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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 115
ANO DE 1951 20 DE DEZEMBRO
V LEGISLATURA
SESSÃO N.º 115 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 19 DE DEZEMBRO
Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários : Exmos. Srs.Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro
Nota. - Foram publicados dois suplementos ao Diário das Sessões n.º 114, inserindo: o 1.º, o parecer da Câmara Corporativa n.º 23/V, sobre a, proposta, de lei n.º 514 (bases da organização da defesa nacional), e, o 2.º, o texto aprovado pela Comissão de Legislação e Redacção acerca do decreto da Assembleia Nacional sobre autorização das receitas e, despesas para 1952.
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado, com alterações propostas pelo Sr. Presidente e pelo Sr. Deputado Pinto Barriga, o Diário das Sessões n.º 114.
Deu-se conta do expediente..
Usaram da palavra os Srs. Deputados Armando Cândido de Medeiros, sobre assunto de interesse para os Açores; Jacinto Ferreira, sobre o exercício da profissão de jornalista; Manuel Múrias, sobre o menino assunto; Vaz Monteiro, acerca da inauguração do circuito radiotelfónico com o ultramar.
Ordem do dia. - Iniciou-se a discussão, na generalidade, das bases da organização da defesa nacional.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Frederico Vilar, Tasco Lopes Alves, Sousa Rosal e Quelhas de Lima.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 15 minutos.
CAMARA CORPORATIVA: - Declaração de voto do Digno Procurador Afonso Rodrigues Queiró, a qual, por lapso, não foi inserta no final do parecer n.º 22/V. publicado no 3.º suplemento ao Diário das Sessões n.º 109, de 6 do corrente mês.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Alberto Cruz.
Albino Soares Finito dois Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Finito.
Américo Cortês Finito.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Torvares.
António de Almeida.
António Augusto Estevas Metades Correia.
António Bartolomeu Gromioho.
António Calheiros Lopes.
António Caídos Borges.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Ferreira.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustosrff da Silva.
António Maria da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António Sobral Mendes de Magalhães Ramalho.
António de Sousa da Câmara.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
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Carlos de Azevedo Mendes.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Délio Nobre Santos.
Elisão de Oliveira Aires Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas
Vilar.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
José Cardos de Matos.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
José dos Santos Bessa.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteio-o.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco Lopes Alves.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 81 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 114.
Sobre este Diário das Sessões desejo fazer as seguintes rectificações. A p. 75, col. 1.ª, 1.37.ª, onde se lê: «José Maria Lopes da Fonseca», deve ler-se: «Luís Maria Lopes da Fonseca». Também na mesma coluna, a 1.46.ª, onde se lê: «Luís Maria da Fonseca», deve ler-se: «Luís Maria Lopes da Fonseca».
O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer a seguinte rectificação essencial ao Diário das Sessões em discussão, supondo que as outras serão feitas bem volamente pelos meus ilustres colegas: a p. 74, col. 2.ª, 1. 48.ª, onde se lê: «mero esforço», deve ler-se: «menor esforço».
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer qualquer reclamação, considero-o aprovado com as rectificações apresentadas.
Deu-se conta do seguinte
Expediente Telegramas
Numerosos de apoio ao discurso do Sr. Deputado Jacinto Ferreira quanto à defesa da situação dos funcionários da previdência.
Exposições
De Manuel Marfins Rosinha, ex-guarda da Polícia Cívica do Porto, pedindo que seja reintegrado ao abrigo do Decreto-Lei n.º 38:267.
De Adriano Regueira, pedindo a sua reintegração no quadro da Guarda Fiscal.
Cópia de uma exposição dirigida a S. Ex.ª o Presidente do Conselho por um grupo de artistas líricos portugueses no sentido de uma maior participação dos mesmos artistas no elenco da próxima temporada do Teatro Nacional de S. Carlos.
Sr. Ministro da Economia. - Excelência: - Foi com júbilo, em absoluto justificável, aliás logo patenteado a V. Ex.ª por organismos de todos os pontos do País, que a organização corporativa da agricultura tomou conhecimento da salutar doutrina e rasgada orientação traçada pelo Governo na proposta de lei referente a condicionamento industrial, enviada à Câmara Corporativa paru sobre ela ser dado o respectivo parecer.
Mais tarde, havendo conhecimento de que vários sectores da indústria relacionada com a preparação e transformação dos produtos agrícolas se movimentavam no sentido de tornar proibitiva a possibilidade de o próprio lavrador, por quaisquer meios, tentar a valorização daquilo que tantas vezes arranca da terra à custa de penosos e inglórios esforços, os grémios da lavoura desta regio imediatamente se dirigiram à Ganiam Corporativa e ao Governo, exprimindo com clareza qual era o seu ponto de vista sobre tão momentoso quanto importante problema.
Aguardou a organização, com consciente serenidade, que a Câmara Corporativa se pronunciasse, e confiou em que esta lhe não negaria justiça, tanto mais que esperava fossem ouvidos, depois de especialmente convocados para o efeito, os directores representantes da produção agrícola em algumas secções daquele órgão consultivo.
Foi com pesar e bastante surpresa que verificou agora, depois de lido o Diário das Sessões n.º 101, de 25 de Abril próximo passado, não ter sucedido nem uma nem outra coisa.
Quer dizer: não foi feita a esperada justiça, nem, talvez por isso mesmo, os representantes da produção foram especialmente convocados.
Esperávamos nós, e pura tanto não nos consideramos demasiado exigentes, que neste particular, de tão larga projecção e evidente importância para a produção agrícola, o mais alto órgão consultivo da Nação não viria
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negar ou contrariar os princípios por ele próprio brilhantemente expressos nos pareceres de que foram objecto os diplomas legislativos sobre os quais foi possível organizar e estruturar os organismos primários da agricultura, ou seja os grémios da, lavoura.
Verifica-se, «porém, no parecer em referencia que a Câmara Corporativa entendeu dever considerar a proposta de lei como menos conforme com a ortodoxia da, doutrina básica do Estado, e ter-se-ia deixado influenciar por representações a ela dirigidas por certas indústrias receosas de que o fim do condicionamento lhes viesse retirar o proteccionismo injusto de que tem gozado, usado e abusado, com evidente e lamentável prejuízo para os produtores da matéria-prima.
(Contra tal preocupação apenas se pronunciou o Digno Procurador Dr. Afonso Rodrigues Queiró, mas foi vencido, não obstante a lógica da argumentação usada na sua corajosa declaração de voto.
E assim, dando plena satisfação «às representações enviadas por numerosos industriais, mas negando-a em absoluto àquelas que foram dirigidas, por grémios da lavoura, a Câmara Corporativa deliberou eliminar, «pura e simplesmente, do teor da base VI a possibilidade, única, aliás, concedida pela proposta do Governo, que à lavoura, era dada de satisfatoriamente defender a economia dos seus produtos e o justo rendimento do seu trabalho, sem dependência do mais que discutível direito arrogado agora por industriais que apenas têm conseguido viver e prosperar à custa de um proteccionismo unilateral e contrário aos mais elementares direitos da produção agrícola.
Dentro deste critério, e patenteando receios, ou escrúpulos, quanto a nós inteiramente descabidos, inoportunos e inaceitáveis, propôs a eliminação de os lavradores associados puderem preparar e transformar os seus próprios produtos, forçando-os a seguir apenas dois caminhos: deixar de produzir por lhes ser vedado valorizar a matéria-prima, por forma a compensar satisfatoriamente o seu trabalho, ou produzido prejuízo e unicamente para maior proveito industrial.
Patenteia a Câmara Corporativa o receio de que os lavradores associados possam vir trazer «grande perturbação» em vários, sectores já ordenados, e tal receio leva-a a preconizar a exclusão, única possibilidade que a lavoura teria de ordenar também o seu sector, sem dependências incómodas e prejudiciais de estranhos, ou até de inimigos declarados.
Não pode o lavrador, por nós legitimamente representado, Sr. Ministro, aceitar sem mais veemente protesto o principio individualista, antigregário, anticorporativo, contrário à própria doutrina cristã e aos mais elementares direitos da solidariedade humana, defendido e preconizado pela Câmara Corporativa por forma tão estranha e inconcebível.
O Governo, estamos disso inteiramente convencidos, repudiará semelhante doutrina, e não pode, é evidente, ir negar à lavoura portuguesa o direito que mundialmente é reconhecido ao agricultor de todas as nações civilizadas, direito esse que os estados não só aceitam como preconizam, acarinham e apoiam pelas mais variadas formas.
Não podemos aceitar nem conceber que tal suceda, pois seria o mesmo que negar à vitima - neste caso o lavrador - o mais elementar direito da legítima defesa.
E o Governo do Estado Novo, que nos habituámos a considerar como entidade incapaz de praticar iniquidades, não poderá deixar de, neste caso, atender à solicitação instante que vimos fazer a um dos mais ilustres membros.
Certos de que assim sucederá, mantendo-se para a base VI do diploma a publicar a redacção proposta pelo Governo, aproveitamos a oportunidade para oferecer a V. Ex.ª a solidariedade de toda a lavoura portuguesa, aqui legìtimamente representada pelos seus grémios.
Porto, 28 de junho de 1951 - Pelos Grémios da Lavoura dos distritos do Porto, Braga, Viana do Castelo, Aveiro, Coimbra e Leiria, Augusto da Silva Maia.
O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos solicitados pelo Sr. Deputado Pinto Barriga à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, os quais vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Foram recebidos na Mesa, enviados pela Presidência da Concelho, em cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, os n.ºs 259 e 261 do Diário do Governo, de 13 e 15 do corrente, que inserem os Decretos-Leis n.ºs 38:558 e 38:560.
Está na Mesa o original da proposta de lei sobre a reorganização militar.
Também se encontra na Mesa o texto da Comissão de Legislação e Redacção sobre a proposta da Lei de Meios para 1952, e que amanhã será submetido à aprovação da Assembleia.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Cândido.
O Sr. Armando Cândido: Sr. Presidente: pedi hoje a palavra por causa de um assunto que se pode tornar muito grave.
Toda a gente que conhece o Vale das Furnas, na ilha de S. Miguel, considera essa estância termal como uma das raras e grandes maravilhas da Natureza.
Não é só o chão que guarda o mistério do fogo, é a lava que respinga da forja, a vegetação que não faz caso do braseiro, a lagoa idílica, a montanha húmida fecha em redondo, o pitoresco forte da paisagem e esse ar de estranho poder e de mágica doçura que nos prende a qualquer coisa de inédito e de indefinível.
É tudo isto, mais o valor das águas mineromedicinais.
Lá existe - escreveu Roldan y Pego, director-geral de Minas e Serviços Geológicos, no perfácio de Portugal Hidrológico e Climático - a mais extraordinária região hidrológica de toda a Europa, tanto pela abundância e variedade das águas hipertermais, como pelas relações evidentes que esses águas apresentam com o vulcanismo ainda incomopletamente extinto.
Furnas, lição viva de hidrologia!
Foi assim que o Dr. Justin Besançon, professor da Faculdade de Medicina de Paris e chefe de clínica e do laboratório de hidrologia e climatologia da mesma Faculdade, começou a descrever as impressões da sua visita ao Vale das Furnas, em 1930. Traduzo mais algumas passagens do seu depoimento:
Tudo o que os livros da hidrologia ensinam sobre as fontes medicinais de origem plutónica se encontra ali, como para mais luminosa das demonstrações.
Não será para admirar que as destilações profundas da crosta terrestre possam fornecer nascentes, umas em ebulição, outras frias, ora oligometálicas, ora carregadas de elementos dissolvidos? Para se compreender um tal fenómeno nenhuma explicação teórica pode forçar a convicção tão vigorosamente como o espectáculo do Vale das Furnas, onde jorram, a pouca distância umas das outras, as nascentes mais variadas.
As possibilidades terapêuticas de um tal centro hidrológico são, sem dúvida nenhuma, ilimitadas. As curas termais sucessivas ou combinadas podem dàr-se, utilizando as nascentes mais diversas, sem a menor deslocação do doente.
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Isto são condições muito raras em crenoterapia.
Tanto pelas suas riquezas' naturais como pela sua situação geográfica excepcional, as Furnas podem ser o bastião avançado das hidrópoles europeias.
Mas há mais apreciações de peso para provar que não dou espaço à fantasia nem corpo ao exagero:
Nas Furnas, no centro de uma antiga cratera, jorram, lado a lado, dezasseis nascentes inteira-mente diferentes, pela origem e pela natureza: umas frias, outras termais ou hipertermais; estas sulfurosas, aquelas cloretadas sódicas ou alcalinas, umas correndo em delgado fio silencioso, outras borbulhando e espalhando-se em torrente tumultuosa. Não será esta a clara demonstração da teoria de Armand Gautier sobre a origem plutónica das águas termais, que, das profundezas do Globo sobem por falhas, vizinhas umas das outras, mas distintas, até ao ponto de emergência V (Dr. Mace de Lépinay, secretário-geral da Sociedade de Hidrologia de Paris).
Se a beleza do lugar e a doçura do clima são incomparáveis, as águas termais e hipertermais ou simplesmente minerais, que se escapam das inúmeras fendas do solo, constituem um recurso terapêutico de primeira ordem.
Esta estação, pela variedade e riqueza das suas nascentes e pelas suas vantagens excepcionais, terá rapidamente o desenvolvimento que merece (Dr. Rayneau, de Clermont-Ferrand).
O foco de emergência das águas das Furnas constitui um fenómeno geológico absolutamente excepcional.
Não me recordo, no decurso das minhas numerosas viagens de estudos hidrológicos, de ter encontrado semelhante variedade de nascentes concentradas numa tão reduzida superfície. Todas as nascentes que jorram na cratera formam uma gama incomparável de águas, tanto para uso externo, como para uso interno, e lamas vulcânicas semelhantes às que se encontram em Pistyani (J. Fo-restier, de Aix-les-Bains).
O que a Natureza reparte parcimoniosamente pelos outros países do Mundo foi dado com prodigalidade às Furnas, que não constituem uma estação, mas uma policlínica termal (Dr. Antony Bes-set, de Chfitelguyon).
Deliciosamente situadas num lugar maravilhoso de majestade e de calma, as Furnas oferecem, concentradas em pequeno espaço, a mais rica, a mais diversa e talvez, pode dizer-se, a mais completa gama de nascentes naturais mineromedicinais (Dr. Pierre Courbemale, professor da Faculdade de Medicina de Lille).
Visitei as estações termais de Inglaterra, Itália, Checoslováquia e Hungria, com a Sociedade Internacional de Hidrologia Médica, e foi nas Furnas que pela primeira vez encontrei águas contendo, em proporção ponderável, um metal tão raro como o titânio.
Felizes os doentes que vêm tratar-se nesta cratera, junto .do foco misterioso deste alquimista que nas entranhas da nossa mãe Gea prepara, em segredo, estas águas e gases termais. (Dr. A. Mon-geot, membro do conselho da Sociedade Internacional de Hidrologia Médica).
Palavras sinceras -no comentário do falecido professor do Instituto de Hidrologia Dr. Armando Narciso - de alguns dos mais cotados hidrologistas da França, para os micaelenses ficarem sabendo, mais uma vez, que são donos de um tesouro imenso, que se torna necessário aproveitar.
E toda esta riqueza, Sr. Presidente, repartida por três zonas hidrológicas dominadas por crateras vulcânicas arrefecidas pelas águas quietas de três lagoas formosas.
As grandes dádivas do Céu nunca se mostram por completo aos homens.
Quem será capaz de desvendar o jogo dessas forças que trabalham noite e dia nas entranhas da ilha de S. Miguel, o milagre que se espalha à superfície, representado em «caldeiras», resfolegadouros seguros do lume recalcado e em nascentes, produto admirável de alquimia sobrenatural?
Quem será capaz de descobrir estes segredos e quem, pensando fazê-lo, não hesitará antes de os revolver e profanar ?
Pois, Sr. Presidente, a estas horas andam por lá dois estrangeiros estudando o chão, à cata dos gases que existem dentro dele, para o aproveitamento químico e de energia térmica.
Quem comissionou estes cientistas para irem a S. Miguel macular a beleza da terra com o projecto em marcha de chaminés enormes a erguer próximo ou em cima das a caldeiras B, que constituem um dos maiores e mais curiosos argumentos turísticos da ilha?
Quem sonhou isto, quem concebeu semelhante plano e passou, com ele, da teoria à realidade começada?
Quem autorizou este primeiro passo?
Dizem-me que dois micaelenses são a alma e o nervo material do cometimento, do atentado contra o património insubstituível, dado às mãos cheias pela Providência generosa.
Atentado, sim, porque os Açores são de formação vulcânica relativamente recente e todo o sistema de distribuição e equilíbrio das manifestações ainda vivas no subsolo pode alterar-se de forma irremediável e perigosa.
Atentado incompreensível, afirmo, porque as erupções, propriamente no arquipélago, contam-se desde 1444 até 1811, passando por 1638 e 1682 quanto ao vulcão das Sete Cidades, 1563 e 1652 quanto ao vulcão de Água . de Pau e 1630 quanto ao vulcão da Lagoa Seca, na ilha de S. Miguel, 1562, 1718 e 1720, na ilha do Pico, 1580 e 1808, na ilha de S. Jorge, 1672 e 1761, respectivamente, nas ilhas do Faial e Terceira, e o quadro das erupções submarinas regista as datas de 1638, 1682, 1720, 1757, 1811, 1867 e 1907, o que demonstra que a actividade vulcânica não acabou; dorme e acorda de vez em quando.
Atentado incompreensível, repito, porque, deferidos os seus propósitos, iria arruinar a riqueza hidromineral de S. Miguel, misturando e perdendo as suas nascentes mineromedicinais, que, na opinião de grandes hidrologistas, podem fazer com que as Furnas sejam o bastião avançado das hidrópoles europeias.
Não, não acredito, não quero acreditar que estejam metidos nisto dois micaelenses.
É o príncipe italiano Piero Ginori-Conti que, segundo estou informado e os próprios jornais noticiam, está presentemente, acompanhado de um engenheiro, também italiano, em S. Miguel, nas termas das Furnas e noutras regiões da ilha, a estudar, como já disse, as emanações das sulfataras.
O príncipe Conti é autor de diversas publicações sobre o aproveitamento geotérmico de Larderello, na Toscana. Mas aí as perfurações fizeram-se através de camadas geológicas de grande espessura, sedimentadas ao longo dos séculos, e em S. Miguel o aparelho vulcâ-
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nico não tem cobertura para ser brocada pela ânsia industrial, que pretende desafiar agora o fogo, provocando-o a dar-lhe lucros, nem que seja em troca da ruína turística de uma ilha inteira e do perigo admissível para a vida de todos os seus habitantes.
As estruturas geológicas de S. Miguel e da Toscana são completamente diferentes.
A perfuração de Larderello não se fez nas regiões do Etna ou do Vesúvio.
Porquê?
Por falta de vapores que produzam energia?
Não, por causa do vulcão, que sacode ainda.
Dir-se-ia: S. Miguel é uma terra sem recursos hidráulicos susceptíveis de darem a energia que a ilha requer.
Mas não.
Está revisto pelo Conselho Superior de Obras Publicas e aprovado superiormente o plano constante do relatório da missão técnica dos aproveitamentos hidráulicos dos Açores, onde se descrevem e consideram os recursos disponíveis como suficientes.
No parecer do Conselho Superior de Obras Públicas até se diz -nem de propósito! - que a ilha de S. Miguel é de formação vulcânica, em grande parte recente, ainda sem grande estabilidade interna e conservando restos apagados de vulcanismo ...
Valerá então a pena e terá, porventura, algum sentido lógico ou defensável este estudo feito por estrangeiros para a recolha e industrialização de vapores subterrâneos?
Valerá manchar a paisagem e reduzi-la debaixo de chaminés monstruosas ?
Valerá correr os perigos de excitar a actividade vulcânica?
Valerá admitir o estrago das águas mineromedicinais?
O melhor é para trás e a tempo.
Na ilha de S. Miguel vive um povo que conhece o valor da sua terra; aqui, na Assembleia Nacional, estão defensores sinceros dessa gente, que trabalha e sofre por um Portugal maior, e, acima de tudo, temos um Governo comandado pelo mais luminoso bom senso.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Jacinto Ferreira: - Sr. Presidente: começo por apresentar o seguinte
Requerimento
Roqueiro que pelos Ministérios respectivos me sejam fornecidas as seguintes informações:
1.º Receitas totais arrecadadas pela Câmara Municipal de Oeiras durante cada um dos anos de 1948, 1941) e 1950, com sua discriminação por rubricas e por freguesias;
2.º Estado em que se encontram os processos de indemnização dos proprietários de terrenos expropriados aquando da última guerra, para fins de defesa nacional, na ilha de S. Miguel, nos Açores;
3.º Relação das firmas subsidiadas pelo Fundo de fomento industrial desde a constituição deste, com pormenorização do quantitativo dos subsídios e da modalidade de indústria explorada; tinha, ou, pelo menos, processo que foi usado para esta apropriação ; b) Indemnizações que foram atribuídas aos proprietários dos referidos terrenos e grau em que elas já começaram a ser satisfeitas.
E agora, Sr. Presidente, vou referir-me a outro assunto.
Antes a suspeita que os avultou de não terem lugar adequado na organização corporativa, os jornalistas desportivos expuseram superiormente a sua situação, solicitando o esclarecimento dela, uma vez que lhes pareceu pouco fácil a entrada no Sindicato Nacional lios Jornalistas.
Então, os serviços de acção social do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência emitiram um parecer sobre o qual eu me permito, por minha vez, emitir opinião, dado que sou, prementemente, nesta Assembleia, a única pessoa que, com efectividade, peregrina, descalço, embora como simples devoto, esta Via Crucis que é actualmente o jornalismo em Portugal.
Segundo o douto parecer, ,as pessoais que escrevem crónicas desportivas .nos jornais da especialidade devem ser enquadradas no Sindicato Nacional dos Jornalistas, e mão só estais como também (aproveita-se a oportunidade para tornar conhecida esta renovadora doutrina) os que trabalham em semanários, bi-semanários, etc.
Etc. o quê? Já se vai ver.
A este parecer outro se juntou, decerto necessário, da .3.º Repartição da Direcção-Geral do Trabalho e Corporações, no qual se afirma:
Quer se trate de um jornalista da imprensa diária, quer se trate de um da imprensa desportiva ou de vulgares semanários, bi-semanários, revistas, etc., a profissão é só uma e o seu enquadramento corporativo deve efectuar-se no Sindicato dos Jornalistas.
Já este outro parecer levanta um pouco o véu do enigmático etc., acrescentando a. palavra «revistas», mas como ainda se insiste em tal abreviatura, ocorre perguntar: Que mais ainda? Também deverão ser considerados jornalistas os que fazem folhetos, manifestos, boletins, cartazes, almanaques, etc.? Não se diz isso, mas deixa-se a conclusão ao livre arbítrio de cada um.
O mais engraçado, porém, é a designação de «vulgares», atribuída aos semanários, naturalmente por aparecerem uma vez de sete em sete dias e se distinguirem assim notavelmente dos que se publicam quotidianamente, e são, por isto, logicamente, «invulgares».
Por terem recebido estes dois pareceres acordo superior, foi mandado dar execução ao projectado alargamento profissional do actual Sindicato Nacional dos Jornalistas.
Ora, esta decisão é, quanto a mini, uma autêntica revolução em matéria de organização profissional, e, como todas as revoluções, abre largos horizontes às ambições mesmo legítimas de uns, ao mesmo tempo que p ml e ser causa de sombrias preocupações para outros.
Exultem, pois, de alegria, em face disto, os engenheiros agrónomos, os engenheiros geógrafos, os geólogos, os auxiliares de engenharia, porque se aproxima a hora de se lhes abrirem as portas da tão desejada Ordem dos Engenheiros.
E porque não haveria de ser assim? Parafraseando o primeiro destes pareceres, poderemos dizer: todos estes, «pela força inegável da própria especialidade em que trabalham, pela actividade intensa que desenvolvem, pelo seu real valor, pelo brilhantismo de muitos dos seus trabalhos e estudos, não têm nem devem ser distinguidos de qualquer outro engenheiro, independentemente do
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seu valor e da modalidade «do seu trabalho». E estaria inteiramente certo.
E não se argumente que os engenheiros não querem. Que importa isso? Também, ninguém perguntou aos jornalistas se eles querem ou não aquilo a que foi mandado dar execução. Dar-se-á o caso de nestas modernas casas dos 24 caberem, à vontade, 26 ou 28 e de as profissões qualificadas serem matéria despicienda perante a omnipotência das repartições e dos institutos?
Há, porém, um aspecto confrangedor, de ordem corporativa, nestes pareceres, o qual consiste na má interpretação do quê seja uma profissão.
Reconhecem eles o valor pessoal de muitos jornalistas desportivos, que podem ombrear com muitos dos que trabalham na imprensa diária.
O Sr. Manuel Múrias: - V. Ex.ª dá-me licença? A maior parte dos jornalistas desportivos são jornalistas que colaboram quotidianamente nos jornais diários.
O Orador: - São colaboradores!
O Sr. Manuel Múrias: - São redactores.
O Orador: - Então são jornalistas.
Isto é verdade e toda a gente o reconhece, mas não é suficiente para justificar o uso de um título profissional.
É sabido que em toda a escala das actividades intelectuais ou artísticas há pessoas que, por amadorismo, adquirem possibilidades de realizar superiores às que muitos profissionais podem exibir.
Mas uma profissão não é apenas um conjunto de pessoas exercendo determinada actividade, porque a ela anda ligado também um significado moral e social.
Só aquele que a vive, que se regozija com o seu prestígio e sofre amargamente os seus reveses, que sente os seus problemas e procura estudá-los a fim de contribuir para u sua resolução, que lhe dedica inteiramente as faculdades próprias e sente que também ela lhe retribui esse afecto, proporcionando-lhe, cada vez mais, melhores condições de vida e de existência - só esse deverá ser considerado profissional de uma determinada actividade.
Ora, nada disto pode ser sentido; ou só o será em grau muito reduzido, por aqueles que trabalham em semanários, porque esta actividade é, em regra, acessória à principal de cada um e, mesmo quando retribuída, constitui mais um governo de vida do que um modo de vida. Inclusivamente, quando os seus principais proventos derivam dessa actividade, a sua situação é mais a de um colaborador efectivo do que a de um jornalista.
Eu sei bem que esta profissão, por ser uma das mais jovens, uma das mais complexas, uma das que mais tem sentido toda a renovação imposta pelo progresso material incessante, não é ainda uma actividade perfeitamente definida.
E não vale a pena estar agora aqui a desfiar todas as definições dadas, pitorescas ou ingénuas, ora eruditas, ora presumidas, porque interessa fixarmo-nos apenas no que entre nós está assente e consagrado pelas disposições legais.
Segundo o que dispõem os estatutos do Sindicato Nacional dos Jornalistas, este admite três categorias de sócios: efectivos, estagiários e correspondentes. São efectivos os que exerçam há mais de um ano, por forma efectiva, permanente e remunerada, em jornais diários, as funções de chefe e subchefe de redacção, redactor, repórter ou fotógrafo, ou que exerçam em iguais condições as funções de correspondente e redactor em agências noticiosas, traduzindo a sua actividade no envio de reportagens de Portugal para o estrangeiro.
Nem mesmo os directores são incluídos na categoria de efectivos, e compreende-se que assim seja, se houver em vista serem eles na generalidade delegados das empresas proprietárias dos jornais.
Hás estas disposições, quanto aos sócios efectivos, não fecham a porta a outros trabalhadores afins, porquanto na categoria de correspondentes podem ser admitidos todos os indivíduos que colaborem por forma efectiva em quaisquer publicações periódicas, e a estes, pelo artigo 14.º do mesmos estatutos, são garantidos todos os direitos e vantagens de que usufruírem os efectivos, com excepção da carteira profissional, porque esta confere título.
"Parece que estas disposições deveriam ser suficientes para tudo resolverem e o Instituto Nacional do Trabalho escusava de se propor modificar os estatutos de um sindicato nacional sem ouvir ou consultar a opinião dos respectivos sócios efectivos.
E esta é que é a chave do problema: desejar-se que, em harmonia com a boa tradição nacional, aos jornalistas portugueses -e só a estes- seja reconhecido o direito de juízo sobre a oportunidade e a conveniência de abrirem a porta da sua casa a quem quer que a ela venha bater.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Manuel Múrias: - Ouvi com toda a atenção as palavras proferidas pelo nosso ilustre colega Prof. Jacinto Ferreira, e devo dizer que não concordei com S. Ex.ª em nenhuma das suas afirmações e vou dizer porquê.
Não há dúvida alguma de que trato de um problema que não me diz respeito, visto que, pelos estatutos do Sindicato Nacional dos Jornalistas, um homem que viveu a maior parte da sua vida profissional exclusivamente do seu trabalho na imprensa, como eu, deixou de ser jornalista no dia em que passou a dirigir a actividade de um grupo de jornalistas, como director de um jornal.
Deverá ser assim?
À primeira vista parece que os próprios directores do Sindicato Nacional dos Jornalistas a certa altura julgaram que era perfeitamente incompreensível que isso pudesse fazer-se a homens que tinham começado e desenvolvido a sua carreira pública e política exclusivamente vivendo, ou quase, do que faziam em jornais diários de maior reputação neste país. Simplesmente se perguntava o que iria fazer-se, que posição se ia marcar a esses homens para poderem continuar a ser considerados em condições de lhes ser distribuída a carteira profissional de jornalista. E a solução foi a de considerar esses homens como sócios correspondentes, a quem nem sequer se dava a categoria dos agentes de informações para a imprensa estrangeira, pois não passavam de tolerados dentro da profissão que, por outro lado, efectivamente serviam.
Como é que se pode admitir uma situação desta ordem? Como é que se pode tolerar que ao fim de uma carreira, em que houve, se quiserem, ascensão, mas que não foi interrompida, se tire a carteira profissional a homens em tais condições?
O Sr. Deputado Jacinto Ferreira, ao referir-se a determinados colaboradores de jornais que não se publicam todos os dias, disse que não se deveria alterar uma tradição nacional.
O Sr. Jacinto Ferreira: - Se V. Ex.ª tivesse usado da palavra amanhã e houvesse, entretanto, lido o Diário das Sessões, veria que eu não disse isso.
O Orador: - Continuando as minhas considerações, devo salientar que, como VV. Ex.ªs ouviram por aquilo
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que disse o Sr. Deputado Jacinto Ferreira, não há uma posição definida para certa qualidade de jornalistas. Dizia S. Ex.ª que não se poderiam integrar no Sindicato Nacional dos Jornalistas, por exemplo, os jornalistas desportivos e os jornalistas da província sem alterar aquela tradição?
Ora a verdade é esta: se existisse há mais tempo um sindicato nos termos do actual Sindicato dos Jornalistas, os homens mais ilustres da história da imprensa portuguesa não poderiam ser considerados jornalistas. Não seria jornalista um Rodrigues Sampaio ou um Mariano de Carvalho; não seria jornalista um Emídio Navarro, nem um Barbosa Colen, nem um Moreira de Almeida. Não seriam jornalistas, numa palavra, os maiores homens que honraram o jornalismo em Portugal.
O estatuto do Sindicato Nacional dos Jornalistas, tal como está, corresponde à diminuição duma profissão que teve realmente no nosso país os seus lauréis e que foi exercida por algumas das mais altas figuras portuguesas do século XIX para cá.
Como se pode admitir uma coisa destas?
Porque não poderia ser considerado jornalista o Dr. Alfredo Pimenta? Ou o Dr. Brito Camacho?
O Sr. Jacinto Ferreira: - O Dr. Alfredo Pimenta sempre escreveu que não era jornalista e que nunca queria ser considerado como tal.
O Orador: - Mas não há dúvida de que o foi. E Aníbal Soares, e tantos outros, para não falar senão nos mortos, que devem ser lembrados como gloriosas figuras do jornalismo português.
O Sr. Jacinto Ferreira: - Esses nunca foram jornalistas, mas sim precursores do jornalismo.
O Sr. Carlos Borges: - Foram jornalistas, e dos maiores.
O Orador: - Existe neste país um Sindicato Nacional dos Professores do Ensino Particular, que tem várias secções.
Porque não há-de também o Sindicato Nacional dos Jornalistas ter as secções que permitam incluir nelas todos quantos exercem a profissão de jornalista, e a exerçam com dignidade, embora não em jornais diários?
O jornalismo quotidiano é um, o jornalismo de semanário outro e o das províncias tem sido, muitas vezes, espelho da dignidade jornalística portuguesa.
Como é que se pode considerar que Artur Eivar, que foi incontestavelmente um dos maiores, mais vigorosos, mais cultos jornalistas do seu tempo, não tenha direito a que o seu nome figure na história da imprensa em Portugal só porque o foi principalmente na imprensa da província? Que direito há de se riscar dela o seu nome? Ou o de Homem Cristo, o extraordinário director e quase único redactor do Povo de Aveiro ?
Quero dizer daqui ao Sr. Ministro das Corporações que é indispensável que se tome realmente a peito a definição exacta e verdadeira do jornalismo e a sua reorganização em Portugal, para que se não possa dizer que quem mais dignifica tantas vexes o jornalismo em Portugal e dele vive já não pode sor considerado jornalista.
O Sr. Jacinto Ferreira: - Mas as considerações de V. Ex.ª e o que disse é que tudo isso era possível desde que fosse deliberado pela assembleia geral do Sindicato Nacional dos Jornalistas.
O Orador: - Quando se trata de resolver problemas que são de interesse de uma classe contra os interesses de outras não é às assembleias gerais que compete decidir, porque elas defendem naturalmente os seus interesses apenas, ainda que sejam os mais egoístas, mas sim ao Governo, pelo respectivo departamento.
O Sr. Carlos Moreira: - V. Ex.ª quer deixar com isso que as classes não tem voz activa?
O Sr. Jacinto Ferreira: - Essa teoria é contrária à tradição nacional.
Não há tradição sindical entre nós. E, se existem divergências entre as classes, é ao Estado que compete decidir, impondo a justiça e a harmonia.
O Sr. Mário de Figueiredo: - O que não pode é consentir-se que a profissão organize o próprio monopólio.
O Sr. Jacinto Ferreira: - O que também não pode ser é que a profissão constitua matéria deficiente.
O Sr. Mário de Figueiredo: - Mas quem é que disse que ela constituia isso?
O Orador: - Sr. Presidente: depois deste diálogo, que parece esclarecedor, e tendo marcado a minha posição perante as considerações do Sr. Dr. Jacinto Ferreira, nada mais acrescentarei.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Vaz Monteiro:- Sr. Presidente: no dia 15 do corrente foi inaugurado o circuito radiotelefónico entre a metrópole e as províncias ultramarinas de Angola, S. Tomé e Príncipe e Cabo Verde, por intermédio da Companhia Portuguesa Rádio Marconi.
A cerimónia inaugural foi realizada no Palácio de Belém e revestiu-se da solenidade que a importância do acto requeria, tendo a presença de S. Ex.ª o Senhor Presidente da República, dos Srs. Ministros do Ultramar e das Comunicações e de outras individualidades.
Este acontecimento de se terem estabelecido comunicações radiotelefónicas entre a metrópole e aquelas províncias de Angola, S. Tomé e Príncipe e Cabo Verde é motivo para nos regozijarmos, visto que veio- suprir uma falta que muito se fazia sentir, e, assim, contribuirá também para o estreitamento das relações, que nós queremos que seja cada vez maior, entre os portugueses de aquém e de além-mar.
Mas, além do começo de execução do importante serviço radiotelefónico, passaram a entrar em vigor entre a metrópole e o ultramar e as províncias ultramarinas entre si e o estrangeiro as novas taxas resultantes do acordo adicional ao convénio entre o Estado e a Rádio Marconi que foi recentemente celebrado, de harmonia com o Decreto n.º 38:4157, de 19 de Novembro findo.
As taxas das comunicações radiotelegráficas, cujo serviço já estava a cargo da Marconi, foram sensivelmente diminuídas.
Por se terem alcançado estes benefícios públicos do abaixamento das taxas telegráficas e do estabelecimento das comunicações telefónicas entre a metrópole e o ultramar eu desejo manifestar agradecimento ao Governo, especialmente aos Srs. Ministros do Ultramar e das Comunicações, e ao mesmo tempo felicitar as populações beneficiadas dos territórios ultramarinos.
Porém, Sr. Presidente, eu devo dizer mais uma palavra relativamente à província da Guiné e ainda por motivo das comunicações radiotelefónicas.
Aquela província ultramarina não se tem poupado a satisfazer todos os encargos necessários para se realizar
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a sua justa aspiração de ter comunicações radiotelefónicas com a mãe-pátria.
Há muitos anos que a província adquiriu e instalou o material necessário às suas comunicações telefónicas.
Foi até a primeira que teve o material instalado e pronto a estabelecer este serviço público.
Em Fevereiro de 1942 chegou à Guiné um engenheiro alemão, que permaneceu seis meses naquela província para proceder à montagem em Bissau do emissor de ondas curtas.
Em Outubro de 1943, indo da metrópole, desembarcou na Guiné uma missão de melhoramentos das telecomunicações, chefiada por um engenheiro do quadro do Ministério do Ultramar, que se demorou na província por mais de um ano. a dar execução aos seus trabalhos.
Esta missão operou na cidade de Bolama, mas agregou a si um funcionário do quadro dos correios da província, funcionário que hoje é director dos correios de Macau, o qual conseguiu pôr em funcionamento o terminal - segredo da estação emissora de Bissau. E, depois de feitas várias tentativas experimentais, por intermédio da Rádio Marconi, para escolher o melhor comprimento de onda adaptado às condições de Lisboa, conseguiu-se uma boa audição.
Foi então que, em 1 de Dezembro de 1944, se fez uma inauguração, ou experiência oficial, das comunicações telefónicas entre Bissau e Lisboa.
O governador da Guiné falou telefonicamente com o Sr. Ministro das Colónias e com outras entidades.
É certo que as comunicações telefónicas não ficaram abertas ao público a partir daquele momento; e davam-se como justificação da falta de funcionamento deste serviço, entre outras, as seguintes razões: a Companhia Portuguesa Rádio Marconi não ter então um circuito livre e ainda não se encontrarem fixadas as taxas respectivas.
O certo é que já lá vão decorridos sete anos, após a referida inauguração, e a Guiné, que foi a primeira província ultramarina a adquirir e instalar o material emissor, ainda hoje não dispõe do serviço público das comunicações radiotelefónicas.
Devem haver, certamente, razões até hoje insuperáveis, tais como a falta de técnicos devidamente habilitados, longos prazos e demoras no fornecimento de material indispensável ao bom funcionamento das comunicações telefónicas, e outras razões desconhecidas do público, que têm impedido ou atrasado a realização completa de tão importante melhoramento da província da Guiné.
Mas o facto de o público desconhecer essas razões não impede que se admita a sua existência.
E embora se lamente que durante tantos anos a Guiné ainda esteja desprovida, não por culpa sua, do importante serviço das comunicações telefónicas, espera-se confiadamente na acção do Governo, a quem o País tantos benefícios deve, que os obstáculos que se têm oposto ao funcionamento deste serviço público sejam prontamente removidos logo que as circunstâncias o permitam.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Vai começar a discussão, na generalidade, da proposta de lei sobre as bases da organização da defesa nacional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Frederico Vilar.
O Sr. Frederico Vilar: - Sr. Presidente: sendo hoje a primeira vez que tenho a honra de falar nesta Assembleia, é com muita satisfação que cumpro o dever de apresentar a V. Exª. as minhas homenagens.
Para VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, vão as minhas mais cordiais saudações.
O facto de, depois da Lei n.º 2:024, de 31 de Maio de 1947, terem sido levadas a efeito alterações, resultantes do Decreto-Lei n.º 37:909, de 1 de Agosto de 1950, na organização dos departamentos ministeriais impõe a adaptação das bases daquela lei.
O relatório do Governo que antecede a proposta de lei em discussão confessa-o francamente: «as providências constantes da proposta de lei n.º 514, agora submetida à apreciação da Assembleia Nacional, serão talvez, por agora, medidas que se me afiguram insuficientes para fazer face às dificuldades encontradas».
Assim, deve concluir-se que essa proposta de lei não vem, praticamente, adiantar muito no sentido de definir a orientação segura sobre a estrutura militar, de forma a que corresponda convenientemente às bases em que assenta a organização da defesa nacional, em conformidade com a Lei n.º 2:024, de 31 de Maio de 1947.
O douto parecer da Câmara Corporativa não se afasta desta opinião quando afirma que a «organização portuguesa se apresenta como um caso sui generis», classificação esta nascida da experiência própria e alheia, cujos resultados nem sempre são os mais aconselháveis.
Pretende-se, diz-se no relatório da proposta de lei, reforçar ligeiramente os poderes do Ministro da Defesa Nacional.
Não se me afigura, todavia, que as bases da proposta de lei dêem ao Ministro da Defesa Nacional a possibilidade de coordenar (uma das modalidades seguidas em vários países) e muito menos concentrar (caminho seguido por outros) tudo o que à defesa nacional possa e deva interessar.
Não se criou o Ministério da Defesa Nacional e o Ministro chamado da Defesa Nacional não tem atribuições que lhe permitam organizar, dirigir e manter tudo o que nesse sentido possa interessar à Nação.
Vozes: - Muito/bem, muito bem!
O Orador:- Em plena concordância com o ilustre relator da Câmara Corporativa quando afirma que a preparação e execução da guerra exigem a impulsão permanente e rapidez», é nossa opinião que, desde longe, durante a paz, devem funcionar convenientemente todos os órgãos da defesa nacional, pois só assim poderá exigir-se-lhes o rendimento conveniente em tempo de guerra.
Não é, pois, de satisfazer a proposta de Lei n.º 514. e acerca dela muito mais haveria que dizer, embora seja bastante elucidativo o notável parecer da Câmara Corporativa e suas declarações de voto, documentos esses de literatura militar que muito honram os seus autores.
Mas, porque de forma alguma nos arredamos da posição de leais colaboradores do Governo, confiando que o tempo e a experiência venham a indicar a necessidade de preencher as lacunas notadas no actual documento, damos o nosso voto à proposta de lei n.º 514, com as seguintes alterações resultantes da discussão havida na Comissão de Defesa:
BASE I
Como no parecer da Câmara. Corporativa, substituindo a frase «política de guerra» por a política
militar».
BASES II E III
Como no parecer da Câmara Corporativa (salvo as questões de redacção).
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BASE IV
Como a redacção da proposta de lei.
BASE V
Como a do parecer da Câmara Corporativa, com as seguintes alterações:
d) Em vez de «Defesa Passiva», «D. C. T. (Defesa .Civil do Território)», eliminando o parêntese seguinte;
b) Substituir «sob a presidência do Presidente do Conselho de Ministros e vice-presidência do Ministro da Defesa Nacional» por «sob a alta orientação do Presidente do Conselho de Ministros e directa presidência do Ministro da Defesa Nacional».
BASE VI
Como no parecer da Câmara Corporativa.
BASE VII
Idem.
BASE VII
Idem.
BASE IX
Idem.
O Sr. Mário de Figueiredo: - Tenho dúvidas sobre o conteúdo dessa fórmula: «Defesa Civil do Território». Podem na defesa civil do território -no significado técnico desta fórmula- ser utilizadas a artilharia antiaérea e a aviação de caça, ou não abrange aquele significado a possibilidade da utilização destas armas?
Como se sabe, a artilharia antiaérea e a aviação de caça estão sob o domínio da competência do Ministério do Exército. Se elas são de utilizar como defesa do território no interior, não devem - quando tenham de ser aí utilizadas - estar sob o domínio da competência do Ministério da Defesa? Eu creio que sim.
O Orador:-Pela designação genérica de D. C. T. estão de facto abrangidas todas as medidas que o Governo entenda tomar, quer activas quer passivas, e precisamente os dois ramos a que V. Exª. acaba de fazer referência. São dois ramos essenciais na defesa civil do território e, como V. Ex.ª acaba de dizer, não podem nem devem estar normalmente sob a alçada do Ministro do Exército, porquanto têm funções em tempo de guerra perfeitamente definidas nitidamente fora da sua alçada.
Na zona da retaguarda essa atribuição, como elemento coordenador de .tudo quanto respeita à defesa nacional, deveria estar sob a alçada do Ministério da Defesa.
O Sr. Ribeiro Cazaes: - Apenas para um esclarecimento que entendo dever prestar, não só por fazer parte da Comissão de Defesa Nacional desta Assembleia, mas também porque colaborei na criação da Defesa Civil do Território, a qual é regulada pelo Decreto n.º 31:906. Aí se define perfeitamente aquilo que lhe compete, tendo sido a sua execução confiada à Legião ^Portuguesa.
E, como V. Exª. disse -e muito bem-, ela não envolve exclusivamente a defesa passiva, mas sim também, de algum modo, a defesa activa. Aliás, V. Ex.ª soldado como eu, sabe a dificuldade que há em classificar uma e outra.
Todavia, não resta dúvida, como V. Ex.ª. também afirmou, de que a defesa civil do território e ainda tudo o que se prende com a defesa do interior deve estar subordinado ao Ministro da Defesa Nacional.
A expressão empregada pela Câmara Corporativa de defesa passiva» não é suficiente. Não abrange todos os sectores de defesa indispensáveis à segurança do interior.
Por isso mesmo opto pela forma apresentada pelo Governo, que está mais em conformidade com o interesse da defesa nacional.
O Orador:-Voltando ainda ao termo D. C. T., julgo que tenho razão.
Ele corresponde ao que hoje se entende por esse conjunto de medidas que têm de ser tomadas à retaguarda para defender o que de defesa carece em caso de guerra. E, embora seja das pessoas que normalmente têm relutância em ir copiar fora o que lá se faz, devo dizer que foi aos regulamentos ingleses que fomos buscar esta designação de D. C. T., certos de que, ao faze-lo. procurámos englobar nela tudo quanto possa interessar à defesa da retaguarda.
O Sr. Ribeiro Cazaes: - V. Ex.ª. dá-me licença? Só para mais um ligeiro esclarecimento.
Nós podemos ter o orgulho de dizer que não fomos" à Inglaterra, país que aliás me merece muita simpatia e do qual temos recebido muitas lições nem à Inglaterra nem a qualquer outro país -, colher a noção do defesa civil.
O Orador:-Não me referi à noção.
O Sr. Ribeiro Cazaes: - Nem a noção, nem a definição, nem a execução.
Mais ainda: nasceu em Portugal o primeiro trabalho sobre defesa civil. A designação e a noção devem-se ao nosso Governo, devem-se aos servidores da Revolução Nacional.
O Orador: - Continuando, Sr. Presidente, direi que a outra alteração proposta na alínea 6) será substituir «sob a presidência do Sr. Presidente do Conselho de Ministros e vice-presidência do Ministro da Defesa Nacional» por o sob a alta orientação do Sr. Presidente do Conselho de Ministros e directa presidência do Ministro da Defesa Nacional». Foi esta a alteração proposta à base v.
A base VI foi aprovada tal como consta do parecer da Câmara Corporativa. As bases vil, viu e IX nas mesmas condições.
Eis, Sr. Presidente e Srs. Deputados, %o que, em resumo, julgo dever apresentar a VV. Ex.ªs como resultado da discussão havida ontem na Comissão de Defesa Nacional.
Tendo sido na qualidade de presidente da Comissão de Defesa Nacional que tive a honra de subir a esta tribuna, não a desejo abandonar sem deixar vincada uma palavra de grande respeito e admiração pelo meu antecessor, Sr. General Craveiro Lopes, a cujas altas qualidades morais e grande cultura presto a minha homenagem, desejando-lhe as maiores venturas no desempenho da sua alta missão.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Vasco Lopes Alves: - Sr. Presidente: as minhas primeiras palavras são de cumprimento para V. Ex.ª Congratulo-me com o facto de mais um ano servir o País nesta Casa sob a presidência de V. Ex.ª e sob a sua orientação, sempre sáia e superiormente inteligente.
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A VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, manifesto também o meu desvanecimento por mais unia vez estar em colaboração convosco, salientando o meu apreço pela elevação com que sempre são postos nesta sala todos os assuntos de interesse nacional.
Trata-se de dizer algumas palavras sobre a presente proposta de lei, relativa às babeis ida defesa nacional. Essas bases, redigidas pelo Governo, demonstram, o constante interesse que o Governo da Nação tem manifestado por todos os assuntos respeitantes ás altas conveniências do País.
Foi a proposta de lei à Câmara Corporativa para ali ser estudada e mereceu dela um parecer e umas pequenas aliterações. Passou depois á Comissão de Defesa Nacional Nacional desta Câmara, ande foi de novo estudada, devo dizer que com muito pouco tempo (apoiados), porque só ontem recebemos o parecer da Câmara Corporativa, e não foi possível fazer um estudo aprofundado. Mas a matéria é tão clara e de tal nível o alcance daquelas bases que, de facto, apesar das dificuldades originadas pela falta de tempo, o trabalho fez-se e foram introduzidas pequenas modificações pelas quais as bases da referida proposta ficam com uma forma que participa da reducção primitiva da proposta do Governo e da que lhe foi dada pelo parecer da Câmara Corporativa.
Desta maneira afigura-se-me que poderia dispensar-me de subir a esta tribuna para fazer comentários a este diploma se ele não viesse precedido de um preâmbulo que, aliás, não está em discussão nesta Câmara por
não conter matéria dispositiva, mas sobre p qual incidiu uma declaração de voto de um oficial de marinha muito competente, invulgarmente competente, declaração que eu perfilho inteiramente.
Nessa declaração de voto contêm-se observações a alguns conceitos que figuram no referido preâmbulo. Porque esses conceitos poderão, de. futuro, informar a promulgação de novas medidas a tomar pelo Governo, convém primeiro que tudo sugerir um pormenor que nele se encontra expresso: que a experiência ainda não aconselhou, até agora, que se mudasse o sistema actualmente em vigor relativamente à orgânica da defesa nacional. Designadamente, trata-se de distinguir entre o sistema de coordenação dos vários departamentos do Estado que tratam dos assuntos militares e o sistema de concentração, pelo qual, além das funções de coordenação, se reúnem em determinada entidade os poderes para orientar e promover os actos necessários à defesa.
Isto por um lado. Por outro, falando-se no Subsecretariado de Estado da Aeronáutica, refere-se a circunstância, que pode prever-se para o futuro, de todas as forças aéreas serem nele integradas.
Sobre estes dois pontos incidiu a declaração de voto de um dos oficiais de marinha que fazem parte da secção respectiva da Câmara Corporativa:
Diz-se nessa declaração de voto que o sistema de concentração tem sido adoptado por vários países sem marinha, com pequena marinha, com marinha já de vulto mas sem tradições e também em alguns países com marinha de vulto e tradições navais. Isto quanto ao sistema de concentração.
Quanto ao sistema de coordenação, ele tem sido adoptado noutros países, como os Estados Unidos da América, a Inglaterra, o Brasil e a Espanha, nações com as quais nós, em caso de emergência, estaremos certamente muito intimamente ligados, política e militarmente.
E evidente que a posição da marinha de guerra em qualquer resolução futura a este respeito não pode deixar de merecer a maior ponderação por parte do Governo, e, consequentemente, também por parte desta Câmara, dessa, circunstância, portanto, resultam as minhas considerações de agora.
Pelo que respeita às suas tradições, tem a marinha de guerra portuguesa tido sempre, entre as actividades da Nação, lugar de alto relevo. Pelo lado da sua importância militar, basta ver qual o valor das nossas posições estratégicas do Atlântico, o valor da utilização das nossas costas marítimas para operações de guerra e a importância da nossa marinha na protecção aos nossos territórios ultramarinos e nas suas ligações com a metrópole. Por esses elementos se. avalia o vulto que os factos navais poderão ter em qualquer conflagração. Sob outro aspecto, ainda, a marinha de guerra não poderá deixar de pesar fortemente em quaisquer considerações do Governo sobre esta matéria; refiro-me a circunstância de que o respectivo departamento, na ordem administrativa, não se ocupa apenas dos assuntos da marinha de guerra, mas também -e, segundo me parece, assim deve continuar" a suceder - de outras questões que a ela estão indissoluvelmente ligadas. São as questões de fomento marítimo, bem como as da marinha mercante e da marinha de pesca, as quais em caso de guerra deverão, dar uma cooperação efectiva à marinha de guerra, funcionando sob a sua orientação e fornecendo pessoal de reserva para as acções em que tenha de entrar.
Por isso me parece que foi a propósito a declaração de voto, por forma a constituir um elemento que mais tarde possa influir na decisão do Governo quando no futuro tenha de optar pelo sistema de coordenação ou pelo de concentração.
O outro ponto da declaração de voto é o que respeita à posição da aviação dentro das forças navais.
Vários países optaram por uma aviação única, outros, dentro deste sistema, mantiveram a sua aviação naval; alguns, ainda, têm várias aviações independentes.
Ë evidente que, nos países de muito pequena marinha, sem possibilidades ou necessidades de desenvolvimento, o assunto poderá talvez considerar-se secundário. Pelo que nos diz respeito, porém, se bem que a marinha seja consideràvelmente inferior ao que necessitamos, devemos alimentar Quanto a nós, tem de começar por frisar-se que não podemos ter a pretensão de possuir uma aviação estratégica; teremos sempre uma aviação táctica, de cooperação com as forças do Exército ou com as forças da Armada, e incluindo a aviação dei caça {Mira defesa do território. A aviação de cooperação exige, como qualquer outro ramo, um alto grau de especialização. Em 1942 visitei várias unidades de marinha na Alemanha, como membro de uma missão naval para que fui nomeado quando era director da Aeronáutica Naval, e também unia base de aviação. Já nessa altura se entendia na Alemanha que para os ataques a submarinos eram necessários observadores aeronáuticos que fossem especializados em submarinos e que para a defesa dos submarinos contra ataques aéreos eram necessários oficiais de submarinos que fossem especializados em aviação.
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Acaba, de sair numa revista um artigo, subscrito por um ilustre almirante francês, pessoa muito conhecida nos meios navais, no qual se diz que a sorte da guerra no Atlântico teria sido diferente se à marinha alemã não tivessem sido subtraídos pelo alto comando aeronáutico alemão os elementos privativos de aviação de que precisava.
Parece-me que esta experiência é bastante para nos obrigar a ponderar com cuidado quando haja de se resolver sobre a necessidade de a Marinha possuir a sua aviação própria.
A declaração que vem apensa ao parecer da Câmara Corporativa está por tal forma bem elaborada, debaixo de todos os pontos de vista, designadamente sob o ponto de vista técnico, que me não parece que possa juntar-Ihe qualquer coisa, a não ser estes elementos de pormenor.
O meu objectivo é, por consequência, essencialmente, manifestar a minha concordância com a oportunidade das bases que vão ser submetidas á aprovação da Assembleia e com a referida declaração de voto.
Tenho apenas mais uma observação a fazer.
Disse o Sr. Brigadeiro Vilar que a sua presidência na nossa Comissão de Defesa Nacional se segue à presidência do Sr. General Craveiro Lopes, lembrando as outras qualidades de S. Ex.ª. e a forma distinta com que sempre (presidiu à mesma Comissão.
Na minha qualidade de oficial de marinha, por acaso o oficial de marinha mais antigo que se encontra naquela Comissão, não quero deixar de também lembrar S. Ex.ª, congratulando-me pela sua ascensão ao alto cargo que hoje ocupa, merecê das suas muitas e excepcionais qualidades.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Ao mesmo tempo, quero dizer que me congratulo pelo facto de a presidência da referida Comissão estar presentemente entregue ao Sr. Brigadeiro Vilar, que ainda ontem, na sessão que tivemos, mostrou as qualidades que todos nós já lhe conhecíamos, incluindo uma grande elevação e nona grande imparcialidade.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Sousa Rosal: - Sr. Presidente: Portugal é já pedra posta no vasto tabuleiro do Mundo, onde jogam neste momento um jogo .estratégico da mais alta importância para os destinos da humanidade os dois agrupamentos de nações e homens em que o Mundo se dividiu em consequência de conceitos diferentes de vida.
Jogo que se afigura perigoso, porque só levará a uma vulnerável paz de compromisso ou ao desencadear de unia guerra de extermínio.
Erro é continuar a afirmar que vivemos em clima de guerra fria, porquanto as forças militares dos dois agrupamentos iniciaram há muito tempo a sua marcha de aproximação para as frentes da Europa e da Ásia.
Na Europa estabeleceram apenas o contacto, perturbado de quando em quando por pequenos incidentes de fronteira.
Na Ásia estão em curso caracterizados e duros combates de empenhamento.
Para o desencadear de uma guerra, que tudo indica que será total e violenta, iniciada sem aviso prévio, basta dar mais um passo em frente.
Porque não podemos ficar indiferentes ao desenrolar dos acontecimentos, nem afastá-los do terreno dos nossos interesses materiais e espirituais e, possivelmente,
das nossas fronteiras, que se estendem por quatro cantos do Mundo, temos «lê nos colocar em condições de desempenhar com eficiência e honra a missão que aios cabe e a que nos comprometemos.
Na proposta de lei apresentada .revela-se o propósito de coordenar e fazer actuar harmoniosamente os seus factores essenciais: a política, a força militar e a economia, no (plano que o Governo julgou conveniente pô-los nesta oportunidade.
A Lei de Meios, que acabamos de votar, já pôs à disposição da defesa nacional os meios financeiros de que podemos dispor para esse fim.
Foi para fazer algumas considerações sobre o factor económico, devidamente enquadrado na proposta de lei, a mais importante actividade da mobilização civil, que me dispus a subir a esta tribuna.
Em períodos de emergência o Estado tem o direito e o dever de intervir directamente na vida económica da Nação, encaminhando-a com método e energia para servir o esforço militar posto a buegadamente ao dispor da Pátria em perigo. Intervenção que tem de exercer-se através das medidas tomadas e planos estabelecidos desde o tempo de paz. Planos que devem considerar o emprego de pessoal, do equipamento industrial e dos recursos naturais e que hão de constituir a estrutura da mobilização económica. Para tanto é necessário pôr em equação todos os factores que a condicionam, entre os quais se situam de maneira preponderante os seguintes:
A validação das necessidades, distinguindo as puramente militares das restantes e destas as indispensáveis e as supérfluas.
A valiação dos recursos nacionais, inclusive os das nossas provincias ultramarinas e os que podem ser cedidos por aliados e adquiridos em países neutros.
Os transportese que podem servir a reunião e a distribuição dos recursos.
Racionamentos e restrições impostos pelo desequilibrio entre as necessidades e os recursos.
Quantidade e qualidade da mão- de-obra utilizável.
Limites que pode atingir a produção industrial e agrícola.
Técnicos e administradores, com experiência em organizações do estado ou em empresas particulares, capazes de assumir no momento oportuno a direcção dos diferences sectores, económicos a movimentar para a defesa nacional.
Domínio e disciplina do consumo, dos preços e dos salários.
Á mobilização económica tem ide exercer-se de maneira coordenada e competente nos seus ramos principais: agrícola, industrial, comercial e transportes.
No agrícola tem de «e. considerar a extensão e natureza dos terrenos cultiváveis, facilidades aos agricultores - dinheiro, sementes e ferramentas, assistência técnica e garantia de preços remuneradores e de consumo dos produtos.
No industrial tem de se respeitar o princípio da racionalização, para e atingir o maior rendimento, o que é facilitado pela centralização directivo- e colocação certa dos produtos. Isto é importante, dado que este ramo de mobilização económica tem de atender as necessidades mais prementes da guerra, que cada vez é mais um conflito de máquinas.
A indústria tem de se adaptar, eliminando o dispensável, reforçando o necessário e melhorando o deficiente, num ajustamento conveniente do capital, trabalho e administração.
No comercial tem de se buscar a colaboração indispensável ao reabastecimento das forças armadas e
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marcar-se os condicionamentos que hão de regular as aquisições e definir o seu papel distribuidor à população civil, de modo que a esta chegue sempre o possível e nas quantidades fixadas.
No de transportes procura-se aproveitai- todos os meios e coordená-los, de modo a fazê-los marchar para pôr os homens e as coisas nos lugares próprios ao seu destino e á sua acção «com oportunidade e em todo o tempo:
Merecem os transportares o maior cuidado, porque influenciam decisivamente o labor económico e o labor militar que as desenvolve das retaguardas ás frentes de batalha.
Em tudo se verifica a preponderância que o factor económico tem na condução da guerra, sendo ele idos meios não militares o que mais influência exerce nas decisões e marcha dias operações militares e o que anais preocupa o Governo em períodos "de emergência, podendo mesmo dizer-se que o papel de mm governo de guerra é "essencialmente em papel económico.
Em compensação, os governos sentem-se aliviados de algumas preocupações que os afligem em tempo de paz, originadas no económico.
O desemprego e a luta pela melhoria das condições de vida e pelo menor esforço são as mais evidentes.
O desemprego desaparece durante a guerra, apesar de um certo número de actividades económicas terem cessado, ou atrofiado, para não se sacrificarem as indispensáveis.
As massas, que lutavam por melhorias económicas com o fim de elevarem o nível de vida e diminuírem o número de horas de trabalho, aceitam severas restrições e o aumento de esforço, colocando em primeiro lugar a honra e o prestígio da Nação.
Em tempo de paz não se encontrou ainda uma razão emotiva que leve as massas, sem reserva mental ou coacção, u estes sacrifícios, para permitir o pleno emprego dos homens. Este desandar, até certo ponto incompreensível, do sentir humano, entre o reclamar do pão e o reclamar do canhão, é mais brusco e desconcertante em certos países onde imperam doutrinas dissolventes. Contudo, os dirigentes de uma economia de guerra não devem deixar de estar atentos para que o moral não seja atingido com exageros condenáveis, procurando sempre anteceder as medidas que levem ao apertar mais um furo ao cinto com a necessária propaganda justificativa.
. Não basta, porém, dispor de homens e de material com maior ou menor abundância; é indispensável saber explorá-los e pô-los em condições de acudir às necessidades da guerra sem enfraquecer os alicerces materiais e morais da Nação.
O contacto que a proposta de lei estabelece no Conselho Superior da Mobilização Civil entre o mundo militar e o anuindo civil para o planeamento da defesa nacional é propício ao estudo e solução dos. assuntos políticos, militares e económicos que ela suscita.
Ao espírito dos militares surgirá mais claro o equilíbrio que deve manter-se entre as operações de guerra e os recursos económicos e conveniências políticas.
Ao espírito dos civis surgirão mais evidentes as particularidades que condicionam as operações militares para se executarem com êxito.
Deste ajustar de pensamentos e no atentar da evolução do progresso das ciências fornecendo novos meios sairá bem formada a concepção da defesa nacional para servir melhor as forças militares no que carecem para viver e combater em todos os lugares e circunstâncias e as necessidades da população com as restrições que a economia de guerra lhe impõe.
A defesa nacional, no seu aspecto económico, não limita as suas previsões à mobilização total de recursos paru os pôr ao serviço da Nação ameaçada; também
solicita, a actuação das forças militares para exercerem acção defensiva e ofensiva sobre objectivos económicos.
O enfraquecimento e destruição do equipamento económico de um país contam-se nas primeiras preocupações do desencadear de uma guerra, o que obriga a planear a defesa dos centros industriais, meios de comunicação e bases de reabastecimento e, logicamente, a preparar as medidas ofensivas destinadas a destruir iguais objectivos do inimigo.
Durante a última guerra, junto das grandes unidades e dos teatros de operações, foram instalados especialistas da economia e criados mesmo departamentos do, Estado encarregados exclusivamente do serviço de informação para conduzir a guerra económica. Este serviço deve estar também organizado desde o tempo de paz e permanentemente actualizado, de maneira que em todo o tempo se possa saber dos recursos naturais de cada nação, produção agrícola e industrial e sua localização e ainda as. dependências de importação, para se avaliar do seu potencial bélico e actuar sobre ele com os meios militares.
A ilustrar o valor da guerra económica temos u derrota alemã no último conflito internacional.
A Alemanha ao lançar-se na luta tinha os mais perfeitos planos de mobilização económica. Planos postos em execução mesmo antes do desencadear das operações militares. Pois, apesar disso, o seu valioso poder militar foi ferido de morte com a guerra à sua economia, no atingir dos centros industriais e vias de comunicação, destruindo instalações, perturbando a produção e dificultando o reabastecimento de matérias-primas e outros produtos indispensáveis à vida das forças armadas e ao labor das suas oficinas. Assim se compreende a luta fero desenvolvida no ataque e defesa das instalações das indústrias de guerra e das linhas de comunicações pela aviação e submarinos.
Hitler, numa das suas cartas u Mussolini, dizia:
O malogro final da nossa vitoriosa ofensiva na Líbia contra os ingleses foi na realidade devido à impossibilidade de resolver o problema dos transportes da Itália ou de Creta para Tobruk e Marsa Matruk. Conquistas militares ou ganhos conseguidos pelos nossos adversários estão por isso dependentes da capacidade destes em manterem as suas linhas de comunicação. A ameaça contra os abastecimentos há-de conduzir mais tarde ou mais cedo a uma catástrofe.
E a previsão foi certa, mas para os seus.
Da história das duas últimas guerras mundiais também devemos tirar outros ensinamentos para o planear do económico. Este tem de ser rodeado de precauções administrativas e fiscalizadoras que contrariem eficazmente o ambiente de prodigalidade que se gerar com a guerra.
Ganhar a guerra por qualquer preço, porque o inimigo tudo pagará, foi pensamento que acarretou pesadas dificuldades e tristes desilusões aos vencedores. Nas duas grandes guerras os vencidos passaram a constituir pesados encargos e motivos de prementes preocupações para os vencedores.
Não menos importante é o planear da desmobilização e readaptação da economia de guerra à vida normal.
Por isso se deve ir prevendo e providenciando no decorrer dos conflitos, de modo que, ao surgir o fim das hostilidades, a paz se possa iniciar com um curto período de transição, num ambiente de equilíbrio, para não provocar a desordem e a ruína da vida económica.
Estes simples comentários e enunciar de dados) a propósito dum grande ângulo desta proposta ide lei, forçado com brilho, objectividade e oportunidade no parecer da Câmara Corporativa, e que provocou a minha atenção
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de homens de serviços, dão uma ideia do vasto e importante campo de cação que tem na sua frente o Conselho Superior de Mobilização Civil, a que preside o Sr. Ministro da Defesa Nacional, e donde emergem variados e complexos problemas, que devem ser estudados e resolvidos na paz, para poderem ser accionados na guerra, num sentido único, com eficiência e um minimo de perturbação para a vida da Nação e o máximo de segurança para as operações militares, e por isso não posso concordar com a base V da proposta, que relega para o tempo de guerra a constituição do Concelho Superior de Mobilização Civil.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Quelhas Lima: - sr. presidente. E Srs. Deputados: sinto que, em rigor não teria de subir à tribuna para tratar o assunto em discussão, que no momento pretende a atenção da Câmara, depois das judiciosas considerações dos ilustres Deputados que me antecederam e essencialmente da falta correcta, inteligível e convincente do Sr. Deputado Vasco Lopes Alves, tanto mais que, sem limitações, não só concordo, como me identifico, com a sua criteriosa apreciação do conjunto.
Confessada em plena contrição de espírito em sincera asserção, vou procurar, pela própria natureza das coisas, ser o mais rápido possível, evitando penalizar a Câmara com divagações que não conduzam a uma finalidade que em meu entender convém alcançar.
A proposta de lei relativa às bases da defesa nacional em discussão sucede em ordem lógica, racional, ao Decreto-Lei n.º 37:909, de 1 de Agosto de 1950, e à Lei n.º 2:024, de 31 de Maio de 1947-
Não deixa de oferecer interesse especial e sensível curiosa interrogação íntima que o exórdio, o preâmbulo da lei em discussão não seja rectamente harmónico com a doutrina das bases que lhe devem coroláriamente suceder.
E assim constata-se que, enquanto a Câmara Corporativa na discussão da matéria dispositiva - base - as aprova com ligeiras alterações, aliás bem justificadas, e outro tanto aconteceu à Comissão de Defesa Nacional, a matéria do preâmbulo da lei dá origem a uma substancial declaração de voto do digno Procurador Sr. Comandante Sousa Uva, na qual é acompanhado pelos Dignos Procuradores Srs. General Tristão de Bettencourt e Capitão-de-Mar-e-Guerra João Francisco Fialho e que constitui, pela clarividência dos conceitos que nela se contêm, limpida isenção, capacidade técnica profissional e inteira proibidade intelectual, digno trabalho.
O próprio relator do projecto, o Digno Procurador Sr. Coronel Humberto Delgado, através do seu bem elaborado parecer, demonstrativo de sólida cultura, sobre a teoria ou filosofia da guerra, índice expressivo de um alto nível intelectual, confessa, ou, antes, afirma, com saudável elegância de espírito, no n.º 2, sob o título «Preâmbulo do projecto»:
Não se fecham estas considerações na generalidade sem referir que o preâmbulo do projecto não condiz perfeitamente com o conteúdo da proposta.
Porque terá acontecido assim?
Não tenho, a qualquer título, que considerar o facto. O que está ao meu alcance é fixar desde já efectivamente, Sr. presidente e Srs. Deputados, a minha posição perante a discussão em causa.
E então digo: em matéria dispositiva - bases - aprovo-as tal como a Câmara Corporativa as redigiu, com as alterações introduzidas pela Comissão de Defesa Nacional, o que equivale a dizer que o somatório das alterações introduzidas, pelo seu escasso significado mal tocam a matéria dispositiva das bases propostas pelo Governo.
Na matéria preambular,reconhecidamente se afasta da matéria, dispositiva, como já se referiu, não só aprovo como sou integralmente solidário com a matéria que se contém na declaração de voto do digno Procurador Sr. Comandante Sousa Uva, acompanhada pelos Dignos Procuradores Srs. General Tristão de Bettencourt e Capitão-de-Mar-e-Guerra João Francisco Fialho.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: peço autorização para um breve parêntese:
Se o planeamento da armadura militar da Nação em qualquer período da história deve merecer a mais prudente e cuidada atenção para poder garantir responsavelmente os objectivos marcados ou formulados pela política aios tempos actuais, em que a guerra tomou incontrolàvelmente a sua face «total», a questão toma aspecto de especial delicadeza.
Porque é possível, Srs. Deputados, que a significação do carácter totalitário da guerra seja pouco explícita, ou diga pouco àqueles a quem estes assuntos não são inteiramente familiares, permito-me traçar em meia. dúzia de simples conceitos a tradução literal daquela expressão, com o seu cortejo de consequências jurídicas e humanas na vida de uma nação.
A noção totalitária da guerra aparece-nos incontrolàvelmente acima da vontade dos homens, pelo desenvolvimento progressivo, incessante, da civilização «técnica», e é fácil de deduzir que a aviação gerou de per si e até apressou, pelas suas possibilidades ou características, o carácter total da guerra.
Assim, a aviação, podendo levar, por um lado, a, sua acção aos centros mais afastados do território, arredando desta forma a nação da guerra localizada à frente ocupada pelos exércitos, alargou-a geogràficamente, e ao mesmo tempo esta ameaça ou terrível realidade compele as populações a colaborarem e tomarem parte efectiva, primordial, na batalha pela sua própria existência,- isto é, a guerra estende-se ètnicamente.
A simples integração das extensões geográfica e étnica da guerra gera a sua feição actual -guerra de povos, de gentes-, deixando sem vestígios a concepção de que a guerra é uma simples «relação de Estado para Estado». Já nada tem que ver à face actual das coisas aquela sentimental definição de Herodoto de que «a paz é aquele tempo em que os filhos dão sepultura aos pais e a guerra aquele tempo em que os pais dão sepultura aos filhos».
Enfim, guerra total, guerra de povos, de gentes, com as respectivas consequências de franco regresso às velhas fórmulas da guerra da antiguidade clássica. Quais são essas fórmulas? A última grande guerra mundial já mostrou o negrume do seu significado aos que foram sacrificados na inglória, inútil e indecisa hecatombe, e angustiou aqueles que, sob a firme vontade dos- homens e com a ajuda de Deus, não a sofreram na sua própria carne.
Se me permitirdes ainda uma citação, dir-vos-ei como F. de Coulanges sintetizava com nitidez as fórmulas da guerra na antiguidade clássica, tempo a que incontrolàvelmente regressamos nesta quadra na vida das nações:
Não se fazia sómente a guerra aos soldados. Fazia-«e à população inteira, homens, mulheres, crianças e escravos.
Não se fazia só aos seres humanos, fazia-se também aos campos e às colheitas. Queimavam-se as searas, abatiairí-se as árvores; a colheita do inimigo era votada quase sempre aos deuses infernais,
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e por consequência queimada. Exterminavam-se os gados, destruíam-se mesmo as sementeiras.
Uma guerra podia fazer de um só golpe desaparecer o nome e a raça de todo um povo e transformar uma região fértil num deserto.
Fecho este parêntese para concluirdes comigo, certamente, que quando se definem bases que devem presidir à organização da defesa da Nação, diante de possível situação emergente, quanto a questão deve prender esmagadoramente a nossa atenção.
E assim suponho que me coloco em límpido plano ao evocar que neste terreno pião há capricho que conte, singularidade que possa ter lugar, reserva que se possa sofrer, sentimento que se deva calar, ou qualquer eclipse de intenções, para ajudar à sobrevivência da Nação.
E, nesta recta, obediência, devo proclamar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, voltando à ordem real do nosso trabalho, mesmo com o perigo de repetição ou redundância, que louvo e aprovo a matéria dispositiva das bases e a forma como se encontram redigidas pela Câmara Corporativa, com as alterações introduzidas pela Comissão de Defesa Nacional, e na matéria preambular me identifico, sem limitação, com a declaração de voto do Digno Procurador Sr. Comandante Sousa Uva.
Mas que diz aquela declaração de voto sobre a matéria preambular da lei em discussão, que mais uma vez entendo referir que se considera, em geral, extrapolada da economia das bases?
Não vou meter-me a apreciar ponto por ponto a matéria lá contida. Não me vou pôr ainda a classificar ou a defender esta ou aquela fórmula que deve revestir em definitivo a organização da defesa nacional dentro das modalidades ou sistemas que parecem consagrados nos tempos actuais, nem defender a necessidade evidente, demonstrada, de gritante realidade, da imperativa vantagem de uma aviação privativa da marinha para assim corresponder às exigências das missões que, em ocasião de emergência, lhe serão necessariamente confiadas.
Não; isso seria quase desfeitear aquela declaração de voto, onde tudo isto se contém em linguagem conceituosa, clara, prudente, digna e convincente.
Preferiria antes lê-la, mas por certo a Câmara dispensa-me fazê-lo por economia de tempo e até porque é fácil a sua consulta, fugindo ao mesmo tempo ao desprazer de um mau leitor. Entendo apenas integrá-la na ordem destas considerações no Diário das Sessões, amalgando-me assim com o seu conteúdo.
Dando embora o meu voto de aprovação à matéria dispositiva do projecto de proposta de lei, com as alterações sugeridas pela Câmara, e pondo de lado, por não implicarem com as bases tal como estão redigidas no parecer, uma ou outra afirmação de que neste dissinta, entendo dever manifestar o meu desacordo com a redacção do preâmbulo do projecto, por estabelecer ou enunciar doutrina que, a meu ver, não está consignada nem se pode deduzir das bases e referir alguns pontos em termos que, deixados sem reparo, poderão mais tarde abrir ou facilitar caminho II soluções que não considero as mais úteis para a Nação. Com efeito:
1. Diz-se no preambulo que pela proposta de lei «são ligeiramente reforçados os poderes e atribuições do Ministro da Defesa Nacional, que passa a assumir a responsabilidade directa da organização de todos os aspectos da defesa nacional fora do âmbito normal das forças armadas afectas aos Ministérios do Exército e da Marinha e da orientação das actividades de todos os Ministérios naquilo que para a organização e planeamento da defesa concorrem». Ora, se é certo que as atribuições do Ministro da Defesa Nacional são reforçadas através da posição que se lhe assegura nos Conselhos Superior da Defesa Nacional, Superior Militar e Superior de Mobilização Civil, aliás consentânea com as suas funções já definidas no Decreto-Lei n.º 37:909, de 1 de Agosto de 1950, a verdade é que nenhuma das bases, nem -segundo julgo - aquela posição lhe conferem a responsabilidade directa da organização e da orientação acima transcritas.
2. Refere ainda o preâmbulo que, «decorrido já mais de um ano sobre o sistema que actualmente rege a organização da defesa nacional e a administração das correspondentes forças militares, poderia aproveitar-se a ocasião para aproximar a solução entre nós adoptada daquela que a quase totalidade dos países pôs em prática, certamente por terem concluído ser mais eficiente na acção, mais económica na administração e mais segura nos resultados».
Depreende-se que esta solução, posta em prática pela «quase totalidade dos países», é a que corresponde ao sistema de concentração tal como vem definido no parecer da Câmara. Indicam-se neste quais são esses países e entre eles figuram mesmo a França e a Itália, que em boa verdade adoptaram o sistema de coordenação e não o de concentração.
Mas deve notar-se que, desses países, a Bélgica, a Bolívia e a Suíça não têm marinha de guerra alguma ; Cuba, o Egipto, a Finlândia, as Filipinas, a Irlanda, o Paquistão e a Pérsia não têm praticamente marinha; a Colômbia, a, índia, a Nova Zelândia, o Sião e a União Sul-Africana, possuem alguma marinha, mas nu o têm tradições marítimas; e, finalmente, só as restantes mações dispõem de marinha de apreciável valor e têm, além disso, tradições marítimas.
Compreende-se facilmente que os países ma primeira ou na segunda condição tenham preferido o sistema da concentração. Os restantes terão adoptado igual solução presumivelmente por ela se adaptar melhor à, sina ética e características próprias.
Mas outras e não poucas nações há no Mundo, e aquelas a que mais apertados laços políticos hoje nos ligam a nossa, velha aliada Inglaterra, os Estados Unidos da América do Norte, COMI quem vimos cultivando ultimamente estrita, política de amizade, a Espanha, nação irmã, o Brasil, filho directo, a França, a Argentina, etc. optaram pelo sistema da coordenação.
Não pode, pois, atribuir-se a qualquer dos sistemas mais eficiência na, acção, melhor economia na administração e segurança mais firme nos resultados. Tudo dependerá das condições especiais de cada nação: da sua política, da sua ética, da sua geografia, da natureza e nível das suas forças, das suas tradições, etc. A solução que para umas é boa poderá ser péssimo, para outras.
A experiência realizada entre nós não permite ainda - di-lo, e julgo que bem, o preâmbulo do projecto da proposta, de lei- concluir pela vantagem deste ou daquele sistema em Portugal. Só a continuação dessa experiência e as conveniências que porventura possam resultar de uma solução idêntica à perfilhada pelos países com os quais mantemos mais estreita relação, mais íntimo contacto político e militar, deverão determinar-nos definitivamente sobre o problema.
3. Finalmente anuncia-se no preâmbulo a próxima e efectiva integração de todas as forças aéreas no Subsecretariado da Aeronáutica, já criado.
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São óbvias a necessidade e a vantagem de prover e organizar esse organismo. Mas será, de facto, a melhor base para a solução do problema integrar todas as forças aéreas no Subsecretariado?
O desenvolvimento extraordinário das possibilidades da aviação, permitindo-lhe o operar com independência dos outros ramos das forças armadas na realização de objectivos que se integram na estratégia geral da guerra e concorrem para a finalidade comum de todas as forças, levou, em diversas países, à organização das forças aéreas como um todo, e independentemente da marinha e do exército e no nível deles. Surgiram assim a Royal Air Force, a United States Air Force, o aviação francesa, a aviação espanhola, com os seus ministérios próprios. Mas, decorridos alguns anos, realizado, a experiência das primeiras actuações, feita sobretudo a dura prova, da guerra, logo se reconhece a indispensabilidade de facultar às marinhas a sua aviação privativa, para que elas possam desempenhar com eficiência os funções que lhes são próprias. E é assim que, actualmente, os Estados Unidos da América, têm a sua aviação naval, instruída, preparado, pela marinha, que a Inglaterra e a França dispõem também das suas aviações navais em condições semelhantes e que a Espanha, conforme informações que até nós têm chegado, se prepara para reconstituir a sua, aviação naval.
Mas não se julgue que a necessidade dessa aviação resulta apenas da existência de porta-aviões - tipo de navio que não possuímos - ou do propósito de os construir (como parece ser o caso da Espanha); a aviação naval é indispensável para colaborar com os navios em muitas das suas funções se realizar, entre outras missões, o patrulhamento anti-submarino, em íntima ligação com as unidades navais. Aviões e navios, neste como noutros serviços, têm as suas limitações, e uns não se substituem aos outros, antes se completam.
Temos presente cópia da carta que em 21 de Abril de 1948 o grande e malogrado Primeiro-Ministro da Defesa Nacional americano - James Forrestal - dirigiu aos Ministros do Exército, da Marinha e da Aviação e ao Conselho de Chefes de Estado-Maior (Joint Chieis of Staff), remetendo um documento, aprovado pelo Presidente Truman, com a indicação das promoções dos três ramos das forças armadas e deste Conselho. Nele se estabelecem para a Marinha, como funções principais, as seguintes, entre muitas outras que não interessa referir aqui:
Estabelecer e manter superioridade local (incluindo a aérea) lia área das operações navais;
Conduzir operações aéreas necessárias à consecução de objectivos numa campanha naval;
Ser responsável pela vigilância naval, guerra anti-submarina, protecção da navegação, lançamento de minai?, incluindo a parte aérea correspondente.
Outro documento, de Março do ano corrente, temos à mão, relativo à organização da defesa nacional na Grã-Bretanha, do qual, para não alongar excessivamente esta declaração de voto, me limito extrair a conclusão final:
A Armada Real voltou a exercer inteiro controle da sua aviação baseada em porta-aviões, controle operacional nas forças aéreas marítimas da Real Força Aérea baseadas em terra, e obterá, sem dúvida, em devido tempo, inteiro controle sobre toda a aviação a empregar na condução da guerra no mar.
Uma última palavra quanto à aviação em Portugal. Nós não temos nem é provável que tenhamos jamais, ao que julgo, dadas as características das nossas políticas militar e naval, tal como as posso conceber ou deduzir, aviação estratégica para a realização de objectivos a grandes distâncias; toda a nossa aviação é, e penso que terá de continuar a ser, de função essencialmente táctica: aviação de caça para a defesa- dos centros vitais do País (grandes núcleos populacionais, concentrações industriais, entroncamentos de vias de comunicação, etc.) contra a acção aérea inimiga e para a aquisição e manutenção do domínio local do ar nas zonas onde operem forças, do Exército ou da Marinha ; aviação de cooperação com as forças de terra e as do mar, para a realização dos, seus objectivos.
E; porque à marinha de guerra o menos que poderá ser-lhe atribuído é a defesa marítima dos portos nacionais e suas zonas focais de acesso, das águas costeiras e da nossa navegação naqueles, trajectos onde não possa aproveitar da protecção dos aliados contra a grave ameaça submarina, é indispensável que ela disponha de uma aviação capaz de a ajudar a desempenhar eficazmente essa modesta mas árdua tarefa, isto é, de uma aviação conduzida e tripulada por pessoal com apurado sentido marítimo e naval, ou seja por gente com uma noção exacta e pronta dos múltiplos aspectos das coisas do mar nas suas constantes mutações e o conhecimento bastante do meio naval, das diversas classes de navios, das suas distintas funções e forma como são desempenhadas, do modo como, em cada eventual situação, os navios devem agir, numa palavra, de uma aviação que dela faça parte integrante, guarnecida, e comandada por pessoal seu.
E assim permito-me terminar este rápido comentário sobre a discussão na generalidade da lei que organiza, as bases da defesa nacional.
Não queria, porém, fazê-lo sem evocar, em matéria simultaneamente importante e delicada para a vida- da Nação, o conceito superior, de pura sabedoria, do Sr. Presidente do Conselho: «Discutamos tudo, mas não nos dividamos em nada».
Vozes. - Muito bem, muito bem!
O Orador: - E para tal ouso acrescentar, como fonte orientadora, aquela resposta, conceito ou parábola do Divino Mestre, em certo momento, segundo rezam os textos, e que por ser de carácter divino nem por isso deixa de iluminar magnificentemente o humano, quer se trate ou considere o campo político, social e militar, e que me permito respeitosamente recordar perante a Exa. Câmara: «Dai a César o que é de César».
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi, muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
O debate continuará na sessão de amanhã.
Da ordem do dia constará também a aprovação da última redacção da Comissão de Legislação e Redacção acerca da proposta de lei de autorização de receitas e despesas para o ano de 1952.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 15 minutos.
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Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
António de Matos Taquenho.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Abel Maria Castro de Lacerda.
Alberto Henriques de Araújo.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Sousa Campos.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Diogo Pacheco de Amorim.
João Carlos de Assis Peneira de Melo.
João Cerveira Pinto.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Pinto Mentires.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Domingues Basto.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Salvador Numes Teixeira.
Vasco de Campos.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
CÂMARA CORPORATIVA
Declaração de voto do Digno Procurador Afonso Rodrigues Queiró, a inserir no final do parecer desta Câmara n.º 22/V, publicado no 3.º suplemento ao Diário das Sessões n.º 109, de 6 de Dezembro de 1951:
Aprovei o artigo 6.º da proposta. O interesse público requer naturalmente que o funcionário tenha os seus cuidados e o seu tempo absorvidos pelo desempenho da função - e as ocupações exteriores têm normalmente como consequência desviá-lo do seu serviço, afectando o seu rendimento.
Do ponto de vista social, por outro lado, é necessário pôr entraves a que alguns já colocados absorvam as ocupações disponíveis, em prejuízo dos valores que não encontram o emprego necessário.
Até que ponto se deve, porém, levar na prática a lógica destas imposições do interesse dos serviços e da política social?
Não pode deixar de se ter em conta que é um facto a exiguidade da retribuição dos cargos, dado o aumento desmesurado do custo da vida, tendo a generalidade dos funcionários dificuldade em viver segundo a sua respectiva categoria. Daqui que haja, designadamente ao funcionalismo de baixos e médios proventos, que permitir em certa medida o desempenho conjunto de funções em serviços públicos e em empresas privadas. O mecanismo da autorização prévia deve chegar para manter as coisas distantes do campo dos abusos.
Depois há que reconhecer que as empresas privadas têm realmente interesse em escolher com largueza os seus administradores e servidores e, por vezes, porão naturalmente os olhos em funcionários especialmente qualificados pelos seus conhecimentos, seriedade e tino administrativo. Acresce, por último, que uma política demasiado rígida em matéria de acumulações poderia levar muitos dos melhores e mais categorizados funcionários - os de mais altos proventos- o preferirem os empregos privados, para que são solicitados pelas empresas, aos seus cargos oficiais, abandonando estes, com todos os prejuízos que daí adviriam para os serviços públicos, que não podem facilmente prescindir da experiência e do saber destes serventuários.
Há, pois, que adoptar, quanto aos funcionários mais capazes e mais bem pagos, uma política que em matéria de acumulações tenha em conta não só as superiores exigências sociais e dos serviços públicos, como também as circunstâncias a que acabo de aludir.
Ora suponho que o agravamento de tributação agora previsto não é ainda de molde a provocar perigoso êxodo dos melhores e contribuirá para tornar menos tentadoras as acumulações de empregos por parte dos que auferem os proventos mais elevados.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA