu valor nominal ou facial;
c) Em escudos, equivalente a 400$ ouro, ao câmbio do dia do pagamento.
Parece que assim, se o executado estivesse de boa fé, unicamente lhe restava pedir a liquidação do equivalente, em escudos, a 390$ ouro, ou sejam 13.968$. Tal não sucedeu, pois, reincidindo no seu propósito de levantar incidentes, expôs em requerimento a fl. 281 que só era obrigado a efectivar o pagamento do foro de harmonia com a decisão transitada em julgado do Supremo Tribunal de Justiça, porque posteriormente a ela foi publicado o decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932, que no seu artigo 7.° prescreve «que o pagamento dos foros estabelecidos em contrato anterior a 1920, em que tenha sido estipulada a entrega da pertença em ouro ou prata, tem do ser feito, segundo a alínea a) do artigo, quando o devedor tenha escolhido o pagamento em prata, ou nos termos da alínea a) quando essa escolha for o pagamento em ouro». Que nestas condições escolhe a moeda de prata para pagamento dos foros executados e requere que se marque dia para o exequente receber no cartório a sua importância (alínea b] do artigo 7.° do decreto n.° 21:199).
Doutamente o juiz Luiz Armando, a fl. 286, propôs o seguinte despacho, que merece ser transcrito:
«Não é de atender, mas sim de repelir, a pertença do executado.
Ao contrário seria proporcionar ao executado o ensejo de continuar a protelar o cumprimento da obrigação, que sobre si impende, e que se cifra em pagar os foros em dívida, de harmonia com o decidido pelas instâncias. Que pretende o executado? Renovar, com a mesma razão de pedir, o incidente que provocou a fl. 70 e que foi repelido. O deferimento do pedido do requerente de fl. 281 tornava inútil toda a actividade jurisdicional, despendida nos autos até ao presente, e permitia ao executado o protelar o pagamento dos foros em dívida. Isso seria o desprestígio da força dos tribunais.
Em que baseia o requerente a sua atitude? No decreto n.° 21:199. Mas é sem razão a invocação. Posteriormente ao dito decreto foi proferido o acórdão de 16 de Dezembro de 1932 pelo tribunal pleno, que confirmou o acórdão da Relação e o do 2 de Junho de 1931 do Supremo Tribunal de Justiça.
Afigura-se-nos que o requerente, com a atitude que vem de assumir, tem com certeza em vista ensaiar uma revisão do julgado, submetendo de novo à tela da discussão, desde a 1.ª instância até final, aquilo que já por três vezes, e com trânsito em julgado, foi decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça, funcionando na última como tribunal pleno. O decreto n.º 21:199, em seu único artigo, tem apenas em vista dar nova redacção ao artigo 7.° do decreto n.° 20:188, de 8 de Agosto de 1931, e de facto algumas alterações nele introduziu.
Mas onde não fez alteração alguma foi no teor do § único, pois inteiramente o manteve, e nele ó que a hipótese dos autos se acha regulada. Sendo assim, cumpre ao executado pagar, não pela forma contida no seu requerimento, mas pela decidida pêlos julgados a que o caso dos autos foi sujeito. Indefiro pois o requerimento e concedo ao exequente a faculdade de requerer ao pagamento dos foros, executados e dos em dívida, pela maneira decidida pelas instâncias superiores.
Vão os autos ao contador para fazer a liquidação». Transitada em julgado esta decisão, e liquidada a fl. 316 v a importância dos foros e juro respeitantes aos anos de 1924 a 1932, inclusive, no total de 166.094$25, pagou-os o executado, como consta do termo de quitação de fl. 318.
Ficou portanto resolvido:

a) Que as decisões dos tribunais superiores, sobretudo a do Supremo Tribunal do Justiça de 16 de Dezembro de 1932, proferidas nos autos, prevaleciam e constituem caso julgado, não obstante o disposto no decreto n.° 21:199;
b) Que, na pior das hipóteses, o citado decreto não alterou a legislação vigente ao tempo da sua publicação no que se refere à parte discutida entre exequente executado;
c) Que a atitude do executado, invocando o dito decreto, tem em vista ensaiar uma revisão do julgado, submetendo de novo à tela da discussão, desde a 1.ª instância até final, aquilo que já por três vezes, e com trânsito em julgado, foi decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça, funcionando um deles como tribunal pleno. Parece que depois de o executado ter pago nove anos de foro à razão de 13.968$ (1924 a 1932) se devia dar por vencido e convencido, e cumprir as suas obrigações de foreiro. Entretanto, diversamente procedeu, e deixou de pagar o foro relativo ao ano de 1933, pelo que o senhorio o fez citar, a fl. 330.
A seguir, mais uma vez, fundado nos referidos decretos n.ºs 19:871, 20:188 e 21:199, pretendeu o executado exonerar-se daquele pagamento, depositando apenas 5.688$80 e embargando a execução nos termos do artigo 616.° do Código de Processo. Na sua contestação deduz o exequente a excepção do caso julgado, alegando:
a) Que está definitivamente julgado pela Relação de Lisboa e pelo Supremo Tribunal de Justiça que o foro em questão tem de ser pago em ouro parte a 390$, ou em moeda-papel, ao câmbio do dia do pagamento, e em prata quanto aos restantes 10$;
b) Que depois de proferida a decisão o embargante tentou subtrair-se ao seu cumprimento, procurando efectivar o pagamento em prata, o que foi terminantemente replicado pelo despacho de fl. 284, transitado em julgado;
c) Que o executado, respeitando as mencionadas decisões, efectuou o pagamento dos foros em dívida de 1924 a 1932;
d) Que todos os diplomas citados pelo executado foram publicados anteriormente ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Outubro de 1932 e ao despacho de 31 de Maio de 1933;
e) Que a execução deve ser julgada procedente, e improcedentes os embargos, e a execução prosseguir nos seus termos regulares.

Feito o processo concluso, depois de um longo arrazoado o juiz a que concluiu o seu despacho, que julga procedentes e provados os embargos, válido o subsistente o depósito de 5.088$80, e declara o executado desobrigado ao foro de 1933, com 4.000$, a sair do depósito em que fixa o valor da causa, para efeitos legais; condena o embargado nas custas, com o máximo de procuradoria a favor do embargante, o que no caso presente nada é (artigo 109, § 4.°, da tabela) para indemnizar quem, em prestações anteriores, pagou a mais, a meu juízo, 89.712$».
Semelhante despacho deu lugar ao presente recurso, interposto pelo exequente no prazo legal, e de que cumpre conhecer.

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O assunto, pela sua simplicidade e clareza, não merece largo estudo nem ampla discussão.
Dispõe o Código de Processo Civil no artigo 7.°, pane final, que é permitido, tratando-se de foro, compreender no pedido e na condenação tanto os que estiverem vencidos como os que se vencerem emquanto subsistir a obrigação.
O legislador teve em vista, ao estabelecer o aludido preceito, evitar que a mesma questão sobre a obrigação de pagar o foro e o seu quantitativo fosse discutida e apreciada mais de uma vez entre as mesmas partes ou seus representantes. Resolvido numa acção executiva que o foreiro era obrigado a pagar ao senhorio um determinado foro, não pode de novo no mesmo processo ventilar-se qual é o quantitativo da justiça, e a sua forma, e local do pagamento.
As execuções terão trato sucessivo, para as que posteriormente se forem vencendo, quere dizer, no mesmo processo vão-se sucessivamente seguindo os termos necessários para a efectivação das obrigações (dito Código, artigo 819.°).
Sôbre o assunto pondera Dias Ferreira:
«Em virtude do disposto no § único do artigo 7.° o senhorio a quem o foreiro deixou de pagar os foros pode pedir na mesma acção que ele seja condenado a pagar-lhe os foros em dívida e os que posteriormente se vencerem, emquanto durar o aforamento.
Se o foreiro torna a ser remisso no pagamento das pensões, não carece o senhorio de propor nova acção, bastando-lhe promover outra vez a execução da sentença condenatória, que alcançou. O devedor não pode mais contestar a obrigação de que, já uma vez, foi convencido». (Código de Processo Civil Anotado, fl. 22).
No mesmo sentido se pronuncia o Professor José Alberto dos Reis, quando escreve:
«O advogado pode pedir a condenação do réu nas prestações vencidas, e nas que se vencerem, ou pedir a condenação em trato sucessivamente nas prestações devidas. As duas formas são equivalentes. Quando de futuro o réu deixar de satisfazer qualquer prestação, não necessita o autor de propor nova acção em juízo para fazer reconhecei o seu direito; basta-lhe promover a execução da sentença condenatória, que uma vez alcançou». (Processo Ordinário, 1.ª edição, p. 343).
É essa também a doutrina, sustentada na sentença do juiz de direito da comarca de Alcácer do Sal, publicada na Revista dos Tribunais, ano VI, p. 304, e a seguida por Eduardo Carvalho no seu Manual das Execuções, vol. I.
Na hipótese dos autos o exequente pediu na petição inicial de fl. 2 que a executada fosse condenada a pagar-lhes os foros vencidos e os vincendos, com trato sucessivo.
Em tais circunstâncias não tem que obter nova sentença, bastando-lhe as referidas decisões para compelir o executado a pagar-lhe o foro do ano de 1933, de harmonia, com o que foi resolvido em última, instância pelo Supremo Tribunal de Justiça, e sobretudo no despacho de fl. 284, depois de levantada pelo foreiro a questão de poder à face do decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 193,2, efectuar o pagamento do foro em 200$ em prata t1 4.880$80 em notas e moeda divisória, representativa esta última de 200$80, conforme o valor fixado nos termos dos decretos n.ºs 20:188, 21:199 e 19:871.
De facto, os aludidos diplomas, que o executado invoca, não lhe aproveitam, porque são os anteriores ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1932 e ao mencionado despacho de fl. 284, com que se conformou, efectuando o pagamento dos foros vencidos em 10$ em prata e os restantes 390$
(ouro) em papel ao câmbio do dia do pagamento, no total de 13.948$ anuais.
Verificam-se, assim os três requisitos do caso julgado:
a) Identidade do direito ou causa de pedir (escritura de aforamento);
b) Identidade do objecto sôbre que versa o julgamento (fôro de 400$ ouro ou prata, correspondentes a 13.968$ papel-moeda);
c) Identidade dos litigantes e da, sua qualidade jurídica.
O caso julgado faz lei entre as partes e tem de ser respeitado tanto por êles como pelo julgador. Os legisladores e jurisconsultos de todas as idades viam ante si um grande dilema, cuja solução podia ser fecunda em efeitos. Dum lado a necessidade de respeitar uma sentença fundada em um erro judiciário, ou na prevaricação do juiz; do outro, o grande perigo de entregar a estabilidade dos direitos e dos bens a uma certeza temerosa e indefinida, que podia prolongar-se durante muitas vidas e gerações.
A longa experiência e as leis dos diferentes povos mostraram que ,a incerteza do direito devia ser considerada como o maior mal (Alves de Sá, Comentário ao Código de Processo Civil, p. 312).
A parte que vê novamente o seu direito contestado, diz o processualista Jorge Americano, invocará a excepção da cousa julgada, a qual, sob a forma de defesa ou contestação, a todo o tempo será admitida, a fim de que uma nova sentença não venha contrariar a sentença já proferida.
«Explana Fabregtes-Cícero considera com justiça e autoridade do caso julgado, como o mais firme sustentáculo da República. O interesse social exige, com efeito, que as decisões dos tribunais sejam consideradas como a expressão da verdade. As leis abrem para elas vias de recurso.
Depois de esgotadas estas é indispensável que não seja possível levantar contestações sôbre o que foi definitivamente decidido. É por isso que existe a autoridade do caso julgado, tanto no cível como no crime». (A lógica judiciária e o acto de julgar, p.74).
Pelas rasões expostas, dão provimento ao recurso, julgam procedente a excepção, deduzida pela exequente, do caso julgado e julgam improcedentes os embargos de executado, fixando o valor da causa em 400$ metálicos (13.968$), e mandam que a execução prossiga nos seus ulteriores termos.
Custas pelo recorrido, em que o condenam, e no máximo da procuradoria, nas duas instâncias.

Lisboa, 1 de Maio de 1935. Joaquim Crisóstomo - Magalhãis Barros - Teixeira Direito.

O Sr. escrivão entregará cópia da minuta de fl. 371, do despacho recorrido e deste acórdão ao Sr. conselheiro presidente desta Relação, para ser remetido ao Conselho Superior Judiciário. - J. Crisóstomo.
Está conforme. - Lisboa, 4 de Maio do 1935.

Cópia. - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.
Com o fundamento de não terem sido papos os foros vencidos no Natal de 1923 a 1927 que incidem na Herdade Carrascal, nos termos da vila de Campo Maior, que, por escritura de 21 de Fevereiro de 1852, foi reduzido à quantia certa de 80$000 réis em metal sonante, ouro ou prata, moveram os autores Carlos Lapa Salema e outros uma acção executória contra Libânio Augusto Severo Dias de Freitas e sua mulher, para destes exigirem o pagamento dos foros vencidos e vincendos, até

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real embolso, na forma estipulada naquele documento público.
A tal acção deduziram os réus embargos, sondo a final proferida a sentença do fl. 138, julgando improcedentes e não provados os embargos o procedente a acção executória, e os réus condenados a pagar aos outros o foro de 80$000 réis sobre aquela propriedade, relativo aos anos de 1923 a 1927, com trato sucessivo para os anos quo se forem vencendo, em metal sonante, ouro ou prata, se ambos os metais moedas, ou qualquer deles, tiverem curso legal ao tempo do pagamento.
A decisão proferida pelo juiz de direito foi confirmada na Relação e do respectivo acórdão se recorreu de revista, dizendo os recorrentes na sua minuta que ó unicamente na parte que se refere à condenação em custas, selos e procuradoria em que o forem os mesmos recorrentes.
A fl. 251 estes recorrentes pediram que os autos fossem ao contador para ser por ali apurado o débito em prata, que é como pretendem fazer o pagamento, podendo na conta expressar-se o quantitativo em tal moeda ou o correspondente em escudos; e, feito isso, que se intimassem os recorridos para receber por têrmo nos autos o que for apurado nessa conta, sob pena de sor depositado o devido.
Ouvida a parto adversa, ela concluiu a sua resposta dizendo que de 1923 a 1930, inclusive, terão os recorrentes de pagar aos recorridos 80$000 réis em metal sonante ou correspondente a cada ano; e quanto aos anos de 1931 o 1932 terá do observar-se o disposto no § 1.° do artigo 7.° do decreto n.° 20:188, alterado em 4 do Maio de 1932 pelo decreto n.º 21:199. Se os requerentes estão na disposição de satisfazer pela forma exposta, que o processo vá à conta; aliás que se conheça de toda a matéria, do acórdão.
Ordenou-se quo a contadoria apurasse a quantia em débito, nos precisos termos das decisões proferidas pêlos tribunais de instância.
Feita a liquidação, determinou-se que fosse a mesma intimada às partes e designou-se dia para os recorridos receberem na secretaria a importância em débito.
Do respectivo despacho recorreram para a conferência Lapa Salema o outros; e contra a liquidação do contador Eles reclamaram também, porque entendem que o pagamento devo ter lugar em ouro de 1923 a 1930, e terá, relativamente aos anos de 1931 e 1932, de observar-se o preceituado nos decretos atrás citados, e a que o contador deu, por falsa interpretação, uma amplitude demasiada, e nessa conformidade fez o apuramento.
A quantia a que a conta se refere foi depositada finalmente, como os autos mostram a fl. 267.
O que tudo visto:
O despacho sub judice foi proferido pelo juiz relator de perfeita harmonia com o texto do artigo 635.° do Código de Processo Civil e, portanto, é confirmado para os fins legais. E mandam que os autos da revista sigam os termos regulamentares, para se decidir a final o que for do direito, tanto mais que a matéria da reclamação sôbre a moeda como o contador fez a liquidação do débito, relativamente ao montante do quo uma parte pretende pagar e a outra se julga com jus a receber, diz respeito ao fundo da questão.
Custas do incidente pelos referidos recorrentes o reclamantes.

Lisboa, 19 de Maio de 1933. - Arez - A. Brandão - Silva Monteiro.

Autos cíveis vindos da Relação de Lisboa. Recorrente Ana Cristina Garcia Pedroso Barata e recorridos Ernesto Leito de Vasconcelos e mulher. Foi proferido o acórdão seguinte:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

D. Ana Cristina Garcia Pedroso Barata, solteira, proprietária, residente em Campo Maior, legitimando-se, com a escritura de aforamento de 3 do Janeiro do 1840. por traslado a fls. 4 e seguintes, e na qualidade de actual senhoria directa do foro anual de 400$000 réis merálicos, prata ou ouro, hoje 400$ metálicos, prata ou ouro, com laudémio de quarentena e as mais condições na mesma escritura exaradas, imposto êsse foro sobre a Herdade do Xévora o seus anexos, composta de casas de habitação, celeiro, abegoaria, casa de malta e mais pertenças, terras de semeadura e arvoredo, sita, na freguesia da Expectação, concelho de Campo Maior, propôs no juízo de direito de Eivas esta acção executiva, nos termos dos artigos 615.° e seguintes do Código de Processo Civil, contra os actuais enfiteutas. Dr. Ernesto Leite do Vasconcelos e sua mulher, proprietários o moradores em Campo Maior, porque à senhoria directa, autora, não pagaram os foros respeitantes aos anos do 1924 e 1925.
Feita a penhora e citados os enfiteutas devedores, vieram estes deduzir embargos, em que alegaram não fazer oposição ao pagamento, que, por várias- vezes procuraram pagar êsses do 1924 e 1925; mas recusara-se a senhoria directa a recebê-los valorizados nos termos do $ único do artigo 4.º da lei n.° 1:645, de 4 de Agosto de 1924, sendo certo que a aplicação do coeficiente nesta lei estabelecido favorece ainda a autora.
Contestou a autora embargada, alugando quo na escritura de aforamento se estipulou quo o foro seria da quantia de 400$000 réis metálicos, prata ou ouro: e em face de tal convenção tem a embargada senhoria o direito de exigir o pagamento do fôro em moeda metálica, ouro ou prata, pelo seu valor legal, pedindo assim a improcedência dos embargos.
Em 1.ª instância foram julgados improcedentes e não provados os embargos e condenados os embargamos a pagar à embargada os foros vencidos e vincendos em moeda metálica, prata ou ouro, ou o equivalente em escudos ao cambio do dia do pagamento.
Apelaram os réus, e a Relação de Lisboa, por seu acórdão do fls. 78-85, de que recorreu do revista a autora em tempo, competente e legitimamente, revogou a sentença apelada, julgou procedentes e provados os embargos e condenou a embargada a receber como pagamento dos foros em divida respeitantes aos anos de 1924 e 1925 os 8.000$ em depósito.
Minutaram e contraminutaram doutamente as partes, respectivamente a fls. 113, 118, 122 e 125.
Houve os vistos necessários para o julgamento do recurso.
E tudo visto, ponderado e discutido em conferência:
Conforme a jurisprudência em casos análogos, seguida neste Supremo Tribunal em seus acórdãos de 16 de Julho e 19 de Novembro de 1920, 22 de Janeiro de 1924 e 12 do Janeiro de 1920, julgou o acórdão dêste Supremo Tribunal de 9 do Novembro do 1928 que, quando os contraentes da enfileire exprimiram a idea de excluir outra forma de»pagamento que a de moeda metálica, tom aplicação os artigos 723.° e seguintes do Código Civil, que expressa o cautelosamente preveniram as alterações do sistema monetário ; e que, subsistindo o regime do papel-moeda em Portugal desde o século XVII, preveniam-se os pactuantes, e o próprio Estado, contra o abuso dessa moeda, garantindo-se do pagamento em metal, como, entre outros diplomas, se pode ver na lei de 9 de Maio de 1857, que já no sistema monetário, esta-

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belecido pela lei de 29 de Julho de 1854. aceitava, em pagamentos ao Tesouro, 3/4 em papel e 1/4 em papel, também sem designação da espécie; que o decreto vigente de 22 de Maio de 1911. mantendo o regime mono-metalista ouro, autorizou todavia a cunhagem do escudo de prata, que declarou de aceitação obrigatória até ao limite máximo do 10$; finalmente, que não pode da. anterior prática do pagamento em papel-moeda inferir-se uma alteração no contrato, ou a renúncia ao direito de receber o foro na moeda estipulada no contrato de aforamento.
Esta jurisprudência se mantém e informa o presente acórdão.
A disposição do § único do artigo 4.° da lei n.° 1:640, de 4 de Agosto de 1024, só tem aplicação aos foros estabelecidos exclusivamente a dinheiro, sem a estipulação contratual em que o dinheiro tenha de ser representado por moeda metálica. Desde que haja estipulação expressa de moeda metálica, é inteiramente de aplicar o § único do artigo 727.° do Código Civil, porque só assim fica respeitada a vontade dos contraentes.
Nem a lei n.° 1:645 teve outro fim que o de remediar em favor dos quo recebiam em dinheiro desvalorizado a renda da terra as terríveis consequências do estado de cousas do após-guerra originado na inflação colossal da circulação fiduciária.
Concedem, assim, revista, anulam o acórdão recorrido por ser contra direito, e, julgando definitivamente, mandam que como ordenou a sentença da 1.ª instância, sejam pagos à senhoria directa os foros vencidos e vincendos em moeda metálica, prata ou ouro, ou o equivalente em escudos ao câmbio do dia do pagamento, com custas das duas instâncias e deste recurso pêlos réus.

Lisboa, 29 de Janeiro de 1929. - A. Osório de Castro - C. Gonçalves - J. Alfredo Rodrigues - Garção - Silva Monteiro (vencido).

Está conforme.- Secretaria do Supremo Tribunal de Justiça, 24 de Janeiro de 1940.- O Secretário, José de Abreu.

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Com base em uma escritura de aforamento celebrada em 3 de Janeiro de 1840 a senhoria directa do foro anual de 400$000 ouro ou prata imposto na Herdade de Xévora e anexos, sita na freguesia da Expectação, do concelho de Campo Maior, D. Ana Cristina Garcia Pedroso Barata requereu na comarca de Évora execução, com trato sucessivo, para obter o pagamento dos foros em dívida respeitantes aos anos de 1924 e 1925 contra os foreiros, que então eram o Dr. Ernesto Leite de Vasconcelos e mulher. Houve embargos.
Os embargantes pretendiam, com fundamento na lei n.º 1:045, pagar o foro de 400$0 00 ouro ou prata de 1840 com 4.000$, ou seja o valor do foro multiplicado por 10, nos termos da indicada lei.
Foram os embargos julgados improcedentes, mas em recurso a Relação revogou a respectiva sentença e adoptou o ponto de vista dos embargantes, que, ainda em recurso para este Supremo Tribunal, não vingou, julgando-se aqui que o pagamento dos foros vencidos e vincendos seria feito em moeda metálica de prata ou ouro ou o equivalente em escudos ao cambio do dia do pagamento, tal qual o fizera a sentença da 1.ª instância. Faleceram os executados e como seu representante foi habilitado o seu sogro e pai, D. João José de Portugal da Costa Mexia e Matos.
Ao tratar-se do pagamento dos foros nova controvérsia foi levantada por este D. José, por pretender fazer esse pagamento em prata, mas foi decidido definitivamente com intervenção do Supremo Tribunal que o pagamento fôsse em ouro, pelo que respeita a 390$ e em 10$, prata, tudo ao câmbio do dia do pagamento, e assim foram pagos os foros em dívida até 1932.
Quanto ao foro de 1933, como não fosse pago, requereu de novo a senhoria do domínio directo do foro a continuação da execução.
Novos embargos foram opostos, renovando-se as anteriores questões, apondo a exequente a excepção do caso julgado e contestando o mais, sendo logo julgados no despacho regulador procedentes e provados, fixando-se a importância a pagar em 4.000$, quando nas decisões respeitantes aos foros anteriores ela tinha sido fixada em 13.968$.
Em agravo interposto pela exequente foi tal decisão revogada, considerando-se procedente a excepção do raso julgado, porque discussões anteriores trazidas até este Supremo Tribunal decidiram e fixaram já a espécie de moeda e o modo como os foros deveriam ser pagos.
Ainda o executado agrava do acórdão que assim julgou.
O recurso é o competente e foi interposto em tempo.
No decorrer cios vistos faleceu o executado, sendo habilitadas como suas representantes as Santas Casas das Misericórdias de Campo Maior e do Alandroal. Será encorporado nos autos o processo apenso da habilitação.
O recurso vem peticionado e contrapeticionado, como se vê ele fl. ... e fl. ...
O recorrente sustenta não se verificar a invocaria excepção e com base principalmente no decreto n.° 21:297, de 4 de Maio de 1932, sustenta ter o direito de pagar o foro com 200$ em prata e 200$ ouro ao ágio de 24,444.
O recorrente não tem porém razão.
O que agora está em causa é o modo e forma do pagamento do foro quanto à moeda em que ele deve ser feito e esse particular foi já decidido e julgado nas decisões relatadas com trato sucessivo com relação aos foros vincendos.
Na hipótese dos autos verificam-se as três identidades do artigo 2503.° do Código Civil.
Está definitivamente assente que às agora executadas não foi reconhecido o direito de escolha no pagamento do foro em ouro ou em prata. Esse pagamento tem de ser feito com 390$ ouro metal e 10$ em prata, e moeda metal sonante ouro, ou sejam nacionais ou sejam libras esterlinas, são moedas com curso legal no País e existem no mercado, e quando não seja fácil a sua aquisição far-se-á o pagamento ao respectivo câmbio, como é de lei (Código Civil, artigos 724.° e seguintes).
Negam, pelo exposto, provimento ao agravo.

Sem custas, por as executadas estarem delas isentas.

Lisboa, 25 de Maio de 1937. - J. Soares - Carlos Santos (Tem voto de conformidade do Sr. juiz Conselheiro Arnaut, que não assina por não estar presente. - J. Soares).

Acordam os do Supremo Tribunal de Justiça em tribunal pleno:
As Misericórdias de Campo Maior e do Alandroal recorreram para o tribunal pleno do acórdão de fl. 181, por se achar em oposição com outros anteriores deste Tribunal, os de 26 de Abril de 1895, 16 de Novembro de 1917 e 6 de Julho de 1920.
Quanto ao de 1895, o que nele se julgou foi que não havia a nulidade de processo decretada pelas instâncias, invocando, para fundamento desta decisão, o não haver caso julgado nem inaptidão.
O que estava em causa era a anulação; e a contradição, que se aponta, é entre um fundamento e uma decisão e não entre duas decisões, como seria mester.

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Quanto ao de 1917, nele se trata do pagamento do imposto de rendimento de uma empresa de pesca.
A tal imposto não é aplicável o disposto no § único do artigo 7.° do Código de Processo Civil. No acórdão recorrido este regime se invoca.
Quanto ao de 1920, versa um despejo por falta de pagamento de rendas, mas não Lá pedido das rendas em dívida.
No acórdão recorrido o pedido é outro, e onde há objectos diferentes- há pontos de direito diferentes, não podendo assim haver contradição.
No acórdão recorrido julgou-se que o trato sucessivo se compreendia no caso julgado.
Nenhum dos acórdãos que se lhe dizem opostos julgou ou providenciou sobre este ponto.
Não havendo, portanto, a alegada oposição, não conhecem do recurso.

Sem custas, por os recorrentes estarem delas isentos.

Lisboa, 22 de Julho de 1938. - Costa Santos - Lopes Cardoso - Carlos Alves - Sampaio Duarte - Adriano Fernandes (Tem voto de conformidade dos Conselheiros Abílio de Andrade, Luiz Osório, Magalhãis Barros e Eduardo Santos) - César A. Santos (vencido, porque entre o acórdão recorrido e os acórdãos que foram invocados como fundamento da contradição existe oposição sobre o mesmo ponto de direito) - Alberto Plácido (vencido, pelos mesmos fundamentos) - Avelino Leite (vencido, pelo fundamento invocado pelo Sr. Conselheiro César dos Santos, visto haver a oposição referida, como aliás foi verificado quando a secção conheceu desse ponto para mandar seguir o recurso) - Ramiro Ferreira (vencido, pelos mesmos fundamentos) - Adolfo Coutinho (vencido, pelas mesmas razões).

António Eduardo Simões Baião, bacharel formado em direito pela Universidade de Coimbra, director do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, etc.:

Em conformidade com o § 1.° do artigo 181.° do decreto n.° 20:550, publicado no Diário do Governo n.° 273, 1.ª série, de 26 de Novembro do ano de 1931:
Certifico que no livro n.° 370 do cartório notarial n.° 7-B, encorporado neste Arquivo, existe um livro de notas do tabelião Francisco Vieira da Silva Barradas, onde a fl. 35 se encontra um documento, cujo teor é o seguinte:
Saibam quantos esta escritura de aforamento virem que, no ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1867, aos 8 dias do mês de Junho, nesta cidade de Lisboa, na Bua Augusta, 28, 1.° andar, no meu escritório, compareceram de uma parte Alexandre Teixeira Sampaio, proprietário, morador na Rua da Procissão, por si e na qualidade de procurador de sua mulher, D. Carlota Sá Viana Sampaio, e de outra parte Eduardo Teixeira Sampaio, solteiro, proprietário, morador na Rua do Monte Olivete, 65, na qualidade de procurador de seus irmãos Augusto Teixeira Sampaio e Frederico Teixeira Sampaio, ambos os outorgantes meus conhecidos, e me apresentaram as procurações de seus constituintes, as quais ficam em meu cartório para irem copiadas nos traslados desta escritura.
E pelo primeiro outorgante foi dito na presença das testemunhas adiante nomeadas e assinadas:
Que êle e seus irmãos Augusto e Frederico são senhores e possuidores em comum da Herdade ou Defesa das Polvorosas, situada na freguesia de Nossa Senhora da Graça da Comenda, concelho do Gavião, descrita sob o n.° 9 no respectivo livro da Conservatória do mesmo concelho, a qual Herdade consta de sete malhadas, duas chamadas das Cortes e cinco das Polvorosas.
Que esta Herdade está hipotecada ao Banco de Portugal, para garantia do pagamento do capital de 11:000$000 réis, de que ele, primeiro outorgante, e os ditos seus irmãos lhe são devedores.
Que, sem prejuízo desta hipoteca, ele, primeiro outorgante, por si e em nome de sua mulher, afora e dá de aforamento aos ditos seus irmãos Augusto Teixeira Sampaio e Frederico Teixeira Sampaio a terça parte da dita Herdade, nos termos constantes dos artigos seguintes:
1.° Que este aforamento é em fateusim e feito pela quantia de 4:000$000 réis, que os enfiteutas ficam obrigados a pagar por ele senhorio ao Banco de Portugal, importância que lhe toca na dívida que todos três devem ao mesmo Banco, e que é considerada como entrada ;
2.° Que os enfiteutas ficam obrigados a pagar anualmente de foro a ele primeiro outorgante a quantia de 400$000 réis, em moeda de ouro sonante, inteiramente livre de todas e quaisquer contribuições para o senhorio;
3.0 Que os enfiteutas não poderão vender, trocar ou por qualquer modo alienar este prazo sem licença do senhorio directo, o qual terá a opção nas vendas, e não usando dela poderão aliená-lo sem obrigação de pagar laudémio;
4.° Que quando os enfiteutas queiram dividir e demarcar a terça parte da dita Herdade, que fica constituindo este prazo, não o poderão fazer senão de acordo com ele, primeiro outorgante, ou com quem lhe suceder no domínio directo ;
5.° Que os enfiteutas incorrerão na pena de comisso alienando o prazo sem licença do senhorio directo, deixando de pagar os foros de três anos consecutivos, sendo-lhes pedidos, e nos mais casos em que esta pena tem lugar por direito;
6.° Que, cumprindo os enfiteutas estas cláusulas, ele, primeiro outorgante, se obriga a fazer-lhes este aforamento bom, firme e de paz.
Pelo segundo outorgante foi dito:
Que ele aceita este emprazamento para seus constituintes, em nome dos quais se obriga a cumprir as precedentes cláusulas, respondendo perante as justiças desta cidade.
Finalmente me apresentou o conhecimento do teor seguinte:
N.° 39. - Distrito administrativo de Portalegre, concelho do Gavião. - Contribuição de registo por título oneroso - Receita eventual. - Importância da contribuição, 730$000 réis - Imposto de viação, 146$000 réis - Total, 876$000 réis. - Pagaram os Exmo. Augusto Teixeira Sampaio e Frederico Teixeira Sampaio a quantia de 876$000 réis proveniente de contribuição de registo por título oneroso e respectivo imposto para viação do contrato de aforamento que fizeram com o Ex.mo Alexandre Teixeira Sampaio, de Lisboa, da terça parte da Herdade das Polvorosas, situada na freguesia da Comenda, deste concelho, ficando a pagar-lhe anualmente a quantia de 400$000 réis, sendo o seu valor 8:000$000 réis, que juntos à quantia de 4:000$000 réis que houve de entrada e à de um laudémio perfaz o total de 12:166$677 réis, a qual fica lançada no livro competente, a fl. 7.
Recebedoria do concelho do Gavião, 4 de Junho de 1867. - O Escrivão de Fazenda, Joaquim, José da Silva. - O Recebedor, Arsénio Jorge.
Trasladado o concertei com o próprio que fica em meu cartório.
Assim o disseram, outorgaram e aceitaram, sendo testemunhas presentes João Pedro dos Santos e Pedro José

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Pereira, empregados neste escritório, que assinaram com os outorgantes depois de lhes ser lida, esta escritura por mim, tabelião, Francisco Vieira da Silva Barradas, que a escrevi. -Desta 4$500 íeis. Dito o escrevi. - Alexandre Teixeira Sampaio - Eduardo Teixeira Sampaio - João Pedro dos Santos - Pedro José Pereira.

Exmos. Srs. Henry Bucknall and Sons. - Travessa do Corpo Santo, 10, Lisboa. - Exmos Srs. - O estado de doença em que me encontro ainda impede-me de aceitar a proposta de V. Ex.ª para o encontro com o seu solicitador, encontro aliás inútil desde que V. Ex.ª lhe mostrem as minhas cartas e lhe peçam opinião sobre elas. Esse senhor certamente informará V. Ex.ª que a expressão «pagamentos em moeda de ouro sonante», que é a da escritura do nosso foro, se não encontra mencionada na legislação a que V. Ex.ª se têm referido, pelo que sinto muito não poder concordar com o ponto de vista de V. Ex.ª
Para maior segurança do meu ponto de vista, vou nesta data pôr anúncios nos jornais, convocando os senhorios de foros em ouro para um movimento de representação ao Governo» no sentido de ser revogada a lei injusta com que, a propósito de actualização de rendas. - cousa defensável, porque a renda é um contrato passageiro -, se vieram prejudicar certos donos de foros-ouro, prejudicar para sempre, visto tratar-se de um contrato perpétuo.
Sem mais e com toda a consideração, de V. Ex.ªs, At.to, V.or, Obg. - José Adriano Pequito Rebêlo.

Lisboa, 11 de Julho de 1932. - Avenida António Augusto de Aguiar, 134.

Exmo. Sr. Alfredo Duarte Rodrigues. - Agradeço a V. Ex.ª a sua carta, com os textos legais sobre o foro das Polvorosas e uma citação da escritura respectiva.
Como já tinha dito a V. Ex.ª, vê-se desses documentos que a expressão da escritura c moeda de ouro, metal sonantes não aparece taxativamente na lei, que só fala de um lado em ouro, do outro em metal sonante, da maneira que ela não me parece aplicável ao caso de que se trata.
Por outro lado, como a lei, na intenção clara do legislador, foi feita na hipótese da moeda estabilizada numa certa base, como depois disso essa base mudou, por ter o escudo acompanhado a descida da libra, parece-me fácil obter, por representação dos interessados, uma modificação da lei no sentido de se modificar o factor da multiplicação.
Somente, não posso tratar disso nos poucos dias que estarei aqui antes de regressar ao estrangeiro, e somente quando voltar definitivamente, daqui a dois meses, o poderei fazer.
V. Ex.ª compreende que, vendo a questão por este aspecto, não posso concordar em receber o foro das Polvorosas de forma diferente daquela por que foi convencionado recebê-la e até hoje se tem seguido sempre.
Com consideração e estima, de V. Ex.ª, At.to, Obg.- José Pequito Rebêlo.

Lisboa, 15 de Maio de 1933.

Exmos. Srs. Henry Bucknall and Sons. - Travessa do Corpo Santo, 10, Lisboa. -Amigos e Srs.:

Foro das Polvorosas:

Só agora, regressado com mais demora do estrangeiro, pude ocupar-me do assunto, sobre o qual tencionava apresentar ao Ministério da Justiça uma representação pedindo que a questão fosse totalmente esclarecida.
Mas agora, estudando a questão mais a fundo com o meu advogado, vejo que a lei é bastante clara no sentido de não impedir que V. Ex.ª cumpram o nosso contrato de aforamento nos termos em que foi convencionado, e estou certo de que V. Ex.ª estimarão reconhecer que a nova lei não veio desrespeitar a vontade expressa dos seus contratantes, que, se não fomos nós mesmos pessoalmente, foram pessoas que nós para todos os efeitos jurídicos e morais representamos.
O decreto n.° 21:199 não se aplica ao nosso contrato, pois esse decreto visa apenas a esclarecer a vontade dos contratantes no caso em que eles convencionaram pagamento em ouro (ou outras expressões pouco claras), expressões estas que se prestam à hipótese de que os contratantes tenham admitido o pagamento em notas-ouro, etc.; o nosso contrato, porém, que contém a expressão claríssima de moeda de ouro, metal sonante, que o citado decreto não menciona, não pode deixar dúvidas sobre a espécie metálica do pagamento.
Portanto parece-me claro que esse decreto em nada podia alterar a forma como se tem cumprido até agora o nosso contrato de aforamento.
Mas mesmo que se julgasse aplicável ao caso o decreto referido, parece-me igualmente claro que a forma do pagamento também não seria alterada.
Diz o decreto: a Tendo-se estipulado o pagamento em ouro, observar-se-á o disposto no artigo 25.° do decreto n.° 19:869 ...», o qual artigo diz:
«Os direitos e obrigações que por lei ou contrato estejam referidos ao escudo-ouro consideram-se desde 1 de Julho de 1931 referidos ao escudo-ouro definido no artigo 1.° deste decreto, multiplicando-se aquele por 24,444».
Quere dizer: a obrigação que V. Ex.ª tinham de me pagar 400$ ouro antigos é substituída pela obrigação de me pagarem 400 x 24,444 escudos-ouro definidos no artigo 1.° (vão notando V. Ex.ª que estas disposições se referem ao valor da obrigação e não à espécie em que tenha de ser satisfeita).
Para V. Ex.ªs me pagarem em escudos-ouro definidos no artigo 1.° teriam de fazê-lo ou «em escudos-ouro, moeda padrão, com o peso de 0a,0739, com o título de 900/1000 (moeda que ainda não circula) ou em «soberanos ou meios-soberanos ingleses, de 7º,98805 e de 3º,95402 de ouro, com o título de 916 2/3 por 1000, os quais continuarão a ter curso legal com o valor de 110$ e 55$ ouro, respectivamente (artigo 1.°). A única forma possível de pagamento é, pois, a segunda, que corresponde à que tem sido usada entre nós, além de ser a que entra perfeitamente no espírito do nosso contrato, tendo sido também, segundo julgo, objecto de um caso julgado, discutido nos tribunais entre o meu bisavô e os anteriores proprietários do domínio útil do foro.
Esperando que estas explicações tenham satisfeito V. Ex.ªs, aguarda as suas indicações quem é, com toda a consideração e estima, de V. Ex.ªs, At.to, V.or, Obg.- José Adriano Pequito Rebelo.

Lisboa, 21 de Janeiro de 1934. - Avenida António Augusto de Aguiar, 134.

(Documentos juntos a fls. 84, 89 e 92 dos autos).

Vicente R. Monteiro - Gaspar António da Cunha Monteiro - Advogados. - Rua do Crucifixo, 16, 1.° - Telefone 2 7588. - Lisboa. - Parecer. - Consultado sobre, qual o foro que actualmente pode ser exigido pelo senhorio directo de um prazo constituído anteriormente a 1920 por título que estipula ser esse

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foro de 400$000 réis moeda ouro, metal sonante, respondo o seguinte:
Dispondo a alínea a) do artigo 7.° do decreto com força de lei n.° 20:188, de 8 de Agosto de 1931 (nessa parte não alterado pela nova redacção dada àquele artigo pelo decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932), que, «tendo-se estipulado o pagamento em ouro, observar-se-á o disposto no artigo 25.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho do corrente ano (1931)», e dispondo aquele artigo 25.° que «os direitos e obrigações que por lei ou contrato estejam referidos ao escudo-ouro consideram-se desde l de Julho de 1931 referidos ao escudo-ouro definido no artigo 1.° deste decreto, multiplicando-se aquele por 24,444», por evidente tenho que para determinar qual o foro exigível o que há legalmente a fazer é multiplicar os mil réis-ouro do contrato, hoje escudos-ouro, por 24,444.
A expressão «metal sonante», aditada no contrato à palavra ouro, tenho-a por manifestamente redundante, porque o ouro é sempre metal.
Ora, dispondo o citado artigo 25.°, como ficou dito, que os direitos e obrigações que estejam referidos ao escudo-ouro se consideram referidos ao escudo-ouro definido no artigo 1.° do respectivo decreto, multiplicando-se aquele por 24,444, feita a multiplicação ficou determinado o direito do senhorio credor e a obrigação do foreiro devedor.
O citado artigo 25.° do decreto n.° 19:869 dispõe que, feita a multiplicação, ficam os direitos e obrigações referidos ao escudo-ouro definido no seu artigo 1.°, e, portanto, pagando o devedor esse produto da multiplicação, em notas, é como se pagasse em moeda metálica ouro, não dando aquele decreto o direito ao credor de exigir esta, decreto que ficou sendo o regulador do caso e revogou a legislação em contrário.

Sub censura é o que parece a - O Advogado, Vicente R. Monteiro.
Lisboa, 14 de 'Março de 1934.

Domingos Pinto Coelho - Advogado. - Escritório: Rua Augusta, 176, 1.° - Telefone 2 7280. - Morada: Rua do Patrocínio, 19. - Telefone 2 3470. - Endereço telegráfico: Sognimod. - Lisboa. - Consulta. - Numa escritura pública, relativa a um contrato de enfiteuse, convencionou-se que o foro de 400$000 réis, a pagar em moeda ouro, seria efectivamente pago em moeda de ouro, metal sonante.
Pregunta-se: em face da legislação vigente qual é o foro a pagar?
Resposta. - O decreto n.° 20:188, de 8 de Agosto de 1931, dispôs no seu artigo 7.° que, relativamente aos foros a pagar só em ouro, se observará o disposto no artigo 25.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho de 1931.
Aquele artigo 25.° dispõe que, em relação aos direitos e obrigações que por lei ou contrato estejam referidos ao escudo-ouro, o escudo se multiplicará por 24,444.
Contra a aplicação deste artigo 25.° não procede dizer-se que, no contrato de aforamento, se não faz referência ao escudo-ouro. O artigo 25.° não é aqui aplicado pela sua simples letra; é aplicado porque assim o preceitua o citado decreto de 8 de Agosto relativamente aos foros a pagar só em ouro.
Depois disto publicou-se o decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932, o qual, por se terem levantado dúvidas, alterou um tanto a redacção daquele artigo 7.° do primeiro decreto atrás citado, dando-lhe redacção nova, mas para casos que são diversos dos da consulta.
Segundo o artigo 7.°, tanto do primeiro decreto n.° 20:188 como do interpretativo n.° 21:199, tendo-se estipulado o pagamento em ouro, observar-se-á o disposto no artigo 35.° do decreto n.° 19:869, isto é, adoptar-se-á para a actualização o multiplicador 24,444.
Nem se objecte que o decreto n.° 21:199 não considerou precisamente a hipótese da consulta «ouro, metal sonante».
Êste decreto prevê as estipulações de pagamento:

Em dinheiro;
Em moeda corrente;
Em metal;
Em metal sonante;
Só em ouro;
Só em prata;
Em ouro ou prata;
Em ouro e prata, sem se fixar a proporção nesta última hipótese.

Vê-se, pois, que ao legislador não esqueceram os casos metal e metal sonante.
Portanto, se não fez distinção entre ouro e ouro, metal sonante, evidentemente foi porque equiparou os dois casos.
Nestes termos, é meu parecer que o foro de 400$000 réis deve ser pago multiplicando-se 400$ por 24,444.

Lisboa, 24 de Maio de 1933. - O Advogado, Domingos Pinto Coelho.

José Alberto dos Reis - Advogado - Professor da Faculdade de Direito. - Coimbra.-Parecer.-Num emprazamento anterior a 31 de Dezembro de 1920 estipulou-se que o foro seria de 400 $000 réis e que seria pago em ouro, metal sonante. Pregunta-se qual a importância que actualmente terá de pagar o enfiteuta.
O artigo 7.° do decreto n.° 20:188, de 8 de Agosto de 1931, interpretado pelo decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932, estabelece as regras que devem observar-se para a actualização dos foros quando os contratos sejam anteriores a 31 de Dezembro de 1920.
As hipóteses principais a considerar são duas:
1.ª Estipulou-se que o foro seja pago em ouro;
2.ª Estipulou-se que o foro seja pago em dinheiro, em moeda corrente, em metal, em metal sonante, em prata.
Na primeira hipótese a alínea a) do artigo manda observar o disposto no artigo 25.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho dê 1931, que por sua vez manda multiplicar o escudo por 24,444.
Na segunda hipótese a alínea b) manda multiplicar a prestação pelo coeficiente 10.
No caso da consulta convencionou-se que o foro seria pago em ouro, metal sonante. Como deve actualizar-se a prestação?
Parece-me evidente que a actualização deve fazer-se em harmonia com a regra da alínea a) do artigo citado.
É certo que a fórmula empregada no contrato não corresponde precisamente à hipótese figurada pelo legislador. O decreto considera o caso de se ter estipulado o pagamento em ouro; no contrato em questão as partes ajustaram o pagamento em ouro, metal sonante.
Mas o adicionamento das palavras «metal sonante» hão altera a solução.
Para o legislador a hipótese de prestação mais onerosa é a de se ter estipulado o pagamento em ouro; acima desta não há nenhuma outra que imponha ao devedor maiores encargos. Tanto faz, pois, que o foreiro se tenha obrigado simplesmente a pagar em ouro, como que se tenha obrigado a pagar em ouro, metal sonante.
E se analisarmos a segunda regra fixada no artigo, vemos que a estipulação do pagamento «em metal sonante» não obriga a satisfazer a prestação em espécies metálicas.

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Com efeito, mostra a alínea b) do artigo que no caso de se ter convencionado o pagamento em metal sonante o enfiteuta cumpre pagando uma importância correspondente a dez vezes a prestação.
Não se impõe, nesta hipótese, ao devedor a obrigação de entregar moedas metálicas; o enfiteuta pode pagar em notas ou em moedas, contanto que satisfaça a quantia equivalente à importância da prestação multiplicada por 10.
Depreende-se ainda da mesma alínea que tanto faz estipular o pagamento em metal sonante como o pagamento em prata. Metal sonante e prata são, no sistema dos decretos n.°s 20:188 e 21:199, expressões equivalentes.
Daqui vem que o adicionamento das palavras «metal sonantes à estipulação do pagamento em prata ou em ouro é manifestamente inútil. É inútil quando se acrescentam ao pagamento em prata, porque tanto exprime uma cousa como a outra; é inútil quando se acrescentam ao pagamento em ouro, porque neste caso a fórmula pagamento em ouro, tendo maior valor que a fórmula pagamento em metal sonante, absorve e domina esta.
Poderá objectar-se que as disposições do artigo 7.° dos decretos citados são meramente supletivas e que por isso cedem perante a vontade das partes em contrário, quando claramente manifestada. E assim, na hipótese sujeita, o foreiro tem de adquirir moedas de ouro com curso legal no País, para com elas satisfazer a prestação; e como existem essas moedas soberanos e meios -soberanos ingleses-, é com elas que tem de pagar.
A objecção não procede. As disposições do artigo 7.° estabelecem regras de interpretação da vontade das partes, mas regras imperativas, que não podem ser afastadas nem substituídas.
Por outras palavras: todas as estipulações contratuais relativas à forma do pagamento do foro têm de ser enquadradas dentro de alguma das regras formuladas pelo artigo.
É o que se infere manifestamente de todo o contexto do artigo, e especialmente da alínea fe), onde o pagamento em prata e em metal sonante vem afinal a traduzir-se no pagamento em qualquer espécie, contanto que a prestação se multiplique por 10;
Quere dizer: para o legislador o que importa é a determinação do montante a pagar e não a forma do pagamento; o que se torna necessário fixar é o coeficiente pelo qual tem de se multiplicar a prestação para se considerar actualizada e não as espécies em que o pagamento venha a ser efectuado.
Concluo, pois, que a alínea a) do artigo 7.° dos decretos n.ºs 20:188 e 21:199 é aplicável a todos os casos em que se tenha estipulado o pagamento em ouro, seja qual for a forma ou o modo por que essa estimulação haja sido feita, e portanto quer se tenha dito simplesmente que o foro será pago em ouro, quer se tenha acrescentado qualquer outra indicação.
A alínea a) do artigo manda observar o disposto no artigo 25.° do decreto n.° 19:869; este artigo manda multiplicar o escudo por 24,444.
Desta maneira o foro actualiza-se, no caso da consulta, multiplicando-se a prestação por 24,444, o que equivale a dizer que o enfiteuta tem de pagar 9.777$60. Esta quantia pode pagá-la em quaisquer espécies.
Pode, é claro, pagá-la em soberanos ou meios soberanos ingleses; mas não é obrigado a satisfazer dessa maneira.
Cumpre a obrigação desde que pague 9.777$60; o pagamento pode fazê-lo em notas ou moedas que tenham curso legal no País.
Coimbra, 6 de Março de 1934. - José Alberto dos Reis.
Sentença da 1.ª instância:

Vistos os autos:

A sociedade Henry Bucknall and Sons Limited, alegando:

a) Que é senhoria útil de uma propriedade rústica sita na freguesia de Nossa Senhora da Graça da Comenda, concelho de Gavião, constituindo a terça parte da Herdade ou Defesa das Polvorosas, descrita sob o n.° 9 do respectivo livro da Conservatória do Registo Predial da comarca de Nisa e de que é presentemente senhorio directo o Dr. José Pequito Rebelo, residente nesta cidade;
b) Que o foro anual estipulado é de 400$000 réis em moeda de ouro sonante, que, actualizado, nos termos da lei, representa hoje a quantia de 9.777$60;
c) Que esse foro se vence em Junho de cada ano e é pagável no escritório da requerente, senhoria útil, nos termos da lei e do contrato; e
d) Que o senhorio directo se tem recusado a receber nos seus vencimentos os foros que a requerente lhe tem querido pagar, ou seja de 9.777$60 em cada ano, relativos aos anos de 1932, 1933 e 1934.
Pede se lhe passem guias para fazer o depósito judicial dos ditos três foros, na importância total de 29.332$80, a fim de se desobrigar, e que, feito esse depósito, se mande citar o aludido senhorio directo para, nos termos e pela forma legal, impugnar, querendo, o mesmo depósito, seguindo-se os mais termos legais e com a legal cominação.
Juntou os documentos de fls. 3 a 7.
Feitos o depósito - guia de fl. 12 - e a citação do senhorio directo - certidão de fl. 21 -, veio êste deduzir acção nos termos e com os fundamentos seguintes:
O autor é - senhorio directo e a ré senhoria útil de um prazo constituído pela terça parte de uma propriedade rústica sita no concelho de Gavião e descrita sob o n.° 9 do respectivo livro da Conservatória do Registo Predial da comarca de Nisa; de harmonia com o contrato de emprazamento, celebrado por escritura pública em 8 de Junho de 1867, o foro anual é de 400$000 réis em moeda de ouro sonante, pago em 8 de Junho de cada ano, nos termos do artigo 1661.° do Código Civil;
Sempre desde a constituição do prazo, e na conformidade do respectivo contrato, o foro foi pago na estipulada espécie moeda de ouro sonante. E como quer que, pouco depois da crise monetária portuguesa de 1891, a senhoria útil, já então a sociedade ré, pretendendo eximir-se aos encargos do ágio do ouro, depositasse a importância do foro em notas de curso forçado do Banco de Portugal pelo seu valor nominal, moveu-lhe o então senhorio directo, Manuel Lopes Maia, bisavô do autor, uma acção para a compelir a reconhecer a obrigação de pagar em ouro, acção que, depois de julgada procedente em várias instâncias, terminou por escritura de transacção de 11 de Agosto de 1898, julgada por sentença de 24 de Janeiro de 1899, que fez trânsito em julgado, e na qual a ré reconheceu efectivamente a obrigação de pagamento do dito foro em moeda de ouro, metal sonante, e em demonstração disso entregou neste acto ao segundo outorgante, senhorio directo, a quantia de 2:911$990 réis em notas do Banco de Portugal, compreendendo o ágio correspondente aos quatro anos de foros vencidos, o último dos quais foi em 1897.
Desde então e até 1931, inclusive, sempre a ré pagou aos sucessivos senhorios directos, incluindo o autor, o foro em causa na espécie estipulada e devida (precisamente sob a forma de soberanos ingleses), segundo o contrato de emprazamento originário, o seu expresso reconhecimento, a lei e o caso julgado, que para todos os efeitos legais se invoca.

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Em 1932, porém, com o pretexto da publicação do decreto n.° 20:188, de 24 de Agosto de 1931, e com o fundamento no que dispõe o seu artigo 7.°, mais tarde modificado pelo decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932, pretendeu a ré exonerar-se da sua obrigação, oferecendo o seu pagamento não em moeda de ouro, metal sonante, conforme era devido, mas em notas do Banco de Portugal pelo seu valor nominal, isto é, não em escudos-ouro mas em escudos-papel, cujo valor é muito inferior desde o abandono do padrão ouro, sancionado pelo decreto n.° 20:683 e sucessivamente prorrogado pêlos decretos n.ºs 21:190 e 21:808.
Ora nada justifica esta nova atitude da ré, pois nenhuma nova convenção incidiu sobre este contrato nem disposição alguma de lei o alterou, antes em todas as novas leis reguladoras do cumprimento de obrigações em moeda metálica de ouro ou simplesmente em ouro só pode encontrar-se confirmação do regime jurídico em que se constituiu, e sempre vigorou o emprazamento em causa e o respeito dos direitos por ele adquiridos legitimamente.
É o que resulta quer do artigo 724.° do Código Civil, quer do artigo 25.° do decreto n.° 19:869, quer do artigo 7.° do decreto n.° 20:188.
Na verdade, mesmo que se admita que a hipótese dos autos não é simplesmente regulada pelas disposições gerais dos citados artigos, mas especialmente pelo referido artigo 7.° do decreto n.° 20:188, certo é que, remetendo este artigo para o artigo 25.° do decreto n.° 19:869, a ré abertamente contraria a lei, na sua letra e no seu espírito, ao pretender exonerar-se com um pagamento em escudos-papel.
De facto, em face do disposto no aludido artigo 25.° do decreto n.° 19:869, para efectuar o pagamento segundo a lei tem de entregar-se por cada escudo-ouro antigo (ou mil réis) 24,444 escudos-ouro, tal como esta moeda é definida no artigo 1.° do aludido decreto n.° 19:869, isto é, escudos-ouro com o peso, cada um, de 0º,0739 e o título 900/1000, e não escudos-papel do Banco de Portugal, de valor legalmente reconhecido como muito inferior e portanto não equiparados ao escudo-ouro.
Por estas razões recusou o autor o pagamento do foro em 1932, 1933 e 1934 que a ré ofereceu em escudos-papel, pelo seu valor nominal, isto é, propondo-se pagar em escudos-papel exactamente o mesmo que devia entregar em escudos-ouro.
Requereu a ré o depósito da quantia de 29.332$80 em escudos-papel, correspondente, segundo seu critério, a três anuidades de 9.777$60 papel, com o qual pretende desobrigar-se ; mas, porque é diversa a espécie de moeda em que é devido o pagamento e porque é maior a quantia devida se se reduzir à espécie definitiva, e assim, porque além das prestações anuais do foro propriamente ditas são devidos em relação a cada uma delas, desde os respectivos vencimentos até integral pagamento, os juros de mora legais, deve a acção ser julgada procedente e, consequentemente, a ré condenada a reconhecer, de harmonia com o contrato, com a lei e o caso julgado, a obrigação de pagar, e a pagar efectivamente, os foros em dívida e os que de futuro se vencerem em moeda de ouro, metal sonante, no montante, por cada prestação anual, de 9.777$60 ouro, com o peso e título que lhe atribue o artigo 1.° do decreto n.° 19:869, ou em soberanos e meios soberanos ingleses, com o peso de 7º,98805 e 3º,99402 de ouro, à razão de 110$ e 55$ ouro cada soberano e meio soberano, respectivamente, e ainda os juros de mora legais. Juntou os documentos de fls. 27 a 50.
A ré contestou por esta forma: desde a constituição do prazo até à crise monetária de 1891 a ré sempre pagou o seu foro em notas do Banco de Portugal, e isto porque a esse tempo o senhorio útil, bem como todos aqueles que tinham a receber moeda em pagamentos, preferiam receber as notas do Banco em lugar da moeda metal; quando surgiu a crise monetária de 1891 a ré quis continuar a pagar em notas do Banco de Portugal, mas o senhorio directo exigiu então o pagamento em ouro, metal sonante, e a questão que então se levantou terminou pela escritura de transacção de 11 de Agosto de 1898, julgada por sentença de 24 de Janeiro de 1899 e se encontra junta; até 1931 a ré pagou o foro nos termos constantes da referida escritura de 11 de Agosto de 1898; a ré não modificou o seu modo de proceder em 1932, pois que apenas pretendeu então pagar o foro com a actualização fixada por forma definitiva no artigo 25.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho de 1931, que estabilizou a moeda portuguesa, acabando consequentemente com as mentiras sobre o valor da moeda, que tanto tinham prejudicado anteriormente o comércio e a indústria em Portugal; a esse artigo 25.° pretende o autor dar uma interpretação que se não coaduna nem com a letra nem com o espírito do mesmo decreto; o caso em discussão não é regido, como o autor pretende, pêlos artigos 724.° e seguintes do Código Civil, visto que, por disposição expressa de lei, tais artigos deixaram de regular a matéria; anteriormente aos decretos n.ºs 20:188 e 21:199 a matéria de pagamento de foros, nos emprazamentos celebrados até 31 de Janeiro de 1930, era regulada pêlos preceitos do artigo 1660.° do Código Civil; com a publicação, porém, dos referidos decretos n.ºs 20:188 e 21:199 - os quais revogaram toda a legislação em contrário sobre a matéria - mudou a situação, que ficou assim: quando o pagamento do foro fosse estipulado em dinheiro, moeda corrente, metal, metal sonante ou prata, multiplica-se pelo coeficiente 10; quando o pagamento fosse em ouro, multiplica-se pelo coeficiente 24,444, por observância do disposto no artigo 25.° do decreto n.° 19:869; quando o pagamento fosse em ouro e prata, multiplica-se pelo coeficiente 10 quanto a 10$ em prata e pelo coeficiente 24,444 quanto ao resto; encontra-se, pois, revogado o artigo 166.° do Código Civil e estabelecendo o novo diploma legal, actualmente em vigor, a actualização dos foros pela sua simples multiplicação pêlos coeficientes 24,444 e 10, conforme se trate ou não de metal ouro, não subsiste mais a obrigação do pagamento do foro no metal convencionado, se tal obrigação existia, bastando, para desobrigação do foreiro, o pagamento em moeda corrente. Com a multiplicação por 24,444 se o metal convencionado for o de ouro, ou por 10 se o metal for o de prata ou se o foro for em dinheiro ou moeda corrente. Não tendo havido, portanto, da parte da ré nova atitude, como o autor pretende, mas sim e apenas o cumprimento da lei, pede aquela a improcedência da acção.
Replicando, diz o autor: mantém o autor tudo quanto alegou respeitante à matéria de facto; sobre a matéria de direito, observa que a doutrina da ré, na interpretação das informações legais, conduz às seguintes conclusões absurdas: pelo artigo 7.° do decreto n.° 20:188 e artigo 25.° do decreto n.º 19:869 todos os foros em ouro (bem como todos as obrigações referidas a ouro) teriam sido convertidos em moeda corrente; as mesmas disposições legais teriam tornado nulas e consideradas como não escritas todas as cláusulas de pagamento em moeda metálica de ouro; o decreto n.° 19:869, ao estabelecer a relação entre o antigo e o novo escudo-ouro na proporção exacta dos seus respectivos juros e títulos, tem estabelecido uma relação meramente teórica e abstracta, sem aplicação às relações jurídicas em que a obrigação de pagamento se exprime em ouro, donde resultaria manifestamente locupletamento dos devedores à custa dos credores no

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caso de uma desvalorização da moeda corrente em relação ao ouro - que é o caso presente -, sendo, como é, certo que nos emprazamentos o foro é afinal uma prestação anual do preço da terra, cujo valor, na sua expressão ouro, é inalterável.
O autor, exigindo o pagamento em ouro, nos termos do contrato, do caso julgado e da lei, pretende apenas, dentro da moral e do direito, defender-se de que a ré se locuplete à sua custa.
Termina como na petição.
Treplicando, diz a ré que mantém, quer quanto à matéria de facto, quer quanto à de direito, tudo quanto alegou. Seria absurdo que continuasse a vigorar, como deseja o autor, o § 1.° do artigo 1660.° do Código Civil depois de revogado pêlos decretos n.ºs 20:188 e 21:199, e seria absurdo e incoerente que a lei admitisse um regime para os pagamentos em ouro diferente do regime para os pagamentos em prata. O processo seguiu seus. regulares termos, juntando a ré os documentos de fls. 71 a 107.
Designado dia para julgamento em tribunal colectivo, a ele se procedeu pela forma constante da acta de fl. 123, tendo as partes chegado a acordo quanto à questão de facto, como da mesma acta consta.
Cumpre decidir.
No regulador, com trânsito, foram as partes julgadas legítimas, e, como não há questões prévias a apreciar, conheço já de mentis.
A questão resume-se nisto: o autor é senhorio directo e a ré senhoria útil de um prazo constituído na escritura pública de 8 de Junho de 1867, na qual ficou consignado que o foro seria de 400$000 réis (quatrocentos mil réis), em moeda de ouro corrente e pago em 8 de Junho de cada ano.
Fará efectuar esse pagamento relativamente a 1932 pretende a ré entregar ao autor a quantia de 9.777$60, que este se recusou a receber, por entender que era devida maior quantia. E porque essa atitude se mantivesse nos anos de 1933 e 1934, a ré veio consignar em depósito a quantia de 29.332$80, soma de três parcelas de 9.777$60, correspondentes aos três aludidos anos, pedindo a citação do senhorio directo para os ulteriores termos legais.
Propôs, então, este a presente acção para fazer condenar a ré a reconhecer a obrigação de pagar, e a pagar efectivamente, os foros em dívida e os que se vencerem em moeda de ouro, metal sonante, no montante por cada prestação anual de 9.777$60 escudos-ouro, com o juro e título que lhe atribue o artigo 1.° do decreto n.° 19:869, ou em soberanos e meios soberanos ingleses, com o peso de 7º,98805 e 3º,99402 de ouro, à razão de 110$ e 55$ ouro, e ainda os juros de mora.
A ré sustenta que a prestação anual devida é apenas de 9.777$60.
Resta averiguar e decidir qual dos dois tem razão.
Em face das disposições contidas nos decretos n.ºs 20:188, 21:199 e 19:869, nenhuma dúvida pode haver, em minha opinião, de que ela pertence à ré.
Com efeito, o artigo 7.° do citado decreto n.° 20:188, interpretado pelo n.° 21:199, estabelece que, nos contratos de enfiteuse ou sub-enfiteuse anteriores a 31 de Dezembro de 1920, se observará quanto ao pagamento do foro, quando haja sido estipulado em ouro, como no caso presente, o disposto no artigo 25.° do decreto referido n.° 19:869.
Êste artigo dispõe que os direitos e obrigações que por lei e contrato estejam referidos ao escudo-ouro consideram-se, desde 1 de Julho de 1931, referidos ao escudo-ouro definido pelo artigo 1.° do mesmo decreto, multiplicando-se aquele por 24,444.
Ora se assim é e se no prazo em causa se estabeleceu que o foro fosse pago em ouro, evidente é que o foreiro satisfaz a sua obrigação entregando a importância resultante da multiplicação da quantia estabelecida pelo coeficiente legal de 24,444.
Ora o produto da multiplicação de 400$000 réis por 24,444 é 9.777$60.
Não argumente o autor com o caso julgado, visto que se não verifica por falta de identidade de objecto das duas acções.
A doutrina defendida pelo autor é sustentada também em artigo doutrinário na Revista dos Tribunais, ano 50.°, p. 18.
A sua argumentação, porém, não convence em face da terminante disposição do artigo 25.° do citado decreto n.° 19:869.
A ré, depositando, em face da recusa do autor, a quantia de 29.332$80, cumpriu a sua obrigação pelo que respeita ao pagamento dos foros relativos aos anos de 1932, 1933 e 1934.
Nestes termos e nos de direito julgo a acção improcedente e não provada e, em consequência, válido e bem feito o depósito da ré e extinta a sua obrigação de foreira quanto ao pagamento dos foros de 1932, 1933 e 1934, podendo o autor levantar a importância depositada.
Nas custas e selos dos autos, com o mínimo da procuradoria a favor da ré, condeno o autor.

Registe e intime-se.

Lisboa, 15 de Julho de 1935. - Arnaldo Augusto Bártolo.

Copia. - Acórdão da Relação de Lisboa:

Por escritura pública de 8 de Agosto de 1867, Alexandre Teixeira Sampaio e esposa deram de aforamento a seus irmãos a terça parte da Herdade ou Defesa das Polvorosas, sita no concelho do Gavião, pelo foro anual de 400$000 réis (hoje 400$) em moeda de ouro sonante.
Presentemente, senhorio útil e directo estão, respectivamente, representados pela Sociedade Henry Bucknall & Sons, Limited, e pelo Dr. José Adriano Pequito Rebelo, os quais entraram em divergência sobre a fornia do pagamento do foro.
Não realizado este, a senhoria útil consignou um depósito, para se desobrigar, na quantia do 29.332$80, que entende ser a importância do foro relativa aos três anos de 1932, 1933 e 1934, à razão de 9.777$60 por ano.
O Dr. Pequito Rebelo opôs-se ao depósito por meio de acção em que alega, em resumo, que desde a constituição do emprazamento sempre o fôro foi pago em ouro sonante, mas, dada a crise monetária de 1891, a senhoria útil, já a actual, pretendeu eximir-se ao encargo do ágio do ouro e depositou o foro em notas de curso forçado do Banco de Portugal, pelo seu valor nominal.
Não se conformando o senhorio directo com tal pagamento, moveu contra a devedora uma acção para a compelir a pagar em ouro, vindo tal processo a terminar pela transacção constante da escritura de 11 de Agosto de 1898, julgada pela sentença de 24 de Janeiro de 1899, que fez trânsito em julgado, na qual a ré reconheceu a obrigação de pagamento do dito foro em moeda de ouro, metal sonante, que solveu com a entrega de 2.911$990 réis em notas do Banco de Portugal, compreendendo o ágio.
Desde então até 1931 sempre a ré pagou na espécie estipulada (soberanos ingleses); mas em 1932, com pretexto na publicação do decreto n.° 20:188, de 24 de Agosto do 1931, e com fundamento no que dispõe o artigo 7.°, mais tarde modificado pelo decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932, pretendeu exonerar-se da obrigação, oferecendo o pagamento, não em moeda de ouro, me-

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tal sonante, mas em notas do Banco de Portugal, pelo seu valor nominal, isto é, não em escudos-ouro, mas em escudos-papel, cujo valor ó muito inferior depois do abandono do padrão ouro, sancionado pelo decreto n.° 20:683, de 29 de Dezembro de 1931, sucessivamente prorrogado pêlos decretos n.ºs 21:190, 21:808 e 22:496, respectivamente de 2 de Maio de 1932, 29 de Outubro de 1932 e 4 de Maio de 1933.
Ora, tanto pelas disposições contidas nestes diplomas como no artigo 724.° do Código Civil e decreto n.° 19:869 (artigo 25.°), mantém-se a obrigação do pagamento em ouro, metal sonante, que deve fazer-se multiplicando o escudo-ouro por 24,444, conforme esta moeda é definida no artigo 1.° do decreto n.° 19:869, isto é, escudo-ouro com o peso cada um de Ogr,0739 e o título 900/iooo e não escudo papel do Banco de Portugal, de valor inferior, e portanto não equiparado ao escudo-ouro.
Nestes termos pede que, além dos juros de mora desde o vencimento, custas e procuradoria, a ré seja condenada a pagar os foros vencidos em moeda de ouro, metal sonante, no montante para cada prestação de 9.777$60 ouro com o peso e título que lhe atribuo o artigo 1.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Julho de 1931, ou em soberanos e meios soberanos ingleses de 7gr,98805 e de 3gr,99402 de ouro, à razão de 110$ e 55$.
A ré contesta o pedido, alegando:
Que pretende fazer o pagamento pela forma definitivamente fixada pelo artigo 25.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho de 1931, que estabilizou a moeda e regula a matéria, e não pelos artigos 724.°, 72õ.° e 727.° do Código Civil, pois o pagamento de foros, antes dos decretos n.ºs 20:188, de 8 de Agosto de 1931, e 21:199, de 4 de Maio de 1932, era regulado pelo artigo 1660.° do Código Civil, com a redacção dada pelo decreto n.° 19:126, que mandou actualizar os foros com a multiplicação pelo coeficiente 10, nos foros em dinheiro, sem designação de metal ou moeda metálica, nada estipulando a lei quando os foros fossem pagos em metal ou moeda metálica.
Que esta situação mudou com os decretos n.ºs 20:188 e 21:199 (artigo 7.°), segundo os quais o pagamento do foro estipulado em dinheiro, moeda corrente, metal, metal sonante ou prata, se multiplicaria pelo coeficiente 10 (alínea b) do citado artigo); o estipulado em ouro e prata se multiplicará pelo coeficiente 24,444, por observância do disposto no artigo 25.° do decreto n.° 19:869; e o estipulado em ouro e prata se multiplicaria pelo coeficiente 10, quanto a 10 escudos em prata, e pelo coeficiente 24,444, quanto ao resto (alínea c);
Que assim, estando revogado o artigo 1660.° do Código Civil, o foreiro se desobriga pagando o foro actualizado com a multiplicação pelo referido coeficiente de 24,444.
Terminava por pedir a improcedência da acção.
Na réplica e tréplica, afora pequenas divergências sôbre matéria de facto, as partes mantêm-se nos sons pontos de vista, sôbre os fundamentos de direito.
As partes foram julgadas legítimas e contra o questionário não se deduziu qualquer reclamação.
No julgamento as partes acordaram sôbre os pontos de facto, não se tornando assim necessário inquirir testemunhas.
Juntaram vários documentos a fls. 131 e seguintes e foi proferida a sentença, julgando a acção improcedente e, consequentemente, válido o depósito e extinta a obrigação.
Apelou o autor, em tempo, sendo o recurso de apreciar.
Tudo examinado e ponderado:
O caso julgado invocado na petição, não como excepção, mas como fundamento da acção, não procede, porque, embora haja identidade das partes e do objecto, não a há do direito ou causa de pedir.
Pelos documentos juntos aos autos e pelo acordo das partes está provado que o autor é senhorio directo dum prazo constituído pela terça parte da Herdade ou Defesa da Polvorosa, sita na freguesia de Nossa Senhora da Graça da Comenda, do concelho de Gavião, de que a ré é senhoria útil, cujo foro anual é de 400$000 réis (hoje 400$) em moeda de ouro sonante, pago em 8 de Junho de cada ano.
Prova-se que o pagamento do fôro se tem sempre feito na espécie estipulada, ou em notas do Banco de Portugal quando, anteriormente à crise de 1891, elas tinham um valor igual e até por vezes superior às moedas de ouro, e que posteriormente a esta data, em virtude de sentença transitada em julgado, e de harmonia com as disposições legais e contratuais, se fixou que o pagamento seria feito em moeda de ouro, metal sonante.
Esta forma de pagamento tinha a sanção dos artigos 1656.° o 1660.° do Código Civil, que estabeleciam ser a qualidade e quantidade do foro reguladas no aprazimento das partes e que o seu pagamento se faria no tempo e lugar convencionados.
Para tanto tinha, consequentemente, de se aplicar o disposto nos artigos 724.°, 725.° e 727.° do Código Civil, que regulavam a forma de pagamento quando estabelecida fosse unia moeda metálica.
Esta legislação vigorou até ao decreto n.° 19:126, de 16 de Dezembro de 1930, que, alterando várias disposições do Código Civil, modificou também o artigo 1660.°, estabelecendo no § 1.°, parte final, que nos emprazamentos anteriores a 31 de Dezembro de 1920 os foros em moeda metálica seriam pagos de conformidade com os citados artigos 724.°, 725.° e 727.° do Código Civil.
Mas, posteriormente, legislação especial veio regular a matéria, e assim é que o decreto n.° 20:188, de 8 de Agosto de 1931, no artigo 7.° preceituou que nos emprazamentos anteriores à mencionada data (31 de Dezembro de 1920) os foros em metal sonante seriam pagos de conformidade com o disposto no artigo 2õ.° do decreto n.° 19:869, de 9 de Junho do mesmo ano, obrigação que se mantém pela nova redacção dada àquele artigo 7.° pelo decreto n.° 21:199, de 4 de Maio de 1932.
E êste artigo 25.° preceitua que «os direitos e obrigações que por lei ou contrato estejam referidos ao escudo-ouro consideram-se desde 1 de Julho de 1931 referidos ao escudo-ouro definido no artigo 1.° deste decreto, multiplicando aquele por 24,444».
O artigo 1.°, fixando o regime da moeda a contar de 1 de Julho de 1931, indicou o peso do escudo-ouro, moeda padrão, o peso e título dos soberanos e meios soberanos ingleses, que continuarão a ter curso legal com, o valor de 110$ e 55$, respectivamente.
Daqui se depreende que a legislação que hoje regula a matéria vertente é a apontada e não a do Código Civil, não só porque se trata de lei especial, que prevalece sobre a geral, como ainda porque, sendo legislação contrária, está expressamente revogada pelo artigo 10.° do decreto n.°.20:188.
Por tais disposições, o pagamento do fôro em ouro, metal sonante faz-se multiplicando o escudo-ouro estabelecido no contrato de emprazamento por 24,444, por fôrça do disposto no artigo 7.° do decreto n.° 20:188, ordena o artigo 25.° do decreto n.° 19:869, isto é, o escudo-ouro antigo, como se depreende da referência feita por este artigo 25.°, que, entre o escudo-ouro do contrato e o do artigo 1.° desse diploma, escolhe aquele, para, com o factor indicado, se conseguir a actualização.
Estas as razões de ordem legal que fundamentam a decisão e que outras de natureza diferente não invalidam nem contrariam, pois, pretendendo as citadas disposições terminar com a incerteza do fôro e fixar uma actualização justa, escolheu um factor correspondente à desva-

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lorização da moeda, som que da sua aplicação resulte locupletamento de qualquer das partes, pois o produto obtido tem um poder de compra igual ou superior ao do foro de 400$000 réis do emprazamento de 1867.
Se o pagamento se fizesse como pretende o autor, resultaria um locupletamento a seu favor e contra a senhoria útil e ficariam sem aplicação as disposições dos decretos n.ºs 20:188 e 21:199. Seria o mesmo que se não existissem tais preceitos, pois que o foro seria liquidado e pago de harmonia simplesmente com o preceituado no Código Civil.
Certamente não foi isto o que pretendeu o legislador.
Em harmonia com o exposto, é de concluir que, tendo a ré depositado, para efeitos de pagamento, o produto da multiplicação dos 400$000 réis do fôro por 24,444, ou seja, em relação a cada ano, 9.977$60, satisfaz a obrigação.
Termos em que confirmaram a sentença apelada, condenando o apelante no imposto de justiça cível e percentagem legal; com 500$ de procuradoria.

Lisboa, 28 de Março de 1936. - Adolfo Coutinho- M. Duque - Oliveira Pires.

Cópia.- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.- A Sociedade Henry Bucknall & Sons, Limited, é senhoria útil da terça parte da Herdade da Polvorosa, concelho de Gavião. O fôro anual é de 400$000 réis em moeda de ouro sonante, que, actualizado, nos termos da lei, dá 9.777$60. O senhorio directo recusou receber os relativos aos anos de 1932, 1933 e 1934, e por isso os depositou, no total de 29.332$82.
O senhorio directo, Dr. José Adriano Pequito Rebêlo, impugnou por acção, em que alega:
Na escritura dê aforamento de 8 de Junho de 1876 estipulou-se o pagamento do foro anual de 400^000 réis em moeda de ouro, metal sonante, e nesta espécie foi pago.
Depois da crise de 1891 é que a ré, para fugir ao ágio do ouro, depositou a importância em notas do Banco de Portugal pelo seu valor nominal. Mas em acção que lhe foi intentada e que terminou por transacção reconheceu a obrigação de pagar em moeda de ouro, metal sonante, e assim cumpriu até 1931, pagando sob a forma de soberanos ingleses.
Em 1932, com fundamento nos decretos n.ºs 20:188, de 24 de Agosto de 1931, e 21:199, de 4 de Maio de 1932, pretendeu pagar em escudos-papel e não escudos-ouro, contra o estipulado, o reconhecido e a lei. Os 400$000 réis antigos equivalem a 9.777$60 modernos, mas ouro, o não papel ou notas, pelo valor nominal.
Em contestação, argumentou-se que o regime do artigo 1660.° do Código Civil, sobre a forma do pagamento dos foros na espécie metálica, observado até 1931, deixou de vigorar, por ser substituído pelo dos decretos n.ºs 20:188 e 21:199, que, no caso, remeteu para o decreto n.° 19:869, e este estabilizou a moeda, e não mais fez do que cumpri-los.
Na réplica e tréplica sustentaram-se os respectivos pontos de vista.
O curador limpou as nulidades e arrumou a legitimidade. A sentença julgou a acção improcedente e a Relação confirmou-a por acórdão de que vem a revista oportuna e competente, com o fundamento de ter julgado contra direito.
Há acordo sobre a existência do contrato, quantia do foro anual, vencimento, espécie metálica - moeda de ouro sonante - e forma de pagamento até à publicação dos citados decretos de 1931 o 1932.
O senhorio directo recebia 88,88 libras (soberanos ingleses) e fracções, pagos em notas do Banco de Portugal, acrescidos do ágio, e a mesma quantidade ouro que receber após a publicação daqueles decretos.
A ré diz satisfazer pagando com notas os 400;5000 réis, actualizados nos termos do artigo 25.° do decreto n.° 19:869, que estabilizou a moeda.
A questão ó, pois, de forma do pagamento.
Dispõe o artigo 1660.°, § 1.°, do Código Civil que, designada a moeda metálica ou metal da moeda, se observem os artigos 724.°, 725.° o 727.°, o êste manda pagar em moeda corrente do metal estipulado. Por isso a prestação foi efectuada até 1931, inclusive, em libras, por ser, à falta do escudo-ouro, a moeda em curso (decreto n.° 19:869). A conversão em notas ou escudos-papel fazia-se acrescendo o ágio do ouro.
A questão agora resume-se em saber se os citados decretos alteraram ou substituíram o regime do Código Civil sobre a espécie em que há-de efectuar-se o pagamento.
O artigo 10.° do decreto n.° 20:188, revogando a legislação em contrário, nada resolve, por não exprimir outra idea que não seja a revogação do disposições incompatíveis com as do decreto.
O artigo 7.°, alínea a), redacção do decreto n.° 21:199, dispõe que nos pagamentos em ouro se observe o artigo 25.° do decreto n.° 19:869. Este estabelece a equivalência do escudo-ouro antigo (1911) o o escudo-ouro moderno, multiplicando aquele por 24,444. De forma que um escudo-ouro antigo vale 24,444 escudos-ouro modernos.
E como o Banco de Portugal era obrigado a manter a estabilização ou a equivalência (decreto n.° 19:869, artigo 5.°), o escudo-papel era representativo só de ouro. Mas este regime foi de curta duração, porque o decreto n.° 20:683, de 29 de Dezembro de 1931, e depois os decretos n.08 21:190, 21:703 e 22:496, de 4 de Maio de 1933, dispensaram o Banco da obrigação da estabilização, voltando ao regime da instabilidade do valor da nota em relação à moeda de ouro.
O argumento, pois, tirado da estabilização da moeda também não resolvo a questão.
A equivalência dos escudos-ouro assenta no peso do ouro o toque, nos termos do artigo 1.° do decreto n.° 19:869, na proporção de 1: 24,444. É a quantidade o qualidade de ouro que estabelece a relação entre o escudo de 1911 e o moderno e dêste com os soberanos e meios soberanos-ouro ingleses, nos termos do n.° 2.° do citado artigo, o por isso o coeficiente 24,444 é de actualização e não ágio do ouro. E como o escudo-papel, continuando inconvertível, não é valor equivalente ao escudo-ouro, a prestação efectuada em moeda-ouro ou moeda-papel é indiferente. O poder de compra não é igual.
Ora, os decretos n.ºs 20:188 e 21:199 mandam observar a equivalência dos escudos-ouro para se achar o montante da prestação, montante-ouro também, mas não mandam que ela se efectue em escudos-papel, antes dos parágrafos do artigo 7.° se infere que deve efectuar-se na espécie estipulada, como dispõe o artigo 727.° do Código Civil. Os decretos ocuparam-se da actualização de harmonia com o novo regime monetário, e não das espécies a entregar em pagamento ou cumprindo obrigação, como se vê do conjunto das suas disposições.
Se os fins dos decretos são regular a actualização e não a forma do pagamento, esta continua a ser regulada pelo Código Civil, o por isso a prestação tem de fazer-se em moeda corrente do metal estipulado, ou seja em moeda de ouro.
E isto é possível, porque, se não há escudos-ouro, há os soberanos e meios soberanos, que têm curso legal no País.
Pela actualização, os 400$000 réis, ouro, antigos, são iguais aos 9.777$60, ouro, modernos, e estes iguais

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a 88,88 o fracções, libras-ouro, pelo que estas quantidades são iguais entre si. A equivalência estabelecida ó a das moedas-ouro, o ela é mandada observar pelo artigo 7.°, alínea a), dos decretos n.ºs 20:188 e 21:199. Efectivamente vê-se que a quantidade de libras é a mesma, estável, como as partes pretenderam. A sua conversão em moeda-papel é que é variável, por a nota sofrer oscilações cambiarias em relação à moeda de ouro.
Daqui se concluo que não tem razão de ser o argumento do locupletamento. Este é o enriquecimento sem causa, e, no caso, há uma convenção lícita.
Se o credor se locupletasse recebendo ouro, o mesmo se poderia dizer do devedor pagando com notas de valor não equivalente. O que obriga a contrata a um e outro, e por isso, para a prestação a ouro poder ser efectuada em notas do Banco de Portugal, é preciso converter a moeda-ouro em moeda-papel, acrescentando ao valor facial desta a diferença cambial ou ágio daquela. E isto não se fez com a quantia depositada, que assim ficou inferior à devida.
Pelo exposto, é concedida a revista, revogando o acórdão recorrido, por ser contra direito, e julgam, nos termos do artigo 1161.° do Código de Processo Civil, a acção procedente e o depósito sem efeito.
Custas pela recorrida.

Lisboa, 8 de Junho de 1937. - Carlos Alves - Sampaio Duarte - A. Magalhãis Barros - Costa Santos - J. Soares.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em discussão, na especialidade, o título I da proposta de lei em que se converteu o decreto-lei que reorganizou os serviços da Câmara Municipal de Lisboa.
Há na Mesa uma proposta, assinada pêlos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, estabelecendo que, em substituição da proposta de lei, se adopte o texto da Câmara Corporativa, com determinadas alterações.
Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto que ninguém quere usar da palavra, começo por pôr à votação essa primeira proposta, que é, como disse, no sentido de a discussão se fazer sobre o texto da Câmara Corporativa, com as alterações que depois forem indicadas.
Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Nesta conformidade está em discussão o título I, que compreende os artigos 1.° a 6.° do texto proposto pela Câmara Corporativa.
Quanto ao artigo 2.°, há na Mesa uma proposta no sentido de se suprimirem os números e as iniciais em maiúsculas; quanto ao artigo 3.°, há na Mesa uma proposta para que no corpo do artigo se suprimam e substituam várias palavras.
E, finalmente, quanto ao artigo 4.°, há na Mesa uma proposta dos Srs. Deputados Carlos Borges e outros.
Essas propostas são as seguintes:

Propomos que, em substituição do texto da proposta, se adapte o parecer da Câmara Corporativa, com as seguintes alterações:

No artigo 2.°, suprimir os números e as iniciais em maiúsculas.

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

No corpo do artigo 3.° substituir as palavras «enumerados» por «referidos» e «dividem-se» por «distribuem-se» e suprimir a palavra «secretarias».

O § 3.° deve ficar com a seguinte redacção:

O tribunal de julgamento de reclamações e transgressões será presidido por um juiz de direito e ficará adstrito à direcção que abranja os serviços centrais.

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

No artigo 4.° as alíneas da parte I devem ficar assim redigidas:

a) Quadro do pessoal técnico para os serviços de urbanização e obras. Técnicos especiais, de salubridade, de abastecimentos e centrais;
b) Quadro do pessoal de contabilidade para os serviços de finanças, de urbanização e obras. Técnicos especiais de salubridade e de abastecimento;
c) Quadro do pessoal operário para os serviços de urbanização e obras. Técnicos especiais de salubridade e de abastecimento;
d) Quadro do pessoal militarizado do serviço de bombeiros e de polícia municipal.

No § único suprimir as palavras «chefes de secretaria».

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

Estão em discussão os referidos artigos 1.° a 6.°, com as propostas de emenda que acabo de referir.

O Sr. Cortês Lobão: - Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª me permita, de uma forma rápida, expor perante a Assemblea a posição que vou seguir na discussão deste assunto, visto que já tomei uma posição a tal respeito em Janeiro do ano passado.
Em 23 de Janeiro de 1939 apresentou V. Ex.ª Sr. Presidente, à ratificação da Assemblea, o decreto-lei n.° 29:389, que reorganizou os serviços da Câmara Municipal de Lisboa.
Concedeu-me V. Ex.ª a palavra nesse dia para discutir este assunto, e apresentei dúvidas e as razões que me levaram a rejeitá-lo pura e simplesmente.
Desejo hoje justificar a posição que vou tomar na discussão.
Subiram a esta tribuna vários ilustres Deputados discutindo o decreto, uns favoravelmente, outros desfavoravelmente, e apresentando os seus pontos de vista.
Prestei a maior atenção à discussão com o fim de me esclarecer sobre as dúvidas que tinha, e o que é facto é que a argumentação aqui apresentada não me convenceu de forma a mudar a opinião que tinha sobre as arestas vivas de tal decreto. E assim, na votação, votei pela sua rejeição pura e simples.
O decreto foi, portanto, automaticamente transformado em proposta da Câmara Corporativa, para depois passar a ser proposta de lei da responsabilidade da Assemblea.

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Não apresentei então propostas de alteração ao decreto porque entendi que, sendo ele feito pelo Governo e, portanto, legislação sua, devia apenas limitar-me a apresentar as dúvidas que ao meu espírito aparecessem, votando pela rejeição pura e simples do decreto. Se as minhas dúvidas tivessem razão de ser, o Governo podia torná-las em consideração, ou publicar o decreto no interregno parlamentar, como urgente, se essas objecções não merecessem atenção.
É facto que toda a Assemblea mostrou o maior interesse pela discussão imediata da proposta de lei; ela era oportuna neste mês de Janeiro, mês em que o decreto entrava em vigor. Esse interesse da Assemblea manifestou-se de uma forma bem intensa, e a tal ponto que o Sr. Deputado Cancela de Abreu pediu a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que a Câmara Corporativa apresentasse o seu parecer com urgência, de maneira a que a proposta de lei fosse ainda discutida na sessão legislativa passada.
Infelizmente a Câmara Corporativa não pôde apresentar o seu parecer de modo a ser discutido nessa sessão, e só no dia 2 de Março, véspera do encerramento da sessão legislativa, é que esse parecer foi presente. A sua discussão foi, portanto, impossível.
Sr. Presidente: o parecer é um trabalho valioso, que honra o professor que o relatou e que esclarece muitos pontos do decreto em questão.
Mas, se é certo que o parecer só foi presente à Assemblea na véspera do encerramento dos seus trabalhos, é certo também que, nos termos da Constituição, o decreto continuou em vigor.
Consequentemente, encontramo-nos neste momento perante o seguinte facto: o decreto, que foi transformado em proposta de lei, está em vigor desde Janeiro de 1939, e todos os seus benefícios ou malefícios surtiram já os devidos efeitos, pelo que nos encontramos perante um facto consumado.
Sr. Presidente: depois do um estudo aturado que fiz do parecer da Câmara Corporativa e dos elementos que tinha obtido durante a minha passagem pela Câmara Municipal na vereação dos Srs. coronel Linhares de Lima e general Daniel de Sousa, compulsando tudo o que havia a favor e contra neste decreto, várias interrogações surgiram ao meu espírito e que ponho diante de V. Ex.ª
Está o decreto referido em vigor há um ano.
Trabalha a Câmara Municipal com orçamento aprovado; há funcionários que foram deslocados, outros cujos vencimentos foram aumentados ou reduzidos, mas, após um ano decorrido, adaptaram-se à sua nova situação.
Então, surgiu ao meu espírito a inoportunidade da discussão do decreto quanto aos vencimentos e quadros do pessoal, que foi o mais discutido, porquanto me parece que uma discussão nesta altura acerca daquele ponto traria como consequência transformações grandes em situações criadas e, logicamente, uma perturbação enorme nos serviços.
Ora, Sr. Presidente, eu não desejo para os outros o que não desejaria para mim; foi nesta ordem de ideas que resolvi, e muito conscientemente, depois de analisar o valioso trabalho da Câmara Corporativa, manifestar a minha absoluta concordância com ele, na parte que diz respeito a vencimentos e quadros de pessoal, entregando-se a solução do caso ao Ministro do Interior e Câmara Municipal.
No resto do decreto, em toda a parte que não é matéria regulamentar, estou perfeitamente de acordo com a Câmara Corporativa, excepto nalguns pontos que vou apresentar a V. Ex.ªs, não com a pretensão de querer convencer, a Câmara, mas para que o problema fique esclarecido.
Sôbre o artigo 2.° tenho uma proposta a enviar para a Mesa, a qual é concebida nestes termos:

Artigo 2.° A Câmara Municipal de Lisboa compreende serviços centrais, serviços de finanças, serviços de urbanização, serviços de obras, serviços técnico-especiais, serviços de salubridade, serviços de abastecimento, serviços de bombeiros, serviços de polícia municipal e um tribunal de julgamento de reclamações e transgressões.

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Cortês Lobão - Salvação Barreto - Nobre Guedes - Cancela de Abreu - André Navarro.

Em que difere o artigo 2.° apresentado por mim e mais pelos Srs. Deputados Salvação Barreto, Nobre Guedes, Cancela de Abreu e André Navarro, do parecer da Câmara Corporativa? Em ser retirada a numeração que está estabelecida e as letras iniciais dos serviços e em mencionar todos os serviços.
Não há diferença do que está no parecer da Câmara Corporativa, retirando a parte da numeração e a parte das iniciais, antes esta proposta tem, na opinião dos Deputados que a subscreveram, a seguinte vantagem: permitir que o presidente da Câmara, se pretender agrupar serviços ou dividir esses mesmos serviços, o faça à sua vontade, conforme as conveniências que se reconheça.
Portanto, enumerando os serviços que estão estabelecidos no parecer da Câmara Corporativa, permite-se que desapareça qualquer indicação, mesmo indirecta, sobre a obrigatoriedade de dividir serviços ou agrupar; antes se permite, como disse, que sejam, divididos ou agrupados conforme o presidente da Câmara entender.
Quanto ao artigo 3.° apresentamos uma proposta de substituição, assim redigida:
Artigo 3.° Os serviços referidos no artigo anterior agrupam-se em direcções de serviços, podendo subdividir-se, em cada uma destas, por repartições e secções.
§ 1.° O § 2.° sugerido pela Câmara Corporativa.
§ 2.° O § 4.° sugerido pela Câmara Corporativa.
§ 3.° O tribunal de julgamento de reclamações e transgressões será presidido por um juiz de direito e ficará adstrito à direcção que abranja os serviços centrais.

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de, 1940. - Os Deputados: Cortês Lobão - Salvação Barreto - Nobre Guedes - Cancela de Abreu - André Navarro.

O artigo 3.° da Câmara Corporativa estabelece que os serviços enumerados no artigo anterior dividem-se por direcções de serviços, podendo subdividir-se, em cada uma destas, por repartições, secretarias e secções.
Vê-se, portanto, que a primeira alteração é substituir a palavra «dividem-se» por «agrupam-se».
Nestas condições, segundo a minha proposta, os serviços que estão enumerados no artigo 2.° ficam todos agrupados dentro desta organização, de forma que, a meu ver, dão mais facilidade e permitem que o presidente da Câmara os subdivida conforme as conveniências indicarem, eliminando o § 1.°, que julgamos ser regulamentar.
Pelo que respeita ao desaparecimento da secretaria, o próprio parecer da Câmara Corporativa diz que não é o termo mais bem aplicado; está em desacordo com o próprio Código Administrativo e pode mesmo vir brigar com os chefes de secretaria, lugar este existente nas outras câmaras, mas que em Lisboa não tem cabimento.
Portanto, entendo que em vez das palavras «chefe de secretaria» devem mencionasse as de «chefe de

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repartição ou de secção», passando portanto a existir só repartições e secções. É o que é mais lógico.
Também entendo que, quanto ao juiz de direito, haverá conveniência em se dar uma maior latitude na escolha para desempenhar a sua função no tribunal
de julgamento das reclamações e transgressões.
Quanto ao artigo 4.°, tenho uma proposta a enviar para a Mesa, assinada por mim e mais quatro Srs. Deputados, que visa apenas a substituir as iniciais do artigo 2.° pelo verdadeiro nome dos serviços; e mais no § único cortar as palavras «chefe de secretaria», que, como há pouco disse, não devem ali figurar.
Essa proposta é a seguinte:

Artigo 4.° O pessoal dos serviços camarários agrupar-se-á nos seguintes quadros:

I - Quadros especiais, destinados a fornecer pessoal aos serviços abaixo indicados:
a) Quadro do pessoal técnico para os serviços centrais, de urbanização, obras, técnico-especiais, de salubridade e abastecimento;
b) Quadro do pessoal de contabilidade para os serviços de finanças, urbanização, obras, técnico-especiais, salubridade e abastecimento;
c) Quadro do pessoal operário para os serviços de urbanização, obras, técnico-especiais, salubridade e abastecimento;
d) Quadro do pessoal militarizado para o batalhão de sapadores bombeiros e serviços de polícia municipal.

II - Quadros gerais, destinados a fornecer pessoal a todos os serviços:
a) Quadro do pessoal administrativo; b) Quadro do pessoal auxiliar; c) Quadro do pessoal menor.

III - Quadro de reserva, destinado a fornecer pessoal menor ou operários necessários para ocorrer à substituição do pessoal impedido e aos aumentos eventuais ou temporários das dotações impostos pelas necessidades dos serviços.
§ único. Não farão parte dos quadros referidos neste artigo os directores de serviços, chefes de repartição, chefes de secção, comandante do batalhão de sapadores bombeiros, comandante da polícia municipal, juiz presidente do tribunal de reclamações e transgressões e secretário da presidência.

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Nobre Guedes - André Navarro - Salvação Barreto - Cortês Lobão - Cancela de Abreu.

São estas as alterações que tenho a apresentar quanto ao título I, que vai até ao artigo 6.° Tenho dito.

O Sr. Carlos Borges: - Sr. Presidente: apenas duas palavras.
As considerações expendidas pelo ilustre Deputado Sr. major Cortês Lobão quanto à proposta em debate, e bem assim as propostas de alteração que enviou para a Mesa, não alteram de modo algum as que foram feitas pela sessão de estudo.

O Sr. Presidente: - Há apenas uma ligeira alteração quanto ao artigo. 2.°

O Orador: - Essa alteração é apenas uma questão de princípio.
O que se propõe visa a uma boa distribuição de serviços, a uma questão de ordem.
Portanto, quanto ao artigo 2.°, não há divergência fundamental entre a proposta apresentada pelo ilustre Deputado que me precedeu nesta tribuna e aquela que apresenta o grupo de Deputados a que pertenço.
Quanto ao artigo b.°, verifica-se a mesma hipótese: as eliminações e substituições apresentadas pelo Sr. Deputado Cortês Lobão são precisamente as que nós fizemos também.
Em vez de quatro direcções de serviços, adoptámos a doutrina da proposta e a fixação de um número de direcções.
Entendemos que a fixação do número de direcções de serviços deve ficar estabelecida, para evitar que a Câmara fique com o arbítrio de criar as que entender.
Nestas circunstancias, deixamos à Câmara a liberdade de, entre seis, quatro e três, reduzir ou ampliar o número de direcções de serviços, sem nunca perder de vista a doutrina que lhe fixamos.
Foi esta a razão que nos levou a perfilhar o disposto no § 1.° do artigo 6.°, que entendemos não dever ser eliminado.
Quanto ao artigo 4.°, também a proposta que subscrevo coincide, salvo erro, com a proposta do ilustre Deputado.
Da mesma maneira se suprimiram as palavras do § único «chefe de secretaria», porque entendemos que não haveria razão para existir na Câmara Municipal de Lisboa secretaria e chefe de secretaria. Não há na Câmara Municipal de Lisboa um chefe de secretaria com as funções características dos chefes dê secretaria das restantes câmaras municipais do País.
Pareceu-nos, pois, que a, supressão das palavras «chefe de secretaria» e «secretaria» corresponderia à vantagem de evitar confusões e de marcar que não há um chefe de secretaria na Câmara Municipal de Lisboa.
Era isto que eu me propunha dizer em esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Parece-me que entre as propostas de emenda do Sr. Deputado Cortês Lobão e as de V. Ex.ªs há apenas uma ligeira diferença: V. Ex.ªs querem o limite, e ele não o quere.

O Orador: - É exactamente isso.

O Sr. Formosinho Sanches: - Sr. Presidente: já tive ocasião de cumprimentar V. Ex.ª e os meus ilustres colegas quando falei a primeira vez nesta Casa, mas hoje, que pela primeira vez falo da tribuna, faço-o novamente, com muito gosto.
A minha situação neste momento é daquelas que poucas vezes só terão dado, porque sou vereador da Câmara Municipal de Lisboa e Deputado.
Posso, porém, afirmar a V. Ex.ªs que a reorganização dos serviços da Câmara Municipal de Lisboa, constante do decreto-lei n.° 29:389, mereceu, tanto da parte da presidência da Câmara como da vereação, um cuidadoso e aturado estudo, havendo todo o desejo de, ao dar cumprimento ao Código Administrativo, reorganizar todos os serviços por forma a que correspondessem às muitas e variadas necessidades da cidade de Lisboa.
Encontrava-me doente quando este decreto veio à ratificação da Assemblea. Não me foi possível, portanto, expor aqui nesse momento a minha opinião.
Embora a reorganização dos serviços da Câmara Municipal de Lisboa tivesse merecido da parte da presidência e da vereação o maior cuidado, nunca seria demais, para que esse trabalho ficasse em absoluto certo, sujeitá-lo a uma revisão; e, por isso, entendo que esta Assemblea andou muito bem assumindo a atitude que tomou, pois isso deu origem a que a Câmara Corporativa fizesse um minucioso estudo do assunto.

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O que é esse parecer já todos sabem. O Sr. Dr. Fezas Vital, como seu relator, mais uma vez nos demonstrou o seu alto valor como técnico na matéria e o cuidado que teve escalpelizando tudo minuciosamente, linha por linha, palavra por palavra, o que essa reorganização continha, introduzindo-lhe aqui e além algumas emendas, todas elas no sentido de melhorar um trabalho que, por tam vasto e de tanta responsabilidade, não tinha, da parte de quem o fez, a intenção de ter atingido, em absoluto, a perfeição.
Bem haja, pois, a Assemblea Nacional; pela atitude que tomou deu azo a que esse trabalho fique, e estou certo de que fica, um trabalho modelar.
Se dei o meu voto como vereador ao primeiro trabalho da reorganização dos serviços da Câmara Municipal de Lisboa, hoje com mais forte razão o dou com as emendas que lhe foram introduzidas, felicitando daqui os meus colegas da vereação de Lisboa por ver que essas emendas não são de molde a poder dizer-se que o trabalho por nós feito e aprovado não era bom, antes, pelo contrário, se pode afirmar que o tempo que gastámos para o fazer foi coroado de bom êxito, e portanto bem empregado.
Falou-se aqui em chefes de secretaria e em secretarias. Devo dizer a V. Ex.ªs que quando foi feita a reorganização se pensou, de facto, no nome que se havia de dar: se o de chefe de repartição, se o de chefe de secção.
«Chefe de repartição» era uma designação que tinha volume de mais, em certos casos, como, por exemplo, para os serviços de turismo; mas «chefe de secção» tinha também, em certos casos, volume de menos. Numa direcção de serviços uma repartição pode não ter volume suficiente para se dividir em secções, mas pode esse serviço ter um volume ou importância tal que pode ele próprio constituir uma secção independente.
Eis as razões por que se lhes chamou «chefes de secretaria».
Não me parece que se possam confundir com as secretarias das várias câmaras municipais.
No resto concordo com as emendas sugeridas a esta Assemblea.
Tenho dito.

O Sr. Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: traz-me a esta tribuna um objectivo simples. Visto que há, de facto, divergências de opinião, já verificadas durante as sessões de estudo, sobre determinados pontos deste título I da proposta, o meu objectivo é apenas o de sintetizar o mais possível essas divergências para que a Assemblea ao votar agora o faça com pleno conhecimento do alcance do seu voto, num sentido ou noutro. Portanto, em poucas palavras direi a V. Ex.ª o que são, estruturalmente, essas divergências.
O pensamento que norteou d parecer da Câmara Corporativa, e que todos nós absolutamente perfilhamos, foi o de eliminar do texto primitivo deste diploma tudo o que pudesse constituir matéria regulamentar. Com essa orientação basilar pudemos, de facto, chegar a um resultado satisfatório, perante a realidade das circunstâncias.
Pois foi no sentido da maior pureza deste princípio que os Srs. Deputados Cortês Lobão e outros, entre os quais me encontro, apresentaram as propostas de substituição dos artigos 2.°, 3.° e 4.° que V. Ex.ª tem na Mesa.
Com respeito ao artigo 2.°, nós entendemos que o facto de se enumerarem e de já se dar determinada arrumação a serviços era, realmente, indicação restritiva sobre matéria regulamentar, que, de certo modo, limitava a liberdade e o critério do presidente da Câmara nesse aspecto, e até do Ministro do Interior que, sob proposta dele, haja de regulamentar ou organizar o pormenor daqueles serviços.
Para que essa liberdade seja maior e não entremos de nenhuma forma nesse pormenor, sugerimos não só que se eliminem os números e as iniciais atribuídas, como na proposta do Sr. Dr. Carlos Borges, mas ainda que se faça a indicação dos serviços sem qualquer agrupamento. O agrupamento far-se-á conforme vier a estipular o regulamento da Câmara, de harmonia com as necessidades e conveniências dos serviços, que nós não estamos habilitados, nem nos compete definir.
É esta a idea da proposta que o Sr. major Cortês Lobão apresentou, e que eu tive a honra de subscrever também.
Quanto ao artigo 3.°, há concordância na eliminação da designação de «secretarias», por isso não insistirei sobre esse ponto especial. Aparte pequenas diferenças na redacção, a divergência substancial está em que nós propusemos a eliminação do § 1.° constante do parecer da Camará Corporativa. Dentro da mesma ordem de ideas que apontei, desde que se pretende dar à Câmara liberdade bastante para distribuir como quiser os seus serviços, não é lógico que definamos um limite para o número de direcções de serviços, limite que de certa forma significaria uma opinião sobre o número de direcções que deve haver realmente. Não sabemos, nem nos compete saber, se bastam seis, sete ou cinco. Os serviços agrupar-se-ão conforme o Ministro do Interior, por proposta da Câmara, vier a resolver. Não me parece que tenha consciente fundamento a limitação a seis do número de direcções, porque não sabemos exactamente se esse número será de mais ou de menos. Vale mais, portanto, não restringir; será isso mais coerente com a posição de generalidade em que pretendemos colocar-nos.
Quanto à restante matéria dos artigos 3.° e 4.°, as nossas propostas envolvem apenas alterações de forma consequentes da supressão de iniciais.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Considero encerrada a discussão das emendas aos artigos 1.° a 6.° Vai fazer-se a votação separadamente, começando pelo artigo 1.°, tal como se encontra no parecer da Camara Corporativa.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 1.°

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o artigo 2.°, em conformidade com a proposta de emendas do Sr. Carlos Borges e de outros Srs. Deputados que a subscrevem também.
Fundamentalmente, a diferença que há entre a proposta do Sr. Deputado Carlos Borges e o texto da Câmara Corporativa consiste simplesmente em alterar os números e suprimir as iniciais em maiúsculas.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 2.° com as emendas propostas pelo Sr. Carlos Borges.

O Sr. Presidente: - Está prejudicada a proposta de substituição apresentada pelo Sr. Deputado Cortês Lobão.
Vai votar-se o artigo 3.°, ainda em conformidade com as emendas propostas pelo Sr. Deputado Carlos Borges.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 3.° de harmonia com as emendas apresentadas pelo Sr. Carlos Borges.

O Sr. Presidente: - Está, portanto, prejudicada a proposta de substituição apresentada pelo Sr. Deputado Cortês Lobão.
Vai votar-se agora o artigo 4.° em conformidade com as emendas propostas pelo Sr. Deputado Carlos Borges.

O Sr. Cortês Lobão: - Sr. Presidente, V. Ex.ª dá-me licença ?...
A minha proposta está prejudicada.

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O Sr. Presidente: - Realmente a proposta de V. Ex.ª está prejudicada, em virtude da votação já feita anteriormente.
Submetido à votação o artigo 4.° em conformidade com as emendas propostas pelo Sr. Deputado Carlos Borges, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Quanto aos artigos 5.° e 6.°, não há na Mesa nenhuma proposta de alteração. Vão, pois, votar-se simultaneamente.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vamos passar ao título II, artigo 7.°
Quanto a este artigo, está na Mesa uma proposta dos Srs. Deputados Carlos Borges e outros no sentido de se eliminar o § 2.° e inserir o seguinte:

§ 3.° Os concursos serão válidos por três anos contados da data da publicação no Diário Municipal das listas dos candidatos aprovados.

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940.- Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

Está em discussão o artigo 7.° em conformidade com a proposta do Sr. Deputado Carlos Borges.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto que ninguém quere usar da palavra, vai votar-se.
Submetido à votação, foi aprovado o artigo 7.° com as emendas referidas.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 8.° Não há na Mesa nenhuma proposta de emenda quanto a este artigo.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se, visto nenhum Sr. Deputado pedir a palavra.
Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 9.° Relativamente a este artigo há na Mesa uma proposta dos Srs. Deputados Carlos Borges e outros, que é a
seguinte:

Suprimir no n.° 1.° do § único as palavras «de secretaria» e aditar, no final, «no respectivo cargo».
No n.° 2.° substituir «operadores» por «aferidores» e intercalar, em seguida a «fiscais informadores» as palavras «fiscais de mercados, enfermeiros e ajudantes de enfermeiros».
No n.° 3.° substituir «os capatazes, os cantoneiros de limpeza» por «os capatazes e cantoneiros de limpeza»; acrescentar, depois de «guardas», as expressões «os auxiliares da limpeza e pessoal operário».

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. -Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mentes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

O Sr. Cortês Lobão: - Sr. Presidente: sobre o artigo 9.°, como V. Ex.ªs devem estar lembrados, apresentei em Janeiro do ano passado o que entendo sôbre
a forma de recrutamento dos directores de serviços. Entendo hoje como ontem que os directores de serviços não devem ser funcionários dos quadros da Câmara, mas sim colaboradores directos do presidente da Câmara, pessoas da sua confiança, isto é, que não deverão ser exclusivamente técnicos, mas também ter funções administrativas, colaboradores administrativos da confiança do presidente da Câmara.
Defendi e apresentei esse ponto de vista, e ainda hoje mantenho a mesma opinião porque não houve argumentos que me convencessem do contrário.
Nesta ordem de ideas eu envio para a Mesa uma proposta de emenda concebida nos seguintes termos:

Propomos, em substituição do artigo 9.° do parecer da Câmara Corporativa, o texto seguinte:

Artigo 9.° Os funcionários contratados nos termos do artigo 7.° poderão ser definitivamente providos nos lugares que exerçam quando tiverem três anos de bom e efectivo serviço prestado ao Município no respectivo grupo.
§ único. Exceptuam-se do disposto neste artigo:
1.° Os chefes, de repartição e de secção, que poderão ser providos definitivamente depois de um ano de bom e efectivo serviço no respectivo cargo;
2.° Os directores de serviços que não forem funcionários públicos, os médicos, o solicitador, os fiéis e ajudantes de fiéis, os mestres e contramestres de obras ou de oficinas e respectivos capatazes e encarregados, os mestres e contramestres de matança, os jardineiros e encarregados, os capatazes e cantoneiros de jardins, os aferidores, os fiscais informadores, fiscais de mercados, os enfermeiros e ajudantes de enfermeiros, os motoristas e ajudantes de motoristas, o chefe de pessoal menor e os contínuos, as telefonistas e o pessoal do batalhão de sapadores bombeiros não mencionado no n.° 1.° do artigo 10.°, que se manterão em regime de contrato;
3.° Os mestres e guardas florestais, os mestres e cabos de cantoneiros e os cantoneiros, os vigilantes de parques e bibliotecas, os condutores de hipomóveis, os coveiros, os capatazes e cantoneiros de limpeza, os serventes, os tratadores de gado, os guardas auxiliares de limpeza e pessoal operário, que serão sempre assalariados.

Sala das Sessões da Assemblea. Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Cortês Lobão - Salvação Barreto - Nobre Guedes - António Rodrigues dos Santos Pedroso - Pedro Botelho Neves - Henrique Linhares de Lima.

Entendo, como disse, que os directores de serviços não devem ser funcionários camarários, devendo, portanto, em face do § 1.°, ficar chefes de repartição e chefes de secção.
Desta maneira os directores de serviços que não forem funcionários públicos desempenharão os serviços em regime de contrato e em comissão de serviço se forem funcionários públicos.
O técnico da Câmara deve ser o chefe da repartição. Julgo que esta situação de director de serviços foi uma solução encontrada para solucionar a situação dos antigos vereadores que não podiam dar a assistência aos serviços.
Cria-se assim um novo quadro de funcionários, a meu ver dispensável, porque se um presidente da Câmara tem a sorte de ter directores de serviços de sua confiança que orientem de facto segundo a sua vontade, tudo correrá muito bem. Mas se as dificuldades surgem por qualquer razão, nessa altura, mal vai ao presidente da Câmara que não tiver confiança nesses directores para orientarem a sua política administrativa. São funcionários que não é fácil deslocar.

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Defendo que o director de serviços faz a política administrativa do presidente, e estou em muito boa companhia com o ilustre Prof. Dr. Fezas Vital, relator do parecer da Câmara Corporativa, que em certa altura do seu parecer, a p. 412 (24), nos diz:
«Os directores de serviços devem integrar-se na sua política administrativa, auxiliando-a e executando-a com plena boa vontade».
Mas não vale a pena alongar mais as minhas considerações quanto a esta parte, porque a justificação está feita.
Sr. Presidente: a propósito do artigo 9.° desejo ainda apresentar um artigo novo, de carácter transitório, e vou justificar a razão porquê.
O artigo novo a que me refiro é redigido da forma seguinte:

O provimento definitivo dos funcionários municipais em qualquer lugar fica dependente da confirmação que o Código Administrativo, na sua redacção definitiva, venha trazer às disposições provisórias em que aquele provimento se baseie.

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Salvação Barreto - Cancela de Abreu - Cortês Lobão - André Francisco Navarro - Nobre Guedes.

A doutrina contida neste artigo tem toda a oportunidade, porque se a proposta de lei que estamos discutindo está dependente da redacção definitiva do Código Administrativo, e possivelmente este Código virá a sofrer alterações, é justo que se estabeleça um condicionamento transitório.
Se nós já votámos no artigo 1.° o carácter provisório desta proposta de lei, é lógico que aprovemos este artigo transitório.
Julgo que tem toda a oportunidade, porque condiciona essa colocação definitiva à redacção definitiva do Código Administrativo.
Disse.

O Sr. Augusto Pires de Lima: - Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer umas ligeiras considerações acerca do n.° 1.° do § único do artigo 9.° da proposta de lei em discussão, referente ao provimento definitivo, depois de um ano de bom e efectivo trabalho, dos directores de serviços.
Esta disposição, embora esteja de acordo com o que se encontra consignado no decreto n.° 28:417, é pelo menos contrária ao que a Assemblea Nacional, depois de um debate motivado pela apresentação do aviso prévio do ilustre Deputado Dr. Pinto de Mesquita, resolveu.
Como resultante dêsse aviso prévio, foi aprovada por unanimidade uma moção do Sr. Deputado Braga da Cruz, em que a Assemblea Nacional emitia o voto de que a experiência ensaiada pelo decreto n.° 28:417 se referia não só às qualidades reveladas no primeiro ano pelas pessoas investidas na função de directores de serviços, mas também ao próprio sistema do provimento definitivo ou não.
Parece-me, portanto, que este n,° 1.° está em desacordo com aquilo que a Assemblea Nacional votou por unanimidade em 31 de Março de 1938, e, sendo assim, as alterações propostas pelo Sr. Deputado Cortês Lobão têm toda a razão de ser. Permito-me também recordar que já na sessão de 14 de Dezembro de 1938 me referi ao mesmo assunto, com o aplauso unânime da Assemblea.
É certo que a Câmara Corporativa diz no seu parecer que foram razões de ordem prática as determinantes do regime vitalício para esses funcionários, e acrescenta: «De resto, iniciada uma experiência, não deve ser ela interrompida, etc.».
Ora está precisamente em experiência o Código Administrativo e só em 30 de Junho de 1940 a deveremos considerar terminada (decreto n.° 29:008), e portanto nesse aspecto, como em todos os outros, não compreendo que se interrompa por esta proposta de lei essa experiência, provendo definitivamente esses cargos. Abandonava-se o período experimental e, por outro lado, deixava-se também de estar de acordo com a moção que unanimemente aqui foi aprovada. Não quero já referir-me à circunstância estranha de nomear vitaliciamente funcionários para cargos que amanhã podem ser reconhecidos como não necessários ou de provimento diferente do que agora se pretende.
Concordo, pois, inteiramente com as propostas de alteração apresentadas pelo Sr. Deputado Cortês Lobão.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Madeira Pinto: - Sr. Presidente e meus ilustres colegas: o que se trata de apurar neste momento é se os directores de serviços da Câmara Municipal de Lisboa devem ser funcionários vitalícios ou se devem ser contratados.
Pronunciou-se o Sr. Deputado Cortês Lobão contra a disposição que faz destes funcionários serventuários vitalícios, dizendo que eles estão naturalmente destinados a ser, pela sua hierarquia, pelo lugar que ocupam relativamente ao presidente da Câmara, os seus colaboradores mais chegados na política administrativa, e que, sendo assim, se não forem funcionários que num determinado momento possam ser deslocados ou afastados, se pode cair neste perigo e nesta situação realmente difícil, que pode trazer inconvenientes graves: abrir-se uma cisão entre o presidente da Câmara e os directores de serviços ou qualquer dos directores de serviços e, portanto, a política administrativa que o presidente da Câmara tem de dirigir e orientar poder ser perturbada; por este emperramento, digamos, da máquina do funcionalismo camarário.
A êsse propósito citou o Sr. Deputado Cortês Lobão uma passagem do parecer da Câmara Corporativa respeitante propriamente a outro problema, que é o do exercício do poder disciplinar, em que realmente a Câmara Corporativa emite a opinião de que os directores de serviços devem ser realmente os colaboradores da política administrativa exercida pelo presidente da Câmara.
Mas, emfim, o argumento da Câmara Corporativa, a meu ver, não tem - como direi? - um valor por aí além; quere dizer: não é necessário socorrer-nos da autoridade da Câmara Corporativa para reconhecermos esta verdade, porque ela está no fundo da nossa compreensão, sem que seja necessário invocar-se uma razão de autoridade para nos convencermos disso.
A meu ver, também contra a natureza vitalícia, da função dos directores de serviços se manifestou o Sr. Deputado Pires de Lima, dizendo que a Câmara, ao realizar-se o debate sobre, um aviso prévio do nosso antigo companheiro de trabalhos e que sempre nesta Câmara é lembrado com apreço e saudade...

Vozes: - Apoiado, muito bem, muito bem!

O Orador: - ...O Sr. Dr. Pinto de Mesquita, a Câmara se tinha manifestado por forma que hoje não soaria bem que não mantivesse ou que não apoiasse esta maneira de ver de ser a função de director do serviços de natureza contratual e não vitalícia.

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Eu devo dizer, sem embargo destas razões, que me inclino para o contrário.
Os mesmos argumentos que significam, podem explicar ou justificar p modo de ver do Sr. Deputado Cortês Lobão são aqueles que me servirão para demonstrar o contrário. Isto é talvez paradoxal, mas é assim.
O argumento é êste: o director de serviços é um colaborador do presidente da Câmara. Logo a função do director de serviços tem de ser amovível. Pode por consequência ser deslocado quando o presidente entender que não colabora com ele.
Mas por esse motivo não havia nem podia haver funcionários vitalícios nos serviços públicos, porque havia o perigo de o funcionário, pela sua actuação, se revelar em discordância com o seu superior hierárquico, e portanto a função vitalícia não podia existir.

O Sr. Augusto Pires de Lima: - É exactamente esse o critério em que se tem baseado o Governo, fazendo o provimento da maior parte dos cargos por contrato.

O Sr. Cortês Lobão: - Não queira V. Ex.ª comparar a função de director de serviços da Câmara com a de, por exemplo, director geral do Ministério em relação ao Ministro.
Eu considero um director geral dum Ministério um técnico, e na Câmara o técnico é o chefe de repartição.
Sangue novo convém levar por vezes para a Câmara.

O Orador: - Mas qual a razão por que há-de ser chefe de repartição e não director de serviços?

O Sr. Botelho Neves: - Os directores de serviços, segundo a nova organização, desempenham as mesmas funções que anteriormente desempenhavam os vereadores.

O Orador: - Não é bem assim. A função que os actuais directores de serviços desempenham não é a mesma que a dos antigos vereadores. Não tem mesmo comparação. Portanto esse argumento não colhe. Com esse mesmo argumento destruía-se a função vitalícia de todos os funcionários do Estado.
V. Ex.ªs não devem esquecer que os directores de serviços das câmaras municipais foram nomeados à sombra do decreto de 17 de Janeiro de 1938, em que, salvo erro, no seu artigo 6.°, se estabeleceu que eles eram nomeados pelo Ministro do Interior, sob proposta do presidente da Câmara Municipal, tornando-se definitivas as suas nomeações depois de um ano de bom e efectivo serviço.

O Sr. Augusto Pires de Lima: - Foi precisamente a propósito desse decreto que o Sr. Dr. Pinto de Mesquita fez o seu aviso prévio.

O Orador: - E a moção com que se encerrou o debate sobre esse aviso prévio foi no sentido apenas de se, ter em consideração a melhor orientação a seguir definitivamente, com respeito ao assunto: se a orientação que estava estabelecida ou uma outra qualquer.

O Sr. Augusto Pires de Lima: - Essa moção pretende que a experiência seja na realidade experiência.

O Orador: - De resto, o assunto foi à Câmara Corporativa, que o estudou largamente, que não considerou que houvesse nele grandes dificuldades nem se manifestou contra ele.
Há um outro aspecto deste problema para o qual eu desejo chamar a atenção, de V. Ex.ª
Os directores de serviços, pelas funções que exercem, têm necessariamente de ser pessoas de categoria mental, porque têm de ocupar na craveira do funcionalismo um lugar elevado.
Infelizmente na nossa terra não abundam...

O Sr. Botelho Neves: - No caso em questão viu-se!...

O Orador: - ... pessoas revestidas de todas as qualidades para poderem exercer cargos desta natureza, e aqueles que realmente têm as qualidades precisas são pessoas que, com facilidade, encontram ocupações fora das câmaras municipais. Quere dizer: é preciso ir arrancá-los ao âmbito doutras ocupações e posições que, porventura, tenham convidativas e das quais, portanto, com dificuldade se desapegam, para os trazer para o exercício daquelas funções de directores de serviços. E estar a convidar pessoas dessa natureza para virem ocupar lugares a prazo dizer-se-lhes: «no dia em que vier um presidente da Câmara Municipal que não goste de si o senhor tem de se ir embora, porque a política administrativa não se compadece pelo facto de o Sr. presidente da Câmara estar em desinteligência com você ou você em desacordo com ele», evidentemente isto, sobretudo para pessoas de certa hierarquia mental, determinará o seu afastamento e desinteresse de ocupar lugares nestas condições.

O Sr. Cortês Lobão: - Mas quebrou-se uma tradição!

O Orador: - Mas, ó Sr. major Cortês Lobão, que andamos nós a fazer, senão a quebrar tradições?...

O Sr. Cortês Lobão: - Mas quebram-se algumas tradições boas.

O Sr. Botelho Neves: - Perdão, a reatar tradições.

O Orador: - E a quebrar aquelas que são más! Então, por esses princípios, nós nunca saíamos do mesmo lugar. Evidentemente, quando eu disse a quebrar tradições», não o disse em sentido pejorativo. Temos de romper com as tradições que sejam más. Por isso o Estado que nos governa se chama Estado Novo.
Em alguma cousa ele há-de ser novo.

O Sr. Melo Machado: - É por isso que eu quero romper com esta que se está a restabelecer.

O Orador : - São estas, em resumo, as considerações que me levam, com muita pena, porque aprecio muito o alto espírito do Sr. major Cortês Lobão, a discordar do seu modo de ver relativamente à vitalicidade dos lugares de director de serviços da Câmara Municipal. Por minha parte, darei o meu voto ao princípio em que se traduzir que esses directores de serviços serão funcionários vitalícios da Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.

O Sr. Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: duas palavras apenas, segundo o meu costume.
O Sr. Deputado Cortês Lobão veio, coerente com a opinião já anteriormente manifestada, criticar a disposição que considera vitalícios os lugares de directores de serviços da Câmara Municipal de Lisboa.
Para clareza da minha posição, pretendo desde já dizer, que, pessoalmente, sou partidário do carácter vitalício dessas funções; por isso não subscrevi essa proposta do Sr. Deputado Cortês Lobão. E sou partidário

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desse carácter vitalício por algumas das razoes que aduziu, e muito bem, o Sr. Deputado Dr. Madeira Pinto, mas principalmente por esta: a da dificuldade que haveria, em qualquer oportunidade, no recrutamento de pessoas idóneas para exercer essas funções. Qualquer indivíduo com os merecimentos mínimos necessários para tal cargo tem, logicamente, uma situação criada; e não iria, com certeza, abandoná-la por uma situação transitória ou precária. Não é forçoso que estejam apenas nos quadros do funcionalismo do Estado as pessoas competentes para essa função; só funcionários poderiam ir exercê-la em comissão sem sacrifício da sua situação anterior. Essas pessoas competentes podem estar, também, fixadas em qualquer actividade particular, e só com uma garantia formal abandonarão a sua posição para exercerem uma função de tal natureza.
Apesar dos inconvenientes verdadeiros que o Sr. major Cortês Lobão apontou, e que eu reconheço, inclino-me para que esses lugares sejam realmente vitalícios, visto que as razoes a que me referi sobrelevam, em meu entender, os inconvenientes apontados.

O Sr. Augusto Pires de Lima: - Julgo não ser êsse o critério adaptado no provimento da maior parte dos lugares públicos, visto a tendência actual ser para o contrato e não para a nomeação vitalícia.

O Orador: - Poderemos apenas comparar cargos que sejam comparáveis; entre estes estão, por exemplo, os de directores gerais dos Ministérios em relação aos Ministros. Os mesmos argumentos que levaram a considerar vitalícios os lugares desses directores gerais concorrem a favor dos directores de serviço da Câmara.
Sr. Presidente: sendo assim, porque subi eu agora a esta tribuna?
Porque na intervenção muito oportuna do Sr. Deputado Pires de Lima eu vejo exactamente uma justificação clara do artigo novo que o Sr. Deputado Cortês Lobão apresentou e que tem também a minha assinatura.
O artigo 1.°, que nós já votámos, diz que «emquanto não for publicado o Código Administrativo, com a redacção definitiva prevista no artigo ..., etc., a organização da Câmara Municipal de Lisboa obedecerá ao disposto nos artigos seguintes».
Quere dizer, nós estamos votando disposições de carácter provisório.
Isto é evidente.
Sendo assim, pregunto como é que à sombra, ao abrigo de disposições expressamente declaradas provisórias se podem criar situações vitalícias na incerteza de virem a ser confirmados ou não, na promulgação definitiva do Código Administrativo, os princípios e os cargos que lhes dizem respeito!

Vozes:.- Muito bem, muito bem! Apoiado, apoiado!

O Orador: - Sendo, assim, entendo que não pode a Assemblea Nacional deixar de aprovar a disposição transitória a que me referi e que vem responder à observação do Sr. Deputado Pires de Lima, pois confirma que será, em última análise, o próprio Código Administrativo, depois da experiência, que estabelecerá a doutrina definitiva, sem encontrar criadas situações vitalícias a que porventura ele se oponha.
E digo isto tanto mais à vontade, Sr. Presidente, quanto é certo que (mantenho, e já afirmei, a opinião de que devem ser realmente vitalícios os cargos em referência.
O novo artigo proposto diz o seguinte:
Leu.
Não votar isto, Sr. Presidente, parece-me que seria contrário ao direito e à lógica.
Eu sei que há um inconveniente. Os que possivelmente discordam, sem poderem contestar esta lógica, vão-me dizer: isso cria uma situação melindrosa aos actuais directores de serviços até à promulgação definitiva do Código Administrativo.

O Sr. Nobre Guedes: - E V. Ex.ª responderá: são acidentes de vida que acontecem em todas as situações ...

O Orador: - Assim é; e eu sou o primeiro a lamentar essa circunstância, que, no entanto, é mais aparente que real, visto tudo indicar que o Código não deixará de confirmar o que agora se estabelece neste diploma. Em qualquer caso parece-me que o inconveniente não pode justificar que se legisle, neste momento, ao contrário do bom senso.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Carlos Borges: - Sr. Presidente: começo por me referir à opinião, apresentada pelo Sr. Deputado Cancela de Abreu, de que realmente os directores de serviços da Câmara Municipal de Lisboa nào devem ser provisórios nem contratados.
As funções de directores de serviços não correspondem às de chefe de repartição, nem correspondem às do antigo vereador, como há pouco referiu o Sr. engenheiro Botelho Neves.
O director de serviços não é um chefe de repartição, é um chefe de serviços que congrega e orienta toda a actividade das diferentes repartições; nem precisa mesmo de ser um técnico e um valor no serviço para que é chamado.
Nesta circunstância, é evidente que não pode ser um homem só da confiança do presidente, nem pode estar à mercê do arbítrio não só do presidente que vem, mas até do presidente que está. Não há pessoa que tenha a categoria de dirigir um serviço que se possa prestar a ser - permita-se o termo - uma espécie de mulher a dias de um presidente da Câmara.
Portanto, que a função deve ser vitalícia não admite sombra de dúvida: primeiro, porque ela não tem o carácter restrito, que se lhe quere atribuir, de um chefe de repartição; segundo, porque também não representa a função de vereador da Câmara ; terceiro, porque não é a de um colaborador íntimo do presidente da Câmara - é a de um responsável de serviços camarários.
O argumento invocado pelo Sr. Deputado Cortês Lobão, longe de ser a seu favor, parece-me, até, que é contra a sua argumentação. A Câmara Corporativa e o seu parecer não indicam que o director de serviços deva ter essa função precária. O que o parecer diz é que a função disciplinar relativamente a estes funcionários não estará bem em igualdade de circunstâncias com a que devem sofrer os outros funcionários.

O Sr. Cortês Lobão: - V. Ex.ª dá-me licença?...
Quando citei o parecer da Câmara Corporativa não foi para me referir à parte disciplinar, mas para chamar a atenção da Assemblea para o facto de que os argumentos que trazia serviam para demonstrar que o director de serviços devia ser uma pessoa que fizesse a política administrativa que o presidente da Câmara indicasse.
É a opinião que tem o digno Procurador que relatou o parecer.

O Orador: - Todo o director de serviços tem obrigação de aceitar a orientação do presidente da Câmara.

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Não haja confusões. Portanto, o cargo que mais se ajusta ao caso é o de director geral, como ponderou o Sr. Deputado Cancela de Abreu. Por isso me parece que o cargo deve ser de provimento definitivo.
De resto, quem tenha uma situação vantajosa não se sujeita a ir para a Câmara Municipal servir um presidente que .pode ser arbitrário e histérico e, assim, ficar em condições de ser despedido dois dias depois de tomar posse. Ou, então, só irão para esses lugares pessoas que não saibam desempenhar as respectivas funções, e isso seria em prejuízo da própria Câmara.
Isto relativamente ao provimento vitalício. Parece-me que, ponderando bem as circunstâncias, não deve haver dúvida de que o provimento não deve ser de carácter provisório ou de contratado.

O Sr. Melo Machado: - Nem mesmo no tempo de experiência?

O Orador: - Não há experiência para este caso, e já vou dizer a V. Ex.ª porquê. É a segunda parte das considerações do Sr. Deputado Cancela de Abreu, que, de certo modo, destrói o que S. Ex.ª disse na primeira, parte.
O Sr. Cancela, de Abreu começou por dizer que devia haver provimentos definitivas e acabou por se opor a esses provimentos, com o fundamento de que estamos em regime de experiência.
É certo que o Código Administrativo está em experiência, mas não está somente para os directores de serviços, mas sim para todos os funcionários administrativos. Nestas condições, desde que se não pode fazer nenhum provimento definitivo, de futuro, a situação de todos esses funcionários ficará à mercê daquilo que venha no Código Administrativo. Assim não haveria provimentos definitivos absolutamente nenhuns. Vêem V. Ex.ªs a situação precária que resultaria para tanta gente.

O Sr. Cancela de Abreu: - Eu receio que V. Ex.ª, com essa generalidade, impressione, de facto, a Assemblea. Mas ó que não tem razão para generalizar.

O Orador: - Eu quero pôr a Assemblea diante dos factos.

O Sr. Cancela de Abreu:-Deixe-me V. Ex.ª então, rectificar.
Não estão em causa as situações definitivas dos funcionários municipais anteriores a êste decreto; apenas se trata daquelas que de novo são criadas.

O Orador: - Então as outras?

O Sr. Cancela de Abreu: - Já o eram, e não foram criadas ao abrigo de disposições transitórias. Não são, portanto, afectadas pelo novo artigo proposto.

O Orador: - Desculpe-me V. Ex.ª mas está em erro.
Os directores de serviços da Câmara Municipal do Porto foram providos definitivamente, e antes dêste decreto-lei foi publicado o decreto n.° 28:417, de 17 de Janeiro de 1938, que no seu artigo 6.° diz:
Leu.
À sombra deste decreto foram feitas nomeações, algumas das quais foram convertidas em definitivas. Portanto, o que vamos fazer é lançar esta confusão: se porventura o Código Administrativo só for revisto daqui a três, quatro ou cinco anos, os funcionários administrativos ficam na situação precária de poderem sor despedidos do pronto.
Isto facilita os serviços da Câmara, o bom recrutamento dos serventuários e a boa selecção dos funcionários? Parece-me que não.
Como estamos perante factos de certa gravidade, parece-me que dar a todas as nomeações, segundo a proposta do Sr. Cortês Lobão, o caracter provisório, tornando-as dependentes da aprovação do Código Administrativo, que não só sabe quando será feita, é pelo monos perigoso, se não for nocivo para os interesses dos serviços municipais.
Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se em primeiro lugar o artigo 9.° conforme o texto da Câmara Corporativa, com a emenda apresentada pelo Sr. Deputado Carlos Borges.
Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Botelho Neves: - Requeiro a contraprova.

Feita a contraprova, verificou-se o mesmo resultado.

O Sr. Presidente: - Vai agora votar-se o artigo novo apresentado pelo Sr. Deputado Cortês Lobão.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 10.° Encontra-se na Mesa uma proposta dos Srs. Deputados Carlos Borges e outros, no sentido de serem eliminadas no n.° 3.° as palavras «o designado o primeiro sob proposta do Conselho Superior Judiciário».

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo com aquela eliminação.

O Sr. Presidente:-Estão em discussão os artigos 11.° e 12.°, sobre os quais não há nenhuma proposta do alteração.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai votar-se.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 13.° Há na Mesa uma proposta, apresentada pelo Sr. Carlos Borges e outros Srs. Deputados, no sentido de ser aditado um novo número.

É a seguinte:

No artigo 13.° adita-se, para ficar com o n.° 1.°, o seguinte:

1.° No quadro do pessoal técnico, um em cada grupo.

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 194U. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sonsa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela, de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácia Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo com o aditamento.

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O Sr. Presidente:-Vão entrar em discussão os artigos 14.° e 15.° Não há na Mesa nenhuma proposta do alteração.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado pede a palavra, vão votar-se.
Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 16.° Quanto a este artigo, o Sr. Deputado Carlos Borges e outros Srs. Deputados que o acompanham propõem
o seguinte:

No artigo 16.°:

Suprimir a alínea b).
Substituir a redacção da alínea f), que passará a alínea e), pela seguinte:

Chefes de secção - em indivíduos aprovados em concurso de provas públicas, a que poderão concorrer os primeiros oficiais dos respectivos quadros habilitados com curso superior; na falta destes, sucessivamente, os segundos e terceiros oficiais que estejam também habilitados com curso superior, e, quando os não haja, indivíduos estranhos aos quadros com aquela habilitação.

No § único substituir alínea f) por alínea e).

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto que nenhum Sr. Deputado pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado com as alterações apresentadas.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão os artigos 17.° e 18.°
Quanto a estes artigos, não há na Mesa nenhuma proposta de alteração.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Não tendo nenhum Sr. Deputado pedido a palavra, vai proceder-se à votação. Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se agora ao título III. Está em discussão o artigo 19.° Não há na Mesa nenhuma proposta de alteração quanto a este artigo.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto que nenhum Sr. Deputado pode a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 20.° Quanto a este artigo, o Sr. Deputado Carlos Borges e outros que o acompanham propõem o seguinte:

No § 1.° do artigo 20.° intercalar adiante de «aplicar» as palavras «aos funcionários».

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 26 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado com a alteração apresentada.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão os artigos 21.°, 22.°, 23.° e 24.°
Não há na Mesa nenhuma proposta de alteração quanto a estes artigos.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado pede a palavra, vão votar-se.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Passamos agora ao título IV. Está em discussão o artigo 20.°
Não há na Mesa nenhuma proposta de alteração.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto que nenhum Sr. Deputado pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 26.° Quanto a este artigo, o Sr. Deputado Carlos Borges e outros que o acompanham propõem a substituição de
uma palavra:

No § 2.° do artigo 20.° substituir «poderá» por «deverá».

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Cariou Borges.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto que nenhum Sr. Deputado pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado com a alteração apresentada.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 27.° Os Srs. Deputados Carlos Borges e outros propõem que se suprima a parte final deste artigo.

O Sr. Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: o Sr. Deputado Carlos Borges e outros Srs. Deputados propuseram a eliminação pura o simples do último período do artigo 27.°, ou seja aquele em que se diz:
Leu.
De facto, Sr. Presidente, com esta redacção não mo parece que este período fosse de aprovar.
Com efeito, não é o pagamento ao empregado que se deve limitar, desde o momento em que ele é obrigado a trabalhar o tempo que os seus superiores ordenarem. O que se deve limitar são as ordens desses superiores a tal respeito. Isto é que é lógico.
Sendo assim, creio que, em lugar de se eliminar pura e simplesmente esse último período, seria mais conve-

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26 DE JANEIRO DE 1940 197

mente substituí-lo por um outro que de qualquer fornia tenha expressa a proibição de se ordenarem trabalhos extraordinários além do limite correspondente a um determinado vencimento máximo. Assim é que me parece que fica certo.
E, então, em lugar da eliminação pura e simples, ficará o período final assim redigido:

«Em nenhum caso, porém, serão determinados serviços extraordinários além do limite correspondente a um terço do vencimento mensal, sem prejuízo do § 2.° do artigo 28.°».

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940.- Os Deputados: Salvação Barreto - Cancela de Abreu - Cortês Lobão - André Francisco Navarro - Nobre Guedes.

O Sr. Carlos Borges: - Sr. Presidente: pedia palavra para declarar que os Srs. Deputados que comigo apresentaram a proposta de eliminação da parte final do artigo 27.° desistem da sua proposta, para que seja considerada a do Sr. Deputado Cancela do Abreu.

O Sr. Presidente: - Consulto a Assemblea sobre se autoriza a desistência.

Consultada a Assemblea, foi autorizada.

O Sr. Presidente: - Visto que ninguém mais quere usar da palavra, vai fazer-se a votação do artigo 27.° com a emenda apresentada pelo Sr. Deputado Cancela de Abreu e que tem também as assinaturas dos Srs. Deputados Salvação Barreto, Cortês Lobão, Nobre Guedes e André Navarro.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 28.° Quanto a êste artigo, está na Mesa a seguinte proposta:

No artigo 28.°:

Substituir «só podem ser» por «apenas serão». No § 1.° substituir «só poderá fazer-se o abono» por «só poderão ser autorizados trabalhos extraordinários».

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de M agulhais Ramalho - António Carlos Borges.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto que ninguém quere usar da palavra, vai votar-se o artigo 28.° com as alterações apresentadas.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão os artigos 29.° e 30.°, sobre os quais não há na Mesa nenhuma proposta de alteração.

O Sr. Carlos Borges: - V. Ex.ª dá-me licença? Não há realmente nenhuma proposta de alteração, mas eu chamo a atenção da Comissão de Redacção para algumas «gralhas» tipográficas que se encontram no artigo 30.°

O Sr. Presidente: - Vão votar-se os artigos 29.° e 30.°

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados Carlos Borges e outros propõem que a seguir ao artigo 30.° do texto da Câmara Corporativa se insira um título novo, com esta epígrafe: «Incompatibilidades».

É o seguinte:

Inserir em seguida ao artigo 30.°:

V

Incompatibilidades

Artigos 31.º, 32.º e 33.°, que serão os artigos 32.º, 33.° e 34.° da proposta de lei, mas intercalando no artigo 32.° da proposta, adiante da palavra «favorável», as palavras «e fundamentado».

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 20 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

O Sr. Presidente: - Vão votar-se estes artigos e a emenda, visto que nenhum de V. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre o assunto.

Submetidos à votação, foram aprovados os artigos e a emenda.

O Sr. Presidente: - Continuando novamente no texto do parecer da Camará Corporativa, entramos na discussão do capítulo «Disposições gerais e transitórias». Estão em discussão os artigos 31.°, 32.°. 33.° e 34.°
Não há na Mesa nenhuma proposta de alteração.
Vão votar-se estes artigos.

Submetidos à votação, foram aprovados os artigos 31.° a 34.°

O Sr. Presidente: - Estão em discussão os artigos 35.° a 43.°, acerca dos quais não existe na Mesa nenhuma proposta de alteração.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado pede a palavra, vai votar-se.

Submetidos à votação, foram aprovados os artigos 35.° a 43.°

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 44.° Quanto a este artigo, o Sr. Carlos Borges, acompanhado de outros Srs. Deputados, propõe o seguinte:

No artigo 44.° substituir na sua parte final as palavras «a diferença entre o novo vencimento, etc.» por «a diferença entre o novo vencimento e o vencimento orçamental que auferiam anteriormente».

Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 25 de Janeiro de 1940. - Os Deputados: Albino dos Reis - António de Sousa Madeira Pinto - Guilhermino Nunes - A. Cancela de Abreu - Artur Águedo de Oliveira - Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho - António Carlos Borges.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Não havendo quem queira usar da palavra, vai votar-se.

Submetido à votação o artigo 44.°, foi aprovado, com a respectiva emenda.

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198 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 68

O Sr. Presidente: - Estão em discussão os artigos 45.º, 46.° e 47.° Não há na Mesa nenhuma proposta e alteração relativamente, a estes artigos. Vão votar-se, visto que ninguém pede a palavra.

Submetidos à votação, foram aprovados os artigos 45.°, 46.° e 47.°

O Sr. Presidente: - Com relação aos artigos 48.° e 49.°, os Srs. Deputados Carlos Borges e outros propõem a sua eliminação.

Vai votar-se a eliminação destes artigos.

Submetida à votação, foi aprovada a eliminação dos artigos 48.° e 49.º

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 50.°

Pausa.

O Sr. Presidente: - Não desejando ninguém usar da palavra, vai votar-se.

Submetido à notação, foi aprovado o artigo 50.º

O Sr. Presidente: - Está concluída a votação da proposta de lei.
A próxima sessão realizar-se-á na segunda-feira 29 do corrente, sendo a ordem do dia constituída pela ratificação dos seguintes decretos-leis, publicados no Diário do Governo de 14 de Dezembro de 1939:

N.º 30:130, que autoriza a Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz a ceder gratuitamente ao Estado uma parcela de terreno com destino à construção do novo edifício dos correios, telégrafos e telefones naquela, vila.
N.° 30:131, que estabelece as regras para o pagamento e remição do foro em propriedades.
N.º 30:132, que concede à Junta Geral Autónoma do Funchal um subsídio extraordinário destinado às obras de reparação e adaptação do Palácio de S. Lourenço e abre um crédito para as referidas obras.
N.° 30:133, que altera o disposto no § 2.º do artigo 14.° do decreto-lei n.° 28:210 e que estabelece a organização da corporação dos oficiais da armada.
N.° 30:134, que reforça várias verbas do orçamento do Ministério da Guerra.
N.° 30:135, que estabelece os princípios gerais de orientação e coordenação a que hão-de submeter-se os estabelecimentos de educação para o serviço social e aprova o plano geral de estudos e programas, tudo para a formação de dirigentes idóneos e responsáveis no meio a que se destinam, ao mêsmo tempo conscientes e activos cooperadores da Revolução Nacional.
N.º 30:137, que autoriza o Govêrno, emquanto durar o estado de guerra na Europa e até onde o exija a defesa da economia nacional, a determinar, por intermédio dos Ministérios competentes, que as importações ou exportações de dados produtos sejam feitas em regime de contrato colectivo celebrado pelo organismo corporativo ou de coordenação económica do respectivo sector.
N.º 30:138, que autoriza as Direcções Gerais dos Serviços Agrícolas e Florestais a ceder gratuitamente, aos produtores agrícolas, castanheiros, nogueiras e aveleiras para repovoamento e intensificação da cultura dessas espécies nas regiões apropriadas e autoriza a Direcção Geral dos Serviços Agrícolas a ceder, a título de auxílio aos vinicultores menos abastados, porta-enxertos adequados para substituição dos produtores directos americanos arrancados ou inutilizados por efeito da aplicação da lei n.° 1:891.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 24 minutos.

O REDACTOR - Costa Brochado.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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