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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES
N.º 102 ANO DE 1941 20 DE FEVEREIRO

II LEGISLATURA

SESSÃO N.º 97 DA ASSEMBLEA NACIONAL

Em 19 de Fevereiro

Presidente o Exmo. Sr. José Alberto dos Reis
Secretários os Exmos. Srs. Carlos Moura de Carvalho
Castão Carlos de Deus Figueira

Nota. - Publicou-se um suplemento ao Diário das Sessões n.º 101 inserido o parecer da comissão encarregada de apreciar as contas da Junta do Crédito Público referentes à gerência de 1939.

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 50 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o último número do Diário das Sessões.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Antunes Guimarãis, Formosinho Sanches, Calheiros Veloso e Viterbo Ferreira.

Ordem do dia. - Discutiu-se, na generalidade a na especialidade, a proposta de lei relativa à dispensa das condições de promoção aos oficiais que vejam Ministros ou Sub-Secretários de Estado, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Álvaro Morna, Alçada Guimarãis, Santos Pedroso, Pinto da Mota e Salvação Barreto.
Procedendo-se à rotação, foi aprovada a eliminarão do § único do artigo 3.º do parecer da Câmara Corporativa; o texto do corpo do artigo 1.º do mesmo parecer; o artigo 8.º, com a emenda apresentada pelos Srs. Deputados Salvação Barreto e outros; foi eliminado o n.º 3.º do artigo 3.º; foi aprovado o artigo 3.º e os seus n.ºs 1.º o 3.º o a emenda ao n.º 3.º; o aditamento e três parágrafos propostos pelos Srs. Deputados Álvaro Morna e Manuel Rodrigues e o artigo 4.º como consta do parecer da Câmara Corporativa.
Foi aprovada, a ratificação pura e simples do decreto-lei n. 31:314, que substituo o decreto-lei n.º 31:110, o que estabelece regras especiais quanta à frequência de cursos para promoção por parte de oficiais professores dos mesmos cursos, o que sem tais regras deveriam frequentá-los como instruendos.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 8 minutos.

Srs. Deputados presentes à chamada, 57.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão, 9.
Srs. Deputados que faltaram à chamada, 6.

Srs. Deputados que responderam à chamada:

Abel Varzim da Cunha e Silva.
Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho.
Alberto Cruz.
Alberto Eduardo Valado Navarro.
Albino Soares Finto dos Beis Júnior.
Alexandre de Quental Calheiros Veloso.
Álvaro de Freitas Morna.
Álvaro Salvação Barreto.
António de Almeida.
António de Almeida Pinto da Mota.
António Augusto Aires.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Maria Pinheiro Torres.
António Rodrigues dos Santos Pedroso.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Artur Ribeiro Lopes.
Augusto Cancela de Abreu.
Augusto Faustino dos Santos Crespo.
Augusto Pedrosa Pires de Lima.
Carlos Moura de Carvalho.
D. Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho.
Fernando Tavares de Carvalho.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco de Paula Leite Pinto.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
João Antunes Guimarãis.
João Botto de Carvalho.
João Garcia Pereira.
João Luiz Augusto das Neves.
João Maria Teles de Sampaio Rio.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim Saldanha.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Alberto dos Reis.

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José Alçada Guimarãis.
José Dias de Araújo Correia.
José Maria Braga da Cruz.
José Maria Dias Ferrão.
José Pereira dos Santos Cabral.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Júlio Alberto de Sousa Schiappa de Azevedo.
Juvenal Henriques de Araújo.
Luiz Cincinato Cabral da Costa.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Figueira.
Luiz José de Pina Guimarãis.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Pestana dos Reis.
Manuel Rodrigues Júnior.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama Van-Zeller.
Sebastião Garcia Ramires.
Sílvio Duarte de Belfort Cerqueira.

Sr s. Deputados que entraram durante a sessão:

Alfredo Delesque dos Santos Sintra.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
António Hintze Ribeiro.
Carlos Mantero Belard.
José Gualberto de Sá Carneiro.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Borges.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Ângelo César Machado.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Guilhermino Alves Nunes.
João Garcia Nunes Mexia.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Rodrigues de .Almeida.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram horas e 44 minutos. Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 57 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário da última sessão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, considero-o aprovado.
Tem a palavra, antes da ordem do dia, o Sr. Deputado Antunes Guimarãis.

O Sr. Antunes Guimarãis: - Sr. Presidente: ainda ontem tomei bastante tempo à Assemblea Nacional para traduzir, conforme me foi possível, a preocupação que domina a lavoura nortenha perante as dificuldades com que vai topar a importante cultura da batata do consumo, e aproveitei o ensejo para fazer alguns reparos ao preço do milho em paralelo com o de outros cereais, e aos entraves que injustificadamente se opõem à circulação de certos géneros agrícolas, como sejam as batatas e o vinho, na cidade do Porto, e volto hoje novamente a usar da palavra antes da ordem do dia para me referir a outro problema da lavoura que, merco da orientação seguida pelo Governo na sua resolução, traz muito preocupados os que na rude experiência da vida dos campos aprenderam que a lavoura extreme seria inviável sem o socorro das pequenas indústrias complementares, que sempre laboraram junto dos seus modestos casais, porque a vida rural desceria fatalmente a nível que a dignidade repele. E como eu nasci numa aldeia minhota, lá me criei, ali volto sempre que posso, e trato de perto com lavradores, muitos dos quais foram meus companheiros na escola primária ali fundada em 1876 por meu padrinho e tio-avô, ó a mim que eles procuram para fazer suas queixas.
Sr. Presidente: o Diário do Governo de 10 do corrente publicou a portaria n.º 9:733 sobre matéria de tanta importância e de tal gravidade que bem merecia algumas horas do debate. Mas uma vez que b Regimento só exige a ratificação de decretos-leis publicados durante o período das sessões legislativas nos casos de urgência e necessidade pública, eu vou usar da palavra antes da ordem do dia para, em termos muito breves, comentar aquele diploma, que, sob a modesta designação de portaria, assume raro alcance económico, político e social.
Visa-se nele o complemento da doutrina do artigo 7.º do decreto n.º 29:749, de 13 de Julho de 1939. que se refere a competência da 3.ª Secção da Junta Nacional dos Produtos Pecuários, porquanto se definem as zonas de abastecimento das fábricas de lacticínios, deixando-se ao critério daquela Junta a determinação das normas de fusão de fábricas o fixação das indemnizações devidas pelo encerramento de fábricas ou do simples postos.
Merecia demorada análise o mapa anexo à aludida portaria, em que surgem vinte e nove zonas com áreas variadíssimas, pois vão desde a modéstia de três freguesias apenas a limites vastos, que chegam a abranger três concelhos e ainda algumas freguesias de outros.
É certo não se medir a produção de leite pela superfície de terreno, pois depende da quantidade e qualidade de pastagens e do número e qualidade das vacas. Contudo a disparidade é tam flagrante que merecia exame mais circunstanciado do que o consentido pela escassez de tempo que o Regimento me faculta.
Não o diz expressamente a portaria que pretendo comentar, mas deduz-se das suas determinações sobre a fusão e supressão de fábricas e postos que se pretende reservar cada zona para uma só fábrica, de forma que muitos concelhos importantes, não só pela área, mas pela capacidade actual e possibilidades futuras de produção do leite, ficarão privados das vantagens múltiplas do fabrico de lacticínios. Não ignoro, e é para mim razão de regozijo, que da intervenção da Junta Nacional dos Produtos Pecuários já resultou o preço do leite ter subido da miséria por que era pago a lavoura pelas fábricas para cotações mais razoáveis; mus para conseguir tam justo benefício não foi precisa a definição de zonas, agora estabelecidas no mapa anexo à portaria, nem se recorreu a discutíveis fusões, ou ao encerramento do postos e fábricas, solução deplorável, pois, embora sejam previstas indemnizações, não se diz na portaria o destino a dar ao pessoal, que, doutra forma, viria agravar o desemprego, nem se alude a criação de novos campos de actividade para os proprietários, gerentes e técnicos dos estabelecimentos suprimidos.
Tam estranha solução de um problema da maior envergadura, o qual, embora em grau muito variável, abrange todas as regiões e interessa a infinidade do casais do lavoura, ainda os mais modestos, não surpreende a quem vinha observando, e para o qual já chamara a atenção de quem de direito, o rumo seguido pelas repartições públicas na elaboração da fórmula que, sob a modesta indumentária de simples portaria, nos revela agora, nas vinte o novo zonas destinadas a vinte e nove fábricas,

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outros tantos monopòliozinhos, que podem vir a ser o germe de um grande monopólio.
Há alguns anos já que as repartições públicas vinham impedindo a instalação de desnatadeiras, nem ao menos se permitindo que os lavradores aproveitassem o leite de sua produção para fabrico e venda de manteiga o outros lacticínios. Assim morreram numerosas iniciativas modestas, que se teriam traduzido em considerável aumento do número de vacas, melhorariam as condições económicas de muitos casais e teriam concorrido parti que a falta de manteiga, agora bem notória, não atingisse o grau de todos infelizmente assaz conhecido. Não não se alegue que o fabrico do lacticínios é prejudicado em qualidade nas oficinas caseiras, pois sei que a nata e a manteiga assim preparadas igualam, se não excedem, a das melhores fábricas; tenho apreciado a excelência dos queijos da mesma procedência, como não ignoro o valor alimentício do leito desnatado para os estômagos dobeis o a importância do próprio sôro na alimentação de porcos o de outro gado. Se há indústrias que bem se adaptam às possibilidades caseiras, e, felizmente, não faltam, a dos lacticínios é uma delas. E para as valorizar lá ficou, entre as bases por nós aprovadas para a organização corporativa da agricultara, a 4.ª, em que se diz que os Grémios de Lavoura podem promover a criação de cooperativas de produção.
A atribuição de zonas tam vastas a determinadas fábricas, se carece de defesa económica, contraria a orientação marcada nu política rural logo após o movimento do 28 de Maio. Entro várias providencias tendentes a proteger as pequenas indústrias complementares da lavoura citarei o § 1.º do artigo 1.º do decreto n.º 10:409, de 4 de Março do 1931, que exceptuou das restrições do condicionamento industrial todas as instalações que não empregassem mais de cinco operários, nem utilizassem força superior a 5 HP.
Nas bases aprovadas pela Assemblea Nacional em Fevereiro de 1937 sobre condicionamento industrial estabeleceu-se (base IV) que «nas regras do aplicação do condicionamento ter-se-á em vista, sempre que seja caso disso, a defesa e a liberdade do trabalho caseiro, familiar o autónomo, estabelecendo-se os justos limites em que este devo ser protegido»; na base a dispõe-se que, «sem prejuízo da alínea seguinte, não podem ser sujeitas a condicionamento as indústrias complementares da exploração agrícola que se destinem à preparação o transformação dos produtos do próprio lavrador». A alínea citada diz que «as actividades que se acharem ou venham a estar organizadas corporativamente ou sujeitas à disciplina dos organismos do coordenação económica de feição corporativa ou pre-corporativa ficam sujeitas no condicionamento inerente ao seu regime especial».
Finalmente a Constituição da República Portuguesa manda, no artigo 32.º, que «o Estado favorecerá as actividades económicas particulares que, em relativa igualdade de custo, forem mais rendosas, sem prejuízo do beneficio social atribuído e da protecção decida às pequenas indústrias domésticas».
Eis, muito rapidamente, os mandamentos do Estado Novo e a orientação marcada pelas repartições do Estado.
Eu prefiro os primeiros, porque são lei é porque estão certos.
Disse.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Formosinho Sanches: - Sr. Presidente: pedi a palavra para, do mesmo lugar de onde há um ano tive ocasião de apresentar várias reclamações quanto à forma como a Companhia dos Telefones cumpria o seu contrato, agradecer, em primeiro lugar, a S. Ex.ª o Sr. Ministro das Obras Públicas as providências que tomou e que, em alguns casos, já se fazem sentir, embora continue ainda sem solução, por ser difícil, a forma como só faz a contagem das chamados.
Também quero agradecer à própria direcção da Companhia dos Telefones, que, tomando em consideração, decerto, as palavras por mim aqui proferidas, mandou empregar em serviços moderados os seus operários tuberculosos que, curados clinicamente, se encontravam fora do serviço.
Em terceiro lugar o meu reconhecimento a S. Ex.ª o Sr. Sub-Secretário das Corporações pelo acerto com que encaminhou, junto da mesma Companhia, o assunto a autorização do casamento das suas empregadas telefonistas, tendo-o conseguido, fazendo assim com que em dezenas de novos lares pudesse, com moralidade, entrar a felicidade.
Aproveito, Sr. Presidente, estar no uso da palavra para lembrar ao Governo que me parece justo, e sem inconvenientes de maior, que o mesmo Govêrno, que conseguiu de uma companhia particular o assentimento para o casamento das suas empregadas, traio de providenciar por forma a que a mesma justa regalia seja dada os pobres enfermeiras e outras funcionárias dos Hospitais Civis.
E digo pobres enfermeiras porque a situação monetária dessas empregadas, ou mesmo até dos enfermeiros, não e de invejar, mas sim de lamentar, devendo ser por quem de direito olhada com atenção.
Senão vejamos:

Para se ser enfermeiro é exigido, e muito bem, independentemente de condições morais apropriadas, o 2.º ano dos liceus, e assim, admitido ao curso, terá de estudar mais três anos, findos os quais lhe é pausado um diploma que o dá por apto a exercer a profissão.
Para entrar para os Hospitais Civis é submetido a concurso documental, no qual prova ter concluído o referido curso, e, se é admitido, entra para um quadro auxiliar, que pode ser dissolvido sempre que as condições o exijam, nas só depois de prestar provas práticas durante três, seis e nove meses, consoante as vagas inteiramente de graça; leva pois u roda de seis anos de estudo, de canseiras e de trabalhos este curso, que o habilita para poder começar a ganhar então a sua vida, passando ao tal quadro auxiliar com o vencimento mensal de 400$ ilíquidos.
Passados dois ou três anos nesta situação, são admitidos a concurso, se houver vaga, e, uma vez prestando boas provas, são promovidos à classe imediata (enfermeiros de 2.º classe), com o vencimento ilíquido de 550$, e nesta, situação se conservam, na melhor das hipóteses, três anos, findos os quais, caso haja concurso, subirão à classe a seguir, isto é, à de enfermeiro de 1.ª classe; a seguia -, enfermeiro sub-chefe depois, chefe, tudo isto com períodos, em cada classe, nunca inferiores a três anos, percebendo por cada uma das categorias, respectivamente, os vencimentos ilíquidos de 600$, 700$ e 800$.
Na melhor das hipóteses, trabalhará este dedicado servidor do próximo, arriscando a sua saúde entre lamentos e sujeito a contágios, cerca de treze anos para atingir a linda situação de enfermeiro chefe, ganhando tanto, excepto de sub-chefe em diante, como um porteiro ou alguns serventes. E quanto trabalhou este homem durante esses treze anos?
Tanto como 50:300 horas, à razão de 11 horas por dia, «em uma folga sequer, acrescentando a essa circunstância que 14:200 horas são feitas de noite.
A fim de evitar que esta classe necessite de recorrer a gratificação dos doentes, parece-me justo e humano que o Governo olhe para a sua situação.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

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O Sr. Calheiros Veloso: - Sr. Presidente: na sessão desta Assemblea Nacional de 24 de Janeiro findo, o ilustre Deputado Sr. engenheiro Belfort Cerqueira voltou a fazer algumas breves, mas muito judiciosas, considerações sobre o problema da electricidade nacional, tanto para produção de força industrial como para usos agrícolas, cuja importância para a vida e progresso económico e social da Nação ressalta, mais vivamente ainda, neste período de perturbação causado pela guerra.
Tem S. Ex.ª para isso especial autoridade, não só como distinto engenheiro electrotécnico, mas também como autor do projecto do lei sobre electrificação rural que apresentou nesta Assemblea, logo em uma das primeiras sessões da actual Legislatura, depois submetido ao estudo da Gamara Corporativa, onde foi objecto dum parecer, publicado em suplemento ao Diário doa Sessões de 27 de Fevereiro do 1939, que fechava com a seguinte conclusão:

«Porque a electrificação rural é uma actividade a integrar na electrificação geral do Pais, devo sor estudada no plano desta e, por isso, êste projecto devora aguardar a proposta de lei do Govêrno e nela ser considerado.

Porque tive, mercê do funções administrativas que- fui chamado a desempenhar nos serviços municipalizados do uma camará distribuidores de corça de 6 milhões do kWh por ano, de acompanhar de perto a evolução do mercado da energia eléctrica e do apreciar a sua posição em face das Autuações de preços dos combustíveis, poço licença para acrescentar também algumas palavras sobre a matéria que, com tanta proficiência, esse nosso ilustre colega já por mais de uma vez aqui versou.
No relatório com que abro a Estatística doa Instalações Eléctricas referente ao ano do 1938, subscrito pelo Ex.ª engenheiro Ferreira Dias - que hoje faz parte do G-ovêrno como ilustre Sub-Secretário do Estado do Comércio e Indústria e ao tempo presidente da Junta de Electrificação Nacional, cargo que ocupou desde a criação desse organismo e a cujo espírito de iniciativa, manifesta boa vontade e superior orientação aproveito a oportunidade paru prestar as minhas homenagens - lê-se a seguinte observação:

«Na política de fomento que se tem seguido, depois que se arrumaram a fazenda e a vida dos portugueses, julgamos descobrir êste critério: estradas, portos, rega, arborização, saneamento, edifícios, urbanização, telefones, tudo quanto pertenço à actividade exclusiva do Estado, está em marcha com a velocidade que permite a nossa capacidade em trabalho o em dinheiro; mas as questões do interesso geral afectas à actividade privada - referimo-nos à electricidade e aos caminhos de ferro - não têm partilhado daquele tratamento, como só o seu progresso não interessasse também a todos nós e ao conceito de Portugal no mundo».

Cabe aqui, e a título de mero esclarecimento, dizer quo o, consumo específico de electricidade por habitante é um dos índices pelos quais se pode inferir o nivel de vida e o grau de progresso industrial de um povo - e esto é entro nós apenas do 47 kWh, quando nu Noruega atinge 2:700 kWh!
Como comentário a estes números reproduzo ainda certas palavras escritas em um outro relatório pelo Exmo. engenheiro Ferreira Dias:

«Consumir electricidade nao é só atributo do homem industrioso; é-o também do homem civilizado, porque aquele a quem hoje a electricidade não interessa, aquele que não sente algumas das necessidades que ela pode satisfazer na multiplicidade dos seus usos, ou é um desgraçado que não tom pão, ou ura irracional que não tem alma. Em qualquer dos casos, uma decadência».
Mas o consumo do energia eléctrica ó função do seu preço e este é sempre incomportável em um país como o nosso, de fraco aproveitamento do seu potencial hidráulico, em que apenas existem hoje umas quatro ou cinco centrais dignas do menção - Lindoso, Chocalho, sistema da Empresa Hidro-Eléctrica da Serra da Estrela, Ermal o Vaiada, da Hidro-Eléctrica Alto Alentejo e de mais fraca ainda produção de combustíveis.
Dos 426 milhões de kWh produzidos nas centrais do País apenas 126 milhões, ou sejam 30 por cento, provam da força hidráulica, sendo os 300 milhões restantes da térmica, e nesta só 69 milhões foram alimentados pelos combustíveis nacionais - carvões e lenhas.
Para obter aqueles 231 milhões de kWh térmicos importámos em 1938 - último ano de que só encontra publicada a estatística respectiva - 150:000 toneladas do carvão inglês, ou seja metade do consumo total dos caminhos de ferro, e mais 12:000 toneladas de carburantes e óleos combustíveis, também de proveniência estrangeira, representando, ao todo, cerca do 30:000 contos saídos do País.
Na presente conjuntura, quando a guerra desorganiza a produção nos países de origem e o transporto até Portugal dêsses combustíveis, quando aquelas 162:000 toneladas nos custam, não os 30:000 contos que citei com referência a 1938, mas 90 ou 100:000 contos, quando a nossa vida industrial, embora de proporções modestas, mus, entretanto, elemento imprescindível já hoje do equilíbrio económico o social da Nação, deles depende o está em risco de os não poder receber - parece-me ser obrigação de quantos nestes assuntos pensam dar todo o sou apoio à petição do ilustre Deputado Sr. engenheiro Belfort Cerqueira.
O desenvolvimento da produção da energia hidroeléctrica, permitindo a sua utilização em usos até agora totalmente servidos pelos combustíveis e carburantes estrangeiros - os produtos da Sacor são extraídos de ramas que também importamos - representará em qualquer tempo uma economia apreciável para o País, mas num período de guerra como aquele que atravessamos tal desenvolvimento evitaria que ela sofresse um desfalque ainda mais avultado precisamente quando mais apertada se devia tornar, e daria ainda uma correspondente autonomia à indústria nacional.
O momento não é, por certo, propicio para iniciar as grandes realizações que esse empreendimento importa, mas, por isso mesmo que é de crise, ele proporciona o mais vivo incentivo e patenteia a verdadeira acuidade do problema, cuja solução pode ser desde já estudada e estar pronta a entrar em execução logo que as circunstâncias o permitam.
O decreto n.º 26:470, publicado em 28 de Março de 1936, criava a Junta de Electrificação Nacional, para estudar, no prazo máximo de dois anos, as providências que desenvolvessem a electrificação e a orientassem, as normas das concessões, o conjunto das centrais eléctricas e das linhas e a inspecção dos serviços referentes à electricidade.
O prazo da duração da Junta foi posteriormente prorrogado por mais dois anos e de novo, pelo decreto n.º 30:647, mantida a sua existência ato à publicação dos diplomas previstos no decreto que a tinha criado.
Assim, quando esta Assemblea está prestes a encerrar a sua 3.º sessão legislativa, atrevo-mo a solicitar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, para sor intérprete junto do Governo do pedido que por intermédio da mesma Assemblea lhe foi feito, para que seja publicado o diploma que estabeleço o plano da rede eléctrica nacional, como elemento imprescindível das valiosas e seguras realizações que pelo mesmo têm de ser condicionadas, tornando a electricidade num poder decisivo do progresso industrial

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e agrícola do Pais, isto é: em trabalho e pão dos portugueses.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Viterbo Ferreira: -Sr. Presidente: anunciaram os jornais desta manhã uma nova baixa nu taxa de desconto do Banco de Portugal. Esta, que em 1928 era de 8 por cento, passa a ser a partir, de hoje de 4 1/4 por cento.
Quando quási todos os países do mundo tom as suas finanças se não arruinadas, pelo menos fortemente abaladas por motivo da guerra, Portugal, merco de subia previsão e orientação firme da sua política financeira, consegue dar mais uma prova da solidez das suas finanças e das suas avultadas disponibilidades de tesouraria. E, se esta medida é notável em si, constituo uma facilidade digna de registo concedida às actividades comerciais e industriais, muitas das quais estão sendo fortemente afectadas pelas consequências da guerra.
Desnecessário se torna encarecer o alcance desta medida. Todos o conhecem e sabem o que representa. Entendo, porém, que este facto devia ser aqui assinalado.
Disse.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Como V. Ex.ª sabem, a ordem do dia é constituída pela apreciação da proposta de lei relativa â dispensa das condições de promoção dos oficiais que sejam Ministros ou Sub-Secretários de Estado e pela ratificação do decreto-lei n.º 31:114.
Como se trata de assuntos conexos, ponho à discussão conjuntamente os dois diplomas.

O Sr. Álvaro Morna:- Sr. Presidente: por esta proposta de lei que o Governo trais u discussão da Assemblea Nacional procura-se solucionar a situação dos oficiais do exército e da armada no exercício das funções do Ministro ou de Subsecretário de Estudo, em face das exigências de tirocínio consignadas nos regulamentos militares e mais condições de promoção impostas por lei a todos os oficiais.
Pretende-se, Sr. Presidente, regular o modo como devem ser satisfeitas ou supridas aquelas condições na hipótese, que a actual legislação não prevê, de os oficiais estarem exercendo funções de Governo, por forma a evitar sacrifícios de interesses individuais considerados legítimos e a atendei as superiores exigências da administração pública.
O problema envolve dois delicados aspectos: mu, de ordem política, a que está naturalmente ligado o interesse nacional; outro, de natureza puramente militar.
E em face destes dois aspectos que se impõe a análise da questão que se suscita e a solução que o Governo propõe à Assemblea Nacional.
Antes de mais nada, Sr. Presidente, cumpre-me dizer que se o aspecto político, só por si, constituo para mini motivo mais que bastante para não dever alhear-me de intervir no debate, a verdade é que a circunstância de não haver de momento nesta Assemblea outro oficial da marinha que com mais competência poderia participar da discussão (Não apoiados) mais imperativo me torna, em faço dos princípios de ordem, militar em jogo, o dever de vir à tribuna a contribuir, ainda que modestamente e sem a mínima pretensão de autoridade (Não apoiados), para a análise da proposta e puro, disser a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e à Câmara as razões determinantes do meu voto.
O problema que, em última análise, se apresenta é este: devem os oficiais era exercido de funções do Governo nos períodos em que por lei lhes compita satisfazer as exigências dos tirocínios, preparação o provas militares ser dispensados do cumprimento deste preceito legal e regulamentar, ou, pelo contrário, há que enjeitá-los as mesmas condições de promoção impostas a todos os outros oficiais?
Esta última hipótese acarreta consequentemente consigo uma nova alternativa - a de o oficial em tal situação ser compelido a abandonar o Governo para ir cumprir as condições de promoção, ou, a manter-se na função, ter de sofrer o prejuízo da preterição, que em certos casos pode acarretar o corte da sua carreira e futuro militar.
Há ainda que pôr a hipótese de o oficial ir cumprir os tirocínios depois de terminado o mandato do Governo, com demora ou sem demora da promoção e, no primeiro caso, sem preterição.
Esta a questão, Sr. Presidente, ou, melhor, estas as modalidades de solução a que se é conduzido - ou dispensa das condições de promoção ao abandono do Governo, ou realização posterior daquelas condições -, ou o prejuízo pessoal que pode atingir o corte ide toda uma carreira militar.
Não quero falar desta última modalidade porque entendo que não há sequer o direito de a pôr em causa.
Se é certo que nunca ninguém foi preso pelo facto de não querer ser Ministro, não é menos certo que as contingências de variadíssima ordem, as responsabilidades inerentes ao exercício da governação pública são suficientemente fortes para que a ninguém seja lícito pretender avolumá-las, por força da lei, com a perda do próprio futuro ou carreira militar.
É solução que não RU pode considerar nem sequer para aqueles que, podendo vir a estar em causa, desejassem levar o sacrifício até à renúncia do interêsse individual, neste caso mais do que legítimo.
Apoiados.
Seria um absurdo que, dentro da lei, não é de admitir.
Tam pouco é de considerar a hipótese da realização posterior das condições de promoção - demorada ou não que esta seja. Se é demorada, o retraimento da antiguidade a que o sistema obriga para todos os efeitos, incluindo a contagem do tempo de serviço no posto a que o oficial ascender, ó contrário a todos os princípios consignados nos leis militares.
Depois, como muito bem frisa a digna Câmara Corporativa no seu douto parecer, ela exigiria que se fizessem os tirocínios relativos a dois postos em parte do período de que normalmente se dispõe para os que correspondem a um só posto.
E isso daria indubitavelmente lugar a graves perturbações no regime das promoções.
Se a promoção não é demorada, piores são as consequências - o sistema ofende a própria hierarquia e disciplina militares quando põe em paralelo e em competência nas situações de tirocínio, frequência de cursos o provas de promoção um oficial que exerceu as altas funções do Governo com camaradas de graduação inferior - inferioridade que pode atingir mais do que um grau na hierarquia militar.
Acresce, Sr. Presidente, com demora ou sem demora da promoção, a injustiça e a inconveniência de, sob tal critério, se sujeitai- o oficial que desempenhou funções de Ministro ou de Sub-Secretário de Estado às exigências, algumas delas de competência com os seus camaradas, dependentes de factores de ordem física e

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intelectual, em períodos em que as condições de um e dos outros, sob aqueles dois aspectos, não podem pôr-se em pé de igualdade.
Acrescem ainda, neste mesmo sistema, situações de difícil solução, como a de o oficial ter logrado mais do que uma promoção no exercício do Governo. A que condições iria ele satisfazer?
As do primeiro posto a que ascendeu? Às do segundo? As dos dois? Se entretanto atingir a idade para passar à reserva?
Em promoção não demorada irá cumprir os tirocínios, preparação e provas numa idade em que por lei, devendo ter passado à reserva, já não está em condições de o fazer?
Em regime de promoção demorada passará à reserva?
Onde está então a salvaguarda do interesse individual que se pretende assegurar?
Se não passa à reserva terá de abrir-se nova excepção para o não abranger pelas disposições legais respeitantes à idade?
Estes são inconvenientes que de momento surgem, a não são poucos nem são pequenos.
Mas quantos não poderão, suscitar-se na prática de tal princípio?
Não! O sistema não é de aceitar como solução do problema que se levanta, já pela perturbação a que conduziria no regime de promoções existente, já pelos princípios de ordem disciplinar e pela equidade a que é mester atender.
Há que pô-lo, igualmente, de parte.
Restam-nos, Sr. Presidente, as duas outras modalidades, ou sejam aquelas em que logo de início pus a questão: ou o sacrifício das exigências da governação
Súplica e do próprio interesso nacional, ou o sacrifício os exigências de ordem militar que determinam os tirocínios e mais condições de promoção - o que implicitamente obriga a analisar o problema, como de princípio disse, nos seus aspectos político e militar.
Estes dois aspectos apresentam-se sob formo, divergente e bem delicada em face dos princípios de natureza militar e das exigências de ordem política.
Há que sacrificar um, ou outro, envolvendo o prejuízo de qualquer deles indubitavelmente um mal.
E entre dois males ha, naturalmente, que escolher o menor.
Qual deles se apresenta em projecção, em consequências, como o menor?
Eis, Sr. Presidente, verdadeiramente o objecto das rainhas considerações - o que me proponho concluir da análise do diploma do Governo nos seus aspectos político e militar.
Sr. Presidente: é fácil criticar - tam fácil, como fácil é derruir.
Eu sei, Sr. Presidente, que para quem quisesse entrincheirar-se na rigidez dos princípios de natureza militar, como em geral para todo aquele que em campo restrito de qualquer actividade pretendesse encarar os factos na pureza dos -princípios de ordem subjectiva que a condicionam, não seria difícil atacar rudemente esta proposta-u principiar pela excepção que ela cria à norma jurídica em vigor e a acabar na lesão dos princípios de ordem técnica militar justificativos dos tirocínios e mais condições de promoção, impostos aos oficiais.
E isto constitue, sem dúvida nenhuma, um mal.
Eu sei mais, Sr. Presidente, que, se nos transportássemos há vinte ou trinta anos atrás, teríamos do reconhecer, por maior que seja o principio de justiça e do interesse nacional com que a proposta hoje se nos apresenta, que nem sequer a iniciativa e muito menos a realização do princípio que se discute caberiam então na mente de ninguém.
A mentalidade política dessa época de que nem sempre furam apanágio e esteios fortes a virtude e a moral - não conceberia o princípio da medida que ora nos ocupa.
Mas isto, Sr. Presidente, é que já não constitue um mal.
Não temos, na verdade, que deplorar essa circunstância, mas, pelo contrário, que regozijar-nos com ela.
É que o sentido político saiu do âmbito restrito dos personalismo» e das paixões estéreis em que tantas vezes se debatiam os homens para atingir uma acepção mais nobre, mais elevada, mais ampla e mais construtiva de uma verdadeira política nacional-subordinando-se aos superiores interesses da governação os interesses restritos de cada uma das actividades da Nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A estabilidade governativa que cia exige em primeiro plano, como base de unidade e sequência, da administração pública, não pode estar à mercê de soluções de continuidade ditadas por exigências de sectores restritos da vida do Estado, com prejuízo do interesse nacional, que a todos os outros sobreleva - isto evidentemente dentro dos limites ditados pela razão, pela própria natureza das actividades e projecção do seu condicionamento aos superiores interesses da governação.
O contrário seria um mal que em certos momentos da vida nacional poderia revestir indiscutível gravidade.
B precisamente esse mal que pela proposta se pretende evitar - sem que no domínio da actividade militar se ultrapassem aqueles limites da razão ou se lesem com consequências de gravidade insuperável os princípios essenciais da organização militar.
A dispensa das condições de promoção é evidentemente um mal.
Não pretendo negá-lo.
Melhor fora que todo o oficial no exercício do Governo as pudesse cumprir.
E essa justiça a todos quero fazer porque ela está, em rainha consciência - tendo como certo que nenhum oficial do exército ou de armada se aproveitará de bom grado da prerrogativa que estamos discutindo e que preferiria, se razões de Estado o não impedissem, sujeitar-se a todas as condições exigidas aos seus camaradas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A dispensa, dessas condições é, sem dúvida nenhuma, um mal.
Mas pregunta-se, Sr. Presidente: até que ponto afecta êsse mal a essência dos princípios reguladores das condições de promoção?
É esta uma lei do excepção?
É sim, ó uma lei de excepção!
Mas excepção imposta por razões de Estado e que, só por isso, se justifica.
Apoiados.
E justifica-se tanto mais quanto ú certo que a essência dos princípios que ditam as exigências de tirocínio e mais condições de promoção não ó de tal modo intangível que não admita por lei já outra excepção - a da promoção por distinção.
Se o tirocínio tem de ser considerado à face dos princípios e técnica de ordem militar como acto, regra, preceito, aplicação, preparação ou prova sem os quais se não possa conceber a aptidão do oficial para o exercício do ponto imediato, não poderíamos admitir a promoção por distinção.

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Longe de mim a idea de por qualquer modo me permitir reparos à promoção por distinção.
Sou o primeiro n abraçar o princípio do justiça que a inspira como estímulo e recompensa por altos feitos militares, e, por isso m esmo, o primeiro a reconhecer a legitimidade da excepção que ela cria.
O que pretendo é frisar perante a novo excepção que a proposta em discussão suscita que se aquela existe, sem abalo dos princípios que regulam as condições cie promoção, tam pouco se afectam esses mesmos princípios com a nova excepção em causa - e prementes são as razões de interesse nacional que esta última, determinam.
Por outro lado, Sr. Presidente, a preparação militar e o seu fim essencial, a guerra, estão intimamente ligadas à política da Nação.
É a política que as condiciona e determina - porque é a política que exprime e concretiza o sentimento e aspirações nacionais de que uma e outra sito consequência.
E tam íntima é a ligação entre a política e a preparação militar, tam fortes os laços de união entre a política, as suas directrizes, e a expressão máxima dessa preparação no campo tam vasto e tam complexo cia estratégia militar, que a própria política externa e a política interna de qualquer país não são verdadeiramente outra cousa senão actos de estratégia - na paz, como na guerra - em que todas as actividades e recursos da nação se põem em campo para a realização dos seus objectivos políticos.
São princípios imutáveis e eternos - hoje mais do que nunca em evidência no expoente máximo que lhes á o carácter totalitário da guerra moderna, envolvendo a preparação da nação nos seus múltiplos aspectos - espiritual, moral, financeiro e económico.
São inúmeros os problemas que a cada passo surgem na preparação militar em ligação com a política que a uma e outra obrigam a caminhar a par, em mútuo entendimento e perfeita compreensão das suas exigências recíprocas.
Não podem os políticos e homens de Estado deixar de estar ao facto das questões militares, dos conhecimentos estratégicos, dos princípios de organização e utilização das forças armadas.
Por seu turno, «igualmente indispensável que os militares tenham conhecimento perfeito das questões políticas.
Não poderão conscienciosamente trabalhar na preparação militar sem conhecimento do fim político que é o determinante do fim militar.
Tudo isto, Sr. Presidente, obriga o militar a estar no conhecimento da política do seu país, a acompanhada nos acontecimentos que se vão desenrolando dentro e fora das fronteiras - numa palavra, a basear na política uma grande parte da sua preparação e formação profissionais.
E eu pregunto. Sr. Presidente: onde encontra o oficial do exército ou da armada no desempenho das funções de Ministro ou de Sub-Secretário de Estado melhor campo de aplicação para a sua preparação neste importantíssimo ramo da formação militar do que no exercício fia função do Governo?
Não será ali, no contacto permanente e directo com a realidade política do País, na sua função dirigente, que os mais altos problemas de ordem política e militar st; lhe apresentam, não apenas para observação e estudo, mas para acção, golpe de vista, decisão - para o exercício do mando na sua mais elevada acepção?
Apoiados.
Julgo que sim, Sr. Presidente.
O princípio estabelecido na proposta não colide substancialmente com o espírito que condiciona de modo geral as exigências de tirocínio e preparação para a promoção dos oficiais.
De resto, Sr. Presidente, a dispensa, por motivos de Estado, dos tirocínios nas condições que o diploma em discussão provê, eventual como na prática se apresenta, não poderia nunca afectar fundamentalmente ou constituir subversão dos princípios reguladores das condições a todos os demais oficiais impostas.
Em seis ou sete graus de tirocínio e preparação a que o oficial tem de satisfazer «m toda a sua vida militar, não é evidentemente a dispensa eventual de um ou pouco mais que pode classificar-se de subversão do princípio por força do qual o mesmo oficial terá já satisfeito ou virá a satisfazer todos os outros graus a que a lei obriga.
Sr. Presidente: é tempo de dar por findas na generalidade as minhas considerações sobre o diploma em discussão.
Na análise que da proposta procurei fazer sem parcialidade e sem paixão, nem deixei de dar justo e devido relevo aos benefícios de que ela informa -sintetizados na superior razão de Estado que a inspira nem de focar o mal que dentro da organização militar representa a dispensa das condições de promoção.
A dispensa dessas condições, do novo afirmo, é um mal.
E ou não hesito em aceitar esse mal, só para evitar um mal maior.
Por isso, dou o meu voto na generalidade à proposta que se discute.
E faço-o com a independência e espírito de justiça que acima de tudo prezo e com que em consciência procuro nortear os meus actos de ordem pessoal, militar e política.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi ouvido com especial atenção da Assemblea e muito cumprimentado.

O Sr. Alçada Guimarãis: - Sr. Presidente: a proposta, de lei n.º 130, que o Governo submeteu à apreciação da Assemblea e se encontra em discussão, compreende dois aspectos essenciais, mas inteiramente distintos: um, o aspecto militar, outro, o aspecto a que podaremos chamar político.
Não é meu intuito encarar os problemas que a proposta suscita no campo militar, mas entendi dever dar à Assemblea pública conta das conclusões a que no seu estudo cheguei no campo político, conclusões estas que, decisivamente, influíram no meu espírito.
A proposta de lei tem como objectivo dispensar os oficiais do exército e da armada, quando Ministros ou Sub-Secretários de Estado, das condições normais de promoção, ou, talvez, dizendo melhor, determinar a forma como hão-de ser satisfeitas ou supridas essas condições, pois assim se exprime o Governo no respectivo relatório preambular.
Do simples enunciado do diploma ressalta logo, como se verifica, o seu carácter de emergência, transparecem as razões de Estado que teriam aconselhado a medida, e que impõem, a meu ver, justificadas reservas no seu debate.
Penso que ante estas razões a severidade que poderia emanar de uma solução estruturalmente militar tem de arredar-se e é à luz da conveniência política que a proposta há-de sei- considerada.
As razões de Estado são, aliás, de todos os tempos. Na antiga doutrina do direito público já se admitia a idea de que havia casos em que o direito existente devia ceder a um interesse superior do Estado. Era o direito de alta necessidade.

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E este direito de alta necessidade, embora sob diferentes modalidades, é ainda aceite no sistema constitucional dos povos modernos.
Pode mesmo dizer-se que ele está ligado à vida e u essência da Administrativo até por força das circunstâncias.
Impelido, assim, pela lógica do raciocínio até à convicção de que um imperioso motivo do interesse nacional teria presidido à proposta em causa, a inteligência nega-se a quaisquer reflexões pura se confinar nos limites de um caso de pura confiança política.
E, chegado aqui, o sentido do meu voto decorre naturalmente - aprovar a proposta.
Mas esta razõo-síntese decompõe-se, ou poderia decompor-se, em várias outras onde se manifesta de maneira mais significativa o fundamento da minha decisão.
Com efeito, os Ministros, como os Sub-Secretários de Estado, constituem o rolamento imprescindível do Governo.
São eles que asseguram a marcha e a continuidade da Administração.
Este principio domina a forma da sua nomeação, as suas atribuições, a sua responsabilidade - e não só as domina, como as explica.
Ora o conjunto de funções que envolvem a actividade ministerial foi-se tornando, a pouco e pouco, não só pela evolução dos tempos, mas pela própria natureza das cousas, em mecanismo de difícil manejo.
O Estado encontra-se hoje perante problemas tam complexos que a sua resolução não pode ser confiada n homens sem sólida preparação.
As dificuldades que se deparam a quem chega aos altos comandos da governação obrigam a amadurecido estudo, conhecimento precisa da orgânica dos departamentos públicos e do seu funcionamento, visão atenta e oportuna às constantes necessidades do agregado social, enfim, a uma verdadeira especialização, que só se conquista com larga estadia no Poder.
A noção meramente especulativa do cargo vai-se sucedendo uma outra noção mais segura e sem dúvida mais benéfica - a da competência técnica.
É claro que esta especialização não prescinde de unia acção preponderada pelo espírito e pela inspiração, ou seja em dar realidade aos ideais da Nação, que é, em última análise, o fim supremo da política.
Tal é, de resto, a lição dos últimos anos no nosso País, a que não furta o expressivo sublinhado das palavras do Sr. Presidente do Conselho, constantes de uma nota oficiosa recente:

«As democracias - diz-se nessa nota- habituaram-nos à idea de que funções da maior gravidade podiam ser desempenhados «em habilitações ou preparação especial, e apenas com o treino dos discursos políticos, inflamados e de matéria vaga.
Certamente a política, como arte humana, existirá e será sempre necessária emquanto existirem os homens: mas o Governo parece que será cada vez mais uma função científica ou técnica».
Pode, pois, afirmar-se, com base na autoridade que resulta destas palavras, que os lugares do Governo são hoje, acima de tudo, verdadeiros postos de actuação técnica.
Por consequência, a demonstração do condicionalismo indispensável ao acesso (hierárquico de alguma maneira se deve considerar suprida pelo exercício das mais categorizadas funções administrativas, mormente quando desempenhados aia esfera da especialidade.
E nesta circunstância encontro eu um primeiro motivo expresso de concordância com a proposta.
Por outro lado, a presunção de aptidão que deriva da circunstância indicada esta ainda subordinada ao parecer favorável do Presidente do Conselho.
É possível que nesta interferência do Chefe do Governo no processo do promoção se pretenda ver unia invasão de funções.
Mas creio que sem razão.
Na verdade, abstraindo embora das condições particulares que neste momento concorrem alta pessoa do Presidente do Conselho, a posição em que o artigo 108.º da Constituição coloca esta entidade obriga-o a um conhecimento exacto do valor dos seus colaboradores, cuja escolha exclusivamente lhe pertence.
Se a lei confia ao Presidente do Conselho o traçado das grandes linhas de governo e a coordenação da actividade de todos os Ministros, é evidente que lhe não hão-de ser estranhos os méritos destes, nem a substância daquelas.
As suas informações podem, portanto, equiparar-se, sem demasiada concessão, ao veridictum de um júri responsável.
E assim surge um novo motivo que me leva a aderir à orientação da proposta.
Além disso não seria legítimo, ainda por virtude da singular posição em que o nosso estatuto constitucional coloca o Presidente do Conselho, que embaraços de natureza regulamentar, por mais respeitáveis que pareçam - e o sejam, de facto, neste caso -, dificultassem a sua actividade, privando-o de auxiliares prestimosos e, porventura, num passo em que a substituição se tornaria não só perturbadora mas inconveniente.
Como poderiam conciliar-se os deveres de responsabilidade pessoal pela política geral do Governo, nos termos em que a Constituição vigente os estabelece, com quaisquer restrições a livre escolha dos Ministros ou à sua manutenção no Poder?
Há, pois, na base desta questão um verdadeiro problema de direito público, já resolvido, e cumpre acatar a solução consagrada.
E aqui deparo com um outro motivo de sujeição à doutrina da proposta.
finalmente, não se afiguraria defensável que os oficiais do exército ou da armada, quando na gerência de cargos ministeriais, fossem, por esse facto, compelidos à renúncia das regalias inerentes às suas profissões, dada a impossibilidade de poderem satisfazer, cumulativamente, aos requisitos dos regulamentos e às exigências da Administração.
Não se compreende mesmo um sistema legislativo que dê origem a semelhante disparidade.
O problema reveste, talvez, agora, toda a acuidade em face de uma inédita mas proveitosa continuidade governativa.
Importa, por isso, resolvê-lo.
E na sua solução, se não podem sacrificar-se as superiores conveniências da Nação, também não devem desprezar-se os legítimos interesses individuais.
No recíproco respeito de umas e outros estará a medida aconselhável.
Ora a proposta inspira-se precisamente nesta regra, pelo que revela ainda mais um motivo de aprovação.
Não se afasta, por sua vez, a Câmara Corporativa do reconhecimento destes princípios, ou, pelo menos, de alguns deles, como se depreende do parecei- que emitiu.
E, se bem que com menor vigor, parece tê-los sancionado por uma forma mais prática e completa, do quo o fizera a proposta, no articulado que sugere.
Devo observar, no entanto, que noto no seu texto serias disposições que de algum modo comprometem os desígnios do legislador e, digamos mesmo, atentam contra as suas iniciais proposições.

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Não é a altura do fazer a apreciação especificada dessas disposições.
Mas acho indeclinável marcar desde já uniu atitude definida: se se trata de uma medida de ordem política há que admiti-la em toda a sua extensão, sem transigências com preço muitos de qualquer outra natureza.
Não seria lícito ampliá-la ou restringi-la.
Devo ser aceita nos precisos termos em que o Governo significa a sua conveniência. Tais são as normas que orientarão o meu voto.
Tenho dito.

Vozes : - Muito, bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª, Sr. Presidente, dá-me uma informação?
Já está na Mesa alguma proposta adoptando as sugestões da Câmara Corporativa?

O Sr. Presidente: - Já está na Mesa orna proposta, assinada pelos Srs. Deputados Álvaro Morna e Manuel Rodrigues, adoptando o texto da Câmara Corporativa e sugerindo algumas emendas ao mesmo. Oportunamente me referirei a essa proposta.

O Sr. Melo Machado : - Muito obrigado a V. Ex.ª

O Sr. Santos Pedroso : - Sr. Presidente: depois das brilhantes considerações produzidas nesta tribuna polo Sr. Deputado Freitas Morna, que à sua competência de técnico, pois ó um dos mais distintos oficiais da nossa armada, alia a de parlamentar dos mais ilustres que têm assento nesta Assemblea, e pelo ilustre Deputado Dr. Alçada Guimarãis, pouco ou nada me resta acrescentar. Não quero, porém, deixar de trazer o meu modesto contributo pára o esclarecimento completo deste problema, que tanto interesse tem despertado dentro e fora desta Assemblea Nacional.
Sr. Presidente: as condições normais u que deve satisfazer todo o oficial para ser promovido ao pôsto imediato são robustez física, determinado tempo de permanência no posto anterior, corto período de serviço activo com tropas, frequência de cursos táticos e técnicos, cursos de informações e informações dos cheios sob cujas ordens sirva.
São múltiplas, portanto, as condições a que todo o oficial deve normalmente satisfazer, condições que só excepcionalmente são dispensadas na promoção por distinção, por feitos valorosos em campanha. Mas porquê? Porque o oficial merecedor de tal galardão mostrou, em circunstâncias particularmente difíceis, possuir no mais elevado grau as qualidades que devem ser apanágio de todo o militar, e que se manifestaram independentemente do preenchimento das condições normais de promoção. Seriam essas qualidades meramente de bravura pessoal? Creio poder afirmar que não, pois para as premiai- lá existem as citações, os louvores, as medalhas de várias categorias, como, entre outras, a medalha do valor militar, Cruz de Guerra e Torre e Espada. É, pois, lógico pensar que para se merecer a promoção por distinção será preciso demonstrar possuírem-se no seu mais elevado expoente as qualidades que impõem os chefes, em qualquer grau da hierarquia militar.
Vejamos quais são elas. Para isso recorro ao regulamento do serviço do campanha, em uso no exército português, semelhante, aliás, ao de todos os exércitos modernos. Diz osso regulamento, ao referir-se à «Função do comando».
«Para que a autoridade em qualquer grau da hierarquia do comando possa exercer-se eficazmente ó necessário que a personalidade; do comandante se imponha pela sua competência, pelo seu carácter e pela sua coragem.
A par disso, um profundo amor à Pátria, desenvolvido sentimento da honra e do dever, uma vontade firme e decidida, faculdades de previsão, concepção e decisão, culto das responsabilidades, bom senso ao serviço duma inteligência clara, espirito de justiça e interesse pelos seus subordinados são dotes necessários ao comando.
A acção do ornando devo ter na devida conta a importância fundamental dos factores morais; assim, o comando deverá, em todas as circunstâncias, procurar elevar o moral das tropas e desenvolver nelas os sentimentos que, impulsionando a vontade de vencer, conduzem à vitoria.
E, mais adiante, diz ainda:

«Ser bravo e entusiasta na luta é dever de todo o oficial e especialmente daqueles que exercerem o comando de tropas, pela influência que tem sobre elas o exemplo. Porém o entusiasmo e a bravura não devem excluir a serenidade nem o bom senso, que, sobretudo perante o perigo, são absolutamente necessários.
O exercício de uma produtiva actividade e o amor das responsabilidades são também qualidades essenciais a um comandante, e as mais brilhantes qualidades de inteligência o ilustração, e até de valentia pessoal, pouco valem se não forem postas ao serviço de uma vontade forte e decidida.
A inacção e o horror das responsabilidades revelam falta de vontade e de carácter do comando e são faltas mais graves e mais prejudiciais que quaisquer erros porventura cometidos na acção.
De alto a baixo da escala hierárquica do comando devo existir ,um acentuado espírito de previsão ... e que:
... A imprevidência, representando uma forma de inacção, pode conduzir à derrota».
Ora não serão estas as qualidades, aparte as de bravura e valentia pessoal, que deve possuir toda a pessoa investida nas altas funções de Governo, Ministro, etc.? Sendo assim, se essa pessoa poste no mais elevado grau esses qualidades, pois de outra forma não deveria estar investido naquelas funções, porque prejudicar a continuidade da acção governativa, tais útil, tam necessária e de tal modo importante que tem sido um das maiores factores do ressurgimento nacional, em holocausto ao preenchimento de um certo número do condições que já na promoção por distinção foram dispensadas? E essas mesmas condições não são aquelas que no mais elevado grau devem possuir todos aqueles que ocupem os mais elevados cargos da governação do País?
Não quero encerrar estas minhas fastidiosas considerações sem mencionar algumas passagens de uma conferência produzida por uni ilustre general do nosso exército quando comandante da Escola Central de Oficiais, ao tempo o mais categorizado estabelecimento de estudos militares, e que, ao referir-se à pessoa do oficial, diz:

«É uma figura complexa - não é um simples indivíduo munido com um curso, ilustrado com conhecimentos vários de técnica, a quem se veste uma farda, e se confiam umas centenas ou uns milhares de homens. E porque a sua, missão é sacratíssima, deverá ser um indivíduo seleccionado; porque, para a cumprir, não lhe basta ser um funcionário, na acepção corrente da palavra, ele precisa possuir a capacidade para todas as virtudes e todos os altos pensamentos que a acção de defender o País na guerra exige.

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Mais adianto diz ainda que:

«Deve ser dotado ainda de uni espírito de sacrifício que não deve conhecer limites, do sentimento da obediência, da agudeza no comando, da consciência da sua missão, do culto da honra, da bravura, do amor pela luta, da reflexão e da alegria da responsabilidade - não pode ser um homem banal, nem se pode formar senão através de processos sólidos e selectivos de educação».
E mais adiante ainda, com toda a sua autoridade de homem competente e de acção, diz:

«A guerra não depende apenas de uma perfeita técnica militar, nem de um conhecimento completo das ciências que a subsidiam - é a acção máxima de espíritos fortes servidos por corpos robustos».

Demonstrado, como parece estar, que as qualidades exigidas para o desempenho de funções do comando em qualquer grau da hierarquia militar são as que devem existir por definição na maior escala nas pessoas que desempenham funções governativas - pois admitir o contrário seria denegar à Presidência do Conselho e da República a autoridade e a confiança de que é credora de todos nós e que constitue a pedra angular da nossa organização política e social-, parece-me também demonstrado que tais pessoas, quando oficiais do exército ou da armada, se possam considerar aptas a desempenhar as funções militares a que devem ser chamadas quando lhes competir.
E não se trata de uma promoção por distinção: trata--se simplesmente da dispensa de prestação de algumas condições que superiores interesses governativas impedem que sejam prestadas na altura devida.
No projecto apresentado à consideração da Assemblea e no estudo sobre ele feito pela Câmara Corporativa verifica-se o propósito de respeitar determinadas condições indispensáveis nas condições normais, qualquer que seja o mérito do oficial, e que suo: robustez física, permanência no posto anterior e vaga no respectivo quadro. ({Será justo que superiores interesses de Governo ou da administração pública e legítimos interesses individuais sejam sacrificados à realização de determinadas condições, aliás já manifestadas? Por minha parte respondo que não, pelo que aprovo a doutrina da proposta do lei em discussão, à qual dou o meu voto, com a redacção que lhe deu a Câmara Corporativa, modificada com algumas alterações que vão ser enviadas para a Mesa e serão devidamente apreciadas na discussão 11.1 especialidade.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Pinto da Mota: - Sr. Presidente: meia dúzia de palavras desataviadas mas francas e sinceras sobre a proposta em discussão. E para que não haja o mais pequeno equivoco sobre as minhas intenções devo dizer que não concordo com certos pontos da proposta nem tampouco inteiramente com o douto parecer da Camará Corporativa, mas quo concordo absolutamente com a intenção do Sr. Presidente do Conselho, e é para mim um dogma a seriedade e honorabilidade que ele põe em todos os seus actos. Pelo que, embora discordo num ou noutro ponto, concordo absolutamente com a parte moral e política da proposta.
O douto parecer da Gamara Corporativa começa por reconhecer a justiça da proposta e vai até reconhecer, além do objectivo político quo a proposta nitidamente representa, o interesse público da melhor preparação para o pessoal dos quadros militares; mas não distingue os graus da hierarquia militar. É neste ponto que começa a minha discordância com esse parecer.
Sr. Presidente: se concordo que para diferentes postos do exército se dispensem os tirocínios e as condições de promoção aos oficiais que exercerem funções do Governo, tal concordância não a posso dar com referência aos postos de general e do almirante. Se até ao posto de coronel, inclusivo, todos mais ou menos concordamos com essa dispensa, com relação aos postos de general o almirante o assunto é de uma capital importância, porque, em muitos casos, de no general depende o ganhar-se ou perder-se uma batalha, e da perda de ama batalha pode resultar a perda do uma noção. Os altos interesses nacionais são superiores aos altos interesses do Estado. O Estado dorme ou pode dormir o a Nação ficar; mas se a Nação dormir nada se salva, a catástrofe é completa, o que quere dizer quo há aqui uma razão, nacional que é superior às razões do Estado.
Por consequência, com relação aos postos de general e do almirante, não posso concordar com o parecer da Camará Corporativa. E admiro-mo de que, tendo sido reconhecido o outro interesso público, o da tecnicidade dos oficiais, não fosse tomado em consideração e não se tivesse exigido que para aqueles postos as leis militares se cumprissem com todo o rigor.
Há ainda outro ponto com o qual eu não posso estar de acordo com a Câmara Corporativa: é o da situação em que se colocam os oficiais que são Ministros ou Sub-Secretários de Estado perante o Sr. Presidente do Conselho.
No relatório provê-se a situação em que está colocado o Conselho do Promoções perante o seu Ministro, paru poder dar opinião sobre o mérito dêsses oficiais. Mas não se faz referência alguma ao pouco à vontade em que pode ficar o Ministro militar no Conselho de Ministros, ou, por outra, a perda de liberdade de espirito que êste Ministro pode ter, visto que de um desfavor pode resultar a perda da sua carreira, não só política como também militar. Isto ó melindroso pelas consequências que pode ter e que todos compreendem.
O parecer da Câmara Corporativa é silencioso a êste respeito, como dissemos, e não põe em relêvo a delicadeza da situação.
Não posso também concordar com algumas das opiniões de alguns dos ilustres colegas que me precederam nesta tribuna. E essa discordância começa polo Sr. Freitas Morna.
Pareceu-me deduzir das palavras do S. Ex.ª que elo não quero que os Ministros o Sub-Secretários de Estado vão fazer os cursos a que os obriga o § único do artigo 1.º, porque isso ou se torna incomportável com a sua dignidade ou com a sua idade.
Não posso concordar nem com ama cousa nem com outra.
Com a sua idade não há incompatibilidade, porque em todos os postos há limite de idade o para todos os graus há a necessidade de haver saúde o actividade intelectual.
Com o desprestigio também não posso concordar, porque se houvesse desprestigio paru ele havia também para os outros, é a igualdade perante a lei.
Concordo que se dispensem os oficiais que são Ministros e Sub-Secretários de Estado de um grande número de tirocínios, mas quando eles sejam generais ou almirantes, não.
A respeito do § único, direi que ela é que sustenta n proposta. Se tirarmos Osso § único, a proposta deixa do ser lei na sua essência.
Trata-se de uma proposta que, convertida em lei, será uma lei de excepção; e ou tenho idea de que há uma definição de lei que servo para justificar a minha asserção. E do Tomaz de Aquino. Diz êle que lei é uma ordenação da razão endereçada ao bem comum.

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Ora este § único é o que endereça ao bem público a proposta que se discute.
Porque é que se trata de uma lei do emergência? Basta ver o artigo 4.º?
Ai se consigna a hipótese de que o Presidente do Conselho é da classe civil? Porquê? Isto não está na Constituição? E se o Presidente do Conselho for militar? Nesse caso a proposta cai como cai um balão veneziano.
Nós vivemos num regime de seriedade, e a seriedade é a vitamina de maior categoria do nosso tempo. É a seriedade que pode garantir a pureza da doutrina e fazer desta uma força, e, se a não houver, então tudo cairá.
Ainda há outro melindre. Presentemente a imprensa ainda atravessa um regime de penitência. Não sei quando isso acabará, nem me compete a mim decidir. Mas todas as leis de excepção são geralmente mais violentamente criticadas quando não há liberdade de imprensa do que quando se pode dizer tudo; e, tomando em atenção este aspecto da questão, devemos recordar que pode haver melindre.
(...)Quer isto dizer que ou não compreenda a situação em que se encontra o Sr. Presidente do Conselho, ou que não aprove a proposta de lei na generalidade? Voto-a, sim, na generalidade e, com relação ao Sr. Presidente do Conselho, todos sabem que eu não podia de forma alguma duvidar da seriedade dos seus actos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas se há matéria de dogmas também há matéria para discorrer, pelo que eu não podia dispensar-me de dizer quatro palavras sobre o assunto.
Tenho dito.

Vozes:-Muita bem! Muito bem!

O Sr. Álvaro Morna:- Sr. Presidente: é para mim subida honra voltar à tribuna para responder às referências que o ilustre Deputado Dr. Pinto da Mota se dignou fazer às considerações que proferi sobre a proposta em discussão.
Pretende S. Ex.ª que não sejam dispensadas as condições de promoção para os oficiais generais do exercito ou da armada.
Não vejo, pelas razões por S. Ex.ª aduzidas, que se justifique a excepção que pretende criar e que afectaria toda a economia do diploma em discussão.
A razão de Estado que obriga, a dispensar as condições de promoção para oficial general a um membro do Governo são as mesmas que para qualquer outro oficial.
Se pelo facto da dispensa de condições de promoção se pode admitir a falta de competência de um oficial para a promoção ao posto imediato, ela tanto pode dar--se para a promoção a oficial general como para qualquer outro posto, e as suas consequências na guerra podiam ser tam desastrosas como as que S. Ex.ª aponta quando pretende exigi-las para aqueles postos.
Não posso também concordar com a situação, a que S. EX.ª se refere, do Ministro em condições de ser promovido perante o Presidente do Conselho.
Não há situações de favor ou desfavor a considerar.
Esta é uma lei de emergência que muitas vezes não haverá sequer necessidade de utilizar.
Se razões de Estado obrigam a conservar o Ministro com prejuízo das exigências das condições de promoção, o Presidente do Ministério conserva-o e são-lhe dispensadas aquelas condições.
Caso contrário, o Ministro sai para ir fazer o tirocínio.
Se o Ministro fica, a promoção, quando lhe couber, depende de todos os preceitos estabelecidos nesta lei, sem situações de favor nem desfavor.
Não tinha tenção de na generalidade me referir ao artigo 1.º da proposta, reservando-me, sobre a eliminação do § único desse artigo, ás considerações necessárias para a justificar na especialidade.
Em face, porém, do ponto de vista manifestado pelo ilustre Deputado Sr. Pinto da Mota, apresso-me a emitir a opinião de que ele constitui a negação de toda a economia da proposta, ao envolver o princípio, embora atenuado e circunscrito nos cursos militares, da realização posterior das condições de promoção.
Ora eu analisei essa modalidade em todos os seus detalhes, na hipótese das promoções demoradas e não demoradas, e pus em foco todos os inconvenientes de ordem legal, moral, disciplinar e de justiça que a tornavam inadmissível.
O Sr. Deputado Pinto da Mota diz que é o § único do artigo 1.º que sustenta a proposta. Pois eu afirmo e sustento que seria ele, a ser aprovado, quem deitaria abaixo toda a economia e espírito da proposta.
O oficial que, nos termos do § único, tivesse de ir frequentar um curso depois de sair do Governo, tendo já ascendido ao posto para o qual esse curso era exigido, poderia não estar em pé de igualdade sob o ponto de vista físico e intelectual com os camaradas em competência na frequência desse curso.
Pode até dar-se o caso de grave inconveniente disciplinar pela diferença de hierarquia militar entre o oficial que deixou de ser Ministro e os seus camaradas no mesmo curso.

O Sr. Melo Machado: -Mas que sucedia até agora?

O Orador: - Sucedia até agora que os oficiais prestavam essas provas na altura que lhes competia. Mas ponha V. Ex.ª o caso de um coronel a frequentar um curso com um capitão e diga-me, em consciência, se acha isso disciplinar e se considera o coronel nas mesmas condições dos oficiais com quem é posto em competência.

O Sr. Melo Machado: - O que não percebo é para que é preciso mudar o que se fazia.

O Orador: - Muda-se porque assim se torna necessário em face das razões de ordem política que ditam a necessidade desta lei.
Repito, Sr. Presidente, o § único do artigo 1.º é a negação do principio do que informa esta proposta.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente:-Como não está mais ninguem inscrito, considero encerrado o debate na generalidade.
Vai passar-se à discussão na especialidade.
Como já disse a V. Ex.ªs, está na Mesa uma proposta, assinada pelos Srs. Deputados Manuel Rodrigues e Alvaro Morna, no sentido de ser adoptado para base da discussão o texto sugerido no parecer da Câmara Corporativa.
Mas, além disso, esta proposta faz várias alterações ao texto sugerido pela Câmara Corporativa. Assim, quanto no artigo 1.º, propõe a eliminação do § único; quanto ao artigo 3.º, propõe que no seu n.º 1.º, depois da palavra «fundamentado», se intercale no «qual indicará, se for caso disso, a classificação».
Quanto ao n.º 3.º deste mesmo artigo, propõe a sua eliminação.
Propõe ainda que ao artigo 3.º se aditem os seguintes parágrafos:

«(...)1.º No caso de o critério da escolha andar associado ao da antiguidade, organizar-se-á a escala ou lista dos (...)

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(...) oficiais em condições de serem escolhidos, tendo-se em conta a classificação do Conselho de Promoções e a do Presidente do Conselho.
§ 2.º No caso de, organizada a lista, se aplicar só o critério da escolha, acrescentar-se-á à estabelecida pelo Conselho de Promoções o nome do Ministro ou Subsecretário de Estado que o Presidente do Conselho declarou em condições de ser escolhido.
§ 3.º Sobre a lista assim organizada decidirá o Conselho de Ministros, sem a presença do Ministro interessado, se por lei couber ao Conselho de Ministros a competência para a promoção, e o Presidente do Conselho, se algum dos incluídos na lista for Ministro da Guerra ou da Marinha».

Além disso propõe-se que se mantenha o artigo 4.º do texto da Câmara Corporativa.
Está, pois, em discussão, na especialidade, o artigo 1.º do texto sugerido pela Câmara Corporativa, a respeito do qual se propõe, como já disse, a eliminação do § único.

O Sr. Álvaro Morna:- Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:-Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Álvaro Morna:-Sr. Presidente: à maioria das considerações que respeitam ao artigo 1.º e sobre a proposta de alteração que tive a honra de assinar e enviar para a Mesa, eliminando o § único, tive já ocasião de me referir em resposta às considerações feitas pelo ilustre Deputado Pinto da Mota. Resta-me fazer referência, à diferença que existe no corpo do artigo 1.º, entre a doutrina da Câmara Corporativa, que perfilhamos, e a proposta do Governo. Pelo corpo desse artigo não se estabelece distinção entre os oficiais que exerçam funções de Ministro ou de Sub-Secretários de Estado da Marinha ou da Guerra e os de outras pastas.
A proposta do Governo estabelecia que os Ministros da Guerra ou da Marinha ou Sub-Secretários destas pastas só poderiam ser promovidos depois de terminado este cargo, retrotraindo-se a data da promoção. O princípio não é de admitir, pela desigualdade de condições que estabelece, e a Câmara Corporativa coloca-os em pé de igualdade. É o que parece justo, evitando para mais o retrotraimento da antiguidade, contrária, como tive ocasião de dizer, a todos os princípios consignados nas leis militares.
Surge neste artigo a intervenção do Presidente do Conselho, dando informações sobre os serviços prestados pelos oficiais nas funções de governo e qualidades reveladas que possam interessar à promoção.
Justifica-se inteiramente.
Como referi já, fazem parte do processo de promoção as informações periódicas que os oficiais recebem dos seus chefes hierárquicos. Essas informações não respeitam apenas à técnica ou a assuntos de ordem militar; referem-se também a muitas outras qualidades que o oficial deve revelar para se considerar em condições de ocupar o posto a que vai ascender - como dotes de inteligência, lealdade, personalidade, coragem moral, honestidade e outras qualidades.
se torna imperativamente necessária a qualidade de militar para o informador. Pode muito bem informar o Presidente do Conselho como chefe hierárquico do Ministro ou Sub-Secretário de Estado. Relativamente ao § único, repito, considero essencial a sua eliminação desta proposta de lei, para que não seja afectada fundamentalmente toda a economia da mesma. Ela baseia-se em razões de Estado que impedem o oficial que exerce as funções de Ministro de preencher disposições legais respeitantes a tirocínios e preparação para a promoção. Se assim não fosse, além de se prejudicar a economia da proposta, criavam-se situações de ordem moral e de ordem militar insusceptíveis de solução. Tenho dito.

O Sr. Pinto da Mota: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, para corroborar o que disse há pouco.
O artigo 1.º e o seu § único são indispensáveis à economia e à moralidade da lei.

O Sr. Presidente: - O que se propõe é a eliminação do parágrafo. Não está em causa o corpo do artigo.

O Orador: - Eu refiro-me ao parágrafo. É ele a disposição que justifica a lei. Fora disso tratar-se-ia de um caso de excepção com sobrescrito, não sobrescrito futuro, mas sobrescrito pretérito, porque, a não ser o Sr. Sub-Secretário do Estado da Guerra e o. Sr. Ministro da Marinha, não existem outros oficiais nesta emergência.
Esse é que é o caso para o qual se pede a autorização parlamentar. Os outros casos futuros serão casos de emergência futura. O que é preciso é que se mostre tecnicidade e competência.
Não é por se ter sido Ministro que se fica sabendo. A circunstância de ter sido Ministro não dá ciência a ninguém.
Para ser mestre é preciso usar: «usa e serás mestres; para ser bom cavaleiro é preciso montar todos os dias; para ser bom esgrimista é preciso fazer todos os dias esgrima. Quer dizer: usa e serás mestre.
Não é por se ter sido Ministro que se será bom general; torna-se necessário estudar, frequentar os cursos e mostrar nos exames e na frequência desses cursos que se tem competência.
Só assim a lei é endereçada ao bem comum. O contrário é uma excepção.
Tenho dito.

O Sr. Álvaro Morna: - (...)Por esse critério V. Ex.ª não pode votar a proposta!

O Sr. Pinto da Mota: - Porquê?

O Sr. Álvaro Morna: - Porque V. Ex.ª exige condições contrárias aos princípios e espírito da proposta e que se tornam inexequíveis se V. Ex.ª quiser dar realização a esses mesmos princípios e espirito que a informam.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação, em primeiro lugar, de harmonia com o Regimento, da eliminação do § único do artigo 1.º do texto do parecer da Câmara Corporativa.
Feita a votação, foi aprovada a eliminarão.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se agora o texto do artigo 1.º
Feita a votação, foi aprovado o artigo 1."

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 2.º

O Sr. Salvação Barreto: - Sr. Presidente: o artigo 2.º do parecer da Câmara Corporativa visa a determinar como se há-de efectuar a promoção por antiguidade de um oficial do exército ou da armada que desempenhe o cargo de Ministro ou de Sub-Secretário de Estado e diz que essa promoção se efectuará «pela escala relativa aos oficiais do seu posto e classe». Nada mais acrescenta.
Isto significa que uma vez aberta uma vaga no quadro dos oficiais do posto imediato só será promovido (...)

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o oficial que desempenha o cargo de Ministro ou de Sub-Secretário de Estado se ele for o mais antigo da escala. E neste caso estaria bem.
Uma vez que o artigo 1.º do parecer o dispensa das condições de promoção, o oficial que exerce algum daqueles cargos será promovido, repito, se for o mais antigo da escala.
Pode, porém, prever-se caso diferente: o de, não sendo esse oficial o mais antigo na escala, os que o precedem não possuírem, no entanto, as condições de promoção a que por lei são obrigados, e esse facto resultar de circunstâncias estranhas à vontade desses mesmos oficiais.
Pela disposição que estabelece a dispensa de condições de promoção, o oficial que está nalgum daqueles cargos governativos é promovido, e nestas condições não se respeita o principio da antiguidade, que este artigo pretende regular.
Não deve ser esse o espírito da lei, e de facto não é. O que se pretende é que a dispensa das condições de promoção não resulte em prejuízo dos oficiais que o precedem na escala relativa, ao mesmo posto e classe, pois de promoção por antiguidade se trata. Assim, parece que a promoção de oficiais que desempenhem alguns dos cargos de Governo mencionados na proposta se realize na altura em que lhe competir, sempre que, para tal autorizados, os oficiais que o precedem na escala tenham completado as condições de promoção a que são obrigados por lei.
Nestas condições julgo que deveria alterar-se o artigo 2.º a partir da palavra «competir», eliminando as restantes e acrescentando-se o seguinte:

«pela sua situação, depois de ter sido permitido aos oficiais do seu posto e classe que o precedem na escala satisfazer as condições legais de acesso ao posto imediato e de estes as terem satisfeito ou delas terem desistido».

Isso consta da proposta, que passo às mãos de V. Ex.ª, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa uma proposta de alteração assinada pelos Srs. Deputados Salvação Barreto, Santos Pedroso, Cancela de Abreu, Cortês Lobão e Pinto da Mota no sentido de o artigo 2.º ficar assim redigido:

«Artigo 2.º A promoção por antiguidade do oficial que exercer o cargo de Ministro ou de Sub-Secretário de Estado efectuar-se-á na altura em que lhe competir pela sua situação, depois de ter sido permitido aos oficiais do seu posto e classe que o precedam na escala satisfazer os condições legais de acesso ao posto imediato e de estes as terem satisfeito ou delas terem desistido.

O Sr. Presidente : - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Seguidamente foi aprovada esta proposta de emenda.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 3.º

Quanto a este artigo, já informei V. Ex.ª de que está na Mesa uma proposta no sentido de, quanto ao n.º 1.º, só intercalar, a seguir às palavras «despacho fundamentado», a seguinte expressão: «no qual indicará, se for caso disso, a classificação.
Está, em segundo lugar, uma proposta no sentido de se eliminar o n.º 3.º e de se aditarem três parágrafos.

Estão em discussão.

O Sr. Álvaro Morna :- Sr. Presidente: o artigo 2.º, que acaba do ser aprovado, define o processo da promoção por antiguidade.
Este artigo 3.º e seus n.º 1.º, 2.º e 3.º que V. Ex.ª pôs em discussão traduzem toda a mecânica da promoção por escolha segundo o parecer da Câmara Corporativa.
Está neste artigo, em grande parte, a razão da, proposta que tive a honra, de mandar para a Mesa, assinada pelo ilustre Deputado Sr. Dr. Manuel Rodrigues e por mim, no sentido de fazer incidir a discussão sobre a proposta de lei da Câmara Corporativa de preferência à rio Governo - não porque eu perfilhe inteiramente neste ponto o parecer da digna Câmara Corporativa, mas porque ela é mais precisa na mecânica a estabelecer neste capítulo, tam importante, do diploma que estamos discutindo.
A minha divergência da doutrina da Câmara Corporativa consubstancia-se na eliminação do n.º 3.º deste artigo e no aditamento dos três parágrafos com tantos da proposta que tive na honra de mandar para a Mesa, cuja justificação me traz de novo à tribuna.
A escolha pode ser pura e simples, como a adoptada na armada e na promoção dos oficiais generais do exército, ou estar associada ao critério da antiguidade, como se pratica nos restantes postos do exército.
Em qualquer hipótese funciona sempre um conselho de promoções, que tem por função, em face do processo respeitante a cada oficial, em certos casos, formar a lista dos que estão em condições de ser escolhidos o caso dos oficiais generais do exército e da armada e dos capitais de mar e guerra das classes da armada em cujos quadros não existe o posto de almirante ; noutros organiza a lista dos oficiais em condições de ser escolhidos, com gradação ou ordenação, segundo o mérito relativo de cada um deles é o caso dos capitãis-tenentes de todos as classes da armada escolhidos em lista tríplice-; noutros ainda, e é o que se dá no exército em todos os postos, com excepção do de general, classificando-se os oficiais em três listas, uma de muito aptos, outra de aptos e outra de inaptos.
Os inaptos são excluídos de promoção.
E a escolha é feita entre os muito aptos, em primeiro lugar, e a seguir entre os aptos, obedecendo sempre à antiguidade dentro de coda uma das classificações.
Esta é a mecânica das promoções por escolha no exército e na armada.
Funciona sempre um Conselho de Promoções.
Compreende-se que um concelho não deva pronunciar-se sobre a escolha dos Ministros ou Sub-Secretários de Estado.
Sem que se possa pôr em dúvida a sua imparcialidade, todos temos de reconhecer o melindre que revestiria a posição de tal organismo a ter que pronunciar-se sobre um oficial no exercício de funções de governo.
Em certos casos, tratando-se de Ministro ou Sub-Secretário de Estado da Guerra ou da Marinha, seria mesmo antidisciplinar.
Há que fazer intervir, portanto, em paralelo com o Conselho de Promoções, outro organismo ou entidade que possa pronunciar-se sobre a escolha dos oficiais no desempenho dos cargos de Ministro ou Subsecretário de Estado.
Essa entidade é naturalmente o Presidente do Conselho.
É a doutrina dos n.º 1.º e 2.º do artigo 3.º, que dão ao Presidente do Conselho essa faculdade e fazem excluir das decisões dos conselhos de promoções os nomes dos oficiais no exercício das funções de Ministro ou Sub-Secretário de Estado.

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Ao n.º 1.º deste artigo foi proposto o aditamento de se indicar, quando for caso disso, a classificação, e assim o texto proposto 11 apreciarão da Câmara apresenta-se nos seguintes termos:
«1.º A promoção só poderá ler lugar se o Presidente do Conselho, quando assim o entender e julgar oportuno, declarar em despacho fundamentado, no qual indicará, se for caso disso, a classificação, que considera o oficial em condições de ser escolhido;
2.º As decisões dos Conselhos de Promoções são tomadas sem considerar os nomes dos oficiais de que trata a presente lei».
Sr. Presidente: propus a eliminação do n.º 3.º deste artigo, que diz:
«A promoção AO se efectuará se a «acolha, fui ta uns termos da lei geral, recair em oficial mais moderno», pelos três parágrafos de aditamento que apresentei, nestes termos:

«§ 1.º No caso de o critério de escolha andar associado com o da antiguidade, organizar-se-á a escala ou lista dos oficiais em condições de serem escolhidos, tendo-se em conta a classificação do Conselho de Promoções e do Presidente do Conselho.
§ 2.º No caso de, organizada a lista, se aplicar só o critério da escolha, acrescentar-se-á à estabelecida pelo Conselho de Promoções o nónio do Ministro ou Sub-Secretário de (Betado que o Presidente do Conselho declare em condições de ser escolhido.
§ 3.º) Sôbre a lista assim organizada decidirá o Conselho de Ministros, sem a presença do Ministro interessado, se por lei couber ao Conselho d« Ministros a competência para a promoção; e o Presidente do Conselho se algum, dos incluídos na lista fôr Ministro da Guerra ou da Marinha».

Justificam-se inteiramente tanto a eliminação como o aditamento propostos.
A Câmara Corporativa diz, e muito bem, que a apreciação dos candidatos a escolha é feita ora conjunto para se chegar n uma classificação e que, se se não pode atribuir àqueles conselhos a classificação de um Ministro ou Sub-Secretário de Estado, não pode tampouco transferir-se para o Presidente do Conselho a função do apreciar os restantes candidatos, sendo necessário que ingressem na mesma escala de acesso indivíduos classificados por forma e entidades diferentes.
É absolutamente certo.
Simplesmente a fórmula proposta pela digna Câmara Corporativa neste n.º 3.º do artigo 3.º é que não me parece a mais justa nem a mais conveniente.
Em primeiro lugar, dá-se por ela um verdadeiro arrastamento na promoção do Ministro ou Sub-Secretário do Estado, fazendo-o promover quando a escolha recair em oficial mais moderno do que ele.
A promoção do oficial mais moderno arrasta a do Ministro ou Sub-Secretário de Estado.
E situação desairosa e, pelo monos, aparentemente do favor, que não é de admitir.
Depois é injusta, porque na dualidade de condições que estabelece entro oficiais a escolher mais modernos e mais antigos do que o Ministro ou Sub-Secretário de Estado não existe contrapartida para a hipótese de os oficiais a escolher serem mais antigos.
Quem nos diz que se o oficial que está exercendo a função de governo estivesse ao serviço da arma, e portanto em condições de sei1 considerado pelo Conselho do Promoções, não figuraria na lista ou classificação feitas pelo Conselho em substituição de qualquer dos mais antigos e que não seria ôle o escolhido?
E justa a fórmula da Câmara Corporativa excluindo-o por esto modo da possibilidade de ser promovido?
Parece que não. Mais justa e mais lógica e mais precisa é a doutrina estabelecida nos três parágrafos de aditamento em que só prevêem, nos §§ 1.º e 2.º, os dois critérios de escolha - a escolha associada a antiguidade no) § 1.º e a escolha pura e simples no § 2.º - num e noutro incluídos na mesma lista e colocados em paralelo os oficiais classificados pelo Conselho de Promoções e o Ministro ou Sub-Secretário de Estado indicado pelo Presidente do Conselho.
O § 3.º constitui simples modus faciendi para a hipótese da escolha competir ao Conselho de Ministros, que e o caso da promoção dos oficiais generais do exército e da armada.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Ninguém mais quero usar da palavra?

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais ninguém quero fazer uso da palavra, vai votar-se em primeiro lugar a eliminação do n.º 3 º do artigo 3.º

Submetida à votação, foi aprovada a eliminação.

O Sr. Presidente:-Vai agora votar-se o texto do artigo, com os n.ºs 1.º e 2.º, fazendo-se no n.º 1.º a emenda que já foi indicada.

Submetido à votação o artigo, com os n.º 1.º e 2.º e a emenda indicada, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai agora votar-se o aditamento dos três parágrafos que estilo indicados na proposta que está na Mesa.

Submetido à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 4.º Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se, visto que ninguém pede a palavra.

Consultada a Assembleia, foi aprovado o artigo 4.º

O Sr. Presidente: - Vai agora votar-se a ratificação do decreto-lei n.º 31:114, que fora posto à discussão conjuntamente com a proposta de lei que acaba de ser aprovada, mas ao qual nenhum dos Srs. Deputados se referiu.

Consultada a Assembleia, foi aprovada a ratificação pura e simples do referido decreto-lei.

O Sr. Presidente: - A ordem do dia da sessão de amanhã será constituída pela apreciação e votação do seguinte:

1.º Proposta de alteração ao Regimento.
2.º Contas Gerais do Justado de 1930.
3.º Contas Gerais da Junta do Crédito Público de 1939.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 8 minutos.

O REDACTOR - Carlos Cília.

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Proposta relativa á proposta de lei n.º 130

1.º
Propomos que seja adoptado paru base da discussão o texto sugerido no parecer na Câmara Corporativa.

2.º
Propomos que seja eliminado o § único do artigo 1.º do projecto da Câmara Corporativa, mantendo-se o corpo desse artigo.

3.º
Propomos que se mantenha o artigo 3.º
a) Que no n.º 1.º deste artigo, depois da palavra «fundamentado», se intercale: «no qual indicará, se for caso disso, a classificação»;
b) Que se elimine o n.º 3.º do mesmo artigo.

4.º
Que se aditem ao artigo 3.º os seguintes parágrafos:

§ 1.º No caso de o critério da escolha andar associado ao da antiguidade, organizar-se-á a escala ou lista dos oficiais em condições de serem escolhidos, tendo-se em couta a classificação do Conselho de Promoções e a do Presidente do Conselho.
§ 2.º No caso de, organizada a lista, se aplicar só o critério da escolha, acrescentar-se-á à estabelecida pelo Conselho de Promoções o nome do Ministro ou Sub-Secretário de Estado que o Presidente do Conselho declarou em condições de ser escolhido.
§ 3.º Sobre a lista assim organizada decidirá o Conselho de Ministros, sem a presença do Ministro interessado, se por lei couber ao Conselho de Ministros a competência para a promoção, e o Presidente do Conselho, se algum dos incluídos na lista for Ministro da Guerra ou da Marinha.

5.º

Que se mantenha o artigo 4.º da Câmara Corporativa.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 20 de Fevereiro de 1941. - Os Deputados: Manuel Rodrigues Júnior - Álvaro de Freitas Morna.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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