Página 193
REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES
N.º 124 ANO DE 1942 12 DE FEVEREIRO
II LEGISLATURA
SESSÃO N.º 119 DA ASSEMBLEA NACIONAL
Em 11 de Fevereiro
Presidente o Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários os Ex.mos Srs.
Carlos Moura de Carvalho
Gastão Carlos de Deus Figueira
Nota. - Foi publicado um suplemento ao diário das Sessões n.º 123, que contem o parecer da Câmara Corporativa sôbre o projecto de lei n.º 169, para concessão da patente do vice-almirante, a titulo honorário, ao ex-oficial da armada João António de Asenedo Coutinho Fragoso de Siqueira.
SUMÁRIO: - 0 Sr. Presidente declarou aberta a sessão ás 16 horas.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado, com rectificações, o último Diário das Sessões.
Usou da palavra o Sr. Deputado Formosinho Sanches, que se referiu à situação da Cooperativa Auto-Mecânica.
Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão da proposta de lei relativa ao imposto sôbre lucros de guerra, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Águedo de Oliveira, Antunes Guimardis e Melo Machado.
O Sr. Presidente encerrou a sessão as 18 horas e 5 minutos.
No final desta Diário publicam-se as emendas recebidas na Mesa acêrca da proposta de lei em discussão.
Srs. Deputados presentes à chamada, 57.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão, 5.
Srs. Deputados que faltaram à chamada, 8.
Srs. Deputados que responderam à chamada:
Abel Varzim da Cunha e Silva.
Alberto Cruz.
Alberto Eduardo Valado Navarro.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alfredo Delesque doa Santos Sintra.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Álvaro Salvação Barreto.
António de Almeida.
António de Almeida Pinto da Mota.
António Augusto Aires.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Hintze Ribeiro.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Artur Ribeiro Lopes.
Augusto Cancela de Abreu.
Augusto Faustino dos Santos Crespo.
Augusto Pedrosa Pires de Lima.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Moura de Carvalho.
D. Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho.
Fernando Tavares de Carvalho.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Guilhermino Alves Nunes.
Henrique Linhares de Lima.
João Antunes Guimarãis.
João Garcia Nunes Mexia.
João Garcia Pereira.
João Luiz Augusto das Neves.
João Maria Teles de Sampaio Rio.
João Mendes da Costa Amaral.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim Rodrigues de Almeida.
Página 194
194 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 124
Joaquim Saldanha.
José Alberto dos Reis.
José Alçada Guimarãis.
José Dias de Araújo Correia.
José Maria Braga da Cruz.
José Maria Dias Ferrão.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Júlio Alberto de Sousa Schiappa de Azevedo.
Juvenal Henriques de Araújo.
Luis Cincinato Cabral da Costa.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Figueira.
Luiz José de Pina Guimarãis.
Manuel Pestana dos Reis.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama van Zeller.
Sebastião Garcia Ramires.
Sílvio Duarte de Belfort Cerqueira.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Borges.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho.
Álvaro de Freitas Morna.
António Rodrigues dos Santos Pedroso.
João Botto de Carvalho.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Sr s. Deputados que faltaram à sessão:
Alexandre de Quental Calheiros Veloso.
Angelo César Machado.
António Maria Pinheiro Torres.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Pereira dos Santos Cabral.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 15 horas e 52 minutos. Fez-se a chamada.
O Sr. Presidente:-Estão presentes 57 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário da última sessão.
O Sr. Carlos Mantero: - Pedi a palavra para fazer as seguintes rectificações ao Diário:
Na p. 190, col. 2.ª, 1. 46, em vez de: «imposta aos preços e à movimentação», deve ler-se: «imposta aos preços, à posse e à movimentação»; na p. 190, col. 2.ª, 1. 51, as palavras: «Por contra» devem eliminar-se; na p. 191, col. l.ª, 1.19, em vez de: «de rendimento líquido real», deve ler-se: «do lucro líquido real»; na p. 191, col. 2.ª, 1. 10, em vez de: «específicas», deve ler-se: «peculiares»; na p. 191, col. 2.ª, 1.11, eliminar a frase: «representados em moeda».
O Sr. Presidente: - Não tendo mais nenhum Sr. Deputado pedido a palavra sôbre o Diário, considero-o aprovado com as alterações apresentadas.
Tem a palavra para antes da ordem do dia o Sr. Deputado Formosinho Sanches.
O Sr. Formosinho Sanches: - Sr. Presidente: cônscio de interpretar o sentir de alguns milhares de portugueses, tal o grupo em que se classifica o n.º 4:700, que representa o quantitativo de sócios que compõe a Cooperativa Auto-Mecânica de Portugal, levanto aqui a minha voz para pedir a S. Ex.ª o Sr. Ministro das Obras Publicas e Comunicações a sua urgente intervenção no sentido de se acabar rapidamente com uma situação que a tantos vem prejudicando.
A Cooperativa Auto-Mecânica de Portugal fundou-se nos termos da lei, tendo dado geral e exacto cumprimento a todas as disposições e exigências legais em 15 de Janeiro de 1937.
Dirigiu-se a todas as entidades oficiais e departamentos do Estado aos quais os objectivos da Cooperativa interessavam, e de todos obteve a garantia do apoio indispensável à obra que se propunha levar a efeito.
O número de sócios e o capital da Cooperativa aumentaram vertiginosamente, e assim em poucas semanas estava assegurado o êxito de tam patriótico empreendimento. Foi aberto concurso para aquisição da primeira série de cem autocarros.
Não esqueceu a direcção o interêsse militar, sob o ponto de vista da defesa nacional, que representava para o exército as características do material a adquirir, e por isso se dirigiu ao Ministério da Guerra, com o qual manteve estreito contacto.
Em Junho de 1937 a Procuradoria Geral da Republica classificava de públicos e colectivos os transportes que a Anto-Mecânica de Portugal se propunha efectivar.
Em face deste facto resolveu a direcção acatar o parecer do chefe dos serviços do contencioso da Cooperativa e recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo do despacho ministerial que homologou a classificação da Procuradoria Geral da República.
Tendo o processo corrido os seus tramites, instruído o recurso com parecer de vários professores da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, foram em 24 de Março e 28 de Abril de 1939 proferidos os acórdãos daquele douto Tribunal.
Dizem os acórdãos:
«Pêlos fundamentos que constam dos seus considerandos, anulam o despacho recorrido e decidem que os transportes, da Auto-Mecânica também dependem de licença, cabendo à Administração resolver, em face das circunstâncias, se o pedido lhe fôr formulado, quais as condições em que poderá utilizar os seus transportes».
Ficou assim clara e insofismàvelmente fixado que os transportes não eram públicos e colectivos, devendo, porém, a Cooperativa pedir licença para pôr os seus carros ao serviço exclusivo dos seus sócios.
Porque lhe foi sugerido não fazer o requerimento imediatamente, visto estar para breve a publicação do novo Código da Estrada, não se formulou aquele.
Porém, em 5 de Agosto de 1940, ao ver aparecer em Lisboa autocarros duma companhia para serviço do público, resolveu a direcção em obediência a indicações que lhe foram dadas, formular naquela data o requerimento, nos seguintes termos:
«A Cooperativa Auto-Mecânica de Portugal vem requerer lhe seja concedida licença para transportar exclusivamente os seus sócios nos seus autocarros, nos termos do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de Março de 1939».
A êste requerimento foi respondido que a licença devia ser requerida nos termos do disposto no regulamento aprovado pelo decreto n.º 23:499, com as restrições resultantes de serem os seus utentes pessoas determinadas.
Tendo sido pedidos alguns esclarecimentos à Direcção dos Serviços de Viação, a fim de a Cooperativa dar exacto
Página 195
12 DE FEVEREIRO DE 1942 195
e fiel cumprimento àquele despacho, tudo feito de acordo com as instruções emanadas daquela Direcção, efectuou o depósito exigido, e em 20 de Setembro de 1940, no Diário do Govêrno, 3.ª série, n.º 220, era publicado o edital de 13 do mesmo mês do Ministério das Obras Públicas e Comunicações - Direcção Geral dos Serviços de Viação - no qual se tornava público que, nos termos da legislação em vigor e dentro do prazo de vinte dias, podiam todas as pessoas e entidades interessadas dirigir à Direcção Geral dos Serviços de Viação representações sobre a concessão da licença requerida e examinar o respectivo processo na Repartição Técnica de Exploração e Estatística.
Constituíram um êxito formidável as manifestações, de todas as classes e organismos, de apoio ao referido requerimento; mais de 25:000 pessoas se pronunciaram pelo deferimento de tal pedido de licença.
Pronunciaram-se nesse sentido, entre outros:
A Comissão Central das Juntas de Freguesia de Lisboa, todos os sindicatos nacionais, Associação Comercial de Lisboa, Associação Industrial Portuguesa, União dos Grémios de Lojistas de Lisboa, Ateneu Comercial, Voz do Operário, Liga dos Combatentes da Grande Guerra, Montepio Geral, clubes desportivos, Cooperativa Militar, etc.
Em 11 de Outubro de 1940 estava o processo concluso e devia seguir para o Conselho Superior de Viação, para êste no prazo de quinze dias se pronunciar e o seu parecer ser a seguir submetido à homologação ministerial.
Não foi dado, porém, cumprimento àquele preceito legal.
E, assim, há mais de três anos que os autocarros se conservam numa garage, sem utilidade para ninguém, com os pneumáticos sofrendo a acção destruidora do tempo; valores que se perdem e que representam o sacrifício de muitos, sacrifício por vezes incomportável de tanto português pobre e humilde que, cheio de fé e esperança na melhoria das suas precárias condições de existência, tudo tem feito pela manutenção da Cooperativa.
Que com urgência se resolva o assunto, para tirar de vez ilusões e esperanças àqueles milhares de portugueses que julgaram poder transportar-se, na sua terra, nos seus carros e à sua custa, pondo ao mesmo tempo um dique ao caudal de ouro que anualmente sae para fora da nossa querida Pátria.
Diga-se sim ou diga-se não, mas ... dê-se uma resposta urgente.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Presidente: -Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão a proposta de lei que autoriza o Govêrno a criar um imposto sobre os lucros extraordinários resultantes da guerra.
Tem a palavra o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.
O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente: creio que um novo imposto se considera sempre como impopular. Sempre um novo imposto levanta clamores, queixas, protestos, acula cóleras, e isto se ergue mesmo no seio da massa daqueles que o tem como indispensável.
Um novo imposto é sempre energicamente combatido, sendo até mais pelos grandes que pelos pequenos contribuintes.
Há quem considere até, e sistematicamente, um imposto novo como um mal, um mal nem sempre necessário. Isto acontece com os que defendem que o Estado seja apenas um polícia de costumes, entendendo que tudo se reduziria a uma compressão de despesas e ao lançamento do uma taxa, outros que porventura imaginam que é necessário conscrever rendas e excedentes, lançar empréstimos forçados também, passando fàcilmente pois sem o emprêgo do imposto. Quer uns quer outros ameaçam o Estado com a bancarrota próxima, quer uns quer outros podem conduzi-lo nos tempos hodiernos ao crepúsculo vermelho da catástrofe final.
Um novo imposto é sempre impopular, e para muitos quási sempre um mal, mas os homens públicos consideram que seria fraqueza sem desculpa ceder perante as queixas, protestos e reclamações, permanecendo surdo e inerte às imposições da justiça e às necessidades financeiras da administração. Porém para além de tudo isto há a grande opinião pública - uma grande opinião pública que apoia sempre os governos patrióticos e esclarecidos, uma grande opinião pública recomendando que haja cautela e prudência, mas insistindo para que não falte a coragem fiscal, clarividência financeira e previdência.
Vem isto a propósito de quê?
Vem a propósito que Portugal entrou na Grande Guerra e não foi capaz de tributar os lucros de guerra.
Vem isto a propósito para afirmar que todos os povos que entraram na conflagração mundial de 1914-1918, e muitos neutros, como a Dinamarca, Suécia, Noruega, Suíça e Holanda, que permaneceram fora do antigo conflito, tributaram realmente os lucros de guerra.
Fizeram-se aqui, em Portugal, negócios formidáveis. Houve lauto banquete para toda a espécie de excedentes de lucros. Pululou por aí a fauna dos novos ricos; mas êsses lucros, que foram amassados pelo diabo, foi o próprio diabo que os levou. Para o Estado nada ficou, e nada ficou porque o Estado apenas tinha farronca mas não tinha coragem. Dispunha de muitos planos e projectos, mas não teve sequer uma lei.
Isto não podia repetir-se agora. Isto não podia repetir-se politicamente, porque o Estado passou para o outro polo. Sente-se hoje a energia governativa que enfrenta corajosamente os problemas e não titubia na realização da justiça social.
De resto, oito meses depois da eclosão do actual conflito, vários países, como a África Equatorial Francesa, Austrália, Bélgica, Canadá, Finlândia, França, Inglaterra, Espanha, Índias Holandesas, Índias Britânicas, México, Noruega, Suíça e África do Sul, estabeleceram o imposto sobre os excedentes de lucros de guerra.
Expliquemos que a Alemanha não tributou êsses lucros pela simples razão de que não precisa. A Alemanha dirige totalitàriamente todos os preços e limita, dentro das bases mais estreitas e na origem, todos os lucros. Compele ainda os rendimentos, e, portanto, esta espécie de lucros marginais não existe - pelo menos teoricamente - na organização económica alemã.
Ora nós já estamos a trinta meses de guerra, e Portugal numa posição muito digna e firme sofre toda a espécie de consequências económicas e financeiras. Repito: Portugal não pode reincidir no êrro, pasmar na inacção, não pode repetir uma lição de fraqueza. De mais a mais, em todas as guerras e conflagrações o sentimento indistinto acerca das cousas da guerra é contra os negócios que, por virtude dela, se fazem e tonto favorece, sobretudo, muito mais ainda contra os lucros que tais negócios asseguram.
Antes de passar adiante, uma ligeira observação apenas sôbre o processo constitucional.
A Assemblea Nacional pôs o seu ponto de vista na lei de meios para 1941 sôbre este assunto. Tomou uma iniciativa; tem de honrá-la, tem naturalmente de se-
Página 196
196 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 124
gui-la. Não estamos, entretanto, amarrados a uma solução.
Lembro isto, mas não esqueço também que ainda há pouco tempo, como se demonstrou, levantou-se aqui elevadamente a questão da hidráulica agrícola. Nada houve que temperasse ou dificultasse o processo dialéctico. Tomámos uma iniciativa mas não estamos amarrados a uma coluna.
A Assemblea Nacional representa o interêsse geral indiviso, o bem comum; não representa classes, não representa sectores económicos, não representa sectores de opinião: combate em prol comum. Tem de desprender-se, portanto, de preocupações restritas, para visionar os problemas num plano geral de conjunto.
A Câmara Corporativa, pelas suas secções e pela pena do seu ilustre relator, um nome financeiro muito conhecido, apresentou observações, sugestões, apontamentos, muito interessantes para o estudo da questão.
É pena que as respectivas secções não nos tenham dito nada da sua particular experiência relativamente aos ramos de negócio em que êsses sobrelucros se manifestam, por vezes.
Eu creio ser fácil de compreender a necessidade que há de novos impostos, pois que, de momento, não deve comprometer-se a elasticidade do actual sistema tributário.
Há, por outro lado, necessidade de recursos pecuniários crescentes, e o mais precavido e o mais sensato sempre é presumir-se que a guerra será longa, será dispendiosa, que os encargos subirão, que as despesas militares não hão-de limitar-se e contarmos ainda com quebras e fugas de rendimento. Emfim, guerra demorada e dispendiosa, mesmo em neutralidade estrita.
Isto impõe, claro está, o recurso imediato, directo, a novos sacrifícios fiscais, a novos tributos, de forma o tornar o sistema mais rendoso e porventura menos pesado onde já faz pressão, a novos impostos portanto para obviar, às necessidades financeiras e a falhas de rendimento na própria tributação e no conjunto das receitas.
Qual era o pensamento doutrinal, a idea construtiva dos teóricos, a teoria adoptada na outra guerra e que serviu de base aos construtores do direito?
O imposto sobre os excedentes de lucros de guerra era considerado uma taxa altamente moralizadora e uma taxa bem intencionada. Porque, polìticamente e até psicològicamente, o grande lucrador tinha de pensar que na sua margem de excesso de lucro entrava a guerra como simples favor; não contava, portanto, nem a sua inteligência construtiva nem o seu talento de organização, nem o próprio trabalho: entrava, sim, a fortuna caprichosa que a guerra representava.
Era um bafejado da sorte e nada mais. E nesta íntima convicção gerava-se a idea de que algo era devido à própria sociedade. E tam sério era êste argumento que não se conhece na literatura da especialidade qualquer objecção séria contra o mesmo formulada. Mas, sob o ponto de vista de justiça social, o caso tinha aspectos mais profundos e graves.
Emquanto a maioria sofria, entrava em novos sacrifícios, empobrecia, não deviam naturalmente alguns fazer negócios por tudo isso e sôbre tudo isso auferir lucros anormais, locupletar-se à custa de quási todos.
Os riscos sôbre a colectividade, as perspectivas de angústia para os homens e para os países, o futuro das nações, cheio de pontos de interrogação no horizonte, não permitiam que alguém tivesse aqui uma base legítima de enriquecimento anti-social.
Nâo há paridade de situações entre aqueles que sofrem e se sacrificam, que suportam aos ombros o pêso inteiro da crise económica, arrastados no naufrágio, e aqueles que conseguem solucioná-la e ultrapassá-la e que assistem da praia, seguindo apenas os trabalhos de salvamento.
Era êste o pensamento dominante na doutrina e nos homens da literatura económica, que teve preponderância nos construtores jurídicos de então.
É sempre difícil isolar o sobrelucro. E, se tivermos em vista qual o carácter específico do mesmo lucro, o que será? Onde começa? Onde acaba? Em que consiste? Qual o carácter específico? A prática resolve, como sempre, o caso de uma forma simplória. Depois do limite, o excedente deriva do estado de guerra. Mas o simples entra em todas as combinações de geometria plana. Não há, por isso, ninguém que deixe de dizer que Euclides tinha as suas razões ...
Depois os economistas também fazem observações sérias e graves e vão às origens económicas para verificar todos os factos e seguem os repercussões de que há efeitos no equilíbrio económico. E então dizem: o produtor alcançado pela tributação dos lucros de guerra torna-se desconfiado, aplica os seus capitais a mêdo e foge com os seus capitais, é claro. Consome o que ganha a mais em extravagâncias. Torna o capital evasivo.
A lei acode a estas dificuldades, e a nossa lei actual procura remediá-las.
Por outro lado, rebate-se o espírito de iniciativa e empreendimento. A observação de agora confunde-se porém com a anterior, no fundo.
Pelo processo de ordem económica, repercutem-se sôbre a classe menos protegida, sobre o mundo consumidor - e isto faz-se subtilmente, a mêdo, obscuramente -, os lucros que lhes são tributados, e então verifica-se que estes lucros caíram em pêso sobre as classes consumidoras e trabalhadoras. Aparece, no fim de contas, um imposto indirecto sobre os consumos. A resposta é esta. O fisco não dormirá.
Tudo isto se faz imperceptívelmente na ordem dos factos económicos.
Mas a resposta a dar a estas observações é que quem lança um tributo desta natureza tem de estar atento a todas as repercussões e efeitos devolvidos.
A prática da outra guerra era dada uniformemente por algumas grandes leis.
Assim, a lei americana de Março de 1916 colocava o Govêrno como principal comparticipante de um sobrelucro de guerra. O Govêrno Americano reservava para si quási a totalidade dos lucros de guerra. E assim, participando neles, deduzia para seu apuro apenas uma taxa de desconto de 7 a 8 por cento.
Peço atenção para estes números, porque êles realmente estão muito aquém dos números contidos na presente proposta.
Estas percentagens tiravam-se sôbre rendimentos determinados nos anos de 1911, 1912 e 1913. A tarifa era progressiva e escalonada - sabe-se qual o significado técnico destas expressões -, compreendendo percentagens entre 20 a 60 por cento.
Em Inglaterra tributava-se o lucro que excedesse em mais do £ 200 o lucro normal. A taxa, que era de 50 por cento a princípio, passou em 1916 a 60 por cento, em 1917 a 80 por cento e em 1919, já depois da guerra, regressava a 60 por cento.
Era deixada ao contribuinte determinada opção adentro de um sistema de cálculo baseado no capital.
Considerava-se nesse caso lucro de guerra o que excedesse nas empresas 6 a 7 por cento do capital investido na empresa no começo da guerra.
A frança publicava a lei de 31 de Julho de 1916 e distinguiu os lucros suplementares dos lucros excepcionais.
Os primeiros eram os que os comerciantes e industriais realizaram, graças ao estado de guerra, no exercício normal da sua profissão habitual, mas além do que
Página 197
12 DE FEVEREIRO DE 1942 197
teriam ganho em circunstancias normais. Os segundos aram os que quaisquer pessoas tivessem realizado por operações lucrativas fora das suas ocupações habituais ou por fornecimentos ao Estado.
Incidia sôbre os lucros que excedessem o normal - média dos últimos três anos -, que não podia, em caso algun, ser inferior a 6 por cento do capital investido nem a 5:000 francos por ano.
Este limite aplicava-se, como único, àqueles que tivessem iniciado no ano do lançamento o exercício do comércio ou indústria.
A taxa era a principio 50 por cento; passou depois para 60 por cento e a lei de 31 de Julho de 1917 tornava-a progressiva nestes termos:
Leu.
A Itália compilou varias leis no texto uniificado de 8 de Junho de 1918
Leu.
Tal era a teoria e a prática ao tempo da Grande Guerra, em que nós, repito, espantosamente não tributámos lucros de guerra.
O pensamento actual, porém, parece, evolucionou. Passou-se da ordem dos factos jurídicos para o campo meramente económico. Da justiça distribuïtiva passámos agora para a apreciação no campo das relações económico-financeiras, dos departamentos parlamentares e e ministeriais saltou-se para o gabinete de estudo onde funciona o barómetro económico. Vejamos:
São benefícios de guerra os chamados benefícios marginais de conjuntura económica. Julga-se necessário travar toda esta espécie de ganhos absorvendo-os pela finança pública. Há, em algumas mãos, excesso de disponibilidades que podem, de alguma forma, perturbar a economia pública, desequilibrar a moeda, alçar os preços, provocar danosas redistribuïções entre as classes.
O Estado tem então de colectar, para reprimir êste excedente disponível de poder comprador, o qual ameaça desequilibrar os consumos individuais e até desorientar e avariar os mercados. Creio que o exemplo dos volframistas ilustra bem êste capítulo.
A segunda razão liga-se a uma idea bem vincada, mais subtil, e que entra na chamada teoria germânica do circuito económico.
Compreende-se que a tributação dos sobrelucros nem sempre seja exacta, e portanto pode suceder que de vez em quando, dados os defeitos da mecânica, se considerem como lucros de guerra algumas vantagens fictícias, alguns lucros que não são lucros de guerra, e algumas desvalorizações que não resultam da conjuntura ou da crise económica.
Mas tal objecção de receber é atenuada, perde alguns efeitos em face daquilo que se chama o movimento circular dos capitais, devidamente considerado.
Muito resumidamente, porque a teoria é longa de expor.
Os capitais soem da poupança e de outros meios de administração. Revestem-se depois das notas de banco. Vêm para o mercado, espraiam-se, dividem-se, produzem ganhos, novas aquisições, distribuem-se novamente, etc. Mas a circulação dos capitais tem de ser fluídica, fácil, ligeiramente veloz e moldada nos meios tradicionais; não pode sofrer condensações, nucleação, borbulhas - vamos. Não pode haver, portanto, exageros e extravagância de lucros, porque êles, realmente, representam uma dificuldade no fluxo de capitais como a economia o quere. Daí a idea de que os lucros de guerra devem sofrer uma tributação para tornar a vida do capital mais célere e fluídica.
É a base deste raciocínio de ordem económica e da tradição de ordem jurídica, tam conhecidas e reclamadas, que eu vou citar dois exemplos, muito próximo um dêles, e relativos à prática fiscal actual.
Quero referir-me, em primeiro lugar, à lei espanhola, de 21 de Outubro do ano passado, sôbre lucros de guerra.
O Govêrno Espanhol reconhece que há sectores enormes da população espanhola que estão sujeitos a duríssimos sacrifícios, o que permite que certas actividades económicas, tanto industriais como comerciais, façam lucros excepcionais, lucros derivados da conjuntura económica. E com base nisto articula-se o seguinte:
Em primeiro lugar, que o imposto sôbre lucros de guerra recaia sôbre os negócios comerciais e industriais. Os lucros taxados como excedentes para efeito de tributação avaliam-se pela média anterior a 1936. Os que não atingem 7 por cento do capital - e cá temos nós uma percentagem realmente muito baixa -, do período anterior àquela data, não se contam. O mínimo de isenções das emprêsas vai até 25:000 pesetas, e há para tributar tudo isto uma escala progressiva, que começa em 40 por cento sobre a fracção de 40 por cento do capital e acaba em 80 por cento sobre a fracção de 60 por cento do capital.
Outro exemplo similar é o da Itália. Neste país entendeu-se que a função do novo imposto resulta mais ampla e rasgada, e tanto assim que êsse imposto é designado por « imposto extraordinário sôbre as vantagens da conjuntura bélica realizadas pelas empresas comerciais e industriais ». Pretendeu-se reduzir, de certo modo, aqueles defeitos e dificuldades notados na realização dos lucros de guerra; no tempo da conflagração mundial de 1914-1918. Para isso estabeleceram-se disposições de maneira a evitar:
1.º Uma incidência tardia sobre os lucros de guerra.
Os lucros, quando apareciam ao fisco, começavam já a envelhecer. Quere dizer: procurou-se captar os lucros desde logo.
2.º O excesso de carga de alguns contribuintes resultante da tributação presumida, e não dos rendimentos pessoais realmente auferidos.
3.º Que não se disponha no início de uma base estável.
A parte dispositiva da lei contém ainda outros princípios interessantes, como sejam: a base de tributação é o biénio 1937-1938. Apenas 8 por cento do capital é contado como rendimento normal. Não se faz caso da desvalorização da moeda. A tarifa é progressiva e escalonada, começando em 10 por cento e acabando em 60 por cento. Nas sociedades e entidades colectivas esta tributação assenta num balanço anual, considerando-se como tendo um rendimento original igual a 8 por cento do capital subscrito ou igual à maior soma necessária para garantir um dividendo de 6,5 por cento.
O sistema de determinação da matéria colectável assenta na declaração fiscalizada do próprio contribuinte.
Em face disto, quais podem ser os traços característicos da proposta sujeito hoje a análise desta Assemblea?
A mecânica da lei portuguesa, ainda que remodelada e um pouco aperfeiçoada pelas emendas propostas aqui e por algumas recomendações da Câmara Corporativa, comparada com outros exemplos de prática fiscal, permite estas observações: os descontos garantidos ao contribuinte, para efeitos de determinação do quantitativo do excedente colectável, atinge entre nós, benèficamente, 20 por cento, maior moderação de tarifa progressiva prevista na parte final da base IV (nova numeração); atenua-se a colecta para as novas instalações e apetrechamento conferido na origem dos lucros (base IV, alínea a); concede-se isenção parcial para algumas aplicações de capital e para os casos da sua legal consolidação, como, por exemplo, para o fundo de renovação da frota; adopta-se um processo não demasiadamente inquisitorial porque a declaração figura como acessório na nossa tributação.
Página 198
198 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 124
Tais são as conclusões que se podem tirar da apreciação, em confronto, da nossa lei com as leis similares.
Também o nossa lei dispõe singelamente, e foi fácil verificar nas sessões de estudo como era possível tomar contacto com a própria lei e com a sua mecânica.
Ora tanto o fisco como o contribuinte, tanto o credor Estado como o devedor pelo imposto exigem e requerem simplicidade.
Todos precisam de uma ordem fácil e razoável no conhecimento daqueles fins e da mecânica, todos querem que sejam eliminados os elementos de incerteza, pois a maior parte das leis de lucros de guerra têm sido marcadas de uma complexidade inextricável. Suponho que entre nós, analisando rapidamente a proposta de lei sujeita à discussão da Assemblea Nacional, é fácil, tomar conhecimento de toda a mecânica prevista e dos seus fins.
O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª acha-a fácil?
O Orador: - Julgo-o. A alta dos pregos derivada da desvalorização da moeda é geral e uniforme, em certo modo lenta e segura, conforme se vê do índice geral do Boletim de Estatística e do índice particular do Banco de Portugal. Eles mostram que ela é mais reduzida do que geralmente se supõe. Por outro lado, a sanidade bancária, a capacidade exterior da moeda, a falta de inflação de crédito confirmam e garantem tal leitura.
Mas, pregunta-se: não haverá lucros de guerra?
Pois não haverá realmente lucros de guerra?
O Sr. Melo Machado: - E a lei é sôbre lucros de guerra?
O Orador: - É sobre lucros de guerra; leia V. Ex.ª particularmente a base nova da proposta. Mas, repito, não haverá realmente neste País e neste momento lucros de guerra?
Certos negócios não têm progredido espantosamente?
Não haverá mesmo novos-ricos?
Não haverá lucradores conhecidos e desconhecidos?A, que tinha o negócio mal parado e que dispõe já de cabedais imensos, não pertencerá à classe dos que ganharam com a conjuntura?
B, que tinha 100 há dois anos e que compra agora por 1:000, não terá um excesso marginal sôbre os lucros da sua classe?
Certas classes conhecidas não terão lucros excepcionais?
A lenha, o volfrâmio, o papel, a cortiça, o estanho, os adubos, o ferro, a sucata e tantos outros, quando não tenham dado a muitos, não terão realmente dado benefícios excepcionais e marginais a alguns?
Claro que os lucradores e especuladores formam minoria; maioria são, em regra, os explorados por estes!
Portanto não interessa propriamente a grande marcha dos fenómenos, quer monetários, quer de equilíbrio económico. Interessam, sobretudo, as particularidades verificadas em cada sector, aqueles negócios que fogem àquilo que é a sua lei usual. Interessam os casos concretos, os casos que o fisco e as comissões hão-de acabar por conhecer, se não sabem já o bastante.
Podem um ou dois ganhar, quando todos da mesma classe perderam. Podem ganhar os de Lisboa, quando perderam os da província, e inversamente.
Podem alguns ter possibilidades de monopólio no mercado e, por isso, tornarem-se também lucradores de guerra. Pode não aumentar o volume das transacções, pode deminuir mesmo. Podem na marcha geral não subir os preços e, entretanto, fazerem-se os maiores lucros de guerra.
Pode vender-se menos calçado, faltarem as peles; mas se se venderem os coturnos com dois ou três andares de cortiça ou madeira por 2, 3 e mais libras também aí não faltará um lucro certo de guerra.
Pode haver sobrelucro mesmo quando haja proibições e restrições, porque é naturalmente nessa altura que alguns fazem subir os seus negócios e se abalançam a ter ganhos marginais, conseguindo passar por cima de tudo.
Enfim, alguns ganham, muitos perdem, a Nação perderá mais, e será bom e justo que aqueles não ganhem tudo para si e alguma cousa devolvam à sociedade onde vivem, a qual lhes permitiu a magia de converter o sacrifício alheio em fortuna própria.
Conhecem-se as dificuldades. Como se distinguirá o sobrelucro da conjuntura do lucro usual?
Como distinguir o sobrelucro não só das vantagens aparentes como do aumento natural das actividades?
Pregunta-se mesmo:
Haverá um ficheiro dos açambarcadores, de lucros clandestinos e de negócios fraudulentos? Haverá um catálogo dos volframistas? Como se ultrapassam todas estas dificuldades? Como se resolvem os novos problemas?
E os negócios ilegais e clandestinos? Conhecerão as repartições e as comissões todos os enriquecidos fulgurantemente?
Em primeiro lugar, o legislador não pode restringir a base da contribuição, de molde a torná-la dispendiosa e infecunda - a cultura forçada não pode substituir a seara.
O legislador terá de tomar uma posição sensata e equilibrada. Estabelece limites e fixa percentagens, procurando-se desagravamentos e atenuações ...
O Sr. Melo Machado (interrompendo): - V. Ex.ª falou em atenuações?
O Orador: - Falei, sim. Leia V. Ex.ª a base III.
Procura a verdade fiscal, um tudo nada ecléctica.
Houve realmente atenuações, mas não houve privilégios de fiscais. De outra maneira criavam-se desigualados financeiras. Voltava-se ao ancien régime. Quebrava-se a igualdade jurídica. Tingia-se tudo de um absurdo maior quando o privilégio fôsse deferido às entidades mais poderosas.
E quem tem de idealizar um regime tributário há-de preocupar-se com as consequências.
Será necessário evitar que a carga passe, dos ombros do beneficiário de guerra para o comprador.
Será necessário evitar o hábito, assaz, conhecido, de vender só depois de pagar o imposto.
Será preciso evitar toda e qualquer malfeitoria sôbre os bens necessários à vida.
Portanto há que tributar os lucros de guerra, mas não me parece que esteja em causa, como alguns pensam, o nosso sistema fiscal.
Talvez fôsse idea de muita gente que haveria necessidade de reformar o nosso sistema de tributação no sentido do realismo e da personalidade. Mas não estará isso em causa. Nenhum financeiro em tempo de guerra, e, para mais, ante um conflito mundial desta amplitude, iria correr êsse risco de reformas.
Se a tributação dos sobrelucros de guerra se baseia na declaração, é porque êsse é um processo habitual e genérico considerado indispensável na técnica tributária e que funciona apenas como complemento de um sistema fiscal que já deu as suas provas. Entre a presunção e a realidade, entre índices externos e a declaração há apenas um ligeiro ajuste, um ligeiro contacto que corrige e atenua os defeitos recíprocos, as objecções respectivas e fatais a qualquer dos sistemas
Página 199
12 DE FEVEREIRO DE 1942 199
analisados é que teòricamente se completam entre si e se atenuam nos resultados.
Este imposto tem uma grande tradição jurídica o melancólicos precedentes neste país.
Não o lançar seria uma timidez inconcebível, uma reincidência indesculpável, uma omissão histórica, absurda, surdez perante a justiça e o geral clamor.
Apoiados.
Vários Srs. Deputados apresentaram uma proposta de emenda depois das sessões de estudo.
Todas as objecções, reparos, queixas, argumentações foram largamente consideradas e ponderadas.
A Assemblea Nacional, fazendo-o, procurou chegar a um resultado justo, esclarecendo, alongando, melhorando, sem um desvio essencial, sem nada prejudicar, na substância da proposta.
E hoje há uma tal compreensão das cousas públicas, das necessidades financeiras do Estado, uma tam honrosa posição nesta matéria, que suponho que muitos daqueles que lucraram com a guerra, se aqui estivessem, pediriam apenas, como nós, justiça para todos.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Antunes Guimarâis: - Sr. Presidente: estava o Govêrno autorizado pela Assemblea Nacional, conforme o disposto no artigo 5.º da lei n.º 1:958, a cobrar impostos sôbre lucros extraordinários de guerra.
Contudo, com muito agrado meu, quis o Govêrno, por intermédio do ilustre Ministro das Finanças, dar-nos a honra de podermos apreciar o critério que se propõe seguir em tam importante e grave matéria. E compreende-se que a nossa colaboração seja pedida, por isso que na proposta agora em discussão, ao lado de preceitos de ordem estritamente técnica, surgem princípios de marcada importância e actualidade, constituindo, particularmente, um dêles valiosa e oportuna novidade, que muito ilustra o seu autor, como já o ilustrava, pelo alcance económico, a determinante principal do empréstimo de 500:000 contos, a juro de 3 1/2 por cento, aqui recentemente aprovado. Trata-se de novidades que, repito, muito ilustram o espirito de um novo, que hoje, com muita competência, ocupa o alto cargo de Ministro das Finanças.
Nas considerações que precediam a proposta de lei sôbre o empréstimo de 500:000 contos a 3 1/2 por cento afirmava-se procurar-se deter a queda brusca das taxas de juros e reduzir ao mínimo o perigo da inflação de preços pelo excesso de disponibilidades particulares, fins para os quais o Govêrno não teve dúvida em sacrificar os interesses da Fazenda Pública, cujas disponibilidades lhe permitiam conservar-se por largo período fora do mercado de títulos.
Agora estimula-se o desenvolvimento da produção através da base III do diploma em discussão, porquanto nela se prevê a isenção do imposto da categoria a) e de 50 por cento das taxas da categoria b) para a parte dos lucros extraordinários de guerra aplicados a novos investimentos industriais tendentes ao desenvolvimento da produção.
Por outro lado, se no primeiro daqueles diplomas fôra afirmado, como fica dito, que a Fazenda Pública não estava carecida de disponibilidades, e, assim, era exclusivamente económica a sua finalidade, na proposta que estamos a discutir citam-se avultados encargos do Estado originados pela guerra, como justificação do imposto excepcional sôbre lucros dela derivados.
Êste último ponto não tem discussão: uma vez que a defesa do País exige despesas de vulto, há que dotar o Tesouro com os fundos indispensáveis para iniludívelmente a garantir.
Ora todos sabem que, em certas actividades, infelizmente pouco numerosas, se têm verificado lucros extraordinários devido ao estado de guerra, sendo absolutamente justo e oportuno que a tributação incida desde já e preferentemente sôbre elas, para que se poupem outros rendimentos já pesadamente contribuídos e que à guerra quási não devem senão dificuldades, e até prejuízos.
Embora constitua sempre sacrifício entregar ao Estado parte do que se ganha com trabalho, risco e legitimamente, é de registar que a opinião pública aceita bem este imposto excepcional.
Contudo, se fórmulas novas nos trazem os dois referidos diplomas, também se regista no que presentemente discutimos manifesta tendência para regressar ao critério de tributação do rendimento real que, com aplauso unânime, fora quási totalmente abandonado nas reformas fiscais do Estado Novo, por não corresponder a nossa tradição nem ser compatível com a mentalidade dos contribuintes portugueses.
Recordo o aplauso público com que foram recebidos os diplomas que acabaram com as declarações obrigatórias para o lançamento do imposto pessoal e progressivo de rendimento, taxa militar e outras exigências fiscais de que os contribuintes se defendiam como lhes era possível, mas sempre expostos a denúncias, devassas e consequentes multas elevadíssimas. Ficaram-nos ainda as declarações exigidas às emprêsas acêrca de suprimentos e operações equivalentes para cobrança do imposto sôbre aplicação de capitais, o qual, bem visto, não passa de uma duplicação tributária, por isso que no cálculo presumível dos lucros já se entra em consideração com o movimento total de cada emprêsa e, assim, de suprimentos e outras quantias entradas na respectiva circulação comercial. Trata-se de fórmulas que determinam para o reduzidíssimo número de legalistas uma situação de manifesta inferioridade em relação aos que nada declaram (a quási totalidade) mas que vivem em sobressalto, na contingência de denúncias que os exporiam a multas elevadíssimas, quási sempre equivalentes à ruína.
O trabalho nacional carece de sossêgo e segurança, sendo urgente que se expurgue o regime fiscal que regula todas as actividades de fórmulas como as que venho de citar, para que não se gerem situações falsas e nocivas de concorrências desiguais, de ocultamente de lucros, de escritas que não exprimem a verdade e outros expedientes.
O trabalho nacional tem que ser dignificado, mas para isso indispensável e urgente se torna que a legislação fiscal se adapte rigorosamente à nossa tradição e à mentalidade dos portugueses.
Neste como noutros capítulos nada de útil temos que aprender do estrangeiro; verifica-se, com muita honra para nós, que são os estrangeiros que vantajosamente poderão lucrar com as nossas lições.
Por isso se me afigura mais razoável permanecermos fiéis ao critério da presunção de lucros, que geralmente acerta, mercê da multiplicidade de indicadores que orientam o fisco nos seus cálculos, e evitar a investigação do lucro real, que exporia os contribuintes à devassa das suas escritas, sem vantagens apreciáveis, mas não isenta dos mais graves inconvenientes, entre os quais tem relêvo particular a quebra do segredo profissional.
Em Portugal, onde não têm vingado as modas de variadíssimos « nudismos », também não encontra clima propício o « nudismo » fiscal, revelado na tendência que se vai esboçando através da respectiva legislação.
Coerentemente com o que venho expondo, afigura-se-me contraindicada a declaração dos lucros de guerra exigida a emprêsas e determinadas entidades, a qual, nos termos da base V, deveria constar da indicação dos ren
Página 200
200 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 124
dimentos ilíquidos realizados em 1941, acompanhada dos respectivos balanços e de todos os elementos demonstrativos do lucro extraordinário, nos termos da base III. Em primeiro lugar, como já foi dito, o lucro ilíquido, tal como o fisco o define, é absolutamente, arbitrário e, como tal, não deve ser tomado como base de uma tributação que, mal calculada, sem se atender às múltiplas despesas das emprêsas comerciais e industriais e ao preço da recuperação das existências anteriores, exporia muitas firmas a ruína, além de constituir uma devassa absolutamente desnecessária, nociva e, como tal, condenável.
A circunstância de a lei de minas ter sido por mim assinada exige que me refira à fórmula de tributação adoptada naquele vasto sector de trabalho, a qual não é baseada em simples presunção, como se verifica na generalidade dos casos, mas no valor real da extracção à bôca da mina. Importa ter esta circunstância na devida atenção para que se evitem duplicações tributárias na actividade mineira, bem como noutras indústrias em que a tributação incida também sôbre o valor real da produção ou da exportação.
Chegar-se-ia a resultados mais exactos e sem aqueles inconvenientes, dividindo as actividades comerciais e industriais em classes e atribuindo a cada uma delas, com base na multiplicidade de indicadores que o fisco não ignora, coeficientes na proporção dos lucros extraordinários que presumivelmente hajam realizado. Aos que se julgassem indevidamente tributados seria garantida a faculdade de o demonstrarem, mas evitando sempre que possível devassas, que sistematicamente são pouco recomendáveis.
E vem a propósito a conveniência de se garantir aos contribuintes que entendam ter sido prejudicados no cálculo do imposto a pagar, não só o recurso para as comissões de reclamação, mas para os tribunais do contencioso das contribuições e impostos, isto é, onde a maioria dos julgadores não pertença a representantes do fisco. Neste, como em todos os casos, importa, para prestígio do Estado Novo, pôr bem em evidência que aos reclamantes são garantidos todos os meios para que a verdade surja e a justiça triunfe.
(Assumiu, a presidência o Sr. José Alberto dos Reis).
É bem de ver - e já desta tribuna ilustres colegas nossos o salientaram com números indiscutíveis - que se a base dos lucros ilíquidos presumíveis, orientadora do cálculo do imposto até agora pago pelo comércio e indústria, era prudentemente alterada, a fim de se corrigirem coeficientes exageradamente elevados e que os contribuintes não poderiam suportar, não devendo, por isso, ser agora aproveitada para, sem uma justa e prudente correcção, servir de base à apreciação dos lucros extraordinários, também importa absolutamente atender ao custo da indispensável recuperação das existências anteriores, para que a emprêsa não sossobre, o qual não deixará de ser elevadíssimo, apesar da robustez da nossa moeda, firmada em alicerces de ouro em barra e outros valores reputados estáveis.
É que neste transcendentíssimo problema do valor da moeda não basta a solidez fundamental daquele alicerce aurífero, por isso que a influência de factores importantes de ordem económica, e também psicológica, é de molde a provocar surprêsas de avultada desvalorização, quando o montante do ouro, cuja influência é notoriamente mais acentuada no mercado internacional do que na economia interna, tudo indicava no sentido de franca valorização monetária. Cumpre não esquecer que a circunstância de a extracção do ouro ser manifestamente insuficiente para atender ao progressivo aumento da circulação económica já levou o monometalismo a gritar por socorro e ir aceitando o valioso concurso da prata, que assim vai regressando do destêrro a que havia sido condenada.
Não é este o momento para dissertar sôbre tam complexo como momentoso problema. Mas, para o caso que está na ordem do dia, importa reconhecer que os factores psicológicos têm entrado na liça e fazem com que, apesar do nosso importante depósito de ouro e da política inteligente e oportuna de defesa do escudo, como se verificou com as determinantes do empréstimo de 500:000 contos a 3 1/2, por cento, que esta Assemblea Nacional aprovou na presente sessão legislativa, e, embora reconhecendo que, de facto, essa valorização se revela, com grande prestígio para Portugal, no mercado dos câmbios, importa reconhecer, dizia eu, que no mercado nacional crescem consideràvelmente as despesas inadiáveis, como sobe a cotação dos grandes valores, cuja estabilidade através dos séculos demonstra que no momento presente, em relação a êles, a moeda marca certo declínio.
Estas considerações levam-me à conclusão de que os resultados de muitas actividades, aparentemente expressos em lucros avultados, mais não representam na realidade que prejuízos muito sérios e que no cálculo dos lucros extraordinários têm de entrar em equação pelo seu real e justo valor.
Isto não quere dizer que não haja lucros reais e importantes em certas actividades: conhece-os o Govêrno, como aliás toda a gente, e não terá o fisco dificuldades para a sua averiguação e correspondente tributação. Mas, repito, infelizmente são bastante mais limitados do que muita gente supõe e do que seria para desejar, pois com isso não lucrariam apenas os que com seu trabalho e inteligência os ganharam, mas o Estado, através das alfândegas e das tesourarias, e, de uma maneira geral, toda a Nação.
Sr. Presidente: na base III da proposta de lei marca-se, muito inteligente e oportunamente, um princípio de largo alcance económico: é o que isenta do imposto da categoria a) e reduz para 50 por cento as taxas da categoria b) relativamente à parte dos lucros extraordinários aplicada em novas instalações destinadas ao desenvolvimento da produção.
Se as necessidades do erário, por virtude das imperativas despesas para garantia da defesa nacional, pudessem dispensar o novo imposto, eu proporia que aos autênticos lucros extraordinários derivados das circunstâncias bélicas actuais fôsse dado êsse louvável destino, para que a produção nacional melhorasse em todos os sectores da actividade, não só da metrópole, mas nos vastos domínios do nosso Império Colonial. Contudo, uma observação me permito fazer, e faço-a pela responsabilidade que sôbre mim pesa do ter proposto e assinado a nossa primeira lei de condicionamento industrial, cujas disposições impediriam muitas emprêsas industriais de consagrarem os seus lucros extraordinários ao desenvolvimento da respectiva produção, eliminando-as assim da lista dos beneficiados com tam justificada isenção.
E o comércio, que, de uma maneira geral, não dispõe de estabelecimentos de produção?
E os comissários, intermediários e outras entidades que tenham auferido lucros extraordinários?
Entendo, Sr. Presidente, que providência tam benéfica deveria generalizar-se a todos os casos em que se tenham verificado lucros extraordinários derivados do actual estado de guerra, permitindo-lhes, para que possam aproveitar-se daquelas justíssimas isenções, aplicar parcial ou totalmente os lucros assim auferidos em empreendimentos metropolitanos ou coloniais de incontestável valor económico, cuja relação o Govêrno estudaria para ser de todos conhecida. Tenho a certeza
Página 201
12 DE FEVEREIRO DE 1942 201
de que tais lucros, que alguns, infundadamente, não olham com simpatia, passariam, como aliás bem merecem, a ser justamente apreciados pela opinião pública.
Sr. Presidente: no douto parecer Já Câmara Corporativa, onde o ilustre relator revela larga erudição, de entre tantos conhecimentos ali arquivados, entendo destacar o que se refere a situação da lavoura, expressa no confronto ali feito do aumento de preços dos produtos alimentares e não alimentares: emquanto os segundos subiram 48 por cento de 1938 para 1940 e 70,2 por cento para meados de 1941, os primeiros, predominantemente produzidos pela lavoura, apenas subiram 10,4 por cento de 1938 a 1940 e 28 por cento para meados de 1941.
No último relatório do Banco de Portugal conclue o ilustre relator que a lavoura de cereais, de 1938 para 1940, teve nos preços de venda apenas o insignificante aumento de 5,9 por cento, quando noutros sectores de actividade as altas registadas foram consideràvelmente superiores.
Já no modelar parecer sôbre as Contas Gerais do Estado em 1939, aqui apreciado na última sessão legislativa, o ilustre relator, Sr. Deputado Araújo Correia, aludiu à baixa, verdadeiramente alarmante, de depósitos realizados nos bancos e caixas económicas em regiões notoriamente agrícolas, referindo-se em especial à Madeira, aos Açores e aos distritos minhotos de Braga e Viana do Castelo.
E no presente parecer da Câmara Corporativa alude-se à baixa de depósitos verificada ao findar o ano de 1940 em oito distritos, dos quais destaca os três do Alentejo, região essencialmente agrícola.
Sr. Presidente: a lavoura, que tudo compra por elevadíssimos preços, vem pagando um autêntico tributo de guerra, não sôbre lucros extraordinários, que, como é geralmente sabido e se verifica por aqueles números, não realiza, mas em resultado da limitação de preços, em benefício da colectividade, com que os diferentes géneros agrícolas vão sendo sucessivamente agravados. E a propriedade urbana, cujos aluguéis a lei não deixa subir, ainda suporta em grande parte os prejuízos da antiga lei do inquilinato, publicada há muitos anos sob o pretexto do estado de guerra, mas que subsistiu durante vinte anos de paz e continua a traduzir-se num autêntico imposto de guerra, não sôbre lucros extraordinários que esta proposta de lei se propõe tributar, mas sôbre a escassez de recursos com que muitos proprietários se vêm debatendo.
Sr. Presidente: o assunto merecia mais comentários, mas outros Srs. Deputados não deixarão de subir a esta tribuna para com mais competência os fazerem; além disso o tempo regimental está esgotado. Em face das considerações com que muito tempo tomei à Assemblea, eu entendo que, às declarações que na proposta se exigem aos que tenham realizado lucros extraordinários, sob pena de multas pesadíssimas, exporia a menos vexames, seria menos perigosa e, sem dúvida, resultaria mais eficaz e muito menos trabalhosa a fórmula seguinte:
1.º O Govêrno fixará coeficientes para o cálculo dos lucros extraordinários de guerra correspondentes às diversas classes comerciais e industriais que presumivelmente os hajam realizado, mas atendendo sempre à necessidade imperiosa de recuperação das existências indispensáveis ao movimento normal respectivo.
A fim de garantir em todos os casos os benefícios das isenções constantes da base III, entendo conveniente estabelecer-se o seguinte princípio:
2.º Quando, mercê da lei de condicionamento industrial, fôr inviável a aplicação de lucros extraordinários em novas instalações destinadas ao desenvolvimento da
produção e respectivo apetrechamento, e, de uma maneira geral, tratando-se de emprêsas comerciais ou de outras entidades abrangidas nas bases desta proposta, poderá o Govêrno indicar empreendimentos de incontestável interesse económico, tento na metrópole como nas colónias, para colocação dos referidos lucros, com o benefício das isenções estabelecidas na base III.
A garantia de recurso para os tribunais poderia exprimir-se assim:
3.º Da deliberação pronunciada pelas instâncias competentes sobre a importância dos impostos n cobrar, ou acêrca das reclamações que os interessados tenham apresentado, é facultado recurso para os tribunais do contencioso das contribuições e impostos.
Eis, Sr. Presidente, as considerações que sôbre a generalidade de tam importante diploma entendi de meu dever submeter à Assemblen Nacional.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem! Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Melo Machado.
O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: vou começar por pedir desculpa de não trazer escrito o meu discurso. Falo de improviso por razões que não vale a pena expor à Assomblea.
Tenho ouvido aqui interessantíssimas prelecções sôbre finanças, e, é claro, essas prelecções foram tam eruditas que pouco haverá a acrescentar-lhes. Considero-me aliás absolutamente insuficiente para dizer seja o que for sôbre tal matéria.
Não apoiados.
Tem sido apenas da prática que tenho arrancado o pouco que sei sôbre o assunto. Eu não posso dizer a respeito deste problema a V. Ex.ª outra cousa que não seja o reflexo duma análise fria deste diploma.
Tem-se querido aqui justificar a aplicação do imposto sôbro lucros de guerra, e parece-me que essa justificação não era necessária.
Apoiados.
A ídea partiu desta Assemblea. Ninguém portanto menos classificado para combater a proposta no seu ponto de vista fundamental.
Quais serão, por consequência, os aspectos que nos impressionam nesta proposta?
Eu há pouco interrompi um dos ilustres oradores que me precederam para lhe preguntar se S. Ex.ª tinha a certeza de que a proposta criava um imposto sôbre lucros de guerra.
E fi-la simplesmente por estas razões: é que, lida a proposta, eu não estou convencido de que se trata de imposto sôbre lucros de guerra, antes me parece que ela traduz pura e simplesmente uma alteração ao imposto industrial.
Diz-se até entre os funcionários de finanças que pude consultar sôbre o assunto que, aplicada esta lei na estrita letra em que está redigida, ninguém escapará ao referido imposto. E não é muito fácil contradizer esta afirmação. V. Ex.ªs já sabem como é lançada a contribuição industrial.
Diz êste diploma que ela é lançada sôbre o lucro ilíquido.
É claro que, já de si, esta palavra « ilíquido » concorre para estabelecer a confusão, e parece que as confusões são muito do agrado das leis fiscais.
Parece, de facto, que há sempre, mais ou menos, o propósito de deixar o contribuinte obscurecido sôbre aquilo que realmente tem de fazer, sôbre aquilo, em suma, a que se chama a incidência do imposto.
O Sr. Presidente: - Acho a afirmação de V. Ex.ª um pouco excessiva.
Página 202
202 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 124
O Orador: - Faça V. Ex.ª o obséquio de a emendar como entender.
Os contribuintes não são todos formados em ciências económicas e financeiras, e as leis fiscais incidem sôbre todas as pessoas, ilustradas ou não. Só haveria, portanto, vantagem em que a interpretação das referidas leis fôsse acessível a toda a gente.
Se a frase que empreguei não agrada a V. Ex.ª, eu direi que, sendo estas leis feitas por pessoas, superiormente competentes, com conhecimentos profundos do assunto, deviam ser percebidas por todos os contribuintes, ainda os de menos cultura intelectual.
O Sr. Presidente: - Pode acontecer às vezes, que qualquer lei não esteja redigida com a clareza que seria para desejar; não podemos, porém, admitir que tenha havido em caso algum o propósito de fazer leis obscuras.
O Orador: - Qualquer obscuridade é altamente inconveniente, e eu reparo que à volta desta palavra «ilíquido» se estabelece uma grande confusão.
Explica o parecer da Câmara Corporativa que, em resumo, êste lucro ilíquido é o lucro bruto representado pela diferença entre o preço da compra e o preço da venda, Mas há outra questão muito delicada: é que a contribuição industrial, de quási 22 por cento, constituo uma taxa evidentemente exageradíssima, à qual dificilmente qualquer actividade industrial ou comercial se poderá sujeitar. E, então, o contribuinte tem de fazer uma declaração à, repartição de finanças, da qual conste a indicação dos seus encargos, isto é, renda de casa, ordenado dos empregados e da gerência, etc., a fim de que o fisco avalie, se um determinado contribuinte precisa de ganhar determinada quantia para poder pagar a referida contribuição.
Esta é a base de incidência do imposto, e quando digo «é» não reproduzo ainda a verdade, porque o têrmo adequado, é êste.: «deveria ser». Com efeito, diz o parecer da Câmara Corporativa que muitas vezes, como esta taxa da contribuïção industrial é exagerada, ainda não é êsse lucro ilíquido á base de incidência do imposto, e o contribuinte, para poder pagar o imposto de X, terá de ter um determinado lucro ilíquido para o efeito.
Tomadas, estas premissas, que virá a suceder com a letra expressa do diploma?
Logo que alguém realize mais de 15 por cento sôbre o lucro ilíquido, será passivo do imposto.
Compreendem V. Ex.ª a minha perplexidade, visto que eu não sei evidentemente o que vai ser tomado em linha de conta.
Será o lucro ilíquido verdadeiro? Será o lucro ilíquido suposto, que não se sabe qual seja?
Se é Verdadeiro, então direi que toda a gente, absolutamente toda a gente, quer tenha lucros de guerra, quer os não tenha, fica envolvida na incidência, dêste imposto.
E assim todos serão abrangidos pelo imposto sôbre os lucros de guerra.
Quero chamar a atenção do V. Ex.ªs para um dos números do parecer da Câmara Corporativa. Apresentando o movimento das letras e referindo-se às letras protestadas dos comerciantes estabelecidos, diz o referido parecer que estas tiveram uma deminuïção de 2 por cento.
Ora, se o movimento das letras tem de facto um significado, qualquer que êle seja, para a situação financeira das firmas comerciais, é evidente que esta deminuicão de 2 por cento não traduz uma situação desafogada. Não é um índice de abastança ou de desafogo da situação comercial das emprêsas.
Por outro lado, todos nós sabemos - e também isso vem referido no parecer da Câmara Corporativa - que os preços têm subido e que, infelizmente, uma grande maioria dos produtos com que se comerceia no nosso País é de origem estrangeira.
E então dá-se um fenómeno, que não é novo, pois já se registou na guerra passada: é o de que a alta dos preços provoca, um maior movimento de dinheiro mas uma menor movimentação de mercadorias; e assim, á medida quê se vai vendendo o produto existente em armazém, há necessidade de comprar novas mercadorias, por preços mais elevados, circunstância que acarreta a necessidade de um capital maior.
Quando êste aumento de capital se não consegue sucede que os stocks se vão esgotando e por consequência a fortuna do comerciante, representada essencialmente pelos artigos do seu comércio, deminue em cada dia.
Há um outro aspecto a encarar ainda. Supondo, porventura, que os comerciantes auferem mais lucros que o costume, eu pregunto: se não há que encarar necessariamente o reverso da medalha, isto é, quem é que acode à situação dêsses comerciantes quando o final da guerra provocar uma caída vertical dos preços?
Aqui têm V. Ex.ª porque não me parece tam simples a aplicação do imposto sôbre lucros de guerra.
A primeira cousa que me impressiona é que, sabendo-se que a taxa do imposto industrial é exagerada, sabendo-se, pela prática de muitos anos, que ó necessário um artificio para a sua incidência, essa taxa não se tenha corrigido ainda.
É certo que a verdade fiscal é muito difícil de atingir, mas quando se tem constantemente conhecimento de deficiências desta natureza, parecia que a primeira medida a tomar era de facto corrigi-las, para se aproximar tanto quanto possível o imposto da verdade. As consequências de não se ter procedido assim são manifestamente inconvenientes, porque, agora, que queremos lançar um novo imposto, onde vamos procurar a base encontramos a falta. Esta situação suscita reservas e preocupações àqueles que porventura venham a estar incluídos na incidência dêste imposto, e quando digo porventura ainda revelo optimismo, porque manifestamente, embora não seja o propósito do legislador, não vejo maneira do, ao entregar-se êste diploma ao fisco, que o tem de cumprir, êle encontrar a forma de excluir da incidência do imposto aquelas pessoas que pela sua letra expressa nela estão de facto incluídas.
Compreendem, pois, V. Ex.ª que um diploma desta natureza não pode ser apreciado nem votado por esta Assemblea de ânimo leve.
Não poucas sessões realizou a Câmara Corporativa para nos apresentar o seu parecer. Antes pelo contrário. Contra o costume, essas sessões foram extraordinariamente numerosas e o parecer que veio a esta Assemblea reflecte evidentemente as dúvidas, as discordâncias e até o renhido da discussão travada naquela Câmara.
Nós tivemos apenas duas sessões de estudo e eu devo dizer a V.º Ex.ªs que 'durante elas o meu espirito não só se não esclareceu, como antes, pelo contrário, se obscureceu, certamente por deficiência minha.
Não apoiados.
Mas parece-me que num assunto desta importância é indispensável que cada um de nós traga para aqui uma opinião firmada num estado sossegado, num estudo exaustivo, direi mesmo, pois uma e outra cousa são indispensáveis ao conhecimento integral desta proposta.
Desculpem V. Ex.ªs o descolorido e desordenado das minhas considerações (Não apoiados), mas, como disse à V. Ex.ª, estou falando inteiramente de improviso; não tenho um apontamento sequer. Estou simplesmente falando e raciocinando alto sôbre êsste assunto
Há uma outra parte desta proposta que me impressiona seriamente: é a possibilidade de devassas as escritas particulares.
Página 203
12 DE FEVEREIRO DE 1942 203
Devo dizer a V. Ex.ªs que êste princípio me repugna e que repugna em geral à maneira de ser da nossa gente, e tanto assim que ainda hoje não foi possível efectivá-lo. Diz-se que êle se admite em muitos outros países. Mas nós temos de ter em consideração que os países onde se adopta esse sistema. têm outro feitio e têm outra maneira de ser e de viver.
É certo que existe, por exemplo, em Inglaterra. Mas tenho a certeza de que êsse sistema em Portugal nunca daria resultados que, do alguma forma, se assemelhassem. Em Inglaterra há outros costumes, e aquilo que lá é óptimo pode ser péssimo em Portugal, e vice versa.
Não devemos imitar os outros simplesmente porque se acha que é bom e que se realiza um qualquer pais, pois sabe-se que a nossa maneira do ser e até porventura a nossa pobreza podem ser circunstâncias impeditivas de certas maneiras de proceder.
De forma que as minhas considerações tendem simplesmente a isto: rogar àquelas pessoas que nos podem esclarecer, àquelas que têm dêste assunto um conhecimento profundo, às que, pelos contactos com o Govêrno, tenham, em suma, conhecimento exacto das intenções governamentais, que venham aqui tirar-nos estas dúvidas, esclarecer o nosso espirito, dar-nos a garantia de qual é a orientação que vai seguir-se na execução desta lei, pois não creio que haja neste momento em Portugal um único comerciante ou industrial que possa dormir descansado perante a iminência da aplicação desta lei tal como foi apresentada em público.
Disse aqui o Sr. Dr. Águedo de Oliveira que existem umas emendas; mas embora eu, talvez como privilegiado, tivesse passado a vista por cima dessas emendas, devo dizer que me julgo incompetente para as apreciar através de uma simples leitura.
Certamente a maioria dos Srs. Deputados não tomou conhecimento dessas alterações, e não será ainda amanhã, por meio duma simples leitura no decorrer da sessão, que nós poderemos ficar completamente esclarecidos.
O Sr. Presidente: - V. Ex.ª tem toda a razão na observação que acaba de fazer. Efectivamente, as emendas que foram apresentadas e que serão publicadas no final do Diário desta sessão precisam de ser estudadas com atenção, e não deve a Assemblea pronunciar-se sôbre elas sem as analisar detidamente.
Em consequência disso, estou na disposição de considerar hoje encerrado o debate, na generalidade no que respeita a esta proposta de lei e marcar para amanhã uma sessão do estudo relativa às referidas emendas, ficando para, a sessão de sexta-feira a discussão na especialidade desta proposta de lei.
O Orador: - Agradeço, Sr. Presidente, o esclarecimento, de V. Ex.ª e a sua resolução, porquanto me parece que ela é não só extremamente útil como também
indispensável
Há, evidentemente, uma ansiedade no público sôbre a resolução, que havemos de tomar neste assunto.
Devo dizer a V. Ex.ªs que, não me sentindo habilitado a votar, como não me sentiria se tivesse de deliberar sõbre essas emendas por uma simples leitura, eu me veria na necessidade de rejeitar a proposta in limine, contrariado evidentemente, porque, como já disse, não pode estar no propósito de ninguém não votar os impostos sôbre lucros de guerra, quando sejam do facto lucros de guerra e não um imposto que abranja indistintamente toda a gente, a não ser que o Govêrno nos dissesse que isso era absolutamente indispensável.
Mas então não deveria chamar-lhe «lucros de guerra». Nesse caso devia dizer-se que o Governo precisa de dinheiro, indo buscà-lo onde o houver. Então estaria certo.
Isto è tanto assim, Sr. Presidente, que até há uma representação na Mesa, enviada peio Grémio dos Lojistas - se não me engano -, onde se diz isto: • «Nós preferimos o aumento da contribuição industrial a sujeitar-nos a esta contribuição».
Este pedido é como que o desejo de ter um pára-raios, isto é, preferir a certeza de hoje à incerteza de amanhã.
Entre a incerteza e a imprecisão da lei, prefere-se ter uma certeza de carácter permanente a ter uma incerteza que não se sabe onde vai cair.
Feitas estas considerações, mal alinhavadas de resto, eu direi que prefiro também às teorias muito interessantes que nós aqui poderíamos escutar, mormente quem, como eu, as não sabe, as cousas que precisamos de atingir...
O Sr. Carlos Borges: - O saber não ocupa lugar ...
O Orador: - Mas como o lugar que temos é pouco e a sessão legislativa está no fim, tendo por outro lado esta Assemblea muitos trabalhos para apreciar, prefiro a lei incisiva, a lei rápida, para chegarmos a conclusões que possamos votar conscienciosamente.
Julgo, Sr. Presidente, que fiz sentir a V. Ex.ª e à Assemblea a necessidade de mais tempo para podermos apreciar este importante problema, não vamos nós arranjar uma situação que, sem permitir lucros escandalosos, vá atingir a riqueza no seu conjunto, porque a riqueza chega para todos, até para aqueles que a não têm, ao passo que com a pobreza já o mesmo não acontece.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado. . '
O Sr. Presidente:- Considero encerrado o debate na generalidade.
A ordem do dia da sessão de amanhã será, assim constituída:
l.º parte. - Ratificaçâo dos seguintes decretos-leis:
N.º 31:838 - Permite ao Ministro das Colónias autorizar o desdobramento do cursos em turmas na Escola Superior Colonial quando, fundado em razões de carácter pedagógico, o conselho escolar assim o propuser. Determina que a gratificação a abonar aos professores das cadeiras que tenham de funcionar com desdobramento seja a que percebem os professares que exercem a acumulação de regências. - Publicado no Diário ao Govêrno n.º 3, de 5 de Janeiro.
N.º 31:839 - Extingue, a partir de l de Janeiro de 1942, as ordens de pagamento para a realização das despesas dás colónias na metrópole. - Publicado no Diário do Govêrno n.º 3, de 5 de Janeiro.
N.º 31:840 - Atribue ao Tribunal Militar Especial competência para conhecer de todos os delitos de assambarcamento e especulação e providencia quanto às mercadorias apreendidas que correm o risco de se deteriorar ou de sofrer quebras sensíveis. - Publicado no Diário do Govêrno n.º 5, de 7 de Janeiro.
N.º 31:842 - Determina que continuem a ser atribuídos ao pessoal técnico da Direcção Geral da Indústria que se deslocar dás suas repartições, a pedido dos interessados, para realização de exames ou vistorias, os honorários fixados nos diplomas vigentes.- Publicado no Diário do Govêrno n.º 5, de 7 de Janeiro.
N.º 31:843 - Torna extensivo o disposto no artigo 576.º do Código de Processo Civil no processo penal e a quaisquer outros em que se exija a declaração de honra ou o juramento. - Publicado no Diário do Govêrno n.º 6, de 8 de Janeiro.
Página 204
204 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 124
N.º 31:844 - Autoriza o Ministro a nomear uma Comissão para o efeito, de elaborar um projecto de reforma, da legislação relativa aos serviços jurisdicionais de menores. - Publicado no Diário do Govêrno n.º 6, de 8 de Janeiro.
2.ª parte. - Duas sessões de estudo, uma da proposta de lei sôbre lucros extraordinários resultantes da guerra, para poder, ser considerada a proposto de alterações que está pendente; outra do projecto de lei n.º 133, apresentado pelo Sr. Deputado Cancela de Abreu, sobre condicionamento da actividade dos engenheiros e outros, técnicos estrangeiros em Portugal.
Suponho que as duas sessões de estudo podem funcionar paralelamente, porque os Srs. Deputados que queiram estudar um daqueles assuntos não quererão naturalmente ocupar-se do outro. Mas, emfim, V. Ex.ªs resolverão pela melhor forma como devem actuar.
Está encerrada a sessão.
Eram, 18 horas e 5 minutos.
O REDACTOR - M. Ortigão Burnay.
As emendas a que se referiu o Sr. Presidente no decorrer do discurso do Sr. Melo Machado são as seguintes:
BASE I
1.- Ficam sujeitas ao imposto sôbre lucros extraordinários de guerra todas as pessoas singulares ou colectivas que, no exercício do comércio ou indústria, tenham realizado 1941 excedentes superiores a 20 por cento sôbre os seus rendimentos ilíquidos normais.
2.- Consideram-se rendimentos ilíquidos normais, para os efeitos desta lei, os que correspondam à média dos verificados em 1937, 1938 e 1939, ou, na sua falta, os que tiverem servido ao lançamento da contribuição industrial de de 1941.
Base II (base nova)
São abrangidos pelo imposto sôbre lucros extraordinários de guerra ou simples intermediários ou comissários e ainda aqueles que eventualmente tenham realizado quaisquer negócios com percepção se lucros que excedam a normal remuneração do capital empregado ou correspondente.
Base III
Não estão sujeitos ao imposto sôbre lucros extraordinários de guerra os contribuintes do grupo A da contribuição industrial nem, dos grupos C, aqueles a quem tenha sido atribuído rendimento ilíquido não superior a 35.000$00, a não ser que os rendimentos extraordinário que tenham realizado excedam êste montante.
Base IV
1.- Os lucros extraordinários determinados pela comparação a que se refere a base I poderão, mediante a apresentação dos necessários elementos comprovativos, ser divididos em duas frcções:
a) A do rendimento ilíquido que se mostre devido quer a um excedente do número de transacções normalmente realizadas, quer a novas aplicações de capitalem apetrechamento e instalações;
b) A do rendimemto que fôr superior ao que, pelos elementos apresentados pelo contribuinte, venha a considerar-se abrangido na alinea anterior.
2. - a) A fracção dos lucros extraordinários considerada na alínea a) do parágrafo anterior será colectada pela taxa do grupo C da contribuição industrial;
c) A fracção restante será tributada pelas taxas seguintes:
Por contos
Pela parte que não exceder 20 por cento do
rendimento ilíquido normal ......................... 20
Pela parte compreendida entre 21 e 40 por
cento do rendimento ilíquido normal................. 25
Pela parte compreendida entre 41 e 60 por cento do
rendimento ilíquido normal.......................... 30
Pela parte compreendida entre 61 e 80 por cento do
rendimento ilíquido normal.......................... 35
Pela parte compreendida entre 81 e 100 por cento do
rendimento ilíquido normal ......................... 40
Pela parte que exceder 100 por cento do rendimento
ilíquido normal .................................... 50
3.- Quando o contribuinte prove ter aplicado lucros extraordinários em novas instalações destinadas ao desenvolvimento da produção ou, por fôrça de disposição legal, à constituição ou refôrço de fundos com o mesmo objectivo, poderá ser-lhe dada, quanto a êsses lucros, a isenção do imposto da alínea a) e a redução de 50 por cento das taxas da alínea b) do parágrafo anterior.
BASE V
1.- Quando se trate de sociedades anónimas tributadas pelo grupo B da contribuição industrial e constituídas posteriormente a 1937, considerar-se-á rendimento normal o que corresponder, pelas taxas do grupo C, à contribuição liquidada para 1941.
2.- Para os efeitos de aplicação do disposto na alínea a) do § 1.º da base IV, o movimento normal de transacções das sociedades a que se refere o parágrafo anterior será determinado por comparação com contribuintes do grupo C que exerçam o mesmo ramo de comércio ou indústria.
3. - Para as sociedades anónimas e em comandita por acções não se considerará em qualquer caso rendimento extraordinário abrangido por esta lei aquele que não exceder o necessário para assegurar ao capital tributável um rendimento líquido de 8 por cento, seja ou não distribuído aos accionistas.
BASE VI
As emprêsas que exerçam indústrias em regime tributário especial ficam sujeitas, na parte aplicável, ao disposto na base V.
BASE VII
1. - Os indivíduos e as emprêsas singulares ou colectivas incluídos em categorias que, por despacho publicado no Diário do Govêrno até 15 de Março, fiquem genericamente sujeitos a declaração de lucros de guerra deverão entregar na respectiva secção de finanças, até 15 de Abril de 1942, uma declaração dos rendimentos ilíquidos que tenham realizado durante o ano de 1941, acompanhada dos respectivos balanços e de todos os elementos demonstrativos que sejam necessários para se apurar o lucro extraordinário definido nas bases I e IV.
2. - Os indivíduos ou emprêsas não abrangidos pelo parágrafo anterior só são obrigados à declaração quando efectivamente tenham realizado lucros abrangidos por esta lei.
BASE VIII
Os secretários de finanças convocarão as comissões a que se refere o artigo 6.º do decreto-lei n.º 24:916, que, com base nas- declarações apresentadas, determinarão
Página 205
12 DE FEVEREIRO DE 1942 205
os rendimentos extraordinários a tributar nos termos da alínea a) e da alínea b) do § 1.º da base IV desta lei.
BASE IX
Os rendimentos extraordinários determinados pelas comissões serão afixados nas secções de finanças, tendo os contribuintes o prazo de oito dias para apresentar quaisquer reclamações, que serão apreciadas pela comissão a que se refere o artigo 7.º do decreto-lei n.º 24:916 no prazo de trinta dias.
BASE X
Poderão ser solicitados à Inspecção Geral de Finanças os exames e inspecções necessários ao julgamento de quaisquer reclamações ou ao exacto apuramento dos rendimentos extraordinários tributados por êste diploma.
BASE XI
A falta de apresentação das declarações a que se refere a base VII ou a sua inexactidão darão lugar a aplicação de multa, que será de 26 a 100 por cento do imposto que a final vier a ser liquidado.
BASE XII
Sôbre o imposto de lucros de guerra não recairão quaisquer adicionais.
António de Sousa Madeira Pinto.
Abel Varzim.
Ulisses Cortês.
Artur Proença Duarte.
Artur Águedo de Oliveira.
José Alçada Guimarãis.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA