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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

N.º 111 ANO DE 1941 15 DE DEZEMBRO

II LEGISLATURA

SESSÃO N.º 106 DA ASSEMBLEA NACIONAL

13 de Dezembro

Presidente o Exmo. Sr. José Alberto dos Reis

Secretários os Exmos. Srs.

Carlos Moura de Carvalho
Gastão Carlos de Deus Figueira

SUMÁRIO:- O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões da última sessão.
O Sr. Deputado Pinto da Mota ocupou-se da portaria que considera requintadas as quantidades de milho existentes em vários concelhos do norte.
O Sr. Deputado Antunes Guimarãis tratou das contribuições e taxas que incidem sôbre moinhos e azenhas e do abandono de culturas por parte dos agricultores que procuram minérios.
O Sr. Deputado Cancela de Abreu apresentou um pedido de informações sôbre a protecção do Estado às famílias numerosas e exortou o País a aceitar com serenidade as restrições que possam vir a ser decretadas.
O Sr. Deputado Calheiros Veloso ocupou-se de vários diplomas que dizem respeito ao ensino superior e técnico.
O Sr. Presidente designou os Srs. Deputados que hão-de constituir as sessões de estudo da proposta de lei sôbre lucros de guerra e do aviso prévio do Sr. Deputado Melo Machado sôbre hidráulica agrícola.

Ordem do dia. - Discutiu-se a proposta de lei que autoriza o Governo a emitir um empréstimo interno consolidado de 3 1/2 por cento, no montante de 500:000 contos, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Madeira Pinto, Botto de Carvalho e Camarate de Campos.
Procedeu-se depois à votação, sendo a proposta aprovada.
Foi aprovado um voto de confiança à Comissão do Redacção para redigir os textos definitivos das propostas de lei de autorização de receitas e despesas para 1942 e do empréstimo interno consolidado.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 52 minutos.

Ultima redacção. - Tantos aprovados pela Comissão de redacção das propostas de lei n.º 165 (autorização de receitas e despesas para o ano de 1942) e n.º 166 (autorização ao Govêrno para emitir um novo empréstimo consolidado de 3 1/2 por cento).

Srs. Deputados presentes à chamada, 61.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão, 1.
Srs. Deputados que faltaram à chamada, 18.

Srs. Deputados que responderam à chamada:

Abel Varzim da Cunha e Silva.
Alberto Cruz.
Alberto Eduardo Valado Navarro.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre de Quental Calheiros Veloso.
Alfredo Delesque dos Santos Sintra.
Álvaro Salvação Carreto.
António de Almeida.
António de Almeida Pinto da Mota.
António Augusto Aires.
António Cortês Lobão.
António Rodrigues dos Santos Pedroso.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Águedo da Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Artur Ribeiro Lopes.
Augusto Cancela de Abreu.
Augusto Faustino dos Santos Crespo.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Moura de Carvalho.
D. Domitila Hormizimda Miranda de Carvalho.
Fernando Tavares de Carvalho.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Guilhermino Alves Nunes.
Henrique Linhares de Lima.
João Antunes Guimarãis.

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João Botto de Carvalho.
João Luiz Augusto das Neves.
João Maria Teles de Sampaio Rio.
João Mendes da Costa Amaral.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Rodrigues de Almeida.
Joaquim Saldanha.
José Alberto dos Reis.
José Alçada Guimarãis.
José Dias de Araújo Correia.
José Maria Dias Ferrão.
José Pereira dos Santos Cabral.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Júlio Alberto de Sousa Schiappa de Azevedo.
Luiz Cincinato Cabral da Costa.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Figueira.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Pestana dos Reis.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama Van-Zeller.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Sílvio Duarte de Belfort Cerqueira.
Vasco Borges.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Jorge Viterbo Ferreira.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho.
Álvaro de Freitas Morna.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Angelo César Machado.
António Carlos Borges.
António Himtze Ribeiro.
António Maria Pinheiro Torres.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto Pedrosa Pires de Lima.
João Garcia Nunes Mexia.
João Garcia Pereira.
Joaquim de Moura Relvas.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Maria Braga da Cruz.
Juvenal Henriques de Araújo.
Luiz José de Pina Guimarãis.
Sebastião Garcia Ramires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

O Sr. Presidente:- Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 52 minutos.

Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 51 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em discussão o Diário da última sessão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como não há reclamações sobre o Diário, considero-o aprovado.
Tem a palavra para antes da ordem do dia o Sr. Deputado Pinto da Mota.

O Sr. Pinto da Mota:- Sr. Presidente: na distribuição do meio dia recebi o Diário do Govêrno n.º 289, que inclue a portaria n.º 9:958, do Ministério da Economia. Peço licença a V. Ex.ª e à Câmara para ler a portaria:

«Portaria n.º 9:958. - Ao abrigo do disposto no n.º 2.º do artigo 1.º do decreto-lei n.º 31:564, de 10 de Outubro de 1941: manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Economia, o seguinte:

1.º Consideram-se requisitadas as quantidades de milho existentes na posse dos produtores dos concelhos de Caminha, Vila Nova da Cerveira, Valença do Minho, Monção, Melgaço, Arcos de Valdevez, Ponte da Barca, Terras do Bouro, Montalegre e Chaves.
2.º O milho requisitado pela forma estabelecida AO número anterior só pode ser vendido à Federação Nacional dos Produtores de Trigo (F. N. P. T.) e será pago por este organismo ao preço fixado oficialmente.
3.º A F. N. P. T. poderá também solicitar a entrega do quo for necessário para o abastecimento público, ao preço acima indicado.
4.º A F. N. P. T. providenciará especialmente quanto ao abastecimento nos concelhos referidos nesta portaria.

Ministério da Economia, 12 de Dezembro de 1941.- O Ministro da Economia, Rafael da Silva Neves Duque.

Esta portaria fundamenta-se juridicamente no n.º 2.º do artigo 1.º do decreto de 10 de Outubro último, cujo teor é o seguinte:

2.º A facultar, em caso de reconhecida necessidade, a requisição das mercadorias que forem indispensáveis .ao abastecimento das actividades produtoras e transformadoras e do consumo público».

Tem esta questão, Sr. Presidente, dois aspectos, mas eu vou apenas encarar uma. Tem o aspecto político, e sêbre êsse aspecto nada digo, porque isso pertence ao sector dogmático, e, porque assim seja, calo-me e curvo-me reverente; e tem também o aspecto administrativo, e nesse ponto não posso calar-me, e não posso porquê sou obrigado, como membro da Assemblea Nacional e como minhoto, a colaborar com o Sr. Ministro na resolução deste problema.
Sr. Presidente, a Câmara sabe e V. Ex.ª também que toda a gente procura fazer o que se chama em linguagem difícil o encaixe desejado, ou seja na linguagem dá todos os dias o govêrno da vida. Quere dizer, toda a gente procura realizar valores com que possa comprar mercadorias e fazer reservas para pagamentos futuros.
Para o lar minhoto, o milho é verdadeiramente a Casa da Moeda. O lavrador precisa de dinheiro? Manda malhar dois ou três alqueires ou dois ou três carros de milho, conforme as suas possibilidades, e manda-os para o mercado, onde é comprado pelos particulares, ou pelos armazenistas; e assim faz dinheiro.
De futuro nada disto se passará assim. Fica tudo para a Federação Nacional dos Produtores de Trigo. Não mais há mercados de milho, não mais há feiras de milho, e apenas fica a Federação Nacional dos Produtores de Trigo, com os encargos e as benesses do abastecimento público.
Desta maneira, os comerciantes, que pagam as suas contribuições, que têm as suas casas abertas, que têm os seus empregados, outra cousa não têm que fazer, senão depenar as asas que Mercúrio pôs nos pés e os particulares dispensarem-se de comprar ou comprar a crédito.
Nestas condições, desde já digo ao Sr. Ministro da Economia que a zona da fronteira passará a ser um verdadeiro Cafarnaum. Ninguém se vai entender: tudo será confusão em todo o sentido.

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O Sr. Alberto Cruz: - Quero esclarecer V. Ex.ª que ouvi dizer ao Sr. Ministro da Economia que ia regulamentar essa portaria.

O Orador: - Muito obrigado a V. Ex.ª, mas isso não tira nem põe ao que estou dizendo.

O Sr. Presidente:- Peço a V. Ex.ª a fineza de não estabelecerem diálogo. V. Ex.ª, Sr. Deputado Pinto da Mota, tem ainda cinco minutos para usar da palavra.

O Orador: - Não é grande fartura, mas... em todo o caso!... Continuemos.
Sr. Presidente: não posso nem quero deixar de respeitar as intenções dos outros, sobretudo quando elas são boas. Julgo que a portaria do Sr. Ministro da Economia visa a acabar com o contrabando.
Embora não queira ser desmancha prazeres, que é desagradável, vejo-me obrigado a dizer a S. Ex.ª que por esta forma não consegue acabar com o contrabando.
O contrabando não se faz no País apenas na zona da fronteira. Faz-se em todo o País. A zona da fronteira começa em Caminha e termina no Algarve, existindo ainda a fronteira marítima. Por esta última é que se faz o maior contrabando, e, se não fosse essa circunstancia, não estaríamos talvez nesta situação, não só em relação à moeda como a outras cousas.
Por estas razões, a providência que o Sr. Ministro tomou outra cousa não consegue fazer senão a deslocação do milho da zona da fronteira para outros pontos do País onde asse contrabando se possa levar a efeito por um trajecto mais longo.
O que estimula o contrabando é o interesse, e êsse interesse provém de irem buscar a terras de Espanha quantias que entre nós não conseguiam.
Sr. Presidente: em minha opinião, a maneira de combater o contrabando é estimular e reforçar a guarda fiscal, é a acção dos fiscais das câmaras, é dotar a fiscalização marítima com as necessárias lanchas-gasolinas, é estabelecer as percentagens de 50 por cento tanto para os apreensores como para os denunciantes, é tornar a questão mais policial que judicial. Estas medidas é que devem ser adoptadas. Não é fazer a moral filosófica.
Temos de prejudicar o jogo do adversário, combatendo com as mesmas armas; ao jogo do interesse temos de opor o interesse.
Temos de ir para a moral do interesse, usando os mesmos meios de que os outros se servem.
Para combater o contrabando devem ainda retirar-se à C. P., por exemplo, os direitos de couto de que ela até aqui tem usado exuberantemente. É preciso que a polícia de segurança e a das cornaras possa entrar nas gares e nos armazéns, fiscalizando-os à sua vontade, porque, à sombra dessa imunidade, muitos empregados da C. P. são contrabandistas.
A Federação Nacional dos Produtores de Trigo é uma instituição respeitabilíssima, à qual não tenho senão de render as minhas homenagens de consideração, mas a verdade é que ela não está bem vista no Minho, porque quando começou êste regime dos trigos a Federação preocupou-se demasiadamente com o trigo desta região, como se ele fôsse em quantidade tam grande que pudesse ter importância. Ninguém até então se tinha interessado por isso, visto tratar-se duma cultura meramente forraginosa; e foram tantos os embaraços e dificuldades que a Federação levantou a êste respeito que hoje o trigo do Minho já nem sequer é uma cultura forraginosa; desapareceu quási.
Veja V. Ex.ª o que irá acontecer na fronteira, lá para os lados da minha terra, quando se tiver conhecimento desta portaria.

O Sr. Presidente:- Agora é que acabam de decorrer os dez minutos do que V. Ex.ª dispunha para fazer as suas considerações.

O Orador:- Vou terminar.

Desejo afirmar que daqui não me sirvo de qualquer processo de ironia, nem por via de subtileza, com relação às intenções dos Srs. Ministros. O respeito que tenho por S. Ex.ª é total, e tanto que devo dizer que, não obstante o que acabo de declarar, quando for para a minha terra usarei de toda a minha boa vontade pessoal e funcional para ajudar a resolução deste grave e complicado assunto.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Antunes Guimarãis: - Sr. Presidente: aludi na sessão de 6 do corrente à circunstância de os moinhos e azenhas estarem simultaneamente registados nas matrizes prediais urbanas, conservatórias de registo predial, Direcção Geral dos Serviços Hidráulicos e Eléctricos, na Inspecção Geral das Indústrias e Comércio Agrícolas, mais conhecida por Igica, e, ultimamente, na Comissão Reguladora das Moagens de Ramas.
Mostrei os embaraçou, incómodos e despesas que isso representa, tanto para os proprietários daqueles modestos prédios, como para os moleiros que ali exercem seu humilde mester.
Apelei para o Governo no sentido de serem imediatamente suspensas todas as formalidades agora exigidas, umas da hidráulica e outras da Comissão Reguladora das Moagens de Ramas, e de se ordenar aos diferentes organismos interessados no conhecimento de quaisquer indicações relativas aquelas insignificantes oficinas do trabalho rural que procurem obtê-las das repartições onde já estejam arquivadas.
Aludi naquela minha exposição a notícia que me chegara de pessoa muito categorizada no que respeita ao magno problema do pão de se projectar nova e pesada tributação sobre a farinha (nada menos que $01(1) por quilograma).
Ora, sôbre este assunto, acabo de receber um atencioso ofício do presidente da Comissão Reguladora das Moagens de Ramas, que duplamente estimei: por verificar que naquela repartição o Diário das Sessões é lido e estudado; e pela informação ali dada de que a taxa a que eu aludira continua a ser a estabelecida nos decretos n.ºs 36:695 e 31:452, isto é, um centavo por quilograma de farinha de milho. Para a farinha de centeio a taxa é de mais meio centavo e para a de trigo está fixada em 2 centavos.
Também naquele ofício sou informado de que, embora o prazo de entrada de requerimentos para inscrição do moinhos e azenhas naquela Comissão Reguladora tivesse expirado em 10 de Setembro, continuam a ser ali recebidos os documentos enumerados no seu edital de 11 do Agosto, sendo os industriais e proprietários informados sobre as dúvidas que tiverem.
Isto já é alguma cousa; mas tendo eu averiguado que entre as pessoas ligadas a moinhos e azenhas, como proprietários ou como moleiros, há certa indecisão em deliberar se apenas os segundos estão na alçada daqueles decretos, por serem industriais, ou se também são abrangidos os proprietários, embora nada tenham com a respectiva laboração, devia o caso ser esclarecido.
É que, nos modelos de requerimentos e declarações, fala-se em proprietários.
Também lavra certa confusão por se dizer que são abrangidos, além dos moinhos que fabriquem farinhas

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para consumo público, os que as produzam para as casas agrícolas.
É que nas zonas rurais as casas são na quási totalidade agrícolas, e, assim, surge a impressão de os moinhos que laboram para os respectivos donos ou seus arrendatários, os quais, por isso, deveriam ser exceptuados, uma vez que a respectiva farinha não se destine a trocas ou à venda ao público, serem também obrigados a pagar a referida taxa.
Outra fonte de confusões provém da exigência de declaração sôbre a moenda média anual do milho e centeio, porque os interessados hesitam entre declararem a capacidade de produção de cada moinho (do que resultaria pagarem um máximo superior à laboração efectiva), ou darem indicações ao acaso, por não terem eccrita e ser extremamente variável de ano para ano a respectiva, produção.
Nos editais exige-se o seguinte:
Requerimento em papel selado. Calcule-se o que isto representa, em incómodos e despesas, para analfabetos geralmente residentes a grande distância da sede do concelho.
E nesse requerimento deve indicar-se: nome o a firma proprietária da moagem; localização da instalação, número de casais de mós; se está licenciada na Igica ou se foi requerido o seu licenciamento.
Ora todos estes elementos já constam dos arquivos da Hidráulica, ou da matriz, ou da Igica.
Seria, pois, preferível, por razoável e menos tormentoso para as eternas vítimas do todos os inquéritos e questionários passados, presentes e (se o Govêrno não tomar (providências) até futuros, que os organismos interessados encarregassem um funcionário de colhêr nos arquivos de outras repartições todos aqueles elementos e, se assim entenderem, ainda outros que dêles constem.
Exige-se a remessa do conhecimento da contribuição industrial referente a 1941. Mas então os contribuintes hão-de ficar sem aquele tam importante documento?
E se houver extravio no correio? Uma certidão da secretaria de finanças? De quantas despesas e incómodos ficariam dispensados os pobres moleiros se a Comissão Reguladora, das Moagens de Ramas e outros organismos do Estado ou corporativos solicitassem do Ministério das Finanças, ou de outros, os informes fiscais e outras indicações que entendessem dever arquivar!
Todos reconhecemos que a Nação precisa da sua burocracia, a qual na precisa dose é benéfica, mas exagerada é profundamente deletéria, porque estiola iniciativas e perturba sèriameute o trabalho.
Entende o Govêrno que os moinhos e azenhas, apesar da sua insignificância, carecem de figurar em cinco arquivos?
Pois, se isso lhe é indispensável, que o faça, mas sem molestar quem precisa de trabalhar para viver, e para bem da Nação.
Que as repartições se entendam e proporcionem umas às outras todos os elementos.
E importa também que os representantes dos organismos públicos, quando cheguem (geralmente de automóvel), junto dêsses modestos trabalhadores, na sua maioria rotos e com fisionomias a traduzir alimentação deficiente, que apareçam como protectores, que pacientemente colham as informações de que carecem e evitem ameaças de selagens, encerramentos, multas e cousas equivalentes, que deixam, sempre muito má impressão.
E porque não são dispensados os moinhos e azenhas de pouca produção, mesmo que trabalhem à maquia ou por trocas, do pagamento da taxa com que agora pretendem onerá-los?
É que o encargo em dinheiro, há as complicações e riscos que daí não deixarão de resultar, porque para avença carecem de elementos de cálculo; e, se for tomada para base a capacidade de laboração, terão de pagar muito mais do que devem.
E a forma de pagamento? Terão de ir às sedes dêsses organismos para o fazerem?
Mas quantas despesas e tempo perdido!
Estas formalidades - um simples requerimento, certidões, preenchimento de boletins e cousas equivalentes - , que nas cidades são toleráveis, nas aldeias. remotas são altamente perturbadoras.
Que o Govêrno tome as providências precisas e urgentes para que da sua burocracia só resultem vantagens para a economia nacional, desde as actividades mais humildes às de maior categoria, são os meus votos, na certeza de que assim os seus funcionários serão sempre bem acolhidos e o Estado Novo lançará raízes bem fundas na alma da Nação.
Para terminar, Sr. Presidente, conceda-me V. Ex.ª dois minutos mais para comunicar à Assemblea Nacional que do Alto Minho recebo neste momento a notícia de que em seguimento dos jornaleiros que abandonaram os trabalhos agrícolas para irem à faina do volfrâmio e de outros minérios, agora são os próprios caseiros ou rendeiros que abandonam as terras; acontecendo também manterem os seus direitos de arrendatários, mas sem procederem aos trabalhos de lavoura, por entenderem que, pagando aos senhorios em dinheiro o que deveriam entregar em géneros, ficam assim desonerados, esquecendo as suas obrigações para com a colectividade, que exige a melhor lavoura da terra que lhes fôra confiada, para que não falte a alimentação do povo.
Ordenou do Govêrno certas providências para disciplinar a lavra dos minérios e só é para lamentar que não o tivesse feito há mais tempo.
Faço agora esta comunicação certo de que o Govêrno acautelará a produção da lavoura, embora com fórmulas inteligentes que não privem os humildes dos benefícios que legitimamente devem colhêr desta maré única, em que o maná sobe das entranhas da terra portuguesa, pois de outra forma só as grandes emprêsas lucrariam com a exploração do subsolo da Pátria, que, salvas as excepções da lei, é de nós todos.
Disse.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Sr. Cancela de Abreu; - Sr. Presidente:, pedi a V. Ex.ª a palavra com dois objectivos.
O primeiro é o de enviar para a Mesa um requerimento ou pedido de informações sôbre matéria que já por mais de uma vez abordei, ao de leve, nesta Assemblea e que entendo merecer insistência. Proponho-me renovar e ampliar essas considerações, uma vez recolhidos os elementos que solicito. O meu requerimento é o seguinte:

Ao abrigo do disposto pelo artigo 96.º da Constituïção e da alínea c) do artigo 11.º do Regimento, requeiro que pelo Ministério da Educação Nacional me seja fornecida a informação seguinte, relacionada com a protecção devida às famílias numerosas:
Quais as reduções de propinas ou outras facilidades ou vantagens até agora concedidas pelo Estado, e em vigor nos estabelecimentos oficiais de ensino público, a favor dos diferentes ou sucessivos filhos do mesmo pai,

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com indicação do condicionamento a que estão sujeitas essas concessões.

Lisboa, Sala das Sessões da Assemblea Nacional, 13 de Dezembro de 1941. - O Deputado Augusto Cancela de Abreu.

O meu segundo objectivo ao pedir a palavra a V. Ex.ª, Sr. Presidente, foi o de expandir em algumas, poucas, palavras as preocupações graves, pesadas, que se obstinam no meu espírito de há dias para cá e às quais, por certo, nenhum de V. Ex.ª é estranho.
A situação internacional acaba de sofrer um extraordinário agravamento; a tragédia, a catástrofe que já assolava uma tal grande parte do mundo, estendeu-se agora por todo êle, de norte a sul, do nascente ao poente, incomensuràvelmente. E o dia de amanhã ninguém neste mundo sabe qual êle será.
Os dois palmos do nosso continente, como as vastíssimas extensões do nosso império ultramarino, têm sido poupados, graças a Deus e honra a quem nos governa, às grandes desgraças da guerra. Portugal tem sido - e quantos portugueses haverá que não o compreenderam bem, ou mal o avaliaram ainda - , Portugal tem sido um abençoado oásis de paz no mundo em destruição.
Até agora, por prodígios de equilibrados esforços e de bom senso, os portugueses, firmes na sua prestigiosa e respeitada neutralidade, tom usufruído os inestimáveis benefícios do seu alheamento do conflito, no seu aspecto político e militar, e mal se têm apercebido de algumas dificuldades económicas e de subsistência que, aqui e ali, começaram a atingi-los.
O comércio externo do País tem podido, apesar de tudo, manter-se em certas proporções. Os nossos poucos navios mercantes e os de algumas nações estrangeiras têm podido continuar a drenar do País certos produtos e a trazer-lhe em troca outros que lhe são indispensáveis.
Mas a tragédia tomou, agora proporções inconcebíveis; e as consequências para nós desse alastramento da guerra - mal que outros fazem - não podem deixar de ter passado a constituir, para toda a gente bem formada e com a noção das realidades, o mais torturante e aflitivo pesadelo.
Na verdade, o que irá passar-se?
As minhas preocupações não se avolumam quanto à nossa integridade política territorial. Por êsse lado havemos, certamente, de continuar impondo ao respeito dos outros, à sua boa vontade, e até à lucidez da sua inteligência ou à lógica compreensão das suas próprias conveniências, a nossa inviolabilidade em todas as partes do mundo, em todos os pontos que nos pertencem na Terra por direito incontestado e incontestável.
Apoiados.
Mas preocupam-me, Sr. Presidente, as consequências económicas e de abastecimento da Nação. Novas beligerâncias vão talvez privar-nos de certos mercados abastecedores e de certos navios que nos trazem aquilo de que carecemos. A guerra no Atlântico vai viver novas e mais terríveis fases, que envolverão em maiores perigos o tráfego pacífico que nele queira conservar-se. Novos o maiores necessidades dos outros, que alguma cousa de que e seu nos destinavam, vão naturalmente impor-se e prevalecer sobre as nossas próprias necessidades. Vamos ter, por consequência, cada vez mais que nos contentar com aquilo que nós próprios pudermos produzir.
E chegada portanto a ocasião, Sr. Presidente, e infelizmente, de a Nação se acautelar a valer. Não podemos agora continuar, como em conto de fadas, a viver alheados das tristes realidades do momento, das tristes realidades que afligem, mesmo fora o sangue e a destruição, o resto da humanidade. Não podemos deixar de entrar desde já como que voluntariamente, em regime de privações, antes que, de chofra e radicalmente, cie se nos imponha sem contemplações. Quanto antes, há que actuar, e com energia, não se fôsse atribuir a nossa serenidade e a nossa inacção nesse campo a um feio estado de alma que se chamaria inconsciência.
É do Govêrno, Sr. Presidente, que eu solicito essa actuação, que a opinião pública não pode deixar de receber com aplauso e confiança.
Apoiados.
Cometem-se ainda nesta hora, neste País, em matéria de consumos, verdadeiros desperdícios, ia a dizer, em face das circunstâncias, verdadeiras monstruosidades. Cada um ainda gasta o que quere daquilo que já falta ou que virá a faltar-nos. O supérfluo ainda não sofreu, sequer, o menor condicionamento. Estamos à beira, quem sabe, de um abismo, e ainda se não restringiram as diversões; A energia eléctrica consome-se ainda, pública ou privada, como se a maior parte não fôsse produzida por carvão e êste não estivesse na iminência de nos faltar; os combustíveis líquidos, para um dos quais se estabeleceu a única medida directa de restrição, continuam a alimentar combustões que deviam ceder lugar a outras de maior indispensabilidade, actual ou previsível; ainda se come por toda a porte, como de costume, sem conta, nem peso, nem medida, desde a casa particular nos hotéis e aos restaurantes; as pastelarias ainda continuam a abarrotar de bolos e outras guloseimas. E o pior, Sr. Presidente, o que começa a ser grave, é que o que uns comem a mais falta para a alimentação frugal do maior número; que o digam, sobretudo por essas nossas províncias fora, os que já não encontram muitos géneros ou matérias indispensáveis à vida, ou têm de os pagar por preço exorbitante!
Temos de entrar desde já e resolutamente, Sr. Presidente, pelo caminho franco e generalizado das restrições. É o bom senso que o ordena.
O Govêrno já apelou para o máximo da produção e o máximo da poupança. Mas nesse aspecto não há que confluir demasiado na iniciativa individual; nem se pode deixar tam grave problema ao arbítrio do mau senso de cada um.
Enveredemos por uma política adequada às circunstâncias, que é a da «mobilização» económica. Orientem-se pelo bem comum, pelo bem nacional que a emergência indica, a produção agrícola e a produção industrial. Condicionem-se com o maior rigor as exportações e vigiem-se eficazmente, para que não abandone Portugal o que faz falta aos portugueses e que, ao que parece, ainda agora nos vai fugindo. E, finalmente, constituam-se as reservas que a salvação pública exige.
Feito isso, feito tudo o que estiver na nossa mão, a tradicional conformação dos portugueses com os azares irremediáveis do destino, a sua proverbial sobriedade, a sua fácil e meritória acomodação ou adaptação às vicissitudes tia vida farão com que eles recebam no ânimo sereno e confiante as privações a que tiverem de ser sujeitos. E à imprensa cube o grande papel de advogar a justa causa e de promover a sua compreensão geral.
Não sou pessimista, Sr. Presidente. Anima-me, pelo contrário, uma grande, uma inabalável fé nos destinos eternos de Portugal, que todos, nu verdade, não somos demais para continuar. Apenas pretendi afirmar ao Governo a favorável espectativa, a confiança e o apoio consciente da opinião pública nesta matéria.
Apoiados.
E termino, resumindo assim: vivemos em economia dirigida; é preciso, especialmente neste momento, dirigir as economias.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

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O Sr. Calheiros Veloso:- Sr. Presidente: no comentário retrospectivo que juntas primeiras sessões do actual período legislativo da Assemblea Nacional tem sido feito aos acontecimentos do maior relêvo da vida pública, e aos factos mais importantes da actividade do Govêrno foi já focada a publicação, por S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional, de algumas diplomas que, visando a resolver de momento e transitòriamente situações que vinham de há muito a patentear-se desvantajosas; encerram também - e êsse aspecto quero salientar - a promessa explícita de mais largas e completas reformas.
Estão neste caso os decretos-leis n.º 30:957 e 31:235; que alteraram a anterior regulamentação dos exames liceais do 7.º ano e de aptidão aos cursos superiores, simplificando a prestação das provas, dentro do critério da especialização nos dois grupos de letras ou ciências.
Sr. Presidente: acabou também com o sistema de os candidatos poderem concorrer às provas dos exames de aptidão antes de lhes terem sido dados os resultados dos exames das disciplinas, do 3.º ciclo dos liceus - sistema que, por tantos motivos de ordem escolar e económica, tínhamos de considerar absolutamente condenável, e assim em boa hora foi modificado.
Bem haja, pois, o ilustre Ministro da Educação Nacional, Exmo. Sr. Dr. Mário de Figueiredo - de quem nesta sala todos recordam, com admiração, a sóbria eloquência e a subtil dialéctica -, pelo espírito de decisão com que pôs termo a um estado de cousas que não satisfazia às necessidades do ensino, nem às justas conveniências dos estudantes ou daqueles que suportam, muitas vezes com enorme sacrifício os encargos da sua educação.
Sr. Presidente: o decreto-lei n.º 31: 658, que actualizou o montante das propinas no ensino superior, teve também nesta Assemblea o mais vivo e incondicional apoio - que, só não era preciso como ratificação legal nem tampouco para o revestir de maior fôrça do que aquela que lhe advinha do órgão competente que o publicou, representa entretanto, a espontânea solidariedade que todos aqui prestam a V. Ex.ª o Sr. Ministro da Educação Nacional em uma medida por êle decretada e que no primeiro momento foi recebida com certa hostilidade por espíritos menos reflectidos ou por outros sempre dispostos a interpretar os factos ao sabor das suas turvas intenções políticas.
Mas neste momento, em que seria impertinência vir referir-me a assuntos já superior e definitivamente tratados, desejo apenas pôr em devido relêvo e assinalar com, algumas palavras a publicação de outro diploma - o decreto-lei n.º 31:431 -, que criou a comissão de reforma do ensino técnico com vista à reorganização desse ensino nos graus elementar e médio.
Num País como o nosso, em que o Governo e os próprios interessados reconhecem a necessidade de restringir, em número, o acesso aos cursos superiores, reservando a obtenção dos respectivos diplomas aos melhores valores que a êles concorrem, para que estes possam ter a garantia do trabalho no exercício das profissões para que se prepararam e que, portanto, se tornará a justa e lógica consequência do diploma que adquiriram; num País, como Portugal, em que os ofícios e mesteres se encontram ainda longe da cultura técnica, que os caracteriza e distingue nas nações fortemente industrializadas da Europa e da América - o decreto-lei publicado em Julho último pelo Sr. Ministro da Educação Nacional bem merece que lhe seja aqui feita uma referência especial pela importância que reveste é oportunidade que apresenta.
Assinalando a sua importância, desejo vincar que ela nos é dada não só pela parte dispositiva, como também pelo sucinto, mas expressivo, relatório que a precede, em um de cujos capítulos são enunciados os principais problemas que a matéria apresenta, por cento, para terem agora a sua resolução apropriada.
Às escolas técnicas espalhadas pelo País devemos já a preparação de um escol de trabalhadores cuja competência se tem afirmado como elemento valioso no progresso da indústria nacional.
Essas escolas têm tomado em cada centro uma modalidade especial, em íntima correlação com a indústria nela denunciada.
E é natural que assim seja, pois, se a indústria peculiar que se fixou em cada região criar na população desta uma adaptação especial, manifestada pelo gôsto do ofício, na habilidade para o seu exercício e até num carácter próprio que lhe consentem um trabalho que outras, sem essa demorada educação, não poderiam suportar - o que tudo se não improvisa - , é lógico que se procure aproveitar ao máximo essas condições naturais, essa instintiva habilidade, criada e feita através de sucessivas gerações.
Assim sucede na Escola Industrial Rafael Bordalo Pinheiro, nas Caldas da Rainha, essencialmente uma escola de ceramistas e oleiros, como a Escola Industrial de Campos Melo, na Covilhã, é, por excelência, o estabelecimento de ensino da laboração dos têxteis.
Não é, na verdade, tam extenso o território metropolitano de Portugal que necessite ter pulverizado por todas as suas escolas técnicas o ensino de certas especializações, que só esporàdicamente se praticam fora de determinados centros.
Confiadamente ficamos à espera que a comissão criada pelo citado decreto-lei n.º 31:431 - que há poucos dias tomou posse e da qual faz parte o nosso antigo colega nesta Assemblea Sr. engenheiro Leite Pinto - aborde os seus trabalhos com espírito de rasgada iniciativa e decisão, por forma a habilitar o ilustre Ministro, que lhe confiou encargo tam complexo, a elaborar o Estatuto do Ensino Técnico, fazendo-se o «reajustamento» da orgânica escolar às realidades presentes, como indica o relatório do mesmo decreto.
E faço votos por que a futura reforma não esqueça, antes facilite e alargue, a instrução técnica ao operário português, cujas qualidades, de inteligência e de adaptação, quando bem aproveitadas e conduzidas, serão um elemento seguro do sucesso na concorrência industrial com as outras nações.
São dignos dessa assistência os novos que, antes de entrarem no exercício lucrativo do trabalho, procuram na escola técnica os ensinamentos necessários para serem bons profissionais.
Mas são-no também, e ainda da nossa admiração e do nosso carinho, aqueles que as duras necessidades da vida obrigaram a entrar para a oficina logo na adolescência e, para depois melhorarem as suas condições de trabalho, vão, após um dia de labuta, sacrificar as horas de repouso, e despreocupação na frequência dos cursos nocturnos.
Apoiados.
A êsses, por um dever social e não por simples benemerência, devem ser dadas e ampliadas as condições de poderem satisfazer o seu justo anseio de saber.
E êles nem por serem os mais humildes deixarão de ser os mais gratos, nem os que menos hão-de corresponder ao auxílio que lhes fôr dispensado na próxima reforma do ensino profissional, honrando: no exercício consciente dos seus ofícios e mesteres a própria Nação - como outros, nas escolas superiores da hierarquia

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do trabalho, a honrava com mais brilho, é certo, mas não com maiores sacrifícios. Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Vou designar os Srs. Deputados que hão-de constituir a sessão de estudo da proposta de lei relativa aos lucros de guerra e do aviso prévio do Sr. Melo Machado.
A sessão de estudo referente aos lucros de guerra será formada pelos seguintes Srs. Deputados: Albino Soares Pinto dos Reis Júnior, António de Almeida, António de Sousa Madeira Pinto, Artur Águedo de Oliveira, Artur Ribeiro Lopes, Augusto Cancela de Abreu, Carlos Mantero Belard, Jorge Viterbo Ferreira, José Dias de Araújo Correia, José Maria Dias Ferrão, Luiz Cincinato Cabral da Costa, Sebastião Garcia R»mires e Sílvio Duarte Belfort Cerqueira.
A sessão de estudo do aviso prévio do Sr. Deputado Melo Machado, sôbre hidráulica agrícola, será composta pelos seguintes Srs. Deputados: Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho, Alexandre de Quental Calheiros Veloso, António de Almeida Pinto da Mota, António Carlos Borges, António Cortês Lobão, Artur Proença Duarte, Augusto Cancela de Abreu, Francisco Cardoso de Melo Machado, Henrique Linhares de Lima, João Antunes Guimarãis, João Garcia Nunes Mexia, João Luiz Augusto das Neves, João Xavier Camarote de Campos, Luiz Cincinato Cabral da Costa e Luiz Maria Lopes da Fonseca.
Vai passar-se à ordem do din.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta de lei relativa ao empréstimo. Tem a palavra o Sr. Deputado Madeira Pinto.

O Sr. Madeira Pinto: - Sr. Presidente: a proposta de lei n. 166, de 25 de Novembro último, que agora entra em discussão, autoriza o Govêrno a contrair um empréstimo interno consolidado, do montante de 500:000 contos, que se denominará «Consolidado 3 1/2 por cento - 1941» e que se caracteriza dêste modo: obrigações do valor nominal de 1 conto ou 1.000$ cada uma, vencendo o juro de 3 1/2 cento ao ano, pagável aos trimestres, de Março a Dezembro; prazo ide conversão ou remição nunca inferior a dez anos; garantias, isenções e direitos - as consignadas nos artigos 57.º a 60.º da lei n.º 1:933, de 13 de Fevereiro de 1936.
Estas regalias são principalmente os seguintes: pagamento integral dos juros e do capital pelas receitas gerais do Estado; isenção de todos os impostos sôbre o capital ou juro, mesmo os do sêlo, averbamento ou recibo; faculdade, tratando-se de títulos livres, de receber antecipadamente o juro, no bimestre anterior ao vencimento, por desconto à taxa do Banco de Portugal; impenhoradamente coerciva dos títulos; livre importação e exportação dos títulos, qualquer que seja a nacionalidade do possuïdor; isenção de imposto sôbre sucessões e doações, tratando-se de títulos pertencentes aos fundos de reserva permanente de certas instituïções ou legados com certos fins (de assistência, caridade ou instrução), e limitado a 5 por cento dos juros - com a cobrança por dedução no acto do pagamento dos mesmos - nos casos de titulares ou portadores não isentos.
Já sôbre a proposta do Governo emitiu parecer a Câmara Corporativa, pelas suas secções de Crédito e previdência, Finanças, economia geral, concluindo por se manifestar, com convicção e elogio, inteiramente favorável à adopção da proposta e não sugerindo qualquer emenda, por entender que o respectivo articulado satisfaz plenamente os objectivos que visa.
O parecer da Câmara Corporativa, de que foi relator o eminente professor da Faculdade de Direito do Universidade de Lisboa, Dr. Rui Ulrich (a quem como seu discípulo, no primeiro curso que regeu na Faculdade de Direito de Coimbra, me é grato prestar homenagem de muita consideração e estima), é um documento que honra o seu autor e aquela Câmara pela justeza dos conceitos, soma de elementos que fornece para a apreciação do assunto e clareza didáctica da exposição.
À vista desta medida do Governo, poderia o português desprevenido formular estas interrogações desconfortantes: porquê e para quê quere o Govêrno contrair um empréstimo de 500:000 contos? Se quem pede emprestado é porque não tem e -precisa, dar-se-á o caso de a obra de saneamento das finanças públicas, glória do Sr. Presidente do Conselho e orgulho de Portugal, ameaçar instabilidade? Serão, de facto, verdadeiros os saldos que as contas públicas indicam e que, periodicamente, a imprensa oferece à nossa meditação?
Tranquilize-se o desprevenido português. A obra de restauração financeira, glória de Salazar, orgulho de Portugal, não mostra desnível, fenda, indício, que de perto ou de longe autorize tais inquietações; continua de pé e sólida como até aqui.
Apoiados.
É outra a razão do empréstimo. Na gestão da cousa pública, lançar um empréstimo não significa necessariamente um apuro de meios, uma rarefacção de disponibilidades de tesouraria; pode traduzir uma medida de ordem económica para travar a inflação, atrair a colocação de capitais superabundantes no mercado, impedir o aviltamento das taxas de juro a ponto de se ser tentado a despender em satisfação de necessidades imediatas - que não conhecem limite - o que se poderá amealhar para ocorrer a necessidades futuras.
O empréstimo que o Governo pretende lançar pertence a este tipo.
Não é indício de falta de disponibilidades por parte do Estado, é antes expressão de economia dirigida, medida tendente a evitar males que, esses sim, poderão reflectir-se desastrosamente na gestão financeira; mostra que o Governo está atento às repercussões no mercado nacional do desvairado momento económico que o mundo atravessa.
Como se passam então as cousas? Por esto modo: a circulação fiduciária, pode sor aumentada por causas diversas (nem só o acréscimo de despesas do Estado a determina) e por vezes inevitáveis; sempre que isso se dá aumentam as disponibilidades no mercúrio e a maior procura das mercadorias; esta origina a alta dos preços; estoutro facto provoca, pelo aumento de despesas, novo a fluxo de circulação fiduciária, estabelecendo-se, assim, um círculo vicioso que pode. levar a desastrosas conseqüências.
É o que os economistas denominam, como nos diz o douto parecer da Câmara Corporativa, a teoria da espiral, em que cada ciclo de fenómenos se sobrepõe ao anterior, mus em plano diferente e com projecção sempre crescente.
Sofremos, em Portugal, de há tempo a esta parte, de um aumento de circulação fiduciária, de uma inflação se se quiser, no sentido geral do termo, que se traduz, em menos de quatro anos (Janeiro de 1988 a Outubro de 1941) por um aumento de 1.538:000 contos, p no tocante a letras e cheques em circulação por um acréscimo de 1. 422:000 contos. O que o provocou? Não foi - registemo-lo com louvor e contentamento - o recurso do Estado ao banco emissor já que, no quadriénio referido, o montante da sua dívida baixou 11:000 contos, números redondos. O que provocou en-

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tão aquele afluxo de circulação fiduciária?, O que explica este aumento de disponibilidades no mercado?
Parece que êle não proveio de uma maior actividade económica; a Câmara, Corporativa assim o concluo das cifras que exprimem o movimento das operações de crédito por bancos e banqueiros comerciais e dos empréstimos; julga antes que o facto se deve atribuir à circunstância de Portugal, mercê da guerra europeia, se ter convertido num tutíssimo refúgio de pessoas e capitais.
Com efeito, a nossa posição de estrita neutralidade no conflito mundial, a ordem e tranquilidade interna de que disfrutamos, o crédito que conquistámos, mercê da política de severo saneamento financeiro, o prestígio mundial de que disfruta o Chefe do Govêrno (por que não proclamá-lo?!) a que benèficamente se reflecte sôbre o País - a par da benignidade do nosso clima e da especial posição geográfica, levaram muitos foragidos aos horrores da guerra a escolher Portugal para residência temporária e muitos capitais ameaçados a buscar a segurança da nossa terra.
As disponibilidades em moeda estrangeira, que a partir de Setembro de 1939 já alinhavam no escalão dos 30 milhões, de liras, acusam a partir de Agosto de 1940 uma ascensão contínua, que, as faz entrar na casa dos 30 milhões de libras em Janeiro, do corrente ano, e que em Agosto as elevou a 47.320:000 libras, totalizando desde 1938, um aumento de quási 29 milhões de libras, libras, ou de 150 por cento!
Esta próspera situação nacional não deve: atribuir-se, como nota a Câmara Corporativa, ao movimento do nosso comércio externo, apesar de a respectiva balança ter passado de 1.146:000 contos de saldos negativos, em 1938, a 138.000 contos de saldos positivos, no fim do 3.º trimestre dêste ano.
Seja, porém, como fôr, o facto positivo é êste: estamos em maré alta de circulação fiduciária, mantém-se a previsão do excesso de disponibilidades monetárias no mercado, com a correspondente alta de preços (que o Banco de Portugal já estima, no comércio de retalho, em quási 39 por cento, em relação a Julho de 1939), e que todos nós pesadamente sentimos.
Entrámos, assim no círculo vicioso a que me referi; estamos a ser vítimas da teoria da espiral; o Govêrno assim o registou e com o projecto que traz à Câmara procura conjurar o perigo, oferecendo às disponibilidades privadas uma aplicação segura do capital, a uma taxa compensadora, procurando desviar de aplicações improdutivas uma massa de capitais que amanhã, quando, as circunstâncias mundiais mudarem há-de fazer falta.
Não somos, por temperamento, povo de poupadores; não fugimos, por via de regra, quando as circunstâncias nos trazem dinheiro a mais, a gastá-lo nem sempre produtivamente. São de nosso rifoneiro, estes adágios: «Quando a velha tem dinheiro, não tem carne o carniceiro» e «O bom ganhão faz o bom gastão». Mas
não vim aqui para, fazer concorrência aos Adágios Portugueses, do Padre Delicado, ou ao Ensaio Phraseológico de Pina Manique; quis apenas registar um facto conhecido.
Já era minha intenção, ao entrar neste debate, preguutar ao Govêrno se não julgava chegado o momento de pôr ordem e regra em certos desregramentos do consumo que depois do agravamento, da guerra, se não podem manter, sem sérias preocupações.
Antecipou-se no propósito o nosso ilustre colega Sr. engenheiro Cancela de Abreu com o sentido da oportunidade e a elevação de propósitos que, sempre manifesta, nas suas intervenções. Só tenho que me felicitar, e à Câmara, porque S. Ex.ª o fez muito melhor do que eu o poderia, ter feito, e daqui lhe endereço os meus cumprimentos e lhe manifesto a minha inteira concordância pelo que disse.

O Sr. Cancela de Abreu (interrompendo): - Eu regosijo-me com o apoio que as palavras de V. Ex.ª representam para as minhas considerações de há pouco. Mas não deixo passar sem protesto a frase de V. Ex.ª relativa ao valor das palavras de Ex.ª em comparação com as minhas. E, assim, sou eu que lastimo ter anteposto a minha iniciativa à de V. Ex.ª.

O Orador: - Agradeço ao Sr. Deputado Cancela de Abreu as suas boas palavras, e por estas se comprova que as virtudes e qualidades que todos lhe conhecemos junta S. Ex.ª mais a da modéstia.
Sr. Presidente: a proposta que o Govêrno trouxe à Câmara é da maior oportunidade, mostra que êle está vigilante e atento à marcha da economia nacional, e por isso não podemos recusar-lhe a nossa aprovação.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Botto de Carvalho:- Sr. Presidente: o Govêrno, por, intermédio do titular da pasta das Finanças, apresentou a esta Assemblea Nacional uma proposta de lei de autorização para emitir um novo empréstimo consolidado de 3,5 por cento. Sôbre essa proposta de lei, que vem precedida dum preambulo digno de nota pela sua concisão e pela sua perfeição, a Câmara Corporativa emitiu um parecer que, a todos os títulos, é admirável.
Na verdade a Camará Corporativa vem habilitando esta Assemblea Nacional com pareceres, como o proferido acêrca da lei de meios e êste a que me estou referindo, que hão podem deixar de ser alvo das nossas homenagens.
A forma como, no parecer da Câmara Corporativa, é estudado o aspecto técnico da projectada operação de crédito, é feita a demonstração da sua oportunidade, dispensaria nesta tribuna quaisquer comentários se esta Assemblea não tivesse uma função eminentemente política e se não houvesse, por consequência, que focar-se um aspecto político que interessa a Nação. Desde que a pasta das Finanças foi assumida por quem lhe imprimiu uma directriz certa é definida, por quem operou, a reorganização financeira do País, que constituo uma das pedras angulares da Revolução Nacional, desde que em matéria financeira se começou construindo objectivamente, criando uma situação de honestidade, uma situação de ordenado desafogo, num programa de equilíbrio em que, a pouco e pouco, a confiança se readquiriu; os capitais acorreram donde se haviam receosamente acolhido, e foi possível abandonar-se aquela situação de desordenada preocupação financeira em que os capitais chegaram a produzir o juro então normal de 18 por cento e em que o encontrar capitais era uma crescente e progressiva dificuldade.
Apoiados.
Ainda em 1929, no preâmbulo do decreto n.º 16:731 o Ministro das Finanças de então afirmava, em relação ao imposto sôbre aplicação de capitais, que nesse momento o movimento do juro era no sentido da alta e se notava a deficiência de capital disponível para satisfazer a procura. Era a consequência da desregrada e desordenada política financeira anterior.
Depois, ao readquirir-se a confiança, com o regresso dos capitais que andavam fugidios, com o estabelecimento duma política económica orientada e definida, começou verificar-se o fenómeno contrário. E nós assistimos consoladoramente à maior viabilidade o mais fácil possibili

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dado do movimentação de capitais, a que começou correspondendo o regresso do juro às suas normais e sérias proporções.
E a partir de 1931, data da reforma do Banco do Portugal, em que a taxa de juro de desconto nesse Banco é fixada em 7 1/2 por cento, nós assistimos progressivamente, compassadamente, cautelosamente, como quem sabe para onde vai e como deve ir, à sua deminuição para 7 por cento no mesmo ano ainda, para 6 por cento dois anos depois, em 1933, para 5 por cento em 1934, para atingirmos no ano de 1941 a taxa de desconto de 4 por conto, em relação ao Banco do Portugal, a que corresponde nos outro» bancos a taxa de desconto de 5 1/2 por cento como limite máximo.
Ao mesmo tempo que se dará esta deminuïção, não como uma consequência de um excesso de numerário, mas como consequência de uma política de regresso àquilo que se entende em boa economia ser a justa remuneração do capital mutuado, assistia-se ao acréscimo da confiança pública nas instituições bancárias; este fenómeno, a par de um aumento de disponibilidades em numerário na riqueza particular, provocava nos bancos uma maior existência de depósitos à ordem e de depósitos a prazo.
E tem interesse verificar essa curva desenhando-se lentamente progressiva, e é fácil vê-la nos gráficos da estatística oficial, desenhando um acentuado aumento nos anos que precederam a guerra, mas desenhando uma linha fortemente ascensional a partir de 1938 para cá, isto é, desde o inicio da conflagração.
Então, como uma consequência normal, quer da redução da taxa de desconto, quer da lei da oferta e da procura, nós assistimos à baixa do juro remunerador dos depósitos à ordem e a prazo nos bancos, que hoje se encontra fixado pela forma seguinte: o máximo de 2,5 por cento nos depósitos a prazo, e digo o máximo porque há bancos que remuneram os depósitos a prazo com 2 por cento, sôbre os quais ainda incide o imposto de 14 por cento, 1 por cento nos depósitos à ordem até 200 contos, e apenas com 1/2 por cento nos depósitos à ordem superiores a 200 contos.
Mas a partir do momento em que se inicia a guerra internacional, aquilo que no nosso País era o decurso de uma política normal de séria administração financeira passou a sofrer a directa influência do estado da guerra e de uma economia consequente.
Por um lado, acorrem a Portugal os capitais estrangeiros, ávidos de encontrarem no asilo seguro onde abrigar-se, muitos trazidos pelos estrangeiros que afluem com as suas economias em numerário ou com valores.
Por outro lado, a balança de importação e exportação alterou-se por sua vez em Portugal, pais que tinha uma balança deficitária, merco da dificuldade ou quási impossibilidade de importação e do maior volume da exportação consequente da salda para o estrangeiro de produtos nacionais que interessam à economia da guerra.
Todos estes factores provocam e implicam uma entrada de valores e um aumento de numerário que se traduzem na curiosa situação extraída das estatísticas oficiais, com a eloquência dos números que vou ler:
Em 1938, em Dezembro do ano anterior ao inicio da guerra, os bancos do continente tinham em caixa dinheiro aã cofre ou depositado noutros bancos 1.849:470 contos, entre os quais estão incluídos 933:421 contos de
uro-metal e moeda divisionária do Banco de Portugal, outra um montante de 5.546:860 coutos de depósitos ordem e a prazo efectuados nesses bancos.
Estes valores em Dezembro de 1940 eram os seguintes: os saldos de caixa passaram de cerca de 1.850:000 contos para 2.636:836 contos, nos quais estão incluídos
uro-metal e 1.233:393 contos de moeda divisionária do Banco de Portugal. Os depósitos a ordem o a prazo tinham subido para mais 6.823:354 contos.
Mas decorre o ano de 1941, acentuam-se as consequências económicas e financeiras da guerra internacional, e em Setembro deste ano, segundo os mais recentes números que pude coligir, a situação já era esta: os saldos de caixa dos bancos do continente, constituídos por depósitos em dinheiro em cofre e em outros bancos, passaram de cerca de 1.850:000 contos em 1938 para 4.297:713 contos, emquanto os depósitos à ordem e a prazo, de cerca de 5.500:000 em Dezembro de 1938, passaram para 9.510:052 contos.
Evidentemente que, sabendo nós, como sabemos, que o aumento da circulação fiduciária, presentemente, dentro desta admirável e sã política financeira, tem sempre a sua contrapartida, pela totalidade, em bens-ouro, seja ouro pròpriamente dito, sejam moedas estrangeiras convertíveis em ouro, o fenómeno da inflação, com todas as suas consequências económicas, desenha-se com um início cuja projecção há que considerar* desde já no nosso País.
O parecer da Camará Corporativa é a esse respeito sumamente douto. E, porque assim é, eu não careço de invocar a opinião dos mestres na matéria, em abono de uma doutrina hoje corrente, para afirmar que em qualquer regime de economia, perante a verificação desse facto, o govêrno de uma nação que tivesse a noção das suas responsabilidades governativas havia necessariamente de adoptar uma medida governativa da força daquela que o nosso Governo adoptou apresentando a esta Assemblea uma proposta de lei para emissão de um novo empréstimo.
Apoiados.
Mas se isto é uma verdade em relação a qualquer outro regime de política económica, em relação a um país de economia dirigida o Governo não só o devia fazer como - vou mais longe - não podia deixar de o fazer.
Tinha de evitar, pelos meios técnicos que a ciência financeira hoje defende e aconselha, as graves consequências que para o País adviria de uma situação de inflação deixada entregue ao seu livre curso, com todo o caudal das suas tristíssimas consequências; consequências que no nosso País começam a poder ser percebidas, sobretudo no seu aspecto de uma alta desmedida no valor de certos bens, dada a ânsia de colocação de um capital que não encontra aplicação fácil, e provoca assim um desequilíbrio na relatividade dos valores, que necessariamente implica, no regresso a unia situação normal, um prejuízo e a ruína parcelar dos que não souberam ou não puderam ver claro o seu interesse real.
Mas o que é notável, o que é logicamente notável, aquilo que me parece, sobretudo, carecer de ser salientado nesta hora, é o facto de em Portugal se ter iniciado e consolidado uma política financeira que permite ao Govêrno - quando e como quere - assumir medidas da natureza desta.
Apoiados.
Ninguém ignora que o Govêrno, propondo lançar um novo empréstimo de 500:000 contos, o faz exclusivamente por necessidades de política económica, e não por carência de o fazer para fins financeiros; que o faz assumindo um encargo de pagamento de juros; que o faz, repito, apenas com a noção de que cumpre um dever orientador o de que está governando fazendo política, na mais nobre e pura acepção desta palavra, de que tanta gente ainda hoje se arreceia pelo mau sentido que se lhe dava, mas que é já tempo de rehabilitar, restituindo-lhe o significado: a arte de governar os povos.
O Ministro das Finanças entendeu, e muito bem, que a situação financeira do País podia permitir, e permite, que o encargo dêsse empréstimo necessário fosse suportado; ao mesmo tempo demonstrou, com razão, a certeza

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na confiança que a Nação depositar no seu Governo e na sua obra; neste momento de dúvidas e de incertezas tais factos constituem um monumento que se ergue à própria Revolução Nacional.
Apoiados.
Esta confiança, que cada vez mais e com maior intensidade a Nação deposita no seu Govêrno; não é demais que em cada hora seja posta em destaque pelo que representa;
Apoiados.
Não é demais que ao próprio Govêrno se lhe acentue a necessidade de que nenhuma cousa, por mais pequena que seja, venha empanar o seu admirável brilho; se lhe diga que, hoje, como nunca, cousa alguma deverá pôr uma nota discordante nas atitudes de um Estado que está sendo reconstruído à imagem daquela verdade primária, afirmada por Salazar, de que o Estado tem de ser e proceder como um perfeito, homem de bem.
Apoiados.
Foi esta confiança que permitiu ao Govêrno condicionar, numa economia dirigida, os interesses nacionais, lançando um empréstimo de 500:000 contos, podendo sofrer os encargos consequentes com a certeza absoluta de que a Nação logo no primeiro momento o subscreve por inteiro, como subscreveria o dôbro ou o triplo se o Govêrno entendesse útil ou necessário estabelecê-lo nesse montante.
Sr. Presidente: do alto desta tribuna, de qualquer lugar, ou seja qual for aquele em que nos acharmos, há que afirmar sempre o que representou e representa ainda para a Revolução, Nacional a primeira das obras realizadas por Salazar: a sua actuação no Ministério das Finanças.
Apoiados.
É ainda essa obra financeira que permite continuar a encarar com confiança, e resolver com segurança a situação de presente, obra que foi, é e será uma das pedras angulares da Revolução Nacional, obra cuja continuação felizmente verificamos nas mãos de quem, com tanta competência, e está sabendo continuar.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Camarate de Campos: - Sr. Presidente: a proposta de lei em discução, bem merece a aprovação da assembleia nacional.
Com efeito, ela honra, o Govêrno que a fez e a orgânica política e administrativa que a tornou possível.
Vejamos, em poucas palavras; as razões em que se filia a nossa afirmação.
Como se acentua no relatório da proposta e se encontra doutamente focado no bem elaborado parecer da Câmara Corporativa, a proposta não tem um fim financeiro, mas uma finalidade económica.
Não precisa o Govêrno de fundos; vai intervir no mercado de títulos com êste empréstimo, exclusivamente para evitar a queda brusca d dinheiro.
De resto, já a lei n.º 1 964, de 18 de Dezembro de 1938, que autorizou um outro empréstimo consolidado de 3 1/2 por cento, não apareceu por necessidades de fundos mas por razões de ordem económica.
Felizmente já lá vai o tempo em que os Govêrnos recorriam aos empréstimos exclusivamente para acudir as necessidades da tesouraria do Estado.
Estamos mesmo convencidos de que em Portugal jamais alguém pensou, a não ser os homens da especialidade, que os empréstimos podiam ter finalidade diferente daquela a que nos vimos de referir, isto é, jamais alguém pensou, que os empréstimos podiam ter fins económicos, pois todos pensavam que eles só serviam para acudir, às necessidades urgentes do Tesouro.
Não nos deve isso causar muita admiração, visto que os empréstimos em Portugal sempre tiveram esse fim!
Sr. Presidente: como se vê dos chamados índices económicos, largamente referidos no parecer da Câmara Corporativa, nomeadamente no movimento da circulação, fiduciária, há dinheiro amais.
De resto, quem olhar com olhos de ver para os balancetes mensais dos nossos bancos logo verifica, que assim é, pois todos os meses as suas caixas sobem, quer em depósitos à ordem, quer em depósitos a prazo.
O Govêrno, porém, fixando no empréstimo a taxa de 3 1/2 por cento, não abusa da situação. Mostra mais uma vez a sua honestidade de processos.
A abundância de disponibilidades bem podia explicar a colocação do empréstimo a taxa mais baixa mas o Govêrno, verificando os inconvenientes que de tal facto resultariam, prefere sacrificar a Fazenda Pública a arrastar o preço do dinheiro.
E êsse sacrifício é manifesto, visto que, emitido o empréstimo, o encargo do juro é certo, e imediato, o que não acontece ao rendimento do capital emprestado, que é bastante incerto.
Se eu não visse que o empréstimo representa para a Fazenda Pública um sacrifício sério, defenderia aqui, com base nas razões económicas que levaram o Govêrno a fazer a proposta, que o quantitativo do empréstimo fosse mais elevado.
Todavia, convencidos estamos, pela confiança que temos no Govêrno, de que, se se tornar necessário e urgente, o Govêrno não terá dúvida em propor um novo empréstimo.
Pelo decreto n.º 20:983, de 7 de Março de 1932, as taxas dos bancos particulares estão limitadas. Não podem exceder em 1 1/2 , por cento as taxas do banco emissor.
Como a taxa do banco emissor é de 4 por cento, segue-se que os bancos particulares não podem fazer empréstimos a taxa superior a 5 1/2 por cento.
Os particulares podem emprestar, com garantia real a 8 por cento, e, sem ela, a 10.
Porém, actualmente, estes empréstimos, raramente atingem as taxas permitidas. Os juros dos empréstimos têm vindo sucessivamente, a baixar desde 1928.
Estão actualmente nas taxas, que indiquei.
Apesar disso, o imposto sôbre aplicação de capitais, não havendo taxa fixada, incide sôbre 6 por cento como se esta taxa fôsse a normal o que não é assim, pelo que se impõe que a incidência deste imposto se modifique, correspondendo à realidade dos factos, que é também uma realidade da lei.
Parece ser, apodíctico.
Como assim é, ouso chamar a atenção do Govêrno para o assunto.
Além das garantias habituais constantes da lei n.º 1:933, de 13 de Fevereiro de 1936, o empréstimo agora proposto, como se vê do artigo 4.º, confere aos subscritores a vantagem de não ser remido ou convertido antes de dez anos.
É mais uma garantia que é de boa justiça salientar, pois a sua vantagem é manifesta.
Termino como comecei: a proposta honra o Govêrno e o Estado Novo, pelo que entendo dever ela merecer a aprovação desta Assemblea.
Disse.

Vozes:- Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

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15 DE DEZEMBRO DE 1941 70

O Sr. Presidente: - Não está mais ninguém inscrito. Está encerrado o debate na generalidade. Vai discutir-se a proposta na especialidade.

Submetidos à votação, foram, sucessivamente aprovados os artigos 1º, 2.º, 3.º, 4.º e 5.º e, último sem discussão.

O Sr. Presidente: - Está concluída a discussão da proposta.
Como V. Ex.ª sabem, a proposta de lei de autorização de receitas e despesas tem marcado, na Constituição, um prazo pura ser concluída e enviada para promulgação.
A Comissão de Redacção, segundo estou informado, já deu forma definitiva ao texto desta proposta, mas esse texto está neste momento na Imprensa Nacional, e eu não posso, por isso, submetê-lo u aprovação da Assemblea.
Por outro lado, a proposta que acaba de ser votada, relativa ao empréstimo, veio também a esta Assemblea com o carácter de urgência.
Não sei se a Assemblea ainda voltará a funcionar antes das férias do Natal. É provável que não; e, nestas circunstâncias, eu solicitaria a V. Ex.ª que aprovassem um voto de confiança à Comissão de Redacção para dar forma definitiva às duas propostas de lei.

Submetido à votação, foi aprovado o voto de confiança proposto pelo Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão será designada oportunamente.
Apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos de Boas-Festas.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 53 minutos.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

Textos aprovados pela Comissão de Redacção

Autorização de receitas e despesas para o ano de 1942

Artigo 1.º Fica o Govêrno autorizado a cobrar, durante o ano de 1942, os impostos e mais rendimentos do Estado e obter os outros recursos indispensáveis à sua administração financeira, de harmonia com as leis em vigor, bem como a aplicar o seu produto às despesas legalmente inscritas no Orçamento Geral do Estado decretado para o mesmo ano.
Art. 2.º Fica autorizada igualmente a aplicação das receitas próprias dos serviços autónomos à satisfação das despesas dos mesmos serviços, constantes dos respectivos orçamentos devidamente aprovados.
Art. 3.º As taxas da contribuïção predial no ano de 1942 serão de 10,5 por cento sôbre o rendimento dos prédios urbanos e de 14,5 por cento sôbre o rendimento dos prédios rústicos.
Art. 4.º Continuará a cobrar-se no ano de 1942 o adicianamento de 4 por cento ao imposto sôbre as sucessões e doações a que se refere o artigo 2.º do decreto n.º 19:969, de 29 de Junho de 1931, incidindo aquela taxa sobre o valor dos bens abrangidos na liquidação do referido imposto relativamente a cada beneficiário.
§ único. Continuará reduzida a 3 por cento a taxa referida no corpo deste artigo para as transmissões operadas a favor de descendentes, quando iguais ou inferiores a 5.000$ em relação a cada um deles.
Art. 5.º Poderá o Governo manter durante o ano de 1942 a cobrança total ou parcial do imposto de salvação pública, criar impostos sôbre os lucros excepcionais resultantes da guerra e ainda tomar as demais medidas necessárias para assegurar o equilíbrio das contas e o regular provimento da tesouraria, nomeadamente a redução de despesas e a suspensão ou redução de dotações orçamentais!
Art. 6.º No orçamento do 1942 o Govêrno inscreverá as verbas necessárias para, de harmonia com os planos aprovados, continuar, promover e realizar obras -, melhoramentos públicos e aquisições em execução da lei de reconstituïção económica, n.º 1:914, de 24 de Maio de 1935, dando prioridade, no início de novos trabalhos, aos exigidos pelos necessidades da defesa e segurança nacionais, desenvolvimento da produção e alívio do desemprego proveniente da situação internacional. Terão preferência sempre as realizações que importem maior ocupação de mão de obra.
§ único. Em cumprimento do disposto neste artigo, deverão prever-se os planos e trabalhos abaixo designados, além de outros que obedeçam na condições êle fixadas e nomeadamente os enumerados no § único do artigo 6.º da lei n.º 1:895, de 17 de Dezembro de 1940:

A) Obras em quartéis, conforme o plano aprovado nos termos do decreto-lei n.º 31:272, de 17 de Maio de 1941, e publicado no Diário do Govêrno, 2.ª série, de 9 de Setembro do mesmo ano;
B) Edificação de escolas primárias em execução do Plano dos Centenários, aprovado por despacho do Conselho de Ministros de 15 de Julho de 1941 e publicado no Diário do Governo, 1.ª série, de 29 de Julho do mesmo ano;
C) Construções prisionais, conforme o plano aprovado nos termos rio decreto-lei n.º 31:190, de 20 de Março de 1941, publicado no Diário Ao Governo, 2.ª série, de 24 de Maio do mesmo ano;
D) Trabalhos de regularização de rios e defesa de campos marginais;
E) Aproveitamentos hiroeléctricos na bacia hidrográfica do Tejo.

Art. 7.º As construções referidas na alínea c) da base VIII da lei n.º 1:971, de 15 de Junho de 1938, poderão constar de projectos especiais, ainda que não tenham de preceder os trabalhos de arborização.
§ único. Emquanto se não dispuser de cartas na escala fixada na mencionada base VIII, podem os projectos de arborização de serras e dunas ser elaborados sôbre as cartas da região na maior escala em que estejam publicadas.

Albino Soara Pinto dos Reis Júnior.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
António de Sousa Madeira Pinto.
João Luiz Augusto das Neves.
José Gualberto de Sá Carneiro.
Fernando Tavares de Carvalho.
José Alçada Guimarãis.

Autorização ao Govêrno para emitir novo empréstimo consolidado de 3 1/2 por cento

Artigo 1.º É o Govêrno autorizado a contrair um empréstimo interno consolidado, na importância, total de 500:000 contos, que se denominará «Consolidado de 3 1/2
por cento - 1941».
Art. 2.º No uso desta autorização será emitida a Obrigação Geral representativa das obrigações do «Consolidado de 3 1/2 por cento - 1941», com as garantias, isen-

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80 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 111

ções e direitos consignados nos artigos 57.º, 58.º e 60.º da lei n.º 1:9333, de 13 de Fevereiro de 1936.
Art. 3.º As obrigações serão do valor nominal de 1.000$ cada uma, e do juro anual 3 1/2 por cento, com vencimento aos trimestres, em 1 de Março, 1 de Junho, 1 de Setembro e 1 de Dezembro.
Os primeiros juros vencer-se-ão em 1 de Março de 1942.
Art. 4.º Este empréstimo só poderá ser convertido ou remido ao par, decorridos dez anos da sua emissão.
Art. 5.º É autorizado o Ministro das Finanças a realizar com a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência ou com os estabelecimentos bancários nacionais quaisquer contratos para a colocação dos títulos ou a fazer esta por meio de subscrição pública ou venda no mercado.
O encargo efectivo do empréstimo, excluídas as despesas da sua representação em títulos ou certificados, não poderá exceder 4 por cento.

Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
António de Sousa Madeira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
José Gualberto de Sá Carneiro.
Fernando Tavares de Carvalho.
José Alçada Guimarãis.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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