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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES
SUPLEMENTO AO N.º 105
ANO DE 1947 19 DE MARÇO
CÂMARA CORPORATIVA
IV LEGISLATURA
PARECER N.º23
Proposta de lei n.° 171
Organização suprema da defesa nacional
A Câmara Corporativa, pela sua secção de Defesa nacional, emite o seguinte parecer acerca da proposta de lei respeitante à organização suprema da defesa nacional, apresentada à Assembleia Nacional em 13 do corrente pelo Presidente do Conselho.
I
A proposta de lei em apreciação destina-se a remodelar a actual lei n.° l:905, de 22 de Maio de 1935, que criou os organismos superiores da defesa nacional.
Não se trata de uma adaptação servil de qualquer organização estrangeira, como infelizmente, em muitos casos, se tem verificado no nosso País, mas sim de um produto de reflexão alicerçada na observação de fenómenos ocorridos em ambiente nacional particularmente propício.
Foi a situação delicada em que a Nação viveu no decurso da última conflagração mundial que permitiu notar os defeitos de uma organização que, sem base em experiência própria, havia sido instituída há mais de dez anos.
Essa organização, inspirada na francesa de Janeiro de 1935, enfermava dos seus defeitos, os quais resultavam do desprezo a que, por virtude do jogo de interesses políticos, haviam sido votados naquele pais alguns ensinamentos colhidos na Grande Guerra de 1914-1918.
Por isso não deve causar estranheza que a organização proposta se assemelhe menos à que a França adoptou em 1935 do que à decretada em Novembro de J 92.1 e que era fortemente influenciada pela experiência da guerra que findara apenas três anos antes.
Basta, com efeito, notar que o Conselho Superior do Defesa Nacional francês, que em 1935 passou a incluir todo o Ministério, era em 1921 constituído apenas pelo Presidente do Conselho e por sete Ministros, no número dos quais se contavam os da Guerra, Marinha, Estrangeiros, Finanças e Colónias.
Pela lei de 11 de Julho de 1938, respeitante à organização geral da Nação para a guerra, a direcção da guerra continuava a competir ao Governo, assistido pelo chefe do estado maior da defesa nacional, escolhido de entre os chefes do estado maior do exército, naval e do ar.
Essa lei estabelecia que o Presidente do Conselho poderia delegar os seus poderes num Ministro da Defesa Nacional, ao qual competiria coordenar as acções dos Ministérios da Guerra, da Marinha e do Ar.
Em caso de guerra, a direcção militar da guerra seria, em harmonia c.om as decisões do Governo, assegurada
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por uma comissão de guerra, presidida pelo Presidente, da. República. Este poderia, porém, delegar numa alta personalidade militar o encargo de assegurar a coordenação superior das acções das forças terrestres, aéreas e marítimas.
Dadas as relações políticas que mantemos com a Inglaterra, será interessante referir, embora a traços largos, a solução que, com base na experiência, foi dada naquele país ao problema da direcção da guerra.
Ao deflagrar o conflito de 1914 era ao Governo, então constituído por vinto e um membros, que competiu aquela direcção. Decorridos, porém, quatro meses, foi criado o Conselho de. Guerra, organismo constituído por oito membros, no número dos quais se contavam os três chefes de estado maior, e que passou a exercer a direcção efectiva da guerra.
Este Conselho, cujo número de membros chegou a «levar-se a treze, foi substituído sucessivamente pela Comissão dos Dardanelos, Comissão de Guerra e, finalmente, pelo Gabinete de Guerra.
A Comissão de Guerra, inicialmente composta de seis membros, chegou a ter onze, mas o Gabinete de Guerra, criado em fins de 1916 com cinco membros, nunca viu este número elevar-se a mais de sete até ao fim da conflagração.
Todos estes organismos não foram outra coisa senão a adaptação ao tempo de guerra do Committee of Imperial Defence, instituído em 1904 e que ainda hoje perdura.
Antes da última guerra, essa comissão suprema de defesa imperial era constituída, sob a presidência do Primeiro-Ministro, pêlos Ministros da Guerra, da Marinha (Primeiro-Lorcl do Almirantado), do Ar, das Colónias, da índia, dos Domínios, dos Estrangeiros e das Finanças, pêlos três chefes de estado maior e pelo secretário do Tesouro.
À Comissão de Defesa Imperial correspondia, portanto, na nossa organização, o Conselho Superior da Defesa Nacional.
Iniciada a guerra em 1939, a Comissão de Defesa Imperial transformou-se, como estava previsto, por concentração de poderes e de autoridade, em Gabinete do Guerra, que passou a dirigir o esforço de guerra em terra, no mar e no ar.
A este organismo corresponde, portanto, o nosso Conselho Superior de Direcção de Guerra.
No decurso da guerra o Primeiro-Ministro britânico tomou o titulo de Ministro da Defesa Nacional e, em nome do Gabinete de Guerra, passou a superintender nos trabalhos da comissão dos chefes de estado maior, a-sssitido pela Comissão de Defesa, também presidida por ele.
À comissão dos chefes de estado maior, constituída pelo chefe do estado maior imperial, pelo Primeiro-Lord do Mar e pelo chefe do estado maior do ar, competia coordenar o emprego e as acções das forças terrestres, navais e aéreas.
Da Comissão de Defesa, acima referida, faziam parte os Ministros dos Estrangeiros, da Guerra, da Marinha, do Ar, da Produção, .os três chefes de estado maior e o comandante das operações combinadas.
Quanto aos serviços de defesa, eles continuavam em tempo de guerra centralizados em três organismos: o Army Councir, o Board of Admiralty e o Air Ministry.
Estes órgãos eram presididos, respectivamente, pêlos Ministros da Guerra, 'da Marinha e do Ar, os quais se conservavam no desempenho das suas funções políticas.
O Army Council e o Board of Admiralty podem considerar-se equivalentes aos nossos Conselhos Superiores do Exército e da Armada, que são também presididas respectivamente, pêlos Ministros da Guerra da Marinha.
Delas estas indicações, que permitem compreende:1 melhor alguns passos do relatório que acompanha a proposta de lei alusivos à redução do número de membros do Conselho Superior de Defesa Nacional, passemos a analisar separadamente cada uma das bases desta proposta.
II
A base- I da proposta corresponde à 1.ª base da lei nº. 1:905, mas, embora no sua aspecto geral pouco difira desta, as alterações que nela se pretendem introduzir merecem cuidadoso exame, porque traduzem orientação completa m ente diferente, confirmada, aliás, nas bases seguintes.
Se a política, por definição, é a arte de governar os Estados e de regular as relações que entre «lês existem, poderemos dizer que a política de um Estado é a arte de governar o povo e regular as relações deste com os outros povos pela forma mais conveniente aos interesses legítimos desse Estado. Compete-lhe, portanto, organizar e aplicar a totalidade das forças-do Estado com uma finalidade determinada.
Para a consecução desta finalidade, quando ela dependa da vontade de outros povos, a política recorro a diplomacia e à guerra: uma pressupõe o emprego de processos suasórios; a outra, o de processos violentos.
Quando, para conseguir determinada finalidade, a política recorre à guerra, ela utiliza forças de naturezas distintas, umas militares e outras económicas, com as quais constitui conjuntos que mantém na sua dependência imediata.
À aplicação da totalidade das forças económicas corresponderá uma estratégia económica, tal como à aplicação da totalidade das forças militares corresponde a estratégia propriamente dita.
Estas duas espécies de estratégia poderão ser consideradas como ramos de uma estratégia geral que se refere à preparação e à execução da guerra em qualquer dos campos.
A estratégia -geral e a diplomacia, no seu conjunto, constituem a política de guerra, cuja actividade se não restringe ao tempo de guerra. Ela deve exercer-se em tempo de paz, sob a forma de preparação para a guerra, pois, se durante esta os objectivos da política não podem ser outros senão conseguir a paz nas mais aceitáveis condições, durante a paz a primeira preocupação da política deverá consistir em preparar a nação para a guerra, de maneira a que possa suportá-la nas condições mais vantajosas.
A expressão «política militar» tem significado mais restrito, porque diz respeito apenas às forças militar-meiite organizadas. Por isso parece mais conveniente e consentâneo com a doutrina da base v, relativa à mobilização civil, que se substitua por «política de guerra» a expressão «política militar» -empregada na base i.
Pela redacção da proposta de lei nota-se que se pretende retirar ao Governo a prerrogativa de dirigir a guerra e atribuí-la a um organismo menos numeroso, como se confirma pelo texto da base m.
A direcção da guerra -não a das operações rnilita-rus- é, como dissemos, um atributo da política, e, como tal, deve competir ao Governo.
Sucede, porém, que a condução da guerra se desenvolve no campo da estratégia geral e que, portanto, deve obedec-er aos princípios que regem esta, entre os quais os da rapidez, da unidade de comando e do segredo contra indicam o recurso a organismos numerosos para orientar o esforço de guerra: a rapidez de uma decisão será tanto maior quanto menor for o número
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de indivíduos que solidàriamente hajam de tomar: a unidade de comando facilita o indispensável paralelismo das forças que se adicionam; o segredo é tanto mais difícil de conservar quanto maior for o número de indivíduos que o conheçam.
Há, pois, manifesta vantagem em reduzir tanto quanto possível o número de membros do Concelho Superior de Defesa Nacional.
Outra alteração que a proposta de lei pretende introduzir à base I da lei n.º 1:905 consiste em retirar também ao Governo a faculdade de se intrometer no comando da força armada.
Este princípio é absolutamente justificado, pois que se trata da condução de operações, a qual exige conhecimentos especiais que são do exclusivo domínio dos técnicos militares, se bem que da sua aplicação possa não resultar a vitória, e, então parecem inúteis aos profanos esses conhecimentos. É que da boa condução das operações militares pressupõe a observância de principios e regras que naturalmente o inimigo conhece e aplica, observância que, por isso mesmo, não basta para assegurar o êxito, mas serve para eliminar determinadas causas de inevitável derrota.
Finalmente, outra alteração à doutrina da base I da lei n.º 1:905 merece ser analisada para se verificar se convirá ou não aceitá-la.
Ao passo que aquela lei reconhece competência ao Governo para, mesmo em tempo de paz, fixar aos fins gerais da guerra e aprovar os planos gerais de acção, a proposta de lei parece limitar ao tempo de guerra a prerrogativa de o Governo fixar os objectivos gerais de guerra e os respectivos planos.
Tanto a lei n.º 1:905 como a proposta em apreciação empregam o termo «plano»: aquela chama-lhe «planos de acção»; esta, «plano de guerra». Interessa, portanto, verificar se há ou não há diferença de conceitos que justifiquem a alteração da proposta.
Clausewitz, que parece Ter sido o primeiro escritor militar que usou a expressão «plano de guerra», ao qual todos os outros fins se devem subordinar.
De harmonia com essa finalidade genérica, podemos dizer que o plano de guerra será a série de processos documentais relativos a determinada hipótese de guerra, nos quais se desenvolvem e sistematizam as providências a tomar para fazer face áquela hipótese, nas condições mais favoráveis ao conjunto geográfico que a formula.
Esses diferentes processos documentais serão elaborados por entidades distintas, mas segundo directrizes estabelecidas pelo Governo e portanto da inteira responsabilidade deste.
Para o estabelecimento destas directrizes convirá formular prèviamente as seguintes perguntas:
Quem é o inimigo e o que pretende ele?
Quais os meios de que dispões ou poderá dispor para a luta e que energia desenvolverá nela?
Quais os meios que lhe deveremos opor como obter esses meios?
Será com base no estudo comparativo das respostas obtidas que o Governo decidirá sobre a modalidade de guerra a adoptar e orientará as acções a desenvolver nos diversos campos da actividade nacional para conseguir os fins gerais da guerra.
O plano de guerra terá, consequentemente, o carácter político- estratégico das directrizes que o orientam.
Os organismos que promovem o desenvolvimento desse plano não são, portanto, apenas os militares: todos os departamentos da Administração Pública, cada um deles na sua esfera de acção, contribuirão, as mais das vezes sem o suspeitarem, para que o plano de guerra se concretize e adquira forma.
As directrizes fixadas pelo Governo para orientarem a elaboração dos diferentes elementos constitutivos do plano de guerra devem:
Expor a situação internacional e indicar as convenções militares e económicas firmadas com as potências aliadas ou amigas;
Referir os auxílios prováveis que o inimigo terá ao desencadear-se o conflito e no decurso deste;
Estabelecer a finalidade geral da guerra;
Definir a importância relativa dos diferentes elementos constitutivos do constitutivos do conjunto geográfico, isto é, dos teatros prováveis de operações; fixar a finalidades alcançar em cada um deles:
Indicar os meios de lutar a utilizar pelo Estado e as retribuições o seu emprego impostas por motivos de ordem política externa ou interna.
O plano de guerra deverá, portanto, concretizar a política de guerra do Estado, ou seja a coordenação harmónica das acções a desenvolver nos diferentes campos da actividade nacional para o conseguimento da finalidade geral da guerra, expressa nas directrizes em que ele assenta.
Para isso, inteiramente subordinados àquele finalidade, deverão ser elaborados e postos em execução, com suficiente antecedência, os vários plano que, reunidos,
Constituem o plano de guerra.
Esses planos referem-se, naturalmente, aos diferentes ramos da Administração Pública que, directa ou indirectamente, interessem ao esforço de guerra, nomeadamente o militar, o económico, o financeiro, os de política externa e interna e o científico.
A esses diversos ramos corresponderão respectivamente: o plano económico, o plano financeiro, o plano de política externa, o plano de segurança interna e o plano de investigações científicas.
Ora se, como dissemos, o plano de guerra diz respeito a determinada hipótese de guerra, ele tem de necessáriamente ser elaborado antes de iniciado o conflito e, para isso, será em tempo de paz que terão de ser definidas as directrizes para a sua elaboração e, consequentemente, fixados os fins ou objectivos gerais da guerra.
Em conformidade com a doutrina exposta, não parece aconselhável que só em caso de guerra os fins gerais desta sejam fixados e que, portanto, a elaboração do plano de guerra só se inicie depois de desencadeadas as hostilidades.
A preparação conveniente da defesa nacional exige o estabelecimento de uma ou de mais hipóteses plausíveis de conflito, a fixação dos objectivos gerais a atingir e a elaboração dos respectivos processos documentais - os planos de acção - que, no seu conjunto, formam o plano de guerra tal como definimos.
Nesta ordem de ideias, a secção de defesa nacional da Câmara Corporativa sugere que á base I da proposta de lei seja dada a redacção seguinte:
O Governo define a política de guerra da Nação e orienta superiormente a preparação da defesa nacional; fixa a finalidade geral da guerra e aprova as directrizes gerais para a elaboração dos respectivos planos; em caso de guerra, poderá à disposição dos comandantes das forças armadas os meios de acção necessários ou disponíveis para a sua execução e desenvolvimento.
III
A base II altera profundamente a constituição do actual Conselho Superior de Defesa Nacional.
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Pela proposta de lei, o número de Ministros que constituem o Concelho é limitado e desaparece a restrição, consignada na lei n.º 1:905, de que os majores generais só a título consultivo são agregados ao Governo para formar o concelho Superior de Defesa Nacional.
As considerações anteriormente feitas justificam inteiramente a nova orientação, tanto mais que nas deliberações do Concelho poderá intervir, quando conveniente, qualquer membro do Governo especialmente qualificado para se pronunciar sobre os assuntos a versar.
Nesta base, ao contrário do que estabelece a correspondente da lei n.º 1:905, ao Concelho Superior de defesa Nacional não é reconhecida a faculdade de deliberar sobre os altos assuntos relativos à defesa nacional, mas apenas a de examinar nesses assuntos.
Não justifica o relatório esta alteração, mas parece que será mais vantajoso que ao Conselho seja mantida a prerrogativa de deliberar, e não apenas de examinar problemas.
Por outro lado, a negar-se-lhe essa competência, não se compreenderia que na mesma base da proposta de lei se dissesse: «Nas deliberações do Concelho Superior de Defesa Nacional...»
Ainda outro reparo suscita esta base. É a consagração de que com ela se dá à designação major general, apesar dos inconvenientes que isso acarreta.
Efectivamente, no exército inglês, com a qual devemos sempre prever as mais estreitas relações, existe o posto de major general, mas este, na hierarquia dos oficiais generais, é o de menor categoria: acima dele existem só de tenente general e de general. Esta circunstância, embora possa parecer de somenos importância, talvez contribua para desprestigiar as entidades a quem, dentro do exército e da armada, se quer atribuir a mais alta categoria.
Para evitar o inconveniente apontado, e não obstante quaisquer fundamentos etimológicos ou históricos que se possam apresentar, parece preferível que, em vez de majores generais do exército e da armada, se diga vice-presidentes dos
Concelhos Superiores do exército e da Armada.
De acordo com o que ficou dito, sugere-se a seguinte redacção para a base II:
O Concelho Superior de Defesa Nacional, constituído pelo Presidente do Concelho de Ministros, que assumirá a presidência, pelos Ministros da Guerra, da Marinha, das Colónias, dos Negócios Estrangeiros e das Finanças e pelos vice-presidentes dos Concelhos Superiores do Exército e da Armada, tem por missão examinar os altos problemas relativos à defesa nacional e, em especial, deliberar sobre os que respeitam:...
(O resto sem alteração).
IV
A base III altera a composição Concelho Superior de Direcção da Guerra, criado pela base II da lei n.º 1:905.
O Ministro das finanças deixa de fazer parte desse organismo; o das Colónias só em casos especiais fará parte; mas, em contrapartida, entraram para ele os majores generais do exército e da armada e o comandante geral da aeronáutica.
Desta forma o Concelho terá composição mais harmónica com as atribuições que lhe devem caber, as quais se exercem inteiramente no âmbito da estratégia geral.
Poderá parecer estranho que o Ministro da Economia não faça parte do Concelho, dado que, como dissemos, a estratégia geral abrange a económica.
Justifica-se, porém, a solução proposta, visto que a aplicação dos processos de guerra que caracterizam estratégia geral abrange a económica.
Justifica-se, porém, a solução proposta, visto que a aplicação dos processos de guerra que caracterizam a, estratégia económica só merecem consideração em países de grandes recursos.
V
A base IV da proposta modifica a redacção da que lhe corresponde na lei n.° 1:905.
É princípio universalmente aceite que a condução das operações militares seja da exclusiva competência dos comandantes das forças. Só assim poderá ser assegurada, no desenvolvimento da acção militar, aquela unidade de comando sem a qual - demonstra-o a experiência - muito difícil, senão impossível, é alcançar o êxito. Como consequência- da observância deste princípio, aos comandantes das forças deverão igualmente caber responsabilidades pela forma como conduzem essas operações. Por outras palavras, a responsabilidade dos comandantes resulta logicamente da competência que se lhes atribui.
Pode, porém, suceder que a condução das operações seja prejudicada por insuficiências dos respectivos planos, cuja elaboração cabe a outrem, ou até por não ser possível pôr à disposição dos comandantes os meios reconhecidos necessários para a conveniente condução das operações, e em tais casos não seria razoável assacar-lhes a inteira responsabilidade dos resultados obtidos.
Nestes termos, e dada a natural tendência para apreciar aquela responsabilidade pêlos resultados das operações, propõe-se que na base IV, em vez de a exclusiva
responsabilidade», se diga «exclusiva competência».
VI
A base V prevê a criação, em tempo de guerra, de um novo organismo, o Conselho Superior da Mobilização Civil, o qual será presidido pelo Ministro da Mobilização.
As vantagens que resultam da criação daquele organismo parecem diminuídas, porém, pelo facto de ele não poder desenvolver a sua acção, desde o tempo de paz, na indispensável preparação da mobilização civil.
Quanto ao Ministério da Mobilização Civil, embora no relatório que acompanha a proposta de lei só se preveja a sua criação em tempo de guerra, tal ideia não está consignada no texto da proposta.
É prudente .a omissão, pois poderá suceder que o Governo, especialmente em época de grande tensão política internacional, reconheça a vantagem de, ainda em tempo de paz, criar o ministério cuja atribuição principal seja .a preparação da mobilização civil nos vários aspectos dos seus dois ramos fundamentais: mobilização do pessoal civil, isto é, do não sujeito a obrigações militares; mobilização dos recursos materiais da Nação não dependentes dos sistemas de forças militarmente organizadas.
Só assim se conseguirá, em caso de emergência, efectuar oportunamente a mobilização económica (industrial, agrícola e de transportes), a administrativa e a científica.
A criação, em tempo de paz, do Ministério da Mobilização Civil faria desaparecer os inconvenientes que resultam de só em tempo de guerra constituir o Conselho Superior de Mobilização Civil, pois há assuntos respeitantes à preparação da Nação para a guerra que não estão afectos a qualquer dos organismos considerados na proposta de lei, a menos que ao Conselho Superior de Defesa Nacional se queira dar tais atribuições, o que se afigura incompatível com a sua composição.
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Em virtude de ser sido extinta a 7.º secção do Conselho do Império Colonial, a referência, que a ela se faz na parte final da base V não se justifica e, por isso, propõe-se a sua eliminação.
VII
Pela base VI o secretariado do Conselho Superior de Defesa Nacional será exercido pelo Gabinete da Presidência do Conselho, o que implica a extinção do actual Secretariado Geral de Defesa Nacional, instituído pela base IX da lei n.° 1:905.
A fórmula proposta obedece à ideia de simplificação da organização actualmente em vigor e não pá ruce inconveniente, desde que a função de secretariado seja exercida por pessoa ou pessoas especialmente qualificadas pêlos seus conhecimentos militares.
Quanto às expressões «Majoria General do Exército» e «Majoria. General da Armada», pelas razoes aduzidas no n.º III, deverão ser substituídas, respectivamente, por «Secretaria do Conselho Superior do Exército» e «Secretaria do Conselho Superior da Armada».
VIII
Coerentemente com o que foi dito no n.° III, a designação «majores generais do exército ou da armada» deverá ser substituída por «vice-presidentes dos Conselhos Superiores do Exército ou da Armada».
IX
A base VIII corresponde, com ligeiras alterações que não carecem de justificação, à maior parte da doutrina contida na base x da lei n.° ]:90õ.
As alterações que a base IX introduz à última parte da base x da lei n.° 1:905 são consequência lógica da extinção do Conselho Superior Militar, instituído pela base III da referida lei. Ela é ditada pelo louvável critério de simplificação.
XI
De harmonia com as considerações produzidas nos números anteriores, a secção ido Defesa Nacional da Câmara .Corporativa sugere que às bases I, II, III, IV, V, VI, e VII seja dada a redacção seguinte:
BASE I
O Governo define a política de guerra da Nação e orienta superiormente a preparação da defesa nacional: fixa a finalidade geral da guerra e aprova as directrizes gerais para a elaboração dos respectivos planos; em caso de guerra, porá à disposição idos comandantes das forças armadas os meios de acção necessários ou disponíveis para a sua execução e desenvolvimento.
BASE II
O Conselho Superior de Defesa Nacional, constituído pelo Presidente do Conselho de Ministros, que assumirá a presidência, pêlos Ministros da Guerra, da Marinha, das Colónias, dos Negócios Estrangeiros e das Finanças e pêlos vice-presidentes dos Conselhos Superiores do Exército e da Armada, tem por missão examinar os altos problemas relativos à defesa nacional e, em especial, deliberar sobre os que respeitam:
(O resto sem alteração).
BASE III
Em tempo de guerra as atribuições essencialmente militares do Conselho Superior de Defesa Nacional concentram-se no Conselho Superior de Direcção de Guerra (Gabinete de Guerra), presidido pelo Presidente do Conselho o constituído pelos Ministros da Guerra, da Marinha o dos Negócios Estrangeiros, pelos vice-presidentes dos Conselhos Superiores do Exército e da Armada, pelo comandante geral da aeronáutica e ainda pelo Ministro das Colónias, quando os assuntos a tratar respeitem ao Império Colonial.
BASE IV
A condução das operações militares, segundo os planos ou projectos previamente aprovados, é da exclusiva competência dos comandantes das forças em operações.
BASE v
(Sem alteração os primeiro e segundo períodos).
Quando se trate de assuntos referentes às colónias ou às forças coloniais, tomará parte na reunião da comissão o Ministro das Colónias.
BASE VI
O secretariado do Conselho «Superior de Defesa Nacional será exercido pelo Gabinete da Presidência do Conselho. Os processas respectivos serão remetidos à secretaria do Conselho Superior do Exército ou à secretária do Conselho Superior da Armada, conforme os assuntos versados disserem mais directamente respeito ou interessarem ao exército ou à marinha de guerra.
(O resto sem alteração).
BASE VII
Compete em especial aos vice-presidentes dos Conselhos Superiores do Exército ou da Armado, conforme os casos, organizar ou assumir a responsabilidade da organização de todos os processos que devam ser submetidos à apreciação do Conselho, registar as decisões tomadas e comunicar aos órgãos ministeriais interessados as resoluções daquele organismo, mantendo o respectivo presidente ao corrente da maneira como tais resoluções são observadas.
BASES VIII e IX
(Sem alteração).
Palácio de S. Bento, .18 de Março de 1947
António Vicente Ferreira (assessor sem voto).
Joaquim de Sousa Uva.
João Cario» de Sá Nogueira (relator).
IMPRENSA NACIONAL DB LISBOA