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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

SUPLEMENTO AO N.º 43

ANO DE 1950 15 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL

V LEGISLATURA

CONTAS GERAIS no ESTADO DE 1948

Parecer da comissão encarregada de apreciar as contas públicas

(Artigo 91.º da Constituição)

INTRODUÇÃO

1. O parecer das Contas Gerais do Estado publica-se este ano sob o signo de uma depressão económica e financeira, dentro do País, que pode ferir substancialmente, nos tempos próximos, o seu desenvolvimento material.
Não é que esteja em causa por agora o equilíbrio das contas públicas - nem a Constituição o permitiria. Se a actividade, porém, estagnar ou não atingir nível que assegure conveniente cobrança de receitas, só um meio aparece para manter o equilíbrio orçamental - que é o de reduzir as despesas.
Ora o nível da compressão destas tem limites e não pode ir além deles, sob pena de deprimir mais ainda a actividade económica.
Parece, assim, tudo indicar que chegou o momento de fazer o balanço geral das disponibilidades financeiras e de estabelecer programas adequados a desenvolvimentos futuros.
Havia quem julgasse serem pessimistas certas previsões dos pareceres das contas, algumas sugeridas até nos tempos em que a euforia de receitas e as facilidades de crédito permitiam uma política de grandes gastos. E algumas vezes, nesta longa e incompreendida série de esforços, orientados no sentido de acordar muitos para a realidade da vida que o País pode viver, o próprio relator das contas teve dúvidas momentâneas sobre o fundamento de previsões que a sua pena traçara ano após ano.
Mas os números são faie-tos duros e reais e eles indicavam que o País não podia por muito tempo suportar financeiramente consumos que não tivessem como contrapartida aumento de riqueza; que a fortuna do País é limitada por factores que não podem ser alterados de um dia para o outro.
A publicação de planos de obras e de aumento de despesa, a tendência para as executar sem, por vezes, se olhar se elas poderiam ser mais económicas, o próprio ar que se respirava nas ruas em matéria de consumos dispensáveis e até supérfluos, constituía um obstáculo à compreensão das modestas, singelas palavras de

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aviso, escritas serenamente, no intuito de aclarar e evitar uma situação que ameaçava os próprios alicerces da tarefa tão corajosamente empreendida em 1928 e inflexivelmente mantida através dos anos.
A guerra deixa atrás de si estes ressaibos de grandeza, estas angustiosas anomalias que os países pagam dolorosamente depois.
Chegou o momento em que se cumpriram aquelas agoirentas profecias, feitas há anos - reunidas na frase «o saco tem fundo»-, e em que é necessário comprimir, até extremos que não podem ser mantidos por muito tempo, certas despesas do próprio Estado. Tiveram de ser retardados, ou adiados, esquemas de obras e aspirações que, algumas, tinham já encontrado lugar de relevo, até nas próprias páginas oficiais.
Foram ilusões que se desvaneceram. Mas ilusões que deixaram atrás de si o travo amargo da descrença e, por isso mesmo, nunca deveriam ter sido geradas ou consentidas.

A redução de gastos disponíveis

2. Não é ser pessimista dizer que o ritmo da execução de planos, por força de despesas extraordinárias, tem de ser muito reduzido nos próximos anos e que os programas decretados em passado recente devem ser limpos de excrescências que em alguns casos os ensombravam.
Não virá disso grande mal ao País nos tempos mais chegados. Mas se a poda tiver de ir até aos esquemas mais úteis, àqueles que asseguram um aumento na produção, então é mais sério o problema.
Uma das necessidades fundamentais dos Governos é cerzir, tão estreitamente quanto possível, a economia pública à economia privada.
Há entre elas íntimo contacto, estreita ligação - o que não puder ser feito pela economia particular, se essencial a comunidade, terá de ser auxiliado pela economia pública. A clara realização deste facto incontrovertível impõe, em tempos difíceis, a fiscalização assídua de financiamentos, até dos de natureza particular.
Alguns países, incluindo os de ideias mais liberais, onde a iniciativa privada reina soberanamente, levam u extremos e até orientam esta fiscalização. Parece que dentro em pouco, se o País quiser enfrentar os factos na sua crua realidade, terá de preocupar-se com muitos gastos invertidos em consumos inúteis, supérfluos ou dispensáveis.
E, como primeira condição para atingir o alvo de uma indirecta canalização de financiamentos - investimentos como é uso dizer-se hoje -, o seu exemplo deve dominar, como dominou com proveito em mais de uma década de gestão financeira.
A primeira condição, já aliás sugerida em páginas de pareceres anteriores, é o próprio Estado, dentro de seus serviços, reduzir os gastos inúteis, por um melhor aproveitamento de unidades de trabalho.
Não quer isso significar que haja de fazer, por este processo, economias em pessoal por aí além, porque a remuneração de muitos dos seus serventuários necessita de ser refundida. Mas uma organização bem orientada pode melhorar o rendimento e impedir demoras na realização de coisas que poderiam ser evitadas e que tantos dissabores e perdas causam ao público.

O facto económico e o facto financeiro

3. É de uso dizer-se, e muitos acentuam frequentemente a afirmação, que não são apenas os factos económicos que contam no governo dos povos. Fazem-se muitas vezes subtis distinções, tendentes a mostrar que a vida do Estado não pode apenas limitar-se a considerar a estrutura da organização económica.
Parece não haver dúvidas sobre a verdade destas afirmações.
Contudo, na situação especial portuguesa, a estrutura económica representa hoje, como aliás há vinte anos, o mais grave problema a considerar.
O País vivera mais de um século num grande alheamento de progressos de natureza material. Enquanto povos europeus se lançavam com ardor na luta pelo desenvolvimento de recursos económicos, na Europa ou em domínios de além-mar, num frenesim de materialismo que em certos casos atingiu quase o paroxismo de paixões, Portugal descurou gravemente melhorias na sua estrutura interna, que o tornaram um país pobre, de baixos índices de produção e, consequentemente, de baixos índices de consumo. A herança legada ao Estado Novo, neste aspecto, como aliás em outros, não parecia brilhante.
Éramos um país de baixa capitação de receitas públicas - e, como o progresso da colectividade depende em grande parte do nível de despesas distraídas para fins sociais, havia necessidades elementares que urgia suprir.
Por outro lado, o rendimento nacional, nos seus diversos aspectos, não podia ser apreciavelmente aumentado sem a execução de um certo número de planos que assegurassem a base do desenvolvimento coordenado de actividades agrícolas e industriais, indispensáveis ao acréscimo de rendimentos individuais e, portanto, da riqueza pública.
A vida financeira do País achava-se, por este motivo, inteiramente ligada à vida económica. Não se pode dizer que uma dependesse da outra. Antes se deve dizer que uma e outra constituem um todo harmónico, porque não pode haver finanças sãs onde estiver doente a economia privada - e reciprocamente é impossível a existência de economia vigorosa e próspera quando reina o caos financeiro na vida pública ou no crédito.
A administração do Estado, nos seus aspectos económico e financeiro, necessita por isso de uma direcção única e forte, que tente dosear, na aplicação de fundos públicos e na orientação de financiamentos particulares, os recursos disponíveis, a fim de assegurar Um gradual desenvolvimento económico firmado em planos cuidadosamente coordenados e dirigidos no sentido de aumentar rapidamente o rendimento nacional.
E evidente que, dadas as exigências actuais e o sentido gravoso dos consumos e inversões financeiras nos últimos anos, há necessidade hoje, ainda mais do que ontem, de desviar para fins reprodutivos o maior somatório possível de recursos monetários.
Não é de agora esta necessidade - ela já se fazia sentir anteriormente, dados os baixos índices de produção, relativamente a outros países, como indicam os que se referem a energia e diversos outros elementos fundamentais. Mas, por virtude de desenvolvimentos demográficos acentuados e de situações difíceis internacionais, o rendimento nacional - dando ao termo o significado do somatório dos bens e serviços recebidos pela comunidade económica durante um período de tempo determinado, o que equivale, no fundo, ao somatório dos rendimentos individuais que se integram na Nação - torna-se de profunda importância na actividade interna nos anos mais próximos.

O sentido da crise europeia

4. Não parece que possa ser esclarecida, ou dissipada nos próximos anos, a nebulosa económica que ensombra a vida do Mundo. Os acontecimentos políticos

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na Europa e na Ásia, escondidos na maior parte das vezes sob a capa de reivindicações sociais, são, no fundo das coisas, bem mais do que isso, como começa já a ser claramente compreendido pela Europa Ocidental.
Não há ninguém hoje sobre a Terra que não seja tocado pelo mal-estar da inquietude que soberanamente reina por toda a parte. E aquelas velhas nações que viveram confortàvelmente durante séculos, na despreocupação de bens adquiridos e multiplicados em tempos de paz, vêem desenrolar-se dia a dia o espectro da incerteza.
De nada vale multiplicar conferências ou discussões internacionais enquanto não for aceite que o problema da Europa Ocidental reside, pura e simplesmente, no aumento de produção de maior volume de bens de consumo, na razoável distribuição do produto nacional e no justo pagamento dos esforços de cada um.
Onde quer que, no estado potencial, haja recursos materiais a desenvolver em boas condições económicas, todos os esforços devem ser feitos no sentido de os aproveitar, de maneira coordenada. A vida social, as grandes aspirações de progressos consideráveis no combate à doença e na dominação da miséria, as tentativas para o pleno emprego, só podem constituir uma consoladora realidade no dia em que cada povo compreender a necessidade de introduzir aios seus agentes produtores os aperfeiçoamentos das ciências aplicadas, que decorrem dia a dia dos grandes progressos na investigação científica.
Foi generosa, imensamente oportuna na sua amplitude e intenções, a intervenção financeira americana nos destinos da Europa Ocidental, numa época em que o caos político parecia dominá-la completamente. Mas tudo parece indicar que essa generosidade, esse benéfico auxílio, não terá o êxito que merecia. A viabilidade económica da Europa Ocidental, prevista para 1952, não será, assim, uniu realidade, e então hão-de aparecer de novo os sintomas de desagregação social que tão fundamente iam cavando a sua ruína há cerca de três ou quatro anos.
Se for base imprescindível, como parece ser em cada país da Europa Ocidental e em outros, procurar nivelar internamente, na medida do possível, os consumos com a produção visível e invisível, haverá que introduzir grandes alterações no regime económico-financeiro nacional. As condições naturais do Mundo são diferentes das que eram antes da guerra, não apenas no que diz respeito à produção interna, mas, sobretudo, no que se refere aos recursos invisíveis que todos os anos alimentavam a balança de pagamentos.
Por outro lado, desenvolveram-se muito os consumos dentro do País - não só por ter aumentado a população, como pelo acréscimo substancial do nível de vida em certas e numerosas classes dessa população.
Isto significa que o rendimento nacional deveria ter aumentado, pelo menos, na proporção de aumentos populacionais e níveis de vida - e não se inclui, por agora, a necessidade do suplemento essencial a novas inversões financeiras.
Não parece ter sido esse o caso, e o desgaste acelerado das reservas financeiras e monetárias, reunidas durante a guerra, comprova que o produto nacional não corresponde ao consumo interno.
Esta é uma verdade que precisa de ser compreendida por todos - ricos e pobres, governantes e governados, gente ilustrada e gente inculta. Verdade que regula o presente e o futuro, verdade que está na base de toda a vida nacional - compreendendo os seus aspectos político, social, cultural e até moral.
Se a produção não atingir níveis que satisfaçam os consumos, descerá o nível de vida, reduzir-se-ão rendimentos, haverá desemprego, serão menores as receitas públicas, numa palavra - haverá crise. As crises quando tem esta origem são sempre sérias e perigosas.
O aumento do rendimento nacional é, pois, uma necessidade basilar. Vale mais a pena tirar aos consumos, durante certo número de anos, os meios financeiros essenciais para a execução de um grande programa de fomento, que eleve apreciavelmente o rendimento nacional, do que manter um nível de vida que tudo indica, e a experiência já mostra, ser instável e muito precário.
Terá de ser reduzido logo que desapareçam os restos de reservas ainda disponíveis.
Não se aplica este raciocínio apenas a Portugal - mas Portugal deve ser um dos países da Europa onde é possível, em relativamente poucos anos, considerada a projecção no tempo dos acontecimentos políticos, desenvolver e aproveitar recursos materiais que trarão grande alívio às exigências da estrutura nacional.

A insuficiência de recursos financeiros

5. Tudo isto está na base da vida - da vida humana, da vida que um povo tem de viver. É uma coisa comesinha querer produzir para, alimentar - e não é outra coisa o querer desenvolver recursos internos para aumentar o rendimento nacional.
Simplesmente, para explorar com a maior economia possível os recursos internos é indispensável procurar aqueles que por suas características naturais assegurem maior rendimento.
O País é financeiramente pobre. Uma cuidadosa administração dos dinheiros públicos permitiu durante muitos anos passar vida mediana. As economias amealhadas não tiveram o destino que esta interpretação das condições nacionais indicava. E não se aplicou em melhorias reprodutivas o suficiente. A análise cuidadosa dias despesas extraordinárias, e ela tem sido feita sempre nos pareceres das Contas Gerais do Estado, mostra, que assim foi; e a das inversões financeiras particulares indica excelsos do consumos.
O exame pormenorizado do destino das despesas extraordinárias tem de ir ao próprio custo das obras, a utilidade imediata dessas obras, ao grau de seu carácter reprodutivo. Não pode limitar-se apenas a considerar que o dinheiro foi gasto nisto ou naquilo; é preciso saber se isto ou aquilo era necessário ou se poderia ter sido feito com menores gastos ou com maior modéstia.
Do mesmo modo, quando se examinam os consumos particulares, tem de ser feita idêntica análise, objectiva e serena, de modo a fazer sobressair a utilidade ou a superfluidade.
É evidente que este exame se tornaria desnecessário se as receitas públicas fossem muito abundantes, se os níveis de consumos de particulares fossem mais uniformes, se o rendimento nacional atingisse cifras que bastassem.
Mas, quando faltam recursos financeiros e a produção se mostra insuficiente, não há outro remédio, em gestão de negócios públicos, senão cada um, na sua esfera de acção, ponderar bem os factos, cortar as despesas, impedir os abusos e canalizar tudo o que for possível para aumentar a riqueza.

A génese de um programa económico nacional

6. Em sucessivos apêndices aos pareceres das Contas Gerais do Estado, o seu relator, ouvindo quase sempre colaboradores escolhidos entre especialistas nas diversas matérias tratadas, procurou dar nota e chamar a atenção para a existência de recursos potenciais do País susceptíveis de serem aproveitados econòmicamente.

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Alguns, mas poucos, serviços oficiais procuraram também estudar tecnicamente rama parte desses recursos.
O relator das contas públicas deseja agradecer o auxílio que lhe tem sido graciosa e devotadamente prestado por colaboradores que, não se poupando nem a trabalho nem a despesas, estudaram problemas intrincados e envolve messes agradecimentos aquelas entidades oficiais que lhe prestaram as informações necessárias para poder ir até mais ao fundo de algumas questões de grande importância para o futuro da economia nacional.
Entendeu sempre, e com muito maior razão o entende hoje, que encarar a vida económica nacional - e neste termo inclui a vida económica da metrópole e do ultramar - de modo individualista ou dispersivo é cometer um erro grave.
As variadas questões que se põem não dizem apenas respeito a este ou àquele aspecto do problema: ao aspecto financeiro, ou individual, ao aspecto da energia, ou da rega, ou da siderurgia. O problema económico português consiste num conjunto de aspectos que necessitam de ser ligados de modo a produzir os melhores frutos.
A economia de Angola ou Moçambique está estreitamente ligada à da metrópole; a rega mo Alentejo tem íntima ligação com o aproveitamento do Douro e do Tejo para água e para energia.
Uma rede de estradas ou um troço de caminho de ferro, ou até um simples aproveitamento de subprodutos ou de desperdícios, são coisas que fazem parte de um todo, e a resultante de tão variadas forças, de natureza física ou de natureza humana, deverá sempre tender para o bem comum, para o bem de todos, que neste caso é indubitavelmente o aumento do rendimento nacional, o somatório dos rendimentos individuais que se integram na Nação.

7. Fundado nesses elementos, e tendo por base estudos anteriormente publicados, elaborou-se um programa de realizações.
A sua resultante será, quando em pleno rendimento, o acréscimo mínimo de bem mais de 8 milhões de contos no rendimento nacional.
Esse programa, que em suas linhas gerais constitui este ano o apêndice ao parecer das contas, encerra uma vasta quantidade de trabalho e tenta aproveitar todos os possíveis elementos de consulta.
Necessita de ser agora pormenorizado em diversos aspectos, e só trabalhos de campo ou laboratório o podem fazer.
Mas no todo não parece que venha a sofrer grandes alterações, tanto no seu alcanço económico, como até no delineamento técnico. Envolve o dispêndio de quase 2 dezenas de milhões de contos aos preços actuais, mas pode ser, e é até vantajoso que o seja, adaptado às disponibilidades financeiras. A sua gradual execução pode trazer ainda rendimentos invertíveis nos últimos estágios do próprio programa.
Baseia-se no princípio comezinho de que as obras a realizar devem ter sentido puramente económico: a obra que permita diversas aplicações úteis deve ser preferida àquela que só tem uma, desde que o resultado final mostre claramente maior rendimento económico.
É o princípio do máximo aproveitamento dos recursos financeiros, que são parcos e não podem ser invertidos ao sabor de gostos, ou de orgulhos, ou de vaidades individuais.
A responsabilidade incorrida na escolha de um programa, ou de um plano de fomento, ou até de uma obra reprodutiva, é muito grande. Vai ferir muita gente. Este é um dos problemas de governo e uma das responsabilidades de especialistas que mais profundamente devem pesar na consciência de cada um.
O homem que governa, o especialista, o técnico, podem errar, podem em consciência imaginar que estão a seguir o caminho que os factos, os estudos e a experiência lhes parecem indicar ser o melhor. Mas quando há alternativas nas soluções, e quando essas alternativas são postas claramente, o dever de quem decide é mandar estudá-las, é investigar qual delas resolve melhor o problema, que é sempre o mesmo: obter maior rendimento com o mínimo de despesa. Se o não fizer, é parcial, não cumpre o seu dever.

O caso do Alentejo

8. Poderá porventura haver um ou outro caso em que o rendimento económico tenha de ser sacrificado a fina de natureza política ou social.
O caso do Alentejo está hoje à vista da opinião pública e é daqueles que mais fere até a sua sensibilidade.
Existe a sul do Tejo uma vasta região com cerca de um terço da área do País, onde é baixa a densidade demográfica.
Periodicamente, numa confrangedora repetição do mesmo facto doloroso, o Alentejo sofre de crises de desemprego que afectam profundamente toda a sua população - proprietários e trabalhadores.
A vida decorre em perene desassossego, o desassossego que se gera em crises de desemprego que de antemão se sabe serem inevitáveis.
O problema existe hoje como existia há muitos anos. Com o aumento da população ele vai assumindo, porém, maior gravidade.
O Estado procura canalizar dotações para obras que debelem as crises periódicas e gasta nisso verbas importantes, que aparecem no orçamento ou nos fundos especiais sob rubricas diversas.
Os proprietários, para minorar a sorte dos desempregados, desviam de suas receitas aquilo que podem.
Não se afirma aqui serem inúteis as obras que se executam em tão estranhas circunstâncias, mas parece não ser exagero afirmar que os dinheiros não têm o rendimento que poderiam ter. Estão até longe disso, no dizer de muitos.
Ora o problema do Alentejo não pode ser resolvido deste modo, e parece que toda a gente concorda com esta opinião. Se outro motivo não houvesse, bastariam tanto os queixumes dos proprietários, como os ilustres trabalhadores, para levar o Estado a encarar o problema d a frente.
Aqui está um caso em que o social ou o político, como desejarem classificar o problema, tem importância considerável. Valerá a pena ao País fazer um sacrifício para resolver, se porventura ele tiver solução.
Não parece haver duas opiniões a este respeito, e organismos oficiais e não oficiais são concordes em que o problema do Alentejo é um problema de água; é, no fundo, um problema de rega.
Ainda que fosse necessário inverter largas quantias sem a remuneração prevista em outros planos de rega, valeria a pena estudar profundamente a questão e resolvê-la.
Felizmente tudo indica ser possível regar largos tractos de terrenos no Alentejo em condições económicas. As áreas poderão subir a centenas de milhares de hectares, e se se considerar o que isso significa de salutarmente revolucionário numa zona que não tem trabalho para pequena população, vê-se logo a conveniência de encetar a tarefa o mais rapidamente possível. Dá-se água a quem tem sede; trabalho, até durante as obras, a quem o não tem; poupam-se verbas que todos os anos

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se distraem para obras pouco úteis, e ao cabo de uns anos conclui-se um plano que sustentará o aumento demográfico, tão pronunciado nos últimos tempos.
Esta é das questões que não tem outra solução humana. O homem que vive na terra à terra fica pertencendo, e o Estado elevará suas receitas no fim de anos e estabelecerá a «paz social numa zona onde está ameaçada.
A solução para o problema consta do programa económico nacional que se descreve no apêndice deste parecer.
Foi estudada em conjunto com especialistas. Tenta aproveitar a água que cai no Alentejo susceptível de ser armazenada e a água que se eleva do Tejo na época em que ela é abundante, usando para este efeito a energia de Inverno deste rio e possivelmente de outros, e, finalmente, procura utilizar os lençóis subterrâneos onde existirem e onde praticamente puderem ser aproveitados.

Os esteios da economia nacional no futuro

9. Mas o caso do Alentejo, arrastado, discutido, falado há tantos anos, não é mais do que uma viga no edifício portentoso das possibilidades nacionais. Para que as vastas províncias do sul do Tejo desempenhem na economia interna o papel que lhes cabe é necessário olhar este rio com olhos de ver. As suas águas, que são volumosas, podem, em parte, ser desviadas para o sul e ir no Verão fecundar zonas secas. A ligação das bacias hidrográficas do Tejo, do Sado e do Guadiana é o natural corolário de qualquer plano de transformação agrária do terço da área do País que se debate em crises periódicas, conhecidas e insolúveis.
Ninguém, contudo, imagine que este magno problema possa ser cabalmente resolvido sem o simultâneo aproveitamento das vastas possibilidades energéticas do ouro e, consequentemente, sem o aproveitamento dos ricos jazigos de minérios de ferro das suas margens.
O conjunto destas três grandes riquezas nacionais - o Tejo e o Douro, os vastos recursos de ferro do Norte e as possibilidades de rega a Sul - constitui o elemento fundamental da estrutura económica portuguesa.
Com a produção de mais de três biliões de unidades de energia e de duas ou três centenas de milhares de toneladas de ferro e aço e com a rega de duas centenas de milhares de hectares Portugal europeu pode marcar definitivamente a sua posição na vida económica do Mundo e, simultaneamente, com a execução do seu programa, lançar os alicerces de uma industrialização equilibrada, que, dispondo de energia e matérias-primas adequadas e essenciais, temi mais largo mercado para a colocação dos seus produtos.

A importância da economia ultramarina

10. Mas nenhum programa económico nacional pode esquecer que, como a metrópole, o ultramar português é Portugal. As terras de além-mar, por virtude de suas condições geográficas e económicas, têm diante de si um papel de primeira grandeza a desempenhar na vida da Nação. Angola e Moçambique são duas pérolas engastadas no anel brilhante que é a comunidade portuguesa e ocupam ambas, em termos estritamente económicos, um lugar de relevo, que tudo indica poder vir a ser cada vez maior. Por definição está-lhes reservado, nos tempos mais próximos, abastecer a metrópole de muitas matérias-primas essenciais ao seu consumo - e poucas são aquelas que, com proveito, não possam ser por elas fornecidas.
O programa económico nacional reserva a uma e outra destas províncias um lugar importante.

A utilização dos recursos financeiros

11. Neste, como noutros assuntos, a mentalidade nacional necessita de evoluir consideràvelmente. Em matéria económica, sobretudo, temos vivido muito de palavras e, infelizmente, em certos casos, de gostos individuais.
A primeira coisa que é fundamental que todos compreendam de maneira infinitiva é o seguinte:
O que se gasta em obras reprodutivas, ou não reprodutivas, provém de unia fonte única. Essa fonte não é inesgotável, como, aliás, se comprovou recentemente na actividade pública e privada.
Não sendo inesgotáveis os recursos financeiros, há que desviar os disponíveis para as obras mais úteis - e não servir este ou aquele esquema, que agrada a esta ou àquela entidade, ou satisfaz este ou aquele desígnio.
O conjunto dos recursos financeiros disponíveis, quer provenham de fundos externos, ou de reservas da previdência, ou de excessos orçamentais, ou de economias privadas, ou de empréstimos, é um depósito sagrado que pertence à Nação e tem de ser utilizado, nesta conjuntura difícil da vida nacional, com inteligência e parcimónia.
Reduzidas, por circunstâncias pouco felizes, as grandes disponibilidades, que ainda há dois ou três anos se amontoavam no erário e nos cofres do banco emissor, é mister defender o que resta e o que poderá ser obtido pela redução de despesas e de consumos.
A defesa só pode ser obtida eficazmente pela sua utilização nas empresas mais reprodutivas, naquelas que com menos ou idênticas inversões financeiras produzam maiores rendimentos económicos.
Os apuramentos provisórios do comércio externo de 1949 mostram que, apesar do travão aplicado às importações e da grande redução no poder de compra através de fortes restrições do crédito, o deficit da balança comercial atingiu õ milhões de contos, números redondos. A diminuição verificada no deficit, em relação ao ano anterior, foi mais devido à baixa nos valores unitários e dos preços do que no peso importado, que ainda subiu de cerca de 126:000 toneladas, 3:037 mil em 1948 contra 3:163 mil em 1949.
Isto significa que os consumos aumentam, apesar das forças opostas que tendem a restringi-los. A pressão sobre os consumos só pode ser neutralizada por apreciáveis aumentos na produção interna, no sentido de os satisfazer tanto quanto possível e melhorar as exportações.
A responsabilidade que impende, por isso, sobre todos, e especialmente sobre aqueles que directamente intervêm na distribuição ou utilização dos recursos financeiros disponíveis, é muito grande e muito grave. Não é coisa para ser encarada de ânimo leve; terá de seguir as normas, aliás seguidas em toda a parte, de conveniente discussão e estudo dos diversos planos que são propostos para realização, tendo em conta as suas finalidades de natureza política, social e económica, sem esquecer que a população aumenta na razão de mais de 1 milhão de almas por década, que a natalidade se mantém e a mortalidade tende a diminuir, que o nível de vida precisa de ser melhorado em certos aspectos, que a remessa de recursos invisíveis se torna cada vez anais precária, que o ultramar tem sede de capitais para se desenvolver em escala cada vez mais acelerada, quanto mais não seja para permitir emigração suficiente da metrópole, e que nuvens internacionais indicam tempestades futuras.

12. O programa económico nacional adiante enunciado baseia-se nos princípios acabados de expor: concentração de recursos financeiros, redução de consumos supérfluos, critério utilitário nas empresas a executar,

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plena eficiência técnica na realização das obras, disciplina e coordenação na orientação económica.
A executar-se, levará o tempo de uma geração, porque é tarefa vasta, complexa, e exige a mobilização dos melhores valores nacionais. Pode ser executado depois de convenientemente debatido e pormenorizado.
Aqueles que, habituados a olhar as coisas superficialmente, atingiram o estado de cepticismo, que é negação, não devem dar-se ao trabalho de o examinar, porque o não compreenderão. Aqueles que se debruçam muitas horas sobre os (problemas reais da vida nacional, mas que os estudaram sempre isoladamente, terão dificuldades em obter uma visão de conjunto. Os que já hoje sentem a necessidade de coordenar os esquemas parciais de modo a transformar o problema económico nacional num todo harmónico, hão-de corrigir arestas que o programa certamente contém e limá-las com seu bom conselho e aperfeiçoá-lo muito. É para isso que o relator das Contas Gerais do Estado e seus colaboradores resolveram oferecê-lo à atenção do País. Um programa desta natureza não pertence a ninguém - só pode pertencer a todos os que sinceramente amam a sua terra -, e por isso mesmo lhe devem todo o seu esforço e inteligência, ainda que, como muitos têm abnegadamente feito, esse esforço seja oferecido a título gracioso.

RECEITAS

I. O problema das receitas começa a tornar-se difícil porque as dificuldades económicas, na agricultura, na indústria e no comércio, se acentuaram nos últimos tempos. Não quer isto dizer que o seu nível seja alto. Não dobrou sequer, em relação a 1938, se forem consideradas apenas as receitas ordinárias; e o índice do preços, que pode ser indicativo, mas não medida, da desvalorização do escudo, alcançou uma cifra que permitiria talvez maior volume de receitas.
As circunstâncias económicas internas são, porém, adversas a qualquer acréscimo que não derive de alargamento da massa tributária. Ainda é possível trazer para o fisco rendimentos que andam arredios, mas a sua influência talvez não compenso os alívios necessários.
Dadas as necessidades públicas, qualquer diminuição na receita ordinária pode exercer influência desfavorável na vida nacional. Terá de ser mantido, pelo menos, o nível actual por uma melhor repartição de encargos, de modo a elevar possivelmente as taxas sobre maiores rendimentos. É a lei natural das coisas, e não há que fugir a elas quando a necessidade obriga.
O aumento das receitas é, porém, mais consequência de aumento de rendimentos do que de outra coisa, e, por isso, a obra de desenvolvimento dos recursos internos é aquela que maior influência pode ter na sua melhoria.
O ano de 1948 foi, no aspecto de receitas orçamentais, um ano próspero, porque o seu quantitativo atingiu a maior cifra que regista a história financeira. Não quer isto dizer que, de um modo geral, para o contribuinte, e também para a vida financeira, a gestão dos negócios públicos fosse feliz.
Há-de ver-se no respectivo capítulo que os gastos foram muito grandes e que poderiam ser adiados alguns, ou até muitos, e substituídos por outros. O não se ter feito isso ocasionou acontecimentos de que se fala noutro lugar.
Assinala-se, contudo, que ainda este ano o País liquidou um elevado somatório de receitas, e que, apesar do pequeno decréscimo nas extraordinárias, ainda o conjunto ultrapassou o de outros anos.

AS CONTAS

2. O quantitativo total de receitas contabilizadas em 1948 foi de 5.761:207 contos, assim divididos:

Contos
Receitas ordinárias ......... 4.428:472
Receitas extraordinárias ....... 1.332:735
Soma ...... 5.761:207

Km 1928-1929, no início da reorganização financeira, as receitas ordinárias somavam 2.174:751 contos e as extraordinárias não passavam do 45:731. O simples enunciado destas cifras mostra que as ordinárias mais do que dobraram e as extraordinárias atingiram coeficiente de aumento muito grande.
Seria, na verdade, um. trabalho interessante, se pudesse ser feito, aquele que nos desse o nível do gradual desenvolvimento económico do País durante este longo período de mais de vinte anos, que viu profundas transformações na vida política e económica da Europa e da Ásia e internamente permitiu progressos de interesse social e financeiro de grande projecção na vida de cada um.
Mas, infelizmente, os nossos índices económicos não são de molde a tais locubrações, aliás de grande importância no progresso da Administração.
Temos, pois, de nos limitar a índices parciais, que nunca poderão dar ideias definitivas.

3. As contas acusam um saldo de 62:137 contos, que vai muito além do saldo orçamental previsto.
Esse saldo obteve-se do modo indicado no quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se que o saldo das receitas sobre as despesas ordinárias foi de perto de 683:828 contos. Havia sido cerca de 874:000 contos em 1947, apesar de menor volume de receitas ordinárias. Se não fora a apreciável diminuição nas despesas extraordinárias, motivada pelas razões expostas no respectivo capitulo, a situação seria diferente.

4. As receitas públicas em 1948, relacionadas com anos anteriores, foram as que constam do quadro da página seguinte.

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[Ver Quadro na Imagem]

5. Estudar-se-ão noutros capítulos três grandes classes de receitas, mas convém desde já decompor as extraordinárias, visto elas terem, na verdade, muita importância nas contas e estarem actualmente condicionadas pela situação do mercado de dinheiro.
Essas receitas tiveram a origem que vai indicada no quadro que se segue:

[Ver Quadro na Imagem]

O quadro mostra claramente a origem das receitas extraordinárias. Circunscrevem-se apenas ao produto de empréstimos e a verbas desviadas de saldos de anos económicos findos.
As dificuldades nos primeiros -nos empréstimos - ocasionarão redução considerável nas obras culturais, sociais e económicas.
Foi o que começou a suceder em 1949 e se tornará mais evidente em 1950 e anos seguintes.

RECEITAS ORDINÁRIAS

6. Viu-se que o total das receitas ordinárias subiu a 4.428:472 contos, o máximo, em escudos, atingido pelas contas na história financeira do Pais. Desde 1938 quase dobraram as receitas ordinárias, não chegando já a 100 mil contos o que falta para isso. Quer dizer: se apenas se tomasse como indicativo de receitas futuras o índice de preços, isto é, se apenas se considerasse a. quebra da moeda, os números de 1948 avizinhar-se-iam dos de 1938, tendo em conta as deficiências dos elementos que ainda caracterizam os índices.
Mas haverá também que olhar para o desenvolvimento interno, que deve ter sido apreciável. O nível de receitas ordinárias não parece exagerado por esses motivos, e, se não fora a crise que se desenha com a estagnação de negócios, poder-se-ia aproximar da lógica.
É ainda defeituosa, porém, a repartição, e convirá redobrar de esforços no sentido de equilibrá-la.

7. Um dos fenómenos interessantes das finanças portuguesas é a constância do peso dos impostos directos e indirectos. Desde 1928-1929 o País pagou quase 54 milhões de contos de receitas ordinárias e cerca de 9,5 milhões de receitas extraordinárias.
As primeiras, as ordinárias, repartiram-se, em percentagens, por capítulos orçamentais, do modo indicado no quadro da coluna seguinte.
A diminuição nos impostos indirectos ocasionou um decréscimo na percentagem da sua influencia no conjunto e um aumento na dos impostos directos - o que até certo ponto corresponde à justiça. As duas, somadas, dão perto de três quartos do total.
Em 1948 as restantes atingiram apenas 27,6 por cento.

Receitas orçamentadas e cobradas

8. As alterações sofridas pela lei orçamental durante o ano cifraram-se em 223:426 contos para mais. As duas modificações de maior vulto deram-se nos capítulos de reembolsos e reposições e consignações de receitas. O total, depois de aprovados os créditos especiais, deu a soma de 4.111:286 contos. No quadro que segue comparam-se as receitas orçamentadas e cobradas de diversos anos, com início em 1930-1931.

[Ver Quadro na Imagem]

Nota.- Nos anos de 1938 e 1939 não foram incluídos neste mapa os creditei especiais nas receitas orçamentadas, o que se fez agora.

Nota-se o facto de ter havido uma diferença de 317:186 contos para mais entre as receitas orçamentadas e cobradas em 1948. Se não fora a insuficiência de previsão, que necessitou da abertura de créditos especiais, a que se aludiu acima, a diferença atingiria cerca de 640:000 contos, o que é muito.

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9. Para dar melhor ideia das realidades há que corrigir as receitas, expurgando delas os juros de títulos na posse da Fazenda Pública, que também recebem juros, e os empréstimos. Poder-se-ia talvez, com propriedade, fazer outro tanto em matéria de certos reembolsos o reposições, mas seria mais complicada a conta se assim se fizesse, e, na verdade, não atinge bem o fim em vista, que é o de determinar o líquido de receitas entradas, já agora podemos dizer, de receitas ordinárias entradas no erário. O quadro seguinte mostra o quantitativo das receitas, sem juros de títulos na posse da Fazenda nem empréstimos.

[Ver Quadro na Imagem]

Por títulos na posse da Fazenda cobraram-se 19:978 contos, deduzidos do conjunto das receitas ordinárias; e nas receitas extraordinárias apenas só consideraram os saldos de anos económicos findos, visto não haver outras além de empréstimos. Apesar disso, o aumento da despesa total ainda foi superior em 124:000 contos relativamente ao ano anterior.

Origem das receitas ordinárias

10. As receitas ordinárias evoluíram muito em sentido ascendente depois da guerra e os aumentos deram-se em quase todos os capítulos, como se nota no quadro que segue, onde se inscrevem desde 1936 as cifras relativas a cada um deles:

[Ver Quadro na Imagem]

O aumento de receitas

II. Antes de estudar as variações de receitas, por capítulos, convém notar a sua influência na soma total
durante os últimos anos. Para isso é de interesse agrupar os dois capítulos principais e calcular as percentagens que lhes correspondem. É o que se fez no quadro seguinte em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Como se nota, a soma dos impostos directos e indirectos é da maior importância.
Anda à roda, como se viu atrás, de perto de três quartos do total.

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12. O grande aumento nas receitas a partir do principio da guerra, por exemplo, deu-se nos impostos directos e indirectos.
Em ambos os casos a ordem de grandeza no aumento foi muito grande.
Reportando a análise a 1930-1031 pode dizer-se que os impostos directos triplicaram e os indirectos mais que dobraram. O quadro que segue exprime as receitas em valor absoluto e em diversos períodos e dá uma ideia clara da sua evolução nos últimos dezoito anos.

[Ver Quadro na Imagem]

13. Na base de 1938 igual a 100, os números que seguem duo talvez melhor ideia de um fenómeno que constitui o fundamento do equilíbrio das contas. Eles exprimem as percentagens do aumento depois da guerra.

[Ver Quadro na Imagem]

I

IMPOSTOS DIRECTOS

14. Apesar da diminuição de cerca de 235:600 contos, em relação a 1945, no imposto sobre lucros excepcionais de guerra, dos quais ainda se recebeu este ano cerca de 3:300 contos, a receita total dos impostos directos aumentou. O amparo veio de quase todos os outros impostos, mas principalmente da contribuição industrial, do imposto complementar e das sucessões e doações. O quadro seguinte mostra a decomposição dos impostos directos e as maiores valias ocorridas entre 1948 e anos anteriores:

[Ver Quadro na Imagem]

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O imposto directo é, sem dúvida, o mais justo no ponto de vista social, porque incide em grande parte sobre lucros e rendimentos. Também é, ao mesmo tempo, um dos mais complicados, porque se torna muitas vezes difícil operar justa distribuição, dada a fuga natural de muitos contribuintes, em certos aspectos da carga tributária.
A progressão do seu rendimento tem sido continua, como consequência natural de maiores cuidados e investigações, e de taxas progressivas que têm sido aplicadas.
Ainda está longe do que pode ser, e não será fácil elevá-lo muito nos próximos anos. A subida do imposto directo não implica, porém, aumento de receita ordinária, porque outros capítulos terão, talvez, de ser aliviados proporcionalmente.
Há-de dar-se, e já se está dando, uma transferência de receitas de capítulo para capítulo, mas não há dúvida que ela trará simplificação nos lançamentos e melhor justiça, se for orientada no sentido de alargar a base de rendimento do imposto directo.

15. Os três grandes impostos, no momento presente, são o predial, o industrial e o complementar. Está quase a atingir um nível idêntico o de sucessões e doações, sobretudo depois de ter sido criada a taxa de compensação.
Os três impostos mencionados renderam, em 1948, 60,6 por cento do total, como é fácil ver no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se a ascensão brusca dos impostos de transmissão, a sisa, as sucessos e doações, que já atingiram, no conjunto, 27,6 por cento.
O resto tem pouco interesse financeiro, embora, no caso do imposto profissional, sejam grandes os seus reflexos.

Contribuição predial

16. O aumento da contribuição predial desde 1930-1931 não foi espectaculoso, nem está relacionado com a quebra da moeda. Andou à roda de 95:000 contos.
Contudo, quem examinar o orçamento do proprietário rústico, nota logo certo desequilíbrio entre os rendimentos efectivos, em muitos anos, e o total de impostos ou taxas que é obrigado a pagar. A sua situação não deve ser vista apenas pelo lado da contribuição predial - o às vezes quando se discute este assunto as aparências tornam obscura a realidade. É que, na maior parte dos casos, os adicionais, as taxas de diversa natureza, as quotas e outros encargos oneram muito os desembolsos do proprietário rústico.
A contribuição predial subdivide-se, como se sabe, em rústica e urbana e é função dos rendimentos colectáveis de uma e outra. Hão-de dar-se adiante os números para esse rendimento, que tem vindo sendo actualizado pelos trabalhos do cadastro e por avaliações.
Mas há um ponto já tratado em apêndice 1 nestes pareceres que tem muito valor.
O número de prédios, relacionado com as respectivas áreas, representa o grau de concentração ou de fragmentação da propriedade rústica. Na exploração agrícola isso tem grande importância. É possível hoje determinar, por distritos, e até por concelhos, o grau de concentração, relacionando o número de contribuintes com o número de prédios rústicos e urbanos.

A fim de esclarecer esta matéria organizou-se o quadro seguinte, que dá, por distritos, o número de contribuintes e o número total de prédios, subdivididos em urbanos e rústicos:

Relação entre o número de prédios e o número de contribuintes, por distritos

[Ver Quadro na Imagem]

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1 Ver parecer sobre as Contas Gerais do Estado de 1940, p, 143 (separata).

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[Ver Quadro na Imagem]

Este quadro mostra a evolução desde 1936 do número de contribuintes e do número de prédios rústicos e urbanos.
Nota-se em primeiro lugar que aumentou o número de contribuintes. Houve um acréscimo de mais de 200 mil em 12 anos, o que parece ser muito.
Mas deu-se apreciável diminuição no número de prédios rústicos.
A impressão que as cifras dariam, no caso de serem reais os números, é que nas zonas mais fragmentadas se começam a notar os inconvenientes e se desenha movimento para a concentração.
Há menos prédios rústicos em 1948 do que em 1936 nos distritos de Aveiro, Beja, Bragança, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria, Lisboa, Porto, Santarém, Setúbal, Viana do Castelo, Vila Real, Viseu, Horta e Ponta Delgada.
Nos restantes distritos, isto é, em Braga, Évora, Faro, Portalegre, Angra do Heroísmo e Funchal o número de prédios rústicos é maior.
Isto poderia significar ter havido fragmentação nos últimos e concentração nos primeiros.
Deve ser aflitiva a situação dos distritos de Aveiro, Bragança, Coimbra e Viseu, com cerca ou mais de um milhão de prédios rústicos. Mas há nos números uma possível anomalia, relativa aos distritos de Beja e Setúbal - distritos do Sul -, onde ainda parece ter descido o número de prédios.
O aumento do número de contribuintes deu-se em quase todos os distritos, excepto em Angra do Heroísmo. Mas, no que diz respeito a propriedade rústica, o número de contribuintes não pode dar indicações, em virtude de se referirem a prédios rústicos e urbanos.

17. O número de prédios urbanos aumentou muito depois de 1936. Nem tudo deve ser considerado como novas construções e julga-se que a parte mais importante foi devida a prédios omissos.
Havia 1.704:080 prédios urbanos em 1936 e 1.834:867 em 1948.
Por ordem de grandeza, os distritos que tinham mais prédios urbanos em 1948 eram:

Porto ................ 176:526
Viseu. .............. 150:182
Coimbra. ............. 130:773
Lisboa ............... 127:083
Guarda ............... 117:577
Aveiro ............... 107:517

No continente os distritos com menos prédios urbanos são:

Setúbal ............... 42:459
Évora ............... 37:532

Rendimentos colectáveis

18. O rendimento colectável da propriedade rústica tem subido muito pouco, e isto explica o pequeno aumento na respectiva contribuição.
O quadro seguinte mostra, desde 1938, a evolução dos factores que afectam a contribuição:

Propriedade rústica

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se ter havido apenas o aumento de 120:000 contos no rendimento colectável da propriedade rústica e de cerca de 24:000 contos na contribuição predial.
Ambos os números são baixos, dadas as modificações sofridas pela moeda neste período de tempo.
Os aumentos do rendimento colectável deram se sobretudo nos concelhos em regime de cadastro geométrico, que são dezoito, sendo onze no distrito de Beja, um no de Setúbal e os restantes no Centro e Norte: Mafra, Mogadouro, Mesão Frio, Peso da Régua, Santa Marta de Penaguião e Lamego.
É de notar que houve percentagens de aumento que não atingiram 100 por cento em todos os concelhos do distrito de Beja, excepto Serpa, e que no Norte e Centro em quase todos os concelhos lhe foram inferiores ou idênticas, com a notável excepção de Lamego (53,72 por cento). De um modo geral, pode dizer-se ser de 72,47 por cento o aumento médio.
Devem ser sujeitos a regime de cadastro mas quatro concelhos em 1950.

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Simultâneamente com o cadastro está a proceder-se a novas avaliações em diversas zonas do País. Já foram reavaliados 22 concelhos, que trouxeram um aumento médio de 09 por cento. Os casos que mostram maiores acréscimos são os de Alpiarça (262,9 por cento), Funchal (244,2 por cento), Góis (159,4 por cento), Coruche (127,3 por cento) e Calheta (123,2 por cento).

Liquidação da contribuição predial

19. O quadro seguinte exprime a liquidação da contribuição predial, urbana e rústica, por distritos, nos anos de 1943 e 1948.
As duas últimas colunas mostram a relação entre as duas contribuições.

Contribuição predial (verba principal) urbana e rústica por distritos

[Ver Quadro na Imagem]

Verifica-se que os distritos de Lisboa e Porto são os únicos em que a contribuição predial urbana é maior que a rústica e que no de Setúbal é quase idêntica. No resto, como mostram as duas últimas colunas, a contribuição predial urbana é muito inferior.
Por verba principal liquidou-se em 1948 cerca de 140:000 contos de contribuição na propriedade urbana e de 164:000 contos na rústica.
Só os distritos de Lisboa e Porto pagaram 90:000 contos.
Os distritos que liquidam maiores quantias na contribuição predial rústica são o de Santarém (15:300 contos) e o de Viseu (11:447 contos). O de Setúbal liquida pouco mais de 4:900.
A verba de adicionais é, no conjunto do País, igual a 98:601 contos para a contribuição predial urbana o rústica.
O quadro que segue exprime as relações entre os rendimentos colectáveis, contribuição predial e capitação em cada distrito do País.

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

As capitações mantêm-se no nível de anos anteriores e não há muito mais a dizer sobre o, assunto além do que já se escreveu o ano passado. É até certo ponto paradoxal o facto de ser maior o rendimento colectável urbano em relação ao rústico.

Repartição geográfica dos rendimentos colectáveis e da contribuição predial

20. Para finalizar estas notas sobre a contribuição predial publica-se a seguir um quadro que tem interesse de conjunto e mostra o que cada distrito paga por contribuição predial rústica e urbana em relação ao total.
Como era de prever sobressaem, no conjunto da contribuição predial urbana, as percentagens relativas a Lisboa o Porto.

Percentagens de cada distrito

[Ver Quadro na Imagem]

Contribuição industrial

21. O aumento da contribuição industrial foi bastante grande desde o começo da guerra. Passou de 197:500 contos em 1939 para 487:800 em 1948, mais 290:300 contos. Este grande acréscimo deu-se sobretudo a partir do 1945 e acentuou-se nos últimos dois anos de 1947 e 1948. Foi o aumento de colectas e o desenvolvimento do capital tributável que operou esto acréscimo da contribuição industrial.

Colectas

22. Vejamos em primeiro lugar o número de colectas. Relacionado com 1938 elo foi o seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

O número de colectas quase atingiu 400:000 em o não ia além do 287:000 em 1938.
Isto deve ser devido, por um lado, a maiores diligências do fisco, no sentido de trazer ao imposto o que dele andava arredio, e, por outro, à intensificação de negócios de toda a espécie que as guerras trazem na sua bagagem, para desaparecerem em parte acabado o conflito.
Foi naturalmente o grupo C que mais concorreu para o grande acréscimo. Por si só é responsável por mais cerca de 110:000 colectas. Os outros grupos mantiveram-se e o grupo A até diminuiu.

Matéria tributável

23. Com o maior número de colectas aumentou o capital tributável - desenvolveu-se a massa produtiva da contribuição.
Há reclamações sobre este grande....aumento do capital tributável. É natural serem feitas ....

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parece ser fácil obter elementos seguros enquanto a grande maioria dos contribuintes não auxiliar nas avaliações.
As cifras que dão o acréscimo são espectaculosas - o capital sobre que incidiu a tributação das sociedades anónimas subiu de 1.458:000 contos em relação a 1938 e o rendimento tributável dos contribuintes do grupo C elevou-se em mais de 1.758:000 contos.
Tudo se pode verificar no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Não é este o lugar para discutir os métodos usados com o objectivo de actualizar uma das mais importantes receitas do Estado, aquela que mais pesa sobre os impostos directos, nem tão-pouco fazer o estudo das relações entro a contribuição industrial e predial na economia do orçamento.
Pode ter-se em conta, como certo, exageros do fisco, mas não são para desprezar fugas do contribuinte - que se vê a braços às vexes com outros encargos obrigatórios por lei, simples decreto ou até instrumento jurídico de menor importância, como às vezes se refere nalgumas queixas apresentadas na própria Assembleia Nacional.
Mas o facto importante é que, no conjunto e nas datas em que se cobraram, não são exageradas nem uma nem outra das contribuições a que se aludiu. Onde há certamente anomalias é na distribuição, e conviria por isso melhorá-la enquanto se não encontra forma mais apropriada de cobrar o que é devido e necessário ao Estado.

Cobrança

24. A contribuição industrial, como se disse acima, atingiu 487:838 contos em 1948. Os números, relacionados com o primeiro ano da guerra e 1930-1931, são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

Foi o grupo C, como é lógico, que produziu maior receita o é nele que se tom dado os maiores aumentos. Quase triplicou desde 1939, em que se cobraram 130:360 contos.
Não se vê bem como poderá sor mantido, ou excedido, o total deste imposto daqui em diante se não se modificar o actual período de estagnação que o comércio atravessa.
A liquidação foi de 624:071 contos, compreendendo os adicionais. Cabe a maior parte aos dois distritos de Lisboa e Porto, que, juntos, cobraram 401:600 contos, cerca do dois terços do total. Vêm a seguir Braga, Setúbal, Aveiro e Coimbra.
A própria distribuição do imposto indica serem as duas capitais do País os grandes centros industriais e comerciais. O quadro que segue mostra, para 1948, a liquidação da contribuição industrial e a sua capitação por habitante e contribuinte.

[Ver Quadro na Imagem]

A grande diferença, em valor absoluto, notada em Lisboa corresponde a média, por contribuinte, de perto de 4.4005.
No Porto a média pouco passa de 3 contos e nos outros distritos é muito inferior. O aumento das médias,

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em relação a 1947, foi substancial nalguns casos, como, por exemplo, em Braga, em Lisboa e no Porto. Mas em Setúbal diminuiu. A média por contribuinte era de 1.479$ em 1947 e de 1.287$ em 1948. Deve isto ser motivado pela crise das conservas de peixe.

25. Todos os anos se procura fixar o que pagam ao Estado, por contribuição industrial, as actividades mais importantes. Não é fácil fazer uma selecção representativa do total das indústrias, tal a sua diversidade.
O que neste aspecto tem certo interesse é a comparação com o período anterior à guerra. De qualquer modo, apesar das insuficiências, essa comparação dá a evolução desta ou daquela actividade.
Todos os anos o Anuário Estatístico das Contribuições e Impostos dá nota das variantes sofridas pelas diversas indústrias em matéria de contribuição industrial.
Não vale por isso a pena esmiuçar a questão do imposto sobre as indústrias porque, além de faltarem elementos sobre as receitas totais de cada ramo, também se desconhece a relação ou relações entre cada um dos seus componentes.
O País pôde desenvolver-se industrialmente e houve grandes lucros durante a guerra, alguns dos quais se inverteram em melhorias importantes, que, infelizmente, em certos casos, se referiram mais a edifícios do que a instalações. O problema industrial, na parte que interessa ao fisco, reside num melhor equipamento que leve a menores custos de produção, porque assim melhor serão satisfeitas as necessidades do imposto.

Imposto complementar

26. O número de contribuintes deste imposto subiu de 46:118 em 1947 para 48:156 em 1948, mais 2:038. Em nome individual contribuíram 10:915 entidades e em nome colectivo o número foi de 32:241.
O imposto complementar incide sobre grande variedade de rendimentos. De qualquer modo, embora com imperfeições, eles dão o grau de concentração de riqueza.
O total dos rendimentos globais subiu a 3.884:953 contos, provenientes de prédios urbanos e rústicos, de entidades passivas do contribuição industrial, de contribuintes sujeitos ao imposto de aplicação sobre capitais, do imposto profissional e, finalmente, de rendimentos resultantes do exercício de funções públicas.
De tudo o que mais pesa são os contribuintes do grupo C e os rendimentos de prédios na contribuição predial urbana.
As deduções de lei mandadas fazer nos rendimentos globais elevaram-se a 1.618:587 contos, de onde resultou muito menor a importância líquida desses rendimentos.
O quadro que segue exprime sumariamente algumas características importantes do imposto complementar para 1948:

[Ver Quadro na Imagem]

Os números do quadro, com excepção no que diz respeito ao número de contribuintes, são em contos. Nota-se o grande peso dos rendimentos provenientes de actividades passivas de contribuição industrial.

Pessoas singulares

27. Viu-se que as pessoas singulares passivas de imposto somaram 15:731. Por escalões de rendimentos podem subdividir-se assim:

[Ver Quadro na Imagem]

Vê-se que os rendimentos compreendidos entre 200 e 500 contos, no total de 1:105, foram os que atingiram nível superior, seguidos pelos escalões entre 100 e 200 e entre 50 e 100.
Acima de 500 contos desce consideràvelinente o quantitativo dos escalões, assim como o número do contribuintes.
Houve, neste aspecto, progresso sensível entre 1947 o 1948. Enquanto que no primeiro destes anos os maiores rendimentos estavam compreendidos entro 50 e 100 contos, no último passou para o escalão compreendido entro 200 e 500.
É de notar haver doze contribuintes entre 2:000 o mais de 3:000 contos com rendimentos globais superiores a 37:000 contos.

Pessoas colectivas

28. O quadro que segue dá a sua distribuição, por escalões:

[Ver Quadro na Imagem]

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Foram os rendimentos superiores a 3:000 contos por ano que serviram de base a mais tributações, seguidos pelos escalões até 00 contos.
Parece haver possibilidades de aperfeiçoar os escalões intermédios, que talvez possam servir de base a maior tributação.

Importâncias cobradas

29. O que acaba de se expor diz respeito a rendimentos tributáveis. Mas interessa saber o que se pagou e isso tira-se facilmente das colectas liquidadas.
Vejamos, em primeiro lugar, as pessoas singulares. O quadro que segue dá uma ideia clara dos diversos escalões.

[Ver Quadro na Imagem]

Títulos em moeda estrangeira

30. Um dos dados interessantes que deriva do estudo do imposto complementar é o do conhecimento do número o valor dos títulos estrangeiros passíveis deste imposto.
O número de possuidores de títulos estrangeiros era do 9:911 e o valor nominal dos títulos de 1.424:634 contos. As moedas da emissão incluíam dólares, florins, libras esterlinas, reichsmark, francos franceses, pesos argentinos, coroas austríacas, francos belgas, cruzeiros, dólares canadianos, mil-réis, réis, coroas dinamarquesas, pesetas, coroas húngaras, liras, ienes, pesos mexicanos, piastras, coroas norueguesas, coroas checas, zloty, lei, rublos, coroas suecas, francos suíços, pesos uruguaianos.
Um pouco de tudo, mas o que prepondera é u moeda brasileira o inglesa, o cruzeiro, mil-réis ou réis, o a libra esterlina.
Tem interesse observar a dispersão das inversões do capital português pelo Mundo, de que devem ter derivado muitos males.
Os valores dessas inversões, traduzidas em moeda nacional, que incidiram no imposto complementar, são os seguintes por moedas:

[Ver Quadro na Imagem]

Evolução do imposto complementar

31. A receita do imposto complementar tom subido gradualmente, atingindo 166:686 contos em 1948. A sua evolução é dada pelo quadro seguinte:

Contos
1930-1931. ............ 36:617
1936 ................43:111
1938 ................50:204
1940 ................57:489
1942 ................65:662
1943 ................70:093
1944 ................79:093
1940 .............. 111:049
1940 ............. 114:162
1947 .............. 145:315
1948 .............. 166:686

Imposto suplementar

32. Subiu para 17:219 contos a receita do imposto suplementar e para 1:524 o número de contribuintes, sendo 912 da classe A e 612 da classe B.
O rendimento do imposto suplementar desde, o seu início foi o seguinte:

Contos
1041 ................3:860
1942 ............... 4:586
1943 ................5:915
1944 ............... 7:616
1945 ............... 9:764
1946 ...............11:435
1947 ...............13:316
1948 ...............17:219

Grande parte deste imposto provém da incidência sobre a acumulação de remunerações (classe B). Na verdade, houve ligeiro retrocesso no imposto da classe A, sobre vencimentos.

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Os números que seguem exprimem aproximadamente a divisão do imposto pelas classes A e B, em relação às quantias liquidadas:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se ter havido aumento bastante apreciável -cerca de 4:000 contos- em relação ao ano anterior. Parece assim denotar que continua a ascensão nas acumulações.
Os vencimentos e remunerações envolvidos neste imposto atingem já hoje uma soma muito grande. Aproxima-se de 222:600 contos. Subiu para esta quantia, de 187:261 que era em 1947.
A ascensão deu-se nos dois tipos A e B, mas foi bastante mais acentuada no último, como aliás era de prever.

[Ver Quadro na Imagem]

O quadro que segue dá os vencimentos isentos de imposto, os provenientes de acumulação e sujeitos a imposto e, finalmente, as remunerações:

[Ver Quadro na Imagem]

A soma total dos vencimentos e acumulações é bastante grande e a sua evolução vê-se claramente nas cifras seguintes, que exprimem o número de contribuintes e o total dos vencimentos e remunerações, desde 1944.

Classe A

33. O vencimento total dos contribuintes (funcionários) para este imposto subiu a 98:108.895$. Deste total, 48:670.922$ foram isentos, por disposição de lei, o 49:437.973$ ficaram sujeitos a imposto.
É uma soma muito elevada quando se considera que o número de contribuintes é apenas de 912, como se viu atrás.
Há qualquer coisa que necessita de ser vista com cuidado, porque envolve concentração de vencimentos que precisa de ser muito modificada.
A acumulação é de si um mal, inevitável às vezes, quando a especialização de funções a exige, em certos casos. Hás não pode ser generalizada ou servir de complemento a vencimento sem que se dêem as condições que as poderiam permitir ou aconselhar.
A maior parte das acumulações dá-se, como era do esperar, em Lisboa e a grande distância, no Porto. Mas Coimbra tem feito também progressos nos últimos anos.
Os números para os vencimentos sujeitos a imposto, número de funcionários e imposto cobrado constam do quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

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Classe B

34. As acumulações na classe B afectaram muito maior somatório de remunerações, visto se aproximar já do 125:000 contos. Eram em 1943 apenas 43:000 e em 1947 não chegaram a 100:000 (97:929 contos). O número de contribuintes aumentou para 612. A remuneração média diminuiu de 204 contos em 1947 para 200, números redondos.
As cifras que exprimem o número de contribuintes e a importância sujeita a imposto, por escalões, constam do quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

Neste caso ainda mais do que na classe A se acentua a importância de Lisboa e Porto. Dos 124:475 contos acima mencionados correspondem 86:529 a Lisboa e 28:093 ao Porto. Quer dizer: 114:622 contos dizem respeito a estas duas cidades, que contêm ambas 559 dos 612 contribuintes. Dos restantes distritos, os mais importantes são Setúbal (1:497 contos), Coimbra (1:488 contos) e Droga (1:391 contos).
Contribuintes com pagamento de imposto superior a 200 contos há apenas 5: o restante é inferior a esta soma, como se verifica nos números que seguem, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

No primeiro escalão a importância é baixa. Onde ela assume maior vulto é nos escalões superiores a 200 contos.

Imposto profissional

35. O imposto profissional subiu ainda e rendeu 57:528 contos. Corresponderam a empregados por conta de outrem 49:740 contos e às profissões liberais competiram 7:788 contos.
O aumento foi importante em relação a 1947. Eram apenas 11:863 contos em 1930-1931 e 17:169 em 1938. Mais do que triplicou em relação a este último ano. Na impossibilidade ide dar larga resenha sobre a vida deste imposto, repetem-se apenas alguns dos quadros publicados noutros pareceres.
A evolução do número de colectas desde 1942 foi muito grande, pois passou, nos empregados por conta de outrem, de 64:656 para 82:499 contos. Houve, porém, quebra em 1948.
Tudo se nota, assim como a verba principal e número de colectas relativas às profissões liberais, na tabela seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Vê-se logo o grande aumento no imposto liquidado, sobretudo no primeiro caso.
Quanto às profissões liberais, com 10:170 contribuintes, é interessante verificar a discriminação dos que mais concorrem para o imposto.
No quadro que segue indica-se a influência das diversas profissões liberais:

[Ver Quadro na Imagem]

Imposto sobre as sucessões e doações

36. O número total e a importância dos processos que produziram ou não imposto sobre as sucessões e doações foi o seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

O número de isenções aumentou muito, recentemente, por virtude de legislação que suavizou um pouco as pequenas transmissões.
Em 1947 fora de 15:190 e em 1946 de apenas 9:387.
Para dar ideia do capital isento de imposto, que atingiu 610:256 contos, contra 186:598 em 1947, publica-se a

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10 DE ABRIL DE 1950 772-(19)

seguir um mapa que mostra claramente onde incidiram as maiores isenções.
Incluem-se nele a importância dos valores legados, das quotas hereditárias e das doações:

A favor de descendentes:

Contos
De valores até 500$ ..... 1:559
Transmissões que não produziram
imposto .......... 482:111
Transmissões que produziram
imposto .......... 104:900 588:570

De valores até 500£:

A favor de ascendentes .... 116
Entre cônjuges........ 140
Entre irmãos......... 284
Entre parentes colaterais . . 437 977

Entre estranhos:

De valores até 500£ ...... 1:275
De valores para o Estado e
entidades de direito público ... 14:193 15:468
Diversas ........... 5:241
610:250

O reforço de outras sucessões e doações por intermédio da taxa de compensação melhorou a receita perdida no aumento das isenções.

Talvez seja de interesse indicar sumariamente, por escalões, o movimento dos processos que produziram imposto, de modo a ter ideia da sua distribuição.

[Ver Quadro na Imagem]

Foi sobre este capital que se liquidou o imposto, no total de 139:365 contos, acrescido da taxa de compensação, que somou 137:876 contos, e do que se recebeu do imposto sobre sucessões e doações, liquidado por avença, no valor de 24:786 contos.
No conjunto, liquidaram-se 302:000 contos e cobraram-se 317:693, em virtude de receitas de processos de anos anteriores.
O imposto sobre as sucessões e doações tem aumentado bastante.
Foi o seguinte nos últimos anos, referido a 1938:

Contos
1938 ................ 118:653
1940 ................ 126:697
1942 ................ 164:965
1944 ................ 180:831
1946 ................ 174:207
1947 ................ 243:856
1948 ................ 317:693

Imposto de sisa

37. Diminuíram os valores declarados para imposto de sisa em relação a 1947, mas, ainda assim, pode considerar-se o ano de 1948 como importante neste aspecto, visto terem atingido 1.745:682 contos.
Nos prédios urbanos o quantitativo foi de 980:102 contos e de 417:199 contos nos rústicos. O resto refere-se a prédios parcelados, juntos ao do adquirente (artigo 106.º do Decreto n.º 16:731), tornas em partilhas e outros.
Como anteriormente, Lisboa ocupa por muito o primeiro lugar. Os valores declarados ainda foram superiores aos de 1947 e em grande parte constituídos por prédios urbanos.
É de notar que em Lisboa os valores que serviram de base à liquidação são bastante superiores aos declarados. Nos prédios urbanos, uns e outros foram, respectivamente, de 566:313 e 644:636 contos.
Os números que seguem mostram, para os três últimos anos, os valores declarados e de base à liquidação, em milhares de contos:

[Ver Quadro na Imagem]

A distribuição geográfica da sisa obtém-se hoje facilmente e pode dar ideia das condições das diversas regiões do País.
No que diz respeito a transacções de prédios urbanos vêm, em primeiro lugar, Lisboa e Porto, seguidos por Funchal, Braga e Setúbal.
Nos prédios rústicos, tirando Lisboa e Porto, ocupam o primeiro plano Aveiro, Viseu, Braga, Santarém, Funchal, Setúbal e Leiria.
O quadro que segue dá os valores para os distritos do continente e ilhas:

Valores declarados

(Em contos)

[Ver Quadro na Imagem]

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38. O imposto da sisa diminuiu nos últimos anos. Atingira 154:384 contos em 1946 e não passou de 111:116 em 1948.
Este imposto está estreitamente relacionado com a actividade da construção civil em todo o Pais, mas sobretudo em Lisboa e Porto, que, como se viu atrás, na tabela dos valores declarados, representam uma percentagem muito alta em relação aos restantes distritos.
O seu rendimento, para os últimos anos, relacionados com 1930-1931 e 1938, foi o seguinte:

Contos
1930-1931. ........... 52:128
1938 ................ 72:019
1945 ................ 154:384
1947 ................ 121:168
1948 ................ 111:116

Outros impostos directos

39. Como receitas importantes nos impostos directos, há ainda que considerar o imposto sobre a aplicação de capitais (89:554 contos), que incide na secção A sobre o capital de 1.906:668 contos, dos quais 1.291:182 representam empréstimos com garantia real e 327:860 empréstimos sobre letras. Os três distritos de maior movimento são Lisboa, Porto e Braga.
Houve neste aspecto um aumento de capitais relativamente a 1946, em que subiram a 1.597:183 contos.
Na secção B, que compreende dividendos ou lucros de acções, juros de obrigações, de suprimentos e empréstimos emitidos por corpos e corporações administrativas, o número de contribuintes manteve-se (3:499 em 1948, contra 3:549 em 1947).
Mas a liquidação do imposto aumentou em sou quantitativo. Passou de 63:881 contos em 1946 para 73:055 contos em 1948.

40. O imposto de trânsito foi de 7:210 contos. O juro de mora de dividas à Fazenda somou 7:494 contos e os lucros excepcionais de guerra ainda contribuíram com 3:629 contos.

II

IMPOSTOS INDIRECTOS

41. Sito simples, na aparência, estes impostos. Mas através deles pode exercer-se profunda acção na vida do País. Não é que seja essa a melhor forma de auxiliar actividades internas, ou, como também por vezes sucede, tirar-lhes o incentivo. Em virtude da sua simplicidade - os impostos indirectos são objectivos, incidem sobre coisas reais, palpáveis, visíveis -, é fácil com um simples decreto, ou até com modificações de taxas, apoiar ou condenar este ou aquele empreendimento produtivo ou parasitário.
A engrenagem que deve presidir, por consequência, à manipulação das taxas dos direitos alfandegários num caso explícito deveria ser um organismo vivo o bom informado, que pudesse actuar rapidamente, estar a par do que se passa dentro e fora do País em matéria de produção e comércio.
Infelizmente isso não tem acontecido. As pautas entro nós são amorfas e, em parte, por virtude da sua própria complexidade, não actuam nas ocasiões devidas. A vida das pautas em cada país, por outro lado, liga-se quase sempre à vida das pautas doutros países. Estabelece-se nas discussões internacionais muitas vezes luta, que, no fundo, tem por base direitos alfandegários - a projecção na produção interna da influência da modificação na taxa aplicada por este ou aquele artigo da pauta e, por consequência, no desemprego, na balança de pagamentos, nos factores que em maior relevo podem perturbar a vida social e económica de uma nação.
As coisas são assim, e não há que tentar saná-las unilateralmente. O dever de cada um, enquanto os outros não modificarem seus métodos, é defender a sua economia.

42. Os impostos indirectos desceram bastante em 1948, cerca de 77:000 contos, e isso foi devido à baixa nos direitos de importação de vários géneros e mercadorias.
Os números que seguem mostram a evolução dos impostos indirectos nas principais rubricas:

[Ver Quadro na Imagem]

Não se deu desde 1938 a subida correspondente à quebra da moeda, mas nalguns, como no imposto do selo e de estampilhas e no dos tabacos, o quantitativo total dobrou.

Direitos de importação e exportação

43. Os direitos de importação atingiram 1:020:538 contos, ou cerca de 23 por cento do total das receitas

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ordinárias. O máximo foi alcançado em 1947. Ha exportação acentuou-se ainda a descida, e é natural que continue a acentuar-se, dadas as necessidades da balança de pagamentos. O caso da exportação tem alto interesse para o País e convirá rever os direitos que incidem sobre ela.
Os números são os que seguem, relacionados com 1930-1931 e anos intermédios:

[Ver Quadro na Imagem]

No conjunto dos impostos indirectos a receita dos direitos de importação e exportação representa cerca de dois terços, como se nota nos números que seguem, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Importação e exportação

44. As cifras do comércio externo (comércio especial) relativas a 1948 constituem o máximo atingido desde a reconstituição financeira.
A importação e a exportação, reunidas, elevaram-se a 4:287 mil toneladas, contra 4:199 mil em 1947. E os valores atingiram nos dois últimos anos, respectivamente, 14:646 mil e 13:769 mil contos. As cifras provisórias para 1949 já se encontram publicadas e reduzem um pouco a importação, embora a aumentem em peso. A exportação manteve-se nos limites do ano anterior.
O comércio externo desde 1929 pode exprimir-se sucintamente no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

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772-(22) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 43

45. A fim de dar nota da discriminação, por classes, do comércio externo, publica-se este ano, em conjunto, st importância que cabe a cada uma delas, para os três últimos anos depois da guerra, em milhares de contos e percentagens do total. No quadro que se insere adiante vêem-se claramente as variações.

[Ver Quadro na Imagem]

No conjunto das importações, quando expressas em valores, as matérias-primas, que incluem combustíveis, contam por 40 por cento.
No ano de 1946 a percentagem foi superior. As substâncias alimentícias representam 20 a 24 por cento nos três anos.
As máquinas, aparelhos, ferramentas, etc., embarcações e veículos, que em 1946 apresentaram 18,7 por cento, subiram para 27,67 por cento em 1948, em virtude da relativamente grande importação de navios neste último ano.
A percentagem das manufacturas diversas firma-se entre 9 e 10 por cento.
Nota-se pois que as matérias-primas e as substâncias alimentícias têm importância especial no conjunto - mas sobretudo as primeiras.
As mais importantes são as de origem mineral-os óleos, combustíveis, carvões e outras. E possível reduzir consideravelmente a sua influência nas importações. Ela foi de 1:153 mil contos em 1948 e havia sido de 1:106 mil contos no ano anterior, um pouco menos de um terço do total.
Nas substâncias alimentícias bastante mais de metade é representado por farináceos, principalmente trigo.
É superior a 1 milhão de contos a importância que saiu do País em cada um destes dois anos de 1947 e 1948.
Haviam sido 952 mil contos em 1946.
E sobretudo nestes dois capítulos que deve incidir a atenção de qualquer programa de fomento económico que tenda a reduzir o deficit da balança de pagamentos.
As exportações mantiveram-se, apesar das dificuldades dos mercados consumidores e do tipo de produção nacional susceptível de ser exportado.
Neste aspecto é mister rever todo o problema da produção, na parte relativa aos mercados externos.
Esta, firmada em cinco ou seis produtos, tenderá a diminuir com as dificuldades dos países consumidores.
Apesar de serem relativamente pequenas, no conjunto mundial do comércio externo, as tendências são de incerteza, e em todo o caso, ainda que se mantenham os valores actuais, a exportação terá de ser consideràvelmente aumentada.

Balança comercial

46. A balança comercial continuou a ser altamente deficitária. Na verdade, o deficit de 1948 foi ainda maior do que o de 1947 e atingiu a cifra dos 6 milhões de contos. O de 1949 anda à roda de 5 milhões.
Como consequência disto deu-se um grave desequilíbrio e uma transferência de cambiais para os mercados exportadores.
O quadro que segue mostra os saldos e os deficits da balança comercial desde o princípio da guerra.
O desequilíbrio total já ultrapassou os 14 milhões de contos, ou 19 milhões, se for incluído o de 1949:

[Ver Quadro na Imagem]

A gravidade da situação exprime-se pelas dificuldades internas no momento presente e pela insuficiência de meios financeiros para executar a obra de fomento que se impõe.
Não parece que os números de 1950 venham aliviar grandemente a situação, embora a possam ligeiramente melhorar.
O problema do comércio externo é mais um problema de produção interna do que outra coisa. As remessas de emigrantes e demais receitas invisíveis corrigiram as falhas em tempos idos, mas não parece que nos tempos mais próximos elas consigam exercer forte pressão sobre a balança de pagamentos, tanto assim que se torna urgente maiores importações de máquinas e outros equipamentos mecânicos.
Restrições de consumo são inevitáveis, como é inevitável uma orientação das inversões financeiras, directa ou indirectamente, e canalização de disponibilidades monetárias para fins reprodutivos.
No conjunto não é impossível este facto sem ferir o poder de compra.

Outros impostos indirectos

47. Além das receitas do comércio externo há que considerar, nos impostos indirectos, algumas verbas de grande relevo, como o imposto do selo e de estampilha.
A receita por meio de estampilhas fiscais rendeu 172:993 contos. Aumentou muito porque não atingia 80:000 contos

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em 1938. O aumento neste ano ainda não é proporcional à desvalorização do escudo.
O imposto do selo rendeu 239:990 contos e era de 86:071 em 1938. Aqui a actualização está mais próxima da verdade.
A taxa de salvação nacional, decretada em 1U28 (artigo 3.º do Decreto n.º 15:814, de Julho), progrediu substancialmente, pois somou 180:690 contos.

III

INDUSTRIAS EM REGIME ESPECIAL

48. Em relação a 1947 aumentou para 274:801) contos a receita do imposto lançado sobre indústrias em regime especial, como se nota nu discriminação do quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Os acréscimos deram-se nas receitas provenientes de diversas indústrias, mas acentuaram-se principalmente nas seguintes:

49. Seguros. - O gradual desenvolvimento desta indústria foz subir o imposto para quase 18:500 contos em 1948, mais cerca de 5:000 contos do que há dois anos, em 1946.
A questão dos seguros talvez necessitasse de ser revista no sentido de maior concentração, de modo a poder reduzir a incidência dos prémios, que em certos casos são bastante elevados.
Deu-se, na verdade, com a guerra, a nacionalização de percentagens de seguros e até resseguros previamente colocados no estrangeiro. Há, porém, campo para introduzir no sistema segurador nacional modificações que o tornem menos oneroso, e até talvez com proveito para as receitas públicas.

50. Cerveja. - As receitas da indústria da cerveja subiram de cerca de 600 contos para 9:060 contos. Nesta indústria há concentração real, por acordo entre os industriais.
Ela necessita de grandes progressos, que, parece, estarem a ser feitos gradualmente.
Na indústria da pesca a receita atingiu 58:428 contos, mais cerca de 6:600 contos do que em 1947, mas menos 4:400 do que em 1946.
A indústria tem sofrido reveses, nos últimos anos, em virtude das dificuldades na pesca da sardinha. É um problema sério, dado o quantitativo de capital invertido.

51. A indústria dos tabacos continua a progredir, pelo menos no que diz respeito a receitas, que atingiram neste capitulo 116:400 contos, números redondos.
O vício do tabaco trouxe para o erário público o ano passado, com exclusão do imposto de salvação nacional, que se não discrimina nas contas, cerca de 306:000 contos.
Este ano, em comparação com o período anterior à guerra, os números são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

As maiores diferenças tiveram lugar nos direitos aduaneiros, que não incluem, contudo, o tabaco importado do ultramar, nem a taxa de salvação nacional, e no imposto sobre indústrias em regime especial. Já se acentuou o ano passado a vantagem de importar muito maiores quantidades de tabaco do ultramar português. A importação de tabaco em folha foi de 5:319 toneladas em 1948, no valor de 104:366 contos. Do ultramar vieram 637 toneladas, no total de 5:331 contos, correspondendo 555 toneladas a Angola o 119 a Moçambique.

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Os números que seguem dão a origem em peso e valor:

Importação de folha de tabaco em 1948

[Ver Quadro na Imagem]

Em cigarros, charutos e picados a importação foi de 95 toneladas, no valor de 9:671 contos.
A parte que corresponde ao ultramar português é muito reduzida em comparação com os Estados Unidos (cerca de 3:000 contos nos cigarros) e a Inglaterra (cerca de 2:600 contos).
Não parece ser difícil desviar as importações de tabacos dos Estados Unidos para territórios de além-mar. A Rodésia, que já exporta para Portugal, como se notou acima, ainda há umas dúzias de anos importava para consumo. O esforço despendido foi grande.
As condições de Moçambique são, em muitas regiões, idênticas, senão melhores, e há indícios seguros da possibilidade de aumentar consideràvelmente a produção da folha de tabaco naquela província ultramarina.
Seria conveniente que o Ministério das Colónias, em conjunção com o Governo-Geral da província, estudasse um problema que, além de auxiliar a balança comercial de um domínio português, pode ter projecção interessante nu balança de pagamentos da metrópole, sobretudo dada a escassez de dólares na Europa.

52. O imposto da camionagem, com ligeiro avanço, mantém-se em 5:000 contos, como no ano passado.

53. Os espectáculos e divertimentos públicos renderam 16:184 contos de imposto, tendo-se liquidado, porém, 16:101, assim divididos:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se ainda a ascensão do imposto dos cinemas. Os restantes mantêm-se em idêntico nível nos dois anos.

54. O imposto ferroviário decresceu e há-de decrescer ainda mais no futuro. A tendência nos transportes é paru dificuldades, e não para melhorias.
O acréscimo do imposto do jogo foi apreciável, e parece, segundo as medidas tomadas, que os rendimentos hão-de progredir. Vieram tarde essas medidas. Deixou-se passar um período - o da guerra - em que esta receita deveria ter sido muito maior do que foi.

IV

TAXAS

55. É neste capítulo que se inscreve grande número de pequenas receitas do Estado, assim como tudo o que diz respeito a emolumentos nas diversas secretarias.
Este imposto aumentou muito entre 1938 e 1947, mas declinou bastante no ano agora sujeito a exame.
A discriminação das receitas que o constituem, por serviços, consta do quadro que segue, em contos.

[Ver Quadro na Imagem]

A baixa foi de mais de 10:000 contos e deu-se em muitas rubricas, nos diversos serviços. Como se nota no quadro, os mais atingidos foram os serviços administrativos, os de fomento, os judiciais e os de registo.
Deram-se pequenas compensações em outros, mas o saldo foi no sentido de muito menores receitas nas taxas.
O rendimento deste capítulo não tem grande influência nas contas e a perda de 10:000 contos, em tempos de abundância, poderia suportar-se com certa facilidade, dado o carácter elástico do orçamento. Convém verificar quais os serviços onde se deram as diferenças.

56. Os serviços administrativos, excluindo emolumentos consulares e multas, acusam uma diferença para menos de cerca de 7:000 contos, da ordem de grandeza de 1946. Os números seguintes exprimem as receitas.

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[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se que nalguns casos o aumento foi grande, como nas taxas adicionais sobre as licenças pelas câmaras, mas que houve reduções apreciáveis em certos emolumentos e em outras rubricas.

57. Os serviços alfandegários acusam receitas sensivelmente iguais nos dois anos agora sujeitos a comparação. Continua a haver um grande avanço sobre 1946, como se nota no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

A melhoria deu se apreciavelmente nos emolumentos e provém do aumento do comércio externo, que, como se sabe, atingiu grandes cifras em 1947 e 1948.

58. Nos serviços de fomento excluíram-se as receitas da marinha mercante, que melhoraram sensivelmente e atingiram 2&608 contos. As outras receitas deste subcapítulo provêm de taxas diversas. As mais importantes foram em 1947:

Contos
Exploração e conservação de obras do fomento hidroagrícola ........ 2:005
Taxas de rega e beneficiação ...... 8:738
Bolsas ............... 1:568
Inspecção-Geral das Indústrias e Comércio Agrícolas ............. 1:641
Custo de passaportes, etc. ...... 1:280
Receitas de capitanias ......... 4:128

A tendência, neste caso, é para a descida.

59. As taxas nos serviços da instrução compreendem diversas origens, mas a mais importante diz respeito às receitas dos estabelecimentos de ensino.
Atingiram em 1948 cerca de 18:736 contos, sobro o total, cobrado, de 18:964. A subida em relação ao ano anterior foi muito grande, na relatividade dos números.

60. Nos serviços judiciais e de registo a descida continuou, devido quase só à baixa no imposto do justiça cível, que não passou de 1:100 contos em 1948 e fora de 17:259 em 1946. Os números mais importantes são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

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O imposto de justiça cível tende a desaparecer, em vista da Lei n.º 2:022, que reformou os serviços da justiça.
A parte que competia ao Estado reverterá para o cofre dos emolumentos.

61. Os serviços militares melhoraram as receitas das taxas em 1947, embora ainda não tivessem atingido as cifras de 1945 e 1946.
As mais importantes são o fundo de instrução do Exército, as receitas a satisfazer pelos estabelecimentos produtores do Ministério da Guerra, a taxa de licenciamento e a taxa militar. Ao todo renderam 18:184 contos.

62. Finalmente, os serviços sanitários não tom taxas de quantitativo apreciável nas contas.
Todos os anos cobram receitas de umas centenas de contos.

V

DOMÍNIO PRIVADO E PARTICIPAÇÃO DE LUCROS

63. O nível de receitas deste capítulo manteve-se praticamente na cifra do ano passado. Houve uma pequena diferença para mais de cerca de 5:000 contos, como mostra o quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Nas contas dos anos de 1945 e 1946 figurava como «Participação do lucros» com as importância", respectivamente, de 240 e 184 contos.

São de notar os desnivelamentos entre a receita do domínio privado e a da participação de lucros. O primeiro desenvolveu-se muito desde 1930-1931 e até 1938, quase que triplicando, e o segundo manteve-se praticamente na cifra de 1938. A comparação entre os dois lê-se a seguir:

[Ver Quadro na Imagem]

A razão provém essencialmente do aumento da receita do porto do Lisboa, que atingiu 90:682 contos em 1948 e era apenas de 37:819 em 1938, e de algumas outras, como a Casa da Moeda, o porto de Douro-Leixões e até os serviços florestais.
Pelo contrário, na participação de lucros houve apreciáveis diminuições, como na Caixa Geral de Depósitos e nos Correios, Telégrafos e Telefones, compensadas por aumentos noutras.

64. A receita do porto de Lisboa não influiu nas contas, por ser quase integralmente consumida no plano de melhoramentos do próprio porto e ter por isso contrapartida na respectiva despesa. Outro tanto acontece com o porto de Leixões. As demais explorações do. Estado têm em geral déficit, dando a esta palavra o sentido de haver desequilíbrio negativo entre a receita e a despesa.
Os números que seguem dão o saldo entre uma e outra nas diversas explorações do Estado.

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Não inclui a importância de 10:514 contos proveniente do «Reembolso do custo de metais para amoedar».
(b) Inclui a Importância de 203 contos proveniente do «Fundo de melhoramentos do porto de Lisboa».
Houve saldo entre a receita e despesa na Imprensa Nacional e déficit nos serviços florestais e aquícolas e na Casa da Moeda. Nos serviços da Imprensa Nacional a verba sobrante deveria ser usada no seu equipamento, como se sugeriu já por várias vezes neste lugar. A explicação do déficit da Casa da Moeda será feita mais adiante, quando for apreciado este organismo, assim como o grande desequilíbrio dos serviços florestais.

VI

RENDIMENTO DE CAPITAIS

65. O aumento notado na receita deste capitulo derivou de maiores valias nos juros pagos de obrigações do Fundo de renovação da marinha mercante. São juros de empréstimos contraídos pelo Estado e transferidos para outros destinados ao pagamento de navios mercantes.
As empresas liquidam os juros das obrigações àquele Fundo.
As quantias que se incluíram neste capitulo referem-se a bancos e companhias de diversa natureza.
Foram as seguintes em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

O rendimento total de capitais na posse do Estado, ano a ano, comparado com 1930-1931, consta do quadro que segue:

Contos
1930-1931. ............ 6:781
1931-1932. ........... 11:008
1932-1933. ........... 10:732
1938 ................ 8:384
1943 ................ 6:941
1944 ................ 9:282
1945 ................ 8:896
L946 ................ 8:971
1947 ................ 5:491
1948 ................ 13:702

Não parece ser brilhante a carteira do Estado nesta matéria, embora lá se encontrem apreciáveis quantidades de capital.

VII

REEMBOLSOS E REPOSIÇÕES

66. A diminuição de receita neste capítulo foi do cerca de 6:500 contos, mas teve repercussão, porque incide em verbas que constituem genuína receita, como as garantias de juros e outras. As diferenças neste aspecto são bastante sensíveis. O quadro que segue mostra as variações nos últimos anos:

[Ver Quadro na Imagem]

A primeira rubrica «Encargos da divida das colónias» fala por si. Não diz tudo a respeito de encargos de dívidas coloniais, porque nos encargos de diversos empréstimos se contabilizam outros, como os do apetrechamento do porto do Lobito, e mais adiante, em separado, se inscreve e cobra a receita de 7:433 contos, relativa aos juros do empréstimo concedido a Moçambique (Decreto n.º 36:446).
Os encargos de vários empréstimos referem-se especialmente aos portos de Lisboa, Douro-Leixões, Vila

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Real de Santo António, Setúbal e Viana do Castelo, além de 1:000 contos da Secção de Casas Económicas e 7:278 contos do Fundo Especial de Caminhos de Ferro.
Das garantias de juros desaparece a do porto de Mormugão e baixaram muito as de outras linhas, como a da Beira Baixa.
O que contém - e avoluma bastante este capítulo - são os reembolsos de despesas, realizadas de conta do diversos organismos, com a conservação, reparação e melhoramento de edifícios.
As verbas mais importantes constam do quadro que segue, em contos.

[Ver Quadro na Imagem]

Duas verbas dignas de certo interesse dizem respeito ao custo de impressos para o serviço de racionamento e trânsito da Intendência-Geral dos Abastecimentos (3:773 contos) e ao reembolso do adiantamento feito à Camará Municipal de Lisboa para a realização da comemoração do 8.º centenário da tomada da capital aos mouros (5:000 contos).
Diminuiu sensivelmente o reembolso dos correios e telégrafos e mantiveram-se os restantes.

VIII

CONSIGNAÇÕES DE RECEITAS

67. Todas as receitas consignadas aumentaram em 1949, excepto a que provém de juros de títulos na posso da Fazenda Pública, que diminuiu, aliás sem qualquer importância de ordem financeira. No conjunto ainda houve o acréscimo de mais de 9:000 contos. As receitas deste capítulo, em 1948, foram as seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

O acréscimo nas receitas de assistência foi bastante pronunciado, devido sobretudo ao reforço das verbas do Instituto de Assistência à Família, que atingiu perto de 17:000 contos.
Também a assistência aos funcionários civis tuberculosos melhorou sensivelmente.
Os números para as receitas consignadas à Assistência Pública são os seguintes, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

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Quase todas as outras verbas progrediram e há-de estudar-se melhor a sua utilização adiante, quando forem apreciados os serviços correspondentes.
Em outras receitas inclui-se o fundo da Casa dos Pescadores, o fundo de bolsas escolares e prémios nacionais, as dos serviços anti-sezonáticos (1:217 contos), da Junta da Emigração (1:471 contos) e diversas outras receitas de menor importância.
Nas receitas consignadas por despesas com funcionalismo, que totalizaram 17:892 contos, ou 12:993, se forem subtraídas as despesas com património do Estado, sobressaem as receitas do Conselho Técnico Corporativo (3:227 contos) e as da Direcção dos Serviços de Fiscalização (4:469 contos).
A fiscalização das fábricas de cerveja c outras e a das fábricas de tabaco e do comércio bancário produzem, respectivamente, as receitas de 480,1:287 e 1:067 contos.

68. As despesas com o património do Estado tiveram contrapartida nas seguintes receitas consignadas:

Contos
Convento de Mafra .......... 42
Teatro de S. Carlos. ........ 4:060
Desamortização de imóveis o
Semoventes.............. 796
Total ....... 4:898

No Teatro de S. Carlos a verba de 4:060 coutos representa receita a entregar para contrapartida de despesas com espectáculos, além do subsídio concedido.
A despesa de S. Carlos, inscrita no capítulo 3.º, artigos 641.º e seguintes Ministério da Educação Nacional), eleva-se a 6:690 contos.
O déficit andará pois à roda de 1:790 contos. Esto déficit não é só da exploração.
Deve ter-se em conta que o Teatro de S. Carlos possui uma escola de bailados e tem outras despesas além das da exploração lírica.

69. Nas receitas dos fundos especiais para fomento avulta, sobretudo, o Fundo Especial de Caminhos de Ferro, que ainda este ano subiu para 70:008 contos. Deve ser o canto do cisne, pelo caminho que leva a exploração ferroviária.
Outras receitas consignadas aos fundos especiais do fomento constam do quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

As receitas consignadas para pagamento de despesas a fazer com o plantio da vinha sobem a 5:237 contos. Tom vindo sempre a aumentar. Em outros rendimentos incluem-se 211 contos para pagamento de despesas a fazer com a publicação do Boletim Comercial do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Boletim da Agricultura.

70. As receitas dos portos mantiveram-se, com ligeira diminuição, na casa dos 17:680 contos.
A maior baixa deu-se nas receitas do porto de Angra do Heroísmo, compensada em parte por maiores valias.
Os números são os que seguem:

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772-(30) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 43

DESPESAS

I. O exame retrospectivo da evolução das despesas ordinárias mostra o seu grande desenvolvimento desde 1938, sobretudo a partir do 1945. Neste último ano ainda não haviam atingido a casa dos 3 milhões de contos (2.755:000); em 1948 passaram para quase 4 milhões (3.744:000). Aumentaram cerca de 1 milhão de contos.
Assim é que o índice da despesa ordinária, na base de 1938 igual a 100, passou já em 1948 de 194.
Este grande aumento da despesa ordinária - 1 milhão de contos em três anos - não pode, evidentemente, continuar, e podia ter sido muito menor.
A nota da compressão tem sido ferida nos pareceres das Coutas todos os anos, nalguns com energia, mas sem resultados, pelo menos aparentes.
Ainda se houvesse melhoria correspondente nos serviços poderia haver justificação para tal. Mas as peias embaraçosas, os atrasos na resolução de assuntos importantes, a indiferença com que se olham muitas vezes reclamações, a falta de estudos que há muito deviam estar preparados, mostram haver insuficiências na engrenagem burocrática que necessitam de ser corrigidas.
Já no parecer das Contas Gerais do Estado de 1940, a propósito do constante aumento da despesa, se escrevia:

A quem tenha por missão distribuir as dotações hão-de ser em breve necessários poderes latos e indiscutíveis que permitam recusar aumentos de despesa não justificada por sólidas razões de ordem reprodutiva.
O dizer não tem de ir às pequenas verbas, porque a soma delas faz as grandes.
Parece que o Ministério das Finanças, como aliás aconteceu em 1928, precisa de intervir, no ponto de vista orçamental e com mais assiduidade e energia, no que se passa na organização de outros Ministérios, de modo a poder, em conjunção com os respectivos titulares, reduzir despesas desnecessárias ou adiáveis1.

E mais adiante:

A vida portuguesa tem do sor organizada no sentido do reduzir ao mínimo, pelo menos nos anos mais próximos, as despesas sumptuárias, do puro gozo ou prazer, enquanto não forem estabelecidas as condições que permitam um muito maior acréscimo no rendimento nacional.

E no parecer seguinte (1947) declarava-se:

O maior aumento nas despesas desde o início da guerra teve lugar este ano. Verificar-se-ão adiante as causas deste considerável desenvolvimento dos encargos orçamentais, que arrasta consigo a necessidade de reforçar as receitas ou recorrer ao empréstimo, e por consequência aumentar a carga tributária.
A questão está a atingir corta acuidade, porque não é possível a progressão constante das receitas. Tom de ser tomadas medidas enérgicas no sentido de comprimir as despesas públicas2.

Os pareceres das Contas eram pessimistas nesta matéria já antes destes anos. A razão foi explicada diversas vezes. A engrenagem do Estado, nos seus diversos aspectos, necessita de ser refundida, sobretudo no sentido de poder produzir trabalho mais útil e eficiente. É absolutamente necessário que se introduza o espírito da utilidade, de modo a aproveitar aqueles elementos que de facto podem produzir trabalho mais eficaz.
A simplificação dos serviços, a sua coordenação, as medidas promulgadas no sentido de evitar sobreposições ou a repetição de tarefas e diversas sugestões têm sido bastas vozes defendidas.
Elas poderiam trazer grande alívio aos negócios públicos e impor a responsabilidade pelo andamento dos processos e de outros assuntos.
No final de contas seria talvez possível fazer economias ate em pessoal, que, sobretudo nas classes menos elevadas, é mal remunerado.
O contínuo aumento de despesa no ritmo dos últimos anos é impossível. Levará indubitavelmente ao desequilíbrio orçamental, sem proveito para o País.
Hão-de ver-se adiante as percentagens dos aumentos para cada Ministério. Poder-se-ia repetir o cálculo para cada serviço. E, se forem compulsados e comparados os números relativos aos funcionários de cada direcção-geral com os que existiam, por exemplo, em 1938, e até em 1945, verificar-se-ão grandes anomalias. Enquanto que alguns serviços alargaram consideràvelmente a sua esfera de influência ou acção, através de grande aumento de pessoal, outros mantiveram-se dentro de quadros.
Um inquérito cuidadoso, nas bases do que foi feito em 1928 por comissões departamentais, mostraria sem dúvida que há possibilidade de reduzir muito os quadros e evitar grandes verbas globais para assalariados, com proveito até para certos serviços. Terá isso de ser feito, mais cedo ou mais tarde, até para defesa dos bons funcionários, que existem em maior número do que às vezes se julga.
Quanto mais depressa se fizer esse trabalho de readaptação de um estado de coisas que a guerra gerou mais fácil será no futuro a vida financeira do Estado.

2. Mas a reforma a efectuar não pode limitar-se apenas à questão burocrática, no sentido de organização.
Tem de ir até aos gastos materiais em todos os Ministérios, mas sobretudo naqueles que, como o das Obras Públicas, são grandes consumidores de verbas.
Este assunto será tratado nos capítulos respectivos, mas ele tem uma grande importância, e convém acentuá-la agora que se verificam os grandes aumentos de despesa.
A mentalidade de «euforia», como o parecer das Contas de 1946 classificou o estado de espirito que alastrava pelo País, em matéria de gastos produziu bem maus efeitos, os quais hoje se estão dolorosamente sentindo.
Se, por exemplo, fosse feito o estudo do custo das missões oficiais, que em constante dobadoura se deslocam para ali ou para além, num frenesim de movimento que surpreende, chegar-se-ia a uma soma apreciável. E, embora isso não possa abrir grande brecha nas finanças ou influir grandemente no equilíbrio, a sua frequência e o número de pessoas de que algumas se compõem causam apreensões no espírito público.
A reforma a fazer terá, por esta e outras razões, de entre as quais sobressai, em elevado destaque, a constante e gradual elevação de acumulações, de abarcar grande número de aspectos da vida portuguesa de hoje. É indispensável manter o ritmo da actividade burocrática dentro

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1 Parecer das Contas Gerais do Estado, 1046, p. L7 (separata).
2 Parecer das Contas Gerais do Estado, 1947, p. 49 (separata).

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das possibilidades reais da receita ordinária, de modo a permitir que anualmente se possam desviar para uns estritamente úteis, reprodutivos, as verbas indispensáveis ao gradual progresso do País.
Não é ser pessimista escrever estas palavras. As ideias que elas exprimem já foram expostas anteriormente de outro modo.
Mas convém acentuar a gravidade do problema.

AS CONTAS

3. Em 1948 as despesas totais atingiram 5.699:071 contos, ainda mais 5:100 do que no ano anterior e perto de 3,5 milhões do contos a mais do que em 1938. O Índico passou de 100 para 247.
Argumentar-se-á que este índice de aumento equivale, grosso modo, ao Índico de preços e que, por consequência, não haverá grande mal nesse aumento. Este assunto já foi visto atrás quando se discutiram as receitas, e então se mostrou que, como as despesas extraordinárias são pagas em grande parte por empréstimos - que deveriam ser integralmente reservados para utilizações reprodutivas -, um aumento tão grande é um mal financeiro, como, aliás, se está já a verificar.
O quadro que segue exprime o movimento das despesas e receitas ordinárias desde 1938 e mostra as suas variações:

[Ver Quadro na Imagem]

Até 1948 a diferença da receita para mais em relação ao ano anterior era sempre maior do que idêntica diferença nas despesas - 572:500 e 289:500 em 1946,412:600 e 394:500 em 1947. Mas em 1948 deu-se o reverso: a diferença na receita foi apenas de 114:650 e nas despesas de 305:000 contos - o que não é bom sinal.

4. Ainda subsistiu, embora em menor escala, relativamente, grande diferença entre as receitas e desposas ordinárias. É através dos saldos entre umas e outras que se liquidam parte das despesas extraordinárias.
O excesso de receitas, que andava à roda de 800:000 contos - a única excepção para menos desde 1942 deu-se em 1945 -, passou agora para menos de 700:000, como se verifica no quadro que segue, em contos:

Contos
1938 ............... 333:800
1939 ............... 249:400
1940 ............... 301:100
1941 ............... 491:800
1942 ............... 936:000
1943 ............... 1.001:000
1944 ............... 823:500
1945 ............... 573:000
1946 ............... 856:000
1947 ............... 874:100
1948 ............... 683:800

Com as dificuldades nas cobranças a diferença atenuar-se-á.
Como é mais difícil comprimir despesas, a não ser que se diminua o ritmo de obras por elas liquidadas, do que aumentar receitas, o problema das despesas extraordinárias não é brilhante no futuro.

DESPESAS ORDINÁRIAS

5. O total das despesas do Estado nos anos mencionados consta do quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

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O total do 5.599:071 contos foi liquidado do modo seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Os empréstimos já pesaram no conjunto com cerca de 27 por cento. E, além destes e dos saldos de anos económicos findos, não houve outras receitas, com excepção das ordinárias.

Despesas orçamentadas e pagas

6. Como habitualmente acontece, houve economia nas receitas orçamentadas em relação às pagas. Umas e outras, distribuídas pelos diversos Ministérios, constam do quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

A diferença foi de 364:000 contos, números redondos. Teria sido bastante maior se não tivesse havido necessidade de reforçar o orçamento.

7. O quadro que segue exprimo pormenorizadamente a distribuição da despesa ordinária pelos diversos departamentos públicos antes e depois da guerra.

[Ver Quadro na Imagem]

Os números absolutos mostram as variações em escudos em cada Ministério ou serviço e dão uma ideia aproximada da sua evolução. Mas convém reuni-los, de
modo a determinar a despesa no conjunto dos Ministérios, na dívida e nos encargos gerais. O quadro que segue exprime esse conjunto.

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[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se ter sido nos Ministérios que se deu a maior percentagem de aumento, embora houvesse sensíveis variações na dívida pública e nos encargos gerais.

8. Ainda para mais clara visão das maiores valias na despesa se publica a seguir um quadro que as mostra em relação a 1939 e 1947:

[Ver Quadro na Imagem]

O Índice do aumento da despesa em relação ao ano anterior à guerra foi cerca de 194,1 inferior ao aumento no índice de preços. O quadro que segue exprime por Ministérios os acréscimos em relação a 1938 nos anos indicados:

Índice da variação da despesa ordinária (1938 = 100)

[Ver Quadro na Imagem]

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ENCARGOS GERAIS DA NAÇÃO

9. Os encargos gerais da Nação dividem-se do modo que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui 35:350 contos de encargos da divida de guerra de Portugal à Grã-Bretanha.

A subida nos encargos gerais da Nação relativamente a1 1947 derivou de mais despesas nas pensões e reformas e na dívida pública. O decréscimo na Presidência do Conselho em relação a 1946 resultou da passagem dos serviços meteorológicos (4:028 contos em 1946) e da aeronáutica e aeroportos para o Ministério das Comunicações. Nas pensões e reformas houve de facto uma subida grande, que proveio da aplicação do suplemento aos reformados.

DÍVIDA PÚBLICA

10. A dívida efectiva aumentou bastante desde 1939. Era de 6.243:044 contos em 31 do Dezembro deste ano e passou para 9.037:274 contos em igual dia de 1948 - um aumento, portanto, de 3.293:730 contos.
A este acréscimo na dívida efectiva não correspondeu, evidentemente, um acréscimo proporcional nos encargos, que atingiram 408:832 contos, contra 294:088, respectivamente, naqueles anos, ou mais 114:743 contos, o que é sensível. O capitai nominal da dívida pública, em milhares de contos, exprime-se do modo seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Divida efectiva

II. Para obter a divida efectiva há que deduzir os títulos na posse da Fazenda Pública e os saldos credores do Estado. Uns e outros variam bastante de ano para ano, tendo os últimos já atingido perto de 4 milhões de contos. Os números que seguem mostram as variações desde 1939.

[Ver Quadro na Imagem]

Vê-se que a dívida efectiva cresceu muito a partir de 1945, sobretudo depois de 1946. Nos dois anos de 1947 e 1948 o aumento da divida em relação a 1945 foi de mais do 2:600 milhares de contos. Esta cifra deve ser relacionada com as despesas extraordinárias nestes dois anos, comentadas nos respectivos capítulos.
É de notar que a guerra trouxe aumento muito pequeno na dívida efectiva. Passou de 6:244 milhares de contos em 1939 para 6:896 milhares de contos em fins de 1945, ou apenas mais 650:000 contos. É até certo ponto paradoxal este facto, dadas as grandes despesas originadas e pagas na guerra, como se verificará noutro lugar.

12. O grande aumento na dívida nacional deu-se no consolidado, como se pode notar no quadro que segue, em contos.

Divida representada por títulos

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se redução na dívida externa e aumento na consolidada.
Parte da dívida é reembolsável, como, por exemplo, os empréstimos concedidos a Moçambique e o que serviu para a renovação da marinha mercante.

Encargos da dívida

13. Os encargos efectivos da dívida somaram 388:853 contos. Relacionados com 1928-1929, têm sido os que adiante se mencionam:

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

Discriminação doa encargos em dívida

14. Os encargos da dívida, incluindo os juros de títulos na posse da Fazenda Pública, em 1948 elevaram-se a 408:832 contos. Comparam-se a seguir com os de 1945:

[Ver Quadro na Imagem]

Verifica-se ter havido subida nos encargos de cerca de 45:500 contos, que teve lugar nos juros (perto de 11:000 contos), nas amortizações e em outros encargos, como nas rendas perpétua e diferida e na dívida dos empréstimos para prisões e tribunais.
Esta comparação deverá ser, no entanto, corrigida pela dedução dos juros de títulos na posse da Fazenda Pública nos dois anos.
Em 1945 a despesa efectiva (deduzida dos juros) foi de 334:708 contos e em 1948 atingiu 388:853 mais 54:145 contos.
O aumento de dívida efectiva trouxe este acréscimo de encargo por ano.

PRESIDÊNCIA DO CONSELHO

15. Hoje a Presidência do Conselho apenas superintende directamente no Subsecretariado de Estado das Corporações e Previdência Social e no Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo e pouco mais, além da Emissora Nacional, que tem autonomia. Para efeitos de comparação incluem-se no quadro que segue os organismos que habitualmente fazem parte de quadros publicados nestes pareceres:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Instituto de Seguros Sociais.

Nota-se ter havido subida em quase todas as rubricas, mas ela acentuou-se especialmente no Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo e no Subsecretariado de Estado das Corporações e Previdência Social.

Secretariado Nacional da Informação

16. A despesa deste organismo ainda subiu este ano para 15:982 contos - mais 984 que em 1947. Ela acentuou-se muito a partir de 1938, visto ter quadruplicado.

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As cifras para 1948 são as que se seguem.

[Ver Quadro na Imagem]

Os aumentos deram-se na verba de pessoal e em outras despesas, entre as quais as que dizem respeito a correios.
Embora tenha sido pequena a subida, deve dizer-se que a despesa este ano atingiu o máximo. Desde 1938, em que os gastos foram de 5:928 contos, até 1948 houve um grande desenvolvimento, muito superior a qualquer outro serviço, ainda que se leve em conta o turismo, com 2:500 contos, transferido para o Secretariado depois daquele ano.
A necessidade de fazer economias em todos os departamentos do Estado torna essencial reduzir a verba do Secretariado, sobretudo os 4:780 contos gastos ao abrigo dos Decretos n.08 34:133 e 34:134.

SUBSECRETARIADO DE ESTADO DAS CORPORAÇÕES E PREVIDÊNCIA SOCIAL

17. Também a despesa deste Subsecretariado subiu muito desde 1938, visto ter passado de 3:895 contos para 9:282 em 1948.
Embora a acção deste departamento se tenha acentuado bastante nestes últimos tempos, torna-se necessário conter aumentos de gastos.
As despesas dividem-se como segue:

Contos
Subsecretariado do Estado ....... 216
Conselho de Providência Social..... 109
Direcção-Geral............ 6:357
Tribunais do trabalho ......... 2:000
9:282

O aumento de despesa deriva, essencialmente, do pessoal.
Parece ser necessário rever a organização do Subsecretariado, do modo a reduzir os seus gastos na medida do possível.

Organismos de previdência

18. O ano passado deu-se uma pequena resenha da posição destes organismos em matéria de receitas e despesas. Viu-se então que, no conjunto, as receitas se elevavam á 729:015 contos e as despesas a 328:688. Pesam muito as receitas das caixas sindicais de providencia - com 395:946 contos em 1947 - e as das caixas de reforma ou de previdência - com 254:257 contos - que existiam naquele ano.
Os números para 1948 são bastante maiores ainda o constam do quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Vê-se que as receitas dos sindicatos, Casas do Povo o dos Pescadores e caixas sindicais de previdência- e reforma aumentaram bastante em 1948. Totalizaram agora 1.016:000 contos, dos quais pertencem às caixas de previdência ou reforma 936:953, ou seja mais de 90 por cento.

19. Ainda não pároco estar esgotada a fonte da receita e certamente que a de 1949 será maior. È preciso considerar sèriamente este assunto, porque a capacidade tributária não é infinita.
A origem das receitas cobradas em 1948 foi a seguinte:

Origem das receitas

[Ver Quadro na Imagem]

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20. Qual o destino desta grande receita?
Em 1948 as despesas, como se disse, aumentaram muito. Passaram de 328:688 contos para 598:170 - mais 269:482 contos.
Não é possível fazer a comparação entre os dois anos, mas convém dar uma resenha do destino das despesas mencionadas. É o que se faz no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se que as verbas de pessoal e administração aumentaram muito nas caixas de previdência. Foram em 1947 de cerca de 33:600 contos e passaram para mais de 51:000 contos em 1948.
A assistência médica desenvolveu-se bastante, assim como os subsídios, que incluem o abono de família.
As pensões em 1947 haviam somado 43:122 contos e passaram para 80:625 em 1948.
A diferença entre as receitas e as despesas nas caixas de previdência e reforma foi muito grande. As receitas somaram 936:953 contos e as despesas 523:941, ou uma diferença de 413:000 contos, números redondos. A capitalização está pois a ser feita com somas muito importantes.
Dada a importância que os fundos de previdência têm na vida das actividades produtoras, convém rever amiudadamente o actual sistema de cobrança. As queixas que têm vindo a lume, até com reflexos na Assembleia Nacional, são fundamento para que seja feito um estudo rigoroso que envolva, além dos próprios serviços, o rendimento da estrutura da previdência, que pouco a pouco assumiu na vida do País um papel muito grande.
A própria vida financeira do Estado se pode ressentir da acumulação de fundos de previdência, e há a vantagem em estabelecer um equilíbrio sensato entre a actual realidade da cobrança e as possibilidades de pagamento.

MINISTÉRIO DAS FINANÇAS

21. A despesa total do Ministério das Finanças foi de 832:699 contos, assim discriminados:

Contos
Despesa ordinária. ......... 277:694

Despesa extraordinária:

Casas do Povo ...... 5
Levantamentos topográficos e
avaliações ...... 10:250
Aproveitamento hidroeléctrico
do Zêzere. ... 20:000
Companhia Nacional de Electricidade
(participação do Estado) .... 17:500
Empresas hidroeléctricas
coloniais. ...... 6:000

Empréstimo à colónia de
Moçambique ....... 451:250
Renovação da marinha mercante
(aquisição de títulos) 50:000 555.905
Total ....... 832:699

Interessa agora apreciar as despesas ordinárias. No capítulo respectivo serão comentadas as extraordinárias, que este ano se elevaram a 555:005 contos, reembolsáveis na sua quase totalidade por se tratar de empréstimos.
Houve em 1948 despesa idêntica à do ano de 1947, que havia sido superior em 31:067 contos à de 1946. As cifras, relacionadas com 1938 e 1947, são as que constam do quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui a Intendência-Geral do Orçamento.

Deve notar-se que em 1948 já a despesa do Instituto Geográfico e Cadastral avolumou a do Ministério das Finanças, visto este Instituto ter sido transferido para ele do Ministério da Economia.

Fazenda Pública

22. A ligeira diminuição na Direcção-Geral da Fazenda Pública, de cerca de 1:000 contos, teve lugar, sobretudo, na compra de automóveis. A verba de semoventes fora de 2:935 contos em 1947 e passou para 1:154 em 1948, e esta verba ainda é alta.
No resto as cifras são idênticas, com excepção da dos palácios nacionais e outros bens, que ainda aumentou perto de 1:000 contos.
Os números para a despesa total discriminada são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

Em imóveis, na rubrica de palácios nacionais e outros bens, há este ano a importância de 5:262 contos. Em 1947 a despesa com aquisição de imóveis fora de 3:459 contos. Já o relator das Contas emitiu a opinião de que não é de aconselhar a política seguida naquele ano nesta matéria. Em 1948 a despesa foi maior ainda.
O aumento de despesas nesta direcção deve-se quase exclusivamente ao reforço desta verba.

Contribuições e impostos

23. A despesa total da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos subiu a 60:548 contos. Se for levado em conta o que se gasta por outros departamentos na fiscalização ou cobrança de impostos, a despesa total será a que se indica no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

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A melhoria deu-se na Direcção-Geral. Os pagamentos de títulos de anulação desceram bastante - de 20:826 contos para 9:000.
As verbas que não representam pròpriamente despesa da Direcção-Geral constam do quadro seguinte, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

O que compete aos serviços reduziu-se, por conseguinte, a 41:558 contos. Fora o ano passado de 48:798; houve, assim, economia sensível.

24. As despesas desta Direcção-Geral podem dividir-se como segue:

Serviços próprios........... 18:990
Direcções de finanças distritais e secções concelhias ............. 40:690

Tribunal de 2.ª Instância do Contencioso.......................... 159
Tribunais das execuções fiscais .................................. 709
Total ...... 60:548

Como era de prever, os maiores gastos são os dos organismos provinciais - as direcções de finanças e as secções concelhias -, e nelas é o pessoal que ocupa posição dominante.
Convém discriminar a despesa destas dependências, o que se faz a seguir:

Pessoal .............. 30:066
Material. ............. 3:761
Encargos ............. 26:721
60:548

Nos encargos pesam diversas verbas com avaliações que somaram 2:620 contos em 1948, e com o pagamento de mínimos, avaliados em 1:406 contos.

25. O serviço das contribuições e impostos é um serviço delicado, no qual os erros podem ter resultados que ferem o público.
Está assoberbado de trabalho. Precisava de ser convenientemente organizado, de modo a usar os modernos métodos de cálculo a fim de abreviar o expediente. Muitas vezes as instalações são precárias, mal apetrechadas.
Com os trabalhos para o lançamento do imposto complementar têm-se dado dificuldades que conviria evitar.
Seria talvez vantajoso estabelecer um plano de reorganização que gradualmente pudesse ser executado, tanto no que diz respeito a instalações, como aos métodos de trabalho, com o objectivo de o simplificar e tornar acessíveis ao público as razões e as bases em que assentam os pagamentos efectuados.
Com o tempo poder-se-ia talvez melhorar o serviço e evitar as queixas muitas vezes justas dos interessados numa matéria que afecta muita gente e tem grandes repercussões na vida financeira do País.

Casa da Moeda

26. A despesa total da Casa da Moeda subiu a 21:783 contos, menos 4:367 do que no ano anterior.
As grandes variações nas contas deste organismo provêm em geral das compras de matérias primas para a indústria. Este ano totalizaram 15:621 contos; haviam sido de 21:395 contos em 1947. Desta acentuada diminuição nas compras derivou a redução acima indicada. Com pequenas maiores valias na despesa e em outras rubricas obtém-se a diminuição de cerca de 4:367 contos, a que atrás se alude.

Instituto Nacional de Estatística

27. O aumento de 22083 contos em relação a 1947 notado nas despesas deste organismo foi devido, essencialmente, às verbas despendidas na comparticipação de Portugal na Organização Europeia de Cooperação Económica.
Nos dois últimos anos, foram as que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

Verifica-se que os serviços próprios do Instituto diminuíram ligeiramente.

Outras dependências do Ministério das Finanças

28. Em outros organismos deste Ministério deram-se variações pouco sensíveis.
A Contabilidade Pública, com a despesa de 7:120 contos em 1948, teve um aumento de cerca de 500 contos em relação a 1947.
As alfândegas e a Guarda Fiscal sofreram acréscimo em conjunto de cerca de 3:700 contos. A Inspecção do Comércio Bancário mantém a despesa à roda de 760 contos - um ligeiro acréscimo de 217 contos relativamente a 1938 e a diminuição de 37 relativamente a 1947.

Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência

29. O fim da guerra trouxe melhoria sensível no emprego de capital em quase todos os estabelecimentos de crédito e, por consequência, sensível progresso nos lucros.
A Caixa Geral de Depósitos não foi excepção à regra. Os lucros brutos subiram apreciàvelmente em 1948.
Embora houvesse maior procura do dinheiro, os depósitos voluntários à vista mantiveram-se com o apreciável aumento ainda de perto de 250:000 contos.
A soma dos depósitos era em 31 de Dezembro de 1948, 7.312:275 contos, descriminados como se mostra no quadro da página seguinte, em contos.

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[Ver Quadro na Imagem]

O tipo de depósito que mais interessa à Caixa - o depósito voluntário à vista ainda progrediu em 1948, atingindo 5.545:490 contos, mais 243:341 do que no ano anterior.
Esta prática salutar de poupança, que tanto distingue o Português, parecia ter-se atenuado nos últimos tempos.
Ela aparece, em grande parte, materializada nos depósitos de caixa económica e tem tido um ritmo ascensional há muitos anos.
Embora os valores da moeda nas diversas épocas variassem muito, o quadro que segue pode dar uma ideia do desenvolvimento da caixa económica desde 1891:

[Ver Quadro na Imagem]

É de interesse registar os saltos bruscos, na totalidade dos depósitos, desde 1940.
Neste ano somavam pouco mais de 2 milhões de contos e já eram o dobro quatro anos depois, em 1944, para atingir 5,5 milhões em 1948.
A evolução dos depósitos obrigatórios também foi acentuada na guerra, mas neste caso as necessidades, directa ou indirectamente relacionadas com o Estado, organismos corporativos e outros, têm-na enfraquecido.
Chegaram a atingir quase 2 milhões em 1947, mas já baixaram para cerca de 1.000:000 contos em 1948.
Os depósitos obrigatórios dividem-se em três tipos diferentes: os obrigatórios propriamente ditos, como as cauções e garantias, os espólios, os inventários, as reunias e outros de menor importância, que subiram de 135:400 contos em 1940 para 176:500 em 1948; os fundos diversos, que compreendem assistência, organismos corporativos e de coordenação económica, os serviços dos Ministérios e outros, que de 1.274:200 contos em 1946 desceram para 780:500 em 1948, marcando assim as dificuldades actuais; e, finalmente, os depósitos de previdência social, que incluem as caixas de abono de família, as caixas de reforma e previdência, o Fundo das casas económicas e outras contas, que de 243:400 contos em 1946 subiram para 314:600 em 1948.

Emprego de fundos

30. Os aumentos no emprego de fundos foram muito grandes em 1948, traduzindo assim um substancial alargamento no crédito.
Já ele se notara em 1947, mas mais se acentuou em 1948, como se nota nos números inscritos no quadro seguinte, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Credora.

Todas as rubricas marcaram a sua ascensão, mas aquelas em que mais se fez sentir, era relação a 1947, foram o crédito hipotecário, com perto de meio milhão de contos a mais. a conta corrente com a Caixa Nacional de Crédito, com cerca de um quarto de milhão de contos, e as operações financeiras e administrativas. Este aumento de crédito reflectiu-se em muitos aspectos da vida nacional e, sobretudo, na edificação de novos bairros em Lisboa.
O aumento na conta corrente da Caixa Nacional de Crédito, como se verificará adiante, exprime, na sua quase integridade, o auxílio à agricultura e indústria.

Receitas

31. O volume notado no emprego de fundos traduziu-se no aumento de receitas, como se deduz do quadro que segue, em contos.

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[Ver Quadro na Imagem]

Apesar das baixas taxas de juros, houve melhoria em relação a 1947 em quase todas as rubricas.

Despesas

32. As despesas diminuíram sensivelmente, por virtude de reduções na rubrica de material. Houve leves aumentos nos encargos de juros de depósitos, devido ao acréscimo no seu volume, como se notar nas cifras que seguem.

[Ver Quadro na Imagem]

Mas, no conjunto, a diferença para menos foi menor, como mostram os números seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

Resultados

33. Os resultados subiram para 47:470 contos, mais do dobro do que no ano anterior. Os lucros brutos atingiram 185:495 contos e a comparticipação do Estado alcançou a cifra de 36:944. Em comparação com o ano anterior as seguintes verbas mostram as diferenças:

[Ver Quadro na Imagem]

34. As variações sensíveis na cotação de títulos do Estado influíram bastante na conta de títulos que faz parte dos fundos de reserva, ocasionando uma ligeira diminuição. Os restantes foram apreciavelmente reforçados, sobretudo os de previsão e de aquisição e construção de imóveis.
O total dos fundos de reserva em 1948 discrimina-se no quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

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Caixa Nacional de Crédito

Activo

35. O activo desta instituição, anexa à Caixa Geral de Depósitos, Crédito o Previdência, atingiu este ano quase 1 milhão de contos (971:052 contos). O seu considerável desenvolvimento é devido à intensificação do crédito, tanto na indústria como na agricultura, como se nota nos números que seguem, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Os 252:000 contos de aumento real no crédito representam auxílios à agricultura e à indústria, respectivamente de 77:700 e 190:016 contos. Mas pelo que diz respeito à agricultura a maior parte do capital mutuado foi incluído, certamente, na rubrica do crédito hipotecário já referido.
É de notar ter a Caixa Nacional de Crédito reforçado os seus empréstimos à lavoura e indústria no período que decorreu entre 1946 e 1948 - portanto dois anos - em cerca de 421 mil contos.

Passivo

36. A maior parte do capital mutuado pela Caixa Nacional de Crédito provém da conta corrente que esta instituição mantém com a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência.
Subiu este ano para 818:463 contos. O restante é constituído por fundos próprios, que já atingiram mais de 150:000 contos.
O passivo exprime-se no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Taxas de juro

37. Não houve modificações sensíveis nas taxas de juro, que não atingiram em média 4 por cento. Em muitos casos são inferiores a 3,5 por cento. A evolução das taxas de juro na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, desde 1937, é dada no quadro que segue, em contos:

Taxas médias nos serviços privativos da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, referidas ao mês de Dezembro nos anos de 1937-1948

[Ver Quadro na Imagem]

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A questão das taxas de juros tem levantado preocupações sérias nos últimos tempos e deveria ser discutida em maior pormenor, se para isso houvesse espaço e tempo.
Não parece ser possível, no momento actual, alargar apreciavelmente o crédito.
As circunstâncias impedem que ele se crie e se conceda com a eficácia necessária.
O tempo há-de certamente ajustar anomalias que agora prevalecem e que resultam de circunstâncias a que, em grande parte, é alheio o sistema de crédito.

MINISTÉRIO no INTERIOR

38. O aumento da despesa do Ministério do Interior tem sido muito grande desde 1938. Mais do que dobrou. O índice de acréscimo atinge 239,4, como se viu atrás.
Em números absolutos, o aumento em relação àquele ano foi de quase 300:000 contos (292:598), dos quais 103:835 pertencem à saúde e assistência pública e o restante à segurança pública, ao suplemento e subsídio eventual e, em menor escala, a outras rubricas. Os números que dão a evolução das despesas deste departamento público constam do quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Subsídio atribuído a partir de 1 de Março de 1945.

O caminho andado em matéria de despesas neste Ministério é muito grande, e parece não poder continuar no mesmo passo em anos próximos. Talvez até haja necessidade de retrocesso, pelo menos em alguns dos seus órgãos.
Nota-se no quadro que foi a partir de 1945 que se acentuou o alargamento na despesa. Neste ano o total ainda foi de apenas 331:000 contos, mais cerca de 121:000 do que no ano anterior à guerra.
Mas de 1946 para 1947 o incremento foi muito grande, mais de 70:000 contos, e ainda aumentou mais 43:500 entre 1947 e 1948.
Ver-se-ão adiante as causas principais destas alterações.

Administração Política e Civil

39. Sumariando as despesas desta dependência, encontram-se os números que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

A grande diferença para mais em relação a 1946, e também a 1938, provém dos subsídios adjuntas gerais dos distritos autónomos das ilhas adjacentes, nos termos do decreto-lei de Agosto de 1947.
Atingiram esses subsídios 9:600 contos em 1948. Deduzidos do conjunto, fica a despesa própria da Direcção-Geral, ou 876 contos.
A despesa dos governos civis era de cerca de 2:500 contos em 1938. Mantivera-se nesta cifra até 1946.
As melhorias de diversa natureza elevaram-na para 3:216 em 1948.
A Imprensa Nacional despendeu neste ano 12:704 contos. Menos do que no ano anterior.
A diferença entre as receitas e despesas neste organismo foi substancial, como já se indicou atrás, no capítulo das receitas. Poderia ter sido maior se fossem atendidas em tempo oportuno as sugestões aqui feitas no sentido de se dotar este importante órgão do Estado com os elementos essenciais ao desempenho de suas funções. Não faz sentido que se se tivesse descurado o apetrechamento da Imprensa, quando em coisas de bem menor utilidade se gastaram somas importantes.
Dá isto azo a que os trabalhos do próprio Estado tenham de ser efectuados em tipografias particulares. Uma vez mais se recomenda, pois, interesse por este organismo.

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Segurança pública

40. As despesas da Guarda Nacional Republicana e da polícia foram as seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

Em relação a 1938 o aumento foi de 68:824 contos e teve lugar sobretudo a partir de 1946. Na Guarda Nacional Republicana o acréscimo foi de 32:000 contos e os restantes 37:000 contos dizem respeito às polícias.
Em 1947 a despesa havia sido de 100:700 contos, números redondos. O incremento entre esse ano e 1948 atingiu, por isso, cerca de 10:000 contos.
A despesa da polícia divide-se assim:

[Ver Quadro na Imagem]

O maior incremento deu-se em quase todas as polícias, na razão de cerca de 2:000 contos em cada uma. Na Guarda Nacional Republicana o aumento entre 1947 e 1948 foi menor, cerca de 2:200 contos.

Saúde pública

41. Como se verificou atrás, as despesas da saúde e assistência aumentaram bastante desde 1938, e já atingiram em conjunto perto de 250:000 contos em fins de 1948.
Dividem-se assim:

[Ver Quadro na Imagem]

Os números revelam um grande acréscimo, que se deu sobretudo a partir de 1940. Neste ano o total das despesas era ainda só de 152:788 contos.
Os pareceres das contas têm insistido quase desde o seu início pelo reforço das verbas da saúde, algumas vezes com bastante energia, e no relatório de 1945 e fez-se o estudo demorado dos institutos e outras dependências do Estado relacionados com a assistência e a saúde.
Mencionaram-se nessa altura certos princípios, que deviam ser seguidos na opinião do relator, de modo a reduzir o sofrimento e defender a saúde - e sugeriu-se a criação do Ministério da Saúde.
Notou-se então haver sobreposições na matéria e propôs-se mais íntimo contacto entre os organismos de previdência que tratam da assistência médica e os serviços do Estado.
Parece que a ideia da criação do Ministério da Saúde tem feito carreira, embora ainda não esteja efectivada. O seu êxito depende, evidentemente, das bases em que for organizado o Ministério. Se, como aconteceu quando se criou o Ministério da Economia, também aqui sugerido, houver apenas uma junção de organismos dos diversos Ministérios, os resultados não serão o que deveriam ser. Se, pelo contrário, se fizer um cuidadoso estudo no sentido de aproveitar tudo o que existe, com o maior rendimento possível, haverá consideráveis economias o a saúde pública terá progressos sensíveis.

42. O aumento de despesa trouxe indubitavelmente grandes melhorias, aliás acusadas claramente pela diminuição dos índices da mortalidade. Neste último aspecto a mortalidade infantil desempenha um papel muito importante, visto ser muito alta em relação à maior parte dos países europeus.
Certos exemplos no País demonstram a possibilidade do a reduzir consideràvelmente e o caso da cidade de Castelo Branco ilustra bem o que é possível fazer.
A percentagem de mortos por 100 nascimentos andava à roda de 16 na década 1920-1930 e a taxa da mortalidade infantil (mortos por 1:000 habitantes) elevava-se a 4.
Foi inaugurado em 1930 o dispensário de puericultura e multiplicaram-se os esforços no sentido de reduzir a mortalidade infantil. Os resultados ultrapassaram todas as expectativas, como se mostra no quadro que segue:

Castelo Branco (cidade)

População (1940)-12:763 habitantes

[Ver Quadro na Imagem]

Os números relativos à mortalidade infantil por 1:000 habitantes da década 1940 a 1950 devem ser melhorados ainda, visto ter aumentado bastante a população da cidade.
O progresso realizado é na verdade muito grande e mostra os que pode fazer-se na matéria.

43. Julga-se, pois, que a reunião de todos os serviços e de todas as dotações gastas na saúde e assistência produzirá grandes efeitos, desde que haja inteira coordenação entre todos os obreiros de uma causa que é muito boa e generosa.
Deve dizer-se a este respeito que a continuação dos esforços no sentido de destruir as causas da doença, tanto nas grandes cidades como nas províncias, é essencial para a melhoria dos índices, e sobre o assunto deram-se já largas explicações no parecer de 1945.

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1 Parecer das Contas Gerais do Estado, 1945, pp. 76 a 105 (separata).

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Parece, no entanto, ser necessário acrescentar agora que não é possível desviar muito maiores verbas. Aliás não se julga que o Pais necessite de equipamento luxuoso ou caro nestes serviços. Os hospitais, asilos, hospícios, sanatórios, assim como a respectiva aparelhagem, têm de ser modestos, como modestas são as verbas de que actualmente pode dispor o erário público.
Hás a modéstia não é incompatível com a eficiência, desde que sejam providos do necessário.
O parecer das contas públicas, que todos os anos se tem interessado por este aspecto da vida nacional, continuará a pugnar pela defesa das dotações, mas também julga ser indispensável uma completa coordenação dos serviços e parcimónia nos gastos.

As contas

44. Os serviços de assistência e saúde despenderam em 1948, em conjunto, 237:352 contos, contra 83:017 em 1938, ou cerca de três vezes mais. Vejamos a discriminação das despesas:

Saúde pública

45. Os gastos da Direcção-Geral de Saúde foram os seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

Os maiores aumentos em relação a 1938 tiveram lugar na sanidade terrestre (delegações e subdelegações de saúde) e em subsídios de diversa natureza. A remodelação e dos serviços acentuou a importância das delegações de saúde, que parecem ter trazido benefícios para os próprios serviços. Os aumentos em relação a 1943 na verba de subsídios incidiram sobre quase todos os organismos interessados, como se nota no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Assistência pública

46. As verbas da assistência publica foram considerà-elmente reforçadas desde 1938, o até desde 1945, como se indicou atrás. Os maiores reforços tiveram lugar nos estabelecimentos hospitalares. Espera-se que o auxílio do Estado possa trazer benefícios reais. O quadro que segue, em contos, dá discriminadamente as alterações:

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui as despesas gerais.

Os estabelecimentos hospitalares já quase atingiram 90:000 contos. Eram em 1938 de cerca de 42:000. As maternidades e o Instituto Maternal receberam mais de três vezes do que em 1938, e em quase todas as outras instituições se deu aumento substancial.
As verbas da assistência ainda não são possivelmente o que deviam ser. O esforço financeiro já efectuado denota a boa vontade de atender a um problema que era, de facto, do grande importância e que merecera, neste parecer, comentários fundamentados em reais deficiências.
O problema que ainda hoje se põe é o de aproveitar bem as verbas concedidas, -tirar delas o maior proveito possível. Não parece que elas possam ser apreciavelmente reforçadas nos anos mais próximos.
Neste aspecto também se põe a necessidade de coordenação, de modo a reduzir os gastos.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

47. Como atrás se disse, uma das maiores percentagens de aumento na despesa em todas as grandes dependências do Estado deu-se no Ministério da Justiça.
Na base de 1938 = 100 o índice de 1948 atingiu 256,7, só maior nos encargos gerais e no Ministério da Economia.
Reportando-se a comparação a 1938 verifica-se que o grande aumento se deu nos serviços prisionais (26:889 contos), de longe seguidos pelos serviços jurisdicionais de menores.
O quadro que segue dá as despesas deste Ministério, relacionadas com 1930-1931, 1938 e 1947.

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Compreende a 4.ª Repartição de Contabilidade.

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Os acréscimos em relação a 1947 tiveram lugar nos conselhos superiores e organismos de inspecção, e no suplemento de vencimentos e em outras pequenas verbas.

48. As receitas da justiça tendem a diminuir. O imposto cível desaparece para o Tesouro Público em virtude da reforma dos serviços.
Como é hábito todos os anos, também se dá nota agora dos rendimentos do Estado directa ou indirectamente relacionados com este Ministério. Em 1948, comparadas com 1947, as receitas foram as seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

Serviços de justiça

49. As principais alterações que se deram nos serviços de justiça constam do quadro da coluna seguinte, em contos.

[Ver Quadro na Imagem]

A modificação mais importante foi na despesa dos conselhos superiores e organismos de inspecção. Gastaram-se por esta rubrica: 1:614 contos no apetrechamento dos serviços prisionais e na satisfação de despesas relativas à organização e financiamento do trabalho prisional ; 6:258 contos em subsídios a conceder nos termos do Decreto n.º 35:659, e, finalmente, 2:282 contos em conta das importâncias de receitas próprias dos estabelecimentos jurisdicionais de menores.

Serviços prisionais

50. Já se escreveu que o aumento de despesa nestes serviços foi muito grande.
Os gastos passaram de 16:555 contos em 1938 para 43:444 em 1948.
Em relação a 1938 todas as dependências desenvolveram a sua despesa. Comparada com 1947 ela diminuiu ligeiramente. Os números são os que seguem, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui desde 1946 o corpo de guardas.

Contabilizou-se a partir de 1946 na Direcção-Geral (serviços de secretaria) a verba do corpo de guardas. E disso resultou o grande aumento notado no quadro.
Uma das razões do acréscimo de despesa é o vestuário e a alimentação de presos. Por outro lado, há novos estabelecimentos prisionais, como a Colónia Penal de Alcoentre, a Prisão-Escola de Leiria, a cadeia de Peniche e outras.

Serviços Jurisdicionais de Menores

51. A desposa destes serviços que aumentou sensivelmente a partir de 1938, consta do quadro que segue, em contos.

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[Ver Quadro na Imagem]

As variações em relação a 1947 foram pequenas. Houve apenas o acréscimo de 27 contos, mas elas aumentaram em mais de 40 por cento quando relacionadas com o ano anterior à guerra.

MINISTÉRIO DA GUERRA

52. O total da desposa deste Ministério em 1948 atingiu 866:426 contos. Era de 549:956 em 1940.
Foi em 1943 que alcançou a sua despesa máxima, com mais de 1:500 milhares de contos, e tem vindo a decrescer desde então por virtude de diminuições na despesa extraordinária.
Há, porém, certas verbas que tendem a aumentar, como a das classes inactivas, que já atinge perto de 80:000 contos.
O quadro que segue dá, desde o começo da guerra, as despesas totais, discriminadas em contos.

[Ver Quadro na Imagem]

O único sintoma perturbador no quadro é o aumento da despesa ordinária, que dobrou desde 1938 o aumentou muito desde 1940, em que não atingira ainda os 400:000 contos.
Em todo o caso o conjunto mostra apreciável melhoria em relação ao último ano (1947), que traduz cerca de 101:100 contos. Parece, assim, que se estão a fazer esforços no sentido de ajustar gradualmente a despesa do Ministério às possibilidades do erário.

53. Em 1948 o total do que se gastou pode discriminar-se do seguinte modo:

[Ver Quadro na Imagem]

Desapareceu a despesa excepcional derivada da guerra. O que porventura ainda restava por liquidar teve cabimento, naturalmente, na despesa ordinária, que aumentou um pouco mais de 00:000 contos em relação a 1947.

Despesas ordinárias

54. O quadro que segue dá, em contos, para grande número de dependências do Ministério da Guerra, a sua despesa discriminada.

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Os respectivos encargos eram pagos pela desposa extraordinária (Despesa excepcional derivada da guerra»).
(b) Além desta importância, despenderam-se 79:310 contos, que foram pagos pela verba inscrita no orçamento do Ministério das Finanças e consignada ao subsidio â Caixa Geral de Aposentações para pensões do reforma e respectivo suplemento a oficiais o praças do Exército e a militares mutilados o inválidos do guerra.
(c) Não Inclui o pessoal correspondente ao que figura em 1948 nas diversas armas e serviços; para efeitos do comparação, as respectivas importâncias foram adicionadas em 1938 e 1947 às mesmas armas o serviços.
(d) Encargos nos termos do Decreto-Lei n.º 37:115. Em 1947 e de Janeiro a Outubro do 1918, subsidio eventual.

Convém anotar algumas considerações ao quadro.
Assim, os encargos da defesa antiaérea fixa, base aérea n.º 4 e guarnição militar de Cabo Verde eram pagos pela despesa excepcional derivada da guerra, cuja rubrica desapareceu este ano.
As classes inactivas, reserva e reforma são também verbas do Ministério das Finanças, que se elevaram a 79:310 contos, como subsídio à Caixa Geral de Aposentações para pensões de reforma e respectivo suplemento a praças e oficiais do Exército e a militares e inválidos da guerra.
As cifras relativas ao pessoal dos quadros extintos foram alteradas, para efeitos de comparação, de modo a fazer corresponder em cada ano idênticos serviços. É assim possível comparar com 1948 as verbas de 1938 e 1947. Todas estas alterações não modificam os totais, antes os uniformizam. A subida na despesa em relação a 1938 foi de 208:309 contos e de 01:365 em relação a 1947.

MINISTÉRIO DA MARINHA

55. O total da despesa do Ministério da Marinha foi este ano de 507:733 contos, o que representa mais 100:000 contos do que em 1947 e perto do triplo de 1938. Este importante acréscimo provém de razões que adiante se mencionarão. O quadro que segue exprime o desenvolvimento da despesa a partir do ano anterior à guerra:

[Ver Quadro na Imagem]

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O aumento deu-se tanto nas despesas ordinárias como nas extraordinárias. Presume-se que estas últimas devam diminuir. Os números que seguem mostram as despesas ordinárias relacionadas com 1038.

[ver tabela de imagem]

(a) Em 1947 incluía algumas das despesas que passaram paru a divisão «Missões e comissões do serviço e de estudo no estrangeiro».

(b) Divisão criada em 1948.

(c) Em 1938 o 1947 incluía despesas que em 1948 estão distribuídas por outras divisões.

(d) Incluía a quase totalidade da despesa com o pessoal civil.

Não se pode dizer terem aumentado muito as despesas ordinárias, no estrito ponto de vista financeiro, visto não terem dobrado sequer em relação a 1938. Neste ano, como se notou atrás, o índice fixou-se em 176,6,

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na base de 100. Quase todos os outros Ministérios mostram maior índice.

O acréscimo deu-se quase todo em pessoal, como era de prever.

A verba de material também sofreu acréscimo, em virtude do maior custo dos abastecimentos.

Total das despesas

58. A despesa extraordinária divide-se como segue:

Contos

Despesa ordinária .......... 301:550

Despesas extraordinárias:

Rearmamento da Marinha ............................................. 71:477
Plano de aviação naval ............................................. 4:520
Despesas excepcionais de guerra .................................... 20:421
Reparação e modernização da frota de contratorpedeiros e avisos .... 109:760
206:183
Total ........................................................ 507:733

As despesas excepcionais de guerra representam naturalmente liquidação de encargos anteriores, e por isso devem desaparecer. Nem faz sentido que esta rubrica se perpetue nas contas.

A modernização da frota, que consumiu 109:760 contos, deve estar no fim. Embora haja sempre despesas importantes com material, o volume das deste ano certamente representa uma excepção.

MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS

As contas

57. Ainda continuou este ano o aumento de gastos que vem sendo assinalado neste Ministério.

A despesa atingiu 65:767 contos, e ora de 31:263 em 1938.

Foi a partir de 1946 que se deu o acréscimo mais pronunciado, o qual continuou em 1947 e 1948.

A diferença para mais entre estes dois anos aproxima-se de 5:000 contos.

Os acréscimos na despesa devem ser corrigidos em cada ano pelas quantias relativas à compra de edifícios e mobiliário para instalação das representações diplomáticas no estrangeiro.

O quadro seguinte dá o desenvolvimento da despesa desde 1938.

[Ver tabela de imagem]

(a) Inclui só o subsidio eventual.

(6) Em 1918 esta rubrica passou a «Suplemento de vencimentos;. (Decreto-Lei n.º 37:115, do 26 do Outubro do 1948).

Para fazer a comparação com 1938 devo deduzir-se àquele último ano a despesa da Sociedade das Nações, que não foi paga em 1948, e acrescentar a Casa de Portugal em Nova Iorque, que não existia naquela época.

Os números mostram que a Direcção-Geral dos Negócios Políticos, só por si, já gasta mais do que todo o Ministério despendeu em 1938. É nesta dependência do Ministério que se inscrevem as desposas do móveis e imóveis acima mencionados.

Negócios Políticos e da Administração Interna

58. As verbas mais salientes desta Direcção-Geral, que totalizaram 38:724 contos, são as seguintes:

[Ver tabela de imagem]

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772-52) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 43

Nota-se ter havido apenas um aumento sensível nos subsídios e quotas.

As despesas de correios e telégrafos diminuíram, como era lógico.

Os serviços externos dos negócios políticos consumiram 31:277 contos, assim distribuídos:

[Ver tabela de imagem]

Vê-se que o aumento de cerca de 2:500 contos proveio do pessoal, material e, em menor grau, de encargos diversos. Houve acentuada diminuição nas comunicações e em rendas de casa.

A verba de material, onde se nota um acréscimo de cerca de 2:000 contos, foi aplicada em grande parte em edifícios e em decoração e mobiliário das representações diplomáticas no estrangeiro.

Em imóveis fizeram-se as despesas seguintes:

Contos

Embaixada no Rio de Janeiro ..... 105
Embaixada no Vaticano ........... 175
Embaixada em Washington. ........ 2:650
Embaixada em Paris .............. 250
Total ..................... 3:180

O que se gastou em mobiliário e decorações foi além desta cifra. Discrimina-se assim:

Contos

Embaixada em Madrid............ 109
Embaixada no Vaticano ......... 257
Embaixada em Washington. ...... 1:830
Embaixada na China ............ 250
Embaixada na Haia ............. 150
Embaixada no Brasil ........... 450
Embaixada em Pretória ......... 100
Total ................... 3:146

Direcção-Geral dos Negócios Económicos e Consulares

59. Também subiram as despesas desta Direcção-Geral. Passaram de 19:542 contos em 1947 para 21:593 em 1948. Discriminam-se como segue:

[Ver tabela de imagem]

Como se nota, houve aumento sensível no pessoal dos serviços externos, cerca de 1:300 contos, e 300 contos nas Casas de Portugal. Juntamente com outros encargos obtém-se o acréscimo total.

Despesas totais

60. As despesas ordinárias acabadas de descrever juntam-se as extraordinárias, que se elevaram a 2:329 contos.

O total das despesas do Ministério dos Negócios Estrangeiros foi assim de 68:096 contos, contra 64:040 em 1947 e 69:250 em 1946. O constante aumento notado nos últimos anos necessita de ser corrigido.

MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS

61. No crescendo contínuo das despesas ordinárias deste Ministério já se atingiu este ano o total de 601:000 contos, se se tiverem em vista-os organismos transferidos para o Ministério das Comunicações. É uma verba impressionante, num orçamento de limitados recursos, que bem revela a tendência para cada vez maiores despesas.

Com seu parcimonioso gasto, sobretudo em obras reprodutivas, poder-se-iam alcançar melhorias sensíveis em muitos aspectos da vida económica.

Mas, infelizmente, há muitos anos se diz, e se explica neste parecer, que a política do Ministério das Obras Públicas não é a que melhor se adapta às condições do País. E este ano a regra mantém-se, e talvez se agrave ainda, dado o destino das despesas, que será esmiuçado adiante.

Os anos que vêm a seguir ainda mais hão-de fazer ressaltar inconvenientes dos critérios seguidos: uma estrutura burocrática larga e dispendiosa, uma insuficiência de dotações correspondentes e a concentração de dotações em obras volumosas e muito caras - é o caso da ponte de Vila Franca -, sem equivalente reforço de verbas para os serviços normais.

62. As verbas que antigamente faziam parte deste Ministério e que transitaram para o das Comunicações podem agrupar-se assim:

Contos

Fundo Especial de Caminhos de Ferro..... 70:508
Serviços de viação ..................... 12:115
Aeroporto de Lisboa .................... 7:715
Porto de Lisboa ........................ 90:885
Porto de Leixões ....................... 17:667
Portos ................................. 16:039
Suplemento ............................. 3:000
217:929

Adicionando as dotações destes serviços às despesas ordinárias, que subiram a 383:172 contos, obtém-se a verba total comparável, ou 601:000 contos, números redondos.

63. Mas o Ministério das Obras Públicas também consome quantias importantes por força de despesas extraordinárias. Em 1948 somaram estas 584:137 contos.

Assim, as despesas totais, comparadas com 1938 e 1947, podem discriminar-se do modo que segue:

[Ver tabela de imagem]

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Às despesas extraordinárias de 1947 e 1948, para eleitos de comparação com 1938, juntaram-se as que foram transferidas para o Ministério das Comunicações, no total de 189:278 contos, relativos a aeroportos e aeródromos, linhas aéreas, rede telegráfica e telefónica e portos, incluindo os de Lisboa e Leixões.

Apesar de já ser alta a verba de 1947, ainda a deste ano aumentou muito, como se verificou atrás.

Não contando com o que transitou para o Ministério das Comunicações e considerando apenas as verbas do actual Ministério das Obras Públicas, os números são os mencionados na coluna seguinte.

[ver tabela de imagem]

Um exame superficial mostra logo que se deu aumento em quase todas as rubricas. Nalgumas o acréscimo foi substancial, como no caso dos edifícios, das estradas e em outros.

Secretaria-Geral

65. A Secretaria-Geral inclui II despesa com o Conselho Superior de Obras Públicas, Direcção de Obras Públicas do distrito da Horta e pagadorias das obras públicas, além das despesas de expediente e material da 8.a Repartição da Contabilidade Pública. O que mais pesa nos 2:276 contos gastos é o Conselho Superior de Obras Públicas, com pouco menos de metade. Já aqui se sugeriu a reforma deste Conselho, que não satisfaz às necessidades do serviço de inspecção.

Os inspectores de obras públicas quase não têm funções de inspecção.

Numa antiga reforma havia, na verdade, fiscalização independente dos serviços, através de inspectores.

Agora são os directores-gerais que têm a seu cargo essa inspecção, o que de facto não parece satisfazer.

O assunto necessita de ser visto com cuidado, porque tudo indica ser mais conveniente voltar à antiga fórmula ou a outra que se lhe assemelhe.

[Ver tabela de imagem]

Apesar da redução nas despesas extraordinárias, ainda o total foi maior do que em 1947.

Despesas ordinárias

64. O quadro que segue mostra, por serviços, as despesas ordinárias do Ministério das Obras Públicas:

Junta Autónoma de Estradas

66. As dotações destes serviços aumentam todos os anos. Atingiram perto de 300:000 contos em 1948 (290:054 contos), assim discriminados:

Contos

Despesas ordinárias .......... 149:999

Despesas extraordinárias:

Estradas da Madeira ................ 4:125
Estradas dos Açores ................ 10:930
Construção de estradas e pontes..... 120:000
290:054

67. Não foi possível este ano dar o desenvolvimento necessário a estes serviços. Convém indagar com certo pormenor, como se fez em pareceres anteriores, sobre o destino das despesas extraordinárias incluídas na verba global de 120:000 contos.

No próximo parecer procurar-se-á estudar a obra realizada até agora com a aplicação das dotações já gastas ao abrigo do crédito de 1 milhão de contos destinado a novas construções de estradas e pontes.

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Deve contudo dizer-se que há um certo número de estradas interprovinciais que esperam ainda conclusão ou melhorias muito necessárias.

Serviços de Urbanização

68. De todas as empresas do Estado Novo uma daquelas que merece maiores louvores é, evidentemente, a dos melhoramentos rurais.

A ideia foi feliz, mas podia ter sido bem melhor aproveitada. O Estado durante muitos anos foi parcimonioso na sua dotação - tão parcimonioso que apenas lhe destinava 10:000 contos, além de verbas desviadas do Fundo de Desemprego.

Nunca o relator das Contas Gerais do Estado compreendeu os motivos desta parcimónia em dotação de tão vastas repercussões na vida nacional, não apenas na vida económica - e ela é grande nesta esfera de acção -, mas principalmente na vida social.

Todos os anos, em comentários que mais se assemelhavam a queixas, os pareceres das Contas trouxeram ao conhecimento do Governo as esperanças de milhares de povoados dispersos pelo País que não tinham nem caminhos, nem fontes, nem ruas, nem esgotos - que não tinham nada ou quase nada.

Houve esperanças quando, por volta de 1939, se dobrou a dotação de 10:000 para 20:000 contos. Era pouco, em comparação com outras verbas do Ministério das Obras Públicas, mas já era alguma coisa.

Voltaram, porém, os anos maus, e já em 1942 se reduziu novamente a dotação para 10:000 contos.

As coisas só se modificaram em 1945, em que para melhoramentos rurais as despesas extraordinárias acusam a verba de 18:272 contos. Vieram depois mais alguns auxílios para abastecimento de águas às sedes dos concelhos.

Mas o valor da moeda em 1945 estava longe de ser o de 1938 quando, para idêntico fim, se destinaram 10:000 contos, que estes pareceres consideraram muito pouco e bem longe de tão útil finalidade.

No entanto, os povos rurais, onde reside a parcela mais sã e laboriosa da comunidade portuguesa, não desesperaram de ver um dia satisfeitas as suas mais justas ambições. Mas a parcimónia nas verbas de melhoramentos rurais continuou.

Despenderam-se 19:108 contos em 1946, acrescidos de 40:010 coutos do Fundo de Desemprego, dos quais a maior parte se destinava fins urbanos. Naquele ano gastaram-se em melhoramentos rurais 27:939 contos, e o que se contabilizou em 1947 não foi além de 25:241 contos, tendo-se despendido 30:402.

Andamos assim à roda dos 25:000 contos por ano, como despesa inscrita nas Contas, para uma obra que é de todo o País e toca fundo na vida do habitante rural.

A questão vai, contudo, atingir aspectos piores porque, com as dificuldades financeiras conhecidas e as insuficiências do orçamento, os melhoramentos rurais estão condenados, irremediavelmente condenados, a sofrer grandes atrasos.

Politicamente cometer-se-á um erro sério, porque o Pais não é Lisboa nem o Porto. É nos concelhos rurais que reside a maior força política do País, assim como é lá que moram as suas melhores reservas morais.

As freguesias, vilas, aldeias e povoados esperam que sejam atendidas as suas pequenas reclamações - as reclamações cuja satisfação lhes dará meios de melhorar a sua vida económica e beneficiará com as fontes, os esgotos, ainda que rudimentares, o calcetamento das ruas, a luz e as suas condições higiénicas.

Parar essa obra, atrasá-la ou reduzir o seu volume apreciavelmente não é de boa administração. Vale mais a pena banir do orçamento as coisas dispensáveis, que não são precisas, como certas obras sumptuárias, construções prisionais, de grande consumo de verbas, edifícios para diversos serviços, estádios, docas de pesca que não correspondem às necessidades e tantas outras coisas, do que diminuir as verbas destinadas à fonte, ao caminho vicinal, ao cemitério, ao arranjo da escola, às ruas, aos pequenos pontoes e a tantos outros pequenos objectivos que são a vida das populações dos campos.

Estes pareceres tom sido profetas em algumas previsões importantes.

Se se tivessem seguido muitos alvitres aqui feitos, ter-se-iam evitado dificuldades. O conselho que agora se dá ao Governo, com toda a sinceridade e veemência, é o de não reduzir as dotações dos melhoramentos rurais, e promover um esquema racional de obras, como anteriormente foi sugerido.

A Assembleia Nacional deve chamar a atenção do Governo para este serviço, para as suas dotações, para as suas necessidades; deve acentuar que não é vantajoso retardar obras de grande importância. O programa anunciado para 1949-1950, que se via logo não ser exequível dentro dos prazos marcados, necessita de ser actualizado.

O que se impõe agora é o reforço das verbas, e não a sua redução; é organizar os serviços de modo a que, dentro do mais curto espaço de tempo, se executem as obras indispensáveis.

69. O caso mais urgente a resolver é o da conservação dos melhoramentos já feitos. Há caminhos vicinais que desaparecerão em breve.

Alguns não se terminaram ainda, e os troços feitos, de pequena utilidade, vão pouco a pouco desaparecendo, porque aterros se esboroam ou até o mato cresce no próprio leito do caminho.

As comissões locais, quando existam, ou as câmaras municipais, deveriam ser os agentes, para este efeito, dos serviços centrais. A penúria das suas receitas é, porém, tal que pouco podem fazer, sobretudo os municípios mais pobres.

Não convém que se perca dinheiro já gasto.

Outro ponto importante é o da distribuição de verbas.

Há regiões do País onde, por força da própria falta de recursos, a vida era e ainda continua a ser atrasada em muitos aspectos, apesar dos progressos registados nos últimos tempos.

Sugeriu-se aqui que a distribuição do comparticipações deveria atender ao grau de progresso dos concelhos e até aos próprios recursos dos municípios.

Ultimamente, com a intensificação de desemprego no Sul, têm sido desviadas dotações especiais para atalhar as crises - e é de prever, dada a pequenez da verba orçamental para efeitos semelhantes, que outras zonas sejam indirectamente prejudicadas no seu desenvolvimento material.

Já há queixas também neste aspecto, e convém não acentuar o desequilíbrio.

As contas

70. O exercício de 1948 foi de grandes despesas, e os serviços de urbanização não fazem excepção à regra. Pagaram-se este ano cerca de 153:000 contos por força de comparticipações e subsídios do Estado.

A origem desta quantia na parte relativa ao Estado foi a seguinte:

Contos

Fundo de melhoramentos rurais ....................... ...... 49:963
Abastecimento de água às sedes dos concelhos. ............. 12:500
A transportar ....................................... 62:463

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Contos

Transporte...................................................... 62:463

Construção de casas de habitação para famílias pobres........... 4:994
Construção do Estádio de Braga ................ ................. 2:500
Trabalhos de urbanização ....................................... 6:749
Casas desmontáveis ............................................. 1:500
Total .................................................... 78:206

A verba de 152:933 contos compara-se com 113:617 em 1947 e a diferença para mais provém de maior utilização do Fundo de Desemprego (58:667 contos, contra 82:432 em 1948).

Comparticipações por distritos

71. A verba paga. distribui-se do modo que segue pelos distritos do País:

Importâncias pagas por distritos em 1948

(Em contos)

[Ver tabela de imagem]

Nota-se logo que os distritos de Lisboa, Porto e Setúbal são os três grandes beneficiários. Neles se despendeu ao todo cerca de um terço do total.

No caso do distrito de Lisboa mais de metade da verba de 23:760 contos pertence à capital (15:034 contos) e diz respeito a rede de esgotos, arruamentos urbanos, assistência social e outras pequenas coisas. Vem logo a seguir Cascais, com 2:104 contos. Os outros concelhos, com excepção de Oeiras, Mafra e Sintra, foram menos felizes. No do Porto a cidade recebeu 6:257 contos e Vila Nova de Gaia 1:647. Tirando Póvoa de Varzim, com 953 contos, e Matosinhos, com 909, o resto não tem importância por aí além. Finalmente Setúbal, Almada e Sines foram os mais contemplados, mas principalmente os dois primeiros, que receberam mais de metade do total. Claro que não se podem opor obstáculos ao desenvolvimento destes concelhos urbanos, sobretudo quando, como no caso de Almada, se destinaram 2:930 contos a abastecimento de águas e, no de Setúbal, 2:022 a casas económicas. Mas deve notar-se que são exactamente os concelhos de maiores receitas os que recebem maiores comparticipações.

Despesas

72. Agrupados por destinos, os gastos de 1948 podem assumir a forma seguinte:

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

Nota-se que os melhoramentos urbanos continuam a absorver uma grande parte das receitas. E se na verba de 62:289 contos forem incluídos «outros fins», que, como se viu atrás, compreendem o estádio de Braga e trabalhos de urbanização, a verba eleva-se para perto de metade do total, além de que a dotação «para construção de casas para famílias pobres» pertence na sua totalidade às cidades ou grandes povoações.

Obras concluídas

73. Em 1948 concluíram-se 646 obras -50 de abastecimento de águas, 204 de melhoramentos urbanos e 392 de melhoramentos rurais-, tudo no valor efectivo de 59:051 contos.

Pelo número de obras concluídas num ano se verifica a influência do serviço.

Se houvesse espaço para dar pormenor sobre cada uma das obras, ainda mais se acentuariam a importância e a projecção das verbas gastas.

Considerando apenas os melhoramentos rurais, o número de obras concluídas foi de 392, assim divididas:

Estradas municipais:

contos

Construídas ............ 93
Reparadas. ............. 67

Caminhos públicos:

Construídos ............ 119
Reparados. ............. 36
315
Outras obras. .......... 77
392

O Estado comparticipou com 68 por cento destas obras.

Nos melhoramentos urbanos concluíram-se 204 obras, que custaram 64:385 contos. Destes dizem respeito a edifícios 28:425 contos, a arruamentos 29:556 contos e a jardins e parques 3:637 contos.

Vê-se ter havido especial atenção das autoridades comparticipadas para edifícios, arruamentos e parques.

Parece que de futuro a verba de melhoramentos rurais deverá ser reforçada, ainda que seja necessário reduzir a dos melhoramentos urbanos.

Devem sor intensificadas as obras de estradas, caminhos, fontes, arruamentos, esgotos, cemitérios e outras que dizem respeito aos pequenos concelhos e freguesias rurais. De toda a obra da Direcção-Geral é esta a que produz maiores resultados.

Comparticipações

74. Resta agora indicar as comparticipações de 1948, que somaram 166:403 contos, contra 164:345 contos em 1947.

Foram ainda os distritos de Lisboa, Porto e Setúbal e também Aveiro e Braga os principais beneficiados.

Os que receberam menos auxílio do continente foram os da Guarda, Viseu, Vila Real, Évora, Viana do Castelo, Bragança e Castelo Branco, todos com menos de 7:000 contos.

Nos últimos anos as comparticipações foram as seguintes :

[ver tabela de imagem]

Nota-se a grande preponderância dos melhoramentos urbanos. Deve dizer-se, além disso, que parte do que se inclui em abastecimento de águas e saneamento se destina também às cidades.

Conclusões

75. O que acaba de se dizer mostra que é indispensável intensificar a obra dos melhoramentos rurais.

Devem ser reduzidas as comparticipações destinadas aos municípios mais ricos, de maiores receitas, de modo a ser possível melhorar as condições de vida das pequenas povoações, sobretudo dos concelhos mais pobres. Dada a exiguidade das dotações, torna-se necessário reduzir ao mínimo as comparticipações em obras dispensáveis, tais como as de puro embelezamento citadino, e alargar os trabalhos na parte relativa a saneamento, abastecimento de águas e esgotos, caminhos vicinais, estradas municipais e luz.

A verba para beneficiação e reparação tem de ser reforçada, sob pena de prejuízos.

E sobretudo essencial terminar, tão depressa quanto possível, as obras já encetadas e macadamizar os caminhos e estradas municipais.

Edifícios e Monumentos Nacionais

76. Apesar de ter havido ligeira diminuição na verba das despesas extraordinárias, que anualmente se classi-

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fica nestes pareceres como pertencendo de facto a esta Direcção-Geral, subiram ainda as despesas totais no exercício de 1948. Passaram de 350:000 para 374:000 contos.

Além dessas dotações, ainda propriamente se deveriam incluir outras, como o custo das novas instalações para a Marinha (13:560 contos) e a Exposição de Obras Públicas, que importou neste ano em 6:000 contos.

Juntando estas duas verbas, o total elevar-se-ia a perto de 400:000 contos (394:000 contos), o que é na verdade uma verba muito grande para edifícios públicos, sobretudo quando se considera a exiguidade das receitas e as dificuldades à vista.

Previa-se em 1947 que a construção civil teria de afrouxar em breve, não só a que dizia respeito ao Estado, como a de particulares.

Cumpriram-se já as previsões e não é motivo para rejubilar com o que aconteceu, porque a redução na actividade da construção civil traz sempre inconvenientes sérios no meio económico.

Teria sido mais vantajoso para o País atrasar o ritmo do trabalho - estender os recursos a mais anos, de modo a manter um nível de construção mais em acordo com os recursos. O que se fez nos dois anos de 1947 e 1948 foi concentrar os esforços públicos e particulares no mesmo objectivo, com as dificuldades conhecidas de materiais e mão-de-obra.

E, acabados os recursos financeiros disponíveis, cessou em quase todo o País o frenesim de obras - e o desemprego iniciou o seu aparecimento, com os desenganos e misérias inerentes.

77. É evidente que o Estado não poderá continuar a gastar em edifícios públicos, nos anos mais próximos, o que gastou em 1947 e 1948, e talvez em 1949. Há obras de interesse a executar ainda e não se ousa aconselhar que se reduzam nelas as dotações. Mas há outras, como, por exemplo, a do Estádio, em Lisboa que já deveriam ter sido acabadas há muito tempo.

A despesa da Direcção-Geral em 1948 avizinhou-se de 400:000 contos, como acima se explicou, e distribui-se do modo que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

Nota-se um importante aumento na despesa ordinária, que mais adiante se explicará, e uma ligeira diminuição nas despesas extraordinárias, proveniente de reduções substanciais nos edifícios prisionais e na Leprosaria Rovisco Pais, já completa. A diferença, no conjunto, é contudo pequena.

Despesas ordinárias

78. O total destas despesas subiu para 141:642 contos, que se compara com 100:000 em 1946 e 107:236 contos em 1947. É pois o máximo atingido até hoje.

Incluem-se nas despesas ordinárias as verbas relativas ao Laboratório de Engenharia Civil, das quais faz parte o antigo Laboratório de Ensaio e Estudo de Materiais. A verba foi consideràvelmente reforçada.

O quadro que segue, em contos, dá discriminadamente as despesas ordinárias :

[Ver tabela de imagem]

Sobressaem diversos acréscimos importantes: o de pessoal, o de construções, o de despesas de conservação, o do Laboratório de Engenharia Civil e, finalmente, o de casas económicas, que, como se notou acima, não representa a totalidade, visto haver outras dotações nas despesas extraordinárias.

Estudos e projectos

79. A verba de estudos e projectos costuma andar à roda de 200 contos. Subiu este ano para 369 contos.

Esta questão de estudos e projectos precisava de ser convenientemente revista e posta em igualdade com a prática seguida em outras dependências do Estado.

Em 1948 a despesa distribuiu-se assim:

Contos

Sanatório Sousa Martins (projecto parcial) 50
Maquetas de diversos monumentos ............................ 37
Materiais para elaboração de projectos e estudos ........... 50
Maquetas das pousadas de Elvas, S. Brás de
Alportel e Santiago do Cacem ............................... 23
Projecto para estação de tratamento de lixos 20
Diversos estudos ........................................... 189
Total................................................. 369

Novas construções

80. As novas construções (construções a efectuar em conta das receitas gerais do Estado, incluindo despesas de pessoal) consumiram 16:682 contos, assim divididos:

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

Nos hospitais para tuberculosos inclui-se o Sanatório de D. Carlos, com o gasto de 6:902 contos, e o de D. Manuel II, com 1:775. Este último já foi inaugurado.

Nos edifícios para quartéis da Guarda Fiscal continuou a melhoria no posto fiscal- de Burgau (108 contos), Caia (33 contos), Vila Verde da Raia (138 contos), Elvas (74 contos) e Cascais (480 contos), e inclui-se, além disso, para administração e fiscalização 108 contos e para diversos 79 contos.

81. Destas obras há já algumas que vêm de trás e seria muito vantajoso terminá-las com brevidade. A despesa de fiscalização continua a ser elevada.

Os edifícios para a Guarda Republicana e Polícia de Segurança somaram 697 contos, distribuídos por diversas localidades, como Castanheira do Ribatejo (43), Viana do Castelo (412) e Cabeço de Bola (44). Aqui também a administração e fiscalização foi muito alta -180 contos.

Nos edifícios para estabelecimentos dos serviços agrícolas, a Estação de Lacticínios de Paços de Ferreira, que já anda em construção há uns anos, ainda neste exercício consumiu 499 contos; no Laboratório- Químico Central gastaram-se 210 contos e mais 30 em Alvalade.

Nos edifícios para os serviços pecuários aparece ainda a Estação Zootécnica Nacional, com 40 contos, a Estação de Fomento Pecuário de Lisboa, com 293; e a Coudelaria Nacional de Alter, com 499.

Aos edifícios das alfândegas gastaram-se 700 contos - em S. Gregório (40), Vila Verde da Baia (172), Vilar Formoso (25), Cascais (242) e Caia (137), e aqui a administração e fiscalização subiu a 134 contos.

Nos edifícios do Ministério da Marinha consumiram-se 629 contos, assim distribuídos: 192 em Sesimbra, 210 em Paço de Arcos, 201 no Armazém de Minas da Azinheira e 26 no Cabo Mondego.

As estátuas a erigir são diversas, mas um modelo em gesso para a de Engenharia, destinada ao Instituto Superior Técnico, custou 130 contos e os modelos para as de D. João I, D. João II e Nun'Alvares custaram 53 contos.

Nesta matéria há ainda a acrescentar a execução de três grupos para as quatro estátuas em gesso de doze navegadores, para os jardins da Torre de Belém, os quais importaram em 240 contos.

Em outras construções inclui-se o Hospital Sobral Cid, 94 contos; a Estação Meteorológica do Montalegre, 131 contos; o Governo Civil de Bragança, 76 contos; a Faculdade de Engenharia do Porto, 495 contos; o Observatório Astronómico da Universidade do Porto, 155 contos ; a Casa Pia de Lisboa 258 contos; a Estação de Melhoramento de Plantas de Eivas, 538 contos; a Pousada de S. Brás de Alportel, 172 contos; o Laboratório de Engenharia Civil, 80 coutos, e mais outras pequenas verbas.

Construções diversas

82. Esta rubrica compreende as construções e melhoramentos a efectuar por contrapartida da inscrição de iguais quantias no orçamento das receitas do Estado, incluindo despesas de pessoal.

Diz respeito aos programas de obras de serviços autónomos ou similares.

Os gastos em 1948 constam do quadro que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

A verba mais importante refere-se ainda este ano aos Correios, Telégrafos e Telefones. Na secção respectiva serão dados os custos dos edifícios construídos e a origem das verbas que os liquidaram.

Sabe-se que não é brilhante a situação financeira daquela Administração-Geral.

Tudo indica que há grandes vantagens em reduzir o seu programa de obras ao estritamente necessário. Aliás é conhecido, por se ter até na Assembleia Nacional levantado o caso, que as obras poderiam ser bem mais modestas do que são.

As verbas mais importantes em 1948 dizem respeito a Ponta Delgada (3:037 contos), Setúbal (1:213 contos), Vila Real (3:077 contos), central telefónica (3:449 contos), Covilhã (2:338 contos) e ainda Restauradores 992 contos, além de 1:395 contos no Porto.

83. Os edifícios construídos para o porto de Lisboa consistem em armazéns (3:978 contos), que eram bem necessários, Estação Marítima da Rocha do Conde de Óbidos, com 527 contos, e outras de menor importância.

Nos edifícios da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência despenderam-se 7:495 contos, dos quais 1:045 são de estudos, administração e fiscalização, o que parece ser, e na verdade é, excessivo.

Os principais edifícios em que se trabalhou foram: Amarante, Arcos de Valdevez, Braga, Figueira da Foz, Gouveia, Guarda, Leiria, Caminha, Loulé, Ponte de Lima, Santo António do Porto, Seia, Santarém, Santa Comba Dão, Valença, Viana do Castelo e diversos. Todas as verbas são pequenas. A maior, além da de administração e fiscalização, foi a de 965 contos, em Loulé, seguida por 885 contos, no Porto.

Nos edifícios para o Ministério da Marinha fizeram-se obras na Apúlia (484 contos), Vila Franca de Xira (190

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contos), Monsanto (933 contos), Algés de Cima (408 contos), ilha das Flores (1:036 contos) e Sagres (167 contos).

Conservação e aproveitamento de material

84. Destinaram-se a este fim 44:322 contos, que se repartiram por grande número de obras.

A verba de estudos importou em 125 contos e destinaram-se à maqueta do edifício do comando da Escola Naval, ao projecto para o Instituto de Ciências Económicas e Financeiras, ao plano geral de conservação dos edifícios e monumentos, à ampliação de fotografias (23 contos) e a diversos.

Na conservação de imóveis houve o gasto de 37:864 contos, números redondos, que se podem discriminar assim:

Contos

Castelos e monumentos nacionais ............................ 3:500
Edifício do Ministério da Guerra ........................... 3:285
Instalações do Ministério da Marinha ....................... 1:500
Edifícios da Guarda Fiscal.................................. 637
Edifícios da Guarda Nacional Republicana.................... 2:300
Edifícios das alfândegas ................................... 1:021
Edifícios das construções prisionais ....................... 498
Edifícios dos hospitais de Lisboa .......................... 722
Paços dos Duques de Bragança ............................... 750
Universidade de Coimbra .................................... 150
Palácios nacionais ......................................... 1:498
Liceus ..................................................... 1:491
Palácio Foz ................................................ 1:719
Escola Superior de Medicina Veterinária..................... 249
Sanatórios marítimos ....................................... 1:000
Convento de S. Bento, Évora ................................ 800
Instituto Superior de Agronomia ............................ 500
Governo Civil de Aveiro .................................... 1:295
Biblioteca de Braga ........................................ 499
Manicómio Bombarda ......................................... 800
Convento de Arouca ......................................... 500
Convento de Lorvão ......................................... 476
Instalações eléctricas em diversos edifícios públicos....... 1:000
Casa da Moeda e Contrastaria do Porto....................... 493
Outros edifícios públicos .................................. 11:181
37:864

Vê-se ter sido grande e dispersa a actividade da Direcção-Geral.

Há algumas obras que se eternizam, como os Paços dos Duques de Bragança; outras que continuam a consumir grandes verbas que eram desnecessárias, como o Palácio Foz. E de novo surgiram coisas que parecia deverem ser já definitivas.

85. Além da verba acabada de discriminar, há ainda que ter em conta o que se gastou por contrapartida de receitas no orçamento, que é o caso dos organismos autónomos ou semiautónomos.

Em 1948 importou em 6:325 contos e dividiu-se assim:

Contos

Edifícios dos Correios, Telégrafos e Telefones ...................... 4:084
Edifícios da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência ........ 900
Edifícios do porto de Lisboa ........................................ 1:136
Outros edifícios..................................................... 205
6:325

Ainda em despesas ordinárias se inscreveram e gastaram 36:467 contos para construção de casas económicas.

Despesas extraordinárias

86. Viu-se atrás que a verba das despesas extraordinárias utilizada em edifícios é bastante alta. Pode discriminar-se do modo seguinte:

Contos

Novos edifícios para escolas primárias
(Plano dos Centenários) ................... 64:070
Estádio de Lisboa ....................... .. 5:428
Ala oriental da Praça do Comércio ....... .. 2:740
Novo Manicómio de Lisboa .................. 473
Novas instalações do Ministério dos
Negócios Estrangeiros ..................... 1:947
Mobiliário e roupas para edifícios públicos 1:000
Sanatório D. Carlos I ..................... 2:316
Sanatório D. Manuel II .................... 2:483
Sanatório da Flamenga ..................... 1:000
Laboratório Químico Central ............... 1:610
Laboratório de Engenharia Civil ........... 500
Direcção-Geral da Fazenda Pública ......... 1:089
Direcção-Geral da Contabilidade Pública ... 872
Novo edifício do Ministério das Finanças... 131
Diversos edifícios......................... 1:746
Total ............................... 87:405

Há que incluir além disso 293 contos de reparações no Estádio de Lisboa; ampliação de escolas de ensino técnico, 2:000 contos; edifícios para liceus, 24:500 contos; mobiliário e apetrechamento para diversos edifícios, 20:247 contos, e outras verbas.

87. Gastaram-se em construções prisionais 18:393 contos, dos quais em estudos e administração 1:409. Não inclui esta verba o que atrás se indicou por força de despesas ordinárias.

A discriminação pode fazer-se do modo que segue:

Contos

Estudos, administração e fiscalização .. 1:409
Cadeia de Bragança...................... 300
Cadeia de Resende ...................... 315
Cadeia de Setúbal ...................... 303
Cadeia Central de Lisboa ............... 2:351
Cadeia Central do Norte ................ 1:814
Cadeia de Odemira ...................... 170
Cadeia de Lamego ....................... 77
Cadeia de Cinfães ...................... 110
Reformatório Feminino de Benfica ....... 175
Colónia Penitenciária de Alcoentre ..... 4:241
Colónia Penitenciária de Pinheiro da Cruz 4:338
Prisão-Escola de Leiria ................ 1:117
Prisão-Escola de Santa Cruz do Bispo ... 251
Prisão para mulheres em Tires .......... 833
Diversos ............................... 589
Total ............................ 18:393

Custo das obras

88. Não é possível, por motivos fáceis de ver, dar o custo de cada obra no estágio em que se encontra. Tem-se tentado ir adicionando todos os anos o que se gastou em cada uma, ou em cada grupo, de modo a poder dar ideia sobre a utilização das receitas públicas.

O quadro que segue dá, de certo modo, essa discriminação para as obras principais.

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[Ver tabela de imagem]

Nota-se o acréscimo contínuo de algumas.

Prolonga-se a construção por anos e anos, quase não saem do orçamento. O Estádio de Lisboa já atinge 67:700 contos, sem contar com o que se gastou e há ainda a despender na auto-estrada, que tem quase como exclusiva função servir o Estádio, visto haver para outros efeitos a estrada marginal, que sobrava para o tráfego da Costa do Sol. Agora iniciaram-se as obras do hipódromo e continuou-se o Instituto Nacional de Educação Física, onde se despenderam em 1948 mais de 5:000 contos.

A Base Naval de Lisboa já vai além de 100:000 contos e os hospitais escolares ultrapassaram os 200:000.

Os Paços do Duque de Bragança continuam a despender as verbas que se vão registando. Já passaram de 5:000 contos os respectivos gastos e o Palácio Foz atingiu em 1948 cerca de 16:000 contos. O novo edifício do Ministério dos Negócios Estrangeiros nos dois anos de 1947 e 1948 já custou mais de 5:000 contos.

Ora o País não pode suportar tão grandes gastos nem tão custosas obras.

Se se juntarem os programas das construções prisionais, a pagar por empréstimos, e outros relativos a vários serviços, ver-se-á que é completamente impossível esta política. Só a força dos factos, que neste caso é a falta de recursos, parece ser o argumento decisivo para arrepiar caminho.

MINISTÉRIO DAS COLÓNIAS

89. Em apêndice a este parecer se descrevem sumariamente certas obras de fomento económico que conviria pôr em prática no sentido do desenvolver os recursos potenciais das províncias ultramarinas, e principalmente de Angola e Moçambique.

E opinião do relator das contas públicas que, assim como em boa hora se procurou estabelecer íntima comunhão de interesses políticos entre os membros da comunidade portuguesa, se deveria do mesmo modo estabelecer íntima comunhão de interesses económicos.

A separação que muitas vezes se pretende fazer entre territórios nacionais, pelo que diz respeito a produções ou abastecimentos, é um erro sério. Não parece haver divergências profundas no papel que cabe a cada um dos membros de Portugal. Todas as províncias, quer estejam situadas na Europa, quer em África, fazem parte de um todo-e só a prosperidade desse todo, que é a Nação, pode trazer a prosperidade de cada um de seus componentes.

A solidariedade política é um facto legal e moral - e acontecimentos recentes indicam que é bem funda e real essa solidariedade.

Convém acentuá-la também no campo económico.

O espírito individualista, que nos caracteriza quase sempre, esquece que é tão necessária a solidariedade económica no continente como nas províncias do ultramar. Tudo o que for feito no sentido de desfazer esse espírito e estreitar a colaboração entre todos os povos do mundo lusitano constitui um serviço real.

Parece, salvo melhor opinião, que um dos métodos a adoptar para atingir esse alvo seria o de dar início a um estudo pormenorizado das possibilidades e necessidades económicas, mediatas e imediatas, de Angola e Moçambique e outras províncias ultramarinas, nas suas relações com a metrópole, que envolvesse o exame além das riquezas potenciais de mais fácil e rendosa exploração, dos capitais disponíveis, da comercialização de produtos e de tudo o que poderia constituir base para a execução de um plano de fomento económico susceptível de desenvolver muitos recursos latentes e sua coordenação com os recursos financeiros e económicos da metrópole.

O Ministério das Colónias não está, nem nunca esteve, organizado convenientemente em matéria de estudos económicos e a posição dos governos provinciais também não parece de molde a poder assegurar o plano de trabalho de tão grande interesse e projecção.

As dificuldades que se levantaram ao delineamento de um programa de fomento económico a longo prazo há um ano mostraram as insuficiências da organização actual e as vantagens que adviriam de uma reforma cuidadosa do Ministério no sentido de maior eficiência.

Os projectos que então se incluíram no programa, como o aproveitamento das carnes, peixes, betuminosos e madeiras em Angola e carvões, irrigação e transportes em Moçambique, além de equipamentos agrícolas de tanta necessidade para poupar a mão-de-obra e tornar mais progressivas as culturas, foram baseados em informações e estudos de especialistas estranhos, nalguns casos, aos próprios serviços do Ministério.

Recomenda-se, pois, o estudo pormenorizado .das relações económicas entre as províncias portuguesas da Europa, da África e da Ásia, no sentido de tornar mais proveitosas para todos as actividades de cada uma.

As contas

90. As despesas ordinárias do Ministério das Colónias subiram a 42:127 contos em 1948, mais 10:108 do que em 1947, como pode ler-se no quadro que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

(a) Segundo a reforma de 7 de Janeiro de 1936 (Decreto n.º 26:180) tinha a categoria de Direcção-geral.

(b) Mais 3:625 em despesas de colonização (Decreto n.º 34:464).

(c) Mais 273 na reparação das picadas das fronteiras do Angola e mais 2:760 na missão do estudos dos problemas do fomento de Cabo Verde o mais 2:558 do encargos com a garantia de juros à Companhia de Caminhos de Ferro de Mormugão.

(d) Menos 100 de encargos com o pessoal o mais 1:750 de subsidio não reembolsável à colónia de Cabo Verde (Decreto n.º 36:780).

(e) Aumento do 1:385 na dotação do Padroado do Oriente.

(f) Redução verificada nos encargos da Junta das Missões Geográficas o de Investigações Coloniais com as missões de investigação por terem deixado de ser satisfeitas por esta verba as desposas das missões actuando em Moçambique.

O exame dos números da tabela mostra logo onde se deram os aumentos mais importantes.

Na Secretaria-Geral, ao abrigo do Decreto n.º 34:464, foram inscritos no orçamento cerca de 10:400 contos para despesas de colonização.

Gastaram-se por esta rubrica 7:323 contos. Em 1947 a despesa fora de 4:698 contos. Daí derivou o aumento assinalado no quadro.

Nas outras dependências do Ministério há maiores valias importantes na Direcção-Geral do Fomento Colonial, e por isso convém analisá-las com certo pormenor.

Fomento colonial

91. As despesas em 1948 foram as seguintes, em contos:

[Ver tabela de imagem]

Vê-se que foi a missão técnica para estudo dos problemas de estradas, hidráulica e arborização de Cabo Verde, juntamente com as garantias de juros de obras de caminhos de ferro nas províncias ultramarinas, que ocasionaram o aumento de despesa mais importante.

92. Também houve maiores gastos na Direcção-Geral do Ensino, quase todos provenientes da verba concedida para subsídios - que neste caso são, na quase totalidade, as missões religiosas. O aumento derivou da diferença entre 6:900 contos despendidos em 1947 e 8:285 em 1948, ou 1:385 contos.

93. Na Junta das Missões Geográficas foi apreciavelmente reduzida a dotação da metrópole. Passou, não contando com pessoal, de 4:700 contos para 2:760, ou
menos 1:940 contos. Não se compreende a razão desta alteração de verba, da qual certamente resultou menor volume de trabalho, ainda na suposição de terem sido mantidas as das províncias onde se realizam as investigações. Já os pareceres das contas emitiram opinião sobre o assunto, mas convém acentuar que a Junta pode prestar grandes serviços económicos aos domínios de além-mar.

Total das despesas

94. A despesa total discrimina-se do modo que segue:

Contos

Despesa ordinária ............. 42:127
Despesa extraordinária ........ 49:829
91:956

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO NACIONAL

95. Atingiram cerca de 400:000 contos (389:312) as despesas ordinárias deste Ministério, mais do dobro das de 1938 e bastante mais de 200:000 contos das de 1930-1931.

Se forem acrescidas do que pelo Ministério das Obras Públicas se gastou em edifícios escolares - escolas primárias e técnicas (66:071 contos), liceus (24:500 contos) e diversas outras obras de reparação, mobiliário e arranjos, o total que pertence propriamente a serviços dependentes deste Ministério alcança perto de meio milhão de contos.

O simples enunciado desta cifra e sua comparação com períodos anteriores mostram que tem sido feito evidente esforço no sentido de melhorar o ensino e a cultura dentro do País. Terão os resultados correspondido a este esforço ?

Como já foi indicado ao tratar-se das despesas ordinárias no seu conjunto, não parece ser possível, pelo menos nos anos mais próximos, alargar substancialmente as dotações deste Ministério.

Talvez possa haver razão para economias nesta ou naquela dependência. Mas, se as houver, tudo indica que as necessidades prementes em certos institutos e escolas são de molde a absorvê-las por completo.

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O quadro que segue mostra discriminadamente, por servidos, a despesa total ordinária do Ministério da Educação e compara-a com 1930-1931, o último ano anterior à guerra e 1947.

[Ver tabela de imagem]

Considerando os índices, não foi ainda actualizada a despesa em relação a 1938, como aliás aconteceu noutros Ministérios. O progresso denotado nos três últimos anos dá, em relação a 1940, um aumento de 77:000 contos, números redondos.

Secretaria-Geral

96. A despesa da Secretaria-Geral atingiu 19:196 contos, mais 2:056 do que em 1947 e mais 15:400 do que em 1938.

O avanço foi muito grande, e por isso se discrimina a seguir como se gastou:

Contos

Mocidade Portuguesa ....................... 10:000
Obra das Mães pela Educação Nacional ...... 5:000
Gratificações, ajudas de custo e
outras despesas pelo serviço de exames..... 1:301
Cantinas escolares ........................ 1:080
Diversos .................................. 1:815
Total ...... 19:196

Em "diversos" incluem-se o Instituto António Aurélio da Costa Ferreira e pequenas verbas relativas a diversos subsídios, além do material e encargos.

Tendo em conta os fins das verbas principais, parece não serem exageradas as dotações.

Instituto para a Alta Cultura

97. No parecer de 1946 dedicaram-se algumas linhas à actividade deste Instituto. Verificou-se nessa altura que poucas bolsas se concediam às profissões mais directamente relacionadas com a economia nacional, como sejam as de agronomia e engenharia.

As coisas não melhoraram sensivelmente desde então, e é pena. Em 1948 as bolsas de estudo distribuíam-se do modo que segue:

[Ver tabela de imagem]

A investigação económica e a engenharia são hoje dois aspectos fundamentais no bem-estar de um povo. Juntamente com os especialistas na agronomia e veterinária, os profissionais economistas e engenheiros orientam em toda a parte o desenvolvimento material dos países. É um facto que se não pode contestar.

Em Portugal há programas de industrialização em andamento. Pensa-se em inverter grandes capitais na produção de energia e parece urgente a necessidade do intensificar pela rega e de outro modo a produção agrícola.

Contudo em 122 bolsas de estudo só 1 foi concedida dentro do País à engenharia.

A agronomia melhorou um pouco em relação aos números anteriores, mas só tem 8 ou pouco mais de 5 por cento do total.

Mas os cursos de Letras, com 35, dos quais 6 no estrangeiro, os de Medicina com 26, dos quais 12 no estrangeiro, e os de Ciências com 31, dos quais 8 no estrangeiro, suplantam facilmente as ciências aplicadas, de interesse urgente e imediato.

Retrogradámos muito neste aspecto. Antigamente haviam-se criado disposições para formar bons técnicos, enviando alunos distintos para fora, tanto pelo Ministério das Colónias como pelo da Instrução.

Criou-se um organismo especial para o que se julgava ser esse fim - e que supriria deficiências das medidas antigas. Os resultados estão à vista.

A despesa com o Instituto aumentou.

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10 DE ABRIL DE 1950 772-(63)

O mapa seguinte dá a discriminação da despesa em 1938, 1947 e 1948.

[Ver tabela de imagem]

O aumento total de 1:300 contos, em relação a 1947, deu-se essencialmente nos diversos subsídios, nas bolsas de estudo fora do País e um pouco no serviço de expansão cultural.
A verba de inventariação de bibliografia científica desapareceu.

Ensino superior e artístico

98. Atingiu 79:757 contos o custo do ensino superior e artístico - mais 2:050 do que no ano anterior. Havia sido de 40:000 em 1938.
Aqui também parece ter havido importante melhoria, sobretudo quando se considera, como aliás noutros casos, que não se inclui nem o abono de família, nem o suplemento de vencimentos, que são contabilizados em verbas globais.
Os números discriminados e comparados com anos anteriores são os seguintes:

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

(a) Compreende o Cutelo de Guimarães.

Os aumentos em relação a 1947 deram-se nas Universidades de Coimbra e Porto, nos diversos órgãos que dependem do Ministério, sobretudo no Instituto de Oncologia (cerca de 2:000 contos).
Diminuições ligeiras tiveram lugar na Universidade de Lisboa e na instrução artística.
A única variação digna de nota é a do Instituto de Oncologia.

Universidades

99. Dadas as pequenas variações sofridas pelas despesas das Universidades, não valeria talvez a pena este ano mencionar as cifras discriminadamente.
No entanto, para maior clareza e para mostrar a sua evolução, publica-se o quadro habitual, com os números de 1948.

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[Ver tabela de imagem]

Os três órgãos que todos os anos se expurgara da despesa da Universidade de Lisboa, para eleitos de comparação, são: o Hospital Escolar, o Instituto Bacteriológico e o Instituto de Oftalmologia, que, em conjunto, gastaram 14:390 contos em 1948, contra 14:977 em 1947. Haviam despendido 5:790 contos em 1938. Foi o Hospital Escolar, como é lógico, que absorveu o maior aumento. Um exame pormenorizado das despesas das diversas Faculdades, laboratórios e institutos dependentes das Universidades mostra ainda insuficiências, sobretudo em material.
O ensino nos laboratórios ainda não corresponde às necessidades, sobretudo nas Faculdades de Ciências, e só o reforço apreciável de verbas para reagentes e equipamentos pode melhorar esse ensino.
O quadro que segue mostra sucintamente as despesas das duas Faculdades mais importantes:

[Ver tabela de imagem]

Universidade Técnica

100. A vida financeira da Universidade Técnica, na parte relativa a despesas, está consubstanciada no quadro que segue, em contos, que mostra a exiguidade de verbas de material para laboratório:

[Ver tabela de imagem]

Analisando os números nota-se que os gastos se elevaram de 9:735 contos em 1946 para 12:212 contos em 1948, mas que o decréscimo em relação a 1947 foi de 42 contos. Os dois grandes consumidores de verbas, que contudo não parecem exageradas, são os Institutos Superior Técnico e de Agronomia.
O aumento de despesa de um e outro nos últimos três anos foi de cerca de 1:200 contos no primeiro e de 700 no segundo.
No conjunto, a Universidade Técnica gastou em 1948 perto do 2:500 contos a mais do que em 1946.

Ensino técnico

101. Em 1948 as despesas do ensino técnico -industrial e comercial -, sem incluir o ensino superior, totalizaram 33:500 contos e dividiram-se como se menciona no seguinte quadro:

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

O aumento desde 1938 foi muito pequeno - de apenas 13:000 contos.
São bem conhecidas as deficiências deste ensino, tanto no que diz respeito ao pequeno número de escolas, como às suas instalações.
A questão do ensino técnico tem sido debatida nestes pareceres quase todos os anos e torna-se urgente melhorá-lo muito em virtude das necessidades económicas do País. Não pode haver industrialização sem bons operários e capatazes, além de dirigentes, nem é possível maiores rendimentos agrícolas por unidade de superfície sem melhores métodos de cultura.
Quase não há escolas agrícolas. Como se nota no quadro acima transcrito, há três escolas secundárias de agricultura e apenas duas de carácter elementar ou especializado.
A tendência para criar escolas comerciais e industriais e descurar o ensino agrícola vem de longa data, e seria preciso modificar essa tendência, sobretudo se se materializarem os projectos de rega que andam no ar.
O quadro que segue dá o total gasto em 1948 no ensino técnico, incluindo o superior, e compara-o com 1938.

[Ver tabela de imagem]

Vê-se que as escolas agrícolas de Santo Tirso e Alcobaça gastaram 875 contos.
Parece ser necessário estabelecer uma ligação mais íntima entre o Ministério da Economia e o da Educação Nacional no sentido de aproveitarem os elementos que existem num e noutro destes Ministérios, e assim melhorar muito a educação técnica.
As verbas gastas com o ensino agrícola, superior e secundário, são bastante reduzidas. Já foi exposto noutro parecer o que, na opinião do relator, seria natural fazer no sentido de melhorar a cultura agrícola, e não vale a pena aporá repetir o que então se disse. Em 1948 despenderam-se no conjunto as verbas seguintes :

[Ver tabela de imagem]

Há 6 escolas - 1 no ensino superior, 3 no secundário, ou médio, e 2 no prático. No conjunto, gastaram-se 9:160 contos, dos quais cerca de 41 por cento pertencem ao superior. Se for incluída a Escola de Medicina Veterinária, as verbas melhoram um pouco, mas estão muito aquém das necessidades.

Ensino liceal

102. Atingiu 32:228 contos a despesa do ensino liceal, como se mostra no quadro que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

A despesa aumentou bastante entre 1947 e 1948, mas todo ou quase todo o aumento se deu em pessoal, como consequência da reforma recente. É de vantagem reforçar muito as verbas de material, de modo a aproveitar as possibilidades dos novos liceus, que já oferecem, em muitos aspectos, condições para intensificação do ensino experimental.

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Ensino primário

103. A despesa com o ensino primário continua a subir e devem ser interessantes, no ponto de vista de redução do analfabetismo, os resultados do censo de 1950. O pessoal docente do ensino primário oficial elevava-se no ano lectivo de 1947-1948 a 14:080 unidades, das quais apenas 2:742 eram homens, quase todos professores.
O seguinte quadro mostra, por distritos, a distribuição do corpo docente do ensino primário:

[Ver tabela de imagem]

Recenseamento escolar

104. A frequência escolar tem aumentado e tudo leva a crer que os atrasos ainda verificados se atenuarão em breve. Já hoje as escolas são frequentadas quase pela totalidade das crianças em idade escolar. De 101:304 crianças recenseadas em 1948 matricularam-se, possivelmente, 90 por cento; O número de alunos em idade escolar matriculados pela primeira vez na 1.ª classe foi de 143:251, ou 94,65 por cento em relação aos recenseados.
Contudo, há ainda certos distritos onde a percentagem dos matriculados é baixa.
Enquanto que Bragança, Porto e Funchal mostram zelo nas matriculas, a ponto de a percentagem dos matriculados ser maior do que a dos recenseados, os dados de Beja indicam 73,53 por cento. À volta de 90 por cento, ou superior, há Braga (89,36), Castelo Branco (89,18), Coimbra (91,12), Setúbal (92,76), Viseu (92,70), Guarda (95,14), Aveiro (96,90), Horta (97,46), Ponta Delgada (99,17), Angra do Heroísmo (99,80), Viana do Castelo (99,50). Os mais atrasados são, além de Beja, os seguintes : Évora (87,06), Faro (83,55), Portalegre (85,68) e Santarém (86,58).
Nota-se que os distritos do sul são os que mostram menor percentagem das matrículas em relação ao total dos recenseados.
Em todo o caso os números já revelam progresso, comparado com anos anteriores, e se se tiver em conta o funcionamento das escolas regimentais, nas quais se inscreveram em 1948 perto de 22:000 alunos, parece que o problema do analfabetismo está em bom andamento.
O custo do ensino primário oficial atingiu 138:589 contos, mais 40:279 do que em 1938, e ainda aumentou cerca de 3:500 contos em relação a 1947.
Divide-se, por serviços, do modo que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

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É de supor que a despesa do ensino primário tenha de aumentar, dada a remuneração inadequada do pessoal docente. Do mesmo modo parece de aconselhar maior percentagem de professores em relação aos regentes e maior percentagem de homens no ensino em relação a mulheres.
Estes assuntos já foram discutidos em pareceres anteriores e tiveram eco em debates na Assembleia Nacional.

MINISTÉRIO DA ECONOMIA

105. E sobre este Ministério que recai em maior grau a responsabilidade do desenvolvimento material do País. As relações entre o Estado e as actividades agrícolas e industriais estabelecem-se através dos seus órgãos, embora em certos aspectos, sobretudo no que diz respeito a pautas aduaneiras o a transportes, deva haver entre ele e outros íntima comunhão.
Não se pode dizer que a actuação do Ministério da Economia tenha sido feliz. Há que descontar, até certo ponto, as dificuldades mundiais em matéria económica, e às vezes não é fácil fazer valer o ponto de vista nacional. Porém, no que diz respeito à vida interna, principalmente no que se refere à produção, a iniciativa particular luta com obstáculos sérios.
A criação do Ministério não resolveu o problema da unidade económica-da unidade tantas vezes preconizada nestes pareceres. O caso, por exemplo, da energia é, na verdade, sintomático e a sua correlação com a rega e as indústrias, que é fundamental no progresso económico, continua a não ter directriz. Daí resulta que estão prestes a inaugurar-se importantes empreendimentos industriais sem adequado abastecimento de energia, que é a sua base. O que isso representa de prejuízo, em importações escusadas ou rendimentos perdidos, é por si um desperdício sério que fere o todo económico nacional.
Outro exemplo merecedor de reparo é a orientação dada aos acordos bilaterais de comércio. Sabe-se que é altamente deficitária a balança comercial portuguesa, e há vantagens em reduzir ao mínimo o seu déficit. Por virtude de circunstâncias apontadas noutro capítulo e que não valo a pena agora explanar, há conveniência no momento presente em dirigir a exportação e a importação de modo a acentuar o déficit com este ou aquele país. Isto pressupõe uma planificação racional do comércio externo o estabelecimento de condições financeiras adequadas. Pressupõe, além disso, a existência de planos de desenvolvimento económico que assegurem a importação do mercadorias úteis ao fomento nacional, em vez de mercadorias que se consomem som proveito, antes com prejuízo, como, por exemplo, automóveis ou outros bens que possam ser produzidos internamente.
A falta de orientação tendente a aproveitar disponibilidades cambiais em mercadorias de utilidade para o fomento do País leva a prejuízos de natureza económica.
Quando se fizer a história do comércio externo e forem verificados os resultados da política seguida, se acaso há uma política, notar-se-ão anomalias que possivelmente levaram à utilização de auxílios em coisas desnecessárias. E não parece estar longe o momento em que isso se demonstrará à evidência.

106. Quando o País se debate numa crise que ameaça alargar-se seriamente, a ponto de ir ferir, como já feriu até agora, as próprias reservas cambiais, a orientação do Ministério da Economia deveria ser no sentido de intensificar medidas que permitissem o aumento da produção. A tendência entre nós, quando se fala em aumentar a produção, é, em geral, considerar que esse aumento só pode obter-se pela construção de novas fábricas ou cultivo de novos terrenos. A produtividade é uma noção que parece andar arredia de muitos espíritos.
Ora é sabido haver instrumentos produtores que trabalham a muito baixo rendimento, ainda que sejam dotados de bons maquinismos. O acréscimo na produção industrial, em muitos sectores, pode ser obtido, com relativa facilidade, pela melhor utilização de instalações que já existem, e é certamente desperdício de capital, sobretudo no momento em que ele falta para outras coisas, instalar novas fábricas com objectivos idênticos aos de outras que trabalham com fraco rendimento por virtude de insuficiências de capital, organização, técnica ou consumo.
Precisa-se de chegar a um sistema que permita aproveitar ao máximo a capacidade de equipamentos existentes, racionalizando obrigatoriamente o que existe, se isso não puder ser feito de outra forma. Só assim se poderá poupar capital em equipamentos, atingir produção em escala que permita lucros razoáveis com preços que possam suportar concorrência estrangeira.
Neste aspecto, construir mais fábricas quando já exista suficiente capacidade para determinado produto não resolve o problema.
Não é novidade dizer também que o aumento da produção agrícola pode ser obtido pelo uso de melhores processos de cultivo. O aumento de rendimento por unidade de superfície deveria constituir um dos fundamentos de uma política agrícola bem orientada.
Muitas vezes a sede de terra é mais orgulho ou vaidade do que benefício nacional ou até privado.
Um proprietário que não tem o capital necessário para a exploração das terras que possui e faz sacrifícios, inclusivamente hipotecários, para adquirir mais terrenos não cumpre a sua missão social - não tira do que usufrui o rendimento que podia e deveria tirar. Muitas vezes arrenda as propriedades a quem, por sua vez, não tem elementos financeiros para a exploração.
Todos estes fenómenos de natureza social e económica necessitam de ser investigados em pormenor. E é a este Ministério que compete fazê-lo, através da numerosa engrenagem de especialistas que possui, mal aproveitada em certos casos.

107. A iniciativa particular foi no passado, e continua a sê-lo no presente, o mais valioso instrumento de progresso do País. Pode acontecer, e isso é da própria natureza do homem, que haja desvios esporádicos nos objectivos desta ou daquela iniciativa - para especulação, ou até para fins imorais, mas estes desvios são excepção, e não regra.
A iniciativa particular precisa naturalmente de ser auxiliada. A engrenagem do Estado deve ter por fim ajudar, tanto quanto possa, aqueles que procuram desenvolver esta ou aquela actividade, melhorar este ou aquele objectivo. Há casos em que o auxílio pode ser decisivo, e até dele podem derivar interessantes progressos económicos no futuro.
Opor obstáculos ou peias, não dar conselho quando preciso, ou até p auxílio técnico, mata muitas vezes iniciativas interessantes. A estrutura do Ministério da Economia deve ser adaptada tanto quanto possível a esse fim.
Há-de certamente lutar com a incompreensão de mui tos, mas não é motivo para desanimar.
O auxílio técnico, sobretudo na agricultura, mas até na indústria, tem de ser experimental. Tudo o que seja ensinar processos de cultura que se não traduzam em resultados económicos para o proprietário pode ter eficácia num futuro longínquo, mas não a tem num futuro imediato.
O Ministério da Economia já hoje possui um largo quadro de técnicos. Infelizmente muitos, talvez mesmo a maioria, exercem a sua actividade em funções burocráticas, de chefia de repartições ou outras. Conviria descentralizar estas actividades no sentido de extrair delas maior rendimento económico.

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15 DE ABRIL DE 1960 772-(69)

As contas

108. A despesa total do Ministério da Economia aumentou para 139:087 contos em 1948, o que dá um acréscimo de 87:476 em relação a 1938. O índice anda por perto de 270, na base de 1938 = 100. A discriminação da despesa consta do quadro que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

Para compreender melhor o significado dos números do quadro há que ter em conta a reforma do Ministério, operada neste ano. Alguns dos serviços foram extintos, outros fundidos.
O mesmo organismo e o seu sucessor aparecem no quadro; e, logicamente, o custo total deve ser a soma das despesas dos dois.

Serviços agrícolas

109. A despesa desta Direcção-Geral ainda continua a aumentar, atingindo 33:200 contos em 1948, contra 13:736 em 1938.
O aumento este ano deu-se em pessoal (1:055 contos) e encargos (1:161 contos), como se nota no quadro que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

Na verba total dos gastos da Direcção-Geral cabe cerca de 42 por cento a pessoal e perto de 40 por cento a encargos e pagamento de serviços, que em parto diz respeito também a pessoal.
O resto pertence a material.

Pessoal

110. A verba de pessoal, discriminada com certo pormenor, consta do quadro da coluna seguinte, em contos.

[Ver tabela de imagem]

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Tem estado na ordem da administração financeira, nos últimos tempos, como foi largamente comentado atrás, o grande acréscimo de despesa, que incidia quase todo em pessoal. Farte dele foi devido, no último ano, a arranjos nos vencimentos, subvenções e suplementos a que obrigou a guerra. Mas derivou também de aumento de pessoal.
A ideia de subdividir a estrutura do orçamento, na parte relativa a pessoal, em rubricas de quadros, contratados e assalariados, com verbas globais, não deu bons resultados, e já isso se notou.
Conviria rever profundamente as necessidades de pessoal em todos os Ministérios. As exigências orçamentais hão-de obrigar a isso.
Pelo que respeita a esta Direcção-Geral, já foi emitida uma opinião. É certamente possível melhorar as condições do seu trabalho. Estes serviços podiam desempenhar uma grande função na vida económica do País. O seu rendimento técnico repercute-se, ou pode repercutir-se, directamente no aumento da produção agrícola.

Material

111. As verbas gastas em material foram as seguintes:

Contos

Construções e obras novas ............................... 70
Aquisição de semoventes. ................................ 495
Aquisição de móveis. .................................... 614
Conservação de imóveis .................................. 2:180
Conservação de semoventes ............................... 620
Conservação de móveis ................................... 157
Matérias-primas. ........................................ 95
Impressos ............................................... 100
Artigos de expediente ................................... 200
Produtos químicos e material de laboratório ............. 236
Material de embalagens .................................. 35
Total ........................... 4:802

A despesa que sobrecarrega mais esta rubrica é a de conservação de imóveis, e em parte diz respeito às dependências espalhadas pelo País.

Encargos

112. O aumento, de cerca de 1:200 contos, notado em relação a 1947, deu-se em verbas que têm contrapartida nas receitas, como as despesas com a cultura do arroz e o plantio de vinha e também na instalação de estações agrárias e outros organismos. O quadro que segue dá as alterações:

[Ver tabela de imagem]

Receitas

113. As receitas dos Serviços Agrícolas referem-se a plantio de vinha e ao fundo da Direcção-Geral. Foram as seguintes:

[Ver tabela de imagem]

Serviços Pecuários

114. Também foi muito grande o caminho andado por esta Direcção-Geral em matéria de despesas, pois passaram de 7:937 contos em 1938 para 19:020 em 1948- menos 621 contos do que em 1947.
O aumento total em relação a 1938 foi de 11:083 contos.
As variações deram-se na forma indicada no quadro que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

A evolução da despesa acentuou-se bastante na Estação de Fomento Pecuário, na Coudelaria de Alter do Chão e no Posto Zootécnico de Miranda do Douro, os quais formam a divisão dos estabelecimentos zootécnicos. O pessoal assalariado consumiu em 1948 1:928 contos; as despesas de conservação e aproveitamento de material (semoventes) 1:740 contos; e finalmente a comparticipação em receitas, com a correspondente contrapartida no respectivo capitulo, 2:367 coutos, como se verificou nas receitas ordinárias.

Custo dos serviços

115. Nos estabelecimentos zootécnicos as despesas constam do quadro seguinte.

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[Ver tabela de imagem]

Estas despesas não atingiam 1:000 contos em 1938. Pelo aumento notado (5:929 contos), deve prever-se um apreciável desenvolvimento, que conviria estudar.

116. A despesa nos serviços centrais absorve grande parte da dotação total, um pouco menos de metade da de 1938. Reparte-se da forma seguinte:

[Ver tabela de imagem]

Nota-se grande aumento nos encargos. O maior é o das comparticipações em cobranças ou receitas, que totalizou 3:641 contos. Outros de interesse são a Campanha de Fomento Pecuário (300 contos), campanhas profilácticas e epizootias (734 contos), e diversas de menor importância.

Receitas

117. As receitas totais que se cobram por virtude da actuação desta Direcção-Geral já sobem a (5:188 contos, divididos pelas várias rubricas que a seguir se mencionam:

Contos

Fundos especiais dos estabelecimentos zootécnicos ............ 2:367
A transportar.............. 2:367

Contos

Transporte ............... 2:367
Laboratório Central de Patologia Veterinária ............... 776
Diversas receitas .......................................... 2:993
Taxas....................................................... 52
Total ................................................ 6:188

Serviços florestais

118. As despesas e receitas dos serviços florestais e agrícolas, as primeiras das quais têm vindo a aumentar sempre, foram as seguintes nos últimos anos, relacionadas com 1930-1931 e p período anterior à guerra:

[Ver tabela de imagem]

Não tem aumentado muito a receita desde 1930-1931, o que na verdade parece estranho.
Dada a grande área dos pinhais do Estado, parecia que a receita, com os anos e a quebra da moeda, atingiria somas muito maiores do que as que assinalam as contas.
Daí resulta ter havido quase sempre um déficit sensível entre a receita e despesa ordinárias, que este ano foi de 4:344 contos.
A despesa extraordinária também se desenvolveu bastante. Ela constitui a base do repovoamento florestal, que prossegue, embora em menor escala do que se julgava.

119. A despesa ordinária divide-se do modo que segue:

[Ver tabela de imagem]

A verba de pessoal mantém-se dentro das proporções, não parecendo ter sido exagerado, antes pelo contrário, o aumento na rubrica de pessoal desde 1938.

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Plano de povoamento florestal

120. A execução do plano de povoamento florestal prossegue, embora mais devagar do que se imaginava. É um trabalho interessante, de alta repercussão no futuro da economia do País, que precisava de ser acelerado e alargado a terrenos particulares, na medida do possível.
Realiza-se em onze distritos que contêm baldios.
O progresso nas sementeiras e plantações para cada distrito é dado no quadro que segue:

[Ver tabela de imagem]

(a) Inclui o povoamento da inata do Braçal, que foi de 70 hectares até 1941.

O total arborizado, em dunas e serras, desde 1939 até fins de 1948 foi de 37:488 hectares, o que é muito pouco para dez anos. A média por ano anda à roda de 3:700 hectares. A sua diminuição deu-se nos anos de 1946 e 1948.

Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos

121. O decréscimo acentuado nas despesas desta Direcção-Geral é digno de louvor. Passada a euforia das "minas", que requereu trabalho exaustivo nos serviços, estes regressam à normalidade e a despesa ressente-se do facto. Quase todas as verbas se mantêm no nível de 1947, havendo a notar pequenas diminuições no material e encargos e ligeira subida no pessoal, como mostram os números que seguem.

[Ver tabela de imagem]

Para compreensão do significado da despesa indica-se onde ela se deu:

Contos

Serviços centrais .................. 1:894
Circunscrição mineira do norte ..... 295
Serviços geológicos ................ 478
Total .................... 2:667

Além desta importância despenderam-se outras verbas por força das despesas extraordinárias, que se resumem no seguinte:

Contos

Fomento da produção e utilização de
combustíveis nacionais ......... 4:206
Fomento mineiro ................ 8:249
Total ..................... 12:505

Despesas totais

122. Os trabalhos do fomento mineiro têm incidido sobre vários afloramentos. Encontram-se já reconhecidos bastantes minérios de ferro e provaram-se reservas valiosas em alguns dos depósitos. As despesas totais elevam-se a 15:172 contos, discriminados do modo seguinte:

Contos

Despesas ordinárias .......... 2:667

Despesas extraordinárias:

Fomento da produção e utilização de combustíveis .. 4:256
Fomento mineiro ................................... 8:249
12.505
Total ..................... 15:172

Serviços industriais

123. Não é possível fazer este ano a análise circunstanciada da despesa destes serviços, que nas coutas se acham discriminados nas rubricas "Direcção-Geral da Indústria" (3:155 contos) e "Direcção-Geral dos Serviços Industriais" (3:278 contos), ou, ao todo, 6:433 contos.
Será isso feito em outra ocasião, dada a importância que este organismo tem na vida económica do País.
Não pareço, porém, que a verba que lhe é atribuída corresponda por enquanto a essa importância. Contudo o julgamento definitivo do assunto só poderá ser realizado depois de melhor estudo.

Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos

124. Em 1948 esta Direcção-Geral, de criação recente, gastou 2:706 contos, contra 2:633 em 1947. A maior verba é naturalmente a de pessoal.
Parece haver sobreposição de suas atribuições peto menos com duas outras direcções-gerais, uma no Ministério das Obras Públicas, outra no próprio Ministério da Economia. O assunto não é simples de resolver e há-de requerer maior estudo para ajustamento.
A experiência de alguns anos dará ideia da necessidade de alterações, se houver caso para isso.

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Outras dependências

125. Não é possível dar uma resenha completa de todos os organismos pertencentes ao Ministério da Economia, que, alem dos da produção, inclui também os da distribuição e outros órgãos correlacionados. As verbas mais importantes dizem respeito à Intendência-Geral dos Abastecimentos, Direcção-Geral dos Combustíveis, Junta de
Colonização Interna, Conselho Técnico Corporativo e à recente criação da Comissão Superior do Comércio Externo.

Despesas totais

126. As despesas totais do Ministério, incluindo as ordinárias e as extraordinárias, foram as seguintes:

[ver tabela na imagem]

MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES

127. A despesa total do Ministério das Comunicações, recentemente criado, foi de 257:879 contos. Não é possível fazer comparações certas com outro ano que não soja o de 1947, visto haver servidos que em 1938, por exemplo, não existiam. Contudo pode ter-se ideia da evolução de alguns e no quadro seguinte mostram-se os principais:

[ver tabela na imagem]

Não obstante as contas acusarem a diminuição de 10:101 contos em relação a 1947, no porto de Lisboa, ainda o aumento total da despesa foi superior a 16:785 contos.

Caminhos de ferro

128. As condições da exploração ferroviária, que têm piorado bastante nos últimos dois anos, influem consideravelmente nas receitas do Fundo Especial de Caminhos de Ferro, que alimenta as despesas da Direcção-Geral.
O imposto ferroviário diminuiu para 55:000 contos, menos 10:300 que no ano anterior. Daí resultou que no conjunto a receita se arredondasse em 58:000 contos. Havia sido de 69:300 em 1946.
Os números que a representam, sem contar com a receita levantada por conta do empréstimo de 50:000 contos contraído ao abrigo do Decreto n.º 37:022, de 21 de Agosto de 1948, foram os da coluna seguinte.

[ver tabela na imagem]

Os caminhos de ferro são hoje explorados, na sua quase totalidade, pela Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses.
O que se cobrou pela do Norte de Portugal representa débitos atrasados. A liquidação e cobrança foram as que a seguir se mencionam.

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[Ver tabela de imagem]

Esta é uma receita que tende a diminuir - mais um encargo a pesar no futuro sobre o Tesouro.
A evolução do imposto ferroviário desde 1937 consta do quadro que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

Despesas

129. As despesas aumentaram de 67:906 para 70:508 contos, mais 2:602 contos. O aumento deu-se sobretudo na rubrica de material, em virtude da aquisição de material ferroviário para os Caminhos de Ferro do Estado, como se nota nos números do quadro seguinte:

[Ver tabela de imagem]

Material

130. Gastaram-se, em 1948, 55:664 contos em material, que se distribuem por diversas obras e aplicações :

Contos

Estudos ................................. 14
Construções ............................. 1:042
Material circulante ..................... 27:294
Material em depósito .................... 8:886
Oficinas do Barreiro. ................... 66
Obras complementares. ................... 17:149
Estradas do acesso ...................... 132
Obras na linha da Beira Alta. ........... 401
55:484
Outras despesas de material ............. 180
Total ................. 50:664

Encargos

131. Os encargos derivam de empréstimos no Tesouro e na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, e são os que seguem:

[Ver tabela de imagem]

Têm sido sensivelmente os mesmos nos últimos anos.

Serviços de viação

132. A despesa destes serviços atingiu 12:114 contos em 1948, contra 4:155 em 1938 e 11:045 em 1947, como se mostra, discriminadamente, no quadro que segue, em contos.

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[Ver tabela de imagem]

As diferenças para mais, em relação a 1938, deram-se sobretudo no pessoal e em muito menor escala nas outras rubricas. O aumento de tráfego nas estradas é, em grande parte, a causa do grande alargamento nos quadros do pessoal. Nos serviços de viação cabem à fiscalização de trânsito em estradas 8:279 contos.

Aeronáutica civil

133. Com a criação do Ministério das Comunicações concentraram-se os serviços de aeronáutica, com despesa que pode apresentar-se da forma seguinte:

Contos

Direcção-Geral............................................... 6:779
Centros de controle regional da navegação aérea ............. 11:981
Aeroporto de Santa Maria .................................... 6:981
Aeroporto de Lisboa ......................................... 7:715
Aeroporto do Porto .......................................... 526
Total ........................................ 33:982

As verbas mais importantes são, naturalmente, as de pessoal; mas em material, nos centros de controle regional da navegação aérea, gastaram-se 4:000 contos em móveis (equipamento) e também se despenderam elevadas verbas no Aeroporto de Lisboa.

Serviços meteorológicos

134. Os serviços meteorológicos transitaram da Presidência do Conselho para o Ministério das Comunicações e englobam tudo o que diz respeito a meteorologia.
Em 1948 despenderam 8:808 contos, contra 5:290 em 1947 - mais 3:518 contos. A maior parte do acréscimo deu-se no pessoal, mas também houve sensíveis aumentos em material e pagamento de serviços.
A discriminação das verbas é a seguinte para os serviços do continente e das ilhas da Madeira e do Sal:

Contos

Pessoal ............... 3:639
Material. ............. 2:828
Encargos .............. 987
Total ........... 7:454

Para o serviço regional dos Açores a discriminação é como segue:

Contos

Pessoal ............... 924
Material. ............. 123
Encargos .............. 308
Total ............1:355

O serviço meteorológico nacional custou, portanto:

Contos

Serviço no continente, na Madeira e no Sal . 7:454
Serviço regional dos Açores ................ 1:355
Total ....................... 8:809

Despesas totais

135. A despesa total do Ministério das Comunicações em 1948 foi a seguinte:

Contos

Despesas ordinárias .......... 257:879

Despesas extraordinárias:

Aeronáutica civil ..................... 5:999
Aeroportos e aeródromos ............... 57:423
Linhas aéreas ......................... 18:000
Rede telegráfica e telefónica ......... 41:675
Porto de Lisboa ....................... 72:083
Porto de Leixões ...................... 97
195.077
Total ...................... 453:156

Correios, telégrafos e telefones

136. A situação da Administração-Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones não é boa. Manifesta-se por dificuldades de tesouraria e por deficits na exploração, que aumentaram bastante nos últimos dois anos, de 1947 e 1948. Nesses exercícios atingiram, conforme elementos à vista, 51:796 contos.
E evidente que esta situação não deve continuar e que há necessidade de tomar medidas no sentido de os reduzir, ou até de os fazer desaparecer, porque, a continuarem, o encargo recairá sobre o contribuinte.
As importâncias integradas no fundo de reserva em cada ano são bastante volumosas, e até certo ponto isso concorre para que a conta de resultados seja menos delicada, visto o déficit tomar em consideração os elevados fundos de reserva. Apesar de tudo é mister rever a situação, de modo a reduzir despesas, pois as receitas não podem aumentar continuamente. Os resultados financeiros determinados pela diferença entre a receita e a despesa são os que se indicam no quadro que segue, em milhares de contos.

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[Ver tabela de imagem]

Nota-se que há duas verbas importantes na despesa: a de pessoal, que atingiu este ano 187:100 contos, ou 190:406 se for incluído o abano de família, e a de pagamentos de serviços, que se elevou a 106:184 contos. É sobre estas duas verbas que tem de incidir a atenção, se houver propósito de reduzir as despesas no sentido de procurar o equilíbrio financeiro que é indispensável. O acréscimo de receitas pelo aumento de tráfego parece estar fora de possibilidade em tempos mais próximos; o desenvolvimento de receitas pela elevação de taxas não pode ir muito além do que já foi.

Receitas e despesas

137. As receitas e despesas dos correios, telégrafos e telefones tiveram a seguinte evolução desde 1933-1934:

[Ver tabela de imagem]

Tanto as receitas como as despesas quase que triplicaram, mais as despesas do que as receitas, nos últimos quinze ou dezasseis anos.
O considerável desenvolvimento, numas e noutras, deu-se desde o início da guerra, sobretudo a partir de 1941, e noutros relatórios se explicou a razão que, em parte, concorreu para tal.

Receitas

138. As receitas desenvolveram-se muito. Mantiveram-se, porém, quase sempre aquém das despesas - ou, antes, do que foi considerado como despesas de exploração. Assim, a diferença, entre umas e outras, nos anos em causa assumiu o aspecto seguinte:

[Ver tabela de imagem]

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O simples exame das cifrais mostra que a situação piorou consideràvelmente a partia de 1946. A soma dos deficits em 1947 e 1948 andou à roda de 51:800 contos.

139. Viu-se que as receitas ainda aumentaram bastante no exercício de 1948. O acréscimo, muito apreciável em relação ao ano anterior, foi de 18:500 contos. Apesar do declínio contínuo na telegrafia internacional (- 12:641 contos), os serviços postais e outras receitas supriram a deficiência. Não parece, contudo, que haja possibilidade de as alargar muito agora. Os (números, desde 1943, são os que seguem:

[Ver tabela de imagem]

A melhoria nos serviços postais, em relação a, 1947, teve a seguinte origem:

[Ver tabela de imagem]

A venda de selos produziu aumento de receita e este foi derivado do acréscimo nas taxas postais. Apesar disso, o déficit total da. exploração aumentou.
Nas receitas da exploração telegráfica houve uma grande quebra aia telegrafia internacional. As receites desta proveniência desceram de 36:770 contos em 1947 paira 24:129 contos, menos 12:641 contos, o que é muito importante. A telegrafia imperial manteve-se ma casa dos 17:000 contos, com ligeira melhoria.
O serviço telefónico continua a desenvolver-se, não tanto nos ultimatos anos, como seria para esperar. Em todo o caso houve um acréscimo de perto de 8:000 cantos, como se nota aos números que seguem:

[Ver tabela de imagem]

Estas verbas dão indicação da origem das receitas dos correios, telégrafos e telefones.
Para as completar poder-se-ão ver os elementos contidos em publicações dos serviços sobre «movimento total, por onde se verificará facilmente as suas variações e os reflexos que elas tiveram nas contas.
Por último, convém esclarecer a importância que qualquer das explorações indicadas tem uns receitas. O quadro que segue mostra a importância da percentagem de cada uma no conjunto.

[Ver tabela de imagem]

Acentuou-se a subida da exploração postal e a descida da telegrafia, que passou de 20,49 por cento em 1947 para 14,77 em 1948. A telefonia acusa ligeiro progresso.

Despesas

140. As despesas continuam a aumentar muito. Convém por isso vigiá-las cuidadosamente, porque os serviços mão podem continuar a suportar deficits da ordem dos dois últimos anos.
Desde 1938 as despesas, em contos, foram as constantes do quadro seguinte:

[Ver tabela de imagem]

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Nos dois últimos anos foi bastante grande o aumento de pessoal e a isso se deve certamente o acentuado desequilíbrio verificado nesses dois anos. As despesas com pessoal atingiram as cifras seguintes:

[Ver tabela de imagem]

Nota-se que houve progresso muito sensível na despesa entre 1946 e 1947, derivado da execução da reforma dos serviços.
O aumento deu-se especialmente nos vencimentos.
Mas entre 1947 e 1948 o acréscimo continua. Há-de haver razões que o expliquem, embora ele se não possa deduzir das contas.
Convém tomar medidas no sentido de reduzir as verbas tanto quanto possível, porque as receitas dentro em breve não poderão suportar mais acréscimo.
As novas franquias entraram em vigor não fim de 1948, em Novembro, salvo erro, e devem ter influído já na receita.

Material

141. Na rubrica de material, que se manteve, incluem-se a conservação e aproveitamento, as despesas com fórmulas de franquia e material diverso, impressos e expediente.
Nos dois últimos anos os números são os que seguem:

[Ver tabela de imagem]

Encargos

142. Em relação a 1947 deu-se um aumento apreciável nesta rubrica. A despesa total pode subdividir-se em três classes características, dizendo respeito a pagamento do serviços, diversos encargos e encargos de administração. Excluindo nestes últimos o abono de família, as cifras pana os dois últimos anos são as seguintes:

[Ver tabela de imagem]

E realmente uma verba muito alta, até em comparação com os outros capítulos orçamentais, a que diz respeito aos encargos. E por isso convém discriminá-la
com certo pormenor, a fim de ter melhor ideia do conjunto. E o que se faz precisamente no quadro seguinte, em contos:

Pagamento de serviço e diversos encargos

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

Requerem alguns comentários as verbas incluídas nos dois últimos quadros.
Em pagamento de serviços estão incluídos os encarregados de estações e postos, que também comparticipam nas receitas.
Considerada no total, a verba desta comparticipação é pequena, visto não ir além de 2:370 contos em 1948.
A maior despesa de diversos encargos é a dos transportes, que atingiu 35:316 contos em 1948, contra 25:097 no ano anterior.
Não se compreende bem tão grande aumento, que se elevou a mais de 10:000 contos num ano, a não ser talvez por se encontrarem muito baixas as remunerações de transportes feitos por particulares.
A despesa com a renda de casas e outros encargos é realmente muito grande, pois atinge 2:540 contos, como se nota na tabela.
Finalmente, nos encargos de administração há que ter em conta certo número, de verbas que dizem respeito a encargos financeiros.
Foram, como segue, nos últimos dois anos:

[Ver tabela de imagem]

A melhoria proveio de juros e amortizações de empréstimos. O fundo de reserva foi, porém, aumentado substancialmente.
Há-de ver-se adiante o destino das reservas. Deve, contudo, dizer-se já que cerca de um quinto das receitas se destina a encargos financeiros. O exame desta importante rubrica, em pormenor, mostra diferenças em relação a 1947, além das já notadas. Umas são para mais, outras são para menos.
Houve acréscimos sensíveis nas despesas de comunicações, no fundo de reserva e nos encargos de assistência social-esta última, que apareceu de novo o ano passado, acusa já o aumento substancial de 1:142 contos. Parece não ser feliz a ideia de criar novos serviços num momento em que a Administração vive com dificuldades financeiras.
As diminuições deram-se, como já se notou, nos encargos de juros e amortizações (4:750 contos) e nas missões ao estrangeiro (648 contos) e ainda em pensões.

Exploração

143. A exploração é deficitária. O déficit atingiu 28:225 contos, números redondos, e foram ainda os serviços postais a causa de grande desequilíbrio. A tonta dos resultados de exploração consta do quadro que segue, em contos:

Resultados da exploração

[Ver tabela de imagem]

Examinando com certo pormenor a conta de exploração, a despesa total lançada nos serviços do correio atinge 148:983 contos, dos quais 112:600 são de pessoal, 13:231 de material, 1:258 de serviços, 40:612 de encar-

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gos diversos, principalmente transportes, e 19:490 de administração. Os anos económicos findos entraram com 160 contos. Como as receitas do correio apenas atingiram 148:703 contos, o déficit subiu muito.
As coisas, no que diz respeito ao correio, não andam bem. Em 1949 a receita das novas taxas deve ter modificado a couta para melhor, a não ser que se tivesse dado o fenómeno de ter diminuído o correio, o que é maneira de o público voluntariamente contrabalançar aumentos de taxas.
A questão está em procurar reduzir a despesa ao indispensável.
Era inevitável o déficit na telegrafia - o mal é ter ainda aumentado este ano. Ele deriva de acentuada diminuição nas receitas da telegrafia internacional, como se viu acima.
Finalmente, os telefones continuam a amparar a exploração, com um saldo de mais de 15:900 contos em 1948.
A receita dos telefones já ultrapassou 85:000 contos e promete melhorar ainda.

Fundos de reserva

143. O fundo de 1.º estabelecimento era de 1:660 contos em 31 de Dezembro de 1948 e o de reserva atingia 175:398 contos na mesma data.
Este último achava-se representado na forma indicada no quadro da coluna seguinte.

Empréstimos

144. A Administração devia, além de outras pequenas importâncias, em fins de Dezembro de 1948 as verbas que seguem, em contos:

À Caixa Geral de Depósitos, Crédito e
Previdência (conta caucionada) .......... 50:276
Tesouro Público (Lei n.º 1:959) ......... 243:368
Total ............. 293:644

Todos os anos se levam quantias relativamente elevadas à conta de empréstimos, como se viu atrás, e num parecer anterior se verificou a forte amortização operada em virtude de lucros excepcionais.
Conviria reduzir o ritmo de gastos por conta de empréstimos. Desde 1938 o que se despendeu foi o seguinte:

[Ver tabela de imagem]

Sintetizando este quadro obtém-se a seguinte despesa feita pelos CTT por conta de empréstimos desde 1938:

Instalações telegráficas e telefónicas .. 246:611
Edificações ............................. 73:87
Outras utilizações ...................... 21:452
Total .................341:936

Instalações

145. O quadro que segue mostra o custo dos edifícios construídos pêlos correios, telégrafos e telefones:

Importâncias despendidas pela Comissão dos Novos Edifícios para os CTT, em execução da Lei n.º 1:959

(Em escudos)

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

Porto de Lisboa

146. O porto de Lisboa tem sido nos últimos anos um grande consumidor de dotações orçamentais, em virtude da execução de um largo plano de melhoramentos estudados há anos e agora em. plena execução. Esse plano é financiado por excessos de receitas do próprio porto e ma maior parte por couta de empréstimos contraídos no Tesouro. Em diversos comentários dos pareceres das Contas, antes de ter sido iniciado o plano de melhoramentos, foi posta em evidência a necessidade de apetrechar convenientemente o primeiro porto português, por onde se escoa a quase totalidade das mercadorias importadas pelo País. E defendeu-se por várias vezes o princípio de que mais valia Concentrar verbas nos dois principais portos nacionais, sobretudo no de Lisboa, do que dispersá-las.
Considerou-se também que a principal obra a realizar seria a do complemento da secção que vai da Rocha do Conde de Óbidos a Santa Apolónia.
A despesa a fazer, compensada pelos terrenos conquistados ao Tejo, seria naturalmente elevada, dadas as condições geológicas. Mas permitiria a concentração de tráfego e até melhoria agradável da estética das margens do rio, além de terrenos para a concentração dos serviços públicos.
A necessidade, porém, mais urgente do porto, agora realizada em parte, era a do seu apetrechamento, demorado pela guerra, e já em 1948 se compraram máquinas e instrumentos que devem ter melhorado as operações de carga e descarga e se construíram abrigos e armazéns, que, além de concorrerem substancialmente para as receitas, constituíam uma necessidade.
Não foi ainda iniciada a obra ido complemento da 1.ª secção, a que se aludiu acima. Preferiu-se efectuar as obras de jusante, como a regularização da margem direita entre Cabo Ruivo e Beirolas, e manteve-se a construção da doca de pesca do Bom Sucesso, que, como aqui se mostrou já, constitui um erro sério, hoje sem remédio. Se o erário dispusesse de fundos e as condições financeiras do porto o permitissem, ainda se compreenderia uma regularização das praias de jusante.
Mas construir lá um porto de pesca, depois dos cuidados havidos para transformar os subúrbios ocidentais em zona de turismo, é que parece contra a razão.
O Governo persistiu na ideia, apesar dos votos e juízos contrários expostos em pareceres do corpo legislativo. E dinheiro que podia ter sido melhor utilizado em porto de pesca construído em local próprio, como aqui se sugeriu, ou em qualquer outra abra reprodutiva.
No momento actual o caso tem importância, dadas as dificuldades financeiras e as exigências de obras em curso.
E já não será possível agora tratai da obra anais interessante, tanto no ponto de vista económico como estético, que é a da secção entre a Rocha e Santa Apolónia.

Receitas

147. Em 1948 as receitas do porto de Lisboa somaram 168:486 contos, imas, em contrário de anos anteriores, as receitas extraordinárias quase atingiram as ordinárias. As cifras foram as seguintes:

Receitas ordinárias ............. 86:339
Receitas extraordinárias ........ 82:147
Total ......... 168:486

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Receitas ordinárias

148. São estas receitas que interessam à conta de exploração e é através delas que parte das obras do porto vem geado efectuada. Serão elas que, em última análise, pagarão as obras.
As receitas ordinárias desenvolveram-se bastante em relação a 1938, como aliás era de esperar em virtude da desvalorização do escudo. São superiores às de 1946, mas inferiores às de 1947. A diminuição foi importante, visto ter atingido cerca de 11:000 contos. O quadro seguinte exprime as alterações havidas em diversos anos:

[Ver tabela de imagem]

A maior depreciação deu-se nos (rendimentos dos entrepostos, mas nas restantes rubricas houve quebras variáveis, embora de menor importância, com excepção das rendas das oficinas, que haviam atingido 11:727 contos em 1947 e não passaram de 7:987 em 1948.
A tendência continua a ser para a baixa, porque o tráfego junto de Lisboa, como outros instrumentos de comunicações, depende muito da situação económica do País. As exportações tendem a declinar e não parece que nos anos mais próximos haja possibilidade de manter o ri tino de importações que prevaleceu nos últimos tempos.
Convém vigiar as receitas se for mantida a ideia de continuarem as obras em curso. Ainda, como se verificará adiante, se desviaram (paira fundos cerca de 16:000 contos, dos quais 11:600 para o de melhoramentos.
Deve notar-se aqui que o plano de obras em execução não traz melhoria proporcional ou correspondente ao seu custo. O progresso na conta de ganhos e perdas deve ser procurado mais na redução de despesas do que no aumento de receitas.

Receitas extraordinárias

149. O total das receitas extraordinárias subiu a 82:147 contos, mais 29:630 do que no ano passado, mas isso foi devido a empréstimos contraídos no Tesouro e no Fundo de seguros. A dívida do porto, que era de (i5:095 contos em 1947, subiu para 114:011 em fins de 1948. A receita extraordinária teve a seguinte origem:

[Ver tabela de imagem]

As receitas para o plano, de melhoramentos vieram em parte do Estado, como se explicou aio parecer de 1947, quer sob a forma de subsídio, quer de empréstimo.
As outras derivaram de resultados de exploração através dos Fundos de melhoramentos e de seguros. Quer dizer: as receitas extraordinárias, com aplicações taxativas, usam-se para aumentos no património e provêm de lucros, subsídios ou empréstimos. Não influem por isso na conta de exploração.

Despesas

150. As despesas totais vêm a aumentar e atingiram 366:879 contos em 1948, assim divididas:

[Ver tabela de imagem]

Apesar do decréscimo apreciável nas despesas ordinárias - e ver-se-á adiante o motivo -, a despesa total aumentou muito.
Esse aumento foi ùnicamente devido às despesas extraordinárias, quer dizer: aos gastos nas obras em execução.

Despesas ordinárias

151. O desenvolvimento da despesa ordinária desde 1939 é dado no quadro seguinte:

[Ver tabela de imagem]

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Só houve maior valia ma despesa de pessoal, que tem crescido sempre desde 193S, como aliás era de .esperar, pelo menos, até 1947. Ainda em relação a este período se deu aumento de cerca de 2:500 contos.
A diminuição mais sensível teve lugar nos diversos encargos e em material, pelas razões que adiante serão, convenientemente analisadas. O aumento no pessoal contrabalançou-a em parte.

Pagamento de serviços e diversos encargos

152. Nestas rubricas incluem-se variadas verbas, algumas de grande influência no progresso do porto, como o Fundo de melhoramentos e outras. O decréscimo de 2:850 contos em pagamento de serviços proveio de menores despesas de tráfego e de outras rubricas, como se nota no quadro seguinte, que as define:

[Ver tabela de imagem]

Na verdade, é através deste capítulo que se pode avaliar da conta de exploração de porto de Lisboa pelo quantitativo das verbas levadas aos respectivos fundos. Neste amo totalizaram 16:103 contos. Mas, como houve um desequilíbrio entre receitas e despesas ordinárias, o lucro real deve ser menor.

Despesas extraordinárias

153. As despesas extraordinárias somaram 77:083 contos, divididos do modo que segue:

Contos

Obras marítimas e terrestres ...... 53:136
Apetrechamento portuário .......... 23:947
Total ................ 77:083

Para dar ideia da obra que está a ser realizada no porto de Lisboa publicam-se a seguir alguns dados das quantias gastas por força do plano de melhoramentos:

Despesas feitas através do plano de melhoramentos

[Ver tabela de imagem]

A verba de 131:639 contos representa as duas maiores utilizações. São as seguintes:

[Ver tabela de imagem]

Agora, que passou o período de euforia que caracterizou os gastos públicos, principalmente nos últimos dois amos, como se nota noutro capítulo deste parecer, terá de descer bastante a verba a gastar pelo porto de Lisboa.
Conviria que a sua administração procurasse efectivar, com as verbas disponíveis, aquelas obras que possam ter mais utilidade económica. O projecto da doca de Pedrouços, condenado nestes pareceres, se não estivesse tão adiantado, poderia talvez ser suspenso, visto demandar quantias muito grandes, e, a ser levado ao ter-mo, consumirá verbas necessárias noutros fins. O projecto do complemento da 1.ª secção, de que tanto se falou e tão interessante é, terá já agora de aguardar melhores tempos.
Parece, por outro lado, necessário rever as obras projectadas ou em curso do lado Cabo Ruivo-Beirolas - consumidoras de verbas em larga escala - e há-de ser necessário também retardar os planos da margem esquerda.

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Edifícios

154. Gastaram-se em 1948, em edifícios construídos pela Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais e Administração-Geral do Porto de Lisboa, verbas que atingiram 7:339 contos.
Por conta do plano de melhoramentos o gasto foi de 4:759 contos, sendo G15 ainda para gares marítimas e 4:144 para armazéns.
A verba total decompõe-se em:

Contos

Estações marítimas ............ 615
Armazéns ...................... 4.294
Abrigos de mercadorias ........ 2:430
Total ........... 7:339

Tanto no aspecto de apetrechamento como no de armazém a Administração tem feito o possível para anular grandes deficiências de que o porto sofria.
Nos dois últimos anos despenderam-se quantias avultadas e as condições de carga e descarga melhoraram bastante.

Empréstimos

155. Os melhoramentos que acabam de ser sucintamente apontados pesam já hoje sobre a situação financeira do porto.
O Estado tem auxiliado a Administração com facilidades financeiras e continuaria certamente a auxiliá-la se não fossem as suas próprias dificuldades e as exigências de execução de um grande programa económico de reprodução em prazo curto, que é devido há muito tempo e é exigido pela situação interna.
O porto tem recursos para liquidar os encargos financeiras desde que o Estado não comparticipe nos lucros da exploração, como faz com outros organismos. E natural, além disso, que melhor apetrechamento traga economias na exploração.
A dívida subia a 114:011 contos em 31 de Dezembro de 1948 e dividia-se assim:

[Ver tabela de imagem]

Vê-se quê o aumento foi muito grande em 1948. Os seus encargos, inscritos na rubrica a Pagamento de serviços e diversos encargos, atingiram 1:569 contos e devem subir nos próximos anos.

56. O relator das contas, como tem feito nos últimos anos, chama novamente a atenção do porto para a sua maior obra, que é o complemento da secção central. Ela tem aspectos de grande interesse portuário e citadino. Dadas as dificuldades próximas já conhecidas, valeria a pena fazer o estudo de um novo arranjo do plano de melhoramentos, no sentido de adiar obras de menor importância ou que não dêem benefícios imediatos e reservar a sua construção para um futuro mais ou menos longínquo. Poupar-se-iam verbas e talvez fosse possível encarar o início da obra principal.
Também o porto deve estudar um porto de pesca fora da área da cidade, porque o que se pretende construir no Bom Sucesso nunca corresponderá às necessidades, e mais cedo ou mais tarde terá de ser abandonado, como, aliás, se fez com instalações vizinhas de outro tipo.
A doca servirá naturalmente para outros fins que não interessarão directamente à pesca.

RECEITAS E DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS

1. O exame cuidadoso e ponderado do capítulo das despesas extraordinárias permite avaliar, em relativo nível de grandeza, a obra realizada nos últimos quinze anos. É através deste capítulo que se pagam as despesas de obras novas, com algumas excepções de menor importância no Ministério das Obras Públicas - e tudo - ou parte importante do que se fez ou despendeu excepcionalmente na guerra ou em obras de natureza social e económica ou constituiu novas aquisições quase sempre nele se inscreveu.
Não se supôs a princípio que este capítulo tomasse tal desenvolvimento, nem se imaginou que as despesas extraordinárias pudessem atingir, como atingiram em 1947, cerca de 2.254:000 contos. Se for levado em conta que a despesa total do Estado (naquele ano somou 5.694:000 contos, ver-se-á logo que no conjunto a despesa extraordinária se aproximou de 40 por cento.
Em 1948 os gastos totais ainda subiram para 6.761:000 coutos, mas a despesa extraordinária diminuiu ligeiramente, visto ter sido de 1.954:000 - menos 300:000

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contos. Neste ano, no conjunto, a percentagem da despesa desceu para 34 por cento.
O considerável desenvolvimento da despesa extraordinária merece uma explicação minuciosa, não só porque os recursos extraordinários têm implicação limitada por disposição constitucional (artigo 67.º da Constituição), mas porque é através dela que melhor se pode aquilatar do critério governativo, e por consequência determinar a sua utilidade.
Ao todo o Estado gastou desde 1928-1929 até fins de 1943 por força do capítulo de despesas extraordinárias a soma de 15.211:000 contos, num total de despesas de um pouco menos de 60 milhões. Ou, postas as coisas de outro modo, 25 por cento do total das despesas gastas desde 1928-1929 foram extraordinárias.
Deve, porém, fazer-se a observação de que, expressas em serviços, obras ou bens de consumo ou- produção, as despesas de cada ano não se correspondem, e por esse motivo não é possível comparar, por exemplo, a despesa de 1948 com a de 1938, dadas as variações do índice dos preços.
Para melhor compreensão do seu significado, até neste aspecto, dá-se a seguir o total gasto até ao início da guerra e depois:

[Ver tabela de imagem]

Assim cerca de 83 por cento do total de despesas extraordinárias se gastaram a partir de 1939.
Convém deixá-las arquivadas neste documento, dada a sua importância, desde 1928, ano a ano. Pelo quadro que adiante se transcreve verificar-se-á a sua subida gradual a partir de 1939.

Milhares de contos

[Ver tabela de imagem]

Estes números necessitam de alguns comentários, que serão feitos adiante. Então se introduzirão certas correcções tendentes a extrair em cada ano, do conjunto, o que foi utilizado no pagamento de empréstimos.
Por agora basta assinalar o facto e mancar que é na verdade uma soma muito elevada aquela que foi preciso obter para pagar despesas extraordinárias.

RECEITAS EXTRAORDINÁRIAS

2. A pergunta que ocorre, ao tomar conhecimento do somatório das despesas extraordinárias, é a da origem das receitas que as liquidaram.
Vejamos o total das receitas extraordinárias que entraram no erário público desde 1928-1929:

Milhares de contos

[Ver tabela de imagem]

3. É interessante comparar os dois quadros sintetizados atrás. Enquanto que até 1939 as receitas extraordinárias (2:597,4 mil contos) quase cobriram as despesas extraordinárias, entre 1939 e 1948 as receitas extraordinárias (6:860,5 mil contos) estiveram muito aquém das despesas extraordinárias (12:596,4 mil contos).
Isto significa que no último período apenas se cobraram como receitas extraordinárias cerca de 54 por cento do que se gastou em despesas extraordinárias. A guerra modificou neste aspecto o sentido da vida financeira.
As cautelas na gestão das contas públicas - despender por despesas extraordinárias mais ou menos aquilo que se recebia por idênticas receitas era a regra - desapareceram em grande parte.
Foi-se muito além em centos anos.
Em 1943, por exemplo, receberam-se 779:000 contos por força das receitas extraordinárias e gastaram-se 1.717:000 contos na conta de despesas.

4. As receitas extraordinárias têm diversas origens. As mais volumosas são:
a) O produto de empréstimos, quer se trate do produto da venda de títulos, quer de outros;
b) Verbas desviadas de saldos de anos económicos findos;
c) Diversas receitas, como amoedação, venda de materiais e outras.

A partir de 1939 a grande fonte de receitas extraordinárias passou a ser o produto de empréstimos, como se nota no quadro que segue, em milhares de contos.

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Receitas e despesas extraordinárias relacionadas com o produto de empréstimos

(Mil contos)

[Ver tabela de imagem]

(a) 613,8 serviram para reembolso do empréstimos. A despesa efectiva por conta de empréstimos foi de 137,1.

Os três últimos anos marcam um período de extraordinária aplicação de empréstimos. Nestes três anos, já depois da guerra, despenderam-se perto de 6 milhões de contos pelo capítulo das despesas extraordinárias, dos quais bem mais de metade (3.257:000) eram empréstimos.
Juntando o que por força de excessos de receitas ordinárias sobre idênticas despesas se gastou, atinge-se grande cifra de 5:496:000 contos.
Foram 5,5 milhões de contos lançados no mercado, concentradamente, para os mais variados fiais. Este período de euforia marca, por si só, uma época e explica os fenómenos da inflação.
A política seguida não podia durar - a própria (grandeza das cifras, na relatividade do meio, a condenava. Ela teve o seu natural fim já em 1949, no período de intensa deflação e desgaste de reservas monetárias, tanto na tesouraria como no mercado.

Analisar-se-á adiante a aplicação das grandes despesas extraordinárias (Realizadas em 1946, 1947 e 1948, sobretudo nos dois últimos anos, e ver-se-á que algumas são recuperáveis. Também se hão-de estudar os seus possíveis reflexos na economia nacional, na urgente necessidade de melhorar consideràvelmente os instrumentos de reprodução económica e ver-se-á que, considerado o conjunto, eles não foram, nem podiam ser, aquilo que seria de esperar com o dispêndio de tão largas somas.
Nota-se que os recursos extraordinários do Tesouro provieram principalmente de duas fontes: os empréstimos e os excessos de receitas sobre as despesas ordinárias.
Vale a pena determinar a evolução da política financeira para mostrar que ela se modificou sensivelmente a partir de 1941. Notar-se-á no quadro que segue a progressiva influência dos empréstimos no conjunto das despesas extraordinárias a partir de 1937:

Percentagens de receitas extraordinárias, por origens, que pagaram o total das despesas extraordinárias

[Ver tabela de imagem]

5. Merece um ligeiro comentário este quadro.
Até 1941 a grande fonte de receitas extraordinárias era o fundo do saldo de anos económicos findos. Andava entre 60 e 70 por cento a percentagem do total. Quer dizer: as despesas extraordinárias liquidavam-se em cerca de dois terços do total por força das receitas ordinárias, ou, chamemos-lhe outro nome, para maior clareza, por força de despesas ordinárias economizadas.

A partir de 1942 a percentagem de pagamentos de despesas extraordinárias por força de excessos de receitas subiu muito. Eram as receitas ordinárias que as pagavam; mas os empréstimos, que até ali haviam in-

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tervindo muito levemente, começaram a ser mobilizados em maior volume, até atingir perto de dois terços do total em 1948.

6. Mostra-se assim que era inevitável uma modificação brusca na política financeira.
Com efeito, a época de abundância de disponibilidades e de crédito (permitira durante algum tempo a emissão de empréstimos a taxas muito favoráveis.
O capital assim realizado, que ainda poderia ter sido maior, ficara em conta de tesouraria, à espera de aplicação. Uma vez voltada a normalidade, findaria a época de dinheiro barato, ou, ainda que continuasse, o simples facto de ser possível vida anais normal mia importação requereria avultados capitais na actividade (privada e assim dificultaria inovas emissões. Quer isto dizer que a política de sustentar a actividade publica através das despesas extraordinárias estava irremediavelmente condenada a afrouxar - a afrouxar logo que se extinguissem as disponibilidades existentes no Tesouro, provenientes de empréstimos, e que, como se viu atrás, chegaram a atingir perto de 4 milhões de cambos.
Diversas vezes estes factos foram trazidos à superfície nestes pareceres - e o conselho dado era sempre o de desviar paira despesas reprodutivas, imediatamente reprodutivas, tanto quanto possível, essas disponibilidades.

7. Agora, que elas se extinguiram, já não é possível manter os gastos dos últimos anos. As despesas extraordinárias terão de regressar a ,um nível muito baixo a um nível próximo do de 1940, se até isso for possível. Os meios financeiros para as pagar hão-de vir quase todos das receitas ordinárias. Há-de ser o excesso destas sobre despesas idênticas que as há-de liquidar, até que chegue a oportunidade de poder emitir internamente empréstimos que possam na verdade ser usados em obras reprodutivas, de real fomento económico.

8. Ainda a este respeito se deve fazer uma reserva.
Os excessos de receitas ordinárias sobre idênticas despesas provêm agora mais de excessos de cobrança sobre estimativas do que de economias nas despesas ordinárias. Quase todos os anos isso acontece - o que prova serem conservadoras as estimativas das receitas.
Ora as condições económicas no próximo futuro não se apresentam muito favoráveis em matéria fiscal.
Há evidentemente ainda a possibilidade de aumento substancial mós impostos indirectos pela actualização das pautas alfandegárias. Se essa actualização tivesse sido feita em tempo oportuno, como aliás se sugeriu, ter-se-iam economizado cambiais que hoje tanta falta fazem e mão haveria a lamentar desgaste inútil de reservas monetárias.
O acréscimo de 200:000 ou 300:000 contos que pode trazer uma actualização poderia contrabalançar a diminuição que vai ser notada nas importações e no afrouxamento do trabalho nacional.
Mas de tudo não resultarão verbas orçamentais consideradas de importância no conjunto.

Receitas extraordinárias orçamentadas e cobradas

9. Ainda este ano o que se orçamentou para receitas extraordinárias foi muito além do que efectivamente se cobrou. Houve entre as duas espécies de receitas uma diferença que atinge 968:000 contos.
A diferença para menos nas cobranças residiu, essencialmente, nos empréstimos, mas também foi acentuada nos saldos.
Os números são os seguintes:

Receitas extraordinárias

[Ver tabela de imagem]

Nem por força de amoedação nem de outras origens houve cobranças. Quer dizer, as receitas extraordinárias limitaram-se apenas a empréstimos e saldos de anos económicos findos, como se verifica no quadro seguinte:

[Ver tabela de imagem]

Este fenómeno não é novo nas finanças portuguesas. Já vem de trás, como se havia notado acima quando se considerou a origem das receitas extraordinárias desde 1928-1929.

Despesas orçamentadas e cobradas

10. Também continua a notar-se a discrepância entre a despesa extraordinária orçamentada e a cobrada, mas em muito menor grau, porque pouco menos é do que 348:000 contos.
Os totais que exprimem, por Ministérios, o que se cobrou e pagou são os que vão mencionados no quadro seguinte.

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[Ver tabela de imagem]

Há-de ver-se adiante, por cada departamento público, em que se empregaram as despesas extraordinárias.
O Ministério das Obras Públicas foi o maior consumidor dessas verbas, apesar do desdobramento operado e da transferência de somas importantes para o das Comunicações.
Como já acima se mencionou, a origem das receitas que liquidaram as despesas extraordinárias foi a seguinte:

[Ver tabela de imagem]

A diminuição dos excessos de receitas ordinárias foi acentuada. Tinha sido de 795:000 e 823:000 contos, respectivamente, em 1946 e 1947. Por outro lado, dado o nível das despesas ordinárias, foi indispensável reforçar a receita proveniente de saldos que aumentou em relação aqueles dois anos.

DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS

11. A discriminação das despesas extraordinárias é indubitavelmente a melhor maneira de fazer ideia do critério do Governo no que diz respeito à política económica que porventura siga.
Em 1948 o total das despesas públicas atingiu 5.761:207 contos, dos quais 1.224:400 provieram de empréstimos, ou cerca de 21 por cento. Houve, por conseguinte, uma ligeira descida na percentagem das despesas extraordinárias, que se há-de acentuar muito nos próximos anos.
O quadro que segue mostra as despesas extraordinárias, por Ministérios e aplicações:

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

12. O Ministério das Finanças, no qual as contas indicam uma despesa extraordinária muito grande, actua mais como distribuidor de verbas do que outra coisa. A única cifra que pertence aos serviços próprios é a do Instituto Geográfico e Cadastral. As outras são participações ou empréstimos reembolsáveis.
Continua a diminuir a despesa extraordinária do Ministério da Guerra, mas aumentou a da Marinha.
Houve ligeira descida no Ministério das Obras Públicas, em virtude da transferência de grandes consumidores de verbas para o das Comunicações, como os portos, os correios, telégrafos e telefones e os aeródromos e aeroportos. Também o Ministério da Economia continua a aumentar a sua despesa extraordinária.

Distribuição das despesas extraordinárias

13. Não é fácil, como já se disse noutro parecer, fazer uma destrinça exacta das despesas extraordinárias.
Os critérios sobre o lugar que compete a cada uma, conforme sua aplicação, diferem.
Para efeitos de continuidade adopta-se ainda o critério seguido em outros anos, mas analisar-se-ão adiante de modo a esclarecer convenientemente este assunto.
A tabela da página seguinte indica onde e como se gastaram as despesas extraordinárias.

[Ver tabela de imagem]

A descida de 300:000 contos nas despesas extraordinárias repartiu-se por quase todas as aplicações, com excepção de empréstimos.
A importância destes aumentou em virtude de terem sido levantados 451:250 contos do empréstimo de l milhão de contos feito à colónia de Moçambique.
Agrupando as cifras, por aplicações, encontra-se o quadro que segue, em contos:

[Ver tabela de imagem]

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Nota-se, como atrás se disse, unia acentuada diminuição em alguns agrupamentos.
Na Defesa nacional incluem-se as verbas gastas pelo Ministério da Guerra no rearmamento (242:710 contos), pelo Ministério da Marinha (206:184 contos), e outras de menor importância, consequência da guerra, como Colónias (49:829 contos) e Negócios Estrangeiros (2:330 contos).
Nas Comunicações o que mais pesa ainda são os portos, agora o de Lisboa, as estradas no continente e ilhas, os aeródromos e aeroportos e os correios, telégrafos e telefones.
No Fomento rural pesam a hidráulica agrícola, a colonização interna e os melhoramentos rurais, estes últimos com perto de 00:000 contos como devido, além do povoamento florestal.
O Estado em 1948 comparticipou na Empresa Hidroeléctrica do Zêzere com 20:000 contos e na do Revué, em Moçambique, com 6:000, a Um de 17:500 na Companhia Nacional de Electricidade. Tudo faz paute da rubrica Fomento industrial.
As despesas com edifícios continuam a ser bastante grandes. Nelas se incluíram casas económicas, liceus, escolas, hospitais, construções prisionais e outras.
Os Empréstimos dizem respeito à província de Moçambique e à renovação da marinha mercante. São ambos reembolsáveis.
Nas Obras diversas estão incluídos, além do reapetrechamento de hospitais civis, diversos subsídios e dotações extraordinárias.

Análise das despesas extraordinárias

14. O exame das despesas extraordinárias e a sua discriminação permite ainda fazer novos agrupamentos, conforme o grau de utilização e, por consequência, de oportunidade.
Uma das questões que se poderiam, levantar seria o significado de obras, que na verdade são obras de fomento: fomento económico, cultural e outros.
O dinheiro gasto em portos, por exemplo, tem também objectivos económicos; o que se gasta em institutos técnicos do mesmo modo os tem, e talvez em bem maior grau que os pontos.
Também o que se gasta em casas económicas, quando habitadas por operários ou empregados em organismos produtores, tem objectivos económicos.
É assim aleatória qualquer classificação baseada na noção de fomento, sobretudo, como no caso da auto-estrada ou do empréstimo à província de Moçambique, no qual se podem incluir verbas não relacionadas ou pouco relacionadas com o que deve ser considerado fomento económico.
Tem importância este assunto, em virtude de os preceitos constitucionais definirem claramente o que pode ser pago por empréstimos.
Como se verificou atrás, gastaram-se desde 1928-1929 até 31 de Dezembro de 1948, por despesas extraordinárias, 15.211:000 contos, que foram pagos por empréstimos, por saldos de anos económicos findos, por diversas receitas extraordinárias e pelo excesso das receitas ordinárias sobre idênticas despesas.
As receitas extraordinárias atingiram 9.628:937 contos, assim divididos:

Contos

Empréstimos ......................... 619:635
Venda de títulos . .................. 5.894:146
Saldos de anos económicos findos .... 2.284:991
Diversos ............................ 830:165
Total ................... 9.638:937

Quer dizer: a origem das receitas extraordinárias, em percentagens, foi a seguinte:

Contos

Empréstimos ............................ 67,7
Saldos de anos económicos findos ....... 23,7
Diversos ............................... 8,6
Total ............ 100

A percentagem da contribuição de empréstimos para as receitas extraordinárias aumentou de 63,7 em 1947 para 67,7 em 1948, tendo diminuído as restantes.
Vem isto confirmar o que atrás se escreveu sobre a importância dos empréstimos nas despesas extraordinárias e a necessidade de as reduzir fortemente logo que elas diminuam ou, para melhor dizer, logo que se extingam as disponibilidades em depósito na tesouraria.

Aplicação de empréstimos

15. Em 1948 gastaram-se 1.224:400 contos de receitas provenientes de empréstimos, que derivaram da venda de títulos e de outra origem.
O quadro que segue mostra a utilização desses empréstimos:

[Ver tabela de imagem]

Os números mostram que já se incluem exclusivamente na conta de empréstimos despesas que, como adiante se verificará, se liquidavam quase sempre por força de excessos de receitas e outras.
O ano passado comentou-se com certo (pormenor esta política, que não parece ser justificada em certos casos, ou, antes, que parece ser justificada apenas (pela ânsia de fazer obras que tudo indica poderem ser adiadas.

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Se as verbas forem examinadas com cuidado, poderá notar-se, num critério rigorista e lógico, que deveriam reduzir-se, pelo menos nos financiamentos por empréstimos, as despesas de certas aplicações. Se não havia outros meios de as executar, seria mais vantajoso alterar o ritmo da sua realização.

Excessos de receitas ordinárias sobre idênticas despesas

16. O excesso de receitas sobre despesas ordinárias foi de 621,7 anilhares de contos, mais o saldo de contas.
Essas receitas, em 1948, serviram para pagar as despesas extraordinárias, que a seguir se mencionam:

Coutos

[Ver tabela de imagem]

Nota-se terem sido pagas por força dos excessos de receitas sobre despesas ordinárias grande número de obras e aplicações, entre as quais se encontra a Base Naval de Lisboa e outras.
As despesas com o Exército e Marinha, incluindo rearmamento, foram também liquidadas por estes excessos.
Embora em alguns casos se tratasse de compras de equipamentos ou de construção de imóveis ou ainda de trabalhos que melhoram a vida económica, muitas das verbas cabiam dentro do orçamento das despesas ordinárias.

Saldos de anos económicos findos

17. Apenas se pagaram por força de saldos de anos económicos findos as seguintes despesas:

Contos

Edifícios para hospitais escolares ....... 45:000
Cidade Universitária de Coimbra .......... 13:371
Melhoramentos rurais ..................... 49:961
Total .......................... 108:335

Origem das receitas que liquidaram as despesas extraordinárias

18. Todos os anos se publicam, no que toca a cada obra ou aplicação, a origem dos fundos que as liquidaram. Por essa origem se verifica, sinteticamente, o critério seguido na distribuição das receitas, quer elas provenham de empréstimos, quer de saldos de anos económicos findos, quer ainda de excessos de receitas.
Deixam-se este ano arquivados, para certo número de aplicações, os números totais corrigidos, no sentido de incluir anos não considerados anteriormente.
Pelo quadro que segue se verificará como se pagaram algumas das realizações mais importantes desde a reconstituição financeira.

[Ver tabela de imagem]

De um total de 10.211:000 contos de despesas extraordinárias, cerca de 7 milhões foram utilizados pelas forças armadas ou serviram para liquidar despesas excepcionais de guerra.
E uma quantia bastante alta para as possibilidades financeiras do País.
Desta elevada soma apenas 618:000 contos tiveram origem em empréstimos.

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SALDOS DE CONTAS

1. Os saldos de gerência desde o início da reorganização financeira, em 1928-1929, atingiram 2.884:209 contos. Tom sido em grande parte utilizados neste longo período, que vem daquela data, e todos os anos se anotam nestes pareceres o quantitativo das verbas gastas e o seu destino.
Restam ainda disponíveis, em operações de tesouraria, cerca de 600:000 contos.
O quadro que segue mostra, desde o início da reforma financeira, por gerências e anos económicos, os saldos realizados, as despesas por conta deles e os saldos disponíveis :

[Ver tabela de imagem]

Nota - Este quadro não inclui uma reposição de 1:200 contos feita em 1938 na conta dos saldos.

De um total de 2.884:000 contos de saldos realizados desde 1928-1929, em vinte anos portanto, pertencem aos primeiros dez anos, até 1938, inclusive, 1.829:000, ou cerca de 63 por cento. No período de guerra os saldos realizados somaram apenas 37 por cento do total, ou 1.055:000 contos.

2. Em 1948 o saldo de 62:137 contos obtém-se do modo que segue:

Contos

Receitas ordinárias ................... 4.428:472
Receitas extraordinárias .............. 1.332:735
5.761:207
Despesas ordinárias ................... 3.744:645
Despesas extraordinárias .............. 1.954:425
5.699.070
Saldo ...... 62:137

Viu-se atrás que em receitas extraordinárias se incluem empréstimos, excessos de receitas sobre despesas ordinárias e saldos.
Contando o que se gastou por conta de saldos de anos económicos findos (108,3 milhares de contos) e o saldo da gerência (62,1 milhares de contos), restam cerca de 1.109:000 contos, que devem ter sido empregados, conforme a Constituição (artigo 67.º), em «aplicações extraordinárias, em fomento económico, amortização de outros empréstimos, aumento indispensável do património nacional ou necessidades imperiosas de defesa e salvação nacional».

Emprego de saldos de anos económicos findos

3. Os 2.284:991 contos já utilizados na conta dos saldos de anos económicos findos tiveram a aplicação seguinte:

[Ver tabela de imagem]

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[Ver tabela de imagem]

Como já se notou atrás, os saldos de anos económicos findos serviram, em grande parte, para liquidar despesas relativas às forças armadas: material e despesas de guerra. Depois destas, as verbas mais importantes dizem respeito a melhoramentos rurais, hospitais escolares e aeronáutica civil.

CONCLUSÕES

A Comissão das Contas Públicas, depois de ter tomado conhecimento do relatório do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado do ano económico de 1948 e de analisar o parecer que acaba de ser transcrito.

Reconhecendo:

1) Que há urgência em reduzir as despesas públicas, tanto ordinárias como extraordinárias, e obter delas a maior utilidade possível sem prejuízo da capacidade de consumo geral do País;

2) Que é de interesse coordenar os serviços públicos no sentido de evitar sobreposições de competências e de trabalho;

3) Que há vantagem financeira em reduzir os gastos em obras públicas, que não tenham influência directa ou incidência na produção económica;

4) Que convém acelerar, dentro das disponibilidades financeiras, a obra dos melhoramentos rurais, sobretudo no que se refere a abastecimento de águas e caminhos vicinais;

5) Que há utilidade em organizar um esquema coordenado de obras estritamente reprodutivas, a executar num prazo de tempo compatível com disponibilidades financeiras previamente calculadas ;

6) Que o programa económico nacional deve ter como base a produção de grandes quantidades de energia, a rega e domínio das cheias, por forma a dar à indústria e à agricultura os elementos essenciais ao aumento de produção imposto pelo desenvolvimento demográfico do País;

7) Que há conveniência em incluir no programa económico nacional a soldagem das economias metropolitana e ultramarina, de modo a evitar a importação de produtos que possam, economicamente, ser produzidos dentro de Portugal;

8) Que devem levar-se a efeito acentuados esforços no sentido de se conseguir a plena utilização dos recursos naturais e de mão-de-obra do País.

9) Que é necessário fazer o estudo das receitas cobradas por todos os organismos do Estado, ou autorizadas por disposição governamental, incluindo as de previdência, com o fim de

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harmonizá-las com a actual situação económica do País;

e tendo em conta:

1) Que em 1948 as receitas públicas totais se elevaram a 5.761:207.388$99;

2) Que foram cobrados 4.428:472.405$81 de receitas ordinárias e 1.332:734.983$18 de receitas extraordinárias, das quais pertencem à conta de empréstimos 1.224:400.063$94;

3) Que as despesas totais pagas se elevaram a 5.761:207.388$99, das quais 3.744:644.666$83 são ordinárias e 1.954:425.802$33 são extraordinárias ;

4) Que os excessos das receitas sobre as despesas foi de 62:136.919$83;

5) Que o total dos empréstimos, proveniente da venda de títulos e de outras origens, utilizado no pagamento de despesas atingiu 1.224:400.063$94 e teve aplicação em fins que cabem dentro dos preceitos constitucionais;

6) Que o saldo de gerência foi de 62:136.919$83;

tem a honra de submeter à aprovação da Assembleia Nacional as seguintes bases de resolução:

a) A cobrança das receitas públicas durante a gerência entre 1 de Janeiro e 31 de Dezembro de 1948 foi feita de harmonia com os termos votados na Assembleia Nacional;

b) As despesas públicas, tanto ordinárias como extraordinárias, foram efectuadas de conformidade com o disposto na lei;

c) O produto de empréstimos teve a aplicação estatuída nos preceitos constitucionais;

d) Foi mantido durante o ano económico o equilíbrio orçamental, como dispõe a Constituição, e é legítimo e verdadeiro o saldo de 62:136.919$83 apresentado nas contas respeitantes a 1948.

Saiu das Sessões da Assembleia Nacional, 2 de Março de 1950.

Henrique Linhares de Lima.
António Calheiros Lopes.
Artur Águedo de Oliveira.
João Luís Augusto das Neves.
José Dias de Araújo Correia, relator.

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APÊNDICE

O PROGRAMA ECONÓMICO NACIONAL

I

INTRODUÇÃO

1. O problema do aumento da riqueza nacional tem preocupado há muito tempo a atenção de todos os que se empenham pelo futuro do País.
Já nas últimas décadas do século XIX e em princípios do actual diversos políticos e economistas se interessaram profundamente pelo aproveitamento dos recursos nacionais, tanto no continente europeu como nas províncias ultramarinas.
Apareceram variadas hipóteses sobre a natureza e o valor desses recursos e escreveram-se memórias e estudos sobre as possibilidades de explorar o que se sabia ou presumia existir.
Pelo vagaroso progresso no desenvolvimento d a riqueza nacional, traduzido no lento acréscimo do poder de compra e nos baixos consumos, espalhou-se pouco a pouco a ideia de que o País era pobre e não podia sustentar em nível adequado uma população a crescer.
Em fins do último século e na primeira década do actual abriram-se as portas da emigração e deu-se o êxodo de gente para as Américas e um pouco para a África. Mas as dificuldades que surgiram mós países do seu destino impediram a continuação de uma sangria de gente que, por ser em geral constituída pelos mais novos, transformaria em pouco tempo radicalmente as condições de vida do País, já de si precárias do ponto dê vista económico.
No entretanto, sobretudo a partir de 1930, começaram a ser estudados com maior interesse e rigor os recursos latentes na metrópole e no ultramar.
A maior procura de certos produtos que se verificou poderem ser produzidos em boas condições dentro do País, como as resíduas e outros, trouxe certo alento à vida portuguesa, e a maior e mais intensiva exploração de terras aumentou a produção de alimentos e de certas matérias-primas.
Mas tudo isso era e é pouco para as exigências nacionais. O desenvolvimento demográfico e a necessidade de melhorias sensíveis no nível de vida têm exercido sempre sobre a economia nacional uma pressão muito grande, e o que se produz, como consequência do natural esforço da iniciativa particular, não consegue ainda suprir as exigências dos consumos.
A falta de produção ordenada é um facto real que se manifesta em quase todos os índices: nas receitas públicas, que são baixas, nos consumos, que são pequenos, nas deficiências do poder de compra, nas grandes importações relativamente às exportações, na balança de pagamentos e em outros índices da vida da comunidade.
Tudo indica a conveniência de dar considerável impulso à minguada {produção nacional; tudo aconselha reforma séria e duradoura dos instrumentos produtos.
O problema em Portugal não se circunscreve apenas a aumentar o quantitativo de bens de consumo; deve tender também a melhorar apreciavelmente a produtividade tanto nas indústrias como na agricultura.
Julga-se que a melhor forma de atender ao que pároco ser exigência imperiosa é formular uma base séria o sólida sobre a qual se possa construir um futuro mais próspero.
O relator das Contas Públicas apresentou à Assembleia Nacional, em Fevereiro de 1935, um projecto de lei sobre reconstituição económica, tendente a acelerar, na medida do possível, as obras de carácter reprodutivo. E desde então acentuou, com toda a energia, a necessidade de grandes aumentos na produção interna.
Naquele documento e nos padeceres que se publicaram e discutiram a partir de 1937 apareceram os fundamentos de (natureza social e política que aconselhavam uma larga obra de fomento económico. Foi cuidadosamente explicado então o significado do termo «fomento económico», a fim de evitar, tanto quanto possível, confusões sobre um assunto que é fundamental na vida portuguesa.
Era opinião do relator das Contas nessa época, e continua a sê-lo ainda hoje, que o primeiro objectivo político nacional consiste em realizai, dentro dos recursos financeiros à vista, uma larga obra de interesse económico que tenda aos fins específicos, claramente definidos, de aumentar a produção e de melhorar consideràvelmente a eficiência dos instrumentos produtores, ou seja a sua produtividade.
Sobre estas duas aspirações, que coincidem com as exigências nacionais, se deveria arquitectar há muito tempo um vasto plano de progresso económico e social, a levar a efeito durante :certo número de anos, conforme as disponibilidades financeiras de antemão conhecidas.
Esse plano constituiria o programa económico nacional.

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2. Algumas ideias que transparecem do (projecto de lei de 1935 e estudos subsequentes eram novas no sentido de introduzir na vida pública portuguesa centos princípios de ordem económica. Tendiam a aplicar regras conducentes ao bom aproveitamento dos recursos internos e a evitar a intromissão de interesses alheios em assuntos que profundamente afectam a vida nacional.
Nunca será demais repetir que o problema é extremamente difícil e complicado, sobretudo num país em que a aplicação da teoria económica ou até o seu estudo se circunscreve a poucos especialistas.
E muito difícil esclarecer a complexa actividade moderna, e, quando uma ideia é nova, até na própria Europa, como parte do que foi exposto em 1930, as dificuldades a um emitam em elevado grau.
Com efeito, como então se explicou, o planeamento de um programa económico, a realizar dentro de certo número de anos, que tenha como objectivo aumentar e aperfeiçoar a produção, deve fundamentar-se em diversos aspectos, demorada e cuidadosamente ponderados, como ao financeiro, o económico, o técnico, o industrial, agrícola ou comercial e mesmo o progresso das ciências aplicadas».
Sugeriu-se naquela data a formação de um órgão coordenador encarregado do estudo e planificação do programa económico nacional, constituído por especialistas imparciais, técnicos no assunto, que apresentariam os estudos ao Governo, o qual, se com eles concordasse, os enviaria, por intermédio da Assembleia Nacional, à Câmara Corporativa para parecer dos representantes dos interesses económicos particulares»1.
O organismo que então se cognominou de Junta Central de Economia nunca veio a ser criado nem a série de medidas propostas mereceram aprovação.
Não foi possível, por este motivo, formular nessa altura o programa económico nacional nem tão-pouco se realizaram, em conjunto, os estúdios necessários para a organização de um plano de utilização dos recursos potenciais.
Hão-de discutir-se adianta estes recursos e indicar-se-ão sucintamente as possibilidades do seu aproveitamento era condições que permitam boa produtividade.
Por agora, convém acentuar, como aliás se acentuou já em 1935 e nos pareceres de contas públicas de diversos anos, sobretudo nos relativos a 1943, 1945, 1946 e 1947, que planos parciais de fomento económico sem serem convenientemente cerzidos e concatenados- não resolvem o problema. Podem até complicá-lo.

Com efeito, não se trata apenas de planos parciais - construir uma estrada ou um caminho de ferro, aplicar um esquema de irrigação ou regularizar caudais de um rio. E mais complexo o problema, porque visa desenvolver recursos económicos, em conjunto e simultaneamente, que dizem respeito a actividades de diversos Ministérios e bem podem influenciar grandemente a vida económica da Nação e do Império. Há necessidade, por consequência, de encarar a questão no todo, e não em parte ou partes, e coordenar as soluções nos seus diversos aspectos, de modo que não haja amanhã largo desenvolvimento numa forma de actividade em detrimento de outra ou, o que seria ainda mais grave, não vendia a verificar-se depois que se despendeu inutilmente dinheiro em qualquer melhoramento que não é requerido pelas necessidades imediatas ou próximas da economia nacional ou em avanço de outras 1.

Esta transcrição define claramente a ideia de conjunto e mostra o perigo de dispersões em matéria de orientação económica. O problema é um todo, e não pode ser encarado dispersiva e decoordenadamente, como tantas vezes tem acontecido entre nós.
Um pouco de tudo o que se menciona atrás aconteceu nos últimos quinze anos. Além «da dispersão de funções», dos antagonismos entre serviços, «da sobreposição de competências», «da defesa de cada serviço pelos componentes», da falta de colaboração e ligação que se nota nas soluções de muitas coisas que dizem respeito a dois ou três departamentos públicos, houve também o gasto de avultadas disponibilidades financeiras em aplicações adiáveis, que não eram requeridas de momento.

As dificuldades do problema

3. Não é fácil traçar com minúcia um programa económico nacional para execução durante os próximos dez, quinze ou vinte anos, por exemplo.
Apesar ide repetidas instâncias, publicamente anotadas e discutidas, sobre a necessidade de fazer um cuidadoso inquérito relativo à existência de matérias-primas, às possibilidades energéticas, às indústrias, às disponibilidades financeiras, às aptidões agrícolas, aos tipos de solos, às reservas aquíferas subterrâneas, às possíveis utilizações das águas idos rios que anualmente se escoam através de Portugal para o mar sem proveito e a muitos outros factores que dizem respeito a mão-de-obra, ensino técnico, cultura geral e outros assuntos, ainda há muito para estudar.
Os pareceres das contas públicas, discutidos na Assembleia Nacional, têm tido larga repercussão na imprensa e até inesperada projecção na opinião pública.
Através deles se ventilaram alguns problemas fundamentais e neles se indicaram bases em que poderá ser traçada em definitivo uma vasta série de obras que, devidamente cerzidas com elementos de outra natureza, pudessem levar à realização de um programa uniforme de desenvolvimento social e material na metrópole e no ultramar.
Infelizmente não foram atendidas muitas das sugestões feitas, tendentes ao estudo de alguns recursos fundamentais, como o caso da produção de emergia no Douro nacional em combinação com seus afluentes, e em primeiro lugar o Sabor e possivelmente o Côa; as condições de navegabilidade do mesmo rio para transporte do? minérios de Moncorvo e de outras minas; as grandes possibilidades do Tejo para efeitos de energia e rega, sobretudo nos politécnicos do Sul; a transformação de minério de ferro em ferro e aço, e muitas outras obras de grande projecção nacional.
E por isso ainda hoje não há projectos definitivos daqueles rios e de outros empreendimentos industriais e agrícolas, apesar de insistentemente se terem pedido. O esquema, por exemplo, do Douro nacional vale como esquema: dá ideia das suas grandes possibilidades, mas não pode ser tomado como base definitiva, nem até o anteprojecto do Carrapatelo, que é o primeiro ou segundo escalão.
Conhece-se o perfil do Tejo internacional, mas, à parte o nivelamento, ainda se não pensou na necessidade, que é urgente, de entabular negociações com o Governo

1 V. relatório e bases do projecto do lei apresentado à Assembleia Nacional pulo Deputado Araújo Correia em 5 de Fevereiro de 1935.

1 Relatório do projecto de lei apresentado à Assembleia Nacional em o de Fevereiro de 1935.

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do país vizinho no sentido de o aproveitar. E perde-se uma ocasião oportuna para chegar a acordo satisfatório sobre assunto que interessa grandemente aos dois países vizinhos e amigos.
O programa que vai ser definido adiante com certo pormenor nasceu da necessidade de ser apresentado um plano de realizações económicas na Organização Europeia de Cooperação Económica (O. E. C. E.).
Teve de ser traçado em pouco tempo com pequeno auxílio das estações oficiais e moldou-se sobre elementos já conhecidos, sintetizados em grande paute mós pareceres das contas gerais do Estado.
Refere-se à economia metropolitana e ultramarina e, neste último caso, especialmente a Angola e a Moçambique. Os elementos que serviram de base aos planos das duas grandes províncias de além-mar vieram em grande parte de estudos feitos por entidades da metrópole, por mandado das respectivas províncias, como os esquemas hidroeléctricos e de irrigação, e de planos ou projectos mandados fazer por entidades particulares interessadas nos assuntos, como o problema dos betuminosos e asfaltos, das carnes e do peixe em Angola.

A importância do comércio externo

4. O exame pormenorizado das balanças comercial e de pagamentos revela sintomas alarmantes em certos aspectos, que convém estudar em pormenor. O mais importante, que é consequência de todos os outros, foi analisado num estudo, publicado em apêndice ao Parecer das Contas Gerais do Estado relativo ao amo de 1946 e seu addendum, e reproduzido noutro lugar 1.
As conclusões desse estudo levaram à investigação das causas que provocam o tremendo desequilíbrio da balança comercial, que já atingiu num ano muito mais do que o total das exportações e quase 60 por cento das importações.
As cifras para os anos de 1938, 1946, 1947, 1943 e 1949 são as seguintes, em milhões de coutos:

[Ver tabela de imagem]


a) Exportação corrigida.
b) Números provisórios.

Este quadro define em termos simples o profundo desequilíbrio da vida económica portuguesa - um déficit comercial que é superior às exportações em anos posteriores à guerra, e não se diz nos anos anteriores porque, como é sabido, a exportação necessitava de ser corrigida por um coeficiente que se podia tomar como igual a 60 por cento. A cifra da exportação em 1938 subiria, com esta correcção, para 1:833 mau contos e o déficit reduzir-se-ia a 473 mil contos ou apenas a 20, por cento das importações.
Ainda se deve acrescentar que no período anterior à guerra eira mais fácil a troca de moedas e, por consequência, as remessas de emigrantes o de rendimentos de capitais no estrangeiro.
Logo a seguir à guerra acentuou-se o grande desenvolvimento nas importações, sem adequada contrapartida ou compensação nas exportações.
A não ser que houvesse nos rendimentos invisíveis entrados no País um apreciável suplemento ao valor das .exportações, dar-se-ia o que na verdade aconteceu: as reservas cambiais, que subiram quase sempre até fins de 1946, começaram a sofrer um terrível desgaste, que se acentuou em 1947, 1948 e 1949, como mostram a conta do Banco de Portugal o os saldos da conta do Tesouro.

Saldos cambiais

5. Pelo que diz respeito ao primeiro caso - a posição do banco emissor - os números desde 1938 podem assumir a forma seguinte, em contos:

[Ver tabela de imagem]

(a) 29 do Junho do 1949.

Deve apenas considerar-se no exame dos números o significado da última coluna, que dá nota das disponibilidades totais, incluindo o ouro, as divisas afectas ú reserva e outras. O processo de contabilização adoptado em 1946 alterou o significado das restantes colunas para* efeitos de comparação, como aliás mostram as próprias cifras.
Verifica-se dos totais que desde 1938 a entrada de cambiais no País foi muito grande, e daí derivou um grande acréscimo na circulação fiduciária e um período intenso de inflação de crédito, que atingiu o seu máximo meses depois de finda a guerra.
O processo deste período está já feito e serviu de base a prolongada discussão ma Assembleia Nacional e até a uma circunstanciada comunicação do Governo 1. Interessa agora fixar que em fins de 1945 o total das cambiais se elevava a 18:067 mil contos e em fins de 1946 a verba atingiu a soma de 18:450 mil contos.
Além desta elevada goma em moeda estrangeira, o Estado possuía cerca de 500 mil. contos (507:766) em fins de 1946, que ainda subiram para 561:898 em fim de 1947. Donde resulta que em Dezembro de 1946 o banco emissor e o Estado tinham à sua disposição cerca de 19 milhões de contos em moeda estrangeira.
Não se encarará agora o caso de uma parte importante desta soma de disponibilidades cambiais poder ser considerada como imobilizada, por virtude de acordos. Na verdade os anos mostraram as possibilidades da sua mobilização gradual quando utilizada para pagamento de bens de produção (equipamentos).

1 Araújo Correia, Ensaios de Economia Aplicada, pp. 105 e seguintes.

1 O Problema Monetário Português, 1917.

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Saldos da conta do Tesouro

6. As disponibilidades do País em moeda nacional também eram elevadas, e consistiam essencialmente em depósitos não utilizados nos bancos, casas bancárias, caixas de crédito e previdência, e saldos positivos da dívida flutuante ou disponibilidades do Estado. Considerando por agora apenas estas últimas, pode construir-se o quadro seguinte, que dá, sumariamente, as somas disponíveis à ordem do Estado:

[Ver tabela de imagem]

(a) 30 de Junho do 1919.

A conta de disponibilidades do Estado, que alcançara mais de três milhões de contos em fins de 1946, desceu vertiginosamente durante os anos de 1947 e 1948 para atingir 44:700 contos em fins de Junho de 1949.
Esta conta fora abastecida, no período da guerra e depois, essencialmente, pelo produto da venda de títulos. A partir de 1941 acentuou-se a subida, que atingiu o máximo em fins de 1946.
Um dos capítulos do parecer das contas públicas explica minuciosamente todos os anos o destino, por força de despesas extraordinárias, das importâncias despendidas de conta das disponibilidades financeiras ateima indicadas - e a ritmo de obras e gastos dos ainda de 1947, 1948 e 1949 projecta-se na diminuição dos saldos disponíveis ma conta do Tesouro - como se verifica no quadro 1.
Variáveis financeiras que influem na vida económica

7. Ainda para melhor elucidação de um problema que está na base de qualquer programa económico nacional, convirá fazer o estudo da evolução dos depósitos de bancos, casas bancárias, caixas económicas e Estado.
Talvez o problema careça de ser encarado pelo lado da comparação entre as disponibilidades cambiais, incluindo reservas, notas em circulação e a totalidade (líquida) de depósitos. São variáveis que se ligam intimamente e têm reflexos fundos na vida económica.
O quadro que segue exprime-os de modo sucinto:

[Ver tabela de imagem]

(a) Junho.
(b) Inclui depósitos do Estado e da Junta do Crédito Público no Banco de Portugal.

Nota - O total dos depósitos nos bancos, casas bancárias e caixas económicas em 31 de Dezembro de 1949 era de 15:576 mil contos.

O quadro mostra, com bastante eloquência, dois fenómenos ocorridos no período do pós-guerra.

O primeiro é o da redução considerável das disponibilidades cambiais, excluindo os do Estado, que vieram

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dei 18,5 milhões de contos, em fins de 1946, para miemos de 11 milhões em Junho de 1949. A parda de perto de S milhões de contos em dois anos e meio dá, como indica o relatório do, banco emissor, os deficits da balança de pagamentos messe período.
Esta massa de cambiais, que se sumiu para fora do País no pagamento de bens de consumo e de produção e de invisíveis, representa a trágica posição económica em matéria de produção. Mostra as insuficiências da actividade interna para manter em nível de consumo razoável uma população que cresce continuamente, em ritmo acelerado.
Podem aparecer razões tendentes a provar que a anormalidade pluviométrica (secas) e a anarquia financeira europeia (falta de disponibilidades para compra de produtos portugueses não essenciais) concorreram também para o tremendo dreno cambial assinalado pelos números, mas isso só é procedente em parte.
Também se pode afirmar que o ritmo de equipamento interno trouxe um aumento na importação, além do que foi necessário mandar vir de fora para refazer stocks de combustíveis e matérias-primas desfalcados pela guerra. E isso conduziria à redução, para comparar com outros períodos, das cifras que mostram a perda de cambiais nos anos de 1947, 1948 e 1949. A situação económica seria então menos perigosa, ou, se as palavras não ferirem - menos angustiosa.
Não vale a pena agora entrar na análise destes três factores para justificar que, ainda que houvesse, pelos motivos apresentados, reduções apreciáveis, e elas não explicam o fenómeno, o .problema apareceria sério e ameaçador em toda a sua grandiosa amplitude. Ele sobressai muito quando se examina o desenvolvimento da população.

A população

8. O aumento da população (portuguesa acentuou-se a (partir do fim da segunda década do século XX e não obstante as preocupações de ordem internacional, como a crise de 1930 e 1931, a, luta. civil no país vizinho 3 a guerra mundial, o ritmo do acréscimo foi muito grande nos últimos vinte anos.
Convém estabelecer o cômputo do seu desenvolvimento na próxima década, que seria aquela em que, simultaneamente, se executaria qualquer programa de fomento económico que o País porventura entendesse dever ser executado, e que adiante se pretende enunciar.
O número de habitantes de Portugal continental e ilibas adjacentes em 1900 lidava à roda de 5:423 mil, que dava uma densidade de 59,1 por quilómetro quadrado. Em 1940 a densidade demográfica subira para 84,2, e deve atingir 94,6 em 1950.
O quadro seguinte 1 fixa em ter-mos (gerais o movimento da população nacional até 1960.

[Ver tabela de imagem]

Nota-se que o aumento da (população, que fora de 896 mil almas entre 1930 e 1940, ultrapassará 960 mil entre 1940 e 1950 e atingirá cerca de 1:140 mil entre 1950 e 1960, se continuar a descida na mortalidade acentuada nos últimos anos.
Praticamente se poderá pois dizer que a população portuguesa alcançará em 1960 a cifra de dez milhões de habitantes e uma densidade demográfica superior a 107. Nesta data, se for executado com vigor, prudência e boa técnica, poderá estar em pleno rendimento a parte mais importante do programa económico nacional.

As exigências nacionais

9. A estrutura da balança do comércio externo, que obriga a contínuo dreno de cambiais; a diminuição acentuada nas entradas de recursos invisíveis provenientes da emigração, do turismo, de serviços e de outras origens ; as necessidades de acréscimos nas receitas públicas destinadas a melhorias sociais; o contínuo e acentuado aumento da população; a formação de capitais precisos para o fomento das províncias ultramarinas, e outras razões, aconselham um grande esforço no sentido de executar, dentro de prazo curto, um largo programa de desenvolvimento económico no sentido de aproveitar em larga escala os recursos materiais disponíveis, tanto na metrópole como no ultramar.
Se não for dado impulso sério, (rápido e efectivo à produção interna aios próximos anos, o País terá de recorrer à emigração maciça de unia população a crescer, ou ao decréscimo apreciável do nível de consumo.
Esse impulso só pode ser dado pela efectivação racionalizada de um programa económico nacional e compreenda a metrópole e os domínios de além-mar.
O programa económico português apresentado à O. E. C. E., discutido ma sessão de 24 de Novembro do 1.948, corresponde a esse fim.
O relator das contas públicas julga que o País tem todo o interesse em conhecer os elementos fundamentais do programa económico nacional que, nas suas grandes linhas, deverá ser aquele que ele próprio defendeu em Paris, e adiante se pormenoriza.

1 Parecer sobre as Contas Gerais do Estado de 1947, p. 7 (separata).

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Necessidades fundamentais da Nação

10. As circunstâncias em que se apresenta a vida económica nacional, relativamente à produção interna e qualidade ou tipo dessa produção, indicam que é mister:

1) Reduzir a importação de produtos alimentares, que pesam fortemente na balança comercial;
2) Aumentar as possibilidades de exportação de produtos alimentares para a Europa, África e Américas do Norte e do Sul e outros continentes, se for possível;
3) Criar condições para o desenvolvimento interno de matérias-primas necessárias á indústria europeia, como os minérios de ferro, as madeiras e outras, e também susceptíveis de serem exportadas para os países da área do dólar, como certos minérios, oleaginosas, fibras, café e mais;

4) Reduzir a importação de combustíveis sólidos e líquidos pela aceleração de obras em curso e de novos aproveitamentos hidroeléctricos nos dois grandes rios portugueses, o Douro e o Tejo, que são os de maior valor económico em virtude da grandeza dos caudais e dos fins múltiplos das obras;

5) Melhorar consideravelmente a produtividade das indústrias nacionais e promover a criação de outras, em circunstâncias que permitam concorrência em mercado livre;

6) Acentuar o progresso dos dois grandes domínios ultramarinos pelo estabelecimento gradual de planos de fomento agrícola (rega e enxugo) e industrial (carnes, peixe, destilação de rochas betuminosas e carvões asfálticos, madeiras e outros), de modo a estabelecer condições adequadas para a fixação dos excedentes demográficos da metrópole e melhoria das suas balanças comerciais.

Estes objectivos, se realizados em escala conveniente, levarão:

a) Ao equilíbrio na balança de pagamentos;
b) À melhoria do nível de vida social;
c) Ao pleno emprego de população, que tende a crescer;
d) Ao maior ritmo no povoamento ultramarino por gente dá metrópole.

11. Examinados os recursos económicos internos e as condições em que se apresentam, qualquer plano de fomento a executar em prazo razoável deverá ser baseado na produção de energia em larga escala, na rega, com os dois fins de produzir mais alimentos e matérias-primas e na intensificação do ritmo industrial do País.
Isto significa que, considerando, por agora, a metrópole, o estudo das disponibilidades aquíferas, tanto as que se escoam para o mar através de rios, como as que constituem lençóis subterrâneos de possível utilização, constitui uma das mais instantes necessidades.
A utilização das reservas aquíferas subterrâneas e dos rios nacionais não deve referir-se apenas à produção de energia e à rega, embora uma e outra tenham grande importância- na vida nacional.
O rio, como já pormenorizadamente se escreveu, permite um conjunto de utilizações económicas, e um plano de fomento tem de ter em conta todas as suas possibilidades.
No caso, por exemplo, do Douro, são óbvias e evidentes a produção de energia e a navegabilidade; no caso do Tejo, a produção de energia, a rega, a navegação, o domínio de cheias, e até a sua regularização, são objectivos a ter em conta quando for feito, conscienciosamente, dentro de princípios económicos racionais, o estudo da sua bacia hidrográfica.
Estando, como está, o progresso económico da metrópole subordinado ou dependente de maior produção de energia, matérias-primas e alimentos, convém verificar quais as possibilidades nesta matéria. E um ligeiro exame do assunto imediatamente indica que a chave do problema económico reside em grande parte no aproveitamento de dois dos seus rios, que são o Douro e o Tejo, e, em bem menor escala, o Guadiana.
As razões que dão importância tão saliente ao Douro filiam-se na existência de ricos jazigos de minérios no começo do seu percurso e outros pontos perto dele em território nacional, principalmente hematites e magnetites, e no acentuado desnível do seu leito, quer no troço fronteiriço, onde a queda pertencente a Portugal por acordo atinge 180 metros, quer no percurso de Barca de Alva até ao Porto, onde o desnivelamento se, eleva a cerca de 120 metros.
No caso do Tejo, há desde a foz do Erges até Santarém um desnível total importante, do qual cerca de 28 metros dizem respeito ao troço internacional. O relevo da margem sul deste rio, o tipo de exploração agrícola, o clima irregular e a possibilidade de intensificar a cultura agrícola em zona de baixa densidade demográfica, e ainda as suas excelentes condições de navegabilidade, quando regularizado, dão a esta via fluvial uma posição de relevo na vida económica do País.

12. Assentes os princípios atrás enunciados sobre a importância da energia, matérias-primas e alimentos na vida nacional, interessa investigar se o País tem ou não possibilidades de produzir, em escala adequada e em condições de concorrência, quer dizer, a preços de custo equivalentes aos de outros países, a energia, as matérias-primas e os alimentos. Uma vez esclarecido este problema, resta averiguar qual o melhor modo de utilizar a energia produzida e as matérias-primas, e, neste último caso, se convém a sua transformação internamente, ou se a exportação tem maior interesse. É ainda no caso de haver possibilidades de produzir em larga escala géneros agrícolas e pecuários, ou produtos florestais, é indispensável estudar o consumo, quer dentro ,do País, quer fora dele.

II

O PROBLEMA DA ENERGIA

Considerações gerais

13. Há muitos anos que o relator das contas públicas vem chamando a atenção para um problema de importância fundamental, no futuro económico do País.
O interesse do problema não é apenas de natureza energética - de produção de força motriz. Tem aspectos que transcendem o mero facto de obter energia para as necessidades do território nacional.
Com efeito, dadas as características, em qualidade e quantidade, dos combustíveis portugueses, não é possível suprir os consumos nacionais de força motriz e outros com o seu emprego.
As exigências dos consumos de combustíveis são hoje satisfeitas por importações maciças de carvões estrangeiros. Em casos de emergência o País sofre consideravelmente na sua actividade, como aconteceu durante o último conflito.
A origem da força motriz no consumo interno está nos desníveis e caudais dos rios. É por eles que se «ecoam ainda hoje para o mar vastas quantidades de energia,

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que irão aumentando, na sua forma permanente, à medida que no país vizinho, no Douro e no Tejo se regularizarem as torrentes que no Inverno se escoam para o mar em proporções enormes.
O autor computou em 9 biliões de unidades de energia 1 as possibilidades de produção nos rios portugueses. Esta cifra, considerada excessiva na época em que se computou, deve estar hoje ultrapassada, em virtude de melhor conhecimento do regime e declives dos rios, tanto os dos seus cursos como os de seus afluentes em território nacional.
Com utilização conveniente não seria descabido elevar a estimativa das possibilidades energéticas nacionais, incluindo energia temporária aproveitável, para perto de 11 biliões de unidades de energia.

E indubitavelmente um grande valor nacional esta realidade económica. Contudo, para ser utilizada, demanda o dispêndio de capitais muito avultados, tanto aio que diz respeito à própria produção como ao transporte e utilização nas diversas formas de actividade.
É indispensável, por consequência, extrair do conjunto das empresas possíveis aquelas que possam produzir maiores resultados económicos, ou, por outras palavras, é preciso iniciar a utilização dos recursos nacionais por aqueles que, com idêntico dispêndio de capital, ofereçam maior rendimento.
Na ordem de classificação dos recursos hidráulicos, e na falta de um inventário cuidadoso, há tantos anos reclamados, aparecem como valores de grandeza, que largamente se distanciam de todos os outros, os dois rios Douro e Tejo. Pondo de parte outras possíveis utilizações económicas, bastaria a importância de seus desníveis e os caudais de suas bacias hidrográficas para atrair paira eles a. atenção dos estudiosos ou de entidades (responsáveis.
Mas qualquer programa nacional não pode apenas considerar, como questão fechada, a produção de energia em determinado rio. Tem de, ao estudá-lo, investigar se é possível, com os trabalhos a realizar, obter dele outras utilizações que concorram para amortizar, quer directa, quer indirectamente, os capitais avultado a inverter no empreendimento.
Esta base financeira é indispensável em toda a obra de progresso material, mas no caso presente, no caso de países de fracos recursos monetários e de insuficiente capitalização, ela é absolutamente necessária.
Num programa, económico nacional há que considerar, pois a, importância do Douro e do Tejo e suas respectivas bacias hidrográficas e verificar se, em matéria de custos, projecção social, influência em outros domínios económicos e mais, eles devem ou «não ter primazia no aproveitamento.

Douro

a) Douro internacional

14. Se for considerado o rio Douro apenas pelo lado de, produção de energia, parece mão haver dúvidas de que o esquema a aproveitar em primeiro lugar deveria ser o do Douro internacional, dividido por acordo entre os Governos Espanhol e Português em dois troços sensivelmente iguais. No troço português, que corresponde a menos de 55 quilómetros, poder-se-á aproveitar cerca de 180 metros de desnível em três centrais. A energia produtível aproximar-se-á de 2 biliões de kWh e o preço do custo na central será bastante baixo. As obras em execução em Espanha, especialmente no Tormes, melhorarão apreciavelmente o caudal, não só do troço internacional, como o da restante partre do rio.

b) Douro nacional

15. A vantagem de muito baixo custo da energia no troço internacional é um pouco contrabalançada pelo seu transporte até aos centros de consumo na zona do litoral. Haverá, pois, que ter em conta este facto do estudo do problema.
Mas aparece, além disso, uma outra questão basilar para a economia nacional, que por si só, afasta a hipótese de iniciar o aproveitamento do Douro pelo troço internacional, a não ser que os progressos mecânicos alterem as actuais condições de transportes ferroviários.
Como já se explicou, o problema do aproveitamento do Douro não é meramente um problema hidroeléctrico.
Há três aspectos fundamentais a ponderar antes de tomar decisões- sobre o assunto. Cada um deles tem de ser encarado à luz do seu valor económico intrínseco.
Os aspectos que aparecem no aproveitamento do Douro são: a produção de energia, a navegabilidade do rio e a rega nos terrenos marginantes ou nos vales de seus afluentes, se isso for possível.
Cada um destes três aspectos tem a sua importância. O seu conjunto forma o valor económico do aproveitamento.
Esta simples verdade terá de ser claramente reconhecida, porque de outro modo cometer-se-á um gravíssimo erro económico, que afectará profundamente o interesse nacional.
Este é um dos casos em que a opinião pública, dada a simplicidade do problema, terá de intervir se for mantida a ideia de não levar em linha de conta as possibilidades totais oferecidas por um rio que, convenientemente aproveitado,- pode ser um dos mais poderosos instrumentos de fomento económico.
Em sua simplicidade a questão apresenta-se assim:
Existem, não longe da fronteira, e a alguns quilómetros do rio, jazigos já reconhecidos que, segundo estudos sérios, têm reservas de minérios de ferro que sobem ao mínimo de 160 milhões de toneladas. Tudo indica que essas reservas sejam da ordem de algumas centenas de milhões de toneladas. Há quem as compute em 500 milhões.
Mais abaixo, outros jazigos de minérios, também não longe do rio, estão em reconhecimento, com alguns milhões de toneladas de hematites e magnetites já provadas; e espalhados pela província de Trás-os-Montes cintes á sinais, e na verdade já foram explorados, de filões ou jazigos de estanho, crómio, manganés e minérios.
O futuro desta riqueza mineira depende em grande parte de transportes fáceis e baratos. Já está provado não ser possível ao caminho de ferro do Douro canalizar pura o porto de embarque ou para oficina siderúrgica, no caso de fusão interna, quantidades avultadas dos minérios que hoje jazem inexplorados nas cabeceiras do rio.
Qualquer outro país onde houvesse um apurado sentimento de realidades económicas teria há muitos anos procedido ao estudo de um meio de permitir a exploração dos minérios de ferro e de outros metais que existem agora naquela zona. E o único meio, e bastante barato, que pode assegurar esse transporte é a esplêndida via fluvial que desce, com níveis acentuados, da fronteira até ao Porto.
Não só permite o transporte de grandes volumes de minérios, como, simultaneamente, assegura a produção de grandes quantidades de energia temporária e permanente.

16. Esta dualidade de utilização económica impõe o imediato aproveitamento do Douro nacional, com prioridade sobre qualquer outro no País, talvez com excepção do Tejo. Quando se diz Douro nacional significa-se

1 Araújo Correia, «Rios Portugueses», Escravos de Economia Aplicada, p. 21.
2 Diário das Sessões de 12 de Dezembro de 1941.

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a série de cinco ou seis barragens a construir no leito do rio - Pé de Moura, Carrapatelo, Régua, Valeira e Focinho - ou qualquer outro esquema económico que, diminuindo as quedas, melhore as condições de navegabilidade.
Mas, paru efeitos de regularização do rio neste primeiro estágio do seu aproveitamento, conviria reforçar o seu caudal permanente por qualquer possível reserva de água no Verão, de modo a elevar o débito estival.
Para esse efeito aparecem duas possibilidades interessantes, que já mereceram atenção: a do Sabor e a do Côa.
O Sabor, na margem direita do Douro, foi estudado por serviços oficiais e permite, com barragem de 100 metros, uma capacidade útil de albufeira de 550 milhões de metros cúbicos.
Poderá regar dois milhares de hectares de terrenos ricos e produzir 120 milhões de unidades de energia.
O Côa, já reconhecido, parece consentir o armazenamento de perto de 400 milhões de metros cúbicos de água em S. Caetano-Noeme, Vale de Madeira-Senhora de Monforte e Cidadelhe-Santa Comba. Presume-se que com alturas de barragens, respectivamente, de 50, 100 e 50 metros a energia produzida se elevará a cerca de 500 milhões de kWh por ano.
A albufeira do Sabor, alimentada por uma área de bacia hidrográfica de 3:460 quilómetros quadrados, influi em todas as barragens do DOUTO nacional, com excepção da do Pocinho, e as do Côa, com uma área variável, influem em todas, incluído a do Pocimiho, com a queda útil de 20 metros.
Em frente destes elementos haverá que escolher entre a prioridade no execução das obras no Sabor e no Côa. A diferença entre a retenção de 400 e 550 milhões de metros cúbicos é importante. O caudal do Douro, abaixo da foz do Sabor, se for construída a barragem projectada neste rio, será elevado em cerca de 40 metros cúbicos na época própria ou 21 permanentes. No Côa julga-se ser
possível avaliar-se em 20 metros cúbicos por segundo o caudal regularizável.
O custo da obra do Sabor, o regime do rio, a área da bacia hidrográfica, o regime de chuvas, a soía influência na rega, as possibilidades de melhoria no caudal do Douro devem ser postos em confronto com as possibilidades do Côa, que tem maior volume de barragens.
Os elementos existentes indicam que, embora os açudes do Côa possam ter grande influência no Douro nacional e até na produção de emergia, o do Sabor, por virtude da grandeza da soía bacia hidrográfica, do volume de água armazenada, da rega e da sua simplicidade uma só barragem, perto do caminho de ferro -, deve ser construído rapidamente. O ideal, se as condições financeiras o permitissem, seria a construção dos dois esquemas e a regularização do Douro com mais 900 milhões de metros cúbicos de água, o que valorizaria extremamente o rio.

Conclusões sobre o Douro nacional

17. Tudo o que acaba de ser sucintamente descrito repousa em dados conhecidos. Leva a concluir a necessidade de começar o aproveitamento do Douro, com vista à produção de energia e navegação.
Posto em esquema o aproveitamento do troço nacional do rio, haverá que dar início imediatamente ao estudo dos estaleiros que assegurem a exploração económica das minas, o transporte do minério para o rio e as possibilidades de descarga para o minério a exportar no porto de embarque.
Adiante se indicarão as soluções electrossiderúrgicas aconselháveis para o aproveitamento de cerca de 500 mil toneladas de minério de ferro por ano e para a produção de 200.000 a 350:000 toneladas de ferro e aço dentro do País.
A construção de uma grande barragem no Sabor que permita uma albufeira da ordem dos 600 milhões da metros cúbicos de águia e o estudo intensivo das possibilidades do Côa, que parece permitir a armazenagem de 400 milhões, deverão constituir os estágios suplementares.

Tejo

18. O Tejo tem, pelo menos, tão grandes possibilidades económicas e sociais como o Douro. Os dois grandes rios completam-se em muitos aspectos, e conviria não perder de vista, num largo programa económico, que as funções de um e outro se harmonizam quase inteiramente.

As utilizações do Douro, como se viu, são principalmente de duas ordens: energia e navegabilidade, e ambas se projectam grandemente na economia nacional.
As utilizações do Tejo são: produzir emergia, embora em menor escala, no que toca a emergia permanente, do que o Douro; permitir a navegação até para o interior de Espanha, e abrir a possibilidade de realizar um vasto plano de rega mo .Ribatejo e mo Alentejo, que, dadas a grande quantidade de água que se eacoa pelo rio e as disponibilidades de energia temporária, poderá transformar vastas áreas pouco produtivas e pouco povoadas, a sul do Tejo, em zonas regadas.
Por outro lado, o percurso fronteiriço do rio, entre os afluentes Sever e Erges, com o desnível de cerca de 28 metros, é susceptível, com pequenas expropriações, de formar uma albufeira, com perto de 50 quilómetros de comprimento, talvez capaz de armazenar para cima de 400 milhões de metros cúbicos, que, em. conjunção cem outras albufeiras em Portugal e Espanha, influirá aias cheias do Ribatejo, enfraquecendo-as quando necessário, e regularizará os caudais de estiagem de modo muito sensível.
Energia, navegação, regularização do rio, amortecimento de cheias e rega em larga escala são, por consequência, possibilidades económicas do Tejo, que é um dos mais valiosos, senão, o mais valioso instrumento económico nacional.
Mercê de circunstâncias que não vêm agoira para o caso, a obra de aproveitamento da bacia hidrográfica do Tejo foi iniciada por um dos seus afluentes - o Zêzere. Os trabalhos estão muito avançados e há que concluí-los o mais rapidamente possível.
A obra do Castelo do Bode tem, pelo menos, o mérito de regularizar caudais a jusante da soía foz e facilita por isso a navegabilidade do rio no Verão, além de poder auxiliar a rega nos campos do Ribatejo, nas margens direita e esquerda. Virá a ser no Futuro uma central de reserva em conjuração com aprovitamentos na Ocreza das próprias centrais do Tejo e do Douro. É neste aspecto e no da rega que residirá no futuro a sua principal função, e não só no da energia, para o qual foi delineada.
As obras no Tejo compreendem, além do Zêzere, as barragens móveis de Belver, com 17 metros, em vias de conclusão; de Fratel, com 24 metros ou mais, e do Tejo internacional, que poderá atingir mais de 40 metros, num acordo entre Portugal e a Espanha. A jusante de Belver, para efeitos de navegação e um pouco de energia, julga-se ser económico e possível duas barragens de pequena altura, perto de Almourol e nas vizinhanças do Tramagal ou mais a montante.
Com as regularizações de Alvito e Pracana, a do Castelo do Bode e as empresas já projectadas ou em curso em Espanha, de que se falará adiante, o caudal de estiagem do Tejo subirá muito.

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19. Uma das razões, e não pouco valiosa, que conduz ao aproveitamento do Tejo é a importância e projecção nos seus caudais das obras em construção ou projectadas em Espanha.
A capacidade das albufeiras quase a serem postas em serviço no Tejo e seus afluentes é superior a 2 biliões de metros cúbicos de água.
As mais importantes são as de Buendia e Entrepeñas no curso superior.
Se forem levados a efeito os projectos para o Tejo inferior no percurso espanhol, entre Alcântara e Talavera, a capacidade de retenção total elevar-se-á certamente muito além de -3 biliões de metros cúbicos de água, e não é exagero nem débitos permanentes da ordem dos 300 metros cúbicos por segundo nos anos médios.
Entre Belver e a fronteira portuguesa do Sever o desnível anda à roda de 43 metros e no Tejo internacional há ainda 28 metros, o que perfaz o total de 71 metros, a que se poderá juntar o percurso Belver-foz do Zêzere ou Belver-Almourol, talvez susceptível de aproveitamento por necessidades de navegação.
O panorama do Tejo, na base dos caudais actuais, tendo em conta as obras em curso - Castelo do Bode, Belver e Fracana - e as que deverão ser rapidamente executadas - Fratel-Alvito -, poderá produzir cerca de 800 milhões de unidades de energia, na base de 350, 180 e 250 para os três casos. Como a obra do Tejo internacional parece ser de grande importância, tanto para Portugal como para Espanha, a produção do rio, incluindo mais este aproveitamento e considerando a altura de 40 metros, subirá talvez a cerca de 1:200 milhões de unidades - e com os escalões de Belver, Fratel e Tejo internacional e regularização do rio a jusante de Belver será possível a navegação até ao interior da Espanha em transportes muito próximos de 1:000 toneladas, como se viu já em outro estudo 1.
Não se levaram em conta, por agora, os projectos da Bouça e Cabril, só justificados por melhorarem um pouco o preço da energia do Castelo do Bode. O dispêndio de capital e a pequena diferença no custo da energia não aconselham, porém, a sua execução imediata, antes indicam a reserva dos capitais disponíveis para as obras no próprio rio e no Douro.

20. Mas no esquema do Tejo um dos pontos mais importantes a considerar é o aproveitamento da sua energia temporária durante os meses de Inverno e da própria água que a produz para a rega duma vasta região da margem esquerda, que pode abranger terrenos pobres e terrenos ricos nos pliocénicos do Sul e nas lezírias ribatejanas.
Quer dizer: o rio, aproveitado convenientemente, é susceptível de auxiliar a resolução de um dos mais angustiosos problemas sociais portugueses, gerador de crises que se repetem todos os anos, com variações de intensidade, mas se imantem permanentes e afectam cada vez mais ia vida económica, que é o problema do desemprego rural no Alentejo.
Adiante se estudará em pormenor o modo prático de atender a esta profunda necessidade de dotar com recursos aquíferos largas áreas alente j anãs e, consequentemente, promover a cultura intensiva e, em última análise, aumentar bastante a produção de alimentos.
Esta é, sem dúvida, uma das maiores utilidades do aproveitamento do Tejo.

Outros aproveitamentos de energia Cova da Beira

21. Na ordem de ideias de preferir a execução imediata daquelas empresas que produzam maior rendimento económico com menor dispêndio de capitais, convém confirmar o estudo e proceder à realização imediata do projecto da irrigação da Cova da Beira, por gravidade, com a água que pode ser armazenada no alto da serra da Estrela pela junção dos rios Zêzere e Mondego nas suas cabeceiras.
Julga-se ser possível armazenar cerca de 70 a 80 milhões de metros cúbicos de água numa área de neves e de intensa pluviosidade e aproveitá-la em diversas quedas.
Parte da água - a das cabeceiras do Zêzere - será utilizada numa queda total de perto de 1 :000 metros.
A quantidade de energia estival a produzir em quatro meses -de Junho a Outubro- aproxima-se de 70 milhões de kWh em diversas centrais. A última, em Valhelhas ou perto, lança novamente a água no leito do Zêzere.
A cota deste lugar permite dominar uma zona de excelentes terrenos de aluvião no vale deste rio e de seus afluentes, no total de perto de 15:000 hectares, dos quais se poderão regar em óptimas condições de produtividade cerca de 6:000 a 7:000.
A vantagem económica do esquema reside na dupla utilização cia água para produção de energia estival, e portanto mais cara, e logo a seguir na rega de zona bastante propícia para esse fim, sem necessidade de albufeira para armazenamento neste último caso.
A razão de 7:000 metros cúbicos por hectare, a área susceptível de ser regada pode ser de cerca de 10:000 hectares, no caso de se provar haver mais terrenos próprios para isso.

Quantitativo da energia produzida

22. Não se encara por agora no programa económico nacional e durante o período da sua execução o início de novos esquemas de importância para produzir energia.
Encara-se apenas o aproveitamento do Douro, com o seu afluente Sabor e possivelmente o Côa, que compreende energia, rega e navegação; o do Tejo, com idênticos objectivos, mas, no que se refere a rega, de muito maior projecção na vida do sul do País, e o da Cova da Beira, em virtude da sua simplicidade e útil aplicação na rega e na energia estival.
Simultaneamente se concluirão as obras em curso relativas ao Castelo do Bode, Belver-Pracana, Ceira, Lima e outras.
Tendo em conta os elementos conhecidos, alguns de origem oficial, e as informações técnicas de outra origem, mas de autoridade genuína, a produção total de energia, depois de executado o programa, seria a seguinte:

Douro-Sabor .......... 2:000 X 106
Pracana-Belver ....... 180 X 106
Alvito-Fratel ........ 250 X 106
Tejo internacional ... 400 X 106
Zêzere-Cova da Beira . 70 X 106
Castelo do Bode ...... 350 X 106
Cávado-Rabagão ....... 210 X 106
Outros ............... 100 X 106
Total ........ 3:560 X 106

1 Araújo Correia, «Rios Portugueses», Ensaios de Economia Aplicada, p. 46.

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A este total acresceria a energia temporária a usar na elevação de água do Tejo, de que se tratará adiante, e o aproveitamento do Côa, calculado em 450 a 300 milhões de unidades.
A produção actual no País anda à roda de 800 milhões e corresponde a uma das mais baixas capitações europeias.
Em 1048 a (produção de energia térmica ainda foi de 437 milhões de kWh, a substituir em grande parte por hidráulica.
Discutir-se-á adiante a questão do aproveitamento de tão grande quantidade de energia em relação aos consumos actuais.
E ver-se-á, na hipótese de ser integralmente realizado o programa, que a capitação portuguesa ainda será muito baixa no fim do prazo de execução, quando comparada com os restantes países europeus e muitos americanos.

III

O PROBLEMA DA AGRICULTURA

A posição e a influência da agricultara na economia nacional

23. É hoje assunto profundamente debatido em quase todos os países que atingiram alto grau de urbanização a possibilidade do regresso à terra. Durante o século XIX e primeiras décadas do actual uma corrente ininterrupta de gente dos campos fixou-se em cidades, como se nelas existissem conforto para suas mágoas e lenitivo para suas misérias. A vida rural perdeu assim em muitas regiões do Globo grande parte da influência que conseguira exercer através de séculos sem conto.
Em frente, porém, das angústias em que se debate o mundo moderno, a vida dos campos passou a ser, no pensamento de muitos sociólogos, políticos e economistas, uma espécie de eldorado maravilhoso. E como que penitência e tónico para as fraquezas e desvairos que ressumam de vida dura e intensa, de condições de higiene e alimentação deficientes e de ambições e desenfreados vícios que caracterizam muitos dos grandes aglomerados urbanos.
A solução, em si mesma, tem aspectos fascinantes. Há nela ética construtiva e sã. A Humanidade nasceu na terra, nela viveu e, por milénios, da terra hauriu suas energias e vitalidade. No fundo da alma do homem supercivilizado há ainda hoje o vago desejo de delir angústias ou destemperos nalguma casa de campo isolada nos confins de aldeia sertaneja - e até aqueles que a força das circunstâncias isola do ar livre sentem nas manhãs douradas do Estio a irresistível necessidade de esquecer no seio da Natureza as agruras de semanas e meses de vida artificial.
É ainda hoje das populações rurais que rescendem, como seiva ubérrima, as energias que mais vigorosamente se aplicam à resolução dos tremendos problemas modernos.
Não admira, pois, que a vida rural, firmada em tão sólidos vínculos, apareça a muitos como remédio salutar na terapêutica dos males de uma sociedade que atingiu P vertigem dos mais inconcebíveis planos de domínio das forças da Natureza.
Portugal foi desde as épocas mais recuadas uma terra de gente dos campos. Desviou-se deles para correr mundo durante século e meio - e quis abarcar, em suas débeis mãos, com golpe de águia, o comércio mais rico do Mundo. Intensificou, com as descobertas marítimas e o comércio oriental, a época mercantil e levou dos campos para as grandes aventuras uma parte das populações que na vida agrícola haviam, por séculos seguidos, lançado raízes e obtido forças para tão grande empresa.
Depois esvaíram-se as ilusões. Utopias e sonhos de riquezas inesgotáveis foram-se desfazendo a pouco e pouco e as duras realidades que aconselhavam o regresso à terra transformaram-se em imposição benéfica e duradoura. Portugal, que nascera pastor e evoluíra para a lavoura e envelhecera no comércio, regressara, desiludido e alquebrado, à terra onde fora feliz e onde se fizera forte e robusto - quase um gigante. E desde então viveu em grande parte da agricultura.
Há nesta evolução milenária poios opostos - aspectos económicos de admirar em país de aptidões tão variadas e de possibilidades tão diversas.
Da pacífica vida agrícola, que caracterizou a primeira dinastia, uma nação nova e pequena lançou-se na actividade quase exclusivamente comercial das descobertas. Depois, sem transição, como se a saciedade a envilecesse, voltou aos tempos de outrora - e passou a ser um país essencialmente agrícola.
Nem os acontecimentos da revolução industrial a acordaram, nem os tremendos progressos do século XIX retiveram sua atenção. A viver nos campos e dos campos, a aplicar processos de cultura quase tão velhos como a Nação, indiferente, em sua grande maioria, às alterações que se iam operando nas sociedades europeias e de além-mar, a população portuguesa agarrou-se à terra como há séculos o haviam feito os seus maiores.
Eram, porém, diferentes as épocas e também foram diversos os resultados. Um povo que vive no seio de um mundo que já se não pode considerar dividido em compartimentos quase estanques tem de adoptar métodos de trabalho que estejam de harmonia com os que outros povos adoptam. As actividades agrícolas, como quaisquer outras, estão hoje inteiramente correlacionadas. O que outros fizerem há-de forçosamente repercutir-se no que fazemos; e o nosso bem-estar material e, pode dizer-se, a (própria felicidade do homem dependem em cada país do sinoronismo de suas energias produtoras com as de outros países.
A intensidade da vida rural nos tempos modernos, como nos antigos, deriva muito de factores materiais - o clima, a fertilidade dos solos e outros: Mas também é resultado de providências tomadas no sentido de a desenvolver ou de a enfraquecer.
Perante os fenómenos graves que resultam de urbanismo levado a extremos de promiscuidade humana, o regresso à terra em grau compatível com as necessidades materiais e sociais vai sendo hoje um objectivo - indefinido e vago em muitos dos seus aspectos -, mas que já passou em outros para além de meras aspirações.

A população agrícola

24. Os últimos censos mostram que cerca de 50 por cento da gente portuguesa do continente exerce a sua actividade na agricultura e dela vive. A percentagem deve ser realmente maior, porque muitos dos indivíduos considerados abrangidos em outros grupos têm actividades mistas, sobretudo nos pequenos meios rústicos, em que comerciantes e artífices, além do seu mister, são também pequenos proprietários rurais.
Tal qual transparece do censo de 1940, a actividade agrícola portuguesa reparte-se do modo seguinte pelos diversos distritos do País:

Percentagem da população agrícola por distrito

Abaixo de 50 por cento:

Horta;
Setúbal;
Porto.

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Entre 50 e 60 por cento:

Aveiro;
Funchal;
Faro;
Angra do Heroísmo;
Ponta Delgada;
Braga;
Lisboa.

Superior a 60 por cento:

Vila Real;
Viseu;
Évora;
Leiria;
Portalegre;
Viana do Castelo;
Santarém;
Beja;
Guarda;
Coimbra;
Castelo Branco;
Bragança.

E de notar que a maior percentagem da população agrícola se encontra nos distritos de Vila Real e Viseu. No de Beja influi a população mineira de Aljustrel e S. Domingos. Não se contaram mós distritos de Lisboa e Porto as populações das cidades.
Estes índices revelam que, apesar das transformações operadas pelo desenvolvimento da indústria, ainda em Portugal a maior percentagem da população vive da agricultura.
A sua prosperidade e o seu grau de desenvolvimento revestem-se por este facto duma importância considerável.

A população urbana e sua evolução

25. Os números que acabam de apresentar o quadro da actividade agrícola não nos dizem, porém, tudo sobre esta sólida cadeia que ainda une o português da actualidade à terra e que devia fazer dela a influência anais poderosa na marcha da política (nacional.
E muito difícil determinar qual a percentagem, da população portuguesa que com propriedade possa ser considerada urbana. Em primeiro lugar, em poucos países como, em Portugal se dá tão emaranhada mistura de gente que, embora vivendo em centros urbanos, dedica, a sua actividade e (usufrui os inconvenientes e vantagens da vida rural. Por outro lado, os números aproximados que é possível obter do censo dão-nos apenas as populações habitando cidades. Mas é sabido que há muitas vilas com populações de hábitos idênticos aos das cidades e que delas se não diferenciam em seu modo de vida. Deveriam também ser consideradas populações urbanas.
Isso dá-se especialmente a norte do Tejo, onde há localidades mistas, de gente que vive dos campos, da indústria e de misteres acessórios.
Na impossibilidade de poder chegar a uma conclusão sobre o quantitativo do que pode ser considerado populações urbanas e rurais, organizou-se um mapa que exprime o desenvolvimento demográfico das cidades desde 1864. Os números são os seguintes:

Evolução do urbanismo em Portugal (população das cidades)

[ ver quadro na imagem]

O quadro dá em cada um dos anos mencionados a população dias cidades então existentes.
Certas vilas, como Abrantes, Barcelos, Caldas da Rainha e outras, foram, elevadas a essa categoria depois, e as suas populações aparecem logo no censo seguinte.
Tem sido relativamente diminuto o aumento demográfico nas cidades. Se se considerarem apenas as que já existiam em 1864, excluindo, portanto, aquelas que foram criadas depois, os números são os seguintes:

[ver quadro na imagem]

Incluem-se as vilas de Santarém e Vila Real, por serem capitais de distrito.

A evolução do urbanismo não mostrou em Portugal, como noutros países, até 1940, pelo menos, acréscimos ou variações espectaculosas. Lisboa, que tinha em 1864 cerca de 163:763 habitantes, e que fixados seus limites aparece em 1890 com 301:206 e em 1900 com 356:009, só trinta anos depois ultrapassava o meio milhão.
Para melhor julgar da importância do urbanismo nas províncias do continente, os números seguintes exprimem a população das cidades, excluindo Lisboa, e Lisboa e Porto:

[ver quadro na imagem]

Vê-se que todas as cidades do continente, excluindo Lisboa, têm cerca de 10 por cento da população total. Esta percentagem desce para 6 por cento se se subtrair também o Porto.

Não é, pois, exagerada a evolução do urbanismo até 1940. Entre 1864 e 1940 o aumento das cidades do continente foi de 890:000 almas, números redondos, se se tomarem em conta só as cidades que já tinham tal categoria nessa data. Foi de 980:000 se se incluírem as que com essa designação aparecem depois.
Um aumento de 980:000 habitantes em setenta e seis anos no total dos aglomerados urbanos do continente

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é coisa de pouca importância, sobretudo se se atender a que Lisboa representa metade.
A população das cidades, menos as duas capitais, era em 1940 de cerca de 451:000 habitantes e tivera aumento ligeiramente superior a 263:000 no decurso de setenta e seis anos.
Não vale a pena fazer agora exame mais minucioso da curva do desenvolvimento demográfico das cidades. Basta olhar os quadros atrás insertos para verificar que existiram épocas de enfraquecimento. No período 1878-1890 parece ter havido êxodo dos campos, dado o grande aumento nas cidades. Na realidade isso deu-se por virtude do decreto de Dezembro de 1886 que fixou os limites dos bairros de Lisboa. Esta cidade aparece nesse período com um aumento que não está em relação com os anteriores, nem com os posteriores.
Finalmente, para dar a ideia do desenvolvimento demográfico das cidades em (relação ao total da população, inserem-se a seguir alguns números curiosos:

População do continente e das cidades

[ver quadro na imagem]

Como era de esperar, deu-«e em setenta e seis anos um aumento na percentagem da população urbana, embora ele fosse, se comparado com o de outros países, relativamente pequeno. Em 1940 cercai de 20 por cento da população habitava cidades, enquanto que em 1864 a percentagem era de 11,4. Cerca de 9 por cento de diferença.

Factores que provocam ou dificultam a emigração rural

26. Todas as considerações feitas mostram que não se intensificou até 1940 em extremos semelhantes aos que existem noutros países o fenómeno do urbanismo em Portugal.
Apenas 20 por cento dos habitantes entre nós viviam em cidades, e desses uma parte importante participava na vida agrícola, sobretudo nas cidades de zonas rurais.
A isso se deve atribuir ser o regime de vida menos dependente de confortos materiais -e menor o poder de compra. E fenómeno conhecido que o (progresso material é muito maior em zonas industriais, onde o rendimento do operário sobreleva o das zonas agrícolas. Só a intensificação do progresso agrícola pode fazer melhorar as condições da população que vive da agricultura, sobretudo em -regiões ide desenvolvimento demográfico acentuado, como o de certas províncias portuguesas.
Alargar a margem dos resultados do produtor agrícola com a consequente melhoria dos salários é (passo importante para combater os extremismos sociais. Populações satisfeitas são em geral populações estáveis e pacíficas.
Certo número de factores tem concorrido em Portugal, como em outros países, para a emigração rural, quer ela se encaminhe para cidades, quer para (países estrangeiros.

Entre outros, podem mencionar-se os seguintes:

1.º Extraordinário {parcelamento da terra, que impede cultura agrícola rendosa e adequada, ou deficiente regime agrário, que não permite exploração intensiva, de que derivaria gradual fragmentação de largas áreas sujeitas hoje a cultura extensiva;
2.º Preço excessivo de produtos manufacturados, devida em parte aos direitos de importação ou à ineficiência de actividades industriais internas ;
3.º Relativamente elevado custo de transportes, sobretudo mas zonas situadas longe do caminho de ferro e desprovidas ainda de estradas. A execução de certas obras nos últimos quinze anos trouxe apreciáveis benefícios à agricultura, embora continue a fazer-se sentir a falta de um plano racional de caminhos vicinais, convenientemente traçados e com o objectivo de permitir os transportes por autocarros;
4.º Atrasos no progresso agrícola, por escassez de capital circulante e ausência de auxílio técnico, ou ainda por virtude de métodos antiquados de cultura, que a rotina não permite modificar. Só uma educação agrícola intensiva e bem orientada pode melhorar as condições actuais;
5.º Instabilidade de preços. A curva que os define nem sempre segue a curva dos preços dos artigos industriais indispensáveis ao amanho das terras, e daí resultarem desequilíbrios que muitas vezes consomem o produto de economias ;
6.º Gradual mas perceptível esgotamento de muitos solos, por virtude de rotações não aconselháveis e dos perniciosos efeitos da erosão acelerada nos últimos anos pelo amanho de terras de mato ou em regime florestal;
7.º Incerteza da colocação de produtos e sua venda muitas vezes em condições impróprias. Um sistema de cooperativas que aperfeiçoasse o tipo e qualidade dos produtos poderia trazer apreciável melhoria no rendimento;
8.º Tendência manifestada por muitos agricultores em preferir colocar suas economias em empresas industriais, que muitas vezes se consomem sem retribuição de qualquer espécie, em vez de beneficiar as propriedades que lhes pertencem. A compra de terras por pessoas que não valorizam convenientemente as que já possuem é, em muitas zonas do País, um dos males do seu atraso agrícola.

Tem, em contraposição, influído consideràvelmente para a elevada percentagem da nossa actividade agrícola:

1.º O tradicional apego à terra;
2.º A instabilidade das actividades industriais e as incertezas que daí derivam;
3.º O baixo nível da educação ;
4.º O desemprego endémico mas cidades mais populosas ;
5.º As dificuldades de emigração mas últimas décadas;
6.º Melhorias apreciáveis, sobretudo nos últimos doze anos, das condições de vida social, embora seja necessário ainda fazer um grande esforço no sentido de amplamente dotar a província com os elementos de bem-estar urbano, como esgotos, água potável, habitação adequada, luz e outros.

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Tudo o que concorrer para o aperfeiçoamento do conforto das populações rurais tende indirectamente a fixá-las.
Não é pessimista a conclusão que é lógico extrair relativa ao desenvolvimento das cidades. (Centros verdadeiramente urbanos há dois ou três. A vida de certas cidades e vilas portuguesas ainda tem muito de rural. Os seus habitantes vivem em grande parte da agricultura e nela exercem sua actividade.
Não é possível alterar o desenvolvimento natural de um país, e medidas de Governo não podem, por si só, impedir a emigração. Uma política definida, orientada no sentido de auxiliar as povoações murais no seu duro mister, atenuará as dificuldades e impedirá que dela raiam.
Ora dos elementos que podem trazer maior intensificação agrícola e mais fartos rendimentos individuais, a rega adequada de largas zonas, tanto a sul como a norte do Tejo, é evidentemente o mais importante.
Como se acentuou em tempo oportuno, o bom aproveitamento dos recursos aquíferos do País, tanto os que derivam de águas das chuvas como os que pelos rins atravessam Portugal e se escoam para o mar, é o primeiro problema económico nacional.
A irregularidade das chuvas e a sua mó distribuição constituem um obstáculo que, sem poder ser totalmente corrigido, pode ser muito atenuado.
Assim, qualquer programa económico nacional deve conter, dentro das possibilidades financeiras, a irrigação de área razoável.
Não se deve esquecer nesta matéria, que a influenciada rega é altamente favorável à paz social e que a contínua pressão demográfica exige medidas urgentes que levem a uma produção muito maior de géneros alimentícios.
O problema tem aspectos e características diferentes a norte e a sul do Tejo, excepto no Algarve e em certos concelhos do distrito de Setúbal vizinhos de Lisboa.
No primeiro caso predomina fortemente a grande fragmentação da propriedade, e o absentismo é pouco importante. No segundo .caso a monocultura, a grande propriedade, o absentismo e a cultura extensiva dominam quase inteiramente a vida económica.
Ainda nesta larga região, que abrange os distritos de Portalegre, Évora e Beja e concelhos, como Grândola, Alcácer do Sal e outros, do distrito de Setúbal, e Coruche e parte da Chamusca e outras zonas do de Santarém, a irregularidade das chuivas e a secura da atmosfera são factores que impedem o bom aproveitamento dos solos.

O regime de chuvas, a área média da propriedade rústica e a densidade demográfica

27. A humidade e o regime de chuvas, além da constituição geológica dos solos e sistema orográfico, são factores preponderantes mas aptidões agrícolas das diversas zonas do País.
Ainda há largo campo para investigação de todos estes factores. O levantamento geológico com a minúcia necessária e o estudo físico-químico dos solos prosseguem vagarosamente.
Já é, porém, possível fazer ideia geral do regime de chuvas de quase todo o País. Espalhados, encontram-se por toda a sua superfície algumas centenas de postos que recolhem os elementos essenciais ao estudo das precipitações atmosféricas e atua frequência. Na maior parte dos casos existem elementos relativos aos últimos vinte anos, e não é raro compulsar dados que se estendem por muito mais tempo.
Não é ainda o que devia ser. A Organização Meteorológica Internacional resolveu, na Conferência de Varsóvia (1935), que o clima se definisse pelas condições meteorológicas médias do mês e do ano, calculadas para um período de trinta anos.
O período das observações de que se dispõe é desigual e, em relação a algumas estações, é pouco extenso para, com segurança, se poderem estabelecer leis.
Em todo o caso, os elementos existentes já permitiram que o Observatório do Infante D. Luís publicasse em 1943 uma carta pluviométrica de Portugal referida ao período normal 1901-1930, que nos dá, com grande relevo e com surpresa .para muita gente, a distribuição das chuvas em todo o País.
Segundo esta carta, as zonas onde chove menos são uma estreita faixa no litoral sul do Algarve e a nordeste do distrito da Guarda, perto das margens do Côa (Pinhal, Almendra, Castelo Melhor).
As médias da maior parte do Alentejo são superiores a 400 milímetros e até mesmo a 600 milímetros, o que é notável sob muitos aspectos.
A maior parte do distrito de Beja, desde a raia de Espanha até ao vale do Sado, está compreendida na zona pluviométrica dos 400 a 600 milímetros.
No Alentejo o distrito de Portalegre é o que recebe maior precipitação. As médias anuais mais baixas encontram-se em Avis (423 milímetros em 1910-1941), em Monforte (454 milímetros em 1910-1941) e em Fronteira (400 a 600 milímetros); no resto do distrito a precipitação média anual vai de 600 a 800 milímetros e nalguns casos a mais

Na maioria dos postos udométricos observam-se em geral meses sem chuvas; mas, como de resto em muitas zonas situadas a norte do Tejo, na média das observações efectuadas num período de muitos anos assinala-se sempre, mesmo na estação mais seca, uma pequena precipitação mensal.
Os dois concelhos de Monforte e de Avis, de baixa pluviosidade quando comparados com o resto do distrito, são dos de maior área média da propriedade rústica e dos de mais pequena densidade de população. E notável esta relação entre o fraccionamento da propriedade, a altura das chuvas e a densidade demográfica.
As cifras que ilustram perfeitamente a influência da divisão da propriedade na população vêm no quadro que segue:

Distrito de Portalegre

[ver quadro na imagem]

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Pode dividir-se o distrito em dois grupos: os concelhos com densidade superior a 30 habitantes por quilómetro quadrado e os de nível inferior.
Entre os primeiros apenas Eivas destoa na harmonia do conjunto, por ter área média superior aos outros; tem densidade demográfica das mais elevadas e, conjuntamente com o concelho de Campo Maior, uma altura de chuvas compreendida -entre 400 e 600 milímetros. A elevada densidade demográfica é devida à população da cidade.
No segundo grupo há três concelhos onde a (precipitação média anual é inferior a 600 milímetros: Fronteira, Monforte e Avis. A altura média de chuvas nos restantes é sempre superior àquele total.
Neste grupo parece que a pluviosidade não influi no fraccionamento da propriedade, excepto nos dois últimos concelhos (Monforte e Avis).
Há zonas de elevada média com precipitação idêntica à de outras com área média inferior.
As condições pluviométricas não se afastam muito das dos distritos limítrofes a norte do Tejo. Há mesmo zonas de intensa precipitação pluviométrica em Marvão, Portalegre e Castelo de Vide (serra de S. Mamede). As médias que prevalecem aios concelhos limítrofes da Beira são idênticas às do lado norte do Tejo. Também não é muito diferente a constituição geológica, que, contudo, produz melhores solos e em certas regiões com maior capacidade de absorção de humidade.

28. O distrito de Évora tem à densidade de 28 habitantes por quilómetro quadrado. Borba, Estremoz e Vila Viçosa são os três concelhos com maior densidade: respectivamente 66 no primeiro e 49 nos outros dois. Os concelhos de Évora, Redondo e Reguengos não passam de 32-31 e os restantes são inferiores a 25. Alandroal e Portei têm densidades inferiores a 20 habitantes por quilómetro quadrado.
Examinando a pluviosidade e as áreas médias, pode organizar-se o mapa seguinte:

Distrito de Évora

[ver quadro na imagem]

Embora os números relativos a chuvas, extraídos da Carta Pluviométrica, possam não corresponder a observações realmente efectuadas dentro da área de cada um dos concelhos, o mapa anterior, que representa as condições gerais da distribuição das chuvas na região, exprime a tendência já atrás verificada.
Nos concelhos de grandes áreas médias a população é esparsa, embora não possa ser dito que a altura das
chuvas seja muito baixa: 600 a SOO milímetros em Évora e Arraiolos e 800 a 1:000 milímetros em Montemor-o-Novo. Os números referentes aos concelhos de Montemor-o-Novo e de Évora devem, porém, sofrer correcção. Os do primeiro na população, que deveria ser menor se não fossem as indústrias de Vendas Novas, e os do segundo pelo aglomerado populacional da capital do distrito.
Os dados pluviométricos mostram alturas médias de precipitação muito diferentes em Mora (na zona de 400 a 600 milímetros da Carta) e Montemor-o-Novo (na zona dos 800 a 1:000 milímetros). A altura de chuvas em Viana do Alentejo (1:000 a 1:500 milímetros) deve também ser assinalada como correspondendo a uma das zonas de mais elevada precipitação da província.

29. O distrito de Beja tem interesse especial, não só por ser de grande área -mais de 1 milhão de hectares, mas por ser também aquele em que parece haver menor pluviosidade.
Seguindo a orientação já aplicada aos dois distritos de Portalegre e Évora, distribuem-se também agora as densidades por grupos, seguidas da área média dos prédios rústicos aios concelhos a que se referem e da respectiva pluviosidade, seguindo a Carta Pluviométrica de Portugal (1901-1930). Os números são os seguintes:

Distrito de Beja

[ver quadro na imagem]

Na cifras referentes as densidades populacionais de Aljustrel e Beja tem também de se tomar em consideração o facto de o primeiro concelho ter população mineira elevada e o segundo ser a capital do distrito.
Este grupo, feitas as correcções, contém quatro concelhos de área média relativamente baixo, com densidade de população superior a qualquer outra do distrito (Cuba, Vidigueira, Serpa e Moura).
A precipitação média de 600 a 800 milímetros por ano dos concelhos de Cuba e Vidigueira não pode ser considerada pequena. O nível das chuvas em Serpa e Moura (400 a 600 milímetros) correspondente aos valores mais baixos da precipitação ma região.
Concelhos de áreas médias superiores a 10 hectares têm densidades pequenas: 26 em Ourique e até 19 em Alvito e em Barrancos. A precipitação em quase todos eles mantém um nível correspondente aos valores mais baixos do primeiro grupo.
Os concelhos de maior densidade de população, já estudados em outro lugar, acusam precipitações compreen-

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didas entre 600 e 800 milímetros. A sua constituição geológica permite prever a existência de lençóis subterrâneos em condições favoráveis de utilização. Mas tanto num como noutro concelho o sistema de arborização é deficiente. Predominam os montados de sobro e azinho de fraca densidade.
Deve por isso ser grande o coeficiente de escoamento, baixa a capacidade de absorção dos solos por falta de matéria orgânica e relativamente elevada a evaporação. Apesar de tudo, algumas culturas que requerem regadio, como laranjeiras, são de bom rendimento, principalmente no concelho da Vidigueira, onde cresce uma casta de laranjeiras com bastante fama, que está sendo utilizada com êxito em outras zonas do País.
As possibilidades agrológicas de qualquer destes concelhos, tanto em olival como noutras árvores, são muito maiores do que as que até agora têm sido utilizadas.

30. A distribuição da altura anual de chuvas no Centro e Norte do País varia muito e raras vezes a precipitação média atinge nível inferior a 600 milímetros. A Carta Pluviométrica de Portugal mostra apenas uma região extremamente seca a nordeste do distrito da Guarda (Pinhel, Almendra e Castelo Melhor, com chuvas compreendidas entre 200 e 400 milímetros), circundada por outra, aliás de pequena área, com alturas de chuvas inferiores a 600 milímetros.
Idêntica pluviosidade se regista acompanhando toda a costa algarvia em pequena profundidade até ao cabo de S. Vicente.
Dum modo geral pode dizer-se que houve menos na área do País situada a sul do Tejo do que a norte.
Na região Sul, uma parte, que abrange quase todo o distrito de Beja e os vales do Guadiana, do Sado e do Sorraia, está compreendida na zona pluviométrica dos 400 ia 600 milímetros; outra, não menos importante, cabe à zona de pluviosidade compreendida entre os 600 800 milímetros (Évora, Estremoz, Nisa, Ponte de Sor, Odemira e parte da região serrana do Algarve), e, finalmente, Portalegre, Sousel, Montemor-o-NoYo, Alcáçovas, Viana do Alentejo e serras de Monchique e do Caldeirão correspondem a zonas onde a precipitação média excede 800 milímetros.
O exame cuidadoso dos elementos fornecidos pelos postos espalhados pelo País, embora alguns deles se refiram apenas a meia dúzia de anos, permite desfazer a ideia de que são extremamente escassas as chuvas nos distritos situados a sul do Tejo. À parte a zona a que se aludiu, todos eles recebem chuvas que, sem serem abundantes, se podem comparar com as que caem em muitas outras zonas em que se praticam culturas mais (remuneradoras.
Os números parecem demonstrar que não é apenas a questão da quantidade de precipitação a causa directa do regime agrário em que vive grande parte da região do sul do Tejo nem da baixa densidade da população.

A frequência das chuvas

31. No estudo do regime das chuvas há um factor importante a considerar, que é a sua frequência e a sua distribuição.
Os números atrás referidos dão as médias anuais durante períodos de anos. Quais as médias mensais? São as chuvas distribuídas de modo a ocorrer às necessidades das diversas culturas agrícolas? Há longos períodos, de dois, três ou mais meses, em que não chove? E indispensável suprir a falta de água nesses períodos pela irrigação artificial?
Não é possível agora dar elementos completos sobre a frequência das chuvas paira cada concelho. Contudo os resultados das observações verificadas e o exame dos elementos relativos a inúmero reduzido de estações permitem já uma ideia da frequência de chuvas no País.
Deles se deduz que a necessidade da rega parece ser imposta exactamente pela falta das chuvas durante o período em que elas são mais precisas.
O exame da Carta Pluviométrica de Portugal (1901-1930) mostra que nos meses de Abril a Setembro cai relativamente pouca chuva no Sul.
Assim para os dois distritos de Beja a pluviosidade divide-se do modo que segue:

[ver quadro na imagem]

Estes são os resultados acusados pelos postos udométricos nas províncias mais secas do País. Eles não permitem, evidentemente, por si só, dar ideia definitiva das condições meteorológicas das zonas que servem e das suas aptidões agrícolas pelo que respeita a humidade.
São em todo o caso preciosos elementos para qualquer estudo que venha a ser feito, como é urgente que se faça, sobre o regime agrário a sul do Tejo e mostram, que é infundada a ideia de falta de chuvas e da sua extrema irregularidade na mesma zona.

A importância da agricultura na vida nacional

32. Os factores que acabam de se enunciar de modo algum completam o quadro do panorama agrícola nacional.
É conhecida a profunda diferenciação entre os tipos de cultura e até dos hábitos das populações que vivem a norte e a sul do Tejo. E a improdutividade de solos, ou a incerteza de trabalho numa ou noutra área (reflecte-se profundamente na vida interna da Nação.

33. Ora o bem estar e a prosperidade dos povos rurais têm grande importância num país em que anais de 50 por cento da população vive da agricultura e onde, na maior parte dos casos, grande percentagem nela se emprega.
A diminuição, mesmo leve, do seu poder de compra afecta logo outras actividades económicas e reduz de maneira considerável as melhorias que anualmente podem ser introduzidas na propriedade agrícola. Se não sobrarem rendimentos da exploração, não se podem aperfeiçoar os métodos de cultura, nem substituir plantações envelhecidas, nem introduzir outros melhoramentos indispensáveis.
Mas onde pesam mais as misérias derivadas de crises periódicas, ou mesmo de constantes crises em certos aspectos da vida agrícola, é no resto da actividade económica. A indústria e a pesca prosperam e desenvolvem-se tanto mais quanto maior for o mercado. Poder de compra estacionário, decrescente ou incerto nas populações agrícolas tem como consequência imediata, na maior parte dos casos, menor rendimento técnico.
Mostra a história económica dos últimos decénios que períodos de decadência agrícola feriram (gravemente outras actividades nacionais.

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Tudo parece, pois, indicar que um dos mais importantes problemas portugueses consiste em criar gradualmente condições que insuflem vida progressiva à exploração agrícola, de modo a aumentar correspondentemente o poder de compra das populações que dela vivem ou que nela exercem a sua actividade. A indústria que trabalha para o consumo interno terá mais largo campo para vendia de produtos e as condições atrasadas e deficientes, sob qualquer dos aspectos por que se encarem, em que vive grande parte da gente dos campos ir-se-ão modificando na medida do progresso dos rendimentos da agricultura.

Esta é uma verdade elementar, com a qual todos concordam. E é verdade tanto mais evidente e real quanto maiores forem as crises, mais frequentes as épocas de desemprego e anais intenso o desenvolvimento da densidade populacional.

O censo de 1960 acusará no continente e ilibas cerca de 10 milhões de -habitantes - mais 4 milhões do que em 1920 e cerca de 71 por cento mais do que em 1911
Este desenvolvimento da população pode considerar-se satisfatório, mas exige correspondente acréscimo dos rendimentos nacionais. Requer até mais do que isso, porque o nível de vida social de grande parte da população portuguesa necessitava em 1911 e necessita ainda hoje de grandes aperfeiçoamentos em quase todos os seus aspectos.
Não faltam dentro do País condições que assegurem, se convenientemente aproveitadas, rendimentos muito maiores dos que os que se extraem agora da agricultura e da indústria.
O mundo moderno tem exigências grandes, que devem ser satisfeitas com método.
Pondo de parte, por agora, a grande obra de progresso que é necessário realizar nas zonas rurais e que trará como consequência o seu desenvolvimento económico e social, suo também de importância as exigências culturais e materiais do País, considerado no seu conjunto - e essas só podem ser satisfeitas se houver aumento apreciável nas receitas públicas e sua boa e criteriosa aplicação.
Toda uma longa série de reformas e projectos de utilidade utilidade pública esbarra perante o nível das receitas orçamentais. E já foi provado 1 que elas são das mais baixas da Europa.
Andam as receitas públicas ligadas aos rendimentos, de cada um, e sobre a agricultura recai grande parte do seu peso - sob a forma de contribuições e impostos directos e indirectos e taxas da mais variada natureza.
Enquanto a economia nacional mostrar predomínio da actividade agrícola na maior parte da sua população, o problema da cultura e do rendimento da tenra há-de revestir-se de grande importância.

Características agrícolas e demográficas a sul e a norte do Tejo

34. Qual é, pois, a situação da propriedade rústica? Quais são os seus (rendimentos? Em que circunstâncias e condições se exerce o labor agrícola em Portugal? Qual o regime de propriedade, o tipo de exploração, o rendimento da unidade de superfície nas várias zonais sujeitas a diversos climas? Como intervém o Estado, pelos seus órgãos técnicos, na melhoria dos rendimentos agrícolas ? Quais as deficiências, os contratempos e as necessidades da exploração? Que correcções é necessário introduzir? Que medidas a impor para melhorar os rendimentos? Quais os limites da interferência do Estado em face das modernas teorias do conceito de propriedade?

Uma longa série de interrogações se poderia alinhar, todas tendentes a esclarecer um problema que é velho como o Mundo e que se reveste em cada época que passa de novos aspectos e terá por consequência de ter novas soluções. Aã ideias humanas evolucionam com o cair dos anos. A política, que noutras eras podia ser talhada pelos homens, é hoje imposta pelos resultados de suas invenções científicas. Escapam ao cérebro humano mais arguto os fios que conduzem a vida material dos povos. O oportunismo inteligente e evolutivo passou a ser a norma em que assenta a orientação política nos tempos modernos. E a pairar sobre tudo - sobre os homens, seus projectos e suas ideias; sobre as coisas e sua crua materialidade - as forças que irradiam de aturadas investigações, levadas a extremos de perfeição, tendem a dominar cada vez mais a vida de cada um.
Não vem para aqui indagar, nem tal poderia ser tentado em estudo desta natureza, se a evolução económica dos últimos decénios tende a dar maior somatório de felicidade ao homem, se o progresso, a crescer com tão avantajados passos, conduz a maior bem-estar moral e material.
A irresistível força das coisas humanas, que transparece luminosamente da análise dos acontecimentos que se desenrolaram nas cinco agitadas décadas do século actual, impõe, porém, a quem governa e a quem é governado o dever de adoptar e acertar as medidas necessárias à neutralização de cataclismos sociais, que só conduzem a misérias e a ruínas.
Noutros tempos emanavam directamente da autoridade e poder real, até nos aspectos materiais, as directrizes que presidiam ao desenvolvimento económico. Abusos de poder e insuficiente atenção a fenómenos económicos e sociais fizeram eclodir certas teorias falsas de um liberalismo extremo, que impediu a- cooperação, anarquizou as relações sociais e fez ruir, por desordenada concorrência e outras causas, os fundamentos de um melhor aproveitamento dos recursos potenciais do Mundo e sua mais justa distribuição. De toda a confusa série de discussões e abalos que caracterizaram grande parte do sacudo XIX nasceu o feroz individualismo, que se reflecte em quase todos os aspectos da vida dos povos e que se tornou extremamente perigoso para o racional desenvolvimento da propriedade rústica, no que diz respeito essencialmente ao rendimento da sua exploração.
Não se trata apenas, neste aspecto, da grande ou da pequena propriedade, dos grandes ou dos pequenos proprietários. A ideia mãe que hoje prevalece e que o rodar dos anos arreigou profundamente no espírito de todos é a completa liberdade de cada um poder exercer em seus domínios a actividade que lhe aprouver.
Ora a noção do bem comum impõe restrições à liberdade individual na actividade económica. Ela é contrária a preconceitos de passado recente, e sem a sua nítida compreensão não serão possíveis progressos nem se poderão evitar catástrofes, tanto no domínio das actividades agrícolas como no das industriais.

O regime da propriedade rústica

35. Qual é o panorama do regime da propriedade agrícola em Portugal no presente momento?
Quais são as relações entre a densidade demográfica e esse regime?
O simples exame dos números permite dividir o País em duas grandes zonas: a norte do Tejo um maciço intricado de pequenas glebas cobre largas áreas, mesmo nas regiões montanhosas mi de solos fracos; a sul do

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Tejo, com excepção de raros oásis, espalhados aqui e além, e de pequenas zonas em redor de povoações, estende-se uma vasta área em que predomina a grande propriedade.
Esta é a (primeira conclusão que se extrai do exame dos números dos (prédios rústicos. A segunda deriva ou está relacionada com a primeira. Á densidade de população da ordem igual ou superior a 100 habitantes por quilómetro quadrado, em muitas regiões, opõem-se outras no Sul inferiores a 30 e até 20. Daí resulta um evidente desequilíbrio no poder de compra e no rendimento por unidade de superfície, que é tanto maior quanto mais intensa for a cultura.
Mas no Norte a extrema divisão da propriedade restringe consideravelmente o seu rendimento. E na verdade angustiosa a vida de milhares de proprietários, pequenos e grandes, com courelas ou glebas quase microscópicas, espalhadas por extensas áreas e às vezes em circunscrições administrativas longínquas.
Reflecte-se em tudo a deficiência da exploração - quer se trate de plantações ou núcleos florestais, quer de culturas hortícolas, arvenses ou frutícolas. Um proprietário de 10, 20 ou mais prédios de ínfimas áreas tem de distribuir a sua atenção e seus recursos por todos eles - e os prejuízos que daí advêm são tais que, muitas vezes, quase que vale mais abandonar a cultura de alguns, ou então destiná-los a exploração pouco rendosa. Nem «pode ser aplicada técnica própria, nem os deslocamentos de mão-de-obra por pequenos espaços de tempo são, ema certos casos, pagos pelos frutos colhidos.
No Sul e nas zonas de grandes prédios a falta de capital e a de mão-de-obra impede muitas vezes o aproveitamento de glebas susceptíveis de cultura intensiva, ou evitam até, como é corrente no Alentejo, a exploração directa das propriedades.
Por outro lado as condições físicas do solo, a falta de água para rega, desconhecimento o de métodos de cultura intensiva, a desorganização dos mercados, a falta de comunicação em certas zonas impediram a exploração para o regime de cultura extensiva, baseado essencialmente na produção do trigo e gados.
A água é condição fundamental para melhor aproveitamento das boas terras alentejanas - e com a água tem de aparecer técnica agrícola e comercial diferente da que hoje se aplica.
Há muito tempo que se espalhou a ideia da irrigação do Alentejo, como se fora possível, em grande escala, desviar e distribuir dos seus rios, por gravidade, as quantidades de água necessárias para a intensa obra de colonização que o sul do Tejo espera há muitos séculos. Mas nem as condições do meio o permitem, nem o relevo orográfico indica ser possível a rega por este processo, com excepção de algumas dezenas de milhares de hectares nos vales do Sado e do Sorraia e provavelmente em outras pequenas áreas.

possível cultura agrícola intensiva em largas zonas ai ente j anãs, mas a água para rega terá de ser elevada da toalha aquífera subterrânea ou dos dois grandes rios, o Tejo e Guadiana, e seus afluentes. A investigação do nível dessa toalha, as possibilidades económicas de seu uso e a delimitação das regiões em que a água dos dois rios pode ser utilizada com proveito deveriam constituir, talvez, o mais rendoso projecto de hidráulica agrícola neste País.
Se são estas as condições em que vivem duas grandes zonas de Portugal, sensivelmente iguais em áreas, desde que se tire à do norte o que é utilizado pela indústria, o que constitui os baldios e o que é formado pelas áreas florestais, quais os remédios a aplicar para a sua valorização? Gomo aproveitar o esforço de tantos milhares de trabalhadores que sobram dum lado e minguam no outro? Não será possível acudir à crise em que periodicamente caem os distritos ai ente j anos e suavizar a vida precária dos povos a norte do Tejo? E não poderá resultar de tudo maior somatório de rendimentos nacionais, e, por consequência, a elevação do nível de vida social do País?

A pulverização e a concentração da propriedade

36. O problema é tão vasto que é ousadia pretender discuti-lo neste lugar. Encerra em si mesmo o presente e o futuro da maioria do povo português e também há nele muito do próprio futuro da Nação.

Qualquer plano que tenda a modificar as actuais condições agrícolas do PUÍS só pode ser iniciado e executado se houver a aquiescência voluntária de, pelo menos, grande parte da população e, sobretudo, dos detentores da propriedade. Ele encerra modificações tão sensíveis da presente estrutura agrícola que se torna absolutamente essencial a educação paciente, constante e séria das pessoas que hão-de sofrer suas consequências.

o norte do Tejo o actual regime agrário indica logo a necessidade do emparceiramento - a transformação gradual de domínios compostos de pequenas glebas em propriedades susceptíveis de melhor exploração agrícola. O emparceiramento tem sido levado a eleito sob a égide do Estado em regiões de grande número de países europeus, com resultados satisfatórios, e não há razão a opor-se a que o mesmo venha a suceder em Portugal. Lá, como cá, havia e continuou a subsistir a tradição, neste ponto rotineira, da excessiva partilha de prédios, e a oposição tenaz à reunião, por troca ou de outro modo, de propriedades confinantes. Apesar de tudo e perante as vantagens que disso advêem, tem sido possível transformar radicalmente a economia de muitas regiões que antes viviam mal.
Na maior parte do sul do Tejo, exceptuando o Algarve, o problema é precisamente oposto ao do norte. Englobadas em prédios de um milhar ou mais de hectares, há zonas excelentes para culturas intensivas, possuindo condições de solo e recursos aquíferos que permitem a obtenção de maiores rendimentos. Muitas dessas áreas continuam, como no passado, em regime de cultura extensiva, exactamente como outras em que não pode ser aplicado diferente regime de exploração.
No Norte e no Sul há, por consequência, defeituoso regime de propriedade: o extremo parcelamento e a grande concentração -que se traduz em elevada densidade demográfica e diminuto povoamento, quase o deserto em certos concelhos, como em Avis e Alcácer do Sal, em que em 1940 não passava de 15 o número de habitantes por quilómetro quadrado.
Sem que sejam devidamente resolvidos estes dois grandes aspectos do problema agrícola português - o emparceiramento com as melhorias, que são sua característica no Norte, e o uso de águas subterrâneas e de rios para rega no Sul, com a consequente exploração intensiva de áreas propícias para esse fim pelos actuais proprietários ou por outros- não pode ser considerado resolvido, ou em vias de resolução, um dos mais importantes problemas da economia portuguesa.
Mas isto é apenas o fundo de uma questão muito complexa, que não pode ser encarada satisfatoriamente só com providências que tendam ao emparceiramento de prédios no Norte e ao uso de água mas zonas próprias no Sul. A técnica agrícola, a comercialização dos produtos, o capital necessário para futuros empreendimentos, a escolha do método de cultura vêm logo a seguir, como no desfiar de um rosário, em que às contas se seguem outras contas.
Qualquer plano de reforma agrícola que não tenha em vista os objectivos fundamentais do melhor rendi-

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mento da terra, pelo aumento da produção por unidade de superfície, pode, momentaneamente, atenuar crises e trazer lenitivo, aqui ou além, mas nunca resolverá nem o problema do Alentejo nem o da vida das populações rurais do Norte.
Aumento dos preços dos produtos agrícolas, forçado por cartéis ou outros organismos, sem olhar às condições de exploração, pode, na verdade, melhorar durante alguns anos a situação do agricultor. Não se deve, porém, esquecer que o poder de compra nacional reside também nele em grande parte, e que o que sobra da exploração não será o suficiente para manter definitivamente o novo nível de vida. Por um lado, o agricultor terá de pagar mais caro os produtos agrícolas que ele próprio não cultiva; por outro lado, encontrará mercado restringido porque diminuiu o poder de compra das classes não agrícolas, por não ter havido aumento de salários. O exemplo do vinho pode ilustrar o caso. Enquanto se mantiver o preço do vinho em certo nível o seu consumo está generalizado; há suficiente poder de compra para absorver as colheitas, se estas, evidentemente, não tiverem ultrapassado esse poder de compra. No caso em que o vinho atinge preço muito superior, aqueles que não viram correspondentemente elevados seus rendimentos ou deixarão de o beber ou, em última análise, absorverão menor quantidade. Haverá decréscimo da produção e o raciocínio poderá ser levado até ao extremo de mostrar ser menor o lucro do vinicultor com preço alto do que antes das medidas que forçaram a subida no preço.
As condições em que se encontra o País, sob o ponto de vista agrícola, são herança de longuíssimos anos de indiferença por certo número de problemas de profundo interesse para a vida nacional. É muito próprio da nossa índole, e possivelmente isso mesmo se tem dado noutros povos, o estudo superficial das questões. As dificuldades atalham-se, as amarguras adoçam-se. Raras vezes é possível, na intensidade e rapidez da vida dos homens, ir até ao fundo dos problemas, estudá-los com minúcia e em conjunto e preparar e impor as medidas que melhorem de vez as questões que se reconheça necessitarem de remédios enérgicos. Por não se fazer isso a tempo e horas há prejuízos sem conta, que se repetem ano após ano, num desfiar amargurado de calamidades que poderiam ser amortecidas ou grandemente atenuadas.
A vida agrícola sofre desses males e há zonas devastadas periodicamente no decurso de séculos pelas mesmas catástrofes.
O Ribatejo, nas lezírias, é exemplo típico de prejuízos, que se cifram por muitos milhares de contos, em culturas destruídas, salários perdidos, terrenos assoreados, canais entupidos, vidas ceifadas, toda uma série de misérias que se lêem e conhecem e que bem mereciam ser corrigidos e suavizadas. Parece estar averiguado que há coincidência de torrentes, porque outro nome não têm muitas vezes as águas dos tributários portugueses do Tejo, sobretudo na sua margem direita, com as grandes águas espanholas, foram as cheias que maiores e mais gravosos prejuízos trazem aos vastos e fertilíssimos campos do Ribatejo.
O Ponsul, a Ocreza, o Zêzere e, possivelmente, duas outras ribeiras de menor importância seriam, se for fundada essa suposição, as causas basilares da grande parte dos prejuízos ribatejanos.
Ora o regime desses rios permite fácil regularização, com dispêndio de somas que bem cabem dentro das possibilidades nacionais. Meia dúzia de barragens em lugares convenientes, auxiliadas por uma ou duas no próprio Tejo, formariam os reservatórios necessários para armazenagem de parte dos volumes de cheias que tanto mal causam nos terrenos de jusante. E a quantidade de energia hidroeléctrica que dessa regularização poderia resultar exerceria acção extremamente benéfica na vida económica nacional.
Presume-se que em uma década esta questão possa ser modificada.
Problemas com o carácter do problema agrícola português não podem, por consequência, ser resolvidos aleatoriamente, tomando todos os anos medidas que auxiliem por algum tempo a gente dos campos ou criando organismos sem meios para atingir as raízes daninhas que minam a economia agrícola. Não atacar de frente a fatalidade de uma cultura cara, apesar dos salários baixos, que, ou não se adapta ao clima e ao solo, ou não é conduzida com os meios técnicos que a ciência agronómica possui e que por outros são usados em larga escala, equivale a deixar em suspenso a sua resolução, a qual se irá tornando mais difícil de ano para ano.

A irrigação e suas possibilidades

37. O sensível progresso realizado no estudo do regime de chuvas, que é consequência da instalação de postos udométricos por toda a área do País e da unificação dos serviços meteorológicos, permite já fazer ideia dos recursos aquíferos nas diversas regiões.
A primeira grande comissão que se extrai é esta: tirando duas pequemos zonas nos cursos do Côa e do Guadiana, a quantidade de chuvas em Portugal tem médias quase sempre superiores a 500 milímetros e na maior parte da região considerada extremamente seca até há poucos anos a altura de chuvas é mesmo superior a 600 milímetros. A norte do País a água que se infiltra é em parte recuperada por uma rede de poços, que são a base de inúmeras culturas de regadio. São essas culturas que permitem a pequena propriedade.
No sul do Tejo, com excepção do Algarve e certas zonas alentejanas situadas em redor de vilas, cidades ou aldeias, o secular regime agrário e os próprios hábitos da vida doméstica das populações, só em casos raros e especiais utilizam as águas subterrâneas para fins de rega. O costume rural das Beiras e outras províncias, onde, se pode dizer, cada morador, ou, pelo menos, a sua maioria, cultiva parte dos legumes de consumo familiar e produz, além disso, frutos ou alimentos, que grandemente ajudam a parca economia do casal, só existe em muito pequena escala no sul do Tejo. Até em zonas de maior fragmentação da propriedade ou em exemplos de tentativas de divisão em glebas, que representem propriedade perfeita, a exploração com objectivo de prover às necessidades da família com legumes e outros produtos hortícolas não é em geral o objectivo imediato.
Das monografias sobre estudos de colonização agrícola que foram examinadas pelo autor há numa que merece reparo especial e até certo ponto indica a tendência que tem presidido à divisão da propriedade em certos casos, com mira no maior valor do terreno repartido.
Uma herdade com 402 hectares mo concelho da Vidigueira, freguesia de Selmes, foi dividida em 111 glebas, agrupadas depois em prédios contendo diferente número de glebas. Formaram-se assim 96 propriedades de áreas variáveis. Depois de arredondamentos e outros contratos reduziu-se o número de propriedades para 86, com a área total de 397 hectares, durante os dezoito anos compreendidos entre 1919 e 1937.
Neste relativamente longo espaço de tempo desapareceram as propriedades de área inferior a 1 hectare; aumentou o número dos prédios compreendidos entre 1 e 2 hectares; diminuíram de 37 para 25 as propriedades entre 2 e 3 hectares; passaram de 8 para 12 as de 3 a 4 hectares; diminuiu o número de prédios entre 4 e 5 hectares; aumentaram o número e a área de todos os prédios compreendidos nos grupos de 5 a 10 hectares, de

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10 a 20 e de mais de 20 hectares. Neste último grupo havia e continua a haver apenas uma propriedade que de 46,5 passou para 56 hectares.
O que há de interesse nesta operação é o regime de cultura que se seguiu à fragmentação da propriedade.
O autor da monografia exprime assim o que se passou:

Efectuada a divisão, passaram as novas propriedades a ser cultivadas intensamente ao modo da região: alqueive com ou sem leguminosas (em raros casos precedidos de um ano de pousio) - trigo, aveia ou cevada -, Verificando-se assim a supressão ou encurtamento da duração do pousio e, consequentemente, o desaparecimento total da exploração pecuária.
As poucas excepções a esta regra resumem-se na cultura caracterizadamente hortícola... de melões, melancias, milho, fava... Todas estas culturas podem considerar-se casos esporádicos e de quase nula importância no conjunto agrícola.

E, depois de descrever alguns dos prédios em que se praticou e continua a praticar a cultura hortícola ou onde foram abertos poços com água que se não utiliza nessas culturas, a monografia conclui:

A superfície da Herdade da Torre, hoje quase tão nua como há dezoito anos, podia estar coberta em grande parte por olival, o qual, tratado com esmero, como o da courela 84, aumentaria consideràvelmente o rendimento e, portanto, o valor das courelas. Abriram-se em todos os prédios no espaço de dezoito anos apenas oito poços.

A mesma monografia trata com certa minúcia das condições do concelho da Vidigueira. A hidrografia da região, na parte relativa a altura das chuvas e na ausência de posto local, pode ser imaginada pelos resultados de Cuba e Beja. A média quinquenal do primeiro dá 667mm,7 e a do segundo em quarenta anos foi de 545mm,9 no posto do Observatório Central Meteorológico e de 859mm,8 segundo os dados para três anos do posto da Herdade do Soeiro (Ministério da Agricultura). Não deve ser por aí além a média das chuvas na Vidigueira. Dada a sua situação, porém, ela há-de andar à roda de 600 milímetros. Sôbre as possibilidades aquíferas a «memória» emite a seguinte opinião, que para ser fundada:
Apesar de os terrenos da maior parte do concelho serem xistosos, em muitos pontos desta mancha geológica seria possível a exploração de águas subterrâneas por meio de poços, de modo a regarem-se áreas relativamente importantes... Na zona do miocénio lacustre melhores resultados poderiam conseguir-se quanto ao aproveitamento dos recursos aquíferos do solo. O aproveitamento dos recursos aquíferos, mesmo para a rega de pequenas superfícies, merece a maior atenção e cuidadoso estudo, pois com pequenas e pouco dispendiosas obras se conseguiriam regar muitas zonas do Alentejo, o que muito influiria no bem-estar da população.

Este exemplo mostra que nem mesmo na pequena propriedade se intentou realizar o tipo de prédio com parte da sua área sujeita a regadio, porquanto se abriram apenas oito poços. De resto foi adoptado, logo a seguir à divisão, o mesmo tipo de cultura pobre, embora mais intensivamente, por muitos dos proprietários serem seareiros e jornaleiros. Nem sequer se desenvolveu a plantação de oliveiras, que exemplos nos vizinhanças provaram ser rendosa.

38. O velho hábito de não utilizar águas subterrâneas de poços e minas a sul do Tejo dá o tipo de cultura extensiva que ali prevalece. Dela resulta a existência de vastas herdades, muitas delas com áreas superiores a 1:000 hectares, e algumas passando vida económica extremamente difícil. Se há resultados positivos na sua exploração, em grande número de casos eles são consequência de arrendamentos ou do trabalho do seareiro, visto não serem exploradas directamente pelo senhorio.
Outro fenómeno que só aparece no sul do Tejo é a tendência para a concentração de propriedade, como no caso já acima apontado dos concelhos de Cuba e Vidigueira, que são, no distrito de Beja, dois dos quatro concelhos com menor área média.
Não devem ser eles excepção e hão-de certamente existir outros em que se dá o mesmo fenómeno, embora, sobretudo na zona do morte, a fragmentação se vá tornando cada vez maior.
Os números parecem demonstrar não serem escassas as chuvas nem ser o tradicional regime de cultura extensiva resultante apenas de falta de possibilidade de utilização das águas meteóricas para usos agrícolas.
Já se verificou, e a carta pluviométrica confirma-o, haver zonas em outras partes do País com idênticas médias anuais, tanto em Trás-os-Montes como na Beira Alta, no Ribatejo, na Estremadura e na Beira Baixa, onde são completamente diferentes os regimes de propriedade e de cultura.
Devem por consequência existir outras razões a explicar um fenómeno que remonta a muitos séculos e que pode porventura ter origem em causas mais de ordem política do que propriamente de ordem física.
Conviria, antes de tudo, estudar as disponibilidades aquíferas que podem ser utilizadas, e não é difícil determinar hoje com suficiente rigor as que se perdem por evaporação, as que encontram saída para os rios por escoamento, e finalmente a percentagem que, infiltrando-se no solo e nas rochas, é susceptível de ser recuperada e usada para regar à superfície. O nível da toalha de água depende de muitos factores. Alguns dos que influem para que ele seja profundo podem ser facilmente corrigidos. Do nível da toalha de água, que flutua com as estações, com a constituição geológica, com a natureza dos solos e ainda com a densidade e tipo de vegetação, depende a possibilidade económica de utilização das águas subterrâneas. Não é difícil, porém, determiná-lo.
Deve ser grande a evaporação no sul do Tejo. Ela varia com a temperatura, velocidade dos ventos e carácter da vegetação. Como este fenómeno é menor em zonas frias e nas estações de baixa temperatura e como as precipitações pluviosas no sul do Tejo se dão em grande parte nos meses do fim do Outono, Inverno e princípio da Primavera, é natural que o seu efeito sobre a totalidade das chuvas seja menor do que se julga.
O escoamento deriva do relevo do terreno, da vegetação e da natureza do solo. O sul do Tejo é levemente ondulado em grande parte da sua área. Em compensação a existência de poucos maciços de vegetação do tipo necessário à correcção de escoamento, leva a prever que este seja grande. A falta de vegetação, tão característica em certas regiões, está produzindo uma das grandes calamidades que há muitos anos vem atingindo, e continua a atingir, em proporções cada vez maiores, os solos portugueses, tanto a sul como a norte do Tejo. Vegetação inadequada ou imprópria aumenta a erosão - o flagelo dos terrenos alcantilados.
O seu desnudamento produz a perda de solos ou diminui consideràvelmente a capacidade de absorver a água das chuvas. A falta de matéria vegetal, que, sobretudo a sul do Tejo, vai transformando em campos sáfaros terrenos outrora susceptíveis de boa cultura, ainda impede a retenção de água das chuvas.

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39. Todos este factores devem ter concorrido para o actual regime de cultura do sul do Tejo, da sua baixa densidade demográfica, da concentração da propriedade e, indirectamente, para o baixo rendimento colectável por unidade de superfície que as matrizes apontam e que se transforma em menor retribuição para o erário público.
A defesa dos solos aráveis pelo uso de meios que tendam a combater os tremendos efeitos da erosão; o estudo de medidas que se destinem a aumentar a capacidade de absorção dos solos; o alargamento das arcas cobertas de matéria vegetal, que possa entravar os efeitos do empobrecimento de matéria orgânica dos terrenos cultivados e, ao mesmo tempo, dificultar o escoamento e a evaporação, estão na base de qualquer projecto de reforma agrária de toda a vasta área do sul do Tejo. Qualquer plano de fomento agrícola que não tente resolver estes problemas ou, pelo menos, atenuar os efeitos dos agentes que gradualmente vão minando a riqueza agrícola dos solos alentejanos está condenado a insucesso.
Não é possível, em ensaio desta natureza, formular largas considerações sobre um assunto de tão transcendente importância e de tão largas repercussões na vida económica nacional, considerada em seu conjunto. Mas não é exagerada a afirmação, nem falha de base sólida, fundada nos elementos que a técnica ensina, de que mais cedo ou mais tarde se haverá que adoptar medidas que envolvam a transformação do regime agrário que caracteriza actualmente grande parte dos concelhos dos distritos de Setúbal, Santarém, Portalegre, Évora e Beja. Não sendo insuficiente o regime de chuvas, há possibilidade de utilizar grandes disponibilidades de águas subterrâneas em cultura intensiva de muitos tractos de terrenos hoje sujeitos a culturas extensivas. É possível repetir em importante área do sul do Tejo o que já constitui realidade em muitas zonas do Norte: uma maior colheita de produtos agrícolas e pecuários pelo uso de rega com águas subterrâneas.
Os grandes projectos de irrigação com a utilização de águas de rios puramente alentejanos são limitados por muitos factores, uns de ordem física, outros de ordem económica. Podem resolver certos problemas locais que envolvam a rega de alguns ou de milhares de hectares. Más, por si só, nunca resolverão o problema da rega no Alentejo.
O uso dos recursos aquíferos do subsolo já constitui, na maior parte dos concelhos do Centro e Norte do País, a base em que assenta a vida das populações rurais.
Há-de vir a ser também no futuro elemento valioso no progresso e colonização de largas áreas a sul do Tejo.
Não tem havido até agora esforço de técnica organizada por parto de entidades oficiais ou particulares no sentido de esclarecer a importância e a possibilidade de utilização de águas subterrâneas, e quanto ao uso de águas superficiais, de rios ou ribeiros puramente alentejanos, os reconhecimentos topográficos feito até agora mostram ser relativamente pequena a área susceptível de rega nos distritos do sul do Tejo. Tirando as obras no Sado e no Sorraia, muito pouco aparece com possibilidades de êxito económico. As bacias mencionadas representam uma percentagem extremamente pequena, no conjunto.
A utilização, porém, das águas do Tejo elevadas na época de grandes caudais, com o emprego de energia temporária, muito barata, e o seu armazenamento nas zonas em que for precisa constitui um auxílio poderoso à valorização de largos tractos de torremos que hoje pouco produzem. O assunto, tratado noutro capítulo, merece estudo muito aprofundado. Poderia operar dentro de bases estritamente económicas uma verdadeira revolução agrária numa zona sujeita a crises de desemprego cíclicas, embora pouco povoada.

IV

O PROBLEMA ALIMENTAR

Condições da Europa

40. Qualquer programa económico nacional tem de basear-se também no aumento da produção agrícola dentro do País e nos territórios de além-mar.
O acréscimo na produção terá de ser muito grande, dadas as insuficiências actuais, sobretudo em cereais panificáveis e gorduras! O gradual desenvolvimento demográfico e as melhorias indispensáveis nos consumos exercem também uma forte pressão sobre a indispensabilidade de melhorar as produções agrícolas.
O problema assume, porém, aspectos alarmantes quando se estuda simultaneamente com as condições dos países da Europa Ocidental.
Apesar de esforços feitos no sentido de melhorar a vida agrícola, a Europa Ocidental terá de importar em 1950 mais de 2 biliões de dólares de alimentos.
Há-de ser possível fazê-lo, embora em detrimento de outros aspectos da própria economia interna, em virtude do auxílio americano. Mas logo que este cesse, em 1952, não se vê modo de resolver uma questão que está no âmago dos seus infortúnios actuais.
Sabe-se que a vida do Mundo se ajustara no sentido de dar a certos países europeus um lugar preponderante no fabrico de produtos industriais, sobretudo bens de produção. A Europa, principalmente a Alemanha e a Grã-Bretanha, e mais tarde a Itália e a Suécia, sem falar na Holanda, Bélgica e Suíça, obtinha grande parte dos meios financeiros, com que comprava alimentos, da exportação de máquinas de toda a espécie. O déficit em produtos alimentares anteriormente à guerra era muito grande. Os números seguintes definem o sentido do seu comércio antes e depois da guerra em relação a alimentos:

Importação de produtos alimentares

Milhões de dólares (preços de 1947, F. O. B.)

[Ver Quadro na Imagem]

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Importação de produtos alimentares

Milhões de dólares (preços de 1947, F. O. B.)

[Ver Quadro na Imagem]

[Continuação]

Nota. - Os números foram extraídos de Economic Survey of Europe in 1948, preparado pela Research and Planning Division - Economic Comission for Europe of the United Nations, Genebra, 1949.

Este quadro mostra, em síntese, a dependência da Europa de países não europeus.
As importações de produtos alimentares de países não europeus em 1938 andavam à roda de 8 biliões de dólares, enquanto que as exportações não passavam de 614 milhões.
Por virtude da guerra e de outros factores de natureza política, a situação piorou muito em 1948 e não parece que a vida possa melhorar conisideràvelmente nos anos próximos. Têm-se feito esforços no sentido de aumentar as exportações, mas com poucos resultados.
Na verdade, apesar de os números mostrarem ligeira baixa na importação, o volume de mercadorias entradas na Europa foi bastante menor, e daí resultou grande diminuição em consumos. A alta dos preços e a falta de meios financeiros deram lugar a demasiadas restrições.

Principais importações

41. As grandes necessidades europeias de origem extra-europeia em produtos alimentares são constituídas por cereais, óleos e gorduras, bebidas e tabacos.
As principais importações de fora do continente, por grupos, em 1938, 1947 e 1948 foram as seguintes, em milhões de dólares (preços de 1947, F. O. B.):

[Ver quadro na Imagem]

Estas cifras definem o estado da Europa pêlo que toca a alimentos. A cisão, claramente marcada, entre o Ocidente e o Oriente complicou as coisas em extremo, dado o sistema de comércio prevalecente no período

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anterior à guerra. A Europa Ocidental, em matéria alimentar, passou a depender quase por completo das Américas do Norte e do Sul e da África.
Os grupos que maior influência exercem nas importações são os cereais, tanto panificáveis como secundários, os óleos e gorduras, as bebidas e tabacos, as carnes e lacticínios. Em outros produtos vegetais incluem-se as frutas, o açúcar, as batatas e diversos.
O problema posto com a crueza que os números mostram dá a razão fundamental que levou ao auxílio norte-americano.
A Europa Ocidental, exausta, com população a crescer, a produção diminuída e com parcos meios financeiros, não podia adquirir os alimentos essenciais à sua vida. Ou os consumos ainda haviam de diminuir mais, até um ponto vizinho da fome, que, aliás, já prevalecia em certas zonas, ou os povos produtores teriam de a socorrer e evitar assim graves acontecimentos que se desenhavam já no horizonte. Daí resultou o auxílio dado pelo plano Marshall, que terminará em 1952.
Não é este o lugar para fazer o processo crítico da aplicação dos fundos postos à disposição da Europa pelos Estados Unidos. O assunto é demasiadamente profundo e envolve a análise da economia da própria América e da Europa Ocidental, e das digitações políticas que a têm assaltado.
Contudo, as modificações constantes introduzidas nos métodos de aplicação do plano e a análise do uso dos fundos votados pelo Congresso indicam que a Europa está longe do equilíbrio previsto para 1952. Nesse equilíbrio a importação de produtos alimentares desempenha um papel de primeira grandeza, e como tal foi reconhecido, desde o primeiro dia, pela Organização Europeia de Cooperação Económica (O. E. C. E.), que é o organismo das nações da Europa Ocidental encarregado de estudar e distribuir os fundos votados na América.
A fim de obviar aos inconvenientes das importações maciças de alimentos, a O. E. C. E. planeou um aumento de 4 biliões de dólares (preços de 1948) na produção alimentar europeia, o qual daria em 1953 um nível superior em 2 biliões ao de 1938.
Era já de si tarefa hercúlea este formidável acréscimo na produção alimentar. Diversos países, entre os quais Portugal, concordaram em fazer um esforço nesse sentido se lhes fossem concedidos os meios financeiros essenciais, e daí o vasto plano de energia e rega proposto ou sugerido.
Mas, como aconteceu com outros países, os planos de expansão previstos não tiveram lugar - não vale a pena agora explicar as razões. Apesar desta falta, que por si seria suficiente para mostrar que o alvo de 1953 não será atingido, novos estudos e investigações indicam ser insuficiente para as necessidades da Europa Ocidental o aumento dos 4 biliões de dólares de produtos alimentícios previstos para 1953, e julga-se agora que essa previsão deve ser aumentada ainda.
Sem que isso aconteça, os consumos a partir de 1952 terão de diminuir. A Europa encontrar-se-á novamente em frente de uma grave crise alimentar, a não ser que outros países - e neste caso é a América do Norte - continuem o auxílio generoso que lhe tem prestado até agora.
Poderá a Europa Ocidental, no curto período que decorrerá até 1953, aumentar tão largamente a sua produção agrícola? Conseguirá a exportação industrial da Europa suprir as falhas do passado e readquirir nos mercados extra-europeus a posição que lhe permita realizar os meios monetários necessários ao pagamento dos produtos alimentares a importar?
Haverá que produzir internamente as substâncias alimentícias essenciais até por preços muito mais altos do que podem ser obtidos noutros continentes?

42. A alimentação constitui hoje um grave problema de governo em todos os países, até nos grandes produtores, como os Estados Unidos, onde são aplicados programas a longo prazo de garantia de preços. Na Europa o Estado, por directa intervenção do Governo e de organismos oficiais ou semioficiais, tem despendido largas somas com a manutenção dos preços, de modo a tentar reduzir o seu nível e manter os consumos.
Mas, infelizmente, certos países aproveitam a oportunidade para sobrecarregar nas vendas à Europa, encargos que estão longe de corresponder a livre concorrência ou até ao razoável.
Os parcos recursos disponíveis desaparecem no pagamento, a preços altos, de géneros essenciais à vida. O processo vai tomando aspectos sérios e graves para o Mundo.
Já não é apenas o nível artificial de custos nas Américas do Norte e do Sul, obtido por programas de garantia ou de outro modo - e houve casos em que se foi além do concebível; nas próprias nações europeias certos produtos, como o carvão, por exemplo, têm preço diferente para o que é exportado.
A questão europeia vai, pois, assumindo aspectos que convirá encarar com seriedade e vigor. A Europa, por voltas de 1953, está na contingência de voltar de novo à posição de há dois anos: a população a crescer e o nível de vida a baixar por insuficiência de meios para adquirir, fora do continente, o suplemento de produtos alimentares essenciais à sua vida. O dilema de baixo consumo ou aumento de produção aparece assim cada vez mais cruciante, envolvido em laivos de tragédia. É uma situação que os governos têm de resolver.

A posição de Portugal

43. Um dos fundamentos de um programa económico nacional tem de ser a produção alimentar.
Não é apenas o mero facto, apesar do seu muito grande interesse, de importar todos os anos quantidades apreciáveis de alimentos para manutenção do povo português que dá importância à necessidade de maior produção agrícola. O próprio regime nutritivo, tanto a norte como a sul do Tejo, exige correcções em dietas - mais elementos protectores no sul, mais elementos energéticos no norte.
Além disso, é conhecido o fraco poder de compra das populações rurais, que depende em grande parte da produtividade da terra.
Pequeno rendimento do solo, além de impedir melhor remuneração do salário, mantém as receitas públicas em nível baixo e impede, além disso, melhorias sociais indispensáveis à higiene e bem-estar da gente do campo. Por outro lado, a Europa, com seus excessos de população encaminhados especialmente para misteres industriais, é obrigada, como se viu, a importar todos os anos grandes quantidades de produtos alimentares de outros continentes, sobretudo da América e da África.
O caso de Portugal, neste aspecto, assumiu em 1948 certa gravidade, que, aliás, embora mais atenuadamente, se manteve sempre na história económica deste século. Foi feito o estudo recente da influência da agricultura no comércio externo. A ideia era determinar os quantitativos, em toneladas e valores, dos produtos agrícolas e subsidiários da agricultura, de modo a mostrar o saldo positivo ou negativo.
Para 1948 os números que resultaram desse estudo foram os indiciados na páconia seguinte.

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Importação e exportação de produtos agrícolas e subsidiários da agricultura

(Metrópole)

[Ver Quadro na Imagem]

Nota.- Instituto Nacional de Estatística, Anuário de Estatística Agricola.

Houve naquele ano, como se nota, um déficit de 864:000 contos entre o total importado e o exportado.
Ora é sabido que mais de metade da exportação portuguesa consiste em produtos da terra.
Apesar disso ela não consegue equilibrar-se com a importação de produtos agrícolas ou subsidiários da agricultura.
Esmiuçando os números do quadro, vê-se que os produtos alimentares importados atingiram 1.608:000 contos e os exportados, apesar dos vinhos, não alcançaram 1 milhão de contos.
Como o País é deficitário em fibras, gorduras, tabacos e outros, o déficit tinha de ser grande.
Pesam, além disso, na importação os adubos e correctivos, apesar do pequeno consumo de nitratos, e neste aspecto a exportação é quase nula.
Isto significa que o problema da adubação, da pecuária, dos alimentos de origem vegetal e das gorduras necessita de ser corajosamente encarado, dado, sobretudo, o desenvolvimento demográfico conhecido de todos.
O programa português a longo prazo considerou, pelo que diz respeito a alimentos, a gravidade do problema.
Não só toma em conta a possibilidade de aumentar em cerca de 650:000 toneladas por ano a produção alimentar vegetal e animal na metrópole, como até considera de primeira grandeza, e com prioridade sobre outros, a produção alimentar nos domínios ultramarinos, com os projectos de carne e peixe no Sul de Angola, o projecto do duque de Bragança - Quanza, perto de Luanda -, o projecto do Limpopo, em Moçambique, e a maquinaria essencial ao desenvolvimento das culturas de oleaginosas, tanto em Angola como em Moçambique. Prevê, além disso, um considerável aumento da produção de arroz e cereais, sobretudo de milho.

A produção e a produtividade

44. O aumento da produção alimentar em Portugal deve ter dois objectivos. Um é imediato, outro poderá ser realizado num prazo que pode ir até vinte anos.
Ambos têm de utilizar meios idênticos, a aplicar progressivamente.
Uma expansão imoderada de área a cultivar de maneira intensiva não é realizável como objectivo imediato. Quer dizer: não é possível de um ano para outro modificar apreciàvelmente em condições económicas, e até em outras, as áreas actualmente sujeitas a cultura extensiva. A transformação de solos e os planos de rega levam anos a realizar.
Melhorias imediatas podem, contudo, ser introduzidas nos métodos agrícolas nacionais.
Julga-se que melhor aplicação de adubos, de sementes convenientemente seleccionadas e de métodos de rotação apropriados poderiam elevar de 40 por cento o rendimento dos 25 milhões de hectares da Europa Ocidental. E o progresso ainda seria maior se houvesse a possibilidade de melhorar a ensilagem.
Supõe-se, além disso, que a introdução do milho híbrido poderia «repetir o aumento de 25 por cento na produção» notado na América do Norte. Esta é a opinião de especialistas.

45. A resenha que acaba de ser feita das condições actuais da Europa, e daquelas que tornam sombrias as perspectivas de 1952-1953 em diante, indica a necessidade premente de tentar alargar a produção de géneros alimentícios dentro do País e no ultramar.
Já não é apenas uma questão de balança de pagamentos, embora indirectamente lhe diga respeito. É uma questão de subsistência real.

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Os números acima transcritos, referentes à produção alimentar na Europa Ocidental, e as dificuldades financeiras e cambiais que caracterizam a vida de quase todos os países europeus implicam a previsão de graves deficiências em produtos alimentares, se uma vez mais a América do forte não acorrer em auxílio dos países participantes no plano Marshall. Se não houver dólares para pagar os alimentos precisos, logo que cesse o auxílio não haverá importações.

46. As considerações que acabam, de ser expostas levaram a encarar a execução, em Portugal, do plano de rega de 150:000 hectares, não incluindo as áreas do pliocénico atrás mencionadas. Ele prevê o acréscimo de produção de alimentos, que se discrimina noutro capítulo e agora se resume:

[Ver Tabela na Imagem]

O PROBLEMA DA REGA

47. No programa português a longo prazo apresentado em Paris em Novembro de 1948, ao tratar-se dos produtos da agricultura, escrevia-se o seguinte:

A este respeito deverá dizer-se que Portugal é um país que ainda vive em grande parte da agricultura. A sua população encontra-se dispersa e a maior parte vive mas aldeias, vilas ou pequenas cidades, que, na grande maioria dos casos, não têm mais de 20:000 habitantes. É um país que ainda tem características rurais bem vincadas, e não há intenção, em qualquer plano de renovação económica, de alienar grandemente essas características.
Assim, parece possível, dada a índole do povo e o seu apego à terra, alimentar bastante a produtividade dos solos, desde que sejam utilizados os elementos necessários ao melhor rendimento do trabalho.
Por outro lado, o carácter do seu relevo topográfico escoa para o Atlântico uma grande percentagem das águas que correm na Península Ibérica e permite ao mesmo tempo apreciáveis desníveis em distâncias relativamente curtas.
Estes dois factores condicionam a reforma económica a operar em Portugal: o aproveitamento com muito maior eficiência dos rios nacionais, com o objectivo de obter pela rega mais rendimentos por anuidade de superfície; e o uso para força motriz das grandes disponibilidades de águas provenientes de chuvas em território nacional e no país vizinho e que parecem atingir mais de metade da água das chuvas que caem na Península e se escoam para o mar.
A utilização racional da mão-de-obra disponível, originária em grande parte das populações rurais, em obras que reverteriam em seu próprio proveito constituirá uma das bases do desenvolvimento do País. Isso implica bem maiores produções agrícolas do que as actuais, em condições de rendimento muito mais progressivas do que agora.
As características climáticas de Portugal nas regiões de maiores possibilidades agrícolas nas presentes circunstâncias mostram ser impossível melhoria considerável da agricultura sem o uso de maiores disponibilidades de água na época própria.
Com efeito, o regime de chuvas é irregular. Não se pode dizer que é baixa a média da altura das chuvas, mas observações meteorológicas de muitos anos proviam certa irregularidade nas precipitações atmosféricas - abundantes e mais do que suficientes durante um período de oito meses, escassas e deficientes durante os restantes.
Destas circunstâncias deriva, como consequência, a necessidade de proceder a um longo plano de irrigação que imolara, além do aproveitamento de águas superficiais dos rios quanto possível, a captagem de lençóis subterrâneos por bombagem ou de outro modo.
Sob estes aspectos já estão concluídas algumas obras de importância que condizem à irrigação de alguns milhares de néctares e estão outras em vias de acabamento. Mas o programa para os quatro próximos anos de obras a completar e de outras a intensificar é de extrema urgência, parque alivia muito, pela sua produtividade, o peso da importação de produtos alimentares até agora provenientes da área do dólar e pode pôr alguns à disposição da Europa, como frutas, legumes e conservas dela importados.
O outro aspecto do programa económico que tende ao aumento da produção agrícola em futuro próximo é o da utilização de águas subterrâneas, que se sabe existirem em condições de serem elevadas económicamente em zonas próprias e, em certos casos, em zonais habitadas por populações habituadas a regar. Julga-se que a captação de águas subterrâneas em volume suficiente em áreas já reconhecidas poderá melhorar consideravelmente a produção agrícola em curto espaço de tempo, sobretudo de produtos essenciais, como milho, legumes, forragens e outros, além de auxiliar bastante a produtividade de áreas actualmente exploradas na fruticultura, vinicultura, pecuária e diversas modalidades agrícolas. A existência de energia barata é uma das bases.
O programa agrícola, que se não pormenoriza agora, por desnecessário, só pode ter a eficiência desejada se for realizado simultaneamente com a produção de energia em condições de preço que permitam a bombagem económica. Isto significa ser indispensável produzir grandes quantidades de energia a preços baixos.

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falar no consumo interno de combustíveis sólidos e até líquidos, que hoje são quase totalmente importados.

As possibilidades de rega e as qualidades dos terrenos

48. A rega em larga escala dentro do País depende bastante da existência de energia muito barata.
Nas zonas em que ela é mais necessária, as zonas secas e pouco pluviosas, com solos que precisam de ser transformados e adaptados ao uso de água, haverá necessidade de recorrer à bombagem, no Tejo e outros rios de grandes caudais, durante o período em que ela ali exista.
O problema mais grave neste aspecto é, evidentemente, o da produtividade do Alentejo, e na palavra Alentejo - nunca será demais repetir - incluem-se certos concelhos dos distritos de Santarém e Setúbal.
Nos capítulos anteriores tentou dar-se, ainda que sumàriamente, uma resenha geral das condições sociais, agronómicas, demográficas, hidrológicas e económicas desta, larga área, que compreende mais de 35 por cento da superfície total do País.
Verificou-se, em frente de elementos estatísticos e como resultado de estudos feitos nos últimos anos, ser baixa a densidade da população, muito irregular a pluviosidade em algumas regiões, ser possível o aproveitamento de águas subterrâneas para rega de áreas que, no conjunto, podem constituir uma zona socialmente importante.
Além disso, notou-se a secura da atmosfera, a falta de arborização, a erosão a aumentar com os anos.
De tudo advêm crises periódicas e alarmantes.
Considerados todos estes factores, o programa económico a longo "prazo sugeria a imediata irrigação de 50:000 hectares na Vilariça, Cova da Beira, Ribatejo e Alentejo, além das áreas em preparação, como as da Campina da Idanha, Pego do Altar e outras.
Porém, na série de discussões havidas em Paris, e dada a dependência da Europa Ocidental de mercados externos no que toca a certos produtos, foi julgado de interesse o alargamento do regadio de 50:000 para 150:000 hectares.
As possibilidades nacionais neste aspecto são muito grandes, em virtude da existência de uma vasta zona de solos pliocénicos que marginam o Tejo e, em forma irregular, se estendem bastante para o sul. Há, além destes, outros susceptíveis de rega.
A região situada nos distritos de Santarém, Setúbal, Évora e Beja, no litoral do Atlântico, já foi parcialmente reconhecida por entidades oficiais.
No ensaio sobre a "Pobreza e Riqueza do País" 1 estudaram-se com certo pormenor as características dos 600:000 hectares que constituem os "pliocénicos do sul do Tejo, tendo em conta os elementos recolhidos por diversos especialistas, e verificou-se a possibilidade de valorizar largamente uma zona que pode utilizar águas subterrâneas e as águas do Tejo, elevadas por bombagem eléctrica nos períodos de grandes caudais e até em outros, além das que caem na própria região.
A área, dominada por curvas de nível da ordem dos 25 a 125 metros, é muito grande e os preços de custo por hectare parece serem inferiores aos que se obtêm em esquemas que obrigam à construção de altas barragens, se houver energia barata.
Mas além desta vasta zona, rica de possibilidades, situada em condições óptimas de consumo, por se encontrar perto da capital, e de transporte, por confinar com uma via navegável de primeira grandeza, que é o Tejo, há outras susceptíveis de serem influenciadas pela rega com águas bombadas deste rio ou do Degebe, que é afluente do Guadiana.
O problema do Alentejo aparece assim, à luz dos elementos reconhecidos até agora, como um dos mais interessantes no aspecto de rega, aquele em que é possível executar um largo plano de conjunto que transforme em uma ou duas gerações zonas sujeitas agora a cultura extensiva, pouco povoadas, de crises de desemprego cíclicas, onde o proprietário e o Estado sofrem periodicamente as consequências de condições climáticas irregulares.
A economia nacional, sob qualquer aspecto que se encare, ganharia muito com a gradual execução de um grande plano de irrigação no Alentejo, nas áreas em que for social e económicamente possível.

49. As hipóteses que se podem encarar, e mereceram a atenção no programa económico nacional a longo prazo, são várias, mas é mister, antes de tudo, esclarecer nitidamente a questão do tipo de solos que convém enriquecer com a rega.
Uma corrente inclina-se, em primeiro lugar, para a rega de terrenos ricos, de terrenos que, sem grandes transformações agronómicas, possam produzir maiores rendimentos em curto espaço de tempo.
Seria o caso, por exemplo, de áreas nos arredores de Évora ou Beja, perto de Sousel e mais.
Outra corrente aventa a ideia de regar, em primeiro plano, terrenos mais pobres, como as zonas do pliocénico, de que se falou atrás.
Esta última opinião filia-se, sobretudo, na necessidade de povoar zonas quase desertas, de encontrar saída, pana excessos populacionais, de valorizar grandemente terras que hoje pouco produzem.
Por outro lado, há que considerar a quantidade de água necessária, a sua origem, o preço do custo da energia para a elevar e os caudais do rio ou rios que abastecerão durante o Inverno as albufeiras a construir em sítios próprios, na zona sujeita a regadio, e que deverão ser muito mais baratas do que as que hoje se constróem com alturas muito maiores.

50. Ainda paia esclarecer melhor o problema torna-se necessário saber se é possível ligar as bacias hidrográficas do Tejo e do Guadiana por intermédio de um canal, a unir o primeiro daqueles dois rios com o Dejebe, que é afluente do último.
Se fosse economicamente praticável esta última hipótese, toda a vasta região que se estende do Tejo até perto de Beja se ligaria. Os troços do canal condutor geral dominariam uma larga área constituída por pequenos e grandes blocos, que, no conjunto, formariam uma zona certamente muito grande. Se irrigada, na medida das disponibilidades aquíferas, superficiais e subterrâneas, modificar-se-iam totalmente as condições sociais da zona do sul do Tejo.
Não se pretende esgotar agora o estudo das possibilidades deste esquema, que é vasto.
Para o realizar é indispensável o concurso de todo o País, a clara e nítida compreensão de que o futuro só poderá desanuviar-se se o sul do Tejo for modificado estruturalmente nos seus aspectos económicos, sociais e demográficos.
É preciso reconhecer e determinar duas coisas fundamentais: a primeira é o volume de água disponível no Tejo para bombagem, no Inverno e no Verão; a Segunda

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é o cálculo da quantidade de energia temporária que na época de grandes caudais no Tejo pode ser utilizada na sua elevação para o Alentejo, de modo a armazená-la para uso na época própria.
Esta íntima ligação entre os dois problemas da energia e da rega era definida no programa português a longo prazo, apresentado em Paris, do modo seguinte:

O programa agrícola só pode ter a eficiência desejada se, simultaneamente, for realizado com a produção de energia em condições de preço que permitam bombagem económica. Isto significa ser indispensável produzir grandes blocos de energia a preços baixos. É neste aspecto que se casam harmoniosamente as possibilidades económicas nacionais.

51. Vistas as coisas de um modo geral, e considerando o tipo de terrenos no sul do Tejo e no Ribatejo e outras zonas, foi delineado, tentativamente, no programa económico que agora se descreve e sujeito a revisão futura, um plano de rega, como primeira fase de um programa nacional 1.
Esse plano inclui:

[Ver Tabela na Imagem]
Hipóteses de regadio no Alentejo

52. Na escolha das áreas a regar deverá atender-se às duas correntes de opinião emitidas e já mencionadas.
Uma diz respeito à rega de terrenos ricos ou, pelo menos, em condições de poderem ser transformados para esse fim rapidamente e com menor dispêndio. A outra refere-se à utilização de terrenos mais pobres, como os dos pliocénicos do sul do Tejo.
Ambas as hipóteses foram já reconhecidas por técnicos especializados e até se traçaram esquemas que podem ser considerados como indicações úteis para estudos mais completos, que, aliás, não são nem difíceis nem morosos.
Para ilustrar com clareza as hipóteses que se põem para a rega de uma larga área no Alentejo com águas parcialmente elevadas do Tejo, descrevem-se adiante, sucintamente, as duas alternativas, que são: o caso de regadio de tractos de terrenos ricos e o de áreas no pliocénico.

Esquema de terrenos ricos (Ribatejo e Alentejo)

53. O esquema respeitante a terrenos ricos compreende a área total de 142:250 hectares, assim distribuídos:

[Ver Tabela na Imagem]

Esta larga zona pode utilizar águas elevadas do Tejo, as provenientes de chuvas na bacia hidrográfica do Sorraia, a água da bacia hidrográfica do rio Degebe e ainda possivelmente a da bacia hidrográfica do próprio Guadiana.
Os 142:250 hectares, regados convenientemente, necessitarão de cerca de 1 bilião e 100 milhões de metros cúbicos de água, distribuídos do seguinte modo:

[Ver Tabela na Imagem]

A origem desta quantidade de água seria a que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

Estes números, cuidadosamente analisados, representam, como se disse, uma tentativa de esquema. Talvez seja possível obter muito maior quantidade de água para os campos de Beja (64:000 hectares) da bacia hidrográfica do Guadiana (Degebe e Guadiana). O custo da energia e a altura da elevação, além da armazenagem, são os factores que necessitam de ser estudados, e mais adiante se verificarão as grandes possibilidades da albufeira do Degebe perto de Amieira.

Esquema de terrenos pobres (pliocénicos)

54. Diversos estudos foram feitos no sentido de traçar na margem esquerda do Tejo um canal que, além de permitir a rega de largas zonas do pliocénico, servisse para ligar aquele rio com as bacias hidrográficas do Guadiana e do Sado.
O traçado desse canal será descrito adiante, e consta do mapa anexo, mas já se indica que a zona de Beja pode ser atingida por duas directrizes: a primeira na direcção de Évora, que põe o Tejo em comunicação com o Degebe, e a segunda através da cota de 125 metros, derivada do canal principal.
Uma e outra dominam uma vasta área do pliocénico, que pode aproximar-se de 400:000 hectares.
Isto demonstra, praticamente, que a área de possível rega nos pliocénicos é limitada apenas pelo volume de água disponível à superfície ou em lençóis subterrâneos, ou que possa ser econòmicamente elevada do Tejo e pela quantidade de energia disponível para esse efeito, além da capacidade de armazenamento.
Os terrenos do pliocénico são menos ondulados, mas bastante mais pobres do que os de outras zonas consideradas neste programa, e é indispensável fazer uma cuidadosa selecção daqueles que, por sua morfologia e por circunstâncias agronómicas e de vizinhança de reservatórios, estejam em melhores condições para serem utilizados na rega.

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O esquema do pliocénico afigura-se ser muito prometedor, porque pode utilizar não só águas superficiais, como lençóis subterrâneos, que parecem ser abundantes.
É evidente que a combinação das duas hipóteses - a rega de terrenos ricos e a de terrenos pobres - deveria ser, em última análise, a finalidade a atingir. Para isso há que contar, porém, com largas quantidades de água e força motriz e com a capacidade necessária para armazenar, através do auxílio de energia sobrante e temporária, o máximo possível de água em sítios próprios.

55. Os terrenos na margem esquerda do Tejo a juzante da ribeira de Muge, são ligeiramente ondulados e estendem-se até ao distraio de Setúbal.
Alguns têm excelentes condições agronómicas, outros são susceptíveis de ser fàcilmente adaptados à rega.
Foram medidas e reconhecidas áreas do pliocénico dominadas pela cota de 125 metros, e por isso podem ser regadas por intermédio de um canal a esta cota, ou, alternativamente, à cota de 75 metros.
Os resultados aproximados são os seguinte:

1) Zona compreendida entre as cotas 75-125

[Ver Quadro na Imagem]

Os reconhecimentos efectuados prevêem a possibilidade de poder armazenar água durante o Inverno em albufeiras que seriam localizadas nas ribeiras seguintes:

1) Pedrógão (afluente da ribeira do Lavre);
2) Barrosa (ribeira das Barrosas);
3) Freicheirinha (afluente da ribeira do Lavre);
4) Rabasqueira;
5) Serrinha (afluente da ribeira de Marateca);
6) Hortinha (afluente da ribeira de Marateca).

Não são ainda definitivos os elementos respeitantes a estas albufeiras; alguns dos locais foram reconhecidos, porém, para uma primeira aproximação.

56. Ainda são mais largas as áreas dominadas pela cota de 75 metros. Alcançam 243:000 hectares, distribuídos assim:

2) Zona compreendida entre as cotas 0-75

[Ver Quadro na Imagem]

Parece, ser possível obter locais para a construção de albufeiras em:

1) Travessos (ribeira de Canha);
2) Montinho (ribeira do Divor);
3) Pelados (ribeira do Lavre);
4) Carro Quebrado (paul das Lavouras);
5) Marmelos;
6) Quintas (ribeira de Aldeia Velha);
7) Cabeça Gorda (ribeira de S. Martinho);
8) Asseiceira.

As possibilidades de conjunto

57. Os dois esquemas mencionados - de terrenos ricos o terrenos pobres - permitem encarar as possibilidades de melhorar consideravelmente pela rega uma larga área no Ribatejo e no Alentejo. Essa área pode discriminar-se do modo que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

Um canal que partisse do paul do Duque, perto da ribeira de Muge, dominaria à cota de 25 metros, nos primeiros 11 quilómetros, 41:000 hectares; à cota de 75 metros abarcaria mais 202:000 hectares, no total de 243:000 hectares. Se se elevasse o canal para o nível de 125 metros a área dominada ainda aumentaria para 400:000 hectares. A distância entre o paul do Duque e a albufeira do Maranhão, na cota de 126 metros, seria de 95 quilómetros.
Estes troços do canal ligariam o Tejo com as duas albufeiras de Montargil (95,6 milhões de metros cúbicos) e Maranhão (128,6 metros cúbicos), mas ribeiras de Sor e de Seda, já estudadas pela Hidráulica Agrícola.
Poderiam, além disso, transportar água para o esquema dos terrenos ricos, como adiante se descreverá.
É evidente que nem todas as áreas dominadas no pliocénico são susceptíveis de rega. Supondo que apenas metade do total de 395:000 hectares é irrigável, os troços do canal acima indicado poderiam transportar água para o regadio de 342:000 hectares, dos quais 200:000 no pliocénico, a cotas inferiores a 125 metros.

everá acrescentar-se o que for possível aproveitar com o emprego de águas subterrâneas.

Canal do Alentejo

58. Há, como se viu atrás, diversos grandes blocos de terrenos no sul do Tejo, em condições de serem irrigados com águas elevadas do rio, além daquelas que seja possível obter nas zonas beneficiadas, ou próximo dessas zonas.
Existem já estudadas ou concluídas barragens que permitem o armazenamento de grandes quantidades de água em sítios próprios. Sem levar em conta as possibilidades de armazenamento nos pliocénicos atrás

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mencionados, os reservatórios já estudados ou concluídos são:

[Ver Quadro na imagem]

Sem incluir as albufeiras de menores dimensões nas ribeiras do Lavre, Barrosa, Marateca, Divor, S. Martinho e seus afluentes, que podem armazenar água proveniente do Tejo, elevada no Inverno, além da que cai nas suas próprias bacias hidrográficas, nem as disponibilidades do Guadiana e seus afluentes Caia, Ardil e outros, os números acima indicam interessantes perspectivas neste aspecto.
A elasticidade de qualquer programa de rega na zona considerada aconselha a ligação, o mais económicamente que for possível, do Tejo com as bacias hidrográficas do Sado e do Guadiana, por intermédio do Degebe neste último caso.
Quer dizer, um esquema integral deverá prever a comunicação entre as albufeiras acima mencionadas, de modo a poder fazer-se a transferência de água nas ocasiões mais próprias (que serão necessariamente as pluviosas) e, sobretudo, superior às faltas por intermédio do Tejo, que tem grandes caudais.
A tentativa do traçado de canal do Alentejo foi feita nesta base, e a sua derivação, apontada no esquema adiante, nas alturas da albufeira do Maranhão liga-o com a bacia do Sado. Este ramal pode até ser continuado para sul, a fim de poder atingir os 64:000 hectares do bloco de Beja a uma cota de 125 metros.

Directriz do canal do Alentejo

59. O canal do Alentejo poderá ter seu início na estação de bombagem do Pinheiro, no Tejo, a montante da Chamusca, e bifurcar-se para o Alentejo no paul do Duque, na margem esquerda da ribeira de Muge.
Seguindo pela margem esquerda do Tejo domina toda a área abaixo da curva de nível de 25 metros.
Do paul do Duque pode sair o distribuidor da lezíria até ao açude da Rainha, no Sorraia, onde alimentará o sistema de rega do projecto Sorraia, aprovado em 1942.
O canal do Alentejo segue do nó do paul do Duque para a estação de bombagem de Vale dos Postigos, à cota de 25 metros. Nesta estação a água é elevada para 83m,50, descendo para a primeira grande albufeira de Montargil, com a capacidade útil de 96 milhões de metros cúbicos, onde chega à cota de 75 metros.
Desta albufeira a água sobe para a de Maranhão, com a capacidade útil de 129 milhões de metros cúbicos, onde atinge a cota de 126m,60. Seguindo em direcção ao sul, a água é bombada desta albufeira para a estação de Sousel, e daqui até à estação de Fragusta, onde chega à cota de 200 metros; é ali elevada para a cota de 259 metros, dirigindo-se de seguida, em canal, até ao bloco de Évora, com 32:000 hectares, e para o Degebe, afluente do Guadiana.
O quadro a seguir transcrito sintetiza as principais características de uma directriz possível do canal do Alentejo:

[Ver Quadro na Imagem]

Este quadro mostra o comprimento do canal, que anda por 200 quilómetros, e a quantidade total de energia necessária para a bombagem do volume de água a transportar, que atinge 500 milhões de metros cúbicos, assim como o respectivo caudal nos diversos troços.
A directriz do seu traçado teve em visita o duplo fim de prover às possibilidades oferecidas pelas zonas do pliocénico na sua margem direita, ligar com o Tejo as albufeiras já estudadas no esquema do Sorraia e unir, na medida permitida pelas disponibilidades energéticas, as bacias hidrográficas do Tejo e do Guadiana, aproveitando no percurso as possibilidades de rega de terrenos próprios.
São importantes os dispêndios de energia para elevação de águas, sobretudo entre Maranhão e Évora. Mas, uma vez atingida a cota das cabeceiras do Degebe,

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parto daquela cidade, oferecem-se largas perspectivas de rega de terrenos ricos e de vasta capacidade de armazenagem na albufeira de Amieira, que tem apenas 80 metros de altura.
A viabilidade económica do canal do Alentejo além do Maranhão depende apenas da quantidade de energia temporária e sobrante.

Ramificação para sul do canal do Alentejo

60. A larga área do pliocénico que é possível dominar para rega à cota de 125 metros e a conveniência em ligar as obras da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola no Sado já concluídas (Pego do Altar e Vale do Gaio) levou à investigação da possibilidade de ramificar para sul o canal do Alentejo.
Verificou-se que podia iniciar-se na barragem de Maranhão um ramo do canal do Alentejo para sudoeste, de modo a uni-lo às obras do Sado. E ainda se verificou ter viabilidade a continuação para sul desse ramal, até ao distrito de Beja.
Seria, porventura, esta derivação que abasteceria as pequenas albufeiras de que se falou atrás.
Assim, os pliocénicos viriam a ser atravessados na direcção sudoeste por um canal que permitiria uma conveniente distribuição de caudais e poderia recolher e encaminhar para pequenas albufeiras a cotas inferiores águas superficiais ou elevadas do Tejo.

61. O canal dos pliocénicos, iniciado perto da estação de bombagem de Maranhão, a cerca de 95 quilómetros da origem do canal do Alentejo, seguiria a cota de 125 metros, atravessando as cabeceiras das ribeiras de Terá, de Sor, do Divor, da Ganha e outras onde se situam alguns dos principais reservatórios já indicados. Passaria não longe de Montemor e Vendas Novas e atingiria a ribeira de Santa Catarina, já na bacia do Sado, ligando ali com o Pego do Altar. Continuando para o sul, iria encontrar o Xarrama, não longe de Alcáçovas, por intermédio do qual ligaria com a albufeira do Vale do Gaio, já concluída.
Os terrenos de Beja seriam atingidos nas cabeceiras da ribeira de Odivelas.
Este traçado, que precisa de ser reconhecido ainda em muitas secções, atravessaria, a cota alta, uma vasta zona de grande interesse.
Mas a cota de 125 metros ainda continua para sul, passando perto de Ferreira, Ervidel e Aljustrel e abrindo novas perspectivas a um problema de grande interesse social.
Como alternativa esta ramificação poderia ser feita a cota mais baixa - 75 ou 50 metros e ainda dominaria larga área.

Canal do Ribatejo

62. O distribuidor da lezíria, com início no paul do Duque, tem o comprimento de 31 quilómetros e alimenta o sistema de rega do Sorraia, já aprovado. Transportará, para esse efeito, perto de 300 milhões de metros cúbicos de água, elevada do Tejo, que contribuirão para a rega de 37:750 hectares na margem esquerda deste rio.
Na margem direita prevê-se a rega de 6:500 hectares por bombagem, na estação elevatória das Ónias, a jusante de Santarém.

Caudais

63. A rega de uma larga área no Alentejo e Ribatejo, nos termos atrás sucintamente descritos, implica a utilização de grandes quantidades de água em cinco ou seis meses do ano - Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro e, nalguns casos, em Outubro.
A água necessária, na razão de 7:000 metros cúbicos por hectare, só pode ter as origens seguintes:

1) Água proveniente de lençóis subterrâneos;
2) Agua captada nas áreas das albufeiras de retenção;
3) Agua elevada do Tejo, Guadiana ou Degebe, utilizando energia temporária na medida do possível.

1) Agua proveniente de lençóis subterrâneos

64. Conforme sugerido em outro lugar 1, deverá fazer-se, tão depressa quanto possível, o estudo dos lençóis subterrâneos de toda a área dos pliocénicos.
O programa económico nacional prevê os equipamentos necessários para tal fim.
Há indícios - e certeza em muitas zonas - de grandes quantidades de água que poderiam ser usadas económicamente na rega. A sua utilização terá o cunho individual ou familiar, como em certas regiões das Beiras, do Minho e Trás-os-Montes. Conquanto bastante apreciável, a área que pode ser regada por este método nunca poderá ter intensificação semelhante à de águas superficiais. Mas o aproveitamento de lençóis subterrâneos, aliás já de certo interesse no aumento de produção de propriedades rústicas nos pliocénicos, poderá constituir uma pedra no edifício da rega do Sul. A constituição geológica de largas áreas permite investigações rápidas, que poderiam ser feitas com brigadas criadas especialmente para esse fim. Dada a escala das cartas topográficas já existentes e os trabalhos de cadastro em curso em certas regiões, parece não ser nem muito dispendioso nem difícil determinar em pouco tempo as zonas susceptíveis de utilização de lençóis subterrâneos.

2) Albufeiras de armazenamento

a) Zona dos pliocénicos:

65. O princípio fundamental do sistema de regadio proposto para os pliocénicos consiste na formação de albufeiras nas linhas de água da área a irrigar, ou próxima. Para assegurar baixo custo da água retida, o tipo de barragem deverá ser tal que permita construção rápida, por sistemas modernos de movimentação de terras, tão usados já hoje, para o mesmo objectivo, em países progressivos.
As barragens não poderão ser muito altas, uma dezena de metros ou pouco mais, e, portanto, a capacidade de cada albufeira nunca poderá ser grande. Só excepcionalmente, e na base de reconhecimentos feitos, ela poderá ultrapassar duas dezenas de milhões de metros cúbicos.
Parece, no entanto, ser possível multiplicá-las, e também, firmado em reconhecimentos já feitos, se pode julgar praticável a formação de um número de reservatórios capazes de armazenar quantidades apreciáveis.
Parte da que seria precisa para atestar as albufeiras provém das próprias bacias hidrográficas das linhas de água ou ribeiras onde existem.

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A restante terá de ser bombada do Tejo com energia temporária no período pluvioso, variável conforme os anos.
Poder-se-á determinar, com alguma aproximação, a quantidade de água armazenada nas vinte ou trinta albufeiras construídas nas diversas zonas regadas. Embora ela constitua um precioso auxílio à rega, deve contudo supor-se que o auxílio do Tejo é o elemento base do esquema de rega de uma larga área que, como se viu acima, depende essencialmente do total da quantidade de água disponível. Há, por consequência, necessidade de fazer o estudo pormenorizado dos caudais do Tejo durante largo período de tempo, com dois objectivos fundamentais, que são: o valor absoluto desses caudais e sua distribuição mensal, ou até diária, e quantidade de energia temporária susceptível de ser produzida por eles durante o curto período em que ela pode abundar.

b) Albufeira do Degebe:

66. Duas razões principais aconselham o estudo do canal do Alentejo. A primeira é a rega de zonas de interesse ao longo do seu percurso, como Sousel (7:000 hectares), Vimieiro (700 hectares), Arraiolos (3:300 hectares) e Campos de Mira (23:000 hectares). A segunda - certamente a mais importante - é de poder suprir as deficiências em caudais da bacia hidrográfica do Degebe, que foi reconhecido poder armazenar, com uma barragem de apenas 80 metros, mais de 900 milhões de metros cúbicos de água.
Se se confirmarem os reconhecimentos já feitos, a possibilidade de armazenar tão grande volume de água naquele local representa certamente um dos mais interessantes esquemas de rega e até de energia do País, no caso de ser possível atestar a albufeira do Degebe todos os anos.
A bacia hidrográfica do rio, que é afluente do Guadiana, poderá fornecer caudais da ordem dos 300 milhões de metros cúbicos por ano. O saldo terá de vir de outras bacias hidrográficas e principalmente do Tejo.
As características reconhecidas na albufeira do Degebe permitem julgar ser económica a bombagem de cerca de 600 milhões de metros cúbicos de água para o Baixo Alentejo no Estio, com energia obtida em grande parte da própria barragem. A altura média da elevação não ultrapassa 40 metros.
Com efeito, dos 930 milhões de metros cúbicos úteis, cerca de 300 milhões poderiam ser utilizados na produção de energia, a qual, lançada outra vez no leito do Degebe, iria ser de novo usada nos saltos do Guadiana, entre os quais avulta o do Pulo do Lobo, a jusante, onde os serviços oficiais projectaram já um aproveitamento importante.
Quer dizer: a água transferida do Tejo para o Degebe no Inverno, com energia temporária e sobrante, juntamente com a que cai na bacia hidrográfica deste rio, seria usada no Verão em parte na rega de um grande bloco (64:000 hectares) de bons terrenos no distrito de Beja, produziria na própria barragem parte da energia para elevar a água para esse terrenos e ainda iria de novo ser aproveitada em energia estival - portanto muito mais cara - no Guadiana, nos saltos naturais deste rio, já reconhecidos, entre os quais avulta o do Pulo do Lobo. O Baixo Alentejo seria assim duplamente provido do água para rega e energia no Verão, que era a que sobrasse do consumo da bombagem para o regadio de Beja.
O problema apresenta uma base económica de interesse, que provém do facto de poder ser constituída uma albufeira de mais de 900 milhões de metros cúbicos de capacidade no rio Degebe, apenas com um açude da altura de 80 metros, e de ser muito necessário o abastecimento em água e em energia de região rica, desprovida hoje de um e outro daqueles elementos.
O projecto necessita de ser convenientemente pormenorizado, porque a resultar, como se julga, o canal do Alentejo irá desempenhar uma função altamente benéfica no Baixo Alentejo.
As possibilidades no Degebe, a montante de Amieira, parece ultrapassarem muito a armazenagem de 930 milhões indicada no mapa.
Julga-se ser viável, em face dos elementos colhidos, que, com a elevação de apenas 3 ou 4 metros na altura da barragem (de 80 para 83 ou 84 metros), construída a uns quilómetros a montante do lugar previamente reconhecido, a capacidade da albufeira atingirá volume de água superior a 1 bilião de metros cúbicos. A altura da elevação para a rega dos campos de Beja (64:000 hectares), já de si pequena, reduzir-se-ia de cerca de 10 metros, e portanto o consumo de energia seria muito menor.
A verificar-se esta hipótese presuntiva, o esquema do Degebe reveste um aspecto que poderá modificar profundamente a zona do Baixo Alentejo, dado o grande potencial de energia de Verão que pode produzir, tanto na própria barragem como nos saltos do Guadiana, incluindo o Pulo do Lobo, além do regadio.
A grande incógnita, aliás decisiva, que precisa de ser cuidadosamente esclarecida, diz respeito à origem dos caudais necessários para encher a albufeira. E esses só podem derivar, em maior volume, do Tejo na época dos grandes escoamentos.

c) Outras albufeiras, de retenção:

67. Já estão em serviço os reservatórios do Vale do Gaio e do Pego do Altar, que podem armazenar, juntos, cerca de 160 milhões de metros cúbicos de água.
A Junta Autónoma de Hidráulica Agrícola concluiu já os projectos das barragens de Montargil, Maranhão e Fragusta.
A primeira tem a capacidade útil de 96 milhões de metros cúbicos e um volume de escoamento assegurado de 129 milhões. Permitirá a bombagem para o Degebe de 36 milhões de metros cúbicos de água.
A albufeira do Maranhão, com a cota no coroamento de 131 metros e a tomada de água a 93,7, permite a bombagem para o Degebe de 30 milhões de metros cúbicos.
Assim, as duas albufeiras de Montargil e Maranhão podem fornecer 268 milhões de metros cúbicos ao bloco de Evora-Sousel-Arraiolos-Vimieiro e ainda transferir cerca de 66 milhões para o Degebe. A este volume há a acrescentar 70 milhões da albufeira de Fragusta.

3) Valor absoluto dos caudais do Tejo

68. Não é possível no momento presente determinar com precisão o regime de caudais do Tejo nos anos mais próximos. As razões que se opõem a isso derivam, sobretudo, das obras em curso na sua bacia hidrográfica, tanto em Portugal como em Espanha, e, consequentemente, do regime de funcionamento das centrais respectivas o dos fins a que se destina a água armazenada.
As albufeiras mais importantes em Espanha, já em construção ou em projecto, permitem regularizar, segundo informações concretas reputadas exactas, cerca de 3,5 biliões de metros cúbicos de água.

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São as seguintes, com as respectivas capacidades:

[Ver Quadro na Imagem]

Parece, além disso, estar em estudo, a montante de Alcântara, não longe da fronteira portuguesa, um aproveitamento obtido por barragem muito alta, que formará uma albufeira capaz de armazenar perto de 2 biliões de metros cúbicos de água. A ser possível o esquema, o aproveitamento do Tejo internacional poderia ser feito em conjugação com a barragem de Alcântara. O rio tornar-se-ia mais facilmente navegável até muito para o interior de Espanha, através das albufeiras de Belver, Fratel, Tejo internacional e Alcântara.
É ambição do Governo Espanhol utilizar parte importante dos armazenamentos nas cabeceiras dos rios em projectos de rega. Mas parece não virem eles a absorver apreciáveis quantidades do total acima mencionado.
Algumas albufeiras foram constituídas ou projectadas exclusivamente para a produção de energia.
Em Portugal estão em vias de construção os aproveitamentos do Castelo do Bode, no Zêzere, Belver, no Tejo, e Pracana, na Ocreza. O reservatório de Ponsul, próximo de Idanha-a-Nova, está pronto, mas a água retida é totalmente utilizada na rega.
Há projectos para as barragens da Bouça e de Cabril, no Zêzere, e de Fratel e Alvito, no Tejo e Ocreza.

69. Com os trabalhos em curso na bacia hidrográfica do Tejo, é certo que o seu regime se modificará muito, tanto no que diz respeito a caudais no Verão, como no Inverno.
A sua influência, que se fará sentir já nos próximos anos, logo que entrem em laboração as centrais de Buendía e Entrepeñas e outras, em Espanha, e a do Castelo do Bode e Pracana. em Portugal, será a de aumentar muito o escoamento no Verão e reduzir as cheias no Inverno.
O caudal disponível perto de Pinheiro, onde, segundo o esquema atrás mencionado, se elevará a água para rega no Alentejo e Ribatejo, será, por consequência, mais no Verão e menos do que actualmente no Inverno.
Os escoamentos anuais da bacia hidrográfica do Tejo na ponte do Ródão foram por ano, conforme medições diárias, os seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

Se as medições correspondem às realidades, o caudal mínimo andou por 2,5 biliões de metros cúbicos de água, nos anos extremamente secos, e atingiu cifras da ordem dos 29 biliões.
Nota-se que, em quarenta e cinco anos, apenas em sete anos o escoamento anual do Tejo foi inferior a 4 biliões de metros cúbicos. Ele foi superior a 6 biliões em trinta e um anos. Em mais de metade do período os escoamento foram superiores a 8 biliões de metros cúbicos.
As medições feitas em Vila Velha de Ródão não incluem o Zêzere, a Ocreza, a Nisa e outros afluentes de menor importância, o que elevará talvez em perto de 2 biliões o caudal na estação de bombagem a jusante da foz do Zêzere na maioria dos anos.

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Isto significa que existe, até nos períodos muito Becos, a possibilidade de bombar do Tejo mais de 1 bilião de metros cúbicos de água no Inverno e algumas centenas de milhões no Verão, especialmente no caso, como parece certo, de a barragem do Castelo do Bode funcionar como central de Verão cinco ou seis meses.

70. Os números que indicam os escoamentos do Tejo, acima publicados, revelam enorme variação de caudais.
Definem, por si sós, o carácter torrencial do rio que carreia para o Atlântico as chuvas de uma larga área da meseta ibérica.
O seu regime torna difícil armazenamentos sensíveis nos anos de cheias extremas.
Se fosse possível obter capacidade bastante para regularizar integralmente o rio, os escoamentos já calculados para cerca de cinquenta anos mostram que as suas possibilidades económicas seriam vastas nos diversos aspectos da vida humana dentro do País e em Espanha.
É natural que com o andar dos tempos se realizem os grandes projectos de arborização, em marcha nalguns casos, e o regime do rio se modifique favoravelmente.
Para melhor esclarecer um assunto que pode ter grande projecção na vida económica do Sul do País, foram investigados os escoamentos médios do Tejo durante o período de quarenta e cinco anos.
Esta afirmação - durante o período de quarenta e cinco anos (de 1904-1905 a 1948-1949) - mostra, em contrário de informações sobre falta de estudos, repetidas periodicamente a respeito dos dois grandes rios portugueses, que no ponto de vista hidrológico são eles os mais bem estudados.
A investigação do Tejo, no período que decorre entre 1904-1905 e 1948-1949, indica as seguintes ocorrências de caudais em Vila Velha de Ródão na média de quarenta e cinco anos de observações:

Ocorrências dos caudais do Tejo, em Vila Velha de Ródão, na média de 45 anos de observações (1904-1905 a 1948-1949)

[Ver Quadro na Imagem]

As médias de quarenta e cinco anos dão cerca de três meses de caudais médios iguais ou superiores a 250 metros cúbicos por segundo e seis meses em que são superiores a 100 metros cúbicos, na ponte de Ródão.
Isto significa, pelo que diz respeito a quantidade de água, ser absolutamente factível a elevação de 40 ou mais metros cúbicos por segundo para reservatórios no Alentejo, durante um largo período de tempo, a jusante da foz do Zêzere.
O problema que se põe não é, por consequência, um problema de água; é essencialmente um problema de energia, uma grande parte da qual poderá ser produzida na forma temporária e sobrante no próprio Tejo.

Possibilidades de elevação dos caudais do Tejo

71. O Tejo é um dos rios portugueses mais conhecidos no ponto de vista hidrológico. A escala de Vila Velha de Ródão (Porto do Tejo) foi lida diariamente, e até em períodos mais curtos, durante uma larga série de anos, e com esses elementos, confirmados por outros obtidos em diversas escalas a jusante, já é possível determinar por meses, e até por dias, os caudais do Tejo.
Os estudos das medições, feitos por entidades oficiais, referem-se a mais de cinquenta anos, que contêm anos secos, muito secos, médios e húmidos. Dão uma preciosa indicação, que peca por segurança.
Considerou-se, na análise a que se procedeu, como energia permanente a que corresponde ao caudal medio de 2-50 metros cúbicos por segundo, que, como se sabe, não é ainda hoje atingido em todo o ano.
A água para armazenamento no Alentejo é bombada no Inverno de um ponto situado bastante a jusante da foz do Zêzere, e uma parte da energia temporária utilizada nessa bombagem será obtida nas centrais de Belver, Fratel e Tejo fronteiriço; mas, dado o carácter internacional da última, considerar-se-á por enquanto apenas a energia temporária das duas centrais de Belver e Fratel. Sabe-se que a última produzirá mais cerca de 40 por cento do que a de Belver.
Com estes elementos, e com o conhecimento dos caudais médios do Tejo, calculados dia a dia e mês a mês, poderá, chegar-se a cifras aproximadas que exprimam a quantidade de energia temporária no Inverno, isto é, da energia obtida no aproveitamento de caudais médios superiores a 250 metros cúbicos por segundo.
Os números resultantes são aproximados, miem outra coisa é precisa neste estágio. Os números definitivos só a experiência os pode fornecer, porque o método será de utilizar toda a possível energia por turbo-alternadores, situados nas centrais, que serão postos em funcionamento quando os caudais do rio o permitirem, o que pode acontecer durante horas no dia ou dias no mês.
O cálculo foi feito para um caudal turbinável de 300, 200 e 100 metros cúbicos por segundo. Traçou-se a curva das possibilidades de elevação de água, para efeitos de rega, a 50 metros de altura nas três hipóteses da potência da sua maquinaria de elevação corresponder a um caudal turbinável de, respectivamente, 100, 200 e 300 metros cúbicos por segundo.
As ordenadas dão imediatamente, em milhões de metros cúbicos por ano, a quantidade de água que é possível elevar.
Considerando apenas as centrais de Belver e Fratel, uma em construção e a outra em projecto, e o caudal turbinável de 300 metros cúbicos por segurado, em trinta e três anos de medições encontram-se os valores indicados na página seguinte.

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Caudais elevados para eleito de rega a 50 metros de altura, na hipótese de a maquinaria da elevação corresponder a um caudal turbinável de 300 metros cúbicos por segundo em Belver e em Fratel

[Ver Quadro na Imagem]

72. O cálculo feito dá os seguintes volumes de água para trinta e três anos:

[Ver Quadro na imagem]

Os elementos acabados de transcrever mostram que no período de trinta e três anos, estudado, era possível elevar, com energia temporária, à altura de 50 metros, durante onze anos volumes de água compreendidos entre um mínimo de 150 milhões, números redondos, e um máximo de 500 e durante vinte e dois anos volumes de água superiores a 500 milhões de metros cúbicos por ano.
É de notar que, nos trinta e três anos, em oito anos podiam utilizar-se, com a energia temporária existente, volumes de água compreendidos entre 700 e 800 milhões de metros cúbicos e mais de 1 bilião em nove anos.
No caso de ser também considerada a central fronteiriça, mediante prévio acordo com o país vizinho, o volume de água ainda aumentaria em cerca do dobro do elevado pela central de Belver, visto o desnível do troço se avizinhar de 28 metros.
Neste caso, os limites mínimos de 144 metros cúbicos encontrados para o uso das duas centrais de Belver e Fratel aumentariam para mais de 250 milhões.
Também, se a houver, poderá ser usada a energia temporária do Zêzere.
Foi escolhida a curva de nível de 50 metros para efeitos de cálculo. Ela domina uma área superior a 150:000 hectares.
O troço do canal já reconhecido entre Vale de Postigos e a albufeira de -Montargil, de que se falou noutro capítulo, atinge aquele grande reservatório à cota de 75 metros.
A área dominada por esse troço sobe para 243:000 hectares.
A energia correspondente ao suplemento de 25 metros na elevação aumenta proporcionalmente.

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O cálculo feito para o caudal turbimável de 300 metros cúbicos por segundo pode ser repetido para 200 e 100 metros, visto ter sido também traçado o gráfico para esse fim, mas não parece haver vantagem nisso, por ser maior a quantidade de energia produzida e, por consequência, a quantidade de água bombada no primeiro caso.
Parece pois que se está diante de um problema extremamente interessante, de alta projecção na vida política, económica e social, que, por si só, representaria, se não houvesse outros factores a recomendá-lo, o aproveitamento do Tejo tão rapidamente quanto possível.
Com esta nova aplicação dos caudais do Tejo este rio começa a assumir na vida nacional uma importância muito grande, porque, além de poder fornecer apreciáveis quantidades de energia permanente, pode constituir uma fonte de caudais e energia barata para regar zonas que sem esse auxílio continuarão a ser o que são hoje.
As possibilidades de elevação de água para o Alentejo ou para outras zonas não se esgotam, porém, com o emprego da energia temporária do Tejo ou seus afluentes.
Com efeito, o programa económico que neste estudo se recomenda implica a construção de uma rede eléctrica nacional, aliás já em estudo ou parcialmente em construção. O que se pretende atingir é uma espécie de grid, que com tanto êxito ajudou a solucionar o problema energético em Inglaterra.
Ora sabe-se que em certas horas do dia no Inverno e até no Verão sobra energia, que em alguns casos - nos casos em que não haja suficiente capacidade de retenção nas albufeiras - corre rio abaixo, dissipada.
É um desperdício inútil, que pode ser facilmente aproveitado. Essa energia será usada na bombagem nas horas em que ela não é utilizável noutros fins - nas horas em que ela se perde.
A flexibilidade de um sistema de bombagem e a existência de larga capacidade de reservatórios devem ser tais que permitam o aproveitamento da energia, que, de outro modo, se dissiparia em pura perda.

73. Julga-se, em frente das previsões, baseadas nos números e nas realidades que acabam de ser indicados, que há vantagem em fazer a investigação cuidadosa do seguinte:

a) Possibilidades de armazenamento de água em toda a área dos pliocénicos situada abaixo da cota de 75 e, alternativamente, abaixo da cota de 125 metros;
b) Estudo das centrais de Belver e Fratel, com o objectivo também de aproveitar a energia temporária - a energia que pode ser produzida por caudais no Tejo superiores a 250 metros cúbicos por segundo;
c) Investigação das possibilidades de construção e do custo de um canal que domine os terrenos do pliocénico situados abaixo da cota de 125 ou, alternativamente, de 75 e 50 metros;
d) Exame da possibilidade de utilizar as águas da albufeira do Castelo do Bode, no Verão, na rega de terrenos da margem direita do Tejo, como parece ser viável em boas condições económicas;
e) Reconhecimento pormenorizado de um canal no Alentejo que permita transferência da água da bacia hidrográfica do Tejo para a grande albufeira do Degebe.

Conclusões sobre a rega do Alentejo e dos pliocénicos do Sul do Tejo

74. Não é possível ir por agora mais além nos estudos sobre a transformação das condições sociais e económicas do Sul do Tejo. Torna-se indispensável para conclusões definitivas proceder no campo a certo número de observações sugeridas pela discussão dos factos apresentados.
Notou-se que o problema só pode ser resolvido em escala razoável se for traçado um plano a longo prazo que considere:

a) O exame dos melhores terrenos susceptíveis de rega no Sul do Tejo, numa área que pode ir até 500:000 hectares. O conhecimento de solos dentro desta área permite entrever a possibilidade de irrigar económicamente com águas superficiais até 300:000 hectares;
b) A origem da água para o regadio. Ela derivará naturalmente do aproveitamento das chuvas que caem nas bacias hidrográficas dos rios ou ribeiras da região; do apoio de água bombada do Tejo na época pluviosa e, em certos casos, na estival, utilizando a energia temporária e sobrante, quer dizer, a energia de Inverno, nos meses em que há grandes caudais no Tejo, e a energia que não tem consumo, passadas as «pontas», tanto no Inverno como no Verão, e que se dissipará no abaixo onde não houver suficiente retenção, como nas centrais de Belver e Fratel e em outras, nos diversos rios que alimentam a rede eléctrica nacional;
c) A capacidade das albufeiras de armazenamento no Sorraia, Degebe, Fragusta, Pego do Altar, Vale do Gaio e outras mais pequenas distribuídas pela área do pliocénico e atrás mencionadas;
d) Um sistema flexível de canais que permita transporte, em relativamente grande escala, das quantidades de água bombadas do Tejo na época pluviosa. Este aspecto do problema é importante porque da secção dos canais pode derivar o encher ou não os reservatórios. O sistema de canais deve procurar unir as bacias hidrográficas do Tejo, Sado e Guadiana;
e) A investigação das zonas mais próprias para rega pelo uso de águas subterrâneas. Tanto as zonas dos granitos como as do pliocénico podem fornecer abundantes caudais subterrâneos para rega de áreas que sobem até 30 ou 40 hectares ou mais em certos casos;
f) Um esquema de arborização que assegure nas diversas regiões melhorias contra a erosão e a degradação torrencial e possa além disso influenciar o clima e fornecer matéria vegetal para a transformação de muitos solos;
g) Finalmente, o estudo de uma reforma agrária que assegure o capital de 1.º estabelecimento e circulante aos detentores da terra, a formação de explorações em escala adequada e a mão-de-obra especializada essencial à transformação metódica de uma larga zona, de pequena densidade demográfica, explorada em cultura extensiva e sujeita a um regime agrário que se não adapta às necessidades de cultura intensiva, nem até às exigências alimentares do País.

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Outros esquemas de rega e energia

Cova da Beira

75. Merece grande atenção a ideia, por diversas vezes discutida, de utilizar as possibilidades de largo interesse que, no ponto de vista hidrográfico, oferece a serra da Estrela. Este maciço tem condições especiais, não só «m virtude da abundância de chuvas, das mais altas do País, mas ainda das neves, que constituem um reservatório natural até fins da Primavera.
Há possibilidade de armazenar na serra, a grande altitude, cerca de 70 milhões de metros cúbicos de água, que poderão ser usados em dois objectivos económicos de grande valor.
Um é a produção de energia estival durante quatro meses, justamente naqueles em que a energia falta ou é menor em outros sistemas produtores. Neste aspecto a serra pode substituir uma central térmica capaz de produzir, no momento próprio, para cima de 60 milhões de kWh.
Supondo que é possível armazenar na Nave da Candeeira e Asse-Dasse 70 milhões de metros cúbicos de água para uso nos meses que vão de fins de Abril a Setembro, poder-se-iam obter cerca de 60 milhões de kwh de energia de Verão.
O esquema compreende o aproveitamento de uma queda de 300 metros das águas da ribeira da Candeeira, a sua junção às do Zêzere não longe da nascente e o aproveitamento do conjunto através de um túnel, em 100 metros de altura, no Covão da Ponte, já no vale do Mondego.
As águas armazenadas na albufeira de Asse-Dasse, tanto as que vieram do Zêzere como as que provêm da bacia do Mondego, a montante da barragem, são de novo aproveitadas numa queda de 400 metros na central do Vale de Moreira, outra vez no leito do Zêzere. E o conjunto, com o restante caudal do Zêzere, a montante daquela central, é de novo utilizado em Valhelhas, mais a jusante.
Assim, as águas do Zêzere são aproveitadas em queda total de 850 metros e as do Mondego, na pequena bacia a montante de Asse-Dasse, na queda de 450 metros.
A descarga de águas da central de Valhelhas tem lugar a uma cota que domina a Cova da Beira desde Gaia até perto do Fundão, incluindo o vale de Caria e parte importante do vale da Meimoa.
É uma área de bons terrenos de aluvião, conhecidos pela sua fertilidade e habitados por gente acostumada a regar.
No momento actual grande parte das suas possibilidades agrícolas perdem-se por virtude da falta de água nos meses em que ela é mais necessária.
A água da serra, depois de ter produzido a energia estival de que se falou acima, pode ser usada por gravidade na rega desta zona. É natural que o preço da energia estival, por virtude da necessidade de retenção para efeitos de rega, tenha custo superior ao que seria se fosse usada em centrais a fio de água, mas a compensação que vem da rega, que pode ir a cerca de 10:000 hectares, amplamente justifica mais elevado custo, o qual pode ser reduzido pelo pagamento da água, se for necessário. Em todo o caso a energia estival para uma barragem em Asse-Dasse de 70 metros parece não dever ser superior a $30 numa produção de perto de 60 milhões de kWh e armazenamento de cerca de 70 milhões de metros cúbicos, equivalente, mais ou menos, à rega de 10:000 hectares.
No programa económico nacional julgou-se conveniente reduzir, por segurança, essa área para 6:000 hectares.
Feitos os reconhecimentos necessários e a actualização de preços, julga-se que o custo da obra, na parte relativa a rega, não atingirá 46:000 contos, assim distribuídos:

[Ver Tabela na Imagem]

O custo por hectare é, por consequência, bastante baixo, em virtude de se não incluírem as obras de armazenamento. Não seria superior a 7.550$.

Encargos

76. Há a considerar os encargos habituais de capital, exploração e conservação. O custo da água dependerá do orçamento definitivo das obras do aproveitamento hidroeléctrico, portanto do preço da energia estival. No caso de ser resolvido construir o esquema que envolva apenas a produção de energia de Verão e, como consequência, o armazenamento da água para ser lançada na rega no período adequado, o custo será mais alto em virtude de maior dispêndio com a albufeira e máquinas, e, assim, maior o preço de energia.
Para os efeitos de se ter ideia aproximada da viabilidade do esquema energia-rega foram orçados os custos na base da venda de água à razão de 300$ o hectare (mais ou menos 7:000 metros cúbicos).
Nesta base os encargos do regadio assumiriam a forma seguinte:

Cova da Beira

[Ver Tabela na Imagem]

E de notar o baixo custo da rega. Ainda pode ser melhorado se for praticável o uso de maior área, pois o custo de canais e distribuidores e outras obras de regadio e, por consequência, os encargos de capital e exploração não aumentam proporcionalmente. E eles constituem mais de metade do total desses encargos, como se verificou acima.

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Vilariça

77. Não é grande a área a regar nos campos da Vilariça, mas é formada de terrenos férteis de aluvião, que já hoje dão boas colheitas, embora incertas por virtude da falta de rega.
As ,possibilidades de utilizar as chuvas de unia bacia hidrográfica de 3:460 quilómetros quadrados, que é a do rio Sabor, afluente do Douro, toma económico o regadio de 1:750 hectares naqueles terrenos, situados enrama região semiárida.
As vantagens do aproveitamento do Sabor derivam em larga escala do grande volume de água que é possível armazenar quase perto da fronteira, a usar nas sucessivas quedas do Douro nacional.
Os recursos hidiroeléctricos utilizáveis somam 689,2 milhões de metros cúbicos e a capacidade da albufeira no Sabor é de 560 milhões, números redondos. Destes podem utilizar-se 535 milhões, que produzem um caudal permanente regularizado utilizável, sob quedas variáveis de 21 metros por segundo.
Este caudal virá a passar por todos os aproveitamentos do Douro nacional, com excepção do Focinho; quer dizer, produzirá a emergia correspondente a perto de 100 metros de queda na época própria, além da que ele próprio pode produzir.
A água do Sabor, armazenada na albufeira, constituirá por isso um valioso apoio do sistema energia na vegação do Douro nacional.

Rega

78. Os 1:750 hectares de regadio nos campos da Vilariça consumirão 13,5 milhões de metros cúbicos de água, mediante o gasto de 35:000 contos, e os encargos da beneficiação aproximam-se de 1:530 contos por ano, assim distribuídos:

Encargos:

De capital:
contos
Amortização em 50 anuidades à taxa de 2 por cento
ao ano (Lei n.º 1:949): 0,03182 x 35:000 contos ....... 1:114

De exploração e consenvação a 225$ por hectare:
225$ X 1:750 .......................................... 394

De energia para bombagem de rega
291:000 kWh a $10 o kWh ............................... 29

Total ..................... 1:537

VI

O PROBLEMA DO FERRO

A produção de minérios na Europa e América do Norte

79. A importância que os minérios de ferro têm na vida económica moderna deriva essencialmente do gradual esgotamento de reservas que até há poucos anos constituíam a fonte da produção de ferro e aço.
O caso mais típico é o dos Estados Unidos. Os grandes jazigos produtores de minérios de ferro estavam e ainda estão situados no extremo norte, próximo da fronteira canadiana, em Mesabi Range e vizinhança dos grandes lagos. Para os trazer para o sul foi preciso organizar um complicado sistema de transportes, através dos grandes lagos, unidos pelo canal de Sault.
O minério, desde a origem até ao destino, percorre primeiro um troço de caminho de ferro de 80 a 160 quilómetros, atravessa depois os grandes lagos e o canal que os une, numa distância de 1:280 quilómetros, e ainda, em certos casos, necessita de ser transportado uma centena de quilómetros em caminho de ferro até nos altos fornos. A eficiência do sistema de transportes atinge o máximo, com barcos de larga tonelagem (18:000 toneladas) e equipamento mecânico dispendioso para cargas e descargas e passagem através do canal.
Os ricos jazigos de Mesabi Range, nas vizinhanças do Lago Superior, «construíram a nação e ganharam duas guerras», no dizer de políticos americanos. Segundo os cálculos mais optimistas, devem estar esgotados por volta de 1970, e os Estados Unidos ver-se-ão na contingência, a partir dessa data, de utilizar jazigos de baixo teor -as taconites-, visto a prosperidade do grande país norte-americano depender do ferro e do aço, e portanto de reservas conhecidas, pelo menos, com dez anos de antecedência, o que representa umas centenas de milhões de toneladas de minérios.
A própria segurança do país depende hoje da descoberta de jazigos ricos de minérios de ferro, que já se podem considerar minérios estratégicos.
E por isso que as pesquisas atingem intensidade muito grande e os gastos que provocam ultrapassam por muito o que normalmente se lhes destina.
A primeira grande descoberta, no Labrador, com a reserva, provada até hoje, de 300 milhões de toneladas, sofre do clima e da distância. Não é possível trabalhar mais de seis meses no ano e a distância até ao mar é de 350 milhas em terrenos essencialmente constituídos por «tundra».
A segunda grande descoberta foi tornada pública recentemente. Existem no Cerro de Bolívar, na Venezuela, perto do rio Carona, afluente do Orinoco, jazigos que se supõe conterem para cima de 500 milhões de toneladas de minério rico. Julga-se ser possível elevar a estimativa, depois de novos reconhecimentos, para um bilião de toneladas.
Ora o Cerro de Bolívar fica situado a mais de 500 quilómetros de Caracas em linha recta. Para a exploração será preciso construir um caminho de ferro de 450 quilómetros de extensão que custará, com uma ponte de cerca de 6:500 metros, perto de 3:400 milhares de contos, ou a dragagem completa do Orinoco. O transporte para os Estados Unidos, na razão de 2 milhões de toneladas por ano, implicará o uso de barcos de 45:000 toneladas e a distância para Pittsburg atinge mais de 3:000 quilómetros.
Este projecto, ousado, em conjunção com os que estão sendo estudados no sentido de aproveitar as taconites do Lago Superior, onde se projecta gastar 5:800 milhares de contos, mostra a gravidade da situação no grande país norte-americano em matéria de abastecimento de minérios de ferro.
É de notar que para obter o mineiro da taconite, que é uma, rocha xistosa, dura, será indispensável esmagá-la e reduzi-la a pó, que terá depois de ser aglutinado em briquetes para uso nos altos fornos. Dois terços da rocha são deitados fora. Só o restante terço constitui minério.

80. A situação da Europa neste aspecto não é melhor que a dos Estados Unidos.
Quando na O. E. C. E. se considerou a integração da economia dos países da Europa Ocidental e se estudaram as possibilidades de restringir as importações da área do dólar, foi posta em relevo a grande vantagem de utilizar maiores quantidades de minérios ricos de ferro, que eram definidos, nas directrizes enviadas a todos os países participantes, por minérios que contivessem percentagem de ferro superior a 42 por cento.

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Na verdade, o exame da produção actual e das importações no período anterior e posterior à guerra mostra as insuficiências europeias.
A produção de minérios de ferro antes e depois do conflito foi a seguinte:

Produção de minérios de ferro

(Milhões de toneladas)

[Ver tabela na imagem]

Nota. - Economic Survey of Europe in 1918, United Nations, Genebra, 1949.

Estas cifras exprimam o conteúdo de metal dos minérios produzidos e excluem pirites. As quantidades absolutas são, por isso, muito maiores.
A fim de determinar as quantidades de minério será preciso conhecer para cada país ou origem o seu teor em metal. Para os países da tabela que antecede o conteúdo em ferro metálico foi o seguinte:

[Ver tabela na imagem]

A produção de 32 milhões de toneladas de ferro sob a forma de minério em 1938, dos quais mais de metade tinha lugar na Suécia e em França, ainda não foi atingida, apesar de esforços feitos nesse sentido. Tudo leva a crer, porém, que, no que diz respeito a quantidades, será possível dentro em breve alcançar, e até ultrapassar, as cifras do ano anterior à guerra.
Contudo, os minérios europeus são pobres - pobres no sentido de conterem teor metálico baixo.
Viu-se acima que só a Suécia consegue a exportação com teores médios de 61 por cento. Os restantes países utilizam hoje minérios que no caso da Alemanha descem até 25 por cento em certas zonas. Os teores de ferro metálico andam à roda de 30 a 35 por cento em quase todos os países europeus e que só condições ideais permitem utilizá-los.
Por isso há necessidade de importar grandes quantidades de minérios de origens não europeias. As duas grandes fontes são o Norte de África e a Serra Leoa.
As quantidades que actualmente vêm da Serra Leou sobem a 800:000 toneladas, as do Norte de África devem atingir perto de 3 milhões de toneladas 1, e julga-se ser possível aumentar a importação para 5 milhões de toneladas em 1953.
A Suíça produz actualmente 150:000 toneladas e conta aumentar a produção para 300:000 em 1953, mas o conteúdo do minério só excepcionalmente atingirá 50 por cento em 50:000 toneladas. As restantes 300:000 não conterão mais do que 28 por cento.

A importância estratégica dos minérios de ferro

81. Estes dois exemplos, o dos Estados Unidos e o da Europa, mostram o estado actual da questão, tanto no ponto de vista interno de cada país como no ponto de vista internacional.
No caso da Europa o assunto ainda assume aspectos de natureza mais grave - e já durante a última guerra se verificou a delicadeza de um problema político de grande importância.
Com efeito, os dois grandes produtores de minérios de ferro no presente são a Suécia, no extremo norte, com saída por Narvique e Báltico, e a França, na Lorena. Em qualquer dos casos, mas sobretudo no primeiro, as comunicações com o Ocidente são muito precárias, pomo, aliás, já foi, por experiência, amplamente demonstrado.
A existência de jazigos importantes ma Península Ibérica, além de outras razões de natureza política e até estratégica, assegura mais estabilidade em caso de guerra.
Ainda não foi posta com o devido relevo a importância da posição do extremo ocidental da Europa neste aspecto, sobretudo quando se desenha no horizonte um conflito em que a cordilheira pirenaica pode vir a representar papel de primeira grandeza.
Uma grande produção de minérios de ferro e o estabelecimento de indústria siderúrgica eficiente, e até volumosa, podem desempenhar acção importante murai conflagração europeia.
São por demais conhecidas as dificuldades de comunicações com a América em tempo de guerra. Os prejuízos que derivaram no último conflito da destruição de meios de transporte atingiram cifras enormes e ocasionaram grandes dificuldades.
Poupar 200:000 ou 300:000 toneladas no transporte de coisas essenciais, como sejam o ferro e o aço, é, de per si, um grande auxílio.
Dadas as circunstâncias actuais, as reservas de ferro portuguesas têm importância muito grande, não só pelo seu valor intrínseco, mas ainda pela sua posição no extremo ocidental da Europa, em ligação relativamente fácil com o mar. Vale por isso a pena estudar o assunto com certo pormenor.

Os minérios de ferro em Portugal

82. A questão do ferro e aço em Portugal pode ser encarada por diversos aspectos.

1 Rapport du Comité de Sidérurgie, O. E. C. E., sec. V, vol. III, p. 15.

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Põe-se em primeiro lugar uma interrogação, que encerra, em si mesma, todo o problema: haverá minérios susceptíveis de serem exportados com lucro ou transformados internamente em ferro e aço?
Os serviços oficiais procuraram esclarecer esta questão e já foram despendidas avultadas somas no estudo de afloramentos de minérios em diversas regiões do País.
Há abundantes sinais da sua existência e é tradicional no comércio externo a exportação de grande volume de pirites. O seu valor provém da percentagem de enxofre e um pouco de cobre, mas, uma vez extraídos estes, os resíduos podem ser usados para a produção de ferro.
Além das pirites, já foram reconhecidos muitos jazigos de óxidos de ferro, entre os quais avultam, por sua frequência e importância, as hematites e magnetites. E as regiões em que umas e outras predominam são o Alentejo e Trás-os-Montes.
Se forem provadas reservas importantes de minérios com o teor e composição adequados, a próxima questão a resolver será a da sua exploração. Neste aspecto há que considerar as possibilidades de os exportar e as do seu aproveitamento dentro do País.
Até agora os trabalhos de reconhecimento que ofereceram dados mais positivos são os de Moncorvo e do Marão.
E é sobre esses que tem recaído nos últimos tempos era, maior grau a atenção de entidades oficiais e particulares.

Minas de Moncorvo

Quantidade de minério

83. De há muito se conhece a existência de vastas quantidades de minério de ferro perto de Moncorvo e diversos especialistas as têm estudado.
Pode hoje afirmar-se com segurança estar provada a reserva de 165 milhões de toneladas de minério, com percentagens de ferro que variam entre 43 e 56,50 por cento. Não se entra em conta nesta avaliação com todas as áreas do jazigo de Moncorvo em que existe minério in situ, nem se cubicou o minério carreado que recobre as vertentes a e Reboredo e Mua. 8e forem tomadas em conta as áreas não cubicadas e a margem de segurança havida na avaliação, não é exagero contar-se com reservas, certas, nos depósitos de Moncorvo de 200 milhões de toneladas.
Os trabalhos de reconhecimento elevam-se a perto de 4:000 metros de galerias e a mais 600 metros de poços verticais.
Além das existências certas, acima indicadas, podem acrescentar-se, pelo menos, 200 milhões de reservas prováveis.
Estas quantidades, avaliadas ou reconhecidas recentemente, confirmam estimativas anteriores, como a de Sampelayo, que admite a existência de 530 milhões de toneladas, e até a de H. Busquet, que eleva a estimativa de todos os minérios para mais de 1 bilião de toneladas.
Se na estimativa deste último engenheiro forem considerados apenas os minérios com teores compreendidos entre 43 e 49 por cento, a ordem de grandeza dos depósitos é de 600 milhões de toneladas - parecida com a de Sampelayo.
Verifica-se, pois, que o volume dos jazigos de Moncorvo atinge cifras muito elevadas e dá-lhes uma importância excepcional na vida económica portuguesa, no caso de ser possível a sua utilização.

Tipos de minérios

84. As características macroscópicas permitem distinguir três tipos de minérios pela cor: o azulado, o preto e o vermelho, com peso específico de 4. A sílica aparece em percentagens altas, que variam entre 13 por cento nas camadas mais ricas e 29 por cento nas que contêm cerca de 43 por cento de ferro.
O teor de fósforo oscila entre 0,2 e 0,4 por cento, com a média de 0,28 por cento.
A percentagem do enxofre é baixa. Só excepcionalmente alcançou 0,11 por cento. Vai de 0,03 a 0,08 por cento na grande maioria dos casos.
As percentagens de outros elementos são, em geral, muito pequenas.
Já se disse, quanto ao teor de ferro, que está compreendido entre 43 e 56 por cento na estimativa atrás feita.
Sampelayo põe a média entre 53 e 49 por cento e a sílica entre 16 e 20 por cento.
O minério é muito silicioso, tem fósforo a mais para ser usado no forno Bessemer e é insuficiente para o convertidor básico Thomas. A questão que se põe é a de saber se será possível a concentração, de modo a reduzir o teor de fósforo e de sílica e elevar ainda mais a percentagem de ferro.
Sobre este último ponto estão sendo feitos estudos pormenorizados, e parece não haver dúvidas sobre as possibilidades da sua valorização, até neste aspecto, ou então misturado com outros minérios mais puros.

Exploração

85. Os jazigos de Moncorvo têm uma disposição sinclinal, que permite exploração muito económica, que em certos casos pode ser a céu aberto. O problema de desmonte é simples.
Julga-se que uma grande mecanização na exploração poderá oferecer um custo por tonelada desmontada de hematites inferior a 25$.
Para extracção anual, a céu aberto, de 400:000 toneladas de minério, o custo da instalação - preços anteriores à guerra- seria da ordem dos 2:500 contos; para a extracção anual de 2 milhões de toneladas a céu aberto, tratamento do minério e transporte por cabo aéreo até às margens do Douro, o custo seria da ordem dos 60:000 contos - tudo na base de preços de 1937-1938.
Os elementos que acabam de ser indicados mostram três coisas importantes:

1.º A elevada concentração de minérios de ferro na zona de Moncorvo, com altas percentagens de ferro. Talvez se possa dizer com segurança existirem lá 500 milhões de toneladas de hematites, com teor superior a 43 por cento;
2.º A facilidade de desmonte e transporte (por cabo aéreo para o rio Douro) e o baixo custo da tonelada desmontada;
3.º Percentagens altas de sílica e de fósforo e dificuldades na concentração, em virtude das próprias características dos minérios.

No caso de ser satisfatoriamente resolvida à terceira questão, os minérios de Moncorvo constituirão um rico jazigo. Tendo em conta as disponibilidades europeias, Moncorvo pode representar um auxílio valioso à economia da Europa Ocidental nesta matéria.
Explorados à razão de 2 milhões de toneladas por ano, darão um ininterrupto caudal de rendimentos à combalida vida económica do País.

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Minas de Vila Cova

86. Os jazigos de magnetites de Vila Cova, nas abas da seara do Marão, a pouco miais de 100 quilómetros do Porto e não longe do rio Douro, são formados de numerosas camadas magnetíticas, com espessuras variáveis.
Os trabalhos de pesquisa e reconhecimento, já de certa importância, fazem prever a existência de reservas de alguns milhões de toneladas de magnetites, que aumentarão certamente depois de efectuados trabalhos de pesquisa e reconhecimento já previstos. Julga-se que as reservas prováveis e possíveis ascenderão a dezenas de milhões de toneladas.
Há diversos tipos de minérios, com percentagens de magnetite que variam entre um mínimo de 54 por cento e um máximo de 70, no tipo I; um mínimo de 44 e um máximo de 50, no tipo II, e, finalmente, um mínimo de 30 e um máximo de 40, no tipo III.
As percentagens de ferro variam entre 56,96 por cento e 44,57 por cento, o que, na verdade, no que diz respeito a teor, mostra ser um bom minério, tanto mais que as percentagens de fósforo e enxofre são muito baixas. A necessidade de o concentrar provém da percentagem de sílica.
Os estudos feitos sobre as possibilidades de concentração, a não existência de elementos nocivos, a própria estrutura e granulometria, indicam, na opinião de serviços oficiais, que estes minérios t têm grande interesse para lotar com outros minérios de baixo teor» e que, «após cuidada concentração, o grau de pureza é tal que torna aconselhável também o seu emprego para utilizações específicas».

Outros jazigos de ferro

87. Além dos dois jazigos de Moncorvo e Vila Cova, que, por suas características e importância, merecem imediato interesse, existem em Portugal numerosos afloramentos de minérios de ferro.
Pondo de lado as minas de pirites, em activa exploração há muitos anos e que, depois de extraídos o cobre e o enxofre, ainda dão apreciáveis quantidades de ferro, há que reconhecer com maior pormenor jazigos conhecidos no Alentejo e em outros pontos do País. Dentre todos merecem menção especial os de Orada, com reservas admitidas de mais de 3 milhões de toneladas de magnetites, e os de ferro-manganés, também no Alentejo que contêm percentagens de ferro compreendidas entre 55 e 56 e de manganês entre 5,5 e 17 por cento.
Podem computar-se as reservas destes últimos em perto de 5 milhões de toneladas.
Finalmente, ainda se pode ter em conta que em Guadramil, em Bates, nos concelhos de Moura, Serpa, Barrancos e em outras zonas há reconhecimentos já importantes que permitem crer na existência de quantidades apreciáveis de minérios, de características razoáveis para a electrossiderurgia. Alguns, como os de ferro-manganés, podem ser usados na produção de tipos especiais de gusa.

Exploração de ferro

88. O programa económico nacional prevê a exploração de minérios de ferro, de preferência os de Vila Cova e Moncorvo, em virtude da posição dos dois jazigos em relação ao caminho de ferro e via fluvial do Douro.
As bases em que se poderia efectivar a exploração seriam as seguintes:

a) Produção no forno eléctrico de cerca de 200:000 a 250:000 toneladas de gusa, com possibilidades de aumentar a capacidade. Isso equivaleria, mais ou menos, e no último caso, ao consumo de cerca de 500:000 toneladas de minérios de ferro;
b) Exportação, através da via fluvial Douro e Porto, de 1,5 milhão de minérios ricos, concentrados, se for possível, na própria mina.

Conclusões

89. Os elementos que acabam de ser sucintamente indicados provam a existência no subsolo português de grandes quantidades de minérios de ferro com características variáveis. O maior volume até agora conhecido está situado perto do Douro nacional e pode ser transportado para esta excelente via fluvial por cabo aéreo a custo muito baixo.
Parece, segundo os mais recentes estudos, que as dificuldades na concentração dos minérios de Moncorvo para uso na siderurgia podem ser facilmente supridas pela sua mistura com as magnetites puras, que já foram provadas em Vila Cova e noutros locais, depois de fácil concentração.
Estas circunstâncias asseguram a Portugal um lugar importante nas disponibilidades de ferro da Europa Ocidental. A existência de tão elevadas reservas de minérios, que já no momento presente se podem computar, com segurança, em cerca de 500 milhões de toneladas entre as reservas certas e prováveis, quase impõe o dever de cuidar imediatamente da sua exploração.
Vai nisso o interesse nacional e ainda as exigências de uma economia europeia que precisa de importar alguns milhões de toneladas de fora do continente ou de regiões longínquas no extremo norte.
Todas estas considerações justificam a inclusão no programa económico nacional da exploração dos minérios de ferro portugueses.
Há-de ver-se adiante que também se justifica a utilização dentro do País de uma parte importante dos minérios.
Até certo ponto a exploração em larga escala dos minérios de Moncorvo depende das soluções encontradas para a sua concentração. Em qualquer caso, não parece impassível, apesar de certos insucessos nos trabalhos até agora realizados, a exportação dos minérios mais ricos daqueles jazigos e utilizar os restantes em mistura com outros mais puros de origem nacional.

A electrossiderurgia

90. Já existem relatórios circunstanciados sobre o problema da siderurgia em Portugal na base de consumos de carvão de madeira como agente redutor e de energia eléctrica. E foram até apresentados orçamentos do custo de instalações para diversas hipóteses (preços de 1937-1938).
Partindo do conhecimento das características dos minérios, e supondo o preço do carvão, naquela data, a 200$ a tonelada, julgava-se que o preço de custo seria suficientemente económico.
O problema neste aspecto merece, porém, mais aprofundado estudo, porque há hipóteses de grande interesse que ainda não foram convenientemente exploradas, como seja, por exemplo, a utilização de carbone de antracites portuguesas como agente redutor.
A produção de grandes quantidades de carvão vegetal não parece ser prática, dado o grande volume de madeira que seria preciso. Se fosse possível, no entanto, utilizar como agente redutor uma mistura de antracite, embora com alta percentagem de cinzas, e carvão vegetal ou coque, a questão da electrossiderurgia seria muito simplificada.

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parece ser isso impossível com certos tipos de fornos modernos, e já num país europeu, pelo menos, em minérios de baixo teor, em forno eléctrico, se usam tipos de carvão ou antracite de má qualidade como agente redutor.
Nos relatórios apresentados sobre a electrossiderurgia, a que se alude acima, não se encarou esta última hipótese, e conviria por isso que, o mais breve possível, ela fosse estudada em ensaios que permitissem elaborar planos definitivos.
O mérito do forno eléctrico reside na economia de combustível, por um lado, e, por outro, no aproveitamento de grandes quantidades de energia temporária que existem no Douro nacional e internacional. Só indústrias deste tipo e a rega permitem o uso económico dessas quantidades de energia, em virtude da flexibilidade do próprio instrumento produtor, que é o forno eléctrico.
Os especialistas encarregados de estudar a electrossiderurgia com minérios portugueses elaboraram orçamentos para a produção de 100:000, 150:000 e 200:000 toneladas de gusa por ano e incluíram nas Buas estimativas, referidas a preços de 1937-1938, os fornos eléctricos para gusa, a instalação para a carbonização de madeira, misturadores, fornos eléctricos para aço, convertidores Bessemer, instalações eléctricas e de sintering, de laminagem e outras.
Admitem que seria de 407:000, 617:000 e 826:000 coutos o custo total para a produção de, respectivamente, 100:000, 150:000 e 200:000 toneladas de ferro e aço. O que mais pesa no conjunto é, evidentemente, a instalação de laminagem, que anda à roda de 80 por cento dos totais.
Quanto a custos do produto, sempre na base dos preços de 1937-1938 (com a energia a $06 e $10), a gusa ficaria a cerca de 495$25 para fundição e 467$50 para a manufactura de aço com. a energia a $06 e a 582$75 o 570$25 a tonelada, respectivamente, com o preço da energia a $10. Tomou-se o juro de 4 por cento e incluiu-se depreciação e amortização.
É evidente que estes números agora são apenas de ordem de grandeza depois de actualizados. Mas dão ideia da magnitude do problema e dos custos do produto-base - que é a gusa.

O resumo do problema do ferro

91. Os dados do problema da exploração dos jazigos de ferro são estes e resumem-se, em poucas palavras, no seguinte:
Existem grandes jazigos de minérios de ferro em boas condições de safra perto do rio Douro. O seu transporte pode ser efectivado directamente das minas, por cabo aéreo, a uma distância que, num dos casos, não vai além de 20 quilómetros. A distância no outro jazigo (Vila Cova) é maior.
Na zona do Douro há depósitos de antracites à beira do rio e perto existem florestas onde poderá ser obtido o suplemento de carvão vegetal necessário (na hipótese de vir a ser provado que é exequível o uso de antracites como agente redutor).
O rio Douro pode ser convertido em via fluvial para transporte de largas quantidades de minério rio abaixo. Para isso será necessário construir barragens de queda de média altura, que poderão aproveitar a energia do rio. Em combinação com o afluente Sabor, e possivelmente o Côa, o Douro, no percurso nacional, poderá produzir mais do que 2 biliões de unidades de energia permanente e temporária, de sete ou oito meses.
Se viesse depois a ser aproveitado o DOUTO internacional, a produção de energia quase duplicaria.
Na bacia do Douro poderão ser aproveitados para produção de ferro e aço os minérios de Moncorvo e Vila Cova, a energia do rio, as castinas da vizinhança e ainda sucatas e os resíduos de pirites das fábricas e ácido sulfúrico, que atingirão quantidades apreciáveis no Barreiro e em Estarreja depois da construção das fábricas de amoníaco. Ainda para lá poderiam ser transportados os minérios de ferro-manganés, ou outros ricos do Sul, em muito menores quantidades.

92. A questão da existência na Europa de excessiva capacidade para a produção de ferro e aço é uma realidade que não obsta contudo à sua considerável extensão, com fundos provenientes do auxílio americano, em França, por exemplo.
Uma grande parte da capacidade europeia é baseada em minérios de baixo teor ou na importação de zonas longínquas, como o norte da Suécia, o norte de África e a Serra Leoa.
Por outro lado, a América do Norte, como se viu atrás, vai importar minérios da Venezuela, a mais de 3:000 quilómetros de distância, ao preço mínimo de $ 8,54 a tonelada. Os seus preços de produtos, como perfilados, rails, são hoje bastante superiores aos europeus.
A questão de criar a indústria electrossiderúrgica num país que tem minérios, calcários, energia e até possibilidades de carvão não pode destoar do equilíbrio necessário à Europa Ocidental. E a oposição que porventura se levante contra um projecto desta natureza não deve resistir ao exame das condições excepcionais que oferecem o vale do Douro e os depósitos no Norte e Sul do País.
A existência na zona do Douro de matéria-prima (minério), de calor (energia eléctrica), de agente redutor (antracite e carvão vegetal) e de calcários, parece assegurar um baixo preço da gusa.
As repercussões que a execução do projecto teria na economia (nacional, não só pelo que diz respeito ao abastecimento de ferro e aço, como de energia permanente para outras indústrias, seriam muito grandes, como adiante se verificará, no capítulo relativo aos benefícios do programa económico, nacional.
Mas até do ponto de vista político os benefícios são muito satisfatórios e de relevo.
E, se não houvesse outros, que dizem respeito ao próprio futuro da Europa Ocidental, a influência dentro do País seria de molde a assegurar uma progressiva industrialização baseada em sólidos alicerces.
Todas estas razões levaram à inclusão, no programa económico, de um plano eletrossiderúrgico que compreende a produção de ferro e aço, incluindo a exploração até ao limite de 2 milhões de toneladas nos jazigos de ferro portugueses.

VII

O PROBLEMA DAS INDÚSTRIAS

Energia

93. A produção de energia prevista no programa nacional eleva-se, como acima se verificou, a mais de 3,5 biliões de unidades, considerando apenas o Douro-Sabor, o Tejo, a Ocreza e o alto Zêzere e os aproveitamentos em curso no baixo Zêzere, Cávado, Ceira e Lima, além de outros de menor importância.
O País consumia em 1948 cerca de 800 milhões de unidades, o que representa, para uma população calculada em 8:400 milhares de habitantes, a capitação de cerca

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de 96 kWh por habitante. Se pudesse ser executado o programa nacional até 1960, a capitação seria de aproximadamente 400 kWh para uma população de 10 milhões de habitantes, tendo em conta a energia térmica substituída por hidráulica.
A população e a produção de energia eléctrica em 1948 nos diversos países europeus, comparados com as dos Estados Unidos e Rússia, eram as seguintes:

[Ver tabela na imagem]

Economia Survey of Europa in 1948, p. 278.

Este quadro mostra as insuficiências nacionais em matéria industrial e, pode dizer-se, em matéria económica. Somos um dos países da Europa de miais baixa capitação de energia.
Não nos podemos comparar a outros, como a vizinha Espanha e Itália, de características raciais, agrícolas e climáticas idênticas, e até ficamos abaixo da média dos países não individualizados no quadro, como a Turquia, a Grécia, a Bulgária, Trieste, o Luxemburgo, Islândia e outros.
O programa económico nacional prevê a produção de mais de 3,5 biliões de unidades dentro de dez ou quinze anos, os quais correspondem a um aumento na capitação para 400 kWh. Esta cifra comparada mostra, na hipótese de os restantes países europeus não aumentarem a sua produção, que ainda a capitação nacional seria muito baixa em relação a muitos deles.
Os estudos da comissão de energia da O. E. C. E. indicam que os programas a longo prazo idos países comparticipantes prevêem entre 1948 e 1953 um acréscimo de produção de 58,5 biliões de unidades de energia, o que representa, na verdade, um grande esforço. A capitação aumentará correspondentemente.
O documento 1 que refere estes números indica que Portugal, segundo informação recebida, deve prever até 1953 no seu plano a longo prazo, revisto, o aumento de 740 milhões de kWh, comparados com 1:650 na Áustria, 2:920 na Bélgica, 1:670 na Holanda, 3:200 na Noruega e 881 na Grécia.
Esta grande redução relativamente ao programa económico a longo prazo apresentado em Novembro é manifestamente errada. Parece mostrar tendência para manter o atraso nesta matéria em relação a outros países.
Poderá objectar-se que nenhum deles atingirá as produções previstas, e isso até certo ponto poderá ser realidade. Mas todos denotam o grande esforço que está a fazer-se no sentido de melhorar a produção de energia na Europa.
Aliás, a produção do 740 milhões em Portugal até 1953 quase será atingida pelas obras já em curso em 1948.

94. A base das indústrias é a energia. Se não forem consideradas nos próximos dez ou quinze anos no programa económico nacional as cifras estabelecidas no primitivo programa português a longo prazo, o País não poderá progredir na medida que as circunstâncias actuais impõem.
Qualquer plano de industrialização tem de basear-se na emergia disponível; quer isto significar que um plano de energia deve ser executado simultaneamente, com um plano industrial.
Faltou até hoje esta coordenação indispensável, e disso derivaram já prejuízos sérios. E evidente que, se determinada empresa for projectada na base de um consumo de energia que vem a faltar por atraso nos programas de produção correspondentes, a imobilização dessa empresa acarreta grandes prejuízos a quem a financiou e, indirectamente, ao País.
Na consideração de um plano de indústrias, tal como houve de ser realizado no programa português a longo prazo, tiveram de levar-se em conta aquelas que já estavam iniciadas ou em vias de o serem. Foram postas na discussão do programa português algumas objecções a várias dessas indústrias, com. o fundamento de que não poderiam competir num regime de livre concorrência.
O assunto não poderá hoje ser posto em discussão, porquanto algumas das instalações se encontram quase completas. Deve, contudo, dizer-se que a questão dia concorrência deverá ser devidamente ponderada no futuro, porque a Europa parece tender para mais íntima correlação das economias nacionais, de modo a obter mais vastos mercados, e portanto maior expansão. A produtividade terá de ser apreciavelmente aumentada por esse motivo.

Factores que influem na industrialização

95. Já se escreveu noutro lugar que os custos têm grande importância na industrialização de um país. quer se trate de emergia, quer de produtos manufacturados. Por isso, o exame das matérias-primas nacionais, a capacidade das instalações, o meneado, as probabilidades de expansão, o ensino técnico, o aproveitamento adequado da mão-de-obra, a localização das fábricas e muitos outros factores são fundamentais no presente e no futuro.
No programa económico nacional, além das indústria? previstas em planos anteriores, como as de sulfato de amónio, celulose, folha-de-flandres, têm cabimento os aproveitamentos de subprodutos agrícolas e de matérias-primas coloniais. Outras de importância relacionam-se com a melhoria da produtividade das indústrias algodoeiras e dos lanifícios, que necessitam de muito maior mecanização.
Mas há, sobretudo, um tipo de indústria que pode ter grande desenvolvimento no País: é a metalomecânica.

1 Documento EL (49) - 6. Anexo 11.

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O progresso das províncias de Angola e Moçambique, acentuado nos últimos anos, assegura possibilidades de grande interesse a esta forma de actividade.
Se fosse estabelecida a electrossiderurgia, com a produção de 150:000 a 250:000 toneladas de ferro e aço, que é sensivelmente o que Portugal necessita dessas matérias, em bruto e em obra, dar-se-ia um Largo passo no sentido de criar internamente condições de trabalho.
Aquela produção melhoraria bastante a capacidade de compra de grande parte da população e não iria ferir muito a própria importação ou até o comércio dos países que pura cá exportam agora, em virtude do próprio desenvolvimento da vida económica nacional.
As indústrias metalomecânicas são ma soía maior parte altamente especializadas e necessitam de mão-de-obra eficiente e culta. Num programa de industrialização há que ponderar bem este aspecto, que é fundamental.

96. Outro assunto a considerar num plano de industrialização diz respeito às relações entre a indústria e a agricultura.
Portugal foi e é ainda hoje um país agrícola-florestal. As aptidões florestais e arbóreas, de um modo geral, dos seus solos e clima parecem sobrepor-se às aptidões agrícolas propriamente ditas. A agricultura viveu quase sempre em circunstâncias precárias e na maior parte dos casos foram sempre baixos os rendimentos da população agrícola, que é mais de 50 por cento do total.
Ora os consumos previstos por maior desenvolvimento económico dependem muito do poder de compra da população agrícola. Terão, por isso, de ser ponderadas convenientemente as condições que influenciam a agricultura e que podem derivar de maior industrialização.
Mas não é apenas pelo lado estritamente económico que o assunto precisa de ser considerado.
Industrialização necessita de mão-de-obra, que só poderá ser recrutada na província, nos meios rústicos. À parte o problema educativo que ela sugere logo, há o das possibilidades de ser fornecida sem detrimento para a própria vida agrícola.
Não convém enfraquecer as características dessa actividade. O interesse nacional, ao contrário, parece indicar a conveniência de consideràvelmente fortalecer a posição agrícola no agregado nacional.
De tudo resulta que a gradual industrialização implica gradual progresso agrícola, tanto no tipo de culturas como no rendimento por unidade de superfície, de modo a reduzir o volume de mão-de-obra, a melhorar a sua qualidade e a aumentar o seu poder de compra.
Os factores energia, matéria-prima e mão-de-obra são fundamentais. Se for deficiente a apreciação e o estudo de qualquer deles nunca o êxito económico poderá ser assegurado.

Indústrias incluídas no programa económico nacional

97. Enunciam-se a seguir as principais indústrias incluídas no programa económico nacional. Não pretende a lista ser definitiva. O contrário estará certo, porquanto, na data em que foi traçado, não havia, como ainda hoje não há, ideias definidas baseadas em estudos aprofundados sobre as possibilidades do estabelecimento de certas indústrias.
Só havia e há uma verdade neste aspecto - e é que o que existe precisa de ser melhorado, quer pela concentração, quer pela racionalização dos fabricos, quer ainda pela amortização de equipamentos ineficazes, que levam a custos extremamente elevados e dão ao conjunto o atraso em que vivem certos ramos.

Principais indústrias

98. No plano da metrópole incluiu-se o financiamento das indústrias seguintes:

Químicas;
Celulose e papel;
Têxteis;
Folha-de-flandres;
Metalomecânicas e minas;
Petróleos e derivados;
Indústrias alimentares;
Indústrias gráficas;
Indústrias de construção civil, principalmente cimentes;
Diversas.

É deficiente, nesta matéria, a distribuição de inversões financeiras em cada uma destas indústrias.
No conjunto foi previsto o dispêndio total de 60 milhões de dólares e cerca de 300:000 contos em moeda nacional no plano português a longo prazo. Julga-se, porém, que esta estimativa deverá ser alargada.
O tipo de indústrias obedeceu mais às circunstâncias prevalecentes à data do traçado do plano do que a elementos de outra ordem, e essas circunstâncias diziam respeito à necessidade de comprimir as exigências de divisas estrangeiras, por um lado, e, por outro, a obras já iniciadas e que conviria terminar dentro do mais curto espaço de tempo -tais como as indústrias dos produtos azotados, da celulose, da folha-de-flandres e do cimento -, e ainda encomendas feitas de equipamentos para as indústrias têxteis, tanto lanifícios como algodões.
Presumia-se então serem necessários cerca de 1:800 milhares de contos para beneficiações industriais, dos quais milhão e meio serviriam para pagar as importações de equipamentos. Nestes, as indústrias têxteis, os produtos azotados e os de cimento ocupavam os primeiros lugares.
Toda a questão industrial necessita hoje de ser revista. Para isso o primeiro passo a dar consiste num conveniente e exaustivo inquérito que, como já anteriormente foi preconizado por diversas vezes, estude em pormenor a questão da viabilidade, e portanto dos custos, quer na hipótese do estabelecimento da produção do ferro e aço, quer de outras.
O estado de adiantamento das fábricas de produtos azotados e de cimentas, que, em qualquer caso, já foram financiadas em grande parte, tanto em moeda nacional como estrangeira, e as importações sensíveis feitas de equipamentos têxteis permitem dar novo arranjo a um plano de industrialização nas bases atrás expostas.
Mas parece ser de vantagem não esquecer que as características agrícolas do País condicionam muito as possibilidades ou desenvolvimentos industriais.

VIII

PROGRAMA DE INVERSÕES FINANCEIRAS

Considerações gerais

99. A execução de um programa económico a longo prazo, da importância do que se descreve neste trabalho, requer o consumo de elevadas somas de dinheiro.
Não é fácil determinar com completa exactidão os capitais que será preciso despender até pleno rendimento das empresas a realizar.

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A maneira lógica e acertada de resolver este importante aspecto do programa económico consiste em preparar todos os planos parciais, pormenorizá-los em seus aspectos técnicos e orçamentar cada um deles.
Depois seria ainda necessário calcular, com aproximação, o tempo necessário paru o executar e o que leva a produzir até chegar ao pleno rendimento.
Ora a execução de projectos da natureza dos que se propõem implica um trabalho de pormenor considerável, com intervenção até de técnicos nacionais e estrangeiros.
Os projectos terão de ser orçamentados na base de preços que muitas vezes se mostram divergentes de país para país e até de casa fornecedora para casa fornecedora dentro do mesmo país.
Por sua vez a execução in loco das obras depende dos métodos adoptados. Um exemplo facilmente aclara este aspecto.
No plano da rega é necessário construir algumas centenas de quilómetros de canais, incluindo os distribuidores.
O tipo de canal diverge e há grande diferença de custos se forem adoptadas poderosas máquinas modernas ou métodos mais antiquados. Uma autoridade, com larga experiência nestes assuntos, encontra uma diferença de 30 por cento, pelo menos, no custo total entre os processos modernos e outros mais antiquados, sem levar em conta a rapidez no trabalho de cada um deles.
Outro tanto se poderá dizer das barragens ou até em certos casos da instalação de indústrias.
Escrevem-se estas palavras de aviso para indicar que os números apresentados não podem ter significado definitivo.
Pela própria natureza das coisas, a execução de um plano é evolutiva. As dificuldades que nascem têm de ser corrigidas gradualmente, e impõe-se por isso revisões cuidadosas amiudadas vezes.
Há ainda a considerar outra questão. É que, infelizmente, nós somos parcos de estudos definitivos e temos poucos elementos de base. Do Douro nacional, de que tanto se fala há meia dúzia de anos, há dois esquemas: um oficial e outro particular. Mas sobre qualquer deles não se pode fazer um orçamento definitivo.

100. Em todo o caso já há obras realizadas de certa envergadura, sobretudo em matéria hidráulica, para energia e rega. Conhecem-se os custos unitários, pela experiência, tanto de barragens de alvenaria, betão e de comportas, como de escavações para canais em diversos tipos de rocha.
Do mesmo modo se sabem os custos da maquinaria para muitas actividades nacionais.
No que diz respeito a minas e produção de gusa e aço, há já orçamentos de especialistas na base de preços anteriores à guerra.
O autor coligiu, por intermédio de técnicos especializados, e coordenou ele próprio os elementos disponíveis. Foi um longo trabalho de pormenor, executado com paciência, que vale para o momento presente e consegue indicar uma cifra aproximada do custo total do programa.
Mas ninguém a deve tomar, como definitiva, nem em parte alguma isso poderia acontecer, porque, ainda que hoje ela pudesse valer como estimativa aproximada, o longo período de execução havia de trazer-lhe naturalmente alterações muito sensíveis.
Foi por isso que já em 1935, em relatório de projecto de lei, se recomendava a revisão de planos de três em três anos, não só para atender a progressos de natureza técnica que conviesse introduzir, como para actualizar orçamentos e, por consequência, o plano de inversões financeiras - o programa de investimentos, como é uso dizer-se agora.

101. Dividir-se-á este capítulo nas seguintes rubricas: energia, electrossiderurgia, irrigação, indústrias, agricultura, transportes e melhorias sociais correlacionadas.
Precisa de ser esclarecido que, no que diz respeito aos subcapítulos da indústria e da agricultura e melhorias sociais, não se inclui plano completo de inversões financeiras.
Quer isto dizer que há empreendimentos de natureza industrial ou agrícola que não são financiados pelo programa.
Não poderia ser outro o caso, porque da produção de tão grande quantidade de energia hão-de resultar naturalmente indústrias novas, talvez até desconhecidas agora, e as existentes hão-de sofrer transformações de grande vulto, quer no sentido de aperfeiçoamento, quer até na capacidade de produção.
Há-de isso trazer a necessidade de inversões financeiras que não podem ser previstas hoje.
A verba de 60 milhões de dólares ou divisas estrangeiras equivalentes para as indústrias é certamente baixa.
Só o futuro poderá dizer a quanto subirá no longo espaço de tempo que se prevê para a realização do programa.
Outro tanto se poderá afirmar, talvez com propriedade, para a verba destinada a progressos agrícolas além da rega.

Orçamento total do programa

Da metrópole

102. As dotações de cada plano são as seguintes:

[Ver tabela na imagem]

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Do ultramar

103. Se são difíceis as estimativas do programa da metrópole, são ainda muito mais difíceis as do ultramar. Contudo, neste caso alguns dos projectos já haviam
sido estudados por organismos oficiais ou particulares, como o caso do Duque de Bragança, das rochas e carvões asfálticos ou betuminosos e ainda outros.
O programa do ultramar prevê os dispêndios seguintes :

[Ver tabela na imagem]

104. Os números são aproximados e dão apenas a ordem de grandeza. No conjunto, os programas da metrópole e do ultramar prevêem o dispêndio total dado pelos números seguintes:

[Ver tabela na imagem]

1 Na base de 1 dólar - 25$.

Programa da metrópole

105. Mais de metade do custo do programa da metrópole é utilizado no financiamento dos planos de energia, de siderurgia e de rega.
Na opinião do seu organizador, são estas as três questões fundamentais na economia nacional. É por isso indispensável atacá-las de frente em termos que assegurem por umas décadas, ao menos, desafogo na alimentação e nos consumos de força motriz, além de promover alívio sensível à importação de matérias-primas.
Mas o estado actual das indústrias, que precisam de ser reconstruídas em alguns de seus aspectos, e as melhorias necessárias nos transportes implicam o gasto de elevadas somas, principalmente em equipamentos. Daí a conveniência em despender, numas e noutras, verbas importantes, que, não sendo o que deviam ser, possam, contudo, melhorar gradualmente o seu funcionamento.
É muito difícil, dada a escassez de elementos e estudos e a insuficiência de dados, traçar Tini programa económico e de antemão calcular a sua projecção na vida do País e na vida de cada um. Nos países onde isso foi feito aproveitou-se o trabalho e a investigação de grupos de especialistas, dos melhores, nas diversas questões tratadas. Nalguns casos a tarefa demorou anos e só depois, em frente de um amontoado de factos, estudos e trabalhos, se traçou o programa e se fomentou a sua execução. Ainda assim o tempo demonstrou que muitos pormenores tiveram de ser ajustados com o decorrer dos tempos e das obras e que previsões, ainda que bem feitas, tiveram de ser modificadas.
No nosso país a colheita de elementos é difícil, e muitas vezes infrutífera nalguns aspectos; o trabalho coordenado é quase sempre inglório, por virtude deste pessoalismo impenitente e improdutivo que torna cada um o senhor de ideias que supõe serem suas apenas e as melhores.
Quem se abalança, pois, a tentar coordenar os elementos que podem servir de base a um programa de realizações vê-se a braços, quase sempre, com resistências inesperadas, vaidades intempestivas e mal fundadas, atritos humanos impróprios.
Vale mais a pena, muitas vezes, pôr de parte o que, pelo menos, as aparências indicam como auxílios úteis, caminhar com seus próprios elementos, e, pela crítica que da sua apresentação derivará, colher as opiniões dos outros, do que arriscar-se a não realizar qualquer trabalho.
Assim, ao menos, se promoverá a eclosão de ideias ou argumentos que a nossa inata tendência para a crítica trará à superfície, e, uma vez conhecidos, já e mais fácil extrair o que deles puder ser aproveitado.
Na coordenação definitiva de qualquer trabalho se tomará em conta aquilo que não foi possível obter anteriormente por processos lógicos e racionais.
Outra dificuldade que nasce da própria concepção de um programa de larga envergadura é o seu reflexo na mentalidade de quem o terá de discutir, aceitar e executar.
Um programa económico de perto de duas dezenas de milhões de contos, se considerarmos o câmbio actual, embora distribuídos por quinze ou vinte anos, causa no cérebro de muita gente uma repercussão de assombro.

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A primeira reacção consiste naturalmente em considerá-lo utópico - pura e simples quimera.
Quando o autor pôs há anos a questão do aproveitamento integral do Douro, incluindo a navegação, meios responsáveis consideraram irrealizável a ideia. O problema em si mesmo, tecnicamente, não oferece dificuldades por aí além e já havia sido estudado em parte. O que parecia transcender a compreensão de muitos era o seu custo e, talvez mais do que isso, a sua grandeza.
Ora, como se disse acima, no programa nacional, além do Douro português, incluem-se o Tejo e outros rios. Apesar disso, a capitação de energia em Portugal, na altura em que estiver completo, ainda fica muito baixa em relação aos restantes países da Europa Ocidental.
É preciso habituar o País a pensar em termos realísticos.
Os recursos económicos que existem necessitam, de ser aproveitados, em virtude de variadas circunstâncias de natureza política e social. Aproveitá-los em termos racionais é um dever. Desbaratá-los improdutivamente ou delinear mal o seu aproveitamento é um erro.

Plano da energia

106. Já atrás se descreveu sucintamente o plano da energia tendente à produção de 3,5 biliões de kWh, que poderão elevar-se até 4 biliões.
Dentro dele cabem obras agora em curso e ainda não acabadas, como o aproveitamento do Zêzere, no Castelo do Bode, o aproveitamento do Tejo-Ocreza, em Belver e na Pracana, e outras de menor importância no Lima, Alva, Ceira e mais.
Conta-se que em fins de 1950 grande parte destas obras estará quase concluída ou, pelo menos, quase integralmente paga.
As verbas constantes do plano de inversões financeiras a elas destinadas ficarão por isso já livres.
No plano da energia o que mais avulta é a empresa do Douro-Sabor, com o possível complemento do Côa, que compreende barragens em Pé de Moura, Carrapatelo, Régua, Valeira e Focinho, além do Sabor, ou esquema equivalente.
A barragem de Pé de Moura (8 metros), ou duas menos altas que a substituam, tende a facilitar a navegação do rio.
A estimativa do aproveitamento Douro nacional-Sabor poderia ser completada com a do Côa, como atrás se escreveu. Não se alteraria o custo total do plano de energia, visto se poderem considerar liquidadas as verbas especialmente desviadas para o que ainda restava pagar de obras já começadas (Castelo do Bode, Cávado, Belver e outras), no total de 600:000 contos.
Apenas com a introdução do plano do aproveitamento do Côa, a recomendar no caso de se verificarem as condições de armazenagem de cerca de 400 milhões de metros cúbicos de água, há a acrescenta? ao total da produção de energia já indicado o que corresponde ao Côa e sua influência na produção do Douro nacional, visto essa água ser lançada nas cabeceiras deste rio em território nacional e nele integralmente utilizada. Pode estimar-se que a produção subiria então para um pouco menos de 4 biliões de unidades.
O custo do esquema Douro foi obtido por comparação com o custo da barragem de Belver, no Tejo, que é de tipo semelhante às que terão de ser construídas naquele rio.
Com efeito, sabe-se hoje com suficiente aproximação o custo total deste empreendimento, já muito adiantado.
Adquiriu-se experiência em obras desta natureza, novas em Portugal, e será possível poupar no Douro o que no Tejo se pagou a mais.
Além disso, se fosse resolvido o aproveitamento integral de meia dúzia de barragens de tipo idêntico nesse mesmo rio, haveria uma economia grande, em virtude do fabrico em série de máquinas, aparelhos e comportas, além de outro equipamento comum a todas.
Há quem avalie esta economia em, pelo menos, 25 por cento do custo total, o que na verdade é muito importante, se puder ser realizado.
A estimativa do esquema do Sabor é deduzida do projecto já aprovado pelos serviços oficiais, com orçamento actualizado. Já existe também projecto orçamentado do Côa.

107. O esquema Fratel-Alvito, no Tejo e Ocreza, é importante pelas razões apontadas, que dizem respeito a rega e energia, como se explicou noutro capítulo. O seu orçamento foi deduzido doa trabalhos de Belver-Pracana, na mesma região e de características semelhantes.

108. Finalmente, o projecto serra da Estrela-Cova da Beira proveio de estimativa feita por pessoas que estudaram o esquema.

109. Com os elementos assim obtidos o plano de energia pode orçamentar-se do modo que segue:

[Ver tabela na imagem]

A verba de 200:000 contos para transporte de energia é manifestamente baixa e terá de ser ajustada em tempo oportuno.
Ela depende de diversos factores, entre os quais deve ser considerado o local escolhido para a indústria electrossiderúrgica e estação de bombagem para os pliocénicos e canal do Alentejo.
Este assunto necessita de ser visto em pormenor. Não pode ser considerado integralmente agora, e porventura virá a constituir um plano especial -o plano de transportes eléctricos-, dada a sua importância.

Central térmica

110. O poblema da instalação de uma ou mais centrais térmicas de apoio ao sistema hidroeléctrico foi estudado pormenorizadamente por diversos especialistas e tem sido alvo de discussões em público nos últimos tempos.
Não se poderá pensar numa central térmica destinada a consumir carvões importados, porque isso seria ir contra os princípios fundamentais de um programa económico nacional e contra os próprios interesses do País. As alternativas que se apresentam são, no fundo, a utilização de carvões portugueses, de qualidade inferior, ou de lignites.

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Neste aspecto, e na hipótese de ser levado a cabo o aproveitamento integral do Douro na forma preconizada, neste programa, a. reserva seria logicamente constituída pelo Castelo do Bode e o Cávado-Rabagão, que supririam nas épocas de menores caudais as fainas do Douro.
Não deve também esquecer-se que existem hoje centrais térmicas de certa importância.
A potência de duas centras em Lisboa e duas no Porto eleva-se a perto de 100:000 kW (98:386) 1.
Há, pois, já instalada a potência suficiente para, em conjunção com o Zêzere e o Cávado, atender as necessidades no Estio e durante o período de "pontas".
É tudo uma questão de organização e aproveitamento do que existe e de poupar cambiais e combustíveis, indispensáveis a outros fins económicos.
Parece, por estas razoes, que a central térmica não seria, precisa nos tempos mais próximos, desde que se executasse um esquema que, em dez ou quinze anos, elevasse a produção energética para 4 biliões de unidades. Inverter nela capitais importantes é no momento actual, e tendo em conta as instalações térmicas existentes, uma forma de atrasar o desenvolvimento hidroeléctrico. Representa um desgaste desnecessário de divisas e escudos.
No futuro, se for acentuado o consumo de energia e houver necessidade de o auxiliar nas apontas", poderá pôr-se a questão de se instalar uma central térmica à boca da mina, de preferência no vale do Douro -talvez no Pejão-, se vierem a confirmar-se as previsões de reservas carboníferas que os reconhecimentos geológicos e pesquisas recentes deixam prever.
Mas deve acentuar-se que as antracites do Pejão podem ter utilização económica remuneradora na siderurgia, no caso de ser possível, como parece, utilizá-las como redutor no processo de fusão.
Estas foram as razões que levaram a não incluir uma grande central térmica no programa económico nacional.

Plano de electrossiderurgia

111. Já atrás se tratou do problema do ferro e se deu o devido relevo à sua importância na vida económica nacional.
O assunto foi demoradamente estudado por diversos especialistas e desse estudo resultaram três grossos volumes que encaram a siderurgia em Portugal nos seus diversos aspectos e nas hipóteses de consumo de coque importado ou carvão vegetal e de alto forno ou electrossiderurgia. Recentes progressos nesta indústria permitem visualizar a hipótese do uso de carvões portugueses misturados com carvão vegetal como redutor, o que torna o esquema independente de importação de coque ou carvão estrangeiro.
Houve hesitações sobre a quantia a destinar no programa nacional para a indústria electrossiderúrgica, em virtude da diversidade de produtos, de os orçamentos de especialistas se referirem a preços anteriores à guerra e de ser difícil fazer comparações com recentes fabricos no Brasil (Volta Redonda), na África do Sul (Pretória), na Índia e, já com o auxílio americano, em França.
Foram examinados todos os dados possíveis e também se considerou se era ou mão vantajoso produzir este ou aquele produto, a conveniência ou inconveniência se instalar, de começo ou dentro do prazo de execução do programa, o equipamento para transformar toda a gusa e se era praticável e rendoso exportar sob aquela forma uma parte das matérias fundidas.
Este é um dos problemas importantes que necessita de ser cuidadosamente visto na base da experiência actual, que engloba progressos feitos no período da guerra, especialmente na electrossiderurgia.
Os elementos dos relatórios a que se alude acima indicavam 41:000 contos como sendo o custo de fornos eléctricos para a produção de 200:000 toneladas de gusa, 40:000 contos para a produção de carvão vegetal e 95:000 contos para misturadores, fornos eléctricos para aço, convertidores Bessemer, instalações eléctricas, construção, sintering, instalações eléctricas de ferro, ligas, equipamento eléctrico, etc. Seriam ao todo 175:000 coutos, a que havia que juntar as instalações de laminagem, para 200:000 toneladas, ou mais 650:000 contos.
Vê-se que o custo das instalações de laminagem é o mais importante no ponto de vista financeiro. Por outro lado, como se prevê a possibilidade de utilizar como redutor carvões nacionais, a instalação de destilação de lenhas poderá ser diminuída.
Tudo somado e ponderado, inclui-se no programa económico nacional a dotação de 32 milhões de dólares, ou 800:000 contos, para a electrossiderurgia.
A flexibilidade da indústria permite adaptar este capital à produção.
A energia a utilizar será obtida no Douro nacional. Grande parte dessa energia será temporária ou sobrante, e por conseguinte de baixo preço.

Plano da rega

112. As duas hipóteses de rega atrás apresentadas - terrenos ricos e pliocénicos - têm custos inteiramente diferentes.
O plano de rega agora considerado envolve 150:000 hectares na Cova da Beira, Vilariça, Ribatejo e Alentejo.
A estimativa do custo é mais fácil do que em outros casos, dada a longa experiência das entidades oficiais portuguesas nesta matéria. Essa experiência permite orçamentar o plano com exactidão suficiente para uma estimativa geral - mas em trabalhos desta grandeza haverá que actualizá-la periodicamente.
A despesa seria aproximadamente a seguinte:

[Ver tabela na imagem]

A verba mais importante (Ribatejo e Alentejo) pode discriminar-se assim:

Contos

Estações de bombagem (1.800$ por kW) ........... 388:800
Albufeiras (1,33 x 73,235) ..................... 97:403
Canais (a 650.000$ por quilómetro: 650 x 385) .. 250:250
Enxugo e defesa (a 1.000$ por hectare) ......... 142:250
Adaptação a regadio (a 3.500$ por hectare) ..... 497:875
Expropriações .................................. 20:000
Administração, estudos e outras despesas ....... 35:000

Total ..............1.431:578

1 Estatística das Instalações Eléctricas em Portugal, 1947, vol II.

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A conta de encargos seria a seguinte:
Contos
De capital, reembolso em cinquenta anuidades
de juro à taxa de 2 por cento (Lei n.º 1:949):
0,03182 x 1.431:578 .............................. 45:552

De exploração e conservação (200$ x 142:250) ..... 28:450
De energia (a $08 o kWh) ......................... 64:800

Total ...................... 138:802

Por hectare: 975$.

Este é o orçamento no caso de terrenos ricos - em que o canal atravessaria o Alentejo e comunicaria com o Guadiana. O consumo de energia é bastante alto, pelas razões apontadas.

113. A segunda hipótese - regadio de terrenos mais pobres (pliocénicos do sul do Tejo)- não foi discriminada, em pormenor, mas é incomparavelmente mais económica, em virtude de ser menos extenso o canal - o canal condutor principal tem apenas 130 quilómetros, contra 360 no primeiro caso, e o consumo de energia é muito menor, visto a cota máxima, em pequena parte do percurso, poder ser apenas de 50 e 75 metros e o restante ser igual ou inferior a 50 metros.

Planos da energia, rega e electrossiderurgia

114. Consideram-se os esquemas da energia, rega e electrossiderurgia em conjunto, porque, na verdade, eles estão intimamente relacionados. A sua base é a produção em larga escala de energia, pelo aproveitamento racional dos dois grandes rios portugueses, o Douro e o Tejo.
Como tentativa para aquilatar da despesa de cada um dos três subplanos -o da rega, o da energia e o da electrossiderurgia- pode estabelecer-se a repartição de financiamentos como no quadro que segue, em milhares de contos:

Financiamento do plano de rega, energia e electrossiderurgia

[Ver tabela na imagem]

No conjunto, estes três planos representam cerca de 55 por cento do total a gastar na metrópole.
A grande percentagem de financiamento que lhes é atribuída corresponde à sua imensa importância na vida económica.
Não é fácil, nas presentes circunstâncias, actualizar os preços-base dos diversos empreendimentos e obras que formam os esquemas de cada um dos planos.
Tanto quanto foi possível, e na falta de projectos definidos, recorreu-se aos custos de obras executadas ou em execução que tivessem semelhança de condições.
Tal foi o caso do Douro nacional e o da rega. Na parte relativa à electrossiderurgia os relatórios pormenorizados de especialistas que estudaram o assunto constituem a base que fixou os custos.

115. Para dar ideia gorai dos financiamentos individualizados, publicam-se os números seguintes:

Custo do plano da energia

[Ver tabela na imagem]

Estes números, revistos, terão de ser alterados em certos dos seus aspectos, e entre eles nota-se já serem baixos alguns indicados em moeda nacional e até em divisas estrangeiras. Mas a tendência para baixa de preço deve auxiliar o cômputo.
Deve, além disso, ser ponderado que parte dos esquemas propostos estuo em execução, alguns com financiamentos assegurados para grande parte da obra, e noutros já se gastaram quantias elevadas. Finalmente, no caso do transporte, haverá que estabelecer previamente o plano. Apenas se incluiu o que é necessário adquirir no estrangeiro para a sua 1.ª fase, tendo em conta o que já se realizou.

Electrossiderurgia

116. Mencionou-se atrás, sucintamente, a importância desta indústria na vida económica nacional. Julga-se ser possível o seu estabelecimento com o dispêndio aproximado de 800:000 contos. Os equipamentos necessários importarão em corça de 28 milhões de dólares, ou o equivalente em divisas estrangeiras.

Rega

117. O problema da rega fui estudado circunstanciadamente, como atrás só indicou.
Neste caso, o dispêndio de divisas estrangeiras é menor. No entanto as estações de bombagem e os equipamentos necessários para a preparação dos solos importam no correspondente a 22 milhões de dólares de moeda estrangeira.

Eventualidades

118. O orçamento de tão largo esquema, firmado em dados tão escassos, não poderá ser considerado como definitivo, dada, por demais, a variação de preços.
Inclui-se, assim, uma verba importante para eventualidades.

Plano de indústrias

119. A industrialização do País é, como outros aspectos económicos do problema português, um assunto que tem merecido há muitos anos discussões, alvitres e

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comentários de natureza diversa, mas que nunca foi encarada pelo lado de estreita coordenação com outras formas de actividade e até entre as próprias actividades industriais.
Esta coordenação pressupõe uma regulamentação de inversões financeiras, quer dizer: limitações sérias aos gastos da iniciativa privada.
Parece que neste aspecto da economia nacional seria de alta conveniência pôr em prática a recomendação feita nos pareceres das Contas e também em proposta apresentada à Assembleia Nacional em 1935.
A recomendação implicava um inquérito industrial rápido às condições de vida de cada indústria, incluindo nesse estudo a capacidade de produção e as condições técnicas em que ela se realiza, as disponibilidades financeiras e de crédito dos empresários, a capacidade de absorção dos mercados nacionais e ultramarinos e as possibilidades de exportação, a origem das matérias-primas e mão-de-obra, os custos dos variados elementos que entoam no produto, como os transportes, a energia, os encargos de contribuições e taxas ide toda a natureza, o tipo de produto, o seu preço nos mercados externos que naturalmente com ele possam concorrer, o direito alfandegário te outros factores que tenham influência na vida da fábrica ou da empresa.
Um inquérito industrial, convenientemente organizado, daria, base séria para construir e seria de grande utilidade para todos, tanto para o empresário como para o consumidor.
Mantido e actualizado com os anos, atento a modificações na estrutura de indústrias similares no estrangeiro, por virtude de progressos técnicos ou até de necessidades financeiras momentâneas, um inquérito industrial poderia dar indicação clara das realidades económicas da indústria e mostrar onde estavam as faltas e onde se poderiam introduzir progressos, até no que diz respeito à capacidade de produção.
Já há dispersos grande número de elementos, individualizados por indústrias, e devem existir relatórios bastante circunstanciados para cada uma delas, porque, de há um tempo a esta parte, diversas comissões de estudo procuram estabelecer dados e conclusões sobre algumas actividades industriais de interesse nacional.
Houve há meia dúzia de anos um impulso interessante no sentido de acelerar a industrialização do País pela concessão de alvarás para fabrico de certos produtos considerados basilares, como os azotados e outros. Hão-de derivar certamente benefícios deste impulso, mas o problema não ficará resolvido.
Tem sido difícil a vida das novas empresas, umas vezes por falta de meios financeiros, outras vezes por dificuldades de natureza técnica e até de outra ordem. Ainda hoje o País não colheu os benefícios previstos.
Não vale a pena insistir numa industrialização mais acentuada do País se não forem antes resolvidas certas dificuldades.
Insuficiente capitalização ou orçamentos que pequem por exagero, devido a serem muito baixos, têm como consequência dificuldades futuras. Os empresários ao quererem lançar a sua ideia douram-na de atractivos tão surpreendentes que às vezes é caso para descrer da sua sinceridade.
A empresa aparece envolvida em róseas esperanças, consubstanciadas em lucros tão exagerados, que à primeira vista se vê serem impossíveis.
Esta mentalidade tem causado muitos prejuízos ao País. É certo que o capitalista muitas vezes não inove e seu dinheiro sem a promessa de grandes lucros, e então o empresário recorre ao expediente de os oferecer nos projectos que apresenta. Mas, se os lucros não vêm, como acontece quase sempre, o desânimo desacredita a indústria, que passa a vegetar.

120. O recurso ao crédito para despesas de 1.º estabelecimento é outro inconveniente que em larga escala afecta muitas empresas.
A função dos estabelecimentos de crédito não é concorrer com alta percentagem de capital de 1.º estabelecimento, que na sua maior parte deve pertencer ao empresário. Pondo de lado excepções meritórias, em que a parcimónia nos dividendos e outras despesas permite capitalização de lucros, e por consequência dinheiro disponível para extensões e aperfeiçoamentos, muitos promotores baseiam a sua indústria mo empréstimo, incluindo até os juros parcelares, o que é manifestamente um erro sério.
Todos estes pontos necessitavam de ser esclarecidos, estudados à luz das possibilidades nacionais, tanto em materna financeira, como noutras, entre as quais avultam o escoamento do produto, a direcção técnica, o crédito e, sobretudo, o capital circulante.
Parece que um dos problemas fundamentais que afecta a indústria está em andamento - esse problema é o da energia. Ele não ficará definitivamente resolvido sem que seja possível assegurar quantidades maiores de força motriz e mais baixos preços de venda. Mas já é alguma coisa o que se faz, e logo que o Douro entre em produção, na forma integral que atrás se descreveu, a industrialização do País disporá de uma base sólida de renovamento, sobretudo aquela que incorpora no custo do produto grande percentagem de energia.

121. O programa económico nacional teve de ser delineado sem a existência de inquérito industrial. Cingiu-se apenas, e essencialmente, àqueles tipos de indústria já em projecto ou estudados em pormenor, e limitou-se a incluir várias dotações de relevo para algumas que se sabia antecipadamente terem encomendado máquinas ou instalações que precisavam de ser pagas.
Baseou-se, por outro lado, em orçamentos calculados por especialistas; e, considerando que não se encontram ainda realizadas as condições basilares de uma industrialização racional, já apontadas acima, foi preferido limitar a soma destinada a esse fim a 71,1 milhões de dólares, dos quais 60 são moeda estrangeira.
As verbas que mais avolumam o total são as dos têxteis, dos cimentou c das indústrias alimentares. Outras, como as dos produtos azotados e da celulose, dizem respeito a obras em andamento ou em estudo muito adiantado.
Se fosse posto em prática o programa, parte das dotações ficariam livres, em virtude de terem terminado algumas das obras (produtos azotados e cimentos) ou pagas encomendas importantes (têxteis).
Parece ser provável desviar da estimativa adiante mencionada, pelo menos, 400:000 contos.
Com esse suplemento, se mantido, poderiam considerar-se aperfeiçoamentos importantes ou a instalação de novas empresas, como o desenvolvimento em maior escala de indústrias derivadas da agricultura, de aproveitamento de desperdícios, de produções químicas e electroquímicas, de aproveitamento de madeiras, de produtos metalomecânicos, de aplicações de resinas, de interessantes aspectos relacionados com as possibilidades de transformação de minérios ou produtos terrosos, e muitas outras coisas, pequenas na aparência, mas que, somadas, poderão constituir um conjunto de actividades de influência sensível na actividade interna.

122. As dificuldades para calcular os financiamentos do plano industrial são talvez maiores do que no caso da energia, rega e electrossiderurgia.

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Por um lado, parte das empresas que o formam estão em execução, algumas em fase avançada de trabalhos; por outro, variavam bastante as estimativas, sobretudo na época em que foram formuladas. Em todo o caso, sujeito a ajustamentos que podem ser substanciais, o plano de financiamentos necessários às indústrias tomou o seguinte aspectos.

Plano industrial na metrópole

[Ver tabela na imagem]

Plano da agricultura

123. O plano da agricultura é de todos o mais dispendioso, e até certo ponto isso se explica pela importância que esta forma de actividade tem mi vida económica nacional.
Compreendendo a rega, a mecanização, a preparação de solos e outras coisas, mas excluindo as indústrias de azotados, o plano da agricultura eleva-se a:

[Ver tabela na imagem]

Só o plano da energia, como se viu atrás, ultrapassa o custo do da agricultura, mas deve notar-se que naquele uma parte do custo é atribuída a este último.

124. Como demoradamente se explicou, a base da rega, em certos esquemas, é a bombagem com utilização de emergia temporária e sobrante.
Os dispêndios paira esse fim incluídos no plano da emergia têm lògicamente objectivos agrícolas.
A discriminação das verbas atribuídas ao plano da agricultura só poderá ser feita depois de estudo mais minucioso sobre as necessidades de mecanização, que são grandes, e o tipo de culturas que a economia interna mais aconselha para a utilização dos terrenos sujeitos a rega.
Contudo, no estudo geral que foi feito sobre o assunto verificou-se a conveniência de importar apreciáveis quantidades de tractores de rodas e lagartas, assim como máquinas agrícolas para fins múltiplos, desde bombas e escavadoras até aparelhos de sondagem e perfuração para a rega por meio de lençóis subterrâneos, sobretudo nas terras dos pliocénicos do sul do Tejo e em outras regiões próprias para esse fim no litoral, a norte e sul do Mondego.
Julga-se que o emprego racional das elevadas somas destinadas a melhorias agrícolas, especialmente na mecanização, acompanhadas do uso de métodos de cultura apropriados e de progressos sensíveis na escolha de sementes, no tratamento de árvores frutíferas, (na introdução do milho híbrido e, sobretudo, na larga aplicação de adubos azotados, trará grande aumento à produção agrícola por unidade de superfície.
Acompanhado isso com a rega em largas áreas de terrenos (pobres e ricos, supõe-se que o País poderá dentro de cinco, dez ou quinze anos reduzir consideràvelmente a importação de produtos alimentares, e até exportar para a Europa alguma coisa do que hoje vem de outros continentes.
Na concepção de qualquer plano que tenda a melhorar as condições agrícolas do País, o Alentejo ocupa um lugar de primeira grandeza por se tratar de uma vasta região, com cerca de um terço da área total do País. Parece estar provado que, comi excepção de pequenas zonas, não é possível exploração agrícola económica sem grandes modificações nos métodos de cultura.
O abastecimento de água para rega está na base da melhoria agrícola de uma larga área a sul do Tejo.
Como se viu atrás, há hoje três correntes de opinião sobre o melhor meio de suprir as deficiências e de operar as transformações necessárias.
A primeira defende a rega em larga escala dos terrenos mais ricos, como os banos de Beja, os arredores de Évora e manchas perto de Sousel, as ricas lezírias do Tejo e outras regiões; a segunda inclina-se fortemente para o aproveitamento de terrenos mais pobres, embora a com água da mesma origem, que é essencialmente o Tejo e, em menor escala, o Guadiana e afluentes -alam da que cai aias zonas -regadas -, e aconselha a irrigação da vasta zona situada a oeste da cota 75 metros, que atinge algumas centenas de milhares de hectares e é constituída por pliocénicos já estudados em parte por serviços oficiais; finalmente a terceira limita-se ao aproveitamento de pequenas manchas, no pliocénico, com emprego de águas subterrâneas elevadas mecânicamente.

125. O assunto mereceria análise mais circunstanciada do que aquela que agora se faz, porque tem na verdade grande importância, dado o volume de capitais a inverter e os resultados que da escolha de uma ou outra podem advir.
O problema não é apenas de natureza económica. A questão social que há muito se desenha, a traços negros, bem vincados, em toda a zona a sul do Tejo, com excepção de regiões do Algarve e pequenos, oásis dispersos, aqui e além, torna mais complicada a discussão de um assunto extremamente importante para a vida política do País.
A cultura extensiva é incompatível com o aumento da população.
As crises periódicas, cíclicas no seu aspecto social, são o pão nosso de cada dia, e aumentam de intensidade com o desenvolvimento demográfico. Têm lugar nos terrenos ricos e nos terrenos pobres, quando sujeitos a cultura extensiva. O fenómeno não é apenas nacional, dá-se em todos os países em que prevalecem condições

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idênticas, e nalguns, como na Itália, com bem maior intensidade.
A cultura intensiva requer capital de 1.º estabelecimento e circulante, mão-de-obra especializada e, em grande número, meios mecânicos aperfeiçoados. Isto equivale a dizer que a muito grande propriedade terá de sor dividida, que o capital a inverter na terra terá de ser aumentado, que o trabalho familiar deverá ser em maior escala e que a água deverá constituir fundamento da exploração.
Se forem regados apenas terrenos ricos, o desequilíbrio no Alentejo acentuar-se-á Quer dizer: manchas extremamente florescentes e povoadas com altas densidades alternarão com zonas quase desertas. Socialmente a situação será desagradável e inefectiva. Por outro lado, as zonas pobres, embora susceptíveis de melhorarem a sua produção, levam tempo a ser transformadas. O processo agrícola é lento.
A terceira corrente de opinião - constituir, aqui e além, no deserto, oásis - nunca poderá atacar de frente um problema. É uma solução transitória, de recurso.
A utilização de águas subterrâneas, onde ela pode ser feita, econòmicamente, foi preconizada pelo autor quando escreveu sobre os pliocénicos do sul do Tejo 1. Mas não pode Constituir uma solução de per ai, não resolve um problema. Ajuda-o a resolver, e foi nesse sentido que se emitiu uma opinião. E até nesse aspecto lia um vasto tempo de trabalho e iniciativa no Alentejo, sobretudo na mancha pliocénica dos estuários do Tejo e Sado, que ocupa uma larga área de mais de 600:000 hectares, e no planalto do Alto Alentejo.
A exploração mo primeiro caso está ligada às possibilidades de uso de água por bombagem do Tejo e do Sado e à possibilidade de se poderem armazenar durante o Inverno grandes reservas aquíferas.
Há indicações, que se julgam certas, de se poder obter suficiente capacidade em algumas dezenas de albufeiras, espalhadas por toda a extensão, para regar grandes áreas, e julga-se que o tipo de barragem de pequena altura de terra é suficientemente económico para permitir fazê-lo em boas condições.
Dentro dessas áreas, que podem atingir centenas de milhares de hectares, há, evidentemente, manchas próprias para o uso de águas subterrâneas, agora facilitado pela própria rega superficial.
Quer dizer: os pliocénicos do sul do Tejo e Sado só podem ser eficazmente explorados por um sistema de rega que utilize simultaneamente águas subterrâneas c; superficiais, e estas últimas provirão, sem dúvida, dos excessos de caudais do Tejo, elevados durante o Inverno com energia temporária; também proveniente do Tejo, que pode até ser energia de três meses, sem uso em qualquer outra, forma de actividade.
Mas num plano de larga envergadura, a executar em irmã ou duas gerações, não devem ser descuradas as possibilidades de rega de terrenos férteis e ricos, hoje explorados em regime de cultura extensiva. O único problema que neste aspecto se põe é mais uma questão de oportunidade, de tempo. Há que decidir se convém mais à vida nacional iniciar a rega por terrenos ricos ou por terrenos pobres, ou, tomo parece indicado, atacar simultaneamente uns e outros, conforme as oportunidades oferecidas pela construção dos canais condutores.
Outro aspecto importante a considerar numa reforma agrícola é o tipo e qualidade de produtos.
Não vale a pena inverter somas consideráveis em melhorias de vulto senão for clara e previamente estabelecido qual o género de produção. Não parece ser difícil estabelecer directrizes gerais.
A análise do comércio externo português já foi feita noutro trabalho 1. Pode dar preciosas indicações a este respeito e o ritmo do aumento demográfico completa-as.
Reproduz-se noutro capítulo deste trabalho a influência dos produtos da agricultura no comércio externo e notou-se então que a produção florestal (madeiras, resinas e cortiças) é na exportação valor de primeira grandeza.
O repovoamento florestal há-de certamente exercer no futuro uma acção benéfica muito grande, até nos valores de exportação.
Mas é preciso acentuar que se torna necessário fazer neste aspecto o estudo do sul do Tejo. Não é naturalmente possível adaptar à rega tão largas áreas sem ao mesmo tempo intensificar o povoamento florestal nas zonas interessadas. O Alentejo neste sentido está muito atrasado.
É, pois, evidente que o alargamento de áreas florestais é uma exigência também do seu desenvolvimento agrícola e qualquer plano de financiamentos não pode descurá-la.

IX

FINANCIAMENTO

126. As disponibilidades financeiras do Estado e de particulares sofreram considerável desgaste nos últimos anos. Os acontecimentos sobrevindos na Europa e na América, de ordem política, económica e financeira, opõem-se, hoje mais do que na data em que foi delineado o programa, ao seu financiamento.
Convém recordar sucintamente os factos que motivaram a sua génese, reservando comentários para outro lugar.

O auxílio americano

127. O Congresso Norte-Americano votou para auxílio à Europa uma elevada quantia, que poderia alcançar a cifra de 16 biliões de dólares a distribuir na Europa Ocidental, através de um organismo instituído pelos países comparticipantes. Dois desses países - Portugal e a Suíça - declararam em Abril de 1948 expressamente não necessitarem do financiamento norte-americano.
A situação financeira e cambial portuguesa não era de molde, porém, a dispensar esse auxílio e o Governo Português, tendo em couta este facto, resolveu pedir a comparticipação nos fundos postos à disposição da Europa Ocidental.
Essa comparticipação agora só poderia ter lugar no exercício económico de 1949-1950, cerca de um ano depois, visto já terem sido distribuídas as verbas relativas a 1948-1949.
O auxílio norte-americano revestiu durante o primeiro ano da sua efectivação dois aspectos: o do chamado auxílio directo e o do auxílio indirecto.
No primeiro caso - o auxílio directo - o saldo das verbas acordadas por esta forma a um país comparticipante podia ser convertido em um empréstimo a longo prazo e a juro muito módico; a amortização iniciava-se anos depois de ter findado o auxílio, em 1952-1953.
O auxílio indirecto - que tomou a forma de dádivas (grants)- consistia na concessão de créditos para fornecimentos de um país comparticipante a outro,

1 Parecer das Contas Gerais do Estado, 1945.

1 Araújo Correia, Ensaios de Economia Aplicada, pp. 105 e seguintes.

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liquidados por dólares entregues pela Administração americana ao país credor. Mas neste caso o país beneficiário deveria depositar no seu banco emissor uma quantia, em moeda nacional, equivalente ao crédito concedido. Quase toda essa quantia em moeda nacional poderia ser utilizada, com autorização da Administração americana - isto é, poderia ser gasta pelo Governo beneficiário em fins úteis, comi a aprovação dos concessionários. Constituíam as dávidas.
Indubitavelmente que o generoso auxílio norte-americano representou considerável alívio às economias europeias. Impediu convulsões políticas de grande envergadura que se desenhavam já perigosamente, sobretudo em França e na Itália.
O seu objectivo era a reconstituição dos instrumentos produtores, arrasados por meia dúzia de anos de guerra.
Tendia a alargar a produção europeia de modo a ocorrer ao sustento de uma população que aumentava dia a dia e que saíra debilitada fisicamente, mal alimentada e céptica de um temeroso conflito mundial. No fundo ambicionava opor um grande dique contra a invasão de ideias comunistas que espraiavam do Oriente.
Para a comparticipação no auxílio norte-americano no ano de 1948-1949, dada a rapidez com que esse auxílio tinha de ser concedido, poucos elementos, ou relativamente muito poucos, se exigiram. Mas foi julgado conveniente fazer o estudo cuidadoso das possibilidades, e disponibilidades materiais da Europa Ocidental e suas dependências ou de outros continentes antes da concessão Ido auxílio respeitante ao ano de 1949-1950, de modo a promover, tanto quanto possível, a sua integração económica.
Foi então pedido a todos os países comparticipantes que apresentassem o esquema geral dos seus objectivos de produção e consumo, de modo a determinar com precisão o quantitativo do auxílio individual.
O programa económico de cada país compreendia por isso, além de um relatório circunstanciado sobre as obras ou fins económicos a realizar até 1952-1953, a estimativa da balança comercial e da de pagamentos com as diversas zonas monetárias. O déficit desta última viria provavelmente a constituir, depois de discutida e aprovada no seio da Comissão Europeia de Cooperação Económica (O. E. C. E.), o auxílio a conceder ao país comparticipante.
Havia, pois, que delinear um programa económico a longo prazo para Portugal e domínios de além-mar, orçamentá-lo em termos de poder ser verificado e estudado por comissões especializadas e extrair do conjunto o que deveria vir a ser gasto no ano de 1949-1950.
As directrizes gerais enviadas pela comissão executiva da O. E. C. E. e aprovadas por todos os comparticipantes estatuíram os objectivos a que deviam obedecer os programas a longo prazo, e instruções pormenorizadas foram mostrando a orientação geral a seguir no seu delineamento, de modo a obter aio conjunto dos dezasseis países tão grande homogeneidade quanto possível.
Discutiu-se cada programa a longo prazo em sessão pública, com dois arguentes ou examinadores e um presidente, escolhidos de entre os comparticipantes. Os resultados das discussões públicas, devidamente estenografadas, sumariavam-se nunca acta. Aos resultados correspondia ou não a comparticipação. O programa de 1949-1950 sofria depois análise semelhante.
Grande número de comissões especializadas estudavam em seguida os programas em separado. Por seu intermédio era possível colher elementos e coordená-los de modo a conhecer com o possível rigor o estado e as necessidades de várias formas de actividade.
Foi assim possível analisar os problemas da energia, dos combustíveis líquidos e sólidos, das madeiras, da electricidade, da agricultura, dos minérios, da siderurgia, da balança comercial e de pagamentos, das colónias, das matérias-primas mais importantes, da pesca, dos transportes, da mão-de-obra, do turismo e de muitas outras coisas de grande interesse para a Europa Ocidental, entre as quais avultavam os consumos e as disponibilidades.
Na verdade as comissões da O. E. C. E produziram em pouco tempo um somatório de trabalho e obtiveram informações de natureza económica e social que merecem relevo e, juntamente com os estudos da Comissão Económica de Genebra, constitui vasto manancial de informação em que poderá ser baseada qualquer acção futura de integração económica e até política da Europa Ocidental.

128. O programa português foi delineado sobre pressão da urgência dos acontecimentos.
Havia poucos dados, sobretudo no que diz respeito às colónias.
Na parte metropolitana ta>inibém não abundavam os elementos, pelo menos na forma requerida.
O programa económico, que se descreve neste trabalho, é, nas suas linhas gerais, aquele que foi apresentado e discutido em Paris, em Novembro de 1948.
Uma vez examinados os programas nacionais de todos os países comparticipantes, as comissões especializadas formulavam os seus juízos ou colhiam informações sobre diversos aspectos dos programas e procuravam, na medida do possível, coordená-los entre si.
Um dos males da Europa que necessitava, e ainda necessita, de profundas modificações consiste na ligação mais íntima das economias regionais, de modo a aproveitar cabalmente as aptidões de cada região. A racionalização económica, para ser eficaz, tem de estender-se aos níveis de preços de produtos industriais e agrícolas, porque, se assim não for, a Europa continuará a ser dominada por uma diferenciação de poderes de compra que se não coaduna com as próprias possibilidades agrícolas-industriais das diversas regiões. Para que seja equilibrada, e sã a vida europeia, as diferenças que existem entre os filhos ricos e os filhos pobres terão de desaparecer.
As comissões da O. E. C. E. têm prestado um serviço excelente no sentido de determinar as aptidões de cada país.
Talvez pequem, por apressados os seus trabalhos. Mas o tempo poderá esclarecer certos aspectos que não foram ainda devidamente apreciados.
O programa português foi considerado um programa ambicioso, e, na verdade, assine. Aliás não é programa para se realizar em três anos, dada sobretudo a impossibilidade de poderem ser fornecidos, dentro deste prazo, pela Europa, os equipamentos essenciais.
Mas ninguém pode ter a pretensão de resolver, ou grandemente aliviar, a situação da Europa até 1952-1953, e é plenamente conhecido já hoje que o déficit ultrapassará 2 biliões de dólares naquela data.
De resto, pode afoitamente dizer-se que nenhum dos programas apresentados poderia ser integralmente realizado até à data indicada.
Os programas submetidos ao exame da O. E. C. E. até Dezembro de 1948 deveriam ser revistos nos meses seguintes, de modo a poderem, ser coordenados em seguida discussão antes de ser distribuído o auxílio americano. Entretanto, cada país deveria, no intervalo, pormenorizar com projectos e esquemas as abras que tivessem de ser incluídas no próximo ano de 1949-1950.
O programa português, logo após a discussão, foi distribuído aos serviços respectivos paia esse efeito. Prepararam-se as coisas no sentido de, em tempo oportuno, ser o plano revisto entregue para nova discussão e

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realizados os trabalhos essenciais que permitissem o dispêndio do auxílio a conceder no primeiro ano da comparticipação portuguesa.

129. Há-de notar-se no exame do programa económico a longo prazo que ele tende a um grande acréscimo do rendimento nacional, computado em perto de 3 milhões de contos por ano, mas que será, talvez, sensivelmente superior a 4 milhões se for incluído o programa do ultramar.
A situação em 1947, tanto das disponibilidades do Tesouro como das reservas cambiais, era de molde a prever a possibilidade de desviar para obras de fomento largas quantias. As posições financeiras comprovativas da disfunção no fim de cada ano foram indicadas em outro capítulo deste trabalho.
Por outro lado, o exame dos depósitos bancários e de caixa económica mostrava que estes se mantinham estáveis.
A balança de pagamentos saíra de um período anormal de grande(r) saldos. No período que decorreu entre 1930 e 1940 houvera apreciável acumulação de disponibilidades cambiais e entre 1940 e 1946 a acumulação atingira cifras nunca visitas no nosso acanhado meio financeiro. Parecia, por isso, em fins de 1946 e até de 1947, que não seria difícil o desvio para fins produtivos de fomento económico de grande parte dos saldos existentes nas mãos do Estado e de particulares. E isso, acompanhado das verbas que pudessem ser desviadas do Plano Marshall, levaria à execução do programa ou, pelo menos, ao seu grande avanço até 1953.
A Administração norte-americana examinou o plano português para efeitos de apresentação do pedido de fundos ao Congresso e considerou que os seus objectivos interessavam especialmente ao fomento económico do País. Entendia assim que parte do seu financiamento se deveria fazer por créditos a conceder por entidades particulares fora do plano de auxílio americano, mas sob sua égide.
Foi esta, em Paris, a posição tomada por alguns países comparticipantes, a qual era até certo ponto lógica, embora egoísta, no sentido de reduzir ao mínimo a comparticipação de um país que meses antes explicitamente declarara não necessitar de financiamentos. Na verdade, o auxílio concedido a um novo comparticipante redundaria ma diminuição correspondente das quotas de outros. A apreciação da Administração norte-americana declarava ser apenas tentativa; baseava-se, porém, como expressamente notado, na insuficiência de elementos e até no desconhecimento do que se passara, em muitos aspectos, nas discussões em Paris. E logo depois se modificou num sentido favorável.

Os financiamentos em moeda nacional e divisas estrangeiras

130. O financiamento de um plano de fomento económico de larga envergadura representa, sem dúvida, o maior obstáculo à sua realização.
Há que considerar certo número de questões preliminares, e a mais importante diz respeito ao prazo de execução.
Neste aspecto devem levar-se em conta outros factores, mas nenhum deles tem a importância do financiamento.
No cômputo do custo de um programa duas questões se devem considerar, relativas aos capitais expressos em moeda nacional e estrangeira. Uma e outra se relacionam com toda a vida conómica e até social.
O poder de compra, o nível de consumo, o comércio externo, as despesas e receitas públicas, as disponibilidades bancárias e outros factores influenciam o programa de financiamento.
Não é possível estudar em pormenor, e nalguma casos até em linhas gerais, todos os factores que se ligam com o assunto.
Convém, em primeiro lugar, ter uma ideia do rendimento nacional e das percentagens susceptíveis de poderem ser desviadas para o financiamento de um largo programa de fomento económico e social durante um período que se pode fixar em dez, quinze ou vinte anos.

131. No programa apresentado em Paris, em Novembro de 1948, estimava-se em 625 milhões de dólares o capital necessário à sua execução, assim distribuído:

[Ver tabela na imagem]

No total de 625 milhões de dólares, ou 15,625 milhões de contos, correspondiam a moeda nacional e a moeda estrangeira as cifras seguintes:

[Ver tabela na imagem]

A grande diferença entre as duas cifras provém da própria natureza do programa.
Na parte hidroeléctrica, de energia e navegação, o tipo de barragens no Douro é de comportas. Há a acrescer o seu custo às divisas estrangeiras para compra de máquinas.
Estudos feitos mostraram, na base de obras em execução, que os materiais a importar neste caso custarão cerca de 75 por cento do total da obra. E, como só o custo do aproveitamento do Douro nacional subiria a 2 milhões de contos, a influência de cambiais seria grande no orçamento total.
Outras circunstâncias apontavam nesse sentido, visto que, sendo o programa português um programa de produção e não de socorro, como outros, e Portugal um país de incipiente actividade na indústria pesada, haveria que recorrer a importação de equipamentos industriais.

Os recursos financeiros internos

132. Na base dos números indicados acima, o custo do programa económico exposto elevar-se-á a 16 milhões de contos, números redondos. A parcela a despender por ano será de 1:066 mil contos se for previsto o prazo de quinze anos e de 800 mil contos se for fixado o de vinte anos.
Considera-se, para efeitos de estudo, que a execução do programa económico nacional precisará da inversão anual de 1 milhão de contos, dos quais 30 por cento em moeda nacional e 70 por cento em divisas estrangeiras. Serão cerca de 4:800 mil contos em moeda nacional e 11:200 mil contos em moeda estrangeira.

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Seriam precisos 700 a 300 mil contos por ano, respectivamente em divisas estrangeiras e moeda nacional.
Estas cifras podem alterar-se sensivelmente se for modificada a ideia primitiva, baseada na possibilidade de obter auxílio substancial em boas condições de moeda estrangeira. E talvez fosse vantajoso alterar o pormenor aqui ou além no sentido de tornar maior a utilização de moeda nacional, dadas as circunstâncias actuais, que pressupõem dificuldades económico-finaniceiras na Europa depois de 1952.

133. Os recursos internos em fins de 1947 eram de molde a prever a possibilidade de financiamento substancial de um programa desta envergadura. Não é este o lugar para analisar as razões que obstaram uns anos depois a essa possibilidade.
Basta apenas verificar agora que com os actuais níveis de consumo não é possível inverter em obras de fomento, extraordinariamente, tão grandes quantias em moeda nacional e estrangeira.
Daí deriva a necessidade de alargar os prazos de execução do programa para quinze ou até vinte anos, como atrás foi indicado.
Isto não significa que não possa ser encurtado o tempo de sua realização se as condições financeiras o permitirem.
A questão que necessita de ser prévia e convenientemente esclarecida é a de saber se o País tem condições que lhe permitam inverter cerca de 1 milhão de contos todos os anos, extraordinariamente, num programa de aumento de riqueza, de modo a poder, no fim de certo tempo, aumentar o seu rendimento nacional em, pelo menos, 4 milhões de contos, na base de preços que adiante se mencionarão.
Deve ainda notar-se que o rendimento das parcelas do próprio programa dentro de alguns anos, depois do início d Um exemplo mostra que assim será. No caso em que se reduz consideràvelmente a importação de combustíveis sólidos e líquidos pela substituição de força motriz de origem térmica por energia hidroeléctrica, as cambiais necessárias para a importação de carvões ou óleos que ficam livres poderão auxiliar a compra de divisas estrangeiras de outro equipamento.
De qualquer modo não parece ser possível financiamento adequado com deficits da balança comercial da ordem dos últimos três anos, a não ser que o auxílio externo neutralize integralmente esse déficit. Quer isto dizer que não parece ser possível o financiamento, por forças próprias, sem economias importantes nos consumos.
O exame pormenorizado do comércio externo dá indicações seguras sobre a possibilidade de economias substanciais nas importações e, portanto, nos consumos de origem externa.

134. Uma parte dos fundos necessários terá de provir do Tesouro - esta parte diz respeito especialmente nos planos da rega e da energia em Portugal que somam, no conjunto, o seguinte:

[Ver tabela na imagem]

O que em quinze anos corresponde sensivelmente a 340 mil contos por ano.
O enunciado desta cifra mostra ser preciso, através dos meios de que dispõe o Estádio, desviar todos os anos menos de meio milhão de contos para a execução de um programa.
Contudo á indispensável efectivar, para que isso seja possível, uma cuidada revisão orçamental nas linhas gerais aconselhadas nos pareceres das Contas. Essa revisão tenderá a reduzir ao mínimo as dotações para obras dispensáveis), o que equivale a dizer que programas de edifícios, de obras de natureza sumptuária, de vilas de comunicação não indispensáveis e de inversões de rendimento aleatório terão de ser cuidadosamente revistos e consideràvelmente diminuídos.
Nas despesas ordinárias será indispensável também reorganizar certos serviços, com dois objectivos, que são o de reduzir despesas e o de desviar, para a execução do programa económico, pessoal que existe a mais.
Está hoje provado ser possível economizar bastante em pessoal, e com a execução do programa o que houver a mais poderá encontrar imediata colocação no próprio programa.
Haverá apenas transferência de funções, que pode até ,ser vantajosa para muitos dos actuais servidores do Estado.

135. A segunda parcela importante a desviar para o financiamento do programa económico nacional diz respeito à capitalização de f unidos de previdência e de reserva, não só de entidades semioficiais ou fiscalizadas pelo Estado, mas até de particulares.
Não vale a pena agora fixar cifras. No entanto, o volume de receitas todos os anos e a natureza das inversões, obrigatórias em certos casos, em fundos do Estado permitem julgar ser possível o desvio pana fins reprodutivos talvez de umas centenas de milhares de contos por ano.

136. Não se conhece o quantitativo que anualmente se poupa para inversões financeiras. Enquanto mão forem estabelecidas as bases necessárias para a determinação do rendimento nacional e seu destino não será possível calcular em cada ano aquilo que pior particulares pode ser usado em novas inversões económico-financeiras.
Neste aspecto a situação não é boa no presente. A euforia de riquezas que não existiam levou a consumos excessivos e ao início de obras escusadas na actividade particular.
O que for possível poupar agora terá de ser usado para completar as obras em curso.
A quanto sobe o que é necessário para terminar ás obras em curso - que podem consistir em edifícios, prédios, armazéns, fábricas, plantações, pequenas barragens e tantas outras coisas?
Não é fácil dizê-lo, mas julga-se que será possível em dois anos aliviar consideràvelmente as condições actuais, no caso de haver inteligência na distribuição de gastos, parcimónia nos consumos e bom aproveitamento dos instrumentos produtores. Se as produções agrícolas melhorarem bastante, a situação tornar-se-á menos precária.
As inversões financeiras de entidades privadas deverão naturalmente ser canalizadas para fins agrícolas e industriais, e há mo programa nacional um vasto campo e grandes perspectivas messes objectivos.

137. Finalmente o auxílio externo será essencial, sobretudo na parte relativa à obtenção de divisas estrangeiras. O problema neste aspecto não parece insolúvel

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se continuar o auxilio americano directo ou indirecto e se internamente houver uma conveniente selecção de inversões em moeda estrangeira. O estudo da matéria implica naturalmente o estabelecimento de uma lista de prioridades relativa a importações, ou, por outros termos, uma hierarquia de importações.
A prioridade terá de ser concedida, evidentemente, a tudo aquilo que implicar auxílio aos esquemas do programa económico nacional.
Dado o volume de importações e a possibilidade de dispensar muitas e substituídas por produções nacionais, não parece ser muito difícil a questão.
Levanta-se agora, porém, um obstáculo sério, que é a chamada liberalização do comércio da Europa Ocidental.
A este respeito deve notar-se que não haverá o propósito de reduzir importações, visto a grande necessidade de mandar vir os equipamentos e outras matérias essenciais.
As importações podem até subir.
Por outro lado, a execução de um programa da natureza do defendido em Paris e agora descrito nas suas uniras gerais item o objectivo imediato de satisfazer necessidades emergentes da situação europeia.
Indirectamente auxilia a sua economia, como ali foi reconhecido na altura da sua discussão.

138. Os fundos do Plano Marshall e o crédito externo são questões que não dependem apenas da boa vontade, interna. Dadas as declarações americanas sobre auxílios, a natureza dos produtos e, finalmente, o carácter estratégico de alguns, não parece ser impossível utilizar uma ajuda substancial desta origem.

139. São estas as actuais perspectivas de financiamento de um programa económico nacional: revisão do orçamento do Estado no sentido de reduzir despesas, tanto ordinárias como extraordinárias, e canalização para fins produtivos das economias possíveis - não se afectando, por esse motivo, o poder de compra; orientação dos fundos sociais disponíveis para fins reprodutivos, com vantagem nos rendimentos da previdência e até de outras reservas; estudo dos consumos, com o objectivo de diminuir o que é dispensável, sobretudo em matéria sumptuária, de modo a substituí-los pela importação dos equipamentos necessários ao programa; recurso ao auxílio externo, na medida do possível, tendo em conta sempre o carácter nacional dos empreendimentos e a utilização desses recursos exclusivamente em bens de produção; indirecta regulamentação do crédito e, por consequência, das inversões financeiras privadas (investimentos), de modo a impedir o seu desgaste ou dissipação.
As medidas a tomar, e que este simples enunciado determina, mostram logo que para realizar um programa de tão vasto alcance nacional é indispensável a compreensão nítida e clara dos seus benefícios e da sua utilidade e a aquiescência tácita da grande maioria da opinião pública informada.
Num país em que é notório o atraso económico e em que muitas vezes não são compreendidos os esforços feitos no sentido de melhorar as condições de vida, não é fácil executar com método tão vasta obra em espaço de tempo que não é grande - quinze ou vinte anos.
Se houver, porém, a compreensão da gravidade das actuais circunstâncias e a certeza de que é possível transformá-las, então não se vêem grandes obstáculos à realização do programa económico nacional.
Antes de o iniciar deverão, porém, ser assegurados, na medida em que humanamente podem ser previstos e nos termos atrás enunciados, os meios financeiros para o realizar.

X

RENDIMENTO NACIONAL

140. Não lia ainda hoje elementos que permitam dar uma cifra global, ainda que aproximada, da produção interna, expressa em moeda corrente, e muito menos da sua repartição e dos consumos.
O problema tem muito interesse porque, sem exacto conhecimento do que sobra dessa produção, não é fácil determinar as verbas que anualmente podem ser adstritas ao financiamento de qualquer programa económico.
E este um assunto que bastas vezes tem sido tratado pelo autor e outras pessoas, mas que, por motivos que não são aparentes, não mereceu ainda a atenção devida.
Todos os países, quase sem excepção, estão a fazer sérios esforços no sentido de conhecer, tão exactamente quanto possível o rendimento nacional.
Já hoje os orçamentos dos Estados modernos se apresentam em muitos deles acompanhados de uma estimativa dos recursos económicos disponíveis no ano a que dizem respeito, e sobre essas estimativas se calculam, com melhor justiça e mais nítida compreensão dos problemas, as receitas, as despesas, e até na vida pública e na vida particular se estabelecem planos de inversões financeiras, ou investimentos, como, com pouca propriedade, é de uso dizer agora.
A determinação do rendimento nacional é um trabalho moroso e implica uma série de informações e estudos que só através de organismos apropriados se poderá obter. Mas não seria difícil com pouco dispêndio, desde que haja boa vontade nos serviços oficiais, proceder a esse trabalho, e para isso está naturalmente indicado o Instituto Nacional de Estatística, que tem à sua disposição já hoje uma larga soma de dados e possui o equipamento mecânico necessário.
A produção interna, expressa em escudos, é conhecida para certo número de produtos, principalmente os agrícolas. E o rendimento líquido de algumas indústrias tem sido estudado e calculado partindo do conhecimento das produções.
Tudo, porém, repousa, por enquanto, sobre inquéritos especiais sem o objectivo de saber o conjunto do rendimento nacional.
Esse objectivo necessita de ser atingido dentro do mais curto espaço de tempo possível, não apenas para satisfazer pedidos de órgãos internacionais com quem estamos em contacto, como a O. E. C. E. e as Nações Unidas, mas principalmente para ter um barómetro que permita inventariar periodicamente a vida financeira e económica.
Compelido pela força das circunstâncias e em posição difícil, o autor, ràpidamente, com os poucos elementos de que dispunha, computou a produção nacional para 1947 em 18 milhões de contos, dos quais cerca de dois terços provêm da agricultura.
A estimativa é, evidentemente, baixa porque até nos números relativos à agricultura há fugas que escapam à análise, sem directo contacto com a vida de todas as regiões do País e até com zonas dentro dessas regiões.
O rendimento caseiro tem grande importância em Portugal, sobretudo nas terras mais povoadas do norte do Tejo. O hábito salutar do cultivo de legumes, da produção de carne e até de azeite no agregado familiar, que suprem durante o ano as deficiências ou falhas nos salários, auxilia apreciavelmente a subsistência das famílias pobres.
Os rendimentos assim produzidos fogem muitas vezes à análise, mas constituem na verdade uma parcela importante.

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Na actividade das indústrias nota-se também certa dispersão oficinal, que escapa em certos casos ao exame. Más a importância das falhas é neste caso muito menor.
É de interesse notar que a economia nacional ainda hoje em grande parte assenta nas produções agrícolas. Como se verificou no estudo sobre o comércio extenuo a que se aludiu atrás 1, a importância da agricultura é muito grande nas exportações. A exportação de produtos de origem vegetal em 1938 e 1946 foi superior a 50 por cento. Assim, o rendimento nacional ainda hoje depende muito da agricultura. É natural que, tendo em conta os progressos recentes nas indústrias, a sua influência no futuro seja maior.
Considerando o labor industrial e a pesca, que deve produzir por ano perto de 800 anil a 900 mil contos aos preços actuais, os salários pagos, a marinha mercante e outras actividades, talvez seja possível elevar o produto nacional para 20 milhões de contos aos preços de 1949.
Mas esta estimativa, embora feita sobre grande número de elementos já conhecidos, tem de ser considerada como aleatória e mal fundada, ou, antes, insuficientemente fundamentada. Representará apenas uma ordem de grandeza, que dá orientação geral para o cálculo dos financiamentos necessários à execução de um programa económico em quinze ou vinte anos.
E a pergunta que necessàriamente agora ocorre é a seguinte: será possível desviar para fins reprodutivos, quer dizer, para financiamento de um programa económico, cerca de 1 milhão de contos por ano na metrópole e nos domínios ultramarinos?
Deve ser esclarecido que o programa tal como foi delineado mão inclui, nem podia incluir, o financiamento de todas as empresas reprodutivas. Ele constitui apenas um programa-base, destinado a desenvolver os elementos fundamentais do ressurgimento económico. Por isso, além da verba acima mencionada, haverá que inverter na indústria e na agricultura quantias variáveis.
Um exemplo mostra o tipo de financiamento que se não inclui: é sabido que era anos de boa safra de azeite, por exemplo, o agricultor tem em geral por princípio aumentar as suas plantações. O número de oliveiras plantadas depende muito das disponibilidades monetárias do rendimento da safra. O conjunto dos rendimentos que todos os anos se invertem, neste caso, em novas plantações é desviado do agregada do rendimento nacional.
Outro tanto se dirá de várias explorações agrícolas, como a vinicultura, a florestal e mais. Deverá ser importante este autofinanciamento, que é mais amplo do que se julga, como é fácil verificar nos vastos olivais plantados nos últimos dez anos, em circunstâncias difíceis e dispendiosas muitas vezes, como, por exemplo, nas bacias hidrográficas da margem direita do Tejo.
Também na indústria se operam desvios semelhantes, embora em menor escala, por se terem atendido no programa os grandes financiamentos. Mas também neste caso haverá que considerar desvios.
Tudo ponderado, o exame dos números e das presunções leva a crer que um programa nacional da envergadura do que foi descrito acima exige a compressão de consumos e o adiamento ide obras dispensáveis.
Mas essa compressão não necessita de ir além do não indispensável. Com efeito, se estão certas as previsões relativas ao rendimento nacional, isto é, se 20 milhões de contos representam uma estimativa aproximada do produto nacional, o que será necessário num plano de financiamentos (num plano de inversões) não chega a 10 por cento por ano. Nos programas de quase todos os países comparticipantes apresentados em Paris a percentagem aio rendimento nacional atribuída ao financiamento dos respectivos programas a longo prazo ia além da difira de 10 por cento, e alguns submeteram até a sua sugestão de comprimir fortemente os consumos. Não se presume no caso português, apesar da orientação dada nos últimos anos às despesas públicas, que a compressão a operar traga sacrifícios pesados ao grande público. A ser feita, ela terá de incidir especialmente sobre as classes mais desafogadas, que em anos sucessivos de crise mundial, de angústias e faltas quase nada sofreram em comparação com outros povos. Mas até neste caso apenas o supérfluo poderá ser atingido.

XI

BENEFÍCIOS ECONÓMICOS E SOCIAIS no PLANO ECONÓMICO NACIONAL

141. Um programa económico da importância e envergadura do que acaba de ser sucintamente exposto deverá naturalmente ter influência muito grande na vida nacional.
Não se pode medir essa influência apenas e exclusivamente no aspecto económico - no puro ponto de vista do acréscimo do rendimento nacional. A percentagem deste acréscimo pode medir-se, e adiante se tentará converter em escudos, aos preços actuais, o aumento físico de produção que derivará do pleno rendimento das empresas incluídas no programa.
Os benefícios, no entretanto, projectam-se mais além do f acto puramente económico - descem até à própria personalidade humana, ao seu modo de ser, à sua educação, à confiança em seus próprios destinos. Vai desaparecendo um pouco, diluído na neblina dos tempos, aquele entranhado fatalismo da perenidade de contas sem ordem. Com os anos reacendeu-se, porém, em matéria financeira, no ânimo de muita gente portuguesa, a ideia de perenidade de boas contas, como se a vida mão tivesse de ser vivida em esforço contínuo.
A execução de um programa económico virá reavivar, na lembrança dos homens, a verdade profunda de que nada no Mundo pode existir de grande sem trabalho e sem a inteligência criadora.
A formação de riquezas em que todos compartilhem tende à solidariedade humana, e sem esta, como os acontecimentos bem na memória de todos comprovam, não pode haver nem moral nem paz nos espíritos.
O primeiro grande benefício que, indubitavelmente, derivará do programa é a convicção, nas classes menos afortunados como nas anais ricas, de que é possível com o trabalho de conjunto melhorar as suas condições. Nuns, acordará a certeza de que acréscimo demográfico não significa necessariamente emigração maciça para terras estranhas - o que equivalerá a voltar as costas, num fatalismo doentio, ao esforço coordenado de valorização interna. Noutros, despertará o respeito por aptidões que parecem esquecidas muitas vezes na confusão de uma luta, travada, ingloriamente, com a natureza rebelde, usando armas antiquadas.
Em qualquer dos dois casos, a resultante é de natureza construtiva - tende a fortalecer o carácter.
Se for possível, e nada impede que o seja, executar um vasto programa económico nacional, com método, dentro de tempo e orçamentos prèviamente fixados, a acrescer aos seus benefícios de natureza física, há um

1 Araújo Correia, Ensaios de Economia Aplicada, p. 198.

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outro, impalpável mas poderoso, que é o da nas aptidões organizadoras da Baça e a negação do que de desconexo e individualista existiu no passado e ainda existe.
Não é para desprezar esta faceta dos .benefícios que derivarão do programa nacional, porque os povos mão vivem apenas pela força imaterial. A consciência do cumprimento de um dever e a certeza da existência de um esforço criador, do espírito e da inteligência, dão ânimo para o prosseguimento de tarefas a cumprir, que, nos povos lusitanos, poderão ser largas e frutuosas nos vastos domínios de além-mar e em outras esferas da actuação humana.

Resultados económicos

142. O plano económico nacional incide sobre a produção de energia, rega, minérios, ferro e aço, indústrias nas suas variadas formas, produtos agrícolas e transportes.
Tem a caracterizá-lo um objectivo importante: aproveitar na medida do possível, dentro de estritas normas económicas, todas as possibilidades que podem derivar da realização das obras.
Um dos grandes males da vida nacional é a indiferença pelo aproveitamento de desperdícios - e dá-se à palavra desperdício todo o seu lato sentido.
O exemplo típico, já citado publicamente, do que se passa em matadouros, em que na maioria dos casos tudo se perde ou se deita fora, excepto a carne, que é apenas parcela, e, em certas explorações, a miemos valiosa, traduzida em dinheiro, ilustra com facilidade o prejuízo de que o País sofre.
Se a análise for extensiva às mil actividades nacionais, poderá verificar-se que na pequena exploração agrícola, como na grande empresa industrial, há lugar para aproveitamentos económicos de grande interesse que, em certos casos, até podem decidir da vida da própria exploração.
Um dos casos estudados e incluídos no programa económico nacional refere-se exactamente a determinado empreendimento, que, se apenas considerado pelo lado da sua produção fundamental, não teria viabilidade no nível económico corrente, mas que, por virtude de aproveitamento integral, atinge alto nível em matéria de rendimento económico.
O aproveitamento de todos os desperdícios agrícolas, industriais ou de outra natureza, a utilização integral de todas as potencialidades de uma empresa, são fundamentos de economia racional e sã.
Um dos objectivos do programa atrás descrito tende a isso: procura incutir no ânimo de todos a necessidade de utilizar tudo aquilo que económicamente possa ser aproveitado.

Plano da energia

Energia

143. O total da energia produzida, não contando com a energia temporária usada na bombagem da água para o Alentejo, atinge 3:500 milhões de kWh, distribuídos do modo que segue:

Sistema Douro-Sabor ................ 2:000
Sistema Tejo-Ocreza ................ 830
Sistema Zêzere ..................... 420
Outros ............................. 310

3:560

Se for incluído o aproveitamento do Côa, o total da energia elevar-se-á, números redondos, a 4 biliões, a que há a descontar metade do Tejo internacional, ou sejam 200 milhões.
De dois modos se pode obter o valor desta energia: ou atribuindo a cada unidade preço médio que derivará de suas utilizações ou incorporando-o no produto manufacturado, quando for caso disso, ou encontrando o seu valor no cômputo desses produtos.
Os preços da unidade de energia diferem muito, conforme o seu destino e o volume dos blocos contratados, e também estão dependentes de exigências económicas nacionais.
Será por isso necessário, para chegar a números aproximados, calcular as quantidades de energia destinada aos diversos usos.
Quais são esses usos? Qual o preço de energia que torna possível a instalação de determinada indústria em que é empregada?
As indústrias de maior relevo, previstas no programa, são:

1) Electrossiderurgia;
2) Sulfato de amónio e outros produtos azotados;
3) Celulose;
4) Cimentes;
5) Metalomecânicas;
6) Electroquímicas;
7) Metalúrgicas;
8) Outras;
9) Usos domésticos: aquecimento, luz e mais.

Além dos consumos nas indústrias, a energia irá substituir grande parte do actual consumo de energia termo-eléctrica e poderá em alto grau ser utilizada em usos domésticos, tais como aquecimento e outros. O preço da unidade variará com o seu uso. Enquanto que, por exemplo, para a electrossiderurgia e sulfato de amónio se poderá admitir, no presente momento, o preço de $10 por kWh consumido, nas demais indústrias o preço três vezes superior peca hoje por segurança, visto as médias serem bastante maiores.
No caso de iluminação e outros consumos, a média é, pelo menos, seis vezes maior.

144. Tendo em conta o que acaba de se dizer, julgou-se que o preço médio para energia permanente a empregar seria de $30 e supôs-se ser de cerca de dois terços do total de 3,5 biliões a produção de energia permanente, dando a esta palavra o significado de utilização em empregos que permitam maior preço.
A energia permanente produzida será, aproximadamente, de 8,4 biliões, a temporária de 1,2 e o valor será de:

Energia permanente:
Contos

2,4 X $30 ............................ 720:000
1,2 x $10 ............................ 120:000

Total ............ 840:000

É evidente que pela própria incorporação da energia no produto manufacturado ela se valoriza bastante e que os números dados são muito baixos, até em comparação com as médias de outros países, incluindo a própria América do Norte e o Canadá, onde se pode tomar 3 cêntimos, segundo apuramento recente, como preço médio de energia na venda e 2 cêntimos na produção, o que, ao câmbio actual, representa média muito maior do que a tomada acima.

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E informações colhidas pela Comissão de Electricidade da O. E. C. E. prevêem custos muito mais altos.
Não será, pois; exagerado computar em 1 milhão de contos a receita bruta do plano da energia.

Plano de minas e de electrossiderurgia

Exportação de minério

145. As variáveis que influem neste plano, na parte relativa à exploração das minas, são as seguintes:

1) Custo da tonelada de hematite desmontada;
2) Concentração do minério;
3) Transporte.

1) A exploração de minério em Moncorvo parece ser muito económica, devido à disposição sinclinal dos jazigos e à sua proximidade do caminho de ferro do Douro e rio. Além disso, o jazigo do Cabeço da Mua tem condições favoráveis para desmonte a céu aberto.
Pode talvez afirmar-se que com mecanização adequada o custo da tonelada de hematite desmontada será inferior a 25$.
2) A concentração do minério é difícil e têm-se feito ensaios no sentido de procurar meio de elevar o conteúdo de ferro e reduzir o da sílica. A própria composição do minério dificulta a concentração, como se informou noutro capítulo.
Toma-se necessário, dentro do mais curto espaço de tempo, proceder a ensaios, em escala adequada, que esclareçam definitivamente os dois aspectos importantes das possibilidades de concentração e do uso directo no forno eléctrico ou misturado com os minérios mais puros de Vila Cova; ou outros, ou pirites, como parece ser de maior vantagem.

146. O transporte de minério em quantidades que permitam uma exploração económica terá de ser feito por via fluvial, que é o Douro, a 20 quilómetros dos jazigos.. Torna-se, por isso, indispensável tornar este rio navegável, o que é possível com a construção de uma série de barragens, que podem produzir elevadas quantidades de energia temporária e permanente.
A distância até ao ponto de embarque anda à roda de 200 quilómetros. Segundo estudos feitos, será praticável o transporte de 1 tonelada de minério por preço inferior a 20$.

Produção de ferro e aço

147. Foram estudadas em relatórios minuciosos a siderurgia e electrossiderurgia na sua aplicação aos minérios de Moncorvo e a outros, na base de 50 por cento de ferro ou misturados com minérios de outra origem, tais como Orada, Serra dos Monges, Vila Cova, e pirites grelhadas.
O combustível e redutor seria carvão vegetal.
Não parece ser possível, nas circunstâncias actuais, o corte anual de 318:000 toneladas de madeira para a produção de 105:000 toneladas de carvão vegetal, que é a estimativa do consumo na produção de 150:000 toneladas de gusa pôr ano no alto forno.
O emprego de electricidade reduzirá o consumo de carvão vegetal para 390 quilogramas por tonelada de gusa eléctrica, em vez de 705 no caso do alto forno. E para a produção de 100:000 toneladas de gusa, correspondentes a 100:000 toneladas de aço, a quantidade de carvão vegetal necessária seria, números redondos, de 60:000 toneladas ou 180:000 toneladas de madeira. Neste último caso o consumo de electricidade seria de cerca de 2:750 kWh por tonelada para gusa a transformar em ferro e aço, ou 3:000 kWh para gusa destinada a fundição.
A questão, por conseguinte, do estabelecimento da indústria siderúrgica depende bastante dos preços do carvão vegetal e da electricidade.
O vale do Douro tem condições especiais para a localização da indústria, em virtude das proximidades dos abastecimentos essenciais: minério na razão de 1:900 quilogramas de 50 por cento por tonelada de gusa, calcário na razão de 367 quilogramas, e da vizinhança do carvão e de outros abastecimentos através do Porto por caminho de ferro ou rio.
Por estas razões, um dos especialistas que investigou o assunto afirma que os resultados do seu estudo indicam a que os custos prováveis de uma instalação bem projectada ... comparam-se favoravelmente com os de qualquer outra nação».
O custo de bateria de cinco fornos eléctricos de 12 kW cada um, incluindo edifícios, moldes, transformadores, ferramentas, trituradores de minério e cais de desembarque, projectos, etc., andaria, antes da guerra, à roda de 800:000 dólares. O custo da instalação usando altos fornos subiria para 7.100:000 dólares. A instalação para aço nas duas hipóteses aproximar-se-ia de 19.600:000 dólares. Estes números referem-se a preços anteriores à guerra.

148. A navegabilidade do Douro poderá permitir a exportação de mais de 1 milhão de toneladas de minérios de ferro e a produção interna de 200:000 a 250:000 toneladas de gusa, ferros especiais e aços.
No plano, dia electrossiderurgia, para mais fácil compreensão, considerar-se-á apenas a gusa e, partindo da base da produção anual de 250:000 toneladas, ao preço de 1.500$ a tonelada, obter-se-á a produção bruta de 375:000 contos.
É evidente que a transformação de gusa em f era-os especiais e ferro e aço aumentará muito o valor dia produção bruta - e, sem ir até ao uso dos preços actuais, não será exagerado computar o total de 500:000 contos para a electrossiderurgia, a que haverá que descontar o custo da energia, a $10 por unidade, já incluída no respectivo plano.
Ainda não foi convenientemente estudado o programa da comercialização de minérios.
Parece tudo indicar ser económica a exportação de elevadas quantidades de minérios ricos - minérios com percentagens superiores a 42 por cento. Já antes da guerra havia compradores para esse tipo de minério, e até se estudaram, as possibilidades oferecidas pelo caminho de ferro do Douro para esse efeito.
Mas há primeiro do que tudo necessidade de resolver o problema da concentração de Certos tipos de minérios de Moncorvo, de modo a elevar a percentagem de ferro para a cifra vizinha de 60, como aliás se pratica no Norte da Suécia. Se isso for possível, e temido em conta o transporte fluvial, ia posição das minas em relação ao Douro e porto de embarque, nada se oporá a que se envie para fona do País quantidades próximas de 1 milhão ou 1,5 milhão de toneladas de minérios de ferro de alto teor de metal.
Esta produção é permitida, pelas reservas dos jazigos de Moncorvo. Os de Vila Cova, embora insuficientemente reconhecidos ainda, já deixam prever a possibilidade de utilizar os minérios mais puros no consumo interno.
Julga-se ser viável a exportação de minério, equivalente a 200:000 contos, aos preços actuais nos mercados consumidores.

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Plano da rega

149. A produção de alimentos é flexível, dando u palavra o sentido da sua variação de ano para ano. Vnia das questões que se levantaram nos debates da Organização Económica Europeia, e teve eco também na Comissão Económica das Nações unidas, diz respeito ao tipo de género agrícola que cada um dos países europeus deve produzir.
Com efeito, a tendência lógica de zonas de características agronómicas e climáticas semelhantes é orientar a sua produção agrícola no sentido mais rendoso - no sentido de extrair da indústria o maior valor económico possível.
Daí resultará, sem dúvida, superprodução de certos géneros agrícolas, com desprezo e falta de outros que são essenciais e até hoje provêm em grande parte de importações de fora do continente europeu.
Esta questão tem alto interesse nacional e particular porque dela depende maior ou menor rendimento agrícola, traduzido em moeda - e pode até impedir crises de produção bem graves.
Há países, como os Estados Unidos e a Inglaterra, que orientam ia produção. Quer dizer, com incentivos de vária natureza encaminham as sementeiras para este ou aquele produto.
Esta política pressupõe, porém, um perfeito conhecimento dos consumos internos e dos mercados exportadores.
A economia agrícola, na aula forma geral, é planificada com grande antecipação.
A insuficiência de elementos informadores, o próprio carácter individualista e arredio de trabalho de conjunto, tem impedido, entre nós, política idêntica, e quando se aplica, para este ou aquele produto, é ressentida e não leva a resultados económicos de interesse.
Em frente de toldos os factos, e tendo em couta o temperamento nacional e o grau de educação, é difícil, senão impossível, indicar claramente o que deverá ser produzido ma área regada. Por outro lado, a produção depende dia magnitude ida área, do tipo de terreno a regar, se rico (barros de Beja, Vimieiro, Cova da Beira, Sousel, Vilariça), ou se mais pobre, como os pliocémicos do sul do Tejo.
Foi pedida à Junta Autónoma de Hidráulica Agrícola a estimativa da produção de 150:000 hectares de terrenos que compreendem Vilariça (1:750 hectares), Cova da Beira (6:000 hectares), Ribatejo (44:250 hectares), Alentejo (98:000 hectares), e os resultados de estudos feitos, comparados com as produções actuais, são dados pelos quadros sintéticos que se publicam adiante.
Deve acrescentar-se que estes dados são provisórios, no sem tido de dependerem anais das carências e necessidades nos anos de exploração, visto ser própria da indústria agrícola a variação de produções.

Vilariça

(1:750 hectares)

150. As produções para o esquema de Vilariça são as seguintes:

Vilariça

(1:750 hectares)

[Ver tabela na imagem]

Na Vilariça haverá um aumento de produtos animais derivado da produção de alimentos para gados. Computa-se esse aumento no seguinte:

Produtos pecuários: Toneladas

Vitela ........................... 60
Queijo ........................... 258

Total ........... 313

O progresso de Vilariça pela rega, embora em pequena área, tem valor local muito apreciável, dada a distância de outros centros produtores e o aumento do nível de vida que poderá derivar da exploração mineira e dia navegabilidade e produção de energia no Douro-Sabor-Côa.

Cova da Beira

(6:00 hectares)

151. O esquema da Cova da Beira pode atingir áreas superiores aos 6:000 hectares previstos. Os teimemos que se situam abaixo da cota em que é captada a água compreendem a área de cerca de 15:000 hectares. Incluem-se neles o vale do Zêzere, de perto de Belmonte até Silvares, e parte do vale de Caria e da ribeira de Meimoa, em que ela própria poderá fornecer um suplemento de água para alargar a área a irrigar.
No entanto, apenas se estudaram as produções agrícolas de 6:000 hectares, constituídos por bons terrenos de aluvião, e em parte regados hoje, embora em circunstâncias muito precárias.
As produções previstas são as mencionadas a seguir.

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Cova da Beira

(6:000 hectares)

[Ver tabela na imagem]

A estimativa prevê um reforço de produção animal bastante grande e mão entra em conta o aumento de produção frutífera, sobretudo no concelho do Fundão. Parte do princípio da necessidade de alimentos essenciais e das dificuldades opostas à exportação de frutos, em concorrência com outros países que estão exercendo uma acção intensiva neste sentido.
A revisão da estimativa daria, porém, lugar a um acréscimo apreciável na produção de fruta.
Do aproveitamento dia alimentação para gados adviria o aumento de produtos animais na proporção seguinte:

Produtos pecuários: Toneladas

Vitela ...................... 320
Queijo ...................... 1:319

Total ......... 1:639

Não se inclui também o acréscimo na produção doméstica de carne de porco, de capoeira e outra relativa a animais de sela e ovinos.

Ribatejo

(44:250 hectares)

152. As áreas a regar no Ribatejo estão situadas nas margens direita e esquema a do Tejo.
É uma zona que compreende terrenos muitos ricos e médios, susceptíveis de grandes aumentos de géneros essenciais.
As produções previstas são as seguintes:

Ribatejo

(44:260 hectares)

O aumento de produção no Ribatejo é, como se nota, muito grande e incide principalmente sobre géneros essenciais. A alimentação de gados ocupa um lugar proeminente. Traduzida em produtos, dá o seguinte:

Produtos pecuários: Toneladas

Viteta ...................... 2:000
Leite ....................... 106:700

Total .......... 108:700

O aumento da produção de leite é necessário num país que tom baixo consumo. O leite é um alimento muito completo e o seu consumo durante a formação do homem é condição indispensável para a sua robustez.
O Ribatejo pode ser o grande fornecedor de leite da capital e arredores, dada a posição e as óptimas condições agronómicas e geográficas para esse efeito.

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Alentejo

(98:000 Hectares)

153. A produção prevista nos 98:000 hectares a regar no Alentejo é a seguinte:

Alentejo

(98:000 hectares)

[Ver tabela na imagem]

Não se incluiu em nenhum dos projectos a produção de palhas, de maior importância no Alentejo e Ribatejo.
Como se nota, a estimativa para os 98:000 hectares a irrigar no Alentejo interessa sobretudo à produção de géneros hortícolas e horto-industriais e carmes. Neste último caso o aumento da produção será:

Produtos pecuários: Toneladas

Vaca ...................... 6:900
Vitela .................... 1:000
Porco ..................... 7:100
Manteiga. ................. 1:400

Total ............ 16:400

A influência que a rega poderá ter no Alentejo estender-se-á, pelo que acaba de mencionar-se, ao próprio regime alimentar.

Súmula do aumento de produção agrícola

154. A fim de mais facilmente se poder compreender o alcance do programa económico nacional, na parte relativa ao plano da rega, sumariam-se adiante os aumentos de produção agrícola dos diversos esquemas:

Resumo dos aumentos de produção (arredondado)

(Área - 150:000 hectares)

[Ver tabela na imagem]

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As cifras mostram ser de cerca de 900:000 contos por ano a receita dos aumentos de produção provenientes do plano de rega. Não se contou com receitas de diversa natureza, derivadas de subprodutos da exploração agrícola. Alguns dos preços unitários são baixos, como, por exemplo, a batata (o preço por grosso em Novembro de 1949 era de 27$ a arroba). Outros apresentam os preços por grosso deduzidos de uma percentagem razoável.
No cálculo do aumento total de produção; derivado da realização do programa económico nacional, julgou-se ser razoável atribuir 1 milhão de contos ao plano da rega, contando com os subprodutos da exploração, que em muitos casos são valiosos.
Nesta cifra inclui-se o valor da emergia temporária, destinada a elevar as águas do Tejo para o plano do Ribatejo e Alentejo.

Plano das indústrias

155. A determinação dos resultados económicos de um programa de indústrias é bastante difícil. Se for analisado pela medida, do aumento da produção, deixará atrás de si, por impossibilidade de o obter agora, o que resulta dia substituição de máquinas antigas por maquinais modernas; se for computado apenas pelo lado dei novas produções, não atingiria completamente o objectivo em vista, dadas as incertezas que derivam de um estudo incompleto, que só pode ser feito sobre os dados emergentes de um cuidadoso inquérito industrial.
Contudo, são possíveis conjecturas, válidas como tal, porque são baseadas em. dados positivos, de empresas já em exploração, de projectos bastante pormenorizados (como a celulose-papel), de fábricas em construção (sulfato de amónio e cianamida), de planos em andamento (canalizações de ferro), de aumentos de capacidade (destilação) e de novas fábricas em construção ou quase completas, que necessitam ainda de ser parcialmente financiadas até à sua definitiva forma e capacidade.
Presume-se que o plano económico nacional, tendo em conta os factos acabados de citar, poderá trazer um aumento de produção não inferior a 500:000 contos. Na
verdade, a cifra é modesta para os preços actuais, se forem imcluídos os produtos azotados, porque só destes deriva cerca de um quarto do total enunciado.
Mas julgam que em assunto desta natureza é de vantagem reservar o futuro, até que elejam atendidas as sugestões indicadas, relativa» ao inquérito industrial, à coordenação das economias metropolitana e ultramarina, ao organismo central coordenador das diversas formas de actividade, a Junta Central de Economia, proposta na Assembleia Nacional, e outras que têm sido explicadas nos pareceres das Contas Gerais do Estado e em diversos escritos.
A importância que este assunto reveste piara o País, considerado nele também o ultramar, é muito grande e precisa de ser vista ràpidamente. A coordenação das actividades industriais da metrópole e do ultramar, por si só, constitui um problema de primeira grandeza, pois os domínios de além-mar podem ser no futuro um precioso reservatório de matérias-primas de diversa espécie, que conviria transformar pelos excessos de mão-de-obra que dia a dia irão assoberbar a vida portuguesa.

Conclusões

156. Considerando apenas na metrópole os planos da energia, das minas e electrossiderurgia, da, rega e das indústrias, o acréscimo no rendimento nacional ultrapassaria tires milhões de contos, sem contar com o aumento de produtividade da agricultura, que necessariamente resultaria ido uso de instrumentos e máquinas agrícolas.
Não é possível fazer agora o estudo do programa do ultramar de modo a poderem ser calculados em pormenor os seus resultados económicos, que compreendem, como atrás se indicou, as carnes, o peixe, as libolites e rochas betuminosas, a rega, as oleaginosas e outras aplicações em Angola e Moçambique. Tratar-se-á desse estudo resumidamente adiante, e em maior pormenor em outro lugar, mas os elementos já conhecidos fazem prever que, no conjunto, não serão inferiores a 4 milhões de contos por ano os resultados económicos do programa económico nacional, incluindo o ultramar.

PROGRAMA ECONÓMICO DO ULTRAMAR

I

INTRODUÇÃO

1. Depois da guerra os territórios ultramarinos passaram a ter para todos os países da Europa Ocidental uma importância muito grande. Ela provém de diversas causas, já conhecidas anteriormente, mas o que, por virtude de acontecimentos de natureza política e económica, assumiram agora extrema urgência.
Não é intenção deste estudo tratar de questões políticas com reflexos em territórios nacionais. Apenas se mencionará que Angola e Moçambique, devido aos seus recursos e à sua posição geográfica, voltadas para o Atlântico Sul e Indico, ocupam um lugar de relevo no xadrez político internacional.
A urgência das razões que lhes dão também grande realce económico filia-se essencialmente na penúria europeia de dólares e na necessidade de produzir em territórios europeus, ou sujeitos à sua influência monetária, o maior somatório possível de mercadorias que possam ser exportadas para a América do Norte, ou substituir aquelas que a Europa lá tem de comprar hoje para poder subsistir, quer dizer, para poder equilibrar a sua economia.
O exame do comércio externo da Europa Ocidental com o Norte da América mostra logo que esses produtos são constituídos por cereais secundários, oleaginosas e óleos vegetais, tourteaux, café, açúcar, couros e peles, certos metais não ferrosos, fosfatas, cacau, fibras, tabaco e outros.
Ao traçar qualquer programa económico para o ultramar português há que ter em conta as deficiências da Europa, onde reside o seu maior mercado, e as necessidades americanas de produtos tropicais, com o intuito de realizar dólares. E, em primeiro lugar, terá de ser considerada a coordenação estreita com a economia metropolitana.

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2. O segundo factor a considerar é o da mão-de-obra. E conhecida a sua escassez, tanto em Angola como em Moçambique. O problema tem já hoje aspectos sérios, porque não é possível aumentar apreciavelmente a produção sem maior rendimento da mão-de-obra indígena.
Quer isto significar que um programa económico tem de atender à possibilidade de substituir a que hoje se emprega em tarefas que podem facilmente e até com proveito ser executadas por meios mecânicos, como transportes e outros, e dar preferência a realizações que não exerçam forte pressão sobre as disponibilidades dessa mão-de-obra.
Torna-se urgente, neste aspecto, fazer um inquérito rigoroso ao trabalho indígena e seu uso actual, de modo a determinar com segurança aquele que pode ser substituído por meios mecânicos adequados. Tudo indica ser possível poupar grandes quantidades de mão-de-obra.

3. Estas ligeiras notas dão logo a ideia de necessidades fundamentais no ultramar, como sejam a orientação no sentido de produções que suplementem exigências do consumo da Europa Ocidental, canalização para a América do Norte de mercadorias que, normalmente, o Canadá e os Estados Unidos importam, emprego de processos de cultura e transporte que reduzam a mão-de-obra de modo a utilizar esta no fomento da produção e, finalmente, escolha de projectos que permitam o uso remunerador de colonos metropolitanos, quer na indústria, quer nos transportes, quer ainda na agricultura e na pecuária.

O comércio externo das províncias ultramarinas

4. Já se fez notar que não existe estreita coordenação entre as economias da metrópole e do ultramar que, em parte, são complementares.
Deste facto, acentuado muitas vezes, derivam graves prejuízos para as províncias metropolitanas e ultramarinas.
A falta de coordenação leva frequentemente à compra em mercados externos de bens de consumo e de outros que poderiam ser importados da metrópole, e vice-versa, ou até das províncias ultramarinas.
Os territórios de além-mar de maior importância económica são os de Angola e de Moçambique.
Na falta de elementos que permitam dar ideia do total da sua produção e consumo, o comércio externo é indicativo, não só de interesse económico, mas de possibilidades futuras.
A guerra desenvolveu consideràvelmente a actividade ultramarina e as suas relações com os mercados externos.
Considerando apenas aqueles dois grandes territórios e Cabo Verde, Guiné e S. Tomé, o comércio externo teve a seguinte evolução desde 1938:

Comércio externo

(Milhares de contos)

Estes números representam a importação e a exportação reunidas. Mostram, na verdade, nona intensificação de trocas, que faz logo prever as possibilidades de cada uma das províncias, unas sobretudo, pelo menos em valor, as de Angola e Moçambique. Do progresso destes territórios advêm indirectamente benefícios para os restantes.
É por isso que no traçado do programa económico nacional eles ocupam o primeiro lugar.

5. A posição das duas províncias de Angola e Moçambique no que diz respeito ao comércio extenuo é diferente.
Enquanto que normalmente Angola equilibra a sua balança comercial, Moçambique vive em regime deficitário neste aspecto.
É preciso notar que os números adiante indicados necessitam de ser corrigidos, tanto pana unia como para outra província, em virtude do tabelamento de preços, que teve talvez maior influência em Moçambique do que em Angola. Os casos ido açúcar, algodão e diversos outros produtos são bem conhecidos. As exportações de Moçambique corrigidas apresentariam melhor aspecto. Contudo isso não invalida o facto de ser deficitária em matéria de balança comercial.
Já outro tanto se não pode dizer da balança de pagamentos, que, por virtude de serviços prestados aos territórios vizinhos, é tradicionalmente positiva.
Nos últimos anos os deficits ou saldos dias duas grandes províncias foram os seguintes:

Importação e exportação

Angola Moçambique

(Milhares do contos)

[Ver tabela na imagem]

No ultramar, como na metrópole, até 1940, há necessidade de corrigir os números da exportação. Com efeito, no ano de 1948 o déficit de Angola, que a estatística oficial indica como sendo de 124:000 contos, é,

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na verdade, um saldo substancial, porque os valores de realização são bem maiores. Um apuramento feito para 1949 mostra que os valores fiscais da exportação andaram à roda de 1.231:000 contos, enquanto que os valores de realização atingiram 1.762:000, o que representa mais 531:000 contos, ou a percentagem de cerca de 45. Se se aplicasse esse coeficiente aos valores de 1948, na hipótese de serem reais as somas da importação, haveria saldo importante na balança comercial de Angola. Outro tanto poderá dizer-se sobre Moçambique, que acusa déficit muito alto em 1948.
Outro tanto poderá dizer-se sobre Moçambique, que acusa, deficit muito alto em 1948.
Deve haver diferença entre os valores de realização e os declarados, sem que contudo se possa determinar qual o coeficiente de variação.
Os números que seguem dão ideia das principais exportações, em toneladas, antes e depois da guerra nos dois grandes territórios de além-mar:

(Toneladas)

[Ver tabela na imagem]

(a) Números provisórios.

Angola

6. No momento actual os grandes esteios da economia angolana são o café, os diamantes, as oleaginosas, os farináceos, o açúcar e, ultimamente, o peixe. Em 1948, na exportação total de 1.091:000 contos, o café, os diamantes e os farináceos representam mais de metade, como se nota, no quadro que segue:

Principais exportações (1948)

[Ver tabela na imagem]

A economia de Angola, como os números mostram, repousa sobre a exportação de três ou quatro produtos: o café, os diamantes e os farináceos - o feijão desaparecerá em breve, para ser substituído pelo milho. Ao peixe e respectivos subprodutos (farinha, óleos e outros) está destinado um grande lugar na economia angolana.
Apesar das condições deficientes em que ainda se explora a indústria, ela já hoje ocupa lugar proeminente nas indústrias exportadoras, além do consumo interno, que é grande.

7. O exame do desenvolvimento, do comércio de exportação nos últimos anos, relacionados com os dois anteriores à guerra, mostra que o progresso indubitável das duas províncias ultramarinas, como consequência de maiores valores de exportação, é devido mais aos preços atingidos pelos géneros coloniais de que própriamente aos grandes aumentos na tonelagem exportada.
Há algumas notáveis excepções, como no caso do café em Angola, que de 16:600 toneladas exportadas em 1938 passou para mais de 53:000 em 1948, e o do sisal, que de 6:200 subiu para 18:000 em 1949. Ainda neste aspecto, a farinha de peixe, com 14:000 toneladas em 1948, é digna de menção, tanto mais que não se exportara metade no ano anterior.

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Mas as possibilidades de Angola são de molde a poderem atingir-se bem maiores tonelagens nestes e ainda noutros produtos, como no arroz, no milho, nos óleos e oleaginosas, nas madeiras, nos minérios e até no sisal.

Moçambique

8. As condições de Moçambique não são melhores.
O açúcar, que chegara a 73:437 toneladas em 1937, baixou para 54:236 em 1948, depois de várias vicissitudes, e o sisal, que produzira para, exportação 22:751 toneladas em 1938, desceu para 16:567 em 1948.
Apenas o algodão mantém números adequados, com a produção de 26:000 toneladas em 1948 - perto de três vezes mais do que em 1937.
Seleccionaram-se alguns produtos de exportação importantes no comércio externo e que pela sua constância caracterizam até certo ponto a actividade da província. O exame do mapa que a seguir se publica mostra, em tonelagem, a influência da guerra no comércio exportador:

Principais exportações (1948)

[Ver tabela na imagem]

Os números mostram que mais de metade em valor das mercadorias exportadas por Moçambique consiste em algodão, copra e sisal. Se o preço do algodão se aproximasse do transaccionado naquele ano nas bolsas internacionais, ainda anais se acentuaria o predomínio dos três produtos-base da exportação moçambicana.

Nota sobre a importação

9. Não vale a pena entrar agora na análise da importação dos dois territórios porque mão poderia dar grandes indicações, dada a sua contínua evolução.
Os tecidos de algodão e os combustíveis e materiais para transportes continuam a ser as mais dispendiosas importações das duas províncias. Os primeiros constituem a base da permuta com o indígena; aio segundo caso, os automóveis, camiões e material ferroviário, aliem do combustível, formam uma verba que pesa muito no comércio importador.
A melhoria há-de ser sensível quando estiverem em pleno funcionamento as fábricas de têxteis em Angola e Moçambique, mas não parece que, por esse motivo, afrouxe a pressão sobre o comércio externo, vistas as exigências de países novos em contínuo crescimento, e portanto as necessidades de importação de materiais e equipamentos de toda a éspecie.

II

PROGRAMA ECONÓMICO

10. Tudo indica pois a conveniência de alargar bastante a produção nas duas grandes províncias ultramarinas.
Ainda que a soía balança de pagamentos apresente saldos positivos, as necessidades de capitais para desenvolvimento interino -que inclui a importação de máquinas, alfaias agrícolas e tantas outras coisas- exigem o consumo de divisas ou escudos.
Por outro lado, na que considerar o problema do aumento demográfico da população metropolitana.
Não parece poder atingir números por aí além a colonização realizada meramente com auxílios do Estado.
Além de diminuta, é bastante onerosa, e as receitas públicas da metrópole mão poderão amparar muito este meio de dirigir para as províncias ultramarinas parte dos seus excessos demográficos.
O melhor modo de abreviar o povoamemto por brancos das províncias de Angola e Moçambique é intensificar o seu desenvolvimento económico; é aumentar as possibilidades de remuneração razoável ao colono e ao emigrante.
E, em última análise, apressar a execução de planos de fomento naquelas províncias.
As obras a realizar não podem limitar-se apenas a portos e caminhos de ferro, que foi no passado a preocupação dominante dos governos metropolitanos e coloniais.
Tem de ir até à intervenção na própria economia produtiva, quer directa, quer indirectamente.
Neste aspecto o problema das províncias ultramarinas é semelhante ao da metrópole.
Mas lá, em maior grau, por virtude de circunstâncias óbvias, o auxílio técnico e financeiro tem de ser mais profundo e decisivo.

Dotações do programa

11. Já se apontou noutro lugar, e agora se repete, a dificuldade em delinear o programa económico para o ultramar, sem a existência de maiores estudos e mais completa informação. À parte os transportes ferroviários e portos, que tão alta função desempenham nos países novos, sobretudo naqueles que, como Angola e Moçambique, são saídas naturais para o mar de vastos e ricos territórios no interior, havia e ainda há poucos projectos convenientemente estudados de empresas económicas.
Até há poucos anos a natureza das exportações angolanas e moçambicanas era essencialmente agrícola. Tirando os diamantes de Angola - o café, as oleaginosas, o açúcar, as fibras e, em menor escala, as madeiras constituíam a grande parcela de exportações.
Ainda nos últimos tempos se acentuou a importância da indústria da pesca no Sul de Angola, mas em condições primárias em muitos casos.
Ora sabe-se existirem recursos de outra natureza susceptíveis de produzirem grandes finitos, se explorados convenientemente.
O problema que se punha a quem tentasse delinear um programa de fomento económico era de saber quais dessas possibilidades seriam as de mais rápida execução, aquelas que produziriam maiores rendimentos financeiros e as que corresponderiam em maior grau aos objectivos de aumentar a produção de alimentos e matérias-primas.
Nesta base e obedecendo a estes princípios se estabeleceu provisoriamente o programa económico para o ultramar português, que, como se viu atrás, importa, no conjunto, em cerca de 5 milhões de contos, repartidos em planos de energia, irrigação, indústria e transportes, exactamente como se fez na metrópole.

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As dotações do programa do ultramar podem dividir-se assim:

[Ver tabela na imagem]

Como se nota, os dois planos de maiores dispêndios são o das indústrias e o dos transportes.
Nos planos de energia e de rega o que mais pesa é o aproveitamento das quedas de água do Duque de Bragança ou Cuanza, Cunene e Movene, e na irrigação o enxugo e nega nos vales do Cuanza-Catete, Limpopo e Incomati.
No plano das indústrias incluem-se em Angola as carnes do planalto da Huíla, o peixe do Sul, os asfaltos e betumes da zona de Luanda e as madeiras; e em Moçambique têm lugar preponderante os combustíveis sólidos, as madeiras, os têxteis, as oleaginosas e outros de menor importância.
Como adiante se notará, a indústria mineira pode ter grande importância, sobretudo no Norte e Sul de Angola, e em Tete. Por isso se incluiu «avultada quantia para pesquisas, reconhecimentos e explorações.
Nos transportes estão incluídos 770:000 contos para caminhos de ferro e 500:000 para estradas, além de outras importâncias menores para aviação, telecomunicações e transportes ferroviários.
Finalmente, a dotação do plano da agricultura é inteiramente destinada aos equipamentos mecânicos, tanto para. transportes como para alfaias agrícolas de variadas características, de modo a reduzir ao mínimo a mão-de-obra.

12. O plano total do ultramar, que importa em 5:035 milhares de contos, decompõe-se monetariamente do modo que segue:

[ver tabela na imagem]

Por este quadro se verifica que as necessidades de divisas estrangeiras são bastante grandes, na razão de 132 milhões num total de pouco mais de 200. E isso devido naturalmente à influência dos equipamentos para quase todas as empresas, mas sobretudo para transportes e energia.

III

PLANO DE ENERGIA E REGA

13. O quadro que segue exprime resumidamente a distribuição dos financiamentos, tanto em Angola como em Moçambique:

[ver tabela na imagem]

Energia (milhões de kWh) .................. 596
Hectares .................................. 65:000

O problema da energia

14. Embora se tivessem feito pesquisas no sentido de descobrir combustíveis sólidos ou líquidos em Angola, ainda não se conhecem hoje jazigos carboníferos - hulhas ou antracites- de importância. Há sinais por toda a província da existência de petróleo, mas as pesquisas levadas a efeito não a confirmaram em condições de ser explorado econòmicamente.
Parece, contudo, em face dos elementos conhecidos, que as reservas de rochas betuminosas e carvões asfálticos têm grande importância e permitem antever a possibilidade de introduzir na província uma indústria muito rendosa é de grande projecção no seu futuro.
Os carvões asfálticos e rochas betuminosas existem nas vizinhanças de Luanda. São conhecidos há muitos anos, e os carvões têm sido utilizados como combustível até aio caminho de ferro de Luanda e Malanje.
Podem ser destilados e produzir hidrocarbonetos líquidos e coque briquetável. Dos hidrocarbonetos líquidos podem extrair-se gasolina e outros óleos para consumo na província ou exportação.
Dadas as reservas de carvões e rochas betuminosas já conhecidas e as suas possibilidades industriais, incluiu-se a sua exploração no programa económico nacional, e adiante se descreverão com certo pormenor o custo e os resultados económicos.
Mas, em matéria de energia, Angola parece ter recursos hidroeléctricos muito grandes. Dada a configuração orográfica da província -um vasto planalto no interior, a cair por degraus para o Atlântico-, era natural a existência de grandes desníveis.
O único inconveniente grave na província de Angola em matéria de energia hidráulica é o carácter torrencial de seus rios, com um período de águas abundantes durante sete ou oito meses e a diminuição de caudal muito acentuada depois.
No futuro, quando porventura tiverem de ser aproveitados muitos dos recursos hidroeléctricos disponíveis,

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há-de ser necessário armazenar, no Estio, grandes quantidades de água em albufeiras; no momento presente não parece ser isso necessário. Julga-se que os recursos hidroeléctricos de Angola já reconhecidos são muito grandes. Ainda não foram convenientemente estudados muitos deles. Mas uma estimativa aproximada na base de elementos colhidos permite encarar a possibilidade de produzir o mínimo de cerca de 28 biliões de afinidades com a potência instalada de 8,5 milhões de C. V., assim divididos:

[ver quadro da imagem]

Nota. - O «Plan décenal pour le développement économique et social du Congo Belge» dá uma estimativa para a potência total disponível na bacia do Zaire (Congo) e atribui à região belgo-portuguesa 44.195:000 cavalos.

Vê-se que a principal potência hidroeléctrica está concentrada nos quatro grandes rios angolanos: o Zaire, o Cuanza, o Cunene e o Zambeze. Os três primeiros desaguam no Atlântico e o último, depois de atravessar a África Central, encontra ainda o oceano Indico através do território português.
Esta é a potência hidroeléctrica estimada, que pode constituir um grande valor no futuro.
Conviria reconhecê-la melhor, a fim de determinar, embora com aproximação, quais as possibilidades certas e qual ou quais, de entre elas, são as mais económicas.
Já foram reconhecidas, com certa aproximação, as seguintes:

Produção
Milhões de kWh

Rio Lucala (Duque de Bragança) .... 200
Rio Cunene (Ruacaná) .............. 140
Rio Cunene (Matala) ............... 58
Rio Quanza (Massangano; ........... 250

15. No presente estão em construção ou em vias de tal o aproveitamento das Mabubas, no rio Bengo, que produzirá no máximo 50 milhões de kWh, destinados a Luanda, e o do Biópio, no rio Catumbela, que poderá fornecer 35 milhões para Benguela e Lobito.
Na hipótese de serem levados a efeito projectos relativos a irrigação e enxugo de terrenos no vale de Catete e margens do Cuanza e de serem instaladas as indústrias de cimentos e nitratos, em projecto e de necessidade urgente para o futuro da província, será indispensável muito maior abastecimento de energia na região de Luanda.
As duas hipóteses mais económicas parecem ser o aproveitamento do Lucala, na queda natural do Duque de Bragança, com o desnível de 112 metros, e as cachoeiras de Massangano. As distâncias à zona de Luanda não são muito diferentes, mas a de Massangano é talvez um pouco mais próxima.
O Cuanza é, sem dúvida, um rio de bem maiores caudais do que o Lucala, seu afluente, e o escoamento no Verão é grande, mas, em contrapartida, a queda do Duque de Bragança é natural, e por isso bastante fácil.
Julga-se que as cachoeiras do Cuanza desde montante da ponte Filomeno da Câmara até ao Dondo -aproximadamente 40 quilómetros - têm o desnível de cerca de 500 metros e que o caudal de nove meses não é inferior a 200 metros cúbicos por segundo. O seu aproveitamento requer, porém, barragem e canal, necessariamente caros.
Deverão fazer-se imediatamente estudos no sentido de verificar qual das duas alternativas deve aproveitar-se em primeiro lugar, por ser mais económica, tanto aio ponto de vista energético como financeiro.
O aproveitamento do Cunene, num próximo futuro, pode ter interesse por motivos relacionados com territórios vizinhos e ainda porque parece estar destinado ao Sul de Angola, na região de Matala, um lugar importante na pastorícia e na indústria pecuária, além de que há já reconhecimentos feitos em jazigos de ferro e ferro-manganés na região.
O programa económico nacional prevê dotações para o aproveitamento de cerca de 400 milhões de kWh, sendo metade na zona de Luanda (Duque de Bragança ou Cuanza) e metade no Sul.

Irrigação e produção de nitratos

16. A rega e o enxugo estão estreitamente ligados à produção de energia. Há reconhecimentos e estudos bastante pormenorizados de rega e enxugo de ricos terrenos muito perto da capital de Angola e já foram até computados os resultados económicos de cerca de 15:000 hectares. Eles ultrapassam todas as expectativas em empreendimentos desta natureza, dada a fertilidade dos solos.

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Se fosse possível o aproveitamento da energia do Duque de Bragança ou Cuanza nos termos acima descritos, uma parte da energia seria usada na rega e enxugo de ricos terrenos na margem direita do Cuanza, na zona de Catete.
A outra parte destinar-se-ia à instalação de uma fábrica de azotados, que, como as produções comprovam, nas zonas cafeeiras do Amboim e em outras se tornam necessários para melhores produções.
Já se fez o estudo da instalação de uma fábrica de azotados (cianamida) e no programa económico para o ultramar incluiu-se a verba necessária para esse fim.
O resto (cerca de 70 milhões de unidades) seria consumido na cidade de Luanda, com as respectivas indústrias.

17. As obras a efectuar, em matéria hidroeléctrica e roga, mas províncias de Angola e Moçambique têm a seguinte distribuição:

[ver quadro da imagem]

(a) Não foi inscrita a dotação para o aproveitamento do Revué em virtude de se prever o seu acabamento antes do inicio do plano. Haveria vantagem em reconsiderar o assunto, dadas as possibilidades de maior consumo dentro de uma dezena de anos.

Aumento de produção agrícola

18. O aumento de produção agrícola que derivaria da rega de 30:000 hectares em Angola e 30:000 em Moçambique é muito grande. No quadro que se publica adiante discrimina-se, por produtos, esse aumento. Contudo deve dizer-se que, dada a flexibilidade nesta matéria, o quadro não exprime definitivamente aquilo que pode ser cultivado.
Circunstâncias locais podem alterar as produções, mas, no conjunto, o seu valor económico será idêntico.
O quadro seguinte dá o aumento de produção que derivará da execução do plano de rega atrás enunciado, conforme projectos já aprovados.

Ultramar
(Rega de 65:000 hectares - Valor da produção)

[ver quadro da imagem]

(a) Embora neste quadro não vá indicada a cultura do tabaco, ela será objecto de atenção especial.

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Os números exprimem os resultados de estudos feitos por estações oficiais. O total da produção directamente derivada da rega eleva-se a 475:500 contos aos preços mencionados, que se arredondarão para 450:000.
O esquema mostra certo número de produções já conhecidas e experimentadas nas províncias, mas isso não significa que sejam apenas essas as culturas praticadas. No caso do Sul de Angola a melhoria do gado indígena tem muita importância e há para isso necessidade de aumentar é melhorar as forragens. Daí o projecto Sul de Angola.
Em Moçambique já se pratica a cultura do tabaco, que, como se sabe, tem bastante interesse para a Europa Ocidental, em virtude das importações dos Estados Unidos.
Moçambique e também Angola podem tornar-se em relativamente poucos anos grandes produtores de folha de tabaco.
Na primeira daquelas províncias há já estudos e experiências feitos em escala comercial e o desenvolvimento da cultura na vizinha Rodésia influenciará, sem dúvida, o estabelecimento de uma indústria em Moçambique de mercado garantido na Europa.

19. Na base do custo da energia a $10 e a $30 por kWh, como se indicou para a metrópole, e tomando os números oficiais para a rega, o plano daria a produção bruta seguinte, expressa em contos:

Energia:
Milhares de contos

200 milhões de kWh a $10 20
400 milhões de kWh a $30 120 140
Rega ................ 450

Total ....... 590

IV

PLANO DAS INDÚSTRIAS

20. Não está no ânimo de ninguém a industrialização do ultramar.
Aliás ela não sei ia possível, em escala apreciável, nos tempos mais próximos.
Há, porém, certas matérias-primas que ganham muito com a transformação local.
Elas são tão importantes que, só por si, exigem atenção imediata.
As mais salientes estão relacionadas com certas deficiências metropolitanas e com a impossibilidade de exportar produtos valiosos sem prévia manipulação.
Num plano económico nacional têm de ser considerados todos ou quase todos estes casos.
A questão está em seleccionar aqueles que parecem ser os mais urgentes e os que produzem maiores resultados económicos.
No plano das indústrias para o ultramar distribuem-se as dotações do modo que segue.

[ver quadro da imagem]

Deu-se preferência às indústrias alimentares e oleaginosas, aos têxteis, aos produtos azotados, às minas, ao açúcar e derivados e aos asfaltos.
No primeiro caso há que considerar, seriamente e em escala adequada, a indústria das carnes e peixe do Sul de Angola, que pode representar um grande valor.
Nos produtos azotados, que parece já serem muito necessários com plantações de café e noutras, prevê-se uma verba importante que aproveitará a energia barata do Cuanza ou Duque de Bragança.
Os carvões asfálticos e rochas betuminosas de Angola justificam uma exploração intensiva.
O resto diz respeito a necessidades prementes em diversos aspectos da vida local e aos aperfeiçoamentos indispensáveis - como no caso dos açúcares e melaços, das madeiras, incluindo o papel e a celulose, em Moçambique, de pequenas oficinas metalomecânicas, do tabaco e cerveja, nesta província, da pesquisa e desenvolvimentos mineiros, dos amidos e outras, tanto em Angola como em Moçambique.

21. Não é fácil calcular os resultados económicos que adviriam da execução de um plano de indústrias. Mas o simples enunciado e indicação das dotações mostram que tanto a África Ocidental como a Oriental Portuguesas sofreriam um grande impulso económico, dadas as suas possibilidades.
Julga-se, com base em dados que derivam de estudos oficiais e não oficiais, que o mínimo de aumento de produção bruta seria de 500:000 contos.
Dão-se adiante alguns elementos que permitem ajuizar ao valor económico de certas empresas industriais incluídas no programa económico nacional.

A indústria do peixe

22. E proverbial a abundância de peixe nas águas do Sul de Angola. Apesar de dificuldades financeiras e de insuficiente capitalização, a província já exporta para territórios vizinhos e para a Europa apreciáveis quantidades de peixe em conserva, seco, farinha e óleos.
Em 1948 e 1949 as exportações foram as seguintes:

[ver quadro da imagem]

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23. Nota-se que os valores de realização, arbitrados pelo organismo que orienta as exportações, assinalam uma diferença de 47:000 contos entre o valor real dos produtos e o valor declarado (valor fiscal), ou cerca de 50 por cento mais.
Assim, pode julgar-se que Angola já exporta perto de 140:000 contos de peixe.
As duas áreas piscatórias mais importantes são as do Lobito e Moçâmedes. A primeira pescou 38.600 toneladas de peixe fresco em 1948 e a segunda atingiu 37:000, usando barcos antiquados, que cobrem áreas pequenas, avaliadas em menos de 30 por cento das possibilidades.
Julga-se não ser exagerada a pesca, pelo menos, de 300:000 toneladas por ano com instalações mais progressivas e há quem suponha extremamente segura esta estimativa se for tomada em conta a riqueza dos mares, do Sul.
Tudo indicava e indica a necessidade de modernizar rapidamente a indústria piscatória de Angola. Os três produtos fundamentais que ela pode fornecer para consumo local e dos territórios vizinhos e da Europa e até América são: o peixe fresco, em conserva ou salmoura e seco, os óleos, que têm largas aplicações e que podem ser transformados na província, e, finalmente, a farinha.
Destas produções fundamentais devem resultar interessantes indústrias.
Não é fácil dar uma estimativa, ainda que aproximada, do valor económico das possibilidades da pesca.
Na base da produção anual de 300:000 toneladas de peixe fresco, e considerando o preço de 300$ por tonelada, o seu valor seria de 90:000 contos. Mas o tratamento da matéria-prima, valiosa, e sua transformação em óleos, conservas e farinhas aumentaria muito o valor.
Supondo que apenas metade do pescado se transforma e se produzam 32:000 toneladas de farinha, 3:200 de óleos, 5:000 de conservas e 1 milhão de fardos de peixe seco, a preços razoáveis, a produção aproximar-se-ia de 180:000 contos. A outra metade auxiliaria a economia interna, por melhor nutrição do indígena e consumo de europeus.
Não é exagero poder afirmar que se aproximará de 300:000 coutos o aumento de produtos, dos quais cerca de 200:000 seriam valores de exportação.
Segundo estimativa, o custo de um projecto equivalente à pesca de 300:000 toneladas será de cerca de 100:000 a 120:000 contos, dos quais 70:000 em divisas estrangeiras.

A indústria da carne

24. Outro projecto de grande interesse para o Sul de Angola, que corresponde também a necessidades da metrópole, é o aproveitamento racional das grandes possibilidades da pastorícia de uma vasta região situada na província de Huíla, que compreende as regiões do Quilenques, Quipungo, Chibia, Grambos, Dongoena e Quitava e se estende ainda para sudoeste.
Julga-se existirem lá, actualmente, mais de 1 milhão de cabeças de gado vacum, dos quais cerca de 50:000 pertencem a europeus.
Devem existir 120:000 a 130:000 animais entre os 5 e 8 anos.
Se for incluído o resto de Angola, os recursos pecuários são certamente superiores a 2 milhões de animais.
Esta riqueza pecuária não é hoje convenientemente aproveitada. E poder-se-ia aumentar com facilidade, sobretudo na região de Quitava e outras, se fossem estabelecidas certas condições relacionadas com o abastecimento de água, transportes e pastagens.
Ora as necessidades de carne nos países da Europa Ocidental são muito grandes e tendem a alargar-se. Só o País, com baixa capitação de consumo, pode absorver
por ano cerca de 5:000 toneladas. Se forem considera-as as necessidades de Angola e territórios vizinhos, as possibilidades de consumo aumentam bastante.
Estes factos mostram a conveniência de projectar uma instalação moderna para o aproveitamento dos recursos pecuários da província e assim facilitar a valorização de territórios bastante salubres a altitudes médias que permitem colonização branca.
O programa económico nacional inclui por isso as verbas necessárias para a instalação de um matadouro frigorífico em Sá da Bandeira e armazéns frigoríficos em Moçâmedes, Lobito e Luanda, destinados estes últimos a conservar, não só a carne proveniente do matadouro de Sá da Bandeira, como o peixe e frutas das regiões vizinhas.
Não se vêem dificuldades em utilizar por ano 40:000 cabeças, que dariam, na hipótese do peso médio de 320 quilogramas, 9:000 toneladas de produtos, dos quais 6:500 seriam carne, 875 vísceras comestíveis e o resto produtos vendáveis, tais como vísceras e sebo nos comestíveis, farinha de sangue e outros.
Supõe-se que um projecto desta natureza custaria 60:000 contos.
Dadas as possibilidades de aumentar os rebanhos, o projecto inicial pode ser consideràvelmente alargado, conforme as necessidades dos mercados consumidores. Do mesmo modo o peso médio de 320 quilogramas por cabeça parece poder ser facilmente aumentado para 500.
A estatística oficial acusa a existência de 2.500:000 cabeças de gado em toda a província. Supondo que se desviavam 10 por cento para a indústria, obter-se-iam, na razão de 320 quilogramas por cabeça, cerca de 80:000 toneladas, que, na base de 50 por cento, produziriam 40:000 toneladas de produtos congelados, além das peles e diversos produtos de importância.
Esta informação permite antever as possibilidades pecuárias do Sul de Angola.
Torna-se necessário agora fazer um estudo circunstanciado sobre a engorda do gado indígena e os melhores métodos de transporte para o ponto de embarque e Europa. Os caminhos de ferro de Moçâmedes e seu prolongamento para o interior, o cais de embarque em Moçâmedes, os frigoríficos em Luanda, Lobito e Lisboa e as condições dos territórios onde se apascenta o gado, na parte relativa a água, pastagens e abrigos, têm de ser estudados circunstanciadamente, de modo a que um projecto desta natureza possa ter, em conjunção com o do aproveitamento da pesca, na mesma região, o êxito merecido.

Produtos asfálticos e betuminosos

25. No Quilungo e Calucala, a 150 quilómetros por caminho de ferro de Luanda, existem jazigos de carvão asfáltico e de grés betuminoso; no Caxito e em Libon-gos, respectivamente a 30 quilómetros de Luanda e a 15 do rio Dande, aparecem depósitos de calcáreos asfálticos.
É possível utilizar uns e outros económicamente por carbonização e destilação, conforme os casos, se houver reservas suficientes.
Nos últimos tempos despenderam-se quantias apreciáveis no sentido de avaliar as reservas, e até à data parece haver a segurança de que existem, pelo menos 8 milhões de toneladas de carvões asfálticos, 130 milhões de toneladas de grés betuminoso e 10 milhões de toneladas de calcáreos asfálticos.

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Os carvões asfálticos com poder calorífico superior a 6:000 calorias podem produzir por tonelada 500 quilogramas de semicoque, 260 quilogramas de alcatrão primário e 78 metros cúbicos de gás, além de 14 litros de benzina.
E a destilação do alcatrão primário poderá fornecer 138 quilogramas de óleos leves, médios e pesados, além de resíduos vários.
O grés betuminoso contém de 8 a 15 por cento de betume e o calcáreo asfáltico contém percentagens de betume compreendidas entre 7 e 20.
Na hipótese de tratar por destilação ou carbonização os carvões asfálticos e as rochas betuminosas, poder-se-iam obter apreciáveis quantidades de combustíveis sólidos e líquidos.

26. As reservas de 8 e 130 milhões de, respectivamente, carvões asfálticos e grés betuminoso correspondem as seguintes quantidades de óleo cru:

Milhões de toneladas

Carvão asfáltico ................... 2
Grés betuminoso .................... 15

Total ................... 17

A rocha asfáltica poderá ser usada localmente ou até exportada para macadamizar estradas ou empregada em másticas ou outros produtos.
Estas vastas quantidades de óleo cru, fraccionadas por produtos comerciais, correspondem ao seguinte:

Milhares
de toneladas
Óleos leves (gasolina) ............... 663
Óleos médios (petróleo e gasóleo) .... 1:105
Óleos pesados ........................ 918
Resíduos (lubrificantes e asfálticos). 1:632

Julga-se ser económica uma instalação inicial para tratamento de 200:000 toneladas por ano de carvões asfálticos, com o rendimento seguinte, em produtos:

Toneladas
Gasolina ...................... 7:800
Petróleo e gasóleo ............ 13:000
Óleos pesados ................. 10:800
Lubrificantes e outros produtos .. 19:200
Semicoque ........................ 102:000

Total .................. 152:800

O processo fornece além disso o combustível necessário para o tratamento, sob a forma de gás, e ainda deste se poderá extrair a benzina na razão de 14 litros por tonelada. Se forem tratadas também 100:000 toneladas de rocha asfáltica, é possível utilizar na província eu exportar produtos destinados a estradas, ou másticas, ou ainda comprimidos.
A situação dos jazigos e a natureza dos produtos que se podem obter, que em grande parte têm de ser importados, dá viabilidade à exploração.
Considerando o actual preço na província dos produtos acima mencionados, não seria certamente inferior a 150:000 contos a produção bruta do aproveitamento de 200:000 toneladas por ano.

V
AGRICULTURA

27. O problema agrícola, ainda que considerado apenas do estrito ponto de vista económico, tem uma importância muito grande nas províncias ultramarinas, e sobretudo em Angola e Moçambique, como mostram os números da exportação.
Mas, internamente, no que respeita a alimentos, a importância é ainda muito maior, porque a grande maioria da população indígena emprega-se na agricultura e vive, como em toda a África, em regime alimentar deficiente.
Uma das razões do seu fraco rendimento é a pobreza do tradicional regime nutritivo, baseado essencialmente no consumo de mandioca.
Um dos objectivos de qualquer programa colonial deve ser, por isso, a melhoria sensível dos consumos do indígena.
No desenvolvimento económico de Angola e Moçambique esse objectivo deve sobrelevar todos os outros, porque o factor humano, lá como na Europa, é de todas as variáveis a mais importante.
Ora a cultura agrícola indígena constitui hoje o fundo da produção, tanto numa como noutra província. É sobre ela, por consequência, que devem recair nos anos mais próximos os possíveis esforços e atenções no sentido de a tornar mais remuneradora, em qualidade e quantidade.
Para alcançar maiores níveis de produção há-de ser indispensável introduzir nas províncias de Angola e Moçambique métodos de trabalho que tendam a melhorar o rendimento do indígena e a poupar, tanto quanto possível, a utilização do seu labor em processos que possam ser vantajosamente substituídos por meios mecânicos.
Isto equivale a dizer que terá de ser melhorado o seu regime alimentar, por um lado, pelo consumo de maior percentagem de proteínas animais, e, por outro lado, será necessário rever os processos de exploração, de modo a poupar o emprego de mão-de-obra.
Não pode ser tratada agora numa terceira condição, muito importante, que diz respeito ao próprio colonato indígena. Ele pode ter grande influência no aumento da produção em proveito das populações autóctones e da província, considerada como unidade económica. Também não é este o lugar para tratar da colonização europeia nos planaltos de Angola e no Norte de Moçambique.
Parece, contudo, ser necessário estudar demoradamente um e outro problema, que estão na base do desenvolvimento demográfico dos dois territórios e que, mais cedo ou mais tarde, hão-de influir no seu futuro.

28. É erro acreditar na fertilidade perene dos solos tropicais, como certas empresas, outrora florescentes, verificaram já. A necessidade de introduzir métodos adequados de protecção dos solos foi amplamente debatida na recente conferência de Goma. A protecção dos solos e das florestas contra a erosão, degradação e desbaste é hoje o fundamento dia conservação de muitos solos tropicais. E qualquer política, agrícola tem de reconhecer estes factos e dar-lhes remédio gradual.

29. Enquanto não for organizado um plano que considere os aspectos relacionados com a erosão, a silvicultura e a zootecnia e a cultura agrícola, que não podem ser considerados em pormenor num programa económico da natureza do que sucintamente se descreve agora, pode dizer-se que é indispensável produzir imediatamente, nas duas províncias, maior somatório de alimentos para consumo indígena e exportação com o emprego mínimo de mão-de-obra.
Embora não esteja provada a eficácia da intensa mecanização em muitos solos tropicais, parece haver campo vasto para maior uso de meios mecânicos nas

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explorações angolana e moçambicana de origem europeia. E também parece não haver dúvidas sobre o maior rendimento indígena com o emprego de instrumentos agrícolas mais aperfeiçoados do que os actuais.
Foi com esse objectivo imediato que se incluíram no programa económico 500:000 contos, a utilizar essencialmente na melhoria de transportes, dentro e fora das plantações, de maneira a reduzir o emprego de carregadores, e na compra de alfaias agrícolas adequadas e instrumentos e aparelhos e máquinas que tendam a aperfeiçoar os métodos de cultivo actuais.
O equipamento de largas concessões é ineficaz em muitos aspectos e urge modernizá-lo tão depressa quanto possível.

VI
TRANSPORTES

30. A verba de transportes atinge 1.535:000 contos. Juntamente com o plano das indústrias soma cerca de 67 por cento do total do programa do ultramar.
A razão provém da importância dos transportes em países novos, tanto rodoviários como ferroviários, e da influência, que podem vir a ter num futuro próximo os transportes fluviais no Cuanza, Gumene e Zambeze.
Os dois grandes territórios portugueses de Angola e Moçambique são, além disso, saídas naturais de Tangas e ricas zonas do interior, que estão em pleno desenvolvimento. Toma-se, por isso, necessário equipar convenientemente os caminhos de ferro e portos de saída e, porventura, introduzir melhorias substanciais indispensáveis ao aumento do tráfego.
Tentativamente, e sujeito a estudos definitivos, o plano dos transportes pode dividir-se do modo que segue:

milhares de
contos
1 - Transportes fluviais ........................ 55
2 - Caminhos de ferro e portos................... 770
3 - Estradas .................................... 500
4 - Navegação aérea ............................. 125
5 - Telecomunicações ............................ 85
Total.................. 1:535

VII
NOTA SOBRE O PROGRAMA no ULTRAMAR

31. O aspecto do programa económico nacional que diz respeito às possibilidades económicas do ultramar não pôde ser tratado com o desenvolvimento que merecia. O autor Lutou com falta de elementos que permitissem ajuizar com segurança, em frente de dados certos, a projecção de um programa económico no futuro. Por outro lado ainda não estão suficientemente definidas as bases tanto de ordem financeira como económica em que pode assentar a execução metódica de um longo plano de produção. Há muitos factores que necessitam de ser investigados, tanto em matéria de transportes como propriamente de produção.
É certo ter sido feito um esforço no sentido de esclarecer certas dúvidas sobre a existência de potencialidades económicas, e pode desde já afoitamente afirmar-se que elas são grandes em Angola e em Moçambique.
Os preços de alguns géneros coloniais, como o café, auxiliaram muito a relativa prosperidade dos últimos anos, mas não devem as actividades responsáveis dormir sobre louros colhidos porque a história colonial é feita de desenganos e crises.
A produtividade nos domínios tropicais, como nas zonas temperadas, é condição fundamental de progresso e dela tem andado arredia a mentalidade europeia no passado.
Também deve ser posta de lado a ideia da existência de riquezas incalculáveis nas Africas. Há, evidentemente, potencialidades mineiras e agrícolas importantes. Mas para as explorar é indispensável o uso de métodos modernos.
Os domínios portugueses não ofereceram até hoje, à parte os diamantes de Angola, as concentrações de riquezas notadas na África do Sul (ouro e diamantes), no Congo Belga (cobre e outros metais), nas Rodésias (ouro, cobre, crómio e diversos produtos). Apesar disso e de necessidades que exigem o emprego de largas somas em obras que interessam a outros territórios, Angola e Moçambique têm progredido satisfatoriamente. Para dar um largo passo no caminho da prosperidade, que nestes conturbados tempos diz respeito também a outros povos, é indispensável a inversão de elevados capitais.
Não parece ser possível que a metrópole possa fornecer os capitais suficientes para a execução de um programa que interessa a toda a Europa Ocidental e é de crer que uma parte importante possa ser desviada do Fundo colonial, instituído no quadro de auxílios americanos à Europa Ocidental.
Os projectos que se enunciaram, sobretudo aqueles que dizem respeito à produção de alimentos, energia e oleaginosas, são urgentes, mas conviria prolongar, com a possível rapidez, o caminho de ferro de Moçâmedes para leste, a fim de atingir depósitos de ferro que se julga serem de grande interesse no Baixo Cunene.
Além de estrategicamente, importante, esta zona pode dar lugar a um projecto de colonização de relevo baseado no aproveitamento de terrenos ricos em "Matá-la e vizinhanças e em exploração mineira que pode ser valiosa, apesar de afastada do mar. Tem, além disso, importância política reconhecida.

NOTA FINAL

1. Hão-de levantar-se muitos obstáculos à execução deste programa. Uns são de natureza material - dizem respeito aos complexos problemas do seu financiamento; outros são de ordem técnica e referem-se à mão-de-obra e pessoal organizador e de direcção; outros ainda são de natureza psicológica e relacionam-se com a sua própria grandeza e com a projecção que, realizado, elo teria na mentalidade nacional.
Os seus efeitos no futuro da Pátria Portuguesa e no nível de vida da comunidade seriam, porém, tão grandes que parece nenhum obstáculo deve ser suficientemente forte para impedir que, total ou parcialmente, ele venha

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a ser uma consoladora realidade dentro de dez ou vinte anos.

2. Quais são as perspectivas económicas e sociais no próximo futuro? Sobre que bases repousará o poder .de compra e o nível de vida da maioria da população portuguesa? Que níveis de produção e consumo atingirá o País dentro de duas décadas?
Sabe-se que o desenvolvimento demográfico levará à população de 10 milhões de habitantes em dez anos e conhece-se, pelo que o período da guerra ensinou, que os níveis de consumo podem aumentar rapidamente. Os anseios e os ideais do povo português modificaram-se muito com os progressos realizados nos últimos tempos.
A produção, por outro lado, não acompanhou as tendências dos consumos; e, o que ainda é pior, os acréscimos dos rendimentos individuais ou colectivos não se adaptaram às exigências de maiores confortos.
Ora não é possível melhoria sensível de consumos materiais sem correspondente elevação de rendimentos que os custeiem.
Para manter e alargar os programas de melhoria de vida social, quer dizer, para que possam progredir os esquemas de bem-estar social, é indispensável aumentar a produtividade e a produção. Sem isso não haverá recursos materiais suficientes. O exemplo, por demais conhecido, das dificuldades de alguns países europeus nos últimos tempos, em virtude da falta de rendimentos adequados para manter os níveis de vida anteriores, ilustra o que em sentido inverso se dá em Portugal. Não se trata neste país de manter apenas os esquemas de natureza social ou os consumos existentes. É indispensável alargá-los, não apenas porque o desenvolvimento da população a isso obriga, mas também porque ainda é baixo o nível de vida em muitos sectores do agregado nacional.

3. Neste aspecto pode haver diversas alternativas para o futuro do País, umas de natureza construtiva, outras de carácter negativo.
As de natureza construtiva, sumariadas, acabam por se reduzir apenas a uma, que é o acréscimo do rendimento nacional, e esse só pode ser obtido pelo aproveitamento dos recursos potenciais, incluindo os do ultramar, e por melhor e maior produtividade dos instrumentos de fomento, incluindo a mão-de-obra.
As de carácter negativo, já apontadas noutro estudo, resumem-se a intensificar, quanto possível, a saída de portugueses para terras de além-mar, onde seja mais rendoso o trabalho, ou, numa palavra, resumem-se na emigração.
Passada a guerra e os três anos a seguir, desapareceram as circunstâncias que permitiram a aproximação de um estado de pleno emprego. A existência de fundos disponíveis, lançados em obras públicas, na construção civil, na importação e em outros objectivos de variada natureza produziu trabalho, mas as obras em que se consumiram esses fundos em sua maior parte não são de carácter reprodutivo ou, se o são, nalguns casos, como os portos e outros, a reprodutividade não atingirá remuneração adequada nos tempos mais próximos. E certo que o ter cessado abruptamente a cadeia de inversões financeiras trouxe desemprego.
Demonstrou-se uma vez mais quanto aleatório é forçar o emprego por financiamento de actividades improdutivas e quanto necessário se torna manter e alargar uma actividade produtiva sã na vida económica de um país.
O equilíbrio social só pode resultar de medidas tomadas em sentido que assegure o emprego convenientemente remunerado de todas as classes da população.

4. Quando se fala em desemprego é hábito mental considerar apenas as classes operárias, quer agrícolas, quer industriais. Esquece-se muitas vezes que é nas classes médias e nas profissões liberais onde se tornam, em certos casos, mais cruciante a sua projecção e mais angustiosos os seus efeitos, até no que se relaciona com o interesse da comunidade.
O desempenho de funções no Estado foi quase sempre para muitos diplomados de cursos superiores o alvo a atingir. Alguns institutos ou Faculdades Universitárias criavam cursos ou diplomavam alunos que não tinham em grau apreciável outra saída que não fosse o emprego do Estado.
Ainda hoje isso acontece e vai acontecer em maior grau nos tempos mais próximos.
Ou há-de dar-se o fenómeno de diminuição de frequência em muitos cursos de carácter universitário ou os seus diplomados terão de recorrer ao emprego, se o tiverem, em funções para que não foram educados, ou o Estado terá de aumentar ainda os seus quadros, já excedidos em muitos casos.
Mas não é apenas nos diplomados universitários, os quais logo no começo da vida vêem desfolhar-se as doces ilusões da juventude, onde dolorosamente se faz sentir o desemprego.
A classe média, que poderia ser o nervo motor da prosperidade na vida moderna, sofre na sua força e na sua iniciativa com o desemprego. Não dá nem pode dar à comunidade o ardor da iniciativa, porque a sua actividade se reduz com a estagnação dos negócios. O desemprego atinge principalmente aqueles que, mais ambiciosos e viris, procuram nos grandes centros, ou até nos meios rurais, uma actividade que lhes permita mostrar o que valem ou o que podem valer.

5. Um programa económico nacional deve ter como objectivo, em primeiro lugar, criar emprego para os excedentes da população, incluindo nesses excedentes tanto os filhos da classe média como os operários agrícolas e industriais.
O emprego não se torna efectivo apenas depois de concluído o programa económico nacional.
Os planos parciais, escalonados pelos anos de execução, já de si dão emprego. A massa de trabalho a realizar, a sua natureza física e intelectual, o próprio carácter desse trabalho inovador e orador, trabalho que só desenvolve riquezas e tem objectivos altruístas que tocam a todos, são de molde a absorver uma parcela importante de gente que vegeta hoje em condições vizinhas da privação ou sente a revolta por não encontrar meio do expandir suas energias. E se porventura for possível imprimir um ritmo metódico à execução de planos, sem pressas, nem demoras, nem hesitações, antes com base em seguros e estudados projectos, a execução de um programa da natureza do formulado nas páginas anteriores pode até ser poderoso instrumento educativo.
Não parece haver outro modo, dentro dos anos mais próximos, de dar emprego à massa de trabalhadores, além da execução de um largo programa económico que aumente os rendimentos e venha a produzir as condições necessárias ao sustento de uma população que se multiplica continuamente.

6. A racionalização das actividades industriais traz, indubitavelmente, reduções na mão-de-obra. Dados os progressos cada vez mais acentuados nas ciências aplicadas, a mecanização quase se impõe em todos os países. A produtividade essencial, para nível de vida conveniente, não pode ser atingida de outro modo. E aparece ainda, por este motivo, diante de nós o problema grave de menor emprego de mão-de-obra como consequência de progressos na eficiência de instrumentos produtores.

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Donde resulta que só com desenvolvimentos da produção se podem absorver os excessos demográficos previstos, além daqueles que, por virtude de melhorias técnicas, sejam dispensados das actuais actividades económicas.
Seria interessante computar em termos de mão-de-obra a projecção de um programa económico da magnitude do enunciado neste estudo.
Por motivos que decorrem da leitura das razões que o justificam não é possível fazer um cálculo definitivo. Mas podem dar-se indicações sobre alguns dos seus aspectos.
No caso, por exemplo, da rega, a experiência mostra que a diferença média na capacidade de absorção demográfica entre o hectare regado e o de sequeiro anda à roda de doze pessoas. Isto significa que a rega de 150 000 hectares absorveria um excesso populacional de 1.800:000 almas.
Juntando os restantes planos, obtêm-se as possibilidades de emprego criadas pela execução do programa económico.

7. Os últimos quinze anos acentuaram de maneira considerável a conveniência de desenvolver os recursos nacionais. Indirectamente, portanto, acentuaram também a necessidade de aumentar as receitas públicas.
O exame, ainda que superficial, das despesas do Estado mostra logo as suas deficiências em muitos aspectos. A compressão vem mais da necessidade de carências financeiras - do que da sua largueza na maior parte dos casos.
Basta atentar na remuneração de muitos funcionários, insuficiente para a manutenção da família. Mas nos aspectos de natureza material, apesar de terem sido gastas largas quantias, ainda se nota a falta de muitos melhoramentos essenciais ao progresso e bem-estar social.
Ora o aumento das receitas públicas não é possível sem o acréscimo dos rendimentos colectáveis, quer se trate da contribuição predial, quer da industrial. E é, no final de contas, na indústria e na agricultura que reside a base da receita do Estado.
Os rendimentos colectáveis não podem desenvolver-se sem o alargamento dos rendimentos da propriedade agrícola ou industrial. E um círculo vicioso, sério, de graves repercussões.
Mas não é apenas na vida do Estado que a incipiência económica tem repercussões graves.
Criou-se através da organização corporativa uma superestrutura social que, por intermédio das caixas de previdência e reforma, cobra hoje receitas anuais de mais de 1 milhão de contos por ano ou cerca de dois terços do total dos impostos directos, que incluem as contribuições predial e industrial.
Esta receita virá a liquidar encargos pesados e já hoje é o esteio de uma estrutura social que influi muito na vida do operário.
Como manter sólida essa estrutura, desenvolvê-lo, e aperfeiçoá-la convenientemente, se faltar a matéria colectável, que afinal tem origem idêntica à que serve para obter as receitas do próprio Estado?
Por isso também se recomenda com urgência, dentro do mais curto espaço de tempo possível, a realização de um programa de desenvolvimento económico suficientemente lato.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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