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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 117
ANO DE 1952 10 DE JANEIRO
V LEGISLATURA
SESSÃO N.º 117 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 9 DE JANEIRO
Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex.mo Srs.Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro
Nota. - Foram publicados dois suplementos ao Diário das Sessões n.º 116, inferindo: 1.º, o avião da Câmara Corporativa comunicando aos Digno Procuradores que S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, receberá os cumprimento» dos membros desta Câmara no dia- 1 de Janeiro, e o 2.º, o texto, aprovado pela Comissão de Legislação e Redacção, acerca do decreto da Assembleia Nacional nobre as bases da organização da defesa nacional.
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 13 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado, com emendas apresentadas pelo Sr. Deputado Pinto Barriga, o Diário das Sessões n.º 116.
Deu-se conta, do expediente.
O Sr. Presidente anunciou estarem na mesa, para o cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 10.º da Constituição, diversos numero do Diário do Governo contendo decretos-leis.
O Sr. Presidente comunicou lerem sido recebidos na Mesa os elementos pedido ao Ministério da Economia pelos Sn. Deputados Armando Cândido de Medeiros e Santos Bessa.
Usaram, da palavra as Srs. Deputados Mendes Correia, que evocou a memória, do falecido historiador Joaquim Bensaúde; José Menores e Pinto Barriga acerca, da situação dos amnistiados políticos, e Proença Duarte, para se referir à recente inauguração da ponte sobre o Tejo, assunto sobro que também usaram da palavra os Srs. Deputados Pimenta Prosado, Calheiros Lopes e Amaral Neto.
Ordem do dia. - Iniciou-se a discussão, na generalidade, da proposta de lei do condicionamento da indústria.
Usou da palavra o Sr. Deputado Melo Machado.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 5 minutos.
CAMARÁ CORPORATIVA. - Acórdão da Comissão de Verificação de Poderes n.º 20/V.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Albino Soares Finito dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
Américo Coortes Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromoicho.
António Calheiros Lopes.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Ferreira.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António de Sousa da Câmara.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
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Caetano Maria de Abreu Bedirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos de Azeredo Mandes.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Elisão de Oliveira Alves Pimenta.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes dia Costa Amaral.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Metades do Amaral.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
José Cardoso de Matos.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
José Pinto Meneres.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco Lopes Alves.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 79 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 13 minutos.
Antes dá ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 116.
O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: desejo fazer várias emendas ao Diário em discussão.
A p. 105, col. 1.ª, a 1.38.ª onde se diz: «tem estes», deve ler-se: «tem destes»; a 1. 50.ª, a seguir à palavra «utilizados», devem colocar-se reticências (...), e a 1. 51.ª, onde se lê: «foi retirada», deve ler-se: «de retirada» ; na col. 2.ª da mesma página, 1. 11.ª, onde se lê: «que começou», deve ler-se: «de que começou». A p. 106, col. 2.ª, a 1. 41.ª, a seguir à palavra «academias», deve ler-se a palavra «militares», e a 1. 69.ª, a seguir à palavra «poder», deve ler-se: «fazer». A p. 107, col. 1.ª, a 1. 14.ª, onde se lê: «ela», deve ler-se: «mobilização», e a 1. 15.ª, onde se lê: «tiverem», deve ler-se: «estiver».
Tenho dito.
(Por lapso, no Diário anterior não se fez menção, no discurso do Sr. Deputado Pinto Barriga, das vozes de a Muito bem» com que várias vezes foi interrompido nem se disse, no final, que o orador fora muito cumprimentado).
Pausa.
O Sr. Presidente:-Visto mais nenhum Sr. Deputado desejar fazer qualquer rectificação ao Diário em discussão, considero-o aprovado.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Dos Grémios da Lavoura do Cadaval e de Mafra pedindo a isenção do condicionamento das indústrias subsidiárias agrícolas.
O Sr. Presidente:-Foram recebidos na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho, em cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, os n.º 262, 263, 265, 266, 268, 270, 271, 272 e 273 do Diário do Governo, respectivamente de 17, 18, 20, 21, 24, 27, 28, 29 e 31 de Dezembro último, que contêm os Decretos-Leis n.º 38:561, 38:563, 38:564, 38:568, 38:569, 38:571, 38:572, 38:575, 38:577, 38:582, 38:587, 38:589, 38:593, 38:594 e 38:595.
Estão na Mesa os elementos solicitados ao Ministério da Economia pelos Srs. Deputados Armando Cândido de Medeiros e Santos Bessa, os quais vão ser entregues aos mesmos Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Correia.
O Sr. Mendes Correia: - Sr. Presidente: desejo proferir algumas breves palavras de homenagem a alguém que foi uma grande figura portuguesa e que acaba de desaparecer do mundo dos vivos. Refiro-me ao Dr. Joaquim Bensaúde, nascido em Ponta Delgada, no coração do Atlântico, nessas ilhas que são um baluarte de Portugal em pleno oceano; dir-se-ia que no lugar do seu nascimento estava marcado o sentido de unia vocação futura de estudioso.
Bensaúde foi para a Alemanha estudar Engenharia, fazendo um curso brilhante, mas, a breve trecho, apaixonou-se pelos estudos da história das navegações e, em 1912, como fruto resultante das suas investigações nos arquivos daquele país, levantava o estandarte de reivindicações justas de prioridades portuguesas em matéria de navegação.
Até então vigorava, quase que exclusivamente, no mundo culto, a tese tendenciosa de que a epopeia marítima dos Portugueses tinha sido inspirada e petrechada nos conhecimentos alheios: as Efemérides, de Regiomontano, e o ensino, por Martim de Boémia, do uso da balestilha. Era a tese de alguém que constituiu, de facto, uma grande glória na história da ciência, mas que foi profundamente injusto para com Portugal: Alexandre de Humboldt.
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Joaquim Bensaúde, já na esteira do seu mestre Ravenstein, pugnou pela justiça que se devia aos astrónomos e nautas peninsulares, e o certo é que, pouco a pouco, com a publicação dos seus trabalhos, conseguiu impor a tese verdadeira e levá-la ao conhecimento e à consideração de todo o mundo culto.
Como era natural, recebeu em Portugal e no estrangeiro as maiores consagrações académicas e universitárias.
Foi notável o elogio académico que dele fez o espanhol Novo y Colzon, como o relatório de Bigourdan à Academia das Ciências de Paris no sentido de lhe ser concedido o prémio Binoux. A nossa vetusta Universidade de Coimbra concedeu-lhe o título de doutor honoris causa. O Governo Português tributou-lhe as mais altas homenagens e a Sociedade de Geografia concedeu-lhe o diploma de sócio honorário.
Trata-se de alguém ligado por laços de família a outras individualidades do mais alto relevo na vida do nosso país.
A família Bensaúde é cheia de moines ilustres, e Joaquim Bensaúde não desmereceu aos títulos honrosos da sua família, antes os acrescentou magnificamente.
Foi das primeiras figuras na nossa história da ciência. No que respeita aos estudos das navegações portuguesas, ele é um dos nomes mais gloriosos, como o foram os do visconde de Santarém, do malogrado D. Luciuno Pereira da Silva e do comandante Fontoura da Costa.
Foram, por assim dizer, seus discípulos, figuras como o saudoso Prof. António Barbosa e alguém felizmente ainda vivo, o visconde de Lagoa.
Está de luto a ciência nacional com a morte de Bensaúde; mas, pelo que este fez pela sua pátria, pela glória e prestígio de Portugal, está de luto também o País.
Dois ensinamentos principais nos deu, a meu ver, o labor de Joaquim Bensaúde. O primeiro é o da importância do apoio, dos recursos materiais, para a realização de uma obra científica verdadeiramente eficiente.
Não bastam as vocações desinteressadas; são necessários também recursos, e esses teve-os, pela sua fortuna pessoal, Joaquim Bensaúde, pois ele «próprio custeou, como grande benemérito, as investigações e as edições das suas obras e dos documentos que conseguiu reunir em Portugal e no estrangeiro. Foi simultaneamente um sábio e um mecenas.
Mas, ao pensar neste facto, entristece-nos que nem sempre autênticas dedicações encontram entre nós o apoio e o carinho que merecem. Desperdiçam-se, desviam-se, vocações preciosas, porque a vida tem os seus encargos e exigências para todos.
Outro ensinamento que decorre da obra de Bensaúde é o da vantagem da colaboração entre os cientistas e os homens do Governo e de acção, como sucedeu na época culminante das nossas navegações e expansão ultramarina, e ele próprio demonstrou. E preciso desfazer a lenda malévola da fraca vocação portuguesa para a investigação. Mal vai à nação moderna que descurar a investigação científica.
Joaquim Bensaúde deu-nos, como historiador do esforço náutico idos Portugueses, uma lição de sábia política nacional.
São estes, Sr. Presidente, os ensinamentos que, nas minhas breves palavras de homenagem, julgo dever extrair da biografia do Dr. Joaquim Bensaúde.
Termino, Sr. Presidente, inclinando-me reverentemente perante a memória insigne do grande sábio, que foi também um grande português; inclino-me perante a memória de alguém que nasceu no coração do Atlântico - do Mar Antigo dos Portugueses, na expressão do ;poeta- e que viveu na contemplação amorosa das estrelas do Céu, dessas estrelas que serviram de guia aos heróis da nossa epopeia. Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. José Meneres: - Sr. Presidente: como é do conhecimento público, foi ultimamente criado mais um tribunal cível na comarca do Porto - o 6.º juízo cível. Mas logo se tornou voz corrente que este tribunal vai ser instalado num prédio da Rua de Santa Catarina, já expropriado pela Câmara Municipal para demolição, e não junto dos outros tribunais cíveis, no velho edifício do Convento de S. João Novo.
Antecipando uma afirmação às considerações que tenciono fazer quando se discutir o aviso prévio do Sr. Deputado Avelino Campos sobre a organização e funcionamento dos serviços de justiça, direi que estes, no Porto, funcionam em precárias circunstâncias, que a, isenção e boa vontade dos magistrados nem sempre conseguem evitar que redundem em desprestígio da justiça.
Se, como se anuncia, esse 6.º juízo cível for instalado em edifício separado e distante daquele onde estão os restantes tribunais cíveis, as apontadas deficiências da organização e funcionamento dos serviços de justiça não deixarão de se avolumar, por motivo da sua dispersão e consequentes inconvenientes para todos que têm de concorrer para a sua eficiência.
Creio que o inconveniente se poderá remediar desviando do edifício de S. João Novo o Tribunal de Execução das Penas e possivelmente a Câmara de Falências, ambos de função diferenciada dos restantes serviços de justiça e de menor acesso do público, instalando-os em qualquer outro edifício ou até naquele onde se tenciona instalar o 6.º juízo, ficando este em S. João Novo.
Ouso, desta Assembleia, chamar para o caso a atenção de S. Ex.ª o Ministro da Justiça, certo de que ele ponderará convenientemente, e enquanto é tempo, a sugestão que acabo de fazer, a qual reflecte, não apenas um alvitre próprio, mas sim o desejo de todos que à causa da boa administração da justiça dedicam os seus melhores esforços.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-Consta-me que a Ordem dos Advogados já representou nesse sentido. A sua solicitação acrescento a de quem veio a esta Assembleia pela cidade do Porto, à qual o caso especialmente interessa.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: passaram-se as festas de Natal e nos lares dos amnistiados que foram reintegrados na situação de reforma reinou uma profunda tristeza; ainda nada receberam, há sete longos meses que esperam ... e desesperam. Fui politicamente perseguido e continuo a ser perseguido incompreensivelmente como universitário, mas ponho o meu caso pessoal sempre fora dos problemas políticos que posso examinar. Há que fazer justiça à forma carinhosa como se têm ocupado do assunto dos amnistiados o Sr. Presidente do Conselho e os Srs. Ministros da Presidência e das Finanças e à incansável boa vontade do Sr. Director-Geral da Contabilidade Pública.
Num organismo autónomo do Estado em que os elementos directivos são dos menores que temos, em probidade e em competência inteligente, afalcou-se uma
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burocracia que emperra e dificulta tudo, sem tentar neste caso dos reintegrados para aposentação apresentar soluções para rapidamente resolver o assunto; melhor seria que a sua diligência burocrática se empregasse no sentido de elevar os rendimentos desse organismo, de modo que o Estado não tivesse lucros que equivalessem quase aos cupões da sua carteira de títulos- o que nos levaria a pensar que bastaria alguém que cortasse os cupões ... e que, com tempo assim disponível, oferecesse soluções para o Estado não pagar os deficits da sua própria previdência com o seu funcionalismo, e estes bem pudessem ser diluídos nos lucros gerais.
Sr. Presidente: não poderia deixar de dizer duas palavras de apreço pelo Sr. Ministro das Finanças, mas quanto aos vencimentos dos funcionários público» parecia-me que talvez fosse ainda possível a S. Ex.ª encarar, dentro da sua boa vontade indiscutível e também das possibilidades dos saldos orçamentada, o aumento o a modificação do abono de família, sobretudo a revisão da sua estrutura.
Fugiria ao mais claro dever da minha bem conhecida sinceridade e do meu absoluto desassombro se não dissesse o que penso: que os aumentos ligeiros são ultrapassados pelo custo de vida, que sobe implacável e sincrònicamente. Defendo tecnicamente, fora dum reajustamento dos abonos de família, os sistemas dinamarquês, austríaco, espanhol e outros, duns aumentos anuais, feitos no género de gratificação de fim de ano, dentro das possibilidades do Tesouro e dum rearmamento fiscalmente pouco produtivo, porque não espevita a nossa economia, por ter quase todo de se fazer, naturalmente, em divisas, e não em escudos.
Tenho dito.
Vozes:-Muito bem, muito bem!
O orador foi multo cumprimentado.
O Sr. Proença Duarte: - Sr. Presidente: no passado dia 30 de Dezembro foi festivamente inaugurada na província do Ribatejo, a cuja vida administrativa tenho a honra de presidir, uma nova ponte sobre o rio Tejo, com a presença de S. Ex.ª o Presidente da República e do Sr. Presidente do Conselho. O facto tem tal projecção na vida do País que bem merece ser assinalado na Assembleia Nacional.
É sabido que os meios de comunicação e a rapidez dos transportes têm influência profunda e decisiva no desenvolvimento da, vida económica, havendo quem afirme que essa influência sobreleva mesmo a das transformações na técnica da produção.
A construção desta nova ponte, adaptada aos modernos meios de transportes terrestres, encurtou distâncias, embaratece e facilita transportes numa vasta zona das de maiores possibilidades produtivas do País.
Por isso não oferece dúvidas de que desempenhará uma função económica altamente utilitária e que se enquadra ajustadamente dentro das realizações levadas a cabo, visando a Reconstituição económica da Nação.
Nas províncias confinantes do Ribatejo e Alentejo há grandes potencialidades de riqueza que carecem de ser estimuladas e impulsionadas por uma indispensável e insubstituível acção do Estado, porquanto dela resultará maior absorção de mão-de-obra nacional, aumento de produção, com inerente melhoria na retribuição do trabalho, e efectivo benefício para a economia e para a paz social.
É indeclinável dever de justiça dizer que o Governo da Revolução Nacional tem realizado mestas províncias várias obras com esse objectivo, entre as quais se podem citar as obras de hidráulica agrícola do Paul de Magos, em Salvaterra, a dos campos de Alvega, as do vale do Sado, a barragem do Castelo do Bode, a reconstrução, beneficiação e a abertura de novas estradas e, agora, a construção da ponte sobre o Tejo, em Vila Franca de Xira, merecendo ainda referência a construção da ponte da Raposa, entre Almeirim e Coruche, a de Muge, entre Almeirim e Salvaterra, e as de Coruche sobre o rio Sorraia, obras estas de menor vulto, mas que muito beneficiaram as comunicações e o transporte de mercadorias nestas regiões, facilitando o desenvolvimento das suas riquezas e a valorização dos seus produtos.
Há, porém, em matéria de pontes, uma obra que uma vez mais aqui me permito lembrar ao Governo: é a ponte de Benavente, aluída e desaparecida há anais de sessenta anos, cuja reconstrução definitiva agora é mais premente, porquanto a estrada em que se localiza é das que maior contributo de veículos dará à ponte de Vila Franca, pois por ela se encaminharão não só os da província do Ribatejo como também os da Beira Baixa e grande parte dos do Alentejo.
Todo este trânsito estará prejudicado nas épocas de cheias, por vezes prolongadas por largos dias, que submergem a ponte provisória num desvio, reconstruída mais uma vez precariamente no passado ano, por ter sido arrastada pela cheia a que lá existia.
O Governo por certo terá considerado já este aspecto do trânsito ligado com a utilização da nova ponte sobre o Tejo e há-de procurar dar-lhe oportuna resolução.
Ela importa benefício para as populações que arduamente trabalham a terra; e estas sabem reconhecer e agradecer o bem que lhes fazem.
O que se passou no momento da inauguração da ponte de Vila Franca é disso exemplo bem frisante e eloquente. De perto e de longe, de muito longe mesmo, foram até lá muitos milhares de portugueses, que da terra e para. a terra vivem, levar agradecimentos ao Governo da Nação, designadamente a Salazar, que há cerca de dois anos, de uma varanda do Terreiro do Paço, lhes havia marcado esse momento para novo encontro, que queria que fosse, da sua parte, para lhes retribuir os agradecimentos que então lhe foram apresentados pela publicação do decreto que adjudicava as obras da ponte. Mas Salazar deve ter sentido bem nesse momento de exaltação e de fé nos destinos de Portugal que esses milhares de trabalhadores foram lá não para receber os seus agradecimentos, mas para o vitoriar e ao Governo da Nação e para lhe afirmar, à clara luz daquele dia luminoso, que todos quantos afanosamente produzem e trabalham nesta boa terra portuguesa compreendem os seus altos objectivos governativos, vivem com ele a mesma ansiedade dominante de dignificar a vida portuguesa, fortalecer a economia e engrandecer u Pátria, e por isso o consideram, como expressiva e portuguêsmente disse Filipe Malta na sua emocionante saudação dos povos do Alentejo, o grande amigo de todos os portugueses; e poderia acrescentar que todos têm a certeza de que ele é o melhor e mais estrénuo defensor dos legítimos e fundamentais interesses de todos os que nasceram nesta terra portuguesa.
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Por isso, ainda, «esperam e têm por certo que o Governo de Salazar ordenará a utilização da ponte de Vala Franca de forma que ela contribua paira que se melhore o custo de produção dos produtos diais terras circundantes e se não agrave o preço dais mercadorias que por ela hajam de transitar.
Essa obra, como tantas outras que se têm levado a caibo, é dias que ficam a assinalar e a marear esta época heróica da administração pública.
E disse e repito que é uma época heróica, da nossa administração pública, porquanto durante ela se restaurou um país em ruínas, se readquiriu prestígio e se fomentou a riqueza, tudo à custa, de um esforço pertinaz e esclarecido e de sacrifícios voluntariamente suportados.
Por isso me parece justo manifestar aqui veemente
agradecimento ao Governo da Nação e a todos quantos por qualquer forma contribuíram porque se tomasse uma reconfortante realidade a construção da nora ponte saibre o Tejo na ridente planura ribatejana.
É o que por mim faço, na certeza de que também interpreto o sentir das populações do Ribatejo e ainda o de todos os membros desta Câmara.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Pimenta Prezado: - Sr. Presidente: a ponte sobre o Tejo, inaugurada aio passado dia 30, é um melhoramento de tal importância e transcendência que não é demais enaltecê-lo, repetindo elogios, reeditando argumentos- a realçar essa grande realização do Estado Novo, só possível com a política de saneamento financeiro de Salazar, consequência de uma administração zelosa e sensata.
Fez muito bem o Governo possibilitando que a inauguração fosse assistida por grande número de portugueses, que foram para os seus lares, contar a sua viagem, maravilhados; regressaram às suas terras com a impressão radicada de um grande empreendimento a enriquecer o património nacional.
Como português, como alentejano, associo-me de todo o coração ao regozijo nacional, acompanho os alentejanos, especialmente os alto-alentejanos, que numa numerosa embaixada foram a Vila Franca tomar parte na inauguração festiva.
E eu, que vivo junto dessa gente rude e boa, que faço vida rural, recolhi com alegria a indelével impressão que essas almas simples trouxeram da sua viagem.
A par do valor do melhoramento inaugurado, não pode deixar de se exaltar o grande alcance político da jornada festiva.
A ponte, muito justamente chamada «do Marechal Carmona», ficará como marco a limitar uma época. Ouvir-se-á por muito tempo: foi aio ano da inauguração da ponte ... foi antes ... foi depois ...
O distrito de Portalegre - o meu distrito - fez-se representar por numeroso séquito, que maior não foi pela impossibilidade de conseguir transportes, e deve notar-se que foram percorridas largas dezenas de quilómetros, centenas mesmo, em más condições de comodidade, diferentemente das regiões próximas.
O meu distrito mais uma vez afirmou a sua presença e respondeu à chamada.
Tenho muito prazer, e até certo orgulho, em o poder afirmar na Assembleia Nacional!
O distrito de Portalegre não deve, não pode ser esquecido pelo Governo da Nação.
E agora, que temos assegurado o transporte da margem esquerda paira a margem direita a facilitar a viagem para a grande e bela capital consumidora de muitos
dos seus produtos, para o porto de miar escoante de muitos outros, agora, que essa velha aspirações se tornou realidade, é necessário que o Governo da Nação ligue o Alto Alentejo por «estradas, para que essa vasta, e rica região não tenha de percorrer, em pura perda, dezenas d» quilómetros por más estradas, alongando trajectos para poder aproveitai o grande melhoramento.
Num exame, mesmo superficial, a uma carta, ressalta imediatamente a falta de estradas que nos possibilitem as viagens no sentido nascente-poente.
Quase todo o Alto Alentejo, para se dirigir a Lisboa, tem de percorrei muitíssimos quilómetros no sentido sul, para só depois encontrar a via fácil e boa que o conduza no sentido desejado.
Não quero tornar-me fastidioso com números, com exemplos. Repito: um leve exame de uma carta rodoviária é bem mais elucidativo do que os meus apagados argumentos.
Pode perguntar-se: porque tem sido o Alto Alentejo tão desprezado? Talvez porque o alentejano pouco pede. Talvez porque o alentejano é paciente.
Na verdade, nenhuma outra região do nosso Portugal tem sido tão esquecida pelos Poderes Públicos.
O alentejano não pede, porque seja orgulhoso, não. O alentejano às vezes pede, mas não insiste, e, consciente da sua razão, quando não vê satisfeitas as suas legítimas aspirações, vê postergados os seus direitos, retira-se, afasta-se, desiste e, entristado, recolhe-se ao seu habitat, de largos e belos horizontes.
Repete-se com frequência esta grande verdade: o alentejano pede de chapéu na cabeça! Parece que este modo de pedir muitas vezes não agrada.
E tempo de o Alto Alentejo ser dotado de uma rede de estradas suficientes, de reparação das existentes, necessárias para o seu vultoso tráfego, para a exportação dos seus produtos, dos mais ricos do País: a cortiça, o trigo, o gado e o azeite, para não falar em tantos outros.
Não sou invejoso, nunca o fui, acho esse sentimento uma reles inferioridade, mas seria quase explicável tão feio sentimento quando, percorridas centenas e centenas de quilómetros pelas nossas boas estradas alcatroadas, ligando muitas das nossas regiões, ao chegar ao Alto Alentejo, encontramos quase só más ou péssimas estradas.
Em muitos dos concelhos do distrito de Portalegre ainda não há sequer uns metros de estrada alcatroada. Cito, para exemplo, Avis, Gavião e Marvão. E no concelho de Ponte de Sor são 2 escassos quilómetros a ligar a florescente vila á importante estação do caminho de ferro.
Ouso lembrar ao Governo da Nação uma revisão séria do problema das estradas do distrito de Portalegre.
Sempre que é necessário, o distrito de Portalegre está presente à chamada.
Compareceu em notável e notado número na inauguração da ponte- Marechal Carmona e ainda deve estar vincado na retentiva de muitos como o distrito respondeu à chamada aquando das últimas eleições de Deputados, em que uma lista de oposição pretendeu disputar os lugares propostos pela União Nacional.
Dos seus 25:430 eleitores votaram a lista A, patrocinada pela União Nacional, 13:887 (54,6 por cento) e apenas 3:637 votaram a lista B.
E deve ainda recordar-se como essas eleições foram disputadas, como foram rigorosamente fiscalizadas, como se amalgamaram correntes oposicionistas para a conquista dos lugares na Assembleia Nacional.
Não faz mal repetir estes factos, não faz mal recordá-los. Às vezes até parece que os sucessos mais impressionantes rapidamente se esfumam por amnésia funesta e molesta!
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Ao apresentar estes queixumes, em nome do distrito em que tive a honra de ser eleito, eu não quero deixar de declarar, em homenagem à verdade e à justiça, que o Estado Novo algumas estradas construiu e reparou. Seria ingratidão não o reconhecer, e o alentejano não costuma ser ingrato, mas também foge ao fácil pecar da adulação.
Recordo a situação de há trinta anos no concelho de Ponte de Sor, onde nasci, e no concelho de Avis, onde exerci a profissão e constituí família.
Ponte de Sor apenas tinha uns escassos quilómetros de estrada macadamizada, sem uma única ligação para outras povoações ou para as suas freguesias. Tem agora uma estrada a ligá-la a uma afastada freguesia, Montargil, que, seguindo para Mora, atravessa, por uma ponte em ruínas, o rio Sor. Essa estrada, pelo seu grande movimento, está em muito más condições.
O Estado Novo terminou a ligação para a freguesia de Galveias, a ligar Avis. Uma outra estrada, de terra batida, liga Ponte de Sor a Bemposta e Abrantes, estrada incapaz para o tráfego actual.
O concelho de Ponte de Sor espera há muitos anos a estrada que o ligue ao vizinho concelho de Gavião e, por ela, à Beira Baixa e a reparação da estrada para Alter.
O concelho de Avis, antes do 28 de Maio, não tinha uma única estrada macadamizada que o ligasse ao resto do Mundo, lia época de invernia passavam-se dois e três dias sem receber as malas do correio.
Região argilosa, eira tormento tentar sair no Inverno da sede do concelho para as suas. freguesias, para outros concelhos, e impossível a ligação com a sede do distrito.
Tem lugar destacado nesta Assembleia o segundo governador civil do Estado Novo- no distrito de Portalegre. O coronel Vaz Monteiro, que tantas amizades conquistou no distrito, aí por 1930, na sua primeira visita ao concelho de Avis, teve de atravessar a vau, com água até aos joelhos, a corrente lodacenta de uma ribeira para entrar num automóvel que o aguardava na outra margem!
Felizmente essa ribeira transpõe-se agora por uma ponte, e uma estrada liga-nos a Fronteira e depois à sede do distrito, estrada, diga-se, em grande parte em péssimo estado.
A estrada para Ponte de Sor foi obra do Estado Novo, mas também necessita de grandes reparações.
Construiu-se recentemente uma outra estrada que liga a sede do concelho a Pavia e por ela a Arraiolos e Évora, estrada ainda em bom estado, que devemos ao Estado Novo e ao denodado empenho de um outro governador civil, que tem também lugar honroso nesta Assembleia, o Dr. Magalhães Pessoa. Essa estrada terá muito em breve um enorme movimento para o transporte dos materiais para a grande barragem do Maranhão, em início.
Cito só estes dois concelhos, mas poderia citar alguns outros nas mesmas condições. Não quero alongar estas minhas considerações, melhor lamentações, que por imperativo da função me obriguei a proferir.
Sr. Presidente: o distrito de Portalegre está sempre presente à chamada, o distrito de Portalegre não deve ser esquecido. A ponte Marechal Carmona é indiscutivelmente um grande melhoramento... mas o distrito de Portalegre só pode apreciá-lo se o ligarem por estradas transitáveis e directas.
Não ouso fazer sugestões que os competentes técnicos dos serviços têm já suficientemente estudadas; apenas se aguarda a execução.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Calheiros Lopes: - Sr. Presidente: durante o período de férias em que estiveram suspensos os trabalhos desta Assembleia deu-se um acontecimento de tanta importância na vida da Nação que me atrevo a roubar alguns minutos do precioso tempo da Camará para a ele aqui me referir.
Quero aludir, Sr. Presidente, à inauguração da ponte sobre o Tejo em Vila Franca de Xira. Como português, como ribatejano e como homem ligado às actividades económicas pelos elos fortes da lavoura, a que me honro de pertencer, e da indústria, em que igualmente trabalho, não posso deixar de manifestar a profunda alegria e o grato reconhecimento com que, não sómente a minha região - o Ribatejo -, mas todo o País, vimos realizada essa aspiração, que tantos anos viveu apenas em sonhos no espírito de várias gerações e que, como tantos outros benefícios nacionais, só conseguimos ver materializada pela acção renovadora e esclarecida do Governo de Salazar.
Penso que a Assembleia Nacional quererá associar-se aos sentimentos de júbilo verdadeiramente nacional despertado pelo grande acontecimento celebrado no dia 30 do mês findo e magnificamente compreendido pelo País inteiro. Nessa tarde maravilhosa, em que a própria natureza, concedendo-nos um dia de sol radioso, parecia associar-se à nossa satisfação, vimos representantes de todas as hierarquias sociais e de todas as regiões rodearem e aplaudirem S. Ex.ª o Chefe de Estado e o Governo, a quem trouxeram, de todos os cantos de Portugal, as sinceras felicitações e agradecimentos pelo grande benefício que, sob todos os pontos de vista, a ponte de Vila Franca representa.
No aspecto local, unindo os milhares de hectares das férteis lezírias da margem sul do Tejo às terras altas da margem norte, a ponte veio fazer cessar aquelas crises de sofrimento, dificuldades e perigos que anualmente se repetiam na época das cheias. Todos sabem o que eram aqueles dias trágicos, em que sob a ameaça das águas povos e gados, para fugirem à cheia, tinham de atravessar o Tejo revolto e caudaloso em saveiros frágeis, em barcos e lanchas que a corrente arrastava - e até a nado, quando não havia outro meio...
Por isso, Sr. Presidente, justificou-se perfeitamente o relevo que o Estado deu ao acto da inauguração da ponte, relevo e significado que os povos sentiram e se manifestou entusiasticamente nu multidão que esteve em Vila Franca no dia 30.
Tomo pois u liberdade de trazer aqui, para que»fique registado nesta Assembleia, o pálido eco dessa satisfação geral, a que se unem os mais justos sentimentos de reconhecimento ao Governo do Estado Novo, que dotou o País de mais este importante melhoramento.
Deu-se à ponte o nome do saudoso Chefe do Estado Sr. Marechal Carmona, e a esse preito de comovida homenagem todos os portugueses «leram u sua plena concordância.
Ao nome do extinto Presidente junta-se, na comemoração do acto inaugural, o do actual Chefe do Estado, S. Ex.ª o General Craveiro Lopes? que com a sua presença, ilustre quis manifestar o patriótico interesse que lhe merecem todos os factos concorrentes para o desenvolvimento do País.
O Sr. Ministro das Obras Públicas, Ex.º Sr. Engenheiro Frederico Ulrich, deixa igualmente o seu nome ligado a esta obra, que orientou, dirigiu e acompanhou diariamente, chefe activo e inteligente, como é, da plêiade brilhante de técnicos que trabalham no seu Ministério.
Ao apreço que os técnicos dos serviços oficiais nos merecem devemos juntar aquele a que têm jus os engenheiros e operários das empresas construtoras. Uns e outros deram mais esta magnífica prova de que o
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nosso país possui quadros de técnicos e operários competentes, de modo a tornar possível a concepção e a execução de grandes obras de engenharia.
E, finalmente, na cúpula do edifício da nossa pública gratidão devemos colocar S. Ex.ª o Presidente do Conselho, pois, se é certo que nenhuma obra de vulto, das que se ergueram em Portugal nestes quase vinte e seis anos de Estado Novo, seria possível seria Sal azar, não é menos para destacar que esta, a ponte de Vila Franca, mereceu as Ex.ª um interesse e carinho que me permito classificar de pessoais.
Atestam-no a satisfação com que o Sr. Presidente do Conselho, em Abril de 1948, assinou, o despacho de adjudicação da obra e a sinceridade com que, dias depois, ante a grande manifestação de agradecimento que os povos do Ribatejo lhe prestaram, prometeu que a ponte se faria no mais breve prazo e proferiu aquela bela frase de despedida:
«Até lá e até então».
Recordando aqui o importante facto que foi a inauguração da ponte de Vila Franca e os homens de Estado que para o valioso melhoramento contribuíram, tenho sómente em vista, repito, como português e como ribatejano, exprimir perante a Assembleia Nacional o profundo reconhecimento do povo da minha região por mais este beneficio que ficamos devendo ao Estado Novo e a Salazar.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: também eu me desejo associar ao recordar jubiloso da inauguração da ponte sobre o rio Tejo, em Vila Franca de Xira, que se fez no penúltimo dia do ano recém-findo, no meio da alegria, aplausos e agradecimento de dezenas de milhares de pessoas, que, não sem desconfortos e trabalhos muitas delas, vieram ali dar público testemunho do apreço devido à obra e aos seus autores. Nem o facto de a inauguração estar prevista desde muito tempo, anunciada até havia, mais de doze meses, nem a circunstância de hoje em dia e entre nós se terem os grandes benefícios públicos como certos logo que são prometidos, nem a pontualidade do acontecimento, em suma, é motivo para o recebermos com menos alvoroço; contar com a obra foi muito, mas poder aproveitá-la e gozá-la é tudo. Gozá-la, sim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque, no unânime dizer de quantos a percorreram já, eis uma estrutura que na elegância singela das linhas, na robustez visível, mas airosa, dos seus elementos, na facilidade e folgança do trajecto, se torna tão grata de contemplar como vantajosa de usar!
E a própria pontualidade do acabamento não merecerá ela mesma, só por si, louvor e congratulação? Acaso andaremos já tão esquecidos das incapacidades ainda recentes que passemos sem atentar na circunstância importantíssima de uma obra desta grandeza, por bem, preparada e com regularidade suprida do necessário, desde os dinheiros à tranquilidade do meio, ficar completa e pronta a servir no tempo muito antes prescrito ? Pois que assim seja, e que por mais esta vitória sobre o passado rejubilemos; mas não deixemos de considerar que, se já não será caso notável concluírem-se os grandes empreendimentos nos prazos marcados, notável é que tenhamos podido chegar à naturalidade no que ainda ontem seria coisa muito célebre!
Inaugurou-se, pois, a ponte, prometida há pouco mais de três anos sabe Deus há quantos sonhada e apetecida pelos povos ribeirinhos e por todos aqueles que podiam avaliar da vastíssima extensão da sua potencial utilidade.
Como os distintos oradores que me precederam, trago ainda nos olhos o espectáculo, não tanto do grandioso e festivo arraial da multidão que veio ver e acompanhar a cerimónia, esse já de si bem belo, como do rio de gente que por horas e horas sem parança irrompeu da ponte a afirmar o seu gosto nela e a agradecer os esforços de quantos lha tornaram possível. Homens e mulheres, vindos de longe e de perto, de todo o Ribatejo e Alentejo, u cavalo, em carros e carroças, em camiões, mal assentes em máquinas e alfaias de lavoura, mas u grande maioria a pé, em trajes domingueiros ou vestes de trabalho, com bandas de música e os estandartes das suas colectividades mais representativas, milhares, dezenas de milhares de pessoas de todas as condições suciais perpassaram ante a tribuna de honra, em infindável e significativo desfile, a darem testemunho de reconhecimento pela decisão da obra, de apreço pela diligência nela posta, de aplauso pela política que a tornou possível. Os mais deles traziam longas horas de caminhada e anteviam outras tantas, já pelo frio da noite; mas as fadigas nunca os venceram na demonstração, visivelmente sincera, dos seus sentimentos, repetidíssimas vezes -e vencendo a conhecida sobriedade das populações do nosso Sul - levada, à mais simpática exuberância ou a verdadeira afectividade para com os homens que sobre todos sabiam serem os mais merecedores das suas manifestações!
Raríssimas vexes, se alguma foi se terão juntado no País tantas e tão variadas gentes de tantas e tão distantes partes a festejar um neto de administração publica; e a vou insuficiente para exaltar a obra quanto ela merece pode ao menos louvar-se na grandeza da manifestação popular e, reconhecendo-a igual- ao seu objecto, dá-la como medida da importância e felicidade do melhoramento.
A ponte, com efeito, estabelecendo nova ligação entre as duas margens do Tejo, a meio dos últimos 80 quilómetros do seu curso, tem maior, muitíssimo maior, importância do que a ele simples ligação regional, que aliás só de si já seria preciosa como travessia única em trecho tão longo.
De Tomar a Castelo Branco e mesmo à Covilhã, até aos confins do Algarve, as relações de mais de metade do País com a capital são efectivamente melhoradas por ela, encurtando os percursos ou permitindo-os mais laceis. No caminho do Lisboa o Algarve e todo o Alentejo afluem a Alcácer do Sal ou a Vendas Novas, e desde qualquer destes pontos seguir-se-á melhor por Vila Franca, poupando uma travessia em barco, com seus riscos e morosidade, e utilizando estradas mais cómodas.
Isto é já do conhecimento geral e devidamente apreciado; mas parece reparar-se menos em que a própria Beira Baixa e o Alto Alentejo terão no aproveitamento dos trajectos pela margem esquerda do rio e da passagem por Vila Franca economias de distância e apreciabilíssima vantagem de um percurso menos tortuoso. Seja a estrada nacional n.º 118, que os servirá, melhorada, como carece, em algumas dezenas de quilómetros de maus pisos que ainda tem e as superioridades deste itinerário tornar-se-ão definitivamente patentes e incontestáveis.
E assim virá a nova ponte a tornar-se ha obra pública de mais vasto proveito -com as únicas excepções dos aproveitamentos hidroeléctricos e dos portos principais - que se tem feito em Portugal depois da linha férrea do Norte!
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Mas esses meamos reparos dão-me indícios seguros do esforço necessário para tornar o projecto realidade, vencendo, sobre todas as dificuldades técnicas da sua promoção, as apreensões que a conjuntura naturalmente suscitava ao tempo em que tudo acabou por ser decidido. Mãos do que o próprio vulto do investimento e os merecimentos dele, havia a louvar em Vila Franca, no passado dia 30, o adunco posto no estudo do problema, a sabedoria dedicada ao equacionar dele, a clarividência com que foi aprovada a resolução; e por muito que nos sentíssemos firmeis ma convicção das bolais razões da obra, quantos lá estivemos do Ribatejo e Alentejo tínhamos dia sobejo a agradecer, aos homens e à Providencia que lhes iluminou os espíritos, o final triunfo dessas razões.
Como Deputado pelo distrito de Santarém, um dos que a nova ponte muito servirá, de inovo e deste lugar me associo aos aplausos, comungo nos regozijes e acompanho no reconhecimento. E sentir-me-ia em pecado de injustiça deixando de nomear, como máximo credor deste reconhecimento - depois de quem criou os condições gerais de exequibilidade de toda a reconstrução nacional -, o Sr. Ministro das Obrais Publicais. Sem a sua inteligência, a sua tenacidade, a sua dedicação à empresa, esta não se teria porventura realizado ainda; e a abra excepcional que de soube querer e justificar ficará talvez como a mais notável duma- actuação que se tem revelado muito feliz num posto bem difícil.
Agora tenho ainda a dizer umas últimas palavras, mas estas para os meus patrícios e sobre um objecto de muitas interrogações recentes: o pagamento de portagem pelo uso da ponte. A resposta às curiosidades provocadas pelos rumores da sua introdução ficou já dada na própria cerimónia inaugural; e a ponta de reticência, em que alguns quiseram ver restos de dúvida, quererá, suponho eu, apenas significar só agora ter chegado, na seriação das preocupações, o ensejo de ajustar os pormenores duma, disposição que afinal pouco importa se aplique umas semanas mais cedo ou mais tarde.
Mas, te as dúvidas foram dissipadas, não foi todavia esclarecido o fundamento da medida, que poucos esperariam e alguns sentem ter razões para estranharem.
Confessarei aqui que eu próprio me incluía no rol destes, aparentemente numeroso. Não porque o facto da portagem em princípio me repugne-sei bem que a prática, suprimida há século e meio por essa Europa fora como estorvo à liberdade da circulação, ressurge agora e multiplica-se por toda a parte, sob as duras exigências da vida moderna, cada vez mais devoradora de recursos. Se a tal uso até os opulentíssimos Estados Tinidos da América entendem necessário deitar mão - e fazem-no para muitas das suas grandes obras rodoviárias -, não seria nunca excessivo que na nossa modéstia aproveitássemos também a receita, cujas cobranças parecem não importunar demais o povo mais apressado da terra.
Tenho todavia por entendido que as portagens servem em regra para amortizar investimentos financiados por operações privativas, e nesta diferença se estribava a minha surpresa.
A ponte de Vila Franca, com efeito, foi paga pelas receitas gerais do Estado; não determina, pois, um serviço financeiro que cumpra assegurar especialmente, e, não estando nos nossos hábitos que o uso das obras de viação seja pago, bem poderia em consequência esperar-se para ela a costumada gratuitidade de passagem. Nem esta é grande favor, porque os usuários das estradas nacionais pagam por si sós, em impostos directos e indirectos, o que elas custam a manter.
Sem dúvida a obra foi muito cara e pesada ao erário; mas outras comparáveis o tem sido também, e todavia utilizamo-las livremente. Ocorre logo o exemplo da auto-estrada de Lisboa: passadas as bifurcações para Algés e Sintra, serve só ao estádio Nacional e a algum trânsito para os Estoris.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Votada em grande parte a tráfego de luxo ou prazer, que rende a auto-estrada, se o próprio Estádio que completa é deficitário nalguns centos de contos por ano?
Nestes termos, sem necessidade forçosa, sem precedentes senão negativos -as últimas portagens foram suprimidas, há ainda poucos anos, justamente como embaraços ao trânsito -, até com certa desigualdade comparativa, a novidade da portagem em Vila Franca de Xira causou sensação, que, repito, também experimentei. Para mais, convicto da larguíssima utilidade da obra, nem me parecia que nela tivessem sido consumidos dinheiros da Nação em proporções que, por demasiadas, impusessem alguma forma de reembolso. E perguntava-me sobre tudo isto se o enfado certo do público poderia ao menos ser compensado por receitas realmente substanciais e apreciáveis no acervo dos rendimentos gerais a que se juntariam.
Possuído destes sentimentos e razões, e sabendo que de alguns deles partilham sectores respeitáveis da opinião, senti que cumpriria inteirar-me das razões em contrário, pois, não querendo calar-me com as minhas, se prevalecessem no meu entender, desejaria dar à medida do Governo, e perante os meus com provincianos, o publico crédito dos fundamentos que era o primeiro a desejar me convencessem deveras.
Procurei, pois, informar-me em boa fonte e conclui, e digo que em favor da medida, seja ela embora ingrata, militam razões de interesse superior, a quê é justo reconhecer o peso.
Conhece-se exactamente, claro está, o tráfego até agora habitual da travessia de Vila França, pela estatística do movimento dos barcos locais; e um inquérito conduzido durante o último ano permitiu ajuizar da proporção, e consequentemente do preciso volume, daquele tráfego dos barcos de Cacilhas que, dado o seu destino, é lícito presumir se desvie para a ponte.
Nestas bases, e com a adicional segurança das provavelmente fortes e por ora indetermináveis correntes que se formarão, atraídas pelas comodidades da nova passagem, foi possível calcular com. segurança a receita da portagem, com taxas, moderadas e a legítima protecção ao tráfego modesto e ao de interesse puramente local.
E verifica-se que tal receita chegará para cobrir os encargos da sua conservação, aliás dispendiosa, e mais os da reintegração total do custo da obra, em prazo razoável e a juros correntes, encargos que são, aliás, incomparavelmente maiores, como é fácil crer.
Esta capacidade de reintegrar o seu próprio custo, numa capitalização normal, conferirá à obra aquele carácter de directa reprodutividade, cuja dúvida a tornou tão discutida por certas vozes autorizadas, e justificará finalmente toda a argumentação que fez triunfar o projecto.
Eis a razão forte - não sei se diga a obrigação moral- da portagem; e as dificuldades da conjuntura que temos atravessado, de modo nenhum vencidas, dão-lhe o maior peso.
Não é, aliás, improvável que, uma vez firmada a receita, a mesma importância dela venha a justificar melhoramentos conexos de alto valor e do maior interesse, abrindo até caminhos de solução a problemas que de outro modo teriam de arrastar-se longamente.
O pequeno ónus incidente sobre os usuários da ponte poderemos todos pagá-lo, pois, com a certeza de que,
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como sempre desde há vinte e cinco anos, será dinheiro bem empregado. Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.
Ordem do dia,
O Sr. Presidente: - Vai começar a discussão, na generalidade, da proposta de lei sobre o condicionamento das indústrias.
Tem a palavra o Sr. Deputado Melo Machado.
O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: o facto de ser presidente da Comissão de Economia obriga-me a abrir este debate, mas estejam VV. Ex.ª tranquilos porque irei ocupar esta tribuna e a vossa atenção por muito pouco tempo - o tempo apenas necessário para esclarecer a Assembleia sobre as intenções desta proposta de lei, que se me afigura oportuna e corresponder a determinadas atitudes que o Sr. Ministro da Economia tem vindo, com aplauso geral, a tomar.
As teorias económicas mudam e transformam-se, acompanhando a evolução económica e social que no Mundo constantemente se realiza. Mas posso afirmar que essas modificações são por vezes espectaculares e impressionantes.
Roosevelt iniciou o New Deal, cuja orientação era aproximar a produção do consumo, e todavia passados não muitos anos verificamos que a teoria actual é absolutamente contrária: o que se pretende é aproximar o consumo da produção.
Esta segunda teoria parece-me mais humana e mais cristã, porque não podemos esquecer que sob o signo da primeira se deitou ao mar o café do Brasil e se queimou nas locomotivas argentinas o trigo que não encontrava preço compensador.
Podem estes factos ter correspondido a circunstâncias de momento, mas, quando pensamos quantas bocas famintas agradeceriam um pouco mais de pão e que muitos males físicos da humanidade provêm de deficiências alimentares, quando verificamos que em algumas regiões do Globo há fomes periódicas, somos levados a concluir que a adopção de tais processos de regular a economia parecem inadmissíveis.
Adaptar o consumo à produção implica, naturalmente, a elevação do nível de vida das populações e presume uma larga preparação, que não pode deixar de agitar ou incomodar as que se instalaram comodamente nos velhos princípios e se recusam a acompanhar a evolução dos tempos.
S. Ex.ª o Sr. Ministro da Economia, nosso ilustre e estimado colega, logo que tomou conta da sua pasta começou a diligenciar libertar a vida nacional de pelas escusadas que a guerra justificara.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-A pouco e pouco, com cuidado, certamente, mas também com perseverança, S. Ex.ª tem vindo a simplificar a nossa vida económica, libertando os produtos e os cidadãos de condicionamentos excessivos ou de formalidades escusadas.
Suponho que sobre o assunto não há duas opiniões, e todos lhe agradecemos os propósitos e a acção.
É o momento de definir a orientação desta proposta de lei, inteiramente de acordo com a actuação de S. Ex.ª o Ministro.
Marca-se logo na sua base I que o sentido em que se pretende legislar é o de estabelecer, com relação à indústria, uma liberdade progressiva, dando à iniciativa particular a possibilidade e o direito de promover o estabelecimento de novas unidades industriais e a modificação ou transferencia das existentes.
Parece, Sr. Presidente, que este princípio devia sorrir aos próprios industriais, que estiveram até há pouco tempo sujeitos a um condicionamento tão apertado que a simples mudança de local de uma máquina requeria autorização mediante vistoria, parecer, etc., com todas as consequentes complicações, aborrecimentos e papelada.
Eu nunca pude compreender como é que qualquer funcionário, por mais engenheiro que fosse, pudesse, ao chegar a uma fábrica, em poucos minutos, decidir para sim ou para não aquilo que o dono da fábrica, velho conhecedor do assunto, tinha levado meses ou anos a pensar.
Todavia isto passava-se, posso afirmá-lo a VV. Ex.ª
O condicionamento, porém, traz aos já instalados uma segurança e tranquilidade que se não abandonam de boa vontade. Pretende-se justificar o condicionamento, além de outras razões, com a necessidade de impedir que se percam alguns capitais que, dada a nossa fraqueza económica, não convém desperdiçar.
Ora entre nós isso não se dá, e a razão é simples: pois se um fabricante não consegue vingar com a sua indústria, há sempre quem lhe compre as máquinas, e, por consequência, o prejuízo nunca é total. Não sucede aqui como na América, em que um industrial, quando consegue que a modificação de uma máquina poupe alguns minutos ou segundos em determinado movimento, destrui ou vende para sucata a máquina antiga para evitar o seu aproveitamento por algum concorrente. Entre nós isso não sucede; quando um industrial não pode vingar, o que faz é vender os mecanismos, que outros compram e aproveitam para os utilizar para o mesmo fim.
Sr. Presidente: mas eu pergunto se não se perderia muito mais descansando à sombra da lei do menor esforço, deixando de acompanhar os progressos da técnica, adormecendo sobre a certeza dos lucros que as pautas e a falta de concorrência garantem, deixando envelhecer lamentavelmente as instalações e abandonando a busca incessante de novas máquinas, de novos processos que a concorrência acicata.
Quanto a mim, Sr. Presidente, estou convencido de que, se fosse possível estabelecer uma conta corrente entre as vantagens e desvantagens dos dois sistemas, o condicionamento não levaria a melhor.
Todos nós sabemos que a indústria que mais condicionada está é a que se refere ao abastecimento do pão. Está condicionado o preço para a lavoura, está condicionado o preço para a moagem, está condicionado o preço para a venda do pão.
Todavia, Sr. Presidente, tenho presente uma representação do Grémio dos Industriais de Panificação de Lisboa dirigida ao Sr. Ministro da Economia, em que se pede nada mais nada menos do que a liberdade de escolha da fábrica. Na representação diz-se:
Urge dar aos industriais de panificação a faculdade de adquirirem a farinha na fábrica ou fábricas que mais lhes convenham. Satisfazendo-se esta aspiração da indústria contribuir-se-ia talvez para a solução dum problema que constitui hoje um dos flagelos da panificação, visto as farinhas se apresentarem quase sempre com o máximo de cinzas e humidade fixado por lei.
O industrial de moagem actualmente não tem de preocupar-se com a colocação do produto porque o
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tem absolutamente garantido, o que algumas vezes o levará a não cuidar como deveria do fabrico, resultando como consequência lógica o fornecimento à panificação de farinhas de fraca qualidade.
Sr. Presidente: julgo que efectivamente a liberdade de escolha da fábrica não seria de todo o ponto desaconselhável, pois me parece que, havendo certa emulação entre as fábricas, estabelecendo-se concorrência, o produto melhoraria.
Dentro do actual sistema sempre haveria que acabar por consumir-se as farinhas pior fabricadas, mas, além do prejuízo resultante da demora na colocação do produto, quando o pão piorasse, podia saber-se quais as fábricas responsáveis.
Em todo o caso, é agradável registar que esta mesma representação prova que ainda há industriais que neste regime fazem a diligência por cumprir e por apresentar os seus produtos pela melhor forma.
Não sei, Sr. Presidente, até que ponto o condicionamento tão apertado que tivemos durante a guerra terá concorrido para que os foragidos dos países conquistados ou invadidos nessa altura deixassem de vir instalar aqui as suas novas indústrias, os seus novos processos. O que sei é que, se se progrediu industrialmente, não utilizámos como seria necessário e indispensável esse afluxo de sangue novo de indiscutível utilidade.
Se continuarmos em apertado condicionamento, que farão os que chegam à vida sem encontrarem maneira de nela se estabelecerem, sem poderem revelar as suas qualidades, dar materialização realidade, a sonhos ousados, que por vezes vingam, vencem, triunfam com proveito geral da colectividade?
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-A proposta, todavia, não faz tábua rasa dá situação anterior, nem pretende impensadamente adoptar um caminho inteiramente oposto àquele que se tem seguido. Considera cautelosamente a situação, admite a necessidade em certos casos de condicionamento, que define na sua base li. Restringe, porém, a sua aplicação aos casos que constam da base III.
Dando satisfação a tantas e tão aturadas reclamações, a proposta isenta de condicionamento o trabalho caseiro e familiar, que era tanto da predilecção do nosso saudoso colega Dr. Antunes Guimarães, e igualmente exceptua do referido condicionamento os estabelecimentos complementares da agricultura.
Quando foi da votação da Lei n.º 1:956, os Deputados que então tinham assento nesta Casa e defendiam a causa agrícola reagiram contra o princípio estabelecido nessa lei da inclusão dos estabelecimentos complementares da agricultura no condicionamento. Lembro-me até que o nosso ilustre colega Dr. Proença Duarte apresentou emenda nesse sentido, a qual não conseguiu vingar, aliás por poucos votos. E talvez por isso mesmo seja consolador verificar agora que o próprio Governo, espontânea e inteligentemente, veio ao encontro desta velha aspiração.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Sr. Presidente: não ficaria satisfeito com a minha consciência se não afirmasse aqui, nesta tribuna, julgando interpretar o sentir da classe agrícola, a S. Ex.ª o Ministro da Economia os meus sinceros agradecimentos, em nome dessa tantas vezes esquecida e por vezes maltratada classe, por ter encontrado em S. Ex.ª quem desse satisfação a um princípio que julga ser inteiramente justo.
Este ponto da proposta em discussão começa a trazer ao meu espírito II esperança de que a agricultura está a ser um pouco melhor compreendida, havendo esperança de melhores dias.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Finalmente, nesta análise esquemática que tenho vindo a fazer, resta-me referir ao facto de se criar um Conselho Superior da Indústria em termos de poder dar satisfação aos próprios industriais e de poder, por esse mesmo motivo servir o fim a que se destina.
Sempre tenho defendido nesta Assembleia o princípio de que se devem ouvir os interessados.
O Sr. José Meneres: - Não se deve preterir, na aplicação da lei do condicionamento, o aspecto político da questão, ou seja o aspecto político do Conselho, pelo aspecto essencialmente técnico.
Ambos devem ser levados em conta e na justa e conveniente proporção.
O Orador:-Suponho que o aspecto político da questão é com o Governo. O Conselho Superior da Indústria não delibera. Discute os assuntos e apresenta-os ao Ministro.
O que sempre me tem parecido errado é que se esqueçam os interessados, que estes não sejam ouvidos.
Porém quem melhor do que eles - pois eles mais do que ninguém os conhecem - pode debater os seus problemas por forma a esclarecer cabalmente o Ministro que queira resolver em consciência.
Infelizmente isso raras vezes se faz.
O Sr. Botelho Moniz: - Para mal dos meus pecados, sou vogal representante da indústria em duas comissões reguladoras, bem ou mal chamadas pré-corporativas ou de coordenação económica. Pois tenho verificado que, por considerações de ordem política, os pareceres dados por essas comissões, que são mistas, compostas por funcionários do Estado e por representantes de actividades económicas, sistematicamente não são aprovados pelo Ministro.
De maneira que há uma prevalência absoluta do critério político sobre o critério económico.
O Orador:-A verdade é que, regra geral, os interessados não são ouvidos.
É natural que os indivíduos, na ânsia de defenderem os seus interesses, vão longe demais, mas a verdade é que não tomar conhecimento nenhum, não se ouvir ninguém, não se querer saber aquilo que acontece é que não pode ser, e faz até lembrar a avestruz, que, dizem, embora não seja verdade, esconde a cabeça para não saber o que se passa.
Acho que se devem ouvir os interessados e, depois, do resultado da discussão tirar todas as indicações ou elementos que se possam considerar úteis.
Estes são, a meu ver, os pontos salientes desta proposta de lei. Não desejo demorar-me muito mais na sua análise, mas a verdade é que não posso deixar de me referir a um ponto que tanto parece ter impressionado o ilustre relator da Câmara Corporativa, isto é, a ofensa à doutrina do Estatuto do Trabalho Nacional.
Na verdade, e salvo o devido respeito por quem na matéria tem excepcional autoridade, não vejo em que a proposta a contrarie.
Se esta reconhece logo na sua base 1.ª a iniciativa particular e se o Estatuto do Trabalho Nacional diz que a iniciativa particular é o mais eficaz instrumento do progresso e da economia da Nação -e este preceito não é o segundo, nem o quarto, nem o sétimo, nem o oitavo, mas logo o primeiro, o principal, o dominante -,
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concluo, logicamente, que a proposta está de acordo com o Estatuto do Trabalho Nacional.
Sr. Presidente e Sr. Deputados: a vossa Comissão de Economia, tendo estudado a proposta, entendeu dever dar-lhe o seu parecer favorável.
O Sr. Calheiros Lopes: - V. Ex.ª dá-me licença? Eu supunha que não havia parecer da Comissão de Economia. Apenas foram apresentadas algumas emendas a proposta de lei que não têm a assinatura de todos os componentes dessa Comissão.
O Sr. Botelho Moniz: - Foi votado por unanimidade, menos um.
O Sr. Calheiro Lopes: - Perdão: que eu saiba pelo menos quatro membros dos presentes não assinaram.
O Sr. Botelho Moniz: - Quais os outros?
O Sr. Calheiros Lopes: - V. Ex.ª possivelmente, pode ver essas assinaturas e verificará quais são.
O Orador:-A Comissão de Economia não há dúvida nenhuma que deu o seu parecer favorável a esta proposta. Não interessa à Câmara, e se interessa não tenho duvida em o dizer, que o parecer não foi dado por unanimidade; mas isso não implica que o parecer não seja favorável.
As emendas que a Comissão apresenta são de pequena monta. Vou esclarecer VV. Ex.ª, embora tencione pedir ao Sr. Presidente que as mande inscrever no Diário das Sessões, para VV. Ex.ª as poderem meditar e estudar.
Na base vi, no último período, substituir as palavras «vários lavradores» por «cooperativas agrícolas».
Quanto à base XI, adopta-se o parecer da Câmara Corporativa. Nesta emenda há realmente uma certa diferença. A proposta permitia a inspecção directa das fábricas e a emenda da Câmara Corporativa não permite essa inspecção.
O Sr. Bustorff da Silva: - A base como está redigida permitiria até a devassa dos segredos de fabrico.
O Orador:-O Sr. Ministro, entendia que quem tem uma situação de privilégio tem, por outro lado, obrigações, mas a Comissão preferiu a proposta da Câmara Corporativa.
Depois há as bases XV e XVI, que no parecer da Câmara Corporativa eram a base XVII.
O ilustre relator, como introduziu várias bases e chegava a uma base XVIII, condensou na base XVII as duas bases da proposta XV e XVI, e então a Comissão adoptou esta base XVII da Câmara Corporativa, mas dividindo-a em duas bases.
E aqui têm V. Ex.ª o que são afinal as emendas propostas pela Comissão de Economia.
Mando para a Mesa estas emendas, pedindo a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o favor de as mandar inserir no Diário das Sessões de amanhã, para que todos os Srs. Deputados as possam estudar, meditar e saber como hão-de votar.
Quero ainda pedir aos Srs. Deputados que porventura tenham interesse em apresentar quaisquer emendas o favor de mas comunicarem, para que a Comissão possa fazer sobre elas o estudo necessário, evitando que se possa rejeitar ou aprovar de afogadilho qualquer emenda apresentada à última hora.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
Amanhã haverá sessão, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.
Eram 18 horas e õ minutos.
Srs. Deputados quê entraram durante a sessão:
António de Matos Taquento.
António Sobral Meados de Magalhães Ramalho.
Diogo Pacheco de Amorion.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Abel Maria Castro de Lacerda.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
António Joaquim Simões Crespo.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Gaspar Inácio Ferreira.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
Joaquim de Moura Relvas.
José Garcia Numes Mexia.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria Vaz.
Mário de Figueiredo.
Pedro de Chaves Cymhron Borges de Sousa.
Vasco de Campos.
O REDACTOR - Luís de Avilles.
Propostas de emendas enviadas pelo Sr. Deputado Melo Machado no final do seu discurso proferido na ordem do dia:
Proposta de lei sobre condicionamento industrial Propomos as seguintes emendas:
BASE VI
No último período substituir as palavras «vários lavradores associados» por «cooperativas agrícolas».
BASE XI
Adoptamos a redacção do parecer da Câmara Corporativa.
BASE XV
O Conselho Superior da Indústria será remodelado com vista a poder pronunciar-se, não só sobre os problemas do condicionamento industrial, mas também sobre quaisquer outros que respeitem à organização e fomento das indústrias acerca dos quais seja consultado pelo Governo.
Deverá ser constituído, além dos naturais representantes do Estado e dos organismos de coordenação ou
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corporativos, por pessoas competentes nos domínios da economia teórica e aplicada e por outros técnicos que o Governo julgue dever designar.
BASE XVI
O Conselho Superior da Indústria será obrigatoriamente ouvido pelo Ministro da Economia nos casos de cessação de condicionamento de qualquer indústria ou modalidade industrial e de modificação ou revogação das autorizações concedidas e tem ainda competência para submeter ao Governo o resultado dos estudos a que tenha procedido acerca da maneira como funciona o condicionamento.
Nota. -Estas duas últimas bases correspondem a emendas do parecer (base XVII), com pequenas alterações.
Francisco Cardoso de Melo Machado - Carlos Monteiro do Amaral Neto - Artur Proença Duarte - António de Matos Taquenho - Jorge Botelho Moniz - António Cortes Lobão - Joaquim de Oliveira Calem.
CÂMARA CORPORATIVA
Acórdão da Comissão de Verificação de Poderes Acórdão n.º 20/V
A Comissão de Verificação de Poderes da Câmara Corporativa, eleita na sessão preparatória de 25 de Novembro de 1949, no uso da competência atribuída pelo
artigo 106.º da Constituição Política e tendo em vista o disposto no artigo 7.º e seus parágrafos do Regimento desta Câmara e nos Decretos-Leis n.º 29:111 e 32:416, de 12 de Novembro de 1938 e 23 de Novembro de 1942, reconhece e valida os poderes como Dignos Procuradores aos Srs. Álvaro da Piedade Abreu e João Pedro Neves Clara, os quais foram designados pelo Conselho Corporativo em sessão de 18 de Dezembro próximo passado, o primeiro como presidente da comissão administrativa do Grémio da Lavoura de Cantanhede e Mira e o segundo na qualidade de presidente do conselho geral do Grémio dos Industriais de Transportes em Automóveis, para preencher as vagas ocorridas nesta Câmara, respectivamente: na secção de Vinhos, por exoneração do Sr. Nuno Pinto Basto de presidente da comissão administrativa do mesmo Grémio da Lavoura; na secção de Transportes e turismo, por haver terminado o seu mandato o presidente do conselho geral do referido grémio, Sr. Rodolfo Ventura Teixeira (does. n.º 67 a 74).
Palácio de S. Bento e Sala das Sessões da Comissão de Verificação de Poderes da Câmara Corporativa, 7 de Janeiro de 1952.
José Gabriel Pinto Coelho.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Adolfo Alves Pereira de Andrade.
Inocência Galvão Teles.
Manuel Duarte Gomes da Silva.
Tomás de Aquino da Silva.
Virgílio da Fonseca.