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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 99

ANO DE 1951 18 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL

V LEGISLATURA

SESSÃO N.º 99, EM 17 DE ABRIL

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Exmos. Srs. Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro

Nota. - Foram publicados dois suplementos ao Diário das Sessões n.º 98, inserindo o 1.º, o parecer n.º 18/V, acerca do projecto de lei n.º 140 (aditamento de um novo parágrafo ao artigo 109.º da Constituição), e o 2.º o parecer da Comissão de Contas da Assembleia Nacional sobre as contas da Junta do Crédito Público referentes ao ano económico de 1949.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão ás 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 98.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente anunciou estarem na Mesa os elementos pedidos por vários Srs. Deputados a diversos serviços públicos.
Para cumprimento do § 3.º do artigo 109.º da Constituição, recebeu-se na mesa o Decreto-Lei n.º 38:220.
O Sr. Presidente deu conhecimento à Câmara de terem sido publicados no Diário das Sessões n.º 98 os pareceres da Câmara Corporativa acerca do projecto de alteração á Constituição relativo à defesa da língua portuguesa e acerca do projecto de lei do Sr. Deputado Paulo Cancela do Abreu relativo ao § 7.º do artigo 109.º da Constituição.
Foi também recebido na Mesa o parecer sobre as Contas Gerais do Estado relativo a 1949.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Mendes Correia, sobre a fiscalização nas sociedades por acções; Sousa Meneses, sobre os prejuízos sofridos pela população da ilha Terceira com o recente abalo de terra; Santos Bessa, para um requerimento, e Pinto Barriga, também para um requerimento.
Ordem do dia. - Continuou a discussão, na especialidade, da proposta de lei n.º 111 (alterações á Constituição Política).
Usaram da palavra, no decorrer do debate, os Srs. Deputados França Vigon, Mário de Figueiredo, Carlos Moreira, Carlos Borges e Dinis da Fonseca.
O Sr. Presidente encerrou a sessão ás 19 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada á qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Eurico Ribeiro Cazaes.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Ferreira.
António Joaquim Simões Crespo.
António Maria da Silva.
António ao Matos Taquenho. António Raul Galiano Tavares.

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António dos Santos Carreto.
António Sobral Mendes de Magalhães Ramalho,
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Mantero Belard.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Cardoso de Matos.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
José Pinto Meneres.
José dos Santos Bessa.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel França Vigon.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco Lopes Alves.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 76 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 98.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer reclamação, considero-o aprovado.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

De duas comissões de habitantes da freguesia de Teixeiró, da Junta de Freguesia de Loivos, do regedor e da Junta de Freguesia de Frende, todos do concelho de Baião, apoiando o discurso do Sr. Deputado Carlos Moreira quanto à integração daquelas freguesias no concelho de Mesão Frio.
De três vogais da Junta de Freguesia de Tresouras, no mesmo sentido.
Do presidente da Junta de Freguesia de Teixeiró, informando que assinou o telegrama de apoio à anexação das freguesias do concelho de Baião ao concelho de Mesão Frio coagido pelo presidente da Câmara deste concelho e declarando agora que discorda daquela anexação.

O Sr. Presidente:- Estão na Mesa os elementos pedidos pelo Sr. Deputado Carlos Moreira aos Ministérios do Interior, Finanças, Justiça, Obras Públicas, Colónias, Comunicações, Corporações, Exército e Negócios Estrangeiros; os elementos pedidos pelo Sr. Deputado Manuel Maria Vaz ao Ministério da Economia; os elementos pedidos pelo Sr. Deputado Amaral Neto ao Ministério do Interior relativos à Guarda Nacional Republicana, e os elementos pedidos pelo Sr. Deputado Elísio Pimenta ao Ministério do Interior. Todos estes elementos vão ser entregues àqueles Srs. Deputados.
Está também na Mesa, enviado pela Presidência do Conselho, para cumprimento de disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Diário do Governo n.º 70, de 10 do corrente, que insere o Decreto-Lei n.º 38:220.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como certamente já é do conhecimento da Assembleia, o Diário das Sessões n.º 98 insere o parecer da Câmara Corporativa acerca do projecta de lei de alteração à Constituição relativo à defesa da língua portuguesa.
Também já chegou à Assembleia o parecer da Câmara Corporativa sobre o projecto de lei do Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu relativo ao aditamento de um § 7.º do artigo 109.º da Constituição. Este parecer foi publicado em suplemento ao Diário das Sessões n.º 98 e baixa imediatamente à Comissão de Legislação e Redacção, para que esta se possa pronunciar.
Ambos estes projectos serão submetidos à discussão nesta sessão legislativa, se para tal houver tempo.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está também na Mesa o parecer sobre as Contas Gerais do Estado relativo a 1949. Vai ser distribuído, em separata, aos Srs. Deputados.
Igualmente, amanhã, será distribuído aos Srs. Deputados o parecer sobre as contas da Junta do Crédito Público, publicado em suplemento ao Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, antes da ordem do dia, o Sr. Deputado Mendes Correia.

O Sr. Mendes Correia:- Sr. Presidente: vou deste lugar pedir a atenção do Governo para um assunto que envolve não só aspectos de moralidade, mas também

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os interesses legítimos de muita gente que confia a administrações de empresas privadas bens de viúvas e órfãos ou as suas economias, obtidas muitas vezes à custa de tanto trabalho e de tanto sacrifício. Refiro-me às sociedades por acções, sobre as quais esta Assembleia aprovou em 1943 uma lei que, afinal, decorridos oito anos, ainda, se não encontra em aplicação, por motivo, ao que ouvi, de não ter ainda sido regulamentada.
Essa lei estabelecia uma fiscalização no género da legislação inglesa, com o objectivo de acautelar os legítimos interesses e direitos dos accionistas, pela verificação da observância dos bons preceitos de contabilidade e administração, nem sempre garantidos por alguns conselhos fiscais desleixados ou demasiado indulgentes e pelas próprias assembleias gerais, facilmente manejáveis por alguns conselhos de administração, mais interessados nos proveitos pessoais dos seus membros do que na cabida retribuição dos investimentos, muito especialmente do pequeno accionista.
Reli há dias o texto da proposta do Governo sobre a matéria, proposta à qual ligaram os seus nomes alguns dos actuais Ministros e membros desta Câmara.
Li o excelente parecer da Câmara Corporativa, de que foi relator o talentoso Prof. Paulo Cunha, hoje Ministro dos Estrangeiros.
Li no Diário das Sessões vários dos discursos então pronunciados nesta Assembleia em apoio dos princípios de moralidade e de justiça contidos na dita lei. Entre esses discursos mencionarei os dos então Deputados e hoje Ministros, os nossos antigos e ilustres colegas nesta Casa, Srs. Drs. Águedo de Oliveira, Ulisses Cortês e Soares da Fonseca. Não posso acreditar que tão distintas personalidades, hoje no Governo, se tenham desinteressado duma matéria sobre a qual então se manifestaram tão lúcida e desenvolvidamente.
Tenho lido alguns relatórios de administração de empresas por acções que me têm deixado uma penosa impressão. Os critérios variam ao infinito em pontos em que se não pode pensar de maneiras diferentes.
As classificações das diversas rubricas deixam-me, nalguns casos, dúvidas sobre a sua legitimidade e seria bom saber se em todos os casos os conselhos fiscais - cujas conclusões são as mais das vezes enunciadas em fórmulas estereotipadas, quase sacramentais- verificaram directamente perante a escrita a correspondência entre esta e as coutas apresentadas à assembleia geral, que docilmente as aprova em regra.
Surpreende-me que as administrações de empresas privadas estejam por vezes entregues a pessoas que fazem parte, de muitas delas ao mesmo tempo, limitando a sua acção a receber chorudas retribuições, frequentemente sem sequer se darem ao incómodo de aparecer de vez em quando nos escritórios da empresa. Não é possível que, pertencendo a tantos conselhos, possam exercer seriamente as suas funções em todos eles. O que é certo é que o Estado, que, com razão, restringe ao máximo as acumulações e limita os vencimentos aos funcionários públicos, admite afinal que, não fazendo nada, uma casta especial de homens de negócios acumule vencimentos astronómicos por cargos particulares que não exercem de facto, e isto em prejuízo do accionista, especialmente, repito, do pequeno accionista.

O Sr. Ernesto Lacerda: - E por vezes do consumidor!

O Orador: - Do consumidor e do trabalhador.
Impressiona-me desagradàvelmemte a distribuição de grandes gratificações aos administradores de empresas que nem sequer dão dividendo e que, como já tenho visto em relatórios e contas publicados, a repartição de gratificações se faça antas da própria, aprovação das contais com base em percentagens instituídas por assembleias gerais anteriores com efeitos per omnia secula ...
Sei que me podem objectar dever o Estado, antes de mais, ser severo para com empresas que vivem de concessões suas ou para os organismos paraestatais, em que a sua ingerência é indispensável. Na verdade, nesta Assembleia tem-se cabidamente reclamado a imposição da severidade que o Estado tem para com as suas próprias contas às entidades mencionadas.
Já aqui ouvi autorizadas críticas a uma empresa que há dias publicou nos jornais de grande circulação um resumo brevíssimo das suas contas, mas um resumo de suficiente eloquência para se ver que se trata dum negócio da China, feito num regime concedido pelo Estado, e cuja função dificilmente se explica num rigoroso critério de justiça económica e interesse colectivo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Amortizadas completamente em curto espaço de tempo as suas despesas de instalação (as instalações imobiliárias figuram já por 3$ apenas no activo da empresa) os lucros líquidos dum ano de exercício excedem metade do próprio capital, que, sem se mencionarem especificadamente no documento publicado os vencimentos e gratificações duma administração tão-pouco extenuante, pode assim obter a mais rendosa retribuição sem riscos de maior ...
Confesso o meu espanto e pergunto a mim mesmo, por exemplo, porque renuncia o Estado à recolha directa dos benefícios financeiros da actividade assim concedida ou então porque não reverte para proveito do pobre consumidor, pelo embaratecimento dos produtos, a maior parte de tamanha margem de lucro. Aliás, não compreendo o motivo por que tal intermediário tem infalivelmente de aparecer relativamente aos fornecimentos de tais produtos para empresas de interesse público cujos déficits consideráveis poderão um dia vir a constituir encargo da Nação.
Admito que tais empresas obtenham condições mais favoráveis de preço, mas duvido que deixem de concorrer volumosamente para o lucro tão substancial que consta do resumo de contas publicado.
Apesar de todos estes factos, que me deixam no espírito uma impressão profundamente desfavorável, não falece ao Estado autoridade para impor normas salutares às administrações das empresas privadas. As regras de administração financeira estabelecidas por Salazar para o Estado Português dão a este a plena legitimidade para, por órgãos adequados, como a Câmara de Verificadores, mandada constituir pela Lei n.º 1:995, de 17 de Maio de 1943 ...

O Sr. José Meneres: - Mas essa lei ainda não foi regulamentada.

O Orador: - Já lamentei o facto. E isso precisamente que determina a minha intervenção, mas, continuando:
Por órgãos adequados, o Estado poderia instituir, dentro dos limites razoáveis, a fiscalização da constituição e funcionamento das sociedades por acções. Mais: aquela lei estabelece-lhe logicamente o dever de não ficar de braços cruzados. Não se esqueça que pela base VII da Lei n.º 1:936, de 18 de Março de 1936, já o Governo ficara autorizado a modificar, oportunamente, o regime de fiscalização das sociedades anónimas, de modo a obter-se que esta seja realizada com a intervenção de técnicos especializados e ajuramentados, designados por entidade estranha à sociedade. Mas o Governo entendeu preferível submeter ao Parlamento uma pro-

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posta - aquela de que resultou a Lei n.º 1:995 -, em vem de utilizar directamente a autorização.
Decerto ponderou a conveniência da intervenção do Parlamento, a escolha do sistema em adoptar nessa fiscalização, da qual o parecer da Câmara Corporativa dizia que, uma vez começada a realização, era difícil arrepiar caminho. Se não se arrepiou caminho, pelo menos estacionou-se, cruzaram-se os braços, e, esta paragem, com todas as suas consequências, dura há oito anos. Porquê? Não será tempo de retomar a marcha, doa a quem doer? Não nos interessa a protecção da riqueza de meia dúzia de privilegiados, mas o bem da Nação e a justiça para todos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:- Uma voz, eloquente referiu-se há dias nesta Câmara à necessidade moral e nacional de que o ruído dos talheres não venha substituir o tilintar das espadas que foram embainhadas depois de 28 de Maio. Acrescentarei que, por mim, ambicionaria que, à voracidade insaciável de alguns, se substituísse o proveito de um povo inteiro, sobretudo dos que trabalham, e que se ouvisse apenas mesta bendita terra de Portugal o rumor de actividades laboriosas, saudáveis, prestantes e fecundas.

Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Sousa Meneses: - Sr. Presidente: quando na sessão de 16 de Janeiro trouxe a esta Assembleia algumas palavras de simpatia para com a população da ilha Terceira, então inquieta e desanimada pela série de tremores de terra que agitaram a ilha com grande violência e continuidade, não sabia ainda até que ponto a essa intranquilidade dos espíritos que juntavam os prejuízos materiais.
Chegam-me agora às mãos informações completas e precisas para poder avaliar a grandeza do que se passou e informações idênticas deve-as ter já neste momento o Governo, remetidas ao seu exame e consideração pela autoridade superior do distrito.
Apurou-se, depois de cuidada vistoria, que nas casas da cidade duzentas e oitenta sofreram estragos apreciáveis, indicando uma reparação urgente de consolidação, e que dezassete edifícios públicos apresentam igualmente danos importantes.
Dessas casas arruinadas, cento e trinta são de gente pobre, gente que só tem o ganho do seu trabalho, que mal chega para o "pão nosso de cada dia", e são justamente essas as que mais sofreram, o que não é de admirar, porque são sempre casas de tipo barato e de construção frágil para regiões dadas a abalos de terra.
Estas informações são todas provenientes do cauteloso inquérito a que se procedeu, o qual foi feito por uma comissão de peritos, nomeada pelo governador do distrito, e os números que ela apresentou foram somente os das casas que sofreram maiores prejuízos e onde em algumas há até perigo de se continuar a residir, se não forem efectuadas as obras de segurança consideradas indispensáveis.
Dos edifícios públicos avariados, melhor que eu deve estar neste momento informado o Sr. Ministro das Obras Públicas, que ali mandou propositadamente um dós seus engenheiros para colher essas informações, e não posso neste momento deixar de frisar quanto isso representou de cuidado e atenção da parte de S. Ex.ª e quanto isso representa de consolação e esperança para o povo do distrito, que se honra de o considerar seu concidadão honorário.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas há três desses edifícios sobre os quais incidiram maiores estragos, e são justamente aqueles que mais vivam no pesar da população pela sua imprescindível utilidade ou por mais valioso significado no seu património espiritual.
São o hospital da Misericórdia, alojado num velhíssimo, convento, já condenado como absolutamente impróprio para tal fim e que agora ficou tão arruinado que me consta foi dado como perigoso habitar numa das suas partos.
Os outros dois edifícios são as antigas Igrejas do Colégio e de S. Francisco, ambas a recordarem o que foi o esforço e o desenvolvimento do povoamento da ilha, com os seus cinco séculos de vida nacional.
A primeira é considerada oficialmente como edifício de interesse público; a segunda é orgulho da ilha porque à sua guarda se encontram os restos mortais de três dos primeiros pioneiros dos nossos descobrimentos: Afonso Gonçalves Baldaia, João Vaz Corte Real e Paulo da Gama, nomes da história da Pátria, que navegaram, respectivamente, nos empreendimentos marítimos dos feitos da Guiné, nas viagens para Ocidente e no descobrimento do caminho marítimo para a índia, este último deixado ali pelo irmão, Vasco da Gama, quando, já colhida a glória, a doença o não deixou prosseguir mais.
Espera esta população, assolada pela violência dos tremores de terra, que a ela sejam facilitados os meios necessários de socorro aos pobres e de financiamento para os remediados que não disponham de recursos imediatos, de modo a que dentro em breve possam convenientemente reparar as suas casas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E eu, como seu representante nesta Assembleia, não posso deixar de secundar esse legítimo e honesto desejo, tanto mais que a ameaça de maior destruição, ou possivelmente de total ruína das suas casas` ainda não cessou, porque continuam a sentir-se abalos de terra, que parecem indicativo de não ter terminado, por agora, este ciclo de actividade sísmica.
É apenas no desejo de se evitar a ameaça que perdura e que poderia ser de irremediável prejuízo, continuando as casas sem a consolidação que a técnica aconselha, que a população da ilha, fazendo-me seu intérprete, solicita ao Governo a prontidão das providências adequadas à solução do seu caso. E é também em seu nome, e no desejo de que essas providências se não demorem, que ou junto aqui, como seu representante, esta minha diligência, para que o Governo a considere na intenção e verdade com que ela foi posta.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: arrasta-se há muito tempo o inquérito acerca da possível existência de peripneumonia exsudativa no gado bovino importado da Holanda.
Recebi, pelo Ministério da Economia, as informações respeitantes aos dois requerimentos que a tal respeito formulei.
Aproveito esta oportunidade para as agradecer a S. Ex.ª o Ministro da Economia.
Mas, se o caso da existência da peripneumonia exsudativa no gado proveniente da Holanda ora uma ameaça séria para os bovinos nacionais, e por isso considerado

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um caso grave - e tão grave que mo fez solicitar esses elementos -, mais grave é a notícia da existência de alguns casos já diagnosticados nos bovinos metropolitanos.

Os dois casos - o dos bovinos da Holanda e o dos bovinos metropolitanos - requerem medidas sérias e imediatas, e por isso me permito chamar para eles a atenção de S. Ex.ª o Ministro da Economia.
E, para estar devidamente documentado a tal respeito, envio para a Mesa o seguinte

Requerimento

"Considerando de extrema gravidade a notícia de ter sido diagnosticado, recentemente, em bovinos metropolitanos a peripneumonia exsudativa, requeiro que, com a possível urgência, me sejam fornecidos, pelo Ministério da Economia os seguintes elementos:

a) Número de casos de doença recentemente verificados;
b) Proveniência desses bovinos;
c) Cópia dos relatórios bacteriológicos o anátomo-patológicos respeitantes ao diagnóstico;
d) Cópia do relatório de apuramento final da responsabilidade resultante do inquérito que foi ordenado sobre o gado importado da Holanda;
e) Informação sobre as investigações acerca do contágio dos bovinos metropolitanos;
f) Informação sobre as medidas de polícia sanitária já tomadas e sobre as que vão ser ordenadas".

O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: tenho a honra de requerer, nos termos constitucionais, que, pelo Ministério das Colónias, Direcção-Geral de Administração Política a Civil, me sejam fornecidos os seguintes elementos:

1.º Quantos diplomados com o curso de altos estados coloniais foram nomeados para exercer as funções mais elevadas das hierarquias coloniais, com indicação dos respectivos cargos, conforme dispõe o Decreto-Lei n.º 35:885, de 30 de Setembro de 1946;
2.º Quais as providências já tomadas a fim de ser dada plena execução ao referido diploma, nomeadamente no que diz respeito aos seus artigos 5.º (última parte do n.º 2.º) e 11.º

Urgentemente, mais requeiro que, pelo Ministério das Finanças e pela sua Direcção-Geral da Contabilidade Pública, me sejam fornecidas cópias dos despachos interpretativos do artigo 27.º do Decreto n.º 26:116.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão, na especialidade, a proposta de lei n.º 111. Está em discussão o artigo 5.º da proposta de lei sobre a revisão constitucional.
Quanto a este artigo encontram-se na Mesa uma proposta do Sr. Deputado Mendes do Amaral e outra da Comissão de Legislação e Redacção, já publicadas no Diário, mas que vão ser lidas.

Foram lidas.

O Sr. Presidente: - A proposta apresentada pelo Sr. Deputado Mendes do Amaral, e que acaba de ser lida, relaciona-se com o projecto de revisão de S. Ex.ª) que se encontra na Câmara Corporativa o dizia respeito ao corpo do artigo 8.º
Pergunto a V. Ex.ª se ainda mantém esta proposta.

O Sr. Mendes do Amaral: - Eu peço a V. Ex.ª e à Assembleia que consintam que eu retiro as minhas propostas.

Consultada a Assembleia, foi autorizado o Sr. Deputado Mendes do Amaral a retirar as suas propostas.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 6.º da proposta de lei, com a proposta de substituição que a Comissão, de Legislação e Redacção apresentou e que já foi lida à Assembleia.

O Sr. França Vigon: - Sr. Presidente: na proposta de lei em discussão, o Governo incluiu entre os direitos dos cidadãos portugueses "o direito ao trabalho nos termos que a lei prescrever".
A Câmara Corporativa é de parecer contrário a essa inclusão o fez a tal respeito uma erudita explanação das razões que a orientaram nesse sentido.
Convencido de que nem de longe posso aproximar-me dessa erudição, atrevo-me, porém, a tratar do assunto nesta tribuna.
Em primeiro lugar é preciso anotar o seguinte:
0 Governo, empregou na resposta a expressão co direito ao trabalho nos termos que a lei prescrever". No parecer daquela Câmara começou-se por reproduzir a expressão completa, mas dai por diante só se tomou uma sua parte - "direito ao trabalho" - o não mais se considerou a outra - "nos termos que a lei rescrever".
Eu bem sei que esta segunda parte tem a aparência de uma redundância, pois que há a considerar que tudo o que se dispõe na Constituição pode ou deve, conformo os casos, ser regulado na lei ordinária; simplesmente, não se notou que o emprego da segunda expressão tinha um valor intrínseco e uma intenção.
Não se tratava de um direito absoluto, com o sentido absoluto da expressão isolada - "direito ao trabalho" -, mas de um direito cujo conteúdo tinha de ser definido pela lei ordinária. E o certo é que tal direito não só já estava definido pelo Estatuto do Trabalho Nacional nas disposições citadas pela Câmara Corporativa, mas também podia ser objecto, como qualquer outro, de melhor definição ulterior, em resultado do seu exercício ou em consequência da sua própria evolução doutrinal.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Preocupou-se a Câmara Corporativa com a origem ideológica do direito ao trabalho, que considerou paramento socialista.
Eu não sei se ainda estamos em tempo, possuindo uma doutrina própria e forte como possuímos, de circunstâncias dessa natureza constituírem preocupação política, e antes me inclino para a substituir pela preocupação com o exame do valor ético dos conceitos e princípios. Tenho por impossível evitar-se hoje a interpretação, o mútua influência, até certo ponto, das ideias e até dos sistemas.
E creio firmemente, por exemplo, que para os legisladores da constituição soviética não foi preocupação escreverem nela, que "quem não trabalha não come", sendo certo que S. Paulo dissera "que quem não trabalhar, não coma", referindo-se este e aqueles precisamente aos homens aptos para o trabalho, mas ociosos.
Porque a Câmara Corporativa levantou a questão, parece-me conveniente esclarecê-la.
Não ma convenço de que o direito ao trabalho seja de "origem ideológica puramente socialista", o que não admira, por muito bem saber que da ideologia crista aproveitaram muitos, até os socialistas.
É de aceitar, pelo menos, que no entendimento completo dos preceitos de que ao homem ganhará o pão com o suor do rosto" - ditame do Génesis -, de que

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«o homem nasce para o trabalhos - como está escrito no texto de Job - e daquele preceito, que já enunciei, do apóstolo, na carta por ele escrita aos da Tessalónia, nesse entendimento completo, ia dizendo, pode encontrar-se a convicção de que o direito ao trabalho não é de origem puramente socialista.
E não será precisamente o contrário ? ...
Faço a pergunta, a que para mim já dei resposta, tão convicta como a de que a única restrição a fazer é de que não se trata apenas do trabalho económico. Mas este seria outro problema, que não há tempo para aqui tratar nem vem para o caso, por não ser fundamental para a discussão.
Sr. Presidente: em ligação com este ponto, a Câmara Corporativa, considerando condensada no Código social de Malines a doutrina social católica sobre o assunto, parte daqui para concluir que também esta doutrina não aceita o direito ao trabalho, mas apenas o dever de trabalhar.
Por mim não seria capaz de concluir com tal certeza que o Código de Malines seja na matéria a última palavra - última como definitiva, última como mais recente -, pois não me conformo nem com a impossibilidade de a Igreja definir melhor em qualquer momento, nem com a de manter a linha de uma sábia e inspirada evolução do seu pensamento e da sua acção, em face da natural e divina evolução da própria vida das sociedades.
Esta minha atitude tem actual fundamento, entre outros antigos, na alocução de S. S. Pio XII, de 4 de Junho do ano passado, feita aos membros do Congresso Internacional de Ciências Sociais e aos da Associação Internacional Cristã, quando, referindo-se a opiniões atrasadas nos velhos países industriais, alude à evolução progressiva do direito ao trabalho. E não resisto à tentação de repetir algumas das suas palavras que dizem respeito ao fundo desta questão do direito ao trabalho:

Queremos recordar o problema da iminente e permanente ameaça dó desemprego forçado, o problema da obtenção e segurança de uma produtividade normal, que, tanto pela sua origem como pelo sen fim, está Intimamente unida à dignidade e ao bem-estar da família, considerada como unidade moral, jurídica e económica.

E, já que me custa deixar aos socialistas a glória imerecida de serem eles os condestáveis do direito ao trabalho e à Igreja Católica a culpa de o contestar, permito-me lembrar que Pio XI afirmou, na Divini Redemptoris, «ser próprio da justiça social exigir aos indivíduos o que seja necessário para o bem comum» e «dar aos homens dotados de dignidade do pessoa o necessário para cumprir as suas funções sociais».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A este respeito, e para terminar esta parte das minhas notas, desejo apenas transcrever mais o seguinte, da alocução do Santo Padre feita em 1 de Junho de 1941:

O direito ao trabalho é imposto e concedido ao indivíduo em primeiro lugar pela natureza, e não pela sociedade. Daqui resulta que o dever e o direito de organizar o trabalho do povo pertence antes de mais aos interessados imediatos: patrões e operários. Se estes não cumprem o seu dever, ou não podem cumpri-lo por circunstâncias especias e extraordinárias, é dever do Estado intervir no campo do trabalho e da sua divisão e distribuição, segundo a forma e a medida requeridas pelo bem comum devidamente entendido.
Depois disto não me restam dúvidas de que não podemos encontrar no Código de Malines o julgamento final sobre o direito ao trabalho.
É indiscutível -creio- que este direito está já consignado nas leis ordinárias portuguesas. Pelo menos o Estatuto do Trabalho Nacional não deixa dúvidas a esse respeito nas disposições que a Câmara Corporativa citou no parecer, as quais, além do direito ao trabalho -assim mesmo dito- consignam ainda o direito ao salário humanamente suficiente.
O problema que se põe à Assembleia é, pois, o de resolver se o direito ao trabalho deve passar a constar da Constituição, tal como já consta o direito de propriedade.
É legítima, porém, uma hesitação a esse respeito em face destas perguntas: mas qual é o sujeito da obrigação correlativa? Qual o conteúdo desse direito? - o que corresponde a inquirir-se sobre se se trata de um dever de subjectivação e objectivação possíveis em nossa organização económico-social. Prefiro responder primeiro à segunda pergunta.
Para nós, portugueses, a resposta é afirmativa. No campo doutrinário e legal
é-nos possível definir já o conteúdo deste direito. E daí resulta -diga-se a propósito- que por isso mesmo facilmente desaparecerá a razão da distinção entre as expressões «direito ao trabalho» e «direito de trabalhar» que a Câmara Corporativa trouxe à colação.
A definição do conteúdo jurídico do direito ao trabalho já se encontra na legislação portuguesa. Não se concretiza, como tanto parece recear aquela Câmara, no facto de a qualquer indivíduo sem trabalho, forçadamente desempregado, ser devido um emprego, um lugar. Não, não é isso que, constituindo a substância do direito ao trabalho, resulta do disposto no Estatuto do Trabalho Nacional, nomeadamente dos seus artigos 21.º e 23.º
Então qual é essa substância ou conteúdo?
Quando aqueles preceitos legais consignam, por um lado, o direito ao trabalho, mas, por outro, prescrevem que «sem prejuízo da ordem económica, jurídica e moral da sociedade»; quando impõem que «ele seja tornado efectivo pelos contratos individuais e colectivos, e nunca por imposição do trabalhador»; quando o artigo 2.º preceitua que «a organização económica da Nação deverá, realizar o máximo de produção e riqueza socialmente útil e estabelecer uma vida colectiva de que resultem poderio para o Estado e justiça entre todos os cidadãos» ; ante tais preceitos, repito, afasta-se completamente a ideia da prestação do emprego privado ou público, posto à disposição do desempregado forçado.
Para mim, o conteúdo deste direito tem dois aspectos - um positivo e um negativo.
O aspecto positivo consiste em que a organização económica e social deve ser estabelecida e regulada por maneira a não faltar o trabalho aos que queiram trabalhar. A organização do trabalho deverá, assim e entre o mais, ter em vista a distribuição deste, e tê-la por modo que não falte como meio de viver e meio de cumprir um dever. A organização económica e social deve ter uma tal estrutura e funcionamento que destes resulte, para todos e normalmente, a possibilidade de encontrar emprego, a possibilidade de assegurar a vida da família, a possibilidade de assegurar, na quota-parte devida por cada um, a própria vida da sociedade, do Estado.
Não fujo ao gosto de fazer ainda duas citações, primeiro, de algumas palavras de Joaquim Azpiazu:

E se a economia, dentro da sua sistemática e teorias, é incapaz de manter um emprego pleno, é porque está mal concebida e mal formada: há que reformá-la.

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E, agora, outra do professor italiano Angelo Perego:

No campo ético-jurídico o direito ao trabalho encontra um limite nas exigências do direito de propriedade e do bem comum.

As determinações do direito ao trabalho competem à autoridade política, à qual pertence também especificar o direito natural não determinado suficientemente.

Na autorizada opinião destes citados autores, e também no meu desvalioso parecer, não se trata de um direito absoluto, embora a sua integração prática exija um progressivo esforço da organização e do Estado, a fim de assegurar cada vez mais normal e geralmente o seu exercício, até que fiquem por liquidar apenas os casos excepcionais de crise de resolução. Mas não serão estes que hão-de formar os princípios, influenciá-los e muito menos destruí-los.
Sr. Presidente: até aqui o aspecto positivo. Agora o aspecto negativo.
O Estado tem o dever de evitar que, na prática, o direito ao trabalho seja tornado ineficaz, quer quando se regulamente superiormente, quer quando se regule nos contratos de trabalho. E a este respeito direi rapidamente alguma coisa do que se tem passado entre nós e que, para mim, dá especial relevo à consignação constitucional deste direito.
O Estatuto do Trabalho Nacional dispõe no seu artigo 46.º que os serviços de colocação dos trabalhadores são normalmente da iniciativa dos organismos corporativos, em especial dos sindicatos. Assegurou ao mesmo tempo às empresas a liberdade de escolha dos empregados e preceituou que, excepcionalmente, estes seriam, porém, escolhidos exclusivamente entre os que constassem das listas de colocação dos sindicatos.
O Decreto-Lei n.º 23:050 assinou aos sindicatos a obrigação de organizarem agências para colocação de profissionais.
Mais tarde, o Decreto n.º 23:712 estabeleceu a faculdade de o Subsecretário dás Corporações determinar quais as profissões relativamente às quais as entidades patronais só poderiam admitir indivíduos registados nas listas de colocação dos sindicatos. Tratava-se, evidentemente, de uma medida transitória e de emergência destinada ao combate ao desemprego.
Ao abrigo deste diploma foram proferidos dez despachos permitindo a elaboração de listas nos sindicatos e foram aprovados cinco regulamentos de colocação dos profissionais respectivos. Ao todo, portanto, quinze providências com o objectivo referido.
Pois, por melhor que fosse a intenção da lei, dos despachos e dos regulamentos e por mais vigiada que fosse a sua execução, não foi possível evitar que, mais tarde ou mais cedo, os sindicatos tendessem naquela execução para utilizar tais medidas como meio de «fechar» as profissões, quer dizer, como meio de as monopolizar em favor dos que nelas já se encontravam e em detrimento dos que, legitimamente, nelas queriam ingressar. E a tal ponto chegou a má execução, e tão completa foi a prova de que, no estado actual da organização, não era possível dominar a tendência e os seus efeitos, que foi necessário abandonar o sistema das listas de colocação.
Hoje só existe uma, a qual não tem dado os maus resultados das outras e, pelo contrário, tem funcionado com respeito pelo espírito que a criou. Mas há mais.
Creio não estar a Assembleia esquecida de que há bem pouco tempo muitos Srs. Deputados deram aqui nota de considerar que as carteiras profissionais poderiam em certos casos trazer perigos semelhantes ao que acabei de apontar.
Também é verdade que até na execução de convenções colectivas do trabalho uma ou outra vez se tentou fechar profissões. Não tem sido pequena nem fácil a luta travada pelo próprio Instituto Nacional do Trabalho para, nestes casos e em outros casos ainda, contrariar as tentativas feitas para se vedar a entrada de novos elementos nas profissões.
Eis, portanto, exposto um aspecto do direito ao trabalho, da sua segurança, que não é indiferente: impedir que o trabalho se concentre apenas nas mãos de alguns, constituídos para o efeito em classe privilegiada.
Sr. Presidente: gostaria ainda, para demonstrar que entre nós está definido o conteúdo do direito ao trabalho, e este parcialmente integrado, de me referir aos fins do Fundo de Desemprego e à assistência dispensada aos desempregados por meio de trabalho nas obras públicas e outras ou por meio de socorros de instituições de assistência. Não seria ocioso fazê-lo, mas não me chega para o efeito o tempo regimental.
E, agora, o problema da subjectivação do direito ao trabalho. Poucas palavras para o efeito, pois me parece que não haverá necessidade de longa explanação.
Se é na organização económica e social que deve encontrar-se a sua objectivação, concluo por mim que é à sociedade, ao Estado, que pertence a obrigação correlativa. Não a obrigação de dar um emprego a cada desempregado forçado - repete-se -, mas a obrigação de estabelecer aquela organização por modo a que dela o por ela resulte distribuir-se o trabalho, normalmente, sem faltar a ninguém.
Isto não invalida que, em certos casos, o sujeito passivo do direito ao trabalho seja a família ou sejam até determinados indivíduos. São problemas que já não há tempo de expor. Recordemos, porém, que, no respeitante às obrigações individuais, há a esse respeito alguma coisa feita ou ao menos começada entre nós. Refiro-me ao imposto arrecadado por contribuição do rendimento do trabalho de cada um para o Fundo de Desemprego e destinado ao pagamento de salários na ocupação de desempregados.
Em resumo, e na tendência para uma síntese final, direi ainda, com Azpiazu:

O direito ao trabalho não supõe que o necessitado exija a uma pessoa determinada que lhe de trabalho, e só supõe um direito ao qual corresponde uma obrigação na sociedade. É exactamente o que sucede ao pobre que morre de fome. Tem direito a viver e a que a sociedade lhe dê o suficiente para a vida (e a sociedade é o conjunto de indivíduos), de modo que alguém terá de dar-lhe o que peça e necessite. Esta determinação concretiza-se na prática por vários modos.

Eis porque podemos dizer com Santo Agostinho: «quia non pavisti, occidisti».
E nem se me afigura procedente o argumento de que a um direito de alguém corresponde sempre uma obrigação certa de outrem. Não se trata de obrigação de um certo e determinado, a cumprir de maneira certa e determinada, mas de obrigação que pode ser, conforme os casos, do Estado, da sociedade ou de particulares, a satisfazer mediante o estabelecimento de uma organização económica e social que normalmente a todos, permita encontrar trabalho ou que socorra na falta deste.
Não se argumente também que o direito ao trabalho é atentatório do direito de propriedade. A afirmação só seria procedente se um ou outro fosse direito absoluto. Mostrámos que não o era o direito ao trabalho, até em face da nossa legislação. Lembremos que o de propriedade também não o é em face dos nossos princípios, da nossa doutrina e da nossa lei, entre o mais porque estas lhe prescrevem uma função social.

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Concorda-se, portanto, em que o direito ao trabalho tem Emites, entro outros, no direito de propriedade exercido com o sentido o respeito daquela função social.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Tudo o que acaba de dizer-se só pode levar-nos à conclusão de a obrigação correspondente ao direito ao trabalho ser disjuntiva quanto á sua subjectivação e quanto a sua objectivação. Não se trata de uma obrigação de justiça comulativa, mas sim de uma obrigação de justiça social, da qual resulta, portanto, uma obrigação de justiça legal.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: chegado a este ponto, confesso reconhecer que foi má a minha explicação, mas VV. Ex.ªs hão-de suprir a sua deficiência, entendendo melhor a expressão "direito ao trabalho", mas "direito ao trabalho nos termos que a lei prescrever".
E acrescentarei que, se defendo a inclusão constitucional do direito ao trabalho, não é pelo "mero platonismo" , a que aludo o parecer da Câmara, Corporativa, mas sim por convicção doutrinária, determinação de consciência e razão de ideologia, a qual não é socialista.
Estarei em desacordo com a larga representação dos trabalhadores na Câmara Corporativa, tal como informa ainda o parecer desta. Lastimo que assim seja neste cas09 onde seria lógico seguirmos - eles e ou - por caminho comum.
Lastimo-o, mas não me afasto - e não me afasto porque tenho os olhos postos naquilo que considero seus direitos justos, o que quer dizer olhos postos em deveres que mo obrigam como Deputado da Nação.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para um pequeno esclarecimento.
A proposta de alteração apresentada pela Comissão de Legislação e Redacção à proposta do Governo dá, segundo creio, satisfação ao sugerido por uma parte do parecer da Câmara Corporativa - aquela parte na qual se entendo que não devem aparem juntos no mesmo número o direito á vida e integridade pessoal e o direito ao trabalho.
Dispenso-me de dizer as razões que, além das produzidas pela Câmara Corporativa, levaram a Comissão de Legislação o Redacção a proceder deste modo.
Na outra parte, como se vê, a Comissão não se convenceu com as razões produzidas pela Câmara Corporativa no sentido de eliminar a proposta do Governo e não admitir, portanto, que na Constituição se consignasse o principio do direito ao trabalho.
Quem tiver lido com o cuidado com que a Comissão de Legislação o Redacção leu o parecer da Câmara Corporativa logo verifica que nesse parecer o que se condena propriamente não é propriamente a consagração do direito ao trabalho, mas os conteúdos de que se tem pretendido encher esse direito.
Condenou-se o princípio do direito ao trabalho com o sentido de obrigação positiva, por parte do Estado, de dar trabalho ou o equivalente a trabalho a quem o não encontrar.
Critica-se ainda uma outra noção que tem sido dada de direito ao trabalho; direito ao produto integral do trabalho, fazendo tábua rasa do capital, da propriedade, etc. E porque á fórmula ""direito ao trabalho" tem sido atribuídos estes conteúdos, entendeu-se que na Constituição não devia afirmar-se o direito ao trabalho.
Ora basta ler, segundo creio, mesmo sem relatório, a fórmula sugerida pelo Governo para se verificar desde logo que não é com nenhum destes conteúdos que se pretendo fazer inscrever na Constituição o direito ao trabalho.
Efectivamente, na proposta do Governo fala-se de o direito ao trabalho nos termos que a lei prescrevera.
E se se diz "direito ao trabalho nos termos que a lei prescrevera, como lembrou o Sr. Deputado França Vigon, isso logo mostra que se não pretendo dar a esta fórmula qualquer dos conteúdos apontados.
Porque terá então o Governo caminhado no sentido de fazer inscrever na Constituição o princípio do direito ao trabalho nos termos que a lei prescrever?
Também dos apontamentos feitos pelo Sr. Deputado França Vigon se podem colher as razões que hão-de ter conduzido a isto: é sabido que, não obstante no Estatuto do Trabalho Nacional estar consagrado, em determinados termos, o principio do direito ao trabalho, não há dúvida que nalguns casos se tem procurado fechar as profissões, não devido a qualquer lei, mas sim mediante regulamentos o despachos.
0 que se terá pretendido então com esta &posição constitucional? Isto: reconhecer o direito ao trabalho e afirmar que esse direito não pode ser enfraquecido, não pode ser modificado senão por lei e nunca por despacho ou regulamento:

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Entendeu a Comissão que devia ter sido neste ambiente que o Governo se decidira a inserir o direito ao trabalho na proposta que apresentou à Assembleia, decerto depois de terem sido considerados todos os aspectos que a Câmara Corporativa considera no seu parecer. E porque o foram, não se limitou a propor, para o simplesmente, "o direito ao trabalho", mas sim direito ao trabalho nos termos que a lei prescrever".
Não quis o Governo enveredar pelo terreno da constituição soviética, que, ao contrário do que se diz no parecer da Câmara Corporativa, nos artigos 118.º o 120.º, expressamente consagra o direito ao trabalho como direito de exigir uma prestação positiva por parte do Estado.
Não foi nessa orientação que o Governo caminhou para propor que na Constituição se inscrevesse o direito ao trabalho nos termos que a lei prescrever.
Dispenso-me de mostrar que a formulação como está feita na proposta do Governo é mais adequada, mais perfeita do que a de "liberdade de trabalho", ou mesmo "direito de trabalhar", que originariam criticas mais procedentes do que a fórmula utilizada na proposta do Governo e que a Comissão de Legislação e Redacção perfilha.

Vozes:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vai votar-se a proposta da Comissão de Legislação e Redacção, que substitui o texto do artigo 5.º da proposta de lei, nos termos em que já foi dado conhecimento à Câmara.

Submetida á votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente:- Bati em discussão o artigo 6.º da proposta de lei, que visa à substituição do artigo 9.º da Constituição.
Sobre este artigo há na Mesa uma proposta da Comissão de Redacção para que seja adoptado o texto sugerido pela Câmara Corporativa.

O Sr. Carlos Moreira: - Sr. Presidente: da redacção que apresenta o artigo 6.º da proposta do Governo verifico, pelo menos, uma aparente disparidade entre a primeira e a segunda partes do mesmo artigo.

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Na primeira é conferido este justo direito a qualquer empregado do Estado das autarquias locais, dos organismos corporativos e de coordenação económica e das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa ou de companhias que com uns ou outros tenham contrato.
Na segunda é também garantido este direito aos empregados o assalariados dos quadros permanentes das empresas privadas.
Ora, Sr. Presidente, ou a palavra "empregado", na primeira parte do artigo, reúne em si também a qualidade de assalariado dos quadros permanentes, e então estaria certo ou não reúne, e ficariam os empregados das empresas privadas numa situação superior à dos empregados do Estado, o que não deve ser de maneira nenhuma.
Todavia, parece-me que não estará muito rigorosamente compreendida, na primeira parte, a situação dos assalariados permanentes do Estado.
Nestas condições, se V. Ex.ª me permito, Sr. Presidente, eu desejaria ouvir a este respeito a opinião do Sr. Presidente da Comissão de Legislação o Redacção.
Tenho dito.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: quando se mencionou, na primeira parte, a palavra "empregado", quis-se significar tanto o empregado propriamente dito, como o assalariado dos quadros permanentes.
Não há, pois, divergência, no sentido apontado, entre a primeira e a segunda parte do artigo.
No entanto, a Comissão de Legislação e Redacção resolveu propor a substituição do texto do artigo 6.º da proposta do Governo pela redacção sugerida pela Câmara Corporativa, pois entendeu que o direito mencionado na proposta do Governo deveria também ser assegurado aos que estão impedidos de exercer o seu cargo
por motivo de estarem ocupados na defesa civil do território.
Por esta razão, essencialmente, é que se adoptou a fórmula sugerida pela Câmara Corporativa.
Devo acrescentar, para completo esclarecimento da Assembleia, visto que não tenciono voltar a usar da palavra sobre este artigo, a não ser que V. Ex.ª Sr. Dr. Carlos Moreira, ou qualquer outro Sr. Deputado, queiram mais explicações, devo acrescentar, repito, que quando se diz na proposta da Câmara Corporativa "emprego permanente", a Comissão entendeu tratar-se de emprego em quadros permanentes.
A questão esclarece-se assim: há empresas que têm determinados quadros de pessoal, mas que, em certos momentos de mais actividade, podem ir buscar pessoal
eventual.
É isto a que a Comissão se quis referir, mesmo quando a Câmara Corporativa fala em emprego permanente: assalariados dos quadros permanentes do Estado ou em'
presas particulares, usando-se esta palavra "empresa" no sentido bastante aproximado do sentido técnico da palavra "empresa".
Quero eu significar que a disposição não se aplicará, por exemplo, aos assalariados da vida agrícola, mesmo se trate de cargos permanentes, como feitor ou criado.
No que se pensou foi nos empregados ou assalariados do Estado, das autarquias ou dos serviços que ocupam lugares de quadros permanentes, ou nos empregados ou
assalariados de empresas que ocupam lugares de quadros permanentes.
Tenho dito.

O Sr. Carlos Moreira: - Agradeço muito ao Sr. Deputado Mário de Figueiredo as explicações que acaba de me dar o permita S. Ex.ª apenas umas ligeiras considerações.
A minha dúvida surgiu precisamente em relação à redacção do artigo da proposta do Governo. A mesma dúvida já não se apresenta com a mesma latitude em relação às emendas da Câmara Corporativa.
Todavia, dentro da redacção dada ao artigo 9.º ou continuo a recear que, a ser aprovada tal como está, surjam as dúvidas a que já me referi.
Parece-me que não se adoptando na primeira e segunda partes a mesma terminologia, poder-se-ia ser levado a concluir que na primeira parte não se quis conferir o direito aos assalariados dos quadros permanentes do Estado.
Foi esta a razão que ma levou a usar da palavra para esclarecimento deste ponto.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Carlos Borges: - Sr. Presidente: breves considerações acerca das dúvidas que me sugeriram a proposta do Governo e a da Câmara Corporativa.
Na proposta da Câmara Corporativa não se fala em quadros permanentes. Diz-se que ninguém pode ser prejudicado na sua colocação ou emprego permanente por virtude da obrigação de prestar serviço militar.
Não se fala aqui em "quadros", fala-se em "emprego permanente" e depois não se definem as empresas...
Não se sabe, como disse o Sr. Deputado Mário de Figueiredo, se os empregados permanentes de uma empresa de exploração agrícola estão abrangidos por esta disposição. Tudo está no vago.
Não vejo maneira de discriminar e de fixar quais silo os empregados que beneficiam desta disposição do artigo 9.º tal como é proposto pela Câmara Corporativa.
Se a redacção da proposta do Governo é insuficiente, no entanto é mais completa o clara do que a da proposta da Câmara Corporativa.
No entanto devo dizer que nem uma nem outra esclarecem as minhas dúvidas e deixam inteiramente fluida qualquer determinação das entidades que tem a obrigação e manter os seus empregados no caso de serem chamados para prestar serviço militar. Não tenho capacidade para organizar um texto melhor, mas nem um nem outro são perfeitos. Em todo o caso parece-me melhor o da proposta do Governo.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra, vai passar-se à votação.
Vai votar-se a proposta da Comissão de Legislação o Redacção que perfilhou a substituição do artigo 9.º da Constituição vigente pelo texto sugerido pela Câmara Corporativa.

Submetida á votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 7.º da proposta de lei, a que se refere o artigo 25.º da actual constituição.

O Sr. Mário de Figueiredo:- Sr. Presidente: é só para esclarecer a Assembleia sobre as razões por que neste caso a Comissão de Legislação e Redacção não perfilha a solução do parecer da Câmara Corporativa, muito embora reconheça que nesse parecer há uma critica precedente a essa proposta; mas é tão precedente para esta proposta como para o texto actual da Constituição, cujo sentido nunca foi posto em dúvida. De resto, a sugestão da Câmara Corporativa é paralela da solução

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da proposta do Governo, e, como esta se aproxima muito mais do texto da Constituição vigente, seguindo a própria orientação geral da Câmara Corporativa, que diz que, quanto possível, se não deve tocar no actual texto, a Comissão entendeu dever manter o texto proposto pelo Governo.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra, vai votar-se o artigo 7.º da proposta de lei tal como consta na proposta do
Governo.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente:- Está em discussão o artigo 8.º da proposta de lei.

O Sr. Mário de Figueiredo:- Sr. Presidente: quero apenas esclarecer a Assembleia sobre as razoes que d1terminaram a Comissão de Legislação e Redacção a manter a solução da proposta do Governo.
0 parecer da Câmara Corporativa não é nesse sentido, mas sim no sentido de se manter o preceito constitucional nos mesmos termos em que vigora.
Segundo este preceito constitucional, os litígios que se referem às relações colectivas do trabalho são da competência de tribunal especial.
Portanto, por força da disposição constitucional, os litígios que se referem às relações colectivas do trabalho hão-de ser julgados por tribunais especiais. Também, mas não por virtude de disposição constitucional, ode ser julgados por tribunais especiais todos os litígios emergentes de contratos de trabalho, ou sejam coutrato5 colectivos ou sejam contratos individuais.
0 problema, portanto, é o seguinte: deve manter-se como obrigação constitucional que só os litígios que se referem às relações colectivas de trabalho hajam de ser julgados por tribunais especiais, ou deve alargar-se este, preceito por Maneira que também todos os litígios emergentes de contratos individuais de trabalho devem ser também julgados por tribunais especiais?
É a questão.
Que uns o outros podem sê-lo não há dúvida nenhuma; é o sistema vigente.
0 que se discute, portanto, é se deve deixar-me a possibilidade de os litígios emergentes de contratos individuais de contrato serem julgados amanhã, por força de lei ordinária, por tribunais ordinários.
E, posta a questão assim, pergunto: se há uma magistratura, se há tribunais especializados para julgarem as relações do trabalho, não é razoável que, constitucionalmente, se disponha que sejam esses tribunais especiais os competentes para julgarem todas as questões emergentes de contratos de
trabalho, quer se refiram às relações colectivas, quer às relações individuais do trabalho? lato é a questão.
0 Governo entendo que a boa solução é de que uns e outros deverão ser julgados por tribunais especiais, por disposição constitucional, e a Comissão de Legislação o Redacção entendeu também ser esta a boa solução. No regime da lei ordinária é já a vigente.
Tenho dito.

Vozes:- Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai votar-se o artigo 8.º da proposta de lei, dando nova redacção ao artigo 38.º da Constituição vigente.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 9.º da proposta de lei. Por este artigo os artigos 45.º e 46.º da Constituição vigente passam a ter a redacção contanto da proposta de lei. Sobre estes artigos há na Mesa uma proposta apresentada pelo Sr. Deputado Manuel Domingues Basto e outros Srs. Deputados, e outra da Comissão de Legislação e Redacção, que a Assembleia já conhece.
Estão em discussão.

O Sr. Dinis de Fonseca: - Sr. Presidente: o artigo 9.º da proposta versa o melindroso problema das Te es entre a Igreja e o Estado. Durante os últimos cinquenta anos - a que chamaremos a nossa história contemporânea - podemos verificar nessas relações quatro regimes de facto:

a) 0 da velha Carta Constitucional de 1826, que declarava a religião católica apostólica romana como religião oficial da Nação, mantendo o Estado com a Igreja, teoricamente, um regime chamado de união moral, mas que, praticamente, se traduzia na sujeição á supremacia do poder civil, através da dependência económica, da interferência doutrina] do beneplácito, da confusão jurisdicional do patronato e de outras cadeias mais ou menos pesadas;
b) A revolução política de 1910 substituiu este regime penoso por outro chamado de separação, praticamente convertido em regime de expoliação, com garras e colmilhos, e de agressiva laicização... isto é, de separação entre a Igreja e a própria vida social da Nação... ;
c) Por decretos de 1918 e de 1926, foi esta separação, laicizadora e agressiva, convertida numa separação que poderemos adjectivar de tolerante ... ;
d) Finalmente, pela Constituição de 1933 e Concordata de 1940, este regime, mantendo embora a imperfeição da sua expressão jurídica, converteu-se, tanto na prática como na intenção política, manifestada em vários documentos públicos, e nomeadamente no discurso proferido nesta Assembleia pelo Sr. Presidente ao Conselho em 25 de Maio de 1940 em separação jurisdicional e colaborante, com harmonia e concórdia nos assuntos de interesse comum.

Foi este regime que a proposta em discussão pretendeu aperfeiçoar na sua expressão jurídica. É incontestável a superioridade do texto proposto pelo Governo sobre o que constava da Constituição. Foi, porém, julgado ainda imperfeito e, no intuito de o melhorar, foram apresentadas ou sugeridas várias alterações.
0 douto parecer da Câmara Corporativa, de harmonia com o seu critério sobre revisão constitucional, que julga preferível a fixidez de um texto aleijado ao aperfeiçoamento derivado duma alteração, opinou pela manutenção do artigo 45.º, sugerindo uma nova redacção para o 46.º Permito-me discordar deste critério de imobilismo constitucional.
Uma coisa são os princípios, outra o aperfeiçoamento da sua expressão e o próprio desenvolvimento do seu conteúdo. 0 critério de maior fixidez do texto constitucional ajustava-se às constituições abstractas do século XIX, mas não às instituições programáticas e vivas do século XX, que terão de acompanhar a elaboração criadora e de fortalecer o aperfeiçoamento progressivo

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das instituições políticas destinadas a presidir a nova época do Mundo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ter receio ao que o evoluir dos princípios ou o aperfeiçoamento da sua expressão lha altere a essência equivale a temer que uma árvore mudo a sua natureza, porque a seiva viva lhe robustece 6 tronco ou lha faz crescer e multiplicar os ramos...
E concluo este símile e parêntese afirmando que a natureza das constituições políticas pode bem comparar-se à das árvores de grande porte - só deixam ao crescer, de melhorar e de dar frutos quando a sua seiva está morta!... E a seiva das constituições políticas são os grandes princípios orientadores, que é preciso renovar sempre nos espíritos e incarnar cada vez melhor nas instituições.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas continuemos a análise das propostas e sugestões.
A secção de Interesses espirituais e murais da Câmara Corporativa, concordando em parte com a proposta do Governo, sugeriu as alterações e aditamentos que constam da conclusão do seu autorizado parecer. E com esta coincidem outras sugestões e propostas de substituição contendo alterações mais ou menos profundos ao texto da proposta governamental.
Quanto ao artigo 46.º é, a meu ver, mais perfeito e compreensivo das realidades nacionais o texto proposto pela Comissão de Redacção, a que tenho a honra de pertencer.
Este texto é já conhecido de VV. Ex.ªs pela sua publicação no Diário das Sessões n.º 97.
Não se ocupa o artigo 46.º propriamente das relações entro a Igreja e o Estado, mas das relações entre as várias confissões religiosas praticadas no território português e a soberania social da Nação.
Acentuarei que esta soberania nada tem com a chamada soberania do povo, manifestada através ao manobras eleitorais; a soberania social da Nação é constituída pelo valor e força dos seus elementos estruturais, pelo valor e força das suas instituições - famílias, autarquias, corporações- e, essencialmente, pela união moral dos portugueses. Tudo o que enfraquece esta união moral enfraquece ou quebranta a soberania socáa1 da Nação, e é sobre esta que assenta a unidade jurídica o política, a força do Estado, ou, digamos, a soberania política da Nação.
Abstraindo, neste momento, do valor transcendente das crenças religiosas para encarar apenas o seu valor sociológico, não pode contestar-se que a crença religiosa constitui um dos mais poderosos factores de sociabilidade e de união moral. Unem-se mais facilmente e mais fortemente os que professam a mesma crença; dividem-se, opõem-se ou porfiam entre si os que professam crenças diversas.
É a lição da História. Daqui poderemos concluir que a existência de uma religião professada pela grande maioria de uma nação constitui poderoso factor da sua união moral, como a existência de muitas e diversas crenças constitui motivo para a sua mais fácil desunião e consequente enfraquecimento social e moral.
Interessa, portanto, à soberania social e é união jurídica e política, que naquela tomem assento, a possível unidade de crenças e não a sua multiplicidade
Mas este legítimo interesse nacional não pode excluir ou negar a liberdade de consciência e de culto, que constitui um dos fundamentos de toda a verdadeira civilização.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na mais pura doutrina católica a crença política a crença religiosa tem de ser obsequio rationale, uma adesão nacional, um fruto de livre persuasão, fora da qual não poderá nunca conceber-se verdadeiro culto religioso, mas apenas uma homenagem de hipocrisia ao mesmo tempo indigna de Deus e aviltadora da consciência humana.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas não confundamos ainda uma ampla e sincera liberdade de consciência e de culto com o fácil abuso dos rótulos religiosos para fins inconfessados, ou para invasões de terra alheia com o fim de provocar desmoronamentos interiores da unidade e da soberania social de uma nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Seria fechar os olhos ás realidades do nosso tempo desconhecer que as invasões da ateocracia comunista, cujo imperialismo pretende impor-se pela violência á terra inteira, se fazem hoje sob os rótulos mais diversos, sem excluir os religiosos. Ninguém ignora que os carrascos do cardeal Midzenty se converteram ao mesmo tempo em promotores de ...acção católica, para á sombra dessa bandeira desmoronarem a soberania social da Eslováquia ou da Polónia, como não hesitarão amanhã em apoderar-se do rótulo de qualquer seita para desmoronarem para a soberania social de qualquer outra nação cuja unidade e força julguem indispensável destruir.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ninguém ignora ainda -porque as agências internacionais o espalharam - que alguns chefes de seitas religiosas não desdenham obter condecorações russas em recompensa da sua adesão ou simpatia pelo novo cesaro-papismo moscovita!
Mas tudo isto, não passa ainda de um dos aspectos da desordem intelectual, porque há outros que lavram mais fundo.
A união moral de um povo não assenta apenas em factores religiosos, ruas num conjunto de conceitos e de verdades filosóficas sociais e morais, aceites por todos como indiscutíveis.
Tais exemplo: o amor das tradições nacionais, a honestidade natural, o respeito pela dignidade humana, a noção do dever moral, o conceito de justiça e tantos outros. Se consentirmos, porém, quer sob o rótulo religioso, quer sob um rótulo de pseudociência ou ao arte, a invasão de uma anarquia intelectual - ou moral, em que essas noções e conceitos fundamentais percam o seu valor comum até mudarem de sentido, como poderá subsistir a unidade moral da Nação? Se, ao falarmos em honestidade, em dever ou em justiça, cada qual der a umas palavras sentidos não, só diversos, mas opostos, a união moral e a própria unidade jurídica tornar-se-ão desde logo manifestamente impossível.
São estes assaltos demolidores que a nova redacção dada á proposta de substituição do artigo 46.º, pretende e a meu ver legitimamente, evitar ou impedir, e, por isso merecem o meu inteiro acordo e dar-lhe-ei o meu voto sem restrições.
Sr. Presidente: vejamos agora pelo que toca à redacção proposta para o artigo 45.º
Das várias sugestões e propostas surgiu como texto conciliador e apresentado pela Comissão de Redacção. Perante ele põe-se naturalmente esta pergunta: será o texto sugerido pela Comissão aceitável à face do ideal doutrinário?

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A resposta depende, como é óbvio, de uma noção precisa desse ideal. Como alcançá-la?
O problema das relações entre o Estado e a Igreja Católica, ou entre os dois poderes, religioso e secular, pode dizer-se crucial na história da civilização cristã.
A primeira dificuldade que ele levanta é obter a seu respeito ideias precisas e claras. Não as poderá ter quem não distinguir cautelosamente o ideal doutrinário da expressão jurídica, que foi encontrando nos textos das leis ou das convenções, e bem assim das realidades que vieram a corresponder-lhe na vida pública dás nações a que as mesmas leis ou convenções diziam respeito.
Se os textos jurídicos muita vez ficaram longe do ideal doutrinário, mais frequentemente ainda as realidades se afastaram da doutrina contida nos textos. E o próprio ideal doutrinário se viu sujeito, nos autores que dele se ocuparam, à influência de muitos interesses humanos, de correntes escolares em que uma apaixonada emulação tinha maior peso, do que a pureza da doutrina, e até algumas vezes de disputas mais preocupadas com a expressão formularia do que com a essência do seu conteúdo real.
Seria fácil provar todos estes desvios com erudito arsenal de citações, se estas não pudessem julgar-se menos acomodadas à índole desta tribuna.
Bastaria recordar as situações verificadas nos dois séculos da nossa história, decorridos de 1750 a 1950, para encontrar provas bastantes do que afirmei. Mas esta mesma retrovisão de dois séculos nos levaria muito longe, sem um grande interesse para o esclarecimento da proposta em discussão, bastando-nos para o efeito recordar os quatro regimes verificados, de facto, nos últimos cinquenta anos e a que já aludi no começo das minhas considerações.
Também não vou embrenhar-me no labirinto dos autores que se tom ocupado deste problema e, não podendo, como leigo e simples curioso nestas matérias, arrogar-
me autoridade que não possuo, limito-me a esclarecer a Assembleia com as palavras que textualmente copiei de duas memoráveis encíclicas desse grande luminar da Igreja Católica que foi o Papa Leão XIII e nas quais, a meu ver, foi condensada a fórmula doutrinal esclarecedora e decisiva deste magno problema.
Apoiados.
Em 1881 Leão XIII decidiu tomar a defesa do poder secular ou poder civil contra a insurreição social assoprada pelas seitas comunistas e anarquistas que ensaiavam por esse tempo as suas primeiras investidas.
Nesse propósito, Leão XIII afirmou, na encíclica Diuturnum, o valor social e a independência do poder civil nestes termos:

Seguramente a Igreja não pode ser suspeita aos príncipes nem odiosa aos povos. Convida aqueles a trilharem o caminho da justiça e a não se desviarem do seu dever e, por muitas razões, fortalece e sustenta a sua autoridade. Ela -a Igreja- reconhece e declara que tudo quanto respeita à ordem civil está debaixo do poder da suprema autoridade deles; nas coisas cujo julgamento, por diversas causas, pertence ao poder religioso e ao poder secular ela quer que exista um acordo, em virtude do qual se evitem muitas questões funestas para os dois poderes.

Encontra-se aqui claramente afirmada a independência e suprema autoridade do poder secular na sua esfera própria; mas, quatro anos depois, em 1885, Leão XIII versou mais directamente o problema na encíclica Imortale Dei, sobre a constituição cristã dos estados.

Nesta se lê o seguinte:

Deus dividiu o governo do género humano em dois poderes: o poder eclesiástico e o poder civil; o primeiro para as coisas divinas, o segundo para as coisas humanas. Cada um deles no seu género é soberano; cada um se contém nos limites perfeitamente determinados e traçados em conformidade com a sua natureza e com o seu fim especial. Há, pois, como que uma esfera circunscrita em que cada um exerce a sua acção por direito próprio ...

Afirma-se, portanto, neste passo a soberania dos dois poderes e a circunscrição ou separação das duas esferas, em que cada um deles exerce a sua acção por direito próprio.
Há, porém, uma terceira esfera: a das coisas ou questões mistas, em que -diz ainda Leão XIII- «uma e a mesma coisa, ainda que com um título e razão diferente, mas sempre uma e a mesma coisa, esteja sujeita à jurisdição e ao juízo de um e outro poder».
Qual deve ser nesta terceira esfera o sistema de relações? O de concórdia entre os dois poderes. Mas concórdia estabelecida por que meios?
Leão XIII prevê dois: um, em que a destrinça da jurisdição atribuível a cada um dos dois poderes se faria atendendo em cada caso u natureza e ao fim das coisas humanas em causa, competindo à jurisdição da Igreja tudo que nelas respeitar à salvação das almas e ao culto de Deus, pois «enquanto às outras coisas - palavras da encíclica-, de que a ordem civil e política trata, é justo que fiquem sujeitas à autoridade civil, porque Jesus Cristo ordenou se desse a César o que é de César e a Deus o que é de Deus».
Um outro modo previsto por Leão XIII de assegurar a concórdia e garantir a paz e a liberdade na esfera das coisas mistas é o de acordos ou tratados entre os Chefes de Estado e os Soberanos Pontífices sobre qualquer ponto particular.
Foi este o modo a que Pio XI veio a dar preferência, através das treze concordatas concluídas durante o seu glorioso pontificado, e o adoptado pelo Estado Novo pela Concordata de 1940, entre o Chefe do Estado e Pio XII.
Afastam-se, pois, do ideal doutrinário, claramente indicado por Leão XIII, tanto o cesaro-papismo das velhas monarquias absolutas, como o regalismo opressor da nassa velha Carta Constitucional, como a separação laicizadora de 1911, como qualquer ideia de condenável ou abusivo clericalismo ...
Se a separação laicizadora de 1911 foi expressamente condenada por Pio X, à face da doutrina, são igualmente condenáveis o cesaro-papismo e o regalismo, que a Igreja tolerou, mas jamais puderam merecer a sua aprovação.
E a fórmula «união moral» que se lê nos autores antigos não pode nem deve entender-se no sentido de confusão de poderes ou de esferas de acção; não é união nos meios, mas nos fins, enquanto os dois poderes, independentes e agindo por direito próprio nas respectivas esferas, colaboram para o bem comum dos componentes de uma sociedade ou nação.
O que a doutrina condena é uma separação agressiva, a separação laicizadora ou meramente tolerante de uma Igreja encadeada, mas não a separação de poderes e de esferas de acção, a separação concordatária e colaborante. Esta pode praticamente aproximar-se, mais do que qualquer outra, do ideal doutrinário.
Como disse há pouco, importa distinguir cautelosamente a expressão jurídica de um regime das realidades que lhe correspondem, e não tenho dúvidas em afirmar

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que as realidades portuguesas de 1951, sob um regime de separação, são incontestavelmente superiores às que a Igreja tolerou no regime da velha Carta, rotulado de união moral!

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- E porque assim é, toda a discussão se resume em saber se a fórmula jurídica da proposta para o texto do artigo 45.º em discussão exprime ou não perfeitamente as realidades e o ideal doutrinário.
Embora o meu modo de ver se una ao daqueles que julgam ainda imperfeita a fórmula proposta para este artigo 45.º, não duvidei considerá-la aceitável em face do seu contexto e das realidades que a esclarecem como separação jurisdicional e colaborante e, neste sentido, inteiramente admissível em face do ideal doutrinário.
Sr. Presidente: direi ainda uma palavra de esclarecimento sobre as sugestões aqui apresentadas de aditamento ao texto deste artigo de uma afirmação clara e solene dos direitos de Deus.
Esta ideia foi defendida com grande brilho por alguns Srs. Deputados, entre eles, com notável elegância, pelo meu velho amigo e condiscípulo Mons. Santos Carreto e com tal viveza de sentimento pela nossa ilustre colega D. Maria Leonor Correia Botelho que não podia deixar de impressionar quantos, como eu, tiveram a dita de nascer de mães cristãs ... Longe de mim negar o valor dessa sugestão, mas, sem ofensa, para ninguém, considero tecnicamente discutível se era neste artigo que essa afirmação teria melhor cabimento.
Considero ainda injusto acusar a Constituição Portuguesa por dela não constar essa afirmação solene e explícita, que era de uso constar do preâmbulo das velhas constituições.
Se não fora fastidioso para esta Assembleia, ser-me-ia fácil demonstrar que a afirmação da existência de Deus se contém implicitamente em vários artigos, incluída na expressão técnico-jurídica que é própria de um documento desta natureza; e creio ainda não ser destituído de fundo e de lógica sustentar que, constando a invocação, da Santíssima Trindade bem explicitamente do texto da Concordata de 1940, e sendo esta confirmada por este mesmo artigo 45.º, dele ficará constando em boa verdade o que, certamente de forma mais explícita, mas com técnica jurídica mais discutível, nele se pretendia introduzir de novo ...
Eis, Sr. Presidente, o meu simples e desautorizado modo de ver. Sei bem que me faltam para versar este problema as altas qualidades que exornam outros elementos desta Assembleia (não apoiados), e por isso - e para concluir - peço licença para chamar neste momento em meu socorro um dos meus incontestáveis defeitos: o de já ser velho ...
Dobrei há muito o cume da minha existência, em que jamais deixei de batalhar ... Dessas velhas lutas seja-me lícito recordar nesta hora um projecto de lei que há vinte e nove anos tive a honra, com outros Deputados, de subscrever e enviar para essa Mesa, no velho Parlamento.
Modesto projecto de lei, que visava apenas um singelo reconhecimento da personalidade jurídica da Igreja! E que tamanha tempestade desencadeou nesta sala! Ao reler há dias os mesquinhos pareceres das comissões que sobre ele recaíram e o inflamado ataque, feito na sessão de 10 de Março de 1922, pelo ilustre magistrado e leader do velho partido democrático Dr. Almeida Ribeiro, que proclamava a necessidade de defender a soberania da Nação contra o poder absorvente de Roma, não pude deixar de sentir e de agradecer a Deus e aos chefes do Estado Novo a diferença entre esse modesto projecto, e esta proposta constitucional ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Permitam os que têm diante de si longos anos para alcançarem mais brilhantes vitórias que nós, os que vivemos a dureza dos amos e das lutas do último meio século, sintamos nesta hora um, pouco de emoção vendo que não foram inteiramente baldados os nossos esforços e canseiras de tão longos anos ...
Quanto àqueles que há trinta anos injustamente nos combatiam, quero admitir que muitos terão evolucionado nas suas ideias, perante as catástrofes que humilharam a altivez ou desfizeram as ilusões dos maiores poderios humanos ...
Seja como for, ninguém ousará contestar que sobre a vetusta cúpula de S. Pedro se cruzam de novo os clarões que iluminam as estradas do futuro, levando às nações inquietas e perturbadas o alento e a esperança de que já absolutamente carecem para poderem subsistir e defender-se da onda negra do asiatismo que implacavelmente as ameaça ...
E, se fitarmos o nosso próprio rumo, havemos de reconhecer que, tendo firmado a nossa independência a batalhar sob as bênçãos da Igreja contra o império embravecido dos agarenos, só poderemos subsistir, como nação, retomando a missão de cruzados contra as forcas da ateocracia comunista, que intentam afogar o que resta de vida e de liberdade cristã nesta Europa enfraquecida e devastada pelos seus próprios erros.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É por isso, Sr. Presidente, que eu desejaria ver à volta do texto conciliador desta proposta, mais do que a sua fácil aprovação, uma afirmação colectiva e solene do fervor patriótico que nos criou e da fera intransigência que nos tem mantido cristãos e portugueses, ao longo destes oito séculos de tão acidentada como gloriosa história.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Carlos Moreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados : poucas palavras, que, aliás, deveriam ser ditas muito melhor e com mais autoridade pelo nosso ilustre colega Deputado P.e Manuel Domingues Basto.
Mas como, já aqui nesta sessão, tivemos conhecimento de que S. Ex.ª se encontra doente, quero neste momento desejar-lhe as mais rápidas melhoras e dizer a VV. Ex.ªs que é apenas devido à doença daquele nosso ilustre colega e à circunstância de ter sido eu o primeiro Deputado que a seguir a S. Ex.ª subscreveu a proposta que está na Mesa que me permito tomar uns minutos e abusar da atenção de V. Ex.ª Sr. Presidente, e da Câmara.

Vozes: - Não apoiado!

O Orador:- A proposta de alteração que tive a honra de subscrever, com outros ilustres Deputados, ao artigo 9.º da proposta do Governo, de substituição dos artigos 45.º e 46.º da Constituição, teve duas razões fundamentais: primeira, a ideia de que se consagrasse o Santo Nome de Deus na Constituição Política da Nação Portuguesa, e isto não só porque já estava nas aspirações do País, mas ainda porque essas aspirações aqui tão brilhantemente se afirmaram e tiveram grande eco através

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de diversos oradores, dos quais destacarei, como o fez o ilustre Deputado Dr. Dinis da Fonseca, o Sr. Cónego Santos Carreto, a Sr.ª D. Maria Leonor Correia Botelho E o Sr. P.e Manuel Domingues Basto.
Ouvi, como todos VV. Ex.ªs, com o agrado com que sempre se ouve, o Sr. Deputado Dinis da Fonseca.
Permito-me, porém, discordar da enunciação das razões que S. Ex.ª aqui apresentou, especialmente no momento em que disse que não seria naquele local para a hipótese mesmo de ter de se consagrar o Santo Nome ao Deus que ficaria melhor.
Concedamos que não ficaria melhor, mas fica bem, porque o nome de Deus fica sempre bem na Constituição Política da Nação.
Passemos á segunda razão.
Eu sei - é uma verdade aceite por todos - que é preferível mil vezes o regime concordatário, como o que tem vindo funcionando em Portugal entre a Igreja Católica e o Estado, ao regime que dominou no período liberal. Mas alo quero fazer confrontos. Pretende-se com esta proposta de alteração estabelecer um regime de uma moral entre a Igreja e o Estado, com uma completa independência económica e administrativa.
Deseja-se que seja dado a César o que é de César e a Deus o que é de Deus. As esferas de actuação são diferentes, mas no campo espiritual não pode haver interferência do Estado. É uma união moral entre a Igreja e o Estado, porque o próprio Estado deve querer e reconhecer a acção da Igreja nos domínios do ensino, da caridade, da moral o noutros aspectos, como, aliás, já se reconhece na actual Constituição.
Pretendo, assim, que o nome de Deus fique consagrado no diploma fundamental da Nação.

Vozes:- Muito bem, muito bem!

O Orador: - Outro problema é o das relações entro o Estado e a Igreja.
O Sr. Dr. Dinis da Fonseca, com a barragem de conhecimentos que possui e com os elementos que eu não tenho, mesmo pelo inesperado da minha intervenção,
expôs-nos claramente qual ora o sentido da doutrinação enunciada nas encíclicas de Leão XIII e Pio X. É evidente que nessas encíclicas, como em outras, se marca
nitidamente a separação entre os dois poderes. Mas uma coisa são esferas de actuação, outra o regime jurídico que regula as relações entre os dois poderes. Essas relações, em regime jurídico de separação, são em princípio condenadas pelos pontífice.
Pode dizer-se que aceitaram esse regime perante a pressão das circunstâncias que obrigaram a Igreja a curvar-se à necessidade de defender aqueles direitos fundamentais para todos os seus agremiados, mas não pode daí concluir-se que não foram condenados expressamente tais regimes nas encíclicas a que me referi.
É certo que, na prática, o regime de separação é diferente, consoante o animo daqueles que têm 4e executá-lo.
Há o regime de separação ad odium e o regime de separação colaborante, mas isso não significa que acima desses regimes não haja outro que constitua uma expressão meia fiel das relações entre o Estado o a Igreja.
Julgo que os factos é que fazem os regimes e não são os regimes que criam os factos.

vozes: - Muito bem!

O orador: - Em Portugal, de facto, existe uma união moral que desejaríamos traduzir constitucionalmente.
Enteado que alo vamos contra a proposta do Governo nem contra a proposta apresentada pela ilustro Comissão de Legislação e Redacção. Vamos um pouco além dessas propostas.
Podemos e queremos ir, ou não podemos ou não queremos ir ?
Por mim, entendo que queremos, podemos e devemos incluir o nome de Deus na Constituição e dar significado constitucional a um regime de união moral entro a Igreja e o Estado e de independência na sua orgânica administrativa e económica.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Mário de Figueiredo:- Sr. Presidente: depois do discurso proferido pelo Sr. Deputado Dinis da Fonseca, eu não mo abalançaria a usar da palavra, se não tivesse de esclarecer, para justificar a minha atitude, a reincidência numa afirmação que aqui foi feita a propósito da discussão na generalidade pelo Sr. Deputado Domingues Basto.
A reincidência na afirmação acabada de fazer pelo Sr. Deputado Carlos Moreira é a de que a separação é condenada pela Igreja.
Eu quero afirmar que, se a separação fosse condenada pela Igreja, eu que, graças a Deus, sou católico não votava a disposição.
Mas isso não foi demonstrado nem mostrado. Foi afirmado por uma pessoa com responsabilidades, especiais, porque é padre e por uma pessoa sem responsabilidades especiais porque é leigo ...

O Sr. Carlos Moreira:- V. Ex.ª dá-me licença?
Eu não disse que a separação é totalmente condenada. É condenada em principio.

O Orador:- Em princípio ... Eu sei que têm sido condenadas leis de separação. Não sei de texto que tenha condenado a separação em si mesma. E até sei que têm sido admitidas hipóteses várias de separação.
Avanço que não podem ter sentido diferente as passagens das encíclicas que foram há pouco citadas pelo Sr. Deputado Dinis da Fonseca. 0 que se condena são certas formas de separação que, no fundo, não correspondem ao próprio sentido de separação.

O Sr. Carlos Moreira:- Eu não posso, evidentemente, trazer aqui os textos das Encíclicas, mas posso indicar a V. Ex.ª o nome do autor responsável e informar que, tanto na Vehementer nos de 1906, relativo á França, como na Iamdudum ia Lusitania, de 1911, referente a Portugal, o Papa reprova não só as injustiças e arbitrariedades dos respectivos governos, mas também o próprio princípio da separação.

O Orador: - E quem é o autor?

O Sr. Carlos Moreira:- 0 trabalho é do reverendo padre António Leito o foi publicado na revista; Brotéria.

O Orador: - E o que é o próprio princípio da separação? É sobre isso que eu gostava de ser esclarecido.
Eu pergunto: é condenada a separação na ordem interna quando, ao lado dela, se instituí um regime de relações na ordem internacional com reflexos no direito interno, quero dizer, nos regimes jurídicos das duas sociedades-Igreja e Estado?
Lembro-mo com saudade dos tempos em que em Coimbra ouvi o meu saudoso professor Magalhães Colaço, no curso de confissões religiosas, discorrer sobre a matéria. Ensinava elo que o que caracteriza o regime de separação é isto: a Igreja, o serviço religioso, não constitui um serviço público. 0 que caracteriza o sistema oposto á separação é isto: a Igreja, o serviço religioso, constitui um serviço público.

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Foi isto que me ensinaram. E as coisas que nos ensinam quando a gente é novo agarram-se a nós, acompanham-nos pela vida fora e arriscamo-nos a não ser solicitados para fazer o exame critico delas para verificar se elas correspondem ou não correspondem ao que é exacto. Eu talvez nunca tenha feito o exame crítico disto que então mo foi ensinado. Guardei o ainda hoje, quando penso em separação, penso que esta consiste em a Igreja, o serviço religioso, não constituir dentro do Estado um serviço público. 0 regime oposto à separação será então aquele em que a Igreja, o serviço religioso, constitui um serviço público.
Ora se isto é assim, se esta noção é adequada, eu pergunto: na ordem interna convém à Igreja um regime diferente do regime de separação? É o mesmo que perguntar: convém que a Igreja, o serviço religioso, constitua um serviço público?
A gente conhece a história o sabe que, quando a Igreja ou o serviço religioso constitui um serviço público, uma de duas: ou se caminha no sentido do chamado "regalismo" ou se caminha no sentido do chamado "clericalismo".
É natural, se é um serviço público, há-de ser regulado e, pelo menos em certa medida, pago pelo Estado. Daí a tendência para ser dominado por ele. É o chamado regalismo ...
Apresentam-se bispos, colocam-se párocos, como se colocam administradores de concelho, etc.
Mas se não é assim, senão é o Estado que domina e que é regalista, então é porque o Estado foi absorvido pela Igreja o então passa a Igreja a dominar o Estado e estamos em pleno terreno do clericalismo.
lato quer, Sr. Presidente, dizer que realmente, pelo menos na noção que tenho de separação, não é só mais conveniente ao Estado, é mais conveniente à Igreja o regime de separação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:- 0 que a Igreja condena, isso sei ou, é um regime de separação impregnado de laicismo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas pergunto se na orientação da nossa Constituição pode dizer-se que o Estado Português é laico?
Pergunto se pode dizer-se o que diz, pela secção dos interesses espirituais, a Câmara Corporativa - ne a nossa lei constitucional não vai nisto muito além ia soviética, na qual também se consagra o principio da liberdade de cultos.
Li no parecer anexo da Câmara Corporativa, depois de se afirmar aquilo, se esclarecer que não pode haver confronto entro a situação da Igreja em Portugal e na Rússia, mas pergunto se é possível sequer, quando se está a olhar para o problema da posição da igreja em Portugal, acudir ao espírito a disposição da constituição soviética?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Apoiados.

O Orador:- É o Estado Português laico?
É ou pode entender-se que a separação é uma separação laicista?
Nos termos da Constituição, o Estado Português não é laico. 0 Estado Português declara-se sujeito aos princípios da moral e do direito.
Que moral? É pelo menos um sistema de moral heterónoma.
Que moral? Dispenso-me de ler outras disposições. Vou directamente ao artigo 43.º:
Leu.
0 Estado tem, a respeito da formação da sua mocidade, uma posição política: é que essa educação deve ser orientada pelos princípios da moral cristã.
Pode dizer-se que o Estado, que tem, de facto, e que é obrigado pelo nosso direito constitucional a ter uma atitude política de defesa da formação católica, é laico? Parece evidente que a separação a que se faz referência não é a separação imbuída de espírito laico, mas sim uma separação por que se afirma que a Igreja, na ordem interna, não constitui um serviço público.
Parece-me, assim, que não há que recear a palavra desde que o conteúdo dela é aquele que acabo de referir e que também não há que recear que o Estado Português procure invadir o domínio da consciência individual.
0 que o Estado deseja é que num ambiente de moral cristã seja formada a mocidade portuguesa, mas reconhece a família pertence orientar a educação e, a
formação e, portanto, se a família entender que há-de ser outro o caminho, o Estado não impõe o próprio sistema dentro do qual quer que se faça a formação da gente portuguesa.
Não há, pois, que ter medo da palavra!
Há que ter medo, sim, da divisão religiosa num país que, graças a Deus, percorreu séculos na mais acabada unidade cristã.
Na verdade, é preciso caminhar no sentido de se procurar evitar, como há pouco notava o Sr. Deputado Dinis da Fonseca, que alastrem formas de divisão religiosa.
Uma coisa é essa atitude política do Estado e outra é a violência exercida sobro as consciências.
Procurar evitar a divisão religiosa é uma coisa; fazer violência à consciência individual é outra. 0 problema é delicado. Entendo que neste domínio o Estado pode - o até deve - propor; mas não impor.

Vozes:- Muito bem!

O Orador: - Do que acabo de dizer resulta. naturalmente que está de harmonia com o meu modo isto de achar bem invocar-se o nome de Deus. Simplesmente uma coisa é invocar o nome de Deus, outra coisa é sujeitá-lo a uma votação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:- Eu não colaboro nisto de sujeitar o nome de Deus a uma votação!

O Sr. Carlos Moreira: - Sr. Deputado Mário de Figueiredo: apenas uma pequena nota. Não é caso único nas constituições mundiais o citar-se o nome de Deus. Ainda recentemente na Alemanha Ocidental se invocou nesse texto o nome de Deus.

O Orador: - Citou-se o nome de Deus no preâmbulo, creio.

O Sr. Carlos Moreira: - De acordo, mas foi referido.

O Orador: - Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Continua a discussão.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai votar-se.

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O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: requeiro a V. Ex.ª a prioridade de votação para a proposta apresentada pela Comissão de Legislação e Redacção.

O Sr. Presidente:- Informo. a Câmara de que há na Mesa duas propostas destinadas a substituir os artigos 45.º e 46.º da Constituição. Uma proposta é da Comissão de Legislação e Redacção, a outra é subscrita pelos Srs. Deputados Manuel Domingues Basto, Carlos Moreira e outros Srs. Deputados. A proposta destes Srs. Deputados foi apresentada em primeiro lugar; portanto só a Câmara pode decidir da prioridade requerida.
Vou, portanto, submeter à votação da Câmara o pedido de prioridade apresentado pelo Sr. Deputado Mário de Figueiredo.
Submetida à votação, foi concedida a prioridade de votação à proposta da Comissão de Legislação e redacção.

O Sr. Presidente:- Submeto agora à votação da Assembleia a proposta da Comissão de Legislação e Redacção no sentido de serem substituídos os artigos 45.º e 46.º pelos da proposta da mesma Comissão.
Submetida à votação, foi aprovada a proposta da Comissão de Legislação e Redacção.

O Sr. Presidente: - Está, portanto prejudicada a proposta do Sr. Deputado Manuel Domingues Basto e outros Srs. Deputados.
Vou encerrar a sessão. Amanhã haverá sessão, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Calheiros Lopes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Jorge Botelho Moniz.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Ricardo Malhou Durão.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Alberto Cruz.
António Júdice Bustorff da Silva.
António de Sousa da Câmara.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Boina campos.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Francisco Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
Joaquim de Oliveira Calem.
José Gualberto de Sá Carneiro.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Teófilo Duarte.
Vasco ao Campos.

0 Redactor - Luís do Avillez.

Propostas enviadas para a Mesa pela Comissão de Legislação e Redacção no decorrer da sessão, em seguimento às publicadas no "Diário das Sessões" n.º 97, de 13 de Abril, a p. 842:

7) A substituição do texto proposto no artigo 10.º da proposta pelo seguinte:

Art. 72.º 0 Chefe do Estado é o Presidente da República eleito pela Nação.
§ 1.º O Presidente é eleito por sete anos improrrogáveis, salvo o caso de acontecimentos que tornem impossível a convocação de colégios eleitorais, terminando neste caso ó mandato logo que tome posse o seu sucessor.
§ 2.º (0 texto da Constituição).
§ 3.º (0 texto da Constituição).

8) Que o texto proposto no artigo 10.º-A da proposta passe a constituir o texto do artigo 74.º como está na Constituição.
9) Que o texto proposto no artigo 11.º da proposta seja substituído pelo seguinte:

Art. 73.º (Tal como está na Constituição).
§ 1.º Não poderão propor-se ao sufrágio os candidatos que não ofereçam garantias do respeito e fidelidade aos princípios fundamentais da ordem política e social consignada na Constituição.
§ 2.º - Se o eleito for membro da Assembleia Nacional perderá o mandato.

10) A eliminação dos artigos 12.º e 13.º da proposta.
11) A substituição ao texto proposto no artigo 12.º da proposta pelo seguinte:

Art. 83.º e n.ºs 1.º e 5.º (Como constam, da proposta).
6.º Dez homens públicos de superior competência nomeados vitaliciamente pelo Chefe do Estado.

12) A substituição do texto proposto no artigo 15.º da proposta pelo seguinte:

Art. 84.º (Corpo do artigo tal como consta da proposta).
a) Decidir sobra a idoneidade dos candidatos à Presidência da República para os efeitos do disposto no § 1.º do artigo 73.º;
b) (Como consta da proposta);
c) Pronunciar-se em todas as emergências graves para a vida da Nação e sempre que o Presidente da República o julgue necessário e para tal o convoque.
§ único. 0 Conselho reunirá por direito próprio para apreciar as propostas de candidatura à Presidência da República, e às reuniões que celebrar para esse efeito não assistirá o Chefe do Estado nem conselheiro a quem alguma das propostas respeite.

13) A substituição do texto proposto no artigo 17.º proposta pelo seguinte:

Art. 85.º A Assembleia Nacional é composta de cento a vinte Deputados eleitos por sufrágio directo dos cidadãos eleitores, e o seu mandato terá a duração de quatro anos improrrogáveis, salvo o caso de acontecimentos que tornem impossível a convocação dos colégios eleitorais.
§§ 1.º a 4.º (Como estão na Constituição).

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18 DE ABRIL DE 1951 879

14) A substituição das palavras "Constitui necessariamente matéria de lei" pelas palavras sugeridas pela Câmara Corporativa "Constitui matéria da exclusiva competência da Assembleia Nacional a aprovação das bases gerais sobre:".
16) A eliminação do artigo 22.º da proposta.
16) Que no texto proposto pelo artigo 24.º da proposta para o § 3.º do artigo 102.º da Constituição as palavras "diploma legal" sejam substituídas pela palavra "lei".
17) Que no artigo 25.º da proposta, quanto à doutrina sugerida pela Câmara, Corporativa para constituir um novo § 4.º do artigo 103.º dia Constituição, seja aprovada a proposta seguinte, a inserir pela Comissão as Redacção no 13.º ao artigo 95.º da Constituição:

Nas sessões das comissões permanentes da Assembleia Nacional em que sejam apreciadas as alterações sugeridas pela Câmara Corporativa pode tomar parte um delegado desta Câmara.

18) Que ao texto proposto no artigo 26.º da proposta se façam as modificações seguintes:
I) O artigo 104.º passa a ter a seguinte redacção:.........

§ 4.º As sessões das secções e subsecções da Câmara Corporativa não são públicas, mas poderão sê-lo as plenárias.

II) No artigo 105.º o corpo do e § único da proposta passam a ser corpo do, artigo e § 1.º, com o aditamento de um § 2.º com a seguinte redacção:

Durante a sessão legislativa da Assembleia Nacional poderá a Câmara Corporativa sugerir ao Governo as providências que julgue convenientes ou necessárias.

19) A substituição da proposta pelo texto sugerido pela Câmara Corporativa para epígrafe do título VI da parte II nos termos seguintes:

Da divisão administrativa, e das autarquias locais na metrópole.

20) A substituição do texto da proposta do artigo, 28.º pelo seguinte:

Do ultramar português.

21) Que seja eliminado o segundo período do artigo 5.º da proposta sobre o Acto Colonial.
22 Que seja aprovada a proposta do Sr Deputado Mendes Correia quanto ao artigo 7.º-B sobre o Acto Colonial.
28) Que entre as palavras "direitos" e "garantias" do artigo 7.º-A sobre o Acto Colonial se intercale a palavra "liberdades".
24) Que depois das palavras "despesas e dívidas" do artigo 88.º sobre o Acto Colonial se acrescentem as palavras "o dos seus actos e contratos".
25) Que antes da palavra: "bens" do artigo 39.º sobre o Acto Colonial se intercalem as palavras aos direitos e bens".
26) Que ao artigo 43.º da proposta sobre o Acto Colonial se acrescentem as palavras seguintes: "para, serem tomadas pela Assembleia Nacional nos termos do n.º 3.º do artigo 91.º", ficando autorizada a Comissão de Redacção a fazer na citada disposição o ajustamento necessário.
27) Que seja substituído o texto proposto no artigo 30.º da proposta sobre a Constituição pelo seguinte:

Art. 134.º A Constituição poderá ser revista de dez em dez anos, contados desde a data da última lei de revisão, tendo para esse efeito poderes constituintes a Assembleia Nacional cujo mandato abranger o último ano do decénio ou os que se lhe seguirem até ser publicada a lei de revisão.
§ 1.º A revisão constitucional pode ser antecipada de cinco anos se, a partir do início da sessão legislativa correspondente ao último ano do quinquénio, assim for deliberado por dois terços dos Deputados em exercício efectivo.
Também neste caso o decénio se conta desde a data da lei de revisão que então for votada.
§ 2.º Apresentada qualquer proposta ou projecto de revisão constitucional, quaisquer outros só poderão ser apresentados no prazo de vinte dias, a contar da data daquela apresentação.
§ 3.º Não podem ser admitidos como objecto de deliberação propostas ou projectos de revisão constitucional que não definam precisamente as alterações projectadas.
§ 4.º Uma vez publicada a lei de revisão, cessam os poderes constituintes da Assembleia Nacional.

O Presidente da Comissão de Legislação e Redução, Mário de Figueiredo.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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